A coisa julgada e o NCPC

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1 A coisa julgada e o Novo Código de Processo Civil Brasileiro Seja como presunção de verdade, como qualidade do efeito declaratório da sentença, ou nova situação jurídica, a coisa julgada esquadrinhada segundo os ditames do NCPC se tornou mais ampla e reafirma-se como um dos pilares da segurança jurídica sem constituir um entrave para a celeridade processual e o acesso à justiça. A coisa julgada é prevista no texto constitucional em vigor em seu art. 5º, XXXVI onde explicitamente informa que a lei não prejudicará o ato jurídico, o direito adquirido e a coisa julgada... Considerados como os três pilares da segurança jurídica. E, está diretamente relacionada com a ideia de previsibilidade dos atos estatais. Há ainda de se ressaltar que ainda no preâmbulo da Constituição Brasileira vigente, há explícita indicação à segurança e com o advento do constitucionalismo só veio enfatizar a Constituição como sol e a baliza central de todo ordenamento jurídico. O direito positivo brasileiro tentou conceituar a coisa julgada em duas oportunidades, isso sem contar a vez no novo CPC, in litteris: Art. 502. Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso.

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A coisa julgada e o Novo Código de Processo CivilBrasileiro

Seja como presunção de verdade, como qualidade do efeito declaratórioda sentença, ou nova situação jurídica, a coisa julgada esquadrinhadasegundo os ditames do NCPC se tornou mais ampla e reafirma-se como umdos pilares da segurança jurídica sem constituir um entrave para aceleridade processual e o acesso à justiça.

A coisa julgada é prevista no texto constitucional em vigorem seu art. 5º, XXXVI onde explicitamente informa que a leinão prejudicará o ato jurídico, o direito adquirido e acoisa julgada... Considerados como os três pilares dasegurança jurídica. E, está diretamente relacionada com aideia de previsibilidade dos atos estatais.

Há ainda de se ressaltar que ainda no preâmbulo daConstituição Brasileira vigente, há explícita indicação àsegurança e com o advento do constitucionalismo só veioenfatizar a Constituição como sol e a baliza central detodo ordenamento jurídico.

O direito positivo brasileiro tentou conceituar a coisajulgada em duas oportunidades, isso sem contar a vez nonovo CPC, in litteris:

Art. 502. Denomina-se coisa julgada material aautoridade que torna imutável e indiscutível a decisão demérito não mais sujeita a recurso.

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Verificamos no art. 6º, terceiro parágrafo da Lei deIntrodução às Normas do Direito Brasileiro há o enunciado:"Chama-se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicialde que já não caiba mais recurso. A origem do termo "casojulgado" é do mencionado direito português (art.677).

Doutrinariamente esclarece Barbosa Moreira que aimutabilidade não se refere aos efeitos da sentença, e sim,ao próprio conteúdo da sentença, posto que seus efeitospossam ser modificados.

Desta forma, conclui-se que a coisa julgada não é efeito dasentença e nem qualidade dos efeitos da sentença é, emverdade, uma situação jurídica que se forma no momento emque a sentença se transforma de instável para estável.

Evidentemente o processo segue adiante em direção ao atoprocessual magno representado pela sentença que poderádecidir ou não o mérito da causa.

Assim, a impossibilidade de recorrer acontece em virtude denão haver mais recursos cabíveis para impugnar a decisão,ou tendo esgotados todos os recursos previstos em lei, oréu perdeu o prazo para a devida interposição recursal, ouainda, porque não se enquadra a decisão nas hipóteses quese submetem ao reexame necessário.

A importância do trânsito em julgado da decisãojurisdicional é peculiar no Estado Democrático de Direito epode não se prender com a preclusão e com o exaurimento depoderes, faculdades e deveres das partes. De sorte que é

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preciso superar esse conceito para se entenderadequadamente a expressão "trânsito em julgado1".

O conceito de trânsito em julgado é de viés processual-dogmático, de maneira que a formação da decisão judicialnão é resultado isola e nem de ação autoritária do juiz.

Afinal, no trânsito em julgado reside a legitimidade nabase produtiva e fiscalizadora do processo. E para tantorecorremos à teoria discursiva do direito desenvolvida porHabermas2.

