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1 LUCIANA DE CASTRO MAEDA AVELLAR A ambientação da cozinha mineira: as interfaces entre a memória, a história e o design Belo Horizonte 2020

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LUCIANA DE CASTRO MAEDA AVELLAR

A ambientação da cozinha mineira: as interfaces entre a memória, a história e o design

Belo Horizonte

2020

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LUCIANA DE CASTRO MAEDA AVELLAR

A ambientação da cozinha mineira: as interfaces entre a memória, a história e o design

Dissertação de Mestrado Apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Design da Universidade do Estado de Minas Gerais.Linha de Pesquisa: Cultura, gestão e processos em Design. Orientadora: Profa. Dra. Marcelina das Graças de Almeida

Belo Horizonte

2020

A949 Avellar, Luciana Castro Maeda

A ambientação da cozinha mineira: as interfaces entre a

memória, a história e o Design. [Manuscrito] / Luciana de Castro Maeda Avellar - Belo Horizonte, 2020.

218f.: il. Color. fots. Orientadora: Profª. Drª. Marcelina das Graças de Almeida.

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em

Design da Universidade do Estado de Minas Gerais – UEMG - como requisito para a obtenção de grau de Mestre em Design, na linha de pesquisa: Cultura, Gestão e Processos em Design.

1. Cozinha. 2. Design. 3. Eletromodernização. I. Almeida, Profª Drª Marcelina das Graças de II. Universidade do Estado de Minas Gerais. III. Título.

CDU – 72.011(043)

Ficha catalográfica elaborada por Ariane Eliza da Silva Porto – CRB6/MG 3244

A AMBIENTAÇÃO DA COZINHA MINEIRA: AS INTERFACES ENTRE A MEMÓRIA, A HISTÓRIA E O DESIGN.

Autora: Luciana de Castro Avellar Maeda

Esta dissertação foi julgada e aprovada em sua forma final para a obtenção do título de Mestre em Design no Programa de Pós-Graduação em Design da Universidade do Estado

de Minas Gerais.

Belo Horizonte, 06 de outubro de 2020.

_____________________________________________

Profª. Rita Aparecida da Conceição Ribeiro, Dra. Coordenadora do PPGD

BANCA EXAMINADORA

Profa. Marcelina das Graças de Almeida, Dra. Orientadora

Universidade do Estado de Minas Gerais

Prof. Glaucinei Rodrigues Correa, Dr.

Universidade Federal de Minas Gerais

Prof. Edson José Carpintero Rezende, Dr.

Universidade do Estado de Minas Gerais

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Dedico esse trabalho a minha filha

Catarina, meu marido Márcio e minha

orientadora Marcelina por terem me dado

todo apoio para que eu chegasse até

aqui.

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AGRADECIMENTOS

A Deus por me guiar e me dar sabedoria e discernimento. A minha

orientadora Profa. Dra. Marcelina das Graças de Almeida o meu muito obrigado por

ter me aceitado, me guiado, pela paciência, pelo apoio e acima de tudo por me

estimular nos momentos mais difíceis da minha caminhada. Ao querido Prof. Dr.

Edson José Carpintero Rezende que sempre esteve ao meu lado e sempre

acreditou em mim. A querida Profa. Dra Maria Regina Álvares Correia Dias com

quem tive oportunidade de trocar tantos conhecimentos. A meu marido Márcio e

minha filha Catarina pelo carinho, apoio e principalmente por entenderem minha

ausência amo vocês. A minha mãe querida por seu amor incondicional e por

nunca me deixar desistir. Aos meus irmãos, cunhados e sobrinhos que tanto amo.

Aos meus colegas e amigos que fiz durante essa trajetória Fábio, Cláudia e Larissa

pessoas que quero levar para minha vida. Aos meus amigos de vida. A todos os

professores que tive a oportunidade de aprender e também aos funcionários da

Escola de Design da Universidade do Estado de Minas Gerais, em especial ao

Rodrigo e a Janaina que sempre estão dispostos a nos ajudar com tanto carinho.

Aos meus queridos entrevistados Sra Edy, Juliana, Fabrício, Sra Marfiza e ao

Tulio, por estarem disponíveis e dispostos a contribuir com meu trabalho me

mostrando seus conhecimentos e experiências. Aos membros da Banca

examinadora, Prof. Dr. Edson José Carpintero Rezende e Prof. Dr. Glaucinei

Rodrigues Correia pela disponibilidade de contribuir com seu conhecimento para

avaliar e aprimorar o meu trabalho. A todos vocês o meu muito obrigado.

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.

Lina Bo Bardi

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RESUMO

A dissertação trata da transformação do ambiente da cozinha em Minas Gerais, a partir da formação da Capitania de Minas Gerais até o século XXI influenciado pela eletromodernização originária da racionalização das tarefas domésticas proposta no final do século XIX. Propõe-se, através da investigação de sua relação com o homem entender a forma como o design de interiores interfere no contexto do ambiente. A análise discorreu sobre a maneira como o ambiente da cozinha se transformou no palco central das casas contemporâneas. Para tal fim, realizou-se uma pesquisa bibliográfica e documental; que foi seguida de pesquisa de natureza qualitativa utilizando o método de história oral, com a intenção de avaliar as informações e resgatar a memória gerando um olhar crítico sobre o tema e sobre o ato de projetar o ambiente da cozinha. Para chegar à conclusão pretendida de que antes a cozinha era um espaço estritamente direcionado aos serviçais e a produção do alimento, situando-se nos fundos das casas e hoje é um ambiente planejado parareceber, localizado na parte central da planta das residências; foi feita uma análise utilizando a teoria da psicologia ambiental que defende a relação do homem com o espaço habitado e uma análise de projetos executados, feita a partir de um estudo de casos a fim de comprovar a importância do projeto para o bem-estar dosindivíduos, uma mudança comportamental e cultural que impacta no projeto do ambiente.

Palavras-chave: Cozinha. Minas Gerais. Eletromodernização. Psicologia Ambiental. Design.

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ABSTRACT

This dissertation deals with the transformation of the kitchen environment in Minas Gerais, from the formation of the Captaincy of Minas Gerais until the 21st century influenced by the electromodernization originating from the rationalization of domestic tasks proposed at the end of the 19th century. It is proposed, through the investigation of his relationship with man, to understand how the interior design interferes in the context of the environment. The analysis discussed how the kitchen environment has become the central stage of contemporary houses. To this end, a bibliographical and documentary research was carried out; which was followed by qualitative research using the oral history method, with the intention of evaluating the information and recovering the memory generating a critical look on the theme and on the act of designing the kitchen environment. To reach the intended conclusion -that before the kitchen was a space strictly directed to servants and the foodproduction, located at the back of the houses and today is an environment designedto receive, located in the central part of the house plan; an analysis was made using the theory of environmental psychology that defends the relationship of man with theinhabited space and an analysis of executed projects, made from a case study in order to prove the importance of the project to the well-being of individuals, a behavioral and cultural change that impacts on the environment project.

Keywords: Kitchen. Minas Gerais. Electromodernization. Environmental psychology. Design.

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Lista de Ilustrações

Figura 1: Casa de pau-a-pique. ................................................................................. 41Figura 2: Casas geminadas Rua da quitanda Diamantina-MG. .......................... 42Figura 3: Beco do Tecla característica ruela com seus balcões salientes - Diamantina-MG. ........................................................................................................ 43Figura 4: Sobrado de 03 pavimentos com varanda, na cidade de Diamantina-MG. . 44Figura 5: Plantas de um pequeno sobrado antigo pavimento térreo e sobrado - Mariana-MG. ............................................................................................................. 45Figura 6: Planta de uma casa térrea em Santa Bárbara-MG. ................................... 46Figura 7: Ilustração de cozinha urbana residencial. .................................................. 47Figura 8: Ilustração de cozinha antiga urbana residencial em Mariana-MG. ............. 48Figura 9: O Arraial Curral Del Rey visto na profundidade de campo da paisagem. .. 52Figura 10: Planta geodésica, topográfica e cadastral da Cidade de Minas (Belo Horizonte), feita pela Comissão que planejou a nova capital. ................................... 54Figura 11: Mapa elaborado pela Comissão Construtora sob direção de Aarão Reis. .................................................................................................................................. 56Figura 12: Fotografia da Praça da Liberdade anterior à década de 1920. À direita a Secretaria das finanças, ao lado esquerdo a secretaria do interior atual secretaria da educação. ............................................................................................................. 58Figura 13: Detalhe do Edifício Acaiaca Belo Horizonte-MG. .................................. 60Figura 14: Casa JK no Complexo da Pampulha Belo Horizonte-MG. .................... 61Figura 15 ilustração - empena. .................................................................................. 62Figura 16: Projeto da Casa JK no Complexo da Pampulha Belo Horizonte-MG. ... 63Figura 17: Edifício Residencial Barca do Sol Bairro da Serra Belo Horizonte-MG. .................................................................................................................................. 65Figura 18: Fogão a carvão Piloto, produzido no Brasil pelas indústrias Dako - 1937. O modelo era produzido em ferro com desenhos decorativos e textura imitando madeira. .................................................................................................................... 69Figura 19 Geladeira de madeira com refrigeração em barras de gelo - 1920. .......... 69Figura 20: A ambientação de uma cozinha na década de 1950................................ 70Figura 21: Fogão a gás Fundição Brasil - 1950. ........................................................ 71Figura 22: Modelo Refrigerador Prestcold Final dos 1950. .................................... 71Figura 23: Cozinha modular Linha Itabela Itatiaia Móveis - 1990. ....................... 73Figura 24: Modelo de azulejo padrão geométrico Décadas de 1960-1980. ........ 74Figura 25: Cozinha modular em MDF Finger - 1996. ................................................ 75Figura 26: Catherine Beecher propõe em 1869, nos Estados Unidos um modelo de organização de cozinhas. .......................................................................................... 84Figura 27: Mulheres alemãs apoiam candidato Bernhard Düwell em janeiro de 1919, pouco depois da conquista do sufrágio feminino - Alemanha. .................................. 85Figura 28: Estudo comparativo do esquema dos movimentos realizados na cozinha em 1926 em Frankfurt na Alemanha. A esquerda cozinha tradicional, com todos os complexos deslocamentos necessários para uma tarefa doméstica, na direita simplificação dos movimentos através de um estudo de eficiência. .......................... 87

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Figura 29: Layout de um dos modelos de Cozinha de Frankfurt projetado por Grete Schütte-Lihotzky medindo 1,87m x 3,44m. Destaque para os números: 11 gavetas de temperos em frente ao fogão número 03 da planta; e 04 uma tábua de passar roupa que podia abrir-se em frente a pia número 10. No eixo pode-se perceber um círculo correspondente ao giro do movimento do corpo para pegar os temperos, possibilitando espaços circulares de trabalho. .......................................................... 88Figura 30: Porta mantimentos de metal projetado para facilitar o acesso e o uso. ... 89Figura 31: Vista da Cozinha de Frankfurt. ................................................................. 89Figura 32: Vista da Cozinha de Frankfurt. ................................................................. 90Figura 33 Modelo de cozinha de 1917 na cidade de São Paulo, onde a valorização das janelas e a compactação dos móveis se torna primordial no espaço. ................ 92Figura 34: A Rua do Capim - Arraial do Belo Horizonte 1894 ................................ 94Figura 35: Casa que pertenceu aos herdeiros de Francisco José da Silva Reis....... 94Figura 36: Casas de Funcionários públicos 1896. .................................................. 95Figura 37: Palácio da Liberdade Fachada principal- 1895 ..................................... 95Figura 38: Fábrica de punhos e colarinhos inaugurada em 1907 - Barro Preto - Belo Horizonte-MG. ........................................................................................................... 96Figura 39: Residência construída em 1911 na zona suburbana de Belo Horizonte-MG. ........................................................................................................................... 97Figura 40: Sobrado construído na Rua da Bahia na década de 1910 em Belo Horizonte-MG ............................................................................................................ 97Figura 41: Palacete Dantas construído em 1915 nas imediações do Palácio da Liberdade para abrigar a família do engenheiro José Dantas Belo Horizonte-MG . 98Figura 42: Palacete Falci residência unifamiliar construída no ano de 1929/1930 no estilo eclético com influência neoclássica. ................................................................ 99Figura 43: Palacete Jeha residência unifamiliar construída no ano de 1934 no estilo artdecò. ............................................................................................................ 99Figura 44: Conjunto JK perspectiva da fachada posterior voltada para a Rua dos Timbirás. Belo Horizonte-MG 1951. ........................................................................ 101Figura 45: Planta dos apartamentos Tipo A (semi-duplex), B e C 1954. .............. 102Figura 46: Apartamento semi-duplex do conjunto JK .............................................. 102Figura 47: Cozinha bicolor amarelo e azul 1950. .................................................. 103Figura 48: Cozinha bicolor: o uso do branco ainda prevalecia na maioria das cozinhas, por sinalizar limpeza e higiene 1950. ................................................... 103Figura 49: Modelo de cozinha compartilhada refeições rápidas na bancada 1950. ................................................................................................................................ 104Figura 50: Modelo de cozinha compartilhada integração familiar 1950............. 104Figura 51: Planta ilustrativa de um modelo de cozinha linear. ................................ 105

............................... 105Figura 53: Planta ilustrativa de um modelo de cozinha corredor............................. 106Figura 54: Planta ilustrativa de u .............................. 106Figura 55: Planta ilustrativa de um modelo de cozinha em ilha............................... 107Figura 56: Modelo de cozinha compartilhada fogão de ilha 1950. .................... 107Figura 57: Cozinha revestida com azulejos em motivo floral 1960. ...................... 108Figura 58: Cozinha revestida com azulejos em estampa de legumes 1960. ........ 108Figura 59: Fogão a gás de ferro criado por James Sharp Inglaterra 1826. .......... 116

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Figura 60: Fogão de ferro fundido de Casserls - modelo Uncle Sam 06 furos de 1877 EUA ............................................................................................................. 117Figura 61: Fogão de ferro fundido de Casserls - Modelo Gazeiro - 05 furos com forno e depósito para água...................................................................................... 118Figura 62: Fogão de ferro fundido de Casserls - Modelo Sinhá - 02 furos para famílias de 03 a 05 pessoas. ................................................................................... 118Figura 63: Fogão a gás de ferro fundido Modelo O Metropolitan Inglaterra 1910. ................................................................................................................................ 119Figura 64: Fogão com acabamento esmaltado e acendedores elétricos Modelo AGA 1929 Inglaterra 1929. ................................................................................... 120Figura 65: Ilustração da versatilidade do modelo de fogão elétrico AGA 1929 Inglaterra. ................................................................................................................ 120Figura 66: Modelo fogão a lenha - começo do século XX. ...................................... 121Figura 67: Modelo fogão a carvão ou a lenha início do século XX. ...................... 121Figura 68: Fogão a carvão de dupla combustão da Indústria Dako Modelo Piloto Brasil 1937. ............................................................................................................. 122Figura 69: Fogão elétrico Dako Brasil 1945. ........................................................ 122Figura 70: Fogão elétrico Dako Modelo Bifiteira Brasil 1947............................. 122Figura 71: Fogão elétrico Dako Brasil 1949. ........................................................ 123Figura 72: Fogão a gás da Fundição Brasil Brasil 1950. ...................................... 123Figura 73: Fogão a gás Wallig Modelo Nordeste Brasil 1963............................ 124Figura 74: Campanha publicitária do fogão a gás Wallig Modelo Nordeste Brasil 1963. ....................................................................................................................... 124Figura 75: Campanha publicitária do fogão Wallig modelo Nordeste 1968. ......... 125Figura 76: Fogão Semer de 06 bocas Brasil 1970/1980. ..................................... 126Figura 77: Fogão Continental 2001 campanha de lançamento Brasil 1980. ........ 127Figura 78: Fogão popular linha branca Modelo Luna, projetado pelo escritório Índio da Costa para a Dako. ............................................................................................ 128Figura 79: Fogão segmento luxo em aço inox e vidro refratário Modelo duplo forno

Electrolux. ............................................................................................................. 128Figura 80: Fogão cooktop Suggar Modelo em inox 2000. ................................. 129Figura 81: Forno independente Neff Modelo embutido 1996. ........................... 129Figura 82: Cooktop vitrocerâmico Wok, por Karim Rashid para a Gorenje 2013. 130Figura 83: Icebox ou Save Box armário de gelo. Anúncio veiculado no Kansas City Journal em 1897. Refrigerador modelo Herrick EUA 1897................................... 132Figura 84: Refrigerador de pequena capacidade da inglesa Thomson-Houston de 1930. ....................................................................................................................... 133Figura 85: Refrigerador modelo Super Six por Raymond Loewy para a Coldspot EUA 1934. ............................................................................................................... 134Figura 86: A primeira Consul. Modelo Refrigerador Consul Q300 - Geladeira a querosene Brasil 1947. ........................................................................................ 135Figura 87: Refrigeradores Climax Brasil 1952. ..................................................... 136Figura 88: Anúncio para geladeira e freezer lançamento da marca International Harvester EUA 1951. ........................................................................................... 137Figura 89: Maçaneta da porta do carro Chevrolet Bel Air 1956. ........................ 137Figura 90: Puxador da Geladeira Brastemp modelo Imperador 1957. ................. 137

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Figura 91: Refrigerador Brastemp Imperador Brasil 1957. ................................... 138Figura 92: Anúncio do lançamento do Refrigerador Brastemp Imperador. Veiculado no Jornal O Estado de São Paulo de 1959. ............................................................ 138Figura 93: Refrigerador Consul Junior 1957. ........................................................ 139Figura 94: Anúncio apresentando o estilo retilíneo incorporado aos refrigeradores brasileiros lançamento da Geladeira Retilínea da General Eletric. Veiculado na Revista O Cruzeiro 1959. ..................................................................................... 140Figura 95: Refrigerador Consul Modelo Consul Luxo 1963. ................................. 140Figura 96: Anúncio da Nova Linha 70 da Consul 1970. ....................................... 141Figura 97: Refrigerador duplex Consul Modelo 3T Freezer, geladeira e uma gaveta umidificadora para verduras e legumes. ...................................................... 142Figura 98: Conjunto Freezer e Geladeira da marca Prosdócimo Modelo Spazio Plus 310. Projetado pelos designers Julio Bertola, João Wasilesxisk Neto, Rodolfo

ambos da equipe de design da Prosdócimo Brasil 1988. ...................................................................... 143Figura 99: Refrigerador Twin System Zyrium do designer Edson Takayuki Tani para a Brastemp. Prêmio Museu da Casa Brasileira 1990. ............................................ 144Figura 100: Refrigerador R310 do designer Júlio Bertola para a Electrolux. Prêmio Museu da Casa Brasileira 1997. ............................................................................. 144Figura 101: Modelos de refrigeradores French Door com 04 e 03 divisões distintas e dispenser de agua. .................................................................................................. 145Figura 102: Modelos de refrigeradores Side by Side da marca Samsung. ............. 146Figura 103: Retrospectiva dos modelos de geladeira de 1900 ao Século XXI. ....... 147Figura 104: Anúncio do fogão Wallig veiculado na Revista O Globo, de 1929. ...... 148Figura 105: Campanha Publicitária da Indústria Epel

1947. ....................................................................................................................... 149Figura 106: Anúncio publicado no Jornal O Globo onde a Arno convida a dona de casa a completar sua coleção de eletrodomésticos da marca - 1962. .................... 150Figura 107: Liquidificador Nêutron da Walita Primeiro modelo produzido no Brasil Walita 1944. ............................................................................................................ 151Figura 108: Anúncio do liquidificador Super Arno 1958. ...................................... 152Figura 109: Liquidificador Brasília e/ou Perfeição Absoluta. Walita 1960. .............. 153Figura 110: Liquidificador Poliwalente LS Walita 1977. ........................................ 153Figura 111: Opções de modelos, cores e funções de liquidificadores lançados pela Arno no Brasil, no começo dos anos de 1980. Modelos LA, LD, LC, LSA e LP respectivamente. ..................................................................................................... 154Figura 112: Opções de modelo, cores e funções de liquidificadores lançados pela Arno no final dos anos de 1980 no Brasil. Modelos LE, LH, PRO e Multi PRO respectivamente. ..................................................................................................... 154Figura 113: Liquidificador Arno Modelo LP 1986. ................................................. 154Figura 114: Opções de modelos e funções de liquidificadores lançados pela Walita no Brasil, na década de 1990. Modelos Omega, Alfa, Beta, Gama, Delta Selector eDelta Eletronic respectivamente. ............................................................................. 155Figura 115: Liquidificador Walita Delta Selector controle eletrônico de funções -1995. ....................................................................................................................... 155

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Figura 116: Opções de modelos de liquidificadores lançados pela Walita no Brasil, nos anos 2000. Modelos Walita Twist, Juice & Co, LiqFaz e LiqArt respectivamente ................................................................................................................................ 156Figura 117: Liquidificador com filtro coador Mondial Modelo Turbo Premium Século XXI. .............................................................................................................. 157Figura 118: Linha Premium Mondial Século XXI. ................................................. 157Figura 119: Retrospectiva dos modelos de liquidificadores de 1900 ao Século XXI. ................................................................................................................................ 157Figura 120: Batedeira Walita modelo Torpedo 1946. ........................................... 158Figura 121: Liquidificador e Batedeira Arno modelo Dual Super Stand Mixer 1954. ................................................................................................................................ 158Figura 122: Batedeira Walita modelo BBJ Batedeira de Bolos Jubileu 1964. . 159Figura 123: Batedeira Walita modelo Jubileu BBT-300 1974-1977...................... 160Figura 124: Batedeira Arno modelo Ciranda 1980. .............................................. 161Figura 125: Batedeira Walita modelo Topa-tudo 1980. ........................................ 161Figura 126: Batedeira Walita modelo Topa-tudo Carrossel 1992. ........................ 161Figura 127: Batedeira Walita modelo Topa-tudo Plus 2000. ................................ 162Figura 128: Batedeira Planetária Arno linha luxo modelo SX80 - 2010. ............... 163Figura 129: Modelos de batedores da batedeira Planetária. ................................... 163Figura 130: Primeiro Forno Micro-ondas da história. Modelo Radarange fabricado e comercializado pela Raytheon Company em 1947 EUA. ..................................... 164Figura 131: Primeiro Forno Micro-ondas doméstico. Fabricado e comercializado pela Tappan em 1955 EUA. ......................................................................................... 165Figura 132: Primeiro Forno Micro-ondas portátil de uso doméstico. Modelo Radarange fabricado e comercializado pela Raytheon Company em 1967 EUA.165Figura 133: Forno Micro-ondas portátil de uso doméstico. Fabricado e comercializado pela Panasonic em 1976 EUA. .................................................... 166Figura 134: Micro-ondas portátil de uso doméstico modelo GE.9 da General Electric. ................................................................................................................................ 167Figura 135: Micro-ondas portátil de uso doméstico modelo Quick Touch da Breville. ................................................................................................................................ 167Figura 136: Estrutura do Cérebro Trino ou Cérebro Triuno de Paul MacLean. ....... 178Figura 137: Layout cozinha projeto apartamento Santo Antônio. Planta de reconhecimento análise espacial. ........................................................................ 184Figura 138: Vista bancada da cozinha original. ....................................................... 185Figura 139: Vista frontal da cozinha original............................................................ 185Figura 140: Vista lateral oposta da cozinha original - geladeira. ............................. 185Figura 141: Moodboard Painel conceitual da cozinha elementos que inspiraram a construção e a imagem do projeto. Projeto: Apartamento Santo Antônio. .............. 186Figura 142: Vista da bancada - projeto apresentado. .............................................. 187Figura 143: Vista frontal projeto apresentado. ...................................................... 187Figura 144: Vista geladeira projeto apresentado. ................................................. 187Figura 145: Layout cozinha projeto apartamento Vila da Serra. Planta de reconhecimento análise espacial. ........................................................................ 190Figura 146: Moodboard Painel conceitual da cozinha elementos que inspiraram a construção e a imagem do projeto. Projeto: apartamento Vila da Serra. ................ 191

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Figura 147: Cozinha projeto apartamento Vila da Serra vista das áreas de trabalho: pia, fogão e geladeira. ............................................................................................. 192Figura 148: Vista da torre de equipamentos. .......................................................... 192Figura 149: Vista da mesa de refeições. ................................................................. 192Figura 150: Layout Varanda Gourmet projeto apartamento Vila da Serra. Planta de reconhecimento análise espacial. ........................................................................ 194Figura 151: Moodboard Painel conceitual da varanda gourmet elementos que inspiraram a construção e a imagem do projeto. Projeto: apartamento Vila da Serra. ................................................................................................................................ 195Figura 152: Varanda Gourmet projeto apartamento Vila da Serra vista das áreas de trabalho: pia, forno e churrasqueira. ................................................................... 195Figura 153: Vista frontal da varanda gourmet. ........................................................ 196Figura 154: Vista da parede verde. ......................................................................... 196

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Lista de Quadros

Quadro 01 Cronograma proposto para desenvolvimento da pesquisa -------------- 27

16

Lista de Abreviaturas

CCNC Comissão Construtora da Nova Capital

CETEC MG Fundação Centro Tecnológico de Minas Gerais

GLP Gás liquefeito de petróleo

IDORT Instituto de Organização e Racionalização do Trabalho

JK Juscelino Kubitschek

MDF Medium Density Fiberboard (Placa de fibra de média densidade)

PU Poliuretano polímero

PS Poliestileno

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 19

CAPÍTULO 1 ............................................................................................................. 25

PERCURSO DA CONSTRUÇÃO DA DISSERTAÇÃO ............................................. 25

1.1- Estrutura da pesquisa .................................................................................. 26

1.1.1- Referencial teórico .................................................................................... 28

1.1.2- Método de história oral ............................................................................. 28

1.1.3- Entrevistas ................................................................................................ 29

1.1.3.1- Características dos participantes ........................................................... 30

1.1.3.2- Local e duração das entrevistas ............................................................ 31

1.1.3.3- Roteiro e transcrição dos dados ......................................................... 32

1.1.3.4- Análise dos dados .............................................................................. 32

1.1.3.5- Considerações éticas ............................................................................ 33

1.1.4- Análise dos projetos ................................................................................. 34

CAPÍTULO 2 ............................................................................................................. 35

CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA ........................................................................ 35

2.1- A Formação da Capitania de Minas Gerais .................................................... 35

2.1.1- De povoado a vila, de vila a cidade .......................................................... 38

2.1.2- Arquitetura e seus interiores ..................................................................... 40

2.1.3- A cozinha no núcleo colonial urbano ........................................................ 46

2.2- O século XIX O surgimento de Belo Horizonte ............................................ 50

2.2.1- Casas as plantas e seus interiores ........................................................ 57

2.2.2- A cozinha em Belo Horizonte ................................................................... 66

2.2.3- As famílias mineiras .................................................................................. 76

CAPÍTULO 3 ............................................................................................................. 83

ESPAÇO DOMÉSTICO NO COMEÇO DO SÉCULO XX - O PLANEJAMENTO DO ESPAÇO DA COZINHA. ........................................................................................... 83

3.1- Organização dos espaços de trabalho o projeto da cozinha no século XX: 83

3.1.1- O projeto da cozinha no século XX no Brasil: ........................................... 91

3.2 Racionalização das tarefas a otimização dos espaços de trabalho através dos objetos e o design no ambiente das cozinhas no começo do século XX: ..... 111

3.2.1- Os principais eletrodomésticos da cozinha A história do fogão ........... 113

3.2.2 Os principais eletrodomésticos da cozinha A história da geladeira: ..... 130

18

3.2.3 Os principais eletroportáteis da cozinha A história do liquidificador, da batedeira e do micro-ondas .............................................................................. 147

CAPÍTULO 4 ........................................................................................................... 170

4.1 O homem e o espaço de morar uma reflexão ............................................. 170

4.2 O homem e o espaço da cozinha uma análise ........................................ 181

4.2.1- Projeto cozinha de uma vida .................................................................. 182

4.2.2- Projeto cozinha tecnológica .................................................................... 188

CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 198

REFERENCIAS ....................................................................................................... 201

APÊNDICE .............................................................................................................. 209

ANEXO I .................................................................................................................. 214

ANEXO II ................................................................................................................. 215

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INTRODUÇÃO

Projetar um móvel, um carro, uma casa; é um processo que demanda uma

organização e um método projetual. Pode variar de profissional para profissional.

Pensar o projeto de um espaço requer cuidado, elaboração e planejamento do

briefing1, compreensão do problema e principalmente conhecer o cliente e como

este se comporta. Estudiosos que se tornaram referência para o estudo do design

construíram métodos e descreveram processos e teorias para se obter o melhor

resultado possível, como o designer Dijon de Moraes2, que defende que para se

obter um bom resultado de projeto é importante colocar, o usuário no centro do

processo (MORAES, 1997, p. 109).

Na teoria parece simples, objetivo e fácil; mas na prática não é. Projetar, além

de todos os métodos e processos, envolve emoção, memória, comportamento. É um

reflexo da sociedade ao qual o indivíduo está inserido, ou seja, é um reflexo da

cultura material de uma civilização. Projetar o interior de uma residência tem por

objetivo principal proporcionar bem-estar e aconchego melhorando a vida de quem

habita.

Na maior parte das residências das pessoas com maior poder aquisitivo, cada

ambiente da casa tem uma função primária especifica, uma proposta para sua

existência na configuração da planta do imóvel e essa separação por cômodos

ocorreu desde a Roma Imperial (RISÉRIO, 2015, p. 145). Por exemplo: nas casas

dos mais favorecidos, a sala de estar é o espaço de socialização, a copa das 1 Briefing Todo projeto deve partir de um briefing, ou seja, uma real necessidade. Seria uma lista de instruções com todas as especificidades do projeto: o perfil do cliente; a quem se destina; onde o produto ou serviço irá atuar um espaço ou um grupo de pessoas; o contexto ao qual o produto ou serviço está inserido e a necessária inter-relação espacial entre o produto e o usuário (GURGEL, 2017, p. 17). 2 Dijon de Moraes (1960) Designer, doutor pela Universidade Politecnico Di Milano Itália), com pesquisa de Pós-Doutoramento no mesmo instituto e com revalidação nacional do diploma de doutorado junto à Universidade de Brasília - UnB. Interessa-se tanto pela prática quanto pelos aspectos teóricos do design. Recebeu vários prêmios no Brasil (foi contemplado com o Prêmio Ouro IDEA Brasil pela carreira e por três vezes o Prêmio Museu da Casa Brasileira de Design) e exterior (Itália, Taiwan e Japão). É autor de vários livros entre eles Limites do Design (1997), Análise do Design Brasileiro (2006) e Metaprojeto o Design do Design (2010) publicados pelas Editoras Studio Nobel e Blücher de São Paulo, co-autor dos históricos Anais do Congresso Internacional Design plus Research (2002), conferência internacional promovida pela Universidade Politecnico di Milano. (Plataforma lattes CNPQ Disponível em: http://lattes.cnpq.br/3963802030917928Acesso em: 18/06/2019)

20

refeições, os quartos para momentos de privacidade e descanso e a cozinha, para

uma grande parcela das famílias, é o coração da casa. Nela receitas são

preparadas, momentos de convívio são vivenciados e um arsenal de objetos é

colecionado ao longo dos tempos. Como estes objetos são registro do

comportamento e dos hábitos de uma época; vão contar a história das famílias e de

seus costumes refletindo na história da sociedade.

No princípio da formação humana, quando o homem passa a dominar o fogo,

o ato de cozer o alimento propiciou o surgimento da cozinha; não somente do ato de

cozinhar, mas também o ambiente reservado ao cozimento. Com o passar do

tempo, a sociedade passou por muitas transformações e a cozinha, com seus

artefatos e receitas, reflete essas mudanças sociais e comportamentais. A cultura

material é o retrato de uma civilização: seus hábitos, valores e princípios, são

percebidos por meio dos artefatos e também pela maneira como se alimentam e o

que alimentam; um reflexo do modus vivendi.

O Brasil é um país multicultural. A mistura de etnias índios, negros e os

europeus, principalmente os portugueses que aqui colonizaram; proporcionou um

cruzamento entre culturas e costumes que vai refletir não somente no

comportamento como também na arquitetura, marcando o estilo de construção na

época da colonização, marco da primeira casa brasileira. Segundo Veríssimo; Bittar

(1999, p.

homogeneizador dessa moradia. Com o índio, aprende que cozinhar nos trópicos é

uma tarefa a ser feita do lado de fora; numa varanda ou num puxado ao lado da

casa .

A vinda da Corte Portuguesa para o Brasil em 1808 uma estratégia do

príncipe regente Dom João VI3 para fugir da pressão de Napoleão Bonaparte4 que

3 Dom João VI (1767-1826) - Nasceu em Lisboa, no dia 13 de maio de 1767. Filho do rei consorte D. Pedro III e de D. Maria I, que para selar a amizade com a Espanha, no dia 8 de maio de 1785, casa seu filho, com 18 anos, com Carlota Joaquina, com apenas 10 anos, filha do rei espanhol Carlos IV. Foi Rei de Portugal, Brasil e Algarves; sendo Príncipe Regente de Portugal e Brasil. Abriu os portos brasileiros ao comércio exterior. Em setembro de 1806, quando Napoleão deu o ultimato, decidiu embarcar com toda sua família real para o Brasil, sob a proteção de navios britânicos, desembarcando em 1808 em Salvador; levando o Brasil da situação de colônia a sede do governo português. (COSTA, Célio Juvenal. O Rei D. João III (1521-1557) e a construção da sociedade de corte em Portugal. In: II SIMDES Simpósio do Dehscubra. Piracicaba, 2013.).

21

pretendia tomar o trono português; trouxe consigo novos modelos familiares e novos

costumes para a colônia modificando o cotidiano e as necessidades dos colonos. No

final do século XIX, de acordo com Silva (2008, p.

civiliz - como classifica Veríssimo; Bittar (1999, p. 111) assumiu a vida

doméstica onde surgiu uma preocupação com a organização dos espaços de

trabalho residenciais o que levou a busca pela racionalização das tarefas

domésticas. Nesse contexto, a cozinha tornou-se o espaço de maior estudo e

pesquisa, além de se tornar um símbolo de libertação feminina. Os olhares se

voltaram não somente para o planejamento e otimização do espaço como também,

para a criação e desenvolvimento de equipamentos que facilitassem o dia-a-dia das

donas-de-casa (SILVA, 2008, p. 95).

O Estado de Minas Gerais, foco deste estudo, com sua história registrada

pelas descobertas de minas de ouro e prata levando a migração de milhares de

pessoas e etnias; foi desde o período colonial, conhecida pela sua gastronomia. As

receitas trazidas pelos portugueses, a comida e os ingredientes manipulados pelos

índios e principalmente os pratos preparados pelos escravos construíram a

identidade da gastronomia mineira. A cozinha e a comida mineira são famosas em

todos os cantos do país, atrai turistas e fomenta negócios. Para o mineiro, qualquer

motivo vira reunião em volta do fogão, ou seja, a maioria dos mineiros tem por sua

cozinha um apego, uma memória.

Entender como o ambiente da cozinha se transformou é muito importante não

somente pelo registro histórico, mas também para despertar em futuros profissionais

a importância de projetar espaços que sejam pensados não somente pela

funcionalidade, mas principalmente pelo significado que o ambiente impera na

memória e na cultura material de uma civilização uma memória não somente

histórica, mas uma memória social e arquitetônica. É preciso disseminar, em meio

aos designers de interiores e arquitetos; a importância da relação do homem com o

espaço habitado no que se trata de manter viva a memória e a tradição.

4 Napoleão Bonaparte (1769-1821) - Foi imperador francês, com o título de Napoleão I. Líder político, ditador e comandante do exército Francês, conquistou uma grande extensão territorial para a França. (Site Plataforma e-biografia. Disponível em: https://www.ebiografia.com/napoleao_bonaparte/ Acesso em: 18/06/2019)

22

Na minha vida, o prazer de conversar na cozinha acabou se somando ao prazer de conversar sobre a cozinha em, pelo menos três sentidos: no arquitetônico, no culinário e no plano da leitura histórica ou socioantropologica desse elemento fundamental dos abrigos humanos, peça material básica dos ambientes construídos, nos seus aspectos residenciais, industriais ou comerciais, com todas as suas conexões e implicações simbólicas. (RISÉRIO, 2015, p. 139).

O que justificou esta investigação foi a possibilidade de entender como o

design contribuiu e contribui para a transformação do espaço da cozinha e sua

ramificação no espaço gourmet5. Nesse contexto, investigou-se a transformação do

ambiente e seus impactos no comportamento dos indivíduos moldado pelo design,

muito importante para a compreensão do espaço e suas características projetuais.

Afinal, segundo Miller (2013, as pessoas estão mais uma vez criando a si

.

Assim surgiu a seguinte indagação que norteou essa pesquisa: de que forma

o planejamento do espaço e os eletrodomésticos modificaram o ambiente da

cozinha das classes A e B6, em Minas Gerais e como refletiu na transformação

comportamental do homem; que levou a investigar quais os impactos a

industrialização propôs ao ambiente da cozinha na sociedade mineira e de que

forma refletiu a cultura material da sociedade do século XXI a sociedade da

"gourmetização" ou conforme cita Risério (2015, p. 139) a sociedade do

.

A proposta de pesquisar sobre as cozinhas das classes A e B não desmerece

a importância das cozinhas populares; estas tão relevantes no contexto histórico,

arquitetônico e social da construção e da urbanização de Belo Horizonte. A proposta

se limitou em detrimento do objetivo central ser canalizado para a compreensão dos

desdobramentos da cozinha com o espaço gourmet compreendidos através da 5 Espaço Gourmet nova tendência entre os empreendimentos, esse espaço foi concebido para a recepção e socialização, uma conexão do privado com o público. Geralmente localizado nas varandas dos apartamentos ou na área externa das casas, é uma cozinha compacta, com aparelhos eletrodomésticos de última geração onde a proposta é estética e a função é gerar valor; status. O conceito desse ambiente foi lançado pela primeira vez na Mostra Casa Cor e desde então tem se tornado o espaço de desejo. (VALÉRY, Françoise Dominique. Da casa de família ao espaço gourmet: reflexões sobre as transformações dos modos de morar em Natal/RN. São Paulo: Cadernos CERU, v. 22, n. 1, p. 147-174, 2011). 6 Classe Social A e B De acordo com a perspectiva da autora, a classificação atribuída para essa pesquisa às classes sociais A e B, cabe àquelas pessoas que têm condição financeira de investir em um projeto de interiores e têm por hábito contratar o profissional de design de interiores para desenvolver e assessorar na criação projetos para os ambientes da cozinha e ou do espaço gourmet, e que tomam como hábito o fato de cozinharem socialmente; além de serem residentes na zona sul da cidade de Belo Horizonte-MG.

23

contribuição do design na transformação desses espaços. A ideia é para um

segundo momento, em uma tese de doutorado estender as pesquisas a fim de

compreender como as cozinhas populares se moldam em torno da capacidade de se

reinventar das classes C e D.

A dissertação se desdobrou em quatro capítulos, sendo o primeiro

direcionado a descrição do percurso da construção da dissertação, ou seja, a

estrutura metodológica percorrida. A intenção de descrever o processo em um

capítulo se deu por entender que era preciso descrever de maneira organizada

explicando mais detalhadamente cada uma das etapas do processo a fim de que o

leitor possa entender o porquê da escolha de cada uma delas e de que forma elas

contribuíram para atingir os objetivos propostos levando à reflexão final.

No capítulo 2, foi pontuado aspectos da dimensão histórica a respeito da

transformação do ambiente da cozinha na planta da casa mineira. O recorte

temporal foi significativo sendo marcado desde a formação da Capitania de Minas

Gerais até a contemporaneidade que imprimiu profundas transformações na história

da formação da sociedade e para a história do design mineiro.

Questões como: a transformação dos artefatos da cozinha a partir da

racionalização das tarefas domésticas somado à análise do comportamento social

das famílias brasileiras que fora influenciado não somente pela organização dos

espaços de trabalho, mas como pelos equipamentos eletrodomésticos, foram

analisadas no capítulo 3, avaliando os impactos dessas transformações no ambiente

da cozinha; onde um breve histórico da transformação dos principais equipamentos

que constituem a área principal do ambiente foi discutido a partir dos contextos

históricos, sociais e políticos.

No capítulo 4, foi feita uma análise utilizando a psicologia ambiental7 para

traçar um estudo sobre a importância do ambiente da cozinha e de seu

7 Psicologia Ambiental tem se destacado nos estudos sobre emoções e afetividade abrangendo diferentes perspectivas, que vão desde aquelas que consideram uma influência mútua entre pessoa e ambiente. Definida a partir do seu objeto de estudo a relação pessoa-ambiente-, a Psicologia Ambiental tem como característica principal poder articular-se com os mais diversos campos do conhecimento, como arquitetura e urbanismo, design, ciências social, ergonomia, ecologia humana, geografia e pedagogia. Ademais, ela conduz o olhar dos estudiosos para a subjetividade e as especificidades do humano que se revelam nessa relação. (CAVALCANTE; ELALI, 2018, p. 65)

24

desdobramento no espaço gourmet. Aqui foram relatadas memórias de pessoas

entrevistadas sobre o ambiente das suas cozinhas; analisando dois projetos

executados pela autora para ilustrar e exemplificar a discussão; para que ao final

pudessem ser propostos aspectos que ajudem na construção de um novo olhar para

o ambiente da cozinha e principalmente na ressignificação dos projetos das

cozinhas contemporâneas.

Com essa pesquisa, que resultou na dissertação, pretendeu-se registrar a

história do ambiente da cozinha em Minas Gerais analisando sua importância

histórica para a sociedade, uma vez que o Estado tem uma relação forte com a

gastronomia e com o ambiente; assim como se aprofundou na compreensão do

papel do designer no projeto e na valorização do ambiente da cozinha através da

análise e do olhar da psicologia ambiental uma vertente muito importante na

compreensão da relação homem-espaço em um cenário complexo e de mudanças

muito rápidas.

Essa análise, também contribuiu com um levantamento bibliográfico e

documental que pôde garantir o entendimento comportamental e cultural da

sociedade do século XXI em relação ao novo gourmet ;

fornecendo material e registro para os designers que pretendem projetar novas

propostas de ambientação para a cozinha com outro olhar que não somente o

estético, valorizando o vínculo do homem com o ambiente através da memória e a

cultura material.

25

CAPÍTULO 1

PERCURSO DA CONSTRUÇÃO DA DISSERTAÇÃO

A pesquisa se caracterizou, por ser de natureza qualitativa utilizando o

método de história oral como método central. Para atender aos objetivos iniciais foi

elaborado um levantamento bibliográfico e documental nas cidades de Ouro Preto

local onde fora constituída a Capitania de Minas Gerais e na cidade de Belo

Horizonte atual capital do Estado de Minas Gerais, foco deste estudo. Foram

pesquisados tanto nos arquivos públicos das duas cidades, quanto em bibliografias

e registros de memórias de habitantes que residiram ou ainda residem nas duas

cidades. Consultou-se: plantas residenciais, documentos de posse e registro de

residências, assim como; relatos, arquivos e publicações que contam a história da

formação e colonização da capitania e o dia-a-dia das famílias para contextualização

histórica do ambiente da cozinha juntamente com seus artefatos, a fim de

compreender sua configuração na planta residencial das casas. Essa análise foi feita

a partir da formação da Capitania de Minas Gerais até o início do século XXI

analisando de que forma o ambiente se relacionou com o homem ao longo desse

período.

Pretendeu-se também conhecer como a literatura científica na área

identificava e pesquisava o ambiente da cozinha e o relacionava com a sociedade,

com ênfase na cultura material; refletindo o modus vivendi do homem brasileiro e

sua relação com o design.

No contexto do uso do método da história oral foram feitas entrevistas, em um

primeiro momento com uma idosa que vivenciou a primeira fase de transição do

modelo de cozinha e que pôde relatar os dados necessários à compreensão do

problema da pesquisa que foi: entender de que forma o planejamento do espaço e

os eletrodomésticos modificaram o ambiente da cozinha em Minas Gerais e como

refletiu no comportamento das pessoas. E no segundo momento, foram feitas

entrevistas com clientes da autora que atualmente projetaram suas cozinhas e

também projetaram o espaço gourmet, a fim de compreender a relação estética,

funcional e conceitual dos espaços dentro das residências, além de compreender

seu vínculo emocional. As informações coletadas através das entrevistas permitiram

confrontar a coleta de dados das fontes documentais e os depoimentos orais.

26

Por conseguinte, as informações confrontadas foram relacionadas aos

princípios da psicologia ambiental que defende a relação do homem com o espaço

habitado e a importância dessa relação para a cultura material da sociedade. Em

seguida foram analisados e apresentados dois projetos de cozinha, ambos projetos

realizados pela autora, sendo um o projeto de uma reforma da cozinha para uma

senhora de 91 anos residente em um apartamento construído na década de 1950 e

o segundo o projeto de uma cozinha e de uma espaço gourmet para um jovem casal

residente em um apartamento construído no ano de 2018. O objetivo desses dois

projetos analisados foi relatar a experiência de projetar os espaços e de mostrar a

diferente relação com o ambiente e sua memória em gerações diferentes.

Assim, como resultado final, construiu-se uma narrativa que pôde, não só

contar a história do ambiente da cozinha no Estado de Minas Gerais como

contextualizar e nortear os designers por meio de discussões e análises de projetos

aplicando as teorias da psicologia ambiental. Uma vez que o resultado esperado

pode ajudar na construção de material para futuros projetos com o olhar atento à

memória e a cultura material.

1.1- Estrutura da pesquisa

Para alcançar os objetivos propostos, conforme mostra o quadro 01, em um

primeiro momento foi feito um levantamento bibliográfico e em seguida um

levantamento documental para contextualização histórica do ambiente da cozinha no

núcleo colonial urbano de Minas Gerais a partir de sua formação; assim como

também, a fim de conhecer como a literatura científica da área veio pesquisando e

reconhecendo o ambiente da cozinha e o relacionando com a sociedade.

No segundo momento foi feita uma pesquisa para se conhecer as premissas

e entender as necessidades que levaram ao desenvolvimento dos primeiros projetos

para o ambiente da cozinha no começo do século XX no Brasil e no mundo; assim

como compreender de que forma o design, por meio do projeto do ambiente e dos

equipamentos domésticos; ajudou a otimizar e a simplificar a vida doméstica.

Complementando a pesquisa, foram feitas entrevistas, analisando os

impactos das mudanças sofridas no ambiente da cozinha, através da experiência e

vivência de pessoas que presenciaram as transformações ocorridas durante esse

27

período aqui no Brasil, mais precisamente na cidade de Belo Horizonte. Foram

documentos do tipo biográficos, assim como de memórias e autobiografias que

capturaram da memória dos entrevistados a importância da cozinha em sua vida e

como vêm se relacionando com o ambiente e seus artefatos ao longo dos tempos.

Quadro 01- Esquema proposto para desenvolvimento da pesquisa

CRONOGRAMA OBJETIVOS ATIVIDADE METAS RESULTADO ESPERADO

1- Traçar um panorama histórico do ambiente cozinha - núcleo colonial urbano até o século XXI.

Pesquisa Bibliográfica

Capítulo 2

Contextualizar e registrar a transformação do ambiente da cozinha ao longo da história de Minas Gerais

2- Conhecer as premissas e entender as necessidades que levaram ao desenvolvimento dos projetos para o ambiente da cozinha no começo do século XX, assim como; compreender de que forma o design, através do projeto do ambiente e dos equipamentos domésticos; ajudou a otimizar e a simplificar a vida doméstica.

