Balcãs (Projecto Portugal segundo a Europa)

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Balcãs Falar sobre Portugal e os Balcãs, a visão de Portugal nos países balcânicos e as imagens e estereótipos que os povos balcânicos construíram sobre este país, é uma questão complexa. Ao pronunciar-se a palavra “Balcãs”, no ocidente europeu, e parcialmente também em Portugal, as associações costumas ser negativas: zona de frequentes guerras, conflitos, instabilidade política, confusão, crises económicas, reivindicações violentas da identidade nacional ou religiosa, ditaduras de esquerda… Porém, muitas destas imagens são apenas representações superficiais, às vezes propositadamente exageradas, por vezes equívocas, ou reduzidas ao território da antiga República Socialista Federativa da Jugoslávia e à crise da sua desintegração provocada pela guerra civil entre 1991 e 1995. Contudo, não se pode esquecer que a ex-Jugoslávia (actualmente dividida em seis repúblicas que dantes tinham feito parte da Federação: a Sérvia, a Croácia, a Eslovénia, a Bosnia- Herzegovina, a Macedónia e o Montenegro) não era o único país balcânico. Acerca da questão sobre quais são os outros países integrantes desta região, existem diferentes critérios: geográficos, históricos, linguísticos, políticos, económicos… O que está certo é que se trata de uma zona étnica e religiosamente heterogénea, de grandes divergências e diferenças culturais, mas também de muitas semelhanças em termos do folclore, costumes, mentalidade, carácter, partes do passado histórico, formas de pensar, clima, geografia, gastronomia, música.

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Balcãs

Falar sobre Portugal e os Balcãs, a visão de Portugal nos

países balcânicos e as imagens e estereótipos que os povos

balcânicos construíram sobre este país, é uma questão complexa.

Ao pronunciar-se a palavra “Balcãs”, no ocidente europeu, e

parcialmente também em Portugal, as associações costumas ser

negativas: zona de frequentes guerras, conflitos, instabilidade

política, confusão, crises económicas, reivindicações violentas

da identidade nacional ou religiosa, ditaduras de esquerda…

Porém, muitas destas imagens são apenas representações

superficiais, às vezes propositadamente exageradas, por vezes

equívocas, ou reduzidas ao território da antiga República

Socialista Federativa da Jugoslávia e à crise da sua

desintegração provocada pela guerra civil entre 1991 e 1995.

Contudo, não se pode esquecer que a ex-Jugoslávia (actualmente

dividida em seis repúblicas que dantes tinham feito parte da

Federação: a Sérvia, a Croácia, a Eslovénia, a Bosnia-

Herzegovina, a Macedónia e o Montenegro) não era o único país

balcânico. Acerca da questão sobre quais são os outros países

integrantes desta região, existem diferentes critérios:

geográficos, históricos, linguísticos, políticos, económicos… O

que está certo é que se trata de uma zona étnica e religiosamente

heterogénea, de grandes divergências e diferenças culturais, mas

também de muitas semelhanças em termos do folclore, costumes,

mentalidade, carácter, partes do passado histórico, formas de

pensar, clima, geografia, gastronomia, música.

Se é necessário definir os Balcãs em termos geográficos,

diremos que se trata do território entre os mares Adriático,

Jónico, Egeu e Negro. Deste modo, aos Balcãs pertenceriam:

Grécia, Bulgária, Roménia, parte europeia da Turquia, Albânia,

Macedónia, Sérvia, Montenegro, Bósnia-Herzegovina, Croácia,

Eslovénia. Há quem destaque o Kosovo também como parte dos

Balcãs. Não reconhecendo o Kosovo como país independente, e

considerando-o parte integrante da Sérvia, pensamos que esta

enumeração seria redundante. Por outro lado, por motivos

históricos (ocupação austro-hungara), religiosos (pertença ao

catolicismo), culturais (a mentalidade mais parecida com a

ocidental e o uso do alfabeto latino), ou políticas (a recente

adesão à União Europeia), a Croácia e a Eslovénia frequentemente

negam qualquer identificação com os Balcãs, entendendo talvez

essas qualificações como negativas e depreciativas. No nosso

entender, a integração na União Europeia não diminui a identidade

balcânica, uma vez que a Grécia, a Roménia e a Bulgária já fazem

parte desta instituição, podendo caracterizar-se perfeitamente

como balcânicos.

