Crise do Ensino Jurídico no Brasil

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O ENSINO JURÍDICO NO BRASIL: Impactos da massificação dos cursos de Direito na qualidade da formação dos profissionais de carreira jurídica no País. 1 Marcos Pereira da Silva Filho 2 Jairo Rocha Ximenes Pontes 3 SUMÁRIO: Resumo. 1 Introdução. Evolução do processo de massificação dos cursos jurídicos no Brasil. 2.1 O surgimento dos cursos de Direito no Brasil; 2.2 A expansão dos cursos jurídicos no País na primeira metade do século XX; 2.3 A massificação de cursos jurídicos no século XXI. 3 O perfil dos cursos de Direito quanto à instituição de ensino. 3.1Quantidade e perfil de cursos de Direito em instituições públicas; 3.2 Quantidade e perfil de cursos de Direito em instituições privadas; 3.3 Comparação entre os cursos de Direito em instituições públicas e privadas. 4 Os cursos de Direito e o Exame da Ordem. 4.1 O surgimento do Exame de Ordem no Brasil; 4.2 O processo de unificação do Exame de Ordem em todo o território nacional; 4.3 O surgimento do ENADE e sua importância atual na qualificação dos cursos de Direito no Brasil do século XXI; 4.4 A involução (ou evolução) percentual de aprovações (ou reprovações) dos recém-graduados no exame da OAB e/ou no ENADE. 5 Malefícios e/ou benefícios provocados pela massificação dos cursos jurídicos no Brasil. 5.1 Os principais malefícios que a elevada quantidade de cursos jurídicos no Brasil repercute na formação e qualificação dos graduandos de Direito; 5.2 Os principais benefícios que a elevada quantidade de cursos jurídicos no Brasil repercute na formação e qualificação dos graduandos de Direito. 6 Considerações Finais. RESUMO O trabalho tem como objetivo demonstrar se, de que forma e em que medida o processo de massificação de cursos jurídicos existente atualmente no Brasil se relaciona e impacta de forma negativa na qualidade da formação dos profissionais do ramo do Direito. Para tanto, inicialmente se traça um panorama histórico da evolução da quantidade de cursos de Direito no País, do século XIX a esse início do século XXI. Posteriormente, estabelece-se um perfil dos cursos nas instituições públicas e particulares, quanto ao quantitativo, das grades curriculares, atividades de pesquisa, extensão e práticas jurídicas. A seguir, discorre-se sobre alguns aspectos da relação entre o exame da Ordem e a qualificação dos recém-graduados em Direito. Por fim, tenta-se demonstrar como o processo de massificação de cursos jurídicos no Brasil interfere e influencia na formação dos profissionais e na qualidade dos cursos, valendo- se dos indicadores apresentados pelos resultados do exame de Ordem e do ENADE. Palavras-chave: Massificação. Direito. Qualificação. Exame de Ordem. ENADE. 1 Paper apresentado à disciplina Metodologia da Pesquisa Científica, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco UNDB. 2 Aluno do 1º período do curso de Direito, da UNDB. 3 Professor Mestre, orientador.

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O ENSINO JURÍDICO NO BRASIL: Impactos da massificação dos cursos de Direito na

qualidade da formação dos profissionais de carreira jurídica no País.1

Marcos Pereira da Silva Filho2

Jairo Rocha Ximenes Pontes3

SUMÁRIO: Resumo. 1 Introdução. Evolução do processo de

massificação dos cursos jurídicos no Brasil. 2.1 O surgimento dos

cursos de Direito no Brasil; 2.2 A expansão dos cursos jurídicos no

País na primeira metade do século XX; 2.3 A massificação de cursos

jurídicos no século XXI. 3 O perfil dos cursos de Direito quanto à

instituição de ensino. 3.1Quantidade e perfil de cursos de Direito em

instituições públicas; 3.2 Quantidade e perfil de cursos de Direito em

instituições privadas; 3.3 Comparação entre os cursos de Direito em

instituições públicas e privadas. 4 Os cursos de Direito e o Exame da

Ordem. 4.1 O surgimento do Exame de Ordem no Brasil; 4.2 O

processo de unificação do Exame de Ordem em todo o território

nacional; 4.3 O surgimento do ENADE e sua importância atual na

qualificação dos cursos de Direito no Brasil do século XXI; 4.4 A

involução (ou evolução) percentual de aprovações (ou reprovações)

dos recém-graduados no exame da OAB e/ou no ENADE. 5

Malefícios e/ou benefícios provocados pela massificação dos cursos

jurídicos no Brasil. 5.1 Os principais malefícios que a elevada

quantidade de cursos jurídicos no Brasil repercute na formação e

qualificação dos graduandos de Direito; 5.2 Os principais benefícios

que a elevada quantidade de cursos jurídicos no Brasil repercute na

formação e qualificação dos graduandos de Direito. 6 Considerações

Finais.