Pesquisa Bibliográfica. .

Capítulo 3

A partir da análise da organização dos espaços domésticos de trabalho no começo do século XX e da compreensão a respeito da racionalização das tarefas domésticas, compreender o processo produtivo e a maneira de pensar o projeto das cozinhas.

3- Cultura e a Psicologia ambiental - Refletir como o ambiente da cozinha se relaciona com os indivíduos e os impactos de suas transformações em seu cotidiano; e Análise de projetos

Pesquisa Bibliográfica, entrevistas e análise de projetos realizados.

Capítulo 4

Interpretar, através da psicologia ambiental; a relação do homem com o espaço habitado comprovando a importância do projeto para o bem-estar dos indivíduos.Demonstrar como as cozinhas vêm sendo projetadas hoje e suas ramificações na cozinha gourmet.

Fonte: Da autora (2019)

Coletados e analisados os dados, em seguida foi feita uma análise sob a ótica

da psicologia ambiental relacionado à cultura e tradições no contexto do ambiente

da cozinha refletindo como este se relaciona com os indivíduos e quais os impactos

em seu cotidiano. A psicologia ambiental parte do princípio do bem-estar de quem

habita e das relações construídas entre pessoas com afinidades. Para concluir e

construir essa relação foram analisados dois projetos de cozinha, realizados no ano

de 2019 pela autora, cujo objetivo foi entender como as cozinhas vêm sendo

projetadas na atualidade e como surge a necessidade dos espaços gourmet.

28

1.1.1- Referencial teórico

No capítulo do referencial teórico, foi elaborada uma pesquisa bibliográfica e

uma pesquisa documental para conhecer e escrever sobre a contextualização

histórica do ambiente da cozinha na Capitania de Minas Gerais a partir de sua

formação, traçando um estudo cronológico até o século XX; nele foi avaliado sua

configuração na planta da casa e seus artefatos compreendendo de que forma se

relacionou com o homem ao longo desse período.

No campo do levantamento bibliográfico, a análise partiu das discussões de

autores e especialistas da área estudada que escreveram sobre o tema; a revisão

dessa literatura contribuiu para o embasamento das entrevistas realizadas através

do método da história oral proposto para o segundo momento para então confrontar

os dados com a teoria da psicologia ambiental levando à conclusão pretendida.

No campo da pesquisa documental, foram estudados registros de imóveis,

plantas das residências de Ouro Preto e Belo Horizonte do século XVIII, XIX e XX e

cartas enviadas nesse período entre os moradores e visitantes da região que

relatavam a realidade urbana da Colônia e da formação da Capital; ambos foram

pesquisados no arquivo público de Ouro Preto e no arquivo público mineiro; essa

análise documental proporcionou uma visão da situação da cozinha na planta da

casa mineira.

1.1.2- Método de história oral

A proposta de trabalhar uma pesquisa de natureza qualitativa utilizando o

método de história oral como método principal se deu por entender que a vivência

das pessoas é fundamental para compreender a importância do ambiente da

cozinha no contexto histórico em Minas Gerais, levantando informações e dados que

partiram da vivência das pessoas, afinal de acordo com Matos; Senna (2011, p. 96)

-se na memória humana e sua capacidade de rememorar o

passado enquanto testemunha do viv

Entender que grande parte da análise veio por meio da experiência e da

vivência de pessoas que presenciaram as transformações ocorridas durante esse

período, fez com que documentos do tipo biográficos, assim como de memórias e

autobiografias, passassem a fazer parte do material de pesquisa a fim de

29

compreender como as mudanças afetaram direta ou indiretamente o comportamento

dos indivíduos.

A escolha da proposta de metodologia de história oral teve como princípio a

percepção da carência de registros sobre o ambiente estudado. As entrevistas foram

apenas com o intuito de investigar, por meio do cotidiano dos entrevistados como

era o ambiente da cozinha e a sua relação com o mesmo. As perguntas foram

direcionadas apenas ao espaço da cozinha e a relação do entrevistado com o

ambiente; não oferecendo, a princípio, nenhum tipo de risco à saúde ou qualquer

dano moral.

Ao detectar a carência de registros e bibliografias na área pesquisada, uma

vez que foram encontrados poucos estudos e relatos do interior das residências em

Minas Gerais, a proposta de levantar um estudo sobre o ambiente da cozinha; este,

muito rico do ponto de vista social, cultural e gastronômico; e ao mesmo tempo a

escolha da metodologia de história oral possibilitou recuperar valores e memórias

que estavam sendo perdidos com o tempo e que fazem parte da história da

sociedade. A narrativa se apresentou como uma ferramenta de grande valor, pois foi

responsável pela humanização das pessoas; recuperou experiências e histórias de

momentos da vida do entrevistado que talvez nem mesmo os parentes mais

próximos tivessem conhecimento.

A história oral pode dar grande contribuição para o resgate da memória nacional, mostrando-se um método bastante promissor para a realização de pesquisa em diferentes áreas. É preciso preservar a memória física e espacial, como também descobrir e valorizar a memória do homem. A memória de um pode ser a memória de muitos, possibilitando a evidência dos fatos coletivos. (THOMPSON, 1992, p.17 apud MATOS; SENNA, 2011, p. 96).

O método de história oral é uma forma estratégica de manter viva a

individualidade de cada uma das pessoas entrevistadas, mostrando sua importância

enquanto indivíduo e ao mesmo tempo suas memórias passam a fazer parte da

memória do ambiente e da sociedade, retratando a cultura material local.

1.1.3- Entrevistas

As entrevistas foram feitas por meio de um questionário e submetidas à

transcrição; transformadas num relato literário em primeira pessoa. Para o registro

das emoções, observações e avaliação do processo foi utilizado o recurso do

30

caderno de campo. As narrativas foram editadas na forma de um caderno

personalizado sintetizando a narrativa.

O principal resultado esperado ao final da pesquisa proposta foi um

diagnóstico a respeito da forma como se tem projetado os ambientes das cozinhas e

os espaços gourmet nas residências na cidade de Belo Horizonte.

Como desfecho secundário detectou-se como foram aproveitados e

dimensionados os espaços da cozinha e dos espaços gourmet; se estão

favorecendo as relações sociais entre os indivíduos e se os artefatos utilizados são

realmente condizentes com as necessidades e a realidade local - a cidade de Belo

Horizonte; ou se são meros elementos de desejo frutos da sociedade industrializada

capitalista.

1.1.3.1- Características dos participantes

A amostra estudada foi de 03 mulheres e 02 homens totalizando 05

entrevistados ambos pertencentes às classes A e B, conforme classificada

anteriormente; da cidade de Belo Horizonte. Pessoas que buscam conforto, bem

estar e priorizam um estilo de vida onde o ato de cozinhar é parte do dia-a-dia e dos

seus momentos de lazer social. Partes desses entrevistados realizaram projetos de

interiores, onde a estética e a funcionalidade foram pré-requisito de projeto.

Os participantes foram selecionados a partir da sua relação com o espaço da

cozinha e com o espaço gourmet, durante o período estudado, o século XX. Desses,

03 entrevistados foram: a Entrevistada 01 Sra. Edy Garcia; a Entrevistada 02

Sra. Juliana Martins Carvalho e o Entrevistado 03 Sr. Fabrício Carvalho, ambos

clientes de projeto de interiores da autora e a Entrevistada 04 Sra. Marfiza de

Castro e o Entrevistado 05 Sr. Túlio Vanni por terem uma relação de subsistência

e de apego respectivamente pelo ambiente da cozinha um espaço importante em

suas vidas.

A Entrevistada 01, nascida em Belo Horizonte no ano 1929, viveu na capital

até o ano de 1932 quando se mudou com a família para a Fazenda Granjas

Reunidas no município de Bocaiúva em Minas Gerais e ao se casar no ano de 1953

mudou-se para a Capital onde morou em uma residência construída no ano de 1925

na Rua Sergipe no Bairro dos Funcionários em Belo Horizonte. No ano de 1955 se

31

mudou para um apartamento construído na década de 1950 no Bairro Santo Antônio

onde reside atualmente. A Entrevistada 01 contratou a autora para realizar a reforma

de seu apartamento com destaque para sua cozinha a fim de modernizá-la e

organizá-la, porém seu desejo era manter vivo seus costumes e sua identidade.

A Entrevistada 02 e o Entrevistado 03, casados, ambos nascidos em Belo

Horizonte nos anos de 1978 e 1975 respectivamente, contrataram a autora para a

realização do projeto de interiores de seu apartamento no Bairro Villa da Serra na

cidade de Nova Lima MG. O projeto envolvia a reforma da cozinha e a criação de

um espaço gourmet destinado aos momentos de lazer da família e um lugar especial

onde o Entrevistado 03 poderia relaxar e cozinhar para os amigos.

A Entrevistada 04, nascida em Belo Horizonte no ano de 1932, foi

selecionada por ter vivenciado parte de sua vida na cozinha, pois trabalhou como

cozinheira até abrir um buffet. A escolha se deu por entender que a entrevistada

vivenciou e vivencia várias transições e modernizações no ambiente da cozinha em

Belo Horizonte.

O Entrevistado 05, nascido em Belo Horizonte no ano 1970, foi selecionado

por ter como hobby o prazer de cozinhar e também por sonhar em ter um espaço

gourmet em casa para receber os amigos sonho que será realizado no ano de

2021 com a entrega de seu novo apartamento, imóvel esse que tem uma área que

será destinada ao espaço gourmet. A escolha se deu por entender que seria

importante conhecer a relação do homem com a cozinha e também para entender o

que leva uma pessoa a buscar um espaço gourmetizado.

1.1.3.2- Local e duração das entrevistas

Parte das entrevistas foi realizada na casa dos entrevistados, a fim de

proporcionar maior conforto e disponibilidade aos mesmos. No caso da Entrevistada

01 e da Entrevistada 04 a entrevista foi programada para durar 60 minutos, porém

foi conduzida de maneira aberta permitindo a intervenção e alteração do roteiro

conforme o relato de suas percepções e experiências. Já os entrevistados 02 e 03

programou-se para que não ultrapassa o tempo de 45 minutos, prevendo inclusive

um tempo de bate papo inicial e para o entrevistado 05, a entrevista foi realizada via

questionário enviado por e-mail, por sua escolha.

32

1.1.3.3- Roteiro e transcrição dos dados

Os roteiros foram pensados de acordo com cada perfil de entrevistado

seguem, no apêndice, os roteiros individualmente. Foram propostos três roteiros

diferentes, sendo o primeiro roteiro direcionado aos indivíduos que contrataram a

autora para realizar o projeto de reforma do ambiente da cozinha e do espaço

gourmet para aquele que tinha; o segundo roteiro direcionado a entrevistada que

vivenciou as transformações ocorridas no ambiente da cozinha e o terceiro roteiro

para o entrevistado que tem o hobby de cozinhar.

As entrevistas foram gravadas, com exceção do entrevistado 05 que foi via e-

mail. Com a autorização dos participantes, os dados foram analisados e os trechos

mais relevantes foram transcritos para um caderno de campo, para a melhor síntese

dos dados que a autora necessitava para a conclusão do trabalho. Os trechos

transcritos foram

.

1.1.3.4- Análise dos dados

Os dados coletados passaram por uma análise e uma seleção. As

informações relevantes à pesquisa, ou seja, para aqueles entrevistados que foram

clientes da autora, foram selecionados os dados que respondiam as questões

projetuais, analisando as necessidades que levaram à reforma da cozinha e a

separação e criação do espaço gourmet; além dos aspectos principais que

envolviam as escolhas associados ao desejo e a memória de cada um para o

espaço.

No caso da entrevistada que vivenciou as transições do espaço da cozinha,

foram selecionados os dados que contavam as histórias de cada momento marcante

das mudanças do espaço e da sua relação com a proposta de organização e

racionalização do trabalho no ambiente; além de seu vínculo com o espaço no que

se trata da libertação da mulher e da entrada do homem na cozinha.

No caso do entrevistado que tem como hobby o prazer de cozinhar e que

sonha em ter um espaço gourmet em casa foram consideradas as informações que

envolvem a relação do mesmo com a cozinha questões de emoção e afeto e

33

também argumentos que o levam a buscar o espaço gourmet em casa a fim de

entender a sua relação com o ambiente.

Em ambos os casos, foram levadas em consideração àquelas informações e

memórias que relataram, dentro do contexto da experiência vivida pelos

entrevistados; sua relação com o ambiente do ponto de vista emocional e funcional;

sua relação com os objetos não somente do ponto de vista funcional, mas como

esses modificaram a compreensão e a relação com o ambiente e aqueles dados que

registraram historicamente essas transformações.

1.1.3.5- Considerações éticas

Este trabalho foi apresentado ao Comitê de Ética da Universidade do Estado

de Minas Gerais ED/UEMG, sob o registro CAAE: 09329119.2.0000.5525

conforme atesta o documento no anexo. O registro tem por objetivo autorizar a

utilização por parte da autora de entrevistas realizadas com seres humanos, uma

vez que julgou as entrevistas como essenciais para a obtenção dos resultados

pretendidos.

Foram realizadas apenas entrevistas de cunho pessoal onde as perguntas

eram direcionadas à relação desses com o ambiente da cozinha foco desse

estudo. Os entrevistados foram selecionados a partir de sua relação de proximidade

com a autora, ou seja, uma amostragem por conveniência e também de sua

conexão com o ambiente em questão, ambos autorizaram as entrevistas por meio

de um termo de consentimento livre esclarecido em anexo; e participaram como

voluntários da pesquisa onde tiveram liberdade de responder e também de contribuir

com o conteúdo.

Sendo assim, para tal percurso, deu-se início com o estudo bibliográfico onde

no referencial teórico, a seguir, pesquisou-se a formação da Capitania de Minas

Gerais com enfoque na arquitetura, a fim de contextualizar o ambiente da cozinha

foco deste estudo, na configuração da planta residencial das moradias do século

XVIII e XIX.

34

1.1.4- Análise dos projetos

Para este trabalho, foram analisados dois projetos realizados e executados

pela autora no ano de 2019. A opção de usar projetos exclusivamente da autora se

deu por entender a necessidade de um acompanhamento mais preciso, onde seriam

investigadas questões de cunho pessoal e seria necessário recorrer várias vezes ao

cliente durante o processo. A ferramenta da psicologia ambiental, antes de mais

nada, exige uma afinidade e um relacionamento entre o cliente e o designer de

interiores e essa interface só é possível e realizada de maneira a aprofundar nos

conceitos da ferramenta, quando o cliente se propõe a se entregar e aceita o

envolvimento com o profissional; portanto a investigação utilizando projetos de

outros profissionais tornou-se inviável.

As análises partiram de uma entrevista com cada cliente a fim de investigar as

necessidades e avaliar os desejos e sonhos de cada um. Em seguida foram

estudadas, a partir da coleta dos dados, cada demanda e analisadas junto aos

conceitos da psicologia ambiental para que fosse possível a criação de perfil para

cada cliente facilitando o processo de desenvolvimento do projeto. Ao diagnosticar

cada cliente torna-se mais fácil perceber o que o envolve e o motiva para então

atender os seus anseios de maneira concreta e real valorizando cada momento de

sua vida e potencializando sua identidade.

Feito o perfil do cliente, a terceira etapa da análise envolveu a discussão do

espaço pontuando as questões técnicas e decodificando os aspectos favoráveis e os

pontos negativos do ambiente. Em seguida foi apresentado o layout e as

perspectivas refletindo cada uma das escolhas de projeto devidamente justificadas

pelos conceitos da psicologia ambiental ferramenta principal do processo projetual

aqui defendido.

A análise dos projetos tornou-se essencial para o entendimento das vantagens

de se aplicar a psicologia ambiental no projeto de interiores, uma maneira de

humanizar e valorizar as relações, as lembranças e as memórias dos indivíduos.

Fator essencial para a conclusão deste estudo.

35

CAPÍTULO 2

CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA

Este capítulo trata da contextualização histórica a respeito da formação da

Capitania de Minas Gerais e da transição da capital de Ouro Preto para Belo

Horizonte incluindo a história da construção da cidade; abordando aspectos sociais,

urbanos e econômicos. O foco da análise parte da investigação e do

reconhecimento do papel das cozinhas na configuração das plantas residenciais dos

núcleos coloniais urbanos do século XVIII e da nova capital construída no século XIX

em resposta às novas aspirações da República.

2.1- A Formação da Capitania de Minas Gerais

No final do século XV, interessados em enriquecer e descobrir novas rotas

comerciais, nações europeias foram desbravando os mares em busca de novos

territórios e novas possibilidades. A descoberta das Antilhas pelos espanhóis tornou

a América um continente desejado, pois fora encontrado muito ouro em suas terras

e desde então muitas expedições foram aferidas ao continente; até que em 1500

Pedro Álvares Cabral8 atraca seu navio em terras brasileiras e a história do Brasil,

do ponto de vista das expedições e desbravamentos, começa a ser contada.

No processo de desbravamento dos novos mares, alguns povos se destacaram, contudo foram os portugueses, seguidos pelos espanhóis, aqueles a quem podemos atribuir o título de pioneiros sendo, contudo, os lusitanos nosso foco de atenção, uma vez que foram hegemonicamente os responsáveis pela dominação, posse e colonização das terras brasileiras.(ALMEIDA, 2019, p. 26).

A colonização brasileira começou pelo litoral segundo Franco (2005, p.

pequenas explorações geográficas aconteceram e aos poucos as Capitanias foram

sendo divididas e povoados foram surgindo em consequência da exploração do pau-

brasil e do açúcar (LIMA JUNIOR, 1978, p. 18). Porém, o maior objetivo era

5 Pedro Álvares Cabral (1467-1520) Capitão-mor da armada de 1500 que descobriu o Brasil. Este fidalgo da Casa Real, membro da Ordem de Cristo, era filho de Fernão Cabral, alcaide de Belmonte, e de D. Isabel Gouveia. Por morte de seu irmão, Vasco Fernandes Gouveia, que não deixou descendência, a mãe do descobridor do Brasil herdou os bens deste alcaide-mor de Castelo Rodrigo. João Fernandes Cabral, irmão mais velho de Pedro, herdou a casa de seus pais. Em 1518, Pedro Álvares é referido como membro do Conselho Régio. (LACERDA, 2006, p. 198)

36

descobrir o ouro e a prata, metais cobiçados pela coroa portuguesa e que conforme

citou Pero Vaz de Caminha9 (1500 apud Lima Junior, 1978, p.

. Desde então

expedições foram sendo encomendadas com o intuito de desbravar o território mata

adentro na tentativa de encontrar o metal precioso conforme confirmado por Franco

terras que futuramente formaria a capitania de Minas Gerais.

A história de Minas Gerais se configura inicialmente por uma formação

urbana, tardia em relação ao litoral com particularidades que diferenciam das demais

províncias. Essas particularidades, segundo Mello (1996, p. 11)

incorporação de aspectos propícios à ocupação, com um perfil diferenciado de

colono . Enquanto a formação dos outros territórios dependia economicamente da

agricultura e da pecuária, ou seja, uma formação inicialmente rural, a formação

urbana da Capitania de Minas Gerais se configurou pela exploração das minas de

ouro e diamante com uma forte influência portuguesa. De acordo com Lemos (1989,

p. em dúvida, a ilha mais portuguesa em sua produção foi Minas, porque foi

extremamente rápida sua ocupação territorial por reinóis10 ávidos de ouro

pelos metais e pedras preciosas levou milhares de pessoas a desbravar o interior do

país rumo à famosa Serra do Sabarabuçu11 cuja lenda profetizava resplandecer em

abundância de ouro e prata.

9 Pero Vaz de Caminha (1450-1500) Pero Vaz de Caminha nasceu em Porto, Portugal, no ano de 1450. Filho de Vasco Fernandes de Caminha, cavaleiro do Duque de Bragança. Escrivão português, autor da carta, que relatou ao Rei Dom Manuel a chegada ao Brasil da esquadra comandada por Pedro Álvares Cabral, em 1500. (Site: e biografia Disponível em: https://www.ebiografia.com/pero_vaz_de_caminha/. Acesso em: 15/05/2019) 10 Reinóis - O termo reinól, era usado na América Portuguesa a partir do século XVII; para designar os portugueses nascidos em Portugal. Os portugueses naturais da América e que residiam na América portuguesa,

diferenciar brasileiros de portugueses (MACHADO, 2011, p. 20). 11 Serra do Sabarabuçu - A Serra Resplandecente também recebia as seguintes denominações: Itaberaba-açu, Taberaboçu e Sabaraboçu. Segundo Sampaio (1987, apud ANDRADE; BASTINI, 2011, p.310) SABARABAÇU ant. Tabará-boçú, corrupção de Itaberaba-uçú, significa pedra reluzente grande, ou cristal grande . Entende-se como serra resplandecente. Conforme o autor, tratava-se de um lugar lendário entre os colonos do primeiro século da conquista. Esta serra resplandecente que os indígenas em sua língua chamavam Itaberabuçú, transformada por corrupção em Taberabuçú e mais comumente em Sabarabuçú, passará a ser, por todo o século seguinte, o alvo das mais arrojadas expedições sertanistas (ANDRADE; BASTINI, 2011).

37

Com o passar do tempo muitas lendas e mitos foram sendo desmistificados,

mas a lenda da existência de ouro, prata e pedras preciosas não era um mito; era

uma realidade onde muitos enriqueceram nessas terras, assim como muitos

morreram na tentativa de encontrá-las. Desde 1554, data da saída da primeira

expedição comandada por Francisco Bruzza Spinozza12 até, segundo Lima Junior

(1978, p. 18),

para que se formasse o então Estado de Minas Gerais.

Partindo de são Paulo em 21 de junho de 1674, deslocou-se a bandeira de Fernão Dias pelo Vale do Paraíba, atravessou a Serra da Mantiqueira e ganhou sucessivamente os lugares assinalados para pousos, e que deram lugar a povoados que se perpetuaram. (LIMA JUNIOR, 1978, p. 22).

Muitos foram os desafios que os bandeirantes enfrentaram. Dentre eles

dificuldades como a fome, as pestes e as conspirações levando a mortes e perdas

do grupo que foi se dizimando aos poucos. Porém, Fernão Dias13 apoiado por seu

filho Garcia Rodrigues14 e seu genro Borba Gato15, continua sua expedição, onde,

12 Francisco Bruzza Spinoza no tempo do Governador Duarte da Costa, deslocou-se Spinozza, sertão a dentro, cerca de duzentas léguas, acompanhado do Padre Jesuíta João de Alspicueta Navarro e mais doze companheiros. Obtivera, o aventureiro, a mercê real de que, descobertos que fosse ouro, prata, aljôfar ou pedras preciosas, o que trouxessem consigo

nheiros, por si, seus filhos, herdeiros ou para o que eles quisessem dar e deixar, sem das ditas coisas pagarem dízimos, sisa, quarto, quinto, nem outro nenhum direito, por qualquer nome que fosse

13 Fernão Dias (1608-1681) - Foi um bandeirante paulista. Ficou conhecido como "O Caçador de Esmeraldas". Os bandeirantes tinham o objetivo de procurar riquezas minerais e encontrar mão de obra indígena. Já no século XVI foram organizadas as primeiras expedições, que exploravam principalmente o litoral. No começo do século XVII, as bandeiras se embrenhavam pela mata em busca de mão de obra indígena, para trabalhar na plantação de cana de açúcar. (Site Plataforma e-biografia. Disponível em: https://www.ebiografia.com/fernao_dias/ Acesso em: 18/06/2019) 14 Garcia Rodrigues Paes (1660-1738) - Fidalgo da Casa Real Portuguesa e Cavaleiro da Ordem de Cristo. Sertanista, acompanhou seu pai, Fernão Dias Paes Leme, na expedição de 1674 em busca do sertão do Sabarabuçu. (Site Plataforma O Ímpar. Disponível em: http://oimpar.com.br/origem/?cadastro=garcia-rodrigues-paes-guarda-mor Acesso em: 18/06/2019. 15 Manuel de Borba Gato (1649-1718) Era filho de João de Borba Gato e Sebastiana Rodrigues. Casou-se com Maria Leite, filha do bandeirante Fernão Dias. Fez parte da expedição chefiada por seu sogro, em busca de esmeraldas. No final da expedição ao pressentir que ia morrer, Fernão Dias entregou o destino da expedição a ele. (Site Plataforma e-biografia. Disponível em: https://www.ebiografia.com/borba_gato/ Acesso em: 18/06/2019)

38

foram encontradas nas proximidades da região do Serro, as águas-marinhas. Em

1681, de posse das pedras preciosas, regressa para casa, mas no caminho morre

por uma febre que abala a todos e Borba Gato assume a liderança do grupo.

Foi dessa centena de homens semibárbaros, comandados por Manuel da Borba Gato, que surgiram os primeiros episódios da História local de Minas Gerais, como foi nesse Arraial do Sumidouro, no Serro do Frio e nas margens trilhadas do Rio das Velhas, que se assentaram os pousos do grande caminho da Bahia, de fundamental relevo na história do povoamento mineiro. (LIMA JUNIOR, 1978, p. 23).

Assim, se formaram os núcleos coloniais urbanos de Minas Gerais, segundo

abrindo caminho para o desenvolvimento no centro do país, ligando-o de norte a sul,

possibilitando a formação econômica e social da Capitania.

2.1.1- De povoado a vila, de vila a cidade

Em torno de 1550, segundo Andrade; Bastini (2011, p.305) foi descoberta a

Serra do ouro ou Sabarabuçu . A notícia da serra resplandecente foi dada ao Rei

Dom João III16 por Felipe de Guillen17, provedor da Fazenda da Capitania de Porto

Seguro.

Segundo Guillen, alguns índios que foram à capitania de Porto Seguro informaram que viviam junto de um grande rio, o qual se encontrava a uma serra, na qual diziam haver muito ouro. Devido a esse fato, os índios relatavam que a serra resplandecia muito. (ANDRADE; BASTINI, 2011, p.306).

16 Dom João III (1502- ram vários dos principais fatos que marcaram a vida lusitana na modernidade. Cada fato tem uma complexidade própria, mas que, no conjunto, revelam a dinâmica que houve na Coroa lusitana na época joanina. A figura de D. João III é tão central na história portuguesa que a historiografia portuguesa dos séculos XIX e XX não oferece um consenso a respeito do reinado de D. João III, no que toca a apresentá-lo como profícuo ou como baldado para a história lusitana. Por um lado, o Rei Piedoso uma das dignidades reais conferidas pelo papa é visto como um grande incentivador das artes, da educação e da expansão político-comercial portuguesa, e, por

-1557) e a construção da sociedade de corte em Portugal. UEL.) 17 Felipe de Guillen (1487-recebe o Hábito da Ordem de Cristo por aperfeiçoar a bússola. Em 1551 foi feito pelo Rei Dom João III provedor da Fazenda Real da Alfândega de Porto Seguro. Em 1571 ainda é dado como vivo, conforme testemunho do Padre Antônio Dias. Segundo historiadores, é atribuído a ele o mito da Itaverava-uçu ou Sabarabuçu a Serra Resplandecente, motivo esse de muitos terem se aventurado pelo interior do Brasil. (Site Plataforma Scribd. Disponível em: https://pt.scribd.com/document/350123496/Filipe-Guilhem. Acesso em: 25/05/2019)

39

A busca pela resplandecente serra se iniciou e muitas expedições não

obtiveram êxito, pois os perigos da floresta acabaram por matar muitos

bandeirantes. A medida que as expedições iam adentrando guiadas pelos rios,

povoados começavam a se formar dando origem, mais tarde a Capitania de Minas

Gerais, conforme cita Lima Junior (1978, p. certo que inúmeras outras foram

desbravando o caminho e fazendo penetrar o povoamento até o Rio das Velhas,

onde em pleno território mineiro, já se encontravam currais de gado, nos meados do

século dezessete .

A riqueza descoberta levou a grande imigração rumo ao povoado. A Corte

Portuguesa, que já não mais detinha o monopólio do pau-brasil e do açúcar

apostava na mineração como forma de sobreviver a grave crise econômica (SALES,

p. 28) e a vinda de pessoas influentes como autoridades públicas e pessoas de

posse transformou rapidamente os arraiais em vilas conforme cita Lima Junior:

Os povoados passaram rapidamente a vilas e nelas se concentrava, além das autoridades públicas, a nata dos moradores da Capitania, que, tendo embora, no campo, minas, engenhos, lavouras de mantimentos ou outras atividades, não dispensavam a moradia urbana, onde se levava a vida à europeia, com requintes de luxo e conforto peculiares à época. (LIMA JUNIOR, 1957, p. 221).

Ainda segundo Lima Junior (1978, p. -se

estimar que, de 1705 a 1750, mais de dez mil pessoas deixaram Portugal em busca

, esse volume de pessoas que chegavam anualmente ao povoado e que

precisavam se assentar, todas vinham carregadas de necessidades e costumes;

fora necessário, para recebê-las; uma adaptação e um desenvolvimento no campo

das construções, do transporte e principalmente do comércio local, conforme atesta

Machado (2011, p.

residenciais para acomodar a multidão recém-chegada e atender às exigências dos

portugueses .

A preocupação com o entorno, para atender as necessidades básicas da

população moradia, saúde, comércio e principalmente a gestão pública controlar

a extração e a saída do ouro; levam a construção de residências, prédios públicos e

casas de comércio. Essa demanda gerou uma preocupação e uma busca por

profissionais especializados o que trouxe para o povoado os carpinteiros, ferreiros,

pedreiros, entre outros, que em prol da formação arquitetônica e social das vilas e

em detrimento aos costumes europeus constrói a identidade urbana de Minas

40

Gerais. A urbanização se torna necessária, não somente do ponto de vista social e

arquitetônico, como do ponto de vista econômico.

Porém, segundo Sales (1999, p.

os portugueses migravam para a C

vitória dos emboabas, as últimas restrições contra a entrada de forasteiros

desapareceram por completo . Portanto, a questão era onde essa massa iria se

instalar, levando ao surgimento de palhoças de barro batido e pau-a-pique cobertas

por palha ou sapé e de ranchos às margens dos córregos (SALES, 1999, p. 32).

Mesmo com a dificuldade de se instalar e contra todas as intempéries, muitas

pessoas ainda migravam para o povoado em busca da lendária montanha

resplandecente. A abundância de ouro levou o desenvolvimento aos núcleos

coloniais urbanos, sendo em 1714, solicitada ao rei, a elevação de vila a cidade,

concedendo os mesmos direitos gozados por localidades como São Paulo

(VASCONCELLOS, 2011, p. 31).

2.1.2- Arquitetura e seus interiores

No Brasil, as primeiras moradias brasileiras estabeleceram sua forma em

torno dos núcleos coloniais urbanos de maneira quase que definitiva em meados de

1650, após a colonização pelos portugueses (VERÍSSIMO; BITTAR, 1999, p. 17),

por ser um território habitado por índios, os primeiros indícios de moradia foram as

ocas indígenas. Desde o descobrimento a influência da cultura portuguesa

transforma a forma de morar. No século XVI, não havia vida pública, os colonos

viviam isolados em seus domicílios interagindo no meio rural, na forma de

subsistência, em um convívio doméstico. (NOVAIS; SOUZA, 1997, p. 88). Com o

passar dos anos a vida rural abre espaço a vida urbana, e a emigração para o Brasil

traz consigo um novo estilo de vida. Assim sendo, a planta da casa se constitui e

toma corpo, influenciada pela mistura entre culturas os negros, os índios e os

portugueses; onde a cultura lusitana exercia maior influência.

A arquitetura nos núcleos coloniais urbanos da Capitania nasce de forma

desordenada e muito rápida. As casas, a fim de atender a população que migrava

rapidamente, foram construídas de maneira rústica, precária apenas para abrigar as

pessoas emergencialmente, sem cuidados básicos de saneamento formando uma

41

aglomeração humana estável (VASCONCELLOS, 2011, p. 121). Foi então se

constituindo os povoados em torno dos principais ribeirões surgindo assim as

construções de sapé e pau-a-pique. Essas construções eram feitas segundo Sá

(2010, p.

vertical engastado na estrutura que recebia uma mistura de barro, água e fibras

vegetais dando origem as paredes seus telhados eram cobertos com palha em sua

maioria, sendo essas construções muito rudimentares, empregadas na zona rural

para moradores de baixa renda. As casas possuíam pouca resistência e baixa

estabilidade. Como ilustra a Figura 01.

Figura 1: Casa de pau-a-pique.

Fonte: SÁ, 2010, p. 13.

Com o passar do tempo, o povo começou a se fixar, as vilas foram se

estruturando, pessoas de posse chegaram e as casas cresceram e tomaram corpo.

A topografia acidentada, assim como o clima brusco foram algumas das

características mais importantes para a formação estrutural da arquitetura. A casa

urbana seguia um único padrão determinado por questões parcelárias, ou seja, no

sistema parcelário o lote era sempre estreito e profundo variando sua largura entre 5

metros a 8 metros (SÁ, 2010, p. 15). As ruas eram uniformes e sem calçamento

levando as construções ao alinhamento das vias e as paredes laterais sobre os

limites dos terrenos. Em consequência desse formato, o partido urbano escolhido

42

para a construção das residências e que caracteriza a arquitetura colonial foram as

casas geminadas18, (SALES, 1999, p. 40) conforme ilustrado na Figura 02.

Figura 2: Casas geminadas Rua da quitanda Diamantina-MG.

Fonte: RODRIGUES, 1975, p. 166.

As casas possuíam, segundo Lemos (1989, p.

tanto na sistemática construtiva, como no planejamento . Desde que os povoados,

em 1761, passaram a qualidade de vilas, que as normas legislativas foram criadas a

fim de uniformizar e trazer ordem a urbanização das vilas. De acordo com

Vasconcellos (

. As fachadas foram padronizadas mantendo a

harmonia estética. Assim:

As casas se dividiam em dois grandes tipos: as casas maiores, tocadas pelos escravos das lides domésticas e as casas pequenas de gente pobre, qualquer que fosse a qualificação. As casas dos brancos, abastados e as casa dos pobres, quase sempre mestiços, mulatos, mamelucos e provenientes ou de ramos bastardos ou de brancos sem qualificações aportados aqui e ali sem maiores explicações. (LEMOS, 1989, p. 19).

Nas vilas ao se consolidarem, a moradia urbana se tornou fundamental,

segundo Lima Junior (1978, p. 111) era europeia, com

. A influência principalmente

portuguesa era marcante; as ruas tortuosas, estreitas conforme ilustrado na Figura

18 Casas Geminadas Edificações construídas encostadas umas as outras sem considerar um espaço entre elas. No período colonial, esse partido urbanístico era muito comum de ser encontrado, estimulado pela topografia acidentada muito natural das cidades do ciclo do ouro (SALES, 1999, p. 40).

43

03 e principalmente o estilo das construções carregava uma estética forte da

metrópole conforme citado:

Nas construções civis do Brasil colonial seguiram-se os modelos vigentes na metrópole portuguesa, incluindo também outras influências romanas, árabes, marroquinas e chinesas introduzidas pelos colonizadores portugueses. (MACHADO, 2011, p. 32).

As casas, nos núcleos coloniais urbanos, eram divididas segundo Machado

(2011, p. as básicas: térreas ou sobrados . Sendo os sobrados

uma forma de acompanhar os terrenos acidentados levando as casas a constituir

vários pavimentos. A palavra sobrado significava um soalho suspenso, o próprio

assoalho. Os sobrados nas áreas centrais chegavam a ter quatro ou cinco

pavimentos onde o primeiro era destinado ao comércio, a armazéns e também para

alojamento de escravos e os demais a moradia, segundo Lima Júnior (1957, p. 223)

térreo, ocupado por lojas de venda, quando situados nos centros comerciais da

Já as

casas térreas, eram menores e mais simples, tinham apenas um pavimento e

poucos cômodos e janelas, abrigavam as pessoas com menos posses.

Figura 3: Beco do Tecla característica ruela com seus balcões salientes - Diamantina-MG.

Fonte: RODRIGUES, 1975, p.165.

Os terrenos acidentados favoreciam em muito o aparecimento de casarões

em níveis, além dos sobrados; foram construídos também os solares. Esses eram

construções de dois, as vezes três pavimentos, destinadas apenas a moradia, onde

44

as famílias mais favorecidas da sociedade residiam. As casas eram construídas

aproveitando o desnível do terreno (FIGURA 04) cada uma delas com

características diferentes, mas em geral respeitavam uma planta quadrada com

acréscimos ou apêndices nos fundos e em alguns casos, pátios centrais;

favorecendo a ventilação e a luminosidade das residências. (VASCONCELLOS,

2011, p. 125)

Figura 4: Sobrado de 03 pavimentos com varanda, na cidade de Diamantina-MG.

Fonte: RODRIGUES, 1975, p. 165.

O material principal utilizado nas construções, era a madeira. Segundo

Machado (2011, p. estruturas dos telhados, nos

pisos e nos forros . A escolha do uso desse material se devia ao fato de ser um

material abundante no país, que consequentente levava a aplicação de peças muito

espessas e com um acabamento bruto, cheio de imperfeições. As paredes recebiam

uma camada de barro refinadas por um reboco de cal misturado com areia e em

seguida, segundo Sá (2010, p. -se o processo de caiação, com cal

padrão das fachadas; que eram quebradas com as pinturas das janelas e portas nas

cores azul, vinho e amarelo (SÁ, 2010, p. 46).

45

No princípio da urbanização, o interior das residências apresenta uma

primeira divisão para os cômodos

configuração, segundo Sales (1999, p. nha, pela

periferia, os quartos e esboça-

das vilas e das famílias, as casas também se transformam, aparecem mais

ambientes, que ficam cada vez maiores; as janelas das fachadas ampliam-se, a

porta se abre para o vestíbulo que vai dar em um corredor, ao longo desse se

estendem os quartos até a sala de jantar que se debruça em uma varanda sobre o

pátio interno; essa varanda comunica-se com a cozinha constituindo a planta interior

conforme ilustra a Figura 05 (SALES, 1999, p. 42).

Figura 5: Plantas de um pequeno sobrado antigo pavimento térreo e sobrado - Mariana-MG.

Fonte: RODRIGUES, 1975, p. 149.

A Figura 06 assim como a solução

iluminação e a circulação de ar (VASCONCELLOS, 2011, p. 125). A localização da

cozinha, normalmente se configurava em um apêndice da casa, justificando o fato

de mesmo estando no corpo da casa ainda sim ficavam isoladas, separadas.

Assim a ventilação ajuda a levar a fumaça dos fogões à lenha para fora da casa uma

vez que a maioria delas eram construídas juntas pelo modelo geminado conforme

citado anteriormente.

46

Figura 6: Planta de uma casa térrea em Santa Bárbara-MG.

Fonte: RODRIGUES, 1975, p. 183.

A escassez de terrenos em detrimento a topografia das cidades, faz com que

as fachadas diminuam e as casas cresçam verticalmente. Não existiam muitas casas

ricas, segundo Sales (1999, p.

riqueza do dono, mas para morada de quem trabalha e vive . As famílias se

abrigavam, alimentavam e repousavam; para isso se destinava a morada nos

núcleos coloniais urbanos (LEMOS, 1989, p. 22).

2.1.3- A cozinha no núcleo colonial urbano

As casas do núcleo colonial urbano, como citado anteriormente, tinham como

sua principal função abrigar e proteger as famílias, alimentar a todos e

principalmente, no meio rural, hospedar viajantes que realizavam longas viagens. Na

constituição do corpo da casa, percebe-se uma divisão entre área íntima e área

doméstica, principalmente nas casas mais ricas. Conforme citam: Novais; Souza

as casas eram, assim, voltadas para dentro, às vezes com pequenos

jardins na frente, e era na parte dos fundos que a vida doméstica se desenvolvia

i . A cozinha, é o ponto principal da vida doméstica. Fora desligada do

corpo da casa nas moradias dos mais abastados, localizando-se na parte externa

(RISÉRIO, 2015, p. 143), pois, além de ser considerada um ambiente sujo e quente

pelo fato do ato de cozinhar utilizar o fogo para cozer os alimentos (LEMOS, 1989, p.

23), a fumaça do fogão à lenha não poderia adentrar a residência.

Eram tipos de moradas a da classe dominante com a cozinha desligada do núcleo residencial, cozinha fora, na edícula e a classe dominada, com o

47

fogão ao lado do dormitório, embaixo do mesmo telhado. Uma explicação fácil é essa; o branco europeu, acostumado ao fogão como centro de interesse da casa, aqui nos trópicos não suportou o calor da cozinha expulsando-a para longe, atitude facilitada a até justificada pela presença do escravo solícito, o mestiço sem criados, ao contrário, em seu habitáculo humilde, tolerou a fogueira intramuros, no meio do chão dos cômodos do fundo, ao lado do quarto e da eventual sala. Dois modelos extremos de residência donde surgiram as dezenas de variantes que encontramos na história. (LEMOS, 1989, p. 19).

A distribuição dos cômodos da casa não favorecia a intimidade, o fato das casas

serem pequenas, com poucos ambientes, várias atividades aconteciam no mesmo

cômodo, por mais pessoas, o que não permitia ter privacidade. Assim:

Enquanto as casas dos homens pobres e livres, no campo e na cidade, consistiam em pequenas choupanas com apenas um ou dois cômodos, nos quais se dormia, cozinhava e que muitas vezes abrigava uma pequena oficina, as casas dos indivíduos com alguma posse dispunham de mais aposentos, geralmente enfileirados. O da frente com janela para a rua, servindo de sala, e os demais acessíveis por um corredor lateral, que serviam de sem janelas. No final instalavam-se a cozinha e o alpendre, que davam para o quintal. (NOVAIS; SOUZA, 1997, p. 99).

A cozinha, geralmente, possuía cômodos grandes e abertos para a área

externa, de acordo com Lemos (1989, p.

(FIGURA 07); beneficiando da ventilação e

favorecendo a entrada da luz natural, pois o clima quente não favorecia ambientes

fechados.

O normal sempre foi mais de uma cozinha: a de dentro e a de fora. Na época da colonização, as casas não tinham cozinha, mas um pátio externo onde se fazia comida. As índias, capturadas e recrutadas para o serviço doméstico, estavam acostumadas a cozinhar fora das ocas. Esse costume permaneceu por longo tempo. (LAGE; ALMEIDA, 2003, p. 68).

Figura 7: Ilustração de cozinha urbana residencial.

Fonte: VERÍSSIMO; BITTAR, 1999, p. 110.

48

Principalmente no meio rural, o espaço se dividia em cozinha limpa e cozinha

suja, sendo utilizada por mão-de-obra escrava e em sua maioria, feminina. As

mulheres abastadas não costumavam frequentar a vida doméstica, principalmente

as cozinhas, pois essas eram responsáveis por cuidar dos filhos e realizar tarefas

rotineiras como bordar, pintar e ler. As atividades domésticas eram operadas pelas

mulheres escravas. (VERÍSSIMO; BITTAR, 1999, p. 109)

Já no meio urbano, a cozinha não difere muito da rural mesmo com a falta

de registros, principalmente das moradias populares que foram destruídas pelo

tempo; também era localizada nos fundos das residências, voltada para o quintal

onde complementava a planta da residência (LEMOS, 1989, p. 32) conforme

ilustrado na Figura 08. Segundo Lima Júnior (1957, a a varanda dos

fundos, davam portas, a cozinha e outras dependências secundárias, inclusive o

Figura 8: Ilustração de cozinha antiga urbana residencial em Mariana-MG.

Fonte: RODRIGUES, 1975, p. 155.

A produção de alimentos era intensa, as famílias eram grandes, sem falar no

fábrica de comida para atender a um verdadeiro restaurante, frequentado pela

Os alimentos eram produzidos e cultivados no próprio

meio rural, ou seja, no próprio engenho; eram fabriquetas domiciliares

independentes da cozinha para produzir e armazenar farinha, rapadura ou cachaça

que serviam a patrões, escravos e aos viajantes (LEMOS, 1989, p. 27). Na divisão

49

territorial brasileira as distâncias eram muito grandes, os viajantes para cruzar de

lugar a outro percorriam longas jornadas muitas vezes em condições muito difíceis

em transportes animais o que levava a necessidade de pousarem ao longo do

trajeto. Hospedar as pessoas era uma questão de obrigação e principalmente de

sobrevivência (LEMOS, 1989, p. 14). Devido a essa questão, o receber

principalmente em Minas por conta da intensa migração; torna-se uma preocupação

e alimentar era parte dessa hospitalidade.

Interessante ressaltar que nos engenhos havia alimento em detrimento a

produção e criação local. Porém, do outro lado, no meio urbano, os povoados

sofriam com a escassez. A grande maioria dos mineradores e escravos passavam

fome, segundo Nunes; Nunes (2010, p. registros dizem que muitos morriam

de fome com as mãos cheias de ouro pois havia poucas plantações e o comércio

nas vilas era praticamente inexistente.

Devido à escassez e ao alto preço dos alimentos, nos primeiros tempos da exploração das minas, as negras para as quais eram dadas as tarefas de cozinhar tiveram, por necessidade local e por sabedoria nata, que criar e variar receitas e modos de fazer com grande astúcia e economia. O alimento da senzala merecia maior esperteza para o preparo, por sua maior escassez. (NUNES; NUNES, 2010, p. 40).

A culinária era um misto da portuguesa, com a indígena e a africana; sendo a

portuguesa muito marcante. Segundo Lemos (1989, p. 22 certos aspectos,

Minas é verdadeiramente Portugal trasladado para o trópico . Nesse contexto, foi no

período colonial que a história da gastronomia mineira começa a ser contada.

Mas foi a partir da fome dos primeiros tempos que formou-se em Minas essa cozinha típica, com tamanha diversidade de pratos: feita com indescritível criatividade, temperada com sabedoria e toques de magia. A abundante cozinha típica mineira surgiu da fome. (NUNES; NUNES, 2010, p. 38).

A tradição da cozinha mineira mistura hábitos e culturas, não somente do

ponto de vista culinário, mas nos modos de servir e comer. Segundo Nunes; Nunes

(2010, p. -se por muito tempo,

. Esse motivo se deve ao fato de que

durante o período da mineração a quantidade de negros sempre fora superior a

quantidade de brancos. Esse cenário começa a ser alterado com a vinda da Corte

Portuguesa para o Brasil trazendo consigo comportamentos e necessidades

50

diferentes, além de utensílios e artefatos que até então a província não estava

habituada.

A partir do século XIX, com a República, novas perspectivas foram

projetadas, sendo a modernidade um dos ideais mais desejados pela sociedade,

refletindo no comportamento das pessoas e nos costumes e hábitos cotidianos. Com

isso, um novo modelo de sociedade do ponto de vista político e econômico fora

idealizado e em meio a disputas e discussões políticas, nasce o projeto de uma nova

capital para atender os novos anseios, levando a construção de Belo Horizonte.

2.2- O século XIX O surgimento de Belo Horizonte

Belo Horizonte, de acordo com Viscardi (2007, p. 30) foi fundada em 12 de

dezembro do ano de 1897 com o nome de Cidade de Minas , como uma tentativa do

Estado de representar a modernidade proposta pela República marcar a queda do

império e o nascimento de um novo mundo; esquecer o passado colonial (RABÊLO,

2013, p. 45). Construir a cidade foi uma decisão de interesse político. Situada em um

planalto que vai do Rio Paraopeba até ao Rio das velhas na Serra do Espinhaço, de

como uma cidade moderna, como se fosse uma capital para a república . Afinal

Minas era considerada, segundo Mello (1996, p. centro e convergência do

espaço nacional brasileiro; daí se construir a imagem de Minas Gerais como centro

incorporador da nacionalidade .

