Vamos Remover a Arma da Bendeira de Mocambique

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Página 1 de 43 VAMOS REMOVER A ARMA DA BANDEIRA DE MOÇAMBIQUE Por Joaquim A.C. do Castelo I. Preâmbulo Este ano, Moçambique celebrou 39 anos de independência num momento conturbado pelo conflito político-militar na zona Centro do País ora terminado, e pelo ressurgimento massivo do crime violento armado e sequestros, particularmente na capital do país, Maputo. A maioria de todos, estes tristes acontecimentos foi protagonizada com recurso à arma de fogo e, coincidentemente com recurso a arma de assalto Kalashnikov. Relativamente ao conflito armado entre irmãos que havia sido ultrapassado com a assinatura dos Acordos de Roma em 1992, este eclodira mais uma vez certamente devido à incapacidade das partes – Governo (FRELIMO) e RENAMO – de se entenderem e se tolerarem mutuamente. Quanto ao crime violento com recurso a armas de fogo e a sequestros, entre muitos factores que devem ter contribuído para o seu alastramento, destaca- se (para mim) o do uso de discursos incendiários que encorajam a procura de riqueza a todo o custo sem metodologias específicas e, principalmente à própria insígnia da nossa bandeira, uma arma de fogo que imortaliza o poder das armas e, particularmente, da Kalashnikov (uma arma construída primariamente para a eliminação de vidas humanas). Porém depois de conversações aturadas no Centro Internacional de Conferências Joaquim Chissano (CICJC) entre os representantes do Governo (FRELIMO) e os do partido RENAMO, os nossos líderes (Presidente Armando

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VAMOS REMOVER A ARMA DA BANDEIRA DE MOÇAMBIQUE

Por Joaquim A.C. do Castelo

I. Preâmbulo

Este ano, Moçambique celebrou 39 anos de independêncianum momento conturbado pelo conflito político-militarna zona Centro do País ora terminado, e peloressurgimento massivo do crime violento armado esequestros, particularmente na capital do país, Maputo.A maioria de todos, estes tristes acontecimentos foiprotagonizada com recurso à arma de fogo e,coincidentemente com recurso a arma de assaltoKalashnikov. Relativamente ao conflito armado entreirmãos que havia sido ultrapassado com a assinatura dosAcordos de Roma em 1992, este eclodira mais uma vezcertamente devido à incapacidade das partes – Governo(FRELIMO) e RENAMO – de se entenderem e se toleraremmutuamente. Quanto ao crime violento com recurso aarmas de fogo e a sequestros, entre muitos factores quedevem ter contribuído para o seu alastramento, destaca-se (para mim) o do uso de discursos incendiários queencorajam a procura de riqueza a todo o custo semmetodologias específicas e, principalmente à própriainsígnia da nossa bandeira, uma arma de fogo queimortaliza o poder das armas e, particularmente, daKalashnikov (uma arma construída primariamente para aeliminação de vidas humanas).

Porém depois de conversações aturadas no CentroInternacional de Conferências Joaquim Chissano (CICJC)entre os representantes do Governo (FRELIMO) e os dopartido RENAMO, os nossos líderes (Presidente Armando

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Emílio Guebuza e Afonso Macacho Marceta Dhlakama) maisuma vez conseguiram dar um passo crucial rumo ao fimdas hostilidades militares, instruindo os seusnegociadores para alcançassem e assinassem o Acordo deCessação das Hostilidades, em 24 de Agosto de 2014,sendo a seguir homologado na Sexta-feira, dia 5 deSetembro do ano em curso pelo Chefe de Estado, ArmandoGuebuza, e o líder da Renamo, Afonso Dhlakama esubsequentemente transformado em lei por consenso, pelaAssembleia da República, em 8 de Setembro de 20014.

No acto da homologação deste último acordo, o discursodas partes centrou-se na elevação da visão de umMoçambique mais seguro, próspero e, acima de tudo,pacífico. Esta visão tem a sua raiz num Moçambique maisinclusivo, em que em vez das forças de defesa esegurança pertencerem a um único partido (a FRELIMO)serão verdadeiramente constituídas por elementos vindospelo menos das duas maiores forças políticas nestemomento, a FRELIMO e a RENAMO, pese ainda as restantesforças políticas e vivas da sociedade moçambicanapermanecerem fora deste cenário. Se a receita correctapara Moçambique é permitir que as forças de Defesa eSegurança sejam de origem partidária (o que para mimnão é aceitável), então para criar um certo equilíbriocomportamental é melhor que elas sejam pelo menos dedois partidos nacionais do que serem monopolizadas pelopartido no poder.

Por tudo que acaba de ser mencionado nos parágrafosanteriores, pode-se depreender que 2014 foi um anocheio de êxitos e conquistas em Moçambique. O paísconseguiu consolidar a paz e reconciliação e, na área

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económica, o ano 2014 foi aquele em que Moçambiqueregistou maiores progressos macroeconómicosassinaláveis, a receber mais investimentos estrangeirose a descobrir mais recursos naturais. Porém, mais umavez, não podemos esquecer que a coisa mais preciosa queaconteceu em Moçambique no ano 2014 foi o ressurgimentoe subsequente aparente fortalecimento da Paz.

Para os apóstolos da desgraça que sempre acreditaram eapregoaram o desenvolvimento económico sem odesenvolvimento humano (trickle down economics, ou a economiadas migalhas indirectas para o povo) fica o recado: a Paz e oDesenvolvimento são duas faces da mesma moeda. Porisso, é dever de todo o cidadão moçambicano incluindo“os individualistas”1que só querem toda a riqueza e odesenvolvimento de Moçambique apenas para si e suaelite oportunista, redobrar esforços com vista a evitartodas as mensagens, linguagem e, acima de tudo, adesencorajar o uso de símbolos capazes de incitar àviolência entre irmãos, sem demagogia nem complexos desuperioridade (os psicólogos chamam-nos de complexos deinferioridade, porque só quem se sente inferior é queos exibe para compensar a sua inferioridade fazendo-sepassar por superior)2. Assim, a prevenção de futuros1 Individualista: termo usado pelo falecido Presidente moçambicano, Samora Moisés Machel, para referir-se a pessoas sem sensibilidade humana e sem visão comunitárias para quem só existem elas e os seus familiares.

2 Science Daily fromhttp://www.sciencedaily.com/articles/i/inferiority_complex.htm. Quando umcomplexo de inferioridade plenamente aflige alguém, o seu impacto pode afectara auto-estima da pessoa afectada. O seu efeito é sempre subconsciente, eacredita-se que na tentativa de compensarem a sua inferioridade as pessoasaflitas podem projector a sua superioridade ferindo ainda mais a sua auto-estima ou tornar-se realmente muito laboriosas.

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conflitos em Moçambique deve ser operacionalizadaatravés da combinação da arquitectura dos autores daAssinatura do Acordo Geral de Paz de 1992, e ossignatários da homologação do Acordo de Cessação deHostilidades, com a ajuda e contribuições de toda asociedade civil (e não apenas a sociedade civilfantoche)3 Académicos, líderes políticos, religiosos ecomunitários, não deixando de lado os homens e mulheresde negócios e, como é óbvio, todo o povo moçambicano.

Neste processo, devemos tentar – primeiro – identificaros pontos ‘quentes’ potenciais e, com a ajuda de todos,reflectir sobre estes. Eu já fiz a minha parte eidentificou o nosso símbolo da “pátria amada”, aKalashnikov na nossa bandeira, como um ponto quente quenão só pode influenciar a nossa visão pró-guerra ecrime violento armado no “solo pátrio”, como tambémpode servir para moldar a consciência e psicologia dosmais novos susceptíveis de pensar que só com uma armana mão se pode progredir na vida.

