Autoria coletiva, autoria ontológica e intertextualidade: aspectos conceituais e tecnológicos
Descrição de fotografias a partir de modelos táteis: ensaios didáticos e tecnológicos
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Descrição de fotografias a partir de modelos táteis: ensaios
didáticos e tecnológicos
Adriane Borda A. da Silva
Monica Veiga
Lilianni Nicoletti
Francisca Michelon
Adriane Borda A. da Silva - Monica Veiga - Lilianni Nicoletti - Francisca Michelon
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Resumo
A criação de uma instituição cultural intitulada “museu do conhecimento para todos”, no
âmbito de uma universidade pública, promove o estudo aqui apresentado. Um conjunto de ações
colaborativas, especialmente entre pesquisadores da área de Museologia, Comunicação e
Arquitetura busca reconhecer referenciais que possam sustentar um primeiro exercício de
realização de uma exposição de fotografias, de maneira inclusiva. Neste trabalho descrevem-se as
experiências que estão sendo realizadas para tornar possível a representação destas fotografias.
Os experimentos envolvem técnicas de representação bi e tridimensionais, explorando o uso de
materiais e tecnologias tradicionais, alternativas e avançadas, incluindo assim o papel vegetal
texturizado, folhas de EVA, maquetes artesanais e modelos produzidos por impressão 3D. A
proposta didática foi batizada como: “adição gradual de informação”, tendo sido avaliada
positivamente por duas especialistas no tema: uma vidente e uma deficiente visual.
Abstract
The creation of a cultural institution entitled "museum of knowledge for all" as part of a public
university promotes the study. A set of collaborative actions, especially among researchers in the field
of Museology, Architecture and Communication seeks to recognize references that would support a
first exercise of holding an exhibition of photographs, so inclusive. This paper describes the
experiments that are being carried out to make possible represent these pictures, as tactile
representation techniques of two and three dimensional, using several materials, from traditional to
advanced alternatives, including the textured transfer papper, EVA sheets, handmade models and
rapid prototyping by 3D printing. The didactic proposal was named as "the gradual addition of
information," having been positively evaluated by two experts on the subject: a sighted one and a
visually impaired.
1 Introdução
Para o Estatuto dos Museus (2009) um museu contemporâneo, deve estar apto a receber
diversos públicos em um ambiente eminentemente inclusivo. Para isto, deve ser capaz de superar o
conceito de deficiência como uma condição patológica, impeditiva para o indivíduo e que o destitui do
convívio social pleno, substituindo-o pelo conceito de deficiência como uma limitação do ambiente
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em receber todos. Nesta perspectiva, o ambiente do museu é que precisa se tornar acessível e
compromissado com tal inclusão.
No âmbito da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), originou-se a proposta do “museu do
conhecimento para todos”, um programa de extensão contemplado com auxílio no edital
PROEXT/MEC 2011 cuja principal meta é a realização de exposições inclusivas, ou seja, exposições
que empreguem recursos de acessibilidade capazes de tornar o conteúdo legível a pessoas com
diferentes deficiências.
Este trabalho apresenta a investigação realizada para produzir uma primeira exposição sob
esta perspectiva, resultando na produção de esquemas e maquetes que buscam traduzir para um
meio de comunicação tátil uma coleção de dezoito fotografias. Tais fotografias registram um
momento recente da história da UFPel, de ocupação de edifícios onde funcionava o Frigorífico Anglo
de Pelotas, dos quais alguns já não existem mais e outros foram modificados para sediar o “Campus
Porto” da UFPel, o qual inclui a sede da reitoria (Figura 1).
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Figura 1- fotografia aérea do conjunto de edifícios do antigo frigorífico, sede atual do Campus Porto/UFPel.
Fonte: recorte de uma foto aérea cedida pela Prefeitura Municipal de Pelotas.
De acordo com Cano (2002), a visão está especializada em transmitir a forma dos objetos. O
tato em transmitir a textura. O ouvido, a posição. Entretanto é o conjunto de tais informações
processadas no cérebro, que permite a compreensão das características do espaço físico. Ao
considerarmos a restrição de um ou mais destes sentidos, faz-se necessário adotar estratégias que
promovam de outra maneira, à aquisição de tal informação. No caso da falta de visão, total ou parcial,
parece possível adicionar informação através das maquetes táteis, do braile e da impressão em relevo.
