The Bushido in the Meiji Restoration

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ ESCOLA DE EDUCAÇÃO E HUMANIDADES CURSO DE LICENCIATURA EM HISTÓRIA O FIM DO BUSHIDO NA RESTAURAÇÃO MEIJI DE 1866 A 1870 CURITIBA 2013

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ

ESCOLA DE EDUCAÇÃO E HUMANIDADES

CURSO DE LICENCIATURA EM HISTÓRIA

O FIM DO BUSHIDO NA RESTAURAÇÃO MEIJI DE 1866 A 187 0

CURITIBA

2013

FELIPE TKAC

JEFERSON RODRIGUES

SAULO NASCIMENTO

O FIM DO BUSHIDO NA RESTAURAÇÃO MEIJI DE 1866 A 187 0

Artigo apresentado a disciplina de Prática Profissional II: Pesquisa em História do curso de Licenciatura em História da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, como requisito à aprovação da disciplina.

Orientadora: Prof. Dra. Etiane Caloy Bovkalovski

CURITIBA

2013

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O FIM DO BUSHIDO NA RESTAURAÇÃO MEIJI DE 1866 A 187 0

Felipe Tkac (acadêmico do curso de História PUCPR)

Jeferson Rodrigues (acadêmico do curso de História PUCPR)

Saulo Nascimento (acadêmico do curso de História PUCPR)

RESUMO Com o objetivo de compreender o significado do Bushido como estilo de vida e a reação dos Samurais à lei que o proibia, iremos pesquisar a importância religiosa que a figura do Imperador possuía ao instituir um novo parlamento findando o sistema de produção feudal no controle do clã Tokugawa. É possível perceber que os pactos entre Xoguns, Daimios, Samurais e Camponeses, assemelham-se, a certa monta, aos pactos verbais de Suserano e Vassalo na Europa Ocidental feudal, entretanto ocorreu uma passagem histórica neste momento e podemos formular questionamentos para entender o modo de vida Samurai. Qual era a relevância do Bushido para o xogunato? Pois sabemos que na legislação de 1870 o Imperador Meiji proíbia sua prática e isso impactou na sociedade de diversas maneiras. Por que o Imperador proibiu a prática do Bushido? Esse questionamento é necessário para compreender as mudanças nas estruturas culturais daquela sociedade. Palavras-chave: Restauração Meiji, Japão século XIX, Bushido, Xogunato

ABSTRACT In order to understand the Bushido’s meaning as lifestyle and the Samurai’s reaction to the law that forbade it, We will search the religious importance the Emperor’s figure had in the moment he set up a new parliament coming to a close to the feudal system production under Tokugawa's clan control. It's possible to realize that the pacts among Shoguns, Daimyos, Samurais and peasants resemble the covenants of words in the feudal Western Europe of Overlord and Vassal, however there was a historical passage at that moment, and We can formulate questions to understand the Samurai’s way of life. What was the Bushido’s relevance to the shogunate? For We know that the law of the Meiji Emperor in 1870 forbade its practice and this impacted on society in many ways. Why the Emperor forbade the Bushido’s practice? This questioning is needed to understand the changes in the society’s cultural structures. Keywords: Meiji Restoration, Japan XIX century, Bushido, Shogunate

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1 Introdução

Com o objetivo de compreender o significado do Bushido como estilo de vida e a

reação dos Samurais à lei que o proibia, iremos pesquisar a importância religiosa que a

figura do Imperador possuía ao instituir um novo parlamento findando o sistema de

produção feudal no controle do clã Tokugawa. É possível perceber que os pactos entre

Xoguns, Daimios, Samurais e Camponeses, assemelham-se, a certa monta, aos pactos

verbais de Suserano e Vassalo na Europa Ocidental feudal, entretanto ocorreu uma

passagem histórica neste momento e podemos formular questionamentos para

entender o modo de vida Samurai. Qual era a relevância do Bushido para o xogunato?

