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DIMENSÕES AFECTIVAS DA EXPLORAÇÃO VOCACIONAL: AVALIAÇÃO DE INDICADORES FISIOLÓGICOS DE ANSIEDADE Natalia Jidovanu & Maria do Céu Taveira Escola de Psicologia, Universidade do Minho Resumo Este estudo insere-se no domínio da avaliação psicológica vocacional. Procuramos investigar indicadores fisiológicos de ansiedade em actividades de planeamento e exploração da carreira. Foi realizado um estudo piloto com 15 participantes, que desempenharam uma tarefa de exploração vocacional. Foi usado um equipamento de biofeedback para obter o registo dos níveis de activação dos participantes durante a tarefa, de uma forma não invasiva. A medida psicofisiológica utilizada foi a actividade electrodérmica. São descritos e discutidos os principais resultados observados. Palavras-chave: exploração vocacional, ansiedade, psicofisiologia, actividade electrodérmica INTRODUÇÃO A exploração vocacional tem sido definida, pelas perspectivas que se inserem na Psicologia Experimental, como um impulso ou como uma resposta motora de procura de informação sobre o ambiente (Harlow, 1954; Berlyne, 1960), ou ainda, à luz da Psicologia da Motivação, como um tipo de comportamento motivado e intencional (Deci & Ryan, 1985). Por sua vez, autores da literatura de identidade, como é o caso de Erikson (1968) e Marcia (1980) definem a exploração vocacional como uma dimensão da identidade,

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DIMENSÕES AFECTIVAS DA EXPLORAÇÃO VOCACIONAL: AVALIAÇÃO DE

INDICADORES FISIOLÓGICOS DE ANSIEDADE

Natalia Jidovanu & Maria do Céu Taveira

Escola de Psicologia, Universidade do Minho

Resumo

Este estudo insere-se no domínio da avaliação psicológica

vocacional. Procuramos investigar indicadores fisiológicos de

ansiedade em actividades de planeamento e exploração da carreira.

Foi realizado um estudo piloto com 15 participantes, que

desempenharam uma tarefa de exploração vocacional. Foi usado um

equipamento de biofeedback para obter o registo dos níveis de

activação dos participantes durante a tarefa, de uma forma não

invasiva. A medida psicofisiológica utilizada foi a actividade

electrodérmica. São descritos e discutidos os principais

resultados observados.

Palavras-chave: exploração vocacional, ansiedade, psicofisiologia,

actividade electrodérmica

INTRODUÇÃO

A exploração vocacional tem sido definida, pelas perspectivas

que se inserem na Psicologia Experimental, como um impulso ou como

uma resposta motora de procura de informação sobre o ambiente

(Harlow, 1954; Berlyne, 1960), ou ainda, à luz da Psicologia da

Motivação, como um tipo de comportamento motivado e intencional

(Deci & Ryan, 1985). Por sua vez, autores da literatura de

identidade, como é o caso de Erikson (1968) e Marcia (1980)

definem a exploração vocacional como uma dimensão da identidade,

enquanto na teoria da vinculação, a exploração é concebida como um

sistema de comportamentos (Bowlby, 1969). Dentro da Psicologia

Vocacional, a exploração tem sido definida como um estádio do

desenvolvimento vocacional ou como uma fase do processo de tomada

de decisão (Taveira, 2000). Em abordagens mais recentes,

nomeadamente na concepção de Flum e Blustein (2000), é proposta

uma definição mais ampla do conceito de exploração vocacional,

incluindo a avaliação dos atributos internos do sujeito,

nomeadamente, os valores, as características da personalidade, os

interesses e habilidades, e a exploração das opções e restrições

externas presentes nos contextos educacional, profissional e

relacional. Estes mesmos autores afastam-se das perspectivas que

conceptualizam a exploração vocacional como uma etapa do

desenvolvimento da carreira, concebendo a exploração como um

processo com funções adaptativas ao longo do ciclo vital,

direccionado para alcançar o auto-conhecimento e o conhecimento do

ambiente envolvente.

