Anuário 2016

359

Transcript of Anuário 2016

ANUÁRIO

2016

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

3

© ERAS Título: ANUÁRIO 2016.

Autor: AA.VV.

Editor: PBACC.

Coordenação: Levi Leonido.

Organizadores / Revisores: Levi Leonido, Elsa Morgado, Mário Cardoso, João Bartolomeu.

Design: Luís Canotilho e Filipe Canotilho.

Edição e Execução Gráfica: Levi Leonido.

Data da edição: Agosto de 2017.

Impressão: Gráfica UTAD.

ISBN: 978-989-99832-5-0

Depósito Legal: 430150/17

Classificação THEMA - Nível 1: A – Artes.

ÍNDICE

ESTUDOS MUSICAIS

Utilização da música “Aqui no Mar” como estratégia pedagógica para o ensino de ciências e biologia

Lucas Esquivel Dias Brandão; & Marcelo Diniz Monteiro Barros [2-20]

VOCEAR, CANTAR, CONTAR: Derivas metodológicas de una investigación artística y autoetnográfica

Gisela Magri

[21-41]

A INTEGRAÇÃO PLURICULTURAL NA EDUCAÇÃO MUSICAL BRASILEIRA Maria Beatriz Licursi Conceição; Maria Ione Silva; Levi Leonido (coord.); Maria do

Carmo dos Santos Motta; Thelma Pignataro; & Davson Mansur Irff Silva [42-62]

ESTUDOS MUSICAIS: uma análise das investigações realizadas em Roraima – Brasil Jefferson Tiago de Souza Mendes da Silva

[63-75]

ESTUDOS TEATRAIS

Inteligências Múltiplas na Expressão Dramática Rita Miranda; Elsa Morgado; & Levi Leonido

[78-93]

A prática do Sociodrama em contexto escolar Dulce Silva; Levi Leonido; & Elsa Morgado

[94-121]

Teatro posmigrante en alemán: derroteros de la institucionalización Soledad Pereyra

[122-154]

El lenguaje escénico que conforma el repertorio creado por August Bournonville Ioshinobu Navarro

[155-198]

ESTUDOS EM ARTES VISUAIS

Ensino do desenho em uma perspectiva inclusiva: o figurativo para além da visão

Rivaldo Bevenuto de Oliveira Neto; & Jefferson Fernandes Alves [200-223]

Personajes extraordinarios, arquetipos y estructuras narrativas clásicas: sobre la representación de la pobreza en dos documentales argentinos

Pablo Lanza [224-234]

O Design e a valorização de produtos, territórios e identidades Jacinta Helena Alves Lourenço Casimiro Costa

[235-244]

Grete Stern y la vanguardia del ’40. Arte y psicología de la Gestalt entre fronteras permeables

Maria Cecilia Grassi [245-266]

ESTUDOS INTERDISCIPLINARES

A DANÇA E A EXPRESSÃO CORPORAL: prática educativa, cultural e social

Susana de Pinho Figueiredo [268-275]

ARTE E EDUCAÇÃO: uma abordagem da cultura da cidade de Embu das Artes para a formação de professores no curso de pedagogia

Maria do Carmo dos Santos Motta; & Nilton de Souza Bispo [276-290]

ARTE Y CIUDAD: experiencias de danza en el espacio urbano Mariana Lucía Sáez; & Lucía Belén Merlos

[291-319]

Reflexões em torno de exemplos da representação, na arte contemporânea, do funcionamento da memória como atividade cerebral

Carlos Alberto de Matos Trindade [320-353]

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

1

STUDOS MUSICAIS

Utilização da música “Aqui no Mar” como estratégia pedagógica para o ensino de ciências e biologia Lucas Esquivel Dias Brandão; & Marcelo Diniz Monteiro Barros

| 2-20

OCEAR, CANTAR, CONTAR: Derivas metodológicas de una investigación artística y autoetnográfica Gisela Magri

| 21-41 Integração pluricultural na educação musical brasileira Maria Beatriz Licursi Conceição; Maria Ione Silva; Levi Leonido (coord.); Maria do Carmo dos Santos Motta; Thelma Pignataro; & Davson Mansur Irff Silva

| 42-62 STUDOS MUSICAIS: uma análise das investigações realizadas em Roraima – Brasil Jefferson Tiago de Souza Mendes da Silva

| 63-75

A

V A

E

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

2

A UTILIZAÇÃO DA MÚSICA “AQUI NO MAR” COMO ESTRATÉGIA

PEDAGÓGICA PARA O ENSINO DE CIÊNCIAS E BIOLOGIA

The use of the song “Aqui no Mar” as a pedagogical strategy for Science and Biology

teaching

BRANDÃO, Lucas Esquivel Dias1; BARROS, Marcelo Diniz Monteiro2

Resumo

Objetivando repensar e reavaliar a maneira como o ensino é realizado nas escolas e visando buscar novas metodologias que venham a aprimorar as formas tradicionais de ensino, foi desenvolvida uma atividade contendo 16 questões sobre a música “Aqui no Mar”, interpretada por Diogo Nogueira, que pode ser trabalhada nas disciplinas de Ciências e Biologia. Espera-se que os professores de Ciências e Biologia tenham acesso a essa atividade e que possam, de acordo com os seus anseios, trabalhar os diferentes conteúdos biológicos que se fazem presentes na letra da música. Pretende-se, ainda, despertar a criatividade dos professores, de forma que os mesmos possam desenvolver outras atividades como essa em suas práticas educativas.

Abstract

Aiming to rethink and re-evaluate the way teaching is done in schools and seeking new approaches to improve traditional education forms, it was developed an activity containing 16 questions about the song “Aqui no Mar”, sang by Diogo Nogueira, that can be worked in the Science and Biology disciplines. It is expected that the Science and Biology teachers have access to this activity and can, according to their proposals, work the different biological contents that are present in the lyrics. It is intended also to awaken the creativity of teachers, so that they can develop other activities like this in their educational practices.

Palavras-chave: Ensino de Biociências, Música como estratégia de ensino, “Aqui no mar”.

Keywords: Biosciences Education, Music as a teaching strategy, “Aqui no Mar”.

Data de submissão: Janeiro de 2016 | Data de publicação: Março de 2016.

1 LUCAS DE ESQUIVEL DIAS BRANDÃO - Graduando do Curso de Ciências Biológicas da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, BRASIL. E-mail: [email protected]. 2MARCELO DINIZ MONTEIRO DE BARROS - Professor Adjunto IV do Departamento de Ciências Biológicas da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, BRASIL. E-mail: [email protected].

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

3

INTRODUÇÃO

Segundo a Lei nº 9.394/96, no 2º parágrafo do artigo 1, a educação escolar deve

vincular o conteúdo ministrado ao mercado de trabalho e à sociedade. Porém, mais de

dezoito anos se passaram e o que percebemos atualmente é que o Ensino de Ciências e

Biologia tem se dado, na maioria das vezes, por meio da transmissão de informações

prontas apresentadas nos livros didáticos, não estimulando o raciocínio e a busca de

soluções por parte dos alunos (SOBRINHO, 2009).

Atualmente, não se pode mais aceitar o ensino a partir da memorização. É

necessário que os professores adotem metodologias alternativas e inovadoras em suas

práticas pedagógicas, que venham propiciar ao aluno uma maior utilização do raciocínio

(SILVA et al., 2009; COSTA & BARROS, 2014).

Há mais de 30 anos a legislação brasileira estabelece um espaço para a arte e suas

diversas linguagens na educação básica. Entretanto, mesmo a música sendo uma dessas

linguagens, muitas vezes ainda é desvalorizada no ensino (MOURA, 2013).

Dentre tantos recursos didáticos que podem ser utilizados pelo professor a fim de

oportunizar e facilitar o processo de aprendizado dos alunos, destaca-se no presente

trabalho o uso da música em sala de aula.

Apesar da música não ilustrar visualmente o conteúdo que pode ser explorado, ela

se constitui em um veículo de expressão que é capaz de aproximar mais o aluno do tema

a ser estudado. Muitos são os benefícios de se utilizar músicas como recursos didático-

pedagógicos nas aulas de Ciências e Biologia, dentre elas a saber: 1) É uma opção de

baixo custo; 2) É um recurso de fácil assimilação; e 3) É uma atividade lúdica para os

alunos (BERTONCELLO & SANTOS, 2002; BARROS, ZANELLA, & ARAÚJO-

JORGE, 2013).

Visando contribuir para a melhoria no modo como o ensino é realizado nas

escolas, o presente estudo acredita que a música pode ser utilizada como uma ferramenta

eficiente, capaz de contextualizar os conteúdos, e desse modo, facilitar a aquisição dos

saberes biológicos pelos alunos. Nesse viés, foi apresentada uma proposta para a

utilização da canção “Aqui no mar” como uma alternativa para o ensino de Ciências e

Biologia.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

4

METODOLOGIA

Foi elaborada uma atividade contendo 16 questões sobre a música “Aqui no mar”,

interpretada por Diogo Nogueira, que possui composição de Ashman e Menken (2010),

que pode ser trabalhada nas disciplinas de Ciências e Biologia. É necessário que os

docentes testem a atividade nos mais variados contextos educacionais, e se acharem

necessário, que efetuem modificações na mesma, visando aproximar ainda mais o ensino

de Ciências e Biologia da música popular brasileira.

RESULTADOS

Letra da música Aqui no mar, Composição: Howard Ashman e Alan Menken.

O fruto do meu vizinho

Parece melhor que o meu

O sonho de ir lá em cima

Eu creio que é engano seu

Você tem aqui no fundo

Conforto até demais É tão

belo o nosso mundo

O que é que você quer mais?

Onde eu nasci, onde eu cresci

É mais molhado, eu sou vidrado por tudo

aqui

Lá se trabalha o dia inteiro

Lá são escravos do dinheiro

A vida é boa, eu vivo à toa

Onde eu nasci

O peixe vive contente

Aqui debaixo do mar

O peixe que vai pra terra

Não sabe onde vai parar

Às vezes vai pra um aquário

O que não é ruim de fato

Mas quando o homem tem fome

O peixe vai para o prato

Vou lhe contar: Aqui no mar

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

5

Ninguém nos segue nem nos

persegue pra nos fritar

Se os peixes querem ver o sol

Tomem cuidado com o anzol

Até o escuro é mais seguro

Aqui no mar

Onde eu nasci

Neste oceano entra e sai ano

Tem tudo aqui

Os peixes param de nadar

Quando é hora de tocar

Temos a bossa que é toda nossa

Aqui no mar

Tritão sopra a flauta

E a carpa na harpa

A solha no baixo,

Melhor som não acho

E aqui nos metais

Tem peixe demais, espere que

temos mais

Ninguém toca mal,

nem o bacalhau A

truta dançando, o

preto cantando

Até o salmão vem para o salão

E olhem quem vem soprar

Aqui no mar, aqui no mar

Até a sardinha entra na minha e vem cantar

E se eles têm montes de areia

Nós temos coro de sereia

Qualquer molusco

Sempre que eu busco sabe tocar

Até a lesminha sai da conchinha E

vem dançar Caracolzinho tira um

sonzinho, por isso a gente daqui é

quente

Faz um programa até na lama

Aqui no mar

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

6

Perguntas propostas: Observando as estrofes: “O fruto do meu vizinho/ Parece melhor que o meu”.

Responda as três primeiras questões:

1) Descreva as formas existentes de dispersão de frutos na natureza por animais.

Sugestão de resposta: A dispersão de frutos por animais chama-se Zoocoria, e

ocorre de três formas: I) Ingestão do fruto e liberação da semente (Endozoocoria), II)

Transporte do fruto de forma consciente (Sinzoocoria). Ambos os casos estão

relacionados com os frutos carnosos e coloridos, uma vez que, nesses casos, o animal está

normalmente procurando uma forma de alimentar-se. III) Transporte de fruto

acidentalmente (Epizoocoria). Normalmente não está associado à alimentação, e sim às

estruturas que fazem com que os frutos prendam-se ao corpo do animal. Nesse caso, são

comuns frutos com ganchos, espinhos e cascas adesivas, que se fixam facilmente

(SANTOS, 2015).

2) Cite as diversas denominações dadas para a dispersão de frutos realizada por

animais (Zoocoria) de acordo com o animal dispersor.

Sugestão de resposta: 1) Mirmecocoria - dispersão por formigas. 2) Ictiocoria -

dispersão por peixes. 3) Saurocoria - dispersão por répteis.4) Ornitocoria - dispersão por

pássaros. 4) Mamaliocoria - dispersão por mamíferos.5) Quiropterocoria - dispersão por

morcegos. 5) Antropocoria - dispersão pelo homem (SANTOS, 2015).

3) Cite e explique as partes que constituem a estrutura básica do fruto.

Sugestão de resposta: O fruto, geralmente, possui pericarpo e semente. O

pericarpo é dividido em três partes: epicarpo, mesocarpo e endocarpo. O epicarpo é a

porção externa a casca. O mesocarpo é a parte muitas vezes carnosa e comestível. O

endocarpo é a camada interna que envolve a semente.

4) No mundo contemporâneo as pessoas são, cada vez mais, classificadas pelo que

possuem e pelo que consomem. A partir do trecho “Lá se trabalha o dia

inteiro/Lá são escravos do dinheiro”, discuta o que significa o consumismo e

quais são os impactos ambientais causados por ele.

Sugestão de resposta: O consumismo é uma compulsão que leva o indivíduo a

comprar de forma ilimitada e sem necessidade bens, mercadorias e/ou serviços. Um dos

problemas causado pelo consumismo é o uso desenfreado dos recursos naturais que não

são renováveis, como o petróleo, por exemplo, que cada vez mais está se esvaindo. O

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

7

aumento no consumo de energia, água, minerais e elementos da biodiversidade vêm

causando sérios problemas ambientais, como a poluição da água e do ar, a contaminação

e o desgaste do solo, o desaparecimento de espécies animais e vegetais e as mudanças

climáticas. Outro grande problema é o aumento da produção de lixo, que por sua vez,

nem sempre possui um tratamento ou um local de descarte adequado, sendo levados para

lixões a céu aberto (PORTAL, 2015).

5) Leia as estrofes : “O peixe vive contente/ Aqui debaixo do mar”. A seguir cite a

forma pela qual os peixes excretam seus produtos nitrogenados no ambiente

marinho e como acontece a regulação da sua temperatura corporal.

Sugestão de resposta: Os produtos nitrogenados são excretados no ambiente

marinho na forma de amônia, substância altamente tóxica e solúvel, que demanda grande

quantidade de água para ser eliminada. Por isso esse tipo de excreta ocorre apenas em

animais aquáticos, para os quais obter água não é um problema. Como são animais

Ectotermos (heterotermos) a regulação da temperatura corporal varia de acordo com a

temperatura do ambiente (POUGH et al., 2008).

6) “Os peixes param de nadar/Quando é hora de tocar”. A locomoção dos peixes

na água é feita através do movimento de suas nadadeiras na água. Cite e

explique cada tipo de nadadeira que existe neste grupo.

Sugestão de resposta: Há seis tipos de nadadeiras: a adiposa que não ocorre em

todas as espécies (é desprovida de raios e tem finalidade desconhecida, localizada entre

as nadadeiras dorsal e caudal); a anal que atua como uma quilha, dando equilíbrio ao

peixe (localiza-se logo abaixo da caudal); a caudal que impulsiona o peixe na água. É a

principal responsável pela sua propulsão na água e também tem influência sobre o

equilíbrio. Há vários tipos: arredondada (tem a forma circular), bifurcada (tem a forma de

um "V" deitado), confluente (assemelha-se a um pincel), crescente (tem o formato de uma

lua), margeada (parece um semi-círculo com irregularidades na extremidade) e a truncada

(tem a forma de um trapézio); a dorsal que tem basicamente a mesma função da anal,

atuando como uma quilha. Com ela o peixe pode fazer curvas; a peitoral que têm várias

funções: permitem que os peixes girem em torno de seu eixo, podem reduzir a velocidade

de nado, movimentam a água próxima a ovos, para proporcionar uma oxigenação;

deslocam alimento que esteja sobre o substrato; e a pélvica (ventral) (POUGH et al.,

2008).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

8

7) Sobre o trecho “Tritão sopra a flauta e a carpa na harpa”. A carpa é um peixe

que vive em águas cálidas, rios de curso lento e lagos. Se alimenta de pequenos

invertebrados e é muito usada em piscicultura. Explique qual é a importância

da carpa para países orientais como China e Japão.

Sugestão de resposta: A carpa3 significa boa sorte, sucesso, vida longa e

perseverança, e é um peixe muito valorizado nesses países. Existe uma lenda chinesa que

diz que a carpa tinha que atingir a fonte do Rio Amarelo, que atravessa todo o continente

chinês, na época da desova, tendo que nadar e saltar vales cheios de cascatas até à

montanha Jishinhan. A carpa que chegasse até o fim, se transformaria em dragão.

8) “A truta dançando, o preto cantando”. A carne da truta é indicada como

coadjuvante no tratamento da artrite reumatoide e psoríase, impede enfartos do

miocárdio, reduz os níveis de colesterol e triglicerídios e diminui a pressão

sanguínea (hipertensão) e atenua estados inflamatórios. Escreva características

nutricionais dessa espécie bem como outros benefícios a saúde.

Sugestão de resposta: A carne da truta4 possui alto valor nutritivo, com alto teor

de proteína, cálcio, fósforo, sais minerais e vitaminas. Apresenta também ácidos graxos

do tipo Ômega-3 e baixo teor de calorias, o que a torna uma boa opção para dietas de

emagrecimento e na redução do colesterol ruim (LDL), nocivo ao coração. Ômega-3 é

um suplemento alimentar indicado na prevenção primária e secundária da aterosclerose e

da doença coronária.

9) Baseando-se nas estrofes: “ Mas quando o homem tem fome/ O peixe vai para

o prato”; explique, os benefícios da carne de peixe. Posteriormente, discuta

porque a carne de peixe cozinha mais rápido que a carne de outros animais.

Sugestão de resposta: A carne de peixe possui grande quantidade de minerais

(como cálcio e fósforo), vitaminas, e é rica em proteínas. Possui ômega-3 que ajuda a

controlar a pressão, reduz o risco de doenças cardíacas, aterosclerose (endurecimento das

artérias) e o nível de colesterol e triglicérides. “Cozinha mais rápido porque a estrutura

muscular é diferente da dos mamíferos terrestres. Se comparada às outras carnes (bovina,

suína e de aves), a carne de peixe tem menos quantidade de tecido conjuntivo, o que

contribui para a maciez da sua textura. É por essa razão que a carne do pescado cozinha

3 http://www.significados.com.br/carpa/ 4 http://www.truta.com.br/sobre_a_truta.htm

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

9

mais rápido. Grosso modo, a estrutura muscular do peixe é arranjada de tal forma que os

feixes de fibras se destacam em flocos após o cozimento. Já o teor de gordura do peixe

ajuda a carne a reter uma parcela da umidade depois de cozida. Alguns exemplos de

peixes gordos que podem apresentar teores de até 20% de gordura: mapará (típico da

região Norte) e sardinha” (LOMBARDI, 2003).

10) Sobre o seguinte trecho: “Tritão sopra a flauta/ E a carpa na harpa”; explique

quem foi Tritão na mitologia grega, quem é Tritão no sistema solar, e quem é

tritão na biologia. A seguir, atribua qual o significado da carpa nos países

orientais como China e Japão.

Sugestão de resposta: Tritão5, (Triton) na mitologia grega, é um deus marinho

conhecido como o Rei dos Mares. Filho de Poseidon (Netuno na mitologia romana) e

Anfitrite (Salácia), geralmente é representado com cabeça e tronco humanos e cauda de

peixe É um fiel servidor de seus pais, atuando como seu mensageiro e acalmando as águas

do mar para que a carruagem de Poseidon deslize com segurança.

Tritão6 é também a maior lua de Netuno, que se encontra a cerca de 4 500 milhões

de quilômetros do Sol. É um dos astros mais gélidos do sistema solar, com uma história

geológica bastante complexa; possui uma superfície bastante jovem e de aspecto rugoso,

desfigurada por violentas erupções vulcânicas, rápidos congelamentos de superfície e

com repentina fundição, gerando assim uma rede de rachaduras enormes. Na biologia,

Tritão7 é o nome comum dado a anfíbios pertencentes à subfamília Pleurodelinae (família

Salamandridae). Estão presentes em toda a Europa, Ásia, América do Norte e norte da

África (WIKIPÉDIA, 2015c). Em países orientais, como Japão e China, a carpa é um

peixe muito valorizado já que significa boa sorte, sucesso, vida longa e perseverança.

11) “Ninguém toca mal, nem o bacalhau/ A truta dançando, o preto cantando/ Até

o salmão vem para o salão”. Explique o significado do termo “bacalhau do

porto” utilizado em Portugal. Discuta, a seguir porque a truta pode ser vendida

como salmão.

5 http://pt.wikipedia.org/wiki/Trit%C3%A3o_%28mitologia%29 6 http://pt.wikipedia.org/wiki/Trit%C3%A3o_%28sat%C3%A9lite%29 7 http://pt.wikipedia.org/wiki/Trit%C3%A3o_%28anf%C3%ADbio%29

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

10

Sugestão de resposta: O peixe Gadus morhua é conhecido como bacalhau do

Porto, uma referência à cidade portuguesa, apesar de não haver bacalhau em águas

lusitanas. Portugal chegou a se tornar o maior mercado consumidor de bacalhau do mundo

sendo um importante centro de comércio do peixe seco e salgado que chega do Atlântico

Norte, em especial da Noruega (NOGUEIRA, 2004),

“A truta e o salmão integram a família dos salmonídeos e têm gosto bem parecido - só que a truta é mais barata. Por isso, há produtores que dão às trutas uma ração aditivada com corante, para que elas fiquem rosadas, visualmente idênticas ao salmão. Se a truta for consumida na forma de sushi, cortada e misturada com shoyu, é muito difícil notar diferença no sabor. O próprio salmão também é alimentado com corantes - porque, como é criado em cativeiro, não tem acesso aos crustáceos dos quais se alimenta na natureza, e que dão a ele sua cor rosada natural. Os criadores colocam na ração os pigmentos astaxantina e cantaxantina, que podem ser sintéticos ou extraídos de algas, afirma o engenheiro de alimentos Cláudio Lima” (SZKLARZ & GARATTONI, 2012).

12) “Aqui no mar, aqui no mar/ Até a sardinha entra na minha e vem cantar”. Cite

o principal item alimentar das sardinhas.

Sugestão de resposta: As sardinhas se alimentam principalmente de plâncton

(CORNILS & LACERDA, 2015).

13) “Qualquer molusco/ Sempre que eu busco sabe tocar”. Sabendo da existência

do músculo adutor em alguns moluscos, explique porque conchas cruas são

difíceis de ser abertas.

Sugestão de resposta: Simplesmente porque os organismos que vivem dentro

delas estão vivos. Dos moluscos mais conhecidos na gastronomia, como o marisco ou

mexilhão, a ostra, a vieira e o vôngole, consumimos o músculo adutor, também chamado

de manto, que se agarra à concha. Enquanto o organismo está vivo, esse músculo preserva

a concha fechada (LOMBARDI, 2003).

14) Quais são as vantagens e as desvantagens dos aquários?

Sugestão de resposta: Para os animais de aquário:

Vantagens: O animal está submetido a um cuidado especial. O animal está livre

de predadores, bem alimentado e sadio, pois as plantas colocadas no aquário devem estar

livres de parasitas (DURREL & DURREL, 1984).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

11

Desvantagens: O animal está totalmente dependente do seu dono ou do mantedor

do aquário. Neste caso, se houver um excesso de detritos no tanque, falta de alimento para

os animais que ali habitam, déficit de oxigenação da água, entre outros, os indivíduos

sofrerão (DURREL & DURREL, 1984).

15) No mar, ninguém segue os seres para que possam fritá-los... mas seguem para

outras finalidades?

Sugestão de resposta: Sim. Seguem para predá-los. Para isso, os animais lançam

mão de variados métodos de captura. Exemplos disso são: a captura de material em

suspensão (principalmente por parte dos invertebrados); a filtração, principalmente por

parte dos vertebrados, a saber, os cetáceos misticetos, peixes ósseos, moluscos bivalves e

até aves (HICKMAN et al., 2004); a captura por inteiro da presa durante a pesca (por

parte de algumas aves); por sucção (POUGH et al., 2002) ou, como no caso dos cetáceos

odontocetos, pela incapacitação das presas por meio de mordidas em locais estratégicos

(como as nadadeiras, por exemplo) seguida pela deglutição desta por inteiro (DI

BENEDITTO et al., 2010). Outros animais podem perseguir presas para se alimentarem

de seus fluidos, como no caso de algumas lampreias (HICKMAN et al., 2004).

16) Você seria capaz de dividir os mais variados grupos de animais que aparecem de acordo com as categorias taxonômicas a que pertencem? Sugestão de resposta:

Nome comum Reino Filo Classe Ordem Família

TRITÃO Animalia Chordata Amphibia Caudata Salamandridae

CARPA Animalia Chordata Actinopterygii Cypriniformes Cyprinidae

TRUTA Animalia Chordata Actinopterygii Salmoniformes Salmonidae

SOLHA Animalia Chordata Actinopterygii Pleuronectiformes Soleidae

SALMÃO Animalia Chordata Actinopterygii Salmoniformes Salmonidae

BACALHAU Animalia Chordata Actinopterygii Gadiformes Gadidae

SARDINHA Animalia Chordata Actinopterygii Clupeiformes Clupeidae LESMINHA/

CARACOLZINHO* Animalia Mollusca Gastropoda - -

Fontes da tabela 1: Chumchal (2002), Dewey (2015a,b), Larson et al. (2006), Ridolfi (2006), Roberts

(2000), Ryan (2014), Wilmot (2005). *Lesma e caracol são palavras genéricas que designam popularmente

moluscos da classe Gastropoda.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

12

DISCUSSÃO

Belisário et al. (2013) demonstraram como contextualizar os conteúdos de

botânica e história através da música “Tanto Mar”, de Chico Buarque. Por meio dessa

música, os professores de Biologia e de História, da educação básica, podem pedir aos

seus alunos que procurem se aprofundar na temática do Dia da Liberdade e, façam uma

produção de texto acerca desse acontecimento; que caracterizem o período conhecido

como a Primavera Marcelista; que investiguem um movimento popular, que tenha

ocorrido em Portugal ou no Brasil, e descrevam seus aspectos mais importantes; podem

também explicar a importância do embrião de uma planta para o seu estabelecimento na

terra. Da mesma maneira, podem solicitar aos estudantes que representem o ciclo

reprodutivo de uma fanerógama, identificando a fase gametofítica e a esporofítica; que

elaborem um texto destacando o valor das algas, de maneira ampla, associando as mesmas

ao mar; que façam uma reflexão sobre a importância das plantas e partes das mesmas no

nosso dia-a-dia, nas nossas conquistas, na manutenção da biodiversidade, na manutenção

da vida; dentre outros aspectos possíveis de se explorar na letra da música.

Barros, Diniz e Araujo-Jorge (2014a) demonstram como descobrir ciências em

letras de músicas. Focando nos eixos temáticos Terra e Universo/ Tecnologia e

Sociedade, os autores sugerem, dentre várias, utilizar a música “Carimbador maluco”, de

Raul Seixas. As discussões propostas são: Na música, onde é que as pessoas pensam que

vão?; Viajar de um país a outro é mais fácil... Podemos ir de avião, navio, de carro entre

outros meios de transporte. Por que é mais difícil viajar pelo universo?; Quais condições

são responsáveis por dificultar esse trajeto; Além do sol e da lua, o que mais você conhece

em relação a Terra e ao Universo?; Que aventuras você gostaria de experimentar?, Dentre

outras discussões possíveis. Para a canção “Lindo balão azul”, de Guilherme Arantes,

sugerem trabalhar: o que é viver no mundo da lua?; Os papos dos cientistas são futuristas

e lunáticos?, Que outros papos eles tem?; Como é a alma do artista?; É possível pegar

carona na cauda de um cometa?; O que é a Via Láctea?; O que seria o balão azul?; O que

a expressão voltar pra casa quer dizer?, entre outros tópicos.

Brandão et al. (2014) mostraram como estudar botânica através da música “Feira

de Mangaio” escrita por Sivuca e Glorinha Gadelha (1979). Trata-se de um clássico da

música nordestina, que apresenta os produtos que são comercializados pelos mangaieiros

nas feiras livres, que podem ser entendidas como verdadeiros celeiros culturais.

Evidencia, ainda, as manifestações artísticas que compõem o modo de vida das pessoas

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

13

que transitam por estas feiras. Através da canção, recomenda-se que os professores de

Ciências, das séries finais do Ensino Fundamental, e Biologia, do Ensino Médio, possam

trabalhar com os alunos a associação entre as culturas fumageira e tabagista e a saúde

humana; que possam associar o milho, o amendoim, a cana de açúcar e o coco verde, às

suas respectivas classes vegetais e aos diferentes tipos de reprodução; que possam

compreender a interação existente entre plantas e aves e sua importância para a botânica;

que aprendam e discutam o significado das diferentes expressões nordestinas; que

entendam a importância das feiras de mangaio para o sustento das famílias nordestinas,

entre outros aspectos retratados pela rica letra da música.

Através da poesia “Solar”, de Milton Nascimento e Fernando Brant, ainda para o

tema Terra e Universo/ Tecnologia e Sociedade, pode-se trabalhar os seguintes aspectos:

O que significa a expressão venho do sol?; É possível existir vida no planeta Terra sem o

sol?; Por que é triste não ter o sol todo dia?; O que acontece nesse caso, quando o sol “não

está lá”?; O que pode ser o inverno azul? (BARROS, DINIZ, & ARAUJO-JORGE,

2014a). Para a poesia “Sobradinho”, de Sá e Guarabyra, recomenda-se discutir : Como o

homem desfaz a natureza?; O sertão vai virar mar?, O mar vai virar sertão?; Quem é o

beato que dizia que o sertão ia alagar?; O que significa a expressão “vem o rio te

engolir”?; “O povo vai embora com medo de se afogar”. Para onde o povo vai embora?,

Como esse processo acontece?. Na poesia “Rosa de Hiroshima”, de Vinícius de Moraes

e Gérson Conrad, pode-se perguntar aos alunos: O que é a Rosa de Hiroshima?; Mudas,

cegas, feridas... em consequência de que?; Porque a rosa é estúpida e inválida?; O que

significa cirrose?, Em que condições ela pode ocorrer?. E por fim, para a música “Pombo

correio”, de Moraes Moreira, seria interessante discutir quais características biológicas

podem fazer do pombo correio um mensageiro em potencial; Que situações poderiam

provocar esse desencontro citado na música?; Voar o mundo se preciso for... o pombo

correio pode voar a que distâncias?; Será que o pombo correio ainda é muito usado no

mundo nos dias de hoje?; E outras tecnologias, como o Código Morse? (BARROS,

DINIZ, & ARAUJO-JORGE, 2014a).

É bastante comum o fato de que alguns alunos nem sempre reconhecem a relação

entre o que estudam, seus próprios conhecimentos e o quotidiano em que vivem. Assim

sendo, interpretam que a Biologia se resume a memorização de nomes complexos,

classificação de fenômenos e resolução de problemas que não fazem parte do seu dia-a-dia.

Para mudar esse pensamento, é preciso que o Ensino de Biologia seja feito de uma forma

contextualizada e interdisciplinar (BUSATO, 2001; MORAIS, 2004; ROSA & OREY, 2014).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

14

Contribuindo para o que foi relatado anteriormente, Barros, Diniz e Araujo-Jorge

(2014b), para a temática Ser Humano e Saúde/ Vida e Ambiente, sugerem discutir os

seguintes aspectos na poesia infantil “Ai meu nariz”, de Alvaréz, Bermudéz e Edgard

Poças: O que pode provocar o funga funga da música?; Acupuntura... o que isso

significa?; Como evitar que novas crianças fiquem com resfriado?; Por que o nariz fica

se parecendo com um chafariz?. Na poesia de Edu Lobo e Chico Buarque, intitulada

“Ciranda da bailarina”, pode-se discutir quais são os grupos de seres vivos que aparecem

na música; O que pode provocar piriri?; Por que as pessoas tem remelas quando

acordam?; A bailarina possui algum tipo de problema, doença ou dificuldade?; A música

pode permitir uma reflexão acerca dos hábitos de higiene... quais atitudes podem ser

adotadas pelas pessoas para que a saúde fique cada vez melhor?, dentre outras

possibilidades.

Ainda de acordo com os mesmos autores, para a música “Tudo vira bosta”, de

Moacyr Franco, seria relevante discutir com os alunos o trajeto dos alimentos em nosso

corpo, até a formação das fezes. Ao utilizar o trecho ninguém vai escapar do pó... explicar

o que isso significa. Ao utilizar a poesia de Chico Buarque e Francis Hime, na música

“Passaredo”, interessante seria, debater sobre: Por que os autores pedem aos animais para

se afastarem de alguma forma quando o homem se aproxima?; Os nomes dos animais

listados na música pertencem a qual grupo de vertebrados?; O que pode acontecer aos

animais se eles não ficarem atentos?, etc. Para a poesia “O cio da terra”, de Milton

Nascimento e Chico Buarque, pode-se polemizar qual é a relação entre o trigo e o milagre

do pão; O que significa debulhar e forjar; Quais são os desejos da terra; O que quer dizer

“cio da terra”; Como podemos fecundar o chão do Brasil; A cana e o mel são alimentos

que possuem muitos açúcares... você conseguiria indicar mais alguns alimentos ricos

nesse tipo de nutriente?. E, por fim, para a poesia de Gordurinha, “Vendedor de

caranguejo”, aconselha-se abordar: qual é o tipo de ambiente em que encontramos

caranguejos?; O que é um gordo guaiamum?; Os caranguejos podem ser vendidos em

cordas... você ou alguém da sua família já comprou os animais dessa forma?; Por que o

vendedor perdeu a mocidade com os pés sujos de lama?; O que é e para que serve um

caçuá?; O que significa a expressão “os bichinho tão criado”?, Dentre outros aspectos

possíveis de se explorar na letra da poesia (BARROS, DINIZ, & ARAUJO-JORGE,

2014b).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

15

Brandão et al. (2015) registram como é possível aproximar os conteúdos

botânicos para os alunos através da música “Espatódea”, escrita por Nando Reis em

homenagem a sua filha Zoé. Através dessa música, sugere-se que o professor trabalhe

com os alunos a relação entre a distribuição geográfica da Spathodea campanulata (P.

Beauv) e os usos medicinais desta planta em cada região; As prováveis consequências

que essa espécie vegetal pode provocar nas áreas onde foi introduzida; Os nomes

populares para a Espatódea; O motivo da árvore ser conhecida como xixi de macaco;

Informações botânicas: tipo de inflorescência, tipo de fruto, função das flores na

ornitofilia, nomes de componentes florais e suas respectivas funções, pigmentos

responsáveis pelas cores vermelhas, laranjas e raramente amareladas das flores. A letra

da música foi ricamente explorada, por exemplo no sentido de questionar o aluno sobre o

órgão reprodutor que o gineceu representa e quais os diferentes recursos de atração

adotados pelas flores, a partir da estrofe “Espatódea, gineceu cor de pólen”. Os discentes

também podem criar grupos de discussão e propor hipóteses para explicar a toxicidade

do néctar da planta; dentre outras perspectivas possíveis de se explorar.

Para contextualizar o tema Saúde/ Orientação sexual/ Meio Ambiente, Barros,

Diniz e Araujo-Jorge (2014c), sugerem utilizar a canção “Exaustino”, de Roberto Lopes,

Canário e Nilo Penetra; a poesia infantil “De umbigo a umbiguinho”, de Toquinho e Elifas

Andreato; a música “O mundo é um moinho”, de Cartola; a poesia “Flor da idade”, de

Chico Buarque; a poesia “O sal de Terra”, de Beto Guedes e Ronaldo Bastos; e finalizam

recomendando utilizar a poesia infantil “Herdeiros do futuro”, de Toquinho e Elifas

Andreato. Para debater o tema Ética/ Pluralidade Cultural/ Trabalho e Consumo; Barros,

Diniz e Araujo-Jorge (2014d) defendem aproveitar a canção “Coração de estudante”, de

Wagner Tiso e Milton Nascimento; a poesia “Uma canção desnaturada”, e

“Assentamento”, ambas de Chico Buarque; a música “A violeira”, de Tom Jobim e Chico

Buarque; a canção “Sapato velho”, de Mu, Cláudio Nucci e Paulinho Tapajós; e encerram

com a música “Bolsa de grife”, de Vanessa da Mata.

No tema Ciência e Arte, Barros, Diniz e Araujo-Jorge (2014e) disponibilizam

atividades que contextualizam esse assunto na poesia “A ciência em si”, de Gilberto Gil

e Arnaldo Antunes; na música “Ciência e Arte”, de Cartola e Carlos Cachaça; na poesia

“Emergindo da Ciência”, de Arnaldo Baptista; e na poesia “Quanta”, de Gilberto Gil. Já

para contextualizar o tema “Brasil sem Miséria”, Barros, Diniz e Araujo-Jorge (2014f)

aconselham usar a música “Haiti”, de Gilberto Gil e Caetano Veloso; o pagode “Caviar”,

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

16

de Luiz Grande, Barbeirinho do Jacarezinho e Marcos Diniz, interpretado por Zeca

Pagodinho; a poesia “O Meu Guri”, de Chico Buarque; a música “Burguesinha”,

interpretada por Seu Jorge; o rock “Miséria”, de Arnaldo Antunes, Sérgio Britto e Paulo

Miklos; a poesia “Pobreza por pobreza”, de Luiz Gonzaga Jr.; e concluem com a música

“Problema social”, de Guará e Fernandinho.

A sociedade atual vive em um mundo bastante dinâmico, repleto de informações,

que permitem a aquisição do conhecimento de uma maneira rápida. Considerando esse

contexto, é necessário repensar e reavaliar a maneira como o ensino é realizado, bem

como buscar novas metodologias que venham a aprimorar as formas tradicionais de

ensino (BAÏDAK & COGHLAN, 2006; FORSTHUBER et al., 2011; OLIVEIRA &

SILVA, 2013).

Sendo assim, espera-se que os professores de Ciências e Biologia tenham acesso

a essa atividade e que possam, de acordo com os seus anseios, trabalhar os diferentes

conteúdos biológicos que se fazem presentes na letra da música “Aqui no mar”. Pretende-

se, ainda, despertar a criatividade dos professores, de forma que os mesmos possam

desenvolver outras atividades como essa, em suas práticas educativas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ASHMAN, H., & MENKEN, A. (2010). Aqui no Mar” (Under the Sea). In: Disney

Adventures in Samba. Walt Disney Records. 1 CD - ROM. Faixa 6. Intérprete: Diogo

Nogueira.

BAÏDAK, N., & COGHLAN, M. (2006). O Ensino das Ciências nas Escolas da Europa:

Políticas e Investigação. Europa: Agência de Execução relativa à Educação, ao

Audiovisual e à Cultura (EURYDICE).

BARROS, M. D. M., DINIZ, P. G. Z., & ARAUJO-JORGE, T. C. (2014). Descobrindo

ciências em letras de músicas 1- Ciência e Arte em oficinas dialógicas de música. Rio de

Janeiro: Com Ciência e Arte na Escola© LITEB/IOC/Fiocruz.

BARROS, M. D. M., DINIZ, P. G. Z., & ARAUJO-JORGE, T. C. (2014). Descobrindo

ciências em letras de músicas 2- Brasil sem Miséria em oficinas dialógicas de música.

Rio de Janeiro: Com Ciência e Arte na Escola© LITEB/IOC/Fiocruz.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

17

BARROS, M. D. M., DINIZ, P. G. Z., & ARAUJO-JORGE, T. C. (2014). Descobrindo

ciências em letras de músicas 3- Terra e Universo/ Tecnologia e Sociedade em oficinas

dialógicas de música. Rio de Janeiro: Com Ciência e Arte na Escola©

LITEB/IOC/Fiocruz.

BARROS, M. D. M., DINIZ, P. G. Z., & ARAUJO-JORGE, T. C. (2014). Descobrindo

ciências em letras de músicas 4- Ser Humano e Saúde/ Vida e Ambiente em oficinas

dialógicas de música. Rio de Janeiro: Com Ciência e Arte na Escola©

LITEB/IOC/Fiocruz.

BARROS, M. D. M., DINIZ, P. G. Z., & ARAUJO-JORGE, T. C. (2014). Descobrindo

ciências em letras de músicas 5- Saúde/ Orientação Sexual/ Meio Ambiente em oficinas

dialógicas de música. Rio de Janeiro: Com Ciência e Arte na Escola©

LITEB/IOC/Fiocruz.

BARROS, M. D. M., DINIZ, P. G. Z., & ARAUJO-JORGE, T. C. (2014). Descobrindo

ciências em letras de músicas 6- Ética/ Pluralidade Cultural/ Trabalho e Consumo em

oficinas dialógicas de música. Rio de Janeiro: Com Ciência e Arte na Escola©

LITEB/IOC/Fiocruz.

BARROS, M. D. M., ZANELLA, P. G., & ARAUJO-JORGE, T. C. (2013). A MÚSICA

PODE SER UMA ESTRATÉGIA PARA O ENSINO DE CIÊNCIAS NATURAIS?

ANALISANDO CONCEPÇÕES DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA.

Revista Ensaio, Belo Horizonte, 15 (01), 81-94.

BELISÁRIO, R. et al. (2013). DISCUTINDO A REVOLUÇÃO DOS CRAVOS NOS

CONTEXTOS DA BOTÂNICA E DA HISTÓRIA NA EDUCAÇÃO BÁSICA, A

PARTIR DA MÚSICA “TANTO MAR”, DE CHICO BUARQUE (1978). Trabalho

apresentado ao 64º Congresso Nacional de Botânica, Belo Horizonte.

BERTONCELLO, L., & SANTOS, M. R. (2002). Música aplicada ao ensino da

informática em ensino profissionalizante. Iniciação Científica CESUMAR, Maringá, 4(2),

131-142.

BRANDÃO, L. E. D. et al. (2015). A UTILIZAÇÃO DA MÚSICA “ESPATÓDEA”

COMO ESTRATÉGIA PARA O ENSINO DE BOTÂNICA: APROXIMAÇÕES COM

O ENSINO DE CIÊNCIAS E BIOLOGIA. Trabalho apresentado ao 66º Congresso

Nacional de Botânica, Santos.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

18

BRANDÃO, L. E D. et al. (2014). ENSINANDO BOTÂNICA A PARTIR DA MÚSICA

FEIRA DE MANGAIO DE SIVUCA E GLORINHA GADELHA (1979). Trabalho

apresentado ao XI Congreso Latinoamericano de Botánica /LXV Congresso Nacional de

Botânica, Salvador.

BUSATO, I. R. H. (2001). Desenvolvimento de metodologia adequada à disciplina de

Biologia, que permita uma diminuição da visão fragmentada do saber e contemple uma

visão mais integrada e holística. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção) -

Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção da Universidade Federal de

Santa Catarina, Florianópolis.

COSTA, E. C. P.; & BARROS, M. D. M. (2014). Luz, câmera, ação: o uso de filmes

como estratégia para o ensino de Ciências e Biologia. REVISTA PRÁXIS, VI (11), 81-93.

DI BENEDITTO, A. P. M., SICILIANO, S., & RAMOS, R. M. A. (2010). Cetáceos:

introdução à biologia e a metodologia básica para o desenvolvimento de estudos. Rio de

Janeiro: Fundação Oswaldo Cruz; Escola Nacional de Saúde Pública.

DURREL, G., & DURREL, L. (1984). O naturalista amador: um guia prático ao mundo

da natureza. São Paulo: Martins Fontes.

FORSTHUBER, B., MOTIEJUNAITE, A., COUTINHO, A. S. A., BAÏDAK, N., &

HORVATH, A. (2011). O Ensino das Ciências na Europa: Políticas Nacionais, Práticas

e Investigação. Europa. Agência de Execução relativa à Educação, ao Audiovisual e à

Cultura (EURYDICE).

HICKMAN, C. P., ROBERTS, L. S., & LARSON, A. (2004). Princípios integrados de

zoologia. (11.ª ed.). Rio de Janeiro: Guanabara Koogan.

MORAIS, P. L.L. (2004). A competência dos professores de Biologia em contextualizar

os conteúdos específicos. Dissertação apresentada ao curso de Mestrado do Programa de

Pós Graduação em Educação da Universidade Federal de Pernambuco, como requisito

parcial para a obtenção do grau de mestre em Educação. Recife.

MOURA, H. B. (2013). A Lei nº 11.769/2008 e sua aplicabilidade no ensino básico.

Cadernos para o Professor, Juiz de Fora, 20, 9-17.

OLIVEIRA, V. D. R. B., & SILVA, M. R. (2013). As dificuldades da contextualização

histórica no ensino de biologia. Trabalho apresentado ao EREBIO-Sul – VI Encontro

Regional Sul de Ensino de Biologia/ XVI Semana Acadêmica de Ciências Biológicas.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

19

Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões – campus de Santo

Ângelo (URI), 22 a 24 de maio de 2013.

POUGH, H. F; JANIS, C. M.; & HEISER, J. B. (2008). A vida dos vertebrados, 4.ª ed.

São Paulo: Atheneu.

POUGH, H. F., JANIS, C. M., & HEISER, J. B. (2002). A vida dos vertebrados. (3.ª ed.).

São Paulo: Atheneu.

ROSA, M., & OREY, D. C. (2014). APROXIMANDO DIFERENTES CAMPOS DE

CONHECIMENTO EM EDUCAÇÃO: A ETNOMATEMÁTICA, A

ETNOBIOLOGIA E A ETNOECOLOGIA. VIDYA, Santa Maria, 34 (1), 1-14.

SILVA, R. P. et al. (2009). Ensino de Ciências e Biologia na escola pública: o que dizem

os educandos de seu processo formativo. Trabalho apresentado ao IX CONID -

CONGRESSO DE INICIAÇÃO À DOCÊNCIA, Recife, 2009.

SOBRINHO, R. S. (2009). A importância do ensino da biologia para o cotidiano.

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do título de Licenciado em

Biologia. Programa Especial de Formações de Docentes da Faculdade Integrada da

Grande Fortaleza, Fortaleza – CE.

WEBGRAFIA

BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da

educação nacional. Diário Oficial da União, Brasília, 20 de dezembro de 1996. Disponível

em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm

CHUMCHAL, M. (2002). Cyprinus carpio (on-line), Diversidade de Animais Web.

Disponível em: http://animaldiversity.org/accounts/Cyprinus_carpio

CORNILS, P.; & LACERDA, M. (2015). O fim das sardinhas. Disponível em:

http://super.abril.com.br/ecologia/fim-sardinhas-444191.shtml

DEWEY, T. (2015a). Salmonidae (On-line), Animal Diversity Web. Disponível em:

http://animaldiversity.org/accounts/Salmonidae.

DEWEY, T. (2015b). Clupeidae (On-line), Animal Diversity Web. Disponível em:

http://animaldiversity.org/accounts/Clupeidae

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

20

LARSON, A., WAKE, D., & DEVITT, T. (2006). Caudata. Disponível em:

http://tolweb.org/Caudata/14939/2006.09.05

LOMBARDI, R. (2003). Peixes e frutos do mar. Superinteressante. Disponível em:

http://super.abril.com.br/alimentacao/peixes-frutos-mar443895.shtml

NOGUEIRA, M. (2004). Bacalhau é um peixe?. Superinteressante. Disponível em:

http://super.abril.com.br/mundo-animal/bacalhau-peixe444448.shtml

PORTAL EDUCAÇÃO - Cursos Online. Disponível em: http://www.portaleducacao.com.br/biologia/artigos/48472/o-consumismo-e-seusimpactos-ambientais##ixzz3Vv0qVl00

RIDOLFI, K. (2006). Oncorhynchus mykiss (On-line), Animal Diversity Web. Disponível

em: http://animaldiversity.org/accounts/Oncorhynchus_mykiss

ROBERTS, J. (2000). Salvelinus fontinalis (On-line), Animal Diversity Web. Disponível

em: http://animaldiversity.org/accounts/Salvelinus_fontinalis

RYAN, C. (2014). Salmo trutta (on-line), Diversidade de Animais Web. Disponível em:

http://animaldiversity.org/accounts/Salmo_trutta

SANTOS, V. S. (2015). Dispersão de frutos e sementes. Disponível em:

http://www.alunosonline.com.br/biologia/dispersao-frutos-sementes.html

SZKLARZ, E., & GARATTONI, B. (2012). 25 coisas que estão escondendo de você: O

salmão que você come nem sempre é salmão. Superinteressante. Disponível em:

http://super.abril.com.br/cotidiano/25-coisas-estao-escondendo-voce717510.shtml

WIKIPÉDIA (2015). http://pt.wikipedia.org/wiki/Trit%C3%A3o_%28mitologia%29

WILMOT, C. (2005). Gadus morhua (On-line), Animal Diversity Web. Disponível em:

http://animaldiversity.org/accounts/Gadus_morhua

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

21

VOCEAR, CANTAR, CONTAR. DERIVAS METODOLÓGICAS DE UNA

INVESTIGACIÓN ARTÍSTICA Y AUTOETNOGRÁFICA

´To voice´, to sing, to tell. Methodological drifts of an artistic and autoetnographic

research

MAGRI, Gisela8

Resumen

En este artículo retomaré algunas reflexiones metodológicas surgidas durante el proceso de escritura de mi tesis doctoral, cuyo tema es la construcción de vocalidades y corporalidades en cantantes de música popular de la ciudad de La Plata (capital de la Provincia de Buenos Aires, Argentina). Desarrollaré un conjunto de reflexiones acerca de las herramientas y estrategias que elegí como camino metodológico para realizar mi investigación. A partir de mi doble rol en el campo como antropóloga y cantante de música popular, opté por la inclusión de herramientas autoetnográficas en el trabajo de campo, a la vez que situé al arte como una dimensión humana productora de conocimiento. Tratándose de una etnografía que al mismo tiempo me interpela como nativa, mi desafío ha sido pensar una metodología que sirva de puente entre lo que posibilita la ciencia –o el modo de practicarla desde la antropología social del cuerpo y desde la etnografía– y lo que produce el arte –o la investigación artística tal como la hemos de pensar-. Entendemos a la ciencia y el arte como ámbitos de investigación y experimentación que configuran dos modos de producir conocimiento, los cuales pueden dialogar fluidamente, no sin tensiones, pero sí tendiendo a la mayor igualdad posible de condiciones. En este contexto, la autoetnografía me ha resultado útil para habitar reflexiva y críticamente dos prácticas de mi hacer artístico que al mismo tiempo son corporales, hermenéuticas y conceptuales: enseñar canto y cantar música popular. Pensamos la metodología autoetnográfica como vehículo para levantar esa información, así como la potencia que la recirculación de saberes artístico-etnográficos ha tenido en la composición del devenir de mi trabajo.

8 GISELA MAGRI - Instituto de Investigación en Humanidades y Ciencias Sociales (UNLP – Conicet). Facultad de Humanidades y Ciencias de la Educación, Universidad Nacional de La Plata. Becaria de Conicet (CICES- IdIHCS/CONICET) y Doctoranda en Artes (FBA-UNLP). Línea de Formación en Arte Contemporáneo Latinoamericano – Facultad de Bellas Artes, UNLP. Fundadora do GEC - Grupo de Estudio sobre Cuerpo (formación e investigación teórico-práctica sobre la voz y el canto como práctica corporal, sociocultural y artística, así como diversos proyectos de investigación colectiva y encuentros de investigadores/performers).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

22

Abstract

In this article I will take up some methodological reflections arising during the process of writing my doctoral thesis, whose subject is the construction of vocalidades and corporalities singers of popular music of the city of La Plata (capital of the province of Buenos Aires, Argentina). I will develop a set of reflections on the tools and strategies that chose as a methodological way for my research. From my dual role in the field as an anthropologist and folk singer, I opted for the inclusion of autoetnográficas tools in fieldwork, while situé art as a human dimension producer of knowledge. Being an ethnography at the same time challenges me as a native, my challenge has been thinking a methodology that bridges between what science enables, or how to practice from the social anthropology of the body and from the ethnography and what It produces art-or artistic research such as we think. We understand science and art as fields of research and experimentation that form two modes of producing knowledge, which can converse fluently, not without tensions, but tending to the highest possible level playing field. In this context, autoethnography was helpful to inhabit two practices and critically reflective of my art making at the same time are body, hermeneutical and conceptual: teaching singing and singing popular music. We think the autoethnographic methodology as a vehicle for raising such information as well as the power recirculation artistic and ethnographic knowledge has had on the composition of my work´s drifts.

Palabras claves: voz; canto; corporalidades; autoetnografía; investigación artística.

Keywords: Voice; singing; corporalities; autoethnography; artistic research.

Data de submissão: Março de 2016 | Data de publicação: Junho de 2016.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

23

PRESENTACIÓN

“El cantar tiene sentido, entendimiento y razón...

La noche me enamora más que el día

pero mi corazón nunca se sacia,

de seguir el paso de la luna

que en el silencio de la sombra viaja...

Que hago yo, sola en el campo,

que hago yo sola en el campo”

AMANCIO PRADA

En este artículo retomaré algunas reflexiones metodológicas surgidas durante el

proceso de escritura de mi tesis doctoral, cuyo tema es la construcción de vocalidades y

corporalidades en cantantes de música popular de la ciudad de La Plata9. Desarrollaré un

conjunto de reflexiones acerca de las herramientas y estrategias que elegí como camino

metodológico para realizar mi investigación. A partir de mi doble rol en el campo como

antropóloga y cantante de música popular, opté por la inclusión de herramientas

autoetnográficas en el trabajo de campo, a la vez que situé al arte como una dimensión

humana productora de conocimiento. Tratándose de una etnografía que al mismo tiempo

me interpela como nativa, mi desafío ha sido pensar una metodología que sirva de puente

entre lo que posibilita la ciencia –o el modo de practicarla desde la antropología social

del cuerpo y desde la etnografía– y lo que produce el arte –o la investigación artística tal

como la hemos de pensar-. Entendemos a la ciencia y el arte como ámbitos de

investigación y experimentación que configuran dos modos de producir conocimiento,

los cuales pueden dialogar fluidamente, no sin tensiones, pero sí tendiendo a la mayor

igualdad posible de condiciones. En este contexto, la autoetnografía me ha resultado útil

para habitar reflexiva y críticamente dos prácticas de mi hacer artístico que al mismo

tiempo son corporales, hermenéuticas y conceptuales: enseñar canto y cantar música

popular. Pensamos la metodología autoetnográfica como vehículo para levantar esa

información, así como la potencia que la recirculación de saberes artístico-etnográficos

ha tenido en la composición del devenir de mi trabajo.

9 Capital de la Provincia de Buenos Aires, Argentina.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

24

Quisiera presentar algunas herramientas y estrategias que elegí como camino

metodológico para trabajar con mis preguntas de investigación, y dar cuenta del proceso

de construcción que implica crear tal andamiaje. Dichas herramientas y estrategias fueron

gestando derivas; hablo de derivas por ser un proceso que se va construyendo y armando,

como una ola de mar bravo, donde hay caos y descontrol, pero al mismo tiempo por

convertirse en una estructura, un camino hecho de muchos senderos que va tomando

cauce, justamente por transitar esa oscilación con la insistencia de quien sabe que hay

algo por decir sobre un cierto modo de hacer, dinámico, trastabillado, pero de algún modo,

genuino.

Organizaré este artículo en tres partes. A continuación, presentaré brevemente el

marco epistemológico hermenéutico y algunos recursos desde los cuales estoy pensando

mi trabajo; luego, daré paso a desarrollar los dos accesos fundamentales al objeto que

estoy construyendo e investigando, que respectivamente constituirán el segundo y tercer

apartado: investigación artística y autoetnografía. Pensamos la metodología

autoetnográfica como el puente para vincular estos modos de producir conocimiento que

son el científico y el artístico, los cuales retroalimentan y sitúan mi hacer como etnógrafa.

RECURSOS HERMENÉUTICOS

En primer lugar, mi investigación puede pensarse como una de tipo hermenéutica.

La noción de hermenéutica tiene que ver con el concepto de interpretación, harto

desarrollado desde la filología, la filosofía y las ciencias sociales (GADAMER, 1960;

BAUMAN, 2002). Roxana Ynoub (2012) define a las hipótesis hermeneúticas como

proposiciones que postulan en clave de conjeturas, una interpretación o lectura sobre

determinado material o fenómeno, el que será asumido como material significante. Los

contenidos de las hipótesis deben mostrarse coherentes con los supuestos, conceptos y

eventualmente teorías de alcance general, que han sido explicitados, o son explicitables a

la luz de la concepción asumida. La tarea de interpretar, entonces, siempre implica

resignificaciones de un mismo tema.

Pensando en ilustrar dicha condición hermenéutica de mi investigación, y

teniendo en cuenta el tema del que yo partí para investigar, una de las preguntas centrales

que me hice cuando empecé el trabajo fue por el significado de la voz, desde un lugar

más bien ontológico; podemos pensar a modo de ejemplo, en la variedad discursiva de

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

25

las respuestas que aparecieron a esa primer pregunta que me hice y que reproduje a mis

entrevistados o informantes, durante el trabajo de campo - ¿cómo pensás o qué es para

vos la voz, en el contexto de tu práctica musical cantada?- Mis entrevistados

respondieron, entre otras cosas, que la voz era, es, tanto: un instrumento para cantar, que

es/está en el cuerpo o lo implica, como algo que excede lo instrumental y que es diferente

a todos los instrumentos musicales; nuestra esencia, identidad o la síntesis particular de

cada subjetividad; algo que genera empoderamiento - porque conocer(se) la voz,

aprender a soltarla para cantar, nos modifica, nos empodera -; un territorio en el que se

conectan y unen el lenguaje y el pensamiento, la razón y la emoción, el cuerpo y la mente;

un lugar donde se puede experienciar la “unidad”; algo imprescindible que cualquier

músico/a debe conocer/saber usar -si no se canta lo que uno toca, si no se pone en la voz

lo que se toca en el instrumento, la música popular no suena-; un vehículo del decir, de

la canción, de la poesía y la letra, que cuando aparece en escena, se lleva todas las

miradas y escuchas; una fuerza ligada a lo interno, a lo más íntimo, a algo abstracto y

místico al mismo tiempo, la voz como misterio; algo muy ligado a la sensualidad, hay un

lazo de erotismo en la voz. Estas ideas y representaciones rastreables desde los discursos

que aparecen en las entrevistas, conversaciones, así como en mis observaciones de clases,

ensayos y fechas10, son materiales, que como he dicho más arriba, pueden ser

efectivamente objetivables, y por ende interpretables. Retomando a Ynoub, los discursos,

representaciones y prácticas en ciencias sociales tienen la misma validez que para las

ciencias naturales o exactas, por ejemplo, lo observado en un preparado al microscopio o

en determinado comportamiento etológico o las mediciones del movimiento de una

estrella en astronomía, etc.; esos discursos, como la existencia de microorganismos o

constelaciones, son algunos de los datos de los que, en nuestro campo disciplinar, nos

nutrimos para generar hipótesis. Así, distingue en la práctica científica la “puesta a prueba

de hipótesis” y argumenta que adoptar un conocimiento a título de hipótesis supone un

conocimiento que pueda ser revisado y eventualmente superado por otro que resulte más

adecuado para explicar o comprender los temas en cuestión (YNOUB, 2007). Entonces

una pregunta de investigación es pertinente si: la respuesta arroja algún tipo de

conocimiento no disponible previamente, se formula de tal manera que pueda ser refutada

en el marco de una experiencia posible - es decir de una manera empírica-, y resulta

relevante en el marco de problemas o desafíos de conocimiento. Si volvemos atrás, la

10 Conciertos, shows, recitales o toques”, son otros modos de llamar a las performances musicales. Pero la más frecuente en el campo es “fecha”; cuando se va a tocar, “se tiene una fecha”.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

26

pregunta ontológica de la voz se vuelve investigable y factible científicamente si la

transformamos en una interrogante pragmática: ¿Cómo se entrenan los cuerpos y las

voces, en el contexto de la musica popular cantada en Plata? Este tipo de pregunta, se

vuelve abordable empíricamente, es pertinente para la comunidad y, de ser respondida,

viene a ocupar un lugar de vacancia que la temática presenta localmente, desde el punto

de vista transdisciplinar que queremos colocar11. Lo que cabe señalar aquí es que en las

investigaciones sociales, y particularmente en las etnográficas, ante una enorme cantidad

de datos bajo la forma de paquetes discursivos y observaciones de prácticas que hacemos

durante el trabajo de campo – todos materiales con potencia sígnica, o que pueden

“significar”-, hay que tomar decisiones interpretativas, elegir caminos interpretativos y

transformarlos en hipótesis de trabajo, dando cuenta de ellos, poniéndolos en escena,

haciéndolos legible para otros (los y las lectoras, colegas, etc.). Para ello es preciso

atravesar varias instancias de recomposición de materiales, donde escribir sobre ellos es

una instancia más entre otras. Interpretar es seguir las pistas que creemos pertinentes y

relevantes, recomponer piezas y hacer otras preguntas/observaciones/análisis, a la luz de

otras lecturas (lecturas teóricas de la filosofía contemporánea o del psicoanálisis o de los

estudios en música popular que también quieren construir el objeto “voz”, por ejemplo)

y hacer jugar la tensión entre todos estos materiales, para repreguntar, y para de todo ello

poder hacer emerger la voz propia, poder hacer derivas hacia una tesis. Todo lo cual,

mediante la intersubjetivación de esas decisiones interpretativas, construye objetividad.

Es en este sentido que, en términos gadamerianos, en las ciencias sociales construimos

conocimiento comunitariamente desde una tradición (KARCZMARCZYK, 2007).

Siguiendo con el ejemplo, todas esas ideas que aparecen casi sin excepción, con

matices, pero predominando en los discursos de mis entrevistados, sobre la voz como

rasgo de identidad, síntesis, esencia, potencia, como algo que empodera, como territorio

donde experimentar la unidad y de algún modo “suspender” los dualismos

mente/cuerpo/lenguaje/pensamiento, etc., pueden leerse como datos a la luz de ciertas

preguntas de investigación - que precisarán ir afinándose-, como: ¿Cuáles son los

discursos, representaciones y saberes sobre la voz y el cuerpo, que circulan en el campo

de la música popular platense en el contexto de sectores medios? ¿Cómo se entrenan

para cantar los y las cantantes de música popular en la ciudad, en dicho contexto? y

11 Existen interesantes trabajos locales sobre la voz en las pedagogías de técnica vocal, que vinculan la música y las ciencias cognitivas de segunda generación (BETANCOR, 2014).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

27

otras posibles, resignificadas o puestas a dialogar y a tensionar con lecturas más bien

teóricas de la voz12. Al compás de los discursos sobre la unidad de la voz (del yo que la

produce y dice experimentarla) hay grietas para indagar, en relación a ciertos dualismos

o tensiones que conviven con ese discurso sobre la unidad.13

Más allá del análisis de los contenidos de esos discursos, lo que quiero destacar

aquí es justamente que, es en ese interjuego de recomposición de materiales donde

ocurren los actos interpretativos, las decisiones y estrategias de cómo pensar los discursos

y prácticas que aparecen en el campo y donde en definitiva los etnógrafos producimos

conocimiento, generando hipótesis interpretativas siempre posibles de ser revisadas,

resignificadas y vueltas a objetivar. En cierta forma, todas las tesis que utilizan

metodologías construidas desde las ciencias sociales y las humanidades, generan

hipótesis hermenéuticas, interpretativas. Ahora bien, si el marco epistemológico desde el

cual encuadrar mi trabajo es la hermenéutica - el campo de la interpretación en sentido

amplio-, la clave metodológica desde donde estamos investigando de manera convergente

desde la ciencia y el arte, es la autoetnografía – el campo donde se define cómo se

vehiculizan, desde qué vías se informan, gestionan y producen esos actos interpretativos

de conocimiento en dicho diálogo transdisciplinar, de manera concreta-. A su vez, en mi

práctica artística, como ya he señalado, enseñar canto y cantar, han sido prácticas

corporales artísticas que también pueden situarse como hermenéuticas y conceptuales. Es

menester detenernos en los insumos y potencias de conocimiento provistos por la

investigación artística, tal como han ido derivando en la construcción de mi tesis.

INVESTIGACIÓN ARTÍSTICA

Para John Dewey (1952) tanto los procesos artísticos como los científicos son

parte esencial de un aprendizaje que nos relaciona con el mundo mediante los sistemas

simbólicos y si conocer es siempre un conocer a través de, arte y ciencia son

complementarios e igualmente necesarios. En consonancia con lo anterior y volviendo a

12 Cantantes mujeres y varones de sectores medios platenses, de entre 20 y 50 años aproximadamente. 13 Siguiendo el ejemplo, y a partir de diversas observaciones de las prácticas y performances del canto en La Plata, pudimos visibilizar que muchas veces quien usa la voz en sus prácticas musicales o se adscribe comno “cantante”, dice experimentar la unidad del ser pero al mismo tiempo, está colocado como un Otro musical, y, en varias ocasiones, dentro de ese Otro, como un otro de género. En mi tesis doctoral (Magri, 2016 [en prensa]) profundizamos sobre la reflexión de la construcciones de alteridades de género en el campo de la música popular local, y en el canto en particular.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

28

lo planteado al inicio, la investigación artística también es una práctica hermenéutica en

tanto su sentido desemboca en múltiples interpretaciones que ponen en movimiento y

alteran nuestra interpretación y visión del mundo. Si investigar es producir

conocimientos, la investigación artística es aquella que tiene por objeto «la producción

de conocimientos desde el arte» (VICENTE, 2006).

En relación a la especificidad de la investigación artística, según señala Cristopher

Frayling (1993), investigador músico, hay tres tipos: investigación sobre el arte,

investigación para el arte e investigación a través / desde el arte. Según este autor, la

investigación sobre la práctica artística es el ámbito más académico y se refiere al trabajo

habitual de ámbitos como la (etno)musicología, la pedagogía, la psicología y la cognición

musical. La investigación para la práctica artística produce conocimiento o herramientas

para el desarrollo de la actividad musical en el más amplio sentido, como recursos teóricos

y tecnológicos para la creación, interpretación, escucha y estudio de la música. También

produce herramientas conceptuales, técnicas e instrumentales. La investigación a través

de/desde la práctica artística o investigación artística propiamente tal, constituye un

campo emergente de difícil definición. Son indagaciones sobre problemas que atañen a

la creación artística. Si bien son estudios abordados por los propios artistas, en muchos

casos se trata de proyectos interdisciplinarios con personal artístico e investigador, donde

intervienen músicos, científicos, musicólogos, filósofos, ingenieros, psicólogos,

sociólogos, etc.

Es interesante la discriminación que hace Fraylling, no obstante, creo que en mi

investigación, es casi imposible pensar en que sobre, para y desde la práctica artística se

encuentren separados. Me gustaría ilustrar ésto con una nota de campo:

“Hoy a la mañana, fui a dar clases en el taller. Me di cuenta de la centralidad que tienen por

igual lograr un entrenamiento de la conciencia corporal de la zona de la pelvis, más bien, del

piso de la pelvis. Vocalizar observando ese lugar, usando la pelota y movimientos que favorezcan

la movilidad ahí. Cada alumna respondió distinto pero a todas les pasa algo en la voz, como si

se les abriera. Más tarde fui a una reunión del GEC, en la facu. Conversamos los avances de

cada tesis y les conté que estaba pensando en la cuestión del entrenamiento de esos saberes y la

relación voz/eroticidad, que surgió por una entrevista que hice; que estaba leyendo a Bataille y

que para mi sorpresa, aparece la cuestión de la intimidad y la idea de develar, dos cosas que

estuve pensando mucho, en relación a este discurso que también apareció en el campo, en los

varones que tocaban un instrumento y toda la vida se habían formado en él, tocando y tocando,

tomando clases, estudiando, dando clases de ese instrumento...y que, por otra parte, desde niños

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

29

habían cantado, pero siempre “para ellos” en las fiestas familiares, en las guitarreadas; y que

“como no eran CANTANTES” no se atrevían a hacerse cargo de que cantaban y poner el canto

en la escena de sus prácticas más profesionales (cantar en sus fechas, usar el canto como

herramienta para dar clases, estudiar canto); pero cuando comenzaron a hacerlo, les cambió

todo, y esa timidez que los había “velado” desde chicos, y que habían combatido (escondido??)

desde atrás del instrumento, se desarmó. “Me cambió todo, la forma de tocar la guitarra, de

pensar mi sonido, todo...y ya no puedo volver atrás, ya no puedo tocar sin cantar ni dar clases

sin cantar, sin proponerle a mis alumnos que canten”, me dijo un nativo. Pienso en las relaciones:

cantar / mover el piso de la pelvis, timidez / develar lo íntimo, vocear / empoderarse. Emvocearse.

A la noche fui a La Carpin a cantar un tango, como invitada de la banda de un amigo. Más allá

de los efectos del vino, creo que todo eso que estuve pensando-haciendo y proponiendo hacer

(por las clases que di a la mañana) se me hizo sonido. Sentí como un enardecimiento, como que

mi voz salía de mi pelvis, y que la zona del sacro era la que estaba abriendose para cantar

primero, que no era mi boca y por consecuencia eso sino al revés, mi pelvis (adelante y atrás) y

por extensión, mi boca. En el climax interpretativo del tema sentí que la voz ya no estaba en mi

cuerpo, creo que lo que me pasó es ésto que dije la otra vez cuando expuse en las jornadas, de

que la voz es y no es del cuerpo, es o se hace espectro autónomo, como dice Dolar; porque aunque

de la voz participan el cuerpo, la mente, el lenguaje y el pensamiento, ninguna dimensión la

puede patrimonializar. “Es un animal (o un ánima) incontrolable”, le dijo una profesora de

teatro a una amiga. Es tanto de lo íntimo como de lo público, está en “lo interior” pero también

es proyección al espacio. Por eso, como decía Barthes no la pueden agotar ni la ciencia ni el

arte, sino tan sólo abordar desde el cruce, desde una posición de liminalidad. Creo que a mis

alumnos de canto también pueden servirles estas reflexiones, así como lo fue para mi

interpretación de anoche, tratando de hacer un ejercicio de distanciamiento, es posible que

trabajar y entrenar la percepción de esa zona, destrabe las tensiones al cantar, y se abra la

sonoridad, se nutra la interpretación.” (Nota de campo: 10 de abril 2016).

Analizando el contenido descriptivo de la nota, es posible situar tres contextos y

acciones, que implican diferentes formas de prácticas hermenéuticas: dar clases de canto,

reflexionar con el equipo de investigación y cantar en vivo; esa escritura quedó encarnada

por todas y cada una de esas dimensiones (enseñar/reflexionar/hacer) y ya es imposible

escindirlas o situar con exactitud qué cosa/pensamiento/acción se originó en qué contexto

o faz de mi subjetividad y de acuerdo a qué roles. Por ello, creo que aquella demarcación

introducida por Frayling entre sobre/para/desde para la investigación artística, me resulta

muy forzada o difícil de aplicar a mi modo de investigar el campo. En este caso, son todos

mis roles y prácticas en relación al canto los que están informando la investigación, y es

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

30

más, son las articulaciones entre esas prácticas lo que creo que funciona como un motor

productor de conocimiento. Investigo sobre este tema, acopiando información, leyendo,

discutiendo con colegas, escribiendo, exponiendo e intersubjetivando el material en

reuniones académicas; doy clases de canto y esto ocurrió después de que por muchos años

tomé clases de canto y de otros instrumentos, técnicas de conciencia corporal, teatro,

danza; es decir, para dar clases, me nutrí también de la síntesis que hice con todos esos

saberes en los que me fui entrenando. Y canto, vivo la práctica de cantar música popular.

Es en ese estar y ser parte de aquel entramado de modos o roles que construyo

conocimiento. Claramente, a ello le sumamos las observaciones o participaciones

observantes del campo, al modo más “tradicional” del quehacer etnográfico, del cual por

supuesto extraigo datos e interpretaciones, pero que nunca es una instancia “aparte” de

todo aquel enjambre que he ilustrado.

Entonces, reflexionando sobre el canto puedo producir conocimiento teórico-

práctico para el canto, y a través de la experiencia de cantar o desde ella, también. Lo

mismo al enseñar esa práctica; hay una experimentación/reflexión constante que se

produce en la docencia, con el otro. Volvamos otra vez a graficar ésto con un ejemplo.

Recientemente en una clase una alumna me comentó que la idea de cantar llevando la

atención al piso de la pelvis, le había cambiado la voz y el modo de cantar para siempre.

Y que a pesar de que ella ya hacía años que cantaba y que tomaba clases, nunca había

podido superar trabas y tensiones, y que siempre había llevado la atención a la zona

costodiafragmática del cuerpo; que solo cuando empezó a experimentar esto de abrir el

abajo, el atrás del cuerpo, comenzó a percibir que se destrababa su canto. Aquello nos

llevó a una charla sobre la relación entre el canto y lo íntimo del cuerpo, la necesidad de

experimentar y laboratorear el espacio de enseñanza-aprendizaje que estábamos

construyendo juntas y cómo hablar y generar ideas era parte fundamental de aquello; y

nos derivó, una vez más, a la relación entre eroticidad y voz, algo que en entrevistas

etnográficas e independientemente, también había sido tematizado. Como ya he

manifestado, en mi tesis busco pensar en qué corporalidades y vocalidades se construyen

en el entrenamiento y práctica del canto en la música popular en La Plata; y son este tipo

de pasajes de clases - usados como notas de campo a partir de la operatoria

autoetnográfica- que me permiten pensar comparativamente entrenamientos corpo-

vocales que, por ejemplo, iluminen el análisis sobre la construcción del cuerpo, el gesto,

la voz, a partir de los vínculos entre voz e intimidad, eroticidad, etc.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

31

Esa operatoria resulta ser un bucle inagotable y que re-circula. Esos modos de

interpretar y reflexionar (a partir de los discursos, corporalidades y prácticas del / en el

campo), pueden serme útiles a la hora de cantar, enseñar y pensar el canto; y mi lugar

como investigadora tiene que hacerle preguntas a todos esos materiales arrojados por esas

dimensiones para ponerlas en cuestión, para poderlas objetivar, para poder extrañarme de

ellas (huella o ejercicio antropológico clásico al cual hemos de seguir revisitando) y para

lograr comunicarlas.

Como advertíamos más arriba, lejos de pensar si la tipología de Frayling se adecua

a lo que me interesa pensar en relación con mi propia investigación, vamos a pensar

siempre al arte como un campo que es productor y reproductor de conocimiento,

discursos, poderes-saberes y disputas materiales y simbólicas (BOURDIEU, 2014).

Pero esta “horizontalidad” o ecuanimidad del arte con el modo de producción

simbólica de la ciencia que propongo no ha sido siempre así. Según Silvia García y Paola

Belén (2013), el contexto de la cultura contemporánea ha favorecido el acercamiento de

saberes que la tradición había considerado antagónicos; tal es el caso de la ciencia y el

arte, por ello la importancia de indagar el mundo artístico reside, primero, en el

reconocimiento de la obra como generadora de un conocimiento que sin ser

necesariamente científico permite la interpretación de la realidad que rodea la vida del

hombre y, segundo, que los resultados de esa indagación no son respuestas cerradas sino,

por el contrario, respuestas que dan lugar a nuevas preguntas, confiriendo al proceso de

conocimiento el mismo dinamismo que conlleva el mundo del arte. Algunas nociones

habituales relacionadas con la producción artística han puesto un énfasis excesivo en la

creatividad, la emoción y la inmediatez, lo que ha alimentado de este modo, la idea de

que el arte es una cuestión de pura inspiración y que la obra de arte aflora de repente en

la conciencia del artista y sólo necesita tomar cuerpo en algo. Hay un uso de lo racional

en el arte, que no necesariamente es logocéntrico, en el sentido moderno occidental. A la

inversa, cabe señalar, que la idea de que las emociones, el afecto y la corporalidad no

tienen lugar en la construcción del conocimiento antropológico o científico en general, ya

ha sido ampliamente refutada en gran parte por un inmenso grupo de investigadores del

campo de la Antropología de las emociones (LUTZ & WHITE, 1986; ROSALDO, 1984;

SURRALLÉS, 2004) y en tesis antropológicas que retoman y construyen interesantes

aportes desde la noción de afecto, en el contexto de la formación de artistas (DEL

MÁRMOL, 2016). Sobre este punto, nos es fundamental pensar a la corporalidad como

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

32

locus central desde el cual los investigadores y artistas producimos conocimiento,

performance y prácticas de enseñanza-aprendizaje. Particularmente pienso en los aportes

de la sociología carnal (CROSSLEY, 1995) y en el concepto de modos somáticos de

atención (CSORDAS, 2010), así como en las etnoperformances (Silvia Citro).

Específicamente pensamos en cantar y enseñar canto como prácticas que están

absolutamente edificadas desde una experiencia corporal de la musica, que implica

también la reflexividad. En mi caso, estar atravesada por esa experiencia y ser

antropóloga, al mismo tiempo construyen una complejidad de modos de producción de

saberes enraizados en lo corporal-vocal, como cognición corporizada (SHIFRES, 2007),

al mismo tiempo que como producción de sentidos interpretativos y conceptuales.

Por otra parte, acerca de la dimensión productora de conocimiento de la obra de

arte, según Gadamer (1960) el valor cognitivo de la obra de arte no tiene que ver con la

aprehensión de un objeto, el objeto artístico, sino que el conocimiento puede entenderse

como reconocimiento. La afección por la obra no es del orden de los datos, sino que éstos

son parte de una tarea de la comprensión. Así, podemos decir que el artista se entrena en

saberes y aprende a hacer, comprender e interpretar arte, no nace sino que se forma y

dicha formación requiere de un aprendizaje, del mismo modo que cualquier otra materia

o disciplina. El arte, por lo dicho, es materia investigable, se investiga. En tanto

explicitación de una poética, el discurso artístico constituye una producción de

conocimiento realizada por los artistas que posibilita un acercamiento a la obra y al

mundo en el que se inscribe, cuyo objetivo no es el logro de un conocimiento universal

ni leyes generales aplicables a un conjunto de fenómenos sino que, por el contrario, se

incluye en la singularidad de uno o varios productos. No se trata tanto de demostrar sino

de mostrar. Volviendo a la nota de campo, podemos pensar que puede haber un momento

epifánico en mi cantar que me revela, me muestra, al piso de la pelvis como un lugar

central para cantar, pero aquello también es posible porque hay una práctica de

entrenamiento y enseñanza en la que el pensar y el hacer están basculando en la

experiencia todo el tiempo. Y esas experiencias están atravesadas y construidas por

discursos sobre la voz, lo íntimo, el cuerpo, la eroticidad, etc. Pero esos discursos rebosan

la palabra porque han sido, son, serán encarnados, diremos, vocalizados o voco-

encarnados. Ahora bien, no se trata de tomar como verdad trascendental a esa revelación

autocarnal, sino tomarla como dato e interpelarlo. Concretamente, a partir del registro y

observación de clases de otros docentes de canto, que trabajen tanto abordajes similares

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

33

como divergentes del entrenamiento vocal-corporal (por ejemplo, comparar

entrenamientos que pongan el foco en la exploración de la movilidad del piso de la pelvis

con aquellos que no tomen en cuenta este espacio del cuerpo y sólo trabajen con la

respiración y movilidad costo-diafragmática). Así las preguntas se afinan y perfilan en

relación a qué voces – qué cuerpos – se producen, formatean, potencian, modelan en

relación a qué entrenamientos, pedagogías, discursos.

En suma, el papel de la práctica artística dentro del desarrollo de la investigación

es múltiple y está encadenado a otros modos que la práctica adquiere (es decir, no sólo la

performance sino la enseñanza, la escritura, la reflexión). Por un lado, los hábitos y

prácticas habituales de estudio del canto, son una fuente de información tan válida como

la bibliografía, las entrevistas o las encuestas. Por otro lado, la práctica artística es también

el espacio donde se prueban ideas y conceptos producidos en el proceso de reflexión y

análisis. Necesitamos repensar una metodología que permita hacer un puente para

transitar esta investigación hermenéutica hecha tanto de fibras antropológicas (ésta en

tanto parte del campo de las Ciencias Sociales y de las Humanidades), como musicales

cantadas (en tanto prácticas que son parte del campo del Arte).

El canto, como práctica corporal artística se integra a las tareas de investigación

en primer lugar, con la puesta en marcha del bucle práctica-reflexión: hacer y reflexionar

sobre lo que se ha hecho y lo que se puede hacer para modelar ese hacer que, después de

llevarse a cabo, debe quedar sujeto a otro proceso de reflexión y así sucesivamente. Pero

¿cómo se puede construir un andamiaje metodológico para organizar este proceso? Como

ya he anticipado, es menester adentrarnos en la noción antropológica de autoetnografía,

así como el uso de ésta en el contexto de mi trabajo.

INTERLUDIO: EL PUENTE AUTOETNOGRÁFICO

Según Joaquín Guerrero Muñoz (2014), la autoetnografia es un procedimiento de

investigación que esta enmarcado en el método etnográfico, que se ha desvelado como

una herramienta de gran utilidad para la comprensión de la influencia del proceso

investigador sobre el resultado de la investigación, en la que además se muestran las

tensiones y paradojas que tienen lugar durante el quehacer investigador cuando este se

dirige a captar con profundidad la experiencia humana, social y culturalmente mediada.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

34

La autoetnografía comparte algunos rasgos con la autobiografía. De hecho,

algunos autores dicen que es una especie de fusión entre ésta y la etnografía. Pero hay

una diferencia sustancial entre ellas: mientras la autobiografía es el recuento de los

principales acontecimientos de la vida del sujeto que la escribe, empleando sus propios

criterios, la autoetnografía es un estudio de la introspección individual en primera

persona, que pretende arrojar luz sobre la cultura a la que pertenece el sujeto por medio

de “descripciones culturales mediadas a través del lenguaje, la historia y la explicación

etnográfica”. De este modo, su principal cometido es "conectar lo personal a lo cultural"

(ELLIS, ADAMS, & BOCHNER, 2011).

Hay algunas características internas del trabajo autoetnográfico que lo hacen

atractivo y dúctil para adaptarse a la investigación artística y científica. En la medida que

esta investigación quiere incluir la vivencia emocional, las preferencias estéticas o el

mundo sensible del investigador, requiere que en el proceso sean considerados como

datos o textos autoetnográficos algunos dispositivos artísticos o estéticos como relatos de

ficción, fotos, imágenes visuales o imágenes metafóricas con las que se describen o

representan algunas sensaciones o pensamientos. De manera particular, incluye objetos

artísticos creados por el propio investigador-informante o por otros autores, pero que han

sido apropiados por él mismo por alguna razón que le interpela profundamente. De este

modo, la dimensión estética y artística, ya sea como objeto de reflexión o como medio de

expresión, está plenamente integrada en esta modalidad de investigación, pensamiento y

escritura académica.

La autoetnografía comprende una serie de recursos metodológicos, estrategias de

investigación y formas de discurso académico que se practican en la antropología y

ciencias sociales desde hace tiempo y que cada vez se emplean más en el ámbito de la

investigación artística con diferentes matices y adaptaciones (Rubén López Cano y Úrsula

San Cristóbal, 2013). Los recursos de la autoetnografía se pueden emplear en cualquier

momento de la investigación artística: para modelar las preguntas de investigación más

operativas y productivas, para generar ideas; para documentar procesos y momentos

creativos que se han de detallar, analizar o evaluar en el trabajo; para registrar

percepciones, opiniones o emociones en relación a otras tareas de investigación; etc.

De la información contenida en él y de su posterior análisis, pueden surgir

elementos cruciales. La autoetnografía nos permite conocernos como miembros de una

cultura, identificando cómo reaccionamos o actuamos en nombre de ella. Como

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

35

antropóloga me es crucial estudiar las prácticas –lo que hacen y dicen sobre lo que hacen–

los/las cantantes platenses, por ello hago etnografía. Como esa etnografía me incluye a

mí misma como “nativa”, es decir, como parte del campo estudiado, lo que hago

especificamente es lo que llamamos autoetnografía.

Para poner en contexto el uso de mi propia trayectoria biográfica, desde hace

catorce años soy cantante de música popular; esto construye una parte de mi subjetividad

que, a la hora de investigar, se me ha vuelto, al mismo tiempo que una usina de

productividad, un pantanoso territorio de apegamiento, del cual he tenido que aprender a

distanciarme. Lejos de renunciar a los aportes de mis emociones, subjetividad y

corporalidad, y, en definitiva, al cuerpo -y en él a la voz- como dato en la investigación,

es constante el ejercicio de ida y vuelta entre esas dos fases y la atención que he debido

prestar a no ensalzar esa vía metodológica -que enhorabuena desde la antropología,

sociología y ciencia social contemporánea hemos validado y reivindicado como

herramienta-, y con ello recubrirme de las contradicciones que da atrevesar el arduo

camino de estar “en la misa y en la procesión”, de ir y volver e ir, como dice en su canción

Martin Buscaglia. Ir no sólo del campo a la escritura y viceversa sino de recircular en el

camino de ser etnógrafa-performer-docente gran parte del tiempo. Mi recorrido como

cantante y docente de canto ha impactado y permeado directamente en la construcción de

los objetivos y en el andamiaje metodológico de mi trabajo. Más allá de mi caso

particular, debemos aclarar que los investigadores hacemos usos de nuestras trayectorias

de vida y emocionalidades para construir objetos, investiguemos o no el campo en el que

también somos nativos. Para reflexionar y analizar las experiencias de campo, los

discursos y los conceptos construidos en mi etnografía con músicos platenses tuve que

situar mi mirada de un modo primario: soy mujer de clase media, cantante y antropóloga;

me he formado en técnica vocal, antropología, danza y teatro pero mi alfabetización en

lenguaje musical y entrenamiento en ejecución instrumental ha sido poco sistemático y

fragmentario, en cuanto a mi paso por instituciones de música; no obstante, en los últimos

años, he comenzado a fortalecer esos saberes débiles desde el punto de vista de mi

biografía musical, y comenzado a cantar autoacompañándome con instrumentos

armónicos o de percusión, algunas composiciones propias y de otros. A su vez soy

docente de canto en talleres y espacios de la ciudad, y desde hace algunos años, soy parte

de un colectivo autogestivo de músicos independientes, el cual desde hace unos meses,

es parte de un frente político de artistas. Esta metamorfosis, adscripciones y

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

36

readscripciones identitarias, que traducen el proceso que fui atravesando, de mí como

cantante a mí como música popular ha sido fundamental para problematizar muchas de

las cuestiones que intento desgranar en mi trabajo. Ciertamente, como ya he explicitado

anteriormente, el desafío que se me impone es dislocar los propios supuestos y

transformar esas sensaciones, observaciones y datos de la carne en preguntas

investigables.

Como es sabido, la historia de vida – la biografía – va modelando la trayectoria

de decisiones, pasiones, elecciones profesionales e ideológico-políticas, así como las

modulaciones y tramas vinculares en los campos de los que se es parte. En mi

investigación, la autoetnografía es lo que hace que lo informado por mi producción

artística no se agote en el conocimiento generado por la obra o para ella, sino que implica

reflexión crítica sobre la práctica artística y sobre la práctica antropológica. En mi caso,

no me basta con hacer música, cantar, enseñar canto, ser parte de un colectivo de músicos

independientes de La Plata y de un frente político de artistas, también necesito reflexionar,

extrañarme y construir preguntas de investigación, que necesariamente introducen

tensiones en la mirada sobre mi mundo nativo al mismo tiempo que lo convierten en un

objeto cognoscible y comunicable para otros. La autoetnografía en el contexto de mi

trabajo, una investigación vertebrada desde la ciencia y el arte, me permite conocer cómo

me agencio como artista, docente e investigadora del campo del cual soy parte: transitar

el bucle de la acción-investigación-enseñanza-performance-reflexión-escritura (sin

unilinealidad entre estas fases sino siempre recirculándose y trastocando ordenamientos)

al mismo tiempo que intervenir ese proceso desde las preguntas de investigación y desde

las hipótesis interpretativas que hemos ido construyendo, derivando.

Ya hemos situado e ilustrado cómo funciona la interpretación en el contexto de la

práctica docente y en el de la investigación académica y cómo la autoetnografía nos permite

levantar esa información. ¿Y cantar? Muchas veces se habla de los y las cantantes como

intérpretes14, que vocean materiales musicales y poéticos; una música entrevistada me dijo

que ya en la lectura de la poesía hay canción, hay un melodiamos el decir. Entonces, ¿cantar

es otra práctica hermeneutica? Si bien ya hemos analizado el concepto de interpretación y de

técnica en el canto en otros trabajos (MAGRI, 2013), podemos volver a pensar esta cuestión,

vinculándola con la idea de hermenéutica que he presentado en este artículo, a partir del

14 A veces a los cantantes se les llama “intérpretes” si bien, en el campo platense no es esa una adscripción frecuente.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

37

análisis de conversaciones informales y de una entrevista grupal que realicé con cantantes y

profesoras de canto de La Plata; por esta vía pude repoblar de sentidos las nociones de técnica

e interpretación en el canto en la música popular. Interpretar, en el campo de las y los

cantantes, muchas veces es entendido como el objetivo final del trabajo técnico, y como vía

de expresión, goce, disflrute; pero también interpretar puede tener que ver con la potencia de

ser muchas voces en un mismo canto. Ésto, y mi experiencia como cantante y docente me

permitió pensar, por ejemplo, que la diversidad tímbrica en la música popular construye

modos técnico-interpretativos, y que, de algún modo en la voz de la música popular

latinoamericana, el problema de la división entre técnica e interpretación se hace latente, lo

cual, genera un debate en torno a lo identitario, lo político, lo geográfico15. Esa escisión y la

hegemonía histórica de los modelos europeizantes en las técnicas vocales, inevitablemente

entrará en tensión con lo que los materiales de las músicas populares latinoamericanas

generan, transgreden, convocan, estallando la idea – tan de la modernidad occidental – de: un

sujeto = una voz = una identidad tímbrica. Por lo tanto, podemos señalar que en el contexto

de mi tesis, el canto aparece como otra práctica hermenéutica que tiene implicancias político

pedagógicas.Creo que en mi proceso de investigación artístico-etnográfica, estos modos o lo

que hace que yo los pueda recorrer de maneras distintas y en sentidos múltiples, es esa

posición autoetnografica, en la cual voy y vengo del campo, de sus distintos roles en él, de la

escritura encarnada a una más descriptiva y viceversa, de la producción de lo real a la ficción

para poder volver a producir escritura académica; de la epifanía, al audio de watsapp, del

Atlas T a la clase de canto y del coloquio académico a la conversación de esquina; todo en

un viceversa circular infinito.

CONSIDERACIONES FINALES

He destacado al paradigma hermenéutico como episteme desde la cual estoy

desarrollando mi pesquisa. Cómo en mi investigación, así como en muchas otras que se

hacen desde las ciencias sociales y las humanidades, lo que generamos son actos

interpretativos, a partir de un sinnúmero de operaciones de avance y reversa a diversos

materiales, entre los que destacamos la observación de prácticas y el análisis de los

discursos y representaciones obtenidos en el trabajo de campo. Seguidamente, dedicamos

un apartado a la investigación artística y sus potencialidades, así como a la autoetnografía,

15 En otra conversación con una amiga y colega, retomábamos el tema y, de cómo, aún hoy, se siguen exportando – y exigiendo - métodos y técnicas de canto que surgieron en otras latitudes en función de una idea universal de sonido, contribuyendo una vez más al eurocentrismo pedagógico político de la enseñanza y práctica de la música popular en las instituciones y fuera de ellas.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

38

que nos ha servido de puente metodológico para gestionar la producción de conocimiento,

parida en las abras de datos etnográficos y artísticos. Así, desde la autoetnografía he

recuperado fundamentalmente dos modos distintos de ser-en-el-campo16 – ser docente de

canto y cantar – que pueden ser pensados y localizados como prácticas corporales

interpretativas o hermenéuticas del propio campo, recuperables para la producción de

conocimiento antropológico; y un tercer modo de práctica hermenéutica: el reflexivo, que

toma protagonismo en mi faz como investigadora académica pero que, como hemos visto,

atraviesa y tiñe los modos antedichos a la vez que es conducido por las mismas derivas

corporales-reflexivas del campo. Es decir, no sólo por interpelar dichos modos y generar

repreguntas sobre éstos, desde esa actitud de puesta en tensión para la cual hemos sido

entrenados los y las investigadoras, yo he puesto bajo la lupa las afirmaciones de los

nativos, los prejuicios propios, mi apegamiento a mi ser y estar en el campo y mi

subjetividad sino, muchas veces, por la misma reflexividad que se genera en/desde las

prácticas (de enseñar, de performativizar, de hacer con otros). Al mismo tiempo, una gran

fuente de análisis funciona o se hace posible fundamentalmente a partir de la

intersubjetivación de saberes entre mis compañeros de equipo de investigación–

antropólogas y artistas, así como de otros pares; y es esa gran red lo que construye un

saber reflexivo comunitario, más disponible y abierto a otros.

A partir de diversos ejemplos, hemos podido apreciar cómo en el caso de la

docencia, el papel de la interpretación en la escucha del proceso del otro se vuelve vital.

Poder intervenir en la biografía vocal del otro desde mis intervenciones, voz y

movimiento; la enseñanza del canto, me ha entrenado la escucha no sólo sonora sino en

el vínculo pedagógico y afectivo que se construye con los alumnos lo que también genera

reflexividades e interpretaciones conceptuales. Luego, hemos también visibilizado a la

acción de cantar como una práctica artística corporal que en gran medida implica poner

en el cuerpo o vocoencarnar, una interpetación, al mismo tiempo que performativizar

distintas voces y poner en tensión la idea occidental moderna de universalidad del sonido

y univocidad vocal del sujeto, con el consecuente caudal de implicancias políticas y

culturales que ésto supone.

Finalmente, en el contexto de mi investigación, la autoetnografía me ha servido

entonces para bascular reflexiva y críticamente entre la ciencia y el arte porque a través

de ésta establecí un canal por el cual la información obtenida desde esos dos modos de

16 Reapropiación de la idea merleaupontyana de ser-en-el-mundo (MERLEAU PONTY, 1993 [1945]).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

39

producción de conocimiento, decanta y permite profundizar en las hipótesis

interpretativas generadas, prestando atención a los distintos contextos de acción: la

experiencia de cantar, dar clases u observar etnográficamente desde distintos grados de

distancia. Es decir, a partir de la autoetnografía he podido levantar la información

producida, y tomar decisiones interpretativas que allanaron el camino de germinación de

mi tesis. De las derivas (auto)etnográficas presentadas en este artículo, arrivamos a la idea

de que la potencia de este proceso no estaría dada solamente en poder situar esos distintos

modos de estar, y ser-en-el-campo sino más bien en la re-circulación entre ellos y en

poder repreguntar en/ desde y sobre esa condición corporal, reflexiva y transdisciplinar

que hemos presentado aquí.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BETANCOR, N. (2014). Vocalidad humana, desarrollo y enacción un análisis

interdisciplinario de cuatro formas de expresión vocal en argentina. European Review of

Artistic Studies – ERAS, 5(1), 1-16.

BAUMAN, Z. (2002). La hermenéutica y las ciencias sociales. Buenos Aires: Nueva Visión.

BARTHES, R. (2005). El grano de la voz. Entrevistas 1962 – 1980. Buenos Aires: Siglo XXI

Editores.

BATAILLE, G. (2007). El erotismo. Barcelona: Tusquets Editores.

BELEN, P., & GARCÍA, S. (2013). Aportes epistemológicos y metodológicos de la

investigación artística. Fundamentos, conceptos y diseño de proyectos. Saarbrücken:

Editorial Académica española.

BOURDIEU, P. (2014). El sentido social del gusto. Elementos para una sociología de la

cultura. Buenos Aires: Siglo XXI Editores.

BUTLER, J. (2007). [1990]. El género en disputa. El feminismo y la subversión de la

identidad. Barcelona: Paidós Ibérica.

CITRO, S. (Coord) (2010). Cuerpos Plurales. Antropologia de y desde los cuerpos. Buenos

Aires: Biblos.

CROSSLEY, N. (1995). Merleau-Ponty, the Elusive Body and Carnal Sociology. Body &

Society, 1, 43-63.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

40

CSORDAS, M. (2010). Modos Somáticos de Atención. In S. CITRO (Coord.), Cuerpos

Plurales. Antropologia de y desde los cuerpos (pp. 83-104). Buenos Aires: Biblos.

DEL MÁRMOL, M. (2016). Una corporalidad expandida. Cuerpo y afectividad en la

formación de los actores y actrices en el circuito teatral independiente de la ciudad de La

Plata. Tesis de Doctorado en Antropología. Universidad de Buenos Aires.

DERRIDA, J. (1985). La voz y el fenómeno. Introducción al problema del signo en la

fenomenología de Husserl. Valencia: Pre – Textos.

DEWEY, J. (1952). La búsqueda de la certeza: un estudio de la relación entre el

conocimiento y la acción. México: Fondo de Cultura Económica.

DOLAR, M. (2007). Una voz y nada más. Buenos Aires: Bordes Manantial.

ELLIS, C., ADAMS, T., & BOCHNER, A. (2011). Autoethnography: An Overview. Forum

Qualitative Sozialforschung, Forum: Qualitative Social Research, 12 (1), art. 10. En línea:

http://www.qualitative-research.net/index.php/fqs/article/view/1589

FRAYLING, C. (1993). Research in Art and Design. Royal College of Art Research Papers,

1 (1), 1–5.

GADAMER, H. (1960). Verdad y método. Fundamentos de una hermenéutica filosófica (A.

A. Aparicio, y R. Agapito, Trad.). Salamanca: Sígueme.

GONZÁLEZ, J. P. (2013). Pensar la música desde América Latina. Buenos Aires: Gourmet

Musical.

MUÑOZ, J. (2014). El valor de la auto-etnografía como fuente para la investigación social:

del método a la narrativa. Azarbe, Revista Internacional de Trabajo-Social, Universidad de

Murcia.

KARCZMARCZYK, P. (2007). Gadamer, explicación y comprensión. La Plata: Edulp.

LÓPEZ CANO, R., & OPASO, U. (2014). Investigación artística en música. Problemas,

métodos, experiencias y modelos. Barcelona: Esmuc-ICM-Conaculta/Fonca.

LUTZ, C., & WHITE, G. (1986). The anthropology of emotions. Annual Review of

Anthropology, 15, 405-436.

MAGRI, G. (2013). De resonancias, técnica e interpretación. Construcciones sobre la voz

cantada en cantantes de música popular de La Plata (Argentina). Question, 1(40). Disponíble

en: http://perio.unlp.edu.ar/ojs/index.php/question/article/view/1974/0

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

41

MERLEAU-PONTY, M. (1993) [1945]. Fenomenología de la percepción. Buenos Aires:

Planeta Agostini.

MERLEAU-PONTY, M. (1970). Lo visible y lo invisible. Barcelona: Seix Barral.

MORA, A. S. (2012). El cuerpo en la danza. Una etnografía sobre la formación en danzas

clásicas, danza contemporánea y expresión corporal. Editorial Académica Española / LAP

LAMBERT Academia Publishing GmbH & Co.

MORALES, P. (2009). Investigar el arte: provocaciones para una reflexión necesaria.

Paradigmas. Una Revista Disciplinar de Investigación, n.º 0, 11-29.

NANCY, J. L. (2002). A la escucha. Buenos Aires: Amorrortu.

PELINSKI, R. (2005). Corporeidad en la experiencia musical. Trans Revista Transcultural

de Música, 9.

PUJOL, S. (2011). Cien Años de música argentina. Desde 1910 a nuestros días. Buenos

Aires: Biblos-Fundación Osde.

ROSALDO, R. (1989). Aflicción e ira de un cazador de cabezas. En: Cultura y Verdad. Nueva

propuesta del análisis social. DF México: Grijalbo.

SHIFRES, F. (2007). Poniéndole el cuerpo a la música. Cognición corporeizada, música,

movimiento y significado. Ponencia presentada en las III Jornadas en Disciplinas artísticas

y proyectuales, Facultad de Bellas Artes, Universidad Nacional de La Plata.

SURRALLÉS, A. (2004). Des états d’âme aux états de fait. La perception entre le corps et

les affects. In F. HÉRITIER, & M. XANTHAKOU (Coord.), Corps et affects, (pp. 59-75).

Paris: Odile Jacob.

VICENTE, S. R. (2006). Arte y parte: la controvertida cuestión de la investigación artística.

In R. GOTTHELF (Dir.), La investigación desde sus protagonistas: senderos y estrategias

(pp. 191-206). Mendoza: EDIUNC.

VILA, P., & SEMÁN, P. (2006). La conflictividad de género en la cumbia villera. Trans

Revista Transcultural de Música, 10, 0. Sociedad de Etnomusicología, España.

YNOUB, R. (2007). El proyecto y la metodología de la investigación. Buenos Aires: Ed.

Cengage Lernin.

YNOUB, R. (2012). Metodología y Hermeneútica. In E. DÍAZ (Comp.), El poder y la vida.

Modulaciones epistemológicas. Buenos Aires: Biblos y Universidad Nacional de Lanús.