Como é sabido há inúmeras definições a respeito da coisajulgada e pode se afirmar que o juiz, ao decidir cada umadas questões do processo, seja sobre os pressupostosprocessuais, condições da ação e mérito, e, quando chega auma conclusão é denominada de declaração. Certo é que adeclaração principal do julgador é àquela que acolhe ou

1 A verdade é que tanto o atual CPC como o vindouro não trazem uma exatadefinição para a expressão "trânsito em julgado", deixando a encargo dainterpretação de doutrinadores que por sua vez buscam outros ordenamentosjurídicos para lhe alcançar o exato sentido. Dispõe o CPC português, em seuart. 677 que é considerada transitada em julgado a decisão não mais suscetívelde recurso ordinário ou de reclamação.

2 Que se pautou pela teoria do discurso no qual as normas são legítimas seencontrarem assentimento de todos os cidadãos (partes processuais) no processodiscursivo. Vasculhando a ideia de legitimidade, Habermas se pautou pelateoria do discurso, no qual as normas somente são legítimas se encontraremassentimento de todos os cidadãos (partes processuais) no processo discursivo.Para que as partes se reconheçam como elaboradores e destinatários de umadecisão legitimada, há a necessidade de garantir a autonomia pública eprivada.

Nesse sentido, o nexo interno da democracia com o Estado de Direito consisteno fato de que, por um lado, os cidadãos só poderão utilizar condizentemente asua autonomia pública se forem suficientemente independentes para exercer umaautonomia privada assegurada de modo igualitário.

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rejeita o pedido do autor, ou seja, a que finalmente julgao mérito.

Mas esse elemento declaratório não pode ser confundido como efeito declaratório da sentença. E, é através do trânsitoem julgada que se verifica a indiscutibilidade e aimutabilidade do elemento declaratório da sentença.

O momento em que se dá a impossibilidade de modificação dasentença ocorre é o chamado “trânsito em julgado". Tornandoa decisão judicial imutável e indiscutível. Quando afinal,a decisão deixa de ser instável e passa a ser estável, dá-se o nome de coisa julgada. Refere-se, portanto a uma novasituação jurídica caracterizada por ser imutável eindiscutível.

Comporta, por sua vez, dois aspectos distintos, a saber: acoisa julgada formal (que se refere à imutabilidade eindiscutibilidade da sentença dentro do processo e entre aspartes mediante os quais fora exarada). Qualquer que seja anatureza da sentença e o seu conteúdo, em determinadomomento deste, esta já não mais poderá ser alterada. Erecebe o nome da doutrina de coisa julgada formal ou depreclusão máxima.

Na clássica definição chiovendiana de preclusão correspondeà perda, extinção ou consumação de uma faculdadeprocessual3. Por outro lado, a coisa julgada materialocorre nos casos da sentença de mérito, onde a relaçãojurídica material é decidida pelo juiz, implicando na

3 A noção de coisa julgada, portanto é mais abrangente para italianos do que para os portugueses. Contudo, no direito português quanto no direito italiano à ideia prende-se à noção de preclusão.

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produção de efeitos externos ao processo (quando a decisãoproduzirá os efeitos declaratórios, constitutivos atémandamentais e executivos lato sensu).

A coisa julgada formal incide ortodoxamente em todos osprocessos. Se a sentença é terminativa, ou seja, estaextingue o processo sem resolução do mérito, então nãoproduzirá qualquer efeito externo ao processo. Posto quenão haverá a coisa julgada material.

Os efeitos não se externalizaram porque o juiz não examinoua relação jurídica de direito material, significando que asentença terminativa apesar de transitar em julgado.Portanto, se houver nova propositura da demanda, só seráacolhível e possível, caso corrija o vício ou eventualfalha que ensejou a extinção do processo sem resolução domérito. É inclusive assim posicionado o novo CPC.

Enquanto que a coisa julgada formal é normalmente chamadade preclusão4 endoprocessual e que gera apenas efeitosintestinos. Por sua vez, somente as sentenças que conseguemjulgar a relação jurídica de direito material que foralevada à apreciação do juiz, ou seja, as que julgam omérito da causa e podem produzir diferentes efeitos,inclusive os externos.

