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CIÊNCIAS E MEIO AMBIENTE NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DOS ANOS INICIAIS: PRÁTICAS EM UM CURSO DE PEDAGOGIA Maria Cristina de Senzi Zancul (Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara – UNESP) Alessandra Aparecida Viveiro (Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara – UNESP) RESUMO Neste trabalho, relatamos as propostas que temos efetivado em três disciplinas que abordam conteúdos de Ciências e de Meio Ambiente, em um curso de Pedagogia. Nessas disciplinas, procuramos propiciar o desenvolvimento de práticas investigativas, que articulem conhecimentos de diferentes campos, contribuindo para uma visão integradora da realidade e para a exploração das múltiplas relações entre Ciência, Tecnologia, Sociedade e Ambiente (CTSA). Entendemos que a realização de trabalhos com esse enfoque, durante a formação, pode contribuir para a valorização das áreas de Ciências e Educação Ambiental e de seu ensino por parte dos docentes em formação e, como consequência, para o enriquecimento da prática educativa com crianças nos anos iniciais da escolarização. Palavras-chave: ciências, meio ambiente, formação de professores, anos iniciais. INTRODUÇÃO Na sociedade contemporânea, convivemos constantemente com produtos da tecnologia e, em nosso dia a dia, somos confrontados com fenômenos, fatos e eventos da realidade relacionados com a natureza científica que precisam sem interpretados com base em conhecimentos. Desse modo, a apropriação de conceitos, princípios e procedimentos científicos torna-se condição necessária para uma utilização compreensiva da ciência e da tecnologia e para o entendimento das relações entre ciência, tecnologia e sociedade. Diante disso, a necessidade de um acesso mais amplo dos indivíduos à cultura científica parece ser um argumento relevante para defendermos o ensino de Ciências nos diferentes níveis de escolarização, desde os anos iniciais. Os conteúdos científicos fazem parte da cultura elaborada e podem transformar a nossa forma de interação com o mundo, ampliando a capacidade de compreender e atuar enquanto sujeitos sociais frente a questões diversas (FUMAGALLI, 1998; ZANCUL, 2007; BIZZO, 2009). Soma-se aos argumentos favoráveis o fato das crianças terem interesse por temas da área de ciências (ZANCUL, 2007). Na infância, estão construindo as primeiras explicações sobre o mundo e cabe à escola o papel de desenvolver um processo sistematizado para formação de conceitos e discussão de ideias (HARLEN, 1989). 135

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CIÊNCIAS E MEIO AMBIENTE NA

FORMAÇÃO DE PROFESSORES DOS ANOS INICIAIS: PRÁTICAS EM UM

CURSO DE PEDAGOGIA

Maria Cristina de Senzi Zancul (Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara – UNESP) Alessandra Aparecida Viveiro (Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara – UNESP)

RESUMO

Neste trabalho, relatamos as propostas que temos efetivado em três disciplinas que abordam conteúdos de Ciências e de Meio Ambiente, em um curso de Pedagogia. Nessas disciplinas, procuramos propiciar o desenvolvimento de práticas investigativas, que articulem conhecimentos de diferentes campos, contribuindo para uma visão integradora da realidade e para a exploração das múltiplas relações entre Ciência, Tecnologia, Sociedade e Ambiente (CTSA). Entendemos que a realização de trabalhos com esse enfoque, durante a formação, pode contribuir para a valorização das áreas de Ciências e Educação Ambiental e de seu ensino por parte dos docentes em formação e, como consequência, para o enriquecimento da prática educativa com crianças nos anos iniciais da escolarização. Palavras-chave: ciências, meio ambiente, formação de professores, anos iniciais.

INTRODUÇÃO

Na sociedade contemporânea, convivemos constantemente com produtos da

tecnologia e, em nosso dia a dia, somos confrontados com fenômenos, fatos e eventos da

realidade relacionados com a natureza científica que precisam sem interpretados com base em

conhecimentos.

