JURISPRUDÊNCIA - STJ

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JURISPRUDÊNCIA

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JURISPRUDÊNCIA

AÇÃO PENAL

AÇÃO PENAL N2 08 - DF

(Registro n2 8986731)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro William Patterson

Autora: Justiça Pública

Réu: José Henrique Gomes Salgado Martins

Advogado: Dr. PUnio de Oliveira Correa

EMENTA: Penal. Ação penal. Denúncia. Legítima defe­sa. Rejeição.

A denúncia não deve ser rejeitada se o fundamento con­tido na resposta prévia (legítima defesa) não enseja motivação absoluta para considerá-lo como causa excludente da antiju­ridicidade.

Denúncia recebida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, por unanimida­de, receber a denúncia, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei. Brasília, 10 de maio de 1990 (data do julgamento).

Ministro TORREÃO BRAZ, Presidente. Ministro WILLIAM PATTER­SON, Relator.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 15-22, ago. 1990. 17

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO WILLIAM PATTERSON: O Presente pro­cesso teve início com o ofício de fi. 2, dirigido pelo digno Subprocurador-Geral da República, Dr. Paulo Sollberger à Egrégia Presidência desta Corte, nestes termos:

"O Ministério Público Federal vem perante V. Ex!! requerer a distribuição e autuação, como inquérito, do expediente anexo, que noticia a prisão em flagrante de José Henrique Gomes Sal­gado Martins, membro do Ministério Público da União (Procu­rador da Justiça do Trabalho), que atingiu com um tiro, no interior de um estabelecimento comercial em Porto Alegre-RS, o cidadão Leonir Carlos Piccini, causando-lhe lesões corporais."

Constam do referido expediente todas as peças referentes aos procedi­mentos efetuados na fase inquisitorial, inclusive os autos do inquérito policial (fls. 30/61), com o respectivo relatório (fls. 56/59).

Autuado como Inquérito e cabendo-me dirigir a instrução do feito, deferi requerimento do MPF e determinei a devolução dos autos ao Delegado Corre­gedor da Polícia Civil no estado do Rio Grande do Sul para providências complementares.

Voltando os autos a esta instância, o órgão do MPF ingressou com a denúncia de fls. 79/81, verbis:

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"O Ministério Público Federal, por seu representante legal, no uso de suas atribuições legais, vem, à ilustre presença de V. Exa. oferecer denúncia contra José Henrique Gomes Salgado Martins, brasileiro, casado, filho de José Salgado Martins e Tasir Gomes Martins, residente em Porto Alegre-RS, na rua Fernandes Vieira n2 101, apartamento 201, Procurador da Justiça do Traba­lho, exercendo suas funções em Porto Alegre-RS, na Praça Rui Barbosa n2 57, com fundamento no art. 105, inciso I, letra a, da Constituição Federal de 1988, pelo seguinte fato delituoso:

Consta dos autos do inquérito n2 125-DF que, no dia 30 de novembro de 1988, por volta de uma hora e trinta minutos, no interior da Churrascaria (restaurante) Barranco, estabelecida (o) na Avenida Protásio Alves, n2 1.578, na cidade de Porto Alegre­RS, o denunciado agrediu e lesionou Leonir Carlos Piccini.

No dia já referido o denunciado jantou, acompanhado de sua esposa, na citada churrascaria (restaurante) e, ao receber a conta, que foi entregue pelo garçon Rosalino Rossevelt da Silva, exal­tou-se achando excessiva a importância cobrada, oportunidade

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que o citado Rosalino tentou explicar o fato, o que não foi aceito pelo denunciado.

Como o denunciado não aceitou as ponderações de Rosali­no, foi por este levado ao gerente do estabelecimento, Sr. limar José Tasca, que refez as contas constatando que estavam certas, o que deixou o denunciado bastante irritado.

Descontente o denunciado passou a preencher um cheque, enquanto faziâ'considerações desairosas contra o estabelecimen­to comercial e à pessoa de seu gerente.

Composto o cheque o denunciado prensou o mesmo contra o rosto do gerente, limar José Tasca, em atitude bastante agres­siva, quando então os garçons Antonio Balbino Pacheco e Leonir Carlos Piccini aproximaram-se para proteger o gerente, oportu­nidade em que Leonir tentou afastar o denunciado, tendo este sacado da arma que portava na cintura (um revólver Taurus, calibre trinta e oito, fi. 16), e desfechado um tiro contra a vítima Leonir, causando na mesma as lesões corporais descritas no laudo de fi. 134.

Assim, estando ele incurso nas sanções do art. 129 caput do Código Penal, requer, após o recebimento da denúncia, seja feita a notificação e o conseqüente interrogatório do denunciado, na forma do que dispõe o art.216 e seguintes do Regimento Interno do extinto Tribunal Federal de Recursos, em combinação com o art. 24, parágrafo único do Ato Regimental n!! 01, do Superior Tribunal de Justiça, ouvindo-se a vítima e as testemunhas do rol abaixo, em dia e hora a serem designados, prosseguindo-se nos demais termos do processo e condenando-se o denunciado na forma já requerida."

Assim sendo, determinei que o procedimento fosse reautuado e distribuí­do como Ação Penal, tomando o número 08. Para que ficasse desde logo definida a competência para o processo, de acordo com o disposto na alínea a,' do inciso I, do art. 105, ou alínea a, do inciso I, do artigo 108, ambos da Constituição Federal, solicitei ao MPF esclarecesse se o denunciado oficiava perante Tribunal, o que foi respondido positivamente pelo ofício de fi. 88.

Citado o denunciado em 30.08.89, ingressou ele, tempestivamente, com as razões de fls. 199/203, nas quais, depois de relatar o episódio em que se envolveu, invoca, em seu prol, a excludente de legítima defesa (art. 25, do CP) e a sua vida pregressa, sempre pautada dentro das normas legais.

Após mais algumas diligências requeridas pelo MPF e por mim deferidas, encerrou-se a instrução com o pronunciamento de fIs. 240/241, em que o MPF

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diz não ter motivo para aditar o libelo e reitera o pedido de recebimento da denúncia.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO WILLIAM PATTERSON: O Réu, em sua resposta prévia (fls. 199/203), não nega a autoria nem contesta os fatos descri­tos na denúncia. Apenas oferece sua versão sobre os mesmos e conclui que agiu em legítima defesa, ao reagir lia uma agressão injusta, atual e também iminente com relação a sua esposa. Fez uso moderado de seus meios de defesa. Sua arma encontrava-se municiada com cinco cartuchos e somente um foi disparado" .

O art. 43, I, do Código de Processo Penal, estabelece que a denúncia ou queixa seja rejeitada quando o fato narrado evidentemente não constituir crime.

Por outro lado, o Código Penal, ao tratar das excludentes de ilicitude diz que não há crime quando o agente pratica o fato em legítima defesa (art. 23, 11).

A conjugação das duas normas conduz ao entendimento, para alguns, de que a comprovação de haver o acusado agido em legítima defesa, permite a rejeição da denúncia, em razão da conceituação legal estratificada no art. 23, 11, do CP.

Acontece, porém, que a medida está condicionada a um juízo de valor absoluto da inocorrência da antijuridicidade do fato. É preciso que nenhuma dúvida persiste acerca da conduta do agente, diante das provas coligidas, nesta fase, e da desnecessidade daquelas que seriam oferecidas na instrução judicial.

Borges da Rosa in "Comentários ao Código de Processo Penal", 3!! Edi­ção, pág. 138), ao comentar o assunto proclama:

"O F caso, em que o Juiz pode rejeitar a denúncia, ocorre quando o fato narrado não constitui crime. Isto, porém, deve ser evidente, como exige o texto legal; isto é, deve ser claro, mani­festo, percebível facilmente sem necessidade de discussão nem de exame ou estudo aprofundado, que o fato narrado não constitui crime. Desde que haja alguma dúvida, a respeito, já se não mais pode dizer que é evidente a não-criminalidade do fato; e desapa­rece então a faculdade concedida ao Juiz de rejeitar a queixa, ou a denúncia, por esse~motivo.1/

In casu, sem embargo das razões apresentadas na resposta, não me sinto, ainda, inteiramente convencido das mesmas, de sorte a ensejar a rejeição da peça inaugural. Com efeito, o confronto entre o que consta do relatório policial

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(fls. 56/59), firmado com base nas provas coligidas na instrução do inquérito, e a fundamentação básica da resposta prévia (legítima defesa) não permite a tranqüilidade que seria de se exigir no cumprimento da providência recomen­dada no art. 43, I, do CPP.

Ante o exposto, recebo a denúncia.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO BUENO DE SOUZA: Sr. Presidente, acom­panhei atentamente o relatório e o d. voto do Sr. Ministro-Relator. Também me acho convencido de que não se oferece a esta Corte acatar, de pronto, a alegação de legítima defesa. A questão conceme ao mérito e é calcada em aspectos dos fatos a serem devidamente verificados, comprovados e avaliados segundo sua significação jurídica, na ocasião oportuna e consoante o procedi­mento legal a observar.

É certo que a legítima defesa pode e deve, em princípio, ser reconhecida e declarada também neste ensejo. Não, porém, no caso em exame, em que os fatos não se apresentam suficientemente esclarecidos.

Acompanho o Sr. Ministro-Relator.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ CÂNDIDO: Sr. Presidente, acompa­nho o eminente Ministro-Relator, porque não vejo na descrição dos fatos nenhum sinal, até agora, de que tenha o réu sofrido injusta agressão. Ao contrário, ele mostrou:"se agressivo com o gerente. É cedo para falar-se em legítima defesa. A sua configuração, se ocorrer, deve ser demonstrada na instrução.

De modo que acompanho o Relator.

EXTRATO DA MINUTA

APN. 08 - DF - (Reg. n!l 8986731) - Relator: Exmo. Sr. Ministro William Patterson. Autora: Justiça Pública. Réu: José Henrique Gomes Salga­do Martins. Advogado: Dr. Plínio de Oliveira Correa.

Decisão: A Corte Especial, por unanimidade, recebeu a denúncia (Em 10.05.90 - Corte Especial).

Votaram de acordo com o Exmo. Sr. Ministro Relator os Exmos. Srs; Ministros Bueno de Souza, José Cândido, Pedro Acioli, Pádua Ribeiro, Flaquer Scartezzini, Costa Lima, Geraldo Sobral, Costa Leite, Nilson Naves, Eduardo Ribeiro, limar Galvão, Dias Trindade, José de Jesus, Assis Toledo, Edson

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Vidigal, Garcia Vieira, Annando Rolemberg, José Dantas e Carlos VeIloso. Ausentes, por motivo justificado, os Exmos. Srs. Ministros Washington Bolí­var de Brito (Presi.dente), Gueiros Leite, Américo Luz e Carlos Thibau. Presi­diu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro TORREÃO BRAZ, Vice-Presidente.

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AÇÃO RESCISÓRIA

AÇÃO RESCISÓRIA N!2 188 - RJ

(Registro n!2 8978291)

Relator: EXlllo. Sr. Ministro José Delgado

Revisor: EX11lo. Sr. Ministro América Luz

Autor: Osvaldo Pereira

Ré: União Federal

Advogado: Hilário dos Santos Pimentel Filho

EMENTA: Ação rescisória. Ilegitimidade de parte. Ex­tinção do processo. C.P.C., art. 267, VI e § 3~.

I - Quem não figurou como parte no processo que deu origem à rescisória, não tem legitimidade ad causam para nesta última figurar.

11 - Extinção da ação sem julgamento de mérito.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos que são partes as acima indicadas.

Decide a Egrégia I;! Seção do Superior Tribunal de Justiça, à unanimida­de, julgar extinto o processo, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes destes autos e que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 28 de novembro de 1989 (data do julgamento).

Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente. Ministro JOSÉ DELGADO, Relator.

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RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ DELGADO: Osvaldo Pereira intenta a presente ação rescisória com fundamento nos incisos V, VII e IX do artigo 485, do CPC. Visa, em síntese, desconstituir acórdão do então Egrégio Tribu­nal Federal de Recursos que ao confirmar sentença proferida em mandado de segurança, assim dispôs em sua ementa:

"Mandado de segurança. Inscrição na OAB. Fraude. Apurado que o postulante obteve inscrição na ordem, com

o uso de documento falso, evento devidamente apurado em pro­cesso regular do Conselho Seccional, tem-se como legítimo o ato que determinou o cancelamento dessa inscrição.

Sentença confirmada. Apelação improvida." (fi. 287 - 2!! volume).

A desci são rescindenda transitou em julgado em 27.03.87, conforme certidão de fi. 338. A presente rescisória foi interposta em 09.03.89, data de sua autuação.

O mandado de segurança, no primeiro grau, foi impetrado contra o Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Rio de Janeiro. A ação rescisória chamou como parte passiva a União Federal, afir­mando que era representada pela Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Rio de Janeiro.

A União Federal, em contestação, argüiu, em preliminar, o não conheci­mento da ação, alegando inexistência de prova do trânsito em julgado da decisão, e, em caso contrário, a improcedência.

As partes, embora intimadas, não apresentaram provas. Somente o autor depositou razões finais, reiterando as teses iniciais.

A douta Subprocuradoria-Geral da República, ao ofertar parecer, opinou pelo não conhecimento da rescisória, alegando inexistência de prova do trân­sito em julgado do descisório. E, em caso contrário, pela improcedência.

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É o relatório. Ao Revisor.

VOTO - PRELIMINAR

EMENTA: Ação rescisória. Ilegitimidade de parte. Extin­ção do processo. c.P.C., art. 267, VI e § 3!!.

I - Quem não figurou como parte no processo que deu origem à rescisória, não tem legitimidade ad causam para nesta última figurar.

11 - Extinção da ação sem julgamento de mérito.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 23-28, ago. 1990.

o EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ DELGADO (Relator): À presente ação rescisória foi chamada, por manifestação expressa do autor, a União Federal, pessoa jurídica de direito público, que não integrou a relação jurídica de direito form~l desenvolvida no acórdão rescindendo.

A cópia autenticada da decisão que se pretende desconstituir comprova que o mandado de segurança, tanto em primeiro grau, como em segundo grau, desenvolveu-se com a participação do Conselho Seccional da Ordem dos 'Advogados do Brasil, Seccional do Rio de Janeiro, e da própria Ordem, no pólo passivo.

Há, conseqüentemente, evidente ilegitimidade passiva ad causam da União Federal para ser demandada, haja vista que a Ordem dos Advogados do Brasil e suas Seções têm personalidade jurídica própria (art. 4!!, § 2!!, Lei 4.215/63), inconfundível com a da União Federal, pois, conforme já decidiu o Colendo Supremo Tribunal Federal, interpretando o art. 487, do CPC, recipro­camente, é réu na rescisória a parte no processo principal ou o seu sucessor a título universal ou singular ... (STF-RTJ 831390; RT 515/254).

Em face dos fundamentos apresentados, voto no sentido de extinguir o processo, sem julgamento do mérito, por ter como ilegítima a parte passiva (art. 267, VI, c/c o § 3!!, do mesmo artigo, do CPC). Condeno o autor ao pagamento de honorários advocatícios da parte contrária, fixando-os em NCz$ 500,00 (quinhentos cruzados novos), em razão do ínfimo valor dado à causa. Custas pelo vencido, convertido o depósito em multa, como preceitua o art. 488, C.P.c.

É como voto-preliminar.

Peço destaque.

VOTO - REVISÃO

PRELIMINAR

O EXMO. SR. MINISTRO AMÉRICO LUZ: A inicial elaborada pelo autor contém a propositura, da "Ação Rescisória de Acórdão de Sentença em Mandado de Segurança. Face de a União Federal, representada pela Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Rio de Janeiro, R.J., ... (omissis) ... ter a-n-u-l-a-d-o no dia 01 de abril de 1982 a inscrição principal de Advogado ... ".

Vê-se que o aresto rescindendo examinou a sentença de primeiro grau que denegou o "writ", na relação processual estabelecida entre o autor e a O.A.B. (fls. 285 usque 292 dos autos).

Evidencia-se, assim, a ilegitimidade passiva ad causam da União Federal, pelo simples fato de que não integrou a lide em primeiro e segundo graus de

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jurisidção, sendo certo que a O.A.B. tem personalidade jurídica própria (art. 42, § 22, da Lei n2 4.215/63) e deveria ter sido contra ela intentada a pretensão rescisória.

Caso é, a meu ver, de extinção do processo, ex vi do disposto no artigo 267, VI, e no seu parágrafo 32, do cpc.

É como voto, preliminarmente.

EXTRATO DA MINUTA

AR n2 188 - RJ - (Reg. n2 8978291) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro José Delgado. Revisor: O Exmo. Sr. Ministro América Luz. Autor: Osvaldo Pereira. Ré: União Federal. Advogado: Hilário dos Santos Pimentel Filho.

Decisão: A Egrégia li! Seção, por unanimidade,julgou extinto o processo nos termos do voto do Sr. Ministro Relator (em 28.11.89 - li! Seção).

Votaram com o Relator, os Exmos. Srs. Ministros América Luz, Geraldo Sobral, IImar Galvão, José de Jesus, Garcia Vieira, Vicente Cemicchiaro, Carlos Velloso e Miguel Ferrante. Usou da palavra o Dr. Pedro Alves Pereira pelo autor. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro ARMANDO ROL­LEMBERG.

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AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO.

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE

INSTRUMENTO N!! 715 - MS

(Registro n!! 89.10679-1)

Relator: O EX11lo. Sr. Ministro Assis Toledo Agravantes: Ediberto da Silva Menezes e outro Agravado: Ministério Público do Estado do Mato Grosso do Sul Advogados: Drs. Athayde Nery de Freitas e Rogério Marinho Leite

Chaves

EMENTA: Processual Penal. Recurso extraordinário criminal convertido em Recurso Especial. Prazo de 10 dias para interposição.

Segundo orientação sumulada no STF (Súmula 602), o CPC não revogou a Lei 3.396/58, que continua em vigor no tocante ao prazo para recorrer, no processo penal (art. 2!).

As normas de regência do recurso são as vigorantes à época da decisão.

Agravo regimental improvido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

negar provimento ao agravo regimental, na forma do relatório e notas taqui­gráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

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Brasília, 06 de dezembro de 1989 (data do julgamento).

Ministro JOSÉ DANTAS, Presidente. Ministro ASSIS TOLEDO, Rela-tor

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO ASSIS TOLEDO: Neguei provimento a agravo que objetivava fazer subir recurso extraordinário, in verbis:

"Trata-se de agravo de instrumento ajuizado por Ediberto da Silva Menezes e Grisson de Carvalho contra despacho que negou seguimento a Recurso Extraordinário criminal, por intem­pestivo.

A inconformação dos agravantes reside no fato de ter sido considerado o prazo de dez dias para o recurso extraordinário e não o de quinze dias. Alegam que a Lei 3.396, de 02/6/58, que estabelece prazo de dez dias para o apelo extremo, teria sido derrogada pelo Código de Processo Civil de 1983, cujo art. 542 fixa o prazo de quinze dias para o mesmo recurso.

Sem razão, porém, os agravantes, como demonstra o parecer da Subprocuradoria-Geral da República (fls. 178/180).

O acórdão recorrido foi publicado em 27/5/88, sexta-feira. O prazo recursal começou a fluir dia 31/5/88 (terça), tendo em vista que dia 30/5/88 (segunda) foi feriado por antecipação. O recurso extraordinário foi interposto no lI!! dia, ou seja, dia 10/6/88 (sexta). O despacho agravado foi proferido em 18/10/88, antes da instalação do SJT, ocorrida em abril de 1989.

Pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, vigora, em matéria processual penal, o art. 22 da Lei 3.396, de 02/6/58, que estabelece o prazo de dez dias para o recurso extraordinário criminal (Súmula 602 do STF). Esse entendimento tem apoio no art. 1.211 do cpc.

Assim, como as normas de regência do recurso são as vigo­rantes à época da decisão, sem dúvida que o recurso em exame foi regularmente considerado intempestivo.

Nego provimento ao agravo."

(fi. 187).

Inconformado, ingressou o recorrente com agravo regimental sustentan­do que, a partir da vigência do atual Código de Processo Civil, revogou-se implicitamente a Lei 3.396/58. Acrescenta que a Súmula 602 do STF está alicerçada "em norma jurídica ab-rogada" e, além disso, fere o princípio da

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ampla defesa (art. 153, § 15, da Constituição de 1969; art. 5!!, LV, da atual). A seu ver, não há razão para distinguir o recurso extraordinário criminal do civil, sendo, ademais, incabível a aplicação do direito intertemporal, nos moldes estabelecidos pelo despacho atacado.

É o relatório.

VOTO

EMENTA: Processual Penal. Recurso extraordinário crimi­nal convertido em Recurso Especial. Prazo de 10 dias para inter­posição.

Segundo orientação sumulada do S.T.F. (Súmula 602), o C.P.c. não revogou a Lei 3.396/58, que continua em vigor no tocante ao prazo para recorrer, no processo penal (art. 2!!).

As normas de regência do recurso são as vigorantes à época da decisão.

Agravo regimental improvido.

O EXMO. SR. MINISTRO ASSIS TOLEDO (Relator): A Súmula 602, traz, em sua referência, entre outros, o RECr 83.278 (RTJ 78/958).

O voto condutor do acórdão, nesse precedente, enfrenta a questão central da não revogação da Lei 3.396/58 pelo C.P.c., estando assim redigido:

O SR. MINISTRO MOREIRA ALVES (Relator): Em dois acórdãos recentes - RE 81.083 e RE 81.063, relator de ambos o Sr. Ministro Cordeiro Guerra - decidiu esta Segunda Turma o que a ementa do segundo deles assim sintetiza:

"Recurso extraordinário criminal. Prazo de interposição é de dez dias. O art. 542 do novo C. Pro Civ. é inaplicável ao recurso extraordinário criminal por força do art. 1.211 do mesmo C. Pro Civ. Continua em vigor, no que diz respeito ao processo penal, o art. 2!! da Lei 3.396, de 02.06.1958. Recurso extraordinário não conhecido por intempestivo."

Não votei em ambos os casos, porque ainda não fazia parte deste Tribunal, por ocasião de seus julgamentos.

Apesar das doutas considerações do despacho que admitiu o recurso em causa, do exame a que procedi da matéria concluo por aderir à orientação dos referidos julgados desta Turma.

Com efeito, embora a Lei 3.396, de 02.06.1958, declarasse em sua epígrafe que alterava a redação dos arts. 864 e 865 do C. Pro Civ., o certo é que, em verdade, foi além, pois disciplinou todo o procedimento de interposição do recurso extraordinário, subs-

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tituindo-se às disposições em contrário, não só do Código de Processo Civil, senão também do Código de Processo Penal, como se vê de seu art. 8!!, cujo teor é este:

"Art. 8!!. Esta lei entrará em vigor na data da sua publicação, revogadas as disposições em contrário, especialmente os artigos 863 e 864 do C. Pro Civ. e 632 a 636 do C. Pro PenaL"

Sem dúvida o tratamento único dado ao recurso extraordi­nário, independentemente da natureza da causa, era tecnicamente o melhor. Nada impedia, no entanto, que - como ocorria nos textos originários do C.P. C. e do c.P.P. - a legislação ordinária estabelecesse procedimentos diversos, inclusive no tocante aos prazos, a esse recurso, levando em conta se a causa era cível ou criminal. Nem mesmo sua natureza constitucional a isso obstava, uma vez que seu procedimento não é disciplinado na Constitui­ção.

Ora, com o novo C. Pro Civ., ao invés de se deixar essa matéria para ser tratada unitariamente em lei especial, discipli­nou-se o procedimento do recurso extraordinário no terreno do processo civil (art. 1.211 do C. Pro Civ.), derrogando-se, nesse particular, a Lei 3.396/58, sem, no entanto, revogá-la, uma vez que ela subsiste como substitutiva da disciplina, a propósito, do C. Pro Penal, no tocante às causas criminais. Para chegar-se a conclusão diversa, mister seria que o novo C. Pro Civ. tivesse avocado a si, inequivocamente, toda a disciplina do procedimento do recurso extraordinário, independentemente da natureza da causa. Nada há nele, porém, que permita essa conclusão. Pelo contrário, a orientação anterior à Lei 3.396/58 parece ter preva­lecido, tanto assim que, no Projeto de Código de Processo Penal, ora em tramitação no Congresso, contém toda uma seção - a de n!! VI do capítulo IV do título VII do livro IV - dedicada ao procedimento do recurso extraordinário, o qual, em vários pon­tos, se afasta do regulado no Código de Processo Civil.

Continuando, portanto, a ser de dez dias o prazo para a interposição do recurso extraordinário, em matéria criminal, é intempestivo o presente recurso, uma vez que o dies ad quem seria 2 de julho de 1975, e ele só foi interposto a 4 daquele mês.

Observo, finalmente, que a intempestividade persiste não obstante o fato de o Regimento Interno do Tribunal de São Paulo, ao se adaptar ao novo Código de Processo Civil, ter considerado como único - alcançando, portanto, as causas criminais - o prazo de quinze dias para interposição do recurso extraordinário.

R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990.

Prazo como o da espécie é fatal, e sua disciplina se faz pela legislação federal.

Em face do exposto, não conheço, preliminarmente, do re­curso, por intemPt?stivo."

Ante essa orientação do excelso ]Pretório, que veio a ser sumulada, não vejo como, agora, mais de uma década depois, decidir em sentido contrário, sobretudo quando se trata de um recurso interposto sob a égide das normas que regiam o antigo apelo extraordinário.

Nego provimento ao agravo.

É o voto.

EXTRATO DA MINUTA

AgRegn9Ag715 -MS - (Reg. nU 89.0010679-1) -Relator: O Exmo. Sr. Ministro Assis Toledo: Agravantes.: Ediberto da Silva Menezes e outro. Agravado.: Minitério Público do Estado do Mato Grosso do Sul. Advogados: Drs. Athayde Nery de Freitas e Rogério Marinho Leite Chaves.

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regi­mental (Em 06.12.89 - 5;! Turma).

Os Exmos. Srs. Ministros José Dantas, Flaquer Scartezzini e Costa Lima votaram com o Relator.

Ausente o Exmo. Sr. Ministro Edson Vidigal.

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro JOSÉ DANTAS.

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AGRA VO REGIMENTAL NO AGRAVO DE

INSTRUMENTO NU 997 - SP

(Registro nU 89.115480)

Relator: O EXl/lo. Sr. Ministro Hélio Mosilllal111

Agravante: Algodoeira Donegá Ltda

Agravado: R Despacho de fls. 72

Advogados: Drs. Cyro Pelllla César Dias, Ricardo Estelles e outros e Hermógenes Troyano

R. Sup. Trib. J ust., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990. 35

EMENTA: Recurso especial e extraordinário. Interpo­sição na vigência da nova Constituição Federal, mas antes da instalação do Superior Tribunal de Justiça. Observância das normas relativas ao extraordinário.

Segundo o art. 27, § lQ, do Ato das Disposições Constitu­cionais Transitórias, enquanto não instalado o STJ, o Supre­mo Tribunal Federal continuou exercendo as atribuições e competências definidas na ordem constitucional precedente. Cumpria, pois, à recorrente, observar o Regimento Interno do Supremo, com as restrições ali previstas.

Agravo regimental improvido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a 2;!. Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, na forma do relatório e notas taqui­gráficas retro, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 20 de agosto de 1990 (data do julgamento).

Ministro ILMAR GALV ÃO, Presidente. Ministro HÉLIO MOSI­MANN, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO HÉLIO MOSIMANN: Em autos de execução fiscal promovida pela Fazenda do Estado de São Paulo, para cobrança de ICM e acréscimos, contra Algodoeira Donegá Ltda., a 18;!. Câmara Civil do Tribunal de Justiça daquele Estado, em acórdão datado de 22 de agosto de 1988, negou provimento a agravo de instrumento, interposto pela executada, tendo em vista penhora determinada sobre seus bens imóveis, nos quais, inclusive, encontra­se comercialmente instalada.

Apresentou, então, a sucumbente, recurso especial fulcrado no art. 105, inciso 111, alínea a, da Nova Carta, recurso este apreciado como extraordinário, em face das disposições do § 12, do art. 27, do Ato das Disposições Constitu­cionais Transitórias, e inadmitito, através do despacho de 27 de março de 1989, ao fundamento de que, na hipótese, não houve alegação de infringência a texto constitucional ou de divergência de Súmula; a ação não está prevista no elenco taxativo do art. 325, do Regimento Interno da Suprema Corte; além de inexistir argüição de relevância da questão federal, o que sustaria a preclusão da matéria infraconstitucional.

36 R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990.

Inconformada, agravou de instrumento a recorrente, tendo sido negado provimento ao recurso, por despacho do eminente Ministro Miguel Ferrante, publicado no DJ de 7.12.89.

Desta decisão, baseando-se nos artigos 258 e 259 do Regimento Interno desta Corte, a empresa interpôs, tempestivamente, agravo regimental, reque­rendo a reconsideração da mesma, ou seu julgamento, batendo-se, em sua irresignação, pelo acerto do recurso interposto já como especial, por entender que a Constituição de 1988, "ao dispor sobre o Poder Judiciário, especifica­mente no artigo 105 criou o recurso especial e o condicionou, tão-somente, aos requisitos das alíneas a e c. Aduz, outrossim, que a promulgação da Nova Carta possibilitou "o exercício desse recurso", sendo que lia sua apreciação é que dependia da instalação desse Co lendo STJ, porquanto o E. Supremo deverá exercer a competência anterior".

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO HÉLIO MOSIMANN (Relator): Embora as ponderações da agravante, na realidade não há como acolhê-Ias, razão pela qual mantenho o despacho agravado.

O recurso especial foi interposto na vigência da Nova Carta, mas antes da instalação deste Superior Tribunal de Justiça, e, assim sendo, por força do art. 27, § I!!, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias - que prorrogou a competência do Supremo Tribunal Federal-, mesmo interposto como especial, o recurso dever-se-Ía ater ao elenco taxativo do art. 325 do Regimento Interno da Suprema Corte, o que, na hipótese, não ocorreu.

"O apelo extremo - assinala decisão referida no despacho recorrido -foi manejado antes da instalação desta Corte, razão pela qual deve observar as disposições do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, então apli­cável" (Min. Sálvio de figueiredo Teixeira).

Outra manifestação desta Casa encontra-se no Agravo Regimental no REsp n!! 1. 186-RJ, cuja ementa rege (Min. Nilson Naves):

"Recurso especial - Recurso extraordinário. Acórdão de 9.3.89, publicado no DJ de 04.04, antes, portanto, da instalação do STJ. Hipótese de cabimento do recurso extraordinário, com as restrições do art. 325 do Regimento do STF, e não do recurso especial. O que disciplina o cabimento de recurso é a lei vigente ao tempo da decisão recorrida, com a publicação. Questão federal não argüida como relevante, na forma regimental. Recurso espe­cial a que o Relator negou seguimento, por despacho. Agravo regimental improvido."

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2( 12): 29-63, ago. 1990. 37

Inexistindo, outrossim, na espécie, argüição de relevância da questão federal, restou preclusa a matéria infraconstitucional, o que definitivamente sela a pretensão do recorrente-agravante.

Mantendo, pois, o despacho de fls. 72 dos autos, nego provimento ao agravo regimental.

VOTO (VOGAL)

o EXMO. SR. MINISTRO VICENTE CERNICCHIARO: Sr. Presiden­te, acompanho o eminente Relator. Incide na espécie o princípio de que a data do recurso é a data da decisão recorrida. À época, porque não instalado ainda o Superior Tribunal de Justiça, é evidente, os recursos continuaram na jurisdi­ção remanescente do Supremo Tribunal Federal, devendo, portanto, adaptar-se à sistemática da época.

EXTRATO DA MINUTA

AgRg no Ag 997 - SP - (Reg. n!! 89.115480) - Relator: Sr. Ministro Hélio Mosimann. Agravante.: Algodoeira Donegá Ltda. Agravado.: R. Des­pacho de fls. 72. Advogados: Drs. Cyro Penna César Dias, Ricardo Estelles e outros e Hermógenes Troyano.

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regi­mental (em 20.8.90 - 2i! Turma).

Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Ministros lImar Galvão e Vicente Cemicchiaro.

38

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro ILMAR GAL VÃO.

Ausente, justificadamente, o Exmo. Sr. Ministro Américo Luz .

• AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE

INSTRUMENTO n!! 1.214 - SP

(Registro N!! 89.00120530)

Relator: O Ermo. Sr. Ministro Ilmar Galvão

Agravante: Purina Nutrimentos Ltda.

Agravado: R. Despacho de Fls. 73

Advogados: Drs. André Martins de Andrade e outros; Dra. Karen Louise Jeanette Kahn

R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2( 12): 29-63, ago. 1990.

EMENTA: Processual Civil. Agravo Regünental. Nega-se provimento ao agravo regimental, em face das

razões que sustentam o despacho recorrido, sendo certo que, em direito intertemporal, a lei do recurso é a lei do tempo da decisão impugnada. Precedentes deste Tribunal.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a 2i! Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao agravo, na forma do relatório e notas taquigráficas cons­tantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 29 de novembro de 1989 (data do julgamento).

Ministro CARLOS VELLOSO, Presidente. Ministro ILMAR GAL VÃO, Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO ILMAR GAL VÃO (Relator): Leio o despa­cho ora agravado:

"Vistos.

Externa-se o presente agravo contra a r. decisão, de 27 de março de 1989, que negou seguimento a recurso especial, datado de 20 de fevereiro de 1989, sob o fundamento de que "não houve alegação de infringência a texto constitucional ou de divergência com a Súmula, a ação não está prevista no elenco taxativo do artigo 325 do referido Regimento Interno, e não foi argüida a relevância da questão federal".

Afigura-se-me incensurável a decisão agravada.

Esta Corte, reiteradamente, vem decidindo no sentido de que, por força do art. 27, § 12, do Ato das Disposições Transitórias da CF/88, se a decisão for anterior à instalação do Superior Tribunal de Justiça, em 07.04.88, aplica-se o art. 325 do RISTF, no tocante à admissibilidade do recurso.

De outra parte, não foi manifestada argüição de relevância e a questão ventilada no recurso especial não se enquadra no aludido permissivo regimental, à época vigente.

Isto posto, nego seguimento ao agravo."

R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990. 39

Nas razões do agravo regimental, alega a agravante, em resumo, serem inaplicáveis ao recurso especial as limitações previstas no Regimento Interno do STF, porque a decisão indeferitória do apelo extremo, embora anterior à instalação do STJ, não passou em julgado, em face da interposição do agravo de instrumento. Além disso, no próprio agravo, foi manifestada argüição de relevância da questão federal, o que, por si só, justificaria o conhecimento do recurso extraordinário, ainda que sob a ordem constitucional·precedente.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO ILMAR GAL V ÃO (Relator): O acórdão recorrido foi proferido antes da instalação deste Superior Tribunal des Justiça, quando o Colendo Supremo Tribunal Federal ainda exercia suas atribuições e competência tal como definida na ordem constitucional precedente, ex vi do § I!!, do art. 27, da ADCT.

Esta Corte, reiteradamente, vem decidindo, apoiada na melhor doutrina, que, em direito intertemporal, a lei do recurso é a lei do tempo da decisão impugnada (cf. Ag. n!! 11, ReI. Min. Cláudio Santos, Ag. n!! 40, ReI. Min. Barros Monteiro, Ag. n!! 67, ReI. Min. Waldemar Zveiter, Ag. n!! 73, ReI. Min. Athos Carneiro, in DJ de 29.06.89, e o Ag. n!! 70, ReI. Min. Nilson Naves, in DJ de 26.06.89).

Logo, não tem razão a agravante quando se rebela contra a aplicação das restrições do art. 325, do RISTF.

De outra parte, não se pode ter como argüida a relevância da questão federal, como quer o agravante, se ela fora deduzida apenas nas razões do agravo. É só ler o art. 328 do RISTF. Por conseguinte, operou-se a preclusão da questão infraconstitucional, não cabendo, pois, apreciá-Ia em sede de ad­missibilidade do recurso especial.

Destarte, nego provimento ao agravo.

EXTRATO DA MINUTA

AgRgnoAg. n!! 1.214 - SP - (Reg. n!! 89.00120530) - Relator: Exmo. Sr. Min. I1mar Galvão. Agravante: Purina Nutrimentos Ltda. Agravado: R. Despacho de fls. 73. Advogados: Drs. André Martins de Andrade, outros e Karen Louise Jeanette Kahn.

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo (Em 29-11-89 - 2!.! Turma).

Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Ministros Vicente Cernic­chiaro, Carlos Velloso, Miguel Ferrante e Américo Luz. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Min. CARLOS VELLOSO.

40 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990 ..

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO NQ 1.236 - SP

(Registro nQ 89121103)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Nilson Naves

Agravante: José Roberto de Vilhena

Agravado: O R Despacho de fls. 554

Advogados: Drs. Antônio Eugênio Cersóssimo Minghini e Rubens Fer­raz de Oliveira Lima e outros

EMENTA: Agravo regimental. Interposição por tele­grama, sem autenticação e sem as razões do pedido de refor­ma da decisão. Em casos dessa espécie, torna-se incabível o agravo. Agravo regimental não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a 3õ!. Turma do Superior Tribunal de Justiça, preliminarmente e por unanimi­dade, não conhecer do agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, em 06 de fevereiro de 1990 (data do julgamento).

Ministro GUEIROS LEITE, Presidente. Ministro NILSON NAVES, Re­lator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO NILSON NAVES: Por despacho publicado no DJ de 30.11, neguei provimento ao agravo de instrumento, verbis:

"Transformado, na origem, pelo despacho de fi. 551, o re­curso extraordinário em recurso especial, prejudicada a argüição de relevância, examino, neste juizo, o tema suscitado pelo recor­rente, ora agravante.

De fato, conforme esclarecido pelo recorrente, fls. 449 e seguintes, cumpre distinguir a apreciação de prova da valoração de prova, no caso de recurso excepcional. Ao que entendo, a apreciação tem a ver com a conta, peso e medida, na expressão da RTJ-32j703, e a valoração com a ofensa a algum princípio probatório. De acordo com a RTJ-86j558, o erro na valoração das

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2( 12): 29-63, ago. 1990. 41

provas 'somente pode ser o erro de direito, quanto ao valor da prova abstratamente considerado'. Só o erro de di rei to, pois é aí que surge a questão federal, qual no writ of error do Direito norte-americano, fonte do recurso extraordinário (por exemplo, Matos Peixoto, 1935, págs. 87 e segs).

No caso destes autos, ao contrário do sustentado pelo agra­vante, cuida-se de apreciação de prova. O acórdão, confirmando a sentença, entendeu, em resumo, (a) que 'a prova dos fatos indiciários é robusta', (b) que 'o embargado não conseguiu com­provar quando e como entregou aquela vultosa quantia' , (c) que 'foge a normalidade dos fatos a entrega de uma importância considerável em dinheiro', e (d) que 'não terem sido as cártulas em execução relacionadas nas declaraçõers de bens'. Posição outra, exigiria o simples reexame da prova. Se erro houve, não se trata de erro de direito. Entendendo não ter cabimento o recurso extraordinário convertido em recurso especial, nego provimento ao agravo."

Considerando-se agravada, a parte requereu a apresentação do feito em mesa, por telegrama:

"José Roberto Barbosa de Vilhena, já qualificado nos autos de agravo de instrumento n!! 1.236/SP, registro n!! 89121103, vem, respeitosamente, a presença de V. Exa., nos termos do art. 258 do Regimento Interno deste Egrégio Tribunal, via seu advogado infra-assinado, às 17:53 h do dia 05.12.89 apresentar agravo regimental à turma competente nos termos do art. 13 inciso IV letra c do despacho de V. Exa. no referenciado agravo de instru­mento pelos argumentos já extendidos no mesmo. São os termos em que pede e espera deferimento, Ribeirão Preto/Brasilia 05/12/89.

É o relatório.

Antônio Eugênio Cersóssimo Minghini

O. A. B./SP n!! 23.255."

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO NILSON NAVES (Relator): Em preliminar, voto pelo não conhecimento do agravo regimental. De início, porque não autenticado, e a autenticação parece-me imprescindível cuidando-se, como se cuida, de interposição por telegrama. Após, porque falta-lhe razões do pedido de refonna da decisão agravada. Em todos os recursos, e o agravo de que se

42 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990.

trata é um deles, cabe à parte interessada dar as explicações pelas quais discorda do ato judicial, sob pena de tomar em vão o inconformismo. Na espécie, limitou-se a fazer remissão aos "argumentos já estendidos no mesmo" (agravo de instrumento). Insuficiente o pedido! Aliás, recordo à Turma prece­dente de minha relatoria, o AgRg-852.

Não conheço do agravo regimental.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Sr. Presidente, estou examinando a hipótese do cabimento de agravo por telegrama nas circunstân­cias expostas pelo eminente Sr. Ministro-Relator. Entretanto, no caso concreto S. Exa. aduziu uma outra razão autônoma para o não conhecimento, o que me basta para acompanhá-lo.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO GUEIROS LEITE (Presidente): Também acompanho o voto do Relator com as ressalvas já manifestadas nos votos dos Srs. Ministros Eduardo Ribeiro e Waldemar Zveiter.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER: Fico, também, na mesma posição adotada pelo eminente Ministro Eduardo Ribeiro. Excluo o aspecto do conhecimento, porque tenho voto proferido, aguardando término de julgamento, com pedido de vista do eminente Sr. Ministro Eduardo Ribeiro.

Como o eminente Relator traz outra motivação, que não a do simples conhecimento, acompanho S. Exa. nesta parte.

EXTRATO DA MINUTA

AgRg no Ag n!! 1.236-SP - (Registro n!! 89121103) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Nilson Naves. Agravante: José Roberto de Vilhena. Agravado: O R. Despacho de fls. 554. Advogados: Drs. Antônio Eugênio Cersóssimo Min­ghini e Rubens Ferraz de Oliveira Lima e outros

Decisão: A Tunna, preliminarmente e por unanimidade, não conheceu do agravo regimental, nos termos do voto do Exmo. Sr. Ministro Relator (3f! Turma - 06.02.90).

Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Ministros Eduardo Ribeiro, Waldemar Zveiter, Cláudio Santos e Gueiros Leite.

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro GUEIROS LEITE.

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990. 43

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE

INSTRUMENTO N!! 1.375 - SP

(Registro n!! 890012446-3)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro José Dantas Agravante: Armindo A rede Agravado: Ministério Público do Estado de São Paulo Advogados: Drs. Edevaldo Alves da Silva e outros

EMENTA: Criminal. Recurso Especial. Imperfeição formal.

Inadmissão. Minguada da indicação dos dispositivos le­gais ditos violados (implícita que fosse) e da demonstração do dissídio pretoriano, incabe suprir-se tal imperfeição do recur­so na via do agravo de instrumento, posto que inadmissível a remoção dos pré-requisitos da admissibilidade recursal para além do seu espaço e tempo, isto é, a petição e o prazo de interposição.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 5ó!. Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

negar provimento ao agravo regimental, na forma do relatório e notas taqui­gráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 05 de fevereiro de 1990 (data do julgamento). Ministro JOSÉ DANTAS, Presidente e Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ DANTAS:

Eis a íntegra do despacho regimentalmente agravado: "O recurso extraor­dinário do ora agravante - manifestado contra condenação de única instância às penas de reclusão e multa - foi inadmitido por fundamentos assim desen­volvidos:

44

"Tem a Colenda Suprema Corte entendido que a petição de recurso extraordinário deve indicar, com clareza, as normas cons­titucionais ou legais que tenham sido eventualmente violadas, ou

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990.

e cuja vigência tenha sido negada, e, no caso de divergência pretoriana, demonstrar a identidade ou semelhança dos acórdãos confrontados (RE 98.059-8 - RJ, DJU de 12.11.82). "É indis­pensável que, na petição de recurso extraordinário, se declarem expressamente os artigos de lei ou da Constituição que se reputam ofendidos" (RTJ 110/1.101).

Nada disso foi feito pelo recorrente, como se verifica pela leitura da petição de interposição, em conseqüência do que, data venia, não pode o apelo extremo ser admitido, por deficiência de fundamentação. Aplica-se a Súmula n!l 284." - fls. 29.

E mais:

"Em relação ao outro fundamento, o da alínea d, limitou-se o recorrente a citar um único acórdão proferido por outro Tribu­nal, que não apresenta, porém, nenhum ponto capaz de evidenciar o dissenso jurisprudencial. E os outros três acórdãos não se pres­tam ao fim visado, porque proferidos por este mesmo Tribunal. Nesse sentido, o enunciado da Súmula 369. Assim, não há de falar em conflito que possibilite a admissão do recurso sob o enfoque da alínea d (artigo 322 do Regimento Interno do Supremo Tribu­nal Federal e Súmula 291)." - fls. 30.

Lendo a petição de recurso reproduzida a fls. 9/14, na ver­dade, concordo em que não há censurar-se o r. despacho de inadmissão, preciso que foi na indicação da absoluta carência formal daquela insurgência extraordinária. Tal carência perma­nece a mesma, se bem que agora se trate de recurso especial, como o sagrou a parcial declinatoriafori constante do despacho de fi. 316.

É bem verdade que, advertido da imperfeição do recurso interposto, o agravante curou de supri-la em sua minuta de agra­vo, na qual se estendeu em estabelecer o longo rol dos dispositivos legais reputados violados peja interpretação que lhes dera o v. acórdão recorrido, assim como procurou demonstrar a divergên­cia pretoriana, de relação àquele único precedente prestante ao confronto, no tema de inépcia da denúncia e de nulidade da sentença, argüido à míngua dos respectivos requisitos legais.

Convenha-se, porém, na extemporaneidade desse supri­mento, consabida que é a completa inviabilidade da remoção daqueles pré-requisitos recursais do seu verdadeiro termo de espaço e tempo - a petição de recurso e o prazo de sua interpo­sição, dos quais se distancia, em forma e substância, o agravo de instrumento que sobrevenha ao despacho de inadmissão.

R. Sup. Trib. Jusl., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990. 45

Portanto, nego provimento ao agravo.

Transitada em julgado esta decisão, devolva-se o processo ao Supremo Tribunal Federal, perante o qual, conforme o r. despacho de fls. 316, continuará pendente o agravo, no tocante à matéria constitucional concomitantemente argüida.

Publique-se.

Brasília, 07 de dezembro de 1989 - fls. 322/23."

Daí que o agravante mostra-se irresignado, em síntese porque: primeiro, sobre conferir ao Relator "o poder de arquivar ou negar seguimento a pedido ou recurso manifestamente intempestivo ou incabível e, ainda, quando contra­riar a Súmula do Tribunal, ou for evidente a incompetência deste", certamente que o Regimento deste Tribunal, art. 34, parágrafo único, não poderia ter aplicação ao caso, salvo interpretação ampliativa, evidentemente vedada ao Relator; segundo, tempestivo que foi o agravo de instrumento (tanto formal quanto substancialmente), não havia impedir alongar-se o mesmo nas consi­derações antes expendidas em termos da inépcia da denúncia e do julgamento cifra petita, contrapondo-as à tese da não admissibilidade do recurso extraor­dinário, e nunca considerá-lo mero suprimento de imperfeições do dito recurso, como quisera o despacho regimenalmente agravado. Leia-se (fls. 326/330).

Mantendo a decisão, trago a julgamento o agravo regimental.

Relatei.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ DANTAS (Relator): Srs. Ministros, da primeira sustentação do agravante, veja-se-lhe a impertinência, pois que, às claras, longe da invocação do art. 34, parágrafo único, do RISTJ, o que se aplicou ao caso foi o seu art. 254, I; cuidou-se, na verdade, da ampla compe­tência ali conferida ao Relator, conforme o expresso improvimento do agravo, com fulcro no juízo de valor então desenvolvido, e não de um simples despacho de arquivamento ou de negativa de seguimento, ao qual equivocamente alude o agravante.

E quanto à segunda sustentação, sobre dizer que o agravo improvido não fora além de alongar as considerações deduzidas no recurso extraordinário, isso não procede. Conforme dito na decisão ora atacada, e facilmente se verifica do confronto das citadas peças do processo, na realidade, o de que cuidou o agravo instrumental foi indicar os dispositivos ditos violados na sua vigência e, de outro lado, pretender analisar o dissídio jurisprudencial à luz da duvidosa pertinência do padrão antes arrolado simplesmente pela ementa.

46 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990.

Desse moelo, sem mais, permaneço na convicção ele que tal suprimento elas lacunas elo recurso extraordinário se deu tardiamente, assim oferecido, repita-se, longe elo espaço e tempo que lhe são reservados, isto é, a própria petição recursal e o seu prazo de interposição.

Pelo exposto, nego provimento ao agravo regimental.

EXTRATO DA MINUTA

AgRg no Ag 1.375 - SP - (Reg. n!.! 89.0012446-3) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro José Dantas. Agravante: Armindo Arede. Agravado: Ministério Público elo Estado de São Paulo. Advogados: Drs. Eclevaldo Alves da Silva e outros.

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regi­mental (em 5.2.90 - 5i! Turma).

Votaram de acordo os Exmos. Srs. Ministros Fiaquer Scarterzzini, Costa Lima, Assis Toledo e Edson Vidigal. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro JOSÉ DANTAS.

AGRA VO NO REGIMENTAL NO AGRAVO DE

INSTRUMENTO N!.! 1.518 - SP

(Registro n!.! 89.0012803-5)

Relator: O Ermo. Sr. Ministro Fontes de Alencar

Agravante: Vicenzo Ruta

Agravado: R. Despachos de Folhas 90.

Advogados: Ronaldo Pessoa Pimentel e Francisco Carlos Rocha de Barros.

EMENTA: Agravo de instrumento. I - Inadmitido o recurso especial, e não tendo a parte,

no agravo de instrumento, refutado o fundamento da decisão agravada, inviável mostra-se o reexame da matéria através do agravo regimental.

11 - Recurso que não mereceu provimento. Unânime.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990. 47

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a 4!! Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, na forma do relatório e notas taqui­gráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 13 de fevereiro de 1990 (data do julgamento).

Ministro ATHOS CARNEIRO, Presidente. Ministro FONTES- DE ALENCAR, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO FONTES DE ALENCAR: Cuida-se de agra­vo regimental interposto contra o seguinte despacho:

"Trata-se de agravo de instrumento a despacho que indeferiu recurso especial contra decisão proferida em ação de despejo.

Inviável é o recurso, porquanto o despacho agravado funda­mentou-se na Súmula nQ 284, e tal argumento não foi infirmado pelo recorrente, tomando-se, pois, inalterada a decisão.

Em face do exposto, nego provimento ao presente agravo (art. 254, I, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justi­ça)."

Sustenta em síntese o agravante que da leitura da Súmula 284 do Supremo Tribunal Federal o despacho atacado refutou o agravo interposto, sem conhe­cer a matéria nele esposada.

48

Diz, ainda, que

" ... não só o agravo, também o especial, ambos, foram inter­postos com fundamento na letra a, do inciso IV, do art. 11, do Ato Regimental nQ 01, de lOA.89, desse mesmo E. Tribunal;

04 - data maxima venia o permissivo enfocado - "con­trariar tratado ou lei federal, ou negar-lhe vigência" - isso é matéria da prefaciaI do recurso especial e do agravo recorrido, razão pela qual se estranha a forma emque foi refutado o agravo presente.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990.

05 - Por outro lado, e no mérito, está evidenciado o abuso de Direito, até porque a locadora agravada após haver celebrado um novo pacto escrito, por ela trazido ao processo, não poderia refutá-lo, da mesma maneira o Tribunal a quo, tendo em vista a jurisprudência cIele mesmo."

É o relatório.

VOTO

o EXMO. SR. MINISTRO FONTES DE ALENCAR (Relator): O des­pacho que indeferiu o recurso fundamentou-se no fato de que este não reunia as mínimas condições de admissibilidade, porquanto o recorrente sequer indi­cou o dispositivo de lei federal que teria sido violado, daí ter aplicado com acerto a Súmula 284.

No agravo de instrumento esse fundamento não foi refutado, tornando portanto esta questão preclusa, não se podendo, por conseguinte, reagitá-Ia através de agravo regimental, como pretende o ora agravante.

Ressalto, outrossim, que em inúmeros julgados desta Corte, inclusive alguns por mim relatados, nos casos em que o recorrente no recurso especial não indica o dispositivo legal apontado, não pode o Relator suprir a deficiência da petição, porquanto isto consistiria em inovação do recurso acarretando surpresa à parte contrária.

Em face do exposto, nego provimento ao presente agravo. É o meu voto.

EXTRATO DA MINUTA

AgRg no Ag n!! 1.518 - SP - (Reg. n!! 89.00128035) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Fontes de Alencar. Agravante.: Vicenzo Ruta. Agravado.: R. Despacho de fls. 90. Advogados: Ronaldo Pessoa Pimentel e Francisco Carlos Rocha de Barros.

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao Agravo Re­gimental (Em 13.2.90 - 4!! Turma).

Os Exmos. Srs. Ministros Sálvio de Figueiredo, Barros Monteiro e Athos Carneiro votaram com o Relator. Ausente, ocasionalmente, o Exmo. Sr. Mi­nistro Bueno de Souza. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro ATHOS CARNEIRO.

R. Sup. Trih. Jusl., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990. 49

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE

INSTRUMENTO N!!1.672 - SP

(Registro n!! 89.0013120-6)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Fontes de Alencar Agravante: Itaú Seguros S/A Agravado: R. Despacho de Folhas 6l. Advogados: Drs. Adílson Roberto Simões de Carvalho e André Vidigal

de Oliveira e outros

EMENTA: Recurso Especial. Impossibilidade de reexa­me de prova. Decisão monocrática do Relator do recurso.

I - A instância ordinária é soberana no exame da prova, que não pode ser reexaminada em via especial.

H - Pode o relator do recurso especial singularmente negar ou prover agravo de instrumento interposto da decisão que o inadmitir (art. 254, I, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça).

IH - Agravo regimental desmerecido de provimento. Unânime;

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que ~ão partes as acima indicadas.

Decide a 4l! Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, na forma do relatório e notas taqui­gráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 6 de março de 1990 (data do julgamento).

Ministro ATHOS CARNEIRO, Presidente. Ministro FONTES DE ALENCAR, Relator.

RELATÓRIO

o EXMO. SR. MINISTRO FONTES DE ALENCAR: Cuida-se de agra­vo regimental interposto contra o seguinte despacho:

50

"Trata-se de agravo de instrumento a despacho que indeferiu recurso extraordinário, transformado ipso lure em recurso espe­cial, contra decisão proferida em embargos à execução.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990.

Alega o recorrente violação aos arts. 147, lI, 1.432 e 1.444 do Código Civil.

Inocorrem violações aos dispositivos legais apontados, por­quanto o acórdão decidiu à luz da matéria fática, não sendo viável o reexame através de recurso especial (Súmula n!.) 279).

Por outro lado, consoante ressaltou o despacho agravado

"pacífica a jurisprudência no sentido de que válido é o con­trato de seguro, quando a omissão, aferida nas informações pré­vias do segurado, não tiver sido intencional ou de má-fé (RT 527/242 e RF 197/102)".

Em face do exposto, nego provimento ao presente agravo (art. 254, I, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justi­ça)."

Sustenta em síntese o agravante que errônea foi a interpretação dada à Súmula 279, porquanto cuida-se de matéria de direito e não de fato.

Acrescenta, ainda, que a segurada omitiu informação de seu estado real de saúde, que modificaria a base do contrato, pois a seguradora após a morte da segurada constatou que esta havia estado internada por diversas vezes no Hospital e Maternidade Bartira, conforme atesta documento emitido pela ad­ministração, fatos estes ocorridos antes da contratação do seguro, induzindo a agravante em erro, por vício de consentimento.

E, finalmente, argumenta que falece competência ao Relator para posi­cionar-se sobre o mérito da questão, pois isto compete à Turma, como deter­mina o inc. IV do art. 13 do RI/S.T.J. Cabe a este, apenas, examinar o cabimento do recurso (adequação), bem como a competência do S.T.J. para apreciar o recurso.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO FONTES DE ALENCAR (Relator): Con­soante se constata do v. acórdão recorrido, a questão foi decidida à luz da prova, sendo, portanto, inviável o reexame da matéria a nível de recurso especial, a teor da Súmula 279 do S.T.F.

Dele destaco as seguintes considerações inseridas no voto do eminente Relator, Juiz Bruno Neto:

"Com efeito, para eximir-se da obrigação sustenta a segura­dora, embora admita não ter havido má-fé por parte da segurada, a quebra de lealdade por parte desta no ato de contratar, pois omitiu circunstâncias só dela conhecida.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990. 51

ças:

52

Não lhe assiste, contudo, razão, pois é de se convir que tratando-se de seguro de vida cujas propostas, como é público e notório, são angariadas por insistentes funcionários do Banco que, de modo geral, se preocupam apenas em obter a assinatura do segurado e com o posterior recebimento da comissão, deixan­do sem explicação qualquer ponto que possa impedir a efetivação do contrato.

Pode-se supor, diante disso, que os quadradinhos riscados na forma de x, no cartão de proposta de fls. 19, não tenham sido feitos pela segurada. Aliás, seria de boa cautela que as segurado­ras exigissem que as propostas fossem respondidas por extenso e de próprio punho, providências que evitariam problemas como o dos autos.

Bem por isso é que, considerando-se como são angariadas tais propostas de seguro de vida, que dispensam prévio exame médico, a jurisprudência, atenta aos fins sociais da lei e às exi­gências do bem comum, vem temperando com eqüidade o con­ceito de boa-fé previsto no art. 1.443 do C.e.

Ora, a embargante não exigiu exame médico prévio, aceitou a proposta e recebeu os prêmios. Assim, deve responder pelos riscos próprios do contrato. Se não lhe convém correr riscos de capital, que crie um departamento clínico. Silenciando assumiu o risco de pagar o capital segurado que, diga-se, é de valor ínfimo, como afirmou o apelado.

Portanto, como concluir, de modo induvidoso, que a segu­rada agiu preconcebidamente, visando induzir a seguradora em erro, quando sequer prova existe nos autos de que de seu punho completou os claros do cartão-proposta? E mais, como afirmar que tinha a segurada ciência exata do seu estado de saúde, sobre­tudo quando se leva em consideração a prova produzida, onde se evidencia não ter ficado plenamente caracterizada a relação de causalidade? - como de resto anotou o Magistrado./1

Acompanhando o Relator, assim ressaltou o eminente Juiz Sena Rebou-

/I Ao que tudo indica, a segurada, pessoa humilde, não tinha consciência de seu estado de saúde. As testemunhas nada trouxe­ram para esclarecimento desse ponto (fls. 47/49). Então, não provada a má-fé, a Seguradora não pode deixar de cumprir o contrato e pagar o seguro./1

R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990.

Saliento, outrossim, que a instância ordinária é soberana no exame da prova, não cabendo a esta Corte transformar-se em terceiro grau de jurisdição para a reapreciação do fato.

Inadequada é a alegação do agravante no sentido de que o Relator no agravo de instrumento deva se limitar apenas a verificar a competência do S.T.J. e à adequação do recurso.

O art. 254, I, do RI/S.T.J., permite ao Relator que em decisão monocrática negue ou proveja agravo de instrumento quando interposto de decisão que não admitiu o recurso especial.

Em face do exposto, nego provimento ao presente agravo.

É o meu voto.

EXTRATO DA MINUTA

AgRg no Ag n!.! 1.672 - SP - (Reg. n!.! 89.00131206) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Fontes de Alencar. Agravante: Itaú Seguros S/A. Agrava­do: R. Despacho de fls. 61. Advogados: Drs. Adilson Roberto Simões de Carvalho e André Vidigal de Oliveira e outros.

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regi­mental (Em 6.3.90 - 4i! Turma).

Os Exmos. Srs. Ministros Sál vio de Figueiredo, Barros Monteiro e Athos Cameiro votaram com o Relator. Ausente, por motivo justificado, o Exmo. Sr. Ministro Bueno de Souza. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro ATHOS CARNEIRO.

AGRA VO REGIMENTAL NO AGRAVO DE

INSTRUMENTO N!.! 1.932 - MG

(Registro n!.! 90.224-9)

Relator: O EXlJlo. Sr. Cláudio Santos

Agravante: Delikatessen Alpino Ltda.

Agravada: R. Decisão de FI. 135

Advogados: Drs. Antônio Vilas B. Teixeira de Carvalho e outros e Wag­ner Scalabrini e outros

R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990. 53

EMENTA: Agravo Regimental. Súmula 485. Divergên­cia. Prova. Exame.

A inexistência de elementos probatórios na demanda, reconhecida na instância ordinária, afasta a possibilidade de divergência com a Súmula aplicada de acordo com a orienta­ção do Supremo.

Não cabe o exame de prova na instância especial, tema que não se confunde com o da valoração.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a 3i! Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental no Agravo de Instrumento n!1 1.932 -MG, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator, na forma do relatório e notas ,taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 20 de março de 1990 (data do julgamento).

Ministro GUEIROS LEITE, Presidente. Ministro CLÁUDIO SANTOS, Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO CLÁUDIO SANTOS (Relator): Nos autos do AG n!1 1.932 - MG, proferi a seguinte decisão:

54

"0 recurso foi inadmitido pela decisão agravada de fls. 75/76 porque, perante o Tribunal a quo, a pretendida indenização por benfeitorias somente foi suscitada nos embargos de declara­ção de fls. 59/61, carecendo, assim, do necessário prequestiona­mento.

Realmente, verifica-se do traslado que no recurso de apela­ção (fi. 37) o agravante expressamente se referiu à matéria sub­metida à apreciação do Tribunal a quo, ou seja, o valor do aluguel fixado pela sentença.

Como ficou evidenciado na decisão de fls. 63/64, de acordo com Barbosa Moreira lia extensão do efeito devolutivo determi-

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990.

na-se pela extensão da impugnação: tantum devolutum quantum . apellatum.

Com relação à divergência trazida à colação, inexiste o alegado dissídio com a Súmula 485 que, aliás, na hipótese dos autos, foi mencionada pelo relator do acórdão recorrido ao evi­denciar a orientação prevalecente na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal quanto a sua aplicação. No entanto, a conclusão do seu voto é manifesta no sentido de que não foi ilidida a presunção de sinceridade do retomante.

Neste aspecto, portanto, a pretensão da recorrente não pare­ce prosperar porque, nesta Corte, ensejaria o reexame das pro­vas." (fi. 135)

Inconformada, vem a parte Delikatessen Alpino Ltda. com o presente agravo regimental a argumentar que o Tribunal a quo teria deixado de aplicar os arts. 20 e 21 do Dec. 24.150/34, e mais, que a locatária-agravante conseguira provar a insinceridade dos retomantes. Acrescenta haver o acórdão recorrido entendido que não se fizera prova capaz de ilidir a presunção favorável aos retomantes, transmudando a presunção reputada relativa em definitiva. Final­mente, expõe não se cuidar de mero exame de prova, mas de valoração dela.

Mantive minha decisão e ora submeto o agravo à consideração da Turma.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO CLÁUDIO SANTOS (Relator): Data venia, a questão não é de valoração, nem há conflito com a Súmula 485.

Com efeito, a decisão recorrida salientou:

"Não colhe, por outro lado, a suposta divergência jurispru­dencial a respeito da Súmula 485.

Quanto à decisão deste mesmo Tribunal (ApeI. Civ. 23.762, fi. 190), nada há a examinar, tendo em vista a vedação expressa da alínea c, inc. lU, art. 105, CF, que exige ser a divergência manifestada com decisão de outro Tribunal.

Todas as outras decisões supostamente conflitantes refe­rem-se à presunção de sinceridade que milita em favor do loca­dor-retomante, e anotam que essa presunção pode ser ilidida por prova em contrário.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990. 55

E outra coisa não foi afirmada pelo v. aresto recorrido, que assim concluiu a exposição detalhada da mais recente jurispru­dência a respeito: "Aqui, nenhuma prova cuidou a autora de trazer para os autos, suficiente para abalar a presunção favorável aos retomantes. A própria sentença, mGxillla venia, firmou-se tão-so­mente em uma presunção, quando asseverou que tudo leva a crer que a Comercial Lucciola Ltda. foi organizada com a finalidade única de tentar ilidir o pedido renovatório. E, respeitosamente, não encontro indícios de que assim tenha acontecido" (fI.273).

Importa observar que as alegações contidas no recurso es­pecial quanto à divergência neste aspecto importam, necessaria­mente, em reapreciação do conjunto probatório, hipótese de todo inadmissível neste grau recursal, incidente a Súmula 279 (Cf. STJ, Agr. Instr. n~ 160 - MA, in DJU de 10.08.89, p. 12.927)."

Como se vê, trata-se de exame de prova, o que é vedado no âmbito do recurso especial.

Por outro lado, nenhum dissídio há com a Súmula citada, pois o próprio relator do acórdão recorrido, como demonstrei na decisão agravada, salientou a orientação do STF e decidiu de acordo com aquela Súmula.

Cumpre-me, ainda, esclarecer que a própria recorrente admite enfrentar a questão das benfeitorias à ausência de requisito do prequestionamento, o que impossibilita o conhecimento do recurso nesta instância excepcional.

Por todos motivos, meu voto é pelo improvimento do agravo.

É como voto.

EXTRA TO DA MINUTA

AgRg no Ag n2 1.932 - MG - (Reg. n290.224-9) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Cláudio Santos. Agravante: Delikatessen Alpino Ltda. Agravada: R. Decisão de fI. 135. Advogados: Drs. Antônio Vilas B. Teixeira de Carvalho e outros e Wagner Scalabrini e outros.

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao Agravo Re­gimental no Agravo de Instrumento n2 1.932-MG, nos termos do voto do Exmo. Sr. Ministro Relator (Em 20/03/90 - 3~ Turma).

Os Exmos. Srs. Ministros Nilson Naves, Eduardo Ribeiro e Waldemar Zveiter votaram com o Relator. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro GUEIROS LEITE.

56 R. Sllp. Trib. JlIsl., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990.

AGRA VO REGIMENTAL NO AGRA VO DE

INSTRUMENTO N!! 2.279 - DF

(Registro n!! 90.1076-4)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Cláudio Santos

Agravante: João Rodrigues da Costa

Agravado: O R. Despacho de fi. 67

Advogados: Celso Franco de Sá Santoro e outro e Anderson Mamecle

EMENTA: Agravo regimental. Agravo de instrum.ento. Recurso especial. Normas de processamento.

De acordo com a decisão da ego Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, no AgRg 1.559 de que fui rela­tor, é condição necessária à viabilidade de qualquer recurso, que o recorrente, ao manifestar o seu inconformismo, tenha impugnado os fundamentos da decisão recorrida.

Em se tratando de agravo de instrumento, é dever do agravante infirmar a decisão agravada para esta Corte, sendo insuficiente, portanto, repetir as razões anteriormente dedu­zidas no recurso especial.

Agravo regimental improvido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a 311 Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental no agravo de instrumento n!! 2.279-DF, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 03 de abril de 1990. (data do julgamento)

Ministro GUEIROS LEITE, Presidente. Ministro CLÁUDIO SANTOS, Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO CLÁUDIO SANTOS (Relator): Trata-se de agravo regimental interposto contra a decisão de fl. 67, assim fundamentada:

R. Sup. Trih. Jusl., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990. 57

"O recurso especial foi indeferido com base na aplicação das Súmulas 279 e 284 do Supremo Tribunal Federal.

Como bem demonstrou o Ministério Público Federal (parecer de fls. 63-65), os fundamentos da decisão agravada não foram atacados pelo ora agravante.

De acordo com o artigo 34, parágrafo único, do Regimento Interno, nego seguimento ao agravo de instrumento./I

Inconformado, sustenta o agravante (fls. 70-71):

"Lê-se em várias passagens contidas na minuta do agravo, o que repete-se das razões do apelo especial, que as normas violadas são os arts. 195 e 202, do Código Civil, e 71 da Lei n!.! 6.051173. Por outro lado, a tese suscitada, em ambos os apelos, é a posse do estado de casado acatada pela decisão do Tribunal a quo o que contraria os dispositivos atrás mencionados.

Ora, se as razões do apelo especial, bem como a minuta do agravo apontam que, em primeiro, o v. aresto violou as normas já mencionadas, e após, em segundo, que o despacho que inadmitiu este apelo não poderia fazê-lo, pois restava demonstrada a violação legal, é de se deduzir, data venia, que os fundamentos - declaração de posse do estado de casado - do v. aresto do Tribunal a quo foram acatados.

Isto posto, não prospera, cone essa venia, as razões do despacho ora atacado." (sic).

58

É o relatório.

VOTO

EMENTA: Agravo regimental. Agravo de instrumento. Re­curso especial. Normas de processamento.

De acordo com a decisão da ego 3!! Tunna do Superior Tribunal de Justiça, no AgRg 1.559 de que fui relator, é condição necessária à viabilidade de qualquer recurso, que o recorrente, ao manifestar o seu inconformismo, tenha impugnado os fundamen­tos da decisão recorrida.

Em se tratando de agravo de instrumento, é dever do agra­vante infirmar a decisão agravada para esta Corte, sendo insufi­ciente, portanto, repetir as razões anteriormente deduzidas no recurso especial.

Agravo regimental improvido.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990.

o EXMO. SR. MINISTRO CLÁUDIO SANTOS (Relator): Neste Tri­bunalnão tenho sido rigoroso no exame da elaboração, pelos advogados, dos agravos de instrumento que são interpostos da denegação de recursos espe­ciais.

No entanto, na aferição do inconformismo da parte, o mínimo que con­sidero indispensável à própria viabilidade do agravo de instrumento é que, nas razões, e de forma inequívoca, haja o agravante infirmado os fundamentos da decisão agravada, conforme decidiu esta Turma, na sessão do dia 20.02.90, ao julgar o Agravo Regimental n!! 1.559, de que fui Relator.

No caso dos autos, isto não ocorreu, pois, em detida leitura das razões do agravo de instrumento, constatei que foi feita uma reprodução literal do ex­posto no recurso especial, com substituição da palavra recorrida, por agravada. Tanto que o Ministério Público Federal, no parecer de fls. 63-65, aduziu:

"( ... ) a simples leitura da petição evidencia que o agravante se limitou a renovar a fundamentação do recurso especial e a indicar peças para o traslado, sem fazer qualquer referência aos fundamentos da decisão que inadmitiu o recurso, o que inviabiliza a acolhida do agravo.

O Excelso Pretório em diversas oportunidades assentou entendimento de que o agravo de instrumento deve combater os fundamentos da decisão que não admitiu o recurso extroardinário (RTJ 109/633; RTJ 92/147)."

No caso dos autos, como no agravo de instrumento não há qualquer referência expressa à aplicação das Súmulas 279 e 284 do Supremo Tribunal Federal, mantenho a decisão agravada.

É o meu voto, Sr. Presidente.

EXTRATO DA MINUTA

AgRg no Ag n!! 2.279 - DF - (Reg. n!! 90.1076-4) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Cláudio Santos. Agravante: João Rodrigues da Costa. Agravado: O R. Despacho de fl. 67. Advogados: Drs. Celso Franco de Sá Santoro e outros e Anderson Mamede.

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regi­mental no Agravo de Instrumento n!! 2.279-DF, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator (Em 03/04/90 - 3i! Tunna).

Os Exmos. Srs. Ministros Nilson Naves, Eduardo Ribeiro e Waldemar Zveiter participaram do julgamento. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Minis­tro GUEIROS LEITE.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990. 59

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO N!) 2.889 - PE (Registro n!) 90.0002271-1)

Relator: O EX11lo. Sr. Ministro Carlos Tlzibau

Agravante: Ministério Público Federal

Agravados: Severino Lourenço da Silva, Adilson José Lins de Souza e Hemetério Fernandes Gllrgel

Advogados: Drs. Jadier Rodrigues de Carvalho, Marconi Dourado e Boris Trindade

EMENT A: Penal. Processual Penal. Recurso Especial. Reapreciação de matéria simplesmente de fato. Impossibili­dade.

Resvala para o terreno da questão puramente de fato a reapreciação da eventual potencialidade lesiva na falsificação de documento público. Por esse motivo, não pode ser admiti­do recurso especial interposto com essa finalidade.

Agravo regimental improvido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 6i! Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei. Brasília, 25 de junho de 1990 (data do julgamento).

Ministro WILLIAM PATTERSON, Presidente. Ministro CARLOS THI­BAU, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO CARLOS THIBAU: Neguei provimento a agravo de instrumento interposto pelo Ministério Público Federal contra des­pacho que não admitiu a subida de seu recurso, antes extraordinário, hoje especial, de acórdão proferido pela antiga 3i! Turma do saudoso Tribunal Federal de Recursos, Relator o Sr. Ministro Flaquer Scartezzini, assim emen­tado:

60

"Penal - Adulteração de documento público - Crime impossível - Configuração.

R. Sup. Trih. Jus!., I3rasília, 2(12): 29-63, ago. 1990.

o delito de falsum tem sua característica na imitação da verdade por contrafação, alteração ou simulação, meios estes capazes de enganar o homem comum. Todavia, não é o suficiente a illllllutatio veri, é necessário que exista a imitatio veri, ou seja, que a falsificação convença, que c0l1:turbe a fé pública, que esta­beleça enfim a possibilidade de dano.

Constituindo, in caSll, a alteração meio absolutamente ine­ficaz e inidôneo para alcançar o resultado pretendido pelo agente, impossível se torna a consumação do crime previsto no art. 297 do Código Penal.

Apelo desprovido.

Sentença mantida."

O aresto recorrido teria negado vigência aos arts. 297, capllt e seu pará­grafo I!!, 62 e 17 do Código Penal, e divergido de decisão elo E. STF (RE 93.292 - RTJ 101/311) ao manter a sentença absolutória, que considerou a conduta dos réus como crime impossível, porque absolutamente ineficaz para atingir o resultado.

Na parte exclusiva do despacho ora agravado, assim me pronunciei:

" ... parece-me que a razão está com o douto despacho agra­vado. Conquanto padeça ele críticas a incidência da Súmula 400/STF em relação ao recurso especial e afigure-se-me apta a análise comparativa feita pelo recorrente entre o aresto recorrido e o precedente confrontado (Súmula 291/STF), o certo é que o apelo em exame sofre o óbice da Súmula 279/STF, pois que enfrenta o reexame da prova, no tocante a saber se foi eficaz, ou não, o meio utilizado para a perpetração do suposto crime, não se tratando, como sustenta o agravante, de mera valoração da prova.

Ante o exposto, nego provimento ao agravo."

A ilustre SGR agravante, Dra. Márcia Dometila Lima ele Carvalho, sus­tenta que seria lícito ao STJ valorar a prova com vistas à teoria do crime impossível, por se tratar ele direito e não de fato a questão a ser apreciada no recurso que quer fazer subir, concernente a saber-se se era de eficácia absoluta ou relativa o meio utilizado para a perpetração elo crime supostamente impos­sível.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO CARLOS THIBAU (Relator): Os réus foram acusados de falsificação ele documento público, que seria um ofício do Procu­rador Chefe da Fazenda Nacional à Procuradoria ela República ele comunicação

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2( 12): 29-63, ago. 1990. 61

de que o primeiro deles, devedor de IPI, saldara o respectivo débito, devendo, assim, ser requerida a extinção da execução fiscal e a conseqüente baixa na distribuição.

Em tal expediente, em princípio verdadeiro, os dois outros réus, funcio­nários da Fazenda Nacional, teriam forjado pequenas mas substanciais altera­ções, de tal modo que o Procurador da Fazenda Nacional passaria a pedir ao Procurador da República não somente a extinção da execução fiscal como, também, o arquivamento de eventual inquérito policial.

Na instrução colheu-se o depoimento do Procurador da República desti­natário do referido ofício, que declarou que, ao receber o expediente, consultou a Procuradoria da Fazenda Nacional sobre o seu conteúdo.

Como bem assinalou o Sr. Ministro Flaquer Scartezzini em seu voto condutor no TFR. ..

"A simples consulta, formulada pelo Procurador da Repú­blica à Procuradoria da Fazenda Nacional, para saber se a altera­ção feita teria sido ordenada pelo responsável do órgão, representa, no meu sentir, mera sugestão, que não alcança a imitatio veritatis, pois a solicitação retira-lhe a possibilidade de uma ocorrência danosa, de vez que o pedido de arquivamento de inquérito policial formulado ao juiz competente é de competência exclusiva do Ministério Público e não da Procuradoria da Fazen­da, que não funciona como órgão fiscalizador da lei especifica­mente.

Em suma, embora se possa afirmar que a alteração levada a efeito em conluio pelos acusados mereça nosso repúdio, pode, sem dúvida, atingir o campo do ilícito administrativo, cuja análise escapa ao âmbito do processo penal, não poderá, contudo, atingir o campo do Direito Penal para configurar a ocorrência do crime tratado no artigo 297 do Código Penal, por se constituir em meio absolutamente ineficaz, inidôneo para atingir o resultado delituo­so."

Com efeito, como está posto nos autos, se a falsificação foi de pronto desmascarada por quem haveria de tomá-la como verídica, deixou, desde logo, de ter qualquer eficácia lesiva o meio utilizado para a prática do crime.

Como se sabe, o legislador do Código Penal brasileiro de 1940 acolheu o exemplo do Código Rocco, no qual se considerou supérflua a menção ao proejudicium alterius como condição do delito, tendo-se em vista o próprio conceito de documento, que se define como escrito juridicamente relevante. Daí porque não há crime se a falsidade documental for inócua.

62 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990.

Como crime de perigo que é, no Brasil, a falsificação de documento público, nossa legislação admite desde o dano efetivo como a potencialidade lesiva da falsidade, descartando, porém, a falsidade inútil ou inócua.

Por tal motivo, data venia, parece-me que resvala para o terreno da questão fática a reapreciação da existência de eventual potencialidade lesiva na falsificação, já que, calcado na prova acolhida na instrução, o acórdão do TFR concluiu contrariamente a tal alegação.

Ante o exposto,nego provimento ao agravo. É como voto.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO COSTA LEITE: Sr. Presidente, ao que de­preendi do voto do eminente Ministro Relator, a questão envolve realmente reexame da prova, sabidamente incomportável em sede de recurso especial.

Acompanho S. Exa.

EXTRA TO DA MINUTA

AgRg no Ag n!! 2.889 - PE - (Reg. n!! 90.0002271-1) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Carlos Thibau. Agravante: Ministério Público Federal. Agravados: Severino Lourenço da Silva, Adilson José Lins de Souza e Heme­tério Fernandes Gurgel. Advogados: Drs. Jadier Rodrigues de Carvalho, Mar­coni Dourado e Boris Trindade.

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regi­menta], nos termos do voto do Sr. Ministro Relator (25.06.90).

Votaram os Exmos. Srs. Ministros Costa Leite, Dias Trindade e William Patterson. Ausente, justificadamente, o Exmo. Sr. Ministro José Cândido. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. M~nistro WILLIAM PATTERSON.

R. sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 29-63, ago. 1990. 63

CONFLITO DE COMPETÊNCIA

CONFLITO DE COMPETÊNCIA N!! 250 - SP

(Registro n!! 89.0007856-9)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Edson Vidigal Suscitante: Juízo Federal da 22Q Vara em São José dos Campos-SP Suscitado: Juízo de Direito da 2Q Vara Criminal de Jacareí-SP Autora: Justiça Pública Réus: Azenildo Cavalcante da Silva e lvanildo Cavalcante da Silva

EMENT A: Processo Penal. Contravenção. Fauna silves­tre. Propositura da ação. Competência.

Tratando-se de ilícito cometido anteriormente à promul­gação da Nova Constituição, portanto, enquadrado como contravenção, o inquérito policial deverá ser recebido, para fins de instauração da ação penal, pela autoridade judiciária federal.

Conflito conhecido para declarar competente o suscitan­te, Juízo Federal da 22l! Vara em São José dos Campos, SP.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas. Decide a 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

conhecer do conflito, e, por maioria, declarar competente o Suscitante, Juízo Federal da 22ª Vara em São José dos Campos-SP, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2( 12): 65-117, ago. 1990. 67

Brasília, 21 de setembro de 1989 (data do julgamento).

Ministro JOSÉ DANTAS, Presidente. Ministro EDSON VIDIGAL, Re­lator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO EDSON VIDIGAL: Seis galos de campina, em duas caixas de sapato "furadinhas", como descrito às fi. 31, ensejaram dúvidas em dois ilustres magistrados paulistas, resultando neste conflito.

Os pássaros ainda devem estar voando, soltos que foram depois pelos policiais que os apreenderam. Os dois acusados de haverem capturado os pássaros, para vendê-los adiante, escapuliram dos policiais e nunca mais foram encontrados. Nem mesmo uma das testemunhas arroladas, já que não residia mais na cidade.

Foi por volta das 15:00 horas do dia 29 de setembro de 1986, segunda­feira, que os irmãos Azenildo, de 20 anos, e Ivanildo, de 19, ambos Cavalcante da Silva e analfabetos confessos, foram surpreendidos por uma patrulha poli­cial, composta por um Sargento e três soldados.

O local em que estavam, no bairro São João, Município de Jacareí - SP, fica próximo a uma rodovia de grande movimento, onde ocorre freqüentemen­te o comércio de pássaros. Azenildo e Ivanildo carregavam, cada um, uma caixa de papelão "furadinha" (fI.31), dessas de sapato, com três exemplares da espécie, da fauna silvestre, como galo de campina.

Autuados, deram como endereço a Rua Ilha das Aranhas, oficialmente Rua Jacy Vieira, n!2 52, no Itaim Paulista, na capital, onde nunca foram encon­trados. Citados por Edital, não deram notícia, pelo que foi nomeada Defensora Dativa a Dra. Altamira Soares Leite, advogada militante em São Sebastião -SP.

Encerrada a fase policial, remetidos os autos à 22l! Vara da Justiça Federal, em São José dos Campos - SP, a meritíssima titular, Dra. Elvira Leão Palumbo, declarou-se incompetente, "a teor do art. 109, inciso IV, c/c art. 27, § 10 das Disposições Transitórias da nova Constituição Federal" (fi. 39), transferindo, assim, a questão para a Comarca de JacareÍ - SP, 2l! Vara Criminal, onde a titular, uma meritíssima não identificada, nem mesmo pelo carimbo da Distribuição, disse que "as condutas definidas na Lei n!! 5.197/67 como contravenção foram criminalizadas pela Lei 7.653/88, permanecendo, assim, a competência da Justiça Federal" (fI.40). Aí, depois de falar o Minis­tério Público Federal, em São José dos Campos-SP, em parecer manuscrito, de 26 de janeiro des 1989, (fi. 42 verso), pela suscitação do conflito, a meri­tíssima Dra. Juíza Federal da 22l! Vara suscitou o conflito.

68 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990.

Aqui, a douta Subprocuradoria Geral da República opinou dizendo que a competência da Justiça Federal, no caso, não foi alterada pela nova Consti­tuição, concluindo pela improcedência do conflito, declarando-se competente o MM Juiz Federal da 22l! Vara em São José dos Campos - SP, ora suscitante.

Relatei.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO EDSON VIDIGAL (Relator): O Código de Caça em que se resume a Lei n!! 5.197, de 03 de janeiro de 1967, a qual dispõe sobre a proteção à fauna, tipifica como contravenção "o comércio de espécime de fauna silvestre", conforme o art. 3!! acionado pela Polícia Federal contra os acusados.

Para o processo e julgamento das contravenções previstas pelo Código de Caça sempre foi competente a Justiça Federal. A propósito, há reiterada jurisprudência (Conflito de Jurisdição n!! 6.289 - SP, Relator Ministro Décio Miranda, in DJ de 04.05.81, STF; Conflito de Jurisdição n!! 6.277 - SP, Relator Ministro Soares Munoz, in DJ de 10.04.81, STF e Apelação Criminal n!! 5.346 - SP, Relator Ministro Lauro Leitão, in DJ de 26.05.83-TFR).

É certo que a Constituição Federal excluiu as contravenções da jurisdição federal (art. 109, IV). Mas antes da promulgação da Nova Carta, já em 12 de janeiro de 1988, a Lei n!! 7.653/88 transformava em crime essas contravenções contra a fauna silvestre.

"A ação penal, embora de iniciativa de autoridade policial - . observa o Parecer de fls. 48/49 - por obedecer o rito sumário, foi proposta perante autoridade judiciária federal, tipificados os fatos como contravenção, pois ocorreram em 29 de setembro de 1986".

"Posteriormente - prossegue - a Lei n!! 7.653, de 12.02.88, erigiu os fatos, aqui apurados, à categoria de crime, da competência da Justiça Federal, ao mesmo tempo em que a Nova Carta excluiu as contravenções da órbita federal, segundo seu art. 109, IV."

"Assim, se antes da Nova Carta os fatos, apesar de enquadrados como contravenção, eram da competência da Justiça Federal, hoje tipificados como crime, continuam na Justiça Federal."

"O cometimento do ilícito se deu antes da Nova Carta, no que se deve dar tratamento como contravenção, mais brando, portanto, à luz do princípio da irretroatividade da lei mais severa; mas com o seu julgamento na Justiça Federal, competente à época e agora."

Não vejo, ainda neste caso, nenhuma razão para se observar o disposto na Constituição Federal, art. 27, § 10 das Disposições Transitórias, posto que

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990. 69

como bem lembrado pelo Ministro Assis Toledo, no CC n!! 150 - SP, o texto constitucional refere-se às ações propostas perante a Justiça Federal até a data da promulgação da Constituição e o que se examina aqui, como o que se examinou no supramencionado Conflito de Competência n!! 150 - SP, ainda é o destino do inquérito policial- se deve ser recebido para fins de ação penal pela autoridade judiciária federal ou estadual.

Em conclusão, conheço do conflito e declaro competente o suscitante, a MMl! Drl! Juíza Federal da 22l! Vara de São José dos Campos - SP.

É como voto.

VOTO (VISTA)

O EXMO. SR. MINISTRO WILLIAM PATTERSON: Tratam os pre­sentes autos de conflito de competência surgido entre a Justiça Federal e a Justiça Comum Estadual para o julgamento do delito capitulado no art. 3!!, da Lei n!! 5.197, de 1967 (Código de Caça).

O eminente Relator, Ministro Edson Vidigal, concluiu pela competência da primeira, ao acolher as seguintes razões ínsitas no pronunciamento do Ministério Público Federal: (lê fls. 48/49).

Parece evidente que o caso deste processo está infenso às modificações registradas. Com efeito, tratando-se de contravenção, pois o fato ocorreu antes da Lei n!! 7.653, de 12.02.88, a competência para o seu julgamento, até a vigência da nova Carta Magna, era da Justiça Federal.

O digno Suscitante, porém, invocando o art. 109, inciso IV, c/c o § 10, do art. 27, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, e a teoria de que "considera-se proposta a ação, tanto que a petição inicial seja despachada pelo juiz, ou simplesmente distribuída, onde houver mais de uma vara" (art. 263, do CPC), recusou a competência, ao fundamento de que o processo foi recebido naquele foro após a promulgação da Lei Maior.

A dúvida que se levanta, portanto, diz à consideração do início do proce­dimento, de sorte a examinar a aplicação da nonna contida no § 10, do art. 27, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

Na sessão do dia 03 do corrente mês, em julgamento de conflito relatado pelo Sr. Ministro Assis Toledo, aderi ao voto de S. Exa., que sustentava, com argumentação lúcida, a tese segundo a qual o início da ação, nas contravenções, não pode ser admitido na fase policial, por contrariar princípio básico da relação processual, cuja integração só pode ser concebida em juízo. Dessa posição discordou o Sr. Ministro Costa Leite, lembrando orientação diversa do Egrégio Supremo Tribunal Federal.

70 R. Sup. Trih. Jusl., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990.

Como, logo a seguir, o Sr. Ministro Edson Vidigal, ao relatar os presentes autos, suscitou igual questão, resolvi pedir vista, para melhor exame do aspec­to.

o direito positivo nos mostra, sem discussão, que o legislador preferiu adotar sistema que se afasta da concepção doutrinária definidora do assunto, em termos genéricos. É o que se infere do art. 26, do Código de Processo Penal, verbis:

"Art. 26. A ação penal, nas contravenções, será iniciada com o auto de prisão em flagrante õu por meio de portaria expedida pela autoridade judicial ou policiaL"

O princípio está corroborado no texto do art. 531, do mesmo Código, quando estabelece:

"O processo das contravenções terá forma sumária, inician­do-se pelo auto de prisão em flagrante ou mediante portaria expedida pela autoridade policial ou pelo juiz, de ofício ou a requerimento do Ministério Público."

O simples fato de a legislação prescrever essa forma, de modo claro, não sepultou as críticas em torno dessa concepção. Muito pelo contrário, prestigia­da corrente doutrinária continua inconformada com o posicionamento consa­grado na Lei Adjetiva, sendo que alguns especialistas chegam até mesmo a acenar com uma possível inconstitucionalidade.

A propósito, ponho em destaque pronunciamentos respeitáveis, nessa linha de entendimento.

O Dr. Luiz Dória Furquim, quando Promotor Público, publicou na Re­vista Justitia o trabalho intitulado "Da analogia entre a denúncia e a portaria no processo sumário das contravenções", págs. 91/99, onde, ao analisar tese sustentada por Cândido Rangel Dinamarco, fez as seguintes considerações:

"Daí, de conseqüência em conseqüência, ele tirar a conclu­são, dentro do Processo Penal, de que também no processo sumá­rio das contravenções se formaria uma relação processual penal triangular, Ç> que se nos afigura excessiva teorização, ou melhor dizendo, demasiada generalização.

É que, se na ação penal iniciada por iniciativa do Ministério Público, a relação processual envolve, de um lado, autor e juiz, e de outro, juiz e réu, dando-se uma perfeita angularização, com maioria de razão, essa triangularização não poderia subsistir no processo sumário de contravenção, já que a ação penal é de iniciativa do juiz, posto que nesta última até mesmo a angulari­zação seria duvidosa, em face do Direito Positivo.

R. sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990. 71

72

Explica-se, que, quanto à ação penal no processo sumário das contravenções, o nosso Legislador regrediu, abandonando as conquistas da Ciência Processual, aos padrões medievais do pro­cesso inquisitivo, no qual a ação não tem lugar, cedendo terreno e diluindo-se mesmo completamente na jurisdição (Cf. Camelut­ti, "Leciones de Derecho Procesal Penal", vol. lI, pág. 13, apud Hélio Ivo Angresani Dória, "Ação e Jurisdição no Código de Processo Penal", in "Estudos de Direito Processual in Memoriam do Ministro Costa Manso", Ed. Revista dos Tribunais, 1965, pág. 20).

Camelutti, citado por Hélio Dória, fala mesmo de um "mos­trum de lógica processual". Hélio Dória afirma, entretanto, que seria absurdo falar-se de uma supressão da acusação, conjunta­mente com a ação, concluindo que haverá, no mínimo, uma pretensão punitiva, a ser deduzida pelo juiz perante si próprio, "para, num momento subseqüente, julgá-la fundada ou infunda­da" (Ob. cit. pág. 21).

A seguir, compara a portaria do juiz à denúncia do Ministé­rio Público, como faz também o meu colega: "Por isso, o juiz, quando inicia o processo das contravenções, deve observar os mesmos requisitos de admissibilidade que a I ei impõe à denúncia. Cumpre-lhe acusar para poder pretender, em nome do Estado­Administração, a aplicação das sanções penais correspondentes aos fatos delituosos imputados a alguém. A portaria é, então, assim como a denúncia, o ato formalizador da acusação" (Hélio Dória, ob. cit. pág. 21).

Mas isto é dito pressupondo-se a validade formal de uma instância sui generis, iniciada sem ação! Vale dizer: não há an­gularidade e muito menos triangularidade no processo contraven­cional, não obstante a pretendida analogia entre a denúncia e a portaria, analogia esta que não tem o condão de modificar a natureza da relação processual, pois aquela somente funciona post legem e esta existe mesmo praeter legem, por necessidade lógica e institucional.

Seria então meramente linear a relação processual no pro­cesso contravencional, envolvendo juiz e réu tão-somente, e a analogia entre a portaria e a denúncia seria invocada por espírito meramente formalístico, sem alcançar a essência das garantias e princípios constitucionais do processo.

Verificando isso é que Hélio Dória deu pela inconstitucio­nalidade do art. 26 e do artigo 531 do Código de Processo Penal".

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2( 12): 65-117, ago. 1990.

E, mais adiante, é peremptório em condenar o disciplinamento vigente: "Com maioria de razão, fulminar-se-á de inconstitucional o

processo penal que se realize sem a intervenção de uma parte, já não se dirá imparcial, mas distinta física e organicamente do julgador a quem caiba sentenciar numa causa perante si proposta com as cautelas de uma investigação preliminar que estabeleça a suspeita de infração penal no caso concreto.

Por conseguinte, de ação penal não se poderá falar, por inexistente, uma vez a constitua preceito legal inconstitucional. Tratar-se-ía de inexistência jurídica, e que se deduz da invalidade lógico-jurídica, conceito paralelo e distinto de inexistência em lógica apofântica."

Manuel Carlos da Costa Leite (in "Lei das Contravenções Penais", pág. 63/64) lembra que o Professor José Frederico Marques leciona que o art. 17, ·do ordenamento, ao dizer que a ação penal é pública, devendo a autoridade proceder de ofício, emana grosseiro e imperdoável erro de técnica, proveniente do uso indevido de conceito do processo, ao falar em ação penal ex officio. Por outro lado, ao aludir à magna posição do MP nesse comando, censura a sua dispensa, ao afirmar:

"Difícil é atinar-se com a razão dessa estranha providência. Se o Ministério Público é o órgão da ação penal, a figura proemi­nente da perseclltio cri111inis, por que se lhe tirar tarefa que pre­cipuamente cabe a esse órgão? Que utilidade, vantagem ou benefício, poderá advir de tão esquisita medida? Que irá ganhar a celeridade ou bom andamento do processo com essa inversão de posições?"

José Roberto Baraúna escreve em Justitia sobre "O procedimento sumá­rio das contravenções", com observações a respeito de inconstitucionalidade suscitada em manifestação do Juiz de Direito Hélio Angrisani Dória, ao vis­lumbrar no fenômeno da "interferência funcional", ocorrido nas contraven­ções, um desvio da boa doutrina, que merece ser combatido.

Sem embargo da respeitabilidade carregada nos pronunciamentos dos contestadores da posição assumida pelo legislador pátrio, é induvidoso que as regras questionadas venceram, intocáveis, as barreiras das críticas, e recebe­ram o aval de uma significativa parcela dos doutrinadores, além de firmarem-se como disposições imaculadas, no crivo da orientação jurisprudencial.

Não são poucos os julgados que cimentaram a literalidade da norma, no sentido de que, nas contravenções, o procedimento inicia-se com os atos relacionados no art. 26, entre eles a portaria expedida pela autoridade policial. No Tribunal de Alçada de São Paulo é tranqüila a orientação que se extrai desses arestos:

R. SlIp. Trih. JlISt., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990. 73

"Portaria - "A portaria equivale à denúncia, motivo por que deve conter os requisitos desta, especificando o fato contraven­cional com todas as suas circunstâncias para que 9 réu possa saber do que é acusado e, assim, exercer o direito de ampla defesa assegurado pelo art. 141, § 25, da Constituição Federal" (ac. por maioria de votos da I!!. Câm. Crim. do Tribunal de Alçada de São Paulo, de 15.7.1960, relator designado: Antônio G. Gonzaga­RT 304/482)".

"Portaria - "A portaria, como a denúncia ou a queixa, deve obedecer aos requisitos do art. 41 do CPP" (ac. unânime da I!!. Câm. Crim. do Tribunal de Alçada de São Paulo de 01.08.1960, relator: Itagiba Porto -RT 306/440).

"Portaria - "Não tem amparo legal a decisão que rejeita portaria expedida pela autoridade policial, em feito contravencio­nal, com fundamento em razões de mérito e sob pretexto menos de que em tais processos o momento da propositura da demanda é o da chegada dos autos ajuízo" (ac. unânime da 2!!. Câm. Crim. do Tribunal de Alçada de São Paulo, de 14.07.1961, relator: Humberto da Nova - RT 318/362).

No mesmo sentido é a orientação do Egrégio Supremo Tribunal Federal, consoante se vê desses acórdãos:

74

"A portaria que pode dar início à ação penal, no processo sumário, além de observar o disposto no art. 533, do CPP, deve satisfazer os requisitos estabelecidos no art. 51, com referência à queixa ou à denúncia" (Relator Ministro Eloy da Rocha, in RTJ 60/345).

RE Cr. n~ 99.326-6 - PRo

Relator: Ministro Alfredo Buzaid. DJ de 16.03.84.

"EMENTA: 1. Contravenção. Na contravenção a ação penal será iniciada com o auto de prisão em flagrante ou por meio de portaria expedida por autoridade judiciária ou policial (Código de Processo Penal, art. 25).

2. Os arts. 39, lI, e 55 da Lei Complementar n~ 40/81, são normas gerais, que não revogaram a legislação especial, nomea­damente o art. 25 do Código de Processo Penal.

3. Não conhecimento do recurso em virtude do óbice regi­mental."

"EMENTA: Nas contravenções penais, é facultada a instau­ração da ação penal, tanto pelo flagrante ou portaria, como pela

R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990.

denúncia oferecida pelo Ministério Público. Recurso Extraordi­nário de que não se conhece por falta de pressuposto regimental (art. 325, I, do R.I., com a redação aprovada em 15.10.80), sem embargo de anotar-se que a tese do acórdão recorrido revela coerência com precedente assentado pela Primeira Turma (RRC 63.536, DJ de 28.02.86). Lei Complementar n!! 40-81, artigos 3!!, lI, e 55, caput."

Os próprios tratadistas que, por convicção filosófica, abominam a disci­plina legal, tal como disposta, reconhecem ser indiscutível que a ação contra­vencional começa com aqueles atos. Por isso mesmo é que se insurgem contra a ordem estabelecida.

Outros, porém, acolhem o texto, sem maiores ressalvas, porquanto diante de uma realidade jurídica. Nessa linha posso incluir o Ministro Evandro Lins e Silva, que em parecer publicado na Revista de Direito Penal (fls. 118/126), aborda o problema com muita acuidade. É ler-se:

"1. O procedimento penal, em relação às contravenções, não obedece a critérios técnicos rígidos, corretos ou isentos de cen­sura. Veja-se o art. 17 da Lei das Contravenções Penais, onde se lê: "A ação penal é pública, devendo a autoridade proceder de ofício."

José Fredrico Marques critica asperamente esse texto, "mo­delo de obscuridade e de absoluta falta de técnica" (Eiem. Dir. Proc. Penal, voI. I, 1961, pág. 370).

Se a ação penal, nas contravenções, é pública, a autoridade a promovê-Ia deveria ser o órgão do Ministério Público. Mas não é isso o que sucede, nem é isso o que determina o CPP, cujo art. 26 prescreve: "A ação penal, nas contravenções, será iniciada com o auto de prisão em flagrante ou por meio de portaria expe­dida pela autoridade judiciária."

O art. 531 do mesmo Codigo estabelece que" o processo das contravenções terá forma sumária, iniciando-se pelo auto de pri­são em flagrante ou mediante portaria expedida pela autoridade policial ou pelo juiz, ou a requerimento do Ministério Público."

Temos, assim, que o processo das contravenções pode ini­ciar-se de duas formas: ou através de auto prisão em flagrante, ou por meio de portaria, esta última expedida pela autoridade policial ou pelo juiz. Nos casos de portaria, o procedimento pode ser ex officio ou a requerimento do Ministério Público.

Estamos com o eminente professor paulista quando caute­riza "o grosseiro e imperdoável erro de técnica" contido na reda-

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990. 75

ção do citado art. 17 da Lei das Contravenções Penais, ficando claro, porém, que "o ato processual em que a acusação se con­substancia é a própria portaria baixada pelo juiz" (ob. voI. cit. pág. 371).

2. Sendo assim, a portaria há de conter a imputação tal como se fosse denúncia, com a exposição do fato e todas as suas cir­cunstâncias, a qualificação do acusado, a classificação da contra­venção e a indicação das testemunhas.

Em outro volume de sua obra, já citada, José Frederico Marques sublinha a necessidade da portaria conter os requisitos da denúncia: "No procedimento contravencional, o juiz promove de ofício a acusação, baixando para isso a necessária portaria, com os requisitos da denúncia e aqueles a que se refere o art. 533, caput, do CPP - tudo tal como na portaria oriunda de autoridade policial" (vol. III, pág. 127).

A jurisprudência é pacífica no tocante à exigência de que a portaria deve descrever, circunstanciadamente, o fato contraven­cionaI. Esse entendimento está expresso em decisões antigas e recentes, como esta proferida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo e que traz a assinatura de três ilustres desembargadores penalistas: Márcio Munhóz, relator, J. Augusto de Lima e Lau­rindo Minhoto: "Embora a lei não discrimine quais os termos da portaria como faz em relação à queixa e à denúncia - é óbvio que ela não se pode limitar à simples enunciação de um artigo de lei; tem-se de referir a um fato, quando mais não seja para que o réu venha a saber porque é chamado aJuízo e qual a acusação que contra ele pesa."

Marcelo Jardim Linhares (in "Contravenções Penais", voI. I, pág. 127), assere:

"Iniciada a ação penal por iniciativa da autoridade policial, seja lavrando-se o auto de prisão em flagrante do contraventor, seja fazendo expedir portaria para o início do processo, tem-se a ação a que se denomina de judicialiforme, cujo curso se inicia na Polícia para terminar em juízo. Assume a autoridade policial a função acusadora, propriamente dita, tomando-se ao mesmo tem­po juiz do feito durante o seu curso naquela fase onde, embora se admita a contrariedade, é ela mais inquisitorial."

Eduardo Espínola Filho ("Curso de Processo Penal Brasileiro Anotado", voI. 1, pág. 348) e Hélio Tomaghi ("Comentários ao Código de Processo Penal, voI. 1 - Tomo 11, págs. 51/52) reforçam a concepção.

76 R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990.

Portanto, em que pesem as críticas fonnuladas ao texto legislativo, o certo é que não se pode fugir do seu indiscutível enunciado, vale dizer, a ação penal, nas contravenções, inicia-se nos moldes prescritos nos arts. 26 e 531, do CPP.

Assim sendo, e considerando que, no caso dos autos, a Portaria da auto­ridade policial data de 17 de agosto de 1988, tem-se como proposta a ação nesse momento, circunstância que leva a concluir pela competência da Justiça Federal.

Ante o exposto, acompanho o Sr. Ministro Relator.

VOTO-VISTA

VENCIDO

O EXMO. SR. MINISTRO FLAQUER SCARTEZZINI: Sr. Presidente, ao votar no CC n!! 150, recentemente apreciado por esta E. Seção, no qual se discutia a competência da Justiça Federal ou Estadual para o julgamento de contravenção penal, ante a disposição contida no art. 27, § 10 do ADCT, entendi, acompanhando o eminente Ministro Assis Toledo, Relator do feito, que os procedimentos propostos na Justiça Federal, até a data da promulgação da Carta Política de 1988, seriam por ela julgados por força de competência residual destenninada pelo dispositivo constitucional citado.

A esse respeito, permito-me a transcrição do voto do eminente Relator do Conflito citado, o qual assim se expressou em determinado trecho:

"Examinando-se os autos, verifica-se tratar-se de procedi­mento sumaríssimo contravencional, iniciado mediante portaria do Delegado de Polícia Federal de São Sebastião - SP, datada de 30/08/88, com audiência para inquirição de testemunhas, ainda na fase policial, realizada em 01/11/88.

Os autos foram encaminhados e distribuídos à Justiça Fede­ral em 11/11/88 (fls. 30v), portanto após a vigência da Constitui­ção de 1988, promulgada em 5 de outubro.

Quando se considera proposta a ação, na hipótese de prévio procedimento sumaríssimo contravencional iniciado por portaria do Delegado de Polícia, caso dos autos?

A resposta é óbvia: mesmo nessa hipótese há que se observar o marco do ajuizamento da pretensão, ou seja, a distribuição ou o despacho da inicial pelo Juiz (art. 263 do CPC). A não ser assim, estar-se-ia pretendendo constituir o absurdo de um "processo" sem duas importantes personagens - o Juiz e o autor.

Por isso é que se diz que, no procedimento contravencional, iniciado por auto de prisão em flagrante ou portaria policial, a

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fase policial é procedimento sem processo, ou segundo Camelut-ti, "jurisdição sem ação". •

Na oportunidade, acompanhei o Min. Relator ao entendimento de que na fase policial não se instaurara o processo, mas sim um procedimento.

Na Sessão passada, após o voto proferido pelo eminente Ministro William Patterson, pedi vista dos autos para reexaminar meu entendimento sobre a matéria, e agora os devolvo, com pequenas alterações no que tange ao momen­to da propositura da ação, e não ao início da mesma. Com efeito, a ação penal nas contravenções é anômala ou quando menos sui generis; inicia-se por auto de prisão em flagrante ou por portaria expedida por autoridade judiciária ou policial (artigo 26 do CPP).

Temos aí o inicio do processo face a determinação legal.

Dessa forma, a portaria, quer seja da autoridade policial, do Juiz, ou mesmo, o auto de prisão em flagrante, será considerada uma verdadeira de­núncia, preeenchendo, inclusive, os requisitos determinados no art. 41 do CPP, tanto que a citação do réu será ordenada pela autoridade policial ou pelo Juiz para que se veja processado até o julgamento final (art. 26 e 533, CPP).

O contraditório se faz, também, perante a autoridade policial, sendo obrigatória a presença da defesa. As testemunhas serão consideradas de acu­sação. O advogado poderá fazer as reperguntas que entender necessárias e inclusive contraditá-las. Em caso do réu não possuir advogado, ser-Ihe-á no­meado defensor.

Após a oitiva da última das testemunhas, em se tratando de processo, dispensa-se, inclusive, o relatório policial, sendo os autos remetidos ao Juiz competente, após o que, manifestando-se o Ministério Público e a defesa e, não havendo necessidade de outras diligências, segue-se o debate e o julga­mento.

Verifica-se, portanto, uma função anômala, conforme afirmei, porém legítima, por parte da autoridade policial nos termos das disposições supraci­tadas.

No caso vertente, iniciou-se o procedimento jurisdicional por Portaria do Delegado de Polícia Federal, datada de 17/08/88, com audiência para inquiri­ção de testemunhas, na fase policial, para 04/10/88.

78

O § 10 do art. 27 do ADCT dispõe:

"§ 10. Compete à Justiça Federal julgar as ações nela pro­postas até a data da promulgação da Constituição, e aos Tribunais Regionais Federais bem como ao Superior Tribunal de Justiça julgar as ações rescisórias das decisões até então proferidas pela Justiça Federal, inclusive daquelas cuja matéria tenha passado à competência de outro ramo do Judiciário."

R. Sup. Trib. Jus\., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990.

Veja-se que ele é incisivo em afirmar a competência residual da Justiça Federal 11 às ações nela propostas" .

Assim, há menos que se saber e definir o exato momento do início da ação, se na fase policial oujudicial, do que, agora sim, quando da propositura, na Justiça Federal.

Desta forma, mesmo que se considere como iniciada a ação penal, ainda na fase policial, esta só foi apresentada na Justiça Federal em 11/11/99 (fl.37v).

Se os autos foram encaminhados e conclusos ao Dr. Juiz em 14/11/88 (fl. 38), repito, é esta a data em que foi proposta na Justiça Federal e, se foi após o iníc~ da vigência da Constituição de 1988 (05/08/88), este (o Juiz Federal) perdera a competência residual.

Tratando-se de feito contravencional, mesmo que contra bens, serviços ou interesses da União, a competência para apreciá-lo é da Justiça Comum, face o disposto no art. 109, IV, da CF/88. .

Todavia, verifico que a permanência desta ação contravencional constitui constrangimento legal.

Assim, se nos cabe, neste momento, tomar conhecimento dos fatos e decidir qual dos juízes é o competente para apreciar a matéria, também somos capacitados para, em obediência ao estatuído no art. 647 c/c o § 2!! do art. 654, ambos do Código de Processo Penal, conceder ordem de habeas corpus de ofício, verificada a existência de ilegalidade.

Desta forma, Sr. Presidehte, concedo de ofício ordem de habeas corpus para extinguir a punibilidade, em face da ocorrência de prescrição da pretensão punitiva.

É como voto.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO JESUS COSTA LIMA: Ao proferir voto como vogal no CC n!! 150-SP, versando á mesma matéria ora em debate, disse que considerava proposta a ação apenas com o recebimento dos autos pelo Juiz.

O voto proferido pelo eminente Ministro Costa Leite em sessão anterior, obrigou-me a reexaminar o assunto, especialmente tendo em conta a lei de proteção à fauna. Verifico que, pelo art. 32 da Lei nU 4.771, de 15.09.65, "têm competência para instaurar, presidir e proceder a inquéritos policiais, lavrar autos de prisão em flagrante, intentar a ação, nos casos de crimes ou de contravenções previstas nesta Lei ou em outras leis que tenham por objeto os animais silvestres" ... "as indicadas no Código de Processo Penal".

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990. 79

A seguir, no art. 34, adianta que o processo das contravenções obedecerá ao rito sumário da Lei nU 1.508, de 19.12.51.

À sua vez, de acordo com o art. lU da Lei nU 1.508/51, o procedimento pode ser iniciado por auto de prisão em flagrante, denúncia do Ministério Público ou portaria da autoridade policial ou judiciária.

Também, segundo o art. 26, do CPP, lia ação penal, nas contravenções, será iniciada com auto de prisão em flagrante ou por meio de portaria expedida pela autoridade judiciária ou policial".

Decidiu o Supremo Tribunal Federal:

"Nas contravenções penais, é facultada a instauração da ação penal, tanto pelo flagrante ou portaria, como pela denúncia oferecida pelo Ministério Público. Recurso Extraordinário de que não se conhece por falta de presssuposto regimental (art. 325, I, do RI., com a redação aprovada em 15.10.80), sem embargo de anotar-se que a tese do acórdão recorrido revela coerência com precedente assentado pela Primeira Turma (RHC 63.536, D.J. de 28.02.86). Lei Complementar nU 40-81, artigos 3, lI, e 55, ca­put."(RECr. nU 109.494-PR ReI. Min. Octavio Gallotti. DJ de 18.09.87)

"Nas contravenções penais, é facultada a instauração da ação penal, tanto pelo flagrante ou portaria, como pela denúncia oferecida pelo Minitério Público. Recurso Extraordinário de que não se conhece por falta de pressuposto regimental (art. 325, I, do RI., com a redação aprovada em 15.10.80), sem embargo de anotar-se que a tese do acórdão recorrido revela coerência com precedente assentado pela Primeira Turma (RHC 63.536, DJ de 28.2.86). Lei Complementar nU 40/81, artigos 3, II e 55, caput." (RECr. nU 109.795 - PR ReI. Min. Octavio Gallotti. DJ de 24.10.86)

"Na contravenção, a ação penal será iniciada com o auto de prisão em flagrante ou por meio de portaria expedida por autori­dade judiciária ou policial (CPP, art. 26)" (RE nU 101.482 - RS. RTJ voI. 111/1339. ReI. Min. Alfredo Buzaid).