O nome, segundo Maria Todorova (TODOROVA, Imagining…), deve-

se às palavras turcas bal, que significa “mel” e kan, que designa

o sangue. Este também é o nome do principal conjunto de montanhas

na península, em homenagem ao qual todo esse espaço geográfico

foi designado. O estereótipo mais comum acerca da etimologia do

nome da península é o da “terra do mel e sangue”, aludindo à

frequência das guerras, que originou o “sangue”, e a uma certa

doçura de carácter dos habitantes dos países balcânicos na

expressão dos sentimentos. Na nossa Tese de Doutoramento

(MARINOVIĆ, Motivos...) damos outra possível interpretação, menos

violenta e mais poética. O “mel” que consta do nome deste espaço

geográfico é usado no sentido literal da palavra, já que esta

região é conhecida pela excelente qualidade e boa produção do

mel, enquanto o “sangue” provém da cor de uma espécie de flores

particularmente representadas nesta zona.

Mais um estereótipo sobre a região dos Balcãs, em vigor em

Portugal e outros países da Europa ocidental é que se trata dos

países ex-comunistas ou socialistas, pelo que frequentemente se

identificam com o “Bloco do Leste”, que surgiu nos tempos da

Guerra Fria. Porém, esta caracterização não é de todo correcta,

uma vez que a República Federativa Socialista da Jugoslávia não

pertencia a esta formação política senão aos Não Alinhados, dadas

as divergências entre Estaline e Tito. Aqui, a nosso ver, há mais

uma imprecisão: a Grécia, um país balcânico por excelência, não

fez parte do Bloco do Leste. Por isso, ao falar sobre os Balcãs,

há que tomar vários cuidados, porque essa região é tudo menos uma

unidade homogénea e uniforme.

Precisamente por causa do longo período do governo dos

regimes comunistas ou socialistas, em Portugal, os povos

balcânicos são vistos como bons trabalhadores, polivalentes,

capazes de adaptar-se facilmente a qualquer tipo de actividade

laboral, disciplinados, cumpridores, com uma vasta cultura geral

e um excelente sistema de ensino, embora na inserção no mercado

de trabalho tenham que exercer actividades não qualificadas

(construção civil, restauração, serviços de limpeza, trabalhos

mecânicos). Apesar disso, as pessoas dos Balcãs são reconhecidas

pela sua grande habilidade de aprender a língua portuguesa em

pouco tempo, interagindo com portugueses e integrando-se

relativamente bem na comunidade.

Devido a uma determinada percentagem de pessoas da etnia

cigana na Península Balcânica, em Portugal e em outros países do

Ocidente Europeu, existe a tendência de confundir ou identificar

os povos balcânicos com ciganos, construindo ideias depreciativas

deles como de pessoas extremamente desfavorecidas, que vieram a

Portugal para exercer roubos, prostituição, mendicidade e outras

actividades indignas que podem ameaçar a segurança do país.

No entanto, os Embaixadores ou políticos poderão

eventualmente qualificar as relações com os países balcânicos

como correctas, tolerantes, pacíficas, sem quaisquer tensões,

apoiando as integrações europeias desses países ou apoiando as

iniciativas da cooperação económica e cultural entre Portugal e

os Balcãs.

Após um resumo de ideias (geralmente depreciativas) que em

Portugal e no resto da Europa ocidental, a nossa impressão é que

há um grande desconhecimento de factos históricos, circunstâncias

culturais, de geografia, relações bilaterais, o que deve ainda

ser estudado e aprofundado.

