INSTITUTO MATERNO INFANTIL PROF. FERNANDO ... - IMIP
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INSTITUTO MATERNO INFANTIL PROF. FERNANDO FIGUEIRA – IMIP
MESTRADO EM SAÚDE MATERNO INFANTIL
Maria de Fátima Costa Caminha
Concentração do retinol sérico em crianças desnutridas graves hospitalizadas no IMIP: um estudo tipo série de casos
Recife 2005
MARIA DE FÁTIMA COSTA CAMINHA
CONCENTRAÇÃO DO RETINOL SÉRICO EM CRIANÇAS DESNUTRIDAS GRAVES
HOSPITALIZADAS NO IMIP: UM ESTUDO TIPO SÉRIE DE CASOS
Linha de pesquisa: Desnutrição Infantil
Dissertação apresentada ao Colegiado do Mestrado
em Saúde Materno-Infantil do IMIP como parte
dos requisitos para obtenção do grau de Mestre em
Saúde Materno-Infantil
Orientadora: Ana Rodrigues Falbo
Co-orientador: Alcides Diniz
Co-orientadora: Ilma Kruze Grande
Recife - 2005
F i ch a ca ta l o gr á f i ca
Preparada pela Biblioteca do Instituto Materno Infantil Prof. Fernando Figueira, IMIP, Ana Bove
Caminha, Maria de Fátima Costa Concentração de retinol sérico em crianças desnutridas graves hospitalizadas
no IMIP: um estudo tipo série de casos / Maria de Fátima Costa Caminha. -- Recife: O autor, 2005.
78 p. il. (figuras, tabelas) + Apêndices
Dissertação (mestrado) -- Colegiado do Curso de Mestrado em Saúde Materno Infantil do Instituto Materno Infantil Prof. Fernando Figueira, IMIP.
Área de concentração: Saúde da Criança Orientadora: Ana Rodrigues Falbo Co-orientadores: Alcides Diniz e Ilma Kruze
DESCRITORES: 1. Deficiência de Vitamina A 2. Vitamina A 3. Proteína C-Reativa 4. Desnutrição Protéico-Energética I. Falbo, Ana Rodrigues, orientadora II. Diniz, Alcides, co-orientador III. Kruze, Ilma, co-orientadora IV. Título VI. Instituto Materno Infantil Prof. Fernando Figueira, IMIP.
NLM WS115
DEDICATÓRIA
A Deus, pela oportunidade de existir, aprender e amar
Ao meu saudoso pai Evandro, sempre presente com seus ensinamentos e orientações
As minhas inigualáveis mães, Aglaênia e Terezinha, pelo amor, dedicação,
disponibilidade, apoio e incentivo durante toda minha vida
A Alex, meu grande companheiro, pelo apoio incondicional na trajetória do meu
crescimento profissional e como ser humano
Ao meu amado filho, Pedro Tadeu, sem o qual não haveria sentido a luta; meu
obrigado pelo companheirismo, amor, incentivo e abnegação das horas de lazer e
convívio familiar
Ao Professor GJ Ebrahim, pelo grande incentivo, apoio e crédito depositado em minha
pessoa. A ele, meu sincero e eterno reconhecimento
Às mães das crianças deste estudo, pelo entendimento, solidariedade e permissão. Sem
elas nada teria começado... Seria só a vontade.
AGRADECIMENTOS
À minha exemplar orientadora e amiga, Ana Falbo, pelo grande e inestimável
aprendizado, disponibilidade sempre demonstrada, habilidade e conhecimento com que
conduziu esta pesquisa. Sem a sua participação, certamente esta caminhada seria muito
mais difícil.
À minha co-orientadora, Ilma Kruze, sempre presente com uma palavra de
estímulo e carinho. Seu incentivo, apoio, observações e realizações muito enriqueceram
o presente trabalho e o meu conhecimento.
Ao meu co-orientador, Alcides Diniz, pela sua grande e preciosa colaboração.
Sua paciência, disponibilidade e competência foram essenciais na conclusão desta
pesquisa.
Ao Mestrado de Saúde Materno Infantil do IMIP, na pessoa do seu coordenador,
João Guilherme, pelo incentivo, apoio, atenção e decisiva capacidade pedagógica.
A todos os meus colegas do mestrado, pelo apoio, companheirismo,
solidariedade e amizade, que permitiram uma convivência agradável e extremamente
enriquecedora durante estes últimos anos.
A Deborah Cook, pelo inestimável apoio bibliográfico-científico.
A Jordão Pereira, pela dedicação, competência, empenho e paciência.
A Regina Lúcia, pelo importante auxílio na coleta dos dados, além de sua
ternura durante todo esse período
A Luciano Lira, pela disponibilidade, atenção, dedicação e competência
Aos profissionais da Farmácia Hospitalar do IMIP, nas pessoas de Mércia
Veras e Eliane Bandeira, que nos forneceu a segurança na estocagem das amostras
sangüíneas.
Aos profissionais do Laboratório de Análises Clínicas do IMIP, na pessoa de
Maria do Rosário, que permitiu a realização dos exames com dedicação e
profissionalismo
Ao Centro de Investigação de Micronutrientes da Universidade Federal da
Paraíba, pelas pessoas Margarida Lóla e Rejane Santana, pelos ensinamentos,
dedicação e competência
A Lucilene Clemente e Silvestria Queiroz, pela valiosa ajuda na coleta de
material dos sujeitos do estudo.
Aos auxiliares e técnicos de enfermagem, cirurgiões e anestesistas do Bloco
Cirúrgico Pediátrico do IMIP, pela colaboração, incentivo e disponibilidade
demonstrados
Aos auxiliares e técnicos de enfermagem da enfermaria “E” do 4º. andar de
Pediatria do IMIP, sempre disponíveis durante a coleta dos dados.
A Emídio Albuquerque, pela importante ajuda nas orientações estatísticas
Ao Professor José Natal pelas valiosas observações e sugestões acerca dos
resultados deste estudo
A bibliotecária Nadja Rezende, pela dedicação, disponibilidade, estímulo e
competência técnica demonstrada
A Odimeres de Oliveira, Josefa Lira e Maria de Jesus pela atenção,
colaboração e empenho, no decorrer do Mestrado.
Aos meus queridos irmãos Evandro, Maria de Lourdes e Raimundo, minha
subrinha/filha Julianna e a minha especial e querida amiga Florence, sempre próximos,
atenciosos e disponíveis à colaborar
Ao IMIP, representado por Antônio Carlos Figueira, pela oportunidade
disponibilizada, empenho em sua concretização e estímulo sempre demonstrado
Ao Departamento de Enfermagem, representado por Cristina Figueira pelo
grande incentivo e apoio sempre disponibilizados
Enfim, a todos que eu involuntariamente não tenha mencionado e que
estiveram presentes na realização desta pesquisa, meus mais profundos agradecimentos.
“Se não houver frutos,
Valeu a beleza das flores.
Se não houver flores,
Valeu a sombra das folhas.
Se não houver folhas,
Valeu a intenção da semente !”
(Henfil)
LISTA DE SIGLAS E UNIDADES DE MEDIDAS
A/I Altura/idade
apo-RBP Proteína carreadora do retinol livre
CIMICRON Centro de Investigação em Micronutrientes da Universidade
Federal da Paraíba
CIC Citologia de impressão conjuntival
CRS Concentração do retinol sérico
DEP Desnutrição energético-protéica
DVA Deficiência de vitamina A
HGP Hospital Geral de Pediatria
holo-RBP Proteína carreadora acoplada ao retinol
HPLC High performance liquid chromatography
IMIP Instituto Materno Infantil Prof. Fernando Figueira
ipm Incursões por minuto
NCHS National Center for Health Statistics
OMS Organização Mundial de Saúde
OPAS Organização Pan Americana de Saúde
P/A Peso/altura
PCR Proteína C reativa
P/I Peso/idade
PNI Programa Nacional de Imunização
Q1 Primeiro quartil
Q3 Terceiro quartil
RBP Proteína carreadora do retinol
RDR Teste dose resposta relativa
RMR Região Metropolitana do Recife
XN Cegueira noturna
X1A Xerose conjuntival
X1B Mancha de Bitot
X2 Xerose corneal
X3A e X3B Ceratomalácia
XS Cicatrizes corneais
mg/L Miligrama por litro
μL Microlitro
μg/dL Micrograma por decilitro
μmol/L Micromol por litro
LISTA DE TABELAS E FIGURAS
Página
Tabela 1 - Distribuição de freqüência das crianças com desnutrição energético-
protéica grave, hospitalizadas no Instituto Materno Infantil Prof.
Fernando Figueira, segundo variáveis da sua condição
sociodemográfica. Recife, agosto de 2004 a maio de 2005.
35
Tabela 2 - Distribuição de freqüência das crianças com desnutrição energético-
protéica grave, hospitalizadas no Instituto Materno Infantil Prof.
Fernando Figueira, segundo variáveis indicadoras da sua condição
biológica e de saúde. Recife, agosto de 2004 a maio de 2005.
37
Tabela 3 - Distribuição de freqüência das crianças com desnutrição energético-
protéica grave, hospitalizadas no Instituto Materno Infantil Prof.
Fernando Figueira, segundo a presença de doença de base. Recife,
agosto de 2004 a maio de 2005.
38
Tabela 4 - Distribuição de freqüência das crianças com desnutrição energético-
protéica grave, hospitalizadas no Instituto Materno Infantil Prof.
Fernando Figueira, segundo a concentração do retinol sérico.
Recife, agosto de 2004 a maio de 2005.
39
Tabela 5 - Distribuição de freqüência das crianças eutróficas do grupo de
comparação, hospitalizadas no Instituto Materno Infantil Prof.
Fernando Figueira, segundo a concentração de retinol sérico.
Recife, agosto de 2004 a maio de 2005.
40
Tabela 6 - Distribuição de freqüência das crianças com desnutrição energético-
protéica grave e das crianças eutróficas do grupo de comparação,
hospitalizadas no Instituto Materno Infantil Prof. Fernando Figueira,
segundo o sexo. Recife, agosto de 2004 a maio de 2005.
41
Tabela 7 - Distribuição de freqüência das crianças com desnutrição energético-
protéica grave e das crianças eutróficas do grupo de comparação,
hospitalizadas no Instituto Materno Infantil Prof. Fernando Figueira,
segundo a idade. Recife, agosto de 2004 a maio de 2005.
41
Página
Tabela 8 - Comparação da concentração do retinol sérico entre as crianças com
desnutrição energético-protéica grave e as crianças eutróficas do
grupo de comparação, hospitalizadas no Instituto Materno Infantil
Prof. Fernando Figueira, segundo a idade. Recife, agosto de 2004 a
maio de 2005.
42
Tabela 9 - Comparação da concentração do retinol sérico das crianças com
desnutrição energético-protéica grave, hospitalizadas no Instituto
Materno Infantil Prof. Fernando Figueira, segundo o sexo, a idade, a
presença de pneumonia e diarréia. Recife, agosto de 2004 a maio de
2005.
44
Figura 1 - Modelo causal de determinação da deficiência de vitamina A em
menores de cinco anos.
16
Figura 2 - Fluxograma de captação dos pacientes. 29
Figura 3 - Correlação entre a concentração do retinol sérico e o nível de
hemoglobina entre as crianças com desnutrição energético-protéica
grave, hospitalizadas no Instituto Materno Infantil Prof. Fernando
Figueira. Recife, agosto de 2004 a maio de 2005.
45
RESUMO
ANTECEDENTES: a desnutrição energético-protéica (DEP) é um grave problema de
saúde pública no mundo, pelas conseqüências biológicas e danos sociais que provoca.
Dentre as alterações existentes nos micronutrientes na DEP, talvez a deficiência de
vitamina A (DVA) seja a mais grave, elevando a mortalidade por doenças infecciosas,
podendo produzir dificuldade visual permanente, dentre outras conseqüências. Obter
mais informações sobre a situação da vitamina A na criança desnutrida, especialmente a
grave, contribuirá para melhorar o manejo desse problema. OBJETIVOS: estimar a
concentração do retinol sérico (CRS) em crianças com DEP grave hospitalizadas,
compará-la segundo a idade, o sexo, a presença de diarréia e/ou de pneumonia e
correlacioná-la com o nível de hemoglobina; assim como, comparar a CRS dessas
crianças com a CRS de um grupo de crianças eutróficas também hospitalizadas.
MÉTODOS: realizou-se um estudo tipo série de casos, incluindo 34 crianças com idade
de um mês a 60 meses, com DEP grave hospitalizadas no Instituto Materno Infantil
Prof. Fernando Figueira (IMIP), no período de agosto de 2004 a maio de 2005. Foram
analisados CRS, hemoglobina e proteína C reativa (PCR) e utilizado formulário para
registro de dados relativos a algumas variáveis sociodemográficas e biológicas. A PCR
foi utilizada para controlar a interferência da infecção na CRS. Foram incluídas 29
crianças eutróficas, que serviram como um grupo de comparação para análise da CRS.
