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A TEORIA DO RECONHECIMENTO DE AXEL HONNETH
Axel Honneth é um dos mais influentes autores do
debate contemporâneo da filosofia social e da teoria
política, é uma das figuras mais proeminente da nova
geração da Teoria Crítica. A Teoria Crítica desenvolvida
pela Escola de Frankfurt, especialmente por Horkheimer e
abrangia uma releitura do pensamento de Karl Marx. Esse
campo teórico do marxismo tornou-se uma tradição de
pensamento que tomou por referência teórica fundamental as
formulações de um texto publicado em 1937 por Max
Hoerkheimer “ Teoria Tradicional e Teoria Crítica”.
Honneth se concentra no campo da Filosofia Social e da
Ciência Social, investigando os fundamentos sistemáticos de
uma Teoria do Reconhecimento e o desenvolvimento de uma
Teoria Crítica da Sociedade por meio de um diálogo com os
princípios contemporâneo na Ontologia Social e da Teoria
dos Sistemas. Sua teoria foi dividia em dois momentos
diferentes: em primeiro momento em fez uma crítica a
Habermas, segundo ele a teoria habermasiana não via a
centralidade do conflito. Para Honneth limitou-se a alarga
o conceito de racionalidade, que criticou em Horkheimer e
Adorno, e de ação social. Em segundo momento, ele procura
desenvolver sua própria versão de teoria crítica ancorada
num processo de construção social de identidade, buscando
em autores como Hegel a fundamentação para construção.
A partir de uma Teoria do Reconhecimento Honneth
desenvolve uma gramática dos conflitos sociais para
explicar como o social se estabelece enquanto um lugar
fundamental da construção de uma conjuntura. Para Honneth é
através do reconhecimento intersubjetivo que os sujeitos
garantem a plena realização de suas capacidades e uma
autorrelação de integridade. É na interação com os seus
parceiros que estes sujeitos podem alcançar uma
autorrelação positiva. Honneth desenvolve uma luta social
na teoria do reconhecimento que não acontece por uma
autoconservação como pensava Thomas Hobbes, mas uma luta
que tem origem na experiência de desrespeito social, que
vem suscitar uma ação coletiva que buscar regatar relações
de reconhecimento. Esse desrespeito acontece a principio em
uma esfera individual, mas depois atinge um coletivo,
processo que o autor chamou de semântica coletiva. Para ele
a tensão moral que surge com o desrespeito as dimensões do
direito e da estima social podem suscitar os movimentos
sociais, foi essa mesma lógica que as análises deste
trabalho seguiram.
O RECONHECIMENTO
Para se compreender a proeminência da “gramática moral
do reconhecimento” é preciso o entendimento de dois pontos
básicos: o primeiro trata da reconstrução do ponto de vista
do social, Honneth usa essa versa para forma seu ponto de
vista sobre a questão do desenvolvimento da história da
teoria crítica. “Honneth enxerga na virada comunicativa a
possibilidade de se colocar no elemento social e, a partir
dele, reconstruir as bases normativas da sociabilidade
contemporânea” (NOBRE, p.3,2013). Em um segundo ponto diz
respeito o papel do social onde se tecem as normas sociais
fundamentais, Honneth critica alguns elementos da teoria de
Habermas, para ele a teoria habermasiana tem uma visão
limitada do conflito e de seu papel central na formação do
social (NOBRE, 2013).
A Teoria do Reconhecimento de Axel Honneth aponta o
remédio para as patologias sociais hodiernas, cujos
sintomas advêm da ausência de reconhecimento intersubjetivo
e social e não da desigualdade material dos indivíduos. A
mesma relativiza a precariedade econômica como causa
principal das lutas sociais e urbanas (Fuhrmann,2013). A
tese central desta teoria seria que a identidade dos
indivíduos se determina por um processo intersubjetivo
mediado pelo mecanismo do reconhecimento. A ausência do
reconhecimento intersubjetivo e social seria o mote dos
conflitos sociais, a luta por este reconhecimento seria
então o “motor” das mudanças sociais e conseqüentemente da
evolução das sociedades.
Um sujeito só pode adquirir consciência de si mesmo e
do seu papel na sociedade na medida em que ele aprende a
perceber sua própria ação da perspectiva, simbologicamente
representada, de uma segunda pessoa, essa ação de
reciprocidade está relacionada ao pensamento de Mead e sua
psicologia social, que associada ao pensamento do jovem
Hegel no período de Jena, formam a base do pensamento de
Honneth.
Em Hegel ele foi buscar um projeto de uma Teoria
Social com conteúdo normativo, buscando inspiração no
conceito de “luta por reconhecimento”, fez isso por
acreditar que ele possui elementos em uma luta atribuída
aos impulsos morais dos sujeitos.
Hegel defende naquela época a convicção de queresulta de uma luta dos sujeitos peloreconhecimento recíproco de sua identidade umapressão intrassocial para o estabelecimentoprático político de instituições garantidorasde liberdades; trata-se da pretensão dosindivíduos ao reconhecimento intersubjetivo desua identidade, inerente à vida social desde ocomeço da qualidade de uma tensão moral quevolta impelir para além da respectiva medidainstitucionalizada do progresso social e, dessemodo, conduz pouco a pouco a um estado deliberdade comunicativamente vivida, pelocaminho negativo de um conflito e se repetir demaneira gradativa (HONNETH, 2003, p. 30)
Esse conceito de reconhecimento discutido por Hegel é
revisitado por Honneth, porém o autor buscar atualizar a
ideia hegeliana,buscando uma visão inovadora de conflito
social. Para o autor da teoria do reconhecimento no meio do
caminho Hegel teria abandonado seu propósito de reconstruir
filosoficamente a construção de uma coletividade ética,
renunciando a intersubjetividade entendida enquanto o
impulso ético originário para a constituição da identidade
individual e coletiva.Honneth, por sua via, resgatará os conceitoscentrais desenvolvidos por Hegel, (...).Critica, porém os passos de Hegel, que passoude uma análise calcada no movimento dasrelações humanas interativas para uma teoria daconsciência, o que faz com que a reflexão emtorno das formas de interação social resvalepara um estudo das etapas que compõem aconsciência individual. Isso significa para
Honneth, abdicar da centralidade das relaçõescomunicativas como anteriores aos indivíduos oucomo mediadoras da consciência individual, masapenas e tão somente um médium dauniversalização social (LEVY, p.80,2012).
Em Mead, Honneth encontra os aspectos da Psicologia
Social e busca trazer aspectos da concepção
intersubjetivista da autoconsciência humana, um sujeito só
é capaz de adquirir consciência de si quando consegui
compreender o reflexo das suas ações no outro, se
constituindo em um processo de interação. Ao aprender a generalizar em si mesmo asexpectativas normativas de um número cada vezmaior de parceiros de interação, a ponto dechegar à representação das normas sociais deação, o sujeito adquire a capacidade abstratade poder participar nas interaçõesnormativamente reguladas de seu meio; poisaquelas normas interiorizadas lhes dizem quaissão as expectativas que pode dirigirlegitimamente todos os outros, assim como osquais são as obrigações que ele tem de cumprirjustificadamente em relação a eles. (HONNETH,2003, p. 135).
As ideias de Mead são importantes na medida em que se
ocupam com o tema da autorelação prática do ser humano e a
formação da identidade prático-moral do sujeito. Os seus
escritos contêm até hoje os meios mais apropriados para
reconstruir as intuições da teoria da intersubjetividade do
jovem Hegel, suas obras demonstram coincidências. Mead
também busca procurar fazer da luta por reconhecimento o
ponto referencial de uma construção histórica que deve
explicar a evolução moral da sociedade.
Mead busca com a psicologia social clarificar os
problemas filosóficos do idealismo alemão, procedendo
empiricamente na busca de elevar o saber dos estudiosos
sobre as operações cognitivas particulares do ser humano.
