ARTIGO 1 0

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FATORES QUE FAVORECEM A ADOÇÃO DE INOVAÇÕES EM EMPRESAS DE PEQUENO PORTE: ESTUDO DE CASO DE EMPRESAS QUE PARTICIPARAM DO PROGRAMA ALI DO SEBRAE-SE Regina Aparecida Alves Feitoza 1 INTRODUÇÃO Configurando como o grande desafio para a maioria dos gestores de organizações, independente do seu porte e setor, a capacidade das empresas de gerar inovação define sua posição na competitividade global, tornando-se fator-chave na relação com esse ambiente, permitindo o desenvolvimento de competências competitivas sustentáveis em longo prazo para a sua permanência no mercado, em particular nos ambientes em que há uma acirrada competição e grandes turbulências, no qual as estratégias podem não ter utilidade de caráter permanente. (BROWN; EISENHARDT, 1997; TEECE; PISANO; SHUEN, 1997; TETHER, 2003). A preocupação em entender quais as causas que fazem com que determinadas empresas consigam ser mais inovadoras que outras e obtenham melhores resultados, fez com que diversos pesquisadores buscassem explicações para essa variação no desempenho organizacional. A literatura especializada na área de administração tem indicado evidências de alguns tipos ou formatos de organizações que têm se apresentado como espaços estimuladores para o desenvolvimento da inovação, sendo

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FATORES QUE FAVORECEM A ADOÇÃO DE INOVAÇÕES EM EMPRESAS DE

PEQUENO PORTE: ESTUDO DE CASO DE EMPRESAS QUE PARTICIPARAM DO

PROGRAMA ALI DO SEBRAE-SE

Regina Aparecida Alves Feitoza

1 INTRODUÇÃO

Configurando como o grande desafio para a maioria dos gestores

de organizações, independente do seu porte e setor, a

capacidade das empresas de gerar inovação define sua posição

na competitividade global, tornando-se fator-chave na relação

com esse ambiente, permitindo o desenvolvimento de

competências competitivas sustentáveis em longo prazo para a

sua permanência no mercado, em particular nos ambientes em que

há uma acirrada competição e grandes turbulências, no qual as

estratégias podem não ter utilidade de caráter permanente.

(BROWN; EISENHARDT, 1997; TEECE; PISANO; SHUEN, 1997; TETHER,

2003).

A preocupação em entender quais as causas que fazem com que

determinadas empresas consigam ser mais inovadoras que outras

e obtenham melhores resultados, fez com que diversos

pesquisadores buscassem explicações para essa variação no

desempenho organizacional. A literatura especializada na área

de administração tem indicado evidências de alguns tipos ou

formatos de organizações que têm se apresentado como espaços

estimuladores para o desenvolvimento da inovação, sendo

caracteristicamente jovens, pequenas de estrutura simples,

poucos níveis hierárquicos normalmente conduzidos por

supervisão direta, coordenado e executado comumente pelos

proprietários da organização e situadas num ambiente dinâmico.

(EMMENDOERFER; VALADARES; HASHIMOTO, 2010; MINTZBERG 1995).

O comportamento empreendedor dos empresários e donos de

negócios também é alvo de análises, visto que o empreendedor é

o responsável pelo processo de mudança, suas ações originam

novos produtos e serviços, seja por meio de uma nova forma de

trabalhar ou o desenvolvimento de um novo produto, destacando-

se como principal ator responsável pela inovação e

desenvolvimento (SCHUMPETER, 1997) e tem como principal

desafio, a descoberta e exploração de novas oportunidades

tanto para aquele que decide criar uma nova empresa como para

o que está em uma organização já existente. (SHANE;

VENKATARAMAN, 2000).

Nesse contexto de desafios num ambiente de mudanças que requer

o constante desenvolvimento de atividades inovadoras, há a

preocupação em entender quais as causas que fazem com que

determinadas empresas consigam inovar mais que outras e

obtenham melhores resultados, assim, objetiva-se com esse

estudo analisar os fatores que favoreceram a adoção de

inovações em empresas de pequeno porte que participaram do

programa ALI do Sebrae Sergipe. Especificamente, busca-se (i)

identificar os fatores relacionados ao empreendedor que

favorecem a adoção de inovações nas pequenas empresas do

programa ALI; (ii) verificar os fatores relacionados a

organização que favorecem a adoção de inovações nessas

empresas e (iii) apontar os fatores relacionados a Inovação

que favorecem a adoção de inovações nessas empresas.