4 E, isso pode acontecer: caso a parte não observe a ordem assinalada paraexercer a faculdade. Se a parte realizar atividade incompatível para oexercício da faculdade. E, ainda, se a parte já tiver exercitado validamente afaculdade. O que corresponde à clara definição das três modalidades depreclusão: a temporal; lógica; e consumativa.Nesse sentido, ocorre trânsito em julgado da decisão se a parte deixar de oporimpugnação à decisão dentro do prazo estabelecido em lei para tal ato, ouquaisquer das outras modalidades de preclusão.

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Ao estudar a coisa julgada, esse misterioso institutoconforme chamou Liebman que afirmou que é a imutabilidade ea indiscutibilidade do comando emergente da sentença queseriam os efeitos materiais produzidos para fora doprocesso.

É importante sublinha que a coisa julgada é pressupostopara a coisa julgada material, vez que esta somente poderáexistir depois daquela.

Também diversas teorias literalmente se digladiam paraapontar a natureza jurídica da coisa julgada. E a correntemajoritária foi tese defendida por Liebman e aponta a coisajulgada como uma qualidade que incide sobre a sentença esobre os efeitos por esta produzidos. Tais efeitos poderãoser condenatórios, constitutivos ou declaratório e seespalham por todo o tecido social, não incluindo dentrodestes a coisa julgada.

Situa o ilustre doutrinador, a coisa julgada fora dasentença, não sendo, portanto, um efeito da sentença. Mas,incide sobre esses efeitos materiais da sentença. Aautoridade da coisa julgada se refere à coisa julgadamaterial.

Outra corrente defendida por Barbosa Moreira, Alexandre F.Câmara se encara a coisa julgada como uma situação jurídica

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nova que se caracteriza pela imutabilidade5 e aindiscutibilidade da sentença e de seu conteúdo.

Afinal resta imutável a aplicação da lei ao caso concreto(conteúdo da sentença) embora os efeitos daí oriundospossam não se produzir, caso esta seja a vontade da partevencedora.

Ao proferir a decisão judicial sobre a relação jurídica dedireito material, o Estado torna pública a aplicação da leiao caso concreto julgado, o que acaba por impedir que estamesma relação seja novamente submetida à apreciaçãojurisdicional.

Conclui-se que o Estado-Juiz decide e examina apenas umaúnica vez a relação jurídica de direito material. Comconfere maior apoio filosófico ao incidente de resolução dedemandas repetitivas (IRDR) já previsto pelo NCPC no afã dese obter maior celeridade processual.

Enxerga-se a coisa julgada material como pressupostoprocessual negativo e só ocorre diante apenas da sentençade mérito que produza os efeitos externos ao processo6. E,5 Fazzalari sobre o tema prefere usar o termo irretratabilidade da sentença oque significa exaurimento por efeito da preclusão, das faculdades, dos poderese dos deveres atinentes aos recursos. No entender desse doutrinador italiano,a irretratabilidade da sentença ou trânsito em julgado pode ocorrer nasentença que julga ou não o mérito da demanda. É efeito exclusivamenteprocessual. Essa situação processual que é imposta pela exigência de colocarfim à lide envolve.

6 E, em parte essa definição acaba sendo útil ao direito processual brasileiro,que ainda acrescentou a possibilidade também de recursos extraordinários paraocorrência do trânsito em julgado.Já o Código de Processo Civil Italiano ao definir trânsito em julgado, o fazcomo sinônimo de coisa julgada formal. Sustenta o art. 324 do CPC italiano que

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pode ser usada para extinguir outro processo, porém, semresolução do mérito.

Portanto, a coisa material é, em verdade, impedimentoprocessual também chamado de pressuposto processualnegativo ou pressuposto processual extrínseco (fora doprocesso).

A melhor forma de definir a coisa julgada seria qualificá-la como uma qualidade que adere ao efeito declaratório dasentença, tornando-o imutável. Por outro lado, a doutrinavem dedicando especial atenção ao estudo de sobre qualparte, especificamente falando, da sentença incide aimutabilidade da coisa julgada.

A sentença é um ato jurídico complexo, envolvendomotivação, fundamentos de fato e de direito e, muitasvezes, conhecimento de relações jurídicas conexas,prejudiciais ou não. Portanto, importante se mostraanalisar a real extensão da norma jurídica declarada pelasentença, com o escopo de estabelecer a real dimensão dalide discutida em juízo. Tal exame refere-se aos limitesobjetivos da coisa julgada.

