A Internação Compulsória de dependentes químicos e o princípio da Dignidade da Pessoa Humana

53
A INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA DE DEPENDENTES QUÍMICOS E O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA INVOLUNTARY INTERNMENT OF DRUG ADDICTS AND THE PRINCIPLE OF HUMAN DIGNITY Dan Igor dos Santos 1 Eduardo Felipe Tessaro 2 RESUMO: O objetivo da presente pesquisa é demonstrar se a internação compulsória, aplicada a dependentes químicos, viola ou não a dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais. Esta questão tem gerado certa polêmica, e intenso debate entre especialistas de diversas áreas, principalmente depois que os estados de São Paulo e Rio de Janeiro promoveram políticas públicas mais incisivas para aplicação da medida. Além disso, novos projetos visam alterar a atual lei de drogas (Lei 11.343/2006), com escopo de permitir aplicação do instituto aos dependentes químicos, já que hoje, não há previsão legal específica sobre o assunto. Neste sentido, buscou-se fazer um estudo legislativo sobre a existência da internação compulsória no ordenamento jurídico brasileiro, disposto na lei 10.216/2001. Após, foi realizada análise interdisciplinar sobre a reforma psiquiátrica e as recentes mudanças no novo modo de pensar sobre drogas. Por fim, foi feita análise do princípio da dignidade humana e suas dimensões, no intuito de questionar a viabilidade de violar a liberdade do indivíduo para tutelar sua saúde, por meio do instituto em tela. PALAVRAS-CHAVE:Internação Compulsória; Dignidade da Pessoa Humana; Dependentes Químicos; Reforma Psiquiátrica; ABSTRACT: The objective of this research is elucidating if the involuntary internment, applied to drug addicts, violates or not, their human dignity or fundamental rights. This question generated some polemics, and huge debate of several areas’ 1 Acadêmico do Curso de Direito da UNIVEL – Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas de Cascavel. 2 Mestre em Direito - PUC/PR e Professor do Curso de Direito da UNIVEL – Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas de Cascavel.

Transcript of A Internação Compulsória de dependentes químicos e o princípio da Dignidade da Pessoa Humana

A INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA DE DEPENDENTES QUÍMICOS E OPRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA

INVOLUNTARY INTERNMENT OF DRUG ADDICTS AND THEPRINCIPLE OF HUMAN DIGNITY

Dan Igor dos Santos1

Eduardo Felipe Tessaro2

RESUMO: O objetivo da presente pesquisa é demonstrar se ainternação compulsória, aplicada a dependentes químicos, violaou não a dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais.Esta questão tem gerado certa polêmica, e intenso debate entreespecialistas de diversas áreas, principalmente depois que osestados de São Paulo e Rio de Janeiro promoveram políticaspúblicas mais incisivas para aplicação da medida. Além disso,novos projetos visam alterar a atual lei de drogas (Lei11.343/2006), com escopo de permitir aplicação do institutoaos dependentes químicos, já que hoje, não há previsão legalespecífica sobre o assunto. Neste sentido, buscou-se fazer umestudo legislativo sobre a existência da internaçãocompulsória no ordenamento jurídico brasileiro, disposto nalei 10.216/2001. Após, foi realizada análise interdisciplinarsobre a reforma psiquiátrica e as recentes mudanças no novomodo de pensar sobre drogas. Por fim, foi feita análise doprincípio da dignidade humana e suas dimensões, no intuito dequestionar a viabilidade de violar a liberdade do indivíduopara tutelar sua saúde, por meio do instituto em tela.

PALAVRAS-CHAVE:Internação Compulsória; Dignidade da PessoaHumana; Dependentes Químicos; Reforma Psiquiátrica;

ABSTRACT: The objective of this research is elucidating if theinvoluntary internment, applied to drug addicts, violates ornot, their human dignity or fundamental rights. This questiongenerated some polemics, and huge debate of several areas’

1Acadêmico do Curso de Direito da UNIVEL – Faculdade de Ciências SociaisAplicadas de Cascavel. 2Mestre em Direito - PUC/PR e Professor do Curso de Direito da UNIVEL –Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas de Cascavel.

2

specialists, mainly, because of the intense institute’spromotion in the states of Rio de Janeiro e São Paulo, in thebeginning of the current year. Besides, there are new billsthat expect to change the current law of drugs (Law11.343/2006), in order to allow the application of theinstitute to the drug addicts, since there’s no specific legalprevision about it. Therefore, it has been done a legislativestudy about the existence of involuntary internment on theBrazilian state of law, specially on the law 10.216/2001.Later on, it has been made an interdisciplinary analysis ofpsychiatry reformation and the recent changes in the new wayto think on drugs. By the end, it can be found an analysis ofthe human dignity principle and its dimensions, with thedesire of question the viability to violate the liberty inorder to protect the wealth, through the institute mentioned.

KEYWORDS: Involuntary Internment; Human Dignity; Substancedependents; Psychiatry reformation;

1 INTRODUÇÃO

Muito embora se imagine que a dependência química é

problema das sociedades atuais, o uso de substâncias

toxicológicas acompanha a humanidade desde a antiguidade. Veja

que Hipócrates e Galeno, ainda na Grécia antiga, definiram que

droga seria toda substância que, em não sendo vencida pelo

corpo humano, teria capacidade de vencê-lo.3

Nas Ordenações Filipinas do Brasil colônia já havia

previsão sobre o uso e distribuição de tóxicos, no Livro V,

título LXXXIX, em que era possível se ler “Nenhuma pessoa tenha

em sua caza para vender, rosalgar branco, nem vermelho, nem amarello, nem

3NUNES, Laura. M; Jólluskin, G; O uso de drogas: breve análise histórica esocial. Disponível em: <http://bdigital.ufp.pt/bitstream/10284/449/1/230-237FCHS04-15.pdf>. Acesso em:23 maio. 2013.

3

solimão, nem agua delle, nem escomanéa, nem opio, salvo se for boticario

examinado (...)”(sic)4

Foi no século XX, entretanto, que efetivamente houve

preocupação internacional, que ocasionou uma gradativa

política contra as drogas no Brasil, passando pelas várias

redações do artigo 281 do Código Penal de 1940, as antigas

leis de drogas de 1971 e 1976 até a recente Lei de drogas

11.343/2006.

Ainda sim, o problema das drogas, como é natural

observar, não foi contornado. O Instituto Nacional de Ciência

e Tecnologia para Políticas Públicas de Álcool e Drogas

(INPAD) demonstrou que três milhões de brasileiros utilizaram

maconha no ano passado, bem como dois milhões fizeram uso de

cocaína (na forma intranasal ou fumada) no mesmo lapso

temporal. Isso corresponde a 2% de toda a população do país.5

Os tóxicos acabam não apenas afetando a saúde dos

usuários, mas também corrompem um ordenamento por completo:

arruínam o desenvolvimento social dos dependentes, afastam

jovens dos meios educacionais e laborais, além de promover

imensas organizações criminosas pela narcotraficância.

A Constituição Federal, no artigo 196, expressa que:

A saúde é direito de todos e dever do Estado,garantido mediante políticas sociais e econômicasque visem à redução do risco de doença e de outros

4BRASIL.Ordenações Filipinas de 1595. (revogado) Disponívelem:<http://www1.ci.uc.pt/ihti/proj/filipinas/l5ind.htm>. Acesso em:29 maio.2013.5INPAD (Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia Para Políticas Públicasdo Álcool e Outras Drogas). II LENAD (II Levantamento nacional de Álcool eDrogas. Disponível em:<http://inpad.org.br/wp-content/uploads/2013/03/LENAD_PressRelease_Coca.pdf>. Acesso em:30 maio.2013.

4

agravos e ao acesso universal e igualitário àsações e serviços para sua promoção, proteção erecuperação.6

Se o Estado tem o dever constitucional de promover a

saúde de todos, a questão que se coloca é como, efetivamente,

tratar e recuperar os usuários de drogas e, em estágio mais

avançado, os dependentes químicos.

Recentemente, o instituto da internação compulsória vem

sendo novamente analisado como medida cabível. Veja que nos

estados de São Paulo e Rio de Janeiro, no começo do ano de

2013, políticas públicas incisivas foram implantadas a fim de

promover a internação, em geral, não voluntária, dos

dependentes em ‘crack’.7

As medidas envolveram agentes sociais e de saúde,

policiais civis e militares. Os dependentes eram passados por

uma triagem, uma avaliação médica, e em seguida, após análise

por advogados e promotores, um juiz decidia com urgência, se

haveria ou não internação.8

Não bastasse isso, o recente Projeto de Lei 7663/2010,

visa realizar diversas modificações na atual lei de drogas

(11.343/2006), dentre elas, institucionalizar a aplicação da

internação compulsória aos dependentes químicos, já que no

atual panorama jurídico, não há específica previsão legal.

6BRASIL. Constituição Federal. Art. 196, caput. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm.> Acesso em: 23 maio.2013.7SP inicia programa de internação compulsória de viciados em crack.G1.Disponível em: <http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2013/01/sp-inicia-programa-de-internacao-compulsoria-de-viciados-em-crack.html>.Acesso em: 30 maio.2013.8COMEÇA internação compulsória de dependentes químicos. Conjur. Disponívelem: <http://www.conjur.com.br/2013-jan-21/comeca-internacao-compulsoria-dependentes-quimicos-sao-paulo>. Acesso em: 30 maio. 2013.

5

A internação compulsória relacionada aos dependentes

químicos, entretanto, se dilui em um paradoxo. Na ordem de

proteger a vida do toxicômano, viola-se a sua liberdade, sem

que ele tenha cometido qualquer crime ou delito. Para proteger

sua saúde, como é dever do Estado, rompe-se com sua

autodeterminação. Afinal, qual a legitimidade do Estado para

tratar usuários e dependentes químicos?

Claramente, o assunto desperta atenção, já que aponta

interesse não só da disciplina da disciplina de direito

Constitucional, mas também da área de direitos humanos e

fundamentais. Abrange também todo o ordenamento jurídico sobre

drogas e as leis que protegem as pessoas portadoras de doenças

mentais. Encontra ainda, enfoque sociológico, psicológico,

médico e político.

Em face disso, as críticas surgiram, dividindo

especialistas. Os operadores do direito não podem se escusar

desta realidade, sendo necessário o debate sobre os efeitos e

consequências da compulsoriedade da internação.

Isso porque o instituto não pode ser simplesmente

executado, no aguarde de resultados positivos. É necessária

ampla discussão sobre a viabilidade da medida, e se não há

violação de direitos fundamentais e humanos em sua aplicação.

O modo como tratamos nossos dependentes químicos e

doentes em geral demonstrará que tipo de estado constitucional

nós temos. O tema não ficará restringido ao plano interno, mas

poderá ter implicações internacionais. O Escritório das Nações

Unidas sobre Drogas e Crime enviou equipe para estudar o

6

assunto, e irá apresentar um relatório no ano de 2014, no

Conselho em Genebra, Suíca.9

Observando a importância do assunto, que certamente se

revelará na prática jurídica, a presente pesquisa buscará

primeiramente fazer um estudo sobre as leis que tratam sobre a

internação compulsória e sobre o tratamento devido aos

usuários de tóxicos.

Posteriormente, é necessário compreender se a internação

compulsória é passível de aplicação em face da recente reforma

psiquiátrica e das mudanças legislativas e políticas sobre

drogas.

Por último, será feita uma análise dos princípios e

direitos constitucionais envolvidos, com fim de determinar se

a internação compulsória encontra compatibilidade com nossa

Carta Magna de 1988.

Salienta-se ainda que haverá fuga da mera dogmática

jurídica, vez que o tema receberá enfoque interdisciplinar,

pelos diversos braços científicos em que se depreende.

2 A INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA À LUZ DO ORDENAMENTO JURÍDICO

BRASILEIRO

A lei 10.216/2001, após longos dez anos de tramitação no

Congresso finalmente foi aprovada, dispondo, conforme seu

preâmbulo, sobre a proteção e direito dos das pessoas

9UNODC – UNITED NATION OFFICE ON DRUGS AND CRIMES.Arrests and compulsorydetentions of drug users in Brazil concern UN experts. Disponível em:<http://www.unodc.org/lpobrazil/en/frontpage/2013/03/28-arrests-and-compulsory-detentions-of-drug-users-in-brazil-concern-un-experts.html>.Acesso em24 maio. 2013. Nossa tradução.