Pois sabemos que na legislação de 1870 o Imperador Meiji proíbiu sua prática e isso

impactou na sociedade de diversas maneiras. Por que o Imperador proíbiu a prática do

Bushido? Esse questionamento é necessário para compreender as mudanças nas

estruturas culturais daquela sociedade.

Para embasar esta pesquisa utilizaremos estudiosos como Collcut e Jansen que

pesquisaram profundamente a História do Japão desde a pré-história, fazendo um

contraponto com Hoffman que trabalhou a religiosidade do Bushido e Sakurai sobre o

comportamento dos japoneses. Além destes, utilizaremos Hobsbawm para

compreender as máculas das tradições em uma sociedade.

Dada a distância da pesquisa, por um lado essencial para formular questões a

partir de uma visão ocidental, o acesso a fontes primárias se torna uma difícil tarefa,

todavia, fomos capazes de encontrar traduzido para o inglês o Datsu-A Ron, que trata-

se de um periódico escrito anonimamente pelos afetados da restauração na época.

Para entender o código de conduta dos Samurais e o significado do Bushido, para este

guerreiro, usaremos o “Um Livro dos Cinco Anéis” de Musashi escrito no auge do

feudalismo japonês e representando todo um modelo de conduta de um renomado

Samurai.

2 O Japão Pré-Meiji

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Após quatro séculos de guerras internas e disputas pelo poder. O Japão

encontrava-se, no início do século XVI, em seu ponto máximo de descentralização.

Entretanto, em 1603 Tokugawa Ieyasu1 unifica definitivamente o Japão sob o regime de

um único xogum2.

Alguns destes Daimios contavam com as vitórias alcançadas a nível regional, para conseguirem uma hegemonia nacional, tentando aproveitar todas as oportunidades para tomar a cidade como ponto de partida para o controle do Japão central. O primeiro daimio a consegui-lo foi Oda Nobunaga (1534-1582), o jovem chefe do pequeno domínio de Owari, na costa do pacífico. Nobunaga tinha como objetivo iniciar a reunificação do país. Depois de seu assassinato a tarefa da unificação ficou a cargo de seus sucessores Toyotomi Hideyoshi (1536-1598) e Tokugawa Ieyasu (1542-1616). Numa série de batalhas taticamente brilhantes, Nobunaga abriu caminho por entre os daimios em 1568 controlava a região da capital. (COLLCUT & JANSEN, 1997, p. 132)

Estabelece-se a partir de então o xogunato Tokugawa que controla o país a

partir de articulações políticas e cessão de terras a daimios3, não obstante, garante o

controle religioso, dando o título de mandatário supremo ao descendente do imperador,

que é reconhecido perante o povo como entidade máxima religiosa e assim permanece

por quase três séculos.

Economicamente, várias reformas ocorreram desde as primeiras unificações,

com sensibilidade de importante significância na cultura daquele período, cito abaixo:

Nos quarenta anos que se seguiram a 1603, quando se instituiu o Bakufu, as casas de setenta e um daimios foram confiscadas [...]. Assim um terço dos daimios foram substituídos. Aqueles sofreram não só a perda dos seus senhores como também as suas remunerações e tornaram-se ronin (samurais independentes). (COLLCUT & JANSEN, 1997, p. 134)

1 Imagem referêncial de Tokugawa Ieyasu em anexo “A” deste artigo 2 Xogum: Grande general, forma contraída de seiitaishogun, significando o grande general que domina os bárbaros. Originalmente um título temporário dado a um príncipe que dirigia campanhas militares ofensivas durante o período Heian. Mais tarde, o título de xógum foi dado [...] a Tokugawa, que criou um Bakufu a fim de obter o título de xógum como expressão de sua legítima autoridade militar para governar o pais como braço militar da soberania imperial. (COLLCUT & JANSEN, 1997, p. 231) 3 Daimio: Senhores feudais das províncias; à letra, “grande nome”. Designando originalmente “grandes propriedades privadas”, o termo daimio foi utilizado, durante o período medieval, para designar os proprietários poderosos das províncias, principalmente os chefes guerreiros locais. [...]. Segundo os xoguns Tokugawa, o daimio era definido como um senhor de um domínio possuindo um rendimento de pelo menos 10.000 koku (1 koku = 5 alqueires de arroz). (COLLCUT & JANSEN, 1997, p. 230)

