A experiência organizativa do Fórum de Assistentes e Psicólogos do TJES: análise...

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A experiência organizativa do Fórum de Assistentes e Psicólogos do TJES: análise éticopolítica dos dez anos de (re)construção e resistência. Eixo: Gestão do trabalho Ana Paula Brito Mozer 1 Emilly Marques Tenorio 2 Fernanda Pinheiro de Oliveira Rubim 3 Maria Augusta Destefani Pancoto 4 Maria Helena de Paula 5 Resumo O presente artigo tem por objetivo abordar a organização coletiva e política dos assistentes sociais e psicólogos do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo (TJES) e analisar seu alinhamento com o direcionamento éticopolítico firmado pelas referidas categorias profissionais. Consideramos, mediante os elementos históricos e teóricos apresentados que a constituição de um espaço coletivo como o FASP, coaduna com os projetos profissionais delineados e legitimados pelas categorias. Destacamos significativas conquistas dos últimos dez anos e reafirmamos que o presente espaço está em constante construção diante das diversas demandas que aparecem, mas configurase como uma estratégia de resistência coletiva e construção da autoimagem profissional dentro do TJES. Palavraschave: organização coletiva, projeto éticopolítico, Serviço Social, Psicologia, Judiciário. 1 Assistente Social do TJES. Especialista em Serviço Social: Direitos Sociais e Competências Profissionais pela Universidade de Brasília. Atua na Central de Apoio Multidisciplinar de Cachoeiro de Itapemirim. Integra a Secretaria Financeira do FASP (Gestão 2014/2015). É Conselheira Suplente do CRESSES (Gestão 2014/2017). [email protected] – (27) 981247287. 2 Assistente Social do TJES. Especialista em Gênero e Sexualidade pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro e mestranda do Programa de Política Social da UFES. Atua na Central de Apoio Multidisciplinar de Guarapari. Coordena a Comissão temática de Violência Domética e Familiar contra a Mulher do FASP (Gestão 2014/2015). [email protected] 3 Psicóloga do TJES. Psicóloga do TJES. Pósgraduada em Análise Institucional e Esquizoanálise pela UNIPAC / Instituto Felix Guattari (2004), mestra em Psicologia Social pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais(2009) e pósgraduada em Psicologia Jurídica pelo Centro Universitário de Araraquara. Atua na 3ª Vara de Infância e Juventude de Vitória. Integra a Secretaria de Comunicação do FASP (Gestão 2014/2015). [email protected] 4 Assistente Social do TJES. Pósgraduada em Gestão de Políticas Sociais Públicas Públicas e Privadas pela Faculdade Salesiana do Espírito Santo. Atua na Central de Apoio Multidisciplinar de Vitória. Atualmente, é coordenadora do FASP (Gestão 2014/2015). [email protected] 5 Assistente Social do TJES. Atua na 2ª Vara de Infância e Juventude de Vitória. Integra a Secretaria de Comunicação do FASP (Gestão 2014/2015). [email protected]

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A experiência organizativa do Fórum de Assistentes e Psicólogos do TJES: análise ético­política dos dez anos de (re)construção e resistência.

Eixo: Gestão do trabalho

Ana Paula Brito Mozer 1

Emilly Marques Tenorio 2

Fernanda Pinheiro de Oliveira Rubim 3

Maria Augusta Destefani Pancoto 4

Maria Helena de Paula 5

Resumo O presente artigo tem por objetivo abordar a organização coletiva e política dos assistentes sociais e psicólogos do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo (TJES) e analisar seu alinhamento com o direcionamento ético­político firmado pelas referidas categorias profissionais. Consideramos, mediante os elementos históricos e teóricos apresentados que a constituição de um espaço coletivo como o FASP, coaduna com os projetos profissionais delineados e legitimados pelas categorias. Destacamos significativas conquistas dos últimos dez anos e reafirmamos que o presente espaço está em constante construção diante das diversas demandas que aparecem, mas configura­se como uma estratégia de resistência coletiva e construção da auto­imagem profissional dentro do TJES. Palavras­chave: organização coletiva, projeto ético­político, Serviço Social, Psicologia, Judiciário.

