Lotina Clara Rafael Burine
Turma: 7111
Nº MEC 73543
BUROCRACIA VERSUS MANAGERALISMO
Instituto Superior de Contabilidade eAdministração da Universidade de Aveiro
Mestrado em Contabilidade e Administração Pública
Burocracia versus Manageralismo
SUMÁRIO
Indice
Resumo
1. Introdução……………………………………………………………………………………….....4
2. Burocracia………………………………………………………………………………………….5
2.1. O que é
burocracia?........................................................
..................................................... 5
2.2. Poder, domínio e denominação…………………………………………………………………...6
2.3. As dimensões burocráticas das
organizações…………………………………………………..6
2.4. As disfunções da burocracia……………………….………………………………………………8
3. A nova gestão pública……………………..……………………………………………………11
3.1. Condições materiais e intelectuais para o surgimento do
manageralismo………………….11
4. O desenvolvimento do manageralismo no setor público. Experiência
Anglo-Americana………………………………………………………………………………………....14
4.1. O manageralismo puro……………………………………………………………………………14
4.2. O novo manageralismo ou New Public Management…………………………………………
16
4.3. Avaliação do New Public Management…………………………………………………..……..19
5. Sugestões conclusiva…………………………………………………………………….……..21
6. Referências bibliográficas………………………………………………………………...……22
2
Burocracia versus Manageralismo
LISTAS DE TABELAS
Tabela 1-Dimensões da burocracia e comentários………………………………………………………6
Tabela 2 - Disfunções da burocracia…………….........……………….…………………..……………...8
Tabela 3 - Elementos-chave do NPM.....…………………………………………………………………18
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Burocracia versus Manageralismo
Resumo
Os modelos de Gestão Pública têm-se sucedido ao longo dos tempos, muitas
vezes associados às mudanças na concepção e ideologia do Estado (mais ou
menos intervencionistas). As últimas décadas têm representado um ataque
ao modelo de gestão pública associado ao Welfare State. Acusam-no de ser
ineficiente e demasiado lento a reagir às necessidades dos cidadãos e às
mutações do meio onde se insere. Também é acusado de prejudicar o
desenvolvimento e o crescimento económico. Este modelo é tido como um
meio que permite a criação de agentes e processos burocráticos que
desenvolvem a sua atuação com um único propósito, o aumento do seu bem-
estar e do seu poder.
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Burocracia versus Manageralismo
A Nova Gestão Pública baseia-se na introdução de mecanismos de mercado e
na adoção de ferramentas de gestão privada, na promoção de competição
entre fornecedores de bens e serviços públicos, na expectativa da
melhoria do serviço para o cidadão, no aumento da eficiência e na
flexibilização da Gestão. A Nova Gestão Pública convida novos atores a
serem parte ativa de um Estado que se pretende menos intervencionista mas
que continue a regular funções importantes da vida social e económica:
Estas alterações, ao nível da Administração Central, acabaram por
influenciar e condicionar a agenda da reforma e modernização
administrativa dos Governos Locais. É relativamente a esta realidade que
procuramos perceber como foram sentidas as alterações induzidas pela Nova
Gestão Pública. Esta comunicação analisa as formas de prestação de
serviços de maneira a verificar o acolhimento das soluções das reformas
sugeridas pela Nova Gestão Pública na governação local.
1. INTRODUÇÃO
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Burocracia versus Manageralismo
Para entendermos as mudanças que vêm ocorrendo nas instituições Públicas
nestas últimas décadas, devemos começar por entender as pressões
governamentais exercidas sobre as administrações públicas para obtenção
de maior eficiência, eficácia, competição pela qualidade, prestação de
contas e as tentativas de eliminação da corrupção, ou seja, as práticas
administrativas do New Public Management conjugadas com a introdução
do managerialismo. O New Public Management
A crise do Welfare State nos Estados Unidos e na Europa conduziu a perguntas
sobre o papel e o carácter institucional do Estado. Deste questionamento
surge a necessidade de reformas na administração pública. Porém, estas
reformas só vão acontecer por pressões externas e no contexto de
programas de ajuste estrutural.