Para os efeitos deste trabalho, não iremos ser demasiado

detalhados, explicando todos os pormenores das relações entre os

Balcãs e Portugal, nem iremos esclarecer todas as circunstâncias

históricas. Procuraremos porém, dar uma súmula das relações

bilaterais entre Portugal e os principais países balcânicos,

focar os acontecimentos da história recente e observar alguns

estereótipos que nestes países prevalecem sobre Portugal e os

Portugueses. Como já abordámos a visão que se tem de Portugal na

Sérvia e na ex-Jugoslávia, (cf. Sérvia) neste artigo não dedicaremos

demasiada atenção a este país, mencionando-o apenas brevemente,

concentrano-nos na Bulgária, Roménia, Grécia e Albânia, como os

principais países balcânicos sem contar com a antiga Jugoslávia.

À semelhança com o que aconteceu com a Sérvia, as relações

bilaterais entre Portugal e a Bulgária datam da segunda metade do

século XIX, quando foi reconhecida a Bulgária como estado

independente com o Tratado da Paz de Santo Estêvão, O país recém-

liberto da ocupação otomana teve a emergente necessidade de

reivindicar a sua identidade através da criação de missões

diplomáticas nos países europeus que reconheceram a sua

independência. Segundo Zlatka Timenova-Valtcheva (TIMENOVA-

VALTCHEVA, Portugal…), os acontecimentos que mais marcaram a

história da Bulgária moderna são a instauração da monarquia, as

duas guerras balcânicas (1912 e 1913), as duas guerras mundiais,

a época do regime comunista, a democratização e a adesão do país

à União Euopeia. Em Portugal, o final do século XIX e o século XX

foram marcados pelo Ultimatum Inglês (1890), as reviravoltas

políticas que conduziram à derrocada da monarquia e instauração

da República (1910), a implementação do Estado Novo, as duas

guerras mundiais, a morte de Salazar, a Revolução dos Cravos de

25 de Abril de 1974, a democracia e a transição e adesão à EU,

Tudo isto, bem como determinadas semelhanças nos processos

políticos pelos que os dois países passaram, influenciou de certa

forma as relações bilaterais, políticas, diplomáticas e culturais

entre Bulgária e Portugal. Luís Ferreira Gonzaga, antigo

Embaixador de Portugal na Bulgária (GONZAGA, Portugal-Bulgária…)

considera que estas relações “lançam alicerce”s e procuram criar

condições para fortalecer a cooperação e o convívio dos povos.

Neste sentido, desde a proclamação da independência da Bulgária,

funcionaram o consulado de Portugal em Varna, como dependência do

Consulado Português em Marselha. A assinatura da Conferência

Internacional da Paz em Viena em 1899 abriu o caminho para o

início das relações diplomáticas entre os países, que iam

melhorando e fortalecendo aproximadamente até à Segunda Guerra

Mundial e a implementação do regime comunista na Bulgária. De

forma semelhante com o que aconteceu na ex-Jugoslávia, na

Bulgária também o comunismo dificultou a posição dos diplomatas

búlgaros em Lisboa, que foram retirados, sem uma ruptura formal

das relações diplomáticas, para serem restabelecidas após a

Revolução do 25 de Abril. As relações diplomáticas entre Portugal

e a Bulgária, nem sempre foram muito pacíficas, dadas as

divergências entre alguns políticos búlgaros e Salazar, para tudo

se estabilizar com a transição dos dois países para a democracia.

Portugal apoiou muito a adesão da Bulgária à União Europeia.

