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AS COMUNIDADES CHINESAS
EM MOÇAMBIQUE
clubofmozambique.com
Azzurra Rinaldi
Centro Científico e Cultural de Macau
Fevereiro-Junho 2011
2
«Un émigrant appartient-il à son pays d’origine,
à son pays d’adoption, aux deux à la fois?»1
INTRODUÇÃO
O meu interesse pelas comunidades chinesas em Moçambique foi motivado por duas
coisas: a minha paixão por esta nação africana e uma grande curiosidade nos confrontos
com os chineses, que estão em toda parte do mundo. Liguei assim as duas coisas neste
trabalho começando por uma narração das primeiras viagens dos chineses no Oceano
Índico concentrando a atenção sobre o descobridor Zheng He; continuando com uma
analise da diáspora chinesa no mundo, qual razão porque os chineses emigram, onde é que
vão e qual é que é o estilo de vida deles. Depois, a pesquisa chega, mais no específico, a
uma descrição dos movimentos chineses em Moçambique durante os anos 1880-1975
tratando as comunidades chinesas de Lourenço Marques e de Beira.
Após a independência houve uma nova diáspora dos chineses de Moçambique em
particular para Portugal e para o Brasil.
Graças às novas relações económicas da China com a África, e também Moçambique,
encontram-se novamente chineses neste território, porque Moçambique é cheio de recursos
para os novos chineses: madeira, carvão, pedras semi-preciosas. Mas não só isso, empresas
construtoras chegam aí para modificar a imagem desta nação edificando estádios, hoteis e
sobretudo edificios políticos.
Portanto aquilo que se vê e que quero de mostrar é o facto que sempre tinham existido as
relações entre da China e África, e muito provavelmente essas últimas são antiquíssimas,
antes das viagens do Zheng He, já do século X encontramos achados arqueológico chineses
em terra africana. Por isso as relações China-África e especificamente China-Moçambique
desenvolveram-se durante os séculos, primeiro com o comércio e com as missões
diplomáticas, depois com a emigração chinesa e em Moçambique com as comunidades que
se formaram para a construção dos caminhos-de-ferro e dos portos no país, e ainda com as
novas relações, que alguém chama “coloniais”, que vêm na China o primeiro investidor na
África.
1 Gentelle, P., 2002, L’Emigration Chinoise et le Concept de “Chinoise”, «Estudos sobre a China Vol.II»,
ISCSP, Lisboa. (p.1003)
3
Estrutura do trabalho
1) Breve introdução das relações comerciais entre a China (época Ming) e a África
Oriental
2) Diáspora chinesa : breve história da emigração (quando começou e os diferentes
lugares da emigração); comportamentos dos chineses nas comunidades
3) As comunidades chinesas em Moçambique até à independência em 1975.
-A comunidade de Lourenço Marques
-A comunidade da Beira
-As famílias das comunidades chinesas
4) Novas relações económicas da China com África (aprofundamento dessas relações
com Moçambique) => Formações de novas comunidades chinesas em Moçambique
4
AS PRIMEIRAS RELAÇÕES COMERICIAIS ENTRE A CHINA E A ÁFRICA
ORIENTAL: ZHENG HE (鄭和) A actividade marítima da China começou cerca de 40000 anos atrás por causa das
glaciações que baixaram o nível do mar assim os povos do Sul da China conseguiram
atraversar um braço de mar de cerca de 40 milhas para chegar às ilhas de Sulawesi e Nova
Guiné, até à Australia. No entanto, quando o nível do mar subiu muitas zonas costeiras do
Sul da China foram submersas e as populações daquela zona aventuraram-se pelo mar
(entre 14000-4000 a.C.)2.
As primiera viagens efectivas da China em direcção ao ocidente foram feitas durante o
período da dinastia Ming, que tomou o poder em 1368. Os Mings sempre tinham tido um
desejo expansionista muito forte, por isso durante esta dinastia tinham feitos muitas
viagens diplomáticos e militares3. Entre 1405 e 1433 o imperador Yung Lo e Husuan-Te
enviaram sete expedições marítimas e duas dessas chegaram às costas da África Oriental
(1417-19, 1421-22)4. Segundo os anais chineses as navegações para as costas africanas já
tinham sido feitas no século IX e provavelemente com a ajuda dos barcos persas e de
outros países asiáticos. O que é certo é que no século XIV os návios chineses chegaram a
Calecute e daí partiram para as costas africanas. No século XV, quando chegaram a
Quiloa, nos seus barcos havia navegadores árabes. No entanto o maior período destas
viagens marítimas foi durante a dinástia Ming (1368-1644)5.
Nesta época teve uma grande importância o descobridor chinês Zheng He que fez todas as
sete viagens no Oceano Índico, visitou trinta países na Ásia do Sul, Ásia do Sueste, Ásia
do Oeste e África Oriental. Com estas viagens começaram as relações comerciais entre a
China e os novos países descobertos6. Zeng He foi escolhido pelo imperador para mostrar
ao “mundo” o imenso poder do Império da China. Assim ele partiu com cerca de 37000
homens e 370 barcos de diferentes dimensões, o maior chamava-se Barco do Tesouro e
tinha 54 metros de largura e 133 metros de comprido, com 9 mastros com 12 velas de seda,
era o maior návio do tempo e podia alojar 400 homens. Os outros navios eram: Barco de
Cavalos, Barco das Provisões, Barco do Comando e o Barco do Combate (54m x 20m com
2 Pereira Cardoso, A., 1996, Navegações dos Chineses, Academia de Marinha, Lisboa. (p.4)
3 Amaro, A.M., 1998, O Mundo Chinês, Vol.1, ISCSP, Lisboa. (p.273)
4 Dias Antunes, L. F., 1996, A Presença Asiática na Costa Oriental Africana, «Povos e culturas, Portugal e
oriente: passado e presente», vol.5, centro de estudos dos povos e culturas de expressão portuguesa,
universidade cátolica portuguesa, Lisboa. (p. 34) 5 Amaro, A.M., 1998, O Mundo Chinês, Vol.1, ISCSP, Lisboa. (p.276)
6 VVAA, 2005, Zheng He’s Voyages Down the Western Seas, China intercontinental Press. (p.1)
5
5 mastros)7. As viagens de Zeng He foram feitas para mostrar às outras populações a
imensidade do Império Chinês. Os chineses que chegavam aos novos continentes
desconhecidos não faziam escravos, nem conquistavam, nem recolhiam informações
científicas8. Quando Zheng He chegou a África recebeu como tributo camelos de Brawa,
rinocerontes e elefantes de Malindi e leões, leopardos e zebras de Mogadiscio9. As relações
do Imperio Chinês com os outros países não foram puramente comerciais, mas tributárias
por isso costumava levar embaixadores dos vários países.
