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Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 1
ARTIGOS
Bibliotecas a saga universitária
Por Ana Paula Lopes da Silva
Políticas Públicas de Informação em
Moçambique
Por Euclides Daniel Cumbe
Web social e movimento hip hop
Por Janaina França e Maria José Jorente
OPINIÃO
Vinicius de Moares Estudante
Por Augusto Montano
Biblioteca do Faça você mesmo
Por Moreno Barros
ENTREVISTA
Liliana Serra
Por Chico de Paula
e Emilia Sandrinelli
SER OU NÃO SER
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 – 2
S U M Á R I O
ARTIGOS
4
Bibliotecas a saga universitária
por Ana Paula Lopes da Silva
6
Políticas Públicas de Informação em Moçambique
por Euclides Daniel Cumbe
9
Web social e movimento hip hop
por Janaina França e Maria José Jorente
REPORTAGENS
13
Belas bibliotecas do Brasil
por Soraia Magalhães
24
Ser ou não ser bibliotecário
por Chico de Paula
ENTREVISTA
29
Liliana Serra
por Chico de Paula e Emilia Sandrinelli
OPINIÃO
38
COLUNA DO AGULHA3AL
A rigidez de seus pontos visuais é um obstáculo à
felicidade
40
COLUNA DO JONATHAS CARVALHO
Os modismos terminológicos
43
COLUNA DO THIAGO CIRNE
Memórias do Judiciário
44
COLUNA DO CLÁUDIO RODRIGUES
Causando na rede
46
COLUNA DO MORENO BARROS
Biblioteca do Faça você mesmo
50
COLUNA DO AUGUSTO MONTANO
Vinicius de Moares Estudante
E X P E D I E N T E
EDITOR-CHEFE
Chico de Paula
EDITORA EXECUTIVA
Emilia Sandrinelli
EDITORA DE CRIAÇÃO
Hanna Gledyz
EDITOR ADJUNTO
Rodolfo Targino
REVISORES:
Isis Brum
Vanessa Souza
COLABORADORES FIXOS:
Daniele Fonseca
Livia Lima
Talita James
Soraia Magalhães
CHARGISTA
Aldo Henrique
COLUNISTAS:
Agulha3AL
Augusto Montano
Claudio Rodrigues
Jonathas Carvalho
Moreno Barros
Thiago Cirne
COLABORARAM NESTA EDIÇÃO:
Ana Paula Lopes da Silva
Euclides Daniel Cumbe
Janaina França
A N O 3 – N. 11 – N O V E M B R O 2 0 1 3 – I S S N: 2 2 3 8 – 3 3 3 6
W W W . B I B L I O O . I N F O
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 3
“MENSALÃO” O QUE HÁ DE FATO PARA SE COMEMORAR?
por Chico de Paula
Não há dúvida de que ver uma elite política condenada e obrigada a cumprir pena é
bastante simbólico. Entretanto, pergunta-se: o que há de fato para se comemorar na
condenação dos “mensaleiros”? Explorado do início ao final de forma sensacionalista
pela grande imprensa, a Ação Penal 470, ou simplesmente “mensalão”, se materializou
em mensagem precípua da mídia gorda, como se esta quisesse o tempo todo dizer: “Eles
são os maus e nós somos os bons”.
O que se sabe de fato é que o “mensalão” serviu para alguns propósitos. O primeiro
deles foi saciar a “opinião pública” brasileira ávida por ver condenados neste país o que
ela considera – ou foi levada a considerar – os vilões da desgraça nacional: os políticos.
O segundo é que o caso serviu para uma elite conservadora e reacionária nacional como
prova de que a esquerda não serve para governar este país, mesmo a despeito do fato do
Partido dos Trabalhadores há muito ter se afastado de suas bandeiras históricas de luta.
Alguns daqueles condenados foram um dia parte da esperança desse país, e suas
condenações por si só já bastaria para se concluir que não há o que comemorar neste
episódio. De outro lado, toda uma corja – de latifundiários a empreiteiros, passando por
concessionários de serviços públicos, chegando aos dirigentes de futebol – continua a
explorar milhões de trabalhadores de Norte a Sul deste país, sem que nada seja feito.
Esses fatos mostram que a condenação daqueles homens não serviu apenas para atender
uma demanda popular. Longe disso! Serviu sim para conformar um jogo de interesses
em que toda a máquina do Estado – da mídia ao judiciário – foi chamada a trabalhar.
Diante deste fatos, nos perguntamos: chegará o dia em que grileiros, cafetões,
contrabandistas, atravessadores e todos os corruptos como esses que agora foram
condenados serão chamados a prestar contas de seus crimes? As dúvidas são muitas e as
esperanças poucas.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 – 4
artigos
por Ana Paula Lopes da Silva
Se há um lugar onde muito se busca, se consome e
se produz informação, este lugar certamente é a
universidade. Pelo menos é o que se espera destes
centros de educação que trazem em sua essência o
ideal de difundir e formar conhecimento. E,
consequentemente, a biblioteca universitária aparece
como uma extensão de tudo isto, ou melhor, um
meio para atingir este ideal, estando fortemente
atrelada à comunidade acadêmica na construção do
processo educacional.
E como parte integrante deste processo, a biblioteca
deve estar em consonância com o que propõe a
universidade: a criação de novos cursos, novas
formas de ensino, a exigências de novos suportes de
informação etc. Mas não tem sido fácil acompanhar
as mudanças incorporadas pelas universidades que,
na maioria das vezes, alteram seus propósitos sem
avaliar sua real capacidade de atender aos mesmos.
E como ficam as bibliotecas? Correndo atrás do
prejuízo...
Na corrida desenfreada pela expansão do ensino,
criam-se universidades e universidades; públicas e
privadas; ensino presencial e à distância. Aliás, este
método de ensino tem se fortalecido e se difundido
de forma surpreendente. O Censo da Educação
Superior 2011, realizado pelo Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
(INEP), revela a grande expansão dessa modalidade
de ensino. São 2.365 instituições de ensino superior;
6.739.689 matriculas na graduação, destas 5.746.762
ensino presencial e 992.927 na educação a distância.
A preocupação é que nem sempre expansão e
qualificação do ensino andam juntas, da forma como
se estabelece atualmente este processo, uma acaba
por abdicar da outra.
A questão é que se criam mais instituições de
ensino, mais cursos de graduação, mais vagas nas
AAA SSSAAAGGGAAA DDDAAASSS
BBBIIIBBBLLLIIIOOOTTTEEECCCAAASSS
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artigos
ÁÁRRDDUUAA ,, PPOORRÉÉMM NNEECCEESSSSÁÁRRIIAA AAOOSS QQUUEE AACCRREEDDIITTAA MM NNOO VVAALLOORR DDAA
IINNFFOORRMMAAÇÇÃÃOO
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 5
artigos
universidades, mas não se considera de imediato que
na mesma proporção devem-se aumentar os recursos
humanos dentro da biblioteca, a verba para aquisição
de obras que atendam a este novo público, o espaço
físico para comportar este acervo e os próprios
usuários, sem falar na necessidade de equipamentos,
como computadores e mobiliário para estudo. Isso
não seria problema se as bibliotecas fossem
projetadas inicialmente visando o crescimento futuro
da instituição, mas também não é o que
normalmente acontece e a biblioteca acaba por ser
apontada por sua insuficiência no atendimento às
demandas universitárias que, na realidade, é uma
consequência da insuficiência do sistema como um
todo.
Dziekaniak em seu artigo Sistema de gestão para
biblioteca universitária coloca: “Não se concebe
mais a educação apenas transmitir conhecimentos,
mas sim, fornecer subsídios para que cada indivíduo
construa suas ideias e descubra/desenvolva seu
potencial. Diante desse cenário, cabe à biblioteca
assumir e desempenhar seu papel de ator principal
no processo educacional e, para que isso ocorra, uma
adequada estrutura é condição necessária, e isso
envolve uma série de requisitos básicos, tais como
recursos humanos, materiais, financeiros e
tecnológicos apropriados [...]”.
Falando em novas demanda informacionais, Murilo
Bastos Cunha em A biblioteca universitária na
encruzilhada nos faz questionar “como serão os
universitários do futuro e as suas necessidades de
informação? Eles vão querer as coisas por via
eletrônica, fáceis de serem usadas e manipuladas?
Teremos que ter leitores de livros eletrônicos [e-
book reader] para empréstimo?, coloca que a
indagação: “Cadê o pdf?” está sendo um
comportamento do estudante universitário”.
Este novo contexto traz também essa “pressão” para
o digital que é uma discussão inevitável para quem
está à frente de uma unidade de informação e que é
um passo importante a ser dado pelas bibliotecas
para permanecerem como fontes úteis de
informação, mas um passo “firme” e não
“desenfreado”, como se está dando por ai, dentro das
necessidades e possibilidades de cada instituição.
A saga é árdua, porém necessária aos que acreditam
no valor da informação!
Ana Paula Lopes da Silva é
graduda em Biblioteconomia pela
Universidade Estadual do Piauí –
UESPI, atua como Bibliotecária pela Universidade
Federal do Vale do São Francisco – UNIVASF
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 – 6
artigos
por Euclides Daniel Cumbe
O cenário histórico Moçambicano é uma natural
referência da necessidade continua de um debate
profundo relactivo as apolíticas de informação. Isso
porque o país desenvolvolve por inerências externas,
tais como a globalização, a informática às tecnologias
globais, onde aqui são considerados outros e novos
elementos, tais as forças naturais externas das quais
sempre dependemos, nesta ordem de ideias, embora a
palavra política esteja sendo usada com certo
preconceito. Ou seja, atribuída ao espírito partidário,
todos os cidadãos são políticos na medida em que, para
além da sua reflexão em torno das dimensões directivas
e promulgativas, a sua aceitação como ser natural e
gregário da sociedade é uma marca dominante na
aceitação da sua dimensão política.
Neste sentido, importa antes de mais nada aceitar que
eternas fraquezas estão no encalço de Moçambique com
maior firmeza para a questão estrutural das políticas
sociais ou públicas com referência à informação,
considerada o maior elemento e dinamizador da
essência liberativa do ser humano ou do
desenvolvimento governamental, mas que no fundo é
este olhar governamental que a relega, em termos
documentais e reais para uma posição secundária, aliás,
como uma plataforma ao serviço da comunicação social
o que decerto parece-nos errada esta proteção.
Basicamente a sociedade moçambicana enfrenta
atualmente transformações significativas em termos
econômicos, políticos e sociais, assim como mudanças
relacionadas aos problemas ambientais aos quais se
precisa de informação, que o governo parece não
preparado e capacitado adequadamente a
satisfazer/explicar. Neste contexto, a informação torna-
se um instrumento crucial da gestão pública diante da
complexidade e das dimensões dos problemas actuais.
O país carece de legislação que indica o grau de
institucionalização de determinadas ações no panorama
da informação como, por exemplo, o decreto 33/92 do
Conselho de Ministros, que criou Sistema Nacional de
INFORMAÇÃO EM
MOÇAMBIQUE FFAALLTTAAMM VVOONNTTAADDEE PPOOLLÍÍTTIICCAA,, VVAALLOORRIIZZAAÇÇÃÃOO EE RREECCOONNHHEECCIIMMEENNTTOO PPAARRAA CCOOMM EESSTTEE SSEETTOORR
artigos
P O L Í T I C A S P Ú B L I C A S D E
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 7
artigos
Arquivos (SNA) como uma mera miragem durante
longo período, fruto de descomprometimento
governamental e falta de mecanismos assentes à
realidade nacional (formados, líderes, analísticas) que
tão bem poderiam aqui intervir de forma mais
consistente a fim de fazer da questão arquivística
nacional um campo certo e potencial para as
transformações e necessidades de informação social.
Institucionalizando o Sistema Nacional de Arquivos
A nossa realidade arquivística se legitima até certo
ponto no Arquivo Histórico Moçambicano (AHM)
como uma unidade bem estruturada e com uma
dimensão nacional em termos do seu acervo, mas que
não se faz competência maior por conta dos defeitos e
diferentes atropelos relativamente a objetivos do Centro
de Documentação de Moçambique (CEDIMO). Enfim,
as falhas de ordem governamental corrente (falta de um
Arquivo Nacional com uma representação nacional,
pois o AHM pertence à Universidade Eduardo
Mondlane – UEM ).
A institucionalização do SNA abria espaço a criação e
inauguração dos arquivos provinciais. Mas não houve
institucionalização/implantação, o que nos leva dizer
que, temos lei, mas não existe infraestrutura. A
considerar o decreto 36/2007, que revoga o decreto
33/92 e institui o chamado Sistema Nacional de
Arquivos do Estado (SNAE), tem o CEDIMO seu
proponente e executor, sob a direcção central do
Ministério da Função Pública, e ao mesmo tempo
“órgão director central do SNAE com regulamentos
centrados em políticos e sem profissionais da área o que
nos leva a apensar numa lei somente para a acomodação
da comunicação ou mesmo para a pura expressão” para
o inglês ver.