Entre as primeiras associações que os búlgaros têm sobre

Portugal são “país quente”, “terra do fado” ou “terra do vinho do

Porto”, para além do futebol e os conhecimentos adquiridos na

escola sobre os Grandes descobrimentos. O interesse dos búlgaros

pela língua e cultura portuguesa na última década tem vindo a

crescer, o que testemunha a existência do Leitorado na

Universidade São Clemente de Ohrid em Sófia. O leitor Francisco

Nazareth leciona nas Universidades de Sófia e Veliko Târnovo,

enquanto os seus colegas Zornitza Stoykova, Kremena Popova e

Iliyana Chalakova dão aulas de língua e cultura portuguesa em

diferentes escolas no país, o que testemunha o grande interesse

dos alunos por Portugal. Relativamente ao vinho e às vindimas,

para além do facto de a Bulgária também ter uma excelente

produção de vinho, o vinho do Porto foi conhecido desde há muito

tempo na Bulgária na Bulgária. Para além do vinho do Porto, os

búlgaros têm boas noções acerca do vinho alentejano, já que há

uma grande comunidade búlgara a trabalhar nas vindimas no

Alentejo. Segundo refere o Jornal de Notícias, (Jornal…), os

Búlgaros fazem um quinto da população de São Teotónio, sentem-se

integrados, falam de Portugal como do seu “ganha-pão”, da

oportunidade de trabalho, de um país tranquilo e bonito. O jornal

Portugal Post (Portugal…) transmite a informação que os búlgaros estão

satisfeitos com a inserção no mercado de trabalho na EU e pela

livre circulação dos cidadãos búlgaros pela União Europeia, o que

lhes permite ir para outros países a trabalhar ou passar uma

temporada e melhorar as condições económicas da família antes de

voltar a Portugal. Devida à elevada migração dos búlgaros para

Portugal nos anos noventa do século passado, após as crises

económicas e instabilidade política no país, os búlgaros

começaram a migrar, e Portugal foi uma das escolhas primárias uma

vez que para a construção da zona da Expo em Lisboa, houve uma

grande necessidade de mão-de-obra barata. Muitos búlgaros vieram

temporariamente, mas a maioria ficou a residir em Portugal. Os

primeiros migrantes búlgaros eram homens, que depois de

consolidarem a situação trouxeram também as famílias,

comportando-se como a maior parte dos imigrantes dos países ex-

comunistas e socialistas.

Por último, para terminar a reflexão sobre a visão de

Portugal na Bulgária, há que destacar o grande conhecimento que

os búlgaros têm da literatura portuguesa, sendo traduzidas as

obras de Alice Vieira, Álvaro Cunhal, António de Oliveira

Salazar, Alves Redol, Almeida Garrett, António Lobo Antunes,

António Ramos Rosa, Camilo Castelo Branco, David Mourão-Ferreira,

Eugénio de Andrade, Fernando Namora, Fernando Pessoa, Florbela

Espanca, José Jorge Letria, José Cardoso Pires, José Saramago,

Miguel Torga, Manuel Alegre, Mário de Sá-Carneiro, Nuno Júdice,

Virgílio Ferreira, Vitorino Nemésio e muitos outros, e por isso e

com muita razão, os búlgaros confirmam o estereótipo dos

portugueses como de “um povo de poetas”.

Agora convém observar a visão de Portugal segundo alguns

outros países balcânicos. Como já referimos, a visão que se tem

sobre Portugal na Sérvia e na antiga Jugoslávia é bastante

positiva, baseando-se em relações diplomáticas que datam desde a

segunda metade do século XIX (parcialmente esquecidas graças às

circunstâncias políticas em ambos os países) e os conhecimentos

dos estereótipos mais generalizados (sobre a música, história,

partes do folclore, gastronomia, desporto) e em aspirações de

aprofundar a cooperação bilateral em termos económicos e

culturais. Para não alargar demasiado o trabalho e porque os

actuais países independentes da Eslovénia, Croácia, Macedónia e

Montenegro terem feito parte da federação jugoslava, não

especificaremos as ideias que nestas repúblicas estão em vigor

acerca de Portugal e dos Portugueses. O seguinte país balcânico a

abordar neste estudo será a Roménia. Devido às semelhanças na

origem das línguas (o português e o romeno pertencem ao grupo

românico), pode pensar-se que entre estes dois países há ou pode

haver uma maior afinidade do que entre Portugal e qualquer país

eslavo. À semelhança com o que acontece com os restantes países

do antigo Bloco do Leste, as relações bilaterais entre a Roménia

e Portugal datam desde a segunda metade do século XIX, para serem

interrompidas durante os regimes do Estado Novo em Portugal e o

comunismo na Roménia. Roménia era o primeiro país ex-comunista a

restabelecer as relações com Portugal e isso aconteceu justamente

em 1974, após a Revolução de 25 de Abril. Este acontecimento foi

comemorado a 11 de Junho de 2014 em Estoril, com a colocação do

busto do filósofo, escritor e diplomata romeno Lucian Blaga, um

dos maiores poetas e pensadores deste país, Embaixador em

Portugal entre 1936 e 1939. A obra de Lucian Blaga foi

influenciada por Portugal, sua grande inspiração. Por isso, os

meios de comunicação social romenos (Timp…) e portugueses (Público),

bem como diferentes instituições públicas (Câmara Municipal de

Cascais, Camões Instituto de Língua e Cooperação, Instituto

Cultural Romeno) comemoraram a desenvoltura do monumento a este

grande diplomata e poeta romeno, situado em frente do Hotel

Palácio em Estoril, em que Blaga costumava viver.

