Desenvolvimento industrial de Mirandela: a CUF, o Complexo Agro-Industrial do Cachão e a fábrica...

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Desenvolvimento industrial em Mirandela, em torno da linha do Tua: a fábrica de cortiças de Clemente Menéres, a CUF e o Complexo Agro-Industrial do Cachão 1 Albano Viseu (investigador do CITCEM e do projecto FOZTUA) Eduardo Beira (Instituto Superior Técnico e coordenador do projecto FOZTUA) J. M. Lopes Cordeiro (U. do Minho e coordenação do projecto FOZTUA) Resumo - Inaugurada em 1887, logo a linha do Tua se tornou impulsionadora de algumas valências para a região transmontana, entre Foz Tua e Mirandela, e a partir de 1906, entre Mirandela e Bragança. A linha ajudou a transformar um pouco o mundo dos transmontanos: a economia, a sociedade, a cultura, a religião, a política, os transportes, a mentalidade, os valores e as tradições, os campos de significação e do simbólico... Os modelos que escolhemos para estudo de caso ajudarão a compreender como a linha representou um suporte de apoio a unidades agro-industriais da região de Mirandela, surgidas em momentos históricos diferentes, que projectaram a sua imagem e canalizaram os seus produtos para o mercado: a Quinta do Romeu e as fábricas de cortiça de Clemente Menéres (a partir de 1874); o Complexo fabril da CUF (a partir de 1926) e o Complexo Agro-Industrial do Cachão (a partir de 1964). 1 Trabalho de pesquisa, apresentado em Tomar, no dia 16 de Abril de 2015, na Biblioteca Municipal Dr. António Cartaxo da Fonseca, no II Encontro Indústria, História e Património, promovido pelo Instituto de História Contemporânea. Faculdade de Ciências Sociais e Humanas. Universidade Nova de Lisboa. Momento de intervenção: Indústria, industrialização - Foz Tua (14.30 às 18:00 h).

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Desenvolvimento industrial em Mirandela, em torno da linhado Tua: a fábrica de cortiças de Clemente Menéres, a CUF e

o Complexo Agro-Industrial do Cachão 1

Albano Viseu (investigador do CITCEM e do projecto FOZTUA)Eduardo Beira (Instituto Superior Técnico e coordenador do projecto

FOZTUA)J. M. Lopes Cordeiro (U. do Minho e coordenação do projecto FOZTUA)

Resumo - Inaugurada em 1887, logo a linha do Tua se tornou

impulsionadora de algumas valências para a região

transmontana, entre Foz Tua e Mirandela, e a partir de 1906,

entre Mirandela e Bragança.

A linha ajudou a transformar um pouco o mundo dos

transmontanos: a economia, a sociedade, a cultura, a religião,

a política, os transportes, a mentalidade, os valores e as

tradições, os campos de significação e do simbólico...

Os modelos que escolhemos para estudo de caso ajudarão a

compreender como a linha representou um suporte de apoio a

unidades agro-industriais da região de Mirandela, surgidas em

momentos históricos diferentes, que projectaram a sua imagem e

canalizaram os seus produtos para o mercado: a Quinta do Romeu

e as fábricas de cortiça de Clemente Menéres (a partir de

1874); o Complexo fabril da CUF (a partir de 1926) e o Complexo

Agro-Industrial do Cachão (a partir de 1964).

1 Trabalho de pesquisa, apresentado em Tomar, no dia 16 de Abril de 2015, naBiblioteca Municipal Dr. António Cartaxo da Fonseca, no II EncontroIndústria, História e Património, promovido pelo Instituto de HistóriaContemporânea. Faculdade de Ciências Sociais e Humanas. Universidade Novade Lisboa. Momento de intervenção: Indústria, industrialização - Foz Tua(14.30 às 18:00 h).

Palavras-chave: industrialização, complexos agro-industriais, cortiça, adubos,

linha do Tua

1. Introdução

A linha quebrou o isolamento daquela região transmontana,

ajudou a fixar quadros, movimentou estudantes a caminho das

escolas e populações a caminho de organismos de centralidade

assistencial (hospitais, dispensários, centros de saúde),

administrativa (Câmaras Municipais e repartições de finanças),

judicial (Tribunais), económica (mercados, feiras, mercearias,

a banca que se organiza em torno das actividades da região,

quintas, cooperativas, complexos agro-industriais, unidades

individuais de produção…), religiosa e profana (festas,

romarias, jogos e tradições), comunicativa (CTT, telégrafo,

telefone), militar (recrutamento, incorporação e cumprimento do

serviço), identitária e libertadora das populações rurais

(saída para outras regiões do país e do mundo, à procura de

melhores condições de vida).

Se, de certa forma, contribuiu para ajudar a esvaziar

alguns centros populacionais de vilas e aldeias, de um universo

apegado aos seus contextos de mundividência, também concorreu

para o crescimento e para o desenvolvimento de localidades como

o Tua, o Cachão, Mirandela, Macedo de Cavaleiros e Bragança.

Os armazéns, e os celeiros de cereais, que se estabeleceram

nestas localidades, serviram para escoar, em maior quantidade

do que em outras estações e apeadeiros da linha do Tua, muitos

dos produtos que da região eram enviados para o Porto, para o

litoral e para Lisboa, e em movimento ascendente para captar

mercadorias que abasteciam esses locais e suas regiões

envolventes. Macedo de Cavaleiros, Bragança e Cachão eram

centros importantes de expedição de cereais.

As grandes dificuldades de circulação de pessoas, de bens e

mercadorias, numa região em que perduraram por muito tempo as

antigas vias romanas, em que faltavam estradas e se transitava

por caminhos esburacados, térreos, lamacentos (inverno) e

poeirentos (verão), foram sendo ultrapassadas com o

aparecimento do comboio.

A Estada Real n.º 6, em macadame, inaugurada em 1870, uniu

Bragança e o Porto seis anos mais tarde, passando por Macedo de

Cavaleiros, Romeu, Mirandela, Murça, Vila Real, Amarante,

Penafiel e Paredes, canalizava a produção agro-alimentar e

animal das terras transmontanas para maiores centros de

consumo, ainda que as viagens fossem perigosas e demoradas.

O rio Douro foi utilizado, desde longa data, como uma via

alternativa de comunicação circulante pelas populações

transmontanas e durienses das duas margens que a ela recorreram

para escoar as suas produções essencialmente para a Régua, para

Lamego e para o Porto, e para receber as mercadorias

necessárias à sua subsistência e à sua actividade.

Em 1792, foi vencido o estrangulamento que representava o

Cachão da Valeira, e a partir de 1811 o tráfego de mercadorias

com o Porto, através do rio Douro, estendeu-se até à fronteira

com Espanha. As populações acima Cachão deixaram de dar

primazia ao negócio fronteiriço e ao comércio das rotas dos

almocreves que por elas passavam e viram as suas produções

agrícolas (vinho, azeite, amêndoa, sumagre, figos…) mais

valorizadas, no contexto da economia nacional.

Em 1887, o caminho-de-ferro da Linha do Douro e da Linha do

Tua passou a ligar o Porto a Barca de Alva e a Mirandela,

surgindo como uma via concorrencial, em relação às

anteriormente referidas e trazendo outras possibilidades de

desenvolvimento à região transmontana e duriense.

A estação de caminho-de-ferro de Mirandela, como local

central desta linha, usufruiu de condições que, a partir do

século XIX, lhe deram movimento e serviram de apoio ao núcleo

de serviços industriais da região: as suas oficinas fizeram a

reparação do material circulante e deram assistência à via e às

máquinas nas suas secções (motorizado; forjas; vapor; tornos;

material rebocado; pilha de carvão; placa giratória) e, por

vezes, atenderam empresas da região, e o armazém serviu para

fazer a expedição e a captação da carga.

Os três exemplos escolhidos para o estudo de caso que aqui

apresentamos ajudam a compreender como a linha foi importante

para Mirandela, e para as populações que viveram em torno das

suas dinâmicas, contribuindo para o aparecimento de empresas

valorizadoras dos produtos locais: a Quinta do Romeu (1874) e a

Sociedade Clemente Menéres, Lda. (1902): cortiça, vinho e

azeite; o complexo fabril da CUF, a partir de 1926: azeite e

óleo de bagaço de azeitona, de grainha e casca da uva, do

gérmen de milho, da copra e do coquenote; e o Complexo Agro-

Industrial do Cachão, a partir de 1964: azeitonas, picles,

azeite, mel, compotas de vários doces, feijão cozido de vários

tipos, marmeladas e geleias, vários legumes cozidos e

enlatados, frutas em calda e cristalizadas, frutos secos,

queijo, vinhos e aguardentes vínicas …, produtos especialmente

destinados à exportação, mas também para consumo interno.

A linha do Tua, tanto na sua extensão até Mirandela como na

sua secção até Bragança deu azo ao desenvolvimento de

indústrias e de complexos agro-industriais e pecuários e

movimentou o seu comércio, mostrando a importância da novel e

poderosa forma de transporte e de comunicação com o litoral.

Demonstraremos os factores que levaram à instalação destas

três unidades na região, os seus objectivos e aspirações, as

suas realizações concretas e as razões para o seu encerramento

(quando este se verificou).

Analisaremos, em seguida, do ponto de vista do património

industrial, o que restou destes empreendimentos e de que forma

esses vestígios foram ou não utilizados.

2. O desenvolvimento “industrial” de Mirandela, em

torno da Linha do Tua

2.1. Clemente Menéres Lda., o comboio e a cortiça

Fig. 1. Clemente Menéres (1843-1916)Fonte: Quinta do Romeu. Disponível em: http://www.quintadoromeu.com/ Data

de consulta: 7/4/2015

Nome da unidade empresarial: Quinta do Romeu e Fábrica de

cortiças de Mirandela

Protagonista principal: Clemente Menéres (1874) e Sociedade

Clemente Menéres, Lda. (a partir de 1902)

A unidade empresarial:

-Factores que levaram à sua instalação

Clemente Menéres (1843-1916) foi um empresário que, na

segunda metade do século XIX, após uma breve e bem-sucedida

estadia no Brasil, para onde emigrara com apenas 16 anos de

idade, regressou a Portugal em 1863, estabelecendo-se no Porto

e passando a dedicar-se à exportação de produtos agrícolas para

várias regiões do mundo.