Utilizou-se a mediana como estimativa da CRS, com precisão avaliada pelo cálculo do
intervalo de confiança de 95%. As comparações da CRS entre crianças com DEP grave
e idade, sexo, presença de diarréia e/ou pneumonia foram realizadas pelo teste de Mann-
Whitney, assim como a comparação das CRS`s entre os dois grupos de crianças. As
comparações das variáveis sexo e idade categorizadas, entre os dois grupos de crianças
foram realizadas utilizando-se o teste exato de Fisher, e para testar a correlação entre a
CRS com a hemoglobina, utilizou-se a correlação de Spearman. RESULTADOS: a
estimativa da mediana da CRS nas crianças com DEP grave foi igual a 21,7μg/dL
(IC95%: 16,8μg/dL - 27,7μg/dL). Nenhuma das crianças com DEP grave evidenciou
CRS deficiente (<10μg/dL), entretanto, 41,2% apresentaram CRS baixo (<20μg/dL) e
70,6% inadequados (<30μg/dL). Apenas uma criança apresentou suspeita da deficiência
clínica. A comparação das CRS`s entre as crianças com DEP grave e as crianças
eutróficas, controlando-se a faixa etária, não apresentou diferença estatisticamente
significante. Na comparação da CRS segundo as variáveis estudadas nas crianças com
DEP grave, apenas a presença de diarréia apresentou diferença com significância
estatística (p=0,021). A correlação entre a CRS e o nível de hemoglobina foi positiva,
porém não estatisticamente significante (r=0,28; p=0,110). CONCLUSÕES: os achados
do estudo sugerem que a DVA nem sempre está associada com a desnutrição quando
avaliada do ponto de vista antropométrico, por outro lado, a deficiência de
micronutrientes pode não ocorrer de forma isolada e sim na forma de múltiplas
carências.
PALAVRAS-CHAVE: Deficiência de Vitamina A; Vitamina A; Proteína C-Reativa:
Desnutrição Protéico-Energética.
ABSTRACT
BACKGROUND: Protein-energy malnutrition (PEM) is a major public health problem
worldwide due to the biological hazard and social damage it entails. Among the existing
impairments of organic micronutrients in PEM, vitamin A deficiency (VAD) is deemed
to be the most severe one, increasing mortality from infections diseases which may
cause life-long visual impairment and a number of other consequences. Obtaining more
information on the vitamin A status of undernourished children, mainly those severely
affected, will be helpful in improving the management of this problem. OBJECTIVE:
To estimate retinol serum concentration (SRC) in infants undergoing severe PEM
hospitalized, match it according to age, gender, occurrence of diarrhea and/or
pneumonia and correlate it to haemoglobin level as well as the SRC of these children to
that of normal children also hospitalized. METHOD: A case series study was carried
out by including 34 children from one to sixty months of age with severe PEM
hospitalized at IMIP from August 2004 through May 2005. Serum retinol, haemoglobin
and C-Reactive Protein (CRP) were analyzed, and also a form for recording data related
to some biological and socio-economic variables was utilized. CRP acted in controlling
infection interference on SRC. A control group of 29 normal children was included in
order to be used as a comparison group for SRC analysis. The median was utilized to
asses SRC, the precision of which was calculated from the confidence interval at 95%.
SRC comparisons of children with severe PEM along with age, gender, occurrence of
diarrhea and/or pneumonia were performed through the Mann-Whitney’s test, as was
SRC comparison between the two groups. Comparisons of categorized gender and age
variables between the two groups were performed through Fisher’s exact test, while for
the correlation between SRC and haemoglobin, Spearman’s correlation was the one
utilized. RESULTS: SRC estimates of children with severe PEM was of 21.7μg/dL
(IC95%: 16.8μg/dL – 27.7μg/dL). None of the children with severe PEM showed
evidence of retinol deficiency (<10μg/dL), however, 42% showed low SRC and 70.6%
were inadequate. Only one child was suspected of having clinical deficiency.
Comparison of children’s SRC with severe PEM and that of normal children, providing
the age group is controlled, showed no statistically significant difference. As for SRC
comparison according to the variables studied in children with severe PEM, only the
presence of diarrhea showed statistically significant difference (p=0.021). The
correlation between SRC and haemoglobin level was positive, although not statistically
significant (r=0.28; p=0.110). CONCLUSION: The study results suggest tha VAD is
not always associated with undernutrition when it is viewed from an antropometric
assessment, on the other hand, micronutrient deficiencies may not occur from a sole
cause, but rather from multiple deficiencies.
KEYWORDS: Vitamin A Deficiency; Vitamin A; C-Reactive Protein; Protein-Energy
Malnutrition.
SUMÁRIO
Página
DEDICATÓRIA ...................................................................................................... i
AGRADECIMENTOS ............................................................................................ iii
LISTA DE SIGLAS E UNIDADES DE MEDIDAS .............................................. viii
LISTA DE TABELAS E FIGURAS ....................................................................... xi
RESUMO ................................................................................................................. xiv
ABSTRACT ............................................................................................................ xviii
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................... 1
1.1 Desnutrição energético protéica / Deficiência de vitamina A: Problemas de
saúde pública .................................................................................................
1
1.2 Indicadores do estado nutricional e da deficiência de vitamina A ................ 3
1.3 Metabolismo da vitamina A .......................................................................... 8
1.3.1 Aspectos gerais ..................................................................................... 8
1.3.2 Absorção ........................................................................................ 9
1.3.3 Armazenamento ............................................................................. 11
1.3.4 Transporte ...................................................................................... 11
1.3.5 Eliminação ..................................................................................... 12
1.4 Implicações da deficiência da vitamina A ..................................................... 12
1.5 Fatores causais para deficiência da vitamina A ............................................. 13
2 OBJETIVOS ........................................................................................................ 18
2.1 Objetivo Geral ............................................................................................... 18
2.2 Objetivos Específicos .................................................................................... 18
Página
2.3 Objetivo Secundário ...................................................................................... 18
3 MÉTODOS .......................................................................................................... 20
3.1 Desenho do estudo ......................................................................................... 20
3.2 Local e período do estudo .............................................................................. 20
3.3 População do estudo ...................................................................................... 20
3.4 Seleção dos sujeitos ....................................................................................... 21
3.4.1 Critérios de inclusão ............................................................................. 21
3.4.2 Critérios de exclusão ............................................................................. 21
3.5 Definição das variáveis .................................................................................. 22
3.6 Coleta de dados .............................................................................................. 25
3.6.1 Grupo de crianças com desnutrição energético-protéica grave ............ 25
3.6.2 Grupo de comparação para análise da concentração do retinol sérico
(crianças eutróficas) ..............................................................................
26
3.6.3 Padronização das técnicas ..................................................................... 27
3.7 Instrumento para coleta de dados .................................................................. 30
3.8 Processamento e análise dos dados ................................................................ 30
3.9 Limitações do estudo ................................................................................... 31
3.10 Aspectos éticos ............................................................................................ 32
4 RESULTADOS ................................................................................................... 34
4.1 Características das crianças ........................................................................... 34
4.2 Concentração do retinol sérico ...................................................................... 38
4.3 Comparação das concentrações do retinol sérico entre crianças com
desnutrição energético-protéica grave e crianças eutróficas .........................
40
Página
4.4 Comparação da concentração do retinol sérico no grupo de crianças com
desnutrição energético-protéica grave, segundo o sexo, a idade, a presença
de diarréia e pneumonia ................................................................................
43
4.5 Correlação entre a concentração do retinol sérico e o nível de hemoglobina
nas crianças com desnutrição energético-protéica grave ...............................
45
5 DISCUSSÃO ....................................................................................................... 47
6 CONCLUSÕES ................................................................................................... 59
7 RECOMENDAÇÕES .......................................................................................... 61
8 REFERÊNCIAS .................................................................................................. 63
APÊNDICES
1. Formulário
2. Termo de consentimento livre e esclarecido
1
1 INTRODUÇÃO
A desnutrição energético-protéica (DEP) na infância é um grave problema de
saúde pública no mundo, pela sua magnitude, conseqüências biológicas e danos sociais
que provoca.1 Não é reconhecida apenas como resultado do desequilíbrio de energias e
proteinas, mas também do consumo inadequado de micronutrientes, sendo proposta a
mudança da utilização do termo genérico “desnutrição energético-protéica” para
“desnutrição de energia e nutrientes”, levando em consideração a deficiência energética
e,ao mesmo tempo,incluindo as proteínas à carência dos outros elementos nutricionais.2
Dentre as alterações por deficiência de micronutrientes existentes na DEP,
talvez, a deficiência de vitamina A (DVA) seja a mais grave, levando a manifestações
clínicas e subclínicas de tal magnitude que podem contribuir para o aumento da
morbimortalidade infantil.3,4
1.1 Desnutrição energético-protéica / Deficiência de vitamina A:
Problemas de saúde pública
Estimativas mundiais mostram que, entre 2000 e 2003, mais que 73,0% das 10.6
milhões de mortes anuais de crianças menores que cinco anos eram atribuidas a
pneumonia, diarréia, malária, prematuridade, sepse neonatal e asfixia ao nascer, estando
a DEP associada em pouco mais da metade (53,0%) de todas essas mortes, havendo
maior prevalência em regiões na África (Sudão e Somália) e Sudeste da Ásia.5
No Brasil, no decurso do período de 1974 a 1996, houve um declínio acentuado
na prevalência da DEP de 17,9% para 5,7% em crianças menores de cinco anos, em
2
todas as regiões do país (utilizando o índice peso/idade < -2 escore Z), porém, ainda
assim, continua sendo um grave problema de saúde pública4. Os resultados da II
Pesquisa Estadual de Saúde e Nutrição (PESN) realizada no Estado de Pernambuco em
1997, revelaram percentuais de 4.9%, 12.0% e 1.8%, para os respectivos indicadores
nutricionais peso/idade, altura/idade e peso/altura, utilizando o ponto de corte <-2
escore Z 6.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a DVA é um grave problema
de saúde pública no mundo, onde mais de 250 milhões de crianças em idade pré-escolar,
estão sob risco de apresentar deficiência deste micronutriente.7,8 As regiões onde existe
maior prevalência da forma clínica e subclínica são: África, Sudeste Asiático, Oeste do
Mediterrâneo e Oeste Asiático. A forma subclínica isolada, como problema de saúde
pública, ocorre em algumas regiões das Américas, incluindo o Brasil e Europa.9 Estima-
se também que, mundialmente, cerca de um milhão de óbitos infantis anuais estejam
associados à carência de vitamina A e que cinco a 10 milhões de crianças desenvolvam,
por ano, xeroftalmia8,10,11.
Não obstante a OMS e a Organização Panamericana de Saúde (OPAS)9
classificarem o Brasil como área de ocorrência de carência subclínica grave, autoridades
de saúde nacionais consideram que os dados epidemiológicos existentes ainda não
possibilitam informações científicas suficientes para que se possa diagnosticar a
magnitude, prevalência e gravidade da DVA na população brasileira.12-14.