7

portadoras de doentes mentais, redirecionando o modelo

assistencial em saúde mental.10

É chamada por alguns autores de Lei da Reforma

Psiquiátrica, já que corolária deste movimento. Atualmente,

vem sendo utilizada para legitimação do instituto em estudo,

já que no artigo 6º, § único, estão disciplinados, nos

incisos, os três tipos de internação para doentes mentais: a

voluntária, a involuntária e a compulsória. 11

Como a própria lei vem expor, a internação voluntária é

aquela que obtém o consentimento do usuário. A involuntária se

dá sem consentimento do paciente, a pedido de terceiros. Já a

compulsória, tema principal deste projeto, é aquela

determinada pela justiça.

A Organização Mundial da Saúde considera a dependência

química uma doença, devidamente inserida no Cadastro

Internacional de Doenças (CID-10)12. Com isso, a priori, a

aplicação da internação compulsória aos dependentes estaria

autorizada por lei, já que são, até por consenso geral,

doentes mentais.

Conforme Salo de Carvalho13, “no direito, a cegueira

provocada pelo positivismo dogmático invariavelmente tem

obscurecido a necessária abertura do tema (aqui ele se refere

às drogas em geral) aos demais ramos do saber.” Em função10BRASIL, Lei 10.216/2001. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10216.htm>. Acessoem: 01 jun. 2013.11Idem. Art. 6º, § único e incisos. 12ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Relatório sobre a saúde no mundo: SaúdeMental. Nova Concepção, nova esperança. 2001. Disponível em:<http://www.who.int/whr/2001/en/whr01_po.pdf>. Acesso em: 20 jul. 2013.13CARVALHO, Salo. A política criminal de drogas no Brasil: Estudocriminológico e dogmático da lei 11.346/2006. 6º Ed. Saraiva. São Paulo.2013. p. 46

8

disso, o mero estudo das leis sobre o assunto mostra-se

deficiente, razão a qual se torna imprescindível apoio das

demais ciências.

2.1 A reforma psiquiátrica e o advento da lei 10.216/2001

Toda lei advém de um contexto histórico, social e

teleológico. No caso da lei 10.216, não poderia ser diferente.

A promulgação dela é resultado de anos da luta antimanicomial,

pelos direitos dos doentes mentais.

Segundo Cíntia Menezes Brunetta, “na metade do século XX,

as falhas dos manicômios passaram a ser evidenciadas por

repetidos casos de maus-tratos aos pacientes, má

administração, má aplicação dos recursos, falta de pessoal e

procedimento”. De acordo com a autora, à época vigorava o

sentimento de proteção à sociedade, e não de acolher, proteger

ou tratar os doentes.14

Em face disso, iniciou um movimento, posteriormente

chamado de ‘reforma psiquiátrica’, que se mostrou evidente no

Brasil na década de 80, no II Congresso Nacional do MSTM em

Bauru, no qual se concretizou o lema ‘por uma sociedade sem

manicômios’15

14BRUNETTA, Cíntia Menezes. O direito das pessoas portadoras de doençasmentais. In PIOVESAN, Flávia (org.)Doutrinas Essenciais: Direitos Humanos.Vol. IV. Grupos Vulneráveis. São Paulo. RT. 2011. p. 946-947.15AMADOR, Salete Monteiro. A reforma psiquiátrica brasileira e a lutaantimanicomial. Disponível em: <http://www.sermelhor.com/especial/luta_antimanicomial.htm>. Acesso em: 29

9

Essas reivindicações desencadearam, no panorama

internacional, a Declaração de Caracas, no ano de 1990, na

qual se lê:

(...) VERIFICANDO que a assistência psiquiátricaconvencional não permite alcançar objetivos compatíveiscom um atendimento comunitário, descentralizado,participativo, integral, contínuo e preventivo (...)DECLARAM (...) 3) que os recursos, cuidados etratamentos dados devem: A) salvaguardar,invariavelmente a dignidade pessoal e os direitoshumanos e civis. B) estar baseados em critériosracionais e tecnicamente adequados C) propiciar apermanência do enfermo em seu meio comunitário (...).16

Os psicólogos Elisângela Maria Machado Pratta e Manoel

Antonio dos Santos expõe a importância dessa retomada

histórica, ao nos lembrar que antes, os drogadictos “eram

encaminhados para instituições psiquiátricas com a finalidade

primordial de retirá-los do convívio social e promover o

abandono do uso, utilizando, para tanto, as mesmas técnicas

empregadas com outros internos.”17

Os mesmos autores, citando Paulo Sérgio Ferreira e

Margarita Antonia Villar Luis prosseguem explicando que a

intervenção do usuário de drogas “vinculada à assistência

psiquiátrica, traz consigo a questão da violação dos direitos

humanos, além do problema da má qualidade dos serviços

maio.2013.16DECLARAÇÃO DE CARACAS, 1990. Disponível em:http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/declaraca o_caracas.pdf. Acessoem: 02 jun.2013.17PRATTA, E.M.M; SANTOS, M.A. O processo Saúde-Doença e a DependênciaQuímica:Interfaces e Evolução. Psicologia: teoria e pesquisa. Brasília. V.25. nº 2. p. 203-211. Abr-Jun 2009. Disponível em:http://www.scielo.br/pdf/ptp/v25n2/a08v25n2.pdf. Acesso em: 29 maio.2013.

10

prestados aos usuários, pois tem como base o modelo

hospitalocêntrico”18

Em face de tal reforma, e de todo o avanço científico na

área, os hospitais psiquiátricos foram sumindo gradativamente,

ao passo que surgiram outros modelos institucionais, a exemplo

dos CAPs – Centos de Atenção Psicossocial – que são serviços

de saúde comunitários, buscando sempre a reinserção do doente

mental na sociedade, com auxílio de equipe multiprofissional.19

É justamente essa abordagem multidisciplinar que

efetivaria, de acordo com os especialistas, o órgão ideal para

recuperação e tratamento de dependentes químicos.

Perceba-se diante do exposto, que houve efetiva luta

antimanicomial no panorama mundial, que influenciou nosso

ordenamento jurídico não só através da lei 10.216/2001, mas

também de diversas portarias e normas expedidas pelo poder

executivo, através do Ministério da Saúde. O tratamento aos

dependentes químicos faz parte desta evolução.

Primeiramente, cabe explanar que para ser internado

contra a vontade, de acordo com o artigo 6º da famigerada lei,

o doente mental precisa ser submetido a laudo médico,

preferencialmente, de uma equipe de profissionais.20

Em seguida, é instaurado um processo de intervenção, e o

juiz competente, levando em consideração as condições de18FERREIRA, P.S; LUIS, M.A.V. Percebendo as facilidades e dificuldades naimplantação de serviços abertos em álcool e drogas. 2004 apud PRATTA, E.M.M;SANTOS, M.A. op. cit.19CONSELHO REGIONAL DE PSICOLOGIA DO PARANÁ. A estrutura no modelosubstitutivo ao hospitalocêntrico. Revista Contato.Curitiba. Ed. 71,Set/Out. 2010.p. 22. Disponível em:http://www.crppr.org.br/revistas/111.pdf. Acesso em: 04 jun.2013.20BRASIL, Lei 10.216/2001. op. cit. Art. 6º, caput: “A internação psiquiátricasomente será realizada mediante laudo médico circunstanciado quecaracterize os seus motivos.”

11

segurança do estabelecimento que irá promover a internação, a

salvaguarda do paciente e dos demais internados e

funcionários, deferirá, ou não, o tratamento forçado. 21

Com isso traçado, aqui cabe fazer outros apontamentos

sobre a lei 10.216/2001. No artigo 4º, há disposição de que a

internação, em quaisquer modalidades, “só é indicada quando os

recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes”.22

Mais adiante, se lê no parágrafo único do mesmo artigo,

que a internação buscará, como finalidade permanente, “a

reinserção social do paciente em seu meio”.

É partindo da análise da lei de internação, e também de

todo esse contexto por trás dela, que despontam as críticas ao

instituto.

2.2 Aplicação e Eficácia do Tratamento Forçado

Recentemente, a Organização Pan-Americana da Saúde e a

Organização Mundial da Saúde no Brasil emitiram nota técnica

expondo que o tratamento forçado tem sido usado com prioridade

em relação às outras medidas, afirmando que uma medida extrema

como a compulsória está na contramão do conhecimento

científico sobre o tema, além de aumentar a vulnerabilidade e

a exclusão social dos usuários de drogas.23

De fato, em especial nas ‘cracolândias’ paulistas, foi

empreendida verdadeira cruzada na busca da internação

21Idem. Art. 9º.22Ibidem.Art. 4º.23ORGANIZAÇÃO PANAMERICANA DE SAÚDE.Nota técnica da OPAS/OMS no Brasil sobreinternação involuntária e compulsória de pessoas que usam drogas.Disponível em: <http://goo.gl/9GPCd>. Acesso em: 22 jul.2013

12

compulsória de todos os dependentes, sem que tivesse havido

notícia da tentativa de outras formas de tratamento ou

recuperação.

Verificando as medidas que foram empregadas atualmente,

podemos perceber que há uma crença de que aos dependentes

químicos de drogas consideradas ‘pesadas’, o tratamento

forçado é a única solução, ou no mínimo a melhor delas. Mas

não é bem assim.

Uma carta24 foi remetida ao Congresso Nacional, assinada

por 417 instituições por todo o Brasil, expondo que “a

aplicação do instituto repetida ad nauseum, ignora, com descaso

e negligência, a rede de serviços substantivos, opção primeira

de qualquer tratamento digno e de qualidade”, violando, dessa

maneira, o artigo 4º da lei em pauta.

Mesmo sendo favorável à internação, a psiquiatra Ana

Cecília Marques25, em debate no programa ‘contra ou a favor’,

da TV Cultura, expôs que “a internação serve pra minoria dos

pacientes”, deixando claro que a necessidade do tratamento

forçado decorre da gravidade do caso, devendo ser indicado

sempre por equipe multidisciplinar.

Isso não tem um fulcro apenas médico, mas também

jurídico, já que são direitos dos dependentes serem tratados

pelos métodos menos invasivos possíveis, de acordo com o

24Dentre as instituições, destacam-se a Associação Brasileira de PsicologiaJurídica, o Conselho Federal de Psicologia e a Frente Nacional de Drogas eDireitos Humanos. A carta, em sua totalidade, bem como a relação deinstituições que a subscreveram pode ser vislumbrada aqui:<http://www.cfess.org.br/arquivos/1Anexo_1-Carta_aos_Deputados_Federais.pdf>. Acesso em: 05 jun. 2013.25TV CULTURA. Contra ou a favor: Internação Compulsória. Disponível em:<http://www.youtube.com/watch?v=5V_0vWSA2FQ>. Acesso em: 24 jul. 2013.

13

artigo 2º, VIII da lei 10.216/200126, em consonância com o

artigo 4º da mesma lei, já mencionado.

Sendo assim, as medidas públicas instaladas nos estados

do Rio de Janeiro e São Paulo, não estariam legitimadas pela

famigerada lei de internação, mas sim, indo contra ela, vez

que não foram adotadas outras medidas preliminares para

tutelar a saúde daqueles indivíduos. Consta que hoje se busca

aplicação da medida compulsória para quase todos os casos de

dependência, sem nem mencionar tentativa da intervenção

voluntária.

O psiquiatria Dartiu Xavier esclarece ainda, que a

internação compulsória é dispositivo médico para ser usado

quando há risco constatado de suicídio, ou quadro com surto

psicóticos, quando por exemplo, o indivíduo pensa que está

sendo perseguido por alienígenas, ou acredita que pode voar e

pula da janela27

Ou seja, meros usuários de drogas que recusam tratamento

não devem ser internados, e também não são todos os

dependentes químicos que necessitam do tratamento forçado. Uma

minoria destes indivíduos deve ser encaminhada à internação.

Além disso, compreendemos que na teoria, forçar o

tratamento na busca pela abstenção de usar drogas não é tão

eficaz como imaginado. Mesmo quando os dependentes fazem

tratamento em clínicas de recuperação e já estão há muito

tempo sem consumir drogas, estes podem ter recaídas, e esse

26BRASIL, Lei 10.216/2001. op. cit. 27CONSELHO REGIONAL DE PSICOLOGIA DO PARANÁ. Internação Compulsória: soluçãoou tática higienista?.Revista Contato. Curitiba. Ano. 15. Ed. 86. Mar-Abr.2013. p. 20

14

fato não está relacionado aos sintomas da abstinência, pois

essa se dissipou há muito tempo.28

Deve-se explanar ainda, que não há quaisquer estudos

brasileiros concretos sobre a viabilidade ou funcionalidade da

internação compulsória, ou pelo menos, eles não são

divulgados.

