Protagonismo econômico do Brasil: o dilema entre a participação econômica nos BRICS e suas...

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2º Seminário de Relações Internacionais: Graduação e Pós-graduação Os BRICS e as Transformações da Ordem Global 28 e 29 de agosto de 2014, João Pessoa (PB), Brasil Trabalho para apresentação em painéis PE Política Externa PROTAGONISMO ECONÔMICO DO BRASIL: O DILEMA ENTRE A PARTICIPAÇÃO ECONÔMICA NOS BRICS E SUAS DINÂMICAS NOS BLOCOS REGIONAIS (MERCOSUL E UNASUL). Ana Luiza Vedovato Rodrigues (Universidade Federal de Santa Maria) Danielle Jacon Ayres Pinto (Universidade Federal de Santa Maria) Riva Sobrado de Freitas (Universidade do Oeste de Santa Catarina)

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2º Seminário de Relações Internacionais: Graduação e Pós-graduação

Os BRICS e as Transformações da Ordem Global

28 e 29 de agosto de 2014, João Pessoa (PB), Brasil

Trabalho para apresentação em painéis

PE – Política Externa

PROTAGONISMO ECONÔMICO DO BRASIL: O DILEMA ENTRE A PARTICIPAÇÃO

ECONÔMICA NOS BRICS E SUAS DINÂMICAS NOS BLOCOS REGIONAIS

(MERCOSUL E UNASUL).

Ana Luiza Vedovato Rodrigues (Universidade Federal de Santa Maria)

Danielle Jacon Ayres Pinto (Universidade Federal de Santa Maria)

Riva Sobrado de Freitas (Universidade do Oeste de Santa Catarina)

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RESUMO

Este trabalho se propõe analisar a política externa brasileira em relação à América do Sul.

Sendo esta evidenciada pelas significativas relações comerciais entre os países dessa região,

principalmente no âmbito no Mercosul, como também através da criação da UNASUL e da

integração regional para além do viés econômico. Em paralelo, este estudo propõe entender

como a dinâmica regional do Brasil está relacionada com sua participação nos BRICS,

tentando perceber se tais interações são possíveis de se coadunar, ou se na verdade, o

âmbito dos BRICS é um empecilho para o fortalecimento das relações regionais do Brasil.

Inicialmente, será analisada a conjuntura de política externa brasileira no âmbito dos BRICS.

Em seguida, essa análise será reduzida ao foco da integração regional, através da

participação no Mercosul e na UNASUL. Por fim, pretende-se fazer um indicativo acerca do

seu fluxo de relações comerciais e analisar seus principais parceiros comerciais, além de

responder a seguinte pergunta problema: até que ponto o pertencimento ao BRICS prejudica

a atuação brasileira na integração regional, no Mercosul e na UNASUL? No trabalho,

apresenta-se que o Brasil, devido ao seu protagonismo econômico frente aos demais países

sul-americanos, principalmente em termos de representação em Produto Interno Bruto (PIB)

nesses blocos, arrisca ser acusado de assumir um papel imperialista em âmbito regional. É

nesse sentido que observa-se que a política externa do Brasil, ainda que orientada para o

fortalecimento do Mercosul e para os projetos da UNASUL, encontra-se dividida entre

cooperação e inserção internacional no contexto do BRICS; e cooperação e integração

regional frente ao Mercosul e à UNASUL.

PALAVRAS-CHAVE

BRICS. MERCOSUL. UNASUL. Política Externa Brasileira.

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1. INTRODUÇÃO

Este artigo busca analisar a adaptação e rumos dados à política externa do Brasil a

partir de suas relações comerciais no âmbito dos blocos aos quais integra. Por um lado,

inserido nos BRICS, bloco constituído por países emergentes que se destacam cada vez mais

por seu potencial de crescimento tanto econômico quanto no cenário internacional. Do outro,

atrelado ao seu compromisso histórico de integração regional, associado a diversos blocos, a

exemplo do MERCOSUL e UNASUL. Nesse sentido, a proposta é entender se o Brasil valoriza

uma participação em detrimento da outra, ou se essa dualidade torna-se conflitiva no sentido

de que devido a sua crescente internacionalização e articulação econômica global, o país

deixa de lado sua proposta e compromisso com a integração regional.

Como exposto por Flemes (2010, p. 142), o Brasil possuí como característica que o

distingue nas relações internacionais a posição em que se encontra “(...) por um lado, entre o

centro e a periferia da atual ordem mundial e, por outro lado, na interface da política

internacional com a regional”. Essas esferas distintas as quais integra, com características,

demandas e ações diplomáticas bastante peculiares evidenciam os esforços dedicados à

essa dualidade, demandando “estratégias de política externa particularmente complexas”

(Ibid., p. 142).

Visando um esclarecimento referente a proposta desse artigo, justificado no intuito de

analisar o comportamento do Brasil em relação às suas propostas de política externa ao nível

global e regional, serão apresentados e comentados dados macroeconômicos e de comércio

exterior do Brasil, dando ênfase a análise da participação do mesmo na dinâmica regional,

afim de constituir argumento e resposta autônomos em relação aos pareceres amplos e

diversos, apresentados aqui em revisão de literaturas sobre o tema.

Para isso, o período escolhido para análise é o intervalo entre 2008 e o presente. Essa

escolha justifica-se no propósito do artigo, justamente pela constituição da UNASUL ter-se

dado em 2008 e, assim, tendo sido reforçado o compromisso e pauta de política externa em

relação a integração regional. Nesse sentido, irá preocupar-se em observar se os dados

relativos às relações intra-regionais se revigoram nesse período ou se, pelo contrário, o Brasil

aproxima-se ainda mais dos BRICS e da esfera internacional, através de uma justaposição

com grandes potências, países emergentes e/ou outros blocos econômicos. O texto encontra-

se dividido em 4 seções. Seguindo essa Introdução, a segunda seção discute de forma breve

a pauta de política externa brasileira e o histórico econômico brasileiro recente, até sua

inclusão como BRICS, além de discutir de forma mais específica sua participação neste. A

terceira seção discute aspectos da integração regional, analisando dilemas e avanços do

Brasil nessa área. Por fim, apresentam-se algumas considerações gerais.