ZUMTHOR, P. (1993). A letra e a voz. São Paulo: Companhia das letras.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

42

A INTEGRAÇÃO PLURICULTURAL NA EDUCAÇÃO MUSICAL

BRASILEIRA

The multicultural integration in Brazilian music education

CONCEIÇÃO, Maria Beatriz Licursi17; SILVA, Maria Ione18; LEONIDO, Levi (coord.)19; MOTTA, Maria do Carmo dos Santos20; TEIXEIRA, Thelma Pignataro21; & SILVA, Davson Mansur Irff22

Resumo

A cultura brasileira, uma importante fonte de recursos para a educação musical, proporciona ao ser humano a aprendizagem espontânea vivenciada e enriquecida por múltiplos fatores. As cinco regiões do Brasil: Norte, Sul, Nordeste, Centro-Oeste e Sudeste, apresentam seus estados reunidos com semelhanças nos aspectos físicos, humanos, culturais, sociais e econômicos. As condições climáticas e geográficas diferenciadas contribuem significativamente para que a população adquira e cultive suas peculiaridades assim como as influências culturais de outros países e continentes devido à imigração dos respectivos povos que aqui se estabeleceram. Neste trabalho será abordada a expressão artística característica de alguns estados, destacando a importância da integração pluricultural com ênfase na música, dança e poesia, como recurso fundamental para a educação musical brasileira.

Abstract

Brazilian culture, an important source of funds for music education, provides the human being experienced spontaneous learning and enriched by multiple factors. The five regions of Brazil: North, South, Northeast, Midwest and Southeast, have combined their states with similarities in physical, human, cultural, social and economic. Climatic and geographical conditions differentiated contribute significantly to the population acquire and cultivate their peculiarities as well as cultural influences from other countries and continents due to immigration of their peoples who settled here. This work will be addressed artistic expression characteristic of some states, highlighting the importance of multicultural integration with an emphasis on music, dance and poetry, as a fundamental resource for the Brazilian musical education.

Palavras-chave: Cultura brasileira; Integração pluricultural; Educação musical.

Keywords: Brazilian culture; Multicultural integration; Music education.

Data de submissão: Março de 2016 | Data de publicação: Setembro de 2016.

17MARIA BEATRIZ LICURSI CONCEIÇÃO - Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). BRASIL. E-mail: [email protected]. 18 MARIA IONE SILVA - Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERGN). BRASIL. E-mail: [email protected]. 19 LEVI LEONIDO - Centro de Investigação em Ciências e Tecnologias das Artes – Universidade Católica Portuguesa. UTAD. PORTUGAL. E-mail: [email protected]. 20 MARIA DO CARMO MOTTA - Faculdade Polis das Artes. BRASIL. E-mail: [email protected]. 21THELMA PIGNATARO - Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRGN). BRASIL. E-mail: [email protected]. 22 DAVSON MANSUR IRFF SILVA- Faculdade Pitágoras. BRASIL. E-mail: [email protected].

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

43

INTRODUÇÃO

O educador tem uma função muito importante junto ao aluno. Suas ações visam

o ato educativo, como instrumento que possibilita a transformação do indivíduo. A

construção do conhecimento parte do professor e finaliza-se no aluno, pelos seus próprios

interesses. Freire (2001, p. 264) considera que “Estudar é desocultar, é ganhar a

compreensão mais exata do objeto, é perceber suas relações com outros objetos”.

Neste sentido, verifica-se que há uma relação de ajuda entre ambas as partes,

onde o professor ensina e aprende e o aluno aprende e ensina ao professor. A educação,

na sua afetividade, torna-se mais facilmente viável a partir da revelação de

potencialidades criativas do ser humano.

A educação libertadora “é, fundamentalmente, uma situação na qual tanto os

professores como os alunos devem ser os que aprendem, devem ser os sujeitos cognitivos,

apesar de serem diferentes” (FREIRE & SHOR, 1986, p. 46). São dois sistemas que se

fundem: professores e alunos promovem a interseção, na qual o conhecimento é o

elemento comum. O professor é o agente que irá balizar o aluno no propósito de induzir

uma nova forma de pensar sobre um determinado problema, objeto de estudo proposto

pela realidade vivida. Na construção de um objeto de estudo, verifica-se que a

pluriculturalidade da nação brasileira é significativa para a promoção de modelos

educativos com recursos acadêmicos que atendam às necessidades voltadas à construção

do caráter moral e social de nossos alunos em fase de formação de suas estruturas

psíquicas e emocionais como seres humanos.

A ampla variedade dos povos que se estabeleceram em terras brasileiras,

contribuiu ricamente com seus modos usuais de agir e de se comunicar. Esse universo

nos conduz ao reconhecimento da existência de “muitos Brasis do Brasil”. As culturas

específicas transmitidas pelos imigrantes são vivenciadas em distintas regiões geográficas

brasileiras promovendo uma viva e dinâmica relação intercultural. São diferentes hábitos

de vida e costumes experimentados por brasileiros natos e imigrantes, influenciados por

características geográficas requisitando, naturalmente, adaptações que preservam suas

tradições e os valores, em cada região. Desse modo, ganhamos relevantes subsídios

culturais que resultam em expressivas inovações comunicativas através da arte do povo

brasileiro. Portanto, podemos afirmar que a pluriculturalidade brasileira oferece muitos

recursos para beneficiar nosso sistema educacional.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

44

Considerar-se-á o perfil estudantil e a urgência de uma prática pedagógica, na

qual contempla a superação das necessidades e dos desafios que visam a construção de

uma sociedade mais justa e integrada. Essas ações visam estimular a união do povo

brasileiro em busca de uma cultura de novos saberes. A cultura brasileira ainda está em

construção. Não há uma formação definida e que ainda está em desenvolvimento, uma

vez que muitos dos nossos povos não conhecem a cultura de uma determinada região.

O presente artigo distinguirá três setores da arte dos estados do Rio de Janeiro,

Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte, São Paulo e Minas Gerais, enfatizando o quanto

é relevante a integração pluricultural na educação musical brasileira.

Assim sendo, o foco dessa abordagem será sobre os recursos educacionais

significativos para o ensino musical com a inclusão da dança e da poesia. Em nosso país

existem sociedades pluriculturais. A multiplicidade cultural se desenvolveu graças às

imigrações de povos que aqui chegaram, se adaptaram e se estabeleceram mantendo a

prática de sua arte como a dança, a música e a poesia. A aproximação com estas culturas

e suas maneiras de viver, propiciam trocas e fusões através das quais construímos

continuamente a cultura brasileira.

1. EDUCAÇÃO

A educação artística aborda e preserva a diversidade de culturas. A

pluriculturalidade fortemente presente em nossas raízes brasileiras é uma vasta fonte de

inspiração para a docência, sobretudo em níveis de ensino fundamental e médio. Nesta

faixa etária, o indivíduo está em formação de sua personalidade e estruturas psíquicas, o

cérebro ávido por fazer novas conexões e o contato com as artes de várias culturas lhe

proporcionará o passo inicial para sua evolução como ser humano. As atividades artísticas

em grupo têm a propriedade de educar individual e socialmente ao mesmo tempo que

promove a evolução nos relacionamentos intra e interpessoais os quais todos nós

experimentamos. Entendemos que a linguagem artística é inerente à raça humana,

presente em todas as culturas e épocas. Interessante e sensível é a postura de Barbosa

(2014, p. 651) ao afirmar que “as crianças fundam suas culturas a começar dos modos

como participam dos mundos naturais e simbólicos com os quais interagem”.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

45

É fundamental o estímulo ao culto às artes desde a infância não apenas

frequentando programações como espectadores, mas, sobretudo participando de

atividades que estimulem a criatividade, atividades motoras e a sociabilidade, como bem

declara Barbosa (2014, p. 654),

“Os saberes, ou as culturas, não existem somente para serem transmitidos, mas se encontram ligados às atividades do dia a dia. As crianças, como todos os seres humanos, são capazes de criar, de atribuir e de compreender significados”.

A música, a dança e a poesia são setores da arte adequados para a educação, pois

apresentam fatores relevantes ao desenvolvimento psíquico, físico e intelectual dos

alunos. Reconhecemos o quanto o ambiente educacional possibilita integrações sociais

colaborando científica e culturalmente para a construção de conhecimentos com vistas à

união com a comunidade, a família e a civilização. Assim sendo, observemos a seguinte

citação:

“o atual momento educacional, social, político e econômico (...) demanda transformações emergentes que requerem pessoas para atuar na sociedade de forma colaborativa com visão holística (...) adotando novas práticas cognitivas colocando em evidência os aspectos pessoais, permeados pelas múltiplas inteligências individuais, que de forma integrada, podem atuar a serviço de um bem maior que é social” (FERREIRA, CARPIM, & BEHRENS, 2013, p. 73).

Caberá, portanto ao professor, adotar uma postura de respeito e cultivo pela

multiplicidade de culturas e saberes. Entendemos que os alunos buscam a aquisição de

novos conhecimentos, valorizando e/ou corrigindo suas experiências pregressas de

acordo com suas realidades sociais e culturais.

É importante ressaltar o pensamento de Queiroz ao declarar que “as políticas

educacionais têm sido foco de atenção das diferentes áreas de conhecimento [...]

determinantes para os rumos da educação e, consequentemente, para o desenvolvimento

humano e cultural de qualquer sociedade” (QUEIROZ, 2012, p. 36).

A consolidação do ensino, da iniciação científica e da extensão promoverá a

disseminação do conhecimento, a construção de saberes efetivos e contribuirá para o

desenvolvimento científico, social e tecnológico.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) define as

universidades como “instituições pluridisciplinares de formação dos quadros

profissionais de nível superior, de pesquisa, de extensão e de domínio e cultivo do saber

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

46

humano”. Estabelece-se, para as Universidades, a indissociabilidade do ensino, da

pesquisa e da extensão (BRASIL, Lei Nº 9.394, Institui a Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional. Diário Oficial da União, publicada em 20 de dezembro de 1996).

Ao mediar os saberes com práticas educativas de cunho artístico poderemos

estimular a autonomia discente de forma dialógica e colaborativa. A cultura popular se

caracteriza pelo anonimato, funcionalidade e transmissão oral.

2. MÚSICA

A música é uma linguagem imprescindível nas diversas culturas humanas. Seres

nativos e imigrantes das diversas regiões geográficas, realizam manifestações artísticas

para assim expressarem sentimentos, pensamentos e rituais peculiares aos seus hábitos de

vida. A prática da música na educação proporcionará o desenvolvimento cognitivo o qual

será importante preparo para estudos futuros em áreas para além da música. O

reconhecimento pela ciência de que a música estimula o funcionamento de quase a

totalidade das regiões do cérebro humano, fez com que a relação música-cérebro se

tornasse objeto de estudos, dos mais relevantes, na área de pesquisa neurocientífica.

Pesquisadores da Fundação de Pesquisa em Música fundada em 1944 na cidade

de Washington descobriram que a música é registrada na parte do cérebro que

normalmente é estimulada pelas emoções, contornando os centros cerebrais que lidam

com a inteligência e razão. O Doutor Ira Altschuler, um dos pesquisadores, explica que

“a música não depende das funções superiores do cérebro para franquear entrada ao

organismo. Uma vez que um estímulo tenha sido capaz de alcançar o tálamo, o cérebro

superior é automaticamente invadido” (IRA, 2001, p. 72).

Devemos mencionar que “a música é ponto de partida e, simultaneamente, ponto

de encontro entre várias expressões artísticas” (RODRIGUES, ARRAIS, &

RODRIGUES, 2013, p. 39). Constatamos claramente como a música se faz presente em

outras manifestações artísticas dentre as quais destacamos a dança, o teatro e a poesia.

Oliveira (2011) ao realizar uma pesquisa sobre o panorama da educação musical

e práticas metodológicas, expressa muito bem sua visão como profissional dedicada ao

processo de ensino,

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

47

“Partindo de aspectos estruturais da música (som, tempo, espaço, ritmo, melodia, gesto, harmonia, silêncio, timbre, consonância, dissonância) integrados a diversas particularidades da condição humana – individuais, sócio-culturais e universais, os conteúdos caminham pelas trilhas do pensamento complexo, visando potencializar atitudes crítico-reflexivas que emergem das experiências subjetivas. Professores e alunos, vivendo um processo de construção mútua” (OLIVEIRA, 2011, p. 12).

A educação musical requisita o desenvolvimento auditivo e motor, a organização

de pensamentos, controle de emoções, memorização, atenção, concentração e

improvisação. A prática musical escolar contempla a integração social, a aprendizagem

de canções, brinquedos cantados, danças regionais, improvisações, atuações individuais

e coletivas além de jogos e apreciações musicais.

O ser humano, de uma forma ou de outra, experimenta e desenvolve aptidões

natas e realizações de expressões musicais desde a infância em seu ambiente familiar e

social através de atividades lúdicas e de movimento. As atividades musicais em grupo

primam por explorar e desenvolver os conhecimentos musicais já vivenciados pelos

alunos apresentando e exercitando novas aprendizagens. Dessa forma será incentivado o

relacionamento e a interação entre os participantes. Rodrigues e seus colaboradores

apresentam uma interessante reflexão neste sentido ao dizer que:

“A dinâmica gerada pela prática musical faz parte de uma estratégia que possibilita o surgimento de novas dinâmicas na teia relacional. (...) o efeito de uma díade tem um efeito contagiante sobre as outras díades e rapidamente se passa a ter um grupo unido, numa interação emocional muito própria” (RODRIGUES et al., 2013, p. 44).

A vivência musical poderá proporcionar a experimentação coletiva de emoções

a serem compartilhadas e fortalecidas. Como músicos e professores podemos declarar

que o som tem um significado emocional o qual não depende de controle pessoal.

A capacidade do cérebro de processar informações musicais comprova que

temos uma capacidade musical nata. A música está presente, necessariamente, nas

atividades da dança e brinquedos cantados assim como na poesia que transforma palavras

em sons. Podemos dizer que a música transforma sons registrados graficamente, em

“palavras de som” que nos afetam profundamente. Ou seja “a música folclórica é a música

anônima, de transmissão oral, antiga, e que constitui o patrimônio comum do povo de

uma determinada região” (CASCUDO, 2012 p. 469).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

48

Assim sendo, será apresentada uma abordagem pluricultural inserindo estes

setores com ênfase na cultura popular brasileira. Reconhecemos elementos importantes

presentes em seus conteúdos de aprendizagem, fundamentais à educação musical.

3. DANÇA/ BRINQUEDOS CANTADOS/FOLGUEDOS

“Todo movimento, desde o mecânico até o simbólico, contém sempre uma grande carga expressiva” (PAULINA OSSONA).

Compreendemos ser a dança um componente relevante na educação pois

permeou a vida de todos os povos com variadas finalidades. Estimula a comunicação

entre os participantes incentivando o conhecimento de novas culturas. A prática de

atividades coletivas relacionadas à dança favorecerá a aquisição de novas formas de

expressão e conhecimento de si próprio contribuindo assim para o processo ensino-

aprendizagem.

Os brinquedos cantados envolvem os alunos na prática de várias atividades

promovendo a autoestima. Os discentes desenvolvem o senso rítmico, aprendem gestos,

compartilham atividades lúdicas além de ampliarem o vocabulário. Para tais resultados

são requisitadas atenção e concentração. Interessante a afirmação de Ossona sobre a

necessidade humana do movimento: “Ele é o meio de expressão a que todo homem, por

mais civilizado e culto que seja, recorre quando não pode fazê-lo pela palavra”

(OSSONA, 2011, p. 29).

A prática da dança, folguedos e brinquedos cantados promove a integração

social, senso de colaboração coletiva, coordenação motora, memorização, expressão

corporal, controle emocional, atenção, concentração, senso de equilíbrio,

desenvolvimento auditivo, conexão com a melodia sincronizada aos movimentos e à letra

da música, em alguns casos, ao descrever os movimentos a serem realizados nos

brinquedos cantados. Concomitantemente apresenta o conhecimento de expressões

linguísticas regionais. Observamos pela trajetória da história da humanidade as

revelações que surgem através da dança como por exemplo, a transformação social,

cultural e a relação do homem com a referência geográfica que interfere nos modos de

vida.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

49

Em seu livro “A educação pela dança”, Paulina Ossana, cita Mary Wigman,

importante coreógrafa alemã, destacando sua afirmativa: “A arte é comunicação

estabelecida por um ser humano para a humanidade, em uma linguagem elevada que fala

dos acontecimentos cotidianos” (OSSANA, 2011, p. 76).

Observamos que no panorama do ensino fundamental e médio nas escolas

brasileiras, o ensino das artes deveria ser uma disciplina de suma importância devido às

imensas contribuições para a aprendizagem e formação da estrutura do indivíduo. A

integração pluricultura na educação musical brasileira é um amplo recurso para o

desenvolvimento de trabalhos docentes que visam a evolução do ser humano de forma

holística.

Algumas danças e folguedos são apresentados em diversas regiões, porém

devido à transmissão oral poderá apresentar nomes variados conforme a manifestação do

povo.

Os folguedos são festas de caráter popular cuja principal característica é a

presença de música, dança e representação teatral. A maioria dos folguedos é de origem

religiosa e raízes culturais africanas, portuguesas e indígenas. Presentes em quase todo

território brasileiro, são mais tradicionais na região Nordeste.

Cunha (2004, p. 31) apresenta interessante observação a respeito dos benefícios

favoráveis ao ensino, resultantes das práticas teatrais.

“A sua prática promove o reconhecimento, a confiança e a valorização do outro, a comunicação um espírito de inter-ajuda e de mútuo apoio, para além de capacitar para a mobilização dos saberes adquiridos em diversas situações. A sua prática permite mais facilmente assimilar os conteúdos, explorar, questionar, experimentar, daí o constituir uma poderosa ajuda na melhoria das aprendizagens e no tornar mais relevantes os conhecimentos”.

A prática da educação musical unida ao teatro proporcionará a sua experiência

conectada ao desenvolvimento da expressão corporal, ou seja, ambas as vertentes

artísticas contribuem intensamente para o aprimoramento da evolução do ser humano.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

50

4. LITERATURA

O contato com a literatura e interpretação de textos oriundos da cultura popular

enriquecerá significativamente o vocabulário assim como a fluência de raciocínio. A

poesia proporciona o conhecimento de variados estilos de escritores populares e não

populares. Um registro típico da cultura popular brasileira é a literatura de cordel, um

gênero literário em forma rimada, divulgado em folhetos. Os autores ou “cordelistas”

recitam os versos de forma melodiosa e cadenciada, acompanhados de viola. Este gênero

literário alcançou relevante status na cultura literária.

Fonte: cafecommonos.blogspot.com.br/p/tradic

5. A PLURICULTURA BRASILEIRA

Apresentaremos a seleção de alguns exemplos da cultura popular brasileira dos

estados: Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul e São

Paulo.

MINAS GERAIS

Dança

Caxambu (Jongo Caxambu): “Caxambu é um grande tambor negro e a dança é executada ao som desse instrumento. O caxambu figura como instrumento em outras danças e mesmo num bailado, jongo em São Paulo, Minas Gerais e Goiás” (CASCUDO, 2012 p. 191). É uma dança afro-brasileira reconhecida como dança de terreiro cujos movimentos são improvisados. As músicas denominam-se “pontos” sendo executadas em forma de diálogo entre um dançador-solista e os demais participantes que respondem ao solo apresentado.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

51

Fonte: www.palmares.gov.br

Mineiro-pau: “Antiga dança de roda, cantada e ritmada com palmas. No Ceará diz-se maneiro-pau, bailado de roda, figurantes masculinos, acentuando a nota dominante com o entrechoque de pequeninos cacetes, característicos” (CASCUDO, 2012 p. 451).

Fonte: blogspot.com.br/dancas-tipicas-da-regiao-sudeste

A transmissão oral admite a liberdade de adaptações nas culturas brasileiras.

Literatura

Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) - nascido em Itabira, foi poeta, contista e cronista, considerado por muito o mais influente poeta brasileiro do século XX. Apresentamos um de seus poemas mais populares na cultura brasileira.

No meio do caminho

No meio do caminho tinha uma pedra tinha uma pedra no meio do caminho tinha uma pedra no meio do caminho tinha uma pedra. Nunca me esquecerei desse acontecimento na vida de minhas retinas tão fatigadas. Nunca me esquecerei que no meio do caminho tinha uma pedra tinha uma pedra no meio do caminho no meio do caminho tinha uma pedra.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

52

Música

Peixe vivo: Uma das canções infantis mais tradicionais de Minas Gerais. A melodia simples de fácil assimilação contribui significativamente para as atividades escolares e sociais.

Peixe Vivo

Como pode o peixe vivo Viver fora da água fria Como pode o peixe vivo Viver fora da água fria

Como poderei viver Como poderei viver Sem a tua, sem a tua Sem a tua companhia Sem a tua, sem a tua Sem a tua companhia

Os pastores desta aldeia Já me fazem zombaria Os pastores desta aldeia Já me fazem zombaria

Por me verem assim chorando Por me verem assim chorando Sem a tua, sem a tua Sem a tua companhia Sem a tua, sem a tua Sem a tua companhia

Grande Otelo (1915-1993) - nascido em Uberlândia foi ator, comediante, cantor, escritor e compositor brasileiro. Participou de diversos filmes brasileiros de sucesso, entre os quais a versão cinematográfica de Macunaíma, realizada em 1969, importante obra de Mário de Andrade.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

53

RIO DE JANEIRO

Dança

Cana Verde ou Caninha Verde: Inserida no Brasil pelos portugueses durante o Ciclo do Açúcar. “Em Portugal é uma das mais populares danças do Minho com coreografia e música diversa do Brasil, onde pelas várias regiões onde é dançada, vai mudando de forma e passos. Os negros brasileiros dançam-na com prazer, com ritmo e maneiras peculiares à raça” (CASCUDO, 2012, p. 167).

Fonte: ederpagode.blogspot.com.br/

Samba: O samba é uma dança popular em todo o Brasil. Câmara Cascudo destaca que samba é nome angolês sendo consagrado no segundo lustro do século XIX. “A difusão do samba é antiga e mesmo prodigiosa. Alcançou os aldeamentos indígenas no decorrer do século XVIII, levado pelos escravos africanos fugitivos, e o ritmo e disposição coreográfica seduziram as malocas” (CASCUDO, 2012, p. 630). Podemos afirma que o Rio de Janeiro respira samba, ritmo que se tornou patrimônio cultural brasileiro. “O samba virou sinônimo de Brasil. Mário de Andrade, registrou num poema o seu entusiasmo pelo carnaval dos negros do Rio de Janeiro, anos antes da criação da primeira escola de samba” (THEODORO et al, 2006, p. 15).

Fonte: carnaval2015.com/carnaval-2015-rio-de-janeiro

“O samba é, pois, fruto de ricas tradições africanas e afro-brasileiras. E sua proteção, como bem imaterial do patrimônio cultural nacional, além de ser um imperativo constitucional, é um dever de consciência”(THEODORO et al., 2006, p.15).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

54

Literatura

Vinícius de Moraes (1913-1980) - nascido no Rio de Janeiro, foi dramaturgo, jornalista, poeta e compositor brasileiro. Poeta essencialmente lírico, o que lhe renderia a alcunha "poetinha", que notabilizou-se pelos seus sonetos, um marco na cultura carioca.

Soneto de separação

De repente do riso fez-se o pranto Silencioso e branco como a bruma E das bocas unidas fez-se a espuma E das mãos espalmadas fez-se o espanto.

De repente da calma fez-se o vento Que dos olhos desfez a última chama E da paixão fez-se o pressentimento E do momento imóvel fez-se o drama.

De repente, não mais que de repente Fez-se de triste o que se fez amante E de sozinho o que se fez contente.

Fez-se do amigo próximo o distante Fez-se da vida uma aventura errante De repente, não mais que de repente.

Anualmente, a cidade de Parati organiza um importante festival literário, o Festival Literário Internacional de Parati.

Música

A primeira marchinha de carnaval: Chiquinha Gonzaga (1847-1935) - Francisca Edwiges Neves Gonzaga nasceu no Rio de Janeiro. Compositora e maestrina carioca, foi autora da primeira marchinha de carnaval intitulada “Ô Abre Alas”. Um dos nomes mais importantes da nossa história cultural lutou incansavelmente pelas liberdades no país pelo seu pioneirismo. Enfrentou a opressora sociedade patriarcal, criando uma profissão inédita para a mulher causando escândalo em seu tempo. Frequentadora assídua do ambiente musical do Rio de Janeiro do Segundo Reinado incorporou ao piano adversidades superadas, sem preconceitos (Fonte: chiquinhagonzaga.com.acervo).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

55

Ó Abre Alas Ó abre alas Que eu quero passar Ó abre alas Que eu quero passar Eu sou da lira Não posso negar Eu sou da lira Não posso negar (Refrão) Rosa de Ouro É que vai ganhar Rosa de Ouro É que vai ganhar (Refrão) Rosa de Ouro Não pode negar Rosa de Ouro Não pode negar

RIO GRANDE DO NORTE

Dança

Bambelô: “Samba, coco de roda, danças em círculo, cantada e acompanhada por instrumento de percussão, fazendo figuras no centro da roda” (CASCUDO, 2012, p. 91).

Fonte: maxdanielartes.blogspot.com.br/bambelo

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

56

Folguedo

Boi Calemba - Luís Câmara Cascudo, autor do Dicionário do Folclore Brasileiro, declara que Boi-Calemba é a versão potiguar do “Bumba-meu-boi”, tradicional folguedo da região Nordeste que aborda a lenda sobre a morte e ressurreição de um boi. Seus integrantes, Enfeitados e Mascarados, são responsáveis pela parte engraçada do espetáculo, enquanto que mestre, galantes e dama, cantam e dançam trajando roupas decoradas com fitas coloridas. “O boi recebe nomes variados pelas regiões do Brasil como bumba meu boi e boi calemba entre outros, e adquire ritmos, adereços, indumentárias, instrumentos e formas diversas de apresentação” (…) “Bumba é interjeição, zás, valendo a impressão de choque, batida, pancada. Bumba meu Boi será “Bate! Chifra, meu Boi! voz de excitação repetida nas cantigas do auto, o mais popular, compreendido e amado do Nordeste. Exibe-se dos meados de novembro à noite de Reis, 6 de janeiro, pertencendo ao ciclo do Natal e sua presença no carnaval é reprovada pelos tradicionalistas” (CASCUDO, 2012, p. 136).

Fonte: diariodomearim.blogspot.com.br/bumba-meu-boi Fonte: upmagazine-tap.com/artigos/maranhao-terra-de-encontros

Literatura

Luís da Câmara Cascudo (1898-1986) - nascido em Natal, foi historiador e antropólogo. Grande pesquisador da cultura brasileira. Nísia Floresta Brasileira Augusta (1810-1885) – pseudônimo de Dionísia Gonçalves Pinto. Foi educadora, escritora e poetisa norte-rio-grandense, importante ativista do feminismo no Brasil no século XIX.

Música

Araruna: “Música folclórica do Rio Grande do Norte introduzida na cidade de Natal pelo mestre Cornélio Campina da Silva, um sertanejo de Porto Alegre que se tornou diretor artístico do grupo Araruna- Sociedade de Danças Antigas e Semidesaparecidas” (NASCIMENTO, 2007, p. 1). Araruna em tupi significa pássaro e sua melodia apresenta componentes indígenas. Ou seja “A música e o brinquedo cantado fazem referência à natureza e a um passo de mesmo nome, oriundo do Pará” (FRADE, 1997, p. 35).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

57

Araruna Eu tenho um pássaro preto, Araruna Que veio lá de Natal, Araruna Eu tenho um pássaro preto, Araruna Que veio lá de Natal, Araruna (Refrão) Xô, xô, xô Araruna Xô, xô, xô Araruna Xô, xô, xô Araruna Não deixa ninguém te pegar, Araruna!

Fonte:ecosdaculturapopular.blogspot.com.brararuna

RIO GRANDE DO SUL

Dança

Pau de fitas: “Portugueses e espanhóis trouxeram o pau de fitas para o continente americano” (CASCUDO, 2012, p. 540). A dança em forma de roda envolve um mastro enfeitado com longas fitas coloridas presas no topo. Variados passos da coreografia formam trançados com diferentes desenhos.

Fonte: riovalejornal.com.br/materias/

Balaio (Bambaquerê): O balaio, muito popular no Rio Grande do Sul, apresenta-se como dança sapateada e, ao mesmo tempo, de conjunto. Constitui uma dança bastante popular nas campanhas do Rio Grande do Sul. O nome balaio: origina-se do aspeto de cesto que as prendas dão às suas saias, quando giram rapidamente sobre os calcanhares e se abaixam, formando o desenho (CORTÊS, 2000).

Fonte: www.sarandeiros.com.br

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

58

Literatura Mario de Miranda Quintana (1906-1934) nasceu na cidade de Alegrete. Um dos mais importantes expoentes da literatura brasileira.

Os Poemas

Os poemas são pássaros que chegam não se sabe de onde e pousam no livro que lês.

Quando fechas o livro, eles alçam voo como de um alçapão. Eles não têm pouso nem porto alimentam-se um instante em cada par de mãos e partem. E olhas, então, essas tuas mãos vazias, no maravilhado espanto de saberes que o alimento deles já estava em ti…

Música

O estilo de música gaúcha tem relevantes influências da música flamenca espanhola e portuguesa. A estrutura harmônica bem elaborada de fácil identificação musical realiza a base do ritmo marcado ao mesmo tempo que transmite o clima nostálgico e romântico da cultura musical gaúcha. Quando à noite tu dormes tranquila

Quando à noite tu dormes tranquila Em teu leito de vida formosa Se ouvires uma voz bem tristonha Despedindo bem deixa saudosa Tu não sabes que fundos tormentos No meu peito irão abrigar Estas trovas que eu solto ao vento Contemplando da noite o luar. Contemplando as estrelas que brilham Nesse céu azulado daqui Tu lá em teu leito não sonhas Com quem vives somente por ti Mas se a caso acaso sonhares querida Que és a dona do meu coração Acredita o teu sonho é bem certo Não desprezes do bardo a canção.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

59

SÃO PAULO

Dança

Batuque: Batuque é o nome dado pelo português, sendo denominação genérica para toda dança de negros da África. “Os instrumentos de percussão, de bater, membranofones, deram batismo à dança que se originou no continente africano, especialmente pela umbigada, batida de pé ou vênia para convidar o substituto do dançador solista” (CASCUDO, 2012, p. 104).

Fonte: africadoladodeka.wordpress.com

Folguedo

Jongo: Espécie de samba, em São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo, Estado do Rio de Janeiro “(...), acompanhado por tambores de jongo. O interesse do jongo está na disputa que fazem os dançarinos de suas habilidades. (...) realizam um verdadeiro desafio de passos” (CASCUDO 2012, p. 379).

Fonte: www.jefinhotamandare.com.br

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

60

Literatura

Fonte: biglistasdanet.blogspot.com.br

Mário Andrade (1893-1945) Nascido em São Paulo, foi poeta, escritor, crítico literário, musicólogo, folclorista, ensaísta brasileiro. Exerceu grande influência na literatura moderna brasileira. “Depois de trabalhar como professor de música e colunista de jornal ele publicou seu maior romance, Macunaíma, em 1928” (DICIONÁRIO GROVE, 1994, p. 29). Macunaíma apresenta as contradições da cultura brasileira descrevendo a fusão de nossas raízes e influências estrangeiras.

Música

Música de viola: Muito frequentemente encontramos violeiros no estado de São Paulo. Violas e rabecas, sempre associadas, existem em grande número em todo o Litoral Sul e Vale do Ribeira, com uma peculiaridade: são fabricadas na própria região. “Companheira fiel das horas de folga dos caiçaras, para quem a viola, portadora de seus sentimentos, fala e chora, costuma receber na região o nome de viola branca pela cor da madeira de que é feita, a cacheta é a própria viola caipira” (biblioteca virtual.sp.gov).

Destacamos o músico José Gomes de Abreu (1880-1935) - de nome artístico Zequinha de Abreu, como um dos mais importantes compositores de choro, autor do tradicional Tico-Tico no Fubá. Nasceu em Santa Rita do Passa Quatro.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Existem associações benéficas aos estudos das artes que estão de acordo com as

leis que regem a evolução do ser humano. O progresso no envolvimento acadêmico com

as artes poderá ser de grande auxílio para a aprendizagem em geral.

É importante a prática de vivências artísticas nas escolas suscitando o

desenvolvimento da imaginação.

A prática musical, da dança e do teatro na escola poderá despertar a curiosidade

que deverá ser explorada como fonte de conhecimento e crescimento, acadêmico e

pessoal.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

61

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARBOSA, M. C. S. (2014). Culturas infantis: contribuições e reflexões. Rev. Diálogo

Educ., Curitiba, 14(43), 645-667.

CASCUDO, L.C. (2012). Dicionário do folclore brasileiro. (12.ª ed.). São Paulo: Global.

CÔRTES, G. P. (2000). Dança, Brasil!: festas e danças populares. Belo Horizonte:

Leitura.

CUNHA, M. J. S. (2004). Animação educativa e teatro: estratégia para desenvolver

competências. In C. CARDOSO, L. LEONIDO, & M. LOPES (Coord.), Teatro na

Educação (pp. 27-33).Vila Real: I Fórum Ibérico.

DICIONÁRIO GROVE DE MÚSICA (1994). Edição concisa. (E. F. Alves, Trad.). Rio

de Janeiro: Ed. Zahar.

FERREIRA, J. L., CARPIM, L., & BEHRENS. M. A. (2013). O professor universitário

construindo conhecimentos inovadores para uma prática complexa, colaborativa e

dialógica. Rev. Diálogo Educ., Curitiba, 13(38), 69-84.

FRADE, C. (1997). Folclore. São Paulo: Global.

FREIRE, P., & SHOR, I. (1986). Medo e ousadia: o cotidiano do professor. Rio de

Janeiro: Paz e Terra.

FREIRE, P. (2001). Carta de Paulo Freire aos professores. Estud. av., 15(42), 259-268.

doi: 10.1590/S0103-40142001000200013

NASCIMENTO, L. B. (2007). Araruna no Rio Grande do Norte: uma dança entre

historiografia e memória. Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

OLIVEIRA, K. R. O. (2011). Panorama da educação musical: práticas metodológicas em

duas escolas de música de Goiânia. Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

Graduação Stricto-Sensu, Mestrado em Música da Escola de Música e Artes Cênicas da

Universidade Federal de Goiás, Brasil.

OSSONA, P. (2011). A educação pela dança. (N. Abreu e S. Neto, Trad.). (6ª ed.) São

Paulo: Summus.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

62

QUEIROZ, L. R. S. (2012). A educação musical no Brasil do século XXI: articulações

do ensino de música com as políticas brasileiras de avaliação educacional. REVISTA DA

ABEM, Londrina, 20(28), 35-46.

RODRIGUES, H., ARRAIS, N., & RODRIGUES, P. (2013). Variações sobre temas de

desenvolvimento musical e criação artística para a infância. In B. ILLARI & A.

BROOCK, (Orgs.), Música e Educação Infantil (pp. 37-68). Campinas: Papirus.

THEODOR, H., JUPIARA, A., & VALENÇA, R. (2006). Dossiê das Matrizes do Samba

no Rio de Janeiro: partido-alto samba de terreiro samba-enredo. CENTRO CULTURAL

CARTOLA, Iphan/MinC – Fundação Cultural Palmares.

Webgrafia

www.africadoladodeka.wordpress.com

www.biglistasdanet.blogspot.com.br

www.blogspot.com.br/dancas-tipicas-da-regiao-sudeste

www.carnaval2015.com/carnaval-2015-rio-de-janeiro

www.chiquinhgonzaga.com/acervo(consultado

www.diariodomearim.blogspot.com.br/bumba-meu-boi

www.ecosdaculturapopular.blogspot.com.brararuna-musica-e-danca-folclorica

www.ederpagode.blogspot.com.br/

www.jefinhotamandare.com.br

www.maxdanielartes.blogspot.com.br/bambelo

www.palmares.gov.br

www.projetomemoria.art.br/NisiaFloresta

www.riovalejornal.com.br/materias

www.sarandeiros.com.br

www.upmagazine-tap.com/pt_artigos/maranhao-terra-de-encontros

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

63

ESTUDOS MUSICAIS: UMA ANÁLISE DAS INVESTIGAÇÕES REALIZADAS

EM RORAIMA – BRASIL

Musical studies: an analysis of investigations conducted in Roraima - Brazil

DE SOUZA MENDES DA SILVA, Jefferson Tiago23

Resumo

O presente trabalho aborda uma análise das investigações realizadas e publicadas na área de música por alunos, professores/pesquisadores em Roraima - Brasil. Roraima é um dos Estados mais novos do Brasil e é constituído por imigrantes de todas as regiões brasileiras e comunidades indígenas. Sua miscigenação cultural o torna com características únicas de um povo que fala e faz música europeia, brasileira, que mantêm as tradições indígenas e tem um contato forte com as culturas venezuelana. O objetivo desde ensaio é de apontar quais sãos as áreas dos estudos musicais predominantes nas investigações realizadas no Estado, os principais trabalhos, além das inquietações e espaços para o desenvolvimento de futuras investigações na área de música em Roraima.

Abstract

The present work approaches an analysis of the researches carried out and published in music by students, professors / researchers in Roraima - Brazil. Roraima is one of the youngest states in Brazil and is made up of immigrants from all regions of Brazilian and indigenous communities. Its cultural miscegenation makes it unique with a people that speaks and makes European music, Brazilian music, maintains the indigenous traditions and has contact with Venezuelan cultures. The objective of this essay is to indicate the areas of the predominant musical studies in the investigations carried out in the State, the main works, besides the concerns and spaces for the development of future investigations in music in Roraima.

Palavras-chave: Estudos Musicais; Brasil; Roraima; Cultura em Roraima; Educação Musical.

Keywords: Musical Studies; Brazil; Roraima; Culture in Roraima; Musical education.

Data de submissão: Junho de 2016 | Data de publicação: Dezembro de 2016.

23 JEFFERSON TIAGO DE SOUZA MENDES DA SILVA - Doutorando em Ciências da Educação na Universidade de Trás-os-Montes. Professor do curso de Licenciatura em Música da Universidade Federal de Roraima. BRASIL. E-mail: [email protected].

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

64

1. RORAIMA E A MÚSICA

Roraima é um dos vinte e seis estado-membros da República Federativa do Brasil

e está situado na Região Norte brasileira, fazendo divisa com os Estados do Pará e do

Amazonas. Em 2015, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

(IBGE) a estimativa populacional do Estado era de mais quinhentos mil habitantes, sendo

que a capital Boa Vista concentrava 64% da população.

Conforme Oliveira (2011) durante a colonização americana as terras ao norte da

Planície do Rio Amazonas até o Mar do Caribe eram conhecidas como Ilha das Guianas,

o qual denomina-se como Amazônia Caribenha “que compreende o litoral Atlântico

Norte entre o delta do rio Orinoco (Venezuela) e do rio Amazonas, pela margem esquerda

do rio Amazonas e do rio Negro, pelo Canal de Cassiquiare (Brasil/ Venezuela) e a

margem direita do rio Orinoco”, no processo de colonização as terras foram divididas

entre os reinos de Portugal, Espanha, Inglaterra, Países Baixos. Em razão das

características geográficas da região, com rios que apresentavam dificuldades para sua

navegação, florestas e serras que se mostravam como muralhas, as comunidades

indígenas presentes na Amazônia Caribenha se mantiveram resguardadas da colonização

europeu e suas terras relegadas durante os primeiros séculos de exploração da América.

Em meados do século XVIII iniciam-se na região expedições missionarias pela

Bacia do Rio Branco com interesses de povoar, explorar e catequizar as comunidades

indígenas da região de Roraima. Para Oliveira e Duarte (2007) as Missões Carmelitas em

1725 permitiram os primeiros contatos das tribos indígenas com os conceitos musicais

europeus, os estudos musicais eram presentes na catequização como ferramenta de

sedução e estratégia de fomentar a cultura europeia e a religião católica, tal como

realizaram a Ordem religiosa dos Jesuítas.

“Para os homens brancos, a música indígena interessava não somente como uma curiosidade para os livros de viagens exóticas, mas também para se conhecer melhor os costumes dos índios e, com isso, saber lidar com eles. Por outro lado, a música europeia foi inicialmente cantada pelos índios também como curiosidade, mas sem saberem que com esta música estavam se entregando à deculturação e à catequese” (CASTAGNO, 2010, p. 9).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

65

A prática musical indígena anterior ao século XX é desvalorizada e com

pouquíssimos registros publicados. Se tem no etnográfico alemão Theodor Koch-

Grünberg a maior referência dos primeiros registros sonoros realizados por diversas

etnias indígenas, “na sua terceira viagem ao Brasil entre os anos de 1911 e 1913, esteve

na região de fronteira entre Brasil e Venezuela. Nessa expedição, gravou manifestações

musicais e dedicou parte do terceiro volume da obra Vom Roroima zum Orinoco à

atividade musical de alguns povos nativos” (OLIVEIRA & BENETTI, 2015, p. 291).

Com interesses de manter o monopólio das suas terras e o comércio fluvial a Coroa

Portuguesa cria em 1775 o Forte de São João Joaquim do Rio Branco, este feito acarreta

na região a presença militar e as influências musicais das tropas que ali se fizeram

presentes, pois a música sempre esteve “ligada às ações militares desde tempos remotos,

não apenas como meio de comunicação no campo de batalha, como elemento psicológico,

animando as tropas e atemorizando os inimigos” (CARVALHO, s.d). Atualmente

Roraima por ser um Estado de fronteira com a Venezuela e a Guyana abriga diversas

unidades das forças armadas brasileiras que ainda têm como tradição ter no seu efetivo

músicos-militares.

A militarização e catequização são os primeiros registros da realização de música

europeia ocidental na Região, porém há pouco registro e publicação dessas práticas de

estudos musicais em Roraima.

Durante o século XIX as terras planas e a vegetação baixa situadas em volta da

Bacia do Rio Branco proporcionou o desenvolvimento de pequenas comunidades civis

em fazendas e vilas, que tinham ali como prática econômica a criação de rebanho bovino

para atender o mercado do Estado do Amazonas, o qual a região fazia parte, Roraima

ganha estabilidade econômica e administrativa com elevação a Território Federal no

início do século XX e se vê a partir daí três grupos que fortalecem os estudos musicais

em Roraima: a imigração da população através do incentivo dos governos para povoação

de Roraima; as práticas religiosas da Igreja Católica e fundação da Escola Euclides da

Cunha - primeira escola fundada em Roraima; e, a militarização para proteção da

fronteira.

Não é propriamnte “uma novidade que a música, através do canto, sempre foi uma

das vias utilizadas para educar e contribuir com a organização da sociedade” (OLIVEIRA

& DUARTE, 2007, p. 360), nessa linha de investigação é possível afirmar que os estudos

musicais passam a ser integrados ao processo de formação das crianças de Roraima e

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

66

seriam o primeiro local de ensino formal de música no Estado, “os educadores de

Roraima, buscando solucionar os problemas e harmonizar as propostas educativas,

conceberam a música como um dos meios para representar sua realidade cultural” (idem,

p. 360).

Na sua dissertação de mestrado o investigador Reginaldo Oliveira (1999, p. 55)

aponta que entre as décadas de 1970 a 1980 eram realizados estudos musicais na educação

básica, porém os professores que atuavam na área tinham em sua maioria “falta de

conhecimento sobre música entre os próprios responsáveis por seu ensino na região”.

Entre meados ao final do século XX existe o desenvolvimento de diversas práticas

culturais em Roraima, desde os eventos e bailes sociais passando pelas práticas e

performances de bandas e corais

“O maestro e professor Dirson Costa24 foi selecionado para formar e dirigir a Banda de Música que nessa época propôs constituir-se na cidade [Boa Vista - capital de Roraima], inicialmente deu aulas de música aos próprios integrantes da Banda, preparando-os para participação dos eventos da época. Assim, se formaram saxofonistas, flautistas e violinistas, cuja participação se pode pôr fim formar a primeira Banda de Música do Governo e da Guarda Civil Territorial que animou a vida cultural dessa cidade entre as décadas de 1960-70” (OLIVEIRA & DUARTE, 2007, p. 362).

Mas somente em 1984 com a criação da Escola de Música do Estado de Roraima

(EMURR) existiria o fortalecimento da educação musical. Rosangela Duarte (2010, p.

16) ressalta que 11 anos depois da criação da EMURR a sistematização de um currículo

não existia, necessitando em idos de 1995 “re-restruturar seus cursos e estabelecer

projetos que oportunizassem o acesso ao ensino da música para a comunidade”.

Rosangela Duarte é uma das maiores referências na área de educação musical em

Roraima, atuando em escolas do município de Boa Vista, na direção da EMURR e em

oficinas de capacitação pela Universidade Federal de Roraima. Através de sua

coordenação o movimento de Canto Coral ganhou força através do Painéis de Regência

Coral do Norte, que permitiu a formação de corais em escolas públicas e igrejas da cidade

de Boa Vista.

24 Dirson Costa foi um importante músico que atuou no Estado do Amazonas e em Roraima “regeu o Coral do Território Federal de Roraima, a Orquestra Sinfônica da Guiana Inglesa, foi um dos idealizadores da criação do Conservatório Amazonense de Música (atual Departamento de Música da Universidade Federal do Amazonas)” (SILVA, 2016, p. 167).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

67

“A minha preocupação em coordenar este evento era principalmente em oferecer oficinas com profissionais que, além de competentes, estivessem dispostos a trabalhar com músicos, professores de música, alunos da Escola de Música [EMURR], mas principalmente com professores da Educação Infantil das escolas de ensino regular” (DUARTE, 2010, p. 17).

A Universidade Federal de Roraima (UFRR) foi criada em 1989, passando a ser

a referência no Estado em termos de investigação cientifica, na área dos estudos musicais

suas primeiras referências em investigações são de Reginaldo Oliveira e Rosangela

Duarte, o primeiro atuando em atividades de musicologia e cultura, e a segunda na

formação de professores e educação musical. A apropriação dos espaços culturais pela

população, o fomento de atividades musicais através das instâncias públicas, além da

obrigatoriedade do ensino de música na educação básica no Brasil leva em 2013 a criação

do curso de Licenciatura em Música na UFRR, ambiente que permitiria o maior acesso

aos estudos de formação de professores em música, sistematização e investigações da

música em Roraima.

É salientar afirmar que atividades de música já eram realizadas pela UFRR antes

da criação do curso de Licenciatura em Música, através da coordenação de cultura com

projetos de extensão como corais, oficinas de música, banda e orquestra, além da

promoção de formação continuada das linguagens artísticas (artes plásticas, dança,

música e teatro) de professores da rede pública no programa federal Polo Arte na Escola,

“o trabalho é realizado através de grupos compostos de professores atuantes na educação

básica, promoção de eventos e oficinas, realização de exposições e mostras de trabalhos

resultantes dos projetos desenvolvidos nas escolas, a partir dos estudos realizados no

Polo” (DUARTE, 2010, p. 19).

2. INVESTIGAÇÕES EM RORAIMA

Em consulta ao banco de dados da Plataforma Lattes do Ministério da Ciência,

Tecnologia, Inovações e Comunicações do Brasil localizou-se entre alunos e professores

da Licenciatura em Música da UFRR, pesquisadores e professores da área mais de

noventa publicações sobre estudos musicais realizadas em Roraima.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

68

Fonte: Plataforma LATTES, jan. 2007.

A área de Educação musical centraliza sessenta e seis trabalhos, sendo a maior

responsável pelas investigações Rosangela Duarte com trinta e cinco trabalhos publicados

como autora principal ou coautora. As temáticas principais da investigadora são de

formação de professores em Artes / Música, relatos de experiência na educação e

educação musical, podendo citar como referências:

- Livro: Expressão musical na Educação Infantil (2013) em coautoria com Patrícia

Kebach.

O livro reuni diversos fundamentos teórico-práticos para o processo de ensino-

aprendizagem da música com crianças. As autoras que realizam publicações em

parceira ao longo de anos apresentam várias atividades de expressão e criação

musical que podem ser desenvolvidas por professores em escolas infantis.

- Capítulo de livro: “Música e Educação em Roraima” em coautoria com Reginaldo

Oliveira em Educação Musical no Brasil (2007) de Alda de Oliveira.

O livro apresenta uma série de artigos sobre a educação musical no Brasil.

Convidados a contribuir sobre Roraima os professores da UFRR Reginaldo Oliveira

e Rosangela Duarte, realizam uma descrição histórica sobre a música, a educação

formal e informal e, a educação musical no Estado.

- Periódicos: “Educação musical e educação especial: processo de inclusão no sistema

regular de ensino” em Textos e Debates UFRR (2011) em coautoria com Patricia Kebach.

“Reflexões sobre a importância da arte na formação do professor - uma nova perspectiva

para a Universidade, a experiência da UFRR” em Textos e Debates UFRR (2005) e “A

música como elemento intercultural: uma abordagem para uma educação multicultural”

em Boletim do Museu Integrado de Roraima da Universidade Estadual de Roraima

(2000), ambos em coautoria com Elena Fioretti.

71 17 7 5

0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100

INVESTIGAÇÕES DE MÚSICA EM RORAIMA

Educação Musical Musicologia Teoria Musical Performance

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

69

Estes artigos contemplam a importância da diversidade cultural, do processo de

inclusão de alunos com necessidades especiais e a valorização da música indígena

como elementos para formação consciente de alunos e professores em Roraima.

Em seguida dois investigadores se destacam com o segundo maior número de

publicações em Educação musical, com doze trabalhos publicados os professores do

curso de Licenciatura em Música, Jefferson Silva e Gustavo Benetti, se dividem em

autorias individuais ou parcerias para investigarem a área. As temáticas principais dos

professores são: formação de professores e currículo na licenciatura em música, podendo

citar como referências:

- Capítulos de livro: “Música e história em Roraima: subsídios para uma educação

musical contextualizada” - autor Gustavo Benetti; “Licenciatura em música da UFRR:

uma análise dos dois primeiros anos (2013-2015)” - autor Jefferson Silva, ambos os

capítulos em Arte na Amazônia: conversas sobre o ensino na Região Norte (2016) de

Ivete Souza da Silva.

Gustavo Benetti, aborta a necessidade de alunos e professores conhecerem a

história de Roraima como ferramenta importante para um ensino de música

consciente. Jefferson Silva, discorre sobre fatos que levam para a criação do curso

superior em música em Roraima, e os resultados positivos e negativos dos 2 (dois)

primeiros anos do curso.

- Anais de eventos: “Música, educação e currículo” em Simpósio Fladem Brasil: a

Educação Musical na América Latina (2016). “Enseñanza en Música en región Norte de

Brasil grados en educación musical” em XXII Seminário do Fórum Latino-americano de

Educação Musical (2016). “Linguagem musical e o ensino de graduação em música:

contribuições para a atualização das disciplinas de teoria e percepção musical” em XXII

Congresso Nacional da Associação Brasileira de Educação Musical (2015).

“Musicologia histórica e o ensino de graduação em música: contribuições para

atualização das disciplinas de história da música” em XXI Seminário do Fórum Latino-

americano de Educação Musical (2015).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

70

Estes trabalhos em parceira dos professores é uma série de discussões sobre a

necessidade de mudanças nas matrizes curriculares das licenciaturas em música no

Brasil, que ainda mantêm unidades curriculares com conteúdos teóricos, formas de

ensino tecnicistas e que porventura sejam desassociadas com as realidades locais

Alunos da Licenciatura em Música da UFRR também apresentam suas experiências

no Programa de bolsas de iniciação à docência (PIBID)25, oficinas ministradas e estudos

de caso em publicações de eventos como Encontro Regional Norte da Associação

Brasileira de Educação Musical (2014, 2016) e Seminário Institucional do PIBID (2014).

A área de Musicologia centraliza quinze trabalhos, sendo o maior responsável

pelas investigações Gustavo Benetti com dez trabalhos publicados como autor principal

ou coautor, uma das razões pelo alto número de publicações de Benetti é motivada pela

sua formação acadêmica em História e Musicologia, o que faz atuar em investigações da

história da música no Brasil e de Roraima, podendo citar como referências:

- Anais de Eventos: “A música no Brasil, de Guilherme de Mello: subsídios para uma

edição crítica” em IV Simpósio Brasileiro de Pós-graduandos em Música (2016).

“Guilherme de Mello: novos apontamentos biográficos” em II Congresso da Asociación

Regional de la Sociedad Internacional de Musicología para América Latina y el Caribe

(2016). “Guilherme de Mello e A música no Brasil: uma análise sobre a publicação

reeditada por Luiz Heitor (1947)” em III Simpósio Internacional de Música na Amazônia

(2014).

Série de publicações da Tese de doutorado intitulada “Guilherme de Mello

revisitado: uma análise da obra A música no Brasil”. Guilherme de Mello é

considerado o primeiro autor da história da música no Brasil, tento o seu livro

publicado em 1908, com as investigações e a sua tese Benetti passa ser a maior

referência no Brasil sobre Guilherme de Mello.

Coautor de “A música dos nativos na visão de Koch-Grünberg: uma análise iconográfica

da obra Vom Roroima zum Orinoco” em III Congresso Brasileiro de Iconografia Musical

(2015), autor principal Áquilas Torres.

25 O Programa de bolsas de iniciação à docência é um projeto da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior que insere “os alunos de licenciatura no cotidiano de escolas da rede pública de educação, proporcionando-lhes oportunidades de criação e participação em experiências metodológicas, tecnológicas e práticas docentes de caráter inovador e interdisciplinar” (UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA, 2015).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

71

Neste trabalho os dois autores realizam uma análise audiovisual das impressões da

visita do etnográfico Koch-Grünberg a Roraima e da música como ritual indígena

no início do século XX e em 2015.

A área de Teoria Musical tem seis trabalhos publicados dos professores Jefferson

Silva e Rafael Friesen, os trabalhos são voltados para análise musical de forma geral e

não são contextualizados com a música realizada em Roraima.

A área de Performance tem cinco trabalhos publicados, se destacam os SongBook

Zeca Preto (2014) e George Farias (2016), com de canções populares de compositores

que vivem em Roraima como Zeca Preta, Eliakin Rufino e Neuber Uchôa, estes músicos

fizeram parte do

“Movimento Cultural Roraimeira, iniciado na década de 1980, inspirado no Movimento Modernista e no Movimento Tropicalista, que teve por finalidade a construção cultural de uma identidade para o povo de Roraima, revestido nos elementos da cultura e da paisagem natural existentes no estado” (SILVA & SANTOS, 2016, p. 460).

As características musicais presentes nas composições envolvem influências

rítmicas das músicas do Norte do Brasil e do Caribe, as letras retratam a cultura indígena

dos povos da Amazônia, belezas naturais da região, sua fauna e flora.

3. RORAIMA E AS OPORTUNIDADES DE INVESTIGAÇÃO

Para Duarte (2015, p. 323) as investigações musicológicas “são capazes de revelar

toda a diversidade das práticas e funções sociais da música”, do ponto de vista da

musicologia histórica e da etnomusicologia, Roraima ainda tem muito para oferecer nas

investigações musicais, poucos registros existem da música desenvolvida nos dois

primeiros séculos da colonização do território, da assimilação da influências da música

caribenha e africana em razão das fronteiras com a Venezuela e Guyana, e, do próprio

sentido do cantar e tocar em rituais indígenas. Ou seja “a identidade de um povo (ou grupo

étnico ou comunidade) está vinculada diretamente a um sistema cultural complexo, no

qual as artes, a língua, a cosmologia, as narrativas míticas e outros elementos culturais

fazem parte” (ALMEIDA & PUCCI, 2014).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

72

Discutir a diversidade cultura e a música indígena é um ponto importante em

Roraima, pois segundo dados do IBGE (2016) o Estado apresenta o maior percentual de

indígenas em terras demarcadas em todo o Brasil com 83,2% da população, em

quatrocentos e setenta comunidades e dez etnias diferentes, com mais de oitenta e cinco

mil índios vivendo em Roraima, porém não se encontrou nessa parcela da população

trabalhos sobre a música em suas comunidades.

“Mesmo vivendo no mesmo país, “ser índio” no Brasil significa conceber o mundo de outra forma e para isso é necessário um exercício antropológico de reconhecimento das diferenças, uma pesquisa, um trabalho mais aprofundado... um dos caminhos a se fazer é conhecer um pouco essas expressões artísticas, o que seguramente irá despertar um olhar mais aprofundado sobre a diversidade cultural do Brasil” (ALMEIDA & PUCCI, 2014).

As bandas militares no Brasil recebem “instrumentistas que encontram no

Exército a possibilidade de se realizarem profissionalmente como músicos e dedicarem a

uma das mais antigas tradições militares e também brasileiras” (CARVALHO, s.d.),

diagnosticou-se poucas pesquisas sobre as bandas militares das Forças Armadas em

Roraima, sua história no desenvolvimento da excelência no sentido de fazer música, o

rigor e comprometimento com os estudos musicais dos músicos-militares, a importância

que as bandas militares têm na criação de bandas civis e grupos de sopros em eventos

sociais, além do próprio acervo-musical executado por estes músicos, sua catalogação e

sistematização como patrimônio material.

O Estado de Roraima não tem uma tradição de se fazer e manter músicas com

grandes orquestras sinfônicas ou filarmônicas como os Estados do Amazonas e do Pará,

que são referência internacional em desenvolver espetáculos e festivais de óperas.

Existem em Roraima trabalhos pontuais como o Instituto Boa Vista de Música, criado em

2005 pela Prefeitura Municipal de Boa Vista, que “ tem como finalidades sociais o ensino

gratuito de música, a inclusão social, a promoção da cidadania, o desenvolvimento

artístico cultural de crianças e adolescentes” (INSTITUTO BOA VISTA DE MÚSICA)

em orquestras sinfônica, de câmara e de violões e bandas municipais. O modelo de projeto

utilizado pelo Instituto é semelhante ao El Sistema Venezuelano, que busca a

sistematização do ensino musical com a promoção da prática coletiva da música em

orquestras sinfônicas e corais, focando ajudar crianças e jovens a atingirem o seu

potencial e melhorar a vida da sociedade ao seu redor.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

73

A educação musical no Brasil é um componente obrigatório no ensino básico, mas

o ensino de música não deve ser somente tecnicista e de uma alfabetização musical

europeia, é necessário formar professores em música que adquiram sensibilidade e

experiência estética de conceitos musicais europeus e também da comunidade que os

cercam.

Os professores de música de Roraima devem além de se envolver com a música

erudita, compreender o sentido e a importância de fazer a música indígena e a música

popular de influência dos imigrantes que formam o Estado, “pois esta música tem uma

forte relação com a sociedade e sua história, com os indivíduos e seu papel na

comunidade” (FIORETTI & DUARTE, 2000, p. 21).

Com o incentivo e aumento de investigações que permitam dialogar com diversas

práticas musicais e um conteúdo amplo do se fazer música seria possível auxiliar o

desenvolvimento humano em Roraima e se tem através da Licenciatura em Música da

UFRR este espaço de investigação, pois, é através da educação que uma comunidade se

desenvolve, desta forma é com professores capacitados que é fomentado o

desenvolvimento de uma comunidade.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALMEIDA, B., & PUCCI, M. (2014). Há espaço para as músicas indígenas em um Brasil

multicultural? A inserção do repertório indígena na educação musical. Anais do VIII

Encontro Regional Norte da ABEM, Rio Branco, Brasil.

BENETTI, G. F. (2016). Música e história em Roraima: subsídios para uma educação

musical contextualizada. In I. S. SILVA (Org.), Arte na Amazônia: conversas sobre o

ensino na Região Norte (pp. 151-163). Boa Vista: Editora da UFRR.

CARVALHO, V. M. (s.d). História e tradição da música militar. Disponível em:

http://www.ecsbdefesa.com.br/fts/MUSICAMILITAR.pdf.

CASTAGNA, P. (2010). Música na América Portuguesa. In J. G. V. MORAES, & E. T

SALIBA (Org.), História e Música no Brasil (pp. 35-76). São Paulo: Alameda.

DUARTE, F. L. S. (2015). Da pesquisa de música sacra à salvaguarda do patrimônio

arquivístico-musical em três capitais da região norte do Brasil: preservação, pesquisa e

difusão da memória musical de tradição escrita. In J. T. S. M. SILVA, et al (Org.), Anais

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

74

do IV Simpósio Internacional de Música na Amazônia, (pp. 321-366), Boa Vista 2015,

Editora da UFRR.

DUARTE, R. (2010). A construção da musicalidade do professor de educação infantil:

um estudo em Roraima. Tese de doutoramento em Educação. Universidade Federal do

Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brasil.

FIORETTI, E., & DUARTE, R. (2005). Reflexões sobre a importância da arte na

formação do professor - uma nova perspectiva para a Universidade, a experiência da

UFRR. Textos e Debates, 01, 211-228.

KEBACH, P. F. C., & DUARTE, R. (2011). Educação musical e educação especial:

processo de inclusão no sistema regular de ensino. Textos e Debates, 15, 98-11

KEBACH, P. F. C., DUARTE, R., PECKER, P., & SANTANNA, D.

(2013). Expressão Musical na Educação Infantil. Porto Alegre: Mediação.

OLIVEIRA, R. G. (1991). Roraima, Amazônia de Makunaima e o ensino de Música.

Dissertação de mestrado curso de música, Centro de Pós-graduação, Pesquisa e Extensão,

Conservatório Brasileiro de Música, Rio de Janeiro, Brasil.

OLIVEIRA, R., DUARTE, R. (2007). Música e Educação em Roraima. In A. Oliveira &

R. Cajazeira (Org.), Educação Musical no Brasil (pp. 359-364). Salvador: P & A.

SILVA, I. S., & SANTOS, C. M. (2016). Movimento Roraimeira: contribuições

interculturais e antropofágicas ao ensino de artes no estado de Roraima. Revista

Educação, Santa Maria, 41(2), 459-470.

SILVA, J. T. S. M. (2016). Licenciatura em música da UFRR: uma análise dos dois

primeiros anos (2013-2015). In I. S. SILVA (Org.), Arte na Amazônia: conversas sobre

o ensino na Região Norte (pp.165-183). Boa Vista: Editora da UFRR.

WEBGRAFIA

FIORETTI, E. C., & DUARTE, R. (2000). A música como elemento intercultural: uma

abordagem para uma educação multicultural. Boletim Museu Integrado de

Roraima. Museu Integrado de Roraima, 6, 1-44. Disponível em:

http://uerr.edu.br/bolmirr/

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

75

FOLHA DE BOA VISTA (2015). Estado tem 55 mil indígenas de dez etnias. Disponível

em: http://www.folhabv.com.br/noticia/Estado-tem-55-mil-indigenas-de-dez-etnias/6381

INSTITUTO BOA VISTA DE MÚSICA. Quem somos. Disponível em:

http://www.ibvmrr.com

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. (2016). Atlas Nacional

Digital do Brasil. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/apps/atlas_nacional/

OLIVEIRA, A. T., & BENETTI, G. F. (2015). A música dos nativos na visão de Koch-

Grünberg: uma análise iconográfica da obra Vom Roroima zum Orinoco. Anais do III

Congresso Brasileiro de Iconografia Musical. Salvador: Ed. UFBA. Disponível em:

http://www.portaleventos.mus.ufba.br/index.php/CBIM_RIdIMBR/3cbim2015/paper/view/72

OLIVEIRA, R. G. (2011). O Holandeses na Amazônia Caribenha Colonial: dos

Caminhos Históricos aos processos das Relações Internacionais. Anais do XXVI Simpósio

Nacional de História – ANPUH. São Paulo. Disponível em:

http://www.snh2011.anpuh.org/resources/anais/14/1300885955_ARQUIVO

_SimposioTematicoANPUHConferencia.pdf

UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA. Pibid. Disponível em:

http://ufrr.br/musica/index.php?option=com_content&view=article&id=65&%20Itemid

=276

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Musicais

77

STUDOS TEATRAIS

Inteligências Mmltiplas na Expressão Dramática Rita Miranda; Elsa Morgado; & Levi Leonido

| 78-93

prática do Sociodrama em contexto escolar Dulce Silva; Levi Leonido; & Elsa Morgado

| 94-121

eatro posmigrante en alemán: derroteros de la institucionalización Soledad Pereyra

|122-154

lenguaje escénico que conforma el repertorio creado por August Bournonville Ioshinobu Navarro

|155-198

As AT El

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

78

AS INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS NA EXPRESSÃO DRAMÁTICA

The multiple intelligences in dramatic expression

MIRANDA, Rita26; MORGADO27, Elsa; & Levi Leonido28

Resumo

Este artigo pretende refletir sobre a cúmplice relação entre a temática das Inteligências Múltiplas e o Universo das Expressões Artísticas. Tem como particular objetivo explorar a influência do ensino da área da Expressão Dramática, praticado nas escolas, enquanto disciplina curricular do 3º ciclo do Ensino Básico, na formação integral dos alunos e realçar, recorrendo à fundamentação teórico-prática, o extraordinário papel coadjuvante no desenvolvimento das Inteligências Múltiplas. Tendo sido consignado à educação artística um direito humano universal, pela Convenção da Unicef sobre os Direitos da Criança - adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 1989 e ratificada por Portugal em 1990 - torna-se pertinente refletir e averiguar a forma como se concretiza este projeto em particular, distinguir se a prática se coaduna com a política a nível do reconhecimento do valor da educação artística na escola.

Abstract

This article aims to reflect on the complicit relationship between the theme of Multiple Intelligences and the universe of Artistic Expressions. Specifically, it aims to: firstly, explore the influence Dramatic Expression education as practiced in schools, as a curricular discipline of the 3rd level of Basic Education, in the integral formation of students; secondly, to highlight, using the theoretical and practical reasons, the extraordinary supporting role in developing Multiple Intelligences. Having art education been consigned a universal human right, by the Convention of UNICEF on children’s rights – Declaration adopted by the United Nations General Assembly in 1989 and ratified by Portugal in 1990 -, it is pertinent to reflect and both to find out how to implement this particular project, and to distinguish whether the practice is consistent with the policy at the level of recognition of the value of Arts Education in School.

Palavras-chave: Expressões Artísticas; Expressão Dramática; Inteligências Múltiplas.

Keywords: Artistic Expressions; Educational Drama; Multiple Intelligences.

Data de submissão: Janeiro de 2016 | Data de publicação: Março de 2016.

26 ANA RITA ARTIAGA PEREIRA DINIS MIRANDA – Mestrado em Ensino de Teatro UTAD. Colégio Marista de Carcavelos. PORTUGAL. E-mail: [email protected]. 27 ELSA MARIA GABRIEL MORGADO – Doutora em Ciências da Educação; Licenciada e Mestre em Biologia e Geologia (ensino de); Pós Graduada em Educação Especial – Domínio Cognitivo e Motor. Membro Integrado do CEFH-UCP. Investigadora em Pós-doutoramento na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. PORTUGAL. E-mail: [email protected]. 28 LEVI LEONIDO - Centro de Investigação em Ciências e Tecnologias das Artes – Universidade Católica Portuguesa. UTAD. PORTUGAL. E-mail: [email protected].

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

79

INTRODUÇÃO

A Teoria das Inteligências Múltiplas (TIM) foi introduzida por Howard Gardner,

na sua obra em 1983, Frames of Mind: The Theory of Multiple Intelligences, na qual, pela

primeira vez, pluralizou o conceito de “inteligência”, rompendo, com a tradicional visão

de inteligência como sendo um potencial que cada ser humano possui em maior ou menor

extensão, que pode ser quantificado e que pode ser medido por instrumentos padronizados

como os testes psicométricos de QI, passando a definir o termo “inteligência” como “a

capacidade de resolver problemas com que o indivíduo se defronta na vida real; a

capacidade de gerar novos problemas a resolver; e a capacidade de fazer algo ou de

oferecer um serviço que é valorizado no contexto da cultura de cada um” (SILVER,

STRONG, & PERINI, 2010, p. 11)

Gardner esclarece como levou a cabo a investigação para fundamentar a sua

teoria, no Simpósio sobre a Teoria das Inteligências Múltiplas em 1987:

“Ao desenvolver esta teoria não parti de uma análise dos testes existentes… Não estava interessado em prever o sucesso ou insucesso na escola… Em vez disso, a minha intuição inicial de que existem diferentes tipos de mentes levou-me a fazer um levantamento o mais exaustivo que me foi possível do leque de estados cognitivos finais, para depois, procurar um modelo que pudesse ajudar-nos a evoluir no sentido de explicar como é que estas diferentes competências se desenvolvem” (SILVER, STRONG, & PERINI, 2010, p. 10).

Posteriormente, no artigo The Science of Multiple Intelligences Theory: a

response to Lynn Waterhouse (realizado em parceria com Seana Moran) em 2006,

Gardner elucida que começou por basear-se em resultados empíricos de centenas de

estudos realizados com base em variadíssimas áreas do saber, incluindo a psicometria, a

fisionomia e a neurologia, a psicologia experimental, a psicologia cognitiva, a psicologia

do desenvolvimento e a psicologia diferencial, a antropologia e os estudos culturais e

biográficos. Gardner elaborou esta teoria por sentir necessidade de esclarecer que a

inteligência não é unitária, mas múltipla, pois pode manifestar-se de várias formas. Em

Refflections on Multiple Intelligence: Myths and Messages (1995, p. 185) refere que a

Inteligência se trata “de um potencial biológico e psicológico que aumenta ou diminui

consoante a experiência, ou o uso que se faz dela e consoante os fatores experienciais,

culturais e motivacionais que afetam um indivíduo”.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

80

Na mesma obra, o autor afirma ainda que não estava preparado para uma reação

tão positiva por parte de educadores e professores quando apresentou a TIM, que, não

tendo sido imposta pelo autor, ganhou vida por si só e evoluiu muito rapidamente,

adaptando-se às diferentes interpretações e uso que dela fizeram nas várias

escolas/culturas.

Esta teoria considera que dispomos de, pelo menos, oito inteligências diferentes.

A maioria dos indivíduos possui a totalidade deste espectro de inteligências, cada uma

qualificável a um nível particular, resultante do legado das características biológicas em

interação com o contexto social e cultural. Portanto, cada indivíduo será consequente

combinação de diferentes inteligências e será essa congregação que nos torna únicos.

As estratégias do ensino de Expressão Dramática, dirigido a alunos do 3º ciclo é

diferente daquela que é vocacionada para os alunos do 1º ciclo do Ensino Básico ou

orientada para indivíduos na idade adulta, embora os exercícios praticados sejam, por

vezes os mesmos, obviamente adaptados aos diferentes grupos.

Deparamo-mos frequentemente com os seguintes comentários dos alunos: “- mas

o jogo da cabra cega ou do macaquinho do chinês é teatro?; Que giro, podemos brincar!”,

ao que se responde: “- assim é, de facto; com a prática da Expressão Dramática aprende-

se a brincar.”

Alguns jogos são, por definição, associados ao recreio, tanto para crianças como

para adultos, pois consistem em divertimentos que os levam a atingir um grau de auto e

hetero-conhecimento (TEIXEIRA, 2012), que permitem, com mais facilidade, aquecer e

descontrair o corpo, soltar preconceitos e unir os atores participantes. Estes jogos

coletivos, quando “brincados” servem para ensinar e avaliar (UNESCO, 2006), pois

condicionam a percepção de aprendizagem do aluno (GARDNER, 2001). Os exercícios

deixam de ser a simples “dança das cadeiras” para se tornarem movimentos que exigem

concentração; de desinibição quando lhes propomos que dancem ou que imitem um

animal; ou deixam de ser encarados como a “cabra cega” para passarem a ser um exercício

de atenção, concentração, confiança e reconhecimento do grupo.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

81

1. AS EXPRESSÕES ARTÍSTICAS E AS INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS

A prática da aprendizagem através das Expressões Artísticas provoca a interação

das várias Inteligências, promovendo o desenvolvimento integral. Apesar de ainda não

ser possível compreender e esclarecer na totalidade o desenvolvimento artístico, existem

pesquisas realizadas na área que comprovam a contribuição da educação artística no

domínio das ciências humanas e sociais.

O Project Zero, liderado por Howard Gardner e David Perkins, desde a década

de 70 do século XX até ao início do século XXI, prestou um importante contributo para

consolidar esta opinião. Apesar de concentrar os seus estudos sobretudo no campo da

psicologia persiste em mostrar que as artes, da mesma forma que as ciências, são formas

de aquisição de conhecimento, vistas como uma atividade cognitiva muito importante,

sendo a sua principal finalidade compreender o processo de aprendizagem e o pensamento

criativo naquelas áreas, ou seja, discutir e analisar do ponto de vista de disciplinas como

a Psicologia, a Pedagogia, a Estética e a Filosofia, os principais conceitos e processos

cognitivos utilizados na Música, nas Artes Plásticas, na Literatura e no Teatro (GARCIA,

2005). Ambas, ciência e artes, procuram compreender e aprimorar a existência humana e

dar respostas aos questionamentos que colocamos sobre a vida, embora utilizem

instrumentos ou sistemas de símbolos diferentes.

Gardner (2000) afirma que existem indivíduos criativos em diferentes domínios,

cujas faculdades podem convergir para a produção artística ou para outro tipo de

atividades que podem ser favorecidas, ou não, pela ação de fatores individuais (genética)

e/ou fatores culturais (contexto): a inteligência espacial é suscetível de ser usada por um

engenheiro, um cirurgião ou por um escultor; a inteligência musical, inclusive, nem

sempre convive com o plano puramente estético, como é o caso dos toques de corneta

usados nos quartéis.

Noutro contexto, Gardner (1983,1994) refere que em determinadas culturas o

desenvolvimento de uma inteligência é estimulado e orientado para determinado uso pelo

meio ambiente ou grupo, quando aquela inteligência é imprescindível à sobrevivência

coletiva; esta particularidade é exemplificada pelo cultivo da inteligência espacial

imprescindível à orientação marítima, tomando somente as estrelas como pontos de

referência.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

82

Partindo destas descobertas, a pesquisa realizada por Silva (2013), apoiada em

Gardner (2000), teceu considerações básicas a respeito do ensino artístico, que elencamos

em seguida:

- Os professores que exercem atividade na área do ensino artístico devem refletir,

atuar e praticar regularmente o conhecimento musical, visual, dramático e físico

obstando a que a especificidade da linguagem artística que lhes é próxima se

reduza à transmissão oral.

- Cada Expressão Artística deve ser ponderada de maneira a dimensionar a

compreensão do aluno naquele registo específico, não privilegiando os sistemas

linguísticos e lógicos: a importância deste procedimento reside em perscrutar

outros potenciais do aluno, através de perguntas e respostas, lápis e papel,

respeitando-se as inteligências envolvidas na compreensão e expressão daquela

linguagem artística.

- As artes devem acompanhar o processo educativo. As crianças têm mais

facilidade em perceber os elementos visuais de um artefacto artístico e aprendem

com maior eficiência quando executam e manipulam diretamente os materiais

correspondentes à produção do objeto proposto.

- A aprendizagem deve ser significativa, persistente e duradoura. O trabalho por

projetos atende a estes requisitos. Reunidos com um objetivo comum, cada

elemento do grupo demonstra uma habilidade diferente que deve ser valorizada,

o que amplia e melhora a capacidade individual de cada aluno.

- Atividades de reflexão, leitura visual, histórica e crítica, designadas por Gardner

como “atividades periartísticas” (GARDNER, 2000, p. 123), devem ser praticadas

em torno do objeto artístico produzido pela criança.

- Importa que os alunos sejam instigados a ter consciência da importância de saber

apreciar e valorizar obras artísticas e aos professores compete estar disponíveis

para aceitar a apreciação de cada aluno sobre as obras artísticas em questão não

se valendo do seu estatuto para sobrepor gratuitamente a sua opinião face à dos

discípulos.

- As linguagens ou modalidades artísticas são inúmeras e cada uma se delas se

desdobra em várias opções, particularmente no domínio das artes visuais.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

83

Segundo a mesma autora, é concebido o Projeto Arts Propel (Projeto para as

Artes) baseado numa metodologia que propõe uma nova abordagem ao currículo e

avaliação nas artes, elaborada em colaboração com professores e pesquisadores do

Harvard Project Zero e do Educational Testing Service, órgão do governo americano

encarregue de realizar avaliações anuais nas escolas americanas. O Arts Propel tem como

objetivos melhorar a educação artística no ensino médio e avaliar os alunos de forma mais

justa. Aplicado em escolas de alguns estados americanos, evoluiu para uma abordagem

curricular que pode ser utilizada nas Artes e em qualquer outra disciplina (GARCIA,

2005).

2. A EXPRESSÃO DRAMÁTICA E AS INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS

A Inteligência Corporal-Cinestética é indubitavelmente cultivada na medida em

que o corpo é a principal ferramenta de trabalho da Expressão Dramática: através dele

brincamos, exploramos o espaço, apuramos os sentidos (olfato, tato, paladar, audição e

visão), criamos personagens, manipulamos objetos, expressamos sentimentos e

comunicamos ideias (ARMSTRONG, 2001, 2006).

A Inteligência Intrapessoal merece destaque já que a prática de exercícios

adequados conduz à interiorização e à reflexão propiciando o autoconhecimento

emocional e a faculdade de gerir sentimentos comunicados, de acordo com a melhor ou

menor capacidade de expressão de que se esta habilitado, mas também, tanto melhor

quantas mais situações forem vivenciadas (ARMSTRONG, 2001, 2006).

A Inteligência Interpessoal é determinante porque são numerosas as propostas

dramáticas que dependem das relações de confiança que se estabelecem entre os

elementos do grupo, pois a criança aprende em contato com os outros, sendo a equipa em

que está inserida a grande responsável pelas conquistas que realiza, ao viabilizar a

compreensão das emoções alheias, a possibilidade de trabalhar com outras pessoas e sentir

empatia em relação aos outros, sempre concretizável através de demonstrações visuais

(GARDNER, 1994).

A Inteligência Visual-Espacial convive diariamente com a Expressão Dramática

uma vez que os alunos devem ganhar gradual competência para conhecerem o espaço

visualizando-o e memorizando-o de forma a poderem deslocar-se em função dos quadros

dramáticas dimensionados em função da área, bem como aos cenários e artefactos

concebidos para o efeito.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

84

O cultivo da Inteligência Linguístico-Verbal disponibiliza uma das mais

importantes aptidões no âmbito desta disciplina que tem por suporte a expressão através

de código próprio, tanto oral como físico e corporal; porque recorre à leitura e escrita para

inspiração e para execução dos quadros dramáticos, esta linguagem deve ser

sistematicamente aprimorada (ARMSTRONG, 2001, 2006).

Sob outro ângulo a competência da Inteligência Lógico Matemática prende-se

com a exequibilidade das aulas na medida em que dependem de jogos individuais e em

equipa que estimulam o raciocínio e o sentido crítico, de atividades subordinadas à

concentração e utilização da memória, bem como do uso de objetos e adereços. Na

circunstância em que pode ser harmonizada com espaços exteriores e ao reproduzir

vocalmente sons da natureza ou imitar elementos da natureza, é passível de alicerçar

interessantes meios no recurso à Inteligência Naturalista (ARMSTRONG, 2001, 2006).

A singular heterogeneidade da disciplina em causa dá aso a que a Inteligência Musical se

torne uma preciosa competência na esfera do processo criativo. Tanto pode funcionar

como elemento inspirador para um quadro dramático, como para a génese de uma obra,

ou personagem, expressar sentimentos ou mensagens e, tão só, como suporte no plano

ambiental.

Na realidade a música é uma forma de expressão detentora de um tal potencial que

possibilita, a partir da sua essência, a criação de um trabalho dramático (ARMSTRONG,

2001, 2006). Cruzando todos os elementos presentes no Quadro 1, podemos constatar que

as Expressões Artísticas trabalham as várias Inteligências Múltiplas e que os resultados

refletem a partilha de características comuns, no caso concreto, a Expressão Dramática:

Expressão Dramática

Linguístico Verbal Linguagem artística própria- dramática - na interpretação e visualização

Interpessoal Observação do mundo exterior para se inspirar e partilhar ideias. Atividades em grupo

Intrapessoal A criação depende de um processo de interiorização e de reflexão e reflete a personalidade do artista

Lógico-Matemática Estímulo do raciocínio em atividades subordinadas à concentração e utilização da memória, bem como do uso de objetos e adereços

Musical A música é uma ferramenta que pode ser usada no processo de criação e de apresentação

Visual-Espacial Demonstrações visuais, memória visual, consciência da correta posição corpo no espaço

Cinestética Corporal Expressamo-nos através do corpo e é a principal ferramenta de trabalho

Naturalista Imitação, inspiração, observação do meio ambiente na criação artística

Quadro 1 - As Inteligências Múltiplas na Expressão Dramática

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

85

3. Uma abordagem das inteligências múltiplas a partir da EXDRA

A Expressão Dramática é uma disciplina relativamente recente. Segundo Sousa

(2003), Baden Powell refere-a pela primeira vez quando se apercebeu do grande valor

educativo propiciado pelas atividades dramáticas, praticadas nos encontros dos jovens

que incorporavam o movimento escutista, fundado com objetivos predominantemente

vocacionados para a formação humanística baseada na educação moral, cívica e social.

Atividades lúdicas, como jogos de imitação, mímicas, palhaçadas e a criação de quadros

dramáticos, conferiam vantagens ao nível da expressividade, concentração,

desenvolvimento vocal e físico, imaginação, humor, alegria, disciplina, método,

espontaneidade, etc., contribuindo fortemente para a sólida evolução das crianças e

jovens. Igualmente ligado ao movimento de escutismo em França, Leon Chanceler

também reconheceu o valor pedagógico das atividades dramáticas, atribuindo-lhe a

designação de jogo dramático. Sousa (2003, p. 26) refere a definição da expressão jogos

dramáticos: “jogos que proporcionam à criança o meio de exteriorizar, pelo movimento e

pela voz, os seus sentimentos profundos e as suas observações pessoais”, aumentando os

seus desejos e as suas possibilidades de expressão. Leon Chanceler sistematiza e

programa o jogo dramático, criando assim um método educativo que também pode servir

todas as formas sociais de representação, desde liturgias, cerimónias e protocolos, e que

deverá ser orientada por pessoas com experiência na área da expressão dramática e com

formação psicopedagógica, ou seja “deverá ser efetuado por educadores, com alguma

formação no campo do teatro” (SOUSA, 2003. pp. 24-26).

A Expressão Dramática, enquanto técnica de aprendizagem escolar, traduz-se

numa

“atividade lúdica, que é própria e natural na criança, surgindo espontaneamente e através da qual ela pode, livremente, expressar os seus mais íntimos sentimentos, dar ampla vazão à sua imaginação criativa, desenvolver o seu raciocínio prático, desempenhar no faz-de-conta os mais diversos papéis sociais e usar o seu corpo nas mais diferentes qualidades de movimento. Ou seja, uma atividade educativa que, ao mesmo tempo, proporciona o mais amplo estímulo no desenvolvimento de valores afetivos, cognitivos, sociais e motores da personalidade da criança. Concebendo-se uma educação que esteja voltada, não para o ensino de matérias escolares, mas para o desenvolvimento equilibrado da personalidade da pessoa, o jogo dramático será um dos melhores, senão o melhor, método educacional” (SOUSA, 2003, pp. 31-32).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

86

A área da Expressão Dramática merece um lugar de relevo no currículo da

educação Infanto-Juvenil, devido às potencialidades que lhe são inerentes no domínio da

na educação global, realçando-se a sua relevância ao nível desenvolvimento cognitivo e

enquanto excelente veículo de sociabilização.

Neste sentido Read (1943, apud Sousa, 2003, p. 20) refere que “A Expressão

Dramática é fundamental em todos os estádios da educação. Considerando - o mesmo

como uma das melhores atividades que consegue compreender e coordenar todas as outras

formas de Educação pela Arte”. Segundo Almeida (2012), a Expressão Dramática inicia-

se na criança, através de gestos simples que, de forma gradual, se vão convertendo em

expressão corporal, passando pela imitação, mímica e jogo dramático, finalizando na

dramatização propriamente dita. Importa referir que esta sequência, que se preludia do

patamar mais simples para o mais complexo, não anula o primeiro pois este é fulcral para

o enriquecimento do patamar seguinte.

A criança tem necessidade de começar por conhecer-se a si própria e identificar-

se para, posteriormente, conhecer e interagir com os outros, no espaço e objetos que lhe

são exteriores. Em seguida, através do contacto corporal, estabelecerá relação com o

mundo e, na tentativa de compreender a realidade que a envolve, enceta a exploração

dessa realidade, observando, sentindo e experimentando tudo o que tem ao seu alcance,

alargando assim os seus “horizontes”, através das diversificadas experiências pessoais

que lhe são apresentadas, a criança compreende a magnificência da expressão,

conseguindo, por seu intermédio, exprimir-se através de vários modos.

Na perspetiva de Ribeiro (2014), o anseio de crescer e de se integrar no mundo

dos adultos, leva a criança a revelar um crescente interesse por comunicar e partilhar os

seus saberes e experiências; através do ato de brincar descreve a maneira como encara o

mundo, transmite os seus sentimentos, as suas ideias, os seus conflitos interiores e os seus

desejos mais profundos.

As ações dramatizadas são o espelho das ações da vida real. Tornam-se uma

oportunidade para a criança comunicar e experienciar as suas apetências de

relacionamento com as demais; perde timidez por contraponto com a vontade de sentir-

se admirada o que requer, como referia Inhelder e Piaget (1997), a necessidade de

proporcionar aos mais pequenos os meios para que o real seja assimilado e compreendido,

evitando a mera imitação.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

87

Os jogos dramáticos têm particularidades que os distinguem dos outros jogos: são

uma forma de desenvolvimento da criatividade, de exploração do mundo envolvente e do

relacionamento entre intervenientes nas atividades, gerando ideias individualmente e em

grupo. Nesse sentido, ao trabalhar a imaginação desenvolve-se a personalidade, processo que

é acompanhado pelo enriquecimento da expressão oral e física, o que se manifesta através da

representação com a aquisição de novos termos e o consequente enriquecimento da oralidade

e das estratégias de comunicação.

4. Expressão Dramática e Inteligências Múltiplas: uma relação cúmplice

A Expressão Dramática é uma área artística transversal tributária do desenvolvimento

afetivo, sensorial, motor, estético, social e moral das crianças, jovens ou adultos. Enquanto

disciplina universal, caracterizada pela imensurável multiplicidade de exteriorizações

regulamentadas em função dos objetivos, níveis etários e meios disponíveis. Em igual plano,

constituem um importante instrumento de trabalho, uma vez que visa processos de

experimentação que ampliam o potencial cognitivo, fazendo com que o indivíduo seja capaz

de expressar, com autonomia, uma visão crítica do mundo. No que às IM diz respeito, é-nos

dado a constatar que existem várias técnicas e exercícios que, praticados no domínio da

Expressão Dramática, potenciam o desenvolvimento das diferentes inteligências nos alunos.

Aqueles desempenhos apresentam-se sob diferentes perspetivas, enquadramentos, meios e

estratégias, podendo oferecer resultados diferenciados, compatíveis com os níveis etários em

que são aplicados e dependentes das características individuais e coletivas do grupo. Com o

intento de demonstrar a veracidade da tese apresentada propomos o seguinte enunciado numa

abordagem exemplificadora das potencialidades que, embora inscritas em exercícios de

expressão dramática, influenciam positivamente o desenvolvimento das IM.

4.1. Inteligência Linguístico-Verbal

Ler e escrever textos dramáticos, guiões ou ensaios, desenvolve a leitura e a escrita

criativa, otimizando as capacidades inerentes à expressão escrita; os exercícios de trabalho

vocal e respiração, tais como dicção, projeção de voz, aprendizagem de respiração e técnicas

para decorar textos, melhoram a expressão oral, a capacidade de ouvir e a concentração; a

própria interpretação oral de uma personagem ou de um texto dramático aprimoram, não só

a oralidade, como também a expressão corporal e a memória (CAMPBELL, CAMPBELL, &

DICKINSON, 2000; SILVER, STRONG & PERINI, 2010).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

88

4.2. Inteligência Interpessoal

Jogos de confiança em grupo, jogos de reconhecimento do grupo, trabalho

cooperativo, partilha de emoções e ideias com o grupo, exercícios que desenvolvem a

capacidade de ouvir e ver com atenção, exercícios de observação e imitação ajudam o

indivíduo na relação consigo próprio, com o seu corpo, com o outro e com o mundo,

respeitando as suas características individuais, a liberdade e as aptidões criativas,

contribuindo para o êxito das relações sociais (CAMPBELL, CAMPBELL, &

DICKINSON, 2000; SILVER, STRONG & PERINI, 2010).

4.3. Inteligência Intrapessoal

Exercícios de relaxamento e introspeção, cujas temáticas são centradas na

resistência e em energia positivas, que trabalhem a metacognição como escrever

autobiografias e diários de bordo ou fazer autoavaliações, trabalhar a gestão do tempo,

produzir portfólios; o processo de construção, caracterização e interiorização de

personagens; a exercitação de relaxamento e de introspeção; exercícios que explorem a

memória afetiva e sensorial, a imaginação e a criatividade, contribuem para a

identificação e gestão dos sentimentos individuais, para melhorar a capacidade de entrega

e disponibilidade, saindo da zona de conforto pessoal e aumentar a autoestima e a

sensação de bem-estar consigo mesmo (CAMPBELL, CAMPBELL, & DICKINSON,

2000; SILVER, STRONG & PERINI, 2010).

4.4. Inteligência Lógico-Matemática

Manusear objetos de diferentes formas e dimensões associados à prática dos

exercícios leva os alunos a pensar com racionalidade; jogos com adivinhas, em equipa,

ou de concentração que consistem na contagem de números e na marcação de tempos, a

memorização de um texto ou de uma sequência de movimentos, como uma coreografia,

a necessidade de delinear estratégias para alcançar um produto final (espetáculo, quadro

dramático, atividade) estimulam a tomada de decisões para resolver problemas que surjam

no processo criativo. Este género de exercícios conduzem ao desenvolvimento de

competências como o raciocínio lógico, a autonomia, a memória, a atenção, a

concentração e a capacidade de definir o mais ou menos relevante (CAMPBELL,

CAMPBELL, & DICKINSON, 2000; SILVER, STRONG & PERINI, 2010).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

89

4.5. Inteligência Musical

O ato de cantar e/ou tocar um instrumento musical integrado num espetáculo ou

em sala de aula; brincar às orquestras, criar efeitos sonoros com a voz e o corpo,

interpretar obras musicais, dançando-as, mimando-as e cantando-as; escrever letras para

canções, expressar sentimentos através da música; identificar e imitar sons do ambiente;

fazer jogos de aquecimento com música ou com ritmos; conhecer a designada “música do

mundo” com o objetivo de entender as diferentes culturas, constituem uma gama de

exercícios altamente promotores da aquisição de uma ampla cultura geral, aperfeiçoam a

capacidade de saber ouvir, desenvolvem a coordenação, o ritmo, a espontaneidade, a

fisicalidade, o reconhecimento do corpo, as relações sociais (CAMPBELL, CAMPBELL,

& DICKINSON, 2000; SILVER, STRONG & PERINI, 2010).

4.6. Inteligência Visual-Espacial

Trabalhar com imagens – vídeo e fotografia - criar uma banda desenhada, ou

conceber e produzir um cenário, objetos de cena, adereços e figurinos, delinear material

de divulgação - folhetos informativos e cartazes, exercícios de exploração do espaço

individual e coletivo, físico e imaginário. Estas experiências elencam notáveis exercícios

de exploração simbólica e figurativa da imagem e do objeto teatral através da criação da

personagem ou de quadros dramáticos, contribuindo para o desenvolvimento da noção do

espaço real e imaginário e para a melhoria da competência interdisciplinar com outras

expressões artísticas (Expressão Plástica, Físico-Motora e Musical), mas também com as

demais áreas do saber que são ensinadas nas escolas (CAMPBELL, CAMPBELL, &

DICKINSON, 2000; SILVER, STRONG & PERINI, 2010).

4.7. Inteligência Corporal-Cinestésica

Criar e inventar; dramatizar para expressar ideias; gerar movimento, ou

simplesmente, dançar; manipular objetos para compreender um conceito, exercitar o

corpo com o objetivo de o trabalhar fisicamente, ou para aquecimento corporal no início

de uma atividade dramática com o intuito de preparação física e mental; a exploração

sistemática do corpo no processo de criação e construção da personagem; a elaboração de

objetos cenográficos e de figurinos são algumas das atividades que promovem o

desenvolvimento desta Inteligência (CAMPBELL, CAMPBELL, & DICKINSON, 2000;

SILVER, STRONG & PERINI, 2010).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

90

Neste âmbito, um especial destaque no que respeita ao incremento da capacidade

de expressar sentimentos e sensações através da expressão corporal, da consolidação e

maior compreensão do uso de técnicas físico motoras associadas à vantagem de

aperfeiçoar a postura, a concentração, a relação consigo mesmo e com os outros.

4.8. Inteligência Naturalista

Atividades que levem as crianças/alunos a observar e descobrir o mundo que os

rodeia e a projetar experiências através da exploração dos sentidos (visão, audição, olfato,

tato e paladar); a imitar sons e comportamentos de elementos e fenómenos da natureza,

animais e plantas; usar objetos reciclados na construção de um adereço, cenário ou

figurino; retratar imagens da natureza e usar os respetivos sons num quadro para a

composição da sonoplastia, contribuem para o aumento de interesse pelo mundo que os

rodeia, tanto a nível ambiental como social, económico e cultural, tornando-se, face às

exigências da atualidade, num essencial contributo ao apuramento dos sentidos, promove

a valorização do meio ambiente e desperta o interesse para as dinâmicas de salvaguarda

que, crescentemente, devem estar presentes na consciência cívica (CAMPBELL,

CAMPBELL, & DICKINSON, 2000; SILVER, STRONG & PERINI, 2010).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Tradicionalmente concebia-se a inteligência como uma entidade única, uniforme

e quantificável, que alguns indivíduos tinham a vantagem de usufruir relativamente a

outros, que, por sua vez, eram considerados menos capacitados.

Em termos pedagógicos, a TIM estabelece as bases para uma aprendizagem mais

personalizada. Permite-nos diferenciá-la, enriquecendo a nossa metodologia. Podemos

observar que todos os indivíduos aprendem de maneiras diferentes e que a nossa

inteligência oferece múltiplas faculdades para alcançar conhecimentos e produzir atos

criativos. Por este motivo, enriquecer a aprendizagem com atividades que nascem das

diversas inteligências, oferece mais oportunidades a todos os alunos.

Neste âmbito, podemos concluir que os professores devem reconhecer e estimular

as diferentes inteligências humanas e a singular combinação que cada estudante patenteia.

Os programas educativos tradicionais concentram-se nas Inteligências Linguístico-Verbal

e Lógico-Matemática, atribuindo inferior importância a outras vertentes do

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

91

conhecimento. Esta situação leva a que alguns alunos que não se destaquem no domínio

das inteligências académicas tradicionais, nem obtenham o reconhecimento derivado do

designado “sucesso escolar”.

Existem dois tipos de experiências que devemos ter em conta: as experiências

cristalizantes, que são produzidas tendo por suporte a “história de vida” e que detêm a

chave para o desenvolvimento de uma inteligência holística, sendo acompanhadas de

emoções positivas: segurança, confiança e afeto; ou as experiências monótonas que

bloqueiam o desenvolvimento da inteligência global e que são acompanhadas de emoções

negativas: medo, vergonha, culpa e ódio. Estas experiências devem ser evitadas a todo o

custo no processo de ensino-aprendizagem.

A Educação Artística promove a integralidade do ser humano, nas suas

possibilidades individuais e sociais. Através da prática continuada e transversal das

Expressões Artísticas, a Expressão Plástica, a Expressão Musical, a Expressão Físico

Motora e a Expressão Dramática, são fortalecidas competências que abarcam as diferentes

Inteligências Múltiplas, promovendo as aptidões criativas, quando praticadas individual

e coletivamente, a entreajuda, a confiança e cooperação entre os pares, a relação

interpessoal, entendida do ponto de vista psicológico, sensorial e físico, e ainda propicia

uma relação mais sensível com o espaço envolvente e o meio ambiente, facilitando

interações sociais e culturais entre indivíduos provenientes de culturas diversas ou com

necessidades especiais. O valor educativo da Expressão Dramática é hiperdimensionado

no caso da criança, pois

“(...) ajuda-a eficazmente no seu processo de desenvolvimento biopsico-sócio-motor, pondo em jogo a sua expressividade, a sua criatividade e a sua consciência de valores ético-morais e estéticos, ao mesmo tempo que a ajuda na sua relacionação social, dado que as atividades de expressão dramática em grupo implicam a cooperação de todos os membros, unindo as suas ações para conseguirem o fim comum” (SOUSA, 2003, p. 33).

Tomando como ponto de partida a opinião de Sousa (2003), não só a criança, mas

também o adulto beneficia da prática regular de atividades relacionadas com a Expressão

Dramática, passível de contribuir para o seu bem-estar, enriquecimento físico e mental, e

equilíbrio de emoções, pois é uma disciplina que oferece excelentes meios para expressar

e projetar livremente fantasias, sentimentos, desejos e tensões interiores, tanto

individualmente como em grupo. Este conceito é corroborado por Leenhardt (1997, p.

27):

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

92

“São os meios de expressão - expressão oral e corporal, tão descuidada e, contudo, tão indispensável à vida adulta!-, a sua aquisição e o seu desenvolvimento, que constituem o principal benefício da prática do jogo dramático”.

Por fim, a componente interdisciplinar da Expressão Dramática, no que diz

respeito à exploração de temáticas e conteúdos, a sua versatilidade e transversalidade a

todas as idades, grupos sociais e culturais, permitiram-me perceber quão facilmente se

torna cúmplice no desenvolvimento das várias Inteligências Múltiplas e, ao mesmo

tempo, um eficiente meio para as percecionar e consolidar.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALMEIDA, P. (2012). Aprender com a Expressão Dramática. Tese de Mestrado

apresentada à Universidade dos Açores, Ponta Delgada.

ARMSTRONG, T (2001). Inteligências múltiplas na sala de aula. Porto Alegre: Art Med.

ARMSTRONG, T (2006). Inteligências Múltiplas. In F. Sheryl, A Aprendizagem e o

Cérebro. Lisboa: Horizontes Pedagógicos. Instituto Piaget.

CAMPBELL, L., CAMPBELL. B., & DICKINSON, D. (2000). Ensino e Aprendizagem

por meio das Inteligências múltiplas. Porto Alegre: Artes Médicas Sul.

PERINI, M., SILVER, H., & SRONG R. (2010). Inteligências múltiplas e estilos de

aprendizagem – para que todos possam aprender. Porto: Porto Editora.

GARCIA, C. F. (2005). Evaluación y desarrollo de la competência cognitiva - Un estudio

desde el modelo de las Inteligencias Múltiples. Madrid: Ministério de Educación y

Ciencia: Centro de Investigación y Documentación Educativa.

GARDNER, H. (1983). Frames of mind: the theory of multiple intelligences. New York:

Basic Books.

GARDNER, H. (1994). Estruturas da mente: Teoria das Inteligências Múltiplas. Porto

Alegre: Art Med.

GARDNER, H. (1995). Reflections on multiple intelligences: Myths and messages. Phi

Delta Kappan, 77, 200 – 209.

GARDNER, H. (1995). Inteligências múltiplas: a teoria na prática. Porto Alegre: Art

Med.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

93

GARDNER, H. (2001). O saber em jogo: a psicopedagogia propiciando autorias de

pensamento. Porto Alegre: Art Med.

GARDNER, H., & MORAN S. (2006). The science of multiple intelligences theory: a

Response to Lynn Waterhouse. Educational Psychologist, 41, 227-232.

INHELDER, B. & PIAGET, J. (1997). Imagem Mental na Criança. Porto: Livraria

Civilização Editora.

LEENHARDT, P. (1997). A criança e a Expressão Dramática. Lisboa, Editorial

Estampa, Lda.

MORGADO, E. (2010). As Inteligências Múltiplas no Contexto Educacional. Pós-

Graduação em Ensino Especial- Domínio Cognitivo Motor, Instituto Superior de Ciências

da Informação e da Administração, Aveiro.

PERINI, M., SILVER, H., & SRONG R. (2010). Inteligências múltiplas e estilos de

aprendizagem – para que todos possam aprender. Porto: Porto Editora.

Project Zero (s/d). Who we are. Harvard Graduate School of Education. Disponível em

http://www.pz.harvard.edu/search/resources?page=1&f[0]=sm_field_resource_type%3

ABook

RIBEIRO, J. (2014). O Jogo enquanto Instrumento de Ensino – Aprendizagem no

domínio da Expressão Dramática. Tese de Mestrado, Universidade de Trás os Montes e

Alto Douro, Vila Real.

SILVA, A. (2013). As inteligências múltiplas e mudanças no desenho de adolescentes da

Escola Estadual de Paulista. Tese de Pós-Graduação, Universidade Federal da Paraíba e

à Universidade Federal de Pernambuco, João Pessoa.

SOUSA, A. (2003). Educação pela arte e artes na educação, (2º vol.) – Drama e Dança.

Lisboa: Horizontes Pedagógicos.

TEIXEIRA, C. (2012). As expressões artísticas no 1º e 2º ciclos do Ensino Básico – Uma

Abordagem Interdisciplinar. Tese de Mestrado, Universidade de Trás os Montes e Alto

Douro, Vila Real.