Estudos realizados em várias regiões do Brasil identificaram a situação
nutricional da vitamina A em crianças em idade pré-escolar (retinol sérico <20μg/dL)
como um problema de saúde pública, nas regiões Sudeste (19,4%), Norte (19,6%) e
Nordeste (32,1%) do País.12,14-20
3
Os segmentos populacionais particularmente susceptíveis e considerados como
grupos clássicos de risco nutricional, notadamente em função do seu momento
biológico, condição socioeconômica, fatores ambientais e hábitos alimentares, são as
gestantes, puérperas, recém-nascidos, lactentes e pré-escolares sendo, este último, o
grupo de maior risco para o desenvolvimento das manifestações da carência de vitamina
A, devido ao rápido crescimento biológico nessa faixa de idade.8,12
1.2 Indicadores do estado nutricional e da deficiência de vitamina A
Para avaliação do estado nutricional, a OMS recomenda a classificação
antropométrica por meio da utilização dos indicadores altura/idade (A/I), peso/altura
(P/A) e peso/idade (P/I) com padrão do National Center for Health Statistics (NCHS).21
Os pontos de corte para esta classificação são: desnutrição leve entre -1 e -2 escores Z;
moderada entre -2 e -3 escore Z; e grave se < - 3 escore Z.22
Consideram-se três formas de desnutrição, segundo a classificação
antropométrica, quando avaliada abaixo de menos 2 escore Z da mediana do padrão de
referência do NCHS: altura/idade (A/I) “baixa estatura ou nanismo nutricional”,
caracterizando um déficit nutricional crônico; peso/altura (P/A) “emagrecimento”,
caracterizando a carência nutricional em sua fase aguda; e peso/idade (P/I) “baixo
peso”. Esta última forma de desnutrição sofre influência tanto do grau do nanismo como
do grau de magreza da criança, não diferenciando a criança que sofreu um problema
nutricional crônico, levando ao nanismo nutricional, daquela que sofreu um agravo
agudo, levando ao emagrecimento.22,23
A criança com emagrecimento grave, caracterizado pelo indicador peso/altura e
a que apresenta edema (no mínimo envolvendo os pés) encontra-se mais vulnerável
4
clinicamente, necessitando de cuidados hospitalares. Segundo a OMS, essas crianças
apresentam um maior risco de desenvolver DVA.24
Para avaliar o estado orgânico da vitamina A, os principais métodos podem ser
divididos entre aqueles que medem a sua concentração bioquímica (sérica, hepática e no
leite materno), os que analisam a citologia ocular, também referidos como indicadores
subclínicos; e aqueles que refletem a integridade anátomo-funcional, que podem ser
denominados de indicadores clínicos.11
A análise bioquímica pode indicar as deficiências nutricionais antes de suas
manifestações clínicas, porém, alguns problemas operacionais, assim como inerentes ao
estado orgânico, podem dificultar a utilização dos mesmos. Desta forma, ainda não
existe um método isolado que seja suficientemente capaz de identificar,
satisfatoriamente o estado orgânico de vitamina A.25,26 A recomendação atual da OMS
sugere a utilização de pelo menos dois indicadores bioquímicos para caracterizar a
DVA.8
O exame mais largamente utilizado na mensuração do estado orgânico da
vitamina A é a análise sérica de retinol.8,9, 11
O método de escolha para a análise laboratorial do retinol sérico é a
cromatografia liquida de alta resolução (HPLC) devido a sua alta especificidade e
sensibilidade, podendo detectar uma concentração inferior a 10μg/dl.8,9,27,28
A OMS recomenda que teores de retinol sérico inferiores a 20μg/dL devam ser
considerados baixos e valores menores do que 10μg/dL, deficientes, para crianças na
idade pré-escolar.8
Apesar das concentrações de retinol inferior a 20μg/dL representarem um ponto
de corte bem estabelecido para definir retinol baixo, concentrações inferiores a 30μg/dL
segundo alguns pesquisadores, indicariam situação marginal ou de risco para DVA.29,30
5
No entanto, ao se utilizar esse ponto de corte, uma criança pode apresentar concentração
de retinol sérico considerada marginal (entre 20μg/dL e 30μg/dL) com reserva hepática
adequada.26
Cumpre-se destacar, que a dosagem sérica do retinol nem sempre reflete a
verdadeira situação dos seus níveis no organismo, porque sua redução somente ocorre
quando os estoques corporais estão bastante diminuídos.8,9,11 Além disso, pode sofrer
influência de outros fatores como, por exemplo, a DEP, que afeta a proteína carreadora
do retinol (RBP), por conta da síntese inadequada desta proteína, e a resposta a
infecções ou doenças inflamatórias, às quais levam à redução dos níveis de retinol
circulantes, mesmo na presença de estoques adequados de vitamina A.27,31-34 Quanto
maior a gravidade da infecção, maior a redução do nível de retinol sérico, sendo esta
redução transitória durante a resposta de fase aguda à infecção.35,36
Está indicado mensurar uma ou mais proteínas de fase aguda, para avaliar a
influência de processos infeciosos e inflamatórios na concentração do retinol sérico
(CRS). A proteína de fase aguda mais indicada para tal avaliação é a alfa1-ácido-
glicoproteína, que se eleva mais precocemente e permanece por um período mais
prolongado que as demais proteínas de fase aguda. A proteína C reativa, alfa1-
antiquimotripsina e amilóide sérico, elevam-se nas primeiras seis horas de infecção e
chegam a concentrações máximas dentro de 24 a 48 horas.28
A dosagem sérica da RBP é mais simples de ser aferida do que o retinol sérico,
uma vez que RBP é uma proteína e pode ser detectada mediante um ensaio
imunológico, o qual é menos dispendioso e mais estável diante de fatores como a luz e a
temperatura que a análise pela HPLC.26,28 No entanto, existem as RBP já carreando o
retinol (holo-RBP) e as RBP no estado pré-formado, ainda não carreando o retinol (apo-
6
RBP), e os ensaios imunológicos não possuem a capacidade de fazer a distinção entre
elas.26
A RBP, a exemplo do retinol sérico, sofre influências de alguns fatores, tais
como, DEP, infecção e doenças hepáticas. Como a maior parte destes fatores interfere
também na concentração de retinol, possivelmente a relação entre retinol e RBP no
sangue não seja afetada. De qualquer modo, o ponto de corte para a concentração sérica
de RBP ainda não está estabelecido, dificultando o seu uso.26
O método que consiste em uma medida mais direta dos estoques de vitamina A,
sendo menos vulnerável à influência dos outros fatores envolvidos na liberação e
utilização deste micronutriente, é a biópsia hepática, porém não é viável para este fim
diagnóstico pela possibilidade de complicações inerentes ao procedimento.8, 25
Os testes dose-resposta relativa (RDR) e RDR modificado se baseiam no fato de
que, mesmo ocorrendo ingestão insuficiente da vitamina A na dieta causando uma
redução dos estoques hepáticos, o organismo continua a produzir a RBP havendo um
acúmulo de apo-RBP (proteína carreadora do retinol livre). Com a administração de
vitamina A exógena, há a liberação do complexo holo-RBP (RBP acoplado ao retinol)
em concentrações proporcionais ao volume de apo-RBP existente no fígado. Com base
neste princípio, os testes avaliam indiretamente os níveis dos estoques de vitamina A no
fígado, refletindo mais precisamente o estado orgânico da vitamina A, no entanto, o
teste RDR tem o inconveniente de utilizar duas amostras sanguíneas. O RDR
modificado não está disponível para a utilização em todos os países.8, 25
A dosagem de retinol no leite materno é o meio diagnóstico de utilidade para
avaliar a situação da vitamina A de mulheres lactantes e realizar comparações entre
grupos.25 Fornece informações sobre o estado de vitamina A tanto na mãe quanto na
criança que está em aleitamento materno.8
7
A análise citológica permite a identificação da conjuntiva xerótica e
queratinizada antes de atingir a xerose conjuntival e é chamada de citologia de
impressão conjuntival (CIC). A técnica consiste na aplicação de um papel de filtro sobre
a conjuntiva, com o objetivo de remover células epiteliais, para análise histológica
subseqüente. O material necessário para a execução dessa técnica é bastante simples,
necessitando apenas de fitas de acetato celulose, lâminas e microscópio óptico. Os
padrões para avaliação da CIC incluem Normal, Marginal +, Marginal – e Deficiente. O
que diferencia entre os mesmos são as formas das células epiteliais (se agregadas ou
dispersas e relação núcleo/citoplasma), as células caliciformes e os depósitos de mucina
(se presentes, raras ou ausentes).37
Os indicadores clínicos fornecem maior fidedignidade ao diagnóstico da DVA.
O termo xeroftalmia inclui todos os sinais e sintomas oculares atribuídos à deficiência
deste micronutriente,9,25 entretanto, essas manifestações não são específicas do estado
carencial desta vitamina.25
Os sinais e sintomas relacionados a xeroftalmia, colocados em ordem crescente
de gravidade,9 são classificados como se segue:
Cegueira noturna (XN): é um dos primeiros sintomas da síndrome xeroftálmica, sendo
decorrente de alterações no nível bioquímico, funcional e estrutural ocasionado pela
DVA.
Xerose conjuntival (X1A): é caracterizada por um estado de extrema secura,
espessamento e enrugamento da conjuntiva.
Mancha de Bitot (X1B): manifesta-se em áreas da conjuntiva onde a xerose é mais
intensa. São lesões ovaladas ou triangulares, concentradas ou dispersas localizadas na
córnea. É rara em crianças jovens. Em crianças mais velhas e nos adultos, usualmente
8
não são devidas a DVA e essas manchas não devem ser usadas como um indicador
desta deficiência.
Xerose corneal (X2): a córnea, como a conjuntiva, adquire aspecto áspero, seco,
enrugado e sem brilho. O tratamento com vitamina A resulta na cura completa do
quadro.
Ceratomalácia (X3A e X3B): é o estágio final da xeroftalmia, o qual leva à destruição
parcial ou total da córnea e cegueira. Ambos os olhos são usualmente afetados, porém
não necessariamente de igual forma. Neste caso, a cegueira é inevitável e está associada
com o aumento da mortalidade.
Cicatrizes corneais (XS): a ceratomalácia usualmente deixa cicatrizes nos
sobreviventes, podendo ser utilizadas como indicadores em estudos populacionais.
A OMS recomenda que, se a prevalência de cegueira noturna e mancha de Bitot
em crianças de seis meses a seis anos ultrapassar de 1,0 e 0,5%, respectivamente, deve-
se considerar a xeroftalmia como um problema de saúde pública. Utiliza-se a
prevalência de 0,01% para o comprometimento corneal ativo e de 0,05% para as
seqüelas cicatriciais.8
1.3 Metabolismo da vitamina A
1.3.1 Aspectos gerais
Micronutriente fundamental para realizar importantes atividades orgânicas, a
vitamina A é um composto orgânico requerido em pequenas quantidades para participar
em diversos e vitais processos biológicos, existindo em três formas no organismo, todos
compostos organicamente ativos: retinol(álcool), retinaldeído(aldeído) e ácido
retinóico.38,39
9
O organismo animal não tem capacidade de sintetizar a vitamina A, sendo este
micronutriente fornecido através de duas fontes dietéticas: a vitamina A pré-formada ou
retinol, através de alimentos de origem animal; e a pró-vitamina A, representada pelos
pigmentos carotenóides, através de alimentos de origem vegetal, que são transformados
organicamente em vitamina A.39-42
Os principais alimentos ricos em vitamina A pré-formada são as vísceras, peixes
de água salgada, aves, gemas de ovos, leite materno, leite integral e seus derivados,
assim como, óleo de fígado de diferentes pescados. Entre os alimentos ricos em
carotenóides (pró-vitamina A) estão a manga, mamão, caju, goiaba vermelha, cenoura,
milho verde, batata doce, abóbora, couve, mostarda, espinafre, brócolis, caruru, folhas
de beterraba e cenoura, chicória, alface, agrião e palma. Os óleos de dendê e buriti, que
são amplamente encontrados no Nordeste brasileiro, constituem-se em fontes ricas de
vitamina A.15
O ser humano possui a capacidade de acumular e converter os carotenóides em
vitamina A no organismo de acordo com a necessidade, processo que assume a maior
importância nos países subdesenvolvidos, onde os vegetais e frutos ricos em
carotenóides constituem as principais fontes de vitamina A, podendo representar 80,0%
ou mais do total de vitamina A ingerida.43
1.3.2 Absorção
Aproximadamente 80,0% da vitamina A presente nos alimentos é absorvida pelo
organismo, desde que haja o funcionamento normal do trato gastrointestinal, e seus
anexos, bem como na presença de gordura na dieta.25,44
No estômago, após ingestão de alimento contendo vitamina A, esse sofre a ação
de enzimas proteolíticas, que separam a vitamina A das outras substâncias alimentares e
10
os agrega aos lipídeos da dieta, sendo, o produto dessa ação, os ésteres de retinil.25,39 Na
mucosa da parte superior do intestino delgado, na presença de sais biliares e gorduras,
sofrendo a ação de uma lipase pancreática denominada de retinil éster hidrolase, os
ésteres de retinil são em grande parte hidrolisados à forma de retinol, o qual é absorvido
mais eficientemente do que os ésteres.39,41,44
O retinol resultante desta hidrólise é absorvido para o interior da célula, onde é
reesterificado, usualmente como retinaldeído, e em seguida, absorvido pelo organismo,
simultaneamente com as gorduras, e transportado pela corrente circulatória para ser
depositado nos tecidos armazenadores. Além desse processo metabólico, também ocorre
absorção direta de retinol na circulação, que se ligam a proteína carreadora do retinol
(RBP) no plasma.39,45
Ao contrário da extensa absorção do retinol, apenas cerca de 15,0 a 33,0% do β-
caroteno ou outros carotenóides, são absorvidos pelo homem. Igualmente, para absorção
dos carotenóides, é necessária a presença no trato intestinal de gordura alimentar
absorvível, bile e suco pancreático, os quais possibilitam a conversão de caroteno
ingerido na dieta em vitamina A.39,40
O caroteno somente é convertido em vitamina A na parede intestinal quando o
organismo necessita, evitando um acúmulo de retinol no tecido hepático, com sua
conseqüente toxicidade,15,44 ao contrário do retinol cujo grau na eficiência de conversão
independe da quantidade de vitamina A no organismo.25
Após a absorção do retinol, ocorre a sua conjugação com o ácido glicurônico,
seguido do seu acesso na circulação êntero-hepática, onde ocorre a esterificação,
originando ésteres de retinil, e/ou sua oxidação, originando o ácido retinóico. Tanto os
ésteres de retinil quanto o ácido retinóico serão transportados para o fígado.40,41
11
1.3.3 Armazenamento
O armazenamento da vitamina A é feito sob forma de éster. Cerca de 80,0 a
90,0% da vitamina A no organismo é captada e estocada no fígado, nas células de
Kupfer no parênquima hepático, onde é ligada à RBP, sendo o restante distribuído para
as células do sangue, medula óssea, tecido adiposo, baço, rins e músculos.11,39-41 A
absorção dos carotenóides em sua forma inalterada ocorre para vários tecidos orgânicos,
como tecidos adiposos e, em pequena quantidade, para pele, sangue, músculos, supra-
renais (glândulas adrenais), testículos, e fígado.15
Os estoques hepáticos ajudam a manter os níveis de vitamina A estáveis e
suficientes para suprir as necessidades do organismo quando ocorrem as variações
sazonais no aporte da vitamina na dieta.9,11,40 Embora a concentração sangüínea,
isoladamente, não seja uma forma acurada de avaliar o estado orgânico da vitamina A,
valores baixos do retinol sérico podem indicar esgotamento da reserva hepática desssa
vitamina.40
1.3.4 Transporte
A vitamina A armazenada no fígado, na forma de retinaldeído, pode ser
mobilizada para distribuição aos tecidos periféricos na dependência da oferta alimentar
e necessidades biológicas. Esse processo envolve a hidrólise de ésteres de retinil em
retinol, fazendo com que o estoque de vitamina A do fígado mantenha sua concentração
constante na circulação orgânica.39,41 O retinol liberado para a corrente sangüínea é
direcionado aos tecidos periféricos e encontra-se em 90,0 a 95,0% dos casos acoplado à
proteína carreadora de retinol (holo-RBP).11,39
O complexo holo-RBP alcança a membrana celular de vários tecidos alvo. Após
a ligação aos receptores da membrana, o retinol entra na célula alvo e a RBP é
12
novamente liberada na circulação, sendo posteriormente degradada ou reciclada.25
Situações nas quais ocorre grave deficiência de proteínas, há uma diminuição
concomitante da síntese da RBP, com redução da liberação de holo-RBP, e consequente
aumento dos estoques hepáticos de retinol. A deficiência de proteína encontrada na
criança portadora de DEP pode dificultar ou impedir a resposta orgânica ao aporte de
vitamina A.11,41,46
1.3.5 Eliminação
Praticamente não há eliminação de retinol do organismo, porque o fígado
apresenta elevada capacidade de armazenamento. Entretanto, se ocorrer administração
de grandes doses da vitamina A, certa quantidade é excretada sob forma inalterada nas
fezes.40,41
1.4 Implicações da deficiência da vitamina A
A DVA leva ao mau funcionamento das células da retina, cujo efeito fisiológico
melhor reconhecido, e geralmente o mais precoce, é a perda da visão noturna
(nictalopia), caracterizada pela dificuldade de adaptação visual no crepúsculo, nos
ambientes de luz fraca ou durante a noite.25 Prolongando-se a carência de vitamina A, o
epitélio de revestimento ocular é gravemente atingido, levando à xeroftalmia.38 A DVA
modifica as estruturas celulares epiteliais levando a disfunção nos tecidos de
revestimento de todo organismo, substituindo células produtoras de muco, presentes nos
tecidos epiteliais de diferentes órgãos, por células produtoras de queratina,
comprometendo a barreira de proteção epitelial e favorecendo a instalação de infecções,
13
principalmente respiratórias e gastrointestinais, aumentando assim o risco de morte em
quase 25,0% nas crianças com diarréia.4,38,40,41
Entretanto, além deste papel clássico na diferenciação dos tecidos epiteliais
(pele, mucosa e endotélio), também influencia os mecanismos imunológicos, o
crescimento ósseo, hematopoiese, fertilidade e embriogênese.15,25 A carência deste
micronutriente contribui para a maior gravidade das doenças infecciosas, doenças por
deficiência de ferro e dos distúrbios do crescimento.10
Segundo estudos realizados, as deficiências de micronutrientes não ocorrem
isoladas, e sim na forma de múltiplas carências, em especial as carências de ferro e de
vitamina A.47-50
A vitamina A apresenta importante papel na mobilização do ferro no organismo
e, sua deficiência, pode levar a hematopóiese defeituosa com conseqüente anemia, a
qual responde melhor ao tratamento quando a vitamina A é adicionada à terapia,
observando-se uma correlação direta entre os níveis séricos do ferro e do retinol.9
Estudo conduzido na Indonésia com 251 mulheres grávidas, sugere que a
suplementação com vitamina A isoladamente durante a gravidez pode elevar a
concentração de hemoglobina, e ainda que a suplementação em conjunto da vitamina A
e ferro pode elevar a concentração da hemoglobina ainda mais que a suplementação
individual do ferro.51
1.5 Fatores causais para deficiência de vitamina A
A OMS refere a associação entre alguns fatores de risco e a ocorrência da DVA,
dentre eles as precárias condições socioeconômicas, difícil acesso a serviços de saúde,
14
baixo peso ao nascer, desmame precoce, imunização deficiente, doenças prevalentes na
infância e estado nutricional comprometido.8
A renda familiar per capita é um importante fator de risco para a DVA, uma vez
que influencia diretamente a ocorrência de outros fatores determinantes, como acesso a
alimentação, condição da moradia, educação e acesso aos serviços de saúde, dentre
outros.4,8,52
Os anos de estudo das mães, mais do que a renda familiar, expressam as
condições de percepção, informação, acesso aos serviços de saúde e práticas sanitárias.
