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Rio ou, há 450 anos, São Sebastião
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Em entrevista, Rui Tavares, dirigente do Livre/Tempo de Avançar, é contra o bloco central e por uma alternativa com o PS p 14 a 16
‘O nosso papel é tornar mais incertos os resultados eleitorais’
Costa bate com a porta ao bloco central: “Ou nós ou eles”Em resposta ao primeiro-ministro, que admitiu um Governo alargado ao PS, o líder socialista respondeu com a necessidade de uma alternativa. Mas nada disse sobre a dívida que Passos acumulou durante cinco anos à Segurança Social Portugal, 17
RIO FAZ450 ANOSA CIDADE VISTA POR QUATRO ESCRITORES E UM HISTORIADORDestaque, 4 a 11
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O terrível assassinato do principal opositor de Putin p28/29 e OpiniãoDOM 1 MAR 2015EDIÇÃO PORTO
Ano XXV | n.º 9086 | 1,65€ | Directora: Bárbara Reis | Directores adjuntos: Nuno Pacheco, Simone Duarte, Pedro Sousa Carvalho, Áurea Sampaio | Directora de Arte: Sónia Matos
ISNN:0872-1556
PRÉMIOS 2014JORNAL EUROPEU DO ANOJORNAL MAIS BEM DESENHADO ESPANHA&PORTUGAL
REPORTAGEM NO HAITI
PORT-AU-PRINCE, A CAPITAL MUNDIAL DO RAPTOTEXTO: LUÍS PEDRO NUNESFOTOS: ALFREDO CUNHA
4 | DESTAQUE | PÚBLICO, DOM 1 MAR 2015
Rio ou, há 450 anos, São SebastiãoRaras são as cidades que têm claro o processo da sua fundação. O Rio tem. Para a maioria das cidades, é óbvia a razão da sua designação. Para o Rio, não. A conjugação dessas duas premissas faz do Rio um paradoxo que a sua realidade confirma a cada passo
“[...] escolhi um sítio que parecia
mais conveniente para edificar
nele a cidade de são sebastião, o
qual sítio era de um grande mato
espesso, cheio de muitas árvores
grossas, em que se levou assaz de
trabalho em as cortar e alimpar
o dito sítio e edificar uma cidade
grande cercada de trasto de vinte
palmos de largo e outros tantos
de altura, toda cercada de muro
por cima com muitos baluartes
e fortes cheio d’artilharia. E fiz a
Igreja dos padres de Jesu [...], e a
sé de três naves também telhada
e bem consertada, fiz a casa da
câmara sobradada, telhada e
grande, a cadeia, as casas dos
armazéns e para a fazenda de sua
alteza sobradadas e telhadas e com
varandas, dei ordem e favor ajuda
com que fizessem outras muitas
casas telhadas e sobradadas.”
in Instrumento dos Serviços Prestados por Mem de Sá, 1570,
Cartório dos Jesuítas, Torre do
Tombo.
Por carta de 1 de Junho de
1553 ao rei D. João III, o
primeiro governador do
Brasil, Tomé de Souza,
maravilhado com a baía da
Guanabara na visita que ali
fizera meio ano antes, mandou-lhe
“o debuxo dela” e sintetizou o que
viu da forma seguinte: “Tudo e[ra]
graça o que se dela pode dizer, senão
que pinte quem quiser como deseje
um Rio, isso tem este de Janeiro.”
vocado por esse quadro natural
profusamente florestado, que em
finais de quinhentos o padre Fernão
Cardim descreveu como parecendo
“que quem a pintou foi o supremo
pintor e arquitecto do mundo, Deus
Nosso Senhor”, a baía apresentava-
se pois como um local ideal para
instalação humana com fácil defe-
sa, pelo que é óbvia a recomenda-
ção de Tomé de Souza na já referi-
da carta ao rei: “V. A. deve mandar
fazer ali uma povoação honrada e
boa.” Assim aconteceria e Guana-
bara e Rio, que afinal e respectiva-
mente são baía e cidade, continuam
a fazer jus ao maravilhamento de
Pero Lopes e Tomé de Souza, que
a descreveram antes de qualquer
instalação europeia.