Nas suas digressões pela Europa, Médio Oriente e Norte de

África, apercebeu-se das vantagens em investir na produção de

vinho e de cortiça, produtos que já então comercializava, antes

de os canalizar para os mercados externos.

A região transmontana que ele visitou, a fim de estudar os

melhores locais onde realizar os investimentos, poderia

fornecer-lhe não apenas a cortiça, que existia em grande

quantidade e de boa qualidade no concelho de Mirandela, mas

também o vinho, o azeite e outros produtos agrícolas.

Em Maio de 1874, adquiriu, no Romeu, em Mirandela, grandes

extensões de terreno e matas de sobreiros, iniciando a

constituição de uma empresa agrícola que se dedicaria,

maioritariamente, à exploração da cortiça, embora também

produzisse vinho e azeite. As propriedades que adquiriu e que

passaram a integrar o domínio da empresa estendiam-se pelo

concelho de Mirandela, por outros seis concelhos do distrito de

Bragança, e ainda pelo de Valpaços, no distrito de Vila Real.

Com matéria-prima abundante e de boa qualidade2 – não

apenas a proveniente das suas propriedades, mas também a que

adquiria na região –, decidiu dedicar-se à sua extracção,

transformação e comercialização, pelo que montou uma fábrica,

transformando-se, assim, num dos pioneiros da industrialização

daquele produto no Norte do país.

Instalada a fábrica de cortiças no Romeu e em Mirandela, a

fim de fazer frente à concorrência de outras fábricas de

cortiça e de outros pretendentes à instalação de unidades

congéneres, Clemente Meneres conseguiu garantir, dessa forma, o

controlo sobre uma grande parte da cortiça produzida na região.2 VISEU, 2007: 244

-Objectivos, aspirações e realizações

Em 1902, a Sociedade Clemente Meneres, Lda. tinha dois

grandes objectivos: «explorar agricolamente na Província de

Trás-os-Montes bens rústicos, próprios ou arrendados, para

produção de vinho, azeite e cortiça e, acessoriamente, cereais,

madeiras, mel e outros produtos agrícolas; manufacturar e

vender os produtos dessa exploração agrícola»3.

A Sociedade Clemente Menéres, Lda., constitui um

interessante caso de longevidade societária e de sucesso a

nível de exploração, de transformação, de qualidade e de

canalização para o mercado da sua produção agrícola,

continuando nos dias hoje a representar um dos principais

empregadores da região.

-Algumas características

A Quinta do Romeu constitui uma unidade económica de

vanguarda na forma como se cultivam os produtos, como se lançam

novas tecnologias e métodos na agricultura (irrigação, métodos

de extracção de azeite, do fabrico e tratamento dos vinhos, da

jeropiga e da aguardente, do cultivo e da apanha de frutas),

como aposta na qualidade das frutas, do azeite, do vinho (de

3 Cit. por VISEU, 2013: 30

mesa e do Porto), como se explora a cortiça e como se faz a

comercialização destes produtos4.

Na Quinta do Romeu destacaram-se três núcleos principais:

Jerusalém do Romeu (centro onde fica o Palacete da família

Menéres, com as suas divisões e casarios, cada uma com a sua

função, os armazéns, a fábrica de cortiça e o armazém de apoio

ao escoamento da produção, localizado junto à linha do Tua);

Vila Verdinho (centro de desenvolvimento e de protecção

florestal do Quadraçal, onde funcionou a primeira fábrica de

cortiças) e Monte Meões (o principal centro vinhateiro).

A exploração agrícola estava organizada nos seguintes

sectores: florestal (montados de sobreiros e alguns soutos de

castanheiros), agrícola (vinhas, olivais, pomares, hortas,

lameiros, culturas de sequeiro de cereais e outras), pecuário

(animais de carga e de trabalho e animais de rendimento como as

ovelhas e as cabras), tecnológico (lagares, barragens,

maquinaria) e transformador (fábrica de rolhas)5.

-Razões para o encerramento das fábricas de cortiça em

Trás-os-Montes

Um dos motivos que explica o abandono da transformação da

cortiça em Trás-os-Montes prende-se com a questão do transporte

da matéria-prima e dos produtos derivados.

De 1874 a 1878, o escoamento da cortiça era assegurado por

carreteiros, recorrendo a carregamentos em carroças e em

carros-matos, puxados por bois, que a conduziam por terra para

4 VISEU, 2013: 355 VISEU, 2013: 31-32

o Porto ou para os portos fluviais (Foz Sabor, Pocinho, Tua)

onde era carregada em barcos (almadia), e seguia através do rio

Douro para o Porto.

Em 1878, quando foi instalada a “fábrica velha” no

Quadraçal, devido às fracas vias de comunicação – Mirandela

estava ligada ao Porto, a partir de 1870, pela Estrada Real n.º

6, mas o percurso era longo e moroso – surgiram problemas para

o escoamento da cortiça, das rolhas e dos outros produtos

derivados desta matéria-prima.

A ligação ao Porto, depois de 1880, a partir da estação de

caminho-de-ferro do Pinhão, pouco contribuiu para alterar esta

situação, porque o percurso entre Mirandela e o Pinhão era

longo e difícil de percorrer, quer ao utilizar os carros-matos,

quer as carroças, quer os carros de bois, quer os animais de

carga.

O comboio seria essencial para Clemente Menéres canalizar a

sua produção para os mercados, pelo que se tornou num dos

principais batalhadores para que este meio de transporte fosse

uma realidade e para que o mesmo lhe passasse à porta.

Clemente Menéres foi o grande obreiro do caminho-de-ferro

de Foz Tua a Mirandela, «pelo seu pragmatismo, pela sua

inflexibilidade, perante as dificuldades do processo e pela

capacidade de congregar diversas personalidades em torno de um

projecto indispensável ao desenvolvimento agrícola, industrial

e comercial das terras transmontanas»6.

O comboio passou a facilitar o transporte da produção da

Sociedade Clemente Menéres, Lda., e a cortiça das suas

diferentes propriedades, que se situavam ao longo da linha,6 PARREIRA, 1997: 70

passou a ser canalizada quer para a fábrica de Mirandela, quer

para a fábrica do Porto.

A partir de Setembro de 1887, passou a existir uma ligação

ferroviária entre Mirandela e Foz Tua, que entroncava nesta

estação na Linha do Douro, pelo que a implantação de fábricas

de cortiça junto do principal centro produtor, no Romeu, deixou

de ter interesse.

Com a abertura pública da linha do Tua, a fábrica da Horta

da Massada perdeu importância e, como o principal obstáculo

para o transporte da cortiça estava ultrapassado, a fábrica de

cortiça de Monchique, instalada na cidade do Porto, ganhou nova

vitalidade. O escoamento da cortiça para esta fábrica ficava,

assim, assegurado pelo comboio.

A fábrica de cortiça de Monchique, cuja produção diminuíra,

entre 1 de Fevereiro de 1879 e 30 de Abril de 1887, reanimou a

sua actividade com a chegada do comboio a Mirandela. Além da

cortiça, Clemente Menéres exportava, nesta altura, rolhas,

conservas (sardinha, doce, fruta em calda, geleia e marmelada),

azeite e fruta (contudo, a produção para a fábrica de conservas

que o empresário tinha instalado no Porto não obteve êxito).

Atestando a qualidade do seu fabrico, os produtos das

fábricas de Clemente Menéres conheceram, muito rapidamente, um

considerável sucesso, tanto a nível nacional como

internacional, tendo sido premiados nas Exposições de

Filadélfia (1876), de Lisboa (1884) e de Paris (1889).

As fábricas do Romeu e de Mirandela trabalhavam a cortiça e

seus derivados (rolhas, quadros, aparas, feixes) e a produção

obtida era enviada para o Porto.

A cortiça em bruto e em fardos foi sempre escoada em

grandes quantidades para a sucursal da Sociedade Clemente

Menéres, Lda., ao longo dos tempos: «Dei ordem ao Cleto para que

acabasse de despachar toda a cortiça que cá [no Romeu] existia da casa

[Menéres] e juntamente 3 sacos com vários quadros que aqui havia, ainda

antigos, assim como 2 sacos de carvão de sobreiro que aqui estavam a fazer

estorvo e a contaminar os sacos»7.

Até 1887, as dificuldades de transporte terão impedido a

preparação da cortiça em prancha, pelo que se fabricaram apenas

rolhas. As facilidades de transporte possibilitadas pela

inauguração da Linha de Foz Tua a Mirandela, nesse ano,

transferiram a quase totalidade da produção rolheira para a

fábrica de Monchique.

Em 1895, a fábrica de rolhas de Jerusalém do Romeu, ainda

se mantinha em funcionamento, embora com uma produção muito

reduzida, ocupando apenas um trabalhador a tempo inteiro, o

qual era ajudado a cozer e a quadrar a cortiça por mais um ou

dois trabalhadores que eram dispensados de outros trabalhos.

A preparação e a transformação da cortiça, seguindo os

modelos industriais, só se verificará com a instalação da

fábrica de cortiças de Mirandela.

Entre 1895 e 1905, Clemente Menéres dedicou-se à Quinta do

Romeu, reactivando a fábrica de cortiças do Bairro do Toural,

em Mirandela, e exportando, durante este período, cortiça,

rolhas, vinhos, bebidas e azeite.