Na viagem do 1421 o Zheng He dobrou o Capo da Boa Esperança e fez uma breve
paragem em Sofala (Moçambique) antes de descer para o sul10
e nesta parte de emisfério,
Zheng He encontrou algumas dificuldades, porque não encontrava a Estrela Polar, portanto
tinha de pesquisar um outro guia no céu, finalmente conseguiu encontrar a Estrela do Sul e
portanto continuou a sua viagem na direção do desconhecido. Provavelmente para navegar
em direcção a África os chineses foram ajudados por pilotas árabes que eram mais expertos
em navigação do que os chineses, porque começaram a navegar no Índico desde o século
VIII d.C.. Isso é provavelmente a motivação das viagens de Zheng He, limitavam-se
exclusivamentes às rotas comerciais já seguidas pelos árabes.
Na verdade a passagem de Zheng He em Moçambique não teve muitos relatos históricos,
porque a parte mais explorada de África Oriental foi aquela ao norte de Moçambique,
sobretudo na Somália. As cidedes que foram visitadas pelos chineses foram Mogadiscio,
Brawa, Djubo, Malinde e quase a costa da Somalia toda, mas não nos parece que tenham
visitado a parte interior da África Oriental11
. Nesta altura foram fechados as Rotas da Seda
e do Chá, para incrementar o comercio marítimo chinês que estava voltado principalmente
para a seda e porcelanas, trocadas em lugares costeiros com os quais contactavam para
firmar alianças12
. Por isso muitos embaixadores chagavam à China regularmente e alguns
desses vinham de África Oriental trazendo zebras e girafas. A girafa foi trazida do reino de
Malindi e era considerada pelos chineses um animal propício e era chamado por eles qilin
que muito provavelmente é uma derivação do termo somálo jili.
7 Amaro, A.M., 1998, O Mundo Chinês, Vol.1, ISCSP, Lisboa. (p.282)
8 Amaro, A.M., 2006, Zheng He: Patrono da VIII Semana Cultural da China,«Estudos sobre a China vol 1»,
ISCSP, Lisboa, (p.52-53) 9 Dreyer, E. L., 2006, Zheng He, Pearson Education, E.U.A. (p.88-89)
10 Malhão Perreira, J.M., 2006, Algumas Considerações de Ordem Crítica ao Livro, 1421 The China
Discovered The World, de Gavin Menzies, «Navegações Chinesas no Século XV Realidade e Ficção»
Academia de Marinha. (p.15) 11
Lelièvre D., 1996, Le Dragon de Lumière, France-Empire, Paris. (p.288) 12
Amaro, A.M, 1999, Os Contactos Oriente/Ocidente e a Dinâmica Cultural da Eurásia, «Estudos Sobre a
China II», ISCSP, Lisboa. (p.146)
6
Uma lenda do Kenya diz que durante as viangens de Zheng He havia um naufragio perto
das ilhas do arquipelago de Lam e alguns chineses conseguiram chegar às costas sul destas
ilhas e casaram com mulheres nativas criando uma nova étnia, chamada pelos locais
wasanga, em realidade não existe nada de escrito sobre isso, mas eles mesmos afirmam ter
discendências chinesas. Para descobrir se esta lenda é verdadeira ou não o Museu Nacional
Chinês, o Instituto Arqueológico de Pequim e o Museu Nacional de Kenya decidiram fazer
algumas pesquisas arqueológicas submarinas perto o arquipelago de Lam13
.
As viangens feitas por Zheng He eram sobretudo viangens diplomáticas e foram
interrompidas por motivos diferentes: conspirações contra Zheng He, os funcionários
confucianos que não gostavam de contactos com os estrangeiros, o grande custo da
construção dos návios, a crise do império devida aos mongois14
. Na verdade, a estela de
Zheng He demonstra que as viagens eram feitos para arranjarem relações comerciais com
os novos países e mais, os chineses nunca saquearam os lugares onde foram não obstante a
frota dele ser a maior do mundo.
Italian.cri.cn
Em 1500 o imperador proibiu o comercio ultramarino para defender os seus návios dos
piratas japoneses. A China, neste período, começou a comerciar ilegalmente com os
portugueses, mas na verdade os chineses não gostavam da presença estrangeira no
continente assim Pequim proibiu formalmente a frequência dos “bárbaros estrangeiro” no
reino. A fase de dissidência durou quase trinta anos desde 1522 até 1550, após esta data o
comercio com os portugueses tornou-se legal, portanto a China abriu-se, novamente aos
comercios ultramarinos15
.
13
I viaggi di Zheng He nei mari occidentali hanno aperto la porta degli scambi di amicizia tra Cina e
l’Africa, Radio Cina Internazionale, 01,09,2010 http://italian.cri.cn/941/2010/09/01/81s139323.htm
Intervista a Zeng Guoxin 14
Gelber, H.G., 2007, O Dragão e os Diabos Estrangeiros, Guerra e Paz, Lisboa. (p.115-117) 15
Deus Ramos, J., 1992, Portugal, China e Macau: os Primeiros Tempos, «Estudos Orientais III», Instituto
Oriental, Lisboa, (p.327-329)
7
Relativamente a Moçambique, com a chegada dos portugueses, mas também antes,
encontravam-se mercadorias chinesas que chegavam a África através dos muçulmanos e
depois através dos mercadores portugueses. Os muçulmanos sempre tinham um papel de
mediadores entre do mundo asiático e europeu: o aparecimento das tecnológias vinha, em
primeiro lugar, da China mas também India, e Persia e mediadas pelos muçulmanos
chegava à Europa. A China tinha um crescimento tecnologico e científico que nenhuma
outra nação tinha, isto era devido ao seu desenvolvimento, na sua estrutura política e
cultural que abria as portas a uma grande vivacidade intelectual e comercial. Por isso os
muçulmanos compreenderam a importância do progresso tecnológico desta civilização que
assimilaram e reelaboraram estas novas descobertas e levavam-nas para a Europa16
.