2 INOVAÇÃO NA PEQUENA EMPRESA

A inovação como fator determinante da vantagem competitiva tem

sido estudada há várias décadas em uma variedade de setores

(DI SERIO; VASCONCELLOS, 2010; PORTER, 1983), se mostrando

como motor da sociedade capitalista e um fenômeno capaz de,

pelo processo de “destruição criativa”, destruir velhas ideias

e conceber novas simultaneamente (SCHUMPETER, 1961), o desafio

para as empresas e gestores está em lidar com a inovação e as

mudanças por ela trazidas.

Longe de se constituir em uma ação restrita às corporações de

grande porte, que contam com alta capacidade de investimento

em processos de pesquisa e desenvolvimento (P&D), a inovação

já entrou definitivamente para a realidade das empresas de

pequeno porte, independentemente de seu setor, Freeman (2012)

ressalta que, mesmo que pressionadas por grandes empresas as

empresas de pequeno porte estão se beneficiando com o aumento

do acesso ao fluxo de informações e conhecimento, mesmo que

ativado por associações de rede, e se capacitando para inovar

em serviços, processos e estruturas organizacionais para

melhor atender as necessidades dos seus clientes e, por

conseguinte, ser capaz de competir com grandes empresas.

A capacidade de inovação em uma empresa de pequeno porte,

segundo Christensen e Overdorf (2000), reside em seus recursos

(pessoal, infraestrutura, tecnológico, financeiro etc) e, como

entendido por Tether (2003), na combinação destes. Já nas

empresas maiores estes recursos são definidos como processos

tendo sua capacidade residindo nos processos. Assim, os

autores entendem que, como os recursos são mais adaptáveis à

mudança que os processos, as empresas de pequeno porte devem,

a despeito de outras características, possuírem um ambiente

mais favorável à inovação.

Esta pode ser uma das características que Christensen (2001)

aponta como o ambiente criativo que favorece a inovação e que

é mais usual nas pequenas empresas. Para compreender a

estrutura organizacional, o comportamento de adoção de

inovações e seus impactos Damanpour; Walker e Avellaneda

(2009), Tidd; Bessant e Pavitt (2008), Amabile (1996), Freire

(2000) e Tether (2003) enfatizaram que é necessário entender

os tipos de inovação, e foram criadas classificações que

divide as inovações em grupos e categorias.

O primeiro grupo apresenta a divisão entre a chamada inovação

administrativa ou inovação organizacional e inovação técnica

ou inovação tecnológica. A inovação administrativa está

diretamente relacionada com a gestão da organização e é usada

para caracterizar as inovações na estrutura organizacional e

no desenvolvimento de novos processos. A inovação técnica ou

tecnológica está relacionada com produtos, serviços e

tecnologia no processo de produção.

O segundo grupo de inovações está relacionado com a inovação

de produtos e inovação de processos. A inovação de produto é

relacionada com a criação de novos serviços ou novos produtos,

e inovação de processo refere-se à introdução de novos

elementos nas operações de produção ou de serviços, tais como,

matéria-prima, especificações de tarefas, mecanismos de

trabalho e informações e equipamento utilizado na produção e

fornecimento de um serviço.

O terceiro grupo apresenta as inovações incrementais que se

distinguem das inovações radicais que se referem ao impacto

causado pela as inovações. Inovações radicais ou distintiva

acontecem a partir de melhorias significativas, produzem

mudanças fundamentais nas atividades de uma organização,

causando uma ruptura com as práticas dominantes. Inovação

incremental é aquela onde ocorrem pequenas melhorias dos

processos, produtos ou serviços da empresa, diz respeito ao

processo de melhoria contínua e a busca da melhoria de

produtos e serviços existentes.