Além de contribuir para a sua qualificação profissional melhorando a oportunidade de
emprego, com consequente aumento da renda familiar.52
A ausência de serviços elementares na habitação, como o abastecimento de água,
saneamento básico e coleta do lixo, assim como poucos cômodos com elevado número
de habitantes, são algumas das condições que estão associadas à ocorrência de doenças
infecciosas e, conseqüentemente, com a DVA.11, 52
A dificuldade de acesso aos serviços de saúde favorece a ausência de
imunização básica, pré-natal, orientações sobre aleitamento materno, higiene, medidas
de prevenção contra diarréia, pneumonia, contribuindo para a ocorrência de doenças
infecciosas e, conseqüentemente, um estado nutricional deficiente.8
O aleitamento materno exclusivo é a medida eleita para iniciar uma alimentação
saudável até os seis meses de vida. A partir do sexto mês, a criança necessita de
alimentos complementares, e, nessa fase a condição socioeconômica pode ter
importante papel na determinação do acesso da criança a alimentos que supram
adequadamente suas necessidades.8
A ocorrência de doenças infecciosas, principalmente diarréia e pneumonia nos
últimos 12 meses, encontra-se associada com o comprometimento da situação
15
nutricional infantil.4,8 As doenças infecciosas podem levar a deficiência de
micronutrientes e a DEP através da diminuição da ingestão, alteração na absorção,
perdas diretas, aumento no requerimento e pela alteração na utilização dos nutrientes.4,8
De todas as deficiências nutricionais, a DVA é a que apresenta maior sinergismo
com as doenças infecciosas,38 sendo implicada na redução da resistência orgânica contra
as infecções, uma vez que a vitamina A modula a resposta imune e mantém a
integridade das membranas biológicas.25,40,41,53,54.
Quanto à associação entre a DEP e a DVA, em alguns estudos foram observados
valores mais baixos de retinol sérico em crianças com desnutrição, quando avaliadas
pelo critério de Gómez,55,56 assim como, pesquisas realizadas na Índia e na África,
também encontraram crianças com DEP grave, por avaliação antropométrica, com
níveis deficientes (<10μg/dL) e baixos (<20μg/dL) de retinol sérico, podendo indicar
que a DEP vem acompanhada da DVA.35,36,57,58 Entretanto, Assis et al.59 não
verificaram associação definida entre o estado nutricional avaliado antropometricamente
e níveis de retinol. Todos esses estudos foram realizados com crianças em idade pré-
escolar.
16
Figura 1 - Modelo causal de determinação da deficiência de vitamina A em menores de cinco anos
A DVA é considerada uma das carências nutricionais mais prevalentes no
mundo, junto com a anemia e a DEP, com as quais se encontra freqüentemente
associada,1 desta forma, a OMS preconiza a administração de uma megadose de
vitamina A no internamento, em pacientes com DEP grave, independente de sinais
clínicos e/ou subclínicos da DVA.24 Portanto, faz-se importante e necessário avaliar o
estado orgânico deste micronutriente nessas crianças, com a finalidade de ampliar o
conhecimento sobre o problema, contribuindo para melhorar o seu manejo e para a
redução da morbimortalidade neste grupo de crianças.
DVA DEP
3 . Infecções (diarréia e pneumonia) . Ingestão inadequada de alimentos
. Baixa renda familiar per capita . Baixa escolaridade materna . Precárias condições da habitação
. Difícil acesso a serviços de saúde . Desmame precoce . Imunização deficiente ou ausente
1 2
18
2 OBJETIVOS
2.1 Objetivo geral
Avaliar a concentração do retinol sérico (CRS) em crianças de um mês a 60
meses com DEP grave hospitalizadas no Instituo Materno Infantil Professor Fernando
Figueira (MIP) no período de agosto 2004 a maio de 2005.
2.2 Objetivos específicos
Nas crianças de um mês a 60 meses com DEP grave hospitalizadas no IMIP:
1) Estimar a CRS;
2) Comparar a CRS dessas crianças com a CRS de um grupo de crianças
eutróficas hospitalizadas no IMIP;
3) Comparar a CRS segundo a idade, o sexo, a presença de diarréia e/ou de
pneumonia.
2.3 Objetivo secundário
Nas crianças de um mês a 60 meses com DEP grave hospitalizadas no IMIP:
1) Correlalacionar o nível de hemoglobina com a CRS.
20
3 MÉTODOS
3.1 Desenho do estudo
Foi realizado um estudo descritivo do tipo série de casos de base hospitalar, cujo
delineamento metodológico envolveu um grupo de indivíduos com uma condição em
particular, descrevendo os achados coletados em um dado ponto no tempo.60,61 Foi
utilizado um grupo de comparação para análise da CRS constituído de crianças
eutróficas (peso/altura > -1 escore Z do padrão de referência do NCHS, 1977).21
3.2 Local e período do estudo
O estudo foi realizado no IMIP, situado na região metropolitana central do
Recife, no estado de Pernambuco, no período de agosto de 2004 a maiode 2005. O IMIP
é uma entidade não-governamental, filantrópica, sem fins lucrativos, tendo como missão
precípua a assistência médico-social, o ensino e a pesquisa.
3.3 População do estudo
A população do estudo foi composta por todas as crianças com DEP grave,
segundo o indicador peso/altura < -3 escore Z utilizando o padrão de referência do
NCHS e/ou pela presença de edema simétrico pelo menos nos pés,24 hospitalizadas no
IMIP durante o período do estudo.
No IMIP são internados anualmente cerca de 19.200 pacientes pediátricos.
Destes, cerca de 50 crianças (0,3%) são admitidas com emagrecimento agudo grave
(peso/altura < -3 escore Z) e cerca de 200 (1,0%) com emagrecimento agudo moderado
(peso/altura < -2 escore Z ).
21
De acordo com estudo anterior realizado no IMIP em 2002, 60,0% das crianças
com DEP grave hospitalizadas nessa Instituição vêm do interior do Estado de
Pernambuco. Água encanada, fossa e coleta de lixo só estão presentes em
aproximadamente um terço das suas casas e 40,0% delas vivem em famílias com renda
per capita mensal menor que um salário mínimo. Diarréia e pneumonia são os
principais motivos da sua hospitalização. 62
3.4 Seleção dos sujeitos
3.4.1 Critérios de inclusão
- Idade de um a 60 meses;
- DEP grave (índice peso/altura < -3 escore Z, utilizando o padrão de referência do
NCHS 1977, e/ou presença de edema simétrico envolvendo no mínimo os pés); 24
- Emagrecimento grave visível, quando o comprimento da criança foi abaixo de 49
cm, portanto, fora da Tabela de referência do NCHS para a aferição do indicador
peso/altura.24
3.4.2 Critérios de exclusão
- Suplementação com Vitamina A na emergência, antes da coleta da amostra de
sangue para a dosagem sérica do retinol;
- PCR >12mg/l (marcador para infecção/inflamação) avaliada após a inclusão inicial
no estudo.
22
3.5 Definição das variáveis
• Concentração de retinol sérico: variável numérica contínua. Categorizada para
análise <20μg/dL (baixo), 20μg/dL a 30μg/dL (marginal) e >30μg/dL
(normal).29,30 Definida como concentração de retinol circulante no sangue.
• Proteína C reativa: variável numérica discreta. É uma das chamadas proteínas
plasmáticas de fase aguda, sintetizadas pelo hepatócito em resposta a
mediadores inflamatórios produzidos por leucócitos e amplamente utilizada na
clínica para detecção e avaliação da gravidade de processos infecciosos ou
inflamatórios. Neste estudo foi considerado como indicativo da presença de
infecção/inflamação nível de PCR >12mg/l. Alguns pesquisadores utilizam
como ponto de corte valores que variam entre 5, 10 e 20mg/l. Neste estudo foi
utilizado a média entre essas três referências.28,34,58,63
• Sexo: variável categórica nominal dicotômica. Gênero definido por duas
categorias: masculino e feminino.
• Idade: variável numérica contínua. Categorizada para análise em menor ou
igual a 12 meses e maior que 12 meses. Medida em meses completos a partir do
dia do nascimento até o dia da inclusão do paciente no estudo.
• Local de residência: variável categórica nominal policotômica. Categorizada
como Zona da Mata, Agreste, Sertão, Região Metropolitana do Recife (RMR) e
outros estados. Local de moradia da criança durante o período do estudo.
• Água encanada: variável categórica nominal dicotômica. Categorizada como
sim e não. Existência de sistema de encanação no domicílio.
23
• Recolhimento adequado de dejetos humanos: variável categórica nominal
dicotômica. Categorizada como sim e não. Existência de fossa ou esgotamento
sanitário.
• Recolhimento de lixo: variável categórica nominal dicotômica. Categorizada
como sim e não. Coleta municipal do lixo.
• Renda per capita mensal familiar: renda familiar total dividida pelo número de
habitantes por domicílio. Categorizada para análise de acordo com o salário
mínimo vigente como <1/2 salário mínimo e >1/2 salário mínimo.
• Escolaridade materna: variável numérica discreta. Categorizada para análise
em <8 anos e ≥8 anos. Número de anos estudados com aprovação.
• Aleitamento materno: variável numérica contínua. Categorizada para análise
como nunca mamou, <3 meses e >3 meses. Período em meses no qual a criança
recebeu leite materno sendo este exclusivo ou não.
• Administração prévia da vitamina A: variável categórica nominal dicotômica.
Categorizada como: sim e não. Dose da vitamina A recebida pela criança antes
da entrada no estudo, avaliada através do cartão de vacinas ou pela informação
da mãe ou acompanhante.
• Pneumonia: variável categórica nominal dicotômica. Categorizada como sim e
não. Presença de tosse e/ou febre, taquipnéia, dispnéia, tiragem intercostal ou
subcostal e batimentos de asa do nariz, assim como freqüência respiratória
elevada para a idade (com níveis iguais ou superiores a 60 ipm em crianças de 0
a 2 meses; 50 ipm em crianças de 2 a 11 meses e 40 ipm entre 12 a 60 meses).64
• Diarréia: variável categórica nominal dicotômica. Categorizada como sim e
não. Ocorrência de três ou mais evacuações de consistência diminuída
24
(semipastosas, semilíquidas e líquidas) ou pelo menos uma evacuação com a
presença de sangue visível em um período de 24 horas.64
• Edema: variável categórica nominal dicotômica. Categorizada como sim e não.