Explorar-se a si e ao mundo de uma forma intencional, regular

e sistemática, é uma capacidade que assume, na actualidade, uma

importância crescente, tendo em conta as múltiplas mudanças e

transformações que se verificam nos contextos escolar, social e

profissional de muitas sociedades. A exploração do mundo e do

ambiente envolvente refere-se à aquisição de conhecimentos, por

parte do indivíduo, acerca das oportunidades de carreira e da

realidade das diferentes profissões, enquanto explorar-se a si

próprio significa conhecer os seus próprios interesses e

habilidades (Hardin, Varghese, Tran & Carlson, 2006).

Na sociedade portuguesa, como na maioria das sociedades

ocidentais, o envolvimento em actividades exploratórias

vocacionais tem uma importância especial na adolescência e no

início da idade adulta, uma vez que constituem os primeiros

exercícios de autonomia e responsabilidade pessoal na tomada de

decisões vocacionais (Faria & Taveira, 2006). Taveira e Campos

(1987) referem que as principais mudanças de identidade vocacional

nos jovens ocorrem quando o sistema de ensino os obriga a tomar

decisões importantes para a definição de um projecto vocacional.

Na mesma linha de pensamento, Yang e Gysbers (2007) mencionam que

a exploração da carreira é uma das tarefas mais importantes que os

estudantes que terminam os estudos no ensino superior têm de

enfrentar. Para a maioria desses estudantes, esta é a primeira vez

que vão procurar um trabalho a tempo inteiro, que passará a ser

parte integrante da sua identidade. Esta primeira experiência

poderá servir de base para as suas estratégias de procura de

emprego no futuro. Vignoli, Croity-Belz, Chapeland, Fillipis e

Garcia (2005) enfatizam a importância, neste período de transição,

da relação com os pais, a qual pode providenciar suporte emocional

aos jovens para lidarem com esta situação. Recorrendo à teoria de

Bolwby (1969), estes autores referem que a vinculação aos pais

proporciona uma base segura a partir da qual os jovens podem

explorar com confiança. A segurança proporcionada pela vinculação

aos pais reduz a ansiedade, o stress emocional e os sentimentos de

depressão e solidão que podem ser despoletados pela situação de

transição, e promove a exploração do ambiente e o planeamento de

uma carreira futura (Vignoli et al, 2005).

Segundo Super (1953), os jovens têm um papel activo no

processo da exploração vocacional e, ainda que o façam de forma

pouco intencional e sistemática, tendem a explorar o mundo em que

vivem e os papéis que poderão vir a desempenhar, de acordo com as

suas personalidades, interesses, valores e capacidades. Assim, os

adolescentes e os jovens adultos que se encontram numa etapa de

transição do ensino secundário para o ensino superior, ou do

ensino superior para o mundo do trabalho, são populações de

interesse no âmbito da investigação sobre a exploração vocacional.

Este interesse justifica-se pelo facto de a transição de carreira

implicar sempre uma tomada de decisão que, na maioria das vezes, é

provocadora de ansiedade.

A ansiedade experienciada pelos jovens nesta etapa assume uma

importância particular, pois segundo Taveira (2000), o stress com

a tomada de decisão regista uma associação positiva com a

indecisão vocacional, que, por sua vez, pode dificultar o processo

de exploração vocacional.

Relativamente à ansiedade, Vaz Serra (1980) refere que o conceito

é utilizado em variados contextos, quer em função das condições

antecedentes que o evocam, quer como agente causal, força

motivadora de um comportamento específico, traço de personalidade,

impulso ou resposta emocional. Por seu turno, Vignoli e col.

(2005), conceptualizam a ansiedade de duas formas distintas: como

um estado emocional, referente a uma situação que é percebida como

ameaçadora; ou como um traço da personalidade, referindo-se às

diferenças individuais na probabilidade de experienciar um estado

de ansiedade em situações indutoras de stress.

No que diz respeito à conceptualização da ansiedade como um

traço da personalidade, Eysenck (1990, citado por Strongman, 1996)

refere a existência de diferenças entre as pessoas que têm níveis

altos e níveis mais baixos do traço de ansiedade no que diz

respeito às informações que armazenam na sua memória a longo prazo

e à estrutura dos seus sistemas cognitivos.