Assim, a situação que caracteriza a questão da
informação no âmbito dos programas governamentais
aparenta um real controle governamental, na sua relação
com a sociedade, mas que no fundo é uma reflexão da
desconexão entre os diferentes vetores legítimos de
politicas, informação e da sociedade em si. Um dos
momentos mais avassaladores refere-se maturamente no
que concerne aos ditames da Constituição da República
(2007), actualmente em vigor. Se refere à dimensão da
comunicação da informação inscrita no âmbito do
preceituado da liberdade de imprensa e do direito à
informação, excluindo a questão que diz respeito à
gestão e disseminação da informação, bem como do
acesso do cidadão à informação. É assim que têm se
manifestado os programas quinquenais do governo.
Falamos concretamente dos de 2000/2004 e o
2005/2009 como uma lacuna, do mesmo contexto, isto
é, mais virado para as questões da comunicação como
se da informação houvesse algum elemento central ou
árbitro regulador das acções e aplicações políticas.
A Resolução n.º 12/97, do Conselho de Ministros, que
aprova a Política Cultural e sua estratégia de
implementação, concebe as poucas Unidades de
Informação que o País possui na estrutura do Estado,
como agências culturais do mesmo e não como agências
de informação, como o mais gritante cenário integrado
aos arquivos e bibliotecas a sua expressão cultural e não
como plataformas integradas nas dimensões
informacionais nacionais, isto é, como elementos da
identidade da informação. Por exemplos: arquivos não
são concebidos em sua dimensão informacional onde
assumiriam papel de liderança na gestão da informação
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 – 8
artigos
e na definição de políticas de informação arquivística,
tão pouco como instrumentos ao serviço da
administração e de apoio à tomada de decisões, mas
sim, concebidos em sentido cultural com função de
preservar a memória institucional e ações de pesquisa
histórica.
A falta de políticas públicas de acesso à informação
A nossa “Lei mãe”, no seu Artigo 48°, n° 1 diz: “Todos
os cidãos têm direito à liberdade de expressão, liberdade
de imprensa, bem como o direito à informação”. Sobre
o acesso a informação o cenário não se difere do já
referenciado artigo acima. O acesso à informação e as
Novas Tecnologias da Informação e Comunicação
(TICs), conforme apresentado na reflexão do Jardim (?),
coloca-se como questão central para os tempos atuais
visto estarmos vivendo na chamada era da informação.
A emergência das TICs e os avanços científicos se
impõem nos países desenvolvidos. Isto permitiu que a
Arquivística ganhasse uma autonomia, deixando assim
de ser uma disciplina auxiliar da história e valendo-se da
sua relação de interdisciplinaridade com outras áreas de
conhecimento.
O acesso à informação tem deparado com obstáculos de
natureza legal e não legal. Os legais relacionam-se com
a criação de mecanismos capazes contribuír para a
diminuição das barreiras que às vezes concorrem para
os problemas do acesso. No caso moçambicano,
podemos dar o exemplo do decreto 36/2007 que contem
instrumentos para a implementação do programa da
gestão dos documentos administrativos. Os não legais
são vários, desde a existência das massas documentais
acumuladas, até à falta de infraestruturas.
De forma sumária, no campo político se realça a
necessidade duma reestruturação de raiz política pública
da informação que deve abranger em primeiro plano o
profissional (da informação) como sujeito e como
objeto. Isto significa que este profissional deve
participar na elaboração dessa política e ser beneficiado
pela mesma como seu objeto. Depois de uma análise ao
cenário moçambicano no âmbito das políticas públicas
de informação, chegou-se a uma conclusão de que o
profissional não figura como peça fundamental na
elaboração das políticas públicas (da informação), por
razões que não são tornadas conhecidas, o que talvez
seja a razão da falta de harmonia entre a legislação,
realidade e os programas do governo nesta área.
A falta de interacção entre o governo e a sociedade civil
faz com que o que se pretendia como Política Pública da
Informação se transformasse numa política
governamental de informação e neste caso, de cultura e
de comunicação social. Considerando o cenário acima
descrito, concordamos com o reportado no dia 1 de
outubro do corrente ano pelo “Jornal Notícias” citando
o Relatório do Instituto de Comunicação Social da
África Austral (MISA), publicado a 30 de Agosto/2010:
“No país não existe nenhuma instituição pública aberta
e transparente no tocante ao acesso à informação”. E
nós diríamos que no país não temos políticas públicas
de informação devido à falta de vontade política à
valorização e reconhecimento da área.
Euclides Daniel Cumbe é
graduado em Ciência da Informação pela
Universidade Eduardo Mondlane,
Bibliotecário na mesma Universidade e trabalha como
consultor independe na área.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 9
artigos
por Luciana Ribeiro de Assunção e Maria José Jorente
A Ciência da Informação (CI) é responsável por
tratar dos estudos informacionais de diferentes
alcances na sociedade a partir da
transdisciplinaridade e interdisciplinaridade
usando elementos produzidos em estudos
científicos para melhorar questões relacionadas
ao usuário. Ambas as formas são aplicadas com
o intuito de desenvolver maneiras inclusivas e
novas metodologias para melhor atender as
necessidades informacionais da sociedade para
proporcionar a ampla inclusão na sociedade da
informação por meio de políticas sociais que
ofereçam maneiras de desfrutar as informações,
a fim de que todos se beneficiem dos avanços
na área da Ciência da Informação.
Com a evolução das plataformas na Internet, a
Web atualmente torna-se o ambiente
privilegiado de inclusão nas questões digitais.
Ela permite aos usuários colaborar e expor suas
opiniões através de seus aplicativos. A
comunicação que antes era feita apenas de uma
forma e controlada por apenas poucas pessoas,
inverte a ordem de apresentação dos elementos
e as possibilidades de autoria múltipla dos
conteúdos dão mais espaço de participação aos
integrantes.
Formas alternativas
de difusão do Hip Hop
O estudo apresentado sobre o Movimento Hip
Hop se relaciona a essas questões na medida em
que ele pode ter a oportunidade de encontrar
nos meios da Web contemporânea o espaço
certo de divulgação dos seus elementos. O Hip
Hop sempre foi uma manifestação mal vista aos
olhos da sociedade por várias razões, entre elas
o fato de ser uma manifestação que acontece da
WWWEEEBBB SSSOOOCCCIIIAAALLL EEE MMMOOOVVVIIIMMMEEENNNTTTOOO HHHIIIPPP
HHHOOOPPP
artigos
CCOOMMOO EESSSSAA FFEERRRRAAMMEENNTTAA PPOODDEE CCOONNTTRRIIBBUUIIRR PPAARRAA
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Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 – 10
artigos
periferia para o centro da cultura e ser de
origem africana e afro-americana. E como outro
movimento de mesma origem, encontra
resistências.
A verificação da falta de espaço que os jovens
praticantes da cultura Hip Hop sempre
enfrentaram nos diversos setores da sociedade,
inclusive nos meios de comunicação, nos leva a
pensar nos meios digitais proporcionados pelos
aplicativos Web da atualidade como formas
alternativas de difusão e até mesmo de justiça
social, pois foram poucos e curtos os programas
nas diversas mídias da indústria cultural que
abordaram os assuntos ligados ao Hip Hop.
As novas possibilidades de acesso, favorecidas
pelas Tecnologias de Informação e
Comunicação (TICs), são atualmente a aposta
para haver inclusão dos membros dessa cultura,
pois são instrumentos disseminatórios
decisivos, e também para o desenvolvimento
social das classes menos favorecidas que
podem, através do bom uso dessas TICs, ser
beneficiadas pela chance de expressão do
individual e grupal.
As propostas de melhoria e de inclusão por
meio da Web devem ser mais estudadas a fim
de explorar e possibilitar o uso dos seus
recursos que são muito bem vindos por toda a
população, mas principalmente pela cultura Hip
Hop, que necessita de oportunidades e espaços
como esses para ter a autonomia, a qual é
reivindicada há muitos anos nos meios de
comunicação brasileiro.
A expressão Hip Hop foi criada por
AfrikaBambata, um DJ que propôs a
pacificação entre as gangues do Bronx através
de encontros dos B.Boys, DJ e MCs, e a
tradução do termo significa: “Hip” quadril e
“Hop” pular, ou seja, é um conjunto de
movimentos que expressa “sacudir os quadris”.
Porém o significado vai muito além da ação de
movimentar o corpo, pois a conotação “jogo de
corpo”, daí derivada, se aplica ao cotidiano dos
tantos seguidores dessa cultura que têm que ter
essa agilidade de se desvencilhar dos problemas
sociais em que vivem.
Em busca do
espaço merecido
Os elementos que são seus pilares
independentemente de qualquer lugar onde
esteja acontecendo são: o Grafite, que
representa o desenho, a arte de registrar através
da plasticidade e da pintura; o Break, que é a
arte de dançar, representada pelo B.Boy e
B.girl; o DJ, disc jockei, que representa a
sonoridade através dos tocas- discos e o MC,
mestre de cerimônia, que é o cantor,
mensageiro de todo discurso cantado nas letras
de rap.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 11
artigos
Desde seu surgimento, o Hip Hop brasileiro
ainda não teve o espaço merecido nos meios de
comunicação da grande mídia. Esse fato impede
a disseminação dessa cultura para população
brasileira, pois as chances de mostrar os seus
elementos foram e até hoje são escassas. Esses
meios têm se mostrado conservadores e
temerosos em abrir espaço às manifestações
culturais vindas das periferias e sempre
exigiram normas restritivas para as
apresentações. Assim, a relação entre os
tradicionais meios disseminadores e às
manifestações ligadas ao Hip Hop se dá de
forma conturbada.
Os meios que o Movimento Hip Hop teve até
hoje na “grande mídia” para mostrar sua cultura
são: 1) No rádio, a 105 FM foi a primeira no
Brasil a dar espaço para essa manifestação. O
programa Balanço Rap está no ar desde 1998,
proporcionando aos ouvintes a sua participação
direta na programação; 2) O Black 105, um
programa de Black Music em que algumas das
músicas que fazem parte das raízes afro como o
rap, entre outras, são tocadas em sua
programação; 3) Espaço Rap é o mais ouvido
entre os programas citados e divide-se em parte
I e parte II, que vai ao ar diariamente; 4)
Charme da 105, que dedica a programação para
a música black em geral; 5) Festa do Dj Hum é
um importante programa disseminador de
música negra, pois contempla os estilos de:
Samba Rock, Rap, Soul, Funk, Boogie e
RareGrooves.
Basicamente são esses os espaços que o Rádio
direciona para o Movimento Hip Hop, mas há
muito a se conquistar, pois os rappers não se
sentem representados totalmente através dessas
programações, que não são puras e exclusivas
para que possam de fato ter autenticidade
voltada exclusivamente á eles. As revistas
impressas sobre o Hip Hop tiveram duração de
aproximadamente dez anos em circulação, mas
saíram do mercado entre os anos de 2008 e
2009. São elas: Pode Crê! Rap Brasil, Rap BR,
Cultura Hip Hop, Planeta Hip Hop, Rap News e
Grafite.
A televisão brasileira também não dedicou
muitas possibilidades de cooperação para o
Movimento Hip Hop. A primeira emissora que
fez um programa aberto foi a MTV Brasil com
o programa YO! Mas devido a
desentendimentos entre a produção e os
apresentadores do programa, ele saiu do ar. Em
Sergipe e Porto Alegre é comemorado com
sucesso o Hip Hop sul que já está há dez anos
no ar e é exibido pela TVE. No ano de 2008 a
TV Cultura finalmente abriu espaço para as
manifestações da Periferia e passou a exibir o
programa Manos e Minas. Entre
desentendimentos com os apresentadores e
algum tempo fora do ar, o programa atualmente
é a maior referência da manifestação da cultura
Hip Hop em uma mídia de comunicação de
massa.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 – 12
artigos
Há um reconhecimento por parte dos seguidores
dessa cultura que apontam a Web como
principal potencializadora do Movimento Hip
Hop, pois nenhum dos meios elencados acima
têm cem por cento de espaço dedicado á
cultura. Alguns sites que estão em veiculação
são: Portal Rap Nacional; Portal Central Hip
Hop; Enraizados; Radar Urbano; Rap
Evolusom; e Central Hip Hop. Pois esses
espaços em ambiente Web são os que de fato
oferecem a expressão máxima de comunicação
entre os seus indivíduos.
