"Veneráveis Representantes da Vegetação Tropical": médicos, curandeiros e fitoterapias na...

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Workshop Plantas Medicinais e Fitoterapêuticas nos Trópicos. IICT /CCCM, 29, 30 e 31 de Outubro de 2008 “Veneráveis representantes da vegetação tropical”: Médicos, curandeiros e fitoterapias na Guiné-Portuguesa (sécs. XIX-XX) 1 ____________________________________________________________________________________________________ “VENERÁVEIS REPRESENTANTES DA VEGETAÇÃO TROPICAL”: MÉDICOS, CURANDEIROS E FITOTERAPIAS NA GUINÉ-PORTUGUESA (SÉCS. XIX-XX) Philip J. Havik i Instituto de Investigação Científica Tropical (IICT) – Departamento de Ciências Humanas [email protected] Resumo A chegada de facultativos médicos e farmacêuticos na Guiné dita Portuguesa com a criação dos serviços de saúde na primeira metade do século XIX trouxe novos conceitos e práticas a uma região onde os curandeiros reinavam. Olhada com uma mistura de fascínio devido a sua natureza exótica e desconfiança pelo seu clima e doenças tropicais endémicas, a Guiné ainda era um agrupamento de presídios dispersos cercados por um interior largamente desconhecido. Médicos e farmaceuticos a um lado e curandeiros como os djambakós e murus noutro, protagonizaram um encontro difícil e hesitante a partir dos meados de oitocentos que pouco mais produziu que alguns resultados pontuais. Porém, a publicação dos primeiros dados sobre a rica flora do território e algumas das suas aplicações fito-terapeuticas no último quartel do século mostram que houve um intercâmbio de conhecimentos sobre o tratamento de diversas patologias comuns e tropicais. Após as campanhas militares e a implantação de uma administração colonial nas primeiras décadas do século XX, quando se estabelecem serviços clínicos em todo o território, a assistência médica e a farmacopeia ocidental aproximou-se aos utentes nativos. Ao mesmo tempo, administradores e antropólogos enveredaram pela procura dos costumes e tradições dos povos através de inquéritos etnográficos, incluindo as fito-terapias mais comuns utilizadas pelas populações. Neste modo fazem-se os primeiros passos para uma sistematização dos conhecimentos sobre os paliativos locais que resultam no primeiro estudo etno-botânico sobre um povo da região. O presente ensaio pretende destacar estas dinâmicas e intercâmbios, que não obstante o seu carácter ambivalente, forneceram dados novos que permitiram conhecer melhor certos aspectos fundamentais da vida diária dos habitantes. Palavras-chave: Plantas indígenas; Fitoterapias; Curandeiros; Antropologia; Etno-biologia; Guiné (Portuguesa) 1. A AMBIVALÊNCIA DA NATUREZA E O DESLEIXO DOS HOMENS Nos relatos de observadores oitocentistas, a Guiné era descrita como terra fértil e luxuriante, uma colónia tão florente, tão risonha e com um horizonte largo e um futuro que se delineava cheio das mais ricas esperanças” ii . Um panorama algo romantizado sobressai da literatura de viagens que surgiu nesta época difundida pelas sociedades de geografia europeias através de publicações tendo em vista a exploração do continente africano. No caso da Guiné, os oficiais da marinha francesa e portuguesa que faziam parte das Comissões de Delimitação de Fronteiras criadas pelo tratado Luso-Francês de 1886 contribuíram decisivamente para este imaginário exótico. Os seus relatos incluem uma abundante iconografia que denota 1

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Workshop Plantas Medicinais e Fitoterapêuticas nos Trópicos. IICT /CCCM, 29, 30 e 31 de Outubro de 2008

“Veneráveis representantes da vegetação tropical”: Médicos, curandeiros e fitoterapias na Guiné-Portuguesa (sécs. XIX-XX) 1

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“VENERÁVEIS REPRESENTANTES DA VEGETAÇÃO TROPICAL”: MÉDICOS, CURANDEIROS E FITOTERAPIAS NA GUINÉ-PORTUGUESA (SÉCS. XIX-XX)

Philip J. Haviki Instituto de Investigação Científica Tropical (IICT) – Departamento de Ciências Humanas

[email protected]

Resumo

A chegada de facultativos médicos e farmacêuticos na Guiné dita Portuguesa com a criação dos serviços de saúde na primeira metade do século XIX trouxe novos conceitos e práticas a uma região onde os curandeiros reinavam. Olhada com uma mistura de fascínio devido a sua natureza exótica e desconfiança pelo seu clima e doenças tropicais endémicas, a Guiné ainda era um agrupamento de presídios dispersos cercados por um interior largamente desconhecido. Médicos e farmaceuticos a um lado e curandeiros como os djambakós e murus noutro, protagonizaram um encontro difícil e hesitante a partir dos meados de oitocentos que pouco mais produziu que alguns resultados pontuais. Porém, a publicação dos primeiros dados sobre a rica flora do território e algumas das suas aplicações fito-terapeuticas no último quartel do século mostram que houve um intercâmbio de conhecimentos sobre o tratamento de diversas patologias comuns e tropicais. Após as campanhas militares e a implantação de uma administração colonial nas primeiras décadas do século XX, quando se estabelecem serviços clínicos em todo o território, a assistência médica e a farmacopeia ocidental aproximou-se aos utentes nativos. Ao mesmo tempo, administradores e antropólogos enveredaram pela procura dos costumes e tradições dos povos através de inquéritos etnográficos, incluindo as fito-terapias mais comuns utilizadas pelas populações. Neste modo fazem-se os primeiros passos para uma sistematização dos conhecimentos sobre os paliativos locais que resultam no primeiro estudo etno-botânico sobre um povo da região. O presente ensaio pretende destacar estas dinâmicas e intercâmbios, que não obstante o seu carácter ambivalente, forneceram dados novos que permitiram conhecer melhor certos aspectos fundamentais da vida diária dos habitantes. Palavras-chave: Plantas indígenas; Fitoterapias; Curandeiros; Antropologia; Etno-biologia; Guiné (Portuguesa)

1. A AMBIVALÊNCIA DA NATUREZA E O DESLEIXO DOS HOMENS

Nos relatos de observadores oitocentistas, a Guiné era descrita como terra fértil e

luxuriante,

“uma colónia tão florente, tão risonha e com um horizonte largo e um futuro

que se delineava cheio das mais ricas esperanças”ii.

Um panorama algo romantizado sobressai da literatura de viagens que surgiu

nesta época difundida pelas sociedades de geografia europeias através de publicações

tendo em vista a exploração do continente africano. No caso da Guiné, os oficiais da

marinha francesa e portuguesa que faziam parte das Comissões de Delimitação de

Fronteiras criadas pelo tratado Luso-Francês de 1886 contribuíram decisivamente para

este imaginário exótico. Os seus relatos incluem uma abundante iconografia que denota

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em forma de gravuras, feitas com base em fotografias, uma crescente atenção a flora e

fauna da regiãoiii. Viajando por via fluvial mas agora também terrestre, abre-se o

interior aos olhares dos leitores das revistas, que assim se conseguem aproximar aos

“mangroves entrelaçados”, a “vegetação resplandecente”, as “poilões majestuosas”, e

as “palmeiras frondosas”.iv Nestas imagens, os homens aparecem como figuras

pequenas dominadas e cercadas pela imponente natureza ao seu redor, não escondendo

contudo as núvens escuras que anunciam a chegada das tempestades da estação das

chuvas (Nordeck, 1886: 292). A natureza com a sua infinita variedade de espécies ‘é

assim retratada como encantadora e sedutora, mas ao mesmo tempo como indomado e

ameaçadora.

Os mesmos relatos também trazem os primeiros desenhos de plantas, por ex. as

folhas e sementes da kola (Sterculia acuminata) e outras espécies botânicas exóticas

(Ibid: 296-8), tal como a arvore de mancône (Eritrophlaeum afzelius) conhecido de

relatos quinhentistas como a ‘água vermelha’ de cuja casca se extrai um veneno, muito

usado nos rituais para identificar a presença de feiticeiros (Brosselard, 1889:139/40).

Um membro português da mesma comissão acrescentou mais algumas espécies com

propriedades curativas como por exemplo o óleo do árvore de azeite amargoso com que

se tratavam colites e doenças das vias respiratórias, aparentemente com “esplêndido

resultado” (Costa Oliveira, 1897-98: 82-91). Uma abordagem mais calculista e menos

romantizada perpassa as observações de comerciantes, autoridades e técnicos sobre os

solos e a flora da região, com o intuito de valoriza-la e fomentar a sua exploração

agrícola. Tal como noutras colónias, a Guiné não escapou a regra, resultante da vontade

de moldar a natureza segundo os critérios dos seus novos ocupantes, cativado pelas

promessas de um ‘novo Brasil’. Segundo fontes coevas a Guiné não possuiu “riquezas,

minérias,” etc., sendo os terrenos que Portugal detém, “por assim dizer meros retalhos

[…] e verdadeiros tiros de terra sem importância, de que só podemos tirar proveito

dispendendo quantias fabulosas que nunca poderão ser compensadas’, uma observação

crítica acompanhada de reivindicações imperiais acerca dos direitos de soberaniav

Não se conhecem nenhuns estudos sobre a flora do território antes da sua

ocupação em 1915, a não ser alguns parágrafos nos relatos de viajantes e zoólogos que

penetraram o seu interior em busca de espécies exóticasvi. Ainda em 1917, no seu

estudo sobre a Guiné o conhecido geógrafo Ernesto de Vasconcellos não dedica mais do

que uma alínea a flora do território, falando do “denso arvoredo verde negro que ao

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as para a metrópole.

navegante se lhe afigura como tufos de verdura, emergindo sobre as aguas” que

dificultava e até tornava perigosa a aproximação da costavii, avisando pelos perigos e

obstáculos que a natureza impôs ao reconhecimento e exploração de África. Os

primeiros estudos agronómicos feitos algumas décadas antes, também exprimem uma

atitude semelhante além de assinalar uma dimensão complementar, nomeadamente a

ideia de a natureza africana ser ‘estática’ que não merecia ou justificava estudos

demorados: ‘nada se tem feito, as culturas são as mesmas e os processos não se

modificaram”.viii Nesta perspectiva, a “agricultura era a primeira condição da

existência e independência das nações, a base segura e a origem mais fecunda do bem-

estar de cada povo” (Ibidem). Porém, este discurso afincadamente colonial e

modernista levou o agrónomo em questão de sublinhar o facto de não existir nenhuns

estudos sobre a flora da Guiné. Daí que sugere a necessidade de conhecer melhor a sua

variedade, propondo a criação de uma ‘comissão executiva para a colheita de produtos

vegetais’ para apreciar amostras de plantas após serem enviad

“não basta ter qualquer conhecimento das espécies botânicas que n’ella vivem;

é sobretudo indispensável conhecer quais as utilidades práticas que se podem tirar

d’essas espécies” (Ibidem).