A área era fartamente habitada
por população nativa, os tamoios,
que além de um considerável grau
de organização tinham grande
propensão, preparação e pronti-
dão para combater. Desde muito
cedo era também frequentada por
franceses que com eles pactuaram
e comerciavam, pondo em causa a
exclusividade de que os portugue-
ses, baseados no Tratado de Torde-
silhas, se arrogavam detentores. O
combate à presença francesa nas
costas brasileiras desenvolveu-se
nas mais diversas frentes, incluin-
do a diplomática, o que não evitou
que por eles fosse gizado e posto
em execução o projeto colonial de-
signado “França Antártica”, pre-
cisamente destinado à Guanabara
e liderado por Nicolas Durand de
Villegagnon. Este, em 1555, instalou
um forte com uma colónia (Forte
ANIVERSÁRIO DO RIO DE JANEIRO
Walter RossaJá em 1531, Pero Lopes de Souza,
relator da armada de Martim Afon-
so de Souza, escrevera: “este Rio é
mui grande, tem dentro oito ilhas
e assim muitos abrigos”. Ambos os
excertos dão-nos conta não só das
excepcionais qualidades do local,
como do facto de durante as primei-
ras décadas de visitas os portugue-
ses terem tomado a baía como a foz
de um rio, cunhando-lhe assim um
topónimo que acabou designando o
povoado cuja fundação ocorreu há
precisamente 450 anos. Ninguém
sabe ao certo quem instalou esse
equívoco (Américo Vespúcio, Gas-
par Coelho, Cristóvão Pires, Fernão
de Magalhães?), e com ele a invoca-
ção do mês em que é natural que
tal tenha ocorrido.
“Água penetrante”A poente de cabo Frio, no único
trecho da costa brasileira que cor-
re paralelo ao Equador e a meia
centena de quilómetros a norte do
Trópico de Capricórnio, o recorte
e a envolvente da baía da Guana-
bara (“água penetrante” em tupi)
são únicos: 140 quilómetros de pe-
rímetro, 30 de profundidade e 26
de largura máximos contrastam
com o pouco mais de quilómetro
e meio da boca balizada pelos mor-
ros de Santa Cruz a este e do Pão
de Açúcar e de São João (outrora
Cara de Cão) a oeste. O entorno
é de serras e morros com verten-
tes abruptas recortando terrenos
planos e férteis, bem como lagoas
que, tal como a baía, foram ricas
em peixe.
Além do deslumbramento pro-
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dada no Brasil, 16 anos depois da
fundação de Salvador da Bahia de
Todos-os-Santos. A integração no
topónimo do nome do jovem rei
sob a forma do seu santo patrono
veio adensar a referência ao mês de
Janeiro, pois D. Sebastião nascera
a 20 de Janeiro, precisamente no
dia em que o calendário católico
celebra aquele guerreiro-mártir. A
decisão terá sido tomada em Lis-
boa, pois a imagem do santo de
madeira policromada que perten-
ceu à paroquial primitiva, depois
à catedral e que hoje está na igreja
capuchinha da Tijuca, foi levada
na armada fundacional de Estácio
de Sá, provavelmente posta ao cui-
dado do ainda noviço jesuíta e pri-
meiro cronista da cidade, José de
Anchieta, o “apóstolo do Brasil”.
Junto dela estão também o padrão
de fundação da cidade e a lápide
funerária de Estácio de Sá.
