Educação Patrimonial em Paderne: ambiente e cultura
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Educação Patrimonial em Paderne: ambiente e cultura*
Patrícia Santos Batista
Câmara Municipal de Albufeira – Museu Municipal de Arqueologia, Albufeira,
Portugal
*Comunicação apresentada no: “I Congreso Internacional de Patrimonio y Educación, 22, 23 y 24 de mayo de 2014.
Facultad de Ciencias de la Educación. Universidad de Granada”. Link de acesso às pré atas:
http://www.patrimonioyeducacion.com/images/enseanza_y_patrimonio-estado_de_la_cuestion.pdf
Resumo
Em Paderne (concelho de Albufeira) localiza-se um importante monumento, o castelo
de Paderne, um hîsn do século XII em taipa militar. A sua envolvente também constituí
um elemento patrimonial significativo, do ponto de vista natural. Percebe-se então, que
a paisagem representa um elemento-chave na interpretação deste território e dos seus
marcos patrimoniais.
Nos últimos anos, duas áreas dentro da autarquia, Ambiente e Cultura, que trabalhavam
de forma independente, mas que abordavam um mesmo território, começaram a juntar
esforços e a trabalhar em conjunto, permitindo uma interpretação mais completa do sítio
em causa.
Realizam-se regulamente saídas de campo a esta zona onde se estabelece a relação entre
recursos naturais e o património cultural, do qual o castelo de Paderne é, sem dúvida, o
ex-líbris. Permite-se o contacto direto com o património e estimula-se a educação do
olhar, o “saber olhar”, numa (re) descoberta constante da paisagem e das histórias que
ela nos conta.
Palavras-chave: Paisagem, Património e Educação
2
Abstract
In Paderne (Albufeira county) finds an important monument, called Castelo de Paderne
a twelfth-century military fortress made in taipa (rammed earth). It’s natural
surroundings is also an important heritage element. It can be easily understood that the
landscape is a key element in the interpretation of this area and its heritage landmarks.
In recent years, two different municipality departments, Environment and Culture, who
worked independently in the same territory, began to join forces and work together,
allowing a more complete interpretation of the site concerned.
Frequently are made field trips in which establishes the relationship between natural
resources and cultural heritage, having the Castelo de Paderne the main role. In those
field trips allows the direct contact with the heritage and promotes the "knowing look"
education, in a (re) discovery of the landscape and the stories that it tells.
Key-words: Landscape; Heritage and Education
3
1. O TERRITÓRIO: PATRIMÓNIO E PAISAGEM
A zona onde se localiza o Castelo de Paderne - marco paisagístico por excelência na
nossa análise – corresponde a um meandro bem delimitado do percurso da Ribeira de
Quarteira1. Este foi implantado, estrategicamente, num esporão com 92 m de altitude,
situado a cerca de 2 Km sul da atual povoação de Paderne2.
É o monumento mais importante do concelho de Albufeira, classificado de Imóvel de
Interesse Público em 1971 (Decreto n.º 516/71 DG, 1.ªsérie, n.º 274 de 22 novembro
1971) e Zona Especial de Proteção de 1999 (Portaria n.º 978/ 99), dada a sua
importância enquanto testemunho histórico e arqueológico da ocupação islâmica neste
território.
1. Planta de implantação do Castelo de Paderne. Cedida por Luís Campos Paulo. CMA.
Trata-se de um hîsn, isto é, de uma pequena fortificação rural, em taipa militar, do
século XII3, período Almóada, tendo sido utilizada na sua construção um único
processo construtivo, a já referida taipa militar4. Apresenta planta de forma sub-
trapezoidal e único vão de acesso ao interior, defendido por torre albarrã (do árabe al-
barrãn – «de fora, no exterior») ligada à muralha por passadiço.
4
A principal preocupação dos almóadas quando chegaram à península foi garantir a
defesa do seu território face ao avanço cristão para sul. É neste contexto, que surge a
necessidade de construir e recuperar os dispositivos militares existentes, a preocupação
de criar uma rede de fortificações, não somente urbanas, mas também rurais, nas quais
se integra o Castelo de Paderne, localizado numa zona que permitia o controlo de uma
importante passagem entre o Barrocal e o Litoral algarvio, entre duas importantes
cidades: Silves e Loulé.