No seu relatório constam as primeiras referências acerca da recolha sistemática

de plantas com fins terapêuticas: “exemplo: se a planta (A) é uma planta arbórea, as

suas folhas são medicinais, o caule depois de fendido produz goma ou resina deve

colocar-se o no. (A) nos amostras de madeira, resina ou folha.” (Ibidem) Mas regra

geral, autores em geral e médicos em particular, sublinham os perigos para a saúde

humana associados ao material orgânico, devido a “humidade excessiva” dos solos, e a

“fermentação dos detritos orgânicos e organizados, que se tornam extraordinariamente

activa”ix. Estes processos exerceram uma “acção extraordinariamente notável

principalmente no que diz respeito a higiene”. Desta afirmação até a condenação da

“insalubre cultura de arroz” em terrenos alagados que constituem “verdadeiros caldos

de culturas de micróbios” (Ibidem: 91) era um pequeno passo. Enquanto se

impressionou pela exuberância do ambiente natural dava a impressão “que a Guiné é

um paraíso”, acabava a mesma frase ao evocar a violência das chuvas torrenciais e das

“febres biliosas e perniciosas”, transformando tudo em “tristeza” e “terror” (Ibidem:

92). Porém, esta relação de amor-ódio com a natureza transforme-se numa verdadeira

elegia quando surgir o tema das praças a beira mar e rio espalhados pelo território. Estes

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núcleos semi-urbanos eram invadidos pelo ambiente tropical num discurso que

lembrava aquele do “sepulcro dos Europeus”x, em que se associava as febres

‘perniciosas’ e ‘palustres remitentes’ e ‘-intermitentes’ ao clima tropical e a

omnipresença de ‘miasmas palustres’ que o vento Leste trazia na estação seca (de

Outubro até Maio), arrastando

“(…) para cima da povoação […] dos pántanos circunvizinhos que os achão na

actualidade quase secos, e os seus leites cobertos de animais e vegetais em adiantado

estado de putrefacção”xi.

Quando oficiais e médicos se debruçaram sobre a situação problemática das

vilas a beira-mar, concluíram que estavam “(…) mal-situadas em relação a defesa e a

higiene […] em terrenos muito baixos e pouco ventilados […] lodosos […] com uma

vegetação prodigiosamente vigorosa […] e condições climatológicas [que] dão causa a

insalubridade do país”xii. Porém longe de somente culpar a natureza, o mesmo autor

também acusava as autoridades e os habitantes de “desleixo e incúria”, dado que “as

imundícies de toda a espécie [se] encontram amontoadas nas casas, nas ruas e nas

praias.” (Ibidem). Esta situação que já se começou a denunciar a partir dos anos 50 de

oitocentos através de editais e posturas - contudo sem grandes efeitos práticos - era visto

com o principal factor da saúde débil dos seus habitantes. Em 1891 um viajante

constatava que Bissau, naquela altura o principal porto português na África Ocidental,

era um local “imundo, sombrio e miasmático” que provocava “deformidades de higiene

e na moral” (Martins, 1891: 253).

As guerras de ocupação e campanhas punitivas que se intensificaram a partir dos

anos 90 de oitocentos, sobretudo a seguir o Ultimato Britânico, provocam um

crescimento da população das vilas sem ter condições para as acolher. A criação de

hospitais de sangue e unidades moveis de assistência ás tropas no terreno, não melhora a

situação precária das populações das ‘praças’, enquanto o avanço para o interior traz

notícias sobre os povos nativos não receberam apoios para combater as pandemias que

ciclicamente assolavam a regiãoxiii. As vilas costeiras como Bissau são descritas por

médicos como “lugares detestáveis” cuja “inebriante atmosfera encobre a veneno e a

morte” (Costa, 1883: 98). Rodeadas por extensas superfícies pantanosas que produzem

uma abundância de ‘emanações miasmáticas’, os médicos denunciam os seus efeitos

sobre a salubridade pública, enquanto as fontes e poços de água estão

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“permanentemente estagnadas”, que constituem “poderosas causas geradoras de tantas

e tão variadas moléstias”(Da Costa, 1886).

A situação noutras praças como no caso do porto fluvial de Geba 150 kms rio

acima, não era melhor, apesar de não ter palissada nem muralhas: “a decomposição das

plantas nos pântanos e as miasmas que produziram são a principal causa das febres

que na época se desenvolvem em quase todos os habitantes.” (Ibidem). O ponto de

Farim na margem direita do Rio Cacheu mais ao Norte era uma das mais insalubres da

Guiné. A ‘acção perniciosa’ do clima era vista como a mais devastadora para a saúde,

sobretudo no caso dos Europeus, mas apesar da suposta “constituição fraca” das

“raças” africanas, a população em geral não era afectada pelo clima da mesma forma.

Contudo, “viveram muito pouco tempo” devido ao abuso de bebidas alcoólicas, uma

alimentação insuficiente, e o “uso de carne e peixe corrupto”. Das crianças morria a

metade até a idade de dois anos, enquanto os que sobreviveram contraíram muitas vezes

“lesões viscerais importantes, que mais tarde dão origem a doenças graves e

incuráveis” (Ibidem). Apesar dos seus avisos, os delegados de Saúde se queixam

repetidamente das ‘autoridades competentes’ se terem mostradas ‘insensíveis’ as suas

reclamações, apesar de terem publicadas posturas neste sentido (Ibidem).

Dez anos mais tarde, o chefe do Serviço de Saúde da Guiné confirma esta

observação: “a vila de Bissau é a localidade mais insalubre das ocupadas por nós na

Guiné”. Este responsável não vê muita diferença com a alagada falta de higiene

demonstrada pelos Pepel de Intim nas povoações ao pé da vila: “a casa é uma pocilga,

um chiqueiro em que promiscuamente convivem o homem e os animais domésticos”

(César Gomes Barbosa, 1894: 58). No caso da povoação de Geba a higiene pública e

privada inspira também as maiores preocupações a este médico, por causa das

“palhoças imundas” e as ruas que classifica como “nojentas veredas” (Ibid: 59),

enquanto a “primitiva higiene” em Cacheu e Farim não diferir muito dos outros pontos

na região. Algumas destas povoações deviam ser deslocadas, além de propor a

plantação de mangueiras, acácias e palmeiras para evitar a “nociva” e “letífera

influência” dos pântanos que as circundam (Ibid: 63).

No caso de Bissau esta situação vigorou até que as muralhas - erigidas em 1844

e que fecharam a vila sobre si - foram demolidas em 1912 para criar condições para a

expansão e reordenamento urbano que prosseguiu a partir de 1914. O centro comercial

do enclave não se comparava “as soberbas capitais” de Senegal e de Serra Leoaxiv.

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Apesar da sua aparência fértil e promissora, a Guiné era na viragem do século de acordo

com fontes coevas uma região inóspita onde o clima, o ambiente e a atmosfera

contribuíram para ainda no princípio do século XX perpetuar a ideia de a aclimatização

do Europeu não seria fácil de resolver. Mas dado que tal situação já se verificava desde

os primeiros contactos feitos no século XV, como é que os estrangeiros e sobretudo a

população em geral se protegeram contra estas ameaças na sua vida diária? Porquê

então as fontes escritas contém tão poucas referências a uma questão que certamente

preocupava os habitantes assolados por epidemias de vária ordem e de doenças

tropicais? E quais eram as curas que aplicavam para alivia-as? E qual o papel da flora

aparentemente tão abundante do território neste sentido? Tentaremos dar algumas

respostas a estas e outras perguntas através de dois estudos de caso, a primeira do século

XIX antes de a Guiné ser militarmente ocupada e a segunda no século XX, já no tempo

colonial.

2. CURANDEIROS E MÉDICOS: UMA RELAÇÃO COMPLEXA E DIFÍCIL

O título desta comunicação foi extraído do relatório de um médico-cirurgião que

servia na época de 1870 no território na altura ainda chamada ‘Senegambia Portuguesa’

e fazia parte de um pequeno núcleo de médicos, facultativos e farmaceuticos dos

Serviços de Saúde da Guiné e Cabo Verde, que fora criado nos anos 40 de oitocentos.

Após meio século de existência estes não eram mais que “um simulacro de quadro de

saúde” somente contando três médicos para toda a região (Gomes Barbosa, 1894: 95).

Algumas vilas nem sequer médicos tinham, mas sim meras ambulâncias com ou sem

botica. Apesar de existirem serviços de saúde, a primeira vista a situação não diferira

muito daquela que existia desde a fundação dos portos fluviais no século XVI e XVII.

A veia prosaica do médico acima referido embelezou relatórios que no fundo

apresentaram um quadro muito crítico do estado de saúde da população tal como do

funcionamento dos próprios serviços, embrionários até os anos vinte de novecentos.

Com o passar do tempo, os seus relatos incluem cada vez mais informação acerca das

condições meteorológicas, da higiene pública e da nosologia dos habitantes das vilas

como Bissau, Geba, Cacheu e Farim e mais tarde a partir dos anos setenta de oitocentos

também Bolama que se tornará capital da província autónoma de Guiné Portuguesa em

1879. Das suas escritas sobressai um panorama desolador sobre a região e a sua

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população, baseado nas suas visitas periódicas, actuando como médicos mas também

como geógrafos e etnólogos in loco. Não obstante a falta de facultativos, a partir dos

meados do século XIX estes começam de produzir mais pormenores acerca do estado

clínico da população e as condições vigentes dos serviços médicos. A título de exemplo

os chefes de serviço apresentam alguns casos clínicos de pacientes para ilustrar as

patologias mais comuns como as doenças tropicais (o paludismo, a febre amarela, etc)

mas também as doenças do foro respiratório (bronquites), gastro-intestinais (disenteria e

diarrheia) e dermatológicos (úlceras da pele).