AS TRÊS FORMAS DE RECONHECIMENTO
A formação prática da identidade humana pressupõe aexperiência do reconhecimento intersubjetivo. Para Honnetha reprodução da vida social se efetua sob o imperativo deum reconhecimento recíproco, porque os sujeitos só podemchegar a uma autorelação prática quando aprendem a seconceber, da perspectiva de seus parceiros de interaçãocomo seus destinatários sociais.
Honneth observa a necessidade de uma justificação natripartição feita por Hegel e Mead das formas dereconhecimento recíproco. Essas três esferas possuempadrões diferentes de reconhecimento, aos quais devemcorresponder respectivamente um potencial particular deenvolvimento moral e formas distintas de autorrelaçãoindividual.
As três formas de reconhecimento: amor; direito esolidariedade, se constituem de forma independente epossibilitam um potencial de desenvolvimento moral doindivíduo. A luta por reconhecimento se inicia pelodesrespeito a estas três esferas do reconhecimento. Aautorrealização do indivíduo em uma sociedade, somente éalcançada quando há, na experiência de amor, apossibilidade autoconfiança, quando ele encontraexperiência de direito, o autorrespeito e quando há naexperiência de solidariedade, a autoestima (SALVADORI,2003).
AMOR
Honneth começa definindo o conceito de relações amorosas:todas as relações primárias, na medida em que elas consistam em ligações emotivas fortes
entre poucas pessoas, segundo padrão de relações eróticas entre dois parceiros, de amizade e
relações pais/filhos (HONNETH, ano, p. 159). Para ele essas são as
relações primárias, ligações emotivas fortes entre poucas
pessoas. Em Hegel o Amor representa a primeira etapa do
reconhecimento, onde os sujeitos se confirmam mutuamente na
natureza concreta de suas carências, é nessa experiência de
dedicação amorosa que os mesmos se percebem dependentes.
Essa esfera está fortemente relacionada à existência
“corporal” dos outros concretos, os mesmos demonstram entre
si sentimentos de uma estima especial.
Honneth faz um resgate dos estudos do psicanalista
inglês Doanal W. Winnicott, que faz um trabalho com a
psicologia infantil. O ponto de partida é a fase da
simbiose, em seus primeiros meses de vida a criança depende
de tal modo da mãe, que a relação dos dois está fundida,
eles estão em estado de indiferenciação. Essa unidade
originária do comportamento, vivenciada de forma recíproca,
foi denominada por Winnicott de “intersubjetividade
primária”. Essa dependência absoluta significa que os dois
parceiros de interação dependem aqui, na satisfação de suas
carências, inteiramente um do outro, sem estar em condições
de uma delimitação de quem seja mãe ou filho. Só apenas na
relação com mãe que o bebê pode aprender a coordenar suas
experiências motoras e sensoriais em torno daquele único
centro de vivência que é mãe. Essa fase começa a fluir
quando a mãe precisa ampliar seu campo social e voltar a
rotina de convívio como, por exemplo, de trabalho. A
criança passa a ter novas referências familiares com as
quais passa a conviver, a esse novo estágio Winnicott
chamou de “dependência relativa.”
Nessa nova fase se desenvolvem as mais decisivas
capacidades infantis, nesse processo de desilusão a criança
precisa tem o desafio de reconhecimento de si próprio e da
mãe como um ser de direito pobre, pois ele já não é mais
onipotente. Segundo Honneth o que podemos concluir das
analises de Winniccot
É possível partir da hipótese de que todas asrelações amorosas são impelidas pelareminiscências inconsciente da vivência defusão originária que marcara a mãe e o filhonos primeiros meses de vida (...) Só a quebrada simbiose faz surgir aquela balança produtivaentre delimitação e deslimitação, que paraWinnicott pertecente à estrutura de uma relaçãoamora amadurecida pela desilusão amora mútua. Oato da deslimitação recíproca, no qual ossujeitos de experienciam como reconciliados unscom os outros, pode assumir(...) as formas maisdiversas: nas amizades, pode ser a experiênciacomum de um diálogo que nos absorve ou o estar-junto enteiramente espontâneo (...). Nesseaspecto, a forma de reconhecimento do amor, queHegel havia descrito como um “ser-si-mesmo emum outro”, não designa um estadointersubjetivo, mas um arco de tensõescomunicativas que medeiam continuamente aexperiência do poder-estar-só como a do estar-fundido; a “refenrencialidade do eu” e asimbiose representa aí os contrapesosmutuamente exigidos que, tomamos em conjunto,possibilitam um recíproco estar-mesmo no outro(HONNETH, 2003, p. 175).
Nessa análise pode-se concluir que essa confiança na
dedicação materna faz com que a criança desenvolva a
autoconfiança. O amor somente passa a existir quando não
existe mais a relação simbiótica, ou seja, quando a criança
consegue perceber o outro como independente e não se ver
mais um ser onipotente.A grande contribuição do estudo dessa dimensãodo reconhecimento é, seguramente, apossibilidade que abre para o desenvolvimentode uma autorrelação na qual os sujeitosadquirem confiança em si próprios, através deuma segurança emotiva elementar, que só é bem-sucedida em razão do sucesso no equilíbrio desuas carências e de suas demandas psicológicaspróprias em situações relacionaisintersubjetivas. Isso, para Honneth, é basepara todas as outras formas de autorrespeito(LEVY, p. 87, 2012).
Para Levy, a análise da importância do amor no
entendimento de Honneth e a centralidade dada por ele para
que se possa compreender as outras formas de autorrespeito,
atentando para autorrelação na qual os sujeitos adquirem
confiança em si mesmos e suas carências psicológicas.
Honneth sustenta que o nível de reconhecimento do amor é o
núcleo fundamental de toda moralidade. O amor é o
fundamento da autoconfiança, pois permite aos indivíduos
conservarem sua identidade, é nessa primeira esfera que o
sujeito desenvolve a autoconfiança que é indispensável para
o seu desenvolvimento em sociedade e nos grupos sociais
onde o indivíduo está inserido, o amor é assim a forma mais
elementar de reconhecimento (SALVADORI, 2003). Assim esse é
responsável pelo desenvolvimento da autoconfiança, sendo
esta a forma que precede todas as outras formas de
reconhecimento.
DIREITO
Essa outra esfera de interação deve ser concebida como
um tipo diferenciado de um mesmo padrão de socialização.
Hegel e Mead perceberam uma relação semelhante no direito,
segundo eles só podemos chegar a uma compreensão de nós
mesmos enquanto portadores de direitos quando possuímos, um
saber sobre as obrigações que temos de observar em face do
outro. Honneth chama atenção para a formulação do predicado
livre utilizado pelos dois autores, segundo ele, em Hegel o
termo demonstra a autonomia individual do singular e se
deve a um modo particular de reconhecimento recíproco,
incorporado no direito positivo. Já em Mead havia um
interesse na lógica de um reconhecimento jurídico. Segundo
Honneth essa diferença entre um direito ligado à tradição e
direito pós-tradicional, torna-se claro que a forma de
reciprocidade especial de reconhecimento jurídico,
diferentemente daquele do amor, só pôde se constituir na
seqüência de uma evolução histórica e de uma transformação
social.