Fernando da Costa Tourinho Filho ("Processo Penal", voI. 1/409 e segts.) registra que Carnelutti, de certo modo, defende o procedimento ex officio, a que chama de "processo penal sem demanda": Adianta que Alcala-Zamora pondera: "Posto a optar entre a impunidade e o respeito-a determinados prin­cípios processuais, é preferível não se sacrificar o primeiro."

Hélio Tornaghi ("Comentários ao Código de Processo Penal", V. I t. II p. 52, ed. de 1956) observa:

80 R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990.

"Tratando-se de contravenções, entretanto, dada a menor importância das infrações, permite a lei que a ação seja movida pela autoridade judiciária ou pela policial. Segue-se rito sumário, sem as mesmas garantias e cautelas do procedimento por crime."

E. Magalhães Noronha ("Curso de Direito Processual Penal", p. 311) acentua ser "incompreensível que se dispondo, hoje, de um Ministério Público organizado, estruturado com base na Constituição Federal, a quem é conferida a titularidade da ação penal, seja substituído pelo juiz, na iniciativa do proces­so."

Ainda Fernando da Costa Tourinho Filho (ob. e voI. citados, p. 415), especificamente sobre contravenção contra a fauna e a flora, escreve:

"Ademais, o Código Florestal dispõe, ainda, no art. 36, que o processo das contravenções obedecerá ao rito sumário da Lei n!:! 1.508, de 19.12.1951. E este diploma legal estabelece, no art. I!:!, que o procedimento pode ser iniciado, também, por denúncia do Ministério Público.

Ora, se o procedimento é o mesmo, não há negar possa o Ministério Público dar-lhe início. Tal raciocínio parece-nos ra­zoável. Aliás, bem mais razoável que aquele outro permitindo ao Ministério Público o ato de iniciativa, nos termos da Lei n!:! 4.611, de 2.4.1965, quando a autoria é de logo conhecida antes de decor­rido o qüinqüênio ...

No que tange às contravenções contra a fauna, a Lei n!:! 5.197, de 3-1-1967, no art. 32, repetiu, praticamente, o disposto no art. 33 do Código Florestal. Apenas deixou de conferir poderes a autoridades outras que não as comuns. Por outro lado, reprodu­ziu, no art. 34, a regra do art. 36, segundo a qual o procedimento é idêntico ao traçado pela Lei n!:! 1.508, de 19.12.1951.

Por tais razões, mantemos nosso entendimento exposto em edições anteriores: pode o Ministério Público praticar o ato de iniciativa nos procedimentos atinentes às contravenções referen­tes à flora e à fauna."

Parece-me que, ao Juiz, nesses casos, cabe apenas dar o impulso inicial, cumprindo ao Ministério Público exercer a partir daí a sua atividade persecu­tória.

Dito isto, reformulo meu entendimento anterior no CC n!:! 150, para admitir que, se a ação penal fora iniciada antes do advento da Constituição de 1988, a competência é do Juízo Federal.

Portanto, voto com o Sr. Ministro-Relator.

R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990. 81

QUESTÃO DE ORDEM

O EXMO. SR. MINISTRO COSTA LIMA: Sr. Presidente, os réus estão foragidos; foram citados por edital e não se manifestaram.

Gostaria de indagar a V. Ex~. se é da nossa competência decretar este habeas corpus de ofício. Qual é o constrangimento?

O EXMO. SR. MINISTRO FLAQUER SCARTEZZINI (aparte): Como não há constrangimento ilegal? Alguém está respondendo por um processo que não pode existir mais. Está extinto o processo, está extinta a pretensão punitiva. Como não existe um constrangimento ilegal?

O EXMO. SR. MINISTRO COSTA LEITE (aparte): Sr. Presidente, o que tenho sustentado nesta matéria é que, para concessão do habeas corpus de ofício, faz-se mister a presença da competência . A causa, em si, não se enquadra no elenco de competência deste Superior Tribunal de Justiça, que está no art. 105. Vamos julgar uma causa, que não é da nossa competência. Então, a interpretação que faço do artigo do Código de Processo Penal, que diz que o Juiz pode conceder de ofício no processo, etc. Mas pressupõe o quê? Pressupõe que ele tenha a competência do orgão julgador para a causa. Nós aqui temos competência constitucionalmente cometida para decidir o conflito de competência. A causa é a minha tese. O Juiz tem que ter competência, quer dizer, está com um processo; por exemplo, estou com um processo, um recurso especial, aí, tudo bem. Concedo o habeas corpus de ofício, porque estou examinando a causa. O legislador constituinte, em sede de conflito de compe­tência, deu a este Tribunal uma única atribuição, vale dizer, a de decidir qual o Juiz competente para resolver a causa. Assim podemos dar o habeas corpus de ofício, apenas na causa, penso eu, e não no conflito de competência.

O EXMO. SR. MINISTRO COSTA LIMA: Sr. Presidente, peço permis­são ao Ministro Costa Leite para incorporar ao meu voto as razões do aparte de S. Exa., pois, repito, entendo que a nossa competência é para dirimir o conflito. Quem irá decretar a prescrição da pretensão punitiva é o Juízo com­petente de I!! grau, dentro dos limites de sua jurisdição (Art. 649, do CPP).

E, neste caso, não concedo de ofício o habeas corpus, pedindo vênia ao eminente Ministro Flaquer Scartezzini.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO CARLOS THIBAU: Sr. Presidente, por ocasião do processo relatado pelo Ministro Toledo, também acompanhei S. Exa., mas depois, na Turma, tive oportunidade de reconsiderar meu ponto de vista, porque também entendo, como o Sr. Ministro Costa Leite (passei a entender assim depois de um melhor exame que fiz), que a ação penal começa

82 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990.

no próprio auto de prisão em flagrante ou na portaria, de acordo com o art. 26 do Código de Processo Penal. Meu ponto de vista é um pouquinho diferente daquele esposado pelo Sr. Ministro Flaquer Scartezzini. Acho que a açãd penal começa naquele momento ali, inicial; sendo assim, a competência será fixada para a Justiça Federal, em função da data em que entrou em vigor a Constitui­ção de 1988.

Acompanho o Sr. Ministro-Relator.

VOTO

O EXMO .. SR. MINISTRO CARLOS THIBAU: Sr. Presidente, a ques­tão em debate é, realmente, uma questão muito interessante. Mas, quer me parecer que nós só poderíamos conceder habeas corpus naqueles processos cujo mérito nos fosse devolvido a conhecimento. Tanto que, nas revisões criminais, a li!. Seção do antigo Tribunal Federal de Recursos concedia habeas corpus. Não me recordo de habeas corpus concedido em conflito de compe­tência. Penso que não se pode fazer isso, porque nós só temos competência para apreciar e julgar o incidente de competência, nada mais.

De maneira que, lastimando não poder acompanhar o Sr. Ministro Flaquer Scartezzini, fico com o Sr. Ministro Relator, neste aspecto.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO COSTA LEITE: Sr. Presidente, acompanho o eminente Relator, na linha do pensamento exposta no aparte em que conce­deu o eminente Ministro Costa Lima.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO COSTA LEITE: Sr. Presidente, a minha posição é bastante conhecida da Seção.

O eminente Ministro Flaquer Scartezzini agregou, no entanto, um novo argumento para dar pela competência da Justiça Estadual, qual seja o de·o processo ter dado entrada na Justiça Federal após o advento do novo texto constitucional.

Não importa. A competência da Justiça Federal se firmou no momento da instauração da ação penal.

Por isso, peço vênia a S. Ex!!. para acompanhar o voto do Sr. Ministro Edson Vidigal.

R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990. 83

VOTO-VENCIDO

O EXMO. SR. MINISTRO DIAS TRINDADE: Sr. Presidente, faço duas considerações: primeiro, a Constituição estabeleceu que as ações penais são privativamente da iniciativa do Ministério Público. Então seria de indagar: e aquelas infrações sobre contravenção iniciadas antes do advento da Constitui­ção? Perpetuar-se-ia a legitimidade da autoridade policial para a ação ou haveria necessidade de o Ministério Público vir a intervir e assumir a iniciativa da ação para legitimar?

A segunda é que no caso anterior votei na linha do voto do Ministro Flaquer Scartezzini por entender que embora proposta a ação por portaria a competência do Juízo só se fixaria com a distribuição, porque antes não havia juiz na causa. Por isso votei com o Ministro Toledo e peço vênia aos que discordam, para acompanhar o Ministro Scartezzini.

Vou aguardar agora a reabertura do problema do habeas corpus.

VOTO-VENCIDO

O EXMO. SR. MINISTRO DIAS TRINDADE: Sr. presidente, a propó­sito do problema da concessão de habeas corpus de ofício, em conflito de competência, que trouxe na sessão passada, num caso semelhante, e que ficou a parecer que estava navegando em águas turvas, inventando doutrina que não existia, permiti-me fazer uma pequena pesquisa a respeito do assunto.

Trouxe um voto para proferir neste momento. É do seguinte teor: O art. 654, do Código de Processo Penal, em seu § 2!!, assim dispõe:

"Os juízes e os tribunais têm competência para expedir de ofício ordem de habeas corpus, quando no curso de processo verificarem que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal."

Têm-se, deste modo, por certo, que se trata de competência funcional atribuída pelo próprio dispositivo, sem importar, portanto, se o exame da coação ou do processo em que a mesma é exercida se insere na competência do tribunal.

Basta que a verificação da afronta ou da ameaça de constrangimento se dê em processo que lhe seja submetido.

Já tive oportunidade de, ao julgar o REsp 302 - RS, em data recentíssi­ma, de conduzir a 6!! Turma deste Tribunal a conceder ordem de habeas corpus, de ofício, embora não tenha a mesma conhecido do recurso, seja pela ofensa à lei, seja por divergência de interpretação a e c do art. 105 II da Constituição.

Não tivesse o tribunal a competência, expressamente prevista no dispo­sitivo acima mencionado, e seria de indagar do acerto dessa decisão, pois que

84 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990.

exaurida, no julgamento do Recurso Especial, a jurisdição da Turma, para o caso.

Assim também o Supremo Tribunal Federal tem conduzido a sua juris­prudência a respeito de habeas corpus de ofício, sendo expressivos os seguin­tes julgados:

"Sentença. Fixação da pena. Ausência de fundamentação. Nulidade.

É nula a sentença que se apresenta despida de motivação ao fixar a pena. Precedentes do STF.

Recurso extraordinário não conhecido, por ausentes os seus pressupostos. Concessão, ex. ofício de ordem de habeas corpus (Reg. STF art. 188, lI). (RE 80.777 - MG - ReI. Min. Bilac Pinto). (RTJ 74-870).

"1. O recurso de habeas corpus para o STF deve ser ajuizado e arrazoado em cinco dias, como exprime o art. 289 do RI da Corte.

2. Caso em que, por sua peculiaridade, o .STF concede o habeas corpus de ofício. (RRC 54.218 - RJ - RTJ 79-425).

"Recurso extraordinário oposto de decisão proferida em revisão. Não conhecimento, por ausência de seus pressupostos de admissibilidade. Expedição, no entanto, de habeas corpus de ofício para que outro julgamento se faça, abstraindo-se a reinci­dência específica, erroneamente reconhecida" (RE 87.006 - SP - Min. Bilac Pinto - RTJ 84-310).

"Sentença. Aplicação da pena.

É nula a sentença que se apresenta despida de motivação ao aplicar a pena, pois o condenado tem direito a saber por que recebe tal sanção. Precedentes do STF, pedido de habeas corpus não conhecido, por ser a coação de autoridade cujos atos não estão sujeitos diretamente à jurisdição do STF, concedendo-se, porém, de ofício, a ordem" (RC 55.798 - RJ - RTJ 83/369).

E, também em Conflito de Jurisdição, que, como se destaca em voto em um dos acórdãos que passo a citar, se inclui como processo, a que se refere o § 22 do art. 654 do CPP, acima transcrito, outra não tem sido a orientação do STF:

"Crime de roubo praticado contra a agência da Caixa Eco­nômicaFederal, antes do advento do Decreto-lei n2 898/69. Com­petência da Justiça Federal. Concessão, ex officio, de habeas

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1 99cf. 85

corpus, para anulação do processo a partir da denúncia, inclusive, ficando prejudicado o conflito de jurisdição."

(CJ 6.027 - RS - Min. Xavier de Albuquerque - RTJ 85/34).

E foi exatamente nesse caso que o Min. Thompson Flores, ao proferir o seu voto, fazendo alusão ao Regimento Interno, que reproduz os termos do § 22 do art. 654 do CPP, assim se expressou:

" ... a expressão usada no citado inciso H do art. 185, fIno curso de qualquer processo", compreende o conflito.

Dele nos temos valido para, meno~ ortodoxamente, anular decisões de instâncias inferiores, em julgamentos muitos deste Plenário."

Outro julgado expressivo, de cuja ementa transcrevo o trecho seguinte:

" IH - Se dos autos está evidenciada a ilegalidade da coação,

reconhecida de resto, pelos tribunais em conflito, cabe ao Supre­mo Tribunal Federal valer-se de suas disposições regimentais e conceder, de logo, o "writ", julgado prejudicado o conflito."

(CJ 5.678-SP-Min. Thompson Flores - RTJ 61/12). Entendo, deste modo, que pode esta Seção, ao examinar Conflito de

Competência, conceder habeas corpus, de ofício, quando verificar a existência de coação ilegal.

No caso ora em exame, ao que depreendi dos votos até aqui proferidos, trata-se de contravenção praticada há mais de dois anos, sem que exista qual­quer causa interruptiva do curso da prescrição, daí porque voto no sentido de conceder ordem de habeas corpus, de ofício, para declarar extinta a punibili­dade do agente, prejudicando o conflito.

EXTRATO DA MINUTA

CC n2 250 - SP - (Reg. n2 89.0007856-9) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Edson Vidigal. Suscitante: Juízo Federal da 22i! Vara em São José dos Campos - SP. Suscitado: Juízo de Direito da 2i! Vara Criminal de Jaca­réi-SP. Autora: Justiça Pública. Réus: Azenildo Cavalcante da Silva e Iva­nildo Cavalcante da Silva.

Decisão: A Seção, por unanimidade, conheceu do conflito, e por maioria declarou competente o Suscitante, Juízo Federal da 22l!. Vara em São José dos Campos-SP (em 21.09.89 - 3i! Seção).

Votaram de acordo com o Exmo. Sr. Ministro Relator, os Exmos. Srs. Ministros WiIliam Patterson, Costa Lima, Carlos Thibau e Costa Leite. Ven­cidos os Exmos. Srs. Mins. Flaquer Scartezzini e Dias Trindade.

86 R. Sup. Trih. Jusl., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990.

Ausentes, justificadamente, os Exmos. Srs. Mins. William Patterson, José Cândido e Assis Toledo.

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro JOSÉ DANTAS.

CONFLITO DE COMPETÊNCIA N!1 629 - SP

(Registro n!1 89097482)

Relator: O EX1I1o. Sr. Ministro Nilson Naves

Suscitante: Juízo Presidente da 3g JCJ de Santo André-SP

Suscitado: Juízo de Direito da sg Vara Cível de Santo André-SP

Partes: Lojas Tamakavy Ltda. e outros e Sindicato de COlJl. Varejista do ABC e outro.

Advogados: Núncio Thephilo Neto e Eduardo Toledo e outros

EMENTA: Ação declaratória de nulidade de convenção coletiva de trabalho, cumulada com perdas e danos. Hipótese de competência da Justiça do Trabalho. Conflito conhecido e declarado competente o suscitante.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a 2!! Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do conflito para declarar competente o Juízo da 3!! Junta de Conciliação e Julga­mento de Santo André-SP, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazen­do parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 14 de fevereiro de 1990 (data do julgamento).

Ministro GUEIROS LEITE, Presidente. Ministro NILSON NAVES, Re­lator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO NILSON NAVES: O Sub procurador-Geral da República, Dr. WaIter José de Medeiros, assim relatou o conflito e sobre ele opinou:

R. Sup. Trib. Jusl., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990. 87

88

"Lojas Tamakavy Ltda. e outras propuseram, perante o MM. Juiz de Direito da 5;! Vara de Santo André (SP), ação ordinária declaratória de nulidade de ato jurídico, cumulada com perdas e danos, contra o Sindicato do Comércio Varejista do ABC e o Sindicato dos Empregados no Comércio de Santo André, objeti­vando fosse, por sentença, declarada nula a convenção coletiva firmada pelos réus em 8.12.87, com base nas razões amplamente descritas na peça inaugural, condenado, ainda, o 1!! co-réu, a indenizar as perdas e danos causados à autora em razão do refe­rido acordo, tudo conforme vier a ser apurado em liquidação de sentença.

O Julgador de primeiro grau, depois de recordar a existência de julgado do então TFR proclamando a competência do foro estadual para decidir ações de cumprimento de sentença norma­tiva intentada por sindicato contra empregador, a fim de compe­li-lo a honrar cláusulas fixadas em dissídio coletivo, assinalou, todavia, que, no caso em tela, 'os atos jurídicos que as autoras pretendem impugnar têm relação com os dissídios coletivos entre empregados e empregadores', pelo que a competência, em con­trovérsia, oriunda das relações de trabalho, estava afeta à compe­tência da Justiça especializada, nos termos do art. 142 da Carta revogada.

Interposto agravo de instrumento, consoante certificado pe­la escrivania, o Magistrado manteve a decisão agravada, a final confirmada por acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo.

Remetidos os autos à Justiça do Trabalho, a MM;! 3;! JCJ de Santo André, já sob o pálio da nova Constituição, entendeu ine­xistir, no caso, dissídio entre empregado e empregador, por isso que a controvérsia se cinge apenas a empregadores e sindicato da respectiva categoria econômica, que, como mandatário, teria exorbitado de suas funções.

Suscitado o conflito, veio ele com vista ao Ministério Públi­co Federal.

Para fixar a competência do foro especializado, o ego Tribu­nal paulista enfatizou, com razão, a natureza jurídica do pedido, consistente na 'declaração judicial de nulidade integral da con­venção coletiva que dispôs sobre temas peculiares ao direito do trabalho, tais como aumento de salários, percentual de produtivi­dade, escala móvel de salário, piso salarial, descanso semanal remunerado, etc., num total de 98 itens, todos concernentes às relações de trabalho e restritos à esfera jurídica de patrões e empregados'. .

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990.

Em seguida, remarcou o v. acórdão que a anulação da con­venção, tal como pretendia, implicaria 'inegáveis reflexos nas relações de trabalho de toda uma categoria profissional', senten­ciando em seguida:

'Ademais disso, a convenção coletiva é um instituto típico de direito do trabalho, contemplada em título próprio da CLT e por esta disciplinada nos arts. 611 e 625, sendo certo que sua natureza jurídica mereceu acurada análise doutrinária de Russo­mano'.

Na verdade, se se cuidasse de sentença proferida na jurisdi­ção contenciosa, o meio processual cabível, para desconstituí-la, seria a ação rescisória, hipótese em que induvidosamente a com­petência para seu julgamento estaria assegurada à Justiça do Trabalho.

Como se cuida, na espécie, de convenção coletiva em que, ou a sentença tem caráter meramente homologatório, ou simples­mente se prescinde de tal sentença, bastando, como no caso, o simples registro do acordo no Ministério do Trabalho, a regra a seguir é a contida no art. 800, § único, do CPC de 1939:

'Art. 800 ( ... )

Parágrafo único. Os atos judiciais que não dependerem de sentença, ou em que esta for simplesmente homologatória, pode­rão ser rescindidos como os atos jurídicos em geral, nos termos da lei civil.'

Ora, neste último caso, a competência para julgamento da ação em que se objetiva desconstituir ato jurídico, de cumprimen­to obrigatório entre as partes que dele participaram, não pode ser senão do órgão jurisdicional competente para homologar - se graciosa e jurisdição - ou julgar - se contenciosa - o negócio jurídico de que derivou o estabelecimento de cláusulas regulado­ras das relações de trabalho, matéria sujeita à competência do foro especializado (CF, art. 114).

Parecer, em conclusão, pelo conhecimento do conflito, de­clarada competente a MM!! 3!! JCJ de Santo André (suscitante)."

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO NILSON NAVES (Relator): O ato que se quer ver declarado nulo é uma convenção coletiva de trabalho, que, em 98

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990. 89

itens, estabeleceu condições de trabalho, certamente envolvendo empregados e empregadores, com a ação ordinária declaratória ajuizada por diversas em­presas contra sindicatos, encontrando-se o fato assim descrito, n!2s 05 a 07 da petição inicial: .

"05. Tendo expirado a vigência da Convenção Coletiva celebrada pelos réus em 1986, com vigência entre 1!2 de novembro de 1986 a 30 de outubro de 1987, firmaram em 08 de dezembro de 1987, em frontal violação a inúmeros dispositivos legais, novo Convênio, desta feita para vigorar de 1!2 de novembro de 1987 a 30 de outubro de 1988 (doc. 17 e 18).

06. As inúmeras transgressões à lei a que deu margem o 1!2 co-réu, geradoras da nulidade do negócio jurídico inquinado, ou, quando não, ensejadoras de seu decreto de anulação, restaram arquitetadas pelo 'sindicalista ' José Carlos Buchalla Moreira, seu atual presidente, que arvorando-se em supremo dono da verdade tratou de celebrar a avença ao seu bel talante, ignorando que pela força normativa que a lei empresta às Convenções Coletivas de Trabalho, deveria se comportar muito mais como mandatário dos desígnios de Assembléia válida e regular, pelo que lhe cumpria velar, que, como fez, mandante e timoneiro de desastrado episó­dio.

07. Diga-se, inclusive, para desde já deixar assinalada a má-fé com que se houve o 1!2 co-réu, que os documentos subja­centes à Convenção Coletiva ora guerreada, quer sejam, a ata da Assembléia Geral Extraordinária respectiva e a lista dos associa­dos a ela presentes, jamais foram exibidos às Autoras, mesmo diante de pedidos escritos (does. 19 e 20), bem assim à própria fiscalização do Ministério do Trabalho instaurada a respeito (doc. 21), decerto com o intuito de criar embaraços à elucidação judi­cial da questão."

Não obstante o que ficou resolvido pela Corte Especial, no CC-448, da relatoria do Sr. Ministro Eduardo Ribeiro, suponho que, no caso presente, cuida-se de assunto cometido à esta Seção, por dizer mais com o direito do trabalho que com o direito sindical. Reconheço,· pois, a competência da 2;! Seção, para solver este conflito, com fundamento no art. 9!2, § 2!2, inciso IV, do nosso Regimento.

Entre as duas Justiças em conflito, a saber, a trabalhista, representada peJo suscitante, e a comum estadual, representada pelo suscitado, quero, aqui, proclamar a competência trabalhista (3;[ Junta de Conciliação e Julgamento de Santo André-SP), nos termos do parecer do Subprocurador-Geral da Repúbli­ca, que se reportou ao acórdão do Ag-135.754-2, da Sexta Câmara Civil do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

90 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990.

Com efeito, a mim também me parece correto o posicionamento do Tribunal paulista, ao asseverar:

"Não há dúvida que 'compete à Justiça Comum Estadual o processo e julgamento da ação de cobrança de contribuição sin­dical' (Súmula n!! 87 do TFR), bem como não se questiona que igualmente 'compete à Justiça Comum Estadual processar e jul­gar as causas entre os sindicatos e seus associados' (Súmula n!.! 114 do TFR).

Entretanto, a espécie não se identifica com as hipóteses de competência da Justiça Comum, desde que não se controverte sobre contribuições sindicais ou assistenciais, nem há litígio entre o sindicato e seus associados que reclame julgamento no âmbito estadual.

Diversamente, buscam as agravantes declaração judicial de nulidade integral da convenção coletiva que dispôs sobre temas peculiares ao direito do trabalho, tais como aumentos de salários, percentual de produtividade, escala móvel de salário, piso sala­rial, descanso semanal remunerado, etc., num total de 98 itens, todos concernentes às relações de trabalho e restritos à esfera jurídica de patrões e empregados.

É matéria afeta à Justiça do Trabalho, consoante bem remar­cou a r. decisão impugnada, sendo incompetente a Justiça Esta­dual para apreciar demanda onde se postula anulação total de convenção coletiva, com inegáveis reflexos nas relações de tra­balho de toda uma categoria de empregados."

Conheço do conflito e declaro competente a Junta suscitante.

EXTRATO DA MINUTA

CC-629 - SP - (Reg. n!.! 89097482) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Nilson Naves. Suscitante: Juízo Presidente da 3i!. JCJ de Santo André-SP. Suscitado: Juízo de Direito da Si!. Vara Cível de Santo André-SP. Partes: Lojas Tamakavy Ltda, outros e Sindicato de Com. Varejista do ABC e outro. Advo­gados: Drs. Núncio Thephilo Neto e Eduardo Toledo e outros

Decisão: A Seção, por unanimidade, conheceu do conflito para declarar competente o Juízo da 3i!. Junta de Conciliação e Julgamento de Santo André­SP, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator (2i!. Seção, 14/2/90).

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990. 91

Votaram com o Relator os Exmos. Srs. Ministros Eduardo Ribeiro, Athos Carneiro, Waldemar Zveiter, Fontes de Alencar, Cláudio Santos, Sálvio de Figueiredo, Barros Monteiro e Bueno de Souza. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro GUEIROS LEITE.

• CONFLITO DE COMPETÊNCIA N~ 696 - PR

(Registro n!! 89107224)

Relator: Exmo. Sr. Ministro Pedro Acioli

Suscitante:Juízo Presidente da Junta de Conciliação e Julgamento de Campo Mourão - PR

Suscitado: Juízo de Direito da ]!~ Vara Cível de Campo Mourão-PR.

Autor: Construtora Chave Ltda

Réu: Sindicato dos Trabalhadores na Ind/ da Construção e do Mobiliá­rio de Maringá

Advogados: Drs. Daisy Lucy Desan Silveira e Pedro Stefanichen

EMENTA: Constitucional. Competência. I - A questão jurídica originando-se de relação traba­

lhista anteriormente existente, fez surgir a obrigação ora liti­gada.

Razão suficiente a aplicar-se o preceito constitucional que determina a competência trabalhista.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a Egrégia li! Seção do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, decidir pela competência da Junta de Conciliação e Julgamento de Campo Mourão-PR, suscitante, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes destes autos e que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 13 de março de 1990 (data do julgamento).

Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente. Ministro PEDRO ACIOLI, Relator.

92 R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO PEDRO ACIOLI: Trata-se de conflito de competência suscitado pelo Juiz-Presidente da Junta de Conciliação e Julga­mento de Campo MourãojPR, nos autos de ação de consignação em pagamento que move Construtora Chave Ltda contra o Sindicato dos Trabalhadores na Ind. da Construção Civil e do Mobiliário em Maringá - PR e o sediado em Campo Mourão/PR, diante de questionamento acerca de quem deve legitima­mente receber a contribuição sindical recolhida dos empregados.

O Juízo de Direito da li.! Vara Cível de Campo Mourão - PR, às fls. 30, face a instalação da Junta de Conciliação e Julgamento de Campo Mourão/PR, determinou a remessa dos autos àquele Juízo.

Entende o Juízo suscitante às fls. 165 que:

"Como se observa, a matéria foge,à competência desta Jus­tiça Especializada, à qual compete "conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores ... ", conforme estabelece o art. 114 da Constituição Federal, o que não é o caso destes autos."

Acresce que o Sindicato de Campo Mourão sustenta ser o legítimo des­tinatário da contribuição sindical correspondente ao ano vertente (fls. 47); e o sindicato de Maringá entende ser ilegítimo para figurar no pólo passivo, face à regra do artigo 586 da C.L.T.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO PEDRO ACIOLI (Relator): Discrimina o art. 114 da Constituição, ipsis verbis:

"Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores, abrangi­dos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta dos Municípios, do Distrito Federal, dos Estados e da União, e, na forma da lei, outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, bem como os legítimos que tenham origem no cumprimento de suas próprias sentenças, inclusive coletivas."

O entendimento firmado por esta Seção é no sentido de que as questões jurídicas que tenham origem em relações trabalhistas, são da competência da justiça do trabalho.

É de se ver que, a justiça comum, anteriormente à nova Carta Constitu­cional realmente detinha a competência para a questão que ora se apresenta,

R. sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990, 93

contudo, tal competência desvaneceu-se ao comando do 'artigo 114, retro­transcrito.

Não há que se afastar o entendimento de que a controvérsia existente só teve origem dada a existência de uma relação trabalhista preexistente, que fez surgir a obrigação de reter-se o Imposto Sindical.

Diante do exposto, e ao amparo dos precedentes desta Casa, declaro competente a Junta de Conciliação e Julgamento de Campo Mourão - PR, o suscitante.

É como voto.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO AMÉRICO LUZ: Sr. Presidente. Adiro, com ressalva do meu ponto de vista, ao entendimento que tem prevalecido nesta Seção, acompanhando, portanto, o Sr. Ministro Relator.

VOTO - VENCIDO

O EXMO. SR. MINISTRO GERALDO SOBRAL: Sr. Presidente, dou pela competência do Juiz de Direito.

É o meu voto.

VOTO - VENCIDO

O EXMO. SR. MINISTRO GARCIA VIEIRA: Sr. Presidente, o art. 114 da Constituição estabelece certas condições, para que a competência seja da Justiça do Trabalho. A competência da Justiça do Trabalho é para conciliar e julgar dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores, empregadores e outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, bem como os litígios que têm origem no cumprimento de suas próprias sentenças, inclusive coleti­vas.

Ora, no caso, não existe nenhuma interferência da Justiça do Trabalho, não existe sentença, não existe nenhum dissídio entre trabalhador e emprega­dor, não se trata de controvérsia decorrente de relação de trabalho ou de litígio originado em cumprimento de Sentença da Justiça do Trabalho; existe uma sentença, cuja convenção não foi homologada pela Justiça do Trabalho.

A competência, data venia dos que entendem em sentido contrário, é do Juiz de Direito.

94 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990.

VOTO (VENCIDO)

O EXMO. SR. MINISTRO VICENTE CERNICCHIARO: Sr. Presiden­te, no Conflito de Competência n!.! 813, de que fui Relator, entendeu-se que a ação visando ao cumprimento de decisão da Justiça do Trabalho é da compe­tência da Justiça Especializada. A Justiça Ordinária processa e julga a ação, quando a causa de pedir é a convenção das partes. No caso concreto, pelas informações do eminente Relator, não houve interferência da Justiça do Tra­balho; conseqüentemente, não se irá executar, cumprir-se decisão daquela Justiça Especializada.

Em razão desse pormenor, pedindo vênia aos eminentes Ministros, acom­panho o douto Ministro Garcia Vieira.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO CARLOS M. VELLOSO: Sr. Presidente, na verdade, a competência da Justiça do Trabalho, ex vi do disposto no art. 114 da Constituição, em casos como este, decorre de sua competência para executar as usas decisões, inclusive coletivas (CF, 1988, art. 114, parte final). Dir-se-á, então, que, se a convenção coletiva de trabalho não foi homologada pela Justiça do Trabalho, não seria desta a competência para as ações de cumpri­mento com base em tais convenções.

Esse entendimento, entretanto, Sr. Presidente, funda-se numa interpreta­ção meramente literal do dispositivo constitucional mencionado e não atenta para aspectos outros da questão, que devem ser considerados, pois o direito é um todo orgânico e as normas legais não podem ser interpretadas isoladamente.

Equaciono a controvérsia.

No CC n!.! 412-RS, de que fui Relator, decidiu esta Egrégia P. Seção:

"Constitucional. Processual Civil. Competência. Sindicato. Contribuição. Dissídio coletivo. Convenção coletiva.

I - A competência para o processo e julgamento das ações de cumprimento de sentenças normativas havidas em dissídios coletivos e convenções coletivas - contribuições devidas a sin­dicatos e resultantes de convenção coletiva de trabalho ou de dissídios coletivos - é da Justiça do Trabalho, tendo em vista a inovação, em termos de competência, inscrita no art. 114 da Constituição de 1988.

R. Sup. Trib. Jusl., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990. 95

II - Conflito negativo de competência julgado improce­dente. Competência, no caso, da Junta de Conciliação e Julga­mento de Taquara-RS, suscitante."

(D.J. 02.10.89)

Dir-se-á, entretanto, que a competência do Juízo Trabalhista será, apenas, para as ações de cumprimento de sentença normativa, vale dizer, sentença proferida em dissídio coletivo e não para as ações de cumprimento de conven­ção coletiva ou acordo coletivo,já que, nestes dois últimos, não se estará dando cumprimento a uma sentença do Juízo Trabalhista.

A objeção, ao que me parece, é irrelevante.

A convenção coletiva, fonte de direito, tendo em vista o seu conteúdo normativo, assim criadora de norma, incide sobre os contratos de trabalho individuais de trabalhadores por ele abrangidos. Deve ela, sabemos todos, preceder ao dissídio coletivo. Este, aliás, somente será instaurado no caso de fracassar a autocomposição (CLT, art. 616, § 1 !!). A solução jurisdicional, pois, dar-se-á na hipótese de frustrar-se a negociação, legitimado o sindicato, pela Constituição de 1988, a suscitar o dissídio coletivo (CF, 1988, art. 114, § 2!!).

Esclareça-se, de outro lado, que, enquanto a convenção coletiva é o acordo celebrado por sindicatos representativos de categorias econômicas e profissionais (CLT, art. 616), o acordo coletivo é firmado pelo sindicato patronal e dos empregados representados pelo sindicato de empregados com uma ou mais empresas da correspondente categoria econômica. Aquela, a convenção coletiva, abrange as empresas representadas pelo sindicato profis­sional que firmou o pacto. Este, o acordo coletivo, aplica-se ao âmbito da empresa ou das empresas acordantes. No acordo coletivo, portanto, não há a participação do sindicato patronal.

É verdade que, diante do que está inscrito no art. 8!!, VI, da Constituição, há quem afirme a impossibilidade de a empresa participar do acordo coletivo. A interpretação harmônica, entretanto, dos artigos 8!!, VI e 7!!, XXVI, conduz à conclusão outra (João de Lima Teixeira Filho, "A Empresa e a Negociação Coletiva na Nova Constituição Federal", Revista LTr, jan/89, pág. 1). Esta questão, entretanto, não é relevante para o deslinde da controvérsia posta nestes autos.

Aqui, o que é importante ressaltar é que a natureza jurídica da convenção coletiva e do acordo coletivo não difere da natureza jurídica da sentença normativa. Porque, "como ninguém ignora", ensina Délio Maranhão, "senten­ça coletiva e contrato coletivo equiparam-se pela nonnatividade que lhes serve de traço característico, razão pela qual a doutrina alemã chamou a sentença coletiva de contrato coletivo forçado". (Délio Maranhão, Arnaldo Sussekind

96 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990.

e Segadas Viana, "Instituições de Dir. do Trabalho", Liv. Freitas Bastos, 6''-, ed., 1974, II/925).

Para o eminente Juiz Ari Rocha, "é substitutiva e constitutiva a sentença normativa de natureza econômica. Substitutiva porque, de certo modo, equi­vale a "uma convenção coletiva forçada, ou seja, imposta à categoria" (Geraldo Bezerra de Menezes, "Dissídios Coletivos do Trabalho e Direito de Greve", pág. 125)" (Ari Rocha, "Dissídio Coletivo", Revista Brasileira de Direito Processual", 28/37-62, 49).

Convenção coletiva de trabalho (CLT, art. 611) e acordo coletivo (CLT, art. 611, § P), espécies do gênero acordos normativos (Amauri Mascaro Nascimento, "Direito Sindical", LTr Editora, 1984, 2!!. ed., pág. 257) têm, na verdade, natureza jurídica idêntica à natureza jurídica da sentença normativa, sendo esta "a solução processual de um conflito de interesses: substitui a solução contratual que não pôde ser realizada, ou seja, a convenção coletiva. São, ambos, instrumentos jurídicos de composição de conflitos da mesma natureza, que se equivalem e visam ao mesmo fim" (Délio Maranhão, "Dir. do Trabalho", FGV, Rio, 1988, pág. 325).

Assim posta a questão, não seria lógico e nem sensato dar-se pela com­petência da Justiça do Trabalho para as ações de cumprimento baseadas em sentenças nonnativas e pela competência da Justiça Comum estadual para as ações de cumprimento com base em acordos normativos não homologados pela Justiça Trabalhista. Haveria, inclusive, a possibilidade de interpretações conflitantes entre os dois ramos do Poder Judiciário, com evidente prejuízo para o direito coletivo e para o Poder Judiciário.

Ora, idênticos nas conseqüências e nos efeitos jurídicos, porque a natu­reza jurídica da sentença coletiva é idêntica à natureza jurídica dos acordos normativos, deve-se emprestar interpretação analógica ao dispositivo consti­tucional inscrito no art. 114, parte final, da Constituição; neste caso, não estaríamos partindo de uma norma legal para a criação de norma jurídica nova para aplicação a uma situação diferente da prevista na lei, mas, simplesmente, estaríamos, a partir de um texto legal, fazendo incluir uma situação análoga, embora não referida expressamente no texto. Não há, em caso assim, a criação de direito novo, já que, nesse tipo de interpretação denominada analógica, apenas se completa o alcance do direito existente. Ora, fatos de igual natureza devem ser regulados de modo idêntico, lembra Carlos Maximiliano, com apoio em Ferrara (Carlos Maximiliano, "Hermenêutica e Aplicação do Direito", Forense, lO!!. ed., pág.209). É que, ubi eadem legis ratio, ibi eadem legis dispositio, proclamavam os romanos, o que, em vernáculo, quer dizer: onde se depare razão igual à de lei, ali prevalece a disposição correspondente, da nonna referida" (C. Maximiliano, ob. e loco cits.). Tem-se, nesse tipo de interpretação,

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990. 97

vale invocar a lição de Paula Baptista, a aplicação da lei "a casos novos, e não previstos por ela, nos quais se dão os mesmos motivos fundamentais e gerais que no caso previsto", fundando-se a extensão da lei, neste caso, "não tanto na vontade do legislador deduzida de suas palavras (mente legis), como na har­monia orgânica do direito positivo com o científico: é um dos meios de suprir as lacunas da lei escrita a respeito de certos fatos sujeitos ao domínio do direito em sua universalidade" (Francisco de Paula Baptista, "Hermenêutica Jurídica", Edição cuidada por Alcides Tomasetti Jr., Ed. Saraiva, 1984, págs. 41/42).

Do exposto, com a vênia dos eminentes Colegas que não pensam assim, declaro a competência, no caso, da Junta de Conciliação e Julgamento.

EXTRATO DA MINUTA

CC N!.! 696 - PR - (Reg. n!.! 89107224) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro PEDRO ACIOLI. Suscitante: Juízo Presidente da Junta de Conciliação e Julgamento de Campo Mourão - PRo Suscitado: Juízo de Direito da F Vara Cível de Campo Mourão - PR. Autor: Construtora Chave Ltda. Réu: Sindi­cato dos Trabalhadores na Ind/ da Construção e do Mobiliário de Maringá. Advogados: Drs. Daisy Lucy Desan Silveira e Pedro Stefanichen.

Decisão: A Seção, por maioria, vencidos os Exmos. Srs. Mins. Geraldo Sobral, Garcia Vieira e Vicente Cemicchiaro, decidiu pela competência da Junta de Conciliação e Julgamento de Campo Mourão - PR, suscitante (em 13.03.90 - F Seção).

Votaram com o Relator os Exmos. Srs. Ministros Américo Luz, IImar Galvão, José de Jesus e Carlos Velloso. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro ARMANDO ROLLEMBERG.

98

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CONFLITO DE COMPETÊNCIA N!.! 713 - RS

(Registro n!.! 89.0010935-9)

Relator: O Ermo. Sr. Ministro Walde1l1ar Zveiter

Suscitante: Juízo de Direito da ]!1 Vara Cível de Bagé-RS

Suscitado: Juízo Presidente da Junta de Conciliação e Julgamento de Bagé-RS

Autor: Luiz Carlos Alves Marill10n

Réu: Departamento de JÍgua, Esgotos e Saneamento de Bagé

Advogados: Drs. Carlos Alberto Fraga do Couto e Humberto Alves Gasso

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 65-1 J 7, ago. J 990.

EMENTA: Processual civil. COlÍlpetência. Reclamação trabalhista. Funcionário público municipal.

I - Existência de relação de emprego anterior, sob o regime da Consolidação das Leis do Trabalho.

U - Desinlluente a natureza estatuária posterior, ·quan­do a pretensão deduzida refere-se à relação de trabalho, per­tinente a horas-extras, depósito do FGTS, adicional de periculosidade.

lU - Conflito conhecido, para declarar-se competente a Justiça Trabalhista.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 2!!. Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

conhecer do Conflito, para declarar competente o Juiz Presidente da Junta de Conciliação e julgamento de Bagé-RS, na forma do relatório e notas taquigrá­ficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei. Brasília, 13 de dezembro de 1989 (data do julgamento). Ministro NILSON NAVES, Presidente. Ministro W ALDEMAR ZVEI­

TER, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO W ALDEMAR ZVEITER: Nos autos da reclamação trabalhista ajuizada por Luiz Carlos Alves Marimon contra Pre­feitura Municipal de Bagé-RS, a Colenda Junta de Conciliação e Julgamento daquele Município, acolhendo exceção de incompetência argüida pela recla­mada, declinou-a em favor do Juízo de Direito da F Vara Cível daquela Comarca, ao argumento de que "a relação jurídica existente entre as phrtes é de direito público" (fls. 53/54).

O Dr. Juiz de Direito, por sua vez, suscitou o presente conflito negativo de competência, sustentando que a pretensão do reclamante "fundamenta-se em suposto descumprimento de obrigação contratual trabalhista, sob a égide da CLT e não da sua condição de funcionário público ... " (fl. 60).

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990. 99

A douta Subprocuradoria Geral da República opinou pelo conhecimento de conflito, para declarar-se competente a Juízo do Trabalho.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO W ALDEMAR ZVEITER: Conquanto osten­te o reclamante a qualidade de funcionário público municipal, regido pela Lei municipal n!! 2.294/84, Estatuto dos Funcionários Públicos do Município de Bagé-RS, inequivocamente, o postulante ajuizou reclamação trabalhista, ob­jetivando o recebimento das seguintes parcelas: horas-extras, depósitos do FGTS, adicional de periculosidade, pagamento da multa prevista no art. 22, do Regulamento do FGTS.

É de ver, tal postulação pressupõe a existência de relação de emprego anterior, ao tempo em que o reclamante prestou serviços à reclamada, sob o regime da Consolidação das Leis do Trabalho.

Portanto, revelam os autos, a relação jurídica litigiosa, na espécie, é de natureza trabalhista e, assim sendo, deve a ação ser processada e julgada perante a Justiça do Trabalho.

Desinfluente, aqui, a natureza estatutária posterior do vínculo entre re­clamante e o reclamado; relevante, no caso, é o caráter da relação jurídica litigiosa, como afirmado, que é a empregatícia, a aferir-se a competência para o processo e julgamento do feito.

Nesse mesmo sentido, já decidiu, unanimemente, esta Egrégia 2l'. Seção, quando do julgamento do Conflito de Competência n!! 735-SE, do qual fui Relator, em que se adotou, também, precedentes nos CC n!!s411-MS e 257-PE, Relator o eminente Ministro Sálvio Figueiredo (in DJ de 2.10.89 e 16.10.89, respectivamente) e CC n!! 336-RO, publicado no DJ de 25.9.89, Relator o ilustre Ministro Barros Monteiro.

Pelo exposto, conheço do Conflito, para declarar competente o Dr. Juiz Presidente da Junta de Conciliação e julgamento de Bagé-RS.

EXTRA TO DE MINUTA

CC 713 - RS - (Reg n!! 89.00109359) - Relator: Exmo. Sr. Ministro Waldemar Zveiter. Suscitante.: Juízo de Direito da F Vara Cível de Bagé -RS. Suscitado.: Juízo Presidente da JCJ de Bagé - RS. Partes: Luiz Carlos Alves Marimon e Departamento de Água, Esgotos e Saneamento de Bagé.

100 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990.

Decisão: A Seção, por unanimidade, conheceu do conflito para declarar competente o Juízo da Junta de Conciliação e Julgamento de Bagé - RS (Em 13.12.89 - 2"" Seção)

Os Exmos. Srs. Ministros Fontes de Alencar, Cláudio Santos, Sálvio de Figueiredo, Barros Monteiro e Athos Carneiro votaram com o Exmo. Sr. Ministro Relator. Ausentes,justificadamente, os Exmos. Srs. Ministros Eduar­do Ribeiro, Gueiros Leite e Bueno de Souza. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro NILSON NAVES.

CONFLITO DE COMPETÊNCIA N!! 855 - SP

(Registro n!! 891286112)

Relator: Exmo. Sr. Ministro Pedro Acioli

Suscitante:Juízo Presidente da 49f! Junta de Conciliação e Julgamento de São Paulo-SP

Suscitado: Juízo de Direito da 23Q Vara Cível de São Paulo-SP

Autores:Sindicato dos Hospitais Clínicas Casas de Saúde; Laboratórios de Pesquisas e Análises Clínicas; Instituições Beneficientes Re­ligiosas e Filantrópicas do Estado de São Paulo

Réu: Homeomed-Clínica Homeopática S/C Ltda.

Advogados: Drs. Eriete Ramos Dias Teixeira e outro

EMENTA: Constitucional. Competência. Art. 114 -C.F.

I - Compete à Justiça Obreira a apreciação de lides originárias de suas próprias decisões. Precedentes.

II - Competência que se firma a favor da Justiça do Trabalho.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a Egrégia 1"" Seção do Superior Tribunal d~ Justiça, por unanimi­dade' decidir pela competência da 49!! Junta de Conciliação e Julgamento de

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2( 12): 65-117, ago. 1990. 101

São Paulo-SP, a suscitante, na forma do relatório e notas taquigráficas cons­tantes destes autos e que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 13 de março de 1990 (data do julgamento)

Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente. Ministro PEDRO ACIOLI, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO SR. MINISTRO ACIOLI: Cuida-se de conflito de competência onde é discutido a quem compete julgar ação de cumprimento de decisão oriunda de dissídio coletivo, onde restou finnada a obrigatoriedade de o em­pregador, recolher a favor do Sindicato, contribuição dos empregados, refe­rentes ao dissídio coletivo.

Subiram os autos a esta instância, sendo-me conclusos após manifestação da ilustrada S.G.R ..

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO PEDRO ACIOLI (Relator): Entendia eu, anteriormente, que a ação de cumprimento de sentença normativa competia à Justiça do Trabalho, por força da nonna insculpida na C.L.T., qual seja, artigo 142.

Advindo a nova Carta Política, esta erigiu em seu artigo 114, que compete à Justiça Obreira a apreciação de causas que tiverem origem em suas próprias decisões. É o caso presente.

Aliás, outra não é a orientação da Egrégia Seção, em casos como o presente.

Assim, conheço do conflito para dar pela competência da Justiça do Trabalho, em apreciar a questão.

É como voto.

EXTRATO DE MINUTA

CC N!! 855 - SP - (Reg. n!! 89128612) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Pedro Acioli. Suscitante: Juízo Presidente da 49;1 Junta de Conciliação e Jul­gamento de São Paulo-SP. Suscitado: Juízo de Direito da 23;1 Vara Cível de

102 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990.

São Paulo-SP. Autores: Sindicato dos Hospitais Clínicas, Casas de Saúde; Laboratórios de Pesquisas e Análises Clínicas; Instituições Beneficientes Re­ligiosas e Filantrópicas do Estado de São Paulo. Réu: Homeomed-Clínica Homeopática S/C Ltda. Advogados: Drs. Eriete Ramos Dias Teixeira e outro.

Decisão: A Seção, por unanimidade, decidiu pela competência da 49i!. Junta de Conciliação e Julgamento de São Paulo-SP, a suscitante (em 13.03.90 - F Seção).

Votaram com o Relator, os Exmos. Srs. Ministros Américo Luz, Geraldo Sobral, Ilmar Galvão, José de Jesus, Garcia Vieira, Vicente Cernicchiaro e Carlos Velloso. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro ARMANDO ROLLEMBERG.

CONFLITO DE COMPETÊNCIA N!! 865 - MS

(Registro n!! 89.0012952-0)

Relator: O EXlJlo. Sr. Ministro Costa Lima.

Autora: Justiça Pública.

Réus: Palllo Roberto Santos Bonfim, Palllo Ferreira da Silva, Salmo Ferreira e Elias Souza Tavares.

Suscitante: Juízo Auditor da lI! Auditoria da Justiça Militar do Estado de Minas Gerais.

Suscitado: Juízo de Direito de Carlos Chagas-MG.

EMENTA: Processual Penal. Competência. Policiais Militares. Facilitação de fuga de presos de cadeia pública.

I. A competência da Justiça Militar é para processar e julgar os policiais militares e bombeiros militares nos crimes militares definidos em lei.

H. A Justiça Comum é a competente para julgar policiais militares, que facilitem a fuga de preso de cadeia pública. Trata-se de crime contra a administração da Justiça.

IH. Precedentes.

IV. Conflito julgado procedente e declarado competente o MM. Juízo de Direito de Carlos Chagas-MG, ora suscitado.

R. Sur. Trih. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990. 103

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a 3;! Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do conflito e declarar competente o Suscitado, Juízo de Direito de Carlos Chagas-MG, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 19 de abril de 1990 (data do julgamento).

Ministro, JOSÉ DANTAS, Presidente. Ministro COSTA LIMA, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO COSTA LIMA: Cuida-se de conflito nega­tivo de competência em que é suscitante o Juízo Auditor da P. Auditoria da Justiça Militar do Estado de Minas Gerais (fls. 100/104) e suscitado o Juízo de Direito de Carlos Chagas-MG (fi. 61-apenso).

Discute-se qual a Justiça competente para julgar dois policiais militares que teriam facilitado a fuga de presos da cadeia pública de Carlos Chagas-MG, os quais se encontravam à disposição da Justiça Comum.

O Subprocurador-Geral da República, Dr. Haroldo Ferraz da Nóbrega, arrimado em acórdão do Supremo Tribunal Federal, opina pela competência da Justiça Comum.

Relatei.

104

VOTO

EMENTA: Processual Penal. Competência. Policiais Mili­tares. Facilitação de fuga de presos de cadeia pública.

I. A competência da Justiça Militar é para processar e julgar os policiais militares e bombeiros militares nos crimes militares definidos em lei.

11. A Justiça Comum é a competente para julgar policiais militares, que facilitem a fuga de preso de cadeia pública. Trata-se de crime contra a administração da Justiça.

IH. Precedentes.

IV. Conflito julgado procedente e declarado competente o MM. Juízo de Direito de Carlos Chagas-MG, ora suscitado.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990.

o EXMO. SR. MINISTRO COSTA LIMA (Relator): O presente conflito retoma a discussão de um tema pacificado na órbita da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do extinto Tribunal Federal de Recursos, onde foi até mesmo objeto da Súmula 233, já se tendo conhecimento de julgado nesta Corte Superior no mesmo sentido.

Sem delongas na fundamentação do meu entendimento, concluo compe­tir, inelutavelmente, à Justiça Comumjulgar militares que, mesmo em serviço, facilitam a fuga de presos de cadeia pública que se encontravam à disposição da Justiça Comum, eis que não caracterizado crime militar face à inexistência de quaisquer circunstâncias previstas no art. 9!.! do Código Penal Militar -Decreto-Lei n!! 1.001/69.

Não raras foram as decisões do Supremo Tribunal Federal neste sentido, como se lê nos seguintes verbetes:

"EMENTA: Policial Militar.

Compete à Justiça comum apreciar o processo em que se acusa o policial militar de crime estranho ao domínio do art. 92

do Código Penal Militar." (CC n!! 6.437-MG, ReI.: Min. Francisco Rezek - RTJll10 - p. 67).

"EMENTA: Competência.

Policial militar processado por delito de facilitação de fuga de preso da cadeia pública (art. 351, § 42 , do Código Penal). Competência da Justiça Comum. Precedentes do STF. Recurso Extraordinário provido." (RE/Cr. n2 102.348-SP, ReI.: Min. Djaci Falcão - RTJIllO - p. 922).

"EMENTA: Competência. Policial Militar. Constituição, art. 144, § 1!.!, alínea d.

Não se trata de competência definida por mera prerrogativa de função. Se o crime não for militar, o policial militar será processado e julgado pela Justiça Comum. Policial Militar pro­cessado por crime de facilitação na fuga de preso, na modalidade culposa. Código Penal, art. 351, § 42; Código Penal Militar, art. 179. Compreensão de crime militar. Código Penal Militar, art. 92•

O crime de facilitação de fuga de pessoa legalmente presa com­preende-se na lei penal comum (CP, art. 351, § 42), entre os crime contra a administração da Justiça. Não se trata, assim, de crime praticado contra a pessoa, mas, sim, contra a administração pú­blica. Embora a conduta imputada ao policial militar esteja pre­vista, também no Código Penal Militar, é necessário que ocorra uma das hipóteses do art. 92, desse diploma criminal, sem o que não há o delito militar, em tempo de paz. No caso, a fuga do preso

R. sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990. 105

aconteceu de uma Cadeia Pública, submetida à administração civil do Estado, e não de estabelecimento sujeito à administração da Polícia Militar do Estado. Não se caracteriza, dessa maneira, o crime como em detrimento da ordem administrativa militar, única situação em que se poderia enquadrar o art. 9!!, lI, letra e, infine, do Código Penal Militar. Conflito de Jurisdição conheci­do, para declarar-se a competência da Justiça Comum." (CJ n!! 6.395-MG - ReI.: Min. Néri da Silveira - RTJ/111 - p. 559)

"EMENTA: Competência. Policial Militar. Crime Militar. Constituição, art. 144, § I!!, alínea d.

Não se trata de competência definida por mera prerrogativa de função. Se o crime não for militar, o policial militar será processado e julgado pela Justiça Comum. Crime de facilitação de fuga de preso de cadeia pública, não sujeito à administração militar. Inexistência de crime militar. Competência da Justiça Comum. Recurso extraordinário conhecido e provido, para, diri­mindo conflito de competência, afirmar a competência do Juiz de Direito." (RE n!! 102.998-MG - ReI.: Min. Néri da Silveira -RTJ/116 - p. 1123).

O extinto Tribunal Federal de Recursos, a seu tu mo, através da Súmula 233 solidificou a mesma orientação:

"Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar o policial militar por crime de promover ou facilitar fuga de preso de cadeia pública."

Finalmente, nesta Corte Superior, noticia-se o CC n!! 359 - RS, ReI. Min. Anselmo Santiago, pub. DJU de 23.10.89, pág. 16.190, com a seguinte ementa:

"Competência. Facilitação de fuga de preso.

Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar o policial militar por crime de promover ou facilitar fuga de preso da cadeia pública (Súmula 233 do extinto Tribunal Federal de Recursos).

Conflito procedente."

Ainda se considere o disposto na Constituição em vigor - art. 125, § 4!! - a competência da Justiça Militar cinge-se aos policiais e bombeiros militares nos crimes militares definidos em lei.

Sabido que, nos termos do art. 9!! do Código Penal Militar, a hipótese não se acha contemplada. Portanto, não basta a condição de policial militar para atrair a competência da Justiça Militar. Se é certo que a facilitação de fuga de

106 R. SlIp. Trib. JIISl., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990.

preso está prevista também no art. 178 do Código Penal Militar, acham-se ausentes os requisitos inscritos no aludido art. 9!:! do mesmo Estatuto Punitivo.

Os autos dão notícia, outrossim, de que a evasão ocorreu em estabeleci­mento não sujeito à administração da Polícia Militar, porém, da Justiça Comum do Estado.

Ante o exposto, conheço do conflito, para declarar competente o juízo de Direito de Carlos Chagas-MG, ora suscitado.

É o voto.

EXTRATO DA MINUTA

CC n!:! 865 - MG - (Reg. n!:! 89.0012952-0) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Costa Lima. Autora: Justiça Pública. Réus: Paulo Roberto Santos Bonfim, Paulo Ferreira da Silva, Salmo Ferreira e Elias Souza Tavares. Sus­citante: Juízo Auditor da F Auditoria da Justiça Militar do Estado de Minas Gerais. Suscitado: Juízo de Direito de Carlos Chagas-MG

Decisão: A Seção, por unanimidade, conheceu do conflito e declarou competente o Suscitado, Juízo de Direito de Carlos Chagas-MG (Em 19.04.90 - 3;! Seção).

Votaram de acordo os Exmos. Srs. Ministros Carlos Thibau, Costa Leite, Dias Trindade, Assis Toledo, Edson Vidigal, Willian Patterson, José Cândido e Flaquer Scartezzini. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro JOSÉ DANTAS.

• CONFLITO DE COMPETÊNCIA N!:! 884 - DF

(Registro n!:! 132130)

Relator: O EX/IIo. Sr. Ministro Eduardo Ribeiro

Suscitante: Juízo Federal da 7!!. Vara - DF

Suscitado: Juízo de Direito da 3!!. Vara Cível de Brasília - DF

Partes: Paulo Argelo e cônjuge e Gilzira Mendes da Silva e cônjuge

EMENTA: Competência. Conflito inexistente.

Proposta demanda perante Juiz do Distrito Federal, fi­gurando como litisconsorte empresa pública federal, cabe-lhe declinar da competência, não lhe sendo dado decidir se aquela

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990. 107

deve ou não figurar como ré. Se o Juiz Federal entende que inexiste razão para o litisconsórcio, excluindo do processo o ente federal, uma vez precluso o decidido desaparece a razão que levava fosse ele o competente. Os autos devem ser sim­plesmente devolvidos à Justiça local, inexistindo conflito, pos­to que não mais subsiste o motivo que levara esta a declinar para o foro federal.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a 2i! Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do conflito para o Suscitante determinar a remessa dos autos ao Suscitado, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Brasília, 08 de agosto de 1990 (data do julgamento).

Ministro GUEIROS LEITE, Presidente. Ministro EDUARDO RIBEI­RO, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Paulo Argelo e sua mulher ajuizaram ação contra Gilzira Mendes da Silva e seu marido, pedindo fossem condenados a outorgar escritura de compra e venda de imóvel, em cumprimento a contrato de cessão de direitos. Pediram, mais, fosse citada a Caixa Econômica Federal "para integrar a lide, na qualidade de litisconsorte passiva, visto ter sido credora hipotecária, já paga de todos os seus haveres".

A demanda foi proposta perante o juízo de Direito da 3i! Vara Cível de Taguatinga - Distrito Federal, que declinou da competência, acolhendo. ar­güição da Caixa Econômica. O MM Juiz Federal da 7i! Vara, entretanto, suscitou conflito negativo. Fundou-se em que "mesmo que a CEF ainda seja credora, a adjudicação pretendida não extingue a hipoteca (Código Civil, art. 849). Logo não há o que defender, tendo em vista o direito de seqüela". E concluiu que "excluída a CEF e em razão da qualidade das partes remanescen­tes" era incompetente para o julgamento da causa.

O Ministério Público opina seja reconhecida a competência da Justiça local.

É o relatório.

108 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990.

VOTO

EMENTA: Competência. Conflito inexistente.

Proposta demanda perante Juiz do Distrito Federal, figuran­do como litisconsorte empresa pública federal, cabe-lhe declinar da competência, não lhe sendo dado decidir se aquela deve ou não figurar como ré. Se o Juiz Federal entende que inexiste razão para o litisconsórcio, excluindo do processo o ente federal, uma vez precluso o decidido desaparece a razão que levava fosse ele o competente. Os autos devem ser simplesmente devolvidos à Justiça local, inexistindo conflito, posto que não mais subsiste o motivo que levara esta a declinar para o foro federal.

O EXMO. SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Bem ou mal, com ou sem fundamento razoável, a ação foi proposta também contra a Caixa Econô­mica cuja citação, como litisconsorte, pediu-se, sendo oferecida contestação. Bem andou o Juiz do Distrito Federal, ao declinar da competência, já que figurava como ré empresa pública federal. Não lhe era dado decidir se aquela deveria ou não figurar no processo, matéria afeta aos Juízes Federais.

O ilustre Juiz suscitante, entretanto, entendeu que não havia razão para que a Caixa figurasse no processo. Explicitou que aquela ficava excluída do mesmo, já que nele não tinha o que defender. Decidiu no âmbito de sua competência, apreciando a demanda contra o ente federal. Ao excluí-lo, fez desaparecer o motivo que conduzira a que lhe fosse submetida a causa. Ope­rada a preclusão quanto ao decidido, cabia-lhe, simplesmente, devolver os autos ao Juiz de Taguatinga que, antes incompetente, deixara de sê-lo com a exclusão da Caixa Econômica. Inexiste qualquer conflito. Não conheço do conflito, devendo o suscitante determinar a remessa dos autos ao Juízo de origem, se não tiver sido interposto recurso.

Voto, outrossim, por que cópia da Íntegra do acórdão seja remetida ao Juiz Federal para juntada aos autos.

EXTRATO DA MINUTA

CC 884 - DF - (Reg. n!l 89.132130) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Eduardo Ribeiro. Suscitante: Juízo Federal da 7i! Vara. Suscitado: Juízo de Direito da 3i! Vara Cível de Brasília - DF. Partes: Paulo Argelo e cônjuge e Gilzira Mendes da Silva e cônjuge.

Decisão: A Seção, por unanimidade, não conheceu do Conflito para o Suscitante determinar a remessa dos autos ao Suscitado, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator (2i!Seção 08.08.90).

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990. 109

Votaram com o Relator os Exmos. Srs. Ministros Athos Carneiro, Wal­demar Zveiter, Fontes de Alencar, Cláudio Santos, Barros Monteiro, Bueno de Souza e Nilson Naves.

Ausente, justificadamente, o Exmo. Sr. Ministro Sál via de Figueiredo.

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro GUEIROS LEITE.

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CONFLITO DE COMPETÊNCIA N!21.063 - SP

(Registro N!:! 900001916-8)

Relator: O Exmo Sr. Ministro Costa Lima

Autora: Justiça Pública

Réus: Paulo Henrique Benedito, Moisés Poli, Luiz Antônio Ângelo e Roberto Vicente da Silva

Suscitante: Juízo Federal da 3!! Vara-SP

Suscitado: Juízo de Direito de Regente Feijó - SP

EMENTA: Conflito negativo de competência. Falsifica­ção grosseira de moeda. Estelionato.

1- Compete à Justiça Comum do Estado julgar crime relativo a falsificação grosseira de moeda, facilmente percep­tível a olho desarmado.

II- Precedentes.

III- Conflito conhecido e declarado competente o Juízo de Direito de Regente Feijó-SP.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a 3;! Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do conflito e declarar competente o Suscitado, Juízo de Direito de Regente Feijó-SP, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 5 de abril de 1990 (data do julgamento).

Ministro JOSÉ DANTAS, Presidente. Ministro COSTA LIMA, Relator.

110 R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO COSTA LIMA: Trata-se de conflito negativo de competênciaem que aparecem como suscitante e suscitado, respectivamen­te, o Juízo Federal da 3!! Vara de São Paulo e o Juízo de Direito de Regente Feijó-SP.

Discute-se se o crime descrito nos autos seria o de moeda falsa, de competência da Justiça Federal, ou, em tese, de estelionato, exteriorizado através de falsificação grosseira de moeda, de competência da Justiça Comum.

Opina o Ministério Público Federal, à fl. 50, pela competência dessa Justiça, eis que os autos revelam a existência do crime de estelionato.

Relatei.

VOTO

EMENTA: Conflito negativo de competência. Falsificação grosseira de moeda. Estelionato.

I- Compete à Justiça Comum do Estado julgar crime relativo a falsificação grosseira da moeda, facilmente perceptível a olho desarmado.

II- Precedentes. III- Conflito conhecido e declarado competente o Juízo de

Direito de Regente Feijó-SP.

o EXMO. SR. MINISTRO COSTA LIMA (Relator): A conclusão do laudo pericial de fl. 18 é a seguinte:

"São falsas as cédulas de papel moeda objeto de exame, tendo em vista as seguintes divergências:

- qualidade do papel;

- qualidade das tintas; - ausência de meias tintas;

- ausência de filigranas;

- impressão unilateral.

Vale ainda ressaltar que o processo utilizado para a obtenção das referidas cédulas foi através de cópia xerográfica e pintura com lápis de cor ou similar."

De outra parte, o simples exame das "notas" de Cz$ 5.000,00 e Cz$ 10.000,00 nos autos (fls. 5, 7 e 15) mostra que, sequer foram pintadas nas duas faces, permanecendo uma delas em branco.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990. 111

Trata-se, portanto, de falsificação grosseiríssima, verificável a olho de­sarmado por pessoa de inteligência mediana, não se podendo concluir pela existência de crime de moeda falsa, mas sim de estelionato.

A jurisprudência é pacífica neste sentido, existindo julgado inclusive desta 3!! Seção, como se lê nos seguintes verbetes:

"Processual Penal. Competência. Falsificação grosseira de moeda. Crime de estelionato.

Tratando-se de falsificação grosseira, constatável a olho nu, o crime em tese a ser cogitado é de estelionato, não de moeda falsa.

Competência da Justiça Estadual." (CC n. 337-SC, STJ, 3!! Seção, ReI. Min. Assis Toledo, DJU 05.09.89, p. 14.949)

"Processual Penal. Conflito de competência. Cédulas gros­seiramente falsificadas.

Grosseiramente falsificadas as cédulas apreendidas, não se configura o delito do art. 289 do CP, pelo que a competência para conhecer do inquérito policial é da Justiça Estadual, a ver se existente outra figura típica para a ação nele noticiada." (CC n. 619-GO, STJ, 3!! Seção, ReI. Min. Dias Trindade, DJU 16.10.89, p. 15.855)

"Penal e Processual. Competência. Moeda falsa. Falsifica­ção grosseira.

Compete à Justiça Comum do Estado processar e julgar o crime relativo a papel-moeda grosseiramente falsificado e inca­paz de ilaquear a boa-fé do homem comum." (CC. n. 8.077-AM, TFR, I!! Seção, ReI. Min. Costa Lima, DJU de 30.06.88)

"Competência. Falsificação grosseira de cédula de hum mil cruzeiros.

n - A imitação grosseira, perceptível ictu oculi, não con­figura o delito de falsificação de moeda. Hipótese que caracteriza, em tese, a tentativa de estelionato.

In - Conflito negativo de jurisdição conhecido, para de­clarar competente a Justiça Comum." (CJ 6.271-MG, STF, Ple­nário, ReI. Min. Thompson Flores, in RTJ 98-03, púg. 991)

Na mesma orientação: CC 4.606, TFR, I!! Seção, ReI. Min. Costa Lima, DJU 22.04.82; CC 8.056-PE, TFR, F Seção, ReI. Min. Costa Lima, DJU 12.05.88; CJ 6.096-MG, STF, Tribunal Pleno, ReI. Min. Soares Munõz, RTJ 85/430.

112 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990.

Ante o exposto, conheço do conflito para julgar competente o Juízo de Direito de Regente Feijó-SP, ora suscitado.

É o voto.

EXTRATO DA MINUTA

CC n2 1.063 - SP - (Reg. n2 900001916-8) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Costa Lima. Autora: Justiça Pública. Réus: Paulo Henrique Benedito, Moisés Poli, Luiz Antonio Ângelo e Roberto Vicente da Silva. Suscitante.: Juízo Federal da 3l! Vara-SP. Suscitado: Juízo de Direito de Regente Feijó-SP.

Decisão: A Seção, por unanimidade, conheceu do conflito e declarou competente o Suscitado, Juízo de Direito de Regente Feijó-SP (Em 05.04.90 3l! S.)

Votaram de acordo os Exmos. Srs. Mins. Costa Leite, Assis Toledo, Edson Vidigal e William Patterson. Ausente, por motivo justificado, os Exmos. Srs. Mins. José Cândido, Flaquer Scartezzini, Carlos Thibau e Dias Trindade. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro JOSÉ DANTAS .

• CONFLITO DE COMPETÊNCIA N2 1.262 - SP

(Registro n2 90.4970-9)

Relator: O EX11lo. Ministro José Cândido Suscitante:Juízo Federal da 4Q Vara de Santos - SP Suscitado: Julzo de Direito da 3Q Vara Criminal de Santos - SP Autor: Justiça Pública

Réu: Nelson de Giulio Réu: José Epitácio Soares Rocha Réu: Waldir Fonseca

EMENTA: Conflito de competência. Fatos delituosos atribuídos a empregados da CODESP (sociedade de econo­mia mista) contra outros empregados da mesma companhia. Tentativa de extorsão. Competência da Justiça Estadual.

Tratando-se de empresa de economia mista, não inserida na relação do inciso IV, do art. 109, da Constituição, as infra­ções penais, praticadas em detrimento de seus bens, serviços ou interesses, são da competência da Justiça Estadual. No caso, o Juízo de Direito da 3.!!. Vara Criminal de Santos - SP.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990. 113

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos, em que são partes as acima indicadas. Decide a 3;! Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

conhecer do conflito e declarar competente o Suscitado, Juízo de Direito da 3;! Vara Criminal de Santos - SP, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 02 de agosto de 1990 (data do julgamento).

Ministro JOSÉ DANTAS, Presidente. Ministro JOSÉ CÂNDIDO, Rela-toro

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ CÂNDIDO: Trata-se de inquérito para apurar tentativa de extorsão, por funcionário da Companhia Docas do Estado de São Paulo - CODESP, contra outros funcionários da mesma empresa.

O Juiz de Direito da 3;! Vara Criminal de Santos, a que foi encaminhado o processo, acolhendo promoção do Ministério Público, que entendera tratar-se de delito contra a administração pública, figurando como sujeito passivo a União, acionista majoritário da CODESP (sociedade da economia mista), determinou a baixa na distribuição e remessa dos autos à Justiça Federal.

Foram, então, os autos, mandados à Polícia Federal para complementação das investigações, resultando delas o relatório de fls. 93-94, no qual sugeriu o Delegado fosse suscitado conflito, pois que entendia incompetente a Justiça Federal, em face do art. 109, IV, da Constituição.

Nesse sentido opinou o Procurador da República, Dr. Paulo Eduardo Bueno, vindo o conflito negativo de competência a ser suscitado pela ilustre Juíza Federal da 4;! Vara de Santos, Alda Maria Bastos Caminha Ansaldi, fundamentando-se no citado dispositivo constitucional (art. 109, IV) e em acórdão do antigo Tribunal Federal de Recursos.

A douta Subprocuradoria Geral da República manifestou-se pelo conhe­cimento do conflito e declaração da competência da Justiça estadual.

114

É o relatório.

VOTO

EMENTA: Conflito de competência. Fatos delituosos atri­buídos a empregados da CODESP (sociedade de economia mista) contra outros empregados da mesma companhia. Tentativa de extorsão. Competência da Justiça Estadual.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990.

Tratando-se de empresa de economia mista, não inserida na relação do inciso IV, do art. 109, da Constituição, as infrações penais, praticadas em detrimento de seus bens, serviços ou inte­resses, são da competência da Justiça Estadual. No caso, o Juízo de Direito da 3!!. Vara Criminal de Santos - SP.

O EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ CÂNDIDO (Relator): A competência é, realmente, da Justiça Estadual, desde que se trata de sociedade de economia mista, não inserida na relação do inciso IV, do art. 109, da Constituição. Nele figuram a União, suas entidades autárquicas e empresas públicas. Com estes fundamentos, conheço, pois, do conflito, para declarar a competência do Juízo de Direito da Terceira Vara Criminal de Santos - SP, para processar e julgar o feito.

É o meu voto.

EXTRATO DA MINUTA

CC n!! 1.262 - SP - (Reg. n!! 90.4970-9) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro José Cândido. Autor: Justiça Pública. Suscitante.: Juízo Federal da 4!!. Vara de Santos - SP. Suscitado.: Juízo de Direito da 3!!. Vara Criminal de Santos - SP. Réus: Nelson de Giulio, José Epitácio Soares Rocha e Waldir Fonseca.

Decisão: A 3!!. Seção, por unanimidade, conheceu o conflito e declarou competente o Suscitado, Juízo de Direito da 3!!. Vara Criminal de Santos - SP (Em 02.08.90).

Os Exmos. Srs. Ministros Flaquer Scartezzini; Costa Lima, Carlos Thi­bau, Costa Leite, Dias Trindade, Assis Toledo, Edson Vidigal e William Patterson votaram de acordo com o Exmo. Sr. Ministro Relator.

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro JOSÉ DANTAS.

-. -CONFLITO DE COMPETÊNCIA N!! 1.278 - PR

(Registro n!! 90.0005220-3)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Costa Leite

Suscitante: Juízo de Direito de Andirá - PR Suscitado: Juízo de Direito da Terceira Vara de Ourinhos - SP

Autor: Justiça Pública

Réu: Sílvio Luiz Benato

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2( 12): 65-117, ago. 1990. 115

EMENT A: Processual Penal. Conexão. Simultalleus processus. Furto e receptação. Existência de conexão. Impos­sibilidade, no caso, de simultaneus processus, visto que sen­tenciado o feito relativo ao primeiro crime. A expressão sentença definitiva não é empregada, no art. 82 do CPP, no sentido de sentença transitada em julgado, como tecnicamen­te correto, mas no de sentença final. Conflito de competência conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas. Decide 3i! Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, co­

nhecer do conflito de competência para declarar a competência do MM. Juízo suscitado, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 23 de agosto de 1990 (data do julgamento).

Ministro JOSÉ DANTAS, Presidente. Ministro COSTA LEITE, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO COSTA LEITE: Trata-se de conflito negati­vo de competência entre o MM. Juízo de Direito da Comarca de Andirá-PR e o MM. Juízo de Direito da Terceira Vara da Comarca de Ourinhos-SP, em tomo do processo e julgamento de crime de receptação, argumentando o suscitado com a existência de conexão com crime de furto praticado no terri­tório da jurisdição do suscitante, enquanto este sustenta não ser mais possível a reunião dos processos, uma vez que o feito que determinaria a prevalência de sua jurisdição já foi sentenciado.

O parecer do Ministério Público opina no sentido de que se converta o julgamento em diligência, para se saber se a sentença prolatada no processo pelo crime de furto transitou em julgado.

É o relatório, Sr. Presidente.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO COSTA LEITE (Relator): Muito embora exista a conexão, a hipótese não comporta a providência de que cogita o art. 82, do CPP, ou seja, a avocação pelo juiz de jurisdição prevalente, para o simultaneus processus, eis que o feito relativo ao crime de furto já foi senten­ciado.

116 R. Sup. Trib.lust., Bmsília, 2(12): 65-117, ago. 1990.

Pouco importa que a selltença não haja transitado em julgado. Como observa Tourinho Filho, o legislador processual penal emprega a expressão "sentença definitiva" com'o sentido de "sentença final" ("Processo Penal", 22

VoI., 2ª ed., pág. 113).

Em passo seguinte, lançando mão de um exemplo, o insigne processua­lista agrega um argumento irrecusável:

" ... não se pode conceber, na hipótese, que o juiz de Bauru possa avocar o processo que tramita por Agudos, já com sentença final (sem transitar em julgado), para proceder à unificação dos processos e proferir uma única sentença, vale dizer, apreciar a matéria que já foi objeto de apreciação por outro juiz. Somente a instância superior é que tem tal poder."

Trata-se, com efeito, de entendimento confortado pela jurisprudência do colendo Supremo Tribunal Federal, como ilustra o acórdão no Conflito de Jurisdição Criminal 6.428-MG, cujo voto condutor, da lavra do eminente Ministro Moreira Alves, após transcrever o art. 82, do CPP, assevera, verbis:

"A avocação, como se vê, não Se dará se o processo já esti ver com sentença definitiva. Sentença definitiva, nesse dispositivo, não significa sentença transitada em julgado, mas sentença final, como sucede no art 593, I" do mesmo Código, onde se lê que cabe apelação " ... das sentenças definitivas de condenação ou de absolvição", a traduzir evidentemente sentenças finais, uma vez que não cabe apelação de sentenças transitadas em julgado."

Afastada, pois, a possibilidade desimultaneusprocessus, impende aplicar a regra geral de competência do art. 70, do CPP, pelo que conheço do conflito para declarar a competência do M.M. JUÍZb suscitado. É o meu voto.

EXTRATO DA MINUTA

CC 1.278 - PR - (Reg. nQ 90.0005220-3) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Costa Leite. Autor: Justiça Pública. Réus: Sílvio Luiz Benato e Marcos Alberto Soares. Suscitante.: Juízo de Direito de Andirá-PR. Suscitado.: Juízo de Direito da 3ª Vara de Ourinhos-SP.

Decisão: A Seção, por unanimidade, conheceu do conflito e declarou competente o suscitado, Juízo de Direito da 3ª Vara de Ourinhos-SP (3ª Seção - 23.08.90).

Votaram de acordo os Exmos. Srs. Ministros Dias Trindade, Assis Tole­do, Edson Vidigal, William Patterson, José Cândido, Flaquer Scaterzzini, Costa Lima e Carlos Thibau. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro JOSÉ DANTAS.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 65-117, ago. 1990. 117

HABEAS CORPUS E RECURSO

RECURSO DE HABEAS CORPUS N!.! 55 - SP

(Registro n!.! 89,0007975-1)

Relator Para o Acórdão: O Exmo. Sr. Ministro Armando Rollemberg

Relator Originário: O Exmo. Sr. Ministro Garcia Vieira

Recorrente: Paulo Gomes de Oliveira Filho

Recorrido: Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

Pacientes: José Maria Carvalho Ribeiro e Sérgio Burzicheli

EMENTA: "Processo Penal. Prisão Civil. Recurso de Habeas Corpus. Réu preso. Competência.

Tratando-se de recurso de Habeas Corpus relativo a réu preso, a competência para apreciá-lo e julgá-lo é da 3ª Seção deste Tribunal."

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas:

Decide a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, pela competência da Egrégia 3;! Seção, na forma do relatório e notas taquigrá­ficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 28 de setembro de 1989 (data do julgamento).

Ministro TORREÃO BRAZ, Presidente. Ministro ARMANDO ROL­LEMBERG, Presidente.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990. 121

RELATÓRIO

o EXMO. SR. MINISTRO GARCIA VIEIRA: O Bacharel Paulo Gomes de Oliveira Filho impetrou habeas corpus em favor de Sérgio Burzichelli e José Maria Carvalho Ribeiro, apontando como autoridade coatora o MM. Juiz de Direito da 2i! Vara das Execuções Fiscais do Estado de São Paulo.

Narra a inicial que os pacientes participaram como administradores da sociedade Indústria de Roupas Regência Ltda., o primeiro como funcionário e o segundo como sócio cotista, tendo deixado a empresa no início de 1985 e em abril de 1986, respectivamente.

Acrescente-se que os pacientes serviram muitas vezes como depositários de bens penhorados em execução fiscal e reclamações trabalhistas propostas contra a referida sociedade, que teve sua falência decretada em dezembro de 1986.

Sustentam que o art. 40 da Lei Falimentar impede o decreto de prisão do depositário infiel, se este, em razão da falência da devedora, já não mais detinha, de fato e de direito, o bem do qual foi aquele nomeado depositário.

Pleitearam a concessão da ordem para o fim de tornar sem efeito os r. despachos que determinaram aos pacientes a obrigatoriedade de apresentarem os bens ou depositarem seu equivalente em dinheiro, sob pena de prisão.

Processado regularmente o feito, a Décima Primeira Câmara Civil do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo concedeu a ordem em favor de Sérgio Burzichelli e a negou em relação a José Maria Carvalho Ribeiro. (fls. 231/235)

Irresignado, José Maria Carvalho Ribeiro interpôs recurso ordinário de habeas corpus perante o Supremo Tribunal Federal (fls. 239/244), sendo que por despacho proferido pelo eminente Relator à fi. 239, foi determinada a remessa dos autos a esta E. Corte, competente para apreciar a espécie.

Levado o presente recurso ajulgamento, a C. Sexta Turma Criminal, após acolher voto em questão de ordem suscitada pelo eminente relator, Ministro José Cândido, decidiu submeter a matéria competencial à consideração desta E. Corte Especial.

É o relatório.

VOTO (VENCIDO)

O EXMO. SR. MINISTRO (Relator): Sr. Presidente: A questão é saber a qual das seções deste Tribunal compete apreciar e julgar o presente RHC. Nos termos de nosso regimento interno, cabe à Primeira Seção processar e julgar os feitos atinentes ao Direito Público (art.9Q, § 1 Q), à Segunda os feitos atinentes ao Direito Privado (art. 9Q

, § 2Q) e à Terceira, matéria penal em geral

122 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990.

(art. 9!!, § 3!!). A nosso ver, no presente HC se discute matéria concernente a todas as três seções. Se a própria Constituição Federal prevê a prisão civil do depositário infiel (art. 5!!, LXVII) e assegura o direito de habeas corpus a quem sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder e se o paciente, dado como depositário infiel, está sob ameaça de prisão por caracterizada como ilegal, estaria em jogo o direito à liberdade, o direito de ir e vir e estas são questões relativas ao Direito Público. Saber se houve ou não o depósito, se o paciente era ou não o depositário, se os bens dos quais ele era o depositário foram ou não por ele devolvidos, se houve ou não arrecadação dos mesmos com a falência, se houve ou não exoneração do encargo de depositário e se o paciente é ou não depositário infiel, são matérias que dizem respeito ao direito privado. A ameaça de prisão, a decretação desta e a própria impetração de um habeas corpus envolvem questões peculiares.à matéria penal em geral.

Resta saber quais são os traços mais característicos da ameaça de prisão ou da prisão do depositário infiel e perquirir qual a matéria preponderante. A nosso ver é a de direito privado porque se discute a existência do próprio depósito, seu conceito, sua natureza jurídica, seu objeto, as obrigações do depositário, se houve ou não a devolução ou arrecadação dos bens, se restaram ou não comprovados os pressupostos para a ameaça de prisão e a decretação desta. A apreciação de todas estas questões cabe ao Juízo CiviL A própria prisão do depositário infiel é uma prisão civil tendente a compeli-lo a cumprir uma obrigação também de natureza civil. Celso Ribeiro Bastos, no seus recen­tes Comentários à Constituição elo Brasil, 2!.! volume, ed. 1989, esclarece que:

- "Ao próprio direitos de liberdade a Constituição preferiu fazer valer nestas restritivíssimas hipóteses outros direitos espe­cialmente encarecidos, quais sejam: o de perceber a pensão ali­mentar e o de ver restituída a coisa depositada. A prisão de que trata a Constituição é de natureza civil. Com isto quer-se signifi­car que ela não visa a aplicação de uma pena, mas tão-somente a sujeição do devedor a um meio extremamente violento de coer­ção, diante do qual, é de se presumir, cedam resistências do inadimplente. É por isso que, paga a pensão ou restituído o bem depositado, automaticamente cessa a prisão." (pág. 306)

Como se vê, a prisão do depositário infiel visa aplicar-lhe uma pena e sim compeli-lo a devolver os bens e constItui a coerção derradeira para constran­gê-lo a cumprir o seu dever, assumido num processo civil. É bom lembrar que o presente habeas corpus foi julgado pela lI;! Câmara Cível elo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (l1s. 231/235) e, coerentemente, deve o presente Recurso ser apreciado e julgado peJa Seção de Direito Privado.

Meu voto é para declarar competente a Segunda Seção e remeter-lhe os presentes autos.

R. Sup. Trib. Jusl., Brasília, 2(12): 119-1 RR, ago. 1990. 123

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO ARMANDO ROLLEMBERG: Sr. Presiden­te, tratando-se de recurso de habeas corpus relativo a réu preso, tenho que a competência é da3i! Seção, Seção Criminal.

Por isso, data venia do eminente Sr. Ministro Relator, voto em tal sentido.

(QUESTÃO DE ORDEM)

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ DANTAS: Sr. Presidente, se bem posto o voto do Sr. Ministro-Relator, em negar à prisão civil a natureza penal, isso, a meu ver, não implica, necessariamente, em que se tenha como estranha à competência criminal o habeas corpus, no mister da proteção ao direito de ir e vir.

Na verdade, com esse objetivo consitucional específico, tenha-se por correto dizer-se que o habeas corpus se rege por normas procedimentais genuinamente penais, tal como se alojam no centro do Código de Processo Penal. Ademais, no caso do depositário infiel, embora a prisão se autorize por força da legislação civil, desde ela própria se esboça a conseqüência penal tipificante do crime de apropriação indébita.

Daí, não há negar que, antes de dever-se atender a natureza jurídica da compulsão, para efeito da competência revisora da decisão, deve-se atender a natureza jurídica do processo revisor, o habeas corpus, remédio de conotação processual penal por excelência.

E digo mais, na Sessão passada desde Eg. Órgão, resolvemos aqui, a respeito da prisão administrativa, de conotação igualmente peculiar (ato de Ministro para expulsão de estrangeiro, medida também sem nenhuma carga penal), que o procedimento revisional seria da 3i! Seção, de competência dos feitos penais - Relator o Sr. Ministro Carlos Thibau.

Desse modo, até por coerência, convém remeter-se aos integrantes da­quela mesma Seção o conhecimento do habeas corpus, sem indagação de tratar-se da prisão civil, já que assim se disse sobre a prisão administrativa.

Daí que, Sr. Presidente, com todas essas considerações, sem deslustre algum da excelência teórica do voto do Sr. Ministro Relator, voto por que o processo se comporte na competência das Turmas da 3i! Seção.

VOTO (VENCIDO)

"Processual Civil Regimental. Prisão Civil do depositário infiel e do responsável por inadimplemento de pensão alimentar. Habeas corpus: com­petência da Seção de Direito Privado."

124 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990.

o EXMO. SR. MINISTRO CARLOS M. VELLOSO: Sr. Presidente, pretendemos, no nosso Regimento Interno, fazer uma distribuição de trabalho, distribuindo-o pelos ramos do Direito )público, do Direito Privado e do Direito Penal. A regra assentada foi que a competência das Seções e das respectivas Turmas seria fixada em função da natureza da relação jurídica litigiosa, sub­jacente.

Recentemente, tive oportunidade de suscitar, na Egrégia 1 i! Seção, um conflito de competência junto a esta Egrégia Corte Especial, num mandado de segurança que nos fora remetido pela Egrégia 2i! Seção e que me pareceu que foi determinante, na tomada da decisão da Egrégia 2i! Seção, o fato de se tratar de mandado de segurança. Estamos aqui, praticamente, diante do mesmo fato ou, pelo menos, de fato semelhante, porque o objeto imediato da causa é a liberdade individual; sustenta-se, por isto, que deve ser competente para co­nhecer do habeas corpus a Egrégia Seção Penal.

Com a devida vênia, não me parece que deva ser assim. Na verdade, não há negar que a natureza da relação jurídica litigiosa subjacente é de Direito Civil, é de Direito Privado. Destarte, competente para julgar o habeas corpus, que, além de ser a ação sob o ponto de vista jurídico processual, é, também, uma garantia constitucional, é a Seção incumbida de apreciar as questões de Diréito Privado, que é a Egrégia 2i! Seção. É que, na verdade, nada há de Direito Penal, no caso. A Constituição autoriza a prisão, prisão civil, prisão adminis- ' trativa, do depositário infiel e do responsável por inadimplemento de pensão alimentar. A Seção vai decidir, nesta causa, neste habeas corpus, se o deposi­tário é mesmo infiel frente à legislação civil, jamais frente à legislação penal; ou vai verificar se o responsável por pensão alimentar tornou-se inadimplente porum motivo ou outro, próprio ou atinente ao Direito Civil, jamais ao Direito Penal.

Vale dizer, a Seção jamais mandaria libertar o impetrante com base em um dispositivo de lei penal, e sim com base em um dispositivo da legislação civil. .

Desse modo, Sr. Presidente, acho que a competência é mesmo da Egrégia 2i! Seção, com a vênia daqueles que me antecederam, assim na linha do voto do Sr. Ministro Relator.

Poderão até surgir problemas. Imaginemos que, amanhã, em um recurso dirigido à Egrégia 2i! Seção, competente para apreciá-lo, esta entenda que realmente a prisão deveria persistir, ou pode até o Relator detenninar a prisão, o Relator do recurso especial na causa em que anteriormente fora decretada a prisão. Conflitos poderiam surgir entre as duas Seções.

Em síntese, Sr. Presidente, não fixo a competência da Seção pela natureza da ação, e sim pela natureza da relação jurídica litigiosa subjacente.

R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 119-1 RR, ago. 1990. 125

Com estas brevíssimas considerações, e com a vênia sempre devida aos Srs. Ministros Armando Rollemberg, José Dantas e Gueiros Leite, meu voto é no sentido de dar pela competência da Egrégia 2i!. Seção, na linha, portanto, do voto do Sr. Ministro-Relator.

VOTO - VENCIDO

O EXMO. SR. MINISTRO BUENO DE SOUZA: Sr. Presidente, reco­nheço bastante razoável a questão sobre competência para o habeas corpus, tal como foi trazida à Corte Especial. Mas quer me parecer que o critério que foi eleito pelo Regimento Interno é concernente à matéria a ser decidida, ou seja, à área da ciência do Direito tal como instrumenta o ordenamento jurídico vigente, em que encontra a sua sede o ato qualificado como portador de violência ou coação. Em outras palavras, penso que não se deveria dar priori­dade ao tipo de processo, ou seja, tratar-se de um habeas corpus, de um mandado de segurança ou de um procedimento tal ou qual, mas sim ao litígio que esse instrumento processual conduz perante o Tribunal.

A pouco aduzia o Sr. Ministro Gueiros Leite em comunicação pessoal, que era necessário ter em conta o litígio - falava a S. Exa. de pretensão -mas parece-me que a pretensão deve ser considerada tendo em vista a sua base empírica, a sua motivação. E a motivação, no caso, é um ato jurisdicional, que reconheceu uma das hipóteses em que a Constituição autoriza a prisão, art. 52, inciso LXVII.

Para dizer a mesma coisa em outras palavras, mais recentemente o habeas corpus tem sido qualificado em doutrina como um meio de tutela constitucio­nal da liberdade.

Ele não se filia necessariamente ao Direito Penal, e até pertence à história da jurisprudência brasileira, que no passado alguns fazendeiros costumavam manter em prisão os seus empregados em determinadas situações. Então, usava-se de habeas corpus em favor destes trabalhadores rurais que sofriam estas violências que não partiam do Poder Público, mas de um simples patrão. Penso que a matéria deduzida diante do Tribunal, como já acentuou o Sr. Ministro Carlos Velloso, é uma matéria de Direito Civil, como diz a Consti­tuição:

"Não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável por inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação ali­mentícia e a do depositário infiel."

Quando se tratar de decidir o habeas corpus tratar-se-á de verificar se o ato atacado pela impetração perpetra ou não uma coação ou uma violência

126 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990.

contra a liberdade de locomoção. Violência ou coação contra a liberdade de locomoção que se qualifique como ilegal ou como prática de abuso de poder, tendo em vista o modo como a lei autoriza o juiz a decretar uma prisão por infidelidade, no depósito, questões que certamente surgirão: Existe depósito? Ocorreu infidelidade no depósito? Havia débito por pensão? Deixou de ser pago? Houve intimação regular para pagar? São questões, a meu ver, concer­nentes à matéria de Direito Civil. Penso que não deveríamos dar realce ao tipo de procedimento adotado, porquanto, sendo habeas corpus um meio de tutela da garantia constitucional de liberdade, ele pode ser empregado onde quer que a liberdade esteja emjogo. E isto tanto pode acontecer a propósito do exercício da ação penal como a propósito quem sabe até de uma atividade meramente privada.

Por isso que, com a devida vênia dos votos que me antecederam, fico com o Sr. Ministro Relator, ao entender que a matéria caberia melhor na Segunda Seção, de Direito Privado.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO AMÉRICO LUZ: Sr. Presidente. Peço vênia para acompanhar os eminentes Ministros Armando Rollemberg e José Dantas, pelo seguinte: a hipótese cuida de depositário infiel. Ora, o depositário infiel é presumivelmente autor de apropriação indébita. A apropriação indébita é crime previsto no Código Penal. Entendo que, nestas divisões do Direito, de que trata o nosso Regimento Interno, surgirão hipóteses nebulosas, podendo-se pender para uma ou outra interpretação. Mas, quando cuida 31! Seção, o pará­grafo 3Q do art. 9Q do Regimento diz que cabe à Terceira Seção processar e julgar a matéria penal em geral.

Com estas breves considerações, pedindo vênia aos eminentes Ministros que votaram em sentido contrário, opto pela competência da Egrégia Terceira Seção.

VOTO (VOGAL)

O EXMO. SR. MINISTRO FLAQUER SCARTEZZINI: Sr. Presidente, coerente com o entendimento mantido por este Eg. Tribunal e trazido ao nosso conhecimento, pelo Ilustre Ministro José Dantas, de que na Seção passada esta C. Corte, em questão semelhante, entendeu que a competência era da Seção Penal, no caso, onde os fatos referem-se a depositário infiel, é de se seguir no mesmo diapasão, razão porque com a devida vênia, acompanho o eminente Ministro Armando Rollemberg.

É como voto.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990. 127

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO COSTA LIMA: Sr. Presidente. A 5i! Turma, ..:..... sendo eu Relator - conheceu e deu provimento a um recurso de habeas corpus originário também de São Paulo, tratando de matéria semelhante e em que o paciente se insurgia contra ato do Juiz que, em ação de depósito, lhe decretara a prisão. Entendo que, no caso presente, o objetivo maior do pedido é o direito de locomoção.

Com estas breves considerações, e pedindo vênia aos Ministros que entendem contrariamente, voto de acordo com o Sr. Ministro ARMANDO ROLLEMBERG.

VOTO (VOGAL)

O EXMO. SR. MINISTRO NILSON NAVES: Sr. Presidente, a prisão, ainda que de natureza civil, diz respeito ao Direito Penal. Este ramo do Direito usa muito de conceitos próprios do Direito Civil. Por exemplo, quando cuida da apropriação indébita, art. 168, prevê o aumento de pena, quando o agente recebe a coisa na qualidade de tutor, curador, síndico, Iiquidatário,inventa­riante, testamenteiro ou depositário judicial, § 12 - lI. Mas, há outro fundamen­to, de ordem pragmática. Na distribuição de trabalho, a que aludiu o Sr. Ministro Carlos Velloso, o Tribunal não pode esquecer o lado prático das coisas - a verdade da proposição reside na sua utilidade - sob o risco de inviabilizar uma de suas Seções, futuramente.

Com a vênia devida, acompanho o Sr. Ministro Armando Rollemberg.

VOTO-VENCIDO

o EXMO. SR. MINISTRO DIAS TRINDADE: Sr. Presidente, essa questão de ordem, que fez subir este processo a esta Corte, foi levantada por mim na Turma, tendo em vista o que está disposto no art. 92 do Regimento Interno: (lê):

"A competência das Seções e das Turmas, respectivamente, é fixada em função da natureza jurídica litigiosa."

A relação jurídica litigiosa, aqui, é de Direito Privado, como esclareceu o Sr. Ministro-Relator.

De modo que não vejo como fixar a competência na Turma Penal. Daí porque acompanho o Sr. Ministro Relator.

128 R. Sup. Trih. J ust., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO ASSIS TOLEDO: Sr. Presidente, no habeas corpus é muito difícil ir-se aos extremos da relação jurídica litigiosa para firmar-se a competência. Quando no habeas corpus se discute, por exemplo, prisão por furto, esse extremo envolveria saber se houve subtração de coisa alheia, portanto discussão sobre direito de propriedade, matéria de Direito Civil. Aqui, também, no tema da prisão civil, do depositário infiel, ou da prisão administrativa, se põem questões semelhantes. Há discussão subjacente sobre normas de direito privado, de direito público, de direito extrapenal. Mas a verdade é que, no habeas corpus, nãó se deslindam tais questões. Seu objeto é outro. A relação jurídica litigiosa, no habeas corpus, se limita ao direito à liberdade que está sendo violado por ato de autoridade. Não se deslindam, não se julgam as questões subjacentes. Restringe-se o habeas corpus, em regra, no caso de prisão civil ou de prisão administrativa, a examinar se foram observa­dos os aspectos legais para a decretação da prisão, autorizada pelo texto constitucional.

Por estas razões é que me parece que a discussão se coloca aqui não tanto em termos de Direito Privado ou de Direito Penal (também seria discutível que ela fosse de Direito Penal). Mas tudo se resolve numa questão de conveniência da distribuição de trabalho. A Corte Especial tem poderes para dizer, em caso de dúvida, qual a Seção competente para apreciar tais habeas corpus.

A meu ver, por uma questão de conveniência, é melhor que essa compe­tência seja deferida a uma única Seção, ou seja, a Penal, que aprecia normal­mente os pedidos de habeas corpus.

Opto, pois, pela solução dada pelo eminente Ministro Armando Rollem­berg, data venia dos que pensam em contrário.

É o meu voto.

EXTRATO DA MINUTA

RHC n!! 55 - SP - (Reg. n!! 89.0007975-1) - Relator para o acórdão: O Exmo. Sr. Ministro Armando Rollemberg. Relator original: Exmo. Sr. Ministro Garcia Vieira. Recorrente.: Paulo Gomes de Oliveira Filho. Recorri­do.: Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Paciente.: José Maria Carva­lho Ribeiro e Sérgio Burzichelli.

Decisão: A Corte Especial, por maioria, decidiu pela competência da Egrégia 3l!. Seção, vencidos os Exmos. Srs. Ministros Relator, Carlos Venoso, Bueno de Souza, Miguel Ferrante, Pedro Acioli, Geraldo Sobral e Dias Trin­dade. (Em 28.09.89 - Corte Especial).

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990. 129

Votaram de acordo com o Exmo. Sr. Ministro Armando Rollemberg, que lavrará o acórdão, os Exmo~ Srs. Ministros José Dantas, Gueiros Leite, Amé­rico Luz, Flaquer Scartezzini, Costa Lima, Costa Leite, Nilson Naves, lImar Galvão, José de Jesus e Assis Toledo.

Ausentes, por motivo justificado, os Exmos. Srs. Ministros Washington BQlívar, Presidente, William Patterson , Pádua Ribeiro, Carlos Thibau, Eduar­do Ribeiro e Edson Vidigal.

O Exmo. Sr. Ministro Garcia Vieira integra a Corte Especial em substi­tuição ao Exmo. Sr. Ministro José Cândido que se encontra em gozo de férias. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro TORREÃO BRAZ, Vice-Presi­dente.

RECURSO DE HABEAS CORPUS N2 134 - RJ

(Registro n!:! 0008643-0)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro José Cândido

Recorrente: José Carlos Fragoso Recorrido: Tribunal de Alçada Criminal do Rio de Janeiro

Paciente: João Agripino da Costa Dória Júnior

EMENTA: Recurso de Habeas Corpus. Queixa-Crime Contra Presidente de Empresa Pública Federal

Se o ato considerado ofensivo foi praticado pelo quere­lado, em nome da Empresa Pública Federal que preside, e no exercício de sua atividade funcional, em informação prestada ao Ministro de Estado, é irrecusável que a competência para o processo e julgamento da ação penal é da Justiça Federal.

Recurso provido para anular a decisão recorrida e o processo penal ab initio, com a determinação de sua remessa ao Juízo Federal.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos, em que são partes as acima indicadas: Decide a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar

provimento ao recurso, para reformar a decisão recorrida e, em conseqüência, anular o processo ab initio, por entender competente a Justiça Federal, motivo

130 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990.

pelo qual determina a remessa dos autos à Seção Judiciária do Estado do Rio de Janeiro, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Afirmou suspeição o Sr. Ministro Costa Leite; na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 11 de junho de 1990 (data do julgamento).

Ministro, WILLIAM PATTERSON, Presidente. Ministro, JOSÉ CÂN­DIDO, Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ CÂNDIDO: Sirvo-me, nesta primeira parte, do Relatório da egrégia 1;! Câmara do Tribunal de Alçada Criminal do Estado do Rio de Janeiro, assim expresso:

"O paciente, como Presidente da Embratur, determinou in­vestigações para apurar as atividades da empresa R.D.E. Em­preendimentos Publicitários Ltda. que opera no Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro. Afirma que essa empresa se dedicava a fraudar turistas que aqui desembarcavam, vendendo a eles um papel intitulado "PASSEPORT RDE", que substituía documento oficial de turista, usando de estratagemas que men­ciona.

0.2 Em decorrência desses fatos, o Sr. Francisco Walter Rizzoto, à frente dessa firma, passou a publicar nos jornais da Capital matéria paga ofensiva à pessoa do paciente e à EMBRA­TUR, por ele presidida.

0.3 Atingido em sua honra o paciente ofereceu duas repre­sentações contra Francisco Walter Rizzoto, e o fez junto o Minis­tério Público Federal, nos termos da Lei de Imprensa.

0.4 Francisco Walter Rizzoto, em contra pattida resolve então acionar o paciente porque teria publicado carta no lornaI do Brasil, edição de 16 de fevereiro de 1987, e ainda pelo fato de ter solicitado ao Ministro da Aeronáutica, providências contra sua pessoa, apresentando então queixa-crime junto à 32;! Vara Crimi­nal.

0.5 Diz o impetrante que essa queixa não poderia ser rece­bida, configurando, por isso, constrangimento ilegal.

Aponta ele a inépcia da inicial; B) que ocorreu a prescrição, pois o crime foi cometido através da imprensa; C) que se deu a decadência do direito do crime contra a honra; D) que o paciente

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990. 131

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agiu segundo a excludente da antijuricidade do art. 142, III, do Código Penal, e, por fim; E) que a competência para o processo é da Justiça Federal.

0.6 A autoridade apontada como coatora, Juiz Luiz Carlos Peçanha, informa à fi. 38 que não houve conciliação, sendo rece­bida a denúncia.

Acrescenta que foi declarada a prescrição dos crimes come­tidos através da Imprensa (fi. 84). Com relação à invocação da exclusão da antijuricidade é matéria de mérito. Entende que se trata de matéria da competência da Justiça Federal.

0.7 A digna Procuradora da Justiça, Dra. Márcia Paiva Are­lIand, opinou no sentido de se julgar prejudicado o pedido de prescrição, porque já foi declarada a sua extinção com relação aos crimes de injúria.

No tocante à inépcia da inicial, foi ela sanada.

Também não ocorreu a extinção da punibilidade pela deca­dência, porque a ofensa foi tomada pública em 16/5/87, somente ocorrendo o lapso decadencial em novembro de 1987.

O argumento de ausência de justa causa para o processo em face da atuação inequívoca do paciente em estrito cumprimento do dever legal é matéria de mérito, sendo denegada a ordem pelos citados argumentos.

Acha a Procuradoria que em face do art. 109 da Constituição Federal a matéria não é da competência da Justiça Federal.

E, por derradeiro, sustenta que inexiste conexão entre os fatos narrados nos inquéritos instaurados na Justiça Federal por iniciativa do paciente e os fatos narrados no processo que tramita na 32õ! Vara Criminal. Nos inquéritos instaurados na Justiça Fe­deral o indiciado é o Sr. Francisco WaIter Rizzoto, querelante na 32õ! Vara Criminal, o qual teria praticado crime em detrimento da EMBRATUR, enquanto na ação penal privada o querelante é o mesmo Sr. Francisco WaIter Rizzoto que imputa ao paciente a prática de delitos contra a sua honra pessoal, nada havendo em detrimento da EMBRA TUR.

0.8 Requisitei os autos originais (fi. 49).

0.9 O impetrante requereu a juntada de cópias das repre­sentações formuladas junto ao Ministério Público Federal com objetivo de reforçar o seu ponto de vista da exclusão da compe­tência da Justiça Ordinária.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-1R8, ago. 1990.

0.10 O P.J. se pronunciou às fls. 68 confinnando a extinção da punibilidade do paciente, opinando pela denegação.

0.11 Por insistência do relator, retoma o P.J. através do Dr. Guy Benigno Brasil aduzindo novos argumentos para denegação da ordem, ressaltando que a especulação sobre competência não pode ser objeto de Habeas Corpus, só se podendo proclamá-la por via própria."

julgando o writ, a egrégia Turma afastou, inicialmente, a competência da Justiça Federal para processar e julgar a ação penal. Adverte que a discussão sobre competência não pode ser objeto de exame de Habeas Corpus.

Que a inicial não é inépta. Que os crimes cometidos pela imprensa já foram declarados extintos, que

não ocorreu decadência do crime comum, e, a final, que a exclusão da antiju­ridicidade é matéria de mérito, que não pode ser tratada em Habeas Corpus.

Em conseqüência, denegou a ordem. Inconformado, recorreu o impetrante. Nesta Corte, o Ministério Público Federal opinou pela conexão, em razão

da prova, "entre a queixa-crime apresentada contra o recorrente (na qualidade de Presidente da EMBRATUR) e os processos que Francisco Walter Rizzoto responde na Justiça Federal ... "

Preliminannente argüiu "a incompetência da Justiça Estadual para co­nhecer e julgar a queixa-crime formulada contra o Presidente da EMBRA­TUR. .. "

No mérito, pede o trancamento da ação penal, em face "da decadência do direito de queixa, por parte do querelante, e/ou a ausência de justa causa para o seu processamento".

É o relatório.

VOTO

EMENTA: Recurso de Habeas Corpus. Queixa-Crime Contra Presidente de Empresa Pública Federal.

Se o ato considerado ofensivo foi praticado pelo querelado, em nome da Empresa Pública Federal que preside, e no exercício de sua atividade funcional, em informação prestada ao Ministro de Estado, é irrecusável que a competência para o processo e julgamento da ação penal é da Justiça Federal.

Recurso provido para anular a decisão recorrida e o processo penal ab initio, com a detenninação de sua remessa ao Juízo Federal.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990. 133

o EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ CÂNDIDO (Relator): Examino, de logo, a preliminar do Ministério Público Federal, que dá como incompetente a Justiça Estadual, "para conhecer e julgar a queixa-crime formulada contra o Presidente da EMBRATUR, quando ainda se encontrava ele investido naquele órgão, competência essa que se prorrogou não obstante o seu afastamento da presidência da empresa ... "

O recorrente, em suas razões, insistiu na tese da incompetência do juízo estadual, mostrando que os crimes praticados por funcionários públicos em razão de seu cargo são da competência da Justiça Federal.

A EMBRATUR é uma empresa pública federal, e o paciente agiu em seu nome, ao enviar a informação de que trata o processo principal, ao Sr. Ministro da Aeronáutica.

O ilustrado órgão do Ministério Público Federal, em seu Parecer de fls., pronuncia-se em favor da competência da Justiça Federal para processar e julgar o feito.

Quanto ao exame da matéria competencial, em sede de Habeas Corpus, desde que se trate de incompetência absoluta do Juiz, de fácil identificação nos autos, nenhum óbice pode ser criado ao seu exame, tal como já admitiu o Egrégio Supremo Tribunal Federal, in RTJ 93/1018.

Com estas considerações, liminarmente, tenho o juízo estadual como incompetente, e, conseqüentemente, dou provimento ao recurso para reformar a decisão do Tribunal a quo e anular a ação penal ab initio, mandando os autos à Justiça Federal de P. Instância, do Rio de Janeiro.

Éo meu voto.

EXTRA TO DA MINUTA

RHC n!! 134 - RJ - (Reg. n!! 89.0008643-0) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro José Cândido. Recorrente: José Carlos Fragoso. Recorrido: Tribunal de Alçada Criminal do Rio de Janeiro. Paciente: João Agripino da Costa Dória Júnior.

Decisão: A Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso para reformar a decisão recorrida e, em conseqüência, anular o processo ab initio, por entender competente a Justiça Federal, motivo pelo qual determina a remessa dos autos à Seção Judiciária do Estado do Rio de Janeiro, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator (61!. Turma - 11/6/90).

Votaram os Exmos. Srs. Ministros Dias Trindade e William Patterson, de acordo com o Exmo. Sr. Ministro Relator. Afirmou suspeição o Exmo. Sr. Ministro Costa Leite. Presidiu o julgamento o Ministro WILLIAM PATTER­SONo

134 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990.

HABEAS CORPUS NQ 209 - RS

(Registro nQ 89.0013155-9)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Flaquer Scartezzini

Impetrante: Joel Rodrigues Azambuja

Impetrado: Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

Paciente: Joel Rodrigues Azambuja (réu preso)

EMENTA: Processual penal. Prisão preventiva. Alega­ção de excesso de prazo na formação da culpa.

Justifica-se a prisão preventiva fundamentada na garan­tia de aplicação da Lei e na conveniência da instrução crimi­nal.

Estando o feito em fase final, na pendência, apenas, de atos de interesse da defesa, não há que se alegar excesso de prazo como fator de constrangimento.

Ordem denegada .

. ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 5i!. Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

indeferir o pedido, na forma do relatório e notas taquigráficas anexas, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei. Brasília,5 de março de 1990 (data do julgamento).

Ministro JOSÉ DANTAS, Presidente. Ministro FLAQUER SCARTEZ­ZINI, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO FLAQUER SCARTEZZINI: Joel Rodrigues Azambuja impetra, em favor próprio, ordem de habeas corpus, alegando constrangimento ilegal porque, inobstante ser réu primário, se encontra preso há mais de quatro meses no Presídio Regional de Bagé-RS, tendo sido negado, sem quaisquer explicações, os recursos que interpôs.

As informações prestadas dão conta de que o ora paciente está preso preventivamente, acusado de haver violado os arts. 121, caput, e 129, § 1 Q, inciso lI, ambos do Código Penal, e que impetrou dois pedidos de habeas

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990. 135

corpus perante o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que restaram indeferidos, e cujas cópias estão às fls. 12/23.

Com vista dos autos, a ilustrada Subprocuradoria-Geral da República, às fls. 32/33, manifesta-se pelo indeferimento do pedido.

É o relatório.

VOTO

EMENTA: Processual penal. Prisão preventiva. Alegação de excesso de prazo na formação da culpa.

Justifica-se a prisão preventiva fundamentada na garantia de aplicação da Lei e na conveniência da instrução criminal.

Estando o feito em fase final, na pendência, apenas, de atos de interesse da defesa, não há que se alegar excesso de prazo como fator de constrangimento.

Ordem denegada. O EXMO. SR. MINISTRO FLAQUER SCARTEZZINI: Sr. Presidente,

pretende, o ora paciente, com o presente writ, a refonna das r.r. decisões prolatadas nos dois pedidos de habeas corpus que impetrou perante o Eg. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em que se insurgia, no primeiro, com o decreto de prisão preventiva, e no segundo, com o excesso de prazo ocorrido para a formação da culpa.

136

Ambos os julgados restaram, assim ementados, verbis: "HABEAS CORPUS NQ 689 025 856 Prisão preventiva fundamentada.

Perigosidade decorrente da brutalidade do evento. HC denegado." "HABEAS CORPUS NQ 689 058 584 HABEAS CORPUS. Denegação. A violência e crueldade do fato e suas circunstâncias de­

monstram, por si sós, a perigosidade do paciente. Foragido antes, a tal tomará se posto em liberdade, frustran­

do a eventual aplicação de lei penal. Inocorrência de excesso de prazo para a instrução, pois, a

demora hoje existente decorre de atos de exclusivo interesse do paciente.

Ratificação de denegação de anterior habeas corpus."

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990.

Verifico, preliminarmente, que a presente ordem foi impetrada em subs­tituição ao recurso ordinário não interposto, de competência desta Colenda Corte, conforme art. 105, inciso lI, letra a da Constituição Federal.