Até o século XX, as infra-estruturas rudimentares se limitavam a um hospital

militar em Bolama, a capital de então, com duas enfermarias, e o hospital militar de

Bissau, estabelecida numa casa particular sem condições e algumas ambulâncias

rudimentares nos postos mais afastados. O relatório acima referido descreve pela

primeira vez e de forma detalhada o impacto de epidemias, neste caso de cholera

morbus que varreu a região de África Ocidental em 1869xv. No século XIX, epidemias

de cólera, varíola, sarampo e febre-amarela eram frequentes, mas também certas

epizootias que dizimaram o gado, sem que os serviços tinham condições, pessoal ou

recursos para as combaterxvi. Durante a sua visita ao interior que ainda era largamente

desconhecida aos colonos, o único médico-cirurgião na região regista as fortes

contrastes entre a população profundamente ansiosa e afectada e o exotismo da flora

tropical, aqui na zona do Rio Grande, no Sul do território:

‘veneráveis representantes da vegetação tropical, baixas temperaturas nas

planuras do oceano, carregando – ao passar - suave aroma desta luxuosa vegetação

[que] veêm amenizar o clima fustigado pela rude aspereza deste sol africano.”xvii

Apesar de regra geral o seu raio de acção se limitar as poucas vilas costeiras, o

referido médico visita algumas pontas ou explorações agrícolas/postos comerciais no

interior para se inteirar da situação, sobretudo em caso de epidemias como cólera e

febre amarela, admitindo porém que ‘muito raras vezes é o facultativo chamado para

tratar o indígena gentio.’ (Ibid). De facto, os serviços não estavam a par daquilo que se

passava no interior, mesmo a curta distância da praça de Bissau, e o modo como que a

população se tratava as patologias comuns e epidemias.

“Não se sabe se a epidemia se tem extendida aos gentios limitrofes. Ouvem se

em Antim e Bandim repetidas descargas de espingardaria, sinal de ter morrido algum

entre eles, mas ignora-se a moléstia que os devasta”xviii.

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No ano anterior, na sequência de uma epidemia de febre amarela que já tinha

provocado a morte do então governador da Guiné, o cirurgião-mor da província dirigiu

então um pedido ao ‘rei’ de Bandim, área vizinha da vila de Bissau sob controlo dos

Pepel, “licença de ir a localidade ver os doentes, mas isto da ênfase nos prejuízos

daqueles povos, e não é provável que se consiga”xix.

Esta observação ilustra bem que as autoridades lusas estavam dependentes dos

chefes nativos ou régulos, não somente nas questões de saúde, mas em todos os

aspectos da vida política, económica e social fora - e até dentro - do perímetro das

praças. Este isolamento foi somente quebrado pelo facto de as vilas estarem ligadas

entre eles por via fluvial e por redes comerciais ao exterior. Porém, os grandes rios

como o Geba, o Cacheu e o Casamance onde as vilas se situavam, são qualificados

pelos médicos como as principais vias de difusão das epidemias. Os mesmos rios de que

os habitantes dependerem para a sua sobrevivência constituem ao mesmo tempo uma

ameaça silenciosa ao bem-estar destes sem meios adequados para a sua defesa. Numa

série de relatórios o pessoal médico dá azo a sua frustração, enumerando as patologias

que afligem a região além de cólera, nomeadamente angina, varíola, sarampo, febres

endémicas, febre-tifoide, febre-amarela, cachexia africana, gripe e escorbuto. Isto além

de outras doenças mais comuns como por exemplo inflamação do aparelho visual,

reumatismo agudo e crónico, bronchitis aguda e crónica, affecções da pele, doenças

venéreas e sifilíticas, úlceras das pernas, padecimentos de figado, em geral do baixo

ventre, diarreia, disenteria, doenças do sistema nervoso com epilepsia, histeria,

delirium-tremens e doença do sono. Os médicos não esquecem também de referir a

fome, frequente no arquipélago de Cabo Verde onde os habitantes ainda estavam a sarar

as feridas de uma epidemia de fome nos mesmos anos 60 de oitocentos, para qual se

importava arroz e outras culturas do continentexx. O combate as epidemias também se

complicou por o pequeníssimo Quadro de Saúde não conseguir convencer a população

de se vacinar, devido a grande relutância que esta mostrou recusando a vacinação dos

filhos. Estas campanhas, que somente se tornaram obrigatórias no século XX, nunca

chegaram a ter um impacto fora das praças, nas zonas do interior cuja população travava

uma guerra cada vez mais intensa contra a tentativa das autoridades para estender o seu

domínio na região, que só se veio confirmar a partir de 1915.

Olhando principalmente para as doenças que afectam os Europeus, os médicos

admitem que ainda pouco sabiam. Sendo a aclimatização do Europeu uma condição

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para a colonização, nos anos 70 de oitocentos um médico recomenda fazer “um estudo

acerca da influência mórbida do clima e o solo sobre os habitantes desta região”, que

considera ”importante” porque permitirá recolher a “historia de doenças”, e definir

quais as “patologias, e principalmente aquela para a qual tem fatal privilégio a raça

branca.”xxi Reconhecem então que muitas das doenças que afectam os colonos são

desconhecidas na Europa, e procuram conhecer melhor as terapias locais, começando

então a procurar “substâncias medicamentosas aplicados pelos indígenas em certas

moléstias.” O médico em questão confessa que sinta

“(…) dificuldades acerca das segundas, já provenientes de pouco conhecida

que é a flora deste pais, já do mistério que usa o selvagem quando o estrangeiro

pretende entrar no conhecimento de suas práticas gentílicas’xxii.

Esta observação ilustra não só a falta de informação sobre fitoterapias entre os

profissionais de saúde, mas também as relações - quase inexistentes – entre estes e os

curandeiros, além de sugerir como os últimos viam os primeiros. A aparente recusa dos

curandeiros de partilhar conhecimentos sobre métodos curativos com médicos, é uma

constante nos relatórios médicos; mesmo assim, aparecem esporadicamente dados sobre

o modus operandi de curandeiros locais, principalmente os de origem Balanta e os

Mandinga. Algumas referências a certas patologias tropicais - por exemplo a doença do

sono e o seu tratamento - evidenciam observações feitas in loco. A primeira descrição

da chamada ‘operação da pedra’ feita por curandeiros ou murus Mandinga (der. do Port:

mouro; curandeiros de povos Islamizados como os Mandinga e Fula), sugere contactos

com praticantes locaisxxiii.

Somente nos anos setenta de oitocentos aparecem as primeiras referências acerca

de “substâncias medicamentosas aplicadas pelos indígenas”, como por ex. antídotos

aplicados contra o envenenamento por mordidas de serpentes. “O Balanta emprega

como tópico a casca reduzida a pó de um arbusto’; usando também a seguir “o decrelo

das folhas do Jatropha curcas L., sucedaneos da quina”, além de aplicar “a casca do

bissilón (Khaya Senegalensis), do qual se extrai um vinóleo que ele emprega em

subsituição do vinho da quina”. A casca do bissilón ou mogno africano como também

é conhecido, já fora referido pela primeira vez por um médico de origem caboverdiano e

director dos serviços em 1855 como base de preparados anti-inflammatóriosxxiv Um dos

seus sucessores, um conterrâneo, fala dos curandeiros ou djambakós Balanta que

costumam também preparar pós cicatrizantes para tratar úlceras fagedemicas com o pó

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de raiz do mambimba (Kr. mambumba, Annona Senegalensis), enquanto no caso de

resistência usavam o pó amarelo a que chamam ‘pó di massando’. Este médico também

menciona o azeite de arco extraído de sementes da Croton tiglium L. como substituto

para ‘os caústicos liquidos’ que os médicos europeus empregam, “com a vantagem de

dar pequeno dor”xxv.

Um facultativo da delegação da Junta de Saúde de Bissau cujo longo relatório

anual foi publicado no Boletim Oficial da Guiné em 1886, mostra como os remédios

aplicados para certas patologias já continham fármacos de origem botânica. Ao mesmo

tempo faz duras criticas ao (não) funcionamento dos serviços hospitalares nas vilas

devido a falta de condições, verbas, pessoal qualificado e material, que bem ilustra a

importância da enumeração de dados e receituários. Para este médico goês, que também

actuava como farmacêutico, o tratamento de febres biliosas hematúricas fazia-se

melhora através de uma mistura de um tártaro emético com ipecacuanha (Pschotria

ipecacuanha) em pó feita das folhas da planta, nativa do Brasil, em combinação com

sulfato ou valerianato de quinino (Costa, 1886: 176). É o primeiro médico colocado na

Guiné que reconhece, explicitamente, o valor fitoterapeutico da flora da região,

lamentando a falta de informação acerca as suas variadas aplicações.

“A flora guineense é riquíssima em plantas medicinais e convinha por isso e

para o progresso da ciência, que fosse ela detida e escrupulosamente estudada, não me

consta que de datas remotas até o presente se tenham escrito considerações mesmo

ligeiras sobre tão importante assunto”.

O seu principal relatório sobre o tema abrange um número “assaz limitado” de

espécies, somando 41 plantas com os seus nomes vernáculos e as suas propriedades,

sem contudo referir os seus nomes latinos (Costa, 1886: 183/4 & 187) xxvi. Na sua

maioria as entradas (ver quadros) se referem a raízes, cascas e folhas de arbustos e

árvores bastante conhecidos e de uso comum na África Ocidental usados tanto por

djambakós e murus como pela população em geralxxvii.. A selecção apresentada baseia-

se na recolha feita na Ilha de Bissau e na povoação de Geba durante um relativo curto

período de permanência nestes locais, sem contudo explicar como é que foi feito. Ele

exprime a esperança que os seus colegas “pela sua ilustração” e “pela sua longa

permanência” continuassem o seu estudo inicial da flora, que soa a uma velada

observação crítica. Dez anos antes, um dos seus antecessores, também delegado de

saúde, fez observações acerca dos medicamentos usados pelos “filhos do pais” ou filhos

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da terra (Kr: fidjus di tchon) usam, tais como o azeite de chavé, azeite de arco etc.,

admitindo porém que ainda não tinha uma opinião formada sobre a sua eficácia,

exceptuando resultados positivos da aplicação de azeite de arco no tratamento de úlceras

no hospital de Bissauxxviii.