RESUMO

O trabalho tem como objetivo demonstrar se, de que forma e em que medida o processo de

massificação de cursos jurídicos existente atualmente no Brasil se relaciona e impacta de

forma negativa na qualidade da formação dos profissionais do ramo do Direito. Para tanto,

inicialmente se traça um panorama histórico da evolução da quantidade de cursos de Direito

no País, do século XIX a esse início do século XXI. Posteriormente, estabelece-se um perfil

dos cursos nas instituições públicas e particulares, quanto ao quantitativo, das grades

curriculares, atividades de pesquisa, extensão e práticas jurídicas. A seguir, discorre-se sobre

alguns aspectos da relação entre o exame da Ordem e a qualificação dos recém-graduados em

Direito. Por fim, tenta-se demonstrar como o processo de massificação de cursos jurídicos no

Brasil interfere e influencia na formação dos profissionais e na qualidade dos cursos, valendo-

se dos indicadores apresentados pelos resultados do exame de Ordem e do ENADE.

Palavras-chave: Massificação. Direito. Qualificação. Exame de Ordem. ENADE.

1 Paper apresentado à disciplina Metodologia da Pesquisa Científica, da Unidade de Ensino Superior Dom

Bosco – UNDB. 2 Aluno do 1º período do curso de Direito, da UNDB. 3 Professor Mestre, orientador.

2

1 INTRODUÇÃO

Pesquisa acadêmica revelou que, no final da década de 1980 e durante a década de

1990, houve um crescimento vertiginoso na quantidade de cursos de Direito implantados no

país, pois somente entre 1995 e 1997 mais de 589 pedidos de aberturas de novos cursos

chegaram à OAB, e que, no início de 2004, já existiam mais 700 cursos jurídicos no território

brasileiro. O crescimento maior foi nos cursos de instituições privadas, sendo que o Censo de

Educação Superior mostrou que de 1992 a 2002 houve um crescimento de 718% do número

de criações de faculdades privadas no país, chegando em 2005 com um número em torno de

864 cursos funcionando. (MORAES, 2005). A partir de consulta formulada no portal “e-

mec”, do Ministério da Educação, obteve-se como resposta a existência de 1.167 cursos de

Direito em atividade no País neste ano de 2012.

Com toda essa proliferação de cursos jurídicos, já na década de 1990, muitos

juristas começaram se preocupar com o grande número de bacharéis em Direito

despreparados que estavam saindo de algumas dessas novas faculdades. Eles questionavam se

a maior causa dessa despreparação e desse ensino problemático era o tal crescimento

desenfreado dos cursos, tendo em vista que muitas faculdades abriam seus cursos jurídicos

sem muito critério e exigências e os resultados dos exames da Ordem dos Advogados do

Brasil apresentavam índices de reprovação muito altos, sem falar nas notas baixas do ENADE

– Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (do ensino superior). Em função dessa

situação, esse artigo tem como missão a tentativa de obter e demonstrar respostas ao seguinte

problema: “Em que medida a massificação de cursos jurídicos no Brasil prejudica a qualidade

da formação dos profissionais de carreira jurídica?”

Preliminarmente, foram elencadas algumas hipóteses, a seguir descritas, que, em

princípio, têm o mesmo grau de possibilidade de verossimilhança, não havendo uma

hierarquia de importância ou prioridade entre elas, apenas situações possíveis de se chegar à

solução da problemática acima:

a) Tendo em vista que grande parte dos novos cursos de Direito provém de

instituições de ensino privadas, as quais, em sua esmagadora maioria, não definem

mecanismos de seleção de ingressantes com rigor razoável, os estudantes desses cursos não

detêm pré-requisitos mínimos necessários para uma absorção adequada dos conhecimentos,

não conseguindo produzir o raciocínio suficiente para entender a realidade, reduzindo o

aprendizado e impactando negativamente na formação/qualificação profissional dos mesmos.

3

b) As instituições, sendo privadas, precisam de resultados financeiros positivos,

não sendo desejável, ou mesmo praticável, rigor nas avaliações e nas mensurações do

aprendizado. Essa redução do rigor avaliativo tem consequência indesejada na

formação/qualificação profissional dos graduandos desses cursos.

c) A elevada quantidade de cursos jurídicos em nível de graduação dificulta a

fiscalização pelo Ministério da Educação, o qual não tem condições de fazer um trabalho de

acompanhamento desejável em todos os cursos numa periodicidade que se julga necessária.

Dessa forma, o presente tema continua atualizado e, apesar de não se inserir em

ineditismo, ainda carece de respostas convincentes e esclarecedoras, razão pela qual despertou

o interesse acadêmico desse graduando, já que essa temática o intriga há tempos,

possibilitando, hodiernamente, apresentar dados confiáveis que sustente a argumentação de

que muitos cursos não possuem qualidade necessária. De outro modo, esse trabalho justifica

sua feitura como tentativa de apresentar elementos à comunidade acadêmica, ao mercado de

trabalho e ao Ministério da Educação, que a massificação dos cursos jurídicos, apesar de ser

importante para a democratização e expansão do ensino, sem a definição de critérios mínimos

de qualificação para a abertura e funcionamento de cursos, se torna uma medida inócua, sem a

devida preparação adequada de profissionais para o mercado de trabalho. Outro fator

importante que justifica a escrita deste artigo se relaciona com a relevância do tema, já que

pode servir para que se promovam debates acadêmicos e institucionais e se obtenham

soluções que possam conciliar a democratização do ensino com a qualidade profissional

necessária e exigida.

