CONSTITUIÇÃO, DIREITO ADMINISTRATIVO, DIREITO TRIBUTÁRIO E ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA NO...
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UMA DINÂMICA DO ESPAÇO PÚBLICO NO REGIONALISMO
ECONÔMICO CONTEMPORÂNEO: A ADMINISTRAÇÃO
FAZENDÁRIA NA MICROFÍSICA INSTITUCIONAL DE ATUAÇÃO
DOS TRATADOS DA UNIÃO EUROPÉIA E DO MERCOSUL
por
Marcos Antonio Bezerra Brito
Relatório de estágio da
pesquisa de pós-doutorado do
Programa de Pós-Graduação em
Direito da Pontifícia
Universidade Católica do Rio de
Janeiro em convênio com o
Instituto Alemão de Pesquisas em
Administração Pública (Deutsche
Agradeço à Profa. Dra. Gisele GuimarãesCittadino, Coordenadora da Pós-graduação emDireito da Pontifícia Universidade Católica doRio de Janeiro e supervisora deste estágio noBrasil.
Agradeço ao Prof. Dr. Dr. Karl-PeterSommermann, da Deutsche Universität für
3
Verwaltungswissenschaften – Speyer, supervisordeste estágio na Alemanha.
Agradeço ao Advogado José Francisco FrancoOliveira, pelo apoio nos dois anos de duraçãodeste estágio.
Estes profissionais, juristas e pesquisadores,tornaram possível o empreendimento.
IDENTIFICAÇÃO DA PESQUISA
Título da pesquisa:
“Uma dinâmica do espaço público no regionalismo
econômico contemporâneo: a administração
fazendária na microfísica institucional de
atuação dos tratados da União Européia e do
Mercosul.”.
Linha de pesquisa:
Pensamento Constitucional Contemporâneo
Área de concentração:
Teoria do Estado e Direito Constitucional
Duração da pesquisa:
Novembro de 2013 a outubro de 2015
Objeto:
4
A atuação da administração fazendária no
regionalismo econômico contemporâneo
Tema:
“Uma dinâmica do espaço público no regionalismo
econômico contemporâneo”
Delimitação do tema:
“A administração fazendária na microfísica
institucional de atuação dos tratados da União
Européia e do Mercosul”
ÍndiceSumário
Abstract
Introdução: O regionalismo econômico
contemporâneo como fenômeno transnacional de
consenso e compromisso
5
Capítulo 1 - Espaço e duração da administração
pública no regionalismo econômico contemporâneo
da mundialização eletrônica comercial, das
comunicações e do crédito, e da
transnacionalização do espaço público 1
A. Uma dinâmica do espaço público
B. Regionalismo econômico contemporâneo
C. Espaço público e regionalismo econômico
contemporâneo
D. Espaço público e administração pública no
regionalismo econômico contemporâneo
E. Espaço público jurídico-constitucional
Capítulo 2: Sentido e propósitos da existência
e da atuação institucional econômica, política
e social no regionalismo econômico
contemporâneo
F. Elementos institucionais introdutórios
G. Microfísica institucional e administração
fazendária contemporânea
1 Espaço público dos direitos e liberdades individuais e coletivas;espaço público regional de atuação da administração pública por parâmetrosfiscais e critérios sociais de distribuição; espaço público de cooperaçãoinstitucional entre as administrações públicas através da regionalização daadministração pública e globalização do direito administrativo.
6
H. Elementos institucionais da atuação
administrativa fazendária contemporânea
I - O institucionalismo da administração
pública multinível nos tratados regionais
J. Cooperação institucional
K. Regionalismo econômico e estadocentrismo
Capítulo 3 - Exame comparativo institucional de
atuação da administração fazendária brasileira
e alemã no regionalismo econômico
contemporâneo, no âmbito do Acordo Quadro-
Regional de Cooperação da União Européia com o
Mercosul
L. A administração fazendária na microfísica
institucional de atuação dos tratados do
Mercosul e da União Européia: Brasil e Alemanha
M. Administração fazendária, federalismo fiscal
e regionalismo econômico no Brasil e na
Alemanha
N. Tarefas e dívidas da administração dos
municípios (Kommunen)
O. Algumas conclusões tópicas
7
P. A Alfândega no regionalismo econômico
contemporâneo: atualização das atribuições
internas e internacionais
Q. Direito administrativo na dinâmica regional:
interpretação ou integração do direito
administrativo regional?
Referências bibliográficas
SumárioHabitamos e protagonizamos, como
cidadãos, empreendedores ou agentes públicos, o
curso do regionalismo econômico contemporâneo,
embora sejam eventualmente escassas em nossa
compreensão cotidiana as dinâmicas subjacentes
moventes das decisões políticas, negociais ou
de consumo que nos afetam na forma, p.ex. como
podemos negociar os bens ou a garantia do que
compramos, a maneira como as empresas devem
8
prestar informações comerciais, contábeis e
fiscais, ou como precisamos atender o controle
migratório e alfandegário de outros países, se
viajamos. Assim também os requisitos para a
transferência de empresas ou de oportunidades
de emprego e salário em nosso país ou para
outro. É dizer que a intensidade com que
percebemos alterarem-se nossas alternativas de
consumo, crédito, serviços, emprego ou
empreendimento, não é correspondida usualmente
de imediato por nossa capacidade de
compreender-lhes as causas subjacentes, nós que
hoje convivemos situados no regionalismo
econômico contemporâneo. Mas o que está
mudando, se já antes do regionalismo econômico
também havia regras que se modificavam como
acontece hoje? O que se pode até aqui indicar é
que as modificações nas relações econômicas e
sociais que nos afetam hoje e nos afetarão
doravante tendem já agora a originar-se em
menor medida nas fontes de direito político
estatal, e não mais necessariamente serem
9
mediadas somente pelos Estados nacionais.
Procuramos neste ensaio investigar a atuação da
administração fazendária no regionalismo
econômico. Palavras-chave: Regionalismo
econômico, espaço público contemporâneo,
administração fazendária.
Abstract
We join the course of contemporary
economic regionalism as citizens, entrepreneurs
or public officials, although it may be
possibly difficult to percieve, in our everyday
understanding, the underlying dynamics of
moving political, dealing or consumption
decisions that affect us in the form that we
may negotiate the goods or the guarantee of
what we buy, or how companies must give
commercial and tax informations, or what we
must show to immigration and customs control of
other countries if we travel. So on the
10
requirements for the transfer of businesses or
employment opportunities and wages in our
country or to other. It is to say that the
intensity with which we realize change in our
alternatives of consumption, credit, services,
employment or undertaking, is not usually
immediatly matched by our ability to understand
their underlying causes, as we live together
today also in the contemporary economic
regionalism. But what is changing, since even
before the economic regionalism we also had
rules that were been modified as it is today?
What can be here indicated is that the changes
in economic and social relations, that affect
us today and from now on, tend now to come not
only from the prior source of state political
right, and even not necessarily be mediated
exclusively by national states. In this paper
we investigate the performance of the tax
administration in the economic regionalism. Key
words: economic regionalism, contemporary
public space, tax administration.
11
O regionalismo econômico contemporâneo como
fenômeno transnacional de consenso e
compromisso
Já distante de experiências congêneres
de integração e regionalização no âmbito
político e econômico, como a da Liga
Hanseática, o regionalismo econômico
contemporâneo tem exemplar experiência na União
Européia, iniciada no fim da Segunda Guerra
Mundial com a Comunidade Européia do Carvão e
do Aço, experiência seguida posterior e
atualmente em escalas diferentes nos 5
continentes.
É nesta perspectiva transnacional que
podemos compreender porque as demandas por
padronização de qualidade, preço mínimo e até
de distribuição dos produtores de vinho da
Europa não dependem de seus ministérios de
agricultura ou das relações exteriores, pois
têm eles representação na Comissão Européia, em
Bruxelas. Também assim podemos compreender, por
13
exemplo, a existência e atuação das OSCIP 2 na
execução das políticas públicas no Brasil, as
quais concorrem pelas verbas orçamentárias com
órgãos governamentais que atuam no mesmo
segmento. Isto porque a mundialização
comercial, da comunicação e do crédito
dinamizou de tal modo as relações econômicas e
sociais, que o Estado não tem condições de hoje
sozinho - quiçá nem mesmo predominantemente -
organizar a sociedade.
E a regionalização econômica
contemporânea, iniciada no último pós-guerra,
subjaz aos acontecimentos que nos afetam mas
não compreendemos, se apenas consideramos os
conceitos e as instituições situadas no
horizonte das relações geopolíticas.
Por ser um fenômeno 3 ainda em curso de
atuação formadora, não se pode compreender o2 Organizações Sociais Civis de Interesse Público.3 Na acepção desta pesquisa, um fenômeno dá conta da emergência eduração de instituições políticas, jurídicas, econômicas e sociais porqueinserido nelas, pelo que oferece instrumentos de percepção e compreensão dosconceitos políticos, jurídicos, sociais ou econômicos na sua própriahistória de ruptura, emergência, duração e crise. Sobre fenomenologia geral,dentre muitos mais didáticos, HUSSERL, Edmund, HEIDEGGER, Martin, e GADAMER,Hans-Georg. Para fenomenologia aplicada, dentre muitos outros, SARTRE, Jean-Paul, FOULCAULT, Michel, e DERRIDA, Jacques.
14
regionalismo econômico contemporâneo somente
com conceitos construídos por uma experiência
histórica secular, como a das relações
geopolíticas, ou reduzido aos algoritmos
estatístico-financeiros que especulam
crescimento econômico sem densidade 4, tampouco
seu institucionalismo cabe em definições
reduzidas pela repetição de problemas, soluções
e consequências, como as instituições
construídas e referidas à atuação estatal, e.g.
a administração pública e a administração
fazendária, nos seus catálogos de competência.
É dizer que não se pode divisar o regionalismo
econômico contemporâneo apenas a partir da
definição de conceitos, instituições e
catálogos de competências administrativas,
porque estes ainda estão em formação na4 Veja-se atualmente, por exemplo, o curso corrente do “Bitcoin”, quejá se lança a alcançar a esfera mundial, causando apreensão no mercadofinanceiro, eis que esta moeda virtual não tem algoritmo financeiro, mascorresponde a indicadores econômicos, sociais e de avanço científico, osquais comparecem nos algoritmos do “Bitcoin” não por formulaçõesassemelhadas ao exponencial juro composto. Neste ano de 2015 se tem notíciade um cidadão europeu que está viajando em volta do globo terrestreutilizando apenas “Bitcoin”, para demonstrar o curso corrente mundial damoeda virtual, e também é notícia de domínio público que em Luxemburgo já háiniciativas de utilização regulamentada do “Bitcoin” como moeda correntevirtual.
15
dinâmica de constitucionalização e
implementação dos tratados nos Estados
nacionais e regionalmente, no âmbito das
reuniões para a implementação dos consensos e
cumprimento dos compromissos de cooperação
entre os Estados nacionais.
No institucionalismo estatal, a
administração fazendária tem sido das mais
alvejadas por modificações na direção de sua
atuação e pela necessidade de flexibilização
dos seus papéis tradicionalmente exercidos,
para permanecer a serviço público: o público de
seus serviços tem se expandido para além do
espaço territorial, transbordado pelo espaço de
atuação dos tratados de regionalização
econômica5.
Se o espaço público contemporâneo da
regionalizaçãoeconômica não é mais apenas
territorial, estático, macrofísico – hoje mais
evidente em matéria de defesa geopolítica e de5 No âmbito do regionalismo europeu, já não se debate o conceito de“serviço público”, mas acerca dos “serviços de interesse geral” e “serviçosde interesse econômico geral”, estes últimos concedidos contratualmentepelos Estados nacionais.
16
acordos tarifários -, ele é permeado pelo
espaço de atuação dos tratados regionais e das
relações comerciais, de crédito e comunicação
mundiais.
Então, para identificar o fenômeno 6 do
regionalismo econômico no espaço público
contemporâneo de nossos dias, precisamos
retornar teórica e epistemologicamente a
decompor e reconduzir um modelo de espaço não
definido territorialmente, não visível num
mapa-mundi, não somente perceptível estático,
macrofisicamente, mas movido também por atores
e eventos exteriores ao cotidiano estatal, um
espaço dinâmico, movido nas e pelas redes de
telecomunicações transnacionais segundo a
manifestação da opinião e da vontade difundidas
fora de espaços previamente mapeados,
territoriais. O espaço público contemporâneo
6 Na acepção desta pesquisa, um fenômeno dá conta da emergência eduração de instituições políticas, jurídicas, econômicas e sociais porqueinserido nelas, pelo que oferece instrumentos de percepção e compreensão dosconceitos políticos, jurídicos, sociais ou econômicos na sua própriahistória de ruptura, emergência, duração e crise. Sobre fenomenologia geral,dentre muitos mais didáticos, HUSSERL, Edmund, HEIDEGGER, Martin, e GADAMER,Hans-Georg. Para fenomenologia aplicada, dentre muitos outros, SARTRE, Jean-Paul, FOULCAULT, Michel, e DERRIDA, Jacques.
17
não está definido, delimitado, está em curso de
construção, é dinâmico, portanto seus eventos
não são inteiramente pré-definíveis, pois
decorrem também da implementação uniforme e
gradativa dos tratados em cada espaço público
estatal nacional, regional e no espaço público
internacional. Daí porque a percepção do espaço
público contemporâneo se dê mais
abrangentemente por um modelo dinâmico,
microfísico, a par do modelo convencional
macrofísico estático de mapeamento das relações
internacionais geopolíticas e dos catálogos de
competências dos entes e órgãos estatais.
Será preciso conceber um itinerário de
compreensão para a atuação da administração
fazendária no regionalismo contemporâneo dos
tratados do MERCOSUL e deste com a União
Européia a partir de novas referências
teóricas, como a dinâmica do espaço público, o
regionalismo econômico, os novos
institucionalismos, para examinarmos nossas
melhores oportunidades a partir dos tratados do
18
MERCOSUL, e deste com a União Européia. Dessa
articulação entre as diretrizes dos tratados a
uma abordagem adequada à dinâmica econômica
regional, das comunicações e do crédito
espraiada e já hoje simultânea nos cinco
continentes, poderemos fazer convergir
respostas que possibilitem perceber a atuação
da administração fazendária no indefinido
espaço público do regionalismo econômico
contemporâneo, através da implementação dos
tratados e de sua concretização constitucional,
que coadjuvamos como cidadãos, empreendedores
ou agentes públicos.
Os tratados bilaterais e multilaterais
(entre países, ou entre um bloco regional e
país ou países, como os tratados-contrato), por
serem típicos das relações internacionais
geopolíticas, é dizer, acordos entre Estados-
Partes (os quais levam ao acordo seus
interesses individuais e denunciam o tratado em
sendo tais interesses desatendidos) e não entre
Estados-Membros (que se reúnem para formar
19
núcleos de consenso, compromisso e
implementação uniforme), não pertinem ao escopo
da regionalização econômica, nem permitiriam a
percepção do espaço público contemporâneo,
proposto para ampliar direitos individuais e
uniformizar direitos sociais
transterritorialmente, segundo parâmetros
fiscais convergentes de distribuição.
Sem prejuízo aos acordos de conteúdo
contratual, por exemplo, do Brasil com os EUA,
Chile ou mesmo com blocos regionais, como um
acordo Mercosul-EUA, Mercosul-Canadá, Mercosul-
México ou Mercosul-Chile, a aposta
constitucional do Brasil (CRFB 88, art. 4º.
Par. Único), movida através do Mercosul, tem
nos acordos-quadro suporte de convergência
institucional prévia para um acordo-contratual.
Para nossa percepção de avanço do espaço
público contemporâneo no regionalismo
econômico, vale por exemplo a comparação das
posições de desempenho entre a administração
fazendária brasileira no Mercosul e a
20
administração fazendária alemã na União
Européia, permeadas pelo Acordo-Quadro de
Cooperação Inter-Regional Mercosul-União
Européia, é dizer um espaço público inter-
regional, cuja dinâmica se pode perceber, por
exemplo, na recente regulamentação, pela
administração fazendária brasileira (INRFB
1515/2014), da convergência internacional dos
padrões de tranparência das demonstrações
financeiras das corporações, adotado na Europa
e já agora no Brasil, padrão este que corrobora
a abertura de um espaço público de acesso para
profissionais, investidores e financiadores
europeus e de outros países ou blocos
econômicos às corporações brasileiras 7,
resultante também do consenso e do compromisso
de cooperação interinstitucional prevista no
Acordo-Quadro referido. Não fora resultado de
consenso e compromisso do Brasil no âmbito do
Mercosul com os países da União Européia, a
padronização das demonstrações financeiras
7 Padrão este entretanto ainda não adotado pelos EUA.21
corporativas no Brasil teria aderido, p.ex. ao
padrão financeirizado norte-americano,
restringindo as possibilidades de aporte
externo de financiamento e investimento nas
corporações nacionais8.
Nos marcos da constitucionalização de
garantias aos direitos fundamentais e da
necessidade política de integração regional na
Europa e na América do Sul9, e da mundialização
da comunicação, do crédito e do comércio
eletrônicos, pode-se perceber que o espaço
público contemporâneo tende a ampliar-se
desterritorializando-se, e nesse âmbito a
administração pública passa a atuar, em
8 Conquanto o padrão IFRS esteja em vigor no Brasil, e mesmo o BancoCentral do Brasil apresente neste padrão de tranparência suas prestações decontas ao exterior, os agentes financeiros que operam no Brasil, a exemplodos EUA, ainda não atendem a este padrão internacional de transparência, queé o padrão da União Européia, a qual tem com o Mercosul – no âmbito doAcordo-Quadro inter-regional – acordos de cooperação institucional, é dizer,de consenso e compromisso para padronização das funções e procedimentosinstitucionais.9 LAFER, Celso, e FONSECA Jr., Gelson. Notas sobre o alcance do diálogopolítico entre a União Europeia e o Mercosul, consultado entre 16/06/2011 e29/06/2011 no website https://docs.google.com/viewer?a=v&q=cache:GdaMHZkq4-UJ:www.ieei.pt/files/Regular_Democratizar.Lafer-Fonseca.Notas_Sobre.pdf+&hl=pt-BR&gl=br&pid=bl&srcid=ADGEEShuWG2pslyRdAJoV2Lrp8aIkBudMPnMbrc_68_JjllKN7vxMQtn2GrlbEx2kDcmOgFL6UGPkbfk9InxCl4OgXt5lAwJWQxriClGktkfksbt0iNJ-1PjjbO9r722TK3Zfb_VZTwN&sig=AHIEtbTPchHGIJlUlclNR6CXkAUW-rYw2g&pli=1;
22
conjunto com atores públicos e privados, para
além dos limites territoriais e diplomáticos
estadocêntricos tradicionais 10.
A tendência crescente – após a 2 a.
Guerra Mundial - de constitucionalização dos
tratados regionais11 – que avança por sobre o
tortuoso e emaranhado caminho da harmonização
legislativa, frequentemente permeado por
desavenças políticas, econômicas e culturais
internas de cada estado nacional –, a par da
10 SOMMERMANN, Karl-Peter, und MAGIERA, Siegfried (Hrsg.).Europäisierung und Internationalisierung der Öffentliche Verwaltung.Speyerer Forschungsberichte 252, websitehttp://www.foev-speyer.de/publikationen/pubdb.asp?reihen_id=1. O termo“estadocêntrico” é amplamente conhecido em ciência política e especialmenteempregado em teoria da democracia, ou seja, na perspective política querelativisa os ditames políticos “estadocêntricos”. 11 HÄBERLE, Peter. “El Regionalismo como Princípio Estructural Nacientedel Estado Constitucional y como Máxima de la Política del Derecho Europeo”in Retos Actuales del Estado Constitucional, Õnati, IVAP, 1996, p. 75;SOMMERMANN, Karl-Peter, und MAGIERA, Siegfried (Hrsg.). Europäisierung undInternationalisierung der Öffentliche Verwaltung. SpeyererForschungsberichte 252, website http://www.foev-speyer.de/publikationen/pubdb.asp?reihen_id=1. Ver sobre “relações internacionais” e “diretrizes comunitárias”,tratados multilaterais e bilaterais, e tratados regionais, in BRITO, MarcosAntonio Bezerra. Elementos de governança em sistemas multiníveis deadministração pública: A vinculação constitucional contemporânea daadministração fazendária na integração regional. Pesquisa apresentada comoresultado do estágio de pós-doutorado do Programa de Pós-Graduação emDireito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, em convêniocom o Instituto Alemão de Pesquisas em Administração Pública de Speyer, e aUniversidade Alemã de Ciências da Administração de Speyer. RJ, PUC-Rio,2012.
23
participação em sua elaboração e da
responsabilidade por sua implementação interna,
têm resultado numa ampliação transterritorial
da administração pública, já agora atuante em
um espaço público também ampliado tanto pelos
tratados regionais, quanto pela mundialização
da comunicação, do crédito e do comércio
eletrônicos, porque também constitucionalizadas
em âmbito regional garantias de direitos
fundamentais, tais como o direito à informação,
à comunicação e os direitos de consumidor.
Entretanto, se com isso o espaço público
contemporâneo ganhou em participação, com mais
entes públicos e privados tendo acesso aos
procedimentos decisórios e/ou de implementação
de políticas públicas deliberadas em nível
regional, ele perdeu em definição, definição
esta que é cara à atuação estatal legislativa,
reguladora, executiva ou jurisdicional. Esta
opacidade na definição do espaço de atuação
estatal decorre tanto da constitucionalização
de um espaço público regional (na CF88, art.
24
4o., par. Único), quanto da tendência interna
das sociedades contemporâneas de o Estado
desocupar o espaço público como agente direto e
passar a uma posição de agente indireto, é
dizer regulador.
Modificadas que vêm sendo as tarefas do
Estado contemporâneo ocidental na dinâmica
regulatória e de implementação dos tratados
regionais, tem-se tornado difícil optar por um
itinerário de investigação que vise “mapear” a
atuação da administração pública neste espaço
público que se amplia mais temática que
territorialmente12, tanto pelo concurso de
atores privados, quanto pela difusão regional
da regulação, que se não lhe retira a
competência, tampouco pode definir - ex ante da
implementação dos tratados regionais - os seus
12 Ver sobre “relações internacionais” e “diretrizes comunitárias”,tratados multilaterais e bilaterais, e tratados regionais, in BRITO, MarcosAntonio Bezerra. Elementos de governança em sistemas multiníveis deadministração pública: A vinculação constitucional contemporânea daadministração fazendária na integração regional. Pesquisa apresentada comoresultado do estágio de pós-doutorado do Programa de Pós-Graduação emDireito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, em convêniocom o Instituto Alemão de Pesquisas em Administração Pública de Speyer, e aUniversidade Alemã de Ciências da Administração de Speyer. RJ, PUC-Rio,2012.
25
limites. É dizer que o concurso dos tratados
regionais e sua eventual constitucionalização
revolvem as já inseguras definições por
catálogos de competência, levando a que, onde
não haja consenso mínimo para sua implementação
interna, judicialize-se a definição política 13,
freando com isso o avanço do espaço público
constitucional democrático nos próprios países
e o espaço público descentralizado do
regionalismo econômico contemporâneo.
Mais importante portanto que procurar
mapear limites de atuação da administração
pública – o que nos parece uma infrutífera
tarefa, considerando-se que a regionalização
13 Transconstitucionalismo: “Em poucas palavras, otransconstitucionalismo é o entrelaçamento de ordens jurídicas diversas,tanto estatais quanto transnacionais, internacionais e supranacionais, emtorno dos mesmos problemas de natureza constitucional. Ou seja, problemas dedireitos fundamentais e limitação do poder que são discutidos ao mesmo tempopor tribunais de ordens diversas. Por exemplo, o comércio de pneus usados,que envolve questões ambientais e de liberdade econômica. Essas questões sãodiscutidas ao mesmo tempo pela Organização Mundial do comércio, peloMercosul e pelo Supremo Tribunal Federal no Brasil. O fato de a mesmaquestão de natureza constitucional ser enfrentada concomitantemente pordiversas ordens leva ao que eu chamei de transconstitucionalismo.” MarceloNeves, Revista Consultor Jurídico, 12 de julho de 2009. No espaço públicodas relações internacionais, a cooperação entre as administrações naprevenção e no combate à lavagem de dinheiro, p. ex. Pelo rastreamentoeletrônico de cédulas de Euro e de Dólar e dos fluxos de recursosfinanceiros do comércio eletrônico mundializado.
26
econômica contemporânea se encontra em
desenvolvimento, não tem posições conceituais
definidas como a geopolítica das relações
internacionais, tampouco portanto definições
claras de institutos e limites de competência
no espaço público transnacional -, é procurar
identificar não os catálogos de competência,
mas a própria atuação da administração pública
neste espaço público, e, especificamente nesta
pesquisa, da administração fazendária, pelos
eventos postos em curso por atores públicos e
privados no âmbito regional 14, a par do espaço
público geopolítico internacional 15. Os limites14 Por exemplo, a Jornada Mundial da Juventude, a Copa do Mundo deFutebol e as vindouras Olimpíadas de 2016, para o que concorrem asadministrações públicas dos países com preparação de procedimentos,treinamento e desempenho adequado aos eventos, através de cooperaçãoinstitucional de procedimentos e troca de informações e, neste particular,opera a administração fazendária aduaneira nos aeroportos, portos e pontosde fronteira por onde chegam e saem do país pessoas e bens integrantesdesses grandes eventos no país. No caso da Copa do Mundo do Brasil, foipublicada lei que regulava as relações do Estado Brasileiro com indivíduose corporações, inclusive em material fiscal.Este é um exemplo de espaçopublico microfísico: produzido através de um evento de interessesupranacional e desta feita localizado no Brasil, mas cujas causas econsequências para a administração pública transbordam as fronteirasnacionais, e no particular das causas e consequências econômicas,compartilha já a adaptação functional das administrações fazendárias natroca de informações já padronizadas no âmbito das demonstrações financeirasdas corporações, resultado da crescent cooperação institucional, prevista emacordos-quadro, não em acordos-contrato..15 No espaço público das relações internacionais, a cooperação entre as
27
de atuação da administração pública se
encontram fixados em seus catálogos legais de
competências, mas sua atuação na dinâmica de
implementação interna dos tratados regionais
constitucionalizados têm ampliado seu poder
regulamentar para além da delimitação legal
catalogada16, e por isso mesmo é que não
perceberemos o alcance da atuação da
administração pública nem o espaço público
regional se nos ativermos aos seus catálogos de
competências. Será preciso examinar as
tendências de atuação da administração pública
a partir da constitucionalização dos tratados,
e compreender sua atuação situada nos núcleos
de consenso e compromisso como, por exemplo, de
convergência e adequação das demonstrações
financeiras das corporações ao padrão regional
acordado, sendo entretanto os efeitos
tributários diferenciados em cada país,
administrações na prevenção e no combate à lavagem de dinheiro, p. ex. pelorastreamento eletrônico de cédulas de Euro e de Dólar e dos fluxos derecursos financeiros do comércio eletrônico mundializado.16 Sobre o poder constitucional de auto-regulamentação administrativa,ver OTERO, Paulo. Legalidade e Administração Pública: O Sentido daVinculação Administrativa à Juridicidade. Coimbra, ed. Almedina, 2003.