Dado que Moçambique está hoje no caminho certo porquedepois de muita experiência com conflitos armados, jános apercebemos da importância da convivência pacíficaà medida que escrevemos o nosso próprio futurocolectivo a partir das nossas experiências positivas enegativas do passado através da nossa capacidade delidar com conflitos complexos, torna-se necessáriosermos corajosos no sentido de podermos identificar e,onde possível, neutralizar os possíveis focos decontínuo conflito. É nesta óptica que depois de ter

3 A Wikipedia define a palavra fantoche como uma forma particular de marionetaanimada por uma pessoa (ou organização) e que se distingue pela manipulação…

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identificado a Kalashnikov como um dos pontos quentesque podem perigar a nossa paz, sugiro: VAMOS TIRAR(REMOVER) A CLASHNIKOV da nossa bandeira, pois nãodevemos ficar de braços cruzados perante o perigoeminente que ela representa.

II. Porquê Remover a Kalashnikov da nossa Bandeira?

Para começar, dado que na realidade muitos doscidadãos que constituem uma nação nunca chegarão aconhecer-se uns aos outros, a ouvir falar sobreoutros, nem mesmo a encontrar-se, nas suas obrassobre o nacionalismo, Benedict Anderson (2006) defineuma nação como algo imaginado, pois “nas mentes decada cidadão reside a imagem da comunhão dacidadania”. Então, símbolos fortes são aqueles quemantêm plantada firmemente tal comunidade imagináriana mente e nos corações dos cidadãos duma nação.Seguindo esta lógica, símbolos nacionais fortes sãoos que, nas palavras de David Kertzer (1984):

“…Possuem uma qualidade palpável e permitem que opovo encare conceitos como coisas. Esta asserção éevidente nas metáforas que ajudam a definir ouniverso político. De igual modo, uma bandeira nãodeve ser apenas um pedaço de pano decorado, mas simdevem corporizar uma nação; de facto, a nação édefinida tanto pela sua bandeira assim como umabandeira é definida pela nação.4”

4 Kertzer, David I. Ritual, Politics and Power. New Haven, Yale University Press, 1988.

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A Kalashnikov, uma arma automática vulgarmenteconhecida por AK 47, foi fabricada em 1947, pelorusso Mikhail Kalashnikov. Em função das suascaracterísticas, conservação sob condições precárias,baixo custo de produção, disponibilidade, facilidadeno seu uso e eficácia, a Kalashnikov tornou-se, eainda hoje é, uma das armas mais usadas e conhecidasno mundo, e para além da Rússia, é também produzidanoutros países incluindo o Irão e Israel5.

Logo após o seu fabrico em 1947, “…os soldados russosprimeiro dispararam com raiva durante a supressão dolevantamento da Hungria.6” Até hoje, em todo o mundoincluindo Moçambique, a Kalashnikov é uma arma quesimboliza a repressão, crime e, acima de tudo,ditadura. Segundo o jornalista investigativo de NewYork Times, C.J. Chivers (2002), a Kalashnikov é aarma escolhida por qualquer força de ocupação e pelamaioria de grupos terroristas e ditaduras.

Nos Estados Unidos da América, as vendas da versãocivil de AK 47 conhecida pelo nome Saiga7 tendem asubir anualmente. Neste país (E.U.A) a AK 47 é umaarma imensamente popular entre os caçadoresdesportivos, particularmente devido a facilidade do

5 http://www.kalashnikov-encyclopaedia.com/the-ak-goes-usa.php

6  Stalinismo: Suas Origens & e Futuro, por Andy Blunden, 1993: Volume II, Capítulo 2, secção 2

7 Michael Vines, no seu artigo “So what does a Gun symbolize”, de 7 de Outubrode 2005, na Internet.

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seu acesso e preço baixo. Isto não acontece apenasnos Estados Unidos da América como também na Europaonde a posse de pequenas armas de fogo é maisburocrática.

A Kalashnikov é igualmente usada em quase todas aszonas de conflito político-militar em África, na Ásiae no Médio Oriente, para não mencionar a América doSul onde a Kalashnikov é a arma preferida no mundo docrime e do narcotráfico.

Em suma, pesando em média apenas 4 quilos, a AK-47 ouAKM (Kalashnikov) é muito usada por rebeldes,terroristas e bandidos, dada a facilidade deaquisição, manuseamento e limpeza. Esta arma tem umraio de acção útil acima de 1,5Km, embora com alcanceeficaz de 600m e pode disparar cerca de 600 tiros porminuto8.

Em Moçambique, a Kalashnikov já esteve nos dois ladosda Guerra Civil e hoje, é ela a arma responsável pelamorte de centenas senão milhares de moçambicanostanto pelos bandidos comuns como por opositores aoregime e, pela polícia moçambicana cuja únicalinguagem é a violência armada.

Tomando em consideração as palavras de David Kertzneracima citadas, pode-se dizer que Moçambique denenhuma forma é definido pela sua bandeira, ou seja,

8 http://www.globalsecurity.org/military/world/russia/ak-47-tech.htm, artigo permanente.

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a Bandeira Nacional não define o nosso país.Moçambique e o seu povo possuem outrascaracterísticas e atributos mais nobres do que aKalashnikov, uma arma estrangeira que decora umpedaço de pano que se faz passar por bandeiranacional. Como símbolo, a Kalashnikov apenas defineum grupo de pessoas encontradas na FRELIMO e nãoMoçambique como nação tão pouco o seu povo. Por isso,apoquenta-me que a Kalashnikov seja celebrada como osímbolo do meu país, Moçambique, e que o partido nopoder, a FRELIMO, insista em fazer de Moçambique oúnico país no mundo que se sente obcecado com aostentação pública duma arma de assalto que não foipor si produzida e muito menos inventada e cujoinventor9 (vide Figura 1) morreu em 23 de Dezembro de1994 sem nunca ter recebido quaisquer benefíciosfinanceiros pela sua invenção10, colocando-a nabandeira Nacional que, em princípio, deve representartodos os moçambicanos e não apenas os membros esimpatizantes da FRELIMO, partido no poder, e os seusapetites egocêntricos.

Quanto às razões que podem ser dadas à pergunta“Porquê Remover a Kalashnikov da Bandeira Nacional?”feita no início desta secção, a primeira é porque umaKalashnikov na bandeira é tão ameaçadora e insultuosa

9  Калашников Михаил Тимофеевич (em russo)  Grande Enciclopédia Soviética, na página pt.wikipedia.org/wiki/Mikhail_Kalashnikov.10 Resultado da Injustiça Social que caracterizou a União Soviética, hoje Rússia, primeiro país a usar a Kalashnikov.

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para o povo de Moçambique como a Suástica de AdolfoHitler foi e ainda é para o povo Judeu. Foi pelaKalashnikov que muitos moçambicanos foramassassinados tanto pelas então FPLM como pela RENAMO,publicamente fuzilados, e humilhados; é por ela que aFRELIMO e seus acólitos confundem Nação com partido,com a Kalashnikov servindo como um símbolo de orgulhoe relíquia para os membros deste partido, o que éantidemocrático pois a democracia é mutuamenteinclusiva. Para provar estas declarações da fraseanterior, basta lembrar que mesmo depois daintrodução da política multipartidária no país, aFRELIMO veio muitas vezes ao público dizer que aFRELIMO é o povo e que o povo é a FRELIMO, negandoassim a diversidade de opiniões, escolha e aliberdade de opção política e ideológica emMoçambique, ao mesmo tempo que paradoxalmente apregoaa unidade nacional.