Essa abertura em função da construção coletiva
do conhecimento pode melhorar e unificar a
cultura Hip Hop caso exista um ambiente em
linguagem wiki especifico para ela, como um
WikiHipHop, que crie convergências para o
grafiti, o break, o mc e o dj, juntamente com
links para discussões que crie esse universo
como a literatura marginal, gênero literário que
surge para representar os tramas das periferias,
assim como as letras de rap e seus conteúdos
reivindicatórios.
Percebe-se assim que a Web Social pode ser
uma potencializadora de espaços digitais onde
os usuários possam colaborar para construir
maior autonomia nas informações,
principalmente comunidades e produções
periféricas que são estereotipadas ou não
representadas nas mídias tradicionais.
Janaina França de Melo é
bacharel em Biblioteconomia pela
Faculdade de Filosofia e Ciências da
Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita
Filho”. Trabalha na Biblioteca Municipal Prefeito
Mitsuo Marubayashy da Estância Turística de
Paraguaçu Paulista – São Paulo.
Maria José Jorente é
licenciada em Artes pela FAAP e em
Letras pela USP. Especializada em
Design de Produto. Doutora pelo Programa de Pós-
graduação em Ciência da Informação pela UNESP.
Professora Assistente-Doutora do Departamento de
Ciência da Informação (UNESP). Coordenadora do
Laboratório de Desenvolvimento e Aplicação de
Multimídia da FFC - UNESP. Desenvolve atividades
nas áreas de Informação e Tecnologia, TIC, Mídias,
Intersemiótica, Hipertextualidade, Web Design,
Mobilidade, Portabilidade e Convergência de
linguagens na Internet, Cultura Digital, Redes de
Informação, Intersemioses Digitais, TIC aplicadas às
Unidades de Informação e transformações do uso
das TIC na Web Social e Colaborativa.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 13
artigos reportagens
E O Q U E C A D A U M A D E L A S T E M D E E S P E C I A L . . .
por Soraia Magalhães
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 – 14
reportagens
Para incentivar o surgimento de listas de belas bibliotecas brasileiras aos moldes das
que são periodicamente difundidas nas redes sociais, ou mesmo pelos canais de notícias
sobre belas bibliotecas do mundo, optei por eleger dez bibliotecas do Brasil que a meu
ver se destacam não apenas pela beleza arquitetônica, mas pela inovação ou decoração
interna ou por sua história e relação com a cidade. Desde já, observo que as dez
selecionadas foram bibliotecas que tive a oportunidade de conhecer in loco e por isso
deixei de fora tantas outras que por não ter visitado, mesmo sabendo de suas
potencialidades, não as adicionei a essa lista.
Real Gabinete Português de Leitura
Rio de Janeiro, RJ
Presente em várias listas internacionais como uma das mais bonitas bibliotecas do
mundo, o Real Gabinete Português de Leitura, do Rio de Janeiro, confere posição de
destaque por seu deslumbrante projeto arquitetônico, detido especialmente na decoração
interna, envolta em rico acervo de autores lusitanos e por sua relação histórica com a
capital fluminense. Um tesouro.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 15
reportagens
Biblioteca Nacional
Rio de Janeiro, RJ
A Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro abriga acervo composto por cerca de nove
milhões de itens, sendo considerada pela UNESCO uma das dez maiores bibliotecas
nacionais do mundo. Seu precioso acervo, sua beleza arquitetônica e as diversas
atividades que realiza fazem com que seja ponto de referência cultural do turismo na
cidade do Rio de Janeiro.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 – 16
reportagens
Biblioteca Pública de Niterói
Niterói, RJ
A Biblioteca Pública de Niterói se destaca não apenas por sua composição arquitetônica
junto a outros edifícios históricos, mas pela adequação do antigo com o novo. Após
detalhada reforma, passou a exibir novidades que vão do mobiliário aos equipamentos
tecnológicos, ao acervo e ações que motivam a participação da comunidade, numa
proposta que referencia as bem-sucedidas bibliotecas Parque da Colômbia.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 17
reportagens
Biblioteca Pública Estadual do Amazonas
Manaus, AM
A Biblioteca Pública do Amazonas teve seu marco de criação no ano de 1870, mas seu
espaço foi consolidado somente em 1910, em prédio construído em estilo neoclássico,
na área central de Manaus. Apesar de ter fechado suas portas para reforma por um
longo período, reabriu em 2013 atraindo o interesse do público local e de turistas de
diversas partes do mundo que visitam o Amazonas.
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Biblioteca Mário de Andrade
São Paulo, SP
A Biblioteca Mário de Andrade foi fundada em 1925 e seu edifício em art déco, figura
como umas das jóias do centro histórico de São Paulo. Com amplos e elegantes salões,
possui o segundo maior acervo documental bibliográfico do Brasil, formado por
inúmeras raridades. O que a faz tão bela e vale a pena ressaltar é a percepção da
grande quantidade de usuários fazendo uso dos serviços. Uma Biblioteca vibrante!
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Biblioteca Parque de Manguinhos
Rio de Janeiro, RJ
A Biblioteca Parque de Manguinhos, inaugurada em 2011, segue os preceitos das
Bibliotecas Parque da Colômbia, onde a visão de espaço e serviços constituiu elemento
de resgate social e cidadania. Colorida, ampla e cheia de novidades é uma biblioteca
bela, coerente e necessária.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 – 20
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Biblioteca de São Paulo
São Paulo, SP
Construída onde outrora funcionou a Casa de Detenção do Carandiru, a Biblioteca de
São Paulo, inaugurada em 2010 em uma área de 4.200 metros quadrados, energiza o
passado criando um espaço de oportunidades. O lúdico está presente em diversas áreas
internas e a atenção ao público jovem e infantil fazem desta Biblioteca um exemplo a
ser valorizado e seguido por gestores de outras cidades do país.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 21
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Biblioteca Luiz de Bessa
Belo Horizonte, MG
Foto: Divino Advincula/Flicker
Foi projetada por Oscar Niemeyer e fundada em 1954 no governo de Juscelino
Kubitschek. Faz parte do Complexo Cultural da Praça da Liberdade, sendo um espaço
bastante visitado na capital mineira. Em frente ao edifício, foi instalada a obra o
“Encontro Marcado” com os escritores mineiros Otto Lara Rezende, Fernando Sabino,
Paulo Mendes Campos e Hélio Pellegrino, em estátuas de bronze em tamanho natural.
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Biblioteca da Floresta
Rio Branco, AC
A Biblioteca da Floresta foi inaugurada em 2007 em edifício moderno e confortável
com traços característicos dos ambientes amazônicos. Além de dispor de relevante
acervo especializado sobre o estado do Acre e da região, abriga exposições permanentes
e temporárias e viabiliza uma série de serviços aliando ações de biblioteca com
elementos museológicos.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 23
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Gabinete Português de Leitura
Salvador, BA
Foto: Flávio de Queiroz Panoramio
A Biblioteca do Gabinete Português de Leitura de Salvador é outra jóia marcante da
presença portuguesa no Brasil. Recebe o nome Infante D. Henrique, e não é tão
conhecida como o Real Gabinete do Rio de Janeiro. O edifício, contudo, do ponto de
vista exterior, ricamente projetado em estilo Neomanuelino, é um primor projetado
entre os anos de 1912 e 1915.
Soraia Magalhães nasceu em Manaus, Amazonas. Mestra em
Sociedade e Cultura na Amazônia. Participa do Núcleo de Estudos e
Pesquisas das Cidades na Amazônia Brasileira (NEPECAB). É
Bibliotecária voluntária do Instituto Ler para Crescer e editora do Blog Caçadores de
Bibliotecas.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 – 24
reportagens
por Chico de Paula
reportagens
S E R O U
N Ã O S E R
B I B L I O T E C Á R I O
QUAIS AS PRINCIPAIS MOTIVAÇÕES PARA
SE ESCOLHER A BIBLIOTECONOMIA COMO
PROFISSÃO?
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 25
reportagens
RIO – Há alguns anos o bibliotecário Edson Nery da Fonseca escreveu o clássico artigo que
ora tomamos o título emprestado. No texto Nery elenca alguns motivos pelos quais se
poderia (ou se pode) estimular ou desestimular alguém a seguir a carreira de bibliotecário:
“Ser bibliotecário para transformar as bibliotecas em organismos dinamicamente integrados
no desenvolvimento econômico, científico e tecnológico; Não ser bibliotecário para tornar-
se um burocrata a mais no sistema administrativo da nação, do estado ou do município”, diz
ele.
Nery, que foi mais professor de Biblioteconomia do que bibliotecário, defende a ideia de
que o bibliotecário não deve ser um técnico: “o bibliotecário deve ser uma pessoa culta,
como foram os bibliotecários da antiguidade”. Culto ou técnico, o fato é que existem
motivos diversificados que levam alguém a optar pela Biblioteconomia como profissão.
Alguns apontam o gosto pelo livro e pela leitura; outros simplesmente colocam a baixa
concorrência, seja no vestibular, no mercado de trabalho ou mesmo em concursos públicos
como atrativo, dado ao pequeno número desses profissionais no Brasil. Conforme dados do
sistema CFB/CRBs, os bibliotecários somam 34 mil, sendo que destes apenas 18 mil estão
ativos.
Para Silvia Maria Fortes, que é bibliotecária escolar em Niterói, região metropolitana do
Rio, o que lhe motivou a escolher a Biblioteconomia foi o fato de que quando ainda cursava
o ensino médio, antigo segundo grau, teve a oportunidade de trabalhar em uma escola de
ensino fundamental, onde passou pelos setores de auxiliar de maternal e assistente de
secretária, até receber a missão de montar uma biblioteca.
“‘Contratar uma bibliotecária? Não! Vamos colocar a Silvia lá!’ E assim fui inaugurar a
biblioteca do IEEP, totalmente crua. Não sabia nada da profissão, não tinha ninguém para
me orientar. Comecei a observar o trabalho das bibliotecárias da biblioteca da escola em
que eu estudava e que eu frequentava desde sempre e por instinto comecei a realizar
empréstimos e ‘catalogar’ no meu trabalho [...] Foi aí que descobri a profissão e tive a
certeza de que era isso que eu queria fazer. Trabalhei na escola durante seis anos, quando
saí estava começando a faculdade”.
Mesmo se desdobrando para dar conta de todo o serviço técnico da biblioteca – receber o
público (alunos da escola) para a realização de empréstimos e eventualmente fazer algumas
leituras, internas ou ao ar livre – Silvia ainda encontra tempo para editar um blog com dicas
de leitura. “Realizo também oficinas relacionadas à leitura ou a algum escritor específico,
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 – 26
reportagens
segundo a necessidade de cada turma mediante trabalho conjunto com os professores”,
informa a bibliotecária.
Bibliotecária e docente da Universidade Federal Fluminense (UFF), Marcia Tavares fez, no
fim da 8º série, testes vocacionais que lhe indicaram potencialidades para várias áreas:
“tirando Desenho e Engenharia Civil – baixíssimo raciocínio espacial – eu poderia fazer o
que quisesse, incluindo área matemática e altíssimo raciocínio mecânico – em geral baixo
para mulheres”. Mas o que ela gostava mesmo de fazer era ler. Seu pai tinha uma biblioteca
de cerca de 500 livros, onde ela adorava classificar, organizar as coleções e ler, ler muito, de
tudo um pouco – de Eça de Queroz a Machado de Assis, de biografias de Mahatma Ghandi
a relatos de tortura na guerra de independência da Argélia. E Monteiro Lobato, todo. A
coleção infantil e a coleção adulta.
Lobato, a propósito, apareceria novamente na vida de Márcia. Já formada em
Biblioteconomia, ela fez vestibular para Direito e uma questão discursiva (o ano era 1986)
ganhou por causa do autor de clássicos como o Sítio do Pica-pau Amarelo. A pergunta era
sobre a campanha “O petróleo é nosso!”, tema de uma de suas obras: “A questão era
dissertativa e assim, passei em 9º lugar para Direito. E eu havia entrado em 1º lugar em
Biblioteconomia”, se orgulha.
Quando estudante de Biblioteconomia, Marcia estagiou desde o primeiro semestre de
faculdade. Era 1979. De lá para cá foram vários estágios e três empregos: UFRGS, Tribunal
Regional Federal da 2º Região e UFF, onde entrou em terceiro lugar: “Um terceiro lugar de
que muito me orgulho”. Foram 12 anos de prática bibliotecária e mais os estágios. Tendo
estudado de 1979 a 1982, começou a trabalhar em janeiro de 1983, somando 31 anos de
formada e mais os quatro de estagio. “Praticamente 35 anos de militância bibliotecária e
arquivística também dado aos estágios e à docência em Arquivologia”, ressalta.
