PASSARAM DOS - ESPM

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LONGEVIDADE: MESA REDONDA ELES 80 PASSARAM DOS ENTREVISTA O novo mundo da maturidade LUIZ EDMUNDO PRESTES ROSA Sonhos e lembranças FRANCISCO GRACIOSO Velho, este desconhecido MARIA AUGUSTA BLECHER Velho: o novo hit da sociedade do conhecimento RICARDO GUIMARÃES O último dia ALEXANDRE MATHIAS E MARCO DALPOZZO Criando real valor para clientes Três modelos de valor comprovados NEIL RACKHAM E JOHN DEVINCENTIS Anúncios honestos J. ROBERTO WHITAKER PENTEADO/BEATRIZ PENTEADO CASE-STUDY BANCO REAL MATURIDADE” TALENTOS DA MESA REDONDA H V L E S O ? REVISTA DA ESPM – VOLUME 12 – ANO 11– EDIÇÃO N o 3 – MAIO/JUNHO 2005 – PREÇO R$ 26,00 REVISTA DA ESPM – VOLUME 12 – ANO 11– EDIÇÃO N o 3 – MAIO/JUNHO 2005 – PREÇO R$ 26,00 AS DUAS FACES DA MOEDA AS DUAS FACES DA MOEDA ISSN – 1676-1316 R e v i s t a d a

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LONGEVIDADE:MESA REDONDA

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80PASSARAMDOS

ENTREVISTA

O novo mundo da maturidadeLUIZ EDMUNDO PRESTES ROSA

Sonhos e lembrançasFRANCISCO GRACIOSO

Velho, este desconhecidoMARIA AUGUSTA BLECHER

Velho: o novo hit da sociedade doconhecimento

RICARDO GUIMARÃES

O último diaALEXANDRE MATHIAS E MARCO DALPOZZO

Criando real valor para clientesTrês modelos de valor comprovados

NEIL RACKHAM E JOHN DEVINCENTIS

Anúncios honestosJ. ROBERTO WHITAKER PENTEADO/BEATRIZ PENTEADO

CASE-STUDYBANCO REAL

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MESA REDONDA

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REVISTA DA ESPM – VOLUME 12 – ANO 11– EDIÇÃO No 3 – MAIO/JUNHO 2005 – PREÇO R$ 26,00REVISTA DA ESPM – VOLUME 12 – ANO 11– EDIÇÃO No 3 – MAIO/JUNHO 2005 – PREÇO R$ 26,00

AS DUAS FACES DA MOEDAAS DUAS FACES DA MOEDA

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R e v i s t a d a

A

EditorialEXPEDIENTECONSELHO EDITORIALFrancisco Gracioso – Presidente

Alex Periscinoto

Alexandre Gracioso

Jacques Marcovitch

J. Roberto Whitaker Penteado

EDITORJ. Roberto Whitaker PenteadoMTB no 178/01/93e-mail: [email protected]

COORDENAÇÃO EDITORIALLúcia Maria de Souza

PROJETO GRÁFICO E CAPAMiriam Duenhas

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REVISTA DA ESPM – uma publicação bimestral da

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ceitos emitidos em artigos assinados são de exclusiva

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Professores, pesquisadores, consultores e executi-

vos são convidados a apresentarem matérias sobre

suas especialidades, que venham a contribuir para o

aperfeiçoamento da teoria e da prática nos campos da

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o contrário do que pensam muitos de nós, a lucidez e a sabedorianão são apanágio dos mais velhos. A prova disso está nos artigose pronunciamentos que fazem parte desta edição, ricos emsabedoria e escritos ou feitos por pessoas na flor da idade. Masnão há dúvida de que a velhice traz consigo aquela espécie de“lucidez contundente” de que falava Pirandello, e que torna osmais velhos capazes de enxergar as coisas através de um filtromágico que elimina a influência das emoções. Lembrei-me dissona entrevista com José Mindlin, que aparece nesta edição. Mindliné um lendário empresário de 91 anos que se tornou um grandebibliófilo. Perguntei a ele que conselho daria ao jovem tenenteretratado por Dino Buzatti em seu livro O deserto dos tártaros. Noinício do livro, o jovem tenente dirige-se a cavalo para a fortalezaonde iria ficar durante 30 anos, num serviço de guarnição inútil efrustrante. O jovem tenente passa por um velho oficial que desciaa montanha, acabrunhado, depois de cumprir os seus 30 anos [deserviço inútil e frustrante]. Minha pergunta a Mindlin foi: “Sevocê fosse o (muito “velho”!) oficial, que conselho teria dado aojovem tenente?” Sabem o que Mindlin respondeu? “Eu diria aojovem tenente – como diria a todos os jovens no começo da vida– que experimente se quiser, mas se não gostar não fique. Ajuventude é muito preciosa para ser desperdiçada.”

Moral da história: Os jovens podem não gostar dos conselhos dosmais velhos, mas a sabedoria e a lucidez da velhice ajudam-nosa não repetir os erros que os velhos cometeram quando jovens. Senão houvesse outras razões, bastaria essa para agradecermos alongevidade que torna, hoje, mais comum e mais frutífero oconvívio entre as gerações.

Francisco Gracioso

LUCIDEZCONTUNDENTE

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Índice10

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O mundo novo da maturidadeLUIZ EDMUNDO PRESTES ROSAUm novo mundo maduro, com mais idosos do que jovens, vai provocar expressivas mudanças

em nossas formas de pensar e agir, transformando os padrões de vida, o consumo e a gestão empresarial.

Sonhos e lembrançasFRANCISCO GRACIOSOO artigo fala do passado e do futuro, na construção do presente das organizações. Segundo o autor, isto significa que do

passado vêm a experiência e recursos acumulados, os valores organizacionais e o espírito de missão. Do futuro extraímos

os nossos objetivos e desafios. Mas, o que realmente importa é o presente – seus problemas e oportunidades.

Velho, este desconhecidoMARIA AUGUSTA BLECHERA turma da terceira idade – aquela parcela da população que ultrapassou a barreira dos 60 anos – conquista um espaço

cada vez maior num mercado ávido por consumidores diferenciados. O que sempre valeu para os vinhos, agora vale

também para este público: quanto mais velho, melhor.

Velho: o novo hit da sociedade do conhecimentoRICARDO GUIMARÃESA Sociedade Industrial supervalorizou o jovem, mas, hoje, percebe-se a urgência de rever esse padrão. Maturidade talvez

seja a palavra que melhor sintetize e defina a carência de nossa época.

O último diaALEXANDRE MATHIASMARCO DALPOZZOMarco Dapozzo e Alexandre Mathias contam a emoção do último dia de um poderoso presidente de uma grande empresa

global. Uma obra de ficção que revela a emoção humana que está por trás das pessoas que vivem o dia-a-dia das grandes

corporações.

EntrevistasHOMERO ICAZA SANCHEZ, SAID FARHAT, JOSÉ MINDLIN

Criando real valor para clientesTrês modelos de valor comprovadosNEIL RACKHAMJOHN DEVINCENTISO artigo avalia as mudanças na gestão do processo e força de vendas resultantes das diferentes percepções de valor dos

clientes. Uma nova proposta de segmentação de clientes é apresentada considerando o perfil do profissional de vendas

para cada cliente criando valor para o cliente.

Anúncios honestosJ. ROBERTO WHITAKER PENTEADO/BEATRIZ PENTEADOA Revista da ESPM decidiu perguntar, a três dezenas de profissionais do ramo, quais são os anúncios e campanhas mais

“honestos” de que se recordam. Confira os resultados – instigantes e, às vezes, surpreendentes.

Mesa RedondaLONGEVIDADE: AS DUAS FACES DA MESMA MOEDA

Case-StudyBANCO REAL

Leitura Recomendada

Sumário Executivo

English Abstract

Ponto de Vista

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6 R E V I S T A D A E S P M – M A I O / J U N H O D E 2 0 0 5

CartasBRASIL COMPETITIVO

Sobre matéria “A construção de umamarca internacional de tênis”, ficosatisfeito ao ver empresas brasileirassendo competitivas e bem-suce-didas em mercados grandes, comoa Azaléia. Chamou atenção o em-preendedorismo do presidente daempresa, que detectou uma opor-tunidade no ambiente e conseguiuresolver um problema de sazonali-dade do seu negócio. Hoje em diasão poucos os profissionais queconseguem ter essa visão deoportunidade através de umasimples notícia no jornal... “Gover-no de São Paulo implementa orodízio de veículos”, “Medicamen-tos aumentam de preço a partir desegunda-feira”, “Banco Centralaumenta a taxa de juros pela nonavez consecutiva”... o que a suaempresa poderia ter feito em reaçãoa cada uma dessas notas para

ganhar mais dinheiro? Já ouvi dizerum dia: em tempos de crise, en-quanto uns choram, outros vendemlenços.

João MarcosNetwork ToTheTop

www.tothetop.com.br

ÓPERA BOVINA

Acabei de receber a Revista. Estáexcelente e acredito que este exem-plar deve virar referência essencialpara refletirmos sobre o futuro donosso país. Não apenas a apre-sentação gráfica está impecável, oconteúdo é robusto, pertinente,muito bem estruturado, riquíssimo.Já li o resumo da mesa-redonda eacredito que ele reproduz muitobem o teor dos debates. Ali, apenasum senão do revisor: minha «ópera

bufa» virou «ópera búfala», talvezpor influência do ex-Ministro Pratinide Moraes, presidente da asso-ciação dos exportadores de carnebovina. De toda forma, a Revistaestá magnífica. A vocês todos, meusmais sinceros parabéns.

Carlos SallesPresidente Movimento Brasil

Competitivo

R.: A Revista pede perdão ecumprimenta o ilustre leitor ecolaborador pelo senso de humor...

SUGESTÃO: TURISMO

Tendo tomado conhecimento daRevista da ESPM, já na edição an-terior, quero cumprimentá-los pelobrilhante material e conteúdoe aproveito para comentar que a

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Revista já é parte importante nas mi-nhas leituras. Gostaria de sugerir uma pauta paraa Revista, uma matéria especi-al sobre a atividade turística noBrasil, o desempenho do Brasil nomercado nacional e internacional,as atrações turísticas e o que osdestinos estão fazendo para melho-rar suas imagens. Certo da atençãode vocês fico à disposição paracontribuir na forma que estiver aomeu alcance no que diz respeito àFoz do Iguaçu em especial as Cata-ratas do Iguaçu – uma das 10paisagens mais fascinantes da Terra(Condé Nast Traveller).

Jean Jefferson Jareck Cataratas do Iguaçu S.A

R.: Obrigado. Sua sugestão estásendo submetida ao ConselhoEditorial e não deixaremos deaproveitar a sua oferta.

CUMPRIMENTOS

A última edição da Revista da ESPMmerece um registro especial dequem se preocupa com a com-petitividade da empresa brasileira.A mesa-redonda produziu umdocumento de grande atualidadeque nos auxilia a ter uma visão denossas potencialidades e limitaçõese ajuda a entender como podemosnos inserir no jogo mundial decompetição dos dias de hoje. Sugiroenviar alguns exemplares para oMinistro Furlan e o Juan Quiróz naApex. O primeiro tem se empe-nhado em promover nossas ex-portações e desagravar do custo-Brasil nossas empresas, e o segundotem procurado promover nossosprodutos no exterior enganjando noesforço exportador a micro, a pe-quena e a média empresa. Algunsdos registros desta matéria podemser bons subsídios ao belo trabalhoque eles têm feito pelo país.

Hiran Castello BrancoSócio-diretor Giacometti, Farkas

Deveríamos produzir um programaespecial e disponibilizá-lo nainternet, em DVD e vídeo sobre oassunto da entrevista com Pratini deMoraes, tamanha importância paraos empresários atuais e para ageração futura. Sensacional! Aliás,a edição inteira.

Jose Claudio LucasCEO and Creative Director

G o l M a r k e t i n gwww.golmktglobal.com.br

R.: Nossa intenção é, justamente,de contribuir, com textos originaise pertinentes, para o debate e aimplementação de soluções dosnossos grandes temas sociais eeconômicos. Ficamos felizes como reconhecimento desses leitorese amigos. ESPM

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O Novo Mundo da Maturidade

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Luiz Edmundo Prestes Rosa

H ele pode substituir sua criatividade eousadia pela ordem, dogmatismo econforto. Estrutura a rotina, veste-sede normas e despreza propostas demudança. E, se não estiver atento, faráexatamente aquilo que um diacriticou.

A idade parece, para muitos, si-nônimo de perda. Seja de resistênciafísica, memória e raciocínio. Paraoutros, sinônimo de ganho de rea-lidade, estabilidade e sabedoria. Mas,em cada momento que atravessamos,perdemos e ganhamos ao mesmotempo. Se por um lado temos limitesdo corpo e do tempo, há possibi-lidades de escolha que permitemestender nosso potencial, emboranem sempre ousemos vivenciá-lo.

Neste sentido, alguns parecem nãoenvelhecer ao desafiar os limites daidade. Continuam a viver da mudan-ça e inovação. Aprendendo algo no-vo, realizando uma nova experiênciae abrindo uma nova perspectiva emsuas vidas.

Há casos surpreendentes de pessoasque decidiram, com idade avançada,fazer aquilo que se começa bemmais cedo. Vamos ver alguns exem-plos que mostram como sonho,vontade e ousadia podem ultrapassarlimites e possibilidades pré-conce-bidos, para concretizar algo que, àprimeira vista, seria improvável ouaté impossível.

A revista Época (edição 366, de23.05.05), em matéria intitulada “NoCaminho dos Netinhos”, discorresobre a experiência de pessoasfazendo intercâmbio no exterior emidades, até então, incomuns. São cin-qüentões aprendendo idiomas,como fazem os adolescentes. Relatao caso da Elvira Gentil, de 75 anos,que estará, em julho próximo, se-guindo para seu segundo intercâm-bio em Nova York. Sua primeira ex-periência ocorreu no ano passadoquando começou a estudar inglês,idioma que praticamente desco-nhecia. Esteve lá por três meses emorou em uma república com oito

O NOVO

á velhos que parecem jovens e jovensque parecem velhos. Idosos comespírito jovem, e jovens com espíritode velho.

Espírito não é atributo da idade e nemprivilégio do tempo. Não há idadepara sonhar, sentir, amar, criar, pensare ser feliz. Todos temos uma trajetória,mas cada um segue o seu caminho.Compartilhamos de princípiosbiológicos comuns e experimentamosum processo similar de nascer,crescer, maturar e morrer. Mas nossosgenes, nossa história, nossas prefe-rências e hábitos nos diferenciam edão um sentido único ao quepodemos ser e exprimir.

Historicamente vivemos de mudan-ças, na passagem sucessiva de ge-rações. Cabe aos jovens abrir novoscaminhos, ousar naquilo que não erapermitido, tentar o que pareciaimpossível, criar o inimaginável e vi-ver um novo estilo. Mas o tempopassa e o jovem não é mais jovem.De repente, do outro lado da idade,

MUNDO DA MATURIDADE

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O Novo Mundo da Maturidade

jovens. Conta que ‘’aproveitava mi-nhas tardes livres para ir aos museuse passear. Fui muito bem aceita pelagarotada, mas alguns achavam queeu era a professora. Até fui a umabalada com as meninas da república,mas não gostei muito do escurinho”.

José da Silva Martins publicou seuprimeiro livro Sabedoria e felicida-de aos 84 anos. Por esse motivo foiincluído no Guiness Book como oescritor brasileiro mais idoso a ini-ciar sua carreira de autor. Ao partir,quando tinha 101 anos de idade, há

cinco anos, havia escrito outros seislivros, demonstrando enorme com-petência e erudição.

Em 2002, Jenny Wood-Allen, esco-cesa, correu a sua última Maratonade Londres, aos 90 anos. Ela haviacomeçado a participar desta provaquando tinha 71 anos de idade. Seumédico lhe desaconselhou dizendoque se ela mal conseguia pegar umônibus, como ela poderia correr umamaratona. No entanto seu sonho edeterminação levaram-na, aos 75anos, a quebrar o recorde mundial

para sua faixa de idade. Jenny con-cluiu sua carreira, depois de corrermais de 50 provas e arrecadar cercade 40.000 libras para financiarinstituições de caridade.

Fauja Singh, nascido na Índia, con-cluiu a Maratona de Londres emtempo recorde de apenas 5 horas e40 minutos e se tornou o mais velhocorredor desta prova londrina. Suaidade? 93 anos, em 2004! O maissurpreendente é que ele começou acorrer maratonas aos 89 anos,segundo ele para fugir da solidão.

Fauja Singh, nascido na Índia, concluiu a Maratona de Londres em tempo recorde de apenas 5horas e 40 minutos e se tornou o mais velho corredor desta prova londrina. Sua idade? 93 anos, em 2004.✲

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Luiz Edmundo Prestes Rosa

Desde este tardio e surpreendenteinício de carreira, Fauja já correu emprovas semelhantes em Nova York eToronto. Ele já arrecadou milhares delibras e, com isso, tem apoiado insti-tuições beneficentes, incluindo umaespecializada em cuidar de bebêsprematuros. Com esse intuito, as-sinou com a Adidas sua participaçãonuma campanha publicitária inti-tulada “Nada é impossível”.

Fauja consegue manter uma dis-ciplina exemplar. É vegetariano, fazmeditação e se exercita seis vezespor semana. Em cada treino, ele cor-re de 13 a 19 km.

A DEMOGRAFIAEM MUDANÇA

Estudo concluído pela Organizaçãodas Nações Unidas – ONU, emdezembro de 2004, aponta que apresença dos mais idosos será umadas principais tendências demo-gráficas mundiais. O relatório estimaque a população da terra deveráatingir 6,5 bilhões de pessoas em2005 e poderá se estabilizar quandoalcançar 9 bilhões de habitantes, porvolta do ano de 2050.

Desde o século passado, a proporçãode pessoas acima de 60 anos vem

tendo um aumento expressivo, quecontinuará a se acelerar no séculoXXI. Em 2001, esta população jáhavia atingido o total de 600 milhõesde pessoas, cerca de três vezes maisque há cinqüenta anos. Em 2050,este contingente deverá chegar a 2bilhões, triplicando novamente essenúmero. Globalmente, este grupoestá crescendo a 1,9% ao ano, emvelocidade bem mais rápida do quea população como um todo. A idademédia da população mundial subiráconsideravelmente nos próximos 45anos, passando de 26 para 37 anos.Tais mudanças demográficas deve-rão provocar profundos impactos

Estudo concluído pela Organização das Nações Unidas – ONU, em dezembro de 2004, aponta que apresença dos mais idosos será uma das principais tendências demográficas mundiais.✲

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O Novo Mundo da Maturidade

econômicos e sociais.

Ainda segundo o relatório da ONU,a relação entre pessoas em idade detrabalho (16 a 65 anos) e as acimadeste limite está caindo rapidamente.Hoje é de um para nove e chegará aapenas um para quatro em 2050. Issotrará importantes implicações para ossistemas de previdência social,especialmente naqueles países emque os atuais trabalhadores pagampelos benefícios dos aposentados.

Outros estudos contemporâneosindicam que a expectativa de vida nosúltimos 300 anos mais do quedobrou. Por volta de 1.700 eram deapenas 30 anos e hoje supera 77 anos,nos países mais desenvolvidos.Estima-se que uma criança que nasçaem 2005 tenha o potencial de che-gar aos 100 anos e que pelo menosuma em duas consiga chegar a estaidade.

Um outro fenômeno é a queda dadiferença da expectativa de vida en-tre os países desenvolvidos e osmenos desenvolvidos. Em 50 anos,essa diferença reduziu-se de 25 para12 anos.

O aumento do número de idosos éconseqüência de muitos fatores queelevaram substancialmente a lon-gevidade, fruto de um conjuntoamplo de melhorias pelas quais o serhumano vem sendo beneficiado.Pode-se mencionar, por exemplo,que as condições de vida em geralforam progressivamente se aperfei-çoando, seja na alimentação, higienee saneamento, seja na evolução damedicina, capaz de prevenir, diag-nosticar e curar como nunca. Surgi-

ram novas vacinas, antibióticos,remédios de última geração, trans-plantes e agora a terapia genética ede células-tronco.

NOVAS TENDÊNCIAS

Pesquisa promovida pelo HSBCsobre o Futuro da Aposentadoria,publicada em 23.05.05, traz impor-tantes informações sobre as tendên-cias quanto à terceira idade eaposentadoria. Foi realizada em 10países e território envolvendo 11.453indivíduos acima de 18 anos, abran-gendo quatro continentes. Além doBrasil, o estudo incluiu os EUA,França, Reino Unido, China, Índia,Japão, Canadá, México e Hong Kong– que representam juntos a metadeda população mundial. Esta pesquisatrabalhou com amostras significativase chegou a conclusões importantes:

Há uma nova visão sobre avida na velhice. Esta etapa éagora vista como um tempo

de oportunidade e reinvenção, aoinvés de descanso e relaxamento. Emtodo mundo, mais pessoas queremque suas aposentadorias incluamperíodos de trabalho, educação elazer. Em sete países este foi consi-derado o modelo ideal, mas foi oBrasil que apresentou a maiorpreferência por este estilo de vida,seguido da França e Japão.

Definições tradicionais de ida-de avançada são vistas comofora de moda e muitas pes-

soas têm uma atitude positiva paracom a terceira idade. A visão dequando começa a velhice tornou-sebem mais individual. Se para uns ela

começa aos 60 anos, para outrosinicia-se aos 85. O parâmetro maissignificativo para se sentir velho é onível de energia e disposição de cadaum, que não é, naturalmente, o mes-mo para todos.

Há uma rejeição global paraa aposentadoria compulsória.Acredita-se que os emprega-

dos deveriam ser capazes de conti-nuar a trabalhar em qualquer idade,desde que consigam fazer bem o seutrabalho. Consideram que restriçõesbaseadas em idade impedem a vidaativa que eles gostariam de ter nofuturo.

O papel da família está mu-dando. Futuras gerações po-dem não receber o cuidado e

o apoio financeiro que esperam desuas famílias.

As pessoas se sentem respon-sáveis por escolher o melhorestilo de vida quando se apo-

sentarem e não recebem apoio sufi-ciente das empresas e dos governospara tal. Estes, pelo contrário, aindadeterminam a aposentadoria com-pulsória, sem levar em conta as novasaspirações das pessoas.

UM NOVO OLHARPARA A VELHICE E AAPOSENTADORIA

A pesquisa do HSBC, além das ten-dências comuns mencionadas,aponta haver particularidades rele-vantes entre os pesquisados.

Os brasileiros consideram a velhicecomo um tempo de desaceleração,

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Luiz Edmundo Prestes Rosa

proximidade da família, parentes eamigos. Esperam apoio significativodos filhos. Consideram a religião e asaúde muito importantes, mas so-mente alguns se preocupam em terdinheiro suficiente, fazendo muitopouco planejamento. Neste quesito,fomos o penúltimo na lista da pes-quisa, só ganhando dos japoneses.

Os franceses consideram a velhiceum tempo de sonhos e aspirações,mas também de preocupações. Te-mem se tornar um peso para suas fa-mílias e que o governo irá falhar nofornecimento de benefícios. Apesardisso, fazem muito pouco na prepa-ração de sua aposentadoria. Só ga-nham do Brasil e do Japão.

Os japoneses acreditam em podertrabalhar até idade avançada e cus-tear suas próprias despesas. Ao con-trário do que normalmente se acre-dita, a pesquisa revela que são osjaponeses que têm a visão mais ne-gativa sobre os mais velhos, no quese refere à percepção de que eles me-recem respeito e de que são dotadosde sabedoria.

Os americanos tiveram a visão maispositiva da terceira idade e os cana-denses foram o número um em pla-nejamento, com 96% da populaçãotomando ações concretas diante dofuturo. Ambos são países com fortetendência na preparação e formaçãode reservas.

Um fenômeno mundial que seobserva é a crescente participaçãodos idosos em ONGs e associações,sejam esportivas, sociais, religiosasetc. Na França, entre 1973 e 1999,o número de pessoas, com mais de

60 anos, que atuam em alguma ativi-dade associativa, mais do que do-brou, passando de 22,5% para 47%.Muitos profissionais aposentadospassaram a se dedicar a atividadesbeneficentes, contribuindo parareduzir as diferenças socioculturais,substituindo a socialização profis-sional pela associativa.

OPORTUNIDADESDA NOVADEMOGRAFIA

As empresas precisarão saber tirar omelhor proveito da mudança demo-gráfica. A criatividade será o limitena busca de tornar a empresa muitomais veloz e flexível, independente.

O envelhecimento da populaçãotrará um novo desafio às empresas.Não serão apenas os seus cola-boradores que ficarão mais idosos,mas também seus clientes, forne-cedores, investidores e acionistas.Haverá, portanto, uma nova dinâ-mica nesse relacionamento, tra-zendo consigo maiores desafios eoportunidades.

Se o mercado envelhece, o perfildos consumidores se altera. Abrem-se perspectivas de novos serviçose produtos que precisarão sercriados, levando-se em conta asnovas tendências e aspirações.Como aproveitar este público cadavez mais numeroso, que detémrazoável poder aquisitivo, disponi-bilidade de tempo, mobilidadepara viajar, desejo de vivenciarnovas experiências e de buscar umestilo de vida mais saudável,produtivo e com mais lazer?

Se o mercado envelhece, operfil dos consumidores sealtera. Abrem-se perspectivasde novos serviços e produtosque precisarão ser criados,levando-se em conta asnovas tendências easpirações.

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O Novo Mundo da Maturidade

Afinal, como o mundo das empresastrata hoje a questão etária? Será queestamos levando em conta as dife-renças de idade quando se concebeum produto ou serviço? Precisamosreconhecer que jovens, adultos emais velhos não consomem da mes-ma forma, não cultivam os mesmosinteresses e não se comportam damesma maneira. Contudo, muitasvezes acabam tendo que comprarexatamente o mesmo, não por de-sejo, mas por absoluta falta deopção.

Há muitas diferenças no compor-tamento que variam conforme a idade

do consumidor. O idoso de amanhãnada terá a ver com o idoso de hoje emenos ainda com o de ontem. Estasdiferenças, se bem analisadas,poderiam ser transformadas emoportunidades. Bastaria se criarprodutos e serviços voltados para assingularidades e dinâmicas de cadafase da vida.

É só examinar o universo do que hojeé oferecido e ver o potencial de ne-gócios que pode ser aproveitado. Adificuldade talvez ocorra porqueainda estamos impregnados de ummodelo mental do passado, em queser idoso era sinônimo de pouca

mobilidade, riscos de doença eexcessivo conservadorismo. Hojetemos idosos de espírito jovem, comconsciência maior sobre sua saúdee que adotam um posicionamentoativo consigo mesmo e nas suasinterações com as comunidades.Assim, cabe perguntar, como deve-riam ser elaborados produtos sobmedida para este público? Porexemplo, como deveriam ser os pro-jetos de apartamentos, programas delazer, pacotes turísticos, produtosfinanceiros etc?

Ao contrário do passado, é só olharnas ruas, parques e clubes o número

Assim, cabe perguntar, como deveriam ser elaborados produtos sob medida para este público? Porexemplo, como deveriam ser os projetos de apartamentos, programas de lazer, pacotes turísticos,produtos financeiros etc?

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Luiz Edmundo Prestes Rosa

expressivo de pessoas idosas que fa-zem atividade física. É natural quequando viajam se interessem porhotéis que favoreçam a continuidadede sua prática esportiva, como aca-demia de ginástica (fitness center).

No entanto, ainda imperam os pro-dutos e serviços padronizados, semfazer qualquer diferença etária. Po-de-se justificar a mesmice das ofertasque ignoram as diferenças de idadedizendo-se que se privilegiou opadrão com apenas a perspectiva deum casal ou família. Porém, esta pre-missa perde seu sentido na rápidamudança pela qual passa o sistemasocial, já que muitos entram para aterceira idade sozinhos, viúvos,descasados e até mesmo solteiros.

Empresas que, internamente, discri-minam o idoso podem não conseguirlevar para seus produtos qualquerdiferencial que reforce a sua atrativi-dade para esse público consumidorcada vez mais numeroso. É possívelimaginar que o perfil etário naempresa tenha de acompanhar operfil dos seus stakeholders, atémesmo para que ela possa ficar maissensível às suas necessidades e podertransformá-las em oportunidades denegócio.

Adicionalmente, as organizaçõestenderão a ser mais exigidas no exer-cício da sua responsabilidade social,onde a presença da diversidade,acompanhando o tecido social, sejaum dos focos de atenção dos forma-dores de opinião e de fundos deinvestimentos voltados para o desen-volvimento sustentável. Até mesmoaquela empresa, que, desde as suasorigens foi essencialmente constituídade jovens, terá de imaginar ummelhor balanceamento de idadesentre a sua equipe. Caso contrário po-

Empresas que, internamente, discriminam o idoso podemnão conseguir levar para seus produtos qualquerdiferencial que reforce a sua atratividade para essepúblico consumidor cada vez mais numeroso.

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O Novo Mundo da Maturidade

de correr o risco do distanciamentomercadológico e de se tornar umavelha empresa de jovens. E qualempresa estará disposta a descon-siderar o segmento dos idosos,sabendo que ele é o que mais vaicrescer, que é dotado de considerávelpoder de consumo e com muitasnecessidades específicas que podemser atendidas?

UMA NOVADINÂMICANA GESTÃO

Uma questão relevante será o desafioda empresa em cuidar da sua reno-vação permanente e de administrar,adequadamente, a carreira dos maisjovens. Estes serão indispensáveis,como sempre foram, para impulsio-nar as mudanças, a partir de sua formaoriginal de olhar e de seu forte desejo

para realizar. Como evitar que sefrustrem, se não houver espaço paraavançar e progredir? Como gerenciarsua ansiedade e pressa para que tudoaconteça rapidamente?

Este é um problema que nunca vi-vemos com tal intensidade, cuja so-lução vai demandar uma ação ino-vadora, a qual passa por uma novadinâmica no relacionamento entre osmais novos e os mais velhos.

Esta relação precisará ser revista eintensificada, buscando-se alterna-tivas que vão além do desenho atualda maioria das empresas. Muitasdestas utilizam-se de uma estruturahierárquica que acaba contribuindopara criar barreiras e distanciamentosentre as gerações. Os mais jovenscomeçam, geralmente, em funçõesmais simples, enquanto os maisvelhos ocupam posições de maior

destaque. As possibilidades verticaisde convivência são muito maisdifíceis, de forma que os maisqualificados e experientes acabamnão apoiando suficientemente aformação dos novos quadros.

Para quebrar este modelo, pode-ríamos imaginar que as organizações,até mesmo para responder, rapida-mente, às demandas do mercadocompetitivo, vão precisar mais e maistrabalhar por projetos. Por natureza,eles têm início, meio e fim. Taisprojetos, para atingir os seus objetivos,precisam contar com uma orga-nização mais horizontal e flexível,baseada no trabalho de equipe, queaproxima e intensifica as relações.

Os projetos podem viabilizar su-cessivas oportunidades de partici-pação e integração de grupos comidades diferentes. Bem coordenados,

Muitas empresas utilizam-se de uma estrutura hierárquica que acaba contribuindo para criar barreiras edistanciamentos entre as gerações.✲

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podem se tornar centros de apren-dizado e conhecimento. Propor-cionam a oportunidade para os jovensparticiparem ativamente, expressaremsuas opiniões, testarem suas idéias eserem percebidos pelo seu valor.Podem ser transformados emverdadeiras incubadoras de jovenstalentos e de inspiração e renovaçãodos mais velhos.

Trabalhando juntos em projetos dife-rentes, cada um exprime suas forçase complementaridades. A impetuo-sidade juvenil e o bom-senso adulto,a criatividade de um e o pragmatismodo outro, a pressa e a velocidade, oque fazer e o como fazer, o curto pra-zo e o longo prazo, o resultado finan-ceiro e o resultado sustentável.

Além disto, os mais velhos podemcontribuir na formação e orientaçãodos mais jovens, atuando como edu-cadores e mentores. Assim, cabeàqueles ouvir e entender as aspirações

AUTOR

LUIZ EDMUNDO PRESTES ROSADiretor Corporativo People da Accor

no Brasil, Mestre em Psicologia Social

pela PUC-SP, especializações em

Administração de Empresas pelo IMD,

Lausanne, Suíça, e pelo Insead,

Fountainebleu, França.

destes, buscar caminhos para colocarsuas idéias em movimento, estimulariniciativas e aceitar os errosdecorrentes do aprendizado, desafiar,avaliar e reconhecer os avanços, paradepois iniciar um novo ciclo dedesafios e realizações.

Esta dinâmica virtuosa será mais bem-sucedida se houver uma nova culturaempresarial que estimule as trocasentre as gerações. Cabe pensar emnovas relações de trabalho com aspessoas que se aposentam e detêmconhecimento e sabedoria. Elaspoderiam continuar, de uma outraforma, adicionar valor, seja comomentores e educadores de jovens,atuando agora como prestadores deserviços.

E algumas ferramentas poderão serajustadas para incentivar, reconhecere recompensar a troca entre gerações.Pesquisas, grupos focais e painéis dedebates poderiam ser conduzidos para

entender expectativas e tendências deambos os grupos. Os indicadores degestão poderão ser ampliados paramedir os avanços e ampliar o escopodos resultados esperados.

Com esta ação será possível aproveitara diversidade das gerações paratransformá-las em verdadeiras forçascompetitivas, preparando a empresapara esta nova era da maturidade, ondeteremos um novo ciclo de vida deconsumidores, ávidos por produtos eserviços que atendam aos seus sonhose necessidades.

Cabe pensar em novas relações de trabalho com as pessoas que se aposentam e detêm conhecimento e sabedoria.✲

ESPM

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Sonhos e Lembranças

DE COMO O PASSADO, SEMPRE VIVO NA MEMÓRIADOS MAIS VELHOS, INTERAGE COM O PRESENTE ENOS AJUDA A CONSTRUIR O NOSSO FUTURO

NR.: Este artigo é um resumo da palestra feita pelo autor aos professores da ESPM em SP, em abril/05.

Sonhos e Lembranças

LEMBRANÇASSONHOS E

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Francisco Gracioso

Pensar no futuro e lembrar do passado,de certa forma, tem constituído parteda servidão humana, da nossa sinanesta Terra. As frustrações e alegrias quevêm do passado e a inquietação como futuro são parte importante dospensamentos que ocupam as nossashoras vagas. Goethe já dizia: “Amelancolia é a doença dopensamento”. Sem dúvida, de tantopensar, a gente pode cair na “fossa.”

Schopenhauer dizia: “Não tem saída,ou o homem sofre ou se aborrece”.Mas um poeta – Schiller –, que foidiscípulo de Schopenhauer, retrucou:“Há saída; é o riso. Aquilo que faz rirnos liberta”. Então, vamos rir o quantopudermos, pois o riso nos alivia.

Mas, voltando a falar de “sonhos e

lembranças”, falo naturalmente dossonhos que temos acordados e daslembranças que nos acompanham aolongo de toda a vida, pois passam afazer parte de nós.

O passado é importante. Dele vêmos recursos materiais que nos per-mitem investir no futuro. Vêm tam-bém os conhecimentos e experiên-cias acumulados que utilizamos etransferimos às novas gerações. E vêm,ainda, as crenças e valores queformam as nossas raízes, sem as quais,certamente, não seríamos os mesmos.

Que o passado e o futuro se encon-tram para definir o nosso presente,não há dúvida. O problema está noponto de equilíbrio entre ambos. Nãoé bom pensar demais no passado,

Levantávamos às 3h30 da manhã e íamos para a meditação;trabalhávamos, alternávamos meditação com o trabalho duro –manter aquilo limpo, arrumar camas, limpar privadas, tudo isso.

