Os actos de fala e a frase declarativa: os actos directivos nos anúncios publicitários

17
Os actos de fala e a frase declarativa: os actos directivos nos anúncios publicitários Anamarija Marinovi Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias da Universidade de Lisboa Resumo: O objectivo principal deste trabalho é ver como funcionam os actos de fala na frase declarativa aplicados aos anúncios publicitários. Em primeiro lugar dar-se-á uma abordagem teórica dos conceitos de frase, frase declarativa e actos de fala, tendo em conta sobretudo as teorias de Searle e Grice. Na primeira parte do trabalho os exemplos serão inventados pela autora, para se facilitar a compreensão destes termos e na segunda ver-se-á o seu funcionamento na prática através de exemplos concretos retirados dos anúncios portugueses. Palavras-chave: frase, declarativa, actos de fala, anúncios publicitários Abstract The main purpose of this work is to see how the speech acts work in declarative sentence applied to the commercials. Firstly will be given a theoretical approach of the concepts of sentence, declarative sentence and speech acts, focusing especially the theories of Searle and Grice, In the first part of the work the examples will be made by the author in order to make easier the comprehension of these terms and in the second we will see its functioning in the practice through concrete examples taken from Portuguese commercials. Keywords: declarative sentence, speech acts, OS ACTOS DE FALA E A FRASE DECLARATIVA: OS ACTOS DIRECTIVOS NOS ANÚNCIOS PUBLICITÁRIOS Introdução Ao falarmos, não pronunciamos meras frases gramaticais sem termos em conta o contexto em que elas foram pronunciadas. Por isso, o objectivo deste trabalho será definir os conceitos de frase, enunciado, frase declarativa e actos de fala, dado que as áreas da linguística e da pragmática estão estreitamente relacionadas entre si. Concentrar- nos-emos especificamente na categoria da frase declarativa, porque ela não tem características marcadas nem na

Transcript of Os actos de fala e a frase declarativa: os actos directivos nos anúncios publicitários

Os actos de fala e a frase declarativa: os actos directivos

nos anúncios publicitários

Anamarija Marinovi�

Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias da Universidade de Lisboa

Resumo:

O objectivo principal deste trabalho é ver como funcionam os actos de fala na frase declarativa aplicados aos

anúncios publicitários. Em primeiro lugar dar-se-á uma abordagem teórica dos conceitos de frase, frase declarativa e

actos de fala, tendo em conta sobretudo as teorias de Searle e Grice. Na primeira parte do trabalho os exemplos

serão inventados pela autora, para se facilitar a compreensão destes termos e na segunda ver-se-á o seu

funcionamento na prática através de exemplos concretos retirados dos anúncios portugueses.

Palavras-chave: frase, declarativa, actos de fala, anúncios publicitários

Abstract

The main purpose of this work is to see how the speech acts work in declarative sentence applied to the

commercials. Firstly will be given a theoretical approach of the concepts of sentence, declarative sentence and

speech acts, focusing especially the theories of Searle and Grice, In the first part of the work the examples will be

made by the author in order to make easier the comprehension of these terms and in the second we will see its

functioning in the practice through concrete examples taken from Portuguese commercials.

Keywords: declarative sentence, speech acts,

OS ACTOS DE FALA E A FRASE DECLARATIVA: OS ACTOS DIRECTIVOS NOS ANÚNCIOS

PUBLICITÁRIOS

Introdução

Ao falarmos, não pronunciamos meras frases gramaticais sem termos em conta o contexto em que elas foram

pronunciadas. Por isso, o objectivo deste trabalho será definir os conceitos de frase, enunciado, frase declarativa e

actos de fala, dado que as áreas da linguística e da pragmática estão estreitamente relacionadas entre si. Concentrar-

nos-emos especificamente na categoria da frase declarativa, porque ela não tem características marcadas nem na

entonação, nem na pontuação e pode servir para vários tipos de situações comunicativas, nomeadamente para

constatar um estado, para dar informações, para fazer pedidos e ordens etc. Todos estes significados que uma frase

declarativa pode ter, realizam-se através de vários tipos de actos de fala, dependendo tanto do contexto em que o

enunciado é pronunciado, como da intenção do falante. Aqui podemos observar que na comunicação são

importantes também os factores extra-linguísticos, além dos critérios puramente linguísticos e ligados à gramática.

Isto é, não é suficiente apenas proferir as frases baseando-se na correcção gramatical, mas também é inevitável saber

se a frase é ou não apropriada a uma determinada situação, tal e como termos em conta e percebermos o verdadeiro

sentido do nosso interlocutor. Mais adiante serão dadas algumas das possíveis definições dos termos “frase”, “frase

declarativa”, “enunciado”, “função comunicativa” e outros, que são de grande importância para avançarmos nesta

pequena investigação da relação que existe entre a frase declarativa e os actos de fala. Depois restringiremos o nosso

interesse numa espécie de actos, os directivos, para vermos de que formas nos podemos dirigir ao ouvinte, com que

objectivos e qual é o efeito que o nosso enunciado terá na mente do nosso interlocutor. O corpus de investigação

prática serão os anúncios publicitários encontrados nos jornais e outros meios de comunicação, tanto como os

anúncios que se podem ver nos meios de transporte público para aproveitarmos a possibilidade de observar os

mecanismos usados no marketing para aconselhar/sugerir/ propor ou obrigar o destinatário a comprar um

determinado produto. Na parte teórica do trabalho os exemplos e as situações comunicativas serão inventadas pela

autora para se ver até que ponto as noções teóricas, os conceitos e as classificações ficaram claras e perceptíveis. Na

parte prática, os exemplos já feitos nos meios de comunicação ou transporte serão usados para se comprovar se os

conceitos aprendidos na teoria concordam com o uso prático e daí a necessidade de se aplicarem duas metodologias

ao longo deste trabalho: a de inventar exemplos e a de os procurar nas situações reais da vida quotidiana.

Frase e enunciado: breves determinações dos conceitos

De acordo com Stanoj i� e Popovi�, (2000: 185) “A frase comunicativa é uma unidade sintáctico-comunicativa

mediante a qual se exprime uma mensagem completa (ou seja acabada). Esta unidade está composta por palavras

segundo os princípios do sistema sintáctico e pronuncia-se e escreve-se de forma que mostra a sua completude

comunicativa.