Em 1900, a fábrica de Mirandela já empregava 20 famílias e

estava equipada com 25 máquinas accionadas por uma máquina a

vapor: 9 de quadrar cortiça e 16 de fazer rolhas e de contar. 7 BARBAS: 1891

Em 1905 (Julho), a linha chegou ao Romeu e em 1906 (1 de

Dezembro) atingiu Bragança. A cortiça passou a ser carregada em

vagões em várias estações e apeadeiros da Linha do Tua

(Salselas, Macedo de Cavaleiros, Romeu, Mirandela, Cachão,

Abreiro, Brunheda, S. Lourenço, Tralhariz …). Esta matéria-

prima viria a ser o verdadeiro motor da empresa de Clemente

Menéres, pois as suas exportações para diferentes praças da

Europa, da Ásia e da América, às quais se deve acrescentar o

vinho e o azeite, proporcionaram avultados lucros.

Na realidade, foram cinco as fábricas de cortiça que

Clemente Menéres fundou, uma no Porto e quatro em diversos

locais do concelho de Mirandela.

Na Cidade Invicta fundou, em 1872, nas instalações do

antigo convento de Madre de Deus de Monchique, em Miragaia, a

sua primeira fábrica de rolhas de cortiça, que ao longo do

tempo conheceu vários períodos de laboração.

Na Quinta do Romeu, mais propriamente na ribeira do

Quadraçal, fundou em 1878 outra fábrica de rolhas e de

preparação de cortiça em prancha – que, por ter sido a primeira

da região, ficou conhecida por “fábrica velha” –, a qual se

manteve em funcionamento até 1881.

No Inquérito Industrial publicado nesse ano, Clemente

Menéres já possuía uma outra fábrica, no lugar do Carriço, em

Jerusalém do Romeu, que manteve o mesmo tipo de produção da

fábrica anterior, isto é, rolhas e cortiça em prancha, mas que

raramente funcionava, porque a maior parte da cortiça era

canalizada para a fábrica de Monchique, no Porto, a partir da

estação do Pinhão, inaugurada em 1880.

Apesar do empresário possuir uma plantação de sobreiros nas

proximidades da nova fábrica, estas árvores eram ainda muito

novas para produzir cortiça, capaz de se ajustar às

necessidades de produção. Por conseguinte, em 1883 a fábrica do

Carriço cessou a laboração, entrando nesse mesmo ano em

funcionamento uma nova fábrica na Horta da Massada, no Romeu.

Finalmente, em 1900, Clemente Menéres transferiu grande

parte dos equipamentos da fábrica de Monchique, para o Bairro

do Toural, na chamada Canelha do Outeiro, em Mirandela, onde

instalou uma nova fábrica, a qual veio a cessar a laboração em

1913, regressando os equipamentos à fábrica do Porto, a partir

de 1909.

A partir de 1908, a cortiça em bruto, produzida na região –

a Casa Menéres sempre escoou grandes quantidades de cortiça em

bruto, ao longo dos tempos –, passou a ser transportada para a

fábrica de Monchique, que reanimou a sua actividade, suspensa

desde 1900. E em 1909, após ter-se expandido para novas áreas

do antigo convento de Monchique, e ter sido reapetrechada com a

maior parte das máquinas que vieram de Mirandela por caminho-

de-ferro, assim como com o pessoal operário que trabalhava

nesta fábrica, a fábrica do Porto estava já a laborar

normalmente.

Consequentemente, em finais de 1913, a fábrica do Toural,

em Mirandela, cessou definitivamente a actividade.

-Relação com a linha do Tua

A consulta dos dados relativos à carga de mercadorias na

linha de Foz Tua a Bragança, incluídos nos Relatórios de Contas

Anuais da Companhia Nacional dos Caminhos-de-Ferro, operadora

da linha de Foz Tua a Mirandela (desde 1887) e, depois, de

Mirandela a Bragança (a partir de 1906) permitem chegar a

algumas conclusões, sobre a evolução do negócio da cortiça em

Trás-os-Montes, em especial na zona do Vale do Tua.

Grande parte dessa cortiça pertencia à Casa Menéres que a

enviava para o Porto para alimentar a fábrica de Monchique e

também para ser exportada.

A quase totalidade da carga expedida pela linha do Tua

(cerca de 90%) tinha origem na estação de Mirandela e como

destino a linha do Douro, para ser canalizada para o Porto.

Antes de 1891, data da grande reestruturação financeira da

Companhia Nacional, em que o controlo de gestão foi assumido

pelos obrigacionistas, salvando, assim, a empresa da falência,

nunca foram publicados dados de tráfego e carga nos relatórios

anuais.

O gráfico 1 refere a tonelagem total de cortiça, expedida

ao longo da linha, desde 1891 a 1933:

Gráfico 1 – Cortiça expedida ao longo da Linha do Tua

(1891-1933). Fonte: Relatórios Anuais da Companhia Nacional

de Caminhos-de-Ferro (RACNCF).

Da observação do gráfico 1, podem inferir-se algumas

conclusões:

a carga média expedida de cortiça variou habitualmente

entre as 1.000 e as 1.500 toneladas anuais, sem que

seja visível uma tendência nos dados;

os anos em que essa tendência esteve abaixo desses

valores: 1906, 1915; 1917-1920; 1928; e acima desses

valores: 1916, 1923, 1933;

a abertura da linha de Mirandela a Bragança não parece

ter tido uma grande influência nas expedições totais de

cortiça, uma vez que já antes dessa inauguração a

cortiça era comprada e transportada para a estação de

Mirandela;

ao contrário de outras mercadorias, o período da I

Guerra Mundial não parece ter afectado grandemente as

expedições desta matéria-prima.

O gráfico 2 mostra a evolução das cargas totais de

mercadorias e de cortiça (em toneladas e movimentadas em ambos

os sentidos) expedidas quer pela linha do Tua a Mirandela, quer

pela linha de Mirandela a Bragança, no mesmo período (1891-

1933).

Gráfico 2 – Evolução das cargas totais de mercadorias e

cortiça movimentadas em ambos os sentidos. Fonte: RACNCF.

A análise dos dados do gráfico 2 permite concluir que a

importância das cargas de cortiça, no tráfego total da linha,

se manteve estacionário a longo prazo, não seguindo as

tendências gerais do tráfego total de mercadorias.

Este tráfego mostra uma tendência crescente, até final da

primeira década do século XX, com um salto entre 1905 e 1907,

associado à abertura progressiva da linha até Bragança.

Gráfico 3 – Tonelagem da cortiça movimentada, em relação à

carga total. Fonte: RACNCF.

No entanto, apenas nos primeiros anos de exploração da

linha, entre Foz Tua e Mirandela, é que a cortiça teve uma

quota importante da tonelagem movimentada em pequena

velocidade: próximo dos 8% da carga total, no seu início de

actividade, mas já só cerca de 4% ao virar do século, tendo

posteriormente estabilizado à volta de 2% (gráfico 3).

A linha de Foz Tua a Mirandela representou, mesmo após a

abertura da ligação a Bragança, cerca de 70% da carga total,

porque Mirandela continuou a ser o principal pólo de negócio e

de expedição das cargas de cortiça.

Um conjunto de fenómenos explica a irregularidade do

negócio da cortiça: no início, pouca cortiça era enviada para o

Porto, porque foi necessário esperar que os sobreiros dessem

cortiça mansa e apta para ser transformada; os incêndios e a

entrada das cabradas nos sobreirais dificultaram a extracção e

a obtenção de cortiça; graças ao trabalho dos feitores, dos

guardas, dos fiscais e dos colaboradores, a "propriedade" e a

quantidade de sobreiros aumentou, como foi aumentando a área em

que se comprava cortiça a terceiros; a mão-de-obra constituiu

um problema, porque era escassa para a execução das tarefas

agrícolas e estava pouco preparada para a transformação da

cortiça nos seus derivados; as dificuldades de comunicações e

os problemas de transportes, relacionados com os carros de

bois, os animais de carga, e o transporte por camioneta, após

1915; a possibilidade do roubo da cortiça que devia ser

guardada ou colocada em lugares seguros para que isso não

acontecesse.

Tudo isto contribuiu para o apuramento de um valor variável

na obtenção de cortiça.

Ao longo do período em análise, vários carregamentos

significativos de cortiça foram enviadas em bruto directamente

da exploração agrícola (Casa Menéres) e de outros locais

(Cachão, Azibo, Salsas, Abreiro...), sem terem passado pela

fábrica, um fenómeno que sempre se verificou, como a leitura

dos copiadores da correspondência entre os feitores e Clemente

Menéres parece indicar; a procura da cortiça em prancha passou

a ser maior do que a transformada em rolhas; a reactivação da

fábrica de Monchique representou uma maior movimentação e criou

a necessidade de captar a cortiça ainda em bruto; a

concorrência de outras fábricas e de outros negociantes da

cortiça surgiu em Vimioso e em Mogadouro.

A linha do Tua foi essencial no transporte da cortiça e dos

seus derivados, ajudando Clemente Menéres e a Sociedade

Clemente Menéres, Lda., a partir da sua criação em 1902, a

alimentar a exportação destes produtos e a fábrica de

Monchique, quando se veio a organizar, e a trazer até à região

transmontana inovações técnicas e novos métodos de produção e

de transformação (maquinaria, bacelos, adubos, utensílios,

carboreto, gasómetros, ceiras, alfirme, corda, enxofre,

sulfato, carvão, géneros alimentares, manutenção de

equipamentos, o telefone…).

A diferença de bitola, existente entre as Linha do Tua e do

Douro, levantou dificuldades ao negócio da cortiça, pois era

preciso fazer o seu transbordo na estação de Foz Tua, o que

tornava o serviço lento e mais caro, e o pouco cuidado na

descarga e carga dos vagões danificava a cortiça, afectando-lhe

a sua qualidade.

Houve outros factores que se tornaram adversos8 à

continuidade das fábricas de rolhas no Romeu e em Mirandela: a

dificuldade em contratar operários especializados (escolhedores

de rolhas e quadradores) e de os operários contratados na

região de Lisboa não desejarem fixar-se em Mirandela; os baixos

níveis de qualidade das rolhas ali fabricadas; o facto de a

cortiça ter passado a possuir mais valor se exportada em

prancha do que se fabricada em rolhas9; os problemas com a

8 VISEU; 2013: 749 MENÉRES: Entrevista de Maio 2013

manutenção das máquinas e a dificuldade de assegurar a sua

assistência técnica em Mirandela, pois os técnicos qualificados

tinham de se deslocar do Porto.