Os interesses comerciais da China por África já se encontram no século X, porque os
chineses reuniam em compêndio muitas informações que tinham sobre a África Oriental
sobretudo sobre o comercio de escravos, marfim e âmbar. As primeiras expedições
comerciais foram feitas durante a dinastia Song, há testemunhos de navios mercantis que
chegaram até a ilha de Madagascar trocando chá, sal, alcool e parfumes chineses por
elefantes, chifres de rinocerontes, colares de pérolas e incensos. Os beneficios dessas
relações comerciais de 1127-1162 com o imperador Gao Zong eram cerca de 20% das
entradas para estado e Zhão Rukena, comissário da marinha em Quandzhou, refere que
esta dinastia mantinha relações marítimas com a Indonésia, Malásia, Índia, Filipinas,
Coreia, Japão, Costas de Oman e Somália. Encontram-se muitos testemunhos escritos
sobre as viagens para África: Yu-Yang Tsa Tsu conta sobre alguns lugares de Berbera na
costa sul do Golfo de Aden (IX século d.C); Hsin Thang Shu escrito em 1060 contem
descrições de Malindi (Kenya); a secção de Tshêng-Pa do livro Chao Ju-Kua fala das
costas entre o rio Juba na Somália e do Canal de Moçambique, no entanto Chou Chhü-Fei
(1178) descreve a ilha de Madagascar. Portanto no século XIV os chineses tinham um
grande conhecimento destas zonas africanas. As coisas que os chineses queriam eram
presas de elefantes, chifres de rinoceronte, pérolas, substâncias aromáticas e incensos, e ao
contário África recebia da China e da Índia ferro, musgo e porcelana, algodão, aloe,
malagueta, e outras especiarias17
.
Encontraram-se na costa oriental da África alguns objectos chineses como porcelana e
moedas, alguns estudiosos como W. Gungwu dizem que aquelas coisas não chegaram
16
Araco, F., 2007, Il “Mito” dell’Eccezionalità Europea,
www.liberamente.eu/approfondimenti/culturaeintercultura 17
Needham, J., 1970, China, Europe and the Seas Between, «The Global Opportunity, an Expending World
Vol. 1», Variorum, Cambridge. (p.11-12)
8
directamente através dos chineses, mas através dos árabes, outros como J. Needham que
afirma que os objectos chineses encontrados são tão numerosos que seria impossível crer
no facto que estes tivessem chegado graça as intermediários18
. Embora a última teoria aqui
esposta, provavelmente a mercadoria chinesa chegava a África através mercadores
muçulmanos que se movimentavam de Bassorá até Malaca e daí à China. Os navios
transportavam algodão indiano, cavalos, ouro, marfim e escravos africanos e regressavam
com louças, porcelanas e sedas19
. Ao mesmo tempo, na China encontram-se mercadorias
africanas por exemplo peles de leopardo, carapaças de tartaruga, âmbar, escravos, cornos
de rinoceronte, ouro (provavelmente tirado por as minas de Moçambique que se situavam
entre os rios Limpopo e Zambese) e marfim20
.
«Os Chineses parece terem reatomado a frequência regular do Oceano Índico no período
do terceiro imperador Ming (1403-1424). Teve lugar na década de 1430 o último dos
grandes comboios anuais de juncos que passavam seis meses na costa oriental africana
adquirindo escravos, ouro, marfim, holotúrias, peles de leopardo, carapaças de tartaruga,
chifres de rinoceronte, etc. De importante significado e apreciadas pelo próprio
imperador seriam as girafas,consideradas como animais celestiais.»21
O facto de que os chineses fizessem comercio com outros países ultramarinos é
testemunhado pelas porcelana da época Ming: a típica porcelana azul e branca pode ter
sido produzida pelos mercados com o Médio Oriente onde já era conhecida e havia
também uma transformação de chifres de rinoceronte provenientes de África Oriental em
chavénas22
. Mas não só:
«Os arqueólogos depararam com abundantes testemunhos desse tráfego, que deu origem a
uma época de invulgar prosperidade nos Séc. XIV a XVI e que culminou com a importação
de tecidos de Cambraia e o fabrico e obtenção de jóias e ornamentos de ouro. No vale do
Limpopo, outro grande centro de comércio com o litoral... Inúmeros são os vestígios
deixados também entre as populações de Moçambique por esta milenária actividade
18
Lelièvre D., 1996, Le Dragon de Lumière, France-Empire, Paris. (p.287) 19
Dias Antunes, L.F., 1996, A Presença Asiática na Costa Oriental Africana, «Povos e culturas, Portugal e
oriente: passado e presente», vol.5, centro de estudos dos povos e culturas de expressão portuguesa,
universidade cátolica portuguesa, Lisboa. (p. 20) 20
Idem. (p.24) 21
Rita-Ferreira, A., 1975, Pequena História de Moçambique Pré-Colonial, Fundo de Turismo de
Moçambique. 22
Gelber, H.G., 2007, O Dragão e os Diabos Estrangeiros, Guerra e Paz, Lisboa. (p.122-124)
9
asiática. Os Persas e sobretudo os Árabes deixaram, naturalmente, mais profundas
marcas. Além da islamização dos habitantes do litoral norte e de parte dos Ajauas (Yao) -
a eles se deve a importância considerável assumida pelas actividades mercantis e
marítimas. As plantas alimentares introduzidas pelos asiáticos, além de evidentes
benefícios nutritivos, vieram incrementar as trocas comerciais.»23
O comércio na zona da África Oriental deve-se in primis aos mercadores islâmicos que
graça às descobertas chineses como a bússola contribuiram à intensificação do comercio
marítimo, testemunho disto são as plantas como bananeira, inhames, coqueiro, mangueira,
cafezeiro, citrinos, cana de açúcar e diversas variedades de arroz, que vinham da Ásia.