1 Assistente Social do TJES. Especialista em Serviço Social: Direitos Sociais e Competências Profissionais pela Universidade de Brasília. Atua na Central de Apoio Multidisciplinar de Cachoeiro de Itapemirim. Integra a Secretaria Financeira do FASP (Gestão 2014/2015). É Conselheira Suplente do CRESS­ES (Gestão 2014/2017). [email protected] – (27) 98124­7287. 2 Assistente Social do TJES. Especialista em Gênero e Sexualidade pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro e mestranda do Programa de Política Social da UFES. Atua na Central de Apoio Multidisciplinar de Guarapari. Coordena a Comissão temática de Violência Domética e Familiar contra a Mulher do FASP (Gestão 2014/2015). [email protected] 3 Psicóloga do TJES. Psicóloga do TJES. Pós­graduada em Análise Institucional e Esquizoanálise pela UNIPAC / Instituto Felix Guattari (2004), mestra em Psicologia Social pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais(2009) e pós­graduada em Psicologia Jurídica pelo Centro Universitário de Araraquara. Atua na 3ª Vara de Infância e Juventude de Vitória. Integra a Secretaria de Comunicação do FASP (Gestão 2014/2015). [email protected] 4 Assistente Social do TJES. Pós­graduada em Gestão de Políticas Sociais Públicas Públicas e Privadas pela Faculdade Salesiana do Espírito Santo. Atua na Central de Apoio Multidisciplinar de Vitória. Atualmente, é coordenadora do FASP (Gestão 2014/2015). [email protected] 5 Assistente Social do TJES. Atua na 2ª Vara de Infância e Juventude de Vitória. Integra a Secretaria de Comunicação do FASP (Gestão 2014/2015). [email protected]

1­ Introdução:

“Esse é tempo de partido, tempo de homens partidos (...) As leis não bastam. Os lírios não nascem da lei” . 6

O presente artigo tem por objetivo analisar a organização coletiva e política dos

assistentes sociais e psicólogos do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo (TJES) e o seu

alinhamento com o direcionamento ético­político firmado pelas referidas categorias profissionais.

Tal análise é referenciada na experiência organizativa desenvolvida por meio do Fórum de

Assistentes Sociais e Psicólogos do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (FASP) e da articulação

com os movimentos sociais e sindical, do qual parte dos profissionais da psicologia e do serviço

social do TJES faz parte. Pretende­se ainda identificar os elementos disparadores que

demandaram a organização profissional e avaliar as possibilidades, os desafios e as conquistas

alcançadas até os dias atuais.

A atuação das autoras deste artigo no FASP, a partir do ano de 2012, a inserção na Gestão

deste Fórum, no biênio 2014/2015, e os consequentes dilemas e experiências construídas nesse

espaço coletivo foram importantes motivadores para a elaboração do presente artigo. Destaca­se

nesse sentido, os questionamentos presentes quanto a predominância das mobilizações e lutas

relacionadas as questões de caráter técnico, corporativista e salarial em relação as de amplitude

política e de reconhecimento de pertencimento à classe trabalhadora. Além disso, as autoras

também foram impulsionadas pelo interesse em compreender em que medida as demandas

originárias ainda se fazem presentes no cenário atual e como essa forma de organização coletiva

se mantém há 10 anos, mesmo diante do contexto sócio­político de desmonte e enfraquecimento

dos movimentos de organização dos trabalhadores.

O caminho metodológico foi construído a partir da pesquisa qualitativa, mediante revisão

bibliográfica, entrevistas semi­estruturadas e pesquisa documental dos registros históricos do

FASP. Cabe destacar que a pesquisa qualitativa se firma na intenção de se extrair sentido aos

significados que os outros atribuem às suas experiências, baseado em suas perspectivas históricas

e sociais (CRESWELL, 2010). Esse método “adequa­se a aprofundar a complexidade de

6 Todos os trechos que antecedem cada tópico da estrutura do artigo são do poema “Nosso Tempo” de Carlos Drummond de Andrade.

fenômenos, fatos e processos particulares e específicos de grupos” (MINAYO; SANCHES, 1993,

p. 247).

O Serviço Social e a Psicologia possuem referenciais teóricos distintos, mas com

perspectivas complementares, que permitem avaliar este espaço de organização. Em comum,

possuem a crítica ao sistema capitalista e o compromisso político com a defesa dos direitos

humanos e com a ampliação da democracia. Além disso, ambos partem de princípios

convergentes, quando afirmam a importância de uma nova sociabilidade livre de opressões e

permeada por modos de subjetivação mais autônomos.