A filosofia da New Public Management (NPM) torna-se a filosofia dominante na
implantação destes ajustes estruturais. Seu objetivo central é a melhoria
dos modos pelos quais o governo é administrado, com ênfase em eficiência,
economia e eficácia (LARBI, 1999 citado por Dalva Magro (2006)), bem como
na implantação de políticas que premiam estas qualidades como forma de
reorganizar e modernizar burocracias públicas.
Objetivo do Estudo
Contribuir para uma clarificação sobre a burocracia e a nova gestãopública em Portugal, mas também propor algumas sugestões na administraçãopública portuguesa.
Metodologia do Trabalho
Dado a complexidade da elaboração de um trabalho científico, a seleção
dos documentos necessários é importante para o desenvolvimento do
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Burocracia versus Manageralismo
trabalho. Foi necessário analisar e fazer as revisões bibliográficas,
utilizando o suporte das pesquisas de artigos na internet.
2 BUROCRACIA
2.1 O QUE É BUROCRACIA?
A burocracia tem assumido diversos significados na sociedade atual. Por
vezes quer significar um excesso de formalismo do estado formal exagerado
dos órgãos que o constituem, ora quer dizer apenas uma teoria
administrativa de gestão eficiente, segura e racional de instituições
públicas ou privadas. A expressão burocracia assume diversos significados
e é utilizada pelos mais variados agentes sociais e políticos para
designar, de uma forma ou de outra, a racionalidade e a eficiência
gerencial. CHIAVENATO (1999, p. 15):
[...] a burocracia é visualizada geralmente como uma
empresa, repartição ou
organização onde o papelório se multiplica, impedindo as
soluções rápidas e eficientes. O termo também é empregado
com o sentido de apego dos funcionários aos regulamentos e
rotinas, causando ineficiência na organização. O leigo
passou a dar o nome de burocracia aos defeitos do sistema
(disfunções) e não ao sistema em si mesmo.
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Burocracia versus Manageralismo
Para Robbins (2000), por sua vez, descreve burocracia por um sistema de
tarefas operacionais padronizadas, que seguem com precisão regras pré-
estabelecidas e regulamentos sempre formalizados (escritos), autoridade
centralizada e rigor hierárquico na tomada de decisão. Na verdade, esta
posição defendida por Robbins, de que a burocracia é um sistema de
tarefas operacionais padronizadas por um regulamento minucioso, não se
confronta em nada com a descrição efetuadas por WEBER (2004), em Economia
e Sociedade, pois para o sociólogo alemão, o entendimento de uma
organização dentro de um contexto estatal moderno capitalista deve ser
pautado na eficiência plena, onde os regulamento e normas da organização
devem ser minucioso o suficiente para abstrair ao máximo a
discricionariedade do burocrata de divergir das norma.
MARTINS (2006), demonstra que “o primeiro problema da burocracia é de
natureza epistemológica: a sociologia política de WEBER raramente conta
com uma apreciação organizacional condizente com a sua complexidade. Isto
se reflete, grosso modo, em duas perspetivas: a da sociologia das
organizações e a da administração”.
2.2 PODER, DISCIPLINA E DOMINAÇÃO
No conceito de Weber (1998) citado por CArvalho, o poder, a disciplina e
a dominação constituem a base do modelo burocrático.
O poder, a disciplina e a dominação são características que caminham
juntas dentro do modelo burocrático. O poder é descrito por Weber (1998)
citado por carvalho, como "toda probabilidade de impor a própria vontade
numa relação social, mesmo contra resistências, seja qual for o
8
Burocracia versus Manageralismo
fundamento dessa probabilidade". A burocracia é considerada pelo autor
como instrumento de socialização das relações de poder e um instrumento
de poder de primeira ordem, para quem controla o aparato burocrático.
2.3 AS DIMENSÕES BUROCRÁTICAS DAS ORGANIZAÇÕES
Para estudar a perspetiva dimensional da burocracia, deve-se
primeiramente entender o que Weber (1998) entende como tipo ideal, dado que
foi com base nesse parâmetro que essa perspetiva se originou.
Em suma, as dimensões burocráticas de Hall (1961) citado por Menegassi
(2007) possui as características apontadas no quadro abaixo:
Tabela 4-Dimensões da burocracia e comentários
Dimensões Comentários
1. Hierarquia de autoridade Estrutura hierárquica piramidal;
A autoridade é do cargo;
O poder das pessoas deriva do
cargo que ocupam;
O mando também é decorrência do
papel;
A estrutura organizacional prevê
as responsabilidades, a delegação
e o comando;
A coordenação e a
responsabilidade final cabem às
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Burocracia versus Manageralismo
chefias.