O Estado vinha sofrendo com a diversidade política e econômica, segundo

Viscardi (2007, p. 19 explica o ressurgimento da

proposta de mudança relacionando-a as disputas políticas e à diferenciação

. A capital

Ouro Preto vinha sofrendo com a queda da mineração no final do século XVIII,

segundo Santos; Fialho (2016, p. medida visa, sobretudo, a superação

da ordem colonial, decadente desde a segunda metade do século XVIII, em 19 Afonso Arinos de Mello Franco (1905-1990) - Desde o Império, diversos membros das famílias de seus pais se destacaram como políticos, intelectuais e diplomatas, especialmente em Minas Gerais. Republicano, democrata e liberal, Arinos foi um liberal todo o tempo, conservador a seu modo, aberto a mudanças e progressista em algumas circunstâncias cruciais. Revela adesão ao liberalismo com consciência social. (Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2019/02/afonso-arinos-protagonizou-momentos-de-ruptura-da-politica-brasileira.shtml Acesso em: 15/06/2019)

51

que levou a emigração para as

regiões em desenvolvimento e também com o fato de sua produção agrícola ser

basicamente voltada à subsistência (SOUZA; CHAVES, 2011, p. 55).

No contexto vivenciado pelo Estado mineiro de perda dos espaços políticos significativos, após o declínio da atividade mineradora, a construção da capital apresentava um sentido de resgatar o espaço nacional do Estado e readequar valores à estrutura tradicional dos grupos políticos aqui residentes. (CALVO, 2013, p.72).

A transferência da capital foi muito debatida, de um lado os republicanos

conhecidos como mudancistas adeptos da busca por um novo lugar por uma nova

ordem econômica visando a industrialização do país (RABÊLO, 2013, p. 45) e de

outro, os conservadores ou não mudancistas que lutavam pela manutenção da

capital em Ouro Preto. Assim, segundo Santos; Fialho (2016, p. o final do

século XIX, ganha força uma vontade política em prol da transferência da sede do

Governo de Minas Gerais de Ouro Preto para um sítio mais adequado à implantação

de uma cidade capital alinhada aos ideais republicanos . Vários foram os

argumentos utilizados nessa disputa, afinal, desde 1720 que projetos de mudança

vinham sendo propostos no estado, pois Ouro Preto não tinha uma localização

favorável, dificultando, segundo Rabêlo (2013, p.

expansão econômica do Estado .

O primeiro projeto de mudança ocorreu em 1720 por iniciativa do conde de Assumar como forma de se evitar as rebeliões de Vila Rica. No período da Inconfidência, seus articuladores teriam feito uma proposta de transferência da capital para São João del Rei. Em 1867, nova proposta de mudança foi feita pelo padre Agostinho Paraíso, a qual chegou a ser aprovada pelo Legislativo e vetada pelo presidente da Província. Segundo Afonso Arinos de Mello Franco (Um estadista na república, Rio de Janeiro, José Olimpio, 1956), citando informações de Abílio Barreto, até 1851, foram feitas cinco propostas de mudança. (SIQUEIRA, 1972, apud VISCARDI, 2007, p. 40).

A nova capital começa a contar sua história, do ponto de vista da sua

construção; em 1701 quando o bandeirante João Leite Silva Ortis20 se instala nas

imediações fundando a Fazenda Cercado. Com o tempo casas foram se instalando 20 João Leite Silva Ortis (1670-1730). de chegar a região, segundo Abílio Barreto, o bandeirante Paulista iniciou a exploração de uma propriedade rural, que recebeu o nome de Fazenda do Cercado. No curral da fazenda, como em diversas outras, ficavam estacionadas as boiadas destinadas à venda nas vilas mineradoras, após seus proprietários pagarem, no posto arrecadador, os tributos devidos à Coroa Real. Daí, ainda segundo Barreto, a denominação de Curral del Rei,

34)

52

ao redor da fazenda e em 1750 nasceu o Arraial Curral Del Rey conforme ilustra a

Figura 09 (PERDIGÃO, 2007). Com a queda do império e a institucionalização da

República em 1889 Vaz de Mello21, a fim de romper com as oligarquias do Império

propõe a troca do nome de Curral Del Rey para, dentre muitas opções; Novo

Horizonte esse nome foi escolhido em assembleia no clube dos republicanos. O

então governador do Estado João Pinheiro22 não aprova a escolha modificando-o

para Belo Horizonte, sendo então registrado em 12 de abril de 1889 (VISCARDI,

2007, p. 31).

Figura 9: O Arraial Curral Del Rey visto na profundidade de campo da paisagem.

Fonte: SALGUEIRO, 2007, p. 49.

Belo Horizonte segundo Souza; Chaves (2011, p. 57) seria a primeira cidade

efetivamente republicana do país a se constituir após o Império . Nesse momento

21 Vaz de Mello Coronel Guilherme Ricardo Vaz de Mello, foi juiz da comarca de Sabará e presidente do Clube dos Republicanos do Curral del Rei; foi dele a iniciativa de trocar do nome do Arraial Curral Del Rei para Belo Horizonte. Foi um ilustre morador do arraial que trabalhou para o desenvolvimento e crescimento do município. (PERDIGÃO 2007) 22 João Pinheiro (1860-1908). Nascido na cidade do Serro-MG, diplomou-se em direito em São Paulo em 1887. Mudou-se para Ouro Preto onde fundou um escritório de advocacia e foi um dos organizadores do Clube Republicano. Em 1889 candidatou-se ao cargo de deputado provincial, no ano seguinte nomeado pelo governo provisório como secretário do Estado de Minas Gerais; foi o primeiro vice-governador do Estado no governo de Cesário Alvim assumindo seu lugar em 1890 permanecendo na direção do governo mineiro até julho do mesmo ano quando renunciou. (Arquivo Público Mineiro Disponível em: http://www.siaapm.cultura.mg.gov.br/modules/fundos_colecoes/brtacervo.php?cid=48. Acesso em 20/05/2019).

53

várias regiões disputavam para sediar a nova capital dentre elas: Juiz de Fora,

Barbacena, Paraúna, Várzea do Marçal23 e o Arraial Curral Del Rey fora a cidade

de Ouro Preto que lutava para manter-se como sede. Sendo o Arraial Curral Del Rey

escolhido como local adequado para sediar a nova capital.

É neste cenário que o Arraial do Curral Del Rei surge como um local adequado para sediar a nova capital. Nesta localidade, o projeto poderia ser executado sob medida para as necessidades vigentes no Estado. Ali se daria a construção do centro urbano tão imprescindível a Minas Gerais. Esse era o progresso que as elites mineiras almejavam obter dentro da visão de progresso das elites brasileiras do final do século XIX. Esperava se que a nova capital funcionasse como centro de integração econômica do Estado, como centro político privilegiado e, sobretudo, como espaço simbólico da República que acabava de se formar. (SOUZA; CHAVES, 2011, p. 57).

Para a construção fora convocado o engenheiro paraense Aarão Reis24,

contratado por Afonso Pena25 primeiro presidente do Estado, para dirigir a

Comissão Construtora a CCNC Comissão Construtora da Nova Capital, que vai

atuar de 1894 a 1898 (PARRELA, 2004) com o objetivo de fazer um levantamento

geodésico e topográfico (SANTOS; FIALHO, 2016, p. 774). A proposta era ousada,

afinal fora instituído um prazo para a construção da nova capital. Esse prazo, dado a

Aarão Reis era de apenas quatro anos para levantar a cidade, caso contrário a

capital permaneceria em Ouro Preto (PERDIGÃO, 2007).

Reis tinha um curto prazo e um grande desafio, que para ser cumprido, foram

necessárias à contratação de muitos operários e a criação de um projeto inovador,

que de acordo com Rabêlo (2013, p. s imaginou a nova capital com a

23 Várzea do Marçal Na primeira sessão, realizada no dia seguinte, [23 de novembro de 1893], a comissão especial apresentou à consideração daquela corporação seu parecer e projeto, datados de 26 do mesmo mês de sua eleição, designando para capital Várzea do Marçal, lugar em favor do qual, como viram os leitores, optou o dr. Aarão Reis, em seu relatório. Esse projeto marcava o prazo máximo de 4 anos para a definitiva transferência do governo e dava autorização ao presidente do Estado para mudar provisoriamente a sede da administração para qualquer ponto do estado se -374 Apud GUILARDUCI, 2009, p. 168-169). 24 Aarão Reis (1853-1936). Aarão Leal de Carvalho Reis, um construtor Paraense convidado por Afonso Pena para dirigir a Comissão Construtora, como engenheiro-chefe. Formou-se pela Escola Politécnica do RJ, uma das matrizes da moderna engenharia brasileira. Desde cedo aderiu às ideias positivistas, que viam no conhecimento científico a base do desenvolvimento e do apr . (RABÊLO, 2013, p.45) 25 Afonso Augusto Moreira Pena (1847-1909). Foi um advogado e político brasileiro. Foi governador do estado de Minas Gerais entre 1892 e 1894, sendo o primeiro governador de Minas Gerais a ser eleito pelo voto direto. Durante seu governo que se decidiu pela mudança da capital do estado, de Ouro Preto para a Freguesia do Curral del Rei, inaugurada como Belo Horizonte. (PERDIGÃO, 2007)

54

preocupação de torná-la de fato, o centro político, administrativo, econômico, social

e . A migração de pessoas para a cidade em busca de novas

oportunidades fez com que a população aumentasse consideravelmente e para

acomodar a todos fora necessário setorizar a população no espaço físico.

A distribuição da população no espaço físico da nova capital foi planejada de forma a ocupar uma área que era limitada por uma avenida que circundava todo o perímetro urbano da cidade. Nesse perímetro estaria a sede político administrativa da capital e do Estado, bem como os seus funcionários e outros moradores mais abastados. (SOUZA; CHAVES, 2011, p. 59).

O projeto fora pensado segundo os preceitos do positivismo, onde a ordem, a

ciência e o racionalismo eram os valores principais. Conforme ilustrado na Figura 10,

a proposta para a planta da cidade seguia à risca o racionalismo com suas ruas

planejadas e largas buscando um traçado geométrico e linear o que contrariava o

formato das vilas Coloniais (RABÊLO, 2013, p. 50).

Figura 10: Planta geodésica, topográfica e cadastral da Cidade de Minas (Belo Horizonte), feita pela Comissão que planejou a nova capital.

Fonte: Disponível em: https://joaodiniz.wordpress.com/2011/12/17/fervor-cartesiano-paixao-barroca-reflexoes-sobre-o-centenario-de-belo-horizonte-por-roberto-segre/. Acesso em:

18/05/2019.

55

O marco da planta da cidade era a avenida do Contorno, ou seja, dentro dela

as ruas eram planejadas e distribuídas com um propósito de regularidade, conforto e

estética; já fora dela ficava a periferia, zona destinada às pessoas de baixa renda e

após essa área situavam os terrenos destinados a produção agrícola conforme

citado por Aarão Reis em seu relatório sobre a planta definitiva de Belo Horizonte

aprovada pelo decreto 817 de 15 abril de 1895.

Foi organizada a planta geral da futura cidade dispondo se na parte central, no local do atual arraial, a área urbana, de 8.815.382 m², dividida em quarteirões de 120 m x 120 m pelas ruas, largas e bem orientadas, que se cruzam em ângulos retos, e por algumas avenidas que as cortam em ângulos de 45º. Às ruas fiz dar a largura de 20 metros, necessária para a conveniente arborização, a livre circulação, o trafego dos carros e trabalhos da colocação e reparação das canalizações subterrâneas. Às avenidas fixei a largura de 35 m, suficiente para dar lhes a beleza e o conforto que deverão, de futuro, proporcionar à população. (REIS, 1985 apud SOUZA; CHAVES, 2011, p. 59).

Ainda segundo Aarão Reis:

À zona suburbana, de 24.930,803 m2 em que os quarteirões são irregulares, os lotes de áreas diversas, e as ruas traçadas de conformidade com a topografia tendo apenas 14 de largura , circunda inteiramente a urbana, formando vários bairros [...]. (REIS, 1985 apud SOUZA; CHAVES, 2011, p. 59).

A planta fora distribuída em áreas: área urbana, zona suburbana e sítios.

Conforme ilustra a Figura 11, a área urbana era cercada pela avenida do Contorno e

fora pensada para receber os poderes constituídos do Estado, o setor destinado ao

lazer, as escolas, igrejas, comércio, hospitais e demais setores indispensáveis ao

funcionamento de uma cidade e também o Bairro do Funcionários onde seriam

construídas as residências dos funcionários e servidores. A zona suburbana

situada fora da Avenida do Contorno fora destinada às vilas e bairros, não chegou a

ser planejada, nela se instalaram os operários e toda a população que migrara em

busca de oportunidade levando ao surgimento da primeira favela Favela Acaba

Mundo (RABÊLO, 2013, p. 56) e o terceiro espaço, os sítios receberiam os terrenos

para produção agrícola de abastecimento.

56

Figura 11: Mapa elaborado pela Comissão Construtora sob direção de Aarão Reis.

Fonte: RABÊLO, 2013, p. 51.

As obras correram contra o tempo. Enfrentou-se muitas crises, principalmente

no campo econômico em detrimento a crise do setor cafeeiro no final da década de

90. Em 1895, Bias Fortes26 assume o lugar de Afonso Pena como governador do

Estado e Aarão Reis deixou a chefia da Comissão Construtora assumindo seu lugar

o engenheiro Francisco Bicalho27. O cenário de crises e mudanças leva o projeto a

sofrer algumas alterações impactando no decorrer da obra.

Assim, aos tropeços, a cidade de Belo Horizonte foi inaugurada em 12 de

dezembro de 1897, de acordo com Calvo (2013, p. e

con . Nasceu com luz elétrica nas ruas, praças e nas principais

26 Bias Fortes (1847-1917). Chrispim Jacques Bias Fortes formou-se em Ciências Jurídicas pela Faculdade de Direito de São Paulo em 1870 exercendo o cargo de promotor de justiça e de juiz municipal na cidade de Barbacena MG. Em 1881 elegeu-se deputado provincial pelo Partido Liberal. No início da República recebeu o convite de João Pinheiro para elaborar o anteprojeto da constituição de Minas Gerais onde exerceu o governo provisório por nomeação do Marechal Deodoro da Fonseca. Durante seu governo realizou a transferência da Capital mineira de Ouro Preto para Belo Horizonte em 1897. (Disponível em: https://www.mg.gov.br/governador/crispim-jacques-bias-fortes Acesso em: 10/06/2019) 27 Francisco de Paula Bicalho (1847-1919) Nascido em São João Del Rei MG, Formou-se em Engenharia, matemática, física e ciências pela antiga Escola Central; integrou juntamente com Aarão Reis a Comissão Construtora da Nova Capital em 1894 se tornando engenheiro chefe em 1895, faleceu em Petrópolis no Rio de Janeiro em 1919. (Disponível em: franciscobicalho.blogspot.com Acesso em: 20/06/2019)

57

construções sendo, segundo Rabêlo (2013, p.

.

2.2.1- Casas as plantas e seus interiores

Em meio ao turbilhão de mudanças sociais e demográficas acontece o regime

republicano e como resposta, em Minas Gerais, ocorre a construção de Belo

Horizonte no final do século XIX, conforme citando anteriormente. A cidade é

inaugurada praticamente junto à virada do século. Substituir o velho pelo novo era a

premissa da arquitetura da nova capital. O estilo barroco de influência portuguesa

que dominou a cena na formação de Minas, agora seria substituído por um estilo

novo, imponente e com ares de modernidade, conforme afirma Freitas (2007, p. 138)

ob a égide do ethos evolucionista, os republicanos de Minas Gerais queriam

construir uma cidade diversa do passado barroco, colonial e escravocrata que até

então marcara o Estado e o país .

Em Belo Horizonte, o eclético domina a cena arquitetônica das construções,

inspirado pela escola neoclássica europeia28. O Palácio da Liberdade e suas

secretarias são um exemplo dessas construções conforme ilustra a Figura 12. De

acordo com Machado (2011, p. 29 e o Art

Decò30 ainda representavam a corrente classicista em evidência na arquitetura

brasileira .

As cidades cresceram e suas ruas e casas se articularam em uma nova

dinâmica urbana. Essas mudanças afetaram desde a ordem e as hierarquias sociais

até as noções de tempo e espaço das pessoas (NOVAIS; SEVCENKO, 1998, p.

28 Escola neoclássica europeia Neoclassicismo. Movimento artístico e intelectual dominante na arte europeia no século XVIII e início do século XIX, foi motivado pela rejeição ao rococó, pelo interesse no passado clássico como meio de compreender as mudanças no mundo contemporâneo e pela busca de seriedade moral, em conexão com alguns princípios do academicismo. (LITTLE, 2010, p.66) 29 Ecletismo - O termo ecletismo denota a combinação de diferentes estilos em uma única obra sem com isso produzir novo estilo. Pode designar um movimento mais específico relativo a uma corrente arquitetônica do século XIX. (Disponível em: http://enciclopedia.itaucultural.org.br/termo357/ecletismo Acesso em: 20/05/2019) 30 Art Decò Em português artes decorativas, foi um estilo deliberadamente extravagante, muito popular no período entre guerras do século XX. A designação desse estilo deve-se à primeira exposição de artes decorativas ocorrida em Paris, em 1925, a Exposition des Arts Décoratifs et Industriels Modernes. (GIBBS, 2017,p.24)

58

132). A distinção de classe aparece nesse novo cenário de maneira nítida. A

revolução industrial deu origem à classe burguesa e a um novo modelo cultural e

arquitetônico. A necessidade de diferenciação ficou intrínseca a essa nova classe o

que fez surgir novas configurações urbanas como os elegantes bairros residenciais

em contraponto aos bairros e habitações populares conforme cita Novais; Sevcenko

(1998, p. 133).

Figura 12: Fotografia da Praça da Liberdade anterior à década de 1920. À direita a Secretaria das finanças, ao lado esquerdo a secretaria do interior atual secretaria da educação.

Fonte: BAETA; NERY, 2016, p. 09.

Assim, o começo do século XX assistiu ao nascimento e crescimento de

Belo Horizonte. Um crescimento que aconteceu contra o planejado em função da

quantidade de pessoas que aqui se instalaram ocorrendo do subúrbio para o

centro. A cidade foi população

pobre, operária, miserável, imigrante, ex-escrava, rural que, de fato, delineou a

produção da cidade em detrimento da elite ouro-pretana os altos funcionários

públicos .

Paradoxalmente, Belo Horizonte assistiu a um desenvolvimento com foco nas

elites políticas que ansiavam por uma cidade metrópole haja vista o projeto de

urbanização citado anteriormente; um modelo urbano diferente do aplicado na

época. Esse formato criou uma interface entre o público e o privado.

Nas décadas de 1910 e 1920, a cidade viveu sob a perspectiva da

industrialização. Mesmo ainda sofrendo com os serviços urbanos básicos e

59

essenciais, em 1915, se tornou referência na produção têxtil do país. Até 1920, Belo

Horizonte viveu segundo Freitas (2007, p.

arquitetura eclética e neoclássica .

A década de 1930 assistiu à consolidação da capital e vivenciou grandes

avanços socioculturais nesse contexto se consolidou a arquitetura Art dèco que

chegou à cidade trazida pelos imigrantes italianos que aqui se instalaram - resultado

da demanda por operários na construção civil, agricultores para as culturas de café e

principalmente em detrimento a crise europeia (FREITAS, 2007, p. 139); e

apresentou um pequeno polo industrial, onde o desafio foi, segundo Rabêlo (2013,

p. olidar os avanços conquistados . A Segunda Guerra Mundial31

(1939-1945) impulsionou a indústria mineira que abriu as portas para a imigração

italiana exercendo uma forte influência no cotidiano da cidade.

As décadas de 1940 e 1950 ficaram marcadas pela expansão industrial, com

a construção da Cidade Industrial em 1941; e pela modernização da cidade.

Juscelino Kubitschek32 então prefeito, construiu o Conjunto Arquitetônico da

Pampulha no início dos anos de 1940 colocando Belo Horizonte na vanguarda da

arquitetura moderna brasileira; o projeto não somente resgatou uma área

desvalorizada como marcou para sempre os rumos da arquitetura belo-horizontina

até então fortemente influenciada pelo estilo Art dèco. (RABÊLO, 2013, p. 96)

O processo de modernização da capital ocorre em paralelo à verticalização

urbana que se iniciou na década de 30. O edifício Acaiaca (FIGURA 13) um dos

marcos da verticalização da cidade fora inaugurado em 1943, construído no estilo

31 Segunda Guerra Mundial (1939-1945) Conflito militar mundial que iniciou em 1939 envolvendo as grandes potências mundiais. Foi organizada entre os Aliados e o Eixo terminando com a vitória dos Aliados em 1945 modificando significativamente o alinhamento político e a estrutura social do mundo elevando os Estados Unidos da América e a União Soviética a emergirem como superpotências rivais, preparando o terreno para a guerra fria (1945-1991). (VAINFAS; FARIA; FERREIRA; SANTOS, 2010, P. 650) 32 Juscelino Kubistchek (1902-1976) Juscelino Kubistchek de Oliveira nasceu na cidade de Diamantina-MG, estudou no Seminário e em 1922 ingressa no curso de Medicina na Universidade Federal de Minas Gerais UFMG. Em 1934 ingressou na política como chefe de gabinete de Benedito Valadares, no mesmo ano elegeu-se deputado federal. Entre 1940-1945 foi prefeito de Belo Horizonte onde juntamente com o arquiteto Oscar Niemeyer projetou e construiu o conjunto arquitetônico da Pampulha, em 1950 foi eleito governador de Minas Gerais e em 1955 foi eleito Presidente da República. (Disponível em: https://www.ebiografia.com/juscelino_kubitschek/. Acesso em:25/05/2019)

60

Art dèco foi, por muito tempo, considerado o maior edifício da cidade. Em 1952, o

título de arranha céu mineiro passou para o Conjunto Governador Juscelino

Kubitschek, mais conhecido com conjunto JK o projeto foi do arquiteto Oscar

Niemeyer33 que marcou para sempre a paisagem modernista mineira juntamente

com o Edifício Niemeyer construído entre os anos de 1954-1955 na Praça da

Liberdade cujas curvas inspira-se nas montanhas mineiras. Esses são alguns

exemplos que marcam a arquitetura modernista e o estilo de morar da capital.

Figura 13: Detalhe do Edifício Acaiaca Belo Horizonte-MG.

Fonte: Disponível em: https://www.flickr.com/photos/portalpbh/8742670166 Acesso em: 21/05/2019.

Nesse contexto de novas relações sociais foram sendo instituídas pela

ascensão da sociedade liberal burguesa, um momento de troca de relações;

comportamento esse já vivenciado pelos europeus. As novas relações sociais

permitiram que, as casas abrissem espaços aos grandes salões de recepção e

convivência social. Conforme cita Lemos (apud Novais; Souza 1997 p.

passa a se tornar palco permanente das atividades condicionadas à cultura de seus

usuários .

A planta da casa, no caso das residências das famílias mais abastadas, se

dividia em área social, onde os amplos salões de estar e jantar ficavam abertos para

as áreas externas em alguns casos integrada pela varanda; e área intima onde um

33 Oscar Niemeyer (1907-2012). Oscar Niemeyer foi um arquiteto brasileiro um dos maiores representantes da arquitetura moderna no mundo. Niemeyer ficou reconhecido, dentre mais de 600 obras assinadas em todo o mundo; pela construção do Conjunto arquitetônico da Pampulha e a construção da cidade de Brasília-DF ambos projetos desenvolvidos com o apoio de Juscelino Kubistchek. (LAGO, 2007, p. 02)

61

mezanino ou mesmo um estar íntimo separava os quartos favorecendo os

momentos de privacidade. Um exemplo dessas construções na capital foi a Casa JK

(FIGURA 14).

Figura 14: Casa JK no Complexo da Pampulha Belo Horizonte-MG.

Fonte: LAGO, 2007, p. 27.

A casa, construída em 1943 mesmo ano da inauguração do Conjunto

Arquitetônico e Paisagístico da Pampulha uma região que na época fora criada

para ser um complexo de lazer calmo; foi uma construção tipicamente modernista,

projetada por Oscar Niemeyer para ser a casa de descanso de Juscelino

Kubitschek, localizada na orla da lagoa da Pampulha. A edificação foi construída em

um grande terreno em aclive favorecendo a vista para a lagoa, de onde se podia

avistar as outras obras projetadas por Niemeyer para o Conjunto da Pampulha

construídas ao redor da lagoa, uma vista privilegiada em um ângulo em perspectiva

(LAGO, 2007, p. 26). As principais características do projeto eram o concreto

armado na fachada com a empena34 (FIGURA 15) sobre a varanda inspirado nos

elementos da arquitetura vernácula35 brasileira.

34 Empena - Empena é a parte superior das paredes externas, acima do forro, fechando o vão formado pelas duas águas da cobertura. Cada uma das paredes laterais onde se apoia a cumeeira os telhados de duas águas. Nas fachadas principais, em alguns casos, a empena adquire a forma de frontão. (Colégio dos arquitetos Disponível em: http://www.colegiodearquitetos.com.br/dicionario/2009/02/o-que-e-empena/. Acesso em 28/05/2019) 35 Arquitetura Vernácula de conhecimentos num meio ambiente definido, que fornece determinados materiais ou recursos em condições climáticas bem característsuas construções, suas casas, satisfazendo a peculiares necessidades expressas em programas caracterizados por próprios e únicos usos e costumes. A casa vernácula é, portanto, uma expressão cultural. Só pode ser daquele povo e daquele sítio. É uma arquitetura que percorre gerações. É funcional. Está fora dessas questões

62

Figura 15 ilustração - empena.

Fonte: Colégio de Arquitetos. Disponível em: http://www.colegiodearquitetos.com.br/dicionario/2009/02/o-que-e-empena/. Acesso em 28/05/2019.

O projeto conta também com um jardim projetado pelo arquiteto e paisagista

Roberto Burle Marx36 e com um painel de azulejos pintado pelo artista plástico

Alfredo Volpi.37 A configuração da planta interna conforme ilustrado na Figura 16;

respeitava a divisão da área íntima e da área social, de modo a preservar a área

íntima protegida por uma sala de leitura; deixando a área social aberta e livre para

receber convidados confortavelmente em reuniões sociais. A cozinha fica na área

doméstica da casa, localizada nos fundos da planta com acesso restrito a copa, não

tendo ligação com a área social. A ambientação, integrada com a proposta

modernista, apresentava um layout arrojado com móveis em pés palito, cores e

acabamentos contrastantes e formas inusitadas.

ligadas a estilos arquitetônicos. É a oca do índio brasileiro, é o iglu esquimó, é a tenda árabe e pode ser a casa de pedra do camponês de Trás-dos- 36 Roberto Burle Marx (1909-1994) foi um artista plástico brasileiro. Autor de mais de três mil projetos de paisagismo em 20 países. Foi também pintor, escultor, tapeceiro e criador de joias. (Site Plataforma e-biografia. Disponível em: https://www.ebiografia.com/roberto_burle_marx/ Acesso em: 18/06/2019) 37 Alfredo Volpi (1896-1988) - foi um pintor ítalo-brasileiro. Foi considerado um dos mais destacados pintores da segunda geração da Arte Moderna Brasileira. Suas pinturas são caracterizadas por casarios e bandeirinhas coloridas. (Site Plataforma e-biografia. Disponível em: https://www.ebiografia.com/alfredo_volpi/ Acesso em: 18/06/2019)

63

Figura 16: Projeto da Casa JK no Complexo da Pampulha Belo Horizonte-MG.

Fonte: Publicação Papadaki 1950. Disponível em: http://www.iepha.mg.gov.br/index.php/programas-e-acoes/patrimonio-cultural-protegido/bens-

tombados/details/1/56/bens-tombados-casa-juscelino-kubitschek. Acesso em: 26/05/2019.

A década de 1940 foi o marco da transição na história de Belo Horizonte, o

movimento modernista38 marcou o desenvolvimento da cidade que passou de

província a uma cidade efervescente carregada de esperança e renovação. Uma

capital cosmopolita, que manteve os ares interioranos se tornando um polo atrativo

de turismo.

As décadas de 1960 a 1980 foram marcadas pelos conflitos políticos que

acabaram eclodindo no Golpe Civil Militar39 em março de 1964 Belo Horizonte

assistiu ao processo de metropolização. A cidade vivenciou um período de

crescimento e de desenvolvimento atraindo investimentos. A cidade industrial,

inaugurada em 1941, tornou-se, segundo Rabêlo (2013, p. rincipal polo 38 Movimento Modernista O movimento modernista é o conjunto de escolas e estilos que prevaleceram no design e nas artes plásticas no começo do século XX. O movimento propunha o novo, ou seja, o novo era sinônimo de ideal, de bom; o princípio da estética. No Brasil o modernismo se inicia com a Semana de Arte Moderna de 1922 e no campo arquitetônico com a construção do Ministério da Educação e Saúde em 1936 na cidade do Rio de Janeiro, passa por um amadurecimento com a construção do Conjunto Arquitetônico da Pampulha (1942-1943) em Belo Horizonte e atinge seu auge com a construção de Brasília (1956-1960). (CAVALCANTI, 2006, p.9) 39 Golpe Civil Militar - O Golpe Militar de 1964 redesenhou o panorama político, social, econômico e cultural do Brasil pelas duas décadas seguintes. Na manhã de 31 de março daquele ano, o então Presidente João Goulart foi deposto e instaurou-se no país a ditadura militar que durou 21 anos. (VAINFAS; FARIA; FERREIRA; SANTOS, 2010, P.795)

64

fabril do estado e a implantação da Fiat, em Betim, provocou um impacto na vida

econômica da região . A vida cultural da cidade cresceu com a abertura em 1970, do

Palácio das Artes; com o movimento Clube da Esquina e com os trabalhos de

artistas como Yara Tupinambá40 e Amílcar de Castro41 importantes nomes das artes

plásticas mineira.

Na Arquitetura, o período vivenciou o auge do modernismo, a simplificação da

forma e o barateamento das construções em detrimento a especulação imobiliária,

que levou a uma vulgarização do estilo (RABÊLO, 2013, p. 196). Os arquitetos e

designers de interiores voltam a buscar sentido para as construções e

ambientações.

Muitas dessas recentes habitações unifamiliares começam a abandonar as formas geométricas simples, o concreto aparente, o grande pano de vidro,

está à procura de elementos plásticos que lembrem a arquitetura colonial [...] Na casa, no seu próprio espaço, talvez esse homem não se encontre. (VERÍSSIMO; BITTAR, 1999, p. 44).

É o momento de resgatar detalhes e ornamentos, um retorno ao Art

Nouveau42, ao rococó43 ou até mesmo o estilo gótico44; inspirando-se nas cores,

40 Yara Tupinambá Gordilho Santos (1932) - Pintora, gravadora, desenhista, muralista e professora. Foi convidada a fazer um mural sobre a inconfidência mineira na reitoria da UFMG, inaugurado em 1969, e posteriormente torna-se se diretora da Escola de Belas Artes da mesma universidade. (Disponível em: <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa8822/yara-tupynamba>. Acesso em: 18/06/2019.) 41 Amílcar Augusto Pereira de Castro (1920-2002) - Escultor, gravador, desenhista, diagramador, cenógrafo, professor. Muda-se com a família para Belo Horizonte em 1935, e estuda na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), de 1941 a 1945. A partir de 1944, frequenta curso livre de desenho e pintura com Guignard (1896 - 1962), na Escola de Belas Artes de Belo Horizonte, e estuda escultura figurativa com Franz Weissmann (1911 - 2005). (Site Enciclopédia Itaú Cultural. Disponível em: http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa2448/amilcar-de-castro Acesso em: 18/06/2019) 42 Art Nouveau No final do século XIX surgiu na Europa um estilo decorativo original e complexo, denominado por Art Nouveau ou arte nova. A assimetria e as formas curvilíneas próprias desse estilo, assim como a inspiração na natureza e o uso das cores tenras influenciaram a arquitetura e o design de interiores da virada do século. (GIBBS, 2017, p.20) 43 Rococó Estilo de arte muito rebuscado, decorativo e ornamental, dominante na França no reinado de Luis XV (1715-1774) que se propagou por toda a Europa chegando a outros países. A arte rococó favorecia as formas complexas e intricadas do Barroco, mas era mais delicada, feminina e graciosa, priorizando temas agradáveis e contemplativos (LITTLE, 2010, p.62) 44 Estilo Gótico O estilo gótico se manifestou durante a Idade Média em meados do século XII na França. Surgiu em contraponto a Arte Românica, possuía característica bastante singulares com enfoque político, social

65

materiais e composições. Esse novo estilo ficou conhecido como pós-moderno. Em

Belo Horizonte, o pós-modernismo45 ficou marcado pela construção do edifício

residencial Barca do Sol (FIGURA 17) de 1976 e consolidado pela construção do

edifício Rainha da Sucata inaugurado em 1984 no então epicentro político de Minas

Gerais a Praça da Liberdade; ambos projetos dos arquitetos Éolo Maia46 e Sylvio

Podestá47.

Figura 17: Edifício Residencial Barca do Sol Bairro da Serra Belo Horizonte-MG.

Fonte: Arq-BH. Disponível em: http://www.arqbh.com.br/2007/04/condomnio-barca-do-sol.html Acesso em: 21/05/2019.

e principalmente religioso associado aos princípios estéticos e filosóficos contrapondo o estilo Românico. (LITTLE, 2010, p.16) 45 Pós-modernismo - é um processo contemporâneo de mudanças significativas nas tendências artísticas, filosóficas, sociológicas e científicas. O conceito de pós-moderno foi introduzido a partir dos anos 60 e veio acompanhado dos avanços tecnológicos da era digital, da expansão dos meios de comunicações, da indústria cultural, do capitalismo e da globalização. As principais características do movimento pós-moderno são a ausência de valores e regras, imprecisão, individualismo, pluralidade, mistura do real e do imaginário (hiper-real), produção em série, espontaneidade e liberdade de expressão. (Disponível em: https://www.todamateria.com.br/pos-modernismo/ Acesso em: 18/06/2019) 46 Éolo Maia (1942-2002) Foi um arquiteto, engenheiro de obra e editor brasileiro com influência na arquitetura contemporânea mineira. Forma-se, em 1967, pela Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais UFMG e foi responsável por grandes obras contemporâneas em Belo Horizonte. (Site Enciclopédia Itaú Cultural. Disponível em: https://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa245489/eolo-maiaAcesso em: 15/06/2019)

47 Sylvio Podestá (1952) - É um Engenheiro Arquiteto brasileiro. Formou-se pela pela Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais em 1982. É sócio diretor da editora AP Cultural, que edita livros e revistas de arquitetura, design e meio ambiente. Ex-professor de desenho da Escola de Arquitetura da PUC Minas e de projeto da EA-UFMG. (Site Sylvio Podestá Disponível em: https://www.podesta.arq.br/ Acesso em; 15/06/2019)

66

Muitas experimentações nas possibilidades de construção e ambientação

foram sendo testadas pelos arquitetos e designers de interiores; que levou ao

surgimento do estilo contemporâneo48 em fins do século XX. A premissa dessa

tendência estava na funcionalidade do projeto sem abrir mão do conceito estético.

Alguns dos representantes da arquitetura contemporânea mineira, os arquitetos

Gustavo Penna49 e Carlos Alexandre Dumont50 assim como muitos outros

profissionais contribuíram para a diversidade e as múltiplas facetas não somente da

arquitetura de Belo Horizonte como também dos interiores e seus projetos como no

caso dos projetos dos ambientes das cozinhas mineiras.

2.2.2- A cozinha em Belo Horizonte

A capital Belo Horizonte, nasceu sob a égide da modernidade, para ser a capital

signo da República. Os prédios públicos e as residências ganharam formas

inspirados no estilo eclético e seus interiores acompanharam essa tendência.

No começo da formação da cidade, a distribuição da planta residencial não se

modificou muito em relação as casas do século XVIII. A vida doméstica não alterou

. Porém, o comportamento se modificou,

a opulência tomou conta da sociedade e inaugurou a vida social interferindo nos

costumes e comportamentos dos indivíduos trazendo um novo contexto cultural.

48 Estilo Contemporâneo Muito confundido com o modernismo ou o estilo minimalista; o estilo contemporâneo sucedeu o estilo moderno. A arquitetura pós-moderna assim como o estilo pós-moderno é uma das mais recentes manifestações contemporâneas, assim como a high-tech, a sustentável, a vernacular e a futurista. (Disponível em: https://enciclopedia.itaucultural.org.br/estilo/contemporâneo Acesso em: 18/06/2019) 49 Gustavo Penna (1950) Arquiteto e urbanista, nasceu em Belo Horizonte na década de 50 e formou-se em arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal de Minas Gerais UFMG em 1973 e no mesmo ano, funda seu escritório Gustavo Penna Arquiteto & Associados. Professor da Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais (EA/UFMG) entre os anos de 1977 e 2009, torna-se Membro da Congregação desta escola em 2004. Desde 2010, é membro da Academia de Escolas de Arquitetura e Urbanismo de Língua Portuguesa (AEAULP). (Disponível em: http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa590798/gustavo-pennaAcesso em: 15/06/2019) 50 Carlos Alexandre Dumont Carico (1963) É um arquiteto formado pela Universidade Federal de Minas Gerais UFMG; referência na arquitetura contemporânea mineira. Nascido em Araxá-MG veio morar em Belo Horizonte aos 10 anos. (Site Carico Disponível em; http://www.carico.com.br/arquiteto.php Acesso em: 15/06/2019)

67

No ambiente da cozinha, o que mudou foram os novos equipamentos

modificando a ato de cozer e servir o alimento, afinal, segundo Veríssimo; Bittar

(1999, p. 112 va ser tão isolada

da casa como em partidos anteriores, onde se procurava afastar o calor e impedir a

. As refeições passaram a exercer um papel

importante nas relações familiares e, a cozinha, como sendo fundamental na

realização dessas refeições passa para o interior das casas como forma de

praticidade (NOVAIS; SOUZA, 1997, p. 128).

A cozinha vai ocupar seu lugar determinado no organograma das novas casas. Ela deve ficar próxima aos quintais, no fundo da casa, porém dentro dela, com acesso fácil à sala de jantar das casas mais ricas ou à copa das casas de classe média. (VERÍSSIMO; BITTAR, 1999, p. 112).

Para atender esse novo modelo, os espaços da casa foram redimensionados,

ou seja:

Tudo se transformou lentamente, e a cozinha, servindo mais uma vez de exemplo, permite avaliar como se deu a passagem vagarosa de uma forma a outra, de um costume a outro, ao encontrarmos casas com duas cozinhas:

inda do lado de fora. (NOVAIS; SOUZA, 1997, p.102).

Já no século XX, o imigrante estrangeiro, assentado no Brasil, busca amenizar a

distância de sua terra natal ambientando suas casas com características próprias de

sua cultura evidenciadas, nos chamados objetos biográficos e traz consigo seus

hábitos cotidianos sendo as refeições parte importante dessa história (NOVAIS;

SEVCENKO,1998, P. 133). A presença desses imigrantes no espaço domiciliar se

deu pela introdução de novos modos de cozer o alimento, de preparar os

ingredientes e também na introdução de receitas típicas, que vão se tornar muito

significativas em detrimento a falta de mão-de-obra que levou esses a assumirem os

programas domésticos (MACHADO, 2011, p. 120).

Assim como os imigrantes, os emigrantes rurais e o negro urbano são

protagonistas da industrialização acelerada e da urbanização rápida. A modernidade

da sociedade apressou também a mudança dos padrões de conduta privada. Surge

um novo modelo familiar, onde a mulher assume um lugar no mercado de trabalho, e

as rápidas transformações tecnológicas possibilitam uma nova configuração na vida

doméstica, onde a cozinha através de seus acessórios passa a simbolizar a

doméstico no dia-a-dia.

68

A água corrente, a luz elétrica, assim como a substituição do fogão à lenha pelo

fogão a gás, marcaram a entrada da dona de casa no cotidiano da cozinha afinal a

abolição da escravatura e a falta de empregados fizeram com que a mulher

assumisse os afazeres domésticos conforme atesta Machado (2011, p.

início do século XX, sem a mão de obra escrava, a dona de casa aparece ocupando

e zelando pelas cozinhas, necessitando utilizar suas prendas domésticas, antes

trabalho das negras . A presença feminina na cozinha, levou a uma preocupação

maior com a ambientação do espaço. Segundo Veríssimo; Bittar (1999, p. 112) os

materiais de revestimento, além de laváveis e duráveis, começaram a apresentar

certa preocupação .

A verticalização iniciada na década de 1930, que irá aos poucos, modificar a

paisagem da Capital, apresentou um novo formato de planta e automaticamente um

novo conceito de ambientação para a cozinha. Segundo Veríssmo; Bittar (1999, p.

com os edifícios de apartamentos, as cozinhas vão atingir dimensões mínimas

. Aos poucos, as edificações vão aumentando e

substituindo as casas e com isso a indústria buscou atender aos usuários com

produtos, cada vez mais, compactos e funcionais para as cozinhas. De acordo com

Farias et al. (2006, p.

brasileira é a ampliação do acesso ao consumo de eletrodomésticos .

Mesmo com toda influência da modernização e a invasão dos eletrodomésticos

no país, grande parte da população ainda utilizava o fogão à lenha, principalmente

nas regiões rurais e suburbanas. Poucas residências, dos mais abastados que

começavam a operar, a partir 1935, com os fogões à carvão. O primeiro modelo de

fogão à carvão de uso doméstico produzido no Brasil foi o modelo Piloto (FIGURA

18) da empresa Dako51 (FARIAS et al., 2006, p. 55).

51 Dako Eletrodomésticos Fundada em 16 de novembro de 1935, na cidade de São Paulo, a Dako Foi uma empresa brasileira fabricante de eletrodomésticos pertencente ao grupo Mabe Eletrodomésticos. A empresa produziu fogões domésticos e esteve presente em todo o território nacional e também em algumas cidades de Portugal. (Disponível em: www.portaldoeletrodomestico.com.br/dako1.htm Acesso em: 20/06/2019).

69

Figura 18: Fogão a carvão Piloto, produzido no Brasil pelas indústrias Dako - 1937. O modelo era produzido em ferro com desenhos decorativos e textura imitando madeira.

Fonte: FARIAS et al., 2006, p. 55.

Não somente os fogões simbolizam a modernização das cozinhas, as geladeiras

também marcam presença. A energia elétrica permitiu o uso da geladeira para

refrigerar os alimentos, mudando a maneira de armazenar e possibilitando novas

experiências ao cozinhar. As primeiras geladeiras a chegarem no Brasil, em 1920,

eram muito caras e de baixo consumo. O primeiro modelo utilizado nas residências

era feito em madeira forrado com folha de zinco para armazenar e conservar as

barras de gelo (FARIAS et al., 2006, p. 60) modelo ilustrado na Figura 19.

Figura 19 Geladeira de madeira com refrigeração em barras de gelo - 1920.

Fonte: FARIAS et al., 2006, p. 61.

70

A segunda metade do século XX ficou marcada por uma forte influência norte

americana e pela disseminação do american way of life52 as mulheres do pós-guerra

foram levadas de volta à vida doméstica. Segundo Machado (2011, p.

1950, com a influência norte-americana servindo de modelo para os lares brasileiros,

houve uma tentativa de incorporar sala e cozinha, como nos filmes de Hollywood .

Assim, o desenvolvimento industrial, onde eletrodomésticos como fogão e geladeira

já eram uma realidade nas cozinhas brasileiras; propõe-se uma nova configuração

na ambientação do espaço. D

No mobiliário, os armários se tornaram suspensos,

colocou-se cortina nas janelas e novos equipamentos e utensílios tornaram a

cozinha um ambiente aconchegante e decorado transformando-o em um espaço

ideal para a dona de casa moderna, conforme ilustra a Figura 20.

Figura 20: A ambientação de uma cozinha na década de 1950.

Fonte: Fotografia Marel Santos. Disponível em: https://universa.uol.com.br/listas/o-coracao-da-casa-como-eram-e-sao-as-cozinhas-de-1950-ate-hoje.htm. Acesso em: 26/05/2019.

Já na segunda metade da década de 1950 iniciou a produção do fogão a gás,

modelo produzido em ferro fundido e esmaltado. Sua produção ocorreu na mesma

época em que segundo Farias et al., (2006, p.

GLP A produção seriada

possibilitou a redução do custo do produto tornando-o barato e acessível à

população de baixa renda modelo ilustrado na Figura 21.

52 American way of life uma expressão que traduzia um estilo próprio de viver adotado pelos americanos que foi disseminado pelo mundo capitalista.

71

Figura 21: Fogão a gás Fundição Brasil - 1950.

Fonte: FARIAS et al., 2006, p. 58.

Nos anos de 1960, o design de eletrodomésticos mudou o conceito dos produtos

brasileiros, as formas arredondadas como mostra a Figura 22; inspiradas na era

espacial juntamente com as cores pastéis invadiram as cozinhas brasileiras, de

acordo com C dadeiras

. A tecnologia permitiu o uso de novos materiais modificando

a forma e o desempenho dos produtos. A popularização desses produtos,

direcionados pelo consumismo e pela propaganda; vai impactar nos projetos das

cozinhas, assim como no mobiliário, com o conceito de móveis planejados e o uso

das chapas de metal. A compactação dos ambientes leva a indústria a desenvolver

linhas de mobiliário modulares beneficiando e otimizando os espaços de

armazenamento.

Figura 22: Modelo Refrigerador Prestcold Final dos 1950.

Fonte: TAMBINI, 2004, p. 68.

72

Em Minas Gerais, na cidade de Ubá, nasceu na década de 1960, mais

precisamente em 1964 a Itatiaia Indústria de Móveis, sob o comando do italiano

Lincoln Rodrigues Costa53 empreendedor que viu a possibilidade de pensar o

mobiliário sob a perspectiva industrial. A Itatiaia surgiu com 08 funcionários, uma

pequena fábrica de móveis feitos a partir de uma máquina de dobrar chapas de aço

material inovador para a época. A fabriqueta vai se transformar em uma grande

indústria iniciando um dos maiores polos moveleiros do Estado o Polo Moveleiro

de Ubá-MG. Em 1989, já sob o comando do filho Lincoln César Penna Costa54, em

parceria com a Fundação Centro Tecnológico de Minas Gerais CETEC 55

implantou o primeiro projeto com curadoria de designers a linha Itabela de

cozinhas modulares (FIGURA 23), o projeto das designers Leila Amaral Gontijo56 e

Denise Botelho57 vai mudar o conceito e a maneira de projetar as cozinhas mineiras.