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2. POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA E RELAÇÕES COMERCIAIS NO ÂMBITO DOS

BRICS: O BRASIL COMO EMERGENTE

Na última década, a política externa do Brasil voltou-se para novos dilemas de atuação,

diante de uma considerável mudança no cenário internacional, descrita por Nieto (2012) como

além do âmbito diplomático, mobilizando estruturas econômicas, políticas e culturais do

mundo inteiro, em decorrência da proposta de identificação das economias emergentes no

grupo dos BRICS. O Brasil viu-se num constante crescimento econômico que projetou-o no

cenário internacional, integrando-se com outros países emergentes, e aspectos estruturais

semelhantes.

O conceito dos BRICs surgiu em 2001, a partir do relatório Building Better Global

Economic BRICs, estudo de Jim O’Neil publicado pelo grupo Goldman Sachs (2001). A

consolidação como grupo e a incorporação do conceito às políticas externas dos países

constituintes – Brasil, Rússia, China e Índia – deu-se, para citar um evento, durante a reunião

dos chanceleres desses países na 61ª Assembleia Geral das Nações Unidas, em 2006. A

inclusão da África do Sul, no entanto, consolidou-se somente em 2011, após o

desenvolvimento de uma análise política no grupo devido a proeminência da África do Sul no

continente africano (BRIC Policy Center, 2011)1.

Esse cenário aparentemente promissor no qual o Brasil se inseria, no entanto, foi fruto

de questionamento por parte de muitos pesquisadores – como exposto nos decorrentes

relatórios da Goldman Sachs, os mesmos que previram tal ascensão –, no sentido de

especular (i) como o Brasil havia alcançado uma posição nesse grupo, (ii) como faria para

manter-se nele como país de fato emergente e em expressivo crescimento, e (iii) se devido a

sua inclusão, por fim, receberia benefícios absolutos no cenário comercial mundial.

Afim de analisar algumas colocações a respeito do item (i), propõe-se aqui um breve

levantamento a respeito do histórico econômico e comercial brasileiro a partir da década de

90, momento a partir do qual o Brasil iniciou, mais expressivamente, políticas de liberalização

no âmbito do comércio internacional. Aos poucos, eliminavam-se barreiras de proteção às

indústrias e reduziam-se as de importação (OLIVEIRA et. al., 2010, p. 94).

Com a introdução do Plano Real, em 1994, pôs-se fim às altas taxas de inflação que

vigoravam na economia brasileira desde o início dos anos 1980. A partir deste, houve uma

acentuada redução nas tarifas de importação de diversos produtos, expandiram-se as

importações a partir da implementação da política tarifária, que alimentou déficit comercial e

conduziu à rápida deterioração de contas externas (Ibid., 2010). Segundo Holanda (1997),

1 Nesse sentido, quando mencionado BRIC, refere-se ao agrupamento anterior ao ano de 2011, onde constituem-se como membros Brasil, Rússia, Índia e China. Quanto utilizado BRICS, refere-se a Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.

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que é citado por Oliveira, tais medidas mostraram que a estabilização passava a subordinar

uma nova estratégia de política comercial, que passou a incentivar as exportações e proteger

alguns setores da indústria, no objetivo de desincentivar a entrada de importações e fortalecer

as exportações, sem que a reversão nas contas externas afetasse o conquistado ajuste

inflacionário.

Foi também na década de 1990 que o setor agropecuário brasileiro sofreu rápido

desenvolvimento, favorecendo as exportações na área. Houve, a partir desse período, o

aumento de investimentos, o advento de novas tecnologias e a significativa expansão da

fronteira agrícola. Devido a esse período de reestruturação, a partir dos anos 2000, o setor

agropecuário passou a constituir-se como elemento fundamental no crescimento das

exportações do país (OLIVEIRA, 2010).

Todavia, o período que parecia promissor e decisivo na reestabilização econômica do

país, viu-se submetido a vulnerabilidade externa após as séries estratégicas de abertura. Em

1999, com a crise na balança de pagamentos, o governo procurou realizar uma abertura mais

prudente que viabilizasse também o desenvolvimento do setor exportador (op. cit, 2010). No

entanto, em comparação a outros países do BRICS, como Índia e China, a abertura comercial

foi mais expressiva.

A partir de 1999, em função da crise na balança de pagamentos, a estratégia de

abertura foi reestruturada a partir de medidas como a desvalorização do câmbio e a

concessão de incentivos financeiros às exportações (BELLUZZO; ALMEIDA, 2002 apud

OLIVEIRA, 2010 op. cit.). Como exposto pelos autores, o país não tornou-se, de fato, um

competidor em nível global (à exceção do setor agrícola). No entanto, tais medidas

econômicas foram fundamentais para que o Brasil preparasse a base econômica do que viria

a tornar-se um país emergente pertencente ao BRICs.

O que se viu na prática em relação aos BRICS, com o passar do tempo e

principalmente na cena pós-crise de 2008, com a economia internacional em fervorosa, foi

que “tais países não só agiram como elementos de sustentação da economia mundial [...]

como se tornaram polos de expansão do comércio internacional” (THORSTENSEN, et al.,

2011, p. 2). Ao tornarem-se sobreviventes da crise que assolou a economia de grandes

potências desenvolvidas, como os Estados Unidos e alguns países europeus, os BRICS

consolidaram-se como potências emergentes e abriram caminho para sua projeção e

crescente protagonismo enquanto “grupo informal” (FLEMES, 2010, p. 151).