Uma outra abordagem possível do conceito da frase é feita por Mário Vilela (1995:246): “ Sendo a frase a mais

pequena unidade comunicativa, é normal que em cada frase o falante tenha uma determinada intenção: qualquer

frase incorpora necessariamente uma determinada função comunicativa, um determinado objectivo. Nas duas

determinações do termo “frase” aparecem vocábulos cujo significado é importante como ponto de partida duma

análise mais profunda dos factores pragmáticos que influenciam em grande medida a linguagem. (“comunicativa”,

“mensagem”, “intenção”, “função comunicativa”).

De acordo com a função comunicativa que uma frase desempenha, as frases podem ser classificadas nas seguintes

categorias: frases declarativas, interrogativas, exclamativas, optativas e imperativas. Um factor importante que

determina o tipo das frases é a intenção do falante. A intenção das frases declarativas pode ser constatar um facto

“informar sobre um acontecimento ou descrever uma situação”, (Machado de Castro Pinto, Vieira Lopes, 2007).

Para Mário Vilela, as frases declarativas servem apenas para comunicar algo. Como já vimos na definição anterior,

este conceito abrange muitas situações mais do que pura e simplesmente “ comunicar”. As frases declarativas

caracterizam-se pelo ponto no fim e pela entonação neutra. Nesta altura será conveniente introduzir o termo

“enunciado” para podermos observar a relação entre a gramática e a pragmática, a forma e o uso das frases. Em

palavras simples, o enunciado representa uma frase contextualizada, porque uma frase em várias situações pode

produzir diferentes efeitos no interlocutor. O resultado que a nossa fala terá depende da nossa entonação, das formas

verbais utilizadas e, obviamente, do efeito que desejamos produzir. Desta forma, a frase: “Este vestido é muito

bonito” pronunciado numa situação em que duas amigas passeiam pela cidade e olham para a montra duma loja de

vestidos, poderia ser interpretada como uma mera constatação, enquanto, se uma jovem pronuncia isso na presença

do namorado, poderia significar o desejo da rapariga de ter o vestido e interpretar-se como uma sugestão para ele lho

comprar.

O que nos interessa para começarmos a analisar os actos de fala, são os enunciados e não as frases.

Possíveis definições dos actos de fala e as suas classificações

O conceito dos actos de fala foi introduzido pelo linguista John L. Austin porque na sua opinião, as frases e

enunciados que pronunciamos, não servem só para constatar um facto ou descrever um estado, mas também para

realizar uma acção. Além de actos de fala, utilizam-se também os seguintes termos: actos linguísticos, actos de

linguagem ou actos ilocutórios No Dicionário de Termos Linguísticos organizado por Maria Francisca Xavier e

Maria Helena Mira Mateus, o acto de fala é definido da seguinte forma: ”acção realizada por um falante através de

um enunciado, considerando as intenções da sua realização e os efeitos que visa alcançar no alocuctário”. (Xavier,

Mateus, 1990, página 21) As palavras-chave aqui são: “enunciado”, “intenções da realização” “efeitos no

alocutário”, o que nos permite ver o carácter pragmático da linguagem usada numa situação comunicativa. Na

mesma linha de investigação, a professora Mateus continua a definir o acto de fala como: “um comportamento

verbal governado por regras que asseguram que as intenções comunicativas venham a ser adequadamente

interpretadas” (Mateus, 2003, pág. 73) Nesta definição é importante perceber que em cada acto de comunicação

existem normas que devem ser respeitadas em que apara a interacção verbal entre duas ou mais pessoas não é

suficiente só proferir frases gramaticais, mas também ter em consideração uma série de factores externos que não

dependem da linguística (a utilização duma determinada entonação, a linguagem gestual, o contexto, a intenção do

falante, (chamada também força ilocutória) a forma de que o ouvinte reage perante o enunciado etc.) Os actos de

fala podem desempenhar várias funções: informar, pedir informação, dar ordem, perguntar, fazer um pedido etc. Um

acto de fala compõe-se de falante, ouvinte, expressão e contexto (Alonso-Cortés, 1993). Todos estes elementos são

imprescindíveis para a realização de um acto de fala: O falante serve para pronunciar uma frase, que, de uma ou de

outra forma pode ser importante, como constatação, expressão de sentimentos, de obrigação, de pedido, ordem ou

qualquer outra função pragmática. O ouvinte é o segundo elemento indispensável, porque serve para um acto

comunicativo se levar a cabo. Porque, quando alguém pronuncia uma frase sem que ninguém o ouça, não se pode

falar de um acto de fala em pleno sentido da palavra. A expressão é importante por causa da força pragmática que

tem e, finalmente, o contexto é um segmento de grande relevância para um acto de comunicação, porque dele

depende o efeito que o enunciado terá no ouvinte. Por exemplo: Portugal é um país pequeno dito numa aula de

geografia por um aluno pode ter a conotação neutra, mas dito num discurso político pode adquirir várias conotações:

Portugal não tem forças suficientes para lutar com os problemas que tem, ou Portugal é um país pequeno, mas

apesar disso tem grande cultura etc. Dependendo da intenção comunicativa do falante, podem existir várias

classificações dos actos de fala. Uma delas foi elaborada por John. R. Searle e segundo ela, dividem-se em:

1) actos assertivos

2) actos directivos

3) actos expressivos

4) actos compromissivos

5) actos declarativos ou declarações

6) declarações assertivas

Os actos de fala assertivos. Definição e exemplos

Os actos assertivos estão relacionados com o valor de verdade ou falsidade do enunciado. Mediante estes actos

descreve-se pura e simplesmente uma situação ou constata-se um facto ou um estado. Tal é o exemplo da

frase: Todo ser humano é mortal, cuja veracidade pode ser cientificamente comprovada e que neste caso é

verdadeira.