Quanto à ansiedade experienciada no contexto vocacional,

Mallet (2002, citado por Vignoli et al, 2005) enfatiza o facto de

esta aumentar progressivamente na adolescência. A ansiedade é um

dos problemas de internalização mais prevalentes nesta etapa de

desenvolvimento, levando os adolescentes a experimentar e a

reconsiderar alternativas de identidade, sem assumirem uma escolha

firme e definitiva (Crocetti, Klimstra, Keijsers, Hale & Meeus,

2009).

Vignoli et al (2005) identificaram três tipos de ansiedade na

adolescência: o medo de falhar na carreira académica ou

profissional, o medo de provocar o desapontamento dos pais com a

escolha da carreira e o medo de se afastar da família e dos

relacionamentos íntimos como consequência das exigências

académicas ou profissionais. De acordo com os resultados obtidos

por estes autores, o medo de falhar está positivamente associado

com a frequência e diversidade da exploração vocacional, mas

apenas no caso das raparigas, enquanto o medo de desapontar os

pais é mais característico dos rapazes e conduz a uma maior

procura de informação relacionada com a escolha da carreira por

parte destes.

A habilidade dos jovens para explorar opções, planear

actividades relacionadas com a carreira e tomar decisões

vocacionais apropriadas, é influenciada por diversos outros

factores afectivos, de entre os quais se destacam a qualidade

percebida das interacções na família de origem (Hargrove, Inman &

Crane, 2005), o optimismo (Patton, Bartrum & Creed, 2004), a auto-

estima (Patton, Bartrum & Creed, 2004; Di Fabio, 2006; Janeiro &

Marques, 2010), a timidez (Philips & Bruch, 1988) e a inteligência

emocional (Di Fabio & Palazzeschi, 2009). Hardin e col. (2006),

destacam também a ansiedade social, como variável importante no

processo de exploração vocacional, especificando que, tanto no

caso dos homens, como das mulheres, níveis elevados de ansiedade

social estão associados negativamente aos compromissos face à

carreira.

Ainda no âmbito da influência dos factores afectivos,

Solberg, Good, Fischer, Brown e Nord (1995) mencionam que a auto-

eficácia na exploração da carreira, isto é, a auto-confiança na

capacidade de concluir com sucesso actividades de exploração da

carreira, tem sido identificada como um construto que prediz os

comportamentos de exploração da carreira futuros. Do mesmo modo,

autores como Stumpf, Colarelli e Hartman (1983) demonstram que a

satisfação com a informação obtida e a ansiedade relacionada com

as actividades de exploração e de decisão vocacional constituem

importantes factores cognitivo-motivacionais da exploração

vocacional futura. Assim, a quantidade e a qualidade das

informações obtidas durante as actividades de exploração

vocacional conduzem a reacções de satisfação ou insatisfação face

ao processo exploratório, que, por sua vez, afectam o envolvimento

futuro na actividade de exploração. Relativamente à ansiedade,

estes autores mencionam que esta é experienciada quando os

indivíduos sentem incerteza quanto aos resultados da exploração.

Tal como a satisfação com a informação obtida, a ansiedade

experienciada no processo de exploração vocacional pode

condicionar os comportamentos exploratórios futuros e as crenças

acerca da utilidade destes comportamentos (Greenhaus & Sklarew,

1981, citados por Taveira, 2000).

Apesar da evidência empírica sobre a relevância dos factores

afectivos para o processo de exploração vocacional, a investigação

neste domínio é pobre. A maioria das concepções tem-se focado

privilegiadamente na dimensão comportamental da exploração

vocacional e nos resultados, ignorando as dimensões motivacionais

e afectivas do construto (Taveira, 2000). No caso da ansiedade, a

sua influência no processo de exploração permanece pouco clara,

uma vez que não se encontram na literatura investigações que

permitam definir o nível ideal de stress na exploração vocacional,

de modo a esclarecer em que situações a ansiedade contribui para

activar ou inibir a exploração vocacional. Do mesmo modo, não se

encontram estudos que clarifiquem a influência da ansiedade como

traço da personalidade no processo de exploração (Vignoli et al,

2005).

