Interação, Discurso e Espaço Público em Ambiente Digital

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Interação, Discurso e Espaço Público em Ambiente Digital Adriano D. Rodrigues (FCSH da UNL) a Adriana A. Braga (PUC-Rio) b Resumo: Neste artigo, a partir de uma perspectiva interacional de Espaço Público, propomos uma leitura genealógica desta noção, fazendo intervir o funcionamento da memória da sociabilidade, para abordar a dicotomia público / privado a partir de uma perspectiva etnometodológica. Buscamos, deste modo, compreender os métodos utilizados pelas pessoas para a Licenciado em Sociologia e doutor em Comunicação. Professor Catedrático emérito da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Autor de vários livros, entre eles Estratégias da Comunicação (Presença, 2001, 3ª ed.), Comunicação e Cultura (Presença, 2010, 3ª ed.), A Partitura Invisível (Colibri, 2005, 2ª ed.) e O Paradigma Comunicacional (Calouste Gulbenkian, 2011). Email: [email protected] b Doutora em Ciências da Comunicação e graduada em Psicologia. Professora do Programa de Pós Graduação em Comunicação Social da PUC-Rio. Pesquisadora do CNPq. Autora dos livros Personas Materno- Eletrônicas (Ed. Sulina, 2008) e CMC, Identidades e Gênero (Ed.UBI, 2005). Email: [email protected] 1

Transcript of Interação, Discurso e Espaço Público em Ambiente Digital

Interação, Discurso e Espaço Público emAmbiente Digital

Adriano D. Rodrigues (FCSH da UNL)a

Adriana A. Braga (PUC-Rio)b

Resumo:Neste artigo, a partir de uma perspectiva interacional

de Espaço Público, propomos uma leitura genealógica desta

noção, fazendo intervir o funcionamento da memória da

sociabilidade, para abordar a dicotomia público / privado a

partir de uma perspectiva etnometodológica. Buscamos, deste

modo, compreender os métodos utilizados pelas pessoas para

a Licenciado em Sociologia e doutor em Comunicação. Professor

Catedrático emérito da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da

Universidade Nova de Lisboa. Autor de vários livros, entre eles

Estratégias da Comunicação (Presença, 2001, 3ª ed.), Comunicação e Cultura

(Presença, 2010, 3ª ed.), A Partitura Invisível (Colibri, 2005, 2ª ed.)

e O Paradigma Comunicacional (Calouste Gulbenkian, 2011). Email:

[email protected] Doutora em Ciências da Comunicação e graduada em Psicologia.

Professora do Programa de Pós Graduação em Comunicação Social da

PUC-Rio. Pesquisadora do CNPq. Autora dos livros Personas Materno-

Eletrônicas (Ed. Sulina, 2008) e CMC, Identidades e Gênero (Ed.UBI,

2005). Email: [email protected]

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constituírem a distinção do espaço público, observando como

a concretizam nos seus comportamentos na vida cotidiana,

tomando como material empírico de observação mensagens

veiculadas em ambientes de Internet. Particularmente,

assumem relevo 1. os processos referenciais pelos quais as

pessoas negociam a formação dos mundos que se convertem em

objetos de troca, de partilha e de ação coletiva; 2. os

pressupostos que formam os quadros ou as fronteiras que

delimitam, tanto os consensos, como os dissensos. A este

propósito observamos a importância do dispositivo de

categorização, dispositivo de negociação da referência que

determina de maneira evidente a constituição do espaço

público.

Palavras-chave: ambiente digital, público, privado,

etnometodologia, discurso.

Para uma abordagem genealógica do espaço

públicoNeste artigo, depois de propormos uma leitura

genealógica do espaço público, fazendo intervir o

funcionamento da memória da sociabilidade, pretendemos

abordar as noções público / privado a partir de uma

perspectiva etnometodológica. Buscamos, deste modo,

compreender os métodos utilizados pelas pessoas para

constituírem a distinção do público e do privado, observando

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como a concretizam nas suas práticas na vida cotidiana,

tomando como material empírico de observação comentários

veiculados em ambientes de Internet.

A nossa abordagem demarca-se tanto da perspectiva

estrutural-funcionalista como da teoria crítica,

nomeadamente da que é apresentada por Hannah Arendt, em

1958, e por Jürgen Habermas, em 1962, perspectivas que

costumam ser adotadas por autores/as que, nos últimos 60

anos, têm procurado compreender as categorias do público e

do privado nas ciências sociais. Na nossa perspectiva não

consideramos estas categorias de maneira substantiva, como

se referissem espaços ou esferas delimitadas por fronteiras

precisas, mas as vermos como dimensões relativas da

experiência coletiva, com as quais as pessoas lidam

constantemente, em função da natureza dos quadros em que

localmente situam suas interações. É por isso que um mesmo

comportamentoc

pode ser considerado ora público, num quadro interacional,

ora privado, noutro quadro interacional. Fazemos nossa a

distinção que John Dewey fazia entre público e privado num

texto de 1927, entre ações que provocam consequências apenas

nas pessoas envolvidas nessas ações e ações que têm

consequências indiretas, para além dessas pessoas. c Damos aqui um sentido lato ao termo comportamento, uma vez que

consideramos como comportamento tanto um gesto, a realização de

uma tarefa, como um discurso. Quando for necessário,

distinguiremos comportamento verbal e comportamento não verbal.

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Tomamos então nosso ponto de partida do fatoobjetivo que as ações humanas têm consequênciassobre os outros, que algumas dessasconsequências são percebidas e que a percepçãodelas leva a um esforço posterior para controlara ação a fim de garantir algumas consequências eevitar outras. Seguindo essa pista, somoslevados a notar que as consequências são de doistipos, aquelas que afetam as pessoas diretamenteenvolvidas em uma transação e aquelas que afetamoutras além daquelas diretamente envolvidas.Nessa distinção encontramos o germe da distinçãoentre público e privado. Quando consequênciasindiretas são reconhecidas e há um esforço pararegulá-las, algo que se assemelha a um Estadoganha existência. Quando as consequências de umaação são restringidas principalmente às pessoasdiretamente envolvidas nelas, a transação éprivada (DEWEY, 1927)

Como vemos, não podemos identificar o público com o

social, porque

o público consiste em todos aqueles que sãoafetados pelas consequências indiretas dastransações a tal ponto que se consideranecessário ter essas consequências tratadassistematicamente. Os agentes públicos sãoaqueles que cuidam dos interesses assim afetadose protegem (DEWEY, 1927).

Também não podemos identificar o público com o Estado,

uma vez que é o público que constitui o Estado como garantia

da regulação das interações públicas das pessoas entre si.