A necessidade construtiva e a sua urgência faziam da taipa o material ideal, pois era um
material acessível, fácil de trabalhar e resistente. A taipa é constituída por terra húmida
comprimida entre taipais móveis de madeira, formando, pela sua secagem e após a
retirada daqueles, paredes ou muros homogéneos e monolíticos.
No caso concreto de Paderne, a taipa é composta por uma fina argamassa com inertes
triturados e pequenos seixos da ribeira, que lhe confere uma enorme consistência, com
uma forte componente de cal.
Quanto ao exterior a superfície de taipa apresenta-se bem alisada, sendo visíveis os
orifícios dos taipais de madeira e a separação entre as cofragens. Nesta separação das
cofragens são ainda observáveis traços pintados a branco, em bandas horizontais e
verticais, a imitar falso aparelho de grandes silhares.
2. Castelo de Paderne. Foto: Patrícia Batista. 2013
5
1.1. Paisagem
A paisagem constituí o suporte da vida do homem e este último assume-se como agente
fundamental na transformação e criação de paisagens, daí que Jorge Gaspar5 refira que
“… o regresso à paisagem não é só apanágio da Geografia, manifesta-se em vários outros
domínios onde é necessário apreender a luz, as formas, os ambientes, para compreender os
lugares e o sentido do espaço e do tempo…” abordando, deste modo as suas diversas
dimensões, com particular enfoque para a sua realidade física, mas sobretudo enquanto
construção social, e consequentemente, cultural, embora nem todas as paisagens
humanizadas, isto é, com marca da ação do homem, sejam necessariamente, paisagens
culturais. Estas últimas encerram em si valores memoriais, uma herança que se pretende
preservar.
Existem nesta paisagem marcos que testemunham a exploração dos recursos naturais,
que por sua vez se irão repercutir, diretamente, no modo de vida das pessoas que aí
vivem e viveram.
Esta zona do Barrocal algarvio é uma zona fértil, como o comprovam os campos
agrícolas aí existentes e tem abundância de água (Ribeira de Quarteira e a Fonte de
Paderne).
A água é um elemento preponderante para a fixação de população, sobretudo em épocas
mais antigas, daí que se considere um elemento incontornável na construção desta
paisagem, a começar pela presença de arquiteturas de produção a ela associadas como
as azenhas; as noras, ou outros sistemas de captação de água destinados à rega das
produções agrícolas de regadio, inovações introduzidas neste território, precisamente
pelos muçulmanos.
3. Antiga Nora. Paderne. Foto: Patrícia Batista. 2014
6
A riqueza botânica e faunística da zona também determinaram a permanente ocupação
do espaço, ainda que no interior do castelo esta tenha sido apenas até ao século XVI,
como o compravam os níveis de ocupação medieval cristãos aqui encontrados no
decorrer das várias campanhas arqueológicas.
Predominam árvores como a alfarrobeira6e a oliveira, os arbustos como o carrasco, o
zambujeiro, o lentisco, o medronheiro e a palmeira anã, também conhecida como
palmeira das vassouras ou apenas como palma, a partir da qual se fabricavam vassouras,
tapetes, alcofas entre outros trabalhos de palma ou empreita, uma atividade tradicional
do Algarve, atualmente em desuso.
Diversas espécies eram aproveitadas para tarefas do quotidiano, até há relativamente
pouco tempo, em particular pelas pessoas do meio rural, que continuavam a usar as
canas para os telhados das suas habitações; ou o tojo para chamuscar o porco aquando
da matança; ou até mesmo as folhas da mariola (Phlomis purpúrea) para lavar a loiça.
A localização do castelo neste local, deve-se à riqueza da sua envolvente e à sua
importância estratégica, num ponto alto, devido à necessidade de defesa. Estes dois
aspetos são indissociáveis da história deste monumento. Daí que uma visita ao castelo
sem um olhar atento à sua envolvente será sempre uma visita incompleta, ou vice-versa.