GOETHE já dizia: “Amelancolia é a doençado pensamento”.

SCHOPENHAUER dizia:“Não tem saída, ou ohomem sofre ou seaborrece”.

SCHILLER, que foi discí-pulo de Schopenhauer,retrucou: “Há saída; éo riso. Aquilo que fazrir nos liberta”.

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Sonhos e Lembranças

pois acabamos nos repetindo. Temosvários exemplos de nações, em-presas e pessoas, que perdem aparada porque insistiram em repetir-se. Não é bom, também, pensardemais no futuro, quando se trata deconstruí-lo a partir do presente. Je-sus, numa de suas parábolas, aler-tou os homens contra “o perigo dese preocupar demais com o futuro”.Há perigo nos dois excessos. Masnão se trata apenas disso, trata-setambém do que vamos extrair decada um e de como isso vai influirno nosso presente, e de como – apartir do presente – construiremos ofuturo, que é o que, realmente,importa.

O KOANDO MESTRE

Há muitos anos, quando eu traba-lhava em propaganda, numa agên-cia internacional, meu chefe cismouque o Budismo Zen ajudaria a criarmelhores anúncios. Assim – comoutros colegas, de todo o mundo –fiquei quinze dias numa regiãomaravilhosa perto de Nova York –Montauk, num pequeno MosteiroZen Budista. Encantei-me. Infeliz-mente, a vida não permite que a gen-te faça tudo o que gosta, tudo o quese quer, mas, certamente, eu gostariade ter estudado, a fundo, o BudismoZen.

O Mosteiro não era o que a gente vêna televisão agora, com Kung Fu,aquelas artes marciais, nada disso.Levantávamos às 3h30 da manhã eíamos para a meditação; trabalhá-vamos, alternávamos meditaçãocom o trabalho duro – manter aquilo

limpo, arrumar camas, limpar pri-vadas, tudo isso. Fazia parte dotrabalho sessões em que conversá-vamos com os mestres que nostransmitiam ensinamentos. Fez par-te, justamente, destes ensinamentos,deste diálogo entre o mestre e odiscípulo, o Koan – o Enigma queme foi confiado. O Koan é uma frase,um conceito que o Mestre passa aodiscípulo, para que ele pense, emedite sobre aquilo. O Koan que mefoi passado foi este:

“O passado já não existe, o futuroainda não existe, o presente é tudo oque importa”.

Realmente, à primeira vista, é es-tranho: “O passado não existe; nãodeve ser lembrado. O futuro aindanão existe; não deve ser conside-

rado?” Isso foi objeto de muitameditação, muita conversa e – quan-do finalmente achei que estavapronto para discutir uma solução –informei ao meu Mestre, e, parasurpresa minha, ele disse: “Ah, óti-mo, você já chegou à solução? Masnão me interessa a sua solução. Vamostomar um chá”. E assim encerramos oassunto.

Curioso. Depois, vim a saber que issoé parte do Budismo Zen, uma filosofiareligiosa que nasceu na China hácentenas de anos e, hoje, é forte,principalmente no Japão. Ele influiudecisivamente na filosofia empresarialjaponesa, principalmente no que serefere ao planejamento estratégico.Os japoneses costumam dizer – talvezcom razão – que nós ocidentais nãosabemos planejar o futuro; que nosso

Quando, finalmente, achei que estava pronto para discutir umasolução informei ao meu Mestre, e, para surpresa minha eledisse: “Ah, ótimo, você já chegou à solução? Mas não meinteressa a sua solução. Vamos tomar um chá”.

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planejamento estratégico é falho. Edizem isso, não por empáfia, masporque eles raciocinam comobudistas zen; para eles, o exercíciodo planejamento estratégico é bemdiferente do nosso.

Para o Budismo, de modo geral, e parao Budismo Zen, em particular,passado, presente e futuro são umalinha contínua; não há distinção claraentre elas. Principalmente porque elesprofessam a reencarnação, o quetorna ainda mais tênue a distinçãoentre essas etapas. No início, asculturas ocidentais eram um poucoassim também. Entre os romanos, osdeuses lares eram os deuses da famíliade cada um; eram parte da família,tanto quanto os filhos ou os netos; osdeuses lares tinham presença quasereal, no conselho da família. A liga-ção entre o passado e o presente eramuito maior.

A SOLUÇÃODO ENIGMA

Compreendi, finalmente, que o pre-sente é o ponto de encontro ondeinteragem o passado e o futuro, ouseja, nossos sonhos e nossas lembran-ças. Da fusão destes dois elementosincorpóreos, surge o presente, real econcreto.

O que narrei aconteceu pouco antesde eu ter assumido a direção daESPM. Vou, agora, mostrar como estafilosofia – que, desde aquela época,me acompanha – me ajudou adesempenhar minha tarefa.

Na verdade, se o passado e o futurose “fundem” no presente e, em fun-

ção disto, nós construímos o futuro –esta é a nossa verdadeira missão.

Quando assumi a direção, em 1981,a Escola era, realmente, muito pe-quena. Mas, apesar de pequena, tinhauma imagem definida – um “capitalintelectual”, por assim dizer, que mefoi legado, e logo percebi que era oque havia de mais valioso, muito maisdo que o patrimônio físico dos móveise das instalações.

NOSSOS SONHOS

De início, eram muito modestos. Re-sumiam-se em equilibrar as finançase consolidar o curso de propagandae marketing original. Mas, com-binando a tradição do passado e ossonhos do futuro, chegamos pouco apouco a uma nova missão: “Quere-mos ser cada vez mais reconhecidos,como Centro de Excelência nageração de conhecimentos no ensinoda Comunicação de Mercado,Marketing e Administração com focono mercado”.

LEMBRANÇAS

Uma sala cedida pelo Professor Bar-di, no MASP; mais tarde, uma antigamarcenaria no Bexiga, com o telhadoroído pelos cupins. E quandomostrei, pela primeira vez, aplanta do atual prédio, ouvi umcochicho: “O Chico ficou louco?”Mas, acima de tudo isto, haviaalgo que nunca perdemos: nossoespírito de missão.

Nossa missão já foi “ensinar pro-paganda”. Começamos numa épo-

Uma sala cedida pelo ProfessorBardi, no MASP; mais tarde, umaantiga marcenaria no Bexiga, como telhado roído pelos cupins.

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Sonhos e Lembranças

ca em que propaganda era algomeio parecido com “magianegra”. Se você se apresentassecomo “publicitário”, ninguémsaberia o que era, se explicasse oque fazia, logo imaginariam quevocê era um desses bruxosamericanos, capaz de fazermilagres com a alquimia dapropaganda. Era esse, realmente,o clima. A indústria dapropaganda, daquele tempo,precisava, desesperadamente, dejovens talentos bem treinados.

A escola nasceu para isso – e não

era difícil atrair esses jovens ta-lentos, porque a propaganda,naquele tempo, era uma profissãocharmosa por excelência. Era oque foi, há poucos anos, ainformática; mas a informáticaperdeu rapidamente o seu charme.A propaganda não; ela manteve ocharme por muitos e muitos anos.

UM PASSOIMPORTANTE

Mas chegou o momento em queensinar apenas propaganda já não

bastava. Acompanhando aevolução do mercado, demos umpasso pioneiro e passamos aensinar a propaganda no contextodo marketing. Mais tarde, sempreacompanhando o mercado, pas-samos a ensinar marketing nocontexto da gestão empresarial.Marketing – naquela época – tinhaadquirido a feição, a identidade,reforçada nos últimos anos, comofilosofia de negócios, muito maisdo que meramente uma função donegócio. Isto não significava –como não significa até hoje – queabandonamos ou esquecemos dapropaganda. Hoje, falamos emcomunicação, é claro, porque apropaganda, embora seja a formamais importante de comunicaçãocom o mercado já não estásozinha nisto. Mas acomunicação, repito, é ensinadapor nós no contexto de marketing,e o marketing – cada vez mais – éensinado no contexto maior daempresa, como negócio.

Daí vem a formulação de nossamissão. E isto mostra, também, co-mo o presente e o passado – emfunção do futuro – interagem. Oque quero dizer é que aslembranças e os sonhos serão depouca utilidade, se não foremancorados, se não tiverem basefirme na realidade de hoje. Isto éo que significa: “O passado já nãoexiste, o futuro ainda não existe,a única coisa real que importa é opresente”, do Budismo Zen.Compreendem? É do presente quetiramos a nossa fonte principal deinspiração para construir o futuroa partir dos sonhos e levando emconta as lembranças.

Acompanhando a evolução do mercado, demos um passo pioneiro epassamos a ensinar a propaganda no contexto do marketing.✲

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Francisco Gracioso

NOSSA CULTURA

Mas os valores que herdamos vãomuito além do espírito de missão.Incluem também a integração nacomunidade, os valores éticos e abusca da excelência. Esta é a he-rança de todos nós – professores,funcionários e alunos da ESPM.

O SEGREDO DACOMPETITIVIDADEDAS NAÇÕES

Pondo em prática os valores queherdamos, nossa Escola sempre sedistinguiu pela sua integração como mercado a que serve e pelo seuespírito inovador. Curiosamente, ofamoso World Economic Forum, na

Suíça, chegou a uma conclusãosemelhante para explicar a forçacompetitiva das grandes nações.Segundo o professor StephaneGarelli, do WEF, as nações maiscompetitivas são as que reúnemestas três qualidades: valoresculturais, capacidade deimplementar rapidamente osavanços tecnológicos e nível deeducação dos jovens. Tentaremosresumir abaixo o que isto significa.

Quando fala de valores, o profes-sor Garelli se refere, princi-palmente, aos valores culturais dajuventude, como o amor aotrabalho, a lealdade e a respon-sabilidade. A implementaçãorápida dos avanços científicosexige a sintonia permanente com

a realidade do mercado. E quantoao nível de educação dos jovens,é claro que, quanto mais bempreparados eles forem, melhorserão os resultados.

Em suma, o professor Garelli diz que osucesso futuro de um país (comotambém de uma empresa, ou de umapessoa), depende de suas raízes culturais,de sua sintonia com o presente e dainteração destes dois fatores em relaçãoaos sonhos para o futuro.

O CASO DA AT&T

O leitor deve recordar-se do queaconteceu, recentemente, com aAT&T, gigante norte-americana dastelecomunicações. Esta empresa játeve o monopólio das telecomuni-cações do mercado americano, masfoi obrigada pela lei do país adividir-se em sete empresas. A AT&Toriginal ficou com a fatia da comu-nicação à distância e com a respon-sabilidade pela pesquisa de novastecnologias. Pois bem, pouco maisde dez anos depois, a AT&T chegouà insolvência e foi comprada poruma das sete empresas locais.

O que teria acontecido? A rupturada cultura organizacional (perdados valores) e a distância do mer-cado tornaram a empresa incapazde responder às demandas de seusclientes. Por outro lado, a AT&Terrou o foco do P&D e perdeu bi-lhões de dólares desenvolvendotecnologias que não conseguiuimplementar. Em outras palavras, aAT&T perdeu a sua memória e saiuda sintonia com o presente. Nessascondições, de nada adiantou ter sonhos

Quando assumi a direção, em 1981, a Escola era, realmente, muitopequena. Mas, apesar de pequena, tinha uma imagem definida – um“capital intelectual”, por assim dizer, que me foi legado, e logopercebi que era o que havia de mais valioso, muito mais do que opatrimônio físico dos móveis e das instalações.

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grandiosos para um futuro.

Voltamos a insistir. Tão ou mais impor-tante do que cultivar os valores dopassado é estar em permanente sintoniacom o presente, pois, é deste que vema inspiração para as inovações queprovocarão as mudanças.

SERÁ QUE NÓSCONHECEMOS ONOSSO MERCADO?

Por falar nisso, levei um susto ao ler, narevista Exame de 2/2/2005, que 49%dos CEO’s brasileiros são engenheiros.Enquanto isso, os estudantes deengenharia representam apenas 4,4%dos diplomandos de cursos superiores.

O QUE HÁ DE TÃO EXTRAORDINÁRIONAS ESCOLAS DE ENGENHARIA?

O mais curioso é que a situação serepete quando se trata dos diretorescomerciais dessas grandes empresas.Na mesma revista lemos também que,47% deles são engenheiros, embora omarketing e a comunicação demercado não façam parte do currículode engenharia. Parece-nos isto sim, queo que distingue os formandos de enge-nharia mais do que os conhecimentosque adquirem no curso, são as suasmentes inquisitivas (sempre dispostas aencontrar respostas para os problemas),e, os valores tradicionalmenteassociados à profissão. Fizemos umlevantamento entre professores eexecutivos e chegamos à conclusãode que as características típicas dosengenheiros são as seguintes:

1. FOCO NOS RESULTADOS

2. CAPACIDADE ANALÍTICA

3. PROCESSOS DE TOMADADE DECISÕES BASEADAS NAAVALIAÇÃO METÓDICA DASALTERNATIVAS

4. ADMINISTRAÇÃO DOSPROCESSOS PRODUTIVOS EDISTRIBUTIVOS – FACILIDADEPARA LIDAR COM PROJETOS DENOVOS PRODUTOS/PROCESSOS

5. FAMILIARIDADE COM AMATEMÁTICA/MÉTODOSQUANTITATIVOS – MAIORRESPEITO PELOS NÚMEROS

6. SÃO PONDERADOS – OUVEMMAIS DO QUE FALAM – INSPIRAMCONFIANÇA

A conclusão nos parece óbvia. Pormais importantes que sejam osconhecimentos técnicos transmitidosa um aluno de graduação ou de pós-graduação, ganham destaque osvalores atitudinais e comporta-mentais. Sem exagero, pode-se dizerque serão estes valores que definirãoos futuros líderes.

CONCLUSÃO

Recapitulando, eis como resumimoso que dissemos até agora:

❖ Sonhe com um futuro melhor. Econstrua-o. Se você crer nele, osoutros também irão crer.

❖ Evolua. Absorva e provoque as

dos CEO’s brasileirossão engenheiros.

49%

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Francisco Gracioso

NEGOCIANTE, ESTRATEGISTA E ESPECIALISTA

ESTRATEGISTA, EMPREENDEDOR

AMIGO DO TESOUREIRO

DEFENSOR DA MARCA, INOVADOR

COMUNICADOR, COORDENADOR

1965 – 2005

2005

1995

1985

1975

1965Figura 1

mudanças. Mas não rompa com opassado.

❖ Fique sempre em sintonia com oseu mercado e o seu ambiente denegócios. Por exemplo, se você forum educador, fique sempre ligadocom os alunos e com os futurosempregadores.

❖ Tire do mercado, e dos problemasdo dia-a-dia a inspiração para asinovações que criarão vantagens ediferenças competitivas.

Para que o prezado leitor pense umpouco mais no que estamos dizendo,imitaremos agora os mestres do zenbudismo e proporemos dois “koans”,ou seja, enigmas que não exigem res-posta. O primeiro diz respeito àforma como ainda hoje ensinamosmarketing nas escolas, fora da reali-dade do mercado de hoje.

A Figura I mostra a evolução do con-ceito de marketing, e do papel dohomem de marketing, nos últimos40 anos. Como se vê, há 40 anosesperava-se que o gerente de mar-keting fosse essencialmente umcomunicador. Este conceito evoluiuprogressivamente ao longo dos anose hoje se espera que ele seja essen-cialmente um negociante, estra-tegista e especialista. Será que nos-sos currículos estão acompanhandoesta evolução?

O segundo “koan” que quero pro-por é o da propaganda. Todos sabemque a propaganda já representoumais de 70% das verbas de comu-nicação de marketing, há apenas 20anos. Hoje representa cerca de 40%

A propaganda járepresentou mais de

das verbas de comu-nicação de marketing, háapenas 20 anos. Hoje apropaganda representacerca de

70%

40%

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1)

e a sua participação continua cain-do. Isto não significa que a pro-paganda tenha perdido a suaimportância, mas é preciso levar emconta as demais formas de comu-nicação com o mercado. Para ajudá-lo a pensar no que está aconte-cendo, daremos duas dicas:

O nome do jogo é relacio-namento

As arenas da comunicaçãoagora são pelo menos sete:

I. MUNDO DO ENTRETENIMENTO –DE MADONNA ATÉ O ROCK IN RIO

II. ESPORTE – PATROCÍNIO DEESPORTISTAS E CLUBES

III. MUNDO DA MODA – DE GISELEBÜNDCHEN A SÃO PAULO FASHIONWEEK

IV. COMUNICAÇÃO PROMOCIONALE DIRIGIDA (MERCHANDISING,PROMOÇÕES, CONCURSOS,PREMIAÇÕES, INTERNET,TELEMARKETING ETC.)

V. GRANDES EVENTOSPROMOCIONAIS, COMO SALÕESE FEIRAS

VI. GRANDES CADEIASVAREJISTAS

VII. PROPAGANDA TRADICIONAL

O NOME DO JOGO ÉRELACIONAMENTO

O problema de hoje, cada vez mais,consiste em manter viva, na mente

2)

Mas, muitas vezes, não é mais: é um patrocínio, é um grande show demoda, é um grande show de rock.✲

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Francisco Gracioso

do consumidor, a imagem da nossamarca. Já não é mais possível, paraos grandes anunciantes, como anti-gamente, ter no ar, permanente-mente, 50 a 60 campanhas. E o queé mais incrível ainda, falo de coi-sas de 20, 30 anos atrás, 50 cam-panhas, e as 50 conseguiamimprimir a marca de um produtona cabeça do comprador de talforma que ele ia ao supermercadoe preferia aquela marca. Não émais possível. O mercado tornou-se muito mais competitivo, muitomais sofisticado, o consumidor jánão se emociona com facilidade.

Um estudo recente mostrou que astrês grandes preocupações daclasse média hoje são: primeiro,plano de aposentadoria para ochefe de família; segundo, aeducação para os filhos; terceiro,plano de saúde para a família. Sãoessas as coisas que têm apeloemocional, realmente, para amaioria das famílias de classemédia neste país. Eles não atribuemgrande valor emocional a leite empó, sabonete, creme dental, deter-gente e coisas deste tipo. Os desa-visados culpam a propaganda: “apropaganda não consegue maisvender, porque não consegue maismarcar a marca”. Que grandebobagem! Não é culpa da propa-ganda; é culpa de uma realidadetotalmente nova, culpa das própriasempresas, que não investiramcomo deveriam em inovação, nosúltimos anos, e, hoje, temos umamesmice de cair o queixo. A únicareferência é a marca, porque o restoé tudo igual. Aí dizem, novamente:“culpa da propaganda”. Não, não

é “culpa” da propaganda. Oproblema existe, mas seu enuncia-do é: “Como conservar o relacio-namento de minha marca com oconsumidor?”

A propaganda de hoje também ga-nhou limitações de verba, de con-ceito, de responsabilidade. A pro-paganda não pode mais se respon-sabilizar pela construção de marcasespecíficas. É praticamente impos-sível lançar um novo detergente,investir 200 milhões de reais paraprovar que lava mais branco. Por-que, dentro de um mês, surgirá umconcorrente que vai lavar aindamais branco.

Então, a propaganda, cada vezmais, se preocupa com umaimagem baseada em confiança, emfatores subjetivos, o que mudacompletamente a natureza dapropaganda, e leva novamente àpergunta: “Então, como manter orelacionamento da marca?”. Aresposta existe e os grandesanunciantes de vanguarda, semdesprezar a propaganda, estãoencontrando outras formas de fazer,criar e reforçar este relaciona-mento. São verdadeiros “esquemasestratégicos” em que a propagandadeixa de ser o fator principal, em-bora continue como fator im-portante, e algo lhe toma o lugar.Esse algo pode ser um programa namídia, como o Show do Milhão,um time de futebol ou a figura doRonaldo – o fenômeno –, que pro-move uma nova linha de celulares.Não há realmente limite para aimaginação. Se o problema érelacionamento, a solução ainda

pode ser a propaganda, lá em cima,no ápice do triângulo. Mas muitasvezes, não é mais: é um patrocínio,é um grande show de moda, é umgrande show de rock.

Chegamos ao item seguinte: estoulançando e propondo a vocês, comomais uma franchising da ESPM, asSete Arenas da Comunicação, por-que, realmente, ninguém ainda pen-sou nisto e, entretanto, é o que jáestá acontecendo no mundo real.

As agências de propaganda de an-tigamente baseavam a sua forçapara o cliente em duas coisas: emprimeiro lugar, na criatividade; emsegundo lugar, na capacidade deplanejar o uso da mídia de formaeficiente e econômica.

A mídia o que era? Jornal, revista,rádio, TV, cinema e cartaz de rua.As agências, melhor do que nin-guém, sabiam como combinar essesveículos e sabiam como criar bonsmateriais para usá-los nas campa-nhas. Hoje, a agência continua aplanejar o uso da mídia, mas já nãoé mais exclusiva nisso. A agência sa-be que, do lado do cliente, muitasvezes, há gente capaz, tanto quantoa agência, de planejar aquela mídiade uma forma perfeita. Sabe quetem a ameaça dos bureaux de mí-dia, que podem fazer isso melhor emais barato. Qual é a diferença quea agência, pouco a pouco, poderáassumir? Na minha opinião: em vezde planejar mídia com base emcinco veículos, a agência vai pla-nejar mídia, com M maiúsculo, combase nas Sete Arenas da Comu-nicação.

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Sonhos e Lembranças

As campanhas passam, cada vezmais, a ter, como ambiente, as SeteArenas da Comunicação e nãoaquele mundo restrito da propa-ganda, que é apenas uma delas.Vocês dirão: “Mas isso é im-possível. Como é que eu voucontrolar, cobrar comissão, fatu-rar?” Eu não sei, e pouca gentesabe, mas garanto a vocês que vãochegar lá e nossa Escola tem de seantecipar, e tem de começar adiscutir este tipo de problema comseus professores e alunos.

A outra grande vantagem da agên-cia de propaganda para o seucliente era, e ainda é, a criativi-dade. Só que, agora, criatividadedeixa de ser aquele fator mágicorestrito ao anúncio ou ao comer-cial. Criatividade continua a ser obom anúncio, o bom comercial,mas tornou-se mais do que isso,precisa ter uma idéia que tirepartido, de alguma forma, daspossibilidades propiciadas pelasSete Arenas da Comunicação.

Como fazer isso? Darei um exemplosingelo: há anos a Fischer & Justus,que tinha a conta da Brahma, nãoconseguiu ou não quis obter, para aBrahma, o patrocínio de uma cotada Copa do Mundo, que estavasendo promovida pela Rede Globo.Para manter o nome da Brahma, dealguma forma, presente nas trans-missões de TV, a Fischer & Justus,reuniu uns 50 ou 100 “branca-leones”, com camisetas com o no-me da Brahma, e essa turma sentavanos estádios, em lugares privile-giados, em jogos do Brasil, de talforma que, muito a contragosto, a

Globo não escapava de, vez ou ou-tra, focalizar um daqueles carasfantasiados, e o nome da Brahmaaparecia na transmissão.

Na época, foi um escândalo, os pu-blicitários se sentiram traídos, masera apenas um tênue prenúncio dealgo que está acontecendo cadavez mais. A Coca-Cola, há doisanos, deslocou 90% das suasantigas verbas de propaganda emTV, principalmente, para showstipo Rock in Rio, e tudo agora éfeito em função de esquemaspromocionais armados a partirdesses eventos. Eu poderia citarinúmeros exemplos.

Ora, isso é uma oportunidade paraa criatividade das agências e é tam-bém uma nova responsabilidadepara nós. Quando falamos em cria-tividade, não basta mais falar emanúncio e comercial. De algumaforma, nossos alunos têm de com-preender, nossos professores tam-bém, que, criatividade vai muitoalém e incluiu a busca de idéiaspara o aproveitamento dessas ou-tras seis arenas da comunicação.

Eu sei que isto é polêmico e vai exi-gir muita discussão adicional, maseu lanço aí a luva, para que vocêsmeditem.

Voltando a falar de sonhos. Antesqueríamos ser cada vez mais re-conhecidos como um Centro de Ex-celência na geração de conhe-cimento e no ensino da comuni-cação de mercado, marketing eadministração com foco no mer-cado. Agora queremos ser vistos

ANTES

“Queremos ser vistos comoum Centro de Excelênciana formação de futurosdirigentes e empreendedoresda comunicação e dosnegócios.”

“Queremos ser, cada vezmais, reconhecidos comoum Centro de Excelência nageração de conhecimentose no ensino da comunicaçãode mercado, marketing eadministração com foco nomercado.”

AGORA

Figura 2

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Francisco Gracioso

AUTOR

FRANCISCO GRACIOSOPresidente da ESPM

como um Centro de Excelência naformação de futuros dirigentes eempreendedores da comunicaçãodos negócios (vide Figura II).

Vocês se lembram daquela frase doChacrinha: “Eu não vim para es-clarecer; vim para confundir”. Poiseu vim para confundi-los hoje,deliberadamente, de mil maneiras,e esta é uma delas.

Confesso que me sinto inquieto coma formulação de “missão” clássica,tradicional, que temos, e, estimula-do por esta questão dos engenheiros,eu pergunto: não será o caso decomeçarmos a pensar nesta Escola,acima de tudo, como um Centro deExcelência que forma líderes?

Porque, vejam, formar bons profis-sionais, nós já formamos. Nós as-sinamos, em 2004, 1.400 contratos

de estágio e 90% deles deram certo.Nós estamos formando, para omercado de trabalho, bons profis-sionais em potencial e acho quepoderemos melhorar ainda, mas jáestamos conseguindo. Porém, eupergunto: este é um daquelespontos decisivos, que chamamosde “break-throughs”? Não terá che-gada a hora de assumirmos, paravaler, que, nossa missão daqui paraa frente, em função do mercado dehoje e pensando no futuro, deveráser cada vez mais de “formar líde-res”? E se assim for, o que fazer parachegar lá, para que não fique só naspalavras?

A Coca-Cola, há dois anos,deslocou 90% das suasantigas verbas de propagandaem TV, principalmente, parashows do tipo Rock in Rio, etudo agora é feito em funçãode esquemas promocionaisarmados a partir desseseventos.

ESPM

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Velho, esse Desconhecido

VELHO, ESSE

UM DOSSIÊ DAQUELES QUEATINGIRAM A MATURIDADE

DESCONHECIDO

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Maria Augusta Blecher

Terceira idade. Maior idade. Melhoridade. Muppies (sigla dos ameri-canos para Mature Upscale Post-Professional que só vale para os maisricos). Cabeça Branca para osreverenciados anciões japoneses. NoBrasil, os vovôs já foram os “coroas”.Mas a expressão Seniores parece sera que mais agrada os de melhorpoder aquisitivo. Vale tudo que acriatividade permitir para definir aturma dos que ingressam na faixa dossessenta anos em diante. O queninguém quer ouvir é apenas umaúnica palavra: velho.

Até meados dos anos 70, os idososainda não despertavam maiores in-teresses como uma categoria dife-renciada de consumo. Eram vistos ousob o estigma do velho abandonadoem asilos, ou sob o estereótipo dopatriarca bem-sucedido que gastaseu tempo e dinheiro com viagensde cruzeiro, chás de caridade oujogos de golfe. Ambas as situaçõesainda persistem em seus extremos. Oque vem se delineando de forma cadavez mais consistente, com base nãoapenas em simples percepção, masem estatísticas, estudos e pesquisas,é uma nova visão mais realista dessesindivíduos, seu estilo de vida,comportamento, hábitos, atitudes decompra, desejos e expectativas. É o“novo velho” do século XXI.

De tempos em tempos, a febre doouro ataca a mídia e o mercado acada vez que descobrem um novofilão de consumo. Foi assim com asmulheres no período da SegundaGuerra quando elas passaram a servistas como força produtiva, capazde gerar renda própria, e com poderde decisão para comprar e consumir

uma infinidade de produtos queforam surgindo exatamente paraatender a essa nova demanda. Con-seqüência também do fim da Guerra,a geração baby boomer foi o focodo marketing nos anos 60 e 70, coma descoberta de jovens com dispo-sição para gastar dinheiro, ganhocom trabalho ou generosas mesadasde pais cada vez mais permissivos.Os yuppies, nos anos 80, foram oextrato mais emblemático dos exa-geros do consumo quando mostra-ram ao mundo com quantos Armanisse constrói o status.

A tendência revelada nos anos 90, eque agora proporciona um novofôlego na busca cada vez mais seg-mentada por novos nichos de con-sumo, é o fenômeno representadopela chamada “Revolução da Longe-vidade”, uma equação baseada emdados demográficos que prevê umcontingente cada vez maior depessoas com 60 anos ou mais em con-

traste com uma população jovemcada vez mais reduzida. O alerta,que partiu da Organização das Na-ções Unidas às vésperas da viradado novo milênio, dividiu o mundoentre os que viam nisso uma tremen-da crise e os que veriam nestes dadosuma grande oportunidade.

CONHECER PARACONQUISTAR

Quando foram realizadas as primei-ras prospecções desse emergentemercado e começaram a surgir con-ceitos e definições para explorar essacategoria de consumidores, osautores descobriram que a própriafaixa etária não era consenso paradefinir quem pertenceria a essa nova

Os velhos eram vistos ou sob oestigma do velho abandonadoem asilos, ou sob o estereótipodo patriarca bem-sucedido quegasta seu tempo e dinheiro comviagens de cruzeiro, chás decaridade ou jogos de golfe.

60 ANOS PARA ACONSTITUIÇÃO

65 PARA A POLÍTICANACIONAL DO IDOSO

70 PARA OCÓDIGO CIVIL

DISTINÇÕES

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Velho, esse Desconhecido

idade. Ainda hoje no Brasil, há dis-tinções: são 60 anos para a Cons-tituição, 65 para a Política Nacionaldo Idoso e 70 para o Código Civil.Estabelecida a confusão, não bastavaclassificá-los apenas por ocupação,renda e grau de instrução. Na horade criar produtos ou serviços paraessas pessoas, analistas se sur-preenderam com a variedade deperfis, muito diferentes das imagenstradicionalmente exploradas pelamídia. Existem muito mais nuancesentre o estilo de uma Vovó Donaldaque prepara biscoitinhos para osnetos e tricota meias na cadeira debalanço e o comportamento de umaSue Johanson, que aos 70 e tantosanos chacoalha os telespectadorescom seu ousado programa “Falandode Sexo”. E antes que alguém digaque velha é a vovozinha, é bom co-nhecer as “Racing Grannies”, as sub-versivas vovós canadenses que saemàs ruas para contestar tudo queacham de errado. Com seus xales co-loridos e suas canções de protestoelas ilustram de forma radical e bemhumorada até onde podem chegaros velhos deste novo milênio.

Aprofundar o conhecimento dessegrupo e desenhar combinações –estatísticas e perfis de compor-tamento – torna-se decisivo paranortear qualquer ação voltada paraeste novo mercado. E o maior incen-tivo para isso é que os números sãofabulosos. Só no Brasil, no censorealizado pelo IBGE em 2000, pes-soas com mais de 60 anos somavam14.536.029, ou seja, 8,6% dapopulação brasileira. Numa retros-pectiva rápida, em 1991, os idososrepresentavam 7,3% do total. Re-cuando para 1980, a terceira idade

somava 16 para cada 100 indivíduosde 0 a 14 anos – e praticamentedobra de número em 2000 na pro-porção de quase 30 idosos para cadacentena de jovens. As projeções maisconservadoras apontam que em2025 o Brasil terá por volta de 32milhões de pessoas acima dos 65anos, 15% da população total dopaís. Quando isto acontecer, o Brasilestará ocupando o posto de sextamaior população de idosos domundo. Serão 1,1 bilhão de indiví-duos nesta faixa etária em todo oplaneta. Em 2050, segundo proje-ções do IBGE, jovens e velhos seigualarão em quantidade, represen-tando cada grupo 18% da populaçãodo país que terá, então, atingido umapopulação de 260 milhões depessoas.

Se os números das estatísticas inti-midam por sua grandeza e soam co-mo música para o mercado de con-sumo, projetando um nicho pro-missor para gerar novos negócios, asprojeções assustam quando apontampara um colapso de proporções ini-magináveis. Devem temer os go-vernos, despreparados para enfrentaras contas públicas de uma grandemassa de aposentados e pensionis-tas, e os dependentes dos sistemasde saúde que, se precários hoje, po-dem tornar-se inviáveis em paísesmenos desenvolvidos, se não houverplanejamento à altura.

Os índices do censo realizado peloIBGE 2000 sinalizam mudanças im-portantes, e para melhor, quando seanalisa do ponto de vista dos ren-

2000, PESSOASCOM MAIS DE 60ANOS ERAM 8,6%

2050, SEGUNDOPROJEÇÕES DO IBGE, ELESREPRESENTARÃO 18%

2025, REPRESENTARÃO15% DA POPULAÇÃOTOTAL DO PAÍS

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Maria Augusta Blecher

dimentos desta faixa etária: em 2000,a média de proventos de cada idosoestava em R$ 657,00, um cresci-mento relativo de 63% em relaçãoao censo de 1991, quando somavamR$ 403,00. Estes valores podem ga-nhar uma dimensão muito maisampla quando posicionados no con-texto de um país com enormes desi-gualdades econômicas e sociais, degrande concentração de renda emdeterminadas regiões, projetandodiferentes realidades entre um idosourbano da região metropolitana deSão Paulo, que em 2000 ganhava emmédia R$ 879,00, e o idoso do inte-rior rural de um Estado nordestinoque tem os índices mais baixos doBrasil, com rendimento médio, men-sal, de apenas R$ 198,00.

Todo cuidado é pouco quando seanalisa, por exemplo, a formação derenda do idoso: ela se compõe orade aposentadoria, pensão de viúvas,trabalho regular remunerado, lucrosprovenientes de aluguéis ou inves-timentos e mais recentemente deprevidência privada que em 1999detinha um percentual de apenas1,3% nesta composição. Segundo oIPEA (Instituto de Pesquisas Eco-nômicas Aplicadas), até esta data,89% nunca pensaram ou tiveramacesso a este tipo de informação. To-das as variáveis são importantes paraos profissionais de marketing queprocuram aliar dados estatísticosracionais a informações detalhadasde comportamento. Sem isso, corre-se o risco de errar na comunicaçãoe ter produtos ou serviços rejeitados.Ainda hoje publicitários vivem pisan-do em ovos quando criam campa-nhas para a terceira idade. O velhosempre se considera mais jovem

1985 1990 1995 2000 2005 2010 2015 2020 2025

CERCA DE 30MILHÕES DEPESSOAS

7,48,3

9,1

15,5Porcentagem da populaçãocom mais de 60 anos no Brasil

CRESCIMENTO

POPULAÇÃO IDOSA 2002

POPULAÇÃO COM MAIS DE 60 ANOS

13% POPULAÇÃOADULTA

14% POPULAÇÃOADULTA9% POPULAÇÃO

9% POPULAÇÃO5 MILHÕES

15 MILHÕES

METROPOLITANASREGIÕES

BRASIL

Fonte: Pesquisa GFK/Indicator

40 R E V I S T A D A E S P M – M A I O / J U N H O D E 2 0 0 5

Velho, esse Desconhecido

espiritualmente do que a sua idadecronológica possa indicar.

DERRUBANDOMITOS

No Brasil, as iniciativas para se di-mensionar o universo da terceira ida-de continuam tímidas. Exceção quese tornou antológica foi a pesquisarealizada pela consultoria GFK/Indicator, em 2003 – Panorama daMaturidade – que contribuiu de for-ma sem precedentes para eliminar

um imaginário distorcido em relaçãoaos brasileiros que ultrapassaram os60 anos. Foram 1.800 entrevistas quetraduziram o dia-a-dia dos idososbrasileiros em detalhes inéditos,desmistificando comportamentos eredimensionando a realidade daterceira idade no país. Confira al-gumas conclusões do estudo: idososgastam 10% da renda com planosde saúde e igual proporção em me-dicamentos. O supermercado leva24%, enquanto as contas de manu-tenção – gás, luz entre outras – vãoficando em 6% cada.