Conheço, pois, do pedido.

No mérito, examinando os autos, constato que o fato delituoso ocorreu no ano de 1985.

A verdade é que, em parte por culpa do próprio Poder Judiciário, em parte porque se encontrava foragido, o processo crime se arrastou em demasia e, por isso, só em 1988 foi pedida e decretada a prisão preventiva do paciente, que veio a ser efetuada somente em 1989, isto porque se encontrava desaparecido, na oportunidade.

Assim, se for colocado em liberdade, evidentemente retomará a condição de foragido, protelando mais ainda a tramitação da ação, implicando em incoveniência para a instrução criminal e frustrando a eventual aplicação da lei penal.

. Por outro lado, afirma um dos julgados trazido por cópia aos autos, que a instrução criminal está finda, na pendência de atos que interessam, nesta fase, apenas à defesa (fi. 16).

Desta forma,justificada a prisão preventiva fundamentada na garantia da aplicação da Lei e na conveniência da instrução criminal, e já estando o feito em fase final, pois, a demora hoje existente decorre de atos de exclusivo interesse do paciente, não há como acolher-se o pedido de habeas corpus sob a alegação de constrangimento ilegal.

Isto posto, denego a ordem.

É como voto.

EXTRATO DA MINUTA

HC 209 - RS - (Reg. nº 89.0013155-9) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Flaquer Scartezzini. Impetrante: JoeI Rodrigues Azambuja. Impetra­do: Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Paciente: Joel Rodrigues Azam­buja (réu preso).

Decisão: A Tunna, por unanimidade, indeferiu o pedido (5!! Turma -05.03.90).

Votaram de acordo os Exmos. Srs. Mins. Costa LIma, Assis Toledo, Edson Vidigal e José Dantas. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro JOSÉ DANTAS.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990. 137

RECURSO DE HABEAS CORPUS N!! 215 :- PA

(Registro n!! 89.0009354-1)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Edson Vidigal

Recorrente: Peron Diones Lemos da Fonseca

Recorrido: Tribunal de Justiça do' Pará

Paciente: Peron Diones Lemos da Fonseca (Réu Preso)

Advogado: Dr. Raymundo N. Fidellis

EMENTA: Penal. Recurso de Habeas Corpus. Roubo. Prisão preventiva. Excesso de prazo na formação da culpa. Constrangimento ilegal.

Comprovado o excesso de prazo ensejador da impetra­ção, e restando claro que a demora na instrução criminal ocorre por culpa do juízo processante, há que ser concedido o beneficio requerido.

Recurso provido para conceder a ordem e determinar que seja expedido o alvará de soltura do paciente, se por ai não dever permanecer preso.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que ~ão partes as acima indicadas. Decide a 5ª Turma do Superior Tril:?unal de Justiça, por unanimidade, dar

provimento ao recurso para conceder a ordem e determinar que se expeça o alvará de soltura do paciente, se por ai não dever permanecer preso, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei. Brasília, 19 de fevereiro de 1990 (data do julgamento). Ministro JOSÉ DANTAS, Presidente. Ministro EDSON VIDIGAL, Re­

lator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO EDSON VIDIGAL: Peron Diones Lemos da . Fonseca, ou "Magno", como também é conhecido no bairro do Guamá, na capital paraense, é brasileiro, marítimo, com 20 anos. Em 2 de fevereiro de 1988 foi denunciado, juntamente com Manoel Rodrigues de Almeida, que também atende por "Fábio", "Japonesinho" ou "Preguiça", por haverem assal-

138 R. Supo Tribo Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 19900

tado, a mão annada, um veículo da Companhia de Cigarros Souza Cruz. Decretada a prisão preventiva de ambos, pelo crime de roubo (art. 157, § 22,

ines. I e 11 do CP), em 22 de junho de 1988. Aos 13 dias de setembro do mesmo ano foi interrogado apenas o "Mag­

no", pois, o comparsa encontrava-se ausente da penitenciária. Designado o dia 3 de fevereiro de 1989 para interrogatório de Manoel Rodrigues de Almeida, o que não se realizou por não ter ele residência fixa, providenciando-se então a citação por edital, para o dia 16 de março, às 10 horas.

Em razão do decreto de prisão preventiva, o advogado Raymundo N. Fidellis impetrou ordem de habeas corpus em favor do ora paciene Peron Diones Lemos da Fonseca, apontando a Juíza de Direito da 7~ Vara Penal da Comarca da Capital como autoridade coatora. Pleiteou a expedição do alvará de soltura, alegando para tal excesso de prazo na fonnação da culpa, o que gera, a seu ver, constrangimento ilegal por parte daquele juízo.

Solicitadas, vieram à fl. 08 infonnações da MM~ Juíza, prestadas em 17 de fevereiro de 1989.

O Ministério Público estadual em 1.3.89 trouxe seu pronunciamento sobre a ordem impetrada, opinando pela denegação, mas "recomendando-se urgência na conclusão da instrução".

Julgado em 13 de março de 1989, pelo Tribunal de Justiça do Pará, o pedido foi indeferido, por unanimidade, nos tennos do voto do Relator, ao argumento de ter o paciente "comportamento pouco recomendável à socieda­de" e não enxergou o alegado excesso de prazo, dizendo que a demora tem motivos justificáveis, uma vez que o co-autor Manoel R. de Almeida ainda não fora ouvido.

Inconfonnado, o recorrente interpõe este recurso de habeas corpus contra o v. acórdão do Tribunal de Justiça do Pará, às fls. 16/19.

A Procuradoria-Geral de Justiça paraense, às fls. 33/34, opinou pelo conhecimento e improvimento do recurso, dizendo que "os motivos do atraso processual estão satisfatoriamente justificados e encampados pela v. decisão recorrida" .

Também a douta Subprocuradoria-Geral da República acolheu as justi­ficativas da demora no cumprimento dos atos processuais, opinando pelo improvimento do recurso, em parecer de 28 de agosto de 1989, após 14 meses do decreto de prisão preventiva.

Solicitei, em 5.9.89, por telex, com urgência, ao Juízo de Direito da 7~ Vara Penal da Capital, infonnações sobre o interrogatório do co-réu Manoel Rodrigues e o motivo da pennanência do recorrente na prisão.

A resposta veio, por ofício de 14.9.89, dizendo não ter sido ainda interro­gado o co-réu, e que o réu Peron Diones pennanecia preso, em razão da preventiva decretada em 22.6.88.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990. 139

Considerando a possibilidade de estar o pedido prejudicado, reiterei, em 25.9.89, o pedido de informações de fls. 39.

Como, aos 21 de outubro do ano p. findo, continuava à espera das informações solicitadas, voltei a insistir, reiterando o pedido (fi. 44).

Vieram à fi. 45, em 14 de novembro de 1989, os esclarecimentos que nada acrescentaram, apenas informando o novo dia (22/11/89) para interroga­tório do co-réu.

Aguardei decorresse um período razoável e solicitei (fls. 46) novas infor­mações que vieram à fi. 50. Nestas, surge apenas um fato novo, quanto à revelia do réu Manoel Rodrigues de Almeida Filho, decretada, e a nomeação de defensor dativo para o mesmo. Quanto a Peron Diones da Fonseca, permanece preso. A inquirição das testemunhas de acusação (grifei) está designada para o dia 30.3.90, às 10 horas.

Relatei.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO EDSON VIDIGAL (Relator): Sr. Presidente, lembro o Recurso de Habeas Corpus n!:! 240 - PB (Reg. n!:! 89.0009724-5), por nós julgado no último dia 14 de fevereiro, aparentemente semelhante. Ressalto que neste caso está caracterizado, de forma incontestável, o excesso de prazo. Não há, nestes autos, fato algum demonstrando justificativa capaz de nos conduzir à conclusão que adotamos no julgamento anterior.

Assim, estando muito claro que a demora na instrução não pode ser imputada nem ao réu e nem aos seus advogados, porquanto a desídia parte, na verdade, do juízo coator, reconheço e proclamo o excesso de prazo reclamado pela defesa do ora paciente. O processo encontra-se na fase de inquirição de testemunhas de acusação, sendo injusto ao réu os ônus da demora na formação da culpa, especialmente quando o excesso de prazo ocorre por motivos abso­lutamente alheios à sua vontade.

Dou provimento ao recurso para que se determine a imediata soltura do réu, se por outro motivo não estiver preso.

EXTRATO DA MINUTA

RHC n!:! 215 - PA - (Reg. n!:! 89.0009354-1) - Relator: O Exmo Sr. Ministro Edson Vidigal. Recorrente: Peron Diones Lemos da Fonseca. Recor­rido: Tribunal de Justiça do Pará. Paciente: Peron Diones Lemos da Fonseca (réu preso). Advogado: Dr. Raymundo N. Fidellis.

Decisão: A Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso para conceder a ordem e determinar que se expeça o alvará de soltura do paciente, se por ai não dever permanecer preso (em 19.2.90 - 5ó! Turma).

140 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990.

Votaram de acordo com o Relator os Exmos. Srs. Ministros José Dantas, Flaquer Scartezzini, Costa Lima e Assis Toledo.

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr.-Ministro JOSÉ DANTAS . . --RECURSO DE HABEAS CORPUS N!! 229 - se

(Registro n!.! 89.9546-3)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Assis Toledo Recorrentes: Guaracy da Silva Freitas e Outro

Recorrido: Tribunal Federal de Recursos

Paciente: Ronaldo Pinho Carneiro

EMENTA: Penal e Processual Penal. Falso Testemunho (Art. 342 do CP). Oferecimento de uma só denúncia pelo crime principal e pelo de falso testemunho que teria sido prestado no inquérito em que se apurava o primeiro crime.

O exame em conjunto dos arts. 342, § 3~, do CP, e 211 do CPP, recomenda não se inicie a ação penal por falso testemu­nho antes de proferida a sentença no processo onde o depoi­mento tido por falso foi produzido.

Não se exige, porém, o trânsito em julgado da sentença.

Recurso de habeas corpus parcialmente provido para excluir o paciente da denúncia.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a Si!. Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso, para excluir da denúncia o paciente, sem pre­juízo de futura denúncia, após sentença que porventura reconheça o falso testemunho, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 20 de novembro de 1989 (data do julgamento).

Ministro, JOSÉ DANTAS, Presidente. Ministro ASSIS TOLEDO, Rela-toro

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990. 141

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO ASSIS TOLEDO: O extinto Tribunal Federal de Recursos, por sua 1 ª Turma, sendà Relator o Ministro Carlos Thibau indeferiu, por maioria, ordem de habeas corpus em acórdão assim ementado:

"Processual Penal. Trancamento de Ação Penal por Meio de Habeas Corpus.

I - O habeas corpus não constitui meio idôneo para o trancamento de ação penal, que visa apurar fato revestido, em tese, de ilicitude penal.

11 - É impossível, no .âmbito estreito do habeas corpus, firmar-se juízo excludente da culpabilidade do paciente.

111 - Ordem denegada."

(FI. 314).

Inconformado, recorreu o impetrante, apoiando-se no voto vencido do Ministro Dias Trindade e insistindo na tese de que o paciente, na condição de advogado, estaria proibido de depor.

Remetidos os autos ao Co lendo Supremo Tribunal Federal foram devol-'" vidos a esta Corte (fI. 331).

A douta Subprocuradoria-Geral da República opina pelo conhecimento e provimento do recurso.

É o relatório.

VOTO·

O EXMO. SR. MINISTRO ASSIS TOLEDO (Relator): O voto condutor do acórdão recorrido está assim redigido: .

142

"O EXMO. SR. MINISTRO CARLOS THIBAU (Relator): O paciente foi citado pelo indiciado Arquimedes de Souza como sua testemunha e, nessa qualidade, foi ouvido pela autoridade policial (fIs. 278/279).

A procuração de fI. 277 não comprova, de forma induvidosa, que o paciente atuou no inquérito como advogado do indiciado, estando, assim, proibido de depor como testemunha (CPP, art. 207).

A ausência do compromisso ou a falta da promessa de dizer a verd~de não ilide o delito, pois, tal circunstância não constitui requisito implícito do crime de falso testemunho.

R. sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990.

Como se vê, pela análise feita, para apurar a existência, ou não, da responsabilidade penal do paciente, há necessidade de um aprofundado exame de prova, incomportável no "writ."

Ante o exposto, denego a ordem." (FI. 310).

O Min. Dias Trindade ficou vencido, assim se expressando: "Peço vênia ao eminente Relator, para conceder a ordem

neste caso, porque entendo que só se pode instalar processo por falso testemunho depois que houver transitado em julgado a de­cisão, dizendo que houve falso testemunho. Só o fato de chegar e declarar, e o Juiz, porque ouviu a um outro depoimento que se contradiz a ele, dizer que já é falso testemunho, eu acho que é exagero.

Concedo a ordem./I

(FI. 311).

De início, afasto o exame, na via sumaríssima do habeas corpus, da alegação de que o paciente, agindo na condição de advogado, estava obrigado ao sigilo profissional, com as conseqüências daí resultantes.

Ante as fundadas dúvidas levantadas a respeito pelo voto do Ministro Relator, tal alegação, por dependente de prova, deve ser melhor examinada em momento adequado, no processo principal.

Compulsando-se os autos, verifica-se que, de posse do inquérito policial que apurava delito de descaminho, o Dr. Procurador da República, mesmo antes de oferecimento da denúncia pelo fato principal, pediu o indiciamento do paciente por falso testemunho (fi. 124). E isso se fez (fi. 135 e segs.). Depois, veio uma só denúncia pelo crime de descaminho contra os vários indiciados e pelo de falso testemunho contra o paciente, por declarações prestadas no mesmo inquérito.

Solicitei informações atualizadas, tendo o MM. Juiz, em 16/10/89, escla­recido que o processo resultante dessa denúncia encontra-se paralisado, por motivo de força maior, não tendo sido sequer realizado o interrogatório (fi. 339). .

Feitos esses esclarecimentos iniciais, examino o mérito da questão sus­citada pelo voto veneido, reiterada no recurso.

É muito controvertida, na jurisprudência, a questão de saber se, em face dos arts. 342, § 32, do Código Penal, e 211, do Código de Processo Penal, a ação penal por falso testemunho pode ser iniciada antes da sentença proferida no processo onde o depoimento tido por falso foi produzido. (Consulte-se CPP Anotado, Damásio de Jesus, comentários ao art. 61).

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2( 12): 119-188, ago. 1990. 143

Há julgados que, fugindo das posições extremadas, entendem ser de todo conveniente "que se aguarde a solução da causa principal, oportunidade em que o magistrado haverá ou não como válidos os depoimentos incriminados". (RT 405/74)

Apesar da opinião em contrário de Nelson Hungria, que sustenta ser possível julgar o fato principal e o falso testemunho, na mesma sentença proferida no processo em que este último tiver sido prestado, se tratar-se de processo penal (Comentários, voI. IX, pág. 486), penso que aquela outra solução é a que mais se ajusta ao espírito do art. 211 do CPP, in verbis:

"Art. 211. Se o juiz, ao pronunciar sentença final, reconhecer que alguma testemunha fez afirmação falsa, ou negou a verdade, remeterá cópia do depoimento à autoridade policial para a instau­ração de inquérito.

Parágrafo único. Tendo o depoimento sido prestado em plenário de julgamento, o juiz, no caso de proferir decisão na audiência (art. 538, § 22), o tribunal (art. 561), ou o conselho de sentença, após a votação dos quesitos, poderão fazer apresentar imediatamente à testemunha a autoridade policial."

Mas não se exige, como faz o douto voto vencido do Ministro Dias Trindade, o trânsito em julgado da sentença. Basta a prolação desta, o que marca o termo final do prazo de retratação, previsto no art. 342, § 32, do Código Penal.

Por este fundamento, dou parcial provimento ao recurso para excluir o paciente da denúncia em tela, mas 'não tranco a ação penal, pois ressalvo ao Ministério Público a possibilidade de intentá-la se, na sentença, o Juiz concluir pela falsidade do depoimento, sem que tenha havido retratação.

Éo meu voto.

EXTRATO DA MINUTA

RHC nº 229 - SC - (Reg. nº 89.9546-3) - Rel.ator: O Exmo. Min. Assis Toledo. Recorrentes: Guaracy da Silva Freitas e outro. Recorrido: Tri­bunal Federal de Recursos. Pacientes: Ronaldo Pinho Carneiro.

Decisão: A Turma, por unanimidade, deu parcial provimento ao recurso, para excluir da denúncia o paciente, sem prejuízo de futura denúncia, após sentença que porventura reconheça o falso testemunho. Sustentou oralmente o Dr. Guaracy da Silva Freitas. (Em 20.11.89 - 5~ Turma).

Votaram de acordo com o Relator os Exmos. Srs. Mins. José Dantas, Flaquer Scartezzini e Costa Lima.

Ausente o Exmo Sr. Min. Edson Vidigal.

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Min. JOSÉ DANTAS.

144 R. sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990.

HABEAS CORPUS NQ 422 - MT

(Registro nQ 90.0006870-3)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Costa Leite

Impetrante: Zoroastro C. Teixeira

Impetrado: Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso

Paciente: Dorival Francisco Lessa e outros (Réus presos)

EMENTA: Penal. Execução. Pena de detenção~ Regime inicial de cumprimento da pena.

O regime inicial de cumprimento da pena de detenção deve ser o aberto ou semi-aberto, admitido o regime fechado apenas em caso de regressão. Inteligência do art. 33, do Có­digo Penal.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, denegar a ordem, mas de ofício conceder a ordem de habeas corpus para anular a sentença na parte do relatório respeito à fixação do regime prisional, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 28 de agosto de 1990 (data do julgamento).

Ministro WILLIAM PATTERSON, Presidente. Ministro COSTA LEI­TE, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO COSTA LEITE: A inicial é, no mínimo, pouco clara, motivo por que procedo à leitura do seu inteiro teor, para melhor compreensão: (lê).

Solicitadas as informações de estilo, prestou-as o eminente Desembarga­dor-Presidente do e. Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, pelo ofício de fls. 61/66, nestes termos: (lê).

O parecer do Ministério Público Federal é no sentido de que os autos sejam remetidos ao colendo Suprem,o Tribunal Federal.

É o relatório, Sr. Presidente

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990. 145

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO COSTA LEITE (Relator): Estava propenso a acolher o parecer do Ministério Público Federal, pois, de fato, a impetração não tem caráter substitutivo de recurso ordinário de habeas corpus.-

Todavia, examinando mais detidamente o verdadeiro aranzel que é a petição inicial, verifiquei que o constrangimento ilegal redundaria de atraso na publicação do acórdão proferido no habeas corpus impetrado em favor dos pacientes perante o e. Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso.

A coação, em tais circunstâncias, promanaria de ato do Desembargador Relator, e não do Tribunal, como já decidiu o colendo Supremo Tribunal Federal, em hipótese análoga, remetendo, inclusive, os autos a este Superior Tribunal de Justiça, daí porque conheço dã impetração.

Com efeito, além de inexistir o apontado atraso, como esclarecem as informações, certo é que, se existisse, não demandaria a providência persegui­da pelo impetrante, qual seja a suspensão do~ efeitos da sentença condenatória.

Na verdade, divisa-se o propósito de ver reconhecido aos pacientes o direito de apelar em liberdade, o que não se afigura possível, já que, como anotou a sentença, possuem os mesmos maus antecedentes, além do que se encontravam presos preventivamente quando da condenação. À feição, no particular, o acórdão do colendo Supremo Tribunal Federal no RHC 62.042-SP, assim exteriorizado:

"Habeas corpus. Apelação em liberdade. Não faz jus ao benefício de apelar de sentença condenatória

em liberdade quem tem maus antecedentes, e já se encontrava preso preventivamente quando da condenação."

Destarte, indefiro a ordem. Impende, porém, conceder habeas corpus de ofício, para corrigir-se ilegalidade flagrante quanto ao regime inicial de cum­primento de pena.

Ao julgar o habeas corpus, o e. Tribunal de Justiça assim se manifestou sobre a questão:

" A decisão sobre o regime e a sua conveniência, se fechado, aberto ou semi-aberto, é matéria que depende sempre de prova complexa, e como tal impossível de avaliação e concessão em sede de Habeas Corpus."

Em princípio, o raciocínio é correto. Sucede que,no caso, trata-se de questão exclusivamente de direito. Muito embora haja imposto pena de deten­ção, a sentença estabeleceu o regime fechado, para o início do cumprimento da pena, em franca testilha com a segunda parte do art. 33, do Código Penal:

146

"Art. 33. A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semi-aberto ou aberto. A de detenção em regime semi-

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990.

aberto ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado. (grifei).

Com efeito, a transferência é a passagem de um regime de execução para outro, seja em progressão, seja em regressão. O mérito ou demérito constituem as expressões de força para levar o condenado ao progresso ou ao regresso no itinerário da execução", como anota ArieI Dotti ("Código de Processo Penal", Forense, 7i! ed., pág. 546).

Assim, não paira dúvida que o regime inicial de cumprimento de pena de detenção deve ser o aberto ou o semi-aberto, admitido o regime fechado apenas em caso de regressão. Não há falar, obviamente, em regressão antes de se iniciar o cumprimento da pena.

Do quanto exposto, Sr. Presidente, concedo a ordem de ofício, para anular a sentença na parte relativa ao regime inicial de cumprimento de pena, para que seja estabelecido na conformidade da segunda parte do art. 33, do Código Penal. É o meu voto.

EXTRA TO DA MINUTA

HC 422 - MT - (Reg. n2 90.0006870-3) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Costa Leite. Impetrante: Zoroastro C. Teixeira. Impetrado: Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso. Paciente: DorivaI Francisco Lessa e outros (réus presos).

Decisão: A Turma, por unanimidade, 'denegou a ordem, mas de ofício concedeu a ordem de habeas corpus para anular a sentença na parte que diz respeito à fixação do regime prisional, nos termos e condições do voto do Exmo. Sr. Ministro Relator (6i! Turma - 28.08.90).

Votaram os Exmos. Srs. Ministros Dias Trindade, William Patterson, José Cândido e Carlos Thibau. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro WILLIAM PATTERSON.

RECURSO DE HABEAS CORPUS N2 455 - SP

(Registro n!! 902427)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Dias Trindade Recorrente: Mario Cyfer

Recorrido: Tribunal de Justiça de São Paulo Paciente: Aldo Antonio Bandieri

R. Sup, Trib. Just., Brasília, 2( 12): 119-188. ago. 1990. 147

EMENTA: PenalfProcessual. Crime falimentar. Falta de justa causa para a ação. Exame de provas. Processo em grau de apelação. Inquérito judicial. Contraditório.

I. Não cabe ao juízo do habeas corpus substituir-se ao da apelação no exame de dados informativos para o exercício da ação penal e, menos, das provas colhidas na instrução.

11. O inquérito judicial previsto na Lei de falências cons­titui peça de informação, sem caráter contraditório, de sorte que não contaminam a ação penal eventuais irregularidades no seu processamento.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 6!! Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazen­do parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei. Brasília, em 7 de agosto de 1990 (data do julgamento). Ministro WILLIAM PATTERSON, Presidente. Ministro DIAS TRIN­

DADE,Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO DIAS TRINDADE (Relator): - Mario Cyfer recorre de acórdão proferido pela 3!! Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, que concedeu, em parte, ordem de habeas corpus impetrada em favor de Aldo Antonio Bandieri, determinando o trancamento de ação penal movida contra o paciente, fundada no delito do art. 288 do Código Penal. Subsistem, contudo, as acusaçõ.es de prática dos delitos previstos nos artigos 188, III e 187 da Lei de Falência e 347 do Código Penal.

Sustenta o recorrente que sofre constrangimento ilegal em virtude da falta de justa causa para a propositura da ação penal, inobservância dos prazos previstos no artigo 106 da Lei de Falências, bem como violação do princípio constitucional que assegura o contraditório e a ampla defesa mesmo em pro­cessos administrativos (Constituição Federal art. 5Q LIV e LV).

Converti em diligência o julgamento, para informações complementares, que vieram indicando a absolvição do paciente, com recurso da Justiça Pública, pendente de julgamento no Tribunal competente.

É como relato.

148 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO DIAS TRINDADE (Relator): A ordem é impetrada sob o fundamento básico de inexistência de justa causa para a ação penal, a envolver abuso do poder de denunciar por parte do Ministério Público.

Embora tenha por possível o exame de provas, no âmbito do habeas corpus, quando se trate de averiguar da existência de justa causa para a ação, dado que esta não pode ser iniciada sem a existência de aparência de violação a normas penais, com base em fatos definidos como crime, bem assim em indícios de autoria, que somente podem ser aquilatados em exame dos elemen­tos de informação de que dispõe o órgão acusador, embora assim entendendo, repito, no caso vertente, em que já houve julgamento em primeira instância, por sinal favorável ao paciente, que foi absolvido, não é possível que o juízo do habeas corpus se substitui ao da apelação, no exame aprofundado dos dados informativos que serviu de lastro à denúncia e, muito menos daqueles resul­tantes das provas produzidas na instrução, postas já a exame do Tribunal competente, na apelação interposta pela Justiça Pública.

De outra parte, não se há de considerar eventual irregularidade do inqué­rito judicial falimentar como susceptível de invalidar o processo, seja porque dito procedimento tem caráter meramente informativo, destinado que é a colher elementos para o exercício da ação penal, seja porque o seu caráter inquisitório não fora elidido pela superveniência da norma do art. 5!:! LV da vigente Constituição.

É que dito inquérito judicial teve curso anteriormente à edição da citada norma, sem desconsiderar que a mesma assegura a amplitude do contraditório apenas aos litigantes e aos acusados, posições que não eram a do paciente, até então.

Isto posto, voto no sentido de negar provimento ao recurso.

EXTRATO DA MINUTA

RHC n!:! 455 - SP - (Reg. n!:! 902427) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Dias Trindade. Recorrente: Mário Cyfer. Recorrido: Tribunal de Justiça de São Paulo. Paciente: Aldo Antonio Bandieri.

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. (Em 07.08.90 - 6i! Turma).

Votaram os Exmos. Srs. Ministros William Patterson, José Cândido, Carlos Thibau e Costa Leite.

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro WILLIAM PATTERSON.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990. 149

RECURSO DE HABEAS CORPUS N!.! 540 - RJ

(Registro n!.! 900001395-0)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Flaquer Scartezzini Recorrente: José Carlos Tortima.

Recorrido: Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro Paciente: Marcos Vinicius da Silva Desimone (réu preso)

EMENTA: Recurso de Habeas Corpus. Prisão Preven­tiva. Legalidade da Decretação.

Não há ilegalidade na decretação da custódia cautelar quando esta se reveste dos elementos necessários e fundamen­ta qua1ltu11l satis a obrigatoriedade da medida, levando em consideração a periculosidade do agente e a possibilidade de sua evasão, o que conflitaria com o interesse da instrução criminal e com a garantia da aplicação da lei penal.

Recurso a que se nega provimento.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 5i! Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

negar provimento ao recurso, na forma do relatório é notas taquigráficas, anexas, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei. Brasília, em 14 de março de 1990 (data do julgamento). Ministro JOSÉ DANTAS, Presidente. Ministro FLAQUER SCARTEZ­

ZINI, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO FLAQUER SCARTEZZINI: Trata-se de recurso de habeas corpus impetrado em favorde Marcos Vinicius da Silva Desimone com a pretensão de ver reformada a r. decisão da 1 i! Câmara Criminal do E. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro que denegou ordem originária que pretendia desconstituir decreto de prisão preventiva, ao fundamento de que, sendo primário e de bons antecedentes, não podem subsistir as razões invoca­das para a expedição da medida.

O E. Tribunal, ao denegar a ordem entendeu manter a custódia "no interesse da instrução criminal e garantia da aplicação da lei penal", motivos que, ao Juiz singular, ensejaram a decretação da prisão cautelar.

150 R. Sup. Trib. 1usl., Brasília, 2(12): 119-188, ligo. 1990.

Agora, no entender do recorrente, as razões que motivaram o Dr. Juiz a decretar a prisão, verbis: "a sua negativa em admitir a autoria do crime; a conduta dos dois outros acusados que, ao contrário do paciente, não são encontrados", o que, absolutamente deve prevalecer.

Subiram os autos e nesta Superior Instância, a douta SPGR opina no sentido da mantença da custódia eis que provados os pressupostos para tal.

É o relatório.

VOTO

EMENTA: Recurso de Habeas Corpus. Prisão Preventiva. Legalidade da Decretação.

Não há ilegalidade na decretação da custódia cautelar quan­do esta se reveste dos elementos necessários e fundamenta quan­tum satis a obrigatoriedade da medida, levando em consideração a periculosidade do agente e a possibilidade de sua evasão, o que conflitaria com o interesse da instrução criminal e com a garantia da aplicação da lei penal.

Recurso a que se nega provimento.

O EXMO. SR. MINISTRO FLAQUER SCARTEZZINI: Senhor Presi­dente, do v. acórdão da F Câmara Criminal do E. TJRJ que denegou a ordem esclarece-se que o Dr. Juiz ao prestar informações, "diz que, acolhendo repre­sentação da autoridade policial, secundada pelo órgão do MP, decretou a prisão preventiva do paciente e seus dois outros companheiros e, ao fazê-lo, analisou todos os elementos constantes dos autos, verificando que o paciente estava sendo encontrado, e desaparecidos os dois outros, desta análise constatando que ele (paciente) vem negando a autoria".

Prendendo-se a esta primeira afirmação, o ora recorrente pretende a desconstituição do decreto prisional provisório porque, no seu entender, ao juiz não é dado "vincular o status libertis à obrigação de confessar o crime, sonegando ao acusado o seu mais elementar direito no processo, qual seja o de defender-se da impetração que lhe é dirigida".

Se nos ativermos, como fez o ora recorrente, somente a essas considera­ções, poderemos chegar a conclusão, como também chegou o recorrente, de uma subversão dos princípios do moderno processo penal e da ordem consti­tucional, de que a ninguém é dado o direito de coagir o réu a confessar determinado crime, tenha-o ou não cometido.

No entanto, ao verificarmos o inteiro teor das informações (fls. 52/53) neles constam, além do que sugerira o recorrente, como fundamento da man­tença do decreto, o seguinte:

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990. 151

"Há evidências de que o paciente é pessoa violenta e tem tido atitudes ameaçadoras, como se vê das declarações prestadas pela mãe da vítitna e do termo de acareação constantes dos autos (docs. anexos).

Esse fato, aliado à sua negativa quanto a autoria, apesar das evidências, e ao desaparecimento dos outros dois acusados, seus amigos, faz presumir que a liberdade deles prejudicará a instrução criminal, colocando em risco a aplicação da lei penal."

Não há dúvidas de que a prisão preventiva deva ser mantida. Não só porque o decreto que a sustentou, fundamenta quantuln satis os motivos da decretação, demonstrando os motivos torpes com que o crime foi perpetrado e a possibilidade do possível agente furtar-se ao cumprimento da pena, bem como ficou patente a periculosidade do mesmo que, a par dos indícios que o incriminam, ainda fez, ameaças ao filho e à mãe da vítima, que por diversas vezes pediu garantia de vida (cópia de declarações prestadas - fi. 55).

Este fato, acrescido de um anterior seqüestro sofrido pela vítima e prati­cado pelo indiciado (depoimento da mãe - fi. 59); de que o veículo que afirmado estar de posse do pai do ora recorrente, (ReI. fls. 18/19) fora avistado no local e dia do crime (Rel. fi. 19) e que a arma que disparou contra a vítima fora a mesma vendida a um segurança das Casas da Banha, formam um somatório incapaz de ilidir a presunção de que, o acusado, ao saber do resultado positivo de balística, certamente se evadirá, prejudicando a aplicação da lei penal, como afirmado pelo Dr. Juiz que decretou a prisão preventiva (fi. 17).

Assim, estando presentes os pressupostos para a decretação da prisão preventiva, mantenho-a, negando provimento ao presente recurso.

Éo meu voto.

EXTRATO DA MINUTA

RHC nº 540-RJ - (Reg. nº 90.0001395-0) - Relator: O Exmo. Sr. Min. Cid Flaquer Scartezzini. Recorrente: José Carlos Tortima. Recorrido: Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Paciente: Marcos Vinicius da Silva Desimone (réu preso).

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso (5i! Turma, 14.03.90)

Votaram de acordo os Exmos. Srs. Ministros Costa Lima. Assis Toledo e José Dantas. Ausente o Exmo. Sr. Ministro Edson Vidigal. Presidiu o julga­mento o Exmo. Sr. Ministro JOSÉ DANTAS.

152 -R. Sup. Trih. Jus\., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990.

RECURSO DE HABEAS CORPUS N!1 544 - BA

(Registro n!! 90.1559-6)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Flaquer Scartezzini

Recorrente: Wilson Pires Nascimento

Recorrido: Tribunal de Justiça do Estado da Bahia

Paciente: Edson Borges

EMENTA: Recurso de Habeas Corpus. Ausência de in­timação do patrono da causa. Cerceamento de defesa. Prin­cípio da indivisibilidade. Renúncia tácita. Não ocorrência.

Havendo "disposição regimental para que o Conselho da Magistratura funcione como Câmara de Férias, não há falar em cerceamento de defesa, por não haver o patrono sido cientificado deste fato.

Não há ferimento ao princípio da invisibilidade (art. 48 do CPP), nem ocorrên~ia de renúncia tácita de que trata o § único do art. 104 do CP, o fato da ação ter sido proposta sem inclusão de um dos querelados, maxime quando a queixa não o identifica claramente, e há'a possibilidade de que, no curso da instrução, o Ministério Público adite a denúncia, em aten­dimento ao § 22 do art.'46 do CPP.

Recurso improvido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a 5!!. Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas anexas, que ficam fazendo parte integrante elo presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 25 ele abril de 1990 (data elo julgamento).

Ministro JOSÉ DANTAS, Presidente. Ministro FLAQUER SCARTEZ­ZINI, Relator.

RELATÓRIO

o EXMO. SR. MINISTRO FLAQUER SCARTEZZINI: Trata-se de recurso de habeas corpus impetrado em favor de Edson Borges, contra o v.

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990. 153

acórdão do Conselho de Magistratura do Eg. Tribunal de Justiçado Estado da Bahia, funcionando como Câmara de Férias, assim proferido:

"EMENTA - Indivisibilidade da ação: A impossibilidade de identificação não obsta que seja a ação proposta contra os demais não oferecimento justificado da queixa. Não exige a lei que a queixa seja precedida de inquérito policial. Para o tranca­mento da ação, a inexistência de justa causa deve ser por demais manifesta. Pedido indeferido."

Nesta oportunidade, o recurso assenta-se em que há nulidade do julga­mento do habeas corpus, porque o patrono do paciente não fora cientificado que a ação seria julgada pelo Conselho da Magistratura e, pela quebra da indivisibilidade da ação penal privada, por não ter sido incluído na queixa um quarto indivídio identificado como residente na casa de um dos três outros querelados.

O Ministério Público baiano opina pelo improvimento do recurso, ao entendimento de que a nulidade pela não intimação do patrono de que a ação seria julgada pelo conselho da Magistratura, inexiste, eis que norma regimental e, como tal, deveria ser do conhecimento do causídico.

Quanto à indivisibilidade da ação penal, entende o representante do Ministério Público que, se desconhecido um dos querelados, nada obsta seja promovida a ação contra os demais.

Subiram os autos, e nesta Superior Instância a douta Subproduradoria­Geral da República, reportando-se ao parecer do Ministério Público e às razões do v. acórdão, opina pelo não provimento do recurso.

154

É o relatório.

VOTO

EMENTA: Recurso de Habeas Corpus. Ausência de inti­mação do patrono da causa. Cerceamento de defesa. Princípio da indivisibilidade. Renúncia tácita. Não ocorrência.

Havendo disposição regimental para que o Conselho da Magistratura funcione como Câmara de Férias, não há falar em cerceamento de defesa, por não haver o patrono sido cientificado deste fato.

Não há ferimento ao princípio da indivisibilidade (art. 48 do CPP), nem ocorrência de renúncia tácita de que trata o § único do art. 104 do CP, o fato da ação ter sido proposta sem inclusão de um dos querelados, maxime quando a queixa não o identifica claramente, e há a possibilidade de que, no curso da instrução, o

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990.

Ministério Público adite a denúncia, em atendimento ao § 2º do art. 46 do CPP.

Recurso improvido.

O EXMO. SR. MINISTRO FLAQUER SCARTEZZINI (Relator): Sr. Presidente, conforme nos demonstra o Ministério Público baiano, o fundamen­to da nulidade do julgamento, pela não intimação do ora recorrente de que a ação de habeas corpus teria curso no Conselho da Magistratura, não procede, pois, resultante de imposição regimental daquela Eg. Corte.

Por desconhecer os artigos regimentais que tratam da matéria, permito­me a transcrição do trecho do parecer ministerial, nos seguintes termos:

"O fundamento da nulidade ... esbarra na letra c do item 11 do art. 33 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça local, que dispõe que os RCs da competência originária do TJ serão julga­dos, durante as férias, pelo Eg. Conselho da Magistratura. E o mesmo RI determina, no § 3º do art. 10, que os trabalhos do TJ, no segundo semestre, terão início do primeiro dia útil de agosto, pelo que se deduz ser o mês de julho o segundo mês de férias coletivas do TJ (o primeiro é janeiro). Ora se assim é, não havia porque o ora recorrente devesse ser cientificado de que os autos da ação de RC tramitariam em julho, pelo Conselho da Magistra­tura, nem que seria designado (sorteado) outro Relator, cuja com­posição tem previsão no art. 30 da Lei de Organização Judiciária local."

Tem razão o ilustre representante do parquet estadual.

Não se concebe que advogado militante não conheça o RI do tribunal onde atua.

Quanto à indivisibilidade da ação penal, o que geraria nulidade, uma vez que a queixa foi oferecida e recebida contra três querelados, havendo renúncia tácita quanto ao quarto personagem, que concorreu para o delito, igualmente improcede.

Não resta a menor dúvida de que o princípio da indivisibilidade inserido no art. 48 do CPP, há que ser zelado pelo representante do Ministério Público, no sentido de que a "queixa contra qualquer dos autores do crime obrigará ao processo de todos". .

Pretende, in casu, o ora recorrente, valer-se da letra do § único do art. 104 do CP, ao entendimento de que houve renúncia tácita por parte do querelante.

No entanto, se atentarmos para os termos da queixa-crime juntada às fls. 07/09, veremos que em determinado trecho assim expõe, verbis:

" ... os querelados reuniram-se no dia 9 (nove) de maio do fluente ano e, por volta das 21:00 hs, após trocarem o cadeado

R. sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990. 155

que trancava a garagem do prédio abandonado para que o quere­lante não mais a ele tivesse acesso, depredaram o veículo deste que lá se encontrava, juntamente com um outro elemento, que trabalhava para o Édson e reside em sua casa ... "

Pela simples leitura desta parte da queixa, não se pode afirmar quem era o quarto elemento, citado como morador na casa de Edson, nem qual a sua participação na prática delituosa. Sabe-se apenas que estava presente, cf. visto.

Ademais, no curso da ação penal, se novas provas surgirem no sentido da identificação positiva do quarto elemento, e qual sua participação no evento danoso, nada impede que o MP adite a denúncia neste sentido.

Para Damásio E. de Jesus ("CPP Anotado", Saraiva, 1989), Tourinho Filho, Sergio Demoro Hamilton, Antonio Rodrigues Porto, Bento de Faria e Câmara Leal, são incisivos em que "no caso de exclusão de infratores pela queixa, ao Ministério Público incumbe velar pela indivisibilidade da ação, incluindo em aditamento a queixa todos quantos tenham sido indevidamente excluídos pelo queixoso" (Coment. art. 48, fi. 45, op. cit.).

É de se ver que dentro do prazo do art. 46, § 2!!, do CPP, pode o MP aditar a queixa para nela incluir co-autor ou partícipe do delito, mas quando identi­ficado e provada sua participação.

Não é apenas a menção aleatória de estar um determinado elemento no local, onde se consuma um delito, que se possa incluí-lo como um dos parti­cipantes do fato danoso, e sua exclusão da queixa ser tomada como renúncia tácita.

Não há, a meu ver, qualquer quebra do princípio da indivisibilidade da ação penal, até que se individualize e determine a participação do prefalado quarto elemento, e isto somente se dirá no decorrer da instrução criminal.

Desta forma, não havendo qualquer ilegalidade em não ter tomado, o ora recorrente, conhecimento de que o processo seria julgado pelo Conselho de Magistrados, eis que procedimento regimental, e, por outro lado, não sendo o habeas corpus meio idôneo para o trancamento da ação penal, ao fundamento de ferimento do princípio da indivisibilidade, posto que tal somente poderá ser apreciado no decorrer da mesma, nego provimento ao presente recurso.

É como voto.

EXTRATO DA MINUTA

RHC. 544 - BA - (Reg. n!! 90.1559-6) - Relator: Exmo. Sr. Ministro Flaquer Scartezzini. Recorrente: Wilson Pires Nascimento. Recorrido: Tribu­nal de Justiça do Estado da Bahia. Paciente: Edson Borges.

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso (5i!. Turma - 25.04.90).

156 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 119-ISS, ago. 1990.

Votaram de acordo os Exmos. Srs. Mins. Costa Lima, Assis Toledo e José Dantas. Ausente o Exmo. Sr. Min. Edson Vidigal. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Min. JOSÉ DANTAS .

• RECURSO DE HABEAS CORPUS N!! 562 - RS

(Registro n!! 9019443)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro William Patterson

Recorrente: Raul Szulcsewski

Recorrido: Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

Paciente: Santiago Antonetti

EMENTA: Penal. Defensor Dativo. Apelação. Ausência.

A falta do recurso de apelação da sentença condenatória enseja o trânsito em julgado da mesma.

O fato de o réu ter sido defendido por defensor dativo, que exerceu amplamente as suas funções até esse momento, sem censuras, não indica a nulidade apontada no "writ".

Recurso desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 6;! Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, negar

provimento ao recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, em 3 de abril de 1990 (data do julgamento). Ministro WILLIAM PATTERSON, Presidente e Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO WILLIAMPATTERSON: Leio, no parecer de fls. 158/159, exarado pelo Dr. Paulo R. P. Angeli, ilustre Procurador de Justiça da Comarca de Porto Alegre, Estado do Rio Grande do Sul, o seguinte:

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990. 157

Cuida-se de habeas corpus impetrado em favor do pa­ciente Santiago Antonetti. Refere a impetração que o pacien­te foi processado, restando condenado à pena de quatro anos de reclusão,. com fulcro no artigo 214, c/c o artigo 224, a, ambos do Código Penal. Diz o impetrante que o paciente teve defesa meramente formal, o que fere o princípio constitucio­nal da ampla defesa. Cabia, ao defensor dativo, eis que aponta falha no decisum, a obrigação de apelar, o que não fez. Acena, ainda, com o fato de que o co-réu foi absolvido, quando pro­vou-se que este teve participação efetiva e mais grave nos fatos denunciados. Diz que a pena imposta ao paciente foi exacerbada. Postula a nulidade do processo, ou, alternativa­mente, da sentença prolatada. A liminar postulada foi inde­ferida.

A Egrégia Câmara de Férias do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul houve por bem indeferir o pedido, ao fundamento de que o defensor não estaria necessariamente obrigado a interpor recurso da sentença desfavorável ao Réu.

Inconformado, o Impetrante interpôs o presente recurso ordinário com as razões de fls. 167/168, em que procura elidir as razões do indeferimento do "writ".

Com as contra-razões do M.P.E. (fls. 171/172) subiram os autos a esta instância, onde o digno representante do Ministério Público Federal, invocan­do recente Julgado do Colendo Supremo Tribunal, que imprimiu nova orien­tação jurisprudencial, opinou pela confirmação do decisório atacado (fls. 175/177).

É o relatório.

VOTO

o EXMO. SR. MINISTRO WILLIAM PATTERSON: A impetração, alegando cerceamento de defesa, pretende ver reconhecida a nulidade proces­sual indicada na vestibular, qual seja a falta de oferecimento do recurso de apelação da sentença condenatória, por parte do defensor dativo.

Advirta-se, por oportuno, que nenhuma censura se faz ao trabalho do referido defensor durante todo o curso do processo, agindo no exercício pleno de suas funções. Portanto, não se há de falar ausência de defesa ou deficiência desta. É certo que não apelou, daí ensejando o trânsito em julgado da sentença condenatória. Teria, por tal omissão, propociado vício, de molde a configurar causa da reclamada nulidade?

158 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990.

A jurisprudência vem mostrando-se vacilante no exame do alcance e conseqüência da atividade do defensor dativo. Todavia, numa posição de resguardo dos interesses do réu, quase sempre preferiu identificar nas omissões e falhas do primeiro, prejuízo para o último, e, em decorrência, consentiu em permitir novas chances para o exercício do sagrado princípio constitucional (ampla defesa). Nesse contexto de posicionamento foi incluída a falta de apelação.

A ilustre Dra. Márcia Lima de Carvalho, digna representante do MPF, demonstrou, em seu pronunciamento de fls. 175/177, que, recentemente, tal entendimento sofreu modificação. É ler-se.

O Supremo Tribunal Federal em algumas decisões vinha entendendo que se o defensor dativo não apelasse da sentença condenatória haveria inegável prejuízo para o réu, aplicando-se a Súmula 523 com reabertura do prazo para apelação. Neste sentido:

"Cerceamento de Defesa - Defensor dativo que não apela da sentença condenatória - Prejuízo para o réu - Restituição do prazo - Concessão de habeas corpus - Inteligência do art. 153, 15, da Constituição da República Federativa do Brasil e da Súmula n!.! 523.

Cabe ao advogado dativo, no desempenho de seu munus público, exercitar, forçosamente, todos os meios de defesa que a lei confere aos acusados, notadamente apelar da sentença conde­natória. Assim não fazendo, ampla não se fez, portanto, a defesa, como a requer o preceito constitucional (Constituição da Repú­blica Federativa do Brasil, art. 153, § 15)." (HC n!.! 54.961 publ. na R.T. n!.! 501/361).

1/ HABEAS CORPUS. O direito de o réu reverter defesa se estende à segunda instância. Se o Defensor Público não puder atuar em segunda instância para a interposição de embargos in­frigentes e de nulidade, dever-se-á dar ao réu outro defensor dativo; caso possa, mas não interponha esse recurso, configura-se deficiência de defesa, com real prejuízo para o réu, aplicando-se à hipótese a parte final da Súmula 523.

Habeas corpus concedido para a reabertura do prazo para a interposição dos embargos infringentes do prazo e de nulidade, bem como a soltura imediata do paciente." (HC n!.! 54.139 - RJ. pub. na RTJ 79/413).

Posteriormente, a orientação daquela Magna Corte passou a ser no sen­tido de que o defensor dativo não está obrigado a apelar por não se dever tomar necessário um recurso que a lei diz ser voluntário. Nesse sentido:

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990. 159

"Processo penal. O defensor dativo, a quem se intima pes­soalmente da sentença condenatória, não está obrigado a apelar, se não o faz, a sentença transita em julgado. Habeas Corpus denegado." (in HC n!! 57.434-SP - Publicado na RTJ 92/1118).

Colho do voto condutor do acórdão da lavra do Ministério Xavier de Albuquerque, que alterou a orientação os seguintes fundamentos:

Para mim, o defensor dativo, a quem se intima pessoalmente da sentença condenatória, não está obrigado a apelar. E, se não o faz, a sentença transita em julgado.

No voto que proferi no referido RECr n!! 89.965, reportei-me aos excelentes fundamentos do despacho de admissão daquele recurso, da lavra do ilustre Presidente Dinio de Santis Garcia. Cópia desse despacho foi agora anexada às informações que S. Exa. prestou nos presentes autos (fls. 71-74)."

O Senhor Ministro Cordeiro Guerra, na mesma linha assim se expressou:

"Sr. Presidente, data venia do eminente Ministro Cunha Peixoto, entendo, e ontem assim julgamos na Segunda Turma, no HC 57.546-MG que recurso não é compulsório, não é obrigatório, mesmo porque, se o advogado fosse constituído e não recorresse, ninguém diria que ele estava cerceando a defesa de seu consti­tuinte. Será, quando muito, objeto de crítica e submisso às san­ções do órgão a que está subordinado, a conduta do Defensor Público, se negligente.

De outro modo, também, estaríamos criando um recurso de embargos ex officio.

Em igual sentido o aresto pertinente do RHC n!! 62.796-0 - SP, Relator o Ministro Sydney Sanches (DJ. de 16.08.85), de cuja ementa se lê:

NULIDADE. PROCESSO CRIME.

A falta de interposição de recurso voluntário (apelação), pelo Defensor dativo, em favor do réu, não configura, por si só, nulidade do julgado condenatório. Menos, ainda, quando as con­dições do "sursis" já foram cumpridas pelo sentenciado com extinção das penas impostas.

Estou de pleno acordo com o vigente pensamento do Pretório Excelso. Na verdade, não vejo como se privilegiar o acusado nessa fase processual. Lembre-se, por exemplo, que mesmo na etapa de instrução e de oferecimento de defesa há de se perquirir o grau de afetação, vale dizer, de prejuízo para o réu.

160 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990.

No caso do recurso contra a sentença condenatória, não se pode equiparar a falta da providência àqueles atos de participação obrigatória, pois, a ausência importa, necessariamente, em prejuízo. Como se resolveria o problema da intempestividade da apelação apresentada pelo defensor dativo? Portanto, não se pode conceber que em tais situações não prevaleçam as regras adjetivas que regulam a conduta das partes.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso.

RETIFICAÇÃO DE VOTO VENCIDO

O EXMO. SR. MINISTRO CARLOS THIBAU: Sr. Presidente; peço permissão a V. Exa. para reconsiderar o meu voto e acompanhar o voto do eminente Ministro Costa Leite, porque entendo, também, que o exercício da defensoria dativa é mais do que um exercício de uma advocacia, é um 11lll11llS

público: é, realmente, uma investidura que o Juiz dá a esse defensor, em que ele deixa de ter apenas uma faculdade e passa a ter uma obrigação de procurar defender o réu, principalmente num momento em que a decisão judicial é definitiva, se ele não apelar, como ocorre.

Acoml"anho o Sr. Ministro Costa Leite.

VOTO-VENCIDO

O EXMO. SR. MINISTRO COSTA LEITE: Sr. Presidente, peço vênia para ficar com a antiga orientação do Supremo Tribunal Federal, que me parece mais consentânea com a regra inserta no inciso LV do art. 5!! da nova Consti­tuição, pelo que dou provimento ao recurso, para deferir a ordem.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO DIAS TRINDADE: Sr. Presidente,jájulguei caso semelhante nesta Turma, acompanhando a linha defendida pelo voto de V. Exa., porque o recurso, diz o Código de Processo Penal, é voluntário. Não há possibilidade de o recurso coato dessa maneira; com o defensor dativo. Junto cópia do voto do RHC 339 - SP.

Por isso que acompanho, pois, V. Exa.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO DIAS TRINDADE (Relator): A citação edital do paciente se deu após a realização de inúmeras diligências no sentido de sua localização na casa indicada como de sua residência, mercê das quais

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990. 161

se constatou, por informação da própria irmã do réu, de que o mesmo se achava ausente, em lugar incerto e não sabido, como certificado.

Do mesmo passo, a intimação da sentença, por edital, se deveu ao estrito cumprimento do que estabelece o art. 392 VI do Código de Processo Penal, depois que o genitor do sentenciado afirmou ao Oficial de Justiça de que o intimando se achava em lugar desconhecido, circunstância portada por fé pelo Oficial.

Não ocorre, portanto, a alegada nulidade do processo, que teve desenvol­vimento válido, figurando como defensor dativo do réu revel advogado no­meado pelo Juiz do processo.

Não merece prosperar o argumento de que a apelação, pela defesa dativa seja obrigatória, sob pena de se considerar como cerceada a defesa, posto que, segundo o nosso sistema processual, são voluntários os recursos, salvo quando a lei dispuser em contrário.

É certo que a negligência da defesa, em não praticar os atos que lhe incumbe no curso do processo, a bem do réu, pode ser interpretado como cerceamento, podendo nulificar o processo. Contudo, a ausência de recurso oportuno, por parte do defensor dativo, por si só, não o configura.

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, sobre o tema é vasta e cristalizada no sentido oposto ao defendido pelo recorrente, como ressai dos julgados seguintes:

162

IIDefesa. Alegação ele cerceamento, por ausência de apela­ção do defensor dativo. Peculiaridade da espécie, que afasta a irregularidade apontada. Insuficiência de prova. Matéria que não cabe em habeas corpus. Recurso de habeas corpus desprovido. (RHC 56.060 - SP - Relator: Min. Leitão de Abreu - RTJ 88/78).

IIProcesso Penal. O defensor dativo, a quem se intima pes­soalmente da sentença condenatória, não está obrigado a apelar: se não o faz, a sentença transita em julgado. Habeas corpus denegado. (HC 57.434 - SP - Relator: Min. Xavier de Albu­querque - RTJ 92/1118).

1 .................................................................................................... .

2. O defensor dativo, intimado pessoalmente da sentença condenatória, não é obrigado a apelar; prevalece entre nós o princípio da voluntariedade de recurso. Não apelando, transita em julgado a sentença. (RHC 59.888 - RJ - Relator: Min. Alfredo Buzaid - RTJ 102/150).

Habeas corpus. Defensor dativo. Não interposição de em­bargos infringentes.

R. SlIp. Trih. JlISt., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990.

A jurisprudência mais recente desta Corte Realmente - e essa questão foi amplamente debatida pelo Plenário, no RECr 89.965 (RTJ 94/788 e segs.) - vem mantendo o entendimentp de que, ainda quando se trate de defesa dativa, não tem ela o dever de apelar, por prevalecer, no díreito processual penal, o princípio da voluntariedade do recurso, salvo se a lei o tem como obriga­tório.

- Se assim é com relação, o mesmo se dará, por identidade de razão, com os embargos infringentes. Habeas corpus indefe­rido. (HC 61.371 - SP - Relator: Min. Moreira Alves - RTJ 110/639).

A doutrina não discorda, como faz certo o que diz Eduardo Espíndola Filho:

Às partes interessadas é deixada ampla liberdade na matéria, conforme suas conveniências, e, por isso, o recurso se diz volun ... tário, para salientar que a nenhuma delas é imposta a obrigação de recorrer; nem mesmo ao Ministério Público, ao critério de cujo representante fica decidir sobre a necessidade e a utilidade de promover o reexame da questão" (Código de Processo Penal Anotado - vol. V pago 558 - 2!l ed. Freitas Bastos - Vol. VI pago 14 - Ed. Borsoi).

É de se dizer, de passagem, ainda que discorde da orientação, que várias são as decisões de Tribunais do país, qL)e têm entendido não ter ° defensor dativo atribuição para apelar, valendo lembrar, de memória, uma do nosso Tribunal Federal de Recursos, salvo engano da 2!l Turma e com relatoria do Sr. Ministro Gueiros Leite, em que se determinou a baixa da apelação, para que fosse pessoalmente intimado o réu, para dizer sobre o seu desejo de recorrer, o que serve a indicar da inanidade da tese esposada pelo recorrente, ou seja, da obrigatoriedade da interposição do reçurso pelo defensor dativo.

E destaque-se que sequer é exigida a intimação da sentença ao defensor dativo, como está no art. 392 VI do CPP.

Assim, não demonstrado o cerceamento, tanto quanto não evidenciada a irregularidade da citação do réu e nem da intimação editalícia da sentença, voto no sentido de negar provimento ao recurso, para confirmar o acórdão recorrido.

EXTRATO DA MINUTA

RHC N!l 562 - RS - (Reg. n!l 9019443) - Relator: Exmo. Sr. Min. William Patterson. Recorrente: Raul Szulcsewski. Recorrido: Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Paciente: Santiago Antonetti.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990. d63

Decisão: A Turma, por maioria, negou provimento ao recurso. (Em 03.04.90 - 6;! Turma).

VC!lcidos os Exmos. Srs. Ministros Carlos Thibau e Costa Leite. Os Exmos. Srs. Ministros José Cândido e Dias Trindade votaram com o Exmo. Sr. Ministro Relator. Presidiu o julgamento, o Exmo. Sr. Ministro WILLIAM PATTERSON.

+ RECURSO DE HABEAS CORPUS N!1 578 - PB

(Registro n!1 9022452)

Relator: O EXlJlo. Sr. Ministro Carlos Thibau

Recorrentes: Joacil de Brito Pereira e outros

Recorrido: Tribunal de Justiça da Paraíba

Paciente: João Silveira de Alencar Filho

EMENT A: Processual Penal. Prisão preventiva decre­tada com base em inepto aditamento à peça acusatória.

Recurso provido. Habeas cOI1JllS concedido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a 6;! Turma do Superior Tribunal de Justiça, à unanimidade, dar provimento ao recurso para cassar a decisão recorrida e, em conseqüência, conceder a ordem de habeas corpus, nos termos e condições do voto do Sr. Ministro Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 8 de maio de 1990 (data do julgamento).

Ministro WILLIAM PATTERSON, Presidente. Ministro CARLOS THI­BAU, Relator

RELATÓRIO

o EXMO. SR. MINISTRO CARLOS THIBAU: João Silveira de Alencar Filho, funcionário do DETRAN paraibano e então Chefe do Posto da CIRE-

164 R. Sup. Trih. J lIst., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990.

TRAN da cidade de Brejo da Cruz, foi denunciado, juntamente com outras três pessoas, pelo crime de receptação porque, segundo a denúncia:

"Na madrugada de 17.02.1986 foi furtada uma caminhonete Ford F-4000, placa GF 197-BA, ano de fabricação 1983, mo­delo 1984, cor preta-cinza, nas proximidades do posto telefônico da Telebahia, no município de Monte Santo, Bahia. Após o furto, o mesmo foi adquirido pelo primeiro indiciado, através de uma compra realizada com o terceiro indiciado. Visando certificar-se da legalidade da compra, Paulo Normandes (F indiciado) con­sultou a João Filho (2!! indiciado) que cuidou de toda a documen­tação, alterando-os para dar-lhes forma legal. Este veículo. foi recebido depois do furto pelo terceho indiciado e José Paizinho, que realizaram a transação relatada, dando-o como originário do Pará. Descoberta a prática delituosa, o carro foi restituído ao seu proprietário original enquanto que os envolvidos encontram-se respondendo a inquérito administrativo instaurado pelo Detran."

A denúncia foi recebida em 24.05.88, mas o processo, ao que parece, arrastou-se morosamente até que o MM. Juiz de Direito Ricardo Vital de Almeida assumiu o exercício da Comarca de Brejo da Cruz e resolveu impul­sioná-lo, recebendo, em 26.11.89, o aditamento de tls. 337/337 v. à peça acusatória, em que o representante do Ministério Público assim se manifestou:

"Sr. Juiz:

Em atenção ao despacho de tl. 46/v vem esta promotoria requerer o seguinte:

1) seja anexado aos autos a cópia do inquérito administrativo movido pelo DETRAN contra o indiciado João Silveira de Alen­car Filho e o Sr. Francisco Fernandes de Lima; 2) sejam anexadas as folhas que acompanham este pedido; 3) sejam ouvidas as pessoas abaixo arroladas, devendo o Sr. Delegado de Polícia diligenciar no sentido de localizar aquelas onde não constem o endereço: 3.1) Agripino Amaro de Normandes: residente à Rua Padre Ayres, n!! 160, nesta cidade; 3.2) Pocina Roque: brasileira, viúva, doméstica, residente à Rua Deputado Américo Maia, n!! 45, nesta cidade; 3.3) Edson Alves Dantas: casado, residente no Sítio Juremal, São Bento, PB.; 3.4) Geracina Costa de Souza: brasileira, casada, do lar, residente à Rua 07 de Setembro, n!! 99, Centro, Lima Campos, Maranhão; 3.5) Joseval Dutra de Oliveira; 3.6) Paulo Gomes de Araújo; 3.7) João Fernandes Bezerra; 3.8) Geraldo Dutra de Araújo; 3.9) João Maria Dutra Cavalcanti; 3.10) Martinho Clementino da Silva; 3.11) Antônio Abrantes Sarmen-

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-IRR, ago. 1990. 165

to; 4) em consonância com o art. 384, § único, do CPP, bem como com o despacho ministerial de folhas 204 e verso, vem aditar a peça denunciatória, visando: 4.1) a inclusão, como co-autor do delito, o Sr. Francisco Fernandes de Lima, vulgo "Neto", brasi­leiro, casado, funcionário público, lotado no DETRAN, prestan­do serviços na 22l! CIRETRAN, em São Bento; 4.2) a inclusão de todos os denunciados, inclusive o cidadão acima descrito, nos arts. 171, 180,288,297,299 e § único, e 304, c/c os arts. 29, caput, 30,61 g 62, ítem I, 70, 71 e 76, todos do Código PenaL"

Em 28.11.89, mediante longo e fundamentado despacho, o MM. Juiz de Direito decretou a prisão preventiva dos réus.

Por isso é que, em favor de João Silveira de Alencar Filho foi impetrado este habeas corpus, em que se alegou, na respectiva inicial, que a situação do paciente não se adequaria aos requisitos estipulados no art. 312 do CPP, porque ele fora o único dos denunciados a comparecer espontaneamente a todos os atos do processo, como o próprio Juiz de Primeiro Grau reconheceu, além de ter bons antecedentes e domicílio no distrito da culpa, sendo funcionário público estadual.

Já estava o habeas corpllS prestes a ser julgado quando o novo advogado do paciente, o Dr. Joacil de Brito Pereira, apresentou novos fundamentos para a impetração, a saber:

I!! - Que o aditamento à demlncia, em que foi atribuído um rosário de crimes ao paciente, seria inepto e nulo porque, tendo-lhe sido imputada, na peça vestibular, a prática de um só deI ito, o de resceptação de um único veículo, não poderia a segunda promoção acrescentar fatos novos além daquele que já havia sido objeto da primeira, sob pena de inobservância ao disposto no art. 384 do CPP;

2!! - Que, embora tantos crimes novos fossem acrescentados pela acu­sação, nem ao menos foi assegurada ao paciente a oportunidade de sobre tal acréscimo apresentar defesa ou arrolar três testemunhas, como estipula o parágrafo único do dispositivo mencionado.

3!! - Além disso, teria deixado o aditamento à denúncia de descrever, com precisão, a participação do paciente e dos demais réus em cada delito, ou mesmo o liame psicológico que uniria o comportamento de todos na societas sceleris.

4!! - Ademais, como o paciente se encontra preso desde 28.11.89, sem que a instrução esteja encerrada, padeceria sua prisão do vício cio excesso de prazo.

De tal maneira, impor-se-ia a nulidade do processo a partir do aditamento da denúncia e o relaxamento da prisão do paciente, seja por esse motivo, seja para responder solto à acusação.

166 R. Sup. Trib. Just., Brasíliu, 2(12): 1 19-IR8, ago. 1990.

o Ministério Público, que antes opinara- pelo indeferimento do writ, instado novamente e se pronunciar, ante os novos fundamentos, manifestou-se pela proclamação da nulidade do aditamento, por inépcia, com a conseqüente desconstituição da prisão cautelar do paciente.

O eminente relator, Desembargador José Martinho Lisboa, exarou, então, despacho, solicitando ao MM. Juiz impetrado que informasse se fora, ou não, adotada a providência determinada no parágrafo único do art. 384 do CPP. A resposta à indagação foi positiva.

Novamente se pronunciaram impetrante e MP pela falta de aptidão do aditamento à denúncia.

Inobstante, em votação unânime, a E. Câmara Criminal indeferiu a or­dem, motivo do presente recurso, em que os argumentos respectivos estão assim ementados:

1!! - nulidade do processo a partir do aditamento à denúncia, por inépcia da peça complementar;

2!! - cerceamento de defesa pela inclusão, nesse aditamento, ele fatos novos, sem que fosse cumprido o disposto no art. 384 do CPP;

3!! - falta de requisitos para a prisão preventiva;

4!! - excesso de prazo na formação da culpa. A douta S.G.R. opinou pelo improvimento cio recurso.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO CARLOS THIBAU (Relator) : Releio a denúncia e o respectivo aditamento, por me parecer o exame de tais peças fundamental para a apreciação dos dois primeiros fundamentos do recurso:

(Lê fls. 335f337v.)

Embora não seja um primor de técnica, a denúncia oferecida inicialmente contra o paciente e três outras pessoas descreve razoavelmente o suposto comportamento delituoso de cada um 110 crime de receptação.

Já no aditamento isso não ocorre. Essa peça nada esclarece com relação às novas acusações feitas aos quatro réus e ao quinto nome que ali foi incluído.

Muito menos descreve qual o envolvimento de cada um nesses crimes.

Por isso é que o Dr. José Lemos, ilustre Procurador de Justiça oficiante na Câmara Criminal a quo, ao examinar aquela peça assim se manifestou:

"Traz a nova impetração, digamos assim, fatos novos indi­cadores de que a ação penal atacada encontra-se eivada de nuli­dade que a contaminam e corroem o seu arcabouço, tomando-a

R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 119-11\1\, ago. 1990. 167

inidônea para a sustentação da custódia cautelar açoitada. Tal fato se faz presente a partir do ofertamento do 'aditamento à denúncia, como positiva o doc. de tl. 337.

Por primeiro, se processualmente válido o aditamento ao libelo inicial, formalmente deixa ele muito a desejar, por inobser­vância à regra do art. 41, do Código de Processo Penal.

O aditamento, embora tecnicamente não seja substitutivo da denúncia, possui as mesmas características desta, quanto à sua forma. Quer dizer, tem que ser descritivo das circunstâncias que o motivara, sob pena de inépcia. É o que se verifica na hipótese, sub judice, onde o il. Promotor de Justiça a quo limita-se em anexar ao pedido vasta documentação de notícia crime, um elenco de novas testemunhas, a inclusão de um novo indiciado coator, terminando por alinhar uma talentosa capitulação delituava adi­tiva.

Não descreve nada, não frisa as circunstâncias em que cada um dos co-autores participou na teia criminosa. É, enfim, uma peça vazia e inepta. Isto sem adentrar na questão da pertinência do referido aditamento, de que nos ocuparemos mais adiante."

Com efeito, o precário aditamento está completamente vazio de informa­ções sobre a participação, quer do paciente quer dos demais acusados.

A propósito de tal inépcia, o ilustre advogado recorrente apresentou os seguintes julgados da E. 2;\ Turma do Colendo S.T.F:

168

RHC - 66.020-7 - ES, relator o Sr. Ministro Carlos Madeira:

"EMENTA: Recurso de Habeas Corpus. Concurso de di­versas pessoas na prática do delito. Para configurá-lo, a denúncia há de caracterizar o acordo de vontade dos acusados e a partici­pação efetiva de cada um dos agentes. Se não ficou devidamente esclarecida a participação do recorrente na ação criminosa, em ordem a lhe conferir valor jurídico-penal em face das outras condutas convergentes, a denúncia é inepta em reláção a ele.

Provimento parcial do recurso para anular a denúncia rela­tivamente ao recorrente, por inépcia, estendida a decisão ao co­réu José Alves dos Santos, por aplicação do artigo 580 do C.P. Penal, sem prejuízo de que, contra eles, venha a ser outra ofere­cida, com observância do artigo 41 do mesmo diploma."

RHC - 66.349-4. 197-MG, relator o Sr. Ministro Carlos Madeira:

"EMENTA: Recurso de Habeas Corpus. Homicídio.

Acusação indiscriminada a três pessoas. Baseada em indí­cios, a denúncia não expõe o fato criminoso com todas as suas

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990.

circunstâncias, como determina o artigo 41 do Código de Proces­so Penal: carente de elementos necessários a identificação da pessoa do agente, dos acidentes do evento e da maneira da exe­cução do crime de morte, a denúncia é inepta.

Recurso provido pra anular a denúncia, sem prejuízo de que outra seja oferecida em obediência aos requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal." (FI. 412).

RHC - 65.935-7 - SP, relator o Sr. Ministro Aldir Passarinho:

"EMENTA: Denúncia: desatendimento do disposto no art. 41 do CPP. Aditamento inepto.

Se, em aditamento à denúncia já oferecida, o Ministério Público inclui o paciente, apenas e simplesmente declarando que constava que o óleo subtraído fora transportado, em parte, para Lorena, pelo paciente e porum outro, e que, assim agindo, haviam concorrido para o roubo daquele óleo, sem qualquer indicação das razões desse "consta", sem nenhuma referência às circuns­tâncias relativas a sua participação no delito, senão a do transpor­te, sem menção à maneira como fora realizado o transporte, local ou data, sem mencionar se ao menos sabia o paciente que o óleo era roubado, enfim, com completa desatenção à regra do art. 41 do CPP, tem-se que o aditamento à denúncia, no que diz respeito ao paciente, é inepta, por omissa, podendo outro aditamento ser feito ou nova denúncia ser oferecida, com cumprimento do alu­dido preceito, se for o caso.

Em conseqüência da inépcia do aditamento da denúncia no que diz respeito ao paciente, defere-se também a ordem de habeas corpus pata que fique sem efeito sua prisão preventiva."

Como visto, essa deficiência contraria o que dispõe o art. 41 do CPP, que exige na denúncia a exposição do fato criminoso com todas as circunstâncias, para que a defesa possa ser articulada, sob pena de ocorrência da nulidade cominada no art. 564, UI, a, do mesmo diploma.

Patente a nulidade, é de ser concedido o habeas corpus, para que seja o processo anulado, a partir do aditamento da denúncia, inclusive, o que implica na anulação da prisão preventiva do paciente e dos réus Paulo César de Normandes, Manuel Andrade de Silva, José Paizinho da Silva e Francisco Fernandes de Lima, decretada em função do recebimento da denúncia com­plementar.

Por isso que dou provimento ao recurso para cassar o acórdão recorrido e conceder o habeas corpus ao paciente, estendendo-o, de ofício, aos réus

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2( 12): 119-188, ago. 1990. 169

acima mencionados, salvo se por outro motivo estiverem presos (CPP, art. 580).

É como voto.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO DIAS TRINDADE: Sr. Presidente. Acom­panho o eminente Ministro Relator.

EXTRA TO DA MINUTA

RHC-578 - (Reg. nQ 9022452) - PB. Relator: O Exmo. Sr. Ministro Carlos Thibau. Recorrentes: Joacil de Brito Pereira e outros. Recorrido: Tri­bunal de Justiça da Paraíba. Paciente: João Silveira de Alencar Filho.

Decisão: A Turma, à unanimidade, deu provimento ao recurso para cassar a decisão recorrida e, em conseqüência, conceder a ordem de habeas corpus, nos termos e condições do voto do Sr. Ministro Relator (08.05.90).

Votaram os Exmos. Srs. Ministros Costa Leite, Dias Trindade, William Patterson e José Cândido. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro WIL­LIAM PATTERSON.

170

RECURSO DE HABEAS CORPUS NQ 579-PB

(Registro nQ 900002267-3)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Costa Lima

Recorrente: Simplício Matos dos Santos

Recorrido: Tribunal de Justiça de Paraiba

Paciente: Simplício Matos dos Santos

EMENTA: Processual Penal. Recurso de Habeas Cor­pus. Prisão especial. Transformação em domiciliar.

1. O recorrente encontra-se recolhido em local do Bata­lhão da Policia Militar onde já estiveram alojados outros presos com direito à prisão especial. Adite-se que o aposento foi vistoriado pelo Juiz de Direito e Promotor de Justiça que o acharam adequado ao fim pretendido pelo legislador.

2. Recurso improvido.

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas: Decide a 5;!. Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

negar provimento ao recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 16 de abril de 1990 (data do julgamento). Ministro JOSÉ DANTAS, Presidente. Ministro COSTA LIMA, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO COSTA LIMA: Cuida-se de recurso de habeas corpus interposto por Simplício Matos dos Santos, através de seu advogado, eis que não se conformou com o v. acórdão de fls. 32/35, proferido pela egrégia Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba, denegatório do "writ" resumido na seguinte ementa:

"Habeas corpus - Excesso de prazo justificado - Pedido de liberdade provisória ou prisão domiciliar - Improcedência.

Tendo sido justificado o atraso na instrução criminal que já foi concluída, não há mais que se falar em excesso de prazo. Ocorrendo nos autos de prisão em flagrante as hipóteses que autorizam a prisão preventiva, descabe a liberdade provisória. Se o paciente encontra-se em prisão especial, não lhe assiste o direito a prisão domiciliar, razão porque denega-se a ordem." (fl. 32).

Pretende o impetrante responder o processo em liberdade ou ter o bene­fício da prisão domiciliar. Para tanto, alegou, inicialmente, excesso de prazo para a instrução; que é pri mário, tem bons antecedentes, residência certa, profissão de alta categoria funcional, que não revela nenhum ponto negativo perante a sociedade, companheiros de trabalho e relacionamento social. Final­mente, para justificar o pedido altemativo de prisão domiciliar, alega que faz jus a prisão especial, mas que se encontra preso no Quartel do 1!2 Batalhão de Polícia Militar, em alojamento de militares inferiores, sem as condições pre­vistas em lei.

Em grau de recurso, o recorrente não mais alega excesso de prazo para o encerramento da instrução.

O ilustrado Ministério Público Federal opina pelo não provimento do recurso ordinário, trazendo à colação jurisprudência da 6;! Turma desta Corte (fls. 44/45).

Relatei.

R. SUl'. Trih.lusl., Brasília, 2(12): 119-IRR, ago. 1990. 171

VOTO

EMENTA: Processual Penal. Recurso de Habeas Corpus. Prisão especial. Transformação em domiciliar.

1. O recorrente encontra-se recolhido em local do Batalhão da Polícia Militar onde já estiveram alojados outros presos com direito a prisão especial. Adite-se que o aposento foi vistoriado pelo Juiz de Direito e Promotor de Justiça que o acharam adequa­do ao fim pretendido pelo legislador.

2. Recurso improvido. O EXMO. SR. MINISTRO COSTA LIMA (Relator): O MM. Juízo

Auxiliar de li! Vara Criminal de João Pessoa - PB, autoridade coatora, prestando informações às fls. 23/24, esclarece que, verbis:

172

"Sobre o alegado na petição inicial do HC., tenho a informar a Vossa Excelência que o paciente se acha preso por força de flagrante regularmente lavrado e contra cujo auto nada foi alega­do na impetração.

E, ressalte-se, o réu, ora paciente, foi preso justamente quan­do tentava fugir do distrito da culpa. Na ocasião, negou o quanto pôde a prática do crime, até que, não mais resistindo, ou seja, abatido pelo cansaço, terminou por confessá-lo à polícia.

Quanto aos seus antecedentes, o que consta da inicial está evidenciado nos autos. Só que, por ter um bom, até notável, currículo, ninguém pode bancar o Jack, o Estripador e ficar na impunidade. Isso, datíssima vênia, não!

O alegado excesso de prazo não ocorreu. O impetrante se apressou, sem subtrair da contagem que fez dos dias, aqueles em que a máquina judiciária esteve paralisada em face de greve deflagrada pelos serventuários, quando todos os prazos foram suspensos por decisão do egrégio Tribunal de Justiça.

O crime imputado ao paciente foi um dos que maior impacto causaram na sociedade. E tamanho foi o requinte de perversidade, que o próprio impetrante o reconheceu na inicial, in verbis": " ... não importa que se alegue que o delito revelou alguns traços de exacerbação temperamental na pessoa do acusado." E, adiante, complementa: " ... a concessão do favor agora não impede que a pena espelhe as circunstâncias agravantes do crime e a possível periculosidade do agente" (destaquei, em negrito).

A periculosidade do réu não está apenas nas deduções que se possa tirar do comportamento do mesmo, do conteúdo do laudo

R. sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990.

pericial resultante do incidente de insanidade mentaL Basta que se dê uma olhadela - é preciso que se tenha bom estômago, para poder fazê-lo - nas fotos que se acham nos autos, para se ver o estado em que o réu deixou aquela infeliz mulher." (fls. 23/24)

Vejo que motivos sobejam para se manter a prisão do réu, a saber: tentativa de fuga para outro Estado, o crime revelou grande perversidade e periculosidade, impacto considerável na sociedade, não bastando a primarie­dade e os bons antecedentes para ilidi-Ia, como entende remansosa jurispru­dência deste Tribunal.

Quanto à prisão domiciliar, a autoridade coatora esclarece:

"Relativamente ao pedido alternativo, de prisão domiciliar, informo a Vossa Excelência que o paciente se encontra alojado numa dependência do I BPM, onde já estiveram outros bacharéis em situações semelhantes. O local foi por mim vistoriado, o requerimento dele próprio réu. Na ocasião, onde me fiz acompa­nhar do Dr. Curador, pude verificar as condições normais do aposento." (fi. 24)

Evidentemente, decidiu com acerto o Tribunal recorrido, eis que, pes­soalmente, o MM. Juízo de Direito de F Vara Criminal de João Pessoa - PB, acompanhado do Parquet local, fiscal da lei, verificou as perfeitas condições do alojamento em que se encontra ° réu, que goza do benefício da prisão especial.

Ao tempo do extinto Tribunal Federal de Recursos, em hipótese seme­lhante, fiz constar do meu voto as seguintes considerações sobre o tema:

"O pedido de prisão domiciliar tem como corolário trazer à baila o velho sonho de todos quantos labutam na faina laboriosa da Justiça. Suscita o velho e dourado sonho de ver o País dotado de moderno e exemplar sistema penitenciário, que vem sendo postergado, imprudente e negligentemente pelas autoridades, en­quanto a violência e criminal idade crescem a olhos vistos inchan­do as penitenciárias e prisões de todos os matizes com as mazelas da promiscuidade que põe à mostra a falência do sistema repres­sivo, agravadas dia a dia, impotente para conseguir tratamento individualizado às várias classes de criminosos em atenção às características pessoais de sua personalidade e natureza dos deli­tos cometidos.

Fiel a este contexto que, desgraçadamente, é uma realidade gritante em nosso País, a prisão especial vem merecendo ele Juízes e Tribunais as sensatas ponderações que cada caso concreto pro­porciona.

R. Sup. Trib. Jusl., Brasília, 2(12): 119-1 RR, ago. 1990. 173

174

Esta realidade deve, necessariamente, constituir o norte, o farol, o referencial para situar-se, prudentemente, à análise do direito a prisão especial e seu consectário, diante da impossibili­dade daquela, que é a prisão domiciliar.

Não se pode, utopicamente, pretender verificar as condições objetivas assinaladas e que devem ostentar a prisão especial, diante de um parâmetro que não exista concretamente.

Se a lei fala em sala decente, arejada e onde encontre todas as comodidades, conforme alude o artigo 66 da Lei n!! 5.250, de 9 de fevereiro de 1967, ao estabelecer a prisão especial ao jorna­lista profissional, onde, neste País, em que Presídio, qual Peni­tenciária ou Cadeia Pública a existência concreta das condições idealizadas pela lei, que são desejáveis?

Em que ponto deste imenso Brasil, a Cadeia, Presídio, Pe­nitenciária ou Custódia que reúne condições materiais para o atendimento exato da lei retro referida?

Debate-se, na verdade, diante do possível, do que é ofertado em cada localidade, em termos de prisão, diante do reconhecido desprezo das autoridades responsáveis intimidadas diante do pro­blema e de seu enfrentamento.

Daí, porque os Tribunais, vigilantes e atentos a esta triste realidade nacional em venerandos julgados, enfaticamente, des­tacam que o fundamental é garantir aos detentos com direito a prisão especial a sua separação dos demais detentos, deixando a comodidade material à percepção daquilo que é possível ser oferecido em cada localidade, ou região. O Direito é indisociável da realidade social de onde promana e que o alimenta e deve, obrigatoriamente, retratar o que existe, no estágio de desenvolvi­mento do povo que se destina abrigar com os seus comandos." (HC n!! 6.407/SP,julgado em: 17.12.85, fls. 06/07)

A ementa ficou assim redigida:

"Prisão especial ou domiciliar. Estabelecimento penal. Ine­xistência. Alojamento condigno.

r. Os pacientes são médicos, que foram condenados a 05 anos e 11 meses de reclusão como envolvidos nas fraudes loca­lizadas no INAMPS, em São Paulo. Estão presos provisoriamente em alojamento adaptado pelo DPF, aguardando o julgamento do recurso respectivo.

lI. A iryspeção realizada pelo Juiz acompanhado de Repre­sentante do Ministério Público e do advogado dos pacientes de-

R. Sup. Trih. Jusl., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990.

monstra que ocupam alojamento amplo, isolado e separado dos outros presos, arejado, com duas janelas, banheiro privativo, re­cebendo visitas dos familiares e assistência dos advogados, além de afinnarem que desfrutam de tratamento condigno de parte dos servidores do DPF.

lII. Ordem denegada, porque atendidos os requisitos míni­mos para a prisão especial, considerando-se a realidade brasilei­ra."

A tal respeito a STF, reiteradamente, tem decidido:

"Habeas Corpus.

- Prisão especial. Alegação de recolhimento a local inade­quado e pedido de transformação da prisão especial em domici­liar.

- No caso, inexistem os requisitos necessários à concessão da prisão domiciliar.

- Sujeição a desconfortos de natureza vexatória e privação de recreio dão margem a representação (Decreto n~ 38.016-55), uma vez que dizem respeito à forma de tratamento, e não à qualificaç~o, como condigno, do estabelecimento em que o preso está recolhido.

Recurso ordinário a que se nega provimento." (RRC n~ 55.278/SP, ReI. Min. Moreira Alves, DJ 12.08.1977)

"Criminal. Prisão especial: Advogado.

Habeas Corpus impetrado para que o acusado, advogado, permaneça em liberdade ou em prisão domiciliar, por inexistir, na localidade, prisão especial.

Encontrando-se o réu, acusado de homicídio, recolhido, na comarca, em sala separada, ampla, do estabelecimento penal, e com requisitos de comodidade, considerada mesmo uma das me­lhores do prédio, há de ter-se como atendidas as exigências per­tinentes à prisão especial, ante as condições penitenciárias locais.

Recurso de habeas corpus improvido." (RRC n~ 61.624/SP, ReI. Min. Aldir Passarinho, DJ de 15.06.84)

"Prisão especial. Jomalista. Art. 66, parágrafo único, da Lei 5.250/67. Prisão domiciliar indeferida.

Tendo-se que, conforme se encontra esclarecido, pelo MM. juiz de direito, o paciente se encontra recolhido em quartel de polícia militar que oferece as condições necessárias, em atenção

R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2( 12): 119-1 RR, ago. 1990. 175

ao parágrafo único do art. 66 da Lei n~ 5.250/67, pois, é esclare­cido serem as acomodações amplas, bem arejadas, sem sujeição a regime penitenciário ou carcerário, e sem qualquer contato com presos comuns, e sendo o recolhimento aquele quartel por não possuir a comarca estabelecimento prisional adequado ao propor­cionamento da prisão especial, é de ter-se como atendidos os requisitos legais que a prevê para os jornalistas." (RRC nº 65.568/MG, ReI. Min. Aldir Passarinho, DJ de 27/11/84)

A doutrina não distoa desses conceitos:

fIOS quartéis do Exército ou da Armada foram freqüente vez, designados especialmente como podendo oferecer a garantia, que o Código atual vê suficientemente assegurada, igualmente, nos da Polícia Militar, bem como em qúalquer aposento, que, não sendo cárcere comum, represente prisão especiaL"

(Filho, Eduardo Espínola - "Código de Processo Penal Brasileiro Anotado", Vol. 111, pág. 317)

"Se a localidade onde o condenado deva cumprir a pena não dispuser de prisão especial, o réu deve cumprir sua pena em sala livre da Delegacia e não na cela comum, juntamente com outros condenados. É preciso que haja muita compreensão nesses casos, para que o condenado não sofra além do devido com a aplicação da pena."

(Nogueira, Paulo Lúcio - "Questões Processuais Penais Controvertidas", pág. 244)

Ante o exposto, conheço do recurso para negar-lhe provimento.

É o voto.

EXTRATO DA MINUTA

RRC n~ 579 - PB - (Reg. n!.! 900002267-3) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Costa Lima. Recorrente: Simplício Matos dos Santos. Recorrido: Tribunal de Justiça da Paraíba. Paciente: Simplício Matos dos Santos.

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso. (Em 16.04.90 - 5l! T.

Votaram de acordo os Exmos. Srs. Ministros Assis Toledo. Edson Vidi­gal, José Dantas e Flaquer Scartezzini. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro JOSÉ DANTAS.

176 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990.

RECURSO DE HABEAS CORPUS NQ 581 - SP

(Registro nQ 90.2339-4)

Relator: O EX1Ilo. Sr. Ministro José Cândido

Recorrente: Ademir Aparecido da Silva

Recorrido: Tribunal de Justiça de São Paulo

Paciente: Ademir Aparecido da Silva

Advogado: Dr. Luciano Aparecido Caccia

EMENTA: Apelação em liberdade. Primariedade e bons antecedentes. Art. 594, do CPP.

Considerando o juiz, na sentença, que os antecedentes do réu não o recomendavam, acertada a decisão, confirmada pelo acórdão recorrido, negando-lhe o beneficio de apelar em liberdade, embora tecnicamente primário.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos, em que são partes as acima indicadas.

Decide a 6i! Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes do autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 26 de junho de 1990 (data do julgamento).

Ministro WILLIAM P ATTERSON, Presidente. Ministro JOSÉ CÂNDI­DO, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ CÂNDIDO (Relator): O advogado Luciano Aparecido Caccia, impetrou habeas corpus em favor de Ademir Aparecido da Silva, condenado na Comarca de Catanduva, Estàdo de São Paulo, a 2 anos e 6 meses de reclusão, pelo crime do art. 217, do Código Penal, pretendendo possa ele recorrer em liberdade, pois, que primário e de bons antecedentes.

A sentença negou-lhe o benefício, expressamente: "o réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, pois, seus antecedentes não o recomendam, como já anotado". A anotação foi feita a propósito da fixação da pena, verbis:

R. sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990. 177

"O réu é tecnicamente primário, mas seus antecedentes não o recomendam: tem condenação anterior por direção perigosa de veículo e responde a inquérito policial por furto, quadrilha e estelionato; ademais disso o réu teve conduta altamente reprová­vel no que conceme aos fatos deste processo: procurou difamar a vítima, com o concurso de seu cunhado, e fez gestões sérias para a consumação de crime de aborto, sendo insistentes as men­ções ao remédio oferecido à vítima para interrupção da indesejada gravidez. Por tudo isso, a pena base será fixada em quantidade substancialmente acima do mínimo: três anos de reclusão."

A pena base foi, no entanto, reduzida para dois anos e seis meses, aten­dendo à circunstância da menoridade do réu, à época dos fato, a ser cumprida, inicialmente, em regime semi-aberto.

A Eg. Câmara de Férias do Tribunal de Justiça negou a ordem, em votação unânime, acolhendo parecer da Procuradoria Geral de Justiça.

A douta Subprocuradoria-Geral ela República endossou a manifestação do Ministério Público estadual, entendendo que "os antecedentes do paciente pennitem a não conce~são do benefício".

É o relatório.

VOTO

EMENTA: Apelação em liberdade. Primariedade e bons antecedentes. Art. 5~4, do CPP.

Considerando o juiz, na sentença, que os antecedentes do réu não o recomendavam, acertada a decisão, confirmada pelo acórdão recorrido, negando-lhe o benefício de apelar em liberda­de, embora tecnicamente primário.

O EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ CÂNDIDO (Relator): O acórdão re­corrido, manteve a negativa do benefício de apelar em liberdade, nos seguintes tennos:

178

"Ao ser condenado por sedução, o paciente já havia sido pela contravenção do art. 34 da respectiva lei. Respondia, também, a processo por falsidade e estelionato, embora estes delitos tenham sido cometidos posteriormente ao de sedução.

Considerou ainda o magistrado, ao negar o direito de apelar sem recolher-se à prisão, que o paciente teve conduta altamente reprovável ao procurar difamar a vítima a pressioná-la, antes, a abortar.

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 119-IR8,.ago. 1990.

A condenação anterior sofrida pelo acusado e o seu compor­tamento após o crime de sedução justificam a orientação da sentença, como acentua o parecer da douta Procuradoria Geral de Justiça.

Para apelar sem recolher-se à prisão o réu deve ser primário e possuir bons antecedentes."

Foi por tais considerações que o juiz, acertadamente, negou ao réu, na sentença condenatória, o benefício de apelar em liberdade. Embora tecnica­mente primário, seus antecedentes não o recomendavam.

Desse modo, acolhendo, ainda, o Parecer da douta Subprocuradoria-Ge­ral da República, nego provimento ao recurso.

É o meu voto.

EXTRATO DA MINUTA

RHC 581 - SP - (Reg. n!! 90.2339-4) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro José Cândido. Recorrente: Ademir Aparecido da Silva. Recorrido: Tribunal de Justiça de São Paulo. Paciente: Ademir Aparecido da Silva. Advogado: Dr. Luciano Aparecido Caccia.

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do Exmo. Sr. Ministro Relator (6;! Turma - 26/6/90).

Os Exmo. Srs. Ministros Carlos Thibau, Costa Leite, Dias Trindade e WiIliam Patterson votaram de acordo com o Exmo. Sr. Ministro Relator.

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro WILLIAM PATTERSON.

RECURSO DE HABEAS-CORPUS N!! 666 - ES

(Registro n!! 90 50 545)

Relator: O EXlIlo. Sr. Ministro Dias Trindade

Recorrente: Nilo de Oliveira

Recorrido: Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo

Paciente: Nilo de Oliveira

Advogado: Dr. Vinicius Bittencourt

R. Sup. Trib. Jusl., Brasília, 2(12): 119-IRR, ago. 1990. 179

EMENTA: Penal. Sentença de pronúncia. Causa inter­ruptiva da prescrição. Desclassificação pelo tribunal do júri.

A sentença de pronúncia conserva o efeito de interrom­per a prescrição (art. 117 11 CP), ainda no caso de desclassi­ficação pelo Tribunal do Júri do delito para outro de competência do juízo singular, sobretudo quando reconhece excesso de legítima defesa, dado o caráter condenatório da decisão, não infirmatório do juízo de acusação.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 611 Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos em que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei. Brasília, 29 de junho de 1990 (data do julgamento). Ministro, WILLIAM PATTERSON, Presidente. Ministro DIAS TRIN­

DADE,Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO DIAS TRINDADE (Relator): O advogado Vinicius Bittencourt recorre de acórdão da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Espírito Santo, que indeferiu ordem de habeas corpus que impetrara em favor de Nilo de Oliveira, com o objetivo de ver declarada a ocorrência de prescrição retroativa, pela pena que lhe foi aplicada, em face da prática de homicídio culposo, após decisão do Tribunal do Júri, que reco­nheceu excesso culposo de legítima defesa em seu favor, argumentando que se apresenta irrelevante a interrupção do prazo pela sentença de pronúncia, que não pode ser considerada para qualquer de seus efeitos.

Parecer do Ministério Público, por sua representante com atuação perante esta Turma, a Subprocuradora-Geral da República Lima de Carvalho, no sentido de ser negado provimento ao recurso.

É como relato.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO DIAS TRINDADE (Relator): A tese defen­dida pelo recorrente não tem merecido unanimidade dos que a examinaram,

180 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 1 19-IRR, ago. 1990.

como demonstram peças dos autos, a ponto de situar-se o ilustre advogado em sustentar que, por ser a sua a mais liberal, por certo dia virá em que se tornará vitoriosa.

Com efeito, vários doutrinadores defendem, uns, a tese do recorrente, enquanto outros, opinião oposta, ambas as correntes com argumentos fortes e valiosos.

A jurisprudência, do mesmo passo, vacila, mas a do Supremo Tribunal Federal, evidenciada no acórdão trazido no debate desta causa, conserva-se no sentido de que prevalece a interrupção do lapso temporal da prescrição pela sentença de pronúncia, ainda quando o júri a desclassificar o delito para outro de competência do juízo singular. Trata-se de acórdão da lavra do Sr. Ministro Neri da Silveira, assim ementado:

"A sentença de pronúncia interrompe a prescrição (CP art. 117 11). A desclassificação do delito operada pelo Tribunal do Júri não retira esse efeito da pronúncia. Se o Júri desclassifica o crime de tentativa de homicídio para lesões corporais dolosas, o prazo de extinção da punibilidade, pela prescrição, em face da pena concretizada, na decisão, pelo delito de lesões corporais dolosas, flui, desde a última interrupção de prescrição no proces­so. A decisão do júri, nessa hipótese, não anula a sentença de pronúncia, trânsita em julgado. Não é possível, assim, entender que, nessas circunstâncias, a sentença de pronúncia não tenha efeito interruptivo da prescrição em relação ao crime de lesões dolosas."

E sustentam os que defendem esse ponto de vista com a sucessi vidade dos atos do processo, conservando cada um, em sua fase, os efeitos próprios, o que serve a afastar o argumento de que se vale o recorrente, da inexigência de sentença de pronúncia no rito processual do delito pelo qual fora condenado o paciente.

Prefiro deixar em aberto o tema, para uma consideração ulterior, não de maneira absoluta, mas em face da natureza da decisão do Tribunal popular, caso a caso, de modo a distinguir, a) quando o veredito popular diz que o delito constante da denúncia não é de sua competência, assim como no caso de desclassificar o delito de tentativa de homicídio para lesões corporais, de homicídio doloso, para o de lesão seguida de morte, ou, se afirma que o homicídio doloso da denúncia foi meramente culposo, ao responder quesito sobre se a ação decorreu de imprudência, negligência ou imperícia do agente; b) se ocorre hipótese, que é a dos autos, em que o órgão popular, após responder afirmativamente os quesitos da legítima defesa, vem a reconhecer excesso.

Poderia tender a admitir que a sentença de pronúncia, nos casos sob a), não deveria ser considerada, como causa interruptiva da prescrição, mas, na

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-11\1\, ago. 1990. 181

hipótese sob b), em que o órgão popular não tenha dito de sua incompetência para o julgamento, senão proferido decisão condenatória por esse excesso, restando ao Presidente do Júri sentenciar, adequando, ao fato reconhecido, a pena, não vejo como desconsiderar a sentença de pronúncia como causa interruptiva do lapso prescricional, e, por conseguinte, a decisão confirmatória dessa sentença pelo Tribunal de Justiça - o que, no caso vertente, ocorreu.

Deste modo, seja pelo princípio da conservação dos atos do processo, seja porque a decisão do Tribunal do Júri, no caso em exame, tem natureza conde­natória, pelo excesso, por força do § único do art. 23 do CP, voto no sentido de negar provimento ao recurso.

EXTRATO DA MINUTA

RHC NQ 666 - ES - (Reg. nQ 90 50 545) - Relator: O Exmo. Sr. Min. Dias Trindade. Recorrente: Nilo de Oliveira. Recorrido: Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo. Paciente: Nilo de Oliveira. Advogado: Dr. Vini­cius Bittencourt.

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto elo Sr. Ministro Relator. Em 29.06.90 - 6;[ Turma.

Os Exmos. Srs. Mins. William Patterson, José Cândido, Carlos Thibau e Costa Leite, votaram com o Relator. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Min. WILLIAM PATTERSON.

182

• RECURSO DE HABEAS CORPUS N!! 668 - PB

(Registro n!! 90.0005056-1)

Relator: O EX1I/o. Sr. Ministro Carlos Thiball

Recorrente: Moacy Ferreira de Souza

Recorrido: Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba

Paciente: Moacy Ferreira de Souza

EMENTA: Processual Penal. I) - Não acarretará nulidade do processo, por inépcia

da denúncia e cerceamento da defesa, a mudança da capitu­lação do crime ali descrito, se os fatos são narrados com todas as circunstâncias e se essa modificação ocorreu antes, mesmo, do recebimento da peça acusatória.

R. sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 119-1RR, ago. 1990.

11) - Prisão preventiva devidamente fundamentada.

IH) - Inexistência de excesso de prazo na form.ação da culpa. Processo em fase das alegações finais.

IV) Recurso improvido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a 6!! Turma do Superior Tribunal de Justiça, à unanimidade, negar provimento ao recurso, nos tennos do voto do Sr. Ministro Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 26 de junho de 1990 (data do julgamento).

Ministro WILLIAM PA TTERSON, Presidente. Ministro CARLOS THI­BAU, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO CARLOS THIBAU: De acórdão denegatório de habeas corpus originário da Câmara Criminal do E. Tribunal de Justiça da Paraíba recorre Moacy Ferreira de Souza, para que seja decretada a nulidade do processo a que responde, pelo crime de extorsão mediante seqüestro, e revogada sua prisão preventiva.

Em suas razões, alega o recorrente: inépcia da denúncia e cerceamento de defesa, em decorrência da mudança da capitulação elo crime nela descrito; constrangimento ilegal, não só porque a custódia preventiva não está devida­mente fundamentada, como também porque ocorreu excesso de prazo na formação da cul pa.

Parecer da douta SGR, às fls. 232/235, pelo improvimento do recurso, por inexistirem a nulidade ou o cerceamento de defesa alegados, e porque a prisão preventiva está devidamente fundamentada, não se podendo falar em excesso de prazo, já que o processo encontra-se na fase de alegações finais.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO CARLOS THIBAU (Relator): A denúncia assim descreveu os fatos e capitulou os crimes:

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 119-188, ago. 1990. 183

184

"Emerge dos presentes autos, que na noite do dia 19joutu­broj89 neste município, mais precisamente no lugar denominado "Subida do Rio Miriri", os acusados acima qualificados simula­ram um assalto e conseqüentemente um seqüestro com a intenção única e exclusiva de assassinarem a Sra. Leonilda de Oliveira Souza, conforme confessou perante a autoridade policial que presidiu o inquérito, o primeiro denunciado, esposo e autor inte­lectual do revoltante crime.

Noticiam ainda as peças informativas, que o primeiro de­nunciado há muito tempo tramava a morte de sua esposa, por achar que a mesma era infiel para com o mesmo, havendo, inclu­sive, informado a uma das testemunhas que desejava eliminar sua esposa, a qual desacomselhou-o da idéia, e por ser também a vítima a sua amiga. A família da vítima sabia que o relaciona­mento do casal era de desavença, contudo não esperavam que Moacy maquinasse um plano aparentemente bem forjado para eliminar sua própria esposa. Concluído o plano e executado, o primeiro denunciado apareceu na cidade de Itambé-PE., amarra­do no interior de um veículo, também fruto de roubo, sendo localizado por uma das testemunhas, dando uma versão que de início não foi acatada pelo irmão da vítima, que duvidando do cunhado diligenciou e conseguiu localizar a camioneta perten­cente a Moacy, que fora incendiada criminosamente para dificul­tar as investigaçõs e colaborar com seu plano diabólico.

Diz ainda os autos que uma outra irmã da vítima era conhe­cedora do desejo de Moacy de eliminar a sua esposa, porque esta lhe contara dias antes, contudo graças a atuação policial, o denun­ciado, vendo-se cercado por todos os ângulos, não se conteve e espontaneamente confessou o crime, com riqueza de detalhes e apontando as pessoas contratadas para eliminar sua esposa, che­gando às pessoas dos demais denunciados e mais um outro que fazia parte do crime, desconhecido de Moacy, e tendo na pessoa do segundo denunciado o articulador principal do crime.

Afora Moacy, todos negam a participação no crime, contu­do, não conseguem provar nenhum deles onde encontra-se na hora e noite do crime, havendo deles que faltou até ao serviço para participar do assassinato. Moacy havia contratado o serviço dos profissionais do gatilho, há mais de trinta dias, havendo conseguido seu intento no dia e hora do crime.

O desaparecimento de sua esposa e o conseqüente resgate que nunca se concretizaria, passaria para o rol dos crimes miste-

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riosos. Foi feito exame pericial na camioneta constatando-se tra­tar-se de incêndio criminoso e presenciado por populares, foi requerido exame de balística das armas dos acusados, foi feita uma acareação entre o primeiro e o segundo denunciado, sendo ratificado tudo que contara à policia, inclusive quando da espera de Moacy pelo resto da "gang" em uma churrascaria e o segundo denunciado ainda dentro de seu veículo lhe dissera: "o serviço está feito do jeito que você queria, agora é para se foder e se você falar morre, conforme o combinadoll

Consta ainda dos autos, que o valor do contrato da morte da Sra. Leonilda foi de 11 quinze mil cruzados novosll e que parte deste dinheiro seria para comprar o carro que seria usado para o crime, quando na verdade o carro utilizado foi o roubado na cidade de Recife, servindo primeiro para eliminar a vítima e depois para conduzir o autor intelectual do crime e esposo da vítima até próximo Itambé-PE, havendo sido quebrada propositalmente a lanterna traseira, para facilitar a entrada de ar para Moacy.

Ante a robustez das provas apuradas, o não aparecimento da vítima, a confissão do mandante do crime, encontram-se os acu­sados acima qualificados incursos as penas dos arts. 121 § 2!.! incisos I e IV c/c art. 61 inciso II letra e, e 62 inciso I e do C.P.B. Moacy Ferreira de Souza; 121 § 2!.! incisos I e IV c/c 211 do mesmo dispositivo penal os demais denunciados. 11

Posteriormente, o Dr. Promotor de Justiça alterou a capitulação do delito para extorsão mediante seqüestro.

E o MM. Juiz prestou ao Tribunal de Justiça da Paraíba as seguintes informações:

111. Como é do conhecimento de todos os paraibanos, por notícias publicadas nos jornais do Estado, o paciente Moacy Ferreira de Souza contratou sicários de aluguel para eliminar sua própria esposa, Sra. Leonilda de Oliveira Souza, simulando se­qüestro em que ele próprio seria IIvítima ll

, tendo com esse propó­sito tomado dinheiro a parentes e amigos com o fito de pagar o "resgatell

• A versão contada por ele não convenceu, tentava ele tumultuar as investigações policiais, por isso tomei como pontos para fundamentar a sua prisão preventiva aqueles realçados pelo impetrante - fi. 08. Vale acrescer que até aquela data o réu ainda não tinha confessado e dado todos os detalhes do crime.

2. A partir da confissão não tive mais como revogar o de­creto construtivo para que o réu pudesse responder em liberdade.

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Em juízo, como já era esperado, o réu negou o alegado à primeira hora, todavia perguntado se ele tinha sido torturado de alguma maneira na Cadeia Pública de Mamanguape, onde a confissão foi feita, ele respondeu negativamente, validando aquele ato e aca­bando de vez com a versão de que a confissão foi "arrancada a pau".

A prisão preventiva foi decretada e mantida com base nas provas até então apuradas, provas essas que dei crédito e validade, não apenas por presunções ou sentimentos, de consciência, des­garrando-me da verdade dos autos.

3. Com relação à capitulação dada na denúncia e posterior­mente modificada, antes mesmo do recebimento da peça acusa­tória:

3.1 - O réu foi denunciado, em concurso com três outros acusados, como incursos nas penas do artigo 121, § 2!!, incisos II e IV, do Código Penal, porém, o Dr. Promotor de Justiça entendeu ter se equivocado na capitulação, aí peticionou pedindo a retifi­cação não da denúncia, mas dos artigos mencionados, para dar os réus como infratores do artigo 159, § I!!, c/c os artigos 29 e 61, inciso lI, letra c e 62, incisos I e lI, todos do Código Penal. A denúncia descreveu o crime e a participação de cada um dos acusados, de modo que não lhes causou qualquer surpresa a modificação da capitulação, possibilitando-lhes ampla defesa, mesmo porque os réus são chamados a Juízo para responderem pelos fatos narrados na peça acusatória e, não pelos delitos ali capitulados. A sentença final, apreciando a prova, é que faz, em definitivo, a classificação.

3.2 - Se, porventura, a petição cujo escopo era modificar a capitulação não foi remetida com os documentos que instruíram as Cartas Precatórias, entendo, data venia, que nenhum prejuízo teve o réu.

4. Quanto ao alegado cerceamento de defesa porque não foi dada ao réu oportunidade de novo interrogatório, como disse no despacho de fls. não ter o réu se saído como foi orientado no primeiro interrogatório, esse fato não lhe outorga o direito de ser novamente interrogado. Novo interrogatório é faculdade assegu­rada ao Juiz, se fato novo surgir no processo, ou se assim entender o julgador.

5. Também indeferi pedido de remessa de ofício à casa de Saúde em Itabaiana, onde o réu diz ter sido interno dias antes da

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prisão. A responsabilidade do Juiz começa, entendo, com a pri­são, isto é, a partir do decreto constritivo, o que lhe aconteceu no passado cabe a ele provar.

6. Com relações aos alegados bons antecedentes, a prima­riedade:

No caso em exame, embora o réu Moacy Ferreira seja tec­nicamente primário, a testemunha José Severino João, conhecido por "Zé Carlos", informa que ele tem uma vida pontilhada de deslizes, de faltas morais.

Tem residência fora do distrito de culpa. A sua liberdade pleiteada não é um direito seu, mas mera faculdade do Juiz, no caso indeferida pelo modo de execução do crime, onde ficou demonstrada torpeza, perversão, malvadeza, além de insensibili­dade moral.

7. Da não Conclusão da Instrução Criminal: No dia 20 de fevereiro do ano fluente, quando o impetrante dava entrada no protocolo desse Egrégio Tribunal de Justiça, a instrução criminal no processo de Moacy Ferreira já estava concluída. Havia sido ouvida a última testemunha residente na Comarca e os prazos assinados para cumprimento de algumas Cartas Precatórias, já esgotados. Iss<;:>- porque o processo foi separado logo depois de seu interrogatório. Atualmente corre outro processo (em virtude do desmembramento) contra os policiais acusados, e o de Moacy está com vista para as alegações finais. Devendo-se acrescentar que as Cartas Precatórias foram cumpridas e estão nos autos.

Sendo estas as informações, colho o ensejo para reiterar a V. Exa. os meus protestos de elevada estima e distinta conside­ração."

A ordem foi denegada sob os seguintes fundamentos, constantes do voto condutor do eminente relator, Desembargador Taigy Filho:

"2.1. Na verdade a denúncia não é inepta, sabido como é que o réu não se defende da capitulação nela contida, mas do fato criminoso a ele impetrado, nela descrito.

É exatamente o que ocorre no caso presente: a peça escordial está conforme o proposto no art. 41 do cód. de Proc. Penal, descrevendo bem claramente os fatos delituosos, sem faltar, in­clusive, os detalhes.

2.2 Por outro lado, não se pode considerar desfundamentado o decreto de prisão preventiva, que se baseia nas notícias dos ardis

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da trama urdida pelo paciente com seus comparsas, sempre vol­tado no sentido de confundir a justiça para não descobrir o crime e muito mais sua autoria.

Ademais, tudo fez o paciente para dificultar a apuração da verdade, usando desde a queima dos veículos utilizados no plano macabro, até o disfarce de seu próprio seqüestro, preso e amarra­do em um automóvel, a seu mandado pelos próprios companhei­ros, segundo dá a entender a prova indiciária recolhida.

2.3 Por último não há falar em excesso de prazo na formação da culpa, se o dr. juiz comarcano informa que a instrução já foi concluída, estando os autos aguardando as razões finais. 11

Nada existe a corrigir no aresto impugnado, que bem examinou a matéria questionada, não só porque a denúncia não é inepta, por descrever os fatos com todas as circunstâncias, conforme determina o art. 41 do CPP, como também porque a errônea qualificação legal do crime pode ser corrigida, como foi, a qualquer tempo, antes de prolatada a sentença final.

Assim, não houve cerceamento de defesa, porque o acusado se defende da imputação do crime contido na denúncia e não do artigo de lei referido pela acusação. Quanto ao decreto de prisão preventiva, ele está devidamente moti­vado e baseado em dados concretos, entre outros, a queima criminosa do veículo e a tentativa do paciente de fugir ela ação penal, fatos que legitimam a custódia provisória.

O excesso de prazo alegado na formação da culpa está superado, porque o processo encontra-se na fase das alegações finais, conforme informou o Juízo do I!! grau.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso.

É como voto.

EXTRATO DA MINUTA

RHC-668 - (Reg. n!! 90.0005056-1) - PB. Relator: O Exmo.,Sr. Mi­nistro Carlos Thibau. Recorrente: Moacy Ferreira de Souza. Recorrido: Tri­bunal de Justiça do Estado da Paraíba. Paciente: Moacy Ferreira de Souza.

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator (26.06.90).

Os Exmos. Srs. Ministros Costa Leite, Dias Trindade, WiIliam Patterson e José Cândido votaram com o Exmo. Sr. Ministro Relator. Presidiu o julga­mento o Exmo. Sr. Ministro WILLIAM PATTERSON.

188 R, SlIp. Trih.ll1sl., Brasília, 2(12): 119-1!!!!, ago. 1990.

MANDATO DE SEGURANÇA E RECURSO

MANDADO DE SEGURANÇA N!! 46 - DF

(Registro n!! 89.0007438-5)

Relator: O EX11lo. Sr. Ministro José de Jesus Filho

Impetrante: Honório Ananíades

Impetrado: Ministro de Estado das Minas e Energia

Advogada: Dra. Eva Lúcia Peçanha

EMENTA: Constitucional. Funcionário da Petrobrás. Anistia. Emenda constitucional n!! 26/85.

I - Comprovada que a rescisão contratual do emprega­do sindicalizado deu-se por motivos eminentemente políticos, face à Emenda Constitucional n!! 26/85, tem ele direito de ver revisto o ato, dentro dos critérios adotados pela Empresa.

11 - Segurança concedida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas.

Decide a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimi­dade, conceder o mandado de segurança, na forma do relatório e notas taqui­gráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 29 de maio de 1990 (data do julgamento).

Ministro CARLOS MÁRIO VELLOSO, Presidente. Ministro JOSÉ DE JESUS FILHO, Relator.

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RELATÓRIO

o EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ DE JESUS FILHO: Honório Ananía­des, brasileiro, casado, geólogo, impetrou mandado de segurança contra ato do Exmo. Sr. Ministro de Minas e Energia, que lhe indeferiu pedido de reintegração nas funções que exercia no quadro da Petrobrás, sob alegação de que foi admitido por concurso público em 25.11.65, sendo demitido, sumaria­mente, em 08.04.68, em razão de suas atividades como representante sindical de sua categoria.

Alegou mais que nos termos da Emenda Constitucional n!! 26/85, reque­reu à Comissão de Anistia, constituída pela Autoridade coatora, seu retorno às atividades, a exemplo de outros companheiros seus do Sindicato etn situação idêntica, por ter sido anistiado mediante despacho do Exmo. Sr. Ministro do Trabalho, de 06.09.88. Entretanto, seu pedido foi negado, sob alegação de que sua dispensa não ocorreu por motivo político e sim por "conveniência da empresa", em razão do desempenho funcional inadequado apresentado pelo impetrante.

As informações prestadas pela douta Autoridade Ministerial sustentam que o Impetrante foi dispensado em 15.09.71, "mediante acordo, e sem que houvesse motivação política no ato", com base no Parecer CA-316/88 da Comissão de Anistia, transcrito.

Para assim proceder, confirma que o Impetrante em fevereiro de 1969 foi destituído da Diretoria de seu Sindicato de classe por ato de exceção, mas que permaneceu no emprego por mais de dois anos, "não tendo aquela arbitrária punição tipo qualquer repercussão no âmbito da Empresa, que o manteve trabalhando" .

