LÓGICA FORMAL VERSUS LÓGICA DIALÉTICA

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1. Introdução A experiência oriunda do Programa Estadual Universidade Sem Fronteiras, no perío- do de dezembro de 2008 a fevereiro de 2010, realizado na Cooperativa Mista de Produção e Comercialização Camponesa do Paraná proporcionou várias reflexões aos professores pesquisadores da Universidade Estadual do Centro-Oeste. Muitas das quais sobre o difícil devir entre a teoria e a prática, ou seja a praxis, bem como a exteriorização das contradi- ções na lógica do pensar de, aproximadamente, 150 (cento e cinquenta) famílias campo- nesas, em quatro municípios da região de Laranjeiras do Sul/Paraná. O trabalho realizado no período supracitado teve como objetivo principal o estudo de mercado sobre o produto óleo de girassol, assim como a análise dos respectivos custos de produção para formação de preço. Neste segundo aspecto, pode-se observar o conflito existente entre duas lógicas de pensar, a formal e a dialética. A primeira diz respeito a um olhar segmentado da realidade, bem como a uma abordagem de relação causa-efeito, que visa, quando aplicada ao processo produtivo, a racionalização e a eficiência produtiva, a inserção de produtos e de serviços com padrão de qualidade aceitável, a preços com- petitivos, e o aumento das margens de lucro. A lógica dialética, entretanto, demonstra a consciência e a luta para manter o modo de vida camponês, por meio do cooperativismo, objetivando a produção e a comercialização do óleo de girassol e de outros produtos. Cabe ressaltar a observação de duas formas de apropriação dos custos, visto que, muitos destes, podem ser atribuídos ao produto sem existirem efetivamente no momento da produção. Por exemplo, o custo indireto aluguel não existe, uma vez que o terreno e o prédio da fábrica foram cedidos em comodato pela Prefeitura de Porto Barreiro – Pa- raná, no entanto, na lógica formal, deve-se levar em consideração a avaliação de todos os gastos, que existem ou existiriam se não houvesse apoio governamental, com bens e serviços que visam a produção de outros bens e serviços (custos), incorrendo no risco, Lógica formal versus lógica dialética: Análise de custos na Cooperativa Mista de Produção e Comercialização Camponesa do Paraná Luciano Ferreira de Lima Roni Antônio Garcia da Silva Luciane Aparecida Munhoz Stefano

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1. Introdução

A experiência oriunda do Programa Estadual Universidade Sem Fronteiras, no perío-

do de dezembro de 2008 a fevereiro de 2010, realizado na Cooperativa Mista de Produção

e Comercialização Camponesa do Paraná proporcionou várias reflexões aos professores

pesquisadores da Universidade Estadual do Centro-Oeste. Muitas das quais sobre o difícil

devir entre a teoria e a prática, ou seja a praxis, bem como a exteriorização das contradi-

ções na lógica do pensar de, aproximadamente, 150 (cento e cinquenta) famílias campo-

nesas, em quatro municípios da região de Laranjeiras do Sul/Paraná.

O trabalho realizado no período supracitado teve como objetivo principal o estudo

de mercado sobre o produto óleo de girassol, assim como a análise dos respectivos custos

de produção para formação de preço. Neste segundo aspecto, pode-se observar o conflito

existente entre duas lógicas de pensar, a formal e a dialética. A primeira diz respeito a um

olhar segmentado da realidade, bem como a uma abordagem de relação causa-efeito, que

visa, quando aplicada ao processo produtivo, a racionalização e a eficiência produtiva,

a inserção de produtos e de serviços com padrão de qualidade aceitável, a preços com-

petitivos, e o aumento das margens de lucro. A lógica dialética, entretanto, demonstra a

consciência e a luta para manter o modo de vida camponês, por meio do cooperativismo,

objetivando a produção e a comercialização do óleo de girassol e de outros produtos.

Cabe ressaltar a observação de duas formas de apropriação dos custos, visto que,

muitos destes, podem ser atribuídos ao produto sem existirem efetivamente no momento

da produção. Por exemplo, o custo indireto aluguel não existe, uma vez que o terreno e

o prédio da fábrica foram cedidos em comodato pela Prefeitura de Porto Barreiro – Pa-

raná, no entanto, na lógica formal, deve-se levar em consideração a avaliação de todos

os gastos, que existem ou existiriam se não houvesse apoio governamental, com bens e

serviços que visam a produção de outros bens e serviços (custos), incorrendo no risco,

Lógica formal versus lógica dialética:

Análise de custos na Cooperativa Mista de Produção e Comercialização Camponesa do Paraná

Luciano Ferreira de Lima

Roni Antônio Garcia da Silva

Luciane Aparecida Munhoz Stefano

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caso o procedimento ocorra de modo diferente, de perder a competitividade de mercado,

o mesmo vale para as despesas.