Nesse diapasão, o artigo tem como objetivo geral “demonstrar se, de que forma e

em que medida o processo de massificação de cursos jurídicos existente atualmente no Brasil

se relaciona e impacta de forma negativa na qualidade da formação dos profissionais do ramo

do Direito”. Como objetivos específicos, o trabalho pretende: (i) Apresentar a evolução do

processo de massificação de cursos jurídicos no Brasil, desde a criação do primeiro curso até

o ano de 2012; (ii) Demonstrar a proporção entre cursos de Direito em instituições públicas e

em instituições privadas; (iii) Enumerar a evolução percentual de reprovações dos recém-

graduados no exame da OAB e/ou no ENADE; (iv) Expor conclusões que apontem os

malefícios e os benefícios causados pela massificação de cursos jurídicos na formação e

qualificação dos recém-graduados.

2 EVOLUÇÃO DO PROCESSO DE MASSIFICAÇÃO DOS CURSOS JURÍDICOS NO

BRASIL.

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2.1 O surgimento dos cursos de Direito no Brasil.

Durante o período do Brasil-Colônia não houve qualquer evolução em termos de

educação superior no Brasil, limitando-se ao objetivo de ensinar o povo a ler e escrever, pois

Portugal via o ensino superior nas suas colônias como um ato “atentatório ao poder da

Coroa”. A situação somente começou a mudar após a vinda da Família Real portuguesa ao

Brasil, fugindo de Napoleão Bonaparte, que impôs seu Bloqueio Continental na Europa.

(CASTELO BRANCO, 2010).

Os cursos jurídicos somente iniciaram sua história em território nacional após a

proclamação da independência. Mendes e Chaves (2007) indicam que:

Os cursos jurídicos no Brasil surgiram e começaram a funcionar a partir da criação

do Estado nacional imperial brasileiro. O primeiro projeto de criação e implantação

foi apresentado em 1823, no ano seguinte ao da proclamação da independência. A

partir de então, começaram os debates a respeito do papel e dos objetivos do curso

de Direito na sociedade brasileira, seus currículos e metodologia, bem como o limite

de influência da Universidade de Coimbra na sua formação e estrutura.

De fato, a primeira faculdade de Direito brasileira iniciou suas atividades em

março de 1828, em São Paulo, após a regulamentação legal feita em 1827. Rodrigues (2005,

p. 25) prescreve: “Os primeiros cursos de Direito brasileiros foram criados através da Lei de

11 de agosto de 1827, com sedes em São Paulo e em Olinda, e denominados, então, de

Academias de Direito”. Complementando, o mesmo autor indica que “O curso de São Paulo

foi instalado no Convento de São Francisco, em março de 1828; o de Olinda, no Mosteiro de

São Bento, em maio desse mesmo ano. Em 1854 passaram-se a denominar-se Faculdades de

Direito, e o Curso de Olinda foi transferido para Recife.” (RODRIGUES, 2005, p. 25)

Os primeiros cursos de Direito no Brasil tinham a característica de serem

direcionados para a elite e preocupados em formar pessoas para ocupar cargos políticos ou

administrativos da esfera estatal. Os cursos iniciais não tinham a missão de criar um corpo de

advogados, juristas, procuradores no País, mas sim alimentar a máquina burocrática da

administração pública ou dos cargos políticos. Castelo Branco (2010) assim informa:

O objetivo [dos cursos jurídicos do Brasil-Império] era, eminentemente, compor

burocratas para ocupar as carreiras jurídicas e, em segundo plano, cargos político-

administrativos [...]. O currículo dos cursos era basicamente um resumo da doutrina

então em vigor na Europa [Coimbra, Portugal], o que demonstra a influência da

formação obtida por seus primeiros mestres. Até mesmo alguns costumes, apesar de

inadequados para o clima, foram importados, como o uso de cartola e sobrecasaca.

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Fato curioso é que os cursos eram gratuitos, valendo a velha máxima de que as

despesas da classe dirigente deveriam ser socializadas com toda a população.

Percebe-se que não há pensamento crítico, resumindo-se o ensino jurídico desse

período a uma reprodução resumida do que era ensinado na Europa, mais especificamente em

Portugal, limitando o ensino a aulas-conferência, no estilo de Coimbra. Além disso, havia um

predomínio de alunos oriundos das classes dominantes, apesar de os cursos serem custeados

pelo Estado brasileiro. Ademais, a doutrina predominante era o Jusnaturalismo, que perdurou

até próximo de 1870, quando se iniciou no Brasil as correntes do Evolucionismo e do

Positivismo.” (RODRIGUES, 2005, p.25)

2.2 A expansão dos cursos jurídicos no País na primeira metade do século XX.

Vencida essa fase inicial e, após o advento da proclamação da República, em

1889, especialmente com a Constituição de 1891, houve o primeiro movimento de expansão

dos cursos jurídicos no Brasil, saindo-se do monopólio de São Paulo e Recife (note-se que em