As pequenas empresas são mais inovadoras por possuírem um

ambiente de estrutura flexível e por isso se adaptam mais

rápido às mudanças, segundo Quinn (1985) essas empresas são

visionárias e não possuem altos custos de operação. São

empresas, geralmente, orientadas pela necessidade e muitas

vezes são fundadas devido a uma nova tecnologia. Os tipos de

inovação frequentemente encontradas em empresas de pequeno

porte são aquelas descritas por Damanpour; Walker e Avellaneda

(2009) como incrementais, conforme Donadio (1983), Gonçalves e

Gomes (1993), Nicolsky (2008), empresas de pequeno porte

apresentam uma alta capacidade de inovação no processo de

gestão e no uso de novas tecnologias.

Ressalta-se nesse contexto, que embora o ambiente da pequena

empresa seja propício para fomentar a inovação, a adoção ou

não desse caminho depende da decisão, visão e percepção do

empreendedor e de sua capacidade de implementá-la, como

afirmam Lodi (1987), Ricca (2005) e Souza Neto (2002) a

centralização das decisões, na figura do proprietário da

empresa, é uma característica gerencial de empresas de pequeno

porte.

Semler (1988) escreveu no final dos anos 1980 que as pequenas

empresas possuem características positivas, como a

criatividade e o espírito empreendedor, porém o autor sinaliza

as dificuldades de inovar da pequena empresa que, na contramão

da história, reluta em profissionalizar a administração. As

dificuldades, neste processo de inovação na gestão, são

consideradas, pelo autor, como determinantes para o fechamento

prematuro das empresas, notadamente nos processos que envolvem

a tomada de decisão o conservadorismo predomina. Para Drucker

(1967) e Oliveira (2004), a tomada de decisão é um processo

classificado nas seguintes fases:

Identificar e classificar o problema observando o cenário

em que a organização se encontra;

Analisar e definir o problema a partir da consolidação

das informações sobre o problema, considerando as ameaças

e oportunidades;

Estabelecer soluções e alternativas para resposta ao

problema;

Analisar e selecionar soluções através do levantamento

das vantagens e desvantagens de cada alternativa;

Implantar a alternativa selecionada, incluindo o devido

treinamento das pessoas envolvidas;

Testar a validade e eficácia da alternativa selecionada,

através de critérios aceitos pela organização, em que a

tal alternativa deverá fornecer resultados a serem

avaliados.

O empreendedor eficaz, na visão de Drucker (1967), é aquele

que possui conhecimento das fases envolvidas no processo de

tomada de decisão e o sucesso desse processo, segundo Oliveira

(2004), depende das escolhas corretas durante essas fases,

avaliando todas as possibilidades e exercitando o ciclo

completo, decidindo pela melhor opção para seu negócio. No

entanto o empresário, da micro e pequena empresa, tem grande

dificuldade em entender esse processo de tomada de decisão.

Algumas etapas são negligenciadas ou desconhecidas por esse

grupo de empresários, sendo as decisões na MPE tomadas

seguindo as etapas: (i) identificar e classificar o problema;

(ii) analisar e selecionar soluções e (iii) Implantar a

alternativa selecionada.

No entanto a pesquisa realizada por Deloitte (2007), mostra

que os empresários de empresas de pequeno porte associam a

inovação menos com a elaboração diferenciada de produtos e

serviços e mais com o fato de contar com um modelo de negócio

inovador. Durante a pesquisa as pequenas empresas

participantes revelaram quais ações que as tornam inovadoras,

conforme aponta o gráfico 1, adotam iniciativas que envolvem

os mais diversos aspectos, com ênfase para tecnologia,

disseminação de uma cultura aberta à inovação, estabelecimento

de parcerias com fornecedores, capacitação de profissionais,

avaliação de produtos e serviços e investimentos em P&D.