As relações com os asiaticos influenciaram as étnias locais como os Khokhas-Bi-Tonga
que encantam os cobras graça ao som das flautas, tinham métodos de pesca parecidos com
aqueles do Extremo-Oriente e lem o futuro através a consulta dos intestinos do roeadores e
galináceos24
.
Depois a colonização de Moçambique tornou-se muito útil aos portugueses para
estabelecer relações comerciais com a Índia. Portanto as relações com a China são
exclusivamente mediáticas. Exemplo desta relação pode ser a colecção de peças de
porcelana da dinastia Ming importadas pelos navios portugueses que se afundaram na
proximidade da Ilha de Moçambique, encontraram-se garrafas com vinho antigo, sementes
de pimenta, peças de porcelana e de ouro. Fazem parte da colecção, algumas peças únicas
que nem os chineses possuem. É possivel que houvesse outros navios naufragados perto da
costa moçambicana entre os quais os maiores galões da “carreira das Índias” que se
afundaram por causa das correntes25
.
A DIÁSPORA CHINESA
A diáspora chinesa caracteriza-se por um fluxo migrátorio que provocou uma disperção
generalizada. Contam-se cerca 40-50 milhões de indivíduos que vivem fora da China: a
diáspora chinesa é considerada a maior do mundo26
.
23
Rita-Ferreira, A., 1975, Pequena História de Moçambique Pré-Colonial, Fundo de Turismo de
Moçambique. 24
Idem.(p.30) 25
Artigo, Moçambique Tem a Melhor Porcelana do Índico, http:// www.mitur.gov.mz/factos.html 26
Da Conceição Botas, S. C., 2010, Atitude de crianças em relação aos grupos nacionais, tese de maestrado
em Relações Interculturais, Universidade Aberta de Lisboa, Orientadora Prof. Doutor Félix Neto, Lisboa.
(p.17)
10
«Em valores aproximados emigraram para a Tailândia 2,8 milhões e número semelhante
para Hong Kong, 2,5 milhões para a Malásia, 2,5 para a Indonésia, 1 milhão para o
Vietname, 1,6 milhões para Singapura, 300000 para a Birmânia, 300000 para as
Filipinas, 300000 para o Cambodja e c. meio milhão para Macau»27
.
Houve várias diásporas chinesas ao longo dos séculos que mostram como os chineses
costumam organizar-se nos vários países onde se fixam e a resposta geral à mudança è a
organização em pequenas sociedades organizadas: as comunidades28
.
Os chineses começaram emigrar já a partir do século XV para a Ásia do Sul, mas, nesta
época, não se pode falar de uma verdadeira migração porque a migração no estrangeiro era
proíbida por decretos imperiais.
É em meados do XVII século que encontramos os chines em outras partes do mundo como
no Japão. Cerca de 1800, encontram-se chineses também no Brasil que trabalhavam nas
plantações de chá, outros instalam-se na ilha de Cuba (1845), Perú, California e na região
australiana de New South Wales (1849) e dois anos mais tarde ficam na região de Victoria.
África parece ser o último lugar onde os chineses aparecem: em 1912 contam-se cerca três
mil chineses na cidade moçambicana de Lourenço Marques e alguns também noutras
cidades da costa.
Os poucos lugares em que os chineses não aparecem são: Groelândia, Islândia e alguns
estados de África do norte e do oeste29
.
Nos anos finais do 1800 os emigrantes chineses eram conhecido como “Mercantes” dos
mares do Sul e em 1893, encontra-se, nas fontes chinesas o termo qiao (emigrantes, saído
temporariamente) e só no início dos século XX os chineses passam a ser verdadeiros
emigrantes.
«Em 1893, devido a pressões estrangeiras, a proibição de 1648 foi levantada e os
emigrantes chineses passaram, então, a usufruir de um estatuto de residentes fora do país
temporariamente mas protegidos, o que levou à criação do termo chineses do ultramar.»30
Há diferentes tipos de chineses do ultramar, precisamente quatro:
27
Citação Pierre George (1985) por A.M. Amaro, O Mundo Chinês, Vol.1, 1998, ISCSP, Lisboa. (p.339) 28
Amaro A.M., 1998, O Mundo Chinês, Vol.1, ISCSP, Lisboa. (p.276) 29
Sen-Dou, C., 2008, The distrubution and occupations of overseas chinese, «The Chinese Diaspora in the
Pacific, coll. The Pacific World: Lands, People and History of the Pacific, 1500-1900», vol. 16, Ashgate-
Varioum, Cornwall. (p.33-39) 30
Amaro, A.M, 1998, O Mundo Chinês, Vol.1, ISCSP, Lisboa. (p.335)
11
1) Emigrantes temporários
2) Chineses residentes no Ultramar
3) Chineses do Ultramar naturalizados, mas cujo sentimento de ser chinês se mantém
4) Chineses do Ultramar naturalizados e mais ou menos assimilados31
B. Wong em 1982 indentífica os diferentes períodos da diáspora chinesa e categoriza-os
em cinco pontos que são: a emigração antiga, durante os quais a população emigrada
deseja manter intacta a sua cultura (aparecimento das China Town); o caso americano, as
classes superiores da burgesia emigrada naturaliza-se nos Estados Unidos e as gerações
nascidas são cidadãos americanos, embora culturalmente híbridos. Estes são representados
por The Organization of Chinese Americans.
Outro ponto é aquele do “sonho americano” dos jovens chineses que partem para os
Estados Unidos e ficam desajustados pelo insuccesso escolar, por isso juntam-se com
bandos marginais porto-riquenos e caem na delinquência. O último ponto tratado por
Wong é a emigração clandestina, organizada a partir da China do Sul para os outros paises
europeus e asiáticos32
.
Para a emigração chinesa na Europa é possivel falar de dois momentos diferentes da
diáspora: uma primeira antes da Segunda Guerra Mundial e uma outra depois da guerra.