A eterna luta pela afirmação e pela valorização
Mesmo sendo uma prática profissional milenar, a Biblioteconomia ainda vive no Brasil
uma fase de afirmação enquanto profissão, sobretudo em virtude da ignorância em relação
às práticas que envolvem a leitura e as práticas profissionais neste campo. Como se sabe, os
índices de leitura por aqui são baixíssimos, chegando a 2,1 livros inteiros por ano, conforme
dados da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil 2011.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 27
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Silvia, por exemplo, está satisfeita com a profissão, mesmo assim reclama da pouca
valorização da profissão, sobretudo no ambiente escolar: “Muitas instituições insistem em
não contratar um profissional, julgando a biblioteca como uma parte menos importante da
escola. Sempre pergunto para amigos e pessoas de meu convívio como é a biblioteca da
escola de seus filhos e geralmente ouço que a escola não tem biblioteca, ou que tem uma
salinha fechada aonde vão às vezes com a professora”.
A falta de reconhecimento e conhecimento é tanta que já se tornou clássica entre
profissionais e estudantes a expressão “Biblio o que?”, se refindo à pergunta comum que os
leigos fazem quando alguém informa que é formado em ou estuda Biblioteconomia.
O desconhecimento acerca da carreira, a propósito, já fez parte da vida de muitos hoje
bibliotecários. É o caso de Cleyde Rosário. Embora vindo de uma família de leitores, a
bibliotecária conheceu o curso por acaso: “nem sabia, como muitos, que havia tal curso”.
Após ser reprovada no vestibular para Jornalismo, Rosário saiu em busca de um curso
menos concorrido. Segundo ela, 70% dos que escolheram o curso em sua época – no ano de
1990 – escolheram em função da baixa relação candidato/vaga no vestibular.
O mercado de trabalho
Conforme o Código Brasileiro de Ocupações (CBO) do Ministério do Trabalho e Emprego,
o bibliotecário tem por atribuição “disponibilizar informação em qualquer suporte;
gerenciam unidades como bibliotecas, centros de documentação, centros de informação e
correlatos, além de redes e sistemas de informação. Tratam tecnicamente e desenvolvem
recursos informacionais; disseminam informação com o objetivo de facilitar o acesso e
geração do conhecimento; desenvolvem estudos e pesquisas; realizam difusão cultural;
desenvolvem ações educativas. Podem prestar serviços de assessoria e consultoria”.
Como se vê, um dos maiores atrativos em relação ao mercado de trabalho para o
bibliotecário é, sem dúvida alguma, o leque de possibilidades de atuação. Esse profissional
pode atuar em unidades de informação variadas, não só em bibliotecas. Além disso, a
internet tem possibilitado novos horizontes a esses profissionais, visto que a informação se
mostra cada dia mais ligada aos aparatos tecnológicos da computação.
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Outro importante atrativo a esses profissionais é o serviço público. Tanto é assim que a
bibliotecária Kátia Maria Costa não escolheu a Biblioteconomia, mas sim o serviço público.
Frustrada por não ter feito Faculdade de Educação Física, vasculhou vários cursos dentre os
quais teria condições de passar no vestibular, além da pressão da idade: já estava com 33
anos: “Mas o que me chamou atenção foi o que estava escrito na habilitação que era em
Gestão da Informação – aquela coisa moderna. Então entrei e não pretendo sair mais…
Uma delicia que satisfaz minha vida profissional”.
Estando formada há cinco anos, há quase quatro Kátia passou em um concurso público,
com salário e ambiente de trabalho que adora: a Biblioteca Pública Municipal Ary Cabral,
dentro da Fundação Cultural de Brusque, em Santa Catarina. “Como a maioria das
Bibliotecas Pública, tenho que muitas vezes me desdobrar do planejamento ao operacional,
são vários problemas, mas muitas conquistas e isso nos faz acreditar que ainda temos
esperança para nossas bibliotecas”, avalia.
A satisfação pela escolha profissional
Apesar de todos os percalços, o que existe de comum nos discursos dos profissionais é a
satisfação pela escolha da carreira de bibliotecário. Para a bibliotecária Rosário, por
exemplo, “foi paixão mesmo”; “estou muito satisfeita!”, diz ela que atua na área há 11 anos.
“Já passei por todo tipo de biblioteca: infantil, escolar, universitária, especializada, centro de
referência e agora pública; posso dizer que dei o meu melhor em todos os locais por onde
passei” ressalta orgulhosa.
De forma semelhante, a bibliotecária Silvia Maria diz que sua satisfação está na realização
do seu trabalho, principalmente lidar com o público infantil. Kátia Maria, por sua vez,
assevera que a profissão de bibliotecário é uma delicia que satisfaz sua vida profissional.
E você? O que lhe motivou, motiva ou pode motivar a ser bibliotecário?
Clique aqui e leia integralmente os relatos que compuseram esta matéria
CHICO DE PAULA é editor-chefe da Revista Biblioo.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 29
reportagens
RIO – Os livros eletrônicos ou simplesmente e-books são o futuro irremediável das
bibliotecas, é o que garante a bibliotecária Liliana Serra. Tendo proferido palestras e
cursos sobre o assunto, Liliana se dedica a pesquisar o complexo tema que tanto tem
afligido os bibliotecários, sobretudo em virtude das diversas dúvidas que surgem na
hora de se optar por esse movo modelo de documento nas unidades de informação.
Nesta entrevista, Liliana fala um pouco da pesquisa que tem desenvolvido no mestrado
e responde algumas questões sobre o tema.
Chico de Paula: Liliana, gostaria de pedir que
você se apresentasse, falasse um pouco sobre a sua
trajetória acadêmica para que possamos conhecer
um pouco mais sobre você.
Liliana Serra: Eu sou bibliotecária, me formei em
1992 pela FESP [Fundação Escola de Sociologia e
Política de São Paulo]. Estou na área de bibliotecas
desde 1989 e nem estou contando toda a minha
vida, porque sou filha de bibliotecários, quase nasci
no meio de estantes. Já passei por vários tipos de
bibliotecas: universitária, escolar, pública, cultural e
jurídica. Sempre com essa visão mais de tecnologia;
sempre me encantou a tecnologia e como ela pode
melhorar o trabalho do bibliotecário e eu trabalho
na Prima Informática [empresa que desenvolve o
software Sophia para bibliotecas] há quase quatro
anos como bibliotecária ajudando a desenvolver o
sistema de bibliotecas e eu comecei a me preocupar,
entrevistas
LILIANA SERRA ““EEUU NNÃÃOO VVOOUU DDIIZZEERR QQUUEE ÉÉ OO FFUUTTUURROO DDAASS BBIIBBLLIIOOTTEECCAASS,,
MMAASS AASS BBIIBBLLIIOOTTEECCAASS VVÃÃOO TTEERR QQUUEE TTEERR EE--BBOOOOKKSS NNOO FFUUTTUURROO””
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 – 30
entrevista
s
já tem quase três anos, com a questão do controle
de estoque, como que o cliente poderia solicitar que
o sistema ajudasse na gestão de conteúdos de sites.
Eu comecei a procurar informação sobre isso e não
achei nada relevante na literatura brasileira.
Comecei a procurar na literatura estrangeira e tive
bastante dificuldade de encontrar alguma coisa, até
que em algum momento eu achei informação e eu
comecei a pesquisar sobre isso. Junte a isso o fato
de eu ter participado de congressos internacionais
onde eu tive contato com alguns nomes muito
representativos da área, pessoas que estão
estudando, grandes referenciais teóricos da área de
e-books, principalmente dos Estados Unidos eu tive
contato pessoal mesmo. Para passar em um projeto
de mestrado foi um pulo. Antes de entrar no
Programa de Mestrado da USP, eu já tinha
apresentado um trabalho finalista do Congresso de
Livro Brasileiro da CBL [Câmara Brasileira do
Livro] no ano passado, terceiro Congresso em
2012, e no final do ano passado eu emendei no
projeto de mestrado, para onde estou levando este
tema. Existem algumas pessoas estudando o
assunto, mas eles têm um foco diferente do que eu
tenho estudado. A minha preocupação é como o e-
book vai mudar o trabalho das bibliotecas, e como
algumas questões estão sendo muito afetadas, do
trabalho do bibliotecário mesmo, enquanto as
pesquisas que têm no curso tem foco muito no
mercado editorial. Eu acho que todas as pesquisas
sobre o tema são interessantes e agregam, mas não
tinha na nossa área ninguém pesquisando o que vai
acontecer com a biblioteca ou como é que eu vou
usar o e-book na biblioteca, e é nisso que estou
querendo focar na minha pesquisa. E quando você
começa a estudar sobre esse tema, ele começa a
mostrar possibilidades das dificuldades. Primeiro,
“o que é um e-book?”. As pessoas têm uma visão
um pouco ingênua do que é um e-book ou do que
pode vir a ser um e-book que é uma tecnologia
nova, e a gente tem observado que o e-book não é
um livro digital simplesmente, ele pode ser um
simples livro digital, mas ele pode ser muito mais
do que isso. Então eu tenho que ter um referencial
conceitual mesmo do que é um livro digital, como
ele entra na biblioteca, quais são as opções… Eu
tenho que falar do modelo de negócios, e é muito
difícil falar de prática em um ambiente acadêmico.
Mas ao mesmo tempo eu acredito que a academia
estuda as questões conceituais, estuda as questões
teóricas – tem que estudar, é o foco da academia –
mas eu também tenho que ter uma aplicação no
mercado, porque senão eu vou fazer o estudo, que é
importante, e o mercado continua sem nenhuma
resposta. Eu não tenho pretensão de dar respostas
ao mercado porque não existe uma resposta ao
mercado, não vai ser uma única resposta, mas o
objetivo da minha pesquisa, e do que eu tenho
escrito sobre o tema, é tentar trazer subsídios para
que a gente saiba que cenário é esse, quais as
possibilidades, quais são as cartas que estão em
jogo hoje, para gente saber o que a gente pode
melhorar, o que eu posso usar, como eu posso usar,
ou se não está bom para mim, como eu vou
negociar para que fique bom. Então eu tenho que
primeiro conhecer esse ambiente para, a partir daí,
eu falar: “não, isso aqui muda a forma de trabalhar,
mas é uma evolução”, porque eu não posso pensar
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 31
entrevistas
no e-book como mais um tipo de suporte
simplesmente. Ele tem um tratamento diferente,
exige um tratamento diferente. Eu tenho que ter um
nível digital muito maior do que eu tinha, porque
uma coisa sou eu ter uma estante de livros – eu vejo
que eu tenho tantos registros, tantas obras no meu
acervo – outra coisa é saber que eu tenho nos
servidores ou meu, ou no repositório externo ou no
fornecedor externo, então eu não vejo mais. O nível
de resposta tem que ser maior.
C. P.: Liliana, em termos práticos, qual ou quais as
principais preocupações que os bibliotecários
devem ter na hora de fazer a aquisição dos e-
books?
L. S.: Já começamos com um problema, porque eu
não posso falar em aquisição de e-books… O tema
da minha dissertação, pelo menos o título provisório
é: “O Impacto dos e-books em bibliotecas” e o
primeiro impacto é que eu não sou mais a dona
dele, eu tenho uma licença de uso, então a forma
como eu faço a aquisição não é a mesma, eu tenho
que saber até onde vai o meu direito de proprietária:
Ele vence? É perpétuo? Eu assino? Que modelo eu
vou usar para ter esse material? Eu vou dispor para
o meu usuário durante um tempo? Às vezes eu vejo
algumas opiniões assim: “Que absurdo! Assinatura!
O livro é da biblioteca!”. Depende! Se eu estou em
uma biblioteca de pesquisa de repente eu não quero
fazer um investimento de longo prazo, eu posso
assinar as obras naquele período, fazer um
investimento para aquele período. Me atendeu, eu
não preciso mais daquele custo. Se for uma
biblioteca pública é diferente, uma biblioteca
universitária é diferente, então começa a ficar mais
claro que não basta eu falar em e-book, eu tenho
que saber que tipo de conteúdo é esse em meio
digital, em que perfil de biblioteca ele vai ser
utilizado, qual é o usuário, qual a expectativa do
usuário que você tem, quem tem esse conteúdo para
fornecer e em quais moldes. Então são muitas
questões que eu tenho que saber para, a partir daí,
eu começar a tomar decisões.
C. P.: Nesses termos, não se pode falar em
empréstimo de e-books?
L. S.: Pode falar em empréstimo de e-books sim
porque a função da biblioteca é emprestar. A
biblioteca não aluga livros, apesar de muito usuário
jovem chegar à biblioteca e perguntar: “vocês
alugam livros?”. “Não, a gente empresta livros!”. A
gente não cobra, o aluguel tem uma negociação
comercial e a biblioteca não tem essa conotação.