Desse modo, a apropriação de conceitos, princípios e procedimentos científicos

torna-se condição necessária para uma utilização compreensiva da ciência e da tecnologia e

para o entendimento das relações entre ciência, tecnologia e sociedade.

Diante disso, a necessidade de um acesso mais amplo dos indivíduos à cultura

científica parece ser um argumento relevante para defendermos o ensino de Ciências nos

diferentes níveis de escolarização, desde os anos iniciais. Os conteúdos científicos fazem

parte da cultura elaborada e podem transformar a nossa forma de interação com o mundo,

ampliando a capacidade de compreender e atuar enquanto sujeitos sociais frente a questões

diversas (FUMAGALLI, 1998; ZANCUL, 2007; BIZZO, 2009).

Soma-se aos argumentos favoráveis o fato das crianças terem interesse por temas da

área de ciências (ZANCUL, 2007). Na infância, estão construindo as primeiras explicações

sobre o mundo e cabe à escola o papel de desenvolver um processo sistematizado para

formação de conceitos e discussão de ideias (HARLEN, 1989).

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Aprender ciências constitui um direito das crianças e a escola possui um dever social

de disseminar a cultura científica (FUMAGALLI, 1998). No entanto, pesquisas apontam que

os conteúdos de Ciências são pouco trabalhados com as crianças, o que pode ser consequência

de lacunas na formação de professores nessa área (HAMBURGUER, 2007; LONGHINI,

2008). Quando trabalham com ciências, é comum uma prática transmissiva, reproduzindo as

“verdades científicas”, fruto das distorções sobre a natureza da ciência que carregam esses

professores (CAMPOS; NIGRO, 1998).

Observamos, também, que os temas ambientais são trabalhados de forma

insatisfatória nos anos iniciais. Um estudo realizado em escolas municipais de Araraquara –

SP revelou que os projetos sobre esses temas são pouco referidos pelos professores e quase

sempre relacionados apenas a visitas, hortas e feiras do conhecimento (FERRARI, 2009).

A necessidade da inserção da Educação Ambiental (EA) nos diferentes níveis e

modalidades de ensino vem sendo discutida há muitas décadas e é contemplada pela

legislação brasileira. A Lei nº 9.795, de 27 de abril de 1999, indica que a EA deve constituir

uma prática educativa integrada, contínua e permanente em todos os níveis e modalidades do

ensino formal, desde a Educação Básica até o Ensino Superior (SÃO PAULO, 1999). A

Resolução nº 2, de 15 de junho de 2012, que estabelece as Diretrizes Curriculares Nacionais

para a Educação Ambiental, enfatiza, entre outros aspectos, que os conhecimentos

relacionados à EA podem ser explorados de forma transversal, a partir de temas relacionados

com o meio ambiente e a sustentabilidade socioambiental, como conteúdo dentro das

disciplinas do currículo já instituído ou, ainda pela combinação dessas formas (BRASIL,

2012).

Entendemos que o professor polivalente que atua nos anos iniciais da escolarização

teria, em tese, uma condição privilegiada para “abordar temas concernentes à temática

ambiental explorando uma questão a partir de diferentes óticas, tanto com conhecimentos

inerentes a cada área do conhecimento, incluindo ciências, que auxiliam na compreensão de

questões, como pelo viés da transversalidade” (VIVEIRO; RUY, 2014, p. 2). No entanto, para

que seja capaz de desenvolver práticas integradas em ciências e meio ambiente nos anos

iniciais da escolarização, os cursos de formação precisam explorar abordagens teóricas e

metodológicas sobre essas áreas.

No Brasil, a formação de docentes para os anos iniciais é feita prioritariamente nos

cursos de Licenciatura em Pedagogia. Apesar da complexidade para se construir um currículo

que inclua os diversos fundamentos e conteúdos necessários a um professor que trabalha

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nesse segmento, é fundamental que os conhecimentos de Ciências e Meio Ambiente sejam

contemplados.