O sucesso na cooperação política proveniente da união dos BRICs representa uma

potencial transformação para o cenário mundial, de grande impacto econômico e influência

no ordenamento global. Para Almeida (2010), o grupo detém de “uma grande capacidade

transformadora da geopolítica e geoeconomia mundiais”, além de sugerir que os mesmos

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abrem portas a um cenário essencialmente multipolar, assim como o buscado pela diplomacia

brasileira e evidenciado em sua política externa.

Como também colocado por Flemes (2010, p. 150), em 2009, quando os BRICs

alcançaram a representação de 22% da economia mundial, o então presidente Lula relatou

que chegava o tempo de dedicar às instituições multilaterais tal importância, e que os BRICs

deveriam trabalhar em conjunto para “mudar a geografia política e comercial do mundo”

(Reuters, jun. 2009 apud FLEMES, op. cit). No contexto desse cenário, o Brasil passou a

incluir incisivamente o BRICS como sujeito e objeto de sua política externa, numa estratégia

institucional que “envolve também o reforço dos laços econômicos entre as potências

emergentes, por meio da colaboração em diferentes setores” (FLEMES, 2010, p. 146),

sugerindo, inclusive, de que isso seria uma estratégia no sentido de “mudar o equilíbrio do

poder econômico”. (Ibid, p. 151), também identificou como um motivo para a união dos BRICS

a existência de um interesse comum em relação à China, potencial sócio comercial chave

para os países inclusos nesse bloco.

Em geral, os países configurados como BRICs apresentam como características uma

“capacidade produtiva ampla (agrícola, industrial e de serviços) que corresponda a seu

potencial econômico, [...] economia relativamente estável e perfil não muito baixo no cenário

internacional” (BAUMANN, et al., 2010, p. 9). As tabelas apresentadas na sequência

objetivam, justamente, ilustrar dados à uma análise, onde num primeiro momento serão

comparados os índices do Brasil em relação aos demais países pertences ao BRICs,

avaliando aspectos relativos a capacidade produtiva, potencial econômico e protagonismo

econômico no cenário internacional.

Tabela 1 – Taxa média real anual (%) de crescimento do PIB (entre os BRICS)

2008 2009 2010 2011 2012 2013

África do Sul 3,6 -1,5 3,1 3,6 2,5 1,9

Brasil 5,2 -0,3 7,5 2,7 1,0 2,5

China 9,6 9,2 10,4 9,3 7,7 7,7

Índia 3,9 8,5 10,3 6,6 4,7 5,0

Rússia 5,2 -7,8 4,5 4,3 3,4 1,3

Fonte: Elaboração própria com base nos dados do World Development Indicators – WDI.

No que diz respeito ao crescimento dos países integrantes ao BRICS no cenário

econômico mundial, faremos uso de alguns indicadores macroeconômico essenciais, como o

Produto Interno Bruto (PIB). A partir dos dados expostos da tabela 1, podemos identificar com

clareza o protagonismo da China e Índia nos índices de crescimento, que destoam de

acréscimos tímidos em relação aos demais membros. No período de 2009, pós-crise de 2008,

é possível identificar que também foram China e Índia os únicos a não apresentarem

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decréscimo no PIB. De forma geral, todos os países ilustram uma relativa diminuição nos

índices ao longo do tempo, com exceção do Brasil, que ensaia um novo crescimento no

período 2012-2013, retomando com aproximação o índice de 2011 – situação semelhante a

da Índia. A China, por outro lado, manteve seus indicadores no período, enquanto Rússia e

África do Sul apresentaram uma sensível redução nos mesmos.

Tabela 2 – BRICS: Participação (%) no PIB Mundial, 2008-2013

2008 2009 2010 2011 2012 2013

África do Sul 0,43 0,48 0,56 0,56 0,52 0,46

Brasil 2,65 2,75 3,32 3,46 3,08 2,99

China 7,27 8,47 9,18 10,24 11,28 12,33

Índia 1,96 2,31 2,64 2,63 2,54 2,50

Rússia 2,67 2,07 2,36 2,66 2,76 2,79

BRICS 15,01 16,10 18,08 19,57 20,21 21,10

Fonte: Elaboração própria com base nos dados do World Development Indicators – WDI.

Em relação à participação dos BRICS no PIB Mundial, observa-se a expressividade

do bloco ao atingir, no último ano, mais de 1/5 de representação. Porém, apesar da

composição dar-se pela união dos indicadores do grupo, os índices chineses são parte mais

significativa da composição. Em 2013, por exemplo, a China representa 58,44% da

participação dos BRICS no PIB Mundial, enquanto o Brasil, sendo o segundo mais significativo

em participação, representa somente 14,20%.

A Índia, por outro lado, apesar de apresentar significativas taxas de crescimento, como

apresentado na tabela 2, ainda não tem uma participação muito expressiva no PIB Mundial,

sendo esta menor que a participação brasileira. Rússia também apresenta índices

relativamente baixos, mas demonstra um sucessivo crescimento desde 2009. A África do Sul,

por outro lado, no período 2010-2011, justamente quando passou a fazer parte do BRIC,

apresentou aumentos, mas voltou a cair nos anos subsequentes.

Em relação às tabelas 1 e 2 e às análises anteriores, é possível concluir que a China

se coloca tanto como protagonista consolidada no grupo, com índices isolados, quanto como

economia suscetível a um crescimento ainda maior. A Índia apresenta grandes taxas de

crescimento, mas ainda não assume um papel de destaque com sua participação no PIB

Mundial, enquanto o Brasil oscila em aceleração e desaceleração do crescimento, mas tem

um papel estável e até certo ponto expressivo em sua participação.