1854 o curso que inicialmente funcionava em Olinda foi transferido para Recife) em oferta de

formação de bacharéis em Direito. Dessa leva, em função da autorização para que os Estados

e a iniciativa privada pudessem abrir cursos superiores em Direito, foram criadas “as

faculdades de Direito da Bahia e Rio de Janeiro (1891), Rio Grande do Sul (1900), Pará

(1902), Ceará (1903), Amazonas (1909), Paraná (1912) e Maranhão (1918)”. No Piauí

somente a primeira faculdade iniciou seu funcionamento em 1931. (CASTELO BRANCO,

2010)

Note-se que se passaram mais de 60 (sessenta anos), desde o início dos primeiros

cursos, em 1828, até o início da expansão, em 1891. Daí, percebe-se que há uma aceleração

na criação de cursos, sendo que em 1918, ou seja, em 27 anos, já haviam sido criados mais 8

(oito) novos cursos. Certo é que, em 1927, já havia 14 cursos de Direito. O perfil da clientela,

nessa época, já se mostra um pouco diferenciado daquele dos primeiros cursos da era do

Império brasileiro. Agora, a maior parte da clientela dos cursos jurídicos dessa primeira

metade do século XX era predominantemente formada dos “filhos da classe média e dos

pequenos industriais, e não mais os descendentes da decadente aristocracia”. (CASTELO

BRANCO, 2010)

Outra mudança que se observa nessa época, além do crescimento maior na

quantidade e no perfil do corpo discente de cursos jurídicos, diz respeito ao conteúdo

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doutrinário ensinado nas faculdades. Dessa forma, abandonou-se o apego ao Direito Natural e

a influência da Igreja Católica e passou-se a dirigir-se e reger-se pelas influências do

Positivismo e do Cientificismo, perdurando desse modo até a reforma de 1962, quando foi

instituído o currículo mínimo. Ainda, assim, percebe-se um ensino tecnicista, conforme

afirma Castelo Branco (2010), “privilegiando o estudo de códigos em detrimento de aspectos

humanistas, sociais e políticos”. Esse mesmo autor afirma que isso só piorou com a reforma

de 1972, em pleno regime militar, que pretendeu acabar por completo o senso crítico da

formação dos profissionais do Direito, privilegiando práticas esportivas e disciplinas

equivalentes a “Educação Moral e Cívica”.

A redemocratização do país resultou em nova reforma, necessária em função da

mudança de paradigma governamental e da própria demanda da nova sociedade, ávida por

exercer seus direitos de cidadãos. Nesse sentido, o Ministério da Educação instituiu diretrizes

curriculares e conteúdos mínimos que demonstram um perfil de “dimensão teórico-prática e

uma formação abrangente e reflexiva”, contendo a volta de disciplinas como Filosofia e

Ciência Política na parte chamada de “disciplinas fundamentais” e, na parte das chamadas

“disciplinas profissionalizantes”, o enfoque foi direcionado para mais discussões e menos

“decoreba”, simples ato de memorização de leis, códigos e doutrinas. (CASTELO BRANCO,

2010)

Esse período de fins do século XX e início do século XXI, momento de intensas

mudanças políticas, econômicas e sociais na vida dos brasileiros, repercute no ensino jurídico.

Livre das amarras da ditadura militar, o país tenta a redemocratização. Assim, percebe-se a

tentativa de (re)inserir o ensino baseado no pensamento crítico, sem perder a vertente de

preparação prática para atuar no mundo real, com casos reais que o profissional se depara no

dia a dia de sua atividade laboral. Exemplo disso é a compatibilização de disciplinas como

Filosofia, Sociologia, Introdução ao Ensino do Direito e Ciência Política em perfeita

harmonia com estudos dos códigos, leis e de disciplinas de prática jurídica, mediante

laboratórios de simulação ou escritórios-modelos que usam casos reais, em programas de

extensão universitária.

2.3 A massificação de cursos jurídicos no século XXI

O ensino jurídico no Brasil chega ao século XXI com a missão de mudar seu

paradigma. Houve massificação de cursos de Direito, principalmente em instituições privadas,

ou seja, de cerca de 500 cursos nos idos de 1997, chega em 2004 com mais de 700 cursos e

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em 2012 com quase 1200 cursos de Direito em funcionamento no País. Isso levou a mudanças

em termos de avaliação dos cursos e dos profissionais tanto por parte do MEC (Ministério da

Educação) quanto pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). Nesse início de século XXI,

o MEC instituiu o Exame Nacional do Desempenho de Estudantes (ENADE), que avalia o

desempenho dos alunos e das instituições de ensino superior no Brasil, incluindo os cursos e

alunos de Direito. Também, a OAB promoveu mudanças no seu “Exame de Ordem”,

tornando-o nacionalmente unificado, dentre outras alterações em termos de aferição do

conhecimento.