Por outro lado, a avaliação da ansiedade na investigação e no

domínio clínico tem sido efectuada recorrendo a medidas de auto-

relato retrospectivas (Lewis & Drewett, 2006). Apesar das

vantagens evidentes, como a economia do tempo (Wahlberg, Dorn &

Kline, 2010) e a facilidade de administração (Mitchell & Miller,

2008), as medidas de auto-relato apresentam várias desvantagens.

Em primeiro lugar, estas medidas têm uma validade questionável,

porque se baseiam no entendimento que as pessoas possuem acerca

das suas próprias experiências emocionais, ou seja, na auto-

percepção, pelo que são susceptíveis ao enviesamento cognitivo.

Além disso, as medidas de auto-relato podem ser influenciadas pelo

humor, auto-estima e valores (Hanita, 2000), ou ainda, pela falta

de insight por parte dos avaliados (Mitchell & Miller, 2008).

Outro problema frequentemente referido na literatura é a

desejabilidade social (Wahlberg et al, 2010).

No sentido de colmatar estas lacunas, na literatura é

recomendada a utilização das medidas psicofisiológicas para

avaliar a ansiedade, as quais, graças à sua objectividade e à

possibilidade de serem utilizadas em situações reais, permitem

superar os problemas das medidas de auto-relato (Lewis & Drewett,

2006).

Dada a escassa investigação no domínio dos factores afectivos

envolvidos na exploração vocacional, a presente investigação

pretende contribuir com dados empíricos para o estudo das reacções

afectivas à exploração emocional, nomeadamente da reacção de

ansiedade. Nesse sentido, foi realizado um estudo piloto, cujo

objectivo foi o de obter um registo fisiológico da ansiedade num

contexto de exploração vocacional. A medida psicofisiológica

utilizada foi a actividade electrodérmica.

De acordo com Dawson, Schell e Filion (1990), o estudo

empírico da actividade electrodérmica teve início na segunda

metade do século XIX, com as experiências laboratoriais de Hence,

Féré e Tarchanoff, a quem se deve a descoberta dos métodos para o

registo da actividade electrodérmica usados actualmente. Uma das

primeiras teorias a proporcionar um contributo importante para a

compreensão dos mecanismos e funcionamento da actividade

electrodérmica, foi proposta por Tarchanoff, em 1890, relacionando

a actividade electrodérmica com a actividade das glândulas

sudoríparas. Dawson e col. (1990) referem que esta concepção foi

posteriormente reforçada pela experiência de Darrow, em 1927, em

que foram medidas, simultaneamente, a actividade electrodérmica e

a secreção das glândulas sudoríparas, numa amostra constituída por

estudantes da Universidade de Chicago. Os resultados apontam para

o facto de as duas medidas estarem intimamente relacionadas. Esta

relação intrínseca entre as alterações da actividade

electrodérmica e a actividade das glândulas sudoríparas foi

entretanto demonstrada, em diversas experiências efectuadas tanto

com populações clínicas, como com animais (Sequeira-Martinho,

1992).

Para uma melhor compreensão desta relação, torna-se

necessário clarificar as bases anatómicas e fisiológicas da

actividade electrodérmica. Assim, as glândulas sudoríparas,

essenciais para o funcionamento da actividade electrodérmica, são

parte integrante do maior órgão do corpo humano – a pele.

Sequeira-Martinho (1992) refere que as glândulas sudoríparas

recebem enervação directa da divisão simpática do sistema nervoso

autónomo, e não estão dependentes de influências hormonais

significativas.