A segunda razão, é porque em vez de encontrar outrosmotivos, e existem muitos, para resgatar a dignidade(e se for o caso, a história) do povo moçambicano, aFRELIMO prefere colocar maior ênfase no poder dasarmas, particularmente na Kalashnikov, pelo facto deter sido esta que este partido usou quando movimentode libertação. Ao proceder desta forma, pretende: (i)negar que houve muitos outros factores, incluindo arevolta interna de moçambicanos, o embargo de armascontra Portugal, o isolamento do governo português

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depois do Massacre de Wiriamu11, a doença de Salazarem 1968 e sua substituição por Marcelo Caetano, aguerra de resistência em todas as ex-colóniasportuguesa, o Movimento das Forças Armadas, osAcordos de Lusaca que contribuíram para a queda doregime colonial; (ii) manter o povo moçambicanocativo à luta armada de libertação nacional, uma vezque para este partido apenas o factor luta armada daFRELIMO “foi o único que contribuiu para adescolonização de Moçambique, o que não constituitoda a verdade.12”

A terceira, mais sinistra, é porque a FRELIMO nuncaconseguiu transformar-se de movimento de libertaçãopara partido político civil, optando por exibir aarma principalmente para recordar ao povo osfuzilamentos em massa que o país sofreu, a luta dos16 anos mais dois, e acima de tudo para subjugar opovo moçambicano ameaçando-o com armas de fogo. Estaúltima razão é que também faz com que o governo daFRELIMO não consiga retirar a Kalashnikov das mãos dapolícia civil que sempre enverga esta arma de guerramortífera, embaraçando assim todos os moçambicanosamantes da paz e assustando os visitantes que vezes

11 Gomes, Carlos de Matos, Afonso, Aniceto. Os anos da Guerra Colonial - Wiriyamu, De Moçambique param o mundo. Lisboa, 2010

Adrian Hastings, The Telegraph (June 26, 2001)

12 Discurso do General Joaquim Alberto Chipande (Beira, 14 de Setembro de 2014)

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sem conta chegam a pensar que estamos num estado desítio, mas sem vergonha sem remorsos para osgovernantes.

A quarta e última razão é que no continente africanopara além de Moçambique, a Libéria, Angola e o Sudãoforam os países da África que mais receberamcarregamentos de Kalashnikovs provenientes daAlbânia, Egipto, Hungria, Alemanha e Bulgária e,segundo o Guinness – o livro dos recordes – a AK-47 éhoje a arma de fogo mais usada no mundo. Uma em cada5 no mundo é uma kalashnikov. Em suma, como dizRoberto Saviano, a AK-47 matou mais do que a bombaatómica de Hiroshima e Nagasáqui, mais do que o SIDA,mais do que a peste bubónica, mais do que a malária,mais do que todos os atentados fundamentalistas, maisdo que o somatório dos mortos de todos os terramotos.Estima-se que a Kalashnikov tenha sido responsávelpela morte de pelo menos, 7 milhões de pessoas emtodo o mundo.13

Figura Nº. 1: Mikhail Timofeevich Kalashnikov, em russo: МихаилТимофеевич Калашников foi um militar russo, notável por ter projectado einventado a Kalashnikov. 

13 Roberto Saviano é um escritório italiano que escreveou Gomorra, um livro sobre a máfia italiana em Comorra, na Itália.

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1.Será que não podemos comemorar a nossa lutaarmada?

Sim, é verdade que somos um país fundado com base emviolência armada: (i) lutamos pela independênciausando armas de fogo e, apesar da multiplicidade dosfactores que levaram com que Portugal sucumbisse àsexigências dos nativos das suas colónias para a suaindependência, a violência (luta armada) desempenhouum papel preponderante; (ii) ajudamos os nossosvizinhos e aliados usando a violência armada (ZANU noZimbabwe, NRM no Uganda e ANC na África do Sul);encorajamos o exercício democrático (Guerra Civil dos16 anos + 2) usando a violência armada. Com aexcepção dos acordos de cessação de hostilidadesassinados recentemente, na essência está claro quesomos (tanto o governo da FRELIMO como a RENAMO)proponentes da forma mais desumana de resolverconflitos entre povos, irmãos e nações— o uso dearmas de fogo, e não existe nenhuma sombra de dúvidassobre isso.

Com o devido respeito para todos os leitores quetiverem a oportunidade de ver esta reflexão,pessoalmente já não consigo ver a razão que leva comque Moçambique continue a ostentar uma arma de fogo,particularmente uma KALASHNIKOV com uma baionetainserida, numa altura em que estamos supostamente empaz. Como disse acima, é sobejamente sabido que estaé a arma eleita por malfeitores e criminosos crónicosneste país e pelo mundo fora. Muitos moçambicanosacreditam que vivemos, pelo menos aparentemente, numademocracia multipartidária, sendo assim inválido o

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argumento de que a razão da Kalashnikov é para nãonos esquecermos da FRELIMO, o que seria um paradoxoem democracia. É decepcionante pensar que as pessoasque estiveram na luta pela independência deMoçambique hoje sejam tão ignorantes ao ponto de sesentirem felizes e realizadas com a presença duma AK-47 na nossa Bandeira Nacional.

Enquanto existem países com um passado mais violentodo que o nosso (Vietname, Camboja, Sri Lanka, Nigéria‘a Guerra Civil da Biafra’, Ruanda, Libéria, etc.,etc., e mesmo os Estados Unidos da América na suaguerra civil, estes não usam a arma de fogo como umsímbolo do seu “orgulho nacional” ao ponto de aincorporarem no seu hino nacional como nós fizemos,no trecho que diz…“Vejo o sonho ondulando nabandeira…”); lembre-se que o que ondula na nossabandeira é uma Kalashnikov (AK-47 (Avtomat Kalashnikova –1947, em russo), uma arma de assalto feita para matarseres humanos. E todas as manhãs nas escolas, aoentoarem o Hino Nacional, as nossas crianças repetema mesma melodia, o que indirectamente influencia asua estrutura de valores e, consequentemente, o seucomportamento pois começam logo a estabelecer umarelação entre a Kalashnikov na nossa bandeira comliberdade e, porque todos os “libertadores” emMoçambique são ricos, com a riqueza fácil.

Mais ainda, até é possível que algumas pessoaspensem e admitam que para se conseguir ser um“verdadeiro” moçambicano é necessário venerar a armade fogo – e porque não tentar ter uma? Chega-se aesta assunção porque quase todos os crimes violentos

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que acontecem no território moçambicano sãoprotagonizados por jovens desempregados e ansiosos emser ricos, ou “psicologicamente perturbados” (apesarde não me lembrar ter visto qualquer diagnóstico doperfil de criminosos em Moçambique, feito pelapolícia ou por entidades do serviço Nacional deSaúde).

Mais uma vez, questiona-se a inteligência daquelesque preferem manter uma AK 47 (Kalashnikov) com umabaioneta inserida, na nossa Bandeira como um símbolonacional. A quem será que a Kalashnikov representa?Aos “libertadores da pátria”, muitos dirão. Mas seráque Moçambique é apenas um país dos que participaramnos 10 anos de luta pela independência? Se a respostafor sim, então os restantes moçambicanos terão querepensar o seu futuro e reinventar um Moçambique quepertença a todos.

III. A história da campanha de remoção da arma da BandeiraNacional

Para quem atentamente acompanha o desenrolar dosacontecimentos político-militares em Moçambique, estáclaro que no fim da Guerra Civil de 16 anos, a FRELIMOe a RENAMO – no âmbito do Acordo Geral de Paz de 1992 –entraram num pacto para ultrapassarem os principais nósde estrangulamento identificados ao longo dasnegociações de paz de Roma e com eles as inimizades eanimosidades que opunham as partes.