Assim, consideramos que um aspecto importante consiste na superação de

concepções equivocadas sobre a natureza da ciência. No que se refere aos temas ambientais, é

preciso ir além das propostas de trabalho pontuais, restritas a datas comemorativas, focadas

muitas vezes, somente em representações de meio ambiente como natureza, como recurso e

como problema, que são apenas três, dentre outras visões apresentadas por Sauvé (2003).

CIÊNCIAS E MEIO AMBIENTE NO CURSO DE PEDAGOGIA DA FCL/Ar – UNESP

A partir das considerações apresentadas e com base na literatura na área de ensino de

ciências e Educação Ambiental, identificamos aspectos que consideramos relevantes para uma

formação de professores que valorize a compreensão de conceitos e aspectos relacionados à

natureza da ciência e ao meio ambiente e estabelecemos alguns eixos para nortear nosso

trabalho em três disciplinas do curso de Pedagogia da Faculdade de Ciências e Letras de

Araraquara (FCL/Ar) – UNESP: Conteúdo, Metodologia e Prática de Ensino de Ciências

(120h), Educação e Meio Ambiente (60h) e Educação Científica (60h).

Em nossas práticas, buscamos inserir a História e a Filosofia da Ciência em uma

concepção processual, problematizando o que é ciência, quais seus objetos de estudo e as

relações entre conhecimento cotidiano e científico, procurando contribuir para a compreensão

de que esses conhecimentos refletem muito do modo como o mundo é ou foi visto em

determinado momento por um grupo de pessoas (CALOR; SANTOS, 2004, GIL-PÉREZ et

al., 2001). Além disso, fazemos uso de atividades experimentais em uma abordagem

investigativa, favorecendo o entendimento sobre a dinâmica da atividade científica, discutindo

o papel de um sistema teórico na interpretação dos dados, analisando as evidências

encontradas, interpretando relações a partir dos resultados (CALOR; SANTOS, 2004;

GONÇALVES; MARQUES, 2006). Utilizamos também atividades de campo, explorando

espaços não formais (Museus e Centros de Ciências, Trilhas Interpretativas em ambiente

natural e construído etc.) que oferecem condições para observação de fenômenos e a vivência

de situações distintas das usualmente experienciadas.

Em síntese, procuramos propiciar o desenvolvimento de práticas investigativas que

compreendam uma articulação de conhecimentos de diferentes áreas, contribuindo para uma

visão integradora da realidade e a exploração das múltiplas relações entre Ciência,

Tecnologia, Sociedade e Ambiente (CTSA), recorrendo a acontecimentos do cotidiano para

analisar as implicações das aplicações do conhecimento científico em questões que afetam a

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saúde e o meio ambiente, as diferentes facetas do desenvolvimento de novas tecnologias, as

questões éticas envolvidas etc. (SANTOS; MORTIMER, 2001).

Os procedimentos incluem também o estímulo à busca de informações em materiais

diversificados, como livros paradidáticos, artigos de divulgação científica, artigos de pesquisa

e relatos de experiência, de forma a orientar a consulta a diferentes fontes bibliográficas

confiáveis. Além disso, procuramos fomentar a discussão sobre a utilização da Internet e das

novas tecnologias da informação e comunicação como forma de acesso a conhecimentos, uma

vez que estas ampliam possibilidades e permitem vivenciar situações que não seriam

possíveis sem o auxílio da tecnologia (WARD, 2010).

Entendemos que o desenvolvimento de trabalhos com esses enfoques, durante a

formação, pode favorecer a compreensão sobre a natureza da ciência e o meio ambiente,

contribuindo para a valorização dessas áreas e de seu ensino por parte dos docentes em

formação e, como consequência, para o enriquecimento da prática educativa com as crianças.

Apresentamos, na sequência, a proposta desenvolvida nas três disciplinas em que são

explorados os conteúdos de ciências e meio ambiente no curso de Pedagogia da FCL/Ar –

UNESP.