Quadro 1: Lista de farmacopeia guineense compilada pelo facultativo Isaac Damasceno da Costa (1886)

Nome vernáculo Nome científico

Espécie Partes utilizadas

Propriedades Preparação

belenkufa (amomo) Afromomum granum paradisi e Afromomum subsericeum

arbusto folhas purgante maceração

bombatú arbusto raiz tratamento de edemas infusão

bombigentli trepadeira raiz tratamento de úlceras reduzida a pó

blongojuba Mand . - biloncojeba

Morinda geminata

árvore casca tratamento de hemorragias uterinas e lóquios

infusão

brai arbusto tratamento de cólicas associadas á menstruação.

maceração em água

sebola di lobu semelhante a cebola albarrã,

tratamento dos panarícios maceração

fidju di kunorga trepadeira raiz tuberculosa

tratamento da tuberculose linfática maceração

ianyancufae muito comum na zona de Geba

arbusto raiz e folhas purgante infusão

intulá trepadeira folhas tratamento de feridas e hemostático maceração

Jumusjungil trepadeira anti-reumático infusão

Jurtu Securidaca longipendulata

arbusto raiz e casca anti-inflamatório e anti-reumático

Jutú trepadeira tratamento de úlceras; afugentar as cobras pelo cheiro

maceração

Kabupa Mitragina stipulosa macrophyllia

arbusto casca purgante infusão

kana fistra (Fula: kunlati Pep: bangai) canafistula

Cassia sieberiana,

arbusto folhas tratamento de úlceras maceração

karta fedi ou palha alta gramínea folhas e caule febrífugo infusão

kola (cola amarga) Sterculiae acuminata

arbusto óleo das sementes

analgésico e anti-reumático tratamento de doenças respiratórias, incl. bronquites

mistura com vinho tinto e gema de ovo

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Quadro 1: Lista de farmacopeia guineense compilada pelo facultativo Isaac Damasceno da Costa (1886)

Nome vernáculo Nome científico

Espécie Partes utilizadas

Propriedades Preparação

madroño maçu Sarcocephalus latifolius.

casca tratamento de disenteria infusão

manducu di futseru árvore parecida com a cana de açúcar

anti-reumático

malgeta pretu (malagueta)

Xylopia Aethiopica

árvore sementes

analgésico, anti-reumático e tratamento da cólera tratamento de cólicas associadas a menstruação

óleo pó das sementes misturado com vinho tinto

mampufa Cyperus articulatus

arbusto raiz prevenção das dores do ventre e tratamento de endoparasitas em crianças

mastigada

Menemenebanta Mand. menebantam-ó

Pycnanthus angolensis

arbusto folhas anti—reumático infusão

nemplé arbusto raiz anti—reumático água proveniente da maceração

paja di arku (palha de arco)

arbusto Folhas sementes

tratamento de vermes intestinais tratamento de febres intermitentes

água proveniente da maceração óleo

paja santa (palha ou folha santa

Senna ou Cassia ocidentalis?

parecida com batata doce

folhas anti—reumático cozidas

paja pretu (palha preta) folhas parecidas com as de papaia

analgésicos e anti-inflamatório pasta

pó di arku (rícino) Alchornia cordifolia,

árvore folhas óleo das sementes

purgante tratamento de úlceras

infusão

pó di bissilón Khaya senegalensis

árvore casca febrífugo, anti-diarreico e tratamento da gonorreia

infusão / decocção

pó di butonke Fagara xantoliodes

raiz tratamento de temores e anemia misturado com óleo de palma

pó di faia Harungana madagascariensis

árvore casca purgante infusão

pó di goiaba Scheribera chevalierii

folhas antídoto de diferentes venenos infusão

pó di kabassera Adansonia digitata L ou baobab

folhas anti-inflamatório e tratamento da gonorreia; não refere a polpa da fruta que é usada para tratamento de disenteria e diarreia

decocção

pó di lite Antiaris africana árvore suco purgante misturado com água

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Quadro 1: Lista de farmacopeia guineense compilada pelo facultativo Isaac Damasceno da Costa (1886)

Nome vernáculo Nome científico

Espécie Partes utilizadas

Propriedades Preparação

pó meladu) casca folhas

tratamento de úlceras gargarejo para tratamento das úlceras da boca e de bronquites,

maceração infusão

pó di sabon (pau de sabão,

Vernónia colorata

arbusto folhas tratamento da gonorreia infusão

pó di sangi Ptorocarpus erinaceus

árvore folhas tratamento de dor de dentes água proveniente da maceração

pó di tara Raphia sp, que pertence a família das palmae

arbusto folhas tratamento de úlceras maceração

pó di veludu (Bal: N’bá, Bij: Epadu Fula: boémaio Mand: cossito

Dialium guineense Willd.

casca anti-emético e tratamento de cólera cozida

sapaté Leptadenia hastata

arbusto folhas tratamento da alienação mental maceração aplicadas na cabeça

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3. MUDANÇAS DE PARADIGMAS: A ADMINISTRAÇÃO COLONIAL E A ETNO-

BIOLÓGIA.

Uma outra fonte coeva que descreve alguns usos e costumes da terra e um dos

primeiros ensaios etnográficos sobre a Guiné, escrita por um padre católico de origem

guineense, confirma a capacidade dos curandeiros locais de tratar certas doenças

comuns, como “a anemia, a tísica pulmonar, e a alienação mental”, mas que não tinham

curas para a lepra, as bexigas e a varíola (Marques de Barros, 1882: 714). Porém, o

mesmo autor que dedicou uma parte significativa da sua obra a cosmologia dos povos

da região, insurge-se contra as actividades dos curandeiros ‘fetichistas’ ou djambakós,

tanto homens como mulheres, encarando-os como obstáculos a conversão e a acção

civilizadora das missões (Marques de Barros, 1868, em: Dias Vicente, 1992: 441). A

forte presença e influência dos sacerdotes e sacerdotizas - descritos como ‘horrorosos’ -

que dirigem ritos duvidosos, consultando ídolos ou chinas enquanto faziam “libações de

vinho ao demónio” é contrastada com a actividade benéfica dos curandeiros

islamizados, os murus. A eficácia da já referida ‘operação da pedra’ é confirmada pelo

mesmo autor guineense citando numerosos casos da sua própria família (Marques de

Barros, 1882: 714) e por outros médicos, mesmo que se questiona o uso de certas

‘ervas’ para tratar a ferida na fase pós-operatório.

Alias, o missionário não hesita em qualificar os Mandinga como um “dos povos

de toda a África mais civilizados e espertos.” (Marques de Barros, em Dias Vicente,

1992: 445). Um familiar e contemporâneo do mesmo afirma a sua admiração pelos

Mandinga descrevendo-os como “a parte mais distinta, mais rica e mais civilizada da

população (que) constitue por assim dizer a nobreza” (Frederico de Barros, 1885: 297).

A mesma atitude perpassa as obras, tanto publicadas como de arquivo, que reflectem

uma nítida distinção que lança um olhar nitidamente colonial sobre os povos da região.

No caso da Guiné, esta mudança de perspectiva não é de estranhar dado a aliança

política que se começa a desenhar nas últimas décadas de oitocentos entre as

autoridades portuguesas e os grupos islamizadas, sobretudo os Fula e Mandinga. As

referências particularmente negativas aos povos do litoral, como os Pepel, Felupe

(Djola), Balanta e Bijagó e as suas crendices ‘feiticistas’ nos ‘génios sobrenaturais’ ou

iran, formam um fio contínuo da literatura oito- e nove-centista. Para identificar as

causas de doença associada ao feitiço ou futis através dos seus contactos com o iran,

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estes “feitceiros” usam o “suco de plantas altamente tóxicas” que podia provocar a

morte da pessoa em questão, sendo acusados de ‘hipocrisia’ (Costa, 1886: 114)xxix.

Esta distinção dicotómica entre povos mais ou menos ‘civilizadas’ ou

‘primitivas’ também caracteriza a correspondência de médicos do Serviço de Saúde,

cujos ofícios estão fortemente impregnadas por noções ‘modernas’ de higiene, asseio e

salubridade. O chefe de serviço de delegação da capital, Bolama, aquando disserta sobre

os povos da região, sublinha que

“A denominação gentio lhes e devida em toda a sua extensão da palavra, são

pela maior parte idolatras, reconhecendo uns, por seu Deus, a iran, outro o Allah, estes

as serpentes, aquelas (outros) animais etc.: são selvagens e (completamente) bárbaros,

excepto a Mandinga, que em seus costumes mostra alguma educação.” xxx

Os Mandinga, por vestirem os seus bubús, por terem uma língua escrita, por não

beberem, por terem certos hábitos de higiene, por terem classes profissionais (como

comerciantes, ferreiros, tecelões, carpinteiros e tintureiros, etc.) e por terem tradições

imperiais na África Ocidental, são vistas como um povo ‘nobre’, ‘semi-civilizada’ e

disciplinada. Além disso, são junto com os Fulas aliados no campo de batalha contra os

povos ‘animistas’ e rebeldes do litoral. No que diz respeito as crenças ‘supersticiosas’

opina que

“Os habitantes da Guiné, e em especial de Bolama, são indivíduos sem

educação, bárbaros, e semi-selvagens, cheios de superstições, cujos costumes estão em

relação com o que são e por isso preferem recorrer nas doenças a seus Irans (deuses)

ou feiticeiros, do que a pessoas técnicas. Não há nada menos raro em Bolama que um

feiticeiro.” xxxi

A designação ‘feiticeiro’ é usada de forma indiscriminada para os curandeiros e

outros agentes como sacerdotes e outros ‘grandes’ que tem um papel decisivo na vida

diária das pessoas da ‘raça negra’ e lhes incutem ‘crenças supersticiosas’. Estas tomadas

de posição que se tornam cada vez mais peremptórios e dominantes no discurso oficial,

não inibem os autores de olhar para os Mandinga doutra forma, numa abordagem que

perpassa a literatura e documentação colonial até 1974. Os preceitos da etno-biologia

que já se fizeram notar nos meados do século XIX, tornaram-se regra nos relatos de

médicos, missionários e funcionários coloniais nas suas descrições das tradições e modo

de vida da população da região. Quanto à botânica, até a primeira década de novecentos

pouco se acrescentou ás tentativas anteriores de sistematizar a botânica da região e os

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seus fins fito-terapeuticas. Esta situação mudou somente após as guerras de ocupação

ou “pacificação” e a implantação de uma administração colonial na Guiné, a partir de

1915. Porém, os médicos e farmacêuticos que penetram o interior da colónia, o fazem

num meio que há pouco assistiu a um conflito violento onde as traumas minaram as

relações entre ‘civilizados’ e ‘indígenas’

A criação das chamadas ‘residências’ ou postos administrativos em 1908 foi o

primeiro passo para a implantação administrativa no interior cuja arrecadação do

imposto de palhota nas zonas ocupadas levou a uma agudização destas relações.

Dirigidos por militares e organizados como postos de comando, estes contudo se

tornaram uma nova fonte de informação sobre as tradições dos povos sob a sua tutela.