Materialmente, aquela instalação
primitiva da cidade de São Sebas-
tião era pequena, provisória e de
cariz assumidamente militar, num
local exíguo escolhido a preceito
junto à entrada da baía, abrigado
pelos morros do Pão de Açúcar e da
Urca, junto a São João. Se pela reac-
ção concertada dos tamoios e fran-
ceses a preocupação defensiva era
permanente, a verdade é que des-
de logo entrou em funcionamento
o sistema político-administrativo
de um novo município colonial (à
imagem dos da metrópole), incluin-
do instituições, cargos e dação de
chãos e sesmarias de um território
que paulatinamente se foi reconhe-
cendo. O processo foi volun-
Foi a segunda cidade real fundada no Brasil, 16 anos depois da fundação de Salvador da Bahia de Todos-os-Santos. A integração no topónimo do nome do jovem rei sob a forma do seu santo patrono veio adensar a referência ao mês de Janeiro
Coligny), uma verdadeira testa de
ponte francesa na ilha que hoje
conserva o seu nome e que quase
está fundida com o aterro entretan-
to feito para o Aeroporto Santos Du-
mond. Era um avanço intolerável
que os portugueses apenas logra-
ram contrariar cinco anos volvidos
sob o comando do terceiro gover-
nador do Brasil, Mem de Sá. Sem
capacidade imediata para ocupar o
local e perante a forte oposição dos
tamoios industriados pelos france-
ses, os portugueses limitaram-se a
destruir o forte e os franceses dis-
persaram-se pela região, pelo que
a ameaça não cessou. Ajudaram os
tempos difíceis que então se viviam
em França.
Cidade de São SebastiãoEra óbvio que a neutralização do
projecto francês passava pela fi xa-
ção de uma instalação portugue-
sa, uma cidade. Depois de muitos o
pedirem, incluindo os jesuítas, em
1563 D. Catarina, rainha e regente
na menoridade de D. Sebastião, deu
ordens nesse sentido a Estácio de
Sá, sobrinho do governador, dotan-
do-o de uma pequena armada que
seria aumentada já no Brasil. Ao fi m
de dois anos de preparativos, hesi-
tações e difi culdades, a armada por
ele chefi ada e integrando um gru-
po de duas centenas de efectivos
(que incluiu temiminós e tamoios
inimigos dos da Guanabara) entrou
naquela baía e, no dia seguinte, 1
de Março de 1565, fundaram a ci-
dade de São Sebastião no Rio de
Janeiro.
Foi a segunda cidade real fun- c
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tariamente apoiado por portugue-
ses instalados noutros pontos do
Brasil, designadamente da capita-
nia de São Vicente, que disso foram
sendo recompensados.
Porém, o sucesso da fundação da
cidade e do domínio português da
Guanabara continuava a depender
da anulação da presença dos fran-
ceses e, assim, do apoio em estraté-
gia e armamento que prestavam aos
numerosos e aguerridos tamoios.
Desta vez, a Coroa demorou me-
nos tempo a reagir, enviando uma
armada que foi reforçada na sede
do governo (Salvador da Bahia), in-
cluindo a participação de gente de
outras capitanias e a chefi a do pró-
prio governador, Mem de Sá. Dois
dias depois de chegada à Guana-
bara, uma vez mais a 20 de Janeiro
(o dia de São Sebastião de 1567), a
força portuguesa atacou com su-
cesso a principal posição forte dos
tamoios e franceses, situada no que
é hoje o Morro da Glória, e dias de-
pois conquistou-se a outra posição
na actual ilha do Governador, bem
maior e mais no interior da baía e
onde hoje está o Aeroporto Tom Jo-
bim (ou do Galeão). Estácio de Sá
fi cou gravemente ferido nos com-
bates, acabando por morrer cerca
de um mês depois.
Nesta campanha, os franceses
presentes ou foram mortos ou feitos
prisioneiros, o que descomprimiu
consideravelmente a ameaça que
constituíam aos interesses portu-
gueses, mas sem a qual, como se
viu, não teria havido qualquer pres-
sa para fundar a cidade e dominar a
região. Contudo, o combate prosse-
guiria, pois em toda a região do cabo
Frio a presença francesa continuava
forte, tal como o entendimento co-
mercial e militar com os tamoios, o
que, aliás, levaria ao seu extermínio
(por morte e dispersão) numa acção
cruel levada a cabo em 1575.
