Educação como poesia: Tagore e a formação integral do homem

21
EDUCAÇÃO COMO POESIA: TAGORE E A FORMAÇÃO INTEGRAL DO HOMEM Daniel Confortin 1 Resumo: No presente trabalho foi realizada uma revisão de literatura tendo como objetivo expor as principais ideias do polímata indiano Rabindranath Tagore a respeito da educação. Serão abordados os conceitos usados por Tagore na implementação de seus diversos experimentos pedagógicos no início do século XX, as influências que assimilou durante suas várias viagens pelo mundo e principalmente sua abordagem ao currículo escolar. Por fim procuramos evidenciar a relevância do pensamento deste educador indiano tão pouco conhecido no Brasil. Palavras-chave: Rabindranath Tagore, Educação, Currículo, Interculturalidade. Primeiro movimento Operam-se crimes contra a essência de um determinado fenômeno humano passageiro ao não eternizá-lo adequadamente na língua. Especialmente quando se trata daquele que conhecemos como Rabindranath Tagore, antigo 'Gurudev' (mestre divino) indiano, não é de direito cantar sua história na maneira fria e falsamente científica típica deste meio. Então que me perdoem os deuses da normatização, veículo da estreiteza positivista reinante nas mentes, mas coloco-me nesta melodia viva composta pelo poeta bengali como voz tímida no entardecer. Encontrei Tagore pela primeira vez em um sebo de Porto Alegre - RS (quando ainda se visitavam as prateleiras empoeiradas dessas lojas democráticas de sonhos). Era o Gitanjali, sua canção de oferenda, que lhe rendeu o prêmio Nobel a exatos 100 anos. Foi ele que me apresentou as tardes da floresta chuvosa, o som da flauta que impregnava o ar bengali e a corada aldeã com seu jarro cortando os campos cultivados nas cercanias de Calcutá. Mais de uma década depois disso um senhor vestido a moda de Nehru me perguntou em uma rua de Delhi: “Pessoas vem até essa parte do mundo buscando o exotismo da paisagem ou os sonhos da religião, e tu, o que fazes aqui? Quem te trouxe?”. Lembro de não saber como responder ao certo a primeira pergunta, mas não exitei em dizer “Tagore me trouxe até aqui”. Acredito que 1 Bacharel em Design, especialista em Arteterapia e Consultoria Ambiental, estudante de Filosofia e mestrando em Educação.

Transcript of Educação como poesia: Tagore e a formação integral do homem

EDUCAÇÃO COMO POESIA:

TAGORE E A FORMAÇÃO INTEGRAL DO HOMEM

Daniel Confortin1

Resumo: No presente trabalho foi realizada uma revisão de literatura tendo como objetivo expor as principaisideias do polímata indiano Rabindranath Tagore a respeito da educação. Serão abordados os conceitos usados porTagore na implementação de seus diversos experimentos pedagógicos no início do século XX, as influências queassimilou durante suas várias viagens pelo mundo e principalmente sua abordagem ao currículo escolar. Por fimprocuramos evidenciar a relevância do pensamento deste educador indiano tão pouco conhecido no Brasil. Palavras-chave: Rabindranath Tagore, Educação, Currículo, Interculturalidade.

Primeiro movimento

Operam-se crimes contra a essência de um determinado fenômeno humano passageiro

ao não eternizá-lo adequadamente na língua. Especialmente quando se trata daquele que

conhecemos como Rabindranath Tagore, antigo 'Gurudev' (mestre divino) indiano, não é de

direito cantar sua história na maneira fria e falsamente científica típica deste meio. Então que

me perdoem os deuses da normatização, veículo da estreiteza positivista reinante nas mentes,

mas coloco-me nesta melodia viva composta pelo poeta bengali como voz tímida no

entardecer.

Encontrei Tagore pela primeira vez em um sebo de Porto Alegre - RS (quando ainda se

visitavam as prateleiras empoeiradas dessas lojas democráticas de sonhos). Era o Gitanjali,

sua canção de oferenda, que lhe rendeu o prêmio Nobel a exatos 100 anos. Foi ele que me

apresentou as tardes da floresta chuvosa, o som da flauta que impregnava o ar bengali e a

corada aldeã com seu jarro cortando os campos cultivados nas cercanias de Calcutá. Mais de

uma década depois disso um senhor vestido a moda de Nehru me perguntou em uma rua de

Delhi: “Pessoas vem até essa parte do mundo buscando o exotismo da paisagem ou os sonhos

da religião, e tu, o que fazes aqui? Quem te trouxe?”. Lembro de não saber como responder ao

certo a primeira pergunta, mas não exitei em dizer “Tagore me trouxe até aqui”. Acredito que

1 Bacharel em Design, especialista em Arteterapia e Consultoria Ambiental, estudante de Filosofia e mestrando em Educação.

Gurudev concordaria comigo que são impensáveis as repercussões de um contato tão frágil (e

profundo ao mesmo tempo) como esse que se estabelece entre pessoas distantes no tempo e

no espaço catalizado pela poesia.