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Gostaríamos, por conseguinte, de chamar a atenção para o

fato de, ao contrário do que muitas vezes se defende, a

fundação ou a constituição do espaço público não ser da

responsabilidade das estruturas, dos sistemas sociais, do

Estado ou das mídias. Como já Gabriel Tarde sublinhava em

1901, o espaço público foi desde sempre constituído pelas

redes difusas e permanentes das interações que as pessoas

estabelecem entre si e em que se envolvem

conversacionalmente de maneira espontânea nos mais variados

quadros da vida cotidiana. Procuramos assim mostrar, a

partir do estudo de materiais oriundos de ambientes

digitais, que aquilo que hoje a internet permite realizar

não é mais do que a tecnicização dessas redes espontâneas de

interação que, desde sempre, estiveram na origem da formação

do público.

Propomos a hipótese de que as diferentes configurações

que a esfera pública foi apresentando ao longo do tempo são

cristalizações historicamente instituídas das redes

espontâneas de interação, que sobrevivem hoje entrelaçadas

umas nas outras, de maneira particularmente complexa, no

imaginário das pessoas. É por isso que achamos importante

começar por recordar a génese de algumas dessas

configurações.

A agora ateniense, a praça do mercado, é habitualmente

considerada a instituição fundadora do espaço público. A

agora era o espaço que, a partir das reformas de Sólon, no

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século V a. C., os Gregos destinavam ao exercício da

cidadania plena, definida pela livre discussão pelos

cidadãos livres, pelos eleuteroi, das questões relevantes para

a organização da vida coletiva da cidade, da polis. Enquanto

espaço de visibilidade, opunha-se aos espaços privados onde

decorria a vida doméstica, onde as mulheres, as crianças e

os escravos estavam subordinados às decisões do pai de

família, do oikodespostes. Essa configuração do espaço público

chegou até nós através da instituição romana da dicotomia

entre público e privado. Embora a agora ateniense e o forum

romano fossem os espaços públicos por excelência,

contrapostos ao espaço privado do oikos grego e da domus

romana, o domínio público estendia-se também às vias, ao

teatro e aos templos, enquanto espaços não reservados, mas

abertos a todos os cidadãos livres. Era nesses espaços de

visibilidade que cada um procurava imortalizar o seu nome

através do exercício da retórica, da lexis e da práxis, quer

das artes quer dos feitos militares.

Na baixa Idade Média, a partir do século VIII, depois

do período conturbado das invasões bárbaras, formou-se uma

nova configuração de espaço público em torno dos palácios. O

palácio era o espaço da notoriedade pública, definido

enquanto espaço da representação do poder dada em

espetáculo, em festas organizadas e apresentadas à

contemplação do povo. Esta publicidade da representação

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terá, nos séculos XVII e XVIII, no barroco e no rococó, a

sua expressão estética mais evidente.

É contra esta modalidade de espaço público que, a

partir do século XIII, assistimos ao progressivo

aparecimento de uma nova configuração de espaço público, sob

a influência crescente da burguesia, formada sobretudo por

comerciantes letrados que habitavam os burgos. É esta nova

configuração de público que está na origem daquilo a que

Jürgen Habermas vai dar o nome de esfera pública burguesa. O

público deixa de ser apenas a designação de espaços de

visibilidade e de notoriedade para passar a ser um ideal de

livre discussão e de crítica. Para o surgimento e o

desenvolvimento desta nova configuração do público

contribuiu evidentemente o aparecimento da imprensa como

dispositivo, ao mesmo tempo, de constituição e de

disseminação da crítica e de formação da opinião pública

esclarecida. As realizações históricas mais evidentes desta

configuração ocorrem, no sec. XVII, em Inglaterra, com o

Revolução Gloriosa, que culminou com a instituição da

Monarquia Constitucional, e, no final do sec. XVIII, com a

Revolução Francesa, que levou ao derrube do Antigo Regime e

à implementação das democracias parlamentares. À vontade do

soberano, a publicidade burguesa contrapunha agora os

imperativos da razão como fundamento do poder. As decisões

vinculativas passavam a ser formadas a partir dos consensos

obtidos a partir da livre discussão racional dos cidadãos

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esclarecidos. É por isso que a democracia burguesa não

compreendia o conjunto da população, mas apenas os homens

que faziam profissão de ser conduzidos pelos ditames da

razão esclarecida, sendo por isso excluídos, não só o povo

iletrado e as mulheres, mas os homens sem poder económico

nem propriedade própria, sobre a qual detivessem domínio

privado.

Importa ainda realçar que é também, no quadro da

configuração burguesa da publicidade, que surge uma nova

concepção do espaço privado, enquanto espaço de intimidade,

dando livre expressão aos sentimentos e aos impulsos do

coração de que o aparecimento dos diários íntimos e das

relações epistolares são as manifestações mais eloquentes. O

surgimento, no século XVIII, do romance enquanto literatura

destinada à exposição ficcional do sujeito representa, neste

quadro, uma nova concepção das relações amorosas. O próprio

espaço doméstico sofre profundas alterações arquitetônicas,

de maneira a subtrair aos olhares e à frequentação de

estranhos e dos convivas os quartos, espaços reservados à

intimidade do casal.

A partir da segunda metade do século XIX, à medida que

a organização industrial do trabalho ia sendo implementada e

que surgia a imprensa de massa, uma nova configuração do

público ia sendo constituída. É neste novo quadro que o

termo publicidade adquire o sentido que hoje conhecemos, de

promoção de produtos e de ideais. O público converte-se

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assim em audiência consumidora das mídias e dos produtos por

elas promovidos. Com esta viragem, é o ideal da livre

discussão e da crítica que é posto em crise. O público, de

sujeito de uma opinião esclarecida, torna-se alvo ou objeto

da publicidade. A esta transformação do público não se

vislumbram ainda hoje novas formas alternativas organizadas

de expressão da esfera pública, a não ser aquela que passam

a revelar as sondagens de opinião, embora se assista ao

ensaio de novas modalidades de irrupção da esfera pública

nas manifestações de uma multiplicidade de movimentos

sociais, mobilizados pelas mais variadas reivindicações. As

sondagens de opinião convertem-se, assim, em instrumentos de

marketing, procurando mais conhecer as tendências de consumo

do público, tendo em vista a eficácia estratégica da

publicidade para a venda de produtos e a inculcação de

ideias, do que o conhecimento das opiniões de cidadãos/ãs

com vista à obtenção de consensos e à formação de uma

vontade política esclarecida.