Conteúdo, Metodologia e Prática de Ensino de Ciências

A disciplina Conteúdo, Metodologia e Prática de Ensino de Ciências é obrigatória,

sendo oferecida aos alunos de Pedagogia no 6º semestre do curso. A carga horária de 120

horas é organizada em 60 horas presenciais, de caráter teórico-prático, e 60 horas de prática

como componente curricular (PCC), realizadas em atividades extraclasse.

Seus objetivos são focados de forma a favorecer a compreensão dos fundamentos

teóricos e metodológicos do ensino de ciências, envolvendo discussões sobre conteúdos,

procedimentos e atitudes referentes à área, além de orientações para elaboração de projetos de

ensino.

A partir disso, possui a seguinte ementa: Características da atividade científica.

Histórico do ensino de Ciências. O ensino de Ciências na Educação Infantil e no Ensino

Fundamental. Análise dos conteúdos usuais de ciências na Educação Infantil e nos anos

iniciais do Ensino Fundamental. Análise de propostas metodológicas. Material didático para a

educação científica. Avaliação em Ciências.

Iniciamos o trabalho levantando as percepções dos estudantes sobre a natureza da

ciência a partir do posicionamento sobre algumas situações e, na sequência, explorando

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aspectos de História e Filosofia da Ciência que favoreçam a compreensão sobre a dinâmica do

trabalho científico.

Após essa etapa, desenvolvemos um histórico sobre o ensino de ciências no Brasil,

relacionando com as perspectivas de ensino predominantes em cada época tendo como base as

discussões de Krasilchik (1987) e Cachapuz, Praia e Jorge (2000).

Na sequência, trabalhamos com os conteúdos específicos nos eixos terra e universo,

seres vivos e ambiente e ser humano e saúde. No eixo terra e universo, temos focado na

compreensão e nas possibilidades de exploração com as crianças de conteúdos de Astronomia

do cotidiano, como o dia e a noite, movimentos da Terra, fases da lua, marés, estações do ano

e pontos cardeais. No início do desenvolvimento desse eixo, os alunos recebem um calendário

lunar e devem realizar a observação e o registro diário da lua durante uma lunação, material

explorado posteriormente na discussão sobre as fases da lua e que constitui um exemplo de

atividade que pode ser realizada nos anos iniciais. No eixo seres vivos e ambiente,

exploramos os diferentes biomas, com foco na percepção do ambiente local e regional, as

inter-relações entre componentes bióticos e abióticos do ambiente, incluindo os impactos da

ação antrópica sobre o ambiente. Para abordagem do eixo ser humano e saúde, enfatizamos a

visão de saúde como bem estar físico, mental e social, estabelecendo a relação com aspectos

ambientais e sociais. Temos explorado o eixo recursos tecnológicos de forma variada, mas o

tônus é que permeie as discussões dos demais eixos. A última experiência possibilitou

explorar o caráter histórico da ciência por meio da seleção de um aparato tecnológico por cada

grupo de alunos. Eles deveriam estudar a história do aparato escolhido, incluindo o contexto

que criou a necessidade de seu desenvolvimento e a sua evolução ao longo do tempo bem

como seu uso e funcionamento na atualidade. Os estudantes apresentaram o resultado das

pesquisas ao longo de várias aulas, em paralelo à discussão de outros temas, explorando

aparatos do cotidiano como ferro de passar, chuveiro, televisão caneta esferográfica, entre

outros.

Para desenvolvimento de todos os eixos, realizamos aulas expositivas dialogadas com

uso de recursos didáticos variados (modelos, vídeos), a experimentação em uma abordagem

investigativa e a discussão de situações-problema que favoreçam uma abordagem sobre as

relações CTSA. Também utilizamos atividades de campo com visitas a museus e centros de

ciências, como o Centro de Ciências de Araraquara (CCA), o Museu da Ciência Prof. Mário

Tolentino e o Centro de Divulgação Científica e Cultural da Universidade de São Paulo

(CDCC/USP), em São Carlos – SP, e a realização de trilhas interpretativas em espaços como

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a Trilha da Natureza na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), em São Carlos – SP,

entre outros. As figuras 1 e 2 ilustram algumas dessas atividades.