As actividades do Instituto Cultural Romeno em Lisboa, uma

instituição importante para a difusão da cultura romena em

Portugal, funciona sem interrupção há seis anos, organizando

exposições, festas, concertos de música clássica, Dia da cultura

romena (13 de Janeiro). Com esses eventos não apenas se negam

determinados estereótipos arraigados na Europa Ocidental sobre os

romenos e a Roménia (geralmente os mesmos que se referem ao resto

dos Balcãs) e pretende-se transmitir a imagem deste país como um

país com um excelente sistema de ensino, uma cultura rica

(popular e erudita), e uma proximidade com a cultura portuguesa

em termos de mentalidade e de sensibilidade. Deste modo, Micaela

Ghiţescu (GHITESCU, in: SOARES, LAUKAHANGAS, Interdisciplinary…) refere

que a palavra romena dor é o equivalente semântico da palavra

portuguesa saudade. Esta é uma das poucas línguas (para além do

sérvio) que têm uma palavra em grande medida equivalente à

saudade, o que pode testemunhar a favor dos estereótipos de

conotação positiva que acerca de Portugal se têm na Roménia.

Outra imagem arraigada sobre Portugal é que se trata de um país

de rica história, o que se reflecte nas traduções de obras

históricas portuguesas para romeno. Uma outra ideia presente na

Roménia é que a língua portuguesa é muito melodiosa e apropriada

para a poesia, o que pode atrair alunos para começarem a estudá-

la. Para além deste, os motivos pelos que os estudantes romenos

optam por português são mais “pragmáticos”: a possibilidade de

emigrar a Portugal, em que já têm amigos ou familiares, ou de

encontrar trabalho mais facilmente quer em Portugal, quer em

algum país da União Europeia. Os alunos por vezes admitem também

que o primeiro contacto com a língua portuguesa foi através da

música ou das telenovelas brasileiras, mas que depois, todos

começaram a falar o “português europeu”, por os leitores serem de

Portugal.

O Leitorado de Língua e Cultura Portuguesa funciona em

Bucareste, segundo a informação do Camões, Instituto de Língua e

Cooperação, funciona desde 1974, e desde 2001 existe um Centro de

Língua e Cultura Portuguesa na capital romena. O facto de em

Bucareste ter sido comemorado o Dia da língua portuguesa

testemunha acerca da popularidade e relevância dessa língua na

Roménia, bem como das ideias positivas que se têm sobre Portugal

e os portugueses nesse país balcânico. A nível de traduções e

trabalhos académicos, existem muitas publicações: teses de

Mestrado e Doutoramento, artigos científicos, dicionários (de

língua ou de provérbios), livros traduzidos. Neste sentido, vale

mencionar as traduções de várias antologias de contos, da obra de

Luís de Camões, Camilo Castelo Branco, José Cardoso Pires, José

Saramago, Lídia Jorge, António Lobo Antunes, Agustina-Bessa Luís

e outros autores, sendo algumas edições esgotadas ou

constantemente reeditadas.

A última referência às relações bilaterais entre Portugal e

a Roménia é a economia. Embora haja cooperação entre estes dois

países, a opinião dos políticos e embaixadores é que ainda há

muitas áreas em que investir e que ainda se podem explorar. De

momento, no mercado romeno estão presentes mais de cinquenta

empresas portuguesas, geralmente da área da produção do calçado,

biodiesel, produção de têxtil, Banco Comercial de Portugal. As

principais razões que levam os empresários portugueses a

investirem na Roménia é a mão-de-obra de custo reduzido e o nível

de competências e saberes que os funcionários romenos possuem,

bem como a vontade de aperfeiçoar-se e aprender. É curioso o dado

de que a palavra romena para laranjas é portucale, o que

testemunha sobre a grande exportação de laranjas portuguesas para

este país. Em Portugal, também existem algumas empresas romenas,

embora em menor número, podendo as relações bilaterais neste

sentido ser melhoradas.