A partir de meados dos anos 80 do século passado, com

as novas técnicas da informação e a implementação das redes

sociais digitais, uma nova configuração da publicidade tem

vindo a ser implantada. A principal característica desta

nova configuração é a autonomia da esfera pública em relação

às fronteiras nacionais, no âmbito das quais, até então,

estava confinada. Movimentos feministas, gay, pela

despenalização e legalização do aborto, contra a

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austeridade, em favor de toda a espécie de minorias,

ecologistas, contra o G7, antiglobalização atravessam

fronteiras, constituem solidariedades e mobilizam pessoas

dos diversos continentes. Estas novas formas de

solidariedade transnacional fazem-se e desfazem-se quase

instantaneamente nas redes sociais, aparentemente fora de

qualquer enquadramento instituído. Alguns/as autores/as

consideram estarmos perante o advento de novas modalidades

de democracia participativa, enquanto outros identificam

estes movimentos como perca do sentido do território de

enraizamento da experiência, entendendo esta perca como

retorno a modalidades arcaicas de nomadismo (Meyrowitz

1985).

Uma característica das transformações ocorridas nestas

últimas décadas com a generalização dos novos dispositivos

midiáticos e dos ambientes eletrônicos, que costuma ser

indicada, se relaciona com a fragmentação da esfera pública.

Para nós, esta fragmentação não é senão a consumação técnica

de uma das características da experiência moderna. Neste

sentido, não são as redes sociais que a provocam; é antes a

natureza fragmentada da experiência moderna, a natureza

orgânica da solidariedade, que a provoca e que torna

possível tanto a invenção técnica de ambientes eletrônicos,

como a generalização do seu uso. Cada uma das configurações

da esfera pública historicamente realizadas, que acabámos de

apresentar resumidamente, também decorreram de processos de

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fragmentação da esfera pública anterior. Nos materiais que

analisámos, podemos observar hoje um novo processo de

cristalização da experiência fragmentada atual, processo que

faz antever a possibilidade de se constituírem no futuro

novas configurações. Nas interações que ocorrem na internet

podemos observar o esforço de criação de novos princípios

reguladores que enquadrem as consequências dessas

interações, ora potenciando aquilo que é entendido, ora como

positivo e favorável, ora como negativo ou nefasto ao

interesse comum.

Os materiais que analisamos foram retirados de

ambientes de Internet. A nossa intenção foi observar a

maneira como as pessoas se apropriam dos dispositivos

eletrônicos, procurando identificar os dispositivos

interacionais que mobilizam nas suas práticas e as

configurações de esfera pública que resultam destas

práticas. Mas, antes de apresentarmos a nossa análise, uma

breve apresentação da metodologia que seguimos.

Para uma abordagem interacional da esfera

públicaGostaríamos de começar por sublinhar a natureza

interacional da constituição da esfera pública, o fato de o

público resultar dos processos de formação do mundo comum

mútua e reciprocamente partilhado. Neste sentido, assumem

particular relevo 1. os processos referenciais pelos quais

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as pessoas negociam, no decurso das suas interações, a

formação dos mundos de que falam e que se convertem assim em

objetos de troca, de partilha e de ação coletiva; 2. os

pressupostos que formam os quadros ou as fronteiras que

delimitam, tanto os consensos, como os dissensos e as

discussões. Particular relevo merece a estrutura

preferencial da organização dos turnos de fala, pela qual

coordenam constantemente as suas interações.

Com esta abordagem, pretendemos levar a sério a

definição que, já em 1901, Gabriel Tarde dava de público:O público é uma multidão dispersa, em que a influência dos espíritosuns sobre os outros se tornou uma ação à distância, a distâncias cadavez maiores. Enfim, a Opinião, que resulta de todas estas ações àdistância ou em contato, está, de algum modo, para as multidões epara os públicos o que o pensamento é para o corpo. E se, entre estasações de que ela resulta, procuramos qual é a mais geral e a maisconstante, apercebemo-nos sem dificuldade que é esta relação socialelementar, a conversação, completamente negligenciada pelossociólogos (Tarde, 2006: 06)

Ao recordarmos esta definição de público proposta por

Gabriel Tarde, entendemos que a conversação é a “relação

social elementar” que constitui o público. É desta relação

social elementar que as relações sociais midiatizadas se

alimentam e nela que se consumam.

Um dispositivo importante, responsável pela

constituição da esfera pública, é o da negociação da

referência, tendo em vista a formação do mundo comum. Por

mundo comum entendemos o conjunto dos objetos, das pessoas,

dos acontecimentos, dos estados dos objetos acerca dos

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quais, não só podem concordar, discordar, mas sobretudo

discutir e formular posições divergentes. O mundo comum

forma assim todo o conjunto dos pressupostos aceites como

indiscutíveis daquilo que podem dizer e fazer, dos

enunciados e das ações que partilham e realizam em conjunto.

A este propósito, podemos formular como hipótese que o

espaço público é em grande medida constituído, não por

aquilo que as pessoas dizem e por aquilo que fazem, mas pelo

conjunto dos pressupostos que tornam possível, tanto dizer e

fazer aquilo que dizem ou fazem.

A este propósito gostaríamos de realçar a importância

de um dos dispositivos da negociação da referência porque

determinam de maneira evidente a constituição do espaço

público: o dispositivo de categorização. Por dispositivo de

categorização entendemos, na sequência de Harvey Sacks, a

escolha das categorias pelas quais são identificadas as

referências (Sacks 1992, 68-71, 597-600; Schegloff 2007). Os

títulos da imprensa oferecem excelentes exemplos do

funcionamento deste dispositivo:

(1) Sete polícias suspeitos de corrupção (Correio

da Manhã 26.6.2013).

(2) Matemática não satisfaz docentes (Ibid.)

(3) Espanhol de 53 anos usava namorada de 14 para traficar

droga (Jornal de Notícias, 9.7.2013)

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Em (1), suspeitos de corrupção podem ser identificados por

todo um conjunto de categorias. Podem ser homens ou

mulheres, jovens ou adultos, polícias de baixa ou alta

patente, residentes na cidade ou no campo, atletas ou não

atletas, afiliados ou não afiliados a um partido político,

altos ou baixos, e assim por diante. Ao escolher identificar

como sete polícias os suspeitos de corrupção, o título desencadeia

processos inferenciais diferentes dos que desencadearia se

utilizasse qualquer das outras categorias, mobilizando os

pressupostos dos saberes que as pessoas associam à categoria

profissional “polícias”, nomeadamente o pressuposto de que

os polícias são agentes responsáveis pelo combate à

corrupção. Deste modo, o que torna notável a notícia é o

fato de serem os próprios agentes responsáveis pelo combate

à corrupção que são suspeitos de corrupção. Em (2), é

acionado o pressuposto de que os docentes, que constituem a

categoria responsável pelo ensino da matemática, para tornar

notável a notícia de que são eles próprios que estão

insatisfeitos pelos resultados dos exames de matemática dos

alunos. Em (3), é acionado o pressuposto de que um espanhol

de 53 anos deve cuidar do comportamento de uma jovem de 14

anos, para tornar notável a notícia tanto do seu

envolvimento amoroso com essa jovem como da sua utilização

para tráfico de droga. Deste modo, o dispositivo referencial

destes títulos da imprensa constitui e encena os públicos

14

dos polícias, dos corruptos, dos docentes, dos alunos de

matemática, dos adultos, dos traficantes de droga.