UNESCO (2006). Roteiro para a educação artística. Desenvolver as capacidades

criativas para o século XXI. Lisboa: Comissão Nacional da Unesco. Disponível em

http://www.unesco.org/new/en/culture/themes/creativity/arts-education

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

94

A PRÁTICA DO SOCIODRAMA EM CONTEXTO ESCOLAR

Practice of sociodrama in school context

SILVA, Dulce29; LEONIDO30, Levi; & MORGADO, Elsa

Resumo

Este trabalho aborda a prática do Sociodrama em contexto escolar31, especificamente nas aulas de Expressão Dramática. A disciplina de expressão dramática é definida como um espaço e uma ferramenta educativa que permite desenvolver o currículo escolar em vários domínios, tais como a educação artística, a expressão corporal, a língua ou literatura e pelas suas características relacionais e interpessoais, é de facto uma ferramenta poderosa para o desenvolvimento de habilidades sociais e pessoais. Constatando que as práticas teatrais traziam não só uma melhoria na assimilação dos conhecimentos, como permitiam a certos alunos ajustar as suas emoções e o seu comportamento e atitudes face a determinadas situações escolares. Pois as atividades dramáticas impõem um trabalho em equipa, em grupo, que pode favorecer qualquer tipo de aula. Estas situações em que o grupo está concentrado numa atividade, num jogo, ajudam a melhorar os aspetos da socialização e da comunicação, sempre que são propostas num espaço e clima seguros para o aluno. É nesse ambiente seguro que o Sociodrama entra, tendo como base a disciplina de Expressão Dramática. Este artigo tem por objetivo ilustrar como a prática do Sociodrama pode ser aproveitada no projeto educativo de uma Escola, e de que forma poderá fazer parte integrante desse mesmo currículo.

Abstract

This report addresses the practice of Sociodrama in schools, specifically in Dramatic Expression classes. Over the last ten years of teaching, I realized that not only did the theater practices lead to an improvement in the assimilation of knowledge, but they allowed certain students to adjust their emotions, their behavior and attitudes in relation to certain school situations. The area of dramatic Expression is defined as a space and an educational tool that allows the development of the school curriculum in various fields such as arts education, body expression, language or literature, and because of its relational and interpersonal characteristics, it is in fact a powerful tool for the development of social and personal skills. The Dramatic Play is an interesting tool for all teachers, not just for the professionals of the areas involved. Dramatic activities require team work, group work, which may favor any kind of class. These situations in which the group is focused on an activity, on a game, help improve socialization and communication aspects, whenever they’re proposed under an environment and a space which are safe for the student. It is in this safe environment that Sociodrama comes in, based on the discipline of Dramatic Expression. This article aims to illustrate how the practice of Sociodrama can be harnessed in the educational project of a school, and how it can be part of that same curriculum in the following years.

Palavras-chave: Sociodrama; Expressão Dramática; Jogo Dramático.

Keywords: Sociodrama; Dramatic Expression; Dramatic Play.

Data de submissão: Janeiro de 2016 | Data de publicação: Junho de 2016.

29 DULCE FERREIRA DA SILVA – Sociedade Portuguesa de Sociodrama. Escola Psicossocial do Porto. Licenciada em Teatro Educação pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Mestre em Ensino de Teatro pela Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. Correio Eletrónico: [email protected]. 30 LEVI LEONIDO - Centro de Investigação em Ciências e Tecnologias das Artes – Universidade Católica Portuguesa. UTAD. PORTUGAL. E-mail: [email protected]. 31 A presente investigação resulta em parte do trabalho submetido e apresentado a provas públicas na UTAD, no Mestrado em Ensino de Teatro intitulado de “O contributo da Expressam Dramática na Prática do Sociodrama” cuja orientação científica esteve a cargo de Levi Leonido e Elsa Morgado.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

95

INTRODUÇÃO

Hoje em dia o Psicodrama e o Sociodrama aplicam-se cada vez mais em

instituições, escolas, empresas, variando muito o tipo de problemáticas a ser trabalhadas.

Fazer parte de uma experiência grupal e da solidariedade entre os membros de um

grupo toma um significado muito particular numa época em que as relações sociais são

muitas vezes empobrecidas e fragmentadas e em que a pessoa está com frequência só,

virada para ela própria.

Desde a sua invenção, por Moreno, no início dos anos de 1900, o Psicodrama

evoluiu muito e expandiu-se para diversos países. Na Europa, França, Espanha, Bélgica

e Alemanha, este recurso é muito utilizado, por sua vez o Brasil difundiu muito esta

prática e, claro, o berço de Moreno, a América, também é um palco prolífero do

Psicodrama.

Portugal não iniciou muito cedo esta cruzada, mas já lá vão quase três décadas

desde que (re) descobrimos esta poderosa técnica.

Cabe a cada um de nós, formadores e profissionais desta área, dar continuidade

ao projeto de Moreno, que pretendia “salvar a humanidade”.

Valorizando o próprio grupo como sujeito do Sociodrama, Moreno focava a

cultura como rede relacional a ser trabalhada, e não o individuo privado. Ele propôs um

método de ação profunda, analisando e provocando a catarse coletiva de problemas

sociais e permitindo uma análise ciosa das origens profundas das tensões e dos conflitos

intergrupais (MORENO, 1975).

Os estudos realizados por Yalom (1995) dizem que num grupo de Sociodrama as

relações do aqui e agora têm o poder de ajudar a reconstruir e redefinir as suas

competências pessoais e relacionais pelos seguintes fatores: infundir a esperança através

da partilha com os outros e não só com o líder do grupo; a universalidade que descobrem

os membros do grupo, através dos graus de intimidade estabelecidos com os outros; o

altruísmo que se desenvolve na relação de ajuda; a recapitulação do grupo familiar inicial,

pois o grupo permite reviver estados emocionais do passado e libertar mecanismos de

defesa; o desenvolvimento de competências sociais, a aprendizagem social é possível

quando há feedback adequado; o comportamento de imitação, aprendemos uns com os

outros através da observação; a aprendizagem interpessoal, os membros tornam-se

conscientes do impacto dos seus comportamentos tanto nos outros como em si próprios;

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

96

a coesão grupal que se constrói reconhecendo as semelhanças e resolvendo conflitos; a

Catarse, pois permite expressar num lugar protegido os pensamentos e as emoções e

finalmente os fatores existenciais que se desenvolvem através da reflexão que nasce da

intimidade profunda e partilha de sentimentos essenciais. Drummond e Souza (2008, p.

16) dizem-nos que:

“O Sociodrama investiga as relações grupais. Tanto o Psicodrama como o Sociodrama têm como proposta trazer leveza e maior alegria à arte de conviver (…) o Sociodrama trabalha as vincularidades das relações, e essas vincularidades são representadas por meio dos papéis sociais desempenhados pelas pessoas no dia-a-dia. Resinificando esses vínculos, possibilitamos a mudança efetiva de valores, e não apenas o treinamento para o desempenho de tais papéis”.

Este artigo tem por objetivo dar a conhecer o mentor e criador do Psicodrama,

Jacob Levy Moreno, assim como perceber a grande afinidade entre Psicodrama e

Sociodrama e as suas diferentes aplicações, nomeadamente nas aulas de Expressões e

que contributos esta disciplina trouxe ao universo de aplicação deste método; e uma

breve abordagem às técnicas mais comummente utilizadas na prática do Sociodrama.

1. PAI DO PSICODRAMA: Jacob Levy Moreno

1.1. Psicodrama versus Sociodrama

“O homem deve tomar o seu próprio destino e o do universo em suas mãos, no âmbito da criatividade, como um criador” (MORENO, 2013).

Jacob Levy Moreno foi um homem com uma visão ampla. Criou métodos de

psicoterapia e de investigação sociológica. Atualmente é conhecido principalmente como

o criador do Psicodrama, uma forma de terapia baseada na representação de papéis. Ou

seja: “Le Psychodrame est une forme de psychothérapie qui par sa dramatisation, son

utilisation du jeu, ses références explicites au corps et à la mise en mouvement permet

l’élucidation et le traitement de certains processus psychiques difficilement accessibles

autrement” (MAGOS, 2011, p. 3).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

97

Inicialmente Moreno conquistou notoriedade pelo seu trabalho inovador com

grupos. Desinteressado tanto pelo coletivo como pelo individual, tomou o caminho do

meio, focalizando o pequeno grupo, que analisou e tratou segundo uma sofisticada e

original teoria dos processos grupais denominada Sociometria, isto é:

“método científico cuja finalidade é medir as relações interpessoais de um grupo. Envolve o estudo das propriedades psicológicas, através do uso de métodos experimentais e a representação dos resultados por meio de fórmulas matemáticas e/ou gráficos. Através disso, podem-se deduzir regras e leis das relações interpessoais numa dada situação” (MARINEAU, 1999, p. 169).

Assim, ultrapassou a linha que dividia a Sociologia e a Psicologia, tornando-se

um pioneiro no desenvolvimento de abordagens grupais para os problemas de saúde

mental e organização social.

Explorando a biografia apresentada por Schützenberger (2003, pp. 21-27)

percebemos que o criador do Psicodrama nasceu em 1889 em circunstâncias incertas

talvez entre Istambul e Bucareste. Era de origem judaica. Aos 5 anos a família mudou-se

da Roménia para Viena. Nos jardins de Viena criava jogos de improvisação com as

crianças, potenciando a sua espontaneidade. Em 1914, participou em parceria com um

médico e um jornalista, num trabalho com prostitutas Vienenses através do qual,

utilizando técnicas grupais, consciencializou-as da sua condição, o que as conduziu a que

se organizassem num «sindicato». Formou-se em medicina em 1917. Até 1920, Moreno

teve uma intensa vida religiosa. Fez parte de um grupo que fundou, chamado “Religião

do Encontro”. Em 1921, fundou o “Teatro Vienense da Espontaneidade”, experiência

que constituiu a base de suas ideias da Psicoterapia de Grupo e do Psicodrama.

Ao trabalhar com os pacientes do hospital psiquiátrico com recurso ao “Teatro da

Espontaneidade”, criou o Teatro Terapêutico, que posteriormente denominou como

“Psicodrama Terapêutico” e em 1925 emigrou para os EUA. Criou o “Teatro de

improviso” e organizou demonstrações públicas em Carnegie Hall. Posteriormente fez

investigação em psicoterapia na prisão de Sing-Sing com adolescentes delinquentes.

Em 1931 introduziu o termo “Psicoterapia de Grupo” sendo considerado o

primeiro ano de início da Psicoterapia de Grupo científica. Em 1936 fundou o Instituto

de Beacon com o bjetivo de formar novos profissionais. Moreno morre em Beacon

(EUA), a 14 de Maio de 1974, aos 85 anos de idade.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

98

O Psicodrama surge assim como uma técnica de intervenção pedagógica e

terapêutica dirigida à mudança de comportamento nos grupos, desenvolvida nos EUA,

nos anos 30. A primeira sessão oficial do Psicodrama teve lugar em Viena, num dia

predestinado: 1 de abril de 1921, que se chamava o “dia dos loucos32”.

Schützenberger (2003, pp. 21-27) diz-nos:

“Partindo da avaliação dos problemas sentidos no passado e no presente da vida de um grupo, ele tentava chegar a formas adequadas de resolução das situações e conflitos mais delicados. Este processo passa pela dramatização das experiências individuais dos vários elementos do grupo que entram no "Jogo da cena". É a vida, a cultura do próprio grupo, que é dramatizada, encenada como teatro, que, no entender de Moreno, permite ao grupo ganhar consciência, como num Jogo típico de espelhos, dos problemas que o atravessam e, ao mesmo tempo, refletir sobre as formas adequadas de intervenção”.

Com base na obra de Moreno (2015) sabemos que se envolveu como dramaturgo,

criou o Teatro Espontâneo, que diferia do Teatro Tradicional da época, que tinha novos

impulsos nesse momento a partir do Teatro Experimentação de Stanislavski, do Teatro

do absurdo de Pirandello, e do Teatro pobre de Grotowski. No seu Teatro Espontâneo,

que depois se converteu no Teatro Terapêutico, havia como pontos de referências, três

fatores: o “status nascendi”, o “locus” e a “matriz”. Segundo Schützenberger (2003, p.

329),

“o status nascendi é um termo de Francis Bacon retomado por Moreno: o processo do nacimento, alguma coisa que está a nascer, no estado de nascimento, a criação do ser em Psicodrama, ou na vida, o nascimento das relações profissionais num grupo. A mesma autora também define o locus nascendi como o lugar de nascimento do protagonista: a matriz, a cena psicodramática onde nasce a ação «onde o homem nasce ou volta a nascer, segundo um termo forjado por Moreno»”.

A matriz segundo a autora será então a placenta social da criança, o lugar onde

ela cria raízes. Ao criar mais adiante o Psicodrama Terapêutico, Moreno acreditou que

a partir das três etapas33 de uma sessão de Psicodrama, e utilizando-se dos cincos

instrumentos34 da sessão; seria possível propiciar a cada indivíduo de um dado grupo a

32 Era um teatro sem atores, sem texto, sem peça com o tema baseado na obra “o romance do rei”. Cada um dos mil espectadores foi convidado a subir ao palco representar o papel do rei e tentar procurar uma nova ordem das cenas. 33 Aquecimento, dramatização e comentários. 34 Diretor, ego-auxiliar, palco, protagonista e público.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

99

possibilidade de encenar o seu próprio drama. Passou então Moreno a uma longa e

exaustiva integração conceitual entre o Teatro Terapêutico, a Sociologia, Psicologia

Social e a Psicologia Dinâmica que resultou na criação de uma ciência que nomeou de

Ciência Socionómica. Esta nova ciência das relações interpessoais ramificava-se em três

grandes áreas: 1. Socio dinâmica, que se caracteriza pelo estudo do funcionamento das

relações interpessoais, cujo método de estudo e ação é o Role-Play; 2. Sociometria, que

procura medir as escolhas relacionais; 3. Sociatria, que se propõe ser uma ciência que

trata/cura relações sociais, na qual se incluem: o Sociodrama, o Psicodrama e a

Psicoterapia de Grupo.

“A diferença entre Psicodrama e Sociodrama é tanto estrutural como de finalidade. O Psicodrama lida com um problema em que um indivíduo em particular ou um grupo de indivíduos (Psicodrama de família) estão engajados de forma privada. O Sociodrama lida com problemas em que o aspeto coletivo da questão é posto no primeiro plano, e a relação particular fica num pano de fundo. (…) no Sociodrama os subgrupos são os protagonistas” (MARINEAU, 1999, pp. 168-169).

Neste sentido Sociodramas são, pois, sessões abertas de Psicodrama mas focadas

nas relações sociais, intergrupais, e pertencem ao ramo da Sociatria da Ciência

Socionómica.

“o verdadeiro sujeito de um Sociodrama é o grupo (…) o Sociodrama, baseia-se no pressuposto tácito, de que o grupo formado pelo público já está organizado pelos papéis sociais e culturais de que, em certo grau, todos os portadores da cultura partilham... É o grupo como um todo, que tem de ser colocado no palco para resolver os seus problemas, mas como o grupo é apenas uma metáfora e não existe per si, o seu conteúdo real, são as pessoas interrelacionadas que o compõe, não como indivíduos privados, mas como representantes da mesma cultura. O Sociodrama, portanto, para tornar-se eficaz, deve ensaiar a difícil tarefa de desenvolver métodos de ação profunda, em que os instrumentos operacionais sejam tipos representativos de uma dada cultura e não indivíduos privados” (MORENO, 2015, p. 413).

O autor acreditava, no valor exploratório, do ponto de vista da investigação

científica, tanto quanto no valor “curador”, modificador de atitudes, da proposta

Sociodramática. Essa modificação ocorreria, segundo ele, pela ampliação percetual e,

consequente, tomada de consciência por essas pessoas, das suas trocas afetivas e dos seus

papéis vividos, a partir das suas representações no palco Psicodramático.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

100

Encenar o drama significa poder trazer para um novo “locus”, e em um novo

“status nascendi” (o palco e o momento em que a ação dramática se desenrola), todos os

elementos que remeteriam aos papéis sociais e psicodramáticos anteriormente

estabelecidos e interpretados. Com essa condição de representar esses papéis, nasce a

grande possibilidade do salto qualitativo, da catarse da integração. E por esse salto

qualitativo e por essa catarse de integração, entende-se a capacidade a partir da ação

dramática, do indivíduo conectado com a sua própria história relacional, de se posicionar

frente aos seus próprios anseios, às suas possibilidades de ação e de transformação.

“nas sessões de Psicodrama surgem momentos de especial intensidade, em que todo o auditório se concentra num protagonista que está prestes a desfazer-se das barreiras que o cerceiam. Lançado na dramatização, este pode encontrar espontaneamente novas soluções pessoais para a sua vida. É como se passasse para um novo universo onde exista a possibilidade de um novo crescimento. A isto chama-se «catarse de integração», que para Moreno, corresponde à cura psicodramática” (ABREU, 2006, p. 70).

O Sociodrama, como todos os métodos de Moreno, é um método de ação que

movimenta e permite a concretização de transformações a partir da consciência e da

verdade desvelada pelo próprio protagonista, que no caso, é o grupo, diferentemente do

Psicodrama, no qual o protagonista é um dos participantes. Esta ação é coordenada por

um terapeuta, ao qual Moreno deu o nome Diretor35, que desempenhará o seu papel tal e

qual um diretor teatral, agindo como um realizador de cinema ou um encenador de teatro.

“O Sociodrama é o Jogo Dramático dos problemas gerais. Uma imagem das idas e voltas das relações entre os indivíduos de um grupo. Contrariamente ao Psicodrama, o Sociodrama trata do aspeto social ou coletivo dos problemas, as relações individuais dos sujeitos são colocadas em segundo plano. Nem sempre há diferenças muito nítidas entre o Psicodrama e o Sociodrama, este último transforma-se muitas vezes, de forma espontânea em algo ainda mais profundo” (SCHÜTZENBERGER, 2003, p. 323).

Parafraseando Datner (2005, p. 17) tendo em conta as palavras de Moreno (1974)

diz-nos: “O Sociodrama criado por Moreno, é, segundo este autor: o método profundo

de ação que trata das relações intergrupais e de ideologias coletiva. (…) o verdadeiro

sujeito do Sociodrama é o grupo”.

35 Como o diretor não é o “autor do enredo” a ser dramatizado, ao contrário do autor teatral, deverá procurar inicialmente encontrar-se primeiro com o seu público e as suas personagens, extraindo delas o material para um roteiro da cena.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

101

Segundo Datner (2005, p. 17) o Sociodrama é um método centrado “nos

denominadores coletivos, e com ele o pesquisador-diretor-facilitador deixa de ser um

observador à distância e fora do grupo, antigo paradigma, para ser um autor/ator

participante do próprio processo de transformação do grupo, inserido nele, por estar

implicado tanto quanto todos os demais participantes”.

1.2. A abordagem sociodramática em contexto de sala de aula

“Os eletrões têm o mesmo peso e a mesma carga de eletricidade quando estão isolados, mas, se se reúnem para formar um átomo, começam a apresentar diferenças individuais. O mesmo sucede com os homens. Se se reúnem para formar um grupo, aparecem ‘diferenças’ individuais, até então não manifestadas” (MONTEIRO, 1998, p. 20).

Se decompusermos a palavra Sociodrama temos “socio” que vem de social e

“drama” que significa ação, ou seja, o grupo em ação (DRUMMOND & SOUZA, 2008),

O Sociodrama consiste na terapêutica de grupos que habitualmente convivem entre si,

onde são trabalhados papéis sociais, profissionais e culturais que o sujeito desempenha e

partilha. Moreno (2015) reconhece que o homem é um intérprete de papéis, e que se

caracteriza por um determinado grupo de papéis que influencia o seu comportamento,

alertando que qualquer cultura impõe um conjunto de papéis aos seus membros, cujo êxito

poderá variar.

Considera-se o Sociodrama como um método de ação que se foca nas relações

intergrupais e nas ideologias coletivas (MORENO, 2015) e, por isso, o seu objetivo é o

próprio grupo, tentando resolver os conflitos interpessoais (ABREU, 2002).

A resolução dos conflitos interpessoais está inerente à procura de criatividade na

medida em que cada pessoa deve refletir sobre as suas ações para as poder transformar

(DRUMMOND & SOUSA, 2008).

O Sociodrama refere-se à dramatização de uma situação da vida quotidiana

mediante a representação de uma situação por voluntários do grupo. Neste caso, os

adolescentes (alunos) representarão as personagens. O representar uma cena da vida

permite colocar-se na situação, experimentar sentimentos, e compreender. Ao resto do

grupo, permite aprender, compreender ao observar o ocorrido.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

102

Sabe-se que é muito mais fácil mudar um comportamento individual,

especialmente nos jovens, quando o grupo legitima essas mudanças. Nas palavras de

Ariès (1978, p. 279), “a adolescência expande-se, empurrando a infância para trás e a

maturidade para a frente, e vamos passando de uma época sem adolescência para outra,

em que a adolescência é a idade favorita”. A adolescência é considerada uma fase do

desenvolvimento humano, entre a infância e a idade adulta, em que ocorrem profundas

transformações como as características fisiológicas que transformam o corpo de criança

num corpo de adulto, o desenvolvimento do pensamento a nível do raciocínio abstrato e

mudanças que conduzem a alterações sócio afetivas (Reymond-Rivier, 1977). Neste

período, os indivíduos (re)constroem a sua identidade, sendo marcante a influência

exercida por vários agentes, como a família, a escola e o grupo de pares, não raramente

com valores, interesses e práticas bastante divergentes entre si (PAIS, 1990).

Frequentemente, os adolescentes vêem-se divididos entre exigências e pressões em

sentidos opostos, manifestando o que Erikson (1972) denominou de crise de identidade,

situação à qual acresce a igualmente frequente dificuldade de comunicação dos seus

sentimentos e problemas, particularmente com os adultos.

“Para o adolescente, os amigos são fundamentais. (…) Ultrapassada a fase inicial, em que o jovem está sobretudo centrado em si, a fase média da adolescência (15-17 anos, no adolescente urbano escolarizado) é caracterizada por uma luta pela independência emocional, uma preocupação por vezes excessiva face aos problemas do corpo e pela crescente importância do grupo. (…) Na adolescência os amigos são sobretudo companheiros de saídas à noite, confidentes de aventuras amorosas, espelhos de dúvidas pessoais, iniciadores conjuntos de rituais que levam à idade adulta” (SAMPAIO, 2003, pp. 104-105).

Neste contexto, o recurso às práticas dramáticas poderá permitir dar voz às

dúvidas e emoções dos alunos, criar condições para a espontaneidade e experimentação

de papéis (MORENO, 1975; SPOLIN, 1999; BOAL, 2005) e, ainda, promover a

participação dos sujeitos no ato educativo (FRAGATEIRO, 1991).

Para Reymond-Rivier (1977), a crise dos adolescentes é sobretudo uma crise de

oposição que se traduz na rejeição dos modelos dos pais e numa procura de originalidade.

Nesta fase, a família, o grupo de colegas e a escola constituem-se como os principais

contextos para desenvolver características pessoais e sociais necessárias na vida adulta

(REYMOND-RIVIER, 1977; ALARCÃO, 2000). Diversos autores, nomeadamente

Erikson (1972), Petrus (1997) e Reymond-Rivier (1977) reforçam a ideia da importância

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

103

do grupo de pares no desenvolvimento do adolescente, sendo que este assume um papel

fundamental no “suporte instrumental e emocional, ajuda na resolução das tarefas

desenvolvimentais e na construção de identidade” (GOUVEIA-PEREIRA et al., 2000,

p. 191). Uma vez que os adolescentes se encontram a experimentar diversos papéis e em

transição “cujo itinerário pode ser modificado, estimulado, alterado ou dificultado pelas

condições em que se desenvolve” (ARTIAGA, 1998, p. 219), compete à educação criar

condições para o desenvolvimento pessoal e social daqueles indivíduos. E

complementando esta ideia Marcelli e Braconnier (2005, pp. 46-47) argumentam que

“A participação dum adolescente num grupo de congéneres, a sua inserção num bando, constituem factos de observação corrente. As relações estabelecidas entre o adolescente e os seus pares, para além das implicações sociológicas evidentes de que são testemunhas, desempenham igualmente um papel de primeiro plano no processo psíquico em curso. Com efeito, se o «bando» encontra inicialmente e antes de tudo a sua origem, a sua definição, nos fatores sociológicos que o determinam e o condicionam, a necessidade que o adolescente tem de estar em «grupo» responde a motivações intrapsíquicas relacionadas com este processo (..) assim o grupo pode ser utilizado como lugar de exteriorização das diferentes partes do adolescente”.

Visto o Sociodrama permitir um espaço de partilha e análise, ele incentiva a ação,

permitindo a reflexão que conduz a mesma. No fundo, trata-se de suscitar a vontade de

participar, de construir, de criar, de ter um papel ativo quer enquanto futuro profissional,

quer no rumo da vida de cada um e na vida em sociedade. Participar numa sessão de

Sociodrama implica imprescindivelmente o desenvolvimento de papéis, e este método

permite-nos experimentá-los e desenvolvê-los, num ambiente protegido, onde a mesma

cena se poderá repetir tantas vezes quanto o necessário. No meio de jogos e brincadeiras,

somos convidados a desenvolver a nossa espontaneidade, tornando-nos reflexivos,

críticos e mais capazes de responder criativa e ajustadamente aos problemas e obstáculos

da realidade social. O palco torna-se assim parte da realidade.

Para que possa haver partilha nas sessões de Sociodrama, é fundamental o grupo

estar disponível, predisposto a.

Sabemos que quando algo é partilhado pelos alunos isso pode ser alvo de crítica,

interrogação ou discórdia, pelo que é natural que sintam algum receio ou medo de se

expor devido às interpretações que o outro possa fazer. Contudo, este sentimento é

natural e poderá transformar-se em algo positivo, uma vez que vai de encontro ao debate

de ideias e contribui para a evolução pessoal, social e profissional do sujeito.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

104

Este aspeto leva-nos a pensar sobre a nossa postura individual e em grupo e, neste

sentido, procurarmos refletir sobre a cooperação, responsabilidade, pro-atividade,

participação, envolvimento e implicação, assim como a cedência face ao grupo. Pois

“ninguém chega a tornar-se humano se está só: tornamo-nos humanos uns aos outros. A

nossa humanidade foi-nos ‘contagiada’: é uma doença mortal que nunca teríamos

desenvolvido se não fosse a proximidade dos nossos semelhantes” (SAVATER, 1999, p.

191).

1.3. Técnicas fundamentais do Sociodrama

“Uma técnica é um recurso instrumental. Em si mesma ela não significa nada, é por assim dizer, neutra. Para que assuma algum sentido, requer pelo menos dois elementos: uma teoria na qual se fundamente e uma finalidade para a qual aponte” (CALVENTE, 1981).

Como qualquer método de ação que se aplica aos indivíduos, são necessárias

técnicas que apoiam a facilitam essa mesma ação. O Sociodrama não difere por isso de

outros métodos e não prescinde de certas técnicas facilitadoras. Antes de se poder aplicar

qualquer técnica, é necessário, porém, pensar no grupo no qual se vão aplicar.

O grupo tem um papel importantíssimo em todas as sessões de Sociodrama.

Lewin (1948) afirma que o indivíduo é função do grupo e todo comportamento dele deve

ser visto como resultante da totalidade dinâmica do grupo. É suposto todos se sentirem

implicados. É necessário permitir ao grupo aquecer, preparar-se para a sessão. Entrar

num registo imaginário abandonando os desenvolvimentos lógicos. Numa entrevista

realizada para a Associação Belga de Psicodrama, diz Schützenberger (2014),

“Quando vemos o grupo na defensiva, é necessário domesticar o grupo, para que este deixe de estar na defensiva. Porque enquanto o grupo está na defensiva não conseguimos fazer nada com ele (…) é preciso que se sintam livres de exprimir o que têm vontade de exprimir. A leitura da linguagem corporal é por isso extremamente importante. Se eu vejo o corpo acessível visualmente ou se o corpo está na defensiva visualmente (fechado). Enquanto o corpo estiver fechado, na defesa, não poderemos trabalhar de verdade”.

Torna-se por isso premente um bom aquecimento que permita ao grupo a sua

abertura para a sessão. Muitas vezes recorre-se a técnicas sociodramáticas para a fase do

aquecimento. Relembra-se que uma sessão de sociodrama processa-se normalmente em

três fases: o aquecimento (preparação do grupo), a dramatização (desenvolvimento da

sessão) e os comentários (partilha- comentários acerca da sessão).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

105

As técnicas mais frequentemente utilizadas recorrem à metáfora, à condensação

(resumo), à linguagem poética, à evocação, às associações livres e aos desenhos.

As técnicas são a operacionalização de um meio ou conjunto de meios para atingir

um fim (PSICOSOMA, s.d.). As técnicas fundamentais do Sociodrama são as mesmas

que as utilizadas em Psicodrama, mas incindindo no grupo e não na pessoa individual.

Segundo Pierre Renouvier, Raymond Corsini e Jacob Moreno existem cerca de

350 técnicas diversas que se podem utilizar numa sessão. Dessas 350, uma centena serão

talvez as mais utilizadas desde 1950.

Com base nas descrições das técnicas elencadas por Schützenberger (2003) e

Abreu (2006), aquelas que são mais frequentemente utilizadas em contexto de

Psicodrama são as seguintes36:

Amplificação da Voz: quando um sujeito fala impercetivelmente, o

Sociodramatista pode retomar a frase, e repeti-la em eco, em alta voz, de forma a todo o

grupo conseguir ouvir;

À parte/Solilóquio: durante a sessão, pode pedir-se ao sujeito de dizer em volta o

que está a sentir naquele momento, no fundo verbalizar para o grupo em alta voz;

Autoapresentação: o sujeito apresenta-se ao grupo tal e qual ele é. Este género de

apresentação pode ser feita, oralmente, através de um desenho comentado, através de uma

estátua legendada;

Bazar: trata-se de fazer um bazar, instalar o caos, uma confusão no meio da cena.

Pede-se depois aos participantes para entrarem na cena e dizer o que é que aquilo lhes

lembra;

Loja mágica: trata-se de uma situação imaginária: uma loja mágica, onde podemos

comprar e vender TUDO o que queremos. Aquilo que se vende ou compra, pode ser

definido pelo Sociodramatista, ou pode ser sugerido pelos sujeitos;

Cadeira vazia: acrescenta-se uma cadeira em cena. O Psicodramatista pede para

cada pessoa a observar, e imaginar alguém sentado nessa cadeira. Após alguns minutos

de silêncio, pede-se para cada um dizer aquilo que sentiu. Pode-se também fazer este

36 As descrições que se seguem são de técnicas para sessões de Psicodrama, mas sabemos que ao aplicá-las em sessões de Sociodrama, teremos sempre de as adaptar e modificar consoante os grupos ou consoante o que se pretende naquela determinada situação da sessão

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

106

exercício pedindo à pessoa que se imagine em diálogo com alguém sentado na cadeira e

pede-se depois para se sentar, imaginado que é essa pessoa e o Psicodramatista representa

o sujeito a falar com ele. Esta técnica deverá ser obviamente adaptada para a sua utilização

em Sociodrama;

Espelho: quando o sujeito não se apercebe de determinados aspetos da sua conduta

ou postura, que para outros são óbvios, o diretor pode pedir a um dos egos auxiliares que

se coloque diante dele e o imite em espelho. Como refere Monteiro (1998), esta técnica

propicia ao protagonista condições de melhorar a auto perceção;

Objeto intermediário: quando um sujeito não consegue tomar uma decisão, ou

verbalizar alguma coisa, pede-se para um ego-auxiliar fazer de objeto intermediário, ou

seja, desempenhar o papel da caneta que não quer escrever a carta, ou da porta que não

quer abrir. Dá voz aos objetos de cena, para ajudar o sujeito;

Monólogo: técnica que implica que o sujeito fale sozinho em cena. Fale alto para

ele próprio;

Caixote do lixo: quando um sujeito tem algum assunto que o incomoda, ou

perturba, pede-se para essa pessoa deitar isso fora no caixote do lixo. O caixote do lixo

por ser real ou simbólico, o que interessa é que o sujeito se livre desse “incómodo” com

um movimento libertador, em direção ao caixote do lixo;

Representação simbólica: certas situações da vida real podem ser difíceis ou

impossíveis de representar em cena. Esta técnica consiste em representar simbolicamente

através de gestos (ou de outras formas) a situação. Por exemplo, um relacionamento

sexual, representado através de um Jogo de mãos, que corresponda aos corpos;

Inversão de papéis: à palavra do diretor, o sujeito troca de lugar com o ego-

auxiliar com quem está a interagir. Este repete então as últimas palavras do protagonista,

que por sua vez, continua a ação como se fosse o personagem. A nova inversão repete-se

este protocolo, mas já com o protagonista no seu lugar. Esta técnica obriga o protagonista

a colocar-se, em termos psicológicos, no lugar da pessoa com quem interagiu. Moreno

entendia a troca de papéis como uma vivência interna simultânea de dois papéis opostos;

Interpolação de resistências: A certa altura durante a cena, pede-se para que um

ego auxiliar atue de modo completamente diferente daquele que o protagonista indicou e

espera, esta técnica permite apanhar o protagonista desprevenido, testando a

espontaneidade da sua resposta;

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

107

Estátua: representação estática de uma maneira de estar, pensar de um

sentimento, etc. A estátua pode ser vista e comentada por todos.

Role Playing: Técnica que representa o treino de papéis. Consiste em representar

um papel cujo desempenho se teme, por exemplo o aluno perante um exame, ou ainda um

papel que se tem mas que não está a ser bem desempenhando, exemplo de um chefe de

equipa que não consegue dar ordens. Nestes casos, utiliza-se um ego-auxiliar (no

Sociodrama poderá ser desempenhado por um aluno sob orientação do diretor), que

representará o papel complementar (professor, empregado) e irão repetir-se as cenas até

o papel estar mais desenvolvido. Segundo Pundik e Pundik (1974, p. 114), o Role Playing

“é um método de interação humana que implica o comportamento realista em situações

imaginárias”. Moreno (2015, p. 182) menciona que proporciona “ao ator uma visão dos

pontos de vista de outras pessoas, ao atuar no papel de outros, seja em cena, seja na vida

real”.

Existe uma multiplicidade de usos e variantes dentro do mesmo recurso. Existem

muitas mais técnicas que se poderiam aplicar em sessões de Sociodrama, no entanto, esta

seleção indica aquelas que são utilizadas com mais frequência.

O fundamental ao trabalhar em Sociodrama é saber-se socorrer destas técnicas

para apoiar a sessão e ajudar o diretor a atingir os objetivos.

1.4. Contributos da EXDRA e do Jogo Dramático na prática do Sociodrama

A criança com as suas brincadeiras, faz-nos ver que de entre todas as atividades

de comer, beber, dormir, imprescindíveis para o seu organismo, sobressai a atividade

lúdica. O que a criança procura é jogar, desempenhar, criar uma realidade própria no seu

mundo do “como se”. Podemos notar a alegria que as crianças sentem nessa situação:

surge o prazer natural, espontâneo, reforçando a motivação para continuar a brincar.

Monteiro (1998, p. 163) diz-nos:

“O homem tem como tendência básica a necessidade de compreender o universo, e neste anseio de curiosidade, desde sempre usou a identificação, a imitação e a representação como forma de se expressar e assim decifrar a natureza, por meio da ação. Esta necessidade imperiosa manifestou-se desde o aparecimento da sociedade humana e a sua consequente cultura, numa atividade livre, alegre, agradável e divertida: o jogo”.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

108

O Jogo permite ir ao mundo das fantasias, da imaginação. É assim que uma caixa

de fósforos se transforma num carro, uma boneca é um ser humano. Nas suas

brincadeiras do faz de conta, a criança alcança pleno domínio da situação, vivendo e

convivendo com a fantasia e a realidade. Este fascinante domínio da passagem de uma

situação para outra, com convicção total, por meio de respostas rápidas a situações novas

ou respostas novas a situações já conhecidas, é assegurada à criança por algo mais que a

razão ou o instinto: a espontaneidade. Relembramos a importância da espontaneidade

para Moreno, nas palavras de, Abreu (2006, p. 69),

“a espontaneidade é o leitmotiv que percorre todo o movimento do Psicodrama desde o seu início (…) é uma energia de novidade e mudança (…) assim nos deixemos guiar por essa energia momentânea, próxima da intuição, que nasce simultaneamente do nosso corpo, da nossa história individual, da nossa liberdade. E que é, ainda, algo que nos faz crescer”.

A essência do Jogo reside nessa capacidade espontânea que leva à liberdade,

permitindo ao homem “viajar” pelo mundo do imaginário e assim, recriar, descobrir

novas formas de atuação. Mas é importante que o individuo queira jogar e esteja

disponível para isso, reafirmando a sua seriedade e a sua busca espontânea e criativa.

Yozo (1995, p. 11) considera que “antes de falarmos em jogos dramáticos, seria

interessante resgatar a origem dos jogos. Desde a Antiguidade, o jogo exerce um grande

fascínio nas pessoas e atravessa incólume na sua estrutura, durante séculos, para produzir

e/ou resgatar o lúdico”. A maioria dos filósofos, antropólogos e etólogos demonstra

interesse pelo lúdico e define “Jogos” como uma atividade que tem a sua própria razão

de ser e contém, em si mesmo, o seu objetivo. Huizinga (1971, p. 3) afirma que

“o jogo é fato mais antigo que a cultura, pois esta, mesmo em suas definições menos rigorosas, pressupõe sempre a sociedade humana; mas, os animais não esperaram que os homens os iniciassem na atividade lúdica. É-nos possível afirmar com segurança que a civilização humana não acrescentou característica essencial alguma à ideia geral de jogo. Os animais brincam tal como os homens”.

Bally (1964 apud YOZO, 2005, p. 11)

“estabelece a relação: animal versus homem, através do Jogo (denominador comum). Associa o Jogo à liberdade (indivíduo tenso – sem liberdade. Há a necessidade de relaxar). O homem joga durante toda a sua vida, principalmente quando criança, pois a disponibilidade para jogar é maior. Afirma, portanto, que o Jogo é o movimento da liberdade”.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

109

Segundo a definição do Dicionário da Língua Portuguesa (2016), o jogo “é uma

atividade lúdica executada por prazer ou recreio, divertimento, distração; atividade lúdica

ou competitiva em que há regras estabelecidas e em que os praticantes se opõem,

pretendendo cada um ganhar ou conseguir melhor resultado que o outro”. Constata-se

então na própria definição do jogo, a íntima relação entre ele, a liberdade e a ordem, num

paradoxo percebido por Bally (1964) em que o jogo seria o movimento da liberdade. O

jogo dá o limite da liberdade e o que ameaça. É preciso permitir ao homem reencontrar

a sua liberdade. Esta é a proposta dos jogos psicodramáticos (jogos dramáticos aplicados

no Psicodrama e Sociodrama), tal como foi pensado por Moreno,

“jouer est ce que font les participants dant le moment essenciel de toute une séance de psychodrame. Jouer est um mot aux multiples significations. (…)em psychodrame il est question de jouer, représenter de façon scénique des fragments de son histoire, «mettre s avie en scéne». Rejouer des élements de sa vi ene sera jamais copie conforme à ce qui a été vécu, de même que jouer des scénes projetées dans l’avenir ne correspondra pas pour autant à ce qui sera vécu (…) Au dela d’un acte de parole, le jeu mobilise le corps des acteurs, met en mouvement un récit qui par sa représantation scénique peut y apporter una utre regard, susciter de la surprise, de l’étonnement, de l’inattendu, ouvrir de nouvelles pistes (MAGOS, 2011, pp. 4-6).

A expressão “jogos dramáticos” aplicada aos jogos de Psicodrama ou Sociodrama

obviamente deve-se ao facto de estes ocorrerem em contexto dramático, contrariamente

a outros jogos que se realizam noutros campos de ação. Jogo Dramático é aquele que

acontece no contexto dramático, «como se». Monteiro (1994, p. 21) define-o como “toda

a atividade que propicie ao indivíduo expressar livremente as criações do seu mundo

interno, realizando-as na forma de representação de um papel, pela produção mental de

uma fantasia, ou por uma determinada atividade corporal”. Anteriormente a autora

argumentou que o Jogo Dramático “é aquele que apresenta dramaticidade”

(MONTEIRO, 1994, p. 26). No teatro a dramaticidade ocorre quando a cena apresenta

um conflito. Sem conflito não há dramaticidade e a cena é vazia. O Jogo Dramático deve,

de alguma forma, comover, isto é, envolver emocionalmente o participante na atividade.

Motta (1995, p. 26) escreve que o Jogo Dramático “é aquele que permite uma

transformação do jogador. O facto de ocorrer um insight no jogador, que possibilite uma

mudança e crescimento, é o que o define como Jogo Dramático e não Jogo de perceção,

iniciação ou improviso”.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

110

Datner (1995, p. 85) refere, “jogar o drama…com quem? Qual drama? To

play…role…role playing game. Jogar, viver um papel, ou representar o papel de um

guião? Criar, expressar e, que mais? O que mais faz parte do conceito de Jogo

Dramático?”.

No Role-Playing, a dramatização é centrada na questão levantada pelo

protagonista e apropriada pelo grupo. No Jogo Dramático o tema protagonista é de carater

grupal, trata-se de uma situação de grupo, do seu funcionamento.

O Jogo em si tem sentido em todos os ambientes do ser humano, pois jogar é

estabelecer relações com pessoas e objetos, e é parte da própria sobrevivência do ser

humano. As relações e os vínculos só ocorrem porque temos a capacidade para nos

emocionarmos. Assim, a emoção é uma função positiva no desenvolvimento do ser

humano.

Os jogos dramáticos apresentam características próprias, não podendo ser

confundidos com um Jogo qualquer. O Jogo Dramático tem como núcleo vivenciar o

Jogo assumindo personagens em permanente caráter lúdico. Através do prazer e do

lúdico, objetiva-se levar ao cenário dramático – contexto dramático – a realidade das

dinâmicas interpessoais, para que sentimentos, emoções e sensações vitalizem a

expressão dos conteúdos emergentes dos fenómenos grupais e dos posicionamentos

diante de uma situação. O Jogo Dramático traz à baila conservas culturais, estereótipos,

modelos cristalizados que aprisionam a espontaneidade e a criatividade.

“A conserva cultural passou a ser o mais alto valor que era possível produzir – os livros da bíblia, as obras de Shakespeare ou as sinfonias de Beethoven. É uma mistura bem sucedida de material espontâneo e criador, moldado numa forma permanente (…) converte-se em propriedade do grande público, algo de que todos podem compartilhar (…) assim, a conserva cultural é uma categoria tranquilizadora” (MORENO, 2015, p. 159).

Segundo Schützenberger (2003, p. 270) “ conserva cultural é um produto acabado

de um esforço cultural (um livro, uma sinfonia musical). O mesmo Jogo que busca, revela

e desvela, também trabalha no sentido da transformação e das mudanças desses mesmos

fenómenos. Como qualquer jogo, o Jogo Dramático tem regras. Ao entrar-se no jogo,

aceitam-se as regras”.

Vasconcelos e Brito (2014) falam das características do jogo dramático.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

111

a. O Jogo Dramático é de adesão voluntária. Tem que haver um acordo

prévio para que cada um participe e existe a liberdade de a todo o momento

sair;

b. O Jogo tem regras: a regra depende do diretor. Tem que ser seguida. Pode

ser transformada. Mas quando a regra é quebrada acaba o jogo. O grupo

autorregula-se no processo do jogo;

c. O Jogo tem um espaço de dramatização: há um contexto e um palco onde

a ação se concretiza. A existência dum estrado (palco) ajuda a mudar de

contexto. Entrar e sair de palco. O estrado ideal deverá ter 3 por 2, segundo

Pio de Abreu. O contexto é fundamental para situar a ação;

d. O Jogo tem um tempo dramático. O diretor usa o tempo dramático

(aumenta ou encurta) conforme as necessidades narrativas e de

reconhecimento. O diretor pode aumentar a tensão ou acalmar as tensões

conforme a narrativa.

Através deste envolvimento e desta opção de jogar, separamo-nos por um

determinado momento do mundo real exterior, entrando em contacto com o nosso interior

para viver o fascínio e a magia do lúdico.

No campo relaxado e lúdico, os conflitos, as dificuldades, as facilidades, as

complementaridades, o encontro e a comunicação são vividos, conhecidos e

reconhecidos pelo grupo.

Caillois (1990) classifica os jogos em quatro tipos, que se entremeiam segundo a

predominância da fonte do prazer:

1 – Jogos de habilidades: o prazer advém do desenvolvimento de aptidões ou de

habilidades;

2- Jogos de competição: o prazer origina-se na luta por um prémio, que pode ser

apenas a vitória;

3- Jogos de acaso (azar): o prazer é originado pela casualidade;

4 – Jogos dramáticos: o prazer dá-se através do faz-de-conta, da representação.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

112

Para um Sociodramatista, o quarto tipo constitui-se num instrumento bastante

importante, embora possa efetivamente se valer de outros jogos, que não somente os

dramáticos. O acordo pressupõe o consentimento mútuo do objeto e modo do Jogo. Para

que haja Jogo é necessário que todos saibam que vão jogar, o que se vai jogar, e como.

O foco e as regras devem ser claramente definidos, a fim de que todos os participantes

possam entregar-se intensamente à atividade. O acordo inclui também – na maior parte

das vezes implicitamente – que o Jogo tenha um início e um final.

A vigência diz respeito à duração do jogo. A energia criativa para jogar tem um

tempo limite de expressão. A sensação de desconforto num Jogo é frequentemente

originada por um descompasso com o tempo.

A utilização dos jogos como ferramenta de trabalho não é privilégio dos

Psicodramatistas e Sociodramatistas, pois os jogos de todos os tipos, são muito anteriores

ao surgimento do Psicodrama. Motta (1995) considera que o Psicodrama colaborou para

o desenvolvimento dos jogos, principalmente os dramáticos, instrumentalizando a sua

utilização e enriquecendo o seu repertório.

Para Castanho (1995, p. 23), “os adolescentes, em geral, estão sempre dispostos

a jogar e a brincar. É fácil uma atividade se transformar num jogo, ou uma conversa

terminar numa brincadeira, ou numa gargalhada”. Segundo a autora, nem sempre é fácil

propor jogos dramáticos a adolescentes, pois muitas vezes são desconfiados, e têm

dificuldade em envolver-se e comprometer-se com propostas que vêm de fora, isto é

quando não sabem onde é que aquilo vai dar, ou quando não sabe o que querem dele. Por

ser uma fase com alguma instabilidade, o adolescente tem as emoções à flor da pele.

“A adolescência é a idade da mudança, como indica a etimologia da palavra: adolescência significa em latim «crescer». A adolescência é uma passagem entre a infância e a idade adulta. Tal como sublinha E. Kestemberg, afirma-se muitas vezes que o adolescente é simultaneamente uma criança e um adulto; mas na realidade ele já não é uma criança, e ainda não é um adulto. Este duplo movimento de negação da sua infância, por um lado, e procura dum estatuto adulto estável, por outro, constitui a própria essência da «crise», do «processo psíquico» que todo o adolescente atravessa” (MARCELLI & BRACONNIER, 2005, p. 23).

Qualquer imprevisto pode fazer com que deixe transparecer algo que não queria

que se soubesse, algo em que não se sente ainda seguro a mostrar ou compartilhar. Ainda

segundo os autores Marcelli e Braconnier (2005) é por isso que muitas vezes se encontra

em sala de aula, adolescentes com um discurso muito racional e de autodefesa.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

113

Sendo assim, o Jogo depende muito da maneira como é proposto ao grupo, pois

podemos encontrar resistências a ele, e essa resistência ser manifestada de diferentes

maneiras (os alunos são ótimos na arte de boicotar atividades quando estas não vão de

encontro às necessidades deles): sono, risadas, barulho, preguiça, etc.

Por isso devemos ter em conta este lado emocional do adolescente quando

queremos apresentar um Jogo Dramático ou outra atividade. A proposta deverá ser

dirigida com sensibilidade e cuidado. Para Castanho (1995, p. 24)

“apesar de algumas barreiras que possam surgir, o Jogo Dramático é uma das técnicas mais utilizadas quando se quer trabalhar com adolescentes. Os alunos costumam empolgar-se e entrar de corpo e alma nas propostas (…) é fundamental no trabalho com adolescentes, às vezes, até mais importante do que a palavra, já que, geralmente, a confusão interna é grande e a ansiedade impede a discriminação das emoções”.

Como refere Monteiro (1994, p. 83) “o adolescente fala pouco das suas

dificuldades pessoais (…) portanto o Jogo Dramático deve ser usado como uma forma

de se criar condições de trabalho num campo relaxado e numa situação menos

conflituosa, mais preservada e, consequentemente mas fácil de ser alcançada”.

Através do Jogo pretende-se criar um clima que facilite a abordagem de

determinadas temáticas, assuntos que muitas vezes o adolescente não consegue exprimir

verbalmente ou falar abertamente. O Jogo Dramático fornece maneiras criativas de se

lidar com os conflitos. O Jogo Dramático amplifica a atitude lúdica. É preciso imaginar

e criar em função do grupo. É preciso compreender o outro e ajudarem-se uns aos outros.

O “Fazer de conta” é coletivo. A comunicação deve por isso estabelecer-se entre todos.

A atitude lúdica oferece a possibilidade ao aluno, de se confrontar com o outro de

uma maneira menos constrangedora, mais suportável. O jovem vai assim, encontrar um

lugar e conseguir situar-se perante os outros.

“El juego funciona como una estratégia de desbloqueo y de leberacíon expressiva, al tiempo qye crea un espácio para la creatividad (…)el juego acaba siendo un lugar en el que nos atrevemos a ir más allá de lo conocido porque las consecuencias no son frustrantes, y esto es lo que lo convierte, en un poderoso medio para la exploracíon y el aprendizaje creativo. El juego es el reino de la libertad y de la creatividad, el ambiente idóneo para el descubrimiento y el hallazgo” (TEJERINA, 1997, p. 75).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

114

O professor, portanto, ao utilizar jogos dramáticos, conta com uma técnica

poderosa no sentido de permitir a sua comunicação com o adolescente e deste com o

grupo.

2. METODOLOGIA

2.1. Participantes

Este trabalho foi desenvolvido com um grupo de 26 alunos, adolescentes,

heterogéneo em gostos e características individuais, (sendo 24 do sexo feminino e um do

sexo masculino), a frequentar o ensino profissional, na Escola Profissional de Tecnologia

Psicossocial do Porto (EPTPP).

Cada aluno foi convidado a participar no espaço de Jogo e de expressão que lhe

foi proposto. O vivido e experimentado pelo grupo produz um impacto, e o grupo serve

de caixa-de-ressonância para cada um dos participantes. Esta abordagem através do

grupo permite ter em conta efeitos possíveis em termos de expressão e de socialização

dos alunos.

Os critérios de inclusão na amostra foram: frequentar a disciplina de Expressão

Dramática; bom comportamento em sala de aula; assiduidade; conhecimentos teórico-

práticos e preferências vocacionais e profissionais favoráveis.

2.2. Procedimento/Instrumentos

Utilizou-se um conjunto de técnicas dinâmicas e ativas, com recurso ao

Sociodrama. Este modelo valoriza a ação, pretendendo ir mais além da mera

comunicação verbal, criando um espaço alternativo onde sejam possíveis modos de

expressão não utilizados habitualmente, permitindo assim o desenvolvimento da

espontaneidade e da autenticidade e aumentar a capacidade de fazer escolhas, de

adaptação à realidade e de desenvolver novos papéis de forma mais integrada e flexível,

de forma a promover o crescimento pessoal e social.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

115

O método ativo apresenta-se como o mais vantajoso se o que pretendemos atingir

com estas sessões se centra no desenvolvimento de competências

cognitivo/comportamentais e sócio relacionais. Neste caso, o professor/orientador da

sessão passa para segundo plano, agindo como o “gestor”, sendo a sua função a de

cooperar com o grupo, no sentido de estimulá-los, ajudar os alunos, clarificando-os e

orientar os esforços do grupo, passa a ter um papel de orientador, mediador e observador

da sessão. “O método ativo baseia-se no conceito da liberdade e autorrecreação de

descoberta da aprendizagem. O aprendiz torna-se o sujeito da sessão, descobrindo,

executando e desvendando todos os domínios do saber inerentes à aquisição de novas

competências e saberes” (PSICOSSOMA, s/d, p. 35).

Foram desenvolvidas dez sessões a partir de janeiro até maio de 2016. Cada

sessão teve uma duração de 90 minutos. As sessões de Sociodrama desenvolveram-se,

em contexto de sala de aula na disciplina de Expressão Dramática. Durante as sessões

foram utilizadas (sempre com as devidas adaptações), as técnicas da Amplificação da

voz; À parte/solilóquio; Loja mágica; Objeto intermediário; Monólogo; Caixote do lixo;

Representação simbólica; Inversão de papéis; Interpolação de resistências; Estátua; Role

Playing.

O conhecimento do contexto e do enquadramento social, económico, familiar em

que os alunos se situam é primordial para a realização de todo o trabalho efetuado.

Para a constituição do grupo de trabalho foi feita a conjugação dos dados

fornecidos pelos Serviço de Psicologia e Gabinete de Inserção na Vida Ativa (GIVA) da

EPTPP, com a aplicação de um inquérito por questionário, com perguntas abertas,

fechadas e mistas, as quais nos forneceram informação relativa a tópicos e assuntos me

estudo37.

2.3. Objetivos

Com as sessões de Sociodrama, pretendeu-se estimular o potencial de

desenvolvimento próprio da adolescência, diminuindo a incapacidade e promovendo a

autonomia.

37 1. Idade e sexo dos alunos; 2. Encarregado de Educação (mãe, pai, o próprio, outro); 3. Agregado familiar (família biológica ou não, nº de irmãos); 4. Percurso Escolar (Habilitações literárias dos alunos e nº de retenções); 5. Disciplina preferida e disciplina em que apresenta maiores dificuldades; 6. Problemas de saúde; 7. Projeto de vida; 8. Acesso a PC e Internet; 9. Áreas de interesse da formação em contexto de trabalho (FCT); 10. Distância de casa à escola e tempo de deslocação; 11. Meio de transporte utilizado; 12. Ocupação dos tempos livres.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

116

Estabelecer uma relação de confiança e ajuda intergrupal que permita através do

partilhar de vivências, emoções e sentimentos, nos diferentes contextos do grupo,

elaborar novos significados e construir novas explicações para situações vividas

atualmente pelos alunos.

Ajudar a identificar situações sentidas pelos alunos como problemáticas,

permitindo-lhes compreender melhor a situação vivida e encontrar novas vias de

resolução para os problemas já identificados e desenvolvendo assim a capacidade para

resolver novos problemas.

Criação de um espaço de integração entre o pensar e o agir. Nesta intervenção

grupal pretende-se também que o adolescente se elabore a si na relação que estabelece

com o outro, nos diferentes papéis que assume no decorrer das sessões.

Perspetiva-se assim, a emergência de um espaço coletivo de reflexão sobre

problemáticas inerentes à condição do aluno/adolescente.

3. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

O Sociodrama aplicado em contexto de sala de aula utiliza a ação, a dramatização

e outras técnicas ativas, e intervém com resultados imediatos, aqui e agora, com rápida

transposição para o dia-a-dia dos alunos.

Não é por acaso que se utiliza o Sociodrama como método, pois ele permite

envolver todos os elementos do grupo num processo de aprendizagem relacional, que

tem como objetivo a mudança de atitudes e alternativas para as soluções dos problemas.

Os jogos dramáticos foram usados em todo este processo para formar um grupo

coeso, e as dramatizações e reflexões permitiram trabalhar temas propostos pelos alunos.

Os jogos, ao criarem um campo relaxado na sala de aula, ajudaram a que os

elementos da turma se conhecessem melhor, para além dos seus papéis enquanto alunos

da escola. Possibilitaram um maior contacto entre todos os participantes e consigo

mesmos.

Williams (1994, p. 14) sugere “a dramatização como um lugar para a encenação

de mudanças na vida quotidiana de uma pessoa, muito mais do que um lugar onde a

mudança deva ocorrer. Situações emocionalmente sobrecarregadas são reorganizadas ou

reclassificadas de modo a levar a novas estruturas nos relacionamentos”.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

117

O método da dramatização e representação de cenas permite chegar rapidamente

ao centro da questão, tanto das emoções como das interações e soluções de situações

problemáticas. Segundo Marra (2004, p. 61):

“o Sociodrama tem como proposta a aprendizagem da participação social e o exercício da criatividade por meio de movimento, da ação, confirmando os recursos internos de cada membro do grupo, tal e qual a teoria sistêmica, quando trabalha para o resgate da competência de cada membro do sistema. É o momento de assumir a responsabilidade por suas escolhas, possibilitando mudanças”.

A utilização das Técnicas Sociodramáticas facilitam em muito a inter-relação dos

alunos na identificação das suas competências para a resolução dos problemas que iam

surgindo em casa sessão. Analisando os pontos fracos e pontos fortes das sessões

apercebemo-nos que o segredo da estratégia era manter o “grupo aquecido, do início ao

fim”. Quando o “grupo está aquecido”, a mobilização deste para a sessão aumenta, e

promove-se assim o interesse e a curiosidade pelo seguimento da linha condutora da

sessão.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

As técnicas sociodramáticas aplicadas em contexto de sala de aula concorrem para o

crescimento pessoal e de grupo. A partir do grupo o aluno trabalhará as suas características

pessoais, os seus medos e anseios e refletirá sobre as suas práticas, contribuindo para o

processo de desenvolvimento pessoal e social, de capacidades e competências, de

cooperação, de confiança, de sentimento de pertença e união ao grupo no qual está integrado.

O espaço criado na aula para as sessões de Sociodrama, será assim um espaço de

trabalho, uma oportunidade para a evolução e transformação, um grande desafio para todos.

O sociodrama pode ser uma prática a introduzir na dinâmica da prevenção escolar, quando as

dificuldades ou problemas ainda não tomaram proporções significativas. A mudança de

perspetiva, do olhar, não diz respeito apenas aos jovens, mas também aos adultos que fazem

parte do ambiente familiar desses alunos, e a quem a prevenção também deverá afetar.

Confrontados diversas vezes com situações problemáticas vividas pelos alunos

(como a gravidez na adolescência, ambientes familiares destrutivos, a violência doméstica e

no namoro, por exemplo) a abordagem sociodramática pode ser uma mais-valia no

tratamento destas situações e pode ajudar os alunos, vítimas indireta ou indiretamente a reagir

e a tomar iniciativa, pois o passar à ação é uma das ferramentas que o sociodrama pode

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

118

fornecer. Nestas situações o aluno precisa de ser ajudado e apoiado, e o recurso a técnicas

alternativas pode ser benéfico. Caso contrário, situações do género acabam por prejudicar a

progressão escolar do aluno (no limite leva ao abandono escolar). Será necessário refletir e

implementar sobre outro tipo de medidas e / ou estratégias para reverter esse fenómeno. O

envolvimento parental torna-se indispensável e a ideia do sociodrama aflora como sendo uma

possível prática eficaz nesse sentido.

Integrar o Sociodrama no programa curricular, na área das expressões, irá permitir a

um grupo ou a um indivíduo de se exprimir, ou exprimir alguma coisa (ideia, sentimento,

emoção, imagem, etc.) através das várias dramatizações, ao longo das sessões, assim como

desenvolver o autoconhecimento. Aliás, qualquer método de aprendizagem deveria passar

primeiro pelo autoconhecimento.

O método de ensino em expressão dramática é tanto individual como coletivo, pois

tem em conta a evolução própria de cada um, dentro de um coletivo, dentro de um grupo. A

disciplina de expressão dramática cria, por si só, a base ideal para a prática do sociodrama.

Uma prática em que os alunos não somente aprendem, como experimentam, e podem ser

livres na sua criatividade e podem, acima de tudo, errar.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABREU, J. L. P. (2006). O Modelo do Psicodrama Moreniano. Lisboa: Climepsi

Editores.

ABREU, J. P. (2002). O Modelo do Psicodrama Moreniano. Coimbra: Imprensa de

Coimbra.

ALARCÃO, M. (2000). (Des)Equilibrios familiares: uma visão sistémica. Coimbra:

Imprensa de Coimbra.

ARIÈS, P. (1978). História Social da Criança e da Família. (2.ª ed). Rio de Janeiro:

Guanabara.

ARTIAGA, J. F. (1998). A animação sociocultural. Teorias, programas e âmbitos.

Lisboa: Instituto Piaget.

BALLY, G. (1964). El juego como expressión de libertad. (2.ª ed). México: Fond.

Cultura Económica.

CAILLOIS, R. (1990). Os Jogos e os Homens. Lisboa: Cotovia.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

119

CALVENTE, C. (1981). PSICODRAMA. Jornadas de Psicodrama. (I. D. PLATA, Ed.),

15-17 de Octubre, Buenos Aires.

CASTANHO, G. P. (1995). Jogos Dramáticos com adolescentes. In J. MOTTA (Org.)

(1995). O Jogo no Psicodrama (pp. 23-43). São Paulo: Editora Ágora.

DATNER, Y. (2005). O método do Sociodrama nas mudanças Organizacionais. In M. M.

MARRA & H. FLEURY (Org.) (2005), Intervenções Grupais nos Direitos Humanos (pp.

15-42). São Paulo: Editora Ágora.

DICIONÁRIO DA LÍNGUA PORTUGUESA com Acordo Ortográfico (2016). Porto:

Porto Editora.

DINIZ, G. (1995). Psicodrama pedagógico e teatro/educação. São Paulo: Ícone.

DRUMMOND, J., & SOUZA, A. C. (2008). Sociodrama nas organizações. São Paulo:

Editora Ágora.

ERIKSON, E. H. (1972). Identidade, juventude e crise. Rio de Janeiro: Zahar Editores.

FRAGATEIRO, C. (1991). Será que se ensina a ensinar teatro? Actas do 2.º Encontro

Nacional de Didática e Metodologias de ensino, Aveiro, Universidade de Aveiro.

GOUVEIA-PEREIRA, M., PEDRO, I, AMARAL, V., ALVES-MARTINS, M., &

PEIXOTO, F. (2000). Dinâmicas grupais na adolescência. Análise Psicológica, 18(2),

191–201.

HUIZINGA, J. (1971). Homo ludens. O jogo como elemento da cultura. São Paulo:

Perspectiva.

IDÁGÑEZ, M., & ANDER-EGG, E. (2007). Diagnóstico social, conceitos e

metodologias. Rede Europeia Anti-Pobreza.

LEWIN, K. (1948). Problemas de dinâmica de grupo. (3.ª ed). São Paulo: Cultrix.

MAGOS, V. (2011). Le Psychodrame. Une Therapie pr le jeu. Bruxelles: CERP.

MARCELLI, D., & BRACONNIER, A. (2005). Adolescência e Psicopatologia. Manuais

universitários: Climepsi Editores.

MARINEAU, R. F. (1999). Jacob Levy Moreno 1889-1974. Pai do psicodrama, da

sociometria e da psicoterapia de grupo. São Paulo: Ágora Editora.

MARRA, M. M. (2004). O Agente Social que Transforma. São Paulo: Editora Ágora.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

120

MARRA, M. M., & FLEURY, H. (Org.) (2005). Intervenções Grupais nos Direitos

Humanos. São Paulo: Editora Ágora.

MONTEIRO, R. F. (Org.) (1998). Técnicas Fundamentais de Psicodrama. São Paulo:

Editora Ágora.

MORENO, J. L. (1975). Psicodrama. São Paulo: Cultrix.

MORENO, J. L. (2015). Psicodrama. São Paulo: Cultrix.

MORENO, J. L. (2013). The Future of Man's World. The North-West Psychodrama

Association, UK, Lulu Press.

MOTTA, J. (Org.) (1995). O Jogo no Psicodrama. São Paulo: Editora Ágora.

PAIS, J. M. (1990). A construção sociológica da juventude – alguns contributos. Análise

Social, XXV, 139–16.

PETRUS, A. (1997) (Coord). Pedagogía Social. Barcelona: Editorial Ariel.

PUNDIK, J. S., & PUNDIK, M. A. D. (1974). Introducción al psicodrama y a las nuevas

experiencias grupales. Buenos Aires: Paidós.

REYMOND-RIVIER, B. (1977). O desenvolvimento social da criança e do adolescente.

Lisboa: Editorial Aster.

SAMPAIO, D. (2003). Vozes e Ruídos, diálogos com adolescentes. Lisboa: Caminho

Editora.

SAVATER, F. (1999). As perguntas da vida. Lisboa: Ed. Ariel.

SCHÜTZENBERGER, A. A. (2003). Le psychodrama. Paris: Petite Biblioteque Payot.

SPOLIN, V. (1999). O Jogo Teatral no Livro do Diretor. São Paulo: Editora Perspectiva.

TEJERINA, I. (1997). Juego dramático y educacíon creadora. Jornadas Internacionlaes

Teatro y Niño. Teatro para ver, Teatro para actuar, Festival Internacional de

Marionetas, Tolosako Ekinbide Extea y Centro de Iniciativas de Tolosa, Tolosa.

YALOM, I. D. (1995). The Theory and Practice of Group Psychotherapy. (4th.). New

York: Basic Books.

YOZO, R. Y. (1995). 100 jogos para grupos, uma abordagem psicodramática para

empresas, escolas e clínicas. São Paulo: Editora Ágora.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

121

DOCUMENTAÇÃO CONSULTADA

PSICOSSOMA (s/d) (Livraria, Editora, Formação e Empresas) M6 – Metodologías e

estrategias pedagógicas (Formação Pedagógica Inicial de Formadores). Disponível em:

http://blearning.psicosoma.pt/FPIF_DATA/modulo_6/MetodologiasEstrategiasPedago

gicas.pdF

Resumo do Módulo: Jogos Dramáticos em Sociodrama, de Miguel Vasconcelos e Maria

João Brito. Lisboa. 8 de março 2014.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

122

TEATRO POSMIGRANTE EN ALEMÁN: DERROTEROS DE LA

INSTITUCIONALIZACIÓN

The Posmigrant Theater in German: pathways of institutionalization

PEREYRA, Soledad38

Resumen En el presente artículo trazamos un recorrido crítico a partir del concepto y la práctica del llamado teatro posmigrante, que se gestó como un fenómeno teatral originado en el circuito independiente desde comienzos del siglo XXI, primero en la ciudad de Berlín pero luego en otros circuitos teatrales de habla alemana. A partir de la reconstrucción de los antecedentes, historia y fluctuaciones del fenómeno junto con la consideración de algunos ejemplos del teatro posmigrante de los últimos años, proveemos un marco teórico-descriptivo general y ponemos especial énfasis en la discusión de ciertos rasgos y modos de este tipo de práctica teatral, en tanto incitadores de cambios en los procesos de institucionalización y consagración del teatro en el ámbito cultural alemán. Finalmente, se propone una reflexión del teatro posmigrante más allá la contingencia inmediata de su aparición, para discutirlo en tanto “ecología cultural” (LADDAGA, 2006), que enlaza su producción y dinámica de trabajo a las de otros grupos y formaciones artísticas de comienzos del siglo XXI. Abstract In this paper we draw up a critical path of the concept and practice of the so-called postmigrant theatre, that has been developing itself as an independent theatrical practice since the dawn of the 21st century, first in the city of Berlin, but the in other German-speaking theatrical milieus. From the reconstruction of the background, history and fluctuations of the phenomenon, together with the consideration of some examples of postmigrant theatre in recent years, we provide a general theoretical-descriptive framework and we place special emphasis on the discussion of certain traits and ways of this kind of theatrical practice, as inciting changes in processes of institutionalization and consecration of theatre in the German cultural sphere. Finally, we propose a reflection of the phenomenon beyond the immediate contingency of his appearance, in order to discuss it as a “cultural ecology” (LADDAGA, 2006) that links its production and dynamics of work with the ones of other artistic formations of the beginning of the XXI century. Palabras clave: Teatro posmigrante; Multiculturalismo; Institucionalización; Ecologías culturales.

Keywords: Posmigrante theatre; Multiculturalism; Institutionalization; Cultural ecology.

Data de submissão: Março de 2016 | Data de publicação: Setembro de 2016.

38SOLEDAD PEREYRA - Institut für Theaterwissenschaft- Bern Universität. E-mail: [email protected].

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

123

1. LOS ORÍGENES

En su estudio sobre el teatro contemporáneo, Andreas Engelhart introduce

brevemente al teatro posmigrante como experiencias, recuerdos colectivos y auto

representaciones de hombres que crecieron en el espacio de habla alemana pero que traen

consigo un origen migratorio (ENGELHART, 2013). En esta forma de primer

delineamiento del objeto, Engelhart se remite fundamentalmente al criterio de contenido

de este tipo de teatro y lo entiende como espacio, lugar de visualización y representación

de una zona de lo real de las sociedades multiculturales contemporáneas que ha sido

relegada y que tendría que ver casi exclusivamente con su enlace con los factores

autobiográficos.

El teatro en este sentido se volvería exclusivamente representación y testimonio,

y al definirlo de esta manera se omiten tres aspectos que incluyen el pasado y la actualidad

del teatro posmigrante, que consideramos aquí como sus verdaderos cimientos y que

sirven para problematizarlo en relación con las prácticas teatrales en el espacio de lengua

alemana. En primer lugar, el teatro posmigrante en alemán aparece, como veremos, bajo

el influjo de la lógica estructural del multiculturalismo europeo de los últimos años, con

el cual establece una forma de desagregación tensional39, y por ello busca tener anclaje

en las discusiones políticas más recientes de las sociedades en las que se inserta, más allá

de un modo representativo del material autobiográfico.

Desde ese lugar de enunciación en tensión con el supuesto afuera del texto

dramático y de la escenificación, este teatro se convierte en un espacio desde donde

renegociar las ideas esencialistas sobre temas vigentes en la realidad sociopolítica

inmediata, tales como: la inmigración, la sociedad multicultural, la violencia discursiva

sobre el otro y los lindes del concepto de lo nacional en Europa hoy. En segundo lugar,

desde sus orígenes se entendió como una práctica cultural que funcionaba también como

un contra-espacio profesional (dentro de una sociedad que simultáneamente desplegaba

un discurso de integración como la base de su política social estatal), en tensión con los

espacios teatrales de lengua alemana institucionalizados que tenían legitimidad y

financiamiento del Estado.

39 Para profundizar sobre el vínculo suplementario de las escrituras transnacionales en alemán con la sociedad multicultural de la que emergen, véase Pereyra (2016).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

124

De este modo, la práctica de teatro se convirtió en acción social directa porque

estaba pensada específicamente como un modo de trabajo inclusivo, orientado sobre todo

hacia los trabajadores de teatro de origen inmigrante, y pretendía ajustarse a sus

necesidades frente un circuito teatral profesional que los segregaba del espacio de la

institución legitimada. Hoy, cuando ya forma parte de la institución a la que antes se

oponía y marcaba como excluyente, se hace necesario volver a pensar esta característica

del teatro posmigrante o, en otros términos, la relación entre teatro posmigrante y política.

En tercer lugar, el teatro posmigrante en alemán se construyó con una arquitectura y

funcionamiento que responden a una forma de práctica comunitaria que se asemeja en

parte (aunque no completamente, como mencionaremos más abajo) al modo de

producción de las vanguardias y que se constata a partir de, justamente, la intensificación

de las colaboraciones y trabajos en forma grupal.

Numerosas obras del corpus que en los últimos años se identificó como teatro

posmigrante en alemán tuvieron su estreno o pasaron por la cartelera de un icónico

espacio, que puede servirnos también para discutir el multiculturalismo en relación al arte

y las prácticas culturales en Alemania hoy: el centro cultural Ballhaus Naunynstrasse en

el barrio berlinés de Kreuzberg. Es allí donde la directora teatral Shermin Langhoff

(n.1969) va a realizar los trazos efectivos de lo que luego se distinguirá como todo un

concepto y práctica teatral, bajo la rúbrica antes citada de postmigrantisches Theater

(SHARIFI, 2011a).

Es válido entonces preguntarnos: ¿en qué consiste el teatro posmigrante en

alemán?, ¿qué términos se involucran para describirlo?, ¿en qué sentido podría decirse

que sus características, propuestas y participantes se diferencian de formas anteriores del

binomino teatro y migración?, ¿cómo llega a constituirse en una práctica reconocida e

institucionalizada en los circuitos teatrales de lengua alemana? y ¿de qué manera se

construye la relación entre teatro posmigrante y política hoy?

Ya en un manual clásico sobre el corpus que él mismo había denominado como

“literatura intercultural en Alemania”, el editor y crítico Carmine Chiellino se encargó de

incluir un capítulo que Sven Sappelt (2000) titula con “Theater der Migrant/innen”, una

fórmula que él mismo reconoce como problemática: teatro inmigrante (sobre ellos) y de

los inmigrantes (hecho por ellos). Allí se sostiene que a partir de la década del 1960, junto

al gran sistema teatral de la República Federal Alemana, se conformaban

simultáneamente una gran cantidad de grupos con los más diversos lazos culturales:

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

125

rusos, kurdos, turcos, griegos, iraníes, griegos, africanos, latinoamericanos, ingleses,

entre otros. En este capítulo del manual se hacía un repaso por sobre los proyectos de

teatro más destacados bajo la premisa que la historia de origen de formación de cada uno

de los grupos refleja y acompaña la historia de migración laboral en la República Federal

Alemana en la segunda parte del siglo XX. Este enfoque le posibilita al autor una

periodización de las prácticas del “Teatro de/por inmigrantes” en tanto evolución, a través

del tiempo, en términos positivos del mismo, siempre tomando como valores de

evaluación un mayor éxito crítico, una recepción más amplia y una instancia de

profesionalización creciente. De esta forma deslinda las siguientes etapas del teatro de

inmigrantes en Alemania: (1) las hipótesis políticas y sociales del teatro (del) inmigrante

de los años sesenta y setenta; (2) las tendencias de profesionalización en los años ochenta

y (3) aspectos del trabajo teatral del teatro (del) inmigrante de los años noventa.

En su tesis de doctorado, una de las pioneras en la investigación sobre el

fenómeno, Azade Sharifi (2011b), busca las huellas previas de este teatro posmigrante en

lengua alemana en por lo menos dos proyectos anteriores que de alguna manera

posibilitaron, según su insinuación, la apertura hacia la institucionalización consagrada

de la propuesta de Langhoff. En primer lugar, Sharifi recuerda como antecedente los

primeros grupos de teatro amateur surgidos en las décadas del sesenta y setenta junto con

los “trabajadores extranjeros” (Gastarbeiter) que migraron hacia la República Federal

Alemana durante la posguerra, en plena era de reconstrucción. De este contexto político-

social bajo la Alemania dividida y en reconstrucción con la fuerza laboral inmigratoria,

tanto Sharifi como Sappelt subrayan el lugar segregado de los programas culturales del

Estado al que era relegado el teatro hecho por/de inmigrantes. En tanto la República

Federal Alemana nunca se reconoció a sí misma como una tierra de inmigración, le dejó

a cargo las responsabilidades de las actividades culturales de los inmigrantes a la propia

iniciativa y a las organizaciones informales de inmigrantes, según lo detallan los

documentos de la Comisión para la política de los inmigrantes del CDU/CSU

(BRAUNECK, 1983, p.12; SAPPELT, 2000, p. 277; SHARIFI 2011b).

Esta fue una forma oficial de apartar una realidad social que pertenece a la misma

sociedad que el Estado gobernaba. Como consecuencias condujo a una total libertad

frente a la ausencia de normativas, directrices y otras formalidades y dio lugar por un lado

a varias formas de experimentación performativas, pero por el otro, debido a las carencias

materiales y a la limitada recepción, llevó a un retraso en el desarrollo a largo plazo, la

profesionalización y la institucionalización. Está claro que la relación con el Estado, el

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

126

financiamiento y la institución teatral oficial es un factor que será después determinante,

como veremos, para los rasgos del más actual teatro posmigrante, tanto en sus propuestas,

en su discurso de identidad y en su práctica.

Del primer período consignado en el manual de Chiellino, se destaca el grupo

amateur español de Hannover de “Teatro popular” que se conformó ya en 1965 con un

ensamble de treinta españoles dirigidos por el vasco Jesús Carretero (SAPPELT, 2000, p.

278). De este grupo, Sappelt destaca la pantomima Die Gastarbeiter – oder: Wie aus

einem stolzen Spanier eine deutsche Arbeitskraft wurde, donde además de presentarse la

historia de una prototípica familia de trabajadores huéspedes españoles, se junta otro

rasgo que parece estar muy unido a este teatro: lo cómico. Cuando todavía no formaba

parte del teatro Gorki, en una entrevista, la directora Shermin Langhoff insistió en este

vínculo preponderante entre lo cómico y el teatro de inmigrantes:

“Mit den Wanderungsbewegungen gab es auch migrantisches Theater, aber vor allem als Kabarett und heute als Comedy. Das kennt man auch aus anderen Ländern. Auch in den Vereinigten Staaten waren die Schwarzen zunächst beim Amüsement und in der Unterhaltung der Mehrheitsgesellschaft präsent. Sie sollten am Besten über sich selbst sprechen und lachen. In diesem Bereich gibt es derzeit auch die größten Erfolge in Deutschland” (LANGHOFF apud FANIZADEH, 2009, sp.).

En ese contexto marcado por las iniciativas amateurs y una Alemania dividida,

también el docente y crítico teatral Manfred Brauneck va a surgir como uno de los

pioneros en la organización independiente de grupos de teatro por/de inmigrantes, ya que

desarrolló el proyecto “Populäre Theaterkultur” (1979) y luego el “Theater der

Ausländer” (1983). Dentro del proyecto participaban 53 grupos de teatro donde la

propuesta principal no era solamente el entreteniendo sino también polemizar sobre

problemáticas sociales cercanas, fundamentalmente las relacionadas con la integración.

También por los años ochenta, en la época que Sappelt marca como de primera

profesionalización, comienza a establecerse el Buhnen der KULTUREN- Arkadaş Theater

(1986) de la ciudad de Colonia.40 En este caso, el eje multicultural que atravesaba la

propuesta se manifestaba no sólo a través de los actores y otros trabajadores teatrales que

contaban con una historia personal de inmigración, sino también a través de la lengua del

escenario.

40 El teatro fue fundado originalmente como Arkadaş Theater por Necati Şahin como teatro independiente turco. En 1997 el ensamble y conjunto de trabajadores, uno de los únicos en su tipo en Alemania que hasta la fecha se había mantenido como una compañía itinerante, se muda a su casa definitiva y así se transforma en “Escenarios de las culturas” (BUHNEN DER KULTUREN), ampliando el foco principal original, que al comienzo buscaba estrechar las relaciones turco-alemanas (SAPPELT, 2000, pp. 286-287).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

127

Así como Shermin Langhoff fue una figura elemental para el proceso de

profesionalización e institucionalización berlinés, en el caso del Bühnen der Kulturen el papel

de agente cultural lo tuvo Lalel Konuk quien estuvo a cargo de la dirección hasta el 2010.

La lista y descripción de estos grupos y eventos teatrales que hace Sappelt en su

capítulo es extensa y variada y en ella se destacan: el Ensamble Turco del teatro Schaubühne

(1979/1980); el Teatro Colectivo de Vasif Öngoren (tanto en Berlín Este como Oeste); el

Teatro Siciliano y I Macap en Frankfurt (1981); el Teatro Polaco de Kiel (1983); el Teatro

Kreatur de Berlín (1989/1990); el Teatro Griego de Colonia (1990), el Teatro Pralipe de

Mühlheim (1991); el Teatro Coreo-dramático y el Teatro Romano de Colonia (1995/96); el

Teatro de Cámara Ruso de Berlín (1998), entre otros.

Naturalmente, el contexto socio-político del llamado Post-Wende alemán con la

llegada de la década del noventa, fue un factor fundamental no solamente para el surgimiento,

sino también en el proceso de institucionalización y reconocimiento del teatro posmigrante

como tal. Como apunta Denise Varney, un aspecto que trae la reunificación es una dimensión

más global y la visualización de perspectivas transnacionales en el teatro en lengua alemana

(VARNEY, 2008, p. 16).

Ya en la década del noventa, se pueden encontrar obras en el espacio de lengua

alemana, realizadas por autores de origen alemán (sin origen inmigratorio) que expresan los

conflictos y tensiones que luego serán característicos del teatro posmigrante. Obras como

Transit Heimat/gedecktetische (1994) de Anna Langhoff41, Germania 3 Gespenster am Toten

Mann (1996) de Heiner Müller42, y Bitte Liebt Österreich (2000) de Christoph

Schlingensief43: “show that the opening of Europe’s eastern borders and the subsequent

increase in cross-border movement create both a resistant force in the form of anti-foreigner

sentiment in the wealthy host nation and dissent among its marginalised ethnic groups that is

also, paradoxically, national in origin” (VARNEY 2005, p. 2). Estos ejemplos, a pesar de sus

diferencias en la forma y modo estético, son representativos de un intenso compromiso crítico

y simbólico por parte del teatro en lengua alemana con los problemas de movilidad y

migración en los años siguientes a la reunificación. Todos ellos comienzan a tematizar en el

teatro en lengua alemana contemporáneo las nuevas zonas sin fronteras de la era global y a

configurar las subjetividades transnacionales que las habitan, que serán también,

posteriormente, algunos de los temas recurrentes del teatro posmigrante.

41 Estrenada en la Baracke del Deutsches Theater en 1994 con la dirección de Sewan Latchinian. 42 Estrenada en el Berliner Ensemble en 1996 con la dirección del mismo Müller. 43 Más cercana a una performance que a una pieza dramática y definida como una “Containeraktion”, Bitte liebt Österreich – Erste Österreichische Koalitionswoche se estrenó en el marco del Wiener Festwochen del 2000.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

128

Tanto la extensa lista de experiencias, talleres, grupos y ensambles teatrales de

inmigrantes como la incipiente tematización de cuestiones referentes a una realidad

transnacional, deben comprenderse como antecedentes claros para la construcción del

suelo sobre el que el teatro posmigrante en alemán se va a erigir y que encontró su modo

y espacio recién dos décadas después de la Reunificación de Alemania.

2. UN CONCEPTO, PRIMEROS ÉXITOS Y RECONOCIMIENTOS

“es ist komisch, aber man darf das wirklich nicht unter die dokumentarische […] Lupe nehmen” (ÇELIK, 2006, p. 44).

Si de rastrear los primeros pasos del teatro posmigrante en alemán se trata, estos

deberían buscarse primero en la dirección artística que Matthias Lilienthal realizó en

Theater Hebbel am Ufer (HAU) desde el 2002 al 2012. Luego de asumir funciones como

director, Lilienthal convocó a Langhoff para realizar estrategias que permiten conectar el

espacio HAU con la población de origen inmigrante que vivía en el barrio. La dirección

de Lilienthal se caracterizó por buscar un lazo entre la diversidad estética para abordar de

ese modo la diversidad social.

En el 2006 Lilienthal le propone a Shermin Langhoff curar el festival “Beyond

Belonging”, que disponía del teatro para poner en escena historias vinculadas al ambiente

multicultural de Berlín. Este festival es el antecedente indiscutido del teatro posmigrante

como tal, es en este punto donde encuentra su inicio y empieza a configurar su modo

estético.44 No sólo porque a través del mismo se llevaron a escena obras icónicas para el

corpus posmigrante como la mismísima Schwarze Jungfrauen/Vírgenes Negras (2006)

dirigida por Neco Çelik (n.1972), sino también porque se caracterizó por la busca de una

escenificación heterogénea, sin renegar de diversas producciones que incorporan géneros

musicales urbanos (como el hip-hop), la interdisciplinariedad plasmada en instalaciones

y la intermedialidad en el uso del vídeo, entre otros (WEILER, 2014, pp. 222-227). A

partir de esta edición del festival, la noción de teatro posmigrante dentro del ambiente

teatral alemán tendrá a la curadora, Shermin Langhoff, como agente principal, ya que fue

ella misma quien acuñó el término, para pensarlo como invitación al debate de una nueva

noción de “nosotros” dentro de la sociedad alemana actual que, como proponía el título

del evento, iba más allá de la(s) pertenencia(s).

44 Esto no surge solamente de nuestra especulación. En noviembre de 2016 se llevaron adelante en el teatro Ballhaus Naunynstraße una serie de eventos para celebrar los diez años de teatro posmigrante. La fecha se toma, justamente, a partir de este festival.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

129

La obra Vírgenes negras de Feridun Zaimoğlu y Günter Senkel fundó un modo

frecuente en el teatro posmigrante con la elaboración de una pieza pensada como una

construcción híbrida sobre los conflictos multiculturales, a partir del entretejido

intermedial, intertextual, y transnacional presente en el texto dramático pre-escénico,

como asimismo en el texto dramático escénico.45

El texto dramático completo de Vírgenes negras se compone de diez monólogos

escritos a partir de entrevistas realizadas a mujeres “neomusulmanas”, tal como fueron

llamadas por la dupla Zaimoğlu/Senkel (BEHRENDT, 2006, p. 40) y este sentido no

puede renegar completamente la herencia de los medios del teatro documental46 que

cuenta con una extensa y fructífera tradición en los escenarios de lengua alemana, aunque

debe destacarse que Zaimoğlu/Senkel vuelven a trabajar el texto para curarlo en un

“lenguaje artístico” (“Kunstsprache”) (ZAIMOGLU apud BEHRENDT, 2006, p. 41). En

este principio estructurante de la obra -el supuesto material real que surge de entrevistas

y le da contenido a los monólogos- se puede dilucidar un rasgo que luego fue significativo

para Langhoff en la delimitación del concepto de teatro posmigrante: el contacto con la

vida misma y fundamentalmente con la realidad social emergente en el contexto social

multicultural actual. De este modo, podemos inferir que el teatro posmigrante tiene entre

sus rasgos fundamentales el vínculo con la vida material social cotidiana, pero no

específicamente para la escenificación de la experiencia personal (como ocurría más a

menudo en las primeras manifestaciones del teatro inmigrante en alemán). Aquí no hay

intimismo o confesión íntima. Tampoco hay una visión de lo documental como

instrumento periodístico, informativo.

En todo caso, ese vínculo con lo real resaltado a través de los préstamos a las

estrategias del teatro documental aparece en el teatro posmigrante para disparar la

problematización de los conflictos frecuentes del multiculturalismo en Europa, de una

manera que toque la sensibilidad del espectador, porque constantemente le está

recordando que esa no es una realidad ficcional o ajena, sino cotidiana y muy cercana.

45 Para esta distinción seguimos la clasificación de Dubatti propuesta en “Escritura teatral y escena, el nuevo concepto de texto dramático” (2009). Sobre el trabajo intermedial para la puesta en escena original de Vírgenes negras, veáse las entrevistas a Çelik (2006) y también el capítulo de Stewart (2014, pp. 81-102), donde ella muestra que justamente la mise-en-scène propuesta por el director, que se compone por lazos intermediales con el film Close Encounters of A Third Kind (1977, dir. Spielberg), es el elemento que mejor desestabiliza la interpretación documental y realista de la obra. 46 Acá Eva Behrendt elige la forma más neutra de “semidocumental” (2006, p.40) y el director de la obra, Neco Çelik insiste en que la pieza no debe interpretarse como documental (ÇELIK, 2006, p. 43). Quizás las dos posturas tengan que ver con alejar la producción de una posible interpretación etnográfica o también biografista, que podría quitarle peso político y artístico.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

130

Si bien el festival del HAU fue una plataforma esencial para esa experimentación

teatral no sólo en contenidos sino en los aspectos concretos de la mise-en-scène, para

Langhoff fue también la evidencia clara de que el proyecto debía trascender las fronteras

de un mero evento circunstancial:

“Wir haben das HAU als Labor genutzt und versucht, neue Protagonisten auf die Bühne zu holen, überhaupt zum Theater zu verführen. Dafür gab es ein immer grösseres Publikum, das wiederum hat die Theatermacher bestärkt, und auch politisch hat es etwas bewirkt. Die Medienaufmerksamkeit war immens. Es war aber auch ganz schnell klar, dass, wenn man es ernst meint mit einer Nachwuchsförderung am deutschen Theater, es nicht mit einem Festival getan ist. Also habe ich mich auf die Leitung am Ballhaus Naunynstrasse beworben” (LANGHOFF apud BEHRENDT, 2013, p. 11).

La pequeña sala para no más de 100 espectadores en el Ballhaus Naunynstrasse,

que como centro cultural existe desde 1983, tiene desde el 7 de noviembre de 2008 una

producción teatral activa vinculada a la comunidad migrante local del por antes marginal

barrio de Kreuzberg; es allí donde Shermin Langhoff, en su rol de directora de la sala,

comienza su trayectoria como impulsora y luego embajadora (en otros espacios) del teatro

posmigrante.

La primera temporada de la sala (2008/2009) se inició con seis producciones

teatrales y de baile en el marco del festival “Dogland-junges postmigrantisches Theater”.

Un subsidio de 200.000 euros del gobierno berlinés otorgado al proyecto junto con una

propuesta artística innovadora fueron las claves para desarrollar el ciclo de ese año de

forma exitosa.

Desde su apertura, la sala cuenta con una ocupación de un 90 % del público total,

que pertenece a diversos orígenes y abarca varios sectores generacionales (SHARIFI

2011b, p. 6).47 Ya en sus comienzos el foco principal fue puesto en la realización de

producciones teatrales propias y, junto a esto, se ubica también el interés en los últimos

desarrollos en el ámbito de la danza, el cine, la música y la literatura.

Naturalmente, es válida la pregunta sobre por qué consignamos el origen mismo

de la práctica del teatro posmigrante en las actividades desarrolladas en la sala Ballhaus

Naunyntraße a partir del 2008.

47 Esto supera con creces al promedio general de las salas alemanas, que “tienen un promedio del 80 por ciento de frecuentación de público en sus salas” (CRUZ, 2016, s. p.).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

131

Existen en paralelo, por esos años, otros proyectos vinculados a la problemática

de teatro y migración en el contexto de habla alemana, que tienen a sujetos inmigrantes

como protagonistas. Por ejemplo, el proyecto “Bunnyhill” llevado a cabo en la sala

Münchener Kammerspiele en el segundo semestre de 2004 que tuvo como principal logro

el estreno de la obra Ein Junge, der nicht Mehmet heißt48, la cual problematizaba zonas

de las afueras del centro de la ciudad, estigmatizadas como las de mayor población

inmigratoria y mayor criminalidad. Podríamos pensar también en Hajusom, la sala y

proyecto artístico transnacional de Hamburgo que desde 1999 reúne para hacer teatro a

adultos de mediana edad y a jóvenes adultos refugiados y posmigrantes de diversos

orígenes. Más allá de los indiscutibles méritos de la Hajusom y de la problematización

política esbozada por el proyecto “Bunnyhill”, los dos emprendimientos se centran en los

aspectos de integración y buscan un efecto más local. Del mismo modo, algunas de sus

acciones y propuestas, especialmente las del teatro Hajusom se ajustan al enfoque de la

pedagogía teatral49.

Si bien estas son características que también marcan al teatro posmigrante, este

último persigue una perspectiva general del multiculturalismo a partir de lo local que

siempre, a pesar de los efectos inmediatos, supone una reflexión más teórica y abstracta;

podría decirse entonces que el teatro posmigrante aborda temas del multiculturalismo

“glocalmente”: desde un pensamiento y reflexión global, que actúa y se arraiga de forma

local. De su lado, la propuesta de Langhoff desde la Ballhaus Naunynstraße responde

siempre a un impacto político más amplio y a una lógica estética, antes que pedagógica o

únicamente social, y es allí donde el concepto de posmigrante se vuelve instrumental para

marcar una diferencia con proyectos anteriores que tenían a migrantes como

protagonistas:

“Der Begriff «postmigrantisch» war notwendig, um den Blick auf die Migranten und ihre Geschichten hochkulturfähig zu machen. Ich wollte eben nicht mehr nur Communityintern agieren, wollte auch kein Theater für die Wohlwollenden machen, keine leicht verdaulichen Comedyformate. Am Ende geht es nicht mehr um Herkunft und Ethnien, sondern um politische Haltungen, Blicke und wie man ästhetisch damit umgeht: Eine Geschichte ist nicht besonders, weil ein Migrant sie erzählt, sondern weil sie besonders erzählt ist” (LANGHOFF apud BEHRENDT, 2013, p.11).

48 Esta obra fue dirigida Peter Kastenmüller (Múnich, 1970) quien inició el proyecto junto a Björn Bicker (Coblenza, 1972) y a Michael Graessner (Berlín, 1969). La obra Ein Junge, der nicht Mehmet heißt fue invitada también al festival Beyond Belonging en la edición de 2006. 49 La pedagogía teatral es un ámbito de estudio que tiene sus orígenes y principales desarrollos en Alemania con Hans-Wolfgang Nickel. Dentro de esta área, las propuestas de teatro inmigrante que apuntamos arriba deben leerse en cercanía con la pedagogía teatral del brasileño Augusto Boal y su “Teatro del oprimido” (BIDLO, 2006).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

132

Contrario a la creencia popular que ve la sala Ballhaus Naunystraße como un

mero salón de encuentro para la comunidad migrante que rodea al establecimiento -

perspectiva que empequeñece el valor artístico de las actividades allí desarrolladas por la

relevancia social más inmediata del espacio- debe destacarse en primer lugar el carácter

progresivo y experimental que tuvieron muchos de los espectáculos allí gestados. Sólo

con mirar al programa para el segundo semestre de 2016 vemos en la propuesta del

festival After the Last Sky (2016) ese impulso transgresor en lo estético que siempre está

enlazado con la vida política actual: el evento incluye performances, pero también

lecturas, debates y exhibiciones, todas realizadas por artistas, activistas, curadores,

académicos, etc. que crearon sus propuestas de manera intermedial e internacional

alrededor de la temática de la im/posibilidad de ser palestino. After the Last Sky es un tipo

de proyecto colaborativo e interdisciplinar, como muchos otros que enriquecen la

cartelera de la Ballhaus Naunynstraße desde su apertura, tales como Conflict Zone Arts

Asylum (CZAA), teatroinstabilo, Balkan Black Box (BBB), diyalog Theaterfest.

En segundo lugar, en relación con el valor estético del teatro posmigrante,

debemos subrayar también que gran parte de los actores que han circulado por el

escenario del Ballhaus no son amateurs, sino profesionales del ambiente de las artes y

prácticas performativas. Algunos de ellos son artistas reconocidos de la televisión y

cinematografía actual de Alemania, pero que hacia el 2008 cuando el proyecto de un

teatro posmigrante comenzaba, ninguno se había consagrado con un puesto permanente

en las codiciadas instituciones teatrales nacionales de ese país. En diversas

intervenciones, Shermin Langhoff ha sido determinante sobre este asunto que expone la

resistencia del mundo profesional hegemónico50 del teatro en lengua alemana frente a la

indiscutible realidad multicultural de la Alemania de hoy, al explicitar que hay numerosos

espacios establecidos para el desarrollo de, por ejemplo, narrativas migrantes en el cine

turco-alemán o incluso, en otros espectáculos, como en el cabaret., pero que al momento

en el que el teatro posmigrante empezó a gestarse en torno al Ballhaus Naunynstraße,

estos espacios estaban ausentes dentro de los circuitos de teatro en Alemania

(KÖMÜRCÜ NOBREGA, 2011, p. 94).

50 Con “hegemónico”, siguiendo a Gramsci (1971), nos referimos a todos los elementos y prácticas que participan y confirman el orden social establecido y, más abajo, con “contrahegemónico” nos referiremos a una hegemonía alternativa, o concretamente a los elementos y prácticas que se contraponen, se definen por ser un signo diferente y cuestionan las estructuras sociales dominantes en las que se insertan. Hegemonía y contrahegemonía, por esto, deben entenderse en conjunto, como prácticas de grupos y clases sociales concretos que luchan entre sí política e ideológicamente. En consecuencia, las fuerzas históricas de la hegemonía son variables y quedan determinadas por las fuerzas sociales que la ejercen.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

133

El nombre de esta sala que hemos marcado como icónica para pensar el teatro

posmigrante, empezó a irrumpir cada vez con más fuerza en los circuitos especializados

más allá del barrio de Kreuzberg especialmente a partir del éxito de Verrücktes

Blut/Sangre Loca (2010) de Nurkan Erpulat (n. 1974) y Jens Hillje (n.1968), que a su

vez fue una de las pruebas más claras de la sobresaliente dirección Shermin Langhoff

estaba realizando en este espacio. La obra tuvo un doble estreno en septiembre de 2010,

primero en la sala Gebläsehalle Duisburg en el marco de la Ruhrtriennale (2.9.2010) y

pocos días después en Berlín, en Ballhaus Naunynstrasse (9.9.2010), siempre dirigida por

Nurkan Erpulat. La obra, que tiene como hipotexto (GENETTE, 1989) el film francés La

Journée de la Jupe (2006, dir. Jean-Paul Lilienfeld), trata de un día de escuela secundaria

en Alemania, donde la docente Sonia Kellich se dispone muy motivada a dar clase a un

grupo de jóvenes -caracterizados en conjunto con rasgos que denotan su origen

inmigrante- que se agreden entre ellos y también a ella.

Toda la situación desde el comienzo es el marco perfecto para (hacer) actuar

muchos de los clichés, prejuicios y tensiones de la vida multicultural: la pañoleta, velo o

Hiyab y las mujeres musulmanas; la pronunciación de la lengua alemana; los gestos y el

lenguaje no-verbal, entre otros. Sin embargo, es un objeto, un elemento externo, lo

determinante para el cambio de la narración dramática. En el medio de una pelea entre

estudiantes, una pistola que estaba en la mochila de uno de los estudiantes cae al piso.

Sonia, abatida por la situación caótica de su clase (o aprovechando la oportunidad) les

confisca el arma decidida a que sus alumnos sigan con el temario del día -Schiller, la

Ilustración y específicamente la obra Los bandidos (1781)- aunque tenga que guiarlos a

través de él a punta de pistola. La paradoja es tan obvia y excesiva que se vuelve,

indefectiblemente también cómica: la docente, movida por las ideas de la Ilustración se

vuelve una criminal y antes que con la razón y la moral, opera con la lógica de la violencia.

La institucionalización del teatro posmigrante, que desarrollaremos más en el

próximo apartado, tiene un punto concreto que puede marcarse en el tiempo: el 2013. En

este año Langhoff se convirtió en la primera Intendantin de origen inmigrante en dirigir

un teatro nacional alemán más específicamente el Maxim Gorki Theater51, ubicado frente

51 Desde su fundación, el teatro Maxim Gorki tuvo cinco directores artísticos o Intendanten: Maxim Vallentin (1952 – 1968), Albert Hetterle (1968 – 1994), Bernd Wilms (1994 – 2001), Volker Hesse (2001 – 2006) y Armin Petras (2006 – 2013). Existen rumores que apuntan que Petras, quien para el 2013 había mantenido una actividad intensa en el Gorki con cerca de 200 puestas en escena y la propuesta de un teatro para la confrontación política, se retiró porque pidió un presupuesto superior que el Senado alemán le negó.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

134

al tradicional boulevar Unter den Linden, en el centro histórico y político de Berlín.52

Aunque el más “pequeño” de los teatros estatales berlineses, el paso del proyecto del

teatro posmigrante a la sala Maxim Gorki representa un cambio significativo que pone en

evidencia su recepción positiva y su paso a la institucionalización53. En primer lugar este

teatro, además de una ubicación central y simbólicamente muy importante, tiene una sala

de 440 localidades, esto es, mucho mayor en cuanto a capacidad de espectadores en

comparación con el espacio de la Ballhaus Naunynstraße. Es también, en términos de

tradición dentro de los circuitos de artes performativas, un espacio más prestigioso que el

anterior espacio de Kreuzberg. Aunque siempre fue un teatro enfocado a la puesta en

escena de producciones contemporáneas y de confrontación política (especialmente a

partir de la dirección artística anterior, llevada a cabo por Armin Petras), esta propuesta

se radicalizó a partir de la nueva dirección en el Maxim Gorki, a cargo de Shermin

Langhoff y Jens Hillje, quienes cada año, desde el 2013, configuran un programa que

dialoga sobre las transiciones artísticas, políticas y sociales.

En resumen, la falta de acceso a un espacio teatral hegemónico (esto es, estatal),

la carencia de presupuestos fijos, la segregación en la contratación laboral de los

profesionales de origen inmigrante por un lado, y el establecimiento en espacios

alternativos y marginales a los centros de prestigio por el otro, fueron determinantes en

esta recepción e institucionalización tardía del teatro posmigrante en alemán, que recién

se concretará de forma efectiva en el 2013, con el desembarco de Langhoff en el Teatro

Maxim Gorki. El cambio de posición laboral de Langhoff no tiene que ver solamente con

el espacio en términos de locación física o de capacidad de espectadores (que por supuesto

son relevantes), sino que también debe leerse como un cambio de espacio entendido

simbólica y económicamente.

52 El edificio de estilo corintio del Gorki, que originalmente fue construido en 1827 por el arquitecto Karl Friedrich Schinkel para funcionar de sede de la Academia de Canto de Berlín, fue destruido casi en su totalidad en la Segunda Guerra Mundial. Fue recién después de la guerra cuando comenzó a utilizarse el edificio para la representación de teatro y en 1952 fue refundado como Teatro Maxim Gorki en honor al escritor soviético homónimo. Al principio la programación se componía principalmente de textos del realismo ruso y soviético, y se define en esta época en oposición a la propuesta del teatro épico del Brecht desde el Berliner Ensemble, como un “Ort zur Pflege russischer und sowjetischer Theaterkunst” (NIEHAUS, MÖCKL, & MÜLLER, 2002, p.1). Sin embargo, a pesar de esa premisa inicial, también se estrenaron aquí Die Korrektur, de Heiner Müller o Nacktes Gras de Alfred Matusche. El paso del tiempo hizo que el Maxim Gorki se convirtiera en uno de los teatros más vanguardistas dentro de los teatros nacionales de Berlín, especialmente en el abordaje crítico de temas sociales conflictivos o considerados tabú, como hoy mismo el de la inmigración, el asilo o la posición de Alemania frente a las contiendas armadas en Israel. 53 La región de Berlín cuenta con un total de cinco teatros que se mantienen con presupuestos provenientes de dinero público (nacional, federal o municipal); estos son: Volksbühne; la Schaubühne; Berliner Ensemble, Deutsches Theater y el Gorki. El teatro Maxim Gorki con su ensamble sigue siendo el más pequeño de Berlín. Su planta cuenta con aproximadamente 148 empleados estables, a diferencia de los 250 que tienen en promedio el resto de los teatros estatales berlineses.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

135

Al tomar el cargo de directora artística del teatro Maxim Gorki y continuar desde

allí el proyecto iniciado en HAU y en Ballhaus Naunynstraße, Shermin Langhoff abría

las puertas para que el teatro posmigrante saliera a jugar, por primera vez, al escenario de

un teatro estatal alemán de forma estable y no como eventualidad de la contingencia

inmediata. Como señalamos arriba, las agrupaciones de teatro inmigrante se encontraban

activas desde la década del sesenta y, luego, desde comienzos del 2000 encontramos

experiencias de una práctica teatral que empieza a esbozarse como posmigrante, que va

contar con una mayor difusión más allá de sus espacios originales de producción y con el

reconocimiento crítico y del público recién cerca de una década después, a partir del 2008.