Se o estopim para gerar este interessepela terceira idade explodiu com asrevelações estatísticas do início dadécada de 90, a efetivação do dis-curso e concretização de ações fo-ram embaladas, com a escolha pelaOrganização das Nações Unidas em1999, como sendo este o “Ano Inter-nacional do Idoso”. Como sempreacontece, o tema ganhou visibili-dade e uma série de eventos e repor-tagens mostraram ao mundo a si-tuação dos velhos em todo o planeta.Enquanto nos países de TerceiroMundo o número de idosos cresceem proporções aceleradas, os ser-viços médicos e facilidades sociaisnão conseguem acompanhar ademanda. No extremo oposto, aindasegundo a ONU, em países ricoscomo a Finlândia, o maior problemaserá a falta de mão-de-obra, já que aopção por uma aposentadoria an-tecipada, com grandes vantagens,tem sido prática comum para ci-dadãos que sequer atingiram os 50anos de vida.

Assim, o novo milênio foi marcadopelas reformas compulsórias nosistema previdenciário em todo omundo, com reflexos também empaíses em desenvolvimento como oBrasil. Aqui, o inchaço das contas es-tava nas privilegiadas condições dosfuncionários aposentados do serviçopúblico. A média histórica de 8 con-tribuintes para cada inativo, em1950, hoje está na proporção quaseempatada de 1 para 1. Uma das mui-tas soluções propostas pela novalegislação da Previdência, aprovadano final de 2003, foi aumentar otempo de contribuição e idade parase pendurar as chuteiras.

CONTRIBUIÇÕES INVISÍVEIS NOÚLTIMO ANO, AJUDOU/RECEBEU AJUDADA FAMÍLIA E/OU AMIGOS...

Ouvindo os problemas

Dando conselhos sobre algum problema

Ajudando quando estava doente

Fazendo companhia

Dando presentes

Preparando ou oferecendo comida

Ajudando a tomar conta das crianças ou filhos

8269

8160

7472

7372

6371

6251

ajudou recebeu

Base: Total de amostra (1.800)Fonte: Pesquisa GFK/Indicator

4752

41 M A I O / J U N H O D E 2 0 0 5 – R E V I S T A D A E S P M

Maria Augusta Blecher

Se a ONU abriu os olhos do mundopara os contrastes entre nações, ge-rando mudanças importantes como,no Brasil, a criação de uma PolíticaNacional do Idoso com um estatutovigente desde 2004, o outro lado damoeda expôs o que já se sabe hámuito tempo: ser idoso nos EstadosUnidos é muito diferente de ser umvelho na África ou em países comoChina e Índia, onde as comunidadescada vez menos preservam traçosculturais de respeito ao ancião ecarecem todos do mesmo problema:falta de políticas para cuidar de seusvelhos. Uma curiosidade em paísesmulçumanos é que ainda prevalece

a solidariedade familiar cumprindoum papel que em outras sociedadesvem sendo empurrado para a respon-sabilidade do Estado.

VIVER MAISE MELHOR

Mas quem ainda encara o velhocomo peso para a família precisa seatualizar. Dados do IBGE analisadospelo IPEA – Instituto de PesquisasEconômicas e Administração – re-velam que, atualmente, apenas 2,4%dos maiores de 65 anos dependemdos parentes para sobreviver. A

grande maioria tem algum tipo derendimento e muitos possuem casaprópria. Ao contrário: quando mo-ram com filhos, os idosos contribuemcom 45% do orçamento doméstico,proporção que sobe para 69%quando são chefes de família.

Atualmente, de acordo com o IBGE,Rio de Janeiro e Porto Alegre são ascidades com maior proporção –cerca de 12% – de idosos em relaçãoà média nacional, que é de 8,6%.As cidades que seriam as mais ade-quadas para os aposentados viveremcoincidem com as que apontam osmelhores índices de desenvol-vimento humano (IDH), padrãoadotado pela ONU, que mede a qua-lidade de vida nos municípios. Aspreferidas são Florianópolis, Santose Niterói que só perdem para SãoCaetano do Sul, na Grande SãoPaulo, melhor IDH do Brasil em2000 e Águas de São Pedro, interiorpaulista – um destino tradicional paratemporadas de férias da terceiraidade. Um estudo do SEBRAE (Ser-viço de Apoio às Micro e PequenasEmpresas), encomendado pela cida-de de Santos, revelou que, após asatividades portuárias, os serviçosvoltados para idosos eram um dosnichos de negócios mais promissorespara toda a Baixada Santista.

O mais famoso destino do mundopara a terceira idade, seja para pas-sear ou para residir é o estado ameri-cano da Flórida, endereço de boaparte dos muppies que se instalamnas ensolaradas praias da região. Em-preendedores atentos souberamexplorar esta preferência incenti-vando a vinda dos maduros e abona-

CONTRIBUIÇÕES INVISÍVEIS NOÚLTIMO ANO, AJUDOU/RECEBEU AJUDADA FAMÍLIA E/OU AMIGOS...

Dando alguma orientação sobre negóciosou questões de dinheiro

Fazendo compras ou alguma tarefa em algum lugar

Arrumando coisas

Ajudando com trabalho doméstico ou fazendoreparos

Oferecendo transporte

Dando dinheiro ou pagando despesas

4636

3240

2839

2738

2041

2021

ajudou recebeu

Base: Total de amostra (1.800)Fonte: Pesquisa GFK/Indicator

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dos aposentados, oferecendo produ-tos e serviços de alto padrão. São fa-mosos os condomínios de luxo cons-truídos e pensados, nos mínimosdetalhes, para atender às necessida-des dos mais idosos – sistemas desegurança, serviços, arquiteturaprojetada para conforto máximo dosmoradores. Localizados em áreasecológicas, com campos de golfeparticulares e comércio privado,alguns chegam a restringir a presençade crianças. No Brasil, também co-meçam a surgir lançamentos imo-biliários inspirados na experiênciaamericana e alguns loteamentos nointerior que focam a clientela maduraoferecendo benefícios similares aosprojetos da Flórida.

O que talvez seja o empreendimento

mais tradicional e um dos mais orga-nizados para atender a demandadesta faixa etária é o turismo. Asagências de viagens continuam o-ferecendo os tradicionais roteiros decruzeiros, resorts e excursões decompras, mas algumas já se adap-taram a uma nova clientela que fogedos destinos convencionais e optapor atividades de lazer mais radicaiscomo trilhas e off road.

A Associação Brasileira dos Clubesda Melhor Idade, que tem apoio daEmbratur, estimula, com informaçõese descontos, o lazer de seus 220 milassociados. Viagens, cursos, acade-mias e até os óculos têm preçosespeciais mediante o cadastro epagamento de anuidade. Este seletopúblico, composto principalmente

por mulheres viúvas e com rendamédia de R$ 1.200,00, é uma finacamada diferenciada que quer seusdireitos respeitados, cobrapontualidade, segurança, higiene, eexige informações corretas. Segundoa ABCMI, seus associados viajam emmédia 3 vezes por ano. Na pesquisada GFK/Indicator, a freqüência éainda maior, chegando a 4 vezes porano.

A leitura de dados e estatísticasprecisa sempre reunir muitas variá-veis para que sejam evitadas con-clusões equivocadas e permitaavaliar quanto há de desperdício ouquando se está subestimando estepúblico. Esta é uma dúvida freqüentepara quem planeja dentro dasempresas e agências de propaganda:dados confiáveis. Nem tudo écertificado. Aprende-se por intuiçãoe observação que, velhos são resis-tentes às novidades, dedicam menostempo a buscar informação e pre-ferem comprar o que já conhecem.Numa pesquisa australiana de 1981sobre a aquisição de novos carros porpessoas mais velhas já se concluíaque esse cliente compra com segu-rança o que conhece de experiênciasanteriores. Já autores americanos,que vêm publicando estudos desdeo final dos anos 70, perseguem aestruturação de perfis mais deta-lhados que contribuam para enten-der melhor estes consumidores.

Algumas conclusões: adultos commais de 65 anos podem ser tra-dicionalistas – apegados a valoresfamiliares, de hábitos caseiros e resis-tentes a mudanças bruscas; sociáveis– esta é a turma que gosta de tra-balhos filantrópicos, bingos e viagens

As novidades não param de surgir: são celulares, MP3 players,gravadores de DVD, modernidades cada vez mais fáceis decomprar, mas muitas vezes difíceis de manusear.

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Maria Augusta Blecher

em grupo; ou isolacionistas – aquelesque não querem participar de ativi-dades coletivas. Em outras abor-dagens, a terceira idade pode revelar-se ativa, econômica ou não en-volvida no que diz respeito a hábitosde compra.

MUDANÇADE HÁBITOS

Outra surpresa da pesquisa GFK/In-dicator foi a constatação de que 20%dos idosos utilizam o computadorpessoal inclusive para pagar contas.O acesso às novas tecnologias, pre-visto até por um artigo do Estatutodo Idoso, não deve se limitar à infor-mática. As novidades não param desurgir: e são celulares, MP3 players,gravadores de DVD, modernidadescada vez mais fáceis de comprar, masmuitas vezes difíceis de manusear.Em plena era digital, a peça de resis-tência ainda é o caixa eletrônico dosbancos. O desafio de aprender a usá-los vem desde os anos 80 e, até hoje,muitos idosos preferem utilizar oscaixas tradicionais, alegando dificul-dades técnicas. As instituições ban-cárias, que mantêm funcionários au-xiliando e monitorando o uso destesequipamentos, ainda computammais uma razão: a busca de contatopessoal em contrapartida à interfacecom uma máquina.

As escolas de informática costumamoferecer classes especiais para a ter-ceira idade, exatamente, para aten-der a essa necessidade de aprendera lidar com novas tecnologias. A-presentados ao computador jáadultos, esta geração não foi exigidaprofissionalmente para utilizá-lo.

RESPONSÁVEL PELO DOMICÍLIO

É O RESPONSÁVEL PELO DOMICÍLIO

NÃO É O RESPONSÁVEL

70%

30%

Fonte: Pesquisa GFK/Indicator

Atualmente, idosos de todas as partes do mundo – em especialaqueles com filhos e netos distantes – descobrem o universo daInternet e as novas formas de interação.

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Velho, esse Desconhecido

Atualmente, idosos de todas as partesdo mundo – em especial aquelescom filhos e netos distantes –descobrem o universo da Internet eas novas formas de interação: e-mails, salas de bate-papo, comu-nicadores instantâneos e softwaresque permitem conversas telefônicascom custo quase zero, além dapossibilidade de enviar fotos e filmeson-line. Já quem convive de pertocom a família acaba aprendendo amexer nestes gadgets até por brin-cadeira, como acontece entre avóse netos com os vídeo-games. Mas,são raras as indústrias que produzemequipamentos de manuseio simpli-ficado com instruções fáceis de

seguir.

Talvez os 90 bilhões de reais nasmãos de idosos – uma média apro-ximada da renda anual dos que têmmais de 65 anos – venham a sen-sibilizar o mercado para criar novasmodalidades de serviços e produtosmais adequados às necessidadestípicas desta faixa etária. Aindaassim, algumas empresas ainda nãodespertaram para fazer, sequer, o queé bastante óbvio: aumentar o tama-nho das letras dos rótulos, evitar de-graus dentro de lojas, oferecer áreasde descanso com poltronas e cadei-ras em shopping centers. São reivin-dicações antigas que, quando aten-

didas, causam enorme impacto parao idoso que tem uma percepção agu-çada e seletiva para quem os trata bem.

Os supermercadistas, mais espertos,sabem que conhecer a clientela faztilintar a caixa registradora. Assim,atendentes são orientados para umcomportamento menos apressado aose deparar com idosos. Ser gentil, daratenção e memorizar nomes declientes mais assíduos faz milagrespara a fidelidade. Serviços de entre-ga, vagas especiais e manobristas pa-ra carros, além de check-outs exclusi-vos incentivam, às vezes, mais deuma visita por dia ao estabelecimen-to. Algumas redes de supermercadose shopping centers estão indo alémdos mimos e oferecem, de aulas deginástica, palestras, eventos de cui-dados com a saúde, onde há, até, mo-nitoramento de pressão e diabetes.

PARAR OUCONTINUAR? EISA QUESTÃO.

Se por um lado existe uma legião deidosos procurando o que fazer como tempo livre, boa parte ainda per-manece na ativa, trabalhando. Osque construíram carreiras bem suce-didas, têm níveis de escolaridade al-tos, e ainda se sentem dispostos acontribuir com seu know-how, par-tem para a segunda carreira comoconsultores ou professores. Muitostambém vão atrás do sonho de terum negócio próprio, em geral ligadoa hobbies que não tiveram tempo decultivar. Mas uma outra parcela pegamesmo pesado, pois trabalha pelasobrevivência ou para melhorar opadrão de vida que despencou junto

UNIPESSOAIS

OUTRASCONFIGURAÇÕES

IDOSO +CÔNJUGE 60 OU +

73%

10%

17%

Fonte: Pesquisa GFK/Indicator

TIPOS DE DOMICÍLIOS

TOTAL

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Maria Augusta Blecher

com a aposentadoria. É o caso dosoffice-boys da terceira idade, mo-dalidade profissional em que ter maisde 60 anos só traz vantagens para osempregadores. Sem custos trabalhis-tas, prioridade em filas de banco epasse livre nos ônibus já que não pa-

gam passagens, os mais velhos aca-bam disputando vagas com os maisjovens. E ganham.

Quem não precisa se preocupar coma sobrevivência também não fica

apenas circulando nos bingos e bai-les da terceira idade, uma lenda quea pesquisa da GFK/Indicator ajudoua derrubar. Menos de 8% dos idososfreqüentam estes lugares. Será maisfácil encontrá-los nos parques – paraonde mais da metade se dirige pelomenos uma vez por semana – assimcomo nos shopping centers fre-qüentados por um terço dos entre-vistados cerca de 4 vezes ao mês. Oresto do tempo em casa, segundoestudo da Mercado Global, o idosogasta vendo televisão – 87%, ou ou-vindo rádio – 59%. A leitura é umhábito pouco cultivado. Dados doIBGE revelam que pouco evoluíramos índices de escolaridade dos ido-sos, medidos por anos de estudo dosresponsáveis pelo domicílio. Amédia nacional é de 3,4 anos de es-tudo. Niterói, no Estado do Rio deJaneiro, é a cidade onde se encontrao índice mais elevado de escolari-dade: 8,2 anos. Os mais baixos são,praticamente, zero em duas cidadesno estado do Piauí, com 0,2. Nestecontexto, é um privilégio, de poucos,freqüentar as chamadas UniversidadesAbertas da Terceira Idade, instituiçõescom suporte das faculdades regularese que oferecem, sem custo ou a partirde taxas simbólicas, disciplinas ecursos livres de temas variados.

Um dos temas da OrganizaçãoMundial de Saúde, que trabalha pelaprevenção da saúde da populaçãodo planeta, no caso da terceira idade,prescreve a necessidade de açõesque assegurem a independência e avida ativa com o envelhecimento.Atender a esta recomendação daOMS está na proporção do bolso dofreguês. Assim, crescem em númeroas ONGs, os centros públicos de

A leitura é um hábito pouco cultivado. Dados do IBGE revelam quepouco evoluíram os índices de escolaridade dos idosos, medidos poranos de estudo dos responsáveis pelo domicílio.

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Velho, esse Desconhecido

convivência, e os lares para abrigaros mais carentes. Por outro lado, umnegócio que tem tudo para se ex-pandir e prosperar são os residenciaisde alto padrão que substituem oconceito de clínicas e casas de re-pouso e abrigam uma clientela dealto poder aquisitivo disposta a pagarpor um espaço exclusivo que reúnaassessoria de saúde com as mor-domias de hotéis.

Até o início do século XX, apenas25% da população mundial comple-tava 60 anos. A expectativa de vidaé um dado que cresceu no Brasil,passando de 43 anos na década de50 para os atuais 67 em média, sendo63 para os homens e 72 para as

mulheres, que, por razões variadasque ainda estão sendo investigadaspela medicina, têm uma sobrevidamaior em todas as partes do mundo.No Japão, os Cabeças Brancasatingem, tranqüilamente, os 80 anos.Mas o fenômeno que maissurpreende com a chegada do novomilênio é o das pessoas queatingiram 100 anos de vida. Eram180 mil em 2000 em todo o mundoe, no Brasil, por volta de 9,5 mil. Asprevisões são de que venham aatingir 3,2 milhões em todo o planetaaté 2050. Hoje já não causa espantosaber que a mãe da rainha ElizabethII atingiu 101 anos de idade e que,Roberto Marinho quase chegou lácom 98. Detalhe de sua longa

biografia: fundou a Rede Globo aos60 anos de idade. Até C. MontgomeryBurns, o magnata centenário dodesenho animado Os Simpsons,continua na ativa comandando commão-de-ferro o seu império nuclearem Springfield.

SÓ PARAVETERANOS

Nos anos 60, os Beatles cantavam oantiquado foxtrot “When I’m Sixty-Four” imaginando o dia-a-dia de umcasal de velhinhos. Paul McCartney,nascido em 1942, pai de uma me-nina de 2 anos, nem de longe lembraa dupla cheia de manias retratadanos versos da canção. Mick Jagger,também pai de um garoto de 5 anos,com atuais 61 anos, continua acantar “Satisfaction” nos palcos.Enquanto isso, a indústria farmacêu-tica fatura, e muito, com medica-mentos destinados a homens comdisfunção erétil, uma das preocu-pações mais temidas quando seingressa na terceira idade. O Viagra,que surgiu em 1998 para combatereste problema, é um campeão devendas junto com o Celebra, umanti-reumático que, por ocasião deseu lançamento em 1999 teve 7,4milhões de receitas aviadas emapenas 6 meses no Brasil.

A indústria farmacêutica, pela na-tureza do negócio, foi um dos pou-cos setores que sempre tiveram umapolítica de marketing para atingir aeste público-alvo. Os remédios deuso contínuo, consumidos emgrande escala por idosos, sãoresponsáveis por boa parte dos lucrosdos laboratórios que investem

ESTATUTO DO IDOSO

Cap. V Art. 20 – O idoso tem direito a educação, cultura, esporte,lazer, diversões, espetáculos, produtos e serviços que respeitem suapeculiar condição de idade.

Cap. V Art. 21 Par. 1 – Os cursos especiais para idosos incluirãoconteúdo relativo às técnicas de comunicação, computação e demaisavanços tecnológicos, para sua integração à vida moderna.

Cap. V Art. 24. – Os meios de comunicação manterão espaços ehorários especiais voltados aos idosos, com finalidade informativa,educativa, artística, e cultural, e ao público sobre o processo deenvelhecimento.

Dos Crimes – Art. 96 – Discriminar pessoa idosa, impedindo oudificultando seu acesso a operações bancárias, aos meios de transporte,ao direito de contratar ou por qualquer outro meio ou instrumentonecessário ao exercício da cidadania, por motivo de idade. Pena:Reclusão de 6 meses a 1 ano e multa.

Dos crimes – Art. 105 – Exibir ou veicular , por qualquer meio decomunicação informações ou imagens depreciativas ou injuriosas àpessoa do idoso. Pena – detenção de 1 a 3 anos e multa.

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fortunas em pesquisas neste seg-mento. Os Planos de Saúde tambémestão investindo em segmentação ejá existem empresas especializadasexclusivamente nesta faixa etária.

Outro mercado que soube explorarexpectativas e cresce sem parar é ode produtos do ramo financeiro. Pla-nos de previdência e aplicações dotipo capitalização que sorteiamprêmios são os favoritos. As finan-ceiras também encontraram no pú-blico maduro uma oportunidade deoferecer empréstimo a um custo

baixo e inadimplência bastantereduzida, já que as parcelas sãodebitadas diretamente do benefíciopago pela previdência social.Algumas instituições vão além. OBanco Real, por exemplo, criou oconcurso Talentos da Maturidade,que já teve seis edições até 2004premiando a produção artística dopessoal da terceira idade. Tornou-seuma referência para o escasso calen-dário de eventos voltados para estepúblico. Mesmo com cases de suces-so como este, as iniciativas no Brasilainda têm pouca visibilidade e boa

parte não tem continuidade. Revis-tas, guias e programas na televisãonão vingaram, e os sites especializa-dos na Internet ainda carecem deatrativos mais espetaculares. NosEstados Unidos, por exemplo, é pos-sível encontrar até um endereço vol-tado para avós que são ativistas con-tra guerras. Todos são patrocinadospor grandes empresas.

Idoso não quer rótulo de velho. Masquando apelar para a idade traz al-gum tipo de vantagem como descon-tos em compras, meia-entrada noscinemas e teatros, passe livre nostransportes públicos, filas e assentospreferenciais, eles assumem suascarteirinhas e cartões de fidelidade.As redes de drogarias travam, atéhoje, verdadeiras guerras por esteconsumidor, utilizando como “garo-tos-propaganda” artistas com suasreais e assumidas idades.

Uma curiosa constatação que vemsendo acompanhada pelo (IPEA),Instituto de Pesquisa EconômicaAplicada é a de que, parte da rendado idoso, de todas as classes sociais,acaba revertendo em benefícios paraas gerações mais jovens. Muitosajudam no orçamento doméstico,pagam estudos para os netos, aulasextras de inglês e esportes, comprambrinquedos e roupinhas, biscoitos,doces e iogurtes. Levam os netos paralanchonetes e shopping centers etambém em viagens de férias. Chegaa 25% a porcentagem dos domicíliosmantidos exclusivamente com apo-sentadorias de idosos.

E a presença de pessoas acima de60 anos nas famílias, respondendopor, no mínimo, 50% do total de resi-

Até o início do século XX, apenas 25% da população mundialcompletava 60 anos. A expectativa de vida é um dado que cresceuno Brasil, passando de 43 anos na década de 50 para os atuais 67em média, sendo 63 para os homens e 72 para as mulheres.

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Velho, esse Desconhecido

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Artigo O que há de bom para a 3ª idade.

Finanças. ISTO É DINHEIRO. Kênia Miriam.

Artigo. Vovô vai a luta. Dieguez, Consuelo. VEJA.

06.09.2000.

Artigo. Admirável terceira idade. Giro News.

p.46- 47- nov 2004.

Artigo. Atenções Especiais para a Melhor Idade.

Mercado Global. p-14-17. 1o trim. 2005.

Artigo. Pijama é só para a hora de dormir. Valor

Investe. P.58-61. Nov. 2003, jan 2004.

AUTORAMARIA AUGUSTA BLECHER

é jornalista, colabora com revistas e

publicações da Editora Abril, textos

institucionais para empresas e

redação de livros.

dentes, acabou gerando a criação deum novo índice de inflação: o IPC-3I, Índice de Preços do Consumidorda Terceira Idade, que a FundaçãoGetulio Vargas vai administrar a partirdeste ano através da coleta mensalde dados e divulgação dos resulta-dos, trimestralmente. A explicaçãopara o novo indicador é que, na cestabásica do idoso, certos itens comomedicamentos, planos de saúde eperfumaria, pesam mais.

Ainda não é uma obsessão, mas jáestá se tornando febre entre os maisjovens a idéia de retardar o enve-lhecimento. Este medo alimenta umaindústria que nunca produziu tantoslivros, clínicas e academias especia-lizadas, e uma “cosmiatria” que tempor lema plantar hoje para colheramanhã, ou seja, a prevenção. Os

cuidados com a saúde ainda são aprovidência mais importante para sechegar com fôlego à terceira idade.Assim, uma série de recomendaçõesinclui abandonar vícios como ci-garro, adotar uma alimentação sau-dável, cultivar as amizades, resolverpalavras cruzadas, sair do seden-tarismo e começar a praticar algumesporte. Nem que seja levar o ca-chorro para passear. Trocar pijama echinelo por tênis e agasalho.

Assim, uma série de recomendações inclui abandonar vícioscomo cigarro, adotar uma alimentação saudável, cultivar asamizades, resolver palavras cruzadas, sair do sedentarismo ecomeçar a praticar algum esporte.

ESPM

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O Último Dia

Hoje é o último dia dele na empre-sa, depois de 40 anos de dedi-cação e muito trabalho. Começoucomo estagiário. Participou doprimeiro programa de trainees daREVELI Company no Brasil. Atuoucomo gerente de produtos,gerente de categoria de produtos,diretor de marketing e gerentegeral de várias divisões no Brasile fora dele. Há dez anos con-quistou o cargo de presidente dacompanhia no Brasil. Com ele àfrente, a empresa se transformouna fatia mais rentável do grupo e,por isso, ocupa uma posição dedestaque na contribuição para osresultados globais. José CarlosBenvenuti, o enigmático. Quaseuma lenda. Um homem poderosoe de fácil acesso aos poderosos.

Fico a pensar em como será a em-presa sem ele. O que nos esperadaqui por diante? Como será osucessor? Como será trabalharaqui sem a presença dele no dia-a-dia? Algumas perguntas e muitasdúvidas. Quase todas egoístas.Todos se referem a si e – nomáximo – sobre a empresa.Ninguém fala dele ou sobre ele.Não se levantam questões do tipo:como será esse novo momentopara ele? No que será que ele estápensando? O que e como ele farádaqui para frente?

Entrei naquela sala pouco antesdo almoço. O normal eraencontrar a porta rigorosamentefechada. Hoje estava entreaberta.José Carlos Benvenuti estava ali.Na sala dos botões. Sala ondepoucos eram convidados a entrar.

DO ÚLTIMO

AI

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Alexandre Mathias e Marco Dalpozzo

Quando entrei, não sabia bem o quefalar. Falo? Perguntei-me. Por fimentrei só com o silêncio dos passos.Ele estava em pé olhando os quadrosperto da janela, em frente a umquadro exótico, lembrança sei lá eude qual viagem, ou quem sabe atéfruto de uma premiação ou reco-nhecimento. Os quadros eram glo-bais. Representavam muitos e varia-dos lugares do mundo, eram os fru-tos de uma história profissional quehá muito tempo misturava-se com abiografia. Mas nada disso parecia fa-zer diferença diante da realidade. JoséCarlos tinha chegado ao último dia.

Recebi o convite de um almoço detrabalho há alguns dias, mas não ti-nha ainda a clara percepção de queaquele era – para ele – o último dia.Agora ele entrava silenciosamentenaquela sala, onde por várias vezessentira frio na barriga antes de cru-zar aquela porta. João Carlos estava– agora – em frente aos quadros de-le, procurando em cada um as coresda sua existência. Não pensei emnada. A quantidade e a intensidadedo momento exigiam máxima con-centração. Era necessário ler e en-tender aquele momento. Mais: eraimportante perceber o sentido queaquilo fazia para ele. Nós, parcei-ros estratégicos de RH, não somoschamados para falar, opinar, agir,mas – naqueles momentos – esta-mos ali para receber, escutar, supor-tar, conter emoções e sentimentosque não cabem em outros lugares;nas decisões do dia-a-dia de umlíder. Assim, proporcionalmente aopeso extraordinário do momento,não era possível pensar nas minhasperguntas. Não seria digno agir as-

sim. Só queria compartilhar com eleum instante de grande emoção.

Os quadros pareciam interrogativosnaquele instante. Por quê? Por quê?Por quê? Era a pergunta que cadaum parecia dirigir-lhe. Por que ago-ra? Por que não esperar mais doisanos? Por que daquela maneira? Porque aquela existência? A força dosporquês se perde ao longo de nossasvidas. São pequenos filhos a quemtemos que conquistar. Sem medos.Aliás, somos fascinados por nossosporquês. Eles são os alicerces denossas conquistas. Mas depois,crescendo e envelhecendo, é comose esquecêssemos que – apesar deadultos – continuamos a ser filhos eque os porquês são cada vez mais,decididamente, instigantes edesafiadores. Nunca tinha entradonaquela sala e o encontrado de pé,em frente aos quadros. Em vez deparecer-me em busca de umanostálgica procura pelos fragmentosdo passado, deu-me a nítidasensação que estivera, sim, àprocura de alívio para a doloridavia-crúcis dos porquês.

Entrei. José Carlos logo percebeuminha presença. Não ficou surpre-so. Estendeu a mão, recebeu-me edisse-me que ficasse ao lado dele ecomentou:

“Catelli, este vem da Mongólia. Es-tive lá quando ainda só tinham ban-deiras vermelhas e militares nas ruascongeladas de Ulambator.” “Comodeveria ser perigoso fazer – naquelaépoca – negócios naqueles países”,disse para iniciar a conversa. “Peri-goso é o Rio de Janeiro de hoje. A

Mongólia é rica em recursos natu-rais e sabia – já naquele tempo – viverem comunidade e com respeito aosrecursos que ela possuía; o que nãoé verdade em nossa cidade.”

Como sempre, tinha uma lição devida a me esperar. Estava ali, diantede mim, o velho sábio que assume opapel de formador. E eu, como alu-no, ansiava por conhecer os critériosda relação e aonde levaria aquelaconversa. Convidou-me a sentar nolargo sofá. Era a primeira vez, depoisde tantos anos juntos, que nossaconversa podia ter lugar em um outrocontexto que não à mesa de trabalhodele. Sinal de um evento extraor-dinário como efetivamente deveriaser o ultimo dia. Ofereceu-me umdrinque e algumas castanhas de caju.Aparentemente relaxado, agia comoutra velocidade, com outro ritmoem relação ao de costume.

“Sabe do que tenho certeza em re-lação ao amanhã?” – Não, disseainda um pouco constrangido pelonovo jeito da conversa. “Sei –continuou – que o telefone vai pararde tocar. Que perderei um dossobrenomes. E aí, passarão à minhafrente todas as fraldas do meu filhoque deixei de trocar em nome doobjetivo de cada ano, mais desafia-dor e de – apesar de tudo – teria deser atingido.” Não precisei falar. Sóo meu olhar interessado e compre-ensivo foi suficiente para que JoséCarlos, normalmente consideradopouco eloqüente, iniciasse uma lon-ga reflexão sobre o momento.

“Em meu primeiro ano como presi-dente a companhia valia dezoito

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O Último Dia

vezes menos do que vale hoje, mas eas fraldas de meu filho? Tampouco astroquei!” O olhar dele, surpreenden-temente, transformou-se. Parecia queolhava aquele filho chorando, ali,agora, naquele instante. Com os olhosmarejados, à espera de uma ajuda,de um conforto, de uma intervenção,que pudesse aliviar a dor dasemoções. Eu não sabia o que fazer.Fiquei surpreso. Por instantes, o queeu acostumara a ver mudou. O sábioe equilibrado presidente que sabiatudo revelava uma outra faceta. Umapersonalidade rica e complexa hámuito tempo escondida.

Só então comecei a entender porqueeu estava ali. Comecei a transitar nadureza do momento, na intensidadede tudo aquilo e naquela intimidadeque, enfim, se revelara. Tratava-se deum líder. Um líder de fato e direito.Homem de sucesso reconhecido. Devitórias representadas em todos oscantos da sala e nas minhas lem-branças. Lá estava ele, no último diade trabalho. E o dia seguinte? Comoseria viver depois de todas as festase comemorações, discursos, cartase agradecimentos? No dia seguintenão teria mais o carro com o fielmotorista e tudo o mais que ocercava de pompas e solenidades.De repente ele diz: “Comprei umHonda Fit. Carro pequeno. Não cha-ma atenção e não quebra”. Falavacomo se a vida recomeçasse. Comose após muitos anos recomeçasse aandar. Pela primeira vez senti aquelasituação mais do que ele. Pela pri-meira vez senti que tinha finalmenteespaço para fazer perguntas a si:Quem sou eu? Senti uma eterna ri-queza naquele instante. Diante de

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Alexandre Mathias e Marco Dalpozzo

versa com seu filho, caminhe na rua,em baixo da sua casa, onde portantos dias passou no seu carroblindado lendo o jornal e se pre-parando para reuniões. Perceba queali existem tantas outras históriasdignas quanto a sua. Com certezaassim terá a chance de encontrardicas de futuro.” Ele me olhou, oalmoço nem tinha começado, emeu cansaço emocional era,imagino, claramente aparente. JoséCarlos então me disse: “Obrigado,Catelli, como sempre palavrashonestas e apaixonadas. Sei quevocê tem uma outra reunião logo,se precisar sair não se preocupe,tenho ainda muitas tarefas a fazer.Nosso papo me deu conforto, maisuma vez, espero reencontrá-lo umdia: cuide de nossa gente”. – “Assimfarei”, disse. “Obrigado pelo almo-ço e pelo privilégio de estar aqui ede ter vivido este momento com osenhor.”

Saí da sala atordoado, sem saber oque fazer. Pequei meu paletó eminhas coisas. Sem falar com nin-guém, fui para casa brincar comminha filha.

mim estava mais do que um eternopresidente: estava ali uma pessoa quese abria à própria complexidade.

“Sabe o que lhe desejo?” Disse-lhe.“O quê?” Perguntou com um olharde rara doçura, “que seu filho e mui-tos outros possam aproveitar estenovo ser, e que você possa, escreveroutras histórias ricas e satisfatóriascomo a que escreveu aqui. Esta é sóuma, que durou um longo e belís-simo instante. Que você com direitoe orgulho coloca sua assinatura, mascom certeza não será a última. Sepermite, o que nos nutre é o projetode nossa biografia, da qual nossacarreira faz parte e nos acompanhapara sempre. Você escreverá outras,importantes, úteis e grandiosas, paravocê e para os seus”. – “Tenho cons-ciência”, disse. “Talvez, além da casae da família e das minhas raquetesde tênis, precisarei de um novosonho. Vou deixar estes quadrosonde estão, assim terei espaço parao novo, assim não guardarei umpassado que arrisca ser minhareferência”. Pensei em suas palavras,e, tremendo de emoção, ganheitempo enchendo o meu copo deágua e respondi. “Sr., tire os seusquadros daqui, deixe que seusucessor, que você preparou comtanto cuidado e antecipação, possaser autor como você foi. Encontre olugar para o seu passado, uma sala,um armário, uma parede. Guarde sóo que é realmente importante. Oresto, o excesso, a gordura de umacarreira tão rica jogue fora, e deixeo lugar, a existência, a novos en-contros, a novas realizações dasquais, talvez hoje, nem tenha a me-nor consciência. Recupere a con-

AUTORES

MARCO DALPOZZO([email protected]) é

Diretor de Desenvolvimento de

Recursos Humanos da Vale do Rio

Doce.

ALEXANDRE MATHIAS([email protected]) é Diretor Geral

da ESPM do Rio de Janeiro.

ESPM

EntreVista

60 R E V I S T A D A E S P M – M A I O / J U N H O D E 2 0 0 5

O

EntreVista

s editores da Revista da ESPM pen-saram em entrevistar um brasileirode mais de 80 anos que estivesseexercendo – mais ou menos normal-mente – as suas atividades profis-sionais em setores ligados à ativi-dade da Escola, como comunicação,marketing, management, e que,naturalmente, concordasse em falarsobre si próprio: como é “ficar ve-lho” num mundo que se considera“jovem” e outros assuntos que for-mam a pauta desta edição daRevista.

A busca resultou não em um, masem três, e o destino definiu que, atéestatisticamente, eles fossem repre-sentativos: Homero Icaza Sanchez,o “bruxo” das pesquisas, está com80 anos – e dirige o seu Itape, pres-

tando serviços regulares à TV Glo-bo; Said Farhat, o “nosso” primeiroe único Ministro das Comunicações,jornalista, publicitário, editor,consultor político, ainda divide seutempo entre São Paulo e Miami, e –aos 85 anos – participa de inúmerasatividades e mantém uma agendacheia; enquanto José Mindlin, ex-empresário e advogado e bibliófiloexemplar, aos 91, administra, ama einspira a sua magnífica coleção, noBrooklyn paulista, concordando eminterromper seu trabalho, de vez emquando, para dar uma entrevista –por exemplo.