28
enquanto não avançam os consensos e
compromissos regionais ou interregionais para a
convergência fiscal. Prerrogativa de seu poder
regulamentar, o Executivo – a administração
pública – cria ou transforma as funções de seus
órgãos, adequando-os aos papéis institucionais
previstos nos acordos-quadro, mesmo sem
necessidade dos demais poderes 17.
Tratamos portanto de um problema que
envolve decerto uma percepção diferenciada da
noção geográfica de espaço como vinculado a
território, e por conseguinte, uma percepção
diferenciada do senso comum acerca da noção de
espaço público.
Diferentemente dos conceitos
estadocêntricos18 já delineados pela experiência
secular das “relações internacionais” 19 desde a17 Sobre o poder constitucional de auto-regulamentação administrativa,ver OTERO, Paulo. Legalidade e Administração Pública: O Sentido daVinculação Administrativa à Juridicidade. Coimbra, ed. Almedina, 2003.18 O termo é já há muito conhecido em teoria política e amplamenteempregado em teoria da democracia, é dizer, a formulação de alternativaspolíticas não centralizadas no Estado, “estadocêntricas”.19 Ver BRITO, Marcos Antonio Bezerra. Elementos de governança emsistemas multiníveis de administração pública: A vinculação constitucionalcontemporânea da administração fazendária na integração regional. Pesquisaapresentada como resultado do estágio de pós-doutorado do Programa de Pós-Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro,
29
Paz de Westfália, o regionalismo econômico
contemporâneo, sem uma experiência secular que
não tem, é um fenômeno em curso de construção.
Daí porque, para além das discussões
conceituais e paradigmáticas entre escolhas de
sujeitos multipolares geopolíticos 20, ou normas
de “global administrative Law” 21, a atuação da
administração pública também pode ser
compreendida22 como uma concertação de critérios
temáticos de consenso com parâmetros fiscais de
distribuição das ações que resultam da
deliberação, decisão e implementação de
políticas públicas por uma multiplicidade de
atores23 públicos e privados aos níveisem convênio com o Instituto Alemão de Pesquisas em Administração Pública deSpeyer, e a Universidade Alemã de Ciências da Administração de Speyer. RJ,PUC-Rio, 2012, Cap. 1, “Percepção e método”.20 Bibliografia geopolítica das relações internacionais bipolares /multipolares, BULL, Hedley. The Anarchical Society – Study of Order in WorldPolitics.London MacMillan, 1977.21 KRISCH, N. (2006). The Pluralism of Global Administrative Law.European Journal of International Law 17(1): 247-278; 22 Ver BRITO, Marcos Antonio Bezerra. Elementos de governança emsistemas multiníveis de administração pública: A vinculação constitucionalcontemporânea da administração fazendária na integração regional. Pesquisaapresentada como resultado do estágio de pós-doutorado do Programa de Pós-Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro,em convênio com o Instituto Alemão de Pesquisas em Administração Pública deSpeyer, e a Universidade Alemã de Ciências da Administração de Speyer. RJ,PUC-Rio, 2012, Cap. 1, “Compreensão e método”.23 Ver BRITO, Marcos Antonio Bezerra. Elementos de governança em
30
regional, nacional, sub-nacional e local.
Para além da regionalização fiscal
financeira em avanço na União Européia com o
Banco Central Europeu, e no Mercosul com o
Grupo de Monitoramento Macroeconômico 24, a par
de outras medidas centralizadas nos
representantes tradicionais de cada país,
dispostos segundo a correspondência geopolítica
westfaliana secular, o crescente concurso de
agências e atores regionais 25 em temas
específicos, como fármacos, turismo, cidades do
sistemas multiníveis de administração pública: A vinculação constitucionalcontemporânea da administração fazendária na integração regional. Pesquisaapresentada como resultado do estágio de pós-doutorado do Programa de Pós-Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro,em convênio com o Instituto Alemão de Pesquisas em Administração Pública deSpeyer, e a Universidade Alemã de Ciências da Administração de Speyer. RJ,PUC-Rio, 2012, Cap. 1, “Compreensão e método”.24 Veja-se também o Projeto de Cooperação Técnica Apoio ao MonitoramentoMacroeconômico, celebrado com a União Européia. Fontehttp://jus.com.br/revista/texto/18391/coordenacao-fiscal-no-mercosul-obstaculos-e-perspectivas#ixzz1umSH57Lt;25 “This new form of international relations is put into practice throughout an innovative form ofdiplomacy, whose actors include not only Member States, but also enterprises, political parties, unions,professional organizations, subnational entities and above all non-governmental organisations”.FRANÇA FILHO, Marcílio Toscano. Law in the Transatlantic Trade Road: The EU-Mercosur Agreement between Global Administrative Law and MultilevelConstitutionalism. Fonte: http://www.garnet.sciencespobordeaux.fr/Garnet%20papers%20PDF/FRANCA%20FILHO,%20Marcilio%20Toscano.pdf.
31
arco atlântico26, vinicultura, entre muitos 27,
tem levado a administração pública a coadjuvar
a construção do regionalismo por vias
perceptíveis somente ex post facto, pelo exercício
de interpretação do desempenho dos atores no
sentido do consenso acordado sobre o tema em
curso de discussão, deliberação, regulação ou
implementação.
Capilarizada no poder regulamentar dos
executivos nacionais, a atuação da
administração pública – e especificamente nesta
pesquisa da administração fazendária – tem
operado o regionalismo contemporâneo da União
Européia, do Mercosul, da Unasul e do Acordo-
Quadro Regional entre a União Européia e o
Mercosul, no âmbito da cooperação
institucional, por onde seguem os atos de
criação, extinção e transformação das funções
26 Contribuição da Conferência das Cidades do Arco Atlântico – 6, rueSaint-Martin – 35700 - RENNES (France) – Tél.: +33(0) 2 99 30 24 51 – Email:[email protected] Além da Comissão Européia, composta por cidadãos que não tomam parteno executivo, no legislativo ou no judiciário nacional nem europeu, e outroscomitês consultivos e para ação social, custeados por fundos, como o FundoSocial Europeu, o Fundo Europeu para o Desenvolvimento Regional e o Fundo deCoesão.
32
dos órgãos da administração estatal, para
cumprimento dos compromissos assumidos a partir
dos núcleos de consenso dos acordos regionais.
O protagonismo da administração pública – e
especificamente da administração fazendária 28 -
na dinâmica do regionalismo contemporâneo, é
coadjuvado por uma convergência de atuação
temática - portanto por eventos inovadores ou
periodicamente renovados, no sentido do tema
geral de consenso e compromisso acordado - que
também inclui entes privados, convergência esta
que deixa gradativamente de ser fortuita das
diretrizes apenas de cada gestão governamental
nacional, se e quando passa a ser acordada
regionalmente e mediada constitucionalmente
para ser implementada internamente, desde as
trocas de informações e comunicação
28 Sobre o protagonismo dos ministérios das finanças – administraçãofazendária – no regionalismo contemporâneo, ver BRITO, Marcos AntonioBezerra. Elementos de governança em sistemas multiníveis de administraçãopública: A vinculação constitucional contemporânea da administraçãofazendária na integração regional. Pesquisa apresentada como resultado doestágio de pós-doutorado do Programa de Pós-Graduação em Direito daPontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, em convênio com oInstituto Alemão de Pesquisas em Administração Pública de Speyer, e aUniversidade Alemã de Ciências da Administração de Speyer. RJ, PUC-Rio,2012.
33
padronizadas entre entes públicos e privados em
termos de procedimentos, procedimentalizando-se
por regulação os elementos de juízo político,
jurídico e de prestação de contas
(accountability), como é exemplo recente a
convergência do Brasil (INRFB 1515/2014) ao
padrão europeu de transparência das
demonstrações financeiras das corporações
brasileiras, ampliando o espaço público
regulador do acesso seguro a investidores e
financiadores dos países que nos 5 continentes
já adotam o mesmo padrão29, além de, por
consequência, ampliar também o espaço de
atuação dos profissionais mercosulinos. Outro
29 Este padrão ainda não é adotado pelos EUA, no que pertine àsdemonstrações dos agentes financeiros que, como os demais no Brasil, nãoadimpliram ao padrão IFRS (International Financial Reporting Standards) detransparência das demonstrações financeiras. As normas IASB (InternationalAccounting Standards Board) européias, da qual sucedem as normas IFRSadotadas nos 5 continentes e no Brasil para as demonstrações financeiras dascorporações, é outro que o padrão norte-americano FASB (Financial AccountingStandards Board), e inclui-se no núcleo de consenso e compromisso previstono Acordo-Quadro entre UE e Mercosul, para o que a contabilidade fiscalpassou a ser disciplinada pela administração fazendária – no âmbito de seupoder regulamentar na IN RFB 1515/2014 – de modo a adimplir, no âmbito desua atuação, ao compromisso brasileiro no regionalismo. É portantoposicionamento brasileiro no regionalismo econômico contemporâneo. SobreIFRS adotado no Brasil, IASB europeu e o FASB dos EUA, ver emHTTP://dvl.ccn.ufsc.br/congresso/arquivos_artigos/artigos/227/20080805123016.pdf, da Universidade Federal de Santa Catarina.
34
exemplo de convergência institucional da
administração fazendária é o Código Aduaneiro
do Mercosul que, mesmo ainda não estando em
pleno vigor regional, já está-se inserindo no
Regulamento Aduaneiro do Brasil para o
Mercosul. Num e noutro exemplos a inovação
regulamentar resultará igualmente em esforços
de implementação pela administração fazendária
que ainda não têm contornos definidos,
contornos tampouco legislativos, mas
decorrentes de seu próprio poder regulamentar,
gradativo de procedimento e juízo na sua
atuação, segundo o alcance do compromisso de
cooperação institucional previsto no consenso
do acordo-quadro30.
Se o espaço público contemporâneo ganhou30 As normas IASB (International Accounting Standards Board) européias,da qual sucedem as normas IFRS adotadas nos 5 continentes e no Brasil paraas demonstrações financeiras das corporações, é outro que o padrão norte-americano FASB (Financial Accounting Standards Board), e inclui-se no núcleode consenso e compromisso previsto no Acordo-Quadro entre UE e Mercosul,para o que a contabilidade fiscal passou a ser disciplinada pelaadministração fazendária – no âmbito de seu poder regulamentar na IN RFB1515/2014 – de modo a adimplir, no âmbito de sua atuação, ao compromissobrasileiro no regionalismo. É portanto posicionamento brasileiro noregionalismo econômico contemporâneo. Sobre IFRS adotado no Brasil, IASBeuropeu e o FASB dos EUA, ver emHTTP://dvl.ccn.ufsc.br/congresso/arquivos_artigos/artigos/227/20080805123016.pdf, da Universidade Federal de Santa Catarina.
35
em participação com mais entes públicos e
privados tendo acesso aos procedimentos
decisórios e/ou de implementação de políticas
públicas deliberadas desde o nível sub-nacional
até ao nível suprarregional (ONU, Banco
Mundial, Organização Mundial do Comércio, Fundo
Monetário Internacional), perdeu em definição
no nível regional, definição esta que é cara à
atuação estatal legislativa, reguladora,
executiva ou jurisdicional. A atuação da
administração pública tanto em sistemas
multiníveis (sub-nacional, nacional e
regional), bem como a partir de sua interação
com outros entes privados e entes/órgãos
públicos (acordos-quadro, convênios,
consórcios, contratos e novas formas de
interveniência de entes e órgãos públicos com
ONG e, no Brasil, OSCIP) para além de um
mapeamento estático por catálogos de
competências, entendemos, pode oferecer uma
dimensão mais esclarecedora dos papéis
desempenhados pelo Estado no regionalismo
36
contemporâneo, um fenômeno 31 que ainda não
oferece ontologia segura como os conceitos
políticos e seus decorrentes jurídicos da
experiência histórica geopolítica moderna.
Mediador da inovação nas tarefas da
administração pública, o constitucionalismo
contemporâneo aponta para um comprometimento
cidadão e solidário com as gerações futuras e
não das gerações futuras32, daí a importância
dos ajustes fiscais buscados regionalmente na
União Européia e no Mercosul, que denotam o
avanço do cooperativismo constitucional
estatal33, a expansão da participação na
interpretação/concretização da Constituição31 Um fenômeno se apresenta como continuidade e emergência, duração eeventualidades. Mais sobre fenômeno e fenomenologia, entre muitos autores,Edmund Husserl, Martin Heidegger e Hans-Georg Gadamer, que operam linguagemfenomenológica mais didaticamente. Para fenomenologia aplicada, dentreoutros muitos, Jean-Paul Sartre, Michel Foulcault, Jacques Derrida.32 Comprometimento das gerações futuras: consumo e crédito, por ex se ofundo previdenciário é utilizado antecipadamente, comprometendo o ajusteatuarial futuro; comprometimento com as gerações futuras é investimento,pois para o cidadão comum, o dinheiro é consumo, ao passo que investimento étempo para qualquer um, tempo, por exemplo, de educação para a cidadania,para a vida comunitária e para a vida profissional. Sobre solidariedade comofonte de integração social inter e intrageracional contemporânea, ver, entreoutros, Habermas, Jürgen. A inclusão do outro – estudos de teoria política.São Paulo, Edições Loyola, 2002, cap. 9, “Três modelos normativos dedemocracia”.33 HÄBERLE. Peter. Estado constitucional cooperativo. RJ/SP/Recife, Ed.Renovar, 2007.
37
(portanto dos tratados regionais
constitucionalizados) por sua
procedimentalização34, capilarizada na atuação
da administração pública35 e dos entes
privados36, e decorrente da tendência crescente
no regionalismo contemporâneo de
institucionalização da opinião e da vontade
política espontaneamente gerada na base das
sociedades ocidentais37.
Portanto o interesse desta pesquisa está
no exame da atuação institucional no
regionalismo contemporâneo, de modo a
identificar, nos eventos e procedimentos 38
34 HÄBERLE. Peter.Hermenêutica constitucional – a sociedade aberta dosintérpretes da constituição: contribuição para a interpretação pluralista e“procedimental” da constituição. P. Alegre, S.A. Fabris, 199735 Por exemplo o Forum Consultivo de Municípios, Estados Federados,Províncias e Departamentos do MERCOSUL, criado em 2004 na Cúpula de OuroPreto;36 Por exemplo, os comitês temáticos da Comissão Européia. Ver emGovernance by Committee, the role of Committees in the European Policy-Making and Policy-implementation, Comitês do Parlamento Europeu e daComissão Européia, http://aei.pitt.edu/548/1/main.pdf37 HABERMAS, Jürgen. A inclusão do outro. SP, Edições Loyola, 2002; eMás allá del Estado nacional. Madrid, Editorial Trotta, 2008.38 A par da ética procedimental proposta por Habermas (HABERMAS.Jürgen.Direito e democracia entre facticidade e validade. RJ, Ed. Tempobrasileiro, 1997, vol. II; e A inclusão do outro. SP, Edições Loyola, 2002;)e da interpretação procedimental da constituição proposta por Häberle(Häberle, Peter. Hermenêutica constitucional – a sociedade aberta dosintérpretes da constituição: contribuição para a interpretação pluralista e“procedimental” da constituição. P. Alegre, S.A. Fabris, 1997;), a proposta
38
consolidados, em curso ou em perspectiva de
implementação, suas tendências de regularidade
e pertinência ao espaço público regional, que
denotem a presença da administração pública
subnacional, nacional e supranacional. Para
tanto lançamos mão de um levantamento
identificador e descritivo da atuação de
concretizadores e implementadores públicos e
privados da Constituição e dos tratados
regionais contemporâneos, e a seguir de uma
comparação de modelos, procedimentos e
resultados da atuação da administração
fazendária brasileira e alemã no regionalismo
contemporâneo do Acordo Quadro-Regional da
União Européia com o Mercosul.
Para saber como está atuando e quais são
as tendências de inovação institucional da
administração pública no regionalismo
contemporâneo do Acordo-Quadro Inter-Regional
de legitimação procedimental de Luhmann (LUHMANN, Niklas. Legitimação peloprocedimento, DF, Universidade de Brasília, 1980). Uma perspectivacomparativa entre Habermas e Luhmann sobre legitimação pelo procedimento,ver em BRITO, Marcos Antonio Bezerra. Apontamentos sobre métodos de trabalhoem direito constitucional tributário. RJ, PUC-Rio, 2005, dissertação demestrado, cap 2.
39
de Cooperação entre União Européia e Mercosul,
valem o exame do período a partir da
Constituição Brasileira de 1988, os tratados do
MERCOSUL e deste com a União Européia, bem como
as emendas constitucionais do período, e
considerando a União Européia, o período a
partir do final da 2a. Guerra Mundial. A
Comunidade Européia do Carvão e do Aço,
inaugurada logo após a 2ª. G.M. para o
reerguimento econômico da Europa destruída,
desdobrou-se nos últimos 60 anos na Comunidade
Econômica Européia e na atual União Européia,
modelo de regionalismo econômico contemporâneo
nos cinco continentes. A iniciativa do Brasil
no sentido de uma integração regional foi
favorecida pelo acordo de distensão e
aproximação política e econômica celebrado em
1986 com a Argentina, mas passou a ser objetivo
da República Federativa do Brasil com a
Constituição de 1988 (art. 4º, parágrafo
único). Conhecendo as raízes históricas e os
propósitos iniciais do regionalismo,
40
compreenderemos o seu sentido atual e futuro,
para identificarmos neles a atuação da
administração fazendária.
Considerado este período, algumas
questões e itinerários podem ser propostos a
quem se interessa pelas tendências de atuação
do serviço público no regionalismo
contemporâneo:
1) se para o regionalismo econômico não
valem apenas as premissas estadocêntricas já
conhecidas, será preciso reelaborar critérios e
parâmetros de percepção e compreensão do espaço
público no regionalismo contemporâneo como
poder regulamentar e como atuação, referidos ao
fenômeno da internacionalização da
administração pública e da transnacionalização
do direito administrativo;39 39 Como proposta metodológica de itinerários para condução destapesquisa:
1) Quanto à discussão de noção de espaço, BACHELAR, Gaston. Aexperiência do espaço na física contemporânea. RJ, Ed. Contraponto, 2010;Estudos. RJ, Ed. Contraponto, 2008.; JAMMER, Max. Conceitos de espaço: ahistória das teorias do espaço na física. Rio de Janeiro, Ed. PUC-Rio, 2010;e EINSTEIN, Albert. Apresentação, in JAMMER, Max. Conceitos de espaço: ahistória das teorias do espaço na física. Rio de Janeiro, Ed. PUC-Rio, 2010;
2) Para sua articulação com uma noção de espaço público contemporâneo,HABERMAS, Jürgen. Más allá del Estado nacional. Madrid, Editorial Trotta,2008; Ay, Europa! Pequeños escritos políticos. Madrid, Editorial Trotta,
41
2) como poderemos compreender a dinâmica
contemporânea do regionalismo econômico com
este novo modo de perceber? Decerto há muitas
possibilidades, e uma delas é que, tido o
espaço público como composto por uma
pluralidade ampliada de atores que coadjuvam a
atuação da administração pública no contexto do
regionalismo contemporâneo, podemos
adequadamente examinar as constituições e os
tratados regionais, para identificar o sentido
e os propósitos da existência e da atuação
institucional econômica, política e social, e
com isso reunir elementos de compreensão da
atuação dos concretizadores públicos e privados
da Constituição e implementadores dos tratados
regionais contemporâneos, dentre eles, como
pudemos exemplificar (INRFB 1515/2014), a
administração fazendária; e
2009; A inclusão do outro. SP, Edições Loyola, 2002; e A constituição daEuropa, 2011; e
3) Para compreensão da dinâmica do espaço público a partir dos atorese sua interação, GADAMER, Hans-Georg. Hermenéutica de La Modernidad.Conversaciones com Silvio Vietta. Madrid, Editorial Trotta, 2006; e Verdadee método: traços fundamentais de uma hermenêutica filosófica. Petrópolis,Ed. Vozes, 2004.
42
3) Percebido o espaço público no
regionalismo contemporâneo e compreendidos o
sentido e os propósitos de existência e
protagonismo de seus atores, precisaremos de
eventos, casos concretos para comparação.
Valeria uma comparação de exemplos dentro do
Mercosul, dentro da União Européia, ou entre os
exemplos de desempenho de uma administração
pública nacional do Mercosul com uma da União
Européia? Tanto para uma perspectiva de
tendências de atuação institucional quanto para
a compreensão de seu papel atual, valeria, por
exemplo, pesquisar elementos de comparação do
desempenho da administração fazendária
brasileira no Mercosul com o desempenho da
administração fazendária alemã na União
Européia, e de ambas no Acordo-Quadro Inter-
Regional de Cooperação Mercosul-União Européia,
considerando a importante observação de que a
convergência institucional é o objetivo
fundamental de um acordo-quadro, prévio - ao
menos no regionalismo econômico - a qualquer
43
acordo-contrato. A cooperação institucional é
portanto um meio de identificar a atuação da
administração fazendária no regionalismo
contemporâneo, mesmo eventualmente sem
regulação legal interna ou contratual externa.
As respostas, que aqui hipotetizamos,
pretendem proporcionar melhor compreensão e
alternativas de escolha diante do que nos virá
alcançar no cotidiano de cidadãos,
empreendedores e agentes públicos, ao menos
nesta década, cá no Mercosul.
Capítulo 1
Espaço e duração da administração pública no
regionalismo econômico contemporâneo da
mundialização eletrônica comercial, das
comunicações e do crédito, e da
transnacionalização do espaço público 40
40 Espaço público dos direitos e liberdades individuais e coletivas;espaço público regional de atuação da administração pública por parâmetrosfiscais e critérios sociais de distribuição; espaço público de cooperaçãoinstitucional entre as administrações públicas através da regionalização daadministração pública e globalização do direito administrativo.
44
O espaço público desterritorializa-se com
a regionalização econômica, sem deixar de ser
entretanto “o público, em primeiro lugar, um conceito
espacial”41. Se o espaço público não é mais apenas
delimitado territorialmente, ou seja, se
“espaço”, para compreender o “público” no
regionalismo econômico, não é mais apenas
“localização territorial”, precisaremos já
então decompor a estrutura lógica do conceito
estadocêntrico de espaço público interno e
internacional para, desconstruída a noção de
“espaço” para relativizar o elemento
“território”, reestruturarmos um entendimento
de espaço público cuja estrutura lógica decerto
não mais poderá ser predominantemente
estadocêntrica (povo-governo-território).
E é na dinâmica de interação da
constelação pos-nacional de atores a que se
refere Habermas42, que se poderá reestruturar o41 HÄBERLE. Peter. Nove ensaios constitucionais e uma aula de jubileu.SP, Saraiva, 2012, p. 9: “...o público é, em primeiro lugar, um conceito espacial.”42 HABERMAS, Jürgen. Ay, Europa! Pequeños escritos políticos. Madrid,Editorial Trotta, 2009, p. 93: “En la literatura pertinente aparecida en los últimos quinceaños se ha investigado y analisado la red de organizaciones internacionalles, inabarcable,
45
“campo” de atuação da administração pública
local, subnacional, nacional e supranacional. O
espaço público, não mais designado
predominantemente pelos territórios nacionais,
deixa de ser “objeto” de estudo - através do
exame dos catálogos de competências das
administrações estatais43 -, para ser um “campo”
de atuação também da administração pública, é
dizer, uma “esfera” pública 44 de possibilidades
e probabilidades de atuação de entes, órgãos e
agentes públicos e privados, possibilidades e
probabilidades estas que se concretizam na
ampliamente ramificada y cada vez más densa, que reacciona ante la creciente necesidad decoordinacíon de una sociedad mundial cada vez más compleja... Por otro lado, es cierto que en latransición de la constelación nacional a la posnacional (a mundialização comercial, dascomunicações e do crédito, e a regionalização econômica) los Estados han perdidomucha capacidad de acción autónoma.”43 O “público” de seus “serviços” tem se expandido para além do espaçoterritorial nacional e de suas competências originárias e derivadas, édizer, por exemplo nos atos administrativos (potestade pública) e nos atosde administração (gestão). No regionalismo econômico europeu contemporâneo,não se debate mais o conceito de “serviço público” pois o “público” já agorasão os “serviços de interesse geral” e os “serviços de interesse econômicogeral”, estes últimos concedidos por contratos com os Estados nacionais.44 A noção de “campo” de probabilidades, proposta pela ciênciamicrofísica, não se restringe à noção bidimensional de área (como em“superfície”), alcança também a noção de esfera, utilizada por Habermas, nãocomo uma esfera-objeto, mas igualmente como uma esfera de possibilidades eprobabilidades de interação da constelação posnacional de atores: o espaçopúblico referido por Habermas igualmente conota a emancipação da noção deespaço-superfície, espaço-território, especificando ele espaço público comrepresentação de uma esfera de probabilidadees e possibilidades deinteração.
46
interação desta constelação pós-nacional de
atores, segundo critérios de consenso e
compromisso acordados nos tratados regionais,
mediados pelas constituições nacionais, e
concretizados internamente segundo parâmetros
fiscais de distribuição das ações políticas
estatais.