2. Divisão do trabalho Os membros da organização são
mantidos dentro da sua função e
competência;
Divisão sistemática do trabalho,
com especialização nas tarefas de
acordo com o cargo;
Causa alienação no trabalho /
impede a pessoa de perceber o
trabalho como um todo.
3. Sistemas de normas Regras e normas devem ser
obedecidas por todos;
Atribuições de todos são de
caráter formal;
Regulamentos formalizados, feitos
por escrito.
4. Sistemas de procedimentos Regras e procedimentos uniformes
estabelecem o poder do comando e
padronizam as ações;
O comportamento do funcionário é
previsível;
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Burocracia versus Manageralismo
Atividades previstas por manuais,
diretrizes de procedimentos,
rotinas etc.
5. Impessoalidade A ordem que orienta a ação é
impessoal;
As pessoas exercem papéis e o
poder é impessoal;
Impessoalidade na comunicação;
Despersonalização dos
relacionamentos interpessoais;
O funcionário é um profissional,
prepara-se para seguir carreira
e, se bem sucedido, pode atingir
os níveis mais elevados da
estrutura da pirâmide.
6. Competência técnica Necessidade dos critérios,
exames, concursos, títulos para
admissão e promoção dos
funcionários.
Fonte: Elaboração própria
2.4 AS DISFUNÇÕES DA BUROCRACIA
11
Burocracia versus Manageralismo
Para Weber, na burocracia existem duas consequências previstas e
imprevistas, que recebeu o nome de Disfunções da burocracia, ou seja,
anomalias e imperfeições no funcionamento da burocracia.
As disfunções da Burocracia são as seguintes:
Tabela 5 - Disfunções da burocracia
1- Internacionalização das normas As normas e regulamentos passam a se
transformar de meios para objetivos. O
funcionário adquire a informação e
esquece que a flexibilidade é uma das
principais características de qualquer
atividade racional.
2- Excesso de formalismo e de
papelório
A necessidade de documentar e de
formalizar todas as comunicações dentro
da burocracia a fim de que tudo possa
ser devidamente testemunhado por
escrito. O papelório constitui uma das
mais gritantes disfunções da burocracia.
3- Resistência a mudanças O funcionário da burocracia esta
acostumado em seguir regras, ou seja,
conforme rotinas, com isso, sentem-se
seguros. Quando apresentam mudança eles
se preocupam, resistindo à mudança.
4- Despenalização do relacionamento As pessoas a possuir caráter impessoal,
pois começam a olhar os colegas como
membros da organização. Os colegas
passam a se comunicar com os cargos ou
registros ou em qualquer forma imposta
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Burocracia versus Manageralismo
pela empresa.
5. Categorização do relacionamento A burocracia se assenta em uma rígida
hierarquização da autoridade, ou seja,
na burocracia quem toma as decisões são
as pessoas que estão no mais alto nível
da hierarquia, mesmo que não saiba do
assunto ele é o único com poder de
decisão.
6. Superconformidade às rotinas e
procedimentos
A burocracia baseia-se em rotinas e
procedimentos, na burocracia as rotinas
e procedimentos se tornam absolutas e
sagradas para os funcionários. Os
funcionários passam a trabalhar em
função das regras e procedimentos da
organização e não mais para os objetivos
organizacionais, com isso, perde a
flexibilidade, iniciativa, criatividade
e renovação.
7. Exibição de sinais de autoridade Como a burocracia enfatiza a hierarquia,
tem como sistema identificar aos olhos
quais as pessoas que possuem mais poder,
como por exemplo as mesmas, as salas, os
uniformes.
8. Dificuldade no atendimento a
clientes/utentes/cidadãos e
conflitos com o público
Os funcionários trabalham voltados ao
interior da organização e isso leva a
conflitos com os clientes. Os clientes
necessitam de atendimentos
13
Burocracia versus Manageralismo
personalizados, mas na burocracia os
funcionários atendem os clientes num
padrão, fazendo com que os clientes
fiquem insatisfeitos com os serviços e
fazem pressões, com isso ameaçam a
segurança, daí a tendência à defesa
contra pressões externas à burocracia.
