O que os ossos revelam mas não contam: a importância dos dados históricos e socio-‐ culturais...

25
O que os ossos revelam mas não contam: a importância dos dados históricos e socio-culturais para a compreensão dos resultados da análise paleobiológica de uma amostra osteológica Portuguesa X Congreso Nacional de Paleopatologia Madrid, 3,4 e 5 de Setembro, 2009 Cristina Barroso Cruz Departamento de Antropologia da Universidade de Coimbra

Transcript of O que os ossos revelam mas não contam: a importância dos dados históricos e socio-‐ culturais...

O que os ossos revelam mas não contam:

a importância dos dados históricos e socio-culturais para a compreensão dos resultados da análise paleobiológica de uma amostra

osteológica Portuguesa

X Congreso Nacional de Paleopatologia Madrid, 3,4 e 5 de Setembro, 2009

Cristina Barroso Cruz Departamento de Antropologia da Universidade de Coimbra

1. Introdução

“Human sekeletons represent answers, and the goal of osteology is to frame the questions”

!by Eugene O’Neill In Amerlagos & Gerven, 2003

1. IntroduçãoContextualização metodológica e teórica

- criação de protocolos de actuação em campo

- base de dados antropológica

- aplicação da base de dados à investigação paleodemográfica e paleopatológica

Departamento de Antropoliga da Universidade de Coimbra

Centro de Investigação em Antropologia e Saúde

Fundação para a Ciência e Tecnologia

1. IntroduçãoFundamentação teórica

- importância da standarização

comparação de diferentes séries só é possível se os procedimentos metodológicos forem iguais (Ubelaker, 1994)

a partir da década de 90 com o desenvolvimento dos sistemas informáticos, começou a haver uma maior aposta na criação de bases de dados (Ousley et al. 2006)

“ (...) Standardised recording will enable greater comparability between human bone assemblages from different site”

(in Brickley & McKinley, 2004)

I. IntroduçãoFundamentação teórica

- importância da multidisciplinaridadeimplementação do conceito de “Bioarchaeology” na década de 70 (Amerlagos & Gerven, 2003)

“(...) In fact, this relationship is so strong that bioarchaeology and paleopathology are linked in the minds of most skeletal biologists”

(in Amerlagos & Gerven, 2003)

durante muito tempo a análise do material osteológico fazia-se desconhecendo o seu contexto de proveniência, comprometendo os resultados finais (Larsen, 2006)

I. IntroduçãoAbordagem

Antropologie du terrain (Duday, XXX)

Bioarchaeology

Ciências biológicas

Ciências sociaisTeoria social (história, sociologia,

antropologia social e cultural etc.)

Teoria biológica (evolução, epidemiologia)

Metodologia arqueológica

Knudson & Stojanowski, 2008

Figuras Históricas

1. Introdução

Protocolos/Standarização

Base de dados Antropológica

Aplicação da base de dados

Projecto: Viver a Morte em Portugal

- Protocolos de campo / Ficha Antropológica de campo*

- Normas para a redacção de relatórios de campo

- Categorização dos dados de campo / Registo de dados*

- Normas para a redacção de relatórios de campo

- Caracterização da população do passado

- Desenvolvimento de estudos comparativos

I. Introdução

Base de dados antropológica

Relatórios antropológicos de campo

Fichas antropológicas de campo +

Protocolos de campo

Análise estatística dos dados

Motor de buscaUniformização da informação

Estudos transversais

Standarização

Multidisciplinaridade

I. IntroduçãoA base de dados antropológica

Relatórios antropológicos de campo

Criação das variáveis

PaleopatologiaPresente/Ausente +

Descrição

Grau da manifestação/intensidade da patologia

Categorização dos dados

Quantificação

Análise estatística dos dados

I. IntroduçãoAlguns exemplos de outras bases de dados

-The Smithsonian

- Global History Health Project- Museum of London

- Herrerin’s project

Museus Investigação

Em Portugal

base de dados essencialmente vocacionada para o registo e dados e eventual aplicação para a investigação

criada para permitir o registo e o acesso para a investigação multidisciplinar

base de dados internacional criada com o objectivo de caracterizar o perfil epidemiológicos ao longo do tempo

IGESPAR/Endovélico: registo de cariz arqueológico contemplando um conjunto básico de dados referentes a restos osteológicos humanos

Programa informático para gestão de necrópoles que permite a criação de relatórios para os indivíduos

I. IntroduçãoA base de dados antropológica

- Antropologia funeráriaorientação, tipo de sepultura, espólio associado, posição dos membros, etc.

- Representatividade e preservaçãoutilizando a metodologia de Ubelaker (1994)

- Paleodemografiadiagnose sexual, estimativa da idade à morte, escalão etário

- Análise morfométrica(a avaliar a pretinência destas variáveis)

- Caracteres epigenéticosconjunto de X variações em várias zonas do esqueleto

I. IntroduçãoA base de dados antropológica

- Patologia oralcáries, tártaro, quistos periapicais, desgaste, doença peridontal, etc

- Patologia geralinfecciosa, neoplásica, congénita, stresses fisiológicos, etc.