Propõem-se então uma descoberta da paisagem com especial atenção para as espécies
naturais, bem como para os marcos patrimoniais (para além do castelo, merece
igualmente destaque a ponte7 ou a dita azenha do Castelo
8) que testemunham a
utilização e exploração dos recursos daquela zona desde há séculos. Sendo que é neste
contexto que surge a educação patrimonial, enquanto forma de mediação entre
património (cultural e natural) e as comunidades.
7
2. EDUCAÇÃO PATRIMONAL COMO PROCESSO DE MEDIAÇÃO
“Ninguém educa ninguém, ninguém se educa a si mesmo, os homens se educam entre si,
mediatizados pelo mundo.”
Paulo Freire – Pedagogia do Oprimido
A educação patrimonial pode encerrar em si processos educativos formais e não
formais, devendo caracterizar-se por uma prática continuada, sistemática, cuja base, ou
“matéria-prima” é o património, seja este cultural ou natural.
A prática educativa implementada nesta zona assume o território como “o local perfeito
para promover e incentivar a consciencialização para o património natural, cultural e
artístico”9 e uma vez que aprender é encarado, cada vez mais, como um processo de
longa duração (lifelong learning), que nos acompanha ao longo da vida, os espaços e as
experiências que vivenciamos são elas mesmas potenciadoras de aprendizagens, pelo
que importa sublinhar e estimular a função educativa do território, da paisagem,
potenciada pela presença de valores patrimoniais autênticos e de uma experiência
multissensorial: visual, táctil, auditiva10
e até olfativa.
A educação patrimonial é tida como um processo de mediação, em que o papel do
educador é o de facilitador. A proposta de atuação é sempre a de descoberta e o de
“educar” o olhar. O património está ali, falta apenas o questionamento que leva à
“descoberta”, ou seja ao conhecimento!
Estabelece-se uma relação de cumplicidade entre público e património através do
desvendar dos seus significados. O papel do mediador é ligar pontos, estabelecer
relações tornando o acesso ao património mais fácil, dando-lhe novos sentidos, novas
interpretações, construindo novas significâncias.
A importância deste sítio, quer do ponto de vista histórico, quer do ponto de vista
natural, como já referido anteriormente, fez com que duas estruturas distintas dentro da
autarquia de Albufeira criassem programas educativos de exploração da zona em
estudo. Por um lado o ambiente, abordando as questões ligadas à natureza e por outro a
8
cultura que, essencialmente, se focava em divulgar o Castelo de Paderne através de
visitas ao recinto.
A continuidade do trabalho desenvolvido no terreno, nomeadamente com algumas
saídas de campo, visitas com grupos de idosos da zona e o reconhecimento da inter-
relação entre espaço e história e, por sua vez, entre recursos naturais e cultura, fez com
que o trabalho feito de forma individual desse lugar a uma colaboração e cooperação
estreita entre os responsáveis pela educação ambiental da Câmara Municipal de
Albufeira e os do serviço educativo do Museu de Arqueologia de Albufeira (cultura).
De forma informal, numa conversa entre colegas, concluiu-se que seria muito mais
vantajoso para todos os envolvidos fazer as atividades em conjunto, para além de
permitir, também, uma melhor distribuição de recursos afectos às atividades em
Paderne, que requerem deslocação em viaturas da autarquia, permitindo reduzir custos;
possibilita uma interpretação muito mais completa daquela realidade e das estreitas
relações que decorrem do modo de vida e das condições naturais de um território. Por
outro lado, percebeu-se que é através desta mediação entre património e
comunidade(s)11
que é possível o reconhecimento do património, a sua valorização e,
consequentemente, a sua proteção. Não há melhor “guardião” do património do que os
seus criadores e detentores (a comunidade).
Parafraseando Hugues de Varine, que defende um património ao serviço do
desenvolvimento local: “Todo território determinado sem o respeito por seus componentes
patrimoniais não poderá servir de base para um desenvolvmento local equilibrado e
sustentável. Esse quadro patrimonial compreende a paisagem, os fatores favoráveis ou
desfavoráveis à vida dos homens e às suas atividades sociais e econômicas. Compreende
também a linguagem, as crenças, os ritmos da vida cotidiana...”12
, o território e os seus
valores patrimoniais são as gentes e costumes de um local, neste caso de Paderne!