Neves (2010), ao se referir à experiência tátil, nos leva ao questionamento de como dar a
fruir, através de outros sentidos, obras que nasceram para serem vistas. Destaca a natureza
intrínseca, de obras como quadros, desenhos, permitindo-nos incluir as fotografias nesta reflexão, as
quais terão sempre de ser percebidas através do olhar. A autora, no referido estudo registra
questionamentos tais como: Estarão estes trabalhos efetivamente vedados a quem não vê? Haverá
forma de transformar tais trabalhos em peças tocáveis? E de complementar ou substituir a visão por
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outros sentidos, nomeadamente o tato, a audição, o olfato e/ou o paladar? A autora particulariza o
questionamento para a pintura, observando que neste tipo de obra os espaços, formas e massas
organizam-se e linearizam-se dando a ilusão de profundidade e tridimensionalidade a quem olha.
Prossegue destacando que, salvas as exceções em que a pintura se oferece de forma texturizada,
ressaltando que até mesmo essa é uma textura para se sentir com os olhos, em essência, a maioria
dos quadros não foram feitos para serem tocados e muito menos ainda para serem ouvidos,
cheirados ou provados. A autora reforça que lidar com o toque é algo complexo, afirmando que é
mais complexo ainda se valer de outros sentidos no momento de fazer com que a arte possa ser
sentida.
Ainda Neves (2010) nos faz entender que “ver” é um conceito que precisa ser
reequacionando quando abordado no contexto museológico. A autora nos apresenta uma lógica a
partir do reconhecimento de que o olho é um simples aparelho mecânico. Lembra que é no cérebro
que se vê, através do recebimento de pequenos impulsos elétricos, com diferentes frequências,
transmitidos por todos os sentidos. Conduz o raciocínio para observarmos que: aquilo que se vê de
forma mecânica não será necessariamente aquilo que é dado ao nosso cérebro ver; aquilo que o
nosso cérebro “vê” não terá sido necessariamente recriado a partir da imagem que entrou pela retina.
Levanta assim a hipótese de que um cego poderá ir a uma exposição de pintura (ou fotografia, para
o nosso caso, aproveitando a linha de raciocínio da autora) para que lhe possa ser dado “ver” através
dos outros sentidos. Com isto ela elabora uma proposta para que a visão não-ocular possa ser
proporcionada através da tridimensionalidade das pinturas e através de textos descritivos. A autora
reafirma que com a junção dos dois meios – o verbal e o tátil – é possível compreender imagens de
maneira muito próxima daquela compreensão captada pela visão.
A partir destas considerações esta investigação se centra na identificação e elaboração de
métodos didáticos e tecnológicos a serem empregados para a representação das fotografias
referidas anteriormente.
2 Metodologia
2.1 Etapa de revisão:
Esta etapa tem sido caracterizada pela produção de mapas conceituais. Exemplificados
na figura 2, os mapas reúnem informações advindas especialmente de Teshima (2010), Labtate
(2007) e Tarricone (2011). Tais mapas auxiliam na identificação de sistemas de classificação de
modelos táteis, quanto às finalidades de uso, às maneiras de execução e aos tipos de materiais
empregados. Auxiliam também no reconhecimento da utilização de modelos táteis para reproduções
de obras de arte.
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Estas sistematizações são realizadas a partir da ferramenta Cmap Tools
(http://cmap.ihmc.us/). É uma ferramenta de acesso gratuito, que possibilita estruturar esquemas
dinâmicos, abertos à adição de novos conceitos, parâmetros, imagens ilustrativas, assim como à
reformulação de categorias. O tipo de esquema facilita a comparação entre referenciais, promovendo
associar informações para a resolução dos problemas encontrados ao longo do estudo.