Presença de edema simétrico envolvendo no mínimo o dorso dos pés à
admissão.
• Prematuridade: variável categórica nominal dicotômica. Categorizada como
sim e não. Nascimento antes da 37ª semana de gestação. Informação baseada no
resumo de alta da maternidade ou na informação da mãe ou responsável,
categorizada como sim e não.
• Peso ao nascer: variável numérica contínua. Categorizada para análise como
<2.500g e >2.500g. Peso da criança menor de cinco anos ao nascer, expresso em
gramas. Informação baseada no resumo de alta da maternidade ou na informação
da mãe ou responsável.
• Hemoglobina: variável numérica contínua. Molécula da hemácia que contém o
ferro orgânico. Foi considerada a primeira dosagem realizada durante o
internamento.
• Doença de base: variável categórica nominal dicotômica. Categorizada como
sim e não. Doença grave e crônica que sabidamente tenha influência negativa no
estado nutricional da criança, diagnosticada previamente a admissão ou durante
a hospitalização através da avaliação realizada pelos médicos especialistas do
IMIP, como cardiopatia, pneumonia crônica, síndrome genética, doença
neurológica, etc., inclusive síndrome da imunodeficiência adquirida.
25
3.6 Coleta de dados
3.6.1 Grupo de crianças com desnutrição energético-protéica grave
A seleção incial das crianças do estudo (idade, medidas antropométricas e
aferição da presença do edema) foi realizada por auxiliar de pesquisa, devidamente
treinada, nas enfermarias pediátricas do IMIP, localizadas nos 3º e 4º andar.
O peso foi aferido em balança, para uso específico da pesquisa, marca Filizola,
modelo BP baby 6767-00 com capacidade máxima de 15kg e mínima de 125g e
sensibilidade de 5g, estando a criança despida e clinicamente hidratada. O comprimento
foi aferido através de um antropômetro horizontal com 130cm de extensão e precisão de
0,1cm, com a criança calma, sem sapatos, deitada em posição supina paralela ao eixo
axial do instrumento, com a cabeça posicionada na linha média e tocando a borda
superior do mesmo. Os pés eram fletidos em ângulo de 90º com a perna, tocando o
limite inferior do antropômetro. As técnicas para a aferição do peso e comprimento
atenderam a padronização do Ministério da Saúde.65
A presença de edema foi avaliada por meio do sinal do cacifo66 presente pelo
menos no dorso dos pés.
Uma vez preenchido os critérios de inclusão, os responsáveis legais pelos
pacientes foram informados pela auxiliar de pesquisa, sobre o presente estudo, quando a
seguir, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (APÊNDICE 2).
No mesmo dia da inclusão do paciente no estudo, contactava-se com funcionário
do laboratório do IMIP, previamente treinado pelo Centro de Investigação em
Micronutrientes da Universidade Federal da Paraíba (CIMICRON) e procedia-se a
coleta de amostra de sangue para a realização dos exames.
26
Foi coletada uma amostra de aproximadamente 8ml de sangue (2ml para a
realização da hemoglobina e 6ml para a realização da PCR e do retinol), através de
flebotomia cubital. O sangue foi depositado em dois tubos identificados (número do
registro, nome do paciente e data), o primeiro tudo Vacutainer com anticoagulante para
a realização da hemoglobina e o segundo protegido da luz recoberto com papel alumínio
para a realização do retinol e PCR. O sangue contido no segundo tubo foi centrifugado a
3.000 rpm por cinco minutos para a separação do soro e dos elementos celulares do
sangue. Posteriormente o soro foi dividido para dois ependorfes. O primeiro ependorfe
identificado (número do registro, nome do paciente e data), seguia para o setor de
bioquímica do laboratório do IMIP para dosagem da PCR e o segundo ependorfe
identificado (número do registro, nome do paciente e data), foi estocado em freezer a
temperatura –20ºC localizado na Farmácia Hospitalar do IMIP, para posteriormente ser
enviado para dosagem da CRS no CIMICRON.
A aplicação do formulário para registro dos dados foi realizada na enfermaria
“E” do 4º andar, destinada às crianças com DEP grave.
As crianças que apresentaram PCR >12mg/l (marcador para
inflamação/infecção) foram excluídas do estudo.
3.6.2 Grupo de comparação para análise da concentração do retinol sérico
(crianças eutróficas)
A seleção inicial (idade e medidas antropométricas) foi realizada nas
enfermarias pediátricas cirúrgicas do IMIP, localizadas no 1º e 2º andar, pela auxiliar
de pesquisa. Foram selecionadas para o grupo de comparação, crianças que iriam ser
submetidas a cirurgias eletivas. O processo de recrutamento foi feito por conveniência.
27
As aferições das medidas antropométricas do grupo de comparação foram
realizadas da mesma forma descrita para as crianças com DEP grave, exceto em relação
às crianças acima de dois anos, nas quais para a aferição do peso e da altura foi utilizada
balança de plataforma eletrônica, marca Toledo, modelo 6063866, carga máxima 150kg
e mínima de 125g estando a criança colocada no centro do equipamento, ereta, com os
pés juntos e os braços estendidos ao longo do corpo. A aferição da altura foi realizada
com antropômetro vertical dessa mesma balança, com a criança posicionada no centro
do equipamento, descalça, com a cabeça livre de adereços, de pé, ereta, com os braços
estendidos ao longo do corpo, a cabeça erguida, olhando para um ponto fixo na altura
dos olhos. As técnicas para a aferição do peso e altura atenderam a padronização do
Ministério da Saúde.65
Após terem preenchido os critérios de inclusão, a auxiliar de pesquisa, informou
aos responsáveis legais pelos pacientes a respeito do presente estudo, quando, assinaram
o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (APÊNDICE 2), e a seguir, aplicou o
formulário para registro dos dados. No início do procedimento anestésico, na sala de
cirurgia, foi coletada uma amostra de sangue pela pesquisadora e/ou anestesista, de
acordo com a técnica já referida anteriormente, e a seguir, essas amostras foram
enviadas ao laboratório do IMIP para a realização das dosagens da CRS e PCR.
As crianças que apresentaram PCR >12mg/l (marcador para
inflamação/infecção) foram excluídas do estudo.
3.6.3 Padronização das técnicas
O valor da hemoglobina foi obtido utilizando o princípio SLS hemoglobine e os
reagentes sulfolyser (para análise) e cell clean (para limpeza). Equipamento: Sysmex
3.000, ano 2002. O tubo Vacutainer com anticoagulante contendo 2ml de sangue foi
28
colocado no aparelho de modo manual ou fechado, passando o sangue junto ao reagente
(sulfolyser) pelo método SLS hemoglobine, tendo como resultado a hemoglobina total.
A CRS foi obtida pelo HPLC. Equipamento: Gilson-França, ano 1997; modelo:
305 – Modular HPLC PUMP; tipo de coluna e detector: Espectromonitor modelo CG-
477-B, operando na região ultra violeta a 325 nm e módulo monométrico 805, coluna de
guarda nucleosil (18) 20μL; padrão: Acetato de retinol – Roche/SP; tipo de saída de
dados: Sistema de dados para cromatografia – Peaksimples II/PK-2/versão 3.92 Ciola e
Gregori; retenção do pico: começo – 1.76min, final – 2.38min; fluxo de fase móvel:
1,5ml/min. Método de H C Furr. Rotina para controle de qualidade: Curva de calibração
(trimestral); determinação da acurácia através de envio para laboratório externo; análise
em duplicata (10,0% da rotina diária), amostra desprezada com diferença maior de
10,0%.
A PCR foi determinada através de KIT’s PCRTEST, cujo princípio é uma
suspensão de partículas de látex estabilizadas e absorvidas com antircorpos anti-proteína
C reativa. Essa suspensão, em contato com amostras contendo PCR e na presença de
íons cálcio, produz uma aglutinação das partículas de látex, visível macroscopicamente.
Teste positivo: nítida aglutinação. Teste negativo: suspensão homogênea.
29
PACIENTES COM DEP GRAVE PACIENTES EUTRÓFICOS
DEP=desnutrição energético-protéica; HGP=Hospital Geral de Pediatria; CRS=concentração do retinol sérico; PCR=proteína C reativa; IMIP=Instituto Materno Infantil Prof. Fernando Figueira; CIMICRON=Centro de Investigação em Micronutrientes da Universidade Federal da Paraíba
Figura 2 - Fluxograma de captação dos pacientes
ENFERMARIAS DO HGP(3º e 4ºandar) • Avaliação dos critérios de
inclusão; • Aferição do peso, comprimento
e da presença de edema; • Consentimento livre e
esclarecido do responsável; • Coleta da amostra de sangue
para dosagem da CRS, PCR e hemoglobina.
ENFERMARIA “E” 4ºº HGP • Aplicação do formulário para
registro dos dados.
LABORATÓRIO DO IMIP • Dosagem da hemoglobina (pacientes com DEP grave); • Centrifugação para separação do soro. Posteriormente o soro
dividido em dois ependorfes diferentes (PCR e CRS); • Dosagem da PCR.
ESTOCAGEM DO SORO PARA A DOSAGEM DA CRS
• Freezer a temperatura de –20ºC
LABORATÓRIO DO CIMICRON • Dosagem da CRS
ENFERMARIAS CIRÚRGICAS DO HGP (1º e 2º andar)
• Avaliação dos critérios de inclusão;
• Aferição do peso e comprimento;
• Consentimento livre e esclarecido do responsável;
• Aplicação do formulário para registro dos dados.
BLOCO CIRÚRGICO PEDIÁTRICO • Coleta da amostra de sangue para
dosagem da CRS e PCR.
30
3.7 Instrumento para coleta de dados
Foi utilizado um formulário pré-codificado (APÊNDICE 1) elaborado com as
variáveis do estudo de modo a possibilitar o alcance dos objetivos propostos.
3.8 Processamento e análise dos dados
Após a revisão dos formulários, os dados foram digitados (com dupla entrada)
utilizando-se o programa software EPI-INFO versão 6.0, construindo-se o banco de
dados. Para análise do estado nutricional utilizou-se o EPINUT, módulo do EPI-INFO,
com o padrão do NCHS 1977.
As variáveis categóricas foram sumarizadas utilizando-se a freqüência (absoluta
e relativa). Para os dados contínuos foram calculadas medidas numéricas de locação e
dispersão. Decidiu-se utilizar a mediana como estimativa do valor da CRS em crianças
com DEP grave, e testes não-paramétricos, devido a assimetria apresentada por essa
variável. A precisão dessa estimativa foi avaliada através do cálculo de um intervalo de
95% de confiança. Entre as crianças com DEP grave, a comparação da CRS por sexo,
idade (<12 meses e >12 meses), presença ou ausência de pneumonia e/ou diarréia, foi
realizada pelo teste de Mann-Whitney. As distribuições do sexo e idade (<12 meses e
>12 meses) entre as crianças com DEP grave e as crianças eutróficas foram comparadas
pelo teste exato de Fisher. A comparação da CRS entre as crianças com DEP grave e as
crianças eutróficas, foi feita segundo a idade (<12 meses e >12 meses), utilizando-se o
teste de Mann-Whitney.
31
A correlação entre o nível de hemoglobina e a CRS foi avaliada pelo coeficiente
de correlação de Spearmann. Em todos os testes foi adotado o nível de significância de
5%.
Os dados foram processados com o software SPSS, versão 13.0.
3.9 Limitações do estudo
O tamanho reduzido da amostra pode ter interferido no encontro de significância
estatística nas comparações estudadas. O pequeno número de crianças com os critérios
de inclusão admitidas por ano no IMIP, implicaria em um tempo prolongado para a
coleta dos dados, extrapolando o prazo disponível pela pesquisadora para tal
procedimento.
Não foi possível, por questões operacionais, a utilização de dois indicadores
biológicos (CRS e CIC) para avaliar a ocorrência da DVA, conforme recomendação da
OMS.8
A utilização da PCR como marcador para a presença de infecção/inflamação,
pode ter interferido no diagnóstico dessas condições, uma vez que essa proteína se eleva
nas primeiras seis horas da resposta de fase aguda, podendo atingir seu valor máximo
entre 24 e 48 horas, com redução após esse período. O marcador ideal para
infecção/inflamação seria a dosagem da Alfa 1-ácido glicoproteína,28 que eleva-se mais
precocemente e permanece prolongada por mais tempo, no entanto, não foi possível a
sua realização nos laboratórios acessíveis a esta pesquisa.
Mais da metade das crianças deste estudo (58,8%) apresentou infecção
diagnosticada clinicamente (diarréia e/ou pneumonia), embora com valor da PCR
<12mg/l, fato que pode ter interferido no resultado da CRS. Como diarréia (55,6%) e
32
pneumonia (26,3%) são os principais motivos da hospitalização nas crianças com DEP
grave no IMIP,62 caso as crianças portadoras dessas doenças fossem excluídas a amostra
desse estudo seria composta por apenas 14 crianças.
Não foi possível selecionar as crianças para o grupo de comparação pela idade,
de tal forma que os grupos fossem homogêneos em relação a essa variável.
3.10 Aspectos éticos
Esta pesquisa está de acordo com a DECLARAÇÃO DE HELSINQUE e com as
Normas da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Ética em Pesquisa e Conselho
Nacional de Saúde.
A coleta de dados foi realizada com prévia assinatura do termo de consentimento
livre e esclarecido pelos pais ou responsáveis pelas crianças participantes (APÊNDICE
2), e o projeto obteve a aprovação prévia do Comitê de Ética em Pesquisa em Seres
Humanos do IMIP
34
4 RESULTADOS
Das 57 crianças inicialmente selecionadas para o estudo, 23 foram excluídas: 3
por terem recebido a dose da vitamina A antes da coleta de sangue para a dosagem do
retinol sérico, 4 por não obtenção do consentimento para a participação no estudo e 16
por apresentarem proteína C reativa >12 mg/L. No total participaram do estudo 34
crianças.