É de todo impossível separar o natural do cultural. Os usos dados às ervas para fins
medicinais, ou culinários, são elementos defindores de uma cultura, refletem um
conhecimento, um “saber-fazer” que tem por base a realidade e a existência de
determinadas espécies no território. Estes saberes transmitem-se de geração em geração
(aspetos que se inserem no Património Cultural Imaterial - PCI). A estas práticas
9
associam-se as crenças, dizeres e ditados populares. Tanto que há quem diga que “a
cozinha é a paisagem posta na panela”13
, expressão bem representativa da simbiose
entre paisagem (património natural) e homem (património cultural).
Reconhecido o potencial desta articulação de trabalho educativo com base no
património cultural e natural, adotou-se uma metodologia de diálogo pró-ativo, através
do questionamento e reflexão dos valores patrimoniais observados in loco; papel ativo
por parte dos visitantes na descoberta e construção das interpretações da paisagem,
estímulo do uso e exploração dos sentidos (observar; cheirar, ouvir, tocar); recurso a
alguns materiais pedagógicos, que embora seja muito simples complementam alguns
aspetos mais abstratos, o que é importante, em particular para o público mais novo e
dinamização de momentos de jogo ao longo do percurso.
O trajeto feito habitualmente14
tem cerca de 3 kms. As saídas de campo têm lugar entre
os meses de Março e de Abril, uma vez que é a época de maior floração, permitindo a
observação de diversas espécies de flora de rara beleza (valor estético da paisagem),
como é o caso das orquídeas selvagens que aqui florescem em abundância.
4.Orquídea - Ophrys apifera. Foto: Ricardo Pereira.
No que à fauna diz respeito a observação é mais difícil, no entanto é comum o
avistamento de algumas aves que fazem desta zona o seu habitat, tais como o falcão
peneireiro (Falco tinnunculus) ou a garça-boieira (Bubulcus íbis). Os mamíferos são
10
mais difíceis de encontrar, devido aos seus hábitos noturnos, mas há registo de lontras,
doninhas, do morcego-rato-pequeno e do ouriço-cacheiro. A ictiofauna é bastante
abundante, sendo possível encontrar: lampreia, bordalo, enguia ou boga-de-boca-
arqueada, espécie conhecida vulgarmente pelos locais por pardelha.
2.1. Os públicos
Os públicos-alvo destas iniciativas são, geralmente, grupos per si já criados/
estruturados, como sejam:
- Grupos escolares, do 1.º ciclo ao ensino secundário, embora a esmagadora maioria
sejam turmas do 1.º e 2.º ciclo (dos 6 aos 12 anos); dentro deste ainda se integram os
grupos com algumas dificuldades de aprendizagem (turmas de ensino especial);
- Grupos de Terceira Idade, como de lares ou centros de dia, com seniores ativos e
- Grupos de outras entidades/ instituições, como por vez o Instituto de Emprego e
Formação Profissional (IEFP), a Associação de Apoio à Pessoa Excepcional do Algarve
(APEXA) ou a Associação de Saúde Mental do Algarve (ASMAL).
De um modo geral são estes os segmentos de públicos para os quais se planificam as
atividades educativas. E embora os conteúdos a explorar sejam os mesmos, a atuação do
mediador é diferente de acordo com o tipo de grupo.
2.1.1. Público escolar
Nos grupos escolares há uma enorme preocupação por parte do docente em articular a
saída de campo com os conteúdos disciplinares ensinados, há sempre uma tentação,
digamos assim, de seguir o programa escolar (educação formal); cabe então ao
mediador levar o grupo mais além, incentivando a um pensamento crítico e criativo,
fugindo ao redutor certo ou errado da avaliação escolar, ali isso não existe, todas as
perspetivas são válidas para a discussão, para se chegar ao conhecimento (educação não
formal).
Nestes grupos o questionamento leva à descoberta da paisagem e dos recursos naturais
que ela encerra e que justificam a ocupação daquele território ao longo da história, com
11
particular enfoque para o período islâmico, precisamente devido à presença marcante do
castelo.
Mais do que observar tenta-se educar o olhar, o “saber ver” e interpretar a paisagem,
que fatores contribuíram para a sua atual configuração? Quais os elementos
responsáveis pela modelação da paisagem? Que marcos paisagísticos destacamos?