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Figura 2.- Exemplificação dos tipos de esquemas produzidos na etapa de revisão
Nesta etapa investiu-se especialmente na identificação de novas tecnologias para a
produção de modelos. Na figura 3, associa-se a imagem de uma impressora 3D a um esquema
realizado a partir de Celani e Pupo (2008). Esta associação buscou contextualizar este tipo de
máquina, recentemente adquirida no contexto deste trabalho, frente ao estado da arte de produção
automatizada de modelos físicos.
3
Figura 3 - À esquerda, esquema construído a partir de CELANI e PUPO (2008).
Fonte da imagem: autoras.Sobre o esquema, classifica-se o tipo de impressora a ser utilizada no âmbito deste trabalho, ilustrada na imagem à direita. Fonte da imagem: www.cliever.com
A máquina referida admite como matéria prima para a impressão o termoplástico, que é
derretido para configurar modelos a partir da deposição de camadas, constituindo-os com resistência
e conforto para a experiência tátil.
2.2 Etapa de Projeto e execução dos modelos táteis
Considerando o propósito de atribuir acessibilidade à compreensão de fotografias, formulam-
se questões específicas, consideradas como desdobramentos das questões iniciais: Como se
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descreve a geometria das formas representadas em uma fotografia a partir de um modelo tátil?
Como se descreve uma imagem em perspectiva? Como explicar as associações entre estas
deformações geométricas em função do ponto de vista?
Para responder a estes questionamentos, evidentemente, pode-se apoiar no conhecimento
da Perspectiva, o qual se encontra sistematizado desde o Renascimento. Entretanto, como explicá-lo
para quem nunca viu?
Durante toda esta etapa de trabalho estão presentes assim questões conceituais, de
discussão sobre a estrutura de saber, relativa à Perspectiva, envolvida no processo de descrição de
uma fotografia. Por outro lado estão as questões tecnológicas, que pressupõem a disponibilidade de
materiais e uso das diferentes técnicas identificadas na etapa de revisão. Além das tecnologias
tradicionais para execução de maquetes artesanais, está sendo possível então experimentar alguns
processos automatizados de produção, a partir de modelos digitais e impressão 3D.
Deve-se destacar que o objetivo desta etapa é de explorar todas as tecnologias disponíveis,
avaliando-as sobre a pertinência e viabilidade. Nesta direção, o método está sendo construído a
cada experimentação. Para uma determinada fotografia realizam-se vários questionamentos, como
por exemplo: Quais representações táteis e quais discursos didáticos comporão todo o processo?
Como sequenciar ou sobrepor representações e discursos? Como apresentar o discurso didático, se
por meios audiodescritivos ou em braile? Como promover a total autonomia para o uso de tais
recursos? Valendo-se de um guia? Em tempo parcial ou integral para acompanhar a experiência?
2.3 Etapa de Experimentação e validação:
O propósito desta etapa é de expor cada um dos processos de descrição para que haja
a contribuição de diferentes públicos: inicialmente para especialistas na área, logo, para deficientes
visuais, seguindo-se a experimentação com estudantes de Perspectiva, e logo para o público
em geral.
2.4 Etapa de sistematização e difusão
Esta etapa inclui a análise comparativa entre os processos de descrição de fotografia
realizados, observando-se as possibilidades de identificar tipos de representações fotográficas
associadas com: métodos didáticos e padrões de produção de modelos táteis. Desta maneira busca-
se sistematizar o processo de desenvolvimento de modelos táteis para a representação de
fotografias.
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Faz-se importante destacar que o desenvolvimento destas quatro etapas de trabalho não
ocorre de maneira linear, havendo um processo dinâmico de realimentação entre elas,
especialmente a partir da etapa de revisão.
3 O processo de projeto e execução das representações
Os projetos e as execuções de modelos táteis até então realizados foram desenvolvidos
durante os meses de abril a junho de 2012. Referem-se à representação de quatro dentre as dezoito
fotos relativas à exposição em questão.