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Tabela 3 – BRICS: Participação (% do PIB) no comércio mundial, 2008-2013

Exportações

2008 2009 2010 2011 2012 2013

África do Sul 35,9 27,3 28,4 30,6 29,9 31,1

Brasil 13,7 11,0 10,9 11,9 12,6 12,6

China 35,0 26,7 29,4 28,5 27,3 26,4

Índia 23,6 20,0 22,0 23,9 24,0 24,8

Rússia 31,3 27,9 29,2 30,3 29,6 28,4

Importações

2008 2009 2010 2011 2012 2013

África do Sul 38,9 28,2 27,7 30,2 31,8 34,0

Brasil 13,5 11,1 11,9 12,6 14,0 15,0

China 27,3 22,3 25,6 26,0 24,5 23,8

Índia 28,7 25,4 26,3 30,2 30,7 28,4

Rússia 22,1 20,5 21,1 21,7 22,3 22,5

Fonte: Elaboração própria com base nos dados do World Development Indicators – WDI.

Cabe observar que a participação dos países do BRICS no comércio mundial se

diferenciam profundamente. Ao analisar o percentual do PIB que cada país dedica a

exportações e importações, por exemplo, nota-se que África do Sul, China e Índia,

principalmente, compõem cerca de 50 à 70% do seu PIB a partir desses setores. No Brasil,

as políticas de reestruturação da abertura econômica, aplicadas no final da década de 1990

e mencionadas no início dessa sessão parecem ainda não terem alcançado o resultado

almejado de substituir importações em detrimento de exportações mais expressivas. O Brasil

ainda compõe seu PIB mais por importações (15% em 2013) do que por exportações (12,6%

em 2013), conforme tabela 3.

Tabela 4 – BRICS: Demais composições (%) do PIB, 2008-2013

Agricultura

2008 2009 2010 2011 2012 2013

África do Sul 3,0 2,9 2,6 2,5 2,5 2,4

Brasil 5,9 5,6 5,3 5,5 5,3 5,7

China 10,7 10,3 10,1 10,0 10,1 10,0

Índia 17,8 17,7 18,2 17,9 17,5 18,2

Rússia 4,4 4,7 3,9 4,3 3,9 3,9

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Indústria

2008 2009 2010 2011 2012 2013

África do Sul 32,3 31,0 30,1 29,7 28,4 27,6

Brasil 27,9 26,8 28,1 27,5 26,0 25,0

China 47,4 46,2 46,7 46,6 45,3 43,9

Índia 28,3 27,8 27,2 27,2 26,2 24,8

Rússia 36,1 33,6 34,7 37,3 36,7 36,2

Serviços

2008 2009 2010 2011 2012 2013

África do Sul 64,7 66,1 67,3 67,8 69,1 70,0

Brasil 66,2 67,5 66,6 67,0 68,7 69,3

China 41,8 43,4 43,2 43,4 44,6 46,1

Índia 53,9 54,5 54,6 54,9 56,3 57,0

Rússia 59,5 61,7 61,4 58,4 59,4 59,9

Fonte: Elaboração própria com base nos dados do World Development Indicators – WDI.

Índia e Rússia destacam-se no setor industrial, ainda que a primeira revele, junto com

a China, os maiores índices destinados à agricultura, ilustrando que ambos ainda possuem

potencial para um processo de industrialização ainda mais expressivo (BAUMANN, 2010). Por

outro lado, o Brasil destaca-se em serviços, chegando, em 2013, à quase 70% do PIB

composto por esse setor. Ainda segundo Baumann (2010, p. 15) “a economia brasileira tem

estrutura produtiva mais aproximada ao padrão observado nos países desenvolvidos”,

justamente por sua predominância no setor de serviços. Porém, para Thorstensen, et. al.

(2011) apesar do Brasil ter optado por um modelo de desenvolvimento voltado para o mercado

interno, sua agricultura vem sendo transformada como fonte de grande polo exportador.

Para Almeida (2010) a China e Índia são consideradas prováveis grandes potências

no futuro da economia mundial, independentemente de seu pertencimento ao BRICS. Esse

protagonismo fica claro em grande parte das análises tabulares feitas aqui até o momento.

Almeida (2010) também sugere que esse caráter de autonomia de China e Índia coloca o

Brasil num patamar inferior de poder e influência internacional – sendo esta colocação uma

das possíveis respostas para a questão exposta no item (ii), no início dessa seção.

No entanto, é notável que os BRICS ganham cada vez mais projeção. Em 2014, o

grupo encontra-se em sua 6ª Cúpula, dessa vez sediada em Fortaleza, e considerada um

sucesso absoluto. Para Stuenkel (2014), “até o momento, ser um membro BRICS produziu

apenas benefícios para o Brasil. Não há sinal de que isso mudará no futuro”. Além disso,

através da 6ª Cúpula o BRICS alcançou uma de suas grandes metas: ganhar uma dimensão

institucional, com a criação do Banco de Desenvolvimento dos BRICS e do Arranjo

Contingente de Reservas dos BRICS (Ibid., 2014).

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No entanto, o Brasil apresenta peculiaridades que também caracterizam seu espaço

autônomo na esfera internacional, independentemente de seu pertencimento ao BRICS.

Integra com veemência à sua pauta de política externa a integração regional e a cooperação,

sendo membro de fundamental importância em outros grupos e blocos políticos, econômicos

e diplomáticos, como MERCOSUL, UNASUL e ALADI. É a respeito de seu compromisso na

atuação regional que será tratado e problematizado, na seguinte seção, o dilema entre sua

participação no BRICS e nas instâncias regionais anteriormente citadas.

3. INTEGRAÇÂO REGIONAL: DILEMAS E AVANÇOS BRASILEIROS

Foi no contexto dos anos 1980, com a restauração democrática e o posterior término

da Guerra Fria, que o enfoque brasileiro às questões internacionais tornou-se mais

diversificado, e as relações com os EUA passaram a ser vistas como uma possível barreira a

projeção internacional brasileira, fato este que atentou para que a América do Sul tornasse-

se âncora na política externa brasileira (HAKIM, 2010). Os processos de integração regional

passaram a apresentar-se como contraponto à globalização econômica, onde a organização

em relação à integração econômica passou a ser uma reação necessária dos Estados no

contexto econômico internacional (SOARES FILHO, 2009).