Mas eu acho sim que existe empréstimo digital, ele
pode acontecer de várias formas. Não vejo como
limitações tecnológicas. São limitações comerciais.
São limitações de como nossos fornecedores estão
oferecendo o material para gente. Então as minhas
limitações são comerciais, são politicas, são
definidas pelos editores.
C. P.: Você falou que um dos pressupostos em
relação a esse novo mercado é o modelo de
negócio das editoras. Você não acredita que o
modelo de negócio das editoras está prevalecendo
sobre o interesse público, em relação aos e-books?
L. S.: Eu não sei se eu falaria em interesse público,
porque depende da biblioteca onde eu estou usando.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 – 32
entrevista
s
O papel de cada biblioteca é diferente. A biblioteca
pública tem uma função social. A biblioteca
universitária, pode ser privada ou pública, tem uma
função educativa, acadêmica. Uma biblioteca
jurídica tem uma função puramente de negócios,
então eu não consigo pensar num papel público da
biblioteca, porque dependendo do uso que eu vou
fazer desse e-book, ele vai ter uma natureza. O que
a gente observa, o que a gente sente – isso não só
Brasil – eu acho que a gente nem começou a ter
problema de e-book no Brasil. Não que estejamos
no zero. Já teve discussão e já temos alguma oferta,
mas estamos muito atrasados em relação à Europa e
bastante atrasados em relação aos Estados Unidos.
O que a gente observa é que o mercado editorial
num todo é extremamente conservador e por medo
do que já aconteceu com o mercado fonográfico,
que foi destruído com MP3, com a digitalização do
que eles tinham pra vender, vendiam música e a
música foi digitalizada e as pessoas começaram a
distribuir livremente, isso causou uma total
remodelação do mercado fonográfico. As pessoas
não ganham mais dinheiro hoje no mercado
fonográfico vendendo disco. Elas ganham dinheiro
com show. Nunca show foi tão caro e ganham
dinheiro vendendo música, e é curioso porque a
gente observa até um retrocesso, pois a partir do
momento que eu começo a comprar uma música e
não compro mais o álbum, o disco que tem 10, 12
músicas eu volto a consumir música como eu
consumia na década de 50, quando eu não tinha o
LP, o Long Play, que era o álbum. É um paralelo
que é bem curioso. No caso do mercado
fonográfico, ele quebrou e está se reinventando. Já
o mercado editorial, quando chegou a digitalização
neste nível, a primeira reação dele, e foi uma reação
natural, “eu vou me proteger porque eu não posso
deixar acontecer comigo o que aconteceu com o
mercado de música”. Eles colocaram uma série de
barreiras, de restrições em uma tentativa de proteger
o seu modelo, o seu negócio porque eu não posso
pensar só com cabeça de biblioteca pública, tenho
que pensar que livro é uma indústria, é um
mercado, as pessoas publicam livro porque é o jeito
que elas ganham a vida, é o negócio delas, elas têm
que ser remuneradas por isso, elas trabalham por
isso. Eu tenho que ser remunerado, eu tenho que ter
a visão de indústria, porque dependendo de onde
essa indústria atua ela vai ter um comportamento
diferente. A biblioteca pública compra livros da
mesma forma que uma biblioteca particular compra
livros. Não é uma questão do público. A biblioteca
faz outro uso da publicação que ela investiu para
atender melhor o seu usuário. Como o mercado
editorial dificultou, ele começou a ver que se ele
vendesse para uma biblioteca um livro digital e esse
livro digital não tivesse proteção, isso significaria
que a biblioteca ia comprar um livro digital,
colocaria em seu acervo e as pessoas entrariam na
biblioteca e baixariam o livro quantas vezes
quisessem e quantas pessoas quisessem. Então
agora eu teria um livro sendo vendido, consumido
por milhares e as pessoas não comprariam mais
livro e as editoras quebrariam. Por causa disso eles
colocaram uma série de proteções tecnológicas para
dificultar que as bibliotecas comprassem livros em
primeiro lugar. Têm casos de editoras que não
vendem ou não vendiam, algumas já estão se
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 33
entrevistas
sensibilizando, mas não vendiam pra bibliotecas,
vendiam só para pessoa física e agora que o
mercado já tem uma segurança tecnológica que
garante, não é 100 por cento – nada é 100 por cento
no meio digital – mas ele já tem uma barreira de
segurança. Eles já estão mais acostumados com o
que é o livro digital. É uma novidade para o editor
também. Eles começam a ver que não precisa ser
tão rigoroso, mas ainda existe muito chão para
gente caminhar e chegar num meio termo que seja
interessante para todo mundo. Eu tenho uma visão
de que não adianta querer brigar com o editor,
porque se eu quiser brigar com o editor eu não vou
caminhar, porque eu dependo do editor para ter as
obras no acervo. Eu não vou aceitar tudo o que ele
quer. Eu entendo o porquê ele está agindo dessa
forma. É o negócio dele, é o meio de vida dele. Eu
entendo, mas ele tem que entender que biblioteca é
parceiro. Afinal de contas, a biblioteca sempre
comprou muito. Às vezes a pessoa conhece o livro
na biblioteca e isso representa venda. A partir do
momento que eu começo a sentar com o editor e
começo a negociar mais flexibilidade de contrato,
mais oferta, menos restrições, eu consigo caminhar
e é nessa linha que tem sido feito no mercado norte-
americano. Eles brigam? Sim, eles brigam bastante.
Tiveram casos que eles chamaram algumas editoras
para sentar – as bibliotecas americanas tem uma
representação muito forte no país junto ao mercado
editorial. Elas chamaram alguns editores muito
importantes para conversar e falaram assim: “não é
assim que a gente quer trabalhar, vamos
flexibilizar”. E muitas coisas já estão avançando. Eu
acho que é nessa linha que a gene tem que ir. Não
adianta querer ficar dando muro em ponta de faca,
brigando com o editor, fazendo manifestação,
“vamos denegrir a imagem dele”, não adianta fazer
isso, com isso você vai se desgastar.
C. P.: Liliana, as duas modalidades básicas que os
bibliotecários têm hoje para ter os e-books nas suas
bibliotecas, ter esse acesso nas suas bibliotecas,
são assinatura e aquisição perpétua, certo? O que
o bibliotecário deve levar em consideração na hora
de fazer a sua opção, em termos práticos?
L. S.: Isso depende muito. Depende de uma série de
fatores.
C. P.: Estou meio que repetindo uma pergunta
anterior, mas é para ficar um pouco mais claro.
L. S.: Existem outros modelos de negócio, mas no
Brasil o que temos de oferta hoje são esses dois:
assinatura ou aquisição perpétua. As duas têm prós
e contras. A aquisição perpétua para a gente é o
mais confortável porque é o mais parecido com o
que a gente fez até hoje: eu escolho os títulos que eu
quero, eu vou adquirir, eles vão ser meus, eu vou ter
uma licença de uso, eles podem ficar no meu
servidor ou podem ficar no servidor do fornecedor.
Isso também tem lado bom e lado ruim, e eu não
preciso comprar para ter a cesso a essa obra, ela é
minha e eu vou acessá-la. Normalmente a aquisição
perpétua é um acesso por vez, não permite acesso
simultâneo, normalmente é isso. No caso da
assinatura, você tem o direito de usar aquela obra
por um período, ela não é sua, se você não renovar
a assinatura você vai perder o acesso à publicação.
Dependendo do uso do seu acervo, essa é uma boa
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 – 34
entrevista
s
modalidade. A gente vai ter que começar a fazer
uma coisa que não era muito usual para o
bibliotecário. Eu vou ter que começar a fazer uma
gestão de recursos, gestão de orçamento. Eu tenho
que prever se eu tenho a minha assinatura, se eu
vou manter essa assinatura. Não vou trabalhar com
uma única assinatura. É uma coisa que o pessoal
aqui no Brasil não percebeu ainda. Eu não vou ter
um fornecedor para me atender em tudo, então eu
vou ter casos em que eu vou ter que fazer gestão de
várias assinaturas: “isso cabe no meu orçamento,
isso não cabe, esse eu renovo?”. Tem uma variação
de preços, obras novas entraram, eu posso ter
acesso simultâneo. É um serviço. Eu estou
contratando um serviço, a assinatura é um serviço,
eu não tenho posse, eu não tenho a licença de uso.
A aquisição perpétua não. Ela dá licença de uso, eu
posso usar aquela obra porque ela me pertence, mas
isso não quer dizer que eu posso fazer o que eu bem
entenda com ela.
C. P.: Em três palavras, o e-book é o futuro das
bibliotecas?
L. S.: Eu não vou dizer que é o futuro das
bibliotecas, mas as bibliotecas vão ter que ter e-
books no futuro. Eu não vou dizer que é o futuro
porque não é só isso.
Emilia Sandrineli: Você comentou que participou
de vários congressos nacionais e internacionais,
então a partir dessa experiência você conheceu
casos de bibliotecas que estão sendo muito bem
sucedidas ou casos interessantes que possam servir
de exemplo da relação das bibliotecas com os e-
books e seus usuários para as bibliotecas aqui no
Brasil?
L.S.: Não, eu não diria da biblioteca, mas eu acho
que os avanços maiores… A gente tem uma
diferença cultural, de políticas de Biblioteconomia
muito grande em relação aos Estados Unidos. Eu
não vou dizer que lá seja melhor, eu não vou dizer
que seja pior, eu não vou entrar nesse mérito. Eu
acho que cada um tem suas características, mas eles
têm uma coisa que no Brasil até já existiram
tentativas, mas não vingou da forma como tem de
consórcio. Eles têm consórcios de bibliotecas e são
consórcios muito fortes. Quando você é forte, você
tem um poder de negociação maior, você fala de
repente num consórcio com 20, 30 bibliotecas ou
públicas ou universitárias e isso você senta para
negociar com o fornecedor com outro peso.
Normalmente os relatos que a gente tem são casos
de consórcio. O movimento dos e-books começou
nas bibliotecas americanas com as universitárias,
porque é onde a demanda é maior, a rapidez da
informação, a facilidade de acesso das obras, então
começou no meio universitário. Foi expandindo
para as públicas, que tiveram muitas restrições dos
editores. A gestão de bibliotecas deles não é
bibliotecas infantis. Elas não são bibliotecas
puramente escolares. Eles as chamam de K12. Você
pega desde a criança bebê, pequenininha, até o que
seria o nosso ensino médio – é o que eles chamam
de infantil, eu falo desde a parte de recreação de
leitura, acompanhamento escolar etc. Então a gente
tem visto esses três seguimentos muito claros. O
seguimento corporativo é bem menor que o
universitário. Nós temos muitos casos… Eu não
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 35
entrevistas
citaria o caso de uma porque o usuário quer, o
usuário precisa, então a biblioteca vai correr atrás
para atender o seu usuário. Eu não tenho o caso de
uma biblioteca que seja exemplar, eu tenho alguns
casos que são mais simbólicos, por exemplo: foi
inaugurada agora no Texas, em agosto, se não me
engano, uma biblioteca que não tem livros. Ela já
nasceu digital. São duas no Texas, uma ligada a
Universidade e a outra ligada a um College, a
universidade também. Elas nasceram já com o
conceito de ser cem por cento digital. Elas não têm
estantes. Tem uma que tem um espaço muito
pequeno, a outra o espaço é maior, mas é uma área
onde você tem mesas, cadeiras, sofás, terminais de
computador, mas não têm estantes. A área de
estantes é usada para o usuário ocupar o espaço. O
que também é curioso porque uma biblioteca digital
não precisa que o usuário esteja presente, é outro
modelo de negócio. Eu passo pelo tipo de acesso
que a pessoa tem que estar na minha biblioteca pra
poder acessar o e-book. É outra forma de gestão
que existe para usar livro eletrônico. Têm vários
casos, têm casos de bibliotecas que emprestam
tablets com o objetivo de leitura, tem biblioteca que
já usa há muito tempo e ai você tem acesso
enquanto é nosso usuário e quando não tem mais
vínculo com a instituição você não tem mais acesso
aos digitais por conta do contrato com os editores.
As bibliotecas públicas que estão começando agora
a fazer uso, que estão conseguindo fazer
assinaturas, têm projeto com a Amazon que não
está muito claro ainda como vai ser isso, não está
claro para eles. Estão tendo algumas brigas… É um
tema que eu estou estudando até para uma
disciplina que estou tendo agora no mestrado. A
Amazon está emprestando livros para os usuários
de uma biblioteca pública, através de um agregador
de serviço, a Amazon aluga.
C. P.: Você lembra o nome desse serviço?
L. S.: É a Overdrive trabalhando com a Amazon. A
Overdrive é o agregador de conteúdo, um dos
maiores que tem no mundo. No Brasil a gente não
tem Overdrive e ela fez a parceria com a Amazon.