Para o projeto das representações de três destas fotos (aqui denominadas como foto
1, 2 e 3) considerou-se, principalmente, as seguintes referências: Teshima (2010), a qual
destaca que as pessoas com deficiência visual podem reconhecer as formas dos objetos
tridimensionais (3D) por tocá-los, no entanto, é bastante difícil reconhecer as formas dos
objetos tridimensionais através de figuras planas bidimensionais (2D) em relevo; Labtate
(2007), que recomenda que devemos generalizar os contornos e formas planimétricas e
altimétricas, pois quanto mais detalhes, mais confusa a informação se mostra para o deficiente
visual, dificultando o processo de aprendizagem; e o trabalho da designer Dayse Tarricone, o
qual exemplifica não só a reprodução em relevo de obras de arte, como também através de
maquetes táteis representando o ambiente da obra bidimensional, a partir de um ambiente
tridimensional para que os deficientes visuais possam entender o porque de cada objeto estar
representado em determinado lugar na imagem.
Já para a quarta foto (denominada foto 4), os recursos materiais e tecnológicos
utilizados foram predeterminados, executando-se um exercício proposto pela especialista da
área de comunicação inclusiva e tradução audiovisual, Dra. Josélia Neves (IACt/IPL/Portugal).
Considera-se pertinente, para contextualizar o enfoque dado aos experimentos, registrar
a formação da equipe que desenvolveu cada processo: uma pesquisadora na área de
representação gráfica e digital, responsável por ministrar disciplinas de graduação em
representação gráfica, especialmente a disciplina de Perspectiva; uma estudante de arquitetura
de segundo ano, já graduada em Comunicação, tendo realizado como trabalho de conclusão de
curso um audiogibi para crianças com deficiência visual, especialista em hospitalidade, tendo
sido estagiária do departamento de entretenimento do Walt Disney World Resorts, tendo por
hobby a produção de maquetes artesanais; uma estudante de arquitetura, iniciante em
processos de representação gráfica digital.
A seguir são descritas as propostas de desenvolvimento dos modelos táteis.
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3.1 Modelos táteis para a representação da Foto 1
A foto 1 refere-se a um quadro de madeira utilizado como suporte de ferramentas do antigo
frigorífico. Uma das hipóteses de representação foi a de executar uma réplica do quadro,
empregando-se assim as mesmas dimensões e mesmos materiais, já que a sua escala viabilizaria a
percepção através do tato. Porém, logo se considerou que o quadro deveria conter efetivamente as
ferramentas. Assim seria mais fácil informar sobre suas formas e a maneira como estavam dispostas
sobre o suporte de madeira. Adicionar-se-ia a informação de que todas as ferramentas haviam
deixado apenas a sua marca, a qual reporta a um grande período de tempo em que tais ferramentas
estiveram ali depositadas, ao término de jornadas de trabalho. Em um segundo momento,
considerou-se a hipótese de representação em menor escala, para viabilizar, por exemplo, a
obtenção de vários modelos a serem disponibilizados para a experiência tátil a um grupo. O conjunto
de imagens da figura 4 ilustra o processo de desenvolvimento de representações digitais para
execução dos modelos físicos. O segundo quadro desta figura demonstra o primeiro estágio do
processo, de vetorização das linhas que delimitam cada uma das formas representadas. Uma das
hipóteses corresponde com aquela ideia de obter um modelo completo do quadro, com as
ferramentas, atribuindo um caráter lúdico: de permitir a experiência do manuseio de cada uma delas.
A segunda hipótese, imagem do centro da figura 4, seria a de disponibilizar apenas o modelo em alto
relevo, informando através do discurso (impresso ou falado) que o alto relevo está sinalizando a
marca deixada pelas ferramentas. A imagem a seguir, já representa outra hipótese, de que o modelo
tátil informe a ausência, a partir do baixo relevo para cada uma das marcas deixadas pelas
ferramentas. Pensou-se ainda no incremento da experiência, se for disponibilizado o modelo de cada
uma das ferramentas, sobre a base em baixo relevo.
4
Figura 4 - À esquerda, a fotografia de um quadro de ferramentas encontrado no edifício do antigo frigorífico (foto 1).