É extraordinário constatar em
documentação coeva como logo
no dia 11 de Março seguinte decor-
reu uma cerimónia de juramento
“nas casas do Tesouro d’El-Rei”
no Morro do Castelo, ou seja, no
local para onde a cidade se muda-
ra com carácter defi nitivo. Já hou-
ve quem defendesse, sem provar,
que tal mudança ocorreu no dia 1
de Março, o que não só é simbó-
lico, como não erra por muito. A
verdade é que o treslado ocorreu
entre a derrota dos franceses em
fi nais de Janeiro e o início de Março.
Estamos necessariamente a falar de
instalações e equipamentos mui-
to simples, e de instituições cujo
acervo seria mínimo e por isso fácil
de mudar da, desde então, cidade
velha para a nova e defi nitiva ins-
talação urbana.
O excerto do Instrumento dos Ser-
viços Prestados por Mem de Sá que
serve de epígrafe a este texto relata
bem o ímpeto (re)fundacional com
que o governador do Brasil presidiu
à construção da cidade de São Se-
bastião sobre o Morro do Castelo.
A par das características defensivas
naturais (elevação, fl ancos em es-
carpa, rodeado de pântano e lagoa,
situação penetrante na baía com
boa vista para a barra), área sufi -
ciente para acolher as instituições
do poder civil e religioso, além de
algum casario, e uma boa exposi-
ção às brisas e ao sol (virado a nor-
te no hemisfério sul), o local tinha
no fl anco norte, frente a um bom
varadouro, uma várzea que permi-
tiria ensanchar a cidade e, para o
interior, aceder a terrenos férteis
para o seu sustento agrícola. Bem
próxima estava a foz do pequeno
rio da Carioca, onde desde o início
os portugueses iam fazer aguada, o
que por certo cedo terá criado uma
propensão para a eleição da zona
como local ideal para a implanta-
ção defi nitiva da cidade.
Desceu e espraiou-seA semente urbanística lançada
no Morro do Castelo ou Outeiro
de São Sebastião, como então era
designado, germinou conforme o
previsível. A Igreja de São Sebas-
tião, a câmara, a cadeia, o colégio
dos jesuítas e mais algumas poucas
dependências civis e casas particu-
lares cedo lotaram o espaço dispo-
nível no exíguo morro muralhado
em forma de tridente. Por isso, a
cidade, que cedo prosperou, des-
ceu e espraiou-se ordenadamente
pela várzea drenada e nivelada para Fonte: PÚBLICO
A fundação da cidade do Rio de Janeiro
Rio de Janeiro
Baía de Guanabara
20 km
BRASIL
Rio de Janeiro
A cidade de São Sebastião no Rio de Janeiro foi a segunda cidade real portu-guesa fundada no Brasil, 16 anos depois da fundação de Salvador da Bahia de Todos-os-Santos. A baía de Guanabara, com os seus 140 quilómetros de perímetro, 30 de profundidade e 26 de largura máximas, era um local ideal para instalação humana com fácil defesa.