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Entre as questões imediatas que deviam ser tratadaspelas partes figurava a mudança do Hino Nacional e dossímbolos nacionais pois a Bandeira de Mozambique como aconhecemos hoje nasceu em 1983, oito anos depois daindependência de Moçambique altura em que a FRELIMOgovernava como partido único.14 A bandeira que vigorouentre 1975 e 1983 vem ilustrada na figura 2, abaixo.Como vem acima mencionado, depois da bandeira na Figura2, em 1983 esta foi mudada para dar origem à actualbandeira, ilustrada na figura 3 desta mesma página.

Figura Nº. 2.: Primeira Bandeira de Moçambique independente, portantoda República Popular de Moçambique.

Figuras Nº. 3 e 4: Bandeira da Repúblicade Moçambique e o Emblema Nacional

Como se pode ver, enquanto a bandeira ostenta aKalashnikov, o emblema nacional ostenta também, paraalém do livro e da Kalashnikov e enxada, uma maçarocaque é inegavelmente um dos instrumentos que constam noemblema e símbolo do partido FRELIMO. Com a nova14 (Note que a bandeira que vigorou entre 1975 e 1983 tinha os mesmos símbolos, mas organizados diagonalmente).

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realidade multipartidária não fazia tanto em 1999 comonão faz hoje, nenhum sentido manter uma bandeira e umemblema nacionais ostentando os símbolos e ideais de umsó partido único, a FRELIMO. Para mim, impor acontinuidade destes símbolos é a máxima expressão daditadura de um partido que nunca sonhou viver emdemocracia e que, apesar de ter introduzido a economiado mercado, a sua gestão económica centra-se numcapitalismo do Estado à mistura de corrupção e exclusãosocial.

Continuando, valendo-se da então nova Constituição de1990, as duas partes concordaram introduzir um novoHino Nacional e, com ele, novos símbolos nacionais ou,como reza o Artigo 13 da Constituição da República de2005, “o emblema”.

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1.A Primeira Tentativa de Mudança dos SímbolosNacionais

Na sequência de concertações entre as bancadasparlamentares da primeira legislatura multipartidária,em Setembro de 1999, e em pleno período eleitoral, aAssembleia da República começou a trabalhar em torno darevisão do Hino Nacional e dos símbolos nacionais. Nodia 02 de Setembro de 1999, a Assembleia da Repúblicalançou um concurso para o desenho da nova bandeiranacional e o respectivo emblema.15

15 Jan Oskar Engene, African Eye News Service (South Africa) September 03, 1999 – (www.africanews.org).

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O lançamento deste concurso foi possível depois domaior partido da oposição em Moçambique, terveementemente negado apoiar a emenda constitucionalentão prevista pela Assembleia da República semprimeiro mudar a bandeira e os símbolos nacionais desupremacia militar do partido FRELIMO caracterizadospela presença de uma Kalashnikov, um símbolo docomunismo, e a maçaroca e cores da FRELIMO na bandeiranacional16. O concurso estava aberto para todos oscidadãos e cidadãs Moçambicanos/as artistas gráficos eo público em geral, e tinha as 12:00 horas do dia 16 deSetembro como fim do prazo de entrega das propostas. Umjúri composto por cinco membros (3 da FRELIMO e dois daRENAMO) foi encarregue de avaliar as propostassubmetidas. Foram registadas 199 propostas. Porém, nodia 20 de Setembro de 1999,17. Porém Assembleia daRepública que considerou todas as propostas comomedíocres.

16 IDEM (A Assembleia da República só pode proceder à emenda constitucional com 2/3 do seu elenco, o que a FRELIMO não conseguiria sem o consentimento da RENAMO).

17 Paul Fauvet (24 de Setembro de 1999, na AIM)

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2.A Segunda Tentativa Falhada de Mudança dos SímbolosNacionais

Com a emenda constitucional de 2004, a RENAMO reforçouas suas exigências de ver uma nova bandeira nacional eum novo emblema. Com vista a poder convencer a RENAMO aaceitar a revisão constitucional, foi lhe garantidatambém a revisão dos símbolos nacionais sem a que aRENAMO não apoiaria nenhuma emenda constitucionalnaquele ano18. Por outras palavras, sem a garantia dosseus pares da FRELIMO para a revisão dos símbolosnacionais, a RENAMO jamais iria aceitar a revisãoconstitucional de 2004 e a FRELIMO sozinha não poderiareunir os dois terços de votos necessários para arevisão da constituição. Revista a Constituição daRepública em 2004, no seu artigo 302 estabeleceu:

“ …As alterações da Bandeira Nacional e do Emblema daRepública de Moçambique são estabelecidas por Lei, noprazo de um ano, a contar da entrada em vigor daConstituição e aprovada nos termos do nº 1 do artigo295 duma lei que entrou em vigor depois da divulgação dos resultadosque deram vitória a Armando Emílio Guebuza.19”

18 http://www.crwflags.com/fotw/flags/mz-new.html

19 O Itálico é meu.

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O optimismo e a esperança que se alimentavam naquelemomento são reflectidos na citação que se segue dojornalista português Paulo de Anunciação, do jornal “OPúblico” então baseado em Maputo, no seu artigo com otítulo ‘Moçambique Engaveta o Socialismo’:

“Moçambique está a rever os seus símbolos revolucionários. Para já, vaimudar o hino nacional encomendado por Samora Machel. A bandeiratambém poderá não sobreviver. E se a colonial rua Nossa Senhora deFátima em Maputo agora é de Kenneth Kaunda, também foi sugeridoque a avenida Lenine passe a ser de Churchill.”

Porém, o projecto não teve progressos assinaláveis poiso mesmo foi-se arrastando a passo de camaleão até asaída do então presidente da República Joaquim AlbertoChissano e só viria a ser retomado em 2005, com Guebuzacomo o novo Presidente do país.

Em Abril de 2005, a Assembleia da República criou uma(outra) Comissão Especial composta por 15 elementos epresidida por Hermenegildo Gamito. No dia 16 de Junhode 2005, esta Comissão Especial lançou o segundoconcurso público para a alteração dos símbolosnacionais, i.e., a bandeira e o emblema nacionais,adoptados depois da independência do país em 1975. Poroutras palavras, o objectivo do concurso era, mais umavez, a recolha de propostas de alteração da bandeira edos símbolos nacionais.

No âmbito deste novo concurso, “os concorrentesdeveriam apresentar propostas que transmitissem algumasmensagens de amplo significado para a vida do povo

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moçambicano, como seja, o sangue derramado pelo povo naluta pela liberdade; a unidade nacional; a paz,democracia e justiça social e as riquezas do país...”20

Foram apresentadas 169 propostas à Assembleia daRepública mas, no acto da sua entrega, nenhuma delasfoi aberta. Apenas o presidente do Júri, HermenegildoGamito, prometeu avaliar as postas duma “formaobjectiva”. Porém, depois da avaliação das primeiraspropostas pelo júri, nenhuma foi seleccionada.

2.2.Movimento para a mudança dos símbolos nacionais

Apesar de não ter havido até aqui nenhuma organizaçãoque se tivesse pronunciado contra os símbolos da Pátriaimpostos pela FRELIMO, Entre as instituições queestavam contra o antigo Hino nacional e os símbolosactuais da Bandeira Nacional e a favor da sua mudança,destacava-se a própria Resistência Nacional Moçambicana(RENAMO). Expressando a posição do seu partido, o seulíder Afonso Dhlakama, uma vez disse a jornalistas: “…osactuais símbolos nacionais foram adoptados pelaFrelimo, no ano da proclamação da independência, em1975, numa altura em que estava banida a existência deoutros partidos, encontrando-se já desajustados, porforça da introdução da constituição multipartidária de1990.”