A lente teórica utilizada pelas pesquisadoras do serviço social para embasar o artigo foi o

referencial materialista­histórico de Marx, pois enquanto método propõe a abordagem dialética

no sentido de considerar os “contextos históricos, as determinações socioeconômicas dos

fenômenos, as relações sociais de produção e de dominação com a compreensão das

representações sociais” (MINAYO, 2013, p.24).

A pesquisadora psicóloga utilizou as concepções de Deleuze (1976), Guattari (1996) e

Foucault (1984) para empreender as análises destes artigo. Os referidos autores propõem a

imanência entre os meios de produção e os modos de subjetivação. Para estes autores a

subjetividade não é determinada pelo social, mas tecida por micropoderes em conexão com

processos sociais, culturais, econômicos, midiáticos, ecológicos, que participam de sua

constituição e de seu funcionamento.

A temática mostra­se relevante em função do direcionamento político assumido

hegemonicamente pelo Serviço Social e pela Psicologia, das exigências e desafios postos aos

referidos profissionais e do atual contexto de crise estrutural do capital, de significativas

mudanças nas diferentes dimensões da vida social e de precarização do trabalho. Nesse sentido,

pretende­se explicitar e fortalecer a história de organização coletiva e política desempenhada

pelos profissionais que compõem o FASP, assim como reafirmar a potência da mobilização, da

construção de alianças estratégicas e da inserção da profissão nas lutas sociais como relevante

estratégia de resistência e como possibilidade de transformação.

2­ Desenvolvimento

“E continuamos. É tempo de muletas.(...)mas ainda é tempo de viver e contar.

Certas histórias não se perderam”.

A inserção de profissionais do Serviço Social no Tribunal de Justiça do Estado do Espírito

Santo (TJES) é datada a partir da década de 1950, mediante a localização e atuação de

profissionais no Juizado de Menor da Capital. Nas décadas seguintes há um processo gradativo

de ampliação do quantitativo de cargos de serviço social, contemplando a partir da década de

noventa as Varas da Infância e Juventude localizadas nas comarcas do interior do estado, a Vara

de Execuções Penais de Vitória e o Centro de Serviços Sociais do Tribunal de Justiça da comarca

da capital.

Em 1999 foi realizado o primeiro concurso público para preenchimento dos cargos de

serviço social e no ano de 2000 foram empossadas 26 (vinte e seis) assistentes sociais, lotadas nas

Varas da Infância e Juventude do estado e na Vara de Execuções Penais de Vitória. De acordo

com as informações obtidas a partir das entrevistas, inicialmente as assistentes sociais

vivenciaram práticas isoladas em seus espaços ocupacionais e ausentes de uma articulação

contínua que proporcionasse a troca de experiências e o aperfeiçoamento do trabalho

desenvolvido nas diferentes áreas de atuação. No entanto, os desafios enfrentados no cotidiano

profissional, a necessidade de construção de processos de trabalho, a ausência de clareza da

instituição sobre as atribuições e possibilidades de intervenção do profissional de Serviço Social e

a não garantia das condições éticas e técnicas por parte do PJES; emergiram a necessidade de

mobilização e articulação dessas assistentes sociais.

Desta forma, iniciou­se um processo de organização coletiva que contemplava

principalmente o compartilhamento de práticas e experiências profissionais, discussões sobre as

condições de trabalho, reconhecimento e consolidação do Serviço Social no PJES e a realização

de ações com vistas à formação continuada. A partir dessa organização inicial, os profissionais

visualizaram as possibilidades referentes à institucionalização de um fórum permanente de

discussão, enquanto instrumento de congregação e direcionamento das demandas apresentadas e

desafios vivenciados naquela conjuntura institucional. Assim, iniciou­se o Fórum de Assistentes

Sociais do Poder Judiciário do Espírito Santo, formalmente instituído e integrado a estrutura

organizacional do TJES em maio de 2005, por meio da Resolução nº 18/2005.