Os resultados dessa rica colheitaestão nas páginas seguintes.

(FG e JRWP)

ELES

80DOSPASSARAM

HOMERO, SAID, MINDLIN

61 M A I O / J U N H O D E 2 0 0 5 – R E V I S T A D A E S P M 61 M A R Ç O / A B R I L D E 2 0 0 5 – R E V I S T A D A E S P M

ENTREVISTAHOMERO ICAZASANCHEZ

HOMERO ICAZA SANCHEZ équase um mito para toda uma geraçãopioneira do marketing e da pro-paganda, no Brasil, sobretudo pela suaatuação no campo da Pesquisa deMercado. Nascido no Panamá – em1925 – ele veio para o Brasil em 1944e daqui nunca mais saiu. Iniciou acarreira em seu país como advogado,passou para a carreira diplomática efoi cônsul geral do seu país, no Rio deJaneiro, onde se tornou aluno e amigodo maior de nossos poetas, ManuelBandeira, que a ele dedicou um deseus poemas. Abandonando a carreiradiplomática, voltou-se para a socio-logia – e daí para a Pesquisa deMercado. José Bonifácio de OliveiraSobrinho – o Boni – contratou-o paraa TV Globo e lá, através de sua agudapercepção social e do sólidoconhecimento técnico, era capaz de“adivinhar” quais as novelas que iamter sucesso ou não e – especialmente– o que o público queria. Isso lhe va-leu o apelido – e a fama – de “bruxo”.Fundou e dirige até hoje o Itape –Instituto Técnico de Análise dePesquisa e Estudos – onde continuasupervisionando análises de pesquisasde opinião pública, de mercado eaudiência.

JR – Com 80 anos completos emjaneiro deste ano, você acha quegostaria de ter feito na vida algumacoisa diferente do que fez?

HOMERO – Não. Acho que foi bomo caminho que fiz.

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JR – E alguma coisa que não tenhadado tempo de fazer?

HOMERO – Antropologia. Eu achouma ciência tão bonita, tãointeressante. Mas não é a antropologiade índios, gente pré-histórica, é aantropologia urbana, da cidade,porque a cidade oferece um espetáculomaravilhoso. Eu estava conversandocom minha mulher, outro dia,imaginando o sujeito que é funcionáriopúblico, ganha pouco, mas o filho fezum curso de computação e disse quegostaria de ter um computador. Entãoele vai a uma firma que vendeaparelhos usados e compra um, àprestação, para dar ao filho, noaniversário. Manda embrulhar oaparelho, pega o ônibus para osubúrbio, onde mora, e vai pensando:“Te cuida, Hans Donner, que meu filhovem aí”. Ele não sabe como funcionao computador, mas sabe que existe umHans Donner e o filho dele pode chegarlá... Através da televisão a filha delecompra um livro de como se fazbijuterias, e faz bijuterias em casa paravender; a mãe compra um livro sobreMedicina Alternativa porque o remédioestá muito caro e com um chazinho,resolve. A tecnologia entra no lar delese provoca comportamento diferente,novo. Isso eu gostaria de estudar comcalma, em detalhes.

JR – O Jorginho Guinle uma vez disse:“Já fui rico e já fui pobre, e ser rico émelhor”. Se alguém dissesse isso comrelação a ser jovem e ser velho, qualvocê acha que seria verdade?

HOMERO – Não, o velho acha quequando era jovem era melhor. Não éque ele é melhor que o jovem, massim que “quando eu era jovem, era

melhor que você”. Aproveitavamelhor a vida.

JR – Você acha isso?

HOMERO – Eu, como velho, sei – élógico.

JR – O Duailibi é um grande colecio-nador de citações e tem uma citaçãoque diz: “Nós não paramos de nos di-vertir porque ficamos velhos, ficamosvelhos porque paramos de nos diver-tir”. O que você acha?

HOMERO – É uma “boutade”.

JR – Você se diverte?

HOMERO – No que posso. A idadevai limitando o seu campo de ação,entende? Quando você tem vinte anos,diz “vamos a Paraty no final de semana”,de ônibus, de carro, de carona ou oque seja. Mas depois dos setenta, aqueda é muito grande, é muito rápida...

JR – É uma coisa objetiva, que tem aver com a sua força física.

HOMERO – Exatamente.

JR – Pirandello escreveu que “coma idade a percepção se torna maislúcida – e isso acaba tornando a vidainsuportável”. Você concordariacom isso?

HOMERO – A “percepção dos ido-sos” é tão aguda, que – às vezes –parece que a gente adivinha. Agora,

o que eu gosto na idade – e tenhoainda interesse por estudar, é essacoisa oriental, é a contenção japonesa,por exemplo. Na história da literaturajaponesa, conta-se que havia umprofessor que dava aulas de haikai –são dezessete sílabas – versos decinco, sete e cinco – medida clássica.Um aluno passou um ano preparandoseu haikai e, no fim do ano chegou aoprofessor e mostrou o poema, quedizia: “Na neve, a sombra das cere-jeiras”. E o professor disse: “Tem muitacerejeira”. Uma cerejeira fazia o mes-mo efeito que várias cerejeiras emtermos de sombra...

JR – E como é que você vê a questão dasempresas, hoje: o desespero pelo resul-tado, pelos lucros, você acha que – defato – esta havendo uma mudança, oué a nossa visão de pessoas mais idosas,por achar que “antes era melhor”?

HOMERO – Acho que antes está-vamos mais preocupados com aformação do profissional, com o de-senvolvimento do profissional até elechegar a um nível de excelência. Hoje,estamos interessados no resultado queo profissional produz; julgamos oprofissional pelo resultado e não porele mesmo. É uma diferença visível.

JR – O que, de fato, os mais velhospodem ensinar aos mais jovens?

HOMERO – Primeiro, paciência,que é fundamental. Há uma coisa noidoso; ele não reage a certas coisas,que deveria reagir, mas “eu já estou

O PT TINHA BOAS IDÉIAS, BONSIDEAIS, MAS NÃO TINHA FORMAÇÃO.

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velho, porque eu vou levantar poralguma coisa? Paciência”. Segundo,a gente tem que prestar atenção; ouvi-los. Há uma história de um japonêsbem-sucedido, que tinha uma fábricade automóveis nos Estados Unidos e,de repente, recebeu uma ligação deum velhinho que se dizia amigo deseu pai, na aldeia em que viveram.“Estou aqui nos Estados Unidos epreciso de um conselho. Será que osenhor poderia me visitar?” Ele foivisitar e o velho estava com a casa todacheia de jornais empilhados, e disse:“Lá no Japão eu guardava jornais etrocava por papel higiênico e outrascoisas, todas as semanas passava umcarro trocando. Aqui não posso trocar,tenho um quarto cheio de jornais, oque eu faço?” Nos Estados Unidos nãohavia a preocupação de aproveitar osjornais usados, como no Oriente. Essamesma coisa acontece com o velho.Torna-se “descartável”. O descartávelé que prejudica mais.

JR – Não existe, também, um certopreconceito em relação ao idoso? Porexemplo, na própria televisão, osprogramas humorísticos mostram aspessoas mais idosas como ridículas...

HOMERO – Ridículos, idiotas,surdos. Há um quadro de uma“velhinha surda”, que devia sercortado da televisão, pois é umaofensa a toda pessoa surda.

JR – Devia ter entrado naquela Cartilhado Politicamente Correto, do Governo...Por que identificar o velho com o usado,com o descartável, o ridículo? Você nãoacha que os velhos deviam fazer ummovimento contra isso?

HOMERO – Isso é um programa que

vocês, da ESPM, poderiam liderar,através do seu Instituto Cultural:levantar os itens importantes do pro-blema – o que ele não tem e o que eletem; no que ele está falho; o que elepode dar. E depois de levantar as infor-mações, então começar a campanha...

JR – Proporcionalmente, o número depessoas idosas vem aumentando e asociedade parece que não estápreparada para utilizar, inclusive, essaforça de trabalho.

HOMERO – Tive um amigo cego, queme contava que o melhor dia da vidadele foi no primeiro dia em que saiucom a bengala branca. Eu perguntei porque e ele respondeu: “Antes, quandoeu não usava bengala – eu tinhavergonha – quando tropeçava, diziamburro, idiota, não vê onde anda? Nomomento em que eu saí com a minhabengala, tudo mudou: me abriramcaminho, me atravessaram a rua, o carroparou...” Eu estou com oitenta anos eando com a minha bengala. Você estána rua, vai pegar um táxi, levanta abengala e o táxi pára...

JR – Você quer dizer que existe umproblema de comunicação: quealguma coisa poderia ser feita emrelação a esse canal de comunicaçãoentre as gerações.

HOMERO – No Brasil, o público emgeral tem preocupação com o idoso, enão se aproveita mais essa preocu-pação. As pessoas têm paciência comos mais velhos, cedem-lhe a vez, dizem

“por favor”, há essa cortesia. Mas omundo dos negócios é contra o velho.Aí é que está.

JR – Para encerrar, como é que você vêo momento em que estamos vivendo,no Brasil? Será que ele permite um certootimismo em relação ao futuro?

HOMERO – Olhe, o PT tinha boasidéias, bons ideais, mas não tinhaformação; os governantes dessepartido não têm idéia do que sejagovernar o país. O que está aconte-cendo, essa história do “mensalão”,isso é o começo do fim. Não é possívelque todas essas pessoas tenham sidoinformadas sobre isso e não tenhamfeito nada.

JR – Não há um aspecto positivo, deque essas coisas estão sendo expostas,divulgadas? Talvez antes elas ocorriame não eram sabidas?

HOMERO – Porque, para os velhi-nhos isso faz parte da “Idade de Cres-cimento”, que é o que estamos vi-vendo. Depois de um período deditadura militar horrível, você cai numaanarquia democrática horrível.

JR – E qual será a síntese?

HOMERO – Quando o Lula ganhou,escrevi um artigo declarando que eleseria um líder continental e – hoje emdia – é um líder continental, semdiscussão. Mas ele é mal-assessorado,em relação ao Haiti, por exemplo. Esteserá um dos grandes fracassos que

JULGAMOS O PROFISSIONALPELO RESULTADO E NÃO POR ELE MESMO.

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teremos, ouça o que digo. A Bolíviavai ser outro problema. Não se enganecom a Bolívia. O Carlos CasteloBranco contou-me, a primeira vez quefoi à Bolívia e voltou: “Homero, sãoselvagens! O cara está marchando,fazendo um protesto, e tem dinamitenas costas, dinamite! Porque trabalhacom dinamite na mina, está fumandoe não se dá conta. Poderíamos voareu e todo o mundo.” Minha irmãSuzana conta que, quando foi àBolívia, hospedou-se num hotel e, nodia seguinte, perguntaram-lhe: “Asenhora conseguiu dormir?” Ela disse:“Por quê?” “Pela festa” E ela disse:“Mas que festa?” A festa era um sujeitocom um bumbo, que batia e dizia:“Soy alegre, soy alegre, soy alegre...”a noite inteira. É difícil.

ENTREVISTASAID FARHAT

SAID FARHAT é considerado – comorgulho dos colegas da área depublicidade – como o profissional queascendeu mais alto na hierarquiasocial brasileira, tendo sido o nossoprimeiro Ministro da ComunicaçãoSocial, durante o governo Figueiredo.Nascido no Acre, em 1921, exerceucargos públicos no seu Estado natal(então território) e foi para o Rio deJaneiro, em 1952, onde trabalhou naStandard Propaganda, transferindo-se,pouco depois, para São Paulo, ondetrabalhou na J. Walter Thompson. Em1962, ingressou no grupo Visão, doqual se tornou editor e proprietário.Vendeu o grupo em 1974, e exerceufunções na Editora Abril e na Embratur,como presidente, de onde saiu para a

SECOM – Secretaria de ComunicaçãoSocial. Detentor de vários prêmios ehomenagens, sempre esteve muitoligado à ESPM – de quem recebeu,em 1991, o prêmio Mauricio Sirotskyde Comunicação Social.

FG – Como se sente um homem de85 anos num mundo onde a maioriadas pessoas tem menos da metade dasua idade?

SAID – De duas maneiras, até con-traditórias. Em relação à expectativade vida, minha mãe morreu aos 89anos e meu pai aos 93. Peço a Deusque me dê a média entre os dois, queparece bastante satisfatória. Aomesmo tempo, olho e vejo, no nossopanorama social, uma juventudemais voltada para aprender coisastécnicas do que aprender a viver. Ouseja, a apreciar o fato da vida; usaro tempo de vida para produzir algoque não seja um bem – não importase pequeno ou grande. E não falode bens materiais; falo de bensmorais, éticos, sociais.

FG – Os jovens, de fato, estão preo-cupados com o dia-a-dia, as coisasimediatas, e tendem a esquecer,principalmente dos valores morais.Isso o incomoda?

SAID – Sim, porque tenho umafamília muito unida; completamos 64anos de casados, temos duas filhas,quatro netos sangüíneos e trêsadotivos, e onze bisnetos. As tentaçõesparecem ter passado ao largo. Vejo

com preocupação, por exemplo, otempo que os jovens gastam comdrogas. Em São Paulo, existe a“cracolândia”, um lugar de venda detóxico em plena luz do dia. Há umacerta condescendência com asatividades criminais. Todos sabem quea esquina da Avenida Rebouças coma Avenida Faria Lima é ponto deassalto. Só a polícia não sabe? Por quenão age? Não age em função de outromal dos tempos atuais, que é acorrupção e que abrange desde oPalácio do Planalto até a mais pobreprefeitura do interior. A juventude dehoje está preocupada com a diversãofácil – as noitadas. Tenho, porexemplo, sobrinhos-netos que saemde casa às 11:30 horas da noite parair a uma festa e voltam às 6 horas damanhã. Isso não é um fenômenolocalizado; espalha-se por todos ospaíses do mundo.

FG – Vamos falar da longevidade nosnegócios. A revista Exame acaba depublicar uma pesquisa feita com asmaiores empresas brasileiras, e a idademédia dos presidentes é de 51 anos,dos diretores está em 45, 48 anos. Sãorelativamente jovens. O que você achadisso?

SAID – No Brasil, temos uma situaçãoanômala: se se é muito jovem, não seconsegue um bom emprego; sepassou de determinada idade, nãoconsegue emprego que valha a pena.A faixa dos 30 aos 45 anos é uma faixade maturidade, exuberância, na qualas pessoas estão produzindo o máxi-mo que podem. Mas essa limitação

ESSA LIMITAÇÃO ESTÁ VINCULADA APRECONCEITOS CONTRA A VELHICE.

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de idade está vinculada a precon-ceitos, em especial contra a velhice.

FG – Você reconhece que, no mundoempresarial, há um preconceito contraa velhice?

SAID – Sem dúvida. E ele está nasgrandes empresas, de modo geral. Vouusar a Ford, como exemplo. A Fordfoi criada por um homem que, nãoapenas se distinguiu pela concepçãodo automóvel, da linha de montagem,como também pela comercializaçãodo produto. O Henry Ford enfeixounas mãos o comando de uma empresaque – hoje – se torna cada vez menoscontrolável pelo poder central. Vemosos altos e baixos que a empresa sofreu,na sucessão de Henry Ford, pelos seusfilhos e netos. Outra coisa é a diferençaentre fundador, fábrica e produto. NaFord, esses três elementos seconfundem. Mas, fala-se em Ford, etodos pensam no carro. Longinqua-mente, alguns ainda se lembram donome Henry Ford. No Brasil isso éverdade em empresas como a Gerdau.O Jorge Gerdau continua à frente daempresa. A Votorantim, com o fale-cimento dos mais velhos, colocou asegunda geração no comando daempresa. Mas é fatal que, mais cedoou mais tarde, se torne umacompanhia mais aberta. Creio que amaioria das pessoas jamais prestoumuita atenção a quem foi o fundadorda General Motors. O nome GeneralMotors significa menos que o nomeChevrolet – a imagem do produtosupera a imagem do fabricante eninguém sabe quem foi o iniciador daempresa.

FG – A GM sempre foi consideradacomo símbolo da vida empresarial

americana. Era – parece que, agora,nem tanto – sólida como uma rocha.O que há de bom e mau nisso? Como tempo, as empresas se tornam maisconservadoras, moderadas, menosagressivas. Isso é bom?

SAID – Acho que entre os fatores querespondem pela longevidade dasempresas, o primeiro é a criatividade.Falamos de automóvel: o automóvelcontinua essencialmente o mesmo.Mudaram as coisas adjetivas: motoresmais potentes, resfriamento, transmis-são automática, mas intrinsecamenteé o mesmo. Então, um aspecto quetem contribuído para a longevidadedas empresas é a criatividade: criarnovos produtos; descobrir, antes dosoutros, o que o consumidor realmentequer. Depois, há questões como aglobalização, que veio para ficar. Nãohá mais economias auto-suficentes.Os americanos custaram a perceberque, mesmo os produtos tradicionais,que fabricavam – como geladeira,automóveis, televisores –, estavamsendo desenvolvidos em outros países.E há globalização dos hábitos. Tenhobisnetos tão sabichões em matéria deeletrônica, que – quando tenhodificuldades com o celular ou ocomputador – recorro a eles. Outroaspecto que evidencia a longevidadedas empresas é o que chamo de “pulodo gato” – um passo ousado,inesperado, surpreendente para osconcorrentes e que – de repente –resolve uma situação de impasse.Poderia citar dois casos brasileiros.Um durante o governo do ItamarFranco. A economia nacional estava

mal, a inflação parecia sem controle,os consumidores sem coragem paracomprar itens mais caros; e a indústriaautomobilística parecia diante de umacrise. Vão os dirigentes da Anfaveafalar com o presidente, expõem,pedem subsídios, apoios, cortes deimpostos etc. E o Itamar, que não tinharesposta para nenhum desses itens,disse: “Por que não lançam de novo oFusca que agradou a tanta gente?” OFusca foi relançado – junto com outroscarros de menor valor – que animouo mercado. Depois veio o Plano Real,que estabilizou preços e salários, e aindústria automobilística brasileira,hoje, fabrica mais de dois milhões decarros por ano.

FG – O pulo do gato é a criatividade.

SAID – O segundo pulo do gato:havia, no Brasil, duas empresas quefabricavam cerveja e dividiam, entresi, a maior parte do mercado: aBrahma e a Antarctica. Estavam asduas se digladiando, quando alguémteve a idéia de que, em vez de brigar,deveriam se unir e criaram a AmBev.Aí, vem uma empresa européia,adquire o controle da AmBev e leva amarca Brahma para outros mercados.Daqui a pouco, o Guaraná será umabebida tão comum quanto a Coca-Cola e a Pepsi, em todos os mercadosmundiais.

FG – O pulo do gato aí – eu conheçoum pouco dessa história – é de umhomem chamado Jorge PauloLemann, que foi o arquiteto de todasessas fusões. Ele esqueceu tudo o que

SER MOÇO É MELHOR.

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a Brahma fazia e pensava e partiu paranovas soluções. A Antarctica mantinhaos laços com o passado, uma posturamais tradicional, e acabou sendoabsorvida.

SAID – O curioso é que jamaispoderíamos imaginar que Antarcticae Brahma pudessem se unir paraqualquer fim. Mas há outras coisas queafetam a longevidade das empresas.Uma delas, talvez mais marcante,foram os computadores de mesa. OSteve Jobs inventou um negóciochamado Macintosh, com grandepotencial, mas não sei se por egoísmoou falta de visão comercial, elesegurou as patentes, os processos defabricação. Aí a IBM veio com o PC,teve a sabedoria de abrir a tecnologiaa quem quisesse utilizar e hoje –apesar da preferência que os homensde publicidade têm pelo Mac – omercado é dominado pelos PCs.Perdeu a briga mas não perdeu aqualidade. Hoje, a Apple caminhapara fazer a tecnologia do Maccompatível com a do PC; o que nãosei se é bom ou ruim. Na mesma linhada criatividade, temos os fabricantesde software. Bill Gates é o homemmais rico do mundo porque nuncadeixou que os consumidores ficassemsatisfeitos por muito tempo com osprodutos que têm. Você vai a uma loja,hoje, compra a última versão doWindows ou do XP, instala no seucomputador e fica orgulhoso de estarem dia. Daqui a alguns meses, vemoutro, e graças à propaganda, sente-se obrigado a comprar o novo modelo.

FG – E, nesse clima de renovação einovação, como se dão os executivos,mais velhos?

SAID – Falando como uma pessoa de85 anos: mal. Os velhos, com algumasexceções, são pouco suscetíveis àinovação. A tendência dos velhos ésegurar os cordões. Mas, hoje, nota-seuma tendência à aglutinação deempresas, formando grandes conglo-merados. E isso as coloca diante de umdilema, que é centralizar o controle,como nós velhos fazíamos antes, oudescentralizar. Até que ponto, acompanhia X, tendo um vice-presidentepara o Brasil, outro para o Cone Sul, ououtro para a América do Sul etc., ocontrole será solto ou apertado? Vemosisso acontecer aqui no Brasil: umaempresa com sede em São Paulo, filialna Bahia, fábrica em Pernambuco, umcentro de comercialização no Rio deJaneiro... Há de haver uma conciliaçãoentre a experiência dos mais velhos e aousadia dos mais jovens. É o equilíbrioentre a prudência e a ousadia. Falandoem ousadia, há outro aspecto: paraprogredir, uma empresa não pode ficaresperando o que os outros devem oudeveriam fazer – nem governo, nemconcorrentes. Os empresários brasi-leiros são muito propensos a ficaresperando o que o governo quer dizer,e se mexem muito pouco.

FG – Você divide o seu tempo entre oBrasil e os Estados Unidos. Comosênior citizen, que você é, onde sesente melhor, mais bem tratado?

SAID – Nos Estados Unidos. Antes doBrasil, eles se tornaram uma sociedadede idosos. Existe uma geração nos

Estados Unidos, de uma época queeles chamam de baby boom – que éo período do pós-guerra – quandohouve um surto de nascimento depessoas. Só que isso foi há 60 anos eos baby boomers estão se aposen-tando. Isso estimula o turismo, pois aspessoas de idade vão-se refugiar naFlórida. Outro ponto é que o conceitode cidadania nos Estados Unidos émais universal do que aqui no Brasil.Aqui, evocar o direito de cidadania éum ato quase hostil. Isso faz com queo idoso se sinta mais confortável ládo que aqui. Ao mesmo tempo, nota-se uma diferença muito grande entreos Estados Unidos de hoje e o de 50anos atrás na relação entre americanose não americanos – claro que lá existemuito preconceito: ou você é branco,ou é latino, ou afro-descendente etc.,mas o preconceito, inclusive o de cor,declinou muito nos Estados Unidos,graças a atitudes de pessoas comoMartin Luther King, que foi as-sassinado por um ato de racismo. Esseato mudou muito a disposição daspessoas. E não é só a questão dopoliticamente correto que envolve emsi um grau enorme de hipocrisia, masna convicção de que é isso mesmo.Agora, na cidade de São Paulo, ascalçadas – graças, em grande parte, àcampanha de uma amiga, Lia Vaz –começam a ter rampas para pessoasdeficientes. Acredito que a situação vaievoluir também no Brasil.

FG – E outra coisa que você podetestemunhar melhor do que ninguém:

O NOME GENERAL MOTORS SIGNIFICAMENOS QUE O NOME CHEVROLET.

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como é ser idoso na vida pública?

SAID – Quando o Getúlio foi eleitoPresidente da República, havia muitadúvida se ele ainda tinha capacidademental para dirigir o país. Coisa quehoje não damos tanta importância,haja vista o caso do Ulisses Guima-rães, que manteve a capacidadegerencial, de liderança políticaenquanto viveu. Acho que hoje o fatode a pessoa ter mais idade, na vidapolítica, já não é um estigma tão fortequanto no passado.

FG – E no senado e nos ministériosprincipalmente?

SAID – O senado é o lugar dosseniores – dos idosos. Acho que hádois caminhos. Um é a consolidaçãode velhas lideranças – como AntonioCarlos Magalhães, José Sarney, opróprio Fernando Henrique. E a outravertente é a dos jovens, na medida emque se deixem atrair pela disputaeleitoral como instrumento de pro-moção do bem-estar do povo.

FG – E o que dizem das empresas quejá cumpriram um longo ciclo de vida– como uma Procter & Gamble,Johnson & Johnson? Há alguns anos,elas não mostram a mesma cria-tividade.

SAID – É que hoje empresas comoProcter & Gamble não têm tantosignificado, mesmo para nós queestamos no mercado. Há umadissociação entre o produto, a marca

do produto e o nome da empresa.Faço duas perguntas: quem se lembrado fabricante do Sonho de Valsa? EKibon? Quem é o dono da Bombril?Não importa. Só que a Bombril era aúnica presente no mercado, e era ummercado aparentemente inexpugná-vel. Daí aparece Assolan, vem e raspauma fatia do mercado da Bombril. Naverdade, você tem de adivinhar o queos consumidores vão querer amanhã.Sem falar na moda que é essencial-mente efêmera. O que apareceu nodesfile de hoje, daqui uma semana,não existe mais. Mas, ao mesmotempo, tem-se o prestígio do nome doidealizador, e na outra ponta, oprestígio da criação. Nomes comoDior, Yves San Lorain, Daslu sãoobjetos de sonho das pessoas eindicação de status. Tenho experiênciade andar em shopping centers pelomundo. Ver os produtos que são ven-didos nesses shoppings, sair de umaloja para outra e encontrar umadiferença de preço brutal entre doisartigos, que ao leigo parece equiva-lente, mas um dos quais tem marca.

FG – Vou pedir a você que comentealgumas citações que vou fazer. Aprimeira é do Pirandello que disse:“Um dos males da idade é que acaba-mos adquirindo uma lucidez con-tundente.” Nos tornamos tão lúcidosque isso faz mal para nós e para osoutros.

SAID – Já fui objeto e vítima dessetipo de lucidez. Até hoje tenho acabeça muito arrumada. De vez em

quando, esqueço de coisas recentes.Mas aí vem uma lembrança dostempos da escola primária ou doginásio. E lembro-me com grandeclareza de temas que não têm a menoraplicação prática na minha vida,como, por exemplo, uma aula nosegundo ano do ginásio sobre Asokae o budismo. Não sei mais quem é oAsoka – sei que foi um dos fundadoresdo budismo, e sei pouquíssimo sobreo budismo. Outro dia, estava noshopping, foram buscar o meu carroe disse: não lembro a marca do meucarro. É cinza com chapa tal. Quandoo sujeito estava indo buscar, disse: éum Subaru cinza.

FG – Outra citação é do RobertoDuailibi, que disse: “A gente começaa ficar velho quando deixa de divertir-se”.

SAID – Acho que ele tem razãoporque divertir-se significa não dardemasiada importância às coisascomuns da vida. Significa, sobretudo,não se preocupar com coisas para asquais você não tem solução. Costumodizer que sou parte da solução e nãoparte dos problemas que afetam ocotidiano, no sentido de que, dadoum problema, procuro resolvê-lo. E,com isso, me divirto. Divirto-me muitotambém vendo pessoas à procura derespostas evidentes a perguntas docotidiano. Não sou de dar garga-lhadas, mas rio intimamente dassituações cômicas, e procuro ver olado bom e cômico das coisas.

FG – Finalmente, o Jorginho Guinledisse uma vez que ele já tinha sidopobre e rico, e achava que o melhorera ser rico. Você já foi moço e agoraé velho. O que é melhor?

SAID – Ser moço é melhor, e vou dar

COSTUMO DIZER QUE SOU PARTE DASOLUÇÃO E NÃO PARTE DOSPROBLEMAS QUE AFETAM O COTIDIANO.

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um exemplo. Durante dez anostivemos um apartamento em Miami,onde íamos 4 a 5 vezes por ano. Atéque um dia, receosos de que com aidade, pudéssemos ter um problemalá e não pudéssemos resolversozinhos, decidimos vender oapartamento. Na semana passada,estivemos em Punta De Leste. E dissea ela: que pena. Se tivéssemos 30 anosa menos, valeria a pena comprar umacasa ou um apartamento aqui, paravivermos o resto de nossas vidas, porcausa das condições da qualidade devida de lá que são infinitamentemelhores do que em São Paulo. Porisso acho que ser jovem é melhor doque ser velho.

ENTREVISTAJOSÉ MINDLIN

O paulista JOSÉ MINDLIN nasceuem 1914. É diretor de tecnologia daFIESP. Foi Secretário de Cultura nogoverno de São Paulo, de onde sedemitiu em 1975, após a morte dojornalista V. Herzog e do metalúrgicoManuel Fiel Fº – na ditadura militar. Éconselheiro de fundações culturais ecentros tecnológicos e presidente doConselho Editorial de O Estado de S.Paulo – onde, aliás, iniciou sua carreiracomo repórter. Em 1932, entrou paraa Faculdade de Direito do Largo de S.Francisco, militando durante 15 anoscomo advogado, o que lhe abriu aoportunidade de fundar, com outrossócios, a Metal Leve – uma das maisbem-sucedidas empresas brasileiras,na fase de industrialização. Consi-derado o maior bibliófilo do país, hojededica-se em tempo quase integral agerenciar – mas, principalmente, amara sua biblioteca de 30 mil volumes,

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que – na apreciação de Pedro Correado Lago, livreiro e colecionador – éde tal qualidade, “que não seriapossível recriá-la nem por 1 bilhão dedólares”...

FG – Apesar de a nossa populaçãoestar envelhecendo – como em todoo mundo – uma pesquisa da revistaExame mostrou que a idade média dospresidentes e diretores das grandesempresas brasileiras está entre 45 e 50anos. Será que – nas empresas pelomenos – essa tendência ainda não seestá fazendo sentir?

MINDLIN – Pelas empresas, nãosaberia responder – apenas pelaexperiência pessoal. Creio que há umatendência de utilizar mais jovens naalta administração porque, de modogeral, as pessoas idosas não acom-panham o cada vez mais acelerado,desenvolvimento tecnológico; e asnovas técnicas de administração e nacomunicação também influem nasempresas e os mais idosos, de modogeral, não acompanharam. E não éfácil, mesmo, porque o ritmo é muitoacelerado – a inovação e a obso-lescência estão cada vez maispróximas. Embora procure estar beminformado, vejo-me, muitas vezes,perplexo diante das mudanças queestão ocorrendo. Há 20, 30 anos, aduração de vida média estava pertodos 60 anos. Então, 50 anos era ocoroamento de uma vida. Falei 30anos, mas talvez seja um pouco mais,pois foi na segunda metade do séculoXX – depois da guerra – que realmentecomeçaram as mudanças. As pessoasque dirigiam as empresas seaposentavam mais cedo e issopermitiu aos mais jovens ascender aoscargos de responsabilidade. É uma

situação complexa e não creio quehaja uma só solução correta. Costumodizer que os problemas realmentedifíceis de resolver não são entre certoe errado; mas entre o certo e o maiscerto – e os dois lados têm uma parcelade razão. Nos anos 50 – em que amédia de vida era da ordem de 60 –os diretores de 50 anos eram exceção;a empresa familiar predominava. Opatriarca era o diretor, e se vivessemuito mais, continuaria a ser opresidente – com auxiliares – mas comuma estrutura completamentediferente – o mundo era maistranqüilo, com idéias e invenções queduravam 10, 20 anos; não havia aefervescência tecnológica dos últimos50 anos. O desenvolvimentotecnológico segue um ritmo tãoacelerado que uma idéia válida hoje,amanhã pode não ser mais aplicável.

FG – O Sr. fala das mudançastecnológicas – mas e as mudanças dosvalores, não lhe chamam a atenção?

MINDLIN – A questão de valoresmudou por outros fatores também. Ainflação, por exemplo, fezdesaparecer o conceito do que são osvalores materiais estáveis. Então, porforça da inflação, havia aquele anseiode ganhar mais depressa e poderguardar e manter uma fortuna, e odinheiro passou a ser um objetivoquando devia ser um meroinstrumento. E assim os valores éticosvão desaparecendo – o fim justificaos meios. Vê-se muito isso naadministração empresarial. Mas,alguns, daquela época, com 50 anos,continuaram e procuraram acom-

panhar e se informar, ter outrasatividades. Muitos se viram comple-tamente frustrados, eram compulso-riamente aposentados, e se nãotivessem um interesse fora do trabalho,decaiam rapidamente. Sua pergunta,se esses administradores mais velhosnão são um problema para a geraçãomais nova, tenho a impressão de queisso ainda não é a regra: uma pessoade 80 anos em plena atividadeprofissional...

FG – O Sr. era um exemplo parajovens executivos, como eu era.Entretanto, de repente, resolveu passarsua empresa – a Metal Leve – aos seussucessores e dedicar-se a umaatividade talvez mais nobre, mascompletamente diferente. Comoaconteceu isso?

MINDLIN – Na minha vida, o acasoteve um papel muito importante.Nunca tinha pensado em serempresário. Formei-me em direito, em1936, e advoguei até 1950. Foi umgrupo de clientes que planejou criar aMetal Leve – contavam com uma fontede financiamento que, na última hora,falhou. Eu tinha redigido, para eles,uma opção para a compra de umequipamento com assistência técnicade um fabricante alemão. Mas nãoconseguiram o capital. Vieramcomunicar-me a desistência. Pergunteise era porque achavam que o negócionão era tão bom quanto imaginavam,ou se era pelo capital. Disseram quepor causa do capital. Eu tinha umamigo diretor de um banco mineiro e– tanto ele quanto eu – queríamosconstruir alguma coisa que não fosse

NUNCA TINHA PENSADO EM SER EMPRESÁRIO.

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exclusivamente pessoal, alguma coisaque pudesse funcionar indepen-dentemente de nós. Quando essesclientes disseram que iam desistir doprojeto, eu disse; “Acho que consigoesse capital”. O meu amigo recebeuum dos meus clientes, viu o projeto econseguiu o capital. Assim, formou-se a Metal Leve e eu fiquei na posiçãode fiador deste meu amigo, peranteos meus clientes, e dos meus clientes,perante o amigo que conseguira ocapital. Virei empresário. A advocaciadeu-me flexibilidade mental – ficamosconhecendo a natureza humana. Eisso me ajudou na parte de admi-nistração que não tinha estudado. Ogrupo que se formou estava interes-sado em fazer coisas bem feitas edifíceis, que não pudessem ser feitaspor qualquer pessoa.

JR – Quanto tempo ficou à frente daMetal Leve?

MINDLIN – Durante os primeiros 20anos, a administração era colegiada;depois fiquei mais 20 e poucos anos.Com nosso grupo, a Metal Leve durou46 anos. A desistência foi muito difícilde aceitar. A venda da empresa – doponto de vista emocional – foitraumática, porque começamos dozero e chegamos a ser uma empresarepresentativa.

JR – Há quanto tempo o Sr. deixou aMetal Leve, para dedicar-se a outrasatividades?

MINDLIN – Nunca deixei-meenvolver totalmente pela Metal Leve;eu exercia as outras atividades emparalelo. Procurava – isso sim – nãotrazer os problemas para casa.Chegava determinada hora, ia embora

e deixava para resolver o problema nodia seguinte. Sou um otimistaincorrigível. Até hoje, quandoacontece um contratempo, minhaprimeira reação é não ficar deses-perado e achar que podia ser pior.Tudo pode ser resolvido, com bom-senso, diálogo e olhando as coisas alongo prazo. Na empresa, logo sentia importância do desenvolvimentotecnológico, independentemente daassessoria técnica que recebíamos defora.

FG – Vocês souberam criar umaimagem corporativa sólida, umamarca forte. Havia alguém lá dentroque pensava em termos de mercado.

MINDLIN – Eu e o Adolfo Buck.Infelizmente, sou o último sobre-vivente.