A experiência é sempre positiva (procede-se à avaliação das atividades através de um
inquérito que é preenchido pelo professor que acompanha a turma) e isso nota-se
facilmente ao longo do caminho através do feedback dados pelos próprios participantes,
cuja excitação culmina na chegada ao castelo. Após a subida (o percurso inicia-se junto
de uma das margens da Ribeira de Quarteira, numa zona mais baixa), a chegada ao
castelo transforma-se num novo assalto àquele hîsn, mas desta feita não pelos cristãos,
mas por jovens ávidos de curiosidade, de perguntas, de inquietações!
2.1.2. Público sénior
Com os seniores a condução da ação educativa é diferente, os mediadores fazem
perguntas apenas para desencadear reações, ou se quisermos, para avivar memórias,
pois a população mais idosa dependia muito mais da natureza do que nós atualmente e
experienciaram aqueles espaços de uma forma completamente distinta daquela que se
faz hoje:
- A ribeira onde as mulheres iam lavar a roupa – memória de uma vida mais dura, com
mais esforço físico, mas era também um local de encontro, de convívio, de partilha de
experiências;
- As ervas aromáticas (que ainda hoje se usa e que estão novamente na “moda”,
sobretudo devido à classificação da dieta mediterrânica como património da
humanidade), que se apanhavam no campo e que agora se compram no supermercado;
- A relação com o castelo que mudou drasticamente nos últimos anos (especialmente a
partir de 1999, quando o imóvel foi adquirido pelo Estado Português).
Grande parte da população mais velha do concelho de Albufeira e em particular, a da
freguesia da Paderne, recorda com alguma nostalgia as grandes festas do 1.º de Maio
que se faziam no interior do castelo, relembram, igualmente, que a porta estava sempre
12
aberta, o castelo podia ser “tomado” pela sua comunidade em qualquer altura… e de
repente fecharam-no e as pessoas, a comunidade sentiu-se excluída do seu património.
5. Grupo sénior em visita ao Castelo de Paderne e envolvente. Foto: Clube Avô. 2012.
A interação estabelecida nestas visitas é riquíssima, sobretudo para os técnicos (os
mediadores) que acompanham as visitas, funcionando como uma excelente aula de
história, que despoleta novas dúvidas e por vezes determina novas áreas de
investigação. Mas também serve para perceber quais as expectativas dos detentores do
património acerca do seu papel na sociedade atual.
2.2. Os números de 2014
Este ano (2014) realizaram-se sete saídas de campo. Uma vez mais a maioria foi de
grupos escolares (6), existindo apenas uma da APEXA, num total de 138 participantes.
13
3. EM JEITO DE CONCLUSÃO
O trabalho de mediação que se desenvolve visa atingir alguns objetivos genéricos:
Preservar e valorizar o património natural – recursos naturais e elementos
naturais de valor excecional;
Promover e valorizar o património cultural, seja ele arquitetónico, arqueológico,
etnológico, material e imaterial;
Reconhecer a paisagem como elemento dinâmico construído pela ação do
homem ao longo do tempo;
Promover a investigação histórica e cultural de Paderne, estimulando assim, a
valorização do território e da sua identidade;
Envolver a comunidade nos processos de valorização patrimonial, criativos e de
desenvolvimento.
Assume-se o último ponto elencado como o principal desafio, pois qual a utilidade e a
mais-valia para os padernenses da existência de um castelo do século XII?! Ou de um
sítio que integra uma rede ecológica de importância europeia?!
O património (natural e cultural) é pertença de uma população, pelo que a sua gestão “
deve ser feita o mais próximo possível dos seus criadores (…) de modo a não separá-lo da
vida”15
, isto é dizer que o património deve servir à vida das pessoas, deve ser útil e não
deve ser encarado como algo cristalizado num tempo ido que apenas consome meios na
sua manutenção.
Deste modo falta, em nosso entender, dar o próximo passo nestas relações já encetadas
com o próprio território e com os públicos (comunidade), fazer da saída de campo
apenas um momento de uma mediação que se quer mais alargada, mais próxima e que
permita a criação de um projeto16
intergeracional em que os públicos escolares
interagem diretamente com os públicos seniores, permitindo a transmissão de
conhecimentos, o convívio entre gerações, que funciona também como um sistema de
inventário ativo e participativo, em que se realiza uma recolha dos valores patrimoniais.