Este texto é uma espécie de arqueologia mental. Uma forma de entender um pouco

mais o poeta que ocupou grande parte das minhas cartas de adolescente. Tal como Tagore não

tenho boas lembranças do meu processo educativo dentro e fora do contexto escolar. Por isso

decidi explorar os princípios de sua pedagogia bem como a relação entre estes, sua prática e

concepção de currículo aberto. Tendo em vista que é impossível dissociar obra e vida em

Tagore a primeira parte deste trabalho é uma apresentação entre amigos. No decorrer do texto

foi necessário construir algumas pontes ligando oriente e ocidente, evidenciando as principais

influencias que o poeta recebeu no desenvolvimento de sua arte e pensamento. Por fim, com

estes elementos em mãos, poderemos juntos avaliar a relevância deste grande polímata

indiano.

O poeta e o tempo

Tagore foi um dos maiores gênios da humanidade, comparável à Leonardo da Vinci,

Sheakespeare e Goethe. Poeta, músico, romancista, artista plástico, dramaturgo e educador,

venceu o Prêmio Nobel de 1913 por meio da obra Gitanjali (canção de oferenda) e usou todos

os seus recursos disponíveis na educação do homem comum indiano e na defesa de sua

cultura. A herança cultural de Tagore é profundamente enraizada no solo indiano e tem poucos

paralelos na história recente. Em seu documentário de 1961 sobre a vida de Rabindranath

Tagore, Satyajit Ray, um dos maiores cineastas da história da Índia, abre a primeira cena com

o cortejo fúnebre do poeta e o seguinte texto:

No segundo dia de Agosto de 1941, na cidade de Calcutá, um homem morreu.

Seus restos mortais se foram, mas ele deixou para trás uma herança que nenhum

fogo consumirá. É uma herança de palavras, música e poesia, de ideias e ideais.

Essa herança teve o poder de nos mover, nos inspirar. Hoje e nos dias que virão

nós, que lhe devemos tanto, saudamos sua memória.

Tal memória tem início no século XIX, precisamente no ano de 1861, uma época de

tremenda turbulência na história indiana. Alguns anos antes de filmar o referido documentário

como homenagem ao centenário do nascimento de Tagore, entre 1955 e 1959, o mesmo

Satyajit Ray realiza a “Triologia de Apu” que conta (mesmo com certa distância temporal)

qual era a situação política, econômica e cultural das terras que circundam a Baía de Bengala

no leste indiano. Os filmes contam a história de uma família bengali envolta pela má sorte que

tem como grande esperança a chegada do filho Apu. No segundo filme da triologia

(Aparajito, 1956, distribuído no Brasil pela Silver Screen) após perder o pai, Apu e sua mãe

deixam a cidade sagrada de Benares e rumam para a região rural em torno de Calcutá. É

quando o jovem decide frequentar uma pequena escola rural e, mais tarde, é selecionado para

ingressar em uma instituição da capital gerando o drama de abandonar ou não a mãe doente

em função de um sonho. O filme retrata exatamente a situação do ensino indiano durante as

décadas finais da dominação britânica na Índia.

Figura 1 - Aparajito (1956) do diretor Satyajit Ray mostra a realidade do ensino mecanicistaindiano contra o qual Tagore lutou sua vida inteira.

Nessa época os ingleses já haviam consolidado um excludente sistema de ensino

produtivista que tinha como objetivo a formação de “brown sahibs”2 onde todo o conteúdo era

transmitido em inglês e usando recursos culturais completamente importados. Tal imposição

cultural deu origem a um movimento de resistência a partir da classe média indiana,

especialmente na região de Bengala, que ficou conhecida como a “renascença bengali”. Sendo

uma família extremamente tradicional e influente, os Tagore eram peças-chave nesse

movimento que buscava contrabalançar a crescente dominação cultural estrangeira.

Como narra Jha (1994, p. 603) “Rabindranath was the fourteenth child of his parents.

His brothers and sisters were poets, musicians, playwrights and novelists and the Tagore home

was thus filled with musical, literary and dramatic pursuits”. Além disso a linhagem de

personalidades notáveis inicia pelo seu avô Dwarkanath Tagore, um dos primeiros indianos a

viajar até a Europa, reformador cultural e social, passando por seu pai Davendranath, versado

tanto na filosofia indiana como europeia e uma figura importante nos movimentos políticos da

época, e finalmente gerando grande influência na personalidade de Rabindranath. Deve-se

notar que uma relação conflituosa com a educação permeia todo o percurso de sua vida.

Estando imerso em um ambiente cultural ativo e efervescente o décimo quarto filho não se

adaptou à escola convencional a qual foi enviado prematuramente. Já aos 14 anos decide

abandonar o currículo imposto e continuar seus estudos por conta própria com o auxílio de

tutores pessoais. É justamente durante esta época que seu trabalho poético e literário tem

início. Aos 17 é mandado para Londres para iniciar seus estudos superiores na maneira

europeia, fez parte de vários círculos de intelectuais e artistas londrinos, apaixonou-se pela

pujante cultura vigente na Europa de seu tempo, mas passados apenas 18 meses decide

abandonar os estudos completamente decepcionado com o sistema imposto e regressa à Índia.

Aos 23 casa-se com Mrinalini Devi e, durante essa época, faz sua segunda viagem ao

Reino Unido mas retorna em apenas um mês para tomar conta dos negócios da família. A

nova fase lhe fornece uma visão completamente nova da vida, como bem coloca

Namadeshwar Jha, onde sua obra era baseada apenas na imaginação agora encontra uma

experiência direta e íntima com o camponês pobre tantas vezes retratado em seus textos. A

situação do interior indiano e seus habitantes comovia tremendamente Tagore e foi isso que o

levou inicialmente a sonhar e imaginar novos caminhos através da educação do homem

comum indiano.