Gráfico 1 – O que fazem para serem inovadoras?Fonte: Deloitte (2007)

Alguns componentes são enumerados por Bendher (1992) como

facilitadores à inovação em um ambiente de pequena empresa

desde que haja uma intenção de inovar que independe do tamanho

da empresa, mas, sobretudo da visão e motivação do

empreendedor, da capacidade organizacional e dos recursos

disponíveis, tais como:

• Proximidade do estado da arte - o que se configura num

risco para a empresa, em função da dificuldade de se prever o

sucesso da tecnologia a ser desenvolvida e para o mercado,

devido a uma possível falha no desdobramento dos desejos do

mercado em especificações ou por problemas de difusão e

utilização da tecnologia.

• Competição dinâmica - caracterizada pela contínua mudança de

tecnologia e de condições de mercado, pela compressão do ciclo

de vida dos produtos e pela dificuldade de se levantar dados

de mercado que orientem o gerenciamento.

• Intensivo uso de conhecimento - conhecimento que é a

essência da inovação e que se degenera rapidamente, exigindo

um correto gerenciamento das informações externas.

Os caminhos percorridos para a implementação da inovação em um

ambiente de pequena empresa é o mesmo, conforme afirma Freire

(2000), no entanto sua gestão ocorre em função da dimensão da

organização (quadro 1) e essas fases não seguem uma sequência

lógica de gestão, podendo ser sequencial, sobrepostas,

integradas ou caóticas.

Fase do Grandes Médias Pequenas

Ciclo

Oportunid

ade

Estudo de

mercado e

segmentação

Análise

informal e

qualitativa do

mercado

Conversas com

clientes e análise

da concorrência

Idéia

Sessões de

criatividade e

pesquisa de

mercado

Sessões de

criatividade e

perguntas aos

clientes

Perguntas a

clientes e ideias

das empresas

líderes

Desenvolvi

mento

Gestão da

qualidade e

estimativa do

potencial

Cooperação com

clientes e/ou

fornecedores

Cópia da

concorrência e

cooperação com os

clientes

TesteInovação,

comunicação e

mercado

Inovação e

mercado

Inovação e

aprendizagem com

os erros

Introduçã

oNacional e

análise global

Regional e

análise de

clientes

Local e análise de

alguns clientes

Difusão

Gestão

proativa da

difusão da

inovação

Gestão reativa

da difusão da

inovação

Gestão oportunista

da difusão da

inovação

Quadro 1 – Gestão do ciclo de inovação e dimensão da empresa Fonte: Freire (2000)

Quando as inovações são implantadas no ambiente de uma empresa

de pequeno porte, seja em seus processos ou produtos, elas

conseguem uma vantagem competitiva em relação aos seus

concorrentes, o que amplia suas possibilidades de sucesso e

longevidade dos negócios.

2.1 Programa Agente Local de Inovação

Fleck (2003) afirma que a habilidade de sobrevivência de um

empreendimento é a sua verdadeira medida do sucesso e a

capacidade de autoperpetuação do negócio, condicionada à uma

busca minuciosa por inovação nas soluções e nas respostas aos

desafios do mercado.

Para Tether (2003), órgãos governamentais aparecem como

importantes fomentadores para o desenvolvimento de empresas de

pequeno porte, visto que, o atendimento fornecido às empresas

por parte de iniciativas governamentais, favorece a capacidade

competitiva, por meio da difusão de informações sobre

possibilidades de inovação e tecnologia.

Como forma de estímulo à implantação da gestão da inovação no

ambiente de empresas de pequeno porte, foi criado o Programa

ALI (Agentes Locais de Inovação) promovido pelo Serviço

Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE).

Esse programa, segundo o Sebrae (2014), oferece aos

empresários de empresas de pequeno porte o acesso a

conhecimentos e recursos que facilitem a implantação de

processos de inovação que contribuam para o aumento da

competitividade de suas empresas e tem por objetivo acompanha-

los e assisti-los, na prática da gestão da inovação, de modo a

implantá-la na cultura das empresas participantes como uma

estratégia de crescimento.

O programa Agentes Locais de Inovação foi implantado em 2008

no Distrito Federal e no Paraná, no ano seguinte, em conjunto

com entidades parceiras, foi expandido para os estados Bahia,

Ceará, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Paraíba,

Pernambuco, Rio Grande do Norte, Sergipe, Acre, Amazonas,

Amapá, Rondônia, Roraima e Tocantins.