Então eu sou usuário de uma biblioteca pública, eu
tenho meu cartãozinho, minha carteirinha de
usuário, eu vou ao site da minha biblioteca e eu
escolho que eu quero emprestar uma obra no
formato Kindle, eu faço a baixa no meu pátio, dali
eu sou direcionada para a Amazon que já sabe
quem eu sou ou eu me identifico com a minha conta
Amazon e ele está lá no meu texto como se fosse de
compra, mas ao invés de fazer uma compra eu vou
emprestar e essa é a política que foi negociada com
a Overdrive junto com a biblioteca. Só que isso não
vai ficar só nisso. A gente sabe que não vai ficar só
nisso, porque o objetivo da Amazon não é só
emprestar. Tudo bem, ela está ganhando dinheiro
com a parceria, ela está sendo remunerada pelo
aluguel, porque ela faz o aluguel, a biblioteca
empresta; e esse aluguel está sendo pago no
contrato com a Overdrive. Mas existem questões
que aqui para o Brasil eu não me lembro de ter visto
isto, mas que é muito sério nos Estados Unidos…
“Cadê a minha privacidade enquanto leitor?”.
Porque uma coisa sou eu ser uma pessoa que tem
uma conta na Amazon e eu compro um livro,
porque cada vez que eu entro na Amazon ela fala
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 – 36
entrevista
s
pra mim: “você que comprou isso, pode gostar
disso, disso e disso!”. Outra coisa é através dos
livros que eu pego emprestado ela saber quem eu
sou e começar a me bombardear com propaganda.
C. P.: É mais ou menos o que o Google faz?
L. S.: O Google reconhece a ID. Ele sabe por onde
você navegou e o que pode te interessar, ele usa isso
como critério de relevância na hora de mostrar os
dados para você. A Amazon é um pouco mais do
que isso, porque ela sabe exatamente quem é você,
ela não está te reconhecendo pelo IP; o IP é uma
das formas dela te reconhecer, mas você pode entrar
de qualquer computador: você logou, ele sabe de
onde você fez o login. Então ele sabe quem é você,
tem seu cadastro lá, onde você mora, o que você
gosta de ler, o que você não gosta de ler. Isso para
gente, se eu for pensar “é minha privacidade, eu não
quero receber propaganda”. Claro que eles vão ter,
eles não são loucos, o sucesso da Amazon é porque
ele sempre privilegiou atender bem o cliente, e o
sucesso da Amazon é isso. Sempre teve a
preocupação, a política da empresa é: “eu vou fazer
com que o cliente tenha uma boa experiência, ele
vai voltar para mim porque ele encontra o que ele
quer e compra rápido”. Essa é a política, ele nunca
escondeu isso, mas para os americanos eles têm
preocupações de segurança que nós não temos. Por
exemplo, aqui no Brasil as pessoas da área de
segurança… Se você for na biblioteca e quiser ler
um livro sobre bomba, você não vai ter a Polícia
Federal batendo na sua porta. Nos Estados Unidos
eles têm um controle. Existem termos legais onde
eu tenho a privacidade do leitor sendo mantida, a
biblioteca jamais pode divulgar e ela não vai
interferir no que o usuário lê porque ela acredita que
o usuário tem liberdade de ler absolutamente o que
quer, e a Amazon pegando isso ela está quebrando a
privacidade do usuário, porque se você vai comprar
um livro de arma, um livro de bomba, isso vai bater
no FBI; se você pega um livro emprestado que fala
de bomba, não importa se você está estudando uma
bomba hidráulica. Se tem “bomba”, eles têm
motivos para serem neuróticos. Não estou tirando a
razão deles, mas você afeta diretamente todos os
tratados que existem de privacidade do usuário. E
uma das coisas que consta nesse tratado, são
documentos legais mesmo, é a privacidade do
usuário para biblioteca.
E. S: Afeta pesquisas científicas, porque os
pesquisadores que vão fazer empréstimos nas
bibliotecas têm sua privacidade garantida, a
privacidade da sua pesquisa garantida!
L. S.: Isso que a gente tá falando de bomba é um
caso extremo, mas às vezes você pode ter coisas
que podem levar as pessoas a uma situação
constrangedora. A pessoa de repente pega um livro
de gosto duvidoso ou um livro mais ousado e ai de
repente a privacidade está sendo invadida. Além
disso, eu não acho interessante – isso me preocupa
bastante em termos de biblioteca – eu não acho
interessante eu desvincular o acesso ao livro da
biblioteca. Porque tudo bem, a pessoa foi no site da
biblioteca, disse que quer aquele livro e dali ela foi
para Amazon e dali a Amazon liberou. O que o
usuário guarda desse processo? “Eu tenho um livro
na Amazon”, não “eu peguei o livro na biblioteca”
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 37
entrevistas
ou “a minha biblioteca me deu acesso a Amazon.”.
Isso é uma questão que a gente tem visto muito e
porque a gente tem tido tanto aquisição perpétua
quanto a assinatura, porque? Eu compro um livro
mesmo que ele esteja no meu servidor, eu vou
acessar através de uma plataforma proprietária
porque é onde os fornecedores conseguem colocar
o DRM. Então se a biblioteca não coloca o usuário
deles no OPAC, para o usuário descobrir o livro, a
biblioteca sendo um serviço de descoberta, eu
descubro que eu tenho um e-book na biblioteca, na
hora de abrir eu vou abrir um aplicativo, não tem
como, mas ele tem que ter a descoberta lá. Não são
todos os fornecedores que me dão os metadados
para que jogue isso no meu OPAC e ai o usuário vai
procurar em outra plataforma. Se eu faço isso, o
meu usuário daqui a pouco nem lembra que existe
biblioteca, ele vai direto para o fornecedor e isso
para a gente não é interessante, porque a gente está
pagando por aquilo, é orçamento da biblioteca, eu
estou proporcionando o acesso a essa obra para o
meu usuário, então eu não posso desvincular isso.
Essa é uma questão que me preocupa, eu tenho que
trazer o conteúdo para mim. Tem fornecedor que
não dá o conteúdo, ai eu tenho outra forma de
conseguir fazer isso, mas sempre estar tentando
trazer para a biblioteca, para deixar claro: “usuário,
eu que estou te proporcionando isso!”.
C. P.: Então sua recomendação é que o acesso seja
sempre pela base da biblioteca?
L.S.: Sim, ou pela base da biblioteca ou pelo
serviço de descoberta. Mas a pessoa descobre que
existe aquele e-book na base da biblioteca. Eu fico
muito preocupada, por exemplo, quando eu faço
uma assinatura e ai eu vou colocar no site da
biblioteca um link pra pessoa pesquisar na página
do dono do provedor. Não, esse acervo, mesmo que
temporário, pertence ao acervo da instituição e é lá
que vai consultar. Essa é uma das coisas que a gente
não pode abrir mão, ou pela biblioteca, pelo OPAC
ou pelo serviço de descoberta, acho isso
fundamental.
EMILIA SANDRINELLI é Editora Executiva da biblioo.
CHICO DE PAULA é editor-chefe da Revista Biblioo.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 – 38
opinião
A "NUVEM VIRTUAL" E O
EVERNOTE ME SALVARAM JÁ OUVIU FALAR EM BLOCOS DE NOTAS DIGITAIS? E
NUM PROGRAMA CHAMADO EVERNOTE?
O mundo informatizado pensou em coabitar
um mundo sem papel, infelizmente esse
“mundo sem papel”, não existe e nunca vimos
um consumo tão alto de celulose como nos
dias de hoje. Porque a carga de informação
que cai em nossas cabeças diariamente só
cresce, não importa o meio.
Semana passada, um computador que eu
usava "morreu". E sim, eu sei da importância
de salvar arquivos, só que não fiz, logo eu
que faço milhares de anotações dei esse
mole... Quando fui caçar minhas anotações
em papel para varias coisas, inclusive para o
texto do mês, cadê? Tive que recomeçar a
escrever esse texto do zero e com outro tema.
Eu tenho o hábito de fazer anotações em
papel para tudo e confesso, é chato não
encontrar uma anotação quando preciso (por
serem muitas).
Isso até encontrar um programa de anotações
virtual! Já ouviu falar em blocos de notas
digitais? E num programa chamado Evernote?
Se não, trata-se de uma ferramenta que conta
já com mais de 10 milhões de utilizadores
registrados. A princípio, ele parece um
aplicativo de agenda comum com uma
interface meio desorganizada, mas depois que
o usuário se familiariza com o serviço, o
Evernote se releva uma excelente ferramenta
para organizar tarefas e ideias. Ele não é
somente um aplicativo isolado para
dispositivos móveis, graças às versões web e
para outras plataformas, ele se torna um App
essencial com integração na nuvem. E fora os
usos comuns com referências nas notas,
coisas comum a todos com espírito
biblioteconômico, descobri alguns usos
bacanas para ele, segue alguns:
1. Web Clipper - Esse recurso é muito útil
para guardar páginas web e substitui com
eficiência o recurso de favoritos do
navegador. O Web Clipper adiciona anotações
nas páginas marcadas. O recurso deve ser
instalado como complemento (extensão) no
navegador, disponível também para
dispositivos móveis. O Web Clipper também
Agulha3al é um boneco de retalhos. Costurado por sinestesia de leituras, vivências, olhares, toques e
distração. Tão distraído que esquece de pessoas que foi apresentado ontem... Esquece objetos, lugares, e
na maioria das vezes até como deve agir corretamente... A maior contradição é ser Anthony Lessa, e ainda
atende pelo apelido de José Antonio, Zé e Toinho.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 39
opinião
se integra ao buscador do Google: quando
algo relacionado a uma página já marcada
pelo Evernote surge no resultado de busca, o
Web Clipper exibe uma miniatura desta
página no canto direito. Para instalar o Web
Clipper, visite a seção do programa no site do
Evernote.
2. Cartões de visita - Tire uma foto ou
digitalize os cartões que você recebe e o
Evernote tornará pesquisável as informações
contidas no cartão. Dessa forma, será muito
fácil encontrar o contato que você procura.
3. Lista de supermercado - Basta colocar
caixas de verificação ao lado dos itens que
precisa comprar e então ir marcando à medida
em que os coloca no carrinho.
4. Receitas - Organize todas as suas receitas
com fotos, links e até sua opinião ou
comentários depois de experimentar o prato.
(Existe um aplicativo everfood).
5. Senhas - Da bicicleta, de sites, do armário,
de conexões Wi-Fi e por aí vai. Você ainda
pode criptografá-las usando o botão direito do
mouse e acionando a opção Criptografar
Texto Selecionado.
6. Livros - Dê uma nota para cada livro que já
leu e compartilhe a lista com os amigos. Ou
melhor: tire uma foto de cada prateleira da
sua estante, e carregue com você a ordem
exata e o lugar de cada um dos seus livros.
7. Recibos - Escaneie ou tire fotos de todos os
seus recibos, comprovantes ou garantias.
8. Livrarias - Se você lê um pouco de tudo
quando vai a uma livraria, é interessante
registrar uma foto de cada livro que folheou,
para escolher depois os que vai de fato
comprar.
Bom é isso! Espero que tenham gostado. Se
sim, faça seu registro no evernote!
HTTP://BIBLIOO.INFO/PUBLICACOES/
SAIBA COMO PUBLICAR SEU ORIGINAL!
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 – 40
opinião
OS MODISMOS
TERMINOLÓGICOS
QUAIS SEUS IMPACTOS NO CAMPO
DA CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO?
A Ciência da Informação (CI) como campo do
conhecimento institucionalmente gestado em
meados do século XX se constitui a partir de
dois fenômenos básicos: 1)
reprodução/apropriação acrítica de teorias de
outras áreas e 2) adaptação de teorias de
outras áreas, como ocorre no âmbito da
Epistemologia (influências da Filosofia,
Sociologia, Psicologia, Educação),
Tecnologias de informação (influências da
Computação e outras áreas tecnológicas),
Gestão/Política/Economia de informação
(Administração e Economia) aplicada, em
particular, as ações das bibliotecas e, em
geral, aos meandros da informação.
No primeiro caso, há uma preocupação
central de fazer da CI mero objeto para
aplicação de fundamentos teóricos e
pragmáticos ou simplesmente de inserir
terminologias a esmo, sem se valer de uma
reflexão crítica. No segundo caso, há uma
perspectiva mais efetiva de diálogo entre CI e
outras áreas do conhecimento primando por
um processo crítico de apropriação de
conhecimento e/ou por diálogos de
reciprocidade entre a CI e outras áreas do
conhecimento.
Enfatizando o primeiro caso, observo que há
uma necessidade em muitos pesquisadores (e
pesquisas) em naturalizar terminologias,
visando fundamentar a cientificidade da CI.