Isso rompe, até, com a Política Nacional sobre Drogas do

CONAD, que explana que “as ações de tratamento, recuperação,

reinserção social e ocupacional devem ser vinculadas a

pesquisas científicas, avaliando-as e incentivando-as e

multiplicando aquelas que tenham obtido resultados mais

efetivos (...)”29

Embora esses estudos inexistam no Brasil, o tratamento

forçado de dependentes químicos já foi amplamente usado em

diversos países, e em nenhum deles, os resultados foram

positivos.

Aponta Alex Stevens que:

Há pouca, ou talvez, nenhuma evidência que o tratamentocompulsório desta natureza seja efetivo quanto aosobjetivos do tratamento da drogadição. Em verdade, háestudos que comprovaram o fracasso da internaçãocompulsória, quanto essas questões, em diversos países,incluindo os Estados Unidos, Suécia e Holanda, bem comohá relatóriosainda não confirmados na China em que astaxas de relapso após o tratamento compulsório sãosuperiores a 98%. (minha tradução)30

28OGA, S. CAMARGO; M. M. A. BATISTUZZO, J. A. O. Fundamentos de Toxicologia.3º Ed. Atheneu.São Paulo. 2008. p. 327.29CONSELHO NACIONAL DE POLÍTICAS SOBRE DROGAS. Resolução03 de 27 de outubrode 2005. Disponível em: <http://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=101642>.Acesso em: 25. Jul. 2013.30STEVENS, Alex. The Ethics and effectiveness of coerced treatment of peoplewho use drugs. Human Rights and Drugs. Volume 2.Nº I. 2012. Disponível em:<http://kar.kent.ac.uk/29903/1/Stevens%202012_ethics%20and%20effectiveness.pdf>. Acesso em: 18 jul. 2013.

15

Sandra Franco explica por sua vez, que a internação

compulsória não teria efetividade, porque os profissionais têm

árdua missão de provocar reflexão no dependente, e se o

paciente não estiver motivado a mudar, qualquer tentativa de

tratamento está fadada ao fracasso. “O norte não é parar de

usar drogas, mas (re) construir uma identidade e círculo de

referências (familiar, social, profissional), resgatando

habilidades e qualidades positivas”.31

Alguns especialistas explanam que o tratamento deve ser

forçado uma vez que os dependentes químicos, pela situação em

que se encontram, não tem discernimento para procurar um

tratamento e, em face disso, caminham para a morte certa.

Entretanto, o instituto Human Rights Watch32 já alerta

que “a presunção que usuários de drogas não têm capacidade de

consentir com um tratamento é perigosa, uma vez que ignora

garantias legais quanto a tomada de decisões para tratamento,

além de aumentar as possibilidades de potenciais abusos”. Não

o bastante, o mesmo estudo demonstrou diversas violações de

direitos humanos em países asiáticos que promoveram o

tratamento forçado, como na China, no Vietnam, Tailândia,

Singapura, Laos e Rússia.

Além disso, na área de políticas públicas voltadas à

saúde, existe um consenso que faltam recursos (no sentido

amplo) para implantação da medida de maneira adequada. Dartiu31FRANCO, Sandra. A internação compulsória de dependentes químicos é eficaz?Revista Consulex. São Paulo. Ano XVII. nº 388. p. 54-55. mar. 201332HUMAN RIGHTS WATCH; et. al.Human rights and drug policy: compulsory drugtreatment. Briefing 4. Londres, Inglaterra. Count The Costs. Disponível em://www.countthecosts.org/sites/default/files/IHRA_Compulsory_Treatment.pdf>.Acesso em: 23 jul. 2013. Nossa Tradução.

16

Xavier preconiza novamente que os hospitais modelos para

implantação do tratamento forçado ainda trazem a herança do

modelo manicomial, vez que muitas vezes as internações não têm

prazo determinado, e os pacientes não recebem atenção

multidisciplinar.33

Veja que no artigo 4º, §2º da Lei 10.216/200134, há

menção expressa sobre direitos à assistência médica, social,

psicológica além de serviços ocupacionais e de lazer. O texto

parece ter virado letra morta na lei, já que a realidade de

nossos serviços públicos de saúde é reconhecidamente

destoante.

Nesse sentido, Sérgio Seibel35, dispõe que:

(...) as intervenções de tratamento coercitivo devem serretardadas até o sistema de saúde ser capaz (e o nossoestá longe disso) de prover acesso apropriado a qualquerum que busque assistência até que evidências empíricasdemonstrem que o tratamento via Judiciário, coercitivoseja superior às opções de tratamento no sistema desaúde.

Mas supondo que os serviços fossem adequados, ou que um

dia venham a ser, ainda não é suficiente, pois a internação

não pode durar pra sempre – aliás, deve se perdurar pela menor

quantidade tempo possível. O cerne da questão é justamente o

retorno à sociedade do toxicômano, eis que mesmo sendo medida

33CONSELHO REGIONAL DE PSICOLOGIA DO PARANÁ. Internação Compulsória: soluçãoou tática higienista?. Op. cit. p. 22. 34BRASIL, Lei 10.216/2001. op. cit. Art. 4º, §2º.35SEIBEL, Sérgio. A Lei 11.343/2006 sobre drogas e o impacto na saúdepública. IBCCRIM.Disponível em:<http://www.ibccrim.org.br/boletim_artigo/4744-A-Lei-11.343-2006-sobre-drogas-e-o-impacto-na-saude-publica>. Acesso em: 26. jul. 2013.

17

in extremis, o fim primordial da internação é a reabilitação e

reinserção do paciente.36

As maiorias das drogas, principalmente o crack, causam

dependência física e psíquica, que duram meses, ou talvez

anos, mesmo sem utilização das substâncias. Em função disso, a

dependência é um transtorno crônico, no qual a recaída é um

risco constante, e por isso, implica tratamento contínuo.37

Segundo os especialistas, os fatores de risco para recaída são

as comorbidades psiquiátricas, condições socioeconômicas,

estresse, desproteção e disponibilidade da droga.38

Esses riscos se alongam ainda mais quando falamos das

‘cracolândias’. É ridículo imaginar que um indivíduo está em

uma delas tão somente porque usa ‘crack’. Após o término da

internação, o paciente é obrigado a voltar ao meio do qual

saiu. Não há menor possibilidade de êxito no tratamento,

quando nossas políticas de saúde ignoram as condições

político-sociais dos dependentes.

Portanto, é um consenso, até para os defensores assíduos

da internação forçada, que após a desintoxicação é necessário

acompanhamento multidisciplinar. Infelizmente, isso não tem

ocorrido adequadamente na atualidade, nem no Brasil e nem nas

outras nações, razão a qual é tão corriqueiro vislumbrar

36MENEZES, Joyceane Bezerra. A Autonomia privada do paciente dependentequímico no Brasil e a discussão sobre a internação involuntária:instrumentos de controle. In: ENCONTRO NACIONAL DO CONPEDI/CESUMAR. 2009.Maringá, PR. Disponívelem:<http://www.conpedi.org.br/anais/36/03_1503.pdf>. Acesso em: 05. ago.2013.37DIEHL, Alessandra. CORDEIRO, Daniel Cruz. LARANJEIRA. Ronaldo. DependênciaQuímica: prevenção, tratamento e políticas públicas. 1º Ed. Artmed. SãoPaulo. 2011. p. 3138Idem

18

dependentes que já foram internados dezenas de vezes e

continuam consumindo drogas.

Sendo assim, considera-se que a dependência é uma

complexa doença cerebral, e sua prevenção e tratamento requer

a compreensão de diversos fatores biológicos, genéticos,

sociais, psicológicos e ambientais39, e justamente por isso, a

internação, tratando a droga como o problema principal, não se

mostra a melhor solução.

Aliás, por vezes, há conclusão de que o problema é a

droga em si, e não o ambiente ou meio propício para a doença.

Em conta disso, devemos nos abrir a uma realidade maior que

nos cerca.

2.3. A política contra drogas no Brasil e o modelo repressor.

Várias foram as legislações que trataram sobre drogas no

Brasil. Surpreendentemente, após início do século XX, muitas

delas trataram sobre a internação/tratamento forçado ao

usuário/dependente.

A primeira menção foi no decreto nº 4.294/1921,

naturalmente inspirado na convenção de Haia do mesmo ano, em

que embriagar-se por hábito, tornando-se nocivo a si, aos

outros ou a ordem pública tinha como sanção “internação por

tresmezes a um anno em estabelecimento correccional adequado.”

(sic)40

39OGA, S. CAMARGO, M. M. A. BATISTUZZO, J. A. O. Op. cit. p. 336.40BRASIL. Decreto 4.294/1921 (Revogado). Disponível em:<http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1920-1929/decreto-4294-6julho1921569300republicacao-92584-pl.html>. Acesso em: 22 jul.2013.

19

Anos mais tarde, no decreto 20.930/1932, estava disposto

que “Os toxicômanos e os intoxicados habituais por

entorpecentes e pelas bebidas alcoólicas ou, em geral,

inebriantes, são passíveis de internação obrigatória ou

facultativa por tempo determinado ou não.”41É perceptível neste

texto legislativo, que o paciente era internado “a bem dos

interesses da ordem pública” (art. 45, §1º), e não haviam

menções sobre direitos como duração ou métodos adequados. A

intervenção era feita para a sociedade, e não para o paciente.

Logo em seguida, a Lei de Fiscalização de Entorpecentes

(Decreto Lei 891/1938) tratava que a internação obrigatória

dar-se-ia quando fosse adequado ao dependente (embora não

explicasse como isso seria avaliado) e quando fosse

conveniente à ordem pública. Além disso, deveria também ser

procedida sempre que houvesse condenação por embriaguez

habitual ou absolvição fundada em doença mental. 42

Esta lei também trazia os tipos penais de tráfico e

outras condutas penalizadoras quanto às drogas, mas apesar

disso, encontra-se em pleno vigor. É preferível acreditar que

ela foi tacitamente revogada pelos demais ordenamentos sobre

tóxicos43.

É, no entanto, a partir da década de 50 que surgem os

discursos relativamente coesos sobre as drogas ilegais e o

41BRASIL. Decreto 20.930/1932 (Revogado). Disponível em:<http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/19301939/decreto2093011janeiro1932498374publicacaooriginal-81616-pe.html>. Acesso em: 22 jul. 2013.42BRASIL. Decreto Lei 891/1938. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/1937-1946/Del0891.htm>.Acesso em: 24 jul.2013. 43 FILHO, Vicente Grego. RASSI, João Daniel. Lei de drogas. 1º Ed. Saraiva.São Paulo. 2007. p.05

20

controle repressivo.44 É neste período, consoante Salo de

Carvalho, que se gera o “pânico moral que deflagrará intensa

produção legislativa em matéria penal”. 45

Isso foi alavancado internacionalmente, pela Convenção de

Estupefacientes de 1961, que reconheceu a toxicomania como

flagelo aos indivíduos, constituindo “perigo social e

econômico para a humanidade”.46Nos Estados Unidos, em 1973,

Richard Nixon declarou a ‘War on drugs’, identificando as

drogas como inimigo nº 1 da América, incentivando aumento das

ações repressivas do estado, no plano interno e externo.47

Marcado por este modelo, a lei 6368/1976, agravada ainda

pelos princípios da ditadura militar, declarava que “o

tratamento sob regime de internação hospitalar será

obrigatório quando o quadro clínico do dependente ou a

natureza de suas manifestações psicopatológicas assim o

exigirem.”48

Segundo Salo de Carvalho49, é a partir disso que se

solidifica o discurso Médico-Jurídico num binômio

‘dependência-tratamento’ e ‘tráfico-repressão’. De acordo com

o autor, esta cisão era tão somente aparente, eis que operando44CARVALHO, Salo. op. cit. p. 6145Idem acima, p. 6246CONVENÇÃO ÚNICA SOBRE ESTUPAFACIENTES DE 1961. Disponível em:<http://www.idt.pt/PT/RelacoesInternacionais/Documents/ConvencoesInternacionais/convencao_unica_1961.pdf>. Acesso em: 24 jul. 2013 47RODRIGUES, Luciane Boiteux Figueiredo. Controle Penal sobre as drogasilícitas: O impacto do proibicionismo no sistema pena e na sociedade. 2006.273f. Tese (Doutorado em Direito). Universidade de São Paulo. Disponívelem:<http://www.comunidadesegura.org/files/controlepenalsobredrogasilicitas.pdf>. Acesso em: 24 jul. 2013. p. 152. 48BRASIL. Lei 6768/1976. (revogado). Art. 10º. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivi03/leis/l6368.htm>. Acesso em: 24 jul.2013.49CARVALHO, Salo. Op. cit. p. 75

21

no sistema repressivo, criavam-se dois estatutos proibitivos

diferenciados, moldados conforme a lógica médica-psiquiátrica.