Este tipo de actos pode exprimir constatação, afirmação, aceitação etc. Os verbos frequentes nos actos assertivos

são: dizer, afirmar, constatar, negar, rejeitar, confirmar, admitir, supor, anunciar e outros. Um acto de fala assertivo

pode aparecer tanto em forma afirmativa, como na negativa. Desta maneira podemos dizer: o Danúbio é um rio tal e

como: o Danúbio não é uma montanha. O verbo principal da oração deve encontrar-se no modo indicativo,

geralmente no presente. Quando pronunciamos: Admito que cometi um erro, trata-se de uma asserção. No entanto, o

acto de fala: Não admito que tenha cometido um erro, já não é assertivo, mas é expressivo, porque exprime uma

atitude subjectiva do falante. Um dos verbos anteriormente citados que se usa com os actos de fala assertivos pode

aparecer explicitamente, mas a sua presença não é obrigatória. Desta forma, podemos encontrar frases como. Digo-

te que agora está a chover. E Agora está a chover. Ambos os enunciados classificam-se como assertivos, só que no

primeiro caso o verbo explicitado serve para reforçar o conteúdo da frase. Um acto assertivo pode também ter a

função de uma advertência . Para ilustrar, servir-nos-emos do seguinte exemplo: Na rua a estas horas há muitos

carteiristas. A frase não foi pronunciada só para constatar o grande número dos carteiristas, mas também para avisar

que é melhor termos cuidado com eles se sairmos para a rua muito tarde.

Os actos de fala directivos. Uma análise mais detalhada

Os actos directivos, tal e como o seu nome indica têm a intenção de se dirigir ao interlocutor e influenciar o

comportamento dele, fazendo-o agir de acordo com os objectivos que o falante deseja atingir. Tais actos são

pedidos, ordens etc. Se um acto vai ser interpretado como pedido ou ordem, depende da entonação, formas verbais

usadas e outros factores. Quando utilizamos um acto directivo, temos em conta a acção que desejamos que o

interlocutor realize no futuro.

Exemplo: Dá-me um copo de água, por favor.

Com este acto de fala, queremos influenciar o ouvinte para levar a cabo a acção de trazer o copo de água.

Este enunciado tem a função comunicativa de pedido, porque assim o indicam as palavras “por favor”, a entonação

normal, e o ponto final. Se o falante quisesse atingir o mesmo objectivo, mas com mais delicadeza e formalidade,

poderia formular a frase como pergunta e dizer assim: “Poderias dar-me um copo de água, por favor?” neste

contexto não estamos interessados em saber se o nosso interlocutor tem a capacidade de nos trazer o copo de água,

porque isso é um facto que se subentende e o que realmente desejamos é saber se a pessoa à qual nos dirigimos tem

a suficiente amabilidade de obedecer o nosso pedido. No entanto, se o falante quisesse dar uma ordem com estas

mesmas palavras, a sua entonação seria diferente e no final da frase encontrar-se-ia um ponto de exclamação: “Dá-

me um copo de água já!” Se repararmos bem, nesta nova frase em vez do elemento “por favor” aparece o advérbio

de tempo “já”, o que indica que o falante deseja que a sua intenção se realize imediatamente. Uma ordem,

naturalmente pode exprimir-se com a frase declarativa também. Neste contexto seria preciso dizer o verbo ordenar:

Ordeno-te que me tragas o copo de água”, o que neste exemplo é pouco natural, ou simplesmente podemos exprimir

uma ordem mediante o verbo no modo imperativo: “Traz-me um copo de água” Um acto de fala que exprime pedido

pode realizar-se através de uma frase declarativa com o verbo no pretérito imperfeito. Nomeadamente, o exemplo:

Queria um pastel de nata neste contexto não significa que antigamente queria um pastel e já não o quero, mas é uma

forma educada de pedir. Com os actos directivos pode se expressar uma proibição, uma permissão, pode dar-se um

aviso ou uma advertência uma ordem ou é possível fazer uma pergunta. Os verbos que ocorrem neste tipo de frases

são: permitir, deixar, pedir, exigir, insistir, ordenar.

“Ordeno-te que não toques as minhas ciosas!” é uma forma clara de dar uma ordem. A frase com o mesmo conteúdo

pode dizer-se com um verbo em imperativo e na forma negativa. Se a ordem for mais “suave”, no final da frase

encontrar-se-á um ponto final, e se for dita com mais rigor, utilizar-se-á um ponto de exclamação. Por exemplo: Não

toques as minhas coisas. Ou: Não toques as minhas coisas! Para fazermos uma pergunta, podemos recorrer aos

recursos linguísticos da frase interrogativa ou mediante o verbo perguntar no presente de indicativo e a frase

declarativa. Nomeadamente: Vais jantar em casa?

Ou : Pergunto-te se vais jantar em casa. O segundo exemplo fora dum determinado contexto não faz muito sentido e

pode parecer pouco natural, mas se imaginarmos uma situação concreta, pode-nos ficar mais claro:

Mãe: Filho, hoje vais jantar em casa?

Filho: O que estás a dizer? Não te estou a ouvir, a ligação está muito má.

Mãe: Pergunto-te se vais jantar em casa.

Filho: Ah, sim, sim.

Neste contexto a frase declarativa tem a função de uma pergunta embora não fossem utilizadas as características

típicas de uma pergunta (a entonação ascendente no final da frase, os pronomes interrogativos etc.) Mesmo assim, a

resposta pode ser sim ou não, igual que nas perguntas feitas com frases interrogativas.

Significado e forma dos actos de fala expressivos

Os actos de fala expressivos utilizam-se para se referirem ao estado psicológico do falante, acerca do conteúdo do

enunciado que é proferido Os verbos frequentemente usados neste tipo de actos são os seguintes: gostar, detestar,

adorar, odiar admirar etc. e a forma verbal usada é a primeira pessoa de singular, porque através do enunciado, o

falante exprime a sua atitude subjectiva em relação a um determinado assunto. Através deste tipo de actos de fala

pode exprimir-se a admiração, os parabéns, a preocupação , o gosto, o desgosto, a lamentação etc. A estrutura dos

actos expressivos funciona segundo a mesma lógica que os actos de fala anteriormente citados e analisados, isto é

com o sem um verbo introdutório que expresse o conteúdo da frase.

Exemplos: Detesto ver a roupa espalhada por todas as partes do quarto.

Gosto de jantar fora com os amigos.

Admiro as pessoas que conseguem tudo aquilo que querem.

Aqui o importante é o verbo expressivo na primeira pessoa de singular, porque exprime a subjectividade e uma

atitude pessoal do falante. Se na frase fosse utilizada qualquer outra pessoa dos mesmos verbos, já o enunciado em

questão não seria um acto expressivo. (ex.) A Maria gosta de jantar fora com os amigos.