2 Os ingleses eram chamados “sahibs”, senhores, o termo “brown sahib” era aplicado a todo o indiano que trabalhava em altos cargos da maquinaria colonial inglesa.

Educar para a unidade e a felicidade

Talvez a citação mais famosa de Gurudev sobre a arte de ensinar seja a clássica “o

homem só ensina bem o que para ele tem poesia”. É um resumo perfeito da maneira que ele

encarava o ensino. Inclusive, talvez por conta disso, é impossível determinar uma pedagogia

estruturada dentro da obra de Tagore. Seus conceitos sobre educação estão dispersos em todos

os seus trabalhos, desde a poesia, cartas e dramaturgia até em suas esforços de implementação

prática de suas ideias.

Como já mencionamos, na época os indianos educados desenvolveram a tendência

comum a colonizados de imitar os colonizadores em praticamente tudo. A minúscula elite

admirava tanto aqueles que falavam inglês que fizeram disso um princípio para ser aceito em

seus círculos sociais. Cerca de trinta anos antes do nascimento de Tagore o inglês já havia

sido estabelecido como língua padrão para o ensino e passou-se a privilegiar a transmissão da

cultura europeia. De acordo com Dasgupta (1993, p. 154) afirmava-se na época que o inglês

era mais adequado que o sânscrito e árabe no ensino de conhecimentos práticos. Os livros

passaram a ser publicados em inglês apenas, a literatura europeia suplantou a indiana. O autor

lembra ainda que essa fascinação cega dos indianos pela literatura europeia e a negligência

para com sua própria literatura criou fortes sentimentos de revolta em Rabindranath durante

sua juventude e tornou-se seu principal motor no desenvolvimento de um novo conceito de

educação.

Figura 2 – Tagore e sua esposa Mrinalini Devi. Fonte: Internet Archive(http://www.archive.org)

Na concepção de Jha (1994) os esforços de Tagore nesse sentido podem ser divididos

em três fases mais ou menos distintas. Na primeira, entre 1892 e 1901, sua principal

preocupação era o supracitado colonialismo cultural e o modelo industrial de ensino

importado do Reino Unido. Muito antes das críticas de Foucault (1926-1984) Tagore já

denunciava a relação intrínseca entre a educação e os ideais da revolução industrial:

What we understand by school is a factory to provide education. Teacher is a

part of that factory. At half past ten the factory opens with the ringing of a bell.

The machine starts. So does the mouth of the teacher. At four o'clock the factory

stops, só does the mouth of the teacher. And the students returno home with a

few pages of machine-chiselled education. And during examination this

education is weighed and given due marks. (TAGORE apud MOKAMMEL,

2014, p. 4)

Após uma série de tragédias pessoais que incluíram a perda de sua esposa Mrinalini

Devi, de apenas 29 anos de idade, e dois filhos que sequer haviam entrado na adolescência,

Rabindranath foca sua atenção totalmente nos trabalhos criativos e em seu projeto

educacional. Alojado em um antigo ashram3 de propriedade de sua família conhecido como

Santiniketan (literalmente “abadia da paz”) que viria a ser seu principal laboratório na

experimentação pedagógica. Além disso, em 1913 recebe o Prêmio Nobel de Literatura e

utiliza-o integralmente nas atividades desenvolvidas em seus centros de educação. Durante

este segundo período que vai de 1901 à 1918 é estabelecido um esboço daquilo que Tagore

imaginava como um sistema de educação apropriado para a Índia de seu tempo. Ele

comportaria elementos como a valorização da língua local e sua cultura, assim como ideais

antigos presentes na educação indiana clássica que incluem o ensino em áreas distantes dos

centros urbanos (Tapovan, ou escolas da floresta), o incentivo a formação integral do caráter

através da reflexão, meditação e principalmente a austeridade da Sadhana (a disciplina dos

sentidos e a retidão da vida). A motivação era clara: onde quer que seja a educação deve

lançar raízes no povo e na cultura local. A Índia deveria redescobrir suas características e estas

não eram do comercialismo ou imperialismo, mas sim da relação correta com o ambiente e do

universalismo tão característico de um lugar que consegue reunir harmonicamente um número

inacreditável de etnias, línguas e credos. Apesar de ser considerado um idealista por seus

críticos é preciso deixar claro que isso se tratava essencialmente de uma correção de rota, uma

crítica construtiva:

Tagore did not neglect the lesser aims of life and education. In the colonial

system of education that existed at that time the whole focus of education was

on employment to the complete neglect of the higher aims of life. His intention

was to correct this wrong emphasis, without ignoring science, technology and

agricultural sciences, as well as training in village crafts. (JHA, 1994, p. 612)

Em sua terceira fase, nos anos de 1918 até sua morte, o pensamento de Rabindranath

Tagore se afasta das questões locais e passa a se preocupar definitivamente com os ideais de

democracia, não violência, felicidade humana e cooperação intercultural. Como afirma

Dasgupta “Tagore was essentially an individualist. In his individualism there was wide room

for a belief in the fundamental unity of mankind and not only of mankind but the whole

universe of nature and man.” (1993, p. 168) É importante lembrar que estes anos ficaram

profundamente marcados pelo fim da primeira grande guerra e o início da segunda, da mesma

forma o movimento de independência indiana capitaneado por seu amigo pessoal Mohandas

3 Nome dado aos centros de prática educativa que se formavam ao redor de um professor na Índia antiga.

Gandhi (intitulado “mahatma”, grande alma, pelo próprio Tagore) chega em seu auge... eram

tempos turbulentos! A principal arma do poeta em meio ao conflito não poderia ser outra, a

palavra. Viajou por todos os continentes promovendo seu trabalho, dialogando com políticos,

artistas, educadores e cientistas de todas as partes do mundo e arrecadou fundos para financiar

seus projetos locais. Listamos em seguida as “três filhas” engendradas e nutridas por Tagore

ao longo de sua vida e as relacionamos com os principais elementos de seu pensamento.