Com essa evolução histórica o autor busca mostra que
houve uma mudança na concepção de direito, juntamente com o
surgimento de uma sociedade pós-tradicional. Ocorreu uma
separação da função do direito do juízo de valor assim,
para que o direito possa ser aplicado de forma universal se
faz necessário duas formas distintas de respeito
No momento, é importante saber aqui apenasquais conclusões se podem tirar preliminarmenteda comparação entre reconhecimento jurídico eestima social: em ambos os casos, como jásabemos, o homem é respeitado em virtude dedeterminadas propriedades, mas no primeiro casose trata daquela propriedade universal que fazdele uma pessoa; no segundo caso, pelocontrário trata-se das propriedadesparticulares que o caracterizam diferentementede outras pessoas. Daí ser central para oreconhecimento jurídico a questão de como sedetermina aquela propriedade constitutiva daspessoas como tais, enquanto para a estima secoloca a questão de como se constitui o sistemareferencial valorativo no interior do qual sepode medir o “valor” das propriedadescaracterísticas (HONNETH, p.187,2003)
Como se pode observar o reconhecimento jurídico está
relacionado às propriedades universais dos sujeitos, as
virtudes pelas quais devem ser reconhecidos, o sistema
jurídico precisa ser entendido como uma expressão dos
interesses universalizáveis de todos os membros da
sociedade, não admitindo exceções e privilégios, pois a
obediência de normas jurídicas só pode acontecer quando os
sujeitos envolvidos se compreendem como sendo livres e
iguais, se reconhecendo enquanto possuidores de direitos,
capazes de decidir com autonomia individual sobre normas
morais.
Em seguida, o autor busca esclarecer a capacidade pela
qual os sujeitos se respeitam mutuamente, quando se reconhecem como
pessoas de direitos, “a definição das propriedades que
caracterizam o ser humano constitutivamente como pessoa
depende das assunções de fundo acerca dos pressupostos de
sujeitos que capacitam para a participação de uma formação
racional da vontade” (HONNETH, 2003, p. 188). Assim, um
indivíduo respeita o outro por saber-se merecedor do
respeito deste.
Honneth destaca ainda que nas sociedades modernas a
ampliação de pretensões jurídicas individuais, pode ser
entendida como um processo em que a extensão das
propriedades universais de uma pessoa moralmente imputável
foi crescendo, sob a pressão de uma luta por
reconhecimento, devem sempre ser adicionados novos
pressupostos para a participação e formação da vontade.
Aqui o autor busca na seqüência utilizada por Marshall uma
maneira de explicitar sua lógica de distinção de direitos:
direitos liberais; direitos políticos e direitos sociais.
No esquema histórico de Marschall há uma ampliação dos
direitos individuais fundamentais que é obtida por meio de
uma luta social, o que assegurou aos indivíduos uma
participação no processo público de formação da vontade.
O direito moderno trouxe um princípio de igualdade,
onde o status de pessoa foi ampliado para além do aspecto
objetivo alcançando atribuições que estendem ao aspecto
social, as relações jurídicas modernas contêm
estruturalmente essas duas possibilidades evolutivas, os
confrontos práticos que surgem devido ao desrespeito,
representam um conflito em torno da ampliação tanto de
conteúdos objetivos como social (HONNETH, 2003).
Para SAAVEDRA E SOBOTTKA (2008), apesar de Honneth
sempre utilizar um conceito problemático de direito
subjetivo, a sua correta intuição pode ser observado quando
ele se utiliza de estudos feitos a partir da reconstrução
histórica de Marshall, onde se pode observar que: os atores
sociais só conseguem desenvolver a consciência de que eles
são pessoas de direito e agir de acordo com isso, no
momento em que surge historicamente uma forma de proteção
jurídica contra a invasão da esfera da liberdade, que
proteja a chance de participação na formação pública da
vontade e que garanta um mínimo de bens materiais para a
sobrevivência destes sujeitos. Essa forma de reconhecimento
cria condições que permitem o sujeito desenvolver
autorrespeito, tomando consciência da sua própria
autonomia, essa garantia de participação possibilita aos
atores sociais mecanismos de atuação política.
Assim como no amor, a criança adquire a confiança
mediante a experiência de simbiose com a mãe, no direito, o
sujeito tem a possibilidade de conceber a sua ação como uma
manifestação da própria autonomia, respeitada pelos demais,
mediante a experiência do reconhecimento jurídico. Um sujeito é capaz de se considerar, naexperiência do reconhecimento jurídico, comouma pessoa que partilha como todos os outrosmembros da coletividade as propriedades quecapacitam para a participação numa formaçãodiscursiva da vontade; e a possibilidade de sereferir positivamente a si mesmo desse modo é oque podemos chamar de “autorrrespeito”( HONNETH, 2003, p. 197).
Essa visão positiva de si mesmo possibilita o sujeito
uma consciência do seu papel na sociedade enquanto cidadão
e permite também o mesmo compreender que suas ações são
manifestações da sua própria autonomia, reflexo de ação uma
política. Levy (2012), afirma que Honneth tem a expectativa
de que os indivíduos atuantes da sociedade, só são capazes
de desenvolver seu potencial se sua liberdade de participar
da formação pública da vontade estiver juridicamente
protegida.
ESTIMA SOCIAL
Nessa terceira esfera de reconhecimento são postas em
questão as propriedades que tornam os indivíduos diferentes
dos demais, as suas particularidades e singularidades, ou
seja, seus valores intersubjetivos. A estima social se
aplica às propriedades particulares que caracterizam os
seres humanos em suas diferenças pessoais, essa forma de
reconhecimento está ligada também à pressuposição de um
contexto de vida social cujos membros constituem uma
espécie de comunidade de valores mediante a orientação de
concepções de objetivos comuns. Essa outra esfera expressa
as diferenças de propriedades entre os sujeitos, que estão
intersubjetivamente vinculados e com os quais se
relacionam. A estima social é determinada pelas concepções
do que são objetivos éticos presentes em cada sociedade,
sendo assim de certa variedade, tendo um alcance social que
vai depender do grau de pluralização destes valores que são
definidos socialmente assim como do caráter dos ideais de
personalidade.
Honneth afirma que assim como a relação jurídica, a
estima social, passou por uma transição de conceitos. Nas
sociedades tradicionais a reputação de uma pessoa era
definida de acordo com sua honra social e de maneira
hierárquica: uma estratificação vertical das tarefas
sociais de acordo com sua suposta contribuição para
realização dos valores centrais, o seu valor resulta da
contribuição coletiva para a realização das finalidades
sociais, o valor de cada sujeito é resultante da medida
socialmente definida da sua contribuição coletiva na
realização das finalidades sociais. O termo “honra”, em
sociedades estamentais, designa a medida relativa de
reputação social que uma pessoa é capaz de adquirir quando
consegue cumprir com as expectativas de um comportamento
social. O comportamento tido como honroso é apenas um
suplemento que cada individuo deve apresentar para agregar
a sua reputação social, que foi atribuída de maneira
coletiva ao seu estamento em virtude de um conjunto de
valores culturais.
Assim as formas de reconhecimento assumiam um caráter
de relações simétricas por dentro e assimétrica por fora:
simétricas, porque no interior dos grupos onde as os grupos
são determinadas por status, os sujeitos envolvidos se
estimam mutuamente como pessoas, partilham das mesmas
capacidades. Já entre os grupos definidos por status, as
relações de estimas são escalonadas, ou seja, diferenciadas
e, portanto hierarquizadas.
Com o processo de desvalorização da eticidade
tradicional, que aconteceu com a passagem para a
modernidade, houve a quebra de uma barreira cognitiva que
determinavam os padrões de um comportamento honroso
específico dos estamentos, que devia sua validade social as
tradições religiosas e metafísicas e por isso estavam
ancoradas na autocompreesão cultural na qualidade de uma
grandeza metassocial. (HONNETHE, 201, p.203).
Já não são mais as propriedades coletivas consideradas
eticamente admissíveis, mas sim as capacidades
biograficamente desenvolvidas do indivíduo, aquilo por que
começa a se orientar a estima social, é nesse quadro
histórico que se compõe o conceito de prestígio social, que seria
a medida da estima que o indivíduo goza socialmente quanto
a suas realizações e suas capacidades próprias e
individuais. Ao contrário da honra, o prestígio se refere
ao grau de reconhecimento social em que o indivíduo merece
para sua forma de autorealização, já que o mesmo de alguma
maneira contribui com ela à implementação prática dos
objetivos da sociedade. Nessa nova ordem de reconhecimento
individualizado, tudo depende da forma como o horizonte
universal de valores é determinado, que tanto deve estar
aberto a formas distintas de autorealização como também
deve servir como um sistema predominante de estima.