Outros contribuintes para a remoção da Kalashnikov dabandeira nacional incluem o jurista Custódio Duma, hojePresidente da Comissão Nacional dos Direitos Humanos(CNDH), órgão criado pela Lei 33/200, no seu artigo da

20 Michael Vines, The New York Time…

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internet, “Peço um voto para tirar a Kalashnikov daBandeira”, escrito em 2009, o político Manuel deAraújo, e muitos outros indivíduos anónimo que falaramcomigo, incluindo o Presidente do PDD/AD, Raúl ManuelDomingos que lamenta o facto de se gasto muito dinheiroem vão no projecto de alteração dos símbolos nacionais.Directamente ou indirectamente estas pessoas entendemque evidentemente, o partido FRELIMO parece orgulhar-secom a distinção dúbia de Moçambique ser o único país nomundo a ostentar uma arma “moderna” (Kalashnikov) nasua bandeira como seu símbolo nacional.

Para citar as suas próprias palavras, uma outrapersonalidade da vida pública moçambicana que sepronunciou contra os actuais símbolos da nossa pátria,o ex-candidato presidencial Carlos Jeque, disse:

“Tanto a bandeira como o emblema nacional foramconcebidos na era de um governo do partido único. Hoje, ocontexto é outro e o emblema poderia ser dispensado coma excepção das cores da bandeira – amarela, branca, verdee vermelha – estas não deviam ser tocadas.”

Através do seu artigo “Mancha negra na nossa bandeira”,Edy Adão Matavele escreveu uma carta ao Director dumapublicação electrónica expressando a sua preocupaçãosobre a presença duma arma de fogo, Kalashnikov, nabandeira nacional. Devido à relevância desta carda,passo a transcrevê-la na íntegra:

“Mancha negra na nossa bandeira

SR. DIRECTOR!

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Agradeço desde já a publicação desta reflexão nesta página que éde todos os moçambicanos. Julgo que não serei o primeiro, quiçá,não seja o último moçambicano a dissertar sobre este assunto,mas tal como os que já o fizeram, considero-o tão pertinentecomo pontual.

Maputo, Segunda-Feira, 24 de Setembro de 2012:: Notícias

O que me provoca “convulsões no estômago” é o facto deapresentarmos na nossa bandeira uma AK47 (Avtomat Kalashnikov1947, com cerca de 100 milhões de exemplares que já tiraram avida de mais de sete milhões de pessoas), vulgarmente tratadaentre nós como AKM.

Fica desde já o aviso de que não pretendo aqui, de forma alguma,diminuir a importância que este instrumento teve na libertação econstrução desta pátria. Mas, ao tomarmos em conta o simbolismoque a bandeira representa para um povo, se considerada umobjecto que por si só caracteriza e identifica os povos, é muitoprovável que, mesmo antes de se saber, por exemplo, onde ficaMoçambique ou quem será o chefe de Estado deste país, se conheçaa bandeira deste, dado que a bandeira constitui um instrumentode fundação da nação, de soberania, é a representação máxima deum Estado, quer no seu território quer além deste, é o BI detodos os moçambicanos. O que significa que a sua apresentaçãodeve representar a cultura e ideologia do povo.

Confesso que via com muita graça o facto de apresentarmos umaarma na nossa bandeira, mas a reflexão chamou-me à razão, atéporque já tive de responder a várias perguntas desagradáveis poresse facto, perguntas decorrentes da indignação das pessoas,justificada pelo significado sanguinário que uma armarepresenta.

Reconheço a pertinência e importância que a AK47 teve e continuaa ter para os moçambicanos, está mais do que claro que ela fazparte de nós, não reconhecê-la seria amputar a nossa própriahistória. Portanto, a lei causal que condicionou este facto podeser perfeitamente incontestável, também este não é o cerne daquestão, elemento questionável à partida é a causalidade de estesímbolo permanecer num contexto explicitamente diferente. Somosum povo que resistiu secularmente para libertar a pátria, somosum povo que precisou de empunhar armas para construir amoçambicanidade, fizemo-lo com bravura. Somos heróis? Claro quesomos! Mas não somos o único povo no mundo que o fez ou que

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ainda o faz e nem por isso esses povos decidiram colocar armasnas suas bandeiras (até porque, de acordo com o conhecimento quetenho, apenas dois países envergam armas nas suas bandeiras, eum deles é o nosso). A interpretação que nós, moçambicanos,temos para esse facto é bem diferente de quem não conhece anossa história, pois para este fica a sensação de violência,fica com a impressão de que somos um povo beligerante eintolerante que usa armas de fogo para resolver os seusdiferendos, armas que significaram e que ainda significam banhode sangue em várias paragens do mundo.

Mas nós, como um povo culto, inteligente e de valores culturaisconsagrados na PAZ e que, acima de tudo, teve tristesexperiências com armas de fogo, não precisamos ser confundidos.Podemos ultrapassar este imbróglio, da mesma forma que o fizemoscom o hino, que não era de consenso para todos os moçambicanos.

Sendo assim, julgo que este momento, em que comemoramos 20 anosde paz e 50 do jubileu da frente que libertou a pátria,constitui uma oportunidade soberana de trazer à tona estedebate. O que proponho é uma forma (não me perguntem qual) dedemonstrar a nossa bravura, contar esse episódio da nossahistória ao mundo, sem ter, necessariamente, de apresentar umaarma na nossa bandeira, até porque agora estamos em outrasfrentes, a nossa guerra é outra. Esta não precisa de armas defogo, precisa, sim, de moçambicanos adestrados para livrarem opaís da pobreza que já não é absoluta…”

Apesar de não ter havido um movimento formal assimdesignado, a oposição aos símbolos nacionais (nestemomento apenas a bandeira e o emblema, pois o HinoNacional já fora alterado) era indirectamenteconstituído por pessoas que não tinha nenhumrelacionamento entre si, mas que estavam a favor damudança dos símbolos nacionais. Assim, enquanto muitoscidadãos alimentavam a esperança de ver a sua bandeiranacional sem a Kalashnikov, a FRELIMO trabalhava contraa mudança dos símbolos nacionais instrumentalizandovários segmentos da sociedade moçambicana.

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Porém, a oposição parlamentar continuava a argumentarque num país civilizado, e não restam dúvida que elesacreditavam que Moçambique era um país civilizado, abandeira nacional não deve exibir uma arma de fogo. Naspalavras proferidas por Eduardo Namburete do partidoRENAMO nessa altura e citado pelo jornal The New ZealandHerald, “dado que os símbolos da pátria foram adoptadosnuma realidade diferente, a realidade actual nãojustifica que a arma na bandeira constitua um símbolonacional; deve haver símbolos que se adaptam a novarealidade de um país multipartidário como o nosso.”

1. Movimento para a inviabilização da mudança dossímbolos nacionais

Enquanto os debates na Assembleia da Repúblicaprosseguiam, paralelamente e com a ajuda dos veteranosda luta de libertação nacional Marcelino dos Santos eLina Magaia, a FRELIMO estava a mobilizar um certosegmento da sociedade civil no sentido de protestarcontra a alteração dos símbolos nacionais. Ao longo domês de Novembro de 2005, os membros do partido no poderrealizaram uma campanha em todo o país com vista a“consciencializarem” a população dizendo que remover aKalashnikov da Bandeira Nacional seria um retrocesso euma traição aos ideais defendidos durante a luta deindependência21. Este movimento que visava inviabilizara mudança dos símbolos nacionais pode ser melhorentendido com base nos seguintes depoimentos dos

21 Michael Vines, 2005, The New York Times.

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membros da FRELIMO contra a mudança dos símbolosnacionais:

Lina Magaia (Antiga Deputada da FRELIMO na AR):“Não posso aceitar a alteração dos símbolosnacionais. Esta questão é como o que se passaentre um filho e a sua mãe. Moçambique nasceuda luta armada de libertação nacional e taisfundamentos vêm reflectidos na bandeira”.António Hama Thai: “A Bandeira nacional e orespectivo emblema da República de Moçambiquesão referências históricas que não queremosabdicar.”Manuel Tomé (Ex-Secretário-geral da FRELIMO):"Não quero esvaziar essa discussão de maneiraantecipada, mas essa bandeira nacionalrepresenta nossa unidade nacional; foi com basenesta bandeira que unimos a população contra ocolonialismo."Joaquim Chissano: “Se a única estrela que estána bandeira tivesse que representar ocomunismo, então os Estados Unidos da Américaque têm muitas estrelas na sua bandeira seriamo país mais comunista do mundo.Edson Macuácua (Secretário para a Mobilização):Depois da reprovação da mudança dos símbolosnacionais pela maioria parlamentar da FRELIMO(156 votos contra os 79 da RENAMO), EdsonMacuácua rematou: “…não existem razões sociais,históricas e políticas que justifiquem amudança dos actuais símbolos nacionais".