Ele explana ainda que:

A tonalidade alarmista, efeito próprio das campanhas deLei e Ordem, está presente na legislação, revelando ostemores que passam a nortear o senso comum sobre amatéria. O discurso de pânico demonstra a distorçãoentre o real e o imaginário, sobretudo porque os índicesde comércio e consumo de drogas ilícitas no Brasil, emmeados da década de setenta, se comparados aos de outrospaíses ocidentais, não são substancialmente elevados. 50

De acordo com Maria Lúcia Karam51, com a Convenção de

Viena Contra52 as Drogas, em 1988, o proibicionismo e o

aprofundamento das práticas repressivas chegam ao seu auge. De

acordo com a autora, o texto, nitidamente inspirado na ‘guerra

às drogas’, se reproduzirá internamente nas nações,

promovendo-se a repressão contra produtores, comerciantes e

consumidores de ilícitos.

Embora promulgada meses antes do referido tratado, não é

surpresa que nossa Constituição Federal, inspirada por esta

guerra global, dispôs normas bastante repressivas contra as

drogas, em todo seu texto, como nos artigos 5º, incisos

XLIII53, LI; Art. 144, §1º, II e Art. 243. 50Idem.51KARAM, Maria Lúcia. Drogas: legislação brasileira e violações a direitosfundamentais. LEAP Brasil. p. 3. Disponível em:http://www.leapbrasil.com.br/textos. Acesso em: 24 jul. 2013.52A autora ainda explica a escalada histórica repressiva, quando explana queos títulos dos tratados anteriores eram ‘sobre entorpecentes’ ou ‘sobresubstâncias psicotrópicas’, enquanto a Convenção de Viena de 1988 seintitulou ‘contrao tráfico ilícito de entorpecentes e substânciaspsicotrópicas’. Além disso, as normas criminalizadoras apareceriam logo noinício, no art. 3º, ao contrário das anteriores.53BRASIL. Constituição Federal. op. cit. Art. 5º, XLIII: “a lei considerarácrimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática datortura, o tráfico ilícito de entorpecentes (...)”.

22

O último estatuto antes de nossa nova lei de drogas, a

Lei 10.409/2002 pretendia, enquanto projeto, substituir

integralmente a Lei 6.368/76, não logrando êxito por falta de

técnica legislativa.54 Seu texto também trazia consigo a

internação forçada como medida cabível, embora já houvesse

normas protetivas aos eventuais pacientes, eis que já previsto

o necessário atendimento multidisciplinar, a assistência da

família, dentre outras regras.55

Busca-se demonstrar nessa singela retomada histórica, que

desde o século passado os governos mundiais adentraram numa

cruzada contra as drogas, buscando os modelos repressores e o

proibicionismo total como fórmula que por si só, encerraria o

problema. A evolução das disposições sobre internação em

nossas legislações sobre drogas apenas reforça essa ideia.

Maria Lúcia Karam, novamente expõe que as drogas foram

apresentadas “como ‘mal universal’, um ‘flagelo’, algo

assustador e ameaçadoramente próximo, que seria incontrolável

por meios regulares e deveria ser enfrentado com medidas mais

rigorosas, excepcionais ou emergenciais.”56

De acordo com Luciane Boiteux Figueiredo Rodrigues, em

extenso trabalho sobre o tema, o modelo proibicionista

sustenta-se no fundamento moral e no fundamento sanitário

social. Segundo a autora, a “proibição repousa sobre a

premissa da supressão da oferta por meio da interdição geral e

54FILHO, Vicente Grego. RASSI, João Daniel. op. cit. p. 655BRASIL, Lei 10.409/2002. (Revogada). Artigos 11 ao 13. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10409.htm>. Acesso em: 25jul. 2013. 56KARAM, Maria Lúcia. op. cit.p. 8.

23

absoluta detodo o uso, comércio e produção, que passaram a ser

previstos como crime, e sancionados com pena de prisão”57

Mas, entre tamanho proibicionismo do século passado e o

novo ordenamento sobre drogas (Lei 11.343/2006), houve

significativa evolução. Em que pese nossa política ainda estar

amarrada ao sistema de repressão total, no novo texto

legislativo não há nenhuma menção sobre ‘internação’,

‘tratamento forçado’, ou quaisquer termos similares. O

tratamento compulsório simplesmente não foi previsto na nova

lei para o usuário ou dependente.58

2.4 A nova Lei 11.343/2006 e a recente mudança de paradigmas

Enquanto na antiga lei 10.409/2002, há algumas

disposições sobre internação, pouco tratando sobre a prevenção

e tratamento dos usuários de drogas, a nova lei 11.343/2006,

dedicou os artigos 1º ao 2659 para tratar de tais assuntos.

No artigo 4º do novo estatuto60, temos os princípios do

Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas, onde se

lê, no inciso I: “o respeito aos direitos fundamentais da

pessoa humana, especialmente quanto à sua autonomia e à sua

liberdade”.

Sobre essa disposição, Alice Bianchini61 dispõe que: 57 RODRIGUES, Luciane Boiteaux Figueiredo. Op. cit. p. 4658GOMES, Luis Flávio. Nova lei de drogas comentada. 1º Ed. São Paulo.Revista dos Tribunais. 2006. p. 103.59Em que pese ter havido veto do artigo 6º ao 15, foi a maior disposição denormas com caráter preventivo e principiológico que uma lei de drogas játeve no Brasil. 60BRASIL, Lei 11.343/2006. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato20042006/2006/lei/l11343.htm>.Acesso em: 30 maio. 2013.61GOMES, Luis Flávio. op. cit. p. 29.

24

Tal princípio inaugura uma nova mentalidade acerca daproblemática que envolve o consumidor de drogas. Eleestá em conformidade com as tendências criminológicasmodernas, nas quais o enfoque estereotipado doconsumidor-doente cede lugar à autonomia da vontade,respeitando e permitindo que o sujeito envolvido comdrogas deixe a situação passiva, para passar aparticipar do processo que envolve o uso ou adependência da droga. Expressam as preocupações com aliberdade e com a tolerância. O princípio da liberdadedecorre da concepção de Estado democrático. Nele háreconhecimento, por parte do Estado, de determinadoâmbito de autodeterminação individual cuja penetraçãolhe é proibida.

O artigo 28 da Lei de Drogas62 submete os usuários a

determinadas medidas. Mesmo assim, a nova lei, numa inovação

ante as anteriores, não estabeleceu penas privativas de

liberdade, e veio estabelecer a liberdade dos usuários, dando

conta de que não devem ter a autodeterminação suprimida, nem

por lei posterior, tampouco por medida pública.

No artigo 22 da nossa lei de tóxicos, temos que as

atividades de atenção e reinserção social devem observar:

I - respeito ao usuário e ao dependente de drogas,independentemente de quaisquer condições, observados osdireitos fundamentais da pessoa humana, os princípios ediretrizes do Sistema Único de Saúde e da PolíticaNacional de Assistência Social; II – (...)III - Definição de projeto terapêutico individualizado,orientado para a inclusão social e para a redução deriscos e de danos sociais e à saúde;IV - atenção ao usuário ou dependente de drogas e aosrespectivos familiares, sempre que possível, de formamultidisciplinar e por equipes multiprofissionais; (...)

62BRASIL, Lei 11.343/2006. Artigo 28: Quem adquirir, guardar, tiver emdepósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas semautorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar serásubmetido às seguintes penas: I - advertência sobre os efeitos das drogas;II - prestação de serviços à comunidade; III - medida educativa decomparecimento a programa ou curso educativo. op. cit.

25

É salutar compreender que a internação compulsória

voltada aos dependentes químicos, não se compatibiliza com

nenhum desses princípios, e que outros modelos de tratamentos

voluntários deveriam estar sendo avaliados. Em contrapartida,

projetos de lei tramitam na busca de tornar a lei 11.343/2006

ainda mais repressiva, e o que parecia evolução, caminha para

retrocesso.

Os projetos de lei 7663/201063, proposto pelo deputado

Osmar Terra, e 3167/201264, do deputado Marcos Feliciano visam

instituir a internação compulsória dentro da Lei de Drogas, o

que na prática, apenas legitimará as medidas que já acontecem,

eis que os favoráveis da medida a justificam na Lei

10.216/2001.

Entretanto, existe um gradual abandono deste estilo de

política no panorama mundial, o que levou, inclusive, a

Comissão Global de Políticas sobre Drogas declarar

expressamente que o mundo havia perdido a guerra contra as

drogas.65

63O projeto, na íntegra, se encontra disponível em<http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb /prop_mostrarintegra?codteor=789804&filename=PL+7663/2010>. Acesso em: 30 maio.2013. Dentreoutros objetivos, pretende acrescentar o artigo 23-A, que institucionalizaa internação compulsória de modo amplo, eis que abarca tanto os merosusuários quanto os dependentes em si.64Disponível em:<http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=963666&filename=PL+3167/2012>. Acesso em: 30 maio. 2013. Esteprojeto recebe ainda mais críticas, eis que insere a internação compulsóriacomo medida cabível no artigo 28, ao usuário de drogas. O excerto,aparentemente, dispensaria qualquer laudo médico, e leva a crer, pelasdisposições, que bastaria comprovação do uso de tóxicos.65COMISSÃO GLOBAL DE POLITÍCAS SOBRE DROGAS. Guerra às Drogas. 2011.Disponível em: <http://www.globalcommissionondrugs.org/reports/>. Acessoem: 05 ago. 2013.

26

Rogério Fernando Taffarello66 conclui em seu trabalho que

o proibicionismo não encontra compatibilidade com a

principiologia atual, não oferecendo “proteção à saúde pública

ou mesmo à segurança pública. Ao revés, consubstancia um

paternalismo estatal indevido”. Ele ainda dispõe ainda:

No que toca a prevenção, a ampla disponibilização deprogramas de redução de danos como trocas de seringas,terapias de substituição, salas de consumo seguro, eoutros deve ser o objetivo central de uma políticapragmática. O sistema penitenciário igualmente há de terprogramas de tratamento efetivos, que, antes de impô-los, tenha mecanismos para estimular adesão voluntária.67

Para Luciane Boiteux Figueiredo Rodrigues68, as medidas

proibicionistas falham em seus objetivos, pois visam a

abstinência sob quaisquer custos. Do contrário, as estratégias de

redução de danos69 preconizam a ideia de moderação, por meio de

uso controlado de drogas e da substituição por condutas menos

arriscadas. O modelo de redução de danos, segundo a ilustre

autora:

66TAFFARELLO, Rogério Fernando. Drogas: Falência do proibicionismo ealternativas de política criminal. 2009. 154f. Dissertação (Mestrado emDireito). Universidade de São Paulo. p. 144.67Ibidem68RODRIGUES, Luciane Boiteux Figueiredo. Op. cit. p. 70. Os grifos são da autora.69Segundo a IHRA – International Harm Reduction Association, redução dedanos é “é um conjunto de políticas e práticas cujo objetivo é reduzir osdanos associados ao uso de drogas psicoativas em pessoas que não podem ounão querem parar de usar drogas”. A prática é exemplificada naadministração de drogas em menor quantidade da usual, ou distribuição deseringas esterilizadas, com escopo de evitar doenças transmissíveis. Apesarde paradoxal, a prática é reconhecidamente funcional, e demonstrou, nospaíses em que foi adotada, grande êxito na diminuição do consumo de drogas.Disponível em:<http://www.ihra.net/files/2010/06/01/Briefing_what_is_HR_Portuguese.pdf>.Acesso em: 09 set.2013.

27

Reconhece que as pessoas continuarão a fazer uso dedrogas, independente da proibição, razão pela qualdirige seu foco de atuação para a prevenção, a saúdepública, e o bem-estar do toxicômano. Seu fundamentosocial é justamente a reinserção social do usuário dedrogas e a melhoria das suas condições de vida.70

Enquanto muitas nações passaram a investir em políticas

pragmáticas, liberais e de redução de danos, a exemplo de

Portugal, Suiça, Argentina, recentemente o Uruguai, e até

mesmo os Estados Unidos71 – que outrora era o precursor de

políticas incisivas contra as drogas – o Brasil, num atraso

irremediável, continua insistindo em medidas que visem a

abstinência total, com discursos moralistas e sem comprovação

científica.