A transição se dá, em resumo, através dasuperação de um referencial cognitivo calcadona tradição religiosa e na metafísica – típicode sociedades tradicionais nas quais osobjetivos éticos são ordenados substancialmentee que por isso, valoram os cidadãos de acordocom o status e a honra social (na qual asrelações são simétricas por dentro eassimétricas por fora) – para uma sociedadeque, superando a ordem hierárquica da estruturade estima social, atinge uma noção de sujeitoque é, em si, dotada de uma noção deindividualidade bem definida (Levy, p. 92,2012).
A estima social assume uma posição que confere as
formas de reconhecimento associadas a ela o caráter de
relações assimétricas entre os sujeitos. A autorrelação
prática de uma experiência de reconhecimento faz com que o
indivíduo tenha um sentimento de orgulho ou honra social
coletiva; os indivíduos se percebem enquanto membros de um
mesmo grupo social que está em condições de realizações
comuns, cujo valor para a sociedade é o reconhecimento dos
outros membros que compõe aquele grupo, essas formas de
interação assumem o caráter de relações solidárias.
Solidariedade nesse caso seria uma espécie de relação de
interação onde os sujeitos envolvidos que têm interesses
recíprocos por seus modos de vida diversos e diferentes,
pois estes se estimam entre si, o conceito de solidariedade
é central nas relações de estima social. A solidariedade na
sociedade moderna está vinculada a condições de relações
sociais simétricas de estima entre os indivíduos autônomos
e a possibilidade de desenvolverem a sua autorrealização
(HONNETH, 2003).
A estima social possibilita uma confiança emotiva em
suas capacidades que são percebidas como valiosas pelo
coletivo de uma sociedade, sendo esta compreendida como
autoestima ou autoconfiança.Modos de
Reconhecimento
Dedicação
Emotiva
Respeito
Cognitivo
Estima Social
Dimensões da
personalidade
Natureza
carencial e
afetiva
Imputabilida
de moral
Capacidades e
propriedade
Formas de
Reconhecimento
Relações
primárias
(amor,
amizade)
Relações
jurídicas
(direitos)
Comunidades
de valores
(solidariedad
e)
Potencial
evolutivo
Generalizaçã
o,
materializaç
ão
Individualiza
ção,
equalização
Autorrelação
prática
Autoconfian
ça
Autorrespeit
o
Autoestima
Formas de
desrespeito
Maus-tratos
e violação
Privação de
direitos e
exclusão
Degradação e
ofensa
Componentes
ameaçados da
personalidade
Integridade
física
Integridade
social
“Honra”,
dignidade
A LUTA POR RECONHECIMENTO
Honneth busca em Hegel as explicações para sua Teoria
do Reconhecimento, começando pela sua filosofia da
consciência que mesmo tendo sido usada de maneira
incompleta foi de fundamental importância para a construção
do Conceito de Espírito. Hegel usou da filosofia da
consciência durante os anos de Jena. A influência patente
de Hegel expressa-se no núcleo do pensamento da luta por
reconhecimento, Honneth concordo com ele quanto ao
entendimento de que é a vida em sociedade que vai ser
condição para sua existência ( LEVY,2012).
A primeira parte da análise filosófica do Espírito
consiste em reconstruir o processo de formação do espírito,
à autoexperiência da consciência individual, esclarece
quais experiências, repletas de exigências um sujeito
precisa ter feito ao todo antes de estar em condições de
conceber-se a si mesmo como uma pessoa dotada de direito.
Uma autoexperiência integral, só é possível quando esse
sujeito aprende a conceber-se também com um sujeito que
possui atividades práticas.
Os conflitos surgem do desrespeito a qualquer uma das
formas de reconhecimento, ou seja, de experiências morais
decorrentes da violação de expectativas normativas. A
identidade moral é formada por essas expectativas. Uma
mobilização política somente ocorre quando o desrespeito
expressa a visão de uma comunidade. Portanto, a lógica dos
movimentos coletivos é a seguinte: desrespeito luta por
reconhecimento, e mudança social. Honneth, seguindo as
idéias de Hegel, afirma que a eticidade é o conjunto de
condições intersubjetivas, que funcionam como condições
normativas necessárias à autodeterminação e a
autorrealização.
A integridade do ser humano se deve aos padrões das
três esferas de reconhecimento discutidas aqui. Assim como
os padrões de reconhecimento são organizados em três formas
distintas, no desrespeito também existe uma esfera
recíproca para cada tipo de negação do reconhecimento. De
acordo com Levy (2012), compreender que para Honneth a cada
dimensão do reconhecimento tida como positiva há uma
manifestação negativa, que se materializa no desrespeito,
seria o ponto central para a compreensão das motivações que
dão origens a uma luta por reconhecimento de acordo com que
pensou o filósofo alemão. Para tornar a sua teoria plausível, Honnethprecisa, por consequência, encontrar nahistória social traços de uma tipologiatripartite negativa da estrutura das relaçõesde reconhecimento. Esta tipologia negativa devecumprir duas tarefas: (1) para cada esfera derelação de reconhecimento deve surgir umequivalente negativo, com o qual a experiênciade desrespeito possa ser esclarecida, seguindoa estrutura da forma de reconhecimentocorrespondente; (2) a experiência dedesrespeito deve ser ancorada de tal forma emaspectos afetivos do ser humano, que a suacapacidade motivacional de desencadeamento deuma luta por reconhecimento venha à tona(SAAVEDARA E SOBOTTKA, p.14, 2008).
Sendo assim, na primeira esfera, a do amor, sendo a
forma mais elementar, os maus-tratos, que impedem a livre
disposição do corpo representam à forma do desrespeito a
esfera, uma espécie de rebaixamento pessoal. Representa um
tipo de desrespeito referente à integridade corporal de uma
pessoa. Não é necessariamente a dor física que leva a essa
situação, mas o sentimento de estar sujeito à vontade do
outro, o que faz com que o sujeito perca seu senso de
liberdade, este tem sua confiança ferida o que gera a perca
da autoconfiança. Aquela autonomia que foi adquirida
anteriormente em uma relação de socialização é perdida aqui
com a quebra da confiança em si mesmo.
As outras duas formas de desrespeito estão inseridas
em um processo histórico de mudança e de construção de
conceitos, são, portanto evolutivos. A princípio em uma
sociedade os sujeitos participam de forma igual da ordem
institucional dos direitos. A violação do autorrespeito se
refere aos modos de desrespeito pessoal sofridos por um
sujeito, onde este fica excluído da posse de determinados
direitos no interior de uma sociedade, ou seja, há uma
negação de direitos e um sentimento de ameaça a integridade
social. Para os sujeitos lesados essa negação de pretensões
jurídicas que socialmente vigentes significa uma frustração
das expectativas de um reconhecimento que possibilite a
formação de um juízo moral em relação a si mesmo, assim ele
perde a capacidade de interagir com os que estão próximo. O
indivíduo que sofre esse rebaixamento acaba por referir-se
negativamente ao valor social de indivíduos e grupos. Essa
experiência varia de acordo com o contexto histórico no
qual este sujeito encontra-se inserido, a privação de
direitos de mede pelo grau de universalização e pelo
alcance material dos direitos constitucionalmente
garantidos.
A terceira forma de rebaixamento é aquela que ofende
e/ou degrada o modo de vida de determinado grupos ou
sujeitos, referindo-se ao valor social dos mesmos. Quando
isso acontece os atingidos são impossibilitados de ter a
suas próprias propriedades pessoais.A degradação valorativa de determinados padrõesde autorrealização tem para seus portadores aconseqüências de eles não poderem se referir àcondução de sua vida como a algo a que caberiaum significado positivo no interior de umacoletividade; por isso, para o indivíduo, vaide par com a experiência de uma taldesvalorização social, de maneira típica, umaperda de autoestima pessoal, ou seja, um perdada possibilidade de se entender a si própriocomo um ser estimado por suas propriedades ecapacidades características. Portanto, o queaqui é subtraído da pessoa pelo desrespeito emtermos de reconhecimento é o assentimentosocial a uma forma de autorrealização que elaencontrou arduamente com o encorajamentobaseada na solidariedade de grupos (HONNETH, p.217-218, 2003).