Fonte: Elaboração própria
14
Burocracia versus Manageralismo
3. A NOVA GESTÃO PÚBLICA
3.1. CONDIÇÕES MATERIAIS E INTELECTUAIS PARA O SURGIMENTO DO
MANAGERALISMO
Cada tipo de Estado corresponde um determinado modelo de gestão pública.
Assim, a um Estado Liberal, interveniente, corresponde um modelo de
Administração Pública que costuma designar-se de clássica ou legal-
burocrática, que se caracteriza igualmente pela sua não intervenção.
A revolução socialista na Rússia e a grande depressão económica, bem
assim como a teoria económica Keynesiana virão marcar os contornos de um
novo modelo de Estado, vulgarmente chamado de Estado Welfare, o qual
passou a alargar a sua intervenção e abarcar políticas sociais,
responsabilizando-se pelo desenvolvimento económico e equilíbrio social
da respetiva população (Pereira 1996).
A Administração Pública correspondente ganha, em consequência novos
contornos, diferentes do modelo anterior. A Administração
profissionaliza-se, isto é, absorve cada vez mais profissionais de saúde,
segurança social, educação e habitação.
Segundo (Pereira 1996) a reforma da Administração Pública implica o
desmantelamento do Estado Welfare e a redução do papel da Administração.
Isto faz-se através das privatizações, em primeiro lugar, do setor
empresarial do Estado e, em segundo lugar, da prestação dos serviços
públicos, o que irá significar a reconstrução de um Estado neo-liberal e
o desaparecimento da Administração Profissional.
A insistência na melhoria da eficiência dos serviços públicos, bem como a
crise da teoria administrativa levam a uma crescente reorientação da
15
Burocracia versus Manageralismo
investigação para o sector público. O paradigma teórico que serve de
suporte a este tipo de movimento denomina-se Managerialismo ou Nova Gestão
Pública. O Estado deixa de ser interveniente e planeador, convertendo-se
em regulador do comportamento dos atores que intervêm no processo
político. Neste tipo de Estado, a Administração Pública deve aproximar-se
na sua gestão de modelo empresarial, alterando muitas das suas rotinas e
formas de funcionamento.
A Administração tradicional de meios tem que, inevitavelmente, alterar o
seu paradigma para a aferição de resultados e para os serviços devidos
aos cidadãos. O Estado não pode continuar a executar e a prestar um
conjunto de serviços que não têm qualquer sentido estratégico público e
estatal. Foi este o espírito que levou à implementação da teoria do new
public management, que mais não é do que a importação, para o sector
público, das regras de gestão de organizações privadas, como é defendido
por Campos (2002) citado por Magro:
Como corolário desenvolveu-se a entrega ao sector privado da produção de
bens ou serviços que estão fora da esfera especializada do sector público, como
alimentação da população prisional, escolar e hospitalar, a limpeza, a
segurança, a higiene, a manutenção de instalações e equipamentos, o
tratamento de jardins e embelezamento de espaços. Surge o “out-sourcing” ou
o contracting out”, que em certos sectores podem ir até à delegação ao sector
privado, por concurso competitivo, da gestão de unidades de serviços público,
como hospitais, escolas e prisões.
Desde os meados da década de setenta, a reforma do Estado tornou-se a
palavra de ordem em quase todo o mundo. O antigo consenso social a
respeito do papel do Estado perdia rapidamente forças, sem nenhuma
perspetiva de retomar o seu vigor. A introdução do modelo gestionário no
sector público faz parte deste contexto. Mas quais foram as condições
materiais e intelectuais que permitiram esta mudança?
Em traços gerais, são quatro os fatores socio-económicos que contribuíram
fortemente para detonar a crise do Estado Welfare. O primeiro foi a crise
16
Burocracia versus Manageralismo
económica mundial, iniciada em 1973, na primeira crise do petróleo, e
retomada ainda com mais força em 1979, na segunda crise do petróleo. O
facto é que a economia mundial enfrentou um grande período recessivo nos
anos oitenta e, nunca mais retomou os níveis de crescimento atingidos nas
décadas de cinquenta e sessenta. Neste momento de escassez, o Estado foi
o principal afetado, entrando numa grave crise fiscal (Pereira 1996).