Uma das características da experiência moderna consiste

na diferenciação do espaço público, em função do processo de

fragmentação dos diferentes domínios da experiência numa

multiplicidade de campos e da autonomização dos diferentes

dimensões da experiência (Rodrigues, 2011). Cada uma das

pessoas pode assim assumir em diferentes situações uma

multiplicidade de identidades, de acordo com exigências

diferentes e por vezes divergentes. Por seu lado, nem sempre

os juízos positivos acerca de uma proposição são

convergentes com os juízos positivos acerca da sua bondade

ou da sua beleza, gerando-se assim uma conflitualidade

insanável na partilha do mundo comum.

No quadro da experiência moderna, ao contrário do que

podemos observar no quadro da experiência tradicional, as

relações de solidariedade ultrapassam o âmbito do território

de pertença e deixam de abranger o conjunto dos domínios da

experiência. As pessoas estabelecem relações de

solidariedade com uma grande diversidade de públicos,

consoante os domínios da experiência em que situam os seus

comportamentos. A esta multiplicidade de relações de

solidariedade dava Emile Durkheim o nome de solidariedade

orgânica (Durkheim, 1991). Cada um de nós faz parte de

públicos muito diversificados, estabelecendo com cada um

formas de solidariedade distintas decorrentes de modalidades

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diferenciadas de reconhecimento. Podemos ser solidários com

os nossos colegas de trabalho, com as pessoas que pertencem

a um partido político, com os frequentadores de um clube

desportivo, com os membros de uma associação filantrópica,

com os cidadãos do nosso país. Cada uma destas relações de

solidariedade forma públicos distintos, porque em cada uma

delas, nos reconhecemos diferentes, adotamos comportamentos

diferentes, somos reconhecidos como parceiros de interesses

e de visões do mundo próprios que são comuns aos seus

membros, possuímos conjuntos de marcas simbólicas próprias

que partilhamos com os membros de uma grande diversidade de

públicos diferentes.

A consumação do processo de constituição da natureza

orgânica da solidariedade que vivemos hoje torna

problemática a exigência do reconhecimento mútuo e

recíproco. Antes de mais porque o reconhecimento se tornou

um valor relativo. Podemos nos reconhecer e ser

reconhecidos, por exemplo, como membros do público

académico, ser reconhecidos pelos nossos colegas e

reconhecer os que partilham conosco a mesma profissão e não

nos reconhecermos nem ser reconhecidos no mundo político, no

mundo econômico ou no mundo desportivo. A nossa opinião pode

ser escutada e respeitada por um dos públicos em que nos

envolvemos e ser completamente ignorada por outros.

A natureza fragmentária da experiência moderna

decorrente da especialização dos seus diferentes domínios

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agudiza as dificuldades de definição do bem comum e do

interesse geral, entendidos como resultado daquilo que as

pessoas particulares ou associadas nos diferentes campos

entendem ser o bem comum e o interesse geral. A partir do

momento em que o público se torna a instância legítima,

torna-se cada vez mais difícil satisfazer os interesses de

cada um e definir aquilo que é o bem comum. Como um exemplo,

podemos citar uma pesquisa realizada pelas organizações

Globo sobre as matérias mais acessadas em seu jornal on-

line. Nenhuma das dez matérias mais procuradas era composta

por notícias sobre economia ou política, por exemplo, mas

por temas como bizarrices, futebol ou telenovelas. Os

trending topics do Twitter, em levantamento recente

(Vasconcelos, 2013), mostram tendência similar. Isto é, a

diferença entre ‘interesse público’ e ‘interesse do

público’, tão cara ao jornalismo, continua uma questão

problemática atual.

Esta dificuldade aumenta se tivermos em conta que

muitas das decisões a tomar no presente têm consequências no

futuro que, não só é impossível apreciar devidamente, mas

para as quais é difícil mobilizar os interesses atuais do

público. Uma das maneiras mais interessantes de observar a

maneira como lidamos com esta multiplicidade de públicos e,

por conseguinte, de domínios de reconhecimento é observar os

dispositivos de categorização de pertencimento que as

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pessoas mobilizam no quadro das interações em que se

envolvem.

Um bom exemplo da utilização de categorizações de

pertencimento como mecanismos de distinção é a categoria

‘salsinha’. Criada pelo blogueiro Carlos Cardoso, trata-se

de uma categoria de acusação. Uma boa introdução ao tema

pode ser a seguinte série de definições, obtida no site

Yahoo Respostas:

 O que é uma pessoa "salsinha"?  

putz, ou eu tô ficando velha ou a gíria é muito nova...

1. Querida é um termo usados pelos editores do Meio Bit parachamar, ao mesmo tempo, em uma só palavra, um indivíduo de:estúpido, ignorante, imbecil, apedeuta, burro, anta, mané, baixoQI, bucéfalo e sem bom senso. Uma pessoa indigna de serconsiderada um Homo sapiens sapiens.  

2. O termo salsinha, especificamente, foi cunhado por umsujeito chamado Cardoso. Ele afirmou que num EEG, 90% dos usuáriosde Internet não teriam ondas diferentes de uma salsinha.  

3. Para mim é uma pessoa igual a um enfeite, sem grandeconsistência, é pouco apreciada por seu valor real. Coloca-se nocentro dos grupos, linda, novinha e só se percebe inutil ao serdeixada a um canto, jogada fora. Porém, é junto aos descartadosque tem a chance de se transformar. Pobres e famintos, osdesvalidos, disputam seu frescor.

O blog Meio Bit, referido na primeira resposta, é

mantido por Carlos Cardoso, referido na segunda. Trata-se de

um blog dedicado a assuntos de tecnologia computacional,

programação e novidades do mundo da TI. Um espaço para

experts, prestigiado na blogosfera e bastante frequentado, o

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que se reflete em um altíssimo número de acessos. (sobre

este tema, v. Figueiredo, 2013). Neste meio, Cardoso é

célebre por sua verve ferina e comentários mordazes. Um de

seus alvos preferidos é justamente a figura do “salsinha”,

um termo criado por ele para descrever o visitante ingênuo

que, ao comentar os textos publicados em blogs, manifesta

seu desconhecimento sobre tecnologia, e é sistematicamente

alvo do deboche de Cardoso e seus followers, como nos exemplos

a seguir:

1. Apareceu a maior salsinha de todos os tempos.Um tal de Eugenio D angelo, passou pelo Blog do Opera Brasil edeixou um comentário que estou até agora tentando entender ondecomeça e termina, e o que ele quer com aquele comentário.