Esse rebaixamento impacta negativamente na vivência
deste indivíduo em coletividade e no processo de formação
de uma identidade, pois gera a perca de uma autoestima que
foi adquirida na vivência com os grupos sociais, que
motivaram este sujeito gerando entre estes membros um
sentimento de solidariedade.
Essas três formas de rebaixamento ou desrespeito, nos
estudos psicológicos que investigam as seqüelas pessoais
das experiências desse tipo de violação, em relação ao
desrespeito na primeira forma de reconhecimento a seqüela
seria a “morte psíquica”; em relação a privação de
direitos, ganhou cidadania o conceito de “morte social”; e
quanto ao desrespeito encontrado no rebaixamento social dos
sujeitos, a categoria é a “vexação” (HONNETH, 2003, p).
As respostas a tais formas de desrespeito podem
apresentar a base motivacional afetiva da luta por
reconhecimento. Segundo Honneth, os seres humanos não podem
reagir de forma emocionalmente neutra diante das situações
de ofensas sociais e privações de direitos. Toda reação
emocional negativa em resposta a um tipo de desrespeito
contêm a possibilidade de se tornar o motivo da resistência
política. As formas de reconhecimento do direito e da
estima social são caracterizadas por objetivos
generalizados, diferente do que acontece com o amor, “uma
luta só pode ser caracterizada de “social” quando seus
objetivos se deixam generalizar para além do horizonte das
intenções individuais, chegando a um ponto em que eles
podem se tornar a base de um movimento coletivo” (HONNETH,
2003, p.256).
O direito e a estima social representam um quadro
moral de conflitos sociais, pois as mesmas dependem de
critérios socialmente generalizados, as experiências de
desrespeito vivenciadas pelos sujeitos podem afeta-los e
serem apresentadas como algo maior e coletivo, afetando
potencialmente um número maior de sujeito, por isso se
generaliza. Essa universalização social não acontece na
esfera do amor, que se encerra nos limites das relações
primárias, dentro do que foi exposto, Honneth formula seu
conceito preliminar do que seja uma luta social.
Trata-se do processo prático no qualexperiência individuais de desrespeito sãointerpretadas como experiências cruciaistípicas de um grupo inteiro, de forma que elaspodem influir, como motivos diretores da ação,na exigência coletiva por relações ampliadas dereconhecimento (HONNETH, 2003, p.256).
Segundo o autor os motivos de uma luta social se geram
dentro de um quadro de experiências morais de violação das
expectativas de reconhecimento, estas estão profundamente
relacionadas à formação da identidade dos sujeitos, quando
há uma quebra destas expectativas ocorre um sentimento de
desrespeito por parte dos indivíduos. Estas experiências
começam no âmbito individual e depois ganham uma relação de
coletividade. Esse sentimento só pode se tornar base
motivacional para uma luta social “quando o sujeito é capaz
de articulá-los num quadro de interpretação intersubjetivo
que os comprova como típicos de um grupo inteiro, nesse
sentido, o surgimento de movimentos sociais depende da
existência de uma semântica coletiva” (HONNETH, p.258,
2003). É essa semântica coletiva que permite que as
experiências de desapontamento pessoal sejam interpretadas
como algo que atinge não apenas o indivíduo mais um número
maior de sujeitos, atingindo uma coletividade.
Pode-se afirma que o sentimento de desrespeito
constitui o cerne de experiências morais, que são
vivenciadas nas relações sociais, pois os sujeitos possuem
sentimentos de expectativas de reconhecimento, quando isso
não acontece pode levar a ocorrência de ações coletivas, na
medida em que são compartilhadas por estes sujeitos. O
engajamento desse sujeito em ações políticas pode tirá-los
de uma situação de passividade e tolerância, onde ele passa
a convencer-se do valor moral de si próprio.
Para Arcanjo (200X) a teoria honnethiana segue a forma
desrespeito, luta por reconhecimento e mudança social, o
modelo de conflito deve ser compreendido como um processo
histórico e de desenvolvimento moral da sociedade. Esses
modelos de conflitos começam com o sentimento de injustiça
social e pela busca de um reconhecimento e se organizam em
ações coletivas. Segundo Levy (2012) quando uma pessoa é
atingida na sua dignidade, em sua expectativa de moral de
respeito, abre-se caminho para uma luta social, sendo “o
combustível para os movimentos sociais”.
Honneth afirma que existe a necessidade de se pensar
uma alternativa para a formação das ações coletivas e
movimentos sociais. Para ele, existe um ponto importante na
determinação das condições de possibilidade da constituição
desses movimentos que é a formação de um horizonte abstrato de
valores éticos, capaz de possibilitar as lutas por reconhecimento em
sociedades ditas modernas, fortemente marcadas pelo
conflito, sem que se perca, com isso, o potencial de
solidariedade das formas coletivas de identidade (Moraes,
200X).
Os sentimentos morais de desrespeito seriam o “mote”
das lutas sociais, o porquê do surgimento de ações
coletivas como, por exemplo, os movimentos sociais
(HONNETH, 2003). A existência de uma semântica coletiva
funciona como uma ponte que une os sujeitos ao ponto de
construir uma identidade coletiva, essa dinâmica antecede a
formação da ação política de um movimento social.
MOVIMENTOS SOCIAIS
No entendimento de Maria da Gloria Gohn, os movimentos
sociais se constituem em “ações sociais coletivas de
caráter sócio-político e cultural que viabilizam distintas
formas da população se organizar e expressar suas demandas”
(GOHN, 2010, p.13). Essas ações coletivas se formam para
Honneth a partir do sentimento de injustiça social e da
busca por reconhecimento. Ele deixa claro o caráter
coletivo dessas ações, sendo esta uma das questões centrais
das lutas sociais, as bases motivacionais saem das relações
primárias e atingem o âmbito universal.
Para Gohn (2008) Axel Honneth é uma referência nos
estudos acerca dos movimentos sociais em relação a
identidade e o reconhecimento. Para ela, o autor ver nos
conflitos um papel educativo, eles podem indicar onde não
há o reconhecimento e os problemas que decorrem daí.
Surgindo uma articulação política, uma luta social, um
movimento propriamente dito, o sentimento de injustiça só
passa a ter relevância política enquanto movimento social.
Reconhecimento não é algo que se conquista de uma vez
por todas, nem um bem a ser distribuído é um produto da
relação que requer a consideração do outro. As lutas por
reconhecimento são intrinsecamente intersubjetivas, estando
intimamente relacionado com a questão da identidade.Com a identidade e o reconhecimento inicia-se oprocesso de dar sentido às ações, individuaisou coletivas. Nesse processo, os indivíduos, deatores sociais – que ocupam diferentes lugaresna estrutura social (como pais, trabalhadores,membros de alguma organização, movimento,partido, sindicato, religião etc.) -transformam-se em sujeitos, autores de açõeshistóricas que ultrapassam as ações cotidianasno desempenho individual ou grupal (GOHN, 2005, p. 32).
As ações coletivas fazem parte de um amplo processo de
mudança nas relações de reconhecimento, a capacidade de uma
sociedade em garantir a integridade coletividade dos atores
que a compõe está ligada a uma ampliação destas relações.É possível perceber aqui uma espécie dedialética positiva entre o reconhecimento e adiferenciação de identidades que leva àquelaampliação das relações de reconhecimento, istoé, com a possibilidade de diferenciaçãoindividual possibilitada pela forma deinteração moderna, também aumenta apossibilidade de ampliação das relações dereconhecimento. Seria desnecessário dizer queeste processo está sendo tratado aqui apenasenquanto possibilidade normativa, mas que,empiricamente, os conflitos sociais são a formamais comum pela qual se dá a ampliação destasrelações; também não precisaria ser dito queeste processo está sujeito a momentosregressivos, dependendo de como se desenvolve aluta política que lhe dá vida (SOUZA, 2012,p.13).