O acompanhamento das empresas acontece por meio de assessoria

dada por agentes com perfil multidisciplinar, que facilitam a

busca de soluções e respostas às demandas de cada empresa

atendida, no que diz respeito a seu desenvolvimento econômico-

financeiro, estrutural, de serviços e de processos produtivos,

conforme apresentado na figura 2.

Figura 2 – Fluxo de acompanhamento de empresas pelo Projeto ALIFonte: Sebrae Nacional

3 METODOLOGIA

A abordagem adotada nessa pesquisa será o estudo exploratório-

descritivo e natureza qualitativa com a utilização de estudo

de casos múltiplos. Segundo Yin (2001), o estudo de casos

múltiplos baseia-se na lógica da replicação e não da

amostragem. A replicação permite que uma determinada

descoberta possa ser considerada suficientemente forte e digna

de investigações e interpretações adicionais.

Dessa forma, cada caso deve ser cuidadosamente selecionado de

modo a prever resultados semelhantes (replicação literal) ou

produzir resultados contrastantes apenas por razões

previsíveis (replicação teórica). Ainda de acordo com Yin

(2001), a utilização de dois ou três casos seriam replicações

literais e de quatro a seis poderiam ser projetados para

buscar diferenças de replicação teórica. Dessa forma serão

selecionadas duas empresas que obedeçam aos seguintes

critérios:

a) Empresas de micro e pequeno porte que possuam até 99

funcionários e faturem até R$16 milhões ao ano - para

esse trabalho, foi seguida a orientação do Sebrae (2014)

para o número de funcionários e do Banco Nacional do

Desenvolvimento (BNDES) (2010) para o valor do

faturamento.

b) Empresas com pelo menos cinco anos de existência com o

objetivo de selecionar empresas que estivessem

estabelecidas e em situação estável, atuantes no mercado

e tivessem ultrapassado o período inicial de risco de

sobrevivência.

c) Empresas que participaram do Programa ALI e que obtiveram

desempenho satisfatório ao final das atividades de

inovação desenvolvidas durante o programa.

d) Empresas que atuassem em segmentos distintos com a

finalidade de identificar práticas gerenciais comuns a

empresas de diferentes segmentos e não específicas a uma

determinada atividade.

3.1 Procedimentos Metodológicos

Os dados da pesquisa serão coletados a partir de fontes

primárias e secundárias. Os dados secundários virão de fontes

bibliográficas e os dados primários serão coletados através de

entrevistas semiestruturadas com as empresas participantes.

Optou-se pela utilização de entrevista por ser uma técnica de

coleta de dados que possui a vantagem de ser direcionada ao

tópico estudado, possibilitando o fornecimento de informações

que resultem em inferências (YIN, 2005).

As entrevistas foram conduzidas com roteiro semiestruturado

objetivando estimular o empresário a identificar as práticas

gerenciais adotadas na direção da inovação e por inovação, no

presente estudo, é entendido como algo novo para as

organizações. Todos os dados coletados foram de caráter

qualitativo.

4 ANÁLISE DOS CASOS

Nesta seção será realizada a exposição e análise dos casos. O

primeiro passo é fazer uma breve caracterização das

organizações pesquisadas, em que cada uma foi representada por

meio de nomes fictícios. O segundo passo analisar

comparativamente os casos com base nos objetivos específicos

estabelecidos na introdução deste estudo.

4.1 Caso Alfa

Empresa familiar do setor de serviços, gerenciada por dois

irmãos paulistas que a fundaram em 04 de Dezembro de 2006,

possui 15 funcionários, sendo três deles especializados no

serviço estratégico do negócio. De acordo com relato do

proprietário, os dez anos que antecederam a abertura do

empreendimento ele trabalhou em uma empresa do mesmo ramo na

cidade de Ribeirão Preto no estado de São Paulo, nesse

período, ele se preparou para a abertura do próprio negócio,

com a formação em técnico contábil, cursos rápidos de gestão e

finanças e outros específicos para o negócio que o ajudaria no

gerenciamento dos anos iniciais. Nesse mesmo tempo seu irmão

também realizou alguns cursos voltados especificamente para o

tipo de serviço oferecido. Foram realizadas pesquisa de

mercado em algumas cidades, inclusive a cidade de Aracaju,

escolhida para abertura do negócio:

“eu trabalhei por dez anos emRibeirão Preto em uma empresa domesmo ramo e nesses dez anos eufiquei me preparando pra podermontar a própria empresa, que eraum sonho [...] fiz uma preparaçãode conhecimento, fiz vários cursosno Sebrae de Ribeirão Preto ecomecei a pesquisar o mercado ecomo Ribeirão Preto tem quase amesma quantidade de habitante queAracaju, sendo que lá tem trêsvezes mais empresas desse ramo queaqui, então a visão foi que tinhacampo pra poder trabalhar e com aqualidade que a gente visava aqui agente conseguiria entrar nomercado, que não foi fácil, mas meufoco era Aracaju porque eu tinhafamiliares aqui então já facilita,né?”.

O modelo do negócio inicial foi modificado, pois percebeu-se

que era possível, além dos serviços convencionais ofertar um

serviço diferenciado, mas por tratar-se de um modelo inovador

na cidade e portanto pouco conhecido, foi necessária uma busca

por mais informações. Essa percepção se deu a partir da

procura por parte dos clientes pelo serviço e os sócios

perceberam então uma oportunidade de inovar. Apesar do serviço

já ser oferecido em outras cidades, inclusive na cidade de

Ribeirão Preto/SP, onde os sócios trabalhavam e já possuíam

conhecimento, o serviço foi inovador para a empresa e para a

cidade.

Nesse sentido, os sócios realizaram uma nova pesquisa de

mercado a fim de conhecer melhor a região que estavam

instalados. Com base nos resultados obtidos e em conhecimentos

adquiridos na cidade de Ribeirão Preto/SP, foi elaborado um

plano de ação para oferecer um serviço inovador na cidade. Uma

das estratégias para o alcance dos objetivos foi a busca por

nova especialização, algo que tem ocorrido com frequência,

visto que a formação de uma equipe foi uma tarefa difícil

principalmente pela falta de mão de obra especializada nos

serviços oferecidos pela empresa, como afirmou o entrevistado:

“fizemos uma pesquisa de mercado epedimos até pra uma funcionária irem algumas outras empresas fazeruma investigação pra gente e agente viu que o foco das outrasempresas era outro, então nós nosespecializamos nesse novo serviçopra ser nosso diferencial e a gentepoder começar a oferecer o serviçoaté porque aqui inclusive nem temmão de obra especializada, então eue meu irmão fizemos o curso etreinamos um funcionário, entãosomos só nós três que realizamos oserviço”.

Outros aspectos mais relacionados ao contexto de mercado

começaram a fazer parte do dia a dia da empresa. Através do

Projeto ALI os sócios buscaram inovar em diversos aspectos do

negócio, dentre eles, implantação do projeto de melhoria de

infraestrutura, implantação do projeto de identidade visual e

implantação de um sistema informatizado modernizado que

permitiu um maior controle sobre a gestão do negócio.

Além dos projetos implantados no empreendimento a participação

da empresa no projeto ALI proporcionou a consolidação da

cultura inovadora na empresa. Nesse aspecto, foi relatado pelo

entrevistado que a empresa possui um ambiente familiar de

diálogo aberto entre os sócios e entre os sócios e os

empregados, facilitando a tomada de decisão diária e o

planejamento das ações. São realizadas reuniões formais

mensais com todos os empregados para discussão das atividades

do negócio. É oferecido um incentivo financeiro como motivação

à inovação, ou seja, uma premiação financeira para os

funcionários que contribuem com ações de melhoria do

empreendimento. A empresa também oferece treinamento e

participação em eventos para todos os funcionários, e

crescimento dentro da empresa, conforme relata o entrevistado:

“nós fazemos uma reunião mensal pragente poder discutir a melhoria,então a gente vê o que táacontecendo o que seria maisinteressante pra implementar. Nãotem salário fixo aqui, se ofuncionário tem uma participação,se ele faz alguma coisa pelaempresa, ele tem uma melhoria, agente dar uma bonificaçãofinanceira pra eles, pra poderincentivar e eles sabem disso, écompartilhado. Os salários não sãotodos iguais, depende do tempo,desempenho e dedicação. Alguns tem

interesse em buscar seu própriodesenvolvimento e procuram o Sebraepra fazer alguns cursos pagos pelaempresa pra melhoria das atividadese trabalhamos na formação da mão deobra, então a gente pega uma pessoaque entrou como serviços gerais,investimos em treinamento e a gentevai dando oportunidade decrescimento na empresa”.

4.2 Caso Beta

Empresa familiar do setor de alimentação, gerenciada por um

casal. De acordo com relato de um dos sócios a empresa começou

em uma barraquinha na feira em 2008 com apenas dez tipos de

produtos. Alguns anos antes eles possuíam um empreendimento em

outro setor, no entanto, após uma crise financeira foram

obrigados a fechar o negócio. Nessa ocasião, o casal sentiu a

necessidade de montar um outro negócio que garantisse renda

para a família, então surgiu a oportunidade de montar uma

banca de produtos alimentícios na feira do turista que três

anos depois foi transformada em um renomado restaurante na

cidade de Aracaju com 32 funcionários. Alguns cursos de

culinária trivial e o gosto pela cozinha ajudaram a

empreendedora a oferecer produtos diferenciados:

“nós antes trabalhávamos em outro setor,mas após um golpe financeiro que sofremosa gente não se segurou e tivemos quefechar a empresa [...] então eu pedi a umvizinho que trabalhava na feira que se elesoubesse de alguma barraquinha na feirapra vender que eu tinha interesse, porqueeu tinha um filho em uma escola e tambémnão sei ficar sem trabalhar, já havia

feito alguns cursos de culinária porinteresse próprio, pra dentro de casamesmo, então pegamos um dinheiroemprestado e compramos uma barraquinha ecomeçamos trabalhar praticamente de dia enoite, dois anos depois nós montamos orestaurante”.

O modelo inicial do negócio foi modificado, pois com a

intensiva participação da sócia nos eventos do Sebrae, foi

percebido que além dos produtos já oferecidos seria possível o

crescimento do empreendimento e oferecer um serviço

diferenciado, para tanto foi necessária uma busca por mais

informações, visto que o setor de alimentação na cidade de

Aracaju é um setor maduro e com empresas consolidadas, seria

necessário um plano de negócios sólido, nesse sentido, foi

realizada uma pesquisa de mercado para conhecer melhor os

concorrentes. Com base nos resultados obtidos, foi elaborado

um plano de ação. A sócia usou como estratégia o seu

conhecimento adquirido durante o estágio na feira e alguns

cursos de culinária já realizados, reforçado pela busca

contínua de aperfeiçoamento realizando outros cursos na área

de alimentação:“fui ao Sebrae, como sempre, porque eu voumuito lá, busquei todas as informações queprecisava, dei entrada no plano, conseguio financiamento e com a ajuda do Sebrae,que indicava as melhores fontes, levamosoito meses construindo e no dia 8 de maiode 2012 abrimos, continuo meespecializando na área de alimentação, jáfiz outros cursos na área de alimentos epretendo fazer gastronomia”.

Nessa busca constante pela diferenciação do negócio a empresa

passou a receber o acompanhamento do projeto ALI e realizou

diversas atividades voltadas para o desenvolvimento do

negócio, dentre eles, projeto de melhoria de infraestrutura,

projeto de desenvolvimento de identidade visual, registro de

marca, desenvolvimento de novos sabores e implantação de

sistema informatizado para auxiliar a gestão do negócio.

A participação da empresa no projeto ALI proporcionou a

consolidação de uma cultura inovadora dentro do ambiente do

empreendimento, onde acontece reuniões mensais para o contato

mais próximo com os funcionários e envolve-los no planejamento

estratégico do negócio, também foi implantado o setor de

recursos humanos que faz a interface entre os funcionários e

os proprietários, com um projeto de remodelagem da gestão.