53 Lincoln Rodrigues Costa (1921-1986) Fundador da Itatiaia Móveis de Aço S.A. em 1964 na cidade de Ubá-MG. Uma consolidada empresa fabricante de cozinhas de aço líder no mercado brasileiro. Fundador do Polo Moveleiro de Ubá-MG. 54 Lincoln Rodrigues Penna Costa (1946-2005) Empresário brasileiro acionista majoritário do Grupo Itatiaia. Uma empresa fundada em 1964 por seu pai Lincoln Rodrigues Costa com apenas 08 funcionários chegando a 1250 na década de 2000. 55 CETEC-MG Fundação Centro tecnológico de Minas Gerais é uma fundação pública vinculada à Secretaria do Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. Foi fundada em 1972 objetivando promover o crescimento econômico e social do Estado por meio do desenvolvimento tecnológico. A fundação apoia a indústria e busca fomentar a política de propriedade intelectual por meio de ações direcionadas à definição de uma infraestrutura formal de estímulo e apoio à Propriedade Intelectual para a Instituição, ao estabelecimento de políticas e mecanismos de apoio a inovação tecnológica, à consultoria e ao apoio a invenções e ao processo de proteção do conhecimento, ao acompanhamento do portifólio de proteção de tecnologias e registros em geral, à avaliação do mercado para melhor adequar os bens protegidos para que não percam seu potencial comercial e, ainda, à prestação de consultoria voltada para um aproveitamento total do conhecimento, trabalhando em conjunto com outros setores da Instituição. (Centro de Inovação e Tecnologia SENAI/FIEMG CETEC Disponível em: http://www.redemineirapi.com/site/membros/fundacao-centro-tecnologico-de-minas-gerais-cetec/. Acesso em: 28/05/2019) 56 Leila Gontijo Amaral (1953) - Possui graduação em Desenho Industrial pela Fundação Mineira de Arte Aleijadinho (1977), mestrado em Ergonomie - pelo Conservatoire National des Arts et Metiers (1983), Doutorado em Ergonomia - Université de Paris XIII (Paris-Nord) (1987), na França, e Pós doutorado na Universidade de Lund, na Suécia (1998-1999). Professora Titular da Universidade Federal de Santa Catarina, atuando na área de Engenharia de Produção, com ênfase em Ergonomia bem como em projeto de produto desde 1989. Ao longo de sua carreira prestou consultorias a diversas empresas, orientou doutorados, mestrados e TCCs e publicou nas áreas de Projeto de Produto e Ergonomia.

57 Denise Botelho (1962) Designer, possui graduação em Desenho Industrial pela Fundação Mineira de Arte Aleijadinho (1983), pós-graduação em Marketing pela Fundação Getúlio Vargas (1999) e em Comunicação

73

Figura 23: Cozinha modular Linha Itabela Itatiaia Móveis - 1990.

Fonte: Fotografia Acervo da Designer Denise Botelho.

A experimentação dos materiais permitiu além do uso das chapas de metal, o

uso das placas laminadas de plástico, conhecidas como Fórmica. Esse material

permitiu aos projetos ganharem novas cores, pois era possível criar uma grande

cartela de cores e também propor novas possibilidades de formas e composições. O

final da década de 1960, início dos anos de 1970, assistiu a influência do movimento

Pop art58. O movimento propunha, como princípio estético, o uso de cores intensas e

alteração no formato dos objetos, assim inspirados pelo movimento os ambientes

ganharam cor, novas composições e novas formas. Nas cozinhas os azulejos se

tornaram marca registrada da época, pois complementavam a composição junto

com o mobiliário; eram peças estampadas em formas geométricas ou desenhos

abstratos dividindo espaço com estampas florais, na sua maior parte coloridas, como

ilustra a Figura 24.

Estratégica pela PUC Minas (2007). Atualmente é sócia proprietária da 22 Graus empresa de comunicação e marketing em Belo Horizonte MG. 58 Movimento Pop Art Ou Popular Arte/arte popular. Um movimento artístico que surgiu em meados dos anos 1950, com o objetivo de "abraçar" e desconstruir imagens pertencentes às culturas de massa, a chamada "cultura pop", feita para as grandes multidões. (Fonte: Significados. Disponível em: http://www.significados.com.br/pop-art/ Acesso em: 20/06/2019)

74

Figura 24: Modelo de azulejo padrão geométrico Décadas de 1960-1980.

Fonte: Imagem Getty Imagens. Disponível em: https://universa.uol.com.br/listas/o-coracao-da-casa-como-eram-e-sao-as-cozinhas-de-1950-ate-hoje.htm Acesso em: 26/05/2019.

A virada dos anos 70 para os anos 80 do século XX assistiu a transformação das

cozinhas. Os projetos além de receberem novos materiais e cores, começaram a se

preocupar com a iluminação, a exaustão e se adaptarem a um arsenal de inovações.

Nesse cenário, o auge do milagre econômico leva a uma mudança comportamental,

onde os valores familiares se modificaram em detrimento a nova cultura

americanizada.

O executivo bem-sucedido procura ter sua cozinha americana junto ao estar, com produtos congelados, mesas quentes, freezers e fornos de micro-ondas, numa imitação do modo de viver americano condizente com seus atuais padrões. (VERÍSSIMO; BITTAR, 1999, p.114).

Nas grandes metrópoles a distância e a falta de tempo mudou os hábitos

alimentares, como cita partir de uma nova

realidade em que os moradores da casa fazem refeições em horários diferentes, ou

às vezes sequer comem em casa . Os alimentos passam a ser cada vez mais

industrializados e o ato de comer passa a ser supérfluo onde os fast foods59 viram

febre entre os indivíduos. Conforme atesta (2010, p. 46) o

espaço da cozinha, antes inviolável

equipamentos de tecnologia sofisticada para o preparo de congelados .

Nesse momento, a cozinha perde seu papel de coração da casa torna-se um

mero depósito de traquitanas eletrônicas coloridas e com formas inusitadas

59 Fast Food Quer dizer comida rápida, são lanchonetes com comidas industrializadas onde o objetivo é comer de forma rápida e prática, um modelo de negócio americano.

75

perdendo seu espírito e parte de sua função (VERÍSSIMO; BITTAR, 1999, p. 115).

Passa a ser exibida, sai do ambiente doméstico para o ambiente social um marco

no projeto e na maneira de projetar o ambiente das cozinhas. Segundo Castro

dos valores e dos costumes se perderam em funç dernidade

Os anos de 1990 vivenciam o surgimento do MDF (Medium Density Fiberboard)

chapas de fibra de madeira prensada que vão impactar modificando completamente

a maneira de projetar as cozinhas. Os tons vibrantes vão ser substituídos pelas

cores neutras como o branco, o bege, o marrom e na virada do século os tons de

preto e cinza entram para a cartela de cores das empresas de móveis planejados.

(FIGURA 25)

Figura 25: Cozinha modular em MDF Finger - 1996.

Fonte: Imagem Getty Imagens. Disponível em: https://finger.ind.br/finger-museum/. Acesso em: 26/05/2019.

O século XXI marca uma forte transição da cozinha. Um novo estilo de vida é

adquirido e novos modelos de moradia e consumo mudam o modus vivendi. A

preocupação com a saúde e o meio ambiente faz com que os indivíduos voltem a

cozinhar em suas casas e a valorizar alimentos naturais. O homem passa a cozinhar

e cada vez mais integrar e participar da cozinha, antes um ambiente exclusivamente

feminino. Esse novo hobby da origem ao espaço gourmet, uma cozinha exclusiva

que integra a parte social da casa a vida social dos moradores (MACHADO, 2011, p.

121); favorecendo reuniões e encontros ao redor do fogão, afinal, segundo Miller

casa é sem dúvida um instrumento poderoso de objetificação . Para

76

compreender esse contexto contemporâneo dos novos hábitos e novos espaços de

socialização, é fundamental entender como se constituiu a família mineira ao longo

dos séculos desde a formação da Capitania de Minas Gerais; assim é possível

entender suas bases e analisar o comportamento que envolve a premissa da

memória da cozinha e sua importância e relevância enquanto ambiente e tradição.

2.2.3- As famílias mineiras

Quando a Corte Portuguesa se instalou no Brasil em 1808, a família patriarcal

brasileira tinha suas bases no meio rural, onde os senhores de terra plantavam

produtos como a cana-de-açúcar e o café; entre outras atividades agrícolas, que

eram as bases da economia. Essa família era constituída segundo Machado (2011,

p. , esposa, filhos, parentes, amigos, dependentes, escravos

casa era em sua maioria homem, onde este era o responsável pelas decisões

políticas, administração da economia e também a reprodução.

A sociedade colonial era marcada por grande diferenciação social e diversidade na sua composição regional. No topo da pirâmide social estavam os grandes proprietários, comerciantes mais abastados e altos funcionários do governo. Nas cidades, de modo geral, havia uma reduzida elite de comerciantes, profissionais liberais e altos funcionários públicos.Abaixo deles aparecia uma camada média formada por feitores, capatazes, padres, militares de baixa patente, artesãos e funcionários públicos. Na base dessa sociedade estavam os escravos, mulatos e desempregados.(MACHADO, 2011, p. 20).

No caso das famílias mineiras, para compreendê-las comportamentalmente e

psicologicamente de suma importância para o contexto da pesquisa; é

fundamental compreender de onde vieram suas bases e como ela se formou. Para

tal torna-se relevante frisar o contexto pelo qual se formou a capitania, ou seja,

Minas formou-se pela grande migração em busca de ouro conforme relatado

anteriormente. Os primeiros núcleos se formaram ao redor de capelas e do próprio

comércio que mesmo escasso; ia se estabelecendo conforme a necessidade. As

pessoas, em sua maioria, vinham em busca do sonho de riqueza projetado pela

mineração, eram homens e mulheres que vieram para trabalhar nas minas. Porém,

como o arraial estava em formação conforme atesta Sales (1999, p. O

povoamento aumentava cada vez mais e é de se supor que a partir de 1708, com a

vitória dos Emboabas, as últimas restrições contra a entrada de forasteiros

desapareceram por completo , assim com a vinda dos portugueses, outras formas

77

de mão-de-obra foram necessárias onde vieram também os artífices, pedreiros,

ferreiros, carpinteiros, alfaiates, sapateiros, ourives, entre outros; sem falar nos

funcionários públicos e da igreja.

Vieram para a Capitania de Minas Gerais, segundo Lima Junior (1978, p. 75)

estáveis do povoamento mineiro . Vieram também, emigrados de Portugal e de

outras partes da Europa em sua maioria homens solteiros (LIMA JUNIOR, 1978, p.

75) formando os pilares cristãos do núcleo colonial e sem falar nas famílias de

brancos paulistas que se estabeleceram e constituíram suas raízes.

A constituição da família mineira parte de uma desorganização social

carregada de paradoxos. Segundo Vasconcellos (2011, p.

extremamente ciosa de sua intimidade e honra, por outro se dissolve no concubinato

e na perversão, facilitada pela escravatura . A Igreja e a Monarquia Portuguesa,

para tentar manter a ordem e civilizar a sociedade prioriza o matrimônio incentivando

a formação familiar. Porém, o número de mulheres na colônia era menor que o de

homens, levando o governo português a adotar algumas medidas para garantir a

quantidade de mulheres no povoado. Segundo Ramos, (2008, p. 145) foram

ad

autorização régia para que mulheres fossem para conventos em Portugal . Os

imigrantes portugueses eram em sua maioria homens solteiros que se

estabeleceram e assumiram posições de destaque na administração e no comando

do povoamento.

Essa prevalecência do macho português, em número superior e em grande atividade, fez com que [...] Nas Minas Gerias se constatasse o fenômeno de uma integral transplantação do espirito e da civilização portuguesa. Nenhum ou quase nenhum resquício de influência africana ou indígena se manteve na linguagem, nos costumes ou nas lendas mineiras, pelo menos na região clássica e característica da civilização do século XVIII. (LIMA JUNIOR, 1978, p.76).

Ao longo do século, diferenciou-se a sociedade mineira em brancos, mulatos

e pretos, onde a discriminação racial principalmente pela cor foi alimentada pelas

irmandades (LIMA JUNIOR, 1978, p. 78), pelos militares e pela nobreza, ou seja, a

separação econômica era a distinção principal onde o nome das famílias garantia a

posição social.

78

No final do século XVIII, a crise da mineração levou a uma forte migração da

população, principalmente os homens; de Minas Gerias em busca de novas

oportunidades modificando a estrutura familiar. Em 1804, já no século XIX, segundo

Ramos

ou seja, esse número marca a permanência das mulheres nos antigos núcleos

urbanos mineradores o que irá justificar a liderança feminina nas famílias mineiras,

uma importante questão da história social. (RAMOS, 2008, p. 147)

Os costumes das famílias mineiras no século XVIII foram influenciados pelos

portugueses conforme justificado anteriormente em consequência do predomínio

dos homens e chefes de família que migraram para o povoado. A distância em

povoamentos levava ao isolamento das famílias, principalmente no meio rural. As

mulheres costumavam ficar escondidas, motivo de preservação e respeito devidos

monitoravam os afazeres da casa, as criadas e cuidava das crianças. As famílias, à

mesa, comiam com as mãos, mesmo os nobres; era costume e a hierarquia permitia,

segundo Frieiro (1982, p.

quando muito os filhos já casados, e algum hóspede de consideração . Uma vez que

as famílias mineiras tinham como hábito hospedar viajantes. Assim, de acordo com

Veríssimo; Bittar (1999, p. -se mais uma vez, e o

receber, ainda que contra a vontade dos velhos senhores de engenho, é uma prática

inevitável .

No final do Império início da República, por volta de 1822; as mulheres gozam

de mais liberdade, uma liberdade ainda monitorada, mas tinham mais espaço para

circular nas áreas sociais. Os povoados cresceram e se transformaram em vilas com

suas características à europeia. À mesa, os talheres são introduzidos no hábito das

famílias mudando a maneira de comer, porém as mulheres preferiam segundo

Frieiro (1982, p. -se na cozinha com as crianças e as

criadas, para comerem à vontade com os dedos . Afinal, os utensílios que se usam

às mesas para comer são tão familiares quanto as mãos (PETROSKI, 2007, p. 25)

A segunda metade do século XIX assistiu ao começo da mudança nos

costumes e no comportamento. A Abolição da Escravatura e a Proclamação da

República modificam o comportamento das famílias e o jeito de morar; o sonho da

modernidade abre espaço para a socialização. As refeições passam a exercer um

79

papel importante nas relações familiares e, a cozinha, como sendo fundamental na

realização dessas refeições passa para o interior das casas como forma de

praticidade (NOVAIS; SOUZA, 1997, p. 109).

Na mudança da capital para Belo Horizonte, os imigrantes italianos que se

instalaram e a forte influência modernista modificam a cena familiar mineira. Tanto o

jeito de morar como os hábitos e costumes, foram alterados, de acordo com Castro

As famílias dos governantes e servidores vieram de

Ouro Preto, segundo Rabêlo (2013, p.

guardados antigos e tudo mais que puderam transportar, para iniciar uma nova

-se um processo de adaptação, uma vez que ainda existia uma

resistência por parte da mudança. As pessoas que vieram de outras regiões

inclusive os imigrantes estrangeiros trouxeram em sua bagagem um pouco da sua

identidade e foram construindo a cena belo-horizontina.

No começo, a cidade oferecia poucas opções de lazer, eram festas religiosas

e encontros literários; mas com a chegada do movimento modernista e mais tarde

com a construção do conjunto arquitetônico da Pampulha a vida social se modifica

radicalmente impactando no dia-a-dia das pessoas e na arquitetura das casas. Os

grandes salões se abrem para receber e mais uma vez as reuniões em torno da

mesa marcam o cotidiano das famílias mineiras, é a efervescência da década de

1950.

O final do século XX assistiu a grandes mudanças no corpo familiar. A era da

conveniência, influenciada pela americanização mudou o comportamento das

famílias isolando os indivíduos da convivência familiar. Segundo Castro (2019)

excessiva por parte

A praticidade vendida através dos fast food somada às

possibilidades da industrialização modificaram o hábito de cozinhar e principalmente

a planta das cozinhas, que passaram de espaços domésticos a ambientes de

exibição impactando na alimentação e no comportamento das famílias. Segundo

Wilson, (2014, p.

era fora

80

A entrada do homem60 no ambiente culinário também marcou a mudança

comportamental e o jeito de cozinhar. A cozinha feminina é diferente da cozinha

masculina, afinal a divisão sexual do trabalho imposta na formação social das

civilizações impunha que a mulher era responsável pelo ato de alimentar a cria e

segundo Dória, (2014, p.

recusar a comida é o mesmo que recusar essa modalidade fundante de afeto, um

ato que exprime grande emoção . Assim a cozinha pode ser vista como um lugar

associado ao feminino visto que a mulher, de acordo com Dória (2014, p.

sempre circunscrita pela solidão, confinada a um espaço doméstico que impede um

viver feminino comum. A esfera pública é tomada como masculina . Assim, a

cozinha vai se desfeminilizar se projetando como um território de domínio masculino

justificando a cultura dos grandes chefs de cozinha. A cozinha masculina é pública,

encenada, externada o que leva a modificação do projeto do espaço de cozinhar

masculino.

A arquitetura acompanha e reflete essas mudanças. As casas térreas ou

sobrados, os apartamentos ou conjuntos habitacionais; dos flats aos cortiços, enfim

o lar mostra as características peculiares de cada família de cada cultura. A família é

o principal gerador da casa, do lar e o que marca essas famílias, principalmente as

famílias mineiras; na maior parte das vezes são as reuniões ao redor da mesa, os

momentos vividos nas cozinhas e a contemporaneidade levou essas famílias a

vivenciarem momentos de crise e de necessária reestruturação.

Na década de 1940, no auge do Modernismo em Belo Horizonte, receber

ficava direcionado as salas da área social da casa sendo a cozinha reservada

apenas ao preparo, os convidados não tinham contato com o ambiente. Já na

contemporaneidade o receber passa para um espaço especialmente projetado para

se cozinhar. Nele, cozinhar é um espetáculo a ser exibido, uma área onde mulheres

e homens exibem seus dotes culinários em pequenos encontros gastronômicos.

Nesse espaço, também assistido pelos homens, que ganham um lugar à frente do

60 Nesse contexto, a autora aponta a desfeminilização da cozinha a partir da entrada do homem no ambiente. Um momento que passou a ser assistido na contemporaneidade. O objetivo aqui é destacar o instante em que o cozinhar masculino ganha espaço, ou seja, o período que a cozinha deixa de ser um território estritamente feminino como nas décadas anteriores. Aqui não haverá espaço para a discussão de gêneros, destacando sua importância e ressaltando a intenção de ampliar os estudos para um futuro projeto.

81

fogão o cozinhar passa a fazer parte da reunião e os convidados assumem papel

de expectador do chef. Para esse momento, seria necessário um cenário

apropriado, um novo conceito de ambiente que ficou conhecido como espaço

gourmet nele o ato de cozinhar e preparar o alimento ganhou destaque, ou seja, a

cozinha do dia-a-dia ainda existe na área doméstica da casa e as salas ganham os

espaços gourmet. Uma nova maneira de recuperar as reuniões familiares com novas

características e novos utensílios momentos propícios a socialização e ao afeto.

A virada do século XX para o século XXI ficou marcada pela grande recessão

de 2007-2008, uma grave crise no setor financeiro que abalou investidores e

instituições financeiras pelo mundo; esse cenário vai impactar na rotina das famílias.

renascimento da culinária doméstica, em parte como resposta a austeridade da

recessão . Mas não foi somente a recessão que marcou o renascimento da culinária

doméstica, a preocupação com a saúde e com o meio ambiente também levou as

pessoas a repensarem a alimentação, um dos motivos que levou o jornalista Carlo

Petrini61 a desenvolver a cozinha Slow Food. O princípio básico do estudo está na

valorização do alimento ao natural e na maneira de prepará-lo, ou seja, cozinhar a

própria comida, escolher o próprio ingrediente e o momento de degustar a refeição é

repensado e novas práticas vêm sendo adquiridas pelas pessoas. Essa nova prática

trouxe o prazer de cozinhar somado ao prazer de receber característica nata do

mineiro; ajudando a modificar os espaços residenciais.

Receber é um ato de amor, assim como cozinhar é sinônimo de doação, um

momento de sensibilidade que marca a espécie humana são os instintos sociais

intrínsecos da evolução da espécie humana a que Charles Darwin62 se referiu. Para

se compreender a importância dos momentos de reuniões familiares e a relação

com ato de cozinhar é importante compreender, segundo Doria (2014, p. 204) a

história da sensibilidade gastronômica, em que história e sensibilidade apontam um

61 Carlo Petrini (1949) - Nasceu na província de Cuneo no município de Bra na Itália. É fundador do movimento internacional Slow Food que nasceu contra o movimento fast-food e fast-life contra a padronização e a industrialização alimentar. 62 Charles Darwin (1809-1882) - Charles Robert Darwin (1809-

82

campo de múltiplas relações . Assim, compreender essa relação baseia-se em

entender como as sociedades são construídas e de como são organizadas, ou seja,

entender como a vida doméstica se desenvolveu e de como afetou a vida social e

familiar para então compreender como os espaços das cozinhas se desenvolveram.

83

CAPÍTULO 3

ESPAÇO DOMÉSTICO NO COMEÇO DO SÉCULO XX - O PLANEJAMENTO DO

ESPAÇO DA COZINHA.

Este capítulo tem por objetivo conhecer as premissas, a partir da análise da

organização dos espaços domésticos de trabalho no começo do século XX; e

entender as necessidades mediante a racionalização das tarefas domésticas a fim

de liberar a mulher para o mercado de trabalho; que levaram ao desenvolvimento

dos projetos para o ambiente da cozinha no começo do século XX, assim como;

compreender de que forma o design, através do projeto do ambiente e dos

equipamentos domésticos; ajudou a otimizar e a simplificar a vida doméstica.

3.1- Organização dos espaços de trabalho o projeto da cozinha no século XX:

A vida doméstica teve suas funções constituídas nas civilizações antigas a

partir do fogo. As lareiras que há séculos serviam para cozinhar o alimento e

aquecer eram o ponto central das casas. Acendê-las, mantê-las acesa controlando o

calor necessário e apagá-las a noite para não incendiar a casa constituiu,

juntamente com a tarefa de fornecer o alimento, ou seja, cozinhar; o conjunto de

tarefas

Um dos principais influenciadores da mudança na vida doméstica no Brasil foi

à abolição da escravatura em 1888. Manter a casa - a alimentação, os cuidados com

a limpeza e as necessidades básicas da família tornou-se responsabilidade das

donas da casa que passaram, em sua maioria, a assumir as atividades sem o auxílio

dos escravos. Dessa forma os serviços domésticos se tornaram o principal problema

de tempo e espaço para as mulheres modernas o que consequentemente levou o

ambiente da cozinha a receber maior atenção e preocupação, pois nele, a maioria

das atividades domésticas da casa é executada. Organizá-la passou a ser um

grande desafio não somente para as mulheres como para os arquitetos e projetistas.

A organização da cozinha tinha como premissa a racionalização das tarefas

no final do século XIX mesmo com alguns resquícios de escravos, de acordo com

Silva (2008, p. -de-casa tinham que se deslocar muito, principalmente

as pesquisas

84

propunham a mecanização como forma de otimizar as atividades conforme citou

Risério (2015, p. espaço profissional da mulher, equivalente da

Estudos como o tratado sobre economia doméstica63 escrito por Catherine

Beecher64 em 1841 comprovam a teoria da preocupação dos americanos com a

organização do trabalho doméstico. O Tratado propunha um aprendizado sobre

economia doméstica e organização das tarefas da cozinha, afinal, tornava-se

necessário simplificar a rotina das atividades a fim de liberar a mulher para o

mercado de trabalho. (SILVA, 2008, p. 95). Catherine aprofunda seus estudos em

1869 e propõe um planejamento para as cozinhas conforme ilustrado na Figura 26.

Figura 26: Catherine Beecher propõe em 1869, nos Estados Unidos um modelo de organização de cozinhas.

Fonte: HOMEM, 2003, p. 129.

63 Treatise on Domestic Economy Tratado sobre Economia Doméstica escrito em 1841 e reeditado em 1851. Um guia completo de manutenção da casa publicado por Catherine Esther Beecher nos Estados Unidos. (SILVA, 2008, P.95) 64 Catherine Esther Beecher (1800-1878) - Educadora e autora americana popularizou e moldou um movimento ideológico conservador que propunha elevar e consolidar o lugar das mulheres na esfera doméstica da cultura americana. (Disponível em: https://www.britannica.com/biography/Catharine-Beecher#ref237965Acesso em: 15/01/2020)

85

Nesse tratado, a obra ; Catherine Beecher

organiza a cozinha da seguinte forma:

As superfícies de trabalho contínuas juntamente com a organização dos utensílios e dos gêneros alimentícios a serem utilizados pela cozinheira. Na pia, instalou bombas de água quente e fria. Contudo o fogão a lenha foi colocado em outra zona. (HOMEM, 2003, p.129).

A publicidade e o cinema norte-americano influenciaram muitas mulheres, que de

acordo com Risério (2015, p. -americanas que

tivemos as ações, as reflexões e os produtos do movimento alemão de

-as a buscar por libertação e a lutar por seus

direitos abrindo caminho ao movimento feminista65 onde lutavam pela igualdade

entre os sexos tanto na esfera social quanto na esfera política conforme ilustra a

Figura 27; e como consequência fora aos poucos sendo proposto um novo modelo

de organização doméstica.

Figura 27: Mulheres alemãs apoiam candidato Bernhard Düwell em janeiro de 1919, pouco depois da conquista do sufrágio feminino - Alemanha.

Fonte: DW Brasil Notícias e análises do Brasil e do Mundo. Disponível em: https://www.dw.com/image/46256777_303.jpg. Acesso em: 05/03/2020.

Propor um novo modelo de organização doméstica demandou muitos estudos

e pesquisas principalmente nos grandes centros como nos Estados Unidos e na

Europa que lideravam os movimentos de modernização e onde as mulheres

ganhavam espaço. A cozinha foi o destaque de muitos desses estudos de

organização doméstica no início do Movimento Moderno, que focavam a

65 Movimento feminista o movimento feminista parte da premissa do feminismo, que se define como um movimento daquelas ou daqueles (homem pode ser feminista) que preconizam a ampliação legal dos direitos civis e políticos da mulher, ou sua equiparação legal ao direito dos homens (BRINK-FRIEDERICI, C. M. K. Momentos históricos do novo e velho movimento feminista na Alemanha e no Brasil. 1990, p. 99).

86

funcionalidade e a eficiência, afinal é o ambiente onde a maioria das tarefas é

realizada e onde a mulher, dona-de-casa, passa a maior parte do tempo.

De acordo com Silva (2007, p.

tiveram um papel primordial na reorganização do trabalho doméstico, na Europa

a Europa, mais

precisamente na Alemanha berço do nascimento do verdadeiro design moderno

(FUSCO, 2019, p. 95), na década de 1920, a cidade de Frankfurt era o centro do

pensamento social e arquitetônico da Alemanha, a única cidade alemã em que as

construções eram projetadas e controladas por arquitetos modernistas. Nesse

cenário, destaca-se a arquiteta racionalista Grete Schütte-Lihotzky66 cujos estudos

levaram a mudança no modo de pensar, projetar e utilizar as cozinhas. Seu projeto

de destaque ficou conhecido como a Cozinha de Frankfurt marco do design de

ambientes das cozinhas no período modernista que mudou a forma de pensar e

projetar o espaço no século XX.

Os modernistas se esforçavam para tornar a vida cotidiana mais racional,

menos rebuscada e mais dinâmica (CAVALCANTI, 2006, p. 10). Na Cozinha de

Frankfurt projeto de 1926, Grete Schütte-Lihotzky apostou na eficiência, na

racionalidade e na funcionalidade; foi a primeira cozinha equipada sendo um

protótipo para as outras cozinhas internas projeto que foi amplamente divulgado

na Europa e no mundo.

O conceito do projeto se baseava nos princípios do Scientific Management da

FW Taylor sistema que analisava a maneira mais eficiente de realizar tarefas em

casa e no local de trabalho. O projeto foi pensado com um espaço suficiente para a

dona-de-casa trabalhar sozinha, ou seja, o espaço deveria diminuir o deslocamento

entre os equipamentos principais de uso assim como a localização desses 66 Margarete (Grete) Schütte-Lihotzky (1897-2000) Formada em arquitetura, foi a primeira mulher a ser contratada para construir uma casa em 1916 na cidade de Frankfurt Alemanha. Inspirada por seu mentor na Escola de Artes Aplicadas de Viena, Oskar Stmad, ela se envolveu no projeto de moradias populares e trabalhou com outro arquiteto vienense, Adolf Loos, no planejamento de assentamentos para veteranos da Primeira Guerra Mundial. Foi a autora do projeto Cozinha de Frankfurt, marco da organização doméstica do início do século XX. (Disponível em: https://www.moma.org/interactives/exhibitions/2010/counter_space/the_frankfurt_kitchen/ Acesso em: 05/03/2020).

87

equipamentos fora pensada sob a lógica de usabilidade simplificando os

movimentos por meio de um estudo de eficiência, conforme mostra o esquema na

Figura 28.

Figura 28: Estudo comparativo do esquema dos movimentos realizados na cozinha em 1926 em Frankfurt na Alemanha. A esquerda cozinha tradicional, com todos os complexos deslocamentos necessários para uma tarefa doméstica, na direita simplificação dos movimentos através de um

estudo de eficiência.

Fonte: História e Teoria da Arquitetura, Urbanismo e Paisagismo I. Disponível em: https://histarq.files.wordpress.com/2013/03/31.jpg?w=768&h=439. Acesso em: 05/03/2020.

O projeto foi encomendado a Grete Schütte-Lihotzky por Ernst May67 -

arquiteto responsável pela construção de novas moradias na cidade de Frankfurt na

Alemanha. A ideia era que o projeto fosse pensado para um ambiente de 3,50m x

1,90m um espaço pequeno, porém uma cozinha confortável onde se pudessem

resolver todas as atividades domésticas; sendo apropriado para apartamentos de

classe média a fim de ser reproduzido em todas as unidades.

67 Ernst May (1886-1970) Arquiteto e urbanista alemão atuou junto a prefeitura de Frankfurt Alemanha na construção de novas moradias após a I Guerra Mundial. Foi responsável entre os anos de 1925-1930 por dar início a um programa de desenvolvimento habitacional em larga escala na cidade de Frankfurt Alemanha reunindo arquitetos progressistas em meio a um cenário de instabilidade política e escassez de moradia. (Fonte: Architetcs, Architecture and Architectuul. Disponível em: http://architectuul.com/architect/ernst-may.Acesso em: 05/03/2020).

88

Como havia tamanhos diferentes de apartamentos, o projeto foi pensado em

três tamanhos de cozinha mantendo o conforto necessário para a realização dos

movimentos. Os principais pontos de destaque ficaram a cargo de um banco para

trabalhar sentado estrategicamente colocado sob uma janela para receber luz e de

acessórios como gavetas de temperos instaladas em frente ao fogão conforme

ilustra a Figura 29.

Figura 29: Layout de um dos modelos de Cozinha de Frankfurt projetado por Grete Schütte-Lihotzky medindo 1,87m x 3,44m. Destaque para os números: 11 gavetas de temperos em frente ao fogão número 03 da planta; e 04 uma tábua de passar roupa que podia abrir-se em frente a pia número 10. No eixo pode-se perceber um círculo correspondente ao giro do movimento do corpo para pegar

os temperos, possibilitando espaços circulares de trabalho.

Fonte: História e Teoria da Arquitetura, Urbanismo e Paisagismo I. Disponível em: https://histarq.files.wordpress.com/2013/03/21.jpg. Acesso em: 05/03/2020.

Cada área do espaço foi projetada pensando estrategicamente em atender a

um objetivo. As superfícies dos móveis e bancadas eram lisas, sem molduras e

detalhes, evitando assim a retenção de sujeira o que facilitava a limpeza. Na época

não havia geladeiras elétricas, portanto fora projetado um móvel baixo e aberto por

fora para manter a comida fresca. Os recipientes para armazenamento de

mantimentos como arroz, farinha e açúcar foram desenvolvidos em metal, de fácil

acesso por uma alça que permitia colocar o produto direto na panela minimizando o

esforço das mãos como ilustrado na Figura 30.

89

Figura 30: Porta mantimentos de metal projetado para facilitar o acesso e o uso.

Fonte: História e Teoria da Arquitetura, Urbanismo e Paisagismo I. Disponível em: https://histarq.files.wordpress.com/2013/03/41.jpg. Acesso em: 05/03/2020.

Na Figura 31 é possível perceber o módulo de armários onde ficava os porta

mantimentos de metal que são abertos facilitando o acesso. Na área da pia é

possível observar o escorredor de pratos, projetado levemente inclinado na direção

da cuba, escoando facilmente a água e por fim, destaque para a luminária instalada

sobre um trilho possibilitando seu deslocamento para qualquer área de trabalho da

cozinha.

Figura 31: Vista da Cozinha de Frankfurt.

Fonte: História e Teoria da Arquitetura, Urbanismo e Paisagismo I. Disponível em: https://histarq.files.wordpress.com/2013/03/51.jpg?w=522&h=466. Acesso em: 05/03/2020.

90

O espaço foi planejado sob as ideias do taylorismo68 e da engenharia da

eficiência onde prevalecia um estudo racional dos movimentos e deslocamentos

para a realização das tarefas. Foram realizados estudos de tempo e movimento do

corpo humano colocando o usuário no centro do processo. O objetivo era otimizar o

tempo e poupar os movimentos. De acordo com Monteiro et al. (2013, p. 03

instaladas por volta de 10.000 unidades. Nenhuma cozinha poderia ser feita de

2 o ambiente

foi projetado meticulosamente onde até um estudo cromático fora realizado, sendo a

escolha da cor azul proposital, pois repelia os insetos.

Figura 32: Vista da Cozinha de Frankfurt.

Fonte: História e Teoria da Arquitetura, Urbanismo e Paisagismo I. Disponível em: https://histarq.files.wordpress.com/2013/03/6.jpg. Acesso em: 05/03/2020.

68 Taylorismo Um sistema de gestão do trabalho desenvolvido no início do século XIX a partir de estudos sobre os movimentos do homem e da máquina nos processos produtivos fabris. Enfatiza a eficiência operacional das tarefas realizadas, no qual busca extrair o melhor rendimento dos usuários. Portanto é um sistema de racionalização do trabalho concebido em moldes científicos, onde cada aspecto do trabalho deve ser desenvolvido e estudado cientificamente. (Fonte: Toda Matéria. Disponível em:https://www.todamateria.com.br/taylorismo/. Acesso em: 11/03/2020).

91

O projeto da Cozinha de Frankfurt foi um marco de projeto para o design de

interiores no começo do século XX mudando o conceito de pensar o ambiente da

cozinha na Alemanha influenciando todo o mundo, afinal o momento era de

modernização e a Europa era referência de modernidade principalmente quando se

trata de arquitetura e design de interiores. O Brasil importava não somente as raízes

estilísticas como a maioria dos produtos utilizados na construção civil vinham dos

países europeus conforme atesta Lemos (1989, p.

areia, o tijolo e a cal das argamassas o resto era europeu, chegando como lastro

dos navios que voltavam pesad

3.1.1- O projeto da cozinha no século XX no Brasil:

O Brasil, na virada do século XIX para o século XX, passava por um momento

de transição, pois vivenciava no campo político o início da República e sofria com o

êxodo rural que levou os principais centros a presenciar um grande crescimento

demográfico. Em cidades como São Paulo, que estava em franco crescimento

econômico devido ao comércio do café, sua população passou de 30 mil habitantes

em 1873 para 120.775 mil habitantes em 1893 (SILVA, 2008. p. 97) abrindo o limite

das cidades, expandindo-as; fazendo com que fossem instituídos novos códigos

sanitários e novas leis de zoneamento que acabaram favorecendo o aparecimento

de novos modelos de moradias a fim de racionalizar os espaços e acomodar todos

os emigrantes oriundos de classes sociais diferentes.

O crescimento da cidade e a forte especulação imobiliária estabeleceram empreendimentos dos mais diversos padrões. A preocupação com a limpeza e a racionalização de novos espaços de moradia levaram ao surgimento de áreas distantes dos centros, destinada às classes operárias, próximas às fábricas estabelecendo assim, novos focos de crescimento. Havia uma variação de tipos de habitação que atendia não apenas as elites (palacetes), mas também as classes mais baixas, desde a ocupação de grandes casarões transformados em cortiços até a construção de vilas operárias e o surgimento de residências de padrão médio. (SILVA, 2008, p. 100).

Segundo Lemos (1989, p. casas operárias, as

casas da baixa classe média, as casas da classe média propriamente dita, as casas

da classe média alta, os palacetes e as soluções mistas69 Essas moradias foram

construídas com influência de estilo arquitetônico e os materiais importados da

69 Soluções mistas Estabelecimento comercial com moradia (LEMOS, 1989, p. 65).

92

Europa, pois até a Primeira Guerra Mundial70 a indústria nacional não produzia

praticamente nenhum material da construção civil.

No começo do século XX, as cozinhas, mesmo aquelas das residências dos

mais abastados, ainda seguiam os preceitos das cozinhas coloniais um espaço

localizado no fundo das residências, ainda sujo pelo uso dos fogões à lenha na

maioria das casas e pelo uso do fogão a carvão nas mais prósperas; sendo a luz

natural e a ventilação uma preocupação nesses ambientes conforme ilustra a figura

33, afinal os primeiros modelos de fogão a gás vão começar a ser produzidos no

Brasil no ano de 1935 pela empresa Dako fundada na cidade de São Paulo (FARIAS

et al., 2006, p. 54).

Figura 33 Modelo de cozinha de 1917 na cidade de São Paulo, onde a valorização das janelas e a compactação dos móveis se torna primordial no espaço.

Fonte: HOMEM, 2003, p. 129

A partir dos anos de 1930, em resposta a crise de 1929; foi criado em São

Paulo o Instituto de Organização Racional do Trabalho - IDORT71 cujo objetivo era

70 A 1ª Guerra Mundial dificultou a importação de produtos da Europa, que se tornou complexa devido ao alto custo dos produtos estrangeiros. Para reparar, alguns itens foram importados dos EUA como vidro e móveis abrindo precedente a americanização brasileira. No segmento da construção civil e do design de interiores ouve uma grande influencia do cinema e das revistas de arquitetura e decoração que aos poucos mudaram inclusive a nomenclatura dos ambientes nascem os livings, os halls e as kitchenettes. Nesse contexto muitos produtos não foram suprimidos levando a indústria nacional a se ver obrigada a desenvolver e produzir esse material (LEMOS, 1989, p. 62-66). 71 Instituto de Organização Racional do Trabalho IDORT: Foi criado em 1930 por um grupo de empresários paulistas liderados por Armando de Salles Oliveira com o objetivo de responder à crise de 1929 que oprimia as instituições da época. A iniciativa foi a responsável pela introdução do planejamento, da pesquisa e do trabalho em nosso país que estava em franco descompasso com relação aos países desenvolvidos. (HOMEM, 2003, p. 125).

93

introduzir a pesquisa, o trabalho e o planejamento no país, afinal a revolução

Industrial no Brasil foi tardia (FARIAS et al., 2006, p. 54).

Era preciso organizar a indústria de forma a combater o desperdício de tempo, de material e de energia humana, princípios formulados pelos engenheiros norte-americanos Frederick W. Taylor (1856-1915) e Frank B. Gilbreth (1868-1924), os quais também deveriam ser aplicados nos lares.(HOMEM, 2003, p.126).

No ano de 1938 foi apresentado um estudo pelo arquiteto Henrique Mindlin72

que abordava a cozinha propondo um formato organizacional envolvendo três

setores, com o objetivo de trazer funcionalidade e praticidade ao espaço. Assim,

definia-se a cozinha racional:

Como aquela que é especialmente organizada e ocupa um espaço reduzido, em vista da economia de tempo e de energia humana. Deve ser clara, arejada e bem iluminada por janelas e luzes noturnas, e ter aspecto alegre. Considera três grandes centros de atividades: armazenamento e conservação; limpeza e preparo; cozimento e serviço, apresentando-os em perfeita conexão entre si, mediante a melhor disponibilidade do equipamento e das janelas, além de relacioná-los com as peças que compõem a habitação. O trabalho será simplificado pela disposição e pela automação dos aparelhos auxiliares. Móveis e aparelhos se integram às superfícies contínuas e compactas, contidos todos em um espaço menor e mais bem utilizado, apto a atender à necessidade de economia de passos e de movimentos do usuário. (HOMEM, 2003, p.126).

No Estado de Minas Gerais, foco central desse estudo, o final do século XIX

começo do século XX buscava a partir dos preceitos da modernidade construir a

nova Capital. A cidade foi planejada e construída segundo os princípios do

positivismo onde a ordem, a ciência e o racionalismo eram os valores principais

(RABÊLO, 2013, p. 50), sendo assim, de acordo com Silva (2008, p. 100)

com o passado,

Para compreender como a organização dos espaços de trabalho e os projetos

das cozinhas na Nova capital foram pensados, é importante entender como se

72 Henrique Mindlin (1911-1971) Arquiteto, urbanista, professor historiador da arquitetura. Viveu nos EUA entre os anos de 1943-1944 onde aprendeu e trouxe para o Brasil os preceitos da racionalização onde aplicou e especializou em atividades de projeto e na organização de equipes de trabalho orientador por técnicos com conhecimentos específicos. Foi um importante arquiteto modernista no Brasil. (Fonte: Enciclopédia Itaú Cultural. Disponível em: https:// http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa860/henrique-mindlin. Acesso em: 11/03/2020).

94

da cozinha estava diretamente ligada ao tipo de habitação, variando seu tamanho e

Anteriormente ao projeto de construção da nova capital eram observadas

casas rústicas, construídas sem uma preocupação com a situação no terreno,

carente segundo Arrais (2010, p. 589)

, conforme ilustram a figuras 34 e 35.

Figura 34: A Rua do Capim - Arraial do Belo Horizonte 1894

Figura 35: Casa que pertenceu aos herdeiros de Francisco José da Silva Reis

Fonte: Acervo da Comissão Construtora da Nova Capital de Minas. Disponível em:

http://www.comissaoconstrutora.pbh.gov.br/exe_dados_documento.php?intCodigoDoc=CCFot1894%20006&strTipo=FOTOGRAF

IAS Acesso em: 20/03/2020.

Fonte: Acervo da Comissão Construtora da Nova Capital de Minas. Disponível em:

http://www.comissaoconstrutora.pbh.gov.br/tpl_documento_ampliado.php?tipo=fotografias%20&pasta=CCFot1

896%20011&strNotacao=CCFot1 Acesso em: 20/03/2020.

Após, um esforço para suprimir os problemas básicos; foi implantado o

planejamento proposto pela Comissão Construtora que delimitava uma nova planta

situacional dos terrenos para a capital, ou seja, aos poucos as questões civilizatórias

básicas foram sendo resolvidas gradativamente. Ainda segundo Arrais (2010, p.

589) , objetivo de

realizar uma verdadeira toilet ; favoreceu a construção de novas

moradias, prédios públicos e comerciais além da instalação de iluminação elétrica

em ruas, praças e nas construções principais.

A cidade foi inaugurada segundo Rabêlo (2013, p.

casas, destinadas em sua quase totalidade aos membros da Comissão Construtora

95

e aos servidores do Estado [...], além do Palácio da Liberdade, três secretarias e 38

m as figuras 36 e 37.

Figura 36: Casas de Funcionários públicos 1896. Figura 37: Palácio da Liberdade Fachada principal- 1895

Fonte: Acervo da Comissão Construtora da Nova Capital de Minas. Disponível em:

http://www.comissaoconstrutora.pbh.gov.br/tpl_documento_ampliado.php?tipo=fotografias%20&pasta=SA2%20004%20005&strNotacao=SA2%2000 Acesso em:

20/03/2020

Fonte: Acervo da Comissão Construtora da Nova Capital de Minas. Disponível em:

http://www.comissaoconstrutora.pbh.gov.br/tpl_documento_ampliado.php?tipo=fotografias%20&pasta=CCALB01%20036&strNotacao=CCALB01%2000. Acesso em: 20/03/2020

Na planta da Nova capital, segundo Linhares (2009, p. 168

espaço para os setores populares

moderna cidade não se ateve a discussão das habitações populares, porém a

população operária e os imigrantes que vieram para construir a Capital

necessitavam se acomodar o que deu origem a zona suburbana formando as

colônias agrícolas. Rapidamente o subúrbio cresceu e aproximou-se da área urbana,

essa expansão desordenada somada ao crescimento populacional levou as

autoridades a instituir a Polícia Sanitária que segundo o regulamento que se refere

ao decreto n. 1.367 do ano de 1900 atribuiu que segundo o polícia

Sanitária da Cidade de Minas terá por fim a observância do disposto neste

regulamento, relativamente à prevenção e repressão dos abusos que possam

comprometer a saúde pública (BELO HORIZONTE, 1900, p. 243 apud REAPCBH,

2018, p. 64).

No documento o Título IV do decreto dizia respeito à regulação das

habitações para operários e chamou a atenção para os seguintes pontos:

96

Art. 99. As habitações para operários não podem ser construídas sem apresentação de planos e sua respectiva aprovação, de acordo com o que se exige para as habitações particulares.

Art. 100. Essas habitações serão situadas fora da zona urbana.

Art. 101. Serão preferidas pequenas casas isoladas para cada família ou em grupo de duas até quatro, tendo cada uma um vestíbulo especial com um pequeno jardim.

[...]

Art. 103. As grandes casas, constituindo domicilio comum a um grande número de indivíduos, são terminantemente prohibidas.

Art. 104. São também prohibidas as construções de cortiços e as cozinhas ao ar livre.

Art. 105. A lotação das casas será determinada de modo que a cada habitante não possa caber menos de 14 metros cúbicos livres.

[...]

Art. 112. O médico da Prefeitura fará visitas frequentes às villas operárias, exigindo que a limpeza e o asseio sejam mantidos cuidadosamente nas habitações e suas dependências. [...]. (BELO HORIZONTE, 1900, p.256 apud REAPCBH, 2018, p. 64).

Na década de 1900 a construção desordenada das residências, levou a

aproximação com a zona urbana e a chegada das indústrias (FIGURA 38)

incentivadas pelo governo; a prefeitura começa a emancipar as colônias agrícolas e

bairros como: Santa Efigênia, São Lucas, Anchieta, Santa Tereza e Horto começam

a se formar.

Figura 38: Fábrica de punhos e colarinhos inaugurada em 1907 - Barro Preto - Belo Horizonte-MG.

Fonte: Site Curral Del Rey desconstruindo BH, uma cidade em eterna construção. Disponível em: http://curraldelrei.blogspot.com/2010/06/os-anos-1910-e-o-inicio-do-grande.html. Acesso em:

24/03/2020.

Em 1910, a cidade contava com aproximadamente 30.000 habitantes

chegando a 54.000 no final da década, ou seja, muitas residências de classe média

97

baixa, classe média e classe média alta foram construídas nesse período como

ilustra a Figura 39, uma casa construída na zona suburbana para abrigar uma

família de classe média.

Figura 39: Residência construída em 1911 na zona suburbana de Belo Horizonte-MG.

Fonte: Site Curral Del Rey desconstruindo BH, uma cidade em eterna construção. Disponível em: http://curraldelrei.blogspot.com/2010/06/os-anos-1910-e-o-inicio-do-grande.html. Acesso em:

24/03/2020.

A década de 1910 foi um período de mudanças significativas na paisagem

urbana da cidade. Nesse período surgiam também as soluções mistas, casas

comerciais como ilustra a Figura 40; no eixo central da capital. Este demarcado

pelas ruas da Bahia, dos Timbiras e pela Avenida Afonso Pena; que foram se

consolidando e marcando o espaço de articulação da população. Assim foi

necessária a expansão da zona urbana favorecendo a construção de casas para

atender a classe média alta. (BORSAGLI, 2010).