Em última análise considera-se que a educação patrimonial, estando presente em todos
os momentos de valorização patrimonial, representa uma estratégia válida e efetiva de
gestão e salvaguarda dos bens patrimoniais que constituem as “raízes do futuro”17
.
14
NOTAS
1 A bacia hidrografia da Ribeira de Quarteira compreende um troço de cerca 28,7 Km, que atravessa as
três geológicas que constituem o Algarve: Serra, Barrocal e Litoral. A nossa zona de atuação (Paderne)
corresponde ao Barrocal. Esta área da Ribeira de Quarteira apresenta uma grande importância do ponto de
vista botânico e faunístico, integrado na Rede Natura 2000, que é uma rede ecológica europeia para a
conservação dos habitats, da flora e da fauna de importância comunitária. 2 Mário Varela GOMES, Luís Campos PAULO e Sónia Duarte FERREIRA- Levantamento Arqueológico
do Algarve Concelho de Albufeira, Câmara Municipal de Albufeira, 2003, p. 36. 3 Desconhece-se o ano da sua construção, no entanto este é referido, pela primeira vez num documento
escrito de 1189. 4 Natércia MAGALHÃES – Algarve - Castelos, Cercas e Fortalezas (As Muralhas como Património
Histórico), Letras Várias, Edições e Arte, Faro, 2008, p. 40. 5 Jorge GASPAR – “O Retorno da Paisagem à Geografia – Apontamentos místicos”, in: Finisterra,
XXXVI, 72, 2001, p. 84. 6 A alfarrobeira (Ceratonia síliqua L.) foi uma espécie introduzida na Península Ibérica e no Norte de
África pelos muçulmanos. 7 A ponte localiza-se a 200m Sudeste do Castelo de Paderne, sobre a ribeira de Quarteira e é formada por
3 arcos de volta perfeita, defendidos por 2 talha-mares. Sobre o arco central apresenta a data de 1771. 8 Azenha do Castelo localiza-se a Poente do mesmo, junto à ribeira de Quarteira. Trata-se de moinho
fluvial, sendo que a primitiva azenha pode remontar à época medieval. 9 In: A Educação do Museu no Contexto das Funções Museológicas, Cornelia BRUNINGHAUS-
KNUBEL, p. 130. 10
Susana Gomes da SILVA, “Enquadramento teórico para uma prática educativa nos museus”, in:
Serviços Educativos na Cultura, Colecções Públicos n.º 2, Coord. Sara BARRIGA e Susana Gomes da
SILVA, Sete Pás, Porto, 2007, pp. 57-66. 11
Comunidade como um grupo de pessoas que estão unidas por modos de vida comuns e laços afectivos
desenvolvidos por essa mesma convivência vicinal, que se exprime através de uma geometria
sociocultural variável, resultante de uma série de acontecimentos históricos, de sinergias locais e de
formas de relação sociocultural e económica, em constante evolução. 12
In: As Raízes do Futuro. O Patrimônio a serviço do desenvolvimento local, Hugues de VARINE,
Medianiz, 2012, p. 19. 13
Citado por Maria Manuel VALAGÃO, “Identidade e Memória Mediterrânica da Alimentação
Algarvia”, in: Dieta Mediterrânica. Património Cultural Milenar, Câmara Municipal de Tavira, 2013, p.
44. 14
Existem vários percursos pedestres nesta zona. 15
In: Hugues de VARINE, ob. cit., p. 19. 16
Projeto de inventário participativo de trabalho com a comunidade, à semelhança do que se tem
verificado nos ecomuseus italianos, nos últimos anos, que têm desenvolvido “Mappe di comunità”. Estes
são cartas/ mapas construídos através da participação ativa da população de áreas, sobretudo, rurais, que
representam o património ao qual a comunidade atribui valor, com o objetivo de reforçar a identidade
local e como base para projetos de desenvolvimento sustentável. 17
Metáfora que dá nome à obra de Hugues de Varine e que traduz a importância e valor do conhecimento
da história e do passado na planificação do futuro.