2. Lógica do pensar: formal versus dialética

Ao iniciar uma pesquisa, muitas vezes, o pesquisador levado a questionar e refletir

sobre um problema, vê-se num emaranhado de perguntas, teorias, conceitos, métodos, e,

mesmo, concepções do senso comum. Portanto, torna-se necessário delimitar o objeto de

pesquisa, especificando e restringindo o problema; apontando, de acordo com Lakatos e

Marconi (1983, p. 104), “uma resposta, ‘provável, suposta e provisória’, isto é, uma hipóte-

se.” Neste sentido, pode-se afirmar que a situação problemática diz respeito à transição dos

camponeses de seu modo de produção e comercialização de subsistência para a competiti-

vidade de mercado, sem perder a identidade. No que tange a hipótese básica, infere-se que

os conceitos e a forma de trabalhar inerentes ao processo produtivo baseado na racionali-

zação dos gastos, na eficiência da utilização das máquinas, no máximo aproveitamento da

matéria-prima e dos tempos de produção, bem como na escolha do melhor arranjo produ-

tivo, inevitavelmente, implicarão em transformações do modus operandi camponês.

Por meio do processo de pesquisa buscou-se, dentre outros objetivos, realizar o le-

vantamento dos custos do produto óleo de girassol na Cooperativa Mista de Produção e

Comercialização Camponesa do Paraná. A análise dos dados empíricos coletados possi-

bilitou a observação da existência de duas estruturas de custos, a primeira com o apoio

governamental e a segunda de acordo com o livre mercado.

Na pesquisa, por meio de um ‘olhar’ interdisciplinar1, pretendeu-se, também, conhe-

cer a essência dos múltiplos fatores que concorrem no sentido de estabelecer mudanças

significativas no modelo de gestão e produção da Cooperativa Mista de Produção e Co-

mercialização Camponesa do Paraná, no que se refere ao modo de vida camponês, ao pro-

cesso produtivo, ao levantamento de custos e à precificação dos produtos. Pois, o enfoque

interdisciplinar permite a utilização de vários conhecimentos (integrados), bem como a

análise do fenômeno em estudo sob diversas perspectivas.

De acordo com Pedro Demo, a interdisciplinaridade pretende abarcar o conhecimento

acerca da realidade de modo vertical (aprofundado) e horizontal (amplo), contemplando, deste

modo, a particularidade e a complexidade do real (DEMO, 1999). Pois, por meio da ciência, por

muito tempo, buscou-se na especialização o conhecimento do todo, do real, da essência dos

fenômenos, obtendo-se êxito em muitas áreas, como na Matemática, na Física e na Química,

entretanto, a complexidade da realidade não se resume às fórmulas, aos conceitos, às teorias e

aos métodos, daí, talvez, a necessidade da comunicação dos ‘diversos’ saberes (DEMO, 1999).

1 No entendimento de Demo (1999, p. 88), interdisciplinaridade constitui “a arte do aprofundamento com sentido de abrangência, para dar conta, ao mesmo tempo, da particularidade e da complexida-de do real”.

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e Luciane Aparecida Munhoz Stefano

Transitar entre as várias áreas do conhecimento, apropriando-se de saberes que ofe-

reçam elementos para um entendimento mais amplo da realidade, talvez seja uma estra-

tégia para alcançar a interdisciplinaridade, uma vez que a partibilidade do real em ‘de-

partamentos’ visa uma melhor compreensão para efeito de análise, contudo, a realidade

constitui muito mais que a simples soma de conhecimentos, pois se mostra dinâmica,

complexa e, na maioria das vezes, contraditória.

O método dialético tem como instrumento a lógica do pensar totalizante que infere a

realidade não apenas pelo viés sequencial no espaço e no tempo, mas também, e principal-

mente, por meio de suas contradições, mediações e rupturas. Com a aplicação da lógica dia-

lética busca-se a compreensão da realidade na sua dinâmica espaço temporal, objetivando

conhecer o sentido da totalidade no seu movimento, visto que a realidade constitui síntese

de múltiplas determinações interligadas de modo complexo em constante movimento.

Segundo Marx e Engels (1979, p. 125), o defeito principal de todo o materialismo

“consiste em que o objeto, a realidade, a sensibilidade, só é apreendido sob a forma de ob-

jeto ou de intuição, mas não como atividade humana sensível, como práxis, não subjetiva-

mente”. A práxis pressupõe o devir, a teoria orientando a prática e a prática, por sua vez,

fazendo com que seja repensada a teoria. Isso favorece o constante repensar da realidade,

por meio de novos elementos advindos da prática que, por sua vez, contribuirão com a

construção de novos conhecimentos que não constituem verdades absolutas, mas ajudam

na compreensão de alguns fenômenos em determinados momentos.

Para Marx e Engels (1979, p. 125), “[...] é na práxis que o homem deve demonstrar a

verdade [...] a realidade e o poder, o caráter terreno de seu pensamento. [...] um pensamen-

to que se isola da práxis “é uma questão puramente escolástica”. Daí que, a validade ou

não validade das afirmações teóricas dá-se somente quando confrontadas com a prática,

pois esta possibilita o repensar da teoria, permitindo, deste modo, que a teoria seja avalia-

da, deixando de ser apenas retórica e passando a existir como realidade objetiva.