JR – Na mesa-redonda que fizemossobre este assunto, uma jovem – deorigem oriental – observou que aspessoas não deviam se ater a uma sóatividade. O Sr. falou da sua atividadecomo advogado, como empresário, eli comentários seus sobre literaturaabsolutamente “profissionais”. Comovê essa sua pluralidade?

MINDLIN – Isso é uma coisa pessoal;não tem receita. Mas nasci e crescinum ambiente cultural. Boa parte doque eu ganhava era destinada para aconstrução da biblioteca, que estácom 38 mil títulos. Meus pais gos-tavam muito de artes plásticas. Eutambém gosto, mas acho que herdei

a paixão deles dirigida para livros.Comecei a formar a biblioteca com13 anos – e ela completa 78 este ano.

JR – Como começou o seu interessepela leitura?

MINDLIN – Pela ficção, mas logopela história. Aos 13 anos, recebi deuma tia uma história do Brasil escritano século XVII por Frei VicenteSalvador. Foi o que marcou o meuinteresse e resultou na formação daminha “Brasiliana”, metade da bi-blioteca é sobre assuntos brasileiros...

FG – Um dos primeiros livros que li,aos 11 anos, do Stefan Zweig, foiBrasil, país do futuro. Ganhei comoprêmio de um trabalho escolar.

MINDLIN – Hoje pode-se falar queo Brasil é um país do futuro, mastambém é um país do presente e aindapode ter muito mais. A Europa não temo que progredir muito mais.

JR – O Sr. é empresário, bem-sucedido, vem de uma família ondecresceu com livros e obras de arte –portanto, um homem culto. Masvivemos hoje em um mundo em quetemos pessoas bem-sucedidas – BillGates e o nosso presidente Lula, porexemplo – que se vangloriam de nãoter tido formação escolar e até de nãoterem lido nada.

MINDLIN – Houve muitos por-tugueses analfabetos que fizeramfortuna no Brasil. Mas era uma coisa

UMA IDÉIA VÁLIDA HOJE,AMANHÃ PODE NÃO SER MAIS APLICÁVEL.

EntreVista

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quase que acidental. Na nossaempresa a ética foi importante desdeo primeiro dia – não havia caixa dois;nos primeiros 20 anos tínhamos umpró-labore que não era nada espe-tacular – era o que a legislaçãopermitia. E tudo que a empresaproduzia de lucro era reinvestido.Procurávamos ter solidez financeira,qualidade de produção, recursoshumanos tratados como gente e nãocomo números. Depois, até la-mentamos o crescimento porque nosprimeiros anos conhecíamos todos.Depois cresceu, chegamos a ter 7.200funcionários. Mas eu lia desdepequeno, porque era muito ligado aomeu irmão mais velho, HenriqueMindlin, que foi um grande arquiteto.Descobrimos o mundo juntos. Muitacoisa que ele lia aos 16 eu lia aos 12.Eu corria os sebos de São Paulo,porque não queria pedir dinheiro aosmeus pais. Os sebos eram todos nocentro da cidade e eu percebi queviviam isolados uns dos outros e queos preços variavam muito. Elesmarcavam o preço de venda deacordo com o que tinham pago, semse preocupar com a raridade. Umvendia por 5 o que o outro vendia por30, até 50. E o que vendia por 50também vendia por 5 o que o primeirovendia por 30. Percebendo isso, pedium pouco de dinheiro ao meu pai, ecomecei a comprar os livros de 5 e10, levava para o outro, deixava emconsignação e quando ele vendia,creditava os 30% de comissão, eretirava a minha parte em livros.Depois de três meses, tinha crédito em

todos os sebos da cidade e compravameus livros sem desembolso. Issodurou pelo menos uns três anos.Depois os sebos começaram aaprender... Mas comprei muitos livrospagos pelos livreiros.

FG – Sobre a tendência dos jovensem não aproveitar a experiência dosmais velhos, há livro de Dino Buzatti– O deserto dos tártaros – que começacom o personagem do jovem tenente,que acabava de sair da academiamilitar, e ia – a cavalo – para a fortalezado deserto. Pouco antes de chegar, elecruzou com um velho oficial quehavia passado 30 anos lá dentro. Ojovem não troca palavras com o velho,faz continência e continua – e acabacumprindo a sua sina: 30 anos defrustração e desapontamento. Se o Sr.fosse o velho oficial, teria dito algumacoisa ao jovem?

MINDLIN – Eu diria: “Se quiserexperimentar, experimente, mas nãofique; tente outra coisa”. Vocês mecolocam numa posição um poucoconstrangedora por falar de mimmesmo – mas quando aparecia ummoço querendo um lugar na empresa– muitas vezes, era o primeiroemprego – havia freqüentemente areação dos outros de “não entregaressa responsabilidade a um moço”. Euachava que devia – orientando eacompanhando, tolerando o erro eformando as pessoas. Começamos areceber estagiários das escolas deengenharia, criamos um prêmio MetalLeve, e recebíamos muitos estagiários,

dos quais aproveitávamos poucos.Mas tivemos, em postos deresponsabilidade, pessoas com vintee poucos anos e isto foi um doselementos de força da Metal Leve.Quando recebi, do Conselho deAdministração, o título de professor –e profissional emérito – disse no meudiscurso: “Vocês estão enganados; eusou um profissional empírico”. Agora,uso a cabeça e acredito na juventude– até hoje – tenho um contato muitobom com os jovens, através da leitura,orientação de vida...

JR – São os jovens da sua família?

MINDLIN – Alguns – e algunsamigos de netos que vêm aqui, jovensestudantes. Brinco, às vezes, que sefosse do século XIX, seria chamadode conselheiro – como os personagensde Machado de Assis. E eles falam atéde problemas matrimoniais,separação etc. Converso com eles,procurando orientá-los. Vou festejar,este ano, 67 anos de casamento – umcasamento curtido, um prazer de vida.Há problemas, mas é preciso quererresolver. Sempre digo: “Procurem secompreender; casamento não é umaluta de poder”. Já consegui que várioscasais se reconciliassem. Mas hásituações de tanta incompatibilidade,que eu citava uma frase do Fausto “Émelhor um fim com horror do que umhorror sem fim”. Tudo depende dagravidade dos problemas. Mas – comoadvogado – sempre acreditei mais nodiálogo. Ao invés da imposição, aconciliação. Só chegava ao processoquando não havia alternativa. Umcliente perguntou-me, certa vez: “Doque o Sr. vive, se é contra osprocessos?” Respondi: “Vivo do queganho na conciliação”. O processo

DEPOIS DE TRÊS MESES, TINHACRÉDITO EM TODOS OS SEBOS DA CIDADE.

HOMERO, SAID, MINDLIN

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fazia mais mal ao cliente do que aoprocessado. Então, é melhor um mauacordo do que uma boa demanda.Isso eu aplicava na empresa, também,no contato com os gerentes, ossubalternos. Trabalhava com o que euchamava de “porta aberta”. Qualquerum podia vir falar comigo paraqueixar-se de alguma coisa, euanotava e dizia: “Não posso resolverisso, passando por cima de seu chefe,mas vou conversar com ele”. Então,muita coisa se resolvia. Processostrabalhistas, tínhamos pouquíssimos;as greves só começaram a existirquando vieram as greves políticas. Elesnão faziam contra nós; era contra osistema. Lembro-me que, uma vez, osoperários entraram e ficaram de pé,junto à máquina, sem produzir.Quando chegou a hora do almoço,veio o gerente perguntar se era paradar almoço a eles. E eu disse: claroque sim. Não estão lá contra nós. Ojornalista Humberto Werneck certavez perguntou-me: “Olhando paratrás, o que lhe dá mais satisfação? Asua biblioteca ou a Metal Leve?”Respondi: “A Metal Leve foi umaexperiência gratificante porqueconseguimos, realmente, fazer umbom trabalho – mas foi um trabalhode equipe. A biblioteca, eu fiz sozinho.Tudo que está aí tem uma razão deser. É um interesse central de vida, queme deu grandes satisfações. Noprimeiro ano de Metal Leve, oalumínio ainda não era produzido noBrasil; tinha de ser importado. E o dólarde importação era de Cr$ 18.72, maso dólar no mercado paralelo estavaem 30, 40. Então, qualquer diferençade importação era lucrativa. Houveum princípio de corrupção, na Cacex,até compreensível. Uma licença eralucro certo. Eu ia lá duas, três vezes

por semana e faziam-nos esperarhoras, às vezes, para nos receber. Asempresas estrangeiras tinhamdespachantes que davam dinheiro eobtinham licença. Eu aproveitava essetempo para ler – li toda a obra deBalzac nas salas de espera – e acabavaconseguindo a licença. Mas fazíamosquestão de não ter corrupção deforma alguma.

FG – Isso se chama “responsabilidadesocial”, que agora está na moda...

MINDLIN – Tenho satisfação de falardisso. Há mais de 30 anos, afirmo quea empresa não é um objetivo em simesma; é um instrumento dedesenvolvimento social. Ela tem defuncionar bem, ter lucro para podercumprir essas responsabilidades. Masela não é um objetivo em si mesma –e essa idéia agora está pegando. Souum cético que acredita em catequese.Precisamos pregar idéias, que um diapegam. Nos anos 50, por exemplo,ninguém acreditava em exportação deprodutos manufaturados.

Eu tinha também o apoio dos meuscompanheiros na atividade cultural.Quando a Metal Leve fez 25 anos,propuseram um grande jantar. E eudisse: “Jantar, coquetel, as pessoas vãopor obrigação e logo esquecem.Vamos fazer uma comemoraçãomenos efêmera”. Lembrei-me daRevista de Antropofagia – um dosdocumentos mais importantes domodernismo – e fizemos uma edição

em fac-símile, que teve um grandesucesso. Fomos uma das primeirasempresas a fazer publicações de livros.Fizemos publicação de arte, tudorelacionado com o modernismo e aMetal Leve ficou muito conhecidapela atividade cultural. Isso beneficioua imagem da empresa, mais do que oproduto – que ficava dentro dosmotores e não tinha qualquersedução. Tive uma assessora decomunicação social – May Nunes deSouza – que acompanhou quase todaa carreira da Metal Leve, e eu dizia aela: “Queremos criar uma boaimagem da empresa, mas com duascondições básicas: a imagem tem decorresponder à verdade – simpatiapaga não nos interessa. Vamos ter umarelação aberta com a imprensa”.Comecei minha vida como jornalista– aos 15 anos era redator do Estado.Fui o redator mais jovem do Estado, eaprendi a escrever, porque o jornalexigia uma linguagem correta,simples, acessível ao público médio.Fiquei conhecendo os bastidores dasociedade e da política. Passei quatroanos no Estado e foi uma escolainsubstituível. Foi onde eu conheci asagruras de ser repórter; de modo que,quando estava na Metal Leve ou naSecretaria de Cultura, Ciência eTecnologia do governo Paulo Egídio,eu sabia as dificuldades por quepassara o repórter que vinha conversarcomigo. E também o que era – paraele – uma verdadeira notícia, diferenteda informação que só interessava anós... ESPM

HÁ MAIS DE 30 ANOS, AFIRMO QUE A EMPRESANÃO É UM OBJETIVO EM SI MESMA; É UMINSTRUMENTO DE DESENVOLVIMENTO SOCIAL.

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“ Em todos os lugares aos quaisele chega existe uma novatecnologia, novos processos, e,acima de tudo, uma nova formaaparentemente radical de sefazer o trabalho.”

Três Modelos de Valor Comprovado

CRIANDOCLIENTESVALOR PARA

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ele costumava trabalhar, está muitoparecido com aquele do qual elelembrava no momento em queadormeceu. De fato, a maioria daspessoas agora tem laptops, apesarde muitos deles parecerem ser maisdecorativos do que úteis. E existemmulheres no departamento: agoraele é um “profissional de vendas”em vez de um “homem de vendas”.Entretanto, a maioria das outrascoisas no escritório de vendas não osurpreende.

A empresa decide dar a Rip o seuantigo cargo em vendas. Ele entãosai com seu gerente para conferirse o processo de vendas sofreu al-terações. Descobre que a maiorparte do processo de vendas lhe éfamiliar. Existe certamente umnúmero maior de produtos, e muitosdeles parecem ser mais complexos.A competição é maior e maisintensa, e o ritmo de trabalho émais acelerado. A venda por pres-são, hard sell, parece estar ofi-cialmente desencorajada – masmesmo no passado Rip semprepreferiu vender através de relacio-namentos, em vez de vender porpressão.

Rip possui ainda a expectativa depreencher relatórios de visitas,apesar de que a tecnologia de hojepermite que ele entre com suasmentiras e desculpas, eletroni-camente. O pagamento é maior doque em uma geração atrás, masainda vem na forma de um fixo

Neil Rackham e John DeVincentis

Imagine que o empregado Rip VanWinkle tenha caído no sono há umageração e esteja acordando hoje.Ele poderá voltar para a sua em-presa e não reconhecê-la. As suaslembranças do processo de fabrica-ção o levarão a esfregar seus olhosna frente das novas máquinas e elemurmurará: “Alguma coisa estámuito diferente. O piso da fábricaparece um laboratório. O óleo, agraxa, e as pilhas de produtos semi-terminados não existem mais. Nãoexistem filas de pessoas trabalhan-do em linha de montagem. Nin-guém está parado esperando porinstruções sobre o que fazerdepois. Não existe nenhuminspetor de controle de qualidadepor perto. Onde estão os supervi-sores? Quem é o trabalhador equem é o gerente?”.

É uma grande transformação, e émuito mais do que Rip pode absor-ver no seu primeiro dia depois dedespertar; por esta razão ele sai embusca de algo familiar. Primeiro, elese dirige à central de digitação, so-mente para descobrir que ela nãoexiste mais. Depois, ele passa poruma sucessão de outros departa-mentos. Em todos os lugares aosquais ele chega existe uma novatecnologia, novos processos, e,acima de tudo, uma nova forma,aparentemente radical de se fazero trabalho.

Todos os lugares? Não totalmente.O departamento de vendas, onde

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mais uma comissão variável. O seugerente de vendas o treina comtermos familiares – características,benefícios, argumentação e contra-argumentação, perguntas abertas efechadas, e assim por diante –, oque o faz se sentir como se nuncativesse adormecido por tanto tem-po. Na verdade, quase tudo o queele fala, palavra por palavra, vemdo livro A Psicologia da Venda deE. K. Strong, publicado em 1925.“Bem”, ele pensa: “Vender sempreserá vender. E eu, provavelmente,poderia tirar uma soneca por maisalguns anos”.

Mas ele está errado. Novas e pode-rosas forças começam a mudar omundo das vendas. As funções devendas em todos os lugares estãoainda nos estágios primários de umatransformação comparável à queredesenhou o processo de fabrica-ção, há vinte anos. De acordo comalgumas estimativas, pelo menosmetade das posições de vendas dehoje acabará nos próximos cincoanos. Estruturas territoriais utilizadaspor um longo período também serãoextintas. A essência da venda estáem constante movimento.

Algumas organizações já cruzarama porta de entrada desse novomundo. Até alguns anos atrás, aMicrosoft, por exemplo, possuíauma equipe de vendas que ofereciasoftware em pacotes para contascorporativas em típicas negocia-ções B2B (“business-to-business”).Hoje, os seus representantes devendas investem seu tempo orga-nizando e mobilizando redes deprovedores (tais como: especia-listas, treinadores, software desig-

ners, e instaladores), para, desenvol-verem soluções independentes,individuais, tailor-made.

No passado, quando você chamavaCharles Schwab, o pioneiro em in-termediação dos serviços de tele-fonia, nos anos 70, você tinha umintermediário (broker) ou umvendedor com outro nome queintermediava o negócio para você.Hoje, você pode optar por acionara Schwab pela Internet e fazer seusnegócios diretamente, sem inter-mediários.

QUAL É A RAZÃOPARA SE TER UMAFORÇA DE VENDAS?

As questões que os executivos dalinha de frente estão começando alevantar são, sem dúvida, sinais deque a natureza da venda está emprocesso de mudança. Há três anos,quando CEOs conversavam a res-peito da força de vendas, elesfocavam em remuneração, treina-mento e automação. Entretanto, emrecente fórum de CEOs, as questõeslevantadas foram mais profundas.“Será que eu preciso efetivamentede uma equipe de vendas?”, levan-tou o presidente de uma empresa detecnologia. Um outro CEO per-guntou: “Qual é a diferença entrevender e fazer marketing? Eu nãoestou mais certo de que entenda adistinção entre estas duas atividadesclaramente.” Um chefão de umagrande empresa de comunicaçãosugeriu: “Talvez tenha chegado ahora de respondermos à perguntamais básica de todas: Qual é a razãopara se ter uma força de vendas?”

As questões que os executivosda linha de frente estãocomeçando a levantar são,sem dúvida, sinais de que anatureza da venda está emprocesso de mudança.

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“Talvez tenha chegado a hora derespondermos à pergunta maisbásica de todas: Qual é a razãopara se ter uma força de vendas?”

Durante muitos anos, as forças devendas existiram com o propósitode comunicar o valor das ofertasde produtos e serviços das empre-sas. Todavia, enquanto a equipe devendas preenchia totalmente estafunção, uma grande mudança jávinha sacudindo o mundo dos ne-gócios. Outras funções – produção,engenharia, desenvolvimento deproduto, e até mesmo recursoshumanos – há tempos vêm sofrendoprocessos de reestruturação erealinhamento com o objetivo decriar mais valor para os clientes.Atividades que não agregam valorestão sendo reduzidas, ajustadas oueliminadas.

Essas novas formas de trabalhar, taiscomo, melhoria contínua, reenge-nharia dos processos, Kaizen, etimes autogerenciáveis (TAG), es-tão sendo introduzidas para contri-buir na criação de produtos de altaqualidade e serviços mais baratose eficicazes. Ou seja: outras fun-ções se tornaram criadoras de valor,conscientes. Nas empresas de hoje,é difícil para as funções e atémesmo para os indivíduossobreviverem – e é impossível queeles prosperem – a não ser queagreguem valor para os clientes, deuma forma clara.

No mundo de ontem, era admissívela contra-argumenção pela simplescomunicação sobre os novosprodutos para os clientes: esta era

a forma antiga pela qual a força devendas estava, efetivamente, agre-gando valor. “Nós éramos muitoúteis para os médicos porque osinformávamos a respeito dos últi-mos medicamentos”, disse umrepresentante farmacêutico. “Nósfalávamos a respeito das novasalternativas que ainda não estavamdisponíveis nos livros de referênciado mercado. Sem a nossa infor-mação, os médicos ficavam,rapidamente, desatualizados”.

A tendência hoje é de que os com-pradores tenham as mesmas infor-mações a respeito dos produtos queos profissionais que estão ven-dendo. O advento da especializa-ção na medicina, por exemplo,resultou na participação de muitosmédicos, em testes clínicos, apren-

dendo sobre os efeitos de novosmedicamentos, antes mesmo deeles serem aprovados para lança-mento no mercado.

Compradores em outras indústriastambém são mais bem informadosdo que costumavam ser. Hoje, commuita informação acessível sobrequase tudo, a real necessidade porum profissional de vendasaltamente qualificado e,conseqüentemente, caro estásendo cada vez mais questionada.

A “onipresença” da informação nãoé a única força transformadora dafunção de vendas. Outra força é adiminuição da diferença entreprodutos. Conforme os produtos setransformam em commodities, assuas características passam a ter

O advento da especialização na medicina, por exemplo, resultou na participaçãode muitos médicos, em testes clínicos, aprendendo sobre os efeitos de novosmedicamentos, antes mesmo de eles serem aprovados para lançamento no mercado.

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cada vez menor relevância para osclientes. O valor migra do produtopara o processo pelo qual ele é adqui-rido, e os clientes começam a darmaior importância para o ambientede compra que mais lhes agrada.

Infelizmente, gerações de profissio-nais de venda vêm desenvolvendo anoção de que eles criam valor atra-vés do lucro. E isto não é suficientepara a sobrevivência nos mercadosaltamente competitivos de hoje.

O VALOR ESTÁNOS OLHOS DEQUEM COMPRA

A idéia de que a força de vendasdeve criar valor e não somente co-municá-lo, é simples e atrativa.Mas o que realmente significa? Sevocê perguntar para acadêmicos ouconsultores, eles lhe dirão damaneira mais simples que, o valoré definido pela equação:

VALOR + BENEFÍCIOS – CUSTO

Desta forma, existem duas maneiraspelas quais os profissionais devendas podem criar valor: elespodem gerar benefícios adicionaisou reduzir os custos dos benefíciosque estão fornecendo.

No primeiro caso, a empresa deveaumentar a capacidade de sua forçade vendas em entregar benefícios,melhorando a sua capacidade pararesolver problemas, ou permitindoque os seus profissionais de vendaspossam dedicar mais tempo àsquestões de seus clientes. No segun-do caso, a empresa deve buscar

formas de vender mais barato.Algumas organizações que buscamcriar valor através da redução decustos de vendas vêm utilizando orecurso de vendas por telefone eprofissionais de vendas que traba-lham meio período. Outras elimina-ram toda a força de vendas, adotan-do novos canais de distribuição,catálogos, ou comércio eletrônico(e-commerce).

É o cliente quem decide se o benefí-cio é real. Diferentes clientes emuma mesma indústria possuemdiferentes conceitos de valor.

Estrategicamente, qual é a melhorforma de se criar valor: agregandonovos benefícios ou reduzindo oscustos dos benefícios já existentes?A maioria das pessoas prefere aúltima, vislumbrando a possibili-dade de criar um “bolo” maior, ar-recadando mais lucro, e fornecendoum valor adicional tão grande ediferenciado ao cliente, que causaa morte da concorrência. A força

de vendas que agrega um novo valor,sente-se muito mais vitoriosa do queaquela que corta custos. Mesmoassim, muitas organizações estãodesacelerando esta tendência dian-te da descoberta de que elas regula-mentaram estratégias custosas que nãosão valorizadas e nem reconhecidaspelo mercado. E assim diminuíram acompetitividade de suas empresas.

A melhor abordagem depende total-mente do cliente. Definitivamenteé o cliente quem decide se um be-nefício é real. Clientes diferentes,mesmo que em uma mesma in-dústria, possuem percepções muitodiferentes de valor. Se uma empresafornece à sua equipe de vendas ahabilidade para oferecer novosbenefícios que os clientes genui-namente desejam, eles estarãosatisfeitos e dispostos a pagar muitobem por esses benefícios. Porém,se os clientes forem indiferentes, aempresa também pode perdernegócios. O pensamento tradicional

O valor migra do produto para processo pelo qual ele é adquirido, e osclientes começam a dar maior importância para o ambiente de compraque mais lhes agrada.

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de vendas falha em reconhecer estarealidade.

SEGMENTAÇÃOPOR TAMANHONÃO É SUFICIENTE

Desde os anos 60, a maior parte dasorganizações de vendas segmentaos seus clientes de acordo com oseu tamanho, uma prática que fun-cionou muito bem por mais de 30anos. Mas esta segmentação não é

mais suficiente. Vamos consideraras três maiores contas da segura-dora Sleepy Hollow InsuranceGroup: são três corretoras de segu-ros, praticamente, do mesmo ta-manho. Um time de conta-chaveKey account no Sleepy Hollowtenta vender seus produtos para ostrês, praticamente, da mesmaforma, utilizando valores similaresde recursos.

Apesar da aparente similaridade en-

tre as três contas, os três clientes pos-suem necessidades muito diferentes:

Cliente A: Uma corretora regional,agressiva, comenta com SleepyHollow. “Não me envie o seu pessoalde vendas, apenas me envie a suacotação. E a sua cotação deve serrápida e enxuta, porque como vocêpossui uma dezena de concorrentes,eles poderão ganhar o nosso negóciose eles forem mais rápidos e tiverempreços melhores que os seus”.

Cliente B: Uma corretora que cresceuatravés de fusões e aquisições epossui uma história bem diferente.“Nós precisamos de muita ajuda. Todomundo em nosso escritório faz ascoisas do seu próprio jeito. Nós nãopossuímos um conjunto de pro-cedimentos ou um sistema de infor-mações único. Nós faremos muitosnegócios com você se a sua equipeestiver preparada para trabalhar comcada escritório individualmente eajudá-los a atuarem juntos”. Nestecaso, existe a oportunidade para aequipe de vendas criar valor real.

Cliente C: Procura ainda outro tipo derelacionamento. “O que nós alme-jamos é um parceiro estratégico quecoloque seus recursos em nossosescritórios, desenvolvendo sistemasde informação de última geraçãoconosco, para transformar os núme-ros em uma velocidade que ninguémjulgou ser possível, e que tambémtrabalha desenvolvendo sistemasnovos e inovadores de gerenciamentode risco. Nós gostaríamos de apro-veitar um pouco do nosso conhe-cimento administrativo e estamosinteressados em ter o seu pessoal demarketing contribuindo no processode planejamento interno”.

Como uma força de vendas tradicio-nal, acostumada a julgar seus esfor-ços e recursos através do tamanhode seus clientes, consegue adminis-trar essas três demandas? Pessima-mente. Uma força de vendas acos-tumada a atender a clientes grandes,

Outras empresas eliminaram toda a força de vendas, adotando novoscanais de distribuição, catálogos, ou comércio eletrônico (e-commerce).✤

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normalmente investe muitos recursosem sua primeira conta. Este tipo decliente não almeja – e não pagará –um alto valor no processo de venda.Empresas podem desperdiçar oudestruir valores por alocar esforçosdesnecessários nessas contas.

Contrariamente, clientes grandes doterceiro tipo esperam um altoinvestimento no esforço de vendas.A alocação inadequada de recursosde investimento, colocando profis-sionais de vendas no papel decomunicadores de valor, quando, defato, o cliente está em busca decriadores de valor, é freqüente.Nesse caso, o esforço de vendas foierroneamente focado em persuasãoe não em compreensão: profissionaisde vendas passam um tempoexplicando e diferenciando produ-tos, em vez de trazerem novas idéiase valores para o cliente, através dodiagnóstico de seus problemas enecessidades.

É indispensável dizer que problemassimilares podem invalidar osesforços da força de vendas paraatender aos clientes pequenos.Apesar de a segmentação por ta-manho implicar que esses clientespossam ter a expectativa de receberapenas um pequeno esforço devendas, alguns deles estão, real-mente, preparados para remunerar,generosamente, por recomendaçãoe ajuda. Entretanto, a maioria dasforças de vendas não está estruturadapara atender a esse tipo de cliente, fal-tando mecanismos que permitam,aos profissionais de vendas, exerceresse papel, para agregar valor. Comoresultado disso, a oportunidade paracriar e capturar valor é perdida.

ALINHANDOA ESTRATÉGIAAO CLIENTE

Mas não é somente a alocação derecursos, feita pelas forças de ven-das, que está errada. Elas erramtambém em reconhecer que, di-ferentes abordagens são necessáriaspara diferentes clientes, mesmoquando eles são similares em

tamanho. Para se ter sucesso, elasdevem aprender que os clientesnecessitam ser segmentados de acor-do com a maneira pela qual elescompreendem valor. Essa segmen-tação gera três categorias distintas,cada uma demandando uma abor-dagem própria (Quadro 1):

VENDATRANSACIONAL

Para o Cliente A e seus pares, o valor

INVESTIMENTO PARA SATISFAZERÀS EXPECTATIVAS DO CLIENTE

CustoEnxuto

investimento do cliente

Quadro: 1

VENDACORPORATIVA

VENDATRANSACIONAL

VENDACONSULTIVA

perdas-desperdíciorecursos desnecessários

inve

stim

ento

do

forn

eced

or

riscovulnerabilidade competitiva

Criar ValorExtraordinário

CriarNovo Valor

é intrínseco ao produto. A força devendas agrega pouco ou nada, umavez que eles já conhecem o queestão comprando e sabem comousá-lo. Esta categoria de clientesconsidera os produtos como com-

modities. Eles desejam, simples-mente, um custo competitivo,decidindo pelo preço ou pelafacilidade de compra, e não estãodispostos a gastar tempo com o pes-soal de vendas. Este tipo de cliente

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demanda técnicas de vendastransacionais que não devem terrisco, cuja negociação seja a maiseficaz possível.

O Wal*Mart, por exemplo, trabalhacom fornecedores relativamente pe-quenos, mas se recusa a atender aseus profissionais de vendas, comfreqüência. Como um porta-voz doWal*Mart comentou: “Seria melhorque seus salários e comissões fos-sem tirados dos preços dos produtos.Por que é que nós devemos pagarpor algo que consome o nosso tem-po sem nos agregar nada em troca?”E não são apenas os tradicionaisfornecedores industriais de com-modities que estão vendendo destaforma; fornecedores de serviços,como advogados, contadores,

consultores e médicos – pessoasque nunca sonharam que suasprofissões poderiam ser consi-deradas commodities –, encontramcada vez mais clientes que dese-jam comprar seus serviços, transa-cionalmente.

VENDACONSULTIVA

O Cliente B observa amplamenteos elementos extrínsecos à equa-ção de valor. Para esses clientes,valor não é inerente ao produto;ao contrário, reside, principal-mente, em como o produto éutilizado. Neste caso, a força devendas pode muito agregar valor.Premiando a recomendação ou

ajuda, esses clientes esperamaumentar a compreensão de suasnecessidades e alternativas. Estetipo de venda consultiva, quedemanda uma força de vendaspróxima aos clientes e que tenhauma compreensão profunda dasnecessidades do negócio, envolveinvestimento de tempo e esforço,tanto do vendedor, quanto do clien-te-comprador.

Nas vendas consultivas, a habilida-de de ouvir e construir uma com-preensão do negócio do cliente é ahabilidade de vendas mais impor-tante do que a de persuasão, aempatia sobrepõe o conhecimentodo produto. Uma força de vendasdesse tipo cria valor de três formasbásicas: ajudando aos clientes acompreenderem melhor os seusproblemas e oportunidades, de umaforma nova e diferente; fornecendosoluções melhores do que aquelasque os clientes descobririam porconta própria; e atuando como “ad-vogado do diabo”, dentro da pró-pria empresa, assegurando que, osrecursos sejam alocados no tempodesejado e que as soluções propos-tas respondam às suas necessidadesespecíficas.

Uma vez que essas tarefas deman-dam muitas habilidades e energia,bons profissionais de vendas consul-tivas são difíceis de encontrar.Organizações, na busca pelo aper-feiçoamento de suas habilidades devendas consultivas, podem, facil-mente, ficar reféns de profissionais“estrelas”, de ótimo desempenho emuito bem pagos. Por esse motivo,esforços de vendas consultivasefetivas, cada vez mais utilizam ins-

Wal*Mart, por exemplo, trabalha com fornecedoresrelativamente pequenos, mas se recusa a atender a seusprofissionais de vendas com freqüência.

Três Modelos de Valor Comprovados

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trumentos de diagnóstico, processosde vendas, e sistemas de informaçãoque permitem a qualquerprofissional de vendas o desem-penho desse sofisticado papelconsultivo.

VENDACORPORATIVA

O Cliente C, e outros clientes comoesse, demanda um nível extraor-dinário de criação de valor. Eles nãodesejam, simplesmente, produtosou recomendações de um forne-cedor: eles desejam também utili-zar de uma forma ampla e com-pleta todas as principais compe-tências de seu fornecedor-parceiro,para transformar suas própriasorganizações e estratégias em umarelação de grande valor. Nesse tipode situação, é quase impossível sepa-

rar quem está vendendo de quem estácomprando. Existe uma aliança sinér-gica entre os parceiros que trabalhamjuntos para atingir um nível de valorextraordinário que nenhuma daspartes poderia atingir sozinha.

Tais clientes exigem um esforço devenda corporativa no qual tanto oproduto quanto a força de vendassão secundários, pois o objetivoprincipal é o de aumentar todo equalquer ativo corporativo do forne-cedor, contribuindo, assim, para osucesso estratégico do cliente. Ne-nhum profissional de vendas, ou atémesmo um time de vendas, podecomeçar ou manter um relacio-namento corporativo. Essa relaçãoé, invariavelmente, iniciada peloprimeiro escalão das organizações

Este tipo de venda consultiva, que demanda uma força de vendaspróxima dos clientes e que tenha uma compreensão profunda dasnecessidades do negócio, envolve investimento de tempo e esforçotanto do vendedor quanto do cliente-comprador.

Tais clientes exigem um esforço de venda corporativa no qual tantoo produto quanto a força de vendas são secundários, pois o objetivoprincipal é o de aumentar todo e qualquer ativo corporativo do fornecedor.

Neil Rackham e John DeVincentis

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envolvidas. Ela está totalmente li-gada à direção estratégica do cli-ente e, normalmente, implemen-tada por uma equipe multifuncionalde ambos os lados.

Uma boa maneira de se pensarsobre a venda corporativa é consi-derá-la como a revisão e a melho-ria contínua dos limites que sepa-ram o fornecedor do cliente. Fre-qüentemente, centenas de pessoasparticipam diretamente dessarelação, e é difícil, se não impos-sível, dizer onde ela começa eonde termina.

POR FAVOR, EUPODERIA PENSARSOBRE ISSOAMANHÃ?

Desde os dias de Júlio César temsido conveniente pensar a respeitode problemas complexos dividindo-os em três partes. Mas será que

existe alguma vantagem real emclassificar os esforços de vendasdividindo-os em transacionais,consultivos e corporativos? A maio-ria das organizações não sobre-viveu razoavelmente bem dividindoos seus clientes por tamanho? Qualé o benefício em segmentá-los deacordo com a maneira pela qualeles percebem valor?

Em nossa opinião, a resposta ésimplesmente esta:

QUALQUER FORÇA DE VENDASQUE QUEIRA SOBREVIVER NÃOTEM ALTERNATIVA, A MENOS QUESUA ABORDAGEM PARA CRIARVALOR REFLITA CLARAMENTE ASPERCEPÇÕES DE VALOR ENECESSIDADES DOS CLIENTES;SEUS ESFORÇOS ESTÃO FADADOSAO FRACASSO. OS TRÊSEXEMPLOS A SEGUIRDEMONSTRARÃO O QUE NÓSQUEREMOS DIZER COM ESTAAFIRMAÇÃO.O COMPRADOR

DE BAIXO VALOR

Um fabricante de materiais de em-balagem concorre em um merca-do em que mais de 90 % dos clien-tes são compradores de baixo valorpercebido, preocupados única eexclusivamente com custo baixo emanutenção de sua margem derentabilidade; compram transacio-nalmente. Como os custos do fa-bricante eram um pouco mais altosdo que os dos concorrentes, eleestava perdendo negócios. Eleresolveu que, a melhor maneira pa-ra reverter a situação seria investirna sua força de vendas. Em vez derepresentantes de vendas, agorasaíram para o mercado consultoresde embalagem capacitados paraagregar valor, oferecendo aosclientes ajuda e recomendações.

O esforço para recrutar, treinar edesenvolver um novo custo estra-tégico de marketing resultou em umaumento de $ 10 milhões. As des-pesas com custos operacionaiseram ainda mais assustadoras. Ocusto médio de cada visita de ven-da não saía por menos de $ 890 e,o custo médio de aquisição de umanova conta era de $ 112 mil – muitomais do que uma conta normalgerava, em lucro, durante todo oseu ciclo de vida.

A não ser que a abordagem daforça de vendas, para criar valor,reflita claramente as percepçõesde valor e as necessidades dosseus clientes, ela estará fadada aofracasso.A estratégia foi um desastre. Esses

Desde os dias de Júlio César tem sido conveniente pensar a respeito deproblemas complexos dividindo-os em três partes. Mas será que existealguma vantagem real em classificar os esforços de vendas?