As três filhas

Durante minhas pesquisas bibliográficas tive grande dificuldade de estabelecer

divisões no trabalho de Tagore. O único contato que travei diretamente com suas ideias sobre

a educação foi durante uma passagem rápida por Pondicherry e Auroville no estado indiano

de Tamil Nadu durante os anos de 2010 e 2011, mas nunca havia conseguido visualizar suas

experiências como um todo e dentro de uma moldura temporal. Além das três fases já citadas

acima, que dizem respeito mais diretamente às tendências do espírito, pode-se classificar o

trabalho prático de Tagore por meio de seus três grandes experimentos ou “filhas”:

Santiniketan, Visva-Bharati e Sriniketan. Dos campos para a cidade esses movimentos

distintos corporificaram aquilo que se fazia presente na mente do poeta.

Propriedade de seu avô, Maharishi (“grande sábio”) Dwarkanath Tagore, um antigo

Ashram localizado nas planices de Bolpur recebeu o nome de Santiniketan, em português

“abadia da paz”, um local que Rabindranath se determinou a construir como um templo a

serviço da humanidade. Como afirma Dasgupta (1993, p. 149) “Some scholars are of

opinion that the establishment of the ashrama School at Santiniketan had its origin in

Rabindranath's own painful experience about education in his childhood” tendo em vista que

o que ocorria naquele espaço era o exato oposto da experiência escolar que levou Tagore a

desistir do ensino institucionalizado. Santiniketan representa uma criativa reação contra a

atmosfera fabril das escolas urbanas tradicionais (um desafio até hoje difícil de superar). Em

sua concepção as crianças deveriam receber em Santiniketan a oportunidade de aprender

através da natureza, observar o ritmo das estações a céu aberto e, através de uma noite

estrelada associada à uma assombro característico da filosofia, poderiam adquirir um

conhecimento muito mais importante do que aquele contido nos livros. As atividades físicas,

especialmente as manuais, tinha um papel importantíssimo na escola. Isso incluía desde aulas

de agricultura, tear e cuidado com animais até artes como pintura, cerâmica, escultura e

trabalhos em madeira.

Mas Tagore não tinha em vista apenas uma escola rural bucólica, seu ideal maior era a

formação completa e universalista do indiano moderno da mesma maneira proposta pelo

antigo sistema Gurukul4 porém de forma massificada. Além disso os estudantes eram

conclamados a participar na educação da população local pois “for true education is to realise

at every step how our training and knowledg have organic connection with our surroundings”

(TAGORE apud DASGUPTA, 1993, p. 146).

Figura 3 – Gurudev preside a abertura do “Shantiniketan Arts and CraftsExhibition” no Congresso Indiano em 1934. Fonte: The Hindu

(http://www.thehindu.com/)

Com o crescente movimento pela independência do país e a consequente necessidade

do fortalecimento técnico e científico, a partir dos anos 1920 Santiniketan ensaia uma guinada

em sua constituição. Por meio de suas viagens, Tagore inicia um movimento de cooperação

internacional e seu laboratório/escola rural se transforma em universidade no ano de 1939.

4 Antigo sistema de ensino que enfatizava a relação entre professor e aluno, utilizado no brahmanismo clássico.

Passa então a se chamar Visva-Bharati ostentando o lema “uma universidade onde o mundo

faz seu ninho” e realizando os ideais universalistas de Gurudev. A Índia possui a mais antiga

tradição de centros de ensino do mundo, como bem nos lembra Jha (1994, p. 609) muito antes

do estabelecimento das universidades ocidentais (mais de meio milênio antes!) existiram na

Índia universidades “such as Nalanda end Vikramashila, where various branches of

knowledge had been pursued by scholars for centureies during the buddhist period of India's

history”. O que se estava fazendo era um processo de revitalização de uma antiga prática que

notabilizou o subconetinente indiano como berço civilizatório. Nas palavras do próprio

Tagore se encontra uma questão ainda atual:

Universities should never be turned into mechanical organizations for collecting

and distributing knowledge. Through them the people should offer their

intellectual hospitality, their wealth of mind to others and earn their proud right

in returno to receive gifts from the rest of the world (TAGORE apud

DASGUPTA, 1993, p. 159)

Talvez tenha sido ele o primeiro poeta a se tornar fundador-presidente de uma

universidade moderna, mesmo assim exercia com maestria suas tarefas administrativas, algo

que se provou pela saúde econômica de seus projetos. Visva-Bharati tinha objetivos bem

claros que a diferenciaram do projeto inicial de Santiniketan: 1) Criar intimidade com as

diferentes culturas asiáticas através do estudo paciente e dedicado com fins de evidenciar seu

valor histórico-cultural; 2) Abordar a cultura ocidental de um ponto de vista em que se

entenda a ligação entre vida e pensamento, ao contrário da mera importação de conhecimento.