Figura 40: Sobrado construído na Rua da Bahia na década de 1910 em Belo Horizonte-MG

Fonte: Site Curral Del Rey desconstruindo BH, uma cidade em eterna construção. Disponível em: http://curraldelrei.blogspot.com/2010/06/os-anos-1910-e-o-inicio-do-grande.html. Acesso em:

24/03/2020.

98

Nesse período, vão surgir também os palacetes que abrigaram a classe mais

privilegiada da sociedade, conforme atesta Borsagli (2010

nesse período demonstravam a prosperidade de seus proprietários com ricas

decorações nas fachadas 1, o Palacete

Dantas foi um dos primeiros exemplares a ser construídos na capital. Projetado em

1915 pelo arquiteto Luiz Olivieri73 para abrigar a grande família do engenheiro José

Dantas74, o prédio foi projetado em estilo eclético ricamente ornamentado com

destaque para a escadaria de ferro trabalhada, importada da Bélgica. O palacete foi

dividido em dois pavimentos concentrando os quartos, a sala e a cozinha no

segundo pavimento.

Figura 41: Palacete Dantas construído em 1915 nas imediações do Palácio da Liberdade para abrigar a família do engenheiro José Dantas Belo Horizonte-MG

Fonte: Site BH nostálgica. Disponível em: http://bhnostalgia.blogspot.com/2008/10/palacete-dantas-em-1920-o-palacete_4895.html. Acesso em: 24/03/2020.

73 Luiz Olivieri (1869-1937) Graduado em Florença teve uma formação que permitiu atuar como arquiteto, desenhista, escultor e pintor. Chegou em Belo Horizonte em 1895 como desenhista da Comissão Construtora da Nova Capital onde viveu até 1937, ano da sua morte. O arquiteto deixou além de importantes obras arquitetônicas como o Palacete Dantas, esculturas e objetos de memória que se encontram no Museu Abílio Barreto em Belo Horizonte-MG. (RODRIGUES, Rita Lages. Architecto moderno na cidade [manuscrito]: traços e rastros de Luiz Olivieri em Belo Horizonte. Belo Horizonte, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas UFMG, 2012). 74 José Dantas (1874-1946) Graduado em engenharia civil pela Escola de Minas, foi responsável pela execução dos principais prédios da Nova Capital, entre eles estão: o Palácio da Justiça (1909-1912) e o Grupo Barão do Rio Branco em 1914. (Fonte: Patrimônio Belga no Brasil Disponível em: http://www.belgianclub.com.br/pt-br/heritage/escadaria-palacete-dantas-belo-horizonte. Acesso em: 27/03/2020).

99

A partir da década de 1920 a cidade assiste a um pequeno crescimento

começando a tomar forma. A área urbana da cidade, dentro da Avenida do

Contorno, recebe maior atenção e investimentos apesar do crescimento da zona

suburbana; e nascem imponentes na paisagem urbana da capital mais dois

exemplares dos grandes casarões: o Palacete Falci (FIGURA 42), construído na

década de 1920 em estilo eclético com influência neoclássico; e o Palacete Jeha

(FIGURA 43) construído em 1934, um representante do estilo Art Decò na Capital.

Ambos foram construídos para abrigar famílias tradicionais da sociedade mineira.

Figura 42: Palacete Falci residência unifamiliar construída no ano de 1929/1930 no estilo

eclético com influência neoclássica.

Figura 43: Palacete Jeha residência unifamiliar construída no ano de 1934 no estilo artdecò.

Fonte: Arqbh Guia de arquitetura de Belo Horizonte. Disponível em:

http://www.arqbh.com.br/2018/05/palacete-falci.html Acesso em: 20/03/2020.

Fonte: Arqbh Guia de arquitetura de Belo Horizonte. Disponível em:

http://www.arqbh.com.br/2018/07/palacete-jeha.html Acesso em: 20/03/2020.

Os palacetes, em sua maioria, apresentavam plantas divididas em

pavimentos separando a área social da área doméstica. A área social apresentava

amplos salões ricamente decorados com móveis e ornamentos, muitos deles

importados; geralmente isolados da área doméstica. Esta tinha como solução o

isolamento das cozinhas que em grande parte se localizavam no térreo, ou seja, nos

fundos da casa; próximo à dispensa e ao quarto dos empregados. Eram ligadas à

sala de jantar ou copa por uma escada separando a zona de serviço e os

empregados do corpo da casa. Essa organização interna, dividida por áreas, assim

como a introdução de novos equipamentos como o exaustor e o fogão americano,

100

atendiam aos quesitos sanitários de limpeza e higiene. Essas cozinhas começavam

a receber eletricidade, água encanada e mais a frente até um fogão a gás. (SILVA,

2008, p. 114).

Belo Horizonte assiste a um crescimento exponencial. De acordo com

Borsagli (2010 s realizados pelo poder público na capital, durante a

década de 1920, proporcionaram o crescimento contínuo da malha urbana de Belo 75 possibilitou a capital, assim como a

quase todos os grandes centros do país; vivenciar um crescimento econômico,

urbano e social que juntamente com a administração do prefeito Juscelino

Kubitschek favoreceu a expansão e a transformação da cidade em metrópole nos

próximos anos. Kubitschek remodela Belo Horizonte com a ajuda do arquiteto Oscar

Niemeyer construindo novos modelos de moradia, reconfigurando as plantas das

casas, deixando marcado o estilo modernista na capital.

Entre os anos de 1940 e 1950 surgem os primeiros arranha-céus e a cidade

assiste a passagem do modelo de casa compacta unifamiliar para os primeiros

projetos de apartamentos como forma corriqueira de alojamento. De acordo com

dos modelos

habitacionais, uma nova tradição na forma de viver, introduzida pela cultura

A verticalização foi um dos aspectos mais marcantes do planejamento urbano

dos grandes centros, causando significativo impacto no uso e apropriação do

espaço. Na década de 1950 foi construído o Conjunto Governador Kubitschek mais

conhecido como Conjunto JK (FIGURA 44) no centro de Belo Horizonte. O projeto,

monumental causou grande impacto na época, afinal a cidade ainda com

características provincianas estava acostumada com a horizontalidade da paisagem

do inicio da sua construção. Mesmo com o já construído Edifico Acaiaca o primeiro

arranha-céu da cidade, de 1943, citado anteriormente; o JK tornou-se uma marca, o

símbolo da modernidade na capital. 75 Era Vargas (1930-1945) Momento político brasileiro em que eclodiu o movimento revolucionário levando Getúlio Vargas (1882-1954) à presidência da República. Vargas foi um militar, advogado e político brasileiro, líder da revolução de 1930 que acabou com a República Velha depondo Washington Luis e impedindo a posse do presidente eleito Julio Prestes em 1° de março de 1930 (Fonte: site Brasil escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/biografia/getulio-vargas.htm. Acesso em: 24/03/2020).

101

Figura 44: Conjunto JK perspectiva da fachada posterior voltada para a Rua dos Timbirás. Belo Horizonte-MG 1951.

Fonte: Site Vitruvius. Disponível em: https://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/20.235/7592. Acesso em: 24/03/2020.

Foi construído divido em duas torres uma com 26 andares e a outra com 36

andares totalizando 1.068 unidades de apartamentos (JUNQUEIRA, 2019). O prédio

mais baixo fora construído apenas para apartamentos residenciais e o mais alto

abrigava além dos apartamentos residenciais algumas lojas comerciais e escritórios

de repartições públicas.

O projeto do apartamento propunha uma planta diferente, que buscavam a

funcionalidade dos ambientes influenciados pela arquitetura modernista americana e

europeia que pregava a racionalização e o melhor aproveitamento dos espaços.

es configurações

internas mostravam organizações inovadoras, que desde o próprio nome já se

mostravam como sendo diferenciadas: o semi-d . Na

distribuição dos espaços, chama-se a atenção aos planos que dividem os ambientes

íntimos e sociais por escadas sem a necessidade do uso dos longos corredores; e

às varandas que possibilitam ao morador um contato com o ambiente externo.

102

Figura 45: Planta dos apartamentos Tipo A (semi-duplex), B e C 1954.

Fonte: Site Vitruvius. Disponível em: https://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/17.196/6224. Acesso em: 24/03/2020.

O modelo semi-duplex, que na Figura 46 ilustra o apartamento Tipo A do

Conjunto JK segundo o folder publicitário da época o descrevia:

Num setor do conjunto você poderá adquirir um tipo também interessante de apartamento. O chamado semi-duplex. Que dá para as duas fachadas do edifício. Sem os inconvenientes do tipo duplex. Que coloca o quarto a três metros do piso das salas. E está mais isolado e independente de toda a vida do conjunto. Terá sala, quarto, banheiro, kitchenette e duas varandas.(FERNÁNDEZ; SOUZA. 2016).

Figura 46: Apartamento semi-duplex do conjunto JK

Fonte: Site Vitruvius. Disponível em: https://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/17.196/6224. Acesso em: 24/03/2020.

O novo ambiente a que o folder se refere denominado Kitchenette - que

significa pequena cozinha; geralmente integrada à sala de jantar modificando o

103

conceito de separação e isolamento do espaço; começaram a ser projetados na

arquitetura modernista. Esse novo layout favorecia a aproximação da mulher com a

família durante a execução das tarefas domésticas, facilitando não só o acesso

como diminuindo o esforço exercido por ela, pois além dos ambientes diminuírem

consideravelmente em detrimento do crescimento demográfico e do novo

planejamento urbano, o fato de ficarem expostos para a área social da casa

demandou um tratamento especial, um embelezamento. Assim, influenciados pela

Cozinha de Frankfurt, os modernistas propuseram novos modelos para as cozinhas

residenciais marcando uma mudança dos ambientes nas plantas de apartamentos

modernistas - a cozinha moderna e racional (HOMEM, 2003, p. 126).

Nesse cenário, a década de 1950 estava fortemente influenciada pelo

american way of life -guerra no EUA voltavam para

casa assumindo as atividades domésticas só que, munidas de muitos equipamentos

elétricos como a geladeira, o fogão, o liquidificador, a enceradeira, a cafeteira, a

batedeira, entre muitas outras opções. Essa mulher que assumia como a

acessórios e armários

coloridos em composições bicolores de tons pastel como ilustram as Figuras 47 e

48.

Figura 47: Cozinha bicolor amarelo e azul 1950. Figura 48: Cozinha bicolor: o uso do branco ainda prevalecia na maioria das cozinhas, por sinalizar

limpeza e higiene 1950.

Fonte: Nostalgiarama. Disponível em:

http://nostalgiarama.blogspot.com/2015/04/cozinhas-dos-anos-50.html. Acesso em: 27/03/2020.

Fonte: Nostalgiarama. Disponível em: http://nostalgiarama.blogspot.com/2015/04/cozinh

as-dos-anos-50.html. Acesso em: 27/03/2020.

O ponto forte do projeto era a integração da cozinha com o corpo da casa que

geralmente era dividido por uma bancada mais alta onde eram realizadas as

refeições rápidas como o café da manhã conforme ilustra a Figura 49. Esse

104

compartilhamento, além de aproximar a família, permitia a mulher, mãe e esposa

acompanhar ao dia-a-dia dos filhos como mostra a Figura 50.

Figura 49: Modelo de cozinha compartilhada refeições rápidas na bancada 1950.

Figura 50: Modelo de cozinha compartilhada integração familiar 1950.

Fonte: Nostalgiarama. Disponível em:

http://nostalgiarama.blogspot.com/2015/04/cozinhas-dos-anos-50.html. Acesso em:

27/03/2020.

Fonte: Nostalgiarama. Disponível em: http://nostalgiarama.blogspot.com/2015/04/cozinhas-

dos-anos-50.html. Acesso em: 27/03/2020.

O modelo da cozinha permitia várias configurações espaciais que vão se

ajustar ao espaço. Na virada da década de 1950 para 1960, os projetos de cozinha

no Brasil, seguiam a composição triangular marcado pela conexão dos três

elementos de trabalho principal, ou seja, de maior uso na cozinha que são: a

geladeira, o fogão e a pia. Essa proposta respondia às questões ergonômicas76

mantendo os princípios da otimização e da racionalização das tarefas proposto pela

Cozinha de Frankfurt. Essas configurações poderiam ser: o modelo de cozinha

linear, onde a área de trabalho principal, conforme ilustra a Figura 51, fica em linha

reta sendo a pia instalada no centro entre o fogão e a geladeira, sempre que

possível embaixo da janela e de preferência, o fogão instalado ao lado direito da pia

facilitando o acesso durante a sua manipulação; muito comum em ambientes muito

pequenos.

76 Ergonomia Ciência que estuda a interação entre homem e máquina, onde o objetivo principal é a eficiência ideal obtida dessa interação. (BAXTER, Mike. Projeto de Produto. São Paulo: Ed. Blucher, 1998.).

105

Figura 51: Planta ilustrativa de um modelo de cozinha linear.

Fonte: Banco de dados da autora.

Nele a pia continua centralizada e o fogão também instalado, preferencialmente, do

lado direito da pia. A também é uma configuração utilizada em

ambientes menores, porém exige uma largura mínima capaz de acomodar com

segurança o fogão ou a geladeira (FIGURA 52).

Figura 52

Fonte: Banco de dados da autora.

Outro modelo muito utilizado é o modelo Corredor. Esse modelo ajusta-se

bem em ambientes pequenos onde a área de trabalho fica separada por um corredor

central, ou seja, as bancadas são instaladas em paralelo conforme mostra a Figura

53. Nessa configuração a pia fica de preferência em uma bancada separada em

frente ao fogão.

106

Figura 53: Planta ilustrativa de um modelo de cozinha corredor.

Fonte: Banco de dados da autora.

Para ambientes maiores, pode-

bancada é instalada aproveitando três paredes do ambiente e cada um dos pontos

de trabalho fica acomodado em uma bancada possibilitando maior espaço na área

de manipulação de acordo com a Figura 54.

Figura 54

Fonte: Banco de dados da autora.

107

Outra opção de configuração mais moderna e muito usada em cozinhas que

possibilitam o layout conjugado com a sala é o modelo de ilha (FIGURA 55). Aqui o

fogão se desloca para o centro do ambiente formando uma ilha, separado da

bancada ou acoplado ao balcão que divide os ambientes. Na Figura 56 é possível

visualizar em projeção um projeto onde a ilha fica centralizada entre as bancadas.

Figura 55: Planta ilustrativa de um modelo de cozinha em ilha.

Figura 56: Modelo de cozinha compartilhada fogão de ilha 1950.

Fonte: Banco de dados da autora. Fonte: Nostalgiarama. Disponível em: http://nostalgiarama.blogspot.com/2015/04/cozinha

s-dos-anos-50.html. Acesso em: 27/03/2020.

Nesse período, além dos armários coloridos e das cortinas estampadas,

usava-se muito a azulejaria decorativa como revestimento para as paredes. Eram

azulejos estampados com motivo florais ou desenhos de elementos utilizados na

cozinha como bules, frutas e legumes conforme ilustram as Figuras 57 e 58. Eram

peças coloridas que adornavam as paredes e compunham o ambiente. Uma

herança portuguesa que permeou forte até os anos de 1980 onde predominaram os

padrões geométricos e abstratos, influência do movimento pop art. De acordo com

Machado (2011, p.

arte moderna em espaços convencionais e públicos, inserindo-se na esfera urbana,

108

Figura 57: Cozinha revestida com azulejos em motivo floral 1960.

Figura 58: Cozinha revestida com azulejos em estampa de legumes 1960.

Fonte: Nostalgiarama. Disponível em:

http://nostalgiarama.blogspot.com/2015/04/cozinhas-dos-anos-50.html. Acesso em: 27/03/2020

Fonte: Nostalgiarama. Disponível em: http://nostalgiarama.blogspot.com/2015/04/cozinh

as-dos-anos-50.html. Acesso em: 27/03/2020

Ainda na década de 1960 surge nos EUA e na Europa, um novo modelo de

moradia que ficou conhecido como loft. O modelo surgiu a partir do aproveitamento

de velhos edifícios comerciais que por algum motivo não serviam mais a demanda

do mercado, como por exemplo, sua localização. Esses espaços eram, em sua

maioria, galpões, armazéns ou depósitos que ficavam localizados em bairros

industriais. O amplo espaço e o pé direito alto favoreciam a criação de ambientes

totalmente compartilhados sendo divididos apenas por mobiliários estrategicamente

posicionados. Em alguns casos, por terem o pé direito duplo propunha-se a

construção de mezaninos que geralmente acomodavam o dormitório. No caso da

cozinha, essa se tornou um destaque no projeto; geralmente no modelo Kitchenette,

ficava embaixo do mezanino e totalmente integrada à sala exigindo uma

ambientação que valorizasse o espaço e pudesse ser exibida. Assim foram criados

projetos inusitados, que acabaram se tornando modernas residências e deu origem

ao estilo industrial de decoração.

Esse estilo, assim como esse modelo de cozinha rapidamente se difundiu

para outros países sendo adaptado à realidade local. No Brasil chegou no início da

década de 1970 com o nome de cozinha americana, sendo muito bem aceito pelos

arquitetos e designers de interiores por possibilitar imprimir um estilo ao ambiente

que geralmente acompanhava a tendência da indústria somada a identidade do

cliente. Afinal, em Belo Horizonte, nessa época, assim como nos grandes centros do

109

país; havia um intenso crescimento populacional que acabou aumentando a procura

por imóveis. A especulação imobiliária acarretou no aumento do preço do metro

quadrado na capital e consequentemente houve uma diminuição do tamanho das

residências e a planta da cozinha sofre uma alteração se adaptando muito bem ao

conceito da cozinha americana.

Nesse cenário, percebeu-se uma diminuição das ações no espaço doméstico.

De acordo com Machado (2011, p.

trabalho e seu novo papel na sociedade, desempenhando uma dupla jornada,

acumulam-se os trabalhos doméstico e profissional . Consequentemente as

atividades na cozinha passaram a ser desenvolvidas e pensadas de maneira prática

e funcional a fim de reduzir ao máximo o tempo gasto.

Com o desenvolvimento da tecnologia e a propagação do lifestyle americano

que priorizava a conveniência deixando tudo às mãos, são lançados pela indústria

os alimentos congelados; e emergem os fast foods e os deliverys, que juntos,

levaram ao distanciamento das cozinhas por parte das pessoas. Fora que, de

acordo com Risério (2015, p. o divórcio entre o local de moradia e

local de trabalho profissional remunerado que começou com a sociedade burguesa

u, cada vez

mais, as mulheres para trabalhar fora de sua residência, resultando em um

distanciamento que condenou a mulher ao isolamento.

A cozinha passa a ser um depositário de traquitanas eletrônicas fruto da

sociedade capitalista onde os eletrodomésticos assumem um papel essencial não só

pela função, mas também pela sua estética, ou seja, eles passam a ser exibidos.

Nesse momento a produção industrial está em franco crescimento, favorecida pelo

capitalismo; e o design desponta no Brasil marcando sua presença e desenvolvendo

produtos com identidade e conceito; afinal, nos EUA, desde a década de 1920, que

de acordo com Fusco (2019, p. industrial design

para indicar a representação de todos aqueles objetos que requerem um projeto

acurado, e [...], nos anos de 1930, nasce a profissão de designer .

e funcionalidade, surgindo assim às primeiras empresas especializadas em cozinhas moduladas. Aparecem novos materiais para revestimentos, mobiliário adequado, iluminação apropriada, exaustão, em suma, uma gama

110

de inovações que atingiu seu apogeu na década de 1970. Os estratos sociais mais abastados, atentos às novidades tecnológicas, procuravam ter

american way of life. (MACHADO. 2011, p. 121).

Desse modo o final do século XX assiste a uma mudança no comportamento

de consumo ocasionada por essa nova sociedade construída nos preceitos

americanos, que aos poucos foi introduzindo costumes como as lojas delicatessen e

os serviços dos deliverys, pois se percebeu que as atividades domésticas não

diminuiriam como era proposto nas décadas de 1960/1970. De acordo com Risério

(2015, p.

Sendo assim, ficou evidente que houve

transformações quanto à cozinha e seu uso.

Nas residências das pessoas menos favorecidas economicamente, a maioria

das atividades cotidianas é realizada no ambiente da cozinha assim como na classe

média as pessoas costumam se reunir ao redor do fogão conversando enquanto

preparam a refeição. Sendo assim, no final da década de 1990 a cozinha passa a

ser um espaço de socialização (MACHADO, 2011, p. 121). Entretanto nas

residências dos mais favorecidos ainda se mantêm um certo isolamento da área

doméstica, mantendo a cozinha distante do convívio da casa. Porém, com a difusão

da gastronomia que acabou por gourmetizar a sociedade houve um crescimento dos

espaços gourmet nessas residências.

A entrada no homem na cozinha acontece na virada do século XX para o

século XXI paralelo a disseminação da cultura da gastronomia. De acordo com

Risério (2015, p.

masculino

sentido prima-se pela supervalorização do fazer masculino em detrimento ao

improvis

espaço condizente com sua arte, e, assim como toda arte precisa ser exposto.

Como resposta, a partir dos anos 2000; vão surgir nas varandas das

residências do estrato mais abastado da sociedade, o chamado espaço gourmet ou

varanda gourmet. Antes eram utilizadas para se manter um contato com a área

externa; agora passam a ser fechadas por vidros e transformadas em mini cozinhas

de luxo, com acessórios de última geração e na maioria das v

111

homens, para exporem sua arte de cozinhar conforme afirma Risério (2015, p. 150)

fogão, os homens agiam como artistas conscientes de sua arte, da mesma maneira

A cultura gourmet lançou muitos programas culinários que acabou

disseminando o gosto por cozinhar. Esse novo hobby não se tornou apenas um luxo

masculino, as mulheres também aderiram à cozinha gourmet, ou seja,

redescobriram o prazer de cozinhar, sem a obrigação imposta e para esse novo

ambiente envolto pela socialização e convívio; uma variedade de materiais de

revestimento e uma linha de eletrodomésticos de alta tecnologia, automatizados e

com um conceito inovador foi lançado pela indústria.

No campo dos revestimentos e dos materiais de acabamento os antigos pisos

de cerâmica deram lugar aos pisos de porcelanato77 assim como os granitos e o

quartzo que deram um ar mais sofisticado para as bancadas assumindo o conceito

de personalização e exclusividade, muito difundido no século XXI. Portanto,

encontram-se nas residências mais abastadas, duas cozinhas sendo de acordo com

Machado (2011, p.

doméstica no dia-a-dia. A segunda, uma cozinha exclusiva, a do gourmet,

integrando a parte social da casa à vida dos

3.2 Racionalização das tarefas a otimização dos espaços de trabalho

através dos objetos e o design no ambiente das cozinhas no começo do

século XX:

A otimização das tarefas domésticas assim como a redução lógica proposta

pela engenharia de eficiência reduziu não somente os espaços da cozinha como

redesenhou suas operações abrindo espaço para o desenvolvimento de um novo

tipo de habitação, que de acordo com Silva (2007, p.

. Assim, a busca incessante por tempo e a luta pela libertação

feminina que ocorreu na virada do século XIX para o século XX despertou na

77 Porcelanato Produto cerâmico para revestir pisos e paredes fabricado a partir de uma combinação de quartzo, argila que se moldam e são prensados se submetendo a um processo de secagem e tratado a uma temperatura de mais de 1.300° C, tornando o produto altamente resistente. (Fonte: Conceito De. Disponível em: https://conceito.de/porcelanato. Acesso em: 28/03/2020).

112

indústria a vontade de investir em pesquisas que projetassem novos produtos

capazes de reduzir o esforço e até quem sabe substituir a mão-de-obra humana.

Dessa forma fabricantes de aparelhos eletrodomésticos foram estimulados a criarem

e desenvolverem novas tecnologias para atingir a simplificação das tarefas

cotidianas resultando em uma nova forma de morar, ou seja, casas concebidas

2010, p. 37).

As atuações cotidianas dentro de casa são inúmeras. Sua quantidade sempre foi muito variável no tempo e no espaço e a sua tendência é diminuir com o progresso. Hoje, dezenas de ações deixaram de ser exercidas no lar devido às providências da indústria, tanto no que diz respeito às necessidades do passadio do dia a dia como às condições técnico-construtivas. E o que caracteriza uma casa de um povo determinado ou de uma região, ou, ainda, de uma classe social, é o conjunto de critérios que regem a superposição ou a distribuição de atividades diferentes dentro de um mesmo espaço. (LEMOS, 1989 apud RISÉRIO, 2015, p. 144).

Na primeira metade do século XX, a indústria produzia cada vez mais,

acelerada pela eletricidade que veio substituir o vapor consagrando-se como um dos

maiores símbolos da modernidade (FARIAS; AYROSA; CARVALHO; ABRAMOVITZ;

FRAIHA, 2006, p. 18). A eletricidade assim com o gás, juntos, abriram as portas da

indústria para o mundo favorecendo a mecanização das casas e estimulando a

mudança no

Os aparelhos que hoje denominamos eletrodomésticos são filhos diletos da Revolução Industrial. Esses artefatos, presença obrigatória em quase todos os lares modernos, representam mais um grande passo no processo de mecanização e agilização do trabalho doméstico. (FARIAS et al., 2006, p.20).

De acordo com Lemos (1989, p.

dependências e reduzindo a enorme lista dos componentes dos programas de

A indústria nacional, que

se desenvolveu estimulada pela 1ª Guerra Mundial78; se popularizou a partir da

78 A 1ª Guerra Mundial (1914-1918), um conflito que ocorreu na Europa envolvendo grandes potências mundiais que se organizaram em duas alianças opostas onde, de um lado os aliados (França, Rússia e Reino Unido) contra a Alemanha e a Áustria-Hungria. Esse conflito dificultou a importação de produtos da Europa, devido ao alto custo dos produtos estrangeiros. Para reparar, alguns itens foram importados dos EUA como vidro e móveis abrindo precedente a americanização brasileira. No segmento da construção civil e do design de interiores houve uma grande influência do cinema e das revistas de arquitetura e decoração que aos poucos mudaram inclusive a nomenclatura dos ambientes nascem os livings, os halls e as kitchenettes. Nesse contexto muitos produtos não foram suprimidos levando a indústria nacional a se ver obrigada a desenvolver e produzir esse material (LEMOS, 1989, p. 62-66).

113

american way

of life importado dos EUA pelo cinema e pela publicidade das revistas. Esse novo

estilo de vida, americanizado, apresenta o eletrodoméstico como peça central e

símbolo do status social. De acordo com Farias et al.

, onde novos hábitos foram sendo

incorporados no cotidiano das famílias e a moradia ganhou novas configurações e

novos artefatos; sendo lançados no mercado uma gama de eletrodomésticos como o

ferro de passar roupas, a geladeira, o fogão, a enceradeira, o liquidificador, o rádio e

as TVs que acabaram por modificar o dia-a-dia das donas de casa.

Esses eletrodomésticos incorporaram-se ao ambiente da cozinha racional e

juntamente com a criação de um projeto para o ambiente, possibilitou o

desenvolvimento de espaços mais limpos, organizados, funcionais e com apelo

estético; que somado à tecnologia, constituíram a cozinha moderna. O projeto da

nova cozinha se desenvolveu juntamente com a expansão urbana; que apoiado pelo

modelo da Cozinha de Frankfurt e pelos princípios da gestão científica que pregava

uma melhor coordenação de movimentos, muito em voga nos EUA foi redesenhada

em torno dos novos equipamentos, novos modelos de mobiliários priorizando a

economia de espaços e a melhor coordenação das tarefas (SILVA, 2008, p. 114),

instituindo uma área de trabalho principal onde: o fogão, a geladeira e a pia foram

articulados de maneira a priorizar a entrada da luz natural (HOMEM, 2003, p. 128).

A indústria brasileira de eletrodomésticos, que se desenvolveu escoltada pela

1ª Guerra Mundial, resultado do elevado custos das importações, cresceu e se

desenvolveu estimulada pelo consumo dos artefatos do lar (FARIAS et al., 2006, p.

67). Assim, empresas como a Dako que produziu o primeiro fogão no Brasil,

assistidas pelas universidades que formaram os primeiros profissionais no país,

introduziram o conceito de design imprimindo uma estética aos produtos nacionais.

Sendo assim a história dos produtos made in Brasil começa a ser contada.

3.2.1- Os principais eletrodomésticos da cozinha A história do fogão

A história do fogão associa-se ao discurso do fogo, em grande parte das

civilizações antigas as casas eram construídas ao redor da lareira onde o fogo servia

como aquecimento, como higiene esquentava-se a água para o banho, e

principalmente para o cozimento conforme relatado anteriormente. De acordo com

114

Wilson (2014, p.

. A tarefa de cozinhar, uma das mais antigas do

mundo, foi o momento decisivo da evolução humana, pois o alimento cozido

aumenta seu valor nutritivo favorecendo a digestão e o melhor aproveitamento dos

nutrientes pelo organismo, consequentemente o cérebro pode se desenvolver e o

homem se tornou plenamente humano (WILSON, 2014, p. 104).

Desde então, se assiste ao uso da lareira como meio para o cozimento e o

aquecimento das casas. Porém, com a descoberta do vapor e consequentemente a

possibilidade de se cozinhar por meio da água fervente, foram criados recipientes

capazes de suportar o calor do fogo para cozinhar o alimento. Assim, houve uma

compreensão da necessidade de entender como concentrar calor para um melhor

aproveitamento deste no cozimento. Percebeu-se que um compartimento fechado

em torno do fogo aumentava sua capacidade de potencialização da chama

diminuindo a perda de calor, assim fora necessário fazer aberturas específicas de

modo a acomodar a panela sobre o fogo permitindo que o calor se concentrasse,

sem se dispersar, e o alimento cozinhasse.

A utilização da água para cozinhar possibilitou não somente a criação de

utensílios como também, chegou-se ao desenvolvimento do fogão. Em 1630, surge

o primeiro modelo de fogão de ferro na Inglaterra, aquecido com carvão, porém o

compartimento não absorvia bem o calor e o alimento não cozinhava por igual,

ficando parte cozida, parte queimada e parte crua.

No século XVIII, a preocupação com a limpeza e a higiene em detrimento da

saúde pública se tornou prioridade, visto que, conforme cita uma reportagem do

jornal O Vulgarisador79 de 10 de novembro de 1878:

Reconhecendo-se que os alimentos ruins e a sua defeituosa preparação, eram causa de muitas enfermidades, que affectam especialmente o

79 O Vulgarisador Jornal dos conhecimentos úteis de 1877-1880. Foi editado no Brasil pelo escritor, poeta e jornalista português radicado no Brasil em 1850 Augusto Emílio Zaluar (1825-1882). O jornal contou com 38 números publicados e 37 ilustrações, e diferente de outras publicações que circulavam no país no século XIX, como a Revista Ilustrada e o Almanack Leammert, o jornal que possuía esse sugestivo nome de O Vulgarisador pode ser considerado uma revista com recursos visuais rústicos e de pouca definição, se comparado com os demais periódicos. Fonte: Jornal O Vulgarisador. Disponível em: http://site.mast.br/ovulgarisador/jornal.phpAcesso em: 28/03/2020.

115

aparelho digestivo, procurou-se obviar a estes inconvenientes, vigiando não somente a natureza dos alimentos e más condições de salubridade, como fabricando utensílios apropriados, em que melhor podessem ser manipulados e sujeitos sem perigo ao trabalho digestivo. (O VULGARISADOR, 1878, p. 234).

Assim sendo, o fogão foi o utensílio da cozinha que recebeu maior atenção

por parte dos inventores e engenheiros. Em 1802, aconteceu a primeira tentativa de

modernização do modelo criado em 1630, o inglês George Bodley80 criou o modelo a

gás em ferro fundido com apenas quatro acendedores e um forno com aquecimento

regular, ainda sim, eram modelos pesados, grandes, que consumiam muito para

manter o calor.

No começo da década de 1810, já se utilizava na Inglaterra com mais

frequência o gás. Esse era obtido através da queima de carvão e usado para

acender os lampiões e iluminar as vias púbicas. Em 1826, James Sharp81 patenteia

o primeiro modelo de fogão a gás ilustrado na Figura 59, este viria a ter êxito no

mercado inglês. O fogão em folhas de ferro tinha como função principal assar o

alimento. Possuía um queimador na parte inferior do forno e suas paredes internas

foram projetadas com chapas separadas para facilitar a circulação do ar e arrefecer

o fogão. Esse modelo como protótipo foi testado na residência de James Sharp

sendo lançado para o mercado pela firma William Lankester & Son of Southampton

no ano de 1937.

80 George Bodley Inglês foi o inventor do primeiro fogão a gás no ano de 1802. Porém os primeiros fogões desse tipo existentes eram perigosos e explodiam com facilidade por causa da instabilidade da quantidade de gás que passava para suas bocas. (Fonte: Books. Disponível em: https://books.google.com.br/books?id=qxSJDwAAQBAJ&pg=PA25&lpg=PA25&dq=George+Bodley+fog%C3%A3o&source=bl&ots=URSYU8Xabu&sig=ACfU3U238IeG05AK-TlovmVBUpDKmL_0BA&hl=pt- Acesso em: 03/07/2020). 81 James Sharp (1790-1870) Diretor adjunto da Northampton Gas Light Company empresa responsável pela distribuição de gás na Inglaterra de 1823 a 1949. (Fonte: Books. Disponível em: https://books.google.com.br/books?id=qxSJDwAAQBAJ&pg=PA25&lpg=PA25&dq=George+Bodley+fog%C3%A3o&source=bl&ots=URSYU8Xabu&sig=ACfU3U238IeG05AK-TlovmVBUpDKmL_0BA&hl=pt-BR&sa=X&ved=2ahUKEwji5IfzurTqAhVGHrkGHaONBTUQ6AEwAXoECAoQAQ#v=onepage&q=George%20Bodley%20fog%C3%A3o&f=false. Acesso em: 03/07/2020).

116

Figura 59: Fogão a gás de ferro criado por James Sharp Inglaterra 1826.

Fonte: História do fogão a gás. Disponível em: http://capsilva.blogspot.com/2009/02/historia-do-fogao-gas.html. Acesso em 28/03/2020.

Com o tempo, estudos e pesquisas aprimoraram o projeto dos fogões

ingleses, levando ao lançamento em 1877 nos EUA, dos fogões de ferro fundido

Casserls ilustrado na Figura 60. A indústria investiu em pesquisas científicas,

industriais e até artísticas para obter o resultado que deu destaque a indústria

americana na época. Os maiores desafios da marca era equilibrar o preço com o

desempenho conforme cita o jornal O Vulgarisador (1878, p.

primeiramente estudar o modo de espalhar com igualdade e por toda parte

simultaneamente o combustível. [...] conseguindo este melhoramento, era preciso

que o novo utensílio estivesse pela modicidade de seus preços ao alcance de todas

117

Figura 60: Fogão de ferro fundido de Casserls - modelo Uncle Sam 06 furos de 1877 EUA

Fonte: Jornal O Vulgarisador. Disponível em: http://site.mast.br/ovulgarisador/pdf/OVulgarizador.pdf Acesso em: 28/03/2020.

Esse modelo passou por diversas modificações técnicas, científicas e até

mesmo estéticas vencendo vários desafios até chegar ao modelo ideal. A partir dos

estudos e testes realizados no produto, obteve-se como resultado principal, um

melhoramento no seu desempenho, conseguindo distribuir simultaneamente o calor

pelos furos onde eram colocadas as panelas, conservando melhor a caloria e

obtendo um cozimento ideal para os alimentos, além de diminuir o desgaste do

combustível que era lenha ou carvão. O segundo grande desafio a ser vencido foi

o custo final do produto. Era importante que o mesmo fosse acessível a todas as

classes sociais da época, afinal o grande objetivo era um melhoramento na

qualidade de vida das pessoas através da alimentação salubre (O VULGARIZADOR,

1878, p. 235).

Assim sendo, foi desenvolvida uma variedade de tamanho de produtos que

facilitava o acesso de acordo com o espaço disponível e a quantidade de furos

necessária para atender à família, ou seja, famílias menores, menor quantidade de

panelas no fogão economizando espaço e combustível conforme ilustram as Figuras

61 e 62.

118

Figura 61: Fogão de ferro fundido de Casserls - Modelo Gazeiro - 05 furos com forno e depósito

para água.

Figura 62: Fogão de ferro fundido de Casserls -Modelo Sinhá - 02 furos para famílias de 03 a 05

pessoas.

Fonte: Jornal O Vulgarisador. Disponível em:

http://site.mast.br/ovulgarisador/pdf/OVulgarizador.pdf Acesso em: 28/03/2020.

Fonte: Jornal O Vulgarisador. Disponível em: http://site.mast.br/ovulgarisador/pdf/OVulgarizado

r.pdf Acesso em: 28/03/2020.

Foram projetados com todas as suas peças deslocadas e acondicionadas

facilitando o transporte, a montagem e a limpeza.

ponto de vista estético e mais flexíveis do ponto de vista da funcionalidade e

usabilidade. Em plena revolução Industrial, pode-se dizer que foi um produto

desenvolvido de acordo com os princípios do design no século XVIII, ocasião na

qual ainda não se falava em design industrial (O VULGARIZADOR, 1878, p. 235).

Interessante destacar que, ainda segundo o jornal O Vulgarisador (1878, p. 235)

es foram apreciados de tal modo na exposição atual de Paris, que o jury

lhe conferiu a única medalha de ouro, destinada a servir de primeiro prêmio aos

.

O desenvolvimento da indústria do ferro possibilitou o surgimento dos mais

variados modelos de fogão nos EUA e na Europa em meados do século XIX, mas

ainda assim se difundiram de forma lenta (SILVA, 2008, p. 123). Mas, de acordo

com Cowan (1985, p. 53 apud A evolução do fogão aconteceu

num curto espaço de tempo, no final do século XIX, associada a pesquisas de novas

formas de concentração crescente do calor . Na virada do século XIX para o século

XX, ocorreu um grande crescimento por meio do desenvolvimento das companhias

de gás e de eletricidade que popularizaram novos combustíveis para o uso

doméstico (SILVA, 2008, p. 123), levando ao surgimento de novos modelos de fogão

119

como O Metropolitan de 1910 ilustrado na Figura 63, um modelo a gás de ferro

fundido de aparência rústica e industrial, de difícil operação.

Figura 63: Fogão a gás de ferro fundido Modelo O Metropolitan Inglaterra 1910.

Fonte: TAMBINI, 2004, p. 66.

A década de 1920, com a expansão da eletricidade surgiram os primeiros

exemplares de fogão elétrico, como o modelo criado em 1922 por Gustaf Dàlen82 e

lançado em 1929 na Inglaterra pela AGA Fogões. O projeto imitava o modelo dos

fogões a gás lançados anteriormente, sua queima de combustível era constante

permitindo reter e controlar o calor de maneira que se pudesse cozinhar bem em

seus vários fornos e queimadores, foi produzido com acabamento esmaltado e

recebeu acendedores elétricos conforme ilustra a Figura 64. Ao lado, na Figura 65,

segue uma ilustração da época destacando a versatilidade do produto.

82 Nils Gustaf Dàlen (1869-1937) Engenheiro sueco, ganhador do prêmio Nobel de Física de 1912 pela criação, em 1906, de um procedimento de iluminação automática para faróis de acetileno. Foi o fundador da fábrica de fogões AGA. Fonte: Site EcuRed. Disponível em: https://www.ecured.cu/Nils_Gustaf_Dal%C3%A9n. Acesso em: 29/03/2020.

120

Figura 64: Fogão com acabamento esmaltado e acendedores elétricos Modelo AGA 1929

Inglaterra 1929.

Figura 65: Ilustração da versatilidade do modelo de fogão elétrico AGA 1929 Inglaterra.

Fonte: TAMBINI, 2004, p. 66. Fonte: TAMBINI, 2004, p. 66.

No final dos anos de 1920 e começo dos anos de 1930 os eletrodomésticos

chegaram ao Brasil importados da Europa e dos EUA. De acordo com Farias et al.

ampliação do consumo de eletrodoméstico s casas

mais ricas, com a produção em massa, aos poucos foram se popularizando, assim,

de acordo com Tambini (2004, p. -se um padrão cuja popularidade

Ao contrário da Europa e dos EUA, aqui no Brasil o fogão derivou

principalmente do fogão à lenha que era feito de barro ou alvenaria e localizava-se

no quintal das casas (SILVA, 2008, p. 123). Mesmo em processo de modernização,

os grandes centros do país ainda esbarravam em casas que utilizavam esses fogões

à lenha como ilustrado na Figura 66. A maioria da população, da camada mais

pobre da sociedade, moradores dos bairros de periferia, ainda cozinhava nos fogões

a lenha como uma herança do Brasil rural. Nas casas mais abastadas já se

utilizavam o fogão a carvão, modelos importados conforme ilustra a Figura 67 já se

tornara objeto de desejo e consumo das donas de casa do começo do século no

país.

121

Figura 66: Modelo fogão a lenha - começo do século XX.

Figura 67: Modelo fogão a carvão ou a lenha início do século XX.

Fonte: Site All Posters. Disponível em:

https://www.allposters.com/-sp/Woman-Stands-at-Old-Fashioned-Stove-to-Cook-Cats-Prowl-at-Her-

Feet-Posters_i6101151_.htm. Acesso em: 29/03/2020.

Fonte: Site All Posters. Disponível em: https://www.allposters.com/-sp/Woman-

Stands-at-Old-Fashioned-Stove-to-Cook-Cats-Prowl-at-Her-Feet-

Posters_i6101151_.htm. Acesso em: 29/03/2020.

No ano de 1935, foi inaugurada na cidade de São Paulo a Sociedade Dako do

Brasil fundada por Joaquim Gabriel Penteado83. Seu Joá, como era conhecido,

adquiriu uma fábrica paulista de fogões, a Dako, que estava praticamente

desativada. Estimulado pelos aquecedores de carvão que movia os trens a vapor,

lançou o primeiro modelo de fogão a carvão do país, o modelo Piloto ilustrado na

Figura 68; que impulsionou as vendas e se popularizou consolidando a marca no

mercado nacional. A produção da fábrica, que também produzia fogões a lenha para

atender as classes mais populares, produzia trinta e cinco unidades por mês do

modelo Piloto que trabalhava com carvão de dupla combustão. Este fora fabricado

em ferro com desenhos decorativos e texturas imitando madeira.

83 Joaquim Gabriel Penteado ( ) Mais conhecido como Joá Penteado, adquiriu em 1935 a fábrica de fogões Dako, que na época estava praticamente desativada. A indústria que se situava em São Paulo foi transferida para a cidade de Campinas SP, onde teria condições mais favoráveis ao seu crescimento. (Fonte: Imagens de Campinas. Disponível em: https://www.facebook.com/imagensdecampinas/photos/jo%C3%A1-penteado-empres%C3%A1rio-de-sucesso-nomeia-t%C3%BAnel-de-campinasum-dos-maiores-empres/492989180743379/ . Acesso em; 02/07/2020).

122

Figura 68: Fogão a carvão de dupla combustão da Indústria Dako Modelo Piloto Brasil 1937.

Fonte: FARIAS et al., 2006, p. 55.

As Indústrias Dako, além dos fogões a lenha e a carvão, na segunda metade

da década de 1940, lançou os modelos elétricos conforme ilustram as Figuras 69, 70

e 71.

Figura 69: Fogão elétrico Dako Brasil 1945. Figura 70: Fogão elétrico Dako Modelo Bifiteira Brasil 1947.

Fonte: FARIAS et al., 2006, p. 58. Fonte: FARIAS et al., 2006, p. 56.

123

Figura 71: Fogão elétrico Dako Brasil 1949.

Fonte: FARIAS et al., 2006, p. 56.

Já em 1950, estimulados pela Segunda Guerra Mundial que dificultou a

importação, outras empresas se fundem no Brasil como a Wallig, a Semer e a

Fundição Brasil, iniciando a produção dos fogões domésticos lançando os modelos a

gás conforme ilustra a Figura 72.

Figura 72: Fogão a gás da Fundição Brasil Brasil 1950.

Fonte: FARIAS et al., 2006, p. 58.

Esses modelos foram produzidos no período em que o gás de cozinha

124

Os fogões a gás, por sua vez, surgem na década de 1950, quando a Petrobras inicia a produção de GLP gás liquefeito do petróleo -, o popular gás de cozinha. O mercado para fogão a gás cresceu rapidamente, levandoao quase total desaparecimento, nas cozinhas residenciais urbanas, dos fogões a carvão e os elétricos. (FARIAS et al., 2006, p. 50).

A década de 1960 foi o marco da introdução do design na indústria de

eletrodoméstico nacional. A marca Wallig, fundada em Porto Alegre no ano de 1904,

convidou o designer gaúcho José Carlos Bornancini84 para criar um novo conceito

de fogão. A proposta era repensar a forma e a funcionalidade dos fogões da marca

(FARIAS et al., 2006, p. 107), que acabou dando origem ao modelo Nordeste

ilustrado nas imagens 73 e 74.

Figura 73: Fogão a gás Wallig Modelo Nordeste Brasil 1963.

Figura 74: Campanha publicitária do fogão a gás Wallig Modelo Nordeste Brasil 1963.

Fonte: Site Propaganda de todos os tempos. Disponível em:

http://propagandasdeontemedehoje.blogspot.com/2018/10/1968-fogao-wallig.html . Acesso em:

29/03/2020.

Fonte: Site Propaganda de todos os tempos. Disponível em:

http://propagandasdeontemedehoje.blogspot.com/2018/10/1968-fogao-wallig.html . Acesso em:

29/03/2020.

84 José Carlos Mário Bornancini (1923-2008) Engenheiro e designer formou-se em engenharia civil em 1946 pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) . Durante muito tempo lecionou na Faculdade de Arquitetura e no Departamento de Expressão Gráfica da UFRGS até que em 1952 ajuda a criar o núcleo autônomo de Arquitetura da UFRGS para desenvolver pesquisas de integração entre arte e técnica. Nesse período, Bornancini trabalha com design. A partir de 1963 trabalha em parceria com o arquiteto Nelson Ivan Petzold (1931-2008) prestando serviços para a marca de acordeões Todeschini cujo objetivo era desenvolver uma pesquisa visando o setor moveleiro. A parceria entre Bornancini e Petzold modifica a forma de projetar do país levando ambos a se tronarem referência no design nacional. (Fonte: Enciclopédia Itaú Cultural. Disponível em: http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa486967/jose-carlos-mario-bornancini. Acesso em: 29/03/2020).

125

O modelo contou com os estudos ergonômicos para adaptá-lo a realidade da

mulher brasileira. Bornancini buscou em seus estudos ouvir as mulheres, a fim de

entender exatamente quais eram suas necessidades e o que mais valorizavam em

um fogão, conforme demonstra a campanha publicitária ilustrada na Figura 75.

Sendo assim, o fogão Nordeste lançado em 1963, foi tão bem aceito no mercado

brasileiro ganhando em 1968 o prêmio de desenho industrial no IV° Salão de

Arquitetura do Rio Grande do Sul.

Figura 75: Campanha publicitária do fogão Wallig modelo Nordeste 1968.

Fonte: Site Propaganda de todos os tempos. Disponível em: http://propagandasdeontemedehoje.blogspot.com/2018/10/1968-fogao-wallig.html . Acesso em :

29/03/2020.

Nas três últimas décadas do século XX, marcada pela globalização mundial,

onde se presenciou a popularização do computador somada à chegada da internet,

a Itália, ainda o epicentro do design mundial, adere ao movimento pós-modernista85

que buscava romper com o elitismo modernista e popularizar o erudito tornando o

intelectual acessível (TAMBINI, 2004, p. 24).