O Fórum é normatizado por Regimento Interno, se organiza mediante reuniões bimestrais

ou extraordinárias, quando necessário, e dispõe de uma Direção Executiva, composta

inicialmente por dois membros efetivos intitulados Coordenador e Secretário, bem como seus

suplentes. Conforme os registros documentais, o Fórum de Assistentes Sociais iniciou­se como

um:

[…] espaço organizativo desta categoria profissional. Tem por finalidade o debate das questões vivenciadas e trabalhadas pelos assistentes sociais em suas diversas áreas de atuação, com vistas ao desenvolvimento de projetos de intervenção, da constante avaliação de suas rotinas e de seus procedimentos, e da representação dos profissionais de Serviço Social em sua relação com a instituição (Material Informativo do Fórum de Assistentes Sociais, 2009, p. 02)

Além disso, o Fórum de Assistentes Sociais estruturava sua atuação a partir de três eixos

básicos: 1. Discussão da prática profissional na instituição judiciária, com vista à capacitação

continuada e à articulação com os órgãos e instituições públicas e privadas que atuam na garantia

de direitos; 2. Melhoria das condições e organização do trabalho do assistente social na

instituição judiciária; 3. Representação dos profissionais de Serviço Social em sua relação com a

instituição.

No ano de 2012, ocorre a nomeação de assistentes sociais e de psicólogos, estes últimos

pela primeira vez, inseridos mediantes concurso público, que foram lotados nas Varas de Infância

e Juventude, na Coordenadoria de Serviços Psicossociais e de Saúde (CSPS), Vara de Execuções

Penais e Medidas Alternativas (VEPEMA), assim como nas Centrais de Apoio Multidisciplinar

das Zonas Judiciárias (CAMs). As CAMs foram criadas com o objetivo de atenderem demandas

oriundas das Varas de Família e das Varas Especializadas em Violência Doméstica e Familiar

contra a Mulher e no interior do Estado, também, as demandas das Varas da Infância e da

Juventude.

É importante mencionar que anteriormente as demandas psicológicas eram atendidas por

meio de servidores com formação em psicologia em desvio de função ou por psicólogos cedidos

pelo Poder Executivo. O ingresso mediante concurso público representou um marco histórico

para a categoria, pois mesmo com a grande demanda de trabalho para a especialidade, foi a

primeira vez que o TJES realizou concurso público para esse cargo. Seu trabalho ganhou

contornos diferenciados, marcado, sobretudo, pelas diversas demandas que passaram a atender.

Cabe ressaltar que os psicólogos se organizaram internamente para analisar os problemas

institucionais que interferiam no seu processo de trabalho (precárias condições de trabalho em

alguns espaços de atuação; a necessidade de nomeação de mais profissionais e a necessidade do

reordenamento do trabalho nas Centrais de Apoio Multidisciplinar), além de compartilharem

experiências de atuação e definirem estratégias referentes ao requerimento de regulamentação e

concessão de Gratificação por Execução de Trabalho com Risco de Vida.

Esses profissionais produziram documentos levando ao conhecimento do chefe do PJES

os diversos fatores que dificultavam a prestação do serviço jurisdicional com qualidade no

Espírito Santo. Além disso, propuseram a sua incorporação ao Fórum de Assistentes Sociais do

Poder Judiciário do Espírito Santo, por compreenderem que grande parte dos dilemas enfrentados

no cotidiano se assemelhava a situação vivenciada também pelos assistentes sociais. Sendo

assim, em 2012, os psicólogos se juntaram ao Fórum já constituído pelos Assistentes Sociais, que

foi transformado no Fórum de Assistentes Sociais e Psicólogos do Poder Judiciário do Espírito

Santo (FASP).

Com o ingresso de novos assistentes sociais e a posterior integração dos psicólogos, o

Fórum de Assistentes Sociais e Psicólogos do PJES (FASP) experimenta possibilidades de

ampliação da sua atuação, oportunizadas principalmente pela amplificação da Direção Executiva

e instituição das Comissões Temáticas (Infância e Juventude, Família, Saúde e Trabalho, Penas e

Medidas Alternativas e Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher), estabelecidas mediante

reformulação do Regimento Interno, publicado no Diário da Justiça em 04 de outubro de 2013.

A Direção Executiva passa então a ser composta por 04 (quatro) membros efetivos intitulados

Coordenador, Secretário Administrativo, Secretário de Comunicação, Secretário Financeiro, bem

como seus suplentes; enquanto as Comissões Temáticas são coordenadas por 01 (um) assistente

social e 01 (um) psicólogo cada, com seus respectivos suplentes.