Caso o pedido e a causa de pedir sejam diferentes, porém arelação jurídica de direito material for a mesma pelateoria da identidade da relação jurídica, se consubstanciaa coisa julgada.

se entende que a transitada em julgado é a sentença não mais sujeita a nenhumtipo de impugnação, seja ordinária ou extraordinária e nem mesmo a açãorescisória ou revocazione.

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Assim, a coisa julgada material é uma preclusãopanprocssual ao passo que a coisa julgada formal é apreclusão endoprocessual. Questiona-se como identificar acoisa julgada. Pela tríplice identidade que aliás, não é aúnica a ser observada. Positivamente configura-se a coisajulgada diante da demanda que tem igual partes, igualpedido e igual causa de pedir.

Haverá configurada a coisa julgada, pois o juiz não poderádecidir o segundo processo sem antes alterar a decisão doprimeiro processo (cronologicamente decidido antes).

Portanto, mesmo sendo elementos distintos, se a relaçãojurídica material estiver sendo analisada na segundademanda for a mesma da primeira e, puder acarretaralteração no que já fora julgada, então, não se poderepeti-la7, pois haverá coisa julgada pela identidade dasrelações jurídicas.

É verdade que os efeitos da coisa julgada são variados e,entre estes, temos o vinculativo direto, vinculativoprejudicial e ainda o preclusivo de coisa julgada.

O vinculativo direto é o efeito que impede nova discussãoacerca da mesma causa, da mesma demanda (mesmas partes,mesma causa de pedir e pedido) e impede seja propostanovamente a mesma demanda.

7 Explicitamente o parágrafo quarto do art.337 do NCPC prevê que: Há coisa julgada quando se repete ação que já foi decidida por decisão transitada em julgado.

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Há a eficácia preclusiva da coisa julgada capaz de impedira propositura de uma demanda contrária, que acarretará arediscussão daquela relação jurídica.

O vinculativo prejudicial, o julgamento de mérito de umarelação jurídica de direito material impede que em qualqueroutro processo esta mesma relação jurídica de direitomaterial, possa ser decidida de maneira distinta daquelaefetuada pelo juízo originário.

O efeito vinculativo prejudicial significa que o julgamentode mérito transitado em julgado de uma demanda serátransportado para outra demanda, a fim de que a questãotransitada em julgado vincule a decisão judicial pelo menosquanto àquele aspecto.

É sabido que a coisa julgada está adstrita a limites ediante de sua natureza de garantia constitucional, taislimites podem ser de ordem subjetiva, objetiva, territoriale temporal.

Os limites subjetivos significa o alcance diverso no quetange às pessoas que serão tocadas pelo efeito vinculante.E tem íntima ligação com a natureza do direito posto emcausa.

Além dos limites de ordem subjetiva e objetiva da coisajulgada, são impostas restrições de ordem temporal,levando-se, em consideração o direito posto em causa.

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Em resumo, a coisa julgada projeta-se ex tunc, para opassado, mas, diante de fatos novos existirá uma nova causade pedir, uma nova situação jurídica, pelo que se concluique também existem limites temporais da coisa julgada.

Tendo em vista que a sentença é ato jurídico complexo emultifacetado que pode envolver múltiplas questões de fatoe de direito, prejudiciais ou não ao julgamento do caso, éde grande relevância identificar sobre qual ponto dasentença, especificamente, incide a coisa julgada.

Para que possa ter maior previsibilidade de onde investirnuma maior atividade probatória.

Ao disciplinar os limites objetivos da coisa julgadaoscilou consideravelmente a história do direito processualcivil brasileiro. Especialmente no período anterior ao CPCde 1939, era praticamente uníssona em doutrina a concepçãode que a coisa julgada constituíra mera presunção deverdade, ideia relacionada a Friederich Karl Savigny.

A concepção de Savigny de coisa julgada como presunção deverdade fazia não só concluir que a sentença injusta tambémse tornava imutável como estendia os limites objetivos dacoisa julgada aos motivos da sentença.

Ainda que anteriormente à vigência do CPC de 1939 boa parteda doutrina inclinava-se pela admissibilidade da incidênciada coisa julgada sobre as questões prejudiciais, desde queefetivamente controvertidas no feito.