85 Pós-modernismo -modernismo se desenvolveu a partir da contestação ao modernismo arquitetônico nos anos 1970. Na década seguinte -

Ismos para entender a arte. São Paulo. Editora Globo, 2010.).

126

A década de 1970 ficou marcada pelas cores e estampas do movimento pop

art que influenciou o design mudando o projeto dos produtos antes influenciados

pela forma espacial tão difundido nas décadas de 1950 e 1960. Os modelos de

eletrodomésticos como os fogões e geladeiras ganharam cores mais intensas como

o azul, o vermelho e o amarelo como ilustra a imagem 76.

Figura 76: Fogão Semer de 06 bocas Brasil 1970/1980.

Fonte: Site Coisas antigas. Disponível em: http://vfcoisasantigas.blogspot.com/2013/07/marcas-extintas.html. Acesso em: 29/03/2020.

Já as duas últimas décadas do século XX, os anos de 1980 e 1990 assistem

ao avanço tecnológico que mudaram drasticamente os processos de produção e o

consumo. O design voltado para as necessidades defendido na conferência

internacional de 1976 em Londres assinalava que o design deveria agir em prol do

meio ambiente pensando no bem estar social e ambiental principalmente dos países

subdesenvolvidos. Nesse momento, a indústria de eletrodoméstico deixa para trás o

colorido dos anos de 1970 e os tons sóbrios como o marrom, o cinza e o preto

assumem a dianteira da produção nacional nos anos de 1980. Conforme ilustra a

Figura 77.

127

Figura 77: Fogão Continental 2001 campanha de lançamento Brasil 1980.

Fonte: Site Naftalina. Disponível em: https://naftalina-retro.tumblr.com/post/185068130185/continental-2001. Acesso em: 29/03/2020.

No final do século XX, o mercado passa a diversificar as opções de modelos e

os eletrodomésticos inovam em tecnologias dispondo de diversos dispositivos que

facilitam o uso. Influenciados pelo conceito futurista, os equipamentos passam a

utilizar portas de vidro refratário ao calor, puxadores longilíneos, botões de pressão

e timer86 que podem ser manuais controlados pelo ignitor no fogão ou digitais

através de dials87 iluminados. Uma infinidade de possibilidades surge nas lojas

especializadas.

A existência de um mercado segmentado em diversas faixas de consumo também contribuiu para a oferta de uma variada gama de produtos, marcada pela multiplicidade de modelos, disponíveis em categoria, como é o caso dos fogões e refrigeradores. O mercado oferece desde produtos básicos, os tradicionais da linha branca, até os mais sofisticados destinados às classes de maior poder aquisitivo. (FARIAS et al., 2006, p. 180).

86 Timer Temporizador, um dispositivo sonoro embutido nos aparelhos eletrodomésticos que emite um alerta ao final de um período de tempo preestabelecido, pode ser manual ou digital. (Fonte: Diconário on-line. Disponível em: https://www.dicio.com.br/timer/. Acesso em: 01/04/2020). 87 Dials Painel digital iluminado com visor em vidro, onde são marcados e controlados as temperaturas temporizador digital e normalmente marcam o horário nos aparelhos eletroeletrônicos. (Fonte: Diconário on-line. Disponível em: https://www.dicio.com.br/timer/. Acesso em: 01/04/2020).

128

O mercado brasileiro diversifica as linhas e oferece opções de modelos para

diferentes classes desde os mais básicos como ilustra a Figura 78, até os mais

sofisticados como a Figura 79. Os modelos com duplo forno receberam maior

destaque nas classes mais abastadas, sua tecnologia permite assar dois pratos

independentemente em diferentes temperaturas e tempo.

Figura 78: Fogão popular linha branca Modelo Luna, projetado

pelo escritório Índio da Costa para a Dako.

Figura 79: Fogão segmento luxo em aço inox e vidro refratário Modelo duplo forno Electrolux.

Fonte: FARIAS et al., 2006, p. 180. Fonte: FARIAS et al., 2006, p. 181.

A tecnologia e a personalização dos ambientes que marcou a virada do

século XX para o século XXI, permitiu que estudos evoluíssem para a separação

das peças, ou seja, o fogão foi separado do forno flexibilizando a montagem das

cozinhas que passaram a ser projetadas de maneira personalizada. Nesse momento

surgem os primeiros modelos de cooktop e fornos independentes revestidos em aço

inox, com acendedores automáticos e, no caso dos cooktops, com grades em ferro

fundido e queimadores de alumínio. Exemplificados nas Figuras 80 e 81,

129

Figura 80: Fogão cooktop Suggar Modelo em inox 2000.

Figura 81: Forno independente Neff Modelo embutido 1996.

Fonte: Site O Globo. Disponível em: https://oglobo.globo.com/economia/adeus-ao-velho-tradicional-fogao-3880159. Acesso em: 01/04/2020.

Fonte: TAMBINI, 2004, p. 67.

De acordo com Wilson (2014, p.

século XXI a tecnologia permitiu o uso dos

modelos de cocção por indução que controlam melhor a temperatura e consomem

menos energia; abrindo espaço para um novo conceito de cooktop.

Os modelos criados em acabamento vitrocerâmico88, possuem resistência

termomecânica apresentando baixa condutividade térmica e resistência a choques

de temperatura proporcionando uma estética minimalista favorecendo a composição

em projetos mais ousados. Seus queimadores são linhas sutis por onde passam a

corrente elétrica permitindo desenhos dos mais variados formatos e os acendedores

são pequenos botões touch acionados pelo toque.

Nos anos 2010 a indústria aposta na alta tecnologia como diferencial nos

equipamentos mais simples do cotidiano, como o modelo Wok (FIGURA 82), da

marca eslovena Gorenje, com projeto do designer Karim Rashid89. Nesse projeto,

88 Vitrocerâmica Matéria cerâmica composta de lítio, silício, alumínio e óxidos; obtida por técnicas vidraceiras, constituída de microcristais dispersos numa fase vidrosa. É obtido através do superaquecimento do vidro comum elevando-o a temperaturas entre 500°C 1000°C promovendo uma resistência termomecânica apresentando baixa condutividade térmica e resistência a choques de temperatura. (Fonte: Site Infopédia. Disponível em: https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/vitrocer%C3%A2mica. Acesso em: 01/04/2020). 89 Karim Rashid (1960) Designer egípcio, criado no Canadá, formou-se em Design Industrial e teve suas bases construídas na Itália. Rashid possui mais de 3.000 projetos e mais de 300 prêmios como o Best Retail Store e ID

130

Rashid pensou na cor branca para dar destaque e sofisticação, assim como, a curva

das linhas que delimitam a área de cocção para criar um conceito estético.

Figura 82: Cooktop vitrocerâmico Wok, por Karim Rashid para a Gorenje 2013.

Fonte: Site Gorenje. Disponível em: https://www.gorenje.com.br/produtos/coccao/modelos/cooktops.

Acesso em: 01/04/2020.

Na virada da década para os anos 2020, as indústrias dos eletrodomésticos

investem ainda mais na tecnologia como diferencial competitivo. O design aprimora

as pesquisas que buscam melhorar a funcionalidade dos produtos causando menos

impacto no meio ambiente sem perder o conceito estético e a proposta inovadora

que os consumidores buscam. Afinal, as pessoas estão cada vez mais informadas e

buscam lançamentos e interfaces inovadoras.

3.2.2 Os principais eletrodomésticos da cozinha A história da geladeira:

O começo de século XIX, conforme citado anteriormente, vivenciou a

propagação da Revolução Industrial da Inglaterra para o mundo. Muitas cidades

puderam vivenciar o progresso e a evolução da tecnologia que permitiu a chegada

da eletricidade nos grandes centros. Assim como o fogão, a geladeira foi no século

es estão em 35 países que impressiona não só pela quantidade das coisas que cria, mas também pela sua alta capacidade de fazer peças sempre modernas, atuais. Você pode se deparar com objetos criados por ele há 20 anos, que ainda assim elas parecerão futuristas. (Fonte: Site Guia das Artes. Disponível em: https://www.guiadasartes.com.br/karim-rashid/obras-e-biografia. Acesso em: 01/04/2020).

131

XX um dos eletrodomésticos de maior importância no cenário industrial, não

somente pela sua importância quanto à refrigeração e conservação dos alimentos na

cozinha, como pela grande variedade de modelos e opções que a evolução histórica

apresentou.

Quando se tratava de conservação dos alimentos, as primeiras maneiras

utilizadas foram a salga e a secagem. Durante anos estas foram responsáveis por

manter os alimentos até o seu preparo e consumo. Porém, não eram eficazes para

todos os tipos de alimentos. Nas civilizações antigas, como a Civilização Suméria, foi

descoberto que eles utilizavam as casas de gelo90 para conservar o alimento; pois

era sabido que as baixas temperaturas eram capazes de prolongar a vida útil do

alimento, mantendo-o por mais tempo. Portanto, as casas de gelo foram a inspiração

para a criação da geladeira uma caixa de madeira com barras de gelo.

A primeira referência de geladeira doméstica que se tem notícia foi inventada

em 1802 nos EUA um módulo portátil resfriado por um cubo de gelo. Durante o

século XIX novas versões foram testadas até que foram lançados os primeiros

modelos que ficaram conhecidos como Save Box ou Icebox armários de gelo,

conforme ilustra o anúncio de 1897 do refrigerador modelo Herrick (FIGURA 83).

Os primeiros modelos foram feitos como uma caixa de madeira feita em

carvalho maciço polido, com dobradiças e fechadura em latão; e adornada com

entalhes também de latão niquelado. As portas e paredes eram isoladas e seu

interior era dividido por repartições com prateleiras feitas em malha de arame

estanhado onde a parte superior possuía uma câmara revestida em aço

galvanizado, geralmente, era reservada ao gelo que resfriava os outros módulos

onde ficavam os alimentos, Como possuía um sistema de drenagem removível, a

limpeza era fácil.

90 Casas de Gelo ambientes construídos com um sofisticado sistema de irrigação e com piscinas que eram congeladas durante a noite. Os primeiros indícios da existência da casa de gelo remota à civilização Suméria em 1775 a.C.. (Fonte: História do Mundo. Disponível em: https://www.historiadomundo.com.br/sumeria/economia-sumeria.htm. Acesso em: 01/04/2020).

132

Figura 83: Icebox ou Save Box armário de gelo. Anúncio veiculado no Kansas City Journal em 1897. Refrigerador modelo Herrick EUA 1897.

Fonte: Site Old Appliance Ads. Disponível em: https://oldapplianceads.com/vintage-ads-for-herrick-refrigerators/. Acesso em: 01/04/2020.

Os refrigeradores foram por muitas décadas um item de luxo, restrito apenas

as famílias mais abastadas até que atingiu seu pico industrial no final da década de

1920, começo da década de 1930, quando foi introduzido nas residências (FARIAS

et al., 2006, p. 180). Nesse período, os EUA, desenvolviam pesquisas em torno dos

efeitos da dinâmica dos corpos na água e no ar que os levou a descoberta da

aerodinâmica aplicada pelos designers da época na criação e no desenvolvimento

de carros mudando radicalmente o desenho de transportes como os trens, os

aviões e os barcos (TAMBINI, 2004, p. 16). A indústria automobilística, muito à frente

quando se trata de lançar novos conceitos no mercado, desde sempre foi uma

referência quando se trata do desenho dos produtos da indústria dos

eletrodomésticos.

Enquanto na Europa ainda eram desenvolvidos modelos tradicionais de

refrigeradores, como o modelo produzido pela companhia britânica Thomson-

133

Houston ilustrado na Figura 84; nos EUA a Coldspot, uma marca de refrigeradores

americana pertencente ao grupo Sears, percebe que a demanda por refrigeradores

elétricos crescia cada vez mais e então, contrata o designer industrial Raymond

Loewy91 para redesenhar seus modelos.

Figura 84: Refrigerador de pequena capacidade da inglesa Thomson-Houston de 1930.

TAMBINI, 2004, p. 68.

Loewy recriou os produtos da marca transformando velhas caixas quadradas

em modelos aerodinâmicos e inovadores aumentando consideravelmente os lucros

da empresa. O modelo Super Six apresentado na Figura 85, desenvolvido em 1934,

foi projetado em aço prensado e seu estilo arredondado lembrava a carroceria de

um carro. O acabamento brilhante em branco proporcionou uma sensação de

higiene e limpeza. Um produto que foi muito copiado pelos outros fabricantes

(TAMBINI, 2004, p. 68).

91 Raymond Loewy (1893-1986) Após uma promissora, porém curta carreira como ilustrador de moda, Loewy dedicou-se integralmente ao design industrial. Revolucionou a indústria desenvolvendo os mais icônicos e ousados produtos durante sua carreira de 1919-1975, que marcou o design mundial. (Fonte: Site oficial Raymond Loewy. Disponível em: https://www.raymondloewy.com/. Acesso em: 01/04/2020).

134

Figura 85: Refrigerador modelo Super Six por Raymond Loewy para a Coldspot EUA 1934.

Fonte: Pinterest. Disponível em: https://br.pinterest.com/zlouisgarfield/raymond-loewy/. Acesso em: 01/04/2020.

No Brasil, a virada da década de 1920 para a década de 1930 era um período

de transição, afinal a indústria nacional ainda se consolidava. A maioria dos produtos

ainda eram importados, principalmente as geladeiras, tornando-as muito caras, de

difícil manutenção e restritas às famílias de posse, ou seja, muitas casas ainda

possuíam os modelos antigos as grandes caixas de madeira onde eram

armazenados os alimentos através do uso de barras de gelo (FARIAS et al., 2006, p.

60).

Em 1947, por meio de testes e experimentos, foi lançada pela Oficina92, na

cidade de Brusque Santa Catarina, um modelo de geladeira a querosene produzido

artesanalmente com matéria-prima brasileira. A oficina, que mais tarde deu origem a

Indústria de Refrigeração Consul lançou o modelo Q300 conforme ilustra a Figura

86. O refrigerador seguia o conceito de design da época que propunha linhas

arredondadas e geralmente um desenho aerodinâmico para o puxador com

92 Oficina A Oficina deu origem a Indústria de Refrigeração Consul. Havia, na cidade de Brusque Santa Catarina uma oficina que para contornar a dificuldade de importação de matéria-prima por conta da guerra consertava bicicletas, anzóis e outros artigos com sucata e para tal desenvolvia pesquisas e experiências para obter resultados compativeis. Assim, Carlos Renaux cidadão de Brusque, era cônsul do Brasil na Holanda, e financiou muitos projetos de pesquisa para auxiliar no desenvolvimento de projetos que beneficiasse os moradores da cidade; entre os projetos financiados estava a oficina. Os produtos da oficina passaram a se chamar Consul em sua homenagem. (FARIAS et al.. 2006, p. 68).

135

acabamento cromado. O modelo possuía um sistema de refrigeração, por

absorção93, que funcionava a base de querosene. O modelo foi um sucesso de

vendas e de aceitação, afinal a eletricidade ainda estava sendo implantada no país,

ou seja, somente os grandes centros possuíam energia elétrica.

Figura 86: A primeira Consul. Modelo Refrigerador Consul Q300 - Geladeira a querosene Brasil 1947.

Fonte: Site Consul. Disponível em: https://www.consul.com.br/sobreaconsul/. Acesso em: 03/04/2020.

Em 1949, foi lançado o primeiro modelo de geladeira nacional que fora

destinado ao uso comercial e em 1952 foi lançado o modelo de uso residencial o

modelo da marca Clímax ilustrada na Figura 87. A forma do produto foi inspirada nos

modelos americanos, principalmente os da marca Coldspot; nesse caso o destaque

foram os puxadores com um desenho arredondado e acabamento cromado.

93 Refrigeração por absorção O ciclo de refrigeração por absorção utiliza o calor como fonte de energia, ao contrário do ciclo de compressão, que utiliza energia elétrica através de um compressor. Datado do século XVII, foi utilizado domesticamente a partir de 1900. (Fonte: Site Portal da Refrigeração. Disponível em: https://www.refrigeracao.net/Topicos/refrigeracao_absorcao.htm. Acesso em 03/04/2020).

136

Figura 87: Refrigeradores Climax Brasil 1952.

Fonte: FARIAS et al.. 2006, p. 68.

Nessa época, período pós-guerra, enquanto potencias como EUA e URSS

travavam a Guerra Fria94 a indústria, principalmente a americana; influenciada pela

corrida espacial, desenvolveu modelos inspirados nas viagens espaciais como os

modelos de geladeira e freezer da marca americana International Harvester

ilustrado na Figura 88. Esses modelos buscavam na tecnologia da aerodinâmica um

diferencial estético, que ficou conhecido como movimento streamline95. Um conceito

inovador para a época, que já estava sendo aplicado na indústria automobilística

desde os 1930.

94 Guerra Fria - Período histórico que compreendeu o fim da Segunda Guerra Mundial 1945 até a extinção da União Soviética em 1991. Nesse período emergiram duas superpotências no cenário mundial Estados Unidos (EUA) e União Soviética (URSS). De um lado os EUA representavam o capitalismo e o livre comércio; de outro URSS defendia a consolidação do modelo socialista com forte tutela do Estado sobre a sociedade. Foi ao mesmo tempo um conflito ideológico, econômico, científico, cultural e militar, ambos procuravam aumentar seu poderio militar e estabelecer zonas de influencia na Europa arrasada pela guerra; na Ásia; África e América Latina (Fonte: Site Memórias da ditadura. Disponível em: http://memoriasdaditadura.org.br/capitalismo-ou-comunismo/. Acesso em: 29/03/2020). 95 Movimento Streamline Movimento da forma aerodinâmica onde a principal característica de sua linguagem, era a linha aerodinâmica, motivada por razões técnico-científicas. Representou o fenômeno mais importante na história do design norte-americano do século XX (Fusco. 2019, p.212).

137

Figura 88: Anúncio para geladeira e freezer lançamento da marca International Harvester EUA 1951.

Fonte: Site Irma Harding. Disponível em: https://irmaharding.tumblr.com/Refrigerators. Acesso em: 03/04/2020.

Como sinônimo de inovação, o ponto alto do design da década foi a

introdução do conceito espacial nos carros, a aerodinâmica e a velocidade eram o

ápice perseguido pelos fabricantes onde sua forma vinha coberta de detalhes

cromados inspirados nas aeronaves. Verdadeiros foguetes foram lançados no

mercado. Assim os eletrodomésticos, principalmente as geladeiras receberam

acessórios aeroespaciais, como os puxadores e a grafia das logomarcas, conforme

ilustram as Figuras 89 e 90.

Figura 89: Maçaneta da porta do carro Chevrolet Bel Air 1956.

Figura 90: Puxador da Geladeira Brastemp modelo Imperador 1957.

Fonte: Site Lowrider. Disponível em: https://www.lowrider.com/rides/cars/addicted-

perfection-1956-chevy-bel-air/attachment/1956-chevrolet-bel-air-door-handle-2/. Acesso em

04/04/2020.

FARIAS et al.. 2006, p. 68.

A Brastemp, antiga Brasmotor, desenvolveu um parceria com o grupo

americano Whirlpool e importou tecnologia no campo da refrigeração resultando em

138

modelos inovadores do ponto de vista tecnológico além de introduzir a cultura do

design com destaque para a estética, ou seja, inspirado no modelo de design

americano, foi introduzido o departamento de Stylist onde engenheiros

especializados ficaram responsáveis por redesenhar e criar novos modelos de

refrigeradores. De acordo com Farias et al. (2006, p. 75)

neste momento grande parte das transformações estéticas era consequência da

introdução de inovações, tanto nos materiais como nos processos de fabricação A

Brastemp lançou seu primeiro modelo em 1954 que ficou conhecido como o

Refrigerador Brastemp Super Luxo e em resposta ao sucesso foram lançados nos

anos seguintes os modelos Príncipe, Conquistador e o Imperador ilustrado na Figura

91, este último lançado em 1957 marcando o sucesso dessa parceria (FIGURA 92).

Figura 91: Refrigerador Brastemp Imperador Brasil 1957.

Figura 92: Anúncio do lançamento do Refrigerador Brastemp Imperador. Veiculado no Jornal O Estado

de São Paulo de 1959.

Fonte: FARIAS et al.. 2006, p. 75. Fonte: Acervo Estadão. Disponível em: https://acervo.estadao.com.br/noticias/acervo,em-

1959-brastemp-anunciava-seu-refrigerador-de-classe,70002722710,0.htm. Acesso em:

03/04/2020.

Ainda na década de 1950, outro marco foi o lançamento do refrigerador

Consul Junior ilustrado na Figura 93, lançado também em 1957. Esse modelo, uma

micro geladeira, foi desenvolvido para os pequenos apartamentos as famosas

kitchenette lançadas nos anos de 1950. Interessante observar que esse modelo foi

lançado para atender às transformações porque passava a sociedade da época com

139

uma nova configuração urbana. O modelo além de inovar no tamanho era versátil

para transportar e oferecia opção de escolha de cores.

Figura 93: Refrigerador Consul Junior 1957.

Fonte: Site Harpya Colecionáeis e antiguidades. Disponível em: https://d1o6h00a1h5k7q.cloudfront.net/imagens/img_m/2689/1019973_3.jpg. Acesso em: 03/04/2020.

A década de 1960 foi a década do consumo, foi o nascimento do consumismo

em massa difundido pela força da publicidade americana que espalhava o modelo

econômico capitalista pelo mundo. A indústria brasileira, colhendo os frutos do

desenvolvimento dos anos anteriores, abriu espaço para o design industrial no país

impulsionado pela abertura dos primeiros cursos de design no Brasil, afinal o país

vivia um momento de ascensão pós Segunda Guerra Mundial, um período que ficou

conhecido como os Anos Dourados em função do crescimento econômico e cultural.

O conceito estético aprimorado na época veio influenciado pelo movimento

cultural que ficou conhecido como Bossa Nova96, muito impactante na época sendo

inclusive apresentado no exterior como sinônimo de brasilidade. A Bossa Nova ficou

marcada pelo vanguardismo e pela modernidade e juntamente à inauguração da

cidade de Brasília, marco do movimento modernista no Brasil, influenciou o desenho

dos eletrodomésticos e a publicidade da época.

96 Bossa Nova - Durante a década de 50, o Brasil vivia a euforia do crescimento econômico gerado após a

compositores de classe média alta do Rio de Janeiro começou a buscar algo realmente novo e que fosse capaz de fugir do estilo operístico que dominava a música brasileira. Estes artistas acreditavam que o Brasil poderia influenciar o mundo com sua cultura, por isso, o novo movimento visava à internacionalização da música brasileira. Para a maioria dos críticos, a Bossa Nova se iniciou oficialmente em 1958, e foi consagrada internacionalmente no ano de 1962. (Fonte: Site Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/artes/bossa-nova.htm. Acesso em: 03/03/2020).

140

Ao contrário dos anos 1950 o design da década de 1960 assume um conceito

mais retilíneo como mostra a Figura 94, linhas retas deixavam os refrigeradores mais

leves visualmente imprimindo o conceito vanguardista com cores claras como o

modelo Consul Luxo da marca Consul lançado em 1963 como ilustra a Figura 95. A

tecnologia avançava e possibilitou uma melhoria na conservação da temperatura

dos alimentos e surgiram os refrigeradores com isolamento em poliuretano (PU). A

espuma de PU permitia uma camada de isolamento mais fina diminuído a espessura

das paredes deixando os produtos mais leves e mais finos.

Figura 94: Anúncio apresentando o estilo retilíneo incorporado aos refrigeradores

brasileiros lançamento da Geladeira Retilínea da General Eletric. Veiculado na Revista O

Cruzeiro 1959.

Figura 95: Refrigerador Consul Modelo Consul Luxo 1963.

Fonte: Site Mercado Livre. Disponível em: https://produto.mercadolivre.com.br/MLB-

708279720-propaganda-geladeira-retilinea-ge-revista-o-cruzeiro-1959-_JM. Acesso em:

03/04/2020. .

Fonte: Site Consul. Disponível em: https://www.consul.com.br/sobreaconsul/.

Acesso em: 03/04/2020.

Nos anos de 1970, o design foi se consolidando no país, começam a se

formar os primeiros alunos de desenho industrial e as indústrias tiveram acesso mais

facilmente para a contratação de profissionais. Pioneira, a Consul contrata em 1969

o designer Freddy Van Camp97 que introduziu o departamento de design na fábrica

97 Freddy Van Camp (1946) Designer formado em 1968 pela escola Superior de Design Industrial ESDI, foi contratado pela Consul em 1969 para assumir como chefe desenhista a fábrica de Joinville SC. Lá fundou o departamento de prototipagem que mais tarde, em 1975, se transformou no departamento de design. No ano de 1980 deixa a Consul e funda o escritório Van Camp Design e se dedica a projetos de interiores, embalagens, exposições, sinalizações e de sistemas. (Fonte: Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras.

141

mudando o conceito da marca e dos produtos. Van Camp lança uma nova linha de

refrigeradores de 270 e 340 litros, introduzindo duas cores inéditas para o

acabamento das peças o verde abacate e o vermelho combinado com detalhes em

cores como o caramelo e o chocolate visto principalmente nos puxadores e em

detalhes internos como apresenta a Figura 96. A linha foi muito bem aceita no

mercado e de acordo com Van Camp idia na

aplicação de uma filosofia de projetar que não fosse baseada apenas em responder

aos produtos pela concorrência, tentando antecipar as necessidades dos

, 1972, apud FARIAS et al., 2006, p. 123)

Figura 96: Anúncio da Nova Linha 70 da Consul 1970.

Fonte: FARIAS et al.. 2006, p. 123.

Em 1980 o design brasileiro assume seu lugar na indústria nacional, os

departamentos de design passam a ser coordenados pelos designers, não mais por

engenheiros e de acordo com Farias et al. (2006, p.

. Na produção dos refrigeradores, novas tecnologias

são lançadas como o sistema frost free98 e os modelos duplos e triplos freezer e

geladeira em um mesmo aparelho como mostra a Figura 97.

Disponível em: <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa3820/freddy-van-camp>. Acesso em: 03/04/ 2020). 98 Sistema Frost Free A tecnologia frost free (livre de congelamento) é um sistema de refrigeração controlado eletronicamente. Sua principal característica é refrigerar sem formar gelo. O sistema impede a formação de gelo nas paredes internas do aparelho, dispensando a necessidade de degelo facilitando a limpeza. O fato de não se formar gelo nas paredes internas permite uma melhor circulação do ar distribuindo-o mais uniformemente evitando odores e mantendo saudáveis os alimentos por mais tempo. (Fonte: Site Consul.

142

Figura 97: Refrigerador duplex Consul Modelo 3T Freezer, geladeira e uma gaveta umidificadora para verduras e legumes.

Fonte: Site Consul. Disponível em: https://www.consul.com.br/sobreaconsul/. Acesso em: 04/04/2020.

O sistema frost free foi uma evolução e uma revolução na época, pois

apresentou uma série de vantagens para o desempenho do produto como: melhor

circulação interna de ar mantendo os alimentos saudáveis por mais tempo evitando

odores e principalmente distribuindo a temperatura de forma homogênea e o fato de

não formar gelo permitia um melhor aproveitamento do espaço, principalmente nos

congeladores e freezers, além de facilitar a limpeza, pois não havia necessidade de

descongelamento, qualidade essa que chamou a atenção das donas de casa, pois

agilizou consideravelmente o tempo de serviço.

Na virada da década de 1980 para a década de 1990 novos conceitos de

aparelho, totalmente projetados e desenvolvidos no Brasil, começam a ganhar força

no mercado. São lançados os modelos de refrigeradores slim geladeira e freezer

compactos e acoplados formando um conjunto na cozinha, como o premiado modelo

Spazio Plus 310 (FIGURA 98) produzido pela equipe de design da marca

Prosdócimo. O conjunto recebeu o Prêmio Museu da Casa Brasileira em 1988 com a

categoria de equipamentos domésticos, modalidade objeto.

O briefing do refrigerador Spazio Plus pedia um aproveitamento máximo de peças do freezer então produzido pela empresa, para aproveitar uma linha

Disponível em: https://www.consul.com.br/facilita-consul/bem-pensado-para-voce/blog-voce-sabe-o-que-e-frost-free/. Acesso em: 04/04/ 2020).

143

de montagem que ficaria ociosa. O resultado acabou configurando o primeiro refrigerador concebido por uma fábrica brasileira para formar um conjunto único com o freezer. O júri observou que essa modularidade

inovação estava na disposição dos espaços internos, que mereceram demorados estudos e originaram novas soluções de design, como a introdução de travas na caixa interna e na contraporta, para impedir a queda das prateleiras durante o smodelo de refrigerador ganhou linhas arredondadas, seguindo tendências

de vendas: em 1988, ao ser lançado, produziam-se 3.000 refrigeradores/ mês, em 1996 esse número havia pulado para 30 mil peças/mês, a um preço

Brasileira de Design no setor de eletrodomésticos. (Museu da Casa Brasileira99).

Figura 98: Conjunto Freezer e Geladeira da marca Prosdócimo Modelo Spazio Plus 310. Projetado pelos designers Julio Bertola, João Wasilesxisk Neto, Rodolfo Floerter

Sonia Keiko Utumi ambos da equipe de design da Prosdócimo Brasil 1988.

Fonte: Site Museu da Casa Brasileira. Disponível em: https://mcb.org.br/pt/design_mcb/17297/. Acesso em: 04/04/2020.

Além da Prosdócimo, outras marcas fortes no mercado na época como a

Brastemp e a Electrolux também ganharam prêmios com o modelo Twin System

Zyrium (FIGURA 99) do designer Edson Takayuki Tani100 para a Brastemp em 1990

onde o modelo se destacou por apresentar um freezer de 160 litros na parte inferior

99 Informações obtidas no site do Museu da Casa Brasileira. Disponível em: https://mcb.org.br/pt/design_mcb/17297/. Acesso em: 04/04/2020. 100 Edson Takayuki Tani (1962) - Possui graduação em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo(1982) e mestrado em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2002). Tem experiência na área de Arquitetura, Urbanismo e Desenho Industrial. Professor de Design e Arquitetura e Urbanismo na Uninove - Universidade Nove de Julho. (Fonte: Escavador. Disponível em: https://www.escavador.com/sobre/5884294/edson-takayuki-tani. Acesso em: 04/04/2020).

144

e uma geladeira de 310 litros na parte superior confeccionado com material

polimérico que proporcionava economia de consumo de energia devido ao seu

poder de isolamento térmico; e o modelo R 310 (FIGURA 100) do designer Júlio

Bertola101 para a Electrolux que veio lançando como novidade o porta-ovos

ajustável, a gaveta de carnes e frios, uma gaveta porta legumes com capacidade de

armazenamento maior e uma bandeja separada para frutas, ambos transparentes,

otimizando gasto energético e poupando tempo. Ambos foram premiados pelo

Prêmio Museu da Casa Brasileira na categoria de equipamentos domésticos,

modalidade objeto em 1990 e 1997 respectivamente.

Figura 99: Refrigerador Twin System Zyrium do designer Edson Takayuki Tani para a Brastemp.

Prêmio Museu da Casa Brasileira 1990.

Figura 100: Refrigerador R310 do designer Júlio Bertola para a Electrolux. Prêmio Museu da

Casa Brasileira 1997.

Fonte: Site Museu da Casa Brasileira. Disponível em: https://mcb.org.br/pt/design_mcb/17258/.

Acesso em: 04/04/2020.

Fonte: Site Museu da Casa Brasileira. Disponível em: https://mcb.org.br/pt/design_mcb/17297/.

Acesso em: 04/04/2020.

Nos anos 2000, a diversidade do consumo favoreceu o lançamento de várias

linhas de refrigeradores com acabamentos diferentes e opções de divisões e

acessórios variados. Da linha branca modelos mais simples que atendem a

101 Júlio Bertola (1958) Possui Graduação em desenho industrial pela Universidade Federal do Paraná (1978). Em 1999 se especializou em marketing e negócios na ISAD. Atualmente é diretor da América Latina do Electrolux Major Appliances Design Group. Trabalhou em várias empresas projetando móveis, barcos, veleiros, computadores e eletrodomésticos. Atualmente é professor da PUC - Pontifícia Universidade Católica do Paraná e da Universidade Federal do Paraná - UFPr. (Fonte: World Design Guide. Disponível em: https://ifworlddesignguide.com/juror/8136-julio-bertola. Acesso em: 04/04/2020).

145

classes menos favorecidas aos modelos high tech de última geração de uma porta,

duplex, inverse102, side by side103, french door104(FIGURA 101) e até mesmo o

frigobar, ambos com tecnologia de ponta, onde a maioria possui painel digital blue

touch que controla temperaturas diferentes para resfriar produtos distintos e

dispenser de água na porta diminuindo a abertura de geladeira afim de poupar o

consumo de energia.

Figura 101: Modelos de refrigeradores French Door com 04 e 03 divisões distintas e dispenser de agua.

Fonte: Site Compre sua geladeira. Disponível em: https://www.compresuageladeira.com.br/comprar-geladeiras-french-door/. Acesso em 04/04/2020.

No século XXI percebe-se que as pessoas estão mais conscientes em relação

à saúde que no período anterior e também estão cada vez mais atraídas pela

102 Refrigerador modelo inverse Refrigerador invertido geladeira em cima facilitando o acesso aos alimentos e freezer na parte de baixo. (Fonte: Site Compre sua geladeira. Disponível em: https://www.compresuageladeira.com.br/comprar-geladeiras-inverse/. Acesso em 04/04/2020). 103 Refrigerador Side by Side Refrigerador lado a lado geladeira e freezer no mesmo aparelho porem um ao lado do outro. (Fonte: Site Compre sua geladeira. Disponível em: https://www.compresuageladeira.com.br/comprar-geladeiras-side-by-side/. Acesso em 04/04/2020). 104 Refrigerador French Door Refrigerador Porta Francesa é um modelo de refrigerador com maior capacidade de armazenamento e subdividado por partes. Geralmente tem duas portas na parte superior com abertura lateral e um freezer na parte de baixo que pode ser gaveta ou porta e pode inclusive ser divido em duas partes para armazenamento diferentes de alimentos congelados. Fonte: Site Compre sua geladeira. Disponível em: https://www.compresuageladeira.com.br/comprar-geladeiras-french-door/. Acesso em 04/04/2020).

146

tecnologia. Percebe-se uma incessante busca por qualidade de vida que levou as

pesquisas científicas ao encontro da nanotecnologia aplicada nos refrigeradores. De

acordo com Farias et al. (2006, p.

eletrodomésticos,

A nanotecnologia funciona através da ionização da prata metal conhecido

por ser grande agente bactericida natural, onde são gerados nano íons de prata que

combatem e eliminam mais de 650 tipos de bactérias que prejudicam a saúde e

causam odores desagradáveis (FARIAS et al., 2006, p. 187). O modelo de

refrigerador Side by Side da marca Samsung é um exemplo do uso da

nanotecnologia conforme ilustrado na Figura 102.

Figura 102: Modelos de refrigeradores Side by Side da marca Samsung.

Fonte: Site Fast Shop. Disponível em: https://www.fastshop.com.br/wcsstore/FastShopCAS/imagens/_LB_LinhaBranca/SGRS50N3413S8/S

GRS50N3413S8_PRD_447_1.jpg. Acesso em: 04/04/2020.

Da década de 1900 ao século XXI, mais de 100 anos de história dos

refrigeradores marcaram não somente a história do design no Brasil e no mundo

como também contam parte da historia da cozinha refletindo no seu projeto a

estética de cada período como ilustra a Figura 103.

147

Figura 103: Retrospectiva dos modelos de geladeira de 1900 ao Século XXI.

Fonte: site Engenharia e. Disponível em: https://engenhariae.com.br/tecnologia/a-evolucao-dos-eletrodomesticos-ao-longo-do-tempo. Acesso em 28/03/2020.

O futuro dos refrigeradores com certeza está envolvido com a tecnologia,

cada vez mais a compactação e o compartilhamento de funções é um conceito

perseguido pela indústria de eletrodomésticos. Um exemplo disso, no caso dos

refrigeradores, são os modelos com TV acoplada e muitas outras funções estão

sendo desenvolvidas pelos departamentos de design e tecnologia.

3.2.3 Os principais eletroportáteis da cozinha A história do liquidificador, da

batedeira e do micro-ondas

Em uma sociedade que desde cedo intitulou a mulher como mãe, esposa e

dona de casa, suas obrigações, segundo Chortaszko; Moreira (2013, p.

estavam traçadas desde o seu nascimento e marcavam a feminilidade das

Portanto, ser boa mãe e ser boa dona-de-casa definia sua essência e

seu caráter. Diante desse cenário, campanhas publicitárias estimulavam o consumo

elucidando e elevando os objetos da cozinha como se estivessem valorizando a

mulher, como é o caso do anúncio de fogão veiculado na Revista O Globo, de 1929,

ilustrada na Figura 104, onde é definido o melhor presente dado a uma mulher por

seu noivo.

148

Figura 104: Anúncio do fogão Wallig veiculado na Revista O Globo, de 1929.

Fonte: Gauchazh Almanaque. Disponível em: https://gauchazh.clicrbs.com.br/cultura-e-lazer/almanaque/noticia/2017/11/melhor-presente-cjaee0ds20g1z01mxo6z7xk26.html. Acesso em

05/04/2020.

Os eletrodomésticos de pequeno porte, os eletroportáteis, assim como o

fogão e o refrigerador, também são parte importante da história da cozinha e

marcam sua transformação. Ao término da Segunda Guerra Mundial, com a baixa

das importações, com a indústria nacional se estruturando e o estilo de vida

brasileiro se modificando em detrimento da influência norte-americana, a década de

1940 foi um período de crescimento urbano.

A indústria começa a produzir eletrodomésticos para atender a demanda de

consumo e os primeiros equipamentos brasileiros são colocados no mercado.

Dentre a gama de opções oferecidas, durante esses mais de 100 anos, alguns

aparelhos se tornam sinônimo de modernidade e foram conduzidos pela publicidade

como uma independência feminina, como foi o caso do liquidificador, da

enceradeira, da batedeira e do aspirador de pó. Porém, para que esses artefatos se

tornassem objetos de desejo e impulsionassem o consumo da nova tecnologia foi

necessário inscrevê-los no cotidiano das famílias levando as mulheres a acreditarem

que tê-los além do status afinal de acordo com Krause (2009, p. s meios de

149

comunicação de massa se tornaram espaços privilegiados de familiarização de

aspectos tidos como desconhecidos pelos indivíduos de determinado grupo social

teriam seu dia-a-dia mais leve convencendo-as de que refrigeradores, enceradeiras,

liquidificadores e rádios eram imprescindíveis à vida moderna (CHORTASKO;

MOREIRA. 2013, p. 11).

A publicidade, estimulada pelo cinema Hollywoodiano cria uma série de

campanhas direcionadas ao público feminino associando a liberdade da mulher aos

novos modelos de eletroportáteis, como o caso da campanha da Epel Indústrias

Reunidas Indian Epel Ltda (FIGURA 105); que defende que a vida com os

eletroportáteis da marca fica melhor.

Figura 105: Campanha Publicitária da Indústria Epel Slogan: Assim, a vida é melhor. Aparelhos elétricos de real utilidade para conforto das donas de casa

Fonte: Propagandas Históricas. Disponível em: https://www.propagandashistoricas.com.br/2013/12/epel-vida-melhor-para-mulheres-1947.html.

Acesso em 05/04/2020.

150

Durante muito tempo, esse estigma de mulher do lar perpetuou na sociedade.

Em 1962, um anúncio publicado no jornal O Globo fomentava o desejo pelos

eletroportáteis estimulando o colecionismo, ou seja, quanto mais opções disponíveis

em casa, melhor o dia-a-dia das donas-de-casa (FIGURA 106).

Figura 106: Anúncio publicado no Jornal O Globo onde a Arno convida a dona de casa a completar sua coleção de eletrodomésticos da marca - 1962.

Fonte: Acervo O Globo. Disponível em: https://acervo.oglobo.globo.com/propaganda/vida-

domestica/eletrodomestico-era-de-conforto-lazer-14230469#ixzz6JcnKtKA2. Acesso em 05/04/2020.

Dentre todos os aparelhos desenvolvidos no Brasil durante o século XX, três

deles foram escolhidos como referência de estudo nessa dissertação, pois partiu-se

do princípio que desses pequenos objetos de grande importância, esses três foram

marcos cada um há seu tempo; e mudaram muito o trabalho doméstico na

cozinha. São eles: o liquidificador, a batedeira e o microondas ambos sinônimos

de modernidade e libertação para a mulher no que se trata de otimizar o trabalho

doméstico; foram utilizados dentro do ambiente da cozinha.

O primeiro modelo de liquidificador produzido no Brasil foi o Liquidificador

Nêutron da marca Walita produzido em 1944 como ilustrado na Figura 107 (FARIAS

et al., 2006, p. 78), seu conceito primava pela modernidade e elegância.

151

Figura 107: Liquidificador Nêutron da Walita Primeiro modelo produzido no Brasil Walita 1944.

Fonte: Memorial Walita. Disponível em: http://www.memoriawalita.com.br/neutron.htm. Acesso em: 05/04/2020.

O projeto desenvolvido105 apresentava um aparelho leve devido a estrutura

feita de aço utilizando uma chapa de espessura fina. O acabamento externo era

esmaltado na cor branca com desenho em degraus inspirado no bolo de casamento

e o copo era de vidro ondulado. O sistema desenvolvido para o motor aplicava a

tecnologia da marca Suíça Turmix uma parceria da Walita na produção de

liquidificadores na época; que o tornava resistente a quedas de energia.

Além da Walita, a Arno também foi uma empresa de eletroportáteis referência

na produção de liquidificadores. Nasceu no ano de 1940 com o nome de

Construções Eletromecânicas Brasileiras Ltda especializada na produção de

motores elétricos. No ano de 1949, já registrada como Arno S.A. iniciou na produção

de eletrodomésticos. Para sua primeira linha, a empresa contratou a norte-

americana Sears Roebuck & Co106 para criar seus produtos, fato esse que comprova

a influência do estilo streamlining nos peças. A aerodinâmica torna-se o ponto forte

do desenho dos aparelhos brasileiros, estilo que irá perpetuar até a década de 1960,

um símbolo da modernidade no Brasil (FARIAS et al., 2006, p. 80).

105 Informações obtidas no site Memória Walita. Disponível em: http://www.memoriawalita.com.br/neutron.htm. Acesso em: 06/04/2020. 106 Sears Roebuck & Co Fundada em 1886, a Sears, Roebuck and Company conhecida como Sears, é uma rede de lojas de departamentos americana sediada em Chicago, no estado americano de Illinois. Foi fundada por Richard Sears e Alvah Roebuck no final do século XIX. (Fonte: Wikipedia. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Sears,_Roebuck_and_Company. Acesso em: 06/04/2020).

152

O modelo emblemático da Arno foi o liquidificador Super Arno lançado na

década de 1950. O modelo aerodinâmico também apresentava detalhes formais

inspirados no estilo art dèco como é o caso da tampa e da base escalonada,

conforme ilustra a Figura 108.

Figura 108: Anúncio do liquidificador Super Arno 1958.

Fonte: Site Anos Dourados. Disponível em: http://www.anosdourados.blog.br/2009/07/imagens-anuncio-arno.html. Acesso em: 06/04/2020.

Os anos de 1960 ficaram marcados pelas conquistas de Juscelino

Kubitscheck. A inauguração de Brasília, com seu estilo moderno simbolizava uma

nova era. De acordo com Krause (2009, p. Brasília

introduziu na arquitetura foi cenário para inúmeras peças publicitárias, e definiu

novos padrões estéticos tanto para os meios de comunicação, como para o design

dos próprios bens de produção .

lança o liquidificador Brasília, também conhecido como Perfeição Absoluta (FIGURA

109). O modelo era robusto, sua base era desenhada com linhas curvas,

arredondadas, inspirado na arquitetura do Palácio do Planalto de Oscar Niemeyer.

Nesse período são lançados os primeiros modelos em plástico e acrílico, no lugar do

aço na base e do vidro no copo, respectivamente.

153

Figura 109: Liquidificador Brasília e/ou Perfeição Absoluta. Walita 1960.

Fonte: Memorial Walita. Disponível em: http://www.memoriawalita.com.br/Perfeicaoabsoluta.htm. Acesso em: 06/04/2020.

As cores da década de 1970 também coloriram os liquidificadores, o modelo

Walita Poliwalente LS é um exemplo dessa tendência que atou por todos os

eletrodomésticos da época (FIGURA 110). O grande diferencial desse modelo foi

sua capacidade de rotação. Com um motor mais econômico e mais potente

oferecia dez velocidades diferentes, seu desempenho melhorou; funções como

moer, triturar, picar, bater, ralar foram realizadas com mais eficiência. Possuía um

controle digital deslizante e o fio era embutido na base facilitando o armazenamento

e a limpeza do equipamento.

Figura 110: Liquidificador Poliwalente LS Walita 1977.

Fonte: Memorial Walita. Disponível em: http://www.memoriawalita.com.br/Campeao.htm. Acesso em: 06/04/2020.

Com e entrada dos designers na indústria brasileira na década de 1980, os

eletrodomésticos ganham novos desenhos e variadas capacidades e funções. A

154

flexibilidade do consumo associada a diferentes classes sociais que avidas por

novos produtos levam a indústria a colocar vários modelos e opções de custo no

mercado. A Arno foi uma das empresas que lançou muitas opções de modelos de

liquidificadores na década de 1980, conforme ilustram as Figuras 111 e 112.

Atenção ao modelo LP onde seu design privilegiou detalhes como os botões e as

pegas incorporados à base, o modelo recebeu destaque no Prêmio Museu da Casa

Brasileira de 1986 (FIGURA 113).

Figura 111: Opções de modelos, cores e funções de liquidificadores lançados pela Arno no Brasil, no começo dos anos de 1980. Modelos LA, LD,

LC, LSA e LP respectivamente.

Figura 112: Opções de modelo, cores e funções de liquidificadores lançados pela Arno no final dos anos de 1980 no Brasil. Modelos LE, LH,

PRO e Multi PRO respectivamente.

Fonte: Flickr. Disponível em:

https://www.flickr.com/photos/32089334@N08/5568447674/in/photostream/. Acesso em:

06/04/2020.

Fonte: Flickr. Disponível em: https://www.flickr.com/photos/32089334@N08/55

68447674/in/photostream/. Acesso em: 06/04/2020.

Figura 113: Liquidificador Arno Modelo LP 1986.

Fonte: Flickr. Disponível em: https://www.flickr.com/photos/32089334@N08/5568447674/in/photostream/. Acesso em: 06/04/2020.

155

Na década de 1990 as pesquisas e o desenvolvimento tecnológico

favoreceram a criação de modelos inovadores como mostra a Figura 114. Botões

com regulagem onde a velocidade e as distintas funções eram controladas, assim

como a presença de timer foram os diferenciais dos produtos da época. Destaque

para o modelo Walita Delta Selector HL3274, ilustrado na Figura 115.

Figura 114: Opções de modelos e funções de liquidificadores lançados pela Walita no Brasil, na

década de 1990. Modelos Omega, Alfa, Beta, Gama, Delta Selector e Delta Eletronic respectivamente.

Figura 115: Liquidificador Walita Delta Selector controle eletrônico de funções -

1995.

Fonte: Flickr. Disponível em: https://www.flickr.com/photos/32089334@N08/4339

279837. Acesso em: 06/04/2020.

Fonte: Flickr. Disponível em: https://www.flickr.com/photos/32089334@N08

/4339279837. Acesso em: 06/04/2020.