Fonte: acervo do “museu do conhecimento para todos”/UFPel. Na sequência, imagens de seus modelos digitais: a partir da vetorização das formas representadas na fotografia; por extrusão do modelo vetorizado, em alto e baixo relevo, respectivamente. Fonte: autoras
Em um terceiro momento questionou-se o quanto os modelos projetados podem ser
capazes de informar sobre tal fotografia. Buscou-se explorar outro tipo de modelagem, o qual
agregasse mais informação, além da geometria simplificada de cada elemento representado. A ideia
foi de tentar informar sobre a textura, sobre a aparência do conjunto dos elementos, produto do
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fenômeno de interação entre luz e matéria. A figura 5 exemplifica o modelo digital produzido sob esta
perspectiva.
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Figura 5 - À esquerda, vista frontal do modelo digital tridimensional, buscando representar o máximo de informação
extraída da foto 1. À direita, vista em perspectiva de tal modelo. Fonte: autoras
Entretanto, como já identificado na etapa de revisão, este tipo de modelo pode
comprometer a compreensão pelo tato, exatamente pela quantidade de informação e imprecisão do
limite do contorno de cada uma das formas. Salvo o caso em que este modelo fizesse parte de uma
sequencia, em um processo adicional de informações. Este tipo de modelagem é obtido por um
processo digital parametrizado. A imagem fotográfica é traduzida em níveis de cinza sobre os quais
são atribuídos, automaticamente ou não, diferenças de profundidade.
Foram experimentadas outras técnicas de produção. A figura 6 ilustra uma tentativa
frustrada de execução. Estas representações foram realizadas com o propósito de acelerar o
processo de validação, já que ainda não tínhamos naquele momento a impressora 3D. Partindo-se
do modelo digital vetorizado, bidimensional, foi realizado o corte automatizado, a laser. Com isto
obtiveram-se todos os elementos para testar as hipóteses anteriormente descritas (reconhecimento
tátil de cada uma das ferramentas e, logo, a ideia de ausência). As cores escolhidas para a execução
do modelo buscou seguir as recomendações de alto contraste. Entretanto, o material utilizado, EVA,
se mostrou frágil. De qualquer maneira, considerou-se válido registrar aqui esta experiência, pois
pode de alguma maneira, suscitar em outros pesquisadores soluções mais viáveis, promovendo a
discussão sobre o emprego de materiais alternativos. E, ainda sempre considerando, que em
determinadas situações emergenciais para resolver problemas de comunicação é um recurso
acessível em termos econômicos e operacionais.
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Figura 6.- À esquerda, registro fotográfico do momento de aplicação de verniz sobre a representação da foto 1 em EVA; à
direita, modelo deformado, após aplicação do verniz. Fonte: autoras.
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3.2 Modelos táteis para a representação da Foto 2
A foto 2, à esquerda da fig. 7, traz elementos de escala arquitetônica. Para descrevê-la é
necessário adotar outras estratégias, especialmente pela evidência das deformações provocadas
pelo efeito da imagem em perspectiva. A foto representa a imagem vista por um observador que está
no interior de um dos edifícios olhando para o exterior, visualizando, através de uma malha de
caixilhos de uma das janelas, um dos elementos mais característicos da arquitetura industrial: uma
chaminé.
As demais imagens da figura 7 registram as hipóteses de representação da foto 2. Optou-se
inicialmente pelo desmembramento dos elementos representados em dois blocos tridimensionais
para explicar as diferentes profundidades: um bloco de fundo representando a paisagem vista
através da janela, e o segundo bloco, sobreposto ao primeiro, como um jogo de encaixe,
representando o caixilho da janela. A última imagem traz o mesmo tipo de representação comentada
anteriormente, exemplificada pela figura 5.
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Figura 7- à esquerda, Foto 2, obtida a partir do interior de um dos edifícios e visualizando a chaminé do antigo frigorífico.
Fonte: acervo do “museu do conhecimento para todos”/UFPel. Em seguida, imagens dos modelos para impressão 3D:
bloco de fundo, bloco a ser sobreposto e, por último, um bloco único com toda a informação sobre a ideia de textura da foto.
Fonte: autoras.