Sem verbo introdutório, os actos de fala expressivos têm uma das seguintes formas:

Parabéns! Neste exemplo numa só palavra se expressa a satisfação e o sentimento da alegria do falante por algo que

o ouvinte fez.

Maldito seja o dia em que nasci! Em que se exprime um estado de tristeza e rancor ao mesmo tempo. O que chama a

atenção aqui é uma grande carga emotiva das frases proferidas, e por isso, a entonação deve também ser emotiva

(Moreno Cabrera, 1994). No entanto, se pronunciarmos qualquer uma das últimas duas frases com uma entonação

neutra, o efeito não será o mesmo. A frase “Parabéns.” Pronunciada ou escrita como se fosse declarativa, sugeria-

nos uma certa indiferença perante a alegria do outro ou até inveja., enquanto o enunciado: “Maldito o dia em que

nasci.” Sendo uma frase declarativa, não tem grande força ilocutória nem grande poder de convencer o ouvinte das

emoções e da verdadeira situação em que o falante se encontra.

O compromisso dos actos compromissivos

Os actos compromissivos são aqueles através de cuja pronúncia o falante se compromete que no tempo

futuro mais ou menos próximo realizará uma acção. Exemplo: O próximo sábado vou dar-te uma surpresa. O mesmo

efeito seria conseguido se o falante tivesse pronunciado: Prometo-te que te vou dar uma surpresa no próximo

sábado.

Este tipo de actos aparece geralmente com os verbos prometer, jurar, oferecer, propor, comprometer-se. O verbo

comprometer-se tem a força ilocutória maior que o verbo prometer, mas menor que o verbo jurar.

Prometo que te vou comprar um vestido novo. Este acto é uma promessa, mas pode realizar-se num futuro não

muito próximo, ou pode até ficar sem realização, enquanto “comprometo-me “ ou “juro” implicam uma grande

seriedade da intenção do falante. Claro está que estes verbos não são obrigatórios e que um acto de fala

compromissivo pode ser válido sem eles. Tal é a situação com as seguintes frases:

Compro-te um computador quando tiveres boas notas. Ou:

Para a semana iremos ao Palácio da Pena.

Nestas frases o falante, sem pronunciar nenhum verbo introdutório compromete-se a fazer um acto no futuro,

relacionado com o interlocutor Mesmo sem verbos que se usam neste tipo de actos, podemos concluir que se trata de

um acto compromissivo, porque na primeira frase existe um elemento relacionado com o futuro “quando tiveres

boas notas” ou um verbo no futuro simples de indicativo, que indica mais certeza no momento de cumprir a

promessa.

Os actos de fala declarativos e a sua relação com a frase declarativa

Os actos de fala declarativos procuram alterar a realidade existente. Acontecem numa instituição e fazem com que o

conteúdo do enunciado e a acção coincidam.(Almeida Mora, 2003). Um dos verbos que ocorre com frequência nos

actos declarativos é naturalmente o verbo declarar. Usa-se tanto nos casamentos, como nas conferências. Exemplos:

Declaro aberto o Quinto congresso internacional sobre os problemas da imigração em Portugal. Ou. Declaro-vos

marido e mulher. Aqui o verbo declarar tem uma maior força ilocutória que o verbo casar, porque nas cerimónias de

casamento não é possível dizer: “Caso-vos”. A frase “caso-vos” não tem um grau de formalidade suficiente para se

adequar a um acto oficial, institucionalizado e formal como o casamento.

As características formais deste tipo de actos de fala são as seguintes: o verbo introdutório declarar e afins,

encontram-se na primeira pessoa de singular do presente de indicativo, a entonação da frase, e as marcas da

pontuação correspondem à frase declarativa Um acto declarativo não se pode fazer através de formas interrogativas

ou exclamativas. Se o verbo da frase se encontrar em qualquer outro tempo e modo verbais, já não será um acto o

declarativo. Por exemplo: Declarar-vos-ei marido e mulher seria mais parecido com um acto compromissivo em que

se faz uma promessa. Uma subespécie dos actos declarativos denomina-se na linguística como actos declarativos

assertivos ou declarações assertivas.

As declarações assertivas representam uma combinação entre as puras asserções e as declarações, isto é, introduzem

um novo estado dentro da realidade existente, tendo em conta a verdade do enunciado. Tal é o caso dos veredictos

nos tribunais que declaram uma pessoa culpável ou inocente. Nesta situação realizam –se dois actos: o de declarar

oficialmente a culpabilidade ou inocência da pessoa em questão e de constatar um estado ou um facto.

A classificação dos actos de fala na perspectiva de Austin

John L. Austin tem uma outra perspectiva para abordar a teoria dos actos de fala e divide-os em dois grandes grupos:

constatativos e performativos. Dentro do primeiro grupo cabem os enunciados com os quais se constata uma

situação, que servem para informar sobre o estado de coisas e que podem ser considerados verdadeiros ou falsos e

correspondem ao que Searle chama “actos assertivos”. O outro grupo de actos são aqueles em que o acto de proferir

e o acto de fazer coincidem. Estes actos exigem o uso da primeira pessoa de singular e o presente de indicativo. Se

forem usadas outras formas verbais, perder-se-á a força ilocutória performativa. Também devem ser realizados

dentro do espaço e tempo adequados à situação, por uma pessoa que seja legalmente autorizada a realizar a dada

acção .As condições necessárias para um acto performativo ser levado a cabo chamam-se condições de felicidade

(felicity conditions) (Kurzon, 1986) Os exemplos frequentemente citados para ilustrarem estes actos de fala

relacionam-se com os baptismos ou casamentos. (“Eu baptizo-te em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo”ou

“Declaro-vos marido e mulher”). No entanto, mesmo que sejam pronunciados na primeira pessoa de singular do

presente de indicativo, estes enunciados não são válidos se forem pronunciadas por qualquer pessoa ou em qualquer

lugar e situação. Devem ser proferidos por uma autoridade civil ou religiosa, numa determinada instituição e na

situação apropriada às circunstâncias de baptismo ou de casamento. Se o enunciado “declaro-vos marido e mulher”

for proferido num funeral ou no parlamento, por exemplo, já não faria sentido e não seria pragmaticamente correcto,

embora a frase usada seja gramatical Sem serem cumpridas as condições requeridas, este enunciado deixa de ser um

acto performativo e passa a ser pura e simplesmente uma frase declarativa sem força ilorcutória.