“… Esta dificil de conviver com esses O.S. obtusos, oWindows precisa de Hard Disk ! Que porcaria ! Eu jah mandei E-mailpara aquele dinossauros da Microsoft e a atençao que eu tive delesfoi zero !

NHAAAAAC ! Comi o rabo deles e eles nao sentiram que o rabodeles perdeu a ponta, pois foi abocanhado com uma dentada eseparado do resto da cauda, e eles, o cerebro daquelaentidade/organismo primitivo ainda nao percebeu ! O que eu dissepara eles ? Que era para fazerem uma versão para celulares daquelewindows e que rodasse compativelmente com os demais… nada ! Nãoescutam ! O Cérebro desse dinossauro nao capta o estimulo ! Jahfalei para eles façam um Windows mais Leve, que nao precise deHard Disk que rode num NETBOOK …” 2. Elas estão se espalhando mesmo…

Entrei no link e realmente é impossível entender o que eleestá falando… parece que ele foi picado por um Stallman radioativoraivoso usando LSD e geneticamente manipulado…Onde podemos encontrar um herbicida adequado????Fthang! 3. WORNING! É a invasão das salsinhas assassinas radioativas doespaço, ou o Gokernel deu cria. }:)

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4. Po, coitado do piá! Ao menos, pela foto, ele deve ter no máximo12 anos 

5. Essas crianças de hoje em dia estão cada vez mais sapequinhas 6. Na hora eu ri tanto, que soltei palavrão, escrevi de qualquerjeito e quase que sai um momento salsinha meu, também. 

7. meodelz… de onde sai uma criatura infernal dessas? Deve seralgum recém migrado do Konqueror. Pow… não cola(resume)/linkadireto(usa o tinyurl) essas as coisas aqui, vai atrair ele paracá.  8. Meu chute: o cara está decepcionado com peso do Vista e querque a MS faça uma coisa mais leve, que possa inclusive rodardireito em discos flash que vêm em netbooks mais baratos.

9. Só que ele precisou de mais de 1000 palavras para falar isso.

10. Só para posicioná-los… Eu parei de ler nos updates de 15 deSetembro!!! E O CARA CONTINUA LAH! :jawdrop:

Queria descobrir o mail desse cara…

No caso acima, podemos fazer algumas inferências sobre

o ‘salsinha’ em questão. Ele provavelmente é um adolescente,

que evidenciou seu desconhecimento sobre TI em uma longa

pergunta (‘mais de 1000 palavras,’ segundo o trecho 9).

Apesar de certa condescendência com sua inexperiência

juvenil, manifesta no trecho 4 (‘Pô, coitado do piá!’), o

tom geral dos comentários é de cáustica impiedade. Outro

ponto que se destaca é o uso de termos técnicos e

referências a elementos do universo da programação de

computadores, como a referências ao Konqueror, browser do

sistema Linux ou ao ataque de um “Stallman radioativo raivoso

usando LSD e geneticamente manipulado” (trecho 2),

20

referência a Robert Stallman, ativista do software livre. O

uso destes e de outros elementos de conhecimento restrito a

iniciados (como siglas e abreviaturas técnicas), além de

maneirismos como ‘meodelz’ (‘Meu Deus!’) opera como um

mecanismo de categorização de pertencimento. Quem sabe,

sabe, e pode ocupar aquele espaço com a autoridade e a

arrogância dos incluídos. Quem não sabe o que essas coisas

significam, deve permanecer calado, sob pena de ter sua

ignorância exposta publicamente, como uma ‘salsinha’.

É por isso importante dar conta dos processos que as

pessoas seguem para negociarem concretamente nas interações

em que se envolvem, no dia a dia, as fronteiras que

delimitam aquilo que entendem ser público daquilo que

entendem preservar como da esfera privada. Pela importância

que adquiriram as redes sociais, procuramos mostrar como as

pessoas se apropriam destes ambientes digitais para esta

negociação.

Processos de negociação das fronteiras da

esfera pública e privada

Nas interações discursivas ocorrentes em ambientes

digitais, existe uma ampla margem de manobra para a

deliberação e o estabelecimento de regras para organizar

aquelas interações. Essa regulamentação in statu nascendi

apresenta algumas especificidades que vale a pena destacar.

21

Devido ao pouco poder de punição ou de coerção, essas regras

só funcionam efetivamente se forem resultantes de um

processo de negociação. Desta forma, em ambientes digitais

de uso público, conflitos emergem com frequência, e no seu

arbitramento, o recurso a essas regras é essencial. Essas

regras – muitas vezes tácitas – perfazem uma espécie de

‘moralidade digital’, que obedece a imperativos

fundamentados em uma moral religiosa, civil ou simples bom

senso, como nos exemplos a seguir, retirados de um fóruns de

discussão sobre que informações pessoais seria adequado ou

não postar na internet: 

 1. Miguel: Rede social não é lugar para desnudar a alma, publique ideias, mas guarde o coração para quem está perto o suficiente para olhar em seus olhos... Quem joga sua alma no ventilador da internet corre o risco de nunca mais conseguir juntar seus pedaços. 'Preserve-se', intimidade não é para 'amigos do Facebook'e sim para amigos do face a face.

2. Ana Paula: as pesoal estão se deixando levar por esse mundo virtual e estão expondo exageradamente sua vida pessoal,participo de redes sociais, entretanto uso como meio de evangelização,postando mensagens,evitando fotos, enfim,como diz a palavra \”Tudo é permitido,mas nem tudo me convém\”.

3. Tatiana: Eu não publico nenhuma foto de minha filhota em rede social, nem foto minha gosta de publicar, primeiro que existem muitas pessoas mal intencionadas nessas rede social e são usada como um jeito moderno de fofocar sobre a vida dos outros. Sinceramente não gosto. 4. Téo: As pessoas fazem isso para ganhar likes.O número de likes é muito maior quando tem bebê na foto. Patético.

5. Denise: AFFFFFFFFFFFFF pode postar alguma coisa??? Quanta frescura! Concordo com o negócio de criança pelada, é muita falta de noção, mas o resto? Por favor...basta postar as coisas com

22

visualização apenas para seus amigos e realmente adicionar apenas seus amigos. Aliás, não compreendo a mente de pessoas que postam coisas com visualização pública, a menos que seja algo como campanhas e tals, e pior, pessoas que adicionam quem não conhece!