4.1 Características das crianças
Mais da metade das crianças (58,8%) era procedente do interior do Estado de
Pernambuco, com cerca de 40,0% das residências sem abastecimento de água, sem
saneamento básico e sem coleta de lixo adequada. Das 34 crianças, 31 (91,2%) tinham
mães com menos de oito anos de escolaridade e 94,1% pertenciam à famílias com renda
per capita mensal inferior a meio salário mínimo (Tabela 1).
35
Tabela 1 - Distribuição de freqüência das crianças com desnutrição energético-protéica
grave, hospitalizadas no Instituto Materno Infantil Prof. Fernando Figueira, segundo
variáveis da sua condição sociodemográfica. Recife, agosto de 2004 a maio de 2005.
Variáveis n %
Local da residência RMR 11 32,4
Zona Mata 10 29,4
Agreste 8 23,5
Sertão 2 5,9
Outros Estados 3 8,8
Total 34 100,0
Água encanada Sim 20 58,8
Não 14 41,2
Total 34 100,0
Fossa ou esgoto Sim 20 58,8
Não 14 41,2
Total 34 100,0
Recolhimento de lixo Sim 20 58,8
Não 14 41,2
Total 34 100,0
Escolaridade materna Nenhuma 6 17,7
<8 anos 25 73,5
>8 anos 3 8,8
Total 34 100,0
Renda per capita <1/2 salário mínimo 32 94,1
≥1/2 salário mínimo 2 5,9
Total 34 100,0
36
A idade das crianças variou de 1 mês a 57 meses, com mediana de 9 meses (1º
Quartil = 3,0 meses e 3º Quartil = 21,5 meses), sendo, a maior parte delas (64,7%) do
sexo feminino. Dezoito das 34 crianças (52,9%) mamaram por um período inferior a
três meses e sete (20,6%) nunca foram amamentadas. Antecedentes de baixo peso ao
nascer e de prematuridade foram verificados respectivamente em 44,4% e 31,2% das
crianças. Diarréia e/ou pneumonia (58,8%) foram os motivos mais freqüentes de
hospitalização nessas crianças.
No momento da admissão aproximadamente 40,0% das crianças apresentava
edema e pouco mais de um terço (35,3%) apresentava uma doença de base. Das 23
crianças com idade maior que seis meses, portanto com indicação para receber a
suplementação pelo Programa do Ministério da Saúde, 12 haviam recebido
suplementação prévia da vitamina A (Tabela 2).
37
Tabela 2 - Distribuição de freqüência das crianças com desnutrição energético-protéica
grave, hospitalizadas no Instituto Materno Infantil Prof. Fernando Figueira, segundo
variáveis indicadoras da sua condição biológica e de saúde. Recife, agosto de 2004 a
maio de 2005
Variáveis n %
Idade <12 meses 23 67,6 > 12 meses 11 32,4 Total 34 100,0 Sexo Masculino 12 35,3 Feminino 22 64,7 Total 34 100,0 Aleitamento materno Nunca mamou 7 20,6 <3 meses 18 52,9 ≥3 meses 9 26,5 Total 34 100,0 Peso ao nascer * < 2500g 12 44,4 ≥2500 g 15 55,6 Total 27 100,0 Prematuridade * Sim 10 31,2 Não 22 68,8 Total 32 100,0 Motivo do internamento Diarréia 9 26,5 Pneumonia 5 14,6 Diarréia e pneumonia 6 17,7 Outras causas 14 41,2 Total 34 100,0 Edema Sim 14 41,2 Não 20 58,8 Total 34 100,0 Doença de base Sim 12 35,3 Não 22 64,7 Total 34 100,0 Administração prévia de vitamina A * † Sim 12 75 Não 04 25 Total 16 100,0 * A diferença em relação ao número total de crianças estudadas corresponde à ausência de informação; † Não
foram incluídas as crianças < 6 meses
38
As doenças de base estão apresentadas na Tabela 3
Tabela 3 - Distribuição de freqüência das crianças com desnutrição energético-protéica
grave, hospitalizadas no Instituto Materno Infantil Prof. Fernando Figueira, segundo a
presença de doença de base. Recife, agosto de 2004 a maio de 2005
Doenças de base n %
Cardiopatia congênita 3 25,1
Displasia bronco pulmonar 1 8,3
Displasia ectodérmica 1 8,3
Encefalopatia 1 8,3
Hidronefrose 1 8,3
Infecção congênita 3 25,1
Síndrome de Down/cardiopatia congênita 1 8,3
Síndrome de Down 1 8,3
Total 12 100,0
4.2 Concentração do retinol sérico
O nível da CRS nas crianças com DEP grave estimado pela mediana foi igual a
21,7μg/dL (IC95%: 16,8μg/dL - 27,7μg/dL).
Não foram observados níveis de retinol sérico considerados deficientes
(<10μg/dL). Níveis baixos (<20μg/dL) foram encontrados em 41,2% das crianças,
39
enquanto níveis marginais (20 a 30μg/dL) em 29,4% delas, totalizando 70,6% de níveis
inadequados de retinol (Tabela 4).
Tabela 4 - Distribuição de freqüência das crianças com desnutrição energético-protéica
grave, hospitalizadas no Instituto Materno Infantil Prof. Fernando Figueira, segundo a
concentração do retinol sérico. Recife, agosto de 2004 a maio de 2005.
Retinol sérico n fr% Fr%
<20μg/dL 14 41,2 41,2
20 a 30μg/dL 10 29,4 70,6
>30μg/dL 10 29,4 100,0
Total 34 100,0 -
fr%= freqüência relativa simples; Fr%= freqüência relativa acumulada.
Em apenas uma criança houve a suspeita de xeroftalmia, a qual tinha 48 meses
de idade (quatro anos e 23 dias), apresentava antecedentes de prematuridade e baixo
peso ao nascer. Foi amamentada até os dois anos de idade e havia recebido
suplementação de vitamina A há oito meses da admissão. Foi hospitalizada por diarréia,
apresentando dosagem de hemoglobina de 9,1g% e retinol sérico de 16,48μg/dL. O
exame com lâmpada de fenda realizado pelo oftalmologista diagnosticou xerose
conjuntival, xerose de córnea e úlcera de córnea. Apresentava também como hipótese
diagnóstica a displasia ectodérmica, síndrome genética caracterizada pela ausência,
atraso ou desenvolvimento incompletos de uma ou mais estruturas derivadas do
ectoderma (cabelos, glândulas sudoríparas e unhas).
40
4.3 Comparação das concentrações do retinol sérico entre crianças
com desnutrição energético-protéica grave e crianças eutróficas
Das 39 crianças eutróficas selecionadas inicialmente, 10 foram excluídas: duas
por apresentarem PCR >12mg/L e oito por hemólise da amostra sanguínea
inviabilizando a realização desse exame. No total fizeram parte do grupo 29 crianças.
Não foram observados níveis de retinol sérico considerados deficientes
(<10μg/dL). Níveis baixos (<20μg/dL) foram encontrados em 24,1% das crianças,
enquanto níveis marginais (20 a 30μg/dL) em 55,2% delas, totalizando 79,3% de níveis
inadequados de retinol (Tabela 5).
Tabela 5 - Distribuição de freqüência das crianças eutróficas do grupo de comparação,
hospitalizadas no Instituto Materno Infantil Prof. Fernando Figueira, segundo a
concentração de retinol sérico. Recife, agosto de 2004 a maio de 2005
Retinol sérico n fr% Fr%
<20μg/dL 7 24,1 24,1
20 a 30μg/dL 16 55,2 79,3
>30μg/dL 6 20,7 100,0
Total 29 100,0 -
fr%= freqüência relativa simples; Fr%= freqüência relativa acumulada.
A distribuição do sexo foi homogênea entre os grupos de crianças com DEP
grave e eutróficas (p=0,212). Quanto a idade verificou-se que a proporção de crianças
menores ou iguais a um ano foi significantemente maior no grupo com DEP grave do
41
que no grupo de crianças eutróficas (p=0,001). A distribuição do sexo e da idade entre
os grupos está apresentada respectivamente nas Tabelas 6 e 7.
Tabela 6 - Distribuição de freqüência das crianças com desnutrição energético-protéica
grave e das crianças eutróficas do grupo de comparação, hospitalizadas no Instituto
Materno Infantil Prof. Fernando Figueira, segundo o sexo. Recife, agosto de 2004 a
maio de 2005.
Sexo DEP grave Eutróficas p*
n % N %
Masculino 12 44,4 15 61,1 0,212
Feminino 22 55,6 14 38,9
Total 34 100,0 29 100,0
* Teste Exato de Fisher; DEP=desnutrição energético-protéica.
Tabela 7 - Distribuição de freqüência das crianças com desnutrição energético-protéica
grave e das crianças eutróficas do grupo de comparação, hospitalizadas no Instituto
Materno Infantil Prof. Fernando Figueira, segundo a idade. Recife, agosto de 2004 a
maio de 2005.
Idade DEP grave Eutróficas p*
n % n %
<12 meses 23 67,6 8 27,6 0,001
>12 meses 11 32,4 21 72,4
Total 34 100,0 29 100,0
* Teste qui-quadrado; DEP=desnutrição energético-protéica
42
Como a distribuição das idades não foi homogênea entre os grupos, a
comparação da CRS foi feita por faixa etária, segundo a categorização utilizada (<12
meses e >12 meses).
O resultado do teste de Mann-Whitney mostra que tanto em crianças com idade
<12 meses, quanto entre as crianças com idade acima de um ano, não houve diferença
estatisticamente significantes entre as medianas do retinol sérico entre os grupos
(Tabela 8).
Tabela 8 - Comparação da concentração do retinol sérico entre as crianças com
desnutrição energético-protéica grave e as crianças eutróficas do grupo de comparação,
hospitalizadas no Instituto Materno Infantil Prof. Fernando Figueira, segundo a idade.
Recife, agosto de 2004 a maio de 2005
Idade Grupo n = 63 Min Q1* Mediana Q3** Máx p***
<12 meses DEP grave 23 12,5 16,7 21,2 27,8 52,1 0,078
Eutróficas 8 20,7 23,7 26,0 34,5 38,2
>12 meses DEP grave 11 14,4 15,5 22,3 34,1 50,3 0,890
Eutróficas 21 14,0 17,8 23,2 28,7 35,3
* 1º Quartil;**3º Quartil; ***Teste Mann-Whitney; Min=minímo; Máx=máximo.
43
4.4 Comparação da concentração do retinol sérico no grupo das
crianças com desnutrição energético-protéica grave, segundo o sexo, a
idade, a presença de pneumonia e diarréia
O resultado do teste de Mann-Whitney mostra que não houve diferença
estatisticamente significante entre as distribuições da CRS, de acordo com o sexo, a
idade e a presença de pneumonia das crianças com DEP grave, entretanto, foi
significativamente menor em crianças com diarréia (p=0,021) (Tabela 9).
44
Tabela 9 - Comparação da concentração do retinol sérico das crianças com desnutrição
energético-protéica grave, hospitalizadas no Instituto Materno Infantil Prof. Fernando
Figueira, segundo o sexo, a idade, a presença de pneumonia e diarréia. Recife, agosto de
2004 a maio de 2005.
Variáveis Retinol sérico (μg /dL)
n Minímo Q1* Mediana Q3** Máximo p***
Sexo
Masculino 12 14,5 15,5 17,4 33,9 52,1 0,614
Feminino 22 12,5 16,7 22,8 32,8 50,3
Total 34
Idade
< 12 meses 23 12,5 16,6 21,2 27,8 52,1 0,985
> 12 meses 11 14,4 15,5 22,3 34,1 50,3
Total 34
Pneumonia
Sim 11 12,5 15,5 20,5 27,8 35,9 0,387
Não 23 14,4 16,5 24,4 33,7 52,1
Total 34
Diarréia
Sim 15 12,5 15,5 16,6 23,4 35,6 0,021
Não 19 14,4 17,7 27,6 34,6 52,1
Total 34
* 1º Quartil; ** 3º Quartil; *** Teste Mann-Whitney
45
4.5 Correlação entre a concentração do retinol sérico e o nível de
hemoglobina nas crianças com desnutrição energético-protéica grave
Foi observada uma correlação positiva entre a concentração do retinol sérico e
hemoglobina, porém essa correlação não foi estatisticamente significante (coeficiente de
Correlação de Spearman: (r=0,28; p=0,110) (Figura 3).
Hemoglobina (g%)
Retin
ol s
éric
o(µg
/dL)
1614121086420
50
40
30
20
10
0
Figura 3 - Correlação entre a concentração do retinol sérico e o nível de hemoglobina
entre as crianças com desnutrição energético-protéica grave, hospitalizadas no Instituto
Materno Infantil Prof. Fernando Figueira. Recife, agosto de 2004 a maio de 2005.
47
5 DISCUSSÃO
As características das crianças estudadas são compatíveis com o perfil
epidemiológico esperado para a criança desnutrida hospitalizada no IMIP,62 uma vez
que, a maior parte delas tinha idade inferior a 12 meses, pertencia a famílias que
residiam no interior do Estado, em habitação com precária condição de saneamento, e
com rendimento situando-as abaixo da linha de pobreza. Além disso, são crianças que
foram desmamadas precocemente e têm mães com baixo nível de escolaridade.