O seguinte país balcânico a abordar brevemente para os

efeitos deste trabalho é a Grécia. No que se refere às relações

bilaterais entre a Grécia e Portugal, o primeiro obstáculo que se

nos impõe é a escassez de informação acerca dos contactos

históricos anteriores ao século XIX ou início do século XX. Na

página Web da Embaixada de Portugal em Atenas consta que em 1919

o Ministro Plenipotenciário Marinho Teixeira Brederote, chefe da

delegação para os Balcãs, sedeada em Bucareste, e encarregue de

Atenas e Belgrado. Em 1929. Portugal reconheceu a República

Helénica. Pouco se sabe sobre as relações bilaterais entre os

países em questão entre este período e o fim da Segunda Guerra

Mundial, para em 1946 José Mendes de Vasconcelos Guimarães

apresentar credenciais como Ministro Plenipotenciário,

permanecendo na função apenas até ao fim do ano. Entre 1951 e

1954 houve uma série de encarregados de negócios. Em 1964. A

Legação foi elevada ao nível da Embaixada, sendo o primeiro

Embaixador Alfredo Lencastre da Veiga. O que se pode notar é que,

diferentemente dos outros países balcânicos, a função das

Embaixadas não estava estreitamente ligada com o regime político

e que o 25 de Abril aparentemente não desempenhou um papel

fulcral no desenvolvimento ou restabelecimento de relações

bilaterais entre Portugal e a Grécia, uma vez que houve

interacções mesmo durante o regime do Estado Novo em Portugal.

Portugal e a Grécia são dois países que à primeira vista têm

bastantes elementos em comum, apesar de escassos contactos: os

dois são países de tamanho pequeno, com aproximadamente o mesmo

número de habitantes, são mediterrânicos, têm o clima parecido,

desenvolvem o turismo, a produção vinícola e alguns outros ramos

de economia, como a pesca. Nas últimas três décadas foram

celebrados alguns acordos entre a Grécia e Portugal, nomeadamente

a Convenção entre a República Portuguesa e a República Helénica

para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em

Matéria de Impostos sobre o Rendimento (2002), Acordo sobre o

Transporte Aéreo (1993), Acordo sobre a Cooperação Cultural e

Científica (1983) e o Protocolo da Cooperação Turística (1982).

Como se vê, estes dois países hoje em dia fazem parte da União

Europeia, são membros da NATO, das Nações Unidas e de todas as

organizações europeias relevantes, porém, entre os dois ainda

existe muito desconhecimento mútuo e uma necessidade de

aprofundar as relações. Em termos de cultura, para além das

embaixadas, que promovem os laços culturais, na Grécia existe a

associação Cultural para a Comunidade Portuguesa na Grécia, que

divulga a cultura portuguesa neste país, organizando eventos como

o Magusto, festas de Santo António, Carnaval, e outras

actividades que não se comemoram na Grécia. Em termos de cultura

e relações interculturais, podemos dizer que Camões, Instituto de

Língua e Cooperação tem o seu Leitorado em Atenas, e para a

língua grega estão traduzidas algumas obras de Fernando Pessoa

(O Banqueiro Anarquista, A Hora do Diabo, O Heróstrato e a Busca da Imortalidade, O