Três Modelos de Valor Comprovados

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clientes ou não precisavam ou nãoqueriam ajuda ou recomendação.Para eles, o valor estava no produto.Eles necessitavam, simplesmente,de materiais de embalagem eestavam dispostos a pagar apenaspor isto. Em outras palavras, elescompravam transacionalmente,mas o fabricante tinha embarcadoem uma custosa estratégiaconsultiva. Não muito tempodepois, um concorrente comprou aempresa por um preço de barganha,cortou o custo das vendas re-vertendo o esforço de vendas paratransacional, totalmente adequadopara as necessidades de valores deseus clientes.

FAÇA UMA

VENDA E PASSEPARA A PRÓXIMA

Uma pequena empresa de consul-toria desenvolveu uma quantidadede serviços para melhorar a pro-dutividade de seus clientes. Comouma firma de consultoria, ela nãopossuía uma força de vendasprópria, em vez disso, os seus con-sultores trabalhavam com osclientes para definir suas neces-sidades e para desenvolver solu-ções tailor-made – um exemploclássico de vendas consultivas. Vis-lumbrando uma oportunidade paraexpandir seu mercado, a empresacontratou um novo diretor execu-tivo que havia trabalhado anterior-

mente no negócio de pacotes desoftware. Ele ficou horrorizado coma duração do ciclo de vendas e ouso de consultores tão caros noprocesso de desenvolvimento denegócios.

O novo diretor executivo retirou osconsultores do papel direto de ven-das. Ele estruturou uma equipe devendas por telefone, formada porprofissionais de venda comis-sionada que eram gerenciados comeficiência e a custos rudimentarescom o objetivo de aumentar a suacobertura. Com a regra mestra de“Faça uma venda e passe para apróxima”, eles agora consideravamcomo desnecessário investir tempono conhecimento das necessidadesdos negócios de seus clientes. Onúmero de contatos com novosclientes quadruplicou, enquanto ocusto de cada contato caiu paramenos da metade. Neste aspecto,o novo diretor executivo obteveêxito em criar alta cobertura e baixocusto da força de vendastransacional.

Infelizmente, os clientes da empre-sa – principalmente os mais rentá-veis – eram compradores de valoresextrínsecos e que compravam con-sultivamente. Eles estavam dispos-tos a pagar bem pela compreensãodos seus negócios e das soluçõescustomizadas que a empresa haviafornecido no passado. Diante dessanova abordagem de vendas, muitosdeles mudaram para concorrentesque lhes ofereceram forças devendas que criavam valor. A em-presa começou a perder negóciose em pouco tempo decidiu “perder”também o seu diretor executivo.

Como uma firma de consultoria,ela não possuía uma força devendas própria, ao invés disso,os seus consultorestrabalhavam junto aos clientespara definir suas necessidadese desenvolver soluções tailor-made – um exemplo clássico devendas consultivas.

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Neil Rackham e John DeVincentis

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Retornando para um modelo maiscustoso que atendia às expectativasde valor de seus clientes, a empresafoi capaz de recuperar um poucodo mercado que havia perdido.

O FIM DEUMA RELAÇÃO

Um fornecedor de contêineres tinhauma associação de longa data comuma grande empresa de alimentos,para a qual, não somente forneciacontêineres, como também maqui-naria especial e consultoria nodesign dos contêineres. A relaçãoera boa e feliz para ambos os lados.Um dia, o cliente perguntou se ofornecedor estaria interessado emum tipo diferente de relaciona-mento, que envolveria assumiralgumas das suas atividades deprodução e participar com ele dodesenvolvimento, (dividindo osriscos) de novos conceitos radicaisde embalagem.

Com falta de autoridade para res-ponder àquela revolucionária pro-posta, a equipe de vendas levou aquestão para a direção da empresa.“Nós não estamos preparados paracuidar das linhas de produçãodeles”, disse o CEO. “Nós nãosomos uma empresa que produzalimentos, e esta idéia de co-desenvolvimento parece ser de altorisco. Mas como ele é um clientevalioso, vamos então oferecer-lheapoio adicional em design e emengenharia”. Para surpresa doCEO, o cliente rejeitou a ajuda eacabou fechando parceria com umnovo fornecedor cujo presidente etime de executivos havia traba-

lhado, durante seis meses, com umalto nível de envolvimento com aempresa de alimentos para criarnovas estratégias, com riscoscompartilhados.

O novo fornecedor concordou emgerenciar todas as linhas de pro-dução da empresa de alimentos eem desenvolver conjuntamenteuma nova linha de conceitos ino-vadores de embalagens, criados porum time de pesquisa e desen-volvimento, que incluía membrosdas duas empresas. O clientealmejava uma relação de valorestratégica com o seu antigofornecedor, o qual foi incapaz deoferecê-la, devido às preocupaçõesde seus esforços de venda con-sultiva. Um novo fornecedor quecompreendeu como iniciar vendascorporativas de alto nível, foi ca-paz de acabar com uma relação de30 anos. O fornecedor antigo recen-temente anunciou uma queda em

seus resultados e uma grandereestruturação.

Esses casos – e centenas de outroscomo esses – mostram que, adotarum modelo de vendas quando ocliente deseja outro, é fatal. Nãoexiste quantidade de habilidadesde vendas, estratégias brilhantes,ou proposição de valor muito bemdesenhada que possam preenchero buraco entre o que o clientedeseja e o que o fornecedor tempara oferecer. Uma força de vendasnão pode transformar clientestransacionais em consultivos, ouvice-versa. Na melhor das hipóte-ses, vendas eficazes podem alterarlevemente o equilíbrio, mas é umaescalada vertical e escorregadia.Na era em que os clientes nãosomente exigem mais valor do quenunca, mas estão conscientes edecididos a respeito do tipo de valorque eles desejam, a força de vendasdeve estar atenta para alinhar seus

Adotar um modelo de vendas quando ocliente deseja outro, é fatal.✤

Três Modelos de Valor Comprovados

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valores com os deles.

Além do mais, o valor das expec-tativas de negócios de grandesclientes, pequenos clientes, e atémesmo consumidores individuaisestá mudando dramaticamente. Co-mo resultado, as forças de vendasestão nos estágios primários de umatransformação que afetará todos osaspectos da venda. Desde a simplesvenda transacional até relaçõescorporativas massivas que estãoreformulando totalmente as estra-tégias de negócios dos partici-pantes, as mudanças são profundase irreversíveis. E as mudanças estãoganhando cada vez mais veloci-dade. Profissionais de vendas indi-viduais estão fadados a se sentiremalarmados, confusos, e inseguros,mas, como Rip Van Winkle, nestasituação, por mais embaraçosa quepareça, é mais fácil mantê-losacordados do que fazê-los dormir.

Nós gostaríamos de dizer o mesmodas forças de vendas para as quaiseles trabalham, mas muitos dessesprofissionais parecem estar sono-lentos, esquecidos de que as forçasde hoje podem, no final, levá-los àextinção. Em quase todos os luga-res, as forças de vendas transa-cionais possuem custos altos insus-tentáveis de estrutura, forças devendas consultivas não vendem tãoprofundamente para ganhar negó-cios, e os pseudojogadores corpo-rativos pecam pela falta de capa-cidade de agregar diferentes fun-ções para criar valor suficiente paracobrir o alto custo de sua abor-dagem (Quadro 2). Forças de ven-das de empresas, cujos membros co-muns permanecem firmemente con-vencidos de que sua missão é

comunicar valor, normalmentedesconhecem que, alguns de seusconcorrentes, mais espertos, já estãoaprendendo a criá-lo.

A mensagem para essas funções devendas ainda adormecidas é simples:acordem rápido! Nosso assalariadoRip Van Winkle pode ter dormido poruma geração e acordou para des-cobrir que pouca coisa tinha mudado,mas hoje, qualquer função de vendasque cochila, mesmo que por algunsmeses, não valerá a pena acordar.As forças de vendas devem pensarem termos de criação de valor ecompreender como estruturar e geren-ciar os elementos dos esforços devendas transacionais, consultivos ecorporativos para entregar novosvalores para os clientes.

Este é um momento de oportunida-des sem precedentes para es-trategistas. No passado, vendasofereciam altas recompensas paraaqueles com energia para vender

TERRA DE NINGUÉM

Quadro: 2

❖ A maioria das forças de vendas é “terrade ninguém”.

❖ É muito caro obter o sucesso, transa-cionalmente.

❖ Faltam muitos recursos e habilidadespara se ter sucesso com a estratégiaconsultiva.

❖ Falta alinhamento e equipe para tersucesso corporativamente.

TRANSACIONAL

TERRA DENINGUÉM

CORPORATIVO

CONS

ULTI

VOpersuasivamente e com táticas parafechar negócios. A nova será muitomais generosa, recompensandoaqueles que venderem de formainteligente, compreendendo eprogramando estratégias para criarvalor para o seu cliente.

© 2004 Huthwaite, Inc. Translated and Reprintedby ESPM (Escola Superior de Propaganda eMarketing) with Permission from Huthwaite,Inc.

Huthwaite é uma empresa líder no mundo emconsultoria e treinamento de processos eficazesde vendas. Durante os últimos 25 anos, Huthwaitevem ajudando centenas de empresas no mundoa alcançarem vantagens competitivas atravésdo desenvolvimento de habilidades de vendas,gerenciamento e programas estratégicos devendas e respostas inovadoras da força devendas às demandas do mercado. Para maioresinformações a respeito de como eles podemajudar a sua empresa a atingir de forma eficaz osseus objetivos de vendas e como consolidarmudanças de desempenho duradouras, entre emcontato com: [email protected], <htpp://www.huthwaite.com/> ou 703-467-3800.

ESPM

Tradução e adaptação do textopara o português feita por:LÍGIA HERNÂNDEZ

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Anúncios Honestos

EPESQUISA

mbora “marcada” como essencial-mente desonesta, por alguns setoresda sociedade – tais como os políti-cos de Brasília e a maioria dos jor-nalistas – a atividade da propagan-da, pela própria natureza, deve tri-lhar um caminho cheio de condi-ções. Se o anúncio é “bem-compor-tado” em demasia, corre o risco depassar batido pela atenção doconsumidor; se exagera nas hipér-boles, deixa de ter credibilidade.

A arte – ou ciência – da propagandanasceu e se desenvolveu nos dois sé-culos passados, principalmente noXX – considerado por muitos comoo século dourado da propaganda –e, nos seus primórdios, usouapelos que seriam consi-derados, hoje, comoexagerados – ou poli-ticamente incorretos.A famosa sextilhade Ernesto de Sou-za – para o RhumCreosotado –,que a maioria dospublicitários sabede cor, é umbom

exemplo: Veja ilustre passageiro, obelo tipo faceiro, que o senhor temao seu lado. E, no entretanto, acre-dite: quase morreu de bronquite;salvou-o o Rhum Creosotado! Nadamenos do que salvar da morte. Háoutros: “É mais fácil um burro voardo que a Esquina da Sorte falhar”. Amaioria dos anúncios para remédiosmilagrosos, no início do séculopassado: Phymatosan, A Saúde daMulher, Biotônico Fontoura, Cafias-pirina, Urodonal... Mesmo nos anos40, a Cia Harkson anunciava seuChica-bon como “sorvete for-midável” e a Milani o creme dental

HONESTOS

Gessy, para as mulheres, como “achave mágica que abre o coraçãodos homens!”

Mas os publicitários aprenderam,com o tempo, que a honestidade nosargumentos e nas afirmações dosanúncios e das campanhas é – alongo prazo – a melhor estratégia pa-ra conquistar e manter os clientes.Uma das mais importantes agênciasde propaganda internacionais, a Mc-Cann-Erickson, usa até hoje, comoslogan, a expressão “a verdade bemdita”. Ela foi criada por um dosfundadores da agência americana,Ralph St. Hill, no início do séculopassado.

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José Roberto Whitaker Penteado e Beatriz Penteado

Este artigo nasceu de uma troca deidéias dentro do Instituto Cultural daESPM sobre o tema credibilidade dapropaganda. Será que há anúnciosque são – ou parecem – mais hones-tos do que outros? Em que consistiráexatamente a “honestidade” de umamensagem publicitária? Decidimosfazer uma pesquisa – qualitativa –,já que não havia metodologia pos-

sível para estabelecer com exatidãoparâmetros de honestidade para apropaganda – e escolhemos cinqüen-ta nomes de publicitários, princi-palmente entre os mais ligados àESPM, mandando-lhes um texto-de-safio: Para uma matéria que queremosfazer para a Revista da ESPM, por favor,responda à pergunta: Qual o anúnciomais HONESTO que você já viu em

sua vida? (Brasileiro ou estrangeiro).

OS RESULTADOSAQUI ESTÃO

Houve céticos que responderamcoisas como “este é um animal quefaleceu antes de nascer”, ou fizeramblague: “Este seu, anunciando suadisposição de obter um anúncio tãosério, que nem Deus poderia duvi-dar”. Mas houve quem fosse maisfundo, na busca de referências e pa-râmetros, como o ex-diretor de co-municações da Nestlé e conselheiroda ESPM, Avelar Vasconcelos:“Nunca olhei para um anúncio pen-sando se era honesto ou não. Masteria uma resposta mais conceitual:anúncio honesto é o anúncio deprodutos com marcas que venderam,tiveram sucesso e cresceram nomercado. Porque todo o marketing –e o seu principal instrumento, a pro-paganda – só servem para vender aprimeira vez. A partir desse momento,quem assume o leme é o próprioproduto, que deverá confirmar, a cadadia, que continua correspondendo aoanúncio que dele foi feito e que porisso ele foi comprado e merece conti-nuar sendo”.

“Mas, se você pretende ilustrar amatéria, não irei ao passado. Pego arevista Veja desta semana e, napágina 6, está um anúncio para “Ve-ja multiuso” – nova embalagem. Esseanúncio “parece” honesto: diz demaneira simples e direta, além dereforçar o argumento de maneiravisual, que a nova embalagem é anti-deslizante. E de fato ela parece sê-lo. Mas só saberei de fato se oanúncio é honesto depois que –movido por ele – eu vá comprar o

Pego a revista Veja desta semana e, na página 6, estáum anúncio para “Veja multiuso” – nova embalagem. Esse anúncio“parece” honesto: diz de maneira simples e direta.

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Anúncios Honestos

produto e comprová-lo”.

Walter Guelfi, publicitário e consul-tor, com longa e bem-sucedidacarreira, também abordou a questãocom profundidade. “Segundo oAurélio, honesto significa honrado,digno, decente, íntegro, probo, reto,conveniente, correto, adequado,casto, puro,virtuoso. Dentre essesbelos adjetivos optei por dois –conveniente e adequado – paraqualificar atributos da publicidade.São expressões que se ajustam melhorà natureza efêmera, “manipuladora”– porque deve ser persuasiva – e

1) 2)

superficial da comunicaçãopublicitária. Refletem uma idéia derelatividade em relação às circuns-tâncias. Não têm um sentido absolutocomo honrado, por exemplo. Umapessoa é honrada, ponto. Um anúncioé conveniente, adequado em relaçãoa alguma coisa, por isso são conceitosrelativos. Se concordamos nisso,posso tentar listar algumas peçaspublicitárias que se encaixam nessesconceitos. Não são, necessariamente,criativas; criatividade não é o objetode sua pergunta. Nessa categoriaencontram-se os anúncios que nãoescondem seu caráter íntimo, sua

intenção de mobilizar o público parao objetivo de estimular a venda. Umapeça publicitária institucional, porexemplo, pode ser menos honesta doque um anúncio para uma promoçãode varejo. Uma peça de varejo bemrealizada é conveniente e adequadaporque atende ao interesse do públicoem busca de informação e respondeao desejo do anunciante de vender.Ela não pode ser mentirosa. Se for, nãofunciona. Mas eis uma lista, se não édos anúncios mais honestos da minhavida – porque não tenho memóriasuficiente – terão sido os maismarcantes”.

3)Casas Bahia (representandotodas as campanhas hones-tas de varejo). Os anúnciossão cansativos, mas eu já

entrei em várias lojas da rede paraconsultar sobre promoções anun-ciadas. Eram verdadeiras.

Campanhas de OMO (repre-sentando todas as campa-nhas que respeitam as con-

sumidoras com depoimentos au-tênticos). As consumidoras reco-nhecem a honestidade e retribuemcom a compra do produto.

Campanha de Kolynos/Sor-riso (representando todas ascampanhas que trabalham

com as emoções de maneirasaudável e crível). A campanha é tãohonesta, que sobreviveu à mudançada marca do produto.

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José Roberto Whitaker Penteado e Beatriz Penteado

O professor Francisco Gracioso,presidente da Diretoria Executiva daESPM – mas que foi, também, pro-fissional de criação e de plane-jamento nas agências JWT e Mc-Cann-Erickson – concorda com ainclusão das campanhas de Kolynosentre as mais honestas: “Principal-mente os anúncios de “Ah, Kolynos”que tiveram um papel histórico, aodeixar de tentar convencer osconsumidores sobre o papel do cre-me dental como remédio, para evitarcáries, etc. e concentrou-se sobre asensação de bom hálito e bocalimpa. Isso fez com que Kolynos setornasse a marca líder em vendas, noBrasil.”

Christina Carvalho Pinto, diretora daFullJazz, respondeu: “o grande mar-co, para mim, partiu da Natura, mos-trando mulheres bonitas de verdade.Isso resgatou o conceito da ver-dadeira beleza e mostrou a deso-nestidade dos anúncios de outrasmarcas, que costumavam usarmodelos de 20 anos para anunciarcremes anti-rugas”. Essa campanha,também, foi considerada comoexemplo de publicidade honestapelo diretor da Tymus Branding, Ri-cardo Guimarães.

Décio Clemente, diretor da DeCle-mente e também conselheiro da

ESPM, lembrou o anúncio da cam-panha contra a fome da época doBetinho, “que mostrava uma panelavazia, dizia que as pessoas precisa-vam comer mas, apesar da honesti-dade, até hoje tem gente que morrede fome. Ninguém se sensibilizoude verdade. Outra é da campanhacontra a Aids. A única e mais seguramaneira de evitar é usando camisi-nha, honestamente é verdade, masainda tem gente que não acredita”.Roberto Duailibi, um dos sócios daDPZ, também contribuiu para essapesquisa, lembrando de um anún-cio criado pela agência para ospreservativos Jontex, muito, muitoantes da ameaça da AIDS. Trata-sede “Bonitinho pero sifilítico”, abor-dando o tema então tabu das doen-ças venéreas.

José Esquenazi, ex-diretor da Artplan,do Rio, é de opinião de que os maishonestos são os anúncios com-parativos – que, no Brasil, não sãomuito bem-vistos. Diz Esquenazi: “Éválida a idéia desde que os fatoscitados sejam verdadeiros, não difa-matórios, nem diminuam a quali-dade do concorrente. Lembro dePepsi X Coca e do Fusca X Chevette,era tudo claro e honesto. Quando aArtplan recebia visita de estudantesde Comunicação, eu fazia umapalestra e sempre citava os aspectos

da ética desses cases”.

Graciela Presas Areu, publicitária econsultora, de Curitiba, indica a“campanha mais honesta e inte-ligente que já vi foi a do fusquinhanos EUA, quando assumiram que eraum carro feio. Era uma campanha

O anúncio da campanha contra a fome, da época do Betinho, “que mostrava uma panela vazia, dizia queas pessoas precisavam comer mas, apesar da honestidade, até hoje tem gente que morre de fome”.✲

Duailibi, um dos sócios da DPZ,também contribuiu para essa pesquisa,lembrando de um anúncio criado pelaagência para os preservativos Jontex,muito, muito antes da ameaça da AIDS.Trata-se de “Bonitinho pero sifilítico”,abordando o tema então tabu dasdoenças venéreas.

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Anúncios Honestos

muito inteligente, meiga, gostosa, edeu bons frutos, pois foi feita emcima dos diferenciais positivos;assumiu as desvantagens do produto,que manteve. Outra campanha quelembro, pelo bom humor, foi a deBenson & Hedges dos cigarros decem milímetros. Lembro até hoje doscomerciais de televisão, brincandocom os “problemas” (claro que deforma figurada e metafórica) quetrazia um cigarro de 100’s. Não diriaque foi exatamente uma campanhahonesta, mas transformava o dife-rencial em vantagem, destacando oque pareciam ser aspectos negativos– com competência na utilização doequívoco, para surpreender; esabemos que este é o princípio dohumor, da piada”.

O professor e consultor Isnard MansoVieira lembra de um anúncio que faziaparte do lançamento de uma cam-panha do Ponto Frio: “Nos idos de 71,72, na SGB – o Cleber Neves foi ocriador. O cliente queria uma cam-panha que mostrasse a transparênciado Ponto Frio, o respeito dele pelo

consumidor. Ainda nem se pensava emCódigo do Consumidor. Saímos comuma campanha que tinha o título deO Fim das Ilusões. A foto era um má-gico tirando um coelho de uma car-tola. E o texto falava de que no PontoFrio não havia engano, não haviajogadas, os preços anunciados eram

A sede da Avis era em Long Island. Alugaram o carro e partiram. Nomeio do caminho, abriram o cinzeiro e viram que estava cheio depontas de cigarros. Horrorizados, porque a campanha da Avis vinhaprometendo ao público carros e cinzeiros limpos – naquela quinzenaou naquele mês, a Avis estava exibindo um outdoor com a promessa.

Outra campanha que lembro, pelo bomhumor, foi a de Benson & Hedges doscigarros de cem milímetros.

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José Roberto Whitaker Penteado e Beatriz Penteado

aqueles mesmos e apresentava osprodutos com os preços a vista e comos preços a prazo em 12 parcelas. E asoma do total das parcelas, semsubterfúgios. Esta campanha contri-buiu para que o Ponto Frio ganhasseuma aura de confiabilidade que duroumuito tempo”.

José Francisco Queiroz, outro publi-citário que é conselheiro da ESPM, éde opinião de que anúncios devemser, na maioria, honestos. Casocontrário o CONAR acaba (ou deveriaacabar) com eles. Mas lembra – de seustempos da agência Norton – de umanúncio-comunicado publicado pelaNestlé por volta de 1993. “Um malucoameaçou a empresa, dizendo quehavia colocado veneno em váriosprodutos, nos pontos-de-venda, e aempresa publicou um anúncio sobreo fato, pedindo à população paratomar cuidado na compra dosprodutos, evitando os que tivessemqualquer tipo de adulteração naembalagem”.

O tema foi lembrado, também, pelodiretor-executivo do IBOPE, PauloPinheiro de Andrade, evocando umepisódio ocorrido com a empresaJohnson & Johnson, informando queretiraria das prateleiras todos osestoques do seu produto Tylenol,devido à ameaça de algum dese-quilibrado, que afirmava ter coloca-do arsênico em alguns frascos, nospontos-de-venda.

Julio Cosi Jr. – publicitário emérito,mestre de uma geração, na qual meincluo – conta sobre um anúncioespecífico da famosa campanha dalocadora Avis: “Aconteceu, creio, em1964. Meu amigo David Herzbrun,

Copy Supervisor na Doyle DaneBernbach, e o Diretor de Arte HelmutKrone – famoso pela campanha doFusca – alugaram, em New York, umcarro da Avis para ir a uma reuniãocom o Presidente da Avis, RobertTownsend. A sede da Avis era emLong Island. Alugaram o carro epartiram. No meio do caminho,abriram o cinzeiro e viram que estavacheio de pontas de cigarros. Hor-rorizados, porque a campanha daAvis vinha prometendo ao públicocarros e cinzeiros limpos – naquelaquinzena ou naquele mês, a Avisestava exibindo um outdoor com apromessa: “Avis won’t rent you a dirtycar. No ifs, ands, or butts” – o HelmutKrone disse: “precisamos fazer umanúncio sobre isto”. Herzbrunrecolheu as pontas de cigarro numenvelope. E começaram a trabalharnum anúncio que ficou pronto uns2 ou 3 dias depois”.

“O título era o seguinte, “The writerof this ad rented an Avis car recently.Here’s what I found. “O texto come-çava dizendo algo como ...”eu escre-vo anúncios para a Avis como meiode vida, mas isso não me transformanum mentiroso pago.”A última frasedo texto era: “Eles provavelmentenunca veicularão este anúncio.”Quando o anúncio foi apresentadoao Robert Townsend, ele ficouassustadíssimo. Acabaram entrandonum acordo: Townsend concordavaem publicar o anúncio mas queriaser informado sobre onde e quandosairia, para que ele nunca mais visseo anúncio novamente”.

O presidente da Young & Rubicamno Brasil, Silvio Matos, também deuo seu voto à campanha da Avis –

number 2 – como a mais honesta.

Luiz Fernando Garcia, diretor doscursos de graduação em Comuni-cação da ESPM, chegou a teorizarum pouco, diante da pergunta: “Elacria um falso dilema: se responder“espere aí que vou lembrar”, indu-zirei o leitor a perceber o restante douniverso como algo ardiloso; mas sedisser, “todos o são” também estareiinferindo uma verdade que pareceevidente, diante da existência detantos órgãos para verificação destaveracidade, que se trata de umafalácia... Logo assumiremos que háa possibilidade de uma honestidaderelativa, o que nos levaria a continuar

O título era: A Volvo desco-briu: no vidro de trástambém chove. No layout,saia e blusa – uma foto datraseira do novo carro como limpador.

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Anúncios Honestos

filosofando sobre a diferença entrementira e omissão, novamente,manipulação, etc. Todo anúncio quetraz em si uma declarada intenção(propósito claro) e uma mensagem“sharp and clear” é honesto “per se”.Aí incluem-se a maioria dos anún-cios das companhias mais admiradasno mundo”.

Lembrando de sua experiência comoexecutivo da Agroceres, relata:“fizemos uma campanha co-brandcom o então Bamerindus, traba-lhando sob o tema AdministraçãoRural: é assim que se ganha, onde amensagem comercial da escolha dosinsumos do campo era ampliadapara sua dimensão mais técnica...Sua linguagem atuava com o perfildas campanhas publicitárias tradicio-nais (incluindo o uso do cantorSérgio Reis como ícone etc.) esse éum bom exemplo”.

Washington Olivetto, da W/Brasil,respondeu: “Entre muitos anúncioshonestos (dentro do critério verdade,inteligência e simplicidade) que eugosto, adoro um em particular, escri-to pelo meu amigo Ed McCabe mui-tos anos atrás, quando a Volvo lançouo primeiro automóvel do mundocom limpador de pára-brisa no vidrotraseiro. O título era: A Volvo desco-briu: no vidro de trás também chove.No layout, saia e blusa – uma fotoda traseira do novo carro com olimpador”.

Ruy Lindenberg, diretor de criaçãoda Leo Burnett, indicou dois comer-ciais de TV: “o filme que lançou oMacintosh, filmado pelo Ridley Scott– onde a moça entra correndo, numambiente com uma tela gigantesca

de onde fala o Big Brother, e jogaum martelo. E o locutor diz que, gra-ças à Macintosh, 1984 não será1984. O poder da IBM, de quasemonopólio, acabava de ser que-brado. Acho muito honesto porquefoi exatamente isso o que aconteceu.E há o filme do Fusca, no meio daneve (da DDB dos bons tempos), ocarro chega até a uma garagem,desce o fulano do fusquinha, abre aporta e, dentro está um dessesenormes veículos que limpam a nevedas estradas. Acho muito verdadeiro,pois, na época era um dos poucosveículos que podiam enfrentar umasituação daquelas”.

Francisco Socorro, experiente profis-sional, hoje radicado em Santa Ca-tarina, conta uma história curiosa: “Oanúncio que mais me impressionou,pela honestidade, foi publicado háquase 50 anos – em 1956, ano emque ingressei na Publicidade (JWT)como office-boy. Era preto & brancoe deve ter sido publicado em OCruzeiro. Num primeiro plano, rostode mulher com belíssimos cíliospretos – o uso de foto era ainda pou-co comum naquele tempo. Numsegundo plano, desenho mostrandohomem e mulher (ela com o jeitoclaro de secretária). Título: Ele era

Há o filme do Fusca, no meio da neve, o carro chega até a umagaragem, desce o fulano do fusquinha, abre a porta e dentro estáum desses enormes veículos que limpam a neve das estradas.

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José Roberto Whitaker Penteado e Beatriz Penteado

meu Chefe ... (as reticências, tambémcomuns na época). Hoje é meu ma-rido. Subtítulo: Passei a usar Cilion.Sem mais explicações: só a emba-lagem do produto e o slogan”.

Carlos Salles, presidente do movi-mento Brasil-Competitivo, contribuiucom duas peças. “O Exército de Sal-vação publicou um anúncio, há unstrinta anos, no qual alguns músicosuniformizados com a farda daorganização ameaçavam tocar se odistinto público se recusasse a fazerdoações. Era honesto, porque reco-nhecia o incômodo provocado nasvias públicas por músicos absolu-tamente desafinados. E tambémporque dizia – com toda a clareza –que a organização precisava deses-peradamente de dinheiro. Será queo Bispo Macedo teria a coragem depublicar, hoje, um anúncio parecido?O outro foi da Pérsico-Persamiglio,fabricante de tubos metálicos, que– diante do estado de derrotanacional causada pela moratória dadívida em 1981 – conclamou-nostodos à reação. A frase de chamadaera: “Atrás da palavra crise, geral-mente se esconde uma crise detalento”. Para mim, esse anúncio foiimportantíssima peça de motivação,inspirando-me a implementar, naXerox do Brasil, um grande pro-grama de ação que rendeu precio-sos e significativos dividendos ànossa empresa”.

Outras indicações – sem explicações– foram: Série do garoto BomBril (A-na Carmen Longobardi); Gordinhada Ohrbach´s (Bia Penteado); Veí-culos Lada (Fernando Nobre); PostosSão Paulo (Marcelo Aragão); PrimeiroSutiã Valisère e Pão de Forma Levy’s

“O Exército de Salvação publicou um anúncio, há uns trinta anos, no qualalguns músicos uniformizados com a farda da organização ameaçavamtocar se o distinto público se recusasse a fazer doações.

(JR). Todos merecem entrar.

Para encerrar, o meu próprio depoi-mento: em primeiro lugar, concordocom a maioria das indicações dosprofissionais consultados. Mas estouem condições de acrescentar doisesquecidos – ambos americanos.Lembrava-me de ter visto, no final

Era preto & branco e deve tersido publicado em O Cruzeiro.Num primeiro plano, rosto demulher com belíssimos cíliospretos – o uso de foto era aindapouco comum naquele tempo.

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Anúncios Honestos

Outras indicações – semexplicações – foram: Sériedo garoto BomBril (AnaCarmen Longobardi);Gordinha da Ohrbach´s(Bia Penteado); VeículosLada (Fernando Nobre);Postos São Paulo(Marcelo Aragão);Primeiro Sutiã Valisère ePão de Forma Levy’s (JR).Todos merecem entrar.

dos anos 50, uma série de anúnciostestemunhais para a pasta deamendoim Skippy – produto degrande venda nos EUA – utilizandocelebridades já entradas em anos,como Groucho Marx, Basil Rath-bone, a artista de teatro HermioneGingold e Bert Lahr, o leão covardedo filme O Mágico de Oz. O quetornou esses anúncios inesque-

cíveis para mim, que mal iniciavacarreira em propaganda e mar-keting, foi o fato de que todos ostextos contavam uma históriaparecida: “O pessoal da Skippy meofereceu uma grana para fazer umanúncio elogiando o produto deles.Disse: Impossível! Nunca proveiesse negócio, isso é coisa decriança, etc. etc. Aí eles dobraram

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José Roberto Whitaker Penteado e Beatriz Penteado

AUTORES

TextoJ. ROBERTOWHITAKER PENTEADOEditor, Revista da ESPM

PesquisaBEATRIZ PENTEADODiretora de Arte

Para a pasta de amendoim Skippy – produto de grande venda nos EUA– utilizando celebridades já entradas em anos, como Groucho Marx.✲

a grana. Continuei recusando. Aíme deram um monte de dinheiro enão pude mais recusar. Até provei agororoba – e sabem de uma coisa? –até que não é tão ruim assim.”Conversei sobre a série com algunscompanheiros da publicidade;

poucos se lembravam, e sóvagamente. Uma pesquisadora deNova York encontrou os anúncios,para a revista. São de 1959.

O outro é mais conhecido: foi para aintrodução do Vermouth Cinzano

ESPM

Durante anos vocês roubaramnossos cinzeiros; agoracomprem o nosso vermouth

fabricado e distribuído nos EstadosUnidos. Dizia: “Durante anos vocêsroubaram nossos cinzeiros; agoracomprem o nosso vermouth” – re-ferindo-se aos turistas americanos quelevavam – dos bares e restaurantes – oscinzeiros de propaganda da Cinzanocomo souvenir. Estão todos aqui paraserem lembrados.

Mesa-Redonda

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Mesa-Redonda

PARTICIPANTES

ALEXANDRE GRACIOSODiretor Acadêmicoda ESPM

AMALIA SINAExecutiva e Professora daFundação Dom Cabral

FLÁVIO CONTIDiretor DPZ

MARCOS MINORUGerente Nacional deRH da Trevisan

MÁRIO CHAMIEEscritor e Professorda ESPM

ORIVALDO GALASSOUnilever

J. R. WHITAKERPENTEADOModerador

ALEXANDRE GRACIOSO

MARCOS MINORU

J. ROBERTOWHITAKER PENTEADO

FLÁVIO CONTI

99 M A I O / J U N H O D E 2 0 0 5 – R E V I S T A D A E S P M

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eira LONGEVIDADE:

AS DUAS FACES DA MOEDA

raças aos progressos da medicina,alimentação mais saudável e vida maisativa, as pessoas mantêm-se em formamesmo em idades mais avançadas. Háalguns anos, já estariam todosaposentados, mas hoje nem pensamnisso. Quais as conseqüências –positivas e negativas – dessa maiorlongevidade na vida e nas atividadesprofissionais? Por um lado, uma ricaexperiência deixa de ser desperdiçadapara ser colocada a serviço dasempresas e da sociedade em geral. Poroutro, também é certo que a idadecobra o seu preço. As pessoas tornam-se mais conservadoras, temem asmudanças e tendem a repetir-se. Arevista Exame publicou, recentemente,que a idade média dos presidentes dasmaiores empresas brasileiras é poucosuperior a 50 anos. Diretores de primeiroescalão têm, em média, 45 anos. Nãosão idades avançadas. Será que alongevidade – pelo menos até agora –só tem provocado o aumento do númerode generais de pijama? Como será, paraos mais jovens, trabalhar com pessoasmais idosas, e como os mais velhosvêem essa “invasão” dos jovens.

Reunimos, em mesa-redonda, pessoasde várias idades para discutir essa novarevolução, ainda silenciosa, que ocorreno mundo e na vida profissional. Osresultados confirmam que há conflitos,mas também apontam caminhos nadireção da harmonia.

(FG)

AMALIA SINA

ORIVALDO GALASSO

MÁRIO CHAMIE

Mesa-Redonda

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JR – Estamos reunidos para a discus-são de um tema atual e polêmico –até na própria definição. Vamos falarsobre os velhos e os novos. Gostariade começar, tentando conceituarquem é jovem quem é idoso.

MÁRIO – Pois eu considero um diá-logo muito jovem e oportuno. Hoje,devemos mudar o conceito decronologia. Esta classificação bipolar– juventude e velhice – envelheceue em função dos próprios dados dalongevidade, da diminuição dashoras de trabalho, do aumento daspessoas acima de 60 anos e doinvestimento brutal que o Estado temque fazer em função dessa novarealidade. Essa cronologia não podeser considerada nem como prisãopara os mais idosos e espaço abertopara os jovens. Não vou falar emcausa própria até porque já passei da“terceira” idade; estou na idade dashomenagens. Mas, em 1980, havia600 mil brasileiros com mais de 80anos; em 2004, eram dois milhões e,em 2050 teremos 14 milhões de pes-soas com mais de 80 anos. E, nasegunda metade deste século, tere-mos cerca de 32 milhões de pessoasacima de 80 anos com condiçõesvitais de atividade, participação eintervenção no tecido social. Por isso,não podemos mais ser reféns da cro-nologia – a cronologia é um engodo.