A crise fiscal foi o segundo fator a enfraquecer os alicerces do antigo
modelo de Estado. Após ter crescido por décadas, a maioria dos governos
não tinham mais como financiar os seus défices. E os problemas fiscais
tendiam agravar-se na medida em que se iniciava, sobretudo nos Estados
Unidos e na Grã- Bretanha, uma revolta dos taxpayers (contribuintes) contra
a cobrança de mais impostos, principalmente porque não visualizavam uma
relação direta entre o acréscimo de recursos governamentais e a melhoria
dos serviços públicos. Estava em xeque o consenso social que sustentara o
Estado Welfare (Pereira 1996).
Portanto, o terceiro fator detonador da crise do Estado Welfare
constituía-se naquilo que a linguagem da época denominava de situação de
insustentável governança: os governos estavam inaptos para resolver os
seus problemas (Holmes e Shand 1991) citado por Pires 2008.
Por fim, a globalização e todas as transformações tecnológicas que
transformaram a lógica do setor produtivo também afetaram o Estado. Na
verdade, o enfraquecimento dos governos em controlar os fluxos
financeiros e comerciais, somado ao aumento do poder das grandes
multinacionais resultou na perda de uma parcela significativa do poder
dos Estados nacionais de ditar políticas macroeconómicas (Pereira 1996).
Esta crise do Estado afetou diretamente as organizações das burocracias
públicas. Por um lado, os governos tinham menos recursos e mais défices.
Com efeito, a redução dos custos tornou-se uma prioridade. No que se
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Burocracia versus Manageralismo
refere à Administração Pública, isto implicou dois efeitos. Primeiro, a
redução dos gastos como o pessoal era vista como uma saída necessária –
os discursos das administrações de Thatcher e Reagan representaram o
ponto máximo desta tendência. Segundo, era preciso aumentar a eficiência
governamental, o que implicava, para a maioria dos reformadores da década
de oitenta, uma modificação profunda do modelo weberiano, classificado
como lento e excessivamente apegado a normas (Pereira 1996).
Por outro lado, o Estado Welfare estava a perder o seu poder de ação,
especialmente se tivermos em conta os problemas da governabilidade
(governos sobrecarregados) e os efeitos da globalização. (Peters 1989)
Redução nos gastos – inclusive de pessoal –, aumento da eficiência e
atuação mais flexível do aparelho burocrático, tudo isto es tava
contemplada na reforma gestionária, tal como era proposto pelos
reformador es do começo da década de oitenta. O managerialismo substituiria
o modelo weberiano, introduzindo a lógica da produtividade existente no
sector privado. No entanto, as condições materiais não eram suficientes
para sustentar a defesa do managerialismo. Existia também um contexto
intelectual extremamente favorável às mudanças na Administração Pública.
Ao longo dos últimos anos, entretanto, o managerialismo sofreu um
contínuo processo de transformação, como veremos a seguir.
18
Burocracia versus Manageralismo
4. O DESENVOLVIMENTO DO MANAGERIALISMO NO SECTOR PÚBLICO: A
EXPERIÊNCIA ANGLO-AMERICANA
O conceito de managerialismo invadiu o sector público dos Estados Unidos
e da Grã-Bretanha, a partir da eleição dos governos neo- conservadores.
Era, inicialmente, uma forma bem particular de se utilizarem os
instrumentos da gestão, através daquilo que chamamos de managerialismo
puro, mais direcionado para a redução de custos e para o aumento da
eficiência e da produtividade da organização (Butler 1993).
O facto é que, naquele momento, as modificações no sector público
estavam vinculadas a um projeto de reforma do Estado, caracterizado como
um movimento de retração da máquina governamental a um menor número de
atividades. (Butler 1993).
Mas nos últimos anos o managerialismo não tem sido somente utilizado como
mecanismo para reduzir o papel do Estado. O managerialismo acoplou-se,
dentro de um processo de defesa da modernização do setor público, a
conceitos como a procura contínua da qualidade, descentralização e
avaliação dos serviços públicos pelos consumidores/cidadãos. Com a
introdução do managerialismo na Administração Pública, surgiram diversas
respostas à crise do modelo burocrático weberiano, todas defendendo a
necessidade de se criar um novo paradigma organizacional.
4.1 O MANAGERIALISMO PURO
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Burocracia versus Manageralismo
O managerialismo puro foi o primeiro a ser implementado no caso inglês,
como também ocorreu, com algumas ligeiras modificações, na experiência
americana do governo Reagan.