Essa “naturalidade terminológica” não
somente não abre perspectivas para
fundamentação teórico-epistemológica e
pragmática quanto acomoda processos de
criação na área. Em especial, destaco duas
terminologias comumente importadas
acriticamente e que viraram modismos na CI:
paradigma e interdisciplinaridade.
Com relação ao conceito de paradigma, desde
as obras escritas por Thomas Kuhn intituladas
“A Era das revoluções científicas (1962)” que
passou por várias revisões com o objetivo de
elucidar alguns aspectos polêmicos quanto à
compreensão, mas sem perder o ethos
conteudístico do pensamento kuhniano e “A
tensão essencial (1977)” o conceito de
Jonathas Carvalho é professor do curso de Biblioteconomia da Universidade Federal do Ceará - Campus
Cariri. Mestre em Ciência da Informação pela UFPB. Doutorando em Ciência da Informação pela UFBA.
Atua nos seguintes segmentos: epistemologia e pesquisa em Biblioteconomia e Ciência da Informação;
mediação e estudos de usuários da informação; bibliotecas escolares, comunitárias e públicas; fundamentos
sociais, políticos, éticos e profissionais aplicadas a Biblioteconomia.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 41
opinião
paradigma se propagou largamente pelas
correntes epistemológicas das diversas áreas
do conhecimento.
Na CI, o conceito de paradigma foi
desenvolvido para validar cientificamente
questões da área, em especial, calcadas na
formação dos paradigmas físico, cognitivo e
social (ou sócio-cognitivo), de estudo de
usuários e outros assuntos.
No entanto, atentando para um dos principais
sentidos de paradigma em Kuhn como
“realizações científicas reconhecidas em
caráter global que, durante algum tempo,
fornecem problemas e soluções para uma
comunidade científica”, entendo que o
paradigma foi apropriado viciosamente na CI,
de modo que é visto na área como princípio
norteador da atividade científica quando, em
verdade, o paradigma é resultado de um
conjunto de ações e teorias reconhecidas entre
uma comunidade científica internacional.
De outro modo, o paradigma na CI se
estabelece como uma espécie de “molde
epistemológico” (a CI impõe o paradigma
como fundamento de configuração científica
inibindo a necessidade de um pensamento
crítico-criativo, isto é, a formulação de
fundamentos inovadores universalmente
reconhecidos pelos praticantes da área).
Quanto à interdisciplinaridade, considero que
foi outro conceito apropriado acriticamente
na CI e postulado como característica natural
fundante da área. Discordo dessa afirmação
em virtude de que a interdisciplinaridade não
é uma ciência, fundamento teórico ou
categoria de conhecimento, mas fundamento
pragmático ou categoria de ação.
Entendendo a interdisciplinaridade como ação
recíproca ou de integração entre áreas do
conhecimento. Nenhum campo científico
pode ser naturalmente considerado
interdisciplinar se não for efetivado na
prática. Logo, a interdisciplinaridade
comumente não é questão de cunho global,
mas local que depende das relações entre
pesquisadores de determinadas áreas, em
determinados espaços/instituições e em
determinados tempos históricos.
Isso significa que a interdisciplinaridade na
CI não é um fenômeno pré-determinado,
imutável e arbitrário, mas construído
pragmática e humanisticamente (é preciso a
disposição de dois ou mais
pesquisadores/grupos que partilhem de
objetivos em comum e que respeitem suas
diferenças em prol desses objetivos), promove
transformações entre pesquisadores e/ou áreas
do conhecimento envolvidas e é concebida
dialogicamente (demanda diálogos
horizontais).
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 – 42
opinião
Mas a pergunta que não quer calar é: por
quais motivos os termos paradigma e
interdisciplinaridade são postulados na CI em
caráter de modismo? Elenco alguns motivos
que justificam essa conotação:
1) os termos paradigma e
interdisciplinaridade (assim como seus
complementos pluridisciplinaridade e
transdisciplinaridade) se estabeleceram
maciçamente no início da década de 1960,
precisamente equivalente ao período do
advento da CI enquanto campo do
conhecimento científico institucionalizado
(1962);
2) o termo paradigma foi pertinente para
fundamentação teórico-epistemológica de
muitas áreas do conhecimento, especialmente
aquelas oriundas no século XX, incluindo a
CI, enquanto o termo interdisciplinaridade
favorece uma “cartilha de conduta
pragmática” dos pesquisadores da CI que
possibilita o diálogo (direto ou indireto) com
outras áreas confirmando o modismo como a
terminologia interdisciplinaridade é
apropriada na CI.
Nos dois sentidos assinalados, o objetivo
principal é amadurecer o viés epistemológico
da CI, mas, em síntese, nenhum deles
favorece esse amadurecimento. Ao contrário.
Prendem a área a procedimentos “chavões”,
sem uma perspectiva mais expressiva de
fundamentação crítica e criativa.
Enfim, para um entendimento mais amplo
acerca dos termos paradigma e
interdisciplinaridade aplicados a CI, partilho
links de alguns artigos, visando despertar
percepções crítico-analíticas sobre a temática
do texto, uma vez que esta é muito ampla para
ser encerrada por aqui:
Reflexões teóricas sobre a construção
paradigmática da Ciência da Informação:
considerações acerca do(s) paradigma(s)
cognitivo(s) e social
Das concepções disciplinares na Ciência
da Informação e/ou de suas
configurações epistemológicas: o
desiderato percepcionado da
interdisciplinaridade
A(s) disciplinaridade(s) da ciência da
informação: aplicação das leis da dialética
marxista no contexto pluri, inter e
transdisciplinar
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 43
opinião
MEMÓRIAS DO JUDICIÁRIO MUSEU DA JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
EXIBE ACERVO PRECIOSO SOBRE A HISTÓRIA DO
JUDICIÁRIO BRASILEIRO
Rio – Quem visita o Centro do Rio de Janeiro tem
mais uma opção cultural. O Museu da Justiça,
inaugurado em 23 de agosto de 1988, passou por
processos de restauração e, desde novembro 2010,
expõe seu acervo ao público interessado.
A coleção é composta por livros, fotos e outros
documentos que relembram acontecimentos de
grande repercussão no Poder Judiciário, incluindo
170 arquivos audiovisuais e 24 mil processos
sobre diversos temas. O prédio ficou conhecido
por abrigar julgamentos famosos, com os dos
envolvidos no caso Tim Lopes, morto em 2002, e
de Paula Thomaz, no caso Daniella Perez,
assassinada em 1992.
Carlos Jorge Fernandes, Diretor da instituição, fala
sobre as ações desenvolvidas pelo Museu: “Temos
uma parceria com o Centro Cultural do Palácio da
Justiça e realizamos visitas guiadas com turmas de
escolas e universidades. Outra atividade em
andamento é a digitalização de documentos raros,
alguns destes expostos aos visitantes”. O cuidado
com a preservação do mobiliário também faz parte
dos planos para 2014. “Estamos com o projeto de
recuperação de peças antigas e iremos lançar um
catálogo com móveis, quadros e outras peças”,
afirma Carlos.
Formado basicamente por p rocessos judiciais
datados do séc. XIX, o acervo textual é
considerado um dos mais importantes do Brasil.
Gilmar de Almeida, historiador do Museu,
descreve a coleção: “Temos livros de registros de
compra e venda de escravos, patentes, atas e
documentos pessoais de magistrados como
Bezerra Câmara e Aguiar Dias. Nosso processo
mais antigo é de 1723”.
Com 15 anos de existência, o programa História
Oral narra, através de entrevistas, a vida de
desembargadores, juízes, advogados e políticos
com trajetórias ligadas à administração da Justiça,
destaca Gilmar de Almeida. “São 160 entrevistas
em nosso banco de dados”, complementa o
historiador.
Visitas: segunda a sexta-feira, das 11 às 17h.
Endereço: Rua Dom Manuel, 29, Centro – RJ.
Tel.: 3133-3532/3133-3497
E-mail:seexp@tjrj.jus.br
Thiago Cirne é graduado em Biblioteconomia pela Universidade Federal do Estado do Rio de
Janeiro (Unirio). Pós graduado em Jornalismo Cultural pela Universidade do Estado do Rio de
Janeiro (Uerj). Bibliotecário do Centro de Estudos Jurídicos da Procuradoria Geral do Estado
(PGE-RJ). Atua em Acervos de Memória e Coleções Especiais.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 – 44
opinião
CAUSANDO NA REDE
PORQUE A VIDA NEM SEMPRE PRECISA SER CLICHÊ
Não basta estar na rede, é preciso causar.
Interessante é que o verbo causar, que pede uma
transitividade, na condição de gíria é tangenciada
pela intransitividade. Quem causa simplesmente
causa. Está, pois, cheio do efeito, sendo sua
própria consequência. O problema é querer causar
com frases feitas.
As frases feitas sempre existiram. Mas agora elas
abundam nas redes. Abundar é o verbo ideal nesse
caso (estou propondo outra etimologia para a
palavra). Não gosto de frase feita. Na falta do que
dizer, diz-se o que já foi dito. Vai-se ao baú dos
clichês, espreme-se esse sumo ralo do dito até que
se ele fique desbotado. Vivendo numa excitação
constante, queremos a todo custo ser vistos, lidos,
elogiados: “Me vê, me cutuca, me curte, me
ama... Eu saberei retribuir na mesma intensidade”.
Escambo virtual.
Não gosto dessa necessidade fremente, que muito
se vê por aí, daqueles que, não sendo leitores,
querem passar uma imagem de que são cultos,
letrados, intelectuais. E vão destilando as tais
frases feitas, sem saber que elas são feitas para
serem usadas por quem não tem criatividade ou
não querem pensar. Ou, querendo pensar,
preferem o fácil. Eu quero a arqueologia do fóssil.
Ih, acho que fiz uma frase feita (não é redundante
dizer isso? Não existe frase não feita. Veja como
sou meu próprio crítico). Mas é só pra descontrair.
O importante é impactar, mesmo que a via seja
compactar.
Será que estamos emburrecendo? Não creio.
Apenas a rede expõe a gente como “nunca antes
na história desse país” (a frase feita mais famosa
da década). Nunca antes na história da
humanidade as sociedades puderam se exibir em
tão altas doses. Daí que sabemos o que outro
pensa, do que é capaz ou não, o que aparenta ser, o
que quer ter, apenas pelo que ele diz, mesmo
copiando e colando, mesmo usando frases feitas.
Antes ninguém gostava de escrever redações
porque precisava pensar e desenvolver sua opinião
em mais de 20 linhas. Hoje, que tudo é sintetizado,
as pessoas copiam e colam. Dão Control C e
Control V o tempo todo. Vá entender esse povo!
Vemos uma legião de frases sem nenhum efeito,
apenas na onda do bonitinho. Aliás, têm, sim,
efeito colateral: mostram que você não consegue
ser você quando e onde mais deveria ser você.
Cláudio Rodrigues é maranhense e mora no Rio de Janeiro. Mestre e doutor em Teoria Literária, dá aulas para a
EJA; escreveu os livros Um rei que virou lenda (2009), Cirandeira do Menino-Deus (2009), e O encontro do
Corvo inglês com o Urubu brasileiro na terra do sol inclemente (2012), geralmente colocados na prateleira dos
infantojuvenis, mas voltados para o leitor de todas as idades.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 45
opinião
Sociedade dos escribas virtuais. Copistas. A idade
média é aqui.
Clarice Lispector disse certa vez que passara uma
noite toda tendo pesadelos horríveis. Tinha
sonhado lendo coisas que jamais escrevera. Ela
acordou atordoada e extremamente chateada com
essa possibilidade. Ah, Clarice, e não é
exatamente isso que ocorre hoje? Você é usada
para as mais bobas frases de efeito por gente que
nunca de fato leu um fio de sua narrativa
complexa, mas apaixonante.
Caríssimo, um exercício de criatividade vem com
um exercício de personalidade. Você pode me
perguntar: “mas como posso desenvolver esse meu
lado crítico e criativo para poder ir além de uma
maria vai com as outras?” Estude! Mergulhe nos
livros! Vá a uma biblioteca, afogue-se de cultura
(afogar é exagero, não quero nem o suicídio
cultural). Vá ao teatro, ouça uma música boa (ah,
você não sabe o que é uma boa música?), vá a um
teatro e assista a uma tragédia ou a uma comédia,
visite uma exposição de arte. Ou, simplesmente,
contemple a natureza, buscando nela sua dose
diária de linguagem. É preciso praticar a arte do
ver para poder falar/escrever, como diz um
heterônimo do Pessoa:
O meu olhar é nítido como um girassol.
Tenho o costume de andar pelas estradas
Olhando para a direita e para a esquerda,
E de vez em quando olhando para trás...