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A bancada da FRELIMO votou a favor da soberaniado povo e da história do país"...a RENAMOperdeu uma oportunidade de se reconciliar com opaís".

A intervenção mais determinante deste movimento para ainviabilização da mudança dos símbolos nacionais foi ado Marcelino dos Santos, veterano da luta de libertaçãonacional, que exigiu que a Comissão Especial fossedissolvida. Marcelino dos Santos organizou grupos taiscomo a Organização da Juventude Moçambicana (OJM), aOMM, a “mulher dinâmica, um braço civil da FRELIMO”,para defender a não mudança dos símbolos nacionaisargumentando que o trabalho da Comissão Especial daAssembleia da República era apenas um esforço vão queiria gastar rios de dinheiro que tanta falta fazia paraexecutar estratégias de combate à pobreza, etc…Umexemplo de tais depoimentos é o da Associação da MulherDinâmica:

`Não entendemos como (os Deputados) podem ser influenciadospor um punhado de indivíduos ambiciosos que só queremusufruir das conquistas do povo. Não entendemos comoaceitam as tentativas de mudar o curso da história de umpovo. A mulher dinâmica nega veementemente a mudança daBandeira e do Emblema´, lê-se na referida mensagem.”

Outras organizações que se insurgiram à mudança dossímbolos nacionais incluem o Fórum de ConcertaçãoSindical, em representação da Organização dosTrabalhadores de Moçambique - Central Sindical (OTM-CS), Confederação Nacional dos Sindicatos Independentese Livres de Moçambique - CONSILMO, Sindicato Nacional

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de Jornalistas (SNJ), Sindicato Nacional de Professores(ONP-SNPM) e Associação dos Aposentados de Moçambique(APOSEMO) que depois de terem “reflectido sobre oprocesso de mudança dos símbolos nacionais, decidiurealizar uma manifestação pública em repúdio da revisãodos símbolos nacionais, nomeadamente a Bandeira e oEmblema.

Mesmo depois de tantos protestos de personalidadeligadas ao partido no poder e até manifestaçõespúblicas contra a mudança dos símbolos nacionais(bandeira e emblema), os trabalhos da Comissão Especialcontinuaram e em 30 de Setembro de 2005, um júriconstituído por 5 personalidades: três do grupoparlamentar da Frelimo, nomeadamente Júlio Carrilho(arquitecto), Sansão Cossa (arquitecto) e Nelson Saúte(escritor e membro do Conselho de Administração dosCFM), e duas personalidades da bancada da Renamo-UEapresentou (Bernabé Lucas Nkomo (escritor e pesquisadorna área de Ciências Sociais) e Xavier José Maria Mbeve(escritor) avaliou as propostas submetidas e escolheuuma proposta— a submetida pelo arquitecto José Forjazcomo a proposta vencedora. O vencedor ganhou os cercade 8.500 euros previstos e o segundo e terceiroclassificados receberam 5.000 euros e 3.500 euros,respectivamente, de acordo com os termos de referênciado concurso então divulgados22. 

Porém, em Dezembro de 2005, a Assembleia da Repúblicarejeitou a moção da oposição para a remoção da arma deassalto Kalashnikov AK-47 da bandeira nacional. O voto

22 Michael Vines, The New York Times

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para alteração da bandeira nacional e os respectivossímbolos foi de 155 votos da FRELIMO contra e 79 votosda RENAMO a favor. Mais uma vez, havia-se perdido umarica oportunidade de desmilitarizar as mentesmoçambicanas.

Muitos analistas externos encaram esta atitude como umafalha do partido FRELIMO de efectivamente setransformar de um movimento de libertação com aderênciae ideologia restritas para um partido político normalinclusivo, um problema que existe em toda a África.Ainda hoje, existem muitas perguntas sobre como um povosistematicamente martirizado por conflitos armados quemataram milhões de cidadãos conseguem sentir-se em pazcom imagens de arma imortalizadas na sua bandeira.

Hoje, em plena campanha eleitoral, não vi ainda nenhumconcorrente a abordar esta questão da relação entre aglorificação da arma de fogo na nossa bandeira e ocrime violento armado no nosso país. Mais ainda, nemsequer o Bispo Anglicano Don Dinis Sengulane, patronoda iniciativa “transformação de armas em enxadas”alguma vez veio ao público repudiar a exibição de umaarma de fogo na bandeira de Moçambique como um símboloda nossa pátria…Porque será? Sei que alguém iráargumentar que a arma na bandeira não comete nenhumcrime, mas que sim as pessoas o cometem. Tal argumentoseria inválido senão falacioso pois a Kalashnikov matae uma submissão a ela causa um condicionamento crónicoao comportamento violento, como veremos a seguir.

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IV. Os Efeitos da Exibição de Armas de Fogo

O efeito das armas é um fenómeno que evidencia que apresença de armas ou imagens de armas conduz aspessoas, particularmente aquelas anteriormente expostasa elas, a um comportamento agressivo.23 No seu estudorealizado há mais de 40 anos (em 1967), denominado“Weapons as Agressions-Eliciting Stimuli”, na Revistade Personalidade e Psicologia Social (Journal of Personalityand Social Psychology) Leonardo Berkowitz e Anthony LePagecitam um estudo realizado na Universidade de Wisconsin,Estados Unidos da América, em que os investigadoresexplicavam a relação existente entre um estímulonormalmente associado à agressão (como armas ou apresença das suas imagens) e respostas agressivas porparte das pessoas expostas…particularmente àquelas jápreparadas para lidar com armas. A conclusão do estudofoi que “…a presença de armas ou mesmo de imagens dearmas pode levar com que as pessoas se comportem maisagressivamente.”24

Apesar de haver muitos estudos de investigadores empsicologia que criticaram o efeito das armas de fogo nocomportamento agressivo, portanto criminal, osresultados dos estudos de Berkowitz e LePage, assim23 Personal and Social Psychology Berkowitz, L., & LePage, A. (1967). Weapons as Aggression-Eliciting Stimuli. Journal of Personalityand Social Psychology.

24 Anderson, C.A., Benjamin, A.J., & Bartholow, B.D. (1998). No seu estudo “Does the gun pull the trigger? Automatic priming effects of weapon pictures and weapon names. Psychological Science, 9, 308-314.

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como os de Craig Anderson et al, nunca foramexactamente replicados, mas os efeitos da exposição àarmas de fogo no comportamento agressivo e crime foramvárias vezes confirmados em muitos contextos pordiferentes equipas de investigadores, alguns dos quaisconcluíram que a explicação básica deste efeito básicode armas no comportamento agressivo envolve umainiciação, ou efeito primórdio, que inclui o facto deque mesmo a menção frequente de armas de fogo podecausar um comportamento agressivo nos seres humanos.