O caminho-de-ferro contribuiu também para a

desindustrialização da região, pelo menos no que diz respeito à

indústria corticeira, pois ajudou a deslocalizar máquinas e

operários de Mirandela para Monchique.

Património industrial: o que subsistiu; utilização dos

equipamentos

O património agro-industrial da Quinta do Romeu está bem

preservado em Monte Meão, em Jerusalém do Romeu, em Vale de

Couço e no Romeu. Apesar de algumas unidades se encontrarem

desactivadas, ainda se encontram conservadas e a funcionar as

instalações de produção e de engarrafamento de vinho e de

azeite e encontram-se em bom estado as unidades de apoio à

exploração e ao negócio das produções (residência da família

Menéres, escritório, casas de apoio, restaurante Maria Rita….)

O Museu de Curiosidades encontra-se aberto ao público e

constitui um verdadeiro acervo da memória da família Menéres e

das pessoas da região, reportando-se a tecnologias, maquinaria

e à época dos melhoramentos das aldeias de Vade de Couço, Vila

Verdinho, Vimieiro e Romeu.

As fábricas de cortiça estão desactivadas e restam apenas

as instalações da fábrica Velha no Quadraçal, que por se manter

quase na íntegra representa uma autêntica «cápsula no tempo».

O arquivo da Sociedade Clemente Menéres, Lda., existente no

Romeu e em Monchique (Porto), é magnífico para o estudo

aprofundado sobre a acção empresarial de Clemente Menéres e dos

seus descendentes, assim como para aprofundar a forma como a

Sociedade se manteve em actividade e indivisa, até aos nossos

dias. O primeiro núcleo, localizado no Romeu, precisa de um

espaço de conservação dos documentos nele existente

(copiadores) e o segundo, localizado em Monchique, precisa de

um trabalho de arquivo e de catalogação.

As máquinas e as inovações introduzidas na Quinta do Romeu

constituíram um símbolo de «progresso» e de modernidade,

encontrando-se muitos desses equipamentos expostos no Museu de

Curiosidades do Romeu e em armazéns e unidades de

transformação, pertencentes à Quinta do Romeu.

2.2. O complexo Fabril da CUF em Mirandela

Fig. 2. Alfredo da Silva (1871-1942)

Fonte: O criador de empresas. Disponível em:http://economico.sapo.pt/noticias/o-criador-de-empresas_196941.html.

Data de consulta: 7/4/2015

Nome da unidade empresarial: Fábrica da CUF de Mirandela

Protagonista principal: Alfredo da Silva

A unidade empresarial:

-Factores que levaram à sua instalação

A região de Mirandela possuía abundância de matérias-

primas, indispensáveis para o funcionamento da fábrica:

azeitona, bagaço de azeitona, grainhas e cascas de uvas, lenha

e troncos para alimentar a caldeira.

Cada unidade tinha três pessoas para trabalhar as 24 horas

em todo o dia. Uma caldeira tinha três fogueiros, contando

ainda com três ajudantes, e a central eléctrica tinha também

três pessoas para tomar conta do serviço. E havia mão-de-obra

necessária para esses e para outros serviços.

A CUF possuía um lagar onde se fazia azeite e se obtinha o

bagaço, apesar deste produto que abastecia a fábrica ser

também proveniente de diversas localidades. Os grandes

vendedores de bagaço existiam por todo o Nordeste, em Freixo

de Numão, em Moncorvo, em Foz Coa e, até mais a sul, em

Idanha-a-Nova, perto de Castelo Branco.

Quando Alfredo da Silva decidiu instalar o lagar em

Mirandela, o acontecimento causou um grande impacto sobre os

industriais de Mirandela que não acolheram bem a ideia: o Dr.

Manuel Maria Pires, médico da CUF, o Dr. Aires Lima, o Conde

Fijó, o Capitão Ilídio Esteves, o «Zé» Lima, o Hermenegildo

Castilho, o Dr. Amândio… Alguns deles só produziam o azeite,

pois tinham os seus lagares, e vendiam o bagaço para a CUF.

A unidade da CUF de Mirandela passou a ser compradora desse

subproduto da região e tornou-se também no empregador favorito

para muitas pessoas, para além de criar uma ocupação para os

angariadores, «os comissários», que angariavam o bagaço na zona

onde viviam, com o objectivo de o venderem à CUF.

A existência de espaço necessário para instalar as várias

unidades, mesmo ao lado da linha do Tua, em Mirandela,

correspondia a uma exigência de Alfredo da Silva que instalou

todas as suas fábricas onde havia linhas de caminho-de-ferro e

matérias-primas e utilizava este meio de transporte, para

escoar a sua produção e para abastecer os armazéns de produtos.

A fábrica em Mirandela ficou servida por um ramal de

caminho-de-ferro, ligado à Linha do Tua, e ainda por um

guindaste para cargas e descargas.

A fábrica tinha óptimas instalações e estava equipada com

todo o material necessário para fazer face a um incêndio.

Na caldeira, havia uma buzina que funcionava a vapor:

chamavam-lhe a buzina da CUF e ouvia-se a 20 km de distância,

regulando as horas de entrada e de saída do pessoal.

-Objectivos, aspirações e realizações

A CUF constituiu um gigantesco conglomerado empresarial,

com actividade em inúmeros sectores económicos, como a

indústria, a banca, os seguros, etc, tendo baseado o seu

crescimento em cinco grandes segmentos de produção:

Química orgânica: refinação de óleos, azeite, sabões,

farinhas e rações.

Química inorgânica: fabrico de ácidos.

Metalúrgica: cobre, chumbo, ouro e prata e tratamento de

cinzas de pirite.

Metalomecânica: oficinas de ferro, bronze e fabrico de aço

especial para a indústria do ácido sulfúrico.

Têxtil: primeiro com embalagens para os adubos e, depois,

alargada à produção de diversos tecidos.

Na década de 1930, para corresponder ao objectivo principal

da empresa, a CUF já tinha fábricas em Lisboa, Barreiro,

Alferrarede, Soure, Canas de Senhorim e Mirandela (química

orgânica) e empregava 16 mil pessoas.

A CUF era a infra-estrutura económica mais importante da

região transmontana, dado que era praticamente a única, pelo

que desempenhou um papel fundamental na sua história e,

particularmente, na de Mirandela.

Constituía uma unidade de primeiro plano, tendo criado uma

rede de comissários, que realizavam parte das compras, o que

acabava por não ser rentável para a CUF, porque a azeitona era

paga a diferentes preços. Um comissário comprava a azeitona na

aldeia dos Avantos e vendia-a como se fosse de Mascarenhas ou

de Mirandela, o que tinha implicações no rendimento … A fim de

solucionar este problema, a CUF criou um pequeno laboratório e

passou a comprar azeitona com amostra laboratorial.

Em toda a região de Mirandela, o aquecimento fez-se durante

muitos anos, a partir do subproduto da CUF. O bagaço queimado

era vendido para as lareiras e produzia um borralho excelente.

Nos anos 40 e 50, tanto na altura da II Guerra Mundial,

como no pós-guerra, a CUF constituiu também uma infra-

estrutura de apoio social. A fome foi então muito sentida na

região, sobretudo pelas classes mais humildes. Como Mirandela

era uma excelente zona agrícola, foi criada a inspecção dos

abastecimentos, a fim de se evitar o mercado negro, sendo

instituído um sistema de senhas.

O agricultor não podia vender livremente a sua produção,

sendo obrigado a entregá-la à CUF. De Mirandela, alguns

comboios iam directamente para a Alemanha, outros para os

Aliados, e os «junkers» de Alijó vinham comprar o minério e o

azeite. As padarias vendiam o pão, o denominado «charrão», que

era já só farelo…

A CUF foi de extrema importância para a região de

Mirandela: garantiu postos de trabalho ao longo dos 70 anos da

sua existência; adquiriu os produtos da região; abasteceu-se

no mercado local; dominou a actividade comercial de Mirandela

e da região; proporcionou apoio à agricultura local; os

seguros e a camionagem viverm 80% à volta da CUF; movimentou o

serviço de cargas e descargas da CP; forneceu energia

eléctrica a Mirandela e o bagaço para aquecimento. A população

tirou vantagens da existência da CUF, porque umas vendiam

(azeitona, bagaço, grainha, amêndoa), outras compravam

(adubos, rações, bagaço) e os trabalhadores viam os seus

ordenados garantidos.

-Algumas características

A fábrica da CUF em Mirandela foi construída em 1926 num

local conhecido por Vale da Azenha ou Cruzeiro, perto da

estação de caminho-de-ferro da linha do Tua, numa área de 38

000 m2, abrangendo uma área coberta de 11 000 m2.

Da área coberta faziam parte: o lagar de azeite, a unidade

de extracção de óleos, a caldeira, a central eléctrica, os

secadores verticais, o armazém do bagaço de azeitona, as tulhas

de azeitona, o armazém do subproduto, o armazém de matérias, as

oficinas, a casa das bombas, a casa do boi, os balneários e os

refeitórios do pessoal.

Esta unidade era ainda composta por: uma chaminé com 38 m

de altura, ainda hoje existente, como símbolo da indústria da

CUF instalada no local; uma buzina que se ouvia a 20 km de

distância, e servia de referência às populações como

sinalizador temporal, marcando o ritmo da vida e das

actividades; um ramal da linha do Tua, um guindaste e uma

roldana elevatória; o Bairro da CUF; a casa do director; a casa

da gerência e a casa para receber os vendedores.