Falaremos mais adiante sobre a questão curricular, talvez a maior inovação da instituição, e

também é importante ressaltar que a universidade se mantém ativa até hoje tendo educado

personalidades importantíssimas para a história da Índia e do mundo como Indira Gandhi, o

intelectual Amartya Sen e o mesmo diretor citado no início deste texto Satyajit Ray.

Figura 4 – Aula de tear em Sriniketan. Fonte: The Hindu(http://pathabhavanpraktoni.net)

A terceira filha de Tagore, Sriniketan (ou “abadia da prosperidade”), foi um projeto

paralelo que o ocupou entre 1901 e 1922. Seu foco era a educação fundamental dos filhos de

agricultores localizados nas cercanias rurais de Calcutá.

The objective of the new school was to provide an all-round education for

village children, enabling them to earn a decent livelihood but also equipping

them to improve rural life in all its aspects. (…) Sri Niketan aimed at combining

work with joy. Picnics, excursions, games, music, theatrical performances and

celebrating socio-religious festivals constituted regular features of the calendar.

(JHA, 1994, p. 611)

O calendário da escola respeitava os ciclos da natureza e Tagore costumava a criar

festivais a cada ano para incentivar o conhecimento da tradição cultural do local. Eram

comuns aulas serem ministradas durante caminhadas pela floresta ou mesmo através de

histórias encenadas pelos próprios professores. O projeto de Sriniketan era também um

esforço internacional, quiçá o primeiro a reunir Reino Unido, Estados Unidos, Japão e Índia

em um esforço de pesquisa educacional. Para entender melhor este experimento analisaremos

brevemente as “pontes” construídas por Tagore com a pedagogia pragmatista ocidental.

Pontes entre oriente e ocidente

Viagens por si só não mudam muito quando feitas da maneira turística asséptica,

colecionando imagens de lugares ao invés de se deixar moldar por eles. Por sorte esse é um

modelo mais popular entre as personalidades europeias, o cidadão periférico, os antigos povos

e os orientais costumam adotar uma postura completamente oposta. Tagore responde a tal

característica e encarna a máxima de Paulo Freire “a cabeça pensa onde os pés pisam”. O

poeta infelizmente nunca pisou em solo brasileiro, mas já esteve no continente americano

sendo profundamente influenciado pelas suas andanças. Podemos até afirmar que foi ele o

arauto desta universalização cultural da qual somos filhos. Como falamos anteriormente,

Tagore não deixou um sistema o educacional estruturado em parte por que sua filosofia era

eminentemente prática e ligada à sua vida, por outro lado ele também foi influenciado por

vários teóricos da educação ao redor do mundo. O principal aporte estrangeiro foi, sem

dúvida, o pragmatismo americano nas figuras de John Dewey (1859-1952), William James

(1842-1910) e Charles S. Peirce (1839-1914). Cabe salientar que, na implantação de

Sriniketan, Rabindranath contou com o auxílio decisivo do anglo-americano Leonard Knight

Elmhirs (entre outros voluntários internacionais) além de manter contato direto com William

H. Kilpatrick, eminente discípulo de Dewey, desde sua primeira vinda à Índia em 1926.

Tagore ' s concept of realistic curriculum attained its fullest expression in the

Siksha-Satra experiment at Sriniketan. Assisted by Elmhirst, a disciple of

Dewey, he introduced there an integrated and co-related pattern of activity

which is very similar to the Project Curriculum developed by Kilpatrick.

(JALAN, 1976, p. 100)

Então, mesmo sendo seu pensamento muitas vezes comparado ao de Rouseau (com

certa justiça) foi no conceito de “escola laboratório” e na democracia como forma de vida

proposta por Dewey que ele se apoiou para realizar várias experiências educativas,

especialmente nos estágios iniciais de Santiniketan e Sriniketan. Uma das coisas que atraiu o

poeta até o pragmatismo foi a ênfase na natureza social do indivíduo. Na visão de Dewey a

sociedade é uma sociedade de indivíduos e o indivíduo é sempre um indivíduo social, ele não

possui existência como tal fora deste contexto. Para Samuel (2011, p. 1162) “Tagore's

international educational perspective complements Dewey's concept of social individual and

democracy, and their views help to inform contemporary educational philosophy and

practice”.

A máxima que anuncia o fato de ser a experiência o motor do aprendizado, de que

apenas um pouco dela é melhor que uma tonelada de conhecimentos teóricos, encontra eco

mesmo no pensamento inicial de Tagore. O própria crença de que o centro da escola são as

interações sociais das crianças e a interação entre escola e comunidade de maneira orgânica,

já denuncia uma empatia tremenda entre o professor bengali e Dewey. Para ambos educação

era crescimento e auto-realização:

It involves both the individual and community. It is incorrect to consider growth

as mere self-fulfillment in a narrow sense of the term. It is also social. When

education fails to achieve social growth among its members, it ceases to be a

wholesome education. A democratic education integrates both the individual and

the social needs. (SAMUEL, 2011, p. 1162)

O homem moderno experimenta um estado de alienação para com o mundo natural,

desenraizamento ecológico, como observaram ambos os pensadores isso deriva de uma falta

de conhecimento sobre o próprio ambiente e sobre o próprio homem. A necessidade vista por

Tagore de realizar sempre seus experimentos educacionais junto a natureza buscava preencher

essa lacuna, por outro lado as escolas laboratório de Dewey rumavam para um processo de

conhecimento pessoal através da autonomia. Outro fator que une ambas as perspectivas de

certa maneira é a concepção de currículo adotada especialmente em Santiniketan e Visva-

Bharati.