Souza analisa a teoria do reconhecimento através de
uma perspectiva dialética, que leva a uma ampliação das
relações dentro de uma sociedade e das formas de interação.
Ele continua discutindo a teoria e afirma que as relações
entre as esferas do reconhecimento jurídico e social podem
trazer a ampliação dos horizontes de sociabilidade, das
interações entre os sujeitos e do seu modo de vida. Ao
compreender os aspectos positivos dessa relação o autor
chama atenção para a capacidade que os conflitos sociais
têm de ampliar estas relações e que o processo de
reconhecimento compreendido por Honneth está sujeito
momentos de regressão, pois se desenvolve de acordo com a
luta política.
Gohn (2013) diz que as energias sociais que antes
estavam dispersas são canalizadas pelos movimentos sociais
na busca da construção do novo, embora em alguns casos
tenhamos aqueles que são conservadores. No caso nos
movimentos sociais que buscam um reconhecimento estes
estariam elencados nos que a autora chamou de
progressistas, que segundo ela atuam com uma agenda
emancipatória, onde realizam diagnósticos sobre a realidade
na qual estão inseridos e constroem propostas.
Na busca de analisar as teorias que estudam os
movimentos sociais Alexander faz um resgate do Modelo
Clássico que segundo ele foi o primeiro usado para estudar
os movimentos sociais, este estava centrado em torno de
duas correntes: marxista e funcionalista, este predominou
até os anos 60 do século passado, se desenvolveu nos
Estados Unidos, não adquirindo uma forma homogênea. Este
modelo centrava o indivíduo em torno das lutas de classe,
as ações políticas e sociais destes estavam marcadas por
uma transformação histórica (Costa, 2013 – mono). No modelo
clássico deu grande ênfase às motivações econômicas, além
disso, destacava a reação psicológica dos indivíduos diante
das mudanças, reação considerada como comportamento
irracional, estes eram considerados como fruto de tensões
sociais, ideia de uma anomia social. Os movimentos sociais
foram identificados segundo o modelo dos movimentos
revolucionários, reformistas e reacionários, entendidos
como mobilizações de massa que visam apossar-se do poder de
um Estado antagônico.
O indivíduo era visto dentro de macroestruturassociais. A grande questão era a inadaptaçãodeles àquelas estruturas, o que geravadesajustes e conflitos. Os movimentos sociaisnasciam neste universo, eram elementosdistributivos. A ideia durkheimiana de anomiasocial permeava analise (GOHN, p.23,2008).
Este modelo, de acordo com Alexander (s, d) é
fortemente impregnado por um materialismo ontológico na
busca pelo controle do poder. Assim, os teóricos do modelo
clássico interpretaram os movimentos como sendo respostas
práticas e coerentes a distribuição desigual das privações
sociais criada pela mudança institucional. Criava-se uma
concepção de Reforma Social, o paradigma teórico mais amplo
era o do processo de mudança e transformação social.
O leque das abordagens teóricas dos movimentos sociais
é amplo e diversificado, em cada paradigma interpretativo,
podemos encontrar também uma grande variedade de teorias,
sejam elas focadas em eixos culturais ou justiça social
(GOHN, 2008, p, ). Até 1970 era frequente a associação das
lutas políticas dos movimentos sociais a um suposto quadro
de luta de classe no interior de uma sociedade capitalista,
em uma concepção que sugere que os movimentos sociais um
produto da ação histórica da sociedade, diante das
contradições do sistema capitalista (MACHADO, 2007, p. ).
Após 1970 um novo olhar é lançado sobre os movimentos
sociais, agora mais particular deixando de lado o
determinismo econômico, focando-se na multiplicidade de
fatores que causam uma ação coletiva, assim de acordo com
Alexander:
A necessidade de introduzir uma correção aomesmo tempo histórica e teórica no enfoqueclássico para incluir os significadosculturais, identidades psicológicas e umateorização dos fatores institucionais parecelevar diretamente aos estudos dos novosmovimentos sociais (ALEXANDER, ..... p. 8)
Essa nova linha de pensamento parte de um pressuposto
em que leva em conta a subjetividade dos sujeitos
envolvidos em ação coletiva, sua identidade, assim como os
aspectos históricos e institucionais envolvidos. “A
identidade passa a ser uma categoria utilizada com
múltiplos sentidos e significados, da identidade jurídica a
cultural.” (GOHN, 2008, p.45). É importante ressaltar a
contribuição de Alain Toraine na reformulação dessa
perspectiva de análise dos movimentos sociais, outro nome
que também merece destaque é o de Alberto Melucci, tendo
este último contribuído com análises mais radicais e
categórica (ALEXANDER, .....). Toraine direciona sua
crítica ao modelo clássico por sua miopia em relação as
instituições. (TOURAINE,1981, ....). A hierarquia de
classes subsiste no âmbito da integração cultural mais
geral da sociedade industrial, e as lutas pela hegemonia
ideológica, não são só pelo poder e dinheiro, são também
caracterizas pelos conflitos em torno de mudanças sociais,
é nessa perspectiva que se encontram os novos movimentos
sociais. De acordo com Melucci
Quando se fala de um movimento social, refere-se, geralmente, a um fenômeno coletivo que seapresenta com uma certa unidade externa, masque, no seu interior, contém significados,formas de ação, modos de organização muitodiferenciados e que, frequentemente, investeuma parte importante das suas energias paramanter unidas as diferenças (MELUCCI, 2001,p.29).
Esse fenômeno é para o autor uma ação heterogênea, o
agir coletivo não é para ele o resultado de leis da
história, são respostas dos atores a certas disfunções do
sistema social, por isso são contraditórios, “nenhum
fenômeno de ação coletiva pode ser assumido na sua
globalidade” (MELUCCI, 2001, p.33), o autor diz isso porque
os movimentos sociais não únicos. A ação coletiva de um
movimento pode manifestar-se através da ruptura de uma
compatibilidade com um sistema de relações sociais, um
movimento não se limita, portanto, a manifestar um
conflito, mas o leva para além dos limites deste sistema a
qual essa ação se destina, isso pode ocorrer por meio do
rompimento de regras de jogos, questionamento da
legitimidade do poder etc.
O aprofundamento das instituições democráticas
possibilitou uma diversificação dos movimentos sociais,
lutando pelas causas mais diversas, tem-se então o termo
“novos” movimentos sociais, eles reuniam coletivos de
mulheres, ambientalistas, movimentos identitários,
pacifistas e outros. Outras dimensões da realidade vieram à
tona, estando predominantemente presentes nos campos das
experiências de participação em lutas e movimentos sociais,
culturais etc. As formas contemporâneas de ação coletiva
são múltiplas e variáveis, envolvendo atores sociais
diversos, tornando mais explícita a pluralidade dos fatores
envolvidos em um mesmo fenômeno (MELUCCI, 2001, .....).
Ainda na tentativa se explicar o que marca os novos
movimentos sociais o autor continua sua análise
O que é “novo” nos “novos movimentos sociais”?Estando entre aqueles que têm introduzido otermo “novos movimentos sociais” na literaturasociológica, assisti com embaraço à progressivareificação desta categoria. A “novidade” está,com efeito, na definição de um conceitorelativo, que tem a função temporária deassinalar algumas diferenças comparativas entreas formas históricas do conflito de classe e asformas emergentes de ação coletiva (MELUCCI,2001, p.24).