Fig. 3. A chaminé do complexo fabril da CUF em Mirandela

Fonte: Mirandela – ninho de cegonha (habitado). Foto de Luís A. D.Liberal. Disponível em: http://www.panoramio.com/photo/14763526. Data

de consulta: 7/4/2015

O Bairro da Fábrica, ou Bairro da CUF, era composto por

sete edifícios, destinados a diverso pessoal da fábrica:

electricista, serralheiro, pessoal de escritório, o director, o

encarregado de pessoal. Havia uma casa para receber os

vendedores que percorriam a área e para nela descansarem, e a

casa da gerência, um edifício ainda hoje existente, o qual só

era habitado pelo fundador da empresa, Alfredo da Silva, quando

visitava Mirandela, acompanhado pela sua secretária, uma

senhora francesa. O empresário só dispunha de habitações em

Mirandela e em Alferrarede, localizadas nas proximidades das

estações da CP, onde se instalava, aquando das suas visitas. As

casas eram de excelente qualidade e já possuíam aquecimento.

Fig. 4. Casa da gerência da CUF em Mirandela

Fonte: Mirandela – casa do Encarregado da CUF. Foto de Luís A.D.Liberal. Disponível em:

http://www.alltravels.com/portugal/braganca/mirandela/photos/current-photo-86852580. Data de acesso: 7/4/2015

Em 1929, entrou em laboração a fábrica de azeite da CUF, em

Mirandela, que alargou as possibilidades de valorização de um

produto da agricultura regional, a azeitona, em cuja frontaria

se podia ler, em letras de grandes dimensões: Companhia União

Fabril – fabrica os melhores adubos.

Em 1970, a fábrica já não era como a primitiva, mandada

instalar por Alfredo da Silva, uma vez que o lagar fora

remodelado em 1956 e a extracção de óleos em 1963.

O funcionamento da fábrica, propriamente dito, mantinha-se

sem grandes alterações, mas o subproduto, o bagaço, já

produzia óleo alimentar, enquanto que, anteriormente, o óleo

de bagaço só era útil para sabão.

O azeite só passou a ser feito de modo contínuo, a partir

de 1956, altura em que o lagar trabalhava com 26 prensas

tradicionais, 4 moinhos de pedra e em que utilizavam nas

prensas, alimentadas por vagonetas, capachos de Cairo.

Em 1956, o lagar foi remodelado, passando a ocupar uma

décima parte do edifício, tendo sido instalado um equipamento

Alfa Laval, de fabrico italiano, por técnicos franceses, e

estava preparado para trabalhar a azeitona da região. Já

laborava 50 toneladas nas 24 horas. Não havia capachos, mas sim

grandes lavadeiras por jacto de ar que faziam uma boa lavagem

da azeitona. A azeitona era moída por moinhos de martelos e

depois seguia para os malaquecadores que trabalhavam com 2 sem-

fins, um direito e outro esquerdo.

Toda a massa era aquecida, através de uma câmara a vapor.

Depois de estar quente, seguia para as prensas contínuas que

funcionavam com um crivo em aço inox e um sem-fim, tipo

parafuso. As prensas tinham um comprimento de 3 metros e um

diâmetro de 70 cm. Eram reguladas por uma tampa de ferro

fundido e uma alavanca de ferro com pesos de ferro fundido. A

primeira separação da miscela era feita, através de uma grande

centrífuga que separava três produtos em simultâneo: o azeite,

a água e a borra. O azeite passava para uma segunda centrífuga

normal, por um filtro e por um arrefecedor, seguindo depois

para o armazém. O caroço da azeitona saía das prensas com uma

pureza de 3,5% a 4% e seguia para o secador.

Em 1963, trabalhavam na fábrica, durante todo o ano, 40

trabalhadores efectivos e 40 sazonais (sazonais, neste

contexto, significa que não pertenciam ao quadro, mas que se

encontravam efectivamente ao serviço durante o ano inteiro,

desempenhando as tarefas que lhes eram atribuídas).

Como a fábrica estava modernizada, funcionava

continuamente ao longo do ano, estando equipada para as mais

variadas funções. Até chegou a produzir farinha com o

excedente da batata.

A extracção de óleos laborava 24 horas/dia, durante todo o

ano, com o bagaço da azeitona, com a grainha da uva, que

também dava cerca de 12% de óleo para a alimentação, com a

copra e o coquenote (vinham de África milhares e milhares de

toneladas), com o gérmen de milho e com a azeitona.

Durante um ano, seis meses eram para trabalhar o bagaço da

azeitona, dois meses eram para trabalhar a grainha da uva;

três meses para trabalhar os outros produtos (copra,

coquenote, milho) e um mês para reparações.

Os extractores tinham uma carga de 6.000 Kg cada um e, em

2 a 3 segundos, descarregava-se o produto todo do extractor,

conforme se desejava, a 1 kg ou a 1,5 kg de pressão, em 2 a 3

segundos, através de uma porta de descarga.

Dentro da fábrica, o bagaço era transportado em vagonetas

manuais, movimentadas manualmente, numa linha que existia ao

longo de toda a fábrica. Mais tarde, a movimentação dos

produtos era efectuada por «dumpers» e máquinas carregadeiras.

Existiam também uns secadores verticais para secar o

subproduto. Este percorria vários andares até que caía seco.

Funcionava a lenha ou a vapor.

O transporte do subproduto para a extracção era efectuado,

depois de seco, por uma conduta subterrânea de 100 metros de

comprimento, por metro e meio de largura e 2 metros de altura.

Na extracção, o carregamento do extractor fazia-se através

de um tapete que transportava o bagaço para o exterior, o qual

tinha um tegão que funcionava em cima de carris. Trabalhava

com uma redutora e cabo de aço.

Central Eléctrica

Quando a fábrica iniciou a sua actividade, os motores eram

poucos e a maior parte a vapor. Eram conhecidos por

«burrinhos» embora, na realidade, fossem motores de pistão. A

base principal que fazia movimentar toda a fábrica era

constituída pelas caldeiras – duas – que trabalhavam com a

pressão de 12 Kg/cm2; tinham 8 m de comprimento por,

aproximadamente, 1,5 m de altura, e 100 tubos atestados de

água para aquecer.

As duas caldeiras, que trabalhavam todos os dias, faziam

movimentar toda a fábrica: a extracção, os secadores e, em

caso de necessidade, o lagar e a Central.

Os dois geradores eram a vapor e produziam energia para

poderem accionar os motores que forneciam energia a Mirandela

(nas festas da N.ª S.ª do Amparo, em que havia grande consumo

deste tipo de energia, este fornecimento tornou-se essencial).

Inicialmente, a Central funcionava a vapor. A partir de

1963, o vapor tinha outro consumo, pelo que era preferível

dispor de uma central eléctrica. Através de um transformador,

a electricidade que era recebida da rede eléctrica nacional em

alta tensão, passava a baixa tensão, a fim de poder ser

distribuída.

Nos anos 60, a CUF tinha completa autonomia, nomeadamente

para a manutenção dos equipamentos, e dispunha da melhor

oficina de Mirandela. Já se encontrava equipada com um torno,

que torneava, se fosse necessário, um veio com 30 metros de

comprimento. As oficinas da CP também dispunham de um bom

equipamento, mas as da CUF estava melhor equipada: um bom

limador, um bom torno, um engenho de furar…

A caldeira trabalhou durante muito tempo a lenha, que era

transportada pelo caminho-de-ferro, e nessa época havia todos

os dias mais de 10 homens a rachar lenha. A lenha vinha de

Rossas e de outros sítios onde houvesse linha de caminho-de-

ferro para poder transportar os troncos. Depois passou a

trabalhar com o bagaço, mas ainda se vendiam milhares de

toneladas de lenha para as cerâmicas e para o consumo da

população local. Também se consumiu muita casca de amêndoa.

A CUF era das empresas portuguesas que oferecia boas

condições para os trabalhadores. O Hospital da CUF era

exclusivo para os trabalhadores da empresa e estes já possuíam

Caixa de Previdência. Os filhos dos trabalhadores da CUF eram

subsidiados nos estudos e recebiam roupa e brinquedos pelo

Natal.

Um serralheiro recebia, em 1963, numa oficina de

Mirandela, 30$00/dia, enquanto se trabalhasse na CUF ganharia

47$00/dia e receberia de 15 em 15 dias.

A CUF tinha duas bombas no rio Tua, de quatro polegadas,

que estavam 24 h a extrair água para dois tanques com a

capacidade de 300 mil litros cada um, mas mesmo assim era

necessário proceder-se à recuperação de água, através de

bombas de recuperação, para uns tanques, uma vez que o consumo

de água era bastante grande.

A água que entrava na fábrica era recuperada, através de

umas bombas de circulação, uns tanques, uns tubos

refrigeradores, que a aspergiam. Posteriormente era misturada

com a que vinha do rio, que a arrefecia, passando a circular

por toda a fábrica.

Também se procedia à recuperação da hexana, através de um

depósito, uma cisterna, que se localizava a um metro de

profundidade.

Os adubos que eram produzidos no Barreiro, tal como as

rações, eram vendidos em Mirandela no posto, no armazém da

distribuição da CUF, o qual era servido por um ramal

ferroviário, em que o adubo vinha nos vagões, ensacado, sendo

descarregado por um guindaste, existente na plataforma da

fábrica, capaz de suportar 2.500 Kg de carga.

Esse guindaste servia para, após a chegada dos vagões à

plataforma, auxiliar a tarefa de transportar os produtos para

paletes, passando depois para «dumpers» que os conduziam para

a respectiva tulha. O bagaço vinha também em vagões.

Esse ramal, que estabelecia a ligação com a linha do Tua,

ficava próximo da estação de Mirandela. Junto das oficinas da

CP de Mirandela existia uma agulha giratória, que permitia as

manobras dos vagões.

-Razões para o encerramento da fábrica da CUF

Em 1975, o maior grupo empresarial privado em Portugal, a

CUF, foi nacionalizado.

A fábrica de Mirandela encerrou em 1987 e até 1994 foi

realizada a venda dos terrenos, a expropriação e a legalização

pelos compradores.

-Relação com a linha do Tua

O volume de negócios da CUF de Mirandela era quase todo

escoado pela linha do Tua.