Portanto nosso interesse está no exame
da atuação institucional no regionalismo
econômico contemporâneo, de modo a identificar,
nos eventos e procedimentos 45 consolidados, em
curso ou em perspectiva de implementação, suas
tendências de regularidade e pertinência ao
espaço público regional, que denotem a presença
da administração pública subnacional, nacional
e supranacional. Para tanto lançaremos mão de45 A par da ética procedimental proposta por Habermas (HABERMAS.Jürgen.Direito e democracia entre facticidade e validade. RJ, Ed. Tempobrasileiro, 1997, vol. II; e A inclusão do outro. SP, Edições Loyola, 2002;)e da interpretação procedimental da constituição proposta por Häberle(Häberle, Peter. Hermenêutica constitucional – a sociedade aberta dosintérpretes da constituição: contribuição para a interpretação pluralista e“procedimental” da constituição. P. Alegre, S.A. Fabris, 1997;), a propostade legitimação procedimental de Luhmann (LUHMANN, Niklas. Legitimação peloprocedimento, DF, Universidade de Brasília, 1980). Uma perspectivacomparativa entre Habermas e Luhmann sobre legitimação pelo procedimento,ver em BRITO, Marcos Antonio Bezerra. Apontamentos sobre métodos de trabalhoem direito constitucional tributário. RJ, PUC-Rio, 2005, dissertação demestrado, cap 2.
47
um levantamento identificador e descritivo da
atuação de concretizadores e implementadores
públicos e privados da Constituição e dos
tratados regionais contemporâneos e, a seguir,
de uma comparação de modelos, procedimentos e
resultados da atuação das administrações
fazendárias brasileira e alemã no regionalismo
contemporâneo do Acordo Quadro-Regional de
Cooperação da União Européia com o Mercosul.
A. Uma dinâmica do espaço público
Se o espaço público contemporâneo da
regionalização não é mais apenas territorial –
hoje matéria mais circunscrita à defesa
geopolítica dos tratados-contrato -, ele é
permeado pelo espaço de atuação dos tratados
regionais e das relações comerciais, de crédito
e comunicação mundiais, as quais, embora tendam
também a uma medida geral de regulação (global
administrative law ou constitucionalismo
48
multinível46), esta também não está circunscrita
territorialmente.
Então precisaremos retornar teórica e
epistemologicamente a decompor e reconduzir uma
noção de espaço não apenas definida
territorialmente, não visível por inteiro num
mapa-mundi geopolítico, um espaço de atuação
não perceptível estático nos catálogos de
competências, macrofisicamente, mas movido e
tecido também por atores e eventos exteriores
ao cotidiano estatal, um espaço dinâmico,
microfísico, que emerge nos eventos da
mundialização eletrônica comercial, das
comunicações e do crédito, entretecido pelo
regionalismo econômico regulador, na atuação
aqui examinada da administração fazendária e de
outros entes, órgãos e agentes públicos e
privados.
Neste emergente espaço público
inicialmente amorfo, porque alheio a46 FRANÇA FILHO, Marcílio Toscano. Law in the Transatlantic Trade Road:The EU-Mercosur Agreement between Global Administrative Law and MultilevelConstitutionalism. Fonte: http://www.garnet.sciencespobordeaux.fr/Garnet%20papers%20PDF/FRANCA%20FILHO,%20Marcilio%20Toscano.pdf;
49
mapeamentos territoriais, não se aumenta seu
conhecimento isolando-o em catálogos de
competências, pois nessa individualização perde
ele suas propriedades substanciais de evento em
curso: a substância dos infinitamente pequenos
eventos de comunicação e troca mundiais são
contemporâneos de relações (por exemplo
microeconômicas de oferta e procura), e não
objetos de exame (por exemplo os catálogos de
competências ou o conteúdo genérico dos
tratados)47.
47 Para este parágrafo, analogicamente ao modelo de espaço microfísicoexaminado por BACHELARD, Gaston. Estudos, Ed. Contraponto, Rio de Janeiro,2012, pp. 12 e 13: “Não é isolando-o que se aumentará o conhecimento de um objetoultramicroscópico. Isolado, um corpúsculo se torna um centro de irradiação para um fenômeno maior.Considerado em seu papel físico, ele é, para o conhecimento empírico, mais um meio de análise queum objeto. É um pretexto para o pensamento, e não um mundo a ser explorado. É inútil prosseguir aanálise até se isolar sob todos os aspectos um objeto único, porque parece que no mundo damicrofísica o único perde suas propriedades substanciais. Logo, só há propriedades acima – e nãoabaixo – dos objetos microscópicos.”;
“Na física contemporânea de um mundo desconhecido (p.ex. o espaço público noregionalismo), o da microfísica atômica, em que não se pode “medir” geométrica oumecanicamente seus objetos, não se aumenta o conhecimento isolando-o, pois na microfísica o únicoperde suas propriedades substanciais: a substância do infinitamente pequeno é contemporânea darelação. Também por isso a noção de campo substitui, na física contemporânea, o conceito deobjeto”; e
“No domínio infinitesimal (das trocas do comércio e comunicações mundiais),nada se enumera (p.ex. Competências de cada administração fazendária estatal),tudo se aglomera” (p.ex. As relações de troca e comunicação, e em razão dessas,a interveniência da administração na regulação e fazendária na tributação).“No domínio infinitesimal, nada se enumera, tudo se aglomera”. BACHELARD. Gaston. Estudos,Rio de Janeiro, Ed. Contraponto, 2008, p.20.
50
Se portanto o espaço público
contemporâneo do regionalismo também emerge
visibilidade nos eventos em que a administração
pública participa, media ou protagoniza, então
poderemos perceber o espaço público regional
como um campo de possibilidades de atuação da
administração pública com mediação
constitucional, campo de possibilidades
conversíveis gradativamente em probabilidades
que concretizam-se na dinâmica dos eventos –
políticas públicas48, ações de governo - de
implementação regional e interna dos consensos,
compromissos e metas pontuados nos tratados
regionais49.48 DENNINGER, Erhard. Segurança, diversidade e solidariedade” ao invésde “liberdade, igualdade e fraternidade”. Revista de estudos políticos, n.88, p. 21-45, dez. 2003: Conforme afirmado pelo prof. Erhard Denninger, comrespeito aos debates contemporâneos recorrentes sobre questõesconstitucionais de liberdade, igualdade e fraternidade – ideais que deresto jamais alcançaram concretude de experiência histórica - subjazemquestões mais prementes, que não são matéria constitucional, mas questõessobre o alcance das políticas públicas em torno dos ideais de segurança,solidariedade e diversidade (DENNINGER, 2003, p. 25, citado em VIEIRA, JoséRibas (organizador). Constituição e Estado de Segurança nas Decisões doTribunal Constitucional Federal Alemão, Curitiba, Juruá Editora, 2008, p.29).49 Para este parágrafo, analogicamente ao modelo de espaço microfísicoexaminado por BACHELARD, Gaston. Estudos, Ed. Contraponto, Rio de Janeiro,2012, pp. 12 e 13: “Na física contemporânea de um mundo desconhecido (o espaçopúblico no regionalismo), o da microfísica atômica, em que não se pode “medir” geométrica oumecanicamente seus objetos, não se aumenta o conhecimento isolando-o, pois na microfísica o único
51
B. Regionalismo econômico contemporâneo
Diferentemente dos conceitos
estadocêntricos já delineados pela experiência
secular das “relações internacionais” 50 desde a
Paz de Westfália, o regionalismo econômico
contemporâneo, sem uma experiência secular que
não tem, é um fenômeno em curso de construção.
Daí porque, concomitantemente às discussões
conceituais e paradigmáticas entre escolhas de
sujeitos multipolares geopolíticos 51, ou normas
de ‘global administrative law’52, a atuação da
administração pública também pode ser
perde suas propriedades substanciais: a substância do infinitamente pequeno é contemporânea darelação. Também por isso a noção de campo substitui, na física contemporânea, o conceito de objeto”.50 Ver BRITO, Marcos Antonio Bezerra. Elementos de governança emsistemas multiníveis de administração pública: A vinculação constitucionalcontemporânea da administração fazendária na integração regional. Pesquisaapresentada como resultado do estágio de pós-doutorado do Programa de Pós-Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro,em convênio com o Instituto Alemão de Pesquisas em Administração Pública deSpeyer, e a Universidade Alemã de Ciências da Administração de Speyer. RJ,PUC-Rio, 2012, Cap. 1, “Percepção e método”.51 Bibliografia geopolítica das relações internacionais bipolares /multipolares, BULL, Hedley. The Anarchical Society – Study of Order in WorldPolitics.London MacMillan, 1977.52 KRISCH, N. (2006). The Pluralism of Global Administrative Law.European Journal of International Law 17(1): 247-278;
52
compreendida53 no contexto regional como uma
concertação de critérios temáticos de consenso
com parâmetros fiscais de distribuição das
ações que resultam da deliberação, decisão e
implementação de políticas públicas 54 por uma
multiplicidade de atores55 públicos e privados
aos níveis regional, nacional, sub-nacional e
local.
Entendemos que, para além da
regionalização financeira em avanço na União53 Ver BRITO, Marcos Antonio Bezerra. Elementos de governança emsistemas multiníveis de administração pública: A vinculação constitucionalcontemporânea da administração fazendária na integração regional. Pesquisaapresentada como resultado do estágio de pós-doutorado do Programa de Pós-Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro,em convênio com o Instituto Alemão de Pesquisas em Administração Pública deSpeyer, e a Universidade Alemã de Ciências da Administração de Speyer. RJ,PUC-Rio, 2012, Cap. 1, “Compreensão e método”.54 Conforme afirmado pelo prof. Erhard Denninger, com respeito aosdebates contemporâneos recorrentes sobre questões constitucionais deliberdade, igualdade e fraternidade – ideais que de resto jamais alcançaramconcretude de experiência histórica - subjazem questões mais prementes, quenão são matéria constitucional, mas questões sobre o alcance das políticaspúblicas em torno dos ideais de segurança, solidariedade e diversidade(DENNINGER, 2003, p. 25, citado em VIEIRA, José Ribas (organizador).Constituição e Estado de Segurança nas Decisões do Tribunal ConstitucionalFederal Alemão, Curitiba, Juruá Editora, 2008, p. 29).55 Ver BRITO, Marcos Antonio Bezerra. Elementos de governança emsistemas multiníveis de administração pública: A vinculação constitucionalcontemporânea da administração fazendária na integração regional. Pesquisaapresentada como resultado do estágio de pós-doutorado do Programa de Pós-Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro,em convênio com o Instituto Alemão de Pesquisas em Administração Pública deSpeyer, e a Universidade Alemã de Ciências da Administração de Speyer. RJ,PUC-Rio, 2012, Cap. 1, “Compreensão e método”.
53
Européia com o Banco Central Europeu, a par de
outras medidas centralizadas nos representantes
tradicionais de cada país, dispostos segundo a
correspondência geopolítica westfaliana
secular, a gradativa institucionalização de
convergência fiscal no Mercosul com o Grupo de
Monitoramento Macroeconômico 56, e o crescente
concurso de agências e atores regionais 57 em56 Veja-se também o Projeto de Cooperação Técnica Apoio ao MonitoramentoMacroeconômico, celebrado com a União Européia. Fontehttp://jus.com.br/revista/texto/18391/coordenacao-fiscal-no-mercosul-obstaculos-e-perspectivas#ixzz1umSH57Lt;
Para dar um exemplo mais visível em toda na administração fazendáriafederal brasileira (a Receita Federal), refiro-me à IN RFB 1515/2004, queatende – não gratuitamente - às normas IASB (International AccountingStandards Board) européias, da qual sucedem as normas IFRS (InternationalFinantial Report Stndard) também européias adotadas nos 5 continentes e noBrasil para as demonstrações financeiras das corporações, e é outro que opadrão norte-americano FASB (Financial Accounting Standards Board), einclui-se no núcleo de consenso e compromisso previsto no Acordo-Quadroentre UE e Mercosul, para o que a contabilidade fiscal passou a serdisciplinada pela administração fazendária – no exercício de seu poderregulamentar na IN RFB 1515/04 – de modo a adimplir, no âmbito de suaatuação, ao compromisso brasileiro no regionalismo. Conquanto somente osagentes financeiros que operam no Brasil não cumpram ainda este padrão, bemcomo também não os EUA, é portanto inequívoco posicionamento brasileiro noregionalismo econômico contemporâneo voltado, neste caso, à União Européia.Veja-se, sobre IFRS europeu adotado no Brasil e decorrente do IASB tambémeuropeu, e sobre o FASB dos EUA, em publicação da Universidade Federal deSanta Catarina,HTTP://dvl.ccn.ufsc.br/congresso/arquivos_artigos/artigos/227/20080805123016.pdf.
57 “This new form of international relations is put into practice throughout an innovative form ofdiplomacy, whose actors include not only Member States, but also enterprises, political parties, unions,professional organizations, subnational entities and above all non-governmental organisations”.
54
temas específicos, como fármacos, turismo,
cidades do Arco Atlântico 58, vinicultura, entre
muitas59, tem levado a administração pública a
coadjuvar a construção do regionalismo por vias
perceptíveis somente no curso dos
acontecimentos, dos eventos de que participa,
media ou protagoniza, ou ex post facto, pelo
exercício de interpretação do desempenho dos
atores envolvidos nas políticas públicas no
sentido do consenso acordado sobre o tema em
curso de discussão, deliberação, regulação ou
implementação60.
FRANÇA FILHO, Marcílio Toscano. Law in the Transatlantic Trade Road: The EU-Mercosur Agreement between Global Administrative Law and MultilevelConstitutionalism. Fonte: http://www.garnet.sciencespobordeaux.fr/Garnet%20papers%20PDF/FRANCA%20FILHO,%20Marcilio%20Toscano.pdf. 58 Contribuição da Conferência das Cidades do Arco Atlântico – 6, rueSaint-Martin – 35700 - RENNES (France) – Tél.: +33(0) 2 99 30 24 51 – Email:[email protected]. Emhttp://ec.europa.eu/dgs/secretariat_general/eu2020/docs/atlantic_arc_cities_pt.pdf.59 Além da Comissão Européia, composta por cidadãos que não tomam parteno executivo, no legislativo ou no judiciário de seus países, outros comitêsconsultivos e para ação social, custeados por fundos, como o Fundo SocialEuropeu, o Fundo Europeu para o Desenvolvimento Regional e o Fundo deCoesão. 60 Veja-se em português, sobre o “método de coordenação aberta”, emBRITO, Marcos Antonio Bezerra. Política e Direito em Sistemas Multiníveis deAdministração Pública, Pesquisa apresentada como resultado do estágio depós-doutorado do Programa de Pós-Graduação em Direito da PontifíciaUniversidade Católica do Rio de Janeiro, cap.3.2.8.2. A economia políticados pactos sociais e o método de coordenacão aberta.
55
Celebrados os tratados regionais, seu
conteúdo não é ainda um fato social, econômico
ou político, mas dependerá da técnica
constitucional, política e jurídica com que
sejam provocados e controlados seus efeitos -
inicialmente projetados e aguardados – nas
sociedades dos países signatários. Seria
temerário postular a simplicidade desses
efeitos como decorrente da atuação da
administração pública regional (p.ex. a
Secretaria do Mercosul ou a Comissão Européia),
nacional ou local, segundo suas competências
catalogadas, derivando o espaço público de suas
esferas de atuação. Se cogita este espaço
público regional nas esferas de atuação das
administrações públicas em sistemas multi-
níveis, a partir do microcosmo de suas relações
entre si (é dizer, com entes, órgãos e agentes
públicos), bem como com entes, órgãos e agentes
privados (p. ex. corporações, ONG, no Brasil as
OSCIP, associações), e também entre estes
últimos. E por isso os efeitos estejam no campo
56
das possibilidades abertas pelos tratados e
mediadas pelas constituições nacionais e das
probabilidades das políticas públicas,
projetadas e executadas para a interação entre
pessoas, corporações, entes, órgãos e agentes
públicos dos países signatários dos tratados
regionais61 segundo os parâmetros fiscais de
cada país.
O regionalismo econômico contemporâneo
pode ser percebido, mais que através de uma
possível descrição de fenômenos políticos que
se repetem e reafirmam os conceitos já
consolidados das relações internacionais desde
a Paz de Westfália, como uma produção de
efeitos macroeconômicos e macrossociais,
realimentados por diagnósticos e projeções
micro e macroeconônicas do comércio, das
comunicações e do crédito mundiais, bem como61 Como é exemplo o recente ato de exercício de poder regulamentar pelaadministração fazendária federal brasileira (Receita Federal), a IN RFB1.5152014, que regulamenta - a partir das normas de transparência dasdemonstrações financeiras das corporações e com base nas normasinternacionais européias IFRS – os efeitos fiscais tributários dasinterações econômicas entre pessoas, corporações, entes, órgãos e agentespúblicos no Brasil e no exterior, adequando-se ao regionalismo econômico deque o Brasil é signatário no Mercosul e no Acordo-Quadro Mercosul-UniãoEuropéia.
57
microssociais de consumo, emprego e seguridade
dos países signatários, que movimentam as ações
de atores públicos e privados reguladas pelos
tratados regionais constitucionalmente
mediados.
C. Espaço público e regionalismo econômico
contemporâneo
O regionalismo econômico contemporâneo
tem existência orgânica e objetiva, pois
pensado e praticado – não sem recuos – nas
políticas públicas por parâmetros fiscais,
monetários e de competitividade, bem como por
critérios políticos e sociais de distribuição,
que mediam a interdependência e a cooperação
(organicidade) dos países signatários, com o
compromisso mútuo de metas fiscais, econômicas
e políticas (objetivos) dos tratados
regionais.62
62 Para este parágrafo, analogicamente ao modelo de espaço microfísicoexaminado por BACHELARD, Gaston. Estudos, Ed. Contraponto, Rio de Janeiro,2012, pp. 12 e 13: “Se o real se desindividualiza fisicamente indo para essas profundezas dafísica infinitesimal, o cientista dará mais importância à organização racional de suas experiências à
58
Como proposto já em pesquisas anteriores,
decisões políticas ou jurídicas são juízos que
podem ser decompostos tridimensionalmente em
fatos, valores/princípios e textos normativos,
conjugados em procedimentos decisórios
metóticos63, que são a dimensão prática de sua
concretização64 por entes, órgãos e agentes
públicos ou privados, portanto sua quarta
dimensão65, é dizer a dimensão de sua
legitimidade66. Assim é que podemos identificar
esta quarta dimensão como legitimação
medida que aumentar o grau de precisão delas, Uma medida exata é sempre uma medida complexa:logo, é uma experiência organizada racionalmente”. 63 BRITO, Marcos Antonio Bezerra. Elementos de governança em sistemasmultiníveis de administração pública: A vinculação constitucionalcontemporânea da administração fazendária na integração regional. Pesquisaapresentada como resultado do estágio de pós-doutorado do Programa de Pós-Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro,em convênio com o Instituto Alemão de Pesquisas em Administração Pública deSpeyer, e a Universidade Alemã de Ciências da Administração de Speyer. RJ,PUC-Rio, 2012; _______. Uma metódica do sistema tributário brasileiro: oprocedimento fiscal fazendário federal. RJ, Pontifícia Universidade Católicado Rio de Janeiro/Deutsche Hochschule für Verwaltungswissenschaft - Speyer,2010, tese de doutorado; _______. Apontamentos sobre métodos de trabalho emdireito constitucional tributário. RJ, PUC-Rio, 2005, dissertação demestrado.64 MÜLLER, Friedrich. Metódica Estruturante do Direito.65 A quarta dimensão de um objeto de estudo é seu campo depossibilidades e probabilidades: “No ponto simbólico das três dimensões cartesianas abre-se então uma perspectiva interna; todo objeto tem uma extensão interna que se acrescenta à extensãoexterna.” BACHELARD, Gaston. “Recherches philosophiques”, III, p. 306-320, inEstudos. RJ, ed. Contraponto, 2012, p. 37.66 Legitimidade – ver institucionalismo sociológico, no Cap.2,“Regionalismo econômico e estadocentrismo”.
59
democrática das decisões políticas e jurídicas
em seu aspecto interno de formação, é dizer, o
procedimento transparente de condução do juízo
decisório67. Não por acaso o regionalismo
econômico - cujas possibilidades de eventos
econômicos, políticos, jurídicos e sociais são
postas em termos gerais nos tratados e mediadas
constitucionalmente - tem como campo de suas
probabilidades de eventos a sua implementação
na atuação de entes, órgãos e agentes públicos
e privados, que se movimentam e relacionam
segundo procedimentos deliberativos e
decisórios legitimadores. Para agentes, órgãos
e entes públicos, tais procedimentos precisam
ser explicitados em leis 68 ou, mais
consentaneamente com o cooperativismo
institucional regional, pelo poder regulamentar
da administração pública constitucionalmente
67 A ética procedimental proposta por Jürgen Habermas e que permeia suasintervenções no debate filosófico, político e jurídico do regionalismo naEuropa. 68 Lei alemã do procedimento administrativo –
Verwaltungsverfahrensgesetz, de 25/05/1976; em http://www.gesetze-im-
internet.de/bundesrecht/vwvfg/gesamt.pdf;60
autorizado. Mas consideremos também – no campo
das decisões políticas - o exemplo das metas de
ajuste fiscal acordadas na União Européia, que
preveem o binômio necessidade / obrigatoriedade
de procedimentos de controle fiscal deliberados
em Bruxelas, ao país que precisar alcançar as
metas fiscais acordadas para permanecer na Zona
do Euro, é dizer, dentro do mesmo padrão
monetário: se o câmbio entre os países da Zona
do Euro não pode ser alterado - por escolha de
compromisso entre os países -, também é
compromisso o cumprimento de um procedimento
transparente de ajuste fiscal das contas
nacionais do país, p.ex. recente, a Espanha e a
Grécia69.
É então nesta dimensão interna,
procedimental, de cumprimento / implementação
dos tratados que nos estamos propondo a
69 TRATADO da União Européia sobre Estabilidade, Coordenação eGovernação, assinado em 02 de março de 2012; emhttps://www.google.com.br/search?q=Tratado+da+Uni%C3%A3o+Europ%C3%A9ia+sobre+Estabilidade%2C+Coordena%C3%A7%C3%A3o+e+Governa%C3%A7%C3%A3o&oq=Tratado+da+Uni%C3%A3o+Europ%C3%A9ia+sobre+Estabilidade%2C+Coordena%C3%A7%C3%A3o+e+Governa%C3%A7%C3%A3o&aqs=chrome..69i57.1005j0j4&sourceid=chrome&es_sm=122&ie=UTF-8.
61
identificar a atuação da administração pública
e especificamente da administração fazendária.
A quarta dimensão das decisões da administração
fazendária está - não apenas em seu catálogo de
atribuições – mas em seu aspecto interno de
formação e portanto legitimação de suas
decisões, que é o procedimento transparente de
condução do juízo decisório segundo os
consensos e compromissos dos tratados 70, nos
seus eventos de atuação no cooperativismo
institucional regional/interregional movidos
pelo seu poder regulamentar constitucionalmente
autorizado.
No regionalismo econômico contemporâneo,
antes de se interpretar atribuições (conceitos)
em catálogos de competência e/ou a validade da
atuação da administração pública por seus
resultados guardarem ou não pertinência à
70 No âmbito do regionalismo europeu, quanto ao procedimento
administrativo, veja-se o Procedimento Administrativo para as Instituições
da União Européia - Código Europeu da Boa Conduta Administrativa, em
http://www.ombudsman.europa.eu/pt/resources/code.faces#/page/1,
file:///C:/Users/Artur/Downloads/code_2013_PT.pdf. 62
temática de sua competência legal – o que, como
reiteramos, é uma tarefa infrutífera -, importa
aferir a correspondência dessa atuação ao
itinerário procedimental de legitimação das
decisões, bem como a medida de atingimento do
propósito visado nos eventos de que a
administração pública participa, media ou
protagoniza segundo o cooperativismo
institucional movido internamente pelo seu
poder regulamentar.
No âmbito do regionalismo econômico
contemporâneo a dimensão da legitimidade na
atuação do poder regulamentar constitucional da
administração pública tende a preceder a de sua
competência legal, enquanto não sedimentadas no
tempo as instituições que surgem e se
transformam dentro e fora da administração
pública, e com ela coadjuvam a implementação
dos tratados.
D. Espaço público e administração pública no
regionalismo econômico contemporâneo
63
Nossa imaginação, movida pela intuição
sensível, propõe-nos uma lógica de senso comum
com percepção macroscópica 71, na qual inexiste
objeto que não esteja situado em um espaço e/ou
que não há espaço definível sem referência a
objetos. Desde esta lógica parte-todo / todo-
parte, individualizadora de objetos e
delimitadora de espaços estáticos, é simples
propor que não há espaço público sem referência
aos cidadãos. Entretanto, caso este espaço não
seja territorial – tal como estamos acostumados
nas relações interestatais (povo, território,
governo) -, esta lógica torna-se incompleta
para compreender o deslocamento de pessoas,
corporações e bens entre países, segundo
direitos e deveres comuns, não intermediados
exclusivamente por cada Estado nacional de
origem e de destino. Tal é o que ocorre p.ex.
com a cidadania européia, com o deslocamento de
71 BACHELARD, Gaston. Estudos, RJ, ed. Contraponto, 2012, p. 39: “Sejaqual for nossa liberdade espiritual no campo dos conceitos abstratos, não deixa de ser verdade que écom a retina que se imagina”.
64
corporações mediado por normas comuns aos
países de origem e destino na Europa (p.ex.
filiais, em vez de sucursais), ou com a
dispensabilidade de visto para cidadãos de
países do Mercosul, e também com a referência
comum de troca – a moeda – na União Européia.
O espaço público de cada país deixa de
ser, no regionalismo contemporâneo do último
pós-guerra, predominantemente ocupado pelo
Estado, territorializado, para ser estimulado -
não mais exclusivamente determinado - pelo
Estado, segundo os consensos, metas e
compromissos dos tratados regionais
constitucionalmente mediados.
A atual e gradativa harmonização
constitucional entre os países, que se segue à
constitucionalização dos direitos fundamentais
nos Estados ocidentais após a 2. G.M., enseja
admitir-se que no regionalismo contemporâneo “o
espaço público é um dos elementos estruturais do Estado
constitucional democrático” 7 2. 72 HÄBERLE. Peter. Nove ensaios constitucionais e uma aula de jubileu.São Paulo, ed. Saraiva, 2012, p. 74.
65
Em curso de construção de seu campo, o
espaço público regional avança ou regride
gradativa e cotidianamente, na implementação
dos tratados regionais, tecida por cidadãos,
corporações, entes e órgãos públicos e
privados, é dizer, numa dinâmica experimental
inovadora cuja sistematicidade não tem
referências consolidadas, porque os consensos,
compromissos e metas acordados dependem de
inovação e desenvolvimento institucional dentro
e fora dos territórios dos Estados nacionais.