Oliveira (2004) indica que há necessidade de se desenvolver novo paradigma no

ensino jurídico desse século XXI. Vejam-se: “O ensino superior em todo mundo passa por

uma transformação [...]. O ensino repetitivo já perdeu o seu sentido, faz-se mister que o

ensino se complemente com a pesquisa e extensão universitária, como meios de proporcionar

uma boa formação acadêmica”. No século XXI, o profissional do direito necessita

desenvolver algumas capacidades, tais como: “liderança, confiabilidade, comunicação,

ousadia, criatividade, trabalho em equipe, conhecimentos técnicos, aprender a aprender,

profissional cidadão e empreendedorismo”, e o aluno não deve esperar a transmissão de “um

conhecimento pronto [...] [já que o] aprendizado é construído”, o professor apenas faz uma

intermediação entre o conhecimento e o aprendiz. (OLIVEIRA, 2004).

3. O PERFIL DOS CURSOS DE DIREITO QUANTO À INSTITUIÇÃO DE ENSINO

3.1 Quantidade e perfil de cursos de Direito em instituições públicas

O Quadro I, a seguir, traz o quantitativo de cursos presenciais de Direito em

instituições de ensino públicas, quer sejam da esfera federal, estadual ou municipal,

apresentando a evolução anual desde 2007 até 2011, segundo dados do INEP/MEC:

Quadro I – Quantitativo de Cursos Presenciais de Direito em Instituições de Ensino Públicas

ANO/ESFERA FEDERAL ESTADUAL MUNICIPAL TOTAL

2007 57 47 24 128

2008 57 49 26 132

2009 63 48 31 142

2010 67 50 27 144

2011 69 50 34 153 Fonte: Elaborado pelo autor a partir de dados obtidos do sítio do MEC/INEP/DEED na Internet.

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O perfil das instituições públicas se concentra em cursos universitários, ou seja,

ofertados por universidades no sentido de instituições de ensino superior onde se encontra

estabelecido o tripé ensino, pesquisa e extensão, estabelecendo-se em cerca de 89% do total

das instituições públicas, com exceção de um percentual mínimo de aproximadamente 11% de

instituições municipais que não são universidades. Isso se verifica em todos os anos citados.

3.2 Quantidade e perfil de cursos de Direito em instituições privadas

O Quadro II, a seguir, traz o quantitativo de cursos presenciais de Direito em

instituições de ensino privadas, distribuídas em particulares, propriamente ditas, e em

comunitárias/filantrópicas, apresentando a evolução anual desde 2007 até 2011, segundo

dados do INEP/MEC:

Quadro II – Quantitativo de Cursos Presenciais de Direito em Instituições de Ensino Privadas

ANO/TIPO PARTICULAR COMUNITAR/FILANTROP TOTAL

2007 639 284 923

2008 662 286 948

2009 757 197 954

2010 753 194 947

2011 768 199 967 Fonte: Elaborado pelo autor a partir de dados obtidos do sítio do MEC/INEP/DEED na Internet.

O perfil das instituições privadas se concentra em cursos não universitários, ou

seja, ofertados por centros universitários, faculdades, institutos ou centros de educação

tecnológica, ou seja, onde não se encontra estabelecido de forma sistemática e recorrente o

tripé ensino, pesquisa e extensão, existindo, quando muito, de forma acidental, fixando-se em

torno de 70% do total das instituições privadas nessas situações, sendo, portanto, apenas em

cerca de 30% delas que são universidades. Isso se verifica em todos os anos citados.

3.3 Comparação entre os cursos de Direito em instituição públicas e privadas

De forma resumida, a partir das informações explicitadas nos dois itens anteriores

(3.1 e 3.2), chega-se aos seguintes dados comparativos entre os cursos jurídicos das

instituições públicas e aqueles das instituições privadas em três bases a seguir descritas:

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a) Em termos quantitativos, há uma supremacia de cursos em instituições

particulares em relação às públicas, já que estas representam apenas 13% do total, enquanto

aquelas chegam a 87%.

b) Em termos qualitativos (considerando os cursos em universidades com melhor

qualidade em função de aplicar o tripé ensino, pesquisa e extensão de forma sistemática),

percebe-se que as instituições públicas possuem os cursos de melhor qualidade, já que 89%

dos mesmos são cursos universitários, enquanto que nas instituições privadas esse número

chega a apenas 30% do total.

4. OS CURSOS DE DIREITO E O EXAME DA ORDEM

4.1 O surgimento do Exame da Ordem no Brasil

A primeira regulamentação legal, que fez surgir a exigência do Exame de Ordem

no Brasil, foi a Lei 4.215, de 27 de abril de 1963, que afirmava, em seu art. 48, Inciso III, que,

para “inscrição no quadro dos advogados é necessário [...] habilitação no Exame de Ordem”.

Essa lei foi revogada pelo atual “Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil”, estatuído pela

Lei 8.906, de 4 de julho de 1994, que reafirmou, em seu art. 8º, Inciso IV, a necessidade de

“aprovação em Exame de Ordem” como condição indispensável para “inscrição como

advogado é necessário”.