O azeite era despachado para o Barreiro em bidões de 200

litros.

Os adubos – constituídos por ureia, sulfato de cobre,

fosfato, curato, enxofre em pó e molhado – começaram a ser

transportados para o armazém de distribuição de Mirandela

quando a fábrica foi montada (1926), sendo vendidos ao público

até 1994.

A CUF, que beneficiou bastante do apoio da CP,

especialmente para o transporte de adubos, utilizou sempre o

caminho-de-ferro, até terminar a sua actividade em Mirandela,

tendo encerrado em 1994 o ramal de caminho-de-ferro que a

servia.

Quando o caminho-de-ferro entrou numa fase de decadência,

já existia um serviço de camionetas que faziam o transporte

directo de produtos, como aconteceu com a copra e o coquenote.

Nos anos 70, ficava mais barato à empresa fazer o

transporte de produtos, através do comboio da Linha do Douro,

até Foz Tua, onde eram carregados em camionetas, através de um

sem-fim, montado pela empresa naquela estação, e seguiam para

Mirandela.

O transbordo também levantou problemas a esta empresa,

pelo que este processo ficava-lhe mais económico e era uma

operação mais rápida e eficiente.

O sem-fim era um parafuso que empurrava os produtos,

funcionando como elevador: era só encostar a camioneta e esta

era facilmente carregada, pois bastava abrir a tremonha do

vagão, o sem-fim caía, e iniciava-se o carregamento.

Património industrial: o que subsistiu; utilização dos

equipamentos

O património industrial foi completamente demolido,

restando apenas a chaminé da fábrica, a casa da gerência e a

roldana elevatória que fazia a carga e descarga dos vagões de

mercadorias.

Fig. 5. – Estação elevatória da CUF (cargas e descargas)Fonte: Foto de Albano Viseu

O espaço foi ocupado pelos edifícios do Campus do Instituto

Jean Piaget/ Mirandela, pelo Hospital Terra Quente, por parques

de estacionamento e por lotes de terreno para construção de

habitações.

A nível do acervo documental, durante a pesquisa realizada

na casa da gerência, não foi possível encontrar documentos,

apenas algumas fotografias. Muita documentação foi destruída e

graças a uma pesquisa realizada no arquivo da CUF, no Barreiro,

constatou-se que ali não subsiste nada de importante para a

reconstituição do impacto sócio-económico da CUF no concelho de

Mirandela.

2.3. O Complexo Agro-Industrial do Cachão

Fig. 6. Camilo de Mendonça (1921-1984).

Fonte: Camilo de Mendonça. Disponível em:http://www.politipedia.pt/mendonca-camilo-de-n-1921/. Data de

consulta: 7/4/2015

Nome da unidade empresarial: Complexo Agro-Industrial do Cachão

Protagonista principal: Eng.º Camilo de Mendonça, presidente

do Grémio dos Agricultores e da Federação dos Grémios da

Lavoura do Nordeste Transmontano (extinta em 12/12/1986).

A unidade empresarial:

-Factores que levaram à sua instalação

No início dos anos 60, o Eng.º Camilo de Mendonça realizou

uma primeira reunião, na sede do Sport Clube de Mirandela,

para criar uma cooperativa de olivicultores, medindo, dessa

forma, a resistência da maioria dos participantes e tendo de

enfrentar três baluartes económicos, com grande poderio

naquela altura: a CUF, o capitão Ilídio (presidente da Câmara

de 1946 a 1959) e o Dr. Pires (delegado de Saúde). Defenderam,

nessa reunião, que não se justificava a criação de uma

cooperativa daquelas, porque os nove lagares de azeite que

havia em Mirandela se mantinham em funcionamento10.

Existiu, por conseguinte, desde o início, uma oposição por

parte de alguns sectores da população, de muitas casas

agrícolas, os quais consideravam que esse empreendimento

representaria um concorrente aos produtos das suas explorações

agrícolas, tendo aceitado com má vontade a instalação das

fábricas em Mirandela.

Os terrenos no Choupim, junto ao rio Tua, em Mirandela,

local em que o Eng.º Camilo de Mendonça pensara instalar o seu

projecto, atingiram valores tão altos que ele pensou instalá-

lo no Cachão, onde o complexo fabril seria construído mais

economicamente, e permaneceria no concelho.

O Complexo Agro-Industrial começou a ser instalado no

Cachão em 1962, numa região plana, próxima do rio Tua, e

dispondo de duas vias de comunicação: o caminho-de-ferro e a

estrada nacional.

O complexo precisava de um grande caudal de água para

funcionar (rio Tua e barragem Eng.º Castro Serra) e do caminho-

10 VISEU, 2007: 277.

de-ferro para escoar os seus produtos e para captar matérias-

primas, máquinas, equipamentos, técnicos e operários.

O Complexo Agro-Industrial do Cachão viria a atingir «uma

área de 18 ha de terreno»11 e em 1964, ano em que entrou em

actividade, ocupava «uma área coberta de cerca de 9 ha»12, prevendo-se

que viria a constituir um importante pólo de desenvolvimento da

agricultura de toda a região transmontana. Foi criado pela

Federação dos Grémios da Lavoura do Nordeste Transmontano

(FGLNT), mas com uma gestão própria. As suas diversas unidades

fabris foram construídas por trabalhadores da própria FGLNT,

organismo assim denominado até ao 25 de Abril de 197413, tendo

contribuído para o crescimento da aldeia do Cachão.

No seguimento da implantação das construções do

empreendimento e com o arranque da laboração de algumas

fábricas, fixaram-se no Cachão trabalhadores, técnicos e

chefias, para os quais foram construídas casas, com o objectivo

de angariar e de fixar mão-de-obra.

O Complexo foi projectado para suportar uma verdadeira

revolução agrícola que colocaria a agricultura transmontana ao

nível das melhores congéneres europeias.

Para além de um Complexo destinado à agro-indústria, o

empreendimento incluía a extensão do regadio a uma vasta área,

suportado pela construção de 130 barragens de terra. E, na

realidade, conseguiu alcançar o patamar de maturidade

industrial14.

11 Notícias de Mirandela, de 25/7/1968.12 Breve Historial do Complexo Agro-Industrial do Cachão: 1964-1992. Associação Comercial eIndustrial do Cachão. 2002: 1.13 Entrevista n.º 1. 14 Entrevista n.° 2.

-Objectivos, aspirações e realizações

O Complexo Agro-industrial do Cachão surgiu com o propósito

de valorizar a região transmontana, através do lançamento de

projectos que modernizassem e expandissem as explorações agro-

pecuárias (irrigação, tosquia mecânica, maquinaria, estábulos,

transformação industrial), assegurassem a qualidade da produção

e contribuíssem para o seu escoamento para o mercado interno e

externo15.

O promotor e impulsionador de uma obra desta envergadura,

que lutou «pela dignificação e pela libertação das gentes da região do Nordeste

Transmontano»16, foi o Eng.º Camilo de Mendonça, com a cooperação

do Dr. Trigo de Negreiros e o apoio do Estado Novo, que

concluíra que para a desenvolver e poder fixar as suas

populações havia a necessidade de desenvolver a indústria

(empreendimento do Cachão) e nela implantar o ensino superior

(UTAD)17, com núcleos de mecanização dispersos pelo distrito,

amparados e orientados por técnicos e complementados por um

avultado apoio financeiro, capaz de contribuir para a

indispensável mudança das mentalidades e assegurar a

mecanização da agricultura.

O CAICA conseguiu imprimir dinamismo na aldeia do Cachão e

na região, possibilitando a promoção das principais indústrias

transformadoras locais, como a olivicultura, a vinicultura, a

panificação, a queijeira e os lanifícios.

15 VISEU, 2007: 337.16 Breve Historial …, 2002: 1.17 VISEU, 2007: 340.

As casas do núcleo primitivo fixaram-se junto à estrada e

próximo da estação de caminho-de-ferro. No Bairro Social, um

pouco acima do Complexo Agro-Industrial, na estrada que conduz

a Vila Flor, viviam os trabalhadores e as chefias do Complexo,

que chegou a possuir um jardim-de-infância, escola primária e

um posto médico18.

Entre os vectores dinâmicos que contribuíram para a

elevação do Cachão à categoria de aldeia e ao respectivo

desenvolvimento, contam-se: a estação de caminho-de-ferro e o

complexo agro-industrial.

O complexo recebia o apoio dos Grémios da Lavoura, sócios

da Federação, que procediam ao fomento dos produtos mais

adequados à sua zona de acção. Existia também o apoio dos

técnicos agrários e de maquinaria (equipamento mecânico,

tractores, alfaias agrícolas), sempre com tecnologias de ponta

para a época.

Estes núcleos agrários, denominados núcleos de mecanização,

eram promovidos pela FGLNT, em colaboração e com o

envolvimento dos agricultores.

Como a água era primordial para a agricultura, foram

construídas várias represas, como a do Cachão, Macedo de

Cavaleiros, Vilarelhos, Santa Comba, Alfândega da Fé, e

existiam ainda outras em projecto19.

-Algumas características

18 VISEU, 2007: 208-209 e 331-333.19 Entrevista n.º 1.

O Complexo integrava várias fábricas: de frutos preparados

(conserva de azeitona, cereja, figo com respectivo

embalamento, produção de fruta cristalizada e canditada); de

frutos secos (castanha, figo, leguminosas, amêndoa, noz,

pinhão e avelã); de hortícolas (produção de doces diversos,

marmelada, fruta em calda, picles, polpa de tomate e ketchup,

diversos molhos, enlatados de feijão e outras leguminosas,

espargos, castanha para congelação, pimento vermelho,

preparação de couve-flor, tremoços, ervilhas, etc.); de

queijaria (produção de queijo de diversos tipos, manteiga,

etc…); uma adega de vinhos (produção de vinhos de mesa, entre

outros); uma destilaria (produção de aguardente bagaceira, a

partir de frutos como figo e outros em estado deteriorado;

queima de vinho para aguardente vínica e álcool); uma fábrica

de rações (alimento composto para animais, para abastecer os

fornecedores do leite, em compensação da entrega deste

produto); uma lavandaria das lãs (lavagem e preparação de

lãs); um lagar de azeite (com extracção de azeite e seu

posterior embalamento); uma central de vapor (diversas linhas

de vapor para todas as fábricas e, inclusive, através do

vapor, a produção de energia eléctrica, garantindo a auto-

suficiência ao complexo fabril); um matadouro (para abate de

gado bovino, ovino e suíno); estavam projectadas e em

esqueleto outras fábricas, como as de curtumes, óleos,

refinaria, salsicharia e charcutaria. Dentro do Complexo

funcionavam ainda um lagar, um laboratório e oficinas de

apoio.