Existem dois tipos de glândulas sudoríparas no corpo humano –

as écrinas e as apócrinas, sendo a distinção usualmente feita com

base nas suas funções e localização. Enquanto as glândulas écrinas

cobrem grande parte do corpo e encontram-se em maior densidade nas

regiões palmares e plantares, as apócrinas estão tipicamente

localizadas nas regiões axilar e genital. Têm sido atribuídas às

glândulas apócrinas algumas funções relacionadas com a activação

sexual, contudo, o debate acerca deste tema continua inconclusivo

na literatura. Em contrapartida, as funções das glândulas écrinas

são claramente conhecidas: regulação da temperatura corporal e a

produção do suor por resposta aos estímulos emocionais. A

propósito das glândulas écrinas localizadas nas superfícies

palmares e plantares, Edelberg (1972, citado por Dawson et al,

1990) menciona que estas são mais responsivas aos estímulos

emocionais do que aos estímulos termais.

Por fim, é importante referir que actividade electrodérmica

tem sido uma das medidas mais utilizadas na história da

Psicofisiologia. Segundo Dawson e col. (1990), a sua ampla

utilização deve-se a alguns fenómenos observados na investigação.

Em primeiro lugar, destaca-se a habilidade de vários tipos de

estímulos sensoriais para produzir alterações na actividade

electrodérmica. Em segundo lugar, verificou-se que uma estimulação

forte provoca respostas mais largas, enquanto repetições do mesmo

estímulo levam à habituação. Por último, foi comprovada a

eficiência das imagens mentais, dos esforços mentais e das emoções

em gerar actividade electrodérmica, enquanto as diferenças

individuais observadas nas respostas da actividade electrodérmica,

suscitaram o levantar de questões acerca da utilidade desta medida

para a distinção entre o normal e o patológico. Fisher e col.

(2010), referem, ainda, que a actividade electrodérmica é sensível

a vários parâmetros do estímulo, como a novidade, a intensidade e

a significância, e responde tanto a estímulos de valência positiva

como negativa. Assim, é inegável a significância psicológica da

actividade electrodérmica, tendo sido utilizada em investigações

no domínio da emoção, activação e atenção (Dawson et al, 1990) e

psicopatologia (Fisher, Granger & Newman, 2010). Para Sequeira-

Martinho (1992) a actividade electrodérmica é um sistema que

exprime de maneira fidedigna as variações de origem cerebral.

OBJECTIVOS DO ESTUDO

O objectivo geral desta investigação consiste no estudo dos

processos cognitivos e fisiológicos associados à ansiedade que

ocorre no âmbito da exploração vocacional. Pretende-se chamar a

atenção para a necessidade de estudo e avaliação não só dos

componentes comportamentais da exploração, mas também cognitivos e

afectivos.

Os objectivos específicos referem-se à avaliação dos

correlatos fisiológicos da ansiedade, através do registo da

actividade electrodérmica. Mais concretamente, pretende-se estudar

o padrão de activação emocional à medida que os participantes

desempenham uma tarefa de exploração vocacional.

METODOLOGIA

Instrumentos

Para o registo da actividade electrodérmica foi utilizado o

dispositivo de Biofeedback 2000 x-pert do Laboratório de

Neuropsicofisiologia da Escola de Psicologia da Universidade do

Minho. A resposta electrodérmica foi analisada através do registo

do nível de condutância da pele (Skin Conductance Level, em inglês).