4.2 O processo de unificação do Exame de Ordem em todo território nacional

A aplicação de um Exame de Ordem em 2006 unificado nacionalmente foi

instituída a partir do Provimento nº 136, do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do

Brasil, de 19 de outubro de 2009, publicado no Diário de Justiça de 10 de novembro de 2009.

Tal previsão está prescrita nos arts. 5º, 11 e 12 desse Provimento, in verbis:

Art. 5º O Exame de Ordem ocorrerá 03 (três) vezes por ano, em calendário fixado

pela Diretoria do Conselho Federal da OAB, realizado na mesma data e horário

oficial de Brasília, em todo o território nacional, devendo o edital respectivo ser

publicado com o prazo mínimo de 30 (trinta) dias de antecedência da data fixada

para realização da prova objetiva.

[...]

Art. 11. O Exame de Ordem Unificado será realizado pelas Seccionais que a ele

aderirem, mediante celebração de convênio.

Art. 12. O Exame de Ordem Unificado será executado pelo Conselho Federal,

facultando-se a contratação de pessoa jurídica idônea e reconhecida nacionalmente

10

para a aplicação, indicada pela Diretoria do Conselho Federal, após a manifestação

da Comissão Nacional de Exame de Ordem. (OAB, 2009, grifamos)

A primeira edição desse exame unificado ocorreu no primeiro semestre de 2010.

Desde então, já ocorreram 8 (oito) edições desse exame, sendo que a última está em fase de

execução, com resultados preliminares da segunda fase divulgados em 08 de novembro de

2012. Já existe calendário para as próximas 4 (quatro) edições, ou seja, novembro de 2012 a

março de 2013, março a julho de 2013, julho a novembro de 2013 e novembro de 2013 a

março de 2014.

4.3 O surgimento do ENADE e sua importância atual na qualificação dos cursos de

Direito no Brasil do século XXI

No portal do MEC na internet pode-se ter uma ideia genérica do que venha a ser o

ENADE, senão, veja-se:

O Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade) avalia o rendimento dos

alunos dos cursos de graduação, ingressantes e concluintes, em relação aos

conteúdos programáticos dos cursos em que estão matriculados. O exame é

obrigatório para os alunos selecionados e condição indispensável para a emissão do

histórico escolar. A primeira aplicação ocorreu em 2004 e a periodicidade máxima

com que cada área do conhecimento é avaliada é trienal. (MEC, on line)

Destacam-se da citação acima algumas características do ENADE, quais sejam:

obrigatoriedade, avaliativo, abrange tanto ingressantes quanto concluintes, necessário para

fins de emissão do histórico escolar e periodicidade trienal por área de conhecimento. Essa

última revela que nem todos os alunos são obrigados a fazer o exame, apenas aqueles que

ingressam ou concluem o seu curso no ano de avaliação da área de conhecimento na qual está

inserida.

O ENADE é uma evolução do antigo Exame Nacional de Cursos, que ficou

popularmente famoso sob a alcunha de “Provão”, que causou tantas polêmicas nos primeiros

anos de sua implantação. Seu erguimento ao mundo jurídico se deu por meio da Lei 10.861,

de 14 de abril de 2004, a qual, em seu art. 5º afirma que “A avaliação do desempenho dos

estudantes dos cursos de graduação será realizada mediante aplicação do Exame Nacional de

Desempenho dos Estudantes – ENADE”. (BRASIL, 2004)

O ENADE ganha importância no cenário atual de qualificação dos cursos

jurídicos na medida em que seu resultado “é utilizado para a composição da nota do curso e

11

essa é empregada para a composição do conceito da instituição.”, conforme indicam Verhine,

Dantas e Soares (2006) em artigo no qual comparam o antigo “Provão” ao atual ENADE.

Esses mesmos autores indicam que há outra variável que faz o ENADE

importante na avaliação da qualidade dos cursos, tendo em vista que, avaliando os

ingressantes, pode-se comparar o desempenho dos mesmos quando se tornarem concluintes,

mensurando-se o grau de evolução desses alunos e, assim, mensurando a capacidade do curso

em preparar de forma adequada, satisfatória, ou não, seu corpo discente.

Complementarmente, a prova do ENADE busca captar e avaliar a formação gera e

específica do futuro profissional, mensurando itens como:

(i) ética profissional, (ii) competência profissional, e (iii) compromisso profissional

com a sociedade em que vive. Ao mesmo tempo, devem avaliar a habilidade do

estudante para analisar, sintetizar, criticar, deduzir, construir hipóteses, estabelecer

relações, fazer comparações, detectar contradições, decidir, organizar, trabalhar em

equipe, e administrar conflitos. (VERHINE, DANTAS e SOARES, 2006)

4.4 A involução (ou evolução) percentual de aprovações (ou reprovações) dos recém-

graduados no exame da OAB e/ou no ENADE

No ensino jurídico, a constatação é mais evidente ao analisarmos o número dos

últimos exames da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Vejamos o Quadro III abaixo:

Quadro III – Percentual de Aprovação nos Exames da Ordem Unificados a partir de 2010

ANO DE REALIZAÇÃO DO EXAME PERCENTUAL DE APROVAÇÃO

1º EXAME DE 2010 14.18% de aprovados

2º EXAME DE 2010 14.91% de aprovados

3º EXAME DE 2010 12.04% de aprovados

1º EXAME DE 2011 15.28% de aprovados

2º EXAME DE 2011 24.52% de aprovados

3º EXAME DE 2011 25.98% de aprovados

1º EXAME DE 2012 14.97% de aprovados

2º EXAME DE 2012 ???? Fonte: Elaborado pelo autor a partir de dados obtidos no sítio da OAB na Internet.