A título de ilustração, em 2001, o porte pessoal de

drogas ilícitas foi descriminalizado em Portugal, ao passo que

políticas de redução de danos foram traçadas para apoiar

toxicômanos. Além de o consumo ter caído drasticamente no

país, os usuários se viram livres de perseguições morais e o

número de usuários que passou a buscar tratamento voluntário

dobrou.72

Já na Argentina, no ano de 2009, a Suprema Corte de

Justiça declarou inconstitucional norma que exigia o

processamento de usuários de drogas. Em seu voto, o ministro

argentino Eugênio Raul Zaffaroni explanou que:

70RODRIGUES, Luciane Boiteux Figueireido. Op. Cit. p. 70.71COMISSÃO GLOBAL DE POLITÍCAS SOBRE DROGAS. op. cit.72GREENWALD, Gleen. Drug Decriminalization in Portugal: Lessons for creatingfair and successful drug policies. Cato Institute. 2009. p. 28. Disponívelem:< http://www.cato.org/publications/white-paper/drug-decriminalization-portugal-lessons-creating-fair-successful-drug-policies>. Acesso em: 05ago. 2013.(Nossa Tradução).

28

Que el processiamento de usuarios se convierte en un obstaculo para larecuperacion de los pocos que son dependientes, pues no hace mas queestigmatizar los y reforzar su identificación mediante el uso del toxico, comclaro prejuicio del avance de cualquier terapia de desintoxicacion ymodificación de conducta que, precisamente, se propone el objectivoinverso, esto es, la remoción de esa identificación em procura de suautoestima sobre la base de otros valores.73

Por fim, o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e

Crime74, que anteriormente sugeria medidas repressivas,

recentemente estabeleceu os princípios norteadores do

tratamento de usuários. Nas disposições, claramente se lê que

este não deve ser forçado, salvo em casos realmente

excepcionais em que haja risco grave para o dependente ou para

outrem. (Nossa tradução)

Outrossim, há novas e mais modernas políticas sobre

drogas, e o Brasil está avançando na contramão delas. A

insistência para tornar nossas leis mais rigorosas e de

institucionalizar a internação compulsória como medida ampla

advém de práticas moralistas do século passado, as quais

fracassaram em todos os objetivos.

Salo de Carvalho75 informa que a premissa fundamental de

qualquer tipo de intervenção deve ser o reconhecimento do

envolvido com drogas como um sujeito capaz de diálogo, pois

conforme Mariana de Assis Brasil Weigert, ele deve ter o

direito de decidir sobre a sua vida, sobre seu corpo e sua

73CORTE SUPREMA DE JUSTITIA DE LA NÁCION. Rel. Min. Carmen M. Argibay.Recurso de Hecho nº A-891. XLIV. Julgado em 25 ago. 2009. Disponível em:<http://www.csjn.gov.ar/confal/ConsultaCompletaFallos.do?method=verDocumentos&id=671140>. Acesso em: 06 ago. 2013.74UNODC – UNITED NATION OFFICE ON DRUGS AND CRIMES.WHO – WORLD HEALTHORGANIZATION. Principles of Drug dependence Treatment. 2009. Disponível em:<http://www.unodc.org/docs/treatment/Principles_of_Drug_Dependence_Treatment_and_Care.pdf>. Acesso em: 06 ago 2013.75CARVALHO, Salo. Op cit. p. 443

29

mente, inclusive com fim de contribuir para que o tratamento

tenha êxito.76

Consoante os dizeres de Alice Bianchini, deveria haver

ciência e consciência de que as soluções para o uso indevido

de drogas devem partir de ações dos próprios consumidores,

pois assim, os resultados seriam mais positivos77. Ou seja, o

estado deve disponibilizar tratamento, e não forçá-lo.

Deste modo, fica demonstrado que a internação compulsória

não é instituto novo, mas sim, ideia antiga, que retorna à

práxis jurídica através da repetição de modelos repressores,

motivados pelo inevitável fracasso da atual política de drogas

no país.

Avaliando os novos modelos sobre tóxicos, temos que a lei

11.343/2006 não disciplinou qualquer tipo de internação, e é

gigantesco retrocesso optar agora por fazê-lo, ou realizar

‘interpretação lato senso78’ para legitimá-la amplamente a todos

os dependentes, já que isso viola os princípios que foram

positivados.

Vemos que a internação forçada, voltada aos dependentes

em geral, caminha na contramão da Lei dos Doentes Mentais

(10.216/2001) e da Lei de Drogas (11.343/2006). E quanto a

nossa carta magna? O estado tem legitimidade constitucional para

forçar um tratamento em dependentes químicos?

76WEIGERT. Mariana de Assis Brasil. O discurso psiquiátrico na imposição eexecução de medidas de segurança. 2006 apud CARVALHO, Salo. op. cit. p. 443.77GOMES, Luis Flávio. Op. cit. p. 59.78Aqui nos referimos a argumentações simplistas como ‘já que todo dependentequímico é doente mental, a internação compulsória deve ser feita com fulcrona lei 10.216/2001’. Isso porque, como já demonstramos, não é todo doentemental que deve ou pode ser internado à força.

30

3 O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA E A COMPATIBILIDADE

CONSTITUCIONAL DA INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA.

Como declarou Miguel Reale, a justiça pressupõe o valor

transcendental da pessoa humana e, por conseguinte, de todo o

ordenamento jurídico.79 Segundo o autor, houve compreensão

histórico-social neste sentido de justiça, o que levou a

positivação do direito à dignidade humana na Declaração

Universal dos Direitos do Homem de 1948, não só no preâmbulo,

mas logo no artigo 1º80.

A ideia de dignidade fortaleceu-se após os horrores da

segunda guerra mundial, mas deriva da antiguidade.Com a

evolução filosófica, Kant diria que todo homem tem dignidade,

e não umpreço como as coisas. O homem em sua individualidade é

insubstituível, sem equivalente, e não poderia ser trocado por

coisa alguma, razão qual deveria ser tratado como fim em si

mesmo.81

Em nossa Constituição Federal, a dignidade da pessoa

humana foi declarada não apenas como direito fundamental, mas

como princípio fundamental da República82.Segundo Flávia

Piovesan, ela se impõe “como núcleo básico e informador de

todo ordenamento jurídico, como critério e parâmetro de

79REALE, Miguel. Filosofia do Direito. 20º Ed. São Paulo. Saraiva. 2002. p.272. 80DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS. Artigo 1º. Todos os sereshumanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Disponível em:<http://www.mp.go.gov.br/portalweb/hp/7/docs/declaracao_universal_dos_direitos_do_homem.pdf>. Acesso em: 10 ago. 2013.81COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação história dos direitos humanos. 7º ed.São Paulo. Saraiva. 2010. p. 3482BRASIL, Constituição Federal. op. cit. Artigo 1º, III.

31

valoração a orientar a interpretação e compreensão do sistema

constitucional”.83

José Afonso da Silva84 considera que a “dignidade da

pessoa humana é um valor supremo, que atrai o conteúdo de

todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à

vida”. De acordo com o autor, não insere em seu arcabouço

apenas os direitos pessoais tradicionais, mas também, os

direitos sociais que garantem as bases da existência humana.

Um dos conceitos mais utilizados na comunidade jurídica é

o do doutrinador Ingo Wolfgang Sarlet85, que conclui dignidade

da pessoa humana como:

A qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cadaser humano que o faz merecedor do mesmo respeito econsideração por parte do Estado e da comunidade,implicando, neste sentido, um complexo de direitos edeveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contratodo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, comovenham a lhe garantir as condições existenciais mínimaspara uma vida saudável86, além de propiciar e promoversua participação ativa e co-responsável nos destinos daprópria existência e da vida em comunhão com os demaisseres humanos.87 (grifos meus)

83PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos, o princípio da dignidade humana e aconstituição de 1988. in PIOVESAN, Flávia (org.)Doutrinas Essenciais:Direitos Humanos. V. I. Teoria Geral dos Direitos Humanos. São Paulo. RT.2011. Pg. 31684SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 22º Ed. SãoPaulo. Malheiros. 2002. p. 105.85SARLET, Ingo Wolfgang. As dimensões da dignidade da pessoa humana:construindo uma compreensão jurídico constitucional necessária e possível InSARLET, Ingo Wolfang (org.) Dimensões da Dignidade: ensaios da filosofia dodireito e direito constitucional. 2º Ed. Porto Alegre. Livraria doAdvogado. 2009. p. 3786O doutrinador ainda trás nas notas de rodapé que segundo a OrganizaçãoMundial da Saúde, saúde não é a mera ausência de doenças, mas um completobem-estar físico, mental e social. Segundo o autor, este conceito deveservir para diretriz mínima a ser assegurada pelos Estados.87O Supremo Tribunal Federal tem tratado o princípio dessa forma: (...)“Priva-se alguém de sua liberdade e de sua dignidade tratando-o como coisae não como pessoa humana, o que pode ser feito não só mediante coação, mastambém pela violação intensa e persistente de seus direitos básicos” (...)

32

Recorrentemente, há argumentações no sentido de que o

estado tem o dever de promover tratamento forçado a todos os

dependentes, vez que em face de sua condição psíquica

claramente alterada pela droga, eles acabaram perdendo a

dignidade, cabendo aos órgãos públicos resgatá-la.

Este é um equívoco, eis que “A pessoa humana conserva a

dignidade independentemente de tudo aquilo que externa e

internamente pode degradá-la, humilhá-la e destruí-la.”88

Esclarece-se desde já, que o tratamento compulsório não

visaria (ou não deve visar) devolver a dignidade do paciente

(porque ele nunca a perdeu), mas respeitá-la e concretizá-la.

3.1 A autonomia e liberdade do dependente químico e a

concretização de sua dignidade

A interface entre a psiquiatria e o direito, embora

imprescindível, se faz de maneira árdua, eis que, “enquanto a

linguagem médica descreve o estado do paciente em uma escala

que vai de grave a completamente saudável, a linguagem

jurídica é binária: o doente é capaz ou incapaz, necessita ser

internado ou não (...)”.89

(STF. Inq. 3412. Rel. Min. Marco Aurélio. Tribunal Pleno. Julgado em 29mar. 2012. Disponível em:<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=3076256>. Acesso em: 10 ago. 2013.88MAURER, Beatrice. Notas sobre o respeito da dignidade da pessoa humana… oupequena fuga incompleta em torno de um tema central. In SARLET, IngoWolfgang. (org.) op. cit. p. 13989ZEMISCHLANY, Z. MELAMED, Y. The impossible dialogue between psychiatry andthe judicial system: a language problem. 2006. apudBARROS, Daniel Martinsde; SERAFIM, Antonio de Pádua. Parâmetros legais para a internaçãoinvoluntária no Brasil. Rev. Psiquiatria Clínica. São Paulo.v. 36. n. 4.2009 . Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_

33

Segundo Daniel Martins de Barros e Antonio de Pádua

Serafim, a justificativa da internação involuntária do

indivíduo decorre da perda da autonomia deste, em face de sua

doença mental, que o impede de entender e compreender o

caráter desadaptativo de seu quadro.90

Conforme preceitua Maria Helena Diniz, o Estado deve

tratar o indivíduo que perdeu essa autonomia, com base na

teoria do parens patriae, caso ele apresente perigo para si ou

para outrem.91

Traçando comentários sobre a dignidade, Ingo Wolfgang

Sarlet destaca que ela deve ser considerada em abstrato, “como

sendo a capacidade potencial que cada ser humano tem de

autodeterminar sua conduta”, não dependendo da efetiva

realização, de tal sorte que o absolutamente incapaz ou

portador de deficiência mental tem a mesma dignidade que

qualquer outro.92

Deste modo, seria legítimo para o Estado buscar o

tratamento dos dependentes químicos, se eles, outrora,

voluntariamente se dispuseram a utilizar drogas? Cabe ao poder

público quebrar essa vontade de usar substâncias

toxicológicas, substituindo a autonomia deles?