Com relação à lógica, de acordo com Lefebvre (1991, p. 21), “a lógica dialética acres-

centa, à antiga lógica [formal], a captação das transições, dos desenvolvimentos, da li-

gação interna e necessária das partes no todo” Deste modo, busca-se a compreensão da

totalidade, das contradições e das inter-relações dos múltiplos fatores que compõem a re-

alidade. Entretanto, cabe ressaltar que, mesmo com a utilização da lógica dialética, não se

chegará ao entendimento pleno sobre o fenômeno em questão. Mas, dentre as lógicas do

pensar parece ser a que propicia uma maior aproximação da essência dos problemas pes-

quisados nas ciências sociais. Pois, segundo Lefebvre (1995), como o real está em movi-

mento, o pensamento deve se por em movimento e ser pensamento do movimento. “Se o

real é contraditório, então que o pensamento seja pensamento consciente da contradição”

(LEFEBVRE, 1995, p. 174). Ainda, no entendimento do mesmo autor, a lógica dialética

permite um contato direto com o conteúdo (o que muitas vezes não ocorre com a lógica

formal). No entanto, para que essa condição seja satisfeita, deve-se atentar para algumas

premissas, de acordo com Lefebvre (1995, p. 174):

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a) Do ponto de vista da forma: que o pensamento se torne móvel e pensamen-

to do movimento, sem perder sua forma determinada; b) Do ponto de vista

do trabalho efetivo do pensamento: que ele se mova por meio das contradições

determinadas, pensando-as, refletindo-as, sem se perder na incoerência; c) Do

ponto de vista dos conhecimentos adquiridos (pelas ciências), devemos saber

se existem no real assim conhecido, leis universais, que sejam ao mesmo tem-

po (precisamente porque são universais) leis do real e leis do pensamento: as

leis do movimento no real e no pensamento. Essas leis, para serem universais,

devem “num certo sentido” ser abstratas (isto é, não se referirem a nenhum

objeto particular, não serem nem leis físicas, nem leis químicas ou biológicas,

etc.); e, num outro sentido, serem completamente concretas (referir-se a todos

os objetos, a todo o real, inclusive ao pensamento).

Por meio da aplicação da lógica formal estuda-se, observa-se e investiga-se o objeto ou fe-

nômeno, de modo isolado, ou seja, busca-se a compreensão da parte ora delimitada. A partir de

tal raciocínio gera-se a abstração, pois a parte inexiste sem a totalidade. Perde-se, assim, o en-

tendimento do movimento, bem como das relações da parte com o todo (LEFEBVRE, 1995).

O pensador René Descartes expressa sua lógica de pensar formal, também, ao afir-

mar, em Discurso do método, que se deve “repartir cada uma das dificuldades [...] em tan-

tas parcelas quantas fossem possíveis e necessárias a fim de melhor solucioná-las” (DES-

CARTES, 2010, p. 11). Logo, para se conhecer o todo deve-se dividi-lo em partes, pois

conhecendo as partes se conhecerá o todo, dividir para conquistar. A relação causa-efeito

constitui outro exemplo da lógica formal, uma vez que determina de forma simplista e

abstrata o resultado, ignorando os múltiplos fatores que compõem a realidade, bem como

seu movimento, do qual a contradição constitui-se integrante. Portando, pode-se afirmar

que a lógica formal tem por princípio a abstração.

3. Considerações sobre o modo de vida camponês

No entendimento de Kreutz (2004, p. 9) o cooperativismo não tem como alicerce uma

organização socioeconômica clara, entretanto possui algumas ideias e noções comuns: “mutu-

alidade, união de esforços, solidariedade, associação entre pessoas em função de objetivos co-

muns, e [sic] não exploração do homem pelo homem, justiça social, democracia e autogestão”.

Neste sentido, nota-se um esforço das famílias camponesas de Laranjeiras do Sul e

região para manter seu modo de vida camponês e, ao mesmo tempo, gerar renda por meio

da união de esforços e da inserção na lógica de mercado capitalista, com a produção e

comercialização de alguns produtos, inclusive o óleo de girassol.

O modo de vida camponês pressupõe resistência à lógica contemporânea de mercado

capitalista que visa, de acordo com Oliveira (2010), acumulação e enriquecimento. No

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e Luciane Aparecida Munhoz Stefano

entanto, “tal aspecto não significa que, enquanto unidade de produção/consumo, esteja

alheia às trocas mercantis, mas que as desenvolve a partir das necessidades e perspectivas

do grupo doméstico” (OLIVEIRA, 2010, p. 1).

O pequeno agricultor camponês que resiste à lógica de mercado capitalista e opõe-

se ao modelo do agronegócio, tanto na produção de grande escala, quanto de pequena

escala (agricultura familiar), vê-se enredado ao sistema produtivo hodierno, que requer o

conhecimento das técnicas mercadológicas de produção e comercialização, dos tempos e

movimentos produtivos, da mensuração dos gastos produtivos, bem como da tributação,

do orçamento de capital, das técnicas de precificação, etc. (MPA PARANÁ, 2010). Tal

postura frente aos desafios da geração de renda da pequena propriedade com produção

diversificada, talvez reforce a consciência coletiva de luta pela manutenção da posse da

terra, dos costumes, dos valores, enfim, do status quo.

Todavia, sabe-se, de acordo com a lógica dialética, que a contradição leva ao devir, ao

novo, que não é totalmente novo porque traz características do antigo. Logo, a repetição

de procedimentos e a incorporação de conceitos, pode levá-los, os camponeses, a uma

nova maneira de pensar e agir, transformando, desta forma, seu modo de produção e

interferindo, sobremaneira, na interpretação da realidade objetiva.