Nota-se, pelos dados acima, que, desde a unificação do exame da OAB,

compreendendo uma mesma prova sendo aplicada em todo o território nacional, que os

índices de aprovação se fixaram em torno de 14%, com exceção dos dois últimos exames

realizados no exercício de 2011, os quais se situaram em torno de 25%.

12

Trazendo para o Estado do Maranhão os resultados de aprovação e fazendo a

comparação entre os índices de aprovação dos alunos das instituições públicas e privadas,

obtém-se o seguinte Quadro IV:

Quadro IV – Percentual de Médio de Aprovação nos Exames da Ordem Unificados a partir de

2010: Comparativo entre as Instituições de Ensino Públicas e Privadas.

EXAME

UNIFICADO

PERCENTUAL MÉDIO DE APROVAÇÃO

INSTITUIÇÕES PÚBLICAS INSTITUIÇÕES PRIVADAS

Presentes Aprovados % Aprovação Presentes Aprovados % Aprovação

1º EXAME DE 2010 117 70 59,83% 1.502 129 8,59%

2º EXAME DE 2010 153 46 30,07% 1.656 136 8,21%

3º EXAME DE 2010 146 58 39,73% 1.833 154 8,40%

1º EXAME DE 2011 142 63 44,37% 1.862 206 11,06%

2º EXAME DE 2011 95 47 49,47% 1.940 363 18,71%

3º EXAME DE 2011 134 78 58,21% 1.872 426 22,76%

1º EXAME DE 2012 143 55 38,46% 2.159 235 10,88% Fonte: Elaborado pelo autor a partir de dados obtidos no sítio da OAB na Internet.

Conforme se pode destacar do quadro acima, os índices de aprovação nos Exames

de Ordem, após a unificação, são flagrantemente inferiores nas instituições privadas quando

comparados com os índices obtidos pelos alunos de instituições públicas. Outro dado que

chama a atenção é a quantidade de alunos que se fazem presentes aos exames, que são

extremamente superiores nas instituições privadas em relação às instituições de ensino

públicas

Os índices de aprovação no ENADE, que serão demonstrados a seguir, se referem

apenas aos cursos de Direito de instituições de ensino superior públicas e privadas atuantes no

Estado do Maranhão, relativamente aos dois exames realizados desde o início de vigência

desse Exame e o ano de 2012, ou seja, nos idos de 2006 e 2009, respectivamente. Serão

demonstrados no Quadro V, a seguir, os dados acerca dos conceitos dos cursos somente das

instituições que foram avaliadas nos dois exames citados:

Quadro V – Conceitos dos cursos, por Instituição de Ensino do Estado do Maranhão, daquelas

que foram avaliadas nos exames ENADE de 2006 e 2009.

IES CIDADE PUB/PRIV CONCEITO

2006

CONCEITO

2009

VARIAÇÃO

%

UFMA São Luís Pública 5 4 -20%

CEUMA São Luís Privada 2 2 0%

Fac. São Luís São Luís Privada 3 3 0% Fonte: Elaborado pelo autor a partir de dados obtidos do sítio do MEC/INEP/DEED na Internet.

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O conceito 2, 3, 4 e 5 correspondem às médias situadas entre 1 a 1,9; 2 a 2,9; 3 a

3,9 e 4 a 5, respectivamente, sendo, portanto, 5 o maior conceito possível. Percebe-se que,

também pelo ENADE, os cursos das instituições públicas se situam em patamar superior aos

da instituições privadas. Contudo, há que esclarecer que, no ENADE de 2009, a Unidade de

Ensino Superior Dom Bosco – UNDB ficou com o conceito 4, igual, portanto, ao da

Universidade Federal do Maranhão – UFMA, mesmo sendo uma instituição privada.

5. MALEFÍCIOS E/OU BENEFÍCIOS PROVOCADOS PELA MASSIFICAÇÃO DOS

CURSOS JURÍDICOS NO BRASIL

5.1 Os principais malefícios que a elevada quantidade de cursos jurídicos no Brasil

repercute na formação e qualificação dos graduandos de Direito.

Se forem tomados isoladamente apenas os dados listados outrora acerca da relação

existente entre a quantidade de cursos jurídicos e os índices de aprovação no Exame de

Ordem, chega-se a conclusão de que, infelizmente, a democratização do ensino superior feita

apenas pela abertura sem limites de vagas em instituições particulares, que não desenvolvem

de forma sistemática o tripé ensino-pesquisa-extensão, como base da metodologia de ensino-

aprendizagem, está trazendo um efeito danoso na qualidade da formação profissional dos

bacharéis em Direito, que não conseguem inserir-se no mercado de trabalho, já que não

conseguem o requisito essencial, qual seja o da aprovação no Exame de Ordem e, assim, obter

habilitação legal para exercício da profissão. Este, com certeza, é o efeito mais prejudicial da

massificação de cursos jurídicos observada no País nas últimas décadas.