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O CPC de 1939 disciplinava em seu art. 287 e em seuparágrafo único, in litteris:

“Art. 287 - A sentença que decidir total ouparcialmente a lide terá força de lei nos limites dasquestões decididas”.

“Parágrafo único. Considerar-se-ão decididas todasas questões que constituam premissa necessária daconclusão.”

Tais dispositivos do CPC revogado consistem em uma remissãoliteral ao art. 290 do Projeto de CPC italiano de 1929,elaborado pela comissão presidida por Ludovico Mortara.Mas, na tradução para nossa língua, fora suprimida apalavra lide na frase "ha forza di legge nei limite della lite e dellaquestione decisa”.

O parágrafo único também deu margem a diversasinterpretações, considerando que estabeleceu que asquestões que constituíssem premissa necessária aojulgamento do feito estariam abrangidas pela coisa julgada.

Reparamos que o art. 468 do CPC vigente tem teor quaseidêntico àquele do art. 287 do CPC 1939, diferindo em doisaspectos: trouxe novamente à baila o termo "lide" no corpodo artigo, tal como redigido no projeto italiano, esuprimiu o parágrafo único da referida regra, trazendo, emsubstituição, os arts. 469 e 474.

O dispositivo do CPC de 1939 em literal exegese, entendia-se que imutabilidade decorrente da coisa julgada também seestendia sobre as questões prejudicais suscitadas noprocesso.

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A redação do art. 287 do CPC de 1939 com inspiração no CPCitaliano de 1929 deu margem para a expansão da eficácia dassentenças relativas à lide prejudicial (In: SILVA, OvídioAraújo Baptista da. Sentença e coisa julgada, Porto Alegre:Fabris, 1995, p.139).

Liebman partiu da premissa Carnelutti de que aimperatividade e a imutabilidade da sentença são coisasdiferentes. A sentença é imperativa e produz todos os seusefeitos antes e independentemente do seu trânsito emjulgado. Assim, a autoridade da coisa julgada8 não teriaefeito da sentença, mas um modo com esta se manifesta eproduz efeitos.

A causa prejudicial é questão de direito material que erauma questão prejudicial e que por força do ajuizamento de

8 Afinal para que o contraditório possa realmente possibilitar a construção dedecisões legitimadas e normalmente permitir o trânsito em julgado, é tambémindispensável que haja a fundamentação das decisões, de modo que possa apontaras bases argumentativas sobre fatos e do direito debatido para a motivaçãodessas decisões.Na democracia, portanto, a decisão jurisdicional e ipso facto seu trânsito emjulgado, têm como justificativa a estrutura do procedimento realizado emcontraditório que é direito-garantia fundamental. Outra parte da doutrina considera a coisa julgada formal uma preclusão:“A coisa julgada formal opera-se em relação a qualquer sentença a partir domomento em que precluir o direito do interessado em impugná-la internamente àrelação processual”. Como preclusão que é, não deve ser confundida com a figura (e o regime) dacoisa julgada (material)”.“Assim é que alguns autores acabam por identificar a coisa julgada formal comouma espécie de preclusão e a denominam de preclusão máxima, deixando claro quenenhum outro ato processual poderá ser realizado dentro daquela determinadarelação jurídico-processual porque a sentença de mérito tornou-se imutável”.Não se pode negar que a coisa julgada formal e a preclusão se parecembastante, no entanto a discussão em torno dessa questão é pouco relevante, jáque não tem nenhuma relevância na prática. No final das contas tanto umquanto outro representa a perda de uma faculdade processual, só com um pequenodetalhe, nem sempre a preclusão de um ato processual acarretará a extinção doprocesso sem resolução do mérito.

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ação declaratória incidental passou a ser considerada comopedido da ação acessória, o que acarretou a ampliação doobjeto do processo.

O NCPC eliminou a ação declaratória incidental, e passouabarcar a questão prejudicial dentro do âmbito da coisajulgada. De sorte que se ampliaram os limites objetivos dacoisa julgada, ampliando-se também a imutabilidade.

O efeito preclusivo da coisa julgada se encontra previstono vigente CPC em seu art. 4749 e é ainda mencionada nadoutrina italiana como teoria do julgamento implícito.