Outro aspecto que deve ser levado em consideração para Oliveira (2010, p. 1) diz respeito às:

Contradições internas ao mundo camponês, que ora propõem a estes

produzir acima de suas necessidades e se [sic] engajarem ao mercado,

ora propõem reduzir seu consumo ou sua produção, para resistirem às

situações hostis impostas pelo mercado.

Com a união de forças, por meio do cooperativismo, para produção e comercializa-

ção, o campesinato mantém relações produtivas, comerciais e financeiras diretas com

o mercado. Insere-se cada vez mais no modo de produção capitalista e aprofunda-se na

compreensão dos processos, da divisão do trabalho e da maximização dos retornos. Isto

não nega a identidade camponesa, pelo contrário, reforça-a. Mas, o modo de vida campo-

nês não resiste às mudanças, incorpora-as.

O maior entendimento dos camponeses no que se refere a utilização das técnicas e

procedimentos de produção e comercialização, indubitavelmente, leva-os à nova situação

econômica e financeira, uma vez que a prática cotidiana com a incorporação das novas

ferramentas e das novas tecnologias, torna-os mais competitivos, aumentando, na maio-

ria das vezes, o retorno sobre o capital investido.

A partir de uma nova situação econômico-financeira, pode-se inferir que existirá uma

pressão com o crescimento dos gastos oriundos de necessidades existentes com saúde, edu-

cação, moradia, transporte, lazer, etc. Para tanto, a acumulação de capital faz-se necessária,

torna-se, também, preocupação dos camponeses, visa-se, deste modo, não somente satisfazer

as necessidades do novo padrão de vida, mas, principalmente, aumentar os investimentos para

obter maior retorno.

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Na tentativa de manter o modo de vida camponês, o movimento dos camponeses insere-

se no modo de produção capitalista, pois sem o aumento da renda, teriam, provavelmente,

que buscar nas cidades outra forma de subsistência. No entanto, a contradição leva ao devir, a

um novo estado, do camponês com pensamento capitalista, racionalista e parte integrante das

engrenagens do capital.

O capitalismo enfrentou, durante sua existência, muitas crises, geradas, principalmente, pelo

acúmulo exagerado de capital por alguns segmentos da sociedade. As crises, no capitalismo, ma-

nifestam-se principalmente por meio das altas taxas de desemprego e baixo ciclo de investimen-

tos. A força motriz do capitalismo, talvez seja sua capacidade de reinventar-se sobre novas bases

de produção e acumulação. Percebe-se, por meio dos investimentos governamentais, a intenção

de distribuir a renda nacional, bem como de gerar fluxo de capital nos movimentos sociais.

O MPA (Movimento dos Pequenos Agricultores) expande-se e ramifica-se, na qualidade,

tanto de movimento social, quanto de organização político-administrativa. São inúmeras as

cadeias produtivas que estão sendo estruturadas, visando o fortalecimento dos camponeses

no que diz respeito à produção, à comercialização e à gestão dos produtos provenientes da

agricultura camponesa.

A Cooperativa Mista de Produção e Comercialização Camponesa do Paraná constitui apenas

um núcleo produtivo/administrativo do MPA, no qual alguns produtos (óleo de girassol, feijão,

farinha de milho, café, quirera, entre outros) sofrem transformação, ou mesmo recepção, empaco-

tamento e comercialização. Por meio do Planejamento Estratégico que será desenvolvido busca-se

estabelecer os objetivos de médio e longo prazos, bem como os meios e as estratégias, para que o

MPA e a Cooperativa ampliem suas operações, o espaço no mercado, o número de cooperados e

de produtos comercializados. Cabe ressaltar que os principais clientes serão as Prefeituras onde o

MPA poderá atuar, por meio da Cooperativa, no fornecimento dos alimentos da merenda escolar.

4. Análise de custos sobre a produção de óleo de girassol: duas

apropriações

Há uma grande diversidade quanto à utilização dos óleos de origem vegetal. Alguns são

utilizados na produção de biodiesel, outros na indústria química e, também, como componen-

tes de inúmeros produtos. Possibilitando, deste modo, a formação de muitas cadeias produti-

vas. Cabe destacar as principais aplicações: alimentação humana, ração animal, combustível,

impermeabilizantes, lubrificantes, tintas, vernizes, cosméticos, medicina natural, entre outros

(BORSUK, 2008).

O processamento do girassol mostra-se menos complexo quando comparado com o pro-

cessamento das demais oleaginosas, “pois a extração do óleo pode ser realizada em tempera-

tura ambiente e com os grãos inteiros, conservando assim propriedades nutricionais impor-

tantes” (BORSUK, 2008, p. 40). Após a extração, “o óleo pode ser imediatamente consumido

na alimentação, sendo necessária somente a filtragem ou decantação para separar as impure-

zas oriundas do processo de prensagem” (BORSUK, 2008, p. 40).

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e Luciane Aparecida Munhoz Stefano

No entendimento da Embrapa (2010), o processamento de uma tonelada de grãos de

girassol gera 400 kg (quatrocentos quilos) ou litros de óleo de excelente qualidade, 250 kg

(duzentos e cinquenta quilos) de casca e 350 kg (trezentos e cinquenta quilos) de torta,

com 45% a 50% de proteína bruta, sendo este subproduto basicamente aproveitado na

produção de ração, em misturas com outras fontes de proteína.