Não obstante a redução nos índices de DEP no Nordeste do Brasil, de 27,0%
para 8,3%, no período de 1974 a 1996,3 das 34 crianças com DEP no presente estudo,
22, ou seja, mais de 60,0% possuíam desnutrição primária causada pela ingestão
inadequada dos alimentos e infecções.8 Esta realidade, além de elevar as taxas de
mortalidade hospitalar, os custos hospitalares e a demanda nos serviços de saúde,
contribui para o aumento do número de crianças que poderão vir a ter algum tipo de
retardo no desenvolvimento.67
A forma de distribuição social da renda no Brasil manteve, ou até mesmo elevou
o diferencial entre ricos e pobres, e, portanto, o País, é considerado um dos mais
injustos do mundo no que se refere à partilha social das riquezas produzidas,68 o que
justifica encontrarmos crianças, em nossa realidade atual, com DEP ainda originada por
fatores primários.
Nos últimos anos houve uma melhora no acesso, na cobertura e na
resolutividade das ações de saúde, e praticamente universalizaram-se os programas de
vacinação, assim como o tratamento das doenças prevalentes na infância foi franqueado
à grande maioria da população. Se por um lado essas ações contribuem para a redução
48
das doenças e da DEP, também são responsáveis pela referência dos casos mais graves
para os centros hospitalares através da sua identificação na comunidade.68
A estimativa pela mediana da CRS nas crianças com DEP grave, neste estudo,
foi igual a 21,7μg/dL (IC95%: 16,8μg/dL - 27,7μg/dL). Foram encontrados níveis
considerados baixos (< 20μg/dL) em 41,2% das crianças, enquanto que níveis marginais
(20 a 30μg/dL) em 29,4% delas, o que corresponde a um total de 70,6% de níveis
considerados inadequados em todas as crianças. Nenhuma criança deste estudo
apresentou CRS deficiente (<10μg/dL).
Reddy et al., 57 avaliando 93 crianças na Índia, observaram que a CRS em
crianças com sinais clínicos de DEP grave e sem sinais clínicos de DVA foi de 19,2 +
2,3μg/dL, e que esta média era alterada de acordo com a presença e gravidade das
lesões oculares, ou seja, quando as lesões foram apenas na conjuntiva a média amostral
foi de 17,3 + 3,6μg/dL, e com lesões corneais foi de 6,1 + 0,8μg/dL. Esses autores não
levaram em consideração a presença de marcadores para a inflamação/infecção na
avaliação da CRS.
Estudo descritivo realizado no Zaire, durante janeiro e fevereiro de 1990
envolvendo 28 crianças com sinais clínicos de DEP grave hospitalizadas e 153 crianças
eutróficas observou CRS deficiente (<10μg/dL) em 61,0% das crianças com DEP grave
e em 37,0% nas crianças controles e níveis baixos (<20μg/dL) em 35,0% e 57,0%,
respectivamente. Foi utilizada a PCR como marcador para inflamação/infecção, porém,
a CRS não apresentou diferença estatisticamente significante quando analisada em
relação a essa proteína de fase aguda.69
Donner et al., 58 também em estudo realizado no Zaire, entre março de 1994 a
março de 1996 com 900 crianças com sinais clínicos de DEP grave hospitalizadas de
49
zero a 72 meses, observaram uma média de retinol sérico de aproximadamente 7,0
μg/dL neste grupo.
Pesquisa realizada em Bangladesh de maio a dezembro de 1995, com 95
crianças hospitalizadas, evidenciou que a média dos níveis de retinol sérico variou de
acordo com o grau da desnutrição, sendo significativamente mais baixa em pacientes
com o indicador peso/idade <-2 escore z que naqueles com valor do indicador >-2
escore z (8,6 + 5,4μg/dL comparado com 14,3 + 8μg/dL), p=0,002.35 O mesmo autor,
ao estudar retrospectivamente 32 crianças com DEP grave hospitalizadas em
Bangladesh no mesmo período do estudo anterior, observou que a média de retinol
nessas crianças foi de 16,6 + 5,7μg/dL.36
Estudo realizado em Pernambuco, na década de 70, em 427 crianças em idade
pré-escolar, verificou valores de retinol sérico baixos (<20μg/dL) e deficientes
(<10μg/dL) em 10,2% de crianças sem desnutrição, enquanto que esta prevalência
elevou-se com os casos de 1º, 2º e 3º graus de desnutrição para, respectivamente,14,9%,
23,6% e 53,8%.55 Outro estudo no Nordeste do Brasil, também nesta mesma década,
observou que 18,0% das crianças em idade pré-escolares apresentavam níveis de retinol
inferiores a 20μg/dL, porém quando as crianças apresentavam desnutrição, embora não
analisada por padrões antropométricos, essa percentagem elevava-se para 33,0%.56
Pesquisa na Bahia, nos anos 90, após estudar 161 crianças, encontrou níveis de
retinol sérico baixos (<20μg/dL) em 40,4% e deficientes (<10μg/dL) em 4,3% dos
casos, porém não observou significância estatística com a DEP quando avaliada por
padrões antropométricos, apesar que crianças com déficit de A/I apresentavam
percentuais mais elevados de níveis séricos de retinol quando comparadas com crianças
sem esta condição.59
50
A exemplo, dos achados relatados nos estudos citados anteriormente, esperava-
se que as crianças do presente estudo apresentassem níveis deficientes do retinol sérico
(<10μg/dL), uma vez que são desnutridas graves, e portanto, com maior risco para
apresentarem deficiência de micronutrientes.24,31,36 A diferença encontrada em relação
aos estudos realizados na África pode estar relacionada com a maior freqüência da
malária70 e da infecção pelo HIV,30 bem como na carência alimentar que pode ser um
pouco mais acentuada nas crianças daquela região.
Uma hipótese que poderia justificar os achados dos estudos citados no Nordeste,
é que estes foram realizados antes da implantação pelo Ministério da Saúde do
Programa de Controle à Deficiência de Vitamina A em 1994,71 no qual todas as crianças
que residem em área de risco para a deficiência devem receber mega doses desta
vitamina a partir do 6º ao 59º mês de idade,72 o que vem ocorrendo no Nordeste,
especificamente em Pernambuco.
No presente estudo, das 27 crianças nas quais se obteve a informação sobre a
suplementação, 12 receberam a vitamina A. Das 15 crianças que não foram
suplementadas, onze tinham menos de seis meses de idade, faixa etária não incluída
neste programa, pelo fato de ser considerada de menor risco para desenvolver a DVA.53
Nessa avaliação não se levou em conta o momento da suplementação em relação ao
tempo da admissão no estudo.
Outra hipótese que poderia ser levantada para justificar os achados da CRS no
presente estudo e os demais estudos citados para comparação, seria em relação ao
programa de suplementação de mega dose de vitamina A para puérperas, no pós-parto
imediato nas maternidades/hospitais, com o objetivo de garantir um aporte de vitamina
A para crianças menores de seis meses de idade através do leite materno.72,73
51
No estudo atual não se obteve informação sobre a administração da vitamina A
para as mães, no entanto, foi observado que a maior parte (73,5%) das crianças havia
recebido aleitamento materno. Desta forma, caso essas mães tenham participado deste
programa, contribuíram, através da amamentação, para manter os estoques hepáticos e
níveis estáveis da vitamina A em suas crianças, suprindo as necessidades do
organismo.8,9,40 O colostro (leite secretado nos primeiros dois a sete dias pós-parto)
possui cerca de 10 vezes mais caroteno do que o leite maduro, o que lhe confere uma
cor amarelada.8,74
Como se sabe, a dosagem sérica do retinol nem sempre reflete a verdadeira
situação dos níveis de retinol no organismo,8,9,11 a qual pode ser influenciada pela DEP
e pela resposta inflamatória de fase aguda.27,31-34
Estudos realizados por Mitra et al., 35,36 associaram uma diminuição transitória
nas concentrações de retinol sérico de aproximadamente 22,0μg/dL com a gravidade da
infecção em 90 crianças hospitalizadas (internamento=10,3μg/dL, alta=32,9μg/dL) e de
aproximadamente 10μg/dL em 32 crianças hospitalizadas com DEP grave
(internamento=16,57μg/dL, alta=27,14 μg/dL), ambos os estudos em Bangladesh.
No presente estudo, para melhor estimar a CRS, procurou-se controlar a infecção
através da dosagem da PCR. Alguns estudos, relatados a seguir, referem a importância
da utilização de um marcador de inflamação/infecção para a avaliação da CRS.
Meta-análise realizada por Thurnham et al. 28 em 2003, analisando estudos, que
avaliaram os efeitos da infecção subclínica nas concentrações plasmáticas de retinol e
uma ou mais proteínas de fase aguda, verificaram que estimativas na redução do retinol
no plasma para indivíduos com infecção, comparadas com as estimativas para
indivíduos saudáveis foi de 13,0% na incubação, 24,0% no início da convalescença e
11,0% no final da convalescença.
52
Estudo realizado em 2519 crianças Paquistanesas entre 6 e 60 meses de idade,
aparentemente saudáveis, utilizando proteínas de fase aguda como marcadores de
infecção subclínica, observou o aumento do número de crianças com DVA: em 10,0%
quando as concentrações de retinol foram <20μg/dL e 56,0% quando as concentrações
foram <10μg/dL, confirmando o fato de que os processos inflamatórios interferem na
CRS levando a sua redução.63
Wieringa et al., 75 estimando o efeito da resposta inflamatória de fase aguda nos
indicadores do estado de micronutrientes em 418 crianças na Indonésia, encontraram
que a prevalência de DVA havia sido superestimada para mais em 16,0% das crianças
com infecção quando comparadas com crianças sem resposta inflamatória de fase
aguda. Especificamente quanto a PCR, a CRS foi 3,43μg/dL mais baixa nas crianças
que apresentavam concentração plasmática desta proteína >10mg/L.
Das proteínas de fase aguda, a PCR, apesar de suas limitações, é provavelmente
a mais comumente utilizada para monitorar atividade de infecção e inflamação.63
Entretanto, existem evidências que a DEP grave apresente síntese de proteínas de fase
aguda comprometida, e ainda mais nos casos de crianças edematosas.76
Têm sido descritos níveis, inadequadamente baixos, de proteínas de fase aguda,
em crianças com DEP, em resposta ao estímulo de citocinas.77 Estudo realizado por
Valbuena et al.,78 mostram que a PCR é sintetizada em concentrações menores em
crianças com DEP grave infectadas em relação a controles eutróficos. O mesmo autor,
em outro estudo, demonstrou que todas as crianças eutróficas infectadas apresentaram
elevações nos níveis de PCR, enquanto que para desnutridos com infecção a taxa foi de
72,7%.79
Baseando-se nos estudos acima, pode-se sugerir que, mesmo tendo incluído para
a avaliação apenas crianças com PCR <12mg/dL , esses valores podem ser atribuídos a
53
sua situação nutricional e não à ausência de processo inflamatório/infeccioso. Além do
que, mais da metade (58,8%) das 34 crianças do presente estudo, apresentaram infecção
diagnosticada clinicamente (diarréia e/ou pneumonia), podendo também ter interferido
no resultado da CRS, subestimando-o. Apesar da possibilidade da interferência dos
fatores citados acima, nehuma criança apresentou nível de retinol sérico deficiente
(<10μg/dL), e o percentual de crianças consideradas com nível baixo e marginal pode
estar superestimado.
Quando comparadas as medianas das CRS por faixa etária no grupo das crianças
com DEP grave e no grupo das crianças eutróficas não se evidenciou diferença
estatisticamente significante. Nas crianças eutróficas, a CRS apresentou-se baixa em
24,1% e marginal em 55,2%, evidenciando que, apesar do bom estado nutricional
dessas crianças aproximadamente 80,0% delas apresentaram CRS considerada como
inadequada. Alguns estudos59,69,80 evidenciam a ocorrência da DVA sem associação
com desnutrição quando considerada do ponto de vista antropométrico, podendo a
deficiência desse micronutriente existir indistintamente em crianças adequadamente
nutridas e desnutridas.
Apenas uma criança apresentou sinais clínicos suspeitos de xeroftalmia, porém,
a mesma apresentava como hipótese diagnóstica uma doença de base, a síndrome da
displasia ectodérmica, doença genética rara que afeta os derivados ectodérmicos do
corpo, incluindo a pele, cabelos, dentes, unhas e glândulas sebáceas.81 Série de casos
realizada por Daniel et al.82 em 2002, em 12 pacientes com displasia ectodérmica
confirmada geneticamente, três deles apresentaram expressões variadas, incluindo
secura ocular com injúria da córnea. Desta forma, pode-se interrogar se a úlcera de
córnea desta criança foi derivada da DVA ou da própria síndrome apresentada.
54
Ao contrário do que foi relatado, estudo realizado por Al-Kubaisy et al.83 em
700 crianças com idade entre 0 a 72 meses desnutridas, hospitalizadas no Iraque, foi
observada a síndrome xeroftálmica em 203 (29.0%) destas crianças.