1. Primeira implantação da cidade a 1 de Março de 1565
2. Morro de Santa Cruz
3. Posição forte dos franceses e dos tamoios tomada em 20 de Janeiro de 1567 pelos portugueses (Morro da Glória)
4. Forte Coligny, a colónia francesa fundada em 1555 (Ilha de Villegagnon)
5. Implantação definitiva da cidade portuguesa em Março de 1567 (Morro do Castelo)
6. Conjunto franciscano iniciado em 1608 (Morro de Santo António)
7. Forte da Conceição e antigo paço episcopal (séc. XVII), o último erguido a partir da Ermida da Conceição (Morro da Conceição)
8. Conjunto beneditino iniciado em 1590 (Outeiro de São Bento)
9. Avenida Rio Branco aberta em 1904
10. Avenida Presidente Vargas inaugurada em 1944
Nota: Os números 5, 6, 7 e 8 assinalam morros que balizavam a cidade durante o período colonial
12
3Baía de Guanabara
1 km
7
8
6
5
4
910 Baía de Guanabara
500 m
ANIVERSÁRIO DO RIO DE JANEIRO
Já houve quem defendesse, sem provar, que tal mudança ocorreu no dia 1 de Março, o que não só é simbólico, como não erra por muito
PÚBLICO, DOM 1 MAR 2015 | DESTAQUE | 7
o efeito. Uma “baixa” que chegou
a estar circunscrita num rectân-
gulo balizado, além do Morro do
Castelo, pelos morros interiores de
Santo António (ocupado pelo con-
junto franciscano a partir de 1608)
e da Conceição (ocupado sucessi-
vamente pela ermida, convento,
paço episcopal e forte), e o ribeiri-
nho Outeiro de São Bento (coroado
pelo complexo beneditino a partir
de 1590).
Esse perímetro é hoje o coração
do centro, área que apesar de es-
ventrada por sucessivas operações,
como as aberturas das avenidas Ba-
rão do Rio Branco em 1904 (norte-
sul) e Presidente Vargas em 1944
(este-oeste), não apagou o arrua-
do e o essencial da toponímia co-
loniais. Nessa estrutura urbana, do
edifi cado colonial restam igrejas e
conventos, bem como o Paço Im-
perial, espaços públicos e alguns
monumentos.
Seguindo o que simbolicamen-
te se apresenta como um destino
marcado, o morro e o conjunto de
espaços, sistema defensivo e equi-
pamentos ali construídos entre 1565
e 1570 sob a tutela de Mem de Sá,
que consubstanciaram a instalação
defi nitiva da cidade real de São Se-
bastião da Guanabara ou do Rio de
Janeiro, desapareceram num pro-
cesso encetado na década de 1920,
com o qual se adicionou à Baixa ca-
rioca a zona baixa que foi a base do
próprio morro, e outra do aterro
em que foi processado permitindo a
implantação do aeroporto. Destino
confi rmado pela “substituição na-
tural” do topónimo São Sebastião,
talvez induzida pelo misterioso e
mítico desaparecimento do jovem
rei em nome e com o nome do qual
se fundou a cidade que hoje é, (mis-
teriosa e) maravilhosamente, o Rio
de Janeiro.
Arquitecto, Universidade de Coimbra
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De Barcelos para o Rio de Janeiro
Será difícil começar, para não
dizer impossível, quando
se trata de uma efeméride
como o Rio de Janeiro:
aos 450 anos, já é tanto a
metrópole dos operários
electrocutados em seu nome (uma
das últimas vítimas: Stanley Silva, 35
anos, operário, morreu no estaleiro
do Museu do Amanhã com que a
prefeitura pretendia celebrar mais
o futuro do que o passado do Brasil)
como das escandalosas favelas que só
recentemente começaram a fi gurar
nas telenovelas da Globo. Transversal,
o programa de comemorações posto
em marcha pelo Comité Rio450,
liderado pelo diplomata Marcelo
Calero, quis celebrar todas as vidas
da vida da cidade, e a festa começou
ontem à noite com um megaconcerto
gratuito na Quinta da Boa Vista:
Caetano, Gil, Martinho da Vila, Ana
Carolina e Marcelo D2, entre muitos
outros, cantaram o Rio de Janeiro das
escolas de samba e da bossa-nova,
do hip-hop e da MPB, antes do som
e da fúria de um gigantesco fogo-de-
artifício.
É muito, é pouco, é o que é: até ao
fi nal de ano, largas dezenas de acon-
tecimentos marcarão mensalmente
o aniversário do Rio de Janeiro, do
desporto aos seminários, da música
aos festivais, das grandes exposições
nas comemorações, razão que trou-
xe Marcelo Calero a Lisboa para três
dias de contactos institucionais no
fi nal do ano passado. Com os seus
sete metros de altura, o Pop Galo de
Joana Vasconcelos, que simbolica-
mente chegará à Praia do Leme no
próximo 10 de Junho, será a manifes-
tação mais visível do “engajamento”
português na grande festa carioca.