JR – Ao dizer que a classificação“envelheceu”, como sinônimo de coi-

sa que saiu de moda, o Mário invo-luntariamente disse algo “politi-camente incorreto”. Um conceitoque envelhece, pode ter sido apurado,melhorou, devíamos acreditar maisnele. Mas não é o que acontece.

AMALIA – Acho que há confusão,principalmente dentro das organiza-ções, que é misturar experiência comvivência. O fato de a pessoa estarem algum lugar durante muito temponão lhe dá experiência. Mas sim, aforma como ela se relaciona com oque vive, no dia-a-dia. Mil anos adez não é a mesma coisa que dezanos a mil. Até recentemente, a pes-soa, para ascender a uma posição dedestaque, teria que passar muitotempo dentro da empresa, pelomenos uns 15 anos. Ninguém vinhade fora para assumir uma posiçãoimportante, porque não ficava bem,não era prata da casa. Então, gerenteantes dos 30, diretor antes dos 40 epresidente antes dos 50 era inima-ginável. Hoje, tudo se transformou.

GALASSO – Não concordo. Fui ge-rente com 28, diretor com 35 e presi-dente com 42.

AMALIA – Mas isso era raridade.

GALASSO – Tive uma carreira de38 anos na Unilever; hoje em dia équase impossível.

AMALIA – Olha que interessante.

“A LUTA CONTRA A VELHICE É UMA LUTA PERDIDA, MASPRETENDO PERDER POR POUCO.” JUDITH CARLESSO

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Tenho 40 anos, passei por 9 empre-sas e fiz a mesma coisa: fui gerenteantes dos 30, diretora antes dos 40e presidente antes dos 50. Mas, parachegar lá, foram necessárias 9empresas. Ele conseguiu em uma!

GALASSO – O tipo de carreira quetive não existe mais. Os próprios jo-vens não estão interessados. Nesses38 anos, tive muitas oportunidadesde deixar a Unilever. Às vezes mepergunto se agi certo. Não tenhoresposta. Foram 38 anos em que vivibem e ganhei experiência; vi muitagente sair da empresa e – quandoos encontrava – em outras funçõesem outras empresas, percebia quetinham parado no tempo. Umaempresa multinacional, como aUnilever, oferece a oportunidade deconhecer e entender o mundo; vocêsabe o que acontece na China; rece-bia e-mail do Vietnã, pedindoinformações. Depois, fui trabalharnuma empresa nacional, familiar.Foi um choque enorme. Sabia dosproblemas que as empresas brasilei-ras têm; mas não imaginava quefossem tão grandes. Essas duasexperiências levaram-me à conclu-são de que, enquanto em uma seganha experiência, na outra vocêcontribui. São duas fases importan-tes na vida da gente.

ALEXANDRE – Sempre existirãoexemplos isolados: alguém que sedestacou cedo, como os casos daAmalia e do Galasso, e outro quecomeçou tardiamente. Se olharmosa história, temos inúmeros exem-plos, de artistas ou cientistas...

JR – Como aquela senhora ameri-cana, Grandma Moses, que come-

çou a pintar aos 70 anos – e nossoMonteiro Lobato que se tornou escritorde livros infantis aos 44...

ALEXANDRE – Há exemplos emambas as direções. Quando falamosde envelhecer, temos de pensar namédia da população, que são essesmilhões de pessoas de que o Máriofalou. Pensando em médias, aindaexiste uma relação entre o fato de apessoa envelhecer e o fato de tornar-se mais limitada em relação às suascapacidades quando jovens. Isso seráa verdade para a maioria desses 32milhões. Mas, há dois mil anos – comexpectativa de vida de 30 anos – apessoa, aos 25, já estava sem um braçoou uma perna, perdidos em combate...Há expoentes, pessoas com 70, 80anos, que têm desempenho melhor doque a maioria dos jovens. Essas pessoasfazem bem à sociedade porque inspi-ram os demais, que pensam: “se elesconseguem eu também consigo”. OJ. Roberto nos mostrou algumas frases,e a que mais me tocou foi: “O idosoconserva suas faculdades se mantivervivos seus interesses”. Acho que issose aplica a quase todos os casos.

MARCOS – Eu percebo a questão doenvelhecimento sob duas ópticas: soba de quem envelhece, vai muito decomo a pessoa se sente, de como elaaborda o assunto envelhecimento e,nisso, há diferenças culturais. Eu, porexemplo, venho de uma cultura emque o envelhecimento chega a ser umprivilégio. Mas há o lado externo,como o mercado enxerga profissionais

acima de uma “idade limite”.Infelizmente, estamos todos influen-ciados pela questão cronológica.Nascemos em uma data marcada e– a partir daquele momento – começaa rodar o relógio da vida, ano apósano... No início, não é tão preo-cupante. Meus filhos, de 5 e 8 anos,não têm noção do que os espera daquia 10, 12 anos. Quando olho 10, 12anos à frente, vejo-me com 50 anos.Sinto-me na flor da idade, possoproduzir por muito tempo, mas mepreocupo porque, vou estar, de fato,“velho” para o mercado. O mercadovai me enxergar de forma diferente.

MÁRIO – Mas essa pode ser a ati-tude atual e injunções histórico-estruturais podem obrigar o própriomercado a se adaptar. O Brasilenvelhece; os nascimentos diminueme os conceitos de jovem e velho vãoser abalados com isso. Para ter umaidéia, 77% dos aposentados brasi-leiros – acima de 60 anos – vivemde aposentadoria; 21% das mulheresvivem de pensões. Se o velho forsempre visto como excluído, emfunção da cronologia, esse encargorecai sobre o Estado, que precisa criarhospitais, sanatórios, assistências –coisas impossíveis sem a contri-buição do trabalho dessas pessoas quepossuem recursos físicos e mentaispara se auto-sustentar e sustentar suasfamílias. Hoje, no Brasil, há 15milhões de lares sustentados por pes-soas acima de 70 anos, e 5 milhõesde lares por mulheres acima de 60anos. Isso sinaliza a necessidade de

“BOEMIA, PARA ALGUÉM DA MINHA IDADE, É CAMA;MAS ACOMPANHADO.” NELSON GONÇALVES

Mesa-Redonda

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um repensamento estrutural de todaa sociedade brasileira. Não é maisuma questão de ética, de umaclassificação antropológica – o novoé novo, o velho é velho. Isso nosremete a Cícero – que escreveu umlivro sobre a velhice – que analisaesse problema, e é antigo. Querocitar um trecho: “Há quatro causasque fazem parecer miserável avelhice: a primeira porque nos afastado trabalho; a segunda porque nosenfraquece o corpo; a terceira porquenos priva de quase todos os prazerese a quarta porque é vizinha damorte”. Mas ele mesmo defendia quenenhuma dessas quatro causas sesustenta, porque “no que diz respeitoao trabalho, há trabalhos que sãopróprios da velhice. Quantos velhossustentaram a república por suasabedoria e autoridade?” No que serefere ao enfraquecimento, “avelhice não precisa de forças; hávelhos enfraquecidos que não podempreencher a menor função na vida.Mas esse não é um defeito peculiarda velhice; isso é um problema demá saúde”. Os homens de 80 anos,aos quais me referi, estão com plenascondições de trabalho e contribuição.Um jovem pode não ter saúdetambém; os conceitos têm que serrevistos. Os prazeres não têm omesmo encanto para os velhos, mastambém os desejos são maisadequados – é questão de uma boacalibragem, e hoje a medicina vemem socorro dessa calibragem. Ondeo desejo não existe, a privação émenos penosa. No que diz respeito

à vizinhança da morte, “desgraçadoo velho em que em tão longa vidanão aprendeu que é preciso desprezara morte, porque deve ser uma chaticemorrer e ficar eterno”. Isso transpor-tado para dados concretos e reais deuma sociedade em transformação –e aí entra o problema de vivência eexperiência –, vê em que medidauma nova vivência da experiênciade ser velho deve ser assumida.

AMALIA – Também há o fato deassociarmos a sapiência; venho deuma cultura chinesa em que o enve-lhecer é trazer experiência. Mas asabedoria não necessariamente estásó na cronologia. Há sabedoria numacriança, no viver, num relaciona-mento. Às vezes ouvimos coisas depessoas que não têm cultura aca-dêmica e aprendemos muito. Então,esses conceitos sobre as atitudes,sobre o que é sábio ou não, o que ébonito ou não, têm a ver com a mídia.A Renew, por exemplo, afirma que épreciso fazer alguma coisa para ficarmelhor. A maior escrava dessasociedade do envelhecer-ou-não é amulher, que responde aos estímulosde que é melhor ser mais bonita,mais jovem. Diz-se que, quando seeduca uma mulher, educa-se afamília toda; quando se educa umhomem, educa-se apenas um ho-mem. Isso tudo vai penetrando nasociedade, transformando-a em umamistura da cultura, o reflexo damarca. Os livros não dizem que asmarcas refletem o que a sociedadetem? Na minha visão, todos nós –

“SE EU SOUBESSE QUE IA VIVER TANTO TEMPO,TERIA ME CUIDADO MELHOR.” EUBIE BLAKE

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managers, executivos – estamosconstruindo uma imagem em tornodo que é bonito. Nunca aparece umhomem de 70 anos, com sua mulherde 70 anos, fazendo alguma coisabonita e que dê prazer. Só se vêempessoas com 20, 25 anos. Parece quesó é possível ser feliz hoje em dia sevocê for alta, bonita, de olhos claros,jovem, rica e casada com um jogadorde futebol...

FLÁVIO – Quando o Galasso disseque não sabe se fez uma boa escolha,ao trabalhar 38 anos na Lever, semquerer, ele respondeu, porque mostraorgulho, satisfação de ter ficado tantotempo lá. Eu estou na mesma situa-ção: completo 40 anos de profissão eestou há 33 na DPZ. E a publicidadeé um meio onde a juventude é qua-lidade – é um fator primordial. Apropaganda é como o futebol – pára-se aos 29 anos. Imaginem que atendiao Mário Chamie – que se auto-denomina “arqueológico”. Quando sechega, nessa profissão, à idade quecheguei, nota-se claramente como aexperiência e vivência com jovens éimportante. O jovem precisa dealguém experiente para orientá-lo.Temos que pensar no negócio; só comjovens, nenhuma empresa vai parafrente. Com a era da informatização,a corrida tornou-se intensa. Nós, osmais velhos, sofremos com isso –competir com o jovem, ficar updatecom ele. Quando atendia ao Mário,eu fazia propaganda da máquina deescrever Electra 22. A experiência,hoje, é fator fundamental nos negó-cios. O Brasil é um país meio precon-ceituoso contra a idade. Lá fora,muitos profissionais fundaram agên-cias fantásticas aos 50 anos. Aqui,quando se chega aos 50, é condenado

a sair do mercado. Pois estou combem mais de 50, e considero-me den-tro do mercado, e a experiência queestou tendo com os jovens é ótima.Quem ganha com isso é a empresa.

AMALIA – Do que você está di-zendo, o que me chama atenção éatualização. O fato de envelhe-cermos não quer dizer que continua-mos atuando como quando tínhamos18 anos. Continuar falando conto deréis, achar que está ficando moder-ninho porque está usando argumen-tos do passado para tentar sair de umasituação em que você próprio seconstrange. Atualizar-se independeda idade. Vemos homens que secuidam. Cuidar-se é uma forma dese respeitar; não é vaidade. Mastodos precisam de atualização paranão virar dinossauro – tanto homensquanto mulheres.

GALASSO – Sou uma pessoa queprocura se atualizar sempre. Quandoisso deixar de acontecer, estou morto.Mas é verdade que, com a idade,nos tornamos mais conservadores.Eu, por exemplo, quando olho apropaganda de hoje, vejo coisas quenão aceito. Os jovens gostam; eunão gosto e não aceito. Vejo filmesda própria Unilever e digo: “MeuDeus, quem aprovou isso?”

JR – Mas, dependendo da óptica, osjovens também podem ser conserva-dores. Quero voltar ao assunto mer-cado de trabalho. A realidade dagrande empresa não é a realidadedo Brasil. Certamente, no Brasil opercentual de pessoas que são em-pregados de empresas médias e gran-des deve ser menor do que 50%. Oque existe, agora, – e o Mário cha-

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mou a atenção no início – é que hámuito mais gente de 60 anos; daquia pouco estarão com 80, saudáveis,capazes. Como essas pessoas serãoaproveitadas profissionalmente?

ALEXANDRE – Quer queiramos ounão, não há emprego para todos.

JR – Não há emprego ou não hátrabalho?

ALEXANDRE – No momento, noBrasil, é a própria atividade produtiva– e acho que a única saída é cres-cimento. Ao estudar as faixas dedesemprego divulgadas pelo IBGE,percebe-se que as faixas mais jovensestão sem atividade profissionalremunerada – seja emprego ou mes-mo como free-lancer, enquantofaixas mais idosas estão em atividade.Esse é um conflito. Quero contar umaexperiência própria quando trabalheiem consultoria. Como em toda em-presa de consultoria, havia o esque-ma de sociedade. Mas houve ummomento de limitação no cresci-mento e ela não conseguia fazer maissócios. Aí, começaram a perder bonsexecutivos. A pessoa pensava: “Sóconseguirei ser sócio quando alguémse aposentar”.

GALASSO – Infelizmente, essa gera-ção dos mais velhos não teve educa-ção. Isso começou com os militares,que partiram para um sistema deeducação em massa. E depois deles,permaneceu igual até hoje – aqualidade do ensino no Brasil épéssima. Essa geração que vai chegaraos 80 – de que o Mário falou – éuma geração que não teve educação.

JR – Eles podem educar-se agora.

GALASSO – Mas a vontade deaprender diminui. O problema ésério. Há alunos que saem do ensinofundamental sem saber ler. Aqualidade do ensino no Brasil estátão ruim, que vai criar problemassérios para as velhices futuras.

JR– Continuo achando que ainda hátempo para se educarem.

GALASSO – Entre num supermer-cado, num restaurante e veja aqualidade do serviço lá dentro.

JR – Nos restaurantes, posso garantirque os garçons mais velhos são bemmais competentes que os jovens.

AMALIA – Na minha visão, essageração mais velha que ocupa asposições de poder – e teve boaeducação – dão valor excessivo aotrabalho, vendo-o como única fontede dignidade possível. Quem colocatodos os ovos em uma só cesta, vaiter dificuldades. A visão que o serhumano tem de si próprio, diante dotrabalho, também terá de ser revista.Prazer, a gente não tira só do traba-lho. Há prazer, sim, em viajar quandose aposenta e digo isso, hoje, com40 anos. Há outras coisas, outrasestruturas a edificar na vida – querseja acadêmica, quer seja um livroque você lançou, uma pessoa quevocê fez crescer, um trabalho volun-tário, ou porque desenvolveu outrasprofissões interessantes – advogadotambém faz teatro. Acho que pre-cisamos abrir mais a cabeça. Não é

porque alguém não tenha trabalho ouemprego que não presta. E é mais umproblema masculino. Nós, mulheres,voltamos para casa a hora quequisermos. Ninguém vai falar mal.Mas o homem que não tem trabalhoé execrado.

FLÁVIO – É como a sociedade trataa pessoa que pára – no Brasil é assim.

GALASSO – Você só pode parar setiver uma renda. O INSS é brinca-deira.

JR – O que a Amalia está dizendo éinteressante – tem a ver, talvez, coma sua formação oriental. Quando euestudava poesia – justamente nessavisão de fazermos várias coisas –estávamos lendo um poema do PauloAlberto/ Arthur da Távola, sobre aimportância do “e”. A vida nãoprecisa ser “ou” isso “ou” aquilo; podeser isso e isso e também aquilo. Nóstodos tendemos a pensar seqüencial-mente: jovem, maduro, velho,produtivo, menos produtivo, aposen-tado. O que a Amália levanta é que,se a pessoa for mais plural, holística,vai durar mais.

AMALIA – Por que vocês acham queestá havendo tanto divórcio, e tantoshomens têm a segunda mulher? Issoé uma forma de atualizar. O segundocasamento, que dá certo. O quequero dizer é que o formato de serelacionar começa a transformar-se,na medida em que essa segundamulher, geralmente mais jovem,

“PARA MIM, VELHO SEMPRE FOI AQUELA PESSOA15 ANOS MAIS VELHA DO QUE EU.” BERNARD BARUCH

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exige uma atualização e outrascoisas que não sejam só trabalho. Parao homem, é algo que ele só estádescobrindo agora: saber que pode,um dia, mandar o chefe dele paraonde quiser, porque vai chegar emcasa e encontrar uma mulher que lhedê suporte.

FLÁVIO – Senti-me citado porquetenho segunda mulher. Concordoplenamente com a Amalia sobre apluralidade do homem. Se ficar sófocado no trabalho, ele tende a tornar-se medíocre. Temos de dar lugar aoutras coisas na vida. Se as pessoasque trabalham conosco sentirem isso,vamos ter um convívio mais feliz.Essa convivência é fundamental,para que o indivíduo não se sintapesado e queira sair da empresa parase aposentar. Talvez, se eu me apo-sentar, escreva um livro. Mas será queescrever um livro não vai me trazersaudosismo? Então é olhar omomento certo para se fazer ascoisas. Tenho um amigo que gostavade jogar tênis e me contou: “Quandoeu trabalhava, jogava tênis, religiosa-mente, quintas e sextas das 8 às 10horas. Hoje, que não trabalho e tenhotempo, não jogo mais”. Pergunteiporquê. E ele: “Sempre deixo paradepois porque agora tenho tempo”.Então é questão de disciplina. Otrabalho não é fim; é meio. A vidapessoal deve vir em primeiro lugar.

ALEXANDRE – Flávio, será que oque você quer dizer não é que as

pessoas deveriam saber a hora deparar? Na semana passada, tivemosuma homenagem ao nosso fundador,Rodolfo Lima Martensen, e uma dascoisas mencionadas na mesa dedebates foi que, em 1974, ele disse:“Preciso parar, deixar a ESPM paraoutra pessoa, senão vou atrapalhar”.

JR – E ele não tinha nem 60 anosainda.

FLÁVIO – O fato de saber parartalvez seja a grande questão.

JR – Será que se trata de parar ou demudar?

FLÁVIO – Mudar.

GALASSO – Quando me aposentei,decidi que iria fazer coisas diferentes:trabalhar em ONGs. Então fui tra-balhar numa associação e achei umaconfusão terrível. Aquilo era algoconstruído para satisfazer egos. Euma coisa triste é que, organizaçõesdesse tipo, vivem do dinheiro dadopara fazer alguma coisa específica.Devia haver a obrigação de darsatisfações às pessoas que contribu-em sobre o que está se fazendo. Nãovi isso em nenhuma delas.

JR – O Flávio fala de escrever comose fosse lazer ou “hobby”. Mas hámuitas pessoas que têm o escrevercomo profissão: escritores, jornalis-tas. E a ONG, também, não precisaser “coisa de aposentado”. Muita

“NÃO PARAMOS DE NOS DIVERTIR PORQUE FICAMOSVELHOS; FICAMOS VELHOS PORQUE PARAMOS DE NOSDIVERTIR.” ROBERTO DUAILIBI

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gente jovem quer trabalhar em ONG.Mas creio que o foco da questão estána mudança.

AMALIA – As pessoas também têmdificuldades para lidar com títulos;pensam que os títulos são elas,acham que o motorista e o carro quetêm são delas. Então, não conseguemmais saber quem são e quem é opersonagem. Acho que a novageração está mais desprendidadesses conceitos. Ao mesmo tempohá preconceito de ambos os lados –tanto os mais quanto os menosexperientes. O jovem chega aomercado de trabalho querendo sergerente sênior inter-galático doplaneta Terra. Ele não quer carregarcaixas, papéis, como a geração an-terior; já quer entrar no topo. Já osmais velhos e experientes acham-seos “donos da cocada preta”: para eleé o carro, a sala, o título – e nãoconsegue viver sem isso.

FLÁVIO – Entrevisto muitas pessoasjovens. Eles vêm “totalmentequalificados”: com MBA, falam in-glês, francês, alemão, espanhol. Aípergunto: “você fala português?” Elesvêm preparados para o mercado, masnão para a vida.

JR – Gostaria de ouvir o Marcos, queestá em recursos humanos, sobre umaquestão aritmética. Dois executivos,na empresa há algum tempo, cadaum ganha um bom salário. Manda-se os dois embora e contratam trêsmais jovens, até mais barato do queos dois mais velhos. Qual é a suaexperiência com esse tipo de coisa?

MARCOS – Eu nunca presencieiisso. Mas há empresa que toma essetipo de decisão, muito mais pelo

lado financeiro. A reengenharia foium movimento que, realmente,procurava eliminar o profissional quecustava muito e produzia pouco.

JR – E há o aspecto legal. Pelas leisbrasileiras, não se pode reduzirsalário. Então qualquer um, aos 85anos, vai ganhar mais que opresidente. Se, na vida real, a natu-reza é cíclica, por que não legalizaruma curva de salários? Se alguém,aos 60 anos, está ganhando umafortuna, poderia passar a ganhar umpouco menos.

GALASSO – E não é só. O custo deempregar é altíssimo. Contrata-se umempregado por R$ 1 mil e o custodele é R$ 2 mil. E demitir também émuito caro. Mas, às vezes, é pre-ferível demitir, arcar com os custos eadmitir alguém mais barato paraaquela função. Isso acontece, énormal.

AMALIA – Nessa questão de su-cessão, sai uma pessoa, hoje, e a queestá imediatamente abaixo já se achapronta. Toma como certo que, se saiuaquela pessoa sênior, ela tem odireito de ficar na posição. Mas nãoé assim. Como houve downsizing,diminuíram os níveis entre as hierar-quias. Então, parece haver umadistância, não só de idade, mas deexperiência, capacitação e vivênciaentre o primeiro e o segundo. Isso estágerando conflitos dentro das empre-sas, que beiram à guerra.

MARCOS – A troca não é tãosimples assim. Olhando sob o as-pecto financeiro, parece vantajosa.Mas não é. A experiência é neces-sária. São anos de experiência dealguém que está sendo trocado por

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nada, por alguém que se julgadetentor de um poder que, naverdade, não tem.

AMALIA – É que a aparência, hoje,conta muito: a eloqüência, comu-nicação, capacidade de persuasão,argüição, argumentação, sedução,propaganda; o marketing tomouconta do sistema.

JR – Não fale mal da nossa pro-paganda e marketing!

AMÁLIA – Estou falando bem; soude marketing. Sei porque estudo isso.Vejo que tem a ver com antropologia,sociologia – as pessoas são treinadaspara fazer entrevistas. E se você nãotiver um critério mais rigoroso, sob oponto de vista abstrato, sério,concreto, compra gato por lebre.

MÁRIO – Os depoimentos queestão sendo dados aqui são brilhantese esclarecedores. Mas acho que estáhavendo uma tônica um poucovoluntarista, no sentido de expe-riência particular, pessoal, daempresa em que estou, o que vejo,observo, como lido com o que vaiou não acontecer. Deixe-me sertambém voluntarista, para sintonizar-me com o debate. Fiquei 38 anos naOlivetti e não fiz carreira; fiquei nomesmo lugar, mas atualizei-meainda mais do que os que fizeramcarreira, inclusive os presidentes. Porisso, é preciso distinguir experiênciade vivência e de idade – como essesfatores se equacionam no problemado trabalho, aproveitamento e dacontribuição que as pessoas podemdar. Vou dar um exemplo: na Oli-vetti, acompanhei o ciclo de uminstrumento de comunicação que foia máquina de escrever. Quando fui

para lá, a máquina era manual;passou a mecânica; depois passou aser elétrica; depois eletrônica e aíveio a informática. No tempo em quefiquei lá, não tinha só que meatualizar; tinha que me transformarnuma pessoa contemporânea de mime dos problemas que me obrigavama atualizar-me. Não basta se atua-lizar; atualizar pode ser um ajustede repertório. É preciso projetar esserepertório em termos dinâmicos –precisa ser contemporâneo do queestá em mudança, e não só do acon-tecimento adquirido e acumulado.Por exemplo, vi pessoas que, noorganograma, tinham nível dediretor, chegaram a presidente, masem termos de contemporaneidade,quando o mecânico passou para oelétrico, aquele presidente ficavaobsoleto. E eu – que estava no mes-mo lugar – era o contemporâneo.Tinha feito da minha experiênciauma experiência desdobrável eprospectiva. Não basta a experiêncianem a vivência do experimentado;há de estabelecer as condições dodevir – daquilo que vem – porque oque está ali já veio com o ingredienteda sua própria morte. A máquinamecânica, quando surge, já estácondenada porque a elétrica já estácorrendo atrás dela e assim pordiante. E a compreensão dos ciclosde vida vai ficando, cada vez, maisestreita. Como hoje o gerenciamentoestreita espaço e tempo. As pessoasnão estão sendo contemporâneas;estão trabalhando com atualizaçõesque já nascem velhas.

AMALIA – O que você está dizendoé importante; o Pelé, uma vez, disse:“O meu sucesso tem a ver com ofato de que eu sempre soube aondea bola ia chegar”.

MÁRIO – Isso é brilhante. Sercontemporâneo não é só compre-ender sob o ponto de vista da minhavivência e experiência pessoais –que são fundamentais – mas sim atendência da contemporaneidade.Qual a tendência da contempora-neidade, em termos de trabalho? Voudar um exemplo. No final do séculoXIX, um trabalhador típico da Europavivia 55 anos; hoje vive 78. O tempodisponível para o trabalho durante asua vida era de 242 mil horas; hoje éde 356 mil. Mas o tempo, efeti-vamente trabalhado, para aquele daEuropa era de 125 mil – praticamente50% era de trabalho; hoje é de 69mil – diminuiu. Então o que fazer?Quando me aposentei, disse: “Nãovou me aposentar; vou redimensionaras minhas aptidões”. Em termos – porexemplo – de ser um professor sem-pre contemporâneo de mim e do meutempo. Aqui tenho que fazer umgesto de gratidão à ESPM porque elatem tido – deliberada, consciente ouinconscientemente – esse senso decontemporaneidade. Tenho 72 anos,e já faz uns 10 que trabalho com 5turmas, todos os dias, pela manhã –salas de 50 adolescentes que aindaestão numa busca de neojuventude.Aí sim, a minha experiência é umaexperiência dinâmica, auto-revisio-nada em que eu mesmo me projeto

“OS VELHOS CRÊEM EM TUDO; AS PESSOAS DE MEIA-IDADESUSPEITAM DE TUDO; OS JOVENS SABEM TUDO.” OSCAR WILDE

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em termos dos resultados daquilo queestou aplicando. Caso contrário, nãoterei condições de dar aula. Quandoas pessoas idosas mantêm ummínimo de saúde física, de trata-mento neuronial – com Viagra ousem Viagra – não encaram a mortecomo uma vizinhança fatal, do pontode vista de produtividade, de atuali-zação e contemporaneidade, nãodevem nada a ninguém. Claro quehá problemas graves sociais, pelosquais passa o país, mas este é oproblema do país. Vai chegar o mo-mento em que não pode haver maisaposentadoria. Não vivo da minhaaposentadoria; ela não dá para pagar,sequer, o condomínio. Mas usando osentido dessa contemporaneidade –que antecipa a experiência e avivência e a projeta no cenário viávele imediato – nesses últimos 10 anos,entreguei-me a isso com convicção,escrevi 5 livros, mudei o método deensino 3 ou 4 vezes – porque semantiver o mesmo método que usavahá 5 anos, perco a legitimidade daminha função. Acho que esseproblema da velhice e da não-ve-lhice tem de ser reformulado, emtermos estruturais e históricos.

JR – Parece que o nosso companheiromais idoso é que está propondo ascoisas mais revolucionárias.

AMALIA – Isso me parece precon-ceito ao contrário.

GALASSO– Temos é que o admirar.Se pensarmos na média da popu-lação brasileira, ele é uma enormeexceção lá em cima e sozinho...

JR – Sim, mas por que não podemoster mais pessoas como o Mário?

MÁRIO – A história leva a isso. Daquia 50 anos, as pessoas de 80 anosestarão vigorosas.

GALASSO – Mas o problema socialé grande. A pessoa chega à aposen-tadoria, hoje, dá graças a Deus quechegou e pode – com aqueledinheirinho – sustentar a família.

MÁRIO – A Amalia comentou queo homem – quando fica viúvo – ten-de a arrumar novos casamentos. Asmulheres casam menos, uma segun-da vez. Isso também é um problemacultural: o excesso de patriarcalismo.Em 2002, de um total de 2.424casamentos de pessoas entre 60 e 64anos, 71% foram de homens e apenas29% de mulheres. No grupo de 65anos ou mais, as proporções foramde 84% para homens e 16% paramulheres. Isso é do IBGE. Diz oditado popular que as mulheresevitam casar duas vezes, por sabe-rem que mudar de marido é apenasmudar de problema. Assim como –segundo a voz do povo – os homensamam com os olhos enquanto asmulheres amam com os ouvidos.Agora, Machado de Assis já dizia:“A pior viuvez é aquela que anula ocasamento, conservando o cônjuge”.A mulher deu um passo muito maiorporque ela vem com uma capaci-dade de contemporaneidade superiorao homem. A partir da década de 60,na hora em que ela saiu e conquistouos direitos... A revolução maisimportante do século XX, para mim,

é a revolução feminina.

AMALIA – Ela não saiu exatamenteporque quis. Meu quinto livro foilançado no dia 8 de março – diainternacional da mulher: “Mulher etrabalho: o desafio de conciliardiferentes papéis na sociedade”. Umdos problemas que fez com que amulher saísse de casa para ir trabalharé porque, a cada 4 segundos, noBrasil, uma mulher é espancada peloseu parceiro. Isso não é só porque elaprecisa sair; ela precisa de indepen-dência financeira para poder viver edeixar o seu algoz para trás. Então, aevolução ou revolução, é quan-titativa e não qualitativa. Seria bomse isso fosse para um crescimentoespontâneo, porque o mercadoprecisa de mão-de-obra feminina,mas não é o que está ocorrendo; é anecessidade ensinando o sapo a pularda pior maneira possível.

ALEXANDRE – Quero destacar oque o Mário disse sobre o sucessoque está tendo com as turmas maisjovens, porque acho isso realmenteemblemático: a capacidade do serhumano de se renovar. Já vi profes-sores bem mais jovens não tendosucesso e outros que tiveram. Amesma coisa com professores maisvelhos. A idade cronológica temcada vez menos correlação com acapacidade da pessoa. Já vi execu-tivos de multinacionais brilhantes emedíocres; e isso nada tinha a vercom tempo de casa. A sociedade tem

“NA VIDA, CHEGAMOS DESPREPARADOS AQUALQUER IDADE.” BERTHE MORISOT

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que estar alerta para isso, porque aspessoas vão continuar trabalhando,desde que possam. E embora sejaverdade que, tirar toda a satisfaçãodo trabalho não é saudável, tambémé verdade que uma atividadeprodutiva é muito satisfatória – é algoque dá prazer para a pessoa. Outroponto é que não se consegue,mesmo, viver da aposentadoria. Ageração que está se aposentando éuma geração que não tinhaconsciência disso, há 40 anos... Hoje,pessoas de 20 anos já aplicam no seuFundo de Previdência. Então, não sepode simplesmente dizer: “Sintomuito. Tocou o sinal e você terá desair do mercado”. As pessoas, muitasvezes, não têm alternativa. E, dooutro lado, temos gente querendoatividade produtiva remunerada epressionando. É um conflito. Continuodizendo que a saída é o crescimentoda economia. Se não houver cresci-mento econômico, o conflito tendea acentuar-se. À medida que houvercrescimento, conseguir-se-á limitaressa problemática.

GALASSO – Em vista dos problemasque começa a causar a quantidadede pessoas mais velhas – as em-presas começam a ter regras, comoa de expulsar qualquer executivo aos60 anos. Isso é uma realidade domercado.

JR – Só que há de lembrar que, omercado não é constituído só porempresas. O resto da economiaeventualmente absorverá as pessoasque saem das empresas...

GALASSO – Mas as empresasbuscam essas substituições constan-temente; não adianta fugir da rea-

lidade.

JR – E estão ficando cada vez menoseficientes, cada vez mais são com-pradas, “fusionadas” com outras,perdendo sua identidade...

AMALIA – A somatória de gente dáuma empresa; a somatória de em-presas dá um país. O país está bem?Não. Significa que nem as pessoasnem as empresas estão bem. Signi-fica que temos de olhar outraspossibilidades, não só a do cresci-mento de dois dígitos; começa antes– com a área de Recursos Humanos,fortemente apoiada sob a questão decompetência técnica e pessoal.Fazem avaliação de desempenhonas empresas em todo mundo éexcelente e extra-excelente, mas osresultados estão péssimos há 10 anos.E as empresas, nas reuniões, falamdois segundos sobre as suas forças e,depois, sobre todas as áreas queainda têm de ser desenvolvidas. Quetal se começássemos a olhar noBrasil – como acontece, em algunscasos – a partir de suas fortalezas?Contrata-se um vendedor, no Brasil,e diz: “Você tem de falar inglês”,quando ele mal fala o português. E,durante dez anos, a empresa critica,na avaliação de desempenho,dizendo que o inglês dele é sofrível.Como ele vai conseguir? Isso é pedira alguém o que ela não pode dar.Para mim, pessoas vêm primeiro.

JR – Acho que são temas que sejuntam ao nosso: dos velhos e dosmoços. Falou-se sobre atualização.Mas atualizar em quê? Será que nãoseria mais uma questão de convívio?Como é que vamos encontrar cami-nhos para o convívio desses grandes

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contingentes de pessoas mais velhascom os igualmente grandes depessoas mais jovens.

FLÁVIO – A contemporaneidade doMário Chamie é a atualização; osmais velhos conviverem, hoje, coma velocidade da informação. Isso jáé uma grande atualização.

JR – Mas não do conhecimento. Ainformação é muito rápida e o conhe-cimento quase nulo.

FLÁVIO – Dêem-me um break de15 segundos para um comercial. Tra-balho numa agência descrita assim,no Caderno Propaganda & Marketingde hoje: “DPZ é um fenômeno”; cujosdonos têm mais de 70 anos. Eu, aos62, sou o principal executivo daagência. Mas a agência está emconstante renovação. Já construímosvárias marcas nesse país – uma delas

foi a Olivetti – e digo que nós somosas verdadeiras marcas, no mercadohoje. E uma marca tem de serconstantemente renovada. Casocontrário, morre. É a atualização erenovação constante diante de tudoque está acontecendo. Quando oMário Chamie fala que tem 72 anose dá aula nesta Escola, ele saberá,olhando no olho do jovem, se equando deverá mudar – ou não. Issoé a renovação constante que temosde ter. Quarenta mil reais não setrocam nem por dois de vinte.