No que se refere ao processo produtivo do óleo de girassol, pode-se afirmar, de acordo

com Borsuk (2008, p. 40), que:

Existem vários métodos de extração de óleos, divididos basicamente em ex-

tração a quente e extração a frio. No primeiro, além da extração mecânica

utilizam-se solventes, arrastando-se praticamente todo o óleo do farelo, po-

rém com perda na qualidade nutricional. Já na extração a frio, por meio da

prensagem mecânica, as perdas de óleo na torta geralmente são elevadas,

devendo ser devidamente analisadas. No entanto, o óleo permanece com

melhor qualidade nutricional.

A Miniusina de óleo de girassol da Cooperativa Mista de Produção e Comercialização

Camponesa do Paraná localizada em Porto Barreiro/PR utiliza o processo de extração a

frio com prensagem mecânica. A capacidade produtiva total gira em torno de, aproxima-

damente, 100 kg/h (cem quilogramas por hora). Logo, trabalhando 8 h/d (oito horas por

dia) e 5 d/s (cinco dias por semana) tem-se, em 1 (um) mês comercial (trinta dias), em

média, com 21 (vinte e um) dias úteis, 16.800 kg (dezesseis mil e oitocentos quilogramas)

processados. Dos quais resultam por mês, aproximadamente, 6.720 l (seis mil, setecentos

e vinte litros) de óleo, 4.200 kg (quatro mil e duzentos quilogramas) de casca e 5.880 kg

(cinco mil, oitocentos e oitenta quilogramas) de torta.

Na análise de custos torna-se necessário, por meio da lógica formal, o entendimento

dos conceitos utilizados, bem como da sequência hierárquica de raciocínio pré-estabe-

lecida. Para tanto, a definição de gastos, custos e despesas, a diferenciação entre custos

diretos e indiretos, fixos e variáveis, constitui fator de fundamental importância.

Lê-se em Bruni e Famá (2004, p. 25) que os gastos “consistem no sacrifício financeiro

que a entidade arca para a obtenção de um produto ou serviço qualquer.” Na mesma linha

de raciocínio Martins (2008, p. 24) define gasto como:

Compra de um produto ou serviço qualquer, que gera sacrifício financeiro

para a entidade (desembolso), sacrifício esse representado por entrega ou

promessa de entrega de ativos (normalmente dinheiro).

No que se refere aos conceitos de custos e despesas, ambos gastos, pode-se afirmar, de

acordo com Martins (2008, p. 25), que o custo constitui “gasto relativo a bem ou serviço uti-

lizado na produção de outros bens e serviços” e a despesa “bem ou serviço consumido direta

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ou indiretamente para obtenção de receitas”. Portanto, os custos são os gastos relativos, única

e exclusivamente, ao processo produtivo e às despesas, após a disponibilidade dos produtos

ou serviços para a venda, constituem os gastos administrativos, comerciais e financeiros para

obtenção de receitas. Cabe destacar que Bruni e Famá (2004) compartilham com Martins

(2008) do mesmo entendimento a respeito dos conceitos de custos e despesas.

Os custos diretos são:

Custos que podem ser diretamente apropriados aos produtos, bastando

haver uma medida de consumo (quilogramas de materiais consumidos,

embalagens utilizadas, horas de mão de obra utilizadas e até quantida-

de de força consumida (MARTINS, 2008, p. 48).

Ainda segundo Martins (2008), os custos indiretos são aqueles que não permitem

mensuração de forma objetiva, recorrendo-se, quando apropriados aos produtos, às esti-

mativas e aos critérios de rateio, que, geralmente, mostram-se inadequados, imprecisos

e arbitrários.

Para Bruni e Famá (2004, p. 31) os custos diretos ou primários “apresentam a pro-

priedade de serem perfeitamente mensuráveis de maneira objetiva” e os custos indiretos,

por sua vez, “necessitam de aproximações, isto é, algum critério de rateio, para serem

atribuídos aos produtos.”

A outra classificação em custos fixos e variáveis pode ser entendida a partir da rela-

ção entre “o valor total de um custo e o volume de atividade numa unidade de tempo”

(MARTINS, 2008, p. 49). Ou seja, caso o volume de uma determinada atividade aumente

ou diminua, numa determinada unidade de tempo, e o valor total de um determinado

custo permaneça inalterado, tem-se um custo fixo. De modo análogo, se o valor total

acompanhar o movimento da atividade produtiva, tem-se um custo variável. Do ponto de

vista unitário os custos são pseudofixos e pseudovariáveis.

O levantamento dos custos da Miniusina de Óleo de Girassol foi realizado pelos

membros da equipe que trabalham in loco. A primeira abordagem diz respeito aos custos

incorridos independente da ajuda governamental. Levando em consideração o custo da

quantidade total de matéria-prima, efetivamente, consumida na produção de óleo de gi-

rassol, para tanto torna-se necessário realizar o raciocínio descrito na tabela 1.

Tabela 1: Custo da matéria-prima consumida na produção.