Todavia, é nos Estados Unidos que a discussão do managerialismo puro tem
mais tradição. O debate entre o Public Service orientation versus o Public Management
orientation existe desde o século passado (Martin 1993), quando Woodrom
WILSON escreveu seu célebre artigo – The study of administration –, em 1887,
defendendo a separação entre a política e administração. No entanto, o
modelo gestionário não se conseguiu tornar hegemónico nos EUA,
principalmente porque a burocracia americana foi sendo edificada, ao
longo do século XX, para evitar a interferência das políticas dos
patronados que eram comuns no final do século XIX (Butler 1993). Por
isso, a opção preferencial foi por um modelo que preservasse a
neutralidade e a impessoalidade do Estado, características estas que eram
centrais no tipo burocrático weberiano. A burocracia para Weber
constituía uma condição necessária ou um meio organizado para a
racionalidade legal, económica e técnica da civilização moderna (Rocha
2001) citado por Pires 2008.
É devido aos problemas financeiros que, tanto nos EUA como na Grã-
Bretanha, se implantou o managerialismo puro. O managerialismo seria
utilizado no sector público para diminuir os gastos e aumentar a
eficiência governamental. Em suma, o managerialismo puro tinha como eixo
central o conceito de produtividade (Pollitt, 1990).
O primeiro passo foi procurar reduzir custos e pessoal. Nesse caso, o
governo britânico foi mais bem sucedido do que o americano. O governo
Reagan de facto não conseguiu reduzir os gastos sociais – ao contrário,
naquele período eles cresceram 16% em relação ao PIB (Pollitt 1990).
O ponto fulcral do managerialismo puro é a procura da eficiência. Neste
sentido, havia necessidade de se terem mecanismos objetivos de mensuração
da performance governamental.
No âmbito organizacional, foram tomadas duas medida s. A primeira, foi
20
Burocracia versus Manageralismo
adopção da Administração por objetivos – Management by Objectives –, a partir
da qual se tornaria possível uma avaliação de desempenho baseada na
comparação entre os resultados previstos e os obtidos. A segunda medida,
implicava a descentralização administrativa, ou seja, aumentar a
autonomia das instituições públicas. No entanto, é importante referir que
a descentralização era concebida a partir da definição clara dos
objetivos de cada instituição, os quais deveriam ser cumpridos sob a
vigilância do poder central.
À estrutura extremamente hierárquica, característica do modelo Whitehall
foi contraposto um modelo, em que se procurava delegar autoridade –
empowerment – aos funcionários. Dentro do contexto da cultura
gestionária, era preciso criar mais administradores, com habilidade e
criatividade para encontrar novas soluções, sobretudo para aumentar a
eficiência governamental (Carter 19 92).
O managerialismo puro, na verdade, tem por base a separação entre a
política e a administração. Assim, caberia aos reformadores implementar o
managerialismo na Administração Pública, independentemente do que ocorre na
política. Entretanto, essa perspetiva contradiz o próprio desenvolvimento
do modelo gestionário na Grã-Bretanha, pois foi o forte apoio político
obtido pelos conservadores que propiciou o avanço das reformas.
Em termos comparativos, basta relembrar outra tentativa de reforma
baseada no managerialismo puro que fracassou, sobretudo por razões
políticas. Trata-se da experiência americana no período Regan. Croizier
(1992) citado por Pires, demonstra claramente que foram os obstáculos
existentes no âmbito do Congresso, por um lado, e os erros na estratégia
de negociação, por outro, as causas responsáveis pelo malogro da
implementação do managerialismo puro naquele país.
21
Burocracia versus Manageralismo
Os seguidores do managerialismo puro não consideraram que a especificidade
do setor público dificulta a mensuração da eficiências e avaliação do
desempenho, como ocorre no setor privado. Na gestão pública, estão em
jogo valores como equidade e justiça que não podem ser medidos ou
avaliados por intermédio dos conceitos do manageralismo puro (Mayordomo
1990 citado por Pires 2008).
Esta despolitização da Administração Pública, aliada à ênfase no conceito
de eficiência governamental, fez com que Pollit (1990) , um dos maiores
críticos do modelo gestionário inglês, classificasse o managerialismo como
um neotaylorismo, isto é, uma proposta embebida na busca da produtividade e
na implementação da gestão privada no sector público.