A figura 8 apresenta um modelo digital simplificado do lugar, como primeira hipótese para a
maquete tátil, a qual visaria orientar sobre a localização dos pontos de vista adotados em cada
fotografia, para o conjunto das dezoito a serem descritas. Ao lado, uma evolução do modelo,
buscando informar, além da proporção entre os volumes, características básicas de sua arquitetura
de caráter industrial, tais como: lanternins, simetrias, repetições de janelas idênticas sobre longos
planos de fachada, escadas externas e rampas. Nesta direção, a escala de representação está
pensada para que seja possível percorrer o espaço entre os edifícios com os dedos. A base da
maquete será a própria imagem da figura 1, foto aérea do local, permitindo assim contemplar
informações para os videntes também. A última imagem representa um modelo introdutório para a
compreensão da foto 2, buscando que a partir do tato seja possível compreender as posições
relativas entre os elementos que a compõem.
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Figura 8 - Imagens de modelos para impressão 3D: à esquerda, modelo simplificado do conjunto de edifícios; à direita, o
modelo detalhado sobre a foto aérea do local; Fonte: autoras
3.3 Modelos táteis para a representação da Foto 3
A foto 3 (figura 9) traz também elementos da escala arquitetônica. O ponto de vista adotado
permite observar as coberturas das edificações. Destaca os contrastes entre novos materiais com as
paredes de cimento penteado, técnica de revestimento já não utilizada mais e que caracteriza a
arquitetura industrial da cidade.
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Figura 9 - foto 3. Fonte: acervo do “museu do conhecimento para todos”/UFPel.
Como no caso da foto 2, para entender a geometria da imagem, faz-se necessário explicitar
as posições relativas entre os elementos envolvidos: ponto de vista do fotógrafo e as coberturas
fotografadas. Necessitando-se para isso o uso da maquete do conjunto das edificações, citada
anteriormente.
As seguintes imagens da figura 10 ilustram os modelos construídos para a
representação da foto 3. A primeira refere-se à vetorização dos contornos das formas, para
viabilizar o corte a laser. A próxima, refere-se a um modelo desenvolvido em papel paraná,
atribuindo espessuras aos diferentes planos para informar sobre as distâncias ao plano de
configuração da imagem fotográfica. Neste caso, as técnicas foram totalmente artesanais, com
corte realizado com estilete.
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Figura 10- Vetorização da fotografia seguido do modelo em papel Paraná; por fim, modelo para impressão 3D.
Fonte: autoras.
As duas imagens, à direita da figura 10, são do modelo digital para a posterior impressão
3D. Esta última induz a uma interpretação desta foto que pode estar fazendo alusão ao contorno da
parte inferior do mapa do Rio Grande do Sul ou a um funil de recolhimento das águas do canal São
Gonçalo que está ao fundo.
3.4 Modelos táteis para a representação da Foto 4
Conforme referido anteriormente, os modelos táteis de representação da foto 4,
seguiram o que foi pré estabelecido durante uma atividade proposta pela Especialista Dra.
Josélia Neves. Tal proposta foi de utilização da técnica de textura em relevo sobre papel
vegetal, obtida pela perfuração deste papel por uma agulha de costura, utilizando-se uma placa
de isopor como apoio.
A proposta foi precedida de uma exposição de diferentes materiais táteis, os quais
exemplificaram as diversas soluções que esta especialista identificou como sendo utilizadas por
instituições museológicas. As reflexões provocadas por ela durante a exposição e principalmente a
crítica sistematizada aos materiais apresentados, incrementaram os métodos configurados desde os
exercícios de representação das fotos 1, 2 e 3. As hipóteses de simplificação da informação e adição
gradual de camadas de informação foram todas respaldadas pela especialista.
As imagens da figura 11, da direita para a esquerda, referem-se a uma sequencia proposta
para a descrição da geometria dos elementos na fotografia em questão (foto 4), no espaço
bidimensional, através da técnica pré-definida.
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Figura 11 - Foto 4 seguida de representações que apresentam a informação desta fotografia em camadas de papel vegetal
texturizado (furos dispostos sobre os contornos das formas). Fonte: autoras.
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Já o conjunto de imagens da figura 12, auxilia a explicação sobre as posições relativas e
proporções entre os elementos no espaço real, tridimensional. A primeira imagem informa, em
projeção horizontal, a localização dos pilares representados na fotografia, assim como a posição das
paredes que delimitam tal espaço. Sobre esta mesma representação indica-se, com uma seta, a
posição do fotógrafo. A segunda imagem apoia uma explicação sobre a proporção dos pilares em
relação à figura humana. A terceira tem o propósito de apresentar isoladamente um pilar, explicando
que em função do ponto de vista todos eles estão sendo visualizados por duas de suas faces.