De su parte, las obras icónicas de este teatro, Vírgenes negras y Sangre loca

fueron elegidas por el público y reconocidas por la crítica en diversas instancias por su

valor estético, y por consiguiente también promovieron la institucionalización del teatro

posmigrante en alemán y signaron algunos de sus rasgos característicos: los debates de la

sociedad multicultural, la intermedialidad y el trabajo con las estrategias del teatro

documental. Aunque los parámetros de qué es el teatro posmigrante eran, hacia el 2008,

indefinidos y a veces polémicos (y quizás todavía hoy lo sean), Shermin Langhoff

evidentemente intuía ese valor de iconicidad y reconocimiento institucional que cargaban

las dos obras, ya que las incorporó al programa de la temporada que inauguró sus

funciones como directora artística del teatro Maxim Gorki.54 Y dicha incorporación se

hizo con puestas en escena iguales o muy similares a las que tanto éxito habían tenido

tanto en el HAU como en la Sala de la Naunynstraße. En los términos de Bourdieu (1997),

podemos afirmar que si bien durante la primera década del siglo XXI el teatro

posmigrante logró una serie de triunfos, estos no fueron sólo en cuanto a su capital

económico (nuevos presupuestos, festivales, escenarios permanentes y estables) que

indiscutiblemente ayudó a que creciera como un proyecto estético a gran escala, sino

también en cuanto a su capital simbólico en el campo cultural (reseñas en revistas

prestigiosas de la disciplina teatral, premios, entrevistas a sus participantes, invitaciones

al ensamble para presentarse fuera de la sala berlinesa).

En este sentido, la línea progresiva, experimental y revulsiva del teatro

posmigrante propuesta por Langhoff desembarca en el Teatro Maxim Gorki con ese

margen de capital simbólico que ganó en el Ballhaus Naunynstraße y no tardó en dar

nuevos frutos en el nuevo espacio: en el 2014 fue seleccionado como teatro del año por

54 Sangre loca se reestrenó en el Teatro Maxim Gorki el 22 de noviembre de 2013 dirigida por Nurkan Erpulat y Vírgenes negras el 7 de febrero de 2014 con la dirección de Neco Çelik.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

136

la revista Theater Heute. Durante todo el proceso de institucionalización, cada acción,

evento, reconocimiento individual o específico, de los descriptos en este apartado,

participó de la configuración del teatro posmigrante como iniciativa artística colectiva y

experimental, en tanto depósito de sentidos contrahegemónicos sobre la sociedad

multicultural, las prácticas artísticas experimentales y, muy especialmente, la institución

teatral de Alemania.

3. INSTITUCIONALIZACIÓN

Como todo proceso de institucionalización, el del teatro posmigrante incluye un

conjunto de prácticas específicas a través de las cuales se lo reconoce dentro de un marco

institucional con el cual se relaciona, esto es, el del teatro de Alemania. La actual

institucionalización del teatro posmigrante en lengua alemana, se constata en por lo

menos cuatro elementos que definen su silueta y también su relación con el marco que la

incluye: (1) el desarrollo de una cartelera en un teatro estatal donde la presencia de teatro

posmigrante se vuelve permanente y el presupuesto estable (2) la concreción de una lógica

estética que lo identifica y diferencia a través de las producciones de cartelera, proyectos

interdisciplinarios y a través de intervenciones en diversos medios externos al hecho

teatral mismo; (3) la multiplicación de bibliografía crítica y de proyectos de investigación

sobre el mismo, que incluye la realización de tesis de máster y doctorado sobre el tema,

así como el desarrollo de eventos académicos donde el teatro posmigrante es tema de

discusión e intercambio de conocimiento; (4) la transferencia del teatro posmigrante más

allá de las fronteras de Berlín y de Alemania, donde se origina como un movimiento

específico. Estos elementos, aunque diferenciables, deben observarse como una

constelación.

3.1. Desarrollo de una cartelera en un teatro estatal

Si observamos el programa actual del teatro Maxim Gorki, corroboramos que la

propuesta de un teatro posmigrante no se remitió a una moda temporal, ni a una búsqueda

de la contienda cuando Langhoff tomó el cargo de directora artística en el 2013. Hay una

proyección de la propuesta artística del teatro posmigrante a través de la programación de

cartelera del teatro Maxim Gorki. Si bien en un comienzo fueron determinantes para la

cartelera y el asentamiento de la propuesta el reestreno de los éxitos conocidos de teatro

posmigrante, esto es Sangre loca y de Vírgenes negras, también se introdujeron nuevas

obras que aportaron más marcas de identidad y logros al proyecto en su conjunto.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

137

Por solo nombrar algunas, en la temporada del 2013/2014 se presentó las

adaptación de una novela transnacional, también de temática posmigrante, llamada Der

Russe ist einer, der Birken liebt / A los rusos le gustan los abedules (2012) de la joven

autora Olga Grjasnowa (n.1984)55 y también una nueva puesta en escena de la clásica

pieza Der Kirschgarten / El jardín de las cerezos (1904) de Anton Tschechow 56, pero

esta vez con un enfoque orientado a las problemáticas multiculturales. Hoy la propuesta

se mantiene estable con un presupuesto igual al que tenía el director artístico anterior,

Armin Petras, y se revalida con obras como el estreno de The Situation/ La situación

(2015), escrita grupalmente por Jael Ronen (n.1976) y su ensamble57, la cual habla de la

situación de árabes y hebreos en relación con los conflictos en Medio Oriente y la

emigración a países de Europa occidental. También confirma su institucionalización con

la reinterpretación y trabajo intertextual de clásicos como Je suis Jeanne D’Arc / Yo soy

Juana de Arco58 (2015) obra escrita en base a la pieza original Die Jungfrau von Orleans

/ La doncella de Orleans (1801) de Schiller. En esta obra, la trama schilleriana se

reelabora para hacer dialogar la figura de Juan de Arco, confundida entre emociones y

sus creencias ideológicas, con la situación actual entre las naciones europeas y el

fanatismo religioso, especialmente en relación a Francia y el atentado a la revista Charlie

Hebdo.

3.2. Concreción de una lógica estética

A partir de este proceso de institucionalización, el teatro posmigrante en alemán

comenzó a hacer más explícita y definitiva su lógica estética. Ante todo debe remarcarse

que desde distintos textos de intervención los protagonistas del teatro posmigrante

insisten en una práctica teatral como una “plataforma para el conflicto” (VON HÖBEL,

2014) sobre la visibilidad de los agentes y sujetos de teatro de origen migratorio, pero

también, como propone Langhoff, se trata de:

“[…] Geschichten und Perspektiven derer, die selbst nicht mehr migriert sind, diesen Migrationshintergrund aber als persönliches

55 Estrenada como obra teatral en el Maxim Gorki el 16 de noviembre de 2013, con la dirección de Yael Ronen. 56 Aunque había tenido otras presentaciones en el Gorki, se reestrena con una nueva puesta el 15 de noviembre de 2013 con la dirección de Nurkan Erpulat. 57 Esta obra fue estrenada el 4 de septiembre de 2015, con la dirección de la misma Yael Ronen. Desde su estreno tuvo un gran éxito; fue invitada a los Theatertreffen 2016 y ganó la distinción de “Mejor obra del año” (2016). 58 Esta obra es el producto del trabajo en una de las salas alternativas del Gorki, el STUDIO Я, que se define como “Kunstasyl für marginalisierte Themen und Denkweisen”. Fue estrenada el 17 de diciembre de 2015 con la dirección de Mikaël Serre.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

138

Wissen und kollektive Erinnerung mitbringen. Darüber hinaus steht "postmigrantisch" in unserem globalisierten, vor allem urbanen Leben für den gesamten gemeinsamen Raum der Diversität jenseits von Herkunft” (LANGHOFF apud DONATH, 2011).

Aquí la adopción del término posmigrante tiene indefectiblemente

connotaciones políticas y estéticas. En tanto en su tesis de doctorado, Sharifi (2011b)

habla de la participación de los “posmigrantes” en, por ejemplo, la escena de Colonia,

Langhoff en numerosas intervenciones públicas se refiere a lo posmigrante como una

categoría crítica abstracta, que en su caso define al teatro producido y no exclusivamente

a los sujetos, sino también a la sociedad en general: los sujetos y sus formas de

relacionarse. En su modo de conceptualizar la experiencia teatral que propone, en tanto

“postmigrantisches Theater”, Langhoff apuesta a pensarlo como un modo estético que se

vehiculiza en una práctica heterogénea, la cual, como indica una de las dramaturgas

involucradas, Sasha Marianna Salzmann (n. 1985), no muchas veces es comprendida por

los críticos, espectadores y otros agentes de teatro, que con frecuencia buscan sólo la

materialización del exotismo en el espectáculo teatral posmigrante (SALZMANN, 2012,

p. 3).

Por otra parte, además del costado estético de la práctica, hay también un sentido

político de la misma, que a partir de su aterrizaje en el Maxim Gorki se va a reforzar y es

el de darle visibilidad a todos los sujetos tradicionalmente no representados por los

programas culturales, para participar de la experiencia teatral o también desarrollar una

producción desde una perspectiva translocal59. Es a partir de éste y los rasgos anteriores

que podemos esbozar una primera definición teórica del teatro posmigrante. Lo

consideramos como una forma de producción estética experimental emergente -debido a

su posición en relación con una determinada hegemonía profesional- en el área de las

artes performativas, que se desarrolla en las últimas décadas a partir de un contexto y

comunidad urbana transnacional, cuyo contenido debe leerse en el marco de los debates

por el multiculturalismo, y que se desarrolló primero a partir de espacios no-habituales,

marginales, como el festival Beyond Belonging y la sala Ballhaus Naunynstrasse.

59 La insistencia en visibilizar sujetos que antes no tenían voz dentro del sistema teatral hegemónica aparece insistentemente en la página web del Teatro Maxim Gorki que es su principal plataforma para la comunicación externa: “Das Gorki meint die ganze Stadt, mit allen, die in den letzten Jahrzehnten dazu gekommen sind, ob durch Flucht, Exil, Einwanderung oder einfach durch das Aufwachsen in Berlin” (GORKI, 2016).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

139

Si consideramos el énfasis práctico de la producción estética posmigrante y la

dinámica de trabajo propuesta, podemos también discutirlo como la conformación de una

ecología cultural - concepto que tomamos de Reinaldo Laddaga y de su libro Estéticas

de la emergencia (2006)60- que surge en consonancia con los procesos de globalización

en el espacio urbano, en el caso que nos compete en Berlín. Las ecologías culturales,

como el teatro posmigrante en alemán, se identifican por el modo, la producción y la

perspectiva colectiva que se inscribe siempre en un proyecto común más grande. En tanto

ecología cultural del régimen práctico de las artes, el teatro posmigrante en alemán

delinea la silueta de su identidad a través de procesos experimentales, abiertos,

cooperativos y, especialmente, comunitarios que se hicieron cada vez más explícitos

desde su reciente institucionalización. Podemos pensar como ejemplo, la relación que el

teatro posmigrante tiene, a veces, con la autoría de las obras. Una de las autoras y

directoras más exitosas del teatro posmigrante, Yael Ronen, compone todas sus obras a

través de un método colectivo. El ensamble no sólo produce artísticamente el texto sobre

el escenario, a través de la interpretación y actuación, sino que participa, también, en la

producción del texto dramático escrito y como tal, son considerados autores también de

las obras. Según se documenta en entrevistas, la composición del texto dramático a través

de la interacción y negociación semántica con el ensamble se lleva hasta el punto de no

tener listo, cerrado, concluido el texto incluso un día antes del estreno.

El aspecto comunitario del teatro posmigrante se observa incluso en cómo en su

espacio institucionalizador, en el Teatro Maxim Gorki, le muestra esa faceta a los

visitantes y espectadores.

Por ejemplo, tanto la pared al final de la primera escalera que conduce a la sala

(Foto 1), como en el vestíbulo del auditorio principal y en la escalera secundaria que lleva

a las butacas en la parte superior de la sala (Foto 2), lucían de la siguiente manera durante

la dirección artística de Armin Petras (2006-2013):

60 A su vez Laddaga toma el concepto de la sociología de Charles Tilly (2015). Para Tilly, la formación de identidades está directamente relacionada con las ecologías culturales y es en este punto que su perspectiva resulta productiva para nuestro análisis del teatro posmigrante.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

140

Foto 1 Foto 2

©Aurin (2009)

Las grandes fotos individuales de los actores y actrices del ensamble, realizadas

en blanco y negro, con altos contrastes y una emocionalidad individual resaltada,

decoraban las paredes. En la actualidad, los mismos espacios del teatro muestran, a través

de otro estilo fotográfico y de diseño interior, la emergencia de una lógica estética que

enfatiza el trabajo colectivo, rasgo típico de las ecologías culturales:

Foto 3 Foto 4

©Pereyra (2016)

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

141

En la pared al final de la escalera de mármol que lleva hacia la sala principal

(Foto 3) se presentan las imágenes resultantes de un proyecto llamado “We Are All Under

One Sky” (2016) donde los trabajadores del Teatro Gorki aparecen fotografiados con una

imagen artificial de un cielo superpuesta en la parte de atrás de sus cabezas. El proyecto

fue realizado por Esra Rotthoff, quien ya había colaborado con el Ballhaus Naunynstraße.

En el vestíbulo que da acceso al auditorio (Foto 4) se siguen exhibiendo fotos de los

integrantes del ensamble, pero de una manera diversa. Se presentan en conjunto, como

un grupo, a la manera de un mural. Además de esto, son fotografías a color, en primeros

planos simétricos, como si fuesen destinadas a un pasaporte u otra forma de identificación

clara con su identidad, según sus palabras tratando de lograr con sus imágenes un espejo

de la Berlín contemporáneo. Tanto la estética fotográfica, como la disposición de estas

imágenes y la temática propuesta por Esra Rotthoff para su muestra enfatizan el trabajo

grupal, bajo una dinámica colectiva, como hacen de forma característica las ecologías

culturales y los muestran, como la artista enuncia en su web, “filled not with their persona

of actor, but with personality as human” (ROTTHOFF, 2014).

La práctica cultural del teatro posmigrante reconoce en primer lugar la realidad

poli-migratoria en los países de lengua alemana (aunque podríamos decir de Europa en

general), por ello insiste en deshabitar una idea de la cultura monolítica y se vincula con

la problematización sobre constructos complejos de la identidad en las sociedades

multiculturales. Con ello y en tanto ecología cultural, el teatro posmigrante se desarrolla,

en un primer momento, a través de una amplia red de artistas de segunda o tercera

generación de inmigrantes (originalmente, en Alemania), donde el listado de obras y

autores pone de relieve los vínculos y conexiones entre unos y otros. En su libro sobre el

tema, Sharifi reconoce estos vínculos entre autores y directores, ligados

fundamentalmente a la sala de Kreuzberg: “Ein breites Netzwerk an Künstlern der

zweiten und dritten Generation wie Fatih Akin, Miraz Bezar, Nuran David Calis, Neco

Çelik y Feridun Zaimoğlu inszenieren am Ballhaus Naunynstraße” (SHARIFI, 2011b, p.

66).

Visibilizar ese entramado, la pertenencia, inclusiones y asociaciones de la red

parece ser una parte fundamental de la propuesta del teatro posmigrante en tanto ecología

cultural. Desde su práctica, fundamentalmente desde el Teatro Maxim Gorki, el teatro

posmigrante expone una serie de “fertilizaciones cruzadas” (LADDAGA 2006), esto es

de interacciones productivas para la experiencia cultural propuesta, de entre las cuales

podemos mencionar por lo menos tres:

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

142

A. las novelas de autores trasnacionales que son puestas en escena como

piezas teatrales tienen como directores a aquellos que cuentan con experiencia

en el teatro posmigrante61;

B. algunas de las obras que habían pasado por salas más alternativas, que

responden a la dinámica de producción de su ecología y que habían tenido

una recepción positiva, se incorporaron luego, a partir del 2013, al programa

del Teatro Maxim Gorki y se vuelven referentes clásicos del teatro

posmigrante62, y por último,

C. también algunos de los directores, de los grupos y de los autores con

antecedentes de producción en el cine y teatro vinculado a las temáticas del

multiculturalismo y la inmigración se incorporaron al ensamble y

producciones del Gorki y hoy continúan desde allí su práctica en esta

dirección estética. 63

Vistas a gran escala, todas estas formas de “fertilizaciones cruzadas” pueden

leerse como tareas y experiencias colaborativas que integran un proyecto común, el de la

ecología cultural del teatro posmigrante.

61 Téngase por ejemplo la puesta en escena de las dos novelas de Olga Grjasnowa, la joven autora de Azerbaijan, que se pusieron en escena el teatro Maxim Gorki. Nos referimos a la ya mencionada A los rusos le gustan los abedules y a Die juristische Unschärfe einer Ehe/ La incertitud legar de un matrimonio (2014) —estrenada en septiembre de 2014 y dirigida por Nurkan Erpulat—. Como establecimos arriba, tanto Yael Ronen como Nurkan Erpulat habían trabajado en sus propias producciones de teatro posmigrante. 62 Los ejemplos más evidentes son las ya mencionadas obras Vírgenes negras de Zaimoğlu y Senkel —que había sido estrenada originalmente en el teatro Hebbel am Ufer (HAU) en el marco del festival “Beyond Belonging” de 2006 con la dirección de Neco Çelik— y Sangre loca de Erpulat y Hillje —que se estrenó de forma doble en septiembre de 2010 primero en el marco del festival “Duisburg – Ruhrtriennale” y pocos días después en el Ballhaus Naunynstraße, dirigida por el mismo Erpulat—. Las dos obras, como establecimos en la sección anterior, fueron protagonistas de la cartelera que dio inicio a la dirección artística de Shermin Langhoff en el Gorki, en septiembre de 2013. 63 Para esta forma de “fertilización cruzada” vale el nombre de Neco Çelik como el ejemplo más esclarecedor. Director de cine y de teatro, Çelik junto con varias películas de temática posmigrante, dirigió, como ya mencionamos arriba, Vírgenes negras y también Nathan Messias (2006) — estrenada en el 2009 en el Ballhaus Naunynstraße es una reversión de la clásica Nathan der Weise/ Nathan el sabio de Lessing (1779)—. Hoy dirige con frecuencia en el teatro Maxim Gorki. Del mismo modo, Nurkan Erpulat, quien ya había trabajado en el Ballhaus Naunynstraße, hoy forma parte de los directores estables del Gorki y está a cargo allí de obras de teatro posmigrante, como la puesta de El jardín de los cerezos de T. Así también del lado de los autores, Sasha Marianna Salzmann había escrito algunas piezas que deben considerarse como teatro posmigrante, como Muttersprache Mamelosch / Idioma materno mameloshn (2013) —estrenada en la pequeña sala “Box” del Deutsches Theater de Berlín—. Desde el 2013 hasta hoy en día, varias obras de esta autora se pusieron en escena en el Maxim Gorki, es autora estable del teatro y hoy dirige allí el Studio Я. Por último también puede pensarse en el grupo Rimini Protokoll, uno de los pioneros en la incorporación de las discusiones políticas sobre la migración y los modelos económicos europeos, que forma parte de la temporada 2016-2017 del Teatro Maxim Gorki.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

143

3.3. Multiplicación de bibliografía crítica y de proyectos de

investigación sobre teatro posmigrante.

Como anticipamos al comienzo de la sección, ha habido otro tipo de índice de la

institucionalización del teatro posmigrante, fundamentalmente en la crítica especializada

sobre el tema en lengua alemana y en lengua inglesa. Hay dos momentos decisivos en los

que se puede constatar la multiplicación del abordaje académico sobre el teatro

posmigrante: a partir del 2011 cuando ya habían sido estrenadas y habían tenido un gran

éxito Sangre loca y Vírgenes negras y luego hacia el 2013 cuando Shermin Langhoff se

incorpora al teatro Maxim Gorki.

A partir de estos dos momentos crece de forma consistente el tratamiento del

teatro posmigrante en diversos medios culturales, pero fundamentalmente se produce un

desplazamiento hacia la crítica académica donde se extiende conceptual e

interdisciplinarmente, se multiplica en espacios de trabajo (conferencias, proyectos de

investigación, talleres, entre otros) y se profundiza la reflexión en términos artísticos.

A continuación haremos un breve resumen de las fuentes más importantes que,

por supuesto, no pretende ser exhaustivo sino meramente indicial del proceso de

institucionalización que aquí recorremos.64

En el ámbito de la producción escrita, a partir del 2013 el teatro posmigrante

aparece en textos generales con perspectiva histórica sobre teatro y cultura en lengua

alemana (ENGLHART, 2013; WEILER, 2014) y esto lo desliza fuera de la contingencia

de un fenómeno aislado. De su lado, bajo el inclusivo título de Theater und Migration

Wolfgang Schneider compilaba ya en el 2011 una serie de textos de diversos académicos,

entre los cuales aparece - en algunos de los capítulos como en los de Sharifi, Israel y

Peters- la sistematización del término “posmigrante” tal como lo hemos definido en estas

páginas. De la misma manera, el concepto se vislumbra en los inicios de su

sistematización en un artículo de Sieg (2011), que se propone pensar la relación del teatro

posmigrante con el teatro documental en el espacio berlinés.

Asimismo, una de las escritoras integrantes del volumen de Schneider y, como

hemos destacado, precursora en el tema, publica también en el 2011 su tesis titulada

Theater für alle? Partizipation von Postmigranten am Beispiel der Bühnen der Stadt Köln

64 Por cuestiones inherentes a las limitaciones de espacio, dejaremos de lado las producciones sobre el teatro posmigrante de la prensa y de otros medios de comunicación con soporte virtual que merecen desarrollos separados.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

144

donde además de la investigación descriptiva del contexto de surgimiento toma como

objeto de análisis la presencia del teatro de inmigrantes y posmigrantes en la ciudad de

Colonia. En un capítulo publicado recientemente que lleva el título “Theater und

Migration”, Sharifi (2016) realiza un extensísimo análisis sobre el tema en términos

comparativos a partir de algunos espacios nacionales europeos: Alemania, Inglaterra,

Suiza, Austria, entre otros. Con un análisis completo con respecto a proyectos, datos de

obras y autores Sharifi (2016) entrega un panorama actualizado sobre la problemática,

pero continúa trabajando la noción posmigrante de una manera no conceptual y tampoco

estética (como aparecía en Langhoff) y como un término ligado a la condición de origen

de los artistas, para terminar haciendo en gran parte una “Recherche nach Theatermachern

of color” (SHARIFI, 2016, p. 361), concepto que denota una clara influencia de la crítica

norteamericana y que, en nuestra opinión, aleja la propuesta del teatro posmigrante de su

relación tensional con el círculo de institucionalización en el que se inserta: el sistema y

tradición teatral en lengua alemana.

Otra de las marcas de la institucionalización del tema en el discurso académico

se encuentra en el volumen Das Drama nach dem Drama (2011) compilado Artur Pełka

y Stegan Tigges. En este libro se incluye un debate-entrevista titulado “Migration dichten

und deuten” realizado entre Shermin Langhoff, Tunçay Kulaoğlu y Barbara Kastner. En

muchos casos, cuando aparece el tema del teatro posmigrante, se plantea desde la

pedagogía teatral, como por ejemplo el texto de Tania Meyer Gegenstimmbildung (2016)

donde desde una perspectiva histórica que va hasta la actualidad analiza la potencialidad

política del teatro y la pedagogía teatral para analizar y discutir el racismo.

También hay diversos trabajos que se avocan al estudio de caso de algún

proyecto concreto donde el teatro aparece como herramienta de integración social en

comunidades con una importante minoría de origen inmigrante/posmigrante - muestras

de este tipo de estudio y análisis pueden encontrarse en las secciones “Theater als Ort

gesellschaftlicher Partizipation” y “Theater als Angebot interkultureller Spielpläne” del

volumen de Schneider (2011)-. Cercano a esta perspectiva es el libro Irritation und

Vermittlung (STING et al., 2010) donde las “vírgenes negras” vuelven a aparecer para

discutir el teatro en una sociedad marcada por la interculturalidad y la multireligiosidad.

Encontramos también la proliferación de análisis de obras y autores puntuales como por

ejemplo los textos de Stewart (2015) sobre Vírgenes negras y el de Smerilli (2016) sobre

Weißbrotmusik / Música de pan blanco (2011) y Idioma materno mameloshn de Sasha

Marianna Salzmann.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

145

Por último, también se realizan estudios donde obras y autores puntuales del

teatro posmigrante se incorporan a un corpus más extenso reunido por una temática

específica como por ejemplo el de Müller (2012) sobre la representación de la

discapacidad en el teatro, o bien por una estética, como el de Breger (2012) sobre la

performance narrativa.

A partir de este breve repaso bibliográfico no podemos dejar de señalar la

ausencia de una crítica que también cuestione al teatro posmigrante y debata sus fronteras.

Porque si bien el proceso de institucionalización significa la inclusión dentro de la

institución teatral hegemónica, no podemos dejar de interrogarnos sobre qué queda ahora

fuera de esa frontera, aquello que el teatro posmigrante, hoy por hoy mira desde un centro

resguardado por el Estado. Además, como se planteó aquí, una gran parte del proyecto

de teatro posmigrante surgió como caja de resonancia frente a las políticas de

financiamiento estatal del teatro en Alemania. Ese enlace contextual se analiza (a favor)

del teatro posmigrante en el cierre del capítulo de Peters publicado en el volumen Theater

und Migration, cuando dice. “Tatsächlich sollte sich die Kulturpolitik genau überlegen,

wie die Fördergelder in Zukunft für welches Theater verteilt werden” (PETERS, 2011,

p.176). Este es el talón de Aquiles o bien un Lücke en el discurso de la crítica sobre el

tema: la puesta en cuestión de la forma de vida en particular del teatro posmigrante que,

a pesar de incluir nuevos márgenes en el centro, está dejando también algo afuera

(creando otros márgenes) y también la reflexión sobre qué implica la radicalización de su

estética. En la actualidad y con el peso de la institucionalización sobre sus hombros, el

teatro posmigrante debe ser estudiado a través de una crítica que indague su lógica

estética, o bien que descubra si, en su propuesta, hay en realidad un juego con las etiquetas

y huellas de reconocimiento, que como estrategia de mercado, busca concretar formas de

financiamiento frente a otros teatros estatales.

3.4. La transferencia del teatro posmigrante más allá de las fronteras de

Berlín y de Alemania.

La última marca de la institucionalización que nos proponemos analizar es la

transferencia y marcación del concepto y de la estética del teatro posmigrante fuera de

las fronteras alemanas.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

146

En este caso tomaremos como espacios de expansión del fenómeno teatral

posmigrante los espacios de habla alemana vecinos, puntualmente Suiza y Austria65. En su

más reciente texto, Sharifi (2016) insiste en la complejidad del caso suizo por el federalismo

que organiza las políticas de Estado, pero también las políticas culturales (SHARIFI, 2016,

p. 361)66.

En este mismo texto, Sharifi insiste en la paradoja del caso Suizo: una escena teatral

múltiple, que por un lado busca ser inclusiva, pero al mismo tiempo no lo es y en la que se

ausenta la observación y reflexión del cambio demográfico propio del tiempo globalizado en

el que vivimos. Como evidencia, Sharifi se extiende sobre el caso de la artista de origen

colombiano Diana Rojas, quien desde el 2005 vive en Zúrich y trabaja en múltiples espacios

performativos independientes. La artista insiste en que con frecuencia los papeles que le

ofrecen están ligados a estereotipos y prejuicios culturales sobre su origen nacional

(SHARIFI, 2016, p. 361). Como experiencia destacable de teatro “intercultural”, Sharifi

rescata la labor del teatro Maxim de Zúrich.

Por otra parte, para la investigación que planteamos aquí resulta de suma importancia

marcar cómo el teatro posmigrante en tanto fenómeno institucionalizado llega a Suiza; esto

es qué presencia y formas de transferencia constata. El análisis de puestas en escena dentro

de la llamada Suiza alemana nos ha demostrado que la hipótesis de Sharifi en relación al

federalismo tiene evidencia en el asunto que aquí discutimos: el teatro posmigrante en alemán

en Suiza se visibiliza primero a través de las producciones que más éxito tuvieron/tienen en

Alemania. La puesta en escena de Sangre loca en Winterthur67, de dos obras de la dupla

Anestis Azas (n. 1978)/ Prodromos Tsinikoris (n. 1981) la aclamada Telemachos – Should I

stay or should I go?/ Telemachos- ¿O me voy o me quedo? (2014) en Berna y la más nueva

Clean City / Ciudad limpia (2016) en Zürich68, y de la obra Muttermale Fenster blau /

65 Como bien apunta Sharifi (2016), el teatro posmigrante ha encontrado nuevas embajadas fuera del espacio cultural de habla alemana. Por razones de espacio y también por mantenernos dentro de un área de estudios vinculada a las manifestaciones culturales en lengua alemana, no trabajaremos aquí con el teatro posmigrante de otros países como Inglaterra, Suecia, entre otros. 66 En este sentido, como ella Sharfi apunta, el federalismo significa que cada región se vincula culturalmente con el país vecino que comparte la lengua y no existe, por el contrario, un vínculo tan fuerte entre las diversas regiones suizas, cuestión que evita una línea general con la cual podamos evaluar la situación nacional del teatro y la migración y, más recientemente, del teatro posmigrante. De este modo, la Suiza de habla alemana se enfoca e intercambia procesos culturales fundamentalmente con Alemania y Austria. 67 En Winterthur fue una puesta en escena realizada por el ensamble del teatro Maxim Gorki de gira y, como en sus versiones originales de Alemania, con la dirección de Nurkan Erpulat; aunque realizada recientemente, en mayo de 2016, no fue un estreno con una nueva producción suiza. 68 Los autores también dirigen sus obras. Telemachos – Should I stay or should I go? tuvo su estreno alemán en la ya sala de culto Ballhaus Naunynstraße el 11 de enero de 2013 y en Berna se presentó en el marco del festival AUAWIRLEBEN en mayo de 2015. La más reciente Clean City (2016) se estrenó originalmente en la Müncher Kammerspiele y en Suiza se presentó por primera vez en el Theater Spektakel en agosto de 2016.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

147

Lunares ventana azul (2012) de Sasha Marianna Sazlmann69 son algunos de los ejemplos que

muestran que el teatro posmigrante ha desembarcado en los escenarios suizos con el mismo

repertorio y escritores con el que se ha institucionalizado en Alemania. Sin embargo, como

resto de esa evidencia, parece acertado apuntar que no existen numerosos proyectos propios

o la producción de autores de teatro posmigrante en alemán desde el territorio Suizo.

Como excepción, en nuestro rastreo de campo hemos encontrado que el autor y artista

congolés Elia Rediger (n.1985) fue invitado a participar como autor estable en residencia del

Konzert Theater Bern y prepara para la próxima temporada (2016-2017) una producción

performativa que, por su trabajo con la perspectiva intermedial y multicultural, se parece

mucho a a estética del llamado teatro posmigrante.

Del lado austriaco, la institucionalización del teatro posmigrante se puede observar

en su desembarco fundamentalmente en Viena. En su trabajo Sharifi resalta que Austria tiene

una una producción de teatro posmigrante razonable y fructífera, que en gran parte tiene que

ver con que en el 2011 Shermin Langhoff fue invitada a dirigir y curar el renombrado festival

Wiener Festwochen (SHARIFI, 2016, p. 357). Podemos afirmar que en la capital austriaca,

el teatro posmigrante llegó también con la impronta de su institucionalización y desarrollos

en Alemania, al igual que en Suiza. Otras experiencias de teatro posmigrante en Austria, han

tenido un formato y origen propio, desligado a los éxitos de Alemania.

El proyecto interdisciplinar Pimp my integration desarrollado originalmente entre

el 2011 y el 2012 en el espacio Garage X (actualmente Werk X), es uno de ellos. Esta

producción se proponía, a través de una amplia variedad de actividades la discusión y

pregunta por el desarrollo de estrategias de política cultural que reflejen adecuadamente la

presencia (post)migrante en la escena cultural austriaca. En este primer desarrollo, el caso de

Austria y el teatro posmigrante coincide con los orígenes de la primera propuesta alemana:

la discusión que buscaba gestar el teatro posmigrante tiene que ver con el entretejido posible

entre el teatro lo cultural, lo político y lo social. Hay una diferencia que es significativa con

Suiza que tiene que ver ya no con la mera recreación de la propuesta posmigrante berlinesa,

sino con apelar a nuevos formatos e imprimirles una marca propia; en este gesto ya no

podemos hablar simplemente de la transferencia del teatro posmigrante tal como fue

institucionalizado en el espacio alemán, sino de una apropiación y transfiguración a través

del ambiente cultural y la coyuntura política austriaca.

69 Originalmente estrenada en el Badisches Staatstheater de Karlsruhe en el marco del Ruhrfestspiele Recklinghausen el 20 de mayo de 2012. A Suiza llegó a través del Schauspielhaus de Zürich, donde se estrenó en noviembre de 2016.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

148

REFLEXIONES FINALES

En este artículo hemos tratado de marcar algunos de los elementos y trayectos

recorridos hacia la institucionalización del teatro posmigrante en lengua alemana,

principalmente dentro del territorio de Alemania, pero también con menciones finales a

Austria y Suiza. Como vimos en la primera parte, el teatro posmigrante como tal no surge

en Alemania repentinamente. Hay muchos antecedentes en Alemania que desde la década

del sesenta prepararon la escena para el posterior teatro posmigrante. Sin embargo, como

explicamos, este teatro en el último tercio del siglo XX proponía una fórmula más

reducida: teatro de inmigrantes y sobre inmigrantes.

El teatro posmigrante como tal surge en relación directa con Shermin Langhoff

fundamentalmente a partir del 2006 cuando se estrena Vírgenes negras, el primer gran

éxito de esta propuesta teatral. Los desarrollos posteriores del teatro posmigrante y su

misma definición van a estar vinculados a esa exitosa obra y también a Sangre Loca. En

estas dos obras (tanto en el texto dramático como en la puesta en escena) podemos

encontrar algunos de los rasgos definitorios de la lógica estética del teatro posmigrante:

problematización de las relaciones en el espacio urbano multicultural contemporáneo,

discusión sobre cuestiones de género, cuestionamiento de las identidades nacionales en

general y particularmente las de segunda y tercera generación de inmigrantes,

intermedialidad escénica, transtextualidad e intertextualidad, colaboracionismo en la

creación dramática y vínculos con el teatro documental.

Si bien las primeras puestas en escena del teatro posmigrante en alemán

visualizaban y ponían en cuestión fundamentalmente las problemáticas de los colectivos

inmigratorios de origen turco y el teatro Arkadaş Theater/Buhnen der KULTUREN en la

ciudad de Colonia fue quizá su máximo exponente. En cualquier caso, todos estos

proyectos teatrales que vinculan teatro y migración en la última parte del siglo XX, están

orientados fundamentalmente a visualizar la contingencia de una inmigración

marcadamente laboral y, a veces, la trayectoria individual en en la confrontación cultural

producido en el país de inmigración. En la actualidad, esta cuestión se ha cambiado para

volver la escena el punto de encuentro de discusiones diversas en torno a la globalización,

el multiculturalismo y la realidad socio-política urbana, fundamentalmente, de la

Comunidad Europea. Obras como la adaptación de la novela A los rusos les gustan los

abedules de Grjasnowa, la reversión de El jardín de los cerezos de Chéjov o incluso la

obra Yo soy Juana de Arco convalidan esa expansión y desvinculación del exclusivismo

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

149

étnico del teatro inmigrante y posmigrante original, para postularse como una plataforma

crítica desde el teatro sobre: los cambios y transformaciones propios de una sociedad

post-inmigratoria, las zonas de conflicto de una sociedad diversa y la institución teatral

en general. Asimismo, toda narración o imagen que remita a subjetividades (políticas,

nacionales, sexuales, culturales) emergentes es el alimento mismo del contenido

dramático del teatro posmigrante.

Además de estos rasgos, desde sus orígenes, la propuesta de un teatro

posmigrante en alemán tiende a visibilizar cómo la institución teatral en general, en

Alemania, es, citando a Sharifi, una “institución blanca”, que aún en una sociedad

totalmente multicultural como la alemana, muchas veces deja afuera a aquellos sujetos

que tienen un trasfondo inmigratorio en su biografía, por razones que no son otras que las

de la discriminación étnica.

La trayectoria profesional de Shermin Langhoff y su llegada al Maxim Gorki

como directora artística, señalada en su momento por la prensa como un acontecimiento

especial, confirman esta hipótesis del lugar fronterizo que tienen los sujetos de origen

inmigrante (y muchas veces las mujeres) en los espacios más ponderados de las artes

performativas alemanas.

El recorrido que realizamos ha dejado entrever que los espacios donde se realiza

la propuesta del teatro posmigrante han tenido un rol indispensable en su paso a la

institucionalización. Mientras que las propuestas del comienzo en el teatro Hebbel am

Ufer y en el espacio Ballhaus Naunytraße, tenían un impacto más directo en la comunidad

inmediata y de este modo lograban una intervención social concreta y limitada, la

presencia en el teatro Maxim Gorki, esto es una sala nacional en el centro de Berlín, que

además se encarga de subtitular las obras al inglés, provee al proyecto artístico de una

mayor visibilidad, receptores diversos, y apertura a nuevas formas y experiencias

teatrales.

A partir de su llegada al teatro Maxim Gorki, el teatro posmigrante refuerza y

profundiza sus rasgos fundacionales y este proceso de confirmación estética tiene que

verse como parte de su institucionalización. Hay por lo menos un rasgo que marca su

identidad estética y que debe destacarse para entenderlo como un proyecto artístico

general. Desde el Gorki, este teatro comienza a exhibir algo que estaba en su génesis: una

forma de producción y trabajo artístico cooperativista que se acerca al de las llamadas

“ecologías culturales” tal como fueron delineadas por Reinaldo Laddaga (2006).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

150

Otro rasgo que es índice de la institucionalización del teatro posmigrante es su

incorporación a la discusión crítica y académica: el teatro posmigrante se ha vuelto objeto

de tesis, libros, investigaciones y también reuniones científicas. En el recorrido

bibliográfico apuntamos dos momentos de cesura que indican el crecimiento de la

producción crítica: en el 2011 cuando Vírgenes negras y Sangre loca ya habían tenido

una buena recepción y a partir del 2013 con la incorporación de su fundadora discursiva,

Shermin Langhoff, al teatro Maxim Gorki. Tanto esta aparición en el discurso

especializado de la institución teatral, esto es en la desiderata académica sobre el teatro,

como las práctica misma del teatro posmigrante trascendieron las fronteras geográficas

del fenómeno llegando a otros países europeos ajenos a la lengua alemana como Inglaterra

y Suecia.

Finalmente, como último indicio de la institucionalización del teatro

posmigrante consignamos algunos de los ejemplos de su transferencia a otros países de

habla alemana. En el caso de Suiza, en general el teatro posmigrante aparece trasladado.

Esto es: con puestas en escena de los ensambles berlineses. Así también, hace años hay

algunos proyectos que vinculan la inmigración con el teatro, aunque enfocándose más en

el impacto social de los participantes. De lado de Austria, se constata primero la traslación

del proyecto berlinés y luego una apropiación bajo modos distintos, compatibles con las

problemáticas e inquietudes del espacio cultural austriaco.

En el cierre de este análisis de la institucionalización del teatro posmigrante en

alemán debemos preguntamos sobre su horizonte de posibilidad como fenómeno que

ahora pertenece y se gesta dentro de los muros del teatro institucionalizado. En tanto

produce teatro que critica a la institución teatral, fundamentalmente la alemana (como

institución del Estado y como institución literaria a través del diálogo trans/intertextual).

Actualmente, la paradoja de su crítica se hace más evidente porque elabora sus

producciones desde uno de los teatros estatales de Berlín. Al mirar la intersección entre

su método (crítica) y objeto (el teatro) afirmamos que el teatro posmigrante en alemán

hoy se vincula con la llamada crítica institucional del arte que se inició hacia la década

del setenta en muchas obras y que en su nueva y más actual emergencia trasciende la

barrera del arte para recomponer su producción como crítica a todas las formas de

inclusión/exclusión de las instituciones con respecto a los sujetos y prácticas sociales.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

151

Desde este ángulo el espacio institucionalizado/institucionalizador del teatro

Maxim Gorki a través del modo estético del teatro posmigrante se vuelve no un lugar de

cercamiento, sino de desbordamiento institucional: más allá de las fronteras del Estado

nacional y de la disciplina teatral. Aquello que se encapsula en la reducida fórmula:

nuevas líneas estéticas producen nuevas instituciones (teatrales).

BIBLIOGRAFÍA

BAZINGER, I. (2015). Wozu postmigrantisches Theater? Gespräch mit Shermin

Langhoff. Frankfurter Allgemeine.

BRAUNECK, M. (1983). Ausländertheater in der Bundesrepublik Deutschland und in

Westeberlin. 1. Arbeitsbericht zum Forschungsprojekt Populäre Theaterkultur.

Hamburg.

BEHRENDT, E. (2013). Theater als Labor und Quelle der Inspiration. Passagen, 1, 10-

11.

BEHRENDT, E. (2006). Zumutung gegen Vermutung. Theater Heute, 40.

BREGER, C. (2012). An Aesthetics of Narrative Performance. Transnational Theater,

Literature, and Film in Contemporary Germany. . Columbus: Ohio State University

Press.

BIDLO, T. (2006). Theaterpädagogik. Einführung: Essen Odlib.

BOURDIEU, P. (1997). Las reglas del arte. Barcelona: Anagrama.

ÇELIK, N. (2006). Mal sehen, was Gott sagt. Theater heute, 47(5) 43– 45.

CRUZ, A. (2016). El teatro alemán, desde adentro. Poderío y paradojas de una gestión

pública modelo. La Nación. En línea: http://www.lanacion.com.ar/1899044-el-teatro-

aleman-desde-adentro

DONATH, K. (2011). Die Herkunft spielt keine Rolle – ‘Postmigrantisches’ Theater im

Ballhaus Naunynstraße. Interview mit Shermin Langhoff. Bundeszentrale für politische

Bildung. En línea: http://www.bpb.de/gesellschaft/kultur/kulturelle-

bildung/60135/interview-mit-shermin-langhoff?p=all

DÖRRIES, C., & AURIN, T. (Fotos) (2009). Maxim Gorki Theater Berlin. Die Neuen

Architekturführer Nr.151. Berlin: Stadtwandel Verlag.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

152

DUBATTI, J. (2008). Escritura teatral y escena. El nuevo concepto de texto

dramático. Revista colombiana de las artes escénicas, 2(2), 7 – 18.

ENGLHART, A. (2013). Das Theater der Gegenwart. München: C.H. Beck.

FANIZADEH, A. (2009). Wir inszenieren kein Getto-Theater. Interview mit Shermin

Langhoff. TAZ. En línea: http://www.taz.de/!674193/

GENETTE, G. (1989). Palimpsestos: la literatura en segundo grado. Madrid: Taurus.

ISRAEL, A. (2011). Kulturelle Identitäten als dramatisches Ereignis. Beobachtungen aus

dem Kinder - und Jugendtheater“. En W. SCHNEIDER (Ed.), Theater und Migration (pp.

47-64). Bielefeld: transcript.

KANSTER, B., KULAOĞKU, T. & LANGHOFF, S. (2015). Dialoge I: Migration

Dichten und Deuten. En E. YILDIZ & M. HILL (Eds.), Nach der Migration.

Postmigrantische Perspektiven jenseits der Parallelgesellschaft (pp. 399-408). Bielefeld:

transcript.

GRAMSCI, A. (1971). La política y el Estado Moderno. Barcelona: Península.

HÖBEL, W. von (2014). Sturm auf die Diskursdisco. En Der Spiegel, 20.01.2014. En

línea: http://www.spiegel.de/spiegel/print/d-124554519.html

KÖMÜRCÜ NOBREGA, O. S. (2011). Kanake. Das 'K-Wort' im Kontext von

europäischem Kolonialismus und Nachkriegsmigration in Deutschland. En S. ARNDT

(Ed.), Gefärbtes Wissen. Kolonialismus, Rassismus und Weißsein im Wissensarchiv der

deutschen Sprache (pp. 638-643). Germany: V&R unipress.

LADDAGA, R. (2006). Estética de la emergencia. Buenos Aires: Adriana Hidalgo.

LANGHOFF, A. (1996). Transit Heimat/ gdeckte tische. Berlin: Henschel Shauspiel

Theaterverlag.

MÜLLER, H. (1996). Germania 3: Gespenster am toten Mann. Köln: Kiepenheuer &

Witsch.

MÜLLER, T. (2012). Was schaut ihr mich an?: Darstellungen von Menschen mit

Behinderung in der zeitgenössischen Dramatik. Berlín: Frank & Timme.

NIEHAUS, J., MÖCKEL, M., & MÜLLER, H. (Eds.) (2002). 50 Jahre Maxim Gorki

Theater. Berlin: Theater der Zeit.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

153

PEREYRA, S. (2016). Ante los restos del multiculturalismo (o la literatura transnacional

hoy). Moderna språk, 110(1), 83-100.

PETERS, N. (2011). Umkehrung des eigenen Blickes. Beobachtung und Bekundungen

aus dem Blickwinkel. En W. SCHNEIDER (Ed.), Theater und Migration (pp. 169-173).

Bielefeld: transcript.

SALZMANN, M. (2012). Sie missüberschätzen uns. Über den Versuch, das

Mittelstandsperlen-kettchen wie ein Lasso um das Ballhaus Naunynstraße zu werfen –

Eine Komödie. TRANSIT, 8(1), En línea: http://escholarship.org/uc/item/6q6567pf

SAPPELT, S. (2000). Theater der Migrant/innen. En C. CHIELLINO (Ed.),

Interkulturelle Literatur in Deutschland. Ein Handbuch (pp. 275-293). Stuttgart/Weimar:

Metzler.

SCHNEIDER, W. (2011). Warum wir kein Migranten-Theater brauchen... ...aber eine

Kulturpolitik, die in Personal, Produktion und Publikum der dramatischen Künste

multiethnisch ist. En Theater und Migration: Herausforderungen für Kulturpolitik und

Theaterpraxis. Bielefeld: transcript, pp. 9-20.

SHARIFI, A. (2016). Theater und Migration. En Brauneck, Manfred /ITI Zentrum

Deutschland: Das Freie Theater im Europa der Gegenwart: Strukturen - Ästhetik –

Kulturpolitik. Bielefeld: transcript, pp. 335-430.

SHARIFI, A. (2011a). Postmigrantisches Theater. Eine neue Agenda für die deutschen

Bühnen. En W. SCHNEIDER, (Ed.), Theater und Migration: Herausforderungen für

Kulturpolitik und Theaterpraxis (pp. 35-45). Bielefeld: transcript.

SHARIFI, A. (2011b). Theater für Alle?: Partizipation von Posmigranten am Beispiel

der Bühnen der Stadt Köln. Frankfurt: Peter Lang.

SIEG, K. (2008). German Theatre and Globalisation. En D. VARNEY (Ed.), Theatre in

the Berlin Republic: German Drama since Reunification (pp. 307-324). Oxford: Peter

Lang.

SIEG, K. (2010). Black Virgins: Sexuality and the Democratic Body in Europe. New

German Critique, 109, 147-185. En línea: http://www.jstor.org/stable/25609171

SMERILLI, F. (2016). Kommunikation zwischen Scheitern und Gelingen. Sprachliche

Selbstreflexion hybrider Identitäten in Dramen Marianna Salzmanns. GFL journal, Nº. 1.

En línea: http://www.gfl-journal.de/1-2016/smerilli.pdf

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

154

STEWART, L. (2015). Black Virgins, Close Encounters: Re-examining the ‘Semi-

Documentary’ in Postmigrant Theatre. En S. OZIL, M. HOFMANN, & Y.

DAYIOGLUYÜCEL (Eds.), In der Welt der Proteste und Umwälzungen Deutschland

und die Türkei (Türkisch-deutsche Studien Jahrbuch; vol. 5) (pp. 81-102). Göttingen:

V&R unipress.

STING, W. et al. (2010). Irritation und Vermittlung. Theater in einer interkulturellen und

multireligiösen Gesellschaft. Berlin : Lit Verlag.

TILLY, C. (2015). Identities, Boundaries and Social Ties. Nueva York: Routledge.

VARNEY, D. (2008). Theatre in the Berlin Republic: Introduction. En: Theatre in the

Berlin Republic: German Drama Since Reunification. Frankfurt: Peter Lang.

VARNEY, D. (2005). Transit Heimat: Translation, Transnational Subjectivity and

Mobility in German Theatre. TRANSIT, 2(1). En línea:

http://escholarship.org/uc/item/9jz180fs

WEILER, CH. (2014). Theatre and diversity in the Berlin Republic. En S. COLVIN (Ed.),

The Routledge Handbook of German Politics & Culture (pp. 218-229). New York:

Routledge.

WEBGRAFIA

Teatro Maxim Gorki: http://www.gorki.de/

Fotógrafa Esra Rotthoff: http://esrarotthoff.com/

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

155

EL LENGUAJE ESCÉNICO QUE CONFORMA EL REPERTORIO CREADO

POR AUGUST BOURNONVILLE

The scenic language conforming the repertoire created by August Bournonville

NAVARRO, Ioshinobu70

Resumo

Para la puesta en escena de una obra del repertorio romántico-clásico tradicional son muchos los elementos dentro del lenguaje escénico a tener en cuenta. Este tipo de repertorio, en la mayoría de los casos, debe seguir unos cánones que marca el estilo específico de la pieza que se lleva a escena, lo cual determina en su ejecución el respeto por la tradición ya sea bien del romanticismo, el clasicismo, u otras vertientes estilísticas que surgieron después como es el caso de estilo Balanchine, que con algunas variaciones dentro de la técnica misma se desarrolló en los Estados Unidos de Norteamérica en la década de 1940.

Abstract

For the staging of a work of the traditional romantic-classical repertoire many elements within the stage language to take into account. This type of repertoire, in most cases, must follow some canons that mark the specific style of the piece that takes place on stage, which determines in its execution the respect for the tradition either of romanticism, classicism, Or other stylistic aspects that emerged later as is the case of Balanchine style, which with some variations within the same technique was developed in the United States of America in the 1940s.

Palabras clave: lenguaje escénico; Balanchine; August Bournonville.

Key-words: scenic language; Balanchine; August Bournonville.

Data de submissão: Junho de 2016 | Data de publicação: Dezembro de 2016.

70 IOSHINOBU NAVARRO SANLER - Profesor Investigador de la Universidad Rey Juan Carlos. Ciencias de la Educación, Lenguaje, Cultura y Artes, Ciencias Histórica-Jurídicas y Humanísticas y Lenguas Modernas. Área: Estética y Teoría de las Artes. ESPAÑA. E-mail: [email protected].

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

156

INTRODUCCIÓN

Para la puesta en escena de una obra del repertorio romántico-clásico tradicional

son muchos los elementos dentro del lenguaje escénico a tener en cuenta. Este tipo de

repertorio, en la mayoría de los casos, debe seguir unos cánones que marca el estilo

específico de la pieza que se lleva a escena, lo cual determina en su ejecución el respeto

por la tradición ya sea bien del romanticismo, el clasicismo, u otras vertientes estilísticas

que surgieron después como es el caso de estilo Balanchine, que con algunas variaciones

dentro de la técnica misma se desarrolló en los Estados Unidos de Norteamérica en la

década de 1940.

Hay que acotar que los estilos dentro del ballet parten del trabajo coreográfico de

un personaje histórico bajo circunstancias que buscan el desarrollo del arte del ballet. Si

nos introducimos en la historia de la danza, el estilo Romántico, parte del trabajo de

Filippo Taglionni, quien sin saberlo creaba las bases estéticas de la danza, a partir de lo

pensado para una estética especifica de la danza para su hija, ya que María tenía un cuello

largo, brazos muy largos y no era el modelo físico de la bailarina de la época. El estilo

clásico parte de la estética coreográfica de Petipa, quien es su máximo exponente, y el

responsable de que hoy conozcamos los grandes ballets del Romanticismo, los cuales

aprendió durante su período de trabajo en la Opera de París y que luego remontara en

Rusia, pasados por el tamiz de su estética y pensamiento sin desvirtuarlos de su espíritu

original, que le sirvió de inspiración para sus obras originales. El estilo Balanchine, muy

específico y desarrollado en los Estados Unidos de Norteamérica, parte de la obra del

coreógrafo del mismo nombre, y a quien se le atribuye la mal llamada escuela americana,

que no es más que los cánones estéticos y especificidades técnicas que Balanchine trabajo

en sus ballets.

Dentro de este planteamiento hay un estilo que se puede definir como un caso muy

específico y que se debe analizar muy detenidamente, ya que lleva dentro del lenguaje

escénico no solo cánones estilísticos sino también históricos, técnicos y metodológicos

muy específicos que entroncan con la misma técnica del ballet académico pero que tienen

sus propias particularidades y diferencias. Nos referimos al repertorio desarrollado por

August Bournonville y que define la escuela danesa de ballet, una de las escuelas de

ballet considerada como de las más importantes del mundo, la ha rodeado un gran

misticismo y se ha caracterizado por una poco apertura a las influencias del mundo

exterior, hasta hace unas décadas. La escuela danesa o escuela Bournonville, se puede

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

157

afirmar que es la única escuela que puede llevarnos a comprender realmente el espíritu

del romanticismo por la preservación tan exquisita que ha tenido a través del tiempo.

La escuela danesa, debido a ese hermetismo que mantuvo durante muchísimo

tiempo, es un tema del que no existe un conocimiento popularizado, esto incluye a los

profesionales de la danza, que solo se ubican en escasas piezas de este repertorio que se

han visto representadas en los más importantes escenarios del mundo. No obstante, hay

mucho más detrás de lo que se ve en una representación de una obra de este coreógrafo.

Una de las grandes dificultades que se encuentran en las representaciones de estas

piezas en compañías donde no existe un verdadero conocimiento de este estilo es que se

suelen cambiar pasos técnicos dentro de la coreografía, no se respetan las posiciones de

brazos y pies característicos de la escuela, además de que se cambia en muchos casos el

sentido del movimiento como originalmente estaba concebido. Para muchos bailarines,

este estilo resulta verdaderamente difícil, pues va muchas veces contrapuesto a las

características técnicas de la escuela de las que proceden y muchas veces se comete el

error de llevar las coreografías a las características técnicas de la escuela en la que se

baila, lo cual puede resultar negativo y contrapuesto ya que violenta el lenguaje escénico

que se concibió para la obra y que debe y tiene que ser respetado.

Para que esto se pueda comprender mejor, expondremos un ejemplo concreto, El

lago de los cisnes con coreografía de Marius Petipa y Lev Ivanov, es una obra enmarcada

en el estilo clásico del ballet, no obstante esta realizada bajo los dogmas técnicos de la

escuela de ballet académica desarrollada por los rusos, pero que constituye junto con la

escuela francesa la bases de las subsiguientes escuelas, es por ello que esta obra al no

tener especificaciones estético-técnicas se puede bailar en sus disimiles versiones

coreográficas con las características técnicas de cualquiera de las escuelas de ballet

reconocidas en el panorama mundial. Si tomamos una obra del repertorio Bournonville

como es el caso de Napoli, por proceder de este estilo tan especifico que devino en técnica

con un entrenamiento y una metodología específica y que se reconoció como escuela,

debe ser respetado todo esto para poder logran integrar todo el lenguaje escénico de la

obra. Esto es lo que hace realmente difícil el asumir el repertorio de August Bournonville

para los bailarines que no han tenido ningún acercamiento con la escuela danesa de ballet.

No obstante, como se ha planteado anteriormente en el siglo XX este repertorio

cobro una gran notoriedad, ya fuera porque comenzaron a salir bailarines daneses como

Erick Bruhn o Peter Schaufuss al exterior y llevaron consigo las obras de Bournonville a

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

158

escenarios como los de Estados Unidos como por el interés creciente que se había creado

al conocer de esta escuela y de su particular forma de hacer. Más de un artista importante

de la danza, se ha referido a él como un reto, pues hay muchos detalles que tienen que ver

con el estilo, la coreografía, la técnica en sí misma, e incluso con nomenclaturas

metodológicas de los pasos que hacen de este repertorio algo que se puede definir sin

temor como único.

Es importante llamar la atención de que solo en escasas ocasiones un estilo

coreográfico ha podido devenir en el desarrollo de una técnica que a su vez se ha

convertida y reconocida como escuela. Por lo que las referencias que conforman el

lenguaje escénico de la puesta en escena de este repertorio, que deben manejar tanto los

bailarines como los repetidores y maîtres de ballet se diversifican y deben ser respetadas

con la mayor exactitud posible porque si no se está desvirtuando totalmente el estilo en sí

mismo.

Esta carencia es la motivación principal de esta investigación, pues no resulta

especialmente fácil encontrar información concentrada sobre las especificidades técnico-

metodológicas y estilísticas para enfrentar este repertorio. También hay que decir que

existe un cliché sobre este estilo que es particularmente erróneo, y es que muchos

repetidores al no tener el conocimiento sobre esta técnica y estilo se aventuran a decir que

se baila sin mover los brazos, con particular rapidez en las piernas, y que prácticamente

no se mueve la cabeza. Esta aseveración es muy limitante sobre este estilo y no garantiza

para nada el buen desempeño y puesta en escena de una obra de Bournonville, pues como

podremos ir analizando en el desarrollo de este trabajo las características específicas para

el buen desempeño y puesta en escena de una obra de este repertorio son muchos y

específicos.

Precisamente este es el objetivo que se quiere conseguir con esta investigación,

definir cuáles son las características técnico-metodológicas, estilísticas que se deben

aunar dentro del lenguaje escénico de una obra de August Bournonville.

Para lograr ello, tomaremos como referencias el trabajo del Historiador de Ballet

Erick Aschengreen, además del programa metodológico de la escuela danesa de ballet,

que nos ofrecerán los referentes tanto teóricos, para todo lo que tiene que ver con el

contexto histórico que envuelve este estilo, como de los aspectos técnico-metodológicos

que son importantes para el buen desempeño de este repertorio.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

159

Acercarnos a este problema que resulta evidente, resulta de vital importancia,

sobre todo en la actualidad donde el flujo de información y la globalización del arte son

inminentes. Cada vez más resulta común que dentro de las disimiles compañías del

mundo se encuentran bailarines formados en las diferentes escuelas de ballet reconocidas

(escuela francesa, escuela rusa, escuela inglesa, escuela cubana, escuela danesa).

También es cada vez más conocido alrededor del mundo como un reto el repertorio

Bournonville, que es necesario decir que se encuentra muy bien custodiado por el Real

Ballet Danés, que con las legislaciones de Derechos de Representación y Autor, para las

compañías profesionales exigen que antes de que se haga una puesta en escena de una

obra de este repertorio, uno de sus especialistas sea quien concluya con la unificación de

los elementos que componen el lenguaje escénico de este repertorio.

No obstante en cuanto a las escuelas de ballet alrededor del mundo, han visto este

repertorio como una fuente de trabajo para los estudiantes, muchas veces sin que se tenga

verdadero conocimiento sobre la técnica y la metodología de dicha escuela, lo que hace

que se caiga en errores al realizar el montaje de estas piezas. Además es recurrente que el

repertorio Bournonville se utilice en concursos de ballet internacionales, algunas veces

con gran éxito y otras como verdaderos fiascos precisamente por la falta de conocimiento

sobre este tema.

Las nuevas tecnologías de la información, son un elemento que ha servido de

medio de difusión al repertorio Bournonville pero también ha provocado un gran peligro.

Pues en la actualidad ya ninguna obra de danza es efímera, sino que puede quedar

perpetuada en soportes audiovisuales, y aquí deviene el gran peligro, pues muchos

repetidores toman videos para realizar los montajes y al no tener los conocimientos

metodológicos y técnicos de este estilo devenido en técnica, es común que se hagan

cambios en la secuencias de pasos técnicos y de cánones estéticos dentro del estilo en sí.

Es por ello que el análisis de este problema resulta de vital importancia, pues la

preservación de la memoria histórica del estilo desarrollado por August Bournonville es

ahora una responsabilidad no solo de los daneses, sino de todo el mundo de la danza

clásica. En concordancia con lo antes expuesto se plantea como problema fundamental

de nuestro artículo:

¿Cuáles son los referentes que conforman el lenguaje escénico, tanto históricos,

estilísticos, técnicos como metodológicos a tener en cuenta para la puesta en escena de

una pieza del repertorio desarrollado por August Bournonville?

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

160

En razón de lo antes expuesto, los objetivos de este trabajo son:

Compilar y analizar información biográfica sobre August Bournonville.

Analizar el desarrollo de la obra coreográfica de August Bournonville.

Caracterizar de forma histórica y metodológica el desarrollo de la escuela danesa de

ballet.

Para llegar a desarrollar los objetivos, se formulan las siguientes preguntas científicas:

1. ¿Cuáles son los antecedentes históricos del surgimiento de la escuela danesa de ballet o

escuela Bournonville?

2. ¿Cuáles son las características principales que distinguen la escuela danesa de ballet o

escuela Bournonville?

Esta investigación se justifica debido a la importancia que se ha expresado a través

de la Unión Europea sobre la preservación de la memoria histórica de la danza como uno

de los patrimonios de la cultura de esta zona del mundo. Además como hemos expuesto

anteriormente el repertorio Bournonville se mantiene activo en el mundo de la danza

actual, y es de suma importancia que sea llevado a escena con total rigor. Dentro del

mundo académico de la Universidad Rey Juan Carlos, también se puede justificar esta

investigación ya que resulta un rescate de información tanto histórica, como metodológica

y técnica que puede resultar de gran interés y de particular utilización para los estudiantes

del Instituto Universitario de Danza Alicia Alonso, ya que puede darles herramientas de

trabajo para su desarrollo profesional, tanto en el ámbito de la docencia como maestros

de danza, como en el ámbito de la interpretación danzaría, al poder desarrollar las

habilidades y capacidades que le permitan distinguir los diferentes estilos de la danza

clásica y saber cómo integrarlos en el todo que significa el lenguaje escénico.

1. MARCO TEÓRICO

La base fundamental de esta investigación está en los trabajos del historiador

danes Erick Aschegreen, quien es uno de los más respetados conocedores de la historia

de la escuela danesa de ballet. Múltiples son sus publicaciones que nos dejan comprender

todo el contexto tanto histórico de la danza, como de la vida social danesa en la que se

desarrolla la escuela danesa de ballet. Todo este contexto histórico - político y social

condicionan tanto el desarrollo del repertorio Bournonville como del lenguaje escénico

que lo conforma.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

161

Hay que considerar que la bibliografía en castellano sobre este tema es realmente

escasa, incluso las traducciones de textos al inglés son contadas, pues solo las obras como

Mi vida en el Teatro y Las Cartas sobre la danza, por mencionar dos ejemplos son de los

pocos textos originales de August Bournonville que se puede encontrar. Ya trabajos

posteriores sobre su obra y sobre todo lo que rodea el estilo y la escuela danesa que ha

desarrollado en gran parte el Doctor Erick Aschengreen historiador del Real Ballet de

Dinamarca, cuyas investigaciones y publicaciones son unos de los pilares importantes de

esta investigación, brindando información valiosa para llegar a conocer aspectos de la

historia y características técnicas y estilísticas que son definitivas para el estilo

coreográfico de Bournonville.

No obstante la principal fuente de información teórica de esta investigación viene

del mismo August Bournonville quien a lo largo de su vida profesional, el coreógrafo y

maestro de ballet danés trabajó con el mismo entusiasmo y dedicación a su escritura como

a su trabajo para la escena. A través de sus muchas publicaciones, se tratan los aspectos

estéticos y filosóficos del arte del baile teatral, donde revela, una visión profunda de su

propio formulario y concepciones del arte. En Bournonville sobresale el logro como

teórico del ballet que está más allá de la duda en su tratado de tres volúmenes Etudes

Chorégraphiques, escrito entre 1848 - 1861 y publicado este mismo año.

Otra fuente de información es la serie de ocho artículos del coreógrafo, que se

publicaron en París en 1860 bajo el título Cartas sobre la Danza y la Coreografía, (Lettres

sur la Danse et la Chorégraphie), que claramente pretendía ser una serie similar a las

famosas cartas publicadas por Jean-Georges Noverre, conocidas bajo el nombre de Cartas

sobre la danza y los ballets escritas un siglo antes. En éstos artículos Bournonville se

muestra como un hombre de espíritu combinado con una visión teórica profunda y a su

vez con una visión objetiva y práctica del arte, evidenciado en la polémica que plantea

sobre los aspectos artísticos y estéticos del ballet de su tiempo; estos artículos también

tocaron la temática del hecho moral, dando el espacio para analizar, a menudo, las

condiciones miserables bajo las cuales los artistas de ballet vivieron por esos días.

También se hace necesario para la mejor comprensión de esta investigación

exponer los conceptos con los cuales se ha trabajado, debido a que pueden resultar

aclaratorios para la mejor comprensión del tema que se trata. Uno de los primeros temas

a definir es el concepto de escuela de ballet, ya que este término no podemos vincularlo

solamente al concepto de un centro o institución formadora de bailarines.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

162

Entre algunas definiciones que se han manejado sobre este término, nos

quedaremos con la acuñada por Pedro Simón por ser la que mejor se adecua a nuestro

tema.

Pedro Simón define como una escuela de ballet al

“conjunto de características de estilo, peculiaridades técnicas y forma emocional propia de proyectarse en la escena, presente en todos los bailarines formados dentro de principios similares, y que reflejan la resultante histórica del desarrollo económico y social de un país determinado, su idiosincrasia nacional, el espíritu de su folklore, y la huella dejada, a través de las épocas, por sus grandes artistas. Las escuelas recogen, asimismo, las influencias del desarrollo de la danza mundial, sus tendencias y modalidades coreográficas, así como de las grandes corrientes del arte en general. Una escuela se forma, generalmente en el transcurso de varias generaciones, con el aporte pedagógico y la sistematización de principios realizada por grandes maestros” (SIMÓN, 1973).

1.1. August Bournonville, padre de la escuela danesa de ballet.

Para comprender las características específicas de los elementos que conforman el

lenguaje escénico del repertorio Bournonville se hace necesario conocer y analizar, el

desarrollo del ballet en Dinamarca, además de analizar las especificidades metodológicas de

esta escuela de ballet. No obstante se hace imprescindible partir del análisis de la figura la

figura y personalidad del padre del ballet danés, August Bournonville, quien en su tiempo,

tomó este arte no solo para desarrollo personal, sino que vivió y trabajó arduamente para el

desarrollo humanista del mundo de la danza y el teatro, no solo como un gran coreógrafo y

director de la compañía Real Ballet de Dinamarca (Danish Royal Ballet.) sino también como

teórico de la danza, como luchador constante de los derechos del bailarín y el ballet como

arte.

Hombre de gran integridad, sabía que tenía deberes, pero también derechos, fue un

predicador de la participación en la sociedad de los individuos. August Bournonville no

perdió en ningún momento la identidad con respecto a su sociedad, hombre además de

actitudes progresistas, siempre defendió las causas de los pobres y humildes, su lucha estuvo

dirigida a mejorar las condiciones de la clase más desprotegidas, personalmente llevó

alimentos a los desposeídos afectados por epidemias y enfermedades ; son puntos de su vida

que quizás quedaron en el anonimato, tras una personalidad exigente y fuerte, con un gran

talento e identificación nacional que lo llevó a crear una forma nueva de expresión en el

mundo del ballet, pero que por sobre todas las cosas , fuera la expresión de una identidad

nacional que siempre estuvo presente a lo largo de toda su obra.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

163

1.1.1. Biografía de August Bournonville (1805-1879).

Para hablar sobre la vida y la obra de August Bournonville, es importante

comenzar desde sus orígenes, partiendo de la figura de su padre el bailarín francés

Antoine Bournonville, nacido en Lyon en 1760, cuya familia estuvo muy vinculada a los

orígenes del ballet en la corte francesa. Su madre, bailarina también, lo llevó a Viena,

donde conoce a Jean George Noverre71 quien se convierte en su maestro. Gracias a esto,

Antoine baila los ballets de Noverre en Viena, Paris y Londres, en 1792 llega a Estocolmo

donde hará algunas presentaciones y será maestro de ballet en la corte de Gustavo III.

En este momento, Antoine se encuentra bailando con Marianne Jensen, su primera

esposa y madre de sus primeros hijos. Durante las presentaciones de la pareja en

Copenhague, en Estocolmo Gustavo III sufre el atentado donde resulta asesinado durante

un baile de máscaras. Solo por su nacionalidad francesa Antoine se convirtió

automáticamente en sospechoso, por lo que al conocer la noticia decide asentarse en

Copenhague.

La Revolución Francesa (1789) enviará ondas renovadoras dentro de Europa, que

tendrán repercusiones en la vida de Antoine Bournonville. Bajo las presiones de dicha

Revolución y los temores de la nobleza escandinava Antoine regresa a Copenhague,

proveniente de Francia, donde había fallecido su primera esposa dejándole tres hijos que

mantener. Con esta situación personal, Antoine decide unirse en matrimonio con su

antigua ama de llaves Lovisa Sundberg, de origen sueco, quien en 1805 da a luz a August

Bournonville, en el hospital de maternidad Frederick. August Bournonville nació en

Copenhague el 21 de agosto de 1805, el mismo año que Hans Christian Andersen72, quien,

con el tiempo, se convertiría en uno de sus grandes amigos y más fiel colaborador.

De los seis hijos de Antoine, August fue el único que se inclinó por las artes

escénicas, llegando a decidirse por el ballet. Desde pequeño se caracterizó por ser un

ingenioso bailarín, no era particularmente alto, su pasaporte marcaba una estatura de 1.70

metros, no obstante llegó a convertirse en un excelente bailarín de demi-carácter, además

de llegar a crear y danzar los papeles principales en sus propios ballets, por lo que hoy el

71 Jean George Noverre (1727-1810) Bailarín, Coreógrafo, Maestro de danza y escritor francés, reconocido como uno de los más grandes teóricos de la danza, realizó importantes aportes a la danza escénica a través de sus “Cartas sobre la danza y los ballets” (1760) a él se le atribuye el termino ballet de acción. 72 Hans Christian Andersen (1805-1875), autor danés uno de los escritores de cuentos de hadas más conocidos.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

164

Ballet Danés tiene en su repertorio excelentes roles masculinos para bailarines pequeños,

lo cual deja bien claro que no es un requerimiento imprescindible tener talla de príncipe

para ser un héroe en los ballets de Bournonville.

August comenzó su entrenamiento a la edad de 7 años, recibiendo lecciones de su

padre y de Vicenzo Galeotti, un maestro italiano que había llegado a Copenhague en 1775

para fundar el Real Ballet Danés. Con él, uno de los maestros que ha pasado a la historia

de la danza, recibe un muy buen entrenamiento, además de aprender otros idiomas, toma

lecciones de violín y canto. Todo esto lo llevará a ganar una sólida posición dentro del

arte en Copenhague.

Su primera aparición en escena fue a los 8 años en el Ballet Nórdico Largertha,

después se presentara en ballets como El templo de Salomón, Romeo y Julieta, del mismo

maestro Galeotti, además del ballet Zefiro y Flora de Didelot. En todas estas primeras

presentaciones se caracterizó por su talento desplegado como cantante y actor, había

continuado apareciendo como niño, ahora también en muchas obras del teatro y óperas.

Aunque sus apariciones teatrales no permitieron su instrucción formal, Bournonville era

un lector ávido y se familiarizó con los clásicos de la literatura y la filosofía.

Ya en la adolescencia tuvo que tomar la decisión acerca de que camino en el arte

quería seguir para concentrarse en lo adelante. Actuando, había desarrollado tartamudeo,

su voz de tenor fina había dibujado la alabanza de la gran ópera del compositor Rossini73

pero, incitado por su padre, optó por el baile. Sus estudios de ballet se intensificaron y se

le dio una concesión, en dos ocasiones separadas, para ir a París a estudiar.

En 1816, a la muerte de Galeotti, Antoine Bournonville, el padre de August,

deviene director artístico del Royal Danish Ballet. En 1820, del mes de mayo a diciembre

acompañado por su padre, August parte a Paris para tomar estudios con Pierre Gardel y

August Vestris74, conoce además a los maestros Coulon y Mazi maestros de la Opera de

París. En 1821, de regreso a Copenhague, August hace su debut en el en el Teatro Real

como aprendiz en un divertissement coreografiado por su padre, así se mantiene hasta

que en 1824 regresa a París en un segundo período, en el que retoma sus estudios con

73 Gioacchino Antonio Rossini (1792-1868), compositor italiano, conocido especialmente por sus óperas cómicas. Fue uno de los máximos exponentes del bel canto del siglo XIX, género que realza la belleza de la línea melódica por encima del drama o la profundidad emocional. 74 Auguste Vestris. (1760-1842), bailarín francés. Nació en París; hijo del famoso bailarín Gaetano Vestris y de la bailarina Marie Allard. Heredó el sobrenombre de 'dios de la danza' de su padre. Debutó en la Ópera de París con 12 años y estuvo allí durante mucho tiempo como primer bailarín principal. Su hijo, August Armando Vestris, a quien preparó él mismo, se convirtió en maestro de ballet en Londres y Viena.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

165

Vestris. Como estudiante privado de Auguste Vestris, Bournonville realiza el examen y

pasa a l'Académie Royale el 16 de mayo de 1826, y en una fecha tan temprana como el

8 de abril del mismo año, hace su debut en el pas de trois del ballet Nina ou La Folle par

Amour de Louis Milon; iniciándose así su brillante carrera como profesional y más

adelante, firmando un contrato con La Opera de París.

Durante su estancia en París trabaja con los maestros y corógrafos del momento,

baila el pas de trois del ballet La lámpara maravillosa de Francois Albert, y el papel de

Zéfiro en el ballet Psyche, Alfredo el grande, Aladino, Pablo y Virginia, Zéfiro y Flora,

Abu Hassan y el califa, Filis y Melibe, Los sicilianos y así fue desarrollándose como

bailarín, eso sí, más inclinado al demi – carácter.

Uno de los hitos de su carrera fue que llegó a ser el partenaire favorito de María

Taglioni75, con quien compartirá el escenario en diversas ocasiones. No obstante, y a

pesar de su carrera absolutamente ascendente prefiere regresar a Dinamarca, sobre todo

por una razón en especial, August Bournonville se sentía muy danés y prefirió cambiar

su posición en el ballet en Francia para volver a su tierra; además en Francia se había

posesionado ya el estilo Romántico, que había florecido y hecho autónomo el espectáculo

de danza en los teatros, pero que ya comenzaba a caer en decadencia.

Otro aspecto que ayudó a August Bournonville a tomar la determinación de

regresar a Copenhague fue el cambio que provocó el Romanticismo en Europa con

respecto a la figura masculina. En los inicios de la danza el hombre era la figura central

del ballet europeo, el Rey Louis XIV había sido bailarín, y ¿quién podía bailar mejor que

El Rey Sol?; pero en La Era Romántica, las damas se hicieron dueñas de los escenarios y

el hombre quedó relegado a un papel más secundario, fenómeno que Bournonville no

entendía, y así lo expresó en el desarrollo de su obra coreográfica, donde el hombre tiene

el mismo protagonismo que la mujer. August no quería reducirse a estar detrás de la

bailarina y levantarlas como un “porteur”, que es el resumen de lo que se había convertido

la danza masculina, ser un mero soporte para las bailarinas. Si no que defendía que la

danza masculina también podía desarrollarse y que esto no estaba separado para nada de

los cánones de romanticismo.

75 Maria Taglioni (1804-1884), bailarina sueca de origen italiano, la figura más importante de su tiempo. Estableció el estilo delicado y etéreo característico del ballet romántico.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

166

En su primera visita a Dinamarca después de estar en París durante bastante

tiempo, August Bournonville va a encontrar un panorama bastante complicado en el

Ballet Real; la compañía se encontraba en muy malas condiciones, sus padre Antoine aún

seguía fungiendo como director, pero definitivamente había demostrado que no tenía

muchas dotes organizativas, por lo que muy pronto August comienza a ensayar a los

bailarines, organiza el ballet Søvngængersken de Aumer, y comienza a crear una serie de

divertissements como son Aclamación a los Rozamientos y El Soldado y El Campesino.

Además, realiza presentaciones teniendo éxito además como bailarín, por lo que consigue

que la alta directiva y los bailarines de la compañía de buena gana le abra sus puertas para

ser invitado de vuelta a Copenhague. A la edad de 25 años, August Bournonville se había

convertido en consagrado bailarín, maestro de ballet y coreógrafo de la compañía donde

había hecho sus primeras presentaciones cuando aún era un niño, allí continuó bailando

durante 18 años más y coreografiando hasta los 72 años. Su última aparición en escena

fue en 1848 y sería como Valdemar (1835) en el ballet del mismo nombre, con su propia

coreografía.

A partir de 1830, en su posición de maestro de ballet y coreógrafo, Bournonville,

va a decidir muchas de las cosas que marcarían su vida y su carrera, que asegurarían el

paso a posteridad como una figura imprescindible de la historia de la danza, esto sería el

inicio de lo que años después se convertiría en un estilo dentro del ballet. Comienza una

cosecha de personajes, que va a interpretar él mismo, construyendo así lo que hoy es el

repertorio Bournonville. Progresivamente va a ir relevando a su padre en la dirección del

Real Ballet Danés. En 1848, toma la determinación de que no bailaría más, centrando sus

fuerzas como maestro y coreógrafo y caracterizándose por ser muy exigente con sus

primeras bailarinas, se dice que llegaba a ser obsesivo con ellas.

Bournonville comprendió la necesidad de que el arte de la danza no estaba en el

camino correcto y valiéndose de su experiencia, la cultura que había logrado y el apoyo

que había logrando en Dinamarca, también comienza a escribir sobre los temas que se le

preocupaban del arte y la cultura. Publicó su primer libro, “Regalo de Año Nuevo para

los Amantes del Baile” en 1829 y en 1847 el primer volumen de sus memorias, “Mi Vida

en el Teatro” donde de su propio baile Bournonville escribe: “Yo bailé con la misma

dicha con que viví, y mi sentido de humor y mi energía siempre ha dejado una impresión

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

167

en cada teatro. Parecía hacer feliz a los públicos y antes de que ellos me admiraran, les

gusté yo” (BOURNONVILLE, 1979)76.

En 1830, Bournonville había contraído matrimonio con Helena Fredrika

Håkansson de origen sueco, como su madre, y con quien consigue tener siete hijos.

A su regreso a Dinamarca; Bournonville luchó por el arte en Copenhague y puso

a los bailarines en un nivel social paralelo en Europa. En muchos lugares en aquellos

tiempos los bailarines eran mal vistos y estaban muy poco considerados socialmente,

sobre todo los bailarines hombres. En Paris a finales del siglo XIX la danza masculina

había caído en una crisis, Europa había perdido el respeto por los bailarines hombres pero

esto no se hizo extensivo a Dinamarca, esta crisis es algo que afecta a Bournonville y que

lo marca, es por eso que en sus coreografías las mujeres no necesitan que ser cargadas,

tanto ellas como los hombres bailan cada uno por igual y a su vez el uno para el otro.

El trabajo de punta no era tan importante en los días de Bournonville, en

comparación como lo conocemos en la actualidad, su línea de trabajo era lograr un

entrenamiento inteligente con grupos de pasos que estuvieran fuera de los pasos básicos

y a la vez que desarrollaran al bailarín dentro de ellos. En un momento cuando el bailarín

masculino fue desterrado de la escena, Bournonville escogió resaltar la fuerza del bailarín

masculino, a quienes su coreografía favoreció, para que dejaran de ser meros sustentos de

la bailarina en la escena. Su alumno Johannson, hizo mucho de este entrenamiento en St.

Petersburgo dónde entrenó a los bailarines masculinos rusos que formarían parte de los

elencos de los Ballet Rusos de Diaghilev77.

Con algunas interrupciones Bournonville es Maestro de Ballet en Copenhague de

1830 a 1877, este es un largo período de influencia y además fungiendo cargos que

comenzaron por el de bailarín principal, coreógrafo, libretista hasta llegar a director.

Como bailarín August Bournonville posee elegancia, ligereza y una gracia nueva

para Dinamarca en los años 1800, además tenía una muy fina mímica, la mímica para

Bournonville jugaba uno de los mayores roles dentro de sus ballets; pues en ellos logro

que la historia fuera contada a través de la mímica y la danza78 (ASCHENGREEN, 2005).

76 Referido a Mi vida en el Teatro; Memorias de August Bournonville, la primera edición apareció en 1847. En este libro Bournonville expone sus experiencias en los diferentes lugares que visita y sobre todo de lo que ha vivido en su período de estudio y trabajo en Francia. 77 Se refiere a los Ballets Rusos de Diaghilev. Ballets Rusos, compañía de ballet rusa con sede en París creada por Sergei Diáguilev. Los Ballets Rusos fueron llevados por Diáguilev desde los teatros de la Rusia Imperial a París en 1909 con gran éxito encontrándose en su elenco nombres de las figuras mas importantes de la historia del ballet de la época. 78 Erick Aschengreen, Historiador del Real Ballet Dinamarqués DVD Hablando de Bournonville. 2005.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

168

Una de las características que más distingue el trabajo de Bournonville es que

coreografiaba sus pantomimas, bailaba para que sus pies se tornaran en palabras y las

pantomimas iban sobre la música formando un conjunto donde interactúan y se mezclan

formando un todo único.

August Bournonville se convirtió en una figura central de la vida artística de

Copenhague en el siglo XIX, en cuanto a vida social se codeó con las personalidades más

importantes de su época como Thorvaldsen79, Kierkegaard80, y por supuesto, su gran

amigo y contemporáneo Hans Christian Andersen.

Bournonville tiene en su catálogo coreográfico 50 ballets, que aún están activos

en el repertorio del Real Ballet Danés, y numerosos divertissements, igualmente famosos.

En su obra, captura el espíritu de la Era Romántica; los románticos, estaban interesados

en diferentes tierras, otros horizontes, y en diversos eventos históricos, ya fueran reales o

meras leyendas, el presente es algo que no es importante para ellos, y todo ello define la

obra coreográfica de Bournonville.

August Bournonville escribió los libretos de sus ballet, lo cual era inusual en la

época, además coreografió versiones de ballet existentes, lo cual si era y aún es usual en

el mundo de la danza; no obstante Bournonville siempre le da una visión muy personal

resaltando aspectos dramáticos de los guiones que tomaba para hacer sus versiones, lo

que denota su preocupación porque en cada ballet se contara una historia que pudiera

entender y tocar las fibras más profundas del espectador, pues en ellos podrían verse

reflejados aunque fuera una historia sobrenatural.

Uno de sus primeros y grandes ballet, luego convertido en gran suceso fue La

Sílfide estrenada en 1836, que parte del original francés, que hiciera para María Taglioni

su padre Filippo81 y que se estrenara en Paris en 1832, a cuya función asistiría August

estando en esta ciudad, cuando aún estaba estudiando ballet en la Academia de la Opera

de París.

79 Bertel Thorvaldsen (1770-1844), escultor danés que nació en Copenhague, hijo de un tallador de madera islandés.Estudió en la Academia de Copenhague y en 1797 se trasladó a Italia para estudiar la escultura clásica. Vivió en Roma hasta 1838, y allí se convirtió en uno de los líderes del neoclasicismo. 80 Søren Kierkegaard (1813-1855), filósofo y teólogo danés, cuyo interés por la existencia, la elección y el compromiso individuales tuvo gran influencia en la teología y en la filosofía occidental modernas, sobre todo en el ámbito del existencialismo. 81 Filippo Taglioni maestro de ballet y coreógrafo italiano, padre de la bailarina sueca María Taglioni, fue quien instauro el período romántico en el ballet con su coreografía de La Sílfide.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

169

La historia igualmente se desarrolla en Escocia, considerada en este momento

como un país remoto y casi místico. El ballet está caracterizado por su 2do Acto blanco,

característico de los ballets románticos.

Desde que Bournonville vio este ballet pensó que era una buena historia, por lo

que compró el libreto un tiempo después para llevarlo a Dinamarca y montar su versión

coreográfica en 1836 en Copenhague. Él asumió el personaje de James, y Lucila Grahn82

de 16 años en el papel de La Sílfide, ella, quien fuera una de sus alumnas preferidas, se

convertiría en lo adelante, en la bailarina de muchos de los estrenos de las coreografías

de Bournonville y además en su pareja en la vida. Esta unión se va a disolver

escandalosamente en 1841 cuando Grahn sale definitivamente de la compañía, lo cual

marca también uno de los momentos en los que Bournonville se aleja de Copenhague,

por un edicto Real que lo separa de la dirección de la compañía por 6 meses que los toma

para viajar a otros lugares del mundo, como París, Nápoles y Milán, lugares que pronto

le reportarían muy buenas influencias y nuevos conocimientos que plasmaría en el

escenario y que le depararían nuevos y definitivos éxitos.

Como romántico Bournonville se extasió por la naturaleza, el peligro, la

seducción, se fascinó por lo que podía pasar en otros parajes y por toda la atmósfera que

se podía crear a través de una historia o leyenda, el misterio, las emociones, los

sentimientos, la noche, la luz de la luna; se empapó de todos los elementos que no pueden

faltar en una historia del Romanticismo Francés, pero llevándolo a una forma de decir

que se convertiría después en su propio lenguaje escénico, un estilo propio que luego sería

el estilo de la danza clásica en Copenhague hasta la actualidad.

En su versión de La Sílfide, Bournonville trabajo cambios bastante importantes de

la dramaturgia del libreto original, dándole más carga dramática a personajes que a su

entender tenían más peso en la historia. En su montaje le da a Magde la bruja, un papel

más protagónico dentro de la historia, fortaleciendo así el elemento dramático que desata

la gran tragedia del ballet.

Pero La Sílfide sigue siendo un ejemplo del Romanticismo Francés que invadió el

Ballet Danés; es el fenómeno del hechizo que logra el Romanticismo y una primacía que

alcanza sobre todo el desarrollo del movimiento romántico en Europa, lo cual no quiere

82 Lucila Grahn (1819-1907), bailarina y coreógrafa danesa, es una de las cuatro bailarinas a quien se rinden honores en el famoso ballet Pas de quatre (1845). Nació en Copenhague y estudió con el coreógrafo danés August Bournonville, quien creó una versión de La sílfide (1845) en su honor.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

170

decir que este movimiento no tuviera una gran repercusión en la obra de Bournonville e

incluso en su vida personal. La Sílfide es un típico ejemplo de la percepción romántica

del ser humano como criaturas dualistas, que se dividen en cuerpo y alma y que se les

hace difícil reconciliar ambos lados de este dualismo.

Bournonville estaba familiarizado con este sentimiento. En París no solo practicó

ballet, también había tenido amoríos con una joven que embarazó, ella era hermana de un

bailarín que cursaba estudios en la academia. Bournonville nunca mencionó esto, pues en

ese entonces, tenía una novia en casa, y se arriesgaba a ofender la moralidad

contemporánea, y si además quería ir a casa para hacerse Maestro de ballet, esto podría

caerle encima como un gran escándalo, si se decía que él había ido a Europa a hacer bebés

y deshonrar señoritas. August, atendió a la niña, nacida en 1828, quiso hacer las cosas

decentemente, nadie en Copenhague supo sobre esta historia hasta que su testamento fue

leído.

Así vemos que Bournonville supo muy bien que el ser humano tiene siempre cosas

ocultas y dualidades a las que enfrentarse, lo cual siempre tuvo presente en los guiones

de todos sus ballets.

La armonía es un término importante en el ballet del Romanticismo danés. El

Ballet Real Danés era optimista, con la fe en la posibilidad de crear una existencia

armoniosa. Bournonville rechazó el romanticismo dividido de Europa y adoptó una vista

más armoniosa de la vida. El trabajo central de esta armonía escalonada y que además

representa su mayor rendimiento fue Napoli estrenado en 1842.

Bournonville también creó otros Ballets Románticos, como A Folk Tale (1854),

su trabajo más danés, en el cual se materializa el mundo de los gnomos. Crea Ballets

como La Kermés en Brujas (1851) ballets de tema Español tales como La Ventana (1856)

e italiano como Festival de las Flores en Genzano (1858), pas de deux que es uno de los

fragmentos más familiares y conocidos de la coreografía de Bournonville. Trabajó

también espectáculos de variedades o vaudeville, ballets a los cuales puso música

familiar, esto despertó las asociaciones, ballets como Los Voluntarios del Rey en Amager

(1871) y Lejos de Dinamarca (1860) Hacia los fines de su vida creó los ballets nórdicos

como La Valquiria (1861), y todo esto solo nos reafirma la visión cosmopolita de su arte.

Estos ballets, no se ponen en escena por mucho tiempo pero probablemente uno de los

mayores logros lo obtiene Hartmann, ya que compone una de las músicas mejor escritas

para ballet.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

171

Mientras era maestro de ballet, Bournonville, se interesó por lo que sucedía en

otros lugares del mundo, e intentó lograr el éxito en el extranjero, es en esta época que

organizó algunos de sus trabajos en Viena (1855-56) y dirigió la Ópera Real Sueca en

Estocolmo (1861-64) más en ninguno de los dos sitios encontró la fama. Al contrario de

los muchos artistas de sus días, Bournonville viajó continuamente a través de Europa para

mantenerse actualizado con las tendencias artísticas, por lo que estaría ausente de

Copenhague durante varios años en diferentes temporadas, pero siempre regresaría a casa,

donde realmente se sentía cómodo. Bournonville había soñado con fama mundial,

Andersen había logrado la fama en vida, pero August Bournonville tendría que esperar

hasta muchos años después de su muerte.

En 1950, críticos extranjeros e historiadores empezaron a ir a Copenhague, allí

descubrieron un tesoro del ballet en las representaciones de una docena de ballets y un

estilo que no se encontraba en el resto de Europa, pero no es hasta el Primer Festival

Bournonville en 1979 que August Bournonville comienza a ser comentado

internacionalmente, como una verdadera figura de importancia relevante en el ballet

mundial. Bournonville, nunca había esperado esto, se retiró en 1877 después de un

período muy largo como maestro de ballet, con muy pocas interrupciones, y totalmente

dedicado al desarrollo del Ballet en Dinamarca. El 30 de noviembre de 1879 Bournonville

se derrumbó y murió en una calle de su amada Copenhague camino a casa de regreso de

la iglesia. Su entierro tuvo lugar el sábado el 6 de diciembre en la Iglesia de Nuestra

Señora y es enterrado en Asminderød.

Según declaró algunas veces, Bournonville esperaba que después de su muerte

sus ballets sobrevivieran una década más, sin embargo, hoy, la mayoría de los ballets que

coreografió para el Real Ballet de Dinamarca, son repertorio activo de la compañía y su

repercusión mundial es tan notoria que la mayoría de las compañías de ballet del mundo

constan con piezas de su autoría, además de que muchos de los pas de deux de estas obras

coreográficas, son utilizados en los más importantes concursos del mundo, como son el

de París, Varna y Jacksonville, también es importante destacar, como se han tomado como

versiones clásicas, reposiciones de sus ballets, como es el caso de La Sílfide, ejemplo vivo

de la vigencia de la obra de August Bournonville en el mundo.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

172

1.1.2. Estudios Coreográficos

A lo largo de su vida profesional, el coreógrafo danés y maestro de ballet August

Bournonville trabajó tanto para la escena como para definir su criterio estético en el

escenario. A través de variadas publicaciones, Bournonville dejo plasmados los aspectos

estéticos y filosóficos del arte del baile teatral, y planteó su visión y concepciones sobre

el arte. Estos trabajos no están de ninguna manera sombreados por los trabajos de sus

ilustres predecesores y colegas contemporáneos, como Jean-Georges Noverre, Carlo

Blasis83, Arthur Saint-Léon84 o G. Léopold Adice. Unos de sus trabajos más completos

en cuanto aspectos teóricos se refiere es su tratado de tres volúmenes Etudes

Chorégraphiques, escrito entre 1848 – 1861, publicado este mismo año.

No se espera en general que los bailarines y mimos que usan sus cuerpos y caras

para expresar las diferentes emociones en la escena, sean los grandes teóricos de su forma

de expresión, algunos encuentran innecesario hablar sobre este tema, mientras otros

encuentran la tarea como imposible. Bournonville no compartió este punto de vista, sus

escrituras teóricas crecieron fuera de una tradición crítica, cuestionando la forma con la

que las instituciones trataron el arte del baile teatral y a sus artistas. Un ejemplo excelente

de esto es la serie de ocho artículos de Bournonville, que se publicaron en París en 1860

bajo el título Cartas sobre la Danza y la Coreografía, (Lettres sur la Danse et la

Chorégraphie), que claramente pretendía ser una serie similar a las famosas cartas

publicadas por Jean-Georges Noverre, conocidas bajo el nombre de Cartas sobre la danza

y los ballets escritas un siglo antes. En éstos artículos Bournonville se muestra como un

hombre de espíritu combinado con una visión teórica profunda y a su vez con una visión

objetiva y práctica del arte, evidenciado en la polémica que plantea sobre los aspectos

artísticos y estéticos del ballet de su tiempo; estos artículos también tocaron la temática

del hecho moral, dando el espacio para analizar, a menudo, las condiciones miserables

bajo las cuales los artistas de ballet vivieron por esos días.

83 Se refiere a Carlo Blasis coreógrafo italiano, seguidor de Dauberval y Viganó, recreó la técnica de la danza de comienzos del siglo XIX en su Código de Terpsícore (1830). Adquirió fama con la invención del attitude, derivado de una famosa obra del escultor flamenco Juan de Bolonia, una estatua del dios Mercurio apoyado ligeramente sobre la punta del pie izquierdo. 84 Referido a Arthur Saint-Léon (1852) coreógrafo francés, célebres por sus diversas coreografías pero además por su sistema de notación para la danza que utilizaba figuras en forma de palillos que seguían los movimientos de la danza a lo largo de pautas musicales y, además, fue el primer dibujo que mostraba el punto de vista del público, con lo que las direcciones de derecha e izquierda están cambiadas.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

173

Sus escrituras, no importa cuán teóricas pueden ser, siempre están basadas en su

profunda fe cristiana, la cual siempre expuso explícitamente en los argumentos de sus

ballets, como es el caso de Napoli donde gracias al medallón de la Virgen bendecido por

el fraile, Gennaro vence el poder de Golfo para volver a casa con Teresina.

Otro aspecto importante a destacar, es que Bournonville resume todo su modo de

trabajo y creencias en el llamado Credo Bournonville lo cual resume sus concepciones de

lo que debe ser el arte del ballet y que tienen una vigencia total en nuestro tiempo.

Este Credo planteaba que:

El Baile es un arte que pide vocación, conocimiento y habilidad.

Pertenece a las artes que buscan belleza, en cuanto, lucha por no sólo expresar un

ideal del punto de vista plástico sino también desde un punto de vista lírico.

La belleza que el ballet debe inhalar, no encuentra su base ni fundamento en el sabor

y en el placer, al contrario, lo funda en las leyes invariables de la naturaleza.

El arte del Mimo incluye todos los sentimientos del alma, el baile, es esencialmente

viceversa una expresión de alegría, un deseo de seguir los ritmos de la música.

Es en general misión del arte, y del teatro particularmente, intensificar los

pensamientos, criar a la mente y despertarse de nuevo los sentidos. Por consiguiente,

el ballet debería tener el cuidado sobre cada cosa para satisfacer la inclinación de un

público indiferente para lograr impresiones que son extrañas hasta para el verdadero

arte.

La alegría es la fuerza; envenenarla es la debilidad.

La belleza siempre es la frescura de la novedad, mientras el asombro dirige el

cansancio pronto.

El ballet es capaz, con la ayuda de la música, de alcanzar las crestas de la poesía,

más el exceso de la gimnasia puede degenerarse en bufonadas. Las empresas difíciles

pueden realizarse por los innumerables empleados, pero la apariencia de facilidad de

la ejecución sólo se alcanza por pocos.

La verdadera estatura artística consiste en saber esconder el esfuerzo mecánico y

hacer salir y fluir la calma armoniosa.

El amaneramiento no es carácter y la ostentación es el enemigo jurado de la gracia.

Cada bailarín de ballet debe considerar el arte como el anillo que lo encadena y

compromete a la belleza, la cual debe considerar como un ornamento necesario para

la escena y esto, inmediatamente después, como un elemento importante para el

desarrollo espiritual de las naciones.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

174

1.1.3. El estilo coreográfico de August Bournonville.

Para determinar lo que caracteriza el idioma coreográfico de Bournonville es

importante enfocarse en la interacción delicada entre su pantomima y bailes. Como Jean-

Georges Noverre, Bournonville creyó que en los ballets dramáticos cada papel es

individualidad y tiene un propósito específico. La doctrina de Noverre sobre la necesidad

de asignar "una acción diferente, expresión, y carácter" a cada miembro del cuerpo de

baile, para evitar los papeles completamente ornamentales, fue un punto clave para las

coreografías de Bournonville. Probablemente fue Noverre quien le enseñó de la

"diversidad de expresión, el formulario, actitud, y carácter que se encuentran en la

naturaleza" que constituyeron los elementos que se reconocieron por tantos de los

contemporáneos de Bournonville como típico de su idioma coreográfico, causándolos a

evaluar sus ballets con palabras como "une poésie toute particulière". (Una poesía

particular)

Claramente, Bournonville optó y puso todo su empeño, para lograr una

integración total de mímica y baile. Su arte mímico era un tipo de acción silenciosa

naturalista bastante diferente del idioma de la señal más estilizada que se había usado en

los trabajos de su predecesor, Vincenzo Galeotti - y todavía era actual en los ballets de

Marius Petipa85, y de hecho permanecía hasta el fin del siglo XIX.

En sus memorias, Bournonville describió su ideal de pantomima como “una serie

armoniosa y rítmica de cuadros”, propone que eso debe estar de acuerdo con el carácter

y se debe disfrazar, con la nacionalidad y la emoción, con la persona y el tiempo. En su

universo artístico la armonía pictórica de la pantomima parece haber representado una

clase de entonación ‘dramática' para los bailes que normalmente siguen con escenas

pantomímicas. Sin embargo, estaría equivocado afirmar que el idioma coreográfico de

Bournonville esencialmente es totalmente diferente de sus coreógrafos contemporáneos,

o declarar que sus bailes se motivaron exclusivamente por la acción mímica. La estructura

básica de los ballets de Bournonville, con su alternación continua entre mimo y el puro

baile, es claramente el modelo heredado de los orígenes francés-italianos del ballet

dramático o ballet de acción. Estas tradiciones habían asegurado un idioma coreográfico

que se caracterizó por la interacción cuidadosamente calculada entre el baile y el mimo.

85 Se refiere a Marius Petipá (1822-1910) Coreógrafo francés que en la segunda mitad del siglo XIX infundió más perfección a la técnica del ballet. Creador de la estructura actual del pas de deux: entreé, variación masculina, femenina y coda.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

175

Visto desde esta perspectiva, Bournonville lo representa principalmente por la

brevedad de sus escenas de baile a las que generalmente se asignan un espacio más restringido

dentro del esquema global de sus ballets. Este hecho, en parte, se explica por los recursos

muy limitados que él tenía a su disposición, por lo que se refiere a los bailarines y accesorios.

En sus escrituras privadas lamentó a menudo la falta constante de medios prácticos

con que crear escenas más largas, que con frecuencia, lo refrenaron de insertar más bailes en

sus ballets. Es por consiguiente, errado asumir que la falta eminente de escenas de baile de

gran potencia y divertissements en los ballets de Bournonville era una opción deliberada de

su parte. Mucha evidencia sobre sus intenciones originales para crear sus nuevos ballets o ya

extender los trabajos existentes con más escenas de baile puede encontrarse en sus escrituras

privadas y las fuentes musicales. Es más, en los pocos casos cuando Bournonville tenía los

recursos suficientes agrandó sus ballets casi como una regla; organizando las óperas y otras

obras les fue incorporando bailes adicionales y a los divertissements más viejos que habían

salido del repertorio los fue reciclando en la medida que las condiciones lo permitían. Éste

fue el caso de su restauración de Fausto (1849), sus tres revisiones de La Sílfide (1849, 1862

y 1865), la revisión completa de su versión de Valdemar (1853), y sus reposiciones de La

Kermés en Brujas (1865), para nombrar sólo algunos.