Apesar de fazer uma avaliação negativa destes devido a sua alegada “indolência inata”,

os residentes se mostram optimistas acerca das capacidades de povos Islamizados como

os Mandinga de se adaptarem a introdução de “novas culturas e sistemas modernos e

aperfeiçoados”.xxxii Respondendo a um questionário, alguns residentes acrescentam

alguns dados sobre o uso de plantas medicinais, como bissilón (febrifugo e doença de

peito), senquinó ou kombetu (ou karta fede; febrifugo), chá de serruá (febrifugo), e uma

erva a que os grumetes ou Kriston chamam são caetano, também febrifugo), belenkufa

(purgante) além do suco do mandjambó que é usado contra a dor de dentes. Alguns

residentes realçam o trabalho de curandeiros, como no caso dos Balanta, que se dedicam

ao cultivo de arroz alagado, e são descritos como ‘supersticiosos’ e ‘fetichistas’, que –

tal como relatado pelo facultativo quarenta anos antes - se recusam de partilhar os seus

conhecimentos:

“Todo o Balanta é curandeiro, tratando as doenças com beberagens de várias

folhas e raízes que se negam a dizer”.xxxiii

Os administradores civis que os sucedem a partir de 1917 e ocupam as sete

circunscrições divididas em postos – além dos dois concelhos urbanos de Bolama e

Bissau - não divergem desta abordagem ambivalente, enquanto continuam a privilegiar

os povos Islamizados, com quem mantém relações mais estreitas. Pelo contrário, os

povos ‘animistas’ ou ‘feiticistas’ como os Balanta, Felupe, Pepel e Bijagó são vistos

como comunidades potencialmente refractários as autoridades. A chamada ‘politica

indígena’ que se torna um instrumento emblemático da administração colonial a partir

dos anos 20, obriga-os administradores e chefes de posto de se tornarem um espécie de

‘administradores-etnólogos’, fortemente influenciados pela chamada Escola de

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Antropologia (Física) do Porto sob o égide de Mendes Correia. Porém, a sua

preparação rudimentar e o seu conhecimento existente sobre a maioria dos povos da

região continua ser muito limitado e baseado em fontes antigas e casuísticos até que se

realizar o primeiro inquérito etnográfico abrangente em 1946.

O primeiro projecto de recolher dados etnográficos data da criação dos Serviços

de Negócios Indígenas na Guiné em 1917, inclui somente uma pergunta sobre como

doenças são tratadas, sem contudo haver indícios de ter sido realizado. A primeira

tentativa de recolher informações etnográficas através do questionário que serviu de

base para um ‘inquérito sobre as raças da Guiné e seus caracteres étnicos’ de 1927, nos

primórdios do Estado Novo, foi posto em prática mas teve um percurso algo acidentado.

Num sub-capítulo sobre a ‘ciência’ que se dedica a prática da ‘medicina e a cirurgia’,

consta uma pergunta acerca do uso “dos feitiços como meio de cura ou preservativo de

doenças”.xxxiv Nos dois relatórios publicados, administradores de circunscrição não

parecem estar, regra geral, muito bem informados ou interessados nas artes da cura ou

fitoterapias. Por conseguinte costumem, sobretudo no caso dos povos ‘feiticistas’,

assumir a posição de estes “atribuíram a maioria das suas desgraças ao

descontentamento dos espíritos dos seus antepassados e também aos feiticeiros”. Por

exemplo no caso dos Balanta focam quase exclusivamente as doenças ditos “quentes”

causadas por ‘feiticeiros’, acabando por dedicar-se ao fenómeno mais exótico e

estereotipadoxxxv.

“Há grandes feitiçarias, dizendo eles que a mais usada é a de um número

elevado de feiticeiros que alta noite se reúnem convertendo-se em vários bichos, e é

nessa figura que vão a casa da pessoa que desejam mal. Essa pessoa a quem a alma é

tirada sem dar por isso, deve morrer logo que tenha qualquer doença. Outro feitiço

consiste em ir colocar um pau ou um bocado de uma penal a porta da pessoa a quem

pretendem atingir; mas é indispensável que os objectos sejam fornecidos pelo dono do

‘iran’”xxxvi.

Esta ênfase sobre a feitiçaria como a principal causa de quase todos os males e a

distinção entre patologias europeus e nativas, bastante comum na época, perpassa a

maioria dos relatórios de médicos e administradores, tanto no caso Português como

noutras colónias africanas da época. Algumas teorias focaram o processo de

‘desculturação’ a que povos nativos estavam sujeitos por causa da desintegração das

suas sociedades na era ‘moderna’xxxvii. Por conseguinte, inicialmente as listas de idioma

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‘étnica’ incluídos nos inquêritos etnográficos são parcas quanto a termos associados a

terapias, somente incluindo alguns termos genéricos como ‘bruxa’, ‘corpo’, ‘cadáver’,

‘curar’, ‘doente’, ‘dor’, ‘ferida’, ‘feitiço’, ‘remédio’, ‘sangue’ e ‘veneno’, sem prestar

atenção a patologias ou curas especificas. O pouco que se reporta aos métodos curativos

de curandeiros, denota uma forte ambivalência sendo uma mistura pouco sistematizada

de curiosidades circunstanciais e uma descrença quanto a capacidade nativa para

diagnose e cura. No caso dos Manjacos da Costa de Baixo a medicina praticada é

caracterizada como ‘charlatanismo’, por invocar ‘o poder sobrenatural, enquanto o

administrador reconhece que “por outro lado meios de tratamento que factos de todos

os dias denotam de resultado”.

“A medicina cinge-se a aplicação de compostos vegetais que só eles conhecem.

Garantem pessoas que um napena (ou curandeiro) do regulado de Caio possue remédio

contra a mordedura das cobras venenosas, cuja cura presenciaram numa mulher

picada por um daqueles reptis, e já quando se encontrava em estado de coma. […]

Informam-me que essa mulher ainda vive.”xxxviii

Sem nunca referir a espécie, o tratamento é descrito em segunda ou terceira mão,

consistindo no mastigar pelo curandeiro “de folhas de uma planta posta sobre o local

da picada que antes fizera sangrar a golpes de navalha”, cuja aplicação é repetida

várias vezes seguidas, até que a maceração manter a sua cor clorofila. O óleo de

palmeira é referido como um grande ‘medicamento’ com propriedades anti-

inflamatórias e anticépticas, até o ponto de

‘(…) substituirem pensos e aplicações medicamentosas feitas nas ambulâncias

de sáude, por unturas de azeite de palma e quase sempre com rápidas resultados de

cura”.xxxix

A observação in loco de assistência a emergências pelo pessoal administrativo

contribuiu nalguns casos seguramente para uma apreciação mais positiva, por ex. no que

diz respeito a capacidade de curandeiros de fazer pontos de sutura, aproveitando como

fio “a nervura adelgaçada das folhas de palmeira cuja ponta rija e aguçada serve

também de agulha”. É de notar de o autor desta curta etnografia manjaca ter observado

a grande capacidade dos nativos de suportar as dores causados por ferimentos, suturas,

curativos e talamento de fracturas, que o leva a concluir que tinham uma “resistência

anormal ou por “terem uma sensibilidade física enfraquecida”.xl

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No novo questionário etnográfico publicado em 1934, muito mais ampla que os

anteriores, dedica-se um sub-capítulo inteiro a questões de ‘saúde e higiene’, com o

objectivo de fazer um inventário das patologias mais comuns e os métodos curativos

nativos, além de recolher dados sobre as suas superstições e atitudes perante os serviços

de saúde da colónia. O questionário cujo preenchimento estava a cargo dos

administradores e chefes de posto de cada circunscrição, incluiu perguntas sobre a

actividade de curandeiros, como se distinguiram do resto da população, como eram

remunerados, o seu uso de plantas medicinais, a cirurgia, e se empregavam “(…)

apenas meios supersticiosos” xli

As primeiras publicações baseadas nos resultados do inquérito, parecem a

primeira vista lançar um olhar semelhante a aquela que predominou desde o começo das

campanhas militares, se limitando quase exclusivamente ao exotismo da suposta

‘feitiçaria’ e a referências muitas vezes passageira a fitoterapias. Porém, se fazem notar

algumas excepções a regra que mostram uma maior atençaõ aos povos ‘animistas’ do

litoral. Os djambakós são de vez em quando retratados como sacerdotes por ex. no caso

dos Felupe ou como curandeiros que se dedicam exclusivamente ao exercício da

medicina, por ex. entre os Manjaco (os napena) descrito como “senhores dos segredos

do uso de várias plantas.”xlii No caso dos Pepel, referem-se certas plantas como a

palha santa (Kr: paja santa), empregada como emoliente; a canafistula (Kr: kana fistra)

como balsâmico e hemostático; a raiz macerada do kuntesse (Cryptolepis

sanguinolenta) como cicatrizante; o buku (buço; Combretum micrantum) como

diurético; e o mampataz (Parinari excelsa) como anticonceptivo e abortivo. Isto,

enquanto no caso dos Fula a actividade do murádu (os curandeiros Islamizados) revela

“o seu largo uso de plantas e de ervas” além de referir o emprego de um pó “resultante

da redução da casca de certa árvore com que polvilham a cabeça das pessoas sob a

acção de feitiçaria” (Landerset Simões, 1935: 107). No caso dos Balanta, que foram os

primeiros a merecer a atenção de médicos nos meados de oitocentos, e cuja arte de curar

já foi sumariamente referida no inquérito anterior de 1927 agora tem direito a um

tratamento mais amplo.

“[Os Balanta] praticam a cirurgia e a medicina por forma notável. Chegam a

realizar operações de alta cirurgia em que substituem partes de osso por pedaços de

uma madeira […] e aplicam ventosas com perícia usando chifres de boi […] e curam a

varíola metendo o doente numa cova altamente aquecida “ (Ibidem: 127)

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No que diz respeito a etno-botânica, os Balanta empregam várias plantas como

por ex. a canafistula (Bal: senguelé; Kr: kana fistra; Cassia sieberiana), pelas suas

propriedades depurativas e uma outra espécie chamada ‘firab’me’ pelos seus efeitos

purgativos. A sua reputação é tal que os curandeiros Balanta também já foram

procurados por ‘civilizados e assimilados’ para aliviar os seus males (Ibidem: 127). O

ponto de exclamação é do autor, ele próprio administrador na época, que estava bem

consciente dos potenciais implicações destas visitas, sobretudo no caso dos assimilados

que podiam perder o seu estatuto devido ao regresso as tradições nativas. No caso de

algumas comunidades a existência de curandeiros é quase apagado pelo universo

predilecto do feitiço e dos iran, como no caso dos feiticeiros Nalú (babêsse) e a dança

iniciática do Machol (Ibid: 137-9). Mesmo que reconhece o facto dos Nalú conhecerem

“as propriedades das plantas e delas se utilize”, o autor se limite ao uso mais apelativo

dos venenos mortais (Nalú; mêrafe) que se servia em caso de guerra entre sugestões de

um passado antropófago acompanhado de “rituais estranhos e diabólicas” (Ibid:

139)xliii. Por fim, entre os insulares Bijagó os curandeiros (Bij: odiagué) são muito

considerados por utilizar “com mestria as propriedades medicinais de certas plantas”,

enquanto “pratica a cirurgia, aplica ventosas […] e prepara cataplasmas com a pasta

de um fruto que denomina omango”.