12 Figura 12:- à esquerda, esquema em planta baixa do espaço fotografado com indicação do ponto de vista; ao
centro, informação sobre a proporção entre um pilar e a figura humana; à direita, informação sobre a
visualização de duas faces de cada pilar, em função do ponto de vista Fonte: autoras.
A associação entre tais representações, das figuras 11 e 12, estrutura o discurso didático
para promover a compreensão da foto por um deficiente visual. Entende-se também que tais
representações podem aguçar a percepção dos videntes para a compreensão das deformações em
função dos efeitos da perspectiva.
3.5 O desenho e a experimentação da proposta didática de utilização dos modelos táteis,
relativos à foto 4
Após os exercícios de representação da foto 4 e ainda contando com a presença da Dra.
Josélia Neves, houve a oportunidade de expor os materiais produzidos em papel vegetal, tamanho
A4, para uma voluntária, especialista no tema e deficiente visual: Márcia Santos (Museu Joaquim
Felizardo, Porto Alegre). Desta maneira, foi possível avançar na execução da terceira etapa deste
estudo, de experimentação. Deve-se destacar que não houve tempo para uma discussão mais
detalhada sobre a elaboração do discurso didático de apresentação das camadas de informação.
Entretanto, frente aos resultados desta primeira experiência, considerou-se válido registrar o discurso
empregado tal como aconteceu. O teste consistiu na apresentação das camadas de informação
geradas, guiadas por informações orais de acordo com o seguinte roteiro:
Passo 1: Apresentação da segunda imagem da figura 12. Houve a intenção de introduzir a descrição
da fotografia a partir da apresentação do tipo de elemento que se repete e determina a composição
geométrica da fotografia: o pilar. Paralelamente à experiência através do tato inseriu-se o seguinte
discurso: “Todos os pilares são do mesmo tamanho, porém alguns são representados menores por
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conta da deformação geométrica provocada pela perspectiva...”. A voluntária acusou o
reconhecimento de tais diferenças e também da relação de proporção entre o pilar e a figura
humana.
Passo 2: Apresentação da terceira imagem da figura 12, acompanhada do seguinte discurso: “Os
pilares estão representados na fotografia desta forma, podendo-se visualizar duas faces de cada um
deles. É a representação em perspectiva”
Passo 3: Apresentação da primeira imagem da figura 12. A partir da compreensão da planta baixa e
da posição do fotógrafo, a voluntária expressou o seguinte: “Agora faz sentido” e girou a folha
posicionando a seta (ponto de vista do fotógrafo), percebendo com o tato a posição de todos os
elementos, pilares e paredes.
Passo 4: Apresentação da terceira imagem da figura 11, referente à representação das paredes,
adicionando-se o seguinte discurso: “Estas paredes são o que há de mais distante na foto”. Em
continuidade, a voluntária se pronunciou da seguinte maneira: “Então esse é o fundo da foto e os
pilares estão dentro deste ambiente?”
Passo 5: Apresentação da última imagem da figura 11. Respondendo-se a pergunta da voluntária:
“Sim, os pilares ficam representados dessa forma na fotografia, conforme a planta baixa”.
Considerando-se os limites dos recursos utilizados, com materiais táteis bidimensionais, a
proposta foi considerada válida. Provocou reflexões tanto sobre a sequência das camadas
apresentadas, quanto sobre a qualidade do discurso. E, principalmente sobre a importância em
otimizar o processo através de recursos tridimensionais. Tem-se a hipótese de que uma maquete do
espaço representado eliminaria várias camadas, principalmente o conjunto das imagens da figura 12.
Entretanto, deve-se levar em conta o propósito de adicionar mais ou menos informação no sentido de
promover um aprendizado efetivo sobre a imagem em perspectiva. Outra questão fundamental foi
observar o quanto o material tátil produzido necessita de um sistema de guia ou áudio-descrição.