Segundo o autor, o “novo” que há os “novos movimentos
sociais”, é o contraponto existente entre as formas de
análise do modelo clássico, que como já foi dito
anteriormente, tinha um olhar voltado para a luta de
classes e os movimentos sociais eram identificados segundo
o modelo dos movimentos revolucionários, entendidos como
mobilizações de massa que visam apossar-se do poder de um
Estado antagônico.
Novos sujeitos entram em cena, novas temáticas são
colocadas em discussão abrangendo as mais diversas
temáticas que vão desde a globalização até a
biodiversidade. As categorias de analise dos movimentos
também sofreram mudanças
As categorias de análise também se alteram:redes passam a ter, para vários pesquisadores,um papel até mais importante do que o movimentosocial. Mas eles as redefinem para redes demobilização social. A questão da emancipaçãosocial persiste, mas restrita a alguns teóricose não mais sobre o crivo exclusivo da abordagemmarxista. Território passa a ser uma categoriaressignificada e uma das mais utilizadas paraexplicar as ações localizadas, mas é uma novaconcepção de território (...). Território passaa se articular com as questões dos direitos edas disputas pelos bens econômicos, de um lado,e, de outro, pelo pertencimento ou pelas raízesculturais de um povo ou etnia (GOHN, 2008,p.44).
As análises ainda consistem entre o global e o local;
objetividade e subjetividade; entre o macro e o micro,
incluindo novas tensões nas questões de gênero, raça e
etnia relacionada a aspectos culturais e identitário, o que
seria uma busca pelo reconhecimento das necessidades
humanas, segundo Honneth.
As conceituações de movimentos sociais têm sido
tipificadas através de três características principais. A
primeira dela diz respeito à determinação da identidade,
que era feita através de categorias pertencentes apenas
estrutura social; a segunda, esta relacionado ao caráter
revolucionário; e a última, atribui aspectos da esfera
política. Então, o que caracteriza os novos movimentos
sociais é que através deles rompeu-se a unida destes três
aspectos do paradigma (LACLAU, 2006, ......).
Nos anos 90, novas categorias de análises ganharam
centralidade, tais como: mundialização; sistema-mundo;
sociedade mundial e sociedade de indivíduos; processos de
exclusão e inclusão social e cidadania coletiva (GOHN,
2008, ....). Segundo Gohn (2008) no Brasil o início dos
anos de 1990 foi marcado pelo surgimento de um novo cenário
sociopolítico, o período anterior marcado pela
redemocratização do país, possibilitou o surgimento de
novos atores sociais e de novas problemáticas. Os anos de
1990 são marcados pelo fortalecimento das ONGs
(Organizações Não- Governamentais) e as organizações do
terceiro setor. Nessa mesma década o movimento alter ou
antiglobalização irrompem o cenário internacional, usando
formas de comunicação diferentes das que foram usadas em
anos anteriores, a era dos computadores já predominava,
unindo sujeitos de diferentes partes do mundo em ideias e
ações comuns.
Um dos fundamentos que dão base aos movimentosaltermundialistas iniciados nos 1990 está naeconomia, especialmente nos efeitos perversosda globalização econômica. Contudo, encontram-se também um saldo organizatório das lutasidentitárias décadas anteriores. O chamadoessencialismo foi da luta de classes foisubstituído pelo pluralismo de lutasantirraciais, feministas, etc (GOHN, 2014,p.14).
Dentro da temática dos novos movimentos sociais, Gohn
(2008) chama atenção para os estudos de Axel Honneth, e a
referência que autor faz a identidade e reconhecimento.
Embora ele cite e analise alguns movimentossociais, está mais preocupado em entender asações sociais onde os acontecimentos históricosocorrem, os conflitos sociais e as redes deinterações de lutas sociais, e os processos deinterpretação e entendimento dessas lutas porseus participantes, enquanto sujeitos da ação,para analisar a orientação prática dos grupossociais (GOHN, 2008, p.48).
Para Melucci (2001), os movimentos sociais, podem
desenvolver três diferentes tipos de condutas: a primeira,
de um movimento reinvindicatório, quando o conflito e a
ruptura das regras acontecem dentro de um sistema definidos
por papéis e funções, o ator coletivo reivindica uma
distribuição de recursos mais eficiente, defende as
vantagens de uma categoria, tentando ultrapassar os limites
da organização daquele sistema. A segunda conduta seria
pela ruptura dos limites de um sistema político, pela
ampliação da participação nas decisões, levando-se em
consideração que no jogo político existe um desequilíbrio
que beneficia certos interesses. Esses movimentos buscam
melhorar os canais de participação além dos limites
previsto no sistema políticos. E por último, os movimentos
antagonistas, questionam o controle de recursos coletivos
fundamentais. Esse tipo de movimento deve ocorre com a
mediação dentro do sistema político, tendo uma relação com
os mecanismos de representação e de decisão.
Em um movimento pode uma destas dimensões prevalecer
sobre as demais, ou se misturarem atuando de forma
diferenciada, cada movimento é resultado de uma ação
orientada que se constrói através de relações sociais que
acontecem no interior de campo de oportunidades e de
vínculos, essas ações são construídas por atores por meio
de investimentos organizados, onde eles definem seu campo
de atuação, com agir e os objetivos que perseguem.
Os conflitos se movem, então, rumo àapropriação do sentido contra os aparatosdistantes e impessoais que fazem daracionalidade instrumental a sua “razão” esobre esta base impõe identificações. Asquestões antagonistas não se limitam a atingiro processo produtivo em sentido estrito, masconsideram o tempo, o espaço, as relações, osi-mesmo dos indivíduos. Surgem questõesrelacionadas com o nascimento, com a morte, coma saúde, com a doença, que colocam, em primeiroplano, a relação com a natureza, a identidadesexual e afetiva, do agir individual. Nessasáreas, aumenta a intervenção dos aparatos decontrole e de manipulação, mas se manifesta,
também, uma reação difusa à definições externasde identidade, surgem questões de reapropriaçãoque reivindicam o direito de ser eles mesmos( MELUCCI, 2001, p. 81).
Esses movimentos contemporâneos como chamou Melucci,
têm objetivos que são dificilmente negociáveis, porque são
irredutíveis à mediação política, não buscam uma tomada do
poder, mas o controle das condições de existência e das
reivindicações dentro do espaço no qual encontram-se
inseridos. Outra característica marcante destes movimentos
é a solidariedade, a ideia de pertencimento que une estes
atores coletivos em uma ação em busca de uma identidade
comunitária. Para Gonh (2000), estes novos movimentos
sociais não estão suficientemente explicados, o que se tem
é o diagnóstico das manifestações contemporâneas que
geraram mudanças significativas tanto na sociedade civil
quanto na política.
Ao buscar uma formulação do conceito de movimentos
social a autora afirma que “movimento social refere-se à
ação dos homens na história” (GOHN, 2000, p. 247) essa ação
envolve um fazer e um pensar de ideias que motivam à mesma,
tratando-se assim de uma práxis.
Procurar entender o que demandam estes novos
movimentos requer uma análise de uma conjuntura, pois cada
organização ou protesto está envolvido em realidade com
características singulares que têm eixos temáticos que vão
desde democracia e liberdade de expressão como é o caso do
Oriente Médio; na Europa os protestos são contra as
reformas econômicas e o desemprego. É interessante notar
que estes protestos acontecem em espaços públicos o que dá
uma maior visibilidade a uma determinada manifestação.
Outro ponto que deve ser levado em consideração é que estes
movimentos têm conseguido alterar alguns discursos
políticos, levando a mudanças e a formação de agendas para
a formação de políticas para alguns segmentos. O campo de
luta destes movimentos é diferenciado, mas o igualitarismo
democrático expressa-se como uma bandeira presente nestes
movimentos (GOHN, 2014).
Os novos movimentos sociais têm construído
representações que são consideradas por Gohn (2010)
“simbólicas afirmativas”, por meio de discursos e práticas.