Corno as informações não foram acompanhadas dos documentos que diziam "em anexo" e à vista de contradições de datas com o Parecer da Comissão de Anistia, solicitei do Sr. Ministro a remessa desses documentos, que vieram aos autos com o expediente de fis. 50/51.

De parte do Ministério Público Federal, opina o ilustrado Subprocurador­Geral da República, Dr. José Arnaldo da Fonseca, pela concessão da seguran­ça.

192

É o relatório.

VOTO

EMENTA: Constitucional. Funcionário da Petrobrás. Anis­tia. Emenda constitucional n!.! 26/85.

I - Comprovada que a rescisão contratual do empregado sindicalizado deu-se por motivos eminentemente políticos, face

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à Emenda Constitucional n!! 26/85, tem ele direito de ver revisto o ato, dentro dos critérios adotados pela Empresa.

II - Segurança concedida.

O EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ DE JESUS FILHO (Relator): Para opinar pela concessão da segurança, o douto Subprocurador-Geral, Dr. José Arnaldo da Fonseca, com assento nos documentos que ilustram a inicial e as informações, após sintetizar os fatos, aduziu:

"7. Inexistem, nos autos e anexos, prova de que a demissão tenha ocorrido por motivo disciplinar, uma vez que através das fichas confidenciais de avaliação pode-se observar que os con­ceitos atribuídos ao impetrante variaram entre regular e até mes­mo ótimo, não constando nada que desabonasse a sua performance funcional.

8. Não se comprovou que teriam sido feitas advertências, nem mesmo ter havido um inquérito administrativo ou sindicân­cia. Há, ao contrário, informações truncadas ela Consultoria Jurí­dica da Empresa quando declara data da demissão diversa da real e não ter um Termo de Rescisão Contratual, afirmando não cons­tar qualquer documento a respeito em seus arquivos, tendo como único comprovante, a baixa na CTPS do impetrante.

9. Por outro lado, os artigos publicados no jornal do sindi­cato ("Ouro Verde") bem como as declarações diversas de repre­sentantes sindicais e a filiação do impetrante ao SINDIPETRO, não deixam dúvida quanto às atividades político-sindicais exer­cidas pelo mesmo, tanto que foi anistiado pelo Ministro de Estado do Trabalho (fi. 29).

10. A empregadora deferiu outros processos de solicitação do benefício da anistia, reintegrando os interessados que tiveram como motivo da demissão o mesmo do impetrante, como se pode observar nos documentos 09 e 10 e fi. 21 dos autos. Deu-se, desta maneira, tratamento diferenciado ao impetrante.

11. Não há, pois, elementos demonstrativos de que o impe­trante tenha sido demitido por motivos desciplinares. Os dados constantes dos autos e anexos permitem entremostrar que a de­missão teve uma conotação política, embora dissimulada, em razão da situação difícil e delicada da época.

12. A própria empregadora fez expedir a Resolução n!! 32/64, em 28.08.64, que estabelecia normas definitivas para apli­cação de penalidades a empregados incriminadqs por sua parti­cipação em atividades ideológico-subversivas, fixando um

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procedimento administrativo no qual mandava dispensar os en­volvidos e pagar-lhes as indenizações legais. Desta maneira po­deria dissimular o real motivo das demissões.

13. Do ofício do Sr. Ministro, de fls. 50/51, colhe-se:

"Permito-me, ainda, informar a vossa Excelência que, no caso em comento, não houve readmissão do Impetrante. A data de sua dispensa foi, de fato, o dia 08.04.68, tendo sido equivoca­damente mencionada a data ele 15.09.71, que é referida 110 Ofício SERIND-CONFIDENCIAL n~ 220/88 (Anexo 11), o qual, aliás, não cuida do caso do Impetrante, mas do de Antônio Perreira do Nascimento.

De mister, finalmente, salientar não constar, dos arquivos da Empresa, Termo de Rescisão Contratual que não aquele que pode ser encontrado nos documentos anexados pelo ora Impe­trante, quando de seu requerimento à Comissão de Anistia, con­substanciado no Processo Administrativo n~

27000.006392/86-75 (Anexo 1 deste Aviso, fi. 39. "cópia xero­gráfica da Carteira Profissional do ora Impetrante")."

O Impetrante sustenta na inicial que sua rescisão contratual deu-se por motivo de natureza política, afirmação esta que não deixa dúvida pelo exame atento dos autos. Admitido nos quadros da Petrobrás por concurso público, em 25.01.65, filiou-se ao Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Extração do Petróleo nos Estados de Alagoas e Sergipe - SINDIPETRO, em 20 de janeiro de 1966, participando ativamente da militância sindical como Delegado e colaborando no Jornal "Ouro Negro" com artigos de natureza política (fls. 4/36 do anexo).

O processo administrativo de anistia anexado mostra claramente a dissi­mulação para descaracterizar a conotação política da dispensa sumária do Impetrante.

No expediente enviado em novembro de 1987, pelo Chefe do Serviço de Relações Industriais da Empresa, à Presidente da Comissão de Anistia, lê-se:

194

" - Admitido em 25.01.65 no cargo de Técnico Estagiário, sendo lotado na Região de Produção do Nordeste (RPNE);

- em 01.02.66 foi promovido a Técnico "A" (Geólogo);

- em 01.08.67 foi promovido a Técnico "B" (Geólogo);

- em 08.04.68 foi dispensado por conveniência da Empre-sa.

O Sr. Honório Ananíades, no período compreendido entre o 2~ semestre de 1966 e o 2~ semestre de 1967, vinha apresentando performance funcional não adequada aos padrões estabelecidos

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pela Companhia (Documentos Anexo I fls. 1 a 11). Por este motivo, em 12.03.68, foi proposta pelo Chefe da Divisão de Exploração ao superintendente-geral do Departamento de Explo­ração e Produção, a dispensa do referido ex-empregado, conside­rando que já haviam sido dadas ao Sr. Honório suficientes oportunidades para se corrigir das falhas que diretamente influen­ciavam no rendimento de suas funções sem que, no entanto, tivesse o mesmo apresentado a necessária recuperação (Docu­mentos Anexo H fls. 1 a 5).

Desta forma, em 08.04.68, foi procedida a dispensa do Sr. Honório Ananíades, por Conveniência da Companhia (Docu­mentos Anexo IH fls. 1 e 2).

Relativamente ao exercício da função de Delegado Sindical, não consta para a Companhia que o ex-empregado tenha exercido aquela função.

Assim sendo, a dispensa da Companhia do Sr. Honório Ananíades não teve conotação política."

A contradíção quanto ao desempenho é flagrante.

O expediente transcrito revela que o Impetrante, entre o 2~ semestre de 1966 e o 2~ de 1967, não teve desempenho adequado aos padrões da Empresa, motivando sua dispensa. Entretanto, foi ele promovido a Geólogo "B" em 01.08.67. Ora, se fosse verdadeira a avaliação feita, não deveria ter sido promovido. Entretanto, o foi e a avaliação variou de regular a ótimo.

A Comissão ouviu o Geólogo Dr. Robson de Castro Marques, cujo depoimento corrobora com nosso pensamento.

Eis o que disse o depoente em resposta às perguntas formuladas:

1) O Sr. Trabalhava no mesmo Setor do Interessado?

R - Respondeu afirmativamente, sendo responsável por ele e outros Geólogos pertencentes ao Setor de Geologia de Subsuperfície, no período de 1965 a 1968.

2) Do ponto de vista subversivo e sindical, qual a participa­ção ativa do Sr. Honório Ananíades dentro da Empresa?

R - Não podíamos naquela década distinguir atividades sindicais, subversivas ou esquerdistas. Era do meu conhecimento que o Interessado exercia intensa atividade sindical, inclusive atuando na parte ideológica jornalística, tendo como ponto cul­minante o ano de 1967, aproximadamente. As publicações tinham tanto valor político, que eram comentadas em tom de advertência indireta ao interessado, pelo Superintendente, Eng~ Francisco de

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Paula Mendeiros, ao Secretário da Unidade da PETROBRÁS, Sr. Durval Braga, o qual confidenciou ao depoente.

3) Perguntado se havia recebido ordem superior para demitir o Geólogo Honório Ananíades por motivos políticos, respondeu que não. Mas que como substituto eventual do chefe da Divisão tomou conhecimento da Resolução n!! 32/64 da Diretoria da Em­presa que pune funcionários por motivos políticos ideológicos, com a qual o depoente não concordava. Esclareceu que depois de substituído no Setor por ter ido fazer um Curso na Itália, foi que o Sr. Ananíades recebeu os conselhos do substituto do depoente para que parasse de escrever no Jornal Ouro Negro, matéria de cunho político. Que durante 04 anos que foi Chefe do Geólogo Ananíades, ele sempre teve conceito "Bom", que apenas no pe­ríodo de sua estada no estrangeiro foi que o Interessado sofreu rebaixamento nas avaliações funcionais.

4) Citar um fato que comprove perseguição política ao ex­empregado:

R - Respondeu que as avaliações que eram feitas no perío­do, eram feitas com a finalidade de Avaliação Funcional, mas que posteriormente foram distorcidas para Avaliação Política, daí a queda atribuída ao desempenho funcional do Interessado.

5) Perguntando se tinha conhecimento das convicções polí­ticas do Sr. Honório, respondeu que sim. E que elas eram: sindi­calistas, nacionalistas e socialistas. Aproveita para esclarecer que o Supervisor Geral de Subsuperfície, Geólogo José Carlos Braga, cuja função é exercida no DEPEX do Rio de Janeiro tinha posição política contrária a todas as idéias tidas na época como de esquer­da. O Sr. José Carlos Braga é quem dava a última palavra nas avaliações funcionais dos Geólogos bem como em sua movimen­tação como profissional da Empresa, não sendo demitido nem admitido nenhum funcionário para a área de Geologia sem a sua determinação.

6) Perguntado se pode esclarecer o motivo da demissão do Sr. Honório Ananíades, respondeu que não tem dúvidas a decla­rar, a bem da verdade, perante qualquer juízo que o Geólogo Honório Ananíades foi demitido da PETROBRÁS por razões político-ideológicas."

O então relator da Comissão não considerou os aspectos claros desse depoimento, levando um de seus membros a votar vencido, por entender que a motivação foi política (fls. 94 a 100).

196 R. Sup. Trih. Jusl., Brasília, 2(12): IR9-260, ago. 1990.

As próprias informações (fl. 39) asseguram que o Impetrante foi destituí­do da Diretoria de seu Sindicato por ato de exceção que, por sua natureza, é um ato político.

Por todo o exposto, penso não restar dúvida de que a demissão sumária do Impetrante teve motivação exclusivamente política, mas foi praticada den­tro do espírito da Resolução n!! 32/64 da Empresa (fls. 73/74 do anexo).

Uma vez anistiado, pela Emenda Constitucional n!! 26/85, e considerando que sua demissão teve caráter exclusivamente político, pretende o Impetrante que a Autoridade impetrada mande processar seu retomo ao serviço ativo da Petrobrás e que seja reconhecido, nesse processamento, o direito às promo­ções, salários e vantagens inerentes ao cargo, a partir da Emenda referida.

A Comissão de Anistia, após ouvir os representantes dos ex-empregados da Petrobrás e os Órgãos da Empresa, recomendou ao seu Presidente, critérios, como regra genérica de procedimento para efetivação do retorno de ex-empre­gados, em três expedientes. Em todos eles duas condições são impostas: que tenham sido dispensados por motivos políticos e obtido da Comissão parecer favorável e todos eles se fizeram acompanhar de listas de centenas de ex-em­pregados com direito ao retorno (anexo 7).

Na espécie em exame, o Impetrante só não obteve parecer favorável, porque sua demissão foi considerada pela Empresa como sem motivação política. Reconhecida esta, preenchidos estão ambos os requisitos, até porque, todos os seus companheiros de Sindicato - Presidente, Vice Presidente e Secretário, retomaram.

Ante o exposto, meu voto é concedendo a segurança, cujo retorno dar-se-á dentro dos critérios que precederam o de tantos outros ex-empregados.

É como voto.

EXTRATO DA MINUTA

MS 46 - DF - (Reg. n!! 89.0007438-5) - Relator: Exmo. Sr. Ministro José de Jesus Filho. Impetrante: Honório Ananíades. Impetrado: Ministro de Estado das Minas e Energia. Advogada: Dra. Eva Lúcia Peçanha.

Após o voto do Exmo. Sr. Ministro Relator, concedendo o mandado de segurança, no que foi acompanhado pelo Exmo. Sr. Ministro Garcia Vieira, pediu vista o Exmo. Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro. Aguardam os Exmos. Srs. Ministros Américo Luz, Geraldo Sobral e IImar Galvão. Presidiu o julga­mento o Exmo. Sr. Ministro CARLOS MÁRIO VELLOSO, em razão da ausência justificada do Exmo. Sr. Ministro Armando Rollemberg.

° Exmo. Sr. Ministro Pedro Acioli não participou do julgamento. (F Seção, em 27.3.90)

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VOTO - VISTA

O EXMO. SR. MINISTRO VICENTE CERNICCHIARO - Sr. Presi­dente, acompanho o douto voto do eminente Relator. Subscrevo sua motiva­ção.

EXTRATO DA MINUTA

MS 46 - DF - (Reg. n!! 89.0007438-5) - Relator: Exmo. Sr. Ministro José de Jesus Filho. Impetrante: Honório AnanÍades. Impetrado: Ministro de Estado das Minas e Energia. Advogada: Dra. Eva Lúcia Peçanha.

Decisão: Prosseguindo no julgamento, a Seção, por unanimidade, conce­deu o mandado de segurança. (P Seção, em 29.05.90)

Os Exmos. Srs. Ministros Garcia Vieira, Vicente Cernicchiaro, Américo Luz, Geraldo Sobral e IImar Galvão votaram com o Exmo. Sr. Ministro Relator.

O Exmo. Sr. Ministro Pedro Acioli não participou do julgamento. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro CARLOS VELLOSO, em

razão da ausência, ocasional, do Exmo. Sr. Ministro Armando Rollemberg .

198

• RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA N!! 80 - MA

(Registro n!! 89102621)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Geraldo Sobral

Recorrentes: Maria de Fátima Sousa Fernandes e outra

Recorrido: Tribunal de Justiça do Maranhão

Impetrado: Governador do Estado do Maranhão

Advogados: Drs. Antônio José Soares Ferro e outro.

EMENTA: Mandado de Segurança. Concurso Público. Anulação.

I - Sem prévio procedimento administrativo, no qual fique assegurada ampla defesa dos concursados em estágio probatório, o concurso público não pode ser anulado, deven­do o direito adquirido ser preservado até prova em contrário.

II - Recurso provido.

R. SUl'. Trih. Just., Brasília, 2( 12): I R9-260, ago. 1990.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a F Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso e lhe dar provimento, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 4 de abril de 1990 (data do julgamento).

Ministro PEDRO ACIOLI, Presidente. Ministro GERALDO SOBRAL, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO GERALDO SOBRAL: Trata-se de recurso extraordinário, convertido em ordinário, interposto por Maria de Fátima Sousa Fernandes e Vanda Regina Silva Monteiro, com fundamento no art. 119, inciso IIl, alínea d da Constituição Federal precedente, objetivando reformar o v. acórdão do egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão denegatório de mandado de segurança impetrado contra ato do Sr. Governador daquele Estado que, através do Decreto n!! 10.386, de 23.03.87, anulou os concursos públicos para provimento de cargos de Técnico em Fiscalização e Tributação, Técnico em Arrecadação e Cadastro e Auxiliar de Receita.

Sustentam as recorrentes, em síntese, que por ocasião do decreto anula­tório já se encontravam nomeadas e empossadas, bem assim em pleno estágio probatório, portanto, não poderiam ser exoneradas dos cargos para os quais se abilitaram e obtiveram aprovação sem o devido procedimento administrativo em que se lhes assegurasse ampla defesa, divergindo, deste modo, das Súmulas n!!s 20 e 21, do Pretória Excelso, e de julgados da mesma Corte, que indicaram transcrevendo as ementas.

Inadmitido o apelo extremo ao fundamento de que inocorria, na espécie, as hipóteses elencadas no art. 325, incisos I a X cio RI/STF, subiram os autos a essa Corte por força do acolhimento de agravo de instrumento, e daí reme­tidos a este colendo Tribunal, tendo em vista a promulgação da atual Consti­tuição (1988).

Instado, o douto Ministério Público manifestou-se pelo conhecimento e provimento do recurso.

É o relatório.

R. SlIp. Trih. JlISl., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990. 199

VOTO

o EXMO. SR. MINISTRO GERALDO SOBRAL (Relator): O douto Ministério Público, em parecer da lavra do Dr. Osvaldo Flávio Degrazia, eminente Subprocurador-Geral da República, deu o correto deslinde à contro­vérsia, ao assim dispor, in verbis:

200

"Neste recurso ordinário convertido de extraordinário, en­tendem os recorrentes que o "en: àc. do e~ TJMA, ao julgar válido ato do Governador do Estado que anulou concurso público por eles prestado, feriu direito líquido e certo de permanecerem nos cargos a teor do estabelecido nas Súmulas STF n!!s 20 e 2I.

Arrimaram o pedido recursal na letra d, IH, do art. 119 da EC N!! 1/69, pois, o ven. ac. ao entender válido o Dec. n!! 10.386 de 23.03.87, que anulou os concursos públ icos para o provimento de cargos de Técnico em Fiscalização e Tributação Classe "A", Técnico em Arrecadação e Cadastro Classe" A" e de Auxiliar de Receita Classe "A", realizados pela Secretaria da Fazenda con­trariou as apontadas Súmulas, vez que a anulação do concurso importou em demissão dos impetrantes sem o devido processo legal.

Toda a questão gira em torno da validade da realização de concurso público, em face de diversos diplomas legais estaduais.

Verifica-se da leitura dos autos que a anulação do concurso e o conseqüente desfazimento da investidura dos impetrantes não se fundamentou em motivo grave capaz de viciar a realização do, certame, mas sim, baseou-se na interpretação de leis locais sobre a espécie. .

Os vícios alegados consistiriam na realização das provas por parte da Secretaria da Fazenda quando deveriam ser realizadas pelo Departamento de Administração Geral, competência esta depois transferida para a Secretaria de Administração do Estado que as realizaria através de uma Comissão Central de Concurso (Ver consideranda do aludido Decreto à fi. 23).

Vê-se, pois, que os motivos para a anulação do concurso não são de cunho grave, capazes de viciarem a realização do certame, tais como: violação de provas, divulgação de quesitos, favoreci­mento de candidatos em detrimento de outros, etc.

Aliás, a insubsistência do ato governamental é ressaltada no voto vencido do nobre Desembargador Antônio Guerreiro às fls. 82/84, in verbis:

R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990.

"O Executivo argumenta que os concursos foram anulados por vícios formais, entre esses a ausência de competência do Governador para avocar e delegar competência, isto é, que os concursos não foram procedidos pela Comissão Central de Con­cursos, instituída pela L. 4.558/83.

Acontece a Comissão Central de Concurso, órgão que de fato nunca existiu no Estado, porque seus membros nunca foram nomeados pelo Executivo.

E, além disso, a L. 4.558/84 foi praticamente modificada pela LD.161/84, que dispõe sobre a estrutura e competência do Executivo.

Ressalta a LD. 161/84, em seu art. 22:

"Ressalvados os casos de competência privativa, estabele­cidos na Constituição, é facultado ao Governador, dirigentes de órgãos da Administração direta, indireta e Fundações, delegar competência que lhes tenham sido deferidas ou avocar as que tenham sido atribuídas a órgãos ou agentes sob sua jurisdição."

Para a edição do D. 10.386/87 não foi procedido nenhum inquérito administrativo.

É que se firmou, apenas, em parecer.

Se fosse instaurado verificariam que o secretário da Admi­nistração compôs, também, a comissão, criada pelo D. 9.901/85, art.2!.!:

Fica criada a Comissão Examinadora do Concurso Público referida no artigo anterior, composta dos seguintes membros:

a) Dr. José Ribamar Barbosa Oliveira, secretário Adjunto da Fazenda, que a presidirá;

b) José Ribamar Noleto Cruz, Secretário de Administração;

c) Dr. Nemias Nunes Carvalho, Procurador Geral do Estado;

d) Dr. José Maria Pereira Veras, Auditor-Geral do Estado;

e) Mário Alberto Carneiro de Carvalho, Técnico em Fisca­lização e Tributação."

Assim, o ven. ac. ao manter o ato anulatório feriu o direito adquirido dos impetrantes a manterem-se nos cargos em que se encontravam em pleno exercício e só deles serem apeados através de inquéritos administrativos em que ficasse demonstrada a plena ilegalidade de sua realização.

A vigorar a tese esposada pelo ven. ac. recorrido, fácil seria demitir o servidor sem a necessidade de processo administrativo.

R. Sup. Trib. Jusl., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990. 201

Bastaria a simples alegação de irregularidade de concurso, para, anulando-o, atingir o servidor.

Sabe-se, aqui, que os impetrantes não eram estáveis, isto porém, não invalida a presunção juris tal/tU11l de que o concurso realizou-se na forma estabelecida por atos do governo anterior cuja validade não lhes competia avaliar. Por isto, o desfazimento do concurso só se poderia operar pelo devido processo legal administrativo, porquanto dito concurso gerou direito adquirido que só poderá ser desconstituído se provada a ilegalidade de sua formação.

O princípio prevalecente na matéria é o de que não pode a Administração anular concurso e desfazer as nomeações de fun­cionário já no pleno exercício dos cargos, independentemente do processo administrativo, com a garantia de ampla defesa aos interessados.

Nesse sentido são os vários julgados que servem de referên­cia à Súmula n!! 20 (RMS 9.291-SC, ReI. Ministro Ribeiro da Costa; RMS n!! 9.331-SC, RMS 9.483-RS e 9.495-RS, ReI. Mi­nistro Gonçalves de Oliveira; RMS 9.780-PR, ReI. Ministro Ary Franco; e Ag. 26.618, 26.841 e 26.944, ReI. Ministro Hahne­mamm Guimarães in Jardel Noronha e Odaléa Martins, Referên­cias da Súmula do STF, 1968, v. 1, p. 250-279), confirmados pela jurisprudência mais recente do Supremo Tribunal Federal (RE 71962-RS, ReI. Ministro Xavier de Albuquerque, RTJ 67/142; RE 100.555-RJ, ReI. Ministro Rafael Mayer, RTJ 116/668; e RE 108.192, ReI. Ministro Oscar Corrêa, DJ de 24.10.86).

Do exposto, opina-se no sentido de que seja conhecido e provido o recurso.

Saliento que esta egrégia Primeira Turma, ao apreciar o Recurso em Mandado de Segurança n!! 52-MA (8996540), de que foi relator o eminente Ministro Armando Rollemberg, discutiu matéria idêntica, isto é, anulação do concurso público pelo Sr. Governador do Estado do Maranhão, através do Decreto n!! 10.386, de 23.03.87, tendo a Turma, à unanimidade, negado provi­mento ao recurso, ocasião em que tive oportunidade de acompanhá-lo.

Ocorre que, fazendo uma análise mais acurada da matéria, peço vênia para mudar o meu ponto-de-vista, reconhecendo, sem minimizar a Justiça que comanda os julgados desta colenda Turma e deste egrégio Tribunal, que razão assiste às impetrantes, passando, destarte, a aclotar a mesma linha de entendi­mento esposada no parecer supratranscrito.

202

Isto posto, conheço do recurso e dou-lhe provimento.

É o meu voto.

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 1 R9-260, ago. 1990.

VOTO

o EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ DE JESUS FILHO: Sr. Presidente, quando do julgamento do Recurso em Mandado de Segurança n!1 52-MA, de que foi Relator o eminente Ministro Armando Rollemberg, a exemplo do Ministro Geraldo Sobral, tive oportunidade de acompanhar. Hoje, a matéria se renova com a sustenção do Ministro Firmino Paz, a quem rendemos nossa homenagem.

O Dr. Osvaldo Flávio Carvalho Degrazia, ilustre Subprocurador, de­monstrou, com seu parecer, novos ângulos.

Se há uma lei de 1983, criando a Comissão, por certo, o próprio Estado, que hoje tem interesse em que não se dê provimento a esses recursos, teria feito chegar às mãos dos Ministros dados mais detalhados. Considero que essa Comissão nomeada pelo Sr. Govemador substituiu plenamente a chamada Comissão Central de Concursos. É o único defeito que se alega para invalidá­lo.

Também votei, anteriormente, acompanhando o Sr. Ministro Armando Rollemberg. Estou revendo, neste julgamento, meu voto, porque, na verdade, em se tratando de funcionários concursados e recém-nomeados, diz a Súmula n!1 20 do Supremo Tribunal Federal:

"É sempre necessário processo administrativo com ampla defesa, para demissão de funcionário admitido por concurso."

E a Súmula n!1 21 diz:

"Funcionário em estágio probatório não pode ser exonerado nem demitido sem inquérito ou sem formalidades legais para a apuração de sua capacidade."

Diz ela respeito à capacidade interior e ao desempenho do funcionário. Nada tem a ver com os chamados concursos públicos.

Publica-se edital, abre-se ao público a inscrição; se houve erro ou não na nomeação dessa Comissão, quem de direito deveria ter feito a argüição dessa irregularidade em tempo oportuno? Realizado o concurso, apurado o resultado, nomeados e empossados os funcionários, no pleno exercício do cargo, empos­sado um novo govemo no estado, pode ele anulá-lo, sob o fundamento de erro na nomeação da Comissão que o presidiu?

Parece-me que aí atenta contra o direito desses funcionários de continua­rem no exercício do cargo até que surja um motivo determinante. Poder-se-ia argumentar: mas existem duas Súmulas do Supremo, a 346 e a 473, que dizem: "a Administração pode rever os seus próprios atos".

Essa revisão de que falam as Súmulas do Supremo Tribunal Federal, outrora integrada pelo eminente Ministro Firmino diz, no verbete n!1 346, que

R. Sup. Trih. Jusl., Brasília, 2(12): I R9-260, ago. 1990. 203

a Administração pode declarar a nulidade dos seus próprios atos, e o verbete da Súmula 473, que a Administração pode anular os seus próprios atos quando derivados de vícios que os tomem ilegais, porque deles não se originam direitos, ou revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade - que também não é o caso - respeitados os direitos adquiridos e ressalvados em todos os casos à apreciação judicial.

Por essas razões, também entendo que o Parecer do Ministério Público elucidou bem a matéria.

Peço vênia ao Ministro Firmino Paz, que admiro há tantos anos, para, reformulando o meu entendimento sobre a matéria, acompanhar o voto do eminente Sr. Ministro Geraldo Sobral.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO GARCIA VIEIRA: Sr. Presidente. Pelo que ouvi, durante a exposição, da Tribuna, do Dr. Subprocurador-Geral da Repú­blica, do Relator e do eminente Ministro José de Jesus, não me pareceu que existam vícios suficientes para anular esse concurso, porque, se existia uma comissão de concurso, ela havia apenas sido criada por lei.

Agora, a quem competia nomear esses membros da comissão? Seria o governador? Se o governador tinha competência para nomear, então, essa comissão, que ele criou posteriormente, poderia suprir essa menção da lei que fala na comissão especial do concurso. Essa comissão poderia ser perfeitamen-te criada pelo governador. .

Foi criada a comissão, feito o concurso, os candidatos inscreveram-se, foram aprovados e estavam em exercício. Agora, como demitir esses funcio­nários sem o devido processo legal? Isso não dá para entender.

Diante dessas ligeiras considerações, não tenho dúvidas em acompanhar o voto do eminente Ministro Relator. .

EXTRA TO DA MINUTA

RMS. N!! 80 - MA - (Reg. n!! 89102621) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Geraldo Sobral. Recorrentes: Maria de Fátima Sousa Fernandes e outra. Recorrido Tribunal de Justiça do Maranhão. Impetrado: Governador do Estado do Maranhão. Advogados: Drs. Antonio José Soares Ferro e outro.

Decisão: A Turma, por unanimidade, conheceu do recurso e lhe deu provimento (Em 04.04.90 - li! Turma).

Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Ministros José de Jesus, Garcia Vieira e Pedro Acioli. Ausente,justificadamente, o Exmo. Sr. Ministro Armando Rollemberg. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro PEDRO ACIOLI.

204 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990.

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA N2 137 - RS

(Registro n2 89.0011825-0)

Relator: Exmo. Sr. Ministro José de Jesus Filho Recorrente: Afonso Celso Marques da Silva Rosa

T. Origem: Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

Recorrido: Estado do Rio Grande do Sul Impetrado: Governador do Estado do Rio Grande do Sul

Advogados: Drs. Adão Rolhf da Silva e Caio Martins Leal

EMENTA: Constitucional. Isonomia de vencimentos.

I - O princípio constitucional que permite a isonomia de vencimentos com outros cargos, não é auto-aplicável. Os artigos 39, § 12 , 133 e 134, da Constituição Federal, não são regras de eficácia plena e dependem de leis ordinárias e com­plementar.

II - Recurso não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas.

Decide aI!!. Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 2 de maio de 1990 (data do julgamento).

Ministro GERALDO SOBRAL, Presidente. Ministro JOSÉ DE JESUS FILHO, Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ DE JESUS FILHO: O Delegado de Polícia Afonso Celso Marques da Silva Rosa impetrou Mandado de Segurança contra ato do Exmo. Sr. Govemador do Estado do Rio Grande do Sul, que negou a isonomia nominal de seu salário com o correspondente a Promotor de Justiça de li! entrância. .

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, à unanimidade, denegou a segurança e por maioria concedeu-lhe o benefício da Assistência Judiciária gratuita (fls. 60 e 84).

R. sup. Trib. Jusl., Brasília, 2(12): IS9-260, ago. 1990. 205

Irresignado, recorre o impetrante, com as razões de fls. 67(72 e 98/100, nas quais reafirma seu direito com fulcro nos artigos 135 e 241 da Constituição Federal.

Contra-razões às fls. 78/82 e 116.

A douta Subprocuradoria-Geral da República em seu parecesr de fls. 123/138, opinou pelo conhecimento e improvimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

EMENTA: Constitucional. Isonomia de vencimentos.

I - O princípio constitucional que permite a isonomia de vencimentos com outros cargos, não é auto-aplicável. Os artigos 39, § I!.!, 133 e 134, da Constituição Federal, não são regras de eficácia plena e dependem de leis ordinárias e complementar.

II - Recurso não conhecido.

O EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ DE JESUS FILHO (Relator): Afonso Celso Marques da Silva Rosa impetrou mandado de segurança contra o Sr. Governador do Estado do Rio Grande do Sul, ao fundamento de que como Delegado de Polícia de I!! Classe, tem direito à remuneração correspondente à de Promotor de Justiça de I!! entrância, tenelo em conta o princípio da isonomia de vencimentos constantes dos artigos 135,241 e 39, § 1!.!, da vigente Consti­tuição, por serem dispositivos auto-aplicáveis.

O Colendo Tribunal de Justiça, à unanimiebde, denegou a segurança, tendo como relator o eminente desembargador José Vellinho de Lacerda, estando assim ementado o v. acórdão:

"Delegado de Polícia. Isonomia de vencimentos com outros cargos. Princípio constitucional que não é auto-aplicável. Neces­sidade ele lei regulamentadora. Segurança denegada."

Em suas razões de recorrer, o impetrante reedita sua argumentação ini­cial, ele que os artigos 135 e 241 da Constituição são regras de eficácia plena, independente de lei ordinária.

A decisão do Egrégio Tribunal ele Jusitiça, não merece o menor reparo.

Os artigos 133 e 134 do texto constitucional que institucionalizam a Advocacia e a Defensoria Pública, no capítulo que cuida das Funções Essen­ciais à Justiça, dentro da Organização dos Poderes, não são auto-aplicáveis. Quanto à advocacia, como o próprio texto indica, depende de lei ordinária para, dentre outros aspectos, reformular e ampliar os limites de atuação de advogado por seus atos e manifestações, já constantes da Lei n!.! 4.215/63. Em relação à

206 R. Sup. Trih. Jusl., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990.

defensoria pública o § único do artigo 134 estabelece que Lei Complementar e organizará, prescrevendo normas gerais para sua organização nos Estados, por inexistência de dispositivos legais em particular na esfera federal.

Somente após essa regulamentação, é que a matéria ora em exame deverá ser considerada.

Os dispositivos não são auto-aplicáveis e a decisão a nível estadual está condicionada a essa regulamentação.

Ante o exposto, não conheço do recurso.

EXTRATO DA MINUTA

RMS 132 - RS - (Reg. n!2 89.0011825-0) - Relator: Exmo. Sr. Ministro José de Jesus Filho. Recorrente: Afonso Celso Marques da Silva Rosa. T. Origem: Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Recorrido: Estado do Rio Grande do Sul. Impetrado: Govemador do Estado do Rio Grande do Sul. Advogados: Drs. Adão Rolhf da Silva e Caio Martins Leal.

Decisão: A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso. (F Tur­ma, em 2-5-90)

Participaram do julgamento os Srs. Ministros Garcia Vieira e Geraldo Sobral. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Armando Rollemberg e Pedro Acioli. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro GERALDO SO­BRAL.

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA N!2 170 - RJ

(Registro n!2 89125320)

Relator: O EXJ1Io. Sr. Ministro Geraldo Sobral

Recorrente: Hugo Barcellos

Recorrido: Estado do Rio de Janeiro

T. Origem: Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro

Impetrados: Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e Governador do Estado do Rio de Janeiro.

Advogados: Drs. Reginaldo de Souza Aguiar e outro e Carlos Antonio Navega e outro.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990. 207

EMENTA: Administrativo. Magistrado. Promoção. Lei n!! 5.325/67. Inaplicabilidade. Normas. Funcionários públi­cos.

I - O Magistrado é membro de um dos Poderes do Estado, por isso que se lhe não aplicam as normas tocantes a funcionários públicos, para fins de promoção. Assim, mesmo que tenha servido no Teatro de Operações Bélicas, não se beneficia ele da Legislação que cuida de promoção. A Magis­tratura de Carreira tem suas regras pautadas na Constituição Federal, na Lei Orgânica da Magistratura Nacional e nas normas de Organização Judiciária.

II - Recurso desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a F Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 18 de abril de 1990 (data do julgamento).

Ministro PEDRO ACIOLI, Presidente. Ministro GERALDO SOBRAL, Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO GERALDO SOBRAL: O ilustre Juiz de Direito de Entrância Especial, Dr. Hugo Barcellos, impetrou segurança obje­tivando obter promoção ao cargo de Desembargador do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, ao entendimento de que, tendo integrado a Força Expedicionária Brasileira e servido no "Teatro de Operações de Guer­ra", na Itália, tem assegurado o direito à promoção que pleiteia, por força do que dispõe a Constituição elo Estado e a Lei n!! 5.315, ele 12.06.97, art. 8!!.

O Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade, denegou a ordem.

Irresignado, o ilustre impetrante recol-reu extraordinariamente, com Ar­güição de Relevância, no que teve seu processo negado na origem, subindo, entretanto, ao Pretório Excelso, por força de agravo de instrumento. Indo os autos à Suprema Corte, sobreveio o seguinte decislllll:

208 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): IR9-260, ago. 1990.

"Cuida-se de recurso extraordinário interposto de decisão de Tribunal estadual, que, em única instância, denegou mandado de segurança.

O recurso extraordinário, fundado em matéria constitucio­nal e legal, teve seu processamento negado na origem. Subiu a esta Corte, no entanto, por haver sido provido o agravo de instru­mento manifestado pelo ora recorrente.

Houve argüição de relevância, que foi rejeitada, tomando preclusas as questões de índole legal nela invocadas.

Com a Constituição de 1988, o recurso cabível, na hipótese, passou a ser, quando denegatória a decisão do Tribunal local, o ordinário, da competência do Superior Tribunal de Justiça (art. 105,11, b). O recurso ordinário constitucional- pela natureza de que se reveste - prescinde do exame de admissibilidade na origem CAgo 131.291 - DJ 05.05.89).

Nestas condições, tenho o recurso originariamente interpos­to como convertido, ipso jure, em recurso ordinário, e, em con­seqüência, determino a remessa dos autos ao Superior Tribunal de Justiça, que é o competente para apreciá-lo."

Vindo os autos a esta Corte, foram-me conclusos.

Ouvida, a douta Subprocuradoria-Geral da República, em o seu parecer, opinou pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO GERALDO SOBRAL (Relator): Estou em que não assiste razão ao ilustre impetrante. É que, consoante bem posto no aresto recorrido, o impetrante não é funcionário civil, mas magistrado, vale dizer, membro deum dos poderes do Estado, não se lhe aplicando, destarte, as normas tocantes a funcionários públicos. Realmente, a magistratura de carreira tem suas regras pautadas pela Constituição Federal, na Lei Orgânica da Ma­gistratura e nas Normas de Organização Judiciária. Quisesse o legislador pátrio fazer tal ressalva fá-lo-ia expressamente, não cumprindo ao aplicador da norma fazer distinção onde ele não o fez. Efetivamente, também não se há cogitar de amparo à pretensão deduzida, na Constituição do Estado, o que equivaleria a odiosa violação da Constituição Federal, tanto que a própria Constituição Estadual contém norma específica sobre a promoção dos Juízes aos Tribunais de Segunda Instância, o que afasta a incidência da norma genérica do art. 22, onde não há expressa referência à magistratura. Não cabe, a meu ver, in casu,

R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 11\9-260, ago. 1990. 209

escandir-se se o magistrado é, apenas antologicamente, funcionário público à vista dos argumentos já expostos.

Isto posto, nego provimento ao recurso. É o meu voto.

EXTRATO DA MINUTA

RMS n2 179 - RJ - (Reg. nQ 89125320) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Geraldo Sobral. Recorrente: Hugo Barcellos. Recorrido: Estado do Rio de Janeiro. T. Origem: Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Impetrados: Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e Governador do Estado do Rio de Janeiro. Advogados: Drs. Reginaldo de Souza Aguiar e outro e Carlos Antonio Navega e outro.

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso (Em 18.04.90 - 1!! Turma).

Os Exmos. Srs. Ministros José de Jesus, Garcia Vieira e Pedro Acioli participaram do julgamento. Ausente, justificadamente, o Exmo. Sr. Ministro Armando Rollemberg. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro PEDRO ACIOLI.

210

+ RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA NQ 186 - MG

(Registro n!! 89.0012809-4)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro Recorrente: Adélio Arlindo Duarte e outro

Impetrado: Procurador-Geral de Justiça do Estado de Minas Gerais

Tribunal de Origem: Tribunal de Justiça de Minas Gerais

Advogádos: Drs. Adélio Arlindo Duarte e outro

EMENTA: Mandado de segurança. Concurso. Idade. Art. 72., XXX Consto 1988. A Constituição da República veda qualquer discriminação em razão da idade. O art. 72., XXX, reproduz, materialmente, o art. 153 § 12. da anterior. A dis­tinção é apenas literal. Explicita o princípio da legalidade. Assim, a Lei Maior não afetou as leis que fixam idade para o exercício de condutas. Vedado é, nos limites da lei, estabelecer distinções. Assim, incensurável a lei registrar idade máxima para o ingresso no Ministério Público.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas. Decide a 2i!. Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

negar provimento ao recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei. Brasília, 25 de abril de 1990 (data do julgamento). Ministro CARLOS VELLOSO, Presidente. Ministro LUIZ VICENTE

CERNICCHIARO, Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO VICENTE CERNICCHIARO: Trata-se de recurso em mandado de segurança interposto por Adélio Arlindo Duarte e outro contra o Procurador-Geral de Justiça do Estado de Minas Gerais.

Os recorrentes, por possuírem mais de 40 anos, tiveram indeferida a inscrição para o concurso de ingresso na carreira do Ministérió Público, face a disposição expressa do edital. Entendem haver violação do art. 70., XXX, da Constituição Federal.

Despacho indeferindo a liminar. Contra-razões entendendo não ser auto-aplicável o art. 7'2, XXX, da

Constituição Federal. Lei complementar definirá casos específicos. É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO VICENTE CERNICCHIARO (Relator): O parecer do Ministério Público Federal, subscrito pelo Subprocurador-Geral, Dr. Getúlio Rivera Velasco Catanhede, é o seguinte:

"Trata-se de recurso ordinário impetrado por Adélio Arlindo Duarte e outro da decisão indeferitória de mandado de segurança, proferida pelo Eg. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, no qual o recorrente sustenta ser ilegal o indeferimento de sua inscrição ao concurso para o Ministério Público do Estado de Minas Gerais, em virtude do que se contém no art. 70., XXX, da Constituição Federal, proibindo restrição de idade para o ingresso no serviço público.

A decisão recorrida é incensurável. Em primeiro lugar, porque a norma do inciso XXX do art. 70. está dirigida

apenas aos servidores públicos que não tiverem uma normatização específica, tal como acontece com o Ministério Público.

R. Sup. Trib. Jusl., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990. 211

De fato, pelo § 2!! do art. 127, ao Ministério Público foi deferido dispor mediante lei sobre a sua organização, no âmbito desta compreendendo o provimento dos cargos por concurso de provas e títulos ..

Observe-se, ainda, que quando a Constituição quis aplicar ao Ministério Público outras disposições constitucionais, relativas e outros agentes públicos, o fez expressamente, conforme mostra o § 4!! do art. 129, que manda aplicar o disposto no art. 93, I e VI, no que couber, relativo à magistratura. Do mesmo modo, quando a Carta Magna determinou incidir o art. 37, XI, referente aos limites da remuneração na Administração Pública.

Em suma, para que tivesse aplicação o art. 7!!, XXX, no âmbito do Ministério Público, era necessário que, nas disposições que regulam tal insti­tuição, houvesse o reenvio àquele preceito."

Além dessas doutas considerações, acrescente-se outro argumento no sentido de reforçar a juridicidade da decisão recorrida, evidenciando que a impetração não descreve nenhuma ilegalidade.

A Constituição da República estatui no art. 7!!, XXX:

"proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil".

Essa norma, materialmente, é igual ao art. 153, § I!!, da congênere de 1967:

"Todos são iguais perante a lei, sem distinção de sexo, raça, trabalho, credo religioso e convicções políticas".

A inclusão do vocábulo - idade é mera alteração formal. Tomou explí­cito o que era implícito.

De outro lado, ambas as Constituições adotaram, e os artigos transcritos são decorrência, o princípio da legalidade. Com efeito,

"Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei" (CSonst., 1988, art. 5!!, I; Const., 1967, art. 153, § 2!!).

Assim, tem vigência e eficácia tudo o que a lei formal dispuser, com a única restrição de contrastar a Lei Maior.

Nessa linha, a lei específica do Ministério Público, impondo limite de idade para o ingresso em seus quadros, satisfez o mandamento constitucional.

Não faz sentido, data venia, entender que todas as leis impondo limite mínimo ou máximo de idade estivessem revogadas a partir de outubro de 1988.

Inadequado, é certo,sem lei formal estabelecer distinção entre pessoas. Todavia, respeitados os marcos normativos, nenhuma censura se impõe.

212 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990.

A tese deduzida pelo Recorrente implicaria considerar revogado o Códi­go Civil quando distingue entre pessoas maiores e menores, e menor absoluta ou relativamente incapaz. Suprimida estaria a necessidade de consentimento paterno para o filho menor de 21 anos contrair casamento. Outro exemplo é significativo. A idade mínima, registrada no Código Nacional de Trânsito, para alguém dirigir veículo motorizado na via pública seria ilegal. Qualquer pessoa de oito ou dez anos, por exemplo, teria adquirido o direito de ser portadora da Carteira de Habilitação. O Código Eleitoral, por sua vez, afetado ao dispor ser facultativo o voto de pessoa acima de 70 anos.

Ilegal será, e só neste parâmetro, se nos limites de lei houver discrimina­ção. Assim, vedar, em razão de idade, que alguém obtenha a habilitação para conduzir automóvel, invocando idade avançada, se a lei própria não veda. Impor o edital limite de idade, não existente em lei.

A Súmula 14 do Supremo Tribunal Federal sempre expressou esse en­tendimento:

"Não é admissível, por ato administrativo, restringir, em razão de idade, inscrição em concurso para cargo público".

José Afonso da Silva, "Curso de Direito Constitucional Positivo", Rev. Trib., São Paulo, 1989, 5i! ed. pág. 200, ao enfrentar o tema, registra que a norma não é absoluta:

"É evidente que a não-discriminação em razão da idade há de considerar situações concretas que comportem comparação com situações referidas a homens feitos. A Constituição mesma admite distinção ... "

A própria Constituição distingue pessoas em razão de idade. I1ustrativa­mente, impedindo o voto a menor de dezesseis anos e consentindo a imputa­bilidade penal somente a partir de dezoito anos.

Ao lado das limitações constitucionais convivem as limitações legais. A r. decisão é incensurável. Interpretou com exatidão o princípio da

legalidade. Conheço do recurso. Nego-lhe, porém, provimento.

VOTO

EMENTA: Administrativo. Funcionário. Ingresso no servi­ço público. Lei que fixa requisito com base na idade: Legitimi­dade. Constituição, art. 7'.J., In, art. 39, § 2'.J., artigo 37, I.

O EXMO. SR. MINISTRO CARLOS M. VELLOSO (Presidente): Es­tabelece o artigo 7'.J., XXX, da Constituição, a proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critérios de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil.

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 1R9-260, ago. 1990. 213

o artigo 39, § 22, prescreve, em seguida, que a disposição mencionada - art. 72 , XXX - aplica-se aos servidores públicos. A questão está, pois, em verificar se não estaria a Constituição estabelecendo proibição de fixação de requisito para ingressar no serviço público com base na idade.

O que penso é que as normas postas na Constituição, que dizem respeito ao tema, devem ser interpretadas harmonicamente. Está na Constituição, no que toca a admissão no serviço público, que os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabele­cidos em lei (CF, art. 37, I). Poderia a lei, então, fixar requisito com base na idade? Parece-me que sim. Isso porque há cargos que exigem o concurso de pessoas mais jovens, porque exigem esforço muito maior. De outro ladC\, o serviço público deve ser encarado em termos racionais, quer dizer, o exercício dos cargos públicos pressupõe pessoa capaz no sentido amplo da palavra. Ademais, estabelecida a aposentadoria voluntária aos trinta e cinco anos de serviço, ou trinta anos e vinte e cinco anos, proporcionalmente ao tempo de serviço, e aos setenta anos compulsoriamente (CF, art. 40), supõe-se que o servidor possa exercer o cargo público, de regra, por esse tempo, antes de aposentar-se compulsoriamente.

A interpretação harmônica dessas disposições, ao que me parece, autori­zam a afirmativa no sentido de que o legislador pode estabelecer requisito de ingresso no serviço público com base na idade, vale dizer, idade mínima e máxima para ingresso em certos cargos públicos. Isto, evidentemente, dentro do razoável.

No caso, segundo esclarece o Sr. Ministro Relator, a lei estadual fixa, expressamente, a idade máxima para ingresso no Ministério Público.

Com essas breves considerações, adiro ao voto do Exmo. Sr. Ministro Relator.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO AMÉRICO LUZ: Sr. Presidente, adiro ao voto do eminente Ministro Relator, porque não vejo como evitar que a Lei Estadual estabeleça certos parâmetros para o ingresso na carreira em termos de idade, embora considere baixa a de quarenta anos como máxima para ingresso no Ministério Público, acho esse limite um pouco baixo, mas não ilegal.

EXTRATO DA MINUTA

Recurso em mandado de segurança nQ 186 - MG - (Reg. n2

89.0012809-4) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Vicente Cemicchiaro. Recor-

214 R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990.

rentes: Adélio Arlindo Duarte e outro. Impetrado: Procurador-Geral de Justiça do Estado de Minas Gerais. Tribunal de Ori~em: Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Advogados: Drs. Adélio Arlindo Duarte e outro.

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso (2l! Turma, em 25.04.90).

Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Ministros Carlos Velloso, Américo Luz e Ilmar Galvão.

Presidiu a Sessão o Exmo. Sr. Ministro CARLOS VELLOSO.

+ MANDADO DE SEGURANAÇA N~ 197 - DF

(Registro n~ 89.0009631-1)

Relator para acórdão: O EXlIlo. Sr. Ministro Garcia Vieira

Relator originário: O EXTIlo. Sr. Ministro José de Jesus

Impetrante: Partido dos Trabalhadores

Impetrado: Ministro de Estado da Previdência e Assistência Social

Advogados: Drs. Jonas Duarte José da Silva e outro

EMENTA: Processual. Mandado de segurança coletivo. Partido político. Ilegitimidade.

Quando a Constituição autoriza um partido político a impetrar mandado de segurança coletivo, só pode ser no sen­tido de defender os seus filiados e em questões políticas, ainda assim quando autorizado por lei ou pelo estatuto.

Impossibilidade de dar a um partido político legitimida­de para vir a juízo defender 50 milhões de aposentados, que não são, em sua totalidade, filiados ao partido, e que não autorizaram o mesmo a impetrar mandado de segurança em nome deles.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a F Seção do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, julgar faltar ao impetrante legitimidade para impetrar o mandado de segurança, na

R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990. 215

forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazen­do parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 8 de maio de 1990 (data do julgamento).

Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente. Ministro GARCIA VIEIRA, Relator

RELATÓRIO

o EXMO SR. MINISTRO JOSÉ DE JESUS FILHO: Partido dos Tra­balhadores, partido político com registro definitivo na Justiça Eleitoral (Res. n2 11.165, de 11.6.1982, do T.S.E.), com representação no Congresso Nacional e devidamente representado, nos termos do artigo 52, inciso LXX, letra a, da Constituição Federal, impetra mandado de segurança coletivo, em defesa de direitos dos aposentados, contra ato omissivo do Sr. Ministro da Previdência e Assistência Social, expondo os fatos que o Ministério Público Federal, em parecer subscrito pelo Subprocurador-Geral, Dr. José Al11aldo da Fonseca, sintetizou de forma brilhante, que ora transcrevo:

216

/Ia) em obediência ao disposto no art. 72, inciso IV da Cons­tituição Federal, o legislador ordinário deliberou, fixando em NCZ$ 120,00 o salário mínimo de junho de 1989 (Lei 7.789, de 3.7.89);

b) a autoridade impetra, em virtude da variação do salário mínimo, divulga, mensalmente, novos índices de reajustamento dos benefícios previdenciários que se referenciam nesse parâme­tro legal (ex-Piso Nacional de Salários - extinto pela Lei 7.789j89); inobstante omitiu-se, para o mês de junhoj89, em fixá-los, o que levou o Ministério da Previdência a pagar os benefícios daquele mês com base tão-somente no Piso Nacional de Salários do mês de maio (NCZ$ 81,40, ao invés de NCZ$ 120,00);

c) com isso, violaram-se os arts. 201, § 52, da C.F., e 58, do A.D.C.T., resultando em perda de 32,16% no valor dos benefí­CIOS;

d) e tanto é certo o valor de NCZ$ 120,00 devido em junho que os bénefícios da Previdência Social Urbana, a partir de 12 de julho, foram calculados com base no salário mínimo de junho da ordem de NCZ$ 120,00, adicionado o LP.C., fixado em 24,83% (Resol. 45, de 04 de junhoj89, do LB.G.E.), daí resultando o salário mínimo de julho no valor de NCZ$ 149,80;

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): IR9-260, ago. 1990.

e) a omissão permanece, não se procedendo à retificação para aditar a perda de 32,16% no montante dos benefícios pagos emjunho."

As informações prestadas em tempo hábil trazem três preliminares: ile­gitimidade ativa ad causam, ilegitimidade passiva ad causam e impossibilida­de jurídica do pedido.

Quanto à primeira, que o autor não provou seu interesse e legitimidade para agir, nem mesmo como substituto processual de todos os aposentados, que alcançam aproximadamente quinze milhões de brasileiros, quando, no máximo, um partido político teria legitimidade para representar seus filiados, devendo ser julgado carecedor da ação.

No tocante à sua ilegitimidade, sustenta a autoridade impetrada que apenas cumpre as determinações superiores, tanto em relação à política sala­rial, quanto à política de pagamento de benefícios, uma vez que sua "atividade normativa ou de ordenamento abstrato exercida pelo Ministro de Estado, não tem relevo e instrumento de coatividade prática, para efeito de impetração de mandado de segurança, não passando de um mero executor de normas que são oriundas de um contexto geral", e acrescenta que a fixação dos valores envolve vários setores do Governo como Ministérios da Fazenda e Trabalho, além da Secretaria e Planejamento e Coordenação da Presidência da República, na elaboração da política governamental da Previdência.

Por último, como condição da ação, a impossibilidade jurídica do pedido, porquanto este pretende segurança contra lei em tese, afrontando a Súmula n!! 266, do Supremo Tribunal Federal.

No mérito, afirma que no Ministério, no início de cada mês, ele posse dos valores fixados para o salário mínimo, edita portaria estabelecendo os valores de remuneração dos benefícios, só não o fazendo, no mês de junho, em razão do veto presidencial ao valor estipulado em lei para o mínimo, veto este derrubado pelo Legislativo, promulgando a Lei n!.! 7.789, de 3.7.89, restabele­cendo o mínimo de NCZ$ 120,00.

Aduziu mais que em decorrência da controvérsia política, ficou sem elementos técnicos para a fixação dos valores a serem pagos em junho. Con­tudo, a 19.7.89, fez publicar a Portaria n!.! 4.490, fixando os valores dos bene­fícios de junho, tomando por base o art. 15, da Lei n!.! 7.787, de 30.6.89, para não causar prejuízo aos segurados e pensionistas. E concluiu. Na ausência de omissão, deve ser denegada a segurança.

O douto Representante do Ministério Público, em fundamentado parecer, acolheu as preliminares sucessivas de ilegitimidade ativa e passiva, afastou a

. impossibilidade jurídica do pedido e, no mérito, opinou pela concessão da ordem.

É o relatório.

R. SlIp. Trib. JlISt., Brasília, 2(12): IR9-260, ago. 1990. 217

VOTO (VENCIDO)

O EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ DE JESUS FILHO (Relator): Trata-se de mandado de segurança coletivo, impetrado por Partido Político, com re­presentação no Congresso Nacional.

A autoridade impetrada, em suas informações, levanta três preliminares, dentre elas a de ilegitimidade ativa do Impetrante, preliminar esta acolhida pelo Ministério Público Federal em seu parecer de fls.

O Impetrante vem a Juízo no exercício da inovadora figura do mandado de segurança coletivo, consagrado na vigente Constituição Federal, em seu art. 52, inciso LXX, que diz textualmente:

nal;

"O mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por:

a) partido político com representação no Congresso Nacio-

b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros e associados."

A exegese deste inciso, como a de toda inovação, movimentou a comu­nidade científica, tanto a processual, como a constitucionalista no sentido de dar a exata dimensão a essa conquista social, que tem reflexos diretos no processo, notadamente quanto aos pressupostos específicos do mandado de segurança para a admissibilidade do lIlandalll11S, dentre eles a legitimação ativa dos partidos políticos.

A propósito, José Afonso da Silva, em seu "Curso de Direito Constitu­cional Positivo", já em sua 5!!. edição ampliada e ajustada à nova Constituição, referindo-se ao mandado de segurança coletivo, traz ao debate a lição de Celso Agrícola Barbi, nesta passagem:

"Celso Agrícola Barbi acha que a legitimação dessas enti­dades de classe e associativas se destina "a reclamar direitos subjetivos individuais dos membros dos sindicatos e dos associa­dos de entidades de classe e associações".

E acrescenta: "há ponderações a fazer quanto a isso, pois não se pode, p. ex., deixar de levar em conta o disposto no art. 82, III, que dá aos sindicatos legitimidade para a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria em JUÍzo. Outra questão é saber se as associações podem impetrar mandado de segurança coletivo sem autorização, ou se precisam desta, tal como prevê em geral o disposto no art. 52. XXI, segundo o qual "as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para repre­sentar seus filiados judicial ou extrajudicialmente." Aquela regra do mandado de segurança coletivo contém uma exceção à regra geral, ou a ela se subsume?

218 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990.

Pensamos que a regra geral prevalece em todos os casos "em que se reclama o direito subjetivo individual dos associados."

Celso Agrícola Barbi acha "pouco provável que partidos políticos pudes­sem agir em defesa de direitos subjetivos de cidadãos, pela via do mandado de segurança coletivo". É uma tese que também merece reflexão. As primeiras redações constituintes do mandado de segurança coletivo amarravam os par­tidos políticos no mesmo objetivo das demais entidades: legitimação para defesa de interesses de seus membros e associados. E a palavra "membros" aparecia muito em função dos integrantes das agremiações partidárias. A redação do texto, realmente, vincula a defesa de seus membros e associados a entidades relacionadas na alínea b, pelo que, sem nenhuma dúvida; não podem defender interesses de não membros ou não associados. Não se indicaram, porém, interesses de quem os partidos pai íticos podem defender pelo mandado de segurança coletivo. Questão aberta. Logo, entendemos que eles podem defender direito subjetivo individual de seus membros, desde que se admita, como se está admitindo, que o mandado de segurança coletivo também é meio hábil para defesa de direito subjetivo individual de integrantes da parte insti­tucionallegitimada."

O insigne prof. Celso Ribeiro Bastos, em "Comentários à Constituição do Brasil" - 2!.! vaI., comentando a figura do art. 5!.!, inciso LXX, depois de ressaltar que a criação do mandado de segurança coletivo "veio dar resposta a um reclamo existente de forma difusa, sobretudo nas associações de classe, no sentido de que fossem admitidos requerimentos de segurança em favor de direitos de seus associados", acrescentou, citando Celso Agrícola Barbi, em conclusão, que o mandado de segurança, a exemplo de qualquer outra ação, não autoriza ninguém a ingressar em juízo, como substituto processual, sem lei que o autorize. Enfatizou, ainda, que o inciso rompeu com essa situação ao admitir mandado de segurança requerido por partido político ou organizações nele referidas.

Teceu mais algumas considerações, para ser enfático: "O ponto fulcral da novidade introduzida consiste, sem dúvida, na possibilidade de defesa coletiva de direitos."

"De fato, o que se quis foi facilitar o acesso a juízo, permitindo que pessoas jurídicas defendam o interesse de seus membros ou associados sem necessidade de um mandado especial" e arrematou mais a frente (fi. 353): "O Texto Constitucional não especifica como se dará essa autorização. Assim sendo, queremos crer que não há necessidade de discriminar-se. Em outras palavras, a autorização pode constar da própria lei que criou a entidade, no caso de ela ter assim vindo no mundo jurídico, como também poderá constar dos atos constitutivos da pessoa jurídica, tais como estatuto, por exemplo."

R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): IR9-260, ago. 1990. 219

Já o prof. Michel Teneer, em seu livro, "Elementos de Direito Constitu­cional" - 6ª edição, ao comentar o inciso, foi preciso em seu comentário: "Anoto que as entidades mencionadas podem figurar no pólo ativo da relação processual do mandado de segurança para defenderem interesses que digam respeito a assuntos referentes a categoria classista ou associativa genericamen­te considerada. Para tanto, a entidade impetrante não necessita de autorização de seus integrantes. Esta já é fornecida pelo texto constitucional."

J.J Calmon de Passos, eminente processualista, em seu livro "Mandado de Segurança Coletivo, Mandado de Injunção e Habeas Data", depois de aplaudir a iniciativa da figura, pela economia processual, celeridade, coerência de decisões, etc., ao examinar os pressupostos específicos do mandado de segurança coletivo, referindo-se aos partidos políticos como figura distinta no texto, salientou: "Os partidos políticos têm certa peculiaridade que não permite tratá-los como os demais grupos representativos de interesses. E isso por alguns motivos. Em primeiro lugar, os partidos são um universo de interesses em busca de sua expressão sinérgica, construtiva e compatível. Em segundo lugar, não são eles cómo que titulares desses interesses, por associação, mas apenas representativos deles, expressando-os em dimensão de exercício de poder político: são como que a voz do cidadão inabilitado para se fazer ouvir no Parlamento." E ao concluir foi conciso: "Cuidando-se de partido político, esse nexo assenta em seu papel de intermediador e representante político dos interesses dos cidadãos (sociais), pelo que, na ausência de entidades legitima­da, pode ele atuar numa espécie de legitimação extraordinária supletiva."

Por sua vez, o prof. Vicente Greco Filho, em seu livro "Tutela Constitu­cional das Liberdades", ao analisar o mandado de segurança coletivo, destacou sua finalidade objetiva e, quanto à legitimação ativa generalizou ambas as figuras como substitutas processuais, porém, para agir, devem estar expressa­mente autorizadas, pela forma que o estatuto estabelecer.

A prof! Lúcia Valle Figueiredo, em sua obra "Perfil do Mandado de Segurança Coletivo", ao se referir aos partidos políticos, com assento na Lei Orgânica dos Partidos Políticos, destacou os dois vetores fundamentais a nortear a conduta dos partidos: autenticidade do sistema representativo e a defesa dos direitos humanos fundamentais.

Por fim, nosso eminente colega, prof. Carlos Mário da Silva Velloso, em artigo publicado na Revista da Associação dos Magistrados Mineiros, sob o título "Princípios Constitucionais de Processo", ao se referir ao mandado de segurança coletivo, no tocante à legitimidade ativa dos partidos, em rápida análise que considerou de caráter informativo, destacou: "No mandado de segurança coletivo, impetrado por partido político, o direito a ser pleiteado deve ser de natureza política, assim um direito político ou com este relacionado (Constituição, arts. 14, 15 e 16) ou referido ao partido político (Constituição

220 R. SlIp. Trih.ll1st., Brasília, 2(12): 1R9-260, ago. 1990.

art. 17). O partido político, outrossim, somente poderia impetrar mandado de segurança em favor de filiados seus."

Estes os renomados autores, dentre outros que me foram dada consultar e expostos, com a fidelidade possível, seus pensamentos, todos na busca de uma melhor conceituação para essa figura eminentemente social, que é o mandado de segurança coletivo, estou em que a legitimidade ativa dos partidos políticos deve, também, ser examinada no seu campo político, considerando a legislação que cria e estrutura os partidos, como sinalizou a profo! Lúcia Figuei­redo em seu trabalho.

Com efeito, a Lei n!:! 5.682, de21-7-71, com as modificações introduzidas pela Lei n!:! 6.767, de 20-12-79, em seu art. 2!:!, estabelece que:

"Art. 2!:!. Os partidos políticos, pessoas jurídicas de Direito Público Interno, destinam-se a assegurar, no interesse do regime democrático, a autenticidade do sistema representativo e a defen­der os direitos humanos fundamentais, definidos na Constitui­ção."

O legislador constituinte, ao assegurar aos partidos políticos o direito de impetrar mandado de segurança coletivo, desde que tenham representação no Congresso Nacional, está dando cumprimento à sua destinação e outorgando­lhes o instrumento legal, para o exercício de uma de suas finalidades. De outra parte, não se pode esquecer que o texto de nossa atual Constituição é marca­damente parlamentarista, cujo regime, para sobreviver, exige a presença de partidos políticos fortes, e uma das formas de fortalecê-los é outorgando-lhes o direito de impetrar mandado de segurança coletivo em favor de determinados seguimento social, sem representatividade ativa, cujo sucesso, sem dúvida, atrairá para suas hostes, se não novos filiados, pelo menos, simpatizantes. Portanto, tenho para mim, com a devida vênia, que os partidos estão legitima­dos ativamente, por lei, a ingressar em juízo na defesa do postulado que lhes cumpre preservar e defender.

Na espécie, o Partido dos Trabalhadores ingressou em juízo na defesa de um dos direitos sociais humanos, fundamentais, inscritos na Constituição (art. 62 - previdência social) e direito à aposentadoria (art. 7!:!, inciso XXIV).

Assim pensando, rejeito a preliminar de ilegitimidade ativa, para o qual peço destaque.

VOTO - PRELIMINAR

O EXMO. SR. MINISTRO GARCIA VIEIRA: Sr. Presidente, entendo, data venia do eminente Ministro Relator, que quando a Constituição autoriza um partido político a impetrar mandado de segurança coletivo, só pode ser no

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990. 221

sentido de defender os seus filiados e em questões políticas, ainda assim quando autorizado por lei ou pelo estatuto, e é o mesmo que acontece quando a Constituição autoriza o sindicato a vir a Juízo em defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas.

No art. 82, inciso III: "autorização é para o sindicato vir a Juízo em nome da categoria". Não vejo como darmos legitimidade a um partido político para vir a Juízo defender os 50 milhões de aposentados, que não são filiados ao partido, e que não autorizaram o mesmo a impetrar mandado de segurança em nome deles.

Data venia, denego a segurança, não reconhecendo legitimidade ao par­tido.

VOTO-VISTA

O EXMO. SR. MINISTRO VICENTE CERNICCHIARO: A passagem do liberalismo para a social democracia provocou o surgimento de novos institutos jurídicos.

O princípio inscrito no art. 62 do Cód. Proc. Civil, de que ninguém pode postular em juízo em nome de outrem, perdeu a inflexibilidade inicial.

A ação popular é um exemplo.O cidadão não postula direito individual. Visa ao interesse da coletividade.

A Constituição da República de 1988 ampliou ainda mais o arco. Subs­creveu o mandado de segurança coletivo (art. 52, LXX). Pode ser impetrado por: a) partido político com representação no Congresso Nacional; b) organi­zação sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados.

As entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legi­timidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente (art. 52 XXI). Ao sindicato, de outro lado, cabe a defesa dos direitos e interessados coletivos e individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou admi­nistrativas (art. 82, III).

Relativamente à organização sindical, entidade de classe ou associação, o texto especificou o objeto do mandamus coletivo. Silenciou, porém, quanto ao partido político.

A interpretação exige considerar a distinção entre direito individual (pú­blico ou privado), direito (ou interesse) coletivo e o interesse difuso. Notada­mente entre os dois últimos.

222 R. Sup. Trih. Jus\., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990.

o interesse coletivo pressupõe reunião de pessoas vinculadas por ·um objetivo comum. Interligam-se relações jurídicas com a mesma causa. Poder­se-ia talvez representar pela imagem de expressar interesse de um grupo que objetiva interesse determinado e restrito a esse grupo.

O interesse de um grupo não se confunde com o interesse da coletividade, no sentido de sociedade. No primeiro, apesar da pluralidade de pessoas, são indentificadas por um objetivo comum e limitado. Assim, por exemplo, o sindicato pleiteia no sentido de favorecer os sindicalizados. Nem mais, nem menos.

O interesse difuso, ao contrário, alcança pessoas integrantes da sociedade, identificadas como socii e não ut singulis, ou integrantes de um grupo que não é a sociedade mesma.

No parecer do Ministério Público, subscrito pelo douto Subprocurador­Geral da República, Dr. José Arnaldo da Fonseca, colhe-se a seguinte passa­gem:

"Dirige-se o interesse coletivo aos fins institucionais dos grupos, transcendendo à multiplicidade dos interesses individuais de seus componentes. Resultante do vínculo associativo, ou, com mais precisão, da aifectio societatis, sintoniza-se com os fins próprios da associação. Expressa um conteúdo dis,tinto tanto dos interesses individuais quanto dos interesses públicos."

Emjulgamento anterior, o nobre Relator, em seu erudito voto, citou farta doutrina que abona esta interpretação. Ao lado de Calmon de Passos, José Afonso da Silva e Celso Agrícola Barbi, colacionou o douto Ministro Carlos Velloso.

O partido político é destinado "a assegurar no interesse do regime demo­crático, a autenticidade do sistema representativo e a defender os direitos humanos fundamentais, definidos na Constituição" (Lei n!! 5.682, de 21 de julho de 1971, art. 2!!).

Não obstante a amplitude de sua atuação não me parece, data venia, próprio para pugnar em juízo interesse setorial da sociedade, vale dizer, de grupo determinado, salvo, é lógico, dos seus filiados.

A distinção efetuada pela lex Inater não é literal; decorre da estrutura do partido político e das entidades privadas. Àquele é reservado o papel de postular, inclusive através do mandado de segurança coletivo, os interesses não-personalizados, dirigidos, sim, para toda a sociedade.

Somente nessa linha compreender-se-á a distinção da Constituição. Não se identificam partido político, sindicato e entidades associativas. Teleologi­camente, estão bem delineados, postulam objetivos bem definidos. Em conse­qüência, é marcante a atuação de cada um.

R. sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 189-260, ago, 1990. 223

Esta interpretação confere ao partido político, no tocante ao mandado de segurança coletivo, papel mais amplo do que às outras entidades. Assim, o partido político, por essa via, poderá defender interesses de seus filiados e também os interesses difusos; as demais associações (sentido amplo) restaram limitadas aos interesses de seus integrantes.

No caso dos autos, o pedido é restrito a interesse de grupo determinado.

O impetrante é carecedor do direito da ação.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO CARLOS M. VELLOSO: Sr. Presidente, sustento a tese de que o mandado de segurança impetrado por partido político visa à defesa apenas de direitos atinentes à cidadania, vale dizer, direitos políticos, aqueles que estão inscritos nos arts. 14, 15 e 16 da Constituição Federal; aos direitos atinentes ou referidos aos partidos políticos que estão no art. 17 da Constituição e aqueles outros direitos que dizem respeito ao processo eleitoral. É certo que há autores que sustentam que o Mandado de Segurança Coletivo da letra a, do inciso 70, do art. 5!.!, da Constituição Federal, visa à defesa de direitos de outros, inclusive direitos coletivos e direitos subjetivos de um modo geral. Não posso admitir, entretanto, que a Constituição tenha erigido o partido político como parte legítima para a defesa de todos os indivíduos, em todos os campos. Acho que a interpretação restritiva é, inclu­sive, melhor para a boa aplicação dós direitos e garantias individuais.

Com essas breves considerações, pedindo vênia ao Sr. Ministro Relator, adiro ao voto do Sr. Ministro Garcia Vieira.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO AMÉRICa LUZ: Pedindo vênia ao eminente Relator, acompanho o voto do eminente Ministro Garcia Vieira.

EXTRATO DA MINUTA

MS n!.! 197 - DF - (Reg. n!.! 89.0009631-1) - Relator para acórdão: Ministro Garcia Vieira. Relator originário: Ministro José de Jesus. Impetrante: Partido dos Trabalhadores. Impetrado: Ministro de Estado da Previdência e Assistência Social: Drs. Jonas Duarte José da Silva e outro.

224 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990.

Decisão: Após os votos dos Exmos. Srs. Ministros José de Jesus (Rela­tor), julgando o impetrante parte legítima para impetrar o mandado de segu­rança, e do Exmo. Sr. Ministro Garcia Vieira, negando tal legitimidade, pediu vista o Exmo. Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro. Aguardam os Exmos. Srs. Ministros Carlos Velloso, Miguel Ferrante, Pedro Acioli, Américo Luz, Ge­raldo Sobral e Ilmar Galvão (P Seção: 12/12/89).

Prosseguindo no julgamento, a Seção, por maioria, julgou faltar ao im­petrante legitimidade para impetrar o mandado de segurança, vencido o Exmo. Sr. Ministro José de Jesus (Relator) CP Seção: 8.5.90).

Os Exmos. Srs. Ministros Vicente Cernicchiaro, Carlos Venoso, Pedro Acioli, Américo Luz, Geraldo Sobral e lImar Galvão votaram com o Exmo. Sr. Ministro Garcia Vieira.

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro ARMANDO ROLLEM­BERG.

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA N!! 209 - MG

(Registro n!! 89.00132024)

Relator: O EXlIlo. Sr. Ministro Ilmar Galvão Recorrente: Iracy Pinto Fiúza T. de Origem: Tribunal de Justiça de Minas Gerais Impetrado: Governador do Estado de Minas Gerais

Recorrido: Estado de Minas Gerais

Advogados: Dr. José Neves da Silva, Dr. Erasmo Cesarino de Vilhena e Dr. Francisco Deiró Couto Borges.

EMENTA: Administrativo. Mandado de Segurança. Servidor público. Pretenso direito de acesso a outra categoria funcional, que lhe teria sido reconhecido por anterior decisão judicial.

Decisão que, no entanto, condicionou o acesso à aprova­ção do servidor em concurso, previsto em lei, cuja abertura foi expressamente deixada ao critério da Administração.

Hipótese em que inexiste direito adquirido à ascensão funcional, suscetível de violação a ser reparada pela via do mandado de segurança.

Recurso desprovido.

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990. 225

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a 2i! Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 28 de março de 1990 (data do julgamento).

Ministro CARLOS VELLOSO, Presidente. Ministro ILMAR GAL VÃO, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO ILMAR GAL V ÃO (Relator): Iracy Pinto Fiuza manifestou o presente recurso ordinário contra v. acórdão do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, que lhe denegou mandado de segurança impetrado contra o Governador da mencionada Unidade Federativa, por meio do qual objetivava compeli-lo a determinar a realização de concurso destinado a verificação de suas condições, com vista ao acesso à categoria funcional de Fiscal De Rendas I, que lhe fora assegurado por decisão judicial trânsita em julgado.

Sustentou, em resumo, que o v. acórdão, ao concluir no sentido de que não se fixou, na decisão anterior, qualquer data para a realização das provas, matéria sujeita à discricionariedade da Administração, violou direito adquirido seu.

Com contra-razões do Estado e parecer do órgão do Ministério Público local, subiram os autos a esta Corte, onde foi colhido pronunciamento da douta Subprocuradoria-Geral da República, que opinou pelo desprovimento do re­curso.

226

É o relatório.

VOTO

EMENTA: Administrativo. Mandado de Segurança. Servi­dor público. pretenso direito de acesso a outra categoria funcio­nal, que lhe teria sido reconhecido por anterior decisão judicial.

Decisão que, no entanto, condicionou o acesso à aprovação do servidor em concurso, previsto em lei, cuja abertura foi ex­pressamente deixada ao critério da Administração.

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990.

Hipótese em que inexiste direito adquirido à ascensão fun­cional, suscetível violação a ser reparada pela via do mandado de segurança.

Recurso desprovido.

O EXMO. SR. MINISTRO ILMAR GAL V ÃO (Relator): A recorrente, na qualidade de servidora do Estado de Minas Gerais, juntamente com outros colegas, pleiteou, por volta de 1973, que lhe fosse reconhecido o direito a ascender à categoria funcional de Fiscal De Rendas I, havendo a sua pretensão sido parcialmente atendida, por acórdão da Egrégia Corte Estadual, nos termos do voto de seu eminente relator, que assim concluiu:

"Tudo está na dependência do resultado das provas de aces­so, nos termos do art. 7'2, § 1'2, do Decreto 9441, de 1966. Poder­se-á dizer que a Administração descumpre a lei, não lhes permitindo as provas para o acesso. Todavia, se a Lei não limitou prazo para tais provas, seria indébita qualquer inovação do Judi­ciário se assim o viesse fazer. Cabe à Administração verificar as condições e o tempo de realização dessas provas."

Não se encontra nos autos qualquer das peças da primeira ação, além do respectivo acórdão, o que dificulta, até certo ponto, a interpretação do primeiro julgado.

Do que se contém na inicial e nas informações, pode-se concluir ter havido decisão condicionada, já que deferiu o acesso funcional, desde que aprovada a Impetrante em concurso cuja abertura ficaria a critério da Admi­nistração.

Conforme realçado no v. acórdão recorrido, não se condenou a Adminis­tração a submeter a Impetrante a concurso. Reconheceu-se a esta, forçoso é convir, apenas o direito de concorrer ao acesso, no momento oportuno.

Não se lhe havendo sido oferecida essa ensancha, nada há de executar. Mormente quando, por efeito de superveniente implantação de novo Plano de Cargos, foram extintos não apenas o cargo que era exercido pela Recorrente, mas também a categoria a que pretendia ascender.

Em tais circunstâncias, inexiste espaço para falar-se em direito subjetivo de acesso funcional e, conseqüentemente, em sua violação, a demandar reparo por meio de mandado de segurança.

Meu voto, pois, é no sentido do desprovimento do recurso.

EXTRATO DA MINUTA

RMS n!! 200 - MG - (Reg. n'2 89.00132024) - Relator: Exmo. Sr. Ministro ILMAR GAL V ÃO. ~ecorrente: Iracy Pinto Fiúza. T. de Origem:

R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990. 227

Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Recorrido: Estado de Minas Gerais. Advogados: Dr. José Neves da Silva, Dr. Erasmo Cesarino de Vilhena e Dr. Francisco Deirá Couto Borges.

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso. (Em 28.03.90 - 2i! Turma).

Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Ministros Vicente Cemic­chiara, Carlos Velloso e América Luz. Presidiu o Exmo. Sr. Ministro CAR­LOS VELLOSO.

• MANDADO DE SEGURANÇA N!! 236 - DF

(Registro n!:! 89.11594-4)

Relator: O EXlI1o. Sr. Ministro Américo Luz

Impetrante: Luiz de Paiva Silva

Impetrado: Ministro de Estado da Aeronáutica

Advogado: Dr. Humberto Hansen Machado

EMENTA: Constitucional. Mandado de segurança. Mi­litar. Anistia. Art. 8!! do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias de 1988.

Induvidosa a conotação política do ato de cassação do impetrante, que não chegou a obter a anistia do decreto-Le­gislativo n!! 18/61, há de se lhe reconhecer o direito aos bene­ficios advindos do art. 8!! do ADCT.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a li! Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conceder parcialmente a ordem, na forma do relatório e notas taquigráficas anexas, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas como de lei.

Brasília, 5 de junho de 1990 (data do julgamento).

Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente. Ministro AMÉRI­CO LUZ, Relator.

228 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO AMÉRICO LUZ: Contra ato do Exmo. Sr. Ministro da Aeronáutica, que indeferiu seu pedido de anistia fundado no art. 8!! do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias de 1988, ajuizou o impetrante o presente mandado de segurança, buscando, além do referido benefício, a sua inclusão na reserva remunerada, asseguradas as promoções até o posto de Coronel e pagamento dos atrasados, a partir da promulgação da nova Constituição.

Narra que, por suas atividades políticas como militante ativo na organi­zação clandestina do Partido Comunista do Brasil, teve a patente de p.! Tenen­te-Aviador cassada através de decreto de 22.12.54, após condenação em processo que tramitou pelo STM. Pleiteou a anistia do Decreto-Legislativo n!! 18/61, mas o advento do Decreto-Lei 864/69 impediu a sua obtenção, em face de decisão do extinto TFR, que julgou prejudicada ação que ajuizara com esse objetivo.

Com a nova Carta Política, por entender que a sua situação se encontrava abrangida nas disposições do art. 8!! do ADCT, requereu o benefício, que lhe foi negado, sob o argumento de não atender aos requisitos aludidos na norma. Daí a sua irresignação.

Sem liminar, vieram aos autos as informações de fls. 102/106, nas quais a digna autoridade sustentou falecer razão ao requerente, porque ele foi pro­cessado e condenado pela Justiça Militar, não por crime político ou disciplinar, mas sim em decorrência de crime especial de natureza comum, correspondente à figura típica do incitamento à indisciplina (art. 134 do Código Penal Militar).

O Ministério Público opina pela concessão parcial da segurança.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO AMÉRICO LUZ (Relator): Pretende o im­petrante que este Tribunal o declare anistiado, para que possa usufruir dos benefícios introduzidos pelo art. 8!! do ADCT.

O requerente foi cassado por ter sido condenado pelo Superior Tribunal Militar como incurso nas penas do art. 134 do Código Penal Militar (anterior), dado o seu envolvimento com o Partido Comunista.

Tentou beneficiar-se da anistia do Decreto Legislativo 18/61, não o conseguindo em face do Decreto-Lei 864/69, diante do qual o antigo TFR, acolhendo parecer da Subprocuradoria Geral da República, julgou prejudicada a ação ordinária que intentara e na qual obteve sentença favorável.

R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990. 229

Matéria semelhante à destes autos vem sendo reiteradamente apreciada nesta I;! Seção, conforme julgados nos Mandados de Segurança n!.!s. 66,79,87, 139 e 109.

Ao exame do MS n!.! 66, em voto-vista, desenvolvi minuciosa análise da questão, inclusive através de ampla pesquisa jurisprudencial. Desse voto des­taco alguns tópicos, cujos fundamentos, dada a similitude dos fatos, se aplica à presente hipótese.

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Transcrevo-os:

"Pedi vista, porque em casos análogos o Egrégio Tribunal Federal de Recursos concedeu o writ a militares atingidos em seus direitos por .atos de exceção praticados no período revolucionário, a partir de 1964. Dentre os precedentes julgados pela extinta Corte colacionei os seguintes:

1) MANDADO DE SEGURANÇA N!.! 113.452 - DF

Impetrantes: Reynaldo ele Benedetti e outro

Impetrado: Ministro de Estado da Marinha

Relator: Ministro Geraldo Fonteles

EMENTA: Mandado de Segurança. Anistia. E.C. n!.! 26/85.

Sendo induvidosa a motivação política das ações pelas quais foram punidos os impetrantes, são eles beneficiários da anistia suplicada, com direito, pois, à decisão de seu pedido administra­tivo, concedendo-se-Ihes, para tal fim, a segurança" (DJ de 30.04.87).

A decisão foi tomada por maioria de votos.

2) MANDADO DE SEGURANÇA N!.! 114.889 - DF

Impetrante: Ricardo Nicoll

Impetrado: Ministro de Estado da Aeronáutica

Relator: Ministro José Dantas

EMENTA: Constitucional. Militar. Anistia. Promoções.

Emenda Constitucional n!.! 26/85. Se bem que a norma do art. 4!.!, § 3!.!, não comporte promoções por escolha, tal como as que são próprias do generalato, compreende, porém, a reparação de promoções na passagem para a inatividade, se às mesmas fez jus o militar, punido por ato de exceção, por implemento das respectivas condições do regime legal anterior ao da Lei 4.902/65; incabimento do adicional de 20%, no caso, dado tratar­se de vantagem sucedânea, e assim inacumulável com as promo­ções na inatividade (DJ 29.10.87).

R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): IR9-260, ago. 1990.

Decisão unânime. 3) APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA N2

117.006 - RJ Remetente: Juízo Federal da F Vara - RJ

Apelante: União Federal Apelados: Reino PecaI a Rae e outro Relator: Ministro Edson Vidigal EMENTA: Administrativo. Militares. Anistia. Vantagens

pecuniárias. EC n2 26/85. A anistia abrange as promoções obstadas pela inatividade,

ante a ficção legal de que os beneficiários cumpriram as exigên­cias respectivas se na ativa estivessem (DJ de 02.06.88).

Decisão unânime. 4) MANDADO DE SEGURANÇA N2 97.368 - DF Impetrante: José Benjamin Souza Impetrado: Ministro de Estado da Aeronáutica Relator: Ministro Garcia Vieira EMENTA: Militar. Anistia. Abrangido pelo Decreto Legislativo nQ 18/61, e atingido

pelo Decreto-Lei 864/69, o impetrante foi beneficiado pelo art. 8Q, capllt, das Disposições Transitórias na nova Carta Magna, sem direito, entretanto, à reversão, e sim às promoções na inatividade (DJ de 24.04.89).

Segurança concedida em parte.

Decisão por maioria.

A jurisprudência do TFR, mormente no Pleno, pacificou-se na compreensão do terna, tendo em vista a interpretação do dis­posto no artigo 4Q e parágrafos da Emenda Constitucional n2 26, de 27.XI.1985."

No caso sub examine, após o voto do Sr. Ministro Relator, não conhecendo da segurança, no que foi acompanhado pelo Sr. Ministro Ferrante, a vista dos autos, por mim solicitada, condu­ziu-me a pesquisa jurisprudencial, a qual me ensejou colacionar recente aresto da 2il Turma do Colendo Supremo Tribunal Fede­ral, prolatado em decorrência do julgamento do Recurso Extraor­dinário nQ 116.922-2-RJ, relatado pelo Sr. Ministro Célio Borja, assim dizendo a ementa:

R. Sup. Trib. Jusl., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990. 231

"Anistia. Militar processado, condenado e, posterionnente ao advento da Lei n!! 6.683/79, declarado anistiado, por sentença transitada emjulgado, porque conexo ou relacionado o crime com os delitos políticos ou de motivação política contemplados no art. I!!, § I!!, da referida lei.

Legitimidade do pedido do recorrido, de concessão dos be-nefícios administrativos assegurados na Lei n!! 6.683/79.

RE não conhecido" (DJ de 19.05.89). Decisão unânime.

Do voto do relator transcrevo os seguintes tópicos:

"Opinando pelo conhecimento e não provimento do recurso, a ilustre Subprocuradora-Geral da República, Dra. Yedda de Lurdes Pereira, admite que o ato de licenciamento antecipado do recorrido do serviço ativo da Marinha:

a) era político e punitivo, além de ser

b) "ato de exceção, em face da excepcionalidade das cir­cunstâncias que envolvem a motivação";

c) que em razão do envolvimento do recorrido nos aconte­cimentos do Sindicato dos Metalúrgicos, foi ele processado e condenado pela Justiça Militar, embora, afinal, ineficaz a conde­nação, porque extinta a punibilidade por força da Lei 6.683, de 28.08.79.

O artigo 8!!, caput, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, invocado no parecer antes aludido, concede anistia aos atingidos por atos de exceção, institucionais ou complementares, em decorrência de motivação exclusivamente política; concede-na, ainda, aos abrangidos pelo Decreto Le­gislativo n!! 18, de 15 de dezembro de 1961, e aos atingidos pelo Decreto-Lei nQ 864, de 12 de setembro de 1969.

232

No caso dos autos, cogita-se, exclusivamente, da primeira hipótese, não estando em jogo os diplomas legislativos mencio­nados no caput do referido artigo 8!!:

Há tempos, o Supremo Tribunal Federal assentou que:

"Razão, pois, assiste à Consultoria Jurídica do Ministério da Marinha, quando salienta que "os praças licenciados, demitidos ou expulsos por ato de indisciplina, com amparo na legislação ordinária, não estão abrangidos pela anistia nos tennos em que a concedeu o art. I!! da Lei n!! 6.683/79, e, por via de conseqüência, acrescento eu, improcedem os pedidos que os impetrantes fize­ram, na via administrativa, e que reeditam, agora, no writ, obje­tivando o retorno ou reversão ao serviço ativo" ... "ou transferência para a reserva remunerada" ...

R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990.

... "Ao judiciário" ... "não cabe por não ter função legislati­va" ... "incluir no art. lU da Lei nU 6.683/79, com ânimo do princípio da isonomia, servidores punidos com base na legislação ordiná­ria" (MS 20.287 - DF, Min. Soares Munoz, in RTJ 104/90).

A situação do recorrido assemelha-se à dos impetrantes no paradigma citado, à exceção de um fato: foi ele processado e condenado; mas, posteriormente, ao advento da Lei nU 6.683/79, foi declarado anistiado porque conexo ou relacionado o crime pelo qual fora condenado, com os delitos políticos ou de motiva­ção política contemplados no artigo lU e seu § 1!2, da referida lei.

A incidência da anistia, já agora judicialmente declarada, constitui o recorrido no direito de pleitear e obter da União Fede­ral certos efeitos administrativos, que o v. acórdão recorrido limitou aos indicados a tls. 100, infine, e 101.

Há, pois, um fato relevante desta causa, decisão judicial que se apresenta como definitiva, e declara anistiado o recorrido, que lhe facultou pedir e obter os benefícios administrativos assegura­dos na mesma Lei 6.683/79 e corretamente concedidos pela de­cisão do Egrégio Tribunal Federal de Recursos."

"Ora, como sabido, o ato de expulsão regulado na legislação militar é de execração pública degradante. Se se pode justificar a sua aplicação como ato legal em certos casos de gravidade com­provada, o de que tratam os autos é de ilegalidade flagrante. Tanto a narrativa da petição inicial como a que contém a peça informa­tiva põem às claras que o impetrante sofreu a aviltante punição, por motivo exclusivamente político.

Se antes do avento da Nova Constituição da República, as Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado promulgaram a Emenda Constitucional nU 26, que concedeu anistia a todos ser­vidores públicos civis da Administração direta e indireta e mili­tares, punidos por atos de exceção, institucionais ou complementares, ou por efeitos deles decorrentes, muito mais agora tal anistia deverá ser reconhecida pelo Poder Judiciário, considerando-se o pleno restabelecimento da democracia no País.

O artigo 8U do Ato das Disposições Constitucionais Transi­tórias em vigor dispõe categoricamente sobre o direito perseguido pelo impetrante, assim explicitado na peça vestibular (fi. 07):

" ... declarar anistiado o impetrante e determinar ao Exmo. Sr. Ministro da Aeronáutica que proceda sua reversão ao serviço ativo, ou, se outro for o interesse da administração, que o transfira

R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990. 233

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para a reserva ou o reforme, contando o tempo de serviço ativo para efeito de cálculo dos proventos da inatividade e assegurados os direitos e vantagens previstos no art. 4!!, § 3!!, da Emenda Constitucional n!! 26, de 27.11.85."

Ao relatar o Mandado de Segurança n!! 90.403 - DF, pelo voto do preclaro Ministro Moacir Catunda, decidiu o Tribunal Federal de Recursos, in verbis:

"Destina-se o benefício da anistia, entre outros, a servidores da administração direta ou indireta, punidos com fundamento em Atos Institucionais e Complementares.

Servidores da Petrobrás dispensados dos seus empregos por força de recomendação da Comissão de Investigações, instalada na empresa, e órgãos correlatos, que julgavam incoveniente a permanência deles na empresa.

A interpretação sistemática do documentário dos autos, ao enfoque dos Atos Institucionais e Complementares, demonstra a existência de irremovível nexo causal entre estes e aqueles - o que é bastante a justificar a incidência da Lei 6.683/79 - sobre os atos de dispensa - dos empregos, baixados por motivos po­líticos, todos eles, e não com base na legislação trabalhista.

Mandado de Segurança concedido para que a ilustre autori­dade impetrada conheça dos pedidos de retorno à atividade, ou se outro for o interesse da administração, os considere aposenta­dos (Lei 6.683/79 - art. 4!!)."

A punição por ato disciplinar pressupõe a prática, pelo fun­cionário civil ou militar, ele transgressão a normas estabelecidas na legislação ordinária.

A punião por ato político, de que tratam as normas consti­tucionais, resulta da prática, pelos servidores, de atividades polí­ticas contrárias ao regime eventualmente adotado pelo Governo. Quando advém punição sob o fundamento de pena meramente disciplinar, verificando-se a inadequação da norma legal de en­quadramento ao ato punitivo, ocorre apenas a prática de ato político. Torna-se ineficaz a motivação do ato administrativo. Conseqüentemente, é ilegal a aplicação da penalidade.

Travestir o ato político em ato disciplinar como pretente fazer a autoridade informante, não afasta o sentido político da punição."

"A Lei n!! 6.683, de 28.08.1979 (Lei da Anistia), é taxativa, ao dispor no § I!! do artigo I!!, verbis:

R. sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): IR9-260, ago. 1990.

"§ 1!l. Consideram-se conexos, para efeito deste artigo, os crimes de qualquer natureza relacionados com crimes políticos ou praticados por motivação política."

Embora exacerbada a expressão "crime" para o caso em exame, a amplitude dada no parágrafo à conceituação de "crime político" não deixa nenhuma brecha a que se possa considerar como pena disciplinar a que foi aplicada ao impetrante.

Finalmente, as decisões do Colendo Supremo Tribunal Fe­deral, colacionadas nos votos dos eminentes relatores dos feitos de que pedi vista, não me impressionam, porquanto divergem de outras pronunciadas no mesmo Excelso Pretório e ainda recentes. É que as causas dessa natureza devem ser consideradas caso a caso, pelo que se contenha nos respectivos autos, não existindo nos arestos colacionados uma diretriz jurisprudencial inarredável e portanto sumulável."

A conotação política da cassação do impetrante resta clara, a partir da denúncia oferecida pelo Ministério Público perante aI;!. Auditoria da Aeronáu­tica, que culminou na decisão do STM. Leio às fls. 12/13: (lê).

Face ao exposto, na linha dos julgados mencionados, concedo a seguran­ça, declarando anistiado o impetrante, assegurando-lhe as promoções na ina­tividade ao posto ou graduação a que teria direito se estivesse em serviço, obedecidos os prazos de permanência em atividade, previstos nas leis e regu­lamentos vigentes, respeitadas as características e peculiaridades da carreira, com efeitos financeiros a contar de 05.10.88.

É como voto.

VOTO

o EXMO. SR. MINISTRO ILMAR GAL VÃO: Sr. Presidente, o caráter político do ato fica evidenciado diante da aplicabilidade do Decreto-Lei n!l 864, que trancou a ação ordinária proposta perante o Foro Federal, no Rio de Janeiro. Na verdade, se não se tratasse de matéria política, essa ação não seria afetada pelo referido decreto.

De modo que acompanho em sua plenitude o voto do emitente Ministro Relator.

EXTRATO DA MINUTA

MS n!l 236 - DF - (Reg. n!l 89.11594-4) - Relator: Exmo. Sr. Min. Américo Luz. Impetrante: Luiz de Paiva Silva. Impetrado: Ministro de Estado da Aeronáutica. Advogado: Dr. Humberto Jansen Machado.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990. 235

Decisão: A Seção, por unanimidade, concedeu parcialmente a ordem (Em 05.06.90 - P. Seção).

Os Exmos. Srs. Ministros limar Galvão, José de Jesus, Garcia Vieira, Vicente Cemicchiaro e Pedro Acioli votaram com o Exmo. Sr. Ministro Re­lator.

Ausente, ocasionalmente, o Exmo. Sr. Ministro Carlos Velloso. O Exmo. Sr. Ministro Geraldo Sobral não compareceu à sessão, por

motivo justificado.

MANDADO DE SEGURANÇA N!! 257 - DF

(Registro n!! 89.0012147-2)

Relator Originário: O EX1Ilo. Sr. Ministro Garcia Vieira

Relator Designado: O Exmo. Sr. Ministro VicenteCernicchiaro

Impetrante: Marcírio de Souza Carpes

Impetrado: Ministro de Estado do Exército

Advogados: Dr. Hélio Gonçalves e outro

EMENT A: Mandado de segurança. Anistia. Efeitos fi­nanceiros. Os efeitos financeiros, no caso de anistia, nos ter­mos do art. 82 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, contam-se a partir da Constituição de 1988. O dispositivo expresso supera a restrição da Lei n2 5.021, de 9.6.66 que os limita às prestações que se vencerem a contar da data do ajuizamento da inicial.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas;

Decide aI!! Seção do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, deferir, em parte, o mandado de Segurança, para o fim de conceder as promoções até o posto de capitão, com efeitos financeiros a partir de 05.10.88, vencido, na extensão da concessão, o Sr. Ministro-Relator, que concedia a segurança em menor extensão. Vencidos, integralmente, os Srs. Mins. limar Galvão e José de Jesus, que denegavam a ordem, na forma do relatório e notas taquigtáficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

236 R. sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990.

Brasília, 17 de abril de 1990 (data do julgamento).

Ministro CARLOS VELLOSO, Presidente. Ministro LUIZ VICENTE CERNICCHIARO, Relator Designado

RELATÓRIO

o EXMO. SR. MINISTRO GARCIA VIEIRA: Marcírio de Souza Car­pes impetra Mandado de Segurança contra ato do Exmo. Sr. Ministro de Estado do Exército, o qual violou direito líquido e certo amparado na Lei 1.533/51 e artigo 8!.! do ADCT, alegando ter sido incorporado no Exército na qualidade de soldado, em 02.02.1942, tendo sido, em 30.09.1957, promovido a gradua­ção de Subtenente. Foi reformado pelo Ato Institucional n!.! 01, na graduação de Subtenente. Não fosse a quebra de sua carreira militar teria chegado ao posto de Capitão no QAO, conforme a Lei 3.222 de 21.07.57 e Decreto 41.251, de 06.09.57.

Foi anistiado pela Lei 6.683/79, mas permaneceu na mesma graduação, na reserva remunerada, não recebendo os benefícios da EC 26/85.

Após o ADCT, artigo 8!.!, requereu as promoções a que tem direito de 2!.! Tenente a contar de 25.12.64, I!.! Tenente, Capitão e Major com proventos de Tenente Coronel, conforme paradigmas indicados, tendo seis pedidos, rece­bendo indeferimento.

Neste Mandado pede as promoções de 2!.! Tenente a contar de 25.12.64, de !!.! Tenente a contar de 25.12.68 e Capitão a partir de 25.04.72, de acordo com a Lei 3.222/57 e o Decreto 42.251/57, de acordo com os paradigmas promovidos, nestas datas, assegurada a promoção de Major, conforme Lei 1.156/50, porque serviu na zona de guerra.

Liminar indeferida, fl. 153.

Informações às fls. 155/167, ressaltando que o ato atacado é o que nega ao impetrante direito à promoção, portanto outros benefícios pedidos são inadmissíveis e que inocorre presença de direito líquido e certo, devendo o pedido ser rejeitado liminarmente. Que o direito contido no ADCT, artigo 8!.! é idêntico ao que se contém na EC n!.! 26, cuidando, ambos de promoção na inatividade e que o prazo para o impetrante, começou a fluir na data da edição da EC n!.! 26.

Meritoriamente não cabe acolhimento ao pedido: O ingresso nos Quadros de Oficiais de Administração (QOA) e de Oficiais Especialistas (QOE) teve ordenamento na Lei 3.222, de 21 de Jul de 57 até 27.12.79, seguida pelo Decreto n!.! 84.333 de 20 de Dez de 79, por força do art. 14 da Lei 6.391, de 09.12.76. Não bastaria estar na ativa para receber promoção, pois, esta segue o "critério baseado na avaliação dos atributos do candidato". Promoção de

R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 1 R9-260, ago. 1990. 237

Sub tenente ao posto de 2!l Tenente só ocorre pelo critério de merecimento e ao inativo é incompatível apurar merecimento.

A Douta Subprocuradora Geral ofereceu Parecer n!l 1.752 às fls. 183/187, afastando ocorrência de decadência a Constituição de 1988, reabriu oportuni­dade para nova postulação. No mérito, entende desassistir razão ao impetrante. A promoção depende de avaliação subjetiva, não sendo automática. Se não há direito à promoção de 2!l Tenente, retira-se a liquidez e certeza para promoção ao posto superior de Capitão, concluindo pela denegação da segurança.

É o relatório.

VOTO (VENCIDO)

O EXMO. SR. MINISTRO GARCIA VIEIRA (Relator): Sr. Presidente: Não procede, a nosso ver, a preliminar de decadência, porque a vigente Cons­tituição Federal, em seu artigo 8!l do ADCT, assegurou anistia mais ampla do que as anteriores, propiciando novas pretensões. Referido dispositivo legal assegurou apenas promoções, com efeitos financeiros a partir da promulgação da Constituição e não contagem de tempo de serviço, gratificações, indeniza­ções e adicionais, como pretende o impetrante. Evidentemente, estas parcelas são indevidas, porque não asseguradas pela anistia.

O impetrante, enquanto na ativa, fez vários cursos exigidos para as promoções até Capitão, inclusive os cursos superiores, recebeu várias referên­cias elogiosas e tinha bom comportamento (doc. de fls. 31/72). Quando foi atingido pelo Ato Institucional de 09 de abril de 1964, e reformado, era Subtenente e havia concluído o curso de aperfeiçoamento de Sargento (doc. de fl. 29). Anistiado pela Lei 6.683/79, foi transferido para a reserva remune­rada como Subtenente, a contar de 12 de junho de 1980, (doc. de fls. 73). Requereu sua promoção a Capitão, com suporte no art. 8~ do ADCT, sendo seu pedido indeferido sob a alegação de que as promoções para ingresso no QAO só ocorreu pelo critério de merecimento (doc. de tl. 30). Entendemos não ter razão a digna autoridade coatora. O dispositivo constitucional, citado, ao assegurar as promoções na inatividade ao posto ou graduação a que teria direito o militar se estivesse em serviço ativo, não fez nenhuma ressalva no sentido de que as promoções só seriam por antigüidade. Exigiu apenas fossem obedecidos os prazos de permanência em atividade previstos por lei e respei­tadas as características e peculiaridades da carreira militar. Em nosso modo de ver, não procede a assertiva de que a promoção para o ingresso no QAO só pode ser por merecimento. Isto só é válido para o militar da ativa e não para o da inatividáde. Como poderia o militar, atingido por ato de exceção e transfe­rido compulsoriamente para a inatividade, demonstrar possuir requisitos exi­gidos pela lei, tais como capacidade física, em exame só aplicável em militar

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da ativa, bom comportamento, ser elogiado por sua vida militar e obter parecer favorável da comissão de promoção? É intuitivo que, quando o dispositivo constitucional citado assegura as promoções, na inatividade ao posto ou gra­duação a que teria direito se na ativa estivesse, em verdadeira ficção jurídica, admite que o militar teria obtido as mesmas promoções conferidas a seus colegas em igual situação (paradigmas), da ativa. Caso assim não fosse, só teriam sido asseguradas as promoções por antigüidade e não é esta a determi­nação constitucional. O art. 8!! do ADCT assegurou todas as promoções (anti­güidade e merecimento) a que teria direito o militar, caso tivesse permanecido na ativa. A legislação sobre anistia deve merecer interpretação ampla e não restritiva e se o legislador const~tucional fala em promoções, não se pode deduzir que sejam apenas as de antigüidade. Aliás, é este o entendimento da própria autoridade coatora que, ao prestar informações no MS n!! 156.793 -DF, impetrado por João Evangelista Mendes da Rocha, no extinto TFR (doc. de fls. 91/100), acentuou que:

"A questão de promoção é coisa diversa. Dela se ocuparam a Emenda n!! 26, de 1985, e o art. 8!! do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Como se trata de promoção atípica, que se dá na inatividade, e não na ativa, a ela não se aplica a Lei de Promoções dos Oficiais do Exército, que por se destinar uni­camente aos oficiais da ativa, contém preceitos rígidos que exi­gem a satisfação de determinados requisitos para que a promoção possa ocorrer (Lei n!! 5.821, de 10 de novembro de 1972).

Assim, para a promoção dos oficiais da ativa, a mencionada lei de promoções exige, entre outros requisitos, para ingresso em quadro de acesso, as seguintes condições: interstício, aptidão física e as peculiares a cada posto dos diferentes corpos, quadros armas ou serviços, tais como conceito profissional e conceito moral (art. 15), além dos cursos que habilitem para o acesso.

No tocante à promoção com fundamento nas citadas normas constitucionais, outra é a sistemática, não exigindo o cumprimen­to dos requisitos da Lei de Promoções de Oficiais.

Levando em conta, por isso mesmo, a dificuldade de se efetuar promoção na inatividade, o legislador constitucional, em 1985 e em 1988, assegurou promoções na inatividade "a que teriam direito se estivessem em serviço ativo".

Considerou, pois, fictamente, como no serviço ativo para o efeito tão-somente de promover na inatividade. Não falou em tempo de serviço, nem em qualquer outro favor legal."

Colegas do impetrante até mais modernos do que ele, da ativa, foram promovidos a Capitão (docs. de fls. 73/87 e 110/122). Caso o impetrante

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tivesse pennanecido na ativa, a exemplo dos paradigmas por ele apontados, teria, fatalmente recebido todas as promoções até à graduação de Capitão, porque na ativa, fez vários cursos e sempre era louvado e elogiado por seus superiores (docs. de fls. 29 e 31/72).

Conclui-se que a vigente Constituição assegurou ao impetrante as pro­moções por ele pleiteadas, inclusive a de Capitão, com efeitos financeiros a partir de 05.10.88, sendo irrelevante o fato de já ter sido beneficiado por outras anistias.

Concedo a segurança para determinar à digna autoridade coatora que conceda ao impetrante as promoções sucessivas a que tem direito, até o posto de Capitão e foram conferidas aos paradigmas, levando em conta apenas os prazos de permanência em cada graduação, previstos em lei. Efeitos financei­ros a partir da impetração.

VOTO (VOGAL)

O EXMO. SR. MINISTRO VICENTE CERNICCHIARO: Senhor Pre­sidente, no Mandado de Segurança n!2 253, de que fui Relator, examinei matéria idêntica, agora posta na segurança em julgamento.

Embora divirja na motivação, em alguns aspectos do eminente Ministro­Relator, na conclusão, estou na linha em que S.Exa. se expandiu, para conce­der, em parte, o mandado de segurança. Todavia, e aqui divirjo em parte, entendendo que as vantagens pecuniárias devam ser concedidas a partir da Constituição de 1988.

VOTO-VISTA

O EXMO. SR. MINISTRO PEDRO ACIOLI: 1 - Trata-se de mandado de segurança requerido por Marcírio de Souza Carpes contra ato do Exmo. Sr. Ministro de Estado do Exército que indeferiu pedido seu de promoção na inatividade ao posto de Capitão.

240

2 - Diz o impetrante o seguinte: (fls. 03/04)

"O impetrante nasceu em 17.09.1924, incorporou-se no Exército como soldado em 02.02.1942, iniciando, assim, sua carreira militar. Fez todos os cursos "CRAS" e outros, e exigên­cias técnicas para galgar todas as graduações e postos exigidos por leis militares e ainda se especializou no curso de Paraquedis­mo, possuindo o Curso de Mestre do Salto. Foi Cabo, 3!2 Sgt, 2!2 Sgt, 1!2 Sgt e em 30.09.1957 foi promovido à graduação de Sub­tenente.

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Sua vida militar foi uma das mais dignas, sempre elogiado pelos seus Comandantes, teve mais de 50 elogios. Como cidadão fez doações de sangue a seus semelhantes. Possuidor de curso científico (conforme suas alterações DOC fls 30/71) já na época e instrução universitária (cursos de relações humanas, lideralogia, psicologia profunda, sociologia, relações públicas, ciências so­ciais).

Com o primeiro de abril de 1964 foi reformado proporcio­nalmente ao tempo de serviço pelo Ato Institucional n!! 1, na graduação de Subtenente, sendo um dos Subtenentes mais jovens do Exército, tinha a idade de 40 anos, com estabilidade assegu­rada pela Constituição.

Quando jovem serviu em zona de guerra, na sua juventude daria a vida para salvar a Nação, por uma Lei Especial foi-lhe assegurado uma promoção no momento em que fosse reformado.

Não respondeu IPM, não foi denunciado na Justiça Militar, não respondeu investigação sumária exigida pelo ato e pelo Decreto 53.897, de 24.04.64, não teve qualquer julgamento com direito a defesa, estava no comportamento excepcional, se não fosse a perseguição política sua brilhante carreira militar, conquistada através de concursos, suas aptidões físicas, moral, profissional e técnica, que prestou à Nação foi arbitrariamente interrompida, causando sérios prejuízos morais perante sua vida civil e familiar, pelo abalo moral, psíquico e patrimonial irreparável. Ato nulo de pleno direito.

Sua carreira militar foi deixada pela metade, seu objetivo de vida inaca­bado, seus cargos, concursos, exigidos pelas leis militares, todos estes esforços físicos, intelectuais, foram frustrados. Preenchia e preenche todos os requisitos que assegura o posto de Capitão no QAO e que ficaram prejudicados, deter­minados pelas Leis 3 222, de 21.07.57, e Decreto 42.251, de 06.09.57. Possui o CAS desde 1948 (DOC fl28).

Com a Lei 6 683179, foi anistiado, não lhe concederam o status da promoção assegurada por direito adquirido pela Lei 1.156/50, só os proventos e lhe transferiram para a reserva remunerada na graduação de Subtenente e lhe concederam como tempo de serviço 40A 01M 02D (DOC fl 72).

Com a Ec 26/85, que assegurou as promoções como se na ativa estivesse permanecido, não recebeu nenhuma promoção e nenhum benefício, novamen­te negaram o seu direito adquirido de uma promoção assegurada por Lei Especial n2 1.156/50 aos que prestaram serviço em zona de guerra.

De acordo com a nova Constituição no seu art. 82 do A.D.C.T., que determinou e assegurou as promoções sendo um ato explícito, requereu os benefícios do art. 82 as promoções de 2!! Ten. a contar de 25.12.64, promoções

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sucessivas de 1 Q Ten, Capitão, a promoção especial de Major, mais de 35 anos, os proventos de TenCoronel, assegurados pelos Estatutos dos Militares e Lei de Remuneração.

Tudo conforme seus paradigmas remanescentes de menor nível hierár-quico.: (DOC fls. 73 a 79)

242

Armando Nelson Moretti - Subtenente 30.09.57 Marcírio de Souza Carpes - Subtenente 30.09.57

Osmar Ramos de Oliveira - Subtenente 31.01.58

Ermelindo Santos Crisa - Subtenente 31.01.58 Francisco da Costa Brandão - 1 Q Sgt 30.09.55

José Ferreira Guina - 1 Q Sgt 30.06.59

Alberto Alvim - 1!! Sgt 28.02.58

Israel de Souza Peixoto - 1!! Sgt 28.02.58 Tito Wilson Lobo da Silva - 1!! Sgt 28.02.58

Cita e prova que (DOC fls 80 a 86): Armando Nelson Moretti - 2!! Ten 25.12.63

Marcírio de Souza Carpes Osmar Ramos de Oliveira 2!! Ten 25.04.63 1!! ten 25.04.66

Capitão 25.04.69 Benedito Gouvea Filho mudou de QM, foi para o Quadro

de Dentista 1!! Ten 25.12.60 Capitão 25.12.63 Alberto Alvim 2!! Ten 25.04.65 I!! Ten 25.04.67 Cap

25.12.72 Israel de Souza Peixoto 2!! Ten 25.08.65 12 Ten 25.08.67

Cap 25.08.73

Tito Wila Lobo da Silva 2!! Ten 25.08.65 1 Q Ten 25.08.67 Cap 25.08.73

José Ferreira Gunia 2!! Ten 25.12.64 12 Ten 25.12.68 Cap 25.04.72

Francisco da Costa Brandão 22 ten 25.04.65 I!! Ten 25.04.67 Cap 25.08.72

Ermelindo Santos Grisa 2!! Ten 25.04.63."

3 - Vale mencionar os termos do pedido do impetrante: (fls. 23/24).

" 1) As promoções de 2Q Tenente a contar de 25.12.64, 12

Tenente a contar de 25.12.68 e Capitão 25.04.72, de acordo com a Lei 3.222/57 e o Decreto 42.251/57, de conformidade com seus paradigmas que foram promovidos nestas datas.

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2) Ao status da promoção de Major assegurado por Lei Especial nU 1.156/50, porque serviu em zona de guerra - Esta promoção é assegurada no momento de sua transferência para a reserva.

3) O tempo de serviço como determina os Estatutos dos Militares que estava em vigor na época - Lei 5.774, de 23.12.71 - arts. 139-140 e 14l.

Art. 140 - Tempo de serviço é o espaço de tempo compu­tado dia a dia entre a data de incorporação e a data-limite estabe­lecida para a contagem ou a data do desligamento do efetivo serviço, mesmo que tal espaço de tempo seja parcelado.

O Impetrante ingressou em 02.02.1942 - nasceu em 17.09.1924,"0 único requisito exigido idade de permanência em atividade" - conforme art. 102, b - Capitão - 56 anos. A compulsória o atingiria em 17.09.80 - 38A 07M 15D.

Art. 141 - V - tempo relativo a férias não gozadas, con­tado em dobro.

02A OOM OOD - já assegurado pela Lei 6.683f79,já incor-porado em seu patrimônio.