Estoque Inicial de Matéria-Prima R$ 1.400,00

(+) Compra de Matéria-Prima R$ 1.150,00

(=) Estoque de Matéria-Prima Disponível para a Produção R$ 2.550,00

(-) Estoque Final de Matéria-Prima R$ 1.150,00

(=) Custo da Matéria-Prima Consumida na Produção R$ 1.400,00

Fonte: elaborada pelos autores.

145Luciano Ferreira de Lima, Roni Antônio Garcia da Silva

e Luciane Aparecida Munhoz Stefano

O custo com a Mão de Obra Direta (MOD) diz respeito ao salário e aos encargos

sociais do funcionário que opera à máquina, média mensal. No que se refere à Energia

Elétrica, observou-se que o custo total foi de R$ 100,00.

Caso a Cooperativa Mista de Produção e Comercialização Camponesa do Paraná

produzisse mais de um produto, os Custos Indiretos por natureza (Aluguel, Materiais

auxiliares, Depreciação, Mão de Obra Indireta, Energia Elétrica e outros custos Indire-

tos) não seriam atribuídos diretamente ao produto óleo de girassol, pois seriam apropria-

dos por meio de algum critério de rateio (custeio por absorção) ou rastreamento (custeio

ABC). No entanto, todos os custos, mesmo aqueles que são, em essência, indiretos, foram,

logicamente, atribuídos diretamente ao produto.

O custo com o aluguel do prédio foi avaliado em função do preço médio cobrado

por instalações semelhantes no município de Porto Barreiro/PR. Pois, cabe lembrar que

a Cooperativa não paga aluguel em decorrência da parceria com a Prefeitura Municipal

de Porto Barreiro/PR.

A Depreciação, segundo Silva (2009, p. 54-56), representa o custo necessário para

substituir os bens de capital quando estes se tornam inúteis pelo desgaste físico (depre-

ciação física) ou quando perdem o valor com o decorrer dos anos devido às inovações

tecnológicas (depreciação econômica ou obsolescência). Neste caso, a depreciação foi

calculada pelo método linear, ou seja, o valor venal/inicial da máquina, menos o valor

residual/final dividido pelo período da sua vida útil. Os outros custos indiretos têm em

grande parte da sua totalidade os custos com manutenção. Os demais custos correspon-

dem aos materiais auxiliares. Sabe-se, de acordo com o levantamento dos custos totais

de produção de óleo de girassol, que, por mês, em média, a miniusina realiza um gasto

na produção de R$ 5.672,93. Todos os custos estão classificados e mensurados moneta-

riamente na tabela 2.

Tabela 2: Estrutura de custos mensal da miniusina de óleo de girassol

Custos DiretosMão-de-obra R$ 1.305,60

Matéria-Prima R$ 1.400,00Custo Direto Total R$ 2.705,60

Custos Indiretos (por definição)Aluguel R$ 400,00

Materiais auxiliares R$ 75,00Depreciação R$ 2.152,33

Mão-de-obra Indireta R$ 0,00Energia Elétrica R$ 100,00

Outros Custos Indiretos R$ 240,00Custo Indireto Total R$ 2.967,33

Custo Total de Produção R$ 5.672,93Fonte: elaborada pelos autores.

No que se refere às despesas, foram observados os seguintes gastos: salário e encargos

sociais do administrador (despesas administrativas) de R$ 1.120,00, bem como frete e

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comissão sobre vendas (despesas comerciais) de R$ 150,00. Não há despesas financeiras,

como, por exemplo, juros pagos ao banco.

Sabe-se que toda a produção média mensal de 6.720 l (seis mil, setecentos e vinte litros)

de óleo de girassol do período foi vendida por R$ 3,50 o litro. De acordo com a tabela 3, po-

de-se visualizar que o Custo Total de Produção é igual ao Custo do Produto Vendido. Uma

vez que não houve estoques inicias de produtos em processo e de produtos acabados.

Tabela 3: Demonstração do custo dos produtos vendidos.

Estoque Inicial de Material Direto R$ 1.400,00(+) Compras de Materiais Diretos R$ 1.150,00

Material Direto Disponível R$ 2.550,00(–) Estoque Final de Materiais Diretos R$ 1.150,00

(=) Material Direto Consumido R$ 1.400,00(+) Mão-de-Obra Direta R$ 1.305,60

(+) Custos Indiretos de Produção R$ 2.967,33CUSTO DA PRODUÇÃO DO PERÍODO (CPP) R$ 5.672,93

(+) Estoque Inicial de Produtos em Elaboração R$ 0,00Custo Total de Produção R$ 5.672,93

(–) Estoque Final de Produtos em Elaboração R$ 0,00CUSTO DA PRODUÇÃO ACABADA (CPA) R$ 5.672,93(+) Estoque Inicial de Produtos Acabados R$ 0,00

Custo dos Produtos Disponíveis R$ 5.672,93(–) Estoque Final de Produtos Acabados R$ 0,00

CUSTO DOS PRODUTOS VENDIDOS (CPV) R$ 5.672,93Fonte: elaborada pelos autores.

Portanto, o Demonstrativo do Resultado do Período pode ser assim representado,

conforme a tabela 4:

Tabela 4: Demonstrativo do resultado do período (livre mercado).