Figura 1 – Alunos participam da Trilha da Natureza, na UFSCar.

Figura 2 – Visita à exposição PaleoBrasil - Na Trilha dos Dinossauros1, no Museu da Ciência Prof. Mário Tolentino.

Como uma das formas de avaliação, os alunos desenvolvem, em grupos, durante a

carga horária da PCC, uma proposta de oficina envolvendo um tema de ciências voltada a

alunos da Educação Infantil ou anos iniciais do Ensino Fundamental, podendo inclusive

trabalhar com a Educação de Jovens e Adultos. Para tanto, devem estabelecer contato com

uma escola, em geral aquela em que um dos integrantes do grupo já desenvolve estágio

obrigatório ou outras atividades acadêmicas, e dialogar com o professor ou a professora

responsável por uma turma, identificando um tema que seja de interesse para o trabalho. Após

discutirmos a proposta da oficina e realizarmos os ajustes necessários (adequação de tempo,

faixa etária, materiais disponíveis), ela é aplicada em sala de aula, o que envolve também a

produção ou adaptação de material didático, priorizando materiais de fácil acesso e baixo

custo. Ao final da disciplina, os alunos entregam um relatório com a descrição da atividade

em sala de aula, suas reflexões sobre as dificuldades e os avanços durante o trabalho e

compartilham a experiência com os colegas por meio de uma roda de conversa que reúne toda

a turma.

Pela nossa observação, a disciplina tem contribuído com a formação dos estudantes de

Pedagogia, sobretudo no que tange a percepção da importância do ensino de ciências para as

crianças. No entanto, ao trabalharmos os conteúdos específicos, identificamos graves falhas

1 O Prof. Dr. Marcelo Adorna Fernandes, do Departamento de Ecologia e Biologia Evolutiva da Universidade Federal de São Carlos, foi curador e organizador da exposição, realizada em parceria com a Prefeitura Municipal de São Carlos.

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na formação básica dos alunos que não conseguem ser supridas dentro da carga horária da

disciplina, o que vem constituindo motivo de preocupação sobre a futura prática desses

professores em sala de aula.

Educação Científica

Como detalhamos, o curso de Pedagogia da FCL/Ar – UNESP tem, em sua grade

curricular, uma disciplina obrigatória, que trabalha os conteúdos e metodologias de Ciências,

com duração um semestre. Procurando complementar o trabalho desenvolvido naquela

disciplina, Educação Científica foi planejada, inicialmente, com o objetivo de enfatizar,

principalmente, a questão da experimentação para a Educação Infantil e o Ensino

Fundamental, com uso das atividades do Projeto ABC na Educação Científica – Mão na

Massa (SCHIEL, 2005; SCHIEL; ORLANDI et al., 2009). No entanto, diante da

possibilidade de um aprofundamento de questões relevantes para a formação do professor dos

anos iniciais, os objetivos foram ampliados em uma nova proposta, cujo foco é propiciar que

os alunos vivenciem metodologias e procedimentos relacionados com a prática da atividade

científica, a partir da proposição de situações-problema. Além disso, buscamos trabalhar as

possibilidades formadoras de espaços como museus, parques, centros de ciências e outros, por

meio de visitas. Dessa forma, pretendemos contribuir para que o futuro professor possa

analisar o significado da ciência e da tecnologia no mundo contemporâneo e reconheça a

educação científica como um dos componentes da educação básica, essencial para a formação

das crianças.

A Ementa da disciplina é a seguinte: A ciência como produção humana e a relação

entre ciência e outras formas de produção de conhecimento. Fatores históricos que

contribuíram para a construção da ciência moderna. O debate sobre a ética na ciência, as

relações entre conhecimento e poder, repercussões e aplicações do conhecimento científico.