A comparação da mediana da CRS de acordo com o sexo e a idade nas crianças
com DEP grave não evidenciou diferença estatisticamente significativa. Este resultado é
semelhante aos relatados em outros estudos como o realizado no Zâmbia com 87
crianças na faixa etária de 7 e 29 meses, o qual não encontrou significância estatística
entre retinol sérico baixo, sexo e a idade das crianças,84 o mesmo ocorrendo em
pesquisa com 2519 crianças paquistanesas aparentemente saudáveis de 6 a 60 meses,63 e
na Venezuela, com 207 crianças na faixa etária entre 24 a 85 meses.80 Por outro lado,
estudo envolvendo 919 crianças nas Ilhas Marshall, encontrou uma média de retinol
sérico significativamente menor em meninos (18,3 + 8,3 μg/dL) que em meninas (19,4
+ 8,0 μg/dL) (p=0,033), assim como, também, encontrou, que a média das idades das
crianças consideradas com DVA (CRS <20μg/dL) foi de 3,2 + 1,4 anos quando
comparada com a média das idades das crianças com CRS >20μg/dL, que foi de 2,9 +
1,5 anos, com p=0.01.47
Em 2002, Pee e Dary,26 compararam as prevalências de baixa concentração de
retinol sérico entre subgrupos de crianças menores de cinco anos de diferentes
populações, e observaram que a prevalência de CRS <20μg/dL tendeu a ser mais baixa
para crianças com idade de 48 a 59 meses quando comparadas com crianaças com idade
de 12 a 23 meses.
Quando se analisou a associação entre a mediana do retinol sérico e a presença
de diarréia, a diferença encontrada foi estatisticamente significante (p=0,021). Esse
resultado é semelhante ao encontrado por Salazar-Lindo et al.85 que estudaram 137
crianças na cidade de Lima, Peru, e observaram que a média do retinol sérico das
55
crianças com diarréia (14,57 + 13,71μg/dL) foi significantemente mais baixa que
naquelas sem diarréia (28,57 + 9,14μg/dL), e que episódios mais longos de diarréia
também apresentavam concentrações mais baixas de retinol sérico, sugerindo que os
estoques hepáticos do retinol sérico podem estar depletados na infecção. Tem sido
relatado que a suplementação de vitamina A pode reduzir a incidência, duração e a
gravidade dos episódios de diarréia.86
O papel da vitamina A na manutenção e na diferenciação e integridade das
células epiteliais é bem documentado, e provavelmente explica a influência na
morbidade e mortalidade das doenças infeciosas, uma vez a sua deficiência pode afetar
diretamente a integridade anátomo-funcional da mucosa do intestino, e desta forma
alterar a absorção dessa vitamina40,41 o que pode explicar a associação entre o nível de
retinol sérico e a presença de diarréia no presente estudo.
Quando se analisou a associação entre a mediana do retinol sérico e a presença
de pneumonia, a diferença encontrada não foi estatisticamente significante (p=0,387).
Velasquez et al., 87 em São Paulo, após alocar randomicamente 34 crianças
hospitalizadas com pneumonia e dividir em dois grupos, o grupo do estudo que recebeu
uma alta dose oral de palmitato de retinil aquoso além do tratamento de rotina para a
doença e o grupo controle apenas o tratamento de rotina, observou que no sétimo dia do
tratamento, quando os níveis médios de vitamina A foram comparados entre os dois
grupos, a diferença não foi estatisticamente significante entre os mesmos, sugerindo que
baixos níveis de vitamina A circulando no plasma em crianças com pneumonia pode ser
conseqüência de doenças infecciosas de fase aguda. Apesar do tamanho amostral
reduzido, essa pesquisa corrobora com outros estudos que encontraram associação entre
a diminuição da CRS e a presença de doenças infecciosas.27,31-34
56
Estudo realizado por Silva et al., 88 em Santo André, São Paulo, avaliaram os
níveis plasmáticos de retinol em 40 crianças, na faixa etária de seis a 60 meses,
hospitalizadas com pneumonia na fase aguda e após recuperação, e observaram que o
valor médio de retinol plasmático após a resolução do processo infeccioso foi
significativamente maior em relação à fase aguda da infecção (48,58 + 17,14 versus
40,00 + 17,14μg/dL).
Os estudos citados acima, mais uma vez, enfatizam a importância de se levar em
conta a presença de processos infecciosos quando se pretende analisar os níveis séricos
do retinol.
Quando analisados os níveis de hemoglobina e de retinol sérico entre as crianças
com DEP grave, encontrou-se uma correlação positiva, porém sem significância
estatistica (r=0,28 e p=0,110).
Achado semelhante foi relatado em pesquisa de base comunitária realizada com
904 crianças de idade entre um e cinco anos, entre novembro de 1994 a março de 1995,
nas ilha Marshall, encontrando uma proporção de 33,2% de crianças que apresentava
co-ocorrência de DVA (retinol sérico <20μg/dL) e anemia (Hb <11.0g/dL) de 33,2%,
sendo esta estatisticamente significante (p=0.0095), e de acordo com a correlação de
Spearman, as concentrações de retinol sérico e de hemoglobina revelaram uma co-
relação positiva e significante estatisticamente (r=0,159; p<0,0001).47
Estudo realizado em 178 municípios em Pernambuco, envolvendo 650 crianças
com idade entre 6 a 59 meses, encontrou que o retinol sérico foi significativamente
associado com a concentração de hemoglobina (p<0,001).89 Trabalho realizado na
Indonésia envolvendo mulheres grávidas, revelou que a suplementação com vitamina A
e ferro aumentou significativamente a proporção de mulheres que deixaram de ser
anêmicas, quando comparada com a suplementação isolada de ferro, de vitamina A ou
57
de placebo. Este estudo observou um aumento na hemoglobina maior que 50,0%
quando a vitamina A foi fornecida associada ao ferro.51 Yamanura et al.,48 após
conduzirem pesquisa de base comunitária na Micronésia no ano de 1993, com 355
crianças com idade entre 24 a 48 meses, encontraram associação estatisticamente
significante entre Hb <11,0g/dL e DVA (p=0,002).
Por outro lado, estudo realizado envolvendo 188 crianças entre dois e seis anos,
em Ribeirão Preto, São Paulo, não encontrou significância estatística entre a carência de
ferro e a deficiência de vitamina A.49
Os achados do presente estudo e de forma geral os das pesquisas aqui
referenciadas, corroboram com a hipótese de que as deficiências de micronutrientes não
ocorrem isoladamente, e, sim, na forma de múltiplas carências, em especial as carências
de ferro e de vitamina A.
Por fim, apesar das limitações já mencionadas anteriormente, os resultados aqui
apresentados e discutidos contribuem para ampliar o conhecimento a respeito da
fisiopatologia da criança com DEP grave, especialmente, em relação aos
micronutrientes, o que representa uma ajuda significativa tanto para a implementação de
medidas preventivas tais como imunização, estímulo ao aleitamento materno, melhor
acesso, cobertura e resolutividade das ações de saúde, quanto para adequar o manejo
clínico dessas crianças reforçando ou reformulando recomendações anteriores.
Assim, espera-se que o estudo contribua para a redução da morbimortalidade
associada a desnutrição infantil, problema que apesar de vir diminuindo do ponto de
vista estatístico no nosso País, está longe ainda de ser solucionado.
59
6 CONCLUSÕES
1) Apesar da situação nutricional grave das crianças, nenhuma delas apresentou
concentração do retinol sérico deficiente (<10μg/dL), porém mais de 70,0% delas
apresentaram níveis considerados inadequados (baixos e marginais);
2) As medianas das CRS`s entre os grupos de crianças com DEP grave e as eutróficas,
controladas pela idade, não apresentaram diferença estatisticamente significante
entre si, sugerindo a ocorrência da DVA sem associação com desnutrição quando
considerada do ponto de vista antropométrico;
3) A mediana da CRS foi significativamente mais baixa nas crianças com DEP grave
apresentando diarréia, sugerindo a associação entre essa condição e a DVA;
4) Não houve diferença estatisticamente significante na mediana da CRS entre crianças
com DEP grave, quando analisada segundo o sexo, a faixa etária e a presença de
pneumonia, fato que pode ser explicado pelo reduzido tamanho da amostra;
5) A correlação encontrada, embora não estatisticamente significante, entre o nível de
hemoglobina e a CRS sugere que as deficiências de micronutrientes não ocorrem
isoladamente, e, sim, na forma de múltiplas carências.
61
7 RECOMENDAÇÕES
1) Continuidade do estudo em questão, com a finalidade de se obter um maior tamanho
amostral possibilitando uma melhor análise e poder de inferência dos resultados;
2) Realização de estudo com crianças desnutridas não hospitalizadas, para um maior
controle da presença de infecção clínica;
3) Nos estudos acima, sugere-se a utilização de mais de um indicador para DVA (CRS
e CIC), bem como de marcadores mais adequados para a presença de
inflamação/infecção (alfa1-ácido-glicoproteína);
4) Reforçar as campanhas de cobertura vacinal, incentivo ao aleitamento materno e de
suplementação de vitamina A para menores de cinco anos e para as mães no pós-
parto imediato em todo o Estado de Pernambuco.
63
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74
APÊNDICE 1
Avaliação da concentração do retinol sérico em crianças desnutridas graves hospitalizadas no IMIP Pesquisador_________________________ Nome da criança______________________________________________________ Data da coleta _____/_____/_____ Enfermaria: 1) Formulário No. 2) Registro: 3) Data do nascimento: ____/_____/_____ 4) Data da admissão: ____/_____/_____ 6) Sexo:
1. Masculino 2. Feminino
7) Idade: (meses) 8) Peso: (kg) . 9) Comprimento/Altura: (cm) 10) Indicador nutricional: __________ 11) Local da residência:
1. Zona da Mata 2. Agreste 3. Sertão 4. Região Metropolitana do Recife 9. Sem informação Nome da cidade: _____________________
12) Água encanada no domicílio: 1. Sim 2. Não 9. Sem informação
13) Recolhimento adequado de dejetos humanos (fossa séptica/esgotamento sanitário): 1. Sim 2. Não 9. Sem informação
14)Recolhimento do lixo: 1. Sim 2. Não 9. Sem informação
15) Número de habitantes por domicílio: 16) Renda total da família: 17) Renda per capita familiar:(dividir a renda total pelo número de habitantes):
75
18) Escolaridade da mãe 1. Ensino fundamental completo 2. Ensino fundamental incompleto 3. Ensino médio completo 4. Ensino médio incompleto 5. Ensino superior completo 6. Ensino superior incompleto 7. Nenhuma 9. Sem informação
19) Aleitamento materno 1. Nunca mamou 2. < 3 meses 3. > 03 meses 9. Sem informação
20) Prematuridade 1. Sim 2. Não 9. Sem informação
21) Peso ao nascer 1. < 2500 g 2. > 2500 g 9. Sem informação
22) Administração prévia de vitamina A 1. Sim 2. Não 9. Sem informação
23) Internamento atual por diarréia 1. Sim 2. Não 9. Sem informação
24) Internamento atual por pneumonia 1. Sim 2. Não 9. Sem informação
25) Doença de base (cardiopatia, pneumopatia crônica, síndrome genética, doença neurológica, etc. inclusive HIV):
1. Sim __________________________________ 2. Não 9. Sem informação
26) Edema (no mínimo simétrico no dorso dos pés) à admissão: 1. Sim 2. Não 9. Sem informação
27) Hemoglobina 28) Proteína C Reativa: _________________ 29) Dosagem sérica do retinol:
76
APÊNDICE 2
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO I. Dados de identificação do sujeito da pesquisa ou responsável legal Nome do paciente: Sexo:
Data de nascimento: Endereço: Telefone:
Responsável legal: Natureza (grau de parentesco, tutor, curador, etc.): Documento de identidade: Sexo: Data do nascimento: Endereço: Telefone:
II. Informações sobre a pesquisa Título da pesquisa: “Concentração do retinol sérico em crianças desnutridas graves hospitalizadas no IMIP” Pesquisador: Enfermeira Maria de Fátima Costa Caminha
Cargo/função: Enfermeira do serviço do IMIP, aluna do Mestrado Materno Infantil do IMIP Inscrição conselho regional: 64711 Endereço: Rua Teles Junior n. 113 – apt. 102 – Aflitos – Recife-PE Telefones: 34276496 / 99638097
Pesquisa a ser realizada no Instituto Materno Infantil de Pernambuco – IMIP, sobre “Concentração do retinol sérico em crianças desnutridas graves hospitalizadas no IMIP”. Este estudo trata de investigar a freqüência de deficiência sanguínea da vitamina A em crianças desnutridas graves hospitalizadas no IMIP. A realização do estudo é importante pela gravidade e pela escassez de estudos sobre o problema da DVA em crianças desnutridas graves.
O período da pesquisa se dará entre julho de 2004 a maio de 2005, com risco mínimo. Será coletada uma amostra de sangue para dosagem sérica do retinol, hemoglobina e proteína C reativa no momento da admissão. III. Consentimento da participação do investigado: Eu _________________________________________________, responsável legal pelo menor _______________________________________________, paciente matriculado no IMIP, registro ___________________________, declaro que fui devidamente informado (a) pela pesquisadora _____________________________________, sobre a finalidade da pesquisa “Concentração do retinol sérico em crianças desnutridas graves hospitalizadas no IMIP” e estou perfeitamente consciente de que: 1. Concordei em participar sem que recebesse nenhuma pressão; 2. Continuarei sendo atendido (a) no IMIP e dispondo de toda a atenção devida na
pediatria do IMIP, independente da minha participação na pesquisa; 3. Tenho a garantia de receber resposta a qualquer pergunta ou esclarecimento a
qualquer dúvida acerca dos procedimentos, riscos, benefícios e outros relacionados com a pesquisa;
77
4. Estou ciente que estou participando de um estudo de observação, não havendo qualquer interferência na conduta médica adotada;
5. Estou seguro (a) de que não serei identificado (a) e que será mantido caráter confidencial da informação relacionada com a minha privacidade;
6. Poderei retirar o meu consentimento a qualquer momento e deixar de participar do estudo sem que isso traga prejuízo à continuação do tratamento da criança.
Recife, ____________ de ________________ de 200__ ________________________________________________ Assinatura dos pais ou responsável legal ________________________________________________ Assinatura do pesquisador _______________________________________________ Testemunha