TOTAL - 40A 07M 15D 4) São direitos dos militares, LEI 5.774:

Art. 54 - H - a percepção de remuneração correspondente ao grau hierárquico superior ou melhoria da mesma, quando, ao ser transferido para a inatividade, contar mais de 35 (trinta e cinco) anos de serviço, se oficial, e mais de 30 (trinta) anos de serviço, se praça.

a - a estabilidade, quando praça com 10 (dez) ou mais anos de tempo efetivo de serviço.

5) Conforme o art. 57 clc a Lei de Remuneração geral n!.! 5.787, de 27.06.72.

5.1 Provento integral do posto imediato, ou seja, Ten.Coro-nel.

Porque Capitão situação nonnal - tem direito da promoção especial da Lei 1.156/50 - Major.

Ter mais de 35 anos - o direito do benefício da melhoria do soldo imediato que é TenCoronel.

5.2 Gratificação de tempo de serviço art. 19 e 20 da Lei 5.787 - tem o direito a 8 (oito) qüinqüênios, ou seja, 40%.

5.3 L Hab. Mil. - Decreto 96.877, de 29.09.88-art. I!.!, IH - elevado para 110%."

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5.4 I. Adic. Inat. - Decr. 96.877, de 29.09.88, art. 10, 1-55 (cincoenta e cinco por cento) quando o tempo computado for de 40 (quarenta) anos.

5.5 In. Comp. Orgânica - 10/10 de 40% do soldo do posto de Capitão - arts. 63 e 68 da Lei 5.787. Como o Impetrante serviu no Núcleo de Paraquedismo e sendo Mestre de Salto é beneficiário da gratificação".

4 - O ilustre Relator Ministro Garcia Vieira deferiu em parte o mandado de segurança, para o fim de conceder as promoções até o posto de Capitão com efeitos financeiros a partir da impetração.

5 - Já o Ministro Vicente Cemicchiaro acompanhou o Relator acrescen­tando que os efeitos financeiros se contam a partir da promulgação da Cons­tituição de 1988.

6 - A impetração está bem instruída. 7 - No precedente de minha lavra a que se refere o impetrante, procurei

objetar o alcance daquele ato, porque, como já disse, o art. 82 do ADCT, não é norma e nem preceito é um ato constitucional.

8 - O voto que expressei naquela oportunidade foi buscando o alcance do artigo e, agora, neste voto-vista, diante das preocupações da autoridade impetrada, fui buscar os precedentes do Tribunal acerca da interpretação dada ao art. 4º, da Emenda Constitucional 26/85, sobretudo porque a ela aludem as informações e o Ministério Público Federal.

9 - Ao volver sobre este tema se fez necessário conferir se havia repetição de mandados de segurança com os mesmos impetrantes, buscados no arquivo do Tribunal e nos precedentes citados.

10 - Mas, não encontrei duplicidade de pedidos, ao passo que verifiquei já existir no Tribunal interpretação fixada ao art. 4º, da EC 26/85, daí porque inicialmente faço transcrever o seu teor:

244

11 Art. 4º. É concedida anistia a todos os servidores públicos civis da Administração direta e indireta e militares, punidos por atos de exceção, institucionais ou complementares.

§ 12• É concedida, igualmente, anistia aos autores de crimes políticos ou conexos, e aos dirigentes e representantes de organi­zações sindicais e estudantis, bem como aos servidores civis ou empregados que haja sido demitidos ou dispensados por motiva­ção exclusivamente política, com base em outros diplomas legais.

§ 22• A anistia abrange os que foram punidos ou processados pelos atos imputáveis previstos no caput deste artigo, praticados no período compreendido entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979.

§ 3º. Aos servidores civis e militares serão concedidas as promições na aposentadoria ou na reserva, ao cargo, posto ou

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graduação a que teria direito se estivessem em serviço ativo, obedecidos os prazos de permanência em atividade, previstos nas leis e regulamentos vigentes.

11 - Quanto a esta norma, o Plenário do Tribunal fixou-se o alcance do parágrafo 32, do art. 42, da EC 26/85 nas coordenadas básicas de que ali não se conferiu "aos anistiados mais direitos do que antes possuíam" e que "não se previu aí a promoção dos beneficiados pela anistia ao posto ou graduação que poderiam atingir se estivessem em atividade, e sim aquilo a que teriam direito, se não houvessem sido transferidos para a reserva".

12 - Fixou-se essa tese a partir do julgamento do MS 115.109-DF, in DJ 15.10.87, no qual acentuou o Relator que:

"No mérito, penso que a interpretação dada ao § 32 do artigo 42 da Emenda 26/85, pela digna autoridade impetrada, está corre­ta.

Estavam, ambos, na reserva remunerada com a graduação de 3!! Sargento. Após a referida Emenda Constitucional, por apli­cação da anistia, foram parcialmente atendidos em sua pretensão, tendo sido contemplados, com escala sobre as graduações inter­mediárias, a Subtenentes. Daí por diante, para ingresso no Quadro Auxiliar de Oficiais (QAO), teriam os impetrantes que preencher os ryquisitos previstos nos regulamentos vigentes, como consta eXf>ressamente da ressalva constante da parte final do parágrafo 3!! do art. 4!! da Emenda Constitucional em exma. Entre esses requisitos, o Regulamento aprovado pelo Dec. 90.116, de 29.8.84, alterado pelo de n!! 92.962, de 21.7.86, estipula o critério de merecimento e a idade máxima de 53 anos, 11 meses e 29 dias, na data da promoção. Note-se que essas exigências já constavam do Dec. 90.116/84, art. 4!!, anterior à anistia, seja quanto ao merecimento, seja quanto à idade, ainda mais reduzida.

O segundo impetrante, Osvaldo Silva, atingiu a idade-limite em 13.8.85 (fi. 90). E, com relação a ambos, "se estivessem em serviço ativo" (exigência expressa da Emenda Constitucional), seria imprescindível para o ingresso no Quadro Auxiliar a apura­ção do merecimento, por critérios regulamentares, aferidos na esfera administrativa, a qual não pode ser simplesmente suprimi­da ou substituída pelo Poder Judiciário.

Não tinham, pois, se na ativa, direito líquido e certo às promoções até o posto de Capitão, no Quadro Auxiliar de Ofi-. ciais. Como a anistia concede-lhes somente "as promoções ... ao cargo, posto ou graduação a que teriam direito se estivessem em

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serviço ativo" (§ 3Q do art. 4Q da EC 26/85), a conclusão a que chego é que, por via de conseqüência, não se lhes conferiu, com a anistia, mais direito do que antes possuíam. Em outras palavras: se antes não possuíam direito líquido e certo ao ingresso no Quadro de Oficiais, continuam nessa mesma situação, após a anistia.

Diferente seria se tivessem sido colhidos pela punição quan­do já preenchidas as condições regulamentares para a promoção, o que não é o caso, como se demonstrou."

13 - Nessa linha, o impetrante deveria à data da punição estar preen­chendo as condições regulamentares para a promoção, interpretação portanto restritiva.

14 - Agora, por outro lado, se faz mister que transcreva o disposto no art. 812 e § 1 Q, do ADCT, para confronto, a fim de que se possa verificar se a interpretação a ser dada ou a firmada no precedente de que fui Relator se ajusta à "medida de interesse público, editada por generosa inspiração política e jurídica, para assegurar a paz social, apagando da memória do País fatos, considerados delituosos, em determinado momento histórico-condicionado. Assim, quer na esfera administrativa, quer na aplicação judiciária, as leis de anistia deve ter a interpretação mais ampla possível para que suas normas assumam adequação, eficácia e grandeza "in AC 83735-RJ, in DJ 28.02.85, apud voto Min. Carlos Velloso, no MS 113.488 - DF, in DJ 19.09.88.

15 - Como disse antes o texto constitucional do art. 8Q do ADCT, é do seguinte teor:

246

"Art. 8Q• É concedida anistia aos que, no período de 18 de

setembro de 1946 até a data da promulgação da Constituição, foram atingidos, em decorrência de motivação exclusivamente política, por atos de exceção, institucionais ou complementares, àos que foram abrangidos pelo Decreto Legislativo nQ 18, de 15 de dezembro de 1961, e aos atingidos pelo Decreto-Lei nQ 864, de 12 de setembro de 1969, asseguradas as promoções, na inati­vidade, ao cargo, emprego, posto ou graduação a que teriam direito se estivessem em serviço ativo, obedecidos os prazos de pennanência em atividade previstos nas leis e regulamentos vi­gentes, respeitadas as características e peculiaridades das carrei­ras dos servidores públicos civis e militares e observados os respectivos regimes jurídicos.

§ 1 Q. O disposto neste artigo somente gerará efeitos finan­ceitos a partir da promulgação da Constituição, vedada a remu­neração de qualquer espécie em caráter retroativo.

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16 - Do texto, fazendo o confronto com o da EC 26/85, art. 42, e a

interpretação fixada pelo Tribunal, vislumbro que o art. 8!!, do ADCT, contém uma pequena parte do alcance daquela norma restritiva, ao passo que esta é ampla e consagra em si mesma a própria natureza de ato administrativo.

17 - A atual disposição constitucional não é restritiva, é ampla e não sambarca a interpretação fixada pelo Tribunal nos precedentes de que mencio­nei.

18 - Mantenho o meu entendimento que esposei no MS 109 - DF, in DJ 02.10.89, que foi nessa linha.

19 - A teor do art. 82, do ADCT, a anistia é concedida a todos aqueles que foram atingidos por atos de exceção, institucionais ou complementares em decorrência de motivação exclusivamente política.

20 - Esse ato constitucional, porque assim entendo, afirma que ficam "asseguradas as promoções, na inatividade, ao cargo, emprego, posto ou gra­duação a que teriam direito se estivessem em serviço ativo".

21 - A clareza do ato não deixa dúvidas acerca do direito às promoções do impetrante.

22 - Verifico que existem as seguintes categorias de militares: a -militar da ativa; b - militar da reserva remunerada e c - militar na inativi­dade.

23 - A autoridade impetrada afirma que a promoção haveria de proceder a aferiação de certos requisitos objetivos e subjetivos, além do curso de for­mação de Sargentos.

24 - O art. 8!! do ADCT, que concede a anistia, asseguradas as promo­ções na inatividade ao posto "a que teriam direito se estivessem em serviço ativo", acrescenta que há necessidade de serem "respeitadas as características e peculiaridades das carreiras e observados os respectivos regimes jurídicos."

25 - Entendo que é melhor verificar o alcance dessas expressões cons­tantes do artigo 82 , que no seu todo, quer dizer que a anistia é concedida, está concedida, e ficam asseguradas as promoções na inatividade ao posto, gradua­ção ou cargo, só que o artigo coloca três condicionantes ao serem dadas as promoções, quais sejam, ao serem realizadas ditas promoções há de ser res­peitadas as características da carreira; há de ser respeitadas as peculiaridades da carreira; e há de ser observado o regime jurídico da carreira.

26 - Pois, para isso, há necessidade que a autoridade impetrada ao fazer as promoções na inatividade observe as características, as peculiaridades e o regime jurídico da carreira do militar na inatividade e só, nada mais.

27 - A autoridade administrativa pelo conteúdo do art. 82 do ADCT, está impedida de trazer ou invocar normas das carreiras dos militares da ativa ou da reserva remunerada, para serem aplicadas aos militares na inatividade.

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28 - Ao obedecer as características, as peculiaridades e o respectivo regime jurídico, se o impetrante, estivesse na atividade as promoções ao posto de Capitão se dariam pelo critério objetivo de antigüidade e cursos de formação e pelo critério subjetivo de merecimento e escolha.

29 - No caso o impetrante esteve fora da carreira militar por força de um ato de exceção, daí não se lhe aplicam as características, as peculiaridades e o regime jurídico atinentes ao critério subjetivo de níerecimento e escolha e ao objetivo de curso de formação, mas aplicando-se-lhe o critério objetivo de antigüidade, por estar na inatividade.

30 - Alude, ainda, o seguinte: "respeitados as características e peculia­ridades das carreiras" e, no caso, a carreira de que fez parte o impetrante é a do Quadro de Acesso, ou seja, o chamado QOA e QOE, que ao máximo os seus postulantes só chegam ao posto de Capitão, por promoção, e na inativi­dade, com os proventos de Major, acompanhando, pois, os parad!gmas.

31 - Os paradigm~s, que para o caso entendo devam ficar bem demons­trados, foram apresentados e delineados pelo impetrante, pois assim já me manifestei no MS 109 - DF, in Dl 02.10.89.

32 - Por outro lado, o § I!.! desse artigo, assegura os efeitos financeiros a partir da promulgação da Constituição de 1988.

33 - Ora, esses efeitos financeiros são aqueles decorrentes das promo­ções.

34 - As vantagens a que fez jus são apenas aquelas advindas das promoções e não genericamente como quer o impetrante.

35 - Assim, acompanho o Sr. Ministro Garcia Vieira para deferir em parte a segurança para o fim de assegurar ao impetrante as promoções até o posto de Capitão e somente as vantagens inerentes às promoções, mas com os efeitos financeiros a partir da promulgação da Constituição de 1988, na linha do entendimento do Ministro Vicente Cernicchiaro.

É como voto.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO AMÉRICO LUZ: Sr. Presidente. Concedo a segurança, nos tennos do voto eminente Ministro-Relator, agora apoiado pelo voto-vista do Sr. Ministro Pedro Acioli e, apenas faço ressalva quanto aos efeitos financeiros, que considero devidos a partir da promulgação da Consti­tuição de 1988.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO GERALDO SOBRAL: Sr. Presidente, de acordo com o Sr. Ministro Vicente Cemicchiaro.

É o meu voto.

248 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 1R9-260, ago. 1990.

VOTO (VENCIDO)

O EXMO. SR. MINISTRO ILMAR GAL VÃO: Na linha do voto que pronunciei no Mandado de Segurança n!.! 336, nesta assentada, indefiro a segurança.

VOTO (VENCIDO)

O EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ DE JESUS FILHO: Sr. Presidente. Na linha dos votos que proferi nos Mandados de Segurança n!.!s 287, 293 e 336, na assentada deste julgamento, acompanho o Exmo. Sr. Ministro Ilmar Galvão, denegando a segurança.

EXTRATO DA MINUTA

MS n!.! 257 - DF - (Reg. n!.! 89.0012147-2) - Relator Originário: O Exmo. Sr. Ministro Garcia Vieira. Relator Designado: O Exmo. Sr. Ministro Vicente Cemicchiaro. Impetrante: Marcírio de Souza Carpes. Impetrado: Mi­nistro de Estado do Exército. Advogados: Dr. Hélio Gonçalves e outro.

Decisão: Prosseguimento do julgamento, a Seção, por maioria, deferiu, em parte, o mandado de segurança, para o fim de conceder as promoções até o posto de capitão, com efeitos financeiros a partir de 05.10.88, vencido, na extensão da concessão, o Exmo. Sr. Ministro-Relator, que concedia a seguran­ça em menor extensão. Vencidos, integralmente, os Exmos. Srs. Mins. Ilmar Galvão e José de Jesus, que denegavam a ordem. CF Seção - 17.04.90).

Os Exmos. Srs. Mins. Pedro Acioli, Américo Luz e Geraldo Sobral votaram com o Exmo. Sr. Min. Vicente Cemicchiaro, que lavrará o acórdão.

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Min. CARLOS VELLOSO, em razão da ausência justificada do Exmo. Sr. Min. Armando Rollemberg.

-+

MANDADO DE SEGURANÇA N!.! 307 - DF

(Registro n!.! 90.366-0)

Relator: OExmo. Sr. Ministro José de Jesus Filho Impetrante: Antônio de Menezes Seródio

Impetrado: Ministro de Estado da Aeronáutica

Advogados: Drs. Sérgio Luiz Fernandes de Mello e outro

R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2( 12): 1 R9-260, ago. 1990. 249

EMENTA: Mandado de Segurança. Militar. Anistia. Promoção na inatividade. Sargento Aviador. Lei n2 4.162/42.

I - O militar que teve seu Curso de Sargento aviador interrompido com a Intentona Comunista de 1.935, mas re­conhecido como concluído e promovido à graduação respec­tiva, preenche os dispositivos da Lei n2 4.162/42 e faz jus às promoções aos postos subseqüentes.

11 - Segurança concedida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas.

Decide a 1!! Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, deferir o mandado de segurança, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 5 de junho de 1.990 (data do julgamento).

Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente. Ministro JOSÉ DE JESUS FILHO, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ DE JESUS FILHO: Antônio de Me­nezes Seródio impetrou mandado de segurança contra ato do Exmo. Sr. Mi­nistro de Estado da Aeronáutica que indeferiu requerimento administrativo no qual postulava promoção até o posto de Capitão, com base no artigo 82 do A.D.C.T. da Constituição Federal de 1988.

Aduz o Impetrante que em 30.04.34 ingressou na Força Aérea como aluno da 8!! Turma do Curso de Sargento Aviador a antiga Escola de A viação Militar, tendo concluído o Curso, estando apto a atingir o posto de 32 Sargento. Por ter participado do movimento de 1935 (Intentona Comunista) foi expulso da Arma, através do Aviso n2 33 de 27 de dezembro de 1935, da lavra do então Ministro da Guerra. Alega que, com o advento da Constituição de 1988, pelo seu artigo 82 do A.D.C.T., faz jus à promoção até o posto de Capitão, baseando sua afirmativa na abrangência a que está submetido tendo como relação o Decreto Legislativo n2 18/61. Por isto requereu administrativamente tal bene­fício e no processo foi exarado o seguinte despacho: "Deferido. À DIRAP para a expedição dos atos necessários". Ocorre que "a DIRAP, através do seu Diretor, pela Portaria n2 520/DAP, de 09 de maio de 1989, em síntese, notificou ter sido o Impetrante incluído na Reserva Remunerada, a contar de 27.07.60,

250 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990.

data em que atingiu a idade limite de permanência no serviço ativo, ficando promovido à categoria de Terceiro-Sargento, de acordo com o artigo I!! da Lei 1.156, de 12 de julho de 1.950 e à graduação de Segundo-Sargento, de confor­midade com o artigo 51 § 2!! da Lei 2.370, de 09 de dezembro de 1.954, visto possuir mais de 25 (vinte e cinco) anos de efetivo serviço e haver servido em zona de guerra.

Pela mesma Portaria ficou constatado que a partir de 27.07.72 foi o Impetrante reformado por ter atingido a idade limite de permanência na reserva remunerada, de conformidade com o artigo 26, letra b da Lei n!! 4.902, de 16 de dezembro de 65". Irresignado, dirige novo requerimento ao Sr. Ministro, que também foi indeferido, tendo o seguinte teor o despacho indeferitório:

"0 Decreto-Lei n!! 4.162, de 09 de março de 1942 não estava em vigor na data em que o requerente foi incluído na reserva remunerada, por ter atingido a idade limite para permanêncià no serviço ativo ... "

Impetra, então, a presente segurança sustentando que fora incluído na reserva remunerada a contar de 27 de julho de 1960, data esta em que deveria estar no posto de Capitão. Cita a pessoa do Capitão Antônio Frederico Luvizaro como paradigma para o correto estabelecimento do posto.

Prestando as informações, o Exmo. Sr. Ministro da Aeronáutica argu­menta que o Impetrante, ao ser anistiado e incluído na inatividade na graduação de Segundo Sargento, o foi com base na legislação vigente à época em que atingiu a idade limite de permanência na ativa e na reserva remunerada (art. 51, § 2!! da Lei n!! 2.370/54 e art. 26, b, da Lei n!! 4.902/65). Esclarece, ainda, que não foi também promovido à graduação de Terceiro Sargento, uma vez que não concluiu o Curso de Formação de Sargento da extinta Escola de Aviação Militar. Portanto, o indeferimento à pretensão do Impetrante, quanto à promoção ao posto de Capitão, deve-se ao fato deste não preencher os requisitos do parágrafo único do art. 253, da Lei n!! 4.162/42.

A douta Subproduradoria-Geral da República opina pela denegação de segurança, citando, para tanto, precedente do extinto T.F.R.

É o relatório.

VOTO

EMENTA: Mandado segurança. Militar. Anistia. Promoção na inatividade. Sargento aviador. Lei n!! 4.162/42.

I - O militar que teve seu Curso de Sargento aviador interrompido com a Intentona Comunista de 1.935, mas reconhe­cido como concluído e promovido à graduação respectiva, preen­che os dispositivos da Lei n!! 4.162/42 e faz jus às promoções aos postos subseqüentes.

R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990. 251

II - Segurança concedida.

o EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ DE JESUS FILHO (Relator): Confor­me relatado, o Impetrante com a superveniência da Constituição Federal de 1988, com fundamento no art. 8!.! de seu A.D.C.T. requereu as promoções na inatividade, mas somente obteve até a graduação de 2!.! Sargento e considerado transferido para a reserva remunerada em 24.2.70, data em que atingiu a idade limite de permanência no serviço ativo e, finalmente, considerado reformado a partir de 27.7.72 por'ter atingido a idade limite de permanência na reserva remunerada.

Mas, informa a autoridade impetrada que o Impetrante só teria direito à promoção aos postos subseqüentes até o de Capitão, caso houvesse concluído o Curso de Formação de Sargentos e galgado a graduação de Terceiro Sargen­to, não preenchendo, assim, os requisitos do parágrafo único do art. 253 da Lei n!.! 4.162, de 19.3.42 (fi. 42).

Os autos provam que o Impetrante integrava a 8i! Turma do Curso de Sargento Aviador e da mesma forma que esse Curso encerrou-se em 30.11.35, três dias após ter eclodido o movimento comunista do qual participara o Impetrante, conforme documento fornecido ao ex-aluno Newton Rodrigues Chaves, visto à fi. 20, atestando ter ele coricluído o Curso, do que se conclui que o Impetrante também o concluiu.

Ressalte-se, por oportuno, que o único motivo impeditivo das promoções, segundo a autoridade impetrada, era a conclusão do Curso e a graduação de Terceiro Sargento. A prova desses fatos está comprovada inclusive com a promoção de Antônio Frederico Luvizaro, integrante da mesma Turma, ao posto de Capitão em maio de 1.951.

Afastados os óbices, tem o Impetrante direito à promoção pretendida. Isto posto, concedo a segurança.

EXTRATO DA MINUTA.

MS n2 307 - DF - (Reg. n2 90.366-0) - Relator: Exmo. Sr. Ministro José de Jesus Filho. Impetrante: Antônio de Menezes Seródio. Impetrado: Ministro de Estado da Aeronáutica. Advogados: Drs. Sérgio Luiz Fernandes de Mello e outro.

Decisão: A Seção, por unanimidade, deferiu o mandado de segurança. (li! Seção, em 5.6.90)

Os Exmos. Srs. Ministros Garcia Vieira, Vicente Cernicchiaro, Carlos Velloso, Pedro Acioli, Américo Luz e Ilmar Galvão votaram como o Exmo. Sr. Ministro Relator.

252 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990.

o Exmo. Sr. Ministro Geraldo Sobral não compareceu à Sessão por motivo justificado.

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro ARMANDO ROLLEM­BERG.

-+-

MANDADO DE SEGURANÇA N!! 325 - DF

(Registro n!! 9008298)

Relator: a Exmo. Sr. Ministro Geraldo Sobral

Impetrante: afta Giraldes

Impetrado: Ministro de Estado da Aeronáutica

Advogados: Dr. Sérgio Luiz Fernandes de Mello e outro

EMENTA: Mandado de segurança. Anistia. Ato excep­cional. CF 1988, art. 8!!, A.D.C.T.

I - Havendo o cristalino entendimento de que existente postergação ou indeferimento de direitos, pela administra­ção, com fundamento em ato de excessão, impõe-se o reco­nhecimento, pelo Judiciário, da prevalência da Lei Maior, que preconiza ampla anistia.

11 - Segurança concedida. lU - Precedentes.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide aI;! Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, deferir o Mandado de Segurança, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 24 de abril de 1990 (data do julgamento).

Ministro CARLOS VELLOSO, Presidente. Ministro GERALDO SO­BRAL, Relator.

R. sup. Trib. Just., Brasília,2(12): 189-260, ago. 1990. 253

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO GERALDO SOBRAL: Cuida-se de mandado de segurança impetrado por Otto Giraldes, militar reformado, contra ato do Exmo. Sr. Ministro da Aeronáutica, aos seguintes fundamentos:

Que ingressou na antiga Escola de Aviação Militar como aluno da 8i! Turma do Curso de Sargento Aviador, em 30.4.1934, concluindo indigitado curso quando sobreveio a "intentona comunista" e, cumprindo ordem hierár­quica, no estrito cumprimento do dever legal, participou do referido movimen­to, no que dimanou na expulsão das fileiras militares, expulsão essa convertida, posteriormente, em exclusão, através do Aviso n!! 33, de 27 de dezembro de 1935.

Que com o advento da Constituição Federal de 1988, e com arrimo no que dispôs o art. 8!! de seu ADCT, requereu a promoção na inatividade, obtendo, administrativamente, apenas, a graduação de 2!! Sargento. Todavia, entende que a promoção a que faria jus seria a do posto de Capitão, conforme requereu. Traz, a seu prol, paradigma que elege, o do Capitão Antonio Frede­rico Luziaro. Cita, ainda, a seu favor, decisão desta colenda Corte, proferida no MS n!! 109 - DF (8975020), proferida em 27.6.89.

Solicitadas as informações, prestou-as a ilustre autoridade coatora adu­zindo, em síntese, que:

254

"Foi o impetrante reformado a contar de 11.3.71, por ter atingido a idade limite de permanência na reserva remunerada, fundamentado no art. 26, letra d da Lei n!! 4.902; de 16.12.65.

Ressalte-se que, ao ser anistiado e incluído na inatividade na graduação de Segundo Sargento, o foi com base na legislação vigente na época em que atingiu a idade limite de permanência na ativa e na reserva remunerada.

Ainda, não foi promovido à graduação de Terceiro Sargento na ativa, uma vez que não concluiu o Curso de Formação de Sargento da extinta Escola de Aviação Militar.

Observe-se, ainda, que pretende o:impetrante ser beneficia­do com a promoção ao posto de capitão, na inatividade, com base no art. 253, do Decreto-Lei n'1 4.162, de 19.3.42, o qual foi revogado pela Lei n!! 1.316, de 20.1.51, invocando, ainda, a Lei n!! 288, de 8.6.48.

Vê-se, portanto, que o impetrante só teria direito à promoção ao posto de Segundo Tenente, caso houvesse concluído o Curso de Formação de Sargentos, e galgado a graduação de Terceiro Sargento, o que não ocorreu."

R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990.

Nesta instância, a douta Subprocuradoria-Geral da República, em o seu parecer, opinou pela delegação da segurança.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO GERALDO SOBRAL (Relator): O art. 8!! da ADCT, Constituição Federal de 1988, prescreve:

"Art. 8!! - É concedida anistia aos que, no período de 18 de setembro de 1946 até a data da promulgação da Constituição, foram atingidos, em decorrência de motivação exclusivamente política, por atos de excessão, institucionais ou complementares, aos que foram abrangidos pelo Decreto Legislativo n!! 18, de 15 de dezembro de 1961, e aos atingidos pelo Decreto-Lei n!! 864, de 12 de setembro de 1969, asseguradas as promoções, na inati­vidade, ao cargo, emprego, posto ou graduação a que teriam direito se estivessem em serviço ativo, obedecidos os prazos de permanência em atividade previstos nas leis e regulamentos vi­gentes, respeitadas as características e peculiaridades das carrei­ras dos servidores públicos civis e militares e observados os respectivos regimes jurídicos."

Resta saber, por primeiro, se o impetrante cursou e concluiu o curso de sargento. A ilustre autoridade coatora, em suas informações, diz que não; O A., de sua vez, na exordial, afirma que sim. Vejamos: consoante cópia anexada a fI. 19, o Boletim n!! 08, de 10.01.35, traz certa a inclusão do impetrante no aludido Curso, dentro da especial idade de "Técnico de Aviação", figurando no 7!! lugar. O curso, ao que se infere da documentação ínsita à fI. 23, teve início em 30.04.34 e teve conclusão em 30.11.35. Quer dizer, o impetrante, que fez parte dessa 8l!. Turma, concluiu mesmo o Curso a que se submetera, esperando, apenas, a sua Classificação quando eclodira o movimento que o afastou das Forças Armadas.

Vendo a relação dos seus antigos companheiros de farda, que fizeram o mesmo Curso, tem-se que o paradigma trazido aos autos pelo impetrante, Antonio Frederico Luziaro, de n!! 12 na sua especialidade (Rádiotelegrafista), logrou atingir o posto de Capitão, conforme Decreto de 25 de fevereiro de 1953.

Como visto, ao paradigma referido amolda-se ° impetrante. Demais disso, em caso análogo, esta egrégia Seção, julgando o MS n!! 109-DF (8975020), em sessão de 29 de agosto do ano próximo passado, à unanimidade, concedeu a segurança. O voto condutor, da lavra do eminente Ministro Pedro Acioli, Relator, ficou assim ementado:

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990. 255

"Mandado de segurança. Anistia. Ato excepcional. CF. 1988. Art. 8!.! A.D.C.T.

I - Havendo o cristalino entendimento de que existente postergação ou indeferimento de direitos, pela administração, com fundamento em ato de exceção, impõe-se o reconhecimento, pelo Judiciário da prevalência da lei maior, que preconiza ampla anistia.

II - Segurança concedida. Assim sendo, ao que tenho, impõe-se a concessão da segurança, como

pedida." Concedo a segurança. É o meu voto.

EXTRATO DA MINUTA

MS n!.! 325 - DF - (Reg. n!.! 9008298) - Relator: O Exmo. Sr. Min. Geraldo Sobral. Impetrante: Otto Giraldes. Impetrado: Ministro de Estado da Aeronáutica. Advogados: Dr. Sérgio Luiz Fernandes de Mello e outro.

Decisão: A Seção, por unanimidade, deferiu o Mandado de Segurança (Em 24.04.90 - 1;! Seção).

Os Exmos. Srs. Ministros limar Galvão, José de Jesus, Garcia Vieira, Vicente Cernicchiaro, Pedro Acioli e Américo Luz votaram com o Exmo. Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Exmo. Sr. Ministro Armando Rollemberg.Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro CARLOS VELLO­SO.

256

• MANDADO DE SEGURANÇA N!.! 345 - DF

(Registro n!.! 90.00012.210)

Relator: Exmo. Sr. Ministro Américo Luz

Impetrante: Benedito Massey

Impetrado: Ministro de Estado da Justiça

Advogados: Dr. Nelson Antônio Ramos Júnior e outro

EMENTA: Administrativo. Mandado de Segurança. Despachante. Proibição de sua atuação em Órgão Ministe­rial.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990.

Legalidade do ato praticado pela autoridade impetrada proibindo, preventiva e temporariamente, a presença de pro­fissional no âmbito da repartição pública, até que se apure, nos inquéritos instaurados, a sua participação em fraude na obtenção de certificados de permanência de estrangeiros no Brasil.

Ausência de direito líquido e certo. Mandado de segurança indeferido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a P Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, indeferir o mandado de segurança, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 26 de junho de 1990 (data do julgamento).

Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente. Ministro AMÉRI­CO LUZ, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO AMÉRICO LUZ: Concluindo pelo inacolhi­mento da pretensão deduzida pelo autor, assim sumariou a espécie, em seu parecer, o Subprocurador-Geral da República Dr. José Arnaldo da Fonseca (fls. 27/28):

"Benedito Massey, sob a qualificação profissional de des­pachante, irresigna-se contra ato do Ministro da Justiça, que proi­biu a sua atuação direta ou por interposta pessoa, no âmbito da Pasta Ministerial, por envolvimento com pessoas indicadas em processos de permanência de estrangeiros, acoimados de frauda­dos. O ato de natureza cautelar decorrera de conclusões e propo­sições da Comissão destinada a proceder a sindicância. Em resumo, diz atentar o ato contra o disposto no art. 52, inc. XIII e LIV, da C. Federal.

Nas informações prestadas, aduziu a autoridade impetrada, em abreviado, que o ato proibindo a atuação do autor, na condição de despachante, de modo algum reveste-se de arbitrariedade, ilegalidade ou abuso de poder. Visou a resguardar o interesse maior da Administração, afastando indébita interferência de pes-

R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2( 12): 189-260, ago. 1990. 257

Relatei.

soa estranha aos quadros de servidores do Ministério, na apuração dos fatos objeto da Sindicância, e a preservar a imagem e o nome da instituição que está a dirigir."

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO AMÉRICO LUZ (Relator): Assim opina, sobre a questão, o órgão do Ministério Público Federal (fls. 28/29):

258

A Comissão de Sindicância, ao justificar a sugestão de afas­tamento do impetrante, assim se pronunciou:

"Cumpre esclarecer, ainda, que o acompanhamento do trâ­mite de processos no âmbito da Administração Pública cabe ao interessado ou seu Procurador constituído legalmente, o que não é o caso do Sr. BENEDITO MASSEY que se diz despachante, vez em que nenhum processo dos quase 400 analisados, não aparece nenhum mandato de Procuração de impetrante, não aten­dendo, dessa forma, as qualificações profissionais que a lei esta­belece.

- Além do mais, por sugestão da mencionada Comissão de Sindicância, o Senhor Ministro da Justiça, através da Portaria n2

40, de 18.01.90, constituiu a Comissão de Inquérito Administra­tivo "para apurar a responsabilidade funcional do Servidor SÉR­GIO GUARINON CORRÊA e de quem tenha concorrido com o mesmo para prática de irregularidades e obtenção de vantagem ilícita quanto a concessão de pedidos de pennanência definitiva no País".

Verifica-se, portanto, a existência de fortes indícios de prá­tica atos ilícitos na obtenção de certificados de permanência de estrangeiros no Brasil, objeto já de inquéritos administrativo e policial.

Ora, a medida de afastamento do despachante, em caráter preventivo, que atuava na área em que se levantou a suspeita de fraude, não viola o livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, nem desobedece ao princípio do devido processo legal, eis que, sendo cautelar, poderá ser restabelecido se ficar compro­vada a sua não participação nos fatos, o que se dará no curso dos processos instaurados, nos quais ser-lhe-á facultado exercer o direito de defesa.

É dever do Administrador Público zelar pelo respeito, dentre outros, aos princípios de legalidade e moralidade, cabendo-lhe,

R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990.

nesse sentido, encetar providências. No caso, qual visto, trata-se de afastar, preventivamente e temporariamente, pessoa estranha ao serviço público envolvida com servidores da Secretaria de Estado em fraude na obtenção de permanência de alienígenas.

Sob duplo aspecto é salutar a providência:

a) afasta dali participação entendida perniciosa e em prejuí­zo do poder público;

b) evita eventual interferência no andamento dos trabalhos de apuração.

Ademais, convém referir que "em nenhum processo dos quase 400 analisados, não aparece nenhum mandato de Procura­ção do impetrante", o que denota sua atuação irregular, e não com o despachante.

Desse modo, não há como prover a pretensão deduzida." Adotando como razões de decidir a fundamentação supra, denego a

segurança.

VOTO VISTA

o EXMO. SR. MINISTRO ILMAR GAL VÃO: Sr. Presidente, trata-se de um despachante que teve suas atividades restringidas pelo Ministro da Justiça, que o impediu provisoriamente de exercer essa atividade no âmbito daquele Ministério.

Pedi vista, exclusivamente, para verificar se a atividade de despachante era regulamentada por lei, porque entendo que, nesse caso, a eventual punição só poderia partir do respectivo órgão de classe, como é o caso, por exemplo, dos advogados que só podem ser punidos pela Ordem dos Advogados do Brasil. Não há como uma autoridade administrativa punir um advogado, im­pedindo-o de exercer a profissão no âmbito de qualquer repartição pública.

Verifiquei, entretanto, que se trata de atividade não regulamentada, ha­vendo tentativa nesse sentido, ainda em curso no Congresso Nacional. Por ora, existe a regulamentação da atividade de despachantes aduaneiro, que tem seus estatutos.

Portanto, Sr. Presidente, tratando-se de exercício de atividade que não está sujeita a qualquer regulamentação, nada impede que uma autoridade administrativa evite, provisoriamente, a presença desse profissional no âmbito de sua repartição pública. Entendo, também, como o Eminente Relator, ser legal a providência tomada pela autoridade, impedindo o Impetrante ele acom­panhar processos no âmbito do Ministério, até que se apure ato ilícito em que esteja envolvido.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 189-260, ago. 1990. 259

Assim, por não reconhecer direito líquido e certo ao Impetrante, voto pela denegação da segurança.

VOTO-VOGAL

O EXMO. SR. MINISTRO VICENTE CERNICCHIARO: Sr. Presiden­te, acompanho o Eminente Relator, acrescentando que o órgão público, inclu­sive por força de mandamento constitucional, há de zelar pela moralidade administrativa. Imputando a terceiros atos de improbidade, evidentemente, poderá impedir a atuação abusiva. Recordo, no voto do Eminente Relator, a referida decisão precedida de investigação.

De modo que estou de acordo com o Sr. Ministro-Relator.

EXTRATO DA MINUTA

MS n!! 345 - DF - (Reg. n!! 90.00012.210) - Relator: O Exmo. Sr . . Ministro Américo Luz. Impetrante: Benedito Massey. Impetrado: Ministro de Estado da Justiça. Advogados: Dr. Nelson Antônio Ramos Júnior e outro.

Decisão: Após os votos dos Exmos. Srs. Ministros Américo Luz (Relator) e Geraldo Sobral, denegando o mandado de segurança, pediu vista o Sr. Ministro lImar Galvão. Aguardam os Srs. Ministros José de Jesus, Garcia Vieira, Vicente Cemicchiaro e Pedro Acioli. (111 Seção - 19.06.90).

Prosseguindo no julgamento, a Seção, por unanimidade, indeferiu o man­dado de segurança. (F Seção 26.06.90).

Os Exmos. Srs. Ministros lImar Galvão, Garcia Vieira, Vicente Cemic­chiaro e Pedro Acioli votaram com o Sr. Ministro Relator.

O Exmo. Sr. Ministro José de Jesus não compareceu à sessão por motivo justificado.

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro ARMANDO ROLLEM­BERG.

260 R. Sup. Trib. Just, Br.lsilia, 2( 12): 189-260, agu. 1990.

RECURSO ESPECIAL - EMBARGOS E MEDIDAS CAUTELARES

RECURSO ESPECIAL N~ 460 - MG

(Registro n~ 89.0009204-9)

Relator: Ermo. Sr. Ministro José Dantas

Recorrente: Carlos Antônio Alves de Oliveira

Recorrido: Ministério Público do Estado de Minas Gerais

Advogados: Drs. Décio Fulgêncio Alves da Cunha e Henrique Fonseca de Araújo

EMENTA: Criminal. Pronúncia. Homicídio qualifica­do. Recurso especial. Dissimulação. Não há conhecer de re­curso especial cujo fundamento pressupõe incontroverso determinado fato realmente duvidoso, no caso, a maneira afrontosa e não a disfarçadamente amistosa como o réu abor­dou a vítima.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a 5;! Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 6 de dezembro de 1989 (data do julgamento).

Ministro JOSÉ DANTAS, Presidente e Relator.

R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 263

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ DANTAS: Trata-se de recurso extraor­dinário convertido em especial (fl. 105), via do qual o recorrente acima refe­renciado alega violação do inciso IV do § 2!l do art. 121 do Cód. Penal, e divergência jurisprudencial a propósito de sua interpretação tocante à qualifi­cadora da dissimulação.

Ao que se sustenta contra o acórdão proferido em grau de embargos infringentes pela Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, não seria o caso daquela qualificadora, pois, que, em síntese, a rigor da doutrina e da jurisprudência cotejada, com simulação não age quem como o recorrente se encontrava em avançado estado de embriaguês alcoólica e, a voltar ao local do desentendimento com a vítima, dá-lhe um tapa no rosto, para só então alvejá-la; tapa que, ao invés de dissimular, muito ao contrário, serviu de aviso e premonição do intento hostil. Ler-se (fls. 286/89).

Admitido e processado o recurso, nesta instância oficiou o Subprocura­dor-Geral da República Haroldo da Nóbrega, nestes termos:

"Entendo que o recurso não merece conhecido e se conhe­cido não deve ser provido.

Com efeito, através do recurso especial visa o legislador­constituinte a uniformizar a interpretação e aplicação do direito federal.

Assim, nada obsta a que esse Colendo Tribunal, no exame do recurso Especial, se sirva da farta jurisprudência, inclusive sumulada, que o Excelso Pretório construiu em torno do RE.

Sem dúvida, a concordância ou discordância do pedido for­mulado no recurso especial demanda análise aprofundada de provas. Só perquirindo profundamente a prova produzida no po­der-se-á ou não pela manutenção da qualificadora incluída na pronúncia, pelo Magistrado processante do feito (qualificadora da dissimulação).

Assim, com respaldo na Súmula 279 do excelso Pretório, opino no sentido de que não se conheça do recurso. Se conhecido, opino no sentido de que se lhe negue provimento." - tl. 113.

Anoto o recebimento de um bem-lançado memorial do ilustre advogado Henrique Fonseca (só agora constituído para a causa), que acredito também ter chegado às mãos de Vossas Excelências.

Relatei.

264 R. sup. Trih. Jusl., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ DANTAS (Relator): Senhores Minis­tros, consulte-se a versão dos fatos, preferida desde a sentença e afinal admitida pelo acórdão, com força na prova dos autos, segundo o voto condutor, lavra do Desembargador Sebastião Rosenburg. Ei-Ia:

" ... E, esse meu entendimento se baseia na prova dos autos; de fato, segundo se vê da leitura dessa, Carlos Antônio Alves de Oliveira havia tido uma briga com a vítima Marcelo David Jorge, v. "Marcelino Capacete", tendo sofrido hematomas e escoriações, sendo a briga contida pelos demais freqüentadores do "Bar do Lulu", local onde se deram os fatos; Carlos, então, vai ao aparta­mento de Júlio César Diniz Viana, seu amigo, e conta-lhe o que havia ocorrido; este, vendo-o alcoolizado, oferece seus préstimos para levá-lo em casa, e, quando se dispunha a fazê-lo, Carlos desce do carro e volta ao interior do bar do Lulu, tendo, logo depois, sido detonado o tiro contra a vítima.

Assim, vê-se que, terminado o entrevero, Carlos Antônio, ora embargante, vai ao apartamento do amigo, arma-se e volta ao local onde se encontrava Marcelo, a vítima, e, ali, aproximando­se dessa, dá-lhe um "tapa" amistoso na nuca, parecendo mais uma saudação que uma agressão, e, ato contínuo, saca da arma que portava, disfarçadamente, e desfere um tiro contra sua vítima; ora, tal narrativa ressai da prova dos autos, e, demonstra que, de fato, o ora embargante dissimulou sua intenção com relação à vítima; se assim não fosse, teria chegado ao bar, e, tão logo avistasse a vítima, teria lhe disparado o tiro; porém, chegou-se à vítima, bateu em sua nuca, como se nada houvesse entre eles, e, de repente, saca do revólver que escondera sob a camisa e desfere o tiro mortal.

Com tal atitude, o que não poderia a vítima, nunca pensar é que o embargante ali estivesse para matá-Ia. Não há dúvida quan­to à dissimulação empregada por aquele." - fls. 281/82.

A partir dessa consulta, veja-se que toda a controvérsia abordada pelo recorrente quanto à dissimulação, tanto sob enfoque da letra a como da letra c do novo permissivo constitucional, mescla-se indissociavelmente com o reexame do fato acolhido pela defesa como aviso ou premonição, advertida a vítima da intenção hostil do réu; isto é, o fato daquele "tapa no rosto", segundo sua versão, ou o testemunhado fato de aproximar-se da vítima e dá-lhe um "tapa" amistoso na nuca, parecendo mais uma saudação que uma agressão, para então sacar da arma que disfarçadamente portava, versão acolhida pelo v. acórdão.

R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 265

Acontece que essa reconstituição factual, requerida a termo de preferên­cia por uma ou outra das feições da prova contrastada, consabidamente não se comporta nos limitados traços do recurso especial.

Com efeito, no caso de que se trata, cumpriria medir-se, por exemplo, a pertinência da invocada divergência interpretativa do conceito da dissimulação qualificadora do homicídio como sendo " a ocultação da intenção hostil" (TJSP, in RT 29/364), ou quando a ação do réu torna difícil ou impossível a defesa da vítima (TJPR, EP, 1983/40), para citar apenas os dois precedentes invocados em condição de justi ficar o recurso. Mas, para tanto, certamente que se teria de voltar àquele ponto de partida: a ponderação da prova do fato que antecedeu a agressão fatal - lllll tapa na cara, ofensiva e provocadora (no dizer do réu), ou "um tapa na nuca", gesto amistoso e cordial, seguido do disparo da arma cujo porte disfarçava (ao ver testemunhal que o recorrente contesta, mas que o acórdão louvou como verossímil).

Há, pois, invencível óbice ao conhecimento do recurso, qual o da contro­vertida questão de fato, cuja pacificação, agora incabível, houvesse de pressu­por assento para a tese jurídica pretendida aplicar-se a peso de contrariedade ou negação de vigência ao inciso IV do § 2~ do art. 121 do Cód. Penal, ou ainda de interpretação divergente.

Pelo exposto, não conheço do recurso.

VOTO (VOGAL)

o EXMO. SR. MINISTRO FLAQUER SCARTEZZINI: Senhor Presi­dente, em primeiro lugar, gostaria de ressaltar o brilhante trabalho apresentado pelo ilustre advogado em seu memorial que muito me impressionou.

Entretanto, com a devida vênia, o recurso especial não se presta para uniformização da interpretação ou aplicação do Direito Federal. Se fosse tão-somente a valoração jurídica da prova estaria de acordo para conhecer o recurso mas, no caso, não nos cabe o reexame da prova.

Por isso, Sr. Presidente, acompanho V. Exa.

É como voto.

EXTRATO DA MINUTA

REsp n~ 460 - MG - (Reg. n~89.0009204-9) - Relator: Exmo. Sr. ministro José Dantas. Recorrente: Carlos Antônio Alves de Olivei~a. Recorri­do: Ministério Público do Estado de Minas Gerais. Advogados: Drs. Décio Fulgêncio Alves da Cunha e Henrique Fonseca de Araújo.

Decisão: A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso (5i! Turma, em 06.12.89).

266 R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Votaram de acordo os Exmos. Srs. Ministros Flaquer Scartezzini, Costa Lima e Assis Toledo. Ausente o Exmo. Sr. Ministro Edson Vidigal.Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro JOSÉ DANTAS .

• RECURSO ESPECIAL N~ 507 - SP

(Registro n~ 89.0009306-1)

Relator: EX11Io. Sr. Ministro Assis Toledo

Recorrente: Ministério Público do Estado de São Paulo

Recorrido: Valte11lilsoll José da Silva

Advogados: Drs. Faisal Ali Rallladan e outros

EMENTA: Direito Penal. Crime Continuado. Caracte­rização. Exigência de unidade de desígnio ou dolo total. Si­tuação atual perante a doutrina e a Nova Parte Geral. Insuficiência de teoria objetiva pura. Atenuações pela juris­prudência. Teoria mista que conjuga elementos objetivos com o elemento subjetivo do agente.

Para a caracterização do crime continuado torna-se ne­cessário que os atos criminosos isolados apresentem-se enla­çados, os subseqüentes ligados aos antecedentes (art. 71 do CP: "devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro"), ou porque fazem parte do mesmo projeto criminoso, ou porque resultam de ensejo, ainda que fotuito, proporcionado ou facilitado pela execução desse projeto (aproveitamento da mesma oportunidade).

Recurso especial do Ministério Público conhecido e pro­vido para restabelecer-se a sentença que negou a continuida­de delitiva em caso de criminosos reconhecidos como habituais, os quais, com reiteração, praticaram roubos autô­nomos, contra vítimas diferentes, emhora na mesma Comar­ca e em curto espaço de tempo.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a Si!. Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar provimento ao recurso, para reformar o acórdão recorrido e restabelecer a

R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 267

sentença de primeiro grau, na forma do relatório e notas taquigráficas cons­tantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 20 de novembro de 1989 (data do julgamento).

Ministro JOSÉ DANTAS, Presidente. Ministro ASSIS TOLEDO, Rela-toro

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO ASSIS TOLEDO: Valtemilson José da Silva viu indeferido pedido de unificação das penas que lhe foram impostas em duas ações penais, ambas por roubo e estupro, praticados com intervalo de dez dias, na mesma cidade, contra vítimas diferentes.

A 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, dando pro­vimento parcial ao agravo interposto pelo requerente, assim se expressou:

"

Pesem embora, o pronunciamento do ínclito Procurador de Justiça e as reiteradas decisões da Suprema Corte, entendendo obrigatória a presença daquela situação especial conjugadora dos diversos delitos para configurar-se a continuidade, que poderia ser traduzida como unidade de propósito ou ideação, entende a turma julgadora que, tendo o Código Penal declaradamente ado­tado a teoria objetiva pura, na conceituação do "crime continua­do", não há que se distinguir entre habitualidade e continuidade, palavras sinônimas, uma vez presentes os requisitos objetivos especificados no art. 71 da lei penal substantiva.

Considerando presentes tais requisitos, em relação aos de­litos de roubos, praticados no intervalo de dez (10) dias, entre 03 e 13 de fevereiro de 1981, com maneira mais ou menos idêntica de execução e no território da mesma comarca, provê parcialmen­te o agravo, a fim de unificar suas penas em oito (8) anos de reclusão, tomando como base a sanção base da unificação já operada no Processo 296/81, de cinco (5) anos e quatro (4) meses de reclusão e acrescendo-a da metade, pela continuação, em razão do número de infrações praticadas." (FI. 60).

Inconformado, recorreu o ministério Público Estadual, com apoio no art. 105, lU, c, da Constituição, apontando como divergentes os acórdãos prolata­dos na Revisão 4.602-6-SP e no RECr 85.318-DF, pelo Supremo Tribunal Federal, bem como no agravo 508.301-1, lavrado pela 8ª Câmara do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo, que reclamam a unidade de desígnio para o reconhecimento da continuidade delitiva.

268 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

A douta Subprocuradoria-Geral da República, em parecer do Dr. Cláudio Lemos Fonteles, opinou pelo provimento do recurso, in verbis:

" 10. O crime continuado, em linhas gerais, pode sempre

encontrar-se, tanto nos delitos contra a pessoa, seja com unidade de sujeito passivo, seja com pluralidade de sujeitos passivos, uma vez que nesses, quaisquer que sejam concorram os presupostos do crime continuado, que são:

a) pluralidade de ação (sentido amplo);

b) pluralidade de crimes da mesma espécie;

c) conexão de tempo, lugar, maneira e execução e outras semelhantes, entre os crimes.

11. Ora, a hipótese dos autos é atípica de crime continuado, vez que, entre um e outro houve o espaço de dez dias e lugares diferentes, e, as circunstâncias de tempo a lugar assumem rele­vância de indeclinável importância, não só por exigência do di­reito positivo, como também por imperativo da natureza do instituto.

12. Neste sentido, jurisprudência do E. Supremo Tribunal Federal, da lavra do douto Ministro Carlos Madeira, julgado que assim se apresenta, e por tudo de plena adequação à espécie ora versada, verbis:

Habeas Corpus. Crime continuado. Não há continuidade delitiva nas ações praticadas em ocasiões distintas, embora guar­dem semelhança na maneira de execução e no aproveitamento de idêntica situação. O espaço de tempo separando a reiteração dos fatos afasta o caráter necessário de continuidade.

Habeas Corpus indeferido.

13. Procede, pois, a pretensão." (Fls. 117/118).

É o relatório.

VOTO

EMENTA: Direito Penal. Crime continuado. Caracteriza­ção. Exigência de unidade de desígnio ou dolo total. Situação atual perante a doutrina e a Nova Parte Geral. Insuficiência de teoria objetiva pura. Atenuações pela jurisprudência. Teoria mis­ta que conjuga elementos objetivos com o elemento subjetivo do agente.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 269

Para a caracterização do crime continuado toma-se neces­sário que os atos criminosos isolados apresentem-se enlaçados, os subseqüentes ligados aos antecedentes (art. 71 do CP: "devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro"), ou porque fazem parte do mesmo projeto criminoso, ou porque re­sultam de ensejo, ainda que fortuito, proporcionado ou facilitado pela execução desse projeto (aproveitamento da mesma oportu­nidade).

Recurso especial do Ministério Público conhecido e provido para restabelecer-se a sentença que negou a continuidade delitiva em caso de criminosos reconhecidos como habituais, os quais, com reiteração, praticaram roubos autônomos, contra vítimas diferentes, embora na mesma Comarca e em curto espaço de tempo.

O EXMO. SR. MINISTRO ASSIS TOLEDO (Relator): Volta à baila, agora perante esta Corte, a controvertida questão da exigência, ou não, de unidade de desígnio para caracterização do crime continuado.

No julgamento do RECr 87. 769, pelo Pleno do Supremo Tribunal Federal (RTJ 91/938), dos onze Ministros votantes, inclusive o Presidente, só o Minis­tro Relator, Cunha Peixoto, admitiu expressamente essa exigência, apoiado em Magalhães Noronha. Mas, apesar de seu voto ter prevalecido na conclusão, rejeitaram a unidade de desígnio os Ministros Soares Munoz e Moreira Alves. E a ela não se referiram os demais Ministros presentes, presumindo-se que prescindiram do exame dessa questão para chegar à conclusão a que chegaram (RTJ 91/941).

Assim, não vejo demonstrada a divergência entre o acórdão recorrido com julgados do Supremo Tribunal relativos ao RECr 85.318 e outros citados no recurso, pois, não consigo identificar neles ou na jurisprudência do Excelso Pretória, com nitidez, aquela exigência, já que o ponto de partida dessa juris­prudência está no RECr 87.769 do Pleno. O acórdão na Rev. 4.602-6, além de isolado está citado só pela ementa, que, aliás, não coincide com a publicação também feita só pela ementa, circunstância esta relevadora de sua insuficiência para caracterizar o dissídio.

Diverge, entretanto, o acórdão recorrido do julgado do Tribunal de Alça­da Criminal no Agr. 508.301, citado à fi. 77 (RT 629/350), pois, enquanto no primeiro se afirma a nenhuma distinção existente "entre habitualidade e con­tinuidade, palavras sinônimas" (fi. 60), no último não se admite a continuidade delitiva, na hipótese de criminoso habitual, que "fez do crime seu meio de vida" (fi. 77).

Em razão disso, conheço do recurso, pela letra c, passando ao exame do mérito.

270 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Diga-se, inicialmente, que os crimes objeto cio presente recurso ocorre­ram em fevereiro de 1981, portanto antes da reforma penal de 1984 que introduziu alteração visível no tratamento penal do crime continuado (parág. único do art. 71).

É, aliás, o que está dito no item 59 da Exposição de Motivos do Ministro Abi-Ackel:

"O critério da teoria puramente objetiva não revelou na prática maiores inconvenientes, a despeito das objeções formu­ladas pelos partidários da teoria objetivo-subjetiva. O projeto optou pelo critério que mais adequadamente se opõe ao cresci­mento da criminal idade profissional, organizada e violenta, cujas ações se repetem contra vítimas diferentes, em condições de tempo, lugar, modos de execução e circunstâncias outras, marca­das por evidente semelhança. Estender-lhe o conceito de crime continuado importa em beneficiá-Ia, pois, o delinqüente profis­sional tornar-se-ia passível de tratamento penal menos grave que o dispensado a criminosos ocasionais. De resto, com a extinção, no Projeto, da medida de segurança para o imputável, urge refor­çar o sistema destinando penas mais longas aos que estariam sujeitos à imposição de medida de segurança detentiva e que serão beneficiados pela abolição da medida. A Política Criminal atua, neste passo, em sentido inverso, a fim de evitar a libertação prematura de determinadas categorias de agentes, dotados de acentuada periculosidade."

Assim, as apreensões reveladas pelo recorrente estão em grande parte superadas com a possibilidade, agora, de triplicação da pena, nos crimes de ação violenta, dentre os quais se situa o de roubo.

Mas esse preceito da nova Parte Geral, quando mais grave, não se aplica aos fatos anteriores à sua vigência, caso destes autos. Além disso, não afasta evidentemente toda a polêmica em torno da caracterização da continuidade delitiva porque tratando-se de um parágrafo que excepciona a regra geral do caput, sua aplicação pressupõe a ocorrência da continuidade delitiva, perma­necendo, pois, a indagação: quando ocorre esta última?

Por isso, voltamos ao princípio, com esta outra indagação: pode, ou não, haver crime continuado na criminal idade profissional, isto é, quando o agente pratica vários delitos da mesma espécie, não por estar agindo sob o efeito ou impulso do primeiro (em "continuação do primeiro") mas por ser essa atividade mais ou menos freqüente, como conduta de vida?

O acórdão recorrido diz que sim; no recurso sustenta-se que não.

R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 271

A lei, no Brasil como em outros países, não os oferece critério infalível para a identificação da unidade ou continuidade delitiva, na presença de ações múltiplas. Por isso é que" tanto a teoria puramente objetiva como a subjetiva expõem o flanco a críticas, que não repetirei por serem bastante conhecidas.

Pela mesma razão, a jurisprudência, no exame dos casos concretos, tem procurado, aqui como algures, limitar a incidência muito extensa de normas legais genéricas sobre a continuidade delitiva.

Na Alemanha, por exemplo, berço da denominada teoria objetiva, os tribunais tem exigido a presença de um "dolo total" (Gesamtvorsatz) que enlace o resultado total do fato em seus aspectos essenciais, no que concerne a lugar, tempo, pessoa da vítima e modo de execução, de sorte que os atos isolados representem a realização sucessiva do conjunto desejado. (Jescheck, Lehrbuch des Strafrechts, Allg. tej), 4. Auflage, 1988, pág. 649).

Por outro lado, os atos isolados que lesem bens jurfdicos personalíssimos (hochstpersonliche Rechtsgüter) não configuram o crime continuado, segundo essa jurisprudência, quando cada ato se dirija contra diferentes titulares desses bens (homicídios, atentados sexuais, etc). (Jescheck, op. cit., pág. 648).

Na Itália, como se sabe, por expressa disposição do Código Penal, art. 81, exige-se que as várias ações caracterizem a execução de um mesmo intento criminoso (medesimo disegno criminoso), isto é, as diversas ações ou omissões devem unificar-se pelo mesmo pensamento dirigido à obtenção de um fim, com emprego de determinados meios. (Maggiore, Diritto Penale, 5l!. ed., voI. 1,22, pág. 624).

Como se vê, a "unidade de desígnio" do direito italiano encontra, hoje, certo paralelismo na praxis do direito alemão, guardadas as peculiaridades, com a denominação "dolo total".

Isso revela, a nosso ver, que a teoria puramente objetiva, de certos autores de épocas passadas, cede lugar hoje a uma teoria mista que conjuga elementos objetivos e subjetivos para caracterização mais restrita do crime continuado.

Daí, o entendimento, a nosso ver correto, que predominou no Pleno do Supremo Tribunal, no julgamento do RECr 87.769, que, apesar da votação diversificada, assim se poderia resumir, segundo penso: há de existir uma ligação entre os vários atos criminosos, para que os crimes subseqüentes possam ser havidos como continuação do primeiro.

E essa ligação, a meu ver, dê-se-Ihe o nome que se queira dar (dolo total, unidade de desígnio, elemento subjetivo do agente, ou qualquer outro), deve estar não só nos elementos, objetivos de tempo, lugar e modo de execução, mas também no aspecto interno, psicológico, da conduta do agente, sem o que o Juiz não disporia de critérios menos falhos para distinguir o concurso material de continuidade delitiva.

272 R. Sup. Trih. Jusl., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

E não basta, para tanto, diga-se ainda, uma predisposição genérica ou a resolução indefinida do delinqüente que se propõe a fazer do crime seu meio de vida. Se assim fosse, o Direito Penal estaria, contraditoriamente, punindo com mais benignidade os profissionais do crime, agentes de condutas crimi­nosas de alta reprovabilidade social e moral, contrariando assim a própria essência do crime continuado que, na lição de Honig, citado por Eduardo Correia, é a de punir com pena mais branda, através da unificação dos vários delitos, a redução do grau da culpabilidade verificada quando "a reiteração de uma atividade foi levada a cabo por aproveitamento ou em virtude da mesma oportunidade". (Teoria do Concurso em Direito Criminal, Coimbra, 1963, pág. 243/4).

Assim, para a continuidade delitiva, torna-se indispensável, a meu ver, que os vários atos criminosos apresentem-se enlaçados, os subseqüentes liga­dos ao primeiro (art. 71 do CP), ou porque fazem parte da execução do mesmo projeto criminoso, ou porque resultam de ensejo, ainda que fortuito, propor­cionado pela execução desse projeto (aproveitamento da mesma situação). Isso, é claro, uma vez verificados os requisitos objetivos do art. 7l.

Fora disso, penso que não se deva acolher a continuidade delitiva, fruto, como se sabe, de exigências práticas de Política Criminal.

As conveniências ou maiores comodidades de ordem processual não deveriam pesar para afastar as exigências substanciais de direito material, no tocante ao princípio fundamental da justa retribuição. E o eventual excesso de pena, causado pela aplicação do concurso material, encontra solução pela obrigatória aplicação da norma geral limitativa do art. 75 do CP.

Definidas essas questões examino a hipótese dos autos.

Não sendo o recurso especial adequado ao exame da prova, colho da sentença de primeiro grau os fatos julgados provados in verbis:

"

o caso vertente demonstra claramente hipótese de reitera­ção de práticas criminosas e não de continuidade delitiva como sustentado na inicial.

Em ambos os crimes houve autonomia de desígnios, como passo a realçar: o primeiro crime - processo 203/81 - foi praticado no dia 03.02.81 contra um casal de namorados, por volta de 21:30 horas no Parque São Vicente em Mauá, SP, por três meliantes (o sentenciado e dois comparsas); mediante amea­ça de arma de fogo e de uma faca, subtraíram pertences das vítimas e constrangeram a moça à conjunção carnal, impedindo

R. Sup. Trih. Jus\., Brasília, 2( 12): 261-437, ago. 1990. 273

que seu namorado pudesse evitar a ação criminosa; o segundo crime - processo - 296/81 - foi praticado no dia 13.02.81, por volta de 23:00 horas na cidade de Mauá, SP, por dois melian­tes (o sentenciado e seu comparsa); mediante o uso de annas de fogo os criminosos assaltaram os ocupantes de um veículo e subtraíram, além do veículo vários objetos e valores; em seguida renderam os ocupantes do automóvel e sequestraram duas moças, levando-as para um lugar ermo de um bairro da cidade e as obrigaram, mediante constrangimento, a manterem relações se­xuais com eles.

Desta forma, não se pode dizer que os crimes foram prati­cados um com impulso natural do outro; as condutas foram di­versas e isoladas sem qualquer co-relação entre elas, a não ser a proximidade temporal.

De resto, ainda que identificáveis possivelmente algumas circunstâncias objetivas, não ficou caracterizado o elemento es­sencial do crime continuado: utilização de ocasiões nascidas de uma situação primitiva e única."

(fls. 38/39).

O acórdão, como se viu do relatório, não nega a autonomia declarada pelo Juiz, mas chega a conclusão diversa porque não distingue entre "habitualidade" e "continuidade" criminosas, palavras que reputa sinônimas, desde que pre­sentes os requisitos objetivos elo art. 71.

Como vimos, a teoria puramente objetiva, acolhida pelo acórdão, não é hoje aceita na própria terra de origem com tal amplitude, ou sem limitações, conforme se infere das lições de jescheck, na obra citada.

Pelo exposto, por me parecer que, no caso, não se demonstrou ligação subjetiva entre o primeiro crime e o subseqüente, conheço do recurso e lhe dou provimento para restabelecer a sentença de primeiro grau.

É o meu voto.

VOTO - VOGAL

O EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ DANTAS: Senhores Ministros, ani­mo-me a registrar, em tomo do judicioso voto do Sr. Ministro-Relator, o meu entusiástico aplauso.

Louvo, sem favor, a segurança e a erudição com que S. Exa. preleciou a propósito da doutrina do crime continuado, tanto pela ótica objetiva da Escola

274 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Alemã, como pelo subjetivismo da Escola Italiana. Demonstrou, com a profi­ciência de sempre, a convergência, afinal, daquelas celebradas correntes do pensamento jurídico europeu, em síntese do avizinhamento das suas concep­ções fundamentais - a unidade de des(gnio, de uma, e o termo um só intento, da outra.

Da conclusão a que chegou S. Exa., também entendo ser eclética a posição da doutrina brasileira, em face mesmo do nosso direito positivo, sobre como resolver-se a tormentosa questão da habitualidade confrontada à continuidade delitiva.

Com esses aplausos, respeito ao tema e à dissertação teórica proferida por S. Exa., acolho os seus brilhantes ensinamentos para, descendo ao caso concreto, também dar por muito bem demonstrada a ausência dos requisitos especificados pela lei nacional para a conceituação da continuidade.

Desse modo, acompanho o relator.

VOTO

o EXMO. SR. MINISTRO COSTA LIMA: Sr. Presidente. Dizer mais sobre o tema é ensombrar aquilo luminosamente exposto no voto, que acaba de proferir o eminente Ministro Assis Toledo.

Afirmo, assim, a minha concordância com a solução proposta.

É o voto.

EXTRATO DA MINUTA

REsp. n!.! 507 - SP - (Reg. n!.! 89.9306-1) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Assis Toledo. Recorrente: Ministério Público do Estado de São Paulo. Recorrido: Valtemilson José da Silva. Advogados: Drs. Faisal Ali Ramadan e outros.

Decisão: A Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso, para reformar o acórdão recorrido e restabelecer a sentença de primeiro grau. (Em 20.11.89 - Y Turma).

Os Exmos. Srs. Ministros José Dantas, Flaquer Scartezzini e Costa Lima votaram com o Relator.

Ausente o Exmo. Sr. Ministro Edson VidigaL

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro JOSÉ DANTAS.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2( (2): 261-437, ago. 1990. 275

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO

ESPECIAL N!1 744 - SP

(Registro n!1 89.100319)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Hélio Mosi11lal1ll

Embargante: Fazenda do Estado de São Paulo

Embargado: V. Acórdão à fi. 260

Advogado: Drs. Maria NUza Bianchi, Jaques Bushatski, Eliseu Roque e outro

EMENT A: Processo Civil. Embargos desclaratórios. Omissão. ICM. Isenção. Convênios. Direito líquido e certo.

Rejeição. Inocorrendo omissão no acórdão, único funda­mento deste recurso, rejeitam-se os embargos declaratórios.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 2i! Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

rejeitar os embargos, na forma do relatório e notas taquigráficas retro, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei. Brasília, 22 de agosto de 1990 (data do julgamento). Ministro AMÉRICO LUZ, Presidente. Ministro HÉLIO MOSIMANN,

Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO HÉLIO MOSIMANN: A ementa do acórdão embargado é a seguinte:

"Tributário. ICM. Isenção. Convênios. CTN. Art. 178.

Concedida a isenção de ICM em projeto de interesse nacio­nal, não pode a mesma ser alterada por convênio posterior àquele que a estabeleceu.

Recurso não conhecido pela letra a, e conhecido e improvi­do pela letra c."

Em suas razões de fls. 263/265, o Estado de São Paulo, embargante, alega omissão, pois, no recurso, afirmara frágil e antijurídica a tese do acórdão recorrido sobre a existência de ato jurídico perfeito e de direito adquirido, na

276 R. Sup. Trib. Jusl., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

linha dos paradigmas cotejados e que valeram o conhecimento do recurso especial pela letra c do permissivo constitucional. Assim, omisso seria o acórdão embargado.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO HÉLIO MOSIMANN (Relator): Sr. Presi­dente, o voto condutor do aresto atacado, da lavra do meu ilustre antecessor, Ministro Miguel Ferrante, no ponto objeto dos embargos declaratórios, afirma:

No particular, aduz com acerto o parecer da ilustrada Sub­procuradoria-Geral da República:

"0 recurso veicula matéria já conhecida da Egrégia Turma, ou seja, a revogação da isenção do ICM, concedida pelo Convê­nio n!! 9/75 em face da superveniência dos Convênios 11/81 e 14/81, que objetivavam a execução de projetos de interesse na­cional.

Insiste a recorrente, apoiada em dois precedentes do Supre­mo Tribunal Federal, que a isenção concedida pelo Convênio 9/75 era pura e simples, sem ônus ou contraprestação, de modo que poderia ser revogada a qualquer tempo. O exame de legisla­ção e dos Convênios, entretanto, revela que se trata de isenção de caráter condicional e temporário, que evidentemente não pode ser altetada no curso da execução do projeto de interesse nacional por ela contemplado, consoante dispõe o art. 178, do Código Tributário Nacional."

Após transcrever trecho do parecer com cujos termos concordara, tanto que afirmou o acerto da posição ali adotada, o voto do relator transcreveu as ementas desta e da ego 1l!. Turma deste STJ, todas no sentido de apoio às considerações do parecer.

Afirmou, então, o voto condutor do acórdão, que a isenção de que se trata não pode ser alterada a qualquer tempo, à vista do seu caráter condicional e temporário. Deixou clara, pois, a existência de direito líquido e certo à sua manutenção, enquanto perdurasse a execução do projeto de interesse nacional. Embora, em outras palavras, restou evidente o reconhecimento do ato jurídico perfeito e do direito adquirido.

Inexiste omissão, pelo que rejeito os embargos.

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 277

EXTRATO DA MINUTA

EDcl. REsp n!! 744 - SP - (Reg. n!! 89.100319) - Relator: Exmo. Sr. Ministro Hélio Mosimann. Embargante: Fazenda do Estado de São Paulo. Embargado: V. Acórdão às fls. 260. Advogados: Drs. Maria Nilza Bianchi, Jaques Bushatski, Eliseu Roque e outro.

Decisão: A Turma, por unanimidade, rejeitou os embargos (em 22.8.90 - 2i!Turma).

Participàram do julgamento os Exmos. Srs. Ministros Américo Luz, limar Galvão e Vicente Cemicchiaro.

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro AMÉRICO LUZ .

• RECURSO ESPECIAL N!! 1.027 - SP

(Registro n!! 89.0010772-0)

Relator: O EX1I/o. Sr. Ministro Edson Vidigal

Recorrente: Ministério Público do Estado de São Paulo

Recorrido: José Oliveira da Silva

Advogado: Dr. Orlando Calvielli

EMENTA: Processo Penal. Roubo. Crime continuado. Ausência dos aspectos subjetivos e objetivos. Anulação do acórdão.

Ausentes os requisitos objetivos - modo de execução e disparidade de comparsas - bem como o requisito subjetivo de unidade de dcsígnio, impossível a caracterização da conti­nuidade dclitiva.

Não há, no caso cm tcla, o vínculo entre o primeiro ato criminoso e os subscqüentes, que caractcriza a continuidade dclitiva.

Rccurso Espccial conhecido e provido para que seja res­tabclccida a sentença condenatória de primcira instância.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas.

Descide a 5i! Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso e lhe dar provimento, na forma elo relatório e notas

278 R. sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 20 de novembro de 1989 (data do julgamento).

Ministro JOSÉ DANTAS, Presidente. Ministro EDSON VIDIGAL, Re­lator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO EDSON VIDIGAL: A perigosa quadrilha de assaltantes que vinha tirando a tranqüilidade dos moradores da pequena cidade paulista de Mirassol, na zona rural de Mirassolândia, era chefiada por dois conhecidos elementos nos meios policiais locais. Autores intelectuais, plane­jaram todos os detalhes de dois audaciosos roubos ali ocorridos.

José Oliveira da Silva, o "Zé Baiano" e José Pedro de Araújo, vulgo "Zé Pedro', chefiando os comparsas Carlos Roberto Risso, o "Tio Piço", Antônio Carlos dos Santos, ou "Nanico", Luiz Carlos Benedito Cândido, vulgo "Lelé" e um tal de Geovani, conhecido por "Djavan", invadiram a sede ela fazenda "Casabranca" e, dominaram, amarraram e amordaçaram o proprietário e sua mãe,já velhinha. Cinco destes elementos estavam mascarados e armados nessa noite de 27 de outubro de 1983, quando levaram todas as jóias da família e vários objetos de valor, fugindo em seguida, numa Brasília pertencente a uma das vítimas e que foi encontrada totalmente danificada e sem o toca-fitas, abandonada nas proximidades da cidade.

Dias depois, num primeiro de novembro, dia de todos os santos, ainda em plena tarde, às 15:30 h. quando a jovem Lardete Maria da Silva encontra­va-se sozinha, na Fazenda Bálsamo, de propriedade de Joaquim Antônio da Silva, três elementos armados dominaram a moça ameaçanclo-a retiraram da casa vários objetos e jóias. Trancaram no banheiro e fugiram na Belina do "seu" Joaquim, o proprietário, abandonando-a com o motor danificado e sem o toca-fitas, em local próximo à cidade. Para este segundo roubo "Zé Baiano" e "Zé Pedro" contrataram ainda Antônio Sérgio Cândido, o "Sergião" e Sebas­tião Simão Damaceno, vulgo "Tião Topete". Em ambos os roubos ficou pro­vada a participação efetiva de "Zé Baiano' e, apesar de "Zé Pedro" ter acompanhado a quadrilha até as imediações das propriedades roubadas, per­maneceu nas proximidades, temendo ser reconhecido.

Presos todos durante a ação policial, exceto "LeI é" e "Djavan" que não foram localizados, confessaram com detalhes as ações criminosas, inclusive sendo reconhecidos pelas vítimas.

Coincidentemente, no mesmo dia deste segundo roubo, quase à mesma hora, três elementos mascarados seqüestraram uma adolescente de 16 anos,

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Célia Aparecida Fiamenghi dos Santos, levando-a para lugar ermo, onde tentaram estuprá-Ia. Mas o fato deverá ser apurado em inquérito próprio, não constando dos presentes autos.

Vieram aos autos também informações de que o "Zé Baiano", "Tio Piço", "Sergião", "Toinho" e "Tião Topete" participaram de um roubo numa casa comercial de Bálsamo e uma tentativa de roubo na Fazenda Cavalin e furto de uma Brasília na cidade de Tanabi.

Denunciados José Pedro de Araújo e José Oliveira da Silva pela prática de crime previsto no Art. 157, § 22 , incisos I e II c/c Art. 51, § 22 do Código Penal. Os demais, Antônio Sérgio Cândido, Carlos Roberto Risso, Sebastião Simão Damaceno, Antônio Carlos dos Santos e Luiz Carlos Benedito Cândido, por infração do Art. 157, § 22, incisos I e II do Código Penal, sendo que ao último deles foi imputado também o crime do Art. 129, capllt, c/c Art. 51, capllt, do mesmo estatuto penal.

Encerrada a fase de instrução criminal, chegaram os autos conclusos ao MM. Juiz de Direito da li!. Vara da Comarca de Mirassol que prolatou a sentença condenatória de fls. 18/27. Coube a José de Oliveira Silva - o ora recorrido, - a pena de 07 anos e 11 meses de reclusão e multa de Cr$ 10.888,00, (dez mil e oitocentos e oitenta e oito cruzeiros), por incurso nas sanções do Art. 157, § 22, incisos I e II c/c Art. 51, § 22 do Código Penal por ser reincidente em crime doloso, sujeito a medida de segurança detentiva por 02 (dois) anos, a ser cumprida em Colônia Penal Agrícola, por sentença prolatada em 25 de fevereiro de 1984, no processo n!! 800/83.

Até essa data, porém o assalto acontecido por volta das 21 :30 h do dia 12

de outubro de 1983 contra o estabelecimento comercial "Empório Nossa Senhora Aparecida" de propriedade de Américo dos Santos, permanecia pen­dente de julgamento. Localizado na Rua São Paulo, 560, no município de Bálsamo, o Empório tinha, nos fundos, a residência dos proprietários que naquela noite foram surpreendidos por dois homens encapuçados e armados com revólver e faca que, apontando as armas para o proprietário, esposa e filha avisou-os de que tratava-se de um assalto. Enquanto isto, dois deles permane­ciam guardando a frente da casa. Os que estavam lá dentro subtraíram vários cheques e duas correntinhas, sendo uma de ouro. Antes de fugir, utilizando fios elétricos amarraram mãos e braços de Américo, Josefina, a esposa e da filha, Maria Navas.

A denúncia acusou José Oliveira da Silva, o mesmo "Zé Baiano", João Hermes de Souza, Antônio Carlos dos Santos e Carlos Roberto Risso do crime já descrito, como incursos nas sansões do Art. 157, § 2!!, incisos I e II do Código Penal.

Decidindo, em sentença de 20/05/86 o Juiz de Direito da li!. Vara da Comarca de Mirassol acolheu a denúncia e condenou José de Oliveira da Silva

280 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

- o ora recorrido - à pena de 06 anos de reclusão multa de Cz$ 10,00 (dez cruzados) (v. fls. 04/08). Os demais também tiveram seus crimes apenados na mesma sentença (Processo n!! 825/84).

Da sentença de fls. 18/27 apelaram os réus José Pedro de Araújo, José de Oliveira da Silva, Antônio Sérgio Cândido, Sebastião Simião Damasceno, Antônio Carlos dos Santos e Carlos Roberto Risso.

José de Oliveira da Silva, o "Zé Baiano", pleiteou absolvição por falta de provas. O Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo, por sua Sexta Câmara, deu parcial provimento aos apelos. E, quanto a José de Oliveira da Silva decidiu reduzir a pena a 07 (sete) anos de reclusão e multa de Cr$ 10.870,00 (dez mil e oitocentos e setenta cruzeiros), cancelando-se a medida de segurança imposta (v. fls. 28/35). Considerou o ilustre relator desnecessário o aumento da pena­base como estabelecido na sentença a quo e, para fixação da nova apenação partiu da pena-base de 04 (quatro) anos e meio de reclusão. Este recurso foi julgado em 09 de abril de 1985, portanto, anteriormente à prolação da sentença de fls. 04/08, de 20/05/86.

Já em agosto de 1987 vem José de Oliveira da Silva, então recolhido no Instituto Penal Agrícola de São José do Rio Preto requerer ao MM. Juiz de Direito da Vara das Execuções Criminais a unificação de suas penas, dizen­do-se amparado pelo art. 71 do Código Penal.

O Ministério Público estadual entendeu não estarem presentes "os requi­sitos que permitem o reconhecimento da continuidade delitiva" mas, sim o reconhecimento da reiteração criminosa (fls. 63/65). Acolhendo tais funda­mentos, o MM. Juiz de Direito das Execuções Criminais indeferiu o pedido (v. fl. 66 verso).

Inconformado, o réu agravou dessa decisão (fls. 72/74). Pela mantença da decisão indeferitória manifestou-se o Ministério Público Estadual ressal­tando que nos crimes cometidos "inexiste identidade no modo de execução" e "diversidade de vítimas" (fls. 76/77).

Mantida a decisão agravada, sobem os autos para o Tribunal de Alçada Criminal após receber parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, às fls. 81/82, pelo improvimento do recurso, ao argumento de que o único requisito atendido pelo requerente é o da conexão temporal.

Dando provimento ao agravo em execução, decidiu a Décima Segunda Câmara do Tribunal de Alçada Criminal pela unificação das penas cominadas nos processos 825/84, e 800/83, passando para 08 (oito) anos e 02 (dois) meses de reclusão, mantida a multa, por subordinar o reconhecimento da continuida­de delitiva aos requisitos objetivos, indicados no § 2!!, do Art. 51 do antigo Código Penal (v. fi. 88), reportando-se à "Revista dos Tribunais", (voi. 542/361).

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 281

Este Recurso Especial, interposto junto ao Supremo Tribunal Federal, pretende a anulação do acórdão de fls. 86/89, proferido nos autos do agravo em execução, pelas razões de fls. 91/103 apresentadas pelo Ministério Público do Estado de São Paulo. Após comentar estarem ausentes no presente caso os pré-requisistos exigíveis para a afirmação de crime continuado, em especial o da unidade de desígnios, caracterizando-se assim a reiteração criminosa, o concurso material de infrações penais, afirma o parecer que o acórdão recorri­do dissente da jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Federal. Repor­ta-se aos ensinamentos doutrinários sobre a matéria, lembrando que, no Brasil o entendimento predominante entre os estudiosos do Direito Penal o da con­veniência de aliar-se a teoria subjetiva à objetiva. Citou acórdãos que caracte­rizam o dissídio jurisprudencial e afirma ter a decisão recorrida se abstraído do exame do aspecto subjetivo.

Deferido o processamento do recurso veio o pronunciamento da Procu­radoria-Geral de Justiça, pelo provimento, reiterando a tese da unidade de desígnio do agente (fls. 108/112).

Contra-razões às fls. 115/116.

Remetidos os autos a este Superior Tribunal de Justiça por força da nova Carta, recebeu parecer da douta Subprocuradoria-Geral da República adotando o entendimento esposado pela Procuradoria-Geral de Justiça e opinando pelo provimento do recurso para restabelecer a sentença de primeiro grau (fls. 125/127).

Relatei.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO EDSON VIDIGAL (Relator): Senhor Presi­dente, quando do julgamento do RE n!.! 89.830 - SP pelo Supremo Tribunal Federal o eminente Relator Ministro Néri da Silveira assim argumento:

"Se nos liberalizarmos o reconhecimento da continuidade nos crimes de roubo, estaríamos concorrendo, inequivocamente, para o desenvolvimento da criminalidade. Quanto mais violento for o ladrão, quanto mais ativo, quanto mais roubar, uma vez atrás da outra, quanto mais se profissionalizar no roubo, mais chance terá de ser punido mais brandamente. Se assaltar todos os dias, ao fim de dois ou três meses será punido por um único crime, com o aumento da 6;! parte, e se for bem sucedido e bem temível, no fim da vida será condenado por um único delito, com aumento da 6;! parte até metade da pena. Nessa hipótese, ficaria abolida toda a disciplina do Código Penal Brasileiro, que é baseada na repressão da reincidência, e estaríamos estimulando a criminalida­de porque estaríamos eliminando a repressão penal". (RTJ 115/626, citada à fi. 127 do Parecer do Ministério Público Federal).

282 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Isto quer dizer, no caso, que o juiz, ao apreciar pedido de unificação de penas, deve ser rigoroso para que o instituto não se converta em detonador de estímulo à criminal idade.

Este aliás, é o entendimento predominante no Supremo Tribunal Federal, cabendo mencionar, ainda, o RCr n!.! 86.358 - SP, Relator Ministro Rodrigues Alckmin, DJ de 01.07.77.

Assim, conheço do recurso pela letra c do Art. 105, lII, da Constituição Federal e lhe dou provimento para que, reformando o Acórdão recorrido, seja restabelecida a sentença de primeiro grau, nos termos do Parecer do Ministério Público Federal.

É o voto.

VOTO (VISTA)

O EXMO. SR. MINISTRO ASSIS TOLEDO: O Juiz da Execução Penal de São Paulo negou pedido de unificação de penas por entender que, no caso, se trata de criminoso habitual que praticou delitos sem vínculo de continuidade (fls. 66v).

A 12l!. Câmara do Tribunal de Alçada Criminal, por maioria de votos, sem negar a declarada habitualidade do crime, reformou aquela decisão, em recurso da defesa, adotando a tese segundo a qual o reconhecimento da continuidade delitiva independe de indagações pelo julgador de aspectos subjetivos mas apenas dos requisitos objetivos indicados pelo legislador.

Inconformado, o Ministério Público do Estado de São Paulo interpôs Recurso Especial apenas pela letra c, apontando como divergentes os acórdãos citados a fls. 99/101, isto é: HC 62.451, Rev. 4.602 e RTJ 79/344, do STF; RT 538/403 do TJRJ; RT 423/456, do TJO; e RT 376/120 e RJTJSP 87/435 do TJSP.

Sustenta o recorrente, com apoio na doutrina, a necessidade do requisito unidade de desígnio para a caracterização da continuidade delitiva. Mas, ainda que assim não fosse, no caso, como as circunstâncias (o modo ele execução) de cada delito foram diversas, não se completaram igualmente os requisitos objetivos previstos em lei, como se exigiu no HC 62.451, ReI. Min. Aldir Passarinho.

Reconheço a divergência em relação ao primeiro aresto trazido à colação (HC 62.451, ReI. Min. Aldir Passarinho) já que a disparidade de comparsas, presente no caso destes autos, reputou-se naquele julgado elemento importante para afastar a continuidade delitiva.

Passo, pois, ao julgamento da causa.

R. Sup. Trih. Jusl., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 283

Não se nega, nestes autos, tenha o condenado cometido os crimes com parceiros diferentes em circunstâncias diversas, embora em espaço de tempo inferior a trinta dias. Ausente, assim, o segundo elemento objetivo exigido pela lei penal ("maneira de execução"), isso bastava para a descaracterização da continuidade.

Vou além. Confonne salientei no voto que proferi no Recurso Especial nQ 507-SP, de cópia anexa, para a caracterização da continuidade delitiva toma-se indispensável

" ... que os vários atos criminosos apresentem-se enlaçados, os subseqüentes ligados ao primeiro (art. 71 do CP), ou porque fazem parte da execução do mesmo projeto criminoso, ou porque resultam de ensejo, ainda que fortuito, proporcionado pela exe­cução desse projeto (aproveitamento da mesma situação). Isso, é claro, uma vez verificados os requisitos objetivos do art. 71."

Esse vínculo entre o primeiro delito e os subseqüentes foi negado pelo Juiz sem refutação por parte do Tribunal.

Por essas razões, conheço do recurso, pela letra c, e lhe dou provimento para restabelecer a sentença de primeiro grau.

284

É o meu voto.

ANEXO

RECURSO ESPECIAL N!! 507 - SP (Reg. n!! 89.0009306-1)

VOTO

EMENTA: Direito Penal. CrimeContinuado. Caracteriza­ção. Exigência de unidade de desígnio ou dolo total.

Situação atual perante a doutrina e a Nova Parte Geral. Insuficiência de teoria objetiva pura. Atenuações pela jurispru­dência. Teoria mista que conjuga elementos objetivos com o elemento sllbjetivo do agente.

Para a caracterização do crime continuado torna-se neces­sário que os atos criminosos isolados apresentem-se enlaçados, os subseqüentes ligados aos antecedentes (art. 71 do CP: "devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro"), ou porque fazem parte do mesmo projeto criminoso, ou porque re­sultam de ensejo, ainda que fortuito, proporcionado ou facilitado pela execução desse projeto (aproveitamento da mesma oportu­nidade).

R. Sup. Trih.lusl., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Recurso especial do Ministério Público conhecido e provido para restabelecer-se a sentença que negou a continuidade delitiva em caso de criminosos reconhecidos como habituais, os quais, com reiteração, praticaram roubos autônomos, contra vítimas diferentes, embora na mesma Comarca e em curto espaço de tempo.

O EXMO. SR. MINISTRO ASSIS TOLEDO (Relator): Volta à baila, agora perante esta Corte, a controvertida questão da exigência, ou não, de unidade de desígnio para caracterização do crime continuado.

No julgamento do RECr 87.769, pelo Pleno do Supremo Tribunal Federal (RTJ 91/938), dos onze Ministros votantes, inclusive o Presidente, só o Minis­tro Relator, Cunha Peixoto, admitiu expressamente essa exigência, apoiado em Magalhães Noronha, mas, apesar de seu voto ter prevalecido na conclusão, rejeitaram a unidade de desígnio os Ministros Soares Munõz e Moreira Alves. E a ela não se referiram os demais Ministros presentes, presumindo-se que prescindiram do exame dessa questão para chegar à conclusão a que chegaram (RTJ 91/941).

Assim, não vejo demonstrada a divergência entre o acórdão recorrido com julgados do Supremo Tribunal relativos ao RECr 85.318 e outros citados no recurso, pois, não consigo identificar neles ou na jurisprudência do Excelso Pretório, com nitidez, aquela exigência, já que o ponto de partida dessa juris­prudência está no RECr 87.769 do Pleno. O acórdão na Rev. 4.602-6, além de isolado está citado só pela ementa, que, aliás, não coincide com a publicação também feita só pela ementa, circunstância esta reveladora de sua insuficiência para caracterizar o dissídio.

Diverge, entretanto, o acórdão recorrido do julgado do Tribunal de Alça­da Criminal no Ag 508.301, citado à tl. 77 (RT 629/350), pois, enquanto no primeiro se afirma a nenhuma distinção existente "entre habitualidade e con­tinuidade, palavras sinônimas" tl. 60), no último não se admite a continuidade delitiva, na hipótese de criminoso habitual, que "fez do crime seu meio de vida" (fi. 77).

Em razão disso, conheço do recurso, pela letra c, passando ao exame do mérito.

Diga-se, inicialmente, que os crimes objeto do presente recurso ocorre­ram em fevereiro de 1981, portanto antes da reforma penal de 1984 que introduziu alteração visível no tratamento penal do crime continuado (§ único do art. 71).

É, aliás, o que está dito no item 59 da Exposição de Motivos do Ministro Abi-Ackel:

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 285

"O critério da teoria puramente objetiva não revelou na prática maiores inconvenientes, a despeito das objeções formu­ladas pelos partidários da teoria objetivo-subjetiva. O projeto optou pelo critério que mais adequadamente se opõe ao cresci­mento da criminal idade profissional, organizada e violenta, cujas ações se repetem contra vítimas diferentes, em condições de tempo, lugar, modos de execução e circunstâncias outras, marca­das por evidente semelhança. Estender-lhe o conceito de crime continuado importante em beneficiá-la, pois, o delinqüente pro­fissional tomar-se-ia passível de tratamento penal menos grave que o dispensado a criminosos ocasionais. De resto, com a extin­ção, no Projeto, da medida de segurança para o imputável, urge reforçar o sistema destinando a penas mais longas aos que esta­riam sujeitos à imposição de medida de segurança detentiva e que serão beneficiados pela abolição da medida. A Polícia Criminal atua, neste passo, em sentido inverso, a fim de evitar a libertação prematura de determinadas categorias de agentes, dotados de acentuada periculosidade."

Assim, as apreensões reveladas pelo recorrente estão em grande parte superadas com a possibilidade, agora, de triplicação da pena, nos crimes de ação violenta, dentre os quais se situa o de roubo.

Mas esse preceito da nova Parte Geral, quando mais grave, não se aplica aos fatos anteriores à sua vigência, caso destes autos. Além disso, não afasta evidentemente toda a polêmica em tomo da caracterização da continuidade delitiva porque tratando-se de um parágrafo que excepciona a regra geral do caput, sua aplicação pressupõe a ocorrência da continuidade delitiva, perma­necendo, pois, a indagação: quando ocorre esta última?

Por isso, voltamos ao princípio, com esta outra indagação: pode, ou não, haver crime continuado na criminalidade profissional, isto é, quando o agente pratica vários delitos da mesma espécie, não por estar agindo sob o efeito ou impulso do primeiro (em "continuação do primeiro") mas por ser essa sua atividade mais ou menos freqüente, como conduta de vida?

O acórdão recorrido diz que sim; no recurso sustenta-se que não.

A lei, no Brasil como em outros países, não nos oferece critério infalível para a identificação da unidade ou continuidade delitiva, na presença de ações múltiplas. Por isso é que tanto a teoria puramente objetiva como a subjetiva expõem o flanco a críticas, que não repetirei por serem bastante conhecidas.

Pela mesma razão, a jurisprudência, no exame dos casos concretos, tem procurado, aqui como algures, limitar a incidência muito extensa de normas legais genéricas sobre a continuidade delitiva.

286 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Na Alemanha, por exemplo, berço da denominada teoria objetiva, os tribunais têm exigido a presença de um "dolo total" (Gesa1lltvorsatz) que enlace o resultado total do fato em seus aspectos essenciais, no que concerne a lugar, tempo, pessoa da vítima e modo de execução, de sorte que os atos isolados representem a realização sucessiva do conjunto desejado. (Jescheck, Lehrbuch des Strafrechts, Allg. Teil, 4. Auflage, 1988, pág. 649).

Por outro lado, os atos isolados que lesem bens jurídicos personalíssimos (hochstpersonliclze Reclztsgiiter) não configuram o crime continuado, segundo essa jurisprudência, quando cada ato se dirija contra diferentes titulares desses bens (homicídios, atentados sexuais, etc). (Jescheck, op. cit., pág. 648).

Na Itália, como se sabe, por expressa disposição do Código Penal, art. 81, exige-se que as várias ações caracterizem a execução de um mesmo intento Criminoso (medesimo disegno criminoso), isto é, as diversas ações ou omis­sões devem unificar-se pelo mesmo pensamento dirigido à obtenção de um fim, com emprego de determinados meios. (Maggiore, Diritto Penale, 5l! ed., vol. I, 22 , pág. 624).

Como se vê, a "unidade de desígnio" do direito italiano encontra, hoje, certo paralelismo na praxis do direito alemão, guardadas as peculiaridades, com a denominação "dolo total".

Isso revela, a nosso ver, que a teoria puramente objetiva, de certos autores de épocas passadas, cede lugar hoje a uma teoria mixta que conjuga elementos objetivos e subjetivos para caracterização mais restrita do crime continuado.

Daí, o entendimento, a nosso ver correto, que predominou no Pleno do Supremo Tribunal, no julgamento do RECr 87.769, que, apesar da votação diversificada, assim se poderia resumir, segundo penso: há de existir uma ligação entre os vários atos criminosos, para que os crimes subseqüentes possam ser havidos como continuação do primeiro.

E essa ligação, a meu ver, dê-se-lhe o nome que se queira dar (dolo total, unidade de desígnio, elemento subjetivo do agente, ou qualquer outro), deve estar não só nos elementos objetivos de tempo, lugar e modo de execução, mas também no aspecto interno, psicológico, da conduta do agente, sem o que o Juiz não disporia de critérios menos falhos para distinguir o concurso material da continuidade delitiva.

E não basta, para tanto, diga-se ainda, uma predisposição genérica ou a resolução indefinida do delinqüente que se propõe a fazer do crime seu meio de vida. Se assim fosse, o Direito Penal estaria, contraditoriamente, punindo com mais benignidade os profissionais do crime, agentes de condutas crimi­nosas de alta reprovabilidade social e moral, contrariando assim a própria

R. Sup. Trib. Jusl., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 287

essência do crime continuado que, na lição de Honig, citado por Eduardo Correia, é a de punir com pena mais branda, através da unificação dos vários delitos, a redução do grau da culpabilidade verificada quando "a reiteração de uma atividade foi levada a cabo por aproveitamento ou em virtude da mesma oportunidade". (A Teoria do Concurso em Direito Criminal, Coimbra, 1963, pág.243/4).

Assim, para a continuidade delitiva, toma-se indispensável, a meu ver, que os vários atos criminosos apresentem-se enlaçados, os subseqüentes liga­dos ao primeiro (art. 71 do CP), ou porque fazem parte da execução do mesmo projeto criminoso, ou porque resultam de ensejo, ainda que fortuito, propor­cionado pela execução desse projeto (aproveitamento da mesma situação). Isso, é claro, uma vez verificados os requisitos objetivos do art. 7l.

Fora disso, penso que não se deva acolher a continuidade delitiva, fruto, como se sabe, de exigências práticas de Política Criminal.

As conveniências ou maiores comodidades de ordem processual não deveriam pesar para afastar as exigências substanciais de direito material, no tocante ao princípio fundamental da justa retribuição. E o eventual excesso de pena, causado pela aplicação do concurso material, encontra solução pela obrigatória aplicação da norma geral limitativa do art. 75 do CP.

Definidas essas questões examino a hipótese dos autos.

Não sendo o recurso especial adequado ao exame da prova, colho da sentença de primeiro grau os fatos julgados provados in verbis:

288

" "O caso vertente demonstra claramente hipótese de reitera­

ção de prática criminosas e não de continuidade delitiva como sustentado na inicial.

Em ambos os crimes houve autonomia de desígnios, como passo a realçar: o primeiro crime - processo 203/81 - foi praticado no dia 03.02.81 contra um casal de namorados, por volta de 21,30 horas no Parque São Vicente em Mauá, SP, por três meliantes (o sentenciado e dois comparsas); mediante amea­ça de arma de fogo e de uma faca, subtraíram pertences das vítimas e constrageram a moça à conjunção carnal, impedindo que seu namorado pudesse evitar a ação criminosa; o segundo crime - processo - 296/81 - foi praticado no dia 13.02.81, por volta de 23:00 horas na cidade de Mauá, SP, por dois melian­tes (o sentenciado e seu comparsa); mediante o uso de armas de fogo os criminosos assaltaram os ocupantes de um veículo e

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subtraíram, além do veículo vários objetos de valores; em seguida renderam os ocupantes do automóvel e seqüestraram duas moças, levando-as para um lugar ermo de um bairro da cidade e as obrigaram, mediante constrangimento, a manterem relações se­xuais com eles.

Desta forma, não se pode dizer que os crimes foram prati­cados um com impulso natural do outro; as condutas foram di­versas e isoladas, sem qualquer co-relação entre elas, a não ser a proximidade temporal.

De resto, ainda que identificáveis possivelmente algumas circunstâncias objetivas, não ficou caracterizado o elemento es­sencial do crime continuado: utilização de ocasiões nascidas de uma situação primitiva e única."

(Fls. 38/39).

O acórdão, como se viu do relatório, não nega a autonomia declarada pelo Juiz, mas chega a conclusão diversa porque não distingue entre "habitualidade" e "continuidade" criminosas, palavras que reputa sinônimas, desde que pre­sentes os requisitos objetivos do art. 71.

Como vimos, a teoria puramente objetiva, acolhida pelo acórdão, não é hoje aceita na própria terra de origem com tal amplitude, ou sem limitações, conforme se infere das lições de Jescheck, na obra citada.

Pelo exposto, por me parecer que, no caso, não se demonstrou ligação subjetiva entre o primeiro crime e o subseqüente, conheço do recurso e lhe dou provimento para restabelecer a sentença de primeiro grau.

É o meu voto.

EXTRATO DA MINUTA

REsp nf! 1.027 - SP - (Reg. nf! 89.0010772-0) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Edson VidigaJ. Recorrente: Ministério Público do Estado de São Paulo. Recorrido: José Oliveira da Silva. Advogado: Dr. Orlando Calvielli.

Decisão: Retomado o julgamento, a Turma, por unanimidade, conheceu do recurso e lhe deu provimento (em 20.11.89 - 5;[ Turma).

O Exmo. Sr. Ministro Assis Toledo votou de acordo com o Exmo. Sr. Ministro Relator. Ausente o Exmo. Sr. Ministro Edson Vidigal.

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro JOSÉ DANTAS.

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 289

RECURSO ESPECIAL N~ 1.109 - MG

(Registro n~ 89.0010921-9)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo

Recorrente: Ilka de Souza Campos Rodrigues

Recorrida: Maria Aparecida da Silva

Advogados: Dr. José Guilherme Villela e outro; Dr. José Márcio da Rosa Lopes

EMENT A: Direito Civil e Processo Civil. Investigação de paternidade. Mãe separada. Averbação no registro. Direi­to superveniente. Incidência do art. 462, CPC. Recurso não conhecido.

O advento da Lei 7.250/84, que alterou a Lei 883/49, permitindo o reconhecimento do filho havido fora do matri­mônio pelo cônjuge separado de fato há mais de cinco anos, representou mais uma evolução em favor do princípio da igualdade de filiação, agasalhado na Constituição de 1988 (art. 227, § 6Q

).

Devendo a tutela jurisdicional compor a lide como a mesma se apresenta no momento da entrega, incide no julga­mento a regra do art. 462 do Código de Processo Civil, pelo que autorizado estava o órgão de segundo grau a determinar a averbação no registro, negada a sentença proferida na vi­gência de sistema anterior.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos, em que são partes as acima indicadas.

Decide a 4ó!. Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso, nos termos do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 05 de junho de 1990 (data do julgamento). Ministro ATHOS CARNEIRO, Presidente. Ministro SÁLVIO DE FI­

GUEIREDO TEIXEIRA, Relator.

EXPOSIÇÃO

O EXMO. SR. MINISTRO SÁL VIO DE FIGUEIREDO: Trata-se de apelo interposto em junho de 1986, admitido em agravo para melhor exame,

290 R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

desdobrado no Supremo Tribunal Federal em especial e extraordinário em agosto de 1989 e encaminhado a este Tribunal para apreciação da matéria infraconstitucional pelas alíneas a e c do art. 105 da nova Constituição.

Em autos de investigação de patemidade cumulada com anulação de escritura de doação, decidiu o v. acórdão recorrido, confirmando a r. sentença, pelo reconhecimento da patemidade e pela colação em substância dos bens doados, a fim de serem partilhados, aduzindo o v. aresto da ego 4i!. Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais que, apesar de não ter havido apelação da autora, não poderia prevalecer a restrição da sentença de não determinar a averbação da filiação patema no termo de nascimento em face de inexistir prova nos autos de ter sido dissolvido o casamento de sua mãe .

. No recurso interposto, alegou-se negativa de vigêhcia aos arts. 153, § 32,

da Lei Fundamental pretérita; 2!!, § 2!!, da Lei de Introdução; 2!!, 468 e 512 do Código de Processo Civil.

Argumentam os recorrentes que a Lei 7.250/84 não poderia incidir re­troativamente a fatos passados, e que o V. acórdão não poderia modificar a sentença "em favor da parte que com ela havia conformado".

Manifestou-se o Ministério Público pelo não conhecimento do recurso especial e posterior remessa dos autos ao Pretório Excelso.

É o relatório.

VOTO

o EXMO. SR. MINISTRO SÁL VIO DE FIGUEIREDO (Relator); Aco­lho o parecer do ilustre Subprocurador Geral da República, Dr. José Ribamar de Castro Viana, não conhecendo do recurso especial.

Em primeiro lugar, porque o dissídio não restou demonstrado, limitan­do-se os recorrentes a mera transcrição de ementas, o que é insuficiente ao confronto, como regimentalmente disposto.

Em segundo lugar, porque não se verificou qualquervulneração ao direito federal, apresentando-se de fácil desate a matéria em julgamento.

Com efeito, como enfatizou o Prof. Humberto Theodoro Jr., então na qualidade de revisor (fi. 221), não poderia subsistir a restrição que a sentença, primorosamente lançada quanto ao mais, "fez de não permitir a averbação do reconhecimento de patemidade no Registro Civil. Se o reconhecimento se deu com apoio na lei (Lei n!! 883/49, art. P, § 2!!), seu consectário natural, lógico e necessário, é a averbação no Registro Público adequado."

Não houve, na verdade, ofensa a qualquer das normas invocadas, quer por inexistência de res iudicata nft matéria a inviabilizar o cumprimento da lei, uma vez que o registro se apre~entava como corolário da decisão em face do

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direito vigente à época, quer porque, como bem assinalou o Ministério Público, no referido parecer, o § 2!! do art. 1!! da Lei n!! 883/49, introduzido pela Lei n!! 7250/84, não estabeleceu disposições gerais ou especiais a par das já existentes, mas sim preceito novo permitindo o reconhecimento do filho havido fora do matrimônio pelo cônjuge separado de fato há mais de cinco anos, em modifi­cação sensível da legislação então existente, em mais um passo na evolução ocorrida no campo do princípio da igualdade da filiação, agasalhado na Cons­tituição de 1988, a ensejar o reconhecimento de todo e qualquer filho, inde­pendentemente da sua origem, como autorizado no art. 227, § 6!!, do contexto constitucional, e na Lei n!! 7.841, de 17.10.89, que revogou o art. 358 do Código Civil.

Não bastassem tais considerações, seria de se trazer à colação o disposto no art. 462 do Código de Processo Civil, que reflete a diretriz atinente ao ius superveniens, segundo a qual, na lição de Michelli, "a prestação jurisdicional há de compor a lide como a mesma se apresenta no momento da entrega".

Pelo exposto, não conheço do recurso sob ambas as alíneas e determino a oportuna devolução dos autos ao colendo Supremo Tribunal Federal, para o exame da matéria de sua competência.

VOTO - VISTA

O EXMO. SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO: Em ação de inves­tigação de paternidade cumulada com pedido de anulação de escritura de doação, o Acórdão recorrido, confirmando a sentença conclui pelo reconheci­mento da paternidade e pela colação, em substância, dos bens doados. Apenas num ponto modificou a decisão de 1!! grau: na parte em que deixou esta de determinar a averbação da filiação paterna no assento de nascimento, em virtude de inexistir nos autos prova de haver sido dissolvido o casamento da mãe da autora.

Nos embargos declaratórios e agora no apelo excepcional, argüiram os réus a carência de ação, em face da ausência da aludida comprovação, e, outrossim, a inadmissibilidade de o Acórdão alterar a sentença no tópico relativo à averbação <1:a filiação paterna, à falta de recurso nesse particular da litigante interessada.

Acompanho o voto do eminente Ministro Relator.

O Acórdão recorrido aplicou o ius sllperveniens, qual seja, o disposto na Lei n!! 7.250, de 14 de novembro de 1984, entendendo que, com o § 2!! acrescentado ao art. 1!! da Lei n!! 883/49, o casamento do ascendente deixou de ser óbice ao reconhecimento da filiação adulterina, desde que o cônjuge adúl­tero se ache separado de fato do seu consorte legítimo há mais de cinco anos contínuos.

292 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

o nosso sistema processual admite a alegação dedireito superveniente, desde que não seja modificado o pedido ou a causa de pedir (cfr. Nelson Nery Júnior, "Pareceres - Direito Processual Civil- SeparaçãoJudicial- Direito Superveniente", in Revista de Processo, vol. n!.! 25,janeiro-março de 1982-pág. 218). No caso em exame, intatos permaneceram o pedido e a causa de pedir. O decisório recorrido, em verdade, aplicando a lei nova, removeu o obstáculo aventado pelos réus à derradeira hora: ausência de comprovação acerca da dissolução do matrimônio da mãe autora, circunstância meramente secundária inserta no presente litígio, mesmo porque desde logo, na peça vestibular, a demandante já acenara com a probabilidade do marido de sua genitora ser falecido (achava-se desaparecido há muitos anos).

A Suprema Corte, de outro lado, não se mostra infensa à aplicação do direito superveniente nas instâncias de cognição ordinária em atenção às nor­mas dos arts. 462 e 303, n!.! I, do Código de Processo Civil (cfr. RTJ 105/1.113 - 1.115).

Não se vê, portanto, em que aspecto tenha sido malferido o preceituado no art. 2!.!, parágrafo 2!.!, da Lei de Introdução ao Código Civil. Nem tampouco se obriga ofensa ao art. 512 do Código de Processo Civil. Aliás, são os próprios recorrentes que anotam, nesse passo, o magistério de J.c. Barbosa Moreira, in verbis: "não é a decisão do órgão inferior que transita em julgado, nem será ela que, eventualmente, vai ser executada. Ainda quando se tenha começado a executar, em caráter provisório, a decisão recorrida, posteriormente a exe­cução passará a ter por título o acórdão, que substitui, para todos os efeitos, aquela decisão" ("Comentários ao Código de Processo Civil", vol. V, pág. 318, n!.! 171, ed. 1974).

Não impressiona, afinal, a assertiva de afronta à res judicata. Cuidando­se de uma providência de índole administrativa, simples corolário da decisão havida e dos tennos inequívocos da lei nova, a averbação da filiação paterna poderia ter sido tomada a qualquer tempo, inclusive após a baixa dos autos à primeira instância.

Ante o exposto, não conheço do recurso. É como voto.

EXTRATO DA MINUTA

REsp n!.! 1109 - MG - (Reg. n!.! 89.0010921-9) - Relator: Exmo. Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo. Recorrente: I1ka de Souza Campos Rodrigues. Recorrido: Maria Aparecida da Silva. Advogados: Drs. José Guilhenne ViIlela e outro e José Márcio da Rosa Lopes.

Decisão: Prosseguindo no julgamento, a Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso (4l! Turma - 05.06.90).

Votaram com o Relator os Exmos. Srs. Ministros Barros Monteiro e Fontes de Alencar.

R. Sup. Trih. J ust., Brasília, 2( 12): 261-437, ago. 1990. 293

o Exmo. Sr. Ministro ATHOS CARNEIRO presidiu sem voto, por não haver participado do julgamento anterior.

Ausente, justificadamente, o Exmo. Sr. Ministro Bueno De Souza .

• RECURSO ESPECIAL N!! 1380 '- RJ

(Registro n!! 8900116860)

Recorrente: Luís César de Miranda Ebraico

Recorrida: Márcia Lygia de Oliveira Mafra Lino

Advogados: João Manoel de Albuquerque Lins e Antônio Bonifácio da Silva

EMENTA: Recurso especial. Ação impugnativa do re­conhecimento filial. Prescritibilidade.

A ação do reconhecido para impugnar o reconhecimento filial é prescritível, ex vi do disposto nos arts. 178, 92 , inciso VI, e 362, do Código Civil, exceção legal ao princípio da imprescritibilidade das ações pertinentes ao estado das pes­soas.

Recurso não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 3;[ Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade e

preliminarmente, não conhecer do recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 6 de março de 1990 (data do julgamento).

RELATÓRIO

o EXMO. SR. MINISTRO GUEIROS LEITE (Relator): Ação proposta por Luís César de Miranda Ebraico contra Armando Victor Ebraico, com o

294 R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

objetivo de impugnar o seu registro de nascimento, no qual figura o réu como seu pai. Alega o autor ser, na realidade, filho de José Luiz Cordeiro de Oliveira, havido com sua mãe quando ainda solteira e reconhecido pelo réu depois que casou com ela.

Esta ação, em apenso a outra de investigação de paternidade com petição de herança, que o autor moveu, na mesma Vara e Juízo, contra os herdeiros de José Luís Cordeiro de Oliveira, foi julgada procedente, para dizer-se que Armando Victor Ebraico não é pai do autor e cancelar-se o registro respectivo.

Invocando a qualidade de terceiro prejudicado, Márcia Lygia de Oliveira Mafra Lino, co-ré na ação de investigação cumulada com petição de herança, apelou da sentença. O Egrégio Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, por sua Quarta Câmara Cível, deu provimento à apelação, para reconhecer a decadên­cia da ação, nos termos do art. 178, § 9!!, VI, do Código Civil, decisão com a seguinte ementa:

"Tem legitimidade para apelar da sentença proferida em ação prejudicial, de impugnação ao reconhecimento do autor como filho do réu, a co-ré em ação da investigação de paternidade cumulada com petição de herança, proposta pelo autor da primei­ra contra os filhos do falecido investigado. Preliminar de não cabimento da ação como proposta. Sua rejeição, considerada a ação como de estado, fundada no art. 362 do Código Civil. Aco­lhimento da preliminar de decadência da ação com fundamento no art. 178, § 9!!, VI:do Código Civil."

Luís César de Miranda Ebraico interpôs recurso extraordinário desse acórdão, fundado no art. 119, lU, letras a e d, da CF/67, alegando negativa de vigência do art. 348, do Código Civil, porque o recorrente não poderia vindicar estado contrário ao resultante do seu registro de nascimento sem provar erro ou falsidade do registro. Para tanto impunha-se a decretação da nulidade do ato, ex vi do art. 145, do Código Civil, que o acórdão também violou a pretexto da decadência da ação (CC, art. 178, § 9!!, VI), decadência que jamais poderia aplicar-se às ações de estado.