O Complexo era composto por estas unidades industriais

(instaladas em pavilhões) dispostas em planos sucessivos na

base do monte da N.ª S.ª da Assunção, próximas do rio Tua, do

caminho-de-ferro e da Estrada Nacional n.º 213, contemplando

os seguintes sectores: Fruticultura (essencialmente

azeitonas), Horticultura (tomate, pimento, espargo,

ervilhas…), Destilação e Vinhos, Lacticínios (queijo),

Azeites, Rações, Frutos secos e uma Lavandaria de lãs20.

Todas as fábricas, e inclusive a sua edificação, os

arruamentos, a rede de água, a electricidade, o saneamento, e

posteriormente a sua manutenção e os melhoramentos contaram

com os denominados serviços auxiliares, com diversos sectores

como: mecânica fabril, electricidade, canalizações,

serralharia, mecânica auto, carpintaria, pintura, construção

civil e armazém de materiais.

Com a instalação do Complexo do Cachão, proporcionou-se o

aproveitamento de culturas tradicionais, a introdução de novas

culturas, mais rentáveis, passando a existir a agro-indústria,

caracterizada por novos factores de desenvolvimento: o

acompanhamento técnico, a mecanização, o fornecimento de

sementes, a irrigação, a adubação…

Com esta alteração, que surgiu numa época em que o país

procurava explorar as novas condições económicas resultantes da

sua integração na EFTA, incrementando a sua industrialização,

nascia um novo impulso económico para a aldeia, para a região e

para o país.  

20 VISEU, 2007: 330.

O Complexo, para se abastecer de produtos com que as

fábricas laboravam, recorria à «produção de terceiros, dos

agricultores»21, recebendo produtos de várias localidades:

a castanha de Bragança, Valpaços, Carrazedo de Montenegro

e até de Penedono;

o espargo da zona de Valpaços, Vinhais e Carrazeda de

Ansiães;

o morango de Macedo de Cavaleiros

o tomate na zona da Vilariça.

No Cachão e na região, havia uma agricultura tradicional e

o Complexo Agro-Industrial acabou por causar um impacto nas

explorações agrícolas, com a selecção de produtos (sementes e

plantas), a adubação e a introdução de máquinas. «A agricultura era

modernizada e os agricultores até aceitaram essa alteração, o que acabou por

lançar as bases de uma agricultura mais moderna»22.

O Complexo Agro-Industrial do Cachão comercializou

azeitonas (verdes, pretas e recheadas), picles, azeite,

compotas de vários doces, feijão cozido de vários tipos,

marmeladas e geleias, vários legumes cozidos e enlatados,

frutas em calda e cristalizadas, frutos secos, leite e queijo,

aguardentes vinícolas.

Todos os produtos eram devidamente embalados e

comercializados com as marcas Nordeste, Tua, Sabor e Vilariça.

A marca “Nordeste” teve um enorme impacto devido à qualidade

das matérias-primas regionais, ao conhecimento dos quadros

21 Entrevista n.° 2.22 Entrevista n.° 2.

técnicos, à experiência e saber dos seus executantes, o que

proporcionava a obtenção de produtos de alta qualidade.

Entre os maiores mercados, para onde os produtos eram

escoados, contam-se: «o Canadá, a América, França, Suíça, Áustria,

Alemanha»23.

O Complexo Agro-Industrial do Cachão «gerou inúmeros postos de

trabalho para ser edificado. Havia muita mão-de-obra, quer de Trás-os-Montes, quer

até do Minho (especialmente de Viana do Castelo), de onde vieram muitos canteiros,

uma vez que os edifícios foram todos construídos em granito, proveniente da zona

da Carrazeda de Ansiães e de Vila Flor.

Com cerca de três centenas de pessoas a trabalhar, causou um enorme

impacto na aldeia. A indústria veio a ser a tónica dominante, pois aqui seriam

transformados os produtos agrícolas e pecuários da região do Nordeste

Transmontano»24.

Fig. 7 – A Vila Nordeste e o CAICA.

23 VISEU, 2007: 330.24 Entrevista n.º 1.

Fonte: Concelho de Mirandela. Freguesia de Frechas. Disponível em:

http://www.cm-mirandela.espigueiro.pt/freguesias/freg_frechas.html. Data de

consulta: 7/9/2006.

A aldeia era o complexo fabril. A água canalizada, o

saneamento e a electrificação surgiram pelas necessidades

impostas pelo Complexo.

O Cachão contava com uma cantina, denominada “COOPENORD”,

onde os trabalhadores se abasteciam de grande parte dos

géneros alimentícios para o seu quotidiano.

As pessoas deslocavam-se a Mirandela frequentemente, para

realizar compras, principalmente aos sábados, ou para idas ao

cinema, às festas, ao futebol. Mirandela foi sempre, para as

gentes do Cachão, o centro de atracção (cultural, comercial e

social).

No Cachão, as pessoas tinham alguns espaços de encontro, de

convívio, de partilha de ideias, onde passavam os tempos

livres: dentro das instalações do Complexo, num pequeno bar, o

CAT (Centro de Alegria no Trabalho), onde se serviam bebidas

(café, cerveja...) e havia jogos (bilhar, matraquilhos...); e

fora das instalações do Complexo os lugares frequentados pelos

trabalhadores eram duas tabernas e um café, com muito movimento

à noite25.

Já na década de 80 a Direcção do Complexo promoveu a

formação de um clube de futebol, criando um campo para o

efeito.

25 VISEU, 2007: 175.

-Razões para o encerramento das fábricas do CAICA

Toda a aldeia estava absorvida na dinâmica do CAICA, graças

à criação de emprego, gerador de riqueza e de desenvolvimento:

as produções regionais eram canalizadas para as diversas

unidades fabris, para a respectiva transformação e

comercialização, e daí a concretização do slogan «do produtor ao

consumidor ou do prado ao prato»26.

Após o 25 de Abril, o sector entrou em colapso e o CAICA

passou por uma gestão de diversas comissões instaladoras, ao

sabor do enquadramento político da época, o que veio a

desacreditar uma obra que tinha sido idealizada como o “Motor

da Região Nordestina”.

Em 1974, o MFA tomou conta da gestão do complexo e manteve-

a por dois anos. A Comissão Administrativa, nomeada para a

FGLNT, era constituída por 4 elementos e presidida pelo Capitão

Teófilo Bento.

No dia 25/09/74, dá-se a extinção dos Grémios da Lavoura e

das suas Federações.

Nessa época, «a relação entre a administração, os

directores e os trabalhadores era normal para a época pós

revolucionária. Era normal, porque foi um período marcado por

greves, de Norte a Sul do País, reivindicações sociais, etc.

Só que o complexo agro-industrial empobrecia, definhava e

a cada dia que passava as dificuldades pareciam crescer…

Portanto, não havia muito a reivindicar, a não ser esperar que,

26 Entrevista n.º 1.

no fim do mês, houvesse o salário (precário)… E assistia-se a

uma morte lenta e anunciada.27»

Entre 1974 e 1980, o complexo perdeu a identidade própria.

Em 1976, a propriedade do complexo ficou desafectada da

Federação, passando a empresa pública.

Dia 26/6/ 80, o Cachão passou a sociedade, mas a escritura

de constituição da Sociedade Anónima CAICA - Complexo Agro-

Industrial do Cachão, S.A. só é assinada a 6/1/1981.

Em 1983, o complexo é alvo do primeiro processo de

recuperação.

Dia 8/11/1986, há uma tentativa de relançar e de sanear a

empresa, concretizando-se a transferência de direitos sociais

e da titularidade de participações e os objectivos não

atingidos.

Em Setembro de 1992, o CAICA, SA é dado como falido e

encerra as suas portas. E, depois de uma série de tentativas

goradas de revitalização, a 17/9/1993 foi entregue pelo Estado

às Câmaras Municipais de Mirandela e de Vila Flor que

recuperaram o projecto, tornando-se detentoras de 97% do seu

capital, tendo-se constituído a A.I.N. - Agro-Industrial do

Nordeste, S.A.

Em 1998, a maioria das unidades é reactivada, instalam-se

25 empresas no complexo28 e constitui-se um Parque Industrial.29

A região muito esperava deste Complexo Industrial, mas as

políticas menos correctas, em relação a este, e os tormentos

27 Entrevista n.º 1.28 VISEU, 2007: 25 e Vol. II: 9 e 10.29 Entrevista n.º 1.

políticos, centrais e regionais, não levaram o complexo a “bom

porto”, nem conseguiram criar um “oásis” na região nordestina,

como era o ideal projectado e preconizado30: não houve o

controle sobre o emprego dos dinheiros públicos, nem a

imputação de responsabilidades, perante aqueles que procederam

a uma incorrecta utilização dos mesmos; os desfalques; os

prémios de produção a chefias e a quadros técnicos afectaram

uma empresa imersa numa grave crise financeira; o planeamento,

a certa altura, fracassou; não se resolveram os problemas

reais, capazes de garantir à região o fornecimento da matéria-

prima necessária ao contínuo funcionamento das várias fábricas

do complexo; as dificuldades levantadas pelo não ajustamento da

CP às necessidades de transporte da empresa (a via reduzida

dificultava o transbordo e a circulação dos produtos e das

matérias-primas e tornava o processo moroso; a empresa tinha

necessidade de ter ao seu dispor uma rede de carrinhas para ir

buscar os produtos às estações de caminho-de-ferro e para os

conduzir para os armazéns e para o mercado consumidor, …); a

falta de entendimento entre o CAICA e a CUF, em termos de

cooperação na utilização de equipamentos e na transformação de

produtos idênticos…

-Relação com a linha do Tua

A linha não teve um papel relevante na exploração da

unidade, embora tenha sido importante para a escolha do local

de implementação.