Outro malefício que se pode citar é no tocante à ilusão que as instituições de

ensino passam às pessoas de excelente oportunidade de emprego e sucesso profissional,

levando-as a fazer investimentos de tempo e dinheiro e, ao final, não haver a concretização do

ganho tão propalado. A grande quantidade de cursos dificulta sobremaneira a fiscalização

pelo Ministério da Educação, de forma a detectar as falhas e corrigir rumos ou mesmo fechar

cursos que não tenham a menor condição de subsistir. O MEC fica limitado a atuar apenas a

partir de resultados demonstrados após o ENADE e isso ocorre apenas trienalmente. Note-se

que, desde a sua implementação, em 2004, houve apenas dois Exames e o terceiro está

previsto para este ano de 2012. Difícil tomar tão poucos dados como parâmetros avaliativos.

14

5.2 Os principais benefícios que a elevada quantidade de cursos jurídicos no Brasil

repercute na formação e qualificação dos graduandos de Direito.

Como benefícios da expressiva quantidade de cursos jurídicos, pode-se citar, por

exemplo, o acirramento da concorrência entre instituições de ensino, públicas ou privadas,

que tenham efetivamente comprometimento, fazendo com que elas invistam cada vez mais na

melhoria da qualidade do ensino e, assim, obtenha resultados satisfatórios tanto no ENADE

quanto no Exame de Ordem e, dessa forma, ofertar ao mercado profissionais melhores

preparados e obter uma boa imagem junto à comunidade, atraindo mais cliente (alunos).

Outro ponto que pode ser considerado como positivo é a seleção feita daqueles

profissionais que se destacaram e que, por conseguinte, tendem a ofertar um serviço de

melhor qualidade aos consumidores e usuários dos serviços advocatícios, o que, por tabela,

permitirá uma valorização maior do profissional e, consequentemente, uma melhor

remuneração pelos serviços prestados.

Por fim, cita-se a tendência que as instituições de ensino superior de investirem

em tornar-se universidade e centros universitários, alavancando a pesquisa científica no País.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O artigo teve o propósito de demonstrar se a massificação de cursos jurídicos

verificada no Brasil nas últimas décadas, especialmente em instituições privadas de ensino,

influi na qualidade do ensino e na formação dos profissionais. Partindo do surgimento dos

primeiros cursos ainda no Brasil-Império até chegar ao século XXI, demonstrou-se que muita

coisa mudou, desde a quantidade de cursos, passando pelas doutrinas dominantes e conteúdos

e grades curriculares mínimas, até se chegar aos exames de aferição da qualidade do

aprendizado e da formação dos profissionais do Direito.

Dessa forma, mesmo com dados limitados utilizados na pesquisa, tomando-se por

base apenas os cursos de Direito em funcionamento nas instituições públicas e privadas

localizadas no Estado do Maranhão, demonstrou-se que os resultados do ENADE não são

satisfatórios e que há altos índices de reprovação no Exame de Ordem, aplicados pela OAB de

forma unificada em todo o território nacional, desde 2009, aos que desejam ascenderem da

categoria de bacharéis à de advogados. Isso se mostrou especialmente nas instituições de

ensino privadas, nas quais se verifica de forma mais evidente a massificação.

15

O ENADE, apesar de disponibilizar poucos dados, em função de ter sido realizado

apenas em duas ocasiões para a área em que o curso de Direito se encontra inserido, já

demonstra uma tônica verificada ao longo da pesquisa, isto é, ainda há uma distância, um

abismo entre o aprendizado obtido nas instituições públicas e aquele verificado nas

instituições particulares, já que os indicadores destas são bem inferiores aos daquelas, pelo

menos nos dados obtidos das instituições do Estado do Maranhão. Para ilustrar, verificou-se

que a instituição pública obteve conceitos 4 e 5, enquanto as particulares obtiveram conceitos

2 e 3, respectivamente, nos dois exames realizados. O Exame de Ordem já havia demonstrado

essa realidade. Obviamente, que a tradição de instituições de ensino públicas, como são as

universidades, com certeza influem na qualidade de ensino.

Assim, pode-se fazer uma avaliação, ainda que temerária, de que a quantidade de

cursos está se mostrando inversamente proporcional à qualidade dos mesmos, ou seja, quanto

mais se democratiza o acesso ao ensino jurídico por meio da massificação de cursos de

Direito, menos profissionais qualificados estão disponíveis no mercado. Assim, na sociedade

maranhense, por exemplo, existe uma quantidade enorme de bacharéis em Direito que,

sequer, conseguem tornar-se habilitados ao exercício da profissão de advogado, já que não

conseguem aprovação no Exame de Ordem.

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Brasília, DF, 05 jul. 1994.

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