A origem da distinção entre objeto do processo e objetolitigioso do processo pode ser encontrada na última metadedo século XIX, mais precisamente no pensamento dualista deBüllow e Wach, segundo o qual o processo apresenta doistipos distintos de questões a serem resolvidas pelo juiz,aquelas relativas ao próprio processo e aquelas relativas àrelação material deduzido em juízo, constituindo aapreciação das primeiras o requisito necessário eimprescindível para a apreciação das segundas, formandoambas em conjunto o objeto do processo.

9 Com todo o respeito que se deve a quem pense contrariamente, não se podedesvincular o artigo 474 do Código de Processo Civil do teor do artigo 287 doCódigo de Processo Civil de 1939, que teve forte influência de FrancescoCarnelutti. Dessa forma, não se pode olvidar que, quando analisarmos o conteúdo do artigo474 do Código, comparando-o com o artigo 468, se deve considerar que oslimites da lide devem ser observados (artigo 128 do Código de Processo Civil)e que o nosso compêndio processual, reitere-se, adota a Teoria daSubstanciação, o que se depreende da exegese do artigo 282, III. Diante disso,as alegações e as defesas que são repelidas no momento do julgamento do méritosão aquelas referentes ao fato jurídico questionado na demanda, ou seja, apreclusão se dá nos limites da causa. Corroborando tal assertiva, cito a liçãodo processualista José Maria Rosa Tesheiner.

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Essencialmente na doutrina alemã que se dá odesenvolvimento da teoria sobre o objeto litigioso doprocesso, o que se deve papel central desempenhado peloStreitgegenstand na ciência processual alemã, onde este éerigido ao conceito nuclear do processo e constituiverdadeiro polo metodológico, o que não sucede na doutrinaitaliana, onde é o conceito de ação que ocupa o cerne doprocesso, razão pela qual o tema do objeto do processodespertou menor interesse nesta e, ainda quando abordadopelos seus autores, é sempre analisado partindo-se daperspectiva da ação como polo central.

Na doutrina brasileira, na esteira do pensamento de ArrudaAlvim, o tema foi objeto de estudo por Sydney Sanches, queapós concluir que ao lado do objeto material do processo,que é a pretensão, tem o processo um outro objeto denatureza formal, que é o próprio processo, esclarece, comuma clareza e precisão.

Kazue Watanabe distingue o objeto da cognição judicial, queenvolve o trinômio: questões processuais, condições da açãoe mérito da causa; do objeto litigioso do processo, ao qualatribui apenas o sentido de thema decidendum, objeto sobre oqual deve o juiz decidir principaliter.

Embora não seja posição unânime, a tendência parareconhecer e distinguir dentro do objeto do processo(gênero) um objeto menor que engloba apenas o mérito dacausa (espécie) é hoje acolhida por grande parte dadoutrina nacional, que assim faz referência à existência deum objeto litigioso do processo.

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Ao contrário, esta distinção não constitui simplespreciosismo terminológico, nos termos em que é feita estapõe em relevo o caráter autônomo da ciência processual,tornando evidente a separação entre processo e direitomaterial, possibilitando a delimitação precisa do sejaobjeto de simples cognição judicial e aquilo que é aquestão principal posta a julgamento sobre a qual deverecair a decisão e, posteriormente, incidir os efeitos dacoisa julgada.

Não se trata pois de mero formalismo linguístico, oconceito de objeto litigioso visa possibilitar a definiçãoexata do conteúdo substancial da demanda que constitui omérito da causa, o qual vai servir de fundamento paradisciplina de institutos processuais relevantes tais como acoisa julgada, a litispendência, a modificação e cumulaçãode ações e conexão e, etc.

Não basta que a questão, sobre a qual não recaiu decisãoexpressa, seja em face dos princípios, pressupostonecessário ou consequência lógica do julgamento explícito;é indispensável que os próprios termos da causa estabeleçamesse nexo e autorizem essa ligação. Isto significa que ojulgamento implícito não pode estender-se a questões quenão foram postas e nem formuladas.

Cumpre em primeiro lugar, claramente, desde logo, adiferença entre este conceito e os demais conceitos dejulgamento implícito referente à extensão de limitesobjetivos da coisa julgada.