São estas ações que despertam nos participantes envolvidos
um sentimento de pertencimento social, que Honneth chamou
de estima social. Sobre esse novo associativismo a autora
coloca,
Esse novo associativismo é mais propositivo,operativo, e menos reivindicativo – produzmenos mobilizações ou grandes manifestações, emais estratégico. O conceito básico que dáfundamento às ações desse novo associativismo éo de Participação Cidadã (GOHN, 2010, p.18).
O conceito de Participação Cidadã é envolvido pelo o
de cidadania, que objetiva a construção de uma nova
realidade social onde prevaleça o reconhecimento da
diversidade cultural, dos direitos e deveres de casa ser
humano. Trata-se então de uma participação qualificada, que
terá seu lugar inscrito em leis. Gohn, parte do principio
de que todo movimento social é formado por agrupamentos
humanos, coletivos sociais que estão se alguma forma
inseridos na sociedade e estão em busca da construção de
objetivos. Estes participantes estão inseridos dentro de
uma sociedade civil que vem se firmando em um plano
nacional e internacional, onde podemos falar no
protagonismo de atores sociopolíticos transformados em
novos sujeitos de poder.
Esses sujeitos se organizam em torno de um projeto
social que Gohn (2008) entende com um projeto político-
ideológico, “a apropriação de conhecimento e as
experiências dos sujeitos são a base da prática política
que irá nos explicar a construção dos projetos (GOHN, 2008,
p. 6). É esse projeto que norteia a ação destes sujeitos, o
mesmo não é dado de forma acabada, pelo contrário é
construído de acordo com acordo com a realidade política
daquele grupo, assim como acontece com a cultura política
do mesmo que também não é pronta ou preexistente.
O movimento social, como um sujeito socialcoletivo, não pode ser pensado fora de seucontexto histórico e conjuntural. Asidentidades são móveis, variam segundo aconjuntura. Há um processo de socialização daidentidade que vai sendo construída (GOHN,2008, p.2).
Pensar o movimento social como histórico possibilita-
nos compreender sua capacidade de se transformar de acordo
com o contexto no qual estão inseridos e com as redes que
articulam. As identidades que envolvem este movimento são
perfeitamente mutáveis e vão se construindo de forma
processual e não são únicas, podendo variar em contextos e
conjunturas diferentes. A identidade política de movimento
muda de acordo com as articulações feitas pelos sujeitos,
eles se deparam com projetos “diferentes ou convergentes” e
saberão identificar se forem sujeitos ativos nas ações
coletivas.
O movimento social que este trabalho analisa se insere
dentro de uma categoria que Gohn chamou de “Movimentos
sociais construídos a partir das características da
natureza humana: sexo, idade, raça cor”. Segundo ela este
tipo de movimento vem ganhando centralidade devido sua
natureza universalizante que se destaca em relação a outras
lutas sócias da contemporaneidade. Nessa categoria estão os
movimentos como os de mulheres, negros, índios,
aposentados, jovens e dos homossexuais que é o objeto de
estudo deste trabalho.
Na tentativa de construir um conceito de
homossexualidade Fry e MacRae afirmam que não há uma
verdade absoluta sobre esta questão, que as ideias e
práticas são construídas historicamente e que estão
intimamente relacionadas com o todo das sociedades. Para os
autores o conceito pode variar de acordo com a realidade na
qual está inserido, na Grécia tinha um significado
diferente do que tem para um camponês ou para um índio.
O movimento em defesa dos direitos homossexuais teve
início na Europa, no século XIX, de início lutava contra a
criminalização da homossexualidade, para abolir do Código
Penal da Alemanha, mais especificamente, o parágrafo que
punia o comportamento homossexual entre homens. Nessa época
teve importante atuação o Instituto de Ciência Sexual de
Berlim, que realizou congressos internacionais e formou uma
Liga Mundial para uma Reforma Sexual em 1928. O Instituto
foi pioneiro na realização de estudos de experimentação de
mudança de sexo. “Nesse contexto, a defesa dos homossexuais
dava-se no bojo de uma luta mais ampla por reforma sexual,
incluindo mudanças na legislação e campanhas educativas,
que atraíram a aliança de movimentos trabalhistas e
socialistas, além de vários agrupamentos libertários”
(SIMÕES; FACCHINI, 2009, p. 41). A força do nazismo levou a
destruição do Instituto, e o “recrudescimento” das
condenações por homossexualidade, os presos foram levados
para os campos de concentração, sendo obrigados a usar
uniformes com o símbolo de um triângulo rosa, sendo
submetidos a torturas e passíveis castrações.
Nos anos de 1940 o movimento é retomado nos Estados
Unidos, os ativistas nesse país passaram a adotar uma linha
de atuação mais moderna, com uma ênfase na integração
social. Essa nova onda do movimento homossexual buscava uma
politização mais crescente da liberdade sexual. Esse
momento é marcado por fato que entrou para a história do
movimento, conhecido como “Revolta de Stonewall”, uma
tentativa da polícia de Nova York de interditar um bar
chamado Stonewall Inn, o mesmo era frequentado por
homossexuais, houve um confronto entre policias e
frequentadores do bar, o dia era 28 de junho de 1969 e foi
posteriormente chamado de “Dia do Orgulho Gay e Lésbico.”
A partir de 1980, o ativismo passa enfrentar um novo
desafio: a eclosão da epidemia do HIV-Aids. A doença ficou
conhecida como “peste gay” e reacendeu a discussão em torno
da relação entre homossexualidade e doença, tão questionada
pelos ativistas. As respostas as hostilidades desse período
vão resultar em experiências inovadoras para o movimento em
diversas partes no mundo. No Brasil houve uma luta dos
movimentos por políticas de saúde o que possibilitou uma
aproximação entre estes e o Estado. Essas políticas eram
financiadas em alguns casos por organizações internações,
foram realizados estudos e pesquisas na busca no controle
da doença em todas as partes do mundo.
As redes de comunidades globais e o intercâmbio de
culturas trouxe a oportunidade dos ativistas de organizarem
numa base transnacional. O avanço do processo de
globalização promoveu a atuação de diversos atores não-
estatais no cenário internacional, havendo o que Bringel e
Falero ( 2008) chamaram de “transgressão de fronteiras
nacionais”, ou seja, uma ampliação da discussão de questões
políticas de coletivos sociais que rompeu com o local, com
sua territorialidade, ganhando dimensões internacionais,
havendo uma transnacionalização da política e do
território.
Essa integração transnacional ocorre por meio de
redes, que possibilitam o surgimento de novos padrões de
pertencimento. São através dessas redes que os atores
sociais vão construir novas identidades, com isso podem
solidificar sua capacidade de interação e um aumento da
capacidade de barganha na conquista de objetivos.
Com o processo de transnacionalização os movimentos
sociais compartilham recursos, agendas e fortalecem suas
reivindicações, são nos espaços transnacionais que os
ativistas trocam informações, discutem ideias, levantam
sugestões, socializam demandas, o que amplia seus olhares
para realidade na qual estão atuando (Gohn e Bringel/ Riva
e Munõz, 2012 – Movimentos Sociais na Era Global).
A fundação da ILGA ( Internatonal Lesbian, Gay,
Bisexual, Trans and Intersex Association) em 1978 é um
exemplo de trasnacionalização, a ILGA é uma federação
mundial que reúne grupos que lutam pelos direitos de
lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e intersexuais.
Atualmente sua rede é constituída por mais de 1044
organizações de 117 países (ILGA, 2015). Este é um espaço
de troca de informação e experiência, os membros se
organizam em rede e articulam maneiras de buscarem os
objetivos que traçaram. Essa articulação em rede não exige
(algumas vezes) um deslocamento físico, mas estão unidos
por uma nova estrutura de articulação política acompanhando
uma tendência global hegemônica de uma união vertical
hierarquizada dos lugares e das relações sociais. Essas
novas horizontalidades geram novas sociabilidades através