Acredita-se assim neste contexto, que a identificaçãode uma arma pode automaticamente aumentar a exibição deum pensamento direccionado à agressividade e, comoresultado, um comportamento violento.25 Muitorecentemente, para replicar os estudos que levaram aesta conclusão, foram realizados dois estudos em que osinvestigadores usaram um exercício de pronúncia depalavras para testar a sua hipótese. Assim, as duasexperiências dos investigadores consistiam emtentativas múltiplas em que um estímulo primordial (comarma ou sem arma) era seguido por uma palavra(agressiva e não agressiva) que tinha que ser lida omais rapidamente possível. Na experiência 1, oprincipal estímulo era constituído por palavrasenquanto na experiência 2 era constituído por imagensde armas. Ambas experiências concluíram que a meraidentificação de armas provocava pensamentosrelacionados com a agressividade.26

25 Craig A. Anderson, Arlin J. Benjamin, Jr., e Bruce Bartholow, University ofMissouri, Columbia, Estados Unidos da América.26 Frodi, A. (1975). The effect of exposure to weapons on aggressive behavior from a cross-cultural perspective. International Journal of Psychology.

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Desde que em 1967 Berkowitz e LePage demonstraram que apresença de armas (um rifle e um revólver) produziramuma agressividade mais retaliativa contra o/aantagonista do que a presença de raquetes de badminton,foram realizados muitos outros estudos para replicar aexactidão dos resultados dos seus estudos, mas semnenhum sucesso (Page & Sneidt, 1971). Porém, até hoje,nenhum estudo conseguiu desacreditar esta ligaçãocompletamente. Hoje, mais de quarenta anos mais tarde,existem mais do que suficientes evidências fortificandoa relação entre a presença de armas ou mesmo de imagensde armas e o comportamento agressivo.

Por exemplo, muito recentemente, um estudo publicadopela revista Pediatrics indica que a presença de violênciacom recurso a armas de fogo em filmes classificadoscomo PG-13 (Parental Guidance, uma classificação usada nosEstados Unidos da América para filmes destinados amaiores de 13 com supervisão de um adulto) mais do quetriplicou desde 1985, ano em que foi introduzida estaclassificação. Paralelamente, os autores do estudoconcluem que, mesmo que os jovens que assistem a estesfilmes não usem armas de fogo, por causa da crescentepopularidade dos filmes classificados como PG-13,aqueles estão expostos a uma representação de armas eviolência excessiva, o que poderá aumentar a adopção decomportamentos agressivos. E, invariavelmente, oscomportamentos agressivos saldam-se na violência ecrime.

1.Violência e/ou Crimes Violentos em Moçambique

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Antes de mais, acho necessário definir os termosviolência e crime e/ou crime violento. Enquanto oCongresso dos Estados Unidos da América define aviolência como uma ofensa cujo elemento é o uso, ouameaça de uso da força física contra alguém ou contraa propriedade alheia, o crime é definido comoqualquer outra ofensa que é felonia e que, pela suanatureza, envolve um risco substancial em que se usaa força física contra alguém ou contra a propriedadedo alheio na consumação da ofensa. O Federal Bureau ofInvestigation (FBI) dos Estados Unidos da América,define o Crime Violento como um crime composto porquatro ofensas, nomeadamente assassinato e homicídiovoluntário, violação sexual forçada, roubo e assaltoagravado. Aqui em Moçambique, e de acordo com umartigo colhido do blogue do Sociólogo Carlos Serra,num documento elaborado pela sede do Partido FRELIMOem Maputo e publicado na revista TEMPO na sua ediçãode 19 de Outubro de 1980, o crime é simplesmentedefinido como “…um mal social que importa combater,”atribuindo-o ao sistema colonial então decadente, e aoutras razões como reza a seguinte citação daCircular da “Sede Nacional da FRELIMO” de 11 deAgosto de 1976 publicada pela Revista acimamencionada:

“0s criminosos, os bandidos, sejam eles, ladrões, assassinos, violadores de mulheres ou outros, são inimigos do povo, são inimigos da Revolução. São elementos reaccionários, são elementos contra-revolucionários.

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São reaccionários porque ao roubarem os bens do Povo, ao assassinarem ou maltratarem trabalhadores ao abusarem das mulheres, (sic) agridem os mais elementares princípios do nosso Povo Trabalhador, atacando assim a linha política da FRELIMO.”

Porém, legalmente, a definição do crime,particularmente do crime violento, sugere que o mesmoresulta do comportamento de pessoas que,intencionalmente, ameaçam e atentam contra aintegridade física doutras pessoas ou contra apropriedade alheia, e na realidade conseguem consumaras suas intenções. Independentemente do uso ou não dearmas, apenas o grau dos danos causados à vítima docrime poderão determinar a seriedade de um crime. Apágina U.S. Legal.com enfatiza que os crimesviolentos contra indivíduos e sua propriedade “ …sãotipicamente perpetrados com ódio, ou por um elevadograu de desconsideração da importância da vida davítima…”, um aspecto que pode alterar a severidade deum crime aos olhos da justiça. Nesta perspectiva,legalmente o criminoso é uma pessoa que fez algoilegal. Mas psicologicamente, o criminoso é definidode várias formas:

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O Dr. William Glasser (Médico) aplicou o termo“Escolha Racional” para interpretar o criminoso. Emuitos criminologistas subscrevem a esta teoriapois acreditam que as pessoas escolhem sercriminosas. Esta abordagem sugere que o criminoso éuma pessoa racional. Também conhecida como a Teoriada Escolha Racional esta abordagem mantém que “aspessoas são livres de escolher entre seguir umcomportamento criminal ou “convencional” (Siegel,2005).

Quanto as razões que levam alguém a sercriminoso, evocam-se as necessidades pessoais,incluindo, ódio, vingança, necessidade, zanga,ciúmes, luxúria, vaidade e emoção. De acordo comBurke (2001) nesta teoria de “Escolha Racional”existem três modelos comportamentais: actorracional, actor predestinado e actor vitimado. Omais interessante de todos estes modelos é o deactor predestinado pois este mantém que umcriminoso predestinado não consegue controlar osseus instintos tão pouco os seus ambientessociais, o que o induz a cometer crimes. Nestaperspectiva, a única forma de resolver o problemade “criminosos predestinados” seria a de alteraro seu ambiente biológico, psicológico esociológico. Finalmente, o modelo de “actorvitimado” propõe que os crimes são resultantes dadesigualdade social…

Para o falecido psicólogo britânico Hans J.Eysenck, pai teoria de personalidade e crime, o

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“comportamento criminal resulta de uma interacçãoentre certas condições ambientais e ascaracterísticas do sistema nervoso central”(Bartol & Bartol, 2005). Esta teoria não é umadas mais populares pois sugere que existe umapredisposição genética que leva alguém aenveredar por um comportamento anti-social. Osapóstolos de Eysenk acreditam que o criminosopossui uma moldura fisiológica única que, emconjugação com um certo tipo de ambiente, leva àcriminalidade. Note-se aqui que Eysenk nuncachegou a sugerir que as pessoas criminosasnasciam como tal, mas defendia que a combinaçãode factores fisiológicos, ambientais eneurobiológicos é que eram responsáveis portransformar alguém num criminoso. Em suma, paraEysenk, coloca a sua teoria nas seguintespalavras:

“Não é a criminalidade em si que é nata; são certaspeculiaridades do sistema nervoso central eautonómico que reagem com o meio ambiente, com asocialização e com muitos outros factores ambientais,para aumentar a probabilidade de alguém secomportar duma certa forma anti-social (Eysenk &Gudjonsson, 1989).”