O próprio doutrinador Ingo Wolfgang Sarlet sustenta que a

dignidade possui uma dimensão dúplice, que se manifesta no

arttext&pid=S010160832009000400008&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 10 ago.2013.90BARROS, Daniel Martins de; SERAFIM, Antonio de Pádua.op. cit.91DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 8º Ed.São Paulo.Saraiva. 2011. p 20892SARLET, Ingo Wolfgang. As dimensões da dignidade da pessoa humana:construindo uma compreensão jurídico constitucional necessária e possível.In SARLET, Ingo Wolfang (org.) op. cit.p. 23

34

respeito à autonomia da pessoa, mas também, na necessidade de

sua proteção por parte do Estado. Segundo o ilustre autor:A dignidade, na sua perspectiva assistencial (protetiva)da pessoa humana, poderá, dadas as circunstâncias,prevalecer em face da dimensão autonômica, de tal sorteque, todo aquele a quem faltarem as condições para umadecisão própria e responsável (...) poderá até mesmoperder – pela nomeação eventual de um curador ou asubmissão involuntária a tratamento médico e/ouinternação – o exercício pessoal de sua capacidade deautodeterminação, restando-lhe contudo, o direito de sertratado com dignidade (protegido e assistido).93

Portanto, não é como dizem alguns, que os dependentes

químicos, por sua condição perderam a dignidade, mas sim, que

justamente para efetivá-la e concretizá-la, é necessária a

intervenção, em diferentes graus, conforme o estado do

paciente.

Segundo o mesmo autor, a dignidade da pessoa humana é

simultaneamente limite e tarefa dos poderes estatais. De modo

salutar, ele explica que como tarefa, se vislumbram diversos

deveres concretos de tutela por parte dos órgãos estatais, “no

sentido de proteger a dignidade de todos, assegurando-lhe

também por meio de medidas positivas (prestações) o devido

respeito e promoção”.94

Isto se compatibiliza com a falta de prudência que seria

deixar o dependente químico, tomado pelo vício nas substâncias

toxicológicas, decidir por si só em continuar fazendo uso de

drogas, destruindo a saúde física e psíquica. Não há nada de

‘digno’ em tentar promover um direito de poder usar drogas

ilícitas.

93Idem.p. 3094Ibidem, p. 32

35

Em face disso, deve haver um equilíbrio: o Estado não

pode transformar o usuário em coisa, retirando-o do convívio

social tão somente por que usa drogas, mas definitivamente não

pode manter-se silente, e deve promover medidas para tratá-lo

e respeitar a sua dignidade, até porque, tem o dever

constitucional de promover a saúde de todos.

Essa tutela do indivíduo deve ocorrer mesmo que ele

queira continuar fazendo uso de drogas, eis que “em nome da

liberdade, da autonomia pessoal, é grande o risco de que cada

um determine, defina a sua própria dignidade como bem

entenda”. 95 Esse tipo de ideia encontra respaldo na mitigação

do estado liberal pelo estado prestacionista, que informa a

dignidade da pessoa humana como um limite à autonomia da

vontade.96

Neste sentido, Luís Roberto Barroso dispõe que a

autonomia é o elemento ético da dignidade, fundamentando-se no

livre arbítrio de cada um, que lhe permite buscar, à sua

própria maneira, o ideal de viver bem e ter uma vida boa.97

O Ministro nos explica ainda que essa autonomia pressupõe

o preenchimento de determinadas condições, dentre elas, a

razão, como capacidade mental de proferir decisões.98, o que de

certa forma, falta aos dependentes em estado avançado. Ainda,

consoante suas ideias:

95MAURER, Beatrice. op. cit. p. 129.96NOBRE JÚNIOR, Edilson Pereira. O direito brasileiro e o princípio dadignidade. In PIOVESAN, Flávia (org.)Doutrinas Essenciais: Direitos Humanos.V. I. Teoria Geral dos Direitos Humanos. São Paulo. RT. 2011. Pg. 197.97BARROSO. Luís Roberto. A dignidade da pessoa humana no direitoconstitucional contemporâneo: a construção de um conceito jurídico à luz dajurisprudência mundial 1º ed. 2º reimpressão. Belo Horizonte. Fórum. 2013.p. 81.98Ibidem.

36

(...) ínsito à ideia de dignidade humana está o conceitode mínimo existencial, também chamado de mínimo social,ou o direito básico as provisões necessárias para que seviva dignamente. A igualdade em sentido material ousubstantivo, e especialmente a autonomia (pública ouprivada) são ideias dependentes do fato de os indivíduosserem ‘livres da necessidade’ (free from want), nosentido de que suas necessidades vitais essenciais sejamsatisfeitas. Para serem livres, iguais e capazes deexercer uma cidadania responsável, os indivíduosprecisam estar além de limiares mínimos de um bem-estar,sob pena de a autonomia se tornar mera ficção, e averdadeira dignidade humana não existir.99

Por conseguinte, buscar o tratamento dos dependentes não

desrespeita a autonomia e dignidade destes, eis que se

procedido pelas vias legais, não os rebaixa a instrumentos ou

coisas, mas – bem pelo contrário – procura reconstruir a

identidade desses drogadictos de modo a possibilitar uma vida

livre e saudável.

Sendo assim, vislumbrado que ao paciente falta a razão,

tomada pelo uso das drogas, cabe ao estado realizar a

interferência, com escopo de tutelar a saúde e dignidade do

drogadicto. Este só poderá se contrapuser se estiver dotado

das faculdades mentais para compreender seu estado. Registra-

se, todavia, que esta ‘invasão’ estatal, não necessariamente

será a internação compulsória, pelas razões a seguir.

3.2 O direito ao tratamento correto/proporcional como forma de

concretização e respeito à dignidade humana do dependente

químico.

99Idem, p. 84 e 85.

37

Expondo os direitos dos doentes mentais em geral, Cintia

Menezes Brunetta expõe que eles devem receber o “tratamento

adequado à sua condição cultural e apropriado às necessidades

de sua saúde.”100

Neste sentido, e fazendo um paralelo com o princípio da

proporcionalidade, o Tribunal Constitucional Federal da

Alemanha pronunciou-se desta forma:

O meio empregado pelo legislador deve ser adequado eexigível, para que seja atingido o fim almejado. O meioé adequado quando, com o seu auxílio, se pode promover oresultado desejado; ele é exigível quando o legisladornão poderia ter escolhido outro igualmente eficaz, masque seria um meio não prejudicial ou portador de umalimitação menos perceptível a direito fundamental.101

Analisando agora, a questão lógica, é evidente

compreender que toda e qualquer ação voltada aos dependentes

químicos deve intentar tratá-los, da melhor forma possível. A

ação deve visar o indivíduo em si, e jamais a sociedade,

conforme entendimento de Luís Roberto Barroso:

(...) do valor intrínseco do ser humano decorre umpostulado antiutilitarista e antiautoritário. (...) Oprimeiro se manifesta no imperativo categórico kantianodo homem como um fim em si mesmo, e não como um meiopara a realização de metas coletivas ou de projetospessoais de outros; o segundo, na ideia de que é oestado que existe para o indivíduo, e não contrário.102

Assim, o paciente não deve ser submetido a tratamentos

ineficazes ou ilegais sob a justificativa de um suposto estado

100BRUNETTA, Cíntia Menezes. op.cit. p. 954. 101BVerfGE. 30, 292In: FILHO, Willis Santiago Guerra Filho. Ensaios de TeoriaConstitucional. 1989. p. 87 apud BARROSO, Luís Roberto. Interpretação eAplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática constitucionaltransformadora.7º ed. São Paulo. Saraiva. 2009. p. 234.102BARROSO, Luís Roberto. A dignidade... op. cit. p. 77

38

caótico envolvendo o uso de drogas no país. O mesmo Estado que

criou as condições propícias para a dependência não pode

querer extingui-la de quaisquer formas.

Conforme já exposto, a eficácia da internação compulsória

tem sido questionada, eis que nunca foi comprovada através de

estudos práticos. Além dessa conclusão empirista, é

reconhecível quedado o poder destrutivo e causador de

dependência, o paciente precisa de grande força de vontade e

predisposição, de modo que, o tratamento, quando compulsório,

já inicia fracassado.

Obtendo o conhecimento de que a internação compulsória

pode falhar, não é responsável adotar a medida. Conforme

preconiza Dirley da Cunha Júnior, o subprincípio da adequação,

corolário do princípio da proporcionalidade, “exige que as

medidas adotadas pelo poder público se apresentem aptas para

atingir os fins almejados”103, que no caso exposto é o

tratamento do indivíduo.

Por isso mesmo, citando o Código de Ética dos Médicos, os

especialistas Daniel Martins de Barros e Antônio de Pádua

Serafim alertam que só se deve decidir pela internação quando

o risco é extremo, como no caso de iminente perigo de vida.104

Como orienta Luís Roberto Barroso, um certo grau de

paternalismo é aceitável, “mas os limites de tal interferência

devem ser definidos com bastante cuidado para que ela seja

considerada legítima”.105

103CUNHA JÚNIOR. Dirley da.Curso de Direito Constitucional. 6º Ed. Salvador.JusPODIVM. p.234104BARROS, Daniel Martins de; SERAFIM, Antonio de Pádua. op. cit. 105BARROSO. Luís Roberto. A dignidade... op. cit. p. 90

39

Coadunando-se a isto, Alfredo Jorge Kraut explana que um

dos princípios norteadores da internação involuntária deve ser

a imprescindibilidade desta, sem que haja quaisquer

alternativas terapêuticas mais eficazes e menos restritivas de

direitos.106

Logo, considera-se que uma medida extrema como a

internação compulsória não deve, de modo algum, ser ampliada a

todos os dependentes químicos, podendo ser utilizada como ultima

ratio, em casos de extrema necessidade, para salvaguardar a

própria vida do paciente, ou outros bens jurídicos similares.

De acordo com o que fora considerado no segundo capítulo

deste artigo, exemplifica-se que poderia ser internado

compulsoriamente o dependente que está tentando suicídio, que

desenvolveu quadros psicóticos graves, que está em vias de

overdose, ou que, em decorrência da droga, se tornou

extremamente violento.

Expondo um pouco do pensamento traçado, o Superior

Tribunal de Justiça107 já determinou que:

(...)II - A internação compulsória, qualquer que seja oestabelecimento escolhido ou indicado, deve ser, sempreque possível, evitada e somente empregada como últimorecurso, na defesa do internado e, secundariamente, daprópria sociedade.(...)IV - Não há constrangimento ilegal na imposição deinternação compulsória, no âmbito da Ação de Interdição,

106KRAUT, Alfredo Jorge. Los derechos de los pacientes. Buenos Aires. 2000.apud PINHEIRO, Gustavo Henrique de Aguiar. O devido processo legal deinternação psiquiátrica involuntária na ordem jurídica brasileira. Revistade Direito Sanitário. São Paulo. v. 12, n. 3, p. 125-138 Nov.2011/Fev.2012107STJ. HC 130.155/SP. Rel. Min. Massami Uyeda.Terceira Turma. Julgado em 04maio. 2013. Publicado em 14 maio. 2010. Disponível em:<https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=200900372607&dt_publicacao=14/05/2010>. Acesso em: 24 jul. 2013.

40

desde que baseada em parecer médico e fundamentada naLei 10.216/2001. Observância, na espécie.V -O art. 4º da Lei nº 10.216/2001, fruto de umaconcepção humanística, traduz modificação na forma detratamento daqueles que são acometidos de transtornosmentais, evitando-se que se entregue, de plano, aquele,já doente, ao sistema de saúde mental.VI - Todavia, a ressalva da parte final do art. 4º daLei nº 10.216/2001, dispensa a aplicação dos recursosextra-hospitalares se houver demonstração efetiva dainsuficiência de tais medidas. Hipótese dos autos,ocorrência de agressividade excessiva do paciente.(grifos meus).

Deste modo, é importante ressaltar que as disposições

trazidas pela lei 10.216/2001 são direitos fundamentais dos

dependentes químicos, pois tratam da violação de bens

jurídicos essenciais, como a liberdade, a autonomia e a

dignidade em si.

Outrossim, o dependente que for internado

compulsoriamentesem que recursos extra-hospitalares tenham

falhado ou sido indicados108 (violação ao artigo 4º da lei

10.216/2001); sem que a reinserção social esteja sendo

avaliada ou sem serviços de assistência multidisciplinar

(violando os §1º e 2º do mesmo artigo); ou sem laudo que

justifique109 (artigo 6º) não é vítima de mera ilegalidade, mas

108TJSP. Apelação Cível nº. 0000761-36.2010. Rel. Salles Rossi. Julgado em12 jun. 2013. Disponível em <http://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=6802218>. Acesso em: 12 ago. 2013. INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA. (...)Decreto de Improcedência. Internação compulsória que é medida extrema.Julgamento convertido em diligência. Prova pericial indicativa apenas danecessidade de tratamento ambulatorial (...) Pretensão exordial que nãoencontra amparo no artigo 4º da lei 10.216/2001. 109Nestes meios, TJSP. Apelação Cível nº 0037400-69.2012.8.26.0053. Rel.Isabel Cogan. Julgado em 07 ago. 2013. Disponível em:<http://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=6924005>. Acesso em:12 ago. 2013. (...) A internação compulsória depende de laudo médicocircunstanciado que caracterize os seus motivos (art. 6º da lei10.216/2001). (...)