Na primaira fase os trabalhadores vinham para Europa com varios tipos de contratos
costituindo as primeiras comunidade de emigração. Estes eram originários principalmente
de Guandhong, Hong Kong e Zhejiang. O possessão das colónias na Ásia pela Holanda,
Inglaterra e França favoreceu a emigração nestas regiões europeias. Mais tarde a política
do fecho das fronteiras da RPC, impediu a emigração sobretudo das zonas de Guandgong e
Zheijiang. Foi nos anos 70 que a diáspora começou novamente para a Europa. Segundo
Frank Pieke é possivel dividir os grupos emigrantes em quatro categórias: Chineses de
Zheijiang, os cantoneses do delta do rio das Perolas, de Hong Kong e da Indochina
(Singapura e Malaysia)33
.
A população chinesa migrante não pertece a uma classe social específica, geralmente as
migrações da China do sul são feitas por um individuo só que descendem dos migrantes.
Estes têm a característica de ter nascido na China, viver noutra parte do mundo e voltar à
China na idade velha. Neste tipo de migração os homens chineses deixam a família na
31
Citação de Wang Guangwu (1981) por A.M. Amaro, O Mundo Chinês, Vol.1, 1998, ISCSP, Lisboa.
(p.335-336) 32
Citação de B. Wong (1982)por A.M. Amaro, O Mundo Chinês, Vol.1, 1998, ISCSP, Lisboa. (p.335-336) 33
Rastrelli, R., Immigrazione Cinese e Criminalità. Analisi e Riflessioni Metodologiche,
www.immigrazioneintoscana.it
12
cidade de origem e acontece que eles casem com mulheres nativas, consideradas como
segundas mulheres, se o chinês casar primeiro com uma nativa o casamento não è
considerado valido. Algumas vezes o segundo casamento é pedido pelas mulheres chineses
para evitar o contacto do marido com prostitutas e ter uma vida dissoluta.
Com este tipo de casamento as mulheres locais passam a fazer parte da comunidade
chinesa muito mais do que os chinese com a sociedade de acolhimento34
.
“As comunidades chinesas, dispersas pelos mundo consideram-se membros de um mundo
vasto e único que não depende de território, mas senão de sentido de pertença. Por muito
diversas que possam ser essas comunidades, em origem ou mesmo em estratégia de
integração, a verdade é que o sentimento de pertença é-lhe comum”35
.
Nestas palavras da doutora Soares è possivel perceber como estas comunidades podem ser
também fechadas, este facto é devido aos preceitos do confucionismo e do taoismo
afirmando que o permanecer longe do lugar dos antepassados é grave e a única forma de
ausência possivel é aquela temporária comportando um forte associatismo e uma
resistência à integração36
. O que é muito estranho, porque se a imagem da China do
ocidente é a sua grande mistura entre diferentes etnias, nas comunidades, pelo contrário,
acontece que não há assimilação com os naturais37
.
Geralmente uma comunidade imigrada pode ou assimilar-se, ou integrar-se ou ainda
marginalizar-se. A assimilação é muito complexa e em geral só acontece com a segunda e
a terceira geração e nas franjas de miscigenação dos elementos das comunidade de
imigrantes mais antigos. A marginalização é muitas vezes consequência de uma entrada
ilegal no país de acolhimento onde não se encontra emprego e há dificuldade de absorver
os novos valores culturais, esta situação causa o aumento das actividades ilegais como
fornecer droga, roubar e abusar da prostituição. Esta situação é uma exepção da
comunidade chinesa, em que é mais corrente o fenómeno da integração que pede que um
grupo estrangeiro aceite rever a expressão da sua indentidade e se necessário reformulá-la.
34
McKeown, A., 2008, Conceptualizing Chinese Diasporas 1842 to 1949, «The Chinese Diaspora in the
Pacific, coll. The Pacific World: Lands, People and History of the Pacific, 1500-1900», vol. 16, Ashgate-
Varioum, Cornwall. (p.12-15) 35
Soares, C., 1998, O Caso dos Chineses de Moçambique imigrados em Portugal, «Estudos Sobre a China
1», ISCSP, Lisboa. (p. 312-313) 36
Idem, (p. 304) 37
Da Conceição Botas, S.C., 2010, Atitude de crianças em relação aos grupos nacionais, tese de maestrado
em Relações Interculturais, Universidade Aberta de Lisboa, Orientadora Prof. Doutor Félix Neto, Lisboa.
(p.19)
13
A assimilação é um processo muito mais drástico e por isso utópico38
. Os chineses que
emigram não fazem parte de uma única étnia, porque na China há muitas étnias diferentes,
mas aqueles que chegam a outros países parecem ser de um único grupo. Acontece em
alguns casos que os chinese não utilizam o metodo de defesa da identidade exterior, quer
dizer monstrar exteriormente a própria roupa, comida, a música e os próprios rituais, mas
preferem adoptar uma defesa identitária quase secreta, não se sabe nada da vida deles, se
os meninos frequentam as escolas locais, quantas pessoas são na familia39
. Aquilo que
acontece nas relações de contacto entre uma civilização imigrada e uma outra de
acolhimento são essencialmente duas coisas: ou cultivar as diferenças ou tentar encontrar
pontos comuns para uma integração. Cultivar as diferencias significa que com o passar do
tempo a nova comunidade imigrante estará sempre mais em oposição à sociedade
dominante. Costumam demonstrar a diversidade através da aparência exterior, mas aquilo
que acontece na diaspora chinesa é a união destes dois pontos: segundo uma entervista
François Jullien, os chineses integram-se bem, já a partir da segunda ou terceira geração os
chineses obtêm bons resuldados na escola e na actividade económica, mas ao mesmo
tempo organizam-se autonomamente: mantêm os jornais chineses, comem comida chinesa
e mantêm também uma policia própria. A China, segundo o filosofo, tem de ser um ponto
de confronto para a Europa, a diferença é devida à parte exterior porque a China fica longe
do universo europeu40
.