Enquanto nestes conceitos, do que se tratam em rigor, é deuma ficção, estendendo-se os limites objetivos da coisa

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julgada a questões que podem ou não ter sido debatida nosautos, no conceito de julgamento implícito constante doparágrafo único do art. 660 do antigo do CPC 1939, este temque corresponder necessariamente a uma questão posta ouformulada pelas partes.

Ou seja, o julgamento implícito tem que resultar e tercorrespondência nos limites da demanda fixados pelaspartes.

Em segundo lugar, desta limitação do conceito resulta queao mesmo nunca poderá ser apontado os vícios da sentençaultra ou extra petita, pois este emerge sempre dos termos emque a ação foi proposta e debatida, correspondendo,necessariamente, a um pedido formulado pelas partes,respeitando assim, rigorosamente, o princípio dodispositivo.

Daqui resulta que o julgamento implícito assim delineadonão pode corresponder a todo e qualquer pressuposto ouconsequência necessária do julgamento expressamenteproferido, esta conexão entre os pronunciamentos judiciaistem que ficar estabelecida e demonstrada nos exatos termosda demanda proposta pelas partes.

Os limites objetivos da coisa julgada referem-se à extensãoda matéria que restará imunizada pela coisa julgadamaterial. E definida a matéria imunizada a função negativada coisa julgada impedirá a propositura de demanda idênticae a função negativa da coisa julgada impedirá a propositurade demanda idêntica e a função positiva vinculará ojulgamento de processos futuros em que a questão decididaapresente-se como prejudicial.

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A extensão desses limites é tradicionalmente vinculada aoobjeto da sentença e, por via indireta, ao objeto doprocesso.

É a demanda que define o objeto do processo. A demanda éidentificada pelas partes, pela causa de pedir e pelopedido, sendo relevantes para a finalidade de traçar oslimites objetivos da coisa julgada, da causa de pedir e dopedido.

Há três opções para se ampliar os limites objetivos dacoisa julgada:

a) estender a coisa julgada a questões decididasentre os fundamentos da sentença;

b) impedir que o pedido idêntico sejaapresentado em processo ulterior com fundamento em diversacausa de pedir;

c) impedir que um mesmo direito seja postuladode forma fracionado em diferentes processos.

Precisamos entender que a identificação da causa de pedirtambém interfere na definição dos limites objetivos dacoisa julgada. E o método mais adequado é fornecido pelateoria da substanciação, delimitando-se a causa petendi comreferência aos fatos invocados pelo demandante.

Para que a jurisdição cumpre o fim de aplicar o direitoobjetivo na sua integralidade é conveniente que a máximaiura novit curia seja aplicada de forma abrangente, sem

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limitar-se ao específico fundamento jurídico invocado pelodemandante. O que afasta a teoria da individuação e ateoria eclética, que mistura as características dasubstanciação e da individuação.

É igualmente conveniente que a atividade judicial fiquerestrita aos fatos essenciais invocados na causa de pedir,pois seria irracional e comprometeria a imparcialidade dojulgador exigir que ele busque uma realidade que sequer foialegada no processo.

A eficácia preclusiva não traz um impedimento absoluto àpropositura de demandas incompatíveis com a coisa julgada.O sistema prevê a possibilidade de demandas incompatíveiscom a coisa julgada.

O sistema prevê a possibilidade de a coisa julgada serdesconstituída medida a propositura de ação rescisória enos últimos anos vem ganhando força a tese da relativizaçãoda coisa julgada, que igualmente viabiliza a superação dedecisão transitada em julgado.

A coisa julgada está submissa a dois limitesargumentativos, aptos a afastar o impedimento trazido com aeficácia preclusiva: a falta ou nulidade da citação e adivergente interpretação constitucional pelo SupremoTribunal Federal da norma que fundamentou a decisãotransitada em julgado.

Em resumidas linhas, aponto onde a coisa julgada édisciplinada pelo NCPC:

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Manteve o NCPC que a decisão que concede tutela antecipadanão fará coisa julgada, mas a estabilidade dos respectivosefeitos só será afastada por decisão que a revir, reformarou invalidar, proferida em ação ajuizada por uma daspartes. (art.304, sexto parágrafo do NCPC).

O mesmo diploma legal listou entre as alegações incumbidasao réu a coisa julgada, conforme art. 337, VII, e no quartoparágrafo explica que há coisa julgada quando se repeteação que já foi decidida por decisão transitada em julgado.