Según las creencias artísticas de Bournonville, las condiciones previas de la

dramaturgia para usar en las escenas más grandes estaban en que nunca se debía estar en

conflicto con lo que él nombró la verdad dramática, principio con el que escenificó historias

dramáticas que se desplegaron fácil y firmemente con los bailes que nunca están separados

de la escena en sí, sino que los colocó como la culminación lógica de cada situación

emocional. Por consiguiente, sus divertissements no son momentos abstractos de baile, son

cuadros realistas de la vida diaria de los personajes, sin tener en cuenta si ellos son criaturas

subterráneas, sobrenaturales, o personas cotidianas. En el universo coreográfico de

Bournonville los bailes están llevando el reflejo de los caracteres de la realidad existencial, y

como tal ellos se confrontan con un mundo fantástico. Por consiguiente, su dramaturgia

propone que sus bailes no eran para animar al espectador a cazar abstracciones o ilusiones

por su propia cuenta, sino que los viera como expresiones de emociones dadas. Esto es

particularmente consistente con respecto al concepto que tenía Bournonville sobre los pas de

deux, un género que quizás representa el más intenso punto en su obra como creador y de su

rendimiento artístico entero y en el que probablemente difirió más radicalmente de sus

colegas contemporáneos.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

176

En los pas de deux de Bournonville, el hombre baila casi tanto como la mujer, y

no le hace sombras alrededor de la escena, ni le sirve como portador personal. Es más, la

tensión entre los sexos es cuidadosamente equilibrada, dirigiéndose a algo que podría

traducirse como una competición del virtuosismo, o más bien una muestra del

virtuosismo de ambos bailarines por igual, sin que esto afecte el hecho artístico en sí.

Bournonville no deja que se le telegrafíe su coreografía al espectador por medio de

preparaciones coreográficas obvias, lo cual constituye otra de sus más definitorias

características.

¿Qué, entonces, caracteriza la coreografía de Bournonville? Analizando sus

bailes, los que aún se conservan en escena, así como a través de sus notas personales, es

evidente que su idioma coreográfico era mucho más variado y abierto a las influencias

del extranjero que las que en la posteridad puede haberse reconocido quizás, en sus

memorias, Bournonville dio énfasis a eso claramente; durante su carrera él radicalmente

cambió su estilo coreográfico por lo menos en tres ocasiones. Estos cambios siempre

ocurrieron después de estar un extendido tiempo en el extranjero. El primer cambio tuvo

lugar en 1830 después de una serie de presentaciones en Berlín donde había sido invitado,

para hacer el papel principal de Edmond en el ballet de Jean Aumer86 La Somnambule

(La Sonámbula). Los segundos y terceros cambios eran el resultado de sus estancias en

París en 1834 y 1841. En 1835 presentó un completamente nuevo estilo coreográfico a

Copenhague con los bailes creados para el cuarto acto del ballet nacional histórico

Valdemar, ellos parecen haber sido basados en sus experiencias, recogidas de mirar los

ensayos y actuaciones de los ballets de Louis Henry en París durante el verano de 1834.

Seis años después puso al día de nuevo su idioma coreográfico con un pas de deux

realizado el 12 de diciembre de 1841 como un divertissement incorporado en la ópera de

Giacomo Meyerbeer87 Roberto el Diablo (presentado en Copenhague con el título Robert

af Normandiet). Este baile se coreografió aparentemente por el maestro de ballet francés,

Joseph Mazilier88 cuya influencia en el estilo coreográfico de Bournonville parece haber

sido mucho más importante que lo previamente asumido.

86 Referido a Jean Aumer (1774-1833) bailarín coreógrafo francés. Estudio con Dauberval. Debuta en la Opera de París en 1798. Maestro de Ballet en la Puerta de Saint Martín 1804-06. Se retira en la Opera de Normandía en 1831. 87 Se refiere a Giacomo Meyerbeer (1791-1864), compositor alemán de gran dramatismo que influyó en su compatriota Richard Wagner. Destacó como la figura más sobresaliente de la gran ópera francesa posterior a 1831. Nació en Berlín y su verdadero nombre era Jakob Liebmann Beer. 88 Referido a Joseph Mazilier (1801-1868) Bailarín, Maestro y Coreógrafo francés, debuta en el teatro de la Puerta de Saint Martín en 1822, se une a la Opera de París, se convierte en un gran bailarín de carácter,

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

177

Con su entrenamiento temprano en la escuela de August Vestris, y su experiencia

más tarde en los estilos diferentes de Aumer, Henry y Mazilier, además de las influencias

de los diferentes viajes que realiza, el idioma coreográfico de Bournonville debe, por

consiguiente, ser considerado principalmente como un conglomerado artístico de varios

elementos extranjeros diferentes que se asimilaron y transformaron bajo su ojo

especialista en una especificidad de la escuela danesa de ballet.

Esta Escuela Bournonville, se sometió a varios cambios durante su propia vida.

Los estudios comparativos de sus notas coreográficas que tratan de sus cambios y

revisiones, han revelado que su estilo francés temprano y la coreografía bastante

simétrica, desarrollaron gradualmente en un idioma coreográfico con más anchura y

vuelo. Estas transformaciones progresivas de frases coreográficas originalmente en

pequeña escala fueron convirtiéndose favorablemente centrados en un estilo

caracterizado por más desarrollo del movimiento en el espacio, también puede haber sido

el resultado de la gran proeza técnica de los bailarines que tuvo a su haber en las diferentes

ocasiones. Claramente, su estilo francés académico de base fue reemplazado por una

fluidez más expansiva que caracterizó sus trabajos más tarde y parece haber sido

singularmente algo muy propio.

El estilo que fundó y nutrió Bournonville, era así, una cantidad muy cambiable de

su propio concepto estético e invenciones técnicas, cuidadosamente apareadas con una

selección minuciosa de la coreografía, y dio testimonio de ello durante muchos de los

viajes que realizara al extranjero. En este sentido, Bournonville representa un verdadero

artista europeo que siempre hizo notas distintivas sobre esos elementos extranjeros que

consideró compatible con su propio ideal artístico.

Los ejemplos de influencias extranjeras en el estilo coreográfico de Bournonville

son numerosos, y ocurre a lo largo de su vida. Según sus memorias dividió su carrera

creativa en tres períodos principales que cubren los años 1830-1848, 1849-1861, y 1866-

1877. Durante los primeros dieciocho años como maestro y coreógrafo incorporó varios

bailes extranjeros y divertissements menores en sus producciones para el Teatro Real de

Copenhague. Junto a ellos, se revelan que coreógrafos, compositores, y bailarines,

principalmente franceses e italianos, exactamente, eran muy influyentes en la formación

de su arte. Entre los coreógrafos con los que trabaja frecuentemente, de cuya cosecha es

la mayoría de las coreografías que pidió prestadas durante este período estaban Jean

hace roles en la Sílfide (1832) de Taglioni y La Hija del Danubio (1836) Como coreógrafo realizó entre otras obras una versión de El Corsario.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

178

Aumer, Louis Milon, Pierre Gardel, August Vestris, y Joseph Mazilier. Ellos representan

al estilo francés que parece haber sido lo que a Bournonville le estaba gustando

grandemente en esta primera época.

La música escrita por compositores extranjeros que frecuentemente empleó en la

mayoría en sus ballets tempranos, era de los compositores italianos Michele Enrico

Caraffa, Saverio Mercadante y Gioacchino Rossini, los austriacos Adalbert Gyrowetz,

Robert von Wenzel, Gallenberg y Joseph Mayseder, y los compositores franceses

Ferdinand Hérold, Jean-Madeleine Schneitzhoeffer y Giacomo Meyerbeer. La música

utilizada repetidamente en sus ballets tempranos son las versiones más originales que se

colocaron y o se re-orquestaron con la ayuda de los colaboradores musicales daneses, que

por demás son ejemplo de las preferencias musicales de Bournonville en el repertorio del

ballet europeo de su tiempo. Finalmente, en sus ballets tempranos Bournonville escogió

a menudo incorporar bailes extranjeros que él o tenía anotados o aprendió personalmente

de asistir a las actuaciones hechas por algunos de esos artistas que admiró en su mayoría.

Entre ellos François Decombe, Antoine Paul, Jules Perrot89, María Taglioni, Fanny

Elssler90, y Carlotta Grisi91.

Visto de esta perspectiva, Bournonville representa al coreógrafo, durante el

período Romántico, que unió la mayoría del talento artístico de estos bailarines muy

diferentes; esto, sin embargo, siempre lo hizo prestando una atención cuidadosa y

mientras no sacrificase sus propios ideales estéticos y técnicos. El resultado de su

acercamiento artístico es más aun notable cuando uno comprende que el lenguaje

coreográfico de Bournonville realmente consiste en un inmenso conglomerado de

ingredientes extranjeros, tanto musicales como coreográficos, unido a un estilo uniforme,

que aparece como singularmente propio.

Un ejemplo significante de tal pedir prestado, musical y coreográfico, y

reestructuración de trabajos por los artistas extranjeros merece una atención particular,

porque proporciona una evidencia tangible de que una gran parte de los trabajos por los

que Bournonville, es mejor conocido hoy, o están en la realidad o devinieron a un

producto directo de ballets contemporáneos escritos por coreógrafos y compositores

89 Jules Perrot (1810-1892) bailarín y coreógrafo francés, estudió con Auguste Vestris y Salvatore Viganó, bailó en la Ópera de París (1830-35) como compañero de Maria Taglioni. 90 Fanny Elssler (1810-1884) bailarina austriaca de las más renombradas en la historia del ballet. 91 Carlotta Grisi (1819-1899) bailarina italiana, de las más importantes del romanticismo, baila en la ópera de La Scala de Milán en 1829. Más tarde se une al coreógrafo francés Jules Perrot. Fue la protagonista de Giselle (1841), La péri (El hada oriental 1843).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

179

prominentes del sur y centro europeos. Un examen de las fuentes musicales existentes,

Bournonville lo realizó en 1856 para la presentación en Viena que organiza en el Teatro

de Kärnthnerthor de su ballet Napoli, o El Pescador y Su Novia donde se revela

favorablemente como algo desconocido y como un hecho sorprendente. Esta producción

contuvo, entre otras cosas, un nuevo baile incorporado en el Acto IIl que reemplazó el

original pas de cinq divertissement de Bournonville de 1842 en ese acto. Este baile

consistió en un pas de deux coreografiado por el bailarín italiano, Lorenzo Vienna, para

él mismo (como Gennaro) y la bailarina italiana, Carolina Pocchini (quién representó a

Teresina). En la parte del primer violín la música completa para este baile es incluida,

aparte de la introducción, y demuestra ser casi idéntico, a las notas de las partituras de

Paulli para el pas de deux de Bournonville en Festival de Flores en Genzano, estrenado

casi dos años después en el Teatro Real de Copenhague el 19 de diciembre de 1858. Este

hecho bastante asombroso indica que la música para el pas de deux de 1858 de Festival

de Flores en Genzano de Bournonville que hasta aquí se ha considerado como un trabajo

compuesto exclusivamente por Paulli, deba, de hecho, ya haber existido y haber sido

realizado para la presentación del 56 de Napoli, o El Pescador y Su Novia durante la

estancia de Bournonville en Viena en 1855-1856.

Una nota en la parte del primer violín, en la partitura original conservada en

Dinamarca, como asegura el Dr. Erick Aschengreen, nos proporciona el nombre de su

compositor, el austriaco Matthias Strebinger, quién al parecer escribió esta música en

Viena durante 1855 o temprano en 1856. Sin embargo, las pruebas definitivas que

corrigen que Strebinger era el verdadero compositor de esta música sólo se obtuvieron

con el descubrimiento de su autógrafo para algunas partes del ballet y que estaban

dirigidas a un formato de conjunto, el cual tocó cuando se realizó la puesta en escena.

Estas partituras, junto con una copia manuscrita contemporánea de la versión orquestal

completa de Strebinger, fueron descubiertas tras una investigación del tema, en la

Biblioteca Real de Copenhague.

Ahora a mano, con todas estas fuentes, a Paulli debe dársele hoy sólo crédito por

haber colocado y/o re-orquestado en 1856 la partitura de Strebinger cuando se estaba

incorporando, probablemente al deseo de Bournonville, para la coreografía de Festival de

Flores en Genzano. La posibilidad que la partitura de Pauli y Bournonville del pas de

deux de Festival de Flores podría haber sido incorporada en la versión de Viena de

Napoli, y después haber sido retirada para su première de Copenhague en 1858, es

realmente posible, porque Napoli se dio sólo tres veces en Viena, la última vez el 9 de

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

180

febrero de 1856. Por consiguiente, el hecho es que los pas de deux de Napoli para la

puesta en escena de 1856 coreografiado por un bailarín italiano con la música original

compuesta por un compositor austriaco, es casi idéntico a la versión de Bournonville en

1858 desde un punto de vista coreográfico y musical.

¿Esto significa entonces que hoy en día cuando se presenta este pas de deux se

baila la versión que hiciera August Bournonville sobre el original de Lorenzo Vienna en

1856 para la presentación en Viena?

Para contestar esta pregunta existen pruebas de que ningún autógrafo detallado el

momento se ha encontrado en las notas coreográficas para el pas de deux, ni por parte de

Lorenzo Viena, ni de Bournonville, hasta el momento. Por tanto, solo podemos

remitirnos a la coreografía de Bournonville como se ha dado a conocer de una generación

de bailarines a otra durante más de un siglo, para buscar elementos que pueden apuntar

hacia una fuente coreográfica aún más temprana en este baile.

Ciertamente, Festival de Flores en Genzano es diferente de la mayoría de los otros

divertissements de Bournonville. Si a uno se le pide caracterizar este baile en unas pocas

palabras, se está tentado a llamarlo como una obra maestra del virtuosismo internacional

de Bournonville. En ningún otro ballet conservado encontramos tantos pasos poco

familiares o un trabajo de puntas fuerte como en este pas de deux, esto es particularmente

visible en los pasos de la primera variación de la muchacha, los pequeños gargouillade y

su ronda de petit manège, con cuatro grand jetés en primer arabesque al final de este solo,

también, la serie repetida de relevés rápidos en la punta en su segundo solo, no se

encuentra en cualquier otro de los ballets de Bournonville.

Otra significativa diferencia entre Festival de Flores en Genzano y sus otras

coreografías se evidencian en la coda, aquí un pequeño círculo se realiza cuatro veces por

la pareja, con el muchacho que sostiene a la muchacha, manteniéndose él, en una posición

inclinada baja y ella salta derecha mientras va haciendo ronds de jambe rápidos. Es

bastante raro en la coreografía conservada de Bournonville, que sea repetido cuatro veces

sin la variación más ligera una frase de esta longitud. Incluso el juego de coqueteo entre

la pareja al principio de la Coda, una reminiscencia coreográfica de los pasos de la

muchacha en la primera variación, no se encuentra en cualquier otra parte en el espectro

coreográfico de Bournonville. El fragmento donde ella aguantada por el muchacho llega

a la posición de primer arabesque, y gira entonces a la izquierda que hace una rotación en

avant arabesque y después ella gira de nuevo para volver al correcto primer arabesque,

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

181

tampoco es una secuencia que encontramos usualmente en ninguna de las otras

coreografías de Bournonville.

Los dos solos o variaciones del muchacho parecen cerca de su estilo usual, en el

que los pasos usan los golpes fuertes de la música principalmente. Sin embargo, en su

primer solo encontramos una diferencia significativa de la mayoría de las otras

variaciones para varón, famosas de Bournonville, y es que este solo sigue líneas directas

muy simples en el uso del escenario. El segundo solo del muchacho es quizás la única

parte que está totalmente en el estilo más conocido de Bournonville. Esto se pone claro a

través de los muchos contrastes súbitos entre la serie de pasos que se realizan

repetidamente.

Tomado en conjunto, parece que, aunque generalmente Festival de Flores en

Genzano se han reconocido como una de las expresiones más típicas del arte de

Bournonville, también contiene tantos elementos extranjeros que nos obligan a que lo

consideremos diferente de sus otros trabajos. Sabiendo que este baile es musicalmente

basado en el trabajo de un compositor austríaco, también parece razonable considerarlo

como una traducción coreográfica en danés del trabajo de un bailarín italiano, pero, claro,

funcionó por completo de acuerdo con el propio credo artístico de Bournonville. Visto

desde esta perspectiva Festival de Flores en Genzano representa de hecho en la vida de

la coreografía de Bournonville, la más internacional, en que se fundieron las

peculiaridades musicales y coreográficas estilísticas del ballet Romántico en Europa del

Sur, Central, y Norteña en una verdaderamente única simbiosis artística. La popularidad

mundial y duradera de Festival de Flores en Genzano pas de deux sólo confirman este

punto de vista.

1.1.4. El repertorio desarrollado por August Bournonville para el

Real Ballet Danés.

La obra de August Bournonville, se desarrolla en el siglo XIX y ha pasado la

prueba del tiempo convirtiéndose sus coreografías en clásicos del ballet, del estilo que

cultiva, que es el estilo romántico. Su obra tuvo gran desarrollo en el ballet Real de

Dinamarca, compañía que hoy cultiva aún su estilo y mantiene vivas las coreografías que

hiciera Bournonville y que forman la parte más importante del repertorio de esta

compañía danzaria, que hoy es conocida a escala mundial.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

182

Como antes se ha planteado, la obra de Bournonville gira en torno al

cosmopolitismo, la mayor importancia que tiene su obra y él como persona, gira en torno

al amor, la responsabilidad y el apego que tenía por su natal Copenhague, para la cual

trabajó y a la cual se dedicó totalmente hasta su muerte, a pesar de que su repertorio,

estuvo influenciado por las tendencias del ballet en Europa y por características que le

deslumbraron en muchos lugares de esta región, trabajó para llevar un arte completo,

formar un criterio y lograr una educación en el público danés, sobre el arte del ballet, en

este sentido, se enfocó, a lograr un acercamiento total, una educación, y una coexistencia

de todas las personas, siendo incluso de diferentes estratos sociales. Bournonville trabajó

para su pueblo, sin saber que también lo estaba haciendo para el mundo, y es esto lo que

nos llega de él hoy.

En la historia de la coreografía de August Bournonville durante el período de

trabajo en el Ballet Real de Dinamarca (1830 – 1877) crea más de 70 coreografías que se

pueden identificar en cuatro períodos o etapas.

1. Etapa de Reposiciones (1830 – 1836)

En este período Bournonville hará versiones de:

La Sonámbula 1829

Romeo y Julieta 1835

La Sílfide 1836

Entre otros ballets...

1. Etapa de los ballets originales de influencia francesa. Es el período donde

coreografía nuevos ballets pero todos aún con conceptos muy franceses.

El toreador 1840

El Conservatorio 1849

Napoli 1842

1. La tercera etapa será la que marcará su tránsito al Naturalismo que se desarrolla

entre 1850 al 1860

2. Y la cuarta y última etapa es la del Naturalismo que se pone de manifiesto en su

obra desde al año 1860 al 1877 año en que se retira de la compañía.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

183

1.2. El estilo Bournonville como base fundamental de la escuela danesa de ballet.

August Bournonville tenía un sentimiento natural para la coreografía y

combinaciones de pasos, lo que se ve demostrado en toda su obra coreográfica. Con su

luz, vierte de movimiento su baile que es realmente único. Cuando se enseña el estilo

Bournonville es importante subrayar la gracia natural y la sensación de facilidad, aunque

naturalmente esto demanda que el bailarín domine la técnica básica.

En busca de la armonía estética, el ideal de Bournonville es ése de la edad de oro

europea, que es " armonía sobre todo "

La belleza en el baile es considerada una materia de la extensión y de las

posiciones armónicas y purificadas del cuerpo, la técnica no puede sombrear la gracia de

los movimientos nunca.

En las coreografías de Bournonville, ambos bailarines, necesitan tener un buen

dominio de la técnica pero también necesitan ser buenos actores, la musicalidad y talento

dramático de las parejas de baile es una de las características cruciales dentro de esta

escuela.

El estilo Bournonville tiene su secreto en el épaulement; es la manera en que el

bailarín lleva la parte superior de su cuerpo, o el torso.

El bailarín Bournonville, a menudo tiene inclinaciones del torso hacia la pierna de

trabajo a fin de enfatizar el movimiento de la pierna y el pie.

Generalmente, el épaulement también incluye cierta torcedura de la cabeza, de

modo que la mirada sigue el pie de acción, a fin de hacer que el espectador mire al pie

también.

Los brazos son generalmente redondeados, y los dedos son calmados y blandos.

El juego rápido de los pies. La coreografía de Bournonville es conocida para su

juego de los pies rápido. De hecho, es la característica más conocida de esta escuela, por

la cual muchos la distinguen.

Movimientos diminutos que hacen un contraste aún mayor a los grandes pasos y

los movimientos delicados. Sin embargo, el bailarín tiene que dar la impresión de ligereza

todo el tiempo y sobre todo de una gran facilidad a la mirada del espectador.

La secuencia de los pasos, tiene a menudo una comodidad flotante entre ellos.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

184

Bournonville nunca creo coreografías que fueran de una esquina a la otra del

escenario, él, deja que los bailarines avancen, una y otra vez en la misma variación en

dirección a los diferentes puntos del espacio, usando el área completa de la escena...

En esta escuela se trabaja como una característica el ligado de los pasos, y se le

da mucho énfasis a los pasos de transición, por la utilización que se le da a estos pequeños

pasos que conducen a los grandes pasos dentro de este estilo, junto a esto, la importancia

que se le da al hecho de caminar y cómo caminar es importante, también se trabaja de

forma que todo quede integrado y dé como resultado un perfecto equilibrio entre técnica

académica e imagen que proyecta el bailarín.

El baile que desarrollara August Bournonville, tiene que ser un conjunto de

movimientos dónde no se note el esfuerzo ni siquiera en las combinaciones de pasos

difíciles, cosa que se trabaja y se exige durante todo el período de enseñanza, que

comienza con la entrada a la Real Academia de Ballet con la edad de 6 años.

Musicalmente, Bournonville bastante a menudo nos ofrece sorpresas en

comparación con otros coreógrafos.

Muchos de sus movimientos se hacen delante de la música, para que el énfasis se

ponga en el último cierre del movimiento y no en el estiramiento o el equilibrio, o sea, en

sus coreografías muchos de los movimientos se adelantan a la música, ya que sus acentos

coreográficos son abajo, dándole mayor énfasis a las caídas, que coinciden con el acento

musical, lo cual da un cierre al movimiento.

La redacción musical es allegro, son importantes los movimientos simples y

ligeros de los brazos, coordinados con los rápidos movimientos de las piernas, pero sin

perder la expresión de suavidad corporal.

En Bournonville, encontramos como característica también, que los pirouettes

son con las piernas bajas, sur le coud de pied, esto se debe a un sentido histórico,

en su tiempo las faldas de las señoras eran más largas que lo que son hoy los

vestuarios de las bailarinas y se adopta más esta posición por un sentido de

comodidad y sobre todo de recato. En los pirouettes en dedands se alza la pierna

à la seconde y entonces se ponen los dedos del pie bajo la rodilla, pero sólo porque

la técnica así lo demanda, aunque también se hacen sur le coud de pie.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

185

Bournonville vivió de 1805 a 1879; mas era un hombre visionario y de una

mentalidad muy contemporánea, la técnica que desarrolló se puede analizar de la

siguiente manera: estaba basada en la instrucción francesa de la Era Romántica.

Bournonville, como ya hemos dicho, completó su propio entrenamiento en la Ópera de

París, entonces gradualmente domesticó lo que había aprendido, una vez que se estableció

de nuevo en Dinamarca como director y maestro regular, al parecer, se convirtió en un

instructor dotado e imaginativo para que sus estudiantes apreciaran sus clases, y se

tomaran el trabajo de hacer y guardar las notas de los ejercicios que él coreografió.

En los últimos años del siglo XIX, sus sucesores, asustados de olvidarse de su

herencia, realizaron un estudio de estas notas, agregando pasajes de los ballets de

Bournonville como la sección que se realizara de Konservatoriet (El Conservatorio), el

homenaje del coreógrafo a sus años de estudiante en París, y se codificara el material en

seis juegos de clases, uno durante cada día de la semana activa, lo cual es válido en

nuestros días.

Como los ballets de Bournonville, que han sobrevivido por medio de lo que los

daneses llaman “la tradición viviente”, de esta manera, se transmitieron sus clases,

personalmente, de maestro (siempre un mayor o jubilado bailarín del Ballet Real Danés)

al alumno, o sea, eran conservadas por la transmisión oral y no por una consecuente

recopilación escrita de las mismas. Estos alumnos incluyeron a los niños y adolescentes

pertenecientes a la academia, también atada a la compañía y los profesionales.

La escuela Bournonville, tal y como se conoce hoy, fue creada en el período entre

1893 y 1910. La primera recopilación de las clases de Bournonville, fue realizada por

Hans Beck (1861-1952), quien fuera estudiante de la escuela del Real Ballet Danés en

1869, Bournonville fue testigo de su debut justo dos días antes de morir en 1879, bailarín

temperamental, formó parte de los elencos en los ballets de Bournonville que constituían

el repertorio del Teatro Real en su tiempo, se consideró a sí mismo, como el guardián de

la tradición Bournonville e hizo todo para mantener el espíritu y el estilo de la coreografía

del maestro; después de retirarse de los escenarios, sirvió como maestro de ballet desde

1894 hasta 1915, es la figura clave en el establecimiento de la Escuela Bournonville y

quien a lo largo de la década de 1890 recuperó los pasos y variaciones de los ballets que

luego se implementaron en las "escuelas Bournonville". Los seis juegos de clases, con su

música acompañante, que fue colectada y en parte compuesta por Ludving Theodor Smith

(1850- 1924), quien había tenido una corta carrera como bailarín, y comenzó a los 9 años

en 1859 cuando ingresa a la Escuela de Ballet, luego pasa a formar parte de la compañía

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

186

desde 1870 a 1877. Después de su corta carrera como bailarín, se convierte en maestro de

una escuela de ballet privada, pero cuando Hans Beck se convierte en maestro de ballet

en 1894, lleva a Ludving de regreso Real Ballet Danés como maestro de la escuela y es

en esta asociación que ayuda en la recopilación de los ejercicios del legado Bournonville.

Este conjunto de clases se volvió casi el único instrumento de instrucción del Real

Ballet Dinamarqués y de su escuela, y aún hoy, bajo algunas revisiones, es el sistema de

clases que se utiliza dentro del sistema de enseñanza en Dinamarca.

En 1893 Hans Beck empezó instruyendo a bailarines adultos en una clase que se

denominaba “clase de perfección”, en este momento recopila 108 sucesiones de pasos,

los cuales conforman los seis juegos de clases que hoy existen en el programa de la

escuela Bournonville. Un estudio de estos ejercicios y reconstrucción de 50

combinaciones de pasos, fue publicado por primera vez en 1979 por Kirsten Ralov (1922-

1999), la primera edición del libro Escuela Bournonville, que marca además la

publicación oficial de la escuela. Esta publicación tuvo la particularidad que se emitieron

las indicaciones de los pasos en francés y en dos sistemas de anotación separados (Benesh

y Laban) junto con la música de acompañamiento.

Kirsten Ralov, fue instruida en la Escuela de Ballet del Real Ballet de Dinamarca,

llegó a obtener la categoría de bailarina principal de dicha compañía donde se mantiene

desde 1942 hasta 1962, después de dejar de bailar, ella continúa asociada a la dirección

artística de la compañía y como maestra de ballet en el período de 1978 a 1988, se

convirtió en la responsable de diferentes reposiciones de ballets de Bournonville en

diferentes lugares de Europa, teniendo significativa importancia el teatro Bolshoi de

Moscú.

La segunda edición de la recopilación de los ejercicios, se presenta por Vivi Flindt

y Knud Arne Jürgensen, ambas egresadas de la escuela del Real Ballet, en una publicación

titulada Bournonville Ballet Technique (Técnica de Ballet Bournonville) en 1992, que

venía acompañado por un video. La última edición es del año 2005, realizada por el Anne

Marie Vessel Schlüter (1949) actual directora de la Escuela del Real Ballet Danés,

educada en dicha escuela y quien se uniera a la compañía en 1965, bailando gran parte

del repertorio Bournonville. En 1976 comienza a enseñar y en 1988 es nombrada directora

de la Escuela de Ballet. Como maestra toma parte en las preparaciones para las

presentaciones de la compañía, ejemplo de ello es su participación en el montaje de una

nueva producción de A Folk Tale junto a Frank Andersen en 1991.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

187

La nueva edición del 2005 contiene tres publicaciones, un libro que es el Programa

de Enseñanza y otro que son las partituras de la Música de acompañamiento de las clases,

y dos discos de formato DVD, donde vienen ilustradas las características esenciales de la

escuela, un documental sobre la vida de Bournonville presentado por Erick Aschengreen,

entrevistas a algunas personalidades del ballet en Dinamarca, como Frank Andersen,

Anne Marie Vessel Schlüter, Tomas Luna , además de presentar íntegramente las clases

Bournonville. Esta publicación está basada en la primera edición que hiciera Kirsten

Ralov en 1979.

La meta de este sistema, que a pesar del tiempo que ha transcurrido y de las

diferentes ediciones, es mantener vivo el estilo Bournonville; quizás es bueno considerar

que la escuela Bournonville, más que una introducción a un estilo es un método de

entrenamiento, aunque en un principio se utilizara como tal para los bailarines de la

compañía del Ballet Real Danés, en el siglo XX, es también el sistema utilizado por la

escuela y su objetivo es lograr que cada estudiante, que comienza su período de formación

que se extiende por diez años, luego de graduado, ingrese a la compañía siendo capaz de

ejecutar las clases, no solo como una guía, sino de memoria, esto basado en que los

estudiantes son lo suficientemente jóvenes de cuerpo y mente para absorber el

vocabulario y estilo de Bournonville sin ofrecer ninguna resistencia. Para ellos la pequeña

batería, el sutil épaulement, el singular pero maravilloso fraseo musical, el énfasis en la

alegría y la apariencia agraciada, no es tanto un lenguaje extranjero, contradictorio al

estilo internacional de otros entrenamientos, más bien es el dialecto local que ha sido

absorbido como si fuera propio. Este período de formación que se ha mencionado,

comienza con una audición, con niños entre 6 y 11 años de edad, aunque hay casos en los

que si el alumno tiene un entrenamiento anterior son aceptados a través de audiciones que

se hacen cada año a mediados del mes de marzo.

En esta audición de selección se encuentran los maestros tanto de la escuela como

de la compañía y doctores especialistas en ortopedia y antropología. Entre los parámetros

que se miden están los pies, las piernas, la espalda, el cuello, y también que tengan rostros

bonitos y agradables, además se les hace una prueba para ver la musicalidad, cuya prueba

consiste en que los maestros llevan a los niños en un círculo grande, y se les pide que

caminen al tiempo de la música proporcionada por uno de los pianistas de la compañía.

Después de un minuto, la música se detiene y se les pide a los muchachos saltar a tiempo

con otra melodía. Es importante destacar que se le pide lo mismo a las hembras que a los

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

188

varones, no obstante, a las muchachas también se les pide hacer pasos como chasses y a

veces otro paso simple. En el caso de las audiciones para aspirantes desfasados, consiste

en una clase que incluye selecciones de ejercicios tanto de barra como de centro, pero

todo más corto, y de aquí se escogen los alumnos que posiblemente entren a formar parte

de la escuela, de esta audiciones que se presentan alrededor de 50 alumnos, siempre se

escogen muy pocos debido a que los alumnos no llegan a tener el nivel técnico que

tendrían que tener para su edad.

Los resultados son entregados en cartas personales, dándole el resultado oficial a

cada uno de los alumnos; los seleccionados, comienzan a asistir 4 días a la semana durante

5 o 6 semanas a los salones de la escuela a tomar algunas clases en forma de curso

intensivo, y de ahí se comienzan a escoger los que se convertirán en los nuevos

estudiantes de la escuela, para este curso intensivo son escogidos alrededor de 57

muchachas y 11 muchachos, de los cuales solo se convertirán en los más jóvenes

integrantes de la escuela una docena o dos de ellos. Estos estudiantes empezarán su

instrucción formal al principio del próximo año escolar, a finales del mes de agosto.

En la escuela hay aproximadamente entre 60-70 estudiantes, divididos en siete

niveles por edades y habilidad, los muchachos y muchachas permanecen juntos hasta el

último nivel. Es bueno destacar, que casi siempre se dividen los grupos por edades,

aunque esto no siempre funciona así, pues más bien se dividen por habilidades. Cada día

empieza con una clase a las 8:30 de la mañana, para la mayoría de los estudiantes, y a las

10:00 am. o a las 11:00 am. para los estudiantes más jóvenes. El horario se ejecuta de

lunes a viernes hasta el tercer año, cuando se agregan las clases del sábado.

“Uno tiene una hora y media clase, y entonces toma un descanso durante aproximadamente 40 minutos y luego empieza en el académico alrededor de 10:40… algunos días, teníamos la clase de la tarde de nuevo de 4:15 hasta las 6. Y entonces si estaba haciendo una actuación por la noche, íbamos a la cantimplora y tomábamos la cena; entonces me preparaba para ser un niño en el puente en 'Napoli' tercer acto o para hacer otro ballet. En estas noches quizás hacía la tarea durante los descansos o mientras estaba en el camerino. En la escuela el día es largo, y empieza temprano. Pero, había también tiempos cuando ciertamente no estaba en nada y entonces podía enfocarme en el entrenamiento y en las tareas académicas” (LUND, 2008).

Cada año se realizan exámenes donde se mide el nivel técnico alcanzado por el

alumno y si este no está al nivel de las exigencias de la escuela, no continua cursando sus

estudios de ballet.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

189

En los primeros años se comienza la enseñanza bien despacio, con todo lo que

tiene que ver con las posiciones de colocación, posiciones de brazos, las posiciones

básicas de los pies, las posiciones de la cabeza, los primeros ejercicios para desarrollar la

coordinación, y algunos pasos específicos del estilo como los pas de bourré, chasse

contretemps entre otros, no es hasta la edad de 12 años que se comienza con las clases

Bournonville como tal, a esta edad las niñas comienzan también las clases de puntas en

las tardes. A los 15 años es que se comienzan las clases de Pas de deux, haciendo cosas

sencillas, los diferentes agarres, los promenades, pirouettes, etcétera, sin hacer cargadas,

debido a que esto puede afectar el crecimiento del bailarín.

La academia no solo imparte clases de ballet, en su currículum de asignaturas se

encuentran como una de las fundamentales la pantomima, también a los varones se les

permite practicar deportes, como gimnástica o jugar football entre otros, logrando en el

bailarín una buena resistencia muscular y un buen desarrollo físico.

No obstante hay que señalar que aunque en la actualidad aún este sistema rige la

enseñanza, existió un período en que todo esto se perdió, en los tiempos en que el Ballet

Real decidió tomar otro camino a seguir en su línea de trabajo con la llegada de Vera

Volkova; y fue entonces cuando el primer contacto de los bailarines con el espíritu

Bournonville era cuando tenían que enfrentarse a una de sus coreografías ya en la

compañía, lo cual se les hacía difícil por ser un lenguaje totalmente extraño y lejano para

ellos.

En los años 1980s, con su llegada a la dirección de la compañía, es Frank

Andersen, como habíamos dicho anteriormente, quien reintegra a la enseñanza, las clases

de Bournonville como método principal dentro de la escuela, buscando regresar al espíritu

con que se hiciera la recopilación de estas clases y buscando lograr su objetivo primordial

que es mantener el legado Bournonville con vida.

La clase, está conformada, por barra y centro, dosificada para una frecuencia de 6

veces a la semana, de lunes a sábado. Es necesario apuntar, que esta compilación de los

ejercicios se organizó de la manera siguiente en caso de la barra; lunes y jueves, martes y

viernes, miércoles y sábados, se hacen los mismos ejercicios, en el caso del centro si es

diferente para cada uno de los días en los que se imparte la clase.

La idea de tener un entrenamiento fijo durante todos los días de la semana es

pedagógicamente inconcebible; haciendo el mismo juego de pasos todos los lunes, un

juego diferente el martes, otro el miércoles y así durante la semana, a lo largo de la carrera

de un bailarín, no obedece exactamente a nuestros conceptos actuales de versatilidad.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

190

Bournonville era totalmente consciente de la necesidad de variación del entrenamiento.

En su libro Etudes Chorégraphiques (Estudios Coreográficos), declara expresamente que

los ejercicios deben adaptarse a las necesidades individuales del estudiante, ya que plantea

que los bailarines tienen debilidades y fuerzas diferentes, y entrenando deben ajustarse

para beneficiarse individualmente.

En la actualidad, la academia si mantiene las clases Bournonville puras, más en la

compañía, este tipo de clase se da una vez a la semana, solo cuando va a comenzar la

temporada de presentaciones, se ha decidido hacer dos o quizás tres clases puras a la

semana, lo demás son los maîtres de la compañía los que imparten la clase con ejercicios

propios que indiscutiblemente tienen combinaciones de pasos Bournonville, pero no son

los ejercicios completos de la recopilación.

No obstante, con este sistema, la llamada escuela Bournonville, garantiza un buen

entrenamiento tanto técnico como estético al estudiante, lo cual contribuye a mantener el

estilo y la técnica del Real Ballet Danés.

Un dato interesante a destacar es que la escuela imparte sus clases en los mismos

estudios o salones que los bailarines de la compañía ocupan para las clases y ensayos, así,

los estudiantes de ballet no sólo ven el entrenamiento de los bailarines, sino que también

literalmente se codean con ellos cada día en el salón y el vestíbulo.

¡Dice Tina Højlund, solista del Real Ballet Danés, que “es como un cuento de

hadas cuando se es un niño! Y lo que nosotros tenemos aquí, comparándolo al

adiestramiento de otras escuelas, es que nosotros realmente somos parte de las

actuaciones, muy temprano pues desde el primer año, yo ya era parte de las actuaciones”

(SNEDEKER, 2004).

Los niños realizan papeles en varios de los ballets del repertorio de la compañía.

En los años en que se bailan muchos ballets de Bournonville o en los que hay Festival,

los niños están extraordinariamente ocupados. Muchos niños están en el famoso puente

en “Napoli”, todavía más son gnomos, niños del pueblo y damas de honor en “A Folk

Tale” y varios muchachos jóvenes alternan varios papeles en “Anna Karenina” y claro,

“El Cascanueces” que se hace con los bailarines jóvenes. Todo esto forma parte de la

formación, conseguir bailar junto a los bailarines de la compañía es una experiencia

increíble y les permite a los niños alojar el estilo Bournonville y conseguir un cuadro muy

real de la carrera para la que ellos están entrenando tan intensivamente.

Con menos de 70 estudiantes en la escuela, las clases tanto de la especialidad

como las académicas, es una escuela más bien pequeña, por ejemplo una clase para los

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

191

alumnos de 8 y 9 años en el 2 nivel pueden tener simplemente cuatro estudiantes, mientras

una clase para las muchachas 12-13 años puede tener cinco o seis. Aunque la meta de la

escuela es entrenar a los bailarines para formar parte del Ballet Real dónde Bournonville

sigue siendo una parte vital del repertorio, el entrenamiento específico e intensivo en el

estilo no empieza hasta años más tarde de comenzar a entrenar, como ya se ha explicado

anteriormente, en cambio el plan de estudios apunta para desarrollar a un bailarín integral,

mientras le son enseñadas las habilidades básicas subyacentes y la técnica necesitadas

para dominar el estilo Bournonville en el futuro, también se les proporciona la formación

de base para poder bailar otros estilos y coreografías.

La meta es que los niños se sientan involucrados, motivados y que todos disfruten

las clases para luego poder hacer el trabajo que se necesita durante la formación, lo

primero es lograr que los estudiantes disfruten el ballet, luego entonces introducir y

depurar todos los tecnicismos y especificaciones del estilo Bournonville, que ya desde las

primeras clases les han sido inculcados por lo que entonces el proceso de aprendizaje y

entrenamiento se vuelve mucho más fácil y ameno para el estudiante, quien ya se siente

identificado con esta forma de bailar .

Los estudios académicos, encajados dentro del horario del ballet, también son una

parte importante de la vida de cada estudiante. Cada estudiante debe quedarse en la

escuela a través 9 o 10 años, dependiendo de la fecha de su cumpleaños, y del tiempo en

que comenzaría su aprendizaje en una escuela académica normal. La escuela de ballet es

su propia entidad, aunque desde 1996 ha sido una parte de la Escuela del N. Zahle, Sin

embargo, en los recientes años, se han sostenido clases con los requisitos más

especializados como los laboratorios para asignaturas como la química. Desde que los

estudiantes de ballet tienen su propia escuela, las clases son muy pequeñas, en cuanto a

cantidad de alumnos y la escuela puede proporcionar excepcionalmente y/o individualizar

la atención cuando los estudiantes tienen dificultades o incluso se les facilitan horarios

para clases extras, cuando estos alumnos están complicados por los ensayos, esto resulta

de gran beneficio, pues se están formando bailarines verdaderamente preparados, pero

también se está pensando en que hay alumnos que desgraciadamente tienen que

abandonar la escuela y tienen que estar preparados para poder enfrentar su instrucción

académica en una escuela normal

El estilo Bournonville, tiene un punto importante para la historia del ballet

universal, y es que es la mejor y más certera aproximación que tenemos hoy al estilo de

danza del Período Romántico del siglo XIX.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

192

En la recopilación de ejercicios que hiciera Hans Beck inicialmente y que luego

tuviera publicaciones y ediciones posteriores, se encuentra reunida toda la técnica de esta

forma peculiar de moverse dentro de los cánones de la danza académica clásica, que fuera

creada por Bournonville, que por demás tiene características muy específicas, pensadas

por el creador, en la búsqueda de lo que es perfectamente ajustable a las características y

peculiaridades de los daneses, además de lo necesario para lograr que los movimientos

sean limpios, precisos a la vista del espectador, y deliciosos, de forma que tanto el bailarín

como el público puedan disfrutarlo, lo cual es un sello distintivo de este estilo, muy a

tener en cuenta para enfrentar las obras del legado del repertorio de dicha escuela, junto

a la especificación de características más técnicas de la danza clásica, enmarcadas por el

mismo Bournonville, y que se encuentran expuestas en las diferentes publicaciones de su

programa de clase, como parte fundamental del estilo.

2. ANÁLISIS DE LOS RESULTADOS

Los lenguajes escénicos están compuestos por diferentes elementos que hacen que

una obra danzaria, en este caso, tenga una lectura coherente en el público espectador. Esta

sumatoria de elementos son los que complementan el discurso estético y filosófico de un

coreógrafo. Estos son los elementos que ayudan a que la idea, el sentimiento y la historia

que quiere contar el coreógrafo llegue al espectador.

En el caso que estamos analizando, la obra de August Bournonville, la cual ha

constituido un repertorio histórico, constituye un caso especial dentro del panorama del

ámbito del repertorio romántico, debido a que los lenguajes escénicos de las obras de este

coreográfico necesitan de manera imprescindible la sumatoria de su especifica técnica y

metodología además de cumplir con los patrones estéticos planteados por este coreógrafo.

Es por ello que cualquier bailarín, maestro de ballet, repetidor o ensayador,

necesita tener conocimiento sobre los elementos específicos que diferencian este

repertorio.

A través de la investigación y del análisis de las características metodológica y

técnicas de la escuela danés podemos asegurar que Las características más importantes

dentro de este estilo a tener en cuenta son:

1. El épaulement elegante (la torcedura de los hombros).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

193

2. La cabeza, baja para dar la impresión de bondad, no levantada con la expresión de

orgullo.

3. Los ojos que siguen a la pierna del movimiento.

4. Los brazos que se colocan a la distancia de una mano delante del cuerpo ambos à la

ligne, à la seconde, à la couronne etc.

5. Los pies también son bajos - sur le cou de pied - en una posición enroscada dónde el

talón está en el lado de la pierna, los dedos del pie están detrás de la pierna.

Como hemos podido analizar durante el desarrollo de los temas de la

investigación, el repertorio Bournonville se desarrolla dentro de un contexto histórico

donde hay un predominio de la religiosidad y de la línea filosófica y de pensamiento del

estilo romántico. Se plantea la imagen de una época, con sus conceptos estrictos y su

visión de lo que es positivo o negativo según lo que plantea la moralidad dentro de una

sociedad eminentemente católica. A pesar de esto el coreógrafo, devotamente católico,

realiza un trabajo dramatúrgico en cada uno de sus personajes donde hace una crítica entre

líneas de la forma de vida del hombre a nivel psicológico y moral.

Otro aspecto a tener en consideración, es que cada una de las obras del repertorio

de August Bournonville, está inspirada en su conocimiento del mundo, gracias a sus

viajes, por lo que se puede afirmar que el repertorio que desarrollo tiene un elemento

autobiográfico enmarcado en cada personaje y en las situaciones que viven. Bournonville

quien tiene un pensamiento, que hoy podemos clasificar como humanista, siempre

apuesta por el hombre, por su crecimiento y mejoría como ser moral y físico, por su

integridad y su valía, como la máxima expresión de la creación divina.

Más allá de todo aspecto filosófico, un aspecto a considerar es que Bournonville

desarrolla toda su obra coreográfica en anteposición a lo que el Romanticismo francés

había convertido en Europa el baile masculino. La crisis y el desplazamiento del hombre

como figura significativa dentro de la danza, fue uno de los grandes incentivos de

Bournonville en el desarrollo de su coreografía, es por ello que en sus obras tanto el

hombre como la mujer tienen la misma importancia y necesitan un nivel técnico

considerable.

Dentro de la coreografía de Bournonville, se distinguen también aspectos técnicos

como la altura de las posiciones de los pies, las cuales todas son por debajo de la rodilla

tanto en las posiciones de passes como en las posiciones de coud de pied.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

194

Son de vital importancia también el conocimiento específico de las posiciones de

brazos que difieren de las otras escuelas de ballet reconocidas en el panorama de la danza

mundial. Este conocimiento va muy ligado con los diferentes pasos técnicos que son

específicos de esta escuela y que no se encuentran ni como nomenclatura ni como

explicación técnica para su ejecución en ninguna de las escuelas de ballet del mundo.

Muy característico de este estilo es la posición de segunda abierta, en señal de

ofrecimiento, siempre el bailarín ofrece su arte al público.

Con esto entronca el sentido de humildad que le da a su técnica este coreógrafo,

cuando plantea que la cabeza va siempre baja, en señal de agradecimiento, no en una

posición de arrogancia ante el espectador. Bournonville reconoce que el bailarín es capaz

de realizar proezas con su cuerpo que la mayoría de los seres humanos no podría realizar,

no obstante, esto no puede ser un motivo para que la actitud en el escenario sea arrogante

ni desafiante.

Otro aspecto que podemos desprender de la investigación, que lo importante en

este estilo coreográfico y en lo que el coreógrafo hace gran hincapié tanto en los textos

teórico como en las coreografías, es que lo importante es el principio y el final de cada

paso, es por ello que se cataloga como que los acentos son abajo, dando una marcada

repercusión a la caída de los saltos, y de cada paso específico.

La mirada al pie de ejecución, es otra de las características que siempre tiene que

estar presente en la ejecución de una obra de este coreógrafo ya que, Bournonville,

buscaba que la atención del espectador estuviera enfocada al trabajo de pie que desarrolla

el bailarín en cada uno de los pasos. Acentuados por la espera en cada final de frase,

donde se acentúan los plies, apoyado por el trabajo musical, con acento abajo que se

desarrolla en todo este repertorio.

Es importante tener presente que el conocimiento de todos los elementos que

constituyen el lenguaje escénico del repertorio Bournonville es lo que garantiza su buena

ejecución y puesta en escena. Es importante llamar la atención sobre el peligro que

conllevan los montajes por videos, que, si bien pueden estar bien ejecutados, quizás por

el nivel de conocimiento de esta técnica podemos cometer errores que influyen en el buen

desempeño y respeto de los cánones y especificidades de este estilo coreográfico.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

195

3. CONCLUSIONES

La frase de Stravinski en que afirma que “la verdadera tradición es aquella que

actúa como una fuerza viva que anima e informa el presente, y no la que llega a nosotros

como testimonio de un pasado cumplido”, tiene especial validez dentro del ballet, arte de

tradición por excelencia. La fuerza o la vulnerabilidad del ballet dependen mucho de la

forma en que sus artistas y maestros asuman la herencia de sus predecesores, transmitida

durante años de una generación a otra. Cada época produce formas artísticas peculiares,

que responden a un modo de vida y a un momento determinado en la evolución del

lenguaje artístico. Es decir, reflejan en última instancia una realidad económica y social,

pero también una tradición que está determinada por el desarrollo histórico de la técnica

y los modos expresivos. Cuando surge un creador verdadero, el ballet se enriquece; cada

aportación artística genuina sobrevive a su autor y se proyecta al futuro, integrada en esa

gran tradición.

En la historia de la danza teatral, el romanticismo corresponde a una época de

particular importancia, por su riqueza artística y por el alcance y permanencia de sus

logros. Es el momento en que culmina un proceso de depuración de técnicas y modos

expresivos, los cuales van a manifestarse de manera singular en una pléyade de talentos

individuales, que hoy llegan a nosotros envueltos en la leyenda, ayudados por la magia

de hermosas litografías y de los ardorosos relatos de poetas y críticos que supieron

revelarnos las personalidades de Marie Taglioni, Fanny Elssler, Carlotta Grisi, Fanny

Cerrito y Lucile Grahn. Es también la época de coreógrafos como Filippo Taglioni, Arthur

Saint-Léon, Jules Perrot, Jean Coralli, Joseph Mazilier y August Bournonville, algunos

de los cuales fueron además destacados intérpretes (ALONSO, 2000)92.

Estas palabras de nuestra prima ballerina assoluta Alicia Alonso, sirven como un

perfecto colofón a las conclusiones a las que podemos llegar a través de esta

investigación, ya que la escuela Bournonville ha sido un florecimiento del ballet a escala

mundial

Como conclusión a esta investigación y respondiendo a nuestro objetivo principal,

podemos decir que:

92 Referido a Diálogos con la danza, cuya edición príncipe se publicó en 1981. Este texto está incluido en la Cuarta edición, La Habana, Editora Política, 2000.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

196

Las referencias más importantes a seguir por cualquier bailarín o maestro de ballet

que se enfrente al repertorio Bournonville están concentradas en el conocimiento de los

cánones del estilo, como técnico-metodológicos que constituyen este estilo como las

posiciones de brazos bajos y los movimientos de los mismos combinados con los pasos

técnicos específicos, la cabeza noble, la posición baja de posiciones como los passé o los

coud de pies, pero también en las nomenclaturas de los pasos específicos de esta técnica

y el desarrollo técnico del paso, es también de vital importancia para este repertorio

conocer el contexto y la historia de cada una de las obras ya que cada una de ellas tiene

su propia particularidad con respecto a la interpretación dramatúrgica, una de las

características principales que resalto su creador.

BIBLIOGRAFÍA

ALICIA, A. Toda una vida dedicada a la Danza. Archivo del Periódico Tribuna de la

Habana. Disponible en: www. Poslatino.com.

ALONSO, A. (2000). Diálogos con la danza (4.ª ed.). La Habana:

Editora Política.

ASCHENGREEN, E. (1993/1974). August Bournonville. En Diccionario Internacional

de Ballet, (vol. 1, pp. 188-192). Detroit-Londres-Washington DC, St. la James Press.

ASCHENGREEN, E. (1974/1979). Bournonville: ayer, hoy y mañana en la Crónica del

Baile, vol. 3, (2). pp. 102-151, Nuevo Tork, Marcel Dekker.

ASCHENGREEN, E. (1974). Las facetas del Ballet Romántico. Nueva York: Baile

Perspectivas 58.

ASCHENGREEN, E. (1977). 3 ensayos sobre August Bournonville. Copenhague:

Rhodos.

ASCHENGREEN, E. (1978). August Bournonville, poeta del ballet entre poetas en el

Anuario de Investigación del Ballet IX. Nueva York: ENCORDELE.

ASCHENGREEN, E. (1980). La perspectiva de Bournonville. Copenhague: Nyt Nordisk

Forlag Arnold Busck.

ASCHENGREEN, E., & NØRLYNG, O. (1992). Balletbogen (3.ª ed.). Copenhague:

Gyldendal.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

197

BOURNONVILLE, A. (1978). Lettres la maison de son enfance I –III. (Revisados por

Svend Kragh-Jacobsen y Nada Schiørring). Copenhague: Munksgaard.

BOURNONVILLE, A. (1979). Mi Vida del Teatro (P. McAndrew, Trad.). Middletown,

Wesleyan: Universidad Prensa.

BOURNONVILLE, A. (1983). Los poemas del ballet de Augusto Bournonville: los

guiones completos (P. McAndrew, Trad.). En Crónica de Baile. 3-5. Nueva York.

BOURNONVILLE, A. (1999). Las cartas en el Baile y Coreografía. (K. A. Jürgensen

Trad.). En Los Libros del Baile. Londres.

BRUHN, E., & LILLIAN, M. (1961). Bournonville y Técnica del Ballet. Los estudios y

comentarios de " Etudes chorègraphiques" de Bournonville. Londres: Adán y Charles

Black.

CHRISTENSEN, A. M. (2002). Las diversiones del Ballet dinamarqués Real. (S. Forlag,

Entrev.).

CHRISTOUT, M. F. (1995). El ballet occidental. Nacimiento y metamorfosis, siglos XVI-

XX. Desjonquéres.

DICCIONARIO DEL BALLET Y LA DANZA (s.d.). Barcelona: Editorial Argos S.A.

DICCIONARIO LAROUSSE ILUSTRADO (1968). La Habana: Instituto del Libro.

EDVARD, A. (1915). El cubil Danske Ballet 1870-1915. Copenhague: Erslev &

Hasselbalch.

HALLAR, M., & SCAVENIUS, A. (1992). Bournonvilleana. Copenhague: Rhodos.

HERNÁNDEZ, L. (2006). El Centro Prodanza: Veinte Años de Puesta en Escena.

Trabajo de Diploma. Instituto Superior de Arte de La Habana: Cuba.

INGER, D., & DITHMER, M. (s.d.): Bailando entre el sueño y realidad. Festschrift

presentó al profesor. Erik Aschengreen.

JACOBSEN, S. K., ASCHENGREEN, E., FRIDERICIA, A., SCHIØRRING, V., &

JACOBSEN, S. (1972). La Investigación del Estudio del teatro II (Ensayos). Universidad

de Copenhague: Instituto para la Investigación del Teatro.

JACQUES, B. (1964). Diccionario de la danza. Seuil.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Teatrais

198

JOVITT, D., JORDAN, S., HAMMERGREEN, L., HÜBBE, N., BJØRN, MØRK, E.,

NØRLYNG, J. C., JØRGENSEN, I., DAMSHOLT, M., & DITHMER, M. (2002). Museo

la Prensa de Tusculanum. Universidad de Copenhague.

JÜRGENSEN, K. A. (1987). Los Ballets de Bournonville 1844-1933. En Los Libros del

Baile. Londres.

JÜRGENSEN, K. A. (1997). La Tradición de Bournonville, Los Primeros Cincuenta

Años 1829-1879: Un Estudio Documental. En Los Libros del Baile. Londres.

JÜRGENSEN, K. A. (1997). Una bibliografía anotada de la coreografía y la música, la

cronología, la historia de la representación, y las fuentes. En Los Libros del Baile.

Londres.

JÜRGENSEN, K. A., & HUTCHINSON, A. (1990). La Herencia de Bournonville - UN

Registro 1829-1875 Coreográfico, YO-II. En Los Libros del Baile. Londres.

JÜRGENSEN, K. A., & VIVI, F. (1992). La Técnica de Ballet de Bournonville. En Los

Libros del Baile. Londres.

KIRSTEN, R. (1979). La Escuela de Bournonville. Nueva York: Marcel Dekker.

LAURA, M. (2005). Ballet de Cuba continúa homenaje a Coreógrafo Bournonville.

World Data Research Center.

MANNONI, G. (1993). Ballets. París: Ediciones Pluma.

MIGUEL, C. (2000, diciembre). Teoría de una Práctica en el Umbral del Tercer Milenio.

Balletin Dance Revista Argentina de la Danza.

PATRICIA, M. (1979). Una Cronología de los trabajos de la fase de Bournonville: Los

ballets y divertissements, bailes individuales, y stagings de óperas y obras. En la Crónica

del Baile, Vol. 3, (2). Nueva York.

QUEVEDO, G. O. (1992).Un romántico llamado Augusto Bournonville. Tesis de Grado.

Instituto Superior de Arte de La Habana: Cuba.

RENY, M. (2006). XIII Encuentro Internacional de Academias para la Enseñanza de

Ballet. El príncipe de Dinamarca Entrevista a Frank Andersen Danza hoy.

TERRY, W. (1979). El Maestro de Ballet del Rey. Nueva York: Dodd, el Mead &

Company.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

199

STUDOS EM ARTES VISUAIS

ensino do desenho em uma perspectiva inclusiva: o figurativo para além da visão Rivaldo Bevenuto de Oliveira Neto; & Jefferson Fernandes ALVES

| 200-223

ersonajes extraordinarios, arquetipos y estructuras narrativas clásicas: sobre la representación de la pobreza en dos documentales argentinos Pablo Lanza

| 224-234

Design e a valorização de produtos, territórios e identidades Jacinta Helena Alves Lourenço Casimiro Costa

| 235-244 rete Stern y la vanguardia del ’40. Arte y psicología de la Gestalt entre fronteras permeables Maria Cecilia Grassi

| 245-266

OP O G

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

200

O ENSINO DO DESENHO EM UMA PERSPECTIVA INCLUSIVA: O

FIGURATIVO PARA ALÉM DA VISÃO

Teaching of drawing from an inclusive perspective: Figurative beyond vision

NETO, Rivaldo Bevenuto de Oliveira93; ALVES, Jefferson Fernandes94

Resumo

O ensino de Arte em interface com as deficiências, ao longo dos últimos anos, tem sido um tema de interesse crescente em pesquisas no meio acadêmico, sobretudo no que se refere à educação especial, porém ainda apresenta certa escassez no tocante à socialização de estudos que discutam esse ensino na perspectiva da educação inclusiva. Dessa forma, o presente texto constitui-se um recorte de nosso estudo de mestrado, Desenho e deficiência visual: uma experiência no ensino de Artes Visuais na perspectiva da Educação Inclusiva, defendido em 2015, junto ao PPGEd/UFRN, o qual procura contribuir com essa discussão. Esse estudo situa-se no campo do ensino de Artes Visuais, no contexto da inclusão escolar de alunos com deficiência visual, considerando a participação de alunos videntes e não videntes, tendo como referência investigativa a leitura e a produção do desenho. A abordagem metodológica utilizada, de natureza qualitativa, foi a pesquisa-intervenção, à luz dos princípios bakhtinianos do dialogismo e da alteridade, com características de estudo exploratório. O lócus da pesquisa foi uma escola estadual, a qual está localizada no bairro do Alecrim, na Zona Leste do Natal/RN, e mantém proximidade com o Instituto de Educação e Reabilitação de Cegos – IERC/RN. A turma escolhida para a intervenção foi o 7º ano C do turno vespertino, a qual apresentava um público com idade entre 12 e 16 anos, num total de 27 alunos matriculados, sendo 03 alunos com deficiência: 02 alunas cegas e 01 aluno surdo-cego, com perdas auditivas e visuais leves. No itinerário da pesquisa foram realizadas 10 oficinas com sequências didáticas multissensoriais, articulando as expressões corporal, tátil e gráfica. Nos limites deste artigo, enfocaremos a sessão intitulada objetos do cotidiano, a qual corresponde à primeira oficina ministrada na intervenção realizada, descrevendo e analisando os exercícios de exploração tátil, representação corporal e desenho tátil-visual, os quais foram sistematizados como ações intrínsecas ao processo de produção do desenho no contexto escolar, tendo como referência o desenho figurativo a partir do próprio corpo dos alunos. O processo e os dados construídos na pesquisa provocam uma reflexão acerca das interações entre videntes e não videntes na produção e na análise de desenhos tátil-visuais. Observou-se que a interação entre os pares foi sendo garantida por meio dos intercâmbios verbais, táteis e corporais ocorridos em cada etapa da sequência didática proposta, demonstrando a criatividade dos alunos em suas escolhas, ao realizarem as composições individuais, em dupla e coletivas, envolvendo o corpo e as estimulações sensoriais. Sinalizam, ainda, para a construção de uma abordagem de ensino de desenho no contexto da classe comum, orientada pela multissensorialidade, a partir de oficinas pedagógicas que possibilitem interações artísticas e estéticas na perspectiva da inclusão escolar.

93 RIVALDO BEVENUTO DE OLIVEIRA NETO - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil. Correio eltrónico: [email protected].

94 JEFFERSON FERNANDES ALVES - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil. Correio eltrónico: [email protected].

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

201

Abstract

Along the years, teaching of Art in interface with disability has had an increasing interest in the academic research field, mainly, in regard to special education; yet, studies are less spread when this teaching is discussed from an inclusive perspective. Thus, this present text is part of our Master’s Thesis: Drawing and Visual Impairment: A Visual Arts Teaching Experience from an Inclusive Educational Perspective, defended in 2015 at PPGEd/UFRN, aiming to contribute to the above mentioned discussion. The study belongs to the Visual Arts teaching field in the context of educational inclusion of students with visual impairments taking into account the participation of typical and visual impairment students, focusing on reading and drawing production research. The methodology approach used, from a qualitative nature, was action research, under the light of Bakhtinian’s principles of dialogism and alterity, with characteristics of an exploratory study design. The research took place in a state school located in Alecrim neighborhood, in the East area of Natal, RN, near the Institute of Education and Rehabilitation of Blinds – (IERC/RN). The chosen class for the intervention was the 7th C grade of the afternoon shift, with a total of 27 children raging from 12 to 16 years of age. 3 students out of 27 presented special educational needs, two blind girls and one boy with a mild visual and hearing impairment. Along the research 10 workshops with multisensory didactic sequences were provided, entwining corporal, tactile and graphic expressions. In this paper we will focus on the session called “Objects of the daily life” that is part of the first workshop of the intervention, describing and analyzing tactile exploration, corporal representation and visual-tactile drawing exercises. These exercises were systematized as actions that belong to the process of drawing production in school context, using the figurative drawing from the students own bodies as reference. The process and the data built in the research cause a reflection about the interactions between typical and visual impairment students in the production and the analyses of tactile-visual drawings. Interaction between peers was observed to be developed by verbal, tactile and corporal interchanges, occurring in each step of the didactic sequence that was proposed. Thus, demonstrating the students’ creativity in their choices, when developing the individual compositions, in pairs and collectively, involving the body and the sensory stimulations. Moreover, this process and the data, indicate the construction of a drawing teaching approach in the context of a typical classroom, being oriented by the multisensoriality pedagogic workshops that enable artistic and esthetic interactions in the school inclusion perspective.

Palavras-chave: Desenho; Deficiência visual; Multissensorialidade; Inclusão escolar.

Keywords: Drawing; Visual Impairment; Multisensoriality; School Inclusion.

Data de submissão: Janeiro de 2016 | Data de publicação: Março de 2016.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

202

INTRODUÇÃO

O debate Arte e deficiência, ao longo dos anos, tem sido objeto de interesse

crescente de pesquisas no campo acadêmico. As iniciativas pioneiras de Antipoff e

Varela, precursoras da defesa, no Brasil, da Arte/Educação na Educação Especial, hoje,

somam-se a outras produções científicas publicadas em nível nacional (REILY, 2001;

LOPES, 2004; DUARTE, 2008) assinalando que essa interface tem encontrado espaços

de discussão na pesquisa educacional. Se considerarmos o ensino de Artes Visuais para

pessoas com deficiência visual, a afirmação anterior pode ser corroborada pelos estudos

de Ballestero-Àlvarez (2003), Mary Inês Piekas (2010) e Maria Lúcia Batezat Duarte

(2011). Em contrapartida, verifica-se ainda uma lacuna na produção científica vinculada

ao ensino de Arte no contexto da inclusão escolar (REILY, 2010).

Procurando participar desse diálogo entre arte e deficiência, sobretudo na

perspectiva do enfretamento dessa lacuna, o presente artigo, constituído como um recorte

de um estudo de mestrado95, aborda o desenvolvimento de oficinas pedagógicas em torno

do desenho, contemplando alunos videntes e não videntes de uma escola pública. A

mencionada escola é integrante da rede estadual de ensino do Rio Grande do Norte,

localizada na Zona Leste de Natal/RN, atuando do 2º ao 9º ano do Ensino Fundamental,

funcionando em dois turnos. No ano de 2014, atendia, no matutino, alunos dos anos

iniciais do Ensino Fundamental; no vespertino, recebia alunos do 6º ao 9º ano do Ensino

Fundamental, sendo este o turno escolhido para o desenvolvimento da intervenção, pois

contemplava o critério fundamental do estudo que seria a matrícula de alunos com

deficiência visual. Devido à proximidade da escola com o Instituto de Educação e

Reabilitação de Cegos (IERC/RN), a demanda de matrículas de alunos com cegueira e

baixa visão foi intensificada, principalmente, a partir de 2009. Com isso, a instituição de

ensino passou a buscar estratégias para atender alunos com deficiência visual. A turma

escolhida para a intervenção foi o 7º Ano C do Ensino Fundamental, composta por 34

alunos matriculados, com 27 que, de fato, permaneciam frequentando, três dos quais eram

estudantes com deficiência96, sendo duas alunas cegas e um aluno com surdocegueira com

95 Desenho e deficiência visual: uma experiência no ensino de Artes Visuais na perspectiva da Educação Inclusiva (2015), apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da UFRGN. 96 Utilizar-se-ão nomes fictícios para designar os alunos com deficiência: Tatiana – sexo feminino, 16 anos: iniciou o atendimento especializado aos 7 meses no IERC/RN, onde ficou até os 14 anos. Até os 12 anos, ainda apresentava pouco resíduo visual. Estuda na escola há dois anos. É atleta ouro – Paraolimpíadas de 2012. Compete nos 100 e 200 metros rasos e no salto em distância, modalidade em que já conseguiu 03 medalhas de ouro. Clarice – sexo feminino, 14 anos: estudou no IERC/RN dos 6 meses aos 12 anos. Até os 13 anos ainda apresentava pouco resíduo visual. Não gosta muito de desenhar, mas adora teatro. Já chegou

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

203

restrições sensoriais moderadas97. Além dos 27 estudantes da turma, também contamos

com a colaboração da professora de Arte, pois a intervenção foi efetivada em parceria

com o professor regente da sala comum de ensino desse componente curricular. A

abordagem metodológica adotada no estudo foi a pesquisa-intervenção (JOBIM E

SOUZA & ALBUQUERQUE, 2012), inspirada nos princípios do dialogismo e da

alteridade (BAKHTIN & VOLOCHINOV, 1979), a qual orientou as interações entre os

envolvidos no processo educativo, considerando o pesquisador e seus interlocutores como

sujeitos ativos no processo de produção de sentidos. Com base nessa abordagem teórico-

metodológica, compreende-se que as interações ocorridas no ato de pesquisar se

constituem em um espaço de encontro entre o pesquisador e o seu outro, articulando-se

pensamento e ação de forma colaborativa, com vistas à partilha de experiências, à

produção do conhecimento responsável e à perspectiva de alterar a realidade, bem como

transformar os sujeitos implicados. O posicionamento aqui tomado se apoia em Jobim e

Souza (2011, p. 42), quando declara que

“Intervir significa criar condições para que pesquisador e sujeitos da pesquisa se distanciem de suas experiências e reflitam sobre elas a partir do olhar alheio e, assim, possam libertar-se de verdades que se apresentam como absolutas ao vislumbrarem outras perspectivas e sentidos possíveis para a compreensão de suas experiências e dos discursos que se atravessam”.

Sendo assim, a intervenção realizada propõe que perguntas e respostas se

complementem no ato de pesquisar, assim como sugere Bakhtin (2003, p. 408): “se a

resposta não gera uma nova pergunta, separa-se do diálogo e entra no conhecimento

sistêmico”. O dialogismo e a alteridade, desse modo, perpassam todas as etapas

metodológicas da pesquisa, suscitando debates e problematizando reflexões acerca do

ensino do desenho em uma perspectiva inclusiva. Esses são alguns dos princípios básicos

orientadores do ato de pesquisar, os quais se constituem elementos primordiais,

necessários para dar sentido ao objeto de estudo que está sendo referenciado neste artigo.

a ser protagonista de uma peça teatral em sala de aula. Matheus – sexo masculino, 13 anos: aluno surdocego. A baixa visão o leva à utilização de óculos para ampliar seu resíduo visual; percebe volumes, cores e escrita ampliada; apresenta dificuldade para ouvir e compreender a fala em voz baixa, por isso usa aparelho auditivo. Embora a ênfase na nominação dos alunos com deficiência possa desencadear um movimento paradoxal de negligenciamento nominativo dos demais alunos, optou-se por tal ênfase como um posicionamento investigativo que procura assinalar a participação desses alunos na proposta em questão, uma vez que, usualmente, tais alunos são transformados em “invisíveis” em atividades orientadas pelo oculocentrismo. 97 Pessoa surdocega: sujeito no qual ocorre a deficiência visual e auditiva, não necessariamente total, que dificulta em grande parte suas possibilidades de comunicação e de desenvolvimento independentes na sociedade. Requerem processos educativos de reabilitação especiais (SILVA, 2008, p. 244).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

204

No tocante às estratégias metodológicas de mediação do conhecimento adotadas

no trabalho, destacou-se a oficina pedagógica como lugar de produção, de reflexão e,

principalmente, de encontro com o outro, suscitando, inclusive, uma aproximação com as

contribuições teórico-metodológicas de Cèlestin Freinet, o qual acreditava que educar é

construir junto, sendo, por isso, a sua pedagogia construída sobre quatro eixos

fundamentais: a cooperação, a comunicação, a documentação e a afetividade.

Nesse sentido, devido à contribuição de Freinet para se pensar e se fazer uma

escola cooperativa, dois aspectos de sua pedagogia se constituíram princípios

metodológicos presentes nesta pesquisa. As ideias de Freinet sobre o processo

colaborativo de construção do conhecimento no contexto da escola orientou-nos na

proposição da oficina pedagógica; agregado ao processo colaborativo emerge a dimensão

investigativa subjacente ao que ele designa de tateamento experimental como

possibilidade de construção do conhecimento, em um movimento de tentativas e

descobertas.

Na escola preconizada por Freinet, de acordo com Elias (1997, p. 36), “A

experimentação é o eixo em torno do qual devem girar todas as aquisições infantis,

organizando o meio para favorecer a tentativa experimental”. Desse modo, quando trata

das práticas educativas, Freinet aponta a experiência tateante como via de aquisição do

conhecimento, tão importante quanto a observação, a explicação e a demonstração. Para

ele, “Nenhuma, absolutamente nenhuma, das grandes aquisições vitais se faz por

processos aparentemente científicos. É a caminhar que a criança aprender a andar; é a

falar que aprende a falar; é a desenhar que aprende a desenhar” (FREINET, 1977, p. 14).

Nessa perspectiva, a investigação experimental por meio da oficina pedagógica,

na qual se media a expressão gráfica do desenho na aula de Artes Visuais, constituiu-se

em uma oportunidade para propor novas estratégias de ensino por meio do uso de

materiais diversificados, considerando as dificuldades e as potencialidades de cada aluno,

pois, conforme Pey (1997, p. 13), “A oficina rompe também com a separação disciplinar

entre trabalho e lazer, porque é essencialmente trabalho diversificado com prazer, e não

pode ser reduzida à sucessão de tarefas rotineiras que caracteriza o chamado trabalho

escolar”.

Desse modo, propôs-se transformar a sala de aula em uma oficina pedagógica, um

espaço de produção e reflexão, possibilitando o aprendizado do aluno por meio da

descoberta e da colaboração, sendo a tentativa parte do processo de ensino, como

elemento necessário à aprendizagem. De acordo com Ferreira e Ribeiro (2001, p. 10),

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

205

“Faz-se necessário que a sala de aula se torne um espaço propiciador de reflexões, troca

de experiências e de processos de criação”. Na oficina, o conhecimento se aperfeiçoa na

tentativa, na descoberta e na reflexão sobre a prática.

Objetos do cotidiano: o figurativo além da visão

A oficina pedagógica foi organizada em três etapas de experiências

multissensoriais, cuja apresentação sequencial, abaixo, assume um caráter de

sistematização de um percurso que foi flexivelmente delineado em decorrência de que a

efetivação processual da proposta interferiria nas etapas subsequentes. Assim, tivemos: (

I ) exercício de exploração tátil – consiste na exploração tátil de miniaturas dentro de

caixas vazadas, bem como na análise tátil de desenhos em relevo e estátuas corporais

produzidas pelo grupo de alunos; (II) exercício de representação corporal – trata-se de

atividades em que o corpo é agenciado por meio do jogo de estátuas, com o propósito de

reconfiguração dos objetos manipulados e dos desenhos produzidos; e (III) exercício de

desenho tátil-visual – fazendo uso de diferentes materiais, o grupo produziu e analisou

desenhos em relevo.

Nos limites desse artigo, enfocaremos a sessão intitulada objetos do cotidiano, a

qual corresponde à primeira oficina ministrada na intervenção realizada. A seguir,

apresentar-se-á a descrição e a análise dessa oficina, a qual contempla exercícios de

exploração tátil, representação corporal e desenho tátil-visual como ações intrínsecas ao

processo de produção do desenho no contexto escolar, tendo como referência o desenho

figurativo a partir do próprio corpo dos alunos.

No início da proposta interventiva, foi realizada uma entrevista coletiva, orientada

pela perspectiva dialógica bakhtiniana, a fim de evocar de forma estratégica o repertório

de experiências da turma, tendo, como aporte teórico-metodológico, as orientações de

Kramer (2003), que concebe a entrevista coletiva como um espaço para aprender com a

diversidade e com o outro. Nesse sentido, a entrevista convida o sujeito entrevistado a se

posicionar e fornece elementos para que se possa compreender o contexto de onde

emergem as experiências.

Mediante as entrevistas foi possível aproximar-se das experiências da turma

relacionadas ao desenho no contexto escolar, a partir disso, verificou-se que as

experiências anteriores centravam-se na recorrência dos desenhos para colorir e que as

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

206

experiências escolares mais recentes não se ocupavam curricularmente do desenho.

Diante desse cenário, a proposição da oficina assumia uma responsabilidade de não

apenas contemplar a todos os alunos mas também de desencadear uma proposição

metodológica que pudesse proporcionar uma experiência curricular no ensino de Artes

Visuais que articulasse a participação coletiva sem descuidar dos processos singulares de

autoria imagética.

Na oficina, nomeada de objetos do cotidiano, sugeriu-se aos alunos a utilização

do próprio corpo como referência para a produção de desenhos figurativos, os quais foram

mobilizados, inicialmente, por meio da identificação das formas geométricas nas

miniaturas utilizadas na atividade. Essa escolha se justifica pelo fato de possibilitar a

todos os alunos uma experiência sensorial a partir da percepção tátil de objetos que,

aparentemente, são-lhes conhecidos, já que eles são artefatos culturais que, de alguma

forma, estão presentes na vida dos alunos.

Outro fator determinante para tal abordagem é que a pessoa cega experiencia, em

práticas cotidianas (ou em contextos especializados de reabilitação), atividades nas quais

os objetos do cotidiano, como os móveis da casa, os recursos de higiene pessoal e os

utensílios domésticos, funcionam como referência e elementos mediadores de

aprendizagens no que se refere à mobilidade em ambientes ou na administração

doméstica. Nesse sentido, tomou-se como referência o conceito de instrumentos de

mediação, pois esses também provocam implicações significativas na educação da pessoa

cega.

“[...] O uso de meios artificiais – a transição para a atividade mediada – muda, fundamentalmente, todas as operações psicológicas, assim como o uso de instrumentos amplia de forma ilimitada a gama de atividades em cujo interior as novas funções psicológicas podem operar” (VYGOTSKY, 1998, p. 73).

Dessa forma, o contexto cultural e social possibilita interpretações necessárias às

apropriações dos saberes, os quais se concretizam na interação dos sujeitos com os outros,

com os objetos e com o meio no qual estão inseridos. Além disso, a proposta de

exploração tátil não se restringe ao uso das mãos, mas se configura como uma

possibilidade de criação de “um ambiente estimulador, de mediadores e condições

favoráveis à exploração de seu referencial perceptivo particular” (SÁ, CAMPOS, &

SILVA, 2007, p. 14).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

207

Em relação aos alunos videntes, a escolha pela temática “objetos do cotidiano”

também se justifica pelo uso e pelas interações estabelecidas com tais objetos. No entanto,

há o reconhecimento de que, na maioria das vezes, a percepção desses objetos está restrita

à visão. Diferentemente do que ocorre com a pessoa cega, o tateamento diário desses

elementos, geralmente, passa desapercebido para aquele que enxerga. Desse modo, a

exploração de algumas características dos objetos tem sua percepção comprometida, se

observados aspectos como: espessura, textura, consistência, densidade, entre outras

propriedades tatilmente acessíveis.

Exercícios de exploração tátil

A sala foi organizada de modo que houvesse espaço livre para a realização das

atividades. Por isso, as mesas e cadeiras foram encostadas próximo da parede. Com a

turma organizada em círculo, propôs-se a circulação de três caixas fechadas, porém

vazadas em suas laterais. Explicou-se que cada caixa continha em seu interior miniaturas,

mas não se revelou que estas correspondiam a objetos do cotidiano como móveis de casa,

utensílios domésticos, além de outros elementos (cadeiras, sofá, mesa, geladeira, copo,

garrafa, panela, frigideira, balde, regador, vaso com flor, gaiola, espelho, bicicleta e

carro).

Figura 1 – Caixas vazadas utilizadas no exercício de exploração tátil. Fotos: Rivaldo Bevenuto

A turma foi dividida em três grupos compostos pela mesma quantidade de alunos.

Cada grupo recebeu uma caixa para que colocasse as mãos em seu interior pelas laterais

vazadas e explorasse, tatilmente, as miniaturas. Por meio da mediação verbal, orientava-

se a análise: “perceba as linhas, as texturas, os tamanhos e as formas que compõem os

objetos; perceba se a miniatura representa algo comum em seu cotidiano; o que elas fazem

lembrar? Quais figuras vêm à mente? É possível identificar o que são?”.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

208

A análise era interrompida pelo nosso comando de voz: “passe a caixa”. À medida

que os alunos reconheciam os objetos, tentavam falar aos colegas, mas mantinham o sigilo

até que pudessem revelar as descobertas. Alguns dos alunos que ainda não haviam

explorado a caixa aguardavam com empolgação a sua vez de tatear as miniaturas.

– Ah, eu sei qual é um aqui, mas não posso falar agora, não (Luana: 12 anos – aluna

vidente).

– Eu pensei que teria um bicho aí dentro [risos] (Matheus: 13 anos – aluno surdocego).

No momento em que Tatiana (aluna não vidente) estava com a caixa em mãos, um

colega a provoca, em tom de brincadeira, dizendo que ela estaria demorando muito.

“Eles podem ser mais lentos na realização de algumas atividades, pois a diminuição analítica da percepção tátil demanda mais tempo. Esses alunos precisam manipular e explorar o objeto para conhecer as suas características e fazer uma análise detalhada das partes para tirar conclusões” (SÁ, CAMPOS, & SILVA, 2007, p. 35).

Conforme indicam os estudos na área, essa apreensão tátil por parte da pessoa

cega demanda um tempo diferenciado, porém, de modo algum, a falta de visão interfere

na capacidade cognitiva e intelectual dos cegos. Tatiana, mesmo compreendendo a

brincadeira do colega, contrapõe:

– O cego tem muita habilidade pra isso. Não precisa ficar olhando demais, não [risos]

(Tatiana: 16 anos – não vidente)

Figura 2 – Exploração tátil com as caixas vazadas: alunos videntes à esquerda e aluna não vidente à

direita. Fotos: Rivaldo Bevenuto

A etapa de exploração tátil foi bem aceita pela turma, pelo seu caráter lúdico e

desafiador. Houve envolvimento de todos os alunos e a maioria demonstrou empolgação

na atividade, embora tenha-se observado que um grupo de meninas ainda não

demonstrava total adesão à proposta.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

209

Embora tenhamos a ciência de que os processos de ensino-aprendizagem da

pessoa cega pressupõem o agenciamento deliberado do tato como procedimento sensorial

de mediação, a exploração háptica proposta na oficina não se dirigia especificamente aos

alunos com deficiência visual. Ao contrário, buscávamos a constituição de uma

abordagem tátil que contemplasse todos os envolvidos como um procedimento didático

e estético a ser efetivado na perspectiva de contemplar videntes e não videntes em

situação de escolarização, sem desrespeitar as singularidades expressivas e cognitivas de

cada envolvido.

Do ponto de vista pedagógico, essa ênfase do tato apoiou-se no estudo de Bardisa

(1992), segundo a qual o tato desempenha dois processos perceptivos, a saber: o tátil

estático, ao tocar os objetos com a mão em repouso; e o tátil dinâmico, quando analisamos

pelos dedos polegar e indicador as dimensões do objeto que se pretende conhecer. Em

nosso caso, não tivemos a preocupação em tipificar a natureza do tato, mas assegurar um

processo em que o uso das mãos na manipulação dos objetos e, mais adiante, na leitura

tátil das estátuas e dos desenhos estivessem articuladas, multissensorialmente, com a

palavra e com a mobilização mais ampla do corpo.

A escolha deliberada dos objetos em miniatura estava relacionada ao caráter

metonomínico da exploração tátil de objetos e coisas de grandes proporções, os quais,

para sua apreensão, pressupõem movimentos táteis orientados pela contiguidade. Nesse

sentido, as miniaturas, ao caberem nas mãos, permitem um processo manipulatório

orientado pela apreensão de sua totalidade, de tal maneira que o todo e suas partes são

apreendidos pelo eixo da simultaneidade.

Por sua vez, a dimensão lúdica da caixa e a perspectiva de “ver” com as mãos

suscitou uma ambiência de apreciação estética das miniaturas marcadas pela surpresa,

pela expectativa e pelas descobertas tatéis, remetendo a uma espécie de “jogo de

adivinhação” no qual os jogadores, pelo tateamento dos objetos, iam revelando para si

mesmos a imagem correspondente, sendo interditada sua manifestação verbal. Assim,

fragmentos do cotidiano iam sendo lidos pelas mãos, as quais exploravam, sobretudo,

formas e texturas, dando relevo semiótico aos objetos em estreita relação com os usos

sociais correlatos. Do toque se fez imagem e antes que a imagem se transmutasse em

palavra, fez-se corpo.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

210

Exercício de representação corporal

Tomando o corpo como expressão e inspirados na proposta de desenho que se

orienta pelo gesto e pelo movimento98, desenvolveu-se a segunda etapa da sequência

didática. Quando toda a turma já havia explorado as caixas, informou-se que as

descobertas seriam reveladas, porém sem o recurso da fala. Explicou-se que os objetos

do cotidiano seriam representados corporalmente, a partir de um jogo de estátua, o qual

já era bem conhecido pelos alunos em sua versão tradicional.

Realizou-se o jogo por alguns minutos, no centro da sala, com temática livre.

Tatiana não hesitou e foi a primeira a se dirigir ao centro da sala. Nesse momento,

confirmou-se o que a professora havia dito sobre Matheus, a respeito do seu isolamento

em relação aos demais alunos. No momento em que foram propostos os exercícios de

movimento, a euforia que havia revelado na atividade com a caixa desapareceu e ele se

retraiu, voltando a sentar-se em sua cadeira.

Na tentativa de inserir Matheus na atividade, nós o convidamos, mais uma vez,

porém, ele se negou a participar. Aproximamo-nos, sentamos ao seu lado e conversamos

individualmente, conforme as recomendações de Silva (2008, p. 154), que sugere “[...]

comunique-se sempre com o aluno com deficiência visual, fazendo com que participe

ativamente de todas as atividades propostas”. Nesse caso, o professor mediador disse:

“Matheus, vamos participar dessa atividade. Eu vou ficar ao seu lado para te ajudar”. Com

isso, Matheus pensou por alguns segundos, levantou e voltou a participar do jogo.

Matheus não foi o único que necessitou de intervenção durante as primeiras

oficinas. Havia, também, um grupo de alunas que sentava ao fundo da sala que precisava

ser motivado. Sendo assim, no intuito de despertar o interesse de todos, apresentou-se à

turma os materiais que seriam utilizados na próxima etapa (pranchas, lápis e papel), para

que explorassem e fossem motivados, ainda mais, a participar da próxima etapa.

Fez-se uma demonstração com a prancha, desenhando-se com um lápis sobre o

papel e revelando o relevo no verso. Os alunos ficaram entusiasmados, principalmente as

meninas que, antes, não haviam se integrado por completo à proposta. Acerca dessa

atividade, Ludmila (12 anos – aluna vidente) disse: “Nossa, que legal! Olhem, meninas.

(passando as mãos sobre os desenhos). É como “braile”. Ah, então é assim que Tatiana e

Clarice irão saber o que a gente vai desenhar. Isso é muito legal!”.

98 Essa abordagem é inspirada nas ideias de Artus Perrelet (ARTUS-PERRELET, 1930; MAIA, 2012), bem como, nos jogos tradicionais de estátua.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

211

Figura 3 – Materiais utilizados na oficina. Fotos: Rivaldo Bevenuto

Retomando a descrição do exercício de representação corporal, ressalta-se que,

após o aquecimento com o jogo de estátua e as intervenções verbais realizadas, propôs-

se a continuação do exercício, de modo que os alunos voltaram a circular pela sala e, ao

nosso sinal, passaram a representar estátuas com referência a uma das miniaturas

exploradas tatilmente na caixa. A turma ficou surpresa com a proposta, mas encarou o

desafio com prontidão. Repetiu-se o procedimento algumas vezes e dividiu-se a turma

em dois grupos.

Figura 4 – Composições individuais – cadeira representada por uma aluna não vidente (à esquerda) e frigideira representada por uma aluna vidente (à direita). Fotos: Rivaldo Bevenuto

Os alunos com deficiência visual também foram divididos entre os grupos. Com

a ausência de Clarice nesse encontro, direcionou-se Tatiana para um dos agrupamentos e

Matheus para o outro. Pediu-se que um grupo de alunos representasse os objetos,

enquanto o outro foi desafiado a explorar as estátuas, associando a representação corporal

aos objetos da caixa.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

212

Figura 5 – Composições coletivas – regador (composição em dupla) e gaiola (composição em grupo) representados por alunos videntes. Fotos: Rivaldo Bevenuto

Em seguida, inverteram-se os papéis destinados a cada grupo. Os alunos videntes

e não videntes realizaram estátuas individuais, em dupla e em grupo. Tatiana participou

até o final da atividade, interagindo com os colegas videntes, enquanto Matheus, aos

poucos, foi se afastando até a cadeira, mas também conseguiu concluir a etapa, embora

tenha se limitado a composições individuais.

Os alunos observavam as composições dos colegas e desvendavam sua

representação, explicando o que cada um buscava imprimir em sua expressão corporal.

Nesse sentido, observou-se que os alunos utilizaram diferentes estratégias de

representação corporal, de modo que uns buscavam a representação do objeto modelando

o próprio corpo, tendo como referência a forma da miniatura, enquanto outros fizeram

referência a situações cotidianas em que os objetos em análise eram utilizados.

Em relação aos planos de representação, uns recorreram a planos baixos,

agachando-se ou sentando-se no chão; outros preferiam os planos médios, com estátuas

feitas com os corpos curvados; e houve ainda os que optaram pelos planos altos,

permanecendo de pé, expressando com diferentes partes do corpo a representação da

miniatura.

Enquanto um grupo representava as composições o outro analisava. Logo em

seguida, os papeis eram invertidos. Durante a análise das estátuas dos colegas, eles se

aproximavam para observar os detalhes de cada composição. No caso dos alunos com

deficiência visual, o toque foi um dos meios utilizados para análise, sendo também

experimentado por alguns videntes.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

213

Conforme registro fotográfico/videográfico realizado, observou-se que a

interação entre videntes e não videntes foi sendo garantida por meio das interações

verbais, táteis e corporais ocorridas em cada etapa da sequência didática proposta, pois se

compreendeu que, com aquele público, fazia-se necessário “[...] utilizar mais os modelos

verbais e táteis para interação direta com os objetos do conhecimento e para o

estabelecimento das relações sociais” (SILVA, 2014, p. 236).

Figura 6 – Miniatura de carro; representação corporal do carro feita por aluno vidente; análise tátil e identificação do “objeto” feita por aluna não vidente. Fotos: Rivaldo Bevenuto.

As alunas videntes representaram objetos como frigideira, balde, panela, armário,

geladeira e carrinho de bebê. A representação da cadeira feita por Tatiana foi objeto de

análise pelos colegas videntes. Já os meninos representaram objetos como mesa, regador,

vaso com flor, garrafa, espelho, gaiola, bicicleta e carrinho. A representação corporal do

carro feita por um aluno vidente foi analisada pelo toque da colega cega, a qual revelou a

identificação do objeto. Nessa atividade, Tatiana (16 anos – aluna não vidente) explicou:

“Esse eu sei, tá fácil. Júnior está representando o carro. Tinha um carro dentro da caixa”.

Ao final desse encontro, discutiu-se sobre a opinião dos alunos em relação à oficina e

questionou-se sobre as dificuldades encontradas durante a atividade. Os alunos não

relataram dificuldades e demonstraram aceitação da proposta. De acordo com Clarice (14

anos – aluna não vidente): “Nas oficinas aprendi coisas novas, que eu não tinha feito antes. [...]

Lembro de ter feito algo parecido na 5ª série (referindo-se ao jogo de estátua). Achei esse o

exercício mais difícil das oficinas, mas eu fiz”. Já Douglas (14 anos – aluno vidente) informa

que: “Eu aprendi a me colocar no lugar da pessoa que é cega e a fazer o desenho de outro

ponto de vista”. Da caixa para a sala de aula, o processo de produção das imagens se

expande, alcançando a amplitude do corpo que, em situações de gestos, movimentos e

estatismos, “agiganta” as miniaturas, cuja apreciação mobiliza olhares, toques e palavras

em interações intersubjetivas que vão adensando os encontros entre os alunos a despeito

das distinções entre vidência e não vidência.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

214

Assim, uma cadeia semiótica vai se constituindo ludicamente, na qual um signo

responde a outro signo (BAKHTIN, 2003) em um itinerário multissensorial de leitura e

produção de imagens como partes intrínsecas de um processo de descobertas em torno do

ato de desenhar. Dessa maneira, a imagem mental decorrente do toque é reconfigurada

pela imagem corporal que é “desenhada” tridimensionalmente no chão da sala de aula.

Nesse caso, para se chegar ao papel e ao desenho propriamente dito, foi preciso retornar

à caixa e isso nos remete à terceira etapa da oficina em análise.

Exercício de desenho tátil-visual

Se na primeira etapa da oficina a exploração tátil pressupunha a exploração de

uma caixa fechada, cujas aberturas laterais asseguravam, tão somente, a inserção das

mãos. Agora, a caixa seria aberta, mas a não vidência dos objetos seria preservada pela

proposição de que todos os alunos deveriam usar vendas. Essa proposição foi acolhida

entusiasmadamente pela turma, sendo que as duas alunas cegas não quiseram (e não

precisavam) vendar os olhos. Assim, as 3 caixas, agora abertas, circularam entre os

alunos, os quais, a partir da exploração tátil, escolhiam, cada um, uma miniatura a ser

utilizada como referência na realização dos desenhos. Tal escolha poderia (ou não) fazer

relação com os objetos refenciados na representação corporal do jogo de estátua.

Essa exploração tátil foi mais rápida não apenas pela perspectiva da escolha do

objeto mas também pelo acúmulo da experiência anterior de tocar os objetos dentro da

caixa. Mesmo assim, a atividade não se repetia em decorrência de que a experiência

didática proposta era esteticamente diferente por conta do uso da venda e pelo fato de que

a caixa estava aberta, permitindo mais mobilidade das mãos no manuseio dos objetos.

Na sequência, toda a turma recebeu uma prancha recoberta com tela de nylon, um

lápis 6B e uma folha de papel A4 (peso 40). Assim, todos iriam desenhar sem o

agenciamento da visão, tendo como referência o objeto escolhido. Passadas a euforia e a

surpresa da proposta, a turma iniciou o processo de feitura do desenho.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

215

Figura 7 – Alunas videntes, vendadas, escolhendo as miniaturas para a atividade de desenho (à esquerda). No centro, um aluno vidente desenhando sobre a prancha adaptada. À direita, aluna analisando o relevo. Fotos: Rivaldo Bevenuto.

Percebendo que os alunos com deficiência visual já possuíam noções básicas de

geometria bem consolidadas e levando em consideração que os alunos videntes faziam

uso de vendas, exploraram-se verbalmente as formas geométricas como o círculo, o

triângulo e alguns quadriláteros (quadrado, retângulo e trapézio) identificados nas

miniaturas, as quais foram referência para nortear a produção dos desenhos.

Figura 8 – Produção de desenhos de alunos videntes vendados (à esquerda e ao centro da imagem) e de alunas cegas (à direita) a partir da exploração tátil de miniaturas. Fotos: Rivaldo Bevenuto

Durante todo o processo de construção do desenho, os alunos exploraram as

miniaturas em um movimento intermitente entre o manuseio do objeto e o delineamento

gráfico de sua representação. Logo após a feitura do desenho, os alunos, em duplas, e

permanecendo vendados, analisaram, por meio da exploração tátil, o desenho em relevo

feito pelos colegas e discutiram sobre as possíveis representações do desenho do outro.

Figura 9 – Análise tátil do desenho do outro. Aluno surdo-cego (à esquerda) e aluno vidente (à direita). Fotos: Rivaldo Bevenuto

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

216

Desfeita as duplas, os alunos puderam retirar as vendas e conhecer as miniaturas,

intercambiando suas opiniões, cujo deslocamento pela sala proporcionou novas

interações entre todos os alunos, mediadas pelo desenho e pelos objetos, de tal maneira

que a palavra e o toque asseguravam que videntes e não videntes deslocassem entre as

miniaturas e suas representações gráficas.

Dos registros realizados nessa etapa, destacam-se algumas produções que revelam

as soluções encontradas pelos alunos para desenhar de olhos vendados. O desenho da

bicicleta feito por Matheus (aluno surdo-cego) foi construído com traços suaves, por isso

foi necessário solicitar que ele contornasse as linhas para que o relevo ficasse evidente.

Ele escolheu desenhar o objeto de perfil e as linhas e formas utilizadas nos pneus

demonstram que atentou bem para esses detalhes no exercício de exploração tátil.

Já o carrinho de bebê e o regador desenhados por Gabriela e Robson (alunos

videntes), foram registrados conforme o seu olhar (mesmo vendados) se direcionava ao

objeto durante o exercício de exploração tátil, ou seja, visto de cima. Por isso, no papel

eles são representados de forma plana, com a predominância de linhas curvas.

Figura 10 – Desenho do aluno com surdo-cegueira. Foto: Rivaldo Bevenuto

Figura 11 – Desenhos de alunos videntes. Fotos: Rivaldo Bevenuto

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

217

Assim, alguns optaram por desenhar os objetos tendo como referência o ponto de

vista lateral, enquanto outros representaram o objeto visto de cima. Percebeu-se ainda que

alguns alunos tentavam contornar as miniaturas sobre a folha; outros acompanhavam o

traçado no verso da folha com os dedos, a fim de compreender como estava ficando o seu

desenho. Todavia, somente após a recolha dos trabalhos, perceberam-se alguns detalhes

nos desenhos da turma.

Figura 12 – Desenhos de mesa e cadeira realizados a partir da análise tátil (desenhos de alunos videntes). Fotos: Rivaldo Bevenuto

No caso dos alunos videntes, foi possível perceber que eles utilizaram referências

visuais na composição dos desenhos, mesmo de olhos vendados, como uma leve

indicação de perspectiva ao desenhar as pernas das mesas e cadeiras, conforme se pode

observar nas imagens acima. As referências geométricas foram bem utilizadas nas

análises táteis das miniaturas e foram manifestadas nos desenhos dos alunos.

Já no caso dos desenhos das alunas cegas, percebeu-se que havia uma indicação

ou tentativa de representação de profundidade dos objetos. De acordo com Reily (2004,

p. 39):

“O aluno com cegueira congênita pode não compreender desenhos em perspectiva, com o uso de ponto de fuga, que leva a uma diagonalização de linhas para um ponto no horizonte. A ilusão da diminuição da figura a distância também não faz sentido para o cego, pois a sua referência é tátil”.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

218

Diante disso, alguns questionamentos provocaram certa inquietação no retorno à

escola, motivando a realização de uma entrevista individual com as duas alunas cegas.

Assim, compreendeu-se que, apesar de a deficiência visual ser congênita nos dois casos,

a cegueira total só veio ocorrer no início da adolescência, por isso, elas tiveram algumas

experiências com imagens quando ainda apresentavam pouco resíduo visual. Abaixo,

tem-se um fragmento desse diálogo com as alunas, o qual aborda as estratégias que

utilizaram para desenhar os objetos expostos abaixo:

Prof. Mediador: Meninas, estou com as últimas produções que vocês realizaram na aula

anterior. Lembram quais foram os seus desenhos?

Tatiana: O meu foi uma panela.

Clarice: Eu não lembro.

Prof. Mediador: Aqui está. Podem pegar. [os desenhos foram entregues em mãos].

Clarice: Ah, sim, o meu foi... como é?... um baldinho. [passando as mãos sobre o desenho

em relevo].

Prof. Mediador: O uso das miniaturas facilitou a atividade de desenho para vocês?

[apresentamos as miniaturas da panela e do balde].

Clarice: Sim, pois fica mais bem feito.

Prof. Mediador: Que estratégias vocês utilizaram para desenhar?

Tatiana: Bem, eu coloquei o objeto em cima da folha e contornei.

Clarice: Eu também. Coloquei em cima da folha e cobri. Fica melhor para desenhar.

No desenho feito por Tatiana, é perceptível a indicação de profundidade

demarcada pelas bordas do balde em formato oval. Já no desenho de Clarice, a

profundidade é indicada em sua segunda tentativa, quando desenhou a silhueta da panela

com uma inclinação curva para baixo.

As alunas utilizaram a estratégia de contorno como mediação para

transcodificação da dimensão tridimensional do objeto para o bidimensional do desenho,

realizando um processo de conversão semiótica (REILY, 2004). Dessa forma, as alunas

confirmaram que tatear as miniaturas e usá-las como referência facilita a mediação da

imagem do desenho. A esse respeito, as proposições metodológicas de Bardisa (1992)

apontam o uso das silhuetas; Lima (2001), por sua vez, defende as figuras bidimensionais

tangíveis; e Duarte (2011) prefere o uso de maquetes.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

219

Figura 13 – Desenhos realizados a partir da análise tátil (desenhos de alunas não videntes). Fotos: Rivaldo Bevenuto.

A utilização das caixas (vazadas e abertas), nesse sentido, ocorreu como uma

estratégia que despertou a motivação e a curiosidade da turma. Essa dimensão lúdica que

permeou a oficina desde a exploração das caixas, o tateamento das miniaturas, a

representação corporal, a feitura e a troca dos desenhos entre os alunos para análise tátil

configurou-se como um conjunto de atividades multissensoriais, semioticamente

articulado, cujas provocações estéticas suscitaram uma adesão prazerosa da turma.

Ao final dessa etapa, promoveu-se um momento de discussão sobre as impressões,

descobertas, dificuldades e receios encontrados pelos alunos em uma roda de conversa.

Os alunos videntes relataram, durante esse momento de avaliação, que nunca haviam

desenhado daquela forma (referindo-se ao percurso didático que culminou com o desenho

vendado), enquanto os alunos com deficiência visual demostraram-se receptivos às

atividades propostas, aprovando a sequência didática realizada. A partir dessas atividades,

todos ficaram entusiasmados, aguardando o próximo encontro. No decorrer das etapas, a

interação entre videntes e não videntes e a participação dos alunos na produção e análise

dos desenhos foram contempladas. Os alunos com deficiência visual afirmaram não ter

sentido grandes dificuldades, pois os materiais utilizados facilitaram as atividades de

desenho.

“Cada pessoa desenvolve processos particulares de decodificação que formam imagens mentais. A habilidade para compreender, interpretar e assimilar a informação será ampliada de acordo com a pluralidade das experiências, a variedade e qualidade do material, a clareza, a simplicidade e a forma como o comportamento exploratório é estimulado e desenvolvido” (SÁ, CAMPOS, & SILVA, 2007, p. 16).

Sendo assim, as primeiras impressões sobre o percurso didático construído a

respeito da participação e adesão dos alunos nas atividades propostas indicaram que a

estratégia metodológica da oficina pedagógica mobilizou a participação de toda a turma

a partir de uma abordagem lúdica e multissensorial.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

220

Construindo uma síntese provisória

Compreende-se, por conseguinte, que uma abordagem didática orientada pela

multissensorialidade pode produzir aprendizagens significativas tanto para alunos com

deficiência visual como também para os alunos videntes (SOLER, 1999). Seguindo as

orientações teóricas para a atuação com alunos cegos e com baixa visão, entendemos que

o papel do professor consiste em oferecer oportunidades para que todos os alunos, juntos,

construam processos de construção de conhecimentos acreditando na capacidade de

aprendizagem de cada um e possibilitando-lhes os meios possíveis para a efetivação de

aprendizagens significativas (SILVA, 2008, p. 135).

As interações nos exercícios demostraram a criatividade dos alunos em suas

escolhas ao realizarem as composições individuais, em dupla e coletivas, envolvendo o

corpo e as estimulações sensoriais, sendo possível contemplar o que aponta Tojal (2007,

p. 3):

“[...] as experiências perceptivas desenvolvidas segundo a abordagem multissensorial possibilitam melhor compreensão da realidade, bem como das representações humanas e do meio ambiente, da mesma forma que exercitam e estimulam as potencialidades perceptivas de pessoas com ou sem deficiência e amplia as capacidades de reconhecimento e apreensão do mundo, garantindo, dessa forma, a concretude e incorporação dos conhecimentos e descobertas”.