O facto que levou à emigração chinesa é sobretudo de factor económico devido à
limitação do puder da compra da moeda causado pelo aumento da população e o fraco
progresso da riqueza pública, levando o país à miséria que causou a uma “degradação do
homem” o qual para viver tornava-se ladrão, jogador, traficante provocando um
“verdadeiro salve-se quem puder”(Lopes, 1937), a Emigração41
. Na verdade os custos para
sair da China e para abrir uma actividade são muitos altos e geralmente não podem ser
sustentados para os chineses normais, por isso os potenciais emigrantes pedem o dinheiro
aos amigos e parentes e pagam aos contrabandistas aguardando um trabalho seguro no
novo país42
. O novo trabalho consegue muitas vezes a fazer com que os chineses se tornem
milionários e normalmente os chineses imigrados continuam a estar ligados ao país de
origem portanto são também responsáveis pela entrada de capitais na China e pela abertura
38
Amaro, A.M., 1998, O Mundo Chinês, Vol.1, ISCSP, Lisboa. (p.49-50) 39
A Construção da Identidade étnica Chinesa: Estrátegias e Evidências, ooutrochines.no.sapo.pt 40
Intervista a F. Jullien, L’altrove e l’Occidente, Chiara Pastorini, www.diogenemagazine.eu 41
Lopes, A., 1937, A China e os Chineses Vistos por um Português, Livraria Popular, Lisboa. (p.83-94) 42
Ching Kong, J., 2000, The Chinese Migration Overseas: with Special Reference to the Hokkien
People,«Estudos Sobre a China III», ISCSP.(p.264-266)
14
de novas empresas, por exemplo segundo os dados cidatos por Ana Cristina Teixeira desde
o 1984 entraram na China cerca de 2 bilhões de dólares dos chineses imigrados. O dinheiro
foi utilizado para construir 1200 empresas e hotéis especialmente na zona de Shenzen43
.
Temos também de dizer que, normalmente, os emigrados têm muitas oportunidade de
trabalho concentradas no emprego ilegal, por isso o emigrado vive em situações marginais
ou irregulares. Acontece, em alguns casos, que o ele não tem casa própria, nem a
assistência da saúde e não pode mandar os filhos à escola. Na opinião comum o sucesso
das empresas chinesas é devido ao trabalho étnico e, não vivendo na legalidade, trabalham
com ritmos acelerados durante a noite, moram no mesmo lugar do emprego para ganhar à
concorrência. Aquilo que acontece na Italia é que os chineses têm as empresas, onde os
chineses mesmos trabalham, mas trabalham para os italianos que encomendam a roupa a
fazer e para evitar as incerteza exigem dos chineses que a mercadoria esteja pronta em
tempos muitos rápidos. Se os chineses trabalhassem com horários normais não teriam o
emprego!
A família tem um papel fundamental na empresa chinesa, porque é graça a ela, e à coesão
do grupo familiar, que faz força e permite a adaptação a estas dificeis condições de vida.
Muito provavelmente, se pudessem, os chineses trabalhariam com horários normais e
morariam em casas normais como todos os cidadãos do país de acolhimento44
. A família
tem uma grande importancia no contexto económico dos chineses da diáspora provocando
“uma forte inclinação para a autonomia e para o acesso à propriedade”45
, portanto a cultura
empresarial chinesa é vista como uma forma de “familismo empresarial” que se pode
traduzir em três aspectos diferentes que não precisam de ficar juntos numa mesma
empresa: o primeiro aspecto é um estilo paternalista da gestão da empresa, ou,um outro,
utilização de práticas nepotistas no interior da empresa (preferir utilizar os trabalhos dos
parentes do que o emprego dum estranho à família) ou ainda uma empresa familiar cujos
bens pertecem a família portanto uma verdadeira empresa familiar. O primeiro tipo de
familismo empresial implica uma submissão formal dos trabalhadores da empresa e não
existem conflictos de tipo colectivo, mas só individuais que se manifestam apenas com o
absenteismo ou demissões. A segunda tipologia, aquela nepotista, pode causar danos à
mesma empresa porque não se escolhe o melhor homem para o melhor cargo. O nepotismo
43
Texeira, A. C., 1999, As Influências da Estrutura Familiar na Organização das Actividades Empresariais
dos Chineses da Diáspora, «Estudos Sobre a China II», ISCPS, Lisboa.(p. 149) 44
Rastrelli, R., Immigrazione Cinese e Criminalità. Analisi e Riflessioni Metodologiche,
www.immigrazioneintoscana.it 45
Wong cidado por Texeira, A. 1999, As Influências da Estrutura Familiar na Organização das Actividades
Empresariais dos Chineses da Diáspora, «Estudos Sobre a China II», ISCSP, Lisboa. (p.154)
15
pode ser activo o passivo, o activo é caracterizado pela vontade própria do empregador, o
passivo é dado pela uma obrigação familiar, um sentido muito forte nas famílias chinesas.
O terceiro tipo é o mais complexo:
«O estilo de liderança paternalista concontra-se aliado à existência da propriedade da
empresa. Isto é, o poder advém da propriedade, o que obviamente constitui um osbstáculo
para a criação de um corpo alargado de gestores profissionais, i.e., sem acesso à
propriedade da empresa. Por outro lado, tem consequênciais óbvias a nível da dimensão
da empresa. A impossibilidade de delegação de poder e a existência de uma organização
desburocratizada, produz limitações óbvias sobre a escala dimensional da empresa.»46
Tudo isto comporta um bloco do crescimento das empresas, que fica pequena para ser bem
gerida por uma família. Não obstante há casos de empresas familiares que cresceram e se
multiplicaram em outras pequenas empresas ligadas entre elas através de organizações
“moleculares”. Este tipo de rede funciona graça a “indivíduos-chave” que coordenam as
operações47
.