Os actos de fala e a teoria de Grice

Para abordarmos mais profundamente o tema dos actos de fala, seria necessário mencionar as quatro máximas de

Grice, porque consideramos os princípios de conversação estreitamente ligados ao sentido pragmático das frases que

pronunciamos na nossa comunicação do dia-a-dia. As ditas máximas são divididas em seguintes categorias: de

quantidade (dar a informação suficiente), de qualidade (dizer só aquilo que for considerado verdadeiro pelo falante),

de relação (ser relevante e referir apenas os factos relacionados com o assunto) e de maneira (exprimir-se com

clareza, evitar ambiguidades, ser breve e expor o que tem de ser dito segundo da lógica) (Leech, 1985). Se uma das

regras que Grice propõe não for respeitada, o enunciado pode causar confusão no ouvinte e a intenção comunicativa

do falante pode não ser bem interpretada. Para um enunciado seja percebido com sucesso é preciso ter em

consideração o significado implícito das frases. Este conceito é o que Grice denomina como implicatura. A partir

desta noção podemos voltar à análise dos actos de fala indirectos.

A frase declarativa e os actos de fala

Depois de termos abordado os conceitos da frase declarativa e dos actos de fala, é nos mais fácil estabelecer uma

relação entre eles, mas voltando atrás veremos mais duas abordagens possíveis dos termos “frase” e “frase

declarativa”. “ a frase é um enunciado de sentido completo, a unidade mínima de comunicação” (Cunha, Cintra

2002) As palavras mais importantes são: “enunciado”, “sentido completo” e “unidade de comunicação”, o que

significa que a frase não é um elemento puramente gramatical, e que está estreitamente ligada à pragmática, à

comunicação e aos actos de fala. Na perspectiva de um outro autor (Mi�unovi�,2002), a frase declarativa tem

como função comunicativa a transmissão de informação. (

Segundo esta lógica na língua sérvia existe outro nome para este tipo de frases, para além de “declarativa”, que é “a

frase informativa”. Neste momento poderíamos relacionar a função informativa da frase declarativa com os actos de

fala. Dado que (Aitchison, 1993 “todos os enunciados são actos de um determinado tipo”, podemos deduzir que a

frase declarativa não serve pura e simplesmente para dar informações, mas de certa maneira influencia o interlocutor

e fá-lo agir seja directa, seja indirectamente. Sendo assim, surge uma outra divisão dos actos de fala em actos

directos, onde o objectivo do falante está expresso e a sua intenção é óbvia. Tudo está dito de uma forma clara e

perceptível. O verbo geralmente está no modo imperativo e a entonação pode variar segundo se quer exprimir um

pedido ou uma ordem. Para pedido podemos citar o exemplo: Vai aos correios e entrega esta carta. Se for preciso

dar uma ordem, o seguinte enunciado seria suficiente para ilustrar a intenção do falante: Levanta-te. Como já vimos,

com a frase declarativa podem exprimir-se todos os tipos de actos de fala sem que isto influencie a sua estrutura ou

ordem de palavras. Tendo isto tudo em conta, pode-se deduzir que a forma do acto é tão importante como o seu

conteúdo e tem uma grande influência na sua validade e interpretação.

Quando não utilizamos os meios linguísticos tão claros, e queremos esconder a nossa verdadeira intenção, trata-se

de actos de fala indirectos. Aí o significado literal não corresponde ao significado intencional. (Finegan, 2004). Por

exemplo a frase: A canja de galinha faz bem à saúde, dita a uma pessoa doente, podia significar uma sugestão

indirecta para o paciente comer a mencionada canja. Ou: Neste quarto faz um calor insuportável, além de ter o seu

significado literal, pode interpretar-se como um pedido para se abrir a janela ou ligar a ventoinha ou de se sair ao

jardim etc. Outro exemplo dos actos de fala indirectos vê-se muito bem na seguinte situação comunicativa:

Pedro: Vamos a alguma discoteca esta noite?

Joana: Tenho um exame amanhã de manhã.

À primeira vista estes dois enunciados não têm relação nenhuma entre si, mas a resposta da Joana implica os

seguintes significados:

a) É uma forma educada de a Joana recusar a proposta do Pedro

b) A Joana deseja dizer que está cansada e que quer dormir para se preparar para o exame de manhã.

c) A Joana quer salientar a importância e /ou dificuldade do exame e por este motivo não tem tempo

para divertir-se.

Como é que o ouvinte, neste caso o Pedro vai interpretar este acto de fala, depende da concreta situação

comunicativa, do conhecimento de vários factores extra-linguísticos que aparecem quando um enunciado é

proferido (por exemplo, a entonação da frase, a relação entre os participantes na conversa, etc.)

Os actos de fala indirectos são muito usados nos anúncios publicitários, dado que ali é importante interpretar a

“segunda intenção” do anunciante, que é influenciar o ouvinte da publicidade a comprar o produto em questão. Por

exemplo, os últimos anúncios para a rede de telefonia móvel Optimus “Ninguém vive sem emoções/ sem amigos/

sem diversão” de forma nenhuma representam um pensamento filosófico ou uma pura constatação de um facto ou

situação. Por trás destas frases declarativas está o seguinte sentido: “A rede Optimus vai-vos dar a possibilidade de

conhecer novos amigos e manter as velhas amizades, vai influenciar na sua vida criando um mundo de emoções e

diversão, por isso, comprem os nossos cartões de telemóvel”.