5: INVENTARIAR FITOTERAPIAS: O CASO DA MEDICINA BIJAGÓ:

O período pós Segunda Guerra terá um forte impacto sobre a maneira como era

encarada tanto a ‘medicina moderna’ como a ‘medicina gentílica’ Quanto a primeira, a

profissão médica “a criação de um espírito sanitário novo determinando o interesse

geral de todos, por uma empresa colectiva de saneamento geral”.xliv Por encarar a

assistência sanitária como um acto colectivo em vez de individual atribuiu-se um novo

papel ao médico nos trópicos, nomeadamente como “agente social mais de que de

propriamente um clínico […] indo ocupar o lugar que lhe é adstrito nas outras

colónias, o de agente de penetração e persuasão”xlv. A tentativa de aproximar os

médicos aos seus potenciais utentes nativos, procede como a construção nos anos trinta

de tabankas enfermarias na Guiné. Estas foram baseadas nas experiências com as

enfermarias- senzalas em Angola e as palhota-enfermarias em Mozambique que já as

experimentou nos anos 20xlvi. Supervisionadas por médicos que tinham servido em

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outras colónias portuguesas, a criação destas novas infra-estuturas também teve razões

de ordem económico, a seguir a crise mundial de 1929. Estas enfermarias que imitavam

as palhotas das aldeias africanas aparecem assim como uma solução expediente mas

também a uma tentativa de aproximação dos cuidados primários de saúde às

populações. Porém, é de notar que o discurso oficial que as apresentava como um

modelo para atrair os nativos a medicina ‘moderna’, também as viu como uma barreira

contra a acção dos curandeiros. O governador da Guiné de então, um fiel seguidor do

Estado Novo, enveredou por um discurso optimista dizendo que estas enfermarias:

“[…] que prestam todo os serviços de enfermagem gratuitos ao indígena, que

vendo-se curados contribuem grandemente para voluntariamente se apresentarem a

receber curativo” xlvii.

Nesta óptica “muitos preferem o médico aos mesinhos que lhes ministram os

mouros”, para neste modo conseguir “salvar vidas de indígenas que estão obcecados

por um fatalismo retrógado”. Nesta filosofia “[…] os seus antigos processos de

curativos ministrados pelos seus “mouros” e “curandeiros” eram vistos como sendo

“sempre perniciosos”. Longe de ser entendido como uma aproximação entre as duas

medicinas, as tabankas enfermarias a primeira dos quais fora construída em 1933,

simbolizavam o combate contra as superstições e as más práticas dos “charlatães”

(Ibidem).

A transformação destas tabankas-enfermarias em 1945 no principal palco da

assistência prestada pela Missão do Combate a Doença do Sono, tutelada pelo Instituto

de Medicina Tropical em Lisboa, serviu para aumentar a sua visibilidade e

popularização, atraindo um número cada vez maior de doentes, mais de 300 mil 1952.

Naquela altura, catorze tabankas-enfermarias já estavam operacionais com uma

capacidade de hospitalizar 1000 doentes. Ainda nos anos 40 um relatório de inspecção

louva o trabalho desenvolvido pela Missão “por ser na sua pequena e reduzida verba

[…] a melhor organização de estudo e trabalho que encontrei.”xlviii Ao mesmo tempo,

o inspector constata que os próprios serviços de saúde organizadas em delegações

sanitárias eram muito deficientes, sobretudo no interior onde muitos postos sanitários

nem sequer tinham médicos ou enfermeiros mas meros serventes, cujas intervenções

eram qualificadas como “mais prejudiciais que benéficas”.

Uma das zonas mais remotas e menos servidos por estas enfermarias eram as

Ilhas Bijagós, cuja população continuava a fiar quase exclusivamente nos seus próprios

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curandeirosxlix. Curiosamente foram precisamente os Bijagós, vistos como “um dos

povos menos civilizados da colónia” que se tinham mostrado muito relutante de aceitar

a hegemonia colonial, cuja arte de curar foi reconhecida numa comunicação feita na

ocasião da Conferência Internacional dos Africanistas Ocidentais que teve lugar em

Bissau em 1947l. O autor, o médico-antropólogo, António de Almeida, era ao mesmo

tempo o inspector que produziu o relatório de inspecção acima referido que lhe permitiu

conhecer melhor o território, a administração e os seus habitantes.

Uma das primeiras visitas sanitárias feitas as Ilhas Bijagós nos fins do anos vinte

ainda é dominado pelo contexto omnipresente do feitiço ou futis que se acaba por

sobrepor a uma avaliação do trabalho preventivo e/ou curativo dos curandeiros.

“O Bijagó tem os seus médicos, geralmente mulheres, mas a terapêutica é

rudimentar e muito incompleta. Não lhes cura certas doenças, nem mesmo pretende

curá-las. A influência dos deuses é grande na cura, como a dos feiticeiros o foi na

patogenia. Não tentam curar um doente que um feiticeiro condenou. Doentes

repelentes, miseráveis, nos passaram ante os olhos, vítimas inermes do poder

sobrenatural do feitiço. Aí daquele que as malhas do feiticeiro prenderam e

condenaram a uma doença perpétua; expiará, resignado, toda a vida, o facto

pecaminoso que fez dele um farrapo mórbido”li.

Num contraponto a esta abordagem, o António de Almeida cuja comunicação é

o primeiro estudo antropológico sobre a fitoterapia guineense, apresenta o seu estudo

como sendo “novo”, tanto “no método como nas finalidades” e o segundo crê ser “o

primeiro da sua índole” que obedece a um “plano de investigação”lii. O “estudo

completo da medicina popular” exigia na sua opinião a “colaboração dos clínicos, e

pessoal de enfermagem das colónias portuguesas e do concurso dos seus funcionários

administrativos”. Este estudo teria de ser feito em prol do “progresso da ciência, do

bem-estar dos naturais e proveito dos facultativos recém-colocados nas terras

ultramarinas que estavam menos familiarizados com a pratica da vida profissional no

interior”liii. Aqui perpassa claramente uma noção bem diferente daquele que tanto

marcou o período das campanhas militares e das primeiras décadas da actuação da

administração colonial, profundamente influenciada pelo conceito da soberania politica

e a antropologia físicaliv. Alias, o autor se posiciona claramente como defensor da

‘antropologia cultural’ que se enquadra dentro da mesma esteira ‘modernista’ do

Inquérito Etnográfico de 1946.

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O ensaio procede a um inventário das patologias, a etiologia e a farmacologia

Bijagó, fornecendo receituários para a sua administração, realçando a colaboração de

antigos governadores, administradores, chefes de posto e facultativos. Não desvaloriza

os conceitos “animistas-feiticistas” e questões “mágico-religiosas” dos Bijagós que são

responsabilizadas por “toda uma casta de morbos que possa possui-los”, sobretudo

associados a presença de cobras venenosas nas ilhas e as lendas existentes acerca da sua

acção – que alias é partilhada por muitos povos da África sub-Saariana (Almeida, 1952:

255). Contudo, tal como os seus antecessores, o autor sublinha o ‘segredo profissional’

mantido pelos curandeiros.

“Os brancos da Guiné desconhecem as qualidades terapêuticas de muitas

espécies florais, que os curandeiros, os ‘grandes’ e os velhos guardam no maior

segredo, tão eficazes por vezes, elas se revelam me casos clínicos de prognostico

reservado.” (Ibidem: 257).

Não obstante estes segredos, o autor produz um inventário da farmacopeia

Bijagó, enumerando 30 remédios naturais ou botânicas com os nomes vernáculos (em

Bijagó mas também em Kriol) das plantas (ver quadro 2 abaixo). Fundamental para a

sua percepção destes contextos culturais é a distinção entre doenças frios (medicina) e

quentes (feitiçaria) que está explícito neste discurso, e que é fundamental na percepção

africana – e guineense – e para uma melhor contextualização das patologias e das

terapias aplicadas.

“Repartem-se em dois grupos os medicamentos (unukañe) usados pelos

Bijagós: remédios materiais e remédios espirituais. Entre os primeiros […] contam-se

as substâncias vegetais mais comummente empregados, sob a forma de infusão,

maceração, poção, afusão, loção, fricção, emplastro […]”, regra geral misturadas com

água ou óleo de palma (Ibid: 257). As ditas ‘mezinhas’ como são chamadas em Kriol (o

Crioulo da Guiné), não são somente aplicadas pelos odjaki ou curandeiros, mas também

pelos grandes e os velhos “que os guardam no maior segredo”. O autor conclui que

além da fitoterapia, os Bijagó também usam ‘remédios espirituais’ baseadas em orações

(rónias em Kriol) e sacrifícios ás ‘entidades divinas’ para obter protecção e curar-se que

varia tal como as ‘mezinhas’ de ilha para ilha (Ibidem: 266/7). Enquanto os odjaki são

sempre do sexo masculino, as okinka ou as sacerdotizas conhecedoras também actuam

com curandeiros.Porém, o autor identifica casos pontuais em que pessoas praticavam

tanto a medicina curativa do facultativo como a função de sacerdote, mantendo que

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“sacerdotes são sempre curandeiros, jamais se verificando o inverso” (Almeida, 1947:

289)]. Nos quadros que seguem são enumerados as plantas medicinais que constam no

seu relatório incluindo o seu receituário, completados com os nomes científicos e os

vernáculos em Bijagó e/ou Kriollv.

Quadro 2: Lista de farmacopeia bijagó compilada pelo médico-antropólogo António de Almeida (1947)

Nome vernáculo Nome científico Espécie Partes utilizadas Propriedades Preparação

Banana-sancho Uvaria chamae P arbusto Casca folhas

tratamento de ténia, helmintíases tratamento de bronquite; febrifugo.

macerada e seca, em forma de pó misturado com leite infusão

Botango-erañá Fagara xanthoxyloides raiz analgésico sobretudo no caso de dores cervicais

maceração

Buku Combretum micranthum G folhas diurético; tratamento de da biliosa hemoglobinúrica

Duocélio Lippia citriodora,(P: limonete) folhas tratamento de diarreias em crianças.

aplicadas sobre a zona abdominal afectada

Ébèdó (Mankara bijagó)

Voandzeia subterranea arbusto folhas tratamento das cefaleias aplicadas na cabeça e seguras com pano

Goiaba di mato goiaba Euclinia longiflora folhas e flores tratamento de diarreias sanguíneas em adultos

Jéjan-kufai arbusto folhas purgante infusão em água misturado com sal

Kabailí folhas laxante

Kàdinùou videira purgante

Kadjana suco do fruto laxante

Kápó Elaeis guineensis folha da palmeira para tratar tosse e dores do peito (tal como o pó di bissilón

amarrada em volta do tórax

Kamundo-kokôto Acacia albida árvore casca folha

tratamento de mordeduras de cobras

reduzida a pó aplicadas nas zonas afectadas

Kòmandonge, komandiuke ou mandiakó (Orango) ou mandioka (Kr.)