A peça de fi bra de vidro, que entra-
rá esta semana em produção numa
unidade de Torres Vedras, será de-
pois revestida com azulejos Viúva
Lamego especialmente desenha-
dos pela artista e electrifi cada com
LED: uma luz no escuro da noite do
Inês Nadais
DR
O Pop Galo da artista plástica tem sete metros de altura e chega à Praia do Leme no dia 10 de Junho
Rio, pelo menos até ao fi nal do ano.
“Todo o material do Pop Galo é
português e foi concebido de pro-
pósito para esta peça. Quando esti-
ver pronta, será transportada por via
aérea ou marítima até ao lugar onde
fi cará instalada, não sabemos ainda
até quando. O destino do Pop Galo
dependerá muito da receptividade
da cidade e dos habitantes, e da sua
capacidade para criar um discurso
com a envolvente”, diz Joana Vascon-
celos ao PÚBLICO. Mas ela, que es-
tará lá para o receber quando o Pop
Galo desembarcar do outro lado do
Atlântico, gostaria que fi casse ali para
sempre.
O gigantesco Galo de Barcelos de Joana Vasconcelos iluminará o Rio de Janeiro. A festa começou ontem à noite
como aquela que o Instituto Moreira
Salles organizará em Dezembro em
torno do acervo de Millôr Fernan-
des, um dos seus mais infatigáveis
cronistas, à edição especial da Bie-
nal do Livro, do 30.º aniversário do
Rock In Rio, enorme manifestação
de rua, aos pequenos actos de teatro
e performance que ocuparão várias
casas da cidade, do Leblon a Santa
Cruz, das favelas aos condomínios
da classe A.
Fundado por Estácio de Sá a 1 de
Março de 1565, o Rio de Janeiro já
foi a maior cidade portuguesa do
mundo. Justamente por isso, o Co-
mité Rio450 quis integrar Portugal
8 | DESTAQUE | PÚBLICO, DOM 1 MAR 2015
ANIVERSÁRIO DO RIO DE JANEIRO
1695 São Sebastião do Rio de JaneiroGravura que ilustra o livro de François Froger Relation d’un voyage... As igrejas e os conventos são mostrados com grandes proporções. São Bento aparece com duas torres, como a velha Sé. O Colégio dos Jesuítas é detalhado com minúcias. Aparecem uns trechos de muros no Morro do Castelo e uma parte do perfil das fortificações ali instaladas. Em alguns pontos, junto à praia, estão indicadas as gruas para desembarque de mercadorias
1579 O Verdadeiro Retrato do Rio de Janeiro e do Cabo FrioJacques de Van de ClayeEsta é a primeira representação conhecida do Rio de Janeiro. O detalhe mostra-nos a cidade instalada sobre o Morro do Castelo, com as suas igrejas e a fortaleza. A igreja central seria a dos jesuítas. À sua esquerda, vem a fortaleza, tendo a seu lado a forca e, ao fundo, a Igreja de São Sebastião. No primeiro plano, um pequeno forte, ao pé do Morro do Castelo 1855 Vista do Morro do Castelo
Vitor MeirellesÉ um dos vários estudos realizados por Meirelles que restam do seu projeto Panorama do Rio de Janeiro. Aqui o Morro do Castelo é visto de poente, provavelmente num posto de observação localizado no Morro de Santo António, também ele entretanto desmontado. É um ponto de vista inusitado, em que se vê a relação entre o morro fundacional da cidade com o seu desenvolvimento pela várzea, o chão que hoje constitui o centro