Prevê ainda no art. 433 sobre a declaração de falsidade dodocumento quando suscitada como questão principal, constaráda parte dispositiva da sentença e sobre esta incidirátambém a autoridade da coisa julgada10, referindo-se àcoisa julgada material.

Manteve o NCPC a coisa julgada como pressuposto processualnegativo ex vi o art. 485, inciso V, juntamente com aperempção e a litispendência.10 Em termos históricos, o instituto da coisa julgada passa por uma primeirafase e especialmente no direito romano, pela ineficácia do ato, ou seja, mesmotendo transitado em julgado a sentença uma vez constatando-se uma nulidade noprocesso, (ressalte-se que havia grande importância das formas e por isso onúmero de nulidades era alto e pelos mais variados e menos importantesdefeitos), poderia-se recorrer ao instituto adequado de declaração deinexistência da sentença, pois a mesma não produzia efeitos enquantoperdurasse o vício.Scialoja nos ensina que vige grande diferença entre o direito antigo e omoderno em termos de nulidades ou inexistência da sentença. No direitomoderno, o defeito da sentença leva a uma nulidade, especialmente quanto àforma. No direito romano, uma sentença nula é absolutamente ineficaz e porisso ela não goza da força e autoridade da coisa julgada. Modernamente, talideia de ineficácia do direito romano desapareceu, mesmo nos países que adotamo sistema processual com berço nesse direito. Somente através do recursopróprio ou de ação de impugnação da coisa julgada é que pode ser obtidanulidade de sentença. Do contrário, a sentença transitada em julgado, mesmosendo nula, produz os seus efeitos e goza da autoridade da coisa julgada. (In:Scialoja, Victtorio. Procedimiento Civil Romano. Tradución de Santiado Sentis Melendo y MarinoAyera Radin. Buenos Aires: EJEA, 1954. p.255).

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A grande novidade em relação ao Código Buzaid (mas não emrelação ao CPC de 1939), prevê o art. 503 primeiroparágrafo in litteris: O disposto no caput aplica-se à resoluçãode questão prejudicial, decidida expressa e incidentementeno processo (não precisando mas da ação declaratóriaincidental que fora extinta pelo novo codex).

Adiante no art. 504 explicita-se o que não faz coisajulgada: I- os motivos, ainda que importantes paradeterminar o alcance da parte dispositiva da senteça; II -a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento dasentença.

Já no art. 506 apontando para coisa julgada formal informain litteris: A sentença faz coisa julgada às partes entre asquais é dada, não prejudicando terceiros. Reforça aindiscutibilidade o art. 507 principalmente sobre asquestões já decididas a cujo respeito se operou preclusão.

Já no art. 963, inciso IV, o respeito à coisa julgadabrasileira é um dos requisitos indispensáveis para ahomologação de decisão estrangeira.

Também a ofensa à coisa julgada é um dos motivadores para apropositura de ação rescisória que atua sobre a decisão demérito, transitada em julgado.

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Enfim, com a ampliação dos limites objetivos da coisajulgada11 e também com a imposição de uma fundamentaçãomais complexa e atenta das decisões judiciais, venhohumildemente entender que se pretende diminuir o grandefluxo de recursos que tramitam nos tribunais brasileiros.Pretendendo empreender maior celeridade processual comapoio na segurança jurídica.

Referências

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11 O mais curioso é que os problemas que surgiam com esse debate, os argumentospró e contra, formados a partir da década de 1940, são praticamente os mesmosque temos hoje diante do Novo CPC. Os que defendem a coisa julgada sobrequestões prejudiciais estão preocupados com a utilidade e com o rendimento doprocesso, quanto maior a parte do conflito que puder ser objeto destaimutabilização, maior será o atendimento ao escopo social do processo.

Estendendo a imutabilidade aos motivos da sentença, temos a pacificação doconflito com maior amplitude, evitando o surgimento de novos processos(eficácia negativa da coisa julgada) e simplificando o julgamento de mérito deoutros (eficácia positiva da coisa julgada). In: MACHADO, Marcelo Pacheco.Coisa julgada: limites objetivos. Disponível em: http://jota.info/novo-cpc-que-coisa-julgada-e-essa Acesso em 23.03.2015.

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