A discussão em torno deste modelo gestionário tornou-se complexa e ganhou
novos rumos a partir da metade da década de oitenta. Basicamente, foram
duas as transformações operadas no âmbito do managerialismo puro. Uma
primeira, ligada à dinâmica organizacional, dando prioridade aos conce
itos de flexibilidade, planeamento estratégico e qualidade. A outra
transformação foi mais radical, e trata-se da preocupação dos serviços
públicos em responder aos anseios dos clientes (Pereira 1996).
4.2. O NEW MANAGERALISMO OU NEW PUBLIC MANAGEMENT
Desde o final dos anos setenta, que se vem assistindo a uma mudança da
public administration para a public management e, nos próximos anos, para o
papel do Estado e da ação das suas instituições na sociedade, no espírito
de aquilo que nos países anglo-saxónicos se convencionou chamar governanc.
Esta mudança insere-se na filosofia do managerialismo, ou seja, na
veneração da gestão como solução para os vários problemas que as solam as
organizações.
22
Burocracia versus Manageralismo
Segundo Pollitt (1993) o managerialismo consiste num conjunto de crenças e
práticas, que tem como assunção, raramente testada, de que uma melhor
gestão será uma solução eficaz para um amplo campo de males eco nómicos e
sociais .
Entre as crenças que o compõem, encontram-se as seguintes (Pollitt 1993):
O caminho principal para o progresso social reside na obtenção de
aumentos contínuos numa produtividade economicamente definida;
Tais aumentos de produtividade resultarão da aplicação de
tecnologias cada vez mais sofisticadas, tais como tecnologias de
informação e comunicação (TIC);
A aplicação e exploração destas tecnologias, implicam a existência
de uma força de trabalho disciplinada, de acordo com as ideias de
produtividade;
A gestão é uma função organizacional separada e distinta das
demais, que possui um papel crucial no planeamento, implementação e
mensuração das melhorias de produtividade necessárias.
Para que os gestores possam desempenhar esse papel crucial, deverão
possuir um espaço de manobra considerável (isto é, o direito de gerir).
Esta ideologia, mudança cultural ou estilo de gestão, de seu nome
managerialismo, refletiu-se, nas últimas décadas, num movimento de reforma
e modernização administrativa, que perpassou pelos vá rios países da OCDE
– o New Public Management (NPM).
Para o autor, a emergência do NPM, durante os últimos quinze anos, é uma
das mais surpreendentes tendências internacionais na Administração
Pública. O seu aparecimento parece estar ligado a quatro megas tendências
administrativas, nomeadamente (Hood 1991):
Tentativas para reverter o crescimento do setor administrativo, em
23
Burocracia versus Manageralismo
termos de despesa pública e número de funcionários;
Uma tendência para a privatização e um afastamento das instituições
governamentais, com uma ênfase renovada na subsidiariedade na
provisão de serviços;
O desenvolvimento da autonomia, especialmente das tecnologias de
informação, na produção e distribuição dos serviços públicos;
O desenvolvimento de uma “agenda internacional”, cada vez mais
centrada nos aspetos gerais da Administração Pública, da concepção
de políticas, dos estilos de gestão e da cooperação
intergovernamental, em vez da velha tradição da especificidade da
Administração Pública nacional.
Podemos definir, o New Public Management como a importação de conceitos e
técnicas do setor privado para o sector público.
Hood (1991) descreveu os elementos-chave do NPM:
Tabela 6 - Elementos-chave do NPM
Gestão profissional atuante;
Padrões e medidas de desempenho explícitos;
Tendência para a desagregação de unidade ;
Tendência para uma maior competição;
Ênfase nos estilos de gestão praticados no setor privado;
E uma maior ênfase na disciplina e parcimónia na unificação dos
recursos.
24
Burocracia versus Manageralismo
Fonte: Elaboração prórpia
O NPM está bem patente nas políticas de modernização da OCDE. Esta
organização internacional realizou um estudo (OCDE 1992) em doze países
membros incluindo a Finlândia, Grécia, Turquia, EUA, Nova Zelândia e o
Reino Unido, e concluiu que os processos de reforma administrativa,
nestes países, apresentavam pontos comuns:
Um papel crescente do setor voluntário na provisão dos serviços;
Um aumento do recurso ao setor privado na mesma provisão;
A Administração Central assume um papel preponderante estratégico;
Uma maior consciência dos custos e da necessidade de se analisarem
alternativas aos impostos, como fonte primordial de receitas.