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Isso nos mostra que a sociedade não era estanque, houve mudanças sob o

modelo de divisão social e uma nova categoria foi inserida, o ronin, que é explicado

adiante.

2.1 O Samurai e o Ronin

Samurais4 são guerreiros instruídos nas artes marciais, artísticas e filosóficas,

provenientes de escolas ligadas ao xintoísmo e a prática do Kendo 5 . Que nesse

contexto de guerras e lutas travadas pela unificação do país já no início do século XVII

assumem um papel determinante naquela sociedade. O samurai assemelha-se,

salvando as devidas proporções, ao modelo de cavaleiro ocidental, que descendendo

família rica, tem acesso à educação em Dojo’s (centro de educação) e parte em busca

de servir a um daimio ou xogum.

Samurai remonta à idéia de ‘servir’, ou ‘aquele que serve’. Portanto o samurai era acima de tudo um servente, e não apenas um guerreiro. Algumas outras palavras sinônimas de samurai são tsuwamono, bujin, buke, mononofu, além da palavra bushi, que designa 'guerreiro', a classe samurai, de onde vem 'bushido'. Claro, o samurai era um guerreiro, mas cuja maior característica era a lealdade ao mestre, a servidão. (HOFFMAN, 2007, p. 35)

O ronin é um samurai sem senhor que busca fama em duelos para impressionar

um daimio ou que simplesmente se desligou de seu senhor anteriormente por algum

motivo e não cometeu o seppuku6 (ritual ao qual o samurai tira sua própria vida).

3 O Bushido

Tendo em suas bases o confucionismo, o budismo e o xintoísmo, além de

práticas militares de manejo de armas e até a arte e filosofia, o bushido7 representa

4 Imagem referencial em anexo “B” deste artigo 5 Kendo: Caminho da Espada (MUSASHI, 1645, p. 8) 6 Imagem referencial em anexo “C” deste artigo

5

para os samurais mais do que a prática ou estudo, significa um modo de vida, um

código de conduta e honra. O bushido inicialmente surge através da oralidade, não

sendo um código escrito.

Bushido, então, é o código de princípios morais a que os cavaleiros eram exigidos ou instruídos a observar. Não é um código escrito; no melhor, consiste de umas poucas máximas transmitidas de boca em boca ou vindo da pena de algum guerreiro ou sábio bem conhecido. Com mais frequência, é um código não proferido e não escrito, possuindo muito mais a sanção poderosa de feitos verdadeiros, e de uma lei escrita nas tábuas carnais do coração. Foi instituído não na criação de um cérebro, embora capaz, ou na vida de um só personagem, embora renomado. Foi um crescimento orgânico de décadas e séculos de carreira militar. (NITOBE, 2005, p. 11)

Quando o clã Tokugawa assume a unificação do Japão em 1603, o

bushido é formalizado no direito japonês através de decretos que o caracteriza

legalmente, decretos compilados e traduzidos para o inglês por John Carey Hall, sob o

título The Tokugawa Legislation, Yokohama 1910.

3.1 O Bushido, o Xintoísmo, o Confucionismo e a Lea ldade

Valendo-se de valores religiosos como explicitado anteriormente, o

bushido gradualmente torna-se a base da cavalaria japonesa, no sentido de forjar a

classe samurai, baseando-se no respeito aos ancestrais, aos mais velhos, aos daimios

a qual serviam, ao xogum e finalmente ao imperador, dependendo do período.