Análise mais aprofundada dos actos de fala directivos nos anúncios publicitários

A área da publicidade é uma área onde a linguagem é muito explorada e utilizada com cuidado, tendo em conta os

efeitos que se desejam produzir os no potencial cliente. Por isso, as pessoas empregadas nas empresas de marketing

devem ter bons conhecimentos tanto da própria língua e significados das palavras (sentidos figurados, expressões

idiomáticas, fraseologia, expressões fixas, palavras que podem ser usadas para produzirem um efeito cómico etc.),

como também o seu uso pragmático e as situações comunicativas onde um determinado enunciado se usa na vida

quotidiana. A partir daí relacionam-se as esferas do privado e do público e surge um anúncio publicitário com

determinados objectivos para atingir. Devido a que o destinatário se quer identificar com a imagem feita na

publicidade, uma mesma ideia vai ser transmitida de diferentes formas, dependendo do público-alvo. Quando um

produto se destina a adultos, as formas verbais usadas estarão na terceira pessoa de singular, o que indica um nível

de formalidade e respeito que se mostra ter pelo potencial consumidor. (venha descobrir a Quinta dos Alcountis). Se

uma mensagem publicitária for destinada ao público infantil, a forma de tratamento será o pronome pessoal de

segunda pessoa de singular (tu), o que implica um menor grau de formalidade e uma certa proximidade com a

criança como possível consumidor.

a) Ordens e desejos com estas e outras funções

Como já mencionámos dentro das tipologias dos actos de fala, mediante os actos directivos pode expressar-se

ordem, desejo, pedido, sugestão e advertência.. Para explicitar a força ilocutória destes actos, usam-se os verbos

performativos que exprimem claramente se se trata duma ordem, ou pedido ou sugestão (mandar, ordenar, sugerir,

propor, pedir, rogar, , implorar etc.) Está claro que uma ordem tem maior força ilocutória se for proferida numa

instituição oficial, do que se for pronunciada em casa ou dentro dum espaço privado. Tratando-se das organizações

civis ou religiosas que impõem uma ordem, elas podem recorrer à aplicação duma determinada forma de castigar

aquele que não a respeitar. No entanto, os simples desejos, tendo menor grau de formalidade, não podem ser

puníveis por lei se não forem cumpridos. Na área da publicidade, ninguém menciona a possibilidade de castigar o

cliente se não decidir comprar um determinado produto. Por este motivo frequentemente é preciso reformular uma

ordem de forma a parecer um desejo, pedido, sugestão ou instrução. Tendo isto em conta, nesta área, onde o poder

de persuasão é extremamente importante, devem ser respeitados os princípios de delicadeza e uma ordem pode

aparecer sob a forma de pedido, conselho, advertência ou sugestão. Nomeadamente no exemplo: Seja mais rápido

que um enfarte. Ligue de imediato 112. as frases contêm elementos que nos poderiam sugerir que se trata de uma

ordem: as formas verbais no imperativo, e o sintagma “de imediato” são características das ordens, e a pontuação

existente nas frases declarativas poderia convencer o destinatário de que o anunciante está verdadeiramente

preocupado com a saúde dos cidadãos. Outro exemplo parecido é Adira já, referindo-se aos serviços da Internet ou

da telefonia móvel. Outra vez período de tempo, mas no contexto de anunciar um produto relacionado com as novas

tecnologias, pode obter a interpretação de conselho, ou sugestão desejada pelos anunciantes. Indirectamente, este

enunciado pode significar; “Se não aderir já aos serviços que a nossa companhia oferece, a proposta que fazemos

deixará de ser válida, e o cliente não terá acesso a todas as vantagens da comunicação rápida, barata, segura etc.”

Mesmo sem os verbos performativos que introduzem o efeito que se deseja produzir no destinatário, vimos de que

formas é possível interpretar uma ordem e quais são as suas possíveis forças ilocutórias. Quando é proferida uma

ordem, a sua força é maior que a força do desejo, embora as formas em que estas duas categorias aparecem sejam

parecidas. Uma ordem, tanto como um desejo pode exprimir-se mediante as frases imperativas, a forma verbal

imperativa dentro da frase declarativa, o que ilustram os exemplos anteriormente citados, mediante o uso dos verbos

no modo conjuntivo, mediante as frases elípticas etc.

b) pedidos, conselhos, sugestões e advertências

Embora os significados e situações de uso destas funções pragmáticas sejam parecidos, primeiro faremos uma

pequena distinção entre pedidos e todos os restantes elementos em que se vai centrar esta pequena análise.

Realizando o acto de pedir, o falante deseja ter algum benefício para si próprio, enquanto nos outros actos é preciso

ter em consideração o efeito proveitoso que o ouvinte poderia ter. Tanto no caso de pedir, como no momento de

propor, sugerir, aconselhar ou advertir, a posição do falante (ou no caso das publicidades do anunciante) pode ser

visível ou oculta detrás de uma forma verbal impessoal. Os exemplos que ilustram as seguintes situações são:

“Pedimos desculpa pelo incómodo” (Metropolitano de Lisboa). Nesta frase o predicado está na primeira pessoa do

plural, o que implica o carácter pessoal dum conjunto de pessoas que clara e obviamente expressam o desejo de

pedirem desculpa. Vejamos o seguinte exemplo: “Senhores passageiros, por favor, não forcem as portas”.

(Metropolitano de Lisboa), onde o sentido de pedido se nota através da forma de tratamento delicada “senhores

passageiros” e o sintagma “por favor”. Ou: Pede-se o favor de saírem do comboio” (Metropolitano de Lisboa).

Neste caso, a frase é tem uma forma despersonalizada, mas o objectivo de pedir é óbvio através do verbo pedir e o

substantivo favor que aparece logo a seguir. Nos anúncios publicados nos meios de comunicação, a forma directa

de pedir não é muito usada devido a sua pouca força ilocutória. Numa campanha contra o tabagismo, por exemplo,

ninguém se importaria com um anúncio que dissesse: “É favor deixarem de fumar” ou “pedimos os fumadores que

deixem de fumar.” Neste momento começa a ser importante a forma em que o possível destinatário desta campanha

deve ser convencido a deixar o tabaco e aceitar uma forma de vida mais saudável. Igualmente uma publicidade que

diga: “Pede-se o favor de comprarem este produto ou a aderirem aos serviços que oferecemos” seria interpretada

como uma forma desesperada de andar à procura dos clientes e seria absolutamente contra-produtiva no mundo em

que apresentar bem um objecto, persuadir os destinatários das suas vantagens e finalmente vendê-lo é um

imperativo. Aqui é que os pedidos devem ser transformados em sugestões, conselhos ou advertências. Para ilustrar,

servir-me-ei dum exemplo publicado no jornal Correio de Manhã: “Relembre a grande obra da literatura

portuguesa. “Os Lusíadas” com o CM” Este enunciado tem a função de sugerir de uma forma sofisticada que o

leitor deveria comprar o livro. Para além disso, o verbo usado é relembrar, o que sugere que os destinatários desta