Segundo Biocca (2001) apud Soares Filho (2009, p. 22), a integração “preserva as

identidades das regiões e enseja que o Estado nacional adquira maior potencialidade na

comunidade internacional”. É nesse sentido que o Brasil consolida como pauta de destaque

em sua política externa o processo de integração e passa a ampliar seu papel tanto no cenário

internacional quanto em sua região, conforme Hakim (2010), ao passar a ser reconhecido

pelos demais governos sul-americanos como líder continental.

O constante crescimento da visibilidade brasileira no cenário internacional ganha

destaque a partir de questões como sua expressiva participação na Rodada de Doha, reunião

que demonstrou “a capacidade das potências emergentes para determinar a agenda

institucional, a fim de influenciar normas internacionais emergentes em favor dos seus

interesses” (FLEMES, 2010, p. 147). O país também desempenhou papel de destaque na

construção em outros símbolos de coalizão Sul-Sul, como a transferência das discussões

financeiras globais do tradicional grupo G-8, no culminar da formação do novo grupo G-20,

que passou a incluir as economias mais importantes da África, Ásia e América Latina

(FLEMES; HAKIM, 2010), além de ter tido participação-chave também em debates de cunho

financeiro, no Banco Central e FMI.

Com ações que passaram a ser reconhecidas como de grande impacto na governança

econômica global, na qual o Brasil encontra-se fortemente integrado, operando entre

instituições globais (FLEMES, 2010) configura-se uma “mudança crítica nos esquemas

11

econômicos internacionais, [que] realça a impressionante redistribuição do poder econômico

mundial” (HAKIM, 2010, p. 50). Tal mudança reforça o papel de destaque que o Brasil vem

desempenhando, de modo a iluminá-lo tanto em âmbito global quanto em suas relações intra-

regionais.

É como resultado da tendência mundial em constituir blocos regionais e em atitude de

defesa diante da preocupante iminência da globalização (SOARES FILHO, 2009), cujo ritmo

acelerado pressiona as economias regionais a uma inserção individual e desarticulada

(CORTADA, 2007), que o Mercado Comum do Sul é constituído a partir do Tratado de

Assunção. Firmado entre Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai em 26 de março de 1991, o

MERCOSUL teve personalidade jurídica declarada no Protocolo de Ouro Preto de 16 de

dezembro de 1994. A Venezuela, por sua vez, adere ao mesmo em 12 de Agosto de 2012,

por meio da Decisão CMC 27/12. Os membros do MERCOSUL justificam sua formação ao

caracterizar o processo de integração como “condição fundamental para acelerar seus

processos de desenvolvimento econômico com justiça social”2.

Outra organização que segue a política integracionista no âmbito sul-americano, mas

apresenta inovações em relação as demais, é a União de Nações Sul-Americanas (UNASUL).

Formada pelos países da América do Sul, com exceção da Guiana Francesa, em 28 de maio

de 2008, a UNASUL representou um novo avanço nos esforços para a aproximação da região.

Inspirada nas Declarações de Cusco (2004), Brasília (2005) e Cochabamba (2006), a

UNASUL firmou como ensejo “sua determinação de construir uma identidade e cidadania sul-

americanas”, o desenvolvimento de um espaço regional integrado em diversos âmbitos,

salientando que a integração é imprescindível para o avanço no desenvolvimento destes

países e que a prática da mesma “é um passo decisivo rumo ao fortalecimento do

multilateralismo e à vigência do direito nas relações internacionais”3.

Seguindo um caminho contrário a maioria dos blocos tradicionais, que costumam

iniciar o processo de integração por um viés econômico, a proposta da UNASUL é justamente

percorrer esse caminho de aproximação num sentido inverso. Parte-se de discussões a

respeito de aspectos sociais e políticos dos países integrantes, no objetivo de pautar uma

convergência de ação e planejamento que possibilite a ampliação da integração para os mais

diferentes âmbitos, incluindo o viés econômico (BARNABÉ, 2011). Para Barnabé (Ibid., p. 42)

a UNASUL atua como “instrumento com o qual os países-membros podem contar para uma

inserção menos assimétrica ao cenário globalizado”.

2 Expresso no Tratado de Assunção, p. 1, disponível em: <http://www.stf.jus.br/arqui-vo/cms/processoAudienciaPublicaAdpf101/anexo/Tratado_de_Assuncao..pdf> 3 Conforme Tratado Constitutivo da UNASUL. Disponível em: <http://www.mre.gov.br/portugues/imprensa/nota_detalhe3.asp?ID_RELEASE=5466>

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A Associação Latino-Americana de Integração (ALADI) também configura-se como

outra importante e histórica estratégia de aproximação e reforço à integração regional. A

mesma foi instituída pelo Tratado de Montevidéu, ainda em 1980, no intuito de dar

continuidade ao processo de integração econômica iniciado em 1960 pela então Associação

Latino-Americana de Livre Comércio (ALALC).

No entanto, apesar dos diversos esforços, os processos e iniciativas de integração

regional ainda não podem ser considerados como sucesso absoluto. Hakim (2010) aponta o

pacto do Mercosul como incerto, já que, segundo ele, o mesmo não apresentou resultados

efetivos no desenvolvimento de regras comuns e politicas convergentes. Nesse sentido, o

Brasil transferiria seu foco de integração regional para a UNASUL, com a intenção “de

estabelecer uma integração de estilo europeu, incluindo uma comunidade econômica,

acordos políticos básicos e um mecanismo de defesa mútua” (Ibid, p. 47). Por outro lado,

Soares Filho (2009, p. 36), declara que um processo de integração não exclui o outro e que

“ambos se completam, concorrendo para a mais ampla integração latino-americana”.