Livro do Desassossego, e dois poemas do seu heterónimo Álvaro de

Campos introduzidos na antologia Poesia sem Fronteiras), José Cardoso

Pires e José Saramago. Em Portugal, estão traduzidas mais obras

gregas, nomeadamente de filósofos da Antiguidade clássica e de

mitologia. Por isso, a socióloga russa Natalia Golovanina,

(GOLOVANINA, Os Estereótipos…) no artigo “Os Estereótipos vão

Rolando no Mundo” refere que na maior parte dos países do mundo,

a Grécia é conhecida como o país de mitos e lendas. Entre outros

autores gregos traduzidos para português, destacaríamos Cavafi e

Nikoss Kazantzakis. Naturalmente, em Portugal pode também existir

esse estereótiposobre a Grécia, como o berço da civilização

europeia. Na Grécia, porém, existem outras ideias arraigadas

sobre Portugal; geralmente partilhadas no espaço europeu inteiro:

o país do fado, Fátima e futebol, como se costumava dizer nos

tempos de Salazar, mas também e particularmente como bons rivais

no desporto (especialmente no futebol, sendo que desde 1968 até

2014 houve 13 jogos entre as duas selecções nacionais, dos quais

a Grécia venceu oito vezes, sendo o mais festejado na Grécia e o

mais doloroso para Portugal o jogo no EURO 2004, quando com

apenas um golo de vantagem a Grécia ficou no terceiro lugar).

O elemento que parece mais vidente, os dois foram afectados

pela recente grave crise económica, recorrendo à intervenção da

União Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário

Internacional, popularmente conhecido como a “Troika” (sendo a

palavra introduzida do russo, significando um “conjunto de

três”). A crise económica mais grave no século XXI, surgiu, entre

outras razões do grande endividamento público de países como

Portugal, Itália, Irlanda, Grécia e Espanha, vulgarmente

conhecidos como PIGS (derivado das letras iniciais dos nomes dos

países em inglês (Portugal, Ireland, Italy, Greece, Spain). Este

acrónimo depreciativo, que traduzido do inglês literalmente

significa “porcos”. Com este termo, as grandes potências anglo-

saxónicas se referem aos países que tiveram os rendimentos e o

produto nacional bruto mais baixo comparado com o resto da União

Europeia. Pela Troika foram propostas as medidas drásticas de

austeridade nos países em questão. Supõe-se que Portugal é o país

entre os afectados pela crise, que mais rapidamente se vai

recuperar, tendo, por isso, uma espécie de obrigação de ajudar os

outros que se encontram na mesma condição. Pedro Passos Coelho

(COELHO, Portugal…) para a agência Lusa, declarou que “Portugal é

um dos países na Europa que mais tem ajudado o povo grego”,

referindo-se particularmente ao auxílio e cooperação que Portugal

tem prestado a diversos governos gregos. Embora sejam críticos

com as atitudes do novo governo de Esquerda de Alexis Tsipras,

Portugal e os outros países europeus continuam a ter boas

relações diplomáticas com a Grécia, desejando manter este país na

União Europeia.

O último país balcânico a analisar neste contexto é a

Albânia. A primeira impressão que se pode ter acerca do assunto

das relações bilaterais entre os países em questão é a escassez

de informação e a pouca intensidade de contactos, visitas

oficiais, intercâmbios culturais, económicos ou comerciais, o que

origina um desconhecimento mútuo e uma série de preconceitos e

estereótipos. A dificuldade de encontrar informação adequada

reflecte-se também no facto de, para além da página Web da

Embaixada da Albânia em Portugal, alguns jornais e fontes

electrónicas pouco fidedignas, como a Wikipédia, Infopédia e

outros.