O modelo familiar chinês é patriarcal e no seu interior cada pessoa tem o seu papel
estabelecido com base às relações hierarquicas. O primeiro dever dos filhos é garantir uma
descendência, assim o papel da mulher torna-se aquele de ampliar as linhagens da família
do marido e considera-se o casamento como uma compra para a família do marido e uma
perda para a família da mulher. Na diáspora esta relação mulher-marido muda na estrutura
e na organização familiar. Num primeiro momento o marido conheceu a esperiência da
imigração masculina chegando à criação de conexões entre os varios homens emigrados e
dos homens do país de origem, pelo contrário a mulher para emigrar tem de abandonar a
sociedade femina do seu país de origem para obedecer à necessidade da família, portanto a
primeira fase da imigração das mulheres é uma etapa de solidão, porque ela não acede às
relações comunitárias do marido e ao mesmo tempo perde os seus contactos com o país de
46
Texeira, A. 1999, As Influências da Estrutura Familiar na Organização das Actividades Empresariais dos
Chineses da Diáspora, «Estudos Sobre a China II», ISCSP, Lisboa. (p.158-160) 47
Texeira, A. 1999, As Influências da Estrutura Familiar na Organização das Actividades Empresariais dos
Chineses da Diáspora, «Estudos Sobre a China II», ISCSP, Lisboa. (p.160)
16
origem48
. Portanto aquilo que acontece é que a mulher dá todas as suas energias à família,
vai tendo outros filhos e enfatizam a família antes da carreira de trabalho49
.
A emigração moderna não é mais um movimento devido a pobreza, no sentido em que os
chineses emigrantes não fazem parte dum mundo marginalizado e desconhecido, mas
representam uma nação emergente. Há uma grande ignorância ocidental contra o China e
muitos estereótipos que vêm esta parte de mundo com terror. A cultura chinesa é fundada
sobretudo na religião do confucionismo, o que deixa pensar que os chineses são
submetidos a esta cultura e por isso fecham-se entre eles. A primeira observação que se faz
é que os chineses não aprendem a língua do país de acolhimento e isto é visto como
símbolo de uma não vontade de integração. Na realidade os chineses têm muita dificuldade
com a aprendizagem das outras línguas porque a língua chinesa tem sons completamente
diferentes das línguas europeas, não é alfabética e tem uma estrutura gramatical e sintática
muito particular. A dificuldade do aprendimento duma outra língua europeia para um
chinês só é possivel depois a segunda geração. Uma outra problemática desta língua é que
não sendo alfabética é muito complicada a sua transliteração em caracteres latinos.
Actualmente a metodologia mais usada para a transcrição do chinês para outras línguas em
alfabeto latim é o Pinynn, mas também os chineses instruidos não conhecem esta técnica
de transcrição, por isso acontece, muitas vezes que os emigrados enganam-se na
trasliteração do próprio nome50
. Como diz o filosofo francês Jullien:
«Il cinese non appartiene al gruppo delle lingue indo-europee (a differenza per esempio
del sanscrito) e si basa su ideogrammi, è l’unica lingua ad essersi conservata tra le altre
lingue ideografiche che esistevano un tempo. Il nostro sistema linguistico e quello cinese
sono due sistemi che si sono sviluppati indipendentemente l’uno dall’altro. In primo luogo
le lingue europee sono caratterizzate da una sintassi e da una morfologia praticamente
assenti nel cinese, in cui non esistono differenze di numero, declinazioni, coniugazioni dei
verbi secondo persone e tempi, proposizioni relative, subordinate o principali .Ne deriva
una speciale flessibilità che può essere esplicitata facendo riferimento ad una formula di
Lao Tsu, il fondatore del Taoismo, in cui troviamo la parola di, ad esempio in un frase del
48
Berti, F., Immigrazione e Modelli Familiari. I Primi Risultati di una Ricerca Empirica Sulla Comunità
Islamica di Colle Val D’Elsa e sulla Comunità Cinese di San Donnino, www.gips.unisi.it/files/wp32.pdf 49
Salaff, J., Greve, A., 2006, Chinese Immigrant Woman: From Professional to Family Careers, Social
Transformation in Chinese Societies, http://homes.chass.utoronto.ca/~agreve/Salaff-Greve-Professions-
family-STCS.pdf
50 Rastrelli, R., Immigrazione Cinese e Criminalità. Analisi e Riflessioni Metodologiche,
www.immigrazioneintoscana.it
17
tipo sembra l’antenato di. Ebbene, questo termine, di, può voler dire signore, sovrano, Dio
(al singolare e al plurale), e questo rende lo spettro delle possibilità abbastanza ampio. Al
carattere “determinante” delle lingue europee il cinese oppone quindi un forte grado di
“disponibilità” nella veicolazione dei significati.
Il cinese è, inoltre, una lingua che riflette un pensiero per polarità: per dire che cos’è
questa cosa?, ad esempio, si dice che cos’è questo est-ovest?, o ancora, per dire paesaggio
si dice montagna e acqua, shanshui o shanchuan. Un’altra particolarità del cinese
classico è la mancanza del verbo essere in senso assoluto, esistenziale: possiamo dire c’è
oppure lui è grande, utilizzando il verbo essere in senso predicativo, ma non si può dire lui
è. Come è possibile verificare attraverso l’analisi del pensiero confuciano, l’ontologia è
una possibilità che non è stata esplorata: non c’è la questione del che cos’è?, dell’essenza.
Anche la nozione di verità è assente»51
.
Normalmente os chineses prefiram morar em lugares perto da água, quer dizer perto do
mar, para terem mais próximos aos meios de trasporte para poderem mais facilmente voltar
à terra de origem para passarem aí a velhos ou, se o chinês não conseguiu voltar à China
antes de morrer, para enviar as cinzas do defunto à terra natal. Por isso as comunidades
como aquelas de Boston, Los Angeles, St. Louis estão todas perto do mar. Algumas vezes
encontram-se as comunidades perto de estações de comboios, exemplos são as cidades de
New York e S.Francisco52
. O refrão dos chineses da diáspora é luo ye hui gen (as folhas
que caem voltam às raízes) com o significado de desejo de voltar para a pátria natal, mas
muitas vezes este desejo não se realiza, o movimento contemporâneo dos chineses é
diferente daquele precedente, como diz Frank Pieke uma vez os chineses chegavam aos
lugares onde eram os ocidentais a dominar, agora existe uma extenção da China no
Ocidente. Geralmente a segunda geração, sobretudo aqueles que tinham frequentado as
escolas locais, não querem voltar para a China, pelo contrário, querem integrar-se na
comunidade de acolhimento, mas algumas vezes o problema da integração depende do país
estrangeiro onde os chineses vivem53
.