A partir das informações constantes no arquivo documental do FASP, é possível sinalizar

sobre as formas de organização e as principais ações desenvolvidas nos biênios 2008/2009; 7

2010/2011; 2012/2013; e 2014/2015.

No que se refere à organização das reuniões ordinárias e extraordinárias, no período

referente ao biênio 2008/2009 essas eram estruturadas com vistas a discutir e deliberar sobre

estratégias coletivas referentes as questões enfrentadas pelas assistentes sociais naquele momento

histórico. No segundo ano do biênio 2010/2011 há uma mudança na formatação dessas reuniões,

que passaram a ser divididas em dois momentos, um destinado as discussões de caráter

administrativo institucional e o outro as discussões técnicas, principalmente por meio da troca de

experiências e apresentação do trabalho desenvolvido pelas assistentes sociais em seus diferentes

locais de trabalho. Essa forma de organização se manteve no biênio 2012/2013, sofrendo

alteração no final de 2014 com a instituição das Comissões Temáticas e organização de Grupos

de Trabalho, sendo deliberado ainda sobre a priorização das discussões técnicas. No biênio

2014/2015 essa forma de organização permanece, porém com destaque e ampliação das ações de

formação continuada e articulação com os demais atores da rede de atendimento e dos

movimentos sociais.

Quanto ao direcionamento político e priorização de intervenção por parte do Fórum no

período de sua existência, podemos destacar no biênio 2008/2009 ações referentes à realização de

momentos de formação continuada, participação em processos decisórios institucionais relativos

ao Serviço Social (com destaque na elaboração de estudos sobre as vagas necessárias para o

concurso público, ocorrido no ano seguinte, 2010), reivindicação por adequações e melhorias das

condições éticas e técnicas para o exercício profissional, discussões e encaminhamento de

questões de caráter técnico, bem como articulação com o respectivo conselho profissional e

atores do Sistema de Garantia de Direitos, Sistema de Justiça e entidade sindical. Dentre as ações

realizadas neste período, acentuam­se os pleitos relativos às melhorias das condições éticas e

técnicas do trabalho.

7 No que se refere ao período de 2005 a 2007, foram identificadas ações vinculadas à capacitação profissional e de caráter técnico, dentre elas cita­se: Curso “Ética em Movimento” em parceria com o CRESS, Campanha de sensibilização à adoção e Seminário “Maioridade Penal e Exclusão Social”.

No biênio 2010/2011 observa­se dentre outras, o predomínio de ações ligadas a cursos e

momentos de capacitação profissional e também daquelas relacionadas à participação em

processos decisórios institucionais, com ênfase na integração na Comissão de Implantação e

Estruturação das Centrais de Apoio Multidisciplinar (CAM) e de articulações políticas e

institucionais relativas à reestruturação do Serviço Social do judiciário.

Nos anos subsequentes ­ 2012/2013­, mantiveram­se as ações relativas à qualificação e

educação permanente, com prevalência nas atividades relacionadas à discussão e fomento de

questões éticas e técnicas inerentes ao exercício profissional tanto do Serviço Social quanto da

Psicologia. Também se evidencia a continuidade de uma atuação canalizada à reivindicação por

melhoria nas condições de trabalho, articulação com os movimentos sociais, bem como a

participação na organização do Encontro dos Profissionais da Área Sociojurídica do Estado do

Espírito Santo. 8

Por fim, no atual biênio 2014/2015 , as ações empenham­se, principalmente, na formação 9

continuada, no pleito de condições satisfatórias e dignas de trabalho, na intervenção com vistas

ao reordenamento e ampliação das equipes, além de mobilização e articulação com movimentos

sindical e sociais (Movimento Feminista, Movimento contra a redução da Maioridade Penal,

Conselhos das Categorias Profissionais). No ano de 2014, destaca­se o importante envolvimento

e adesão de profissionais de serviço social e psicologia na 1ª greve geral dos trabalhadores do

TJES, articulada pelo Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário do Estado do Espírito Santo,

participando de todas as mobilizações sindicais propostas durante este período.

É possível observar que o Fórum de Assistentes Sociais, posteriormente alterado para

Fórum de Assistentes Sociais e Psicólogos, apresenta pautas semelhantes desde sua criação, com

destaque para a capacitação continuada (formação permanente), debate de questões técnicas e

éticas do fazer profissional, luta permanente por condições dignas de trabalho, articulação com a

rede sócio­assistencial, bem como envolvimento com o movimentos sociais e sindical.