O Xintoísmo religião de origem animista, que acredita que em todas as coisas

materiais repousa uma alma imaterial, agrega ao bushido o respeito pelos ancestrais e

pela natureza, rituais primitivos, cultos xamânicos e que explica desde os primórdios a

descendência divina do imperador, compreende também em grande parte a devoção

da classe samurai a essa figura e manutenção do governo, na perspectiva de Hoffman:

Junto com este período nasceu o xintoísmo, a princípio como um conjunto de crenças, tradições e rituais, e por isso ele está presente na raiz cultural e na

7 Bushido: “O caminho do guerreiro”, bushi. Uma ética marcial que se desenvolveu a partir da época medieval e que envolvia o apoio do senhor, gon, em troca do serviço militar, hoko, por parte do vassalo. (COLLCUT & JANSEN, 1997, p. 230)

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vida dos japoneses. Portanto, não há data específica de origem, e tampouco alguém que o tenha fundado; além disso, visto que já estava presente na natureza dos japoneses, ele não apresenta nenhum tipo de escrituras sagradas. O xintoísmo explica, mitologicamente, toda a origem do Japão e dos imperadores, tornando-o estritamente ligado à família imperial; no entanto, por vários séculos essa noção é enfraquecida, principalmente quando não era um imperador quem governava o Japão. É uma religião basicamente politeísta com um panteão vasto e variado, havendo desde poderosas divindades até pedras sagradas. É a única religião considerada nativa do Japão. (HOFFMAN, 2007, p. 9)

Agregando ainda mais valores o confucionismo, importado da China, cai muito

bem aos ouvidos japoneses, trazendo a valorização da família tal qual não se

imaginaria, a hierarquização no âmbito familiar proposto por Confucio, garante que

cada classe tenha o seu lugar e a respeite tal qual se deve.

Quando nos referimos à ética dos samurais no período Tokugawa (1603-1868) devemos ter em mente os preceitos familiares que cada clã possuía e impunha aos seus membros. Tais preceitos, chamados de kakun, tinham em sua estrutura básica conceitos do confucionismo que eram completados com valores budistas ou xintoístas, dependendo particularmente de cada clã. Segundo Navarro (2008) o bushidô poderia ser tomado como um kakun, isto é, preceitos familiares que deveriam ser seguidos por todos que fizessem parte do clã ou família. Com o passar dos anos esses preceitos foram tomados como códigos de condutas que deveriam ser seguidos por todos os membros do grupo, principalmente pela parte armada, no caso os samurais. (NUNES, 2011, pp. 7-8)

Desta maneira a influência confucionista ganha voga na cultura japonesa e

através da síntese da cultura japonesa com o confucionismo, o culto a ideias de

Confucio crescem de forma impar no Japão, como cita Yamashiro:

[...] o saber e a moralidade confucianos são ostensivamente respeitados como os mais autorizados. O culto do sábio chinês tem numerosos e grandes seguidores. Sob seu domínio torna-se quase impossível adotar uma nova atitude mental ou posição divergente. (YAMASHIRO, 1997, p. 200).

Nesse conceito a formação da ética samurai como braço armado do

xogum, toma a forma de pactos de palavra. O bushido para o samurai é o código de

conduta que garante que um cavaleiro cumpra seu dever, honre sua palavra e que o

daimio possa com ele contar no campo de batalha, semelhança, salvaguardando as

devidas proporções, ao ocidente europeu no auge da idade média. Ser um samurai é

7

uma posição de honra e que pertencente a uma classe aristocrática vinculada ao

passado, isto é, o xintoísmo garante que o samurai seja reconhecido como o cavaleiro

realmente descendente desse antepassado glorioso e de fundamental importância na

manutenção do xogunato.