Currículo?

A questão do conhecimento é um tema central da filosofia desde seu início. O que é

possível ensinar e qual a natureza desse conhecimento ocupou as mentes de Platão, Agostinho

e, mais recentemente, Wittgenstein. Em seu primeiro trabalho “Tractatus Logico-

Philosophicus” ele aponta a ligação intrínseca entre conhecimento e linguagem, dando ênfase

à chamada “definição ostensiva”. Já em uma fase posterior o filósofo via a mesma linguagem

de maneira mais neutra, não tendo em si significado definitivo mas prático, a linguagem seria

composta de proposições e representações, o que sabemos é representado por aquilo que

fazemos, a linguagem ganha significado no seu uso. Conhecimento então seria muito mais

complexo que a mera indicação de objetos sensoriais ou mesmo a clara distinção proposta por

Descartes. Na verdade este se compõe de organizações sistêmicas e orgânicas que não

possuem uma lógica interna inteligível como os gregos buscavam provar, mas se aproxima

mais do exemplo da cidade antiga proposta por Wittgenstein onde o jogo linguístico vai

criando significados de maneira muito similar ao crescimento de um organismo vivo.

Sendo assim, em um certo aspecto contrariando as teorias platônicas onde aprender é

um ato de recordar um conhecimento já internalizado, aprender se trata de construir uma

intimidade com o conhecimento que envolve vários fatores. Na teoria agostiniana a imitação é

a forma mais natural e primitiva de aprendizado, sendo posteriormente substituída por

associação e assim se inicia a formação das redes de conhecimento. Toda a experiência

acumulada por uma comunidade, tudo aquilo que ela pode aprender e transformar em

conhecimento depende em grande parte de como ela se organiza. É dentro do grupo social que

se cataliza a transformação da experiência em conhecimento para mais tarde ser

sistematizada. Nas sociedades antigas a tradição, o mito e os grupos de excelência técnica

eram responsáveis pela sistematização e transmissão desse legado, já no mundo moderno isso

se dá através da escola e de seu currículo.

O termo que deriva da palavra latina curriculum indica um caminho, uma carreira.

Pode indicar popularmente o todo de uma carreira profissional (como em curriculum vitae) ou

ainda, no sentido que nos interessa neste artigo, os conteúdos selecionados que devem ser

transmitidos no processo educativo. Como afirma Sacristán:

É uma espécie de ordenação ou partitura que articula os episódios isolados das

ações, sem a qual esses ficariam desordenados, isolados entre si ou

simplesmente justapostos, provocando uma aprendizagem fragmentada. O

currículo desempenha uma função dupla – organizadora e ao mesmo tempo

unificadora – do ensinar e do aprender, por um lado, e, por outro, cria um

paradoxo, devido ao fato de que nele se reforçam as fronteiras (e muralhas) que

definem seus componentes. (2013, p. 17)

Se observamos a prática educativa dos principais experimentos geridos por Tagore

vemos claramente que se tratam de currículos flexíveis ou abertos. Ele acreditava que o

currículo deveria ser construído de maneira orgânica, biônica, e que a natureza deveria ser

parte dele. A agenda das aulas era maleável permitindo troca de turnos por conta do clima e

uma atenção especial aos fenômenos naturais. Isto demonstra um conceito diferente dos meios

e fins da sistematização curricular:

Actually Tagore interpreted the curriculum not in terms of certain subjects to be

learned but in terms of certain activities to be undertaken. That is one of the

reasons that in Santiniketan besides the regular academic subjects, emphasis was

placed on drama, excursions, gardening, regional study, and original

compositions. In addition, so called extra-curricular activities like games, social

services, and student selfgovernment formed a regular feature of the normal

working of the institution in order to bring into play all the essential faculties of

the children. (JALAN, 1976, p. 98)

Esse aprendizado auto-direcionado é chamado Heutagonia e confere a ampliação da

autonomia do estudante. Ele se torna responsável pela aprendizagem com o suporte de todo o

aparato tecnológico disponível. No cenário atual, essa noção se dá apenas pelo fato do aluno

não estar presente na instituição, mas os mesmos prazos, as mesmas atividades e a mesma

imposição de currículo, método e objetos de aprendizagem engessados são apresentados para

que o aluno cumpra o cronograma ou ainda como afirmam os criadores do termo:

Heutagogy is the study of self-determined learning and draws together some of

the ideas presented by these various approaches to learning. It is also an attempt

to challenge some ideas about teaching and learning that still prevail in teacher

centred learning and the need for [...] In this respect heutagogy looks to the

future in which knowing how to learn will be a fundamental skill given the pace

of innovation and the changing structure of communities and workplaces.