Esta dinâmica sistêmica está-se
construindo portanto microfisicamente, é dizer,
em cada evento de avanço institucional no
sentido dos consensos, compromissos e metas
acordados nos tratados regionais e
constitucionalmente mediados, pois não tem uma
experiência comparável anterior, e por isso
mesmo (esta dinâmica) guarda coerência
microfísica, pois o “objeto” (o espaço público)
não existe por si e num espaço físico
delimitado (o território de um Estado), sendo
66
identificado somente circunstancialmente, nos
eventos de interação (implementação dos
tratados). “Onde” mais persistentes e numerosos
(portanto intensos) sejam esses eventos, melhor
poderá ser identificado e maior será o “campo”
do espaço público regional, ao menos enquanto
não consolidadas as instituições através das
quais esses eventos têm existência e
continuidade. E é nele portanto que a
administração fazendária brasileira atua a
tessitura do Mercosul, e dos tratados do
Mercosul com a União Européia.
Mediador da inovação nas tarefas da
administração pública, o constitucionalismo
contemporâneo aponta para um comprometimento
cidadão e solidário não apenas intrageracional
- das gerações presentes e das futuras -, mas
também intergeracional, ou seja com as gerações
67
futuras73. E a identidade coletiva 74 dessas
gerações já se está forjando para além dos
limites dos Estados nacionais, a partir do
exercício de direitos fundamentais comuns,
firmados nas constituições ocidentais. Daí a
importância dos ajustes fiscais buscados
regionalmente na União Européia e no Mercosul,
que denotam o avanço do cooperativismo
constitucional estatal75, a expansão da
participação na interpretação/concretização da
Constituição (portanto dos tratados regionais
73 Comprometimento das gerações futuras: consumo e crédito, por ex se ofundo previdenciário é utilizado antecipadamente, comprometendo o ajusteatuarial futuro; comprometimento com as gerações futuras é investimento,pois para o cidadão comum, o dinheiro é consumo, ao passo que investimento étempo para qualquer um, tempo, por exemplo, de educação para a cidadania,para a vida comunitária e para a vida profissional. Sobre solidariedade comofonte de integração social inter e intrageracional contemporânea, ver, entreoutros, Habermas, Jürgen. A inclusão do outro – estudos de teoria política.São Paulo, Edições Loyola, 2002, cap. 9, “Três modelos normativos dedemocracia”.74 Sobre identidades coletivas, entre outros, WOLIN, Richard.Introduction. In HABERMAS, Jürgen. The new conservatism: cultural criticismand the historian´s debate. Cambridge, Massachussets: MIT Press, 1994, p.151 e 152; CRONIN, Ciaran. Democracy and the colletive identity: in defenseof constitutional patriotism. In European Journal of Philosophy. London:Blackwell Publishing, vol. 11, n. 01, April 2003, p. 2, 4, 7 e 9; BERTEN,André. Republicanismo e motivação política. In MERLE, Jean-C. e MOREIRA,Luiz. Direito e legitimidade. Ed. Landy, 2003, p. 31, 32 e 33; e PINZANI,Alessandro. Patriotismo e responsabilidade na época da globalização.Columbia University. Resumo, 2003.75 HÄBERLE. Peter. Estado constitucional cooperativo. RJ/SP/Recife, Ed.Renovar, 2007.
68
constitucionalizados) por sua
procedimentalização76, capilarizada na atuação
da administração pública77 e dos entes
privados78, e decorrente da tendência crescente
no regionalismo contemporâneo de
institucionalização da opinião e da vontade
política espontaneamente geradas na base das
sociedades ocidentais79. Na dinâmica do
regionalismo contemporâneo atuam cidadãos,
entes e órgãos públicos e privados, que tecem
cotidianamente o espaço público regional
mediado pelo cooperativismo constitucional, no
sentido dos consensos, metas e compromissos dos
tratados regionais.
76 HÄBERLE. Peter.Hermenêutica constitucional – a sociedade aberta dosintérpretes da constituição: contribuição para a interpretação pluralista e“procedimental” da constituição. P. Alegre, S.A. Fabris, 199777 Por exemplo o Forum Consultivo de Municípios, Estados Federados,Províncias e Departamentos do MERCOSUL, criado em 2004 na Cúpula de OuroPreto;78 Por exemplo, os comitês temáticos da Comissão Européia. Ver emGovernance by Committee, the role of Committees in the European Policy-Making and Policy-implementation, Comitês do Parlamento Europeu e daComissão Européia, http://aei.pitt.edu/548/1/main.pdf.79 HABERMAS, Jürgen. A inclusão do outro. SP, Edições Loyola, 2002; eMás allá del Estado nacional. Madrid, Editorial Trotta, 2008.
69
E este espaço quadridimensional tem
avanço, recuo ou intensidade 80 na dinâmica
intersubjetiva de seus agentes participantes,
cuja vontade comum no sentido dos consensos,
metas e compromissos dos tratados regionais
exercitam através de novas ou antigas
instituições regionais, nacionais, subnacionais
e locais, no âmbito da cooperação
institucional, característica dos tratados
regionais e interregionais.
O logos desse espaço público emerge como
evento de linguagem intersubjetiva comum que
modula os procedimentos decisórios
constitucionalmente mediados no sentido dos
consensos, metas e compromissos dos tratados
regionais81. Isto porque, como sabemos, entes,80 BACHELARD, Gaston. “Recherches philosophiques”, III, 1933-1934, p.306-320, in Estudos, RJ, ed. Contraponto, 2012, p. 37: “No interior do pontosimbólico das três dimensões cartesianas abre-se então uma perspectiva interna; todo objeto tem umaextensão interna que se acrescenta à extensão externa... equivale a atribuir uma intensidade aoponto do espaço em três dimensões... Tal método equivale a considerar toda intensidade como umadimensão;...”81 Proposição hermenêutica de GADAMER, Hans-Georg. Verdade e método.Petrópois, ed. Vozes, 2004, citada por HABERMAS, Jürgen. Ay, Europa!Pequeños escritos políticos. Madrid, Editorial Trotta, 2009, p. 36: “En ellogos del lenguaje se encarna, pues, un poder de lo intersubjetivo que precede y subyace a lasubjectividad de los hablantes. El logos del lenguaje se sustrae a nuestro control, y sin enbargo somosnosotros, los sujetos capaces de hablar y actuar, quienes se entienden entre sí en este medio. Estemedio sigue siendo “nuestro” lenguaje. Elevar pretensiones de validez incondicionales es un supuesto
70
órgãos e agentes públicos e privados, e mesmo o
“povo”82, são de fato a dimensão externa de
nossas próprias relações intersubjetivas
cotidianas.
Em suma, espaço público contemporâneo,
regionalização econômica e administração
pública não podem seguir considerados
predominantemente “objetos de estudo” 83, mas
como “campo” de estudo de possibilidades e
probabilidades84. Isto também porque,
examinando-se um “objeto” apenas de um reduzido
necesario de nuestras prácticas.” 82 MÜLLER, Friedrich. Quem é o povo? A questão fundamental dademocracia. São Paulo, ed. Max Limonad, 2000.83 Na sequência, parágrafo sobre espaço e objeto macrofísico emicrofísico modelado para assertivas em espaço público, regionalismoeconômico e atuação da administração pública, baseado nas obras JAMMER,Max. Conceitos de espaço – A história das teorias do espaço na física. RJ,Contraponto, Ed. PUC-Rio, 2010; e BACHELARD, Gaston. A experiência do espaçona física contemporânea. RJ, Contraponto, 2010, esta última da qual valeramas assertivas seguintes:
“A prescrição primeira de toda sã filosofia: o dever de definir o objeto pelos métodosexperimentais que nos oferecem as características do objeto.”
“A fé na realidade é reforçada pela certeza de que nada será encontrado fora da célula delocalização, das paredes da célula de localização no vazio”. (dos acontecimentos)
“Para o Realista, o real é uma espécie de deus que se encontra em toda parte, contanto queseja procurado com displicência”.
“De que serve separar a noção de realidade da noção de objetividade da experiência econtinuar repetindo que a objetividade da experiência é possível porque a realidade existe plena, una,imutável, objetivamente?”
“A vida ativa comum nos acostumou a considerar o provável como inferior ao certo”.84 O modelo microfísico, aqui e já antes explicitado, e que se serve danoção de existência como probabilidade, é um dos itinerários metódicos destapesquisa.
71
ponto de vista geral, desprezando-se as
flutuações de um ampliado exame probabilístico
aproximativo percebe-se, por exemplo, que
“a defi nição de Aristóteles de
que “o homem é um animal racional”
expressava pouco a realidade
psicológica pontuada na dinâmica
cotidiana da experiência humana,
assim como afi rmar-se que o elétron
tem um mesmo e único raio, pois para
descrever seus fenômenos, a
microfísica precisa de uma
multiplicidade de micro-objetos 8 5 .
E também assim é na dinâmica do
regionalismo contemporâneo com a redução
conceitual dos papéis da administração pública
em catálogos de competências, pois esta
perspectiva estática, por catálogos de
competências – que serve exemplarmente no
âmbito dos conceitos geopolíticos das relações
85 BACHELARD, Gaston. A experiência do espaço na física contemporânea.RJ, Contraponto, 2010, p. 48. O modelo microfísico, aqui e já antesexplicitado, é um dos itinerários metódicos desta pesquisa.
72
internacionais, aproximados pela experiência
secular desde a Paz de Westfália, e presente,
p.ex. na agenda dos tratados internacionais em
matéria de defesa e nos tratados-contrato de
relações comerciais - tem-se mostrado
insuficiente no âmbito da dinâmica do
regionalismo econômico contemporâneo, já que
este não tem ainda o benefício daquela
experiência secular das relações
internacionais86, que enseja sua análise com uma
tal redução conceitual.
Portanto, em nosso itinerário de exame
não se buscará apenas uma “posição” decisória
da administração pública e da administração
fazendária (competência), mas dados da
experiência de sua “atuação” na dinâmica de
implementação dos tratados regionais, numa
perspectiva aberta para a participação de
agentes privados na formação da vontade e da
ação política e jurídica, nas modalidades
86 Relações internacionais modernas se dão entre Estados-partes, já oregionalismo econômico contemporâneo une Estados-membros por interseção desuas soberanias nos seus consensos e compromissos constitucionais.
73
institucionais estabelecidas e em construção no
regionalismo contemporâneo do Mercosul e da
União Européia.
Quem são os entes, órgãos e agentes
públicos e privados, e quem é o povo 87, senão a
dimensão externa das nossas próprias relações
intersubjetivas cotidianas? E é nessa nova
experiência de intersubjetividade em curso –
voltada aos consensos, compromissos e metas
constitucionalmente mediados e ainda sem os
critérios conceituais atributivos de
legitimidade e competência definidos – que
emergem os eventos de construção cotidiana do
regionalismo contemporâneo protagonizados
procedimentalmente pela administração
fazendária, no exercício de seu poder
regulamentar de criar, extinguir e modificar
órgãos e suas funções, de modo a convergir para
o desempenho institucional dos acordos
regionais e interregionais.
87 MÜLLER, Friedrich. Quem é o povo? A questão fundamental dademocracia. São Paulo, Max Limonad, 2000.
74
È essa dimensão interna, cotidiana, de
atuação procedimentalizada da administração
fazendária para a implementação dos tratados
regionais do Mercosul e deste com a União
Européia de que nos ocupamos. Mas onde essa
atuação acontece?
E. Espaço público jurídico-constitucional
O campo de possibilidades de atuação da
administração fazendária está na Constituição
de cada país e/ou em uma constituição regional,
e no caso da União Européia “já existe um conjunto de
fragmentos constitucionais em sentido material apreensíveis
formalmente”88. Portanto o campo de possibilidades
de atuação da administração fazendária está na
implementação constitucionalmente mediada dos
tratados, é dizer nos consensos, metas e
compromissos comuns entre os países, mediados
pelas constituições de cada Estado nacional.
Tendo sido os tratados constitucionalizados
pelos países signatários, tais possibilidades88 HÄBERLE.Peter. Nove ensaios constitucionais e uma aula de jubileu.São Paulo, ed. Saraiva, 2012, p. 68.
75
convertem-se em probabilidades dependentes de
atuação institucional convergente ou por
isomorfismo institucional89 nos países do bloco
regional, donde passa-se à sua implementação
através de politicas públicas, por meios
institucionais convencionais ou inovadores.
Tal é o espaço público do regionalismo
contemporâneo que permeia a atuação da
administração fazendária. É preciso portanto
perceber a dimensão do espaço público de
atuação da administração fazendária no campo
institucional jurídico-constitucional. E porque
os tratados não são desde logo
constitucionalizados nos países é que se
consideram a Constituição como processo aberto
e a premissa do Estado constitucional
cooperativo90. Pela cooperação é que se
desdobram a inovação e o isomorfismo
institucional, também campos de atuação da
89 Isomorfismo institucional: similaridade de forma e estrutura com oambiente institucional, in Teoria Institucional e Neo-institucionalismo,PUC-Rio, Certificação digital no. 0410663/CB, p. 36. 90 HÄBERLE. Peter. Constituição como processo aberto (1978); e Estadoconstitucional cooperativo. RJ/SP/Recife, Ed. Renovar, 2007.
76
administração fazendária91, desdobrados por
implementação da cooperação institucional
regional e interregional.
O ordenamento jurídico dos Estados
constitucionais constitui o espaço público de
atuação da administração fazendária, e os
convênios de cooperação institucional 92 e de
troca de informações93 são oportunidades de
concretização comum, nos países, das
antecedentes possibilidades de acordos de
regionalização constitucionalizadas 94, que se91 Isomorfismo – Institucionalismo sociológico - Isomorfismoinstitucional: similaridade de forma e estrutura com o ambienteinstitucional, in Teoria Institucional e Neo-institucionalismo, PUC-Rio,Certificação digital no. 0410663/CB, p. 36.92 Por exemplo, no âmbito do Acordo-Quadro Inter-Regional de Cooperaçãoentre União Européia e Mercosul.93 Por exemplo, Revista Fato Gerador, da Receita Federal do Brasil, 1o.Semestre de 2014, p. 63: A Receita Federal, recebeu em fevereiro de 2014,uma delegação do Internal Revenue Service (IRS), responsável pelaadministração tributária dos Estados Unidos, para a avaliação mútua sobre osrecursos tecnológicos, as práticas administrativas e a legislaçãonecessários para a troca de informações protegidas por sigilo fiscal demaneira automática, resguardando sua confidencialidade. Brasil e EstadosUnidos já têm 22 acordos bilaterais desse tipo em vigor. A expectativa é deque os primeiros dados entre os dois países sejam partilhados já em setembrode 2015, referentes às posições dos correntistas de cada país no final de2014, conforme app.folha.uol.com.br de 01/09/2015..94 No Brasil, art. 4o., parágrafo único da CRFB: “A República Federativado Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dospovos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações.” “O objetivo deste parágrafo é estabelecer... abrindo discussões em tornodo Mercosul e das normas destinadas a estatuir sua efetiva implementação.”. BULOS, UadiLamêgo. Constituição Federal Anotada. São Paulo, Ed. Saraiva, 2000, p. 65.
77
tornaram probabilidades nos consensos, metas e
compromissos dos tratados regionais já então
constitucionalmente mediados. No Brasil, p.ex.
os tratados em matéria de direitos humanos se
incorporam por emendas constitucionais, é
dizer, são constitucionalizados e, nas matérias
de tributação, os tratados são internalizados
afastando disposições legais contrárias
antecedentes, condicionando também a legislação
interna posterior sobre a matéria 95, e embora
não se insiram diretamente no texto
constitucional, são oportunidade de
institucionalização da atuação da administração
fazendária brasileira no âmbito dos tratados,
como já é o caso das Adidâncias da Receita
Federal do Brasil em Buenos Aires, Montevidéu,
Assunção e Washington, da convergência dos
demonstrativos financeiros das corporações, e
do atual avanço no consenso para troca
automática de informações bancárias entre o
Brasil e os países da União Européia.
95 Artigo n. 98 do Código Tributário Nacional (CTN).78
Capítulo 2: Sentido e propósitos da existência e da atuação
institucional econômica, política e social no
regionalismo econômico contemporâneo
79
F. Elementos institucionais introdutórios
O público, a par de um conceito espacial,
é também um conceito valorativo 96. O espaço
público como valor para o regionalismo
contemporâneo emerge no cotidiano
aprofundamento institucional do curso da
integração regional, protagonizado, regulado ou
coadjuvado por entes e órgãos públicos e
privados, em suas relações intersubjetivas
cotidianas. A mundialização das comunicações, e
com ela, dos fluxos financeiros e comerciais,
ampliou e ao mesmo tempo fragmentou as conexões
comunicativas dessas relações, antes melhor
moduladas e controladas pelos Estados
nacionais, e
“Por ello, Internet ejerce, ciertamente,
un efecto subversivo sobre cualquier regímen
autoritario del ámbito de lo público, pero, al
mismo tiempo, la intercomunicación
96 HÄBERLE.Peter. Nove ensaios constitucionais e uma aula de jubileu.São Paulo, ed. Saraiva, 2012, p. 72.
80
horizontal y desformalizada debilita los
logros de las esferas públicas tradicionales.” 97
Precisaremos então abordar a
administração fazendária também para além da
esfera pública tradicional estatal de sua
atuação, o espaço público estadocêntrico 98. Mas
isto significa, além do concurso de atores
antes estranhos àquele espaço público
tradicional, também a inserção de sua atuação
num institucionalismo em construção a partir
dos tratados, é dizer, p.ex. a Secretaria do
Mercosul, o FOCEM (Fundo para a Convergência
Estrutural do Mercosul), o Foro de Consulta e
Concertação Política, a Associação Mercosul de
Normalização, a Agência Brasileira de
Cooperação, o Grupo de Trabalho de Alto Nível
(para revisão integral do modelo institucional
adotado no Mercosul, com vistas a ajustes
necessários), e as relações destes com a97 HABERMAS, Jürgen. Ay, Europa! Pequeños escritos políticos. Madrid,Editorial Trotta, 2009, p. 59.98 DOEHRING, Karl. Teoria do Estado. Belo Horizonte, ed. Del Rey, 2008,p. 135: “Atualmente, as organizações internacionais ultrapassaram os Estados do mundo emtermos numéricos.”
81
Secretaria de Assuntos Internacionais da
Receita Federal do Brasil (com núcleo na Cidade
do Rio de Janeiro), as Adidâncias da Receita
Federal do Brasil, além do exercício do poder
regulamentar, como é exemplo a Instrução
Normativa n. 1515/2014, da Receita Federal do
Brasil, que fixou requisitos e procedimentos
para atuação da administração fazendária
federal de neutralização dos efeitos fiscais
decorrentes da adequação brasileira aos padrões
europeus de transparência nas demonstrações
financeiras das corporações.
A administração fazendária, como já
afirmado, ganha protagonismo no regionalismo
econômico 99, pois atuará na execução da
interface das medidas do esforço macroeconõmico
e fiscal comum, na convergência de medidas
99 Sobre o protagonismo dos ministérios das finanças – administraçãofazendária – no regionalismo contemporâneo, ver Ver BRITO, Marcos AntonioBezerra. Elementos de governança em sistemas multiníveis de administraçãopública: A vinculação constitucional contemporânea da administraçãofazendária na integração regional. Pesquisa apresentada como resultado doestágio de pós-doutorado do Programa de Pós-Graduação em Direito daPontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, em convênio com oInstituto Alemão de Pesquisas em Administração Pública de Speyer, e aUniversidade Alemã de Ciências da Administração de Speyer. RJ, PUC-Rio,2012.
82
tributárias, na harmonização a médio prazo das
políticas econômicas e sociais (parâmetros de
equilíbrio e justiça fiscais e de distribuição
social do ônus tributário de financiamento das
ações estatais), é dizer, participar das
reformas institucionais e dos procedimentos
efetivos de implementação dos consensos, metas
e compromissos dos tratados regionais do
Mercosul e deste com a União Européia
constitucionalmente mediados e implementados
pela via da cooperação institucional.
G. Microfísica institucional e administração
fazendária contemporânea
Como perceber a atuação da administração
fazendária na tendência crescente, no
regionalismo contemporâneo, de
institucionalização da opinião e da vontade
política espontaneamente geradas na base das
sociedades ocidentais?100
100 HABERMAS, Jürgen. A inclusão do outro – estudos de teoria política.São Paulo, Ed. Loyola, 2002, e Más allá del Estado Nacional. Madrid,Editorial Trotta, 2008.
83
É através da mediação constitucional que
inauguram-se, operam e interagem as
instituições com a administração fazendária. E
é por isso que a sociedade de intérpretes da
Constituição precisa estar aberta 101 para as
possibilidades plurais de relações
constitucionalmente mediadas entre pessoas,
instituições e de ambas com a administração
pública. Mas então como todos nós, cidadãos,
empreendedores ou agentes públicos
interpretamos a Constituição em nossas
relações? Procedimentalmente.
É no curso de formação dos juízos
jurídico-administrativos que todos nós
interpretamos o que fizemos, fazemos ou
pretendemos fazer segundo a Constituição – e,
sob mediação desta, os tratados internacionais
-, as leis e os fatos cotidianos com que
fundamentamos nosso direito à atuação, garantia
ou abstenção da administração fazendária.
101 HÄBERLE. Peter.Hermenêutica constitucional – a sociedade aberta dosintérpretes da constituição: contribuição para a interpretação pluralista e“procedimental” da constituição. P. Alegre, S.A. Fabris, 1997.
84
Podemos desta maneira inicialmente perceber, e
esta percepção pode ser ela mesma uma
dificuldade (se habituados estamos com a lógica
formal público-privado territorialista estatal)
ou uma oportunidade para compreendermos as
dinâmicas de atuação institucional no
regionalismo contemporâneo em nosso curso
cotidiano. E isto porque as instituições
tradicionalmente atuantes no espaço público
estatal e internacional (p.ex. Ministério das
Relações Exteriores e Ministério da Fazenda, e
seus órgãos), passaram a atuar num espaço
público transterritorial em que também atuam
antigos e novos entes e órgãos públicos e
privados na formação ou na implementação das
políticas públicas, as quais também alcançam
espaços transterritoriais de intervenção 102.102 “A protagonização do espaço público pelas empresas que atuam segundo o princípio daadministração global e a lógica do mercado, e a transnacionalização do consumo urbano e douniverso midiático borraram os contornos espaciais do público, de tal modo que ele deve serreconhecido com imagens de circuitos e fluxos que extrapolam os territórios nacionais. Nesse cenáriopúblico transnacional, em função da depreciação das formas tradicionais de representação política ede solução de problemas, surgem os movimentos sociais e as redes desses movimentos, que, segundouma lógica de resistência e luta por direitos e uma ética de diálogo intercultural, articulam as açõescoletivas locais com ações regionais e transnacionais, e combinam as manifestações massivas e aarticulação em redes globalizadas, pela mediação das Organizações Não-Governamentais. Oengajamento dos cidadãos nesse tipo de ações coletivas constitui uma nova forma de exercício dacidadania.”, in ARENHARDT, Lívio Osvaldo. A redefinição do espaço público e da
85
Então, pelos procedimentos adotados para o fim
visado, p.ex. de implementação de políticas
públicas, é que se podem compreender as
posições tomadas pela administração pública
fora do espaço territorial estatal e dentro da
regulação supranacional.
Esta atuação da administração pública é
hoje demandada menos exclusivamente pelo
próprio Estado – que, como vimos, tem recuado
sua atuação no espaço público como agente
direto determinador e implementador de
políticas públicas - e gradativamente mais
demandada pela própria sociedade organizada em
associações, ONG (e OSCIP, no Brasil), entre
outras modalidades de demanda, eis que - em que
pese tal ampliação transterritorial do espaço
público - aberta portanto à participação de
movimentos sociais,
“esses movimentos, pretendendo construir
alternativas aos partidos políticos e
cidadania no contexto da transnacionalização econômico-simbólica, RevistaDireitos Culturais, vol. 1, n. 2, junho 2007, consultado em 22/01/2015 emhttp://livros-e-revistas.vlex.com.br/vid/publico-cidadania-contexto-mico-simbolica-213240837?_ga=1.45805668.1739157330.1421944639,
86
governos, não conseguiram erigir em
nenhum país projetos globais e, menos
ainda, políticas que reestruturem os
aparelhos estatais e as economias em
declínio”1 0 3
Portanto se as condições em que a
sociedade civil fala consigo mesma denotam que
as maiorias se informam por meios eletrônicos,
nesses meios comparece também o debate e a
promoção do interesse público pelo Estado, pela
administração pública. Mas para intervir-se
eficientemente na vida pública contemporânea
deve-se trabalhar mais escalas, é dizer nas
esferas micropúblicas, mesopúblicas e
macropúblicas, que são esferas comunicacionais
para além de geográficas104
103 ARENHARDT, Lívio Osvaldo. A redefinição do espaço público e dacidadania no contexto da transnacionalização econômico-simbólica, RevistaDireitos Culturais, vol. 1, n. 2, junho 2007, consultado em 22/01/2015 emhttp://livros-e-revistas.vlex.com.br/vid/publico-cidadania-contexto-mico-simbolica-213240837?_ga=1.45805668.1739157330.1421944639.104 “Com base em uma distinção de esferas geográficas e comunicacionais do público, propostapor John Keane – esferas micropúblicas (espaços locais: reuniões de vizinhos, igrejas, movimentossociais, etc.), esferas mesopúblicas (de alcance nacional e regional: jornais de circulação nacional eregional e meios de comunicação de alcance similar) e esfera macropública (agências internacionaisde notícias e empresas transnacionais multimídia)” –“, in ARENHARDT, Lívio Osvaldo. Aredefinição do espaço público e da cidadania no contexto datransnacionalização econômico-simbólica, Revista Direitos Culturais, vol. 1,n. 2, junho 2007, consultado em 22/01/2015 em http://livros-e-
87
Por exemplo, as ações de presença
fiscal105 da administração fazendária cumprem,
concomitantemente com a difusão da comunicação
local de educação fiscal para a cidadania, um
papel de intervenção do interesse público, que
pode tanto delimitar-se geograficamente a um
município quanto ampliar-se a um Estado da
Federação, enquanto o teor mais genérico da
educação fiscal, também veiculada por meios
eletrônicos - além de transmitida na ação de
presença fiscal – difunde-se muito além do mapa
de atuação da administração fazendária no
evento de presença fiscal: Anunciado o evento
de presença fiscal, as associações corporativas
se mobilizam, tendo já agora como elementos
discursivos de diálogo com seus associados e
com o Fisco, a eventual e específica
comunicação social de educação fiscal,
veiculada pelos meios de comunicação locais
revistas.vlex.com.br/vid/publico-cidadania-contexto-mico-simbolica-213240837?_ga=1.45805668.1739157330.1421944639.105 P. ex. as ações fiscais programadas pela Administração FazendáriaFederal – a Receita Federal - em determinada localidade, alcançandosimultaneamente e na mesma ocasião shopping-centers, estabelecimentoscomerciais, industriais e de serviços em um município.