A digna presidência do Tribunal de origem indeferiu o RE, porque o único dispositivo legal ventilado na decisão recorrida foi o art. 178, § 9!!, inciso VI, do Código Civil, aplicando-se, quanto aos demais, as Súmulas n!!s 282 e 356, do STF, que cogitam do requisito do prequestionamento.

No Supremo Tribunal Federal foi provido agravo de instrumento do recorrente e, graças ao mesmo, convertido o RE em REsp, por conter matéria infraconstitucional, assim da competência desta Corte.

É o relatório, no essencial.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 295

VOTO

o EXMO. SR. MINISTRO GUEIROS LEITE (Relator): A decisão in­deferitória do RE apóia-se nas Súmulas n!!s 282 e 356, do Supremo Tribunal, que cogitam do prequestionamento, requisito que não venho acolhendo como óbice ao cabimento do recurso especial, com a rigidez que se lhe emprestava no tocante ao recurso extraordinário. A missão desses recursos, segundo ob­serva Pontes de Miranda, é tão profunda que se pôs em texto constitucional (Cf. "Comentários ao CPC", 1;1. ed., 1975, Tomo VII, pág. 44, nota 6). É certo, porém, não nos cabe, em face da inépcia, suprir as lacunas da interposição, nem aplicar o jus oritllr facti, como pretendem os mais liberais.

Tenho razões, todavia, para transpor a intransigência dos dogmas, tanto mais quando não me pareçam ortodoxos. Na verdade, a Súmula n!! 282 cogita da inadmissibilidade do recurso extraordinário quando não ventilada, na deci­são recorrida, a questão federal suscitada, não exprime, portanto, o critério da literalidade, expungido do nosso sistema constitucional e mantido no Código de Processo Civil, na ação rescisória, em beneficio da segurança dos julgados (art. 485, V). O abrandamento, que a Súmula n!! 284 também prevê, pelo critério da razoabilidade da fundamentação do recurso, recolhe-se, igualmente, da Súmula n!! 356, sem o plus dos embargos declaratórios como super-requisito do RE e cujo exame se devolve à origem por mera tecnicalidade.

Luís Cesar de Miranda Ebraico impugnou o registro do seu nascimento, que disse consubstanciado em certidão falsa, pois, não é filho legítimo do registrante, mas filho natural de José Luís Cordeiro de Oliveira com sua mãe, paternidade esta que investiga em ação conexa.

A egrégia Quarta Câmara Cível decidiu que, sendo o recorrente filho natural, e tendo sido reconhecido por Armando Victor Ebraico como filho do casal, através do registro de seu nascimento ora impugnado, tinha, a partir da maioridade, quatro anos para impugnar o reconhecimento judicialmente, a teor do art. 178, § 9!!, VI, do Código Civil, prazo já expirado. O recorrente conhecia o fato, ou seja, a falsidade da paternidade, desde que tinha vinte anos de idade (fls. 139/140). Ele não foi reconhecido por Armando Victor Ebraico antes do casamento com sua mãe. Ao se casarem, o autor era filho natural, ainda não reconhecido pelo suposto pai, não tendo sido legitimado pelo casamento, mas em virtude do reconhecimento. De qualquer forma, não obstante a legitimação pelo reconhecimento, o autor era, até então, filho natural, tendo, por conse­guinte, ficado o reconhecimento sujeito à regra do art. 362, do Código Civil, impondo-se, pois, o reconhecimento da decadência.

Diante dessa decisão, o autor valeu-se do recurso extraordinário pela letra a, do pennissivo constitucional, alegando a contrariedade aos seguintes textos:

296 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

a) Código Civil - art. 348, "porque ninguém pode vindicar estado contrário ao que resulta do registro de nascimento, salvo provando-se erro ou falsidade do registro";

b) Código Civil- art. 178, § 9Q, inciso V( que consigna a prescrição em

quatro anos da ação do filho natural para impugnar o reconhecimento, contado o prazo do dia em que atingir a maioridade ou se emancipar.

Argumenta o recorrente que, tratando-se de ação de estado, tal como reconhecida pelo respeitável acórdão, contra a mesma não fluiria a prescrição ou decadência;

c) Código Civil- art. 145, lI, que reputa nulo o ato jurídico, quando for ilícito ou impossível o seu objeto.

Não podendo prosperar o ato nulo, impunha-se o acatamento da alteração do registro, que se impõe ao juiz como postura de ordem pública (art. 146).

Foram ventiladas na decisão recorrida, ex abUl1dantia, as questões fede­rais suscitadas. A eficiência da fundamentação do recurso permitiu a exata compreensão da controvérsia. Não houve ponto omisso ela decisão que neces­sitasse de declaração. Quanelo subiu ao STF o agravo de instrumento, o parecer ela Subprocuradoria-Geral ela República encareceu a necessidade do reexame em face ela Súmula nQ 149, quanto à imprescritibilidade da ação de investigação de paternidade (fi. 59, apenso). E o Ministro Sepúlveela Pertence foi preciso ao confirmar:

"O RE, a, alegou negativa de vigência aos arts. 348 e 145, lI, e correlatos do Código Civil, e inadmitido (fls. 172/173), subiu a esta Corte por força do provimento do agravo nQ 129.223-7, pelo eminente Ministro Oscar Corrêa."

De razoável admissibilidade, conforme se vê, o recurso esbarra, porém, no acerto com que se houve a respeitável decisão recorrida, no pertinente à questão decadencial. Tanto o art. 178, § 9!.!, inciso VI, como o art. 362, ambos do Código Civil, fulminam com a decadência, em quatro anos, a ação elo filho natural para impugnar o reconhecimento, a contar dos termos que indica. Pouco importa que o reconhecido não seja filho, conforme registra o caput do art. 362. A ação pode surgir nos casos de falsidade ideológica ou instrumental do assento de nascimento, de que conste a menção da pessoa como filho do casal, sem ser. O varão, ao contrair núpcias com a mãe solteira, pode legitimar o filho natural anteriormente havido com outrem, pois, a legitimação nesses casos não seria o resultado, puro e simples,per subseqllens matrimoniulIl, mas ato declaratório, que não cria a paternidade, mas apenas declara uma situação de que o direito tira conseqüências.

A partir daí questiona-se se é de estado da pessoa a ação ele nulidade de registro e negatória de paternidade. O acórdão afirma que sim. E, por isso, o

R. SlIp. Trib.ll1st., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 297

recorrente contesta a sua prescritibilidade ou decadência, citando Câmara Leal: o estado das pessoas, sendo uma situação permanente, não pode sofrer modi­ficação por ato ou omissão de terceiros e, por isso, as ações que o protegem têm por fim, apenas, o seu reconhecimento para segurança dos seus efeitos, donde, em regra, a sua imprescritibilidade.

Ora, exatamente porque o estado das pessoas constitui-se em situações permanentes, impõe-se a sua preservação, de modo que nem todas as situações assim conceituadas devem seguir a regra da imprescritiblidade. Daí a exceção contida nos arts. 178, § 9!!, VI, e 362, do Código Civil, do que não é recomen­dável discordar. Por isso Pontes de Miranda preleciona que a "ação do filho natural para impugnar o reconhecimento é ação que preclui (o prazo é preclu­sivo, e não prescricional)" (Cf. "Tratado de Direito Privado", Tomos VI, § 669,4, e IX, § 972,3 - apud "Tratando das Ações", Tomo 11, RT, 1971, pág. 81, infine).

Pontes faz distinções relevantes. Assim, a ação declarativa típica é im­prescritível: a de filiação, mas sempre que pode ser exercida sem o embuti­mento. Na hipótese destes autos, quando se alega ser nulo o ato de reconhecimento, ou o registro de legitimidade da filiação, a ação é constitutiva negativa (Cf. Pontes, obro e lugar cits., pág. 295).

Caio Mário da Silva Pereira comenta que fica reservada ao reconhecido a faculdade de impugnar o reconhecimento no prazo do art.362. Anula-se o ato por vício ou defeito de forma ou vício de consentimento. No caso destes autos seria a preexistência de registro feito pela mãe sem indicação do nome do pai. A admitir-se defeito nesse primeiro ato (que me parece apenas poste­riormente complementado), a hipótese não seria a do art. 145, 11, do Código Civil. E sendo o capítulo das nulidades matéria de índole geral, não poderia invadir certas áreas de exceção, como a do art. 362. Afinal de contas, o reconhecimento da paternidade atribuindo status a filho que não tem pai, não importaria em dualidade de filiações, erro ou falsidade.

O mesmo autor ("Instituições", vol. V, Fed., 1972, pág. 171) caracteriza a imprescritibilidade da ação contestatória de maternidade, inclusive através da falsidade do registro. Também da vindicação do estado de legitimidade. Ao filho legítimo, quando lhe falta ou lhe é negada a condição peculiar ao seu status, é reconhecido um direito de ação, por cuja via ele vindica aquele estado. Pode ser intentada pelo filho enquanto viver. E aos seus herdeiros. Diversa é, pois, a situação do que não vindica o estado de legitimidade.

Ante todo o exposto e melhor examinando a matéria dos autos, razão imperiosa de sua subida a esta Corte, dele não conheço, para manter o acórdão recorrido, que bem decidiu a espécie.

É como voto.

298 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

EXTRATO DA MINUTA

REsp n!!1380 - RJ - (Reg. n!! 8900116860) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Gueiros Leite. Recorrente: Luís César de Miranda Ebraico. Recorri­da: Márcia Lygia de Oliveira Mafra Lino. Advogados: Drs. João Manoel de Albuquerque Lins e Antônio Bonifácio da Silva.

Decisão: A Turma, por unanimidade e preliminannente, não conheceu do recurso especial, nos termos do voto do Exmo. Sr. Ministro Relator (6.3.90 - 3f!Turma).

Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Ministros Nilson Naves, Eduardo Ribeiro e Waldemar Zveiter. Ausente, justificadamente, o Exmo. Sr. Ministro Cláudio Santos. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro GUEI­ROS LEITE.

RECURSO ESPECIAL N!! 1.447 - RJ

(Registro n!! 89.0011977-0)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Walde11lar Zveiter

Recorrente: Elevadores Otis S/A

Recorrido: Transportes Coletivos de Anápolis Ltda

Advogados: Drs. Paulo Roberto de Carvalho Rego e outro e Gabriel Lopes Teixeira

EMENTA: Recurso especial. Contrato de cornpra e ven­da e instalação de elevadores. Reajustamento de preço. Par­celas anteriores. Artigo 940 do C. Civil e 433 do C. Comercial. Negativa de vigência não caracterizada.

I - Todas as prestações que foram contratadas sob a vigência do plano cruzado estão isentas do reajustamento de preço, admitindo-se, todavia, liberdade aos contratantes para estabelecerem cláusulas de correção monetária.

11 - As parcelas anteriores, quitadas o foram nas dupli­catas e atendem ao que nestas se contêm e, ainda que assim não fosse, tratando-se de cotas ou parcelas periódicas, o pa­gamento de cada uma delas solve as anteriores a teor do que dispõe o artigo 943 e o 945 do C. Civil.

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 299

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 3l! Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade e

preliminarmente, não conhecer do recurso especial, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei. Brasília,5 de dezembro de 1989 (data do julgamento). Ministro GUEIROS LEITE, Presidente. Ministro W ALDEMAR ZVEI­

TER, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO W ALDEMAR ZVEITER: Interpuseram re­curso especial e recurso extraordinário, respectivamente, Elevadores Otis S/A (fls. 219/229) e Transportes Coletivos de Anápolis Ltda. (fls. 231/237), contra acórdão (fls. 191/192) confirmatório da sentença de primeiro grau (fls. 108/109) que decretara a improcedência dos pedidos constantes das ações judiciais (ordinária para cobrança de diferenças de reajustamento de preços e da parte da ré, ordinária de repetição de indébito, para recebimento do alegado "pagamento a maior", tudo porque celebraram, entre si, contrato, objetivando o fornecimento e instalação, a cargo da primeira, de um elevador e escadas rolantes.

Elevadores Otis S/A embasa seu Especial no art. 105, item 111, letras a e c, do vigente permissivo constitucional sob alegação de que a decisão colegia­da negara vigência aos artigos 940 do Código Civil e 434 do Código Comercial e divergência de Acórdão do STF, e a segunda recorrente apóia o seu apelo extremo no art. 119,111, letra a, por violação ao art. 153, § I!! da CF/67 e no art. 5!!, I, da CF/88, promovendo, ainda, recurso especial, escudado no art. 105, 111, letras a e c da atual Lei fundamental, porque violados os artigos 20; 21; 125, I e 541 do CPC.

No exame da admissibilidade no Tribunal "a quo", o despacho do emi­nente Presidente foi pelo processamento do recurso de Elevadores Otis S/A (fls. 239/242), o mesmo ocorrendo com relação ao do segundo recorrente. Todavia este quedou prejudicado, porque o decreto de fi. 263 declarou-lhe a decisão.

300

Remanesce, pois, o Especial da Elevadores Otis S/A. É o relatório.

R. Sup. Trih. Jus\., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO W ALDEMAR ZVEITER: Dois os funda­mentos do Recorrente: negativa de vigência dos arts. 940 do CC e 434 do C. Comercial, letra a; e de divergência com aresto do STF nos recursos extraor­dinários 74.989-PR - RTJ, 70/425 e 107.749-RJ, 70/425, assim como com o proferido pela egrégia 5!! Turma Cível do mesmo Tribunal, na Apelação Cível n2 5.321/86, letra d.

Isso porque admitiu o Acórdão recorrido como válida cláusula de corre­ção monetária, no contrato de fornecimento de equipamento pelo recorrente à recorrida, na vigência do chamado "plano cruzado",dando, porém, como qui­tadas as parcelas já pagas, valendo a correção monetária somente para as vincendas, pretendendo a recorrente, à título de diferenças, a correção mone­tária sobre as duplicatas quitadas.

Dois foram os contratos celebrados entre as partes. O primeiro objeto da proposta n2 DF-5.459 de 29.10.86 pelo qual a autora, ora recorrente, compro­meteu-se a fornecer e instalar duas escadas rolantes, pelo preço de CZ$ 1.500.000,00, acrescido de IPI e a ser resgatada pelo recorrido em oito (8) parcelas mensais de CZ$ 187.500,00.

O Segundo, n!!DF-5.492, firmado em 22.11.86, referente ao fornecimento e instalação de um elevador para passageiros pelo preço de CZ$ 154.500,00,acrescido de IPI para ser pago em 12 parcelas mensais, no valor de CZ$ 12.875,00, acrescido do IPI.

Em ambos, pactuaram os litigantes duas cláusulas de reajustamento do preço assim redigidas:

""REAJUSTAMENTO DE PREÇO:

Todas as prestações, que foram contratadas para pagamento até 28.2.1987, estarão isentas de reajustamento, em conformidade com o disposto no Decreto-Lei n!! 2.284 de 10.3.86, salvo altera­ções posteriores que o modifiquem, completamente ou anulem, total ou parcialmente e que venham a permitir reajustamento". (fi. 9 do contrato).

"DISPOSIÇÕES GERAIS:

Sempre que for autorizada a cobrança de atualização mo­netária, os créditos do vendedor serão beneficiados pela mesma, segundo os critérios previstos pela autorização legal pertinente. Todos os prejuízos que o vendedor venha a sofrer na execução deste contrato, por motivos de força maior, independentes de sua atuação, lhe serão indenizados, pelo comprador, nos termos do disposto em ônus diversos excluídos do preço. Considera-se for-

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 301

ça maior, a alteração da relação de encargos, vantagens e preço real do fornecimento que possa implicar em perda efetiva do vendedor, em beneficio do comprador, tudo conforme a regra da cláusula "rebus sic stantibus". (fi. 7 do contrato)."

Posta assim a questão, decidiu o Acórdão recorrido:

"Quanto ao exame do mérito das ações, entendemos válido a cláusula que mesmo na vigência do D.L. 2.284/86, previa os reajustes caso houvesse modificação da legislação.

Essa modificação houve com a queda do chamado "Plano Cruzado", ficando frustrada a pretendida estabilização do valor da moeda. Com a volta da inflação, prevista foi novamente a correção cuja exigência legal era anterior à vigência D.L. 2.284.

Inexiste portanto, qualquer ilegalidade na previsão de co­brança de correção, que nada mais representa do que a atualização do valor da moeda defasado pela inflação.

Todavia não assiste razão à Otis, quando pretende cobrar diferenças de prestações já recebidas, pois, que se por acaso recebeu a menos, e a parte contrária afirma que pagou a mais, é porque ou cobrou equivocadamente, ou concordou com o paga­mento tal como foi feito, não lhe cabendo reclamar diferenças.

No que concerne aos pagamentos ainda não efetuados, a 'correção se torna cabível, não podendo entretanto, se ainda não faturados e não apresentados à cobrança ao devedor, ser tidos como devidos na presente ação."

Assim examino a espécie quanto a letra a a ver configurada, ou não a violação apontada aos arts. 940 do c.c. e 434 do C. Comercial.

De logo é de excluir a alegada infrigência ao art. 434 do C. Comercial, eis que dirige-se à proteção do devedor, obrigando o credor a "dar-lhe quitação ou recebido por duas ou três vias se ele requereu mais de uma" dispondo, ainda, " A quitação ou recebido concebido em termos gerais sem reserva ou limitação, e quando contém a cláusula - de ajuste final de contas, resto maior de quantia - ou outra equivalente, presume-se que compreende todo e qualquer débito, que provenha de causa anterior à data da mesma quitação ou recebido", porque no caso ocorrente as parcelas ajustadas e pagas o foram por meio de duplicatas, como se vê às fIs. 88/98, entregues ao devedor, quitadas.

Quanto ao art. 940 do C. Civil, é impossível ter-se como violado, porque as quitações passadas nas duplicatas recebidas atendem ao que nele se dispõe e, ainda que assim não fosse, na espécie, cuidando-se de cotas, parcelas, períodicas, o pagamento efetuado de cada uma delas, salvo prova em contrário, inexistente nos autos, solve as anteriores, nos precisos termos dos arts. 943 e 945 do mesmo diploma legal.

302 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Acrescente-se a isso a irresignação da recorrida que, no curso do proces­so, em repetição de indébito, reclamou importância que, segundo afirma, teria pago a maior e que, eventualmente, corresponderiam aos valores corrigidos das prestações vincendas, cujo exame escapa à espécie, pela deserção decre­tada ao seu Recurso Especial, mas que, a toda evidência, comprovam a reali­zação daqueles pagamentos corrigidos, tendo-se como cumpridos os contratos em seus termos.

Tudo, aliás, como anotado pelo acórdão recorrido, destacado na parte transcrita.

Questões de fatos, ainda, que a toda evidência, também escapam ao exame do Recurso Especial.

Indemonstrada, assim, qualquer violação a lei.

Melhor sorte, também, não favorece a recorrente quanto ao alegado dissídio, letra d.

A uma, porque quanto àquele Acórdão oferecido do próprio Tribunal do Rio de Janeiro, não se presta ao Recurso Especial eis que impõe a letra c do n2

IH do art. 105 da Constituição Federal, seja a interpretação divergente de outro Tribunal e não do mesmo.

A outra, porque os paradigmas ofertados do STF, versam hipóteses di­versas da constante no aresto recorrido. Refere-se o primeiro (fl. 225), no trecho trazido a confronto, a exegese do art. 434 do Código Comercial, inapli­cável a espécie, como se procurou demonstrar quando do exame do cabimento quanto a letra a. E o segundo, a pagamentos feitos através de depósitos ban­cários, por parte do devedor, tidos como não válidos para quitação do débito (fls. 226/227), tratando do Acórdão recorrido de quitação em duplicatas entre­gues ao devedor.

Do que se expôs, fica evidente inexistir qualquer divergência entre o Acórdão recorrido e os paradigmas trazidos a confronto.

Tais os fundamentos pelos quais não conheço do recurso, por ambos os fundamentos das letras a e c.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO CLÁUDIO SANTOS: Sr. Presidente, porque não houve contrariedade e nem está provado o dissídio, também não conheço do recurso.

EXTRATO DA MINUTA

REsp. n2 1.447 - RJ - (Reg. n2 89.00119770) - Relator: Exmo. Sr. Ministro Waldemar Zveiter. Recorrente: Elevadores Otis S/A. Recorrido:

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 303

Transportes Coletivos de Anápolis Ltda. Advogados: Drs. Paulo Roberto de Carvalho Rego e outros e Gabriel Lopes Teixeira.

Decisão: A Turma, por unanimidade e preliminarmente, não conheceu do recurso especial. (Em 5.12.89 - 3i! Turma)

Os Exmos. Srs. Ministros Cláudio Santos e Nilson Naves votaram com o Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Exmo. Sr. Ministro Eduardo Ribeiro. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro GUEIROS LEITE.

304

+

RECURSO ESPECIAL N!! 1.514 - DF

(Registro n!! 89.0012141-3)

Relator: O EX11/o. Sr. Ministro Waldemar Zveiter

Recorrente: Credilar Ltda

Recorridos: Acrísio dos Santos Figueiredo e cônjuge; José Roberto da Silva Figueiredo

Advogados: Drs. Guaracy da Silva Freitas, Antônio Cabral de Castro e Jorge Alberto Vinhaes e outro

EMENT A: Processual Civil. Recurso especial. Ação de anulação de compra e venda e reivindicatória, cumulada com perdas e danos. Art. 119,111, a e ti, do permissivo constitucio­nal anterior, ou art. 105, III, a e c, da constituição federal vigente.

I - Inexistência da alegada negativa de vigência aos artigos 99, 100, 134,11, § 12,147,11, do Código Civil e art. 366, do CPC, eis que não foram sequer mencionados ou discutidos no acórdão recorrido (Súmula n2 282 e 356 - STF).

II - Não configurada a apontada divergênciajurispru­dencial, pois, que a recorrente não demonstrou o dissídio. Os arestos, tidos como padrão, não se aplicam ao caso dos autos.

111 - Ausência de pressupostos (art. 255, parágrafo único, do RISTJ).

IV - Recurso não conhecido por ambos os fundamen-tos.

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a 3l! Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso especial, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei. Brasília, 12 de dezembro de 1989 (data do julgamento). Ministro GUEIROS LEITE, Presidente. Ministro W ALDEMAR ZVEI­

TER, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO W ALDEMAR ZVEITER: Trata-se de Ação de Anulação de Compra e Venda e Reivindicatória, cumulada com Perdas e Danos, proposta por Acrísio dos Santos Figueiredo, Maria Jovelina Figueiredo e José Roberto da Silva Figueiredo contra Credilar - Gomes Araújo, Comér­cio de Móveis e Eletrodomésticos Ltda., julgada improcedente pela sentença de fls. 162/179, porém reformada pelo Acórdão proferido pela 2l! Turma do Colendo Tribunal de Justiça do Distrito Federal (fls. 225/226 e 229/233).

Inconformada, interpôs Recurso Extraordinário, com base no art. 119, 111, a e d, da Constituição anterior, no qual se alega que o Aresto recorrido teria negado vigência aos artigos 99; 100; 134,11, § 1!!; 147,11, do Código Civil e artigo 366, do CPC, bem como divergido de julgado de outro Tribunal (fls. 236/244). Não houve impugnação (fi. 250).

O ilustre Presidente daquele Tribunal, por não oferecer o recurso condi­ções de admissibilidade e com apoio nas Súmulas 279, 283, 284, 400 e 454, do STF, negou-lhe seguimento (fls. 251/252).

Irresignada, a recorrente aforou agravo de instrumento, reiterando argu­mentos, ao qual foi negado seguimento (fl. 66, dos respectivos autos em apenso); contra esta decisão a agravante interpôs Agravo Regimental, tendo o ilustre Ministro Sydney Sanches, Relator, exarado despacho determinando a subida do Recurso Extraordinário, para melhor exame (fi. 95 - apenso).

Devidamente processado, subiram os autos ao Egrégio Supremo Tribunal Federal, onde o Ministério Público Federal opinou pelo não conhecimento do RE (fls. 259/262).

Apreciando o recurso, o Sr. Ministro Relator, adotando os fundamentos deduzidos na questão de ordem suscitada no RE n~ 119.204-6 - SP, por despacho, converteu, ipso iure, o Extraordinário em Recurso Especial e deter-

R. sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 305

minou a remessa do processo a este Superior Tribunal de Justiça, vindo-me os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO W ALDEMAR ZVEITER: Trata-se de Re­curso Extraordinário convolado em Especial, no qual se alega que o Acórdão recorrido teria negado vigência aos artigos 99, 100, 134, II, § 1!.!, 147, II, do Código Civil e art. 366, do CPC, bem como dissentido de julgados de outros Tribunais.

O aresto contra o qual investe a recorrente ficou assim ementado (tl.229):

"Compra e Venda. Nula a procuração e conseqüentemente a escritura de compra e venda, com base na lesão, da qual resultou para os vendedores um prejuízo na conclusão da venda, oriundo da desproporção existente entre as prestações dos contratantes."

Não conheço do Recurso com fundamento tanto na letra a quanto na letra d, do permissivo constitucional precedente, hoje, alíneas a e c, da Carta Magna vigente.

Revelam os autos, quanto à alegada negativa de vigência dos citados artigos de lei, ditos infringidos, ao contrário do que afirma a recorrente, que aqueles dispositivos, supostamente violados, não foram sequer mencionados ou discutidos, tanto na r. sentença de primeiro grau, quanto no aresto atacado. Se quanto a isto foi omissa a decisão recorrida, à recorrente cabia opor embar­gos declaratórios. Contudo não o fez. Dessa forma não pode, posteriormente, invocá-lo na via estreita do Especial, incindindo, assim, nos enunciados das Súmulas n!.!s 282 e 356, do STF.

Quanto à alegada divirgência jurisprudencial, também, não logrou de­monstrá-la a recorrente, eis que os arestos, tidos como padrão, trazidos a confronto, não se aplicam ao caso dos autos, como se vê às fls. 239/240, porque ali cuidou-se, respectivamente, de matéria diversa da discutida no aresto recor­rido.

Ao demais, a recorrente, para dar suporte à sua tese, limitou-se, tão-so­mente, a transcrever, apenas, partes das ementas dos arestos colacionados, as quais não considero válidas ao imprescindível confronto das teses ditas diver­gentes, porque tais transcrições por- si só não se prestam a demonstrar a divergência apontada entre os julgados, pois, que não atendidas as exigências contidas no parágrafo único, do art. 255, do RISTJ.

É ler, pois, no essencial o que dizem os respectivos acórdãos paradigmas, o primeiro, verbis:

306 R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

"O depoimento pessoal da autora a fls. é o melhor desmen­tido às pretensas maquinações ou ardis, ao vício de consentimento ou ao erro, pois, até mesmo a autora chega a dizer que não foi procurada pelo réu para lhe propor qualquer acordo ou fazer-lhe qualquer ameaça. Conta ainda a embargante que entrara em en­tendimento com José Alves Carneiro para venda da herança, calculando receber CR$ 15.000,00, pelo que preferia liquidar logo a questão, a fim de comprar um sítio no Paraná.

Admita-se mesmo que a embargante não soubesse o valor das terras objeto da cessão; mas nem por isto o ato é nulo ou anulável. A disparidade entre o valor da coisa e a alienação não constitui, por si só, erro que acarrete invalidação do ato. Mil motivos pode ter o vendedor para alienar por preço baixo aquilo que vale preço maior; e, no caso, a embargante apresentava um motivo: queria liquidar logo o direito à herança para comprar um sítio no Paraná.

O preço deve ser sério e real, não há dúvida, porque os autores exemplificam que, se se vender por um o que vale mil, haverá doação da parte excedente (B. de Faria, "Cod. Com." art. 193.) Planiol chega mesmo a afirmar que não é necessário que o preço seja o equivalente exato da coisa ("D.Civ." 2, 1.375.) No mesmo sentido as lições de Pacifici-Mazzoni ("1st. di D. Civ." 5. pág. 21) e Cunha Gonçalves ("Compra e Venda", pág. 149.). A Jurisprudência temtembém rejeitado essa espécie de erro ("Rev. de Dir.", 19/180; "Rev. dos Tribs.", 168/338.). A venda de uma coisa que vale mais por preço abaixo do seu valor real não anula o contrato, somente pela existência dessa disparidade. Necessário é que tenha intervindo dolo ou erro, desses que anulam os atos jurídicos. A embargante quis o ato, nele consentiu, sabia qual o objeto da cessão e até sabia o valor das terras. Não foi enganada, nem se enganou. O acórdão deve, pois, prevalecer."

E o segundo:

"Na espécie dos autos, mediante escritura pública, lavrada em 4.1.73 os autores venderam à firma Sanyo Shokai Ltda, uma área de terras, com 145.000 m2

, situada no bairro Pimenta, no município e comarca de Indaiatuba, deste Estado, na qual a ad­quirente ré deveria instalar uma indústria.

Entretanto, como não ocorreu a instalação dessa indústria, os vendedores, alegando "que a ré apenas adquiriu a área para especular imobiliariamente, tendo em vista o crescente aumento dos imóveis", pretendem, através de ação ordinária, intentada em

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 307

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15.3.75, a anulação da alienação e da respectiva escritura de venda e compra e o cancelamento da transcrição imobiliária, porquanto a adquirente descumpriu todas as formalidades esta­belecidas pela Lei 5.709/71, e pelo Dec. 74.965/74.

Ainda que se admita que ambas as partes procederam com dolo, nehuma poderá alegá-lo, para anular o ato, ou reclamar indenização, em face do que dispõe o art. 97 do cc."

Já o aresto recorrido, a certo passo dispôs (fi. 231):

"O que resultou demonstrado é que o contrato firmado não retrata a realidade. Em primeiro lugar comprovado está que não houve o pagamento do preço do imóvel "vendido". É o próprio réu-apelado Antônio Pena Figueiredo quem reconhece em seu depoimento que a importância de Cr$ 100.000,00 consignada como preço da venda era simbólica (fi. 139) não sabendo nem mesmo quem lhe deu essa importância, que não foi paga no ato da venda, razão porque só posteriormente buscou-se consigná-la judicialmente em favor de seu pai (fls. 39/40). Faltou assim, o preço, elemento essencial para a validade do contrato."

Para acrescentar mais adiante (fi. 232):

"A ausência de um dos elementos essenciais à validade da compra e venda já seria suficiente para o acolhimento da preten­são dos autores. E no caso o vício de vontade dos outorgantes -coação - também esteve presente. As circunstâncias e o momen­to em que se deu a outorga, com Acrísio acometido de derrame cerebral, necessitando de tratamento em um centro mais adianta­do e com melhores recursos, tudo isto constituiu para a obtenção de seu consentimento na outorga do mandato. A pressão do filho Antônio incutiu ao pai fundado temor de dano à sua pessoa, sendo de se considerar a idade, a condição de dificuldade por que pas­sava Acrísio e principalmente a sua saúde que se encontrava abalada, necessitando de receber tratamento em Belém.

Também, merece acolhida a pretensão de anular-se a pro­curação e conseqüentemente a escritura pública de compra e venda, com base na lesão, da qual resultou para os vendedores um prejuízo sofrido na conclusão da venda, oriunda da despro­porção existente entre as prestações dos contratantes. Esta figura que se assenta na injustiça do contrato em si e que vem sendo acolhida pelos nossos Tribunais acha-se consagrada no Antepro­jeto do Código Civil apresentado pela Comissão presidia pelo

. Prof. Miguel Reale, no art. 157 que estabelece: "Ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou por inexpe-

R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

riência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta."

Portanto, ao que se depreende dos autos, não se configuram tanto a alegada negativa de vigência dos dispositivos de lei, quanto a suposta diver­gência com os julgados trazidos à colação, que cuidam de matéria disseme­lhantes à versada na decisão recorrida. Esta ao contrário do que afirma a recorrente, aplicou corretamente a lei à espécie, com suporte no direito preto­riano.

Ausentes, pois, os pressupostos de admissibilidade, não conheço do re­curso por ambos os fundamentos.

EXTRATO DA MINUTA

REsp. n!! 1.514 - DF - (Reg. n!! 89.00121413) - Relator: Exmo. Sr. Ministro Waldemar Zveiter. Recorrente: Credilar Ltda. Recdo.: Acrísio dos Santos Figueiredo e cônjuge. Recorrido: José Roberto da Silva Figueiredo.

Decisão: A Turma, por unanimidade e preliminarmente, não conheceu do recurso especial. (Em 12.12.89 - 3!!. Turma)

Os Exmos. Srs. Ministros Cláudio Santos, Nilson Naves e Eduardo Ri­beiro votaram com o Ministro Relator. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro GUEIROS LEITE.

+ RECURSO ESPECIAL N!! 1635 - PB

(Registro n!! 89.0012516-8)

Relator: O EX1I1o. Sr. Ministro Gueiros Leite

Recorrente: Antonio Vieira Lins

Recorridos: João Nogueira da Costa - herdeiros

Advogados: Drs. Paulo Américo Maia e outro; Joás de Brito Pereira Filho e outro

EMENTA: Cônjuges. Disposições testamentárias em proveito recíproco.

Os cônjuges podem instituir-se, reciprocamente, herdei­ros em cédulas diferentes, pois, o que a lei condena (CC, art. 1630) é o encerramento das disposições em um só ato, mas a sua enunciação separada é válida.

Recurso conhecido e provido.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, agn. 1990. 309

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 3l!. Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

conhecer do recurso especial e lhe dar provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 14 de agosto de 1990 (data do julgamento). Ministro GUEIROS LEITE, Presidente-Relator.

RELATÓRIO

o EXMO. SR. MINISTRO GUEIROS LEITE (Relator): Antonio Vieira Lins interpôs recurso extraordinário, com argüição de relevância, do acórdão da Primeira Câmara Cível, do Tribunal de Justiça da Paraíba, confirmatório de sentença de primeiro grau em acórdão assim ementado:

"Ação Ordinária de impugnação e anulação de testamento. Apelação. Quis o Código Civil proibir o testamentó, quando os cônjuges se instituíssem reciprocamente herdeiros, por ser mo­dalidade do pacto sucessório, contraindo caracteres elementares de ato de última vontade. (Art. 1626, dos Comentários de Clóvis Bevilacqua). Desprovimento."

(fi. 277) O recorrente alega que o acórdão teria violado os arts. 1630, 1746 e 1708,

do Código Civil, bem como divergido da Jurisprudência de outros tribunais. A presidência do Tribunal de origem admitiu o recurso (fIs.291/292),

subindo os autos ao Supremo Tribunal federal (fls. 315/316), de onde vieram para esta Corte, após convertido o extraordinário em recurso especial, fundado no art. 105, In, letras a e c, da Constituição (fl. 324).

Ouvida a ilustrada Subprocuradoria Geral da República, opinou pelo não conhecimento do recurso (fls. 328/329).

É o relatório, no essencial.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO GUEIROS LEITE (Relator): Decidiu o ma­gistrado pela procedência da ação e decretou a nulidade do testamento, "por apresentar-se caduco e revogado para todos os fins de direito, por não haver consumado, na sua plenitude, a vontade da testadora, em vista do desquite

310 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, agõ:~ 1990.

decretado por sentença irrecorrida, onde se pôs fim aos termos do casamento e logicamente à relação patrimonial existente entre os cônjuges ll (fi. 271).

A Primeira Câmara Cível do Tribunal da Paraíba manteve a sentença, porque o Código Civil veda, no art. 1630, a alternatividade testamentária. Os testamentos foram feitos pelos cônjuges na mesma data, mesmo livro e perante o mesmo tabelião. O certo seria que se instituíssem herdeiros reciprocamente, preservado o caráter confidencial do testamento.

Acentua o recorrente que são duas as questões debatidas, a saber:

a) se a proibição constante do art. 1634, CC, aplica-se a testam~ntos feitos por marido e mulher em cédulas distintas, na mesma data;

b) se a separação consensual subseqüente tem como conseqüência a revogação ou a caducidade do testamento feito pela mulher ao marido.

O acórdão recorrido responde afirmativamente a ambas as questões e reputa nulo e ineficaz o testamento de Zulmira Nogueira de Jesus instituindo herdeiro o recorrente, respeitada a parte disponível.

Dispõe o art. 1630:

11 Art. 1630. É proibido o testamento conjuntivo, seja simultâneo, recípro­co ou correspectivo. 11

Testamento conjuntivo é aquele feito à mão comum, isto é, por duas pessoas, na mesma cédula, e que se instituem herdeiros recíprocos (fi. 283, item 2). Como tal não ocorreu na espécie dos autos, é de ver-se que o acórdão recorrido violou o art. 1630 citado.

O Ministro Orozimbo Nonato já decidiu que lia vedação do Código Civil atinge o testamento de mão comum, isto é, na definição de Gouveia Pinto, o público ou particular feito por marido e mulher conjuntamente e no mesmo papel 11 (Arq.Jud. 315, RE n\2 16.045/MG).

O Desembargador Nogueira ltagiba proclamou, igualmente, que os côn­juges podem se instituir, reciprocamente, herdeiros em cédulas diferentes. O que a lei condena é o encerramento das disposições em um só ato, mas a sua enunciação separada é válida (Arq. Jud. 75/437).

O Tribunal de Justiça paulista, firmado em Carlos Maximiliano (Suces­sões, n2 366) e Carvalho Santos (CC Interpretado), decidiu que o art. 1630 não obsta a que duas pessoas, em atos separados, embora na mesma data e nos mesmos termos, disponham em proveito recíproco (RT 150/652).

Nesse ponto o acórdão recorrido afrontou a lei.

Quanto à segunda questão, demonstra-se, de igual modo, que a caduci­dade e a revogação do testamento não teriam como causa a separação consen­sual e superveniente dos cônjuges. De acordo com o art. 1746, CC, o

R. Sup. Trih.lust., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 311

testamento só se considera revogado por outro. O art. 1708, do mesmo Código, é aplicável à caducidade dos legados.

O Ministro Gonçalves de Oliveira tem acórdão nesse sentido. Lá está, na ementa, que "o desquite não revoga o testamento feito pelo marido à mulher, mormente se o testador, após o desquite, mantinha relação de amizade de demonstração de estima à esposa" (RTJ 45/469).

Comenta o recorrente passagem do acórdão recorrido onde se diz não ter ficado demonstrada a subseqüente amizade entre os ex-cônjuges. E esclarece, ainda com a mão no voto do Ministro Gonçalves de Oliveira, que se os testadores desquitandos quisessem anular os respectivos testamentos, tê-Io­iam feito na forma do art. 1.746 citado.

Acrescente-se que o Ministro Gonçalves de Oliveira não condicionou a validade do testamento à amizade dos cônjuges subseqüentemente ao desquite, pois, usa a palavra mormente para indicar apenas a excelência do bom relacio­namento dos antigos cônjuges, a justificar uma realidade ética.

Ante o exposto, conheço do recurso e lhe dou provimento. É como voto.

EXTRATO DA MINUTA

REsp n!! 1635 - PB - (Reg. n!! 89.0012516-8) - Relator: O Exmo. Sr. Min. GUEIROS LEITE. Recorrente: Antonio Vieira Lins. Recorridos: João Nogueira da Costa. Herdeiros. Advogados: Paulo Américo Maia e outro e Joás de Brito Pereira Filho e outro.

Decisão: A 3l.! Turma, por unanimidade, conheceu do recurso especial e lhe deu provimento, nos termos do voto do Exmo. Sr. Ministro Relator. (Jul­gado em 14.08.90)

Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Ministros Nilson Naves, Eduardo Ribeiro, Waldemar Zveiter e Cláudio Santos.

312

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro GUEIROS LEITE .

• RECURSO ESPECIAL N!! 1.691 - SP

(Registro n!! 89126628)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Nilson Naves

Recorrente: Cia. de Seguros do Estado de São Paulo

Recorrida: Empresa de Navegação Aliança S/A

Advogados: Drs. Américo de Almeida Rossi e outros e Durval Boulhosa e outros

R. Sup. Trih. Jusl., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

EMENT A: Seguro. Transporte de mercadoria. Cláusu­la limitativa. Não dissente da Súmula 161/STF, e menos da Súmula 188/STF, acórdão que limitou a responsabilidade do transportador ao valor convencionado. A divergência com princípio sumulado há de ser em relação ao que nele estiver disposto, e não quanto ao que virtualmente nele se contenha. Recurso especial não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a 3i! Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade e preliminarmen­te, não conhecer do recurso especial, nos tennos do voto do Sr. Ministro Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 13 de fevereiro de 1990 (data do julgamento).

Ministro GUEIROS LEITE, Presidente. Ministro NILSON NAVES, Re­lator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO NILSON NAVES: Foi o recurso extraordi­nário inadmitido pelo Presidente Marcus Vinícius dos Santos Andrade, nestes termos:

"1. Cuida-se de ação de indenização, sob o procedimento sumaríssimo, objetivando a autora o recebimento de importância paga a sua segurada, em decorrência de danos causados em mer­cadorias transportadas por via marítima.

A r. sentença (fls. 307/311) julgou-a procedente, em parte, para condenar a empresa ré a pagar à autora o equi valente a 1:: 300 (trezentas libras esterlinas), convertido em cruzados ao câmbio do dia do efetivo pagamento.

Apelou a autora, buscando a indenização pelo valor total de Cz$ 45.637,32 (quarenta e cinco mil, seiscentos e trinta e sete cruzados e trinta e dois centavos) e a Egrégia Terceira Câmara Especial, por maioria de votos, negou provimento ao recurso (fls. 346/359).

Interpostos embargos infringentes, por votação majoritária, restaram rejeitados (fls. 423/426).

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 313

314

Pretende a abertura da via extraordinária a vencida, com fundamento no artigo 119, inciso IlI, letras a e d, da Constituição da República de 1967, com a redação dada pela Emenda nQ 1, de 17/10/1969. Alega negativa de vigência aos artigos 985 e seguin­tes e 1.099 do Código Civil, lQ, do Decreto 19.473/1930. Aponta divergência com as Súmulas 161 e 188 da Augusta Corte. Argu­menta operar-se a sub-rogação de pleno direito a favor do credor que paga a dívida. No caso, a recorrente quitou a indenização, e por conseguinte foram-lhe transferidos todos os direitos, ações, privilégios e garantias da recorrida em relação à obrigação. En­tende ser inoperante a cláusula que estipulou limite da indeniza­ção por volume, isto porque a obrigação da transportadora é de entregar a mercadoria no lugar do destino e não restringir ou modificar a obrigação de indenizar em caso de perda ou extravio. Como denotadores da divergência jurisprudencial cita o RE 107.361-6 eas Apelações desta Corte de nQs 311.387 e 378.160. Argúi relevância da questão federal.

Houve impugnação (fls. 439/441).

2. Dentre as hipóteses previstas nos incisos I a X do artigo 325 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, encon­tra-se presente alegação de divergência com súmulas (inciso lI) da Augusta Corte, a permitir que se instaure o juízo de admissi­bilidade (artigo 326).

Contudo, não se vislumbra dissidência com a Súmula 161, cujo teor é o seguinte:

'Em contrato de transporte, é inoperante a cláusula de não indenizar' .

No caso em exame, a douta Turma Julgadora não discutiu acerca da exoneração da obrigação de não indenizar, por parte da recorrida, mas, sim, decidiu o litígio de acordo com a cláusula limitativa da responsabilidade da transportadora.

Nem, tampouco, configurou-se conflito com o verbete 188, que estabelece:

'O segurador tem ação regressiva contra o causador do dano, pelo que efetivamente pagou, até ao limite previsto no contrato de seguro'.

No tocante ao referido ditame pretoriano, apesar de não ter sido prequestionado (Súmula 282), cumpre ressaltar ter a v. de­cisão recorrida com ele se afinado.

A indenização reclamada pela recorrente foi concedida obe­decendo ao limite previsto no contrato.

R. SlIp. Trih. JlISl., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Pertinente a transcrição da exegese alcançada pelos Julga­dores, ao dirimir a controvérsia sobre a abrangência da responsa­bilidade da recorrida no caso vertente: ... "

"

/I Ademais, o que pretende a demandante é a interpretação de cláusula contratual, o que é vedado pela Súmula 454."

Provendo o agravo de instrumento, em apenso, onde o recurso extraordi­nário foi convertido em recurso especial, determinei a subida dos autos prin­cipais, para melhor exame. Eis um trecho do despacho de conversão:

"L Denegado, na origem, recurso extraordinário restrito à matéria infraconstitucional (negativa de vigência de lei ordinária e divergência com Súmula do STF), deduzido juntamente com argüição de relevância, é interposto o presente agravo. A argüição de relevância não chegou a ser processada, porquanto inobser­vando o art. 328, § 2!.!, RISTF."

Na origem, com vista dos autos, a recorrente reportou-se às razões da interposição, e a recorrida nada disse.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO NILSON NAVES (Relator): Do melhor exame que fiz do caso, com a subida dos autos originais, verifiquei que o recurso extraordinário convertido em recurso especial não reúne condições para ser conhecido. A argüição de relevância não chegou a ser processada, ficando, assim, o cabimento do apelo adstrito à divergência com Súmula do Supremo Tribunal Federal, a teor do disposto no art. 325, inciso lI, do seu Regimento. Quanto à de n!.! 188 ("O segurador tem ação regressiva contra o causador do dano, pelo que efetivamente pagou, até ao limite previsto no contrato de seguro"), de todo improcedente a alegação de sua contrariedade, pois, o acórdão recorrido com ela se harmoniza. Quanto à de n!.! 161 ("Em contrato de transporte, é inoperante a cláusula de não indenizar"), foi a que me. levou a mandar subir os autos principais.

Com efeito, encontrei nos autos do agravo de instrumento, e também nestes, trazido pela parte interessada, cópia do RE-1 07 .361-6, com essa ementa: "Diverge, manifestadamente, da Súmula n!1161 do Supremo Tribunal, onde se consagra a inoperância da cláusula de não indenizar, o acórdão recor­rido, que placitou estipulação, limitativa da responsabilidade do transportador marít~mo, a valor de tornar irrisória a indenização. Recurso Extraordinário provido". Cuidou-se ali de hipótese vinda do Rio de Janeiro, com o acórdão

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 315

local sublinhando, em sua ementa, o seguinte: "Responsabilidade do transpor­tador limitada ao valor convencionado. Validade da cláusula. Não implica em 'cláusula de não indenizar', a estipulação do conhecimento limitando a inde­nização a9 valor nele mencionado", fi. 409. Foi tal que me levou - repito -a prover o agravo, em a penso, pois, o acórdão em foco, rejeitando os embargos infringentes, afirmara:

"Ao embarcador são oferecidas duas opções à sua livre escolha: ou declara o valor real das mercadorias pagando o frete correspondente ao que houvera declarado ou prefere o frete re­duzido, fi.cando a responsabilidade do transportador limitada na conformidade da cláusula inserida no contrato. Assim, forçoso é reconhecer que não configura tal cláusula, qualquer restrição ao valor do conhecimento de frete como prova de recebimento de mercadoria e da obrigação de entregá-la no lugar do destino, sendo lícita a cláusula em exame, conforme decisões desse Tri­bunal, destacando-se entre elas aquela proferida na Apelação n!.! 354.172, em que foi relator o hoje Desembargador Laerte Norde, da Quinta Câmara Civil.

Nessas condições, se a embarcadora preferiu não indicar o valor da mercadoria, aderindo explicitamente à modalidade de frete, beneficiando-se do frete reduzido, não poderá a apelante agora reclamar indenização superior à cifra prevista na cláusula contratual que em nada contraria as disposições legais declinadas nas razões recursais.

Não há, pois, infringência à Súmula n!.! 161 do Supremo Tribunal Federal,já que não se trata de cláusula de não indenizar, mas de cláusula apenas limitativa de responsabilidade."

Malgrado a semelhança entre ambos os casos, não creio que haja diver­gência com a citada Súmula 161, data venia. Em síntese, a cláusula limitativa de que ora se trata, obra do embarcador, beneficiando-se do frete reduzido, pode ser tida e havida como "cláusula de não indenizar", para configurar o alegado dissídio com a Súmula 161? Penso que não, para o fim específico. A não ser que se entenda como expresso o qué nela virtualmente se contenha. Porém, em termos de discrepância com Súmula, esta 311 Turma estabeleceu certo rigor, se não estou em erro. Lembro um caso de correção monetária, com a Súmula 562/STF, restando o recurso sem conhescimento, pois, a Turma, por maioria de votos, 11ão aceitou, para caracterizar a alegada divergência, o que potencialmente a Súmula continha (REsp 452, Sr. Ministro Gueiros Leite).

Ante o exposto, crendo não configurada a apontada divergência, não conheço do recurso.

316 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

EXTRATO DA MINUTA

REsp n2 1.691 - SP - (Reg. n!! 89126628) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Nilson Naves

Recorrente: Cia. de Seguros do Estado de São Paulo Recorrida: Empresa de Navegação Aliança S/A Advogados: Drs. Américo de Almeida Rossi e outros e Durval Boulhosa e outros

Decisão: A Turma, por unanimidade e preliminarmente, não conheceu do recurso especial, nos termos do voto do Exmo. Sr. Ministro Relator (3ª­Turma, 13/2/90).

Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Ministros Eduardo Ribeiro, Waldemar Zveiter, Cláudio Santos e Gueiros Leite. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro GUEIROS LEITE.

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RECURSO ESPECIAL N!! 1.709 - RJ

(Registro n2 89.0012730-6)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Fontes de Alencar

Recorrente: Cia. Industrial Santa Matilde

Recorrida: Cyrus Impresso Continuo S/A.

Advogados: Drs. Marcos Oswaldo P. Rodrigues Lima e outros e Maria Lucila Saraiva de Carvalho e outros.

EMENTA: Falência. Depósito elisivo. Apelação. Prazo. I - O prazo para a interposição do apelo manifestado

contra a sentença que, em face do depósito elisivo da falência, julgou extinto o processo, é de ser contado a partir de sua intimação.

11 - Recurso especial provido, sem discrepância de vo-to.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a 4ª- Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, na forma do relatório e notas taqui-

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 317

gráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 6 de fevereiro de 1990 (data do julgamento).

Ministro BUENO DE SOUZA, Presidente. Ministro FONTES DE ALENCAR, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO FONTES DE ALENCAR: Cia. Industrial Santa Matilde apela da sentença de fls. 40 a 42, que julgou extinto o pedido de falência, em face do depósito elisivo.

O acórdão recorrido guarda o seguinte teor:

"EMENTA. Falência. Apelação. Intempestividade. Não co­nhecimento.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n2 4.628/88, em que é apelante Cia. Industrial Santa Matilde, sendo apelada Cyrus Impresso Contínuo S/ A.

Acordam os Desembargadores que compõem a Sétima Câ­mara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade, em preliminar, não conhecer do recurso.

Assim decidem porque a sentença foi publicada em cartório aos 16.6.88, uma quinta-feira.

Face ao disposto no art. 204 da Lei de Falência, o prazo co­meçou a correr aos 17.06.88, sexta-feira, terminando a 12.7.88, uma sexta-feira.

O recurso, porém, só foi interposto aos 7.07.88, quando exaurido o prazo.

É, assim, intempestivo.

Por essa razão, dele não se conhece."

A recorrente interpôs recurso extraordinário, transformando ipso iure recurso especial, alegando violação dos arts. 240, 241 e 242 do Código de Processo Civil, c/c o art. 52 da Lei n!! 6.014/73, além de dissídio jurisprudencial.

318

Pelo despacho de fls. 79 a 81, foi o recurso admitido.

Tão-somente com as razões de fls. 83 a 84, subiram os autos a esta Corte.

É o relatório.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

VOTO

o EXMO. SR. MINISTRO FONTES DE ALENCAR (Relator): Inúme­ras são as decisões do Supremo Tribunal respaldadas na melhor doutrina, no sentido de que o requerimento de falência, em face do depósito elisivo, trans­forma-se em ação de cobrança (Cf. RTJ 118/374).

Somente por este fundamento já poder-se-ia argumentar a impropriedade da aplicação do art. 204 da Lei de Falências, para se julgar intempestiva a apelação.

Ressalte-se, sobretudo, que o art. 204 da Lei de Falências, em que se respaldou o acórdão, foi derrogado por legislação superveniente, não tendo, portanto, aplicação.

Consoante anota Theotônio Negrão ("Código de Processo Civil e Legis­lação Processual em vigor", p. 763, 19ó! ed., Ed. Rev. Trb., São Paulo - 1989):

"Com a nova redação dada pelo art. 52 da Lei nQ 6.014, de 1973, ao art. 207 da lei falimentar, a regra do art. 204 não mais subsiste. Destarte, o prazo para a interposição dos recursos passou a ser contado a partir da intimação da sentença ou decisão recor­rida" (RJTJESP 55/118). No mesmo sentido: RT 527/229, em. 616/159, RF 291/263, RJTJESP 37/144."

De mais a mais, somente para argumentar, mesmo que de falência se cuidasse, melhor sorte não teria o recorrente, pois assim decidiu o Supremo Tribunal Federal em aresto relatado pelo eminente Ministro Rafael Mayer:

"Falência .. Pedido de restituição. Apelação. Prazo (termo inicial). O dies a quo para o oferecimento da apelação começa a correr da intimação da sentença às partes, quando não publicada em audiência (artigo 242 do CPC). Recurso Extraordinário co­nhecido e provido" (RTJ 100/885).

Registro que a certidão de intimação da sentença de 23.06.88 está à fi. 43. O prazo para recurso terminaria, pois, a 08 do mês subseqüente. Assim, tempestivo foi o apelo manifestado a 07 do dito mês de julho de 1988.

Em face do exposto, conheço do recurso pela alínea a do item IH do art. 105 da Constituição federal, e lhe dou provimento, para que, afastada a preliminar de intempestividade, o Tribunal a quo aprecie a causa como enten­der de direito.

É o meu voto.

EXTRATO DA MINUTA

REsp nQ 1.709 - RJ - (Reg. n2 89.00127306) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Fontes de Alencar. Recorrente: Cia. Industrial Santa Matilde. Recor-

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 319

rida: Cyrus Impresso Contínuo S/A. Advogados: Drs. Marcos Oswaldo P. Rodrigues Lima e outros e Maria Lucila Saraiva de Carvalho e outros.

Decisão: A Turma, por unanimidade, conheceu do recurso e deu-lhe provimento, nos termos do voto do Exmo. Sr. Ministro Relator (Em 6.2.90 -4!!Turma).

Os Exmos. Srs. Ministros Sálvio de Figueiredo, Barros Monteiro, Bueno de Souza e Athos Carneiro votaram com o Relator. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro BUENO DE SOUZA.

• RECURSO ESPECIAL Nº 1741 - SP

(Registro nº 89.0012817-5)

Relator: Exmo. Sr. Ministro José Dantas

Recorrente: Ministério Público do Estado de São Paulo

Recorrido: Donizete de Souza Gomes

Advogado: Dr. Orlando Calvielli

EMENTA: Criminal. Regime Prisional. Progressão. - Falta de estabelecimento adequado. Concedido o be­

neficio do regime aberto, constitui ilegalidade desatender o direito do beneficiário sob pretexto da falta de estabelecimen­to adequado. Acertado cumprimento da decisão por via da excepcional admissão do sentenciado à prisão albergue-domi­ciliar.

Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 5i!. Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

conhecer do recurso, mas lhe negar provimento, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

320

Custas, como de lei. Brasília,7 de fevereiro de 1990 (data do julgamento). Ministro José Dantas, Presidente e Relator.

R. Sup. Trib.lusl., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ DANTAS: A espécie está bem relatada pelo r. despacho de admissão do recurso, nestes tópicos:

"Donizete de Souza Gomes formulou, perante o Juízo da Vara das Execuções Criminais de São Paulo, pedido de progres­são para o regime aberto, tendo o MM. Juiz de Primeira Instância deferido a pretensão, permitindo-lhe, até que se tenha designado o local adequado, que se recolha em sua residência.

Desta decisão interpôs o representante do Ministério Públi­co agravo, que a E. Décima Segunda Câmara deste Tribunal, por votação majoritária, deixou de acolher.

Com apoio no art. 105, n.III, letras a e c, da Constituição Federal, a douta Procuradoria-Geral da Justiça interpõe recurso especial. Alega, em síntese, que o ven. acórdão atacado - ao confirmar a decisão de Primeira Instância que concedeu a prisão albuquerque domiciliar, sem que a situação do condenado se enquadrasse em qualquer das hipóteses do art. 117 da Lei n. 7.210/84 - negou vigência ao referido dispositivo, além de dis­sentir de julgados do Colenclo Supremo Tribunal Federal e do E. Tribunal de Justiça de São Paulo." - fls. 81.

Arrazoando o recurso, o recorrente colacionou acórdãos mais recentes, do Pretório Excelso, com ementas deste teor:

"Pena privativa de liberdade. Regime aberto. A inexistência, na comarca, de casa de Albergado, não justifica a concessão de prisão domiciliar, fora dos casos taxativamente enumerados no art. 117 da Lei n!.! 7.210/84" (RE n!.! 118.565/1, SP, P T., Min. Octavio Gallotti, DJU de 21.04.89, p. 5858) - fls. 90.

Nesta instância, o Ministério Público Federal manifestou-se contra o recurso, consoante os seguintes fundamentos:

"I. - O Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo, por sua 12i! Câmara, confirmou decisão do Dr. Juiz de li! instância, que deferiu ao acusado Donizete de Souza Gomes pedido de progressão para o regime aberto, até que se tenha designado o local adequado, que se recolha em sua residência. Contra a referida decisão a Procuradoria-Geral da Justiça daquele Estado manifestou o presente recurso especial, sustentando que aquele julgado, assim decidindo, teria negado vigência do artigo 117, da Lei n!.! 7.210/84 e dissentido de jurisprudência do Excelso Pretório.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 321

Relatei.

2. - A nosso ver, o presente recurso, se conhecido, não deverá ser provido. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já se orientou no sentido de que: "Inexistindo estabeleci­mento penal adequado é legítimo o recolhimento do réu em residência particular do sentenciado a que foi deferido o regime aberto para o cumprimento da pena" (DJU de 21.08.89).

Brasília, 6 de dezembro de 1989.

A.G. V ALIM TEIXEIRA

Subprocurador-Geral da República." - fls. 103.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO JOSÉ DANTAS (Relator): Srs. Ministros, de tão repetitiva que é, volta à baila a controvérsia sobre permitir-se, em caráter excepcional, o recolhimento do beneficiário de regime aberto em residência particular, quando a execução da progressão obtida se impossibilite à míngua de vaga em Casa de Albergado.

De que o recurso do Ministério Público deva ser conhecido, temos dito que o recomenda o comprovado dissídio jurisprudencial de ordem maior, conforme paradigmas proferidos pelo Supremo Tribunal Federal, fulcrados na literalidade do art. 117 da Lei 7.210/84, por sua vez restritiva da permissão daquele favorecimento apenas aos portadores das precárias condições etárias e de sanidade física e mental ali arroladas.

No entanto, sem embargo da respeitabilidade da jurisprudência colacio­nada, este Eg. Tribunal vem afirmando em sentido contrário, nos moldes do v. acórdão recorrido, para reconhecer igual caráter de excepcionalidade em casos como o dos autos. Tal se assevera à luz do argumento-mor de que, constituído por decisão judicial o direito à progressão para um regime prisional mais brando - como no caso se deu do regime semi-aberto para o aberto -, ilegal será manter-se o beneficiário na purgação de regime mais rigoroso; mormente se essa manutenção apega-se tão somente ao despreparo do Estado para garantir o cumprimento regular da lei.

Nesse sentido se tranquilizou a orientação do Tribunal, a exemplo da unanimidade de votos desta Eg. Turma, no REsp 206-SP, por mim relatado, a teor da seguinte ementa:

322

"Criminal. Regime prisional. Progressão.

Falta de estabelecimento adequado. Concedido o benefício do regime aberto, constitui ilegalidade desatender o direito do beneficiário sob pretexto da falta de estabelecimento adequado.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Acertado cumprimento da decisão por via da excepcional admis­são do sentenciado à prisão albergue-domiciliar.

Precedentes do Superior Tribunal de Justiça." Na linha dessas considerações, conheço do recurso pela letra c do per­

missivo constitucional, mas lhe nego provimento.

EXTRATO DA MINUTA

REsp n!:! 1.741-SP - (Reg! n!:! 89,0012817-5) - R~lator: Exmo. Sr. Ministro José Dantas. Recorrente: Ministério Público do Estado de São Paulo. Recorrido: Donizete de Souza Gomes. Advogado: Dr. Orlando CalvieIli.

Decisão: A Tllnna, por unanimidade, conheceu do recurso, mas lhe negou provimento (5;! Turma, em 07.02.90).

Votaram de acordo os Exmos. Srs. Ministros Flaquer Scartezzini, Costa Lima, Assis ':foledo e Edson Vidigal. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Mini~tro JOSE DANTAS.

RECURSO ESPEClAL N!:! 1.749 - ES

(Registro n!:! 8900128337)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Gueiros Leite Recorrentes: Pqulo José Garcia e Cônjuge

Recorridos: Pedro Dçps Filho e Cônjuge

Advogados: Drs. EWico Vieira de Rezende e outros e Pedro Deps Filho

EMENTA: Recurso Especial. Nunciação de obra nova. Direito de vizinhança.

A abertura de janelas no prédio vizinho, construído na divisa há mais de quarenta anos, mas sem obediência ao necessário afastamento, não constitui servidão aparente ca­paz de obrigar o recuo de metro e meio do prédio nunciado edificado nos limites do respectivo lote.

Recur~o conhecido e provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a j-'- Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr.

R. Sup. Trib. Just., Bra"íIia, 2(12): 261-437, ugo. 1990. 323

Ministro Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília,3 de abril de 1990 (data do julgamento).

Ministro GUEIROS LEITE, Presidente-Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO GUEIROS LEITE (Relator): Pedro Deps Filho e sua mulher propuseram ação de nunciação de obra nova contra o casal Paulo José Garcia, julgada procedente.

Houve apelação e a Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Espírito Santo, por maioria, negou-lhe provimento, em acórdão assim emen­tado:

"Direito de vizinhança - Servidão aparente - Abertura de janelas há mais de uma ano e dia - A servidão aparente não depende de transcrição no resgistro de imóveis. Em se tratando de abertura de dimensão superior a 0.10 m x 0,20 m, é considerada janela, cuja vedação só poderia ser intentada no prazo de ano e dia. Excedido o prazo, consolida-se a servidão."

Apresentados embargos de declaração; foram rejeitados. Aos embargos infringentes também interpostos negou-se provimento, acórdão com a seguinte ementa:

"Abertura de janela de um prédio construído na divisa, há mais de 40 anos, constitui servidão aparente que eleve ser respei­tada pelo confinante. Não tendo o acórdão impugnado ferido direito, nem havendo negativa de texto federal e nem elesvio de interpretação de ot;ientação sumulada pelo Excelso Pretório, l)e­ga-se provimento aos embargos, mantendo, por via de conse­qüência, a decisão atacada. Votação unânime."

Dessa última decisão foi manifestado recurso extraordinário, com funda­mento no art. 119, IlI, a e d, ela CFj67;'alegando-se:vulneraelos os arts. 572 e 573, do Código Civil, além de dissídio com as Súmulas n2s 120 e 414, elo STF.

O recurso foi admitido e convertido no STF em recurso especial, com remessa dos autos a esta Corte.

É o relatório, no essencial.

324 R. Sup. Trib.lust., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

VOTO

o EXMO. SR. MINISTRO GUEIROS LEITE (Relator): Os autores, ora recorridos, estavam sendo turbados na sua propriedade e posse por obra nova dos réus, ora recorrentes, que, ao edificarem prédio vizinho, fizeram-no de forma a não obedecer ao distanciamento previsto no art. 573, do CC, obstruin­do a claridade pelas básculas e janelas e afetando a segurança do prédio preexistente.

A ação foijulgada procedente, porque os nunciados não podiam construir sem o necessário afastamento. Quanto a terem os nunciantes o seu prédio construído também em desobediência ao afastamento de metro e meio, isso ocorreu há mais de quarenta anos, estando eles cobertos pelo lapso de ano e dia (CC, art. 576).

O acórdão na apelação confirmou a sentença pelos seus próprios funda­mentos. Mas o fez por maioria, vencido o relator, cujo voto propiciou os embargos infringentes. Achou ele necessário, antes de tudo, preservar o direito de propriedade dos nunciantes, o que incluiria, também, o dos direito de construir rente ao prédio nunciante, confonne admitem as Súmulas 120 e 414, do STF.

O acórdão nos embargos infringentes foi no sentido de que militaria a favor dos nunciantes a existência de servidão, pois, o prédio deles fora cons­truído há mais de quarenta anos. Por isso é que os nunciados não poderiam construir como fizeram, embora o seu projeto esteja plantado nos limites do lote. O que os nunciados defendem é a legitimação da autotutela, pois, assim como os nunciantes têm o seu prédio construídosem obediência ao afastamen­to necessário, também eles podem fazer a mesma coisa.

Parece-me que os recorrentes têm razão, póis, não lhes pode ser imputada a prática de quaisquer atos ao arrepio dos arts. 572 e 573, do cc. Pelo contrário, conforme consta na inicial, os recorrentes "estão subindo as paredes rente às paredes, impedindo a entrada de claridade pelas básculas e janelas que serão totalmente vedadas, ocasionando o escurecimento de quase a área da residên­cia dos suplicantes, ferindo frontalmente dispositivos legais" (fls. 3, item 6). Ora, segundo o art. 572, CC, o proprietário pode levantar em seu terreno as construções que lhe aprouver, salvo o direito dos vizinhos. Esse direito impede apenas que se invada a área contígua ou sobre ela se deitem goteiras, ou que, a menos de metro e meiose abram janelas, ou se faça eirado, terraço ou varanda (art. 573), o que não está ocorrendo. De qualquer modo, porém, os vãos ou aberturas para luz não prescrevem contra o prédio nunciado, pois, o seu dono poderá levantar, todo tempo, a sua casa, ou contramuro, ainda que vede a claridade (art. 573, § 22).

R. sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 325

Não há, pois, como falar-se em servidão aparente a obrigar o recuo de metro e meio do prédio nunciado. A Súmula 11'2 120, do STF, é em sentido contrário ao direito de servidão. Também, a douttina (Virgílio de Sá Pereira, "Manual do Código Civil", vol. VIII, pág. 286).

Ante o exposto, conheço do recurso e dou-lhe provimento, para reformar o venerando acórdão recorrido e jl!lgar improcedente a ação, invertidos os ônus da sucumbência.

É como voto.

EXTRATO DA MINUTA

REsp n'2 1.749 - ES - (Reg. n!:! 89128337) - Relator: O Exmo. Sr. Min. Gueiros Leite. Recorrentes: Paulo José Garcia e Cônjuge. Recorridos: Pedro Deps Filho e Cônjuge. Advogados: Drs. Eurico Vieira de Rezende e outros e Pedro Deps Filho.

Decisão: A Turma, por unanimidade, conheceu e deu provimento ao recurso especial, nos tennos do voto do Sr. Ministro Relator (Julgado em 3.4.90 - 3 i!. Turma)

Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Ministros Nilson Naves, Eduat'do Ribeiro, Waldemar Zveiter e Clátldio Santos. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro GUEIROS LE1TE.

326

RECURSO ESPECIAL NI! 1865 ~ RJ

(Registro n'2 89.d0133551)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Athos Carneiro

Recorrente: Fernando Sobral da ~ruz Recorrido: Carlos da Cruz Fernandes

Advogados: Drs. Aulenio Brasil da Silva e outro Zacarias Mendes Ca­zumba e outro

EMENTA: Uniformização da jurisprudência. O órgão, julgadm.l dispõe de uma margem de discrição, no exame da conveniência e da oportunid'1de de admitir o incidente, por vezes suscitado com invocação a aresto divergente isolado, ou já superado no tempo.

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2( 12): 261-437, ago. 1990.

Pode ser negado processamento à argüição feita pela parte, quando com intuito procrastinatório, sendo notória a orientação jurisprudencial dominante.

Negativa de contrariedade, pois, aos artigos 476 e 477 do Código de Processo Civil.

Locação não-residencial. Cabimento da denúncia vazia, nos termos do artigo 5!!. da Lei 6649/79.

Recurso especial não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 4l!. Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não

conhecer do recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas precedentes que integram o presente julgado.

Custas como lei.

Brasília,3 de abril de 1990 (data do julgamento). Ministro BUENO DE SOUZA, Presidente. Ministro ATHOS CARNEI­

RO, Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SENHOR MINISTRO ATHOS CARNEIRO (Relator): Cui­da-se de ação de despejo movida por Carlos da Cruz Fernandes contra Fernan­do Sobral da Cruz, peranté o Juízo da 14l!. Vara Cível da Comarca do Rio de Janeiro - RJ, visando a desocupação de imóvel não-residencial adquirido pelo autor. A ação foi julgada procedente, reconhecido como único requisito legal para o despejo a notificação prévia, realizada pelo adquirente (fls. 45/46).

O locatário apelou afirmando inadmissível a denúncia vazia nas locações não-residenciais regidas pela Lei n!! 6.649/79, aduzindo mais que a notificação prévia para ter eficácia deveria ter sido feita judicialmente (fls. 48/50); e adiante, em petição avulsa, requereu a realização do julgamento nos termos do art. 456, do CPC, posto que a decisão recorrida teria divergido de acórdão proferido pela 6l!. Câmara Cível do Tribunal a quo.

À unanimidade de votos, o Tribunal de origem negou provimento ao recurso, julgando eficaz a notificação extrajudicial e procedente o despejo, confonne decretado (fls. 76/77).

Em embargos de declaração, o locatário requereu pronunciamento quanto ao pedido de uniformização de jurisprudência. O Tribunal acolheu os embar­gos para declarar que "o acórdão no qual se baseia o argüente (cf. fls. 65/66)

R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 327

é entendimento isolado que não enseja o acolhimento da unifonnização plei­teada, o mesmo ocorrendo com o voto vencido de fls .... " (fls. 82/83).

Inconformado, o apelante manifestou, aos 17 de março de 1989, recurso extraordinário com argüição de relevância, invocando negativa de vigência aos artigos 476 e 477, do CPC (fls. 86/88). Posteriormente, aos 31 de maio de 1989, o apelante interpôs recurso especial, também pela alínea a do permissivo constitucional, alegando contrariedade ao art. 1 Q da Lei nQ 6.649/79 e artigos 476 e 477, do CPC (fls. 90/91).

O Juiz Presidente do Tribunal, em despachos insuficientemente funda­mentados, converteu o recurso extraordinário em especial, julgando prejudi­cada a argüição de relevância e admitindo o apelo extraordinário, "porquanto, em princípio poderia ter ocorrido contrariedade a dispositivo de lei federal, como sustentado pelo recorrente" (fls.96/97); e usou dos mesmos termos para detenninar o prosseguimento do recurso especial (fl. 98).

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SENHOR MINISTRO ATHOS CARNEIRO (Relator): Há uma duplicidade de recursos, o nominado como extraordinário e o REsp, mas ambos interpostos tempestivamente, pois, o primeiro foi protocolado aos 17 de março, o segundo aos 31 de maio, tendo o acórdão nos embargos de declaração sido publicado em 22 de maio de 1989,2l! feira, considerando-se outrossim que os embargos declaratórios suspenderam durante dois dias o prazo recursal. O primeiro recurso está contido na segundo, que é o realmente cabível e portanto apenas este deve ser considerado.

A alegação primeira é de contrariedade aos arts. 476 e 477 do Código de Processo Civil, por haver a ego Câmara rejeitado o incidente sob o fundamento de que" a jurisprudência de nossos Tribunais já tem se manifestado no sentido de que a denúncia vazia vige ainda sob o regime da Lei nQ 6.649". Sustenta a recorrente que o órgão julgador omitiu-se no precisar quais os tribunais que acolhem a denúncia vazia, afirmando outrossim que bastará a ocorrência de divergência, não ~endo necessária a reiteração de julgados divergentes, para que se imponha o deferimento do incidente de uniformização.

Não assiste razão à recorrente. O incidente de uniformização busca ho­mogeneizar a orientação intra muros de um tribunal, a respeito de quaestio juris sobre a qual os órgãos fracionários da corte estejam adotando jurispru­dência conflitante, que se imponha unifonnizar. Não é suficiente, todavia, o mero dissídio eventual, a decisão isolada, ou a decisão antiga, que não mais reflita o pensamento dos integrantes de um órgão fracionário. Em sendo já conhecida a orientação dominante no pretório, a cujo respeito dúvida não

328 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

subsista, perde interesse o processamento do incidente, que quando suscitado pela parte poderá constituir-se em mera manobra protelatória.

Revisando opinião anterior, mestre Barbosa Moreira atualmente sustenta que "deve reconhecer-se ao órgão julgador certa margem de discrição, no exame da conveniência e da oportunidade de dar-se curso ao incidente, às vezes suscitado sem motivo sério, ou até com puro e manifesto intuito protelatório. O que o órgão evidentemente não se abre é a possibilidade de deferir a solicitação ou o requerimento apesar de não reconhecer o dissídio. Este fun­ciona, portanto, como pressuposto necessário, mas não suficiente" (Comentá­rios ao Código de Processo Civil, Forense, v.V, 5!!. ed., n!.! 14). Sublinha, mais, que a deliberação do órgão julgador é irrecorrível, reportando-se, a respeito, ao magistério de Pontes de Miranda ("Comentários ao Código de Processo Civil" de 1973, 1. VI, pág. 35) e de Sydney Sanches ("Unifonnização da Jurisprudência", págs. 40/41). (ibidem, nota 21).

A inexistência de direito processual da parte à instauração do incidente é igualmente defendida por Vicente Greco Filho, aduzindo ele que "na prática dos tribunais, o entendimento vigorante é que não é toda jurisprudência sobre a tese jurídica que deve levar à uniformização da jurisprudência, mas apenas aquela que, pela reiteração repercussão, bem como prognóstico futuro de repetição, convenha se ver unifonnizada e consagrada em Súmula" ('Direito Processual Civil Brasileiro', Saraiva, 2!.! v., 1984, n!.! 82.2).

Ora, é entendimento de todo dominante nos tribunais e na doutrina o da aplicabilidade da denúncia vazia, sob prévia notificação, às locações não-re­sidenciais; da denúncia motivada às locações residenciais (Paulo Restiffe Neto, "Locação", ed. RT, 1979, Capo XVI e passi11l; João Carlos Pestana de Aguiar, "A Nova Lei do Inquilinato Comentada", 1970, n!.!. 14; Silva Pacheco, "Tratado das Ações de Despejo", ed. RT, 7!!. ed., págs. 359/360; Conclusão 37 do VI Encontro Nacional dos Tribunais de Alçada), sendo esta a exegese prevalente dos artigos 5!.! e 51 da Lei n!.! 6.649/79.

Nesses termos, incorrente contrariedade aos artigos I!.! da Lei do Inquili­nato, e 476 e 477 do CPC - aos quais, pelo contrário, o acórdão recorrido deu adequada interpretação e aplicação, meu voto é no sentido de não conhecer do recurso.

EXTRATO DA MINUTA

REsp n2 1865 - RJ - (Reg. n2 89.00133551) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Athos Carneiro. Recorrente: Fernando Sobral da Cruz. Recorrido: Carlos da Cruz Fernandes. Advogados: Drs. Aulenio Brasil da Silva e outro e Zacarias Mendes Cazumba e outro.

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 329

Decisão: A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso. (4l!Turma - 03.04.90).

Votaram os Exmos. Srs. Ministros Fontes de Alencar, Sálvio de Figuei­redo, Barros Monteiro e Bueno de Souza. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro BUENO DE SOUZA.

-+

RECURSO ESPECIAL N!! 1882 - RJ

(Registro n!! 90.00000181)

Relator: Exmo. Sr. Ministro Athos Carneiro

Recorrente: Gomes de Almeida Fernandes S.A.

Recorrido: Condomínio do Edifício Telos I

Advogados: Drs. Cristina Reis dos Santos e outros; Cid Mario Alves dos Santos e outros

EMENTA: Empreitada de Construção de edifício. Apli­cação do art. 1.245 do Código Civil. Conceito de 11 segurança 11

do prédio. Infiltrações de águas e umidade. O art. 1.245 do Código Civil deve ser interpretado e

aplicado tendo em vista as realidades da construção civil nos dias atuais. Vazamentos nas instalações hidráulicas, consta­tados pericialmente e afirmados como defeitos de maior gra­vidade nas instâncias locais. Prejuízos inclusive à saúde dos moradores. Não é seguro um edific~o que não proporcione a seus moradores condições normais de habitabilidade e salu­bridade. Doutrina brasileira e estrangeira quanto à extensão da responsabilidade do construtor (no caso, da incorporado­ra que assumiu a construção do prédio). Prazo qüinqüenal de garantia.

Recurso especial não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos em que são palies as acima indicadas.

Decide a 4l! Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas precedentes que integram o presente julgado.

330 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Custas, como de lei.

Brasília, 6 de março de 1990 (data do julgamento).

Ministro ATHOS CARNEIRO, Presidente e Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO ATHOS CARNEIRO: Cuida-se de ação proposta pelo Condomínio Do Edifício "Telos I" contra a empresa Gomes de Almeida Fernandes S.A., visando obter reparação por defeitos na construção de prédios de apartamentos, demanda esta julgada procedente em 1;). instância.

O egrégio Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, por sua 3;). Câmara Cível, à unanimidade, apreciando as apelações das partes, negou provimento ao apelo da ré e acolheu a irresignação do Condomínio, sob a ementa:

"Danos oriundos de defeito de construção. É de ser a Incor­poradora considerada responsável pela reparação dos danos, por ter tomado a si a construção do prédio, contratando a executora dos serviços. Não é de ser aplicado em casos dessa natureza o prazo para agir do vício redibitório, e sim, o prazo prescricional previsto no art. 1.245, do Código Civil.

Constatados os defeitos de construção, é de ser o responsá­vel por ela condenado a colocar a obra em perfeitas condições de utilização, em prazo expressamente previsto, sob pena de que o prejudicado realize as obras necessárias às custas de quem cons­truiu ou mandou construir."(fls. 160).

Em recurso extraordinário, manifestado em novembro de 1988 com ar­güição de relevância, buscando arrimo ao art. 119,UI, a e d da Constituição pretérita, a ré sustenta negativa de vigência ao art. 178, § 5!.!, IV, do CC e dissídio pretoriano. Aduz que ao revés de aplicar acima mencionado, o tribunal a quo entendeu adequado à espécie o art. 1245 do CC, assim repelindo a tese de que os vícios de construção ocultos e não aparentes têm como prazÇ> de argüição judicial de seis meses. Depois de invocar ensinamentos de doutrina, inclusive alienígena, sustenta o recorrente o desacerto do v. aresto no rejeitar a prefaciai de decadência oposta já na contestação, em face do disposto no art. 178, § 5!.!, IV, do cc. Assim, ressalta que a existência de vícios ocultos, "não aparentes quando da entrega da obra (apareceram após 50 meses de uso do prédio)", ensejaria a "aerio redllihitoria" ou a "qllanti lIIinoris" previstas nos artigos 1.10 1, 1.105 e 1.243 do CC. Depois de ressaltar, enfaticamente, que o contrato tem por objeto "a entrega de coisa certa", reitera que a hipótese cuida de vício redibitório, tratando-se, portanto, de incidência de prazo de decadência e não de prescrição. Para a incidência do artigo 1.245 do CC, que é de

R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 331

interpretação restrita, entende mister que os defeitos realmente afetem "a solidez e segurança da obra". Quanto à divergência jurisprudencial, trancreve aresto do Pretório Excelso, no RE 93.891, e alude a outro aresto da mesma Corte publicado in RTJ, voI. 38/480 (fls. 165/187).

Em contradita, sustenta o recorrido a aplicação do art. 1.245 do CC, sublinhando que o recorrente não nega os inúmeros defeitos de construção, seja quanto aos materiais empregados, seja quanto à mão-de-obra (fls. 1891191).

Determinado o processamento da argüição de relevância (fi. 193), e convertido o recurso extraordinário em especial (fi. 211), a eminente 3!! Vice­Presidênta do Tribunal a quo /I admitiu o recurso pela alínea c do permissivo constitucional (fls. 213/215).

Arrazoado o apelo, subiram os autos a esta egrégia Corte (fi. 247).

É o relatório.

ANEXO

AI na AMS n\! 126.803 - BA

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO CARLOS THIBAU: Sr. Presidente, também acompanho os outros eminentes Ministros, porque essa resolução representa verdadeiro bis in idem em relação ao Imposto Sobre Operações de Câmbio, fere o princípio da reserva legal e extrapola o monopólio conferido ao Banco Central do Brasil, no tocante à incidência do recolhimento sobre a emissão de passagens aéreas, atividade de natureza privada e de âmbito puramente comer­cial. De maneira que acompanho o eminente Relator.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO ATHOS CARNEIRO (Relator): 1. Como se verifica, toda a questão trazida em apelo extremo resume-se na incidência, ou não, ao caso dos autos da norma do art. 1.245 do Código Civil, pela qual:

332

"Art. 1.245 - Nos contratos de empreitada de edifícios ou outras construções consideráveis, o empreiteiro de materiais e execução responderá, durante cinco anos, pela solidez e seguran­ça do trabalho, assim em razão dos materiais, como do solo, exceto, quanto a este, se, não o achando firme, preveniu em tempo o dono da obra."

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Sustenta a recorrente que os defeitos encontrados durante a perícia seriam de menor monta, pelo que a responsabilidade do construtor subsistiu apenas durante o prazo de seis meses; e refere o magistério de Hely Lopes Meireles, em sua monografia "Direito de Construir", onde afirma que os simples defeitos ou imperfeições não se confundem "com os vícios de solidez e segurança da obra, cuja responsabilidade é regida por norma legal própria"(ob.cit., 4~ ed., pág.238).

De início impede ressaltar que a perquirição da natureza e gravidade dos danos é exigente da análise de matéria de fato, insuscetível de reexame em sede de recurso especial, que recurso extraordinário é. Analisando a prova pericial, o juízo singular concluiu pela gravidade dos defeitos pericialmente constatados:

"Os defeitos constatados nas unidades comuns, consoante foi demonstrado no laudo pericial, são de gravidade real a justi­ficar o cabimento do referido artigo, já que afetam a estrutura do imóvel, eis que o laudo pericial constante do processo apenso, atesta à fi. 51, vazamentos nas instalações hidráulicas que se verificam no teto de uso comum, com afIoramento de água, resultante de vazamento ativo, marcando as três tubulações ver­ticais que descem pelos banheiros-suítes da prumada 08, com o gotejamento criando poças no piso. .

A decisão em questão é ilustrada pelas fotografias de fi. 56, sendo, ainda de ressaltar as demais descrições, quanto às áreas atingidas de uso comum à fi. 57."(fI. 86).

No juízo colegiado, a apelação do Condomínio autor foi provida para, afastando condicionalidade posta pela sentença, ser a ré condenada "a sanar os defeitos encontrados pela perícia na parte comum do edifício"(fI. 162).

2. Quando integrante do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul tive oportunidade, no julgamento, em 8.9.81, da Apelação n2 38.068 ("Rev. de Jurisprudência do TJRS" ,v. 90/318), de apreciar o tema da incidência do art. 1.245 do CC relativamente infiltrações de água em prédios de apartamentos.

A ementa do acórdão apresenta o seguinte teor:

"Empreitada de edifício. Infiltração de águas. Exegese do art. 1.245, do c.c. responsabilidade do construtor.

O art. 1.245, do c.c., deve ser interpretado tendo em vista as realidades da construção civil nos dias atuais. Infiltração de águas e manchas de umidade em apartamento situado no mais alto pavimento. Vistoria ad perpetuam. Defeito de construção. Prejuízo à saúde dos moradores. Não é seguro um edifício que não propicie a seus moradores condições normais de salubrida­de."

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 333

Em nosso voto, como relator, reiterando aliás posicionamento já mani­festado em anteriores julgamentos(v.g., nos Emb. Infring. nQ 25.556, ac. de 4.9.77, "Rev. de Jurisprudência do TJRS", 170/127 e ss.), aludimos ao magis­tério de mestre Pontes de Miranda, no seguinte sentido:

"O que o empreitante tem que alegar e provar é o perigo. O defeito há de ser concemente à solidez e à segurança. Os outros defeitos do objeto são assuntos dos arts. 1.101, 1.106, do c.c., com o prazo preclusivo do art. 178, § 5~, IV, para o exercício da ação redibitória ou da ação quanti minoris. O conceito de solidez não apresenta ditlculdades para a apreciação das espécies. Quan­to à segurança, não se pode entender que só se refira à ausência de possíveis danos provindos de desabamentos, ou rompimentos de paredes ou tetos ou soalhos, ou arrebentamento de escadas. Há os perigos de incêndio, de umidade grave, de anti-higiene e de gases. O conceito de segurança não pode ser restringido ao de indanitlcabilidade atinente à estabilidade da construção, porque se distingue do que conceme à solidez e que se prende à seguran­ça. A solidez liga-se, conceitualmente, ao que se construiu, ao objeto. A segurança alude ao sujeito, embora a causa haja de estar na construção" ('Tratado', Tomo 44, § 4.847, nQ 6, p. 410/411).

Bem de se ver, outrossim, que a norma do art. 1.245, do c.c., cumpre ser interpretada com vistas às realidades da construção civil dos nossos dias, muito diversas das previstas e previsíveis ao tempo da edição do C.C.

Mesmo assim, Carvalho Santos, em seus já clássicos 'Comentários', previa a hipótese de umidade, verbis:

334

"Queremos acentuar, antes de mais nada, que sob o nome de vício de construção também conhece-se aquele que, sem com­prometer a segurança do edifício ou a sua duração, toma-o, não obstante, impróprio ao uso a que era destinado. O empreiteiro, ou o arquiteto, na maioria das vezes, é o responsável por esses vícios. Assim, se por defeito de construção o prédio apresentar uma umidade prejudicial à saúde ou à habilidade do prédio, ou se a fumaça das chaminés entra casa a dentro, tomando intolerável a permanência de qualquer pessoa em determinados cômodos" ('Cód.Civil Brasileiro Interpretado', 17/363, da 311 ed.).

Assim também Serpa Lopes:

"O vício determinador da responsabilidade do empreiteiro refere-se não só ao caso de destruição total ou parcial, como igualmente a todos os defeitos ou erros capazes de comprometer a conservação da construção, de modo a criar uma ameaça de ruína quer virtual, como, por exemplo, as int1ltrações no teto,

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

capazes de comprometer a sua segurança, etc./I ('Curso de Direito Civil', Tomo 4!!, éd. de 1958, n!! 470.3, pág. 179).

A legislação civil argentina prevê a responsabilidade do construtor nos casos de 'ruína total ou parcial da obra'. Esclarece o Praf. Raimundo Salvat que a expressão 'ruína' é empregada também figuradamente 'para significar grave daíío de las cosas', citando o caso do vício de construção, que pode compreender toda a classe 'de defectos en la ejecución de las obras, por ejemplo, forma defectuosa de los cimientos, malos niveles, humedades o fil­traciones, etc. ' ('Tratado de Derecho Civil Argentino', Tomo lI, ed. 1957, n!! 1.225/1.227)(grifamos).

Pela legislação da Colômbia, o recibo dado pelo proprietário ao termo da obra somente significa que o dono a aprovou, 'como exteriormente ajustada al plan y a las reglas de arte', mas não significa que a obra esteja perfeita, pois, a ausência de vícios não se pode apreciar no momento de receber a obra. A garantia subsiste por dez anos, durante os quais será o construtor responsável por qualquer vício de construção que comprometa a solidez do edifício, 'así como la falta de precauciones contra incendios, la mala instalación de los tubos,de conducción eléctrica o de las canarias o tubos de desagiie que hacen imposible evitar U11l incendio o una inundación, los cimientos defectuosos, son en general hechos que dan lugar a la aplicación de la responsabilidad que estamos estudiando' (Artura Valencia Zea, 'Derecho Civil', Tomo IV, § 146-B, Ed. Themis, de Bogotá).

Bemard Soinne, Professor da Faculdade de Direito de Ulle, em premiada obra sobre a 'La Responsabililité des Architectes et Entrepreneurs Apres la Réception das Travaux' (Tomo lI, p. 486 e segs.), expõem as opiniões diver­gentes sobre a gravidade dos vícios que permitem a ação decerial (no direito francês) contra os construtores, e considera que' la jurisprudence représente le seul véritable guide de l 'interprete', salientando, outrossim, que a jurispru­dência francesa mais recente 'paraft bien avoir définitivement éliminé toute condition relative a 1 'importance du dommage, subordol1nant la respol1sabi­lité des COl1structeurs à la seule preuve de l' existence d 'Ul1 préjlldice'.

E refere o argumento, também cabível no direito brasileiro, de parecer incompreensível seja exigido 'pour les gros ollvrages un vice compromettant la solidité de I' édifice, tandis que la responsabilité à I' égard des menus travaux pourrait être engageé à l'égard de tous les vices ou malfaçons quelconques, susceptibles de causer um préjlldice, même infime, au propriétaire'.

3. Sustento, destarte, que as infiltrações de água nos tetos ou paredes, por motivo de fendas ou fissuras, podem ser abrangidas no conceito de segu­rança do edifício, pois, a segurança é também a segurança dos moradores, e os moradores não podem ser considerados seguros habitando num prédio onde a infiltração de água e umidade causam ou podem causar manifestos danos à sua saúde. É um problema de segurança, não abrangente apenas da eventuali-

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dade de desabamento do prédio, mas também das perfeitas condições de habitalidade e de salubridade da edificação.

O eminente e saudoso Desembargador Tulio Medina Martins, votando na apelação n!! 38.068, mencionada ('Revista de Jurisprudência do TJRS', 90/322), lembrou em seu pronunciamento que na Rev. dos Trib. 470/18 e segs. encontra-se publicado um trabalho do Prof. Luís Olavo Baptista sob o título 'A Responsabilidade Civil do Construtor'. .

A certa altura desse estudo, à p. 23, diz o autor:

"Difícil é caracterizar o alcance da expressão solidez e se­gurança da obra. O desabamento ou a sua ameaça ressaltam à primeira vista e, não sendo conseqüência de caso fortuito ou força maior, a sua causa não pode ser outra senão o defeito na constru­ção."

Outros exemplos, englobados no conceito de defeito na solidez e segu­rança da obra, são fornecidos pela jurisprudência e abrangem detalhes e mi­núcias tais como: 'Os defeitos atribuídos à culpa da firma construtora dizem respeito à solidez e segurança do prédio, especialmente à sua solidez, não evidentemente no sentido de afetar a sua estabilidade com o risco de desaba­mento, mas a solidez de uma de suas partes componentes, que é a laje do concreto armado da cobertura onde existe um terraço descoberto, o qual não recebeu o devido tratamento para o seu isolamento térmico, ocasionando, manchas de umidade nas paredes, trinca e rachaduras na alvenaria, desloca­mento de pastilhas e deslocamento de peças de cerâmica'(RT 364/134). 'Em vistoria apurou-se a existência de vários defeitos: trincas longitudinais e trans­versais na laje do 14!! andar; trincas no 15!! nas paredes longitudinais, e espe­cialmente no ap. 1.414; batentes de portas com os quadros deformados, não permitindo o seu fechamento; concavidades e empoçamentos de água sobre as lajotas de acabamento da cobertura e vazamento de água no caixilho da escada. Esses defeitos punham em risco a segurança do prédio' (RT, 400/258). 'Veri­ficou-se a existência de defeitos graves na impermeabilidade do terraço, na cobertura do bloco do centro, principalmente nos extremos do terraço, onde existiam fendas consideráveis' (RT, 327/274). 'Os defeitos decorreram da excessiva umidade que impregnou a parede do apartamento térreo do lado direito, confinante com a construção da esquina' (RT, 439/414).

Como se vê, o Prof. Luís Olavo Baptista exemplifica com precedentes extraídos da jurisprudência dos nossos Tribunais o alcance da expressão soli­dez e segurança da obra. Nesse conteúdo evidentemente encontram-se os defeitos apontados na causa ora em julgamento.

O recurso, nestes termos, não pode ser conhecido, pela alínea a, pois a aplicação à espécie da norma do art. 1.245 do Código Civil não implicou, em absoluto, em contrariedade ao aludido comando legal.

336 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

4. Melhor sorte não assiste ao recorrente quanto à alínea c, do permissivo constitucional. O acórdão proferido no RE 93.891, da F Turma do Pretório Excelso, está transcrito apenas em sua ementa, sem que se saiba quais os defeitos na execução da obra empreitada, então declarados como 'vícios ocultos' com alegabilidadetestrita a seis meses a contar do recebimento da obra. Do segundo aresto, apenas uma referência ao repertório que o publicou e a menção ao nome do relator. Descumprido, assim, o preceituado na Súmula 291 do Supremo Tribunal Federal, aplic~vel aos casos de recurso especial, a teor do artigo 255, parágrafo único do Regimento Interno deste Superior Tribunal de Justiça.

Em suma, por qualquer dos incisos do art. 105, IH, da Constituição Federal, o recurso não merece ser conhecido.

É o voto.

EXTRATO DA MINUTA

REsp n!1 1882 - RJ - (Reg. n!1 90.00000181) - Relator: Exmo. Sr. Ministro Athos Carneiro. Recorrente: Gomes de Almeida Fernandes S.A. Recorrido: Condomínio do Edifício Telos L Advogados: Drs. Christina Reis dos Santos e outros; Cid Mário Alves dos Santos e outro.

Decisão: A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso". (em 6.3.90 - 4!! Turma).

Votaram os Exmos. Srs. Ministros Fontes de Alencar, Sálvio de Figuei­redo e Barros Monteiro. Ausente, por motivo justificado, o Exmo. Sr. Ministro Bueno de Souza. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro ATHOS CAR­NEIRO.

RECURSO ESPECIAL N!1 1.917 - MS

(Registro n!190.127-7)

Relator: O EXlIlo. Sr. Ministro Cláudio Santos

Recorrentes: Carlota Maron Goltschalg o outros

Recorridos: Banco do Brasil S/A e Ângelo Domingo Willalba e outros

Advogados: Drs. Ayrton Teixeira Gomes, Mitio e Maki e outros e Cosme Roberto de SOliza Pinto.

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 337

EMENTA: Arrematação. Prazo para lavratura do auto. Inobservância.

A inobseí:vância do prazo do art. 693 do estatuto proces­sual civil não invalidará a arrematação se não exercitado o direito à remição.

Recurso não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a 3ª- Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade e preliminarmente, não conhecer do recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 13 de março de 1990 (data do julgamento).

Ministro, GUEIROS LEITE, Presidente. Ministro, CLÁUDIO SAN­TOS, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO CLÁUDIO SANTOS (Relator): Transcrevo, à guisa de relatório, a decisão da Presidência da Corte Estadual de onde provém o recurso:

338

"Vistos, etc ...

Carlota Maron Goltschalg e outros, inconformados com a decisão proferida nos autos de ação anulatória de autos de arre­matação (Apelação Cível n~ 1.363/88 - Classe H, 1Il - Jardim), em que contendem com Ângelo Domingo ViIlalba e outros, in­terpõem recurso especial, com fundamento no art. .105, IH, a e c da Constituição Federal, com alegação de relevância de questão federal.

Alegam os recorrentes que o acórdão recorrido negou vi­gência ao art. 693 do Código de Processo Civil e está em dissídio com outros julgados.

O recorrido, em sua impugnação, pleiteia o indeferimento do recurso.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça manifesta-se pela denegação do recurso.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

É o relatório.

Os recorrentes argüiram a relevância da questão federal, porém, conforme se observa nos julgados do colendo Supremo Tribunal Federal, com a instalação do Superior Tribunal de Jus­tiça, a argüição de relevância deixou de existir.

A alegação de violação ao art. 693 do Código de Processo Civil tem procedência, pois, observa-se, em tese, que a ementa do acórdão combatido está em conflito com a norma processual, bem como o acórdão trazido à colação (RTJJESP-62-251) está em dissídio com o venerando aresto invectivado.

Diante do exposto, admito o recurso especial e determino o seu processamento." (fls. 282/283)

Regularmente processado o apelo excepcional, subiram os autos.

Eis o relatório.

VOTO

O EXMO SR. MINISTRO CLÁUDIO SANTOS (Relator): Aponta-se violação do art. 693 do estatuto processual civil, o qual determina o prazo de vinte e quatro horas, depois de realizada a praça ou o leilão, para a lavratura da arrematação.

Acontece haver dúvida sobre a observância do prazo de 24 horas, pois, nos autos está uma certidão da escrivania por onde tramitou o processo, no qual foi praticado o ato judicial, dando conta do cumprimento do prazo e de ter ocorrido um lapso quanto à data do leilão.

O fato está registrado na sentença e no acórdão que a confirmou, muito embora a razão principal do julgamento, quanto a esse tema, esteja vinculada à inexistência de prejuízo. Isto porque os recorrentes não demonstraram haver postulado a remição da dívida, no prazo de 24 horas, após o leilão, assinado pelo Código. E assim, a considerar mera irregularidade o fato, não declarou a instância ordinária descumprido o dispositivo legal invocado.

Não vislumbro a alegada violação da lei no acórdão do Tribunal de Mato Grosso, e, muito menos, o alegado dissídio na jurisprudência, pois, não cuida­ram os recorrentes de efetuar a indispensável demonstração analítica.

Com efeito,já decidiu o STFque, não havendo prejuízo, não se invalidará o ato (AgReg no AI 85.335-RJ, 2i!Turma, ReI. o eminente Min. Moreira Alves, in RT 560/228). Nesta questão a versar sobre matéria análoga, transcreveu o relator longo trecho do acórdão, da lavra do insigne processualista, Des. Barbosa Moreira, do qual destaco a seguinte passagem:

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437,ago. 1990. 339

"3.3 Antes de mais nada, cumpre inquerir de que tipo de sanção se pode cogitar para a infração das regras que estabelecem os requisitos do edital. Tratar-se-ia de nulidade absoluta ou de nulidade relativa? A questão é relevante, porque, se absoluta, a nulidade não comporta sanação ao passo que, se relativa, pode eventualmente sanar-se, caso ocorram circunstâncias indicadas no capítulo que à matéria consagra o Código de Processo Civil. De acordo com doutrina acatada, que tem por si a autoridade de processualistas do porte de Galeno Lacerda (Despacho Saneador, Porto Alegre, 1953, p. 72) e Moniz de Aragão (Comentários ao Código de Processo Civil, vol. II/337 e 338, 3i! ed., Rio, 1979), a distinção entre as hipóteses de nulidade absoluta e de nulidade relativa deve basear-se na natureza do interesse predominante­mente tutelado pela norma de cuja violação se trata: se ela visa a proteger, acima de tudo, o interesse público, a infração gera nulidade absoluta; se o interesse particular, nulidade relativa. Ora, as regras que fixam os requisitos do edital destinam-se precipua­mente a tutelar interesse particular, nulidade relativa. Ora, as regras que fixam os requisitos do edital destinam-se precipua­mente a tutelar interesses particulares: dos licitantes potenciais, que precisam ter ciência dos dados necessários para resolver se vale a pena arrematar o bem; e, por outra parte, do executado, a quem aproveita a obtenção do melhor resultado possível na arre­matação, para ver-se exonerado com o mínimo de detrimento. Conclui-se, pois, que aqui se cuida de simples nulidade relativa, passível de sanar-se ante a presença das circunstâncias previstas na lei processual.

3.4 Uma dessas circunstâncias, suscetíveis de excluir a de­cretação da invalidade, é a inexistência de prejuízo, contemplada no art. 249, § 12, verbis: "O ato não se repetirá, nem lhe se suprirá a falta, quando não prejudicar a parte". Que a norma é aplicável à matéria em pauta confirma-o a lição de Celso Neves (Comen­tários ao Código de Processo Civil, vol VII/lI9, 2i!ed, Rio, 1977), o qual referindo-se aos elementos do edital exigidos pelo art. 686, assinala: "Todos esses dados são relevantes e de sua omissão pode resultar nulidade da arrematação quando se demonstre prejuízo, segundo as regras dos arts. 243 a 250 (sem grifo no original). Extrai-se desse texto, a contrario sensu, que a omissão não inva­lidará o ato se não tiver ocorrido prejuízo."

Foi essa a tese acolhida no acórdão ora recorrido. Os recorrentes não manifestaram qualquer interesse em exercitar o direito de remir a dívida, e, com isso, convalidaram a irregularidade.

340 R. Sup. Trih. Jusl., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Em face do exposto, não conheço do presente especial.

É como voto.

EXTRATO DA MINUTA

RE n2 1.917 - MS - (Reg. n2 90.127-7) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Cláudio Santos. Recorrentes: Carlota Maron Goltschalg e outros. Recorridos: Banco do Brasil S/A e Ângelo Domingo WilIalba e outros. Advo­gados: Drs. Ayrton Teixeira Gomes, Mitio Maki e outros e Cosme Roberto de Souza Pinto.

Decisão: A Turma, por unanimidade e preliminarmente, não conheceu do recurso especial, nos termos do voto do Exmo. Sr. Ministro Relator. (Em 13-03-90 - 3;). Turma),

Os Exmos. Srs. Ministros Nilson Naves. Eduardo Ribeiro e Waldemar Zveiter votaram com o Relator. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro GUEIROS LEITE.

RECURSO ESPECIAL N2 1.946 - RJ

(Registro n2 90.0000268-0)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Barros Monteiro

Recorrente: Maria Alice Castilho Alves dos Santos

Recorrido: Christóvão Simões Guimarães

Advogados: Drs. Marcello Rebello de Mendonça e outros e Marta Maria de Carvalho Giret

EMENTA: Reparação de danos. Ação penal por injúria e difamação finda através de reconciliação entre as partes.

Se incorreu retratação pura e simples, mas sim reconci­liação entre as partes, nos termos dos arts. 520 a 522 do CPP, não há que se falar em reparação de danos no campo civil, uma vez que elidida a própria ofensa ensejadora da ação penal. Carência da ação mantida.

Recurso especial não conhecido.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2( 12): 261-437, ago. 1990. 341

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicaelas.

Decide a Egrégia 4;). Turma elo Superior Tribunal de Justiça, por maioria, não cónhecer elo recurso, na forma elo relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante elo presente julgado.

Custas, como ele lei.

Brasília, em 10 ele abril ele 1990 (data elo julgamento).

Ministro BUENO DE SOUZA, Presidente. Ministro BARROS MON­TEIRO, Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO: Em procedimento ordinário, a autora alegou que, em face de comportamento lesivo do réu, o qual a teria injuriado por questões relativas a administração do condomínio, foi obrigada a contratar advogado para ajuizamento da ação penal, motivo por que pleiteou a recomposição dos honorários advocatícios, que despendeu, e mais dano moral. Na contrariedade, asseverou o suplicado que a queixa-crime terminou por conciliação perante o Juízo Criminal, sustentando ainda que a contratação de advogado não constitui dano emergente.

A sentença julgou extinto o processo, sem conhecimento do mérito, nos termos do art. 267, IV, do cpc.

Em grau de apelação, a 6;[ Câmara do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro negou provimento ao apelo da demandante, contra o voto do Desembargador Rui Octávio Domingues, que o provia para, afastada a carência, determinar o exame do mérito. Embasado no pronunciamento minoritário, foram oferecidos embargos infringentes, que o 2U Grupo de Câmara Cíveis, por maioria de votos, rejeitou, com a seguinte ementa:

"Injúria. Queixa-crime. Retratação aceita. Perdas e danos.

Extinta a ação penal, por aceitação da retratação, carente de ação é o querelante para haver do querelado elos honorários ael­vocatícios que desembolsou para o ajuizamento ela ação penal e elano mora!."

Repelidos os embargos declaratórios, a vencida manifestou recurso ex­traordinário com argüição de relevância, arrimando-se no art. 119, alíneas a e d, da precedente Lei Maior. Afirmando que a retratação constitui ato unilateral, que não se confunde com o perdão, apontou negativa de vigência aos arts. 159, 1.027 e 1.547 do Código Civil, bem como ao art. 67, inciso lI, do Código de

342 R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Processo Penal. De passagem, aludiu ao julgado inserto na Rev. dos Tribs. 555/372.

Convertido o apelo extremo em recurso especial, o despacho de fls. 116/117 admitiu-o pela letra a do permissivo constitucional.

Vieram as razões e contra-razões.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO (Relator): Sentindo­se moralmente agredi da em razão ele palavras escritas pelo réu a propósito de querelas condominiais, a autora contra ele intentou ação penal. Observando o disposto no art. 520 do Código de Processo Penal, a Dri!. Juíza de Direito facultou às partes a oportunidade de reconciliação, que foi obtida através do termo de fl. 9, assim vazado:

"TERMO DE RETRATAÇÃO:

Tendo este Juízo oferecido às partes oportunidade para con­ciliação, foram ouvidos separadamente querelante e querelado, tendo sido acolhida pela querelante a retratação nos seguintes termos: Que o querelado rejeita a ata quanto aos fatos ali aponta­dos ocorridos na assembléia extraordinária, matéria que está sen­do discutida no juízo cível, declara ainda mais que não houve de sua parte qualquer intenção de ofender a querelante, mas que a sua avaliação realmente foi rigorosa quanto ao engano cometido na mencionada ata, que deu ensejo a afixação de um comunicado de que trata a petição de fls. 2/6. Pela MM. Dri!. Juíza foi dito que homologa o presente termo para que surta os efeitos legais, ar­quivando após a queixa formulada. Rio, 05.03.86."

Na realidade, portanto, operou-se ali a reconciliação entre as partes, conforme previsto no art. 522 do CPP, que assim estatui: "no caso de reconci­liação, depois de assinado pelo querelante o termo da desistência, a queixa será arquivada."

Não houve técnica e juridicamente a retratação, tal como instituída pelo direito penal pátrio. Ela é ato unilateral, que não se confunde com a conciliação, esta bilateral, constituída pela harmonização de ofensor e ofendido (E. Magal­hães Noronha, "Direito Penal", vol. 1, pág. 358, 25i!. ed.).

A retratação, de acordo com pacífica orientação doutrinária, é causa especial de extinção da punibilidade, pois, se aplica apenas a determinados delitos (cfr. "A Retratação", Paulo José ela Costa Jr., in Rev. elos Tribs. 574/297; José Frederico Marques, "Curso de Direito Penal", vol. lU, pág. 427, eel. 1956;

R. Sup. Trib. Jusl., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 343

Damásio E. de Jesus, "Comentários ao Código Penal", 2!2 vol., pág. 823, ed. 1985; Nélson Hungria, "Comentários ao Código Penal", voI. VI, pág. 120,3iJ. ed.). Segundo o Magistério deste saudoso mestre, por ela - a retratação -não é eliminado o crime (jactu1Il infectlllllfieri neqllit) (ob. e pág. citadas).

Então, se de retratação pura e simples se cuidasse na espécie, era causa de extinção da punibilidade tão-somente, podendo o ofendido postular a repa­ração dos danos causados pelo ofensor.

Todavia, consoante já salientado, o caso presente é de conciliação, ato bilateral, que, por isso, exige a anuência do querelante (cfr. Rev. dos Tribs. 429/457).

Segundo Emeric Levai, "distingue-se a retratação, ainda, da conciliação, a que alude o art. 520 do CPP, propiciada às partes pelo Juiz da causa. Visa esse ato o congraçamento do querelante com o querelado, sem a presença de seus advogados, não se lavrando termo dessa providência preliminar. Ao contrário da retratação, que inclepencle da aceitação do ofendido, a reconcilia­ção é ato sempre bilateral presidida pelo Juiz, mais como conselheiro amigo, do que como julgador, tendo em vista a harmonia dos desavindos que deter­minará a lavratura do termo de desistência da queixa e o conseqüente arquiva­mento dos autos, se vingar o propósito conciliatório" ("Retratação Penal", in "Revista de Processo", n!2 21, págs. 142/143).

Como se vê, não se deu, in caSll, a extinção da punibilidade por força da retratação. O que aconteceu simplesmente foi que as partes se reconciliaram, dando ensejo ao arquivamento da queixa, nos termos do art. 522 do CPP. Com esta reconciliação, descaracterizou-se o ilícito penal; elidiu-se a alegada ofensa no âmbito da esfera criminal, não se podendo falar, por via de conseqüência, em reparação no campo civil, tudo segundo já deixara ressaltado o v., acórdão prolatado em sede de apelação.

Desaparecida a ofensa diante da reconciliação, força é concluir-se daí pela inexistência do dano, pois, como escreve José de Aguiar Dias, "0 direito à reparação é conseqüên,cia imediata e direta da verificação do dano" ("Da Responsabilidade Civil", vol. II, pág. 917, 7ª ed.).

Escorreita, portanto, a decisão dé F instância que deu pelo juízo de carência, cabendo aqui somente retificar o inciso legal em que se escudou o Magistrado sentencialmente (art. 267, VI, do CPC - impossibilidade jurídica do pedido).

Nestes termos, incorre na hipótese sub judice negativa de vigência dos preceitos legais invocados pela recorrente. Acentue-se que não arrolou ela acórdãos divergentes oriundos de outros Tribunais, a fim de cohfigurar o dissídio jurisprudencial, sendo certo que o aresto a que se rtPorta de passagem

344 R. Sllp. Trih.ll1si., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

(Rev. dos Tribunais, 555/372) não tem pertinência, no caso, conforme resulta da exposição feita.

Ante o aduzido, não conheço do recurso.

É como voto.

VOTO-VISTA (VENCIDO)

O EXMO. SR. MINISTRO ATHOS CARNEIRO: Eminentes colegas, em brevíssima recapitulação, lembraria que se cuidou de ação penal, pois a ora autora, então querelante, se sentiu agredi da em razão de palavras escritas pelo réu, a propósito de querelas condominiais, tal como mencionou, em seu voto, o eminente Relator, Ministro Barros Monteiro. A Drl! Juíza de Direito, agindo nos termos do art. 520 do Código de processo Penal, facultou às partes a oportunidade de conciliação e resultou lavrado um termo que está à fi. 9, com a redação seguinte: (lê)

"Termo de Retratação: Tendo este Juízo oferecido às partes oportunidade para conciliação, foram ouvidos, separadamente, querelante e querelado, tendo sido acolhida pela querelante a retratação, nos seguintes termos:

"Que o querelado rejeita a ata quanto aos fatos ali apontados ocorridos na assembléia extraordinária, matéria que está sendo discutida no juízo cível. Declara, ainda mais, que não houve de sua parte qualquer intenção de ofender a querelante, mas que a sua avaliação, realmente, foi rigorosa quanto ao engano cometido na mencionada ata, que deu ensejo à afixação de um comunicado de que trata a petição de fls. 2/6.

Pela MM Juíza foi dito que homologa o presente tenno, para que surta os efeitos legais, arquivando-o, após, a queixa formu­lada".

Pois bem, o que em última análise discute-se, é se teria ocorrido uma retratação ou uma reconciliação entre as partes. Este é o ponto crucial da questão.

O eminente Relator salienta que, no caso de retratação, não é eliminado o crime, e chefa à proposição de que "se de retratação, pura e simples, cuidasse a espécie, era causa de extinção da punibilidade, tão-somente, podendo o ofendido postular a reparação dos danos causados pejo ofensor". Diga-se que, aqui, a querelante quer haver do querelado os honorários que gastou com o seu Advogado, despesa que lhe era indispensável para, em Juízo, obter a reparação, por ela pleiteada, de danos morais.

R. sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 345

Mas entendeu o eminente Relator que o caso presente seria de reconci­liação, "ato bilateral, que por isso exige a anuência do querelante"; e que, tratando-se de reconciliação, ter-se-Ía descaracterizado o ilícito penal: "elidiu­se a alegada ofensa no âmbito da esfera penal, não se podendo falar, por via de conseqüência , em reparação no campo civil, tudo conforme já deixara ressaltado o venerando acórdão prolatado em sede de apelação".,

Pedi vista, Sr. Presidente, para meditar a respeito. Esta ata, a que o querelado refere que rejeita, está aqui, ás fls. 5/6. Aliás, às fls. 5/6 está o "comunicado" que o querelado, que era o subsíndico, afixou no edifício. E neste comunicado, afixado nos elevadores do prédio e assinado pelo subsÍndi­co, é dito que a ata feita lavrar pela querelante seria mentirosa, "não corres­pondendo às verdades dos fatos ocorridos na assembléia". Alude mais que, como a responsabilidade era da síndica, e por ela a ata fora confeccionada, deveria a síndica "responder pela fraude"; ao mesmo tempo, o subsíndico convocou uma nova assembléia. Afirma-se que esta nova assembléia não chegou a se realizar, porque impedida por medida judicial.

Fato é que o querelado ainda fez circular mais uma complementação do seu comunicado. Complementação a que deu o título de "Cultura Geral" (!), na qual ele ensina primeiro o que é Ata numa assembléia: depois explica o que éfraude: "toda manobra empregada para enganar um terceiro traduz a intenção de procurar uma vantagem, um proveito qualquer patrimonial ou não". E, depois, refere os "próximos temas": utilização indevida de funcionários "que são pagos com o dinheiro de todos para assinar papéis, induzindo a erro os moradores".

Ora, realmente este cidadão argüiu nos aludidos "comunicados" fatos que em tese são ofensivos à honra e à reputação desta senhora, que ajuizou a queixa-crime. E não me parece, vênia máxima, que o termo lavrado na quei­xa-crime retrate uma "conciliação" entre as partes, mesmo porque parece que a ação civil sobre as contas continuou. Não me parece também que a circuns­tância de nele constar que a retratação foi acolhida pela querelante desfaça o caráter de verdadeira retratação. Aliás, anotei a definição de Caldas Aulete de retratação:

"Ato escrito em que alguém se desdiz publicamente do que disse anteriormente; satisfação dada publicamente à pessoa ofen­dida".

E o que o réu disse foi que rejeitava a Ata quanto aos fatos ali apontados; disse que não houve intenção de ofender e que a sua avaliação, realmente, fora rigorosa quanto ao engano cometido na mencionada Ata. Só na circunstância de dizer o querelado que rejeita a ata quanto aos fatos ali apontados, de que não houve a intenção de ofender, e que a sua avaliação sobre a Ata foi

346 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

"rigorosa", me parece que está-se retratando das ofensas feitas à querelante. E no caso de retratação, é lição de Magalhães Noronha e de Aguiar Dias, refe­rência à fi. 47, "permanecem os efeitos civis do delito e a possibilidade da indenização" .

Na decisão recorrida, a Desembargadora Maria Estela Rodrigues votou vencida e lançou, na ementa do seu voto vencido, o seguinte:

"A responsabilidade civil difere da penal, não obstante seja um fato gerador de ambas. Exigindo a penal condições mais rigorosas, indo atingir a liberdade e a honra do indivíduo, ao passo que a civil dá predominância ao dano, sendo o direito à reparação conseqüência imediata e direta da sua verificação. Significa que a extinção da possibilidade pela retratação, que a maioria equipa­ra ao perdão aceito, a injúria não admite retratação, nenhuma influência tem na esfera civil, não afastado o dano material já produzido, muito menos o moral. Acolhida dos embargos para o prosseguimento da ação de responsabilidade civil".

Tenho a impressão, com a máxima vênia, de que realmente ocorreu uma retratação. A retratação implica na extinção da punibilidade, mas o art. 67, item lI, do Código de processo Penal, é expresso em que: "não impede a propositura da ação civil, a decisão que julgar extinta a punibilidade".

Nestes termos, portanto, meu voto será no sentido de conhecer do recurso e dar-lhe provimento, para que o Juízo de Primeiro Grau, que extinguiu o processo por carência da ação, venha a apreciá-lo em seu mérito.

O EXMO. SR. MINISTRO FONTES DE ALENCAR: Eminente colega, se ouvi bem, falou-se em extinção de punibilidade, em retratação, em um ato jurisdicional do magistrado 110 feito.

Quero crer que, se bem entendi os dados da causa, cuida-se de uma ação penal contra a honra, numa audiência de conciliação. Obtida esta, caracterizada teria ficado a desistência da ação.

O EXMO. SR. MINISTRO ATHOS CARNEIRO: Eu não diria propria­mente desistência. A Juíza, digamos assim, homologou o termo para que surta seus efeitos legais, arquivando a queixa.

O EXMO. SR. MINISTRO FONTES DE ALENCAR: Esta homologa­ção, que seria tecnicamente prescindível, este ato de conciliação teria como resultado necessário a desistência da ação, até porque, no caso da ação penal privada, de competência do juiz singular nos crimes contra os costumes, a petição inicial, a queixa, não havia sido deferida.

O EXMO. SR. MINISTRO ATHOS CARNEIRO: Mas o problema aqui é que, depois disto, esta senhora entrou com a ação civil para obter do ex-que­relado que a indenizasse pelos honorários que havia pago ao seu advogado.

R. Sup. Trib. Jusl., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 347

o EXMO. SR. MINISTRO FONTES DE ALENCAR: É exatamente. Vou desenvolver o raciocínio para chegar até aí. Então, me permite V. Exl!., e o douto Relator. Proposta a ação penal privada, por crime contra a honra, da competência do juiz singular, o magistrado, nos termos do art. 520, do Código de Processo Penal, não deferiu inicialmente, nem poderia fazê-lo, pela vedação que se acha no art. 520, não deferiu o pedido, citação, apenas designou dia para a tentativa de conciliação, e somente se não obtida a conciliação é que a ação seria realmente instalada. Ora, obtida a conciliação, conseqüência necessária dessa conciliação é a desistência da ação penal, eis que se tratava de ação penal privada. Assim, ocorreu a desistência da ação penal.

O EXMO. SR. MINISTRO ATHOS CARNEIRO: Aí eu faria uma pon­deração a V. Exl!., fundada em posicionamento do próprio Relator. Se se tratasse apenas de mera retratação, o eminente Relator admite a possibilidade da ação de indenização pelos danos que sofreu esta senhora, obrigada a contratar advogado para poder ingressar em Juízo. O eminente Relator entendeu, toda­via, que houve 'conciliação' e por isso teria havido uma verdadeira, digamos, absolvição da instância no Juízo Civil.

O EXMO. SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO: Eu entendi que no caso não houve retratação, porque retratação nos termos da lei penal é uma causa especial de extinção de punibilidade e aqui não ocorreu isto. O que se deu foi o que ponderou o eminente Ministro Fontes de Alencar: houve conju­gação de vontades entre o ofensor e o ofendido. Rotulou-se impropriamente aquele termo como se de retratação se cuidasse, o que, porém, não aconteceu.

O EXMO. SR. MINISTRO ATHOS CARNEIRO: A divergência é exa­tamente em tomo disso. Este termo rotulado "retratação", que V. Exl!. considera uma reconciliação, a mim me parece que realmente e substancialmente cons­titui uma retratação. Este o motivo da nossa divergência.

É o meu voto.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO FONTES DE ALENCAR: Sr. Presidente, o que captei do debate é que foi proposta uma ação penal privada por crime contra a honra da competência do Juiz singular. O Magistrado, nos termos da Lei Processual Penal, designou audiência de conciliação. Obtida a conciliação, caracterizou-se a desistência da ação penal privada. Esta desistência da ação penal privada somente se caracterizou porque contou com a vontade do que­relante. Se o querelante não quisesse desistir não teria feito e a ação prosse­guiria. Creio que, no caso, não se trata de retratação, trata-se realmente de conciliação na audiência própria do art. 520 do Código de processo Penal. Então, em conseqüência, houve a desistência da ação penal privada. Posterior-

348 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

mente, foi movida uma ação civil de indenização. Ao que me foi dado perceber, não se trata de um actio civilis ex delicto, não se trata de uma ação civil para reparação do dano causado pelo delito. Cuida-se de uma ação civil para recuperação da verba honorária dispendida pela autora da ação cível naquela ação penal.

Ora, assim sendo, não vejo como conceder reparação pela verba honorá­ria dispendida por alguém que propusera uma ação, e dela, espontaneamente, desistira. Até se fizermos um paralelo, neste particular, com o processo civil, vale a pena trazida à tona o conteúdo do art. 26 do CPC. Com efeito, ali está disposto que se o processo terminar por desistência, as despesas e os honorários serão pagos pela parte que desistir.

O EXMO. SR. MINISTRO ATHOS CARNEIRO: V. Exa. me permiti­ria? Mas no caso de retratação, ainda que a querelante quisesse prosseguir na ação penal, não poderia.

O EXMO. SR. MINISTRO FONTES DE ALENCAR: O Juiz teria que proferir esta sentença, o que não fez, até porque não houve retratação.

O EXMO. SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO: Neste caso a retra­tação era inadmissível. A retratação, como mencionei no meu voto, só é cabível em determinados delitos e não neste feito, em que um dos crimes imputados na inicial é a injúria.

O EXMO. SR. MINISTRO FONTES DE ALENCAR: E se tratasse realmente de retratação, na hipótese de que fosse a retratação cabível, o Juiz teria que julgar o mérito da ação penal. Não foi isso que aconteceu, o Juiz considerou como deveria fazê-lo, desistida a ação penal. Tanto que não há sentença julgando, mandou arquivar o feito ante a desistência, assim também no processo civil, a verba honorária é ônus de quem desistiu.

Data vênia, acompanho o eminente Ministro Relator.

VOTO (VENCIDO)

O EXMO. SR. MINISTRO SÁL VIO DE FIGUEIREDO: Não obstante as doutas razões expostas neste julgamento e na assentada anterior, vou pedir vênia ao eminente Relator, e aos que aderiram ao seu voto, para votar em sentido contrário, ao entendimento de que, em se tratando de ação privada, qualificada pela querelante como de injúria e difamação, e tendo havido um procedimento prévio no qual as partes estabeleceram formalmente a ocorrên­cia de uma retratação, no caso o que ocorreu foi retratação e não propriamente conciliação.

Pelo exposto, renovando a vênia, voto no mesmo sentido do Ministro Athos Carneiro.

R. Sup. Trib. Jusl., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 349

EXTRATO DA MINUTA

REsp n!.! 1.946 - RJ - (Reg. n!.! 90.0000268-0) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Barros Monteiro, Recorrente: Maria Alice Castilho Alves dos Santos. Recorrido: Christóvão Simões Guimarães. Advogados: Drs. Marcello Rebello de Mendonça e outros e Marta Maria de Carvalho Giret.

Decisão: Prosseguindo no julgamento, a Turma, por maioria, não conhe­ceu do recurso, vencidos os Exmos. Srs. Ministros Athos Carneiro e Sálvio de Figueiredo, que dele conheceram e lhe deram provimento (Em 10.04.90 - 4>! Turma).

Os Exmos. Srs. Ministros Bueno de Souza e Fontes de Alencar votaram com o Relator. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro BUENO DE SOUZA.

• RECURSO ESPECIAL N!! 2.062 - RJ

(Registro n!! 90.0000840-2)

Relator: O EX11lo. Sr. Ministro Garcia Vieira

Recorrente: Estado do Rio de Janeiro

Recorridos: Maria dos Reis Mendes dos Santos e outros

Advogados: Drs. Sebastião de Andrade Figueira e outro e José Orisval­do Brito da Silva e outro

EMENTA: Responsabilidade civil. Indenização por da­nos. Acidente em hospital. Morte de paciente. Juros. Hono­rários.

Inaplicável os juros previstos no art. 1.544 do CC, quan­do não ocorreu ilícito penal.

A base de cálculo para os honorários fixados, conforme o art. 20, § 4!!, do CPC, é a soma das prestações vencidas, mais doze prestações vincendas.

Recurso provido parcialmente.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas. Decide aI>! Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar

parcial provimento ao recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

350 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Custas, como de lei.

Brasília, 6 de junho de 1990 (data do julgamento).

Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente. Ministro GARCIA VIEIRA, Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO GARCIA VIEIRA: O Estado do Rio de Janeiro, fls. 169/174, em demanda com Maria dos Reis Mendes dos Santos e outros, irresignado com o acórdão da 7;]. Câmara Cível, fls. 158/161, interpôs Recurso Extraordinário pelas alíneas a e d dê'permissivo constitucional, ar­güindo relevância, e aduz haver o acórdão impugnado ratificado "a sentença na parte em que reconheceu a responsabilidade civil do Recorrente pela morte do companheiro e pai dos recorridos" e determinando que:

"O termo inicial ele tal pensionamento é a data do fato, já que se trata de ilícito criminal. A partir daquela data deverá incidir também juros compensatórios, ex vi do art. 1.544 do Código Civil".

e

"Deverá o sucumbente arcar com as despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 20% na forma do § 52 do art. 20 do CPC".

O Recorrente argúi negativa de vigência da lei federal e divergência jurisprudencial.

O Recorrente diz inexistir sentença penal condenatória e que os juros compostos só podem ser cobrados do próprio autor do delito (ERE 15.447, DJ de 7.3.52, pág. 3.544)e, quanto aos honorários, apóia-se no RE n!l 94.052, RTJ 99/906, para pedir provimento, e, em conseqüência, reduzir os juros para simples, a partir da citação, e que a base de cálculo para os honorários seja o somatório das prestações vencidas e mais doze vincendas.

Contra-razões às fls. 176/177, negando a existência de prequestionamen­to da matéria constitucional (Súmula 282 do STF), e que o Recorrente limi­tou-se a citar uma ementa de um acórdão do STF, sem demonstrar analiticamente a sua identidade e fundamento com as causas e objetos da lide.

Despacho de fl. 206 do eminente Ministro Célio Borja "para que se examine a admissibilidade do Recurso Extraordinário que se converteu em especial".

Decisão de fls. 208/210 admite, em parte, o recurso especial pela alínea c do item UI do art. 105, da Constituição.

R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 351

A Recorrente arrazoou às tls. 213/214, e a Recorrida deixou passar em branco, tl. 215 v.

A Subprocuradoria Geral da República oficiou às tls. 223/226, pelo provimento parcial, entendendo proceder o apelo, quanto a honorários.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO GARCIA VIEIRA (Relator): Sr. Presidente, no recurso extraordinário, com argüição de relevância, convertido em especial nos limites da matéria suscitada nesta, interposto-com fundamento no artigo 119, item In, letra a (negativa de vigência de lei federal) e d (divergência), admitido pela letra c (divergência), item lU, do artigo 105 da vigente Consti­tuição Federal, sustenta-se que o aresto recorrido violou o artigo 1.544 do Código Civil, ao condenar o recorrente a pagar juros compostos, e o artigo 20, § 4!! do CPC, ao manter a base de cálculo dos honorários de advogado na forma do § 5!! do mesmo artigo, além da divergência com o ER 15.447 e RE 94.052 (fi. 172).

Com referência aos juros compostos, entendemos ter havido contrarieda­de ao artigo 1.544 do Código Civil, que só prevê a sua condenação em caso de crime e, no caso, só houve a denúncia (doc. de tls. 88/89), não existindo ainda a sentença (doc. de tl. 117). É claro que, na ação penal, pode ocorrer a absolvição até por inexistência do crime ou da autoria. É hoje pacífico em nossos Tribunais o entendimento de que são indevidos os juros compostos, quando não se trata de ilícito penal. Neste sentido a decisão da 2;[ Turma do extinto TFR, na AC n!l 106.814 - RJ, Relator eminente Ministro Otto Rocha, DJ de 30.4.87.

Por ocasião deste julgamento, o eminente Ministro Relator, em seu voto condutor, citou os seguintes precedentes: do TFR, AC lO1.739-PB, ReI. eminente Ministro José Dantas, DJ de 24.10.85; AC n!l 94.503 - SP, ReI. Eminente Ministro Gueiros Leite, DJ de 21.2.85; AC 29.361 - RJ, ReI. eminente Ministro Aldir Passarinho, DJ de 15.4.82, e do Colendo Supremo Tribunal Federal, RE 57.505 - GB, ReI. eminente Ministro Adalício Nogueira - RTJ 45/115, RE n!l65.093 - GB, Rel. Ministro Eloy da Rocha, RTJ 65/682, ERE n!l 76.594 - RTJ 74/429.

Nossa Corte Maior, no RE n!! 93.678 - GO, ReI. eminente Ministro Djaci Falcão, RTJ 103/678, entendeu que os juros compostos somente incidem nas obrigações decorrentes de crime (art. 1.544 do CC).

O eminente Ministro Relator, em seu voto condutor do citado acórdão, salientou que:

352 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

"Quanto aos juros compostos, admitidos pelo acórdão, im­põe-se o conhecimento do recurso, eis que predomina nesta Corte o entendimento de que são cabíveis apenas na hipótese de crime (RE 57.256, in RTJ 45/545 e Ag. 40.236, in RTJ 45.816). Acres­cento a estes o ERE 76.594, por mim relatado, cuja ementa é a seguinte:

"Responsabilidade Civil. Indenização. Embargos de diver­gência conhecidos e providos em parte, para excluir da condena­ção os juros compostos. O art. 1.544 do C. Civil, ao estipular a incidência de juros compostos, refere-se a ilícito penal, e não a ilícito meramente civil" (in RTJ 74/429).

No caso, é oportuno realçar, não houve sentença condena­tória no juízo criminal pela prática de infração penal.

Como é sabido, nas obrigações decorrentes de delito consi­dera-se em mora o devedor desde o dia em que é cometido (art. 962 do Código Civil). Por outro lado, estabelece o art. 1.544 do mesmo diploma:

"Além dos juros ordinários, contados proporcionalmente ao valor do dano, e desde o tempo do crime, a satisfação compreende os juros compostos".

Versando sobre o tema diz Aguiar Dias:

"A origem da cominação se encontra no art. 26 do Código Criminal de 1830, que não cogitava de delitos culposos, só defi­nidos no art. 19 da Lei 2.033, de 1871. Seu caráter é de punição e só deve ser aplicado a criminosos, como tal reconhecidos em sentença criminal. A agravação dos juros só abrange autores e cúmplices, convencidos no juízo criminal. Não pode ferir os preponentes, nem ser invocada em matéria contratual. Nada mais claro. A pena se restringe à pessoa de delinqüente e os juros compostos só o são a título de punição pelo crime, não podendo, pois, acrescentar-se sanção penal ao responsável civil que não seja também responsável penal. O critério oposto chega a ser iniquamente aplicado sem que tenha a justificá-lo a prática do crime, por parte de quem satisfaz a indenização, quando essa é a única razão que It~gitima os juros compostos" ("Da Responsabi­lidade Civil", 6;! edição, volume 11, pág. 472).

O Excelso Pretório, no RE n!! 112.165 - SP, Relator eminente Ministro Francisco Resek, RTJ - 120/1.366, entendeu que:

"Os juros compostos só são devidos quando a obrigação resulta de crime, quedando a cargo do autor do delito".

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 353

No RE n2 114.329 - SP, Relator eminente Ministro Célio Borja, DJ de 12.5.89, entendeu o Colendo Supremo Tribunal Federal que:

" ... osjuros compostos só são devidos quando a obrigação resulta de crime, cabendo ao autor do delito, e não ao seu propo­nente, a obrigação do pagamento. A expressão crime, restritiva, referindo-se ao causador imediato do dano, ou seja, aquele que praticou a violência."

No caso em exame a ação de indenização foi movida contra o Estado do Rio de Janeiro, pela morte de Sebastião Evaristo Paixão, ao cair da maca, no Hospital Estadual Getúlio Vargas, e quem foi denunciada, por omissão, foi a enfermeira Maria Áurea Ferreira (doc. de fls. 88/89). Não existindo ainda a condenação, não existe crime, e a responsabilidade seria da enfermeira e não do Estado.

No mesmo sentido foi o acórdão no ERE n2 15.447, citado pelo recorren-te.

Houve contrariedade no artigo 1.544 do CC e divergência com a juris­prudência do extinto TFR e com o STF, porque o venerando aresto hostilizado confirma a . condenação em juros compensatórios, incluídos na sentença, e rejeitou os embargos.

° recorrente, pela sentença, foi condenado a pagar honorários advocatí­cios de 20% (vinte por cento), na forma do § 52 do artigo 20 do CPC. ° venerando acórdão impugnado reduziu a verba para 10% (dez por cento), mas manteve a base de cálculo, na forma do § 52 do artigo 20 do CPC, e rejeitou os embargos.

Pelo referido, § 52,

"Nas ações de indenização por ato ilícito contra a pessoa, o valor da condenação será a soma das prestações vencidas com o capital necessário a produzir a renda correspondente às presta­ções vincendas (art. 602) ... "

Quando, como no caso sub judice, a ação de indenização é movida contra a Fazenda, não existe a condenação dela "a constitúir um capital, cuja renda assegure o seu cabal cumprimento" (art. 602 do CPC) e se ela foi vencida, na fixação dos honorários de advogado, deve o Juiz aplicar o disposto no § 42 e não no § 52, e condená-la nos honorários sobre as prestações vencidas e 12 (doze) vincendas. Neste sentido são os precedentes de nossa Excelsa Corte, nos Recursos Extraordinários n2s 92.259 - RJ, Relator eminente Ministro Moreira Alves, RTJ - 98/394; 93.678 - GO, Relator eminente Ministro Djaci Falcão, RTJ - 103/678; 94.053 - RJ, Relato eminente Ministro Rafael Mayer, RTJ - 99/906; 98.821 - RJ, Relator eminente Ministro Alfredo Buzaid, RTJ - 109/1.117, e 100.685 - RJ, Relator eminente Ministro Alfre­do Buzaid, RTJ - 109/1.231.

354 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Consta da Ementa do RE - 92:259 - RJ que:

"O § 52 do artigo 20 do Código de Processo Civil, sendo texto de natureza excepcional, e devendo, portanto, ser interpre­tado estritamente, só se aplica aos casos de ilícito absoluto (a denominada responsabilidade extra-contratual), não abarcando as hipóteses de inadimplemento contratual (a chamada responsa­bilidade contratual), para as quais persiste a jurisprudência do S.T.F. no sentido de que a base de cálculo sobre a qual incidem os honorários de advogado é o resultado da soma do valor das prestações vencidas e de doze vincendas".

No RE n2 94.053 -RJ salientou o eminente Ministro Relator, em seu voto vencedor, que:

"Cuido que a circunstância de tratar-se de ato ilícito, não contratual, não importa a aplicabilidade, no caso, do § 52 do artigo 20 do Código de Processo Civil. Desde que vencida aFazenda Pública, rege a norma prevista no § 42, que é preceito excepcio­nante frente aos demais regulados no mesmo artigo, e tratamento singular à sucumbência em honorários de entidade pública.

Sempre se há de fixá-los, independentemente de parâmetros, consoante apreciação equitativa do Juiz, atendendo às circunstâncias contempladas nas alíneas do § 32 do mesmo artigo" (RTJ-99j908).

No RE n2 100.685 - RJ, o eminente Ministro Relator Alfredo Buzaid, em seu voto vencedor, diz, com propriedade e precisão, que:

"O que cumpre indagar é se este § 52, introduzido no art. 20 do Código de Processo Civil, pode ser aplicado na causa em que é vencida a Fazenda Pública, em relação à qual o Código de Processo Civil, no art. 20 § 42, estabeleceu regra especial, dizen­do:

"§ 42. Nas causas de pequeno valor e nas de valor inestimá­vel, bem como naquelas em que são houver condenação ou for vencida a Fazenda Pública, os honorários serão fixados consoante apreciação equitativa do juiz, atendidas as normas das letras a e c do § anterior."

2. Esta Egrégia Tunna, no recurso extraordinário n2 94.033, em 7.8.81, e que foi Relator o eminente Ministro Rafael Mayer, entendeu que:

"Desde que vencida a Fazenda Pública, rege a espécie o § 42 do art. 20 do CPC, valendo nesse teor, como razoável, a fixação

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 355

do percentual de honorários sobre o valor das prestações vencidas e doze das vincendas" (RTJ 99/906).

Partilho e subscrevo este entendimento, que está de acordo com o espírito do Código de Processo. O art. 20, § 32, dispõe, para as ações em geral, que os honorários serão fixados entre o mínimo de 10% e o máximo de 20% sobre o valor da condenação. Mas o § 4!! estatui que, nas causas em que for vencida a Fazenda Pública, os honorários serão fixados consoante apreciação equitativa do juiz. A introdução do § 5!! no art. 20 do Código de Processo Civil não revogou o § 4!!, que tem aplicação geral e todas as causas em que for vencida a Fazenda Pública. Os § 42 e 5!! do art. 20 do Código de Processo Civil se excluem e se completam. O § 52 entende com as ações de indenização em geral; o § 4!! diz respeito à condenação em particular da Fazenda Pública.

3. A Egrégia Terceira Câmara do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro condenou a Fazenda Pública, em relação aos honorários advocatícios, nos seguintes termos:

"Quanto aos honorários, são eles devidos na base de dez por cento sobre a totalidade da condenação, compreendendo presta­ções vencidas e vincendas, tudo na forma do § 5!! do art. 20 do CPC".

Aplicou o v. acórdão o § 5!! do art. 20 do Código de Processo Civil. O recorrente insurge-se contra esta v. decisão, alegando negativa de vigência do § 4!! do art. 20 do Código de Processo Civil e divergência com o V. acórdão desta Egrégia Turma,já por mim citado.

Conheço do recurso extraordinário pelos fundamentos das letras a e d e lhe dou provimento para condenar a Fazenda Pública no pagamento da verba de honorários na base de 15% sobre o valor das prestações vencidas e doze das vincendas, por conside­rar critério equitativo e em obséquio ao disposto no artigo 20, § 42, do Código de Processo Civil.

É o meu voto."

Houve a negativa de vigência do § 4!! do artigo 20 do CPC e a divergência com o RE n!! 94.052.

Conheço do recurso pelas letras a e c, item IH do artigo 105 da vigente Constituição Federal, e lhe dou provimento para excluir os juros compensató­rios, e adotar, como base de cálculo, para os honorários de advogado, a soma das prestações vencidas e mais doze vincendas.

356 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

EXTRATO DA MINUTA

REsp n!:! 2.062 - RJ - (Reg. n!:! 90.0000849-2) - Relator: O Exmo. Sr. Min. Garcia Vieira. Recorrente: Estado do Rio de Janeiro. Recorridos: Maria dos Reis Mendes dos Santos e outros. Advogados: Drs. Sebastião de Andrade Figueiredo e outro e José Orisvaldo Brito da Silva e outro.

Decisão: A Turma, por unanimidade, deu parcial provimento ao recurso (I!!. Turma: 6.6.90).

Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Ministros Armando Rollem­berg, Pedro Acioli e José de Jesus.

Ausente, justificadamente, o Exmo. Sr. Min. Geraldo Sobral. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Min. ARMANDO ROLLEMBERG.

RECURSO ESPECIAL N!.! 2.120 - SP

(Registro n!.! 90.10535)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Ilmar Galvão Recorrente: Municipalidade de São Paulo Recorrido: João Rodrigues da Silva Advogados: Dra. Laura França Leme e outros Dr. José Ribamar de

Castro e outro.

EMENTA: Desapropriação. Indenização. Cumulação de juros compensatórios e moratórios.

Nas ações da espécie, a cumulação das duas verbas é admissível, de vez que são distintos os seus fundamentos. Os moratórios são devidos pelo atraso no pagamento da indeni­zação. Os compensatórios, resultantes de criação pretoriana, destinam-se a cobrir lucros cessantes, nos casos de ocupação antecipada do imóvel pelo Poder Público.

Recurso não conhecido.

ACÔRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a 2!!. Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 357

Custas como de lei.

Brasília, 28 de março de 1990 (data do julgamento).

Ministro CARLOS VELLOSO, Presidente. Ministro ILMAR GAL VÃO, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO ILMAR GAL VÃO: O Município de São Paulo impetro u o presente recurso especial contra r. acórdão do Egrégio Tribunal de Justiça que, em ação expropriatória, houve por bem conceder, a par dos juros compensatórios, os de mora, entendimento que, a seu ver, entrou em choque com julgado do Colendo Supremo Tribunal Federal, segundo o qual, a acumulação em tela é injustificável.

O recurso, que foi deferido na origem, processou-se regularmente.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO ILMAR GAL V ÃO (Relator): No Supremo Tribunal Federal e no extinto Tribunal Federal de Recursos firmou-se a juris­prudência no sentido da inexistência de qualquer óbice à acumulação nas ações expropriatórias, de juros compensatórios com juros moratórios.

358

É o que mostram os seguintes acórdãos:

EMENTA: "Desapropriação. Juros compensatórios e mora­tórios. Cumulação.

Os juros compensatórios de 12 % são devidos pela utilização antecipada do imóvel e se contam da imissão provisória na posse até o efetivo pagamento da indenização.

Os juros moratórios à taxa da 6% fluem desde o trânsito em julgado da sentença final e são devidos pelo atraso no pagamento da indenização.

Presentes que sejam essas duas situações, os respectivos juros incidem cumulativamente" (RE n!.! 90.656 - SP. T. Pleno, ReI. Sr. Min. Soares Munoz. RTJ n!.! 99, pág. 708).

EMENTA: "Desapropriação. Juros compensatórios e mora­tórios. Cumulação.

Os juros compensatórios de 12 % são devidos pela utilização antecipada do imóvel e se contam da imissão provisória na posse até o efetivo pagamento da indenização.

R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Os juros compensatórios à taxa de 6% f1u.,;m desde o trânsito em julgado da sentença final e são devidas pelo atraso no paga­mento da indenização.

Presentes que sejam essas duas situações, os respectivos juros incidem cumulativamente. RE conhecido e provido parcial­mente" (RE n!! 95.124 - RJ. 2;[. TT. ReI. Sr. Min. Cordeiro Guerra. RTJ n!! 104, pág. 1.183).

EMENTA: "Desapropriação. Indenização. Cumulação de juros moratórios e compensatórios. Honorários de advogado.

I - Indenização: é de confirmar-se a sentença que fixou com base no laudo do perito oficial, suficientemente fundamentado.

II - Os juros compensatórios e moratórios: são acumuláveis, desde que resultantes de causas diversas. Os primeiros decorrem do desapossamento do imóvel expropriado e os últimos são de­vidos em razão da demora no pagamento da indenização fixada. Incidem, por isso mesmo, os compensatórios desde a imissão na posse (Súmula n!! 164 do STF), à taxa de 12% ao ano, e os moratórios a partir do trânsito em julgado da sentença que fixa o qllGnt1l11l indenizatório.

IH - Honorários advocatícios: fixação no percentual de 10% sobre a diferença entre o valor da oferta e da indenização fixada.

IV - Apelação parcialmente provida." (AC. n!! 51.232 - MG. Reg. 3008061 - ReI. Sr. Min. Antônio de Pádua Ribeiro. Dj de 04.12.80).

EMENTA: "Desapropriação. Servidão de passagem. Inde­nização. Acumulação de juros. Avaliação realizada no Juízo do inventário e perfeitamente válida, dadas as circunstâncias, tanto mais que a indenização apurada pela perícia, à luz das estimativas colhidas, se oferece, à evidência, aviltada. A acumulação de juros compensatórios e moratórios é admissível de vez que distintos são os seus fundamentos jurídicos. Os moratórios são devidos em razão do atraso no pagamento da obrigação: os compensatórios, que constituem criação pretoriana, se destinam a reparar o patri­mônio expropriado. Provida a apelação do expropriado e despro­vida da expropriante." (AC. n!! 59.662 - J. ego 3099024 - 6;[ T. ReI. Sr. Min. Miguel Jerônymo Ferrante. DJ. 29.10.81).

O entendimento discrepante, estampado na ementa do RE n!! 112.389-2-SP e nos votos vencidos constantes dos RE n!!s 90.656 e 85.209, invocados pelo Recorrente, não chegou a fazer escola, não se prestando para determinar uma mudança de orientação que, data venia, se afigura de todo injustificável.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 359

Na verdade, a compatibilidade entre as duas verbas decorre do fato de serem elas distintas, não apenas quanto à natureza, mas também quanto à destinação, nas ações da espécie.

Aliás, os juros compensatórios, calculados à taxa de 12 % ao ano, sem previsão legal, constituem fórmula pretoriana destinada a cobrir lucros cessan­tes, nos casos de ocupação antecipada do bem pelo Poder Público.

Desapossado o proprietário, antes de ser indenizado, como previsto na Constituição, não se compreenderia que ficasse privado dos frutos de seu bem, desde então, ainda que de imóvel baldio se tratasse, eis que, ainda assim, não se afiguraria justificável que o Poder Público, antes de indenizar, pudesse usufruir graciosamente o bem que não lhe pertence.

Ajusta indenização, pois, nessas circunstâncias, há de compreender, não apenas o valor venal do bem (dano emergente), senão que, igualmente, suas rendas (lucros cessantes), calculadas essas até que a pretensão expropriatória venha a consumar-se, por via do pagamento devido.

Tem-se, pois, que os juros compensatórios não possuem, aqui, caráter remuneratório de empréstimo de dinheiro ou de outra qualquer coisa fungível (art. 1.262 do CC), hipótese em que não poderiam exceder a taxa legal de 6%, senão mediante mútuo consentimento, o que não é o caso.

Feliz construção jurisprudencial, correspondem ao lucro cessante do imóvel expropriado, constituindo parcela indissociável da indenização, motivo pelo qual devem ser computados até o dia do pagamento desta, compreendendo todo o período que durou a ocupação provisória do bem.

Os juros moratórios, de sua vez, valem por verdadeira pena imposta ao devedor, em razão de haver retardado do cumprimento da obrigação de inde­nizar, expressa em cifra, a partir da sentença que a fixou.

Entender que os juros moratórios, de 6% ao ano, afastam, a partir da sentença, a incidência dos compensatórios, de 12 %, valeria por premiar-se o expropriante inadimplente com uma redução de 50% na taxa de juros por ele devida, o que seria um verdadeiro contra-senso.

Admitir-se o contrário, isto é, que os juros compensatórios, no mesmo período, eliminam os moratórios, significaria a consagração da impunidade para o devedor relapso, absurdo ainda maior.

Assim, enquanto provisória a ocupação do bem expropriado (provisorie­dade que só se dissipa pelo pagamento da indenização), devidos serão os juros compensatórios, e enquanto não houver o pagamento da indenização fixada, irrecusáveis os juros moratórios.

Inevitável, pois, a simultaneidade dos dois encargos, desde a sentença até o pagamento da indenização, ato final que tem o efeito não apenas de purgar

360 R. Sup. Trih.lust., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

a mora, mas também de transformar em definitiva a ocupação, elidindo os lucros cessantes.

Trata-se de peculiaridade das expropriatórias que, prontamente percebida por sábios julgadores, resultou na orientação jurisprudencial consagrada nas decisões da Suprema Corte e do extinto Tribunal Federal de Recursos, unifor­memente reiteradas ao longo das ültimas décadas, nada justificando a sua alteração.

Não conheço do recurso.

EXTRATO DA MINUTA

REsp nU 1.120 - SP - (Reg. nU 90.0001053-5) - Relator: Exmo. Sr. Min. Ilmar Galvão. Recorrente: Municipalidade de São Paulo. Recorrido: João Rodrigues da Silva. Advogados: .Dr1 Laura Leme França e outros e Dr. José Ribamar de Castro e outro.

Decisão: A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso. (Em 28.03.90 - 2"- Turma).

Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Ministros Vicente Cernic­chiaro, Carlos VeIloso e Américo Luz. Presidiu o Exmo. Sr. Ministro CAR­LOS VELLOSO.

RECURSO ESPECIAL NU 2.170 - SP

(Registro nU 90.1299-6)

Rel<).tor: O EX11lo. Sr. Ministro Eduardo Ribeiro

Recorrente: Banque Poplllaire Sllisse BPS

Recorrido: Naji Robert Nahas

Advogados: Drs. Celso Cibtra Mori e outro e Irinell Strenger

EMENTA: Competência internacional. Causas conexas. A competência da autoridade judiciária brasileira fir­

ma-se quando verificada alguma das hipóteses previstas nos artigos 88 e 89 do CPC.

O direito brasileiro não elegeu a conexão como critério de fixação da competência internacional que não se prorro­gará, por conseguinte, em função dela.

R. Sup. Trih. Jusl., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 361

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 3l!. Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade e

preliminarmente, decidiu no sentido da adequação do recurso especial, e no mérito, por maioria, conhecer em parte, para lhe dar provimento, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Brasília,7 de agosto de 1990 (data do julgamento). Ministro GUEIROS LEITE, Presidente. Ministro EDUARDO RIBEI­

RO, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Trata-se de ação em que se pleiteia declaração de nulidade de contrato, cumulada com indenização, proposta por Naji Robert Nahas contra Banque Populaire Suisse e Advicorp Advisory FinanciaI Corpo Reclamou o autor, ainda, perdas e danos, em razão da publicação de edital de protesto contra alienações de bens, em cautelar movida pelo réu.

O réu argüiu a incompetência da Justiça brasileira, nos termos do art. 92

da Lei de Introdução do Código Civil, art. 42 do mesmo Código e art. 88, IH do CPC.

No Juízo de primeiro grau, o processo foi julgado parcialmente extinto, reconhecida a incompetência da Justiça do Brasil, salvo para o -pedido de indenização, decorrente da publicação do protesto.

Agravaram de instrumento as partes.

Por votação unânime, a Quarta Câmara Civil deu provimento ao recurso do autor, negando-o ao do réu.

Inconformado, o vencido apresentou recurso especial, fundamentado no art. 105, HI, a da Constituição Federal. Afirmou que violados os arts. 88, I, H, IH, que estabelecem critérios de competência da autoridade brasileira, art. 102, pertinente a modificações da competência, art. 103, relativo a ações conexas e art. 265 IV que dispõe sobre a suspensão do processo, todos do CPC.

Recurso admitido. Apresentadas contra-razões, sobem os autos ao Supe­rior Tribunal de Justiça.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: O recorrido apresen­ta como óbice, ao conhecimento do recurso, a alegação de que a espécie não

362 R. Sup. Trih. JtI~l., Bra~íIia, 2(12): 261-437, ago. 1990.

se enquadraria no conceito de causa. Não tem razão. Trata-se de um incidente de causa. Nem se exige, para fazer cabível o especial, que a decisão seja de mérito. É pacífico que também as decisões sobre questões processuais, ainda que simplesmente interlocutórias, propiciam o recurso.

Sustenta, mais, que a decisão não seria de última instância por versar sobre incompetência absoluta. Também aí não tem razão. Foram esgotados os recursos nas instâncias ordinárias. É o que basta.

Não seria também admissível, uma vez que o caso não se enquadaria na previsão do artigo 325 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.

O julgamento foi proferido em nove de março de 1989, quando ainda não fora instalado esse Superior Tribunal de Justiça. A meu entendimento, o direito ao recurso nasceu naquela data. A meu entendimento, o direito ao recurso nasceu naquela data. A ulterior publicação no Diário da Justiça faz-se apenas para efeito dos prazos recursais, relativamente à decisão, que já existia desde o momento em que anunciado, em sessão, o resultado do julgamento. Se assim era, cabível o extraordinário, por força do disposto no artigo 27, § F do A.D.C.T. E como a hipótese não se achava elencada nos itens I a X do citado dispositivo regimental, a admissibilidade do recurso condicionava-se ao re­conhecimento da relevância e a respectiva argüição não foi apresentada.

Ocorre, entretanto, que, publicadas as conclusões do acórdão em 26 de abril, o recurso foi interposto quando já instalado o STJ, ficando prejudicadas as argüições de relevância. Tenho entendido que constituiria excesso de rigor exigir-se fosse feita a argüição quando não poderia mais ser examinada. Com base nesse entendimento, supero o obstáculo.

Afirma, por fim, que o recurso voltava-se contra a garantia consagrada no artigo 5!!, XXXV da Constituição. Isso também não é exato. O Estado brasileiro não poderia, obviamente, deixar de estabelecer limites ao exercício de sua atividade jurisdicional. A discussão sobre se a causa se acha compreen­dida neles é perfeitamente possível.

Sustenta o recorrente que violados os artigos 88, I, II e IIl, 102, 103 e 265, IV, a do CPC.

A infringência aos diversos incisos do artigo 88 resultaria da circunstân­cia de o acórdão haver reconhecido a competência da Justiça brasileira para julgamento de hipótese que não se conteria na previsão daquele dispositivo.

Cumpre distinguir, para que se possa dar à espécie solução adequada. Na inicial, pediu-se a declaração de nulidade do contrato firmado pejas partes, com a condenação do ora recorrente e de Advicorp Advisory Financiai Corp., ao pagamento de perdas e danos decorrentes da gestão de contas e liquidação de contratos, assim como dos que advieram da publicação do protesto contra alienação de bens.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 363

Relativamente à nulidade do contrato, a decisão de primeiro grau enten­deu que o pleito não era de competência da Justiça brasileira. Não assim, entretanto, no que diz com as perdas e danos oriundas da publicação do protesto. Este ato, tendo sido praticado no Brasil, firmar-se-ia a competência das autoridades judiciárias pátrias.

O acórdão reformou em parte o julgado. Considerou que, mesmo admi­tindo-se competente, em princípio, a Justiça estrangeira, para apreciar o pedido de nulidade, a brasileira teria sua competência prorrogada em virtude da conexão.

No que diz com a pretensão pertinente a nulidade contratual, há que se admitir como certo que, em princípio, não seria competente a Justiça brasileira. É que induvidosamente não se verifica qualquer das hipóteses previstas nos artigos 88 e 89 do Código de Processo Civil. Saliente-se que o item II do artigo 88 incide quando seja demandado o cumprimento de obrigação, o que não se verifica na hipótese, sendo irrelevante a alegação da inicial de que o autor aqui cumpria obrigações contratuais. Tenho pois, como desnecessário verificar quanto à existência e validade de foro de eleição.

Cumpre examinar se merece acolhida o entendimento do acórdão, fun­dado na conexão. O tema é objeto de controvérsia. A tese do julgado recorrido é placitada por Tomaghi que a afirma sem ter reputado necessário maiores considerações (Comentários ao C.P.c. vol I - p. 310 li! ed.). No mesmo sentido Ada Pelegrini, em parecer juntado aos autos, onde se salienta que, se admitida a eleição de foro, com maior razão a modificação da competência pela conexão.

Parece-me mais acertada, entretanto, a doutrina contrária, sustentada por José Ignácio Botelho de Mesquita (Rev de Processo - vol. 50 p, 61). Após salientar que o direito brasileiro, ao contrário do italiano, não elegeu a conexão como critério para fixação de competência internacional, invoca o disposto no artigo 90 do CPC, considerando que este cortou cerce a discussão:

liA pendência de uma ação no exterior não impede que a Justiça brasileira conheça de ações conexas com a proposta no exterior (art. 90) e simetricamente a conexão com uma ação proposta no Brasil não se inclui entre os pontos de contacto suficientes para estender até ela a jurisdição nacional (art. 88)".

E a solução parece efetivamente a melhor. Admitir-se que a conexão possa levar a que se firme a competência da autoridade judiciária brasileira, para hipóteses não cogitadas nos artigos 88 e 89 do CPC, poderá levar a um alargamento excessivo daquela, colocando em risco o princípio da efetividade que domina a matéria.

364 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Considero, pois, deva o recurso ser parcialmente provido. Relativamente ao pedido de indenização, fundado em protesto que se sustenta abusivo, a hipótese insere-se no artigo 88, 111 do CPC.

Tenho, pois, como certo que violados os artigos 88 e 89 do c.P.c. ao . dar-se pela competência da Justiça do Brasil para casos não contemplados

naqueles dispositivos. Conheço em parte, pela letra a e dou provimento para restabelecer a sentença de primeiro grau.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO NILSON NAVES: Sr. Presidente, de acordo com o meu método de trabalho, encontro dificuldade para conhecer do recurso especial, que veio ter ao Superior Tribunal de Justiça, pela alínea a, somente. Em sua impugnação, aduziu o recorrido:

"24. Não é esta, no entanto, a realidade. O v. acórdão recor­rido lavrou hermenêutica perfeita, harmonizando a letra da lei com a melhor doutrina (cfr. referência à doutrina de Chiovenda e Liebman, fls. 2 e 3 do acórdão) e interpretando-a à luz de princípios constitucionais (cfr., por exemplo, referência ao prin­cípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, fls. 3 do v. acórdão).

25. Sólidos princípios e sólida doutrina, portanto, a emba­sarem o brilho dos votos dos Srs. Desembargadores. Melhor interpretação não pode haver. É incabível, portanto, o Recurso Especial interposto."

De fato, assim se houve o acórdão local, em interpretação sabia; razoável, portanto. Quando do julgamento do REsp-1.284, lembrei o assunto a tanto me reporto, neste momento.

Data venia, não conheço do recurso especial.

EXTRA TO DA MINUTA

REsp nº 2.170 - SP - (Reg. nº 90.1299-6) - Relator: Exmo. Sr. Ministro Eduardo Ribeiro. Recorrente: Banque Populaire Suisse BPS. Recor­rido: Naji Robert Nahas. Advogados: Drs. Celso Cintra Mori e outro e Irineu Strenger.

Decisão: A Turma, por unanimidade e preliminarmente, decidiu no sen­tido da adequação do recurso especial, e no mérito, por maioria, vencido o Sr. Ministro Nilson Naves, que dele não conhecia, conheceu, em parte, para lhe dar provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Sustentou oral­mente o Dr. Antônio Carlos Gonçalvez, pelo recorrente (3i! Turma -7.8.90).

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2( 12): 261-437, ago. 1990. 365

Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Ministros WaldemarZveiter, Cláudio Santos, Gueiros Leite e Nilson Naves.

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro GUEIROS LEITE.

• RECURSO ESPECIAL N!.! 2.232 - RJ

(Registro n!.! 90.00015499)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Athos Carneiro Recorrente: Com. Ind. de Fios Gilson Ltda

Recorrido: Fábrica Itatiaia de Tecidos S.A. Advogados: Drs. Spencer Daltro de Miranda Filho e outros; Sérgio

Moreira da Silva e outros

EMENTA: Nulidades processuais. Artigos 244, 245, 2490, § 12, 250, § único, do Código de Processo Civil.

Não deve ser declarada nulidade quando a parte a quem possa favorecer para ela contribuiu, e se absteve de qualquer impugnação, no curso da demanda, relativamente ao devido processo legal.

Junção de ação de busca e apreensão, convertida em depósito, e de ação indenizatória por rescisão de contrato. O descabimento da ação de depósito não prejudicou o andamen­to conjunto da demanda indenizatória, pois, realizada au­diência e propiciada oportunidade para provas e memoriais, sem que a pàrte ré haja agravado ou alegado prejuízo.

Não deve o Tribunal substituir-se à parte na afirmação de prejuízos não invocados em tempo hábil. E a crítica à sentença, quando eventualmente haja o juiz errado in proce­dendo ou in judicando, deve ser feita com moderação.

Recurso especial conhecido pela alínea a e parcialmente provido, para cassar a anulação do processo da ação indeni­zatória."

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 4;). Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento, na forma do relatório e notas taquigráficas precedentes que integram o presente julgado.

366 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Custas, como de lei.

Brasília, 26 de junho de 1990 (data do julgamento).

Ministro BUENO DE SOUZA, Presidente. Ministro ATHOS CARNEI­RO, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO ATHOS CARNEIRO: Buscarei resumir os fatos. Tudo parte de contrato de prestação de serviços, pelo qual a firma Comércio e Indústria de Fios Gilson Ltda. forneceu matéria-prima, fios de algodão, à firma Fábrica Itatiaia de Tecidos S.A., a fim de que esta lhe forne­cesse o produto final, sacos para embalagem de açúcar. Em pagamento, a Itatiaia emitiu duplicatas, aceitas pela Gilson e descontadas em banco. Ocorre que a fornecedora da matéria-prima não recebeu da fábrica a quantidade de sacos correspondentes ao montante dos fios entregues, alegando-se saldo devedor de mais de 263 mil sacos. A Gilson notificou a Itatiaia, e esta respon­deu que retivera uma quantidade de fios para garantia de créditos seus, decor­rentes de problemas nos descontos bancários.

A empresa Gilson, após prévia notificação à Itatiaia, contra esta ajuizou, em agosto de 1981, ação de busca e apreensão dos fios retidos pela ré, com liminar deferida. Não encontrada a mercadoria, a autora postulou e obteve a transformação da ação de busca e apreensão em ação de depósito, que a Itatiaia contestou, seguindo-se réplicas.

Nesta oportunidade a empresa Ober S.A. ajuizou embargos de terceiro, buscando resguardar-se do risco da apreensão de mercadorias de propriedade dela embargante, existintes nos depósitos da Itatiaia. Responderam os embar­gados.

Em janeiro de 1982 a firma Gilson ingressou em juízo com ação "de indenização por rescisão de contrato de prestação de serviços". Citada, Itatiaia contestou e, após, apensados os autos, prosseguiu a demanda nos autos do processo relativo à ação de busca e apreensão.

As partes especificaram provas. Foram, em audiência, ouvidas testemu­nhas. O magistrado deferiu perícia. Tendo sido juntado aos autos, pela autora, um parecer técnico, o juiz dispensou a perícia, ensejando às partes alegações finais. Não houve agravo. Sentenciou, a seguir, o magistrado, julgando: a) procedente a ação de depósito; b) extintos os embargos de terceiros; e c) procedente a ação indenizatória, condenada a Itatiaia a ressarcir a autora conforme apurado fosse em liquidação de sentença.

R. Sup. Trib. Just., Bmsília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 367

Apelou a vencida, Gilson Ltda., postulando a anulação da sentença pela ausência de despacho saneador, e referindo que as demandas, não sendo conexas, não poderiam merecer instrução e julgamento conjunto. De mérito, teria sido a autora apelada quem dera "margem ao rompimento contratual".

A egrégia 2õ! Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, após críticas acerbas feitas pelo relator no atinente à condução do processo e ao decisório de primeiro grau, "tumulto geral"; "desastre maior"; acolhimento de "pedidos estapafúrdios"; existência na comarca de um "CPC próprio, de uso doméstico", chegou às seguintes conclusões: a) afastou a nulidade alegada, de ausência de despacho saneador, embora "mal saneado é verdade"; de mérito, b) considerou incabível a conversão da ação de busca e apreensão em ação de depósito, pela inexistência de depósito contratual ou legal, devendo a retenção de matéria-prima ser considerada na ação própria; c) entendeu que os embargos de terceiro, à falta de objeto, deveriam ter sido liminarmente indeferidos; d) julgou que a ação indenizatória deverá prosseguir, "mas alimpada do tumulto causado pelas errôneas determinações, de modo a ensejar segura defesa da acionada-apelante"; em conseqüência, anulou o processo da demanda indeni­zatória a partir de fi. 34, inclusive, "repetindo-se a citação, agora afastado o tumulto estabelecido, ensejando ampla defesa à ré".

Contra esta decisão volta-se o recurso extraordinário, manifestado pela firma Gilson Ltda. em setembro de 1983, antes, pois, de editada a Emenda Regimental n!l 2, de 4.12.85, do Supremo Tribunal Federal. Busca'supedâneo nos incisos a e d do art. 119, In, da Constituição pretérita, alegando violação dos artigos 244, 245, 249 § 1!l, e 250, § único, do c.P.c., e divergência do aresto recorrido com numerosas decisões, que aponta, relativas aos convales­cimento de nulidades processuais. Pede a restauração, em plenitude, da sen­tença.

O eminente Desembargador 3!l Vice-Presidente do Tribunal de origem negou seguimento ao apelo último, argüindo falta de prequestionamento e inobservância do artigo 322 do Reg. Int. do STF. Foi provido pelo relator, no Pretório Excelso, o agravo de instrumento, para que subisse o recurso para melhor exame. Com razões apenas da recorrente, chegam ao Supremo Tribu­nal Federal. O parecer do Ministério Público, perante aquela Alta Corte, é pelo não conhecimento da inconformidade, salientando inclusive que "a anulação da ação de indenização a partir da citação visou, antes de tudo, proporcionar ampla defesa à ré, ora recorrida, impossível de ser feita nos presentes autos, dado o tumulto processual nele estabelecido".

Pela decisão de fi. 260 foi o recurso extraordinário convertido em recurso especial, com remessa a este Superior Tribunal de Justiça, e distribuição, em março p.p., a este relator.

É o relatório.

368 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

VOTO

o EXMO. SR. MINISTRO ATHOS CARNEIRO (Relator): Uma obser­vação inicial, que faço com a devida vênia. A leitura do voto condutor do v. aresto, veemente ao extremo na crítica à sentença do MM. Juízo de Magé, lembrou-me antiga e sábia advertência de ilustríssimo magistrado, que foi do Pretório Excelso, e tenho por convinhável memorar expressamente:

"Moderado há de ser também o tratamento do juiz de segun­da instância para com os de primeira. Não será de boa ética usar de expressões que ponham maIo magistrado de inferior instância perante os seus jurisdicionados. A censura ao magistrado deprime a própria Justiça, algumas vezes.

É doloroso, por exemplo, usar das frases: "O juiz errou", "a sentença não está certa", "é confusa", "o juiz decidiu contra a lei", "os seus argumentos são fragílimos". Chega-se ao mesmo resul­tado, em termos mais suaves: "não procede o argumento do apelado" .

............................................ (ol1zissis) .......................................... .

A ciência do Direito é tão difícil, e tão falível o entendimento humano, que bem pode acontecer que o juiz de segunda instância, supondo estar com a razão, seja quem, na verdade, labore em erro" (Mário Guimarães, "O Juiz e a Função Jurisdicional", Fo­rense, 1958, n!! 219, pág. 364).

Passo ao mérito. Postulando embora, no recurso extremo, a restauração do decisório de 1!! grau em sua plenitude, em verdade, pela argumentação expendida, verifica-se que a inconformidade da recorrente volta-se inteiramen­te contra a anulação pelo v. aresto, desde a citação inicial inclusive, da ação indenizatória por descumprimento contratual que propôs contra a recorrida nos idos de 1982.

Realmente, nada a objetar às conclusões do v. aresto, relativamente à extinção da ação de busca e apreensão, pela inexistência do bem a ser apreen­dido, e no tocante ao evidente descabimento da conversão da aludida ação em ação de depósito.

Todavia, quanto à anulação da ação indenizatória, tenho em que o juízo colegiado, cioso o eminente relator da fiel observância do devido processo legal, relegou, no entanto, ao oblívio, princípios fundamentais de nosso Código em tema de invalidades. Galeno Lacerda, ex-Desembargador do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e processualista civil da maior nomeada, tem sublinhado vezes muitas o caráter peculiar, em nosso direito processual codi­ficado, das regras alusivas às nulidades processuais, enquadrando-as como

R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 369

regras de sobredireito, muito mais voltadas à convalidação e ao afastamento das nulidades do que a sua decretação, sempre com vista à função basilar do processo, como instrumento de aplicação do direito material; assim também mestre Couture, fulminando excessos de formalismo, para que o processo não volte a ser, "como se disse que foi nos seus primeiros tempos, uma 'missa jurídica', alheia às suas atuais necessidades" ("Fundamentos do Direito Pro­cessual Civil", trad. port., Saraiva, 1946, pág. 315).

Sustenta a recorrente ter ocorrido, no v. aresto, violação aos artigos:

a) Art. 245 do CPC, impositivo à parte da obrigação de denunciar nos autos, na primeira oportunidade em que couber, a nulidade dos atos, pena de preclusão. E relaciona a recorrente os passos do processo, em que a parte recorrida, embota regularmente intimada, deixou de impugnar as decisões do juiz, inclusive não comparecendo às audiências e nem apresentando os memo­riais (rectius, razões finais escritas). Refere, ainda, que a própria recorrida postulou o julgamento de plano da lide, a teor do artigo 330 do CPC;

b) Art. 244 do CPC, pois se alguma irregularidade procedimental houve, a recorrida jamais protestou, chegando o processo a bom termo;

c) Art. 249, § 12, do CPC, na anulação do processo desde a citação inicial inclusive, embora haja a recorrida contestado a ação de indenização, sem discutir senão o mérito, não tendo jamais o advogado da ré, sempre intimado regularmente, invocado qualquer prejuízo. Não poderá, assim, o acórdão, supor prejuízo à parte que em tempo nada alegou;

d) Art. 250, parágrafo único, do CPC, sempre com o argumento de inocorrência de prejuízos à defesa.

Assiste, a meu sentir, neste passo, razão à recorrente.

Nas razões de apelação, a única nulidade invocada pela firma Itatiaia terá sido a ausência de despacho saneador, sustentando não poderia ter sido desig­nada audiência de instrução e julgamento para ambas as ações - a de busca e apreensão e a ação indenizatória - em um só processo. E encerra a súplica: "assim, acaso não anulada a sentença pela não observância de importante fase processual- despacho saneador - deve, no mérito, ser acolhida a apelação, julgando-se improcedentes as ações".

Todavia, impende aqui objetar que, devidamente citada na ação indeni­zatória (apenso lII, fi. 36), a ré contestou a ação por petição datada de 10.02.82, postulando então, expressamente, fosse tal demanda indenizatória "anexada à de busca e apreensão, conforme requerido pela autora, a fls. 6, in fine, a qual tramita por esse juízo e cartório de 32 Ofício" (siC, apenso III, fi. 36). O juiz deferiu o pedido de anexação. Isso em fevereiro de 1982.

Por petição de julho de 1982, portanto já reunidas as ações, a ré Itatiaia rogou "0 julgamento de plano do pedido, com sua improcedência". O magis-

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trado realizou aos 20.09.82 a audiência por tenno à fi. 124, intimados os advogados das partes, audiência esta relativamente aos três processos; ouviu duas testemunhas e determinou perícia. Nenhum agravo. Após a apresentação de um parecer técnico pela autora, entendeu o juiz que a prova pericial se tomara desnecessária e a dispensou. E abriu azo a memoriais. A autora apre­sentou o seu. A recorrida, intimada, manteve-se silente. Seguiu-se a prolação da sentença, julgando inclusive procedente a ação indenizatória no an debea­tur, reservando-se o quantum para o processo de liquidação.

Ora, tendo assim transcorrido o processo, não encontrei motivo maior conducente à integral renovação da demanda indenizatória. Embora com per­calços, o rito comum ordinário veio a sdr observado, sem que a parte ré, em momento algum, houvesse impugnado as decisões interlocutórias do juiz. O próprio tema do saneamento, o único suscitado seriamente pela ré já na ape­lação, este tema o acórdão o rejeitou. Mas anulou o processo sob fundamento de um "tumulto geral", e de haver o juiz acolhido "pedidos estapafúrdios". Mas se o dito "tumulto geral" decorreu da união 'das ações, ao realizá-la atendeu o magistrado ao pedido inclusive da própria recorrida. E se a sentença, no mérito, acolheu pedidos estapafúrdios, cumpria ao Tribunal, como o fez com relação à ação de depósito, reformar a sentença. Para isso as apelações.

Em suma: o v. aresto viu nulidades absolutas e insanáveis ao arrepio das regras processuais apontadas pela recorrente. E, mais ainda, ao arrepio do art. 243 do CPC, pelo qual a nulidade não pode ser invovada pela parte que lhe deu causa; e a recorrida requereu a junção dos processos, junção dos processos, junção que teria conduzido a demanda ao "tumulto geral" que não encontrei. Encontrei foi a renitente omissão do procurador da rescorrida, intimado sempre e ausente aos atos processuais os mais relevantes. '

Pelo exposto, o recurso merece ser conhecido pela alínea a.

Deixo no entanto de conhecê-lo pelo dissenso jurisprudencial, pois a transcrição de meros trechos de acórdãos não basta a satisfazer os requisitos regimentais, atualmente revelados no artigo 255, § único, do RISTJ, que neste passo seguiu a orientação do Regimento Interno do Pretório Excelso.

O pressuposto do prequestionamento, realçado no parecer da Procurado­ria da República, devo afastá-lo, pois, o prejuízo de que se queixa a recorrente lhe foi imposto pelo próprio acórdão, ao recusar-lhe o exame do mérito na ação indenizatória. Assim, v.g., o .STF no RE 99.814, RTJ 107/415, reI. ° em. Ministro Oscar Correa. Aliás, a recorrida é que somente questionou nulidades por ocasião da apelação, com descaso pelo instituto da preclusão.

Nestes termos, conheço do recurso especial pela alínea a do permissivo constitucional e ao mesmo dou parcial provimento, para, cassando em parte o acórdão, tomar sem efeito a anulação do processo quanto à ação indenizatória,

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 371

detenninando que a egrégia Câmara aprecie, em seu mérito, a apelação da ré relativamente a esta ação.

É o voto.

EXTRATO DA MINUTA

REsp n!.! 2.232 - RJ - (Reg. n!.! 90.0001549-9) - Relator: Exmo. Sr. Ministro Athos Carneiro. Recorrente: Com. Ind. de Fios Gilson Ltda. Recorri­do: Fábrica Itatiaia de Tecidos S.A. Advogados: Drs. Spencer Daltro de Mi­randa Filho e outros; Sérgio Moreira da Silva e outros. Sustentação oral: Dr. Spencer Daltro de Miranda Filho.

Decisão: A Turma, por unanimidade, conheceu do recurso e deu-lhe parcial provimento (em 26.06.90 - 4l! Turma).

Votaram os Exmos. Srs. Ministros Fontes de Alencar, Sálvio de Figuei­redo, Barros Monteiro e Bueno de Souza. Presidiu o Julgamento o Exmo. Sr. Ministro BUENO DE SOUZA.

372

• RECURSO ESPECIAL N!.! 2.335 - SP

(Registro n!.! 90.0001911-7)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo

Recorrente: Banco do Estado de São Paulo S/A - BANESPA

Recorridos: Nicolau Archila Gallan e Cônjuge

Advogados: Drs. lraci Tallliko Unisedo e outro Dr. Gil Costa Carvalho

EMENTA: Locação. Plano cruzado. Prédio urbano não­residencial. Discrepância entre lei e regulamento. Ilegalidade. Conceito de lei federal.

A legislação decorrente do /I plano cruzado /I não autori­zou a inclusão, no art. 7!lo do Dec. 92.592/86, das locações de prédios urbanos não-residenciais, apresentando-se inquina­do de ilegalidade o regulamento que altera a lei regulamen­tada.

Segundo a melhor doutrina, e mesmo na corrente restri­tiva, o decreto e regulamento federais estão compreendidos no conceito de lei federal, para os fins do recurso especial.

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

A regular argüição de relevância, existente no sistema constitucional anterior e não inadmitida até a data da insta­lação do Superior Tribunal de Justiça, tem o condão de evitar a preclusão da matéria nela suscitada, segundo orientação que veio a ser adotada e prestigiada.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos, em que são partes as acima indicadas.

Decide a 4!!.Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso, nos termos do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei. Brasília, 19 de junho de 1990 (data do julgamento).

Ministro BUENO DE SOUZA, Presidente. Ministro SÁLVIO DE FI­GUEIREDO TEIXEIRA, Relator.

EXPOSIÇÃO

O EXMO. SR. MINISTRO SÁL VIO DE FIGUEIREDO: Cuida-se de pretensão formalizada em "ação ordinária de cobrança de diferença de alu­guéis", ajuizada pelo locador-recorrido, acolhida nas instâncias ordinárias.

Inconformado, recorreu extraordinariamente o locatário, tendo argüido a relevância da questão federal.

Inadmitido o recurso, com a nova ordem constitucional o apeJo foi des­dobrado, tendo então sido admitido o especial sob o pálio da alínea a, do art. 105, UI, da Lei Maior.

Argumenta o recorrente-locatário que o v. acórdão teria negado vigência ao art. 7'2 do Decreto n'2 92.592/86, que inclui as locações de prédios urbanos não-residenciais nas restrições do "Plano Cruzado", acentuando que" o decreto regulamentador não modificou a lei, nem criou obrigações novas. Apenas explicitou os vazios dentro dos limites estabelecidos em lei, suprindo a im­previsibilidade de determinados fatos e circunstâncias que reclamavam provi­dências imediatas".

O autor-recorrido, por sua vez, alega que incabível o recurso, quer porque não existente à época da recorribilidade do acórdão, quer porque a Constituição fala em violação de lei federal e não de decreto.

A r. sentença, ao acolher a pretensão, teve por inconstitucional o Decreto, que estaria a extrapolar os termos do Decreto-lei 2.284/86, que se referiu apenas a imóveis residenciais.

R. sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 373

o v. acórdão (apelação 212.281/8), por sua vez, deu provimento ao apelo do autor, ora recorrido, apenas para fazer incidir a cobrança desde os venci­mentos e não a partir da citação, por tratar-se de obrigação vencida, líquida e positiva (CC, art. 906), acentuando ainda que não seria de declarar-se a incons­titucionalidade pela discrepância entre o regulamento e a lei, mas sim a ilega­lidade, invocando lições do Supremo Tribunal Federal (RTJ 99/1.362 e DJU de 22.10.82, AgRg 88.780-6 - BA).

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO SÁLVIO DE FIGUEIREDO (Relator): A matéria em debate se me afigura simples, a importar no não conhecimento do recurso, o qual, é de acentuar-se, na realidade deveria ter sido também inad­mitido na origem após o desdobramento decorrente da orientação sufragada com a entrada em vigor da Constituição atual.

Cumpre rejeitar, porém, em preliminar, as alegações de não conhecimen­to argüidas pelo recorrido, nos termos expostos no relatório.

A uma, porque o oferecimento da argüição de relevância, existente à época, tomou não-preclusa a matéria nela versada, a ensejar a transformação do recurso extraordinário em especial no tocante à matéria infraconstitucional, segundo orientação do Pretório Excelso, prestigiada nesta Corte Superior.

A duas, porque o decreto e regulamento federais se incluem no conceito de lei federal, consoante lição, dentre muitos, do Ministro Carlos Mário Ve­lloso ("0 Superior Tribunal de Justiça - Competência Originária e Recursal", n!! 5.1, no prelo, citando arestos da Suprema Corte - RTJ 44/467,101/1.149, além de RF 284/157).

Ultrapassadas estas preliminares, oportunas se apresentam as considera­ções do ilustre Juiz sentenciante, Dr. Heraldo de Oliveira Silva, verbis:

374

É da tradição de nosso Direito o tratamento preferencial e protecionista da locação residencial, sendo a habitação um ele­mento básico da vida social.

Ao posto que nas locações não residenciais se exerce ativi­dade lucrativa, civil ou comercial, e de certo modo refugiria a um setltido de equilíbrio manter o locador jungido a determinado inquilino, com possibilidades restritas de retomada do imóvel, em prejuízo de outros interesses relacionados ao melhor ou mais conveniente uso da coisa.

Por esse motivo, os referidos decretos-leis ditaram a fórmula do cálculo do novo aluguel, congelando-se até 28 de fevereiro de 1987.

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Entretanto, não fez menção expressa, em qualquer de seus artigos, a respeito da locação não residencial, e assim o Sr. Pre­sidente da República expediu o Decreto n!! 92.592/86, para regu­lamentar a atualização pro rata e conversão para cruzados de vários tipos de obrigações abrangidas pelo artigo 9!! do Decreto­lei n!! 2.284/86, e entre os contratos as locações não residenciais urbanas, que em seu artigo 7!! estabelece:

"Nos contratos celebrados anteriormente a 28 de fevereiro de 1986, e que não se referiram a saldos devedores regulados pelos artigos 1!! e 3!! deste Decreto, tais como os de prestação de serviços em geral ou de locação de prédios urbanos não residen­ciais, ou de arrendamento de prédio rústico não residencial, ou de locação de coisa móveis, bem como os valores exigíveis em decorrência de autorização, permissão ou concessão de uso ou de direito real de uso, e que tenham bases pactuadas com correção monetária pela variação do IPCA ou da ORTN, terão seus valo­res atualizados pro rata tempore e serão convertidos em cruzados obedecendo ao seguinte procedimento: I - O valor da obrigação mensal em cruzeiros, existente em 28 de fevereiro de 1986, será multiplicado pelo coeficiente constante da Tabela do Anexo In, deste Decreto, correspondente à periodicidade de reajuste e ao mês do último reajuste contratual; (omissis)."

Os decretos, em sentido próprio e restrito, define Hely Lopes Meireles, em seu "Direito Administrativo Brasileiro" (9!! edição, Rev. Trib., pg. 132) "são atos administrativos da competência exclusiva dos chefes do Executivo, destinados a prover situações gerais ou individuais, abstratamente previstas de modo expresso, explícito ou implícito pela legislação".

O Prof. Manoel Gonçalves Ferreira Filho preleciona em sua obra "Comentários à Constituição Brasileira" (Saraiva, 1 i!. edição, 1982):

"Realmente, na pureza do sistema, somente a lei obriga, não estando o indivíduo adistrito a fazer ou deixar de fazer senão o que esta determina (vide, infra, art. 153, § 2!!). Dessa forma, o regulamento seria abusivo e, conseqüentemente, inválido se criasse direitos ou obrigações novas, não estabelecidas pela lei, se ampliasse, restringisse ou modificasse direitos ou obrigações, se ordenasse ou proibisse, e que a lei não ordena nem proíbe, se facultasse ou proibisse diversamente do que a lei estabelece, se extinguisse ou anulasse direitos ou obrigações".

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376

Na mesma linha de raciocínio temos as obras do Prof. José Celso de Melo Filhú ("Constituição Federal Anotada", Saraiva, 1984, pág. 195), Prof. José Afonso da Silva ("Aplicabilidade das Normas Constitucionais", RT, 1968), Prof. Vicente Ráo ("O Di­reito e a Vida dos Direitos", Ed. Res. Univ., 1976, pág. 269).

O referido decreto foi editado para regulamentar um decre­to-lei, expedido pelo próprio executivo, este com força de lei em substância, inserido pela vontade do Presidente da República, regulamentando matéria própria de lei (ordinária), absorvendo anormalmente as funções próprias do legislativo, eventualmente supresso. (Confira-se a respeito "Curso de Direito Constitucional Positivo" do Prof. José Afonso da Silva, RT 1976, 1!J voI. pág. 106).

Estabelecendo o dito art. 7!J do Decreto 92.952 procedimen­to diverso daquele constante no art. 9!J do D.L.2.284/86, com vistas ao cálculo dos alugueres nas locações com a natureza acima referida, evidentemente que veio ele a ferir o Direito dos deman­dantes, extravasando sua competência no referente à matéria que lhe cabia disciplinar, no âmbito estrito da regulamentação, visto que consoante deixou escrito Pontes de Miranda.

"O poder regulamentar é o que se exerce sem criação de regras jurídicas que alterem as leis existentes e sem alteração da própria lei regulamentada".

Em conclusão, observa o sempre lembrado jurista:

"Sempre que no regulamento se insere o que se afasta, para mais ou para menos, da lei, é nula, por ser contrária à lei, a regra jurídica que se tentou embutir no sistema jurídico" ("Comentários à Constituição de 1967", vol. lU, págs. 312/317, RT, 1970).

Assim visto, pode-se concluir, nos expressos termos cons­titucionais, que o decreto é destinado a propiciar a fiel execução das leis ou decretos-leis com força de lei, não podia ir além, como o fez, introduzindo o coeficiente estampado na "Tabela Anexo UI", que diminui sensivelmente o valor aluguel.

Deve-se, então, enquadrar as locações não residenciais nos parâmetros do art. 9!J do Decreto-Lei 2.284/84, posto que o de­creto ilegal tenta regulamentá-lo em sua explicitação, como no presente caso.

O Contrato de locação firmado entre as partes (fls. 17/30) estabelece o reajuste anual nos índices da variação das ORTN (cláusula 2!!), e o último reajuste aconteceu em 10 ele setembro de

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1985. Deve ser atualizado, "pro rata tem pore" (proporcional ao período de tempo decorrido desde a última correção até 28/2/86), dividindo-se proporcionalmente o período de 10/9/85 a 28/2/86, nas bases pactuadas pelas paties. Feito esse reajuste, o valor apurado em cruzeiros será convertido em cruzados pela paridade de Cr$ 1.000/Cz$1,00, confonne demonstrado no item XII da petição inicial, no valor de Crz$ 24.013,37, para todo o imóvel, congelando-se até 28/2/87.

Reconhecível a ilegalidade do artigo 7!2 do Decreto n!2 95.592/86, sujeitando-se o caso ao disposto no art. 9!2 do Decre­to-Lei n!2 2.284/86, como se pode verificar nos trabalhos do d. advogados, Dr. José Adriano Marrey Neto, publicado no jornal O Estado de São Paulo, 11/4/8624/08/86; Dr. Rubens Approbato Machado, publicado no Diário do Comércio e Indústria, 22/4/86.

Por outro fundamento, também é de se acolher a pretensão dos autores.

Tratando-se de contratos legitimamente celebrados, as par­tes têm direito de vê-los cumpridos, 110S termos da lei contempo­rânea aos seus nascimentos, a regular inclusive os seus efeitos, em setembro de 1984 e janeiro de 1985.

Os efeitos ficam condicionados à lei vigente no momento em que foram firmados pelas partes; não havendo que invocar o efeito imediato da lei nova.

Conforme sintetizou Serpa Lopes:

"Todos os fatos consumados durante a vigência ela Lei an­terior, assim como todas as consequências deles decorrentes, devem ser por ela regidos" ("Comentários à Lei de Introdução ao Código Civil", 2!! edição, vol. I, pág. 286).

Se os efeitos do contrato não continuam vinculados à lei vigente no momento de sua celebração, os contraentes ficariam expostos a surpresa, capazes de comprometer uma situação pa­trimonial, como poderá ocorrer no caso sub judice. A lei nova não se aplica aos efeitos futuros do contrato anteriormente celebrado e que se acha em curso.

O alcance de lei nova a situação definitivamente consolida­da mal feriria, às escâncaras, o proibitivo de retroatividade em face do ato jurídico perfeito (art. 153, § 3!2, da Constituição Fede­ra\).

É que o contrato é lei entre as partes e deve ser respeitado, pondo-se ao largo da superveniência de novo ordenamento jurí-

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dico. Essa a orientação que melhor se, ajusta aos princípios de direito, como norma consagrada, lega~ e constitucional (cf. Vi­cente Ráo, "O Direito e a Vida dos Direitos", volume I, pág. 433).

A irretrotabilidade, a bem da verdade, impossibilita outra solução (cf. Bento de Faria," Aplicação e Retroatividade da Lei", pág. 107; Carlos Maximiliano, "Direito lntertemporal", pág. 182).

Firmada a correção dos alugueres por coeficientes das ORTN, estes só prevalecerão, é certo, até o término do pacto locativo, considerado, aí, então, diploma legal que, durante sua fluência, os tomou obrigatórios. Essa a exegese que, na trilha dos ensinamentos de Roubler, vem sendo adotada pela jurisprudên­cia, especialmente da Suprema Corte.

Com efeito, ninguém nega que o contrato de locação é um contrato de trato sucessivo. Mas nem por isso, obviamente, deixa de ser contrato consensual, que é ato jurídico perfeito no momen­to em que ocorre o acordo de vontades entre locador e locatário, ou seja, no instante em que se constitui.

Daí a lição clássica de Carlos Maximiliano ("Direito lnter­temporal", n!! 161, pág. 190, Freitas Bastos, Rio de Janeiro, 1946):

"Não se confundam contratos em curso e contratos em curso de constituição: só estes a norma hodierna alcança, não aqueles (locação, por exemplo); pois são atos jurídicos perfeitos consti­tuídos, que se acham em curso de efeito".

E, mais adiante (n!! 168. pág. 197), acrescenta:

"Os efeitos de contrato em curso no dia da mudança da legislação regulam-se conforme a lei da época da constituição do mesmo; a norma anterior não os modifica, diminui ou acresce".

Por isso, é de apenas adaptar o valor da locação em cruzeiro e correção em ORTN para a nova moeda em cruzados e correção pelo substitutivo OTN, na data de sua instituição, em 28/2/86, atualizando-se o último reajuste, em 10/9/85, pro rata tempore "(sic).

Nota-se, do exposto, que o referido Decreto 92.592 extrapolou efetiva­mente o D.L. 2.284/86 ao pretender regulamentá-lo, dispondo sobre aluguéis de prédios urbanos não-residenciais, o que não lhe era lícito fazer, como salientou o em. Relator do acórdão impugnado, Prof. Gildo dos Santos, tra­zendo à colação orientação da sua ego Câmara, firmada na apelação 208.073/0, de 26.8.87.

378 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Em síntese, não conheço do recurso.

EXTRATO DA MINUTA

REsp n!! 2.335 - SP - (Reg. n!! 90.0001911-7) - Relator.: Exmo. Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo. Recorrente: Banco de São Paulo-Banespa. Recorrido: Nicolau Archilla Gallan e cônjuge. Advogados. Drs. Iraci Tamiko Unisedo e outro, e Dr. Gil Costa Carvalho.

Decisão: A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator (4l! Turma - 19.06.90).

Votaram com o Ministro Relator os Exmos. Srs. Ministros Barros Mon­teiro, Bueno de Souza, Athos Carneiro e Fontes de Alencar. Presidiu o Julga­mento o Exmo. Sr. Ministro BUENO DE SOUZA.

-. -RECURSO ESPECIAL N!! 2.356 - SP

(Registro n!! 90.0001979-6)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Armando Rollemberg Recorrente: Fazenda do Estado de São Paulo Recorrido: Cia. Siderúrgica de Tubarão Advogados: Drs. Nelson Lopes de Oliveira Ferreira Júniorj outro, Ge­

raldo Ataliba e outro

EMENTA: Tributário. ICM. Isenção. A isenção concedida a projeto de interesse nacional não

pode ser alterada por convênio posterior àquele que a previu. Recurso desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas: Decide a F Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

negar provimento ao recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei. Brasília, 30 de maio de 1990 (data do julgamento). Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente e Relator.

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RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO ARMANDO ROLLEMBERG: A Compa­nhia Siderúrgica de Tubarão, promoveu contra a Fazenda Pública do Estado de São Paulo, ação para ver declarado seu direito de isenção do ICM na aquisição de equipamentos e máquinas vinculados à execução do projeto de interesse nacional de implantação da Usina Siderúrgica de Tubarão, com fundamento do Decreto-Lei n!! 1.335/74, alterado pelo Decreto-Lei n!! 1.398/75, nos Atos Declaratórios CST 146/80,242/80 e 37/811 e no Convênio ICM - 09/75.

Processada, foi a ação julgada procedente pelo Juiz de Direito da 2ª Vara da Fazenda Pública, em sentença que veio a ser confirmada pela maioria da Décima Terceira Câmara Civil do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em decisão assim fundamentada no voto do relator:

380

1/ A Companhia Siderúrgica de Tubarão propôs contra a Fa­zenda do Estado de São Paulo a presente ação declaratória, ale­gando, em resumo, tratar-se ele sociedade brasileira, constituída por capitais nacionais, de origem pública na sua participação majoritária e capitais estrangeiros e que tendo elaborado o projeto denominado Tubarão, para a implantação de portentosa usina siderúrgica em solo brasileiro, com estímulos fiscais decorrentes dos Decretos-leis n!!s 1.335/74 e 1.398/75 e constantes do Aviso Ministerial n!! 23, de 30/1/76, e dos atos declaratórios CST n!!s 146, de 17/4/80, 242, de 28/6/80 e 37, de 29/1/81, no âmbito federal, e, no Estado de São Paulo, favorecido com a isenção do ICM, através de atos da Secretaria da Fazenda, tais atos, consubs­tanciados em Resoluções e Portarias, foram expedidos com base no Decreto Estadual n!! 17.727/81 e Convênio ICM n!! 9/75. To­davia, com as restrições impostas pelos Convênios ICM n!!s 11/81

. e 26/83 e a revogação do inciso XLVII do art. 5!! do Regulamento do ICM, pelo Decreto n!! 221.863/83, o projeto foi colocado em risco, uma vez que ainda não contratados ou realizados o forne­cimento e a aquisição da totalidade dos bens necessários ao de­senvolvimento e conclusão das obras.

A questão, assim posta, cinge-se à legitimidade do poder de revogar ou reduzir, a qualquer tempo, isenção tributária. A regra é no sentido positivo. Todavia, essa regra comporta exceções conducentes à imodificabilidade e à irrevogabilidade, como, por exemplo, se a concessão se fez a prazo certo ou em função de

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detenninadas condições. Nessa linha de entendimento, conside­ra-se existente prazo certo aquele definido e determinado pelo próprio tempo necessário à execução total do projeto. Nem se há olvidar que o êxito da execução do projeto, de reconhecido inte­resse nacional, se acha vinculado ao direito atribuído pelo Estado àquela Companhia, em razão do Convênio n!! 9/75. De outra parte, há que se notar que tais isenções não são outorgadas em conside­ração ao fornecedor, que é o contribuinte de direito do tributo, mas sim, em atenção, exclusivamente, ao empreendedor do pro­jeto, que não deve arcar com os ônus fiscais por repercussão, para, assim, não prejudicar financeiramente e até comprometer o pro­jeto. O caso concreto, pois, insere-se na exceção daquela regra.

Nesse tema, a lição de Aliomar Baleeiro é de que: "a regra deve ser a revogabilidade ou redutibilidade da isenção em qual­quer tempo .em que o Estado entende que ela já não corresponde ao interesse público do qual emanou. Mas, há exceções, quando a isenção, pelas condições de sua outorga, conduziu o contribuin­te a uma atividade que ele não empreenderia se estivesse sujeito a tributos da época. Então ela foi onerosa para o beneficiário. Nesses casos, a revogabilidade total ou parcial seria um ludíbrio à boa fé dos que confiaram nos incentivos acenados pelo Estado" (Direito Tributário Brasileiro, 5;[ ed., pág. 525).

Esse entendimento vem cristalizado na Súmula n!! 544, do Supremo Tribunal Federal assim enunciado: "Isenções tributárias concedidas, sob condição onerosa, não podem ser livremente suprimidas".

Assim, a autora, já com a isenção outorgada e no estágio do andamento do projeto, não poderia ver suprimido o direito àquele benefício, por norma posterior que alterou o convênio primitivo, que somente poderia produzir efeitos para o futuro e nunca alcan­çar situações preexistentes, além do que é próprio do nosso orde­namento jurídico constitucional o princípio da irretroatividade da norma, impedindo-a de atingir o ato jurídico perfeito. Não há, pois, qualquer ofensa à Constituição Federal.

Por derradeiro, bem a propósito, mencionada pelas corretas contra-razões, recente decisão do Pretório Excelso, com a seguin­te ementa: "Isenção tributária - Convênios para isenção de ICM - A isenção de ICM concedida, tendo em vista projeto de obra de interesse público, não constitui pura liberalidade, pois é con-

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dicionada à execução daquele projeto. Os convênios posteriores que previram novas condições para a concessão da isenção não alcançam aquela relativa a projeto de interesse nacional em plena execução - Recurso conhecido (R.E n!! 111.63-8-2 - RJ - 2"­Turma - ReI. Min. Carlos Madeira, j. 10.2.87; DJU de 3.4.87, pág. 5.823)."

Inconformado, o Estado de São Paulo interpôs embargos infringentes que foram rejeitados, seguidos de embargos de declaração igualmente rejeitados.

Não se conformando, mais uma vez, interpôs o Estado referido recurso especial com fundamento no art. 105, IH, alínea c, da Constituição da Repú­blica, argüindo divergência jurisprudencial e invocando, para comprová-la, dentre outras, decisões da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, proferidas nos RREE n!!s 105.486-7 e 104.504-3, de que foram relatores os Srs. Ministros Oscar Corrêa e Octávio Galloti, assim ementadas:

382

"ICM - Isenção prevista no Convênio 9/75 e revogada em convênio posterior - 24/81 - na vigência do qual se verifica a saída das máquinas e equipamentos adquiridos.

Isenção pura e simples, sem ônus ou contraprestação. Inci­dência imediata e revogabilidade admitida.

Recurso Extraordinário conhecido e provido."

"Não se subordinou a concessão a qualquer condição ou contraprestação onerosa"

"Ora, a hipótese inclui-se, reconhecidamente, entre as pri­meiras, pura e simplesmente, sem condição ou ônus, ou prazo certo, prevalecendo, desta forma, o princípio, a regra da revoga­bilidade."

"ICM. Isenção concedida pelo Convênio n!! 9 - 75 e revo­gada pelos Convênios n!!s 11 - 81 e 24 - 81.

Acórdão recorrido que se baseou em dois fundamentos, cada qual por si suficiente, sendo um calcado em matéria de fato e interpretação de norma estadual (Súmulas 279 e 280).

Isenção, ademais, pura e simples, e por isso revogável, como decidiu a 1tl Tunna do Supremo Tribunal, ao apreciar o Rec. Ext. 105.486.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Recurso Extraordinário de que não se conhece."

Mencionou, ainda, julgados do Tribunal de Justiça de Minas Gerais.

Admitido, o recurso foi regularmente processado e encaminhado a este Tribunal.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO ARMANDO ROLLEMBERG (Relator): A decisão recorrida, como acentuado no relatório, foi no sentido da impossibili­dade de suprimir-se isenção doICM concedida com apoio no Convênio 09/75, para realização de projeto de interesse nacional e, em sentido contrário, que demonstraria divergência jurisprudencial, apontou a requerente julgados assim ementados:

"ICM. Isenção prevista no Convênio 9/75 e revogada em convênio posterior - 24/81 - na vigência do qual se verifica a saída das máquinas e equipamentos adquiridos.

Isenção pura e simples, sem ônus ou contraprestação.lnci­dência imediata e revogabilidade admitida.

Recurso Extraordinário conhecido e provido.

Não se subordinou a concessão a qualquer condição ou contraprestação onerosa.

Ora, a hipótese inclui-se, reconhecidamente, entre as pri­meiras pura e simplesmente, sem condição ou ônus, no prazo certo, prevalecendo, desta forma, o princípio, a regra da revoga­bilidade."

"ICM. Isenção condicionada pelo Convênio n!! 9 - 75 e revogada pelos Convênios n!!s 11 - 81 e 24 - 8I.

Acórdão recorrido que se baseou em dois fundamentos, cada qual por si suficiente, sendo um calcado em matéria de fato e

. interpretação de norma estadual (Súmula 279 e 280).

Isenção, ademais, pura e simples, e por isso revogável, como decidiu a 1l! Turma do Supremo Tribunal, ao apreciar o Rec. Ex. n2 1105.486 ..

Recurso Extraordinário de que não se conhece."

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 383

A divergência é manifestada e, assim, conheço do recurso.

Nego-lhe, porém, provimento, pois há que distinguir-se, na hipótese, entre saída de máquina e equipamentos destinados a uso normal, e fato idêntico quando relativo a projeto de interesse público, como decidiu a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos RR.EE 111.638 e 112.613, relatados pelo Sr. Ministro Carlos Madeira, assim ementados:

"Isenção tributária. Convênio para isenção de ICM. A isen­ção do ICM concedida tendo em vista projeto de obra de interesse público, não constitui pura liberalidade, pois é condicionada à execução daquele projeto. Os Convênios posteriores que previ­rem novas condições para a concessão da isenção não alcançam aquela relativa a projeto de interesse nacional em plena execu­ção."

Ora, no caso dos autos, a isenção fora concedida para projeto de implan­tação de usina siderúrgica em solo nacional - Projeto Usina Tubarão, para o qual eram necessários máquinas e equipamentos, não sendo possível alterar-se as condições da aquisição respectiva, porque concebido dito projeto conside­rando a isenção de impostos, inclusive o ICM.

Quanto à argüição de negativa de vigência do art. 178 do CTN, de acordo com o qual "a isenção, salvo se concedida por prazo certo e em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei, a qualquer tempo, observando o disposto no inciso IH do art. 104", não se verificou, ao que entendo, no caso presente, pois, a isenção foi concedida considerando ser o projeto de interesse nacional.

Nego provimento ao recurso.

EXTRATO DA MINUTA

REsp. n!! 2.356 - SP - (Reg. n!! 90.0001979-6) - Relator: Exmo. Sr. Ministro Armando Rollemberg. Recorrente: Fazenda do Estado de São Paulo. Recorrido: Cia. Siderúrgica de Tubarão. Advogados: Drs. Nelson Lopes de Oliveira Ferreira Júnior, outro, Geraldo Ataliba e outros.

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso. (Em 30.05.90 - I!! Turma).

Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Ministros Pedro Acioli, Ge­raldo Sobral, José de Jesus e Garcia Vieira. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro ARMANDO ROLLEMBERG.

384 R. SlIp. Trih.ll1st., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

RECURSO ESPECIAL Nº 2.429 - SP

(Registro n!! 90.0002330-0)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Barros Monteiro Recorrente: Banco Bradesco de Investimentos S/A.

Recorrido: Cleper Arnaud Mascarenhas Advogados: Drs. Rosângela Claudino Pedrosa e outros e Augusto Cor­

deiro V. Mascarenhas.

EMENTA: Fraude de execução. Não caracterização. Para que se configure a fraude de execução, não basta o

ajuizamento da demanda, mas a citação válida. Recurso especial conhecido, mas improvido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 4;). Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

conhecer do recurso e negar-lhe provimento, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. .

Custas, como de lei. Brasília, 19 de junho de 1990 (data do julgamento). Ministro, ATHOS CARNEIRO, Presidente. Ministro BARROS MON­

TEIRO, Relator.

RELATÓRIO

O .EXMO. SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO: Contra a decisão, que julgou subsistente a penhora, declarando realizada em fraude de execução a dação em pagamento, objeto de escritura pública, o executado interpôs recurso de agravo de instrumento. Sustentou o agravante que, para a caracte­rização da fraude de execução, não é suficiente o ajuizamento da demanda, mas a citação válida. O Primeiro Tribunal da Alçada Civil de São Paulo, por maioria de votos, deu provimento ao recurso nos seguintes termos:

"lI. Com efeito, exigindo a lei, para a configuração de fraude de execução, que a alienação do bem haja se dado quando, ao seu tempo, corria contra o devedor demanda capaz de reduzi-lo à

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 385

insolvência, não é possível se dar, aqui, o reconhecimento daque­la.

Na hipótese, a alienação se operou na mesma data da citação dos executados, e como acaba de decidir, novamente, o Supremo Tribunal Federal, no RE n!.! 105.846-3, de São Paulo, mantendo a orientação trilhada em acórdão do Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, o simples ajuizamento da execução não con­figura demanda. Ao ver também da mais alta Corte do País, para caracterizar a fraude à execução se mostra imprescindível o ato citatório válido, de modo a se poder falar em demanda, em lide pendente, ou coisa litigiosa. Serviram tie suporte para a decisão referida não apenas a doutrina de Moacyr Amaral Santos, Pontes de Miranda e Amílcar de Castro, quanto a esse entendimento de coisa litigiosa, mas também o entendimento seguido pelo Tribu­nal da Capital Federal em outros recursos extraordinários, por ele invocados, a saber, RE 83.762, transcrito in RTJ 89/899, e RE 85.169, transcrito in RTJ 93/625.

Na linha desse entendimento dado ao artigo 593, n, do CPC, pelo Colendo Supremo Tribunal Federal, não se pode enxergar, . pois, aqui, fraude de execução, como, de resto, assim vem enten­dendo esta Câmara (Apelações n!.!s 348.582, 363.018, 376.485), observando-se, por oportuno, que eventual discussão sobre a verificação de fraudes contra credores se mostra inoportuna e impossível dentro do processo de execução.

Com estas considerações, dão provimento ao recurso para julgar insubsistente a penhora, reconhecendo a inexistência de fraude à execução da mencionada dação em pagamento feita por escritura pública registrada em I!.! de agosto de 1986./1

O Banco agravado manifestou recurso especial com arrimo no art. 105, IIl, letras a e c, da CF, alegando negativa de vigência dos arts. 593, n, e 653 do CPC, ao fundamento de que, para configurar-se a fraude de execução, basta a propositura da ação, com a distribuição do feito. Salientou que o recorrido tinha plena ciência da execução, sendo evidente a simulação com que se houve. Argüiu, ainda, divergência jurisprudencial, trazendo a confronto as decisões proferidas nos Embargos Infringentes n!.! 22.764, do Primeiro Tribunal .de Alçada do Rio de Janeiro e nos agravos n!.!s 855/84 e 1.448/87, ambos do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul, e n!.! 99.054, da Suprema Corte.

Admitido o apelo extremo pela alínea c do permissivo constitucional, as partes ofereceram razões e contra-razões.

É o relatório.

386 R. Sup. Trib. Jusl., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO (Relator): Por escri­tura pública datada de 25.7.86, o executado deu o imóvel sito à rua Ivoturucaia, nº 198, em dação em pagamento a Valdomiro Matias. Tal escritura foi regis­trada no dia 01.08.86, mesma data em que se operou a citação do devedor na execução aparelhada pelo Banco-recorrente.

Discute-se nestes autos se, para fins do disposto nos arts. 592, V, e 593, lI, do CPC, basta o ajuizamento da ação ou, se ao reverso, é necessária a citação.

A litispendência somente ocorre com a citação, conforme resulta inequí­voco do estabelecido nos arts. 219 e 263, segunda parte, ambos da lei proces­sual civil. Assim, para a demanda correr, não basta o aforamento da ação: é de rigor a citação válida. Antes da citação, não se pode afirmar que se tenha instaurado a relação jurídico-processual e, conseqüentemente, a alienação de bens pelo réu não é de ser tida como atentatória ao normal desempenho da função jurisdicional. Pode ser que tenham sido atingidos os interesses privados do credor, circunstância que não se confunde com a fraude de execução (cfr. voto do ilustre Desembargador Rubens Bergonzi Bossay - fi. 137).

Essa é a diretriz jurisprudencial traçada pelo C. Supremo Tribunal Federal (RTJ 89/899-904; 93/625; 116/356 e 122/800), que esta Turma perfilhou ainda recentemente (Recurso Especial n!! 2.573-RJ, Relator Ministro Fontes de Alen­car). Nesse sentido alinha-se, outrossim, o magistério de Mário Aguiar Moura, para quem:

"Entendemos que para o efeito estudado é a citação do réu que pesa. Entre os efeitos da citação está o de tornar litigiosa a coisa, já tendo sido decidido pelo Pretório Excelso: 'Sem a litis­pendência e a insolvência conseqüente à lide existente não se pode configurar a alienação em fraude de execução' (RE nº 18.769, Rev. For., 140/180).

Correto que não se trata de litigiosidade específica em tomo de determinado bem. Isso ocorre relativamente ao inc. I, do art. 593. Mas, tendo em vista que a alienação torna insolvente o devedor, a litigiosidade diz com o patrimônio por inteiro dele. Há uma contaminação genérica e indivisível que coloca sub judice todos os bens do devedor.

Nesse modo de ver, ainda mesmo quajá aparelhado se ache o processo pela distribuição ou despacho, em linha de princípio, a alienação, que se efetiva nesse interregno e antes da citação, não enseja a argüição de fraude de execução. Poderá favorecer a verificação da fraude contra credores".

R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 387

("Fraude de Execução pela Insolvência do Devedor", Revis­ta Ajuris, vol. 12, pág 68).

Tampouco colhe a argumentação desenvolvida pelo recorrente quanto à norma inserta no artigo 653 do CPC. É que a admissibilidade da efetivação do arresto não elidé a exigência de citação válida para fins do estatuído no art. 593, 11, do CPC. Consoante lição de Celso Neves, lia figura do art. 653 insere-se, com o elemento eventual, no procedimento da penhora, sem perder o sentido euremático que lhe é próprio, mas tem, aqui, natureza executória, e como tal deve ser entendidà" ("Comentários ao Código de Processo Civil", vol. VII, pág. 31, Ed. Forense).

A alegação de simulação, de outro lado, situa-se no plano dos fatos, não sendo suscetível de ser apreciada no campo do apelo extremo através da invocação de qualquer das alíneas do permissivo constitucional.

Em suma, não se dá, in casu, negativa de vigência de lei federal.

Tocante ao dissídio pretoriano, dois dos arestos trazidos como paradig­mas prestam-se ao confronto, pois asseveraram a tese de que, para a caracte­rização da fraude de execução, é prescindível a citação, sendo bastante o ajuizamento da ação. São os dois acórdãos provenientes do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul (fls. 134/145 e 146/155). Todavia, como evidenciado acima, interpretação mais compatível com a sistemática de nosso diploma processual civil é aquela que reclama o advento da citação para o fim de possibilitar a configuração da fraude de execução. .

Ante o exposto, conheço do recurso pela letra c do autorizativo éonstitu­cionaI, mas nego-lhe provimento.

É como voto.

VOTO-VISTA

6 EXMO. SR. MINISTRO ATHOS CARNEIRO: Eminentes Colegas, este tema é realmente um tema extremamente polêmico, e isso em conseqüên­cia da redação atécnica do Código de Processo Civil em seu art. 593, inciso 11, onde usa da expressão 11 corria contra o devedor". O uso do verbo "correr" parece-me que, realmente, não tem um significado jurídico preciso, muito ao contrário.

O eminente processualista Alcides de Mendonça Lima, na 6!l edição de seus "Comentários ao Código de Processo Civil", da Revista Forense, refere expressamente ser "essencial de modo irretorquível a litispendência" (obra citada, nQ 1.130). É verdade que, sob esta redação do Código de Processo Civil, com a exegese, que a jurisprudência dominante atribui à lei, abre-se azo a numerosas manobras fraudulentas de devedores que podem, cientes, como é

388 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

tão freqüente, da propositura da ação, usar de artifícios para se furtarem à citação; e no interregno procedem à alienação de seus bens. Estarão a agir, então, não em fraude de execução, e sim apenas em fraude de credores, exigindo do credor todos os percalços, as demoras e os inconvenientes da propositura da ação pauliana.

Embora estas realidades no plano fático, e as perplexidades que a redação da lei nos traz, tendo em vista os precedentes jurisprudenciais e a doutrina prevalente, acompanho o voto do eminente Relator, naturalmente ressalvando ao credor a ação pauliana.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO SÁL VIO DE FIGUEIREDO: Acompanho o Ministro Relator, até porque já me pronunciei a respeito em sede doutrinária.

EXTRATO DA MINUTA

REsp n!! 2429 - SP - (Reg. n!! 90.0002330-0) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Barros Monteiro. Recorrente: Banco Bradesco de Investimento S/A. Recorrido: Cleper Arnaud Mascarenhas. Advogados: Drs. Rosângela Claudi­no Pedrosa e outros e Augusto Cordeiro V. Mascarenhas.

Decisão: A Turma, por unanimidade, conheceu do recurso e negou-lhe provimento (Em 19.06.1990, 4;! Turma).

Os Exmos. Srs. Ministros Athos Carneiro, Fontes de Alencar e Sálvio de Figueiredo votaram com o Relator. Ausente, ocasionalmente, o Exmo. Sr. Ministro Bueno de Souza. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro ATHOS CARNEIRO.

RECURSO ESPECIAL N!.! 2473 - SP

(Registro n!.! 90.0002428-5)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Ilmar Galvão

Relator designado: O Exmo. Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro Recorrente: Sintesul S/A - Síntese de defensivos Químicos do Sul

Recorrido: Fazenda do Estado de São Paulo Advogados: Drs. Roberto Faria de Sant'anna, Marco Antonio Moraes

Sophia e outros

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 389

EMENTA: Recurso especial. GATT. ICM. Isenção. Ma­téria prima. À mercadoria importada de país signatário do GATT estende-se a isenção do ICM concedida a similar na­cional. Interpretação lógica conduz ao mesmo resultado quando se trata de matéria prima para fompor mercadoria, que, por sua vez, é idêntica à composta com material brasi­leiro. Identificam-se na finalidade, qual seja, conferir a mes­ma disciplina tributária.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas;

Decida a 2!! Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, vencido o Sr. Ministro-Relator, dar provimento ao Recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Designado para o acórdão o Exmo. Sr. Ministro Vicente Cemicchiaro.

Custas, como de lei.

Brasília, 06 de junho de 1990 (data do julgamento).

Ministro CARLOS VELLOSO, Presidente. Ministro LUIZ VICENTE CERNICCHIARO, Relator Designado.

RELATÓRIO

o EXMO. SR. MINISTRO ILMAR GAL V ÃO (Relator): SINTESUL S/A Síntese de Defensivos Químicos do Sul interpôs recurso extraordinário, com argüição de relevância, fundado no art. 119, IH, a e d, da CF/67, contra v. acórdão do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, confirma­tório de sentença pela qual. lhe foi denegada segurança, impetrada com o objetivo de ver reconhecido direito a isenção de ICM na importação de país signatário do GATT, de matéria-prima destinada à fabricação de medicamento de uso veterinário isento do tributo.

Disse que a referida decisão negou vigência ao inciso XIII, § 1!!, do art. 1!!, da Lei Complementar n!! 4/69, aos artigos 96 e 98 do CTN e a diversos dispositivos da CF/67, além de haver entrado em divergência com a Súmula n!! 575 do STF e precedentes da mesma Corte.

A argüição de relevância foi considerada prejudicada na Suprema Corte, havendo o eminente Relator, Ministro Francisco Resek, determinado a devo­lução do respectivo instrumento à Corte de origem, a fim de que fosse exami­nada a possibilidade de admissão do recurso especial em que foi convertido,

390 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

ipso jure, o recurso extraordinário, nos estritos limites da matéria deduzida na mencionada argüição.

Deferido o processamento, vieram os autos a este STJ.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO ILMAR GALV ÃO (Relator): A argüição de relevância cingiu-se ao alegado dissídio, devendo-se conter o recurso, pois, nesse limite, conforme observado na decisão do Relator, no STF.

Trata-se, como se viu, de matéria-prima importada de país signatário do GATT, destinada à produção de medicamento de uso veterinário, isento do ICM.

É de reconhecer-se que a jurisprudência do STF, sobre a matéria, não distingue entre produto acabado e matéria-prima, conforme explícito no RE 113. t50, in verbis: -

"Embargos de Declaração. GATT. Isenção do ICM a pro­duto importado cujo similar nacional goza de idêntico benefício. A Emenda Constitucional n~ 23/83, ao acrescentar o § 11 do art. 23 da Carta da República, não revogou o Acordo Geral de Tarifas e Comércio, pelo qual o país garante a igualdade entre as partes contratantes, inclusive quanto ao tratamento tributário.

Embargos declaratórios rejeitados".

Esta egrégia Turma, já por diversas vezes, teve oportunidade de pronun­ciar-se pela validade da isenção prevista no mencionado Tratado, em face da EC 23/83, que introduziu o § 11 no art. 23 da CF/67.

Confronte-se, por exemplo, o acórdão proferido no RESP nQ 1.528-SP, de que fui Relator:

"Tributário. ICM. Importação de produto cujo similar na­cional goza de isenção do imposto. Lei nQ 3.991/83, do Estado de São Paulo, que- instituiu o Tributo com base na competência explicitada e ampliada pela EC número 23/83, ao aditar o § 11 do artigo 23 da CF/67.

Diploma legal que há de ser interpretado em consonância com o princípio da equivalência de tratamento fiscal, consagrado no texto do GATT (Parte lI, art. III), por força do qual as isenções tributárias que contemplam o similar nacional devem ser esten­didas ao produto importado de países signatários do Tratado em apreço, sob pena de ofensa ao art. 98 do CTN. Precedentes do STF.

Recurso provido."

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 391

Não esteve em jogo, entretanto, nessa decisão, o problema da matéria­prima ora apreciada.

Conforme já acentuado acima, o que se estabeleceu no GATT foi a equivalência de tratamento fiscal entre produto importado e similar nacional.

É ler o menciopado documento, na parte pertinente ao assunto:

"Parte 11 - Artigo 111

Tratamento nacional em matéria de tributações e de regula­mentação internas

2) Os produtos do território de qualquer parte contratante importados para o território de qualquer outra parte contratante não sofrerão a inddência, direta ou indireta, de taxas ou outras tributações internas, sejam de que natureza forem, superiores àquelas que incidem, direta ou indiretamente, sobre os produtos nacionais similares. Por outro lado, nenhuma parte contratante aplicará, de outra maneira, taxas ou outras tributações internas nos produtos importados ou nacionais de um modo contrário aos princípios "enunciados no parágrafo primeiro.

3) .......................................................................................... .

4) Os produtos do território de qualquer parte contratante importados pelo território de qualquer outra parte contratante não estarão sujeitos a um tratamento menos favorável que o concedi­do aos produtos similares de origem nacional no que concerne a quaisquer leis, regulamentos ou prescrições que afetem a venda, a colocação à venda, a compra, o transporte, a distribuição e a utilização destes produtos no mercado interno. As disposições do presente parágrafo não interditarão a aplicação de tarifas diferen­tes para os transportes internos, fundadas exclusivamente na uti­lização econômica dos meios de transporte e não na origem do produto".

Diante do texto transcrito, é fora de dúvida que o tratamento fiscal nele previsto somente contempla produto com similar nacional, não se estendendo à matéria-prima ou demais componentes nele utilizados.

É possível que a matéria-prima importada constitua, em si mesma, um produto acabado, com similar nacional isento, embora possa vir a ser utilizado na fabricação de outro mais sofisticado. Nesse caso, é fora de dúvida que está abrangido pela cláusula de equivalência, que não está condicionada, como se viu, à destinação dada ao produto.

No caso dos autos, todavia, a importação é de Trymethil Ortho Formate, substância que não configura a hipótese acima delineada, constituindo, antes,

392 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

uma susbstância destinada à fabricação de defensivos animais, segundo escla­recido na própria inicial.

Sequer se alega que possa ser confrontada com substância da mesma espécie, produção nacional, que desfrute isenção tributária.

Assim sendo, não há considerá-la protegida pela prefalada cláusula de equivalência que, pelo fato de encerrar privilégio fiscal, não comporta inter­pretação abrangente.

Ante o exposto, meu voto é no sentido de negar provimento ao recurso.

VOTO-VOGAL

O EXMO. SR. MINISTRO VICENTE CERNICCHIARO: Sr. Presiden­te, com os esclarecimentos do Eminente Ministro-Relator, peço vênia para dissentir das conclusões de S. Exa., reeditando voto,. anteriormente, aqui pro­ferido. A finalidade da isenção é colocar no produto final preço mais acessível ao consumidor. Em sendo assim, se a matéria-prima é utilizada especificamen­te para a produção de uma mercadoria e, por seu tumo, essa mercadoria é isenta do ICM, há o interesse. A matéria-prima em si mesma não fará concorrência a congênere nacional, porque inexiste a similitude.

Em face disto, data venia, conheço do recurso e dou-lhe provimento.

VOTO (VISTA)

O EXMO. SR. MINISTRO CARLOS M. VELLOSO: A espécie foi assim sumariada pelo eminente Ministro limar Galvão, Relator:

"SintesuI S/A Síntese de Defensivos Químicos do Sul inter­pôs recurso extraordinário, com argüição de relevância, fundado no art. 119, III, a e d, da CF/67, contra v. acórdão do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, confirmatório de sentença pela qual lhe foi denegada segurança, impetrada com o objetivo de ver reconhecido direito a isenção de ICM na impor­tação de país signatário do GATT, de matéria-prima destinada à fabricação de medicamento de uso veterinário isento do tributo.

Disse que a referida decisão negou vigência ao inciso XIII, § I!!, da Lei Complementar n!! 4/69, aos artigos 96 e 98 do CTN e a diversos dispositivos da CF/67, além de haver entrado em divergência com a Súmula n!! 575 do STF e precedentes da mesma Corte.

A argüição de relevância foi considerada prejudicada na Suprema Corte, havendo o eminente Relator, Ministro Francisco

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 393

Resek, determinado a devolução do respectivo instrumento à Corte de origem, a fim de que fosse examinada a possibilidade de admissão do recurso especial em que foi convertido, ipsojure, o recurso extraordinário, nos estritos limites da matéria deduzida na mencionada argüição.

Deferido o processamento, vieram oa autos a este STJ."

S. Exa. votou, em seguida, negando provimento ao recurso. Assim o voto do eminente Ministro Relator:

"A argüição de relevância cingiu-se ao alegado dissídio, devendo-se ,conter o recurso, pois, nesse limite, conforme observado na decisão do Relator, no STF.

Trata-se, como se viu, de matéria-prima importada de país signatário do GATT, destinada à produção de medicamento de uso veterinário, isento do IeM.

É de reconhecer-se que a jurisprudência do STF, sobre a matéria, não distingue entre produto' acabado e matéria-prima, conforme explícito no RE 113.150, in verbis:

"Embargos de Declaração. GATT. Isenção de ICM a pro-_ duto importado cujo similar nacional goza de idêntico benefício. A Emenda Constitucional n!l 23/83, ao acrescentar o § 11 do art. 23 da Carta da República, não revogou o Acordo Geral de Tarifas e Comércio, pelo qual o país garante a igualdade entre as partes contratantes, inclusive quanto ao tratamento tributário.

Embargos declaratórios ,rejeitados".

Esta Egrégia Turma, já por diversas vezes, teve oportunidade de pronun­ciar-se pela validade da isenção prevista no mencionado Tratado, em face da EC 23/83, que introduziu o § 11 no art. 23 da CF/67. '

Confronte-se, por exemplo, o acórdão proferido no REsp. n!l 1.528-SP, de que fui Relator:

394

"Tributário. ICM. Importação de produto cujo similar na­cional goza de isenção do imposto. Lei n!l 3.991/83, do Estado de São Paulo, que instituiu o tributo com base na competência ex­plicitada e ampliada pela EC n!l 23/83, ao aditar o § 11 do art. 23 da CF/67.

Diploma legal que há de ser interpretado em consonância com o princípio da equivalência de tratamento fiscal, consagrado no texto do GATT (Parte lI, artigo III), por força do qual as isenções tributárias que contemplam o similar nacional devem ser estendidas ao produto importado de países signatários do Tratado

R. Sup_ Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

em apreço, sob pena de ofensa ao art. 98 do CTN. Precedentes do STF.

Recurso provido." Não esteve em jogo, entretanto, nessa decisão, o problema da matéria­

prima ora apreciada. Conforme já acentuado acima, o que se estabelecu no GATT foi a equi­

valência de tratamento fiscal entre produto importado e similar nacional. É ler o mencionado documento, na parte partinente ao assunto:

"Parte II - Artigo lIl.

Tratamento nacional em matéria de tributações e de regula­mentação internas.

2) Os produtos do território de qualquer parte contratante importados para o território de qualquer outra parte contratante não sofrerão a incidência, direta ou indireta, de taxas ou outras tributações. internas, sejam de que natureza forem, superiores àquelas que incidem, direta ou indiretamente, sobre os produtos nacionais similares. Por outro lado, nenhuma parte contratante aplicará, de outra maneira, taxas ou outras tributações internas nos produtos importados ou nacionais de um modo contrário aos princ,ipios enunciados no parágrafo primeiro.

3) .......................................................................................... .