A quantidade de botões e funções gerava certo estranhamento por parte da

maioria dos consumidores, dessa forma o departamento de design da Walita

resolveu lançar novos modelos, dessa vez modelos mais simples, porém não menos

potentes. Assim nos anos 2000 foi proposta uma alteração não somente na

configuração das funções como no projeto das peças. A Walita havia sido comprada

pela Philips e sua divisão de eletroportáteis projetou um novo conceito para os

produtos. As linhas retas das décadas de 1980/1990 deram lugar às formas

arredondadas, reflexo da parceria da Philips com a marca italiana Alessi, foi então

que nasceram os liquidificadores Walita Twist, Juice & Co, LiqFaz e LiqArt ilustrados

na Figura 116.

156

Figura 116: Opções de modelos de liquidificadores lançados pela Walita no Brasil, nos anos 2000. Modelos Walita Twist, Juice & Co, LiqFaz e LiqArt respectivamente

Fonte: Flickr. Disponível em: https://www.flickr.com/photos/32089334@N08/4340088248/in/photostream/. Acesso em: 06/04/2020.

Ainda nos anos 2000, surgiu uma nova marca de eletrodomésticos a MK

Mondial Eletrodomésticos S/A, popularmente conhecida como Mondial

Eletrodomésticos. A indústria nasceu com a missão de proporcionar aos

consumidores o melhor custo-benefício do mercado, produzindo peças com projeto

arrojado, tecnologia e custo acessível. A equipe de design da marca propôs um

trabalho direto aos consumidores, ouvindo-os para então propor funções que

realmente fossem necessárias ao dia-a-dia das donas de casa, de onde surgiu a

inclusão do filtro coador para facilitar a separação dos resíduos do liquido obtido do

processamento107 como mostra a Figura 117. Além da tradicional linha branca, a

marca lançou o conceito de cores preto e vermelho para os equipamentos com

detalhes em aço inox ao encontro com a proposta dos eletrodomésticos de luxo,

porém com custo baixo. Dessa maneira a linha de liquidificadores e

eletrodomésticos Mondial obteve êxito no mercado como um todo, como ilustra a

Figura 118.

107 Informações retiradas do site oficial da marca. Disponível em: http://www.emondial.com.br/sobre-a-mondial/. Acesso em: 07/04/2020.

157

Figura 117: Liquidificador com filtro coador Mondial Modelo Turbo Premium Século XXI.

Figura 118: Linha Premium Mondial Século XXI.

Fonte: Site Mondial. Disponível em: http://www.emondial.com.br/produto_departame

nto/liquidificador/page/4/. Acesso em: 07/04/2020.

Fonte: Site Mondial. Disponível em: http://www.emondial.com.br/produto_departamento

/liquidificador/page/4/. Acesso em: 07/04/2020.

Uma breve retrospectiva mostra a evolução dos liquidificadores ao longo de

um século de história conforme ilustra a Figura 119.

Figura 119: Retrospectiva dos modelos de liquidificadores de 1900 ao Século XXI.

Fonte: site Engenharia e. Disponível em: https://engenhariae.com.br/tecnologia/a-evolucao-dos-eletrodomesticos-ao-longo-do-tempo. Acesso em 28/03/2020.

As batedeiras, outro eletroportátil de referência na história dos utensílios da

cozinha, assim como os liquidificadores, também teve sua evolução. Esse

equipamento surgiu na década de 1900, mais precisamente no ano de 1908 pelas

158

mãos do engenheiro norte-americano Herbert Johnson108 que ao observar a forma

como eram misturados os ingredientes para se fazer pão nas padarias, criou um

misturador elétrico para facilitar e melhorar o processo. Em 1915 nasce a primeira

batedeira comercializada apenas para estabelecimentos comerciais devido ao alto

custo do produto. Em 1936, redesenhada, passa a integrar a lista dos principais e

mais desejados eletrodomésticos das donas-de-casa americanas.

No Brasil os primeiros modelos começaram a ser produzidos no final dos

anos 1940 e foram comercializados no início da década de 1950. A Walita lançou o

modelo Torpedo ilustrado na Figura 120 portátil com 03 velocidades, fabricada em

aço esmaltado ao lado da marca Arno que lançou o modelo Dual Super Stand Mixer

juntamente com o liquidificador Super Arno ilustrado na Figura 121, os primeiros

modelos de batedeira vendidos no país. A proposta aerodinâmica do projeto

apresentava misturador compacto e ambas eram portáteis, onde a base de suporte

era um kit vendido como um acessório opcional. O modelo Walita oferecia ainda um

acessório opcional que era um espremedor de frutas.

Figura 120: Batedeira Walita modelo Torpedo 1946.

Figura 121: Liquidificador e Batedeira Arno modelo Dual Super Stand Mixer 1954.

Fonte: Flickr. Disponível em:

https://www.flickr.com/photos/32089334@N08/5840874365/in/photolist. Acesso em: 07/04/2020.

Fonte: Flickr. Disponível em: https://www.flickr.com/photos/32089334@N08/5840874365/in/photolist. Acesso em: 07/04/2020.

108 Herbert Johnson (1899-1978) Engenheiro norte americano foi o responsável por desenvolver um misturador elétrico capaz de mistura massa pesadas. Seu misturador deu origem mais tarde às batedeiras. (Fonte: Museu Tecnológico. Disponível em:https://www.coopermiti.com.br/museu/?MuseuId=1104&CategoriaId=16. Acesso em: 05/006/2020).

159

Na década de 1960, juntamente com o do liquidificador Brasília, foi lançada a

Batedeira de Bolos Jubileu ou BBJ ilustrada na Figura 122; o nome remetia a

comemoração dos 25 anos da marca Walita juntamente com a homenagem da

inauguração da cidade de Brasília. Seu projeto era inspirado nos produtos europeus

que eram desenhados com a influência da era espacial; com detalhes de onde se

observava o desenho da esplanada dos ministérios em cromo. A parte superior do

motor era feita em plástico PS (poliestireno) polido na cor branca com detalhe em

zamak109 na cor bronze e os botões de ejeção e de velocidades eram de melamina

na cor vermelha110. Suas tigelas eram de vidro da marca Pyrex, muito resistentes.

Figura 122: Batedeira Walita modelo BBJ Batedeira de Bolos Jubileu 1964.

Fonte: Memorial Walita. Disponível em: http://www.memoriawalita.com.br/bbj.htm. Acesso em: 07/04/2020.

Nos anos de 1970, mais precisamente entre os anos de 1974-1977, a Walita

lança o modelo Jubileu BBT-300 em parceria com a Philips Brasil. Esse modelo foi

109 Zamak Denominação genérica de diversas ligas metálicas, com baixa resistência mecânica, contendo basicamente zinco (Zn) com adição de alumínio (Al), magnésio (Mg) e cobre (Cu), que encontram diversas aplicações técnicas. (Fonte: Infopédia. Disponível em: https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/zamak. Acesso em: 07/04/2020). 110 Informações obtidas no site Memorial Walita. Disponível em: http://www.memoriawalita.com.br/bbj.htm. Acesso em: 07/04/2020.

160

uma reedição da série BBJ de 1964, porém com um novo pé feito em plástico ABS

em vez de alumínio fundido, foi apresentada em uma gama de cores intensas, as

mesmas dos liquidificadores da época vermelho, azul-petróleo e amarelo ilustrada

na Figura 123, assim como a tradicional branca. Ambas ofereciam como acessório

adicional o espremedor de frutas.

Figura 123: Batedeira Walita modelo Jubileu BBT-300 1974-1977.

Fonte: Flickr. Disponível em: https://www.flickr.com/photos/32089334@N08/5840874365/in/photolist. Acesso em: 07/04/2020.

Na década de 1980 as equipes de design das principais marcas do país

apresentaram vários modelos de batedeiras com opções de função e custo variados.

A Arno lançou a linha Ciranda ilustrada na Figura 124, eram modelos com uma

cartela de cores compatíveis com os modelos dos liquidificadores lançados na época

pela marca, possuíam três velocidades de motor com chave elétrica embutida na

alça, dois batedores com regulagem de altura, assim como dois tamanhos de

tigelas. A marca Walita lançou, na mesma época, a linha Topa-tudo com um motor

potente com capacidade para bater qualquer textura de massa. O equipamento

oferecia duas opções de batedores, sendo o espiralado para massas pesadas e o

tradicional para massas de bolos e receitas leves; com regulagem para oito

velocidades através de um botão deslizante. A batedeira poderia ser portátil, ou seja,

poderia ser solta do pedestal; vinha com duas opções de tamanho diferentes de

tigelas e uma espátula curva que se adaptava à circunferência da vasilha, facilitando

a rotação durante o uso como mostra a Figura 125.

161

Figura 124: Batedeira Arno modelo Ciranda 1980.

Figura 125: Batedeira Walita modelo Topa-tudo 1980.

Fonte: Flickr. Disponível em: https://www.flickr.com/photos/32089334@N08/51

73017603/in/photostream/. Acesso em: 07/04/2020.

Fonte: Flickr. Disponível em: https://www.flickr.com/photos/32089334@N08/41

88535583/in/photostream/. Acesso em: 07/04/2020.

Os anos de 1990 ficaram marcados pela evolução da tecnologia. Em 1992 a

marca Walita redesenha o modelo Topa-tudo e lança a batedeira Topa-tudo

Carrossel ilustrada na Figura 126. O conceito inovador ficou a cargo da tigela

giratória com tampa, onde um sistema de engrenagens rotacionava a tigela

garantindo maior eficiência durante o preparo. O equipamento manteve os dois

modelos de batedores espiral massa pesada e tradicional massa leve, a espátula e

lançou a jarra medidora transparente para auxiliar na medição dos ingredientes.

Figura 126: Batedeira Walita modelo Topa-tudo Carrossel 1992.

Fonte: @memoriawalita. Disponível em: https://www.instagram.com/p/B9x0FZEgBDV/. Acesso em; 07/04/2020.

Nos anos 2000 a máxima menos é mais dominou a indústria de

eletroportáteis conforme citado anteriormente. No início do século XXI, a tecnologia

162

favoreceu a criação de modelos mais eficientes, com maior economia de energia,

mantendo as principais funções, porém sem exagero. No caso da marca Walita, o

conceito arredondado aplicado nos liquidificadores, em resposta da parceria com a

Philips, também foi visto nas batedeiras. Mais uma vez o modelo Topa-tudo foi

reeditado lançando a Batedeira Topa-tudo Plus ilustrada na Figura127.

Figura 127: Batedeira Walita modelo Topa-tudo Plus 2000.

Fonte: Memorial Walita. Disponível em: http://www.memoriawalita.com.br/TopaTudoplus1555.htm. Acesso em: 06/04/2020.

Já na década de 2010, os modelos apareceram com um desenho mais

moderno, acompanhando o conceito dos equipamentos de luxo criados em sua

maioria de aço inox, com painéis digitais e blue touch. No caso da batedeira, em

competição ao conceito da KitchenAid111 um ícone de design e objeto de desejo,

marcas nacionais criaram modelos com o movimento planetário, como o ilustrado na

Figura 128 um sistema de rotação no eixo e ao redor da tigela, capaz de bater de

massas leves a massas mais pesadas. Para cada tipo de massa um batedor, o

modelo globo para massas leves e para clara em neve, o modelo leque para massas

111 KitchenAid Empresa de eletrodomésticos fundada na cidade de Ohio nos Estados Unidos no ano 1919. Pioneira no conceito de eletroportáteis de luxo com tecnologia avançada que se tornou, nos anos 2000 ícone de design e objeto de desejo. (Fonte: Kitchenaid. Disponível em: https://www.kitchenaid.com.br/. Acesso em: 06/04/2020).

163

de médio porte e pouco aeradas como tortas e bolos e o modelo gancho para

massas pesadas como pães e pizzas, conforme ilustra a Figura 129.

Figura 128: Batedeira Planetária Arno linha luxo modelo SX80 - 2010.

Figura 129: Modelos de batedores da batedeira Planetária.

Fonte: Arno. Disponível em: https://www.arno.com.br/planetarias. Acesso em:

08/04/2020.

Fonte: Arno. Disponível em: https://www.arno.com.br/planetarias. Acesso em:

08/04/2020.

Desde 1908 que a batedeira vem se transformando em um objeto simples que

surgiu com o intuito de facilitar a mistura de massas nas padarias, acabou se

tornando uma peça importante da cozinha no Brasil e no mundo.

No caso do surgimento do micro-ondas, é curioso destacar que esse

eletroportátil surgiu das pesquisas e experimentos realizados por engenheiros que

trabalhavam para a indústria de armamentos e equipamentos eletrônicos. As

primeiras micro-ondas foram utilizadas pelos americanos para detectar aviões

inimigos durante a Segunda Guerra Mundial. Durante um dia de trabalho, no ano de

1945, o engenheiro eletrotécnico Percy LeBaron Spencer112 descobriu por acaso

que ao sentar-se próximo do equipamento que emitia micro-ondas uma barra de

chocolates que estava em seu bolso derreteu e a partir de então ele iniciou os

primeiros testes de uso da micro-onda para a culinária. Até que em 1947 a

112 Percy LeBaron Spencer (1894-1970) Americano, nascido em Howland, Maine, EUA; Formou-se em engenharia eletrotécnica e trabalha na empresa Raytheon na área de armamentos e equipamentos eletrônicos para uso militar e comercial; quando descobriu e inventou o aparelho forno de micro-ondas em 1945. (Fonte: Maestro Virtuale. Disponível em: https://maestrovirtuale.com/percy-spencer-biografia-e-contribuicoes/. Acesso em: 09/04/2020).

164

Raytheon113 empresa do segmento de armamentos e eletrônicos para a qual

Spencer trabalhava, produziu e comercializou o primeiro forno micro-ondas da

história, o modelo Radarange ilustrado na Figura 130, medindo 1,8 m de altura,

pesando 340 kg e custava o equivalente a US$ 50 mil dólares.

Figura 130: Primeiro Forno Micro-ondas da história. Modelo Radarange fabricado e comercializado pela Raytheon Company em 1947 EUA.

Fonte: Super Interessante. Disponível em: https://super.abril.com.br/mundo-estranho/a-historia-do-micro-ondas/. Acesso em: 09/04/2020.

O primeiro modelo doméstico, como mostra a Figura 131, foi comercializado

pela empresa Tappan no ano de 1955, era pequeno, equivalente a um forno

convencional sendo montado embutido em um nicho na parede. Porém seu custo

ainda era elevado, o equivalente a US$ 10 mil dólares.

113 Raytheon Company - Conglomerado norte-americano que atua na área de armamentos e equipamentos eletrônicos para uso militar e comercial. Atualmente é uma das maiores produtoras mundiais de mísseis guiados. Fundada em 1922 por Vannevar Bush, Charles G. Smith e Laurence K. Marshall na cidade Cambridge, Massachusetts, EUA. (Fonte: Raytheon Technologies. Disponível em: https://www.raytheon.com/ourcompany/global/. Acesso em: 09/04/2020).

165

Figura 131: Primeiro Forno Micro-ondas doméstico. Fabricado e comercializado pela Tappan em 1955 EUA.

Fonte: Super Interessante. Disponível em: https://super.abril.com.br/mundo-estranho/a-historia-do-micro-ondas/. Acesso em: 09/04/2020.

No ano de 1967, vinte anos após o lançamento do primeiro forno, a Raytheon

Company lança a versão Radarange de uso doméstico ilustrado na Figura 132.

Portátil, o modelo foi reduzido, medindo 55 cm de largura por 38 cm de altura e

custava o equivalente a US$ 3.500 dólares. O modelo do forno micro-ondas

conquistou o mercado, afinal a rapidez com que cozinhava os alimentos facilitou e

agilizou em muito as tarefas domésticas na cozinha.

Figura 132: Primeiro Forno Micro-ondas portátil de uso doméstico. Modelo Radarange fabricado e comercializado pela Raytheon Company em 1967 EUA.

Fonte: Super Interessante. Disponível em: https://super.abril.com.br/mundo-estranho/a-historia-do-micro-ondas/. Acesso em: 09/04/2020.

166

No final década de 1970, ainda nos EUA, foi lançado o modelo com

programação eletrônica, onde o acionamento era realizado a partir de botões e os

marcadores de tempo eram painéis digitais como mostra a Figura 133.

Figura 133: Forno Micro-ondas portátil de uso doméstico. Fabricado e comercializado pela Panasonic em 1976 EUA.

Fonte: Super Interessante. Disponível em: https://super.abril.com.br/mundo-estranho/a-historia-do-micro-ondas/. Acesso em: 09/04/2020.

No Brasil, os primeiros modelos de forno micro-ondas comercializados

chegaram a partir da década de 1990. A rapidez com que descongelava um alimento

ou cozinha outro, conquistou as donas de casa e o aparelho rapidamente se tornou

parte dos principais equipamentos da cozinha brasileira. Porém, o elevado custo

impedia o consumo em massa, sendo assim foi se popularizar somente á partir dos

anos 2000, onde começou a ser produzido pelas marcas nacionais.

A tecnologia do aparelho, onde as micro-ondas produzem um campo elétrico

que reverte sua direção 4,9 bilhões de vezes por segundo energizando e agitando

as moléculas fazendo com que os pólos orientem-se sucessivamente num sentido e

em outro superaquecendo as moléculas de água fazendo com que o alimento

aqueça muito mais rapidamente; pouco se modificou do final dos anos de 1970 para

a atualidade.

167

As mudanças ficaram mais a cargo da interface do usuário com o produto

disponibilizando recursos interativos como: a digitalização de códigos de barra das

embalagens que permite o envio de dados para o aparelho através da leitura do

código de barras do produto por um aplicativo permitindo que o aparelho se

configure e se programe para cozinhar o alimento de acordo com as indicações do

fabricante no caso do modelo GE.9 da General Electric ilustrado pela Figura 134; há

também a integralização do aparelho ao wi-fi permitindo que através de comandos

de voz o usuário possa comandar o dispositivo de qualquer lugar da casa utilizando

o smartphone; e ainda a utilização de sensores integrados para medir a umidade do

alimento como no modelo Breville Quick Touch ilustrado na Figura 135 fazendo com

que o aparelho se ajuste automaticamente definindo o tempo e a potência de

cozimento preservando ao máximo as propriedades do alimento.

Figura 134: Micro-ondas portátil de uso doméstico modelo GE.9 da General Electric.

Figura 135: Micro-ondas portátil de uso doméstico modelo Quick Touch da Breville.

Fonte: Olhar Digital. Disponível em: https://olhardigital.com.br/noticia/conheca-os-

micro-ondas-do-futuro/89146. Acesso em: 09/04/2020.

Fonte: Olhar Digital. Disponível em: https://olhardigital.com.br/noticia/conheca-os-

micro-ondas-do-futuro/89146. Acesso em: 09/04/2020.

Não somente esses eletroportáteis discutidos acima fizeram a diferença na

história da transformação da cozinha e da indústria de eletromésticos no Brasil, mas

também o ferro de passar, a enceradeira, a torradeira e tantos outros merecem

destaque nessa trajetória. Juntos, vão marcar a história do design no Brasil assim

como a entrada da eletricidade e do gás no país símbolo da modernidade. Suas

funções traziam um novo fôlego, novas formas de trabalho doméstico e novas

tarefas conforme resume Silva (2008, p.

visavam substituir pequenas tarefas na cozinha e não algum objeto específico .

168

Além das questões funcionais e de otimização do trabalho, a indústria de

equipamentos adicionou ao objeto característica e aspectos estéticos que tornaram

o produto objeto de desejo. Ao longo do século XX, com o crescimento da classe

média e o aumento pela demanda de produtos, a indústria segmentou a produção e

barateou o custo dos equipamentos para atender um maior número de

consumidores. Com a segmentação e o barateamento, os equipamentos ganharam

projetos e características técnicas muito similares levando ao surgimento da

concorrência. Para sobreviver nesse cenário, à entrada do designer no processo foi

fundamental. De acordo com Maiocchi; Pillan (2013, p.

nasceu com atenção às fases iniciais, aos processos formalizados e medidos, a

padronização, a redução de cu

Atualmente, ao mesmo tempo em que ocorre uma saturação do consumo, as

pessoas buscam por algo que as complete, que lhes faça vivenciar experiências e

que lhes surpreenda, o produto precisa ter algo a mais que sua simples condição de

existência, ou seja, o produto precisa ir além de sua função básica.

produtos, fazendo a diferença e trazendo algumas razões para convencer os consumidores a comprar determinado produto no lugar de outro; além das devidas funções e um preço aceitável, os produtos começaram a apresentar formas e estilos capazes de comunicar emoções aos usuários. Isto é o que chamamos agora de design: a capacidade de comunicar alguns tipos de emoções. (MAIOCCHI; PILLAN, 2013, p.27).

Portanto, o design comunica o produto para com o consumidor por meio das

experiências e dos aspectos sensoriais agregados. É uma questão de apelo à

afetividade e de aguçar as emoções. É colocar o usuário no centro do processo.

Entender de que forma esse usuário interage com o objeto e de que forma esse

objeto integra, faz parte do ambiente.

A cozinha é um dos ambientes da casa no qual são adicionados um número

grande de equipamentos e de certa forma um ambiente que envolve muitos

sentimentos, pois é o ambiente da casa em que são preparados os alimentos, as

receitas de família; um ambiente de convívio familiar e de liberdade. Dessa forma,

] entrar na era da modernidade é tomar posse

de objetos, móveis e equipamentos

169

Assim sendo, o discurso utilizado pela mídia onde de acordo com Eleb (2017,

p.

as casas se tornassem verdadeiras lojas de equipamentos eletroeletrônicos e

grandes ambientes automatizados.

Portanto que casa é essa? Quem a habita? Porque habita? São questões de

fundamental importância na compreensão da relação do design com o homem e

com a cozinha foco deste estudo. Assim sendo, no próximo capítulo foi feita uma

reflexão a respeito da casa e de sua relação com o homem; e como o ambiente da

cozinha é planejado na contemporaneidade.

170

CAPÍTULO 4

CULTURA E PSICOLOGIA AMBIENTAL

Esse capítulo tem por objetivo analisar o espaço de morar discutindo seus

significados e significantes e a sua relação com o homem. A análise ocorreu a partir

da interpretação do espaço da cozinha e a ramificação desta no espaço gourmet

pontuando suas características e valores dentro do espaço da casa. Para tal análise

foram discutidos, apoiados pelas entrevistas, projetos de cozinha executados pela

autora, conforme justificados anteriormente, nos anos de 2018 e 2019, a fim de

entender a importância e a interface destes ambientes com o homem que o habita.

O resultado dessa análise levantou questões e informações que podem levar outros

profissionais a refletirem sobre os espaços interpretando-os com novos olhares.

4.1 O homem e o espaço de morar uma reflexão

A sociedade vivencia, em função da pandemia da Covid-19, um momento

sócio-histórico, onde se espera que vão despertar novos comportamentos e

possivelmente novas perspectivas sociais. Existe uma discussão que aponta para

forme citou o sociólogo Richard Sennett114 em entrevista ao

site do jornal El País115; Sennett questiona como será esse novo normal?.

A problemática ambiental vem sendo discutida há muitos anos e percebeu-se,

com o tempo, que novos aspectos precisariam ser entendidos para que soluções

fossem propostas. Dessa forma chegou-se às questões humano-ambientais onde a

relação que as pessoas estabelecem com os ambientes nos quais estão inseridas

direta ou indiretamente são muito importantes para a compreensão do entorno.

Nesse contexto, a psicologia torna-se essencial para entender essa interface, que a

partir dos estudos da psicologia ambiental, de acordo com Cavalcante; Elali (2018,

114 Richard Sennett (1943) Sociólogo e historiador norte-americano, Ph.D. em história da civilização americana pela Universidade de Harvard, seu trabalho une sociologia, história, antropologia e psicologia social. Atualmente, é professor emérito na Escola de Economia e Ciências Políticas de Londres, onde leciona desde 1990, e professor na Universidade Nova York. (Fonte: Fronteiras do Pensamento. Disponível em: https://www.fronteiras.com/portoalegre/conferencia/richard-sennett. Acesso em: 14/06/2020). 115 Entrevista concedida por Richard Sennett à repórter Carmen Pérez-Lanzac no site do jornal El País no dia 13/06/2020. (Fonte: El País. Disponível em: https://brasil.elpais.com/ideas/2020-06-13/richard-sennett-o-liberalismo-enfraqueceu-nossa-rede-de-salvacao.html. acesso em: 14/06/2020).

171

p. -se para a compreensão do modo como os espaços influenciam o

comportame

A partir desse novo ponto de vista, novos aspectos foram considerados como:

a alimentação o que e como se come; a mobilidade não somente do ponto vista

urbano, mas também a mobilidade das coisas e objetos; e principalmente a moradia.

Esses aspectos vêm sendo ressignificados, pois se concluiu que, segundo

Cavalcante; Elali (2018, p. as consequências que os ambientes exercem sobre

as pessoas [...] pode levar a uma mudança de atitude que transforme positivamente

a qualidade de vida tanto dos indivíduos diretamente implicados quanto da

Todos esses aspectos são extremamente relevantes na compreensão do

homem-ambiente, porém, para o presente estudo foi discutido o aspecto da moradia,

afinal a casa é o reduto do ser humano, onde se habita, onde se constrói a

intimidade, onde são depositados e aplicados os valores de cada indivíduo e o

ambiente da cozinha foco central desse trabalho. Torna-se nesse momento um

ambiente essencial da casa, um meio de propagação de afeto e de sentimentos,

afinal, o ato de alimentar é um ato de amor (MONTANARI, 2009, p. 17).

A casa geralmente localizada em um canto do universo protege, acolhe,

abriga as memórias, as lembranças e as paixões. Sem ela, o homem seria um ser

disperso (BACHELARD, 2008, p. 26). De acordo com Bryson (2011, p.

casa é um repertório incrivelmente -la significa buscar

significados e levantar discussões que vão muito além de mera descrição. É preciso

entender outros conceitos que norteiam o indivíduo e que muitas vezes constrói sua

identidade e o molda.

Portanto, para tal análise buscou-se na psicologia ambiental compreender

esses conceitos, afinal esta propõe a reflexão de vários temas que se inter-

relacionam com outras áreas, inclusive o design. Para obter embasamentos que

justifiquem o presente estudo, foram aqui abordados conceitos como o

enraizamento116, a ambiência117, a docilidade ambiental e também a emoção e a

116 Enraizamento O termo enraizamento vem sendo utilizado na psicologia ambiental há muitos anos e não lhe é exclusivo, apresentando pontos de contato com outras discussões oriundas de outras áreas do

172

afetividade. Destes, os dois primeiros temas são trabalhados nas ciências humanas

e sociais e os dois últimos, já têm origem na própria psicologia ambiental

(CAVALCANTE; ELALI, 2018, p. 11).

O primeiro conceito a ser discutido é o enraizamento, é preciso entender a

importância e o porquê se enraizar, e como afeta o inconsciente humano. O

enraizamento indica um vínculo entre a identidade psicossocial118 e o ambiente do

ponto de vista social, ou seja, a cultura de um povo, sua história e sua memória

coletiva. Como essas pessoas se conectam ou como se agrupam, onde o

importante, de acordo com a análise do psicólogo social Henri Tajfel119, é a

percepção de pertença.

A pertença segundo Tajfel (apud Paiva 2007, p.

pertencer a um lugar; ele protege, abriga, é uma maneira de fundamentar a

identidade pessoal. De acordo com Massola; Svartman (2018, p. -se

carac

conhecimento. Na Psicologia Ambiental a maior dificuldade está em distingui-lo de noções semelhantes, como a relação deve ser

intensa e constitutiva do próprio indivíduo. [...] Entre os principais componentes do enraizamento podemos destacar alguns como: habitação por longo período em um mesmo lugar; estar em casa; familiaridade que provém da frequência recorrente a um lugar; uma forma não consciente de vínculo com um lugar que é sentido como a casa ou o lar e também uma relação com o passado e com a tradição do grupo ou do povo que fundamenta o sentido de identidade pessoal. (MASSOLA; SVARTMAN. 2018, p.76) 117 Ambiência O termo ambiência vem sendo utilizado na psicologia ambiental em conexão com a percepção e traduz a relação entre um organismo e seu ambiente. Tem relação com a maneira de agir e de se comportar dos indivíduos. A ambiência influencia o modo como uma situação se desenvolve. (THIBAUD. 2018, p.13) 118 Identidade psicossocial o termo estudado nessa dissertação se baseia na teoria defendida pelo psicólogo social Henri Tajfel estudo do ano de 1972-1981, que entendia a identidade psicossocial como a percepção de

grupo pode resultar da escolha da pessoa, mas também da imposição externa ou do acaso. (PAIVA. 2007) 119 Henri Tajfel (1919-1982) Psicólogo social britânico nascido na Polônia, referência no estudo da psicologia social e mais conhecido pelo seu conceito de identidade social teoria da identidade social. Lembrado pelo seu esforço em estabelecer um estilo de psicologia social onde reconhece a interface do social com a política e a história no contexto dentro do qual ocorre o comportamento social. (Fonte: Encyclopédia Britannica. Disponível em: https://www.britannica.com/biography/Henri-Tajfel. Acesso em: 11/06/2020.).

173

afinal torna as pessoas emocionalmente apegadas a sua área local, é a ponte com a

sociedade. O vinculo criado com o entorno que vem passando de gerações, traz as

lembranças e as memórias, muitas delas de relacionamentos vividos com outras

pessoas no espaço habitado. Portanto, a casa se torna um elemento muito

importante para o homem. Assim construir o seu espaço e ambientá-lo é de suma

importância para o indivíduo, conforme atesta Bachelard (2008, p.

uma das maiores (forças) de integração para os pensamentos, as lembranças e os

o seu benefício, sua razão de existir. Ainda de acordo com Bachelard (2008, p. 26)

o son

Em consequência dessa análise, pode-se perguntar qual deve ser a

aparência de uma casa? Para responder a essa questão, alguns pensadores

atribuem que a aparência deve imprimir um conceito de lar com um ar doméstico

(BRYSON, 2011, p. 43); ou deve estar conectada com o passado, pois marca a

biografia do indivíduo (MASSOLA; SVARTMAN, 2018, p. 79); ou ainda uma

aparência simplista afinal, de acordo com Bachelard (2008, p.

pitoresco de uma morada pode oculta

arquiteta Lina Bo Bardi120

Uma das maneiras de discutir a aparência parte da percepção, ou seja, como

o homem percebe o espaço. Para tal, dentro dos preceitos da psicologia ambiental,

buscou-se na ambiência, entender essa ligação perceptiva. A ambiência apreende,

120 Achilina Bo Bardi (1914-1992) - Mais conhecida como Lina Bo Bardi, nasceu em Roma na Itália no ano de 1914, formou-se em arquitetura na Faculdade de Arquitetura da Universidade de Roma em 1940 e atuou como arquiteta e designer além de realizar projetos como cenógrafa, ilustradora e editora. Em 1946, após a guerra, Lina casa-se com o crítico e historiador de arte Pietro Maria Bardi (1900-1999) com quem viaja ao Brasil; país

ro Maria Bardi é convidado pelo jornalista Assis Chateaubriand (1892-1968) a fundar e dirigir o Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (Masp), em São Paulo onde Lina projeta as instalações, em que se destaca a cadeira dobrável de madeira e couro para o auditório, considerada "a primeira responsável por muitos outros projetos relevantes e importantes no cenário arquitetônico moderno brasileiro. (Fonte: Enciclopédia Itaú Cultural. Disponível em: http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa1646/lina-bo-bardi. Acesso em: 29/07/2020).

174

impregna e imerge, é revestida de emoção e exprime a totalidade afetiva do instante

por meio do valor, uma interação entre um organismo e seu ambiente.

A ambiência é uma dinâmica composta de diferentes fases que origina um

movimento conjunto, que exprime e condiciona maneiras diferentes de ser e agir.

Assim, a resposta consiste em se situar em um nível individual partindo de um estilo

corporal próprio, a marca do sujeito; para então partir para o nível coletivo uma

relação entre o eu, o mundo ambiental e o outro, sincronizado para que possa

coexistir em um mesmo espaço. De acordo com Thibaud (2018, p.

Dessa forma, o inconsciente capta muito mais o conjunto de objetos

articulados, configurados que os objetos individualizados, isolados. Portanto o objeto

não preenche o vazio, ele modifica a totalidade do campo ambiental, ou seja, ele

modifica a composição global daquilo que nos é dado a ver, essa percepção é

justificada pelo dispositivo de cura psicanalítica freudiana, na qual segundo Eleb

(2017, p. 162

dos campos de visão e dos olhares constitui uma encenação que deve produzir

objetos do ambiente, mas é também experienciar o estado de um meio em um

A ambiência opera aquém da linguagem articulada e resulta mais da compreensão que da interpretação. Sendo ela da ordem do sentimento imediato e da sensação corporal permite fazer valer a vertente estética da experiência ordinária. (THIBAUD, 2018, p. 13).

Dessa forma, desde a corte de Luis Felipe121, Rei da França de 1830 a 1848

um reinado voltado para as questões da burguesia; que e estética se tornou peça

fundamental na construção da aparência do interior de uma casa. Segundo

Benjamin (2006, p.

Portanto, foi a partir do século XIX, no momento em que surge o homem

121 Luis Felipe (1773-1850) através da Assembleia Nacional Francesa e obteve apoio da alta burguesia. Seu reinado foi considerado uma Monarquia Constitucional que durou de 1830 a 1848 quando foi abdicado. Durante sua gestão favoreceu a burguesia em um período em que a nação francesa iniciava um processo de Revolução Industrial. (Fonte: Infoescola Disponível em: https://www.infoescola.com/biografias/luis-filipe-i-de-franca/. Acesso em: 29/05/2020).

175

privado e que a habitação se distancia do espaço de trabalho122, que nasceu a

preocupação com o interior. O espaço interno passou a se tornar um refúgio onde

muitas vezes sustenta as ilusões do homem privado que transformou o interior em

seu universo.

Diante disso, nesse novo ambiente construído, foram reunidas lembranças do

passado e foram acomodadas as memórias que deram origem ao homem

colecionador, onde ocorreu uma idealização dos objetos retirando deles o caráter de

mercadoria agregando valor que não necessariamente é o valor de uso. De acordo

com Benjamin (2006, p.

necessita [...] que no mundo real as coisas estão liberadas da servidão de serem

Assim, o interior deixa de ser apenas o universo do homem privado e assume

o caráter de ser uma capa protetora onde cada objeto adquirido ganha uma

importância e suas características passam a ter um significado conforme atesta

Benjamin (2006, P. -se uma espécie de habitáculo123. Os

vestígios de seus habitantes moldam-

As casas assim como os ambientes aceitam qualquer linguagem, estão

desprovidos de pré-conceitos que impõe um modelo ideal, ou seja, o espaço é

capaz de assumir qualquer forma desde que habite nele um interlocutor e que

imprima suas emoções e afetos.

As casas são coisas muito estranhas. Elas quase não têm qualidades universais: podem assumir praticamente qualquer forma, incorporar praticamente qualquer material, ser de qualquer tamanho, ocupar qualquer espaço. No entanto, onde quer que se ande pelo mundo, nós conhecemos casas e reconhecemos o que é uma casa assim como a vemos. (BRYSON, 2011, p. 44).

Portanto, pode-se concluir, de acordo com Bonfim; Delabrida; Ferreira (2018,

p. a perspectiva do simbolismo do espaço, o lugar é visto como um

122 Esses espaços de trabalho a que Benjamin se refere seriam os estabelecimentos comerciais acoplados às residências, comum da sociedade barroca. Nessa fase século XIX, vão ganhar destaque nas residências os cômodos de escritório um complemento do intérieur (interior). privado que, em seu escritório, presta contas à realidade, deseja ser sustentado em suas ilusões pelo seu intérieur 123 Habitáculo Magalhães. Homens e Livros. p.12, 1902).

176

território emocional, tornando-se, portanto, uma dimensão na construção dos

significados e na extensão da subjetividade dos indivíduos . Assim, para aprofundar

nessa perspectiva é interessante analisar o conceito de docilidade124 ambiental

adotado pela psicologia ambiental. O conceito foi desenvolvido por M. Powell

Lawton125 na década de 1960 onde defendeu a simbiose existente entre a pessoa e

o ambiente a partir do ponto de vista da relação entre as habilidades do indivíduo e a

demanda sobre elas. De acordo com Gunther; Elali (2018, p.

potencializa o uso das capacidades individuais, permitindo que cada um atue em

sua zona ótima de desempenho; para isso contribuem as condições psicossociais e

O ambiente dócil tende a potencializar a capacidade pessoal a partir das

demandas ambientais levando a uma resposta emocional e a um comportamento

adaptativo. As capacidades individuais geralmente demonstram as habilidades do

indivíduo de realizar suas tarefas, cumpri-las (no caso as demandas ambientais); ou

seja, quando as demandas do ambiente se adequam às habilidades da pessoa,

tendem a gerar afeto positivo e consequentemente um comportamento afetivo. Ao

longo do tempo pessoas e demandas se modificam, portanto adaptar o ambiente

para que haja um comportamento adaptativo levam ao afeto positivo melhorando a

qualidade de vida e o bem estar (GUNTHER; ELALI, 2018, p. 48-49).

Adaptar um ambiente, em muitas situações, exige a personalização, ou seja,

entender as habilidades individuais permite que o ambiente seja pensado, projetado

de modo a atender às diferentes exigências promovendo o desenvolvimento físico e

mental além de proteger de eventuais danos proporcionando suporte e estimulando

quem o habita, afinal, de acordo com Duarte & Cohen (2010 apud GUNTHER;

ELALI, 2018, p.

124 Docilidade o termo docilidade, de acordo com Paul Lawton (1923-2001), contextualiza-se pela relação entre: a capacidade pessoal; as demandas ambientais; resposta emocional e o comportamento adaptativo. (GUNTHER; ELALI, 2018, p. 48). 125 Mortimer Powell Lawton (1923-2001) Mais conhecido como M. Powell Lawton, era P.h.d em psicologia clínica pela Faculdade de Professores da Universidade de Columbia EUA; foi um psicólogo de comportamento e gerontologista. Um dos pioneiros na teoria da Psicologia Ambiental e Gerontologia Ambiental que pesquisava as implicações do ambiente físico-social na qualidade de vida dos idosos. (Fonte: Wikipedia. Disponível em: https://es.wikipedia.org/wiki/M._Powell_Lawton. Acesso em: 12/06/2020).

177

Maçanetas são para girar. Ranhuras são para inserir coisas. Bolas são para atirar ou quicar. Quando se tira proveito das affordances o usuário sabe o que fazer apenas ao olhar: não são necessárias imagens ilustrativas, rótulosou instruções. Objetos complexos podem exigir explicação, mas objetossimples não devem precisar delas. Quando objetos simples precisam de imagens, rótulos ou instruções, o design fracassou. (NORMAN, 2006, p.33)

Para a Psicologia Ambiental, além do enraizamento, da ambiência e da

docilidade ambiental, outro aspecto fundamental da análise homem-espaço é

compreender a relação afetividade e emoção. Defendendo a ideia de que o ser é

aquilo que sente, o espaço causa sentimentos dos mais variados aspectos

positivos ou negativos; criando vínculos entre eles. Portanto, o ambiente causa

impacto nas pessoas, ele tem o poder de alterar o estado emocional com base em

uma avaliação afetiva (BONFIM; DELABRIDA; FERREIRA, 2018, p. 61).

Para compreender a importância das emoções e como elas atuam no ser

humano, é importante compreender como funciona o cérebro e como este é

estimulado. Durante muitos anos partiu-se do principio que o cérebro era dividido em

dois hemisférios o direito e o esquerdo; esse mapa cerebral defendido por Roger

Sperry126 apontava o hemisfério esquerdo como sendo o lado da interpretação da

lógica e o hemisfério direito responsável pela interpretação emocional das situações.

(SPERRY, 1986, p. 04). Porém estudos realizados nas últimas décadas do século

XXI apontam que o cérebro humano é todo utilizado durante a realização de uma

ação ou pensamento, as bases que sustentam esse estudo realizado pela

neurocientista brasileira Suzana Herculano-Houzel127 é o conceito do Cérebro Trino

126 Roger Wolcott Sperry (1913-1994) Foi um neurobiologista e fisiologista norte-americano, importante pesquisador e uma das maiores referências intelectuais do século XX. Suas ideias tiveram um impactopermanente na neurociência, neuropsicologia, psicologia, filosofia e sociedade. Foi professor de psicobiologiado conselho de administração emérito do Instituto de Tecnologia da Califórnia e morreu aos 80 anos naCalifórnia em 1994. (Site: Roger Sperry Vida e Obra. Disponível em: http://rogersperry.org/. Acesso em: 13/06/2020) 127 Suzana Herculano-Houzel (1972) É bióloga formada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e autora de vários livros de divulgação científica sobre neurociência. Possui pós-doutorado pelo Instituto Max-Planck de Pesquisa do Cérebro na Alemanha, doutorado pela Universidade de Paris VI na França e mestrado na Universidade Case Western Reserve nos Estados Unidos. Em seu trabalho, analisa como os conhecimentos gerados pela neurociência a respeito dos seres humanos podem ser aplicados na vida diária. Foi a primeira brasileira a falar na conferência internacional TED Global. (Fonte: Fronteiras do Pensamento. Disponível em: https://www.fronteiras.com/conferencistas/suzana-herculano-houzel. Acesso em 13/06/2020).

178

ou Cérebro Triuno, desenvolvido pelo neurocientista norte-americano Paul

MacLean128na década de 1970.

A teoria do Cérebro Trino divide o cérebro em três partes distintas que são: o

neocórtex, o sistema límbico e o complexo reptiliano conforme ilustra a Figura 135.

O neocórtex é a consciência racional, o sistema límbico de acordo com Dutta (NEW

MEDICAL LIFE SCIENCES, é definido como o sistema de rede cerebral

responsável por controlar os impulsos emocionais e a formação da memória

complexo reptiliano é a consciência irracional (NEWMAN; HARRIS, 2009, p. 04). No

caso das emoções e da afetividade, essas atuam no sistema límbico que por sua

vez em conjunto com outras estruturas cerebrais irão controlar uma série de outras

funções fisiológicas e psicológicas como motivação, formação da memória,

comportamento, olfato, paladar, desejo sexual entre outras (DUTTA, NEW MEDICAL

LIFE SCIENCES, 2018).

Figura 136: Estrutura do Cérebro Trino ou Cérebro Triuno de Paul MacLean.

Fonte: Psicologia o portal dos psicólogos. Disponível em: https://www.psicologia.pt/artigos/ver_opiniao.php?3-cerebros&codigo=AOP0496. Acesso em:

13/06/2020.

128 Paul MacLean (1913-2007) Foi um médico neurocientista norte-americano, importante cientista do século XX responsável pelo estudo do Sistema Límbico onde desenvolveu a Teoria do Cérebro Trino na década de 1970. (NEWMAN; HARRIS, 2009, p.02)

179

Dentre todas as funções, as emoções e a memória, quando se trata da

ambientação dos espaços, são essenciais para criar vínculo com o homem; afinal

conforme citado anteriormente, as emoções são à base da relação do homem com o

mundo (BONFIM; DELABRIDA; FERREIRA, 2018, p. 61). A criação desses vínculos

depende de como são explorados os sentidos básicos como o olfato, o tato, o

paladar, a audição e a visão, ou seja, os aspectos psicológicos, em alguns

contextos, são variáveis que podem definir o sucesso ou insucesso de uma

ambientação. Imprimir sentimento ao espaço é permitir que significados emocionais

sejam construídos junto ao lugar que de certa forma é a tradução da expressão da

identidade do indivíduo.

Por exemplo, quando se trata da visão, o olhar humano busca equilíbrio e as

linhas afetam psicologicamente os indivíduos, ou seja, linhas verticais são mais

energizantes assim como as linhas horizontais transmitem a sensação de

tranquilidade (GIBBS, 2017, P. 76), portanto projetar o ambiente utilizando a simetria

como princípio projetual permite imprimir o senso de equilíbrio e ordem. No caso da

audição, a música libera serotonina que causa a sensação de bem estar; já o olfato

por sua vez é essencialmente ligado às lembranças e as memórias, de acordo Nery

(2016, p. olfato, juntamente com o tato, seria um sentido primitivo, animalesco

e, contraditoriamente, [...], trata- , ou seja,

estudos comprovam que o cérebro é capaz de identificar muitos aromas diferentes e

a conexão entre eles causa também a sensação de prazer e bem estar. Por último o

paladar, que não deixa de ser extremamente importante, pois aguçar o paladar

envolve outros sentidos como a visão e o olfato que juntos permitem ao individuo

experimentar sensação distintas.

Para ambientar um espaço, são inseridos objetos que de certa forma são

escolhidos segundo sua função e as sensações que estes despertam, por exemplo,

no sentido de acomodação, em uma sala de estar podem ser escolhidas cadeiras,

sofás, poltronas onde cada qual com sua função específica serve para acomodar as

pessoas no ambiente. A escolha desses objetos parte, de certa forma, do princípio

estético, pois envolve os sentidos. De acordo com Queiroz; Cardoso; Gontijo (2009,

p. tegoria de objetos estéticos, acredita-se que

um produto (objeto de uso), além de servir a fins utilitários, carrega consigo atributos

180

objetos, sendo percebidos a partir dos sentidos e escolhidos conforme sua

identificação. Dessa forma o conjunto de objetos que compõe a ambientação do

espaço causa uma sensação de conforto e apego pelo espaço propiciando estima,

ou seja, segundo Bonfim; Delabrida; Ferreira (2018, p. ão de

significados, torna o ambiente/lugar extensão da subjetividade dos indivíduos, dando

de acordo com Damásio (2012 apud BONFIM; DELABRIDA; FERREIRA, 2018, p.

70 Desse modo:

A interação do sujeito com o objeto se dá em nível mais profundo indo além dos interesses práticos e imediatos, considerando que, além de despertar interesse prático, um produto pode despertar prazer estético e provocar emoções. Essa interação ocorre a partir de diversos fatores, tanto racionais, quanto emocionais, os quais irão afetar o sujeito de modo significativo. Os fatores racionais estão relacionados à função prática, usabilidade, preço, entre outros. Os fatores emocionais relacionam-se às funções estéticas e simbólicas dos objetos (LÖBACH, 2000), evidenciadas pela sua aparência, tais como forma, cor, textura e também pelo seu significado, ou seja, pelo que ele representa para o indivíduo. Segundo Moles (1981), a relação entre o homem e os objetos passa por diversos estágios: inicia pelo desejo, que é suprido pela aquisição, em seguida pela descoberta e pela relação afetiva com ele. Depois desse estágio, ocorre um declínio da relação e o objeto pode ser conservado, substituído ou descartado. (QUEIROZ; CARDOSO; GONTIJO, 2009, p. 04)

Para imprimir emoção ao ambiente, é importante inserir objetos que de certa

forma marcaram ou marcam a vida das pessoas que habitam o espaço, ou seja,

aquelas peças que carregam lembranças e memórias e que tratam da história de

vida. De acordo com o sociólogo Norbert Elias129, que defendeu a relação homem-

sociedade através dos saberes do passado orientado pelos símbolos (NERY, 2016,

p. 18) o objeto ambientado ajuda a construir uma relação entre o homem e o espaço

traçando um vínculo emocional. A relação de vínculo emocional construída entre o

homem e o objeto tem despertado o interesse dos designers que buscam através

das emoções entender o que realmente importa para o indivíduo e, portanto, o que é

bem estar para ele; levando-o a tomar decisões e fazer escolhas. De acordo com

129 Norbert Elias (1897-1990) Sociólogo alemão foi responsável pelo desenvolvimento de uma teoria social que de certa forma ampliou os estudos sociológicos voltados para os processos de interação humana no âmbito da sociedade. A teoria de Elias defende a constituição da relação entre o indivíduo e a sociedade á partir da formação de teias de interdependência que dão origem a estruturas distintas família, cidade, estado, nações, entre outras; que de certa forma se fundem com bases nos saberes antepassados que se comunicam através dos símbolos. (Fonte: Sobre Norbert Elias. Disponível em: http://norbert-elias.com/pt/sobre-norbert-elias/. Acesso em: 01/07/2020).