8 O encontro foi realizado em parceria com a Associação de Assistentes Sociais e Psicólogos do Tribunal de Justiça de São Paulo ­ AASP­TJSP, com o objetivo de discutir e deliberar sobre a criação da Associação Nacional dos Assistentes Sociais e Psicólogos da área sócio­jurídica. 9 O biênio 2014/2015 contempla as ações desenvolvidas até o mês de abril de 2015.

2.2. Apontamentos sobre a organização coletiva

“Calo­me, espero, decifro. As coisas talvez melhorem. São tão fortes as coisas! Mas eu não sou as coisas e me revolto”.

O espaço sócio­ocupacional do judiciário nos traz diversos desafios cotidianos, pois ao

acionar este poder, expectativas quanto à resoluções de expressões da questão social ou solução

de conflitos são criadas. A construção destes encaminhamentos podem dar­se pela determinação

impositiva do magistrado ou por uma perspectiva crítica de construção de alternativas ou projetos

junto à população usuária. Consideramos que a equipe técnica, formada por assistentes sociais e

psicólogos, possui compromisso ético­político na construção destas novas possibilidades

articuladas com as lutas sociais mais amplas contra as desigualdades e opressões.

Diante de fatores conjunturais e estruturais de desmonte de direitos coletivamente

conquistados, recrudescimento da violência, precarização ou ausência de políticas públicas,

Fávero nos indicará a importância de traçar estratégias coletivas de resistência:

Para lidar com desafios e realizar investimentos em algumas frentes, no sentido de contribuir com o acesso à justiça e aos direitos, ao fortalecimento da capacidade argumentativa e consequente fortalecimento do projeto da profissão na contemporaneidade, é necessário o estabelecimento de estratégias e a efetivação de ações políticas organizadas. Avanços nesse sentido possivelmente poderão ser alcançados se ações coletivas forem viabilizadas. (FAVERO, 2013, p. 523)

Consideramos, mediante os elementos históricos apresentados que a constituição de um

espaço coletivo como o FASP, coaduna com os projetos profissionais delineados e legitimados

pelas categorias. Netto (2006) exporá a relevância desses projetos no planejamento das ações,

tendo em vista que esses projetos, que tem por base um sujeito coletivo, exigem organização de

um corpo ou categoria profissional por meio do conjunto dos seus agentes profissionais,

docentes, pesquisadores, estudantes e organismos profissionais, e é resultado de conjunturas e

dinâmicas sociopolíticas particulares, que reforçam a estreita vinculação entre a definição e a

ampliação dos espaços de trabalho dos assistentes sociais e as manifestações da questão social:

Os projetos profissionais apresentam a autoimagem de uma profissão, elegem os valores que a legitimam socialmente, delimitam e priorizam seus objetivos e funções, formulam os requisitos (teóricos, práticos e institucionais) para o seu exercício, prescrevem normas para o comportamento dos profissionais e estabelecem as bases das suas relações com os usuários de seus serviços, com as outras profissões e com as organizações e instituições privadas e públicas (inclusive o Estado, a quem cabe o reconhecimento jurídico dos estatutos profissionais. (Netto, 2006, p. 144)

O autor enfatiza portanto, que qualquer ação humana baseia­se em projetos que objetivam

alcançar uma finalidade. Tal finalidade a ser atingida, relaciona­se “com a invocação dos valores

que a legitimam e a escolha dos meios para lográ­la”. Sendo assim, o trabalho do Assistente

Social e do Psicólogo é pautado por princípios e diretrizes que norteiam seu saber­fazer

profissional. Tão importantes quanto as atribuições são as vedações éticas colocadas pelos

respectivos conselhos profissionais, a fim de atingir o objetivo comum de ambas as áreas que é a

garantia fundamental dos direitos humanos. Os Códigos de Ética Profissionais são uma das

normativas que dão luz ao que Netto (1999) chama de “auto imagem da profissão”.