4 O Jovem Imperador Meiji

Filho do imperador Komei, o jovem Mutsuhito 8 nasce em um momento de

extrema conturbação no Japão. O poder do imperador é apenas de fachada,

comparado ao xogum Tokugawa. A vinda dos estadounidenses, buscando novos

mercados e impondo sua condição comercial, intensificam a necessidade de mudanças

no modo de produção.

O ano de 1868 pode ser indicado como o início do processo de modernização; nesse ano, o Governo anunciou a intenção de introduzir no Japão a tecnologia e os recursos do Ocidente. Em 1871, Iwakura Tomomi é enviado aos Estados Unidos e à Europa, com uma numerosa missão, para tentar renegociar os “tratados desiguais” com as potências ocidentais e, sobretudo, para recolher tudo o que existe no Ocidente que pudesse ser útil à modernização e industrialização do país. (Bath, 1993, p. 33)

O comodoro Mathew Perry, cedento pelo mercado japonês, aporta na costa do

pacífico com seus navios negros 9 , obrigando Tokugawa a aceitar tratados quase

unilaterais.

O Comodoro Perry, dos Estados Unidos, cujas ambições no Pacífico iam bem mais longe dos interesses de seus navios caçadores de baleias [...], forçou os japonses à abertura de alguns portos em 1853-1854 com o método usual das ameaças navais. Os ingleses, e mais tarde, em 1862, as forças unidas ocidentais, bombardearam o Japão com a frivolidade e a impunidade habituais: a cidade de Kagoshima foi atacada como retaliação pelo assassinato de um único inglês. (HOBSBAWM, 2012, pag. 230)

A morte do imperador Komei no ano de 1867 implicou na necessidade de

Mutsuhito ascender ao trono precocemente, com apenas quatorze anos de idade.

8 Imagem referencial em anexo “D” deste artigo 9 Imagem referencial em anexo “E” deste artigo

8

Apesar de jovem, a personalidade forte do novo imperador trouxe mudanças severas

na constituição do estado japonês, império foi tão marcante que passou a ser

conhecido como Meiji (Iluminado).

4.1 A Guerra Boshin e a Restauração Meiji

A guerra Boshin10 é tratada por especialistas como o início da restauração do

poder do imperador, em certa monta, os ares aos quais os termos da guerra são

levados, tem em grande sentido essa realidade, entretanto, Mutsuhito, recorre a outros

samurais, donos de terras e exércitos, para vencer Tokugawa, penhorando parte de

seu poder.

A necessidade de incluir a corte imperial numa ação mais vasta parecida clara, e quando o xogum foi aconselhado a render-se, em 1867, acendeu na esperança de continuar a manter a sua relativa importância numa nova estrutura política colegial. Os acontecimentos provaram-lhe que não tinha razão, visto que os seus rivais o manobraram a fim de obterem uma autorização imperial para o castigar como inimigo da corte. A Guerra Civil de Boshin, durante a qual os exércitos (imperiais) de Satsuma, Choshu e Tosa marcharam sobre os domínios de Tokugawa, terminou no fim da Primavera de 1869. (COLLCUT & JANSEN, 1997, p. 134)

Essa medida não foi suficiente para vencer o exército Tokugawa, então o império

e os samurais favoráveis a ocidentalização acordam com o Ocidente a militarização e a

compra de novas armas capazes de compensar os limites de número. É chegado o fim

da era Tokugawa após 268 anos de xogunato. A morte desse abre espaço para uma

mudança, mas para atingir a população era necessário ser calcada nos valores

japoneses e também agregar toda a tecnologia Ocidental.

Os líderes Meiji habilmente mesclaram passado e futuro na estratégia de construção da modernidade japonesa. Em torno da concepção do Império do Grande Japão, sedimentaram-se ideologicamente os interesses da nação em formação em conformidade com os outros do Estado. Houve uma “capitalização do passado”, como diz Lévi-Strauss, no sentido de glorificar a história do povo japonês para fomentar o orgulho nacional. O alicerce da argumentação baseava-se na ideia da uniqueness, exclusividade,

10 Imagem referencial em anexo “F” deste artigo

9

da cultura japonesa e a história foi amplamente usada para justificá-la. (SAKURAI, 2008, p.146)

A guerra finda-se no início de 1869 e com a nova formação do estado japonês os

daimios foram destituídos e a figura clássica do samurai, principalmente no que tange a

hierarquização das diferentes classes, encontra seu fim. A aceitação de camponeses

ao exército Imperial é fruto da promulgação da lei de igualdade na constituição de 1870.