Nos comentários acima, fica evidente o entrecruzamento

de diferentes lógicas (civis, religiosas e morais),

acionadas para fundamentar o apelo à constituição de regras

para a atividade on-line. Cabe destacar nestes trechos a

crítica moral ao uso de recursos para ampliação dos ‘likes’

(como usar fotos com bebês, no trecho 4), bem como a posição

de dissenso expressa no comentário 5, em que a comentadora

denomina ‘frescura’ às sugestões cautelosas até então

expressas naquele espaço. Não obstante, ela mesma reconhece

um limite, ”o negócio de criança pelada”.

Outro ponto de intensos debates diz respeito ao manejo

da língua portuguesa por participantes. Aqui, a gramática é

convertida em uma espécie de valor moral, e erros de

português são facilmente tomados como confissões de falta de

caráter, como nos exemplos abaixo:

1. ô Spleeny, indiota. Na internet não é lugar para formalidade,

podemos ser coloquial ...ô Zé mané..?

2. Marloned

Coloquial sim mas estirpar, esquaterjar e detonar a pobre língua

portuguesa já é demais né? Existe diferença entre uma coisa e

outra.

23

Tem gente por toda internet que parece que nunca aprendeu a

escrever, seriam o que? os analfabetos informatizados? Faça-me

o favor…

3. leckka

Indiota???????????????????? O que é isso?

Não é uma questão de ser ou não formal, mas também não precisa assassinar o português, né?! E além do mais, você não precisa ficar assim tão exaltado, relaxa!Talvez o outro participante não teve a intenção de te ofender ou te deixar chateado.

A negociação de conflitos dessa ordem requer sempre uma

disposição favorável para acalmar os ânimos, como no

comentário 3, em que a participante demanda que o ofensor

‘relaxe’, mas não sem antes criticá-lo por ‘assassinar o

português’.

Um outro aspecto desta infindável disposição para

negociar presente nos ambientes digitais diz respeito às

sanções a serem aplicadas, bem como aos canais adequados

para expressar ou denunciar ações consideradas ofensivas. Na

sequência a seguir, os/as participantes debatem como agir

com relação a condutas criticadas no contexto do fórum de

discussão de um jogo on-line multiplayer:

1. Paladino Humano 90Fórum não é lugar para denuncias, inclusive teve pessoas com contas suspensas por claramente quebrar a regra, concordo com o ocorrido não, mas faça denuncia no local correto que é por ticket,

24

afinal fazendo algo da maneira errada se torna tão errado como o denunciado.

2. Sacerdotisa Morta-viva 90Olha Nit, o que escrevi não foi nenhuma denuncia, pelo menos não era o que eu pretendia, mesmo porque acredito q a maioria sabe bem... desculpa se acabei citando nomes e causando mal entendimento, mas a minha intenção continua sendo de indignação. (…)

3. Anjos do ApocalipseAcredito que não fez de proposito mas isso poderia ser consideradodenuncia, como assédio sem nome e uma discussão geral concordo atécom o ponto de vista citado aqui (…)Infelizmente se tem que vende é porque tem quem compra, bom tal pessoa é culpada sim, mas mais culpado é quem compra o gold e com isso continua incentivando o usuário a vender e com isso farmar gold para tal. Aonde faço a denúncia sobre quem vende gold? Realmente a situação tá difícil, cada vez mais dias essa mulher está controlando o servidor. Se alguem souber de algum tópico ensinando a fazer ticket que por favor me mostre.

4. HyshaPutz, no jogo, passa o mouse ali naquela interrogaçãozinha vermelha do lado do computadorzinho onde você vê se tá com lag. Clica ali e depois em Ajuda. Abre um pop-up com opções de suporte e denúncia. Ou você pode clicar no ícone do indivíduo suspeito como botão direito e denunciar.

5. Skull Educar as pessoas é o mais correto, alguém comprou e você sabe denuncie o comprador, assim a pessoa vai ficando sem mercado porque vão saber que estão banindo/suspendendo o comprador e esse não vai ter dinheiro e tempo sempre para fazer outra conta.

A maioria das pessoas que fazem isso estão é querendo atenção e não resolver o problema.

Nos exemplos acima, vemos que, no comentário 1, uma

ação de reporte (denúncia contra um/a jogador/a) feita no

fórum é criticada pela inadequação do procedimento – ao

invés de fazê-lo no lugar “correto”. A pessoa que fez o

25

reporte assume que o fez, mas justifica sua ação em nome da

indignação e pede desculpas por citar nomes. Um terceiro

comentador aceita o pedido de desculpas (“acredito não ser

de propósito”), e propõe medidas para coibir a prática

ilegítima de “comprar gold”, isto é, de obter uma vantagem

indevida no jogo por meio de recursos financeiros reais. A

síntese dessa discussão, proposta no comentário 5, enfatiza

um valor abstrato, a necessidade de educar as pessoas”, bem

como a reprovação moral de quem age movido por vaidade e não

para resolver o “problema”.

* * * * *

As interações ocorrentes em ambientes da Internet

apresentam aspectos que exigem uma caracterização

específica, a partir de uma metáfora dramatúrgica,

distinguindo o comportamento social em duas categorias

amplas a que, seguindo a proposta de Goffman, damos o nome

de bastidores (backstage) e fachada ou palco (front) (Goffman

1998: 29). Segundo essa terminologia, quando as pessoas se

encontram no palco de atuação de seus papéis sociais,

geralmente são educadas, ao passo que, na região de

bastidores elas criticam, ridicularizam ou reclamam dos

outros. A comunicação estabelecida nestes ambientes muitas

vezes trata de assuntos pessoais, mesmo íntimos, e é

expressa através de uma linguagem que é típica de

26

bastidores, aproximando-se muito da fala, apesar de seus

registros se darem através de textos escritos, gerados a

partir do número restrito de caracteres de um teclado

(Barnes, 2004). Sendo assim, os ambientes da atividade on-

line, são descritos por muitos/as pesquisadores/as como

espaços que se inscreveriam em uma indistinta fronteira

entre o privado e o público. Entretanto, a partir da

aproximação com dados empíricos, percebe-se que a distinção

entre espaços públicos e privados é feita de modo claro por

participantes da interação.

Apesar do assunto tratado muitas vezes se aproximar de

tópicos de foro íntimo, o uso que participantes fazem dos

ambientes digitais marca claramente os limites entre o que é

intimidade e o que é publicável. O ambiente dos blogs, por

exemplo, é local de encontro. Alguns participantes

frequentemente estabelecem relações para além do espaço

digital público e utilizam vários recursos técnicos de

comunicação, como ligações telefônicas, WhatsApp, listas de

discussão restritas e e-mail, todos eles meios de

comunicação de uso privado.