4.3 Análise Comparativa dos casos com base nos objetivos

específicos estabelecidos

O objetivo desta seção é analisar comparativamente os casos

com base nos objetivos específicos estabelecidos.

Em ambos os casos, os fatores relacionados aos empreendedores

quanto a motivação de adoção de ações de inovação no negócio

foi a identificação de uma oportunidade a partir dos

conhecimentos que possuíam, combinados com a visualização de

uma possibilidade de aplicá-los de forma inovadora. De acordo

com Fleury e Fleury (2001) o conceito de competência deve ser

pensado como conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes

que explicam um alto desempenho, fundamentados na inteligência

e personalidade das pessoas e pode ser percebida como estoque

de recursos.

Quanto aos fatores relacionados à organização, ambas as

empresas apresentam um ambiente inovador com ações que

envolvem os funcionários na busca constante por ideias

inovadoras e os envolvem nas tomadas de decisões, o que para

Dutra (2001) é a valorização das pessoas pelos seus atos e

realizações dentro do ambiente do trabalho associadas aos

interesses da organização.

Os fatores relacionados a inovação que favorecem a adoção de

inovações nessas empresas é o que Freeman (2012) ressalta

quando diz que empresas de pequeno porte estão se

beneficiando com o aumento do acesso ao fluxo de informações e

conhecimento, se capacitando para inovar em serviços,

processos e estruturas organizacionais para melhor atender as

necessidades dos seus clientes e, por conseguinte, ser capaz

de competir com grandes empresas.

5 CONCLUSÕES

As empresas familiares são a forma predominante de empresa em

todo o mundo. Nas economias capitalistas, a maioria das

empresas se inicia com as ideias, o empenho e o investimento

de indivíduos empreendedores e seus parentes. De acordo com

Ricca (2005), as empresas familiares geram metade do PIB dos

Estados Unidos, dominam o segmento das pequenas e médias, na

Europa. Na Ásia, a forma de controle familiar varia de acordo

com nações e culturas, mas ocupam posições dominantes em todas

as economias mais desenvolvidas, com exceção da China. Na

América Latina, grupos construídos e controlados por famílias

constituem a principal forma de propriedade privada na maioria

dos setores industriais.

No Brasil, segundo dados do Sebrae, o universo das MPEs

representa pouco mais de 5 milhões de estabelecimentos, entre

eles, industriais, comerciais e prestadores de serviço, sendo

responsáveis por 20% do PIB brasileiro, gerando 60% dos

empregos.

As empresas pesquisadas nesse estudo são de porte micro e de

base familiar, conforme descrito nos casos. Os empreendedores

entrevistados, apesar de possuir conhecimento técnico sobre o

principal produto/serviço oferecido pela empresa e de possuir

também alguma noção acerca do comportamento do mercado, vêm

passando por transformações em suas concepções de negócio,

conforme acumulam experiência e conhecimento. Essa evolução é

necessária para a sobrevivência do empreendimento. Uma

condição de sobrevivência é a adaptação ao mercado. Conforme

intensificam suas posições no mercado, as necessidades de

ajustes ficam mais claras. Entretanto, os empreendedores serão

mais eficazes na inovação em serviços, produtos e gestão,

quanto maior for seu empenho na filtragem de novas

oportunidades, bem quanto melhor combinarem análise e ação, de

forma a aproximarem-se mais da realidade (BARON; SHANE, 2007).

REFERÊNCIAS

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BARON, Robert; SHANE, Scott. (2006). Empreendedorismo: umavisão do processo. São Paulo: Thomson Learning.

BENDHER, H. O. High technology marketing. Netherlands:Universiteit Twente, 1992.

BROWN, Shona L.; EISENHARDT, Kathleen M. The art of continuouschange: Linking complexity theory and time-paced evolution inrelentlessly shifting organizations. Administrative sciencequarterly, p. 1-34, 1997.

CHRISTENSEN, Clayton; OVERDORF, Michael. Meeting the challengeof disruptive change. Harvard business review, v. 78, n. 2, p.66-77, 2000.

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