Para CORTADA (2007), a dificuldade para consolidar uma maior integração é reflexo

tanto do passado colonial do continente quanto de sua articulação e comportamento em

relação ao processo de acumulação capitalista. Ibid., p. 2 “os vínculos econômicos dos países

da América do Sul são mais estreitos com as economias centrais que entre si”. Entretanto,

afim de que a literatura discutida até o presente momento seja elucidada, serão apresentados,

na sequência, tabelas com dados estatísticos da atuação brasileira na região, através da

participação integrada ao MERCOSUL, UNASUL e ALADI, através das quais será analisada

a participação brasileira nas relações intra-regionais.

Tabela 5 – MERCOSUL: Participação (%) no PIB Mundial, 2008-2013

2008 2009 2010 2011 2012 2013

Argentina 0,65 0,64 0,71 0,78 0,82 0,81

Brasil 2,65 2,75 3,32 3,46 3,08 2,99

Paraguai 0,02 0,02 0,03 0,03 0,03 0,03

Uruguai 0,04 0,05 0,06 0,06 0,06 0,07

Venezuela 0,50 0,55 0,61 0,44 0,52 0,58

MERCOSUL 3,89 4,03 4,73 4,79 4,53 4,51

Fonte: Elaboração própria com base nos dados do World Development Indicators – WDI.

13

Tabela 6 – Brasil: Participação (%) no PIB do MERCOSUL, UNASUL e BRICS –

2008-2013

2008 2009 2010 2011 2012 2013

MERCOSUL 68,21 68,23 70,06 72,35 67,98 66,41

UNASUL 54,11 54,18 56,28 57,72 52,80 51,37

BRICS 17,71 17,08 18,36 17,70 15,25 14,20

Fonte: Elaboração própria com base nos dados do World Development Indicators – WDI.

A partir da tabela 5, podemos observar a timidez em relação a participação dos

membros plenos do MERCOSUL no PIB Mundial. Mesmo o Brasil, que apresenta um índice

mais expressivo entre os países do grupo, não destaca-se a nível global. Apesar disso, como

pode ser visto na tabela 6, em sequência, o Brasil representa, no período delimitado, cerca

de 66 à 72% do PIB do MERCOSUL e 51 à 57% do PIB da UNASUL. Isso destaca o quanto

a participação do país nos blocos regionais é expressiva mas, ao mesmo tempo, a nível global,

não destaca-se no mesmo nível.

Em relação à sua participação no BRICS, por outro lado, o Brasil já apresenta uma

composição relativamente baixa se comparada a participação nos blocos regionais. Ainda

que, com já demonstrado na seção anterior, sua participação nesta composição só é menor

que a da China (ver tabela 2).

Tabela 7 – Taxa média real anual (%) de crescimento do PIB (entre países do Mercosul)

2008 2009 2010 2011 2012 2013

Argentina 3,1 0,1 9,1 8,6 0,9 3,0

Brasil 5,2 -0,3 7,5 2,7 1,0 2,5

Paraguai 6,4 -4,0 13,1 4,3 -1,2 13,6

Uruguai 7,2 2,4 8,4 7,3 3,7 4,4

Venezuela 5,3 -3,2 -1,5 4,2 5,6 1,3

Fonte: Elaboração própria com base nos dados do World Development Indicators – WDI.

Apesar dos valores pouco expressivos de participação do MERCOSUL no PIB

Mundial, países como Argentina, Paraguai e Uruguai, apresentaram no último ano taxas de

crescimento superiores às brasileiras (tabela 7). Como também já foi indagado na seção

anterior, o baixo crescimento do Brasil não significa, necessariamente, que esse esteja

perdendo cenário na economia mundial. Por outro lado, o crescimento no PIB dos países da

região é extremamente positivo par a articulação regional, no sentido de que contribui para a

diminuição da assimetria entre os mesmos no bloco, além de possibilitar uma participação

maior do mesmo a nível global.

14

Tabela 8 – Indicadores de Comércio Exterior – ALADI, UNASUL, MERCOSUL e Brasil

(valores em US$ mi) – 2012

ALADI UNASUL Mercosul Brasil

Exportação global 1.025.440 653.728 437.100 242.580

Importação global 972.292 588.913 384.074 233.368

Exportação intra-regional 165.204 139.778 94.381 45.050

Importação intra-regional 159.325 143.451 89.982 38.238

Exportação intra-regional/global 16,1% 21,4% 19,9% 18,6%

Importação intra-regional/global 16,4% 24,4% 23,4% 16,4%

Fonte: Elaboração própria com base nos dados da Secretaria Geral da ALADI.

Tabela 9 – Brasil: Participação (%) nos indicadores dos blocos regionais – 2012

ALADI UNASUL Mercosul

Exportações Globais 23,6 37,1 55,5

Importações Globais 24 39,6 60,7

Exportações intra-regionais 27,3 32,2 47,7

Importações intra-regionais 24 26,6 42,5

Fonte: Elaboração própria com base nos dados da Secretaria Geral da ALADI.

A partir da análise dos indicadores de comércio exterior dos blocos regionais aos quais

o Brasil integra, conforme tabelas 8 e 9, pode-se observar que apesar do Brasil apresentar

significativa participação nas exportações e importações da ALADI, UNASUL e MERCOSUL,

seus índices de exportação e importação intra-regional não são tão expressivos. Na verdade,

os blocos como um todo, apesar de articularem-se conjuntamente não apresentam na prática

trocas comerciais com ênfase no intra-regionalismo. Até mesmo os indicadores dos próprios

blocos são baixos nesse quesito.