As atividades on-line estão inseridas em condições

práticas de uso, utilizando-se de recursos de outros

contextos comunicacionais em combinações específicas de

acordo com a demanda do caso de uso em questão. Tais

atividades não parecem substituir atividades tradicionais,

mas funcionar como seus complementos ou transformações.

27

O estatuto e os limites entre público e privado nos

ambientes digitais são alvo de grande interesse entre

pesquisadores/as das atividades on-line. Entretanto, na

abordagem desses aspectos, há muita contradição e mesmo uma

confusão de níveis. Enquanto alguns/as se reportam à

natureza e teor dos conteúdos veiculados, outros/as se

referem a aspectos técnicos destes espaços, gerando

contradições conceituais. Por parte dos/as usuários/as, é

possível haver alguma ambiguidade com relação ao caráter

público e privado desses espaços, na medida em que, na

maioria dos foros de discussão, por exemplo, um mesmo e

pequeno número de participantes escreve a maioria das

mensagens, criando a impressão de que o grupo seja menor e

mais íntimo do que de fato é. A natureza pessoal de muitas

conversações on-line também contribui para essa impressão. O

espaço de troca de e-mail pode ser considerado privado, na

medida em que envolve uma relação entre duas pessoas, mas

por outro lado, se pensarmos que as mensagens trocadas podem

ser lidas pelos administradores do sistema ou resgatadas do

disco rígido mesmo depois de terem sido deletadas, ou ainda,

podem ser salvas, encaminhadas ou distribuídas pelos/as

destinatários/as, o e-mail poderia assim ser considerado

espaço público (Barnes, 2004).

Nem todos, usuários/as ou pesquisadores/as, têm a mesma

impressão da natureza pública vs privada dos ambientes. As

mensagens introdutórias de boas-vindas dos provedores

28

geralmente oferecem informações específicas a esse respeito,

mas é a partir do uso cotidiano que os participantes desses

contextos criam suas estratégias pessoais de comportamento.

Nesse sentido, fica evidente no contato com informantes que

não há dúvidas quanto ao caráter público, sem ambiguidade,

onde afirmam regular o teor e o conteúdo do que veiculam em

suas mensagens pessoais, considerando e gerenciando a

impressão desejada frente àquele círculo de pessoas, em um

âmbito mais restrito, e às pessoas em geral, em um âmbito

mais amplo.

Os diversos meios de comunicação empregados por

participantes em suas interações comunicativas suscitam uma

questão importante acerca da especificidade de cada meio.

Acreditamos que um elemento significativo desta escolha

possa ser encontrado no caráter “público” ou “privado” de

cada meio, isto é, um fator importante na escolha desta ou

daquela mídia pode ser encontrado na restrição implícita à

participação. Assim, os blogs seriam espaços declaradamente

públicos, que exigem todo cuidado no que tange ao controle

da informação veiculada. É importante deixar claro que o

grau de publicitação/privacidade de um meio não é um

atributo inerente a ele, mas uma opção de utilização: desta

forma, uma lista de discussão tanto pode ser pública (aberta

a qualquer participante) quanto privada (regulação da

entrada de participantes por convite ou seleção do/a

moderador/a).

29

A situação demanda seu ambiente de ocorrência. Mesmo

que os/as participantes saibam, por exemplo, que o provedor

pode ter acesso aos conteúdos veiculados, interessa mais

diretamente a cada um que o amigo não vá ler, que a mãe não

tenha acesso, que participantes moralistas não indiquem

linhas de comportamento, ou ainda, nenhum/a visitante

anônimo/a irrompa no ambiente de modo agressivo. Para o

provedor, os/as participantes parecem não se importar que os

conteúdos estejam disponíveis. Para os propósitos de quem

usa, para todos os fins práticos, a lista é privada.

Nos labirintos da rede, entender os graus de

privacidade e publicidade de cada ambiente é uma competência

importantíssima. Na medida que as relações interpessoais

travadas ali se estreitam, participantes retiram-se para

ambientes mais discretos, onde possam tratar de assuntos e

conteúdos mais íntimos e pessoais. Segundo dados de

entrevista, quem frequenta sabe que o ambiente de

comentários é local público, mas essa vivência se concretiza

na forma de algum comentário que irrompa ali. Nos trechos

abaixo, de entrevistas retiradas de pesquisa preliminar

(Braga, 2008), a ambiguidade na percepção do caráter do

ambiente se dá nos seguintes termos:

Desde que comecei a frequentar blogs, sempre soubeque tudo que escrevíamos era público. Mas posso dizerque o sinal de alerta sempre toca mais forte quandoalguma "novata" chegava dizendo: "leio vocês há umtempão mas nunca comentei..." Nessas ocasiões eucomparava o número de acessos diários com a

30

quantidade de pessoas que comentava. Por aí, a gentepode se dar conta de que tem muito mais gente lendodo que escrevendo. O número de acessos diários émuitas vezes maior que o número de comentários(Luiza, em entrevista).

Com o aumento da audiência, uma estratégia observada

pelos grupos é criar um grupo de discussão restrito para

abrigar “os assuntos mais íntimos”, conforme depoimento:Quando criei o nickname, minha intenção até era podercomentar qualquer tema sem me preocupar com aexposição. Mas é claro que em poucas semanas já tinhamostrado fotos, conhecido várias das amigas digitaispessoalmente... e o tal anonimato foi pro espaço. Noinício, pensei que me sentiria à vontade para falarde assuntos mais pessoais, mas com o tempo acabeiconstatando que a internet não é o melhor ambientepara isso. Aliás, quando as "comentadoras" maisassíduas começamos a sentir necessidade de conversarsobre assuntos mais pessoais, criamos um grupo dediscussão, que não pode ser localizado pela busca enão tem os arquivos disponíveis para não-membros.Desta forma, conseguimos achar uma solução parapodermos conversar nossos assuntos mais íntimosmantendo a facilidade da internet. (Flox, ementrevista).

Participantes encontram nas facilidades das ferramentas

atuais da Web veículo para suas manobras pessoais. Nos

ambientes digitais privativos, encontram-se para “conversar

os assuntos mais íntimos,” recorrendo aos recursos

oferecidos para não serem localizados por sistemas de busca

e compartilharem arquivos apenas entre o grupo. Ou seja, a

integração crescente do grupo estabelecido demandou espaços

que ultrapassavam o limite público do site.

A palavra usada como parâmetro de busca pelo/a

31

usuário/a para chegar até ao site é um recurso disponível,

assim como o provedor de origem e o número de IP da máquina

utilizada. Não parece haver dúvidas quanto à distinção entre

público e privado com relação aos espaços da rede:

chris: ó, um dia eu conto uma podraça do aécio que cês

vão morrer de ódio, mas tem q ser em off. (...) 