Sendo assim, favorecer experiências que explorem os múltiplos sentidos é

importante para todos os alunos em contexto escolar, sobretudo para os alunos com

deficiência visual, como declara Silva (2014, pp. 235-236):

“Entendemos que mobilizar aprendizagens significativas para alunos com tal deficiência, além de ser de fundamental importância é possível por meio da proposição de práticas que considerem e estimulem os canais sensoriais que lhes favorece o conhecimento das coisas, dos objetos, do mundo”.

Neste estudo, privilegiou-se a exploração do tato e da audição, os quais foram

mobilizados nas interações corporais no jogo de estátua e na produção e análise dos

desenhos dos estudantes participantes da oficina. Sendo assim, tanto videntes quanto não

videntes puderam explorar diferentes formas de percepção e de expressão, confirmando

o que declara Tojal (2007, p. 4):

“[...] as estratégias de mediação baseadas nos métodos de percepção multissensorial, ao contemplar tanto as diferenças pessoais como as diversas formas de percepção apreendidas de um mesmo objeto, proporcionam respostas verdadeiramente estimulantes, podendo ser aplicadas e compartilhadas por todas as pessoas, não importando as suas necessidades ou limitações”.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

221

A multissensorialidade, dessa forma, apresenta-se como uma possível abordagem

a ser desenvolvida no contexto da inclusão escolar, conforme os estudos realizados na

área (SOLER, 1999; BALLESTERO-ÁLVAREZ, 2003; TOJAL, 2007; SILVA, 2008) e

com base nas experiências realizadas em nossa investigação, sem se restringir às

singularidades perceptivas das pessoas com deficiência, mas, de forma mais ampla,

contemplando a todos os envolvidos em processos de ensino-aprendizagem. A

multissensorialidade, por conseguinte, pode se constituir em mediadora de construções

epistêmicas e estéticas coletivas, sem obliterar as diferenças e as singularidades daqueles

que participam de tais processos.

Dessa forma, o percurso lúdico construído, desde a exploração tátil dos objetos

dentro da caixa até a feitura e leitura dos desenhos táteis, demarcou um trânsito entre tais

objetos e suas múltiplas representações imagéticas que perseguia a possibilidade de ser

construídos saberes e experiências no contexto do ensino de Artes Visuais em que a

interfarce Arte e Deficiência não se enclausurasse na segregação didática. Assim, ao

contrário, buscou-se a construção de uma prática pedagógica nucleada pela proposição

de uma oficina que, em última instância, revelasse novos encontros de aprender e de

ensinar, nos quais as descobertas advindas das ações compartilhadas permitissem o

exercício da singularidade nas relações estabelecidas entre o eu e o outro.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAKHTIN, M., & VOLOCHINOV, V. N. (1979). Marxismo e filosofia da linguagem.

São Paulo: Hucitec.

BAKHTIN, M. (2003). A estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes.

BALLESTERO-ÁLVAREZ, J. A. (2003). Multissensorialidade no ensino de desenho a

cegos. Dissertação (Mestrado em Artes Plásticas) – Escola de Comunicações e Artes

(ECA), Universidade de São Paulo, São Paulo, São Paulo.

BARDISA, L. (1992). Como enseñar a los niños ciegos a dibujar. Madrid: ONCE.

DUARTE, M. L. B. (2008). A imitação sensório-motora como uma possibilidade de

aprendizagem do desenho por crianças cegas. In L. A. R. MARTINS, J. PIRES, & N. L.

GLAUCIA(Org.), Políticas e Práticas Educacionais Inclusivas. Natal, RN: EDUFRN.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

222

DUARTE, M. L. B. (2011). Desenho Infantil e seu ensino a crianças cegas: razões e

métodos. Curitiba, PR: Insight.

ELIAS, M. C. (1997). Célestin Freinet: uma pedagogia de atividade e cooperação.

Petrópolis, RJ: Vozes.

FERREIRA, S., & RIBEIRO, M. M. G. (2001). Oficina pedagógica: uma estratégia de

ensino-aprendizagem. Natal: EDUFRN.

FREINET, C. (1977). O Método Natural. Lisboa: Editorial Estampa, v I.

JOBIM E SOUZA, S. (2011). Mikhail Bakhtin e as ciências humanas: sobre o ato de

pesquisar. In M. T. A. FREITAS (Org.), Escola, tecnologias digitais e cinema (pp. 35-

44). Juiz de Fora, MG: Ed. da UFJF.

JOBIM E SOUZA, S., & ALBUQUERQUE, E. D. P. (2012). A pesquisa em ciências

humanas: uma leitura bakhtiniana. Bakhtiniana, São Paulo, 7(2), 109-122.

KRAMER, S. (2003). Entrevistas coletivas: uma alternativa para lidar com diversidade,

hierarquia e poder na pesquisa em ciências humanas. In M. T. FREITAS, S. JOBIM E

SOUZA, & S. KRAMER (Org.), Ciências humanas e pesquisa: leituras de Mikhail

Bakhtin. São Paulo: Cortez.

LIMA, F. J. (2001). O efeito do treino com desenhos em relevo no reconhecimento

háptico de figuras bidimensionais tangíveis. Tese (Doutorado em Artes) – Universidade

de São Paulo, Ribeirão Preto.

LOPES, A. E. R. C. (2004). Olhares compartilhados: o ato fotográfico como experiência

alteritária e dialógica. Tese (Doutorado) – Faculdade de Educação, Pontifícia

Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.

MAIA, N. D. S. (2012). A trajetória de Jean Pierre Chabloz na constituição do meio

artístico da cidade de Fortaleza no âmbito das artes visuais. Dissertação (Mestrado em

Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Estadual do Ceará,

Fortaleza.

PERRELET, L. A. (1930). O desenho a serviço da educação. Rio de Janeiro: Vilas Boas.

PEY, M. O. (1997). Oficina como modalidade educativa. Perspectiva: uma revista do

Centro de Ciências da Educação, Florianópolis: Ed. Da UFSC. jan./jun.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

223

PIEKAS, M. I. (2010). A Desconstrução do Esquema Gráfico Aplicado ao Ensino de

Desenho para Crianças Cegas. Dissertação (Mestrado em Artes Visuais) – Programa de

Pós-Graduação em Artes Visuais, Universidade do Estado de Santa Catarina,

Florianópolis.

REILY, L. H. (2001). Armazém de imagens: ensaio sobre a produção artística da pessoa

com deficiência. Campinas: Papirus.

REILY, L. H. (2004). Escola inclusiva: linguagem e mediação. Campinas, SP: Papirus.

REILY, L. H. (2010). O ensino de artes visuais na escola no contexto da inclusão. Cad.

Cedes, Campinas, 30(80), 84-102. Disponível em: http://www.cedes.unicamp.br

SÁ, E. D., CAMPOS, I. M., & SILVA, M. B. C. (2007). Atendimento Educacional

Especializado: deficiência Visual. Brasília: SEESP/SEED/MEC.

SILVA, L. G. S. (2008). Inclusão: uma questão, também de visão. O aluno cego na escola

comum. João Pessoa: Editora Universitária.

SILVA, L. G. S. (2014). Por uma escola sem exclusões: intervenções pedagógicas junto

a estudantes cegos e com baixa-visão. In L. A. R. MARTINS, G. N. PIRES, & J. PIRES

(2014), Caminhos para uma Educação Inclusiva: políticas, práticas e apoios

especializados. João Pessoa: Ideia.

SOLER, M. A (1999). Didáctica multissensorial de las ciencias: un nuevo método para

alumnos ciegos, deficientes visuales, y también sin problemas de visión. Barcelona:

Ediciones Paidós Ibérica.

TOJAL, A. P. F. (2007). Políticas de Inclusão de públicos Especiais em Museus. Tese

(Doutorado em Ciências da Informação) – Escola de Comunicações e Artes, Universidade

de São Paulo.

VYGOTSKY, L. S. (1998). A formação social da mente (6.ª ed.). São Paulo: M. Fontes.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

224

PERSONAJES EXTRAORDINARIOS, ARQUETIPOS Y ESTRUCTURAS

NARRATIVAS CLÁSICAS: SOBRE LA REPRESENTACIÓN DE LA

POBREZA EN DOS DOCUMENTALES ARGENTINOS

Extraordinary characters, archetypes and classical narrative structures: on the

representation of poverty in two Argentinian documentaries

LANZA, Pablo 99

Resumen

La crisis política, social y económica argentina del año 2001, producto de las políticas neoliberales de la década previa, obligó a un sector de la población a generar nuevas formas de organización laboral para poder subsistir en un país regido por la lógica del desempleo. Trabajadores de fábricas recuperadas y cartoneros fueron representados de forma insistente e instantánea en el cine documental en films como El tren blanco (N. García, S. Pérez Giménez y R. García, 2003), Caballos en la ciudad (A. Gershenson, 2004) y Grissinopoli, el país de los grissines (D. Doria, 2004), entre otros. La mayor parte de estos textos representan a sus sujetos de forma similar, privilegiando una actitud pasiva por parte de los realizadores y registrando el accionar cotidiano de un conjunto de sujetos, quienes expresan sus ideas y sentimientos a través de entrevistas. En este artículo analizaremos dos documentales que trabajan esta temática mediante una aproximación distinta: Bonanza (en vías de extinción) (Ulises Rosell, 2000) y Vida en Falcon (Jorge Gaggero, 2004). Estos dos films presentan la historia de personajes de clases marginadas que encuentran medios de supervivencia peculiares (uno haciendo de su auto Ford Falcon una vivienda y el segundo conviviendo con su familia entre chatarras), adoptando estructuras narrativas clásicas de ficción y personajes a los que se les otorgan valores arquetípicos. El objetivo de dicha operación es intentar reducir la distancia con el espectador apelando a personajes y estructuras reconocibles por sobre la denuncia explicita, favoreciendo el “tratamiento creativo de la realidad” que supone el discurso documental.

99 PABLO LANZA - Doctor en Historia y Teoría de las Artes (Universidad de Buenos Aires). Es integrante del Centro de Investigación y Nuevos Estudios sobre Cine (CIYNE) y del Grupo de Estudios de Teatro Argentino e Iberoamericano (GETEA). Es docente de la materia Historia del Cine Universal (UBA) y miembro del comité editorial de la revista digital Cine Documental. Ha publicado artículos en revistas nacionales e internacionales sobre historia del cine. ARGENTINA. E-mail: [email protected]

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

225

Abstract

The Argentinian political, social and economic crisis of 2001, which was the product of neoliberal policies of the previous decade, forced a section of the population to generate new forms of work organization to survive in a country ruled by the logic of unemployment. The occupied factories workers and cartoneros were represented insistently and instantaneous in documentary films such as El tren blanco (N. García, S. Pérez Giménez y R. García, 2003), Caballos en la ciudad (A. Gershenson, 2004) and Grissinopoli, el país de los grissines (D. Doria, 2004), among others. Most of these texts represent their subjects similarly, favoring a passive attitude on the part of the filmmakers and recording the daily actions of a group of individuals, who in some scenes express their ideas and feelings through interviews. However, in this paper we propose to analyse two documentaries that work this issue through a different approach: Bonanza (en vías de extinción) (U. Rosell, 2000) y Vida en Falcon (J. Gaggero, 2004). These two films present the story of underclass characters who adopt peculiar means of survival (one making his Ford Falcon housing and the second living with his family among scrap and junkyard), adopting classical narrative structures fictional and archetypes of characters. The aim of these films is try to reduce the distance with the audiences by appealing to recognizable characters and structures instead of favouring the explicit denunciation favouring the "creative treatment of reality" posed by the documentary discourse.

Palabras clave: cine documental; representación; estructuras narrativas.

Key-Words: documentary film; representation; narrative structure.

Data de submissão: Março de 2016 | Data de publicação: Junho de 2016.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

226

INTRODUCCIÓN

Uno de los momentos de mayor producción del cine documental en Argentina

coincidió y fue producto del estallido social y político que culminó con los “cacerolazos” de

diciembre del 2001. Los relatos que buscaron dejar imágenes del derrumbe de la sociedad se

multiplicaron en títulos como El tren blanco (Nahuel García, Sheila Pérez Giménez y Ramiro

García, 2003), Cartoneros de Villa Itatí (Eduardo Mignogna, Ingrid Jaschek, Ana Cacopardo,

Pablo Spinelli y Andrés Irigoyen, 2003), Caballos en la ciudad (Ana Gershenson, 2004),

Habitación disponible (Marcelo Burd, Diego Gachassin y Eva Poncet, 2004), Grissinopoli

(Darío Doria, 2004), Memoria del saqueo, Días de cartón (Verónica Souto, 2005) y

Colegiales, asamblea popular (Gustavo Laskier, 2006), entre muchos otros. Los márgenes

de la población fueron retratados de forma insistente, las imágenes de las protestas del 20 de

diciembre de 2001 y las causas que las generaron comenzaron a convertirse en moneda

corriente en las pantallas y su impacto, por esta misma razón, comenzó a disminuir. La lucha

de los trabajadores de fábricas recuperadas, piqueteros, las vidas cotidianas de inmigrantes y,

especialmente, de cartoneros fueron las narrativas privilegiadas durante unos años.

Cumpliendo con una de las cuatro tendencias fundamentales del documental propuestas por

el teórico Michael Renov, estos films buscaban “registrar, mostrar o preservar” (RENOV,

2010) un momento importante de la historia argentina y otorgarle visibilidad a la lucha de

distintos actores sociales.100 En términos generales estos documentales adoptan una retórica

asociativa (PLANTIGA, 1997, p. 120), en la que se agrupan a diversos personajes

remarcando semejanzas, un tipo de organización que no requiere estructuras férreas, sino que

se asocia a narraciones más flexibles. Si bien cada historia tiene sus rasgos peculiares,

podemos reconocer un patrón en casi todos estos documentales que se organiza de la siguiente

forma: una breve escena introductoria que combina la presentación de datos estadísticos –

mediante similares placas negras con tipografía blancas– con imágenes del estallido de los

últimos días del año 2001, a la que sigue el registro de las actividades diarias de los actores

escogidos, entramadas con breves entrevistas en las que reflexionan sobre su situación actual,

su sueños y esperanzas para el futuro. Favoreciendo una actitud observacional, se efectúa el

borrado de las huellas del equipo de filmación del campo visual, a la vez que descartan la

utilización de relatos mediante la voz over confiando en que las imágenes hablen por sí solas,

un rechazo habitual de la mayor parte de la producción documental argentina del período.

100 Las otras tres funciones del documental consisten en persuadir o promover, analizar o interrogar, y expresar (RENOV, 2010).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

227

Sin embargo, aquí nos interesa trabajar de forma conjunta dos documentales que,

si bien se inscriben dentro de esta temática, ensayan nuevos acercamientos al articular sus

relatos alrededor de personajes sumamente excéntricos apelando a estructuras narrativas

clásicas que les otorgan a sus protagonistas rasgos arquetípicos. Los documentales

Bonanza (en vías de extinción) (2001) y Vida en Falcon (2004) fueron señalados en su

estreno por la crítica local como sendos ejemplos de que las supuestamente otrora

marcadas fronteras entre el documental y el cine de ficción comenzaban a borrarse. Para

ello apelaban principalmente a la excepcionalidad de los sujetos representados y el hecho

que los realizadores de los films, Ulises Rosell y Jorge Gaggero respectivamente, habían

participado en la mítica primera entrega del film colectivo Historias Breves (1995),

puntapié inicial del Nuevo Cine Argentino.101 A pesar de que podemos poner en tela de

juicio la noción de que la mixtura con la ficción es un atributo exclusivo del documental

de estos años, sí podemos afirmar que la representación que estos films ofrecen de la

pobreza y la villa no cuenta con antecedentes directos en la cinematografía argentina,

probablemente debido a que su objetivo no es pronunciar una denuncia sino articular

relatos en torno a vidas curiosas. El propósito de este artículo es entonces analizar estos

dos films centrándonos en las estructuras narrativas propuestas, la construcción de los

personajes y las formas en las que el contexto social se intercala dentro de las

representaciones.

UNA FAMILIA (NO TAN TÍPICA) ARGENTINA

El primero de los documentales que nos ocupa, Bonanza (en vías de extinción),

retrata el día a día de las vidas de la familia del personaje del título, Norberto “Bonanza”

Muchinsci y sus dos hijos. Ubicados en la periferia de la ciudad de Buenos Aires, la

familia vive de oficios varios que incluyen, pero no se limitan exclusivamente, a la caza

y venta de animales, venta de chatarra y ciertos favores políticos.

101 El Nuevo Cine Argentino (NCA) de los años noventa supuso un “nuevo régimen creativo” (AGUILAR, 2006, p. 14), que marcó un quiebre en la historia de la cinematografía nacional en términos tanto de producción como estéticos. El film conjunto Historias breves suele considerarse como uno de los antecedentes debido a la participación de futuros realizadores de gran renombre del NCA, entre ellos Lucrecia Martel, Adrián Caetano y Daniel Burman. En el caso del documental de Rosell, se establecen lazos explícitos con su corto “Donde y como Oliveira perdió a Achala” que integró Historias Breves, debido a que comparte a los mismos protagonistas.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

228

La película abre con el protagonista, ubicado en una autopista, narrando hacia la

cámara la anécdota de un robo en el que participó en su juventud. A esta breve escena

siguen otras dos que presentan a sus hijos: Norberto y “La Vero”, sus nombres insertos

en la imagen a través de graphs, el primero desguazando un coche y vendiendo las partes,

y la segunda jugando con unas amigas en una camioneta abandonada. Estas

introducciones marcan el tono de la película y las historias que se contarán, presentando

a personajes joviales, que juegan y trabajan entre escombros, a la vez que se establece

una relación de complicidad con la cámara, con el jefe de familia relatando la historia

directamente a la misma y el hijo guiñando el ojo después efectuar su venta. La presencia

de estos momentos indica que la actuación de los sujetos oscila entre una actitud

representacional y otra presentacional (WAUGH, 2011), es decir entre el supuesto

desconocimiento de la situación de filmación y la conciencia explícita de la misma;

consideramos que este aspecto es de suma importancia ya que constituyó otro de los

puntos que la crítica local señaló para argumentar sobre la supuesta mezcla entre ficción

y documental que el film ofrecía, una observación errónea dado que ignora tanto estos

múltiples momentos de consciencia de los personajes, a la vez que supone que la

observación pura es uno de los fundamentos del documental y no una de sus modalidades.

Si, en términos generales, el personaje en el documental se define gracias a sus

objetos y los espacios que transitan, este film es ejemplar en este sentido, por lo que nos

detendremos sobre este punto. El espacio representado, la villa, resulta casi irreconocible

para el espectador, pues no cuenta con carteles que informen su ubicación ni es posible

reconstruir la misma a través de los diálogos que mantienen los personajes. En las

entrevistas al realizador Rosell con motivo del estreno, aclaró que los lugares pertenecían

a la ciudad de La Plata, pero que fue una decisión consciente presentarlo como un

“territorio imaginario” (NORIEGA, 2000, p. 45) para poder diferenciarlo de las imágenes

más habituales de la villa propuestas por el cine argentino. Este es uno de los motivos que

distingue al film de los documentales de la época, ya que no otorga un contexto social,

no los piensa dentro de una estadística o intenta explicar las razones por la que se

encuentran en tal situación. Las aventuras registradas consisten en su mayoría de escenas

en la que los personajes entablan juegos entre lagunas de lodo o en fogatas nocturnas,

decisión que produce una complicada naturalización de la situación de pobreza en la que

viven: rodeado de chatarras de coches Bonanza alardea ante la cámara que muchos de los

repuestos que yacen ahí poseen un valor incalculable. David Oubiña resume el riesgo de

esta posición:

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

229

[el director] olvida las precarias condiciones de subsistencia, la perversa red de estancamiento social y los crueles sistemas de exclusión; solo ve allí héroes románticos o personajes ejemplares, confundiendo sus tácticas de supervivencia con elecciones de vida. Los protagonistas, entonces, pierden su condición de víctimas (OUBIÑA, 2013, p. 45).

Como describe acertadamente Clara Kriger, “el film no vehiculiza ninguna

intención de alegato o denuncia acerca de la pobreza, sino que muestra a sus personajes

imprimiéndoles algún toque de picardía” (KRIGER, 2003, pp. 437-438).

Esta decisión generó discusiones sobre la ética de la representación de estos

ámbitos precarios, tal como señala el ya mencionado Oubiña al comparar al cineasta con

un “turista de visita en un país lejano”, cuya mirada “nunca supera el exotismo”

(OUBIÑA, 2013, p. 45).102 Sin embargo, un elemento de la puesta en escena explicita

esta posición de lejanía del equipo de filmación, nos referimos a la música extradiegética

perteneciente a Manu Chao o Kevin Johansen, según la versión a la que se acceda,103

ambos representantes de la llamada world music. Si bien este elemento no soluciona los

problemas indicados, sí explicita una consciencia del mismo ya que, en palabras de

Gonzalo Aguilar, “muestra cómo la valorización de esa vida se hace desde una mirada

globalizada que descubre los beneficios de la localidad y de la vida un poco ‘salvaje’ de

aquellos que quedaron afuera” (AGUILAR, 2006, p. 149).

No obstante estas observaciones, podemos apreciar que el contexto político asoma

en una llamativa breve escena al comienzo del film, en la que mediante la voz en off,

Bonanza otorga un parlamento, asumiéndose como referente de la villa, de los beneficios

que obtiene de ciertos políticos a través de ciertos favores:

“Nosotros caminamos con la gente que en realidad nos necesita. Entonces cuando nos necesita, bueno mirá… bueno, vamos. Mirá, hay que ir a tocar los bombos allá, llevame diez, doce bombos, vamos… Mirá, tal patota está hinchando las bolas. Está bien, esperá que te mando la gente. Agarro, busco cuatro, cinco de acá. Bueno, vamos. La gente vamos siempre. Mas o menos cuidamos a esa gente que es la que nos cuida a nosotros”.

102 Jens Andermann plantea una posición opuesta argumentando que aquí se discute la tradición del documental comprometido políticamente, y cuál es la “realidad de la miseria”. Según su visión, los personajes, completamente conscientes de la cámara, ofrecen una interpretación que a la vez satisface y subvierte las expectativas del espectador (ANDERMANN, 2012, p. 102). 103 La musicalización de Manu Chao fue utilizada sólo en las primeras proyecciones, debido a que luego Rosell no pudo conseguir los derechos, razón por la que la reemplazó con música de Johansen.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

230

Mientras el protagonista desarrolla este monólogo, las imágenes muestran a unos

jóvenes que pegan carteles de candidatos políticos que resultan irreconocibles para el

espectador. Aquí se produce una tensión entre la celebración que el film genera de los

personajes y cierta moral que elabora el protagonista que no es desarrollada.

Por último, resulta sorprendente que una de las cuestiones señaladas por la crítica

es que el film no parece contar con una estructura dramática, a pesar de que se la calificó

como una original síntesis entre documental y ficción, sino que se trata del hilado de una

mera sucesión de hechos. Sobre este punto podemos reconocer dos aspectos claves: el

primero tiene que ver con la anécdota ya mencionada del robo que abre el film, la cual

queda trunca hasta el final del film, en el que se retoma la escena inicial construyendo

una intriga que es resuelta mucho más tarde. El segundo aspecto, más importante, tiene

que ver con la presentación de un núcleo dramático que consiste en el deseo que Bonanza

posee hace años de emprender un viaje hacia el norte del país, pero sin saber si su hijo lo

acompañará. La importancia de esta intriga es capital, ya que su resolución articula la

escena final de la película; de hecho, los momentos que introducen y clausuran este

conflicto son resaltados en la película mediante la utilización de un elemento específico:

el fundido a negro, al cual se recurre en tan solo dos ocasiones, primero para introducir el

conflicto y luego para presentar su resolución.

El conflicto central del film maneja entonces un tono íntimo, ofreciendo un

conflicto familiar, que si bien individualiza a los personajes, los enmarca dentro de

funciones narrativas que buscan la identificación con el espectador a través de un

problema común como lo es el crecimiento de los hijos. Bonanza (en vías de extinción)

no se propone como un documental sobre la villa sino sobre la vida y la capacidad

narrativa de uno de sus habitantes.

APRENDIENDO DEL MEJOR

El otro film que nos ocupa es Vida en Falcon, documental que presenta una

estructura narrativa clásica mucho más marcada y que retrata las peculiares vidas de

Orlando y Luis, quienes ante la crisis económica y la falta de hogar deciden hacer de

sendos Ford Falcon sus viviendas. Los actores asumen dentro de la narración propuesta

roles arquetípicos –personajes tipo que simbolizan conductas recurrentes del

comportamiento humano–, en este caso entablando una relación de Maestro y Aprendiz,

en la que Orlando le enseñará a Luis cómo sobrevivir aprovechando el espacioso interior

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

231

de su nueva “vivienda”. A lo largo de la película Orlando impartirá sus enseñanzas a Luis

–las cuales no incumben únicamente al coche sino consejos de cocina y de compras- e

incluso, cuando no se encuentra éste, a la cámara. En un momento expone al equipo de

filmación: “éste (por Luis) pagaba de hotel 20 mangos por día. Escuchame, por esa guita

comprate un auto, hacete una casa y dormí ahí.”. Esta función dramática permite

contrapesar la excepcionalidad de las elecciones de los personajes otorgándoles rasgos

reconocibles para el espectador.

El relato comienza justamente cuando Luis adquiere su coche y revela que no sabe

manejar, motivo que les causa cierta gracia a los participantes, sino que su único objeto

es habitarlo. De forma similar a Bonanza (en vías de extinción), los personajes afrontan

la crisis en la que se encuentran inmersos de forma con un ánimo jubiloso, restándole

dramatismo a los hechos narrados. La postura de los personajes es en todo momento

alegre, incluso cuando a Luis se le introduce un okupa en su Falcon. En otra escena,

mientras preparan una comida en la calle entablan un diálogo que resume el punto de

vista de los personajes:

- Orlando: Escuchame, hay una pregunta clave ahora que están ellos [refiriéndose

al equipo de filmación]. ¿Cómo consideras que estamos nosotros acá? Pongo los

dos, que es masomenos medio parecido el caso. ¿Acá estamos bien o que esto es

una situación… una mala jugada del destino, una desgracia? Acá que desgracia…

Mirá, estamos como duques. Falta un colectivo viejo, viste, que haya lugar, unos

asientos.

- Luis: Estamos elaborando algo para beneficio propio… que viene a ser, ehhh...

contemplar la naturaleza, dialogar, tener… libertad. Contemplar la naturaleza,

plantas, pajaritos, palomas.

- Orlando: ¿Vos pensás que somos olvidados de la mano de Dios o no?

- Luis: No, son pruebas. Él espera que nosotros nos comportemos bien con su

creación.

Tras estas místicas palabras, la siguiente escena lo presenta a Luis ensayando una

socarrona plegaria al cielo, implorando que no llueva, objetivo que finalmente no

consigue y deben afrontar una posible inundación. En esta escena se puede observar que,

al igual que en Bonanza (en vías de extinción), si bien no quedan rastros del equipo de

filmación en el campo visual, los personajes dialogan o asumen representaciones para la

cámara constantemente.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

232

La caracterización de los personajes se produce principalmente de forma indirecta,

a través de los objetos y los diálogos de las personas que los rodean en algunos momentos

claves. El más revelador en este sentido es uno en que Orlando visita a unos antiguos

conocidos para cenar, y éstos hacen referencias a su pasado, su difunta mujer y su antiguo

trabajo. En ningún otro momento se vuelve sobre estos temas ni se refieren a las razones

por las que los protagonistas se encuentran en situación de calle, pero constituye el

epicentro dramático del film, ya que conduce a la siguiente escena en la que Orlando

señala su antigua casa, rememora su vida y concluye con un momento de enojo con sus

mascotas, la única crisis que se desarrolla frente a la cámara.

En esta misma escena también se expone la forma optimista en que los personajes

generalmente afrontan la crisis, ya que mientras exponen sus quejas por la falta de trabajo

y de dinero, observan en la televisión la noticia del fallecimiento de la abuela de Marcelo

Tinelli, la cual los pone tristes, pero rápidamente se consuelan pensando que de todas

formas tendrá un entierro decente. Esta mezcla de tonos de la película sorprende

constantemente y delinea personajes dinámicos, imposibles de predecir, generando una

original conjunción con los ya mencionados arquetipos y su carácter simbólico como

representativos de una clase social particular.

Como mencionamos, la estructura narrativa del film es mucho más marcada en

este film –la historia comienza con la adquisición del coche y concluye tras la venta del

mismo, decisión que Luis finalmente lamenta–,104 lo que permite resaltar los únicos dos

momentos que no se ocupan de estos personajes. El film abre y cierra con las imágenes

de una publicidad televisiva del Ford Falcon, objeto que califica como personaje casi

tanto como Luis y Orlando y que encierra múltiples significaciones. En el comienzo, la

publicidad nos muestra a una mujer asombrada y se presenta al Falcon entre una

constelación de estrellas. Tras hacer gala del gran espacio y lujo del coche, aparece un

policía que lo inspecciona a su vez maravillado, para finalizar con un paneo de la cámara

que se funde con las imágenes de la pintura derruida del coche-cama en la actualidad.105

A través del fundido se puede inferir cómo uno de los símbolos de la industria nacional

de los sesenta ha sido golpeado por las distintas crisis atravesadas al igual que los

personajes, a la vez que se le da un marco más amplio a las causas que llevaron al país a

104 El documental concluye con dos carteles que indican que “Orlando continúa viviendo en su Falcon sin establecerse en un lugar fijo”, mientras que “Luis duerme en la guardia del Hospital Pirovano”. 105 El segundo fragmento de la publicidad muestra a seis personas adentro del Falcon haciendo gala de la amplitud de los espacios mientras el coche se va.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

233

su situación actual, ampliando el período de la década neoliberalista de los noventa. El

coche es por un lado símbolo de las políticas neoliberales, pero también es uno de los

emblemas más asociados a la feroz última dictadura argentina y al secuestro de

personas.106 Esta cuestión marca un punto de divergencia importante con respecto a

Bonanza (en vías de extinción) y la manera en que se inscribe el contexto político. A pesar

de que los personajes no parezcan reparar en estas cuestiones debido a la urgencia en la

que viven, tal como atestigua el hecho que Luis le haya comprado el coche a un militar

sin contar los papeles y que no pueda venderlo en un comienzo debido a que, como le

señala uno de sus amigos, “perteneció al comando”, Gaggero introduce estos pequeños

diálogos, e incluso imágenes de cartoneros, que cargan de sentidos a la película. La

urgencia en la que los personajes viven no les permite detenerse en estas cuestiones y el

realizador respeta este hecho, favoreciendo la caracterización de personajes dinámicos

por sobre el discurso político.

Si bien sería erróneo pensar a estos dos documentales como una reacción a la

cuantiosa producción documental mencionada al inicio –Bonanza (en vías de extinción)

se estrenó antes que la mayoría, en los albores del estallido del 2001–, creemos que

constituyen formas alternativas para representar la crisis que azotaba al país en ese

momento y las alternativas que la población asumió para hacerles frente.107 Los

personajes de Bonanza (en vías de extinción) y Vida en Falcon poseen un estatuto peculiar

ya que si bien no se los presenta como una sinécdoque, una parte por el todo, sí asumen

un carácter simbólico, ya sea a través de la adopción de arquetipos o ejemplificando el

potencial narrativo de los sujetos.

106 El hecho que aparezca un policía en la publicidad original resulta ser una increíble coincidencia, pero permite establecer esta lectura. 107 Un tercer documental que puede incluirse dentro de esta temática es Estrellas (Federico León y Marcos Martínez, 2007) que, a diferencia de los dos trabajados aquí, dialoga de forma más explícita con la representación de los villeros con respecto al cine argentino de ficción. Decidimos no incluirlo en este trabajo debido a que el film de León y Martínez trabaja principalmente con elementos performativos y no una narrativa clásica.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

234

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AGUILAR, G. (2006). Otros Mundos. Un ensayo sobre el nuevo cine argentino. Buenos

Aires: Santiago Arcos Editor.

ANDERMANN, J. (2012). New Argentine Cinema. New York: I.B. Tauris.

KRIGER, C. (2003). Bonanza, en vías de extinción. In P. A. PARANAGUÁ (Ed.), Cine

documental en América Latina. Madrid: Cátedra.

NORIEGA, E. (2000). El rey de la chatarra. Revista El Amante , 104. Buenos Aires.

OUBIÑA, D. (2013). Las huellas del pie: Riesgos y desafíos del cine argentino

contemporáneo. In J. ANDERMANN & B. Á., FERNÁNDEZ (Comps.), La escena y la

pantalla. Cine contemporáneo y el retorno de lo real. Buenos Aires: Colihue.

PLANTINGA, C. (1997). Rhetoric and Representation in Nonfiction Film. New York:

Cambridge University Press.

RENOV, M. (2010). Hacia una poética del documental. Revista Cine Documental, 1.

Buenos Aires. Diponíble en: www.revista.cinedocumental.com.ar

WAUGH, T. (2011). “Show us life”, Toward a history and aesthetics of the committed

documentary. Londres: The Scarecrow Press.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

235

O DESIGN E A VALORIZAÇÃO DE PRODUTOS, TERRITÓRIOS E

IDENTIDADES

Designing and enhancing products, territories and identities

COSTA; Jacinta Helena Alves Lourenço Casimiro108

Resumo

O presente artigo aborda a relação atual entre o design, os contextos locais, as suas comunidades, a criação popular, a autocriação, o artesanato, os produtos autóctones, e a valorização e sustentabilidade territorial e social. Presentemente os fatores considerados como secundários como, o “valor de estima, os factores emotivos, estéticos e psicológicos, a qualidade percebida, o conceito de terroir” (como reconhecimento da comunidade e do território onde se produz) como refere Dijon de Moraes (2009), contidos em muitas destas produções são factores determinantes e diferenciais competitivos para o desenvolvimento de novas tipologias de produtos industriais Neste trabalho evidencia-se a importância do design neste processo imergindo a complexidade do âmbito desta área atualmente.

Abstract

This article discusses the current relationship between design, local contexts, their communities, popular creation, self-creation, craftsmanship, autochthonous products, and territorial and social valorization and sustainability. At present, factors considered as secondary, such as "esteem value, emotional, aesthetic and psychological factors, perceived quality, «terroir» concept" (as recognition of the community and of the territory where it is produced), as Dijon de Moraes (2009) contained in many of these productions are determining factors and competitive differentials for the development of new typologies of industrial products In this work the importance of design in this process is evidenced by immersing the complexity of the scope of this area at present. Palavras-chave: Design; Artefactos populares; Valorização do território; Identidades.

Key-words: Design; Popular artefacts; Valorization of the territory; Identities.

Data de submissão: Março de 2016 | Data de publicação: Setembro de 2016.

108 JACINTA HELENA ALVES LOURENÇO CASIMIRO DA COSTA - Escola Superior de Educação de Bragança do Instituto Politécnico de Bragança. Departamento de Artes Visuais. E-mail: [email protected].

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

236

1. O DESIGN – PARADIGMAS EMERGENTES

“A valorização de recursos e produtos locais é um tema muito rico e complexo, pois produtos envolvem simultaneamente dimensões físicas e cognitivas. É necessário perceber as qualidades do contexto local – o território e a maneira como cada produto é concebido e fabricado – para compreender as relações que se formam em torno da produção e do consumo dos produtos. A perspectiva do design vem justamente ajudar nessa complexa tarefa de mediar produção e consumo, tradição e inovação, qualidades locais e relações globais” (KRUCKEN, 2009, p. 17).

O grau de complexidade atingido pela nossa sociedade com os seus avanços

tecnológicos e desequilíbrios socioeconómicos e ambientais sem precedentes e os seus

modelos de consumo e produção vigentes são indicadores do nosso habitar insustentável,

inoperativo e ineficaz.

Atualmente existem casos de inovação social cujas atitudes se desvinculam desta

lógica imperativa, de descontinuidades locais (MANZINI, 2008, p. 61), desafiando os

modos tradicionais de fazer, com outros muito diferentes e intrinsecamente mais

sustentáveis, presentes em contextos de mudança rápida, com um alto índice de

conectividade e tolerância (idem, p. 74). Têm a capacidade única de aliar interesses

individuais com os sociais e ambientais e que na procura de soluções concretas

consolidam o tecido social (idem, p. 63). Estes apresentam características e modos de agir

diferentes, mas têm algo em comum, a expressão de mudanças radicais na escala local.

Sob a perspetiva de Manzini (2008, p. 13) “para promover a transição para a

sustentabilidade é preciso olhar para além das posições dominantes comportamentos e

opiniões e saber reconhecer na complexidade dos sinais que a sociedade nos envia,

aqueles que são mais promissores”, reconhecendo aqui aqueles emitidos por estas

minorias ativas que revolucionam a forma de ser e de fazer, sem a expectativa de provocar

mudanças gerais no sistema (na economia, nas instituições, nas grandes infra-estruturas),

mas que conseguem a produção de algo novo.

Observa-se atualmente a valorização regional, pelo aumento significativo de

produtos autóctones, com referencial histórico local, concretizado em forma de artefacto.

Em simultâneo verifica-se que o artesanato ressurge como meio de produção,

demonstrando que a relação local /global instituída pelo processo de globalização, ao

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

237

mesmo tempo, completa-se e contrapõe-se. Estas características renovam os mercados,

que se encontram “…massificados técnica e esteticamente, através de novas tipologias

para os produtos industriais e de igual forma novos conceitos, ritos e linguagens, sem

esquecer, por fim, novas possibilidades de uso e consumo” (DE MORAES, 2009, p. 11),

conduzindo a uma nova postura na conceção de produtos e serviços, onde o design deixa

de ter apenas a “actividade do projecto passando para uma cultura projectual, da

tecnologia para uma cultura tecnológica, e da produção para uma cultura produtiva” (DE

MORAES, 2009, p. 11). Assim, este terá que ter a capacidade de integrar redes possíveis

e de promover relações distintas entre os aspetos materiais e imateriais, o serviço, a

distribuição e a logística, a imagem e a comunicação com o mercado, permitir identificar

valores e transformá-los em atributos mensuráveis, em forma de inovações.

Sob a perspetiva da sustentabilidade, o território é estudado como uma entidade

sociogeográfica, uma vez que a esfera ambiental e social é considerada inseparável,

tornando-se um conceito necessário na proposta de soluções exequíveis e promissoras

(MANZINI & MERONI, 2009).

A valorização de recursos locais (produtos, conhecimento, pessoas) em

benefício das comunidades e economias locais actualmente é de grande interesse na

perspetiva de design, sendo nas iniciativas, capacidades, práticas e produções

reconhecido um valor não “reconstruível de outras formas” (MANZINI & MERONI,

2009, p. 14). Deve ainda estimular “novos modos de pensar o desenvolvimento, novos

comportamentos e modelos (sociais, económicos e empreendedores) (MANZINI &

MERONI, 2009, p. 15).

O design deve ter um papel nesta mediação entre “a produção e o consumo, a

tradição e a inovação, as qualidades locais e as relações globais” (KRUCKEN, 2009, p.

17), tornando-se necessário identificar e tornar reconhecíveis valores e atributos para

promover os recursos do território, valorizando o património cultural imaterial que se

relacionam com elementos simbólicos que produzem “marcas” e “identidades”, com um

elevado potencial de internacionalização, sendo esta uma questão pertinente atualmente.

O autor Victor Papanek (1995) refere que, o progresso não pode ter apenas como

base o desenvolvimento tecnológico. As tecnologias imateriais suprimem fatores

intrínsecos característicos da nossa evolução.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

238

A capacidade inventiva do homem é extraordinária, e surpreende pelo que

descobre, aperfeiçoa e cria. Hannah Arendt no seu livro “A condição humana” (1995)

reflete principalmente sobre ‘pensar o que fazemos’. E sobre esse fazer humano ela

designa com a expressão ‘vida activa’ as actividades: trabalho, obra e acção.

O trabalho humano é uma actividade sem fim, repetitivo e corresponde ao

próprio processo biológico do corpo humano, a obra ou fabricação tem um começo e um

final determinado e termina com um resultado tangível, durável: o objecto de uso. Temos

a capacidade de instrumentalizar e construir objectos, definidos pela serventia ou

utilidade no seu quotidiano, por factores culturais e sócio-económicos ou meramente por

um espírito empreendedor. Assim, nascem vários artefactos usados e reconstruídos,

relacionados com a reutilização e a improvisação, aos quais é agregada uma nova função

de uso. Estas produções, criações ou artefactos populares, que podem ser encontrados por

todo o lado, produzidos por várias pessoas e por diversas necessidades, são enunciados

como:

a) design vernacular;

b) do-it-yourseft;

c) home-made;

d) readymade;

e) design incógnito;

f) criação popular;

g) auto-criação;

h) artesanato;

i) entre outros.

Todos eles, no momento se encontram, de facto e com dados relevante sob o ponto de

vista cientifico e de dinamização local e / ou empresarial, num melhor compreender o

universo local e tradicional com na base inspiradora de produtos numa lógica de consumo,

a serem olhados e relacionados com uma perspetiva imensamente interligada e assente

em modelos de desenvolvimento e interação entre criadores e produtores, entre estruturas

de interface e os próprios consumidores num mais amplo diálogo de eventual

reciprocidade em termos de benefícios.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

239

2. REALIDADES PARALELAS - SÍNTESE COMPARATIVA Os Objects réinventés Pénélope de Bozzi e Ernesto Oroza e Droog Design:

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

240

As imagens apresentadas são uma síntese comparativa sobre duas realidades

paralelas em que os sintomas paradoxais sobre a necessidade de questionar o meio

criativamente fluem sobre a identidade e a não identidade, entre o projeto autoral e um

‘design’ anónimo como processos.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

241

Tenta-se assim um possível paralelismo entre objetos provenientes de dois

âmbitos distintos. Nesta comparação sobre meios ou campos tão reconhecidos

territorialmente, socialmente e culturalmente, desenvolvem afluências cognitivas e

percetíveis sobre a necessidade de questionar o ‘establishment’, refazendo um sistema ou

mundo paralelo.

Os objetos observados no livro de Ernesto Oroza e Pénélope de Bozzi (2002), na

sua grande maioria de design anónimo ou incógnito, ilustram o diagnóstico de emergência

da necessidade de reconversão e sobrevivência e o desafio da normalidade de viver do

povo cubano. No mesmo espaço temporal codificamos e sacralizamos os objetos do grupo

Droog Design que nos elevam na sua mensagem provocadora sobre um campo,

demasiado estereotipado em processos de redefinição e ‘reconceptualização’ sobre a ideia

do projeto de design.

Nesta avaliação conseguimos ainda identificar percursos diametralmente

inversos sobre o cenário. No primeiro caso sentimos um pulsar de um povo com escassez

de recursos, que constrói sobre as margens ou periferias colectivas, tendo as casas como

centros de auto-produção e conceção, desembaraçando-se das necessidades do dia-a-dia

de forma espontânea e casual. No segundo exemplo o grupo Droog Design tem como

base este pensar, mas rapidamente é absorvido pelos sistemas. Em Itália, na Holanda, nos

Estados Unidos, esta marca transforma-se num culto que desenvolve a sua

interpenetração sobre um mercado ou um meio, duma forma em tudo menos ‘seco’109,

isto é imiscuindo-se na centralidade.

A identidade do grupo Droog Design autoconstruiu-se com base na sua

morfologia dialética sobre a ideia de questionar e contaminar. No entanto, sobre este

enredo proxémico na dialética da imagem entre povos e culturas tão distintas convém

sentir a noção de distância e proveito. Se uns se fecham ou estão fechados, outros

dispersam e são contaminadores através dum design que numa abordagem e numa

abrangência não difere muito daquela identidade local.

Se os objetos ‘insignificantes’ feitos a partir de caixas de televisores reciclados

em Cuba (fig. c’) condicionam a invenção em predicados dos despojos das ruas e dos

mercados numa subjetividade anónima popular com a criação de centenas de objetos que

vieram atenuar as necessidades destes anos e que nasceram nos lares cubanos através da

109 Droog = “Seco” ou “árido”.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

242

transformação de materiais, usos, significados, processos produtivos e resultados

(OROZA & BOZZI, 2002, p. 9) então a correlação ‘alcançada’ entre produtos dum

mundo periférico e dum mundo desenvolvido, identifica nas memórias das gavetas

reutilizadas da estante de Tejo Remy (fig. c’’) uma profunda tensão envolvente, numa

tentativa de ordenação de ideias e critérios para um ‘novo’ projeto de design.

Dum anonimato ‘convicto’ numa sociedade onde não existem ‘self’s’, e onde o

único ‘self made man’, resulta duma imagem num discurso persistente dum ‘do-it-

yourself’, relembrando a excelente produção Morrisiana dos Arts & Crafts, a qualidade

técnico artesanal do período de Gropius, a sugestiva nuance americana na realidade de

Victor Papanek (DiY), as Global Tools precursoras dum ‘free design’ com Enzo Mari na

década de 70 e, finalmente os processos livres implícitos na revista Do create do grupo

Droog Design. A identidade deve criar-se mas com que custos?

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A reflexão apresentada permite reforçar a perspetiva de que o design deve ser

interveniente direto no delinear estratégias, aprofundando as perspetivas locais estando

apto a novas singularidades processuais, incluindo a sistematização entre os diversos

instrumentos com vista a uma organização interativa e confluente com uma dialética

sobre o meio social, cultural e económico onde este atuar.

Algumas iniciativas e movimentos populares existentes em países periféricos

têm vindo a irromper reinventando processos e conhecimentos locais para a satisfação de

necessidades, transformando-os e adaptando-os a novas necessidades, relegitimando

solidariedades e produtos tradicionais, tudo isto com o objetivo de criarem espaços de

autonomia prática ideológica onde seja possível pensar formas de transformação social

alternativas à do consumismo capitalista, assente na desigualdade, no desperdício e na

destruição do meio ambiente (SANTOS, 1994, p. 270).

Estas ações têm também como objetivos, permitir o desenvolvimento

socioeconómico de populações locais paralelamente à conservação dos valores naturais e

culturais do território.

Assim, em linha com o que refere a obra “Design e território Valorização de

identidades e produtos locais“ de Lia Krucken,

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

243

“para dinamizar os recursos do território e valorizar seu patrimônio cultural imaterial, é fundamental reconhecer e tornar reconhecíveis valores e qualidades locais. Essa é uma das principais tarefas do designer. As contribuições do design para a valorização de produtos locais podem ser agrupadas em três linhas: 1. promover a qualidade dos produtos, dos territórios, dos processos de fabricação; 2. apoiar a comunicação, aproximando consumidores e produtores e intensificando as relações territoriais; 3. apoiar o desenvolvimento de arranjos produtivos e cadeias de valor sustentáveis, visando ao fortalecimento de micro e pequenas empresas” (KRUCKEN, 2009 , p. 18).

Conclui-se, no plano educacional, que a disciplina de design deve reconhecer no

legado presente e passado, existente talvez nas coisas mais simples e humildes do nosso

dia-a-dia, o potencial para de alguma forma reclamar a identidade a valorização e

sustentabilidade do território a nível do seu desenvolvimento económico, reabilitação de

tradições e artesanato locais, conservação e preservação da identidade territorial, através

do estabelecimento de atividades associadas a segmentos especializados do design aliado

a um trabalho de cooperação entre as comunidades locais.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DE MORAES, D. (2009). O papel actual do design. In L. KRUCKEN (Org.), Design e

Território: valorização de identidades e produtos locais (pp. 9-11). São Paulo: Studio

Nobel.

HABERMAS, J. (2000). O discurso filosófico da modernidade. Lisboa: Ed. Publicações

Dom Quixote.

KRUCKEN, L. (2009). Design e Território: valorização de identidades e produtos

locais. São Paulo: Studio Nobel.

MANZINI, E. (1993). Cultura tecnológica - O electronicodoméstico. In AA.VV., Design

em aberto. Ed. Centro Português de Design. Porto: Porto Editora.

MANZINI, E. (2003). A new sense of place Space and pace of flows. USE(R) Design,

Congresso Internacional de Design USE(R), Lisboa.

MANZINI, E. (2008). Design para a inovação social e sustentabilidade. (Vol. I).

Cadernos do Grupo de Altos Estudos, Programa de Engenharia de Produção da

Coppe/UFRJ: Rio de Janeiro.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

244

MANZINI, E., & MERONI, A. (2009). Design em transformação. In L. KRUCKEN

(Org.), Design e Território: valorização de identidades e produtos locais (pp. 13-16). São

Paulo: Studio Nobel.

OROZA, E., & BOZZI, P. (2002). Objects réinventés, La création populaire à Cuba.

Paris: Ed. Editions Alternatives.

PAPANEK, V. (2003). Design for de real World: Human ecology and social change.

New York: Pantheon Books.

RAMMAKERS, R. (1998). Droog Design – A new type of consumer. In Domus 800.

Milano: Ed. Domus.

RAMMAKERS, R. (2002). Droog Design in context Less + More. Rotterdam: Ed. olo

Publishers.

SANTOS, B. S. (1994). Pela mão da Alice. Porto: Edições Afrontamento.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

245

GRETE STERN Y LA VANGUARDIA DEL ’40. ARTE Y PSICOLOGÍA DE LA

GESTALT ENTRE FRONTERAS PERMEABLES110

Grete Stern and the vanguard of 40’s. Art and Gestalt Psychology in the permeable

borders.

GRASSI, Maria Cecilia111.

Resumen

Con el propósito de indagar las relaciones entre psicología y estética en la Argentina desde una perspectiva histórico crítica, se analiza el caso de la fotógrafa Grete Stern como personaje clave de una de las vías de recepción de la psicología de la Gestalt en su intersección con los desarrollos de la Bauhaus. Se tiene en cuenta para ello dos tipos de fuentes. En primer lugar, algunos datos biográficos que la ubican como representante de la “experiencia Bauhaus” y la transmisión oral que de ella hizo. En segundo lugar, los testimonios de algunos artistas y el material bibliográfico (en especial, los Bauhausbücher) que les aportó a quienes incursionaban en los años ’40 en el arte no figurativo de tendencia concreta. A partir del análisis de uno de aquellos volúmenes, se reflejan los debates que tomaban saberes psicológicos para fundamentar postulados del arte abstracto y el papel de la ciencia del arte de finales del siglo XIX como antecedente de ambos.

Abstract

To show the relationship between psychology and aesthetic in Argentine in the ‘40s, we analyze the case of Grete Stern, the German photographer. From an historical-critic framework, we research about the reception of Getsalt Theory in Argentine by the presence of this woman (who was student at Bauhaus in Dessau) and the contacts with the abstract artists’ young generation members of groups like Asociación Arte Concreto Invención and MaDí. We focus on the role played by the account of Stern about Bauhahus experience and the Bauhausbücher (books published by this school that disseminate the theoretical discussions). Finally, we conclude that both of psychological ideas of Gestalt and of Science of Art were on the basis of theory and practice of Argentine abstract art. Before they arrive to this country, these ideas were present in the discussions of European artists of vanguard.

Palabras clave: Grete Stern-Gestalt-Arte abstracto-Bauhaus-Argentina.

Key words: Grete Stern-Gestalt-Abstract art-Bauhaus-Argentine.

Data de submissão: Junho de 2016 | Data de publicação: Dezembro de 2016.

110 Una versión previa y más acotada de este artículo fue presentada en el XVI Encuentro Argentino de Historia de la Psiquiatría, la Psicología y el Psicoanálisis realizado en Mar del Plata los días 1, 2 y 3 de octubre de 2015. 111 MARIA CECILIA GRASSI - Becaria de la UNLP. Investigadora Tesista en el Proyecto de Investigación SeCyT-UNLP (Universidad Nacional de La Plata). ARGENTINA. E-mail: [email protected].

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

246

La psicología de la Gestalt y el arte: contactos en la Bauhaus.

Si revisamos la historia de la psicología, nos encontramos con que, además de

saberes específicos sobre sus variados objetos de estudio, ha mantenido numerosas

relaciones con otros campos de conocimiento y que ha generado modificaciones en la

manera de llevar a cabo diversas actividades humanas. Dentro de la pluralidad de

tradiciones de práctica e investigación que existen en esta ciencia (en la actualidad y en

el pasado), la teoría de la Gestalt surgida en Alemania a principios del siglo XX, no solo

ha sido influenciada por y ha tomado conceptos de otras ciencias (como por ejemplo la

física), sino que también se ha servido de los desarrollos del arte y simultáneamente, ha

brindado saberes que ese campo utilizó para plasmar y fundamentar sus propuestas

estéticas.

Atentos a esto último, en este artículo se exploran las relaciones entre la psicología

y el arte desde una perspectiva histórica a partir de la presencia en la Argentina de Grete

Stern y de los Bauhausbücher (Libros de la Bauhaus). Esto supone analizar el papel

jugado por las relaciones interpersonales por un lado, y los modos de circulación y

apropiación creativa de un recurso material como la publicación mencionada, por el otro.

El propósito más general de poner en diálogo la historia del arte con la historia de

la psicología previa a su profesionalización en nuestro país alrededor de los años ’50

aproximadamente, obedece en realidad a un objetivo más específico que se detalla a

continuación. Puntualmente se pretende retratar a nivel local, cómo el arte abstracto se

sirvió entre otros aportes, de los desarrollos de la psicología de la Gestalt sobre la forma

y el color para fundamentar su poética. La adopción de la categoría “arte abstracto” se

toma de los desarrollos de María Amalia García (2011) quien utiliza este concepto para

agrupar la serie de propuestas no figurativas surgidas durante las décadas del ’40 y del

’50. Para ello se señalan a modo de antecedente de estos vínculos, algunos de los

contactos personales entre miembros de la escuela Bauhaus (1919-1933) y de la

psicología de la Gestalt para mostrar cómo circulaban las ideas de estos teóricos en

aquella institución. Esta circulación previa, tanto de bibliografía como de científicos que

brindaron conferencias, se reflejaría a posteriori en el bagaje conceptual de aquellos que

se formaron en esa institución y en las publicaciones de la misma que conocieron algunos

artistas argentinos en los años ’40 a través del contacto con Grete Stern y los encuentros

culturales celebrados en la residencia de Ramos Mejía.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

247

No obstante y como se muestra más adelante, es menester situar estos cruces en

un marco más amplio en el que puede pensarse que determinadas influencias comunes

previas conformaban un suelo común y fértil que nutrió tanto a las ideas de esta institución

vanguardista (la Bauhaus) como a las de la tradición psicológica alemana (la psicología

de la Gestalt) de principios de siglo XX. Una vista panorámica a los comienzos de este

siglo en Alemania, revela en el ámbito científico-cultural la necesidad fuerte, casi urgente,

de un nuevo vínculo entre la ciencia y la vida práctica. Frente a ella, la teoría de la Gestalt

puede interpretarse como un intento de respuesta a aquel planteo dirigido hacia las

ciencias (ASH, 1998). Este mismo intento de reconciliación, puede considerarse también

entre el arte y la vida práctica al tomar como ejemplo la Bauhaus. Esta institución

emblemática de arte y arquitectura, puede considerarse como un intento de la misma

índole pero para recomponer las relaciones entre el arte y la vida práctica. En definitiva,

ambas propuestas pretendían funcionar como vías de reconciliación entre el hombre y su

entorno más allá de la actividad específica (científica o artística) que la viabilizara

(GRASSI, 2016).

Ahora bien, si se apunta a dar cuenta de un caso particular como el de la Argentina,

deben considerarse cuáles podrían ser los elementos pertinentes para reconstruir las vías

de ingreso y circulación de todos aquellos debates de cuño europeo. Una recorrida por

algunos hechos de la biografía de la fotógrafa alemana Grete Stern y por los temas

abordados por los Bauhausbücher (libros de la Bauhaus cuyo objetivo primordial era

difundir la propuesta pedagógica de la institución) que formaban parte de su biblioteca,

conforman el material seleccionado para dar respuesta al interrogante planteado.

Gestalt y arte: una cuestión de figura- fondo

En el campo de la historia de la psicología Grete Stern ya ha sido tema de varias

investigaciones, pero siempre vinculada a la historia del psicoanálisis debido a los

conocidos fotomontajes que la artista compuso para la revista femenina Idilio en la

sección El psicoanálisis la ayudará, desde el año 1948112.

112 Para ampliar este tópico véase, Hugo Vezzetti “El psicoanálisis y los sueños en Idilio” en Luis Priamo (coord.) Sueños. Fotomontajes de Grete Stern. Serie completa. Edición de la obra impresa en la revista Idilio (1948-1951), Buenos Aires, Fundación C.E.P.P.A., 2003, 149-159 y M. Victoria Sánchez, “Sueños de mujeres. La Revista Idilio y la transformación de la familia en los años 40-50”, 2004, en www.elseminario.com.ar, acceso 1 de mayo de 2014.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

248

A su vez, en el campo de la historia del arte, existen trabajos más o menos

recientes que se han enfocado en Stern y su desarrollo profesional en la Argentina. Nos

referimos en primer lugar al trabajo de Bertúa (2012)113 que emprende el análisis de

aquella sección en tanto elemento híbrido y complejo que combina diferentes estéticas y

discursos. Es decir que combinaba saberes específicos en el marco de la difusión masiva

y lograba a partir del trabajo conjunto de Butelman, Germani y Stern, traducciones

particulares que tenían como destinatarios al público lego. La autora plantea que entre las

diversas filiaciones estéticas de Stern figuran la Bauhaus y la Nueva Objetividad como

las más comunes o, mejor dicho, las que son recuperadas habitualmente por la

historiografía tradicional. Sin embargo, la presencia del surrealismo es considerable y

Bertúa lo argumenta sólidamente en el texto, además de señalar el lugar del fotomontaje

como productor de significaciones (y no como simple ilustración que acompaña) junto al

texto en el que se interpretaban los sueños de las lectoras.

El segundo trabajo es el de Verónica Tell114 (2005) quien analiza el lugar de la

fotografía en la revista Ver y Estimar (aparecida por primera vez en abril de 1948) y las

valoraciones que Jorge Romero Brest realizó en momentos diferentes acerca de la

fotografía y su pertenencia o no al campo del arte (desde una reseña aparecida sobre en

el año 1935 en la revista Sur hasta un texto sobre las fotografías de Kuropatwa en 1984).

Este trabajo muestra la variación en las opiniones a lo largo del tiempo de Romero Brest,

pero no con el fin de subrayar contradicciones sino de revelar el entramado de

valoraciones que dieron lugar a cada una de ellas. Como se mencionó arriba, uno de esos

momentos de producción de Romero Brest que la autora considera es el artículo publicado

en la revista Sur sobre la muestra de fotografía de Stern y Coppola que se exhibió en los

salones de Sur y sobre el que volveremos más adelante.

Además de los aportes señalados en esos trabajos a propósito del psicoanálisis y

la historia de la fotografía, aquí sostenemos, como lo hacen los trabajos clásicos, que

Stern también ha sido relevante en la transmisión de las ideas de la Bauhaus sobre la

abstracción y la composición experimental vinculada al privilegio de la forma en la

Argentina. Pero lo novedoso de nuestra hipótesis radica en mostrar cómo en el “ideario

113 Paula Bertúa, La cámara en el umbral de lo sensible. Grete Stern y la Revista Idilio (1948-1951). Buenos Aires, Biblos, 2012. 114 Verónica Tell, Entre el arte y la reproducción: el lugar de la fotografía. En Andrea Giunta y Laura Malosetti Costa (comp.), Arte de posguerra. Jorge Romero Brest y la revista Ver y Estimar (pp.243-262). Buenos Aires, Paidós, 2005.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

249

Bauhaus”, la psicología de la Gestalt aportó fundamentos teóricos sobre la percepción y

sus leyes en la experimentación e investigación artísticas. Y a partir de ello, señalar que

la pregnancia de esa misma tradición psicológica estuvo presente en los movimientos

concretos argentinos.

Esta transmisión de las ideas de la Bauhaus habría sido posible gracias al contacto

que tuvo durante los años ’40 con algunos artistas de los grupos Arte Concreto Invención

y MaDí (Materialismo Dialéctico).

Respecto de este punto, los testimonios de los artistas son disímiles en cuanto a lo

que consideran relevante de los encuentros mantenidos con la fotógrafa alemana en la

residencia de Ramos Mejía. Esa casa diseñada por el arquitecto Vladimiro Acosta,

funcionó como centro de reuniones. En una entrevista realizada por Di Pietrantonio en

1989, Tomás Maldonado recupera el recuerdo de del rol jugado por los inmigrantes que

huían del nazismo y que llegaron a Buenos Aires, que traían las obras de los artistas de

vanguardia europeos y rusos. Maldonado dice respecto del papel de la emigración

intelectual en la cultura argentina:

“De sus deterioradas valijas de cartón de hombres en fuga, salían milagrosamente documentos que nos fascinaban y de los cuales estábamos en condiciones de obtener informaciones preciosas sobre mutaciones radicales que se habían producido en Europa entre las dos guerras y aún antes” (MALDONADO, 1997, p. 121).

Así, la coyuntura histórico política europea de las décadas de 1930 y 1940 (el

fascismo, las persecuciones y la guerra) inciden en el campo cultural argentino por el

contacto que tienen artistas emigrados como Grete Stern, Luis Seoane y Horacio Coppola

con jóvenes artistas como Maldonado, Prati o Kosice entre otros. Se destacan de estos

contactos la difusión de las experiencias de la Bauhaus, el constructivismo y materiales

bibliográficos hasta ese momento inéditos a nivel local (LUCENA, 2015).

En contraposición a esto, en una entrevista del año 2006, la artista plástica Lidy

Prati sostiene que la relación con Stern no fue cercana por la distancia generacional

existente y que “habló de la Bauhaus cuando todavía no había terminado la guerra y acá

no sabíamos nada de nada” (BERTONE, 2014, p. 73). Sin embargo, unas líneas después

reconoce que no sólo por Grete Stern accedieron a lo que se hacía en Europa sino que

Torres García fue una figura determinante también. Este testimonio confuso, si bien se

contradice, da cuenta del contacto y del conocimiento del escenario artístico europeo al

margen de quiénes hayan jugado el rol de portavoces.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

250

Junto con los intercambios orales que existieron, es preciso resaltar la presencia de

una dimensión material que tuvieron esos encuentros. En particular nos referimos a las

ediciones Bauhausbücher, e interesa destacarlas porque han sido una vía de difusión de las

ideas de la vanguardia alemana de principios de siglo XX que tanto artistas de Arte Concreto

Invención como Maldonado o Prati, y de MaDí , como Kosice tuvieron conocimiento directo.

Más allá de las particularidades y el carácter lacunar de cualquier relato testimonial,

estos artistas refieren en su mayoría que Stern generosamente les permitió acceder a su

biblioteca y conocer los Bauhausbücher. En ellos se plasmaban los desarrollos científicos y

teóricos de los maestros de los talleres de la escuela con la pretensión de divulgarlos en

Europa central y en el exterior en general.

Desde 1925 y bajo la dirección de Gropuis y Moholy-Nagy fueron publicados en

Dessau un total catorce libros teóricos que formaba parte de un proyecto más ambicioso que

suponía una colección de cincuenta. Lazlo Moholy-Nagy fue el encargado de los diseños

junto a su mujer, Lucía Moholy quien colaboró en las tareas editoriales. Entre los autores

destacados en los volúmenes se encuentran Klee (1925), Mondrian (1925), van Doesburg

(1925), Kandinsky (1926) y el mismo Moholy-Nagy (1927). Todos estos artistas integraron

a sus prácticas docente y artística, los desarrollos de la psicología de la Gestalt, aunque el

reconocimiento que cada uno de ellos hizo de esa incorporación fue parcial y variable en el

tiempo. El trabajo con los aspectos formales y el papel del equilibrio y la armonía en las

composiciones puede relacionarse con las conocidas ideas de regularidad, unidad y

simplicidad de Wertheimer115.

Otro hito que da cuenta de las relaciones de los artistas con Stern, fue la muestra

organizada después de la realizada en casa de Pichón-Rivière en 1945 con el nombre francés

de Art Concret Invention. Esta tuvo lugar en la residencia de Grete Stern y Horacio Coppola,

que era su marido en aquel momento. Con el nombre de Movimiento Arte Concreto Invención,

Elizabeth Steiner, Rasas Pet, Arden Quin, Rhod Rothfuss y Klaus Erhardt en pintura y Kosice

y Rothfuss en escultura y otros que aparecían en danza, literatura, música, arquitectura y

urbanismo, expusieron sus propuestas. En esos años, la casa de Ramos Mejía se

caracterizaría, según Moreno (apud ASTUTTI, 2009, pp. 9-10), por ser el sitio de esta y otras

tantas actividades culturales incipientes a nivel local:

115 María Cecilia Grassi, “La Psicología de la Gestalt y la Bauhaus: una historia de intercambios e intersecciones (1919-1933)” Eä. Revista de Humanidades Médicas & Estudios Sociales de la Ciencia y la Tecnología. Instituto de Estudios en Salud, Sociedad, Ciencia y Tecnología (ISO-CYTE). Vol 5 N 2. Buenos Aires. ISSN 1852-4680.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

251

“En Ramos Mejía, localidad de las afueras de Buenos Aires Grete ejerció simultáneamente dos de las estrategias que las artistas modernistas realizaban para integrarse en el campo cultural mientras lo intervenían con su singularidad: al tomar retratos, concentraba el interés de la elite en su condición de documentalista y personaje de momentos fecundos del arte, la literatura y la ciencia de la década del cuarenta mientras que, al poner su casa-taller como espacio de reunión, le peleaba al bar el lugar de la creación en diálogo múltiple”116.

Un detalle que muestra la variedad y la interconexión de los circuitos culturales

es que esa residencia fue diseñada por Vladimiro Acosta (también exiliado, pero de origen

ruso), que fue esposo de Telma Reca, figura ligada a los inicios del psicoanálisis en la

Argentina. A su vez Stern retrató a Reca en alguna ocasión. Por otro lado, sus vínculos

con la arquitectura también se reflejan en las tomas realizadas a la obra en Mar del Plata

conocida como Casa del arroyo, diseñada por Amancio Williams, otro arquitecto del

circuito de esos años, que se publicaron en la revista Nuestra Arquitectura. Es así que por

un lado, tenemos los hitos que dan cuenta de los vínculos de los artistas con la fotógrafa

y que la colocan en su rol de portavoz, así como se destacó el hecho de haber compartido,

entre otros documentos aún inéditos en el país, el material bibliográfico publicado por la

Bauhaus. Pero por el otro, queda aún pendiente la respuesta a porqué la Gestalt puede

considerarse como uno de los discursos que contribuyeron a la fundamentación teórica

de la vanguardia alemana de principios del siglo XX.

En una investigación previa (véase Grassi, 2014) sobre las relaciones entre la

psicología de la Gestalt y la Bauhaus se destacaron los contactos interpersonales y la

circulación bibliográfica de teoría de la Gestalt en la escuela. Sintéticamente, pueden

señalarse una serie de eventos claves como para dar cuenta de ello.

En primer lugar (aunque no necesariamente indique una cronología), una serie de

pinturas de Klee de la década del ’30 sirven como ejemplo para mostrar estas relaciones

entre la Getsalt y el arte. Blaue Nacht (Fig. 1), una pintura de 1937, refleja la pregnancia

de la teoría. En ella, Klee utilizó las ilustraciones que Wertheimer mostraba en su texto

Untersuchungen zur Lehre von der Gestalt (1923) sobre las leyes de la organización

perceptual (Fig. 2).

116 Moreno citada en Adriana Astutti, “Grete Stern: mujeres soñadas”, Badebec Revista del Centro de Estudios de Teoría y Crítica Literaria, 1(2), 1-24. En www.badebec.org. Acceso el 4 de abril de 2015. 116 Sobre este tópico véase el trabajo de Marianne Teuber Paul Klee: Paintings and Watercolors from the Bauhaus Years, 1921-1931: Exhibition Catalogue, Des Moines Art Center, Iowa y el intercambio entre Boudewijnse, Behrens, Danilowitz, Huff, Spillmann, Stember & Wertheimer que recopila la revista Gestalt Theory en 2012 denominado “Dicussion. Gestalt Theory and Bauhaus”. En Gestalt Theory, Vol. 34, Nro 1, 81-98.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

252

Fig. 1 - Blaue Nacht Fig. 2 - Wertheimer

Puede considerarse también la acuarela titulada Cuento de hadas del enano (1925)

(Fig. 3) en el que según en donde haga foco

el espectador (relación figura-fondo), se

observa la transformación de un gnomo en

uno de tamaño mayor y da lugar a la

reversibilidad de las figuras a pesar de ser

la misma constelación de estímulos. O sea

que se detectan dos tipos de uso, uno

directo que toma una ilustración y la

incorpora a la composición; y otro, que

experimenta sobre la alternancia de la

figura y el fondo, tema central de las

formulaciones de la Gestalt, que parte de la

imposibilidad de percibir algo sin que

simultáneamente se recorte sobre un fondo.

Otro evento destacable es la visita del psicólogo Rudolf Arnheim en 1927 a la

Bauhaus de Dessau y la publicación de una reseña en el periódico Die Weltbühne (el 31

de mayo del mismo año) donde describía el placer estético al percibir el diseño integrado

del mobiliario y del edificio, ambos regidos por el privilegio de la forma y la función. Si

bien esa visita no fue por motivos académicos, posteriormente Arnheim se dedicará a las

relaciones de la psicología con la estética y llegará a ser un referente en el tema a partir

de las investigaciones llevadas a cabo en Estados Unidos.

Fig. 3 - Cuento de hadas del enano

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

253

Por último, pueden mencionarse las conferencias de Karlfried Graf von

Dürckheim (proveniente de Leipzig) sobre contraste simultáneo y las relaciones figura-

fondo en 1930. Sobre la existencia de una conferencia dada por el psicólogo Karl Duncker

en reemplazo de Wolfgang Köhler existen discusiones sobre si efectivamente se dictó117.

Köhler, quien no habría podido asistir, habría enviado en su lugar uno de sus discípulos,

Duncker. Pero hay quienes sostienen que en realidad se trataba del padre del psicólogo

Karl Duncker, el Dr. Hermann Duncker quien, como muestran fuentes documentales,

disertó en la Bauhaus sobre teoría marxista.

En lo que refiere a la circulación de la teoría, sus senderos son más difíciles de

circunscribirse; pero puede advertirse la contribución de la Gestalt en el diseño de

actividades de construcción de móviles funcionales que Lazlo Moholgy-Nagy daba como

experimento a sus alumnos y que habían sido desarrollados por K. Duncker

anteriormente. También Kandinsky hablaba en sus clases de las leyes de la percepción,

pero argumentaba que sus descubrimientos eran anteriores a los de la escuela berlinesa.

Esta disputa sobre la autoridad intelectual de las ideas sobre los principios universales

que regulaban la percepción, era común entre otros docentes como Josef Albers o Paul

Klee (GRASSI, 2014).

De todas formas, podemos aventurarnos y suponer que más que contactos

(personales o teóricos) puntuales y concretos que justifiquen el postulado de la existencia

de relaciones entre la Gestalt y el arte, existiría previamente un policentrismo epistémico

en la construcción del conocimiento sobre la cuestión de la percepción humana, que hace

las veces de suelo común de los mismos. Es decir, un clima cultural más amplio que da

lugar al desarrollo de conocimientos que circulan, se fusionan e incluso coinciden al

momento de su formulación, aun ignorándose entre sí.

En síntesis, aquí entendemos por policentrismo epistémico (en tanto paráfrasis del

concepto de historia policéntrica del historiador de la psicología Kurt Danziger) a la

circulación y la producción de saberes, en este caso psicológicos, que se gestan en campos

ajenos al específico y aportan conocimiento más allá de los cánones de producción y de

difusión científicos habituales o estándares. O sea que hay aportes de otras zonas del

conocimiento al dominio de la psicología, y además aportes de la psicología que

enriquecen y modifican prácticas o saberes más allá de su área particular de interés.

117 Sobre este tópico véase el trabajo de Marianne Teuber Paul Klee: Paintings and Watercolors from the Bauhaus Years, 1921-1931: Exhibition Catalogue, Des Moines Art Center, Iowa y el intercambio entre Boudewijnse, Behrens, Danilowitz, Huff, Spillmann, Stember & Wertheimer que recopila la revista Gestalt Theory en 2012 denominado “Dicussion. Gestalt Theory and Bauhaus”. En Gestalt Theory, Vol. 34, Nro 1, 81-98.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

254

Si se prosigue en esta línea, investigaciones que muestran las raíces comunes de

ciertos desarrollos de la ciencia y del arte cobran sentido. Sobre este asunto C. van

Campen (1997), sostiene que hay similitudes pictóricas entre las pinturas abstractas y las

ilustraciones de los psicólogos experimentales de principios del siglo XX porque tienen

una tradición histórica común que comenzó con la ciencia del arte o Kunstwissenchaft de

finales del siglo XIX (CAMPEN, 1997, pp 133-136). Podemos decir que dentro de esta

ciencia, la corriente formalista parte de los elementos objetivos de la obra artística y por

eso su interés principal reside en los tipos y las formas universales que pueden

identificarse como los componentes de la misma.

Este argumento esbozado por el autor mencionado se basa en los aportes que los

desarrollos de Konrad Fiedler, Alois Riegl y Heinrich Wölfflin significaron para la teoría

de la Gestalt a partir de reconducir las experiencias de esta última hacia los desarrollos

de la ciencia del arte. Según van Campen, Wertheimer, Köhler y Koffka, estaban

familiarizados con las teorías de la ciencia del arte, que habían sido introducidas en la

psicología experimental por K. Bühler y Hans Corneluis. Lo que ocurrió en el terreno de

la psicología, fue que la Gestalt viró sus estudios de la percepción desde un enfoque

introspectivo y del estudio de la sensación, hacia un análisis formal que partía de los

patrones pictóricos abstractos. La razón de esa nueva orientación habría radicado en

revelar los principios básicos de la experiencia visual o de lo que Fiedler denominaba

“visibilidad pura”.

Por lo tanto, estos desarrollos, aunque no fueron los únicos, brindaron un marco

común y generador, tanto para los teóricos de la Gestalt como para los artistas abstractos

de principios de siglo XX.

Ahora bien, las llamativas similitudes pictóricas entre las dos disciplinas pueden

ser ponderadas como productos que encajan bien con el enfoque de la percepción de las

imágenes propio de las teorías formalistas de la ciencia del arte de la que mencionamos

antes algunos autores fundamentales (Riegl, Fiedler, etc.). Bastan como ejemplos los

paralelismos existentes entre las lecciones de Klee en la Bauhaus y los estudios de

Wertheimer, la experimentación de De Stijl y los desarrollos de Edgar Rubin y los análisis

visuales de Kandinsky y los de Theodor Lipps. Nos detendremos en el caso de De Stijl y

los desarrollos de Rubin (psicólogo danés) ya que este en 1915, formalizó algunas ideas

en torno a la cuestión de la figura y el fondo que fueron tomadas por Koffka y por van

Doesburg como se mostrará más adelante.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

255

Según el historiador de arte Riegl, esta formalización fue hecha a partir de la

observación de los patrones o motivos de los tapices y las concepciones sobre el cambio

ornamental de tendencia abstracta que favorecía la intercambiabilidad entre las figuras y

el fondo. Según Rubin, las leyes perceptuales que operan serían las siguientes: cuanto

más abstracta es la complementariedad entre

figuras, más intercambiables se vuelven en su

posición de figura o fondo; el borde entre dos

figuras complementarias es normalmente visto

como el contorno de la figura (no como el

contorno del fondo); a su vez, la figura y el fondo

son percibidas como Gestalten (totalidades). Por

último, la figura percibida parece estar delante del

fondo y por ende, genera sensación de

profundidad entre la figura y el fondo (Fig. 4).

Esta relación figura-fondo también era tematizada en 1917 por Mondrian, van

Doesburg y Vilmos Huszár quienes discutían en la revista De Stijl (Vol.1 Nro. 3) sobre

la relación figura-fondo a partir de planos superpuestos y la percepción tridimensional en

la obra Hamer en zaag de Vilmos Huszár (Fig. 5).

En el artículo van

Doesburg destacaba el

carácter problemático de

este efecto dado que la

aspiración de estos artistas

consistía en obtener

composiciones planas que

se lograban a partir de la

implementación de matrices

o grillas que reticulaban el

plano pictórico, sin que el

espectador pudiera recortar

una figura sobre un fondo118.

118 Theo van Doesburg, “Hamer enn zaag. Stillevenkomposite door V. Huszar (Bij Bijlage VII)”, De Stijl. Vol 1. Nro. 3. 35-36, 1917.

Fig. 4 - Copa de Rubin-1915.

Fig. 5 – Huszar-Hamer en zaag

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

256

En la interacción de las barras amarillas y naranjas que aparecen en el cuadro, el

pintor plantea el martilleo como el movimiento vertical, y el movimiento de la sierra con

las barras horizontales. La simultaneidad de estos dos movimientos forma el motivo

visual en el que se basa toda la composición. Sin embargo, surge el indeseado efecto

figura-fondo en el que sucesivamente colores planos y espacio se alternan. Este fenómeno

de cambio en la organización perceptiva es explicado por la Gestalt a partir de una de sus

leyes más conocidas que mencionamos antes.

El principal interés de destacar este debate reside en que el número seis de los

Bauhausbücher publicó Los principios del Arte Neoplástico de van Doesburg, texto en

donde describió el proceso de abstracción llevado a cabo sobre una fotografía de una vaca

en el que se evidencia el trabajo sobre los aspectos formales de la figura.

El resultado final de ese proceso es el cuadro de Theo van Doesburg titulado

Composición (La Vaca) (Fig. 6), del año 1917 y allí se ve el trabajo sobre los aspectos

fundamentales del objeto a partir del lenguaje típico de colores planos y la depuración de

la forma del neoplasticismo, para plasmar lo universal por encima de cualquier

característica individual. Estos desarrollos, sin duda están en consonancia con los debates

en torno a la abstracción, la figura y el fondo que aparecen publicados en la revista De

Stijl que se mencionaron anteriormente.

Fig. 6 – Van Doesburg-La Vaca.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

257

A raíz del panorama descripto sobre los temas que trataban estas publicaciones,

puede afirmarse que este y los demás números de los Bauhausbücher funcionaron como

soporte material de la articulación de saberes psicológicos (entre otros) y estéticos, y

como medio de difusión de los mismos. Inclusive este cruce entre disciplinas se dio antes

de las formulaciones de la Gestalt tal como lo muestra van Campen. Las leyes de la

percepción no solo en la versión de la escuela berlinesa, sino en sus versiones previas

también, eran conocimientos difundidos en las artes e incluso habían encontrado su

inspiración en ellas mismas.

Ser portavoz de una experiencia: Stern, la Bauhaus y los jóvenes de la

vanguardia del ‘40

En lo que respecta al ámbito porteño y al acercamiento a lo que sucedía en Europa,

Grete Stern fue quien a partir de abrir las puertas de su casa y su biblioteca, ofreció la vía

de contacto con las publicaciones de la Bauhaus a los jóvenes artistas concretos y del

grupo MaDí. Tal vez valga la pena detenerse en algunos datos biográficos que brinden

las coordenadas para situarla como representante de la vanguardia y como transmisora de

la “experiencia Bauhaus”, a partir de su pasaje como alumna y de los libros Bauhaus que

poseía.

Stern nació en 1904 en Wuppertal-Elberfeld, Renania (Noroeste de Alemania);

después de estudiar piano, incursionó en la tipografía y el dibujo en Stuttgart, y años

después (en 1927), viajó a Berlín y allí comenzó a formarse en fotografía con Walter

Peterhans.

Cuando en 1929 Peterhans fue invitado a dar clases en Dessau, Stern creó junto a

Ellen Auerbach, el estudio fotográfico ringl+pit. Tiempo después, en 1932, se inscribió

en los cursos de fotografía que dictaba su maestro en la escuela y conoció a Horacio

Coppola, que sería luego su esposo. Después de una estadía en Londres, viajó junto a él

a Buenos Aires y crearon un estudio de publicidad y diseño en 1938 junto al abogado

gallego devenido artista, Luis Seoane. Seoane a su vez, perteneció al grupo en el que

estaba Clément Moreau, de quien hablaremos posteriormente, cuando abordemos el

idioma utilizado en los intercambios entre los artistas argentinos y Stern.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

258

Una vez instalada la pareja y ya relacionados con el círculo porteño, fueron

invitados por Silvina Ocampo para realizar una muestra en la Editorial Sur. Como

mencionáramos antes, en octubre de 1935, Jorge Romero Brest publicó en la revista

homónima, una reseña de lo que se consideraría más tarde, la primera muestra de arte

fotográfico en la Argentina. Es interesante cómo en ese texto se explica el realismo de las

fotografías de Coppola y Stern en términos de conocer los objetos a través de “la

investigación fenomenológica de sus esencias” (BREST, 1935, p. 93.) y simultáneamente

una ordenación jerarquizada de las mismas que se ve retratada en la fotografía final. En

lo que refiere a Stern, su fotografía asimilaba los aportes de la Nueva Objetividad que le

habían sido transmitidos por Peterhans. A su vez, la Nueva visión y surrealismo también

estaban asimilados a la práctica de esta artista (BERTÚA, 2012).

Ahora bien, todas estas teorías que Stern amalgamó en su práctica de manera

personal y creativa, pertenecen al campo del arte. Sin embargo, la investigación

fenomenológica y el análisis formal de los objetos que Romero Brest destacaba, también

figuraba entre los objetos de interés de la psicología de la forma. Estas ideas mencionadas

pueden relacionarse con la concepción particular que la teoría de la Gestalt sostiene sobre

la experiencia fenomenológica de un sujeto cuando contempla una obra de arte. En primer

lugar, debemos tener presente la manera en la que esta teoría conceptualizaba a la forma

u otras cualidades como el color, como propiedades de un todo organizado. Estos todos

organizados poseen cualidades que son propiedades de regiones determinadas que son

realidades dinámicas autodistribuidas. En ellos, podemos aislar gestalten como la

tridimensionalidad, las formas, los agrupamientos, lo redondo, lo delgado, etc.. Estas

gestalten no son sensaciones que suceden en la esfera interna de la conciencia (sino el

campo perceptivo); ellas poseen formas específicas de funcionamiento y conjuntamente

existe un tipo de cualidades que sobresalen y perduran en la memoria incluso después de

la desaparición de las otras (por ejemplo, la dulzura de una rostro, la tristeza de una

melodía). Estas cualidades llamadas terciarias poseen una naturaleza y condiciones

específicas que han sido investigadas por la teoría de la forma cuyos resultados se

traducen en una contribución fundamental al campo de la estética y a la fundamentación

de la existencia de obras de arte universales.

Cuando en una obra de arte logran combinarse gestalten y cualidades terciarias

de determinada manera, lo que da por resultado es una presentación que las amalgama en

una imagen convencional y que logra ser más efectiva que cualquier representación

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

259

simbólica. Esta presentación explica el carácter universal de una obra de arte, perdurable

más allá del tiempo y de las geografías (PRATT, 1972, pp. 23-53). Esta afinidad en los

planteos recientemente señalada puede considerarse como un elemento más que abona la

hipótesis planteada sobre la incorporación y la traducción en prácticas artísticas de ciertos

desarrollos de la Gestalt transmitidos en la Bauhaus principalmente reunidos alrededor

de las condiciones de funcionamiento y exaltación de los aspectos formales de la obra de

arte. Si se observan la postal diseñada por Bayer a raíz de una muestra de 1923 en la

Bauhaus y el fotocollage compuesto por Stern en 1926 titulado MER Fahrplan (Figs. 7 y

8), el espectador puede percatarse de ciertas afinidades relativas a las características

formales de la composición, fundamentalmente en la resolución del logo en blanco y

negro y los juegos de figura-fondo que surgen de la misma.

Fig. 7 – Bayer-Logo-1923.

Fig. 8 – Stern-Fahrplan

No obstante y para retomar el caso puntual de Stern, es imprescindible remarcar

que aquí no se pretende analizar pormenorizadamente el impacto que puede haber tenido

en la producción artística su pasaje por la Bauhaus, sino simplemente sostener que fue un

testimonio en primera persona de una experiencia que en ese entonces los jóvenes

concretos argentinos solo conocían por unos pocos textos o relatos de segunda mano.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

260

De todas formas, respecto al papel jugado por ciertas enseñanzas y experiencias,

interesa situar que su contacto con Walter Peterhans (profesor del taller de fotografía

desde 1929 hasta 1933) es anterior a su asistencia a la Bauhaus. Hermenegildo Sabat

afirmaba en 1981: “Grete Stern sacaba fotos en lo que se daría en denominar el estilo

Bauhaus antes que el Bauhaus incluyera la foto entre sus labores de taller… hay que

ecualizar la Bauhaus con Grete y no a la inversa” (SABAT apud GULLCO, 1982, p. 1).

Queda claro que la forma de concebir la fotografía y la relevancia de la composición

previa para la captación del o los objetos, eran ideas que Peterhans había transmitido a

Stern en 1927 cuando tomaba clases en el taller de Berlín.

Al mismo tiempo, además de sus vivencias, el hecho de permitir el acceso a su

biblioteca a figuras como Kosice, Prati, Maldonado y otros artistas, hizo que Grete Stern

propiciara en alguna forma, el encuentro con textos hasta ese momento desconocidos.

En este punto, es pertinente detenerse un momento y esbozar algunas hipótesis en

torno al idioma en el que se establecieron ese encuentro y los intercambios orales que

estas personas mantuvieron, que a su vez abonan la idea de circulación y socialización de

las experiencias entre europeos y porteños. Como se señaló antes, el círculo artístico-

intelectual que se nucleaba en la casa de Ramos Mejía, estaba formado por personajes

muy variados cuyos orígenes y por ende sus lenguas, también lo eran. Específicamente

en lo que hace al intercambio oral, puede pensarse en la existencia de algunos

interlocutores que oficiaran de intérpretes.

Uno de esos intérpretes podría haber sido el grabador y artista gráfico Carl Josef

Meffert (cuyo seudónimo fue desde 1932 en Suiza, Clément Moreau), que vivió en

nuestro país desde 1935 hasta 1961. Este ilustrador antifascista se relacionó rápidamente

con los intelectuales y con la vanguardia artística porteños, y trabajó por ejemplo, para

el Argentinisches Tageblatt (periódico creado en 1899 por Johann Allemann) que a partir

de la década del ’30 nucleaba a exiliados y germanoparlantes antifascistas) y para

Argentina Libre (revista político cultural, de cuño antifascista, creada en 1940 y dirigida

por Octavio González Roura). Luis Seoane (socio de Copploa y Stern) y Moreau entre

otros, además de conocerse, formaban parte de un grupo de ilustradores en publicaciones

de la época que mostraban cierto aire de familia en sus producciones y participaban con

frecuencia de los encuentros celebrados119.

119 Sobre la vida de Carl Meffert pueden consultarse entre otras fuentes a Rodrigo Gutiérrez Viñuales, “Seoane en el centro. Algunos itinerarios por el arte en Buenos Aires (1936-1963)” en Rodrigo Gutiérrez Viñuales y Miguel Anxo Seixas Seoane, Buenos Aires. Escenarios de Luis Seoane, La Coruña, Fundación Luis Seoane, 2007, pp. 59-153; y Jessica Zeller, “Un ilustrador humanista y transcultural: el caso de Clément Moreau”.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

261

Además de la lengua utilizada en los intercambios y los posibles traductores, la

realidad es que la bibliografía de la que hemos hablado está en alemán. En contraposición

a los relatos de Prati, también existe el testimonio de la esposa de Kosice sobre la cercanía

del vínculo con Stern. Diyi Laañ, relató en una entrevista realizada por Bertone (2014)

que los materiales de la Bauhaus fueron enviados por el artista para su traducción

(BERTONE, 2014, p. 57).

Dentro del espectro local, estos debates de los que se anoticiaban los artistas

argentinos también se reflejaron en diversos escritos aparecidos en publicaciones

dedicadas al arte como Arte Concreto-Invención, creada en 1946. Sobre un artículo de

Maldonado aparecido en esta revista y un texto escrito en Zurich en 1948, nos

centraremos para analizar el modo de recepción y de resolución de los problemas que se

generaban en torno a la tensión entre la representación y la invención en función del

espacio, las formas y su relación con el fondo.

En Lo abstracto y lo concreto en el arte moderno (1946) Maldonado sostiene que

los problemas de la pintura en sentido amplio nunca pueden escapar de la pregunta por la

percepción del espacio y del tiempo en el ser humano. La pintura del pasado, como él la

llama, se ha encargado de representar con formas las figuras y dejar para el resto de las

composiciones que quedaban sin figuras, el destino de volverse fondo. De lo que

finalmente se trataba, era de simulacros sobre una superficie bidimensional. Este

resultado ficticio, señala, la psicología de la estructura bien podría explicarlo aunque

desde la pintura esto haya sido sometido a una revisión durante los últimos años.

Esta alusión a la psicología de la estructura, refiere para nosotros a la psicología

de la Gestalt, muchas veces traducida al castellano como de la forma o llamada psicología

totalista como denominación que permitía su agrupamiento con otras corrientes similares.

A nuestro juicio, lo que Maldonado (1946) dice que esta teoría podría explicar es la

relación que se establece entre la figura o cosa que se percibe como tal (gracias a las leyes

de formación y segregación en beneficio de la “buena forma”) y lo que resta como

alrededor o entorno.

Según se afirma en este artículo y en otros textos como el Manifiesto

Invencionista, siempre que haya una relación figura-fondo, para Maldonado y los

concretos, habrá representación y el espacio será ilusorio. La retícula típica del

neoplasticismo (recordemos el caso analizado de Hamer en Zaag, de Huszar) o el

sfumatto representativo han sido intentos fallidos por objetivar lo concreto.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

262

Desde la Gestalt, esto sería un callejón sin salida ya que la relación figura-fondo

sería inherente a los modos de la organización de la percepción. La teoría explica esto a

partir de señalar que hay una doble representación a nivel mental: de la cosa que se

constituye como figura, y de eso que llamamos figura integrada a lo que denominamos

fondo (que sería una especie de armazón). Esta doble representación implica una

tridimensionalidad (por más sutil que sea) que se manifiesta por ejemplo en el lenguaje,

cuando decimos que una figura tiene por detrás otra (KOFFKA, 1973).

Este problema que para los concretos tornaba representativas pinturas que se

pretendían abstractas, se retoma en el texto inédito El arte concreto y el problema de lo

ilimitado. Notas para un estudio teórico escrito en Zurich, en el año 1948 durante el viaje

a Europa de Maldonado. En este texto reaparece el problema del espacio ilusorio y la

formulación de la pregunta sobre cómo destruirlo. Aparecen además de los intentos de

solución mencionados (el recurso mencionado a la retícula o al sfumatto) en el párrafo

anterior, la alternativa propuesta por Bill y Vantergerloo de liquidar las figuras y hacer

vibrar al máximo el fondo. Sin embargo, Maldonado afirma que se trata de una solución

inútil conducente a una nueva emboscada: “la búsqueda de lo ilimitado dentro de una

forma limitada (la forma del cuadro) crea una situación representativa” (el subrayado está

en el original)120.

Se ve así la serie de propuestas para dar respuesta al tema y lograr que el fondo

cobre el mismo valor óptico que la figura y las dificultades que estas acarrean. Desde la

psicología de la Gestalt, sería un propósito estéril lograr esta igualdad de valor óptico

dado que la existencia de una unidad implica su separación del entorno. Es por lo tanto

imposible que no exista una unidad visual diferenciada de sus alrededores121.

Pues bien, más allá del contacto específico y el itinerario que de él surge y que

podría resumirse en los términos Bauhaus-Gestalt-Stern-Arte abstracto local, la pregunta

que cobra total validez es sobre el lugar de la teoría de la Gestalt en los ’40 en la escena

académica y la recepción en la Argentina.

Según lo investigado hasta el presente, no puede decirse que el canal de recepción

de esta tradición psicológica haya sido sólo o a través de la incorporación indirecta y el

uso en el campo de la estética: ya en el año 1930 Wolfgang Köhler había visitado la

120 Esta versión del texto de Maldonado me fue facilitada en formato digital por la Yale University Art Gallery. 121 Como bibliografía básica sobre el tema pueden consultarse entre otros clásicos: Wolfgang Köhler, Psicología de la forma, Buenos Aires, Argos, 1948 o Kurt Koffka, Principios de Psicología de la forma, Buenos Aires, Paidós 1973.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

263

Argentina y brindado una serie de conferencias, y en revistas como Síntesis, Nosotros, La

Semana Médica y publicaciones de la UNLP, habían aparecido algunos artículos sobre la

teoría (inclusive previos a la visita), reseñas de las conferencias y las repercusiones de las

mismas. Además ya era una bibliografía citada y difundida el libro de Kurt Koffka Bases

de la evolución psíquica editado en Madrid en 1926 o la traducción al francés de 1931

realizada por Paul Guillaume del libro sobre la inteligencia de los simios superiores. No

podemos afirmar que los artistas hayan conocido en forma directa estas obras, pero sí es

interesante tener en cuenta un marco más amplio que el de la relación arte-Gestalt para

pensar la introducción de esta teoría en el campo académico específicamente.

Por ende, podría decirse que existió una vía “académica” de recepción junto con

otra de tipo “silvestre” fundamentalmente ligada a la estética, que derivó en una suerte de

psicologización del estudio de la forma y el color en el campo del arte a partir de la

investigación y el uso de las leyes de la percepción. Cuando decimos psicologización nos

referimos al hecho de que un complejo proceso posibilita que ciertos saberes psicológicos

se implanten en un campo ajeno y realicen aportes significativos a temas relevantes de

una disciplina. Esta implantación implica un uso de teorías que en ocasiones no respeta

la rigurosidad epistemológica propia del conocimiento científico pero brinda un marco de

justificación para la obra artística así como para la fundamentación conceptual de los

manifiestos de algunos movimientos.

No está de más aclarar que la teoría de la Gestalt no es el único desarrollo del

campo científico que fue considerado para la fundamentación de los discursos y prácticas

del arte abstracto local; inclusive no todos los artistas de la época han ponderado de la

misma manera su injerencia. No obstante, es destacable que la incorporación “ecléctica”

de saberes psicológicos de esta tradición alemana de principios de siglo XX, no ha sido

un tópico debidamente indagado y permanece como una dimensión aún latente entre las

ricas y variadas historias del arte a nivel local.

Sobre el circuito Bauhaus-Gestalt-Stern-Arte abstracto argentino

En función de lo expuesto sobre el papel de Grete Stern y los Bauhausbücher en

el circuito local y los debates desarrollados en torno a los problemas del arte abstracto

señalados, pueden señalarse los avances obtenidos en dos sentidos claramente definidos.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

264

-En un sentido amplio este trabajo, contribuye a una historia de las relaciones entre

la psicología y otros campos, específicamente el vínculo entre los desarrollos de la

psicología de la Gestalt y el arte abstracto argentino de la década del ’40. Partimos de la

idea de que la psicología se ha constituido en una relación dialéctica con los problemas y

las preguntas provenientes de la sociedad o los contextos en los que se ha desarrollado.

Por lo tanto, es imprescindible indagar sobre los cruces que, en el intento de resolver los

primeros o responder a las segundas, se establecieron y se establecen incluso en la

actualidad con otros saberes o prácticas.

Por tal motivo, los antecedentes de la historia del arte que influyeron en los

desarrollos psicológicos de autores como Rubin constituyen un ejemplo valioso a nivel

macro (es decir, de la relación de la psicología con el arte en general); así como también

las huellas de las lecturas de desarrollos de la Gestalt en la producción de artistas como

Maldonado son una muestra a nivel local.

-En sentido estricto, muestra cómo la figura de Grete Stern, exiliada alemana,

contribuyó a la difusión de ideas de la Bauhaus en la Argentina a través de su testimonio

y su bibliografía. Quedó claramente reflejado que las mismas estaban impregnadas por

saberes psicológicos sobre la percepción entendida como hecho psíquico regulado por

leyes susceptibles de ser planteadas como universales al prescindir de toda influencia

cultural. También se puso de relieve que sobre los debates difundidos en la Bauhaus

acerca de temas formales o las relaciones entre la figura y el fondo en una pintura,

gravitaban las ideas provenientes de movimientos como De Stijl.

El hecho de hacer hincapié en los Bauhausbücher, obedece a que constituyen un

soporte material concreto de difusión teórica insoslayable, y a que reflejan la propuesta

pedagógica de la institución. El objetivo que impulsó su creación era básicamente

unificador en el plano ideológico y en el editorial. Por lo tanto, esto podría leerse también

en sintonía con el objetivo integrador inicial de Gropius en cuanto a la síntesis y la

coherencia que la pedagogía y los contenidos de la escuela debían tener en los diferentes

espacios de formación y producción. Esta pretensión, sin dudas holística, remite al sello

de ese período de la historia alemana caracterizado por la demanda de síntesis dirigida al

campo intelectual de aquellos años.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

265

BIBLIOGRAFIA

ASH, M. (1998). Gestalt Psychology in German Culture, 1890-1967. New York:

Cambridge University Press.

BERTONE C. (2006). Había que borrarme que es lo que siempre hicieron. Lidy Prati

conversa (L. Prati, Entrev.). Disponible en: http://www.ramona.org.ar/files/R62.pdf

BERTONE, C. (2006). Las revistas madí se publicaron con la plata que recibimos como

regalo de casamiento (D. Laañ, Entrev.). Disponible en:

http://www.ramona.org.ar/files/R62.pdf

BERTÚA, P. (2012). La cámara en el umbral de lo sensible. Grete Stern y la Revista

Idilio (1948-1951). Buenos Aires: Biblos.

BREST, J. R. (1935). Fotografías de Horacio Coppola y Grete Stern. En Revista Sur, año

V, octubre de 1935, p. 93.

GARCÍA, M. A. (2011). El arte abstracto. Intercambios culturales entre Argentina y

Brasil. Buenos Aires: Siglo XXI.

GRASSI, M. C. (2015). La Psicología de la Gestalt y la Bauhaus: una historia de

intercambios e intersecciones (1919-1933). Eä. Revista de Humanidades Médicas &

Estudios Sociales de la Ciencia y la Tecnología, Instituto de Estudios en Salud, Sociedad,

Ciencia y Tecnología (ISO-CYTE), 5(2). Buenos Aires.

GULLCO, J. B. (1982). Grete Stern. En Pintores Argentinos del Siglo XX, Serie

complementaria Fotógrafos Argentinos del Siglo XX/5. Buenos Aires: Centro Editor de

América Latina.

KOFFKA, K. (1973). Principios de Psicología de la forma. Buenos Aires: Paidós.

KÖHLER, W. (1948). Psicología de la forma. Buenos Aires: Argos.

LUCENA, D. (2015). Contaminación artística. Vanguardia concreta, comunismo y

peronismo en los años ’40. Buenos Aires: Biblos.

MALDONADO, T. (1997). Escritos preulmianos. Buenos Aires: Ediciones Infinito.

PRATT, C. C. (1972). Wolfgang Köhler. 1887-1967. En W. KÖHLER (Ed.), Psicología

de la forma. Su tarea y últimas experiencias (pp. 23-53). Madrid: Biblioteca Nueva.

SÁNCHEZ, V. (2014). Sueños de mujeres. En La Revista Idilio y la transformación de

la familia en los años 40-50. Disponible en: www.elseminario.com.ar.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos em Artes Visuais

266

TELL, V. (2005). Entre el arte y la reproducción: el lugar de la fotografía. En A. GIUNTA

& COSTA, L. M. (Comp.), Arte de posguerra. Jorge Romero Brest y la revista Ver y

Estimar (pp. 243-262). Buenos Aires: Paidós.

VAN CAMPEN, C. (1997). Early Abstract Art and Experimental Gestalt Psychology.

Leonardo, 30 (2), 133-136.

VAN DOESBURG, T. (1917). Hamer enn zaag. Stillevenkomposite door V. Huszar (Bij

Bijlage VII). De Stijl, 1(3). 35-36.

VEZZETTI, H. (2003). El psicoanálisis y los sueños en Idilio. En L. PRIAMO (Coord.),

Sueños. Fotomontajes de Grete Stern. Serie completa. Edición de la obra impresa en la

revista Idilio (1948-1951) (pp. 149-159). Buenos Aires: Fundación C.E.P.P.A.M.

VIÑUALES, R. G., & SEOANE, M. A. S. (2007). Buenos Aires. Escenarios de Luis

Seoane. La Coruña: Fundación Luis Seoane.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

267

STUDOS INTERDISCIPLINARES

dança e a expressão corporal: prática educativa, cultural e social Susana de Pinho Figueiredo

| 268-275

RTE E EDUCAÇÃO: uma abordagem da cultura da cidade de Embu das Artes para a formação de professores no curso de pedagogia Maria do Carmo dos Santos Motta; & Nilton de Souza Bispo

.| 276-290

RTE Y CIUDAD: experiencias de danza en el espacio urbano Mariana Lucía Sáez; & Lucía Belén Merlos

| 291-319

eflexões em torno de exemplos da representação, na arte contemporânea, do funcionamento da memória como atividade cerebral Carlos Alberto de Matos Trindade

| 320-353

AAAR

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

268

A DANÇA E A EXPRESSÃO CORPORAL: PRÁTICA EDUCATIVA, CULTURAL E SOCIAL

Dance and body expression: educational, cultural and social practice

FIGUEIREDO, Susana de Pinho122

Resumen

Neste artigo destacamos um projeto realizado no âmbito educativo, entre a dança e a expressão corporal, procurando analisar e discutir a implementação e desenvolvimento desta arte do movimento, como contributo do processo de ensino. No propósito de fomentar a simultaneidade dança-educação, destacamos um projeto - “Apresentando a dança às crianças”, onde as atividades artísticas corporais são o foco mobilizador de conceções fundamentais para os intervenientes e tendo como objetivo o desenvolvimento biopsicosóciocultural e motor global dos mesmos. Evidenciamos, como a dança proporciona um aprimoramento do senso estético, e funciona como um instrumento fundamental, permitindo uma consciência das limitações e competências, além de uma infinidade de relações benéficas e progressivas, na interação da criança com esta arte, em âmbito escolar.