41

de um desrespeito grave contra sua dignidade, tornando o

tratamento eivado de inconstitucionalidade.

Importante a disposição de Gustavo Henrique de Aguiar

Pinheiro, afirmando que “é da Constituição, e não simplesmente

da lei, que deriva o devido processo legal da internação

psiquiátrica involuntária, bem como as conseqüências e

garantias”110. Neste sentido, Maria Helena Diniz expõe que é

“inadmissível o tratamento psiquiátrico que venha a oprimir o

paciente, desrespeitando sua dignidade e a recuperação de sua

saúde mental”111

Nunca é demais dizer, que além de poder ser ineficaz, a

internação também pode ser perigosa. Como expôs José Osmir

Fiorelli e Rosana Cathya Ragazzoni Mangini “a dependência é de

difícil remissão”112 e que a retirada da substância psicoativa

deve ser feita com extrema cautela com escopo de evitar a

síndrome da abstinência, que causa “grande mal-estar físico e

mental, acompanhado de tremores, sudorese, náusea e vômito,

chegando a convulsões, delirium tremens, e até mesmo, a morte.”113

Infelizmente, esse conhecimento científico tem sido

ignorado em algumas ações de interdição civil114, de modo que

não é raro acompanhar decisões em que os direitos fundamentais

110PINHEIRO, Gustavo Henrique de Aguiar. Op. Cit. 111DINIZ, Maria Helena. op. cit. p. 210112FIORELLI, José Osmir; MANGINI. Rosana Cathya Ragazzonni. PsicologiaJurídica. 1º Ed. São Paulo. Atlas. 2009. p. 124.113Ibidem.114A título de exemplo: TJSP. Apelação Cível nº. 0000105-27.2012.8.26.0302.Rel. Fábio Henrique Podestá. Julgado em 28.08.2013. Disponível em:<http://esaj.tj.sp.gov.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=6982904&vlCaptcha=xyqrr>. Acesso em: 12 ago. 2013.Necessidade derealização de perícia médica visando aferir o grau de dependência.Tratamento de drogadição. Não observância dos princípios da ampla defesa edo contraditório. (...) Recurso provido.

42

dos dependentes químicos são ultrajados, pela justificativa

simplista de que a saúde sempre está acima da liberdade, não

dotando a matéria do devido conhecimento científico, quase

considerando que a internação é mágica e cura o paciente com a

mera abstinência.

Considera-se, em contrário, que a internação voltada aos

dependentes químicos deve afastar um flagrante estado de

perigo, com escopo de salvaguardar a sua dignidade e

possibilitar um tratamento por outros meios, já que a

internação involuntária pode não ser efetiva, e há outras

formas mais eficazes de encerrar a drogadição.

O ideal seria que o Brasil seguisse os exemplos das

outras nações e investisse em políticas de redução de danos,

ou pelo menos, em políticas que se fundassem no diálogo com os

dependentes, de modo a incentivá-los a buscar apoio

psicológico e sanitário.

Sobre isso, Salo de Carvalho sustenta que qualquer

política de tratamento no interior de um modelo proibicionista

tende ao fracasso, mas que na contramão, “os projetos de

redução de danos (...), fixam como requisito da intervenção o

reconhecimento do envolvido com drogas, usuário ou dependente,

como sujeito com capacidade de diálogo, dotado dos atributos

da fala e da escuta.”115

Neste ponto, é essencial apontaruma pesquisa realizada

pela Unidade de Pesquisa e Álcool e Drogas que entrevistou 170

usuários de crack, e constatou que 47% dos dependentes se

submeteriam a um tratamento, bem como 62,3% gostariam de parar

115CARVALHO, Salo de. op. cit. p. 443 e 444.

43

de usar substâncias toxicológicas.116Ao contrário do que o senso

comum indicaria, os dependentes químicos, mesmo de drogas

consideradas de alto potencial lesivo, tem certo entendimento

de compreensão e autonomia, e se abordados da maneira correta,

poderiam ser tratados sem menção de compulsoriedade.

A dependência química não é uma doença como outra

qualquer. A droga entra na vida do indivíduo em decorrência

de problemas sociais e psicológicos. Não são remédios que a

curam, e como já traçado, a simples abstinência da droga não

induz tratamento, eis que a vontade do uso da droga irá

acompanhar o toxicômano para o resto de sua vida.

Desta feita, como disse o recém ministro do Supremo

Tribunal Federal, “O dano a si mesmo pode constituir uma base

aceitável para a limitação da autonomia pessoal (...), mas

nesse caso o ônus de comprovar a sua legitimidade vai

usualmente recair sobre o Estado”.117

Cabe ao Estado, detentor do dever de promover a saúde,

institucionalizar medidas eficazes que invadam da menor forma

possível a esfera individual do paciente. Abranger a

internação forçada a todos só estigmatiza os usuários e rompe

com os objetivos e fins de qualquer tratamento.

4. CONCLUSÕES

116MAIORIA dos usuários da Cracolândia se submeteriam a tratamento, afirmapesquisa da Uniad/Unifesp.UNIAD. Disponívelem:<http://www.uniad.org.br/desenvolvimento/index.php/noticias/ 12250-maioria-dos-usuarios-da-cracolandia-se-submeteriam-a-tratamento-afirma-pesquisa-da-uniadunifesp.> Acesso em: 12. ago. 2013.117BARROSO. Luís Roberto. A dignidade... op. cit. p. 97

44

A reforma psiquiátrica no Brasil fez com que os direitos

humanos e fundamentais alcançassem também os doentes mentais –

e dessa forma, os dependentes químicos – a fim que não fossem

tratados como objetos, que poderiam simplesmente ser excluídos

do meio social, em prol da comunidade.

Neste sentido, demonstra-se que não há estudos que

comprovem a internação compulsória aos dependentes químicos

como um tratamento viável ou eficaz. Pelo contrário, parece

uma restrição à liberdade e uma invasão à autonomia do

indivíduo que prejudica o abandono da drogadição.

A nossa política contra as drogas é antiquada, e apesar

de nossa lei de tóxicos ser recente (2006), ainda carregamos

modelos repressores da década de 70, razão a qual estamos

atrasados no panorama mundial. O preconceito, a estigmatização

e a falta de conhecimento científico fazem com que,

equivocadamente, a internação compulsória seja considerada a

única, ou a melhor medida cabível a todos os dependentes

Analisando nossa Constituição e, em especial, o princípio

da dignidade humana, fica notável uma dimensão dúplice: por um

lado, deve-se respeitar a autonomia do dependente, mas por

outro, deve-se garantir a ele um mínimo existencial, não se

podendo permitir que ele continue fazendo uso de drogas, pois

isso inibe uma vida social plena, além de corromper a saúde, a

vida e a dignidade em si. Não há um ‘direito de usar drogas’.

Isso, entretanto, não permite qualquer tipo de abordagem

aos dependentes químicos. A intervenção estatal deve ser

eficaz, e deve abordar o usuário como sujeito capaz de

diálogo, promovendo medidas alternativas para encerrar a

45

toxicomania. Essa intervenção deve ser feita para o paciente,

e não para os fins da sociedade.

A internação compulsória deve ser usada como medida

extrema: a ultima ratio para casos em que o tratamento

ambulatorial ou psicológico realmente não bastam. Deve ser

empregada quando a própria vida do sujeito estiver em risco,

ou quando ele, por meio de comportamentos inadequados, esteja

pondo em risco direitosponderáveis de outras pessoas.

Caso a internação seja realmente necessária, as

disposições da lei 10.216/2001 são garantias fundamentais dos

dependentes, e os requisitos precisam ser preenchidos, um a

um. Se o texto legislativo for cumprido, e a internação for

realmente imprescindível, não há violação à dignidade humana,

eis que a medida será promovida justamente para respeitá-la.

Cabe a ressalva, que essa internação deverá durar o

mínimo possível, e ela por si não irá bastar como tratamento.

Após a intervenção, é necessário um longo acompanhamento

social e psicológico, além de medidas que realmente efetivem o

tratamento da dependência.

Por fim, o especialista internacionalmente reconhecido no

tratamento de drogadição George de Leon, conta em seu livro,

que se costuma perguntar a pessoas recém-admitidas em centros

de tratamento ‘Qual é o seu problema?’. A resposta usual, como

deveria se imaginar ‘Drogas, eu uso drogas’. Neste passo, os

pacientes recebem sempre a mesma réplica: ‘Mas este é o seu

sintoma, não o seu problema’.118

118 LEON, George De. A comunidade terapêutica: teoria, modelo e método. SãoPaulo. Loyola. 2003. p. 41

46

Há gigantesco atraso em nossa política de tóxicos.

Atacamos a droga em si, mas não os problemas que levam a

drogadição. Armamos nossas fronteiras, na expectativa cega de

que drogas não entrem, mas não promovemos medidas eficazes

para evitar que as pessoas as busquem. Caçamos os traficantes,

estigmatizamos os usuários, e rompemos com a dignidade dos

dependentes. Criamos um estado de repressão, e não de

prevenção.

Nosso Estado, estranhamente, quer promover a internação

compulsória aos dependentes, mas não incentiva o tratamento

voluntário, nem o disponibiliza para quem o desejar. O mesmo

Estado às vezes se exime de internar dependentes em clínicas

particulares, em decorrência da falta de locais públicos

adequados.119

É preciso que seja feita avaliação da internação

compulsória com extrema cautela, em cada caso concreto, e que

se busque outras medidas para o tratamento da drogadição, que

respeitem os dependentes e busquem tratar as causas do

problema, e não somente os sintomas.

REFERÊNCIAS

AMADOR, Salete Monteiro. A reforma psiquiátrica brasileira e aluta antimanicomial. Disponível em:

119Neste sentido, decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo, que mantevesentença condenatória ‘a quo’ determinando que o município de Itapetiningaarcasse com as despesas da internação de dependente em clínica particular,pela falta de disponibilização de local público para o tratamento. TJSP.Apelação Cível nº 0001478-95.2012.8.26.0269. Rel. Luciana Bresciani.Julgado em 27.03.2013. Disponível em:<http://esaj.tj.sp.gov.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=6828678>. Acesso em:12 ago. 2013.

47

<http://www.sermelhor.com/especial/luta_antimanicomial.htm>. Acesso em: 29 maio. 2013.

BARROS, Daniel Martins de; SERAFIM, Antonio de Pádua. Parâmetros legais para a internação involuntária no Brasil. Rev. Psiquiatria Clínica. São Paulo.v. 36. n. 4. 2009 . Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010160832009000400008&lng=en&nrm=iso>.Acesso em: 10 ago. 2013.

BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e Aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. 7º ed. São Paulo. Saraiva. 2009.

BARROSO. Luís Roberto. A dignidade da pessoa humana no direitoconstitucional contemporâneo: a construção de um conceito jurídico à luz da jurisprudência mundial 1º ed. 2º reimpressão. Belo Horizonte. Fórum. 2013.

BRASIL, Lei 10.216/2001. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10216.htm>. Acesso em: 01 jun. 2013.

BRASIL, Lei 10.409/2002. (Revogada). Artigos 11 ao 13. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10409.htm>. Acesso em: 25 jul. 2013.

BRASIL, Lei 11.343/2006. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato20042006/2006/lei/l11343.htm>. Acesso em: 30 maio. 2013.

BRASIL. Constituição Federal. Art. 196, caput. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm.> Acesso em:23 maio.2013.

BRASIL. Decreto 20.930/1932 (Revogado). Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/19301939/decreto2093011janeiro1932498374publicacaooriginal-81616-pe.html>. Acesso em: 22 jul. 2013

BRASIL. Decreto 4.294/1921 (Revogado). Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1920-1929/decreto-4294-6julho1921569300republicacao-92584-pl.html>. Acesso em: 22 jul.2013.

48

BRASIL. Decreto Lei 891/1938. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/1937-1946/Del0891.htm>. Acesso em: 24 jul.2013.

BRASIL. Lei 6768/1976. (revogado). Art. 10º. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivi03/leis/l6368.htm>. Acesso em: 24 jul. 2013.

BRASIL. Ordenações Filipinas de 1595. (revogado) Disponível em:<http://www1.ci.uc.pt/ihti/proj/filipinas/l5ind.htm>. Acesso em: 29 maio. 2013.