Receita Bruta R$ 23.520,00(-) Tributos (27%) (R$ 6.350,40)

(=) Receita Líquida R$ 17.169,60(-) CPV R$ 5.672,93

(=) Lucro Bruto R$ 11.496,67(-) Despesas Administrativas R$ 1.120,00

(-) Despesas Comerciais R$ 150,00(=) Lucro Operacional R$ 10.226,67

(-) Despesas Financeiras R$ 0,00(=) Lucro Antes do Imposto de Renda (LAIR) R$ 10.226,67(-) Provisão para o Imposto de Renda (15%) R$ 1.534,00

(=) Lucro Líquido R$ 8.692,67Fonte: elaborada pelos autores.

Apurando-se a receita bruta, todos os custos de produção, as despesas administra-

tivas e comerciais e a incidência dos tributos, bem como a provisão para o imposto de

renda, obtém-se o lucro líquido de R$ 8.692,67, ou seja, uma margem líquida de, aproxi-

madamente, 50,63%.

147Luciano Ferreira de Lima, Roni Antônio Garcia da Silva

e Luciane Aparecida Munhoz Stefano

Por outro lado, com o auxílio governamental das três esferas (municipal, estadual e

federal), que a Cooperativa Mista de Produção e Comercialização Camponesa do Paraná

recebe, pode-se diminuir consideravelmente o Custo do Produto Vendido, o que impac-

tará sobremaneira o resultado do período, de acordo com a tabela 5.

Tabela 5: Demonstração do custo dos produtos vendidos (com ajuda governamental).

Estoque Inicial de Material Direto R$ 1.400,00(+) Compras de Materiais Diretos R$ 1.150,00

Material Direto Disponível R$ 2.550,00(–) Estoque Final de Materiais Diretos R$ 1.150,00

(=) Material Direto Consumido R$ 1.400,00(+) Mão-de-Obra Direta R$ 1.305,60

(+) Custos Indiretos de Produção R$ 415,00CUSTO DA PRODUÇÃO DO PERÍODO (CPP) R$ 3.120,60

(+) Estoque Inicial de Produtos em Elaboração R$ 0,00Custo Total de Produção R$ 3.120,60

(–) Estoque Final de Produtos em Elaboração R$ 0,00CUSTO DA PRODUÇÃO ACABADA (CPA) R$ 3.120,60(+) Estoque Inicial de Produtos Acabados R$ 0,00

Custo dos Produtos Disponíveis R$ 3.120,60(–) Estoque Final de Produtos Acabados R$ 0,00

CUSTO DOS PRODUTOS VENDIDOS (CPV) R$ 3.120,60Fonte: elaborada pelos autores.

O Custo Indireto Total, em uma situação real de economia de mercado seria de R$

2.967,33, com o auxílio governamental deduz-se desse valor R$ 400,00 correspondente ao

aluguel, visto que o estabelecimento industrial foi cedido pela Prefeitura de Porto Bar-

reiro/PR sem ônus, bem como a depreciação de R$ 2.152,33, pois a máquina pertence à

Prefeitura de Porto Barreiro/PR. As despesas administrativas são pagas com recursos de

programas federais, de modo indireto.

O Demonstrativo do Resultado do Período, com ajuda governamental, está represen-

tado na tabela 6, abaixo:

Tabela 6: Demonstrativo do resultado do período (com ajuda governamental).

Receita Bruta R$ 23.520,00(-) Tributos (27%) (R$ 6.350,40)

(=) Receita Líquida R$ 17.169,60(-) CPV R$ 3.120,60

(=) Lucro Bruto R$ 14.049,00(-) Despesas Administrativas R$ 0,00

(-) Despesas Comerciais R$ 150,00(=) Lucro Operacional R$ 13.899,00

(-) Despesas Financeiras R$ 0,00(=) Lucro Antes do Imposto de Renda (LAIR) R$ 13.899,00(-) Provisão para o Imposto de Renda (15%) R$ 2.084,85

(=) Lucro Líquido R$ 11.814,15Fonte: elaborada pelos autores.

148 Lógica formal versus lógica dialética: análise de custos na Cooperativa Mista de Produção e Comercialização Camponesa do Parará

Logo, pode-se verificar por meio das demonstrações contábeis/gerenciais, anterior-

mente realizadas, que trabalhando na capacidade máxima de produção mensal, do pro-

duto óleo de girassol, obtém-se lucro, tanto numa competição de livre mercado, quanto

com incentivo governamental. Na tabela 7, abaixo, observa-se a variação de lucro das duas

alternativas de produção.

Tabela 7: Variação das Alternativas de Produção.

Livre Mercado Ajuda Governamental Variação (%)CPV R$ 5.672,93 R$ 3.120,60 (44,99)

Despesas Administrativas R$ 1.120,00 R$ 0,00 (100)Lucro Líquido R$ 8.692,67 R$ 11.814,15 35,91

Fonte: elaborada pelos autores.

5. A contradição dialética

A contradição na lógica do pensar formal refere-se ao oposto, ou seja, quando a va-

riável A sofre a contradição/negação torna-se Não A, logo A e Não A são completamente

diferentes, assim como verdadeiro e falso. Na lógica do pensar dialética A e Não A fazem

parte do mesmo movimento, a contradição da variável A leva a um novo estado no qual A

e Não A coexistem, portanto o movimento em espiral tese – antítese – síntese leva a uma

nova variável A, que não pode ser totalmente nova porque traz características da antiga.