Manihot esculenta C Manihot glaziovii

folhas tratamento de inflamações dos olhos, conjuntivite

água da maceração

Madí-pili árvore frutos vermelhos tratamento de doenças oftálmicas

folhas lançadas dentro de água e esfregadas nos olhos

Malgeta (Kr: pé di malgeta (malagueta)

Capsicum frutescens tratamento de úlceras leprosas

aplicada nas úlceras previamente incisadas com uma faca através de fricção

Massêti (Bij: Ebude)

Terminália macrocoptera arbusto folhas secas febrífugo (paludismo) e tratamento de dores corpo

Infusão, regra geral misturado com buku

Cachamiñam Sarcocephalus latifolius árvore raiz Tratamento de dores do partida em pedaços e

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Quadro 2: Lista de farmacopeia bijagó compilada pelo médico-antropólogo António de Almeida (1947)

Nome vernáculo Nome científico Espécie Partes utilizadas Propriedades Preparação Kr: Madroño

abdómen e do foro renal seca (em forma de infusão)

Nassanó ou nòmó-kòkátè (Ilha de Uno) Kr: paja santa ou palha santa

Senna ou Cassia ocidentalis planta herbácea folhas tratamento de oftalmias, catarros, febres, e inflamações da garganta, diarreias infantis, cefalalgias e como analgésico geral / de largo espectro e anti-inflamatório, e também como febrifugo através de fricção

infusão

Náxanon Sida acuta folhas febrifugo infantil água da maceração

Nèkená, nékènó (Kr: pau pretu ou pau preto

Dalbergia latifolia casca e folhas analgésico

Nopôroto (Kr: kunô di caçur Cnestis ferruginae folhas tratamento de cefaleias

Okanañe-okoto folhas casca

sudoríferos tratamento de dores menstruais

infusão

Okodu (Kr: bissilón Khaya Senegalensis árvore casca Tratamento de orquites maceração

Oprègará (Ilhas de Caravela & Caraxe) Kr. kana fistra

Cassia sieberiana arbusto folhas analgésico maceração

Otampe (Kr: tagara P: tagarra

Alstoia congensis casca tratamento de gonorreia maceração

Pó di kana (cana de bambú Arundo donax casca tratamento de bubas maceração

Pó di limón (limoeiro Citrus limonum peq. árvore folhas sumo do fruto

tratamento de doenças oftálmicas tratamento de boubas

sumo de limão misturado com a massa fervente das raspas de cana de bambu e lama do mar

Umparanda (papaia) Carica papaya árvore raiz tratamento gonorreia

Uñande casca fumigação maceração

Untunkó (untongue) Bridelia micrantha arbusto folhas. tratamento cefaleias infusão

Urutó (urudo Neocarya macrophilia árvore casca purgante mascada ou chupada

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CONCLUSÃO:

O processo acima descrito de mudanças na óptica tanto de médicos como de

administradores e antropólogos e as suas consequências em termos de conhecimentos de

fito-terapias e a sua difusão, mostra que preceitos geo-climatologicas, etno-biologicas e

médicas mas também politicas e administrativas tiveram um impacto assinalável sobre

as práticas e atitudes relativa a farmacopeia nativa. As três fases aqui delineadas,

passaram pelos primeiros contactos furtivos entre médicos e agentes locais na sequência

da criação dos serviços de saúde nos meados do século XIX; pelas guerras de ocupação

e a implantação da administração colonial nas primeiras décadas de novecentos e a

introdução da medicina dita moderna, e pela fase pós-1945 quando se inicia o estudo

aprofundado das sociedades africanas e a etno-botânica se começa a afirmar como uma

área complementar de estudo. Enquanto a primeira é fortemente impregnada pelas

tentativas de exploração e reconhecimento do território ainda sob o controlo africano, a

segunda ficou marcada pela afirmação da soberania e a organização do domínio

colonial, e a imposição de regras e conceitos metropolitanos. É na última fase que se

fazem sentir os efeitos da mudança tanto nas ciências médicas como sociais, quando a

questão da saúde começa a ser considerada como um serviço público e se torna uma

parte integral dos inquéritos etnográficos.

Tanto médicos e farmacêuticos, como funcionários coloniais e metropolitanos

produzem progressivamente dados novos sobre regiões e povos quase desconhecidos,

não sem exibir uma certa ambivalência perante costumes que chocam com certos

(pre)conceitos. A desconfiança e até reticência mostrada em relação aos contactos com

agentes locais, com destaque para os curandeiros, parece ter sido mútua, e é

repetidamente invocada pelos funcionários como razão pela falta de informação.

Também se nota uma tendência de focar nos aspectos mais exóticos, tanto da natureza

tropical como da percepção das noções mágico-religiosas difundidas entre as

populações nativas. Estas eram classificadas segundo distinções associadas às

diferenças hipotéticas entre os seus níveis de civilização, dos povos ‘Islamizados’ e

‘fetichistas’, que por sua vez foram fortemente influenciadas pelas alianças entre as

autoridades coloniais e estas últimas que se desenharam nos fins de oitocentos e o início

do século XX durante as campanhas militares de ocupação.

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Contudo houve excepções a regra que se destacaram pelas suas abordagens

inovadoras e arrojadas, como as listas de espécies botânicas e as suas aplicações

terapêuticas elaboradas em épocas diferentes pelos médicos e antropólogos acima

citados. As suas contribuições denotam uma certa abertura a recolha e análise de dados

no terreno, fornecendo algumas pistas valiosas acerca de patologias e fitoterapias locais.

Em ambos os casos a atenção especial dada a farmacopeia africana se insere numa

perspectiva ampla e pluralista perante a cultura das comunidades em questão além de

um interesse profissional e pessoal pela fitoterapia. Se bem que os seus autores não

revelam os métodos de investigação, o uso de nomes vernáculos para as espécies em

questão e as receitas das mezinhas denota um intercâmbio com intermediários e

informantes locais com conhecimento de causa.. Para tal a conhecimento do Kriol (o

Crioulo da Guiné), línguas étnicas ou os serviços de intérpretes eram imprescindíveis.

No caso de facultativos caboverdianos estes contactos eram facilitados pela sua língua

materna, o Crioulo das Ilhas algo parecido - sobretudo no caso do dialecto de Santiago -

com a sua congénere guineense. O médico goês autor da primeira lista de preparações

fitoterapeuticas que tal como os seus colegas do arquipélago provavelmente se sentia

mais a vontade num clima tropical, contorna esta questão reproduzindo simplesmente

nomes vernáculos sem adiantar mais sobre o seu significado, a difusão das espécies

botânicas ou os tratamentos seguidas na região ou até como se inseriam no contexto da

medicina nativa, escusando-se de “proceder a classificação científica” (Da Costa, 1886:

183). O médico-antropólogo que se inteirou da farmacologia Bijagó, reconhece estes

problemas quando refere ao “dialecto muito difícil de aprender e variável na fonética e

nas palavras consoante as Ilhas”, que obstaram a “colheita de elementos interpretativos

ou denunciadores de conceitos” dos nativos sobre o corpo e a saúde humanalvi. Porém

ao contrário do médico oitocentista, o antropólogo também fornece uma listagem do das

patologias comuns, do idioma corporal na língua Bijagó, da clínica cirúrgica da

obstétrica da higiene e profilaxia até sobre a deontologia profissional dos curandeiros.

Além do Inquérito Etnográfico de 1946, as missões católicas, e sobretudo

missionários Italianos, recolheram dados sobre as práticas dos curandeiros (por ex.

Bijagó, Manjaco, Mancanhe Balanta, Fula, Felupe), de que resultaram alguns textos de

valor científicolvii. A investigação na senda da chamada “etno-medicina” teve também o

intuito de aprofundar o conhecimento do “pensamento nativo” e chamar atenção a sua

“perspicácia e inteligência” relativo a etiologia e a arte curativa popular. Outros

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investigadores, por ex. agrónomos, recolheram nomes vernáculos da rica flora

guineense numa tentativa de actualizar e sistematizar a etno-botânica, enquanto

disponibilizaram uma taxonomia científica das espécieslviii. A eclosão das guerras

ultramarinas nos princípios dos anos 60 do século passado interrompeu novamente um

processo de uma certa aproximação entre a ciência médica dita ‘moderna’ e ‘africana’

que só seria retomada nos anos noventa com os trabalhos de antropólogos, médicos e

botânicos, por ex. a investigação desenvolvida pela equipa do IICT. Todos os

intervenientes nestes processos complexos de recolha, taxonomia e identificação do seu

uso, sublinharam o facto de a flora guineense ser ‘riquissima em plantas medicinais’

que merecem um estudo aprofundado em prol do “progresso da ciência” e para

aproveitar o valor terapêutico destes remédios para os cuidados primários de saúde às

populações.