BRUNETTA, Cíntia Menezes. O direito das pessoas portadoras de doenças mentais. In PIOVESAN, Flávia (org.) Doutrinas Essenciais: Direitos Humanos. Vol. IV. Grupos Vulneráveis. SãoPaulo. RT. 2011.

CARVALHO, Salo. A política criminal de drogas no Brasil: Estudo criminológico e dogmático da lei 11.346/2006. 6º Ed. Saraiva. São Paulo. 2013.

COMEÇA internação compulsória de dependentes químicos. Conjur.Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2013-jan-21/comeca-internacao-compulsoria-dependentes-quimicos-sao-paulo>. Acessoem: 30 maio. 2013.

COMISSÃO GLOBAL DE POLITÍCAS SOBRE DROGAS. Guerra às Drogas. 2011. Disponível em: <http://www.globalcommissionondrugs.org/reports/>. Acesso em: 05 ago. 2013.

COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação história dos direitos humanos. 7º ed. São Paulo. Saraiva. 2010.

CONSELHO NACIONAL DE POLÍTICAS SOBRE DROGAS. Resolução 03 de 27 de outubro de 2005. Disponível em: <http://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=101642>. Acesso em:25. Jul. 2013.

CONSELHO REGIONAL DE PSICOLOGIA DO PARANÁ. A estrutura no modelo substitutivo ao hospitalocêntrico. Revista Contato. Curitiba. Ed. 71, Set/Out. 2010. Disponível em: http://www.crppr.org.br/revistas/111.pdf. Acesso em: 04 jun.2013.

49

CONSELHO REGIONAL DE PSICOLOGIA DO PARANÁ. Internação Compulsória: solução ou tática higienista?.Revista Contato. Curitiba. Ano. 15. Ed. 86. Mar-Abr. 2013.

CONVENÇÃO ÚNICA SOBRE ESTUPAFACIENTES DE 1961. Disponível em: <http://www.idt.pt/PT/RelacoesInternacionais/Documents/ConvencoesInternacionais/convencao_unica_1961.pdf>. Acesso em: 24 jul. 2013

CORTE SUPREMA DE JUSTITIA DE LA NÁCION. Rel. Min. Carmen M. Argibay. Recurso de Hecho nº A-891. XLIV. Julgado em 25 ago. 2009. Disponível em: <http://www.csjn.gov.ar/confal/ConsultaCompletaFallos.do?method=verDocumentos&id=671140>. Acesso em: 06 ago. 2013.

CUNHA JÚNIOR. Dirley da.Curso de Direito Constitucional. 6º Ed. Salvador. JusPODIVM.

DECLARAÇÃO DE CARACAS, 1990. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/declaraca o_caracas.pdf. Acesso em: 02 jun.2013.

DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS. Artigo 1º. Todos osseres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Disponível em: <http://www.mp.go.gov.br/portalweb/hp/7/docs/declaracao_universal_dos_direitos_do_homem.pdf>. Acesso em: 10 ago. 2013.

DIEHL, Alessandra. CORDEIRO, Daniel Cruz. LARANJEIRA. Ronaldo.Dependência Química: prevenção, tratamento e políticas públicas. 1º Ed. Artmed. São Paulo. 2011.

DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 8º Ed.São Paulo. Saraiva. 2011. p 208

FILHO, Vicente Grego. RASSI, João Daniel. Lei de drogas. 1º Ed. Saraiva. São Paulo. 2007.

FIORELLI, José Osmir; MANGINI. Rosana Cathya Ragazzonni. Psicologia Jurídica. 1º Ed. São Paulo. Atlas. 2009.

FRANCO, Sandra. A internação compulsória de dependentes químicos é eficaz? RevistaConsulex.São Paulo. Ano XVII. nº 388. p. 54-55. mar. 2013

GOMES, Luis Flávio. Nova lei de drogas comentada. 1º Ed. São Paulo. Revista dos Tribunais. 2006.

50

GREENWALD, Gleen. Drug Decriminalization in Portugal: Lessons for creating fair and successful drug policies. Cato Institute. 2009. Disponível em:< http://www.cato.org/publications/white-paper/drug-decriminalization-portugal-lessons-creating-fair-successful-drug-policies>. Acesso em: 05 ago. 2013. (NossaTradução).

HUMAN RIGHTS WATCH; et. al. Human rights and drug policy: compulsory drug treatment. Briefing 4. Londres, Inglaterra. Count The Costs. Disponível em: //www.countthecosts.org/sites/default/files/IHRA_Compulsory_Treatment.pdf>. Acesso em: 23 jul. 2013. Nossa Tradução.

IHRA - INTERNATIONAL HARM REDUCTION ASSOCIATION. O que é redução de danos? Uma posição oficial da Associação Internacional de Redução de Danos. IHRA. Disponível em: <http://www.ihra.net/files/2010/06/01/Briefing_what_is_HR_Portuguese.pdf>. Acesso em: 09 set.2013.

INPAD (Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia Para Políticas Públicas do Álcool e Outras Drogas). II LENAD (II Levantamento nacional de Álcool e Drogas. Disponível em: <http://inpad.org.br/wp-content/uploads/2013/03/LENAD_PressRelease_Coca.pdf>. Acesso em:30 maio.2013.

KARAM, Maria Lúcia. Drogas: legislação brasileira e violações a direitos fundamentais. LEAP Brasil.. Disponível em: http://www.leapbrasil.com.br/textos. Acesso em: 24 jul. 2013.

LEON, George De. A comunidade terapêutica: teoria, modelo e método. São Paulo. Loyola. 2003.

MAIORIA dos usuários da Cracolândia se submeteriam a tratamento, afirma pesquisa da Uniad/Unifesp. UNIAD. Disponível em:<http://www.uniad.org.br/desenvolvimento/index.php/noticias/12250-maioria-dos-usuarios-da-cracolandia-se-submeteriam-a-tratamento-afirma-pesquisa-da-uniadunifesp.> Acesso em: 12. ago. 2013.

MAURER, Beatrice. Notas sobre o respeito da dignidade da pessoa humana… ou pequena fuga incompleta em torno de um tema central. In SARLET, Ingo Wolfgang. Dimensões da Dignidade: ensaios da filosofia do direito e direito constitucional. 2º Ed. Porto Alegre. Livraria do Advogado. 2009.

51

MENEZES, Joyceane Bezerra. A Autonomia privada do paciente dependente químico no Brasil e a discussão sobre a internação involuntária: instrumentos de controle. In: ENCONTRO NACIONAL DO CONPEDI/CESUMAR. 2009. Maringá, PR. Disponível em:<http://www.conpedi.org.br/anais/36/03_1503.pdf>. Acesso em: 05. ago. 2013.

NOBRE JÚNIOR, Edilson Pereira. O direito brasileiro e o princípio da dignidade. In PIOVESAN, Flávia (org.)Doutrinas Essenciais: Direitos Humanos. V. I. Teoria Geral dos Direitos Humanos. São Paulo. RT. 2011.

NUNES, Laura. M; Jólluskin, G; O uso de drogas: breve análise histórica e social. Disponível em: <http://bdigital.ufp.pt/bitstream/10284/449/1/230-237FCHS04-15.pdf>. Acesso em: 23 maio. 2013.

OGA, S. CAMARGO; M. M. A. BATISTUZZO, J. A. O. Fundamentos de Toxicologia. 3º Ed. Atheneu. São Paulo. 2008.

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Relatório sobre a saúde no mundo: Saúde Mental. Nova Concepção, nova esperança. 2001. Disponível em: < http://www.who.int/whr/2001/en/whr01_po.pdf>.Acesso em: 20 jul. 2013.

ORGANIZAÇÃO PANAMERICANA DE SAÚDE. Nota técnica da OPAS/OMS noBrasil sobre internação involuntária e compulsória de pessoas que usam drogas. Disponível em: <http://goo.gl/9GPCd>. Acesso em: 22 jul.2013

PINHEIRO, Gustavo Henrique de Aguiar. O devido processo legal de internação psiquiátrica involuntária na ordem jurídica brasileira. Revista de Direito Sanitário. São Paulo. v. 12, n.3, p. 125-138 Nov.2011/Fev.2012

PRATTA, E.M.M; SANTOS, M.A. O processo Saúde-Doença e a Dependência Química: Interfaces e Evolução. Psicologia: teoria e pesquisa. Brasília. V. 25. nº 2. p. 203-211. Abr-Jun 2009. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ptp/v25n2/a08v25n2.pdf. Acesso em: 29maio.2013.

REALE, Miguel. Filosofia do Direito. 20º Ed. São Paulo. Saraiva. 2002.

52

RODRIGUES, Luciane Boiteux Figueiredo. Controle Penal sobre asdrogas ilícitas: O impacto do proibicionismo no sistema pena ena sociedade. 2006. 273f. Tese (Doutorado em Direito). Universidade de São Paulo. Disponível em: <http://www.comunidadesegura.org/files/controlepenalsobredrogasilicitas.pdf>. Acesso em: 24 jul. 2013.

SARLET, Ingo Wolfgang. As dimensões da dignidade da pessoa humana: construindo uma compreensão jurídico constitucional necessária e possível In SARLET, Ingo Wolfang (org.) Dimensões da Dignidade: ensaios da filosofia do direito e direito constitucional. 2º Ed. Porto Alegre. Livraria do Advogado. 2009.

SEIBEL, Sérgio. A Lei 11.343/2006 sobre drogas e o impacto na saúde pública. IBCCRIM.Disponível em: <http://www.ibccrim.org.br/boletim_artigo/4744-A-Lei-11.343-2006-sobre-drogas-e-o-impacto-na-saude-publica>. Acesso em: 26. jul. 2013.

SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 22º Ed. São Paulo. Malheiros. 2002.

SP inicia programa de internação compulsória de viciados em crack.G1. Disponível em: <http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2013/01/sp-inicia-programa-de-internacao-compulsoria-de-viciados-em-crack.html>. Acesso em: 30 maio.2013.

STEVENS, Alex. The Ethics and effectiveness of coerced treatment of people who use drugs.Human Rights and Drugs. Volume 2.Nº I. 2012.Disponível em: <http://kar.kent.ac.uk/29903/1/Stevens%202012_ethics%20and%20effectiveness.pdf>. Acesso em: 18 set. 2013.

STF. Inq. 3412. Rel. Min. Marco Aurélio. Tribunal Pleno. Julgado em 29 mar. 2012. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=3076256>. Acesso em: 10 ago. 2013.

STJ. HC 130.155/SP. Rel. Min. Massami Uyeda.Terceira Turma. Julgado em 04 maio. 2013. Publicado em 14 maio. 2010. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?

53

registro=200900372607&dt_publicacao=14/05/2010>. Acesso em: 24jul. 2013.

TAFFARELLO, Rogério Fernando. Drogas: Falência do proibicionismo e alternativas de política criminal. 2009. 154f. Dissertação (Mestrado em Direito). Universidade de São Paulo.

TJSP. Apelação Cível nº 0037400-69.2012.8.26.0053. Rel. IsabelCogan. Julgado em 07 ago. 2013. Disponível em: <http://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=6924005>. Acesso em: 12 ago. 2013.

TJSP. Apelação Cível nº. 0000105-27.2012.8.26.0302. Rel. FábioHenrique Podestá. Julgado em 28.08.2013. Disponível em: <http://esaj.tj.sp.gov.br/cjsg/getArquivo.do? cdAcordao=6982904&vlCaptcha=xyqrr>. Acesso em: 12 ago. 2013.

TJSP. Apelação Cível nº. 0000761-36.2010. Rel. Salles Rossi. Julgado em 12 jun. 2013. Disponível em <http://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=6802218>. Acesso em: 12 ago. 2013.

TV CULTURA. Contra ou a favor: Internação Compulsória. Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=5V_0vWSA2FQ>. Acesso em: 24 jul. 2013.

UNODC – UNITED NATION OFFICE ON DRUGS AND CRIMES.WHO – WORLD HEALTH ORGANIZATION.Principles of Drug dependence Treatment.2009. Disponível em: <http://www.unodc.org/docs/treatment/Principles_of_Drug_Dependence_Treatment_and_Care.pdf>. Acesso em: 06 ago. 2013.

UNODC – UNITED NATION OFFICE ON DRUGS AND CRIMES.Arrests and compulsory detentions of drug users in Brazil concern UN experts. Disponível em: <http://www.unodc.org/lpobrazil/en/frontpage/2013/03/28-arrests-and-compulsory-detentions-of-drug-users-in-brazil-concern-un-experts.html>. Acesso em 24 maio. 2013. Nossa tradução.