Como exemplo, pode-se citar a transformação da água em vapor de água, por meio da

contradição, aumento da temperatura acima de 100° Celsius, a água torna-se vapor de

água, ou seja, muda do estado líquido para o estado gasoso mantendo algumas proprie-

dades do antigo estado líquido.

No que se refere à análise de custos do produto óleo de girassol da Coopera-

tiva Mista de Produção e Comercialização Camponesa do Paraná, pode-se inferir

que o entendimento dos camponeses sobre o processo produtivo, dos seus tempos e

movimentos, dos seus gastos, bem como das técnicas de apropriação, mensuração e

demonstração dos custos, das despesas, dos tributos, do imposto de renda e dos resul-

tados, leva-os a uma nova forma de pensar e de agir, baseada nos processos e técnicas

capitalistas. Isso, no entanto, não transforma por completo o modo de vida campo-

nês, pois a cultura, a tradição, os costumes, os valores e o amor pelo campesinato faz

com que muitas características sejam mantidas, surgindo, assim, um novo camponês,

o camponês capitalista.

A contradição supramencionada, de natureza dialética, demonstra, de certo modo,

que mesmo na perspectiva ideológica ocorrem mudanças significativas, uma vez que, a

subsistência sendo a base da discussão teórica e do devir prático, conduz a novas reflexões

acerca do modo de produção capitalista, sendo este estudado, compreendido, melhorado

149Luciano Ferreira de Lima, Roni Antônio Garcia da Silva

e Luciane Aparecida Munhoz Stefano

e incorporado. Logo, a contradição dialética evidencia-se por meio da espiral: tese (modo

de produção e vida camponês) – antítese/contradição (necessidade da geração de renda

adicional a existente) – síntese (camponês capitalista).

6. Considerações finais

O pequeno agricultor camponês, com o incentivo governamental, organiza-se cole-

tivamente e absorve as técnicas contemporâneas de produção, de gestão e de comercia-

lização. Demonstra a capacidade de construir saberes interdisciplinares e resiste à lógica

de mercado capitalista, transformando matéria-prima em capital com menor intensidade

da racionalização produtiva. Todavia, ao interferir no modo de produção capitalista, tem

sua compreensão acerca da realidade objetiva alterada em função dos processos e técnicas

incorporadas ao seu cotidiano.

A contradição dialética leva ao devir, ao novo, que não é totalmente novo porque

traz características do antigo. O camponês não perde suas características de homem do

campo, que possui dedicação à família e à terra, mas adquire novos conhecimentos e

habilidades, por meio do envolvimento nos modernos processos de produção, comercia-

lização e distribuição, que lhe possibilitam aumentar a renda e, principalmente, manter

sua propriedade, os traços culturais e a história de luta e resistência.

A apuração dos custos permite à Cooperativa maior eficiência na utilização dos re-

cursos, bem como precificar seus produtos de acordo com o esforço total de produção. A

partir do conhecimento da estrutura de custos de todos os produtos pode-se aumentar ou

diminuir a margem de lucro por produto conforme as necessidades impostas pelo merca-

do, o que, de certo modo, torna a Cooperativa mais competitiva.

Por meio do levantamento de custos realizado na Miniusina de Óleo de Girassol de

Porto Barreiro/PR, pode-se ratificar a viabilidade econômico-financeira do empreendi-

mento. Uma vez que, utilizando a capacidade máxima da máquina durante um período

de 21 (vinte e um) dias úteis por mês observa-se a produção, aproximada, de 6.720 l (seis

mil, setecentos e vinte litros) de óleo de girassol, os quais podem ser comercializados a R$

3,50/litro, perfazendo R$ 23.520,00 de Receita Bruta. Após a dedução dos tributos, custos,

despesas e imposto de renda, obtém-se um Lucro Líquido de R$ 11.814,15.

Além das observações acerca da contradição dialética e dos estudos relatados neste

escrito, foram realizados, pela equipe que integra o Projeto de Extensão do Programa

Estadual Universidade Sem Fronteiras desenvolvido na Cooperativa Mista de Produção e

Comercialização Camponesa do Paraná, o estudo do mercado em Laranjeiras do Sul e re-

gião, a elaboração das embalagens, o estudo de alguns elementos de marketing, bem como

está em andamento a construção do planejamento estratégico da referida cooperativa.

O crescimento da Cooperativa dá-se de forma acelerada, pois a gama de produtos aumenta

a cada dia. Cabe ressaltar que a sobrevivência de qualquer empreendimento depende de pla-

150 Lógica formal versus lógica dialética: análise de custos na Cooperativa Mista de Produção e Comercialização Camponesa do Parará

nejamento, organização, direção e controle. Os estudos e os trabalhos realizados nas áreas de

custos, marketing e estratégia constituem fator de fundamental importância para o futuro da

Cooperativa, pois fornecem informações a respeito do mercado potencial, bem como de carac-

terísticas internas, pontos fortes e fracos, inerentes aos gastos do processo produtivo do óleo

de girassol, à divulgação dos produtos, melhor disposição das informações nas embalagens,

identificação da missão, visão, valores e objetivos para o curto, o médio e o longo prazo.

7. Referências

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assentados de Abelardo Luz/SC. Florianópolis, 2008. Dissertação (Mestrado em Agroecossistemas) –

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