Esta primeira experiência atentou para a necessidade de uma etapa específica para a construção do
discurso.
Quanto à hipótese de que as imagens deveriam ser desmembradas e reconstruídas na
imaginação do usuário através de patamares de informação, foi possível notar sua eficácia.
3 A delimitação de um método: adição gradual da informação
Os experimentos até então realizados permitiram compreender a necessidade de um
desenho específico para cada fotografia. Apenas para a foto 4 foi possível avançar para etapa de
experimentação e validação. Entretanto, a estratégia de adição gradual de informação, utilizada para
a representação da foto 4, foi sendo construída a partir da configuração de hipóteses de
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representação das três primeiras fotos. O fato de esta estratégia ter sido avaliada positivamente
pelas especialistas permite caracterizar um método a ser experimentado e sistematizado, como
referência para a produção dos modelos táteis no contexto do “museu do conhecimento para todos”.
Deve-se destacar que os tipos de camadas de informação são próprios de cada fotografia.
Entretanto, já se pode supor aspectos que devem ser descritos em todos os casos, configurando-se
como camadas de informações: a geometria dos elementos representados no espaço real; posições
relativas entre tais elementos, distâncias e proporções (relativas à figura humana); a localização do
ponto de vista do fotógrafo; e, sobre a imagem da fotografia em si, deve-se considerar a simplificação
dos contornos e adição gradual da informação para compor a complexidade da imagem da fotografia.
4 considerações finais
Analisando-se os resultados decorrentes das etapas de trabalho, identificam-se alguns
produtos significativos.
A etapa de produção dos modelos promoveu a qualificação da equipe, exigindo a
apropriação de diferentes tecnologias; o desenho do método didático logicamente foi determinando a
escolha de técnicas e materiais a serem experimentados. Ao observar as especificidades de cada
fotografia, considerou-se não ser possível estabelecer regras comuns para a produção dos modelos
em termos principalmente de escala para a produção dos modelos táteis. Entretanto, considera-se
possível associar tipos de situações em que pode ser mais adequada a reprodução em escala
natural, em escala reduzida ou ampliada.
O desafio de expor toda esta trajetória, mesmo que em um estágio embrionário, diretamente
para uma especialista e deficiente visual, incrementou o processo de sistematização do método
didático. Confirmou a hipótese da necessidade de investir na diversidade de modelos e discursos
que serão complementares para a construção da imagem no cérebro, já que os impulsos elétricos
não serão gerados diretamente pela vibração da retina pelo efeito da luz, tal qual nos recorda Neves
(2010).
Todo o conjunto de ações promoveu a construção de uma cultura de inclusão no contexto
trabalhado. Especialmente as reflexões derivadas da estrutura de saber envolvida para explicar a
lógica da imagem fotográfica motivou um repensar sobre a complexidade do conhecimento em si. O
fato de a equipe estar constituída por uma docente e estudantes de arquitetura, que estudam
Perspectiva, o método didático estruturado para a exposição certamente será transposto para o
contexto didático. Esta questão é muito bem colocada em NEVES, 2006, quando afirma que
desenhar para todos significa encontrar soluções que sejam úteis a todos.
Adriane Borda A. da Silva - Monica Veiga - Lilianni Nicoletti - Francisca Michelon
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Neste processo pode-se perceber concretamente que ao buscarmos a inclusão de
deficientes, que ao integrar estes públicos especiais, a partir da constituição do que se denominou
como método de “adição gradual da informação”, criam-se melhores condições para todas as outras
pessoas. Nesta direção, os resultados do trabalho transcendem os objetivos iniciais, motivando cada
vez mais este processo de investigação.
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IMPLEMENTAÇÃO DE MAQUETES TÁTIL PARA PESSOAS COM DEFICIENCIA VISUAL.
Unicamp. Campinas, SP, 2010.
Adriane Borda A. da Silva
GEGRADI/FAUrb/UFPel
E-mail: [email protected]
Monica Veiga
FAUrb/UFPel
E-mail: [email protected]
Lilianni Nicoletti
FAUrb/UFPel
E-mail: [email protected]
Francisca Michelon
ICH/UFPel
E-mail: [email protected]