88
(rádiodifusão, TV locais), além da mídia
eletrônica mundial da Internet, que alcança
municípios (esfera micropública), estados e
regiões (esfera mesopública) e, p. ex. o
Mercosul e a União Européia (esfera
macropública) simultaneamente.
Num espaço público ampliado e
desterritorializado em que os movimentos
sociais não têm tido oportunidade de formar ou
coordenar eficientemente vetores de ações
políticas, econômicas e mesmo sociais
macropúblicos,
“. . . os Estados-nação, por mais que devam
ser desconstruídos, são imprescindíveis
para que a sociedade civil não se dobre aos
interesses empresariais e estes não se
dobrem aos interesses dos investidores.” 1 0 6
Assim, tanto quanto as empresas
transnacionais reordenam os mercados
106 ARENHARDT, Lívio Osvaldo. A redefinição do espaço público e dacidadania no contexto da transnacionalização econômico-simbólica, RevistaDireitos Culturais, vol. 1, n. 2, junho 2007, consultado em 22/01/2015 emhttp://livros-e-revistas.vlex.com.br/vid/publico-cidadania-contexto-mico-simbolica-213240837?_ga=1.45805668.1739157330.1421944639.
89
considerando as relações de consumo, a
sociedade civil não se confunde com o mercado,
e portanto os Estados-membros organizados
regionalmente têm como demanda reordenar o
espaço público em suas esferas de atuação
voltadas à cidadania, da qual as relações de
consumo são elementos constitutivos, a par das
relações de trabalho, seguridade social,
culturais e de identidades coletivas 107,
escassos entretanto como vetores organizados
neste espaço público transnacional. Reconheça-
se todavia que as ações estatais têm menos
flexibilidade de institucionalização dos
vetores de opinião e vontade formados
107 Sobre identidades coletivas contemporâneas, entre outros, WOLIN,Richard. Introduction. In HABERMAS, Jürgen. The new conservatism: culturalcriticism and the historian´s debate. Cambridge, Massachussets: MIT Press,1994, p. 151 e 152; CRONIN, Ciaran. Democracy and the colletive identity: indefense of constitutional patriotism. In European Journal of Philosophy.London: Blackwell Publishing, vol. 11, n. 01, April 2003, p. 2, 4, 7 e 9;BERTEN, André. Republicanismo e motivação política. In MERLE, Jean-C. eMOREIRA, Luiz. Direito e legitimidade. Ed. Landy, 2003, p. 31, 32 e 33; ePINZANI, Alessandro. Patriotismo e responsabilidade na época daglobalização. Columbia University. Resumo, 2003.
90
espontaneamente na base das sociedades 108,
enquanto que
“À medida que desenvolvem sua ação de
forma transnacional, muitos movimentos
sociais intermediários conseguem inserir-se
ao mesmo tempo em várias escalas dos
processos sociopolíticos, com mais
fl exibilidade que os Estados nacionais, os
organismos intergovernamentais e os
agrupamentos estritamente locais” 1 0 9 .
Também por esta razão prática é que no
regionalismo contemporâneo a sociedade civil
organizada fora da esfera estatal tem, p.ex. na
Europa, participação não diretamente mediada
pelos Estados nacionais na deliberação das
políticas públicas, no âmbito da Comissão
Européia110. E isto é possível se e na medida em108 Sobre a tendência crescente no regionalismo contemporâneo deinstitucionalização da opinião e da vontade política espontaneamente geradasna base das sociedades ocidentais, ver HABERMAS, Jürgen. A inclusão dooutro. SP, Edições Loyola, 2002; e Más allá del Estado nacional. Madrid,Editorial Trotta, 2008.109 ARENHARDT, Lívio Osvaldo. A redefinição do espaço público e dacidadania no contexto da transnacionalização econômico-simbólica, RevistaDireitos Culturais, vol. 1, n. 2, junho 2007, consultado em 22/01/2015 emhttp://livros-e-revistas.vlex.com.br/vid/publico-cidadania-contexto-mico-simbolica-213240837?_ga=1.45805668.1739157330.1421944639.110 É nesta perspectiva transnacional que podemos compreender, p.ex.
91
que os tratados regionais sejam gradativamente
constitucionalizados nos Estados nacionais.
É portanto a mediação constitucional que
enseja a atuação do Estado e da sociedade civil
no espaço público transnacional, é dizer, a
institucionalização neste da opinião e da
vontade tanto dos consumidores, nos mercados –
que são movidos pelos imperativos sistêmicos 111
dos empreendedores transnacionais -, quanto
também de cidadãos providos de identidade
coletiva112, seguridade e trabalho ora
protegidos, ora promovidos regionalmente pelos
Estados-membros segundo parâmetros fiscais e
critérios sociais de distribuição das políticas
públicas.
A microfísica institucional do
regionalismo contemporâneo resulta então
porque as demandas por padronização de qualidade, preço mínimo e até dedistribuição dos produtores de vinho da Europa não dependem de seusministérios de agricultura ou das relações exteriores, pois têm elesrepresentação na Comissão Européia, em Bruxelas.111 Sobre os imperativos sistêmicos do mercado, ver em HABERMAS, Jürgen.A inclusão do outro. SP, Edições Loyola, 2002; _______Más allá del Estadonacional. Madrid, Editorial Trotta, 2008112 Também sobre identidades coletivas no regionalismo contemporâneo, verHABERMAS, Jürgen. A inclusão do outro. SP, Edições Loyola, 2002; e Más alládel Estado nacional. Madrid, Editorial Trotta, 2008.
92
provocada pela transnacionalização do espaço
público e proporcionada pelas ações estatais,
uma vez que possibilitada pela mediação
constitucional dos tratados regionais nos
Estados nacionais.
Esta microfísica institucional emerge
tanto na dinâmica de formação dos vetores de
ação das políticas públicas – etapa em que
entes, órgãos e agentes públicos e privados
cumprem os procedimentos de sua formação –
quanto na dinâmica de sua implementação, tarefa
mediada, coadjuvada ou protagonizada pela
administração pública igualmente através de
procedimentos legitimadores de sua atuação. É
dizer que, sem conceitos ou institutos
consolidados por experiência secular que o
regionalismo contemporâneo não tem, a
visibilidade da atuação institucional está
nesta quarta dimensão, a dimensão procedimental
de deliberação, decisão e implementação dos
vetores de atuação das políticas públicas,
constitutivas do espaço público transnacional
93
em que também operam os vetores de mercado,
formados e modificados pelas corporações
transnacionais com ou sem a participação direta
dos Estados-nacionais.
H. Elementos institucionais da atuação
administrativa fazendária contemporânea
Uma abordagem estruturada do
regionalismo econômico contemporâneo precisa
desdobrar-se em atuação institucional
econômica, política e social reguladora,
normativa e cognitiva, em que cada qual desses
elementos convergirá para procedimentos
correspondentes aos âmbitos de sua atuação. Em
comum, como metodicamente até aqui exposto, a
dimensão procedimental de legitimação
democrática contemporânea da atuação,
especificamente nesta pesquisa, da
administração fazendária.
É dizer que a abordagem tradicional
estadocêntrica que permanece, vale e opera até
94
hoje, centrada na divisão de poderes
correspondentes às funções legislativa,
executiva e judiciária, será perpassada por
esta abordagem proposta, de modo a abranger a
atuação da administração pública no
regionalismo contemporâneo do Mercosul e dos
tratados com a União Européia, pela perspectiva
procedimental econômica, política e social,
praticada a partir de instrumentos reguladores,
normativos e cognitivos, desdobrados nas ações
da administração fazendária inseridas na
cooperação institucional.
Mas em que ambiente se podem encontrar
tanto os elementos da perspectiva
estadocêntrica quanto os elementos da inovadora
perspectiva institucional do regionalismo
econômico contemporâneo, para que possamos
fazer-lhes uma interface compreensiva de sua
dinâmica de interação? Os elementos de ambas as
perspectivas se encontram nas constituições
democráticas. É portanto no constitucionalismo
95
contemporâneo – cooperativo 113 - que emergem
cada qual desses elementos analiticamente e
todos eles entretecidos nos procedimentos de
deliberação, decisão e implementação de
políticas públicas114.
Precisaremos examinar a atuação da
administração fazendária para além dos direitos
administrativos nacionais, pois os vetores que
originam sua atuação no regionalismo
contemporâneo se formam para além das
fronteiras dos Estados-nação, mas
necessariamente podem e devem ser identificados
nas constituições, pois são elas mediadoras
necessárias da implementação dos tratados
regionais, e não atendem apenas à lógica113 Sobre o caráter constitucional cooperativo no regionalismocontemporâneo, ver HÄBERLE, Peter. Estado constitucional cooperativo.RJ/SP/Recife, Ed. Renovar, 2007.114 DENNINGER, Erhard. “Segurança, diversidade e solidariedade” ao invésde “liberdade, igualdade e fraternidade”. Revista de estudos políticos, n.88, p. 21-45, dez. 2003. Conforme afirmado pelo prof. Erhard Denninger, comrespeito aos debates contemporâneos recorrentes sobre questõesconstitucionais de liberdade, igualdade e fraternidade – ideais que deresto jamais alcançaram concretude de experiência histórica - subjazemquestões mais prementes, que não são matéria constitucional, mas questõessobre o alcance das políticas públicas em torno dos ideais de segurança,solidariedade e diversidade (DENNINGER, 2003, p. 25, citado em VIEIRA, JoséRibas (organizador). Constituição e Estado de Segurança nas Decisões doTribunal Constitucional Federal Alemão, Curitiba, Juruá Editora, 2008, p.29).
96
cognitiva das “leis”, mas ao exercício
hermenêutico daqueles elementos constitutivos
do que somos coletivamente no país e no mundo.
Por isso, à medida em que os tratados
regionais vão sendo constitucionalizados - e os
compromissos externos têm eventualmente prazos,
se não são apenas cartas de intenção -, e
adicionando-se que o processo legislativo
regulamentador das novas atribuições da
administração pública no sentido dos tratados
pode ser lento, nem por isso deixará de atuar
(através de seu poder regulamentar, é dizer da
regulamentação administrativa 115 de seus
próprios procedimentos) a administração
fazendária, segundo sua cláusula constitucional
de atribuição - no Brasil o art. 37, XVIII -
enquanto não assentado no Brasil um direito
administrativo do regionalismo econômico do
Mercosul e dos tratados com a União Européia.
115 Ver, entre outros autores de direito administrativo no regionalismocontemporâneo, OTERO, Paulo. Substituição da lei pelo Direito Internacional,in OTERO, Paulo. Legalidade e Administração Pública: O Sentido da VinculaçãoAdministrativa à Juridicidade. Coimbra, ed. Almedina, 2003, p. 748 e ss.
97
E isto também porque, conforme
sintetizou Rudolf Smend, qualquer exame teórico
(é dizer, sem antecedentes históricos
dogmatizados em doutrinas) da Constituição e da
atuação do Estado somente é concebível por uma
metodologia própria, que não pode ser
jurídica116. De fato, não se podem compreender
as transformações constitucionais e estatais
contemporâneas do pós-guerra apenas - nem
precedentemente - sob pontos de vista jurídicos,
como parece persistir no auto-entendimento do
ensino dogmático universitário e da prática
majoritária dos operadores do direito no
Brasil, que ainda interpretam a Constituição
como “Lei Maior” de todos, quando todos nela
nos constituímos como pessoas, cidadãos,
corporações e agentes públicos, é dizer,
podemos e devemos fundamentar nosso auto-
entendimento e nossa identidade coletiva na
Constituição, para o que é rasa a cognição
lógico-formal de conceitos, e116 SMEND, Rudolf. Constitución y derecho constitucional. Madrid, Centrode Estudios Constitucionales, 1985, p. 39.
98
descontextualizada da dinâmica constitucional a
cognição principiológica neo-naturalista.
Somente concretizamos a Constituição por
exercício hermenêutico.
Entretanto, a exigência de elaborar
conteúdos sociológicos e teleológicos
econômicos, políticos e jurídicos que aportam
nas constituições, para terem vida no cotidiano
das sociedades através de sua deliberação,
decisão e sua final implementação na atuação da
administração pública, não pode manter-se neste
auto-entendimento que segue tendo como
resultado um alcance limitado à filosofia,
deixando aqueles conteúdos comparecer apenas
como pressuposto ou objeto das ações da
administração pública, não como seus elementos
constitutivos117, em itinerários metódicos de
condução do juízo, procedimentos.
Especificamente no campo jurídico,
aquilo que na abordagem das ciências humanas
pode ser atribuído ao modelo básico da117 MÜLLER, Friedrich. Teoria esruturante do direito. SP, RT, 2009, pp.36 e 37.
99
correlação entre realidade e direito deve ser
destacado de questões abstratas e concretizado
de forma metódica na função normativa 118. As
transformações constitucionais e do Estado
contemporâneas do pós-guerra se implicam e
correspondem, e a compreensão cotidiana de seu
sentido ultrapassa a significação do marco
histórico em que é posta a Constituição e,
nela, a organização e atuação do Estado 119, não
se podendo considerá-los, para deliberação,
decisão, implementação ou mesmo investigação,
como meros documentos jurídicos, simples textos
a interpretar ou catálogos de competências. Por
outro lado, igualmente serve somente em medida
restrita - para se compreenderem o sentido e as
implicações contemporâneas do cotidiano
constitucional e estatal - a organização
sistemática de coletâneas de enunciados das
decisões jurídicas, de modo a reconhecerem-se -
118 MÜLLER, Friedrich. Teoria estruturante do direito. SP, RT, 2009, p.97.119 KÄGI, Werner. La constitución como ordenamiento Jurídico Fundamentaldel Estado: Investigaciones sobre las tendencias desarolladas em el modernoDerecho Constitucional. Tradução de Sérgio Diaz Ricicci y Juan José Deyen.Madrid, Dykinson, 2005.
100
apenas nestes - referências normativas,
regras120 para condução do juízo em assuntos de
Estado, pois sua predominância, pela
exacerbação desta perspectiva no âmbito
jurídico-constitucional, denota judicialização
da política, notório prejuízo para a
democracia121. Uma visão jurídica apenas
analítica e pontual do direito dificulta, senão
impede, o aporte explícito, no itinerário dos
juízos da atuação administrativa, tanto da
normatividade de outros âmbitos que não o
estritamente jurídico - mas também político,
econômico, social -, quanto da normatividade
descritiva122 presente nas circunstâncias que se
120 Ver HART, Herbert L. A. O conceito de direito. Lisboa, Fundação CalousteGulbenkian, 1996, sobre regra de reconhecimento, no positivismo jurídicoanglo-saxão.121 Entre muitos, GARAPON, Antoine.(1996), Le Guardien de Promesses:Justice et democratie. Paris, Editions Odile Jacob. Entre muitos, emportuguês, SIERRA, Vania Morales. Crise das representações e o déficit deurbanidade. Artigo, emhttp://www.plataformademocratica.org/Publicacoes/14541.pdf. 122 A normatividade descritiva das circunstâncias tem horizontes-limitede interpretação segundo a finalidade de decidir, e não apenas de conheceras circunstâncias. Ver, sobre normatividade na atuação procedimental daAdministração Fazendária, em BRITO, Marcos Antonio Bezerra. Uma metódicajurídica do sistema tributário brasileiro: o procedimento fiscal fazendáriofederal. PUC-Rio & Deutsche Universität für Verwaltungswissenschaft-Speyer,2010, tese de doutorado, disponível em www.academia.edu / Marcos AntonioBezerra Brito.
101
apresentam e sucedem interferindo nas decisões
e, portanto, na compreensão em cada caso da
Constituição, dos papéis do Estado e portanto
da atuação administrativa fazendária.
Embora nas leis do direito
administrativo brasileiro o cotejo dessas
normatividades do âmbito da norma e do caso não
tenham sido explicitadas em métodos de trabalho
do decididor administrativo fazendário –
procedimentos administrativos com conteúdo
detalhado de itinerário de atuação podem e
devem, mas eventualmente não são regulamentados
pela própria administração 123 -, nem por isso
tais normatividades deixam de influenciar,
senão eventualmente mesmo determinar as
decisões124. Por isso elas podem e devem emergir
nos procedimentos de atuação da administração
fazendária125, e são sua condição de atuação no123 Sobre o poder constitucional de auto-regulamentação administrativa,ver OTERO, Paulo. Legalidade e Administração Pública: O Sentido daVinculação Administrativa à Juridicidade. Coimbra, ed. Almedina, 2003.124 Ver MÜLLER, Friedrich. Métodos de trabalho do direito constitucional. SP, MaxLimonad, 2000, p. 33 e 34.125 Ver BRITO, Marcos Antonio Bezerra. Uma metódica do sistema tributáriobrasileiro: o procedimento fiscal fazendário federal. PUC-Rio & DeutscheUniversität für Verwaltungswissenschaften – Speyer, 2010, tese de doutorado,disponível em www.academia.edu / Marcos Antonio Bezerra Brito.
102
regionalismo contemporâneo e de sua própria
legitimidade, especialmente onde não foram – se
é que estão ao alcance do legislador 126 -
dogmatizados conceitos jurídicos de atribuição
e delimitação de competência em relação ao
Mercosul e aos tratados com a União Européia.
Uma atuação institucional econômica,
política e social reguladora, normativa e
cognitiva pode ser divisada no exemplo: A
Comunidade Européia do Carvão e do Aço resulta
de uma decisão politica de Estados nacionais
europeus, que criaram a CECA e lhe permitem até
hoje atuar junto aos ministérios das relações
exteriores e ministérios da fazenda de seus
Estados-membros, também regulando a atividade
econômica do carvão e do aço na Comunidade
Européia, já hoje ampliada para União Européia.
126“Quanto às próprias normas das convenções internacionais, também aqui se prescinde daintermediação legislativa em matérias excluídas de reserva de lei e que não envolvem a atribuição aoEstado de opções político-normativas primárias ou, em alternativa, que até então não foram objeto deintervenção legislativa, remetendo-se normalmente para regulamento administrativo o respectivodesenvolvimento ou detalhe. (em termos mais amplos, considerando que o regulamento se podereportar diretamente a normas do Direito Internacional convencional, cfr. Jorge Miranda, Funções....(1986), p. 360; IDEM, Regulamento, p. 267. Posição esta, aliás, objecto de acolhimento pelo TribunalConstitucional no seu já referido Acórdão no. 184/89, de 9 de Março de 1989.”, in OTERO, Paulo.Legalidade e Administração Pública: O sentido da Vinculação Administrativa àJuridicidade. Coimbra, ed. Almedina, 2003, p. 749.
103
A atividade institucional normativa cabe a cada
um dos Estados-membros da União Européia, seja
pelos legislativos nacionais ou por
regulamentação administrativa, decorrente de
seu poder regulamentar. Deste modo, com efeito,
porque as instituições emergem inicialmente
como procedimentos, protocolos, regras, normas
de natureza oficial formal ou não, é que por
sua permanência, para as gerações mais novas se
mostram aquelas instituições como inerentes à
estrutura organizacional de sua comunidade
política, daí o seu final caráter cognitivo , é
dizer, sua inserção no próprio auto-
entendimento e/ou na identidade coletiva dos
cidadãos, corporações e agentes públicos. A
permanência da CECA depende hoje entretanto de
requisitos de legitimidade social inexistentes
ou não cogitáveis por ocasião de sua criação,
no ambiente de intervenção político-econômica
do Plano Marshall, no então recente pós-guerra.
Também pela expressiva ampliação da Comunidade
é que seus procedimentos de deliberação,
104
decisão e eventual implementação de políticas
públicas referidas à atividade de carvão e aço
na União Européia têm sido questionados e
eventualmente modificados, para sua
legitimidade democrática127.
I. O institucionalismo da administração pública
multinível nos tratados regionais
Na sequência do exame e metodologia
propostos, e no intuito de voltar-mo-nos
gradativa e especificamente à atuação da
administração fazendária no regionalismo
econômico do Mercosul e da União Européia,
pontuaremos já agora algumas semelhanças e
distinções nas suas dinâmicas institucionais.
É de notar-se que o livre comércio entre
os países é um grande passo no sentido de uma
regionalização econômica, pois de início amplia
o raio de alcance privado da livre iniciativa e127 Procedimento Administrativo para as Instituições da União Européia –Código Europeu da Boa Conduta Administrativa, emhttp://www.ombudsman.europa.eu/pt/resources/code.faces#/page/1,file:///C:/Users/Artur/Downloads/code_2013_PT.pdf.
105
com isso estimula a competitividade
empreendedora, que movimenta a circulação de
riqueza e de crédito, gerando tributos com que,
por sua vez, se movimentam os entes e órgãos
estatais por parâmetros fiscais e critérios
sociais de distribuição das políticas públicas.
Passo na dinâmica macroeconômica do Estado,
para dar sentido no rumo uma regionalização
econômica, ações voltadas ao livre comércio têm
degraus antecedentes de cooperação
institucional, e degraus conseqüentes de
inclusão, nesta dinâmica, de elementos
basilares da cidadania num Estado
constitucional democrático, quais sejam a
promoção e garantia de emprego e seguridade
social, tarefas que não estão entretanto
diretamente a cargo dos empreendedores
privados, mas dos Estados nacionais, e por
isso, a exemplo do Brasil (CRFB art. 3o., I,
“e” ), o dever de solidariedade social seja
constitucionalmente de toda a sociedade, a
106
cargo de quem está o custeio da seguridade
social (CRFB art. 194, caput, e 195, caput)1 2 8.
J. Cooperação institucional
A cooperação institucional é um
instrumento de ação e de negociação política
indireta, e opera em diversificadas
modalidades, seja, no âmbito das relações
internacionais, por acordos bilaterais,
multilaterais, seja mesmo em situações de crise
política, em que a intervenção, mediação ou
ajuda política ou financeira internacional
pressupõe alterações nas funções institucionais
ou mesmo a inovação institucional. Já no âmbito
do regionalismo econômico contemporâneo, a
cooperação institucional é um termo de consenso
128 DENNINGER, Erhard. “Segurança, diversidade e solidariedade” ao invés de“liberdade, igualdade e fraternidade”. Revista de estudos políticos, n. 88,p. 21-45, dez. 2003. Conforme afirmado pelo prof. Erhard Denninger, comrespeito aos debates contemporâneos recorrentes sobre questõesconstitucionais de liberdade, igualdade e fraternidade – ideais que deresto jamais alcançaram concretude de experiência histórica - subjazemquestões mais prementes, que não são matéria constitucional, mas questõessobre o alcance das políticas públicas em torno dos ideais de segurança,solidariedade e diversidade (DENNINGER, 2003, p. 25, citado em VIEIRA, JoséRibas (organizador). Constituição e Estado de Segurança nas Decisões doTribunal Constitucional Federal Alemão, Curitiba, Juruá Editora, 2008, p.29).
107
e compromisso de médio ou longo prazo que
precede como facilitador da negociação e da
implementação dos compromissos direcionados ao
livre comércio. Na primeira modalidade,
referida às relações internacionais – portanto
bilaterais ou multilaterais – temos no Brasil a
Agência Brasileira de Cooperação. Na segunda
modalidade, a dos acordos regionais, temos as
cláusulas de cooperação institucional
previstas, por exemplo, nos acordos-quadro
regionais e inter-regionais que, por seu âmbito
abrangente do consenso e compromisso entre os
países (mais que a negociação de interesses
comerciais, típica dos tratados bilaterais e
multilaterais de livre comércio, que lhes são
sucedâneos no regionalismo econômico),
necessita de mediação constitucional ao menos
programática de objetivos, como é o caso da
Constituição brasileira (CF, art 4º. Parágrafo
único). É dizer que para negociações
circunstanciais de tarifas podem valer maiorias
congressuais também circunstanciais,
108
transitórias. Já para compromissos de longo
prazo no âmbito econômico-fiscal e tributário,
como é o caso dos acordos-quadro regionais e
inter-regionais, faz-se necessária uma mediação
constitucional para sua institucionalização. No
Brasil esta mediação constitucional, embora
ainda programática, pode e deve avançar,
destacando os setores de atuação estatal que
passam a ter vinculação constitucional com os
tratados regionais, como é exemplo, ainda não
constitucionalizado, do Grupo de Monitoramento
Macroeconômico do Mercosul, que passaria a ter
força normativa constitucional reguladora,
deixando de ser portanto apenas de
monitoramento. O papel da cooperação
institucional é portanto indireto, inicialmente
mesmo didático, por encontros, seminários,
trocas de experiências, e avança por
convergência interpretativa, normativa (por
mediação legislativa, como é o caso da INRFB
1.515/2014, que regulamentou as alterações
legislativas da Lei 6.404/76), e se consolida
109
na mediação constitucional nacional do consenso
e compromisso assumidos no âmbito do tratado
regional ou inter-regional. Daí porque, sob o
ponto de vista das relações comerciais mediadas
por tratados tarifários, a cooperação
institucional e a atuação administrativa no
âmbito dos acordos regionais não tenha
destaque, por vezes sequer seja percebida,
porque o avanço institucional prepara o âmbito
de negociações econômico-fiscais e tributárias
duradouras, como é o caso da União Européia,
cujo institucionalismo avança em suas
modalidades histórica, da escolha racional ou
centrada nos atores sociais, há mais de 60
anos. E é este institucionalismo que a
administração opera o regionalismo econômico
contemporâneo, ora somente através de seu poder
regulamentar, ora eventualmente por mediação
legislativa, ora finalmente por mediação
constitucional específica, como ocorreu, por
exemplo, com a Comunidade Européia do Carvão e
do Aço, na Europa saída então da guerra, em que
110
os ministérios da economia passaram, desde
então – e até hoje – a ter papel proeminente
nos países-membros. Tal é o motivo e o sentido
do protagonismo institucional da administração
fazendária no regionalismo econômico e, no
Brasil, da administração fazendária federal.