É notável a dedicação brasileira ao MERCOSUL, em especial. Em 2012, a participação

brasileira do mesmo significou 55,5% das exportações do mesmo, 60,7% das importações,

47,7% das exportações intra-regionais e 42,5% das importações intra-regionais. Ao analisar

a UNASUL e a ALADI, é necessário levar em conta que o número de países contabilizados

cresce, mas mesmo assim a participação brasileira não alcança tamanha significância como

no MERCOSUL.

Como já observado por Cortada (2007), tais análises, a partir de dados estatísticos,

revelam a importância do Brasil no comércio intra-regional, o fato do mesmo apresentar-se

como a economia de maior destaque no subcontinente e seu papel como país articulador

regional. No entanto, também são apresentadas críticas de que as relações intra-regionais

brasileiras apresentam característica centro-periférica e de que ao invés de uma integração

15

efetiva e articulada, predominam projetos nacionais e independentes de industrialização ou

inserção internacional.

Tabela 10 – Parceiros Comerciais do Brasil – Exportação (%) 2008-2013

2008 2009 2010 2011 2012 2013

África do Sul 0,89 0,82 0,65 0,66 0,73 0,76

China 8,35 13,73 15,25 17,31 17,00 19,02

Índia 0,56 2,23 1,73 1,25 2,30 1,29

Rússia 2,35 1,87 2,06 1,65 1,29 1,23

Total BRICS 12,14 18,66 19,68 20,86 20,20 22,30

América do Sul 19,38 17,65 18,41 17,68 15,69 17,01

MERCOSUL 13,58 12,71 13,10 12,67 10,88 12,20

EUA 13,85 10,20 9,56 10,08 11,01 10,19

EU 23,54 22,35 21,46 20,77 19,18 19,74

Fonte: Elaboração própria com base nos dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (2014)

Tabela 11 – Parceiros Comerciais do Brasil – Importação (%) 2008-2013

2008 2009 2010 2011 2012 2013

África do Sul 0,45 0,34 0,41 0,40 0,38 0,30

China 11,59 12,46 14,08 14,49 15,35 15,57

Índia 2,06 1,72 2,33 2,69 2,26 2,65

Rússia 1,93 1,11 1,05 1,30 1,25 1,12

Total BRICS 16,02 15,62 17,88 18,89 18,98 19,64

MERCOSUL 8,94 10,72 9,60 9,12 8,95 8,53

América do Sul 13,95 14,97 14,26 13,66 13,50 13,39

EUA 14,82 15,68 14,88 15,01 14,50 15,02

UE 20,92 22,89 21,54 20,54 21,09 21,18

Fonte: Elaboração própria com base nos dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (2014)

Essas críticas podem ser devidamente compreendidas ao observarmos dados

relativos aos parceiros comerciais brasileiros, em importação e exportação (tabelas 10 e 11).

Levando em conta o período em que propôs-se a análise, em função do reforço no discurso

integracionista intra-regional com a criação UNASUL, em 2008; observamos que as

exportações em relação ao Mercosul e à América do Sul (considerando âmbito aproximado à

UNASUL e ALADI) apresentaram decréscimo nesse período, enquanto às exportações

destinadas aos BRICS acresceram-se consideravelmente (de 12,14% para 22,30%). No

âmbito das importações, mantiveram-se de maneira geral os índices entre MERCOSUL e

América do Sul, e acresceram-se em relação aos BRICS.

16

Observamos que grande parte do comércio exterior do Brasil ainda é realizado com

países centrais, sendo significativo os índices destinados aos Estados Unidos da América

(EUA) e União Europeia (UE), apesar de apresentarem certo declínio no período em

detrimento do fortalecimento com o BRICS, nesse âmbito, principal e mais fortemente com a

China. Isso evidencia a citação já mencionada de Cortada, no sentido de que os vínculos dos

países sul-americanos permanecem estreitos com os países centrais.

Cortada (2007) coloca como parecer que nas relações comerciais com o Brasil os

países sul-americanos apresentam características similares à de países periféricos. Nesse

sentido, o Brasil exerce certo grau de centralidade ao constituir-se como principal força

comercial do continente. No entanto, essa centralidade é fraca, já que, apesar de principal,

sua participação é pouco expressiva a níveis absolutos, com uma absorção muito pequena

de exportação dos mesmos (Ibid.).

No entanto, um dos crescentes problemas enfrentados, como dilema da integração

regional, é a substituição de exportações e importações que vem sendo executada em relação

a China. A partir de 1998, o comércio intra-regional sofreu certa retração, não só por conta

das crises pelas quais passaram os países sul-americanos, mas também pelo espaço que

Índia e China conquistam com o direcionamento de suas exportações (CARCANHOLO, et al.,

2009).

Com o reforço já mencionado nas iniciativas de política externa no âmbito da

integração regional, a partir do pacto da UNASUL, a expectativa era de que esse

distanciamento fosse de fato revisto e que se executassem esforços no sentido de uma

reaproximação em trocas comerciais. Como colocado por Barbosa (2009) a ascensão da

China jogaria a “última pá de cal” na promessa de um desenvolvimento intra-regional latino-

americano, “devendo neste caso a ‘culpa’ ser imputada à ausência de visão estratégica por

parte dos países da região” (Ibid, p. 36).

Nesse sentido, há divergências em relação à origem e à solução dos dilemas que

enfrenta a integração latino-americana. O consenso que aqui se apresenta, no entanto, tanto

a nível das literaturas revisadas quanto das estatísticas analisadas, é que a aproximação

esperada a partir da constituição da UNASUL não foi efetivada no âmbito econômico tanto

quanto se esperava.

Uma das questões apontadas por Barnabé (2011) como empecilho ao processo de

integração na América do Sul é justamente a liderança “natural” que o Brasil apresenta.

Segundo o autor (Ibid. p. 42), “a liderança regional gera prestígio internacional e faz com que

o ‘país-líder’ busque, a partir deste ‘trampolim político regional’, outros voos, outras metas”.