Como foi dito, todos cederam seus poderes à corte imperial. Portanto em 1870 os dáimios deram todas as suas terras ao imperador, o qual converteu os feudos em prefeituras, modernizando a organização social e deixando para trás o ultrapassado sistema feudal. A secular hierarquia social sofreu drásticas mudanças, pois o governo queria democratizar o país, tornando todos os cidadãos iguais. É nessa reforma que os samurais deixam de existir, uma vez que não há mais classes, e eles perdem todos os seus privilégios. Agora passariam a existir como antigos guerreiros apenas, já que não possuíam mais nenhum papel burocrático, oficial ou hierárquico. Além disso, em 1876 foi instituída uma lei, pelo imperador Meiji, proibindo aos antigos samurais o uso de espadas, encerrando de vez a sua classe. Infelizmente o símbolo do Caminho da Espada foi terminado, ferindo as almas dos samurais, pois suas vidas eram dedicadas à espada, ela era seu meio de servir ao senhor. Tais armas passaram a ser usadas somente em cerimônias xintoístas, e muitos anos mais tarde este uso também foi proibido. (HOFFMAN, 2007, p. 9)

Ainda que constitucionalmente exista a proibição do samurai e do uso da

espada, uma tradição de tantos anos não se extingue simplesmente com a imposição

da força, pequenas fagulhas do brilho daquela cultura ainda apareciam ao longo de

todo o território japonês e os descendentes dos samurais criaram um manifesto

chamado de Dotsu-a-Ron que circulava entre os aristocratas ex-proprietários de terras

com o pensamento reacionário ao novo regime e as reformas propostas.

Mas os ideais de igualdade para o povo japonês e a busca nos camponeses

para compor o exército imperial, colocaram em pé de igualdade o campesinato e o

militarismo. Tal fator foi o principal determinante para que o imperador Mutsuhito

destituisse o bushido da constituição japonesa em 1870.

Contudo os valores do bushido como apresentado anteriormente, baseados no

xintoísmo, budismo e confucionismo, não são esquecidos, foi necessário buscar nesse

ideal a base para justificar a presença do imperador, que fez ao longo da instauração

da reforma Meiji, várias incursões por todo o território, na tentativa de popularizar e

afirmar a descendência divina de sua imagem, o xintoísmo é instituído como religião

10

oficial do Japão, pela proximidade com o culto aos antepassados e a explicação da

origem da família imperial.

5 Considerações Finais

O bushido ao longo do tempo assumiu um papel importante para os japoneses e

tornou-se uma tradição militar, religiosa e social. Ainda que tenha sido proibido,

permanece vivo, a certa monta, algumas características.

As características que se mantém vivas são as tradições de séculos de oralidade

e que compõem a personalidade dos japoneses. O Tokugawa, no início do xogunato,

foi buscar na religiosidade e na prática do bushido uma justificativa para ser aceito

como governante, das mesmas armas o imperador Mutsuhito se utilizou, buscando

agora no xintoísmo.