Abstract

In this article we highlight a project carried out in the educational field, between dance and body language, trying to analyze and discuss the implementation and development of this art movement, as a contribution of the teaching process. In order to promote the simultaneous dance-education, we highlight a project - "Introducing the dance to children" where the body artistic activities are the driving focus of fundamental conceptions to stakeholders and aiming the biopsicosóciocultural development and global motor thereof. We showed, as the dance provides an enhancement to the aesthetic sense, and acts as a key tool, allowing an awareness of the limitations and skills, as well as a multitude of beneficial and progressive relationships in the child's interaction with this art in the school setting.

Palavras-chave: Dança; Artes; Movimento; Corpo; Expressão Motora.

Keywords: Dance; Art; Movement; Body; Corporal expression.

Data de submissão: Dezembro de 2015 | Data de publicação: Março de 2016.

122 SUSANA PINHO DE FIGUEIREDO - Universidade de Vigo. Espanha. Correio eletrónico: [email protected].

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

269

INTRODUÇÃO

“É por o meu corpo que compreendo o outro, assim como é por o meu corpo que percebo “coisas” (MERLEAU-PONTY, 1999, p. 253).

A dança é uma atividade instintiva fundamental no desenvolvimento corporal do

indivíduo, permitindo explorar diferentes formas de movimento e diferentes gestos e

primordialmente uma tomada de autoconsciência dos segmentos corporais. Ao

movimentar o corpo, é estabelecida uma aproximação com a expressão corporal, que

consiste numa linguagem ainda mais natural, adquirida desde o nascimento prolongando-

se e sendo mais evidente nos primeiros anos de vida. A dramatização, o teatro e a mímica,

são áreas que podem ser trabalhadas neste âmbito.

No presente trabalho, iremos refletir e evidenciar a dança como meio de educativo,

cultural e de socialização, formando cidadãos críticos, comunicativos e responsáveis.

Desde cedo, é possibilitado à criança a apreensão do conhecimento corporal e

aperfeiçoamento das habilidades motoras com carácter comunicativo não-verbal.

Segundo o Currículo Nacional do Ensino Básico,

“os elementos fundamentais que sustentam o saber da dança, enquanto forma de conhecimento, seja ele antropológico, social, politico ou artístico, e que nesta perspetiva deverão ser vividos pelos alunos em níveis progressivos de complexidade e interação, ao longo dos nove anos de escolaridade, convergem para aquilo que é a matéria intrínseca e essencial desta arte: o CORPO” (ME, 2002, p. 184).

Este contato com a dança e a expressão corporal incita a criança a pensar através

do movimento, envolvendo-se no espaço, relacionando-se com os outros, quebrando o

sentimento de preocupação, excitação excessiva e de nervos por antecipação. Além disso

permite-lhes experienciar uma variedade de ações, envolvendo os sentimentos: o real, o

imaginário, o alegre, o triste, o preocupado, entre outros. Apesar da relevância do

movimento, a maior parte das matérias lecionadas na escola são focalizadas para a mente,

ignorando o corpo, e desta maneira não permitem que a criança desenvolva o raciocínio

físico, a criatividade, a sensibilidade e consciencialização corporal, que beneficia tanto o

seu cotidiano, como as suas competências escolares. Esta contraditória implica que

repensemos no Currículo Nacional do Ensino Básico bem como nas planificações

curriculares das aulas lecionadas no atual, pois o número de horas letivas dedicadas à

prática da dança ou das expressões físico-motoras é ainda bastante diminuto em relação

às outras áreas.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

270

Foto 1. Dança na Escola (Santa Maria da Feira, 2014).

A DANÇA COMO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM

Este projeto foi desenvolvido, com o objetivo de incluir a dança no processo de

ensino-aprendizagem, dos alunos de várias escolas do concelho de Santa Maria da Feira,

com aulas de uma hora semanal. “Apresentando a dança às crianças”, iniciou com turmas

com cerca de 20 alunos, com idades compreendidas entre os 5 e os 7 anos de idade, e

funcionou como uma possibilidade de fomentar práticas pedagógicas, que entusiasmem

os professores e os alunos ao exercício da dança e da expressão corporal.

Destaca-se a idade com que começam, sendo crianças ainda pequenas, estiveram

muito presentes as suas caraterísticas psicoevolutivas, mas que desta forma permitem ao

docente acompanhar o seu crescimento, a sua aquisição de conceitos, e desde cedo

orientar na consciência das suas capacidades e melhoria das limitações. Estas aulas

oferecem a possibilidade do aluno desenvolver desde o seu movimento corporal até ao

seu conhecimento cultural, passando pela melhoria da sua comunicação social e do seu

bem-estar.

Foram desenvolvidos exercícios com base na perceção corporal, perceção da

dinâmica corporal, perceção do espaço e da relação com os outros no decorrer desta

atividade. Tendo em conta as palavras de Rudolf Laban123 (1971, p. 48) quando diz que:

123 Rudolf Laban: Teórico, coreógrafo e bailarino. Desenvolveu o movimento “Arte do Movimento”.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

271

“o controle da fluência do movimento, portanto, está intimamente relacionado ao controle

dos movimentos das partes do corpo”, e trabalhando neste sentido, incentivando as

crianças a mexer todo o corpo como um só, mas também isolando-o e movendo apenas

algumas partes corporais. Nestes dois procedimentos é possível controlar o corpo, a sua

forma, criar novos movimentos, aumentando a flexibilidade e o equilíbrio.

Estrutura de exercícios com base na “Arte do Movimento” 124 de Laban

Apresentamos os 5 exercícios base deste autor:

1. Movimentos: correr, saltar, baloiçar, esticar, quebrar, dobrar, pender, erguer, sacudir,

calcar, ondular, tremer.

2. Espaço: Níveis e Direções

Níveis: baixo, médio, alto, descer e subir.

Direções: esquerda, direita, à frente, atrás e na diagonal.

3. Tempo e Velocidade: rápido, lento e moderado. Podendo utilizar-se os níveis: I, II e II.

Ascensão gradual e mudança brusca.

4. Formas: Repetindo o movimento, parando o movimento e voltando ao início, realizando

o movimento de trás para a frente.

5. Peso: colocar muito ou pouco peso nas determinadas partes do corpo (joelho, pé, mão,

pernas…) e nos determinados movimentos (saltar, cair, deitar…).

Segundo Laban (1971) o movimento realizado com o corpo implica uma aquisição

de conhecimento, e não é possível separar conceitos, pensamentos e sentimentos, da

expressão desencadeada pelo movimento e da experiência corporal. Estes exercícios

envolvem todos os grupos musculares, em execuções harmoniosas, ou seja, trabalhando

o crescimento consciente e a aceitação do limite corporal, deixando a criança evoluir

gradualmente.

CONTEÚDOS

Exploração do esquema corporal: Corpo, Espaço, Energia e Relação

Jogos Expressivos

Criatividade: Improviso, Interpretação

Elementos de discurso musical

Experiências com parâmetros do som e do movimento: Duração, Timbre e Intensidade

Condicionamento Físico: Aquecimento, Alongamento, Flexibilidade, Força

Memorização: Sequências, Passos, Dinâmicas

124 “Arte do Movimento”: expressão criada por Rudolf Laban, que expõe e identifica as mais variadas manifestações do movimento.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

272

Postura Corporal

Dinâmica de Grupo: Trabalho a par, em grupo, em trios…

Os diferentes estilos de dança: Capacidade de relacionar o estilo de dança com as diferentes etnias e diferentes países.

Foto 2. Dança na Escola (Santa Maria da Feira, 2015).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Em qualquer idade, a ação da dança e da expressão corporal são um apoio do

desenvolvimento da autoestima, onde esta se engrandece principalmente pelo aspeto

físico e pela postura corporal que as pessoas adotam. Permite às crianças expandirem-se

corporalmente, tomarem formas diferentes de agir, de deslocar, de caminhar, possibilita

uma circulação maleável, onde podem correr, subir e descer, saltar, levantar as pernas,

fechar os braços, envolverem-se com os outros corpos e diversificarem as deslocações

corporais. Com este projeto, criou-se na criança, uma rutura à mecanização dos

movimentos e aos gestos automatizados, destacando a capacidade de controlo corporal,

da sua forma, o aumento de flexibilidade, equilíbrio, força e plasticidade.

A espontaneidade praticada carateriza-se como a possibilidade de “fazer”,

“esticar”, “saltar”, “deitar”, sem a participação da mente e isso verifica-se no crescimento

da autoconfiança, segurança escolar e familiar, e uma melhoria na capacidade de

adaptação a várias situações cotidianas. Além disso, ajudou a desenvolver a imagem do

seu corpo, a melhorar a autoestima, reduzir o stress, ansiedade e depressão, diminuiu o

isolamento, a tensão corporal e aumentou as habilidades de comunicação e o sentimento

de bem-estar.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

273

Ou seja, “quando criamos e nos expressamos por meio da dança, interpretamos

seus ritmos e formas, aprendemos a relacionar o mundo interior com exterior” (LABAN,

1999, p. 255), e as emoções, como o medo, a raiva, a angústia, são elementos que

emergem e se difundem, pois a criança aprende a comunicar estes sentimentos, através

do movimento. Desta forma, possibilita uma libertação das tensões orgânicas,

consequentemente gera uma liberdade corporal e humana, e um controle sobre a

concentração mental. Com este instrumento, a criança é capaz de dançar através das

palavras, dos ritmos musicais e corporais, de histórias contadas, relacionando com vários

aspetos técnicos. Consegue trabalhar intensamente, com grande força e rapidez, mas

também é capaz de oscilar para um exercício lento e gentil, o que lhe viabiliza ativar o

seu corpo, interagindo com diferentes fases e etapas, e transportando esta interação,

adapta-se ainda melhor às ações decorrentes no seu cotidiano. Para a criança que aprende

através da comunicação cinésica, a classe de dança é o seu ambiente ideal de

aprendizagem. Além do progresso escolar, da melhoria do pensamento crítico e do

pensamento criativo, estas aulas também resultam na melhoria dos níveis coordenativos,

motores e condicionais (ver tabela 1):

Tabela 1 - Nível funcional das capacidades condicionais e coordenativas da Dança.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os nossos resultados suportam as conclusões, de uma pesquisa prévia na

aprendizagem da dança, onde esta reduz estereótipos e facilita na socialização e

comunicação.

A dança na escola, não pode ser encarada como uma disciplina menos importante,

mas sim, uma ferramenta crucial no processo ensino-aprendizagem. Esta área do

movimento corporal, continua a ser pouco desenvolvida nas escolas, sendo insuficiente

para a orientação e construção da personalidade, e dos conhecimentos da criança.

• Postura Corporal Correta;• Plasticidade;• Elasticidade/Flexibilidade;• Capacidade Rítmica;• Capacidade de Deslocação; • Resistência Corporal;• Dinamismo;• Velocidade de Reação;• Velocidade de Execução.

A dança eleva o nível funcional das capacidades condicionais e coordenativas:

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

274

Além disso, permite interligar o corpo e o movimento com a música, interagindo

com o sistema sensorial, envolvendo várias áreas do cérebro (TSOLAKI, et al., 2010).

Desta forma funciona, como uma resposta social fundamental, uma vez que proporciona

um bem-estar físico, social, cognitivo e emocional, sendo percetível este bem-estar, na

observação de resultados notáveis ao longo de todo o processo evolutivo do contato com

a dança.

É preponderante utilizar as artes como práticas interdisciplinares, que permitam

os alunos alcançarem uma melhoria no contexto educativo (concentração, memorização,

comunicação…), contexto social (postura, relacionamento com os outros que o rodeiam,

expressividade) e contexto cultural (conhecimento, reflexão e construção crítica). Gera-

se também a possibilidade de um envolvimento de alunos de diferentes classes sociais,

raças e etnias, criando um individuo ativo, consciente das suas ações sociais. Na medida

em que se está a introduzir nas escolas, instantes de reflexão, comparação e diferentes

circunstâncias, está a criar-se meios para que os alunos frequentem o teatro, ou uma

exposição de arte, assistam a bailado e possam gradualmente abrir a sua mente, podendo

culturalmente entender o que é preciso, ainda, transformar na nossa sociedade.

Entendendo a dança como uma atividade física, é preponderante ressaltar a

importância na saúde da criança, pois aumenta a resistência, a flexibilidade, a

elasticidade, a força, a capacidade de combater doenças, diminui o stress, a obesidade

infantil (excesso de peso e gordura corporal acumulada), a depressão, os problemas

circulatórios e, apesar de poderem existir lesões por determinadas circunstâncias de aula,

a prática permite que o nosso corpo reaja mais rapidamente a situações de queda ou

desequilíbrio, no dia-a-dia.

Já a dança como diversidade cultural, ensina a criança a valorizar a cultura do seu

país, incentiva à criação e produção cultural, tornando-se crucial no processo de

diminuição de preconceito e de incentivar os alunos a construírem novas ideias, baseando-

se, por exemplo, nas danças de outras culturas e etnias.

O processo de ensino-aprendizagem neste projeto, não pretende impor a execução

de movimentos perfeitos, nem desenvolver uma metodologia de competitividade, mas

sim permitir ao aluno adquirir certas habilidades e destrezas, tornando-o mais capaz e

com autonomia, além disso, a sua responsabilidade criada pela prática, irá transformá-lo

num cidadão crítico que se expressa com autonomamente, tanto a nível educativo, como

social e cultural. Não é só importante, mas acima de tudo, decisivo, incluir a dança e a

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

275

expressão corporal, em todas as fases educativas da criança, relacionando com as outras

disciplinas e aspetos educativos, pois tende a fomentar uma melhor aprendizagem na

escola e na sociedade. Sendo também uma atividade lúdica e recreativa, está diretamente

vocacionada para a integração social e para a fomentação da comunicação contribuindo

para uma melhoria de outros domínios.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DUNKIN, A. (2006). Dancing in your school: A guide for pre-school and elementar

teachers. Hightstown, NJ: Princeton Books.

FRITZEN, C., & MOREIRA, J. (2008) Educação e Arte: as Linguagens Artísticas na

Formação Humana. São Paulo: Papirus.

GARIBA, M., & FRANZONI, A. (2007) Dança escolar: uma possibilidade na Educação

Física Movimento. Brasil: Fundação Universidade Federal do Rio Grande Brasil.

LABAN, R. (1990). Dança Educativa Moderna. São Paulo: Ícone.

LABAN, R. (1971). Domínio do movimento. (5.ª ed.). São Paulo: Summus.

MERLEAU-PONTY, M. (1996). Fenomenologia da percepção. São Paulo: Martins

Fontes.

ME (2002). Currículo nacional do ensino básico: Competências essenciais. Lisboa:

Ministério da Educação, Departamento de Educação Básica.

TSOLAKI, M., PAPALIAGKAS, V., ANOGIANAKIS, G., BERNABEI, R., EMRE, M.,

FROLICH, L., & WINBLAD, B. (2010). Consensus statement on dementia education

and training in Europe. Journal of Nutrition Health and Aging.European, Alzheimer

Disease Consortium.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

276

ARTE E EDUCAÇÃO: UMA ABORDAGEM DA CULTURA DA CIDADE DE

EMBU DAS ARTES PARA A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NO CURSO DE

PEDAGOGIA

Art and education: an approach to the culture of the city of Embu das Artes for

teacher training in the course of pedagogy

MOTTA, Maria do Carmo dos Santos125; BISPO, Nilton de Souza126

Resumo

O presente artigo Arte e Educação: Uma abordagem da cultura da cidade de Embu das Artes para a formação de professores no curso de pedagogia tem como objetivo Articular a cultura local como suporte de formação para o curso de pedagogia e a formação de professores. Dentro dessa perspectiva, a formação inicial dos professores no curso de pedagogia possui um papel relevante, uma vez que prepara os futuros profissionais para refletirem e trabalharem com a diversidade cultural no contexto escolar. Acredita-se assim abrir espaços que permitam a transformação da escola em um local em que as diferentes identidades são respeitadas e valorizadas, consideradas fatores enriquecedores da cidadania. O curso de pedagogia da Faculdade Polis das Artes compreende que a cultura local, constitui-se como um lócus privilegiado, não só para refletir e discutir sobre a identidade de crianças, adolescentes, jovens e adultos, mas também como compreensão do multiculturalismo presente na Cidade de Embu das Artes, sendo assim, um elemento importante na formação dos futuros professores.

Abstract

This article Art and Education: An approach to the culture of the city of Embu das Artes for teacher training in the pedagogy course aims to articulate the local culture as training support for the course in pedagogy and teacher training. Within this perspective, the initial training of teachers in pedagogy course has an important role as it prepares future professionals to reflect and work with cultural diversity in the school context. It is believed thus open spaces that allow the school's transformation into a place where the different identities are respected and valued, considered enriching factors of citizenship. The pedagogy course of Polis Faculty of Arts comprises the local culture, is constituted as a privileged place, not only to reflect and discuss the identity of children, adolescents, youth and adults, but also as understanding of this multiculturalism in the city Embu das Artes, therefore, an important element in the training of future teachers.

Palavras-chave: Educação; Cultura; Formação de professores; Embu das Artes.

Keywords: Education; Culture: Teacher training; Embu das Artes.

Data de submissão: Março de 2016 | Data de publicação: Junho de 2016.

125 MARIA DO CARMO DOS SANTOS MOTTA - Faculdade Polis das Artes. BRASIL. E-mail: [email protected] 126NILTON DE SOUZA BISPO - Faculdade Polis das Artes. BRASIL. E-mail: [email protected].

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

277

INTRODUÇÃO

“A Educação poderia ser o mais eficiente caminho para estimular a consciência cultural do indivíduo, começando pelo reconhecimento e apreciação da cultura local. Contudo, a educação formal no Terceiro Mundo Ocidental foi completamente dominada pelos códigos culturais europeus e, mais recentemente, pelo código cultural norte-americano branco A cultura indígena só é tolerada na escola sob a forma de folclore, de curiosidade e esoterismo; sempre como uma cultura de segunda categoria” (BARBOSA, 1999, p. 1).

Embu das Artes, localizado no Estado de São Paulo, é um município turístico com

muitas riquezas históricas, culturais e artísticas. A sua história se inicia na aldeia

do M’Boy - “cobra-grande” em tupi-guarani que foi fundada pelos jesuítas entre 1555 e

1559. Nos anos que se seguiram, os padres realizaram inúmeros trabalhos na região, como

a catequização dos índios guaranis e a construção da Igreja de Nossa Senhora do Rosário.

Foi das mãos dos jesuítas e dos índios que surgiram os primeiros traços artísticos que

mais tarde se tornariam a marca da cidade: na arquitetura da Igreja, na escultura dos santos

de madeira, nas pinturas e no entalhamento.

A cidade é uma fonte rica de pesquisa cultural e histórica, oferecendo elementos

para a formação de educadores e constituindo um berço para a arte e para as manifestações

culturais de seu povo. Nosso artigo tem como objetivo articular a cultura local como

suporte de formação para o curso de pedagogia e a formação de professores. As

reflexões que envolvem a formação de professores para a diversidade cultural na

educação brasileira têm sido alvo de inúmeros estudos na última década no cenário

educacional. Cada vez mais conceitos como diversidade, diferença, igualdade e justiça

social, cultural local, têm se configurado como uma preocupação por parte daqueles que

lutam por uma educação verdadeiramente cidadã e por parte também das instituições que

formam educadores no Brasil. Ao mesmo tempo, articular tais conceitos à formação de

professores tem se tornado um desafio premente para a educação e para as instâncias

envolvidas nesse processo. Dentro dessa perspectiva, a formação inicial dos professores

no curso de pedagogia possui um papel relevante, uma vez que prepara os futuros

profissionais para refletirem e trabalharem com a diversidade cultural no contexto escolar.

Acredita-se assim abrir espaços que permitam a transformação da escola em um local em

que as diferentes identidades são respeitadas e valorizadas, consideradas fatores

enriquecedores da cidadania.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

278

Na perspetiva de formar professores comprometidos com os saberes e estes

compreendidos como sendo parte da cultura local que irá possibilitar a articulação entre

os conteúdos socialmente relevantes como parte da transmissão cultural da escola e o

comprometimento de educadores que reconhecem a cultura popular entendida aqui

“como vestígios míticos relativos aos sinais de identidade coletivas daquilo que foi e é

um povo” (SACRISTAN, 1999, p. 175). O curso de pedagogia da Faculdade Polis das

Artes compreende que a cultura local constitui-se como um lócus privilegiado, não só

para refletir e discutir sobre a identidade de crianças, adolescentes, jovens e adultos, mas

também como compreensão do multiculturalismo presente na Cidade de Embu das Artes,

sendo assim, um elemento importante na formação dos futuros professores.

O multiculturalismo tem sido compreendido e refletido na formação de

professores como um campo teórico, prático e político que busca respostas à diversidade

cultural e desafio a preconceitos, com ênfase na identidade como categoria central para

se pensar em uma educação valorizadora da pluralidade no contexto escolar (CANDAU,

2008a, b, c; CANEN, 2008; CANEN & SANTOS, 2009; MOREIRA & CÂMARA,

2008). Nesse sentido, a formação de professores na Faculdade Polis das Artes acredita

que a cultural local, estudada e compreendida pelos futuros pedagogos aponta caminhos

para a superação dos preconceitos raciais, de gênero, de orientação sexual, de religião e

outros, rumo a uma visão democrática e plural que permita o diálogo entre culturas e

avance no desempenho positivo de alunos de universos culturais plurais.

Património Histórico Cultural – Cultura

Cultura faz parte do vocabulário básico das ciências humanas e sociais e por

consequência é um conceito relevante e valorizado nos cursos de formação de professores

no Brasil. Faculdade Polis das Artes se faz presente em diversas áreas do saber do curso

de pedagogia que também a compreende como conjunto de crenças, valores, visões de

mundo, redes de significado que definem a própria natureza humana. A Cidade de Embu

das Artes possui um patrimônio histórico muito rico em virtude dos índios guaranis e dos

padres jesuítas que foram os primeiros artistas da cidade. Assim como observamos na sua

história.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

279

Em 1554, um grupo de jesuítas fundou o aldeamento de Bohi, depois M'Boy

Mirin, a meio caminho do mar e do sertão paulista. Como todas as missões jesuíticas no

interior do Brasil, esta tinha objetivos missionários e pretendia catequizar os índios locais,

aproveitando-os também como força de trabalho para as fazendas que se foram criando

na região. Em 1607, as terras do lugarejo passam a ser de Fernão Dias (tio do bandeirante

Fernão Dias, o Caçador de Esmeraldas) e sua esposa Catarina Camacho. Em 1624, o casal

doa as terras da aldeia M’Boy à Companhia de Jesus, com a condição de que os jesuítas

devotassem Nossa Senhora do Rosário e organizassem uma festa de adoração à Santa

Cruz. Em 1690, o padre Belchior das Pontes manda erguer uma igreja em homenagem

àquela santa, hoje a padroeira do município. Já no século XVIII, entre 1730 e 1740, os

jesuítas iniciaram a construção do convento, anexo à igreja.

O padre Domingos Machado reuniu no aldeamento vários padres artistas que

elaboraram os trabalhos de decoração do mesmo. As verbas necessárias às douraduras

dos entalhes das paredes de madeiras e grande número de imagens, foram possibilitadas

pela venda do algodão que cultivavam em grande escala. Os padres jesuítas não moraram

ali por muito tempo, pois, por ordem da Coroa portuguesa são expulsos do Brasil em

1759. A dificuldade de comunicação não permitiu o rápido desenvolvimento do povoado.

Somente no final do século XIX, a cúria diocesana de São Paulo contratou o engenheiro

Henrique Bocolini para demarcação do patrimônio, o qual, reconhecendo os valores

artísticos da capela e do convento, realizou as primeiras obras de apoio à conservação das

construções.

Os padres vão embora, mas deixam um tesouro para a cidade paulista, um

belíssimo conjunto de arquitetura colonial, hoje sede do Museu de Arte Sacra, no centro

histórico. Tombado como Patrimônio Histórico Nacional e protegido pelo Instituto do

Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), é uma das mais preservadas

construções jesuítas remanescentes em São Paulo. Embora exiba detalhes do estilo

barroco paulista, a arquitetura do conjunto tem como principal característica a

simplicidade das linhas retas. A edificação é composta pela antiga casa dos padres e pela

igreja Nossa Senhora do Rosário, construída em taipa de pilão e parcialmente concluída

em 1734, quando a pintura e douração da capela-mor e da sacristia começaram a ser feitas.

Faz parte de seu acervo imagens de anjos, santos e personagens bíblicos entalhados em

madeira, modelados em terracota ou em armações de roca, produzidos pelos jesuítas entre

os séculos 17 e 19. O ponto alto do museu é a obra “Senhor Morto”, esculpida em tamanho

real em uma única tora de madeira.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

280

Embu se desenvolveu a partir do crescimento da aldeia M’Boy, “cobra grande”.

"Embu" é um termo oriundo da língua tupi, significando "rio das cobras", a partir da

junção dos termos mboîa (cobra) e 'y (rio). Ou umbu, a árvore de pequeno porte que no

Brasil Colônia era chamada de ambu, imbu e ombu, corruptelas da palavra tupi-guarani y-

mb-u, que quer dizer “árvore que dá de beber”. Outra possível tradução é “ensino”,

pois mboé significa “ensinar”. A vocação artística da cidade se consolidou nas primeiras

décadas do século XX com a chegada de artistas renomados como: Cássio M’Boy, Assis

do Embu, Mestres Sakai e Gama, Solano trindade, Ana Moysés, entre vários outros.

Em 1937, Cássio M'Boy, santeiro de Embu, ganhou o Primeiro Grande Prêmio na

Exposição Internacional de Artes Técnicas em Paris. Cássio foi professor de vários

artistas e recebia em sua casa expoentes do Movimento Modernista de 1922 e das artes

em São Paulo, incluindo Anita Malfatti, Tarsila do Amaral, Oswald de Andrade, Menotti

Del Picchia, Alfredo Volpi e Yoshiya Takaoka. Sakai de Embu começou por ser

discípulo de Cássio e veio a ser reconhecido internacionalmente como um dos grandes

ceramistas-escultores brasileiros. Sakai forma um grupo de artistas plásticos, do qual faz

parte Solano Trindade, artista que chegou ao Embu em 1962 trazendo consigo a cultura

negra, congregando um grupo de artistas em seu redor. A tradição artística da cidade

institucionaliza-se e ganha projeção dentro e fora do Brasil em 1964, com o Primeiro

Salão das Artes.

Esses artistas ajudaram a fundar em 1969 a feira de Embu das Artes, dando origem

ao movimento artístico que permanece até os dias atuais. Paralelamente, a cidade passou

a pólo de atração para hippies, que expunham os seus trabalhos de artesanato nos finais

de semana na Feira de Artes e Artesanato, que se realizam todos os fins-de-semana desde

1969 e que é um dos principais motores da projeção turística da cidade. Em seus 46 anos

de existência, a feira foi ocupando todas as ruas do centro histórico de Embu das Artes,

um circuito hoje conhecido como Passeio das Artes. É nesse imenso ateliê ao ar livre que

550 expositores mostram as suas obras, desde pinturas, porcelanas, esculturas,

instrumentos musicais, roupas e bijuterias até objetos utilitários. Ao redor da feira

encontram-se ainda diversas galerias de artes, antiquários e lojas de artesanato e de

móveis artesanais de estilo rústico.

Com o nome de M’Boy, o povoado a partir de 1880 desenvolveu tornando-se

distrito de Itapecerica. Em 18 de fevereiro 1938, ocorre a emancipação passando a

denominar-se município de Embu. E através da Lei Estadual n. 14.537, de 06/09/2011,

finalmente passa a ser chamado de Embu das Artes.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

281

Capela São Lázaro

Sua origem está ligada a uma imagem do santo São Lázaro esculpida em madeira

pelo artista Cássio M’Boy nos anos 1920. A imagem atraiu grande número de devotos e,

em 1934, foi construída uma capela para abrigá-la. Em 1969, a capela foi restaurada,

aproximando-se das linhas da arquitetura jesuítica da igreja do Conjunto Nossa Senhora

do Rosário.

Figura 1 Capela São lázaro

Figura 2 São lázaro esculpido em madeira

Museu de Arte Sacra

Sua arquitetura apresenta características do estilo barroco paulista e um acervo

rico em imagens de anjos, santos e personagens bíblicos, quase todos entalhados em

madeira, modelados em terracota ou em armações em roca, produzidas entre os séculos

XVII e XIX. A principal obra do museu é o "Senhor Morto", esculpido em uma tora de

madeira, bem como as imagens de Nossa Senhora das Dores e da Santa Ceia, em roca, de

autoria do Padre Macaré. As demais obras foram esculpidas pelos jesuítas e índios.

Figura 3 Museu de Arte Sacra

Figura 4 Senhor Morto

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

282

Memorial Tadakio Sakai

O Memorial Sakai do Embu, inaugurado em 2003, tem seu acervo peças do artista

Tadakio Sakai, um dos maiores terracotistas do país. O conjunto arquitetônico inclui a

Capela de Santa Cruz, inaugurada em 2008, o Cruzeiro da Paz e um pátio onde são

realizados eventos, além de uma ampla galeria de peças de Sakai e outros artistas.

Figura 5 Memorial Tadakio Sakai

Figura 6 Exposição de artes

Centro Histórico

A arte sempre fez parte da vida da cidade, os padres Jesuítas que colonizaram a

antiga aldeia de M’Boy já a expressavam pela arte nas pinturas e esculturas, a qual

usavam para catequizar os índios. Uma mostra desse legado está no museu Jesuíta de Arte

Sacra, construído entre os séculos XVII e XVIII.

Caminhando pelas ruas de paralelepípedo é possível perceber que esse caráter

histórico legitimamente brasileiro, foi se consolidando com o passar do tempo, até que se

instalou o movimento artístico, no início da década de 60. A Estância Turística de Embu

das Artes representa um importante recanto da região da grande São Paulo, dedicado à

preservação dos recursos naturais, pois abriga mananciais na maior parte do território.

Nos fins-de-semana é um bom lugar para se passear, devido o clima agradável e uma

culinária de norte a sul do Brasil.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

283

Figura 7 Centro histórico

Figura 8 Centro histórico

É nessa realidade que está inserida a Faculdade Polis e o curso de pedagogia. Por isso

é muito importante para nós que as futuras professoras que vão exercer sua profissão tenham

a compreensão e o conhecimento da histórica e da cultural do nosso município para poderem

fazer as articulações entre educação escolar e cultura local. Nesse sentido o universo

sociocultural das crianças, adolescentes, jovens e adultos e dos demais grupos que constituem

a cidade, escola e a sociedade em geral; devem estar nas práticas pedagógicas mobilizando

um conjunto de saberes na sala de aula. A educação deve possibilitar as diversas formas de

estar junto, de ver e conviver nos espaços culturais da Cidade de Embu das Artes.

Educação

Vamos refletir sobre a conceção da educação, sua função social e a escola no

processo de formação dos homens como sujeitos históricos, enfatizando assim, a

importância da cultura local na articulação com os conteúdos do curso de pedagogia,

oferecendo elementos para que os futuros educadores possam trabalhar questões como

identidade, pertencimento, formação de valores, violência e disciplina, preconceito e

discriminação, questões étnicas e de gênero presentes na escola, ajudando a olhar e

perceber as diferenças presentes na sala de aula e, nesse sentido, ajudando a romper com

o que vários autores chamam de daltonismo cultural (STOER & CORTESÃO, 1999).

Outras contribuições estão associadas à possibilidade de que a Pedagogia é um

dos cursos responsáveis pela formação de educadores para a educação infantil e as séries

iniciais do ensino fundamental, nesse sentido irão possibilitar o despertar para questões

relativas às diferentes linguagens presentes na sociedade e no cotidiano escolar, bem

como de articular o social e o cultural. Começaremos discutindo a conceção e a função

da educação como uma construção histórica. Nas comunidades primitivas,

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

284

“os fins da educação derivam da estrutura homogênea do ambiente social, identificam-se como os interesses comuns do grupo, e se realizam igualitariamente em todos os seus membros, de modo espontâneo e integral: espontâneo na medida em que não existe nenhuma instituição destinada a inculcá-los, integral no sentido que cada membro da tribo incorporava mais ou menos bem tudo o que na referida comunidade era possível receber e elaborar” (PONCE, 1994, p. 21).

Com as mudanças da sociedade, da vida em grupo e do próprio homem em

transição da comunidade primitiva para a antiguidade, novas formas de organização vão

surgindo, sobretudo com a substituição da propriedade comum pela propriedade privada.

A relação entre os homens, que na sociedade primitiva se fundamentava na propriedade

coletiva, passa a ser privada e o que rege as relações é o poder do homem, que se impõe

aos demais. Assim,

“com o desaparecimento dos interesses comuns a todos os membros iguais de um grupo e a sua substituição por interesses distintos, pouco a pouco antagônicos, o processo educativo, que até então era único, sofreu uma partição: a desigualdade econômica entre os ‘organizadores’ e os ‘executores’ trouxe, necessariamente, a desigualdade das educações respectivas” (PONCE, 1994, p. 27).

Com o advento da sociedade capitalista e com o aperfeiçoamento da maquinaria,

muda não só a forma de organização da sociedade, mas também as relações sociais de

produção, a conceção de homem, de trabalho e de educação. Na sociedade organizada

sob o modo de produção capitalista, o homem não é aquele ser histórico que se humaniza

nas relações que estabelece com outros homens, resume-se ao indivíduo que vende a sua

força de trabalho e, ao vendê-la, transforma-se em fator de produção.

A educação, segundo a ótica dominante, tem como finalidade habilitar técnica,

social e ideologicamente os diversos grupos de trabalhadores, para servir ao mundo do

trabalho. Segundo Frigotto (1999, p. 26), “trata-se de subordinar a função social da

educação de forma controlada para responder às demandas do capital”. Nessa perspectiva,

a conceção de educação que estamos propondo fundamenta-se numa perspectiva crítica

que conceba o homem na sua totalidade, enquanto ser constituído pelo biológico,

material, afetivo e cultural. Portanto, no desenvolvimento das práticas educacionais,

precisamos ter em mente que os sujeitos dos processos educativos são os homens e suas

múltiplas e históricas necessidades.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

285

Nesse sentido do homem como sujeito histórico e cultural o projeto de educação

a ser desenvolvido na formação dos nossos professores e, por conseguinte nas escolas de

nosso município tem que estar pautado na realidade, visando a sua transformação, pois se

compreende que a realidade não é algo pronto e acabado. Não vamos atribuir a educação

e a escola à função salvação dos problemas sociais, mas reconhecer seu incontestável

papel social no desenvolvimento de processos educativos, na sistematização e

socialização da cultura historicamente produzida pelos homens.

Ao refletirmos sobre a função social da educação e da escola, estamos entendendo

a educação no seu sentido ampliado, ou seja, enquanto prática social que se dá nas

relações sociais que os homens estabelecem entre si, nas diversas instituições e

movimentos sociais, sendo, portanto, constituinte e constitutiva dessas relações.

Assim, a formação de educadores precisa dar conta de construir com os futuros

profissionais de que a educação na sua função social de formadora de sujeitos históricos,

precisa ser um espaço de sociabilidade que possibilite a construção e a socialização do

conhecimento produzido, tendo em vista que esse conhecimento não é dado a priori.

Trata-se de conhecimento vivo e que se caracterizam como processo em construção,

presentes na cultura local. Entendemos a educação, como prática social que se desenvolve

nas relações estabelecidas entre os grupos, seja no município, na escola ou em outras

esferas da vida social. Assim, a educação se constitui numa atividade humana e histórica

que se define na totalidade das relações sociais. Nessa ótica, as relações sociais

desenvolvidas nas diferentes esferas da vida social, inclusive no trabalho, constituem-se

em processos educativos, assim como os processos educativos desenvolvidos na escola

consistem em processos de trabalho, desde que este seja entendido como ação e criação

humanas.

A escola é uma instituição cultural, sendo assim, as relações entre escola e cultura

não podem ser concebidas como dois polos separados ao contrário, constituem uma teia

tecida no cotidiano, com fios e nós profundamente articulados. Partindo dessa conceção,

a arte e a educação irão fazer aproximações na formação de professores para que

educadores comprometidos possam, ao mesmo tempo, trabalhar as relações entre

educação e cultura local.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

286

Contribuição do curso de Pedagogia da Faculdade Polis \das Artes

O curso de pedagogia da Faculdade Polis das Artes reconhece que os professores

estão imersos em um mundo permeado pela cultura, entretanto, entende como fundamental

que na sua formação se promova também o enriquecimento pessoal dos docentes,

possibilitando-lhes o acesso tanto às culturas locais quanto às obras-primas universais. Para

nós, os estudantes de pedagogia e futuros professores devem, ao longo da vida profissional,

ter contato com o mundo da cultura de forma intensa e diversificada, compreendendo que tais

oportunidades possibilitam ampliação dos horizontes, novas formas de enxergar a realidade,

os valores, à sociedade, enfim a vida.

A disciplina de Antropologia da Educação que tem como objetivo, possibilitar ao

aluno o estudo antropológico da sociedade, buscando analisar a experiência humana em sua

diversidade cultural e as articulações entre indivíduo, cultura e sociedade. Promoveu uma

imersão dos estudantes do curso de pedagogia do 3º semestre na cultura local da Cidade de

Embu das Artes, possibilitando uma articulação entre os saberes cultura e educação. O

objetivo da atividade foi de apresentar e analisar a cultura local da cidade de Embu das Artes

fundamentada na experiência da visita a uma exposição museológica ao Memorial Tadakio

Sakai e o Museu do Índio, incluindo a participação em oficinas de terracota como recurso

didático. Em aula refletimos e estudamos conceitos como: identidade, culturas,

multiculturalismo, desigualdades. Analisamos as três conceções que acreditamos ser

importantes na formação do educador: Educação como processo amplo de reprodução

sociocultural; Sociedade: um mosaico multicultural, onde a educação formal não é a única

via, mas uma das vias de socialização; Escola: espaço social onde também está presente o

mosaico multicultural.

Buscando contribuir na mudança da forma como é tratada ou ignorada a temática

indígena na educação, nesse sentido foi juntamente pensado numa atividade que tivesse como

objetivo refletir e analisar que o índio teve um papel decisivo na formação cultural da Cidade

de Embu das Artes. A Faculdade Polis das Artes, através da disciplina Antropologia da

Educação, articulando os saberes de formação do povo brasileiro procura desfazer modelos e

generalizações, possibilitando a construção de um conhecimento mais próximo da realidade

indígena e dos estudos atuais sobre ela, valorizando o diálogo entre as diferenças.

Acreditamos que através do contato com os aspectos que compõem a cultura material da

cidade, as estudantes teriam condições de trabalhar para a preservação do patrimônio cultural

existente e compreenderem a história de formação da cidade e os aspectos da sua própria

história.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

287

Museu Memorial Tadakio Sakai

Tadakio Sakai chegou a Embu em 1952, vindo de Tushima, Nagasaki – Japão foi

agricultor e começou a esculpir por influência de Cássio M’boy, Victor Brecheret e amor por

Embu e pelo Brasil desenvolveu sua arte, com uma criatividade e originalidade digna dos

maiores elogios e foi merecidamente premiado inúmeras vezes pelo seu trabalho. As

estudantes vivenciaram no Museu Memorial Tadakio Sakai uma oficina de terracota, no

momento em que elas esculpiam suas peças podiam ouvir os relatos das histórias ligadas à

formação da cidade, a importância do memorial e do artista “Sakai” compreenderam a

importância da arte para a formação das crianças, adolescentes, jovens e adultos. Os

depoimentos das estudantes foram na perspectiva da importância de conhecer a cultura da

cidade, pois esta vai contribuir para sua formação pessoal e enquanto futuras profissional. Irá

possibilitar a construção de projetos pedagógicos mais comprometidos com as identidades

culturais e históricas. Muitas relataram o fato de não conhecerem o centro histórico e essa era

uma das oportunidades de conhecerem como Embu das Artes foi fundada.

Nesse sentido o curso de pedagogia tem um papel importante na perspectiva de

reconhecer, valorizar e empoderar sujeitos socioculturais. E esta tarefa passa por processos

de contato e conhecimento com a cidade e com os diferentes conhecimentos e saberes,

utilizando da pluralidade de linguagens, estratégias pedagógicas e recursos didáticos, a

promoção de dispositivos de diferenciação pedagógica127.

Figura 9. Visita ao Memorial Tadakio

Figura 10. Alunas de Pedagogia da Faculdade Polis das Artes.

Figura 11. Trabalhando com Terracota

127 Pois “Aprender arte [...] envolve, também, conhecer, apreciar e refletir sobre as formas da natureza e sobre as produções artísticas individuais e coletivas de distintas culturas e épocas (…) Além disso, torna-se capaz de perceber sua realidade cotidiana mais vivamente, reconhecendo objetos e formas que estão à sua volta, no exercício de uma observação crítica do que existe na sua cultura, podendo criar condições para uma qualidade de vida melhor” ( PCN-Arte).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

288

Museu do Índio

Trata-se de um espaço de pesquisa e debate de temas relacionados às questões

indígenas. Grupos étnicos, costumes, hábitos alimentares, arte (plástica, musical, dança,

oratória e ornamental), idiomas, crenças, rituais, vida comunitária e relação com a

natureza e meio ambiente. Fundado e planejado pelo artista plástico, pesquisador e

escritor Walde-Mar de Andrade e Silva neto de índio ficou reconhecido mundialmente

pelas obras de temática indígena. Aos domingos, o artista enchia o seu fusca e partia rumo

a Embu para expor os trabalhos e se encontrar com os escultores da época: Assis, mestre

Gama, Sakai, Vicente de Paula e outros. Walde-Mar apaixonou-se pela cidade, que

começava a ser conhecida como Embu das Artes. A atividade no Museu do Índio abordou

os aspectos de como no nosso cotidiano temos a presença da cultura indígena na

alimentação, na linguagem e nas brincadeiras. As estudantes relataram a importância do

conhecimento da identidade da formação do nosso povo e das contribuições do índio na

formação da sociedade nacional, resgatando as suas contribuições nas áreas social,

econômica e política, pertinentes à história do Brasil.

Figura 12 Exposição do Museu do Índio.

Figura 13 Alunas apreciando as obras

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Sabemos que as faculdades de educação nunca ficaram desatentas às questões da

cultura. Sempre, nos projetos de formação de professores propostos pelos órgãos oficiais,

e, aqueles operacionalizados na/pela faculdade, a dimensão cultural esteve presente. No

entanto, questiona-se sobre a falta de uma proposta que contemple a formação da cultural

local nos cursos de pedagogia. É no bojo de certas mudanças das propostas de formação

de professores e no âmbito de certas teorizações sobre a educação e o currículo que a

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

289

reivindicação pelas relações entre cultura e educação começa a ser manifestas. É possível,

portanto, encontrar nas tendências das formações para o multiculturalismo a chamada

para tal articulação. Nessa perspectiva, a arte e a educação devem ser reconhecidas como

uma abordagem para a cultura local, onde a multiplicidade dos espaços da cidade sirva

de exemplo para a articulação entre cultura local e formação de professores. A cidade

deve ser o espaço a ser promovido na relação entre cultura, educação e formação docente

desenvolvendo ideias em torno de uma cidadania crítica em respeito à diversidade.

Afinal, pensar a formação continuada de professores em uma perspectiva da

cultura local significa pensar uma efetiva mudança de atitude, de postura e de olhar para

o curso de pedagogia propondo a participação das estudantes na cidade e no território.

Para tanto, o diálogo apresenta-se como um instrumento indispensável, a partir do qual

professores e alunos podem estabelecer uma dinâmica de entendimento e reflexão, em

que as “vozes” de todos sejam ouvidas, consideradas e debatidas.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARBOSA, A. M. (1999). Arte, Educação e Cultura. Portal Domínio Público.

BRASIL (19998). Parâmetros Curriculares Nacionais: arte. Brasília: MEC/SEF

- Parâmetros Curriculares nacionais de 5ª e 8ª série.

CABRAL, N. A. (1998). Política Educacional. São Paulo: Sulina.

CANDAU, V. M. F. (1997). Pluralismo cultural, cotidiano escolar e formação de

professores. In V. M. F. CANDAU (Org.), Magistério: Construção cotidiana (pp. 237-

250). Petrópolis: Vozes.

CANEN, A., & MOREIRA, A. F. B. (2001). Reflexões sobre o multiculturalismo na

escola e na formação docente. In A. CANEN & A. F. B.MOREIRA, A. F. B. (Orgs.),

Ênfases e omissões no currículo (pp. 15-44). Campinas: Papirus.

FRIGOTTO, G. (1999). Educação e a Crise do Capitalismo Real. São Paulo, Cortez.

MOREIRA, A. F. B. (2001). A recente produção científica sobre currículo e

multiculturalismo no Brasil (1995-2000). Revista Brasileira de Educação, Rio de

Janeiro, 18, 65-81.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

290

PONCE, A. (1986). Educação e luta de classes. (J. S. C. Pereira, Trad.). (6ª ed). São

Paulo: Cortez: Autores Associados.

SACRISTAN, J. G. (1999). Poderes Instáveis em Educação. (B. A. Neves, Trad.). Porto

Alegre: Artmed Editora.

STOER, S. R., & CORTESÃO, L. (1999). Levantando a pedra: Da pedagogia inter/

multicultural às políticas educativas numa época de transnacionalização. Porto:

Afrontamento.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

291

ARTE Y CIUDAD: EXPERIENCIAS DE DANZA EN EL ESPACIO URBANO

Art and city: experiences of dance in the urban space

SÁEZ, Mariana Lucía128; MERLOS, Lucía Belén129

Resumen

En este trabajo nos proponemos compartir la descripción, comparación y análisis de sucesos, expectativas, concepciones de la danza y lo escénico en dos festivales de danza contemporánea en el espacio urbano de la ciudad de La Plata, provincia de Buenos Aires, Argentina: el Festival Danzafuera y el Festival Diagonales. Desde un abordaje etnográfico detectaremos consideraciones de la relación entre este arte y el espacio público, abriendo a una serie de preguntas acerca de las vinculaciones entre arte, política y sociedad.

Abstract

In this work we propose to share the description, comparison and analysis of events, expectations, conceptions of dance and stage in two contemporary dance festivals in the urban space of the Ciudad de La Plata, province of Buenos Aires, Argentina: the Festival Danzafuera and the Festival Diagonales. From an ethnographic approach we will detect considerations of the relationship between this art and the public space, opening a series of questions about the links between art, politics and society.

Palabras clave: Danza contemporánea; Festival; Espacio público; Ciudad.

Key-words: Contemporary dance; Festival; Public space; City.

Data de submissão: Março de 2016 | Data de publicação: Setembro de 2016.

128 MARIANA LUCÍA SÁEZ - Docente en la Cátedra Etnografía I. Becaria doctoral del Consejo Nacional de Investigaciones Científicas y Técnicas (CONICET), finalizando el Doctorado en Antropología de la Facultad de Filosofía y Letras de la Universidad de Buenos Aires (FFyL-UBA) Integra el Grupo de Estudio sobre Cuerpo (CICES-IDIHCS-UNLP/CONICET) desde su creación en 2008. Licenciada en Antropología por la Facultad de Ciencias Naturales y Museo de la Universidad Nacional de La Plata (FCNyM-UNLP). Organizadora del ECART (Encuentro Platense de Investigadores/as sobre Cuerpo en las Artes Escénicas y Performáticas). Bailarina en el Grupo de Danza “Aula 20” de la Facultad de Bellas Artes (UNLP) e integrante de la compañía Proyecto en Bruto. ARGENTINA. E-mail: [email protected]. 129 LUCÍA BELÉN MERLOS - Profesora de Arte en Danza -Orientación en Expresión Corporal por el Instituto de Profesorado en Arte de Mar del Plata (IPA). Intérprete en Danza por el Centro Polivalente de Arte, Mar del Plata (CPA). Docente e investigadora, se encuentra terminando su tesis de Maestría en Educación Corporal en la Facultad de Humanidades y Cs. de la Educación (UNLP). Integra el Grupo de estudio sobre Cuerpo en la Facultad de Humanidades y Cs. de la Educación desde el año 2012 (CICES-IdIHCS-UNLP/CONICET). Formada en Arte por la Universidad Nacional de San Martín (UNSAM). Recientemente becaria doctoral por el Consejo Nacional de Investigaciones Científicas y Técnicas (CONICET). ARGENTINA. E-mail: [email protected].

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

292

INTRODUCCIÓN

“El bosque, el lago, parques, plazas, glorietas, los juegos, los árboles, el pasto, la tierra, un tronco, la vía pública, edificios, escalinatas, escaleras, escaleras mecánicas, centros comerciales, pistas de patinaje, veredas, baldosas, son sólo algunos de los lugares que se presentan como espacios posibles, escenarios del suceso, en un estar ahí del movimiento, donde la teatralidad y la danza son el evento” (MERLOS & SÁEZ, 2016).

En este trabajo nos proponemos compartir la descripción, comparación y análisis

de sucesos, expectativas, concepciones de la danza y lo escénico en dos festivales de

danza contemporánea en el espacio urbano de la ciudad de La Plata (Buenos Aires,

Argentina). Eventos de danza que apuestan a la relación entre este arte y el espacio

público, abriendo una serie de preguntas acerca de las vinculaciones entre arte, política y

sociedad.

Hablaremos aquí del Festival Danzafuera, originalmente ideado y organizado

por un grupo de artistas locales: Constanza Copello, Jorgelina Mongan, Aurelia Osorio,

Laura Colagreco e Iván Haidar; y del Festival Diagonales gestionado por la coreógrafa y

directora de danza Marisa D’Alessandro, en conjunto con Raquel Rizzo, María Florencia

Salvatore, Marisa Velazquez y Javier García de Souza.

Iniciamos este recorrido entendiendo que las prácticas sociales que

consideraremos tienen un carácter artístico, tanto como estético y político. En este

sentido, referir a prácticas vinculadas con la utilización de espacios públicos por parte de

grupos de artistas, es acercarnos a construcciones de sentido cargadas de significaciones

respecto de cuál es el lugar, el rol y el sentido del arte, a quién está dirigido y para qué;

así como cuáles son los fines que persigue. Consideramos que estas representaciones se

articulan en prácticas concretas, en la medida que buscan producir transformaciones en

los modos de practicar y crear danza en la vida cotidiana y en la realidad local. Al mismo

tiempo, dichas prácticas se valoran a sí mismas como modos de producción escénica: sus

practicantes se construyen como artistas y como espectadores específicos; manejan

concepciones particulares sobre creación y producción; toman, recontextualizan y

resignifican instancias provenientes de otras artes o de otros estilos. Y esto en un marco

en el cual las producciones artísticas comparten la insistencia en establecer otros planteos

respecto de lo que el arte es o podría ser, dentro de un escenario caracterizado de mixtura,

hibridación, experimentación, inclusión de nuevos medios, y ampliación de los contextos

en los cuales desarrollarse.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

293

Desde una metodología etnográfica, se analizarán estos festivales de danza

contemporánea en el espacio público, buscando desandar semejanzas y diferencias en

torno a sus propuestas. Las relaciones contextuales y los vínculos entre la danza, la

ciudad, los artistas y el público serán claves para detectar las motivaciones de una puesta

en marcha, para crear, espetar e interactuar con producciones artísticas.

En esta línea, se utilizarán observaciones, entrevistas a organizadores y

publicaciones online de ambos festivales, destacando primeras ediciones y conceptos

fundantes, recorriendo sus trayectorias desde el año 2013 hasta la actualidad. En

particular, nos centraremos en identificar las consideraciones que en uno y otro festival

cobran especial relevancia, analizando las entrevistas realizadas a sus organizadores

desde cuatro grandes núcleos: los orígenes, objetivos e ideas fundantes de los festivales;

los criterios de selección de espacios, obras y programación general; consideraciones y

relaciones con el público; significaciones, posiciones identitarias y expectativas de

desarrollo futuro.

Ciudad de La Plata, 2013, dos festivales. Danza y espacios públicos.

“El espacio de la plaza se juega entre la algidez de la ciudad, el descanso semanal y el lugar de encuentro político” (LEOPOLDO, 2015)130.

“Ciudad de las diagonales”; “ciudad universitaria”; “ciudad de los tilos”, son

algunas de las denominaciones con que se conoce a la ciudad de La Plata, capital de la

provincia de Buenos Aires de la República Argentina. En ella confluyen grandes

representantes de la academia, el arte y la ciencia, siendo una ciudad con prestigio a nivel

nacional e internacional y caracterizada por su especial geografía urbana.

“La Plata es reconocida por su trazado, un cuadrado perfecto con el ‘Eje Histórico’ conservado hasta hoy en forma intacta; al igual que el diseño sobresaliente de las diagonales que lo cruzan formando rombos dentro de su contorno, bosques y plazas colocadas con exactitud cada seis cuadras”(…)“Está ubicada sobre la pampa húmeda, distante 56 kilómetros en dirección sudeste de la ciudad de Buenos Aires, capital de la República Argentina; y a 9,87 metros sobre el nivel del mar” (...) “La ciudad fundada por Dardo Rocha fue desde su fundación un polo educativo de excelencia; y alberga una historia sumamente rica en el campo de la cultura, el debate de las ideas y la investigación científica”131.

130 Rueda, L. (2015), Festival Internacional Danzafuera: experiencia, imaginación poética y derivas políticas del arte. En S. Mora & L. Merlos (Comp.), CIRCULACIONES: Cuerpo, espacios y textos. Disponible en: http://sedici.unlp.edu.ar/handle/10915/46484 131 Municipalidad de La Plata. http://www.laciudad.laplata.gov.ar/turismo/caracteristicas/generalidades.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

294

Es en esta ciudad donde conviven organismos de autoridades bonaerenses;

universidades destacadas del país; grandes proyectos políticos y culturales; tanto como

expresiones de lucha, resistencia y reivindicaciones sociales. Es en La Plata el lugar donde

gran parte del escenario socio-político del país, y particularmente de la provincia de

Buenos Aires, se vive en el cotidiano con una fuerte potencialidad. Y es allí donde la

danza, con sus posiciones poéticas, se hace presente en formatos y modalidades diversas.

Focalizando la mirada en este arte en el espacio público, describiremos aquí los

festivales anteriormente mencionados, que se hacen realidad casi de manera simultánea,

cada uno desde sus particulares desarrollos, características y formatos. Nos referiremos

al Festival Danzafuera y al Festival Diagonales, desde el modo en que sus propios

protagonistas se ven y en esta línea redefinen y reivindican una toma de posición política

para pensar la danza en las plazas, los parques, el bosque, la vía pública. Al mismo tiempo,

articulamos estas representaciones con los usos concretos del espacio y sus múltiples

apropiaciones. De este modo, y tal como lo plantea Mora (2015, p. 3) “realizar un estudio

sobre la danza y la ciudad implica establecer un doble juego de coordenadas: por un lado,

leer la ciudad con los ojos de quienes realizan intervenciones de danza en sus espacios

abiertos; y por otro, leer a estas intervenciones a través de los usos y apropiaciones que

hacen del espacio urbano”.

DANZAFUERA, interviniendo espacios

Imagen 1: Festival Danzafuera (2014). Foto: Daniela Camezzana.

Según se presenta en su página web, Danzafuera

“Es un festival anual de danza contemporánea que se lleva a cabo en espacios urbanos de la ciudad de La Plata, comprendiendo a la misma como escenario para la producción artística y como paisaje a ser intervenido”. (…) Es producido por un grupo de artistas residentes de la ciudad que vieron la necesidad de generar este nuevo espacio de muestra tanto para la producción artística local, nacional así como como la internacional”.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

295

El mismo tuvo su primera edición durante los días 2 y 3 de noviembre del 2013,

su segunda edición los días 15 y 16 de noviembre de 2014 y la tercera los días 27, 28 y

29 de noviembre de 2015. La organización está coordinada en la actualidad por un grupo

permanente de artistas locales -Constanza Copello, Jorgelina Mongan, Laura Colagreco,

Iván Haidar y Moira Hidalgo- y otros organizadores y colaboradores que van sumándose

en las diferentes ediciones.

En su primera edición, el festival contó con el apoyo y colaboración de

ACIADIP (Asociación de Coreógrafos, Intérpretes y Afines de Danza Independiente

Platense). En 2015 recibió financiamiento por parte del Fondo Nacional de las Artes.

El festival se realiza en dos jornadas continuas, en dos espacios urbanos diferentes.

En ambas jornadas se pueden ver piezas coreográficas de diferentes artistas, elegidas

mediante una convocatoria abierta; y dos proyectos de intervenciones coreográficas, una

en cada espacio, creadas especialmente para el festival por coreógrafos invitados y un

grupo de artistas residentes, que son seleccionados previamente por convocatoria abierta,

y que trabajan juntos durante dos semanas.

En su última edición, a este formato se agregó una intervención performática por

las calles céntricas de la ciudad, para la cual se seleccionaron -también por convocatoria

abierta- un grupo de artistas de diferentes disciplinas, que trabajaron intensivamente

durante cinco días, en la creación de la performance. Además, se sumó un taller abierto

al público, dictado por uno de los artistas participantes, en uno de los parques donde se

realizó el festival.

Danza en paisajes urbanos: DIAGONALES

Imagen 2: Festival Diagonales (2015). Foto: Juan Trentin

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

296

Por su parte el Festival Diagonales se define en su sitio web como un “festival

internacional de danza contemporánea en paisajes urbanos creado en La Plata”, “un

proyecto cultural gratuito, con el objetivo de humanizar la ciudad, revalorizar el

patrimonio artístico y arquitectónico urbano”. Un evento internacional de intercambio

cultural, sin fines de lucro “donde la danza sale en busca del espectador”. Un marco en el

que “se abren calles, plazas, para acoger a creadores, público y artistas en esta gran fiesta

de la Danza y del Arte”. El festival es organizado por la coreógrafa y directora de danza

Marisa D’Alessandro en conjunto con los artistas Raquel Rizzo, María Florencia

Salvatore, Marisa Velazquez, Javier García de Souza, y un equipo de colaboradores que

se suman en cada edición.

En cuanto a la programación, Diagonales también se realiza en dos jornadas

consecutivas en dos diferentes espacios públicos al aire libre, durante las cuales se

presentan obras seleccionadas mediante convocatoria abierta e intervenciones de

procesos creativos desarrollados en talleres y/o seminarios intensivos organizados en el

marco del festival. Asimismo, en algunas ocasiones esta programación es acompañada

por uno o dos espectáculos (ya sean funciones únicas, o funciones compartidas por

diferentes elencos) realizados en diferentes salas teatrales de la ciudad.

A su vez el Festival Diagonales se enmarca en la Red Ciudades que Danzan

(CQD), “una red internacional de festivales de danza contemporánea que programan en

espacios urbanos” que busca crear “un sistema dinámico de cooperación, coordinación e

intercambio entre los miembros. La red favorece la cooperación entre los países, creando

un acuerdo común de difusión artística en diferentes lenguajes y culturas”. En la

presentación del festival dentro del sitio web de la Red se lee: “Este Festival pretende ser

0un encuentro anual entre bailarines, performers, coreógrafos, directores provenientes del

área de la danza, tanto nacionales e internacionales interesados en intercambiar saberes,

procedimientos, formas de hacer; a través de sus producciones o de dictado de talleres o

seminarios teniendo como vector de orientación la intervención de la arquitectura urbana.

El mismo tiene como proyección establecer otros circuitos y plataformas en el

futuro que permitan y promuevan estos intercambios (charlas, debates, mesas redonda,

proyecciones, etc.)”.

Diagonales tuvo su primera edición los días 6, 7 y 8 de diciembre de 2013, la

segunda los días 5, 6 y 7 de diciembre de 2014 y la tercera los días 5, 6, 7 y 8 de noviembre

de 2015. En esta última edición, el festival recibió el apoyo del Fondo Nacional de las

Artes para su realización.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

297

DANZA Y ESPACIO(S)

“Un lugar es invadido y el cuerpo se prepara para la acción, intervenciones asociadas a improvisaciones, cuerpos que llegan y danzan, secuencias se desenvuelven y configuran, utilización no convencional de los espacios elegidos y diversidad de modos de habitarlos” (MERLOS & SÁEZ, 2016).

Espacios convencionales y no convencionales para la danza

Como se desprende de estas breves presentaciones, en ambos festivales aparece

la relación entre la danza y el espacio, y en particular la referencia a un espacio “nuevo”

para la danza, encontrado en el espacio público urbano.

Para comprender a qué se hace referencia al hablar de estos nuevos espacios,

espacios no convencionales, no tradicionales, o espacios alternativos para la danza

contemporánea, se hace necesario un breve repaso de los principales espacios en los que,

de manera característica, se ha desarrollado la historia de la danza académica occidental.

A partir del siglo XVII, la tradición del ballet -que ocupa un lugar preponderante

en la conformación de la danza en tanto arte-, inaugura la diferencia entre ejecutantes y

público que no estaba presente en formas de danza precedentes, como por ejemplo la

Mascarada. Esta diferencia esencial, inaugura también un espacio escénico específico,

que puede verse en los teatros para ópera y danza construidos por las cortes del siglo

XVIII, en los que hay una clara delimitación entre el espacio escénico y el espacio para

el público. La escena tiene un espacio posterior para la tramoya y los cambios de telones,

y un espacio por delante para la orquesta. Por su parte el público se distribuía en la platea

y en los palcos (para los invitados más importantes). En el siglo XIX, el teatro burgués

mantiene esta distribución espacial básica pero, dada la diferencia de su público y la

necesidad de autofinanciarse, en general ya no presenta palcos, sino una platea inclinada,

y una galería al fondo, más elevada, para un público más popular. El espacio escénico

suele tener menos profundidad y el espacio del público se mantiene a oscuras durante las

actuaciones.

Ya a comienzos del siglo XX, el teatro modernista, es típicamente un espacio

escénico semicircular, más bajo que la platea que lo rodea casi totalmente, adoptando una

disposición semejante al teatro griego, pero con tecnologías modernas. De este modo ya

no hay un punto de vista único o privilegiado, se gana tridimensionalidad y el público se

encuentra más próximo a los artistas.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

298

Posteriormente, las producciones del siglo XX “terminan por romper con las

estructuras artísticas y expanden las formas y los lugares donde hacer y experimentar

arte”. (Seijo, 2015:208), siendo un siglo de grandes transformaciones en la danza

escénica, período en el cual, en conjunto con lo que va del XXI, se ha hecho danza en

toda clase de espacios, incluyendo los espacios tradicionales, tales como los previamente

descritos, como otros espacios, “alternativos” o “no convencionales”. De acuerdo con

Pérez Soto (2008, p. 77) “hay tres posibilidades escénicas más (probablemente hay muchas

otras) que es interesante describir por la presencia que tienen en los experimentos de las

vanguardias y en la comunicación masiva. El escenario circular, la pasarela de modas, el pequeño

estudio”. Las experiencias que nos interesa analizar en este artículo podrían encuadrarse

dentro de la primera de estas categorías, el escenario circular, en tanto

“espacio abierto de la calle o la plaza, donde los ejecutantes son rodeados por un público que los ve próximos y a su misma altura, en que el límite del escenario no está claramente marcado y no hay lugares establecidos para entradas o salidas. Es el caso del teatro callejero y de las performances en lugares públicos abiertos (...) En esta situación todos los aspectos de la obra son visibles, en particular las condiciones de su producción, es decir, los cambios de vestuarios, la manipulación de elementos, la entrada o salida relativa de los participantes, la producción de la música. Son condiciones que permiten un gran acercamiento con los espectadores y, en principio, permiten diluir la diferencia entre ejecutantes y público. El público está naturalmente implicado por la cercanía y puede convertirse fácilmente no sólo en destinatario sino en elemento y sujeto de la obra. No hay ilusionismo ni hay una dirección de observación privilegiada” (idem, pp. 77-78).

Espacio público y danza(s) “El espacio público es el de la representación y aquel en el que la sociedad se hace visible. En tanto espacio público, la plaza ha sido considerada también como el lugar en donde se constituye el lôgos. Pero lôgos entendido como palabra pública y comunicable, en tanto lugar de experiencia compartida y comunitaria” (LEOPOLDO, 2002).

Los sentidos del “espacio público” han ido cambiando a lo largo de la historia.

En el desarrollo de las imágenes del pensamiento político-ideológico occidental, que

comienza su recorrido en la separación del ámbito de lo privado y del ámbito de lo

público, el espacio público va tomando un lugar central en tanto asidero físico de la idea

de representación y de comunidad política. Como lo plantea Senett (2011), a partir de la

identificación de lo público con el bien común en sociedad en el siglo XV, fue

prevaleciendo su asociación con los espacios exteriores y abiertos a la mirada de todos,

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

299

en contraposición a los espacios íntimos, a lo privado. Nora Rabotnikof (1997) sintetiza

tres sentidos habitualmente asociados a “lo público”: el interés colectivo o común (en

oposición a lo individual), lo visible o manifiesto (en oposición a lo oculto), y lo accesible

o abierto (en oposición a lo cerrado). Desde el siglo XVIII, en las ciudades capitales, con

la expansión del capitalismo industrial y la consolidación de los estados modernos, se fue

generando la asociación, aún en vigencia, entre espacio público urbano y esfera pública

política. De hecho, como lo plantea Mora (2015) en nuestro país los espacios públicos

urbanos son inseparables de la historia de las militancias y de las manifestaciones de la

sociedad civil; manifestaciones que, por otra parte, han incluido propuestas performáticas

desde hace décadas. Aunque una de sus acepciones más extendidas lo asocie con aquel

lugar al que potencialmente todos pueden acceder, los espacios públicos son siempre

espacios de desigualdad y de disputa, tanto por ser el lugar donde los conflictos se

escenifican, como por ser él mismo objeto de disputa (4).

Vemos entonces que, como plantean Fernández y López (2013), el espacio

público, como imaginario, está ligado a la organización política de la comunidad, aunque

la equivalencia entre público y político, debe ser atendida críticamente.

Tal como fue mencionado con anterioridad, el uso del espacio público para la

danza contemporánea presenta una larga trayectoria “Desde mediados de los años sesenta,

la danza contemporánea ha ido invadiendo todo tipo de espacios fuera del recinto teatral.

Ha acabado por conquistar la práctica totalidad del territorio de lo cotidiano” (ROYO,

2009, p. 13). En este sentido, el desarrollo de la danza contemporánea como tal, es

paralelo a estas modificaciones y diversidades en el uso de los espacios, y en particular

con los trabajos de la llamada postmodern dance (BANES, 2001), -y más específicamente

de la Judson Dance Church- se instalan muchas de las prácticas y tendencias de la danza

contemporánea en espacios no convencionales y es allí donde tienen lugar muchas de las

disputas propias de este campo.

Sin embargo, el desarrollo en espacios teatrales ha sido históricamente

dominante en la danza contemporánea y en buena medida sigue siéndolo en la actualidad-

, aunque es importante mencionar que estos espacios son de características muy diversas,

yendo desde pequeños estudios, hasta teatros líricos. Es en este sentido que al hablar de

espacios no convencionales se hace referencia especialmente a espacios no teatrales

(eludiendo la diversidad que la categoría de espacio teatral ya presenta de por sí), dentro

de los cuales los espacios públicos urbanos abiertos, como los elegidos para el desarrollo

de los festivales Danzafuera y Diagonales, son una posibilidad (junto a otros espacios

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

300

tales como museos, salas de exposiciones, espacios públicos cerrados, etc.) para, en

palabras de Iván Haidar (2014, entrevista realizada por las autoras), “salir de la caja

negra”.

Por otra parte, es necesario mencionar que en la ciudad de La Plata otras formas

de danza se desarrollan habitualmente en el espacio público urbano, tal es el caso de la

danza folklórica nacional, que se baila todos los fines de semana en Plaza Italia -como

lugar característico pero no exclusivo- así como en diversas celebraciones tradicionales

de la ciudad; el tango, que tiene su lugar en la explanada de la Torre I; las danzas de raíz

afro que se bailan el Parque Saavedra -entre otros puntos-; el hip-hop/danza break, en la

glorieta de Plaza San Martín y en la zona fundacional de Plaza Moreno; las murgas y

cuerdas de candombe que ensayan y realizan presentaciones regulares en plazas y parques

de la ciudad; entre otras.

En este sentido, la identificación de la danza contemporánea como “la danza”

podría entenderse como un no reconocimiento de las otras expresiones anteriormente

mencionadas, suponiendo una suerte de desconocimiento del amplio campo de la danza

en el espacio público en la ciudad. Sin embargo podemos detectar, en general, que dentro

de la comunidad de la danza contemporánea estas otras manifestaciones son valoradas o

reconocidas como bailes o manifestaciones culturales, y, en sintonía con esto, la palabra

“danza” parece reservarse únicamente para las danzas escénicas occidentales. Cabe

destacar que estos otros modos, identificados como danzas sociales y/o populares,

forman parte de circuitos que les son propios, en los cuales la práctica en espacios

públicos es constitutiva y no “novedosa”, al igual que la intención de no establecer, al

menos desde el discurso, una separación entre espectadores y público (MORA, 2015).

Es en este marco de visibilizaciones e invisibilizaciones, reconocimientos y

disputas, que se sitúa la realización de los festivales de danza contemporánea en espacios

públicos urbanos de la ciudad de La Plata que son objeto del presente análisis. Como lo

referíamos anteriormente, el uso de este tipo de espacios no resulta ser una experiencia

completamente nueva en el campo de la danza contemporánea, sin embargo, nos aporta

miradas renovadoras desde la posición de artistas y organizadores, las modalidades de

intervención, los modos de construir corporalidades escénicas y los diferentes contextos

socio-culturales en las que estas prácticas se actualizan. En particular, para el interés del

presente trabajo, el uso de este tipo de espacios nos abre a un campo de indagación sobre

las relaciones entre arte y política, analizado desde los sentidos que se enlazan en torno a

la relación danza-ciudad.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

301

UNA CIUDAD. DOS FESTIVALES Retomando las breves presentaciones de los festivales basadas en informaciones

extraídas de sus sitios web, podemos realizar las primeras aproximaciones a los sentidos

que los organizadores de los mismos otorgan a su práctica. Vemos en primer lugar, que

en el caso de Danzafuera la ciudad es concebida como escenario y como paisaje, como

un nuevo espacio para la circulación artística. Aparece una apelación a la propia

comunidad de la danza, en tanto se les ofrece un espacio alternativo en el que crear y

mostrar sus producciones. En el caso de Diagonales, la ciudad aparece como un espacio

a ser humanizado, focalizándose en la revalorización de su patrimonio arquitectónico. Al

mismo tiempo, se habla de acoger a creadores y público, y salir en busca de los

espectadores. Esta inclusión del público no aparece en la descripción del festival que se

hace en la página de la red Ciudades que danzan, donde el foco está puesto nuevamente

en el intercambio entre artistas. Sin embargo, la cuestión del público - en particular del

“público no especializado”- tiene un lugar preponderante en la presentación de la Red,

como elemento común a todos los festivales que la integran, donde la “democratización

de la cultura”, la confianza en “el arte como herramienta de transformación social” y el

espacio público como “espacio de comunidad” resaltan como sus principales valores.

Imagen 3: Festival Diagonales (2015). Foto: Juan Trentin.

Observamos entonces que en el caso de Danzafuera resultan especialmente

pregnantes las motivaciones que responden a lo que Pérez Royo (2009, p. 16) sistematiza

como “propuestas [que] responden al deseo de situar la danza en circunstancias

cambiantes, en el gusto por proponerle al cuerpo condiciones variadas que sirvan de

estímulo y le ofrecen la posibilidad de (o le obliguen a) desarrollar nuevas estrategias

coreográficas o improvisadoras”.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

302

De este modo, la ciudad concebida como escenario y paisaje, implica el trabajo

creativo en un espacio que no es el espacio vacío y mudo de la sala teatral o de ensayo,

sino un espacio repleto de elementos y de personas, de historias y de significados.

La “danza de especificidad espacial ofrece un nuevo modelo de comprensión de

la ciudad, que se descubre como lugar de adquisición y formación de experiencia estética

a la vez que se rescata como un espacio social y dialogal; como territorio de identificación

del habitante con su entorno urbano” (ROYO, 2008, p. 14). Por su parte, en el caso de

Diagonales, la especificidad espacial se destaca en su estrecho vínculo con la arquitectura

y esta referencia a la arquitectura se reitera en sucesivos números de la revista “Ciudades

que Danzan” -publicación de la red homónima-, refiriéndose no ya a la multiplicidad de

aspectos y dimensiones de la ciudad, sino a una parte de la misma, a su dimensión

constructiva, a su uso como escenografía de la obra y a la danza como posibilitadora de

diferentes lecturas del espacio arquitectónico (ver, por ejemplo, Revista ciudades que

danzan, números 0, 1, y 2). Una construcción en danza desde lo arquitectónico, en la que

“la motivación coreográfica parte de la exploración cinética de una arquitectura, en la que

el bailarín encuentra estímulos espaciales para desarrollar su discurso” (ROYO, 2009, p.

17).

Estas potencialidades de la danza contextual, o danza de especificidad espacial,

conectan con los postulados en torno a la “humanización de la ciudad”, que se destacan

en la presentación del festival Diagonales, y cuyos sentidos -más allá de la aparente

redundancia en el término, ya que como afirma Terán (1951), la ciudad es el paisaje

humanizado por excelencia- rondan en torno a una gestión sustentable del desarrollo

urbano que involucre a los habitantes en su cuidado y que proponga mecanismos de

participación ciudadana, como modo de contrarrestar los problemas de funcionamiento,

hacinamiento, incomunicación y desintegración social característicos de las ciudades

modernas (MAURE, 2000). Asimismo, humanizar la ciudad, establecer vínculos con la

arquitectura, son temas recurrentes de la revista “Ciudades que danzan”.

En el editorial del número 1 de esta publicación se lee: “esperamos que nuevas

ciudades se incorporen a este proyecto que busca humanizar nuestro espacio público,

potenciar la creatividad e imaginación, acercar el arte a la comunidad y establecer una

relación más profunda y razonable entre los ciudadanos y su entorno arquitectónico, entre

el arte y el resto de la comunidad, así como también con la propia ciudad.” En este sentido,

la búsqueda de contextos alternativos para la danza contemporánea se vincula a un interés

por establecer un vínculo directo con otras esferas de lo social.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

303

Imagen 4: Festivan Danzafuera (2014). Foto: Daniela Camezzana

A partir de estas iniciales aproximaciones, podríamos señalar algunos elementos

coincidentes entre ambos festivales, a la vez que las primeras diferencias. Ambos

proyectos comparten la preocupación e insistencia de expandir los límites de la danza y

acercarla a otros públicos, en donde intervenir diferentes espacios públicos de la ciudad

se presenta como una premisa fundamental.

En el caso de Danzafuera, estas preocupaciones se conectan fuertemente con una

mirada orientada hacia problemáticas propias y específicas del campo de la danza (la

ausencia de espacios en los que los artistas puedan compartir su trabajo, la búsqueda de

nuevos estímulos para la creación, la necesidad de salir del aislamiento y vincularse con

un público más amplio); en tanto en el caso de Diagonales se encuentra una preocupación

fundante por la relación con el público y por la puesta en valor del patrimonio de la ciudad.

Sin embargo, estos elementos se entrelazan de maneras más complejas en ambos

festivales. La separación entre elementos internos, propios del campo de la danza y su

estructura, y elementos externos, del contexto en que se realiza, no resulta clara ni

operativa, ni se encuentra separada de este modo en los discursos de los organizadores de

los festivales ni en el desarrollo mismo de los eventos. Es por ello que analizar los

festivales en términos de dance event, nos brinda ciertas pistas para profundizar en estas

tensiones. El concepto de dance event (evento o acontecimiento de danza), permite

ampliar la concepción de lo que es danza, incluyendo todo el ambiente que la rodea y el

lugar donde se produce. De este modo se establece un nexo entre la estructura de las

danzas y su función social (ISLAS, 1995).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

304

Como plantea Ronström (ISLAS, 1995), las danzas deben estudiarse como

ocasiones sociales que tienen una significación en el contexto de ejecución. En esta línea,

para el análisis de los dos festivales en cuestión en tanto dance events, recurriremos a

entrevistas realizadas a sus organizadores, para entenderlas en tanto posiciones situadas,

analizadas en conjunto con las observaciones y participaciones de las autoras en ambos

festivales.

SENTIDOS EN CIRCULACIÓN Y TENSIÓN. Entrevistas a los organizadores

En la creación de los festivales, particularmente desde la alianza de artistas

locales en la proyección de estos eventos de danza, aparecen concepciones que resultan

claves para comprender los modos de pensar el arte, la danza y los espacios y las

relaciones recíprocas entre estos conceptos. En esta línea la voz de sus organizadores nos

permite entender los sentidos que se aglutinan para dar identidad a ambos festivales.

A continuación transcribimos fragmentos seleccionados de las entrevistas

realizadas a principios del 2014 y del 2016 a organizadores de Danzafuera: Constanza

Copello, Iván Haidar y Jorgelina Mongan; y a la coordinadora general del Festival

Diagonales Marisa D’Alessandro.Realizamos un recorte y selección de fragmentos de

estos diálogos estableciendo reflexiones conceptuales en cuatro grandes núcleos

temáticos: el primero de ellos vinculado a los orígenes de los festivales y sus objetivos

fundantes; el segundo abordará los criterios para la selección de espacios y propuestas

artísticas; el tercero hará hincapié en la consideración y participación del público; y por

último nos enfocaremos en las posiciones personales e identitarias para pensar la danza

en el espacio urbano de la ciudad y para pensar cada uno de los festivales y su proyección

a futuro.

Primer núcleo temático: orígenes de los festivales y objetivos fundantes

Preguntas disparadoras: ¿Cómo surge la idea de hacer el festival?¿Cuáles son los

conceptos fundantes? ¿Cuáles fueron y son los objetivos del evento?

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

305

Marisa D’Alessandro (Diagonales): Yo en 2004 había viajado a Europa, fui a pasear, pero estuve formándome en varios lugares. Y ahí me enteré de la existencia de los festivales de danza en paisajes urbanos, que yo ni idea. Entonces volví a La Plata con esa idea de hacerlo acá, de investigar qué posibilidades había (...). De a poquito, de a poquito y bueno, fue gracias a que se me ocurrió mandar el proyecto a la red (Ciudades que danzan), poder conseguir la guita para ir y haber estado ahí en Barcelona (...). Porque son los padres de esta realidad.(...). Así que bueno, me vine de allá con esta cosa muy volada, y entonces cuando volví de Europa fue cuando se me ocurrió. (...) Y la selección de la gente para que me acompañe... Raquel (Rizzo) es como de la vida, compañera, pero ella también, como labura mucho en lo de Marta (Cipriano), tiene un contacto, tiene una relación con un lugar que no soy yo (...). Marisa (Velázquez) que viene de la escuela de danzas folklóricas y es muy interesante. Yo lo que quise es tener una multiplicación de voces, que no sea monopólico el asunto, que no todos piensen como yo, porque a mi no me servía...

Constanza Copello (Danzafuera): Hace mucho tiempo que pienso cómo de qué manera y cómo hacer que la danza se mezcle con otras cosas, de hecho mi tesis es sobre la relación del cuerpo y espacio. Y bueno, a mi me encanta Ciudanza, siempre intento ir, un par de veces bailé, y sino como espectadora. Siempre me interesó mucho la relación de la danza con la ciudad. Y en 2012, hablando Jor (Jorgelina Mongan) que es mi amiga y con Aurelia (Osorio) que es mi amiga también, dijimos ‘bueno, por qué no hacemos una edición acá en La Plata’ y ahí empezamos a delirar un poco cómo sería, cómo nos gustaría, cuán grande... y bueno, a fin de año habíamos hecho ya un grupito de trabajo y cada vez fue tomando más forma.

Iván Haidar (Danzafuera): Jorgelina (Mongan) y Laura (Colagrecco) vienen más del butoh, pero también en relación con la danza contemporánea. Jor hizo las dos cosas, entonces hace como unas mixturas, pero sí, es danza contemporánea y butoh si se quiere. y conmigo teatro también. Pero si, todos tenemos en común la Danza contemporánea.

Marisa D’Alessandro (Diagonales): El festival tiene objetivos predeterminados por la Red (...). Los objetivos de acercar la danza al público, al transeúnte, y poner en el mismo plano de importancia tanto al artista como el público, y que pueda haber un puente integrador entre ambos estratos de personas y que la danza deje de pertenecer a una elite. Y otro de los puntos es que los espacios en los que uno camina, casi sonámbulo (...) darle como una mirada distinta a esos espacios, que la gente pueda hacer un registro de esa arquitectura urbana, que es parte de la historia del lugar. Y de ellos mismos, es parte de nuestra historia. Esos son los objetivos. (...) Y creo que los hacedores de los festivales estos tenemos como esa búsqueda, no es que nos atenemos a, sino que por algo queremos hacer el festival. Porque coincidentemente tenemos esos objetivos. Y otra de las cosas por las cuales yo quise abrir el festival, es para abrir, para que la gente de la danza salga a ver otras cosas, y a participar, y no se quede encerrada en sus espacios de pertenencia.

Iván Haidar (Danzafuera): Producir espacios que no existen, que no sean espacios cerrados, una caja negra, sino poder sacar la danza a la calle. Que la danza entre en un diálogo más directo con la gente y que haya una retroalimentación de los creadores para con el público y del público para con los bailarines y los coreógrafos. Que los bailarines de la ciudad tengan la posibilidad de mostrar otro tipo de trabajos y de crear y de pensar sus obras para estos espacios. (...) La idea es crear espacios de producción y de llevar las obras fuera de la caja negra. Pensar en el espacio público es pensar en otra posibilidad de producir, en otra posibilidad de interactuar con tu obra y con tu propuesta, en relación a los espacios y en relación a quien participa mirando, a los espectadores. Entonces, también era un poco acercar la danza a la gente, que no acostumbra ir al teatro o que no acostumbra ver danza, acortar un poco esa brecha que hay entre el público y los creadores de danza. (...)

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

306

Segundo núcleo temático: criterios de selección de espacios y programación

Preguntas disparadoras: ¿Cómo eligen los espacios? ¿Cuáles son los criterios y cómo es la

selección de obras?¿La convocatoria es para la danza contemporánea, es para la danza en

general?

Marisa D’Alessandro (Diagonales)- Buscamos que los espacios sean representación de distintos sectores de la ciudad. El pasaje 8bis como representante del sector comercial, el museo como representante del sector científico universitario y el parque (Saavedra) como representante del esparcimiento. Además nos gustaban arquitectónicamente los lugares, nos parecían interesantes.

Constanza Copello (Danzafuera)- Elegimos espacios que de alguna manera vayan a meterse en donde está la gente. Por ejemplo, tenemos una consideración del sábado y el domingo, como el sábado la gente esa en un tipo de espacios y el domingo está en otra, e intentamos pensar ese tipo de cosas, ver dónde está la gente, y dónde está la gente tomando mate además, porque si estas por ahí circulando tampoco es que te va a interesar mucho detenerte a mirar, en cambio si estas tomando mate… Tomar mate y mirar una obra de danza es una combinación que quizás esté buena.

Iván Haidar (Danzafuera): Los puntos principales por los que elegimos los espacios están bajo dos criterios. Uno, la posibilidad de intervenir espacios por donde circule gente. Por ejemplo, nos encanta la estación de trenes de Tolosa, pero si hacemos una intervención un domingo ahí, la gente se tendría que acercar especialmente, porque no circula por ahí. Y entonces con ese criterio elegimos la plaza Islas Malvinas. Y decidimos como segundo punto un espacio más natural, que tenga verde, y un espacio más de cemento y más urbano. Por eso el sábado lo hicimos en el Paseo del bosque y el domingo en Islas Malvinas, que es como cemento, una plaza llana, que no tiene pasto, está el centro cultural ahí y por eso elegimos los espacios.

Marisa Dalessandro (Diagonales): (En la primera edición) nosotros decidimos que tener curadores externos nos quitaba un peso de encima en todo sentido. Y no nos metimos con sus criterios, respetamos lo que ellos decidieron, sólo les dijimos cuántas compañías podían elegir, por una cuestión de presupuesto nada más. (...) En un principio entendimos que para que sea realmente objetivo, y que esa realidad pudiera verse, que somos objetivos y que no elegimos las cosas según nuestros amiguismos -porque creemos que ese es el comienzo del fin del festival-, convocamos a curadores de otros festivales (...) y les enviamos los proyectos a ellos para que hagan la selección. En el primer año, convocamos a la gente de la organización de Danzalborde, de un festival de Brasil, y de un festival de Bolivia, que al final no participaron porque estaban ausentes en ese momento. En el segundo año también volvimos a convocar a la gente que gestiona Danzalborde, convocamos a la gente Rosario, que por razones de tiempo y organización de lo suyo no pudieron colaborar y convocamos al director de la red (Ciudades que danzan). Ya en el 2015 pensando en una cuestión de identidad, entendimos que la curaduría de los trabajos teníamos que hacerla desde la dirección de nuestro mismo festival, porque entendemos que La Plata es una ciudad que conocemos nosotros, que los trabajos que se presentan identifican el formato del festival, y que quizás no lo identifiquen de la misma manera para la gente de Chile, Rosario o quien sea. Nosotros pensamos el festival de una manera determinada en relación a la ciudad que estamos interviniendo, por lo cual decidimos tener un criterio subjetivo en cuanto a esa cuestión, que sea representativo de la ciudad de La Plata. Entonces hicimos la selección nosotros. De todas maneras creemos que a veces es importante tener la mirada de alguien de afuera, más allá de que entienda o no la identidad platense, porque sí tienen mucha experiencia en lo que significa intervenciones en espacios no convencionales, tienen años de trayectoria haciendo ese tipo de trabajos, y para nosotros es importante tener una mirada, aunque sea general.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

307

Iván Haidar (Danzafuera): Se arma una convocatoria abierta en la cual seleccionamos algunas obras para los diferentes espacios que pasan por nuestra curaduría. Y también hacemos dos residencias, una para cada espacio, coordinadas por dos coreógrafos distintos cada vez, en cada uno de los ciclos (...). Y para esas residencias también se arma una convocatoria abierta donde se selecciona un grupo de gente para hacer un montaje en esos espacios (...) A los coreógrafos los propusimos nosotros y nos encargamos de lo curaduría también. Nos llegaron las propuestas de las obras, nos juntamos y decidimos, una por una viéndolas, cuales podrían llegar a formar parte. Y lo mismo con los dos coreógrafos, una lista de todas las personas que nosotros conocemos y creemos que pueden llevar adelante la propuesta… (...) Lo primero que queríamos priorizar era el trabajo en el espacio, y cómo los proyectos intentaban resaltar alguna relación de lo que es la obra ahí, en ese lugar, por ahí las que más quedaron afuera fueron las que no proponían nada distinto que era lo mismo que lo hagas en un teatro que lo hagas acá.

Marisa D’Alessandro (Diagonales): Es abierto a cualquier tipo de danza, de hecho en algunos lugares de España van ballets españoles, de flamenco o de danza clásica española. Pero el espacio se presta para ciertas trabas. Por ejemplo, alguien que quiera bailar en punta, si no le ponés un tapete se rompe la pierna, y no se va a sentir atraído por la convocatoria. No porque uno lo corte, sino porque va a decir, no puedo. Lo que llega a la convocatoria está todo más o menos dentro del mismo tipo de lenguaje, más de la danza contemporánea.

Constanza Copello (Danzafuera): No es que no entren otras formas que no sean la danza contemporánea, la convocatoria es abierta en ese sentido, pero esas danzas en general tienen coreografías ya armadas y nosotros lo que priorizamos es que sea una propuesta que genere un diálogo particular con el espacio. No es que por ser de afro por ejemplo no la vamos a elegir, si presentaran una propuesta que haga eso, que se vincule al espacio, podría ser, pero en general no pasa, es más secuencia de pasos y no una puesta específica para el espacio.

Tercer núcleo temático: Relaciones con el público

Preguntas disparadoras: ¿Qué formas de participación para el público propone el festival?

¿El público que asiste, es un público en particular? ¿Cuáles son las relaciones entre

intervención/obra y público?

Marisa Dalessandro (Diagonales): Una de las cuestiones fundamentales que tiene la red, y la concepción del festival en sí mismo, es que uno le tiene que dar la misma importancia al artista que al espectador, y que en realidad son los espectadores los que hacen que funcione el festival y que continúe en el tiempo. Y también fomentar que la gente de la danza vea el trabajo de sus colegas. Yo creo que es un laburo que hay que lograr y que una de las cosas por las cuales llevó a cabo el festival es esa, sacar del nicho a la gente (...). Había un montón de gente, que no era de danza, que era gente común. Había gente de danza también, poca. En el parque se vio mucho eso del flaco que salía a pasear el perro como todas las tardes y decía, guau, yo me quedo acá y se quedaba. En el pasaje era re loco ver a las empleadas de los negocios paraditas en las puertas, y eran parte de la coreografía. El portero, que decía, te pongo la música. El cuidador, de uniforme, que decía, yo cierro acá. Cosas que nadie pidió nada, y esas cosas hacen una cuestión de inclusión. Aparte pasaban pibes, pendejitos, que veían bailar y se iban haciendo cosas.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

308

Iván Haidar (Danzafuera): En la primera edición el público fué bastante mezcla, entre los artistas que llevan su propio público, algo de la comunidad de la danza y del teatro que se va enterando y llega a los espacios, y la gente que está ahí. En el Islas Malvinas fue muy claro, porque el día estaba re lindo, había mucha gente en la plaza y en un momento se acumuló todo ese caudal de personas estaba viendo el espectáculo, y ahí se construyó, entre las personas que fueron a verlo y las personas que estaban ahí (...)En cuanto a la participación del público, algunas veces se les fue proponiendo más desde dónde mirar, y en algunas otras propuestas que así lo permitían no, no diciéndoles, entonces quizás hacía que circulen de otra forma. Creo que eso sucedió ahí, en este acercamiento de las personas como intervención a ver o a participar de algo que no habían planificado. Estar en la plaza y salir de la hamaca e ir a ver eso que hay ahí y llevártelo a tu casa y probablemente quedarse pensando que se quedaron charlando sobre la locura que vieron en ese momento, comentarios que se escuchan ahí al pasar. (...) Y después, la interacción con el público, las cosas que pasaban ahí en el momento… No se, todo lo que pasó en el bosque, con la naturaleza, con el clima, con la oscuridad, con los animales, con los perros, con las personas que pasaban o que ya estaban… todas esas cosas que revalorizan un poco lo que es la danza con las cuatro paredes con lo que es la danza en un paisaje abierto y metido en el medio de otros contextos.

Cuarto núcleo temático: Significaciones, identidad y expectativas futuras

Preguntas disparadoras: ¿Qué significó y qué significa para vos Danzafuera? ¿Qué sentido

tiene hacer el evento en el espacio público? ¿Qué modificaciones se fueron dando a lo largo

de las sucesivas ediciones en el modo de concebir el festival? ¿Cómo se proyectan a futuro?

Marisa D’Alessandro (Diagonales): Los objetivos son siempre los mismos, tal vez las acciones conjuntas que se hacen para juntar recursos pueden ser modificadas, pero en líneas generales los objetivos, los destinatarios son siempre los mismos, y es más, creemos que habría que profundizar en ese mismo canal la búsqueda de por qué, cuándo, dónde, para qué. Pero estamos muy contentos y la edición de 2015 fue realmente generadora. (...) El sueño mío, por decirlo de alguna manera, y de la gente que trabaja conmigo en el festival, (...) es que más allá de hacia dónde se proyecte, porque el festival ya tiene la proyección que originariamente se pretendía, nosotros tenemos alcance internacional por pertenecer a la red. A nosotros nos llegan propuestas todo el año de todo el mundo, que no conocemos, por el hecho mismo de pertenecer a la red y estar en la página, hace circular la información. Entonces la proyección ya está. Lo que nos resultaría muy interesante, pero esto ya es una cuestión que atañe a la gestión política en términos más generales -y no acuso ni a un gobierno ni a otro-, es que haría falta un apoyo y recursos, más allá de los que nosotros hemos tenido por parte de la gestión pública, necesitaría poder contar con mayores recursos económicos. Y eso no tendría que ser por parte de la organización del festival, porque la organización del festival está para hacer la gestión cultural, para promoverlo, para difundirlo, para pensarlo, para seleccionar las compañías, para organizarlo, para eso estamos nosotros. Si me gustaría que tenga una proyección, que alguien haga una gestión administrativa. E insisto, creo que eso tendría que estar a cargo de la gestión pública. Ese es el lugar a proyectar a futuro que creo, porque, en líneas generales, con recursos económicos mayores la proyección se da por decantación. (...) Y el festival tiene un peso de lo social muy grosso, una mirada social más que artística. Y entonces estaría buenísimo que alguna gestión se encargue. (...) Otra diferencia (en relación a Danzafuera) son las residencias, que son gratuitas y duran dos semanas en Danzafuera. Nosotros hacemos talleres más cortos, de menos horas de duración, como un modo express de poder pensar la intervención en el espacio. Creemos que el proceso express está muy vinculado a un proceso de investigación intenso. Y nos interesa mucho lo que pueda salir de esos procesos de trabajo. Y por eso creemos que lo express también da un resultado que a nosotros nos seduce mucho. Entonces siempre tuvimos esa mirada para poder intervenir dentro de la programación, el producto del taller.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

309

Iván Haidar (Danzafuera): Trabajar con eso, esas condiciones que no te las propone ninguna otra cosa. Y estar disponible e interesado a poder jugar e interactuar con todas esas cosas, me parece lo interesante de la propuesta, como no estar tan establecido con lo que vos querés hacer al margen de todo y ponerlo ahí, por eso también nosotros elegimos con esos criterios, sino decir qué hay en este espacio que no puedo trabajar en otro lugar. Y para mi es como desafiarse un poco como política de creación, poner la danza en un lugar más peligroso, no tan seguro como lo que yo se hacer, mi técnica, mi forma de trabajar. Sino no, ver qué es esto, y cómo yo puedo relacionar lo que hago con la gente que pasa, con este espacio, con la mugre, con el frío, con el calor, con la luz, con el ruido de la ciudad, con la naturaleza, con el viento, con todas esas cosas, y producir en ese contexto.(...) Es la expansión de la danza y la vinculación de la danza con la sociedad, es eso, es el vínculo entre los creadores y el público y la apertura a que la danza puede ser vista desde muchas otras formas y puede ser pensada y creada desde otras formas. Particularmente para mí es un espacio que disfruto de que haya, me encantaria participar también como artista pero bueno ahora me toca este rol de gestor y de productor y también estoy re contento y orgulloso de formar parte de este proyecto. (...) Se presentaron un montón de propuestas, entonces eso hizo que nosotros pensáramos que realmente existía esta necesidad de que exista algo así. Sabemos que en Diagonales también se presentaron un montón de propuestas incluso estando tan pegados los festivales. Entonces eso significaba que el espacio que estábamos habilitando era productivo. O sea, realmente era necesario.

Jorgelina Mongan (Danzafuera): El festival todos los años nos invita a repensarnos. Suelo creer que si no fuera por las múltiples reflexiones que tenemos, Danzafuera no seguiría en pie, ya que cuestionarnos nos hace crecer y reinventarnos, no sólo como productorxs132, sino también como artistas y educadores (...). Como el festival se produce desde la autogestión una de las cosas que suele modificarse todo el tiempo es el modo de conseguir los fondos para su realización (...). Para ello hablamos de realizar un evento a mitad de año en un espacio cerrado, invitando a varixs artistas a exponer sus obras, performance, charlas y demás que, con el pretexto de juntar fondos, generemos un espacio para ampliar redes humanas, sumar fuerzas y pensar nuevas estrategias para afrontar este “cambio” político que nos posiciona en un estado de alerta. (...) Insisto en que los cambios en los modos de pensar el festival existen cada comienzo o cierre de ciclo y como todo suele estar interrelacionado, ante un pequeño movimiento todo se mueve y ni te cuento con movimientos grandes (...). En esta cuarta edición, después de una larga charla respecto a cómo manejarnos ante las nuevas políticas violentas que está sufriendo nuestro país y sabiendo que el espacio de acción del festival es la calle, decidimos empoderarnos en vez de bajar los brazos, y una vez más probar otra alternativa de recaudar fondos para que este año más que nunca el festival cope las calles y así se evidencie la importancia del arte (...) Este año, aún estamos terminando de definirla, pero sí estamos pensando en algunas modificaciones. Los espacios de formación que brinda el festival es algo que nos interesa muchísimo, y este año más allá de las residencias (aún estamos viendo si será una o dos) estamos queriendo abrir un espacio de trabajo a un grupo de artistas (por convocatoria abierta) que puedan trabajar varios meses en una intervención que se desarrolle en varios espacios de la ciudad, un poco como fue el año anterior que hicimos un recorrido performático con diez artistas de diferentes modalidades para que intervengan las calles comerciales del centro de la ciudad, pero este año apostamos por más tiempo de trabajo y una sumatoria de espacios a intervenir por este grupo específico. (...) Estas modificaciones se van dando a medida que observamos lo que sucede con lxs espectadores y lxs participantes en general, siempre pensamos en varios objetivos: que lxs artistas tengan espacios de formación gratuitos, que el festival impulse a realizar una obra o intervención específica, que la danza sea cada vez más visible, que el público vaya creciendo, generar redes con demás artistas, y sobre todo pasarla hermosamente, estos objetivos en el contexto de cada año.

132 La letra x es una elección de escritura de la entrevistada, expresando una igualdad y a su vez no distinción entre el género masculino y el femenino (él o ella) para referir a las personas.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

310

A partir de las entrevistas realizadas, podemos observar que la principal

referencia para los organizadores del Festival Danzafuera es Ciudanza, festival que se

realiza en la Ciudad de Buenos Aires, Argentina, y del cual han participado. Para la

organización del festival Diagonales, la principal referencia es el Festival Días de danza,

que se realiza en Barcelona, del cual también han participado. En este sentido, si bien

difieren las procedencias de las referencias, en ambos casos, el haber participado en

distintas instancias de esos festivales, la experiencia de haber estado allí, es un elemento

de importancia.

En cuanto a la narración del origen de los festivales, y teniendo en cuenta las

referencias mencionadas, en Danzafuera se destacan los vínculos de amistad entre los

organizadores y el deseo grupal de organizar un festival de estas características. En

Diagonales, este deseo aparece inicialmente en una persona, que convoca a otras para

trabajar en conjunto y en colaboración, quienes por los vínculos afectivos sostenidos y la

pertenencia a circuitos diferentes, permitirían un mayor alcance del festival. En este

sentido, en el caso de Danzafuera, la danza contemporánea aparece como el elemento

común de las trayectorias de los organizadores -aunque algunos tienen además formación

en teatro y danza butoh-. En el caso de Diagonales, la danza contemporánea también es

un factor aglutinador, pero se destacan también las trayectorias en otros géneros,

fundamentalmente las danzas folklóricas nacionales y la danza jazz.

Conversando en torno a los objetivos con los cuales se crean estos festivales,

aparece una preocupación compartida por su función social, reflejada en la intención de

acercar la danza y el público, y de revalorizar y habilitar artísticamente ciertos espacios

de la ciudad.

En el caso de Diagonales las preocupaciones sociales están dentro de sus

principales objetivos explícitos y compartidos por los festivales integrantes de la Red

Ciudades que Danzan, a los cuales se suma como especificidad local una mayor

integración de la comunidad de la danza, que se percibe fragmentada y atomizada. En el

caso de Danzafuera, esta preocupación se da en el marco de una búsqueda de “expansión

de la danza” que en su devenir incorpora otras formas de creación, otros espacios y otros

públicos, dando lugar así a una mayor aproximación entre danza y sociedad.

En lo que refiere a la selección de los espacios en los que se desarrollarán los

festivales, detectamos que en ambos casos la potencial concurrencia de público es un

elemento importante a tener en cuenta. Además, desde Diagonales, se busca que estén

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

311

representados diferentes sectores de la ciudad, contribuyendo a que el festival tenga una

estética claramente “platense”. Por su parte, la elección de Danzafuera, se basa en un

criterio de diversidad estética, buscando espacios que presenten diferentes estímulos para

los artistas siendo así que “una de las motivaciones principales para abandonar el estudio

surge del deseo de relacionarse con otras condiciones espaciales distintas a las usuales, a

las que adaptar la anatomía humana y su movimiento” (PÉREZ ROYO, 2009, p.15).

Por otra parte se manifiesta aquí que el uso de los espacios urbanos es un tema

convocante para los artistas de danza contemporánea, pero no necesariamente para los de

otras danzas que o bien tienen ciertas limitaciones técnicas para hacerlo (como podría ser

el ballet clásico o la danza jazz), o no se interesan por esta temática o no se sienten

interpelados por esta convocatoria al ver en el espacio público su ámbito habitual o

cotidiano (queda abierta la inquietud en torno al alcance, en términos de difusión y

recepción, de las convocatorias abiertas a través de las cuales los festivales seleccionan

su programación). En relación con la programación, vemos que en ambos eventos -a pesar

de los diferentes perfiles profesionales de los organizadores de cada festival y de los

distintos mecanismos de selección de obras-, la misma está compuesta por piezas de

danza contemporánea y las propuestas recibidas se enmarcan, casi exclusivamente, dentro

de este género.