Além, caracteriza o Brasil como “único país que realmente busca projeção global”, fazendo-o

como estratégia o papel protagonista que desempenha nos blocos regionais, colocando-se

como potência regional e frequente mediador de conflitos internacionais.

17

Esses interesses justificam, até certo ponto, “o crescente interesse do país pela

estabilidade da região e pelo avanço da integração” (BARNABÉ, 2011, p. 45). No entanto,

“chocam-se, em alguma medida, com os discursos pró-integração” (Ibid., p. 42), ao mesmo

tempo em que constituem-se como necessidade para o sucesso da integração sul-americana,

tendo em vista a função que representa, como “motor da integração na região” (Ibid., p. 45).

O que aponta-se como parecer em relação à participação brasileira na integração sul-

americana é, e não seria de outra forma, justamente o profundo dilema que o mesmo encontra

nesse âmbito.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A configuração da política internacional sofreu modificações com o advento dos

BRICs, resultando novos papéis de importância no que concerne a política externa desses

países e seu relacionamento no sistema político global (NIETO, 2012). Com esse novo cenário

revelando-se, o Brasil não foi exceção. Teve que repensar e readaptar os rumos de sua

política externa, mantendo o tradicional multilateralismo mas repensando parceiros comerciais

e diplomáticos, abrindo-se para novos mercados. No entanto, o desafio de consolidar e

efetivar a integração sul-americana, que desde o início dos anos 1990 caminhava com mais

afinco como projeto, segue como pauta relevante.

Se a participação do Brasil tanto nos BRICS quanto nos blocos regionais ainda é vista

como incompleta por parte de muitos pesquisadores e especialistas, para Kregel (2009), o

Brasil está, em alguns aspectos, muito mais avançado em relação aos demais BRICS. O autor

destaca a força do mercado interno brasileiro e, inclusive, a importância de investimentos

através de projetos sociais e de infraestrutura, como o Programa de Aceleração do

Crescimento (PAC) – estratégias ausentes, a nível de comparação, nos demais países do

BRICS. Para Barnabé (2011) a prioridade que a política externa brasileira dedica à integração

regional é responsável direta pelos avanços do MERCOSUL e pela edificação da UNASUL.

A partir das análises aqui realizadas, tanto a nível de revisão de literatura quanto em

relação a dados estatísticos do Brasil, países e blocos aos quais integra, é possível perceber

que, de fato, os índices brasileiros não são os que mais se destacam a níveis globais.

Individualmente, o Brasil ainda é coadjuvante quando comparado a países gigantes em

aspecto comercial, como a China, ou grandes blocos, como a União Europeia. Enquanto

membro dos blocos aos quais participa, porém, sendo os analisados aqui BRICS, UNASUL e

MERCOSUL, o Brasil apresenta resultados bastante significativos. Demonstra ser um “motor

propulsor” no que concerne sua articulação com os blocos regionais, e em muitos indicadores

só fica atrás da China, dada sua participação no BRICS.

18

Dada a proposta desse artigo, que busca discutir se a participação brasileira no BRICS

o afasta da integração regional e, num cenário mais negativo, prejudica essa integração, a

análise final é que a participação do Brasil no BRICS vem sendo cada vez mais valorizada

tanto pela diplomacia brasileira, a nível de política externa, quanto pelas relações comerciais

do país. Os indicadores referentes ao BRICS crescem cada vez mais, bem como a dedicação

do Brasil a esse bloco. No entanto, ao mesmo tempo, reforçam-se os incentivos à integração

regional, ainda que esta caminhe a passos lentos se comparado ao ritmo dos BRICS. Em

2008, firmou-se o Tratado Constitutivo da UNASUL, que sublinhou a crescente importância e

a intenção brasileiras destinadas à essa aproximação.

Braga (2002), citado por Cortada (2007), classifica a integração econômica regional

em duas fases distintas. Na primeira fase, a integração ocorre como uma estratégia ao

desenvolvimento econômico, dentro da lógica do processo de substituição de importações. A

segunda fase, enfim, “busca na integração regional uma maior inserção das economias latino-

americanas na economia internacional. Trata-se do regionalismo aberto” (Ibid., 2002, p. 11).

Cortada (2007) distingue a primeira frase como uma integração “para dentro” (intra-regional)

e a segunda como integração “para fora” (extra-regional), a voltada para a industrialização,

vista como motor de desenvolvimento e a segunda com o objetivo de conduzir esses países

à uma “inserção competitiva” no comércio mundial.

Tendo como base a análise e reflexão dos autores, o parecer em relação a integração

brasileira à integração regional é de que a segunda fase, caracterizada por essa abertura no

âmbito da economia internacional, já se iniciou. O Brasil articula sua participação em ambos

os eixos (países emergentes e países vizinhos), mas parece não ter cumprido à risca, junto

com os outros países, a primeira fase – caracterizando um processo de integração incompleto

ou, ainda, não completamente efetivo.

No entanto, em 2014, o Brasil parece ter dado um passo certeiro e ainda maior na

integração dessas duas esferas. A já mencionada 6ª Cúpula dos BRICS foi realizada

juntamente com a cúpula BRICS-América do Sul. Para Stuenkel (2014), “a cúpula dos BRICS-

América do Sul é uma prova do poder convocatório e ambição de liderança regional do Brasil,

um papel ao qual terá de se adaptar a longo prazo”. A união desses dois âmbitos de atuação

evidencia o protagonismo econômico do Brasil e seu poder articulador.

Parecendo deslumbrado com sua crescente inserção internacional, a notável

participação e resultados obtidos através do BRICS, o Brasil não chega a ser visto como um

“imperialista” na América do Sul, seja no MERCOSUL ou na UNASUL. No máximo, atua como

um líder nato pouco atencioso às carências e espaços inexplorados da integração regional, e

aproveita do destaque global para projetar-se cada vez mais internacionalmente.

19

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