Estes aspetos, traduzem-se numa maior transparência no funcionamento da
Administração, num maior envolvimento dirigido aos clientes/utentes, numa
flexibilidade crescente, por forma a satisfazer as necessidades dos
clientes individuais, num melhor acesso físico à Administração e a mais
informação disponível sobre esta (Lawtom e Rose 1994) citado por Pires
2008.
Todos estes programas de reforma partem de um diagnóstico comum: a
Administração, na sua forma clássica, sofre de uma ineficácia endémica, é
egocêntrica e não é recetiva, nem aos objetivos políticos, nem aos
interesses do público.
Tudo em nome de uma melhor Administração Pública, e m nome do bem-estar e
da qualidade de vida, no quadro da filosofia do NPM.
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Burocracia versus Manageralismo
4.3. AVALIAÇÃO DO NEW PUBLIC MANAGEMENT
Grande parte da ideologia managerial assenta na ideia de que não existe
diferença entre, por exemplo, gerir uma empresa, um hospital ou uma
universidade. E se existem diferenças que impeçam o funcionamento do
mercado e medição de lucros, essas diferenças devem desaparecer.
As críticas feitas ao NPM giram em torno da possibilidade de se aceitar a
universalidade da gestão e, logo, da aplicação dos seus conceitos e
técnicas, independentemente do contexto considerado (setor privado ou
público).
A questão, à partida, reside em saber se existem diferenças entre o
sector público e o setor privado e em que é que elas se traduzem.
Para Pollitt (1993) existem determinados fatores de diferenciação entre o
sector público e o privado, que são incontornáveis e que irão
condicionar, se não mesmo desvirtuar, a aplicação de conceitos e técnicas
oriundas do sector privado no sector público, designadamente:
Responsabilidade perante os representantes eleitos;
Múltiplos e conflituantes objetivos e prioridades;
Ausência ou raridade de organizações concorrentes;
A relação oferta/receitas;
Processos orientados para o cliente;
Enquadramento legal.
Finalmente, muitos dos serviços públicos são difíceis de serem medidos,
em termos de eficiência e avaliação de performance, o que torna a
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Burocracia versus Manageralismo
aplicação do NPM muito problemática.
Do ponto de vista mais prático, Hood (1991) citado por Pires 2008,
sintetizou todas as críticas, da seguinte forma:
A primeira crítica é de que o NPM não tem qualquer conteúdo
teórico, é uma roupagem vazia;
A grande consequência do NPM tem sido o aumento exponencial dos
controladores orçamentais e de performance, sem que o fato se tenha
traduzido em melhorias dos serviços públicos, como vem sendo
constatado pelos cidadãos;
Embora se apresente como promotor do bem comum, na realidade o NPM
tem servido de veículo para interesses particulares, sendo criada
uma elite de novos gestores públicos, cujos privilégios são muito
superiores aos antigos administradores;
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Burocracia versus Manageralismo
5. SUGESTÕES CONCLUSIVAS
A burocracia gera estabilidade política e econômica. A progressão social
é influenciada pela posição que os indivíduos ocupam na estrutura
burocrática. Administração Pública existe para realizar interesses
públicos. Pelo contrário, a Administração Privada tem em vista interesses
pessoais ou particulares: se bem que não sejam necessariamente fins
egoístas, são interesses que se referem a pessoas (ou grupo de pessoas)
determinadas.
O managerialismo assenta na ideologia de que não existe diferença entre
gerir uma empresa, um hospital ou uma universidade. As críticas feitas
giram em torno da possibilidade de se aceitar a universalidade da gestão
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Burocracia versus Manageralismo
e, logo, da aplicação dos seus conceitos e técnicas, independentemente do
contexto considerado (setor privado ou público).
Segundo o managerialismo, a Administração Pública deve orientar-se para o
cliente. No entanto, este modelo de gestão generalista tende a trabalhar
com um modelo muito restrito de cliente e, não tem em conta que os
clientes dos serviços públicos não se limitam a ser clientes, são também
cidadãos.
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Burocracia versus Manageralismo
6. REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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