En cuanto al proceso de selección de las obras que serán presentadas en los

festivales, en los dos casos se realizan convocatorias abiertas, pero se han dado diferentes

estrategias de selección. Los organizadores del festival Diagonales en sus primeras

ediciones buscan curadores externos, con la intención de generar un mecanismo

transparente y sin que entren en juego sensibilidades y susceptibilidades de las personas

involucradas. Al mismo tiempo, la mirada de estos curadores externos, organizadores de

otros festivales integrantes del Red Ciudades que Danzan con mayor antigüedad, se

convierte en una mirada que legitima a la vez que enseña, en tanto contribuye a la

formación de criterios propios. Esta estrategia se modificó en su última edición, en la que

decidieron tomar la curaduría en sus manos, para poder construir activamente la identidad

del festival y para poder hacer una selección que sea representativa de la ciudad. Nos

encontramos aquí otra vez con la importancia que los organizadores del festival

Diagonales otorgan a la representatividad y a la identidad local, como elementos

fundamentales en el diseño del evento.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

312

Por su parte, los organizadores de Danzafuera han realizado la curaduría ellos

mismos desde la primera edición, como una manera de elegir activamente el lineamiento

estético del festival. En este sentido, los criterios puestos en juego para la selección tienen

que ver fundamentalmente con el grado de involucramiento espacial que cada propuesta

contemple, como así también con el nivel de experimentación o “riesgo” que se

propongan. En ambos festivales nos encontramos con la enunciación del término

curaduría, que posiciona a los organizadores en relación al campo del arte

contemporáneo. En este sentido, y a partir de esta enunciación, los organizadores de cada

festival realizan una postproducción (BOURRIAUD, 2009) sobre las propuestas

recibidas en conjunto con la selección y distribución de los espacios a ser utilizados. Así,

como proponen los entrevistados, cada festival (como así también cada edición, con el

conjunto de elementos que la compone) puede ser pensado como una obra en sí misma,

entendiendo que “la gestión es un modo de hacer danza y es también una obra” y que de

ese modo se construye activamente “la identidad del festival”.

En cuanto a la reflexión en torno a la vinculación con el público, se halla presente

desde la elección de espacios y obras. Para los integrantes de Danzafuera es importante

contemplar el modo en que la propuesta del festival convivirá con las actividades que las

personas desarrollan cotidianamente en los espacios elegidos. Del mismo modo, para los

organizadores de Diagonales debe propiciarse que los espectadores estén a la misma

altura que los artistas, que la gente se vea involucrada de algún modo en el desarrollo del

festival, al mismo tiempo que pretenden alentar que la comunidad de la danza funcione

como público de sus propias propuestas.

Focalizando la mirada en el espectador, y tomando en cuenta los relatos en los

festivales, es necesario destacar que dicho concepto debe ser pensado en vinculación al

tipo de obra o intervención artística, es decir desde instancias concretas de relación. En el

contexto de los festivales podemos encontrar los diferentes tipo de espectador que

propone Veloso (2015): espectadores deliberados o invitados, generalmente habituados a

frecuentar eventos artísticos, y que por tanto acuden con cierta idea previa de lo que van

a presenciar; espectadores fortuitos o paseantes, que se encontraban en ese espacio con

algún otro objetivo, y cuyo tiempo de convivencia con el objeto estético en cuestión puede

ser variable, dependiendo de su voluntad y disponibilidad para permanecer allí. Por su

parte aparece entre los organizadores los festivales la idea de irrumpir, sorprender en un

espacio cotidiano con una puesta artística y en este sentido “la intervención artística tiene

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

313

la capacidad de transformar el espacio público en su escenario de acción, (...)

instantáneamente propone actualizar a los sujetos circundantes -viandantes, transeúntes,

paseantes- en calidad de espectadores” (GONZÁLES, 2015, p. 111). En esta misma línea

coincidimos con otra consideración del González en tanto que “dicha actualización

dependerá del grado de visibilidad artística que tenga la intervención, es decir, si el

transeúnte es advertido de lo que está ocurriendo es un producto del orden de lo

artístico/ficcional” (ibidem).

En relación a la definición de los festivales que hacen sus organizadores, en

ambos casos se encuentra una valoración altamente positiva, tanto de la primera edición

como del balance al cabo de tres años de desarrollo, y la convicción de estar creando un

espacio necesario para la ciudad, la comunidad y en particular la comunidad de la danza.

Al mismo tiempo, una de las cuestiones que está en permanente revisión se vincula a las

estrategias de gestión y financiamiento de los festivales: ambos eventos se realizan de

modo autogestivo, y el acompañamiento por parte de diferentes instancias estatales

resulta ocasional, incierto e insuficiente. Ante esta situación, las estrategias inmediatas de

gestión han tenido puntos en común, pero en términos de horizontes futuros se percibe en

los organizadores de Diagonales una mayor convicción en la demanda de un

reconocimiento y apoyo económico por parte del estado; en tanto que los organizadores

de Danzafuera se enfocan menos en la dimensión estatal y más en el fortalecimiento de

las redes colaborativas entre artistas independientes y otros proyectos autogestivos.

Otro elemento compartido inicialmente por ambos festivales, es la puesta en

valor de espacios formativos para la comunidad de la danza. Estos espacios toman

diferentes modalidades en cada caso. En el festival Diagonales se realizan talleres

intensivos, acotados en su duración a la duración del festival. En este sentido, se valora

la necesidad de ductilidad para una adaptación rápida al espacio junto con la habilidad

para realizar una investigación profunda en un tiempo acotado, como una de las

características de las intervenciones urbanas. Por su parte, Danzafuera viene realizando

un recorrido que apuesta a procesos de investigación-creación-intervención más

prolongados. Al formato de residencias creativas de dos semanas de duración -presente

desde la primera edición- se sumó en la edición 2015 el trabajo intensivo de una semana

para la creación de un recorrido performático, propuesta que para el corriente año, espera

reformularse en un laboratorio e cuatro meses de duración.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

314

A la hora de destacar los rasgos distintivos y positivos del festival, desde

Danzafuera se hace hincapié en su aspecto experimental, en la necesidad de desafiarse y

reinventarse, tanto desde la organización del festival, como en las líneas estéticas que el

mismo promueve. Por su parte, Diagonales cuenta con una alta valoración en lo que

refiere a la proyección internacional y el gran alcance del festival, potenciado gracias a

su pertenencia a la Red Ciudades que Danzan. Así, aunque reconocen profundizaciones

y actualizaciones, ambos festivales reivindican sus objetivos iniciales.

REFLEXIONES FINALES Y APERTURAS A LÍNEAS DE ANÁLISIS FUTURAS

¿Qué dimensiones se ponen en juego al pensar el arte en el espacio público?

¿Qué consideraciones de intervención, danza, espectador y espacio vehiculizan las

acciones y las propuestas de los festivales? ¿Pensar a la danza en el espacio urbano

implica una toma de posición política? ¿Resulta ser una apuesta hacia nuevos diálogos

entre la comunidad de la danza y el contexto social circundante? ¿Cuestiona la relación

entre espacio privado/privativo y público? ¿Qué motivación encuentran los artistas en

crear/producir obras en este tipo espacios? ¿Qué le aporta al artista la relación con el

espacio urbano?

A lo largo de este artículo nos hemos propuesto recorrer conceptualizaciones y

trayectorias teóricas, posicionamientos de artistas organizadores, procesos de

construcción y puesta en marcha de dos festivales en el espacio público de la ciudad de

La Plata y, en cada instancia, hemos planteado comparaciones y abordajes interpretativos

de ambos eventos. Para cerrar esta descripción y análisis comparativo, al mismo tiempo

que dejar abiertas una serie de preguntas y de futuras líneas de indagación, nos

concentraremos aquí en sintetizar las construcciones de sentido en torno a la danza y el

espacio público que se articulan en el desarrollo de estos eventos. En ambas propuestas

la ciudad se presenta como paisaje a ser intervenido y como un espacio de muestra de

producciones, es decir, como un escenario en el cual desarrollar la producción artística, y

las consideraciones que entran en juego a la hora de elegir este escenario, frente a otros

posibles, son varias.

Los organizadores de ambos festivales comparten como punto de partida un

diagnóstico sobre ciertas problemáticas de la danza contemporánea local y en este marco

uno de los temas recurrentes es la falta de público. En este sentido, el uso de espacios

abiertos se presenta como una estrategia que posibilitaría el acercamiento de la danza a

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

315

nuevos públicos: más allá del público “ya iniciado” es decir, del público conformado por

la propia comunidad de bailarines, coreógrafos, docentes y estudiantes de danza se apunta

a que la danza pueda “llegar” a un público más amplio, “ocasional”, “nuevo”, “no

especializado”.

En lo que a la relación con el público refiere, se valora la posibilidad de que haya

una retroalimentación entre los creadores y los espectadores, y que la brecha que se

supone existe entre ambos, se achique. Desde la organización de Diagonales, por ejemplo,

se destaca también el hecho de que este acercamiento al público podría hacer que la danza

contemporánea deje de ser una práctica de élite, restringida a unas pocas personas, y

amplíe su alcance. Se observa una preocupación manifiesta por la atomización del circuito

de la danza que se percibe como desintegrado con poca vinculación entre sí. Los festivales

se constituyen como espacios en los que se busca fomentar la circulación y el intercambio

entre artistas, y superar esa segmentación proponiendo espacios de encuentro inclusivos.

No obstante predominan propuestas con mayor vinculación a la danza contemporánea y

esto queda evidenciado desde la elección de propuestas que integran la programación. Al

mismo tiempo en esta selección se ponen en juego criterios particulares que marcan una

tendencia y un posicionamiento al interior del propio circuito de la danza contemporánea.

Otra problemática señalada por los organizadores del festival Danzafuera y que

está en sintonía con otros reclamos propios del circuito (SÁEZ, 2015; BERNAT et al.

2015) es la falta de espacios en los que los artistas puedan mostrar su trabajo. La

apropiación del espacio público urbano habilitaría nuevos espacios disponibles para que

la comunidad de la danza contemporánea pueda poner en circulación sus producciones.

En paralelo a esta preocupación compartida en torno a la circulación y recepción

de las producciones, entre los organizadores de Danzafuera se resalta la multiplicidad de

estímulos para la creación que la ciudad, con todos sus elementos y dinámicas, propone

a los creadores. En este sentido, los espacios públicos urbanos aparecen como una fuente

inagotable de estímulos que permitirían a los artistas de danza contemporánea la

renovación de lenguajes y estéticas.

Ahora bien, más allá de estas preocupaciones compartidas, encontramos algunas

diferencias, más o menos sutiles, en el énfasis, las motivaciones y definiciones de cada

festival que pueden ser sintetizadas brevemente. En cuanto a las preocupaciones sociales

sobre la relación danza-sociedad, que cada uno de los festivales manifiesta, encontramos

también algunas diferencias. En el caso de Diagonales, entre sus principales objetivos

compartidos por los festivales integrantes de la Red Ciudades que Danzan, aparecen: la

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

316

democratización de la cultura, el recurso al arte para la transformación social, y la

generación de espacios de comunidad. En el caso de Danzafuera, esta preocupación se

da en el marco de una búsqueda de “expansión de la danza” que en su devenir incorpora

otras formas de creación, otros espacios y otros públicos, dando lugar así a una mayor

aproximación entre danza y sociedad.

En tanto que Danzafuera, desde su denominación, refiere a una circulación de

la danza (contemporánea) por fuera de sus espacios habituales, las salas teatrales, y en

particular por espacios al aire libre, al mismo tiempo, el “afuera” al que hace referencia

este nombre puede ser pensado en términos de la danza misma, de la ‘expansión de la

danza’ - contemporánea-, que pretende ser llevada más allá de sus límites, afuera de su

territorio habitual o de su ‘zona de confort’. Así, la experimentación aparece como un

valor privilegiado a la hora de pensar el festival y evaluar las diferentes propuestas. En

este sentido, observamos como en el caso del Festival Danzafuera se manifiestan una

serie de conceptualizaciones que pueden ser articuladas en torno al concepto de

vanguardia artística (BURGÜER, 2000), tales como las inquietudes y cuestionamientos

en torno a las instituciones artísticas y su tradición, el valor de la experimentación y la

puesta en tensión de los límites disciplinares, y la búsqueda de una reinscripción de la

práctica artística en la práctica social, elementos que se identifican como característicos

y distintivos de este festival.

Por su parte, en el Festival Diagonales se destaca una preocupación por la puesta

en valor del patrimonio arquitectónico y urbanístico: el nombre mismo del festival refiere a

un elemento característico del diseño urbano de la ciudad de La Plata. Esta mirada patrimonial

se extiende también a la concepción de la danza, en la búsqueda de que sea diversa, plural y

representativa, tanto desde la conformación del equipo organizador, como en la circulación y

difusión de las convocatorias y en el armado de la programación. En este sentido, la

representatividad, vinculada a la búsqueda de una identidad propia del festival, en relación

con una “identidad platense”, es un valor importante para sus organizadores. Es así que el

Festival Diagonales se posiciona tomando un rol activo en la constitución del patrimonio de

la danza en la ciudad de La Plata, seleccionando aquello que considera representativo,

relevante o significativo, otorgándole una posición de referencia y dándole un lugar en la

construcción de la tradición y la identidad local.

A partir de este recorrido por los modos en que cada festival se presenta y los

sentidos puestos en juego en el desarrollo de estos eventos, observamos el trabajo de dos

grupos de personas que se establecen no sólo como grupo, sino que también detentan el poder

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

317

de definir e instaurar ideas y valores en torno a la danza y los sentidos que ella conlleva. En

este sentido, sus prácticas son performativas en tanto construyen la danza local, y por eso

mismo, se convierten también en campo de disputa y de efectuación de políticas culturales,

posibilitando un análisis de las mismas que no se limite a la acción estatal, sino que contemple

las diversas instancias y actores que entran en juego y que se agencian en estos procesos

(NAVALLO, 2010).

En continuidad con estas aproximaciones se nos abren múltiples líneas de

indagación y análisis futuras, que incluyen, entre otras: la cuestión del público, el lugar que

ocupa en el desarrollo de las obras y el tipo de espectador que estos eventos construyen; las

estéticas y poéticas que desenvuelven cada uno los festivales analizados; la caracterización

de los diferentes circuitos vinculados a la danza en la ciudad de La Plata, la apropiación y uso

que cada uno de ellos hace del espacio público urbano y las miradas recíprocas que mantienen

entre sí. En este sentido, elegimos aquí una posición desde donde mirar y abordar

conceptualizaciones a ser destacadas desde la propia voz de los organizadores, en tanto se

convierten en gestores culturales que se proponen desarrollar, ampliar y profesionalizar el

propio campo, expandiendo nuevas líneas de interacción-acción.

BIBLIOGRAFIA

BANES, S. (2011). Terpsichore in Sneakers: Post-Modern Dance. Middletown,

Connecticut: Wesleyan University Press.

BERNAT, M. S. y otros (2015). Lo que mueve la danza: representaciones y prácticas

sociales de intervención en el espacio público para el cambio social. Revista Question,

1(45), 45-54.

BOSQUE MAUREL, J. (2000). Ciudad y globalización. Anales de Geografía de la

Universidad Complutense, 20, 33-48.

BOURRIAUD, N. (2009). Postproducción. La cultura como escenario: modos en que el

arte reprograma el mundo contemporáneo. Buenos Aires: Adriana Hidalgo Editora.

BURGÜER, P. (2000). Teoría de la vanguardia. Barcelona: Ediciones Península.

CRESPO, C., MOREL, H., & ONDELJ, M (Comp.) (2015). La política cultural en

debate. Diversidad, performance y patrimonio cultural. Buenos Aires: Ciccus.

DE TERÁN, M. (1951). Habitat rural: problemas de método y representación

cartográfica. Jaca, España: Instituto de estudios pirenáicos.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

318

DEL MÁRMOL, M.; MAGRI, G., & SÁEZ, M. (2012). Historizando la danza local. Una

visión antropológica sobre el surgimiento y devenir de las prácticas de danza

contemporánea en La Plata. En Ponencia presentada en las X Jornadas Rosarinas de

Antropología, octubre de 2012, Rosario, Argentina.

DEL MÁRMOL, M.; MAGRI, G., & SÁEZ, M. (2014). Acerca de ‘lo independiente’ en

las artes escénicas platenses. Un abordaje etnográfico. Actas de las VIII Jornadas de

Sociología de la UNLP. La Plata, Argentina: Facultad de Humanidades y Ciencias de la

Educación.

FERNÁNDEZ, M., & LÓPEZ, M. (2013). Lo público en el umbral: los espacios y los

tiempos, territorios y los medios. La Plata: Ediciones de Periodismo y Comunicación.

GONZÁLEZ, M. L. (2015). Ciudadanos espectadores: cuando la performance sucede en

el espacio público. Reflexión académica en Diseño y Comunicación, Año XVI, 24, 109-

114.

HERRERO PRIETO, L (2004). Impacto económico de los macrofestivales culturales:

reflexiones y resultados. Boletín GC. Portal Iberoamericano de Gestión Cultural.

Febrero de 2004. Disponible en:

http://www.gestioncultural.org/ficheros/1_1316768655_LHerrero.pdf

ISLAS, H. (1995). Tecnologías corporales: danza, cuerpo, historia. México: Instituto

Nacional de Bellas Artes.

LLUL PEÑANLBA (2005). Evolución del concepto y de la significación social del

patrimonio cultural. Arte, Individuo y Sociedad, 17, 175-204.

MORA, A. S. (noviembre de 2014). Danza contemporánea en espacios públicos urbanos:

estrategias de visibilización y fronteras con lo invisibilizado. Trabajo presentado en las

Jornadas de Investigación Cuerpo, Arte y Comunicación, noviembre 2014, Facultad de

Humanidades y Ciencias de la Educación, Universidad Nacional de La Plata. La Plata,

Argentina.

NAVALLO, L. (2010). Pró-Cultura Salta: entre o Estado e a sociedade. Trabajo

presentado en el Seminário Internacional Políticas Culturais: teoria e práxis, Rio de

Janeiro, septiembre de 2010, Brasil.

PÉREZ ROYO, V. (2009). ¡A bailar a la calle! Danza contemporánea, espacio público

y arquitectura. Salamanca: Ediciones Universidad de Salamanca.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

319

PÉREZ SOTO, C. (2008). Proposiciones en torno a la historia de la danza. Santiago de

Chile: LOM ediciones.

RABOTNIKOF, N. (1997). El espacio público y la democracia moderna. México:

Instituto Federal Electoral.

ROGOVSKY, D. (2014). No reconciliados. Perspectivas del activismo artístico en el

actual ciclo de conflicto. Trabajo final del Seminario homónimo dictado por Marcelo

Expósito. Doctorado en Artes, Facultad de Bellas Artes, UNLP.

RUEDA, L. (2015). Festival Internacional Danzafuera: experiencia, imaginación poética

y derivas políticas del arte. En A. S. MORA & L. B. MERLOS (Comp.), Circulaciones:

Cuerpo, espacio y textos. La Plata, Argentina: Ediciones Ecart.

SENETT, R (1997). Carne y piedra: el cuerpo y la ciudad en la civilización occidental.

Madrid: Alianza Editorial.

SEIJO, L (2015). La ciudad como escenario. Prácticas artísticas en el espacio público.

Reflexión académica en Diseño y Comunicación, Año XVI., 24, 208-2011.

VELOSO, V. (2015). Pausa poética, interrupção de fluxos, convite ao olhar passante.

Questões sobre a figura do espectador de ações artísticas no espaço urbano. En A. S.

MORA, & MERLOS, L. B. (Comp.), Circulaciones: Cuerpo, espacio y textos. La Plata:

Ediciones Ecart.

WEBGRAFIA

https://aciadip.wordpress.com/

https://festivaldiagonaleslp.wordpress.com/

http://danzafuera.wix.com/festival

http://www.cqd.info/index.php/es/

http://agendacultural.buenosaires.gob.ar/evento/ciudanza-2015

http://festivales.buenosaires.gob.ar/2015/ciudanza/es/home

http://www.marato.com/lang_spa/dies.html

http://www.laciudad.laplata.gov.ar/turismo/caracteristicas/generalidades

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

320

REFLEXÕES EM TORNO DE EXEMPLOS DA REPRESENTAÇÃO, NA ARTE

CONTEMPORÂNEA, DO FUNCIONAMENTO DA MEMÓRIA COMO

ATIVIDADE CEREBRAL

Reflections around examples of the representation in contemporary art of memory

functioning as a brain activity

TRINDADE, Carlos Alberto de Matos133

Resumo

Neste artigo, após uma introdução geral na qual abordamos conceitos básicos sobre a memória e o cérebro, os esforços desenvolvidos no século XX para entender os mecanismos subjacentes ao funcionamento da memória humana, referindo de passagem os progressos alcançados com as pesquisas levadas a cabo pelas neurociências, que têm tornado possível, entre outros aspectos, uma melhor compreensão de quais as áreas do cérebro envolvidas nas etapas de aquisição e consolidação da informação (e sua evocação), analisamos exemplos de obras de arte contemporâneas, de diferentes áreas de expressão, que nos permitem discutir alguns aspectos relativos ao funcionamento da memória, como actividade cerebral. As obras abrangidas assentam em modelos filosóficos ou psicológicos, num estudo pioneiro sobre a relação da memória com as emoções dos cientistas americanos Roger Brown & James Kulik, que introduziram na literatura científica o termo “flashbulb memories”, e nas possibilidades abertas pela utilização de tecnologias de imagiologia científica.

Abstract

In this article, after a general introduction in which we deal with basic concepts about memory and brain, the efforts made during twentieth century to understand the mechanisms underlying the human memory functioning, making reference in passing to the progress accomplished with research carried out by neurosciences, which made possible, among other things, a better understanding of the specific brain areas involved in the steps of acquisition and consolidation of information (and his evocation), we analyze examples of contemporary art works, from different areas of expression, that allow us to discuss some aspects concerning memory functioning, as brain activity. The works concerned are based in philosophical or psychological models, in a pioneering study about relationship between memory and emotions carried out by american scientists Roger Brown & James Kulik, that introduced in scientific literature the term flashbulb memories, and the opportunities posed by using imaging technologies.

Palavras-chave: cérebro; memória; traço mnésico; emoções; flashbulb memories.

Key words: brain, memory, engram, emotions, flashbulb memories.

Data de submissão: Junho de 2016 | Data de publicação: Dezembro de 2016.

133 CARLOS ALBERTO DE MATOS TRINDADE - Professor da Escola Superior Artística do Porto. Doutor em Arte Contemporânea pela Universidade de Vigo. PORTUGAL. E-mail: [email protected].

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

321

1. MEMÓRIA E CÉREBRO. NATUREZA DA MEMÓRIA

Em sentido lato, o termo “memória” (do latim memorĭa) designa a faculdade

mental que permite ao cérebro reter e restituir as informações apreendidas pelo ser

humano, através de funções cerebrais distintas; a memória pode, por isso, ser definida

genericamente como o processo através do qual tudo aquilo que o ser humano aprende

perdura no tempo. Como afirmam Eric Kandel e Larry Squire,

“A maior parte daquilo que sabemos sobre o mundo não está integrado no nosso cérebro à nascença, sendo antes adquirido através da experiência e guardado pela memória (…) Consequentemente, somos quem somos, em grande parte, devido ao que aprendemos e relembramos. Mas a memória não é apenas um registo da experiência pessoal: também nos permite adquirir uma formação e é uma poderosa força de progresso social” (KANDEL & SQUIRE, 2002, p. 10).

Se existe de facto um tipo de aprendizagem que não exige um conhecimento

consciente (o hábito), implicando a evocação de qualquer experiência passada, mesmo

quando resultou dum processo de repetição continuada – como as actividades motoras em

geral, meras acções reflexivas e mecânicas –, já um outro, pelo contrário, é responsável

pela aptidão humana de evocar conscientemente eventos passados, que está sujeita a ser

perdida através de uma amnésia. Em finais do século XIX, tanto o psicólogo e filósofo

norte-americano William James (1841, Nova Iorque – Chocorua, New Hampshire, 1910)

na sua obra clássica The principles of Psychology (1890), como o filósofo françês Henri

Bergson (1859, Paris – Paris, 1941), na muito influente obra Matière et mémoire: Essai

sur la relation du corps à l’esprit (1896), já tinham reconhecido a existência desses dois

tipos de aprendizagem.

Do ponto de vista científico tradicional, a memória humana e animal depende de

vestígios mnésicos imateriais a que se dá o nome de engrama (s)134, inscritos no cérebro

(sistema nervoso) por um estímulo durante o processo de aquisição de informações, e

depois armazenados e conservados sob forma mais ou menos explícita: a concepção está

ainda intimamente relacionada com a antiga noção de “marca”, aquela que remonta a

Platão e é depois mantida por Leibniz e Descartes, entre outros. Foi o biólogo

evolucionista alemão Richard Wolfgang Semon (1859, Berlim-1918, Munique), nos dias

de hoje pouco referido, quem propôs o termo engram (The Mneme. Londres: George

134 Vd. sobre o engrama, idem, pp. 81-82; e Jean CAMBIER – A Memória. Lisboa: Editorial Inquérito, 2004, p. 37.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

322

Allen and Unwin, 1900) para denominar o “traço mnésico” duradouro que uma percepção

deixa no cérebro, o qual passou a ser usado na psicologia. Semon na sua teoria da memória

sustentava já então que o engram não era um traço imutável e definitivo, porque defendia

que a aquisição de novas lembranças modifica sempre as antigas – algo amplamente

comprovado a posteriori –, e, em consequência, entendia ser a evocação duma recordação

uma nova criação da perceção primitiva memorizada.

No entanto, sabemos hoje, a grande maioria das nossas experiências não deixa

quaisquer engramas permanentes no cérebro. Só algumas delas admite-se serem as

emocionalmente mais marcantes – a eficácia do registo é influenciada pela qualidade da

experiência –, é que alcançam esse estado, sempre relativo, em que determinadas

recordações têm a possibilidade de manterem a sua individualidade, de forma algo

perdurável, através de modificações nas ligações entre os neurónios135, possibilitando a

reconstrução futura da experiência inicial como realidade autónoma. Os neurónios

estabelecem entre si redes sinápticas, nas quais estabelecem interconexões; ou seja, a sua

actividade tende a estar correlacionada, e é através da modificação dessas redes que a

memória se inscreve no cérebro. Depois de constituídas essas redes são relativamente

estáveis embora o seu funcionamento esteja sujeito a incessantes modificações, em

resultado das experiências novas que vão sendo registadas. É esta importantíssima

propriedade das redes neuronais, a de serem capazes de se adaptarem e modificarem

continuamente, que é conhecida pelo nome de plasticidade.

Se recuarmos no tempo, não é por acaso que em tempos idos se podia recorrer,

em certas circunstâncias em que era necessário manter viva a memória de ocorrências

consideradas relevantes, a práticas sociais radicadas na tradição, entretanto caídas em

desuso, que visavam acentuar o cunho emocional da experiência, porque se acreditava na

sua eficácia mnemónica. O psicólogo experimental português Nuno Gaspar fornece um

exemplo imaginativo disso mesmo, na sua tese de doutoramento: “Em tempos medievais,

antes da escrita ser usada para manter registos históricos, era utilizado o seguinte costume

como forma de manter um registo de acontecimentos importantes como um casamento,

135 O neurónio, ou célula nervosa, é a unidade de base do sistema nervoso e a origem de toda a actividade cerebral, consequentemente também da memória, pois é capaz de acumular informação e de a transmitir sob a forma de energia eléctrica. Foi o neuroanatomista espanhol Santiago Ramón y Cajal (1852-1934) quem em 1889 defendeu pela primeira vez, na obra A Doutrina do Neurónio, que as células nervosas são elementos independentes e as unidades básicas do cérebro: ganhou o Prémio Nobel da medicina em 1906, ano em que descreveu como comunicam os neurónios.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

323

negociações entre famílias poderosas ou a atribuição de terras a uma localidade: seleccio-

nava-se uma criança de cerca de sete anos de idade e pedia-se-lhe que observasse os

acontecimentos cuidadosamente, depois atirava-se a criança a um rio. Deste modo, dizia-

se, a memória do acontecimento seria impressa na criança e o registo dos factos era

mantido durante toda a sua vida”136.

Porém, não há memórias “fiéis” ou “perfeitas”, exceptuando casos raríssimos,

mesmo assim apenas por aproximação e em campos muito específicos. O cérebro nunca

mantém um registo completo de eventos passados, não é um dispositivo de transcrição

meticulosa e elimina a maior parte dos pormenores: a memória é selectiva, tem uma

tendência natural para a simplificação e esquematização, as quais permitem a

conceptualização que implica sempre a sintetização de representações completas; as

alterações são incessantes, determinadas seja por novas experiências seja pelos contínuos

apelos à consciência. O que geralmente é descrito como uma consolidação das

recordações, implica um trabalho perpétuo de selecção, o que também equivale a dizer

que as informações não são guardadas intactas mas em fragmentos; as recordações são

“(re)construções” modificadas consoante o contexto em que são recuperadas.

O passado também age sobre o nosso presente, porque uma propriedade

importante da memória é a de que não conseguimos separar as lembranças, dos eventos

que vão ocorrendo nas nossas vidas, daquilo que nos aconteceu previamente. Como

afirma o proeminente psicólogo norte-americano Daniel L. Schacter,

136 Nuno GASPAR – Memória operatória e afecto. Efeitos do estado emocional e da valência de palavras na evocação. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian /Fundação para a Ciência e a Tecnologia, 2011, p. XXXI. O autor colheu o exemplo na seguinte fonte: J. L. McCaugh – Memory and emotion: The making of lasting memories. London: Weidenfeld & Nicolson, 2003, p. IX. O tema da importância das emoções na memorização, e no modo como o ser humano conduz o seu comportamento em sociedade, tem merecido atenção por parte do neurologista e neurocientista António Damásio, que numa entrevista concedida em 2010 (António Damásio – “Não existe memória sem emoção” (Entrevista), Focus, nº 547, 7 a 13/4/2010, p. 119) era categórico: “Focus - Qual é o papel das emoções no processo de formação e armazenamento da memória? António Damásio – A emoção modula constantemente a forma como os dados e os acontecimentos são guardados na memória. Isso é especialmente verdade no que diz respeito à memória para pessoas e para as características relacionadas com elas. Afinal de contas, a nossa sociabilidade faz parte da nossa memória genética, com a qual nascemos e que é resultante de milhões de anos de evolução. Focus – Como é que as emoções controlam a memorização? A. Damásio – (…) Não há memória ou tomadas de decisão neutras, sem emoção”. Vd. também António Damásio – O Livro da Consciência. A Construção do Cérebro Consciente. Lisboa: Temas e Debates/Círculo de Leitores, 2010, pp. 168-169, onde aborda o mesmo tópico a partir do exemplo duma passagem do romance Terna É a Noite, de Scott Fitzgerald; noutra obra, António Damásio (Ao Encontro de Espinosa. As Emoções Sociais e a Neurologia do Sentir. Lisboa: Publicações Europa – América, Lda., 6ª edição, 2004, p. 74) lembra adequadamente que “Todos os mais variados métodos e escolas de representação teatral utilizam diariamente esta memória emocional para o seu trabalho”. Sobre este tema vd. igualmente Jean-Yves & Marc Tadié – Le sens de la mémoire. Paris: Éditions Gallimard, 2004, pp. 117-118.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

324

“What has happened to us in the past determines what we take out of our daily encounters in life; memories are records of how we have ex-perienced events, not replicas of the events themselves. Experiences are encoded by brain networks whose connections have already been shaped by previous encounters with the world. This preexisting knowledge powerfully influences how we encode and store new memories, thus contributing to the nature, texture, and quality of what we will recall of the moment” (SCHATER, 1996, p. 6).

Por vezes, também ocorrem fusões na própria memória, e com o passar do tempo

acontece que formamos uma recordação nova a partir de/sobre outras mais antigas,

modificando-as e inventando, se assim se pode dizer, uma “mentira verídica”: na prática,

o que acontece é que a experiência de cada um de nós é cumulativa, e ocorrências

semelhantes têm tendência para se agruparem, ou confundirem de tal modo que a partir

de certa altura não somos capazes de lembrar-nos delas separadamente. Pode até

acontecer, em certas situações, que o cérebro constitua memórias falsas desde o início do

seu processamento; bastando para isso que um dado evento seja mal interpretado, devido

a expectativas em relação a algo que efectivamente é semelhante. As memórias falsas

também podem ser geradas aquando daquilo que parece ser uma lembrança genuína: se

uma pessoa “for convencida de que lhe aconteceu algo específico, pode “costurar” o

evento com retalhos de outras memórias e vivê-las como lembranças «verdadeiras»”

(CARTER et al., 2009, p. 162).

Tem-se verificado ainda, através de estudos de imagiologia científica, que as

memórias verdadeiras e as memórias falsas activam áreas distintas do cérebro; enquanto

as verdadeiras originam actividade no hipocampo, as outras activam áreas nos lobos

frontal e parietal, mais relacionadas com a “familiaridade” do que com a evocação de

lembranças específicas.

Por isso, a analogia hoje muito popular e difundida, que compara a preservação

dos traços mnésicos no cérebro ao armazenamento passivo de dados de informação num

computador (essa prática comparativa, com alguma tecnologia vigente, já é no entanto

antiga), não tem qualquer aderência à realidade do funcionamento da memória humana.

Por mais sedutora que seja a hipótese, que serviu de modelo ao cognitivismo, a “máquina”

do cérebro é muitíssimo mais complexa do que qualquer computador: nem há uma

homologia entre o espaço do mundo exterior e o espaço mental imaginário, no qual opera

a memória de cada indivíduo. Acresce ainda outra diferença importante: ao invés daquela

dum computador a memória humana não está alojada num único lugar físico do cérebro,

é parte integrante do enorme “condomínio” dos circuitos neuronais.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

325

Uma questão essencial, já colocada na Antiguidade, foi a de saber onde se localiza-

vam as recordações, ou mais precisamente o “sótão das recordações”, usando uma expressão

feliz do neurobiólogo francês Jean-Didier Vincent; uma tarefa a que se tem dedicado a

moderna neurofisiologia ao tentar localizar as regiões cerebrais onde elas se fixam, mormente

através do estudo das amnésias. Sabemos hoje, ao contrário do que se acreditou durante muito

tempo, que as nossas memórias não se encontram armazenadas permanentemente num único

“centro” do cérebro, um loccus físico concreto, ou seja, não existe uma área do mesmo

exclusivamente dedicada a elas e, como tem vindo a ser demonstrado137, podem ser

mobilizadas muitas zonas do cérebro na representação de uma única entidade ou evento.

Se essa mobilização de diferentes regiões do cérebro acontece é porque ele, de igual

modo, constrói as memórias de uma forma bastante distribuída, separando os registos de

aspectos diferenciados das nossas experiências concretas; na prática, as regiões do cérebro

entrecruzam-se amiúde quando este necessita de efectuar uma tarefa de memorização: por

exemplo, tanto a percepção como a recordação da maior parte dos objectos e eventos activam

as regiões cerebrais criadoras de imagens, mas também implicam amiúde outras relacionadas

com o movimento; por isso, esses registos são guardados em partes separadas, e “estas

diferentes partes são coordenadas, em termos dos seus circuitos, de tal forma que os registos

adormecidos e implícitos possam ser, rapidamente e em estreita proximidade temporal,

transformados em imagens explícitas” (DAMÁSIO, 2008, p. 255).

137 Nos últimos anos têm sido alcançados avanços significativos, que muitos consideram espetaculares, nomeadamente nas pesquisas da genética, psicologia cognitiva, biologia molecular e das neurociências. Estas últimas passaram a dispor, a partir da década de 1970, de novos recursos de imagiologia científica que têm contribuído bastante para revelar quais as regiões cerebrais responsáveis por uma determinada função: através das técnicas de recolha de imagens cerebrais, como a tomografia por emissão de positrões conhecida por PET (em Portugal, por TEP), que usa isótopos radioactivos, e a ressonância magnética funcional (designada por fMRI, do inglês functional Magnetic Resonance Imaging), que possibilitam a visualização directa de áreas do cérebro envolvidas nos processos ligados à memória. O uso dessas técnicas tem permitido comparar o funcionamento do sistema nervoso de homens e mulheres, procurando os estudos desenvolvidos contribuir para o tratamento de lesões cerebrais e de várias patologias. No entanto, apesar desse contributo tecnológico para uma melhor compreensão de quais as áreas do cérebro que estão efectivamente envolvidas nas etapas de aquisição e consolidação da informação, e da evocação (a memória propriamente dita), permanecem muitas dúvidas sobre qual a efectiva correspondência directa entre uma qualquer região do cérebro com a função que exerce, tal é de facto a complexidade do nosso aparelho cerebral. Assim (Damásio, 2008, p. 331) “Apesar da importância notável que certas regiões podem ter no desenrolar de certos fenómenos mentais ou comportamentais, os processos da mente e do comportamento resultam da função coordenada de muitas regiões, que constituem diversos sistemas, alguns grandes outros pequenos. Nenhuma das funções importantes da mente humana – percepção, aprendizagem e memória, emoção e sentimento, atenção, raciocínio, linguagem, movimento – têm como base um mero centro cerebral. A frenologia, a ideia de que um centro cerebral poderia produzir uma dessas grandes funções mentais, é uma ideia do passado. Deve reconhecer-se, contudo, que as regiões cerebrais podem ser altamente especializadas e contribuir de forma única para uma determinada função complexa de um sistema”.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

326

A maioria dos especialistas está hoje de acordo que a memória não é um mero

“armazém” passivo de lembranças, e consideram-na uma função dinâmica em mutação

permanente, que é parte integrante de uma vasta rede de circuitos neuronais – a qual se

vai expandindo no cérebro, à medida que os neurónios existentes vão estabelecendo

ligações com novos neurónios –, e depende de um trabalho colaborativo, simultâneo e

sequencial, de vários sistemas cerebrais. O facto das nossas memórias se encontrarem

espalhadas em fragmentos pelo cérebro, quer dizer, guardadas em localizações distintas,

constitui certamente uma mais-valia. Se assim não fosse uma qualquer lesão ou degenera-

ção que atingisse esse suposto locus “electivo” poderia comprometer, irremediavelmente,

a totalidade da memória. Não sendo esse o caso, quando ocorre um traumatismo craniano

localizado apenas uma parte (ou um tipo específico) da memória está sujeita a danos,

como a investigação de lesões cerebrais tem vindo a demonstrar sobejamente; se umas

informações se perderem outras permanecerão disponíveis, mais ou menos inalteradas.

Não subsistem memórias “fiéis”, já o dissemos, porque sempre que rememoramos

uma determinada experiência somamos ou subtraímos novos elementos – em particular,

está demonstrado, quando a contamos a alguém, como já tinha apontado o psicólogo e

neurologista françês Pierre Janet (1859-1947) –, porque “Esta experiência de lembrar

«grava por cima» na memória, e por isso cada vez que um evento é lembrado é na verdade

a recordação da última vez que o lembrou. Portanto, as memórias mudam gradualmente

ao longo dos anos, até eventualmente se assemelharem pouco ao evento original”

(CARTER et al., 2009, p. 162).

Não existem, na realidade, duas evocações iguais da mesma vivência. Quando

evocamos uma recordação, o que acontece de facto é que o cérebro “repete” um

determinado padrão de actividade neuronal, aquele que foi gerado como resposta aquando

do evento original. Esse padrão repetido é semelhante ao original, por isso é que a nossa

memória faz eco da percepção cerebral desse evento real. Contudo, estas repetições nunca

são exactamente idênticas às originais (genuínas); aliás, se o fossem não seríamos capazes

de estabelecer uma distinção entre as experiências genuínas e aquelas recordadas. Quando

procedemos a uma evocação revivemos, em certa medida, um acontecimento passado,

mas, mesmo assim, mantemos sempre uma consciência desperta do momento presente, e

a actividade neuronal não é igual àquela que gerou o evento recordado. A experiência

pode ser semelhante à original, mas misturada com uma consciência da situação actual.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

327

2. Exemplos da representação do funcionamento da memória, como

actividade cerebral, na arte contemporânea

Desde há muito que se procura entender os mecanismos de funcionamento da

memória humana. Os esforços desenvolvidos no séc. XX, para não recuarmos mais no

tempo, deram origem a variadas teorias. Nos últimos vinte anos essa tarefa foi encarada

mesmo como um dos grandes desafios da ciência moderna, que tem procurado esclarecer

os mecanismos cerebrais subjacentes à memória. No entanto, o cérebro é uma máquina

extraordinariamente complexa e continua a ser o território mais misterioso para as

ciências. Pese embora os notáveis progressos alcançados nos últimos anos pelo estudo

dos processos cognitivos, há portanto ainda muito a descobrir. Por outro lado, é inegável

que graças aos avanços tecnológicos, e aos estudos e pesquisas exaustivos, podemos dizer

que possuímos hoje um conhecimento mais apurado sobre os mecanismos de

funcionamento da memória. Mas, não há ainda consenso entre as diversas especialidades

profissionais que estudam o assunto. E isto ocorre, sem dúvida, por causa da enorme

complexidade da memória humana138.

Embora seja possível encontrar um número muito alargado de exemplos de obras

e projectos artísticos dedicados ao tema da memória, nas suas variadas vertentes, atinentes

ao carácter plural de que se reveste, também é verdade que existe uma certa escassez de

obras sobre o seu funcionamento, o seu exercício como actividade cerebral, que nos

parece resultar mais da complexidade do subtema, nada fácil de tratar pois para tal é

necessário possuir um alargado conhecimento científico, do que um qualquer

memosprezo pela sua importância. Os exemplos que se seguem permitem, apesar de tudo,

discutir alguns aspectos, assentando alguns deles em modelos filosóficos ou psicológicos.

138138 Complexidade obrigará a uma maior interdisciplinaridade. Assim, como reconhecia LAROCHE (“La mémoire, mécanismes cellulaires et moléculaires”, Les Transversales du CNRS:”Mémoires” – Synthèse, in <http://www.cnrs.fr/cw/fr/pres/compress/memoire/synthese.htm#macanisme “le rapprochement des différentes disciplines et domaines d’étude sur la mémoire a permis le plein essor des démarches fondées sur l’intégration des niveaux d’analyse de la cellule à l’organisme. Les querelles sur la question d’un niveau spécifique de la mémoire sont dépassées. Aujourd’hui, c’est cette interdisciplinarité qui permet d’aborder la question fondamentale des propriétés émergentes entre différents niveaux d’organisation du cerveau à l’origine des fonctions les plus complexes, telles que la mémoire”. Serge Laroche dirige o Laboratório Neurobiologie de l’apprentissage de la mémoire et de la communication no CNRS, Universidade de Paris Sul (XI), em Orsay.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

328

2.1. Marta de Menezes

A artista portuguesa Marta de Menezes (n. 1975, Lisboa) vem explorando desde

há mais de 10 anos as articulações possíveis entre arte e ciência, e as possibilidades que

daí resultam, colaborando regularmente com cientistas. Assim, após a licenciatura em

Pintura na Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa, em 1999, e um mestrado

em História da Arte e Cultura Visual pela Universidade de Oxford, em 2001 – sob a

orientação do Prof. Martin Kemp, e com o título Diagrams in Art and Science: a study of

Richard Feynman and Joseph Beuys blackboard drawings –, tem trabalhado em diversos

laboratórios e institutos de investigação científica internacionais139 partilhando a sua

rotina. Porque, sendo uma artista, e não tendo uma educação formal nas ciências, e em

particular nas ciências biológicas, teve de ir aprendendo o jargão respectivo, assim como

as técnicas utilizadas nos laboratórios e as possibilidades e limitações respetivas.

A sua actividade artística nos últimos anos tem explorado em particular o uso da

Biologia moderna, métodos e materiais da biotecnologia como “artmedia”, porquanto

“fornecem um novo media para criação de arte que não é substituível por qualquer meio

tradicional ou mesmo electrónico” (MENEZES, 2007, p. 108). É, até ao momento, a única

representante em Portugal da prática designada de Bio art140, em que os artistas trabalham

com organismos vivos como base da sua investigação que incorporam às suas obras e à

sua problemática, no contexto da qual desenvolveu as suas obras mais conhecidas e

divulgadas, recorrendo a tecnologias muito diferentes, e que têm vindo a alcançar um

reconhecimento crescente.

Interessa-nos aqui, todavia, uma série de obras intitulada Retratos Funcionais,

iniciada em 2002. Para essa série, colaborando com a cientista Patrícia Figueiredo, na

altura física na Universidade de Oxford (e com a ajuda também de Mattthew

Higginbottom, animador vídeo, e da fotógrafa Judie Waldmann), Marta de Menezes

desenvolveu e adaptou tecnologia de imagiologia científica, a denominada ressonância

139 No laboratório de Paul Brakefield (Institute of Evolutionary and Ecological Sciences, Universidade de Leiden, Holanda), 1999; no MRC /Clinical Sciences Centre (Imperial College of Sciences, Technology and Medicine, Londres), 2004; estágio em engenharia de tecidos no SymbioticA de Oron Catts (The Art and Science CollaborativeResearch Laboratory, School of Anatomy and Human Biology, University of Western Australia), 2005. É actualmente directora artística de Ectopia, o laboratório de experimentação artística no Instituto Gulbenkian de Ciência, em Oeiras, Portugal. 140 Adoptamos aqui o termo utilizado por Jens Hauser (“A Biotecnologia como Medialidade – Estratégias da Media Art Orgânica”, Nada, nº 9, Março de 2007, pp. 80- 87. Tradução de Luís Filipe Quitas), porque como este refere (idem, nota 1, p. 87) “tende a sintetizar terminologias alternativas e complementares tais como bioarte, artebiotecnológica, media art húmida, vivo art ou arte ao vivo”.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

329

magnética funcional (fMRI), como novo médium artístico. A técnica permite-lhe a

activação de uma dada zona do cérebro aumentando o seu fluxo sanguíneo, causando em

consequência um incremento da intensidade da imagem nessa região, sendo possível

“detectar as áreas do cérebro que estão especificamente envolvidas no desempenho da

tarefa em estudo. O resultado é habitualmente apresentado como um conjunto de imagens

anatómicas do cérebro com pontos coloridos sobrepostos indicando as áreas activadas

enquanto o sujeito realiza a sua tarefa” (MENEZES, 2005, p. 100).

Usando esta técnica criou então Retratos funcionais em que além da face dos

sujeitos representados apresenta imagens dos seus cérebros, graças ao recurso dum

aparelho de ressonância magnética funcional mais potente que os habitualmente

utilizados para diagnóstico médico, ainda experimental, de modo a permitir imagens de

melhor qualidade. Tornando possível combinar a anatomia (interior e exterior) com

imagens de regiões do cérebro em actividade em tempo real, enquanto os “retratados”

desempenhavam uma determinada tarefa no interior do aparelho.

Parece-nos também que vai um pouco mais longe naquele velho anseio dos artistas

que, ao longo dos tempos, através dos diversos meios usados, sempre procuraram retratar

não apenas a aparência física exterior, mas também (lembremo-nos, por exemplo, de

Velázquez e do seu retrato do papa Inocêncio X) tentaram penetrar na personalidade do

modelo. Como dizia o pintor Lucian Freud (TASCHEN, 2005, p. 52), essencialmente um

retratista: “Eu gostaria que os meus retratos fossem das pessoas, não como elas. Sem ter

o aspeto dos modelos, sendo-os”. E como defendia o médico Paulo Cunha e Silva (2001,

p. 21) “o desenvolvimento das modernas técnicas imagiológicas aplicadas ao corpo

humano criou uma nova genealogia de retratos íntimos. O interior do corpo, a sua

imagem, passou a ser pública”.

As obras aqui apresentadas são dois auto-retratos de Marta de Menezes

pertencentes à série referida; constituíram a sua participação na exposição bienal “7

Artistas ao 10º Mês” (Outubro de 2003)141, para a qual foram concebidos especialmente.

Segundo o seu comissário Miguel Amado (2013, p. 13)142 pretendia-se nesta edição, que

tinha pela primeira vez um tema subjacente, que as obras expostas exprimissem

141 Organizada bienalmente pelo Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão, desde 1997, é destinada a divulgar o trabalho de artistas ainda não suficientemente reconhecidos ou não integrados no circuito institucional. 142 Miguel Amado, Entrevista in “Projecto – 7 Artistas ao 10º Mês”, NewsLetter, nº 47, Fundação Calouste Gulbenkian, Outubro de 2003, p. 13.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

330

“um conceito previamente definido: a representação da paisagem. (…) Para os artistas, instituiu-se o desafio de enquadrar interesses singulares numa perspectiva global e desenvolver projectos que convocassem a temática em causa. Mas importa frisar que a representação da paisagem se entendeu como um eixo paradigmático a partir do qual emergiram hipóteses de intervenção, isto é, tratou-se mais de um ponto de partida do que de uma meta a atingir”.

Num desses autorretratos a actividade do cérebro da artista foi registada enquanto

fazia um desenho do jardim da Gulbenkian, utilizando apenas a memória [fig. 1]. No

outro [fig. 2], aplicando o mesmo método, a actividade do cérebro foi registada enquanto

desenhava à vista a partir duma fotografia do jardim. Os trabalhos foram apresentados

lado a lado, como instalação com vídeos projectados sobre tela emoldurada, utilizada

como ecrã, juntamente com os desenhos realizados e a fotografia do jardim. Outros

trabalhos da série têm também sido apresentados como imagens digitais impressas em

tela. O uso da tela não é indiferente, porque como faz questão de salientar “a utilização

da tela como suporte para as imagens digitais ou projecção de vídeo é conceptualmente

importante como suporte por excelência da longa tradição retratista” (MENEZES, 2005,

p. 100).

Fig. 1. Marta Menezes, O meu jardim Gulbenkian (2003). Desenho e vídeo projectado s/tela.

[Retrato a desenhar a partir das memórias do jardim]

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

331

Fig. 2. Marta Menezes, O meu jardim Gulbenkian (2003). Desenho e vídeo projectado s/tela.

[Retrato a desenhar a partir de uma fotografia do jardim]

Mas como previne “tal como alguns cientistas têm notado, não podemos concluir

a partir desses dois retratos quais são as áreas do cérebro que estão envolvidas no desenho

à vista e quais as áreas importantes para o desenho de memória”. Menezes tem

consciência de que,

“para poder tirar tais conclusões seria necessário repetir o mesmo procedimento com outras pessoas a desenhar para podermos confirmar que as diferenças observadas correspondem a diferenças reais comuns em muitos indivíduos diferentes. Esta é uma das distinções mais importantes entre arte e ciência. Como artista estou interessada no evento único. Pelo que aquilo que faço é arte e não ciência” (MENEZES, 2005, p. 101).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

332

Parece-nos importante referir a propósito que as áreas do cérebro envolvidas

poderiam variar se a experiência envolvesse um homem em vez da artista, porquanto

pesquisas realizadas desde há alguns anos a esta parte parecem confirmar diferenças

assinaláveis quanto ao uso que homens e mulheres fazem dessas áreas, quando no

desempenho de tarefas específicas, mormente no que diz respeito à informação

visuoespacial, que no caso presente é um factor bastante relevante. Sem afectar o

respectivo desempenho intelectual, o qual será equivalente, parece todavia que homens e

mulheres usam regiões diferentes do cérebro para executar as mesmas tarefas, dando

predominância a um dos hemisférios 143.

Marta de Menezes tem-se preocupado sobretudo em demonstrar as vantagens do

acesso dos artistas a laboratórios de investigação, com as correspondentes possibilidades

de utilização de novas tecnologias e conhecimentos experimentais. Até porque acredita

que as interacções que neles ocorrem entre artistas e cientistas, poderão ser proveitosas

para ambas as partes. E, talvez, como diz

“es también probable que un enfoque “artístico” en los sistemas experimentales, con la consecuente exploración de nuevas posibilidades, pueda conducir a nuevas cuestiones y nuevos experi-mentos científicos rigurosamente diseñados. La sociedad en su totalidad puede beneficiarse de este tipo de interacción con una mayor comprensión de temas científicos” (MENEZES, 2004, p. 38).

Como a artista anunciou, esta série de trabalhos terá continuidade:

“I am now planning, as a development of Functional Portraits, to paint the brain by manipulating its activity. With the knowledge of the brain regions that are activated by certain tasks or stimuli, it is possible to design a number of simultaneous tasks and stimuli that will achieve a complex brain activity pattern. In other words, by planning a defined set of tasks, it is possible to “paint” a defined pattern of brain activity. Although the artwork has a short lifespan – as long as the subject is performing the tasks –it is possible to document it by means of FMRI. It is a case where it becomes possible to create art by simple thought”

144.

143 Assim, como referia Andrea Cunha Freitas (“Dentro das cabeças de Adão e Eva”, Público (P2), 18/3/2007), divulgando certas pesquisas, “Um artigo publicado na revista Brain and Language em 2006 confirma que as mulheres e os homens usam partes diferentes do cérebro para processar estes dois aspectos: linguagem e informação visuoespacial. Recorrendo a ressonâncias magnéticas entre outras ferramentas para avaliar o desempenho numa série de tarefas propostas, os investigadores observaram: Os participantes femininos e masculinos tiveram resultados equivalentes, tanto em termos de correcção como timing, mas usaram diferentes partes do cérebro para executar os exercícios (…) Num estudo publicado pela Associação Americana de Psicologia, uma vasta equipa de cientistas demonstrou que para reconhecer rostos e identificar as expressões faciais, os rapazes usam mais o lado direito do cérebro e as raparigas o lado esquerdo”. 144Marta de Menezes – “Proteic Portrait”, BIOFEEL, SymbioticA Research Group, in <http://www.martademenezes.com/biofeel.pdf

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

333

2.2. Arnold Dreyblatt

As relações sempre precárias entre memória e arquivo, entre a memória interna

(humana) e os distintos modos protéticos de lembrar (incluídos os institucionais), têm

ocupado praticamente desde o início um lugar central na obra do artista plástico judeu

norte-americano Arnold Dreyblatt (n. 1953, Nova Iorque), também músico e compositor,

radicado em Berlim durante mais de 20 anos.

The Wunderblock (2000). Em 1925, Sigmund Freud escreveu um pequeno ensaio

intitulado Notiz über den ‘Wunderblock’ em que estabelece comparações entre a facul-

dade da memória, assim como o seu funcionamento no apparatus psicológico humano, e

um brinquedo para crianças que tinha surgido então no mercado, conhecido como

Wunderblock (“Bloco de notas mágico”, ou “místico”). Nele, como refere, dava mais uns

passos no desenvolvimento de algumas ideias expostas em obras anteriores como A

interpretação dos sonhos (1900) e Mais além do princípio do prazer (1920), sobre a

estrutura do aparelho psíquico, partindo da constatação das insuficiências dos meios

externos então existentes para ajudar a nossa memória, tais como uma folha de papel ou

um quadro de ardósia, se comparados a outros aparelhos auxiliares inventados para

melhorar o desempenho das nossas funções sensoriais (óculos, aparelhos auditivos, etc.),

porque neles via a impossibilidade de responderem satisfatoriamente à grande capacidade

demonstrada pelo nosso aparelho psíquico em receber percepções sempre novas, e ser

capaz de formar traços mnésicos mais ou menos duráveis, ainda quando não inalteráveis.

Nesses meios, como constatava, capacidade receptora ilimitada e conservação de registos

permanentes parecem excluir-se mutuamente.

O brinquedo descrito por Freud consistia numa placa de resina ou de cera escura,

a qual estava recoberta com uma folha fina estendida composta de duas camadas; a de

cima, de celulóide transparente, a inferior de papel encerado fino e translúcido (celofane).

A folha estava presa no seu bordo superior e livre no inferior, e as duas camadas podiam

ser separadas, excepto nos seus bordos transversais. Nela, podia-se então escrever um

texto com um estilete sobre a face de celulóide, fazendo aderir a face inferior de celofane

à placa de cera; desse modo tornando visíveis os registos na superfície do celulóide nos

mesmos sítios onde tinham sido rabiscados, que de outro modo continuaria do mesmo

branco acinzentado e uniformemente liso, anterior ao ato.

Querendo apagar os registos, facilmente, bastava levantar com um simples gesto

de mão a folha com as suas duas camadas interrompendo o contacto com a placa de cera,

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

334

a qual tendo adquirido de novo a sua condição de uma tabula rasa, ficava apta a receber

novos registos quando necessário. Não reaparecendo os registos na superfície de celulóide

– apelidada por Freud de “pare-stimulus”, em virtude de ser a camada inferior de celofane

a receber os estímulos – depois desse acto, permaneciam mesmo assim traços duráveis na

placa de cera, visíveis e passíveis de ser lidos com uma iluminação apropriada, como

salienta o pai da psicanálise.

Como o nota Freud, não consistindo aqui a inscrição num “depósito” material

sobre a superfície receptora, estamos claramente a utilizar o mesmo método que os gregos

antigos, e depois os romanos, com as suas tabuinhas revestidas de cera145. Freud

estabelece então uma analogia entre a folha receptora de estímulos do Wunderblock e o

sistema Pc – Cs (Pré-consciente – Consciente) por si enunciado em A interpretação dos

sonhos, o qual recebe as percepções mas não conserva traços duráveis, de modo que a

cada nova percepção se encontra na situação duma folha virgem. Segundo a hipótese

avançada nessa obra, os traços mnésicos perduráveis encontrar-se-iam nos “sistemas

mnésicos” colocados por detrás daquele sistema Pc – Cs.

A instalação The Wunderblock, que Arnold Dreyblatt expôs pela primeira vez em

2000 na Galeria Anselm Dreher146, com uma estrutura simples mas eficaz – constituída

por uma mesa em MDF equipada internamente com um computador e TFT-Display,

sobre cujo tampo está inserido um monitor emoldurado como um quadro de ardósia, e

uma cadeira para os visitantes-espectadores – toma como ponto de partida explícito o

referido texto de Freud (figs. 3 e 4).

145 Sabe-se que na Grécia antiga, pelo menos desde finais do séc. VI a. C., a escrita já estaria suficientemente divulgada. Tinha contudo, no começo, ainda apenas uma função supletiva da memória. Devem-se considerar alguns aspectos “práticos” na escrita, mais propriamente relativamente aos seus suportes, que podem ter tido alguma influência na importância atribuída na Grécia antiga à educação da memória. Se com o início da escrita as primeiras obras literárias terão sido transcritas para pergaminhos de pele de carneiro ou cabra (diphtherai), depois assistiu-se a uma difusão do uso do papiro originário do Egipto, habitualmente sob a forma de rolo (em grego, tomos) conhecido como volumen (nome latino, pelo qual é geralmente designado). Mas, se o volumen representou um progresso significativo em relação aos diphtherai, apresentava também alguns inconvenientes de uso: vd. sobre este aspeto François Chamoux – A Civilização Grega. Lisboa: Edições 70, 2000, p. 240. Por isso, os gregos da Antiguidade usavam como suporte habitual de registo tabuinhas revestidas de cera, sobre as quais anotavam com um estilete (stilus) aquilo que não tinha uma importância senão passageira. Estas tabuinhas reuniam em si várias vantagens: eram cómodas e fáceis de transportar; constituíam um suporte apreciavelmente mais barato para um uso corrente – ao contrário do papiro que era bastante caro, pelo que a sua utilização era restrita e reservada para ocasiões especiais; adaptavam-se facilmente a diversos fins; e, sobretudo, apagavam-se sem custo alisando a superfície da sua camada de cera, o que permitia a sua contínua reutilização. Seriam assim como uma espécie de antecessor do moderno bloco-de-notas, ou melhor ainda, do contemporâneo PDA com tecnologia touch-screen, porque serviam, principalmente, para tomar anotações que permitiriam “aliviar” a memória oral. 146 Foi posteriormente exposta no Art Forum, Berlim (2000), Gemäldegalerie (2001), Stadtgalerie Saarbrücken (2003), Kunstverein Hannover (2003) e Jewish Museum, Frankfurt am Main (2005).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

335

Esta instalação de Dreyblatt, que tem dedicado grande atenção ao tema da

memória, em particular no que diz respeito ao armazenamento externo e arquivos, marcou

um ponto de viragem no seu percurso, como ele próprio salientou numa entrevista de

2003: “For many years I have concentrated mostly on external storage mechanisms and

institutions, so that my work on the installation, The Wunderblock (2000) was a turning

point for me, in that text fragments referring to external storage are contrasted with

phrases from Freud’s own metaphorical model which meditates on the psychological,

internal layers of short and long term memory in the brain”.147

Figs. 3 e 4. Arnold Dreyblatt, The Wunderblock (2000). Vista geral da instalação, e pormenor do monitor.

Se, segundo Freud148 “Il est vrai égaiement que le bloc-notes magique ne peut

pas“reproduire” de l’intérieur l’écriture une fois qu’elle s’est effacée; ce serait un bloc

véritablement magique s’il pouvait comme notre mémoire, s’acquitter d’une telle

fonction”, na instalação de Dreyblatt, ao invés do modelo descrito por Freud – no qual o

acto de escrita se realiza através da pressão exercida sobre a superfície de celofane, que

adere ao bloco de cera situado debaixo – a escolha e entrada dos dados utilizados na

mesma foi realizada no passado, e os registos mnésicos “vêm de dentro”. A actividade

origina-se pois a partir do ROM e é sustentada em RAM, emergindo depois à superfície

do monitor em forma de quadro de ardósia. É claro que quando o pai da psicanálise

escreveu o seu ensaio, tentando representar o funcionamento do aparelho psíquico num

147 Arnold Dreyblatt apud Claudia Banz – “Without the presence of the past, we are without consciousness. Interview with Arnold Dreyblatt” (Arnold Dreyblatt – Aus den Archiven/From the Archives. Heidelberg: Kehrer Verlag; Stadtgalerie Saarbücken, 2003), in http://www.dreyblatt.net. Como assinala Thomas Fechner-Smarsly (“Catastrophe, Memory, Archive. Arnold Dreyblatt’s Media – and Archive – Supported Work in Cultural Remembrance” (publicado originalmente em Arnold Dreyblatt – Aus. pp. 17-31), in http://www.dreyblatt.net “Dreyblatt’s universe of memory is primarily text-based; one could also say the texts, in interplay with the media and their staging, are the images, script images in a sense”. 148 Sigmund Freud “Note sur le “Bloc-notes magique” (1ª edição, 1925, sob o título Notiz über den Wunderblock. Edição electrónica francesa in http://www.megapsy.com/Textes/Freud/biblio094.htm)

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

336

modelo técnico exterior, não dispunha (nem podia ainda sequer imaginar) dos recursos

sofisticados propiciados pelas máquinas de arquivar que temos hoje todos à disposição,

como o computador, aqueles utilizados por Dreyblatt na sua instalação.

Autonomamente, independentemente da presença ou ausência dum espectador –

ainda que implique a sua presença, quanto mais não seja a de “leitor” passivo neste caso

–, a instalação busca e escreve os fragmentos de frases que vão aparecendo e

desaparecendo no monitor [fig. 5]. Estes são compostos de extractos, pertencentes ao

texto Notiz über den ‘Wunderblock’ de Sigmund Freud e à obra A Glossary for Archivists,

The Society of American Archivists (CHICAGO, 1992). No entanto, esses fragmentos

textuais que emergem “de dentro” até à superfície do ecrã são difíceis de ser perscrutados

na sua integralidade. Os muitos fragmentos de textos aparecem e desaparecem

simultaneamente. Sendo assim, apenas conseguimos ler um dado fragmento com alguma

dificuldade, num ápice antes que o mesmo desvaneça. A apresentação da instalação

descreve o processo activo, próprio da memória humana que é perecível, como instável e

fragmentária; um processo ao mesmo tempo de descoberta e perda, preservação e

destruição dos traços mnésicos.

Diz-nos Freud (1990, pp. 123-124) que “Si l’on imagine qu’une main détache

périodiquement du tableau de cire la feuille recouvrante pendant qu’une autre écrit sur la

surface du bloc-notes magique, on aura là une figuration sensible de la manière dont je

voulais me représenter la fonction de notre appareil perceptif psychique”.

Fig. 5. Arnold Dreyblatt, The Wunderblock (2000). Frases no monitor.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

337

É claro que, tal como se apresenta no “monitor-ardósia” da instalação, esse

processo activo da memória, instável, incorpora implicitamente – e somos conduzidos lá

também pela inclusão que Dreyblatt faz de fragmentos de textos do já referido A Glossary

for Archivists– aquilo que o filósofo Jacques Derrida chamou mal de arquivo; até porque,

como demonstra o mesmo filósofo, com o ensaio de Freud (para além da inclusão de

conceitos que lhe são primordiais) a teoria da psicanálise torna-se então igualmente uma

teoria do arquivo, e não apenas uma teoria da memória, ao acolher a ideia dum arquivo

psíquico distinto da memória espontânea, através duma prótese:

“Le modèle de ce singulier «Bloc magique» incorpore aussi ce qui aura semblé, sous la forme d’une pulsion de destruction, contredire la pulsion même de conservation, ce qu’on pourrait surnommer aussi la pulsion d’archive. C’est ce nous appelions tout à l’heure, et compte tenu de cette contradiction interne, le mal d’archive. Il n’y aurait certes pas de désir d’archives sans la finitude radical, sans la possibilité d’un oubli qui ne se limite pas au refoulement. Surtout, et voilà le plus grave, au delà ou en deçà de cette simple limite qu’on appelle finité ou finitude, il n’y aurait pas de mal d’archive sans la menace de cette pulsion de mort, d’agression et de destruction” (DERRIDA, 2008, p. 38).

Recovery Rotations (2003), Flashbulb Memory (2002). Arnold Dreyblatt é

também o autor de duas instalações dedicadas ao tema da relação da memória com as

emoções, cuja importância já fora realçada por Ribot149, que deu origem na literatura

científica ao termo inglês flashbulb memories, introduzido em 1977 pelos psicólogos

americanos Roger Brown e James Kulik; em português, o termo recebeu entretanto a

tradução de “memórias cintilantes”150. Com ele, os autores referiam-se num estudo

pioneiro às lembranças relativas às circunstâncias em que uma pessoa tomou

conhecimento pela primeira vez de um acontecimento muito inesperado, mesmo chocante

149 Formado em filosofia, Théodule Ribot (1839, Guingamp – Paris, 1916) interessou-se igualmente pela psicologia clínica tendo colaborado com psiquiatras, para além de ter sido o introdutor da psicologia experimental em França (com Hippolyte A. Taine, como o teórico precursor). Foi dos primeiros investigadores da ciência moderna a chamar a atenção para o papel emocional, que tem uma função fundamental na consolidação das memórias a longo prazo. Assim, a partir do estudo de demências, ao enunciar na obra Maladies de la memoire (1881) as condições da “dissolução da memória”, na lei de “regressão ou de reversão”, conhecida como a Lei de Ribot, postulou que as lembranças mais recentes e mais complexas, e ao mesmo tempo sem significado afectivo, desaparecem com mais prontidão do que as antigas, simples e carregadas de emoções. Do mesmo modo, foi dos primeiros a sublinhar que uma das condições para um bom funcionamento da memória é o esquecimento. Tem-se verificado que a perda de memória causada por traumatismos cranianos, em sobreviventes de acidentes, obedece muitas vezes à Lei de Ribot, e durante as décadas de 1970 e 1980 diversos investigadores chegaram às mesmas conclusões que Ribot, através de testes concebidos para o efeito: sobre este aspecto vd. Daniel L. Schater – Searching…, pp. 84-85. 150 A tradução do termo flashbulb memories para português como memórias cintilantes é usada, como informa Nuno Gaspar (idem, p. XXXII), pelo menos desde 1994 por A. C. Pinto – Cognição, aprendizagem e memória. Edição policopiada do Autor, Universidade do Porto, 1994, p. 207.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

338

– seja do âmbito pessoal, ou vivido como membro de uma dada comunidade posta perante

uma situação particularmente negativa –, com consequências relevantes para ela

(despertando, em qualquer caso, uma grande emoção). Para os dois psicólogos, a memória

cintilante depois de constituída seria praticamente permanente, devido às recordações

extremamente vívidas despoletadas pela ocorrência central que lhes deu origem, pelo que

dispensaria ser fortalecida.

Pondo em paralelo a teoria do comportamento e a teoria neurofisiológica de R. B.

Livingston (a qual influenciou os dois psicólogos), o estudo exerceu uma forte acção

catalisadora, embora tenha sido muito questionado em alguns dos aspectos aí defendidos.

Nele, o caso protótipo apresentado era a notícia do assassinato do presidente John F.

Kennedy em Dallas, no dia 22 de Novembro de 1963 (tivesse sido realizado em 2001, e

seria concerteza o 11 de Setembro), embora também abordasse evidências de memórias

cintilantes de outros nove acontecimentos públicos, além de incluir relatos de outras

relativas a eventos negativos pertencentes à história pessoal dos sujeitos interrogados. É

referindo-se à memória que muitos norte-americanos conservaram desse dia que Brown

e Kulik caracterizam uma memória cintilante, do modo seguinte: “Tem uma qualidade

primária, ‘viva’, que é quase perceptiva. Na verdade, é muito semelhante a uma fotografia

que preserva indiscriminadamente a cena na qual cada um de nós se encontrava quando

o flash disparou” (BROWN & KULIK, 1977, pp. 77-79).151

O termo surgiu, como vimos, por analogia com a fotografia, da qual tira partido o

artista. A instalação Recovery Rotation, comissariada por Christoph Metzger, foi

apresentada na Akademie der Kunste, em Berlim (Festival Conceptualisms:

Contemporary Receptions in Music, Art, and Film, 2003), e na Stadtgalerie Saarbrücken

(2003). Consistia num único objecto colocado no espaço, um cilindro rotativo movido

por um motor, de 80 centímetros de altura e um metro de diâmetro, montado sobre um

suporte de metal, em cujo interior foram colocadas 100 lâmpadas de flash dispostas em

filas numa armação de ferro, diante da superfície exterior, virada para o espectador.

Essa superfície é composta de várias camadas de plexiglass e filme, que se

apresentava branca quando o cilindro permanecia inactivo (fig. 6). Porém, quando este

estava activo, de sete em sete segundos, aproximadamente, um flash de grande

151 Roger Brown e James Kulik – “Flashbulb memories”, Cognition, nº 5, 1977, pp. 77-99, cit. in Nuno Gaspar – Memória…, p. 116. Porém, apesar da caracterização citada poder erroneamente levar a pensar em tal, uma “flashbulb memory” não é uma fotografia, e como acrescenta Nuno GASPAR (ibidem) “uma memória cintilante está muito longe de ser completa e, apenas em certa medida, é indiscriminada e não selectiva”.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

339

intensidade iluminava (a 360 graus) onze frases textuais circulares, inscritas na superfície

do cilindro (fig. 7). À medida que este se movia lentamente, a cada novo flash o

espectador podia então aperceber-se, por um instante fugaz, de novos fragmentos de texto.

Na realidade, as frases apenas eram legíveis como uma lembrança “quase perceptiva” no

cérebro, a letras brancas sobre um fundo preto. Como explica Dreyblatt,

“At the moment of the flash the text is unreadable, so that the few text fragments one perceives are in fact no longer there in external reality, but the fading traces are still visible for a short time within an internal, psychological space. We attempt to retain a fragment of information in the perceptual residue of the flash. As in much of my work, there is a functional and a metaphorical layer, and the interaction between the two. The context texts actually describe what takes place in interaction with my machine” (2003, pp. 8-9).152

Figs. 6 e 7. Arnold Dreyblatt, Recovery Rotation (2003). Vistas da instalação, com o cilindro inactivo e flash com o

cilindro activo.

152 Interview between Claudia Banz and Arnold Dreyblatt Without the presence of the past, we are without consciousness, in: From the Archives, Kehrer Verlag. Heidelberg, 2003.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

340

As frases usadas na instalação foram todas elas directamente extraídas de textos

científicos: R. Brown e J. Kulik – “Flashbulbb memories”, Cognition, nº 5, 1977; U. Neusser

– Memory Observed. Remembering in Natural Context. Nova Iorque: W. H. Freeman, 1982;

R. B. Livingston – “Reinforcement”, The Neuro Sciences (A Study Program, Rockefeller

Press, Nova Iorque), 1967, entre outros.

Antes de Recovery Rotation, Dreyblatt já tinha idealizado a instalação Flashbulb

Memory, cujo título alude directamente ao tema tratado, apresentada pela primeira vez na

Galeria Anselm Dreher, em Berlim (2003), e depois na Gallery e/static, de Torino (2007).

Pensada para ser exposta num espaço escuro, explorando a percepção estroboscópica, é

constituída por três estroboscópios colocados alinhados numa parede [fig. 8], cada um deles

com um pequeno texto em filme. Os estroboscópios lampejam alternadamente numa

sequência de seis segundos. Os textos são frases escolhidas a partir de descrições perceptuais

de memórias cintilantes, que só são legíveis após a percepção, no cérebro. São elas: texto 1 –

Frame Freeze; texto 2 – Event Recall; texto 3 – Now Print.

Fig. 8. Arnold Dreyblatt, Flashbulb Memory (2002). Vista geral da instalação.

2.3. Anne Turyn

A fotógrafa norte-americana Anne Turyn (n. 1954) – também escritora e editora

– tem demonstrado habitualmente um interesse pela narrativa, e é a autora de uma extensa

série de fotografias intitulada Flashbulb Memories (1986), que se seguiu à série

Illustrated Memories (1984); como indica explicitamente o título, estamos pois perante

mais um exemplo de exploração artística do tema tratado no estudo de Roger Brown e

James Kulik. As fotos – criadas, segundo Turyn, sem recurso a colagens ou manipulação

digital – recriam visualmente as circunstâncias em que foram despoletadas experiências

de memórias cintilantes, carrregadas de emoções, a partir de vários acontecimentos

públicos chocantes ocorridos no século XX.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

341

Em cada uma delas, Turyn confronta o título dum jornal (mais ou menos

sensacionalista), referente a um evento noticioso, com o contexto físico no qual uma

pessoa determinada tomou conhecimento daquele, num dado momento. Como estas

recordações são muito vívidas, e provocam imagens mais detalhadas do que outros tipos

de memória, as fotos são apresentadas como uma suspensão no tempo, dum breve

momento: através da aparência dum espaço(s) encenado, dando a perceber o que estava

a fazer cada pessoa justamente antes de ler ou receber a notícia – no caso da fotografia

reproduzida [fig. 9], uma colisão de dois aviões comerciais, que provocou muitos mortos

–, sugerindo até os cheiros e sons em redor (não é por acaso que nalgumas fotos são

incluídos rádios e televisões). A série de Turyn é um dos exemplos artísticos escolhidos

pelo psicólogo norte-americano Daniel L. Schacter, para discutir diversos aspectos

relevantes da memória humana153; Schacter faz a seguinte apreciação geral:

“The photographs are characterized by a kind of hyperclarity, preserving precise nuances of light and shading as well as the exact arrangement of objects – the kind of details that a Now Print memory mechanism might preserve (…) Turyn’s visual rendition of flashbulb memories that result from a Now Print mechanism captures their salient features”.154

Fig. 9. Anne Turyn, 12-7-1960 (Flashbulb Memories), 1986.

153 Na obra já referida inclui obras de arte de 25 artistas plásticos. É ele quem afirma, categoricamente, logo na introdução (op. cit., p. 11) “All art relies on memory in a general sense – every work of art is affected, directly or indirectly, by the personal experiences of the artist – but some artists have made the exploration of memory a major subject of their work. I have come to appreciate that artists can convey with considerable potency some of the personal, experiential aspects of memory that are difficult to communicate as effectively in words. Scientific research is the most powerful way to find out how memory works, but artists can best illuminate the impact of memory in our day-to-day lives”. 154 Idem, p. 196. O termo Now Print é o aplicado por Roger Brown e James Kulik a um mecanismo cerebral específico, activado segundo eles por um evento fora do vulgar e chocante.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

342

2.4. Bruce Conner

Por altura do impactante acontecimento do assassinato de John Fitzerald Kennedy

– o “caso” protótipo no estudo pioneiro sobres as flashbulb memories –, o escultor e

notável realizador do cinema experimental norte-americano Bruce Connor (1933,

McPherson, Kansas – São Francisco, 2008), precursor fundamental da prática particular

de apropriação designada com o termo found footage, vivia em Brookline

(Massachusetts), a terra natal do presidente americano. Assombrado pelo assassínio, nos

dias que se seguiram Connor filmou obssessivamente a cobertura televisiva, directamente

a partir do seu aparelho de televisão com uma câmera de 8 mm; material fílmico que daria

origem a alguns trabalhos realizados por ele nessa década, e nas seguintes.

Embora concebido logo no imediato, o filme Report (1963-1967, 16mm, a preto-

e-branco, 13 min.) só foi concluído por Conner após uma complicada e longa gestação, e

foi montado, e remontado, diversas vezes: na realidade, Report foi exibido em oito

versões diferentes, todas com a mesma duração e a mesma banda sonora, depois da sua

estreia na Harvard Film Society, em 1964; entre outros aspectos, para o longo processo

de gestação também contribuiram alguns problemas surgidos com os direitos de

reprodução das imagens.

Apesar do título, Conner afasta-se do relato seco e objectivo dos factos (nem segue

uma cronologia precisa); procede a uma reelaboração analítica, interessa-lhe muito mais

uma análise do impacto emocional – e o filme solicita uma resposta afectiva por parte do

espectador –, inserir o evento central e suas repercussões num contexto social e político,

mediaticamente saturado, exercer um discurso crítico sobre o consumismo e os mass

media. De certo modo, Report expressa a ira de Conner perante a exploração (uma “fome

por imagens”) e comercialização da morte de JFK.

Para o efeito pretendido, Conner recorre a filmagens e narrações radiofónicas. A

banda sonora é crucial, e realça um repórter radiofónico que após descrever calmamente

o trajecto do cortejo presidencial, e o papel dos Serviços Secretos na sua protecção, relata

o assassínio em directo enquanto este acontece, cuja voz extravaza, em crescendo, as

emoções geradas pelos momentos então presenciados. Conner acentua esta tensão,

cortando em pedaços a narração e repetindo-a em loop, voltando atrás para fazer ouvir

frases essenciais outra vez, e, para o fim, vai distorcendo a voz até soar estranhamente.

Além disso, desmonta metodicamente aquele dia, e em vez de documentar o atentado

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

343

propriamente dito, num movimento exógeno recua até ao passado e desloca-se para o

futuro, num fluxo discontínuo de imagens, submetidas a efeitos estroboscópicos e de

câmara lenta. A cronologia dá primazia à intensidade e à natureza do evento central, que

mudou uma época, no seio dum contexto político e social complexo que, ao mesmo

tempo, conduziu a ele e por ele foi alterado para sempre.

Visceral e pungente, fragmentário, Report é uma tentativa de lidar com as

circunstâncias do assassínio, para compreender o que significa documentar um

acontecimento como este. Conner usa cuidadosamente a cobertura televisiva do dia

trágico – juntando às imagens captadas dos serviços noticiosos daquele dia outras do

funeral de JFK, e ainda várias da sua posse como presidente, entrecortadas por um

conjunto muito variado de imagens aparentemente não relacionadas (de Wall Street,

touradas, publicidade, etc.) –, para reflectir sobre a fronteira que separa o verdadeiro

jornalismo da exploração sensacionalista: daí, a ausência de quaisquer imagens

mostrando o atentado, e, sobretudo, as balas atingindo o presidente, como as do famoso

e muito polémico filme amador de Abraham Zapruder. No filme, esse momento é

preenchido emocionalmente por uma fotografia famosa (de Harold E. Egerton) duma bala

atravessando uma lâmpada eléctrica, despedaçando o seu vidro e passando sem

impedimento; uma metáfora inteligente para a morte do 35º presidente dos EUA.155

Em cima, da esquerda para a direita:

Fig. 10. Bruce Connor, fotograma do filme Report (1963-1967), com JFK e Jackie na limusine presidencial.

Fig. 11. Bruce Connor, vista da instalação Television Assassination (1963-64/95), no Walker Art Center.

Fig. 12. Bruce Connor, fotogramas do filme Television Assassination (1963-95).

155 Sobre o filme de Abraham Zapruder, e para uma análise aprofundada de Report, vd. Adrian Danks –“ Shooting the President: Bruce Conner’s Report”, in <http://sensesofcinema.com/2009/cteq/report/> [consulta em 13/03/2014].

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

344

Também, em vez de imagens muito nítidas, o filme repete alguns segundos de

imagens granulosas e algo desfocadas (mas tão icónicas que são facilmente reconhecíveis,

mesmo se privadas de muitos dos seus detalhes): a limusine presidencial percorrendo o

seu percurso, John e Jackie sorrindo e acenando no banco traseiro [fig. 10]. Entre breves

flashes dessas imagens, o filme consiste de fotogramas neutros, negros, que separam as

imagens por intervalos de tempo progressivamente maiores (persiste a banda sonora), até

a limusine desaparecer completamente, substituída por uma cintilação pulsante de

fotogramas brancos e negros, alternando, que pode ser interpretada como uma alusão ao

trauma e caos provocados pelo assassínio.

A instalação Television Assassination (1963-64/95), pertencente à colecção do

Walker Art Center, em Minneapolis, prolonga a temática de Report mas centra-se noutro

tiroteio, que foi na realidade o primeiro assassínio captado e transmitido ao vivo pela TV:

o de Lee Harvey Oswald, o alegado sniper que atingiu mortalmente JFK (segundo a

versão oficial, resultante de várias investigações governamentais), baleado por Jack Ruby

a 24 de Novembro de 1963, quando era transferido sob custódia policial da cadeia

municipal. Numa primeira fase, Connor montou o filme (a preto-e-branco, mudo) em

1964, e em 1975 integrou-o na instalação [fig. 11], projectando-o sobre o ecrã pintado de

uma televisão fora de uso (Zenith) dos anos 60: e, desse modo, como que devolve as

imagens à sua fonte original.

Por sua vez, Television Assassination (1963-95, 16mm, b/w, 14 min.) partiu do

filme projectado na instalação, e oferece uma extraordinária montagem associativa que

recicla imagens bem conhecidas, ocasionalmente “complicadas” por designs abstractos

simples, soberbamente servida por uma banda sonora musical de Patrick Gleeson à qual

se ajusta na perfeição156, que incrementa a sua eficácia. O loop das imagens, insistente,

assegura que já não as esqueceremos.

156 Na verdade, este filme é um exemplo maior de uma muito cuidadosa harmonia com a música. E assinale-se que desde há alguns anos começou-se a olhar com atenção para os filmes que Conner realizou nos anos 60 e 70, que muitos consideram hoje serem precursores do vídeo musical e da estética MTV; algo que pudemos comprovar numa sessão que lhes foi especialmente dedicada no 19º Festival Internacional de Cinema CURTAS de Vila do Conde (2011): destacaríamos entre eles Cosmic Ray (1961) e Vivian (1965). Sobre esta faceta da obra de Connor vd. Daniel Ribas – “Before There Was MTV, There Was Bruce Connor” in 19º/ CURTAS Vila do Conde, 9-17 de Julho, 2011, pp. 168-170.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

345

2.5. Anne & Patrick Poirier

Pode parecer estranha, à primeira vista, a inclusão que fazemos neste artigo da

escultura Hortus Conclusus (2006) do casal de artistas Anne & Patrick Poirier (Anne, n.

1942 em Marselha, e Patrick n. 1942 em Nantes). Trata-se na realidade de uma obra de

arte peculiar, colocada num lugar inesperado, o Jardim Zoológico de Mulhouse. A

escultura consiste numa gaiola (ou aviário) em aço inoxidável de grande dimensão

composta por uma série de cinco cones interligados entre si – mais precisamente, quatro

mais pequenos dispostos em redor dum cone central –, que abriga pombas [v. figs. 15 e

16]. Todavia, como temos conhecimento através de declaração do casal, a escultura em

causa além de funcionar como obra poética, e abrigo ornitológico, remete directamente

para o tema da memória, de que constitui uma metáfora, visto terem-se inspirado para a

sua concepção nas teorias do filósofo – e prémio Nobel da Literatura (1927) – francês

Henri Bergson (1858-1941)157 mais concretamente aquelas expostas na obra Matière et

mémoire…(1896).

Nela, após estabelecer com clareza a distinção entre percepção e memória e propor

os seus modos de interacção – pois percepção e memória (e imaginação) colaboram,

cabendo à segunda determinar, identificando, as particularidades dentro de quadros gerais

de semelhança –, no capítulo III Bergson de modo a tornar mais evidente estes últimos

imagina metaforicamente a sua representação através do seu famoso cone invertido SAB

[fig. 13], contendo a totalidade das recordações heterogéneas acumuladas na memória

como resultado da nossa experiência adquirida, cujo vértice (S), figurando a cada

momento que passa o presente e os respectivos actos perceptuais – e, por isso, avançando

sem cessar para o futuro no fluir do tempo (na terminologia de Bergson, a durée) – toca,

sem descanso, num plano (P) raso continuamente móvel, o da realidade presente, aquela

da percepção concreta imediata ou, nas palavras do autor, o “da minha representação

actual do universo”.158

157 “Le thème de la mémoire selon Bergson”, association de l’art à l’oeuvre – in <http://www.art-et-voyage.com/blog/index.php?2007/03/047448-le-theme-de-la-memoire-selon-bergson> [consulta em 2/4/2008]. 158 Como bem observa Gilles Deleuze (L’Image-Temps. Paris: Les Éditions de Minuit, 1985, p. 108, nota 21), comentando o cone de Bergson, o ponto S “n’est pas un point à strictement parler, puisqu’il comprend déjá le passé de ce présent, l’image virtuelle qui double l’image actuelle”.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

346

Figs. 13 e 14. Cone invertido de Henri Bergson, na obra Matière et Memoire; o da direita apresenta as secções.

Na base do cone (AB) encontra-se imóvel o passado com a totalidade das suas

lembranças; mas quando nos movemos no presente a nossa consciência é o vértice (S) do

cone – no qual se concentra a imagem do corpo (a percepção é a intersecção do corpo

com o mundo) –, que faz parte do plano P e estabelece o contacto pontual entre a realidade

presente e a memória cumulativa. Também, logicamente, segundo Bergson com a

passagem do tempo a distância entre S e AB aumenta.

Porém, porque para Bergson a memória responde continuamente ao chamamento

do presente vivente – um aspecto importante da sua teoria – aclarando-o e ajudando na

acção, constituem-se secções do cone (AˊBˊ, AˊˊBˊˊ,…) (fig. 14) correspondentes a

diferentes níveis contendo, virtualmente, representações completas de todo o passado

acumulado tal como se conservou (as recordacões puras); as quais apenas constituem

circuitos psicológicos de imagens-recordação consoante “saltamos” do vértice S até uma

destas secções, quando é necessário trazer à consciência o que é útil ao apelo duma acção

presente a cumprir, descendo de novo em seguida a um novo presente (Sˊ), pois segundo

ele o eu normal nunca se fixa numa destas posições extremas (AB e S), metendo-se entre

elas:

“adopte tour à tour les positions représentées par les sections intermédiaries, ou, en d’autres termes, donne à ses representations juste assez de l’image et juste assez de l’idée pour qu’elles puissent concourir utilement à l’action presente”.159

159 Henri Bergson – Matière et mémoire. Essai sur la relation du corps à l’esprit. Paris: Les Presses Universitaires de France, 1965 (1ª edição em 1939. Edição electrónica por Gemma Paquet, 2003, a partir da 72 ª ed. de 1965, p. 112. Collection “Les classiques des sciences sociales”, Université du Québec à Chicoutimi, in <http://classiques.uqac.ca/classiques/bergson_henri/bergson_henri.html>). Vd. sobre o cone, idem, pp. 105 e 111.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

347

Como é evidente os Poirier utilizam a figura do cone160, e os anéis metálicos

internos da estrutura da sua escultura [fig. 16] podem remeter-nos aos círculos das secções

de Bergson; no entanto, ao invés daquele cone da teoria de Bergson, os vértices dos seus

apontam para o céu, o que nos conduz a uma outra famosa metáfora. Os autores da

escultura não o dizem – pelo menos não conhecemos declarações suas nesse sentido, ou

qualquer outro texto que o refira – mas é de crer que este casal de escultores, arquitectos

e “arqueólogos” que trabalham juntos há mais de 40 anos, e cuja quase totalidade da obra

é dedicada ao tema da memória, tenha consciência de outras referências para as quais,

inevitavelmente, a sua escultura remete. A que imediatamente nos ocorre é aquela

metáfora da gaiola de pombas (ou pombal), empregue por Platão no diálogo Teeteto

[197c-200c] logo a seguir aqueloutra dos blocos de cera [191c-196c].161

Na nova metáfora Platão (através de Sócrates) retoma a anterior mas, por assim

dizer, espiritualiza-a. Passamos então duma passividade da sensação (a impressão, ou

traço, no bloco de cera) à actividade do espírito, simbolizada pela caça às pombas. As

pombas (as ideias, as recordações) depois de apanhadas estão juntas numa gaiola colocada

na alma em vez dos blocos de cera [197d] – estritamente falando, Sócrates refere-se no

início [197c] a aves silvestres (pombas, ou quaisquer outras) mas no seguimento fala em

pombais e em caça a pombas –, voando em grupos ou sózinhas e à disposição do caçador

(o espírito), conforme lhe convir e quantas vezes quiser.

160 Não é o único trabalho do casal em que a referência ao cone invertido de Bergson está presente, pois este aparece representado explicitamente em pelo menos cinco folhas do Journal de l’archéologue, pertencente ao amplo projecto Mnémosyne (1990-1993). Aproveitamos ainda aqui o ensejo para referir que temos conhecimento dum outro artista françês, Julien Maire (n. 1969), a residir e trabalhar em Berlim, que é autor de uma obra igualmente baseada no cone de Bergson. Justamente intitulada The Inverted Cone (2009), trata-se de uma instalação multimédia e terá sido apresentada no decurso da exposição “Transmediale 10” (2010), em Berlim. Não a abordaremos, todavia, porque os dados que possuímos não nos permitem ter uma ideia suficientemente clara sobre a mesma. 161 É bem conhecida a metáfora de Platão em famosa passagem do diálogo referido para explicar o funcionamento da memória, quando evoca o esquecimento temporário a que está sujeito o saber adquirido pela alma antes da sua incarnação, e que serviu posteriormente de pretexto para inúmeras reflexões sobre a memória e o esquecimento. Nela, apresenta-nos Sócrates supondo a existência de blocos de cera nas nossas almas, nos quais ficariam gravadas as impressões de pensamentos e sensações. Mas, embora cada bloco se apresente virgem aquando do nascimento da alma respectiva, para Platão a memória, esse dom divino concedido aos homens aquando do seu nascimento, não favorece a a todos da mesma maneira, ao longo da vida. Os diferentes desempenhos da memória de cada um são então explicados pelo tamanho desigual dos blocos, maiores ou menores, assim como pela qualidade da camada de cera desses, consoante a sua pureza e dureza, que varia de indivíduo para indivíduo. É evidente que Platão deve ter tido em mente, para a construção da sua metáfora, aquelas ‘tabuinas de cera’ usadas como suporte da escrita, a que aludimos antes.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

348

O conhecimento assemelha-se então a uma caça às pombas, a qual é de dois tipos

[198d]: uma tem por objectivo capturar o que ele, espírito, não possuía ainda, enchendo

a gaiola antes vazia, ou seja, aprender; a segunda, a daquele que já possui, e procura

“deitar a mão” àquelas pombas que já se encontram no pombal a esvoaçar de um lado

para o outro, ao saber aprendido mas que já não se tem convenientemente à mão no

pensamento (como se não soubesse) quando é preciso utilizá-lo no presente, quer dizer,

tornar a recordar-se. As recordações não estão imóveis, comportam-se como seres vivos,

porque a memória é concebida como uma actividade.

Debruçando-se sobre a natureza do conhecimento, Platão distingue assim entre as

ideias (ou saberes) em acto, consideradas pelo espírito no presente, e as ideias “em

potência” armazenadas na alma (as pombas na gaiola, da memória inteligível) – mas,

também se pode agarrar a pomba errada como no exemplo do matemático [198a-199c] –

, tal como na metáfora anterior fazia distinção entre sensação presente e impressão-

lembrança.

Figs. 15 e 16. Anne & Patrick Poirier, Hortus Conclusus (2006), Mulhouse. Vista geral e pormenor.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

349

Note-se que na antiguidade Greco-romana era atribuído um significado simbólico

aos pássaros, e em particular às pombas, como manifestações da Divindade – na Grécia,

as sacerdotisas de Zeus eram mesmo conhecidas como “pombas”. A pomba (em grego,

peristera) em si é já, portanto, um símbolo do espírito; com a cristianização, a pomba

branca ganha na iconografia cristã um papel relevante (pense-se no episódio do Novo

Testamento, em que o Espírito Santo desce como pomba sobre Jesus Cristo, quando este

é baptizado), e tem sido considerada por muitos o mais espiritual dos pássaros.

Por fim, não podemos deixar de reparar que o próprio título escolhido pelo casal

Poirier para a escultura tem conotações religiosas; porque, se literalmente a expressão

latina hortus conclusus significa “jardim fechado”, deriva da Bíblia na sua versão vulgata

– no Cântico dos Cânticos –, sendo aplicada como atributo emblemático (e ao mesmo

tempo como título) da Virgem Maria, na poesia e na arte medieval e renascentista. Já S.

Bernardo dizia: “Maria é o jardim fechado, a fonte selada, o templo do Senhor, o santuário

do Espírito Santo”.162

2.6. Alexandre Estrela

É ainda a Bergson que nos podemos referir através da obra Ad Nauseam (2011),

do artista português Alexandre Estrela (n. 1971, Lisboa) – professor da cadeira de vídeo

na Faculdade de Belas-Artes de Lisboa –, conhecido por abordar nos seus trabalhos

questões formais, e conceptuais, resultantes do modo como intercepta imagens

projectadas com a matéria, mormente esculturas. Ad Nauseam, que vimos na exposição

individual do artista “Wall Against The Sea” – na Solar, Galeria de Arte Cinemática (Vila

do Conde, 24 Setembro/13 Novembro de 2011) –, consiste numa projecção vídeo sobre

uma escultura de chapa metálica (116 x 83 x 136 cm), assente no chão, que está dividida

em duas partes por uma estreita fenda vertical.

O espectador era confrontado com imagens de um mostrador dum relógio digital

Timex, a que foram retirados os dígitos (fig. 17), rodando num movimento contínuo em

loop – activado, e assinalado, por um som monocórdico, bastante audível –, imagens essas

162 A Rainha do Céu: Lisboa: Editorial Verbo, 1990, p. 104. Doutor da Igreja, S. Bernardo (1090-1153) legou-nos inúmeros sermões, escritos místicos e cartas. Sobre a relação entre os aparatos simbólicos, emblemáticos e figurativos dos jardins, desde o “hortus conclusus” até às criações da época barroca, e os sistemas de imagens mnemónicas, vd. uma breve abordagem em Sébastien Marot – Suburbanismo y el arte de la memoria. Barcelona: Editorial Gustavo Gili, SL, 2006, p. 33.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

350

projectadas obliquamente sobre a “chapa-ecrã”: um efeito acentuado pelo facto da fenda

visível, da escultura, divergir do eixo de rotação do relógio. A propósito do tempo “em

potência” evocado em Ad Nauseam, Maria João Gamito invoca os conceitos avançados

por Bergson em Matière et Mémoire:

“esta peça que, à semelhança do que acontece com todas as imagens, como propõe Bergson, é tocada pelas lembranças que guiam na sua tarefa os mecanismos sensório-motores do corpo, dele fazendo o lugar da representação entendida menos na perspectiva do espaço do que na do tempo vivido, do tempo subjectivo, i. e., da duração tal como Bergson a define. Esse tempo é o da lembrança que a memória actualiza convertendo-a na percepção do incessante movimento do relógio através da discrepante estimulação dos sentidos e da náusea que dela resulta que é, afinal, a náusea que sobra do confronto entre a percepção de um objecto reduzido à sua condição de imagem (à sua condição matérica) e a condição de um infindável presente habitado pela hipótese de uma absurda máquina de movimento perpétuo”.163

Não deixando de lado aquilo que diz Bergson em Matière et Mémoire, porque de

facto o conceito de durée tem nessa obra uma grande importância, pela nossa parte somos

levados, devido à omnipresença do relógio sem dígitos nem ponteiros, a evocar o anterior

Essai sur les données inmédiates de la conscience (1889) no qual Bergson opôs à noção

de “tempo” da física (com a concepção de espaço aderente), que o entende como uma

soma de instantes imóveis passíveis de ser medidos pelo relógio, a dinâmica do tempo

psíquico, ou tempo vivido.164

Fig. 17. Alexandre Estrela, Ad Nauseam (2011). Vista geral.

163 Maria João Gamito – “A Potência das Imagens” in Alexandre Estrela. Wall Against The Sea. Vila do Conde: Solar, Galeria de Arte Cinemática, 2011, p. 2. 164 Sobre esta questão, vd. as passagens contidas na seguinte obra: Henri Bergson – Memoria y vida…, pp. 14-15 e 22-24. Mas também (idem, pp. 25-26) uma outra, importante, extraída da obra posterior L’évolution créatrice (1907).

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

351

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFIA

ESTRELA, A. (2011). Wall Against The Sea. Vila do Conde: Solar, Galeria de Arte

Cinemática.

ALVES, M. V. (2001) (Coord.). Imagens Médicas. Fragmentos de uma História. Porto:

Porto Editora.

BANZ, C. (2003). “Without the presence of the past, we are without consciousness” (A.

Dreyblatt, Interview). Disponível em: http://www.dreyblatt.net

BERGSON, H. (1965). Matière et mémoire. Essai sur la relation du corps à l’esprit.

Paris: Les Presses Universitaires de France.

BERGSON, H. (2004). Memoria y vida, textos escogidos por Gilles Deleuze. Madrid:

Alianza Editorial.

BERNARD, B. (1990). A Rainha do Céu. Lisboa: Editorial Verbo.

CAMBIER, J. (2004). A Memória. Lisboa: Editorial Inquérito.

CARTER, R. et al. (2009). O Livro do Cérebro. Porto: Dorling Kindersley/ Civilização,

Editores Lda.

CHAMOUX, F. (2000). A Civilização Grega. Lisboa: Edições 70.

DAMÁSIO, A. (2004). Ao Encontro de Espinosa. As Emoções Sociais e a Neurologia do

Sentir. (6.ª ed.). Lisboa: Publicações Europa – América, Lda.

DAMÁSIO, A. (2010). Não existe memória sem emoção. Focus, 547( 7), 119.

DAMÁSIO, A. (2010). O Livro da Consciência. A Construção do Cérebro Consciente.

Lisboa: Temas e Debates/Círculo de Leitores.

DAMÁSIO, A. (2008). O Sentimento de Si. O corpo, a emoção e a neurobiologia da

consciência. (16.ª ed.). Lisboa: Publicações Europa – América, Lda.

DANKS, A. (2009, Abril). Shooting the President: Bruce Conner’s Report. Disponível

em: http://sensesofcinema.com/2009/cteq/report/

DELEUZE, G. (1985). L’Image-Temps. Paris: Les Éditions de Minuit.

DERRIDA, J. (2008). Mal d’archive. Une impression freudienne. Paris: Éditions Galilée.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

352

FECHNER-SMARSLY, T. (2003). Catastrophe, Memory, Archive. Arnold Dreyblatt’s

Media – and Archive – Supported Work in Cultural Remembrance. Heidelberg: Kehrer

Verlag; Stadtgalerie Saarbücken.

FREITAS, A. C. (2007, março 18). Dentro das cabeças de Adão e Eva. Público, 2.

FREUD, S. (1925). Note sur le “Bloc-notes magique. Disponível em:

http://www.megapsy.com/Textes/Freud/biblio094.htm

GASPAR, N. (2011). Memória operatória e afecto. Efeitos do estado emocional e da

valência de palavras na evocação. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian /Fundação

para a Ciência e a Tecnologia.

HAUSER, J. (2007). A Biotecnologia como Medialidade – Estratégias da Media Art

Orgânica. Nada, 9, 80-87.

LAROCHE, S. (2007). La mémoire, mécanismes cellulaires et moléculaires. In Les

Transversales du CNRS:”Mémoires” – Synthèse: disponível em:

http://www.cnrs.fr/cw/fr/pres/compress/memoire/synthese.htm#macanisme.

MAROT, S. (2006). Suburbanismo y el arte de la memoria. Barcelona: Editorial Gustavo

Gili, SL.

MENEZES, M. (2007). Decon: Desconstrução, Descontaminação, Decomposição. In

Nada, 9, 108.

MENEZES, M. (2004). Naturaleza?. A Mínima, Oviedo, 6, 34-42.

MENEZES, M. (2015). Proteic Portrait. BIOFEEL, SymbioticA Research Group.

Disponível em: http://www.martademenezes.com/biofeel.pdf

MENEZES, M. (2005). Retratos funcionais: visualizando o corpo invisível. Nada, 4, 96-

101.

PLATÂO (2005). Teeteto (2.ª ed.). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.

RIBAS, D. (2011). Before There Was MTV, There Was Bruce Connor. In 19º/ CURTAS

Vila do Conde, 9-17 de Julho, 2011, pp. 168-170.

SCHACTER, D. L. (1996). Searching for memory: the brain, the mind, and the past.

Nova Iorque: Basic Books.

STREMMEL, K. (2005). Realismo. Lisboa: Taschen.

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

353

TADIE, J. Y., & TADIÉ, M. (2004). Le sens de la mémoire. Paris: Éditions Gallimard.

FUNDAÇÃO CALOUSTE GULBENKIAN (2003). Projecto – 7 Artistas ao 10º Mês.

NewsLetter, nº 47, Outubro de 2003.

WEBGRAFIA

www.anne-patrick-poirier.com/

http://www.dreyblatt.net/

http://www.martademenezes.com

http://www.art-et-voyage.com/blog/index.php?2007/03/047448-le-theme-de-la-memoire-selon-

bergson

© EUROPEAN REVIEW OF ARTISTIC STUDIES Estudos Interdisciplinares

354