4) Os produtos do território de qualquer parte contratante importados pelo território de qualquer outra parte contratante não estarão sujeitos a um tratamento menos favorável que o concedi­do aos produtos similares de origem nacional no que concerne a quaisquer leis, regulamentos ou prescrições que afetem a venda, a colocação à venda, a compra, o transporte, a distribuição e a utilização destes produtos no mercado interno. As diposições do presente parágrafo não interditarão a aplicação de tarifas diferen­tes para os transportes internos, fundadas exclusivamente na uti­lização econômica dos meios de transporte e não na origem do produto."

Diante do texto transcrito, é fora de dúvida que o tratamento fiscal nele previsto somente contempla produto com similar nacional, não se estendendo à matéria-prima ou demais componentes nele utilizados.

É possível que a matéria-prima importada constitua, em si mesma, um produto acabado, com similar nacional isento, embora possa vir a ser utilizado na fabricação de outro mais sofisticado. Nesse caso, é fora de dúvida que está abrangido pela cláusula de equivalências, que não está condicionada, como se viu, à destinação dada ao produto.

R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 395

No caso dos autos, todavia, a importação é de Trymethil Ortho Formate, substância que não configura a hipótese acima delineada, constituindo, antes, uma substância destinada à fabricação de defensivos animais, segundo escla­recido na própria inicial.

Sequer se alega que possa ser confrontada com substância da mesma espécie, produção nacional, que desfrute isenção tributária.

Assim sendo, não há considerá-la protegida pela prefalada cláusula de equivalência que, pelo fato de encerrar privilégio fiscal, não comporta inter­pretação abrangente.

Ante o exposto, meu voto é no sentido de negar provimento ao recurso."

Votou, em seguida, o Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro, que conheceu do recurso e deu-lhe provimento.

Pedi vista dos autos e os trago, a fim de retomarmos o julgamento do recurso.

A sentença denegatória da segurança e que foi confirmada pelo acórdão recorrido, lavrada pelo Juiz Eleutério Dutra Filho, assim deslindou a contro­vérsia:

396

"Pela leitura do capítulo dedicado às isenções no Regula­mento do LC.M., ou mais preciamente, o seu Art. 5!!, item XI, letra c, verifica-se, sem muito esforço mental, que as isenções alinhadas nesse dispositivo, são dirigidas aos defensivos animais já acabados, industrializados e prontos para os fins a que se destinam, não alcançando as matérias primas ou ingredientes utilizados na fabricação desses produtos.

3. Se o legislador estadual pretendesse dispensar do imposto as operações internas com as matérias primas usadas no fabrico de defensivos animais, tal isenção constaria expressamente do Regulamento, conforme ocorreu com os adubos e fertilizantes, cujos componentes estão expressa e literalmente desonerados do tributo (vide Art. 5!!, item IX).

4. Ora, como o produto importado não é um defensivo animal, mas simples ingrediente utilizado na fabricação de defen­sivo conforme se vê pela guia de importação (fi. 27), obviamente que não está desonerado de tributação, uma vez que seu similar nacional, conforme já exposto, não goza do favor fisca!."

(fls. 65/66).

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Divirjo, data venia, desse entendimento. Reporto-me, no ponto, ao voto que proferi por ocasião do julgamento do REsp. n!.! 214-SP, cuja cópia faço anexar, pelo que fica fazendo parte deste.

Em conclusão, com a vênia do Sr. Ministro Relator, conheço do recurso e dou-lhe provimento. .

ANEXO

VOTO (VISTA)

(REsp n!.! 214-SP)

"Tributário. GATT. ICM. Isenção. Similar Nacional. Matéria-prima de produto acabado isento. Súmula 575-STF.

I. À mercadoria importada de país signatário do GATT estende-se a isenção do ICM concedida a similar nacional. Essa isenção alcança matéria­prima destinada a produto final isento.

lI. Recurso Especial provido."

O EXMO. SR. MINISTRO CARLOS M. VELLOSO: Trata-se de man­dado de segurança impetrado por SINTESUL S/A - Síntese de Defensivos Químicos do Sul contra ato do Senhor Delegado Regional Tributário do Litoral do Estado de São Paulo, consubstanciado na exigência de recolhimento do ICM sobre a entrada de Tetracloroacetophenone, matéria-prima destinada à fabricação de inseticida, importada da Alemanha Ocidental, país signatário do GATT.

A Décima Quinta Câmara Civil do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por unanimidade, confirmando decisão de primeiro grau que havia denegado a segurança, negou provimento ao recurso da impetrante.

Entendeu o acórdão de fls. 100/102 que a isenção pleiteada diz respeito a produtos acabados, ou seja, ao inseticida destinado exclusivamente à pecuá­ria e não a simples componente desse. Considerando que a impetrante importou matéria-prima que "depende de processamento industrial" para, juntamente com outras matérias, vir a ser empregado como inseticida, não tem direito à isenção, pois, o diploma que a concede deve ser interpretado restritivamente.

Ressaltou, ainda, que o momento da incidência do tributo é o do desem­baraço aduaneiro, "a partir do qual a mercadoria ficou à disposição" da recor­rente.

Inconformada, a SINTESUL S/A interpõe recurso extraordinário, com fundamento no art. 119, IH, a e d, da Constituição anterior, argüindo a rele­vância da questão federal.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 397

Alega que o aresto negou vigência ao inciso XIII, § 1!l, do art. 1!l, da Lei Complementar n!l4, de 02.12.69, aos arts. 96 e 98 do C.T.N., ao GATT, violou os arts. 19, § 2!.! e 20, III, da Constituição de 1967 e divergiu da Súmula 575-STF, bem como de inúmeros julgados do Pretório Excelso.

Inadmitido na origem, o recurso subiu à Suprema Corte por força de agravo de instrumento.

O eminente Ministro Paulo Brossard, Relator, desdobrando o recurso em extraordinário (matéria constitucional) e especial (matéria legal), determinou a remessa dos autos ao Superior Tribunal de Justiça.

Nesta Egrégia Corte, na sessão de 04.04.90, o eminente Ministro Vicente Cernicchiaro, Relator, não conheceu do recurso. É o seguinte o seu voto:

"O Recurso Extraordinário, admitido por força de provimento de agravo de instrumento, foi convertido ipso iure em recurso especial quanto à matéria infraconstitucional, ou seja negativa de vigência aos arts. 96 e 98 do CTN, art. I!! da Lei Complementar n!! 4/69, do Tratado GATT, bem como contraste com a Súmula 575 do Supremo Tribunal Federal.

É certo, a "legislação tributária" compreende as leis, os tratados e as convenções internacionais, os decretos e as normas complementares que ver­sem, no todo ou em parte, sobre tributos e relações jurídicas a eles pertinentes (CTN, art. 96).

De outro lado, os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação triburária interna, e serão observadas pela que lhes sobrevenha (CTN, art. 98).

O Tratado GATT, na Parte H - Artigo IH - tratamento nacional em matéria de impostos e de regulamentação interna, estatui no ítem I: os produtos de qualquer Parte Contratante serão isentos da parte dos tributos e outras imposições internas de qualquer natureza que excedam aos aplicados, direta ou indiretamente, a produtos similares de origem nacional.

Em outras palavras, a isenção tem como pressuposto que o produto estrangeiro seja similar ao nacional, e este goze, em nossa legislação, de favores fiscais.

A isenção, por seu turno, é instituto de interpretação restritiva, atendo-se à hipótese descrita. Inadmissível a analogia.

Além disso, nos casos relacionados no GATT,a finalidade da norma se mostra sem rebuços. Busca, aqui, incentivar a importação e, no estrangeiro, facilitar a circulação do produto brasileiro. Sem o incentivo fiscal, havendo tributos relativamente a um deles, sempre repassados, provocaria disparidade dos preços ou desestimularia, no Brasil, a importação e correspondente saída dos produtos brasileiros. .

398 R. sup. Trih. Jus\., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Urge, no entanto, atentar para pormenor significativo. O produto estran­geiro, importado, precisa ser similar ao nacional. Inexistente essa qualificação, faltará o pressuposto da isenção porque inexistira a concorrência que se quer evitar.

Restou indiscutível, por afirmação até da Impetrante, ora Recorrente, que "o produto químico denominado Tetracloroacetophenone, de nome comum Tetracloroacetofenoma é matéria prima destinada à fabricação de inseticida para aplicação exclusiva na pecuária" (fi. 3).

O v. acórdão recorrido, como a sentença, deixou acertado, o que não é contestado pelo Recorrente:

"Ora, sendo assim e a isenção prevista pelo art. 5L!, XI, C, do Decreto nL! 17 727/81, com a redação que lhe deu o Decreto 21 987/84, dizendo respeito a produtos, como inseticidas, destinados exclusivamente à pecuária, etc., não se pode subentender como tal a matéria-prima importada pela impetrante (Tetracloroaceto­phenone ou Tetracloroacetofenoma) que, em si mesma não sendo inseticida, mas simples componente, ainda depende de processa­mento industrial para, juntamente com outras matérias, vir a ser empregado com tal finalidade" (fi. 101).

Repita-se, isenção implica interpretação restritiva. Inadmite ampliação de hipótese contemplada.

Não se pode, assim, identificar para o fim postulado pela Recorrente inseticida com produtos destinados à fabricação de inseticidas. Constituem categorias fáticas diversas. Cada uma com sua individualidade. Não se pode, para alcançar a similitude considerar produto acabado com os seus componen­tes. Enquanto não houver a composição, a matéria continua distinta. E distinta do ponto-de-vista econômico, dado sempre relevante em Direito Tributário.

A decisão recorrida interpretou com exatidão o sentido normativo da legislação pertinente. Distinguiu inseticida de componentes para a fabricação de inseticida.

De outra parte a Súmula 575, do STF:

"À mercadoria importada de país signatário do GATT, ou membro da ALALC, estende-se a isenção do imposto de circulação de mercadorias con­cedida a similiar nacionaJ."

não traduz o significado pretendido pela Recorrente.

As hipóteses que inspiraram os julgados sintetizados na Súmula sempre corresponderam a produtos similares, ou seja, a mercadoria estrangeira era igual à existente no Brasil.

O caso dos autos, como se viu, é diferente.

R. sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 399

Aliás, o próprio STF já se manifestou a respeito, distinguindo produto acabado de matéria-prima.

Acrescente-se outro argumento útil para rebater a tese da recorrente. A matéria-prima para inseticida é também matéria-prima para outros produtos, mesmo sem similar nacional. A importação não é vinculada à destinação dos componentes, mas aos componentes em si mesmos.

O referido acórdão do STF é do RE 103.935-3-SP, estampado na RT 596/270:

"Recurso Extraordinário - Invocação de dissídio jurispru­dencial - Hipótese não caracterizada. Acórdãos de um mesmo Tribunal.

ICM - Produto importado de país signatário do GATT -Matéria-prima - Distinção de produto acabado - Inexistência de isenção - Inaplicabilidade.

Não conheço do recurso por nenhum dos fundamentos. Em atenção ao r. despacho de fi. 165, restituam-se os autos

ao Egrégio Supremo Tribunal Federal." ****************

Pedi vista dos autos e os trago, a fim de retomarmos o julgamento do recurso.

Está no acórdão: "

"Ora, sendo assim e a isenção prevista pelo art. 5!!, XI, "c", do Dec. 17727/81, com a redação que lhe deu o Dec. n!! 21 987/84, dizendo respeito a produtos, como inseticidas, destinados exclu­sivamente à pecuária, etc., não se pode subentender como tal a matéria prima importada pela impetrante (Tetracloroacetopheno­ne ou Tetracloroacetofenoma) que, em si mesma não sendo inse­ticida, mas simples componente, ainda depende de processamento industrial para, juntamente com outras matérias, vir a ser empregado com tal finalidade.

Daí o acerto da r. sentença recorrida em sua conclusão de que a isenção existe para o produto pronto e acabado e não a um ou mais de seus ingredientes."

" (fi. 101)

Divirjo, data venia, desse entendimento.

É que a distinção feita pelo acórdão põe-se contrária ao verbete da Súmula 575-STF e contraria o disposto no art. 98, CTN.

Com efeito.

400 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Não. há dúvida no. sentido. de que o. pro.duto. acabado., o. inseticida, está isento. do. ICM. Isto. é inquestio.nável. Quer, dizer, o. produto. acabado. está isento., na saída. Não. há co.mo. exigir, então., o. ICM quando. da entrada da matéria-pri­ma, que integrará o. pro.duto. acabado., po.r isso. que o. ICM co.brado. na entrada da mercado.ria representa antecipação., já que o. seu qllantulII deverá ser dedu­zido. quando. da revenda~ Isento. o. produto. acabado., não. há co.mo. efetivar a dedução. mencio.nada. No.utras palavras, não. po.derá o. co.ntribuinte recuperar, na saída, o. que pago.u de ICM quando. da entrada da matéria-prima. É exata­mente isto. o. que expôs o. eminente e saudo.so. Ministro Ro.drigues Alckmin, no. RE n!! 76.099-SP:

"O ICM co.brado. na entrada da mercado.ria é antecipação., po.is, será deduzido. do. devido. na revenda. Ora, se similar nacio.nal não. vai pagar tributo. na revenda, nem o. impo.rtando.; aquele, isento. de tributo., estará em situação. mais favo.rável que este, que antecipo.u o. ICM na entrada da mercado.ria e não. poderá recupe­rá-Io.."

(RTJ, 73/454)

Acentue-se, de o.utro. lado., que, se o. produto acabado. está isento. do. ICM, não. se justifica a distinção., para o. fim de tributar­se o. co.mpo.nente. Permiti-lo. significa vio.lar, po.r via indireta, o. Tratado.. .

Po.r derradeiro., não. há falar que a "matéria-prima para inseticida é tam­bém matéria-prima para o.utro.s pro.duto.s, mesmo. sem similar nacio.nal". Esta matéria, que é de fato., não. está aventada no. acórdão., que denegou a segurança unicamente co.m base no. argumento. expo.sto linhas atrás. Noutras palavras, o.S fato.s, na versão do. acórdão. reco.rrido., não auto.rizam essa afirmativa.

Do. expo.sto., co.m a vênia do. eminente Ministro. Relato.r, meu voto. é no sentido. de dar pro.vimento ao. recurso..

RATIFICAÇÃO DE VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO ILMAR GALV ÃO (Relato.r): Sr. Presidente, também acho. que esse é um argumento. fo.rte, mas, aqui prendi-me também àquele princípio. geral, do. Código. Tributário. Nacio.nal, de que as isenções devem ser interpretadas de maneira restrita.

Leio. no. tratado. (lê):

Trata-se de no.rma categórica;

R. Sup. Trib. Just., Brasilia, 2(12): 261-437, ago. 1990. 401

o EXMO. SR. MINISTRO VICENTE CERNICCHIARO: Mas, se hou­ver a incidência na matéria-prima, obliquamente estará havendo incidência no produto final.

O EXMO. SR. MINISTRO ILMAR GAL V ÃO (Relator): Sim, mas o que se tem em mira é exatamente dizer que, se no mercado brasileiro os produtos· tais são vendidos com isenção, os importados também ser;io vendidos com isenção, assegurando uma paridade. Não se postula aí, com esse Tratado, isenção para o produto nacional, e sim para o produto estrangeiro, desde que haja o mesmo produto sido vendido no Brasil com isenção.

De modo que, apreciadas todas estas questões, fiquei com aconvicção reforçada de que se trata de isenção. E, isenção deve ser lida ao JIpe da letra", ver realmente o que está sendo isento, e não ampliar para, por meio de inter­pretação abrangente, incluir na isenção outros artigos, produtos ou mercado­rias.

Por esses motivos, estou negando provimento, mantendo o meu voto, com a devida vênia ao Eminente Ministro Vicente Cernicchiaro.

VOTO-VISTA

O EXMO. SR. MINISTRO AMÉRICO LUZ. A espécie foi relatada pelo eminente Ministro IImar Galvão, in verbis: lê.

O voto de S. Exa. conluiu por negar provimento ao recurso, à considera­ção principal de que"o que se estabeleceu no GATT foi a equivalência de tratamento fiscal entre produto importado e similar nacional", para assim fundamentar-se, após transcrever a Parte II - Artigo III - do referido Acordo Internacional:

402

"Diante do texto transcrito, é fora de dúvida que o tratamento fiscal nele previsto somente contempla produto com similar na­cional, não se estendendo à matéria-prima ou demais componen­tes nele utilizados.

É possível que a matéria-prima importada constitua, em si mesma, um produto acabado, com similar nacional isento, embo­ra possa vir a ser utilizado na fabricação de outro mais sofisticado. Nesse caso, é fora de dúvida que está abrangido pela cláusula de equivalência, que está condicionada, como se viu, à destinação dada ao produto.

No caso dos autos, todavia, a importação é de Trymetil Ortho Formate, su_bstância que não configura a hipótese acima delineada, constituindo, antes, uma substância destinada à fabri­cação de defensivos animais, segundo esclarecido na própria inicial.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Sequer se alega que possa ser confrontada com substância da mesma espécie, produção nacional, que desfrute isenção tributária.

Assim s~ndo, não há considerá-la protegida pela prefalada cláusula de equivalência que, pelo fato de encerrar privilégio fiscal, não comporta inter­pretação abrangente."

O Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro conheceu do recurso para dar-lhe provimento, enquanto o Sr. Ministro Carlos Velloso, na sessão anterior (04 do corrente), assim também concluiu.

Trago agora o meu pronunciamento, no mesmo sentido dos votos dos Srs. Ministro& Cemicchiaro e Velloso, louvando-me na fundamentação feita por este último ao apreciar, em voto-vista, questão semelhante, no REsp n2 214-SP. Aduziu S. Exa. estes argumentos:

"Não há dúvida no sentido de que o produto acabado, o inseticida, está isento do ICM. Isto é inquestionável. Quer dizer, o produto acabado está isento, na saída. Não há como exigir, então, o ICl'A; quando da entrada da matéria-prima, que integrará o produto acabado, por isso que o ICM cobrado na entrada da mercadoria representa antecipação, já que o seu quantum deverá ser deduzido quando da revenda. Isento o produto acabado, não há como efetivar a dedução mencionada. Noutras palavras, não poderá o contribuinte recuperar, na saída, o que pagou de ICM quando da entrada da matéria-prima. É exatamente isto o que expôs o eminente e saudoso Ministro Rodrigues Alckimin, no RE n2 76,099-SP:

"O ICM cobrado na entrada da mercadoria é antecipação, pois, será deduzido do devido na revenda. Ora, se similar nacional não vai pagar tributo na revenda, nem o importado; aquele, isento de tributo, estará em situação mais favorável que este, que ante­cipou o ICM na entrada da mercadoria e não poderá recuperá-lo."

~, .

(RJT,73/454)

Acentue-se, de outro lado, que, se o produto acabado está isento do ICM, não se justifica a distinção, para o fim de tributar-se o componente. Permiti-lo signifiça violar, por via indireta, o Tratado.

Por derradeiro, não há falar que a "matéria-prima para inseticida é tam­bém matéria-prima para outros produtos, mesmo sem similar nacional." Esta matéria, que é de fato, não está aventada no acórdão, que denegou a segurança unicamente com base no argumento exposto linhas atrás. Noutras palavras, os fatos, na versão do acórdão recorrido, não autorizam essa afirmativa."

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. . 403

Pedindo vênia ao preclaro Ministro-Relator, por compreender a espécie na mesma linha argumentativa do Srs. Ministros Cernicchiaro e Velloso, meu vo~o é no sentido de conhecer e prover o recurso.

EXTRATO DA MINUTA

Recurso Especial n!12.473 - SP - (Reg. n!:! 90.002423.:.5)'- Relator: O Exmo. Sr. Ministro IImar Galvão - Relator Designado: O Exmo. Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro. Recorrente: SINTESUL S/A - Síntese de Defensivos Químicos do Sul. Recorrido: Fazenda do Estado de São Paulo. Advogados: Drs. Roberto Faria de Sant'anna, Marco Antônio Moraes Sophia e outros.

Decisão: A Turma, por maioria, vencido o Sr. Ministro-Relator, deu provimento ao recurso. Lavrará o acórdão o Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro (2i! Turma, em 06.06.90).

Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Ministros Vicente Cernic­chiaro, Carlos VeJIoso e Américo Luz. Presidiu a Sessão o Exmo. Sr. Ministro CARLOS VELLOSO.

404

RECURSO ESPECIAL N!:! 2519 - RS

(Registro n!:! 90.0002541-9)

Relator: O EX1Ilo. Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo

Recorrente: Bertol S/A - l11d/ Comi Exp/

Recorridos: Ademar Leite da Silva e outros

Interes.: Cereagro Corretora e Representaçes Ltda. - Massa Falida

Advogados: Dr. Ovídio A. Baptista da Silva e outros Dr. Nei Jorge e outro Dr. Luiz Juarez Nogueira de Azevedo e outro Dr. Atílio Giareta

EMENTA: Direito Civil. Depósito. Bem fungível. Natu­reza jurídica. Incidência do art. 1.280, CC. Recurso provido.

- Se a coisa fungível no ganhar foros de infungibilidade pela vontade das partes contratantes, o seu depósito se apre­senta juridicamente como irregular, fazendo incidir as regras concernentes ao mútuo, aplicando-se, via de conseqüência, o disposto no art. 1.280 do Código Civil.

R. sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos, em que são partes as.acima indicadas.

Decide a 4l!. Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso pela alínea a e dar-lhe provimento para restabelecer a sentença, nos termos do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 12 de junho de 1990 (data do julgamento).

Ministro ATHOS CARNEIRO, Presidente. Ministro SÁLVIO DE FI­GUEIREDO TEIXEIRA, Relator

EXPOSIÇÃO

O EXMO. SR. MINISTRO SÁL VIO DE FIGUEIREDO: A recorrente (Bertol S/A) adquiriu 1.500.000 kgs (25.000 sacos) de soja-de-indústria da firma Cereagro - Corretora e Representações Ltda. - em janeiro e feverei­ro/87, tendo sido avençado que a entrega da mercadoria seria efetuada em abril e maio e o pagamento do preço ocorreria em junho daquele ano.

Após a entrega de 1.700 sacos (de 60 kgs cada), a firma vendedora suspendeu a entrega do restante, dando ensejo a que a ora recorrente interpu­sesse ação de execução de entrega de coisa certa e, ainda, medida cautelár de busca e apreensão, que culminou com a retirada, dos armazéns da vendedora, do saldo remanescente devido à compradora.

Efetivada a medida, a compradora depositou a totalidade do preço ajus­tado e a vendedora requereu o levantamento do numerário, parcialmente de­ferido pelo Juízo.

Opuseram os ora recorridos, então, embargos de terceiro, alegando que parte da soja apreendida (264.313 Kgs) da firma vendedora (Cereagro) lhes pertencia, em razão de contrato de depósito celebrado com aquela empresa, anteriormente à apreensão.

Os embargos foram processados, tendo, na dilação probatória, sido reali­zada perícia contábil na firma vendedora, havendo a r. sentença repelido os embargos sob os seguintes argumentos:

I!! - a perícia contábil não teria apontado com exatidão irretorquível a existência de contrato de depósito entre os embargantes e a vendedora, consi­derando que os documentos instrutórios da causa não eram específicos quanto à natureza jurídica do negócio realizado (compra e venda, depósito, preço a fixar e outras modalidades);

2!! - ainda que se tratasse efetivamente de depósito, deveriam ser apli­cadas as regras concernentes ao mútuo, porquanto o depósito fora de coisa

R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 405

fungível (sacas de soja-de-indústria), que não poderia ser identificada em meio às demais sacas do mesmo produto, sendo que, no mútuo, a coiSa fungível, entregue ao mutuário, entra para o seu patrimônio, em virtude do que, quando da apreensão das sacas, essa mercadoria pertenceria à vendedora e não aos embargantes;

3!! - a firnla vendedora, segundo comprovado pela perícia, transacionava soja com várias outras empresas e, no período em que negociou com a ora recorrente, vendeu mais de duas toneladas e meia (2.657.309 kgs) de soja a três empresas relacionadas no laudo. Além disso, após a apreensão da merca­doria pela ora recorrente, a mesma firma vendeu 721.386 kgs de soja a outras indústrias, mais de três vezes o montante pleiteado pelos embargahtes (264.313 kgs), razão pela qual, quando da apreensão, restavam nos armazéns da vende­dora soja mais do que suficiente para atender aos embargantes, não se podendo admitir que a soja apreendida a eles pertencesse.

Interposta apelação, os terceiros-embargantes, ora-recorridos, sustenta­ramque:

a) a perícia havia confirmado a existência do contrato de depósito;

b) sendo proprietários da mercadoria em depósito junto à firma vendedo­ra, estavam legitimados a oferecer embargos de terceiros contra o ato judicial de constrição a seus patrimônios (busca e apreensão de mercadoria).

Em contra-razões de apelação, a ora recorrente afirmou que:

a) a documentação acostada pelos embargantes não era idônea a compro­var a existência de depósito, consoante conclusão da perícia, onde apenas quatro (4) dos dezoito (18) embargantes teriam efetivamente depositado soja junto à firma vendedora, havendo, ainda, dúvidas e incertezas, não esclarecidas no laudo pericial, quanto à natureza jurídica do negócio realizadd;

b) não teria havido registro algum de contrato de depósito celebrado entre os embargantes e a vendedora para justificar sua prevalência contra terceiros;

c) mesmo que depósito houvesse, sendo o produto depositado (soja) coisa fungível, o mesmo se caracterizaria como depósito irregular, cuja regulamen­tação obedeceria às normas relativas ao mútuo, a teor do art. 1.280 do Código Civil, de modo tal que o produto apreendido pertenceria ao patrimônio da vendedora (mutuária);

d) a vendedora, após a apreensão, ainda vendeu e comercializou cerca de três vezes mais soja do que a reclamada pelos embargantes.

O ego Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, por sua Terceira Câmara Civil, deu provimento ao recurso, com citações de Caio Mário, Carvalho de Mendonça e Furtado Fabrício, concernentes ao contrato de depósito de coisa fungível, conhecido como depósito irregular, ao fundamento central de que a melhor interpretação do contrato celebrado entre os apelantes (embargantes)

406 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

e a vendedora apontava na direção da existência do depósito regular, pelo que a apreensão da soja havia recaído sobre a propriedade dos embargantes.

Irresignada, a embargada interpôs recurso especial em alongadas razões, alegando não haver o acórdão recorrido qualificado juridicamente de forma adequada o contrato quaestio juris, aduzindo que, havendo a soja depositada nos armazéns da vendedora se confundido entre os quatro milhões de quilos da mesma mercadoria ali existente, o acórdão recorrido, ao proclamar que os 264.313 kgs de soja dos embargantes foram apreendidos pela recorrida, estaria decidindo contra a prova dos autos, malferindo também o art. 131 do Código de Processo Civil, além de aplicar inadequadamente o art. 1.046, CPC, atri­buindo aos embargantes propriedade de coisa genérica, além de dissentir de outro acórdão, do mesmo Tribunal, com solução diversa da presente.

O recurso foi admitido apenas quanto ao art. 1.280 do Código Civil, sendo considerada imprópria a invocação de paradigma do mesmo Tribunal.

Antes da remessa dos autos a esta Corte, a firma vendedora (Cereagro), agora como massa falida, ingressou no feito como terceira interessada. Inti­mada para manifestar-se quanto às razões das partes, deixou o prazo transcor-rer in a/bis. .

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO SÁL VIO DE FIGUEIREDO (Relator): Re­corre-se, na espécie, de decisão que, reformando o decisum de primeiro grau, acolheu os embargos de terceiró, oferecidos pelos recorridos contra a apreen­são de 264.313 kgs de soja, efetuada judicialmente, por provocação da recor­rente, nos armazéns da empresa-vendedora-armazenadora (Cereagro), com a qual os embargantes teriam contrato de depósito.

Impede liminarmente balizar as questões fáticas e de prova, incontrover­sas nos autos, sobre as quais se arrimam as teses jurídicas debatidas na via recursal.

Nesse sentido, as instâncias ordinárias estabeleceram:

- primeiro, quanto à recorrente, a existência da compra e venda mer­cantil entre esta e a empresa armazenadora, daí originando seu crédito, não satisfeito, perante aquela;

- segundo, quanto aos embargantes:

a) que apenas quatro deles teriam efetivamente contrato de depósito e armazenamento de soja com a referida empresa, Cereagro, sendo os demais negócios, apontados na perícia oficial, de controvertida caracterização jurídi­ca;

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 407

b) que os contratos de depósitos não teriam qualquer especificação ou particularização quanto ao armazenamento da soja;

- terceiro, quanto à empresa armazenadora:

a) que a Cereagro, além de armazenar, comprava e vendia soja para outras empresas, em grand~ quantidade;

b) que, logo após a apreensão, a empresa vendeu a terceiros mais de duas vezes o montante pretendido pelos embargantes;

c) que a soja não era armazenada de modo a ser individualizada dentro dos armazéns.

Em face dessa base fática, sustenta a recorrente que não há como conceber o contrato de depósito (em relação aos quatro recorrentes apontados pela perícia como depositantes) como sendo um depósito regular.

É assim também o entender. A uma, porque era da atividade mercantil da Cereagro a compra e venda de soja e seu armazenamento, efetuado em grande quantidade. A duas, porque os contratos de depósito celebrados com alguns dos embargantes não tinham qualquer especificação a diferenciá-los dos de­mais contratos. Como é cediço, a soja em sacas é coisa fungível, porquanto substituível por outra, na mesma quantidade e qualidade, sem que se afete a sua substância.

Certo é que, segundo a doutrina, a coisa fungível pode ser transformada em infungível pela vontade das partes (dentre outros, Pontes de Miranda, "Tratado de Direito Privado", voI. 42, ed. Borsoi, § 4.664, página 367, e Furtado Fabrício, "Comentários", Forense, citados pelos recorridos). Para tanto, porém, necessária se faria a expressa manifestação das partes no sentido da armazenagem em local separado, pilhas separadas, sacas contendo marca externa identificadora do titular e outras providências que tais. E nas instâncias ordinárias ficou demonstrado que isto não aconteceu.

Assim, nada ocorrendo, "de volitivo ou circunstancial", a afastar a fun­gibilidade, impunha-se a aplicação ao depósito, das regras concernentes ao mútuo, consoante lição segura de Sílvio Rodrigues, verbis:

"A lei equipara esse contrato, cujo objeto, na prática é o dinheiro, ao mútuo (Código Civil, art. 1.280); de modo que atra­vés dele o depositário se toma proprietário da coisa depositada e, por conseguinte, assume os riscos de sua deterioração e perda" C'Direito Civil - Dos Contratos e das Declarações Unilaterais de Vontade", voi. In, Saraiva, 17 ed., 1988, pág. 288).

Conquanto a doutrina não seja acorde quanto à verdadeira natureza jurí­dica do contrato irregular (Serpa Lopes, "Curso de Direito Civil", voI. IV,

408 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Freitas Bastos, n!! 526, pág. 232; Carvalho Santos, "Código Civil Brasileiro Interpretado", voI. XVIII, Freitas Bastos, 1938, pág. 60170; Caio Mário, "Ins­tituições de Direito Civil", voI. III, Forense, 5i! edição, n!! 247, pág. 316), inafastável se afigura a aplicação do art. 1.280 do Código Civil, a cujo respeito preleciona Clóvis Beviláqua:

"O alcance capital desse dispositivo é o seguinte: no depó­sito, a coisa depositada continua na propriedade do dono; o mútuo importa transferência de propriedade e, portanto, o depósito de coisa fungível se regula pelas regras do mútuo, a coisa assim depositada entra para o patrimônio do depositário, que, apenas, terá de pagar outras do mesmo gênero, qualidade e quantidade" (Código Civil dos Estados Unidos do Brasil, vol. IV, 2i! tiragem, ed. histórica, Editora Rio, p. 390).

Em idêntico sentido Washington de Barros Monteiro, acentuando que, em contratos desse jaez, quase sempre se vislumbra um mútuo disfarçado, sendo esse o escopo da norma do art. 1.280. É da lavra daquele insigne civilista ("Curso de Direito Civil", 5!! vol., 20i! edição, de 1985, p. 229):

"0 depósito pode distinguir-se ainda em regular e irregular. Depósito regular, também chamado ordinário, é aquele que se caracteriza pela infungibilidade da coisa depositada; vale dizer, o depositário terá de restituir, precisamente, a própria coisa de­positada. Depósito irregular, ao inverso, é aquele em que o depo­sitário pode dispor da coisa depositada, consumindo-a até e restituindo ao depositante, oportunamente, outra'da mesma espé­cie, qualidade e quantidade.

A verdade, porém, como ensina Clóvis, é que o depósito de coisas fungíveis, para serem restituídas outras do mesmo gênero, qualidade e quantidade, é mútuo e não depósito. As coisas fungí­veis não se prestam ao depósito, porque pressupõe este coisas individuadas. Por isso mesmo, dispõe o art. 1.280 que "o depósito de coisas fungíveis, em que o depositário se obrigue a restituir objetos do mesmo gênero, qualidade e quantidade, regular-se-á pelo disposto acerca do mútuo".

Destarte, laborou em equívoco o v. acórdo recorrido, data venia, quando concluiu no sentido de que a apreensão da soja havia recaído em propriedade dos embargantes, pelo só fato destes haverem celebrado contrato de depósito com a empresa armazenadora (assinalando-se ainda que o exame pericial apenas constatou a existência de contrato de depósito a quatro dentre os dezoito embargàntes).

A natureza jurídica do negócio realizado (depósito de coisa fungível) determinou, necessariamente, a incidência do art. 1.280 do Código Civil,

R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 409

somente inaplicável se as partes houvessem, expressamente, est.abelecido o modo de tomar infungível as sacas de soja depositadas, o que inocorreu na espécie. Como anotado, quando da apreensão, efetuada por terceiro (alheio aos possíveis contratos de depósitos e presumidamente de boa-fé), além de existir nos armazéns mais soja que a pretendida pelos embargantes, não havia condi­ções materiais para distinguir, dentre as várias sacas, quais aquelas pertencen­tes aos recorridos, dada a fungibilidade da mercadoria armazenada, conforme acentuou, a meu juízo com absoluta precisão, a r. decisão monocrática (fi. 1.552).

Pelo exposto, tenho por vulnerada a norma do art. 1.280 do Código Civil, em face do que conheço do recurso pela alínea a do inciso IH do artigo 105 da Constituição e o provejo para, cassando o v. acórdão, restabelecer a r. sentença de fls. 1.547/1.553.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO: Sr. Presidente, não tenho dÚvida em acompanhar o voto do Eminente Relator. Trata-se, como exaustivamente mencionado nesta assentada, de contrato de depósito de coisa fungível, ou seja, do conhecido depósito irregular. E a este depósito aplicam-se as regras concernentes ao mútuo, nos termos do art. 1280 do Código Civil que, como demonstrou o Eminente Relator, foi contrariado pela conspícua Turma Julgadora, nesta hipótese.

Assim, acompanhando o voto do Eminente Ministro-Relator, conheço do recurso especial e dou-lhe provimento.

EXTRATO DA MINUTA

REsp n!! 2519 - RS - (Reg. n!! 90.0002541-9) - Relator: Ministro Sálvio de Figueiredo. Recorrente: Bertol SIA Inl Comi Exp/. Recorrido: Ade­rnar Leite da Silva e outros. Interes.: Cereagro Corretora e Representações Ltda. Interes.: Cereagro Corretora e Representações Ltda - Massa Falida. Advogados: Drs. Ovídio A~ Baptista da Silva e outros, Nei Jorge e outro, Luiz Juarez Nogueira de Azevedo e outro e Atílio Giareta. Sust. oral: Dr. Ovídio A. Baptista da Silva, pela Recorrente.

Decisão: A Turma, por unanimidade, conheceu do recurso pela alínea a e deu-lhe provimento para restabelecer a sentença. (4;! Turma - 12.6.90)

Votaram com o relator os Exmos. Srs. Ministros Barros Monteiro, Athos Carneiro e Fontes de Alencar.

410

Ausente, justificadamente, o Exmo. Sr. Ministro Bueno de Souza. Presidiu o julgamento o Exmo Sr. Ministro ATHOS CARNEIRO.

R. Sup. Trih. Jus\., Brasília, 2( 12): 261-437, ago. 1990.

RECURSO ESPECIAL N!! 2.530 - SP

(Registro n!! 90.0002556-7)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Garcia Vieira Recorrente: Manufatura de Artigos de Borracha Nogam S/A

Recorrido: Fazenda do Estado de São Paulo Advogados: Drs. Domingos Novelli Vaz e outros Betty Lia Tunchel e

outros

EMENTA: ICM. Crédito. Importação de matérias-pri­mas isentas. Ação declaratória. Juros e correção monetária.

Tratando-se de ação declaratória e não condenatória de repetição de indébito, não são devidos correção monetária e juros de mora. O direito a estes não pode ser reconhecido numa simples declaração de direito de creditar-se do crédito de um imposto para futura compensação no seu pagamento, na saída da mercadoria industrializada, e muito menos quan­do este crédito se refere a operações presentes e futuras.

Ademais, na saída do produto industrializado, ou o im­posto foi pago, sendo cabível a ação de repetição de indébito, ou foi repassado ao consumidor, não havendo direito a recla­mar.

Recurso conhecido e improvido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas. Decide a P Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

negar provimento ao recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei. Brasília, 27 de junho de 1990 (data do julgamento). Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente. Ministro GARCIA

VIEIRA, Relator.

RELATÓRIO

o EXMO. SR. MINISTRO GARCIA VIEIRA: Manufatura de artigos de borracha Nogam S/A ajuizou ação declaratória contra a Fazenda do Estado de São Paulo, objetivando o reconhecimento judicial de seu direito de creditar-se

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 411

do ICM nas importações de matérias-primas isentas deste imposto e que são empregadas na fabricação de seus produtos.

Processado regularmente o feito, a ação foi julgada improcedente e o recurso interposto parcialmente provido para reconhecer à Autora o direito de creditar-se pelo valor encontrado pelo Perito, com correção monetária desde o ajuizamento, sem juros moratórios e verba honorária proporcional à sucum­bência.

Opostos embargos de declaração foram os mesmos rejeitados.

Com apoio nos votos vencidos em parte, dos Desembargadores João Lenze, que concedia a correção monetária a partir da entrada das mercadorias, e Mohamed Amaro, que a excluía por completo, as partes ofereceram os respectivos embargos infringentes, a final rejeitados.

A Fazenda do Estado de São Paulo interpôs dois recursos extraordinários, sendo o primeiro indeferido, e o segundo, por não se enquadrar em nenhuma das hipóteses previstas nos incisos do art. 325 do RISTF, teve apenas deferido o processamento da relevância, julgada renunciada por falta de preparo à fl. 853.

A Autora, da mesma forma, interpôs dois recursos extraordinários. O primeiro, com fundamento nas letras a e d do inciso III do art. 119, da ordem constitucional precedente, onde sustenta violação ao art. 153, 1!l, da CF, negativa de vigência aos arts. 955,960 e 1094 do CC, e ao art. 161, § 1!l, do CTN, além de divergência jurisprudencial, por ter o v. acórdão recorrido entendido descabidos os juros moratórios em ação declaratória.

Alega, ainda, que o v. acórdão recorrido, ao reconhecer o direito ao crédito apenas a partir de maio de 1978 e _decidir sobre a proporcionalidade das custas, contrariou o art. 153, § 1!l e 2!l da CF, e o art. 173, I, do CTN, bem como ao art. 21, parágrafo único do CPC.

Dos recursos interpostos, foi deferido, apenas, o f' dcessamento daquele interposto pela Autora às fls. 622/638, no concernente à questão dos juros de mora, conforme se depreende do despacho de tls. 765/773, tendo a Secretaria certificado a interposição de agravo de instrumento.

Da decisão que indeferiu QS extraordinários interpostos pela Fazenda de São Paulo às fls. 596/607 e 746/750 não houve recurso (certidão de fl. 777).

Razões do recurso extraordinário às fls. 781/809 e contra-razões às fls. 842/848.

No E. STF foi determinada a conversão do extraordinário em especial quanto à matéria infraconstitucional e posterior devolução dos autos para a apreciação da parte relativa aos' dispositivos constitucionais invocados pela recorrente.

412 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Nesta Instância a douta Subprocuradoria Geral da República emitiu pa­recer às fls. 869/873.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO GARCIA VIEIRA (Relator): Sr. Presidente. A ação foi julgada improcedente pelo julgador monocrático. Pelo venerando acórdão recorrido deu-se provimento parcial à apelação parajulgar procedente a ação para "reconhecer-se o direito da autora de creditar-se pelo valor encon­trado pelo Perito, isto é, Cr$ 5.656.671,58, com correção monetária desde o ajuizamento desta ação, e custas em reembolso e honorários de advogado da autora (10 por cento sobre o valor apurado em execução)".

Foi julgado improcedente o pedido de juros moratórios por tratar-se de ação declaratória. Desta decisão houve embargos rejeitados e embargos infrin­gentes, também rejeitados.

A Fazenda do Estado de São Paulo interpôs dois Recursos Extraordiná-rios.

Manufatura de Artigos de Borracha Nogam S/A (autora da ação declara­tória) intetpôs, também, dois Recursos Extraordinários. Destes recursos só foi admitido o de fls. 622/638, e somente pela letr.a a e no concernente a juros de mora, além da formação dos instrumentos de argüição de relevância da questão federal (despacho de fls. 765/772). Deste despacho só agravou a autora, e apenas no que se refere o seu RE de fls. 622/638 (sobre os juros).

Assim, o único recurso a ser examinado é o de fls. 622/638, e apenas na parte concernente aos juros de mora.

No caso, trata-se de ação declaratória visando seja declarado o direito da autora de se creditar em seus livros fiscais do ICM relativo às operações de entradas de matérias-primas isentas, relativamente às operações presentes e futuras (Inicial, fls. 02/18), com pedido para julgar procedente a ação para ser "declarada a existência de relação jurídica entre as partes, possibilitando à Autora a fruição do crédito fiscal do ICM nas importações de matérias-primas de seus produtos ... " (Inicial, tl. 17). Não se pede seja declarado o direito de receber correção monetária.

Como se trata de ação declaratória e não condenatória de repetição de indébito, não é devida a correção monetária. O direito a esta, evidentemente, não pode ser reconhecido numa simples declaração de direito de creditar-se do crédito de um imposto para futura compensação no seu pagamento, na saída da mercadoria industrializada e muito menos quando este crédito se refere a operações presentes e futuras. A correção monetária só seria devida se a ação

R. Sup. Trib. Jusl., Brasilia, 2(12): 261-437, ago. 1990. 413

declaratória tivesse sido cumulada condenatória e houvesse nela, também, o pedido de restituição do indébito. Ora, no caso, sequer se alegou ter havido o pagamento do ICM, e mesmo que tivesse havido tal recolhimento só se poderia pretender a incidência da correção monetária na repetição de indébito e não' em ação declaratória. Declarado o direito da autora de creditar-se do ICM relativo as suas operações presentes e futuras, de entrada de matéria-prima, a consequência é ela proceder este crédito em seus livros. Feito o crédito, poderá haver a compensação, na saída do produto industrializado. Na saída deste, ou o imposto foi pago pela autora ou foi repassado ao consumidor. No primeiro caso, terá de mover ação de repetição de indébito, e aí poderá pleitear a correção monetária. Na segunda hipótese, não terá ela nenhum direito a recla­mar. Se não foi, administrativamente, reconhecido referido direito de crédito e a autora não o pagou, não cabe a correção monetária. Na ação declaratória não pode haver condenação, a não ser nas custas e honorários de advogado, e se não há condenação, não pode ser confundida com repetição de indébito. Não se pode dar ao autor mais do que ele está pedindo, e ele só pede uma declaração.

Esta questão dos juros moratórios e correção monetária é hoje pacífica no Colendo Supremo Tribunal Federal. No RE n!! 109.452-SP, Relator emi­nente Ministro Célio Borja (RTJ n!! 121/1.187), entendeu nossa Corte Maior que:

414

"ICM. Direito de crédito pelo tributo isento. Ação declara­tória. Não cabimento de correção monetária e juros.

Pacífico é o entendimento do Supremo Tribunal de que em ação declaratória de crédito pela parcela do ICM isento, diversa essencialmente da repetição de indébito, descabe aplicar a corre­ção monetária e os juros.

RE's não conhecidos."

Por ocasião deste julgamento salientou o eminente Ministro Relator que:

"A jurisprudência do Supremo Tribunal é, presentemente, uniforme no sentido do não cabimento de correção monetária em ações declaratórias da espécie dos autos. Inter alia, lembro os seguintes: RE 109.204-1-SP, RE 106.629-9, 2i! Turma, ambos relatados pelo Ministro Djaci Falcão; RE 107.110-9, 2i! Turma, Relator Ministro Carlos Madeira; ERE 104.963, Pleno, Relator Ministro Cordeiro Guerra; RE n!! 1l0.009-5-SP, lílTurma, Rela­tor Ministro Rafael Mayer.

Pela mesma razão, não há que falar em juros, por não se configurar repetição de indébito, hipótese em que seriam devi­dos."

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

No mesmo sentido os precedentes no RE n!! 108.699-SP, Relator eminen­te Ministro Francisco Rezek - RTJ 119/395 e ERE n!! 104.963-SP, Relator Eminente Ministro Carlos Madeira, Tribunal Pleno (EDcl. na RTJ 115/372). A Ementa neste último foi a seguinte:

"ICM. Declaratória do direito ao crédito do tributo isento. Não cabe, porém, a correção monetária do valor desse tributo, se o fisco, apesar de não reconhecer aquele direito, não exigiu o seu pagamento. Não há identidade de situações entre quem pagou indevidamente o imposto e quem deixou de escriturar o valor da isenção, mas também não o recolheu à Fazenda.

Embargos rejeitados" (RTJ 120/1232).

Mesmo que a autora tenha pago indevidamente o imposto, não é a ação declaratória meio próprio para repeti-lo e pleitear correção monetária. Corre­ção monetária sobre o quê? Sobre o direito de creditar-se do ICM relativo às suas importações de matéria-prima isenta de ICM? O simples reconhecimento da existência ou da inexistência de uma relação jurídica não importa em condenação e muito menos em correção monetária.

A decisão da egrégia Segunda Turma, no REsp n!! 2.485-PR, se refere a hipótese diversa. Nele se trata de mandado de segurança, relativo a café em grão, adquirido do extinto IBC, com isenção de tributo e não pode ser invocado como precedente.

A incidência de correção monetária desde o ajuizamento da ação reco­nhecida pela decisão hostilizada deu à autora mais do que lhe era devido, porque, como vimos, ela é incabível em ação deClaratória.

Conheço do recurso e lhe nego provimento.

Remetam-se os presentes autos ao Supremo Tribunal Federal para exame da matéria constitucional.

EXTRA TO DA MINUTA

REsp n!! 2.530 - SP - (Reg. n!! 90.0002556-7) - Relator: Exmo. Sr. Ministro GarCia Vieira. Recorrente: Manufatura de Artigos de Borracha No­gam S/A. Recorrida: Fazenda do Estado de São Paulo. Advogados: Drs. Domingos Novelli Vaz e outros, Betty Lia Tunchel e outros.

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso (ll! Turma: 27/6/90).

Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Ministros Armando Rollem­berg,Pedro Acioli e Geraldo Sobral.

Ausente, justificadamente, o Exmo. Sr. Ministro José de Jesus Filho.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 415

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro ARMANDO ROLLEM­BERG.

• RECURSO ESPECIAL N!! 2.790 - MT

(Registro n!! 90.0003582-1)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Eduardo Ribeiro

Recorrente: Banco do Brasil S.A

Recorrido: Luiz Domingos Salmazo

Advogados: Drs. Euclides Baleroni e outros e Elídio Lopes Mesquita Filho e outro.

EMENTA: Execução e consignatória.

A circunstância de o devedor ajuizar ação de consigna­ção em pagamento não impede o credor de pretender a exe­cução. Eventuais embargos poderão ser decididos na mesma sentença da corisignatória. Não se pode, entretanto, obrigar o credor a aguardar o desfecho da ação de conhecimento para exercer sua pretensão executória.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes áutos em que são partes as acima indicadas:

Decide a 3;). Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer e dar provimento ao recurso especial, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Brasília, 26 de junho de 1990 (data do julgamento)

Ministro GUEIROS LEITE, Presidente. Ministro EDUARDO RIBEI­RO, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Trata-se de medida cautelar, requerida por Luiz Domingos Salmazo, objetivando impedi"r a exe­cução de título de que credor o Banco do Brasil, até decidir-se a ação de

416 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago, 1990.

consignação em pagamento, proposta pelo autor, que efetuou o depósito do valor nominal da cédula rural e dos juros, excluindo a correção monetária.

Concedida a liminar, nos termos requeridos, agravou de instrumento, não sendo provido o recurso.

O réu, ora recorrente, apresentou recurso especial, fundamentado no art. 105 lU, alíneas a e c da Constituição Federal. Deu como violados os arts. 81, 82 e 100, do Código Civil, 103,580 e § único, 585 II e VII do c.P.C., e os arts. 10 e 41 do Decreto-Lei n2 167/67. Apontou divergência jurisprudencial.

É o relatório.

VOTO

EMENTA: Execução e consignatória.

A circunstância de o devedor ajuizar ação de consignação em pagamento não impede o credor de pretender a execução. Eventuais embargos poderão ser decididos na mesma sentença da consignatória. Não se pode, entretanto obrigar o credor a aguardar o desfecho da ação de conhecimento para exercer sua pretensão executória.

O EXMO. SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: Considero não de­monstrada a divergência, posto que os acórdãos trazidos a confronto não contêm a peculiaridade da decisão recorrida, em que se admitiu a liminar, para impedir o ajuiZa.mento da execução, em virtude de já existir, em curso, ação de consignação. Deve o recurso, entretanto, ser conhecido pela alínea a, como se procurará mostrar.

Entendeu o acórdão que a liminar merecia subsistir, uma vez que existiria conexão entre o objeto da consignatória e o que haveria de sê-lo a execução. Se reconhecido o direito do consignante, estaria afastada a possibilidade deo credor pretender a correção monetária. Isto não ocorrendo, o crédito subsistiria incólume. Não se justificaria corressem as duas demandas.

Entendo data venia, que tem razão o recorrente. Certo que a mesma questão jurídica poderá colocar-se na ação de consignação e, em eventuais embargos à execução, a conexão levará à reunião dos processos, para julga­mento simultâneo. Isto, entretanto, é coisa muito diversa de impedir-se o ajuizamento da execução. Não há dúvida de que, acolhido o pedido de paga­mento por consignação, estará extinto o crédito e a execução não poderá prosseguir. Ocorre, porém que obviamente também o contrário é suscetível de verificar-se. Neste caso, a sentença reconhecerá o direito à correção monetária, mas de nenhum modo será apta a satisfazer o direito do credor que, dispondo de título executivo, pretende receber o que considera ser-lhe devido. Mantida

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 417

a cautelar, o início do processo de execução sofreria delonga injustificável, privando-se o credor de ver de logo decidida sua pretensão executória.

Tenho, pois, que contrariado o artigo 580 do CPC, razão por que conheço do recurso e dou-lhe provimento para reformar o acórdão e cassar a liminar.

EXTRATO DA MINUTA

REsp nÇ! 2.790 - MT - (Reg. n~ 90.0003582-1) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Eduardo Ribeiro. Recorrente: Banco do Brasil S.A. Recorrido: Luiz Domingos Salmazo. Advogados: Drs. Euclides Baleroni e outros e Elídio Lopes Mesquita Filho e outro.

Decisão: A Turma, por unanimidade, conheceu e deu provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator (3ª Turma -26.06.90).

Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Ministros Waldemar Zveiter, Cláudio Santos, Gueiros Leite e Nilson Naves.

418

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Min. GUEIROS LEITE.

RECURSO ESPECIAL Nl! 2.794 - MT

(Registro nÇ! 90.0003586-4)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Barros Monteiro

Recorrente: Banco do Brasil S/A

Recorrida: Cerâmica Estrela da Barra Ltda.

Advogados: Drs. Euclides Baleroni e outros e Elídio Lopes Mesquita Filho e outro.

EMENTA: Medida cautelar. Descabimento da liminar. Excede os limites do poder cautelar geral do juiz o des­

pacho illitio litis que, em medida cautelar inominada, penden­te a consignatória intentada pelo devedor, obsta ou suspende a execução do credor, titular de nota de crédito industrial.

Contrariedade aos arts. 580 e parágrafo único, 585, VII, do CPC. Dissídio pretoriano configurado.

Recurso especial conhecido e provido.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas.

Decide a 4ó! Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Cústas, corno de lei.

Brasília, 19 de junho de 1990 (data do julgamento).

Ministro BUENO DE SOUZA, Presidente. Ministro BARROS MON­TEIRO, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO: Dizendo-se peque­no produtor rural, a emitente de nota de crédito industrial ajuizou ação de consignação em pagamento contra o credor, o Banco do Brasil S/A, visando à quitação de seu débito, livre da correção monetária de acordo com o precei­tuado no art. 47 do ADCT de 1988. Em seguida, intentou medida cautelar inominada, onde pleiteou e obteve liminar, a fim de que o Banco requerido se abstenha de promover a execução do título até o trânsito em julgado da ação principal.

Interposto pelo estabelecimento bancário o recurso de agravo de instru­mento, a Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso negou-lhe provimento, em Acórdão assim ementado:

"Medida cautelar incidental em ação de consignação em pagamento. Admissibilidade. Ação de execução. Liberação da obrigação de pagar o débito com correção monetária. Exigibili­dade dessa obrigação. Conexão existente. Anistia. Artigo 47 do ato das disposições constitucionais transitórias. Agravo de instru­mento improvido.

Há íntima conexão entre o objeto da consignatória e o que é ou seria objeto da execução, concernentemente à incidência de correção monetária sobre débito oriundo de empréstimo"conce­dido por bancos ou instituições financeiras, razão por que é ad­missível se obste ou suspenda o processo executório, a fim de que, mediante um só pronunciamento jurisdicional, seja dirimida a controvérsia."

Rejeitados os embargos declaratórios, manifestou o Banco do Brasil S/A recurso especial com arrimo no art. 105, a e c, da CF, alegando contrariedade

R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 419

aos arts. 81, 82 e 100 do Código Civil; 103,580 e parágrafo único, e 585, n!!s. II e VII, do CPC; 10 e 41 do D.L. n!! 167/67. Sustentou o recorrente que o decisório guerreado lhe impede de exercer o seu direito, estrapola o poder cautelar do Juiz e lhe acarreta a possibilidade de danos, de difícil ou incerta reparação. Aponta, ainda, dissídio jurisprudencial com julgados oriundos do mesmo Tribunal de Justiça de Mato Grosso e do Primeiro Tribunal de Alçada CivildeSãoPaulo(JTACSP-Lex-110/224; 110/227; 110/233 e 112/209).

Admitido o apelo extremo por ambas as alíneas do pennissivo constitu­cional, os autos subiram a esta Corte sem as razões dos litigantes.

É o relatório.

VOTO

. O EXMO. SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO (Relator): 1. Repu­tando legal e perfeitamente admissível a medida liminar deferida pelo MM. Juiz de Direito, no sentido de obstar ou suspender o processo executório, a fim de que, mediante um só pronundamento jurisdicional, seja dirimida a contro­vérsia, o Acórdão recorrido dissentiu, ao menos, de um dos arestos colaciona­dos pelo recorrente como paradigma. É o que se acha inserto na publicação JTACSP, vol 110, págs. 224:"227, .anexado por cópia reprográfica às fls. 154/155 dos autos. Neste julgádo trazido como modelo, assentou-se, in verbis: "A decisão não se limitou à sustação de protesto cambial por injunção do periculum in mora. Avançou muito além e frustrou injustamente a própria exeqüibilidade de contrato de financiamento e da respect~va cédula pignoratí­cia, legalmente revestida de liquidez e certeza inerentes aos títulos de crédito extrajudiciais. Negou-se ao cr.edor o direito assegurado pelo artigo 580 do Código de Processo Civil de promover execução amparada em obrigação e que a lei atribui eficácia de título executivo".

Caracterizada encontra-se, pois, a dissonância pretoriana, no caso.

2. O Banco recorrente é credor do recorrido da quantia de Cz$ 150.000,00 (principal), representada por nota de crédito industrial, título que, sem dúvida, se reveste dos atributos de liquidez, certeza e exigibilidade (arts. 10 e 18, do Dec.Lei n!! 413, de 09.01.69). Mantendo a decisão que concedeu a medida cautelar initio litis, o decisum ora atacado obstou ao credor o ingresso a Juizo para vir cobrar, via processo de execução, o seu crédito.

Penso que vulnerou aí o disposto no art. 580 e parágrafo único do CPC, combinado com o art. 585, inciso VII, do mesmo "Codex".

Não se pode falar em conexão ou continência, quando um dos feitos objeto de cogitação· sequer foi aforado. Nem tampouco caqe invocar-se a litispendência, pela mesma razão. Na verdade, a pretexto de pretender dirimir

420 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

a pendência entre as partes através de um só pronunciamento jurisdicional, a decisão objurgada barrou ao credor o exercício de um direito que lhe é asse­gurado por lei, qual seja, o de aparelhar a execução, uma vez constatado que o eminente da cártula não satisfez espontaneamente a obrigação (art. 580 e seu parágrafo único, CPC).

Preenchidos que estavam os requisitos necessários ao ajuizamento do processo de execução, o Banco credor não podia a tanto ser impedido por uma decisão proferida em medida cautelar inespecífica. É o que se infere da lição de Alcides de Mendonça Lima, segundo o qual "o inadimplente, portanto, é o devedor que se torna suscetível de ser executado, pela circunstância concreta decorrente do reconhecimentodo direito do credor em sentença ou em título com eficácia executiva, desde que aquele, naturalmente, não cumpriu o que lhe competia"("Comentários ao Código de Processo Civil", vol. VI tomo I, pág. 255, I!!. ed.). José da Silva Pacheco ressalta, a propósito, que"a pretensão à execução, eu a tenho, como todos os cidadãos, desde que ocorra fato jurídico capaz de facultar-me,juridicamente, exigir do Estado essa prestação executiva. Claro é que, antes da sentença, o credor, diante de fato que o autorize, tem a pretensão de dirigir-se a alguém, para exigir o cumprimento (a execução no sentido impróprio do direito material) do dever jurídico. Essa pretensão de direito material preexiste à sentença. Mas é pretensão de direito material. A pretensão à prestação executiva por parte do Estado é outra coisa e só di mana da ocorrência de fato jurídico capaz de produzi-la. Assim, no caso de sentença, a ação de execução nasce da sentença de condenação, ou, em outros casos, do título executivo" ("Tratado das Execuções, Processo de Execução", I!.! voI., pág. 197, ed. 1975).

Tolhendo o livre exercício da execução pelo credor, o magistrado de I!.! grau, secundado pelo Tribunal-a quo, excedeu os limites ao poder cautelar do Juiz, porquanto, no dizer do eminente Ministro Sidney Sanches, o fito da medida cautelar "é apenas garantir a utilidade e eficácia da futura prestação jurisdicional satisfativa. Não pode, nem deve, a medida cautelar, antecipar a decisão sobre o direito material, pois, não é de sua natureza autorizar uma espécie de execução provisória" ("Poder Cautelar do Juiz no Processo Civil Brasileiro", pág. 131, ed. 1978).

Vale acentuar que os prejuízos decorrentes da obstrução do acesso do credor ao Poder Judiciário, pela via própria, são de porte marcantemente superiores àqueles alegados pelo devedor. Enquanto este alude à possibilidade de alienação judicial de seus bens (o que se daria tão-só depois de apreciados os embargos à execução) e ao abalo em seu crédito na praça, o credor restaria sujeito à consumação da prescrição; ao possível desfalque do patrimônio do devedor e à perda de eventual preferência pela primeira penhora, tudo isto e mais a delonga em receber o que lhe é devido.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 421

De tudo se conclui que a liminar não poderia frustrar a exeqüibilidade ínsita no título de que o recorrente é legítimo beneficiário, direito este que lhe é plenamente garantido pelo art. 580 e parágrafo único, da nossa lei processual civil.

3. Ante o exposto, conheço do recurso por ambas as alíneas do autoriza­tivo constitucional, e dou-lhe provimento para cassar a medida liminar conce­dida em li! instância.

É como voto.

EXTRATO DA MINUTA

REsp n!l2.794 - MT - (Reg. n!l90.0003586-4) - Relator: o Exmo. Sr. Ministro BARROS MONTEIRO. Recorrente: Banco do Brasil S/A. Recorri­da: Cerâmica Estrela da Barra Ltda. Advogados: Drs. Euclides Baleroni e outros, e Elídio Lopes Mesquita Filho e outro.

Decisão: A Turma, por unanimidade, conheceu do recurso e deu-lhe provimento (Em 19.06.1990, 4i! Turma).

Os Exmos. Srs. Ministros Bueno de Souza, Athos Carneiro, Fontes de Alencar e Sálvio de Figueiredo votaram com o Relator. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro BUENO DE SOUZA.

422

RECURSO ESPECIAL N!l 2.897 - SP

(Registro n!l 90.0003903-7)

Relator: O EXlIlo. Sr. Ministro Ar1llando Rolle1llberg

Recorrente: Prefeitura do Município de São Paulo

Recorrido: Etelvino Tavares

Advogados: Dr. Edison Batistella

EMENTA: Desapropriação. Juros corhpensatórios e moratórios. Cumulação.

Enquanto os juros compensatórios de 12 % são devidos pela utilização antecipada do imóvel e se contam da imissão provisória na posse até o efetivo pagamento da indenização, os moratórios, à taxa de 6 %, fluem desde o trânsito em jul­gado da sentença final e são devidos pelo atraso no pagamento da indenização, nada havendo que impeça incidam cumula-

R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

tivamente. Improcedência, por fim, de argüição de ofensa, pela decisão recorrida, à norma da Constituição Federal de 1988 que limitou os juros em 12 %, pois, que além de dito limite somente se referir a débitos decorrentes de concessão de crédito, tal aspecto não foi objeto do necessário preques­tionamento. Recurso desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas:

Decide a F Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 18 de junho de 1990 (data do julgamento)

Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente e Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR MINISTRO ARMANDO ROLLEMBERG: Apreciando recurso de apelação interposto pela Prefeitura Municipal de São Paulo, em sentença pela qual foi julgada ação de desapropriação, a Décima Primeira Câmara Civil do Tribunal de Justiça proferiu decisão, no qual estabeleceu:

"Os juros compensatórios, à taxa de 12 % ao ano (Súmula n2

618), destinados a indenizar o proprietário pelo não uso do imóvel pelo tempo em que dele ficou privado, incidem sobre a diferença entre a oferta e a indenização, a partir da antecipada imissão de posse (Súmula n!.! 164), até a data do efetivo pagamento, inde­pendentemente da rentabilidade do imóvel (STF - li!. Turma, RE. n!.! 85.704 - MG; STF - 2i!. Turma, RE. n!.! 89.087-4 -GO).

É também de pacífico entendimento a concessão de juros moratórios, à taxa de 6% ao ano, pelo atraso no pagamento da indenização, tluindo cumulativamente, com os compensatórios, a partir do trânsito em julgado da sentença final, ou seja, do momento em que a sentença adquire força executiva em relação ao principal (STF - Pleno, RE. n!.! 88.960-4-RJ; STF -Pleno, R.E. n!.! 447-2 - PR; STF - Pleno, RO 656-8 - SP)."

Inconformada a expropriante interpôs recurso especial alegando que o julgado recorrido, ao admitir a cumulação de juros compensatórios e morató-

R. sup. Trih.lust., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 423

rios, somando 18%, contrariara o art. 192, VIII, § 3!!, da Constituição, e divergira de julgados do Supremo Tribunal Federal, que indicou.

O recurso foi admitido quanto à divergência da interpretação da lei apenas, e regularmente processado.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO ARMANDO ROLLEMBERG (Relator): A possibilidade de cumulação dos juros compensatórios e moratórios, é hoje entendimento pacífico do Supremo Tribunal Federal, como se vê das decisões seguintes:

424

"Desapropriação. Juros compensatórios e moratórios. Cu­mulação.

- Os juros compensatórios de 12 % são devidos pela utili­zação antecipada do imóvel e se contam da imissão provisória na posse até o efetivo pagamento da indenização.

- Os juros moratórios à taxa de 6% fluem desde o trânsito em julgado da sentença final e são devidos pelo atraso no paga-mento da indenização. '

- Presentes que sejam essas duas situações, os respectivos juros incidem cumulativamente."(RE 90.656) Plenário.

"Juros moratórios. Juros compensatórios (fixação). Cumu­latividade. 1. A jurisprudência mais recente tem admitido a esti­pulação dos juros compensatórios em 12% ao ano para melhor atender a finalidade de dar ao expropriado uma justa indenização. 2. Tem-se entendido que os juros compensatórios e moratórios podem incidir, cumulativamente, os primeiros para indenizar o proprietários pelo não uso do imóvel pelo tempo que dele ficou privado, os segundos pelo atraso no pagamento de indenização. Recurso extraordinário provido em parte."

"Desapropriação. Juros compensatórios e moratórios. Cu­mulação.

Os juros compensatórios de 12 % são devidos pela utilização antecipada do imóvel e se contam da imissão provisória na posse até o efetivo pagamento da indenização.

Os juros moratórios à taxa de 6% fluem desde o trânsito em julgado da sentença final e são devidos pelo atraso no pagamento da indenização.

R. sup. Trih. Jus\., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Presentes que sejam essas duas situações, os respectivos juros incidem cumulativamente.

RE conhecido e provido parcialmente." - (F e 2i!. Turmas da Corte Maior).

Quanto à ofensa à norma da Constituição que limitou os juros em 12% trata-se de matéria que não foi prequestionada, como decidido em relação a recurso extraordinário interposto pelo recorrente, e, de qualquer sorte, dito limite somente se refere a débitos decorrentes de concessão de crédito.

Nego provimento ao recurso.

EXTRATO DA MINUTA

REsp n!! 2.897 - SP - (Reg. n!! 90.0003903-7) - Relator: Exmo. Sr. Ministro Armando Rollemberg. Recorrente: Prefeitura do~Município de São Paulo. Recorrido: Etelvino Tavares. Advogados: Dr. Edison Batistella.

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso. (Em 18.06.90 - F Turma).

Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Ministros Pedro Acioli, Ge­raldo Sobral, José de Jesus e Garcia Vieira. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro ARMANDO ROLLEMBERG.

RECURSO ESPECIAL N!! 3.018 - PR

(Registro n!! 9042798)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Dias Trindade

Recorrente: Ministério Público do Estado do Paraná

Recorridas: Rute Kreutzer; Maria Madalena de Paula Kreutzer

Advogado: Dr. José Roberto de Azevedo

EMENTA: Penal. Recurso Especial. Menoridade. Au­sência de prova documental.

Somente se admite a menoridade, para efeitos penais, quando documentalmente comprovada, não apenas por ha­ver sido indicada por ocasião do interrogatório, pelo réu, máximo se a circunstância não foi argüida pela defesa em qualquer oportunidade, sequer devolvida na apelação.

R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 425

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a 6lJ. Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso, por ambos fundamentos, e lhe dar provimento para determinar que a Câmara prossiga no julgamento da apelação, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator, na fonna do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília-DF, 29 de junho d~ 1990 (data do julgamento).

Ministro WILLIAM PATTERSON, Presidente. Ministro DIAS TRIN­DADE, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO DIAS TRINDADE (Relator): O Ministério Público do Estado do Paraná interpõe recurso especial, com base nos incisos a) e c) do item lU do art. 105 da Constituição, de decisão da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Alçada do mesmo Estado, que decretou extinta a punibilidade de Rute Kreutzer, em face da prescrição, com prazo contado pela metade, por ter a mesma menos de 21 anos de idade, na data cio fato delituoso.

Sustenta que, sem prova documental da idade, a decisão afronta o art. 155 do Código de Processo Penal e diverge de jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

Admitido o recurso, vieram os autos a este Tribunal e o Ministério Público Federal opinou pelo provimento, com ressalva de diligência, a fim de determi­nar-se a juntada aos autos de certidão de registro de nascimento da recorrida, a ser feita no juízo da apelação.

É como relato.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO DIAS TRINDADE (Relator): Na assentada de julgamento de 26 último, relatei o RESP 2750 - RJ, em que se discutia hipótese idêntica à do presente, de modo que leio o voto que ali proferi, na parte que interessa, cujas razões passam a integrar o presente. (Ler)

Evidente a divergência jurisprudencial.

Isto posto, voto no sentido de conhecer do recurso por ambos os funda­mentos e lhe dar provimento, para determinar que a Câmara de origem prossiga no julgamento da apelação do Ministério Público.

426 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO DIAS TRINDADE (Relator): Ao pleitear pela inexistência da relação de causalidade, a que se refere o art. 13 do Código Penal, o recorrente quer levar esta Corte ao reexame da prova, vedado em sede de recurso especial, posto que, embora suscitado'o tema na apelação, o Tribu­nal de origem proferiu decisão soberana sobre a prova da autoria, o que serve a dizer que foi a ação do recorrente a causadora da lesão patrimonial da vítima.

Do mesmo passo, sem razão o recorrente, ao sustentar que não se consu­mou o delito, por isso que preso poucos minutos após a ação; é que a prova proclamada soberanamente pelo juízo da apelação é de que não houve perse­guição imediata à ação delituosa, senão que a vítima invocara na Delegacia Distrital a atuação policial, logo após consumada a infração e que a diligência empreendida em seguida, veio a efetuar a prisão do agente em local relativa­mente distante, sendo encontrado o produto do crime em seu poder.

O que a jurisprudência tem entendido é que, sendo iniciada a perseguição no momento em que praticada a ação, enquanto perdure a mesma ou no momento da fuga não se pode dizer que se apresente tranquila a posse da coisa roubada, a indicar a consumação do delito.

Aqui, porém, restou pacificado na decisão recorrida, que não houve perseguição no instante da ação, senão após pedido de auxílio da autoridade policial, na sede do Distrito mais próximo ao local do evento e, portanto, após consumado o delito.

A menoridade não restou comprovada nos autos e nem foi argüida em qualquer oportunidade pela defesa.

É certo que constam datas de nascimento do réu: a) quando qualificado no auto de prisão em flagrante, dita como sendo 14 de setembro de 1967; b) no Boletim Individual, mesma data; c) no Boletim de Sindicância de vida Pregressa de fl. 16, mesma data e; d) no termo de interrogatório, como sendo 14 de outubro de 1977, este, por evidente equívoco.

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que, em regra, merece acatamento, se firma no sentido ele que não se há de admitir a alegação de menoridade sem que comprovada por certidão do registro civil de nascimento.

Assim, no ReCr. 73.180-SP, Relator para o acórdão o Ministro Antônio Neder, está expresso na ementa do acórdão:

"I .......................................................................................... .

2. Em nosso processo penal, a prova da menoridade é feita mediante certidão do termo no Registro Civil" (RTJ 68/109).

O relator, que restou vencido, Ministro Bilac Pinto, em seu voto recusava o reexame do tema, baseado na circunstância de que nos juízos de primeiro e

R. Sup. Trib. Jusl., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 427

de segundo graus fora aceita a menoridade apenas declarada, não cabendo discutir sobre a prova em sede de recurso extraordinário. . .

No RHC 51.043-GB, Relator o Sr. Ministro Barros Monteiro, está na ementa do acórdão:

"

"A menoridade do acusado não deve ser acolhida pela sim­ples alegação da·parte;devendo resultar demonstrada, observadas

"' no que a ela conceme, as restrições à prova estabelecidas na lei civil." (RTJ 67/683).

No HC 53.863-SP, Relator o Sr. Ministro "Cunha Peixoto, diz a ementa do acórdão:

" A menoridade, para os efeitos do art. 115 do CP, não basta

ser alegada pelo paciente, sendo necessário, para o seu reconhe­cimento, que ela esteja documentalmente comprovada nos au­tos." (RTJ 79/74).

E no RCr 87245-SP, assim se expressou sobre o tema, em seu voto, o Relator Ministro Bilac Pinto:

"A orientação desta Corte evoluiu no sentido de só reco­nhecer a menoridade se comprovada por certidão de nascimento. Neste ponto fui mais flexível, ficando vencido em dois casos que se acham publicados na RTJ 58/795 e 68/109. Não vou insistir em meu ponto de vista. Acolho os precedentes.

Inexistindo comprovação documental da argüida menorida­de repilo, nesta parte, o recurso" (RTJ 84/1.048).

O Sr. Ministro Oscar Corrêa, no HC 60.590-SP, indeferiu a ordem por falta de comprovação documental da menpridade, embora estivesse a mesma indicada em várias peças do processo, sequer admitindo prova posterior ao fato delituoso, ante o seu caráter duvidoso. A ementa do acórdão que, então, lavrou, está assim:

"Habeas Corpus. Alegação incomprovada de menoridade, não anteriormente

apurada no processo. Prova posterior ao fato delituoso. Habeas .Corpus indeferido." (RTJ 105/590).

Aqui sequer restou argüida a menoridade do recorrente, quando da prática do delito, menoridade que também não foi considerada na sentença condena­tória, nem devolvida na apelação, circunstância que somente veio a ser !Gvan­tada na petição de recurso especial, o que vem a significar ausência de prequestionamento.

428 R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

De qualquer sorte, sem que a menoridade fosse, em qualquer momento, comprovada nos autos.

Não há, por conseguinte, como dizer ofendidos os dispositivos da lei penal que arrimam o presente recurso.

Isto posto, voto no sentido de não conhecer do recurso especial.

EXTRATO DA MINUTA

RESP N!! 3.018 - PR - (Reg. n!! 9042798) - Relator: O Exmo. Sr. Min. Dias Trindade. Recorrente: Ministério Público do Estado do Paraná. Recorridas: Rute Zreutzer; Maria Madalena de Paula Kreutzer. Advogado: Dr. José Roberto de Azevedo.

Decisão: A Turma, por unanimidade, conheceu do recurso, por ambos fundamentos, e lhe deu provimento para determinar que a Câmara prossiga no julgamento da apelação, nos termos do voto do Exmo. Sr. Ministro Relator. Em 29-06-90 - 6l! Turma.

Os Exmos. Srs. Mins. William Patterson, José Cândido, Carlos Thibau e Costa Leite, votaram com o Relator. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Min. WILLIAM PA TTERSON.

+ RECURSO ESPECIAL N!! 3.140 - PR

(Registro n!! 90.0004565-7)

-Relator: O Exmo. Sr. Ministro Costa Leite

Recorrente: Ministério Público do Estado do Paraná

Recorrido: Elias Vieira Neves e Jairo Veríssimo Batista Advogado: Dr. Élcio José Melhem

EMENTA: Processo Penal. Emendatia libelli. Hipótese em que rechaçado o concurso material, justa­

mente por reconhecer-se a continuidade delitiva, sendo des­considerada, porém, a consequência jurídica desse reconhecimento, qual seja o aumento da pena (art. 71, do Código Penal), à míngua de impugnação específica. contra­riedade aos artigos 383 e 617, do CPP, visto cuidar-se de hipótese típica de emendatia libelli, que é procedida de ofkio, assim em primeiro como em segundo grau de jurisdição. Recurso conhecido e provido.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 429

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas. Decide a 6l!. Turma do Superior Tribunal de Justiça, à unanimidade,

conhecer do recurso especial pela Letra a, inciso lU, art. 105, da Constituição Federal, e dar-lhe provimento, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei. Brasília, 28 de agosto de 1990 (data do julgamento).

Ministro WILLIAM PETTERSON, Presidente. Ministro COSTA LEI­TE, Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO COSTA LEITE: Aespécie foi assim suma­riada no r. despacho de fls. 160/161, do eminente Presidente do Tribunal de Alçada do Estado do Paraná:

430

"Insurge-se o Ministério Público contra acórdão proferido pela Primeira Câmara Criminal deste Tribunal que, confirmando a decisão do juízo singular, assim se pronunciou:

"Roubo. Desclassificação para o delito de furto qualificado. Inocorrência do concurso material. Continuidade delitiva pedida pelo Ministério Público, nesta instância. Inadmissibilidade, por falta de impugnação a esse respeito no recurso do "parquet".

Apelação não provida.

A seguir, opostos embargos declaratórios, restaram rejeita-dos.

Fundamenta-se a irresignação no artigo 119, lU, a e d, da Constituição Federal de 1969, combinado com o artigo 27, pará­grafo I!.!, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, e no artigo 105, lU, a e c, da atual Constituição Federal, sob as alegações de negativa de vigência de lei federal (artigos 157,381, 383 e 617, do Código de Processo Penal, e artigos 69 e 71, do Código Penal) e divergência jurisprudencial (RT 607/399, RT 585/401 e RT 540/272).

Objetiva o douto representante do Ministério Público ver aumentada a resposta penal in concreto pela incidência da majo-

R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

rante da continuidade delitiva (admitida e, no entanto, não apli­cada no caso), ex vi art. 71 do C. Penal.

Não houve impugnação".

Inadmitido o recurso, determinei a subida dos autos, para melhor exame, em sede de agravo de instrumento, nos termos do seguinte despacho:

"Recorreu extraordinariamente o "parquet" estadual de acórdão da e. Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Alçada do Estado do Paraná, sob duplo fundamento, negativa de vigência de lei federal e dissídio jurisprudencial, sobrevindo juízo recusa­tivo de admissibilidade, na conformidade do despacho trasladado a fls. 161/163, do eminente Juiz-Presidente daquela Corte, por falta de prequestionamento, com relação ao primeiro fundamen­to, e em virtude de não terem sido mencionadas, na petição recursal, as circunstâncias que identificariam ou assemelhariam os casos confrontados, no que diz com o segundo fundamento.

Daí o presente agravo. Como escorreitamente consignado na minuta, a vexata quaestia, objeto do apelo extremo, cinge-se no seguinte: na aplicação da emendatia libelli, seja em primeiro grau (art. 383, do CPP), seja em segundo grau (art. 617 do CPP), se o material cognitivo assim indicar.

Com efeito, a divergência específica reclamada para a ad­missibilidade do recurso, pela letra c, do permissivo constitucio­nal, de fato, não restou demonstrada, nos termos do art. 322, do RISTF. No que tange, porém, ao prequestionamento, dissinto do entendimento do r. despacho agravado. A questão da obrigatorie­dadede emendatia libelli em segundo grau, com aplicação do 'princípio iura l1avit curia, só poderia surgir com o julgamento da apelação. Como foram opostos embargos declaratórios versando exatamente o ponto, estou em que se satisfez a exigência de prequestionamento.

Cuida-se de questão de alta relevância e a tese sustentada pelo Ministério Público é das mais respeitáveis, tudo recomen­dando o processamento do recurso, com a subida dos autos prin­cipais, para melhor exame. Para esse fim, dou provimento ao agravo.

Devidamente processado o recurso, subiram os autos, neles lançando parecer o Ministério Público Federal, pelo conhecimento e provimento".

É o relatório, Sr. Presidente.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 431

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO COSTA LEITE (Relator): A v. sentença entendeu não configurado o concurso material, admitindo, no entanto, a con­tinuidade delitiva. Não obstante, deixou de proceder ao aumento da pena, como prevê o art. 71, do Código Penal, no que andou mal, visto cuidar-se de hipótese típica de emendatio libelli.

O r. aresto recorrido, por sua vez, rechaçou a pretensão do Ministério Público de ver aplicada a regra do concurso material, justamente por reconhe­cer a existência de crime continuado. A conseqüência jurídica desse reconhe­cimento, todavia, foi desconsiderada, à míngua de impugnação específica, como visto do relatório.

Com efeito, o equívoco é manifesto, seja porque não seria o caso de exigir-se impugnação específica, eis que a continuidade delitiva apresenta-se como um minus em relação ao que o recurso ministerial visava, seja porque a emendatio libelli é procedida de ofício, assim no primeiro como no segundo grau de jurisdição, a teor do disposto nos arts. 383 e 617, do CPP.

~Dessarte, Sr. Presidente, conheço do recurso pela letra a, do permissivo constitucional, mantido o juízorecusativo de admissibilidade, quanto à alínea c, pela razão exposta do despacho que proferi no agravo de instrumento, e dou-lhe provimento, para aumentar de 1/6 (um sexto) a pena-base aplicada a cada um dos réus, nos termos do art. 71, do Código Penal. É como voto, Sr. Presidente.

EXTRATO DA MINUTA

REsp n2 3140 - PR - (Reg. n!! 90.0004565-7) - Relator: O Exmo. Sr. Ministro Costa Leite. Recorrente: Ministério Público do Estado do Paraná. Recorridos: Elias Vieira Neves e Jairo Veríssimo Batista. Advogado: Dr. Élcio José Melhem.

Decisão: A Turma, por unanimidade, conhceu do recurso especial pela letra a, inciso IIl, art. 105, da Constituição Federal, e deu-lhe provimento (Sexta Turma - 28.08.90).

Votaram os Exmos. Srs. Ministros Dias Trindade, William Patterson, José Cândido e Carlos Thibau. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro WILLIAM PATTERSON.

432 R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

MEDIDA CAUTELAR INOMINADA NO RECURSO

ESPECIAL N!! 3.534 - GO

(Registro n!! 90.5421-4)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Américo Luz

Recte: Daniela Carvalho Murad

Recdo: Universidade Federal de Goiás

Advogados: Dr. Arthur Edmundo de Souza Rios e outros e Dr. José Carlos Miranda Nery e outros

EMENTA: Recurso Especial. Efeito suspensivo. Diante da situação excepcional que o

caso encerra, e presente o periculum in mora, concede-se efei­to suspensivo a recurso especial admitido na origem e sob jurisdição desta Corte, assegurando à impetrante-recorrente a sua permanência na Universidade, matriculada que fora por força de decisão judicial, posteriormente cassada, até o julgamento de mérito do aludido recurso.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a 2;1 Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, deferir a medida cautelar requerida, atribuindo efeito suspensivo ao recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas anexas, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 27 de junho de 1990 (data do julgamento).

Ministro AMÉRICO LUZ, Presidente e Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO AMÉRICO LUZ: Inscrita e aprovada no vestibular realizado em março de 1988 pela Universidade Federal de Goiás, para graduação em Engenharia Civil, Daniela Carvalho Murad, menor impú­bere, não conseguiu efetivar a sua matrícula porque não era portadora, ainda, de certificado de conclusão do 2!! grau.

Inconformada, impetrou segurança contra o Magnífico Reitor daquela Universidade, com pedido de liminar para que pudesse efetivar a matrícula

R. Sup. Trih. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. ~33

correspondente, com fixação de prazo para apresentação do aludido certificado do 22 grau, curso que já cumprira mais de 75% da carga horária.

A liminar foi concedida e, posteriormente, a segurança, nos termos da sentença de fls. 85/87.

Em grau de apelação, o Eg. Tribunal Regional de Brasília, conforme se vê do acórdão de fls. 109/113, reformou a sentença recorrida, cassando a liminar, dada a inexistência de direito líquido e certo, assim cáracterizado pela não apresentação pela impetrante, no ato da matrícula, do certificado de con­clusão do 22 grau.

Daí a interposição, com apoio nas letras a e c do permissivo constitucio­nal, do recurso especial, afinal admitido pela decisão de fls. 143/144, da lavra do em. Presidente do referido Tribunal.

Na peça recursal, pleiteia a impetrante, em preliminar, o seguinte:

Relatei.

"Embora o RISTJ em seu artigo 255 não dê efeito suspen­sivo a Recursos Especiais, é competência do digno Relator (art. 34 n2• V do mesmo Regimento) conceder ou submeter a quem de direito o presente pedido de "Medida Cautelar Incidental", visto que a execução provisória da decisão causará gravíssimo e irre­parável dano (a recorrente já está em trabalhos de estágio), e uma decisão posterior de reforma não teria eficácia.

"Concedida a segurança, para garantir a estudantes o acesso ao ensino superior, não é lícito nemjusto,já no meio do ano letivo e antes do julgamento do recurso interposto da sentença, cance­lar-lhes a matrícula."

(Ag. do MS in STF l1f. 17. 144-GB-RTJ 45/589)

Requerimento: Para espancar dúvidas, pois, de direito já o é, requer-se, diante da relevância, que seja dado efeito suspensivo no recebimento do presente recurso."

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO AMÉRICO LUZ (Relator): Srs. Ministros, por força regimental, esta é a última sessão desta Eg. Turma, encerrando, assim, os trabalhos judicantes do primeiro semestre do corrente ano.

Sem possibilidades de inclus~(j do feito nesta pauta de julgamentos, posto que somente no dia 22 p. passado os autos vieram-me conclusos, tomei a liberdade, ante o disposto no art. 34, V, do Regimento Interno, de submeter à Turma a presente questão.

434 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Como lido no relatório, trata-se de pedido cautelar inserto na própria petição de recurso, via do qual pretende a impetrante, ora recorrente, que se dê a ele efeito que não possui, qual seja o suspensivo.

Data venia, não vislumbro restrições ao seu deferimento.

Deveras, ante a situação excepcional surgida com a cassação da seguran­ça, facilmente aferida diante das peculiaridades que o caso encerra, tenho por presente o periculum in mora, um dos requisitos para o pleito assecuratório.

Assim, estando o recurso sob jurisdição desta Corte, voto no sentido de que lhe seja emprestado o almejado efeito suspensivo, até o seu julgamento de mérito, comunicando-se do teor desta decisão à ilustre autoridade coatora.

VOTO-VENCIDO

o EXMO. SR. MINISTRO VICENTE CERNICCHIARO: Sr. Presiden­te, fico receoso de deferir a provisional, caracterizados que estão dois fatos: primeiro, a interessada não satisfez a exigência de exibição da documentação necessária para matricular-se; segundo, houve mandado de segurança, cujo mérito já foi apreciado. Conseqüentemente, data venia , não existe periculum in mora, uma vez que o tema foi jurisdicionalmente enfrentado. Além do mais, parece-me - invoco a experi-éncia de todos nós na vida judiciária - que se repete, no caso concreto, o argumento futuro do fato consumado. Maneira oblíqua de contornar as exigências legais.

Trata-se de demonstração clara de que ela não tem a conclusão do recurso secundário. O caso já foi apreciado pelo Tribunal Regional Federal.

O EXMO. SR. MINISTRO AMÉRICO LUZ (Relator): Sim, mas e o efeito da execução imediata desse acórdão que denegou a segurança não afetaria o direito postulado por ela?

O EXMO. SR. MINISTRO VICENTE CERNICCHIARO: Afetará, co­mo em todo caso, porquanto o recurso especial não tem efeito suspensivo. Daí a vida processual em lei ser correta. Não me parece existir a excepcionalidade do fato. Se houvesse dúvida quanto à legalidade da documentação apresentada, aí sim. Mas, no caso, ela diz que não concluiu o curso secundário, foi aprovada e quer fazer universidade com 15 anos.

Data venia, entendo de indeferir a provisional.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO ILMAR GAL VÃO: Sr. Presidente, data venia do eminente Ministro Vicente Cernicchiaro, este é um caso autêntico de excepcionalidade, porque, na verdade, se não se der essa cautela não adianta examinar o recurso. Ela não pode voltar para matricular-se de novo:

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 435

o eminente Ministro Vicente Cernicchiaro, para decidir, teve necessida­de de adentrar ao mérito do recurso.

O-EXMO. SR. MINISTRO VICENTE CERNICCHIARO: Data venia, não apreciei o mérito. Analisei a causa de pedir.

O EXMO. SR. MINISTRO ILMAR GALVÃO: V. Exa. já chegou à conclusão de que o recurso não é cabível, não tendo nenhuma chance de prosperar. Se esse recurso, na verdade, prosperar, já não terá nenhuma valia, sem a preliminar.

Não cabe examinar um recurso que não tem nenhuma finalidade. Para examinar-se o recurso é necessário que se dê a medida pleiteada.

Ela disse que não tinha o curso ginasial e que não estava com o curso completo em dezembro, mas que dependia de uma prova. Terminou essa prova em fevereiro.

O EXMO. SR. MINISTRO AMÉRICa LUZ (Relator): A execução do acórdão recorrido levará fatalmente à cassação da matrícula. Então, dá-se um tempo para que o recurso seja julgado. Parece-me que deveria trazer à Turma, ao invés de darum despacho como Relator, porque realmente achei que, sendo o caso excepcional, melhor seria trazê-lo à Turma para apreciá-lo.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO PEDRO ACIOLI: Sr. Presidente, também acompanho o raciocínio de V. Ex~, por entender que somente na análise do recurso especial é que vamos observar se, na realidade, o curso da recorrente está completo ou não. Porque, como disse o Sr. Ministro limar Galvão, ela pode estar na dependência de uma matéria que foi feita posteriormente, depois de cinco dias, quinze dias, etc., e atendeu aos requisitos. Dentro dessa possi­bilidade, sou mais sensível ao jovem que necessita estudar e concluir o curso.

De modo que, data venia do Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro, acom­panho o Sr. Ministro Relator, a partir dos subsídios fornecidos pelo Sr. Ministro Ilmar Galvão.

É como voto.

EXTRA TO DA MINUTA

Med. Cautelar Inominada no REsp nQ 3.534 - GO - (Reg. nQ 90.5421-4) - Relator: Min. Américo Luz. Recorrente: Daniela Carvalho Murad. Reco­rrido: Universidade Federal de Goiás. Advogados: Dr. Arthur Edmundo de Souza Rios e outros e Dr. José Carlos Miranda Nery e outros.

436 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990.

Decisão: A Turma, por maioria, deferiu a medida cautelar requerida, atribuindo efeito suspensivo ao recurso, vencido o Exmo. Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro (2;!. Turma - 27.06.90).

Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Ministros limar Galvão, Vicente Cernicchiaro e Pedro Acioli.

Presidiu a sessão o Exmo. Sr. Ministro AMÉRICa LUZ.

R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 261-437, ago. 1990. 437

REVISÃO CRIMINAL - AGRAVO REGIMENTAL

AGRAVO REGIMENTAL NA REVISÃO CRIMINAL N!! 511 - RJ

(Registro n!! 88462987)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro William Pattersol1

Agravante: Mateu Sbabo Negri

Agravada: Justiça Pública

Advs. Drs.: Alfredo Nobre de Lima e Divino Ferreira de Faria

EMENTA: Penal. Revisão criminal. Acórdão do TFR. Competência.

As revisões criminais propostas contra decisões do ex­tinto TFR são da competência do Tribunal Regional Federal respectivo (art. lOS, I, e, da CF, clc o § 10, do art. 27, do ADCT).

Agravo Regimental desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao agravo, na forma do relatório e notas taquigráficascons­tantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 05 de outubro de 1989 (data do julgamento).

Ministro JOSÉ DANTAS, Presidente. Ministro WILLIAM PATTER­SON, Relator.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 439-442, ago. 1990. 441

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO WILLIAM PATTERSON: Mateu Sbabo Negri, inconformado com o despacho que proferi acerca da competência para o julgamento da Revisão Criminal n!! 511-RJ (TFR), pede reconsideração do mesmo, ou em caso contrário que seja a presente petição recebida como agravo regimental.

Alega que a decisão deu restrita e gramatical interpretação ao texto constitucional que invoca, deixando de aplicar o disposto no art. 108, inciso I, letra b, da Lei Fundamental, além de inobservar as regras contidas nos arts. 10, III, e 24, parágrafo único do Ato Regimental n!! 1.

Inexistindo motivação para a reconsideração solicitada, recebo o pedido como agravo regimental, submetendo-o a julgamento desta Egrégia Terceira Seção (art. 259 do RI).

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO WILLIAM PATTERSON: O despacho im­pugnado, de minha lavra, está arrazoado nestes termos (lê fls. 4/5).

A simples leitura do ato atacado é o bastante para demonstrar que a argumentação que compõe este agravo não merece prosperar, pois já refutada no citado despacho, ajustado, aliás, ao texto constitucional em vigor, ao Regi­mento Interno deste STJ e à orientação jurisprudencial pertinente ao assunto. Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.

EXTRA TO DA MINUTA

Agravo Regimental na Revisão Criminal n!! 511 - RJ - (Reg. n!! 88462987) - Relator: Exmo. Sr. Ministro WilIiam Patterson. Agravante: Mateu Sbabo Negri. Agravada: Justiça Pública. Advogados: Drs. Alfredo de Lima e Divino Ferreira de Faria.

Decisão: A Seção, por unanimidade, negou provimento ao agravo (Em 05.10.89 - 3~ Seção).

Votaram de acordo com o Exmo. Sr. Ministro Relator, os Exmos. Srs. Ministros Flaquer Scartezzini, Costa Lima, Carlos Thibau, Dias Trindade, Assis Toledo, Edson Vidigal e Anselmo Santiago. Ausente por motivo justi­ficado o Exmo. Sr:Ministro Costa Leite. Licenciado o Exmo. Sr. Ministro José Cândido. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro JOSÉ DANTAS.

442 R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 439-442, ago. 1990.

SUSPENSÃO DE SEGURANÇA - AGRAVO REGIMENTAL

AGRAVO REGIMENTAL NA SS NQ 15 - PA

(Registro nQ 9000034523)

Relator: O Exmo. Sr. Ministro Torreão Braz Agravante: Sindicato das Empresas de Transportes de Passageiros de

Belém - Setrans - Bel Agravado: R Despacho de fls. 33/35 Advogados: Drs. Cláudio Lacombe e outros e Ophir Filgueiras Caval­

cante Júnior e outro

EMENTA: Suspensão de liminar em mandado de segu­rança.

Seu cabimento, nos termos do art.4~ da Lei n~ 4.348/64, quando da execução da medida acautelatória puder resultar grave lesão à economia e à segurança públicas.

Agravo a que se nega provimento.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, à unanimidade, negar provimento ao agravo, na forma do relatório e notas taquigráficas cons­tantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Custas, como de lei.

Brasília, 28 de junho de 1990 (data do julgamento).

Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, Presidente. Ministro TOR­REÃO BRAZ, Relator.

R. sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 443-453, ago. 1990. 445

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO TORREÃO BRAZ (Vice-Presidente): Ao apreciar pedido de suspensão de liminar, formulado pelo Estado do Pará, proferi o seguinte despacho:

446

"Vistos, etc.

O Estado do Pará requer a suspensão de execução de liminar concedida pelo relator de mandado de segurança impetrado, no Tribunal de Justiça local, pelo Sindicato das Empresas de Trans­portes de Passageiros de Belém.

Diz que referida liminar autorizou o reajuste das tarifas dos transportes coletivos de Belém, tomando como base o índice de inflação de março de 1990, medido pela variação do IPC, no percentual de 84,32%, aduzindo:

"O Plano de Estabilização Econômica do Governo Federal visou, basicamente, expulsar a danosa inflação da vida da popu­lação brasileira partindo da premissa de suspensão dos reajustes de preços de mercadorias e serviços em geral.

Sob esse prisma, a partir da edição da Medida Provisória n!!154 - o que foi confirmado com a publicação da Lei 8.030, de 12.04.90, que ratificou a citada MP - criou-se, sob a exclusiva supervisão do Ministério da Economia, Fazenda e Planejamento, um mecanismo novo de reajuste de preços e serviços em geral, deixando-se de lado a possível inflação ocorrida em março de 1990, no percentual de 84,32%.

Como não poderia deixar de ser, tal medida, obviamente, restringiu o poder dos trabalhadores, portanto, também, não foi repassado aos salários o reajuste de 84,32%, correspondente, segundo o IPC, à inflação de março/90.

Assim, o Plano de estabilização estabeleceu duas premissas básicas: a)vedação de reajustes de preços de mercadorias e ser­viços em geral e b)manutenção dos salários praticados em mar­ço/90. Em outras palavras, a não concessão para ambos da inflação ocorrida em março de 1990.

Ao mesmo tempo, como referido antes, conferiu, com ex­clusividade, ao Ministério da Economia, Fazenda e Planejamen­to, poderes para, em casos específicos, autorizar esse ou aquele reajuste fora das linhas mestras do Plano, desde que não compro­metesse o Plano como um todo."

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 443-453, ago. 1990.

Assevera que a cautela increpada, além de contrariar medida provisória que proíbe a concessão de liminares em hipóteses comprometedoras do Plano de Estabilização, causará grave lesão à ordem, à segurança e à economia públicas, visto que repassa aos trabalhadores um percentual que não foi incorporado aos seus salários, criando, com isso, situação capaz de gerar reações agres­sivas da comunidade, de difícil controle e resultados imprevisí­veis.

E remata:

"Por último, ainda que não fosse o caso de comprometer o Plano de Estabilização Econômica, o que se admite por hipótese, a atitude do Exmo. Sr. Desembargador de fazer às vezes do Exmo. Governador do EstadÓ do Pará representaria, no mínimo, invasão de competência, configurando-se, assim, a ilegalidade e abuso de poder.

Com efeito, em nosso regime constitucional, os três poderes - Executivo, Legislativo e Judiciário - são harmônicos e inde­pendentes, não podendo um invadir a esfera de competência do outro.

Nessa ordem de pensar, o poder Judiciário, quando chamado a se manifestar sobre o ato do Executivo, só tem competência de fazê-lo naquilo que diz respeito à sua legalidade, sem nunca interferir no mérito de sua conveniência ou oportunidade.

Ora, se o Governador do Estado do Pará, a quem incumbe fazer as concessões dos transportes coletivos para particulares, por entender que o reajuste a ser concedido não atende os inte­resses da coletividade, verdadeira e única mandatária, dentro dos critérios de conveniência e oportunidade, pode deixar de aplicar esse ou aquele reajuste reclamado pelas concessionárias. Se pode ele, inclusive, dar por finda as concessões ou desapropriar as empresas de transportes coletivos, porque não poderia de poder, atendendo determinada e relevante circunstância, como a impos­sibilidade de a população arcar, sem comprometer sua renda familiar, com um reajuste não incorporado ao salário, de não conceder o reajuste pretendido?"

. Ouvida, a Subprocuradoria Geral da República opinou pelo deferimento do pedido.

A decisão sob censura inegavelmente afronta medida pro­visória, com força de lei, proibitiva da concessão de liminar em casos tais, medida cuja constitucionalidade tenho como evidente,

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 443-453, ago. 1990. 447

eis que não tolhe o exercício de direito assegurado pela Carta Magna, inclusive o direito de acesso ao Judiciário (CF, art. 5Q,

XXXV).

O importante a considerar, no entanto, é que ela criou ino­portuna e reprovável exceção à política mediante a qual o Gover­no da República busca encontrar solução para o angustiante problema da inflação no País, e de tal modo que ela certamente se tomará inviável na eventualidade de reiterada repetição de atos judiciais dessa natureza.

Esse fato, per se, obviamente,já é apto a produzir ahirmante desestabilização na economia pública e poçlerá motivar a resis­tência e a ira dos usuários cuja reação, gerando conflitos, se refletirá diretamente no sossego e na segurança da coletividade.

Do quanto foi exposto, com fundamento no art. 4Q da Lei nQ

4.348/64, defiro o pedido e suspendo a execução da medida liminar."

Irresignado, manifesta agravo regimental o Sindicato de Empresas de Transporte de Passageiros de Belém, aduzindo:

448

"A suspensão de segurança, concedida definitiva ou limi­narmente, tem como pressuposto a "grave lesão à ordem, à segu­rança e à economia públicas". Sobre a existência dessa grave lesão ou simples perspectiva de sua ocorrência, o pedido é lacô­nico em fundamentação e parcimonioso em informação. A esse respeito, limita-se o Estado a dizer que a decisão impugnada "além de violar a Lei 8.030/90 causa sérios transtornos a ordem, à segurança e à economia públicas, porquanto restringe ainda mais o poder dos assalariados ... fato esse capaz de gerar sérios conflitos ... "

Ora, a redução do "poder dos assalariados" não chega a comprometer gravemente a economia pública, a não ser que elimine o seu poder de compra de bens essenciais com reflexo em todos os setores de atividades produtivas. O plano econômico do Governo Collor operou brutal redução desse poder, em bene­fício da economia pública.

A grave lesão à economia pública só poderia caracterizar-se, se da concessão da segurança decorresse o colapso de pelo menos um determinado setor de atividade, fosse afetado o regular fun­cionamento dos serviços públicos ou o exercício das atribuições das autoridades constituídas, com prejuízo do comportamento normal dos cidadãos.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 443-453, ago. 1990.

Aqui, nada disso aconteceu e os supostos conflitos, que poderiam resultar da medida, em conseqüência da restrição do "poder dos assalariados", não aconteceram, como é fácil verificar pela leitura dos jornais de Belém (docs. 1 a 5). O r. despacho agravado não pode sustentar-se, assim, pelo seu primeiro funda­mento, uma suposição desmentida pelos fatos."

Em seguida, diz não poder ficar sem registro o segundo fundamento da decisão agravada, consoante o qual "o despacho impugnado "afronta" a medida provisória que proibiu a concessão de liminar contra o Plano Collor".

E argumenta:

"A medida provisória em apreço é, d.v., uma afronta, sim, ao Poder Judiciário, agredindo ostensivamente a garantia da ju­risdição afirmada no art. 5!2, XXXV, da Constituição. Parece evidente, d.v. do r. despacho agravado, que ao assegurar o acesso ao Judiciário, a Constituição assegura, também, a este Poder a atribuição de reparar a lesão que lhe for denunciada, sob pena de a garantia constitucional ficar reduzida a umflatus voeis. A atua­ção do Judiciário não pode ser platônica ou de simples registro: há lesão mas não posso repará-la. É ao Juiz que cabe, em cada caso concreto, avaliar a necessidade de impedir que a lesão se consume, de limitá-la ou eliminá-Ia imediatamente, conforme a hipótese."

Pede, por fim, a reforma da decisão agravada e a restauração da liminar concedida.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO TORREÃO BRAZ (Vice-Presidente): A decisão agravada não se abordou, como sugere o agravante, na norma legal, recentemente editada, que proíbe a concessão de liminar, em mandado de segurança ou ação cautelar, contra o Plano de Estabilização Econômica Na­cional.

Trata-se apenas de argumento a [atere, que exprime o pensamento do seu prolator, mas não pode ser erigido em motivação ou razão de decidir, a teor mesmo do disposto no art. 4!2 da Lei n!2 4.348/64. Por tal circunstância, não me sinto na obrigação de expor as bases em que assenta o meu entendimento quanto a esse ponto específico.

O seu fundamento único consistiu no risc0 de grave lesão à economia e à segurança públicas que decorreria da execução da medida liminar, conforme se lê no tópico a seguir transcrito, verbis:

R. Sup. Trih. Just., Brasília, 2(12): 443-453, ago. 1990. 449

"O importante a considerar, no entanto, é que ela criou inoportuna e reprovável exceção à política mediante a qual o Govemo da República busca encontrar solução para o angustiante problema da inflação no País, e de tal modo que ela certamente se tomará inviável na eventualidade de reiterada repetição de atos judiciais dessa natureza.

Esse fato,per se, obviamente,já é apto a produzir alarmante desestabilização na economia pública e poderá motivar a resis­tência e a ira dos usuários, cuja reação, gerando conflitos, se refletirá diretamente no sossego e na segurança da coletividade".

Assinale-se, em resposta à alegação do agravante, que a suspensão da providência acautelatória não se justifica somente quando perpetrado o dano, contentando-se a lei, como se infere da dicção do citado art. 4!!, com a possi­bilidade da sua ocorrência, ou seja, com a potencialidade que essa providência possui de causar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas.

No caso concreto, os recortes de jomais em anexo ao pedido estampam cenas de violência nas ruas de Belém e servem a demonstrar que a decisão agravada matou no nascedouro a insatisfação e os surtos de revolta da popu­lação em escala generalizada.

Nego provimento ao agravo.

VOTO - VISTA

O EXMO. SR. MINISTRO BUENO DE SOUZA: Sr.'-:Presidente, pedi vista destes autos de agravo regimental para mais amplo esclarecimento a propósito do alcance da r. da decisão agravada, ao deferir a suspensão do despacho liminar proferido pelo Sr. Desembargador-Relator de mandado de segurança originariamente impetrado perante o Tribunal de Justiça do Estado do Pará. Prende-se o feito a mandado de segurança impetrado por sindicato de empresas de transporte, sindicato este que obteve liminar garantindo-lhe re­ajustamento de tarifas, a despeito de medida provisória govemamental voltada a impedir tal providência.

No r. despacho agravado, que me levou a maior reflexão, consta o tópico seguinte:

450

"O plano de estabilização econômica do Govemo Federal visou, basicamente, expulsar a danosa inflação da vida da popu­lação brasileira partindo da premissa de suspensão dos reajustes. de preços de mercadorias e serviços em geral. Sob esse prisma, a partir da edição da Medida Provisória n!.! 154 - o que foi

R. Sup. Trib. Jus!., Brasília, 2(12): 443-453, ago. 1990.

confirmado com a publicação da Lei 8.030, de 12.04.90, que ratificou a citada MP - criou-se, sob a exclusiva supervisão do Ministério da Economia, Fazenda e Planejamento, um mecanis­mo novo de reajuste de preços e serviços em geral, deixando-se de lado a possível inflação ocorrida em março de 1990, no per­centual de 84,32%.

Assim, o Plano de estabilização estabeleceu duas premissas básicas: a)vedação de reajustes de preços de mercadorias e ser­viços em g~ral b) manutenção dos salários praticados em mar­çoj90. Em outras palavras, a não concessão para ambos da inflação ocorrida em março de 1990.

Ao mesmo tempo, como referido antes, conferiu, com ex­clusividade, ao Ministério da Economia, Fazenda e Planejamen­to, poderes para em casos específicos, autorizar esse ou aquele reajuste fora das linhas mestras do Plano, desde que não compro­metesse o Plano como um todo."

Alude S. Ex!!, portanto, ao decreto liminar cuja suspensão se pleiteou, quando assim se expressou:

"Ele afrontaria medida provisória, com força de lei, proibi­tiva de concessão de liminar em casos tais. Medida cuja consti­tucionalidade tenho como evidente, eis que não colhe o exercício de direito assegurado pela Carta Magna, inclusive o de acesso aos Tribunais (Constituição, art. 5!!, 35)."

Por ocasião da assentada de julgamento deste agravo regimental, S. Ex!!, o Sr. Ministro Torreão Braz, acrescentou a sua sustentação da decisão agrava­da, ocasião em que anotou em seu d. voto o seguinte:

"A decisão agravaclla não se abordou, como sugere o agra­vante, na norma legal, recentemente' editada, que proíbe a con­cessão de liminar, em mandado de segurança ou ação cautelar, contra o Plano de Estabilização Econômica Nacional.

Trata-se apenas de argumento a [afere, que exprime o pen­samento do seu prolator, mas não pode ser erigido em motivação ou razão de decidir, a teor mesmo do disposto no art. 4!! da Lei n2

4.348, de 1964." .

Dai que S. Ex!! acrescentou não se sentir constrangido a justificar este seu entendimento, tanto mais que "o fundamento único da decisão agravada con­sistiu na consideração do risco de grave lesão à economia e à segurança públicas, que decorreria da execução da medida liminar".

Sinto-me, então, suficientemente esclarecido para poder pronunciar-me, o que faço, ficando de acordo com o Sr. Ministro Torreão Braz, Relator,

R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 443-453, ago. 1990. ·451

porquanto me capacito de que, ao assim decidir, não me comprometo com o entendimento concernente à compatibilidade da medida provisória sobre de­cretos liminares com a Constituição.

Estou, aliás,. suficientemente esclarecido de que o Supremo Tribunal Federal, em ação direta de inconstitucionalidade intentada contra a medida provisória, não se adiantou, de nenhum modo, sobre a compatibilidade dessa providência com a Constituição, desde que se li mitou a considerar que, quando de sua decisão sobre o pedido de liminar, faltavam apenas poucos dias para que a medida provisória fosse apreciada pelo Congresso Nacional; que não era, por isso, oportuno decidir sobre o assunto que, em tão breve tempo, seria considerado pelo órgão destinatário constitucional da medida provisória; que não lhe parecia emergir da medida tão grave que reclamasse providência urgente do Supremo, a título de liminar; e que os Juízes de Direito em geral estavam (como estão) livres de considerar as concretas solicitações de limina­res, segundo lhes possa parecer que devam decidi-las de acordo com o princí­pio constitucional da independência dos juízes, a despeito mesmo da existência da discutida medida provisória.

Daí ter entendido o Supremo Tribunal Federal que não se recomendava a concessão da liminar, como que a avocar para a sua decisão as pretensões liminares em mandados de segurança ou ações cautelares porventura intenta­das nos mais diversos foros da União, contra a medida provisória.

Não se tem notícia, portanto, de qual seja o pensamento do Supremo Tribunal Federal sobre a possibilidade de convívio dessa medida provisória com a Constituição, que, sem ainda me adiantar de modo definitivo com a apreciação do mérito, observo, contudo, ter assumido feição bem diversa daquela de que se. revestia na Constituição anterior, porquanto art. 52, XXXV, diz que "a lei não e.xcluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". Note-se que as constituições anteriores não aludiam à ameaça. E se é verdade que leis existem retirando, em detenninados casos, o poder de decreto liminar judicial em certos mandados de segurança, também é verdade que estas leis são anteriores à Constituição que hoje vigora.

Mas, tanto quanto fez o Sr. Ministro Torreão Braz, também penso que é prematuro adiantar nosso pensamento sobre o tema. Cuidei apenas de explici­tar que, efetivamente, a suspensão da liminar concedida em segurança, defe­ridá pelo Sr. Ministro Torreão Braz, não se baseou no entendimento de que essa liminar fosse juridicamente impossível, por causa da medida provisória.

Explicitado como se acha este entendimento, e tendo em vista que não ficou suficientemente patenteado no mandado de segurança originalmente intentado no Tribunal de Justiça do Estado do Pará a necessidade da liminar ali concedida pelo eminente Relator da segurança, o presente agravo não se recomenda ao provimento.

E, assim, acompanho os doutos votos que me antecederam.

452 R. Sup. Trib. Just., Brasília, 2(12): 443-453, ago. 1990.

EXTRATO DA MINUTA

Ag. Reg. SS n!:! 15 - PA - (Reg. n!:! 90.34523) - Relator: Exmo. Sr. Ministro Torreão Braz. Agravante: Sindicato das Empresas de Transportes de Passageiros de Belém - SETRANS - BEL. Agravado: R. Despacho de fls. 33/35. Advogados: Drs. Cláudio Lacombe e outros, Ophir Filgueiras Caval­cante Júnior e outro.

Decisão: Prosseguindo no julgamento, a Corte Especial, por unanimida­de, negou provimento ao agravo (Em 29.06.90 - Corte Especial).

Os Exmos. Srs. Ministros William Patterson, Bueno de Souza, José Cândido, Pedro Acioli, Américo Luz, Flaquer Scartezzini, Costa Lima, Geral­do Sobral, Carlos Thibau, Costa Leite, Nilson Naves, Eduardo Ribeiro, Dias Trindade, José de Jesus, Assis Toledo, Edson VidigaJ, Garcia Vieira e Athos Carneiro votaram com o Exmo. Sr. Ministro Relator. Impedido o Exmo. Sr. Ministro Gueiros Leite. Os Exmo. Srs. Ministros Pádua Ribeiro e limar Galvão não compareceram à Sessão, por motivo justificado. Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro ARMANDO ROLLEMBERG, em razão da ausência ocasional do Exmo. Sr. Ministro Washington Bolívar.

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