Os procedimentos da ciência: pesquisas, investigações e experimentação. A ciência escolar e

o ensino de Ciências. Espaços formais e não formais para a educação científica. Relações

entre o conhecimento científico e o exercício da cidadania.

Usamos como referência para nossas ações os trabalhos desenvolvidos por Carvalho

(1998), Campos e Nigro (1999), Schiel (2005), Bizzo (2009), Schiel, Orlandi e colaboradores

(2009), entre outros autores.

Os procedimentos de ensino incluem leituras de textos dos autores citados, além de

textos de divulgação científica, discussão sobre filmes e vídeos que abordam temas de

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Ciências, realização de experimentos a partir de problematizações, visitas técnicas a diferentes

espaços da cidade e região, como o CDCC/USP, o Museu da Ciência Prof. Mário Tolentino e

o Observatório Astronômico Dietrich Schiel da USP, em São Carlos – SP, o Laboratório de

Física da Escola Bento de Abreu de Araraquara – SP, entre outros.

Na Figura 3, a seguir, vemos uma turma de alunos realizando uma atividade durante

visita ao Museu Mário Tolentino, em São Carlos.

Figura 3 – Atividade no Museu da Ciência Prof. Mário Tolentino.

Como um dos itens de avaliação, os alunos devem elaborar um projeto de ensino de

Ciências, para aplicação em sala de aula. A avaliação também leva em conta todo o processo

vivenciado pelos estudantes, os relatórios de experimentos e de visitas e uma auto avaliação

dos estudantes, na qual procuram identificar seus avanços e suas principais dificuldades. Os

resultados da disciplina têm sido satisfatórios, revelando um aumento do interesse pelas

questões de ciência e tecnologia entre os participantes. No entanto, como disciplina optativa,

ela atinge um número bem restrito de alunos, que varia, a cada ano, de acordo com a

disponibilidade dos licenciandos, em função do dia e horário em que a disciplina é oferecida.

Educação e Meio Ambiente

Oferecida desde 2004, é a única matéria do Curso de Pedagogia da FCL/Ar que

aborda diretamente a temática ambiental na formação de professores. A disciplina possui a

seguinte ementa: A importância da temática ambiental e a necessidade da inclusão dessa

temática em todos os espaços de formação, de modo especial nos programas de formação de

professores. A questão ambiental e seus diversos aspectos locais e planetários. Relações entre

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educação, meio ambiente e sociedade. Análise do papel da educação ambiental no currículo

escolar e propostas para uma educação ambiental crítica. A formação do educador e a

construção de uma prática comprometida com a promoção de uma melhor qualidade de vida e

o pleno exercício da cidadania.

Como fundamento teórico, lançamos mão de textos de autores que se identificam

com uma vertente crítica da educação ambiental, como Guimarães (2004) e Loureiro (2004),

entre outros, e buscamos o apoio de Paulo Freire (2005, 2011). A seleção de temas varia a

cada ano, em função do interesse do grupo de alunos e é construída em um processo de

diálogo entre a professora e a turma, com base em diferentes materiais, entre os quais os

Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) – Meio Ambiente (BRASIL, 1998).

Os procedimentos metodológicos utilizados incluem atividades variadas: leituras de

textos e rodas de conversa; estudos de caso; análise de filmes e vídeos sobre temas

relacionados à questão ambiental, tais como consumo e desperdício, uso de agrotóxicos em

alimentos, o destino final do lixo, entre outros; visitas a diferentes espaços, como a

Cooperativa de Catadores de Materiais Recicláveis em Araraquara - a Acácia, Estações de

Tratamento de Água e Esgotos, entre outros; apresentação de convidados, especialistas em

diversas áreas, que abordam temas específicos; elaboração de diagnóstico ambiental;

elaboração e discussão de projetos. Na Figura 4, temos uma amostra de material coletado em

atividade de diagnóstico ambiental realizado no Campus da FCL e na Figura 5, uma foto de

visita realizada à Acácia.