E o que vejo a cada momento
É aquilo que nunca antes eu tinha visto,
E eu sei dar por isso muito bem...
Sei ter o pasmo essencial
Que tem uma criança se, ao nascer,
Reparasse que nascera deveras...
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do Mundo...
O mestre Caeiro nos ensina a arte do ver. Se você
acorda todo dia para a eterna novidade da vida,
certamente terá sobre o que falar, será criativo,
crítico, e saberá que tudo tem um preço. É preciso
ter olhar de girassol. É nesse sentido que você
aprenderá a analisar para, em seguida, sintetizar.
As redes sociais são os ambientes das sínteses,
mais do que das análises. Elas cobram de você a
capacidade de ver grande e reduzir grande. Essa
matemática não combina com aquela regrinha
besta que aprendemos na escola que diz que mais
por menos dá menos. Dessa regra só vale o
“menos por menos dá mais”. O que é isso?
Simples: ser mais, sendo menos.
De minha parte, prefiro pagar um alto preço por
dizer o que penso do que por ficar buscando o que
os outros disseram para me esconder neles e me
anular. Não seja bobo; seja criativo!
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 – 46
opinião
BIBLIOTECA DO FAÇA VOCÊ
MESMO SERVIÇO DE REFERÊNCIA SEM MEDIAÇÃO
Sou uma daquelas pessoas que nunca pedem ajuda
a bibliotecária de referência. Jamais. Não pedia
quando criança, muito menos agora que sou
adulto. Escrevi uma monografia, uma dissertação
e uma tese sem consultar uma única bibliotecária.
Não foi até pouco tempo atrás que realmente
pensei sobre isso e percebi que não estava
evitando o serviço de referência por causa da
minha ansiedade ou timidez. Não era que o balcão
parecia inacessível ou a bibliotecária ranzinza. É
tudo porque eu simples e teimosamente gosto de
descobrir as coisas sozinho.
E esse comportamento moldou o meu pensamento
sobre o serviço de referência. Durante anos,
minhas experiências alimentaram meu desejo de
tornar o balcão e o serviço de referência mais
acessíveis. Como eu, muitas pessoas querem
descobrir as coisas sozinhas. E quando há algo na
biblioteca que não entendem, elas não recorrem ao
serviço de referência. Elas simplesmente vão para
outro lugar.
Mesmo agora, eu vasculho sites, blogs e fóruns
para obter informações antes de pedir qualquer
tipo de ajuda. E lendo artigos sobre a geração DIY
(faça você mesmo) eu percebo que não sou o
único. Vejo a atitude DIY como o respeito pelo
autodidata e o “desenrolado” contra o perito e o
sabichão.
Em uma época onde as massas (veja o Yahoo!
Respostas e Wikipedia) se tornaram em grande
parte o lugar para obter informações e o perito
(veja a bibliotecária de referência) tem visto um
declínio na demanda, pensar em como oferecer
apoio à pesquisa sem que alguém precise consultar
um bibliotecário ou participar de um minicurso é
extremamente necessário.
Muitos serviços de biblioteca são baseados em um
modelo que não existe mais. Nossos serviços de
referência são baseados em um ambiente de
escassez de informações, enquanto que vivemos
atualmente em um ambiente de abundância de
informação. Bibliotecários são os guardiões
exclusivos de quase nada. A ênfase que nós
colocamos em modelos de mediação é equivocada
e pode estar nos movendo em direção à
irrelevância. Embora eu acredite que os serviços
de referência e de instrução ainda devam estar no
centro do que fazemos, a sugestão de repensar
nossos serviços, tendo em conta a mentalidade
DIY, me chama bastante atenção.
Moreno Barros é bibliotecário do Centro de Tecnologia da UFRJ. Graduado pela UFF, mestre em Ciência da
Informação pelo IBICT e doutorando em História das Ciências na UFRJ.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 47
opinião
Isto não é um apelo para diminuir o nosso foco na
instrução, no letramento, mas verificar como
podemos apoiar as pessoas que agem por conta
própria em seus pontos de necessidade no uso de
sistemas de bibliotecas - que não são
frequentemente amigáveis ao usuário. Vejamos:
muitas bibliotecas têm criado tutoriais, mas a
maioria simplesmente coloca objetos de
aprendizagem em uma página de "Tutoriais" e
acha que o trabalho está feito. Quando os usuários
estão tendo dificuldade em procurar uma base de
dados, quantos deles pensam "a biblioteca tem um
tutorial sobre isso"?
Precisamos pensar sobre como podemos fortalecer
esses adeptos do estilo “faça você mesmo“
incorporando ajuda em seus fluxos de trabalho de
pesquisa. Quando eles têm um problema com a
sua busca de informações, a ajuda deve estar
disponível continuamente - isso pode exigir
fornecer um tutorial de como agir dentro de (ou ao
lado de um link para) uma base de dados
complicada ou tornar mapas disponíveis nas áreas
da biblioteca onde os usuários muitas vezes se
perdem. Isto requer compreender os
comportamentos de busca da informação dos
nossos usuários - através de métodos como
estatísticas web, pesquisa etnográfica e testes de
usabilidade – e pensar sobre a incorporação de
ajuda além das paredes da biblioteca e do site
oficial.
As bibliotecas também precisam repensar a forma
como criamos conteúdo instrucional online, que
muitas vezes é projetado com base na maneira
como ensinamos. Um usuário procurando
informações sobre como determinar se um artigo é
acadêmico não quer passar por um longo tutorial
sobre revisão por pares para encontrar a resposta.
Idealmente as bibliotecas desenvolverão sistemas
que podem ajudar os usuários a encontrar
rapidamente o pequeno pedaço de conteúdo
instrucional que eles precisam para resolver seu
problema. Será como ter uma entrevista de
referência sem o usuário ter que pedir ajuda a
alguém.
Se quisermos cativar a crescente população de
DIYs, devemos capacitá-los a utilizar os nossos
recursos sem vir ao serviço de referência ou a uma
oficina. Serviços presenciais são importantes, mas
não podemos torna-los um pré-requisito para
alguém ser um buscador de informações pleno e
satisfeito.
Acredito que os bibliotecários precisam trabalhar
para tornar a sabedoria da biblioteca disponível
para os usuários em um formato sem mediação.
Tenho plena consciência de que nem todos os
nossos usuários se encaixam no estereótipo DIY,
mas acredito que a criação de mecanismos que
eliminam certos aspectos da interação de
referência irá fornecer todos os nossos usuários as
ferramentas que eles precisam para ser bem
sucedidos. Sozinhos.
Tradução adaptada do artigo de Meredith Farkas
“Rethinking how we help those who don’t ask”.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 – 48
opinião
VINÍCIUS DE MORAES ESTUDANTE CURIOSIDADES HISTÓRICAS DA PROVA DE
REDAÇÃO DO VESTIBULAR DE 1930 DO ENTÃO
POSTULANTE AO CURSO DE DIREITO DA
FACULDADE NACIONAL DE DIREITO
No mês de outubro comemoramos o centenário de
Vinícius de Moraes, diplomata, jornalista, poeta e
compositor brasileiro e tivemos o Exame Nacional
de Seleção do ensino Médio – ENEM. Diante destes
acontecimentos faço uma homenagem ao conhecido
“poetinha” pela contribuição à constituição de nossa
nacionalidade pelo viés da cultura poética e musical.
Faço isso através da descrição e comentários sobre a
forma e o conteúdo de uma prova de ingresso que
realizara para então Universidade do Rio de Janeiro
(que em 1937 se tornaria Universidade do Brasil,
passando a se chamar Universidade Federal do Rio
de Janeiro só em 1965).
O leitor mais crítico quer me chamar a atenção
porque o ENEM não tem nada haver com o
vestibular de 1930. Com certeza não. Mas, leitor
amigo, tens de concordar comigo, que este exame
atual não mede em nada as habilidades de leitura e
escrita do indivíduo numa situação normal da vida.
Mede sim a capacidade do estudante em sobreviver
a uma maratona cansativa.
Os exames antigamente tinham prova oral. Mas a
realidade da Universidade era outra. Só os filhos da
elite é que chegavam até o nível superior. Hoje em
dia cursar uma universidade já é prerrogativa das
massas populacionais ávidas por um emprego que
lhe dê um retorno financeiro maior.
Não pretendo constituir nenhuma escrita sobre a vida
do “poetinha” a partir deste documento histórico.
Qualquer consideração sobre qualquer personalidade
será sempre um “texto” aberto a infindáveis
complementações de informações. Há muita
informação arquivística que pode ser descoberta
como, por exemplo,sobre nossos poetas consagrados
da literatura brasileira.
Portanto, há sempre biógrafos que podem se
constituir em referências (autorizadas ou não), mas
nenhuma biografia é completa ou se pretende ser
completa informando tudo sobre as pessoas
pesquisadas.E, já que outubro foi o mês do ENEM,
nada mais interessante que visualizarmos uma prova
escrita de 1930 realizada por uma personalidade
cultural que nem se pretendia tãoimportante e
Augusto Brito Montano é professor de língua portuguesa/ literaturas pela UFF. Especialista em
Literatura e mestrando em Letras pela UFRJ. Arquivista do Centro de Tecnologia da UFRJ.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 49
opinião
querido pelos brasileiros pelas suas poesias e
composições musicais.
A prova escrita de filosofia:
descrição e comentários
Este documento foi recuperado num projeto de
“Memória Arquivística” implantado pelo Núcleo de
Documentação e Memória Arquivística (NUDMA)
da Faculdade Nacional de Direito (FND/UFRJ),
através de um trabalho de pesquisa de servidores
públicos, arquivistas, e exposto numa “Mostra de
Documentos Históricos” em comemoração aos 120
anos da Faculdade Nacional de Direito ocorrida em
2011.
Houve uma pequena publicação no qual a referida
“prova de filosofia” foi reproduzida, portanto
passível de ser estudada e analisada sem maiores
dificuldades.
Esse documento foi escolhido entre os vários para
compor a mostra da FND/UFRJ pelo que diz a
própria instituição, através do Núcleo de
documentação e Memória Arquivística. Diz ele: “
Por entendermos que a memória coletiva é um
processo de construção que se dá pela seletividade
de diversos elementos, elegemos alguns documentos
que nos permitiram recuar mais de um século de
história para traçarmos o caminho percorrido pela
Faculdade Nacional de Direito até os dias atuais
(p.3)”.
Assim, Vinícius de Moraes, como outras
personalidades oriundas de famílias de classe média
alta,se graduaram, geralmente, em Direito, Medicina
ou Engenharia.
A prova é de filosofia, uma redação cujo título é
“Methodo”. A ortografia era assim mesmo em
1930. Vinícius discorre sobre este assunto
embasando sua afirmação a partir do que René
Descartes (filósofo, físico e matemático francês)
expõe em “Discurso do Methodo”, desenvolve a
argumentação com boa coesão e coerência
necessária a uma redação de vestibular. É um
resumo comentado sobre os principais pontos
daquela obra. Há uma indicação em cima da prova
como se ele tivesse podido escolher um “ponto” ou
assunto para discorrer. Está escrito “ponto 3 .
Porém o texto sugere que há uma continuação da
redação em outra folha que não pudemos visualizar.
Só há a primeira parte. O que será que Vinícius
escrevera? A curiosidade se instala muito forte entre
nós. Poderia ter realizado uma grande resenha que
revelaria uma crítica pertinente sobre Descartes. Por
enquanto nesta folha da redação que tivemos acesso
somente há um resumo simples.
Recebeu nesta prova a nota de 7,0 segundo consta o
carimbo ao lado. Além da prova, escrita houve uma
prova oral que ele tirou 2,0. Talvez o peso da prova
oral fosse 3,0 e o da escrita 7,0? É o que se sugere. A
prova é datada de 14/03/1930.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 – 50
opinião
Há outro material ótimo que produzido pelo Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro (AGCRJ) que me foi
presenteado quando de meu estágio curricular em Arquivologia na época da graduação naquela instituição. Nele
constam uma cronologia, uma biografia e materiais pessoais diversos reproduzidos como, por exemplo,
fotografias, uma carta de Vinícius ao poeta Pablo Neruda, um poema que este fizera a aquele, além de vários
outros documentos arquivísticos que retratam os períodos mais consagrados de Vinícius de Moraes que não sua
vida de estudante.
Mas o leitor deve estar muito curioso para ver a prova de redação. Sugerimos a leitura do pequeno catálogo dos
documentos que fizeram parte da Mostra ou se dirijam ao Arquivo da FND agendando horário para visita ao
“arquivo histórico”. Também posso emprestar todas essas publicações.
Revista Biblioo – ano 3, n. 11, nov. 2013 - 51
W W W . B I B L I O O . I N F O
H U M O R
C O N H E Ç A N O S S O S B L O G S
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