Devido às divergências entre o regime de Salazar e a

ditadura comunista de Enver Hotxa, as relações diplomáticas entre

Portugal e Albânia foram estabelecidas apenas em 1977, embora a

nível das funções dos Embaixadores não residentes, sendo o

encarregado para Albânia o Embaixador de Portugal em Roma, e para

Portugal o seu colega albanês, sedeado em Paris. Apenas em 2009

Albânia abriu a primeira Embaixada em Lisboa, sendo o seu

primeiro Embaixador residente S. Exa. Edmond Traco. Portugal não

tem Embaixada em Tirana, apenas alguns serviços a nível de

consulado. O Embaixador não residente é Fernando d’Oliveira

Neves. Na década dos noventa do século passado começaram a

intensificar-se os contactos bilaterais a nível de visitas dos

políticos a ambos os países, sendo a Expo de 1998 o evento mais

importante para a cooperação bilateral entre os dois países,

estando presente nessa ocasião uma delegação albanesa, chefiada

pelo na altura primeiro-ministro albanês. Durante a presidência

portuguesa à União Europeia na segunda metade de 2007, Portugal

apoiou a ideia de a Albânia dever integrar esta instituição. Pelo

facto de Portugal ter reconhecido a independência do Kosovo,

criou na Albânia a ideia de Portugal como um país amigo. Porém,

na Europa Ocidental e em Portugal, a Albânia é encarada como um

país retrógrado, isolado, ex-comunista, de extrema pobreza, cuja

população está desfavorecida e vive na ignorância e fora de

muitos alcances da tecnologia moderna. É frequente este país

relacionar-se com a imagem do crime organizado, drogas, tráfico

humano, tráfico de armas, máfia, prostituição e violência,

construída geralmente com base na informação que circula nos

jornais, ou com a realidade em alguns países ocidentais, em que

os mafiosos mais perigosos são justamente os albaneses.

Contudo, quem visitou Albânia recentemente, poderá ver

edifícios modernos, centros comerciais semelhantes aos das

grandes cidades capitais europeias, ruas largas e limpas,

influências ocidentais na arquitectura e um desejo evidente de o

país se libertar do atraso histórico.

Em termos de cultura, dos autores, albaneses, o público

português conhece Ismail Kadaré e a sua célebre obra O Palácio dos

Sonhos (KADARÉ, O Palácio…), em que, através de imagens oníricas se

transpõe para a realidade literária o regime totalitário do

comunismo albanês, e se colocam as questões da liberdade, da

posição do indivíduo no mundo, o isolamento e o medo, bem como o

absurdo e o sentido da vida. Na Albânia, segundo a informação do

Camões Instituto de Língua e Cooperação, estão traduzidas as

obras Jerusalém de Gonçalo M. Tavares, e O Homem Duplicado de José

Saramago, havendo ainda muito trabalho por realizar.

Para finalizar a descrição dos contactos entre Portugal e

Albânia, devemos mencionar os jogos de futebol, realizados

sobretudo a partir de 1998 até ao presente. Segundo se refere na

página Web oficial da UEFA, as selecções nacionais portuguesa e

albanesa encontraram-se até agora cinco vezes, tendo a equipa

portuguesa quatro vitórias e um empate, sendo este dado anterior

ao 9 de Setembro de 2014, quando, nas qualificações para o EURO

2016, a selecção nacional de Portugal perdeu com o resultado 1:0,

com o golo de Balaj, na segunda arte do jogo. Os jornais

portugueses caracterizaram o jogo da equipa nacional como fraco e

a derrota provocou raiva entre os adeptos portugueses, o que se

manifesta em numerosos fóruns da Internet, podendo alguns deles

ser referidos na bibliografia.

Resumindo, entre Portugal e os Balcãs, em termos de relações

bilaterais, há algumas constantes: são relativamente recentes,

interrompidas ou inexistentes durante os regimes do Estado Novo

em Portugal e as ditaduras comunistas em cada um dos países

integrantes desta zona, o interesse por Portugal, a língua e

cultura portuguesa começou a aumentar após a Revolução do 25 de

Abril ou a derrocada do comunismo, havendo leitorados, livros

traduzidos, trabalhos académicos e uma maior cooperação sobretudo

nas áreas da cultura e do desporto. Nos países balcânicos

prevalecem os estereótipos positivos acerca de Portugal

(relativos ao clima, gastronomia, música, desporto, e as partes

da História referentes aos Descobrimentos e à Revolução dos

Cravos), enquanto à primeira vista, em Portugal há alguns

estereótipos negativos (que dizem respeito À instabilidade

política e crises económicas), mas que começam a desaparecer

conforme se amplia o conhecimento sobre esta região europeia. Os

Balcãs e Portugal são unívocos no desejo de os países desta zona

integrarem a União Europeia e de aprofundarem e consolidarem as

relações bilaterais, e estão a fazer-se tentativas e iniciativas

neste sentido, que, num futuro próximo poderão dar melhores

resultados.

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Bibliografia recomendada:

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Books, London, 1996.

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York University Press, New York, 1997

_____________; Bulgaria, Blue Guide, London, 1998.