Figura 4 – Material coletado em atividade de Diagnóstico Ambiental

Figura 5 – Visita à estação de triagem de material reciclado da Cooperativa Acácia

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Como avaliação, analisamos a proposta de Educação Ambiental elaborada pelos

alunos, para ser trabalhada na Educação Infantil ou nos anos iniciais do Ensino Fundamental e

fazemos uma apreciação de toda produção realizada, bem como do processo vivenciado pelos

estudantes durante o curso. Também aqui é feita uma auto avaliação, de forma que os

participantes possam refletir sobre tudo o que foi realizado no semestre.

Os resultados dessa disciplina têm sido muito gratificantes, pois os depoimentos dos

estudantes expressam suas mudanças de concepções e de formas de atuação frente às questões

ambientais. Além disso, vale destacar que vários alunos, depois de participarem da disciplina,

buscaram uma continuidade de suas formações na área de Educação Ambiental, por meio de

cursos e estudos de pós-graduação. Uma opinião comum entre os participantes é a de que,

devido à sua importância, a disciplina Educação e Meio Ambiente deveria fazer parte da

grade de disciplinas obrigatórias do curso.

Essa é uma questão sobre a qual temos nos debruçado, pois, como optativa,

Educação e Meio Ambiente atende a um número muito pequeno de participantes, não

chegando a atingir 20% dos alunos dos períodos diurno e noturno do curso. Isso significa que

um número muito grande de formandos não teve qualquer contato com as possibilidades de

trabalho com o tema Meio Ambiente, o que pode comprometer sua atuação com as crianças.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O ensino de ciências e a Educação Ambiental são fundamentais na formação das

crianças. Para que sejam adequadamente inseridos nos anos iniciais da escolarização, no

entanto, é fundamental que a formação de professores contemple o trabalho com essas áreas,

contribuindo para a sua valorização e consequente enriquecimento da prática educativa na

escola.

Apresentamos as experiências desenvolvidas junto ao curso de Pedagogia da FCL/Ar

por meio de três disciplinas, das quais apenas uma é obrigatória. Embora, por meio delas,

busquemos avançar no sentido de contribuir para a percepção dos licenciandos sobre a

importância dessas áreas, há limitações que desfavorecem o trabalho formativo. As

deficiências em conteúdos específicos que os estudantes carregam, fazem com que o tempo de

um semestre para a disciplina obrigatória não seja suficiente para uma adequada exploração

de conteúdos, metodologias e práticas em ciências. Ainda que não seja possível ampliar a

carga horária, acreditamos que, distribui-la ao longo de dois ou mais semestres poderia

favorecer a formação de modo mais processual, permitindo aos alunos maior aproximação e

convivência com as discussões sobre a natureza do conhecimento científico e o ensino de

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ciências. A oferta de disciplinas optativas na área de educação científica e, sobretudo, de meio

ambiente, atinge um número pequeno de licenciandos e a maior parte deles não recebe

qualquer formação para lidar com a dimensão ambiental nos anos iniciais, embora legalmente

essa dimensão deva fazer parte do currículo, ainda que de modo transversal. Na dificuldade de

garantir uma abordagem da Educação Ambiental que permeie todo o tempo de formação

inicial, perpassando todas as disciplinas, uma alternativa seria que a disciplina Educação e

Meio Ambiente ou uma disciplina que tenha objetivos semelhantes seja ofertada como

obrigatória a todos os alunos da Pedagogia.

Esperamos que as propostas e experiências aqui apresentadas, frutos de nossas

reflexões teóricas e práticas nas áreas de Ensino de Ciências e Educação Ambiental, possam

se constituir em contribuições para as discussões sobre formação de professores para os anos

iniciais e, sobretudo, para a elaboração de propostas de reformulação de cursos de Pedagogia.

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