publicidade já tinham lido a obra num determinado momento das suas vidas e que seria bom trazerem de novo à

memória tudo o que é belo neste livro O sintagma “a grande obra” também tem o seu poder sugestivo, porque as

pessoas que por vários motivos ainda não a leram, ficarão intrigados e influenciados a irem buscar e comprar o

jornal e o livro. Num anúncio publicado na rádio TSF para o banco Espírito Santo a voz de uma criança pronuncia a

seguinte frase: “Vai ao BES e pergunta lá..” Isto é uma sugestão, porque se dirige ao ouvinte e sugere-lhe

directamente a acção que deve realizar. Outro elemento sugestivo tem a ver com o facto de ser uma criança a

proferir a frase, o que implica que até as crianças são capazes de reconhecer a qualidade dos serviços que este

determinado banco oferece e que por isso, seria muito proveitoso que os adultos abrissem uma conta ali. O tom

informal da publicidade tem a função de sugerir uma relação de proximidade entre o banco e os clientes, o que

implica também uma relação de confiança.

Um exemplo acto de fala com o significado de conselho seria: “Esta semana não perca O Fiel Jardineiro com

a Visão.” Aconselha-se a compra da revista porque com ela vem um DVD de um filme famoso e premiado, e não

vê-lo, segundo os autores da publicidade, seria uma grande perda para o leitor da revista e potencial comprador do

disco com o filme. Aqui a forma de tratamento é a terceira pessoa de singular, e dado que o disco vem junto com

uma revista destinada ao público intelectual, o conselho para eles é verem um bom filme, conhecido pelo Globo de

Ouro que lhe foi atribuído. A forma da frase é negativa, o que implica uma certa obrigatoriedade no valor e

significado do conselho. Neste tipo de actos de fala, explorados para fins publicitários não devem aparecer palavras

com a conotação negativa, porque o efeito da publicidade seria contra-produtivo. No exemplo: “Não seja parvo para

pagar mais do que deve” que se ouve nas rádios para expor as vantagens dos serviços de um banco a palavra “parvo”

sugere uma visão extremamente depreciativa dos que não são clientes desse determinado banco, porque se poderia

interpretar como: “aqueles que não estão bem informados sobre os nossos serviços são parvos e pagam mais”. Para

se evitarem as possíveis ambiguidades deste enunciado, seria mais recomendável transformar a inicial frase negativa

numa afirmativa e dizer: “Seja prudente/inteligente e pague menos”. Desta forma, o potencial cliente sentir-se-ia

mais à vontade, vendo que o banco lhe aconselha uma coisa razoável e poderia tomar a proposta em consideração.

Um exemplo de acto de fala com significado de conselho que poderia ter muito sucesso entre as pessoas às que se

destina é: “Case a sua poupança com o seu investimento”. O verbo casar aqui sugere uma relação estável, duradoura

e de confiança, o que, junto com a imagem de dois jovens felizes e os seus anéis de aliança inspira os potenciais

utentes do banco a identificarem-se com o conteúdo do anúncio. Um exemplo mais de conselho ou sugestão seria o

anúncio: “Vá de metro ao cinema”, que tem forma de explicação ou até instrução, não serve para indicar como é que

se vai ao cinema, mas é uma forma indirecta de anunciar que os utentes do passe Lisboa Viva terão certos descontos

nos cinemas da cidade. Este acto directivo tem em conta algumas vantagens que o destinatário pode tirar se

apresentar o seu passe nos cinemas, e por isso tem força ilocutória de conselho ou sugestão.

Visto que os significados dos actos de fala directivos que exprimem sugestão, recomendação ou conselhos são muito

próximos, por vezes é difícil estabelecer uma diferença entre eles. No caso das advertências, esta distinção é

aparentemente mais fácil. Nomeadamente a frase: “Cuidado com os carteiristas.” Que se encontra em todos os meios

de transporte público de Lisboa está clara a intenção do falante prevenir os passageiros para o perigo que pode

existir nos veículos. No entanto, existem muitas outras formas menos directas de exprimir o mesmo sentido.

Nomeadamente o aviso que se encontra frequentemente no metro de Lisboa “Andar de transporte público sem

o válido é punível por lei” é uma advertência indirecta sobre o que pode acontecer se um passageiro não pagar ou

validar o título (pagar uma coima que ultrapassa cem o cento e cinquenta vezes o valor do bilhete). Unida esta

mensagem com uma imagem de uma pessoa sem rosto que nas mãos tem um cartaz que diz “cliente sem título” que

faz lembrar um prisioneiro, provavelmente tenha um efeito maior nos destinatários do que simplesmente uma frase

que diz assim “É proibido entrar no metro sem pagar o título” ou “Atenção! Cada utente do metro deve pagar e

validar o título, se não, vai ser obrigado a pagar um valor superior a cem valores do preço do bilhete.”

c) Instruções

Com as instruções relacionadas ao uso dum determinado produto encontramo-nos cada dia: quando compramos um

aparelho e precisamos de o montar, nas embalagens onde lemos como se deveria preparar uma determinada comida,

quando queremos participar num jogo ou sorteio. A forma duma instrução pode ser uma frase declarativa que

contém um verbo no presente de indicativo, imperativo ou infinitivo. Podem usar-se os verbos na sua forma

afirmativa ou negativa. Os exemplos que ilustram estes usos são: “Pode resolver os problemas técnicos e colocar

dúvidas através do sistema da ajuda automática prestada pela Knowledge Base da Creative , disponível as 24 horas

por dia no site www.creative.com” Neste primeiro caso, a instrução é feita mediante o uso do presente de

indicativo, uma forma aparentemente vazia de sentido de querer ensinar, instruir ou indicar algo ao utilizador, no

entanto, pode ser interpretada como tal porque dentro da frase aparecem dados como o nome do serviço que dá o

apoio técnico ao cliente e o horário do seu funcionamento e o sítio Web onde se podem encontrar todas as

informações úteis ao cliente. Uma instrução indirecta feita a partir do verbo em forma impessoal do presente de

indicativo é: “Há preços ali e há preços Aki”. Com esta frase instrui-se o destinatário de ir ao supermercado do

mesmo nome, tendo em conta uma seta que mostra a direcção do local onde este se encontra.