Para a avaliação do comportamento de exploração vocacional

foi utilizado um questionário composto por 5 itens. O primeiro

item incide sobre os objectivos de carreira a curto-prazo: “Neste

momento, quando pensa no seu futuro escolar e profissional, que

objectivos de carreira gostaria de ver concretizados num prazo de

1-2 anos?”. O segundo item destina-se a explorar as estratégias

que os participantes planeiam utilizar para a concretização dos

objectivos referidos na questão anterior: “O que pensa fazer para

que tal aconteça?”. Numa terceira parte, é apresentado um conjunto

de informações genéricas sobre o emprego a nível mundial, segundo

a Organização Internacional do Trabalho, e informações

específicas, nomeadamente dados estatísticos do Ministério do

Trabalho e Solidariedade Social, sobre a situação do desemprego em

Portugal em 2009. Além da taxa de actividade e da taxa de emprego,

são apresentados outros dados, como o número de pessoas inscritas

nos Centros de Emprego do Continente e Regiões Autónomas e a

evolução do desemprego face ao ano anterior e face ao mês

anterior. O texto evidencia ainda as regiões do país onde se

registam as maiores taxas de desemprego, os grupos profissionais

mais afectados e a percentagem de desempregados de acordo com o

nível de habilitações literárias. O quarto item destina-se a

avaliar a percepção subjectiva dos participantes relativamente aos

dados apresentados na questão anterior: “Que comentário lhe

suscita este tipo de informação?”. Por fim, o último item procura

avaliar a intenção de desenvolver comportamentos de exploração

para atingir os objectivos vocacionais: “O que lhe parece

essencial fazer, ter ou desenvolver, para aumentar a probabilidade

de arranjar emprego na sua área preferida?”.

Procedimento

A experiência deste estudo decorreu nas instalações do

Laboratório de Neuropsicofisiologia na Escola de Psicologia da

Universidade do Minho. Previamente ao início da experiência foi

entregue a cada participante uma Declaração de Consentimento

Informado, onde constam os esclarecimentos acerca dos objectivos

da experiência, a finalidade dos dados recolhidos e o seu

tratamento. Foram igualmente explicitados os procedimentos

relativos ao registo fisiológico da actividade electrodérmica,

familiarizando cada participante com o equipamento utilizado.

Conforme o recomendado na literatura (Venables e Christie, 1973,

citados por Dawson et al, 1990), foi pedido aos participantes para

lavarem as mãos com sabão não abrasivo antes da colocação dos

eléctrodos. Tivemos também o cuidado de assegurar que a região

onde o eléctrodo foi colocado estava seca. O eléctrodo foi

colocado na superfície volar da falange distal do dedo indicador

da mão não dominante, uma vez que na tarefa de exploração

vocacional era pedido aos participantes para registarem a sua

resposta por escrito. Tratando-se de uma experiência nova para a

maioria dos participantes, tivemos a preocupação de incluir um

período de adaptação de alguns minutos, prévio à manipulação

experimental, com o objectivo de deixar os participantes calmos e

familiarizados com a situação experimental. Outra vantagem do

período de adaptação é o facto de permitir a estabilização das

respostas psicofisiológicas.

De seguida procedeu-se ao registo da linha basal, com a qual

posteriormente foi comparada a activação registada em cada um dos

itens da tarefa de exploração vocacional. Nesta condição foi

pedido aos participantes para que, durante 2 minutos, tentassem

relaxar o máximo possível.

O registo da linha basal foi seguido da condição

experimental, que consistiu numa tarefa de exploração vocacional,

em que era solicitado aos participantes a resposta a um conjunto

de 4 questões e a leitura de um bloco de informação sobre o

desemprego no país na actualidade. O registo da activação

provocada por cada uma das questões foi delimitado através de

marcadores na fase de recolha dos dados.

A experiência acaba com o período de adaptação, cujo

objectivo é reduzir a ansiedade nos participantes provocada pela

manipulação experimental.

O estudo envolve seis momentos distintos de avaliação

(baseline e 5 itens da tarefa de exploração), constituindo um

estudo de medidas repetidas longitudinalmente.

A variável independente corresponde à ansiedade induzida pela

tarefa de exploração vocacional. A variável dependente corresponde

à resposta emocional dos participantes, medida através do registo

da actividade electrodérmica.

Participantes

Os participantes recrutados para este estudo são voluntários

que manifestaram interesse em participar na experiência, divulgada

no meio académico. O recrutamento foi realizado na Escola de

Psicologia da Universidade do Minho.

A amostra, não representativa, é constituída por 15

estudantes universitários, 11 raparigas (73%) e 4 rapazes (27%),

com idades compreendidas entre os 19 e os 28 anos (M=22; DP=2,27).

93% dos participantes encontram-se a realizar estudos no âmbito de

um Mestrado Integrado na Universidade do Minho, sendo um

participante investigador nessa mesma universidade.