K. Regionalismo econômico e estadocentrismo
Com a premissa do livre comércio é que,
embora o ambiente historicamente predominante
entre os Estados nacionais seja o de uma
sociedade internacional129, no regionalismo
contemporâneo os Estados nacionais dão-se
passos recíprocos prévios a uma zona de livre
comércio, compartilhando a disponibilidade de
recursos macroeconômicos através de
instrumentos regulatórios comuns, que orientam
129 Entre diversas outras acepções, a de Hedley Bull, segundo a qualexiste sociedade internacional, ou sociedade de estados ”quando um grupo deestados, conscientes de certos valores e interesses comuns, formam umasociedade, no sentido de se considerarem ligados, no seu relacionamento, porum conjunto comum de regras, e participam de instituições comuns” (in “TheAnarchical Society – Study of Order in World Politics.London MacMillan,1977, P. 9-10).
111
a institucionalização político-normativa
econômica interna (uma das esferas de atuação
da administração fazendária, que também atua na
esfera econômico-financeira regional) e
avançam, num padrão de troca comum (mesma
moeda) através de parâmetros fiscais e
critérios sociais de distribuição interna de
emprego e seguridade social. Para tanto, a
partir de um ambiente inicialmente de contornos
societários, tem-se conformado o regionalismo
contemporâneo em um ambiente comunitário, com a
introdução gradativa de contornos
regionalizados da cidadania e da ação social
que transcendem o institucionalismo
estadocêntrico mediado pelos poderes nacionais
legislativos, executivos e judiciais, cujos
representantes têm suas diversificadas
competências exaustivamente descritas, desde a
esfera interna nacional, até a esfera da
sociedade internacional, cristalizada no quadro
institucional da Organização das Nações Unidas.
Já num ambiente comunitário regional, emerge a
112
atuação de uma inovadora constelação de
atores130 transnacionais, nacionais,
intranacionais públicos e privados, em conjunto
com atores públicos e privados da sociedade
internacional já conhecidos (p.ex. Banco
Mundial, Fundo Monetário Internacional,
Unesco). A comunidade econômica não é ela mesma
um ator regional, mas um ambiente, ou campo –
na expressão metódica desta pesquisa - no qual
os atores interagem entre o público e o privado
por dinâmicas temáticas concretizando as
políticas públicas131. E porque a constelação de
atores não se encontra somente em catálogos de
130 Entre a “constelação paralisante da política mundial”, refletida nafuga dos mercados financeiros ao alcance dos Estados nacionais, e a novaconstelação de atores a que se abre a tentativa dos Estados nacionais derecuperar uma parte da capacidade de autocontrole político por meio dacomunitarização supranacional, ver em HABERMAS, Jürgen. Sobre a constituiçãoda Europa. SP, Ed. Unesp, 2012, p. 90.131 DENNINGER, Erhard. “Segurança, diversidade e solidariedade” ao invés de“liberdade, igualdade e fraternidade”. Revista de estudos políticos, n. 88,p. 21-45, dez. 2003. Conforme afirmado pelo prof. Erhard Denninger, comrespeito aos debates contemporâneos recorrentes sobre questõesconstitucionais de liberdade, igualdade e fraternidade – ideais que deresto jamais alcançaram concretude de experiência histórica - subjazemquestões mais prementes, que não são matéria constitucional, mas questõessobre o alcance das políticas públicas em torno dos ideais de segurança,solidariedade e diversidade (DENNINGER, 2003, p. 25, citado em VIEIRA, JoséRibas (organizador). Constituição e Estado de Segurança nas Decisões doTribunal Constitucional Federal Alemão, Curitiba, Juruá Editora, 2008, p.29).
113
competências é que, para identificar a atuação
da administração fazendária no regionalismo
contemporâneo neste passo nos serviremos, como
instrumentos cognitivos, dos denominados 1)
“Akteurzentrierter Institutionalismus”, ou
institucionalismo centrado nos atores, a par
2) dos procedimentos, protocolos, regras,
normas de natureza oficial formal ou não, é
dizer, do institucionalismo histórico, 3) do
isomorfismo institucional sociológico de
adequação dos Estados e sociedades ao ambiente
comunitário, através de dos tratados de
cooperação institucional, e 4) do
institucionalismo da escolha racional,
movimentado pelas corporações transnacionais,
seja na representatividade parlamentar e da
sociedade civil, seja nos lobbies junto às ações
governamentais de deliberação, decisão e
implementação de políticas públicas.
A regulação transnacional é um método de
decisão político-jurídica132, enquanto a132 ‘A regulação é um método de decisão política de mais “baixos custos”e visaria compensar crises de governabilidade a nível interno dos Estados
114
governação administrativa é um método de
complementação jurídico-política 133 afeto ao
sistema multi-níveis de administração pública,
e portanto ligado aos modelos de gestão para a
eficiência. Daí se pode entender a União
Européia como uma comunidade política multi-
nível e simultaneamente como governança multi-
sistemática, é dizer com múltiplos,
interdependentes e interligados sistemas de
administração pública.
Um grau avançado de regulação
transnacional vem se construindo na Europa
desde há mais de 60 anos, desde a regulação da
atividade de carvão e aço. Esta regulação –
acordada entre Estados nacionais europeus -membros.’...’A linha de intelecção que procura clarificar a União como umesquema regulador transnacional - onde se integra também a governaçãomulti-nível – reflete especialmente a idéia de que muita da atividadepolítica da EU envolve a regulação da ação dos governos nacionais e dasentidades sub-estatais, e do comportamento das empresas.’ Fonte: IEEI –Instituto de Estudos Estraqtégicos Internacionais,http://www.ieei.pt/publicacoes/artigo.php?artigo=811, consultado entre maioe junho de 2011 através dos sistemas informatizados do DeutschesForschungsinstitut für Öffentliche Verwaltung – Speyer (Instituto Alemão dePesquisas em Administração Pública, em Speyer).133 Ver, em português, BRITO, Marcos Antonio Bezerra. Política e Direitoem Sistemas Multiníveis de Administração Pública, Pesquisa apresentada comoresultado do estágio de pós-doutorado do Programa de Pós-Graduação emDireito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Cap. 3.2.3.Colocação do conceito de governança no âmbito da administração pública.
115
resultou em condições concorrenciais
crescentemente padronizadas, que ofereceram
segurança para o aporte de investimentos de
atores econômicos privados, é dizer atores que
atendem à lógica do institucionalismo da
escolha racional , seja no financiamento dos
investimentos de longo prazo em bens de capital
– onde a regulação econômica proporcionou na
Europa condições de estabilidade -, seja, em
condições menos estáveis – como ocorre com
maior frequência nos países do Mercosul – os
financiamentos de curto prazo voltados ao
consumo, que estimulam também a circulação do
crédito. Neste particular - a regulação
econômica - ainda falta no Brassil a mediação
constitucional do papel das agências, que por
ora, como as empresas públicas e sociedades de
economia mista, são criadas ou têm suas funções
modificadas por lei, é dizer, sujeitam-se ainda
às maiorias congressuais circunstanciais
movidas por fatores políticos, econômicos e
sociais internos, dificultando assim a garantia
116
de compromissos regulatórios regionais: será
necessária mediação constitucional da função
reguladora estatal no campo dos serviços de
interesse econômico geral, como, por exemplo,
nos setores de transporte, energia e
telecomunicações, além do setor de ciência e
tecnologia, reduzindo internamente a
politização partidária e a captura das
agências, ampliando por conseqüência a
influência dos usuários em âmbito
transnacional: desnacionalização da
administração pública134 pela mediação
constitucional da regulação supranacional.
Condições regulatórias de concorrência
para a iniciativa privada repercutiram também
na atuação da administração pública dos Estados
nacionais envolvidos no acordo do CECA, de modo
que um grau crescente de isomorfismo
institucional as alcançou, seja diretamente,
134 Sobre desnacionalização da administração pública no regionalismocontemporâneo, Composição de projetos (Projektverbund) sobre adesnacionalização da administração pública (Denationalisierung deröffentliche Verwaltung), do Instituto Alemão de Pesquisas em AdministraçãoPública, de Speyer (Deutsches Forschungsinstitut für öffentliche Verwaltung– Speyer), em http://foev.dhv-speyer.de/projekte/projdbdetail.asp?ID=198.
117
pela regulação econômica – agências reguladoras
nacionais -, seja, por exemplo, nos modelos de
atuação da administração fazendária de cada um
dos Estados nacionais que, praticando sua
soberania fiscal tributária, gradativamente
fizeram convergir os critérios – p.ex. fato
gerador - e parâmetros – p.ex. base de cálculo
e alíquota – de seus institutos jurídico-
tributários, em consequência da regulação
regional135.
Numa perspectiva institucional de exame
podemos identificar na regulação regional
elementos do institucionalismo histórico , isto
é, procedimentos, protocolos das negociações
para regulação e regras de natureza oficial -
os estatutos com que passa a atuar a
administração pública -, ou mesmo regras de
natureza não oficial, é dizer, as inovações nas
formas negociais entre os atores privados, bem
como a flexibilidade com que os Estados
135 Veja-se p.ex. no Brasil a dificuldade de implementação de um tributounificado sobre o valor agregado – o conhecido IVA – implementado na Françajá em 1976 e que, no Mercosu,l até o Paraguai já implementou.
118
nacionais atuam seus instrumentos fiscais e de
políticas públicas naquele segmento de atuação
privada136.
É de notar-se que a evolução das ações
de governo e da administração pública
brasileira no regionalismo econômico se deu por
necessidade política deliberada e decidida na
Assembléia Nacional Constituinte de que
resultou a Constituição atual em 1988,
enquanto, p.ex., o modelo de decisão e
coordenação política alemão doméstico e europeu
desenvolveu-se mais pragmaticamente, a partir
das limitações políticas impostas à Alemanha
após a guerra, ainda a partir de 1945. Isso
repercute nos diferenciados estágios de
regulação econômica, já com avanço de mais de
136 Método da coordenação aberta no regionalismo econômico, ver cap.3.2.9.2. A economia política de pactos sociais e o método de coordenaçãoaberta, in BRITO, Marcos Antonio Bezerra Brito. Elementos de governança emsistemas multiníveis de administração pública: a vinculação constitucionalcontemporânea da administração fazendária na integração regional. Pesquisaapresentada como resultado do estágio de pós-doutorado por convênio entre aPontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e o Instituto Alemão dePesquisas em Administração Pública (Deutsche Forschungsinstitut füröffentliche Verwaltung – Speyer) e a Universidade Alemã de Ciências daAdministração de Speyer (Deutsche Universität für Verwaltungswissenschaften– Speyer), 2012.
119
60 anos na Europa, enquanto que a regulação
econômica no Mercosul ainda se encontra em
formação, como é de se notar no caráter
consultivo e de bases estatísticas das
instituições supranacionais do Mercosul
voltadas à atividade econômica – p.ex. o Manual
de Estatísticas do Grupo Mercado Comum (GMM).
Concorre decerto para sua construção e
aperfeiçoamento no Mercosul o Acordo-Quadro
Inter-Regional com a União Européia e seu
extenso compromisso de cooperação
institucional.
A par dos atores supranacionais e
transnacionais, que operam a lógica do
institucionalismo da escolha racional política
e econômica, vale considerarem-se os atores
públicos intranacionais, é dizer Estados,
Províncias, Departamentos, Municípios – o
federalismo em multiníveis de administração
pública, tecido por regulação constitucional,
convênios e consórcios -, e seus coadjuvantes
equivalentes agentes privados, já agora em
120
abordagem dialógica com elementos do
institucionalismo centrado nos atores sociais
(“Akteurzentrierter Institutionalismus 1 3 7”).
O federalismo brasileiro contemporâneo
da Constituição de 1988 apresenta pontos de
contato, senão com o modelo federal alemão
atual, com etapas do evolver histórico do
federalismo alemão desde o pós-guerra em sua
conformação federativa na União Européia.
Problemas recorrentes entre federação e estados
no Brasil, e entre Bund e Länder na Alemanha e na
União Européia, estão presentes, p.ex., na
recente pauta de debate do pacto federativo
brasileiro por uma comissão não-governamental
de especialistas criada pelo presidente do
Senado brasileiro – que representa os estados -
no primeiro semestre de 2012, como a revisão
137 Entre outros, SCHARPF, Fritz W. Problemlösungsfähigkeit derMehrebenenpolitik in Europa, MPI for the Study of Societies Max PlanckSociety: „präsentiert die konzeptionellen Instrumente zur Beschreibung und Analyseunterschiedlicher Typen von kolletiven und korporativen Akteuren, Akteurkonstellationen undInteraktionsformen“(„apresenta os instrumentos conceptivos para descrição eanálise de diferenciados tipos de atores coletivos e corporativos,constelações de atores e formas de interação“). Ver em Interaktionsformen:Akteurzentrierter Institutionalismus in der Politikforschung,http://pubman.mpdl.mpg.de/pubman/faces/viewItemOverviewPage.jsp?itemId=escidoc:1235052, consultado em 24/08/2015.
121
dos critérios de rateio do Fundo de
Participação dos Estados, a concorrência fiscal
entre os Estados em torno do seu imposto sobre
o valor adicionado, o ICMS, a revisão dos
critérios de correção da dívida dos estados,
além da recente contenda em torno da partilha
constitucional dos royalties do petróleo 138. A
instalação de uma tal comissão não-
governamental por um ente governamental, e que
oferece ao próprio Senado Federal propostas
para reconstrução política do pacto federativo
brasileiro, denota esta mesma tendência que
espraiou efeitos da regionalização econômica
européia no pacto federativo alemão: a da
ampliação do espaço público da colaboração para
o da construção política conjunta. Já agora faz
parte da pauta prioritária do Senado Federal,
conforme anunciado para março de 2015 (reporte
por radiodifusão na Voz do Brasil da segunda
semana de fevereiro/2015), a par da reforma
política, o pacto federativo brasileiro, ambos
138 Revista Valor Econômico, em 13/04/2012.122
pela via de propostas de emenda constitucional.
À semelhança do que ocorre no MERCOSUL -
embora ainda em escala minimalista -, com a
integração européia, e como conseqüência da
transferência de ambas competências, federal e
compartilhada, para o nível europeu, os Länder
alemães e os Estados brasileiros foram
inicialmente marginalizados nos processos de
tomada de decisões domésticas, ao mesmo tempo
em que minguavam seus direitos de co-
determinação nas tomadas de decisões federais.
A transferência de soberania do governo federal
para o foro supranacional poderia na Alemanha
como pode no Brasil, se não vigiado, reduzi-los
a meras unidades administrativas 139. Com efeito,
essa marginalização na esfera política européia
replicou internamente um padrão de exclusão da
responsabilidade pela tomada de decisões
políticas no sistema federativo da Alemanha 140.
139 Governança administrativa preponderante à governança política.140 Fonte: Disentangling Double Politikverflechtung? The implications ofthe federal reforms for Bund-Länder Relations in Europe, pages 488-508,Carolyn Moore & Annegret Eppler, consultado entre maio e julho de 2011 emhttp://dx.doi.org/10.1080/09644000802490527.
123
Deste risco de marginalização política no
processo de integração regional padecem também
os Estados brasileiros que, sem assento no
Parlasul, sua representatividade nas
deliberações regionais sulamericanas é ainda
apenas consultiva no FCCR 141. Por exemplo, em
matéria de tributação sobre o valor agregado 142,
o CONFAZ143, no qual têm assento os secretários
de fazenda dos Estados, reporta-se ao Senado
Federal144, mas não tem poder de veto na
construção da política tributária do setor no
MERCOSUL, possível motivo político do atraso
brasileiro na adesão ao IVA – imposto sobre o
valor agregado, que uma vez implantado haverá
de unificar este tipo de tributação, o qual
hoje está distribuído nas competências federal
(IPI - imposto sobre produtos141 Forum Consultivo de Municípios, Estados Federados, Províncias eDepartamentos do MERCOSUL, criado em 2004 na Cúpula de Ouro Preto.142 O ICMS, imposto sobre a circulação de mercadorias e serviços, é agrande fonte de receitas tributárias dos estados e do Distrito Federal.Argentina, Paraguai e Uruguai, diferentemente do Brasil, já implementaram atributação uniformizada pelo valor adicionado, o conhecido “IVA”, para osprodutos, mercadorias e serviços com mais expressivo peso no Produto InternoBruto.143 CONFAZ - Conselho Nacional de Política Fazendária.144 Representantes dos governos estaduais.
124
industrializados), estadual (ICMS – imposto
sobre a circulação de mercadorias, e serviços
previstos na constituição) e municipal (ISS –
imposto sobre serviços previstos em lei
complementar federal).
A experiência mais recente do
federalismo brasileiro, inaugurada em 1988,
também é contemporânea das duas décadas de
integração regional no MERCOSUL 145, e o avanço
na implementação dos acordos têm produzido
efeitos econômicos e financeiros nos entes da
federação não previstos na formulação
constitucional do pacto federativo de 1988,
p.ex. as medidas de política fiscal da União no
sentido do cumprimento de metas acordadas no
MERCOSUL, e a implementação dos mecanismos de
convergência e correção baseados no Manual de
Estatísticas do GMM146 (muito semelhantes aos da
União Européia), em cujas reuniões de145 Em novembro de 1988 - mês seguinte à promulgação da constituiçãobrasileira atual, que prevê a tarefa do Brasil de promover a integração dospaíses da América Latina - , Brasil e Argentina assinaram o Tratado deIntegração, Cooperação e Desenvolvimento, com o objetivo de futuramenteformarem um mercado comum.146 Declaração de Florianópolis, em 13/12/2000.
125
deliberação e decisão política não têm assento
os estados e os municípios brasileiros - estes
últimos constitucionalmente reconhecidos desde
1988 também como entes da federação -, somente
sendo chamados às mesas de deliberação para
convênios ou consórcios 147 na etapa de
implementação das medidas macroeconômicas já
deliberadas e decididas, gerando um ônus não
correspondido pela participação política - que
aloca recursos próprios resultantes de
deliberações e decisões próprias, transpostas147 Atualmente, no âmbito do federalismo brasileiro, a aposta governativamultinível tem emergido nos consórcios públicos - como no caso do SistemaÚnico de Saúde, do SUAS (Sistema Único de Assistência Social) e dos SistemasNacionais de Políticas Públicas - para consecução do qual harmonizaram-se asrelações federativas verticais, de modo a integrar competências, estruturaro sistema decisório, definir o financiamento e estabelecer uma divisãocompartilhada de trabalho: ‘O consórcio público é um arranjo institucionalde cooperação e coordenação federativas. Constitui-se como expressão doexercício das autonomias dos entes federados consorciados. É uma autarquiaassociativa destinada a operar competências a ela delegadas. Não possuicompetências originárias. Exerce aquelas delegadas pelos entes federadosconsorciados, seguindo uma lógica inovadora. Os municípios, os estados e aUnião, quando se consorciam, delegando competências, não renunciam a elas.Participando do conselho de administração e da assembléia geral doconsórcio, eles as supervisiona (TREVAS, Vicente Carlos y Pla. Consórciospúblicos: uma aposta estratégica do federalismo brasileiro? Revista Le MondeDiplomatique Brasil, número 6, ano 6, 2012, p. 25). E no âmbito sul-americano, a construção e operação da Itaipu Binacional é exemplo deconsórcio público entre os países do MERCOSUL, que deverá ganharregulamentação por tratados complementares ao Tratado de Constituição daUNASUL, de modo a dar institucionalidade à administração pública multinívelpara a consecução dos seus objetivos de integração e união dos países daAmérica Latina e Caribe.
126
para as leis de orçamento -, pelo que
permanecem os Estados e os Municípios
brasileiros dependentes das decisões
centralizadas no governo federal que ensejam o
aporte de recursos correspondentes do orçamento
federal. Não é de surpreender portanto que o
tema do pacto federativo, atualmente discutido
no Congresso brasileiro, seja também tema da
referida criação, pelo próprio Senado Federal,
de uma comissão não-governamental de experts em
política fiscal, sociologia, economia, ciência
política, além de juristas 148, o que sinaliza um
avanço na tendência de colaboração para a de
construção política num espaço público em que
se correspondam as responsabilidades por
implementação com a participação no processo de
deliberação e decisão das políticas públicas.
Isto se explica pelo fato de que, no
regionalismo contemporâneo os Estados cedem
prerrogativas de soberania para atenderem à
regulação emanada de um ente supraestatal no
148 Revista Valor Econômico, em 13/04/2012.127
qual estejam organizados e incorporados ser
estarem submetidos, com o compromisso de
crescente coordenação política, e portanto
entre si não têm nesse particular
predominantemente “relações internacionais” 149
entre soberanias estatais, mas motivam-se pela
participação e compromisso de implementação
política no sentido de uma união monetária,
econômica e política, compromisso este
proporcionado por mediação constitucional.
Este modelo de soberania compartilhada,
que serve ao regionalismo europeu, teve um
embrião no regime de semi-soberania da Alemanha
ocupada no após-guerra, o qual se desenvolveu
no seio do reerguimento da Europa de então, a
partir da Comunidade do Carvão e do Aço (CECA),
depois Comunidade Econômica Européia, através
da integração econômica. E atualmente, já com
um padrão monetário comum, avança para uma149 Para juízo crítico de aplicabilidade do conceito de “relaçõesinternacionais” no regionalismo contemporâneo, ver em BRITO, Marcos AntonioBezerra. Política e Direito em Sistemas Multiníveis de AdministraçãoPública, Pesquisa apresentada como resultado do estágio de pós-doutorado doPrograma de Pós-Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica doRio de Janeiro, Cap. 1, ‘Percepção e método’.
128
uniformização do controle fiscal 150 – não sem
impasses151 - através do método político da
governança em sistemas multi-níveis de
deliberação, decisão e implementação das
políticas públicas, num espaço público regional
que desenvolveu gradualmente uma rede de arenas
interligadas de negociação política, em que uma
multiplicidade de atores públicos e privados
têm assento152, com ou sem poder de veto, mas
com o compromisso e a responsabilidade comuns
na implementação das políticas públicas.
Portanto o institucionalismo da
administração pública multinível nos tratados150 O recente Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e Governação,assinado em 02 de março de 2012.151 Impasse trazido pelo recente resultado das eleições na Grécia, no mêsde janeiro deste ano de 2015, eis que o representante político vencedorelegeu-se questionando o preço que os gregos vêm suportando em termos desalário, emprego e previdência, para manterem-se na Zona do Euro, acenandocom renegociação ou descumprimento dos termos de disciplina fiscaldeliberados em Bruxelas.152 Institucionalismo centrado nos atores: ver, entre outros, SCHARPF,Fritz W. Problemlösungsfähigkeit der Mehrebenenpolitik in Europa, MPI forthe Study of Societies Max Planck Society: „präsentiert die konzeptionellenInstrumente zur Beschreibung und Analyse unterschiedlicher Typen von kolletiven und korporativenAkteuren, Akteurkonstellationen und Interaktionsformen“(„apresenta os instrumentosconceptivos para descrição e análise de diferenciados tipos de atorescoletivos e corporativos, constelações de atores e formas de interação“).Ver em Interaktionsformen: Akteurzentrierter Institutionalismus in derPolitikforschung,http://pubman.mpdl.mpg.de/pubman/faces/viewItemOverviewPage.jsp?itemId=escidoc:1235052, consultado em 24/08/2015.
129
regionais corresponde também ao grau de
mediação constitucional no sentido de sua
implementação na dimensão interna,
intranacional, o que denota que o regionalismo
contemporâneo se move tanto pela dimensão
vertical de decisões das pessoas jurídicas de
direito público internacional nos tratados,
quanto pela dimensão horizontal de participação
de outros órgãos e entes públicos e privados,
bem como pela dimensão interna, procedimental,
de sua legitimidade democrática na deliberação,
decisão e implementação das políticas públicas,
que pode ser aferida cotejando-se as leis
gerais de procedimento administrativo
nacionais, já há muito em voga em países da
União Européia, como no exemplo da Alemanha, e
que entretanto no Brasil ainda não desempenham
seriamente seu papel legitimador das decisões
institucionais no espaço público nacional e do
Mercosul por não terem ainda sido
sistematizadas em lei geral de procedimento
130
administrativo153.
153 Lei de Procedimento Administrativo alemã, Verwaltungsverfahrengesetz,de 25/05/1976, disponível emhttp://www.gesetze-im-internet.de/bundesrecht/vwvfg/gesamt.pdf.
131
Capítulo 3: Exame comparativo institucional de atuação da
administração fazendária brasileira e alemã no
regionalismo econômico contemporâneo, no âmbito
do Acordo Quadro-Regional de Cooperação da
União Européia com o Mercosul 154.
L. A administração fazendária na microfísica
institucional de atuação dos tratados do Mercosul
e da União Européia: Brasil e Alemanha
Passamos já agora ao exame da atuação
institucional no regionalismo contemporâneo, de
modo a identificar, nos eventos e
procedimentos155 consolidados, em curso ou em
154 A partir do Acordo-Quadro de Cooperação Inter-Regional entre aComunidade Européia e seus Estados-Membros e o Mercosul e seus Estados-Partes, de 1999, disponível em http://dai-mre.serpro.gov.br/atos-internacionais/multilaterais/acordo-quadro-inter-regional-de-cooperacao-entre-a-comunidade-europeia-e-os-seus-estados-membros-e-o-mercosul-e-os-seus-estados-partes/.155 A par da ética procedimental proposta por Habermas (HABERMAS. Jürgen.Direito e democracia entre facticidade e validade. RJ, Ed. Tempo brasileiro,1997, vol. II; e A inclusão do outro. SP, Edições Loyola, 2002;) e dainterpretação procedimental da constituição proposta por Häberle (Häberle,Peter. Hermenêutica constitucional – a sociedade aberta dos intérpretes daconstituição: contribuição para a interpretação pluralista e “procedimental”da constituição. P. Alegre, S.A. Fabris, 1997;), a proposta de legitimação
132
perspectiva de implementação, suas tendências
de regularidade e pertinência ao espaço público
regional, que denotem a presença da
administração pública subnacional, nacional e
supranacional, em especial a administração
fazendária. A seguir empreendemos uma
comparação da atuação administrativa fazendária
brasileira e alemã no regionalismo econômico do
Acordo-Quadro Inter-Regional de Cooperação da
União Européia com o Mercosul.