181

Iida (2006 apud QUEIROZ; CARDOSO; GONTIJO, 2009, p.

Sendo assim, pode-se entender que a casa é o lugar de moradia fundamental

para preservar a sanidade dos indivíduos. É nela que abriga suas memórias e

lembranças, muito importantes para assegurar o seu bem estar. Diante disso, para

pensar e projetar seus ambientes, além de respeitar suas funções e favorecer as

interações sociais, é importante entender o sentido de pertença de quem habita o

espaço para que por meio da percepção possa criar um ambiente personalizado que

propague vínculo afetivo e potencialize suas capacidades conforme demonstrado a

seguir.

4.2 O homem e o espaço da cozinha uma análise

Pensar esteticamente, estilisticamente e funcionalmente são tarefas

complexas e essenciais ao projeto. Para tal são utilizados princípios técnicos que

permitem chegar ao resultado imprimindo a sensação de prazer e bem estar

perseguidos pelos clientes. O planejamento de um ambiente envolve basicamente,

desde a reunião e análise da informação pilar do trabalho, pois permite ao

designer de interiores amadurecer as ideias iniciais; passa pela etapa de criação que

além da intuição vai abordar questões como os princípios e normas norteadoras que

são fundamentais ao projeto de design para então chegar ao resultado pretendido

que seria um ambiente equilibrado e harmonioso segundo os valores de quem o

habita o cliente. Para tal são considerados aspectos como dimensionamento

humano, escala e proporção, os princípios da ordem (GIBBS, 2017, p. 70) e o

conceito de dispositivo espacial. Este último compreende uma análise que aborda:

O modo de relações interindividuais (homem/mulher, pais/filho, patrões/empregados), [...] a dimensão econômica (espaço de trabalho, de produção) e a sociabilidade ampliada (hospitalidade, recepção, modo de interação, ...) [...] onde a noção de dispositivo é compreendida como a organização de elementos reunidos de determinada maneira para produzir um efeito (relativo a condutas e práticas), que a intenção por si só explicita ou implica. (ELEB, 2017, p. 161).

O ambiente da cozinha, foco deste estudo, é o espaço segundo Eleb (2017, p.

163) que mais evoluiu no século XX e também o lugar principal do trabalho feminino

Sendo assim muitas opções e projetos foram pensados e desenvolvidos para

esse ambiente ao longo dessas décadas, assim como muitos objetos e materiais de

182

acabamento foram lançados pela indústria para conquistar os clientes e os

profissionais; é a democratização do bem-estar.

Nesse sentido, os clientes buscam na ambientação de suas cozinhas um

novo conceito, uma nova perspectiva, que muitas vezes pode estar direcionado por

modismos ou mesmo influenciado por tendências impostas de outras culturas como

uma forma de vender um estilo de vida; ou apenas uma remodelação com o objetivo

de organizar e otimizar os espaços de trabalho, principalmente quando se trata de

espaços pequenos conforme analisado a seguir.

4.2.1- Projeto cozinha de uma vida

No caso desse projeto realizado pela autora deste trabalho para sua cliente, a

Entrevistada 01 descrita anteriormente; uma senhora de 91 anos, nascida em Belo

Horizonte - MG, que mora em um apartamento construído na década de 1950 no

bairro Santo Antônio em Belo Horizonte Minas Gerais. O projeto solicitado à autora

compreendia a reforma de alguns cômodos do apartamento banheiro, quarto e

salas de estar e TV, com ênfase no ambiente da cozinha, espaço esse, que segundo

Algumas questões foram percebidas e levantadas, pois o apartamento se

localiza no terceiro e último andar do prédio que não possui elevadores, preocupada

com as questões de acessibilidade questionei a cliente, e também a sua filha e sua

neta que acompanharam o desenrolar do processo desde a criação do projeto até

a execução da obra; se não seria prudente vender o imóvel e comprar outro

apartamento com elevador ou mesmo em um andar mais baixo, mas segundo

o aqui guardada muitas

essa questão foi descartada uma

vez que a cliente tem pelo imóvel um apego, um afeto, portanto nem os filhos e

netos conseguiram convencê-la da troca.

Diante desse fato, o primeiro ponto a ser percebido foi a questão do

enraizamento, ou seja, o vínculo entre ela e o lugar ficou claro. Para ela, estar

naquele apartamento lhe proporciona uma sensação de pertencimento, de proteção,

de abrigo, muitas lembranças e uma forte conexão com os momentos felizes vividos

183

ao lado do seu marido já falecido e de sua família; fora que segundo Garcia (2019)

já estou acostumada aos vizinhos e ao lugar, tenho tudo perto e

Portanto, pensar a ambientação desse apartamento não permitia romper com esse

vínculo. Seria muito importante renovar trazendo elementos novos, mas mais

importante ainda seria preservar os aspectos que a conectasse com suas memórias.

Afinal defende-se que quando se trata de uma intervenção em um ambiente,

principalmente para um idoso, acredita-se ser de suma importância manter a

conexão com seu passado e ter cuidado ao substituir objetos que estão lá por algum

motivo, que simbolizam algo, seja uma crença ou mesmo uma lembrança.

A proposta inicial do projeto, solicitado por elas, era a modernização do

espaço criando um ambiente mais contemporâneo. De acordo com Garcia (2019)

Porém, investigando mais sua

história, tomou-se conhecimento de um período muito importante da sua vida em

que viveu na Fazenda Granjas Reunidas130, momento esse que ela relembra com

muito carinho. z

da minha vida Portanto, esse aspecto de sua história precisaria ser considerado

sem perder sua intensão de modernizar o espaço. O ponto importante agora seria

entender, a partir da interpretação dela, o que realmente seria um ambiente

moderno.

Após as reuniões de investigação, o próximo passo foi o reconhecimento dos

espaços a serem repensados. No caso da cozinha, esta foi devidamente identificada

e medida. A planta do espaço era comum às cozinhas do começo do século XX

influenciadas pelo projeto da Cozinha de Frankfurt relatado anteriormente, modelo

130 Fazenda Granjas Reunidas do Norte Um complexo de 1.500 km² que no começo do século XX pertencia ao Conde Alfredo Dolabela Portela ficava situada na região do norte de Minas mais precisamente no município de Bocaiúva MG. Nos terrenos da Fazenda havia uma serraria, uma destilaria de álcool e outros inúmeros empreendimentos que deram origem a Cia. Agro-industrial Dolabela Portela. Na época havia destaque para as condições de trabalho, pois os operários que ali trabalhavam recebia toda assistência além de independência econômica. O progresso e as condições locais de produção levaram a construção da linha ferroviária ao qual se denominou Estação Granjas Reunidas inaugurada em 1925 que ligava a fazenda à estrada de ferro Bahia-Minas. Em 1940, após o falecimento do Conde, a Fazenda foi vendida para as Industrias Reunidas Francisco Matarazzo maior grupo industrial do Brasil na época. (Fonte: Correio Paulistano. Ano 1939/Edição 25553. Disponível em: http://memoria.bn.br/DocReader/Hotpage/HotpageBN.aspx?bib=090972_08&pagfis=29787&url=http://memoria.bn.br/docreader#. Acesso em: 28/06/2020).

184

esse muito difundido no Brasil na época da construção do prédio. É uma planta mais

longa e fina (medindo 4,20M x 2,00M) cujo modelo reconhecido foi o corredor já

explicado no capítulo anterior, conforme ilustra a Figura 137.

Figura 137: Layout cozinha projeto apartamento Santo Antônio. Planta de reconhecimento análise espacial.

Fonte: Da autora (2019).

Durante a investigação percebeu-se um espaço pequeno, com restrição de

circulação; com pouca ventilação, pois a janela é um basculante no alto ao fundo do

ambiente e consequentemente com baixa iluminação natural. Avaliou-se também

que havia um amontoado de coisas sobre as bancadas entre utensílios

domésticos, eletroportáteis, adornos e vasilhas com alimentos; além do fato de que

se perdia muito espaço de armazenamento dentro dos armários porque o botijão de

gás ficava localizado embaixo da bancada ao lado do fogão afinal na década de

1950 não existia gás canalizado.

Mesmo diante desse cenário era possível perceber um espaço relativamente

organizado onde tanto a cliente quanto sua funcionaria se situavam muito bem,

sabiam exatamente onde estava cada item. Mas pa

ter lugar para todos os objetos, hoje não consigo ter acesso aos armários que estão

muito altos e é difícil acessar o que está muito embaixo, por isso deixo tudo na

; e cozinhar, utilizo

muito a bancada para abrir massas e manipular receitas, todas as vezes que preciso

cozinhar ou limpar tenho que tirar tudo de cima, é conforme ilustram

as Figuras 138, 139 e 140.

185

Figura 138: Vista bancada da cozinha original. Figura 139: Vista frontal da cozinha original.

Fonte: Da autora (2019) Fonte: Da autora (2019)

Figura 140: Vista lateral oposta da cozinha original - geladeira.

Fonte: Da autora (2019)

O passo seguinte foi a criação do projeto, a busca por elementos de

identidade, símbolos que registrassem as lembranças e também a preocupação com

a acessibilidade do espaço, pensando na melhor forma de potencializar a

186

capacidade individual da cliente, ou seja, criar um ambiente dócil cuja demanda está

no prazer de cozinhar e oferecer alimento aos seus. O conceito do projeto envolveu

elementos que remetessem a fazenda; uma pequena inserção de herança ancestral

que é a descendência espanhola e pequenos toques de modernidade oferecendo

diferentes sentimentos, conforme ilustra a Figura 141, o painel conceitual.

Figura 141: Moodboard Painel conceitual da cozinha elementos que inspiraram a construção e a imagem do projeto. Projeto: Apartamento Santo Antônio.

Fonte: Da autora (2019)

Nesse passo, foi importante considerar as questões que envolvem a

docilidade ambiental assim como a emoção e a afetividade, pontos analisados sob a

ótica da psicologia ambiental. Os elementos de inspiração levaram à escolha do

tijolo a vista que remete a fazenda e do azulejo trabalhado inspirado nos azulejos

valencianos131 que carrega o símbolo da região de Valência na Espanha. O

resultado apresentado, ilustrado nas Figuras 142, 143 e 144; apontou para um

espaço harmonioso, utilizando materiais contrastantes com texturas diferentes e

toque aconchegante, afinal de acordo com Gunther; Elali (2018, p.

131 Azulejo Valenciano Durante a permanência islâmica na Península Ibérica, a produção do azulejo cria bases próprias na Espanha, por meio dos artesãos mulçumanos, onde desenvolveu-se a técnica mudéjar entre o séc. XII e meados do séc. XVI em oficinas de Málaga, Valência e Talavera de la Reina, sendo o maior centro o de Sevilha. (Fonte: JHenrique arte, projetos e design. Disponível em: http://jhenrique.art.br/historia/. Acesso em: 02/07/2020).

187

Figura 142: Vista da bancada - projeto apresentado.

Fonte: Da autora (2019)

Figura 143: Vista frontal projeto apresentado. Figura 144: Vista geladeira projeto apresentado.

Fonte: Da autora (2019)

Fonte: Da autora (2019)

O toque de modernidade coube à reinterpretação dos azulejos valencianos

que foram substituídos pelas peças geométricas; assim como na utilização de

eletrodomésticos em aço inox e também na configuração dos armários. Estes foram

projetados utilizando ferragens que permitem oferecer opções de módulos mais

versáteis como os gavetões e prateleiras corrediças permitindo que os produtos

188

venham até o usuário, não o usuário vá ate o produto. Os armários altos foram

projetados para que fiquem mais baixos respeitando a ergonomia na utilização da

bancada, assim como um escorredor de pratos foi instalado dentro do módulo de

armário que fica sobre a pia permitindo que a bancada fique livre. As cores das

superfícies de acabamento foram escolhidas pensando em uma cartela de cores

mais sóbrias misturando tons terrosos com um toque de azul que proporciona uma

sensação de mais aconchego. O resultado foi um ambiente agradável, funcional e

carregado de lembranças positivas

tenho uma cozinha onde me sinto bem e onde consigo ter espaço e acesso

.

4.2.2- Projeto cozinha tecnológica

Outra experiência vivida pela autora foi o projeto que realizou para os

entrevistados 02 e 03, também clientes. Um casal jovem, dinâmico com uma vida

social ativa e que costuma receber amigos e parentes em casa. O projeto foi

solicitado com o objetivo de ambientar um apartamento de 205 m2 que o casal havia

acabado de adquirir no bairro Villa da Serra em Nova Lima Minas Gerais. O projeto,

além da ambientação dos cômodos quartos e as salas; priorizou a ambientação da

cozinha e a criação de um espaço gourmet.

As primeiras questões levantadas para entender as necessidades do casal,

principalmente nos aspectos que se referiam ao espaço gourmet, abordavam os

costumes, o gosto e os anseios de cada um. Descobrir seus valores aquilo que

realmente importa. Assim como entender o comportamento praticado pela família

para então perceber a demanda real e entender como atendê-la, afinal de certa

forma, foi solicitado a criação de dois espaços com funções semelhantes, diante

desse desafio era preciso compreender exatamente a função e os desejos, para se

obter uma affordance132.

Tanto um quanto o outro são extremamente conectados com tecnologia e

gostam de automação residencial,

132 Affordance - A definição foi originalmente proposta pelo psicólogo James Gibson em 1977 para denotar a qualidade de qualquer objeto que permite ao indivíduo identificar suas funcionalidades através de seus atributos (forma, tamanho ou peso) de maneira intuitiva e sem explicações. (NORMAN, Donald A. O design do dia a dia. 1988, p. 09).

189

equipamentos que facilitem as atividades diárias e que sejam facilmente

manuseados pelo tablet ou smartphone . Ambos priorizam o conforto acima de tudo,

mas .

Sendo assim, o que os atrai e o que os encanta é a possibilidade de ter

equipamentos eletroeletrônicos com a mais alta tecnologia e poder tirar deles o

maior benefício possível, um comportamento muito comum dessa geração que pode

ter sido herdado da cozinha equipada e racional do começo do século XX em que

segundo Eleb (2017, p.

Porém não somente a tecnologia

os atrai, pertencentes à geração X133, uma geração ambiciosa, mas que acima de

tudo, busca o equilíbrio, a natureza é um fator essencial para o casal. Para Martins

m conectar com minha infância e é muito

A partir das informações obtidas, percebeu-se que o primeiro ponto a ser

discutido era a questão da ambiência. Afinal segundo Thibaund (2018, p.

trata apenas de perceber uma paisagem ou de apreender visualmente um ambiente,

mas de experienciar

quem assume cada papel foi importante para compreender os aspectos que seriam

abordados em cada um dos ambientes.

espaço gourmet será o lugar do meu marido, onde ela irá passar a maior parte do

No caso da cozinha, o projeto priorizou a conexão

dos espaços e o fato de a família se reunir nela para realizar refeições rápidas, de

nos reunimos na mesa da

cozinha para o café da manhã, é o momento em que a família se reúne, pois temos

horários diferentes ao longo do d Dessa maneira projetar um canto com mesa e

as cadeiras de maneira confortável era uma das prioridades do espaço.

133 Geração X Pessoas nascidas antes dos anos 1980, homens e mulheres ambiciosos onde a carreira é importante assim como o equilíbrio com a vida pessoal. As mulheres dessa geração conquistaram um espaço relativamente importante no mercado de trabalho como líderes assim como os homens descobriram novas possibilidades de carreira como, por exemplo, o gosto pela gastronomia. (Fonte: Harvard Business Review. Disponível em: https://hbr.org/2017/08/a-survey-of-19-countries-shows-how-generations-x-y-and-z-are-and-arent-different. Acesso em: 28/06/2020).

190

Quanto ao espaço gourmet, sempre cuidadosamente tratado por eles,

carregava um conceito de conexão da família com o social, de acordo com Carvalho

de pessoas, pois nossas reun

Percebeu-se uma maior conexão por parte do marido, não somente por ser um

espaço em que ele passa a maior parte do tempo, mas por ser nele que aplica seu

hobby de cozinheiro aquela história do homem que assume a cozinha, porém dá a

ela uma nova conotação, um novo formato e obviamente separada do espaço

doméstico criando um ambiente propício à socialização; a exibição, como um

espaço de criatividade, de realizar a chamada alta gastronomia. (RISÉRIO, 2015, p.

148).

Compreendida as intenções e com o maior número possível de informações

coletadas, o passo seguinte foi o levantamento da área tanto da cozinha, quanto da

varanda onde seria projetado o espaço gourmet. O diagnóstico do espaço foi fácil,

pois o apartamento havia sido entregue com o mínimo de interferência possível, os

espaços estavam vazios. A planta da cozinha é ampla, medindo 4,30M x 3,00M;

permitindo várias possibilidades de configuração. Dessa forma, a escolha para esse

importante deixar livre uma área para colocar

uma mesa com quatro cadeiras. Essa configuração permitiu um layout confortável e

espaçoso onde cada elemento de trabalho principal ficou acessível sem interferir a

circulação, como mostra a Figura 145.

Figura 145: Layout cozinha projeto apartamento Vila da Serra. Planta de reconhecimento análise espacial.

Fonte: Da autora (2019)

191

O conceito proposto para o projeto foi o uso da tecnologia aliada aos

elementos da natureza. Onde o natural ficou presente por meio dos materiais de

acabamento e da escolha da cor principal do ambiente o verde bambu, conforme

ilustra o painel conceitual da Figura 146.

Figura 146: Moodboard Painel conceitual da cozinha elementos que inspiraram a construção e a imagem do projeto. Projeto: apartamento Vila da Serra.

Fonte: Da autora (2019)

Para esse projeto foi utilizado os aspectos da ambiência, segundo os

preceitos da psicologia ambiental e também da biofilia134 por meio da escolha de

superfícies que remetem a natureza como a utilização de padrão amadeirado nos

móveis, da pedra nas bancadas e a especificação do revestimento de pastilhas de

pedra natural e vidro na parede acima do fogão. A tecnologia ficou marcada à partir

da especificação de equipamentos eletrodomésticos automatizados e com

tecnologias de ponta que minimizam gasto energético e que, quando possível, 134 Biofilia O conceito de biofilia segundo Edward Osborne Wilson (1929) um entomologista e biólogo americano conhecido por seu trabalho com ecologia, evolução e sociobiologia; pode ser entendido como um complexo ou conjunto de instintos, que em algum momento do passado evolutivo da humanidade favoreceu o indivíduo em algum nível de seleção natural através do direcionamento das relações de aprendizado para os fenômenos naturais. A biofilia aplicada à arquitetura e ao design defende a premissa de que a essência do homem enquanto indivíduo está intimamente ligada à natureza e que para construir espaços do ponto de vista urbano e também privado é importante compreender a relação homem-natureza, sendo assim o estudo da biofilia auxilia na compreensão dessa interface. A utilização de plantas, materiais naturais ou que remetam à natureza foi um dos aspectos que os profissionais encontraram de marcar a presença verde dentre dos ambientes residenciais e corporativos. A maneira como são utilizados e as propriedades e benefícios adquiridos

of biophilia and the environmental movement in the USA. Kladyan: Research Gate, v.6, 4-17, 2009.).

192

tenham características e funções com benefícios à saúde como o caso do

refrigerador side by side que utiliza a nanotecnologia no combate as bactérias. O

resultado apresentado, conforme ilustram as Figuras 147, 148 e 149; demonstrou

um espaço equilibrado, harmonioso, confortável acima de tudo, que utilizou

materiais contrastantes com texturas, cores e acabamentos diferentes.

Figura 147: Cozinha projeto apartamento Vila da Serra vista das áreas de trabalho: pia, fogão e geladeira.

Fonte: Da autora (2019)

Figura 148: Vista da torre de equipamentos. Figura 149: Vista da mesa de refeições.

Fonte: Da autora (2019)

Fonte: Da autora (2019)

193

No caso do espaço gourmet ou varanda gourmet a proposta conceitual do

espaço em si, que no Brasil apareceu pela primeira vez na Mostra de Decoração

Casa Cor135 no final do século XX e se difundiu pelo país; acredita ser o de criar um

ambiente favorável a interação social que ofereça ferramentas suficientes para fazer

pratos especiais para pequenos grupos de convidados onde o destaque fica por

conta do ato de cozinhar a comida ao vivo exibindo utensílios e eletroportáteis de

última geração. Como a ideia de que o ambiente da cozinha é um espaço restrito ao

trabalho doméstico onde de acordo com Eleb (2017, p.

invisível, pois é preciso deixar tudo bem arrumado e, de alguma maneira, fechá-

não se torna propicio para receber pessoas, mesmo que na contemporaneidade

tenha se transformado em um lugar de sociabilidade familiar (ELEB, 2017, p. 163).

Portanto, para receber pessoas e cozinhar para elas transformando a reunião em

uma verdadeira experiência gastronômica, o ambiente precisa ser preparado e

socializado, ou seja, para projetar o espaço gourmet é imprescindível conecta-lo

com a sala de estar.

Sendo assim, o espaço da varanda do apartamento do casal foi a área

escolhida para a ambientação do espaço gourmet. Um ambiente relativamente

grande medindo 6,85M x 3,00M foi encontrado dividido por uma porta de correr de

vidro e aberto à área externa. Diante desse cenário, a primeira proposta era de

integrá-lo ao corpo social da casa a sala de estar; que para tal foi removida a porta

e a sacada foi fechada por uma cortina de vidro. A escolha da cortina de vidro foi

estratégica, pois uma das exigências era que nesse espaço fosse projetada uma

churrasqueira, dessa forma a cortina de vidro permite abrir o espaço deixando-o livre

e totalmente aberto. A integração favoreceu não somente a criação de um espaço

agradável e espaçoso como ampliou a sala de estar, conforme ilustra a Figura 150.

135 CASA COR A CASACOR é uma das empresas do Grupo Abril, é reconhecida como a maior e mais completa mostra de arquitetura, design de interiores e paisagismo das Américas. Anualmente, o evento reúnerenomados arquitetos, designers de interiores e paisagistas. Está presente em 21 cidades nacionais e mais seis países entre eles: Peru, Bolívia, Paraguai e EUA na cidade de Miami. A primeira edição aconteceu em junho do ano de 1987 na cidade de São Paulo-SP no Brasil, nasceu com o intuito de ser um evento social, cultural e benemérito, organizado por Yolanda Figueiredo (1925-2017) e Angélica Rueda personalidades na área de arquitetura e design de interiores. (Fonte: Casa Cor. Disponível em: https://casacor.abril.com.br/historia/. Acesso em: 30/06/2020.)

194

Figura 150: Layout Varanda Gourmet projeto apartamento Vila da Serra. Planta de reconhecimento análise espacial.

Fonte: Da autora (2019)

Depois de pensada as devidas alterações estruturais, o próximo passo foi

definir o conceito do projeto

importante criar vínculo entre ele e o ambiente, nesse sentido buscou-se através de

sua história aspectos que pudessem se tornar referência. Sendo assim, sua infância

foi investigada para conhecer suas lembranças; e seus desejos foram avaliados,

traçando o perfil de uma pessoa discreta, que viveu poucas, mas intensas

experiências e que acima de tudo gosta de ser livre. Portanto o conceito pensado

para o projeto manteve a essência conceitual proposta para o projeto do

apartamento aliar tecnologia com elementos da natureza, porém a escolha dos

materiais buscou traços mais masculinos, como linhas mais retas e um espaço sem

excessos. A cartela de cores propôs tons neutros e mais sóbrios, contrastantes entre

si, onde o diferencial ficou por conta das texturas das superfícies dos materiais.

Foram inseridos objetos de sua identidade com elementos de suas memórias a fim

de proporcionar um ambiente aconchegante e confortável, conforme ilustra o painel

conceitual da Figura 151.

195

Figura 151: Moodboard Painel conceitual da varanda gourmet elementos que inspiraram a construção e a imagem do projeto. Projeto: apartamento Vila da Serra.

Fonte: Da autora (2019)

Para esse projeto, foi utilizado os mesmos preceitos do projeto anterior

aspectos da ambiência e da biofilia; a fim de manter uma lógica projetual. Os

elementos escolhidos para o ambiente também foram a madeira que aparece no

detalhe encrustado na parede, os equipamentos automatizados e as plantas

naturais, pois a luminosidade e a ventilação do ambiente favorecem sua utilização.

O resultado foi um ambiente elegante, sóbrio e muito confortável, que de acordo

com Martins

momentos de convívio social além de momentos de privacidade e prazer ao meu

conforme ilustram as Figuras 152, 153 e 154.

Figura 152: Varanda Gourmet projeto apartamento Vila da Serra vista das áreas de trabalho: pia, forno e churrasqueira.

Fonte: Da autora (2019)

196

Figura 153: Vista frontal da varanda gourmet.

Figura 154: Vista da parede verde.

Fonte: Da autora (2019)

Fonte: Da autora (2019)

Mediante a análise dos dois casos é possível compreender a importância da

avaliação sob a ótica da psicologia ambiental. O mesmo ambiente, a cozinha, que

possui as mesmas características foi visto de pontos de vista completamente

diferentes. Os aspectos que envolvem as escolhas e as preferências podem e

devem ser avaliados a partir de pontos de vista distintos; principalmente quando há

choque de gerações com anseios, valores e expectativas de vida diferentes.

Como resultado das duas análises, é interessante avaliar como a ferramenta

da psicologia ambiental trouxe perspectivas diferentes além de novas maneiras de

perceber e entender o cliente favorecendo o encontro de mais possibilidades e mais

opções para pensar o projeto e suas características. Cada espaço tem além de sua

função uma idealização, sendo assim é importante entender o cliente intuitivamente.

No caso da idealização de um espaço, aqui se destaca o espaço gourmet,

está muito mais ligado à possibilidade de vivenciar experiências, intrínseco das

novas gerações, que propriamente a necessidade de se ter esse ambiente em casa.

De acordo gourmet é um sonho que

pretendo realizar em breve, pois cozinhar para mim é um prazer e o espaço é muito

Os modismos propiciam novas

abordagens que estimulados pela sociedade capitalista desencadeou em uma

dinâmica de produção e de consumo estético, transformando na sociedade

espetáculo (LIPOVETSKY; SERROY, 2015, p. 27).

197

É imprescindível entender que as relações homem/mulher, pais/filhos e entre

irmãos são complexas e que, do ponto de vista psicossocial, exigem aspectos

específicos à realidade de cada um, afinal ambos precisam coexistir no mesmo

espaço mantendo sua privacidade e suas exigências devidamente atendidas para

que a relação homem-espaço seja plena em todos os aspectos constituindo vínculo

entre eles.

Independente do ambiente, independente da necessidade, conforme citou

Bachelard (2008, p. -estares têm um passado. Todo um

passado e independente de suas experiências é importante buscar nele força para

sustentar o presente e essa força está nas referências e lembranças que a memória

nos permite vivenciar.

Atualmente os indivíduos vivenciam uma realidade em que segundo Eleb

(2017, p. , os rituais ligados aos diferentes grupos sociais,

são negligenciada a verdadeira essência de quem habita

percebendo seus valores, potencializando suas competências e respeitando suas

lembranças e memórias; pode ser uma saída para entender a nova realidade a qual

a sociedade está vivenciando.

198

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A proposta que motivou a construção dessa dissertação teve início com a

vontade de conhecer e aprofundar na história do ambiente da cozinha, que é muito

negligenciado mediante a história da gastronomia. Chama-se muita atenção à

culinária com seus ingredientes e ousadas composições de sabores e esquece o

quão importante é o espaço destinado à cozinha, não somente do ponto de vista

projetual como e principalmente para a história da sociedade tanto no Brasil como

no mundo. A cozinha é um símbolo de muitas rupturas sociais que vão desde a

reorganização dos espaços de trabalho, passa pela reestruturação no modo de

pensar o projeto e os espaços, esbarra nas questões feministas, na história do

design e termina refletindo a transformação comportamental das sociedades.

Sabe-se que, a sociedade capitalista através da estetização das coisas e da

sociedade espetáculo impõe comportamentos e difunde hábitos de consumo e

juntamente com o fator globalização, abriu precedentes aos modismos, que acabou

por descaracterizar as culturas locais; internacionalizar os gostos e estilos e em

alguns casos, desconstruiu a identidade dos lugares. É preciso ter cuidado, esse é

um dos riscos da globalização. Por outro lado proporcionou uma rápida difusão das

tendências e tecnologias aproximando as culturas. As influências estilísticas se

tornaram globais e nos grandes centros, os clientes querem que suas casas

acompanhem as tendências internacionais.

Uma mudança de estilo de vida e de comportamento tornou-se necessária,

afinal os recursos naturais estão cada vez mais escassos e a saturação da produção

industrial está cada vez mais nítida. É preciso mudar, é fato que há uma

aproximação do caos. Para tal mudança é importante um alto conhecimento, uma

compreensão do entorno e de suas relações, o que nos move, o que nos faz feliz. A

importância do debate histórico torna-se visível, pois através dele que se podem

entender os caminhos percorridos e quais pontos foram deixados de lado.

Em meio a essa reflexão ocorre, no começo do ano de 2020, uma grave

pandemia que para o mundo inteiro, isola as pessoas em suas casas e assombra as

sociedades forçando os indivíduos a se reorganizarem exigindo uma ressignificação

do modo de vida e de produção. Diante desse cenário são levantadas várias

199

questões, e reflexões começam a surgir em todos os âmbitos sociais onde a mais

importante delas é a ressignificação do espaço de morar, afinal a casa se tornou o

centro de todo o contexto. As pessoas passaram a ficar em casa, trabalhar e estudar

de casa e a relação das pessoas com o espaço ganhou uma nova conotação.

A importância para com o território avaliando os benefícios e potencial que o

entorno é capaz de oferecer, ou seja, alimentar-se do que se pode fornecer e

produzir; trabalhar de maneira mais equilibrada; assim como o autoconhecimento e

a preocupação com o outro são alguns aspectos a serem considerados. Nunca

antes visto se teve tanta preocupação com as questões emocionais, de afeto e os

valores, afinal estar isolado não é mais uma questão de opção. Reconhecer esse

novo lar, e à sobrevivência

da sociedade e das profissões. Ressignificar, repensar e adaptar-se têm sido as

palavras de ordem.

Mediante esse cenário, surge então uma forte relação com o ambiente da

cozinha. Este, que já passava por transformações, assume agora o verdadeiro

status de coração da casa, um espaço capaz de propagar afeto, afinal o ato de

alimentar o outro é sim, de fato, uma demonstração de amor. Portanto, torna-se de

suma importância questionar, refletir e discutir sobre esse ambiente, inserindo

elementos que podem facilitar a compreensão das questões do espaço, e uma das

mais importantes é a reflexão da relação homem-ambiente.

Para tal é fundamental entender o homem, como ele pensa e age e também

compreender o significado do espaço e seu entorno para então entender como se

relacionam e aqui a psicologia ambiental se mostra essencial, por meio de seus

conceitos é possível projetar um espaço direcionado onde sejam abordados

aspectos fundamentais para se atingir o bem estar e o equilíbrio muito importantes

para o atual cenário.

Mediante essa análise, fica então a grande reflexão e a conclusão de que

essa dissertação abre discussões e precedentes a novas interpretações da relação

do homem-ambiente no espaço de morar, novos estudos precisam ser realizados

assim como questionamentos precisam ser feitos; mostrando não somente a

importância de reflexões como essa, como abrindo precedente para a continuidade

200

desse trabalho que podem ser discutidas em outros momentos por mim ou por

outros pesquisadores.

201

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Horizonte: Produtora Suma Filmes, 2007. Disponível em:

https://www.youtube.com/watch?v=EoTn-ExUdxc. Acesso em: 10 de maio de 2019.

ENTREVISTAS

CASTRO, Marfiza de. Entrevista sobre a cozinha. [Entrevista concedida a] Luciana

de Castro Avellar Maeda. Belo Horizonte, 30 de outubro de 2019.

CARVALHO, Fabrício. Entrevista sobre cozinha e espaço gourmet. [Entrevista

concedida a] Luciana de Castro Avellar Maeda. Belo Horizonte, 05 de Janeiro de

2019.

GARCIA, Edy. Entrevista sobre a cozinha. [Entrevista concedida a] Luciana de

Castro Avellar Maeda. Belo Horizonte, 10 de Setembro de 2019.

MARTINS CARVALHO, Juliana. Entrevista sobre cozinha e espaço gourmet.

[Entrevista concedida a] Luciana de Castro Avellar Maeda. Belo Horizonte, 05 de

Janeiro de 2019.

VANNI, Tulio. Entrevista sobre a cozinha e espaço gourmet. [Entrevista concedida a]

Luciana de Castro Avellar Maeda. Belo Horizonte, 20 de Junho de 2020.

209

APÊNDICE

Roteiros das entrevistas realizadas

Abaixo seguem os questionários aplicados a cada um dos entrevistados a fim

de analisar sua relação com o espaço da cozinha e o espaço gourmet. Os

questionários estão devidamente identificados pela ordem citada no texto.

Entrevistada 01:

Entrevistada: Sra. Edy Garcia

Data da Realização: 10 de Setembro de 2019

Roteiros das entrevistas:

Questões:

1- Quem é a Sra. Edy Garcia uma breve biografia.

2- Quais as preferências e o que não gosta.

3- Como foi sua infância?

4- Descreva sua casa ao se casar fale-me dos ambientes, dos locais onde

gostava de ficar, da sua relação com sua casa.

5- O que significa o ambiente da cozinha para você?

6- Descreva como era a cozinha da sua casa? Fale-me do ambiente.

7- Quem era responsável pela cozinha em casa? Cozinhava, limpava, cuidava.

8- A partir de quando os eletrodomésticos fizeram parte da sua vida? E qual a

importância deles para você?

9- Qual o primeiro eletrodoméstico você adquiriu? Foi um presente? Quem deu?

10- Descreva sua família: profissão, filhos, marido.

11- Como era o dia-a-dia da sua família em casa? Local predileto para refeições,

para descansar, para conversar.

12- Quantas cozinhas diferentes você teve? Casa, apartamento, projetos.

13- Qual delas foi mais importante, mais especial?

14- Conte-me sobre um momento especial que você viveu em sua cozinha.

15- Qual a cozinha dos seus sonhos?

210

Entrevistada 02:

Entrevistada: Sra. Juliana Martins Carvalho

Data da Realização: 05 de Janeiro de 2019

Roteiros das entrevistas:

Questões:

1- Que é a Juliana uma breve biografia.

2- O que mais gosta de fazer?

3- O que mais te choca?

4- Como você percebe a tecnologia hoje?

5- Descreve sua casa na sua infância.

6- Descreva sua casa ao se casar fale-me dos ambientes, dos locais onde

gostava de ficar, da sua relação com sua casa.

7- Descreva como era a cozinha da sua casa? Fale-me do ambiente.

8- Quem é o responsável pela cozinha em casa? Cozinhava, limpava, cuidava.

9- Como seria sua cozinha sem os equipamentos eletrônicos? E qual a

importância deles para você?

10- Qual o primeiro eletrodoméstico você adquiriu? Foi um presente? Quem deu?

11- Descreva sua família: profissão, filhos, marido.

12- Como é o dia-a-dia da sua família em casa? Local predileto para refeições,

para descansar, para conversar.

13- Quantas cozinhas diferentes você teve? Casa, apartamento, projetos.

14- Qual delas foi mais importante, mais especial?

15- Conte-me sobre um momento especial que você viveu em sua cozinha.

16- Qual a cozinha dos seus sonhos?

17- Porque você quer um espaço gourmet?

18- Qual sua relação com o espaço gourmet?

19- O que não pode faltar em um espaço gourmet?

211

Entrevistado 03:

Entrevistado: Sr. Fabrício Carvalho

Data da Realização: 05 de Janeiro de 2019

Roteiros das entrevistas:

Questões:

1- Quem é o Fabrício uma breve biografia.

2- Como foi sua infância?

3- O que mais gosta de fazer?

4- Quais seus sonhos?

5- Como você se relaciona com a tecnologia?

6- Descreva como era a cozinha da sua casa? Fale-me do ambiente.

7- Como seria sua vida sem os equipamentos eletrônicos? E qual a importância

deles para você?

8- Qual o primeiro eletrodoméstico você adquiriu? Por quê?

9- Descreva sua família: profissão, filhos, esposa.

10- Como é o seu dia-a-dia e o da sua família em casa? Local predileto para

refeições, para descansar, para conversar.

11- O que você faz para se divertir?

12- Gosta de cozinhar?

13- Onde prefere cozinhar?

14- Quais os pratos prefere fazer?

15- Quais utensílios e equipamentos eletrônicos não podem faltar no seu espaço?

16- Qual a importância do espaço gourmet para você?

212

Entrevistado 04:

Entrevistado: Sra. Marfiza de Castro

Data da Realização: 30 de Outubro de 2019

Roteiros das entrevistas:

Questões:

1- Quem é a Sra. Marfiza? Uma breve biografia.

2- O que ela gosta de fazer? O que não gosta?

3- Como foi sua infância?

4- Qual sua relação com a cozinha? E com a culinária?

5- Descreva sua casa ao se casar fale-me dos ambientes, dos locais onde

gostava de ficar, da sua relação com sua casa.

6- Descreva como era a cozinha da sua casa? Fale-me do ambiente.

7- Quem era responsável pela cozinha em casa? Cozinhava, limpava, cuidava.

8- A partir de quando os eletrodomésticos fizeram parte da sua vida? E qual a

importância deles para você?

9- Para você qual o significado dos eletrodomésticos na vida da mulher na

década de 1950?

10- Qual o primeiro eletrodoméstico você adquiriu? Foi um presente? Quem deu?

11- Descreva sua família: profissão, filhos, marido.

12- Cozinhar profissionalmente para você significa?

13- Como era o dia-a-dia da sua família em casa? Local predileto para refeições,

para descansar, para conversar.

14- Quantas cozinhas diferentes você teve? Casa, apartamento, projetos.

15- A cozinha de casa era diferente da cozinha profissional?

16- Qual delas foi mais importante, mais especial?

17- Conte-me sobre um momento especial que você viveu em sua cozinha.

18- Qual a cozinha dos seus sonhos?

213

Entrevistado 05:

Entrevistado: Sr. Túlio Vanni

Data da Realização: 20 de Junho de 2020

Roteiros das entrevistas:

Questões:

1- Qual o primeiro contato com a cozinha que você teve?

2- O que te levou a cozinhar como hobby?

3- Como é a sua cozinha atualmente?

4- Descreva como era a cozinha da sua casa na infância? Fale-me do ambiente.

5- Você tem um espaço gourmet?

6- Pretender ter um espaço gourmet? Por quê?

7- A partir de quando os eletrodomésticos fizeram parte da sua vida? E qual a

importância deles para você?

8- Qual o primeiro eletrodoméstico você adquiriu?

9- Descreva sua família: profissão, filhos, esposa.

10- Como é o dia-a-dia da sua família em casa? Local predileto para refeições,

para descansar, para conversar.

11- Quantas cozinhas diferentes você teve? Casa, apartamento, projetos.

12- Qual delas foi mais importante, mais especial?

13- Conte-me sobre um momento especial que você viveu em sua cozinha.

14- Qual a cozinha dos seus sonhos?

15- Como é o espaço gourmet dos seus sonhos?

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ANEXO I

215

ANEXO II

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE ESCLARECIDO

Caro (a) Senhor (a),

Eu, nome do pesquisador, aluna do curso de Mestrado da Escola de Design da UEMG, portador (a) do RG número do documento, residente na Rua endereço completo, sendo meu telefone de contato número do telefone, vou desenvolver uma pesquisa cujo título é A ambientação da cozinha mineira: as interfaces entre a memória, a história e o design, cujo objetivo deste estudo é entender a transformação do ambiente da cozinha em Minas Gerais a partir da eletromodernização proposta pela revolução industrial da virada do século XVIII para o XIX até a cozinha contemporânea através da investigação de sua relação com o Homem e de que forma o design interfere nesse contexto.

Para a realização deste estudo adotou-se os seguintes procedimentos: A pesquisa foi iniciada com um levantamento bibliográfica e documental para contextualização histórica do ambiente cozinha na capitania de Minas Gerais a partir de 1750 traçando um estudo cronológico até o século XXI, nele foi avaliado suaconfiguração na planta da casa e seus artefatos compreendendo de que forma se relacionou com o homem ao longo desse período. Pretendeu-se também conhecer como a literatura científica na área identifica e projeta o ambiente da cozinha e o relaciona com a sociedade, com ênfase na cultura material e sua relação com o design. Em seguida, para se atingir os demais objetivos específicos, pretendeu-se fazer um trabalho com a metodologia de pesquisa qualitativa utilizando a história oral de vida, uma vez que se entende que grande parte da análise vem através da experiência e vivência de pessoas que presenciaram as transformações ocorridas durante esse período estudado, são documentos do tipo biográficos, assim como de memórias e autobiografias, a fim de compreender como as mudanças afetaram direta ou indiretamente o comportamento dos indivíduos. O universo das entrevistas se restringiu a cidade de Belo Horizonte - capital do estado de Minas Gerais; onde os sujeitos foram pessoas de ambos os sexos, que presenciaram no dia a dia as transformações propostas pela eletromodernização.

216

A amostra estudada foi de 03 mulheres e 02 homens totalizando 05 entrevistados ambos pertencentes às classes A e B da cidade de Belo Horizonte. Pessoas que buscam conforto, bem estar e priorizam um estilo de vida onde o ato de cozinhar é parte do dia-a-dia e dos seus momentos de lazer social. Partes desses entrevistados realizaram projetos de interiores, onde a estética e a funcionalidade foram pré-requisito de projeto. A coleta de dados foi feita por meio de uma entrevista semiestruturada, pois permite adaptar de acordo com cada realidade; a ser realizada em local de preferência do entrevistado. De posse dos dados coletados, foi feita uma análise de conteúdo, para que os resultados possam ser interpretados a partir de categorias isoladas conforme objetivos da pesquisa e relevância apontada na literatura científica.

Gostaria de convidá-lo (a) a colaborar de forma VOLUNTÁRIA com esta pesquisa.

Para participar deste estudo você não terá nenhum custo, nem receberá qualquer vantagem financeira; a proposta de metodologia de história oral, foi escolhida, pois foi detectada uma carência de registros sobre o ambiente estudado. A entrevista foram apenas com o intuito de investigar, através do cotidiano dos entrevistados como era o ambiente da cozinha e a relação com o mesmo. As perguntas foram direcionadas apenas ao espaço da cozinha e a relação do entrevistado com o ambiente; não oferecendo nenhum tipo de risco à saúde ou qualquer dano moral. Ao detectar a carência de registros e bibliografias na área pesquisada, uma vez que são encontrados poucos estudos e relatos do interior das residências em Minas Gerais, a proposta de levantar um estudo sobre o ambiente da cozinha; este, muito rico do ponto de vista cultural e gastronômico; e ao mesmo tempo a escolha da metodologia de história oral de vida possibilitam resgatar valores e memórias que estão sendo perdidos com o tempo e que fazem parte da história da sociedade. Além de ser uma pesquisa simples na prática e de baixo custo, a narrativa se apresenta como uma ferramenta de grande valor, pois é responsável pela humanização das pessoas; resgata experiências e histórias de momentos da vida do entrevistado que talvez nem mesmo os parentes mais próximos teriam conhecimento. É uma forma estratégica de manter viva a individualidade de cada uma das pessoas entrevistadas, mostrando sua importância enquanto indivíduo e ao mesmo tempo suas memórias passam a fazer parte da memória do ambiente e da sociedade, retratando a cultura material local.

217

Você será esclarecido (a) sobre o estudo em qualquer aspecto que desejar e estará livre para participar ou recusar-se a participar. Poderá retirar seu consentimento ou interromper a participação a qualquer momento. A sua participação é voluntária e a recusa em participar não acarretará qualquer penalidade ou modificação na forma em que é atendido pelo pesquisador.

Não existe outra forma de obter dados com relação ao procedimento em questão e que possa ser mais vantajoso do que o proposto nesta pesquisa.

Eu, Luciana de Castro Avellar Maeda, como responsável pela condução desta pesquisa, tratarei os seus dados com o devido profissionalismo e sigilo, garantindo a segurança da sua privacidade.

O Sr (a) tem o direito de ser mantido atualizado sobre os resultados parciais da pesquisa, e caso seja solicitado, darei todas as informações que o senhor (a) quiser saber. O senhor (a) também poderá consultar a qualquer momento o Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade do Estado de Minas Gerais, responsável pela a autorização para a realização deste estudo.

Não existirão despesas ou compensações pessoais para nenhum participante em qualquer fase do estudo, incluindo exames e consultas, se necessário. Se existir qualquer despesa adicional, ela será absorvida pelo orçamento da pesquisa.

Eu me comprometo a utilizar os dados coletados somente para pesquisa e os resultados deverão ser veiculados por meio de artigos científicos em revistas especializadas e/ou em encontros científicos e congressos, sem nunca tornar possível sua identificação. Seu nome ou o material que indique sua participação não será liberado sem a sua permissão.

Em anexo está o consentimento livre e esclarecido para ser assinado caso não tenha ficado qualquer dúvida, esse termo de consentimento será impresso em duas vias originais: sendo que uma será arquivada pelo pesquisador responsável, e a outra será fornecida a você.

Acredito ter sido suficientemente informado a respeito das informações que li ou que foram lidas para mim, descrevendo o estudo A ambientação da cozinha mineira: as interfaces entre a memória, a história e o design, com o objetivo de investigar quais os impactos da Revolução Industrial no ambiente da cozinha na sociedade mineira e de que forma a "eletromodernização" reflete a cultura material da sociedade do século XXI a sociedade da "gourmetização".

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Eu tirei todas as minhas dúvidas sobre o estudo e minha forma de participação com o (a) pesquisador (a) Luciana de castro Avellar Maeda, responsável pelo mesmo.

Ficaram claros para mim quais são os propósitos do estudo, os procedimentos a serem realizados, as garantias de confidencialidade, os riscos e benefícios e a garantia de esclarecimentos permanentes.

Ficou claro também, que minha participação é isenta de despesas ou gratificações e que tenho garantia do acesso aos resultados, onde os meus dados apenas serão divulgados com a minha autorização. Concordo voluntariamente em participar deste estudo sabendo que poderei retirar o meu consentimento a qualquer momento, antes ou durante o mesmo, sem penalidade, prejuízo ou perda de qualquer benefício que eu possa ter adquirido anteriormente ao estudo.

DADOS DO VOLUNTÁRIO DA PESQUISA: Nome Completo: _________________________________________________Endereço: _______________________________________________________ RG: ____________________________________________________________ Fone: ( __ ) ______________ Email: __________________ __________________________________, _______________________, __________ Assinatura do pesquisador Cidade, Data.

DADOS DO PESQUISADOR RESPONSÁVEL: Nome Completo: _________________________________________________Endereço: _______________________________________________________ RG: ____________________________________________________________ Fone: ( __ ) ______________ Email: __________________