ANÁLISE DOS DADOS

De acordo com Dawson e col. (1990) a actividade

electrodérmica pode variar entre diferentes indivíduos, e dentro

do mesmo indivíduo, em diferentes estados psicológicos. Assim, a

análise dos dados foi efectuada nos dois níveis de variabilidade

da activação fisiológica: inter e intra-individual.

A análise a nível intra-individual destina-se a avaliar,

dentro do conjunto dos dados de cada participante em particular,

as diferenças de activação registadas nos distintos momentos da

tarefa de exploração vocacional. Este processo começa com a

organização da base de dados originada pelo sistema de

biofeedback. O primeiro passo consiste em eliminar o registo das

medidas psicofisiológicas que não têm interesse para o fenómeno

estudado, como a temperatura ou a frequência cardíaca, deixando

apenas o registo da medida psicofisiológica que será alvo de

análise – a actividade electrodérmica. Antes de iniciar quaisquer

cálculos, o investigador deve verificar, na coluna que representa

os marcadores, ou seja, o início e o fim da linha basal e de cada

um dos cinco itens que integram a tarefa de exploração, se os

marcadores estão associados correctamente aos itens.

O passo seguinte consiste no cálculo do valor médio da linha

basal. Este valor é obtido através da média aritmética dos valores

da actividade electrodérmica que estão incluídos no intervalo

entre o marcador que indica o inicio e o marcador que representa o

fim da linha basal.

Por último, para cada item da tarefa de exploração, calcula-

se a média dos valores obtidos.

No que diz respeito à análise inter-individual, esta foi

efectuada com o intuito de verificar a existência de diferenças

entre os vários participantes, quanto ao nível de activação

registado na linha basal e durante a tarefa de exploração

vocacional.

Neste âmbito, para cada participante separadamente, procedeu-

se ao cálculo da diferença entre o valor médio da linha basal e a

média dos valores de cada um dos itens da tarefa de exploração.

Seguidamente, as diferenças obtidas com cada um dos participantes

relativamente à linha basal e à cada um dos itens da tarefa de

exploração foram agrupadas, calculando-se uma média geral das

diferenças para cada item, o que permite avaliar o aumento, a

diminuição ou a manutenção dos valores obtidos em cada item por

comparação à linha basal.

RESULTADOS

Os valores da actividade electrodérmica registados situaram-

se no intervalo de 2-14 micro-mhos, o que, de acordo com Dawson et

al (1990), são valores típicos do padrão normal da actividade

electrodérmica.

Relativamente aos valores da actividade electrodérmica

registados durante a tarefa de exploração vocacional, estes foram

superiores aos valores registados na linha basal. Através da

Tabela 1, que representa as diferenças entre cada item e a linha

basal de todos os participantes, podemos verificar que todos itens

da tarefa de exploração produziram mais activação do que a

condição de relaxamento, com excepção do segundo e terceiro item

no caso do segundo participante, cujos níveis de activação se

mantiveram iguais à linha basal.

Por outro lado, à medida que os participantes prosseguiram no

desempenho da tarefa de exploração vocacional, a activação

aumentou. No Gráfico 1, que representa a média das diferenças

entre cada item pertencente à tarefa de exploração e a linha

basal, podemos verificar que a média das diferenças entre o

primeiro item e a linha basal (0,41) é inferior à média das

diferenças entre o último item e a linha basal (1,20).

DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Os resultados apresentam dados empíricos que confirmam a

ocorrência da reacção de ansiedade no início do processo de

exploração vocacional. Contudo, estes resultados devem ser

interpretados com precaução, já que a magnitude com que a

ansiedade é sentida pode ser influenciada por factores individuais

como o sexo, a idade, as características da personalidade, a

qualidade da vinculação aos progenitores. Além disso, no processo

de exploração vocacional não emergem apenas emoções negativas.

Outras dimensões afectivas da exploração vocacional deverão ser

igualmente investigadas.