Especificada uma percepção de espaço
público regional tecida no espaço público
nacional de constitucionalização dos tratados
regionais e no espaço público internacional
geopolítico das relações internacionais (cap.
1) e o sentido da atuação institucional neste
espaço público (cap. 2), procuramos delimitar o
campo de investigação na atuação da
administração pública naquilo que tem
procedimental de Luhmann (LUHMANN, Niklas. Legitimação pelo procedimento,DF, Universidade de Brasília, 1980). Uma perspectiva comparativa entreHabermas e Luhmann sobre legitimação pelo procedimento, ver em BRITO, MarcosAntonio Bezerra. Apontamentos sobre métodos de trabalho em direitoconstitucional tributário. RJ, PUC-Rio, 2005, dissertação de mestrado, cap2.
133
pertinência à necessidade política de
integração regional constitucionalizada, é
dizer partindo portanto dos tratados, da
Constituição, da legislação e sua
regulamentação, examinando os atos de que toma
parte a administração pública, e
especificamente a administração fazendária no
regionalismo econômico contemporâneo 156,
procedendo cotejo da atuação da administração
fazendária alemã no curso da regionalização na
União Européia (que já conta com mais de 60
anos, desde a Comunidade Européia do Carvão e
do Aço), com a atuação da administração
fazendária brasileira no âmbito da
regionalização econômica do Mercosul, da
Unasul, e do Acordo-Quadro Inter-Regional de
Cooperação entre a União Européia e o Mercosul.
156 Sobre a proeminência dos ministérios das finanças no regionalismocontemporâneo, ver BRITO, Marcos Antonio Bezerra. Elementos de governança emsistemas multiníveis de administração pública: A vinculação constitucionalcontemporânea da administração fazendária na integração regional. Pesquisaapresentada como resultado do estágio de pós-doutorado do Programa de Pós-Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro,em convênio com o Instituto Alemão de Pesquisas em Administração Pública deSpeyer, e a Universidade Alemã de Ciências da Administração de Speyer. RJ,PUC-Rio, 2012.
134
O protagonismo da administração pública –
e especificamente da administração fazendária 157
- na dinâmica do regionalismo econômico
contemporâneo é coadjuvado por uma convergência
de atuação temática – objetivos consensuais e
eventos158 - que também inclui entes privados 159,
convergência esta que deixa gradativamente de
157 Sobre o protagonismo dos ministérios das finanças – administraçãofazendária – no regionalismo contemporâneo, ver BRITO, Marcos AntonioBezerra. Elementos de governança em sistemas multiníveis de administraçãopública: A vinculação constitucional contemporânea da administraçãofazendária na integração regional. Pesquisa apresentada como resultado doestágio de pós-doutorado do Programa de Pós-Graduação em Direito daPontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, em convênio com oInstituto Alemão de Pesquisas em Administração Pública de Speyer, e aUniversidade Alemã de Ciências da Administração de Speyer. RJ, PUC-Rio,2012.158 Objetivos consensuais, p.ex. os recentes acordos Brasil-Alemanha –neste mês de agosto de 2015, por ocasião da visita ao Brasil da ChancelerAngela Merkel - nas áreas de saneamento, gestão de resíduos e mobilidadeurbana, com aporte de recursos alemães para pesquisa, uma via institucionalde influenciar políticas públicas duradouras, e que não depende de maioriascongressuais circunstanciais. Em www.amupe.org, 27/08/2015. Eventos: p. ex.a coordenação para grandes eventos mobilizada atualmente pela AdministraçãoFazendária Federal, a Receita Federal, com vistas às Olimpíadas de 2016 nacidade do Rio de Janeiro.159 A Instrução Normativa RFB n. 1521/2014, que institui o ProgramaBrasileiro de Operador Econômico Autorizado, visa intensificar aharmonização dos processos de trabalho com outros órgãos regulatórios docomércio exterior, e seu Fórum Consultivo OEA - que tem como objetivo deconstituir canal permanente de comunicação entre a RFB e os operadorescertificados no âmbito do Programa Brasileiro de OEA, além do aprimoramentotécnico e normativo do Programa Brasileiro de OEA - não constitui órgãointegrante da administração direta ou indireta da União, possuindo funçõesconsultiva e propositiva. Emhttp://norma.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?visao=anotado&idato=59000.
135
ser fortuita das diretrizes apenas de cada
governo nacional, se e quando passa a ser
acordada regionalmente e mediada
constitucionalmente para ser implementada
internamente, desde as trocas de informações e
comunicação padronizadas entre entes públicos e
privados em termos de procedimentos,
procedimentalizando-se daí seus elementos de
juízo decisório político e jurídico, bem como
de prestação de contas (accountability). E tem
sido esta a via por excelência de implementação
do regionalismo econômico, eis que os tratados
regionais aportam objetivos comuns regulatórios
nas constituições dos Estados-nação (que no
contexto do regionalismo econômico passam de
Estados-Partes contratantes para Estados-
Membros compromissados por núcleos de
consenso), que precisam ser implementados em
conjunto, e para tanto se presta a harmonização
legislativa/jurisprudencial em cada país
segundo uma interpretação conforme sua própria
constituição, mas igualmente a
136
procedimentalização da atuação da administração
pública no sentido, p.ex. de uma parametrização
fiscal já conhecida porque regulada nos
tratados e constitucionalmente mediada: fixados
pelos Estados nacionais os compromissos quanto
aos objetivos e meios pelos órgãos regionais de
cúpula – dentre eles a administração, o
executivo regional -, a administração pública
de cada Estado nacional passa a atuar segundo
as disposições dos tratados regionais
constitucionalizadas, no exercício de sua
potestade pública regulamentar (poder
regulamentar)160, e como o motor do regionalismo
contemporâneo é eminentemente econômico, emerge
em consequência o protagonismo de atuação da
administração fazendária, no Brasil o
Ministério da Fazenda.
O avanço do regionalismo na Europa - e no
mundo - expressa-se pela gradativa substituição
160 Ver p.ex. A IN RFB 1.526, de 15/12/2014, que dispões sobre a obrigação de prestar informações relativas às transações entre residentes oudomiciliados no Brasil e residentes e domiciliados no exterior que compreendam serviços, intangíveis e outras operações que produzam variações no patrimônio das pessoas físicas, jurídicas ou dos entes despersonalizados.
137
da lei pela Constituição, pelo Direito
Comunitário e pelo Direito Internacional, com a
garantia constitucional de espaços de autonomia
administrativa e limitação do legislador 161. É
dizer que no avanço do regionalismo econômico
reconhece-se constitucionalmente - tanto pelos
compromissos internacionais quanto pelas
limitações - a atuação do poder regulamentar da
Administração162. E isto também por conta do
alcance transterritorial das medidas de ajuste
fiscal, que afetam os demais países do bloco
econômico regional, como, p.ex. as que
recentemente no Brasil incluíram o reajuste na
tributação sobre operações financeiras,
anunciadas em janeiro último (2015) em conjunto
pelo Ministro da Fazenda e pelo Secretário da
Receita Federal do Brasil, e que afetam também
os negócios entre empreendedores do Mercosul,
161 Ver OTERO, Paulo. Legalidade e Administração Pública: O sentido daVinculação Administrativa à Juridicidade. Coimbra, ed. Almedina, 2003, p.p.733 a 754.162 Por exemplo, a IN RFB 1.560, de 22/04/2015, que dispõe sobre oconceito de padrões internacionais de transparência fiscal, referente àclassificação de país ou dependência com tributação favorecida ou regimefiscal privilegiado.
138
conquanto os direitos aduaneiros venham sendo
gradativamente reduzidos intra-bloco 163.
É um fato não negligenciável a tendência
de gradativa autonomia da administração
fazendária, por se apresentar territorialmente
desconcentrada em serviços centrais e regionais
nacionais, e para assumir no regionalismo
econômico contemporâneo peculiaridades
interativas com as demais administrações
fazendárias nacionais (através, p.ex. das
Adidâncias Aduaneiras e Tributárias), bem como
com uma administração financeira ou fazendária
regional, embrionária ou estabelecida e com
funções definidas. Um exemplo disso é o
Regulamento Aduaneiro do Brasil, que já inclui
regramento incorporado pelo Mercosul, mesmo
enquanto o Código Aduaneiro do Mercosul não
esteja ainda em pleno vigor regional, o que
denota que a Aduana Brasileira, à semelhança da
163 Veja-se também sobre a irradiação de efeitos distintos intra e extraMercosul, a IN RFB 1.555, de 17/03/2015, dispõe sobre os preços a serempraticados nas operações de compra e de venda de bens, serviços ou direitosefetuadas por pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no Brasil,com pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no exterior,consideradas vinculadas.
139
Alemã e da Portuguesa164, p.ex., já atua hoje
regrando e protegendo tanto as fronteiras
nacionais quanto as fronteiras regionais do
Mercosul que lhe competem165.
A Alemanha e o Brasil são a 4ª. e a 7ª.
economia do mundo. As maiores, respectivamente,
da Europa e da América do Sul. 166
A Administração Fazendária Brasileira
como a Alemã têm em comum um marco histórico
datado do final da década de 80: a Queda do
Muro de Berlim em 1989 e a Constituição do
Brasil de 1988, que inauguraram nova
periodização no federalismo fiscal brasileiro e
alemão. Exemplo disso é a atualidade do debate
acerca do federalismo fiscal na Alemanha e no
Brasil, de que podemos desdobrar pontos de
164 Autoridade Tributária e Aduaneira – anuário 2013 – Portugal – pág. 6:“No domínio da gestão da fronteirq externa nacional e da União Européia e do controlo da cadeialogística internacional, realça-se a série de projetos estruturantes que têm vindo a ser desenvolvidosna área aduaneira, nomeadamente o STADA importação, o Simplex Exportação ou o Sistema dasDeclarações Sumárias na via aérea”.165 A distinção entre fronteira externa e zonas de livre comérciodisciplina a IN RFB 24, de 05/03/2001, que dispõe sobre a disciplina dasaída de mercadorias da ZFManaus e das Áreas de Livre Comércio.166 Declaração presidencial por ocasião da visita da Chanceler daAlemanha ao Brasil, em 20/08/2015, em http://www.itamaraty.gov.br/index.php?searchword=acordos%20MErcosul%20uniao%20europeia&searchphrase=all&Itemid=441&option=com_search&lang=pt-BR.
140
contato em sua inserção no regionalismo do
Mercosul e da União Européia.
M. Administração fazendária, federalismo fiscal
e regionalismo econômico no Brasil e na
Alemanha
Com a Queda do Muro de Berlim, foi
reincorporado à República Federativa Alemã
(RFA) o território da até então República
Democrática Alemã (RDA), território este
dividido em Estados (Länder) e Municípios
(Kommunen), sob a mesma Lei Fundamental, que
vem sendo emendada tanto para acolher desde
1990 os novos entes federativos quanto para
inserir-se na Comunidade Econômica Européia,
hoje União Européia. Ainda recentemente alguns
temas de federalismo fiscal prementes no Brasil
estão em debate e deliberação na Alemanha 167:
1. Quanto a uma unificação entre os
Estados e a Federação em termos de tributação,167 Revista “Bund + Land Journal ver.di” edição 2/2014 – Jornal Federal +Estadual, em tradução livre.
141
os interesses ainda são distintos. Na Alemanha
os Estados financiadores (em sua maioria da
antiga RFA) lutam para frear a tendência de
equivalência financeira entre os Estados e o
consequente crescimento de sua carga de custeio
em favor dos Estados do Leste. E embora não
haja uma margem definida dessas diferenças, os
Estados do Leste (antiga RDA) não têm, mesmo
após 25 anos da reunificação, perspectivas
paupáveis de alcançar o poder fiscal dos
Estados do Oeste.
No Brasil, a partir de 1988, inaugurou-
se novo federalismo fiscal, que busca em sua
missão constitucional reduzir as desigualdades
e equilibrar o crescimento econômico das
regiões do país. Os Estados do Norte e do
Nordeste - à semelhança dos “Länder” alemães
do Leste - ressentem-se cá no Brasil da
desproporção de investimentos para o
desenvolvimento de suas potencialidades
econômicas, em relação aos Estados do Sudeste e
do Sul, em que pese – à semelhança da Lei
142
Fundamental Alemã – a Constituição do Brasil
ter fixado algumas diretrizes no sentido de
incentivar com subsídios ou benefícios às
regiões da federação menos desenvolvidas
economicamente.
2. A perspectiva de uma unificação em
termos de tributação na Alemanha poderá ser
delineada num quadro de consenso mínimo que não
venha a ser modificado (um consenso mínimo é a
base dos acordos-quadro institucionais comuns
no regionalismo contemporâneo). Se entretanto
no curso desse esforço comum no sentido do
consenso mínimo, circunstâncias conjunturais
exigirem que os grupos de trabalho da Federação
(Bund) e dos Estados (Länder) eventualmente
apresentem resultados aquém do compromisso
consensual mínimo, os líderes partidários
poderão, através das negociações de coalizão,
encontrar soluções até o final do período da
Legislatura. Notemos que os Länder alemães têm
representação em assuntos de União Européia. Um
tal consenso mínimo não pode ser fixado
143
constitucionalmente, deve resultar das
negociações de custeio e investimento de médio
e longo prazos, que na Alemanha seguem diretriz
constitucional e podem ser deliberadas e
decididas pelas administrações fazendárias dos
Länder, e no Brasil depende, entre outras
manifestações das administrações fazendárias,
do Ministério da Fazenda, da Receita Federal do
Brasil e do COAF. O pacto federativo
constitucional brasileiro de 1988 tem resultado
em dificuldades e impasses quanto a custeio e
investimento, tanto no âmbito do Mercosul
quanto internamente. Por exemplo, em razão da
catástrofe natural havida recentemente (janeiro
de 2015) na capital do Estado do Acre, Rio
Branco, os cidadãos e as corporações em sua
maioria perderam seus bens e/ou
empreendimentos, sem que o Governo do Acre
pudesse, por exemplo, conceder por lei isenção
ou remissão do imposto sobre a circulação
(ICMS) para facilitar o acesso aos víveres e
aos insumos necessários ao reerguimento daquela
144
capital: neste caso, somente foi possível o
aporte emergencial de recursos federais, por
conta da formatação do pacto federativo fiscal,
o mesmo pacto que resulta no fato de que até
mesmo o Paraguai já tenha instituído o IVA –
Imposto sobre o Valor Agregado (que na França
existe desde a década de 70 do século passado e
é condição de adequação fiscal tributária em
âmbito regional) -, enquanto cá entre nós
brasileiros o pacto federativo em torno do ICMS
tenha posicionado os Estados como quase
inimigos entre si e dos países do Mercosul do
ponto de vista fiscal tributário, conquanto
nossa Constituição aponte para o regionalismo
econômico há mais de 25 anos, e já antes dela o
país procurasse tal caminho, com o acordo
celebrado em 1986 entre Argentina (Raul
Alfonsin) e Brasil (José Sarney).
Na Alemanha como no Brasil, onde não
houver consenso mínimo para a manifestação do
poder regulamentar e as circunstâncias assim o
exijam, a Legislatura dá soluções ou, em útimo
145
caso, também na persistente falta de consenso,
judicializa-se a decisão política
conservadoramente, sem negociação, porque
frustrada entre as administrações fazendárias e
entre as lideranças partidárias.
Exceto pela representação estadual (dos
Länder alemães) em assuntos de âmbito regional
europeu, podemos verificar as semelhanças entre
os sistemas federativos fiscais correntes na
Alemanha e no Brasil, no qual a
representatividade é equânime dos Estados no
Senado Federal, e guarda proporcionalidade
populacional na representatividade na Câmara
dos Deputados, em que pesem as grandes
disparidades entre a riqueza econômica do
Sudeste e do Sul, com as demais regiões do
país, que ressentem-se, à semelhança dos Länder
alemães do Leste, de custeio social e
investimento em seu potencial econômico.
Recentemente na Alemanha tem ganho espaço nas
deliberações por equalização fiscal entre
governos Federal (Bund) e Estaduais (Länder) a
146
integração, no Imposto de Renda
(Einkommensteuer), de uma “sobretaxa de
solidariedade”, além do já existente proveito
do imposto de renda retido pelos Estados
(Länder) dos servidores públicos em seu
território168, o que se assemelha ao proveito
dos Estados e Municípios brasileiros dos
valores retidos de Imposto de Renda de seus
servidores. A solidariedade social, que na
Alemanha repercute em cotas adicionais de
imposto sobre a renda, no Brasil entretanto
constitui o tripé da seguridade social (saúde,
assistência e previdência social), custeado no
âmbito federal pelas contribuições sociais
colhidas de trabalhadores e corporações.
Como no Brasil, a administração
fazendária alemã é responsável, como parte da
administração pública, pelos procedimentos
administrativos de tributação, e tem a tarefa
168 Bund und Länder Journal ver.di 2/2014, p. 3, acesso web 20/03/2015 emfile:///C:/Users/Artur/Downloads/BuL_Journal_2014-02_V17b.pdf.
147
de recolher de maneira uniforme os tributos do
sistema de leis tributárias 169.
Na Alemanha como no Brasil a
administração fazendária divide-se e opera em
um sistema multi-níveis federal, estadual e
comunal/municipal e, no Brasil, desde 1988, os
Municípios são reconhecidos como entes da
federação, embora não tenham Constituição, mas
Lei Orgânica, nem Poder Judiciário. Com a
regionalização econômica já há mais de seis
décadas em curso na Europa, as cidades
européias – comunas, é dizer municipalidades –
passaram a se fazer representar na Comunidade e
hoje na União Européia, através de associações,
como a Associação das Cidades do Arco
Atlântico.
Já do ponto de vista financeiro, nos
Länder alemães, p.ex. em diversas lojas locais
nas Kommunen (comunas, municípios) da
Rheinland-Pfalz (Renânia-Palatinado), as
169 Zusammenfassung, in Steuerverwaltung in Deutschland,Bundesministerium der Finanzen (Tradução livre: Sumário. AdministraçãoTributária na Alemanha, Ministério Federal de Finanças).
148
compras são pagas em espécie ou com o cartão de
crédito/débito ou cheque do “Land” Renânia-
Palatinado, e com isso a circulação da riqueza
produz seus efeitos nos limites da própria
Rheinland-Pfalz, e não fora dela. No Brasil,
desde a desconstitucionalização do sistema
financeiro nacional (Emenda Constitucional n.
40/2003) e a extinção dos bancos estaduais de
fomento, foram afastadas as já frágeis
restrições territoriais à volatilidade de
aporte e fuga dos capitais financeiros, que
mesmo hoje permanecem fora do alcance da
recente regulamentação de convergência às
normas internacionais de contabilidade para
transparência na prestação de contas aos
credores, acionistas e ao Fisco (desde a Lei
11.638/07 até a recente Lei 12.973/14), normas
de transparência que o próprio Banco Central do
Brasil está obrigado a atender. É dizer que a
supressão das diferenciações do Sistema
Financeiro Nacional pela Emenda Constitucional
n.40, que remeteu a matéria para lei
149
complementar, fragilizou a função estatal
reguladora/diretiva da geração e circulação do
crédito no país pois, retirando-lhe a mediação
constitucional, deixa-a ao sabor de maiorias
parlamentares circunstanciais: mais legislação
e judicialização em lugar de regulação
financeira constitucional.
O curso da convergência contábil às
normas internacionais iniciado no Brasil em
2007 inclui-se nas medidas de uniformização
abrangidas pelo Acordo-Quadro Inter-Regional de
Cooperação entre União Européia e Mercosul 170.
Com a entrada em vigor do Regulamento IAS, em 1
de Janeiro 2005, a Comunidade Européia mudou
dramaticamente a forma legal européia de
prestação de contas por demonstrativos170 As normas IASB (International Accounting Standards Board) européias,da qual sucedem as normas IFRS adotadas nos 5 continentes e no Brasil paraas demonstrações financeiras das corporações, é outro que o padrão norte-americano FASB (Financial Accounting Standards Board), e inclui-se no núcleode consenso e compromisso previsto no Acordo-Quadro entre UE e Mercosul,para o que a contabilidade fiscal passou a ser disciplinada pelaadministração fazendária – no âmbito de seu poder regulamentar na IN RFB1515/2014 – de modo a adimplir, no âmbito de sua atuação, ao compromissobrasileiro no regionalismo. É portanto posicionamento brasileiro noregionalismo econômico contemporâneo. Sobre IFRS adotado no Brasil, IASBeuropeu e o FASB dos EUA, ver, entre outras fontes, emHTTP://dvl.ccn.ufsc.br/congresso/arquivos_artigos/artigos/227/20080805123016.pdf, da Universidade Federal de Santa Catarina.
150
contábeis. O primeiro conjunto abrangido
constituiu-se de todas as empresas cotadas em
bolsa dos relatórios na União Européia, que
devem prestar contas em conformidade com as
regras uniformes (IAS / IFRS) que entraram em
vigor, as quais são de um corpo de
contabilidade privada (IASB) e foram elaboradas
pela Comissão Européia. Muito além da Europa, o
IAS / IFRS tem sido um "padrão mundial" cada
vez mais aceito 171. Do ponto de vista da
administração fazendária federal brasileira, o
fato de a forma de prestação contábil dos
agentes financeiros ao Banco Central manter-se
ainda no Brasil sem adequação ao padrão
internacional já adotado pela lei brasileira –
enquanto o próprio Banco Central já presta
171 Internacionalização da contabilidade, em tradução livre de “Internationalisierung der Rechnungslegung”: Mit dem Inkrafttreten der IAS-Verordnung der Europäischen Gemeinschaft zum 1. Januar 2005 hat sich dieGestalt des Europäischen Bilanzrechts dramatisch geändert. Erstmals müssensämtliche börsennotierten Konzerne in der Europäischen Union nacheinheitlichen Regeln (den IAS/IFRS) bilanzieren, die von einem privatenRechnungslegungsgremium (IASB) erarbeitet und von der EuropäischenKommission in Kraft gesetzt werden. Weit über Europa hinaus werden dieIAS/IFRS als „Weltstandard“ zunehmend akzeptiert.“Disponível emh ttp://www.tax.mpg.de/de/pub/unternehmens_und_steuerrecht/forschungsschwerpu nkte/internationalisierung_rechnung.cfm.
151
contas segundo os padrões internacionais –
prejudica a necessária transparência analítica
para credores e investidores, e dificulta a
atuação fazendária na verificação de seus
efeitos tributários. É dizer que os agentes
financeiros atuantes no Brasil ainda não estão
obrigados aos procedimentos contábeis que façam
interface com os procedimentos de auditoria
fiscal da administração fazendária segundo as
normas internacionais de transparência
contábil, consenso e compromisso de
convergência constante do Acordo-Quadro Inter-
Regional de Cooperação entre a União Européia e
o Mercosul, e que vem sendo implementado no
Brasil desde a Lei 11.638/07 até a recente Lei
12.973/14, regulamentada, entre outras, pela
Instrução Normativa da Receita Federal do
Brasil n. 1515/14. No âmbito financeiro houve
retrocesso regulatório por supressão da
mediação constitucional, pois a matéria foi
remetida integralmente para o âmbito
legislativo que, como sabemos, no Brasil,
152
sujeita-se ao sabor das maiorias congressuais
circunstanciais, acostumadas a atender, no
máximo, ao ciclo político-partidário
governamental de quatro anos, quando não ao
ciclo financeiro anual dos agentes financeiros
influentes no Congresso Nacional.
Enquanto a administração fazendária
federal alemã é responsável por gerir a maior
parte dos impostos federais estatutários, os
Estados alemães (Länder) gerenciam seus
impostos por direito próprio ou em nome do
governo federal172. No Brasil, mais
recentemente, o SIMPLES e o SUPERSIMPLES
trouxeram para a esfera federal, por meio de
leis e convênios entre os entes federados, a
administração e cobrança dos tributos federais,
estaduais e municipais dos empreendedores
optantes por tais regimes simplificados de
tributação, permanecendo o destino da
172 Zusammenfassung, in Steuerverwaltung in Deutschland,Bundesministerium der Finanzen (Tradução livre: Sumário. AdministraçãoTributária na Alemanha, Ministério Federal de Finanças).
153
arrecadação de cada tributo para o ente
constitucionalmente competente.
N. Tarefas e Dívidas da Administração dos
Municípios (Kommunen)
Na Alemanha, uma solução global da
dívida pública interna que considere a situação
financeira dos Municípios (Kommunen) não parece
alcançar atualmente consenso nos grupos de
trabalho intergovernamentais de equalização
fiscal. Também na distribuição vertical dos
fluxos financeiros, não há posição comum entre
os governos federal e os governos estaduais,
pois embora as comunas – os Municípios – devam
ser desonerados de custos sociais, ainda estão
em discussão as vias e medidas para alcançar
tal objetivo173. Enquanto não desoneradas as
Comunas (Kommunen, Municípios) dos custos
173 Bund und Länder Journal ver.di 2/2014, p. 3, acesso web 20/03/2015 emfile:///C:/Users/Artur/Downloads/BuL_Journal_2014-02_V17b.pdf. Os cidadãosassalariados e/ou proprietários de bens ou empreendimentos que não têmmobilidade geográfica têm sido onerados pelas crescentes demandas de custeiodos serviços públicos localmente oferecidos.
154
sociais – pois são a administração pública mais
próxima das cidadãs e dos cidadãos -, e com a
volatilidade dos maiores capitais, que não se
fixam mas aproveitam os serviços públicos
disponíveis, e ainda pelo fato de que os locais
(os residentes) terminam por arcar com o ônus
tributário da manutenção dos serviços públicos
ao nível local, é de se esperar uma tendência
deficitária nas Comunas (Municípios, Kommunen)
sem pujança econômica, motivo da desoneração
dos custos sociais em curso de implementação.
No Brasil não parece haver ainda uma
agenda mínima de consenso e compromisso entre
as fazendas federal, estaduais e municipais, em
relação a uma equalização fiscal, pois embora
um exercício simples de hermenêutica
constitucional dos dispositivos voltados à
administração fazendária deixe claro uma tal
possibilidade a partir de seu poder
regulamentar, a invocação do pacto federativo
comparece quase que apenas nos fori em que a
discussão central se dá acerca de alocação de
155
recursos escassos dos orçamentos ferrenhamente
disputados, afastando das pautas uma agenda
mínima de consenso para um acordo-quadro de
compromisso fiscal entre os entes federados
brasileiros restando, majoritariamente ou quase
que exclusivamente, semelhantemente à Alemanha
(embora lá minoritariamente), a fixação das
metas fiscais e o controle de seu cumprimento
para decisão em negociações de coalizões
partidárias, quando não resultam mesmo em
impugnação pelos Tribunais de Contas dos
Estados ou da União, ou mesmo de
inconstitucionalidade, perante o Supremo
Tribunal Federal174.