No comentário acima, Chris afirma saber “uma podraça do

aécio”, se dispondo a contar, “mas tem q ser em off,” na

medida em que dizer algo contra alguém sem provas em um

espaço público poderia ser enquadrado como calúnia ou

difamação, e assim configurar um crime.

Na ordem da interação digital, há um uso interessado

das diferentes estruturas da Web, a propósito de diferentes

níveis de privacidade e exposição pretendidos. Os dados

permitem relativizar as frequentes referências na literatura

da área à Internet como espaços de fronteiras indefinidas

entre os âmbitos público e privado. Se, por um lado, a

Internet oferece uma vitrine para ser visto/a pelo mundo,

elemento fulcral na constituição do chamado poder das

mídias, a desejada visibilidade midiática; por outro,

oferece recônditos esconderijos, que oferecem a privacidade

e o conforto de quatro paredes, no sentido de poder-se estar

com alguém, longe de olhos alheios. Ao exercerem as

atividades on-line, participantes demonstram plena

competência social e tecnológica na escolha e manejo de

32

diferentes meios e ambientes conforme a demanda específica

de cada situação.

Do ponto de vista interacional, a conduta em ambientes

on-line é regulada por protocolos tácitos, em processo de

elaboração. A ausência de regulação formal – por meio de

legislação específica, como no caso da TV, por exemplo – faz

com que a produção de representações culturais no contexto

digital seja autorregulada por constrangimentos

interacionais, na forma de críticas, interpelações, ou mesmo

de estratégica indiferença. Entretanto, a produção de

representações culturais para difusão na arena pública

demanda responsabilidade social. Em público, agentes ou

representantes de outros setores da sociedade demandam

negociação com relação a interesses diversos, gerando

críticas, interpelações, adesões e conflitos.

ConclusãoO percurso que seguimos aponta para uma visão da esfera

pública, não como uma realidade que possamos encontrar e de

que possamos definir os contornos, mas como um processo em

que os seres humanos se envolvem, tendo em vista encontrar a

maneira de viverem em comum ou, como dizia John Dewey

(1954), de fazerem comunidade.

Dito de outro modo: a esfera pública não existe, mas

projeta-se como um ideal que os seres humanos prosseguem

constantemente mas que nunca é completamente atingido. Em

33

cada sociedade e em cada época, este ideal foi apresentando

configurações que resultaram de processos historicamente

inventados. As pessoas hoje, tal como ontem, estão

constantemente envolvidas num processo regulado pela relação

deste ideal com as configurações que este ideal de público

vai apresentando ao longo da sua vida.

Verificamos também neste domínio, a lógica paradoxal da

vida social, dado que o ideal de esfera pública decorre, por

um lado, dos comportamentos em que as pessoas adotam por

ocasião das interações em que se envolvem, mas ao mesmo

tempo, estes comportamentos ajustam-se em permanência ao

ideal de esfera pública que eles próprios criam.

As exigências deste processo são reguladas por

princípios ambivalentes e formam princípios que se situam a

montante das regras e das normas que regulam os

comportamentos coletivosd. A estes princípios podemos dar o

nome de constrangimentos ou vínculos, no sentido que a

d Fazemos aqui a distinção entre princípios de natureza distinta,

a que damos o nome de regras, de normas e de constrangimentos. As

regras são princípios que se aplicam para executar comportamentos

que elas constituem ou fazem existir; as normas são princípios a

que se obedece para adotar os comportamentos de acordo com aquilo

que estabelecem; os constrangimentos são condicionantes dos

comportamentos e por isso não se aplicam nem se lhes obedece,

impõem-se por força das circunstâncias e o mais que se pode fazer

é procurar contorna-los.

34

Escola de Palo Alto dava à expressão bind (Watzlawick,

Beavin & Jackson 1993).

A tecnicidade dos seres humanos parece equivaler assim

a uma mera tecnicidade de uso, deste modo provocando a

generalização da identidade do sujeito ou de manipulador/a

de dispositivos técnicos. Fazemos nossa a exigência de uma

formação técnica dos cidadãos que os habilite a compreender

a natureza da tecnicidade como condição de formação plena

para a cidadania, exigência que já Gilbert Simondon

formulava, nos final dos anos 50 do século passado (Simondon

1989: 106-112).

Na constituição da esfera pública, as pessoas estão

constantemente confrontadas com situações que as obrigam a

escolher entre exigências contraditórias. É o caso, por

exemplo, das escolhas que têm que fazer entre o respeito da

igualdade e o reconhecimento das diferenças, quando estão em

jogo questões que se prendem com as decisões acerca do

direito da igualdade versus diferença de género, de

orientação sexual, de repartição dos recursos, da expressão

pública de símbolos particulares da identidade cultural e/ou

religiosa de comunidades minoritárias, numa palavra, acerca

das questões fraturantes, para as quais não é possível

encontrar soluções consensuais.

De todas as questões fraturantes, as que mais

dificuldades apresentam para a constituição de consensos são

35

as questões relativas à delimitação das fronteiras de

situações limite, tais como as que se relacionam com a

delimitação das fronteiras da vida, da morte, do universo.

Como constituir um público dos que aceitam a legitimidade do

aborto antes de determinada data de gestação, da eutanásia,

de uma fronteira da morte ou de uma fronteira delimitadora

do universo? Afinal, se observarmos com atenção cada uma das

questões em torno das quais um público pode ser constituído

descobrimos que todas se relacionam com a impossibilidade de

delimitação consensual da fronteira das realidades que dizem

respeito a essas questões. É essa impossibilidade que está

na origem dos constrangimentos a que estão sujeitas as

relações intersubjetivas responsáveis pelo processo de

institucionalização das diferentes dimensões da vida

coletiva. Por onde passa a linha delimitadora, por exemplo,

da diferença sexual, da identidade cultural, da identidade

nacional, da crença religiosa?

Neste sentido, é particularmente interessante seguir de

perto a maneira como as pessoas hoje se confrontam com estas

questões e observar os processos que utilizam e os

procedimentos que adotam para, localmente, encontrar

maneiras de contornar os princípios paradoxais que

constrangem os seus comportamentos e as suas decisões.

Com este texto, pensamos ter mostrado que as

configurações históricas da categoria do público, e da sua

conversão na categoria abstrata de esfera pública, que

36

apresentamos na primeira parte do nosso texto, não são

realidades substantivas, mas resultam de processos

interacionais que seguem a lógica ambivalente da

sociabilidade. São idênticos processos interacionais que

observamos hoje nas práticas sociais que se desenrolam nos

ambientes digitais. É provável que destes processos resultem

no futuro novas configurações do público apropriadas às

exigências e aos condicionamentos dos novos dispositivos

técnicos.

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