1755 Perspectiva da Cidade de S. Sebastião do Rio de JaneiroA perspectiva mostra, a partir da esquerda, a área conhecida como Ponta do Calabouço, tendo à sua direita o hospital e a Igreja da Misericórdia. Segue-se o Morro do Castelo, no qual se vê o Colégio dos Jesuítas, tendo à frente o seu monta-cargas (guindaste), algumas casas e o Forte do Castelo. Ao fundo, a Igreja de Santa Teresa (8). Na mesma direcção, junto à praia, o Palácio dos Governadores (11), tendo ao fundo o convento e a Igreja do Carmo (12). À sua direita, e mais ao fundo (16 e 17), o convento e a Igreja de Santo António, com a capela da Ordem Terceira. A seguir, vemos a igreja e o mosteiro de São Bento (27) e, à sua frente, mais afastado, o Forte da Conceição (26) e o Palácio do Bispo (25). Os morros ao fundo não correspondem à topografia real, mas os edifícios são correctamente representados, dando-nos uma imagem muito exacta da cidade
Esta é uma cronologia do Rio de Janeiro colonial feita a partir do livro Imagens de Vilas e Cidades do Brasil Colonialde Nestor Goulart Reis Filho
PÚBLICO, DOM 1 MAR 2015 | DESTAQUE | 9
1714 Planta da Cidade de São Sebastião do Rio de JaneiroJoão MasséO desenho mostra-nos a primeira planta da cidade do Rio de Janeiro já com padrões de representação correspondentes às técnicas actuais. O casario amplo avança após a praia, em direção a Santo António. A cidade aparece murada pela parte dos fundos, entre os morros do Castelo e da Conceição, nos limites da área urbana. Pelo lado da praia, são indicadas algumas linhas de fortificação. No alto dos morros, as duas grandes fortalezas do Castelo e de Conceição parecem constituir a base da defesa da cidade, juntamente com os fortes da Ilha das Cobras e de Santiago, no limite leste da cidade. A Casa do Governador não ficava no local em que depois foi construído o novo palácio pelo engenheiro militar José Fernandes Pinto Alpoim. Nessa época, o local ainda era ocupado pela Casa da Moeda, indicada com a letra H, e pelos armazéns reais, indicados com a letra G. A Casa do Governador ficava pouco adiante, indicada com a letra L, junto à praia
1750 Carta Topográfica da Cidade de S. Sebastião do Rio de JaneiroAndré Vaz FigueiraDurante o governo de Gomes Freire de Andrade (1733-1763) foi realizado um levantamento, que resultou na planta elaborada pelo capitão André Vaz Figueira, que nos mostra a cidade com sua área construída muito ampliada, ultrapassando, pela parte dos fundos, os limites dos muros que haviam sido construídos segundo os planos do brigadeiro João Massé
1760 Perspectiva da Cidade do Rio de JanneiroMiguel Angelo BlascoO desenho mostra a cidade em perspectiva, a partir do mar, tendo à sua direita a Igreja de São Bento e à esquerda a entrada da baía. Vemos a Ilha das Cobras e, sobre o Morro do Castelo, a igreja dos jesuítas. O trabalho mostra em detalhes as edificações mais simples, como os sobrados e armazéns junto ao porto, com as suas urupemas (esteiras de sombreamento) sobre as janelas e balcões de madeira, bem como o plano inclinado do Mosteiro de São Bento, as instalações portuárias com seus monta-cargas accionados por escravos, um estaleiro e, ao centro, o Palácio dos Governadores
1711 Planta representando a baía, as fortalezas e o dispositivo do ataque ao Rio de JaneiroDe La GrangeA cidade é vista à esquerda, acima do quadro da legenda. Entre a massa verde do Morro do Castelo, onde a cidade foi fundada, uns poucos quarteirões edificados. A seguir, a Fortaleza do Castelo e a Igreja de São Sebastião. Mais acima, os quarteirões da cidade junto à praia, com forma geométrica mais regular, tendo aos fundos as áreas alagadas e, no outro extremo da praia, o Morro de São Bento