O Estado pode lançar mão de
oportunidades inexploradas para aumentar a
174 PROTOCOLO ICMS 21, DE 1º DE ABRIL DE 2011: Consignado pelos Estadosde Acre, Alagoas, Amapá, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, MatoGrosso, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Roraima,Rondônia e Sergipe e pelo Distrito Federal,foi impugnado deinconstitucionalidade e julgado inconstitucional pelo Supremo TribunalFederal (STF). É portanto inconstitucional a cobrança de ICMS pelo Estado dedestino, com fundamento no Protocolo ICMS 21/2011 do Conselho Nacional dePolítica Fazendária - Confaz, nas operações interestaduais de venda demercadoria a consumidor final realizadas de forma não presencial. ADI4628/DF, rel. Min. Luiz Fux, 17.9.2014. (ADI-4628). ADI 4713/DF, rel. Min.Luiz Fux, 17.9.2014. (ADI-4713). RE 680089/SE, rel. Min. Gilmar Mendes,17.9.2014. (RE-680089).
156
arrecadação de receitas quando melhorias na
execução fiscal são urgentemente necessárias.
Alguns estados alemães, que operam com uma
execução fiscal frouxa, recentemente têm
apresentado no acesso aos seus serviços
informatizados muitas vezes “sítio em
manutenção”, quanto aos resultados da exigência
federal de execução uniforme do orçamento 175. No
Brasil deste ano de 2015, a desaceleração
econômica, associada ao instável ambiente
fiscal nos três níveis de governo (União,
Estados e Municípios), e o agravado
comprometimento já antecipado com os “Restos a
Pagar” sem perspectiva de solvência divisável,
têm levado Estados e Municípios – que têm
dependência do repasse de verbas federais para
cobrir custos sociais correntes - a lançarem
mão também de uma corrida otimizadora de
arrecadação de tributos estaduais e municipais
cujos fatos geradores iniciam com o ano fiscal
(IPVA – Imposto sobre a Propriedade de Veículos175 Bund und Länder Journal ver.di 2/2014, p. 3, acesso web 20/03/2015 emfile:///C:/Users/Artur/Downloads/BuL_Journal_2014-02_V17b.pdf.
157
Automotores e IPTU – Imposto sobre a
Propriedade Territorial Urbana). Do ponto de
vista de prestação de contas fiscal, conquanto
o orçamento da União, dos Estados e dos
Municípios deva ser público, pouca ou nenhuma
divulgação - senão mesmo omissão – pode ser
constatada em relação às leis de orçamento e
especialmente em relação à sua execução no ano
fiscal. Sem foro de consenso para equalização
fiscal entre União, Estados e Municípios,
acorrem periodicamente os Prefeitos a Brasília
em “romarias” para fazer ouvir e atender as
premências de renegociação de dívidas
municipais com a União, alargamento da sua
margem de endividamento externo garantida pela
União, e de repasses das receitas tributárias
constitucionalmente destinadas aos municípios,
estes porém sujeitos a condicionamento de
quitação de suas respectivas dívidas com o ente
repassador: em vez de consenso mínimo para
compromissos fiscais politicamente conveniados,
é reincidente apenas o modelo de um balcão de
158
negócios entre credores e devedores, porque a
disputa de verbas se antepõe a qualquer
consenso ou compromisso que lhe deveria
preceder em foro adequado. A reduzida de
transparência agudiza os problemas de escassez
de recursos para manutenção dos serviços
públicos e custos sociais, pois ao aparelho
administrativo - voltado então para disputa e
gestão de recursos próprios escassos – reduz o
seu emprego em ações coordenadas de
investimento econômico e distribuição de bem-
estar social, agudizado que é pela escassez de
transparência que no Brasil pode e precisa ser
reduzida - para além do critério da Lei de
Responsabilidade Fiscal – por uma lei geral de
procedimentos administrativos, com que já conta
há mais de 40 anos a Alemanha 176. Uma lei geral
de procedimento administrativo significa a
possibilidade de acompanhamento do itinerário
de condução do juízo decisório da
176 Verwaltungsverfahrensgesetz, Lei alemã do procedimentoadministrativo, de 25/05/1976; emhttp://www.gesetze-im-internet.de/bundesrecht/vwvfg/gesamt.pdf.
159
administração, e não apenas a possibilidade de
impugnação administrativa ou judicial de seu
resultado, do gasto já efetuado.
É dizer que a microfísica institucional
movente da dinâmica de consensos e compromissos
federativos escasseia quando se adentra em
temas que dizem respeito ao ingresso e
dispêndio de recursos, e substituem-se os
procedimentos de cumprimento dos compromissos
resultantes de consensos mínimos – que não são
alcançados – por processos de dialetização de
interesses contrapostos de receitas e despesas.
Nisso, como vimos, há muita semelhança quanto à
relação entre os estados brasileiros e entre
estes e União, e as relações entre os Länder do
Leste e os do Oeste Alemão e destes com a
Federação (Bund).
O. Algumas conclusões tópicas
Os denominados acordos-quadro
interinstitucionais constituem o instrumento
160
político-jurídico, e a regulamentação de sua
implementação em procedimentos administrativos
- que é seu instrumento jurídico-político
correspondente - caracterizam e fundamentam, do
ponto de vista da administração pública,
propósitos integrativos de entes políticos
autônomos e/ou independentes.
Concludentemente pode-se avaliar que,
num Estado nacional, ou ao menos no âmbito do
Mercosul e da União Européia, onde se
identifiquem desdobramentos procedimentais
decorrentes do poder constitucional
regulamentar da administração fazendária a
partir dos tratados regionais
constitucionalizados, com177 ou sem178 mediação
legislativa, identificaremos a dinâmica
microfísica institucional de avanço do177 P.ex. a já citada IN n. 1.515/2014, que regulamenta a Lei n. 12.973,de 13 de maio de 2014, dispondo sobre a determinação e o pagamento doimposto sobre a renda e da contribuição social sobre o lucro líquido daspessoas jurídicas, disciplina o tratamento tributário da Contribuição para oPIS/PASEP e da Cofins, adequando o regime de tributação brasileiro ao padrãointernacional de transparência das demonstrações financeiras dascorporações.178 P. ex. A IN RFB n. 1.059, de 02/08/2010 que - em vista da Decisão doConselho do Mercado Comum do Mercosul n. 53, de 15/12/2008 – dispõe sobre osprocedimentos de controle aduaneiro e o tratamento tributário aplicável aosbens do viajante.
161
regionalismo contemporâneo acordado por
consensos e compromissos político-jurídicos. E
diversamente, onde se identifique ampliação do
processamento legislativo ou judicial de
questões afetas aos tratados regionais, aí se
identificará o limite do diálogo político-
jurídico de consensos e compromissos e/ou sua
substituição pela dialetização política ou
jurídica de impasses entre interesses
contrapostos, suspendendo-se a dinâmica
dialógica dos tratados para antepôr-lhe a
estática dialética interna dos interesses e dos
catálogos de competências.
P. A Alfândega no regionalismo econômico
contemporâneo: atualização das atribuições
internas e internacionais
Desde o início de 2014 a alfândega alemã
(Zollamt) tem gradualmente assumido a
administração e cobrança do imposto sobre os
automóveis (Kraftfahrzeugsteuer, abreviadamente
162
KraftSt), atribuições que eram até recentemente
tomadas como responsabilidade dos Estados 179.
Esta transferência da administração e cobrança
dos estados para a esfera federal unifica-as em
território alemão, além de consolidar
informações sobre veículos e seus proprietários
com vistas ao intercâmbio de informações com as
administrações fazendárias dos demais países do
bloco, preservando-se nos Estados a aplicação
dos recursos desta exação tributária derivada.
No Brasil uma tal medida de federalização da
administração e cobrança do IPVA (Imposto sobre
a Propriedade de Veículos Automotores) também
seria de grande valia para adequar a
administração fazendária brasileira a um padrão
regional – no Mercosul – e inter-regional
(Mercosul e União Européia) de uniformização de
troca de informações sobre veículos, origem e
destino dos recursos empregados em sua
aquisição/alienação, e seus proprietários. É
uma iniciativa institucional possível mediante179 Zoll: Schutz für die Schützerinnen und Schützer, in Bund und LänderJournal ver.di, 2/2014, p. 22.
163
convênio180, que não ofende o pacto federativo
fiscal brasileiro, pois preserva a competência
tributária estadual deste imposto, cuja
arrecadação destinar-se-ia no Brasil aos
respectivos estados da federação. Dos convênios
seguem-se os procedimentos administrativos
fazendários de cada ente no sentido do
compromisso acordado resultante do consenso
inicial dos já então entes conveniados. Ou
seja, a dinâmica microfísica institucional se
constitui e se move pelos procedimenios
administrativos dos entes conveniados, que
passam das etapas de formação de consensos e
compromissos para a etapa da cooperação
interinstitucional. Tal ocorre nas negociações
birregionais entre a União Européia e o
Mercosul, que avança pelos pilares comercial,
180 No Brasil já existe a disponibilização de informações sobre veículosautomotores dos Estados para a União, não entretanto convênios paraarrecadação e/ou fiscalização pela União do imposto sobre a propriedadedesses veículos (o IPVA), o que permitiria associar a informação depropriedade com a de aquisição e alienação, através da origem e da aplicaçãode recursos pelo proprietário, é dizer, seguir pelo fluxo financeiro ohistórico de localização, propriedade, utilização e destino dos veículos,também para disponibilizar transferência de informações para paísessignatários de acordos para transferência automática de informações, como osacordos regionais.
164
político e de cooperação, dos quais o que
denota o protagonismo da administração pública
é o pilar da cooperação interinstitucional. 181 A
atual exigência no Brasil de convergência para
um regime de maior transparência nas
demonstrações financeiras das empresas,
adequando-se ao padrão internacional – europeu
-, e expressa mais recentemente na Instrução
Normativa da Receita Federal do Brasil n.
1.515/2015, dá conta do avanço institucional do
Acordo-Quadro pela uniformização da linguagem
de transparência contábil para aferição por
investidores e credores privados e o fisco
estatal dos países.
Q. Direito administrativo na dinâmica regional:
interpretação ou integração do direito
administrativo regional?182 181 Mercosul-EU: XXI Reunião do Comitê de Negociações Birregionais,Assunção, 2 a 6 de maio de 2011 – Comunicado de Imprensa – Assunção, 6 demaio de 2011 - http://www.itamaraty.gov.br/sala-de-imprensa/notas-a-imprensa/mercosul-2013-eu-xxi-reuniao-do-comite-de-negociacoes-birregionais-assuncao-2-a-6-de-maio-de-2011-comunicado-de-imprensa-assuncao-6-de-maio-de-2011.182 STELKENS, Ulrich. Europäische Verwaltungsrecht II, Disciplinaacadêmica oferecida no Semestre de Verão de 2014 na Universidade Alemã deCiências da Administração (Deutsche Universität für
165
A atuação do direito administrativo
regional pelos órgãos regionais (direta) e/ou
pelos ofícios dos Estados nacionais (indireta)
dá-se antes de mais por integração e aplicação,
no âmbito do poder regulamentar, se não há
ainda (ou não haverá) lei a ser interpretada,
tampouco condicionante legislativo nacional,
daí o termo “integração” preceder, em âmbito
regional, qualquer espécie de interpretação
legislativa183, pois é integração do direito
regional por mediação constitucional.
Esta integração do direito
administrativo regional se desdobra
internamente em regulamentação por decretos dos
Estados nacionais (integração imediata) ou
regulação jurídica (integração mediata), é
Verwaltungswissenschaften – Speyer).Ver emhttp://www.dhv-speyer.de/stelkens/.183 Sobre a expansão do poder regulamentar da administração públicacontemporânea, ver OTERO, Paulo. Substituiçãoda lei pela Constituição, peloDireito Comunitário e pelo Direito Internacional e garantia constitucionalde espaços de autonomia administrativa e limitação do legislador; in OTERO,Paulo. Legalidade e Administração Pública: O sentido da VinculaçãoAdministrativa à Juridicidade. Coimbra, ed. Almedina, 2003, pp. 733 a 754.
166
dizer, mediada pelos legislativos dos Estados
nacionais.
Também podem-se verificar na forma
imediata de integração dois desdobramentos, se
e como o cumprimento das tarefas pelos Estados
nacionais são reguladas por diretrizes
jurídicas regionais. Se se trata, por exemplo,
de implantação do código/regulamento aduaneiro
regional pelos ofícios aduaneiros nacionais,
verificamos tanto no Brasil quanto na Alemanha
a modalidade autêntica de integração do direito
administrativo regional, que tem como
requisitos a observância das ordens de
competência e procedimentos regionais. Se
eventualmente especificadas, além disso, como
tais tarefas devam ser cumpridas quando sejam
aproveitadas pelos Estados-Membros, a
integração no direito nacional precisa atentar,
respeitar diretrizes regionais prévias, e então
diz-se184 que a modalidade de integração é184 STELKENS, Ulrich. Europäische Verwaltungsrecht II, Disciplinaacadêmica oferecida no Semestre de Verão de 2014 na Universidade Alemã deCiências da Administração (Deutsche Universität fürVerwaltungswissenschaften – Speyer).Ver em
167
“respeitosa”. Desta última forma de integração
podemos exemplificar as ações do FOCEM no
âmbito Mercosulino, pois a forma de captação do
Fundo é receita originária da contribuição dos
Estados-Membros – ainda não há no Mercosul ou
na União Européia receitas derivadas do poder
de tributar -, mas a destinação dos recursos
tem aplicação pelas administrações públicas dos
Estados nacionais e entes privados segundo –
portanto “respeitando” - ordens de competência,
procedimentos e diretrizes que orientam
especificamente como os recursos do FOCEM serão
empregados.
Concludentemente, pode-se observar que a
dinâmica do espaço público no regionalismo
econômico contemporâneo comparece
primordialmente na experiência microfísica
institucional de atuação dos tratados pelos
entes e órgãos da administração pública
regional e dos Estados nacionais, a partir de
mediação constitucional a que se seguem os
http://www.dhv-speyer.de/stelkens/.168
âmbitos legislativo e judicial regional e
nacional.
O direito administrativo da União
Européia e do Mercosul – em curso de
convergência por cooperação interinstitucional
- regulam exclusivamente a relação entre os
órgãos regionais e os Estados nacionais;
relações com cidadãos são reguladas pelo
direito administrativo dos Estados nacionais.
Os sistemas administrativos nacionais
estão, na aplicação do direito regional, sob
uma crescente pressão para se adaptar. Exemplo
disso, no Brasil, é a atual dinâmica de
reestruturação dos sistemas informatizados da
Receita Federal do Brasil para atender novos
aos padrões internacionais de transparência das
demonstrações financeiras das corporações,
baseados no modelo da União Européia 185
utilizado nos 5 continentes, e que se insere no
185 Internacionalização da Contabilidade, consultado emhttp://www.tax.mpg.de/de/pub/unternehmens_und_steuerrecht/forschungsschwerpunkte/internationalisierung_rechnung.cfm.
169
âmbito do Acordo-Quadro Inter-Regional do
Mercosul com a União Européia 186.
Se a ação administrativa interna é hoje
inicialmente determinada cada vez mais pelas
disposições substantivas do direito regional e
do direito internacional, encontramo-la desde
os anos oitenta do século XX na Alemanha e
desde os anos noventa no Brasil fortalecida -
em vez de uma transformação do processo
administrativo e a organização administrativa
dos Estados nacionais - pelos impulsos do Poder
Executivo. No entanto, diferentes graus de
aplicação nos Estados nacionais devem ser
observados. É de notar a hercúlea dificuldade,
no federalismo administrativo fiscal
brasileiro, de se implementar um imposto sobre
o valor agregado (IVA), quando no âmbito do
Mercosul até o Paraguai já o instituiu.
186 Acordo-Quadro Inter-Regional de Cooperação entre a ComunidadeEuropéia e o Mercosul (1992), consulted between 15/06/2011 and 30/06/2011 atwebsite
http://www2.mre.gov.br/dnc/dnc2/Acordo_Quadro_Inter_Regional_Coopera%C3%A7%C3%A3o_Mercosul_UE.pdf.
170
Tipologicamente pode haver mudanças,
como obedecer-se imediatamente aos comandos-
padrão acima do Estado (supranacionais),
diferentes daquelas mudanças que carregam os
requisitos de integração já convertidos, do
direito político regional ou do quadro jurídico
internacional, sem um prévio comando-padrão
explícito. No primeiro caso, pode-se considerar
uma regionalização ou internacionalização
direta no direito administrativo (decorrente de
auto-regulamentação administrativa da mediação
constitucional187), e falar-se no segundo caso
de uma regionalização ou internacionalização
indireta, mediada pelo legislativo 188 ou pelos
tribunais nacionais189.
187 P. ex. A IN RFB n. 1.059, de 02/08/2010 que - em vista da Decisão doConselho do Mercado Comum do Mercosul n. 53, de 15/12/2008 – dispõe sobre osprocedimentos de controle aduaneiro e o tratamento tributário aplicável aosbens do viajante. 188 P.ex. a já citada IN n. 1.515/2014, que regulamenta a Lei n. 12.973, de 13 de maio de 2014, dispondo sobre a determinação e o pagamento do imposto sobre a renda e da contribuição social sobre o lucro líquido das pessoas jurídicas, disciplina o tratamento tributário da Contribuição para oPIS/PASEP e da Cofins, adequando o regime de tributação brasileiro ao padrãointernacional de transparência das demonstrações financeiras das corporações.189 Ver, p. ex. CORRÊA, Antonio. “MERCOSUL – Soluções de conflitos pelos juízes brasileiros”, Porto Alegre, Ed. Safe, 2005.
171
Dentre os fenômenos de regionalização
indireta incluem-se os ajustes funcionais no
sistema jurídico, a coerência de um regime
legal de fixação de repercussões (modulação de
efeitos), ajustes gerados pela concorrência e
financiados pela cooperação administrativa 190, e
intercâmbios acadêmico-científicos dos efeitos
da transnacionalização191.
A conectividade da administração
regional se desenvolve fortemente nem tanto
pela regionalização dos direitos
administrativos nacionais, mas através de um
direito administrativo regional regulador. Sem
prejuízo ao fato de que, devido ao suporte do
fenômeno da regionalização, também pode ser
190 Ver Lei n. 11.444, de 5 de janeiro de 2007, que autorizou doação de R$ 20 milhões para modernização da Aduana do Paraguai. Ver sobre acompanhamento na aplicação dos recursos em http://www.gazetadopovo.com.br/economia/brasil-vai-fiscalizar-r-20-milhoes-doados-ao-paraguai-ac7uemezivfgx3iczzjy1oq4u; 191 Traduzido e interpretado da página de pesquisa do Instituto Alemão dePesquisas em Administração Pública de Speyer, referente ao projeto depesquisa “Europeização e Internacionalização das Administrações PúblicasNacionais em Comparação: Projeto-Rede Desnacionalização da AdministraçãoPública”, consultado em 16/05/2015 emhttp://www.foev-speyer.de/projekte/projdbdetail.asp?ID=199. Esta pesquisa seinsere no âmbito da cooperação administrativa e do intercâmbio acadêmico dosefeitos da transnacionalização da administração pública.
172
mostrado como cada ordem jurídica nacional tem
empregado diferentemente as diretrizes
regionais, e como elas se manifestam pela via
do emprego da força persistente de cunho
jurídico e cultural administrativo, hoje
verifica-se ainda que o processo de
transformação regional estendeu-se - na
Alemanha da União Européia e gradativamente se
estende no Brasil do Mercosul - a alcançar as
estruturas profundas das ordens jurídicas
nacionais.
Tem-se verificado que as modificações
nos ordenamentos jurídicos nacionais não
dependem apenas de pressões jurídicas, mas em
grande medida ocorrem causadas por modificações
nos contextos jurídico, econômico e cultural 192,
é dizer, não se explicitam apenas nos tratados-
contrato, mas são provocadas no curso da
implementação dos consensos e compromissos dos
192 SOMMERMANN, Karl-Peter. Veränderungen des nationalenVerwaltungsrechts unter europäischen Einfluss – Analyse aus deutscher Sicht,in SCHWARZE, Jürgen. Bestand und Perspektiven des EuropäischenVerwaltungsrechts: Rechtsvergleichende Analyse. Nomos, Sonderdruck (nichtBuchhandel erhältlich), Auflage 2008.
173
acordos-quadro. Por isto também é escassa de
densidade uma análise da estática – posições de
negociação - dos acordos regionais com base
apenas em questões de barreiras comerciais,
como é exemplo o Acordo Transpacífico de
Integração Econômica193, que visa - para
concorrer com a Asean Economic Community 194 -
promover o livre comércio, pontuando apenas na
vontade política o afastamento das barreiras
jurídicas, macroeconômicas e culturais dos
países signatários, as quais somente por
mediação constitucional podem ser deliberadas,
autorizadas e gradativamente implementadas – na
dinâmica de tessitura da cooperação
institucional - no âmbito dos ordenamentos
econômico, político e cultural de atuação da
administração pública interna dos Estados
nacionais.
193 Acordo Transpacífico de Integração Econômica. Sobre, emhttp://pt.reingex.com/TPP-Acuerdo-Trans-Pacifico.shtml.194 Asean Economic Community, em http://www.asean.org/communities/asean-
economic-community.
174
No direito administrativo alemão, as
modificações estruturais, jurídico-
fundamentais, especialmente da administração
(alargamento da publicidade e participação, e
as liberdades de informação), dependem do
desenvolvimento de um direito administrativo
regulatório e da transformação na estrutura das
modalidades de contratos públicos e de outras
modalidades de interesse (p.ex. convênios,
consórcios), no sentido de uma abertura
concorrencial. De fato, as codificações ou leis
fundamentais, como a lei dos procedimentos
administrativos e a jurisprudência
administrativa, ou ainda a via da
comparatividade, se tornam fortes afirmações
jurídicas específicas, como o código de obras e
a lei federal para proteção contra emissões
poluentes, já distinguidas como integrantes do
resultado do desenvolvimento do direito
175
nacional alemão195 referido às diretrizes
supranacionais da União Européia.
No Brasil temos avançado internamente
iniciativas regulatórias, com sobressaltos nas
leis de contratos públicos das concessões e na
prestação de contas de agências e
concessionárias, por carência de mediação
constitucional regulatória, de uma lei geral de
procedimentos administrativos e da
reestruturação da jurisdição administrativa
(que na esfera fiscal tributária federal se
encontra em curso, no Conselho Administrativo
de Recursos Fiscais), base de sustentação de
iniciativas regulatórias. Com isto, a
jurisdição administrativa fazendária no Brasil
(embora já com cláusula constitucional, p.ex.
no art. 37, XVIII), cede espaço de atuação - em
prejuízo de cidadãos, corporações e da própria
administração - à crescente judicialização de
195 SOMMERMANN, Karl-Peter. Veränderungen des nationalenVerwaltungsrechts unter europäischen Einfluss – Analyse aus deutscher Sicht,in SCHWARZE, Jürgen. Bestand und Perspektiven des EuropäischenVerwaltungsrechts: Rechtsvergleichende Analyse. Nomos, Sonderdruck (nichtBuchhandel erhältlich), Auflage 2008.
176
questões administrativas, hipertrofiando o
serviço administrativo de acompanhamento de
processos judiciais, porque ainda nos falta a
reestruturação da jurisdição administrativa
fazendária em uma lei geral de procedimentos
administrativos.
No âmbito geral do regionalismo
econômico contemporâneo,
“uma função produzida cada vez
mais fortemente pelo direito regional e pela
prática administrativa nas leis
administrativas nacionais vê-se conduzida,
não somente por modifi cações legislativas
pontuais ou novas interpretações, mas
através da participação integrada dos
Estados nacionais na conectividade das
ordens jurídicas administrativas
(cooperação
interinstitucional)”1 9 6,196 SOMMERMANN, Karl-Peter. Veränderungen des nationalenVerwaltungsrechts unter europäischen Einfluss – Analyse aus deutscher Sicht,in SCHWARZE, Jürgen. Bestand und Perspektiven des EuropäischenVerwaltungsrechts: Rechtsvergleichende Analyse. Nomos, Sonderdruck (nichtBuchhandel erhältlich), Auflage 2008. Tradução livre do autor destapesquisa.
177
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mais de 60 anos em curso na Alemanha e há 25
anos no Brasil - de um novo sistema
institucional jurídico-administrativo. “Numa
ordem policêntrica, um direito administrativo regional
coerente protagoniza um papel central” 1 9 7, e é pela
crescente mediação constitucional direta, ou
por mediação legislativa do direito
administrativo regional, que a administração
fazendária opera a microfísica institucional
jurídico-procedimental - regulamentadora ou
decisória - coerente com o curso do
regionalismo econômico contemporâneo.
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outro que o padrão norte-americano FASB
(Financial Accounting Standards Board), e
inclui-se no núcleo de consenso e compromisso
196
previsto no Acordo-Quadro entre UE e Mercosul,
para o que a contabilidade fiscal passou a ser
disciplinada pela administração fazendária – no
âmbito de seu poder regulamentar na IN RFB
1515/2014 – de modo a adimplir, no âmbito de
sua atuação, ao compromisso brasileiro no
regionalismo. É portanto posicionamento
brasileiro no regionalismo econômico
contemporâneo. Sobre IFRS adotado no Brasil,
IASB europeu e o FASB dos EUA, ver, entre
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institui o Programa Brasileiro de Operador
Econômico Autorizado, visa intensificar a
harmonização dos processos de trabalho com
outros órgãos regulatórios do comércio
exterior, e seu Fórum Consultivo OEA - que tem
como objetivo de constituir canal permanente de
comunicação entre a RFB e os operadores
certificados no âmbito do Programa Brasileiro
de OEA, além do aprimoramento técnico e
normativo do Programa Brasileiro de OEA - não
constitui órgão integrante da administração
direta ou indireta da União, possuindo funções
consultiva e propositiva. Em
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