2.Como as armas de fogo incentivam crime eviolência

Para além de moldar o comportamento violento naspessoas, a presença de uma arma de fogo na nossa

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bandeira inflaciona a prevalência da violência emMoçambique, cultivando a impressão de que Moçambiqueé um país em que só se chega ao poder, ou se conseguealcançar riqueza, com recurso a uma arma de fogo. Omedo de ser deixado atrás pode ser um grande factormotivador para alguns jovens ganharem o apetite deesgrimirem armas de fogo, e tornar-se mais agressivospor pensarem “é desta vez; tenho a minha arma e voutornar-me rico também.”

Apesar de não possuirmos psicólogos capazes dereflectirem sobre a questão da arma na bandeira deMoçambique, existem muitas evidências comprovando quede facto algumas crianças expostas a armas (e asnossas são sobejamente expostas), sofrem deansiedade, depressão e uma desordem chamada stress pós-traumático, perturbações de sono, pesadelos eisolamento social. Estes sintomas podem sercomparados com os que uma criança exposta a violênciados órgãos de comunicação social (filmes violentos,etc.) pode experimentar.

Aliás, Moçambique não é o único país no mundo comproblemas de experiências com a presença de armas(fisicamente ou em forma de imagens). Na suaabordagem com base na saúde, a Organização Mundial deSaúde (2004) possui estatísticas que revelam que“todos os anos, meio milhão de pessoas morrem decausas relacionadas com armas de fogo e que destas200.000 pessoas morrem de violência interpessoal ecrime e não da guerra e conflito armado. No âmbitodesta abordagem da OMS, milhões de outras pessoas

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ficam feridas acabando por contrair uma incapacidademental ou física.

Enquanto não consegui identificar nenhum estudorecente sobre o nível do crime com recurso à arma defogo no nosso país, a OCISA conseguiu apurar que em2008, foram reportados 40.312 crimes violentos(Procuradoria Geral da República) ou 27.254 crimes(Polícia da República de Moçambique. A maioria destescrimes foi com recurso a armas de fogo.

A seguir, eis uma tabela de Crimes em Moçambique, deacordo com

Em Moçambique circulam, a qualquer momento, mais de 1milhão de armas de fogo nas mãos de moçambicanos.Mais adiante, procederei à estratificação das armasem Moçambique de acordo com os seus portadores.

Relativamente a relação entre a submissão às armas defogo e a prevalência do crime violento em Moçambique,torna-se importante ler a seguinte constatação deThemba Shabangu do Instituto IDASA, que diz (oitálico é meu):

“Em Moçambique (e África do Sul), o grau e tipo de violência que osinfractores usam quando cometem um crime é bastante preocupante einexplicável. Durante roubos aos domicílios ou assaltos àviaturas, os infractores violam mulheres. Disparam para ascrianças que choram durante o roubo. Usam armas e outros objectospara cometer crimes interpessoais e de aquisição. O uso daviolência e armas, particularmente em situações em que a vítimanão está resistindo e tão pouco constitui uma ameaça para osmeliantes, serve para aumentar o medo do crime e insegurança.”

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A tabela 1 que se segue ilustra o número de armas nasmãos de moçambicanos desde o ano 2000. Apesar de osautores dos dados recolhidos para a constituição destatabela não mencionarem a marca específica das armas nasmãos de cidadãos moçambicanos e outras pessoasresidentes no país, não restam dúvidas de que a maioriadestas armas é de marca Kalashnikov.

Tabela 1: Armas nas mãos de civis em Moçambique:

Mapa de estatísticas sobre a existência de armas de fogo em MoçambiqueTaxa de Armas nas Mãos de Civis por cada 100 Moçambicanos/as

Taxa de Armas nas Mãos de Civis num universo de 178 países. Número de Armas nas mãos de Privados

Número de Portadores de Armas deFogo com Licença de Porte de Arma

Número de Portadores de Armas de Fogo com Licença de Porte de Arma em Cada100 Moçambicanosem 2009

Número das Armas Licenciadas

(2005)

1.000.00027 5.128 Nº. 9929 4.00030 0.0231 7.00032

27Karp, Aaron. 2007. ‘Completing the Count: Civilian firearms - Annexeonline.’ Small Arms Survey 2007: Guns and the City; Chapter 2 (Annexe 4), p.67 refers. Cambridge: Cambridge University Press. 27 August, 2007.28 Leaõ, Ana. 2004. ‘Civilian Firearms.’ Hide and Seek: Taking Account of Small Arms inSouthern Africa, p. 98. Pretoria: Institute for Security Studies. 1 October.

29 Karp, Aaron. 2007. ‘Completing the Count: Civilian firearms.’ Small Arms Survey2007: Guns and the City; Chapter 2 (Annexes 1-5), p. 67 refers. Cambridge:Cambridge University Press. 27 August.

30 Mozambique. 2010. ‘Record Keeping.’ National Report of Mozambique on itsImplementation of the United Nations Programme of Action to Prevent, Combat and Eradicate the IllicitTrade in Small Arms and Light Weapons in All Its Aspects (UNPoA); Section B.3, pp. 14-15. New

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Qual é a explicação desta relação? Uma resposta óbvia éque as armas sempre foram associadas como a agressão e,aqui em Moçambique, com o poder. Assim, a presença deuma arma na bandeira do nosso país aumenta aacessibilidade de pensamentos associados com aagressividade que, por seu turno, podem motivar umcomportamento criminoso. A ideia de que a ctivação deum conceito na memória semântica aumenta aacessibilidade de conceitos relacionados ao conceitoinicial chama-se a activação da generalização, um conceitodemonstrado em vários estudos experimentais. SegundoAnderson, Benjamin e Bartolow que testaram estahipótese, se esta activação da generalização do efeitodas armas for correcta, então a presença de uma arma na

York: Permanent Mission of Mozambique to the United Nations. 1 January.

31 GunPolicy.org. 2014. ‘Calculated Rates – Mozambique.’ Historical Population Data – USCB International Data Base. Suitland, MD: US Census Bureau Population Division. 28 July.

32 McKenzie, Katharine. 1999. ‘Number of Licensed Firearms.’ Domestic Gun Control Policy in Ten SADC Countries; Appendix A, pp. 32-33. Johannesburg: Gun Free South Africa. 1 September.

ANONÚMERO DE HOMICÍDIOS200975020088782007858200680720051.002200496220031.00420021.04020011.1002000905

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nossa bandeira é capaz de incitar os/as cidadãos/ãs àviolência.

Em Moçambique, para além de todo o povo, com particularênfase nas crianças e adolescentes nas escolas, serexposto (submisso) à arma de fogo na sua bandeira, opartido FRELIMO frequentemente evoca a luta armada delibertação nacional como tendo sido a única forma quelevou ao derrube do regime colonial português emMoçambique, esquecendo-se até doutras foças vivas quetanto em Moçambique como noutras colónias portuguesaspassiva- ou activamente se opunham ao colonialismo nosseus territórios nacionais, e doutros esforços dasagências das Nações Unidas e foros tais como osrecentemente celebrados Acordos de Lusaka, e a revoltadas mães portuguesas sobre a morte dos seus filhos noultramar (Angola, Guiné Bissau, Moçambique, São Tomé ePríncipe e Cabo Verde), para não citar mais exemplos.Recentemente, vimos que para fazer valer as suasreclamações sobre a exclusão social e a Lei Eleitoral,o maior partido da oposição em Moçambique, aResistência Nacional Moçambicana, recorreu mais uma vezàs armas. Nos exemplos aqui mencionados, pretende-sedar primazia ao uso das armas como o único instrumentoútil e viável para a resolução de conflitos, remetendoos outros métodos incluindo o diálogo ao segundo plano.

Voltarei num futuro muito breve para mostrar a relaçãoentre a arma na nossa bandeira e a proliferação docrime violento armado em Moçambique. Irei, igualmente,comparar a bandeira de Moçambique com a da Hezbollah, aúnica organização no mundo que usa a arma como seusímbolo, um feito muito lamentável senão triste.

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