I. IntroduçãoCaracterização da base de dados

Datas de intervenção: 1991 - 2005

Motivos da não inclusão: - relatórios incompletos - material muito fragmentado - contextos de ossário

Relatórios Antropológicos de Campo em depósito no Laboratório de Osteologia do Departamento de Antropologia da Universidade de Coimbra

N=56

Época: séc. II - século XX

Contextos: necrópoles, conventos, igrejas, castelos, etc.

Total de indivíduos = 368

I. Introdução

Distribuição por sexo Distribuição escalão etário

Indeterminado - 41,6% Feminino - 22,8% Masculino - 35,6%

Sem informação - 11,1% Não adulto - 19,0%

Adulto - 69,8%

Caracterização da base de dados

2. ObjectivosTestar a viabilidade da base de dados ao nível da análise:

2.1 Testar a aplicabilidade da base de dados

2.2 Concluir sobre a pretinência da base de dados e da necessidade de criar protocolos de campo;

Hipótese em análise: De que forma o sexo e a idade são afectados por aspectos socio-culturais e paleopatológicos que de alguma forma são indicadores de estatuto.

O género e a idade são duas variáveis que estão intimamente relacionadas com a questão do estatuto social e de fácil aferição em campo.

Análise inspirada em Sullivan (2004)

2. ObjectivosHipótese em análise: De que forma o sexo e a idade são afectados por aspectos socio-culturais e paleopatológicos que de alguma forma são indicadores de estatuto.

Variáveis a analisarSepultura: tipo de sepultura (covacho, escavada na rocha, limitada por pedras ou lages, etc) e classificação da sepultura (simples, dupla, etc.)

Existência de espólio: simbolos religiosos (rosários, caronte, etc), adorno (brincos, pulseiras, etc), inclusão de metais e cerâmica (votiva e utilitária)

Paleopatologia: patologia infecciosa (periostite, tuberculose), stress fisiológico (cribra orbitalia, hiperostose porótica, etc.)

Estes elementos podem ser interpretados como sendo

indicadores de pertença a uma classe social com algum poder

económico

Considerando que estas patologias afectam mais

indivíduos de menor estatuto social

3. MaterialAmostra específica - 187 indivíduos

Época - medieval

Análise - Variáveis

Antropologia funerária: - espólio funerário; tipo de sepultura, tipo de inumação, estrutura de inumação

Paleodemografia: - estimativa da idade à morte, escalão etário, sexo

Selecção da amostra

Distritos - Bragança, Viseu, Évora, Setúbal

Paleopatologia: - infecciosa, stress fisiológico

3. MaterialAmostra específica - 187 indivíduos

Distribuição por sexo Distribuição escalão etário

4. Métodos

Correlações de Pearson

Controlo da amostra: foram eliminados todos os dados de classificação “indeterminado” e/ou “sem informação”

Tratamento estatístico - SPSS 17,0

Sexo e Idade

Antropologia funerária

Paleopatologia

- sepultura: classificação e tipo; - existência de adereços; - símbolos religiosos; - presença de adornos; - presença de metais;

- evidências de periostite; - evidências de tuberculose; - evidências de cribra orbitalia; - hiperostose porótica;

5. Resultados

Classificação da sepultura Tipo de sepultura Símbolos religiosos

Escalão etárior = -0,311 p = 0,012 N = 65

r = -0,316 p = 0,003 N = 85

r = 0,227 p = 0,027 N = 95

Observações

As sepulturas múltiplas são mais comuns entre os

mais novos

Os indivíduos mais jovens são inumados

em sepulturas de materiais mais

resistentes.

Os simbolos religiosos são mais frequentes entre indivíduos mais

velhos

Antropologia funerária - correlações significativas

Em relação ao sexo verificou-se apenas uma tendência no que diz respeito à existência de adereços nas inumações, sendo esta prática tendicialmente mais comum entre os homens (r=0,188; p = 0,068; N = 95)

Não foi encontrado qualquer tipo de correlação no que diz respeito aos dados paleopatológicos.

6. Discussão

Resultados pouco significativos e claros...

Análise preliminar da base de dados antropológica:

...contudo reveladores do potencial de análise de natureza multidisciplinar.

A ausência de outras bases de dados do género - que entrem em linha de conta com os dados de campo - não permite a comparação de resultados

Ainda assim vai ao encontro de pelo menos uma premissa social: os indivíduos mais velhos são inumados com maior quantidade de espólio.

6. DiscussãoAnálise preliminar da base de dados antropológica:

Motivos- diminuição do tamanho da amostra à medida que se seleccionam as variáveis a analisar;

- a esmagadora maioria dos relatórios é omisso na informação que fornece;

- subjectividade relativa ao que cada antropólogo considera pertinente executar no campo e incluir nos relatórios;

7. Conclusão- A criação de uma base de dados antropológica vai ao encontro do que se faz e que permite a evolução científica da disciplina;

- Contudo, este processo e projecto só fará sentido se for acompanhado por metodologias e protocolos de campo e laboratório que permitam um maior aporte de informação;

- Os resultados obtidos a partir da utilização da base de dados deverá ser sempre acompanhada de uma análise multidisciplinar;

- Procurar comparar resultados e integrar outras bases de dados sempre que possível.

8. Bibliografia

9. Agradecimentos

Professora Eugénia Cunha

Fundação para a Ciência e Tecnologia

Centro de Investigação em Antropologia e Saúde