i Instituto de Investigação Cientifica Tropical, IICT, Lisboa, com apoio da Fundação para a Ciência e para a Tecnologia (FCT). ii Cartas do Ultramar, Bolama, Outubro de 1888; em As Colónias Portuguezas, ?. iii Ver Coffinières de Nordeck Voyage aux Pays dês Bagas et du Rio Nuñez, in: Le Tour du Monde, 51, 1886: 273-304, e também H. Brosselard, Voyage dans la Sénégambie et la Guinée Portugaise, in: Le Tour du Monde, 57, 1889: 97-144. iv Ver por ex. Coffinères de Nordeck, Voyage au Pays du Baga e du Rio Nunez, in: Le Tour du Monde, 51, 1886: 273-304 e H. Brosselard, Voyage dans la Sénégambie et la Guinée Portugaise, in: Le Tour du Monde, 57, 1889: 97-144. v Teixeira de Aragão, Cabo Verde, 23-6-1890, in: As Colónias Portuguezas, 3ª série, VIII, 25-7-1890. vi Veja por ex. o relato de um zoólogo alemão das suas viagens pela zona Sul da Guiné-Bissau actual: Cornelius Doelter, Ueber die Capverden nach dem Rio Grande und Futah-Djallon (Leipzig: Paul Frohberg, 1884). vii Ernesto de Vasconcellos, Guiné Portuguesa: estudo elementar de geografia física, económica e politica, Lisboa¨Tip. Da Cooperativa Militar, 1917: 53/4. viii António José Sacramento Monteiro, Relatório Agrónomico do Distrito da Guiné Portuguesa, 1892-1893, in: Boletim Oficial da Guiné Portuguesa, 20, 19-5-1894 ix António José Sacramento Monteiro, Relatório Agrónomico do Distrito da Guiné Portuguesa, 1892-1893, in: Boletim Oficial da Guiné Portuguesa, 20, 19-5-1894 x Esta expressão foi pela primeira vez usada por um diplomata português ao serviço da Comissão Mixta de Sierra Leone para verificar os acordos entre Portugal e o Reino Unido para a abolição do tráfico de escravos ao Norte do equador; ver Figanière de Mourão, . J. César Figanière e Mourão, Descrição de Serra Leoa e Seus Contornos (...)’, (Lisboa, Imp. João Baptista Morando, 1822: 38). xi Of. 253, Francisco Frederico Hopffer, Director da Delegação, Junta de Saúde, Praia, 23-4-1858; AHU, CV, Serviços de Saúde, Cx. 130. xii Januário Correia de Almeida, Um Mez na Guiné, Typ. Universal, 1859: 14/5. xiii Sobre estas campanhas e os serviços de saúde, ver Philip J. Havik, Boticas e Beberagens: a criação dos Serviços de Saúde e a colonização da Guiné, in: Africana Studia, 10, 2007: 235-70. xiv Ver António Augusto de Santa Clara, Serviço de Saúde da província de Cabo Verde, Delegacia da Junta de Saúde Publica, Bissau, 20-2-1871, AHU, Cabo Verde, Cx. 132. xv Relatório sobre a epidemia de cholera morbus que no ano de 1869 grassou no distrito da Senegambia Portuguesa, António Augusto de Santa Clara, cirurgião de 2a classe do Quadro de Saúde da Província de Cabo Verde, Bissau, Fevereiro 1877; AHU, Cabo Verde, Serviços de Saúde, Cx. 132. xvi Na altura da apresentação da comunicação que servia de base a presente ensaio, outra epidemia de cólera assolava a Guiné, sendo recorrente nesta região mas também noutras zonas da África sub-Saariana

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xvii Ibidem (ver nota 13). Nesta região do Rio Grande se cultivava naquela época a mankara ou amendoins para exportação nas chamadas pontas, parcelas de terra a beira-rio desde os anos cinquenta de oitocentos. xviii Custódio Duarte, director do Serviço de Saúde, para o presidente do Conselho de Saúde Naval e do Ultramar em Lisboa, Praia, 6-6-1868; AHU, Cabo Verde, Serviços de Saúde, P. 132. xix Custódio Duarte, (op. cit.?) Director do Serviço de Saúde, para o presidente do Conselho de Saúde Naval e do Ultramar em Lisboa, Junta de Saúde, Praia, 6-6-1868; AHU, Cabo Verde, Serviços de Saúde, P. 132. xx Sobre as fomes nas Ilhas de Cabo Verde, ver António Carreira, Cabo Verde: aspectos sociais, secas e fomes do século XX, Lisboa: Ulmeiro, 1984. xxi António Augusto de Santa Clara, Relatório do Serviço de Saúde da Senegambia Portuguesa, dependência de Província de Cabo Verde, Bissau, Janeiro 1872; AHU, Cabo Verde, Serviços de Saúde, P. 132. xxii Circular (Ibidem). xxiii Ver o uso de termos locais (sinó djangali em Mandinga; ‘númú em Crioulo de Bissau para as glândulas inchadas), até reproduzir o nome dado a intervenção em Mandinga (bero abondim a cam oló, ou ‘tirar a pedra da garganta’). ] xxiv Francisco Frederico Hopffer, Bissau, 2-4-1855, para o físico-mor da Província; AHU, Cabo Verde, Serviços de Saúde, P. 130. Infusões de folhas e pós da casca da Khaya senegalensis foram em tempos recentes clinicamente testados, confirmando a sua apliçação como remédios para tratar disenteria e tecidos cancerígenas (refs?) xxv xxv António Augusto de Santa Clara, Relatório do Serviço de Saúde da Senegambia Portuguesa dependência de Província de Cabo Verde, Bissau, Janeiro 1872; AHU, Cabo Verde, Serviços de Saúde, P. 132. xxvi De algumas espécies cujas nomes vernáculos (em Crioulo) constam no relatório não se conseguiu verificar os nomes científicos, q.d. no caso bombygently, fidju di kunorga, intulá, nemplé, brai, cebola do lobo, jumusjungil, menemenebanta, jutú,e ianyancufae. xxvii Fontes de referência e comparação para identificação das espécies: Pe. P.A. Biasutti Vokabulari Kriol-Purtugis, Bubaque: Missão Católica, 1987; Quintino Bancessi, Identificação de Descricção de Leguminosas e Gramíneas da Guiné Bissau, Bissau: INEP, 1991; e M.A. Diniz & E.S. Martins, Nomes Vernáculos de Plantas da Guiné Bissau: I Contribuição, in: Garcia de Orta, Série Botânica, Lisboa, 15, 1, 2002: 17-53. xxviii Domingos Joaquim de Menezes, delegado de Saúde, Relatório Anual do Serviço de Saúde Publica em Bolama no ano de 1872, Bolama, 6-3-1873; AHU, Cabo Verde, Serviços de Saúde, P. 133. xxix O juramento com água vermelha, feita com a casca de mancône (Erithropleum guineensis), para identificar feiticeiros, é já referido em relatos de viagens do século XVI, por exemplo no ‘Tratado Breve’ de André Álvares de Almada (1594). xxx Domingos Joaquim de Menezes, delegado de Saúde, Relatório Anual do Serviço de Saúde Publica em Bolama no ano de 1872, Bolama, 6-3-1873; AHU, Cabo Verde, Serviços de Saúde, P. 133. xxxi Ibidem, Domingos Joaquim de Menezes, P. 133. xxxii José António Castro Fernandes, Relatório da Residência de Buba,in: Boletim Oficial da Guiné Portuguesa, 2, 30-9-1911. xxxiii Sebastião Luís de Miranda Pereira, Relatório, Posto Militar de Goly (Porto Gole), 6-2-1910; Boletim Oficial da Guiné Portuguesa, 27-4-1912 (Anexo 1). xxxivQuestionário de inquérito sobre as raças da Guiné e os seus caracteres étnicos, Boletim Oficial da Guiné Portuguesa, 17, 26-3-1927. Apesar de se ter publicado um questionário em 1917, não se encontrou até agora vestígio algum das respostas nos arquivos. xxxv Sobre estas abordagens antropológicas das sociedades africanas que se centraram nas várias formas de feitiçaria, ver E.E. Evans Pritchard Witchcraft, Oracles and Magic among the Azande (Oxford: Oxford University Press, 1937). xxxvi Alberto Gomes Pimentel, Resposta ao Questionário de inquérito sobre as raças da Guiné e seus caracteres étnicos […] acerca da Circunscrição Civil de Mansoa’, Julho 1927; Boletim Oficial da Guiné Portuguesa, 50, 10-12-1927: . xxxvii Sobre esta corrente de pensamento, ver Megan Vaughn, Curing their Ills: colonial power and African illness (Londres: Polity Press, 1991): 100-28. . xxxviii Vítor Hugo de Menezes, Resposta ao Questionário de inquérito sobre as raças da Guiné e seus caracteres étnicos […] acerca da Circunscrição Civil de Costa de Baixo, 10-9-1927; Boletim Oficial da Guiné Portuguesa, 3, 21-1-1928.

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xxxix Vítor Hugo de Menezes, op cit. xl Vítor Hugo de Menezes, op cit. xli Questionário Etnográfico, Jorge Frederico Velez Caroço, Direcção dos Serviços e Negócios Indígenas, Boletim Oficial da Guiné Portuguesa, 20 (Apenso), 14-5-1934. xlii Landerset Simões, Babel Negra, Ed. do autor, 1935: 34 & 49. . xliii Sobre a medicina Nalú numa perspectiva pós-colonial, ver Amélia Frazão Moreira, Apropriação Social da Natureza entre os Nalú da Guiné, tese de doutoramento, ISCTE, Lisboa, 1999. xliv Eurico de Almeida, Da Assistência Médica as Indígenas na Colónia da Guiné Portuguesa, Bolama: Imprensa Nacional, 1935. xlv Ibidem. xlvi Ver Philip J. Havik, Potions and Politics: Indigenous Practices, Health Services and Colonial Administration in Portuguese Guinea’ (no prelo) xlvii Colónia da Guiné, Relatório referente ao 4º trimestre do ano económico 1933-34, Bolama, 12-12-1934; AHU, DGCOcd, 400 xlviii Relatório do Inspector Superior, Dr. António de Almeida, Lisboa, Maio de 1949; AHU, ISAU. xlix Um dos primeiros estudos antropológicos das Ilhas, foi feito pelo etnólogo austríaco Hugo Bernatzik que publicou os resultados das suas deslocações na Guiné como Aethiopien dês Westens: forshungsreisen in Portugiesisch Guinea (Vienna: Seidel & Sohn, 1933) l António de Almeida, Da Medicina Gentílica dos Bijagós, in: Conferência dos Africanistas Ocidentais, 2ª Conferência, Lisboa: Junta de Investigações Coloniais, 1952: 243-92. li José Vitorino Pinto, Relatório sobre uma visita sanitária feita aos Bijagós, Direcção dos Serviços de Saúde e Higiene, Bolama: Imprensa Nacional, 1928. lii António de Almeida, Da Medicina Gentílica dos Bijagós, in: Conferência dos Africanistas Ocidentais, 2ª Conferência, Lisboa: Junta de Investigações Coloniais, 1952: 243-92. liii Relatório do Inspector Superior, Dr. António de Almeida, Lisboa, Maio de 1949; AHU, ISAU. liv Ver por ex. J.A. Pires de Lima, C. Mascarenhas & J. Santana Barreto, Contribuição para o Estudo Antropológico da Guiné Portuguesa, Coimbra: Imprensa da Universidade, 1932. liv António de Almeida Da Médica Gentílica dos Bijagós: 250 liv Ver por ex. António Scarpa, Pratiche Mediche di Alcune Tribú della Guinea Portoghese, in: Estudos sobre a Etnologia do Ultramar Português, Lisboa: Junta de Investigações do Ultramar, 1960: 157-81. liv Ver J. do Espírito Santo, Nomes Vernáculos de algumas Plantas da Guiné Portuguesa, Estudos, Ensaios e Documentos, Lisboa: Junta de Investigações do Ultramar, 1963. liv Por vezes as mesmas plantas tem vários nomes, tal como certas partes da mesma espécie, além dos informantes não usaram termos uniformes e a terminologia não ser igual em toda a região; ver Diniz et al (2002): 17. BIBLIOGRAFIA:

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