AMALIA – Tudo isso tem a ver como que pensamos que somos versus oque as pessoas vêem na gente.Temos alguns momentos desfocados– o que pensamos que estamospassando para o outro, mais ou me-nos como as marcas. Há dissonânciacognitiva. Muitas vezes, achamosque estamos fazendo algo, mas o

mercado não está vendo assim.Achamos que nos atualizamos, maso mercado não está vendo assim;que estamos jogando um bolão enão estamos. Para mim, aí sim,Aristóteles e todos esses filósofos,que amo de paixão: Conheça-te ati mesmo, primeiro, mas a partirdo interesse do outro. O ego-centrismo gera uma sociedadeindividualista, interessada só emmostrar que é melhor do que ooutro, gerando competitividade enão uma concorrência leal. Asempresas estão vivendo essesconflitos entre os jovens e os maisexperientes, porque estão com-petindo ao invés de se juntar. Nãoconseguimos ainda fazer asso-ciações dentro do mercado detrabalho porque existem agendassecretas. Todo mundo tem duas, trêsagendas escondidas; ninguém falaa verdade, falta transparência. Omundo corporativo das empresas emgeral é um mundo cão. Então – porconta disso – ainda acredito queconhecer a si mesmo, quais são seusvalores e tentar ver no outro como

“NÃO FORAM OS ANOS QUE ME ENVELHECERAM.FORAM MINUTOS...” CASSIANO RICARDO

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você pode ajudar, é a única esca-patória que temos para sair dessemarasmo.

GALASSO – Atualização é pro-blema de cada um. Treinamentopessoal pode-se dar a qualquerpessoa; sabendo do que ela precisa,a pessoa pode até melhorar. Mastambém é decisão de cada um. Sevocê não quiser se treinar e achaque é o melhor do mundo, e nãoolhar para dentro e não fizer umaauto-análise constante do que se é,onde se está e onde se quer chegar,você nunca vai se atualizar. Sóvocê pode fazer isso por você.

MÁRIO – Talvez a fórmula queresuma tudo isso seja: cada um denós e a sociedade em que vivemosprecisam ser contemporâneos de sipróprios – nós contemporâneos denós mesmos e a sociedade contem-porânea dela mesma. Aí a atualiza-ção é prestativa e tem vida. Isso éaté uma forma de sabedoriapopular. Na cidadezinha de Cajubi– onde nasci – há uma pessoa que

é o sábio do lugar – o velho daaldeia – e que está com a visãomais atualizada porque é o únicoque está refletindo sobre asmudanças e as perspectivas demudanças e sempre impedindo queas coisas se engessem. Usandouma palavra às vezes perigosa: quenão vire um sistema fechado nelemesmo, um ferrolho sistêmico. Essesenhor de Cajubi disse, certa vez:“Todos nós precisamos ser pres-tativos, todos nós temos que ter esseconvívio – do velho com o jovem,do maduro com aquele que está emcrescimento. Sendo prestativo,você interage, cria e modificahorizontes. Senão, meu caro, acoisa se resume a isso: ou o sujeitopresta ou é sistemático”.

GALASSO – Quando você olha, noBrasil de hoje, um presidente quediz que nunca estudou na vida,

nunca se preocupou em se atualizare chegou à presidência – tornou-seexemplo para o resto do Brasil. Aívem o Severino Cavalcanti e falaesse monte de besteira. Vivemosuma realidade que puxa para o ladocontrário de tudo que falamos aqui.O país está vivendo um período demediocridade e nós estamos acei-tando essa mediocridade de umaforma feliz, risonha e satisfeita.

JR – Diante da heterogeneidadedas contribuições, ficou difícilencerrar com um resumo dodebate... Mas vou aproveitar oexemplo do Mário e ler para vocêsduas citações: “A idade é algo quenão tem importância a não ser quevocê seja um queijo”, (BillieBerke). “As pessoas se assemelhamaos vinhos. A idade estraga os mause melhora os bons”, (Marie Ebner-Eschenbach). Muito obrigado. ESPM

“JOVENS GUIANDO JOVENS SÃO COMO CEGOSGUIANDO CEGOS.” LORD CHESTERFIELD

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Case-Study Banco Real

NÃO TENHO TEMPOPARA ENVELHECERAutor: Senhor Arlete Sacramento

A única diferença entre o personagemlendário e eué que não vendi a minha alma ao diabo.Mas, eu também não envelheci!Sinceramente, se me perguntarem minhaidade,eu não saberei dizê-la.Sou tão feliz por fazer tanta coisa,que o tempo passa por mim sem que eusinta.– É a brisa que bate em meu rosto e segueseu caminho.– É o infinito azul que me inspira e esqueço

o ontem e o amanhã.Não tenho tempo para envelhecer!Experimente, não fique aí parado lamentando-se,esperando que a vida passe!As rugas, qual chibatadas, vincarão seu rosto!Vamos, sorria um pouco...– Goste de você mesmo...– Sonhe com o próprio sonho...– Ame com amor...– Erga os braços – realize alguma coisa.EU NÃO TENHO TEMPO PARA ENVELHECER.Quando meu rosto disser que tenho cem anos,não acreditem, porque minha alma é umaeterna juventude.EU NÃO TENHO TEMPO PARA ENVELHECER!

Este case foi elaborado por Rosilene M. A. Marcelino, sob a

orientação do professor Ivan Pinto, com base em entrevista e

informações cedidas pelo Banco Real.

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Rosilene Marcelino

Em 2004, durante a cerimônia depremiação da 6

a edição do Concur-

so Banco Real Talentos da Matu-ridade, a atriz Carmem Silva recitoueste poema em tom de entusiasmo,de convite à vida, de convite a umanova percepção da maturidade.

O Concurso Banco Real Talentos daMaturidade, idealizado pelo BancoReal, acredita nessa nova per-cepção. Desde sua primeira edição– realizada em 1999, em come-moração ao ano internacional doidoso – o projeto busca a valoriza-ção e reintegração da terceira idadena sociedade por meio do reco-nhecimento de seu talento e de suasabedoria.

A publicitária Christina Carvalho Pinto conceituou em um artigo queescreveu para a revista Exame, que, marca-cidadã é aquela que“expressa a sua cidadania de forma contínua, contribuindo para amelhoria da qualidade de vida da comunidade interna e externa”.

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Case-Study Banco Real

A CONTINUIDADEDO PROJETO

O CONCURSO BANCO REALTALENTOS DA MATURIDADE FOIPENSADO PARA TER APENAS UMAEDIÇÃO. MAS, DADA AREPERCUSSÃO E EMOÇÃO NAENTREGA DOS PRÊMIOS EM 1999, OPRESIDENTE – FABIO BARBOSA –DECIDIU A CONTINUIDADE DOPROJETO, TORNANDO-O ANUAL.

CONCURSO BANCOREAL TALENTOS DAMATURIDADE –MISSÃO

“CONTRIBUIÇÃO DA INICIATIVAPRIVADA NA CONSTRUÇÃO DE UMASOCIEDADE QUE VALORIZA OSIDOSOS, ATENDENDO A ASSEMBLÉIAMUNDIAL DO ENVELHECIMENTO(ONU, 2002), PARA RESPONDER AOCRESCENTE AUMENTO DAPOPULAÇÃO MUNDIAL COM MAISDE 60 ANOS.”

Para alcançar seu propósito, oprojeto estimula a expressão dotalento e da criatividade daspessoas com mais de 60 anos,fomenta a reflexão e a consciência

CATEGORIAS

Participantescom mais de60 anos

Incentivar a produção e amemória cultural, valorizandoa criatividade, o potencialartístico e ampliando a parti-cipação social

Provocar uma reflexão aca-dêmica sobre questõesrelacionadas ao envelheci-mento, traçando parâmetrospara a construção de umasociedade mais justa (parti-cipantes com nível superiorcompleto ou em curso)

Identificar e estimular tra-balhos de qualidade direcio-nados à população idosa

ARTES PLÁSTICAS

MÚSICA VOCAL

LITERATURA (CONTOOU POESIA)

CONTADOR DEHISTÓRIA

MONOGRAFIA

PROGRAMASEXEMPLARES

OBJETIVOPÚBLICO -ALVO

Participante dequalquer idade

acadêmica sobre o envelhecimento,identifica, proporciona visibilidadee dissemina programas realizadosem benefício dos idosos.

Atualmente, o concurso possuiseis categorias – quatro delasabertas a pessoas com 60 anos oumais: artes plásticas, músicavocal, literatura (conto e poesia),contador de histórias; e duasdelas abertas a pessoas de todasas idades: monografia eprogramas exemplares. Aavaliação de todos os trabalhospassa pelo crivo de uma comissãode especialistas em cada área,composta por membros derenome no cenário cultural ,art íst ico e/ou gerontológico.Para garantir a imparcialidadedos votos, os nomes dos juízessomente se tornam públicos apósa definição dos vencedores. Oscinco melhores trabalhos decada categoria são eleitos emordem de igualdade e ospremiados recebem um troféu eR$ 7.000,00.

EVOLUÇÃO DAS INSCRIÇÕES

2000 2001 2002 2003 2004Fonte: Banco Real 04/2005

1999

5.4894.390

15.33916.888

18.21918.854

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Rosilene Marcelino

Como resultado da transparência eseriedade com que o ConcursoBanco Real Talentos da Maturidadeé conduzido, o número departicipantes cresce a cada edição,acumulando em sua trajetória maisde 80 mil inscrições.

Mais do que acumular e superarnúmeros, o Banco Real procuradesenvolver uma relação estreita ede longo prazo com os participantesdo concurso; e também deaprendizado.

É o caso do Sr. Henrique Lessa queparticipa do Concurso Banco RealTalentos da Maturidade desde o seulançamento: “um dia minha esposachegou com o folheto do concursoe fiquei empolgado”, recorda-se.

EVOLUÇÃO DA BASE DE CLIENTESATENDIDOS PELO BANCO REAL EEMPRESAS ABN AMROBASE DE CLIENTES (MILHÕES)

9,28,3

7,16,86,2

Dez 00 Dez 01 Dez 02 Dez 03 Dez 04

Fonte: Banco Real - 05/2005

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Case-Study Banco Real

É o caso do Sr. Henrique Lessa, que participa doConcurso Banco Real Talentos da Maturidadedesde o seu lançamento: “um dia minha esposachegou com o folheto do concurso e fiqueiempolgado”, recorda-se. Quatro anos maistarde, em 2003, foi vencedor na categorialiteratura com o texto “O Andante”. E hoje, eleafirma – com entusiasmo – que continuaráparticipando de outras edições do concurso,porque acredita nele e no estímulo à auto-estima que proporciona.

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Rosilene Marcelino

Quatro anos mais tarde, em 2003,foi vencedor na categoria literaturacom o texto ‘O Andante’. E hoje, eleafirma – com entusiasmo – que con-tinuará participando de outras edi-ções do concurso, porque acreditanele e no estímulo à auto-estima queproporciona.

Chegar a um vínculo como este é oresultado de muito trabalho e muitadisposição para a mudança.

O Concurso Banco Real Talentos daMaturidade é hoje um dos maisimportantes projetos do banco. Éuma iniciativa pioneira que refletea liderança de uma organização empleno crescimento.

Nos últimos anos, o Banco Real temcada vez mais se posicionado comouma organização que se pauta pelaresponsabilidade socioambiental epelo desenvolvimento sustentável.Exercendo sua visão de negóciocom responsabilidade, transparên-cia, diálogo e resultados em bene-fícios dos acionistas, funcionários ecomunidade.

A publicitária Christina CarvalhoPinto conceituou em um artigo queescreveu para a revista Exame, quemarca-cidadã é aquela que “expres-sa a sua cidadania de forma con-tínua, contribuindo para a melhoriada qualidade de vida da comu-nidade interna e externa”. Ela tam-bém defendeu que a personalidadesocial da empresa deve ter umamotivação legítima, em sintoniacom os valores internos da empresae com o desejo sincero de beneficiara comunidade.

O Banco Real tem procuradosedimentar – de dentro para fora –a crença de que valores humanos eeconômicos podem caminharjuntos.

“ACREDITAMOS QUE É POSSÍVELCONSTRUIR UM CAPITALISMO MAISHUMANO E INTEGRADOR, EESTAMOS FAZENDO UMA PROFUNDATRANSFORMAÇÃO EM NOSSAGESTÃO PARA ATINGIR ESSEOBJETIVO. NOSSA VISÃO DENEGÓCIOS BUSCA UM MAIOREQUILÍBRIO ENTRE O LUCRO, ASPESSOAS E O PLANETA”.

Dentro da organização, em 2001, foicriada a Diretoria Executiva deResponsabilidade Social, hojedenominada Diretoria Executiva deEducação e Desenvolvimento Sus–tentável, com o objetivo de dis-seminar uma nova cultura e mobilizaros mais de 28.000 funcionários paraesse novo olhar. Mas essa área temprazo para acabar. Isso porque, nofuturo, o banco acredita que essa novaatitude não será o foco de apenas umdepartamento, mas de toda aorganização. À medida que a cons-cientização interna é enraizada, ascampanhas publicitárias avançam.Desde a primeira campanha, quandoreposicionou sua marca em janeirode 2000, a Diretoria de Estratégia daMarca & Comunicação Corporativavem refletindo os valores da orga-nização (respeito, profissionalismo,integridade e trabalho em equipe),também de dentro para fora, eassim estimulando o processo deconstrução da Identidade do ABNAMRO REAL, estabelecendo umanova proposta de relacionamentocom todos os stakeholders damarca e aumentando de forma

significativa sua atratividade entre osnão clientes.

CAMPANHASPUBLICITÁRIAS

CONSTRUINDO UM BANCO CADAVEZ MELHOR PARA VOCÊ (2000)O BANCO DE SUA VIDA (2001)FAZENDO MAIS QUE O POSSÍVEL(2005)

Várias iniciativas são desenvolvidaspara concretizar a cultura nas de-cisões e ações, como, por exemplo,

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o Programa de Valorização daDiversidade – que parte da premissade que “diversos somos todos” e doValor Corporativo de “respeito”.

PROGRAMA DEVALORIZAÇÃODA DIVERSIDADE

DIFERENÇAS PRECISAM SERRECONHECIDAS, RESPEITADAS EVALORIZADAS

Uma parte da estratégia desseprograma destaca alguns grupospara os quais são desenvolvidasações específicas, como pessoascom necessidades especiais,

mulheres, afrodescentes e pessoascom mais de 45 anos. Um dosexemplos de ações voltadas parapessoas com mais de 45 anos é oFórum de Valorização da Maturi-dade, que se estruturou com opropósito de ser um articulador dasdiferentes ações que a organizaçãojá desenvolvia, estimulando a

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Rosilene Marcelino

reflexão e adequação de práticas,processos e produtos para oadequado atendimento àsnecessidades desse público. Criadoem agosto de 2003, esse fórumconta com o envolvimento derepresentantes de algumas áreas dobanco (Recursos Humanos, Edu-cação, Desenvolvimento Susten-tável, Comunicação, Estratégia daMarca & Comunicação Cor-porativa, Segmentos, Produtos eDistribuição) e com a consultoraLaura Machado.

A razão de se estudar esse segmentoocorre em detrimento ao “cresci-mento dessa parcela da populaçãoem todo o mundo, a falta deprodutos e serviços adequados paraatender esse segmento, a falta deinformação sobre os hábitos eatitudes dessas pessoas e a própria

FUNCIONÁRIOS

RH

EDUCAÇÃO

COMUNIDADE

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

ESTRATÉGIA DE MARCA & COMUNICAÇÃO CORPORATIVA

FUNCIONÁRIOS

ESTRATÉGIA DA MARCA & COMUNICAÇÃO CORPORATIVA

PRODUTOS

SEGMENTOS

COMERCIAL VAREJO

- Programas Vida Nova na Aposentadoria- Abordagem educacional- Comunicação Interna- Holandaprevi (programa de previdência)

- Banco Real Talentos da Maturidade- Programa de voluntariado corporativos

- Fortalecimento do posicionamento- Adequação de produtos, abordagem- Manutenção e crescimento da base de clientes- Capacitação Rede e Canais de Relacionamento- Inclusão de matérias educativas nos canais decomunicação

ignorância e preconceitos sobre otema”.

Partindo desses pressupostos, foirealizada uma pesquisa em parceriacom duas empresas privadas quepermitiu delinear um panorama damaturidade embasado em algumasetapas: entendimento das infor-mações disponíveis e identificaçãodos principais gaps, subsídio para aelaboração de um questionárioqualitativo.

A equipe saiu a campo e realizou1.800 entrevistas com pessoasacima de 60 anos distribuídas nascidades de São Paulo, Rio deJaneiro, Belo Horizonte, Curitiba,Porto Alegre, Salvador, Recife,Fortaleza, Belém, Goiânia e Brasília.

Este trabalho garantiu a separação

do que era apenas uma impressãodo que era realidade para os idosos:

❖ 70% são responsáveis pelodomicílio

❖ 85% têm renda pessoal

❖ 47% são os principais res-ponsáveis pelas compras da casa

❖ 74% não fazem e nem queremfazer trabalhos voluntários

❖ 92% raramente ou nuncafreqüentam bailes da terceira idade

❖ 59% vão ao banco a cada 15 diasou uma vez por mês

❖ 44% consideram um abor-recimento ir ao banco, contra 43%

PRINCIPAIS PROJETOS PROPOSTOS

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Case-Study Banco Real

que consideram um prazer ir aobanco porque é uma atividade quedistrai

❖ 54% julgam todos os bancosiguais, contra 35% que consideramque são bem diferentes

❖ 26% têm a confiança como fatorfundamental para abrir uma conta

ou trocar de banco

❖ 28% trocariam de banco seencontrassem tarifas mais baratas

❖ Para 43%, o atendimento (aten-ção, educação, cortesia) é umatributo importante

❖ 20% usam computador, sendoque 71% para navegar na Internet e

acessar bancos (59%), e-mail (46%),pesquisas, notícias, bate-papo

❖ 46% não se atrapalham com asmáquinas do auto-atendimento

❖ Acreditam que produtos e serviçospensados para pessoas com mais de60 anos devam ser classificadoscomo ‘terceira idade’ (40%), Idoso(22%), maturidade (14%)

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Rosilene Marcelino

O resultado dessa pesquisa permitiuo alinhamento e desenvolvimento deprojetos e propostas. Por exemplo,as áreas de Recursos Humanos eEducação estão readequando oprograma de preparação paraaposentaria, existente desde 1999;algumas questões do programa dePrevidência Privada Holandapreviforam revistas; houve a inserçãodessa questão nos programas edu-cacionais e na comunicação já estáem desenvolvimento, entre outrasações. Para a comunidade, as áreasde Desenvolvimento Sustentável eEstratégia da Marca & ComunicaçãoCorporativa colocaram foco novoluntariado, tornando possível aparticipação de funcionáriosaposentados no programa devoluntariado corporativo e noaprimoramento do Concurso BancoReal Talentos da Maturidade. Por fim,as áreas de Estratégia da Marca &Comunicação Corporativa, Produtos,Segmentos e Comercial Varejo têmtrabalhado no fortalecimento doposicionamento, adequação deprodutos e abordagens, manutençãoe crescimento da base de clientes,na capacitação da rede e canais derelacionamento, na adequação dacomunicação e na inclusão dematérias educativas nos canais decomunicação.

Fica evidente que o Concurso BancoReal Talentos da Maturidade faz partee é resultado de um universo muitocomplexo. Ano a ano, o concurso éaprimorado, refletindo todo oprocesso de aprendizagem da orga-nização. A edição corrente, porexemplo, inseriu a categoria ‘Con-tador de Histórias’ para democratizarainda mais a participação noconcurso.

A mesma atenção dada à terceiraidade é dispensada pelo banco apessoas (físicas e jurídicas) emoutras fases da vida e em diferentesníveis financeiros. Cada segmentoexige atenção e desmembramentoem outros projetos e produtos coma mesma profundidade dada aosidosos: o Micro-crédito (créditooferecido a micro-empreendedoresde regiões carentes de São Paulo,como a favela de Heliópolis); oFundo Ethical (fundo de rendavariável com carteira composta porempresas de potencial financeiro,mas que tenham compromissoscom a governança corporativa,meio ambiente e responsabilidadesocial); a Política de RiscosAmbientais (inclui aspectossocioambientais na análise deconcessão de crédito); os ProdutosSocioambientais (linha de créditoespecial para apoiar clientes emações voltadas para o desen-volvimento sustentável); o RealUniversitário (garante atendimentodiferenciado a estudantesuniversitários); os serviços VanGogh (voltados para clientes-altarenda).

O objetivo do Banco Real – “estarsempre ao lado do cliente, desde oinício de sua vida financeira atédepois de sua aposentadoria” –torna-se um desafio diário.

QUESTÕES PARADISCUSSÃO

O Banco Real trabalha conti-nuamente o posicionamentode sua marca como ativo

estratégico e na gestão do processo

de geração de valor, presente efuturo, para seus stakeholders. Quaisatributos do micro e macroambien-tes podem contribuir para que osprocessos de geração de valor sejamotimizados?

A segmentação de mercadocolabora na customização eassertividade das estratégias

empresariais. Ao eleger uma vastagama de públicos-alvos, o BancoReal não corre o risco de ter muitosposicionamentos e enfraquecer osvínculos com a marca?

A trajetória do Banco Realmostra muito empreendi-mento na disseminação da

cultura da empresa entre os funci-onários. Mas o turnover, claro, éuma realidade para qualquer em-presa. Dessa maneira, que açõespodem proporcionar uma rápidaabsorção dos princípios dainstituição?

O Concurso Banco Real Ta-lentos da Maturidade de-monstra pioneirismo a cada

edição. Quais inovações podemainda ser sugeridas?

Fontes:ABN AMRO RealPortal Exame:http://portalexame.abril.com.br/

AGRADECIMENTOS:Fernando Byington E. Martins –Diretor Executivo de Estratégia daMarca & Comunicação Corporativa.Rodrigo Villaboim – Coordenadordo Concurso Banco Real Talentosda Maturidade.1

2

3

4ESPM

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SumárioEXECUTIVO

O mundo novoda maturidadeLUIZ EDMUNDO PRESTES ROSA

pág. 10

Uma verdadeira revolução vai mu-dar a sociedade e a economia mun-dial. A expectativa de vida vem seelevando, globalmente, e, o contin-gente dos mais idosos vai, em breve,superar o dos mais jovens. Já alcan-çamos 600 milhões de pessoas commais de 60 anos e, em 2050 chega-remos a 2 bilhões. Ao mesmo tem-po o idoso se transforma e ganhaum novo perfil. Passa a almejar umaaposentadoria mais ativa e exigente,com melhor equilíbrio entretrabalho, lazer e realização. Essenovo mundo, maduro, vai provocarexpressivas mudanças em nossasformas de pensar e agir, abrangendoa educação, a família, o consumoe a gestão empresarial. As oportuni-dades já estão aí para quem estáaberto à imaginação e ousadia.

Sonhos e lembrançasFRANCISCO GRACIOSO

pág. 22

O artigo trata do passado e do

futuro, na construção do presentedas organizações. Segundo o autor,isto significa que, do passado vêma experiência e os recursos acu-mulados, os valores organizacionaise o espírito de missão. Do futuroextraímos os nossos objetivos edesafios. Mas, o que realmente im-porta é o presente – seus problemase oportunidades. O autor cita váriosexemplos em abono de sua tese,como os estudos sobre a compe-titividade das nações, organizadopelo World Economic Forum, e o fiminglório da AT&T, gigante americanodas telecomunicações. Finalmente,o artigo trata de problemasespecíficos do ensino superior, e daESPM em particular, na formação dejovens destinados a assumir cargosde liderança nas empresas. Nestecontexto, a nova natureza domarketing e a nova abrangência dascomunicações com o mercado sãoestudadas e conceituadas.

Velho, essedesconhecidoMARIA AUGUSTA BLECHER

pág. 36

Chinelo e pijama? Nem pensar.Quem ainda acredita nestes este-reótipos da terceira idade precisarever os seus conceitos. Com renda

atraente, tempo disponível e umaexpectativa de vida cada vez maior,os idosos constituem um dos maispromissores segmentos para a cria-ção de novos produtos e serviços.Nunca, em outra época, tantosnegócios e oportunidades se dirigi-ram para esta faixa etária que temsido apontada como o grande nichode mercado do futuro. Mesmo ass-im, este universo – representadopela população que passou dos 60anos de idade – está apenas come-çando a ser desvendado. Conhecermelhor a turma da “melhor idade”é o primeiro passo para conquistare comprovar o grande potencialdeste público especial e diferen-ciado.

Velho: o novo hitda sociedade doconhecimento

RICARDO GUIMARÃES

pág. 50

A Sociedade Industrial supervalo-rizou o jovem porque seu principalindicador foi a produtividade, quedependia, essencialmente, das pes-soas que trabalhavam nasmáquinas. Daí, transformou-se ajuventude, fase da vida em queestamos fisicamente mais aptos,

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Orivaldo O. Gallasso

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ESPM

num juízo de valor.

Hoje, na Sociedade do Conhe-cimento, percebe-se a urgência derever esse padrão. As máquinasestão automatizadas; a informaçãotornou-se commodity.

É mais verdadeiro do que nunca oaviso que as corretoras de valores eos fundos de investimentos são obri-gados a estampar em seus anúncios:Performance passada não é garantiade resultados futuros. Mas o quedeixa uma pessoa ultrapassada é acerteza do aprendizado passado e,conseqüentemente, a falta de aber-tura para as perguntas. Logo, são osmais velhos que têm mais chancede dar uma contribuição de valorpara a sociedade atual.

Maturidade talvez seja a palavraque melhor sintetize e defina a ca-rência de nossa época e a virtudeesperada de qualquer pessoa, nãoimporta a sua idade, em posição dedecidir alguma coisa.

O último diaALEXANDRE MATHIASMARCO DALPOZZO

pág. 54

Neste conto os autores falam sobreas reflexões do último dia de umpoderoso presidente de uma grande

empresa global. A história narra osmedos que afloram da perda depoder repentina que ocorre nas vidasdessas pessoas. Em um diálogofranco, José Carlos Benvenuti falade seus medos, seus anseios e desuas dúvidas. Um homem poderosoe de fácil acesso aos poderososmostra toda sua humanidade quandose depara com a dura realidade doúltimo dia.

Criando real valor paraclientes. Três modelosde valor comprovados.

NEIL RACKHAMJOHN DEVINCENTIS

pág. 74

A força de vendas está, ainda, nosestágios primários de uma grandetransformação. Os profissionais devendas persuasivos, os conhecidos“tiradores de pedidos”, que eram osmodelos de sucesso no passadoestão fadados à extinção se não setornarem mais estratégicos. A estra-tégia antes exclusiva dos “marke-teiros”, hoje é um fator de sucessoque permeia todas as áreas de umaempresa, e, em especial, a área devendas para o fornecedor e decompras para o cliente. Este artigoilustra como repensar a estratégiade segmentação de clientes e como

atuar, de forma eficaz, entre eles,não apenas captando valor, maspassando para o estágio de criarvalor.

Anúncios honestosJ. ROBERTO WHITAKER PENTEADO/BEATRIZ PENTEADO

pág. 88

Critica-se, freqüentemente, apropaganda por uma suposta – masnão comprovada – desonestidade.Embora haja registro de muitoexagero – e algumas distorções –ao longo da história antiga dapropaganda, os publicitários dehoje sabem que a honestidadecostuma ser, a longo prazo, amelhor estratégia de comunicação.De qualquer modo, a Revista daESPM decidiu perguntar, a trêsdezenas de profissionais do ramo,quais são os anúncios e campanhasmais “honestos” de que serecordam. Os resultados foraminteligentes, instigantes e, às vezes,surpreendentes. Algumas campa-nhas clássicas foram lembradas:Avis Nº 2, Volkswagen, Natura,BomBril, Valisère. E algumas sur-presas, já caídas no esquecimento:Skippy Peanut Butter, Ohrbach´s,Ponto Frio, Kolynos e Cilion.

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AbstractsENGLISH

The new world ofmaturityLUIZ EDMUNDO PRESTES ROSA

pagE 10

A real revolution is about tochange society and the worldeconomy, as life expectation rises;and soon there will be many moresenior than junior citizens-worldwide. There are, already, 600million people over 60, and, by2050, there will be 2 billion.

The profile of senior citizens alsochanges fast: they long for moreactive retirement, where restinterchanges with meaningfulwork. This new, mature world willinfluence everybody’s way ofthinking and acting, and it willencompass school, family,consumption and management.There shall be many opportunitiesfor those who are open toimagination and daring.

Dreams andremembrancesFRANCISCO GRACIOSO

pagE 22

This article deals with the past andthe future, insofar as theyinfluence the present oforganizations. The author thinksthat experience, resources,corporate values and the sense ofmission are to be found in thepast. The future providesobjectives and challenges. But allthat really matters is the present –in the form of problems andopportunities. He goes on to quoteseveral examples to support histhesis, such as the studies on thecompetitiveness of nations, madeby the World Economic Forum,and the inglorious end of AT&T,the fallen giant oftelecommunications. The articleends dealing with specificproblems of the university, andparticularly of ESPM, to prepareyoung people to tackle positionsof leadership in their profession. Inthis context, the new nature ofmarketing, and the new width ofmarketing communications arepresented and discussed.

This unknowncharacter: the agedMARIA AUGUSTA BLECHER

pagE 36

Slippers and pajamas? Don’t eventhink of it. If this is your idea ofwhat the “third age” means, youmust change it fast. With moneyto spend, and time to do it, thesesenior folks know that they maylook forward further than anygeneration before them. And theyare sure to buy, to consume, andto make up a very desirablesegment for the marketing of newproducts and services. Neverbefore, so many businessopportunities pointed to this agegroup as the market segment ofthe future. This universe is onlynow being discovered. To know itbetter is just the first step towardthe discovery of an untappedpotential for growth.

The knowledgesociety´s new hit: theelderlyRICARDO GUIMARÃES

pagE 50

Industrial Society has overvaluedyouth as it looked at them asproducers of machine-made goods.In this respect, they did performbetter than their elders. However,

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Orivaldo O. Gallasso

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ESPM

in our Knowledge Society, it isurgent to reconsider this approach.Machines are operated by robots,and information is the generalcommodity. Now, more than everbefore, the warning made byfinancial companies is true: pastperformance is no guarantee offuture results. Nothing renders aperson more obsolete than thecertainty that past learning is thekey to knowing all the answers. Inthis context, the older may knowthe right questions to ask, in orderto contribute to today’s society.Maturity may be the word thatbest conveys the needs of ourtime, and the one virtue that mayenable anybody to pick andchoose, no matter what his age is.

The last dayALEXANDRE MATHIASMARCO DALPOZZO

pagE 54

This is a tale about the last day inthe job of the CEO of a largeglobal corporation. It is a tale ofthe fears that overcome him, withhis sudden loss of power. In acandid dialogue, José CarlosBenvenuti speaks about his doubts

and anxieties. This powerful menamong the powerful shows all hishumanity when confronted withthe harsh reality of the last day.

Creating real value forclients. Three provenvalue methods.NEIL RACKHAMJOHN DEVINCENTIS

pagE 74

Sales forces are still in the primarystages of a big transformation tocome. The professionals ofpersuasive selling – the well –known “order-takers”, a model ofsuccess in the past, are nowdoomed to extinction, unless theybecome more strategic. Strategy –formerly an exclusive feature of“marketers” now is a successfactor permeating all corporateareas, and specially sales tosuppliers and purchasing toclients. The article shows how tomanage the strategies of customersegmentation and not only toincorporate value, but toeffectively evolve to the stage ofcreating it.

Honest adsJ. ROBERTO WHITAKER PENTEADOBEATRIZ PENTEADO

pagE 88

Advertising is frequently criticised for itsassumed – but unproved – dishonesty.Although it is guilty of frequentexaggeration and some distortions – inits early days. But contemporaryadpeople know that honesty is the bestpolicy when it comes to effectiveadvertising strategies.

The editor of Revista da ESPMdecided to ask 30 Brazilianadvertising professionals whatwere their choices for the most“honest” ads and campaigns theycould remember.The results werequite interesting, and sometimesintriguing and downrightsurprising.

Some classic campaigns werementioned, such as Avis n02,Volkswagen, Natura cosmetics.BomBril scouring pads andValisère underwear. But somecame from deep searching: SkippyPeanut Butter, Ohrbach´s, PontoFrio stores, Kolynos toothpaste andCilion eyelashes’ enhancer.

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Ponto de Vista

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A

ESPM

grande vantagem da senectude sobrea juventude é que ela é as duas, por-que já foi e passou pela outra. Ajuventude poderá vir a ser, mas aindanão é. Talvez, será.

Neste mundo moderno do trabalho égritante, particularmente no Brasil,o preconceito à idade avançada, coma maioria das empresas adotandocomportamentos discricionários,oferecendo sérias resistências à suaadmissão ou permanência nas suasorganizações. A preferência é nitida-mente pelos jovens. É a vitória daesperança sobre a experiência. Eumesmo, hoje sexagenário, quase se-tuagenário, sempre dei preferênciaaos jovens nas empresas do meu Gru-po. Mas, sempre coloquei, nas che-fias, os mais experientes a quem aescola da vida dura e do apren-dizado prático confere qualidadesque autorizam sábias tomadas dedecisões. Sempre entendi que os maisvelhos dispõem da prudência obtidapelo melhor uso das coisas e um juízomais agudo, competente e eficaz.Evitam correr riscos. E é aí que morao perigo, porque ao não correrem ris-cos – que é próprio da ousadia e daagressividade dos jovens – trilhamcaminhos seguros, mais próprios damesmice rotineira que da incansávelbusca do novo, inusitado. É um paradoxo, mas, nesta vida mo-derna, nossos jovens executivos esuas empresas buscam, ousada eagressivamente, o novo, o original,

o inusitado, o exclusivo, o diferente,o inédito mas... que já tenha sidoprovado antes. O corolário dessepensamento é que, talvez, derive daía razão pela qual todos preferemaderir ao velho, já tentado, contra onovo e ainda não tentado. Resultado:na maioria dos casos as ações sãomeras repetições do já feito ante-riormente, o que não requer nem cria-tividade nem bom cérebro. Bastaaceitar, adaptar e repetir o que já exis-te, trilhando o mesmo caminho queos outros já trilharam, o que somentevai nos levar aonde os outros jáchegaram. Entendo que os velhos não devemperder a coragem de assumir e correrriscos. Assim, ficam jovens parasempre. E se rejuvenescem infundin-do inspiração, entusiasmo e motiva-ção nos jovens, potencializando-os,e correndo, com eles, os riscos darenovação.Nada grandioso se faz sem riscos. Foi assim que os grandes executivosforam alçados às maiores posições,não levando para a sua velhice osseus erros e falhas juvenis. Em con-traposição, muitas empresas adotama filosofia da “juniorização”, concen-trando o poder nas mãos de profis-sionais ainda não muito experientes,mas considerados exponenciais everdadeiras esperanças de poderembem conduzir as empresas a preçosmenores. Num país em que as em-presas estão mais preocupadas com

o fim-do-mês do que com o fim-do-mundo é natural que os esforços,igualmente, se concentrem em tudoque pode reduzir custos, e os jovens,potencialmente capazes, sucedemhoje, mais rapidamente que ontem,as funções dos velhos dirigentes. Estão ocorrendo mudanças no afas-tamento destes. Raramente se apo-sentam antes dos 60 anos. Dados depesquisas globais indicam que, 50%dos pesquisados têm planos paratrabalhar além de 64 anos. 15% alémdos 70. Aumenta a permanência dosmais velhos no trabalho, com asenectude reaproximando-se da ju-ventude, da adolescência e da idademadura, para manter-se atuante.Parece que todo velho passou aconsiderar velhos somente aquelesque têm, pelo menos, 10 ou 20 anosa mais que ele (sic). Há um momento, em todos os sereshumanos, que as portas do seu pas-sado se fecham e, se eles não sereciclam e se renovam, não só nãoabrem como não deixam entrar asdo futuro. O corpo pode envelhecer.O espírito não. Jamais. Hoje, aos 68 anos percebo queminha melhor idade não está atrásde mim, nas muitas coisas que já fiz,mas à minha frente, nas muitas queainda farei.

É para lá que eu vou. E você?João De Simoni Soderini Ferracciù – Presidente do Grupo De Simoni Associados

SENECTUDE

JOÃO DE SIMONI SODERINI FERRACCIÙ

JUVENTUDE&