Um exemplo em que a instrução se faz mediante o verbo no imperativo é o seguinte anúncio “ Envie duas vezes

dinheiro para o estrangeiro pela Western Union e ganhe telemóveis e muito mais.” Esta frase declarativa em função

de acto de fala directivo é uma instrução porque explica o que é que um potencial participante num sorteio

deve fazer para ter a possibilidade de ganhar um determinado prémio.

A terceira variante de instruções pode fazer-se utilizando a forma infinitiva, como a mais neutra de todas, mas que

também tem força ilocutória directiva. Tais são os exemplos que se encontram nas caixas de determinados produtos

ou nos ecopontos, nomeadamente: “abrir aqui”, “não mexer” ou “colocar aqui só papal”. Devido à sua forma

impessoal, o infinitivo nos anúncios publicitários é mais raro do que o imperativo, mas é possível encontrá-lo nos

sites da Internet (por exemplo: “Comprar agora”) , o que se pode interpretar como uma influência da língua inglesa

onde as formas verbais não têm marcas para cada pessoa em particular.

Ensino e aprendizagem dos actos de fala

Dado que os actos de fala pertencem ao domínio da pragmática, a questão que se levanta é se existe uma forma

adequada de os ensinar na sala de aula. O que é óbvio é que a parte teórica, os nomes e as classificações que vários

autores lhes atribuíram estão disponíveis nas gramáticas e nos manuais de linguística e qualquer aluno pode

consultá-los no momento em que precisar. No entanto, saber a teoria nem sempre significa dominar a prática e que

um saber abstracto vai ser-nos útil no momento em que será preciso actuar concretamente. O uso correcto dos actos

de fala aprende-se nas situações concretas, na comunicação e interacção com outros falantes da língua. Por outro

lado, no domínio da propaganda e do marketing, mencionados ao longo deste pequeno trabalho, o que é

indispensável estudar as necessidades do público, as imagens com as que os destinatários se identificam, os

momentos e as situações da vida em que eles se encontram ou desejam encontrar-se, para se poder recorrer ao acto

de fala apropriado para atingir o objectivo desejado e não produzir efeitos negativos. Tudo isto são elementos extra-

linguísticos e nem sempre é fácil aprendê-los.

Conclusões

Nas páginas deste trabalho foram analisados vários conceitos importantes tanto para a gramática, como para a

comunicação, em primeiro lugar, foram analisadas as definições da frase, enunciado, frase declarativa, actos de fala,

as suas tipologias e classificações. Isto tudo serviu-nos como ponto de partida para nos centrarmos numa área

aparentemente pouco relacionada com o domínio linguístico: a das publicidades e anúncios em vários locais

públicos. Além de serem estudados os actos de fala directivos, tentámos observar quais são alguns dos seus

possíveis efeitos nos destinatários, quais são os factores que podem influenciar o ouvinte /leitor para optar por um

determinado produto. As fontes usadas para a elaboração deste trabalho de seminário foram várias: o

enquadramento teórico baseia-se nos livros e investigações de autores eminentes na área da linguística (Mira

Mateus, Searle etc.), enquanto para os exemplos práticos, foram procurados nos meios de comunicação, nos

transportes e no ambiente que nos rodeou. Esta pequena pesquisa foi-me útil no sentido de ter reforçado alguns

conhecimentos que já tinha adquirido ao longo dos meus estudos anteriores e também ajudou-me a olhar para os

actos de fala como um meio em maior ou menor medida poderoso para influenciar os interlocutores e pessoas com

quem interagimos na comunicação quotidiana.

Bibliografia:

a) Gramáticas de referência:

CUNHA, Celso, CINTRA LINDLEY, Luís Filipe (2002) Nova Gramática de Português Contemporâneo, Edições

Júlio Sá de Costa, Lisboa, pp. 119-120

MATEUS, Maria Helena Mira,et. Al (2003),Gramática da Língua portuguesa, 5ª edição revisada e aumentada,

Caminho, Lisboa, p.73

b) Outras gramáticas:

ALMEIDA MORA, José de (2003), Gramática do Português moderno, Lisboa Editora, Lisboa, pp.224-225

CASTRO PINTO José Manuel, VIEURA LOPES Maria do Céu (2007), Gramática do Português Moderno, Plátano

Editora, Lisboa,pp175-176

MI�UNOVI�, Ljubo, (2002), Gramatika bez muke, priru nik za osnovne i srednje škole, Altera, Beograd

STANOJ I�, Živojin, POPOVI�, Ljubomir, (2000), Gramatika srpskoga jezika, Zavod za udžbenike i nastavna

sredstva, Beograd, p.195

VILELA, Mário (1995), Gramática da Língua portuguesa, Livraria Almedina, Coimbra, pp.246-247

c) Dicionários:

XAVIER, Maria Francisca, MATEUS, Maria Helena Mira (org.) (1990) Dicionário de Termos Linguísticos, vol 1,

Edições Cosmos, Lisboa, pp.20-33

d) Teses

CASANOVA, Maria Isabel (1899), Os Actos Ilocutórios Directivos- a Força do Poder ou o Poder da Persuassão,

tese de Doutoramento em Linguística Inglesa, Faaculdade de Letras, Lisboa

e) Manuais de Linguística:

ALONSO-CORTÉS, Ángel, (1993), Lingüística General, 3ª edición corregida y aumentada, Cátedra, Madrid,

pp.219-221

AITCHISON, Jean, (1993) Introdução aos Estudos Linguísticos, 4ª edição, Publicações Europa-América, Lisboa,

pp.111-1113

FINEGAN, Edward, (2004) Language, its Strusture and Use, fourth edition, Worsforth, Thompson, Boston,

pp.298-324

HUB FARIA, Isabel, et. Al. (1996) Introdução à Linguística Geral e Portuguesa, Caminho, Lisboa

KURZON, Dennis (1986) It is Hereby Performed... An Exploration in Legal Speech Acts , John Benjamni´s

Publishing Company, Amsterda, Philadelphia

LEECH, Goeffry N, (1986), Principles of Pragmatics, Longman, London, New York

MORENO CABRERA, Juan Carlos (1994),Curso Universitario de Lingüística General, tomo II, Semántica,

Pragmática, Morfología y Fonología, editorial Síntesis, Madrid, pp.359-373

SEARLE, John, (1969), the Speech Acts, an essay on Philosophy of Language, Cambridge Universsity Press,

London