(HASE; KEYON, 2001)

Várias décadas mais tarde o estadunidense Carl R. Rogers (1978) também conferia

grande importância ao processo heutagônico. Ele considerava o ensino apenas uma questão de

facilitação, sendo que a aprendizagem é tão natural quanto a respiração, um processo interno

controlado pelo aprendiz. Em seu livro “Liberdade para aprender” nos aconselhava a dar

autonomia de escolha e formação do currículo aos estudantes, criando assim “um clima

psicológico adequado à aprendizagem auto-dirigida e significativa” (ibid, p.197). Além disso

predicava a criação de uma instrução programada por meio de pequenos módulos de ensino

paralelos ao currículo principal (o mais enxuto possível) que seriam apropriados pelo

estudante na medida que sentisse certa lacuna em sua formação dando-lhe assim “o

sentimento de que toda matéria é suscetível de aprendizagem e a verificação de que o

processo de educação é inteligível e compreensível”.

Figura 6 – Rabindranath Tagore recepcionando “Mahatma” Gandhi em Visva-Bharati. Fonte:The Hindu (http://en.wikipedia.org)

Se retomamos a comparação com Dewey podemos observar novamente muitos pontos

em comum no que se refere ao currículo. O estadunidense abordava o currículo como um

cientista experimental, a vida era um problema a ser resolvido. Tagore olhava como o poeta

que era, de maneira natural e transcendental, seu amor pela natureza refletia no currículo. Mas

ambos concordavam na concepção de um currículo adaptativo às necessidades do aluno, da

comunidade e da escola:

Dewey and Tagore did not subscribe to a ready-made curriculum. They each had

a framework of curriculum, but it was flexible and open. It was adjustable to the

needs of the individual and the community and thus opened to the demands of

the individual and social dimensions of education. Curriculum for Dewey and

Tagore was more than traditional subject matter. It went beyond the books and

the classroom. (SAMUEL, 2011, p. 1167)

O currículo de acordo com Tagore era a corporificação da harmonia e realização

humana. Significa um curso de estudos aberto e pleno que leva em consideração o individual,

o social e o universal. Em Santiniketan por exemplo, de acordo com Jalan (1976), ao seguir

este currículo aberto se incentivava a livre experimentação e originalidade tanto por parte dos

professores quanto dos alunos. Na verdade podemos dizer que não havia um currículo como o

concebemos, não havia caminho a seguir, a vida era o currículo. Aprender a viver ao invés de

viver para aprender. Isso não quer dizer, como já salientamos, que os conteúdos “duros”

ficavam em segundo plano, ao contrário, o que Tagore propunha era um equilíbrio que ainda

hoje se faz necessário.

Tagore not only gave a new orientation to academic work but also pleaded for

the education of man's emotions, for giving music, painting and other fine arts

and crafts their due place as a means of self-expression and fulfillment. Side by

side with his insistence on the cultivation of emotions, he showed a full

awareness of the role of intellect and reason and was appreciative of the

contribution of Western science. (JALAN, 1976, p. 101)

No currículo escolar proposto em Santiniketan, Sriniketan e Visva-Bharati, qualquer

conteúdo que apresente tendências de parcialidade, com especial atenção a qualquer tipo de

orientalismo, seria evitado. Em seu lugar seriam incentivados debates multidisciplinares e

interculturais buscando o reconhecimento das complexidades inerentes ao processo de

aprendizado e as perspectivas multidimensionais de observarmos qualquer questão com uma

mente crítica. Pode-se imaginar que dentro deste sistema o jovem Rabindranath, quem sabe,

não haveria abandonado a escola para trilhar seu caminho solitário, quem poderia afirmar com

certeza? De qualquer maneira a poesia que se esconde por trás da história luta contra a

padronização da experiência, a conformação fabril a qual estamos tão acostumados, e canta a

diversidade humana e suas infinitas possibilidades, nas palavras do gênio bengali:

Real unity will be established on real diversities. Those who desire to usher in

new age have to practice the diversities in order to be united. They jave to keep

in mind that through this endeavour the liberation of not any particular

individual nation will take place, but the whole mankind will be liberated.

(TAGORE apud MOKAMMEL, 2014, p. 13)

A guisa de despedida (ou coda)

O Brasil conheceu Tagore através de outra alma poética, Cecília Meireles (1901-1964).

Poucos amaram o poeta como ela amou. Chamado carinhosamente de “meu amigo Rabindra”

ele foi cantado de várias maneiras pela brasileira. Se no início responsabilizei Tagore por

minhas andanças orientais ela foi muito mais fundo adentrando na alma mesma do poeta.

Cecília publicou vários textos, poemas e homenagens para Rabindra incluindo o clássico

“Rabindranath, pequeno estudante” onde afirmava a necessidade de se retomar certos pontos

de sua pedagogia. Apesar de estarem entre as raríssimas referências ao Tagore educador na

língua portuguesa, não tive a oportunidade de me aprofundar em seus vários textos durante o

tempo de produção deste artigo. Esbarrei já ao apagar das luzes “meio sem querer” em um

ótimo artigo/conto de Elizabeth Macedo “Viagem à ilha do Nanja” parte de uma coletânea em

homenagem à relação de Cecília Meireles com o poeta intitulada “Cecília Meireles: A poética

da educação” publicada pela Editora Loyola, infelizmente não o pude aproveitar. Por conta

disto e da escassez de trabalhos abordando o tema na nossa língua pátria, este texto ficou

exclusivamente composto por artigos e livros em língua inglesa.