30 Entrevista n.º 1.

Inicialmente, transportou muitos produtos e foi essencial

para fazer o deslocamento de pessoal entre as aldeias vizinhas

(Codeçais, Brunheda,...) e as fábricas do Cachão e entre esta

localidade e Mirandela.

Nos anos 70, a linha continuou a ser atractiva para o

transporte de passageiros, mas não para as mercadorias: o CAICA

tinha transportes privativos; a concorrência dos transportes

rodoviários; a aquisição de veículos automóveis; a diminuição

da produção; a quebra do poder de compra; os atrasos das

composições, devido à reparação de alguns troços da via; a

saída de pessoas para outros locais do país e do estrangeiro. 31

Os produtos tinham de ser levados a um lugar qualquer e não

era muito prático, através do caminho-de-ferro. E tinham de ter

carrinhas para ir buscar os produtos às estações.

O complexo tinha armazéns próprios em Lisboa e no Porto e,

depois, tinha carrinhas de distribuição.

O complexo tinha também dois autocarros para o transporte

de pessoal (um, para a zona de Carrazeda de Ansiães e de Vila

Flor e, o outro, para a de Mirandela) quatro carrinhas, com

bancos e com lonas, para levar e trazer os trabalhadores de

Vale da Sancha, Vale Frechoso e Vilarinho das Azenhas.

A linha estreita causou problemas no transbordo no Tua,

como já referimos, e encareceu o transporte dos produtos

transformados, a ponto de o complexo arranjar uma frota

própria, porque com o comboio era muito complicado.

Os adubos seguiam, nos últimos tempos, pela via larga da

Linha do Douro, até ao Pocinho, para não andarem a fazer o

transbordo. Desta estação, seguiam para os armazéns que a31 VISEU, 2007: 287.

empresa mandara construir na Vilariça, onde havia uma báscula,

e onde eram depositados, e era a partir dali que eram

distribuídos.

Património industrial: o que subsistiu; utilização dos

equipamentos

A Revolução de Abril “ditou” o abandono do projecto. Apesar

da grandiosidade e da riqueza de todas as infra-estruturas a

ele associadas, o CAICA entrou em decadência, após a Revolução

de 25 de Abril de 1974. Contudo, algumas fábricas, bem como as

barragens de Alfândega da Fé, Cachão, Carvalheira, Vila Flor,

Vilares da Vilariça e Vilarelhos resistiram ao abandono do

empreendimento.

A situação económica complicou-se progressivamente,

agravada pelo facto de Portugal passar a integrar a Comunidade

Económica Europeia e porque a região ficava afastada dos

principais e maiores centros urbanos e de consumo, sendo que o

transporte e a distribuição de produtos saíam encarecidos pelas

más acessibilidades.

Depois de um lento enfraquecimento económico e financeiro,

o CAICA acabou por encerrar. O património dos Grémios da

Lavoura foi integrado nas cooperativas e o Estado tomou conta

do complexo. A maior parte do património que restou do antigo

Complexo, quase 98%, foi posteriormente entregue às Câmaras

Municipais de Mirandela e de Vila Flor.

Esse património passou a ser administrado por uma sociedade

representante de todos os accionistas, a A.I.N. (Agro-

Industrial do Nordeste, S.A.). Ainda funcionam algumas fábricas

no Cachão que empregam cerca de 200 pessoas, mas parte dos

antigos funcionários do CAICA viram-se obrigados a emigrar ou a

procurar trabalho noutros locais da região.

A aldeia parou um pouco no tempo. Foi o desvanecer do sonho

transmontano…

Há marcas indeléveis da presença de um “motor” que firmou

um grande avanço, mas cuja paragem ditou uma tremenda

estagnação. O mesmo bairro, a mesma estrada, o mesmo campo de

futebol. Apenas umas quantas melhorias, quase tudo

reaproveitamentos de tudo quanto ali se fez.

Nos dias de hoje, ainda funcionam algumas unidades originais

(lavagem de lãs), mas perderam-se as de transformação hortícola

e a de lacticínios, que foi exemplar. Ao visitar o escritório,

o laboratório e as unidades de transformação sofre-se um

tremendo impacto, ao constatar que perderam a sua função.

“A aldeia parece então composta por três zonas demarcadas: o bairro dos

trabalhadores (Vila Nordeste), o Complexo, o Cachão Velho (…) A sombra do

cabeço arrepia-me; as bancadas já perderam o calor. Vou embora e despeço-me

com um aceno. Serpenteio até Mirandela, com a cabeça cheia de sol, de ideias e

de cansaço" (Diário de Campo, 2000). 

3. Conclusão

A Sociedade Clemente Menéres, Lda. e a CUF foram sociedades

por quotas, mas enquanto a primeira teve continuidade e

persistiu até aos nossos dias, apesar de após o 25 de Abril os

Pioneiros dos Cortiços quererem ocupar as suas instalações e

gerir a Quinta do Romeu; a CUF foi extinta, vindo a assistir-

se mais tarde, em 1998, ao aparecimento da CUF-Quimigal já sob

gerência do grupo Mello.

O CAICA, como projecto agro-industrial, foi modelar no

contexto da industrialização europeia, mas foi esmorecendo e

caminhando de encontro ao adormecimento e à reformulação

necessária, precisando de alento nos nossos dias.

A História ressalvará, na sua trama constante e assertiva,

o encontro com o tempo em que os três projectos industriais

existiram, funcionaram, captaram riqueza e mão-de-obra e

causaram impacto na região transmontana e no todo nacional. E

em que, igualmente, levaram o nome de Portugal, graças à

qualidade dos seus produtos, aos vários recantos do mundo.

O interior continuará a afirmar a constância da qualidade

da sua produção e a defender o valor patrimonial em que as

raízes identitárias serão um suporte de revigoramento.

Muitos projectos industriais tiveram uma existência

efémera, ao longo dos séculos, num interior a precisar de ser

valorizado e desenvolvido, competindo-nos a nós historiadores

analisar e reconstituir a textura desses empreendimentos e

mostrar o que falhou nos seus processos de implementação.

4. Bibliografia

Artigos, monografias, documentos manuscritos e impressos

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Romeu.

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1992. Cachão: Associação Comercial e Industrial do Cachão

(2002)

Diário de Campo, 2000. 

ENTREVISTA n.º 1 (57 anos, M, natural da freguesia de

Mirandela, pertenceu aos quadros do CAICA de 1987 a 1991,

como Director dos Serviços Auxiliares, actualmente é

sócio-gerente de empresas sedeadas no Parque Industrial

do Cachão, Licenciado em Engenharia Mecânica pela FEUP),

2009.

ENTREVISTA n.º 2 (69 anos, M, natural de Antas, concelho de

Penedono, reformado, Eng.º Agrónomo, trabalhou no CAICA),

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PARREIRA, José Joaquim A. – A industrialização da cortiça no Norte de

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VISEU, Albano Augusto Veiga - Desenvolvimento da Periferia

Transmontana: a Linha do Tua e a Casa Menéres. Vila Nova de Gaia:

Inovatec. Foz Tua – Memory of the Tua Railways and Valley

Interdisciplinary Project/Universidade do

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2013.

VISEU, Albano Augusto Veiga - A fábrica de cortiças de Mirandela, in

Anne McCants, Eduardo Beira, José M. Lopes Cordeiro and

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Minho/Massachusetts Institute of Technology Portugal,

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http://economico.sapo.pt/noticias/o-criador-de-

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Disponível em: http://www.panoramio.com/photo/14763526.

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http://www.politipedia.pt/mendonca-camilo-de-n-1921/.

Casa da gerência da CUF em Mirandela - Mirandela – casa do

Encarregado da CUF. Foto de Luís Liberal. Disponível em:http://www.alltravels.com/portugal/braganca/mirandela/photos/c

urrent-photo-86852580.

Clemente Menéres - Quinta do Romeu. Disponível em:

http://www.quintadoromeu.com/

Autores:

Albano Viseu é licenciado em História, mestre em Antropologia

Social e Cultural (As Memórias do Estado Novo no espaço rural: estudo

antropológico de um tempo histórico na freguesia do Romeu) e doutor em História

pela FLUP (Memórias históricas de um espaço rural: três aldeias de Trás-os-Montes

(Coleja, Cachão e Romeu) ao tempo do Estado Novo). Professor aposentado de

História do ensino secundário e superior. Investigador do Centro de

Investigação Transdisciplinar Cultura, Espaço e Memória (Faculdade

de Letras da Universidade do Porto) e do projecto FOZTUA

(convidado). Autor de vários livros e artigos.

Eduardo Beira é coordenador do projecto FOZTUA. Engenheiro

químico (1974). Professor associado (convidado) da Escola de

Engenharia da Universidade do Minho (2001-2012), docente do programa

MIT Portugal e Senior Research Fellow do IN+ Center for Innovation,

Technology and Public Policy (Instituto Superior Técnico,

Universidade de Lisboa). Autor de diversos livros e tradutor da obra

do filósofo Michael Polanyi.

José Manuel Lopes Cordeiro é doutor em História Contemporânea

pela Universidade do Minho, onde é professor auxiliar no Instituto

de Ciências Sociais. É director do Museu da Indústria Têxtil da

Bacia do Ave, assim como representante nacional do The International

Committee for the Conservation of the Industrial Heritage, organismo

consultor da UNESCO/ICOMOS para o património industrial, e

presidente da Associação Portuguesa para o Património Industrial. É

também director da revista Arqueologia Industrial. Membro da equipa

coordenadora do projecto FOZTUA.