O Serviço Social e a Psicologia imprimem em seus Códigos de Ética um compromisso

com o desempenho de um trabalho de qualidade e compromisso com a população atendida,

respeito à diversidade humana, combate as opressões e defesa dos direitos humanos. O Serviço

Social em seu Código de Ética Profissional (CFESS, 1993), elenca entre seus princípios

fundamentais a “Opção por um projeto profissional vinculado ao processo de construção de uma

nova ordem societária, sem dominação/exploração de classe, etnia e gênero”. A Psicologia

aborda que o trabalho ocorrerá “visando promover a saúde e a qualidade de vida das pessoas e

das coletividades e contribuirá para a eliminação de quaisquer formas de negligência,

discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão” (CFP, 2005). Também elege como

princípio fundante a concepção de que “o psicólogo atuará com responsabilidade social,

analisando crítica e historicamente a realidade política, econômica, social e cultural” (CFP,

2005).

É importante ressaltar que o direcionamento presente atualmente nos Códigos de Ética do

Serviço Social e da Psicologia fazem parte de uma construção ético­política marcada pelo

rompimento de uma prática pautada pelo ajustamento e adaptação do indivíduo.

No que concerne a Psicologia, este processo permitiu que paulatinamente, fossem

operadas mudanças nos modos de inserção da categoria na sociedade, como também em relação a

concepção do fenômeno psicológico (BOCK, 2001). Por a politização da categoria, é colocado

em xeque o fenômeno psicológico, abstrato e universal, relacionado a ideia de natureza humana e

é engendrada a concepção do fenômeno psicológico enquanto produção de subjetividade, o que

possibilita a aproximação Psicologia com as lutas sociais. Com isso,

parte dos psicólogos dá um salto ao perceber que, para ampliar seu espaço e sua contribuição social, não basta o conhecimento das teorias psicológicas. Pelo contrário: é preciso perscrutar nossos instrumentos; por em cheque nossa visão de homem e de mundo; assumir a atuação política de nossa atuação profissional e analisar criticamente, o alcance nossas intervenções (BOCK, 2001, p. 21)

O Serviço Social também obteve muitos avanços na inserção neste espaço, fazendo a

mediação entre a expectativa institucional e a intencionalidade do profissional ao atender sua

população usuária sem uma perspectiva criminalizadora de comportamentos ou idealizada de

família, sem o apelo ao “ajustamentos social” e descontruindo o papel de investigador da verdade

nos processos.

É importante destacar o caráter inovador observado no processo de construção e

consolidação do FASP, em especial ao se considerar o espaço institucional em que está inserido,

marcado historicamente por relações de poder e hierarquia. Os desafios vivenciados no exercício

profissional e na relação institucional ­ em especial as lutas por mudança, novos sentidos,

relações horizontalizadas e democratização dos processos decisórios no Poder Judiciário –

encontram lugar privilegiado de enfrentamento e de fortalecimento dos atores envolvidos na

organização coletiva e política. É possível sinalizar relevantes pautas inseridas e conquistas

alcançadas por meio da ação coletiva dos assistentes sociais e psicólogos do TJES, que

dificilmente seriam possíveis mediante atuações de cunho imediatista e/ou individual.

Podemos sinalizar sobre o alinhamento do FASP aos projetos ético­políticos das

respectivas categorias, materializado através da direção política expressa nas ações desenvolvidas

nos últimos dez anos. Ao promover a qualificação profissional continuada, na perspectiva

teórica­metodológica e ético­político crítica, busca­se contribuir para o exercício profissional

competente e comprometido. No que se refere à luta coletiva dos assistentes sociais e psicólogos

por melhorias nas condiçoes éticas e técnicas do trabalho, esta se insere no contexto de lutas da

classe trabalhadora, marcado pela carência de recursos institucionais, mudança nos parâmetros

legais e institucionais que orientam as relações de trabalho, pela falta de reconhecimento

profissional e pelo desmonte das políticas públicas. As articulações realizadas com os

movimentos sociais e o sindical assinalam para estratégias de lutas mais amplas, que extrapolam

a atuação do Serviço social e Psicologia, embora sejam a ela vinculadas.

O FASP, enquanto uma organização coletiva institucionalizada, tem buscado conjugar a

valorização do trabalho interdisciplinar com a capacitação técnica e educação permanente, com

as lutas políticas internas (reconhecimento das atribuições das categorias, melhores condições de

trabalho, articulação com o sindicato) e com as lutas sociais mais amplas (direcionamento

ético­político, participação em fóruns, conselhos e movimentos sociais), o que possui grande

relevância para o exercício profissional e para a consolidação da auto­imagem das profissões.