As tradições são tratadas por Hobsbawm:

Por “tradição inventa” entende-se um conjunto de práticas, normalmente reguladas por regras tácita ou abertamente aceitas; tais práticas, de natureza ritual ou simbólica, visam inculcar certos valores e normas de comportamento através da repetição, o que implica, automaticamente, uma continuidade em relação ao passado. Aliás, sempre que possível, tenta-se estabelecer continuidade com um passado histórico apropriado. (Hobsbawm & Ranger, 2006, p. 9)

O custo da guerra em seu próprio território e de divisões políticas trouxe a

transformação que o Japão passa na época abordada. A capacidade de sintetizar o que

havia de melhor no Ocidente e possuindo uma estrutura social bem elaborada que leva-

o ao ápice da industrialização, modernização dos meios de produção e a uma política

inclusiva de classes que pode, por exemplo, dar acesso a educação a todos os

japoneses através do decreto de igualdade.

REFERENCIAS BIBLIGRÁFICAS

BATH, Sérgio. Xintoismo : O Caminho dos deuses, São Paulo: Ática, 1998.

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BATH, Sérgio. Japão ontem e hoje , São Paulo: Ática, 1993.

BENEDICT, Ruth. O Crisântemo e a Espada . São Paulo: Perspectiva, 1988.

COLLCUT, Martin e JANSEN, Marius. Japão : O Império do Sol Nascente. Madrid: Del

Prado, 1997.

HOBSBAWM, Eric. A era do capital 1848-1875. 15° Ed. São Paulo. Paz e Terra, 2012.

HOBSBAWM, Eric. RANGER, Terence. A Invenção das Tradições . São Paulo. Paz e

Terra, 2008.

HOFFMAN, Leonardo. A Influência do Xintoísmo, Pensamento Chinês e Zen

na Formação do Bushido e a Experiência Zen de Eugen Herrigel , Trabalho De

Conclusão De Curso – Fil5503, Santa Catarina, UFSC, 2007.

KWOK, Dwight Tat Wai. A translation of Datsu-a Ron : Decoding a prewar japanese

Nationalistic Theory. Toronto: University of Toronto, 2009.

NITOBE, Inazo. Bushido : Alma de Samurai. São Paulo: Tahyu, 2005.

NUNES, Gabriel Pinto. A Ética Samurai e a contrução de uma Nação : a

apresentação da Ética Oriental Moderna na obra de Inazo Nitobe. Florianópolis: Anais

do VII Seminário de Pós-Graduação em Filosofia da UFSCar, 2011.

SAKURAI, Célia. Os Japoneses . São Paulo: Ed. Contexto, 2008.

YAMASHIRO, José. Japão : Passado e Presente. 3ª edição - São Paulo: Aliança

Cultural Brasil-Japão, 1997.

ZACARIAS, G. F. A abertura sob a mira de canhões . História viva: Japão 500 anos

de história 100 anos de imigração. São Paulo: Duetto editorial, v.02, 2008.

FONTES PRIMÁRIAS

HALL, John Carey, The Tokugawa Legislation , Yokohama, 1910.

KWOK, Dwight Tat Wai. A translation of Datsu-a Ron : Decoding a prewar japanese

Nationalistic Theory. Toronto: University of Toronto, 2009.

MUSASHI, Myamoto. Um livro de Cinco Anéis . São Paulo: Ediouro, 1984.

ANEXO - IMAGENS

ANEXO A

Tokugawa Ieyasu, autor desconhecido - Imagem disponível em:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Xogum

ANEXO B

Screenshot do filme “Os Sete Samuais” de Akira Kurosawa que exemplificam a figura

do Samurai.

ANEXO C

Imagem de autor desconhecido do ritual seppuku executado por Samurais. Imagem

disponível em: estudodosamurai.blogspot.com

ANEXO D

Imagem do Imperador Mutsuhito, autor desconhecido. Disponível em: http://milem.over-

blog.fr/70-categorie-10425298.html

ANEXO - E

Selo oficial lembrando a chegada do comodoro Perry em 07 de agosto de 1853, foto de

Taiso Yoshitoshi

ANEXO - F

Imagem de Tokugawa Yoshinobu e o seu exército no Castelo de Osaka durante a

Guerra Boshin, autor desconhecido. Disponível em:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Hist%C3%B3ria_do_Jap%C3%A3o