Relativamente à medida psicofisiológica utilizada, Sequeira-

Martinho (1992) refere que factores como a idade e o sexo do

indivíduo, o sítio de registo, a temperatura e a humidade cutâneas

e do ambiente podem modificar de maneira significativa o registo

da actividade electrodérmica. No presente estudo houve a

preocupação de realizar a experiência num ambiente adequado, em

que foram controladas as condições de registo. Apesar das

desvantagens referidas, o seu baixo custo comparativamente a

outras medidas psicofisiológicas, o fornecimento de informação

directa sobre a actividade do sistema nervoso simpático e a

possibilidade do seu uso na investigação de diversos processos

cognitivos fazem com que a actividade electrodérmica continue a

ser uma das medidas mais populares nas investigações em

Psicofisiologia. A preocupação central dos investigadores deverá

incidir sobre o controlo das condições experimentais, de modo a

assegurar que as variações que a actividade electrodérmica

reflecte são provocadas pelo fenómeno em estudo e não por

variáveis parasitas.

Relativamente ao processo de avaliação e registo do padrão de

activação emocional, devem ser enfatizadas algumas considerações

sobre a interacção entre o profissional e o indivíduo avaliado. A

postura do profissional deve caracterizar-se pela promoção da

segurança relativamente à avaliação e aos procedimentos, pela

comunicação efectiva e pela consistência. Ao longo do processo de

avaliação, o profissional deve manter um contacto ocular frequente

e estar atento à manifestação de sinais de ansiedade excessiva,

resistência ou confusão por parte do avaliado.

Este estudo apresenta algumas limitações, como a reduzida

dimensão da amostra e o modo de recrutamento da mesma. A

generalização também está limitada, ainda, pelo facto da amostra

ser constituída apenas por estudantes universitários. No futuro,

será importante realizar este tipo de investigação com outras

populações que se encontrem no inicio de um processo de exploração

vocacional ou em períodos de transição de carreira, nomeadamente

adolescentes, jovens adultos e adultos de diversas faixas etárias.

Tal como Yang e Gysbers (2007) evidenciam, as transições de

carreira dos estudantes no ensino secundário ou universitário

podem ser significativamente diferentes das transições dos

adultos, uma vez que os primeiros poderão não ter os mesmos

stressores que os adultos desempregados, como dificuldades

financeiras ou existência de dependentes. Sugestões para futura

investigação poderão incluir a resposta às questões: Qual o nível

adequado da ansiedade necessário para promover a exploração

vocacional? De que forma e em que condições a exploração pode

aumentar a auto-confiança e a auto-eficácia?.

CONCLUSÃO

No processo de exploração vocacional é importante que o

profissional procure compreender o comportamento e as atitudes do

jovem que explora, prestando atenção tanto às características

individuais que podem influenciar as suas decisões (sexo, etnia),

ao contexto de decisão, bem como aos factores motivacionais e

afectivos. Os profissionais deverão ser assertivos e eficazes a

responder às reacções afectivas e cognitivas dos jovens no

processo de exploração vocacional, garantindo que este processo

produza resultados a nível do aumento dos comportamentos

exploratórios e diminuição dos níveis de ansiedade face à

exploração vocacional. Além disso, deverão guiar os jovens no

sentido de desenvolverem capacidades cognitivas e emocionais que

se revelem eficientes na transição do ensino secundário para o

superior ou do ensino superior para o mundo do trabalho.

Sabemos que o sistema nervoso autónomo opera com alguma

autonomia face ao resto do sistema nervoso, o que indica que a sua

actividade não requer uma intervenção consciente. Contudo, com

treino, os humanos podem aprender a exercer algum controlo sobre

as funções corporais que são parte do sistema nervoso autónomo.

Esta capacidade de auto-regulação psicofisiológica pode ser

aprendida e treinada através do recurso ao biofeedback, cuja

eficiência terapêutica no tratamento de variados sintomas e

perturbações foi comprovada por um grande número de estudos na

área da Psicofisiologia Aplicada. (Schwartz, 1995).

Assim, a intervenção ao nível da ansiedade que os indivíduos

sentem no início e ao longo do processo de exploração vocacional

poderá ser uma estratégia eficaz para a promoção da exploração.

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