Denota­se que diversas pautas se mantêm na história de luta do FASP, relacionadas

principalmente aos rebatimentos da reestruturação do mundo do trabalho, do contexto de

expansão do conservadorismo e de perdas de direitos historicamente conquistados e da natureza e

função social do Poder Judiciário na vida e no trabalho de assistentes sociais, psicólogos e da

sociedade como um todo. A definição de prioridade das pautas perpassa o contexto sociopolítico

e institucional, assim como a identidade política e os interesses expressos pelo coletivo de

profissionais e pela direção executiva.

É possível sinalizar sobre a predominância de mobilizações e lutas do FASP relacionadas

as questões de caráter técnico e corporativista, em relação as de amplitude política e de

reconhecimento de pertencimento à classe trabalhadora. Desta forma, a expansão e capilarização

das lutas mais amplas, principalmente por meio de articulações estratégicas com movimentos

sociais que compartilham do mesmo projeto de sociedade, ainda se apresenta como um desafio ao

FASP, embora seja inegável os avanços já alcançados nesse sentido.

3­ Considerações finais

“A escuridão estende­se mas não elimina o sucedâneo da estrela nas mãos.

Certas partes de nós como brilham! (...) Há soluções, há bálsamos para cada hora e dor.”

Diante dos elementos expostos, podemos destacar a especificidade do FASP, uma

organização coletiva institucionalizada, que conjuga a capacitação técnica com a prerrogativa de

promover uma educação permanente, que não seja desvinculada de demandas das categorias

profissionais e tampouco das lutas sociais mais amplas, buscando a inserção e articulação com os

movimentos sociais e espaços participativos.

O FASP tem se apresentado como um importante espaço de problematização da aliança

histórica entre o Judiciário e os saberes do Serviço Social e da Psicologia no controle dos

comportamentos e dos modos de vida de determinados grupos sociais, além de se instituir e se

fortalecer cotidianamente como um espaço de luta política.

Percebemos que o Fórum tem caminhado em consonância com os aspectos ético­politicos

dos projetos profissionais e a garantia de um espaço articulador de troca e sistematizaçao da

prática, atento aos debates e às demandas da sociedade. Esta forma de organização, torna­se

fundamental em tempos de individualização das lutas e do fortalecimento do “homem egoísta”,

no qual se identifica esvaziamento de espaços coletivos, além de reprodução de posturas acríticas

e naturalizadoras das desigualdades sociais.

Nota­se ainda que as principais demandas desde a criação até os dias atuais ainda se

mantém e fazem parte da própria configuração técnica e política deste espaço coletivo em

permanente construção, quais sejam, formação/capacitação profissional, lutas por melhores

condições de trabalho, aumento no quantitativo de trabalhadores e busca por um atendimento

qualificado, crítico e comprometido com a população usuária.

Frisa­se também que, por meio desta organização coletiva, os profissionais conseguiram

se fazer “enxergar” institucionalmente e obtiveram êxito em alguns de seus pleitos. Participam de

espaços administrativos dentro do Tribunal, no qual poderão pleitear maiores avanços: como a

participação no planejamento estratégico do TJES em 2015 e a recente criação de um grupo de

trabalho das CAMS pelo Ato Normativo nº74/2015 que “Institui o Grupo de Trabalho para

análise situacional e proposição de melhorias nas Centrais de Apoio Multidisciplinar (CAMs) do

Poder Judiciário do Espírito Santo” (DJES nº 4987).

Concluímos ainda que a descentralização em comissões temáticas instituídas pela

reformulação do regimento interno e grupos de trabalhos deliberados em plenária, permitiram a

equipe técnica do judiciário, se debruçarem teoricamente e construírem estratégias, diante da

diversidade das demandas jurisdicionais, administrativas e políticas que lhe são apresentadas,

possibilitando uma gestão com maiores possibilidades de encontros e participação.

Salienta­se porém, que com o aumento da sobrecarga de trabalho, adoecimento de

servidores e falta de condições estruturais dificultam a participação massiva nestes outros

espaços. Percebemos com isto, que as questões técnicas não podem estar alijadas dos

pressupostos ético­políticos e das lutas internas e externas das categorias para que não haja

retrocesso, apenas (re)construção e resistências.

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