Uma outra questão que é necessária assinalar é o caráter muitas vezes vago de algumas

colocações. Não se trata de falta de critério ou pesquisa, como coloquei no início é impossível

dissociar a teoria da prática em Tagore, tudo é poesia! Temos descrições de atividades em suas

escolas e de seus ideais, mas é praticamente impossível achar registros quantitativos de

qualquer elemento. Por conta disso o texto acaba assumindo um tom muito voltado para a

utopia. O próprio Gurudev tem ao seu redor essa aura de profeta reformador, mas isso não

passa de ilusão. Como buscamos deixar claro durante o texto, os esforços de Tagore no

sentido de introduzir elementos práticos e o pensamento científico no ensino foram de um

pioneirismo sem comparação na Índia de seu tempo. Como afirma DASGUPTA (1993) :

Many scholars are of opinion that Rabindranath essentially was a poet and

essentially an artist, he could not have welcomed mechanization of materialism

wholeheartdly. (…) The poet was not anti-progressive, as we have seen from a

study of his works, but his humanist and artistic senses were not always in

accord with the vibrant forces of the modern world. (p. 191)

O legado do “amigo Rabindra” sobrevive na forma de sua obra e também por meio da

Visva-Bharati University, atualmente muito diferente daquilo que ele idealizou pela

necessidade de enquadrar-se no programa de ensino estabelecido pelo governo indiano.

Visva-Bharati entered an entirely new chapter in its career when it was

converted into a statutory university under the central government of free India

in May, 1951. Since the reorientation of the institution, many of its departments

have been reorganized partly for administrative reasons and partly for bringing

them in line with other regular universities in the country. (JALAN, 1976,

p.103)

Porém uma universidade é feita verdadeiramente de seus alunos, julgando pelos

egressos da instituição podemos afirmar que o pensamento de Tagore age no mundo através

de muitos discípulos separados pelo espaço e tempo. Por sua postura inovadora e também por

haver visto antes de qualquer outro educador a internacionalização do ensino é que ele

permanece relevante até os dias de hoje. Um bom exemplo disso é o conceito de currículo

aberto ou “orgânico” citado durante o texto, com a acensão do ensino descentralizado e o

processo crescente de desescolarização proporcionado pela tecnologia da comunicação, talvez

a principal chave para se repensar a educação no século XXI. Por fim, lembro de ler certa vez

uma afirmação do sábio bengali de que seu conceito de Índia não é geográfico, mas sim uma

disposição de espírito, e que ele seguia em busca de conterrâneos... sinto que somos

compatriotas afinal! E para terminar esta (nem tão) breve arqueologia mental, esta canção

desajeitada para um amigo meu e de Cecília, deixo suas próprias palavras para dar o tom da

despedida:

Our education to us is like the carriage to a horse; a bondage, the dragging of

which merely serves to provide it with food and shelter in the stable of its

master; the horse has not the same freedom of relationship with the carriage as

its owner and therefore the carriage remains for it an imposition of beggarly

necessity... The great use of education is not merely to collect facts, but to know

man and make oneself known to man. It is the duty of every human being to

master, to some extent, not only the language of the intellect, but also that

personality which is the language of Art... Education can only become natural

and wholesome when it is the direct fruit of a living and growing knowledge.

Our education should be in full touch with our complete life, intellectual,

aesthetic, social and spiritual, and our educational institutions should be in the

very heart of our society, connected with it by the living bonds of varied

cooperation. For true education is to realise at every step how our training and

knowledge have organic connection with our surroundings. (DASGUPTA, 1993,

p. 146)

Referências

APARAJITO. Direção: Satyajit Ray Roteiro: Bibhutibhushan Bandyopadhyay Produção:

Satyajit Ray. Documentário, 110'00". Disponível em: http://youtu.be/QLKLNZdrhAI . Acesso

em janeiro de 2014.

APARAJITO. Direção: Satyajit Ray Roteiro: Bibhutibhushan Bandyopadhyay Produção:

Satyajit Ray. Documentário, 110'00". Disponível em: http://youtu.be/QLKLNZdrhAI . Acesso

em janeiro de 2014.

DASGUPTA, Tapati. Social thought of Rabindranath Tagore: a historical analysis. New

Delhi: Abhinav Publications, 1993.

HANSE, Steward; KENYON, Chris. From Andragogy to Heutagogy. 2001. Disponível

em:http://www.psy.gla.ac.uk/~steve/pr/Heutagogy.html . Acesso em janeiro de 2014.

JALAN, Radha Vinod. Tagore: His educational theory and practice and its impact on indian

education. 1976. 164 f. Tese (Doutorado em Filosofia) – University of Florida, Gainesville,

1976.

JHA, Narmadeshwar. Rabindranath Tagore (1861-1941). Paris, Prospects: The quarterly

review of education, n. ¾, p. 603-619, 1994.

MOKAMMEL, Tanvir. Educational Ideas of Rabindranath Tagore in the Era of Globalization.

Disponível em: http://tanvirmokammel.com/home/images/stories/download/educational

%20ideas%20of%20rabindranath%20tagore%20in%20the%20era%20of

%20globalization_bangla.pdf . Acesso em janeiro de 2014.

ROGERS, Carl R. Liberdade para aprender. Belo Horizonte: Interlivros, 1978.

SACRISTÁN, José Gimeno. Saberes e incertezas sobre o currículo. Porto Alegre: Penso,

2013.

SAMUEL, Francis A. Educacional visions from two continents: What Tagore adds to the

Deweyan perspecte. Educational Philosophy and Theory, Oxford, n. 10, p. 1161 – 1175, 2011.