A China Town é a marca territorial onde se delimita geograficamente o lugar de
competência chinês. Nessa parte da cidade, onde a comunidade se desenvolve, há regras
51
Intervista a F. Jullien, L’altrove e l’Occidente, Chiara Pastorini, www.diogenemagazine.eu 52
Sen-Dou,C., 2008, The distrubution and occupations of overseas chinese, «The Chinese Diaspora in the
Pacific, coll. The Pacific World: Lands, People and History of the Pacific, 1500-1900», vol. 16, Ashgate-
Varioum, Cornwall. 53
Ceccagno, A., 2002, Prime Riflessioni sulla Mobilità Economica e Sociale dei Cinesi di Prato,
«L’imprenditoria degli Immigrati Cinesi, Atti del Pomeriggio di Studio», Camera di Commercio Industria
Artigianato Agricoltura di Vicenza, Vicenza. (p.21-22)
18
específicas de comportamento e de convivência que seguem a hierarquia chinesa
tradicional. Nestes bairros, que são normalmente muitos grandes, encontra-se um número
consistente de negócios e de residentes originando ilhas económicas de successo
baseiando-se na protecção e no controlo das redes54
. Com o termo China Town indica-se
uma prevalência numérica de chineses num bairro onde parece que há uma grande
autonomia e uma elevada linha de demarcação entre da comunidade chinesa e a sociedade
de acolhimento. A imagem da China Town propõe uma visão de invasão no território pelos
imigrados, uma visão mística onde se percebe um sentido ameaçador que é mais forte se
aproximado à “mafia chinesa”55
. A ideia do “Perigo Amarelo” estava muito presente nos
EUA onde os chineses tinham sido objecto de politicais racistas e restritivas que têm
origem no medo da concorrência representada por uma força de mão-de-obra barata e
também dum modo reservado das China Town que dava a ideia de ilegalidade por causa do
atraso cultural do estilo de vida, no sentido de uma falta da higiene moderna, a mafia e a
difusão das supestições56
.
Os trabalhos comuns dos migrados chineses são abrir restaurantes e lavanderias isto
acontece sobretuto na Europa do Leste, Estados Unidos da America, Canadá e Japão, ser
vendedores, criadores (Asia do sul, Nova Zelanda, Australia), trabalhar nas indústrias
(Itália, Tanzánia, Kenya e Uganda) em fim, trabalhar nas minas57
.
Desde 1990 os chineses não migram só para melhoras as condições de vida, mas para
encontrar, sobretudo nos países ocidentais, uma condição de saúde mais barata, tecnicas
avançadas e uma política mais estável comportando uma emigração de jovens estudandes
que frequentam as universidades no estrangeiro. Este tipo de imigração dos jovens
intelectuais começou em 1978 quando o chefe da China Deng Xiaoping procurou inviar os
estudantes ao estrangeiro, sobretuto para o oeste criando uma diáspora dos estudantes e
professores chineses. Nesta altura foram enviados para o ocidente cerca de 300000
intelectuais e poucos voltaram para China58
. Por isso encontram-se nas universidades
54
Da Conceição Botas, S.C., 2010, Atitude de crianças em relação aos grupos nacionais, tese de maestrado
em Relações Interculturais, Universidade Aberta de Lisboa, Orientadora Prof. Doutor Félix Neto, Lisboa. 55
Rastrelli, R., Immigrazione Cinese e Criminalità. Analisi e Riflessioni Metodologiche,
www.immigrazioneintoscana.it
56De Giorgi, L., 2002, Dalla Cina a Vicenza: Caratteristiche del Flusso Migratorio Cinese Verso l’Europa e
l’Italia, «L’imprenditoria degli Immigrati Cinesi, Atti del Pomeriggio di Studio», Camera di Commercio
Industria Artigianato Agricoltura di Vicenza, Vicenza. (p.3) 57
Sen-Dou, C., 2008, The distrubution and occupations of overseas chinese, The Chinese Diaspora in the
Pacific, coll. The Pacific World: Lands, People and History of the Pacific, 1500-1900, vol. 16, Ashgate-
Varioum, Cornwall (p.48-49) 58
Ching Kong, J., 2000, The Chinese Migration Overseas: with Special Reference to the Hokkien People,
Estudos Sobre a China III, ISCSP.(p.264-265)
19
americanas e nos centros de pesquisa muitos professores e especialistas de origem chinesa,
sobretudo no âmbito científico e tecnológico59
.
COMUNIDADES CHINESAS EM MOÇAMBIQUE: 1858 1975
“Entre 1858 e 1975 formou-se, desenvolveu-se e extingui-se em Moçambique uma
importante e dinâmica comunidade com núcleos principais na Beira e em Lourenço
Marques”.60
Porque os chines escolheram África como lugar onde viver? África não é um local
economicamente privilegiado, alguns estudiosos consideram o facto da pouca densidade,
outros dizem que os chineses escolheram Moçambique porque havia paz este facto pode
ser verdadeiro, porque os chineses partiram de Moçambique em 1975 (ano da
indipendência), nesta altura a comunidade chinesa contava cinco mil pessoas e diminuiu
para pouco menos de uma centena. Muitos partiram em direcção ao Canadá, Brasil,
Estados Unidos da America, Inglaterra, África do Sul, Portugal e muitos voltaram à
China61
.
Em 1850 chegam à Ilha de Moçambique os primeiros trinta chineses de Macau (8
carpeinteiros, 12 pedreiros, 4 ferreiros, 4 cobreiros e 2 picadores de pedra) que foram
contratados pelo governo da Colónia de Moçambique para trabalhar nas Obras Públicas.
Não se sabe muito sobre a vida desses, seguro é que alguns se fixaram na parte continental,
os outros permanecem na Ilha tornando-se cultivadores, o testimunho disso é uma casa
colonial que se diz que foi um templo chinês na Rua da Horta62
.
A partir do 1881 com a construção da cidade de Beira e de Lourenço Marques os
administratores da colónia pediam uma mão-de-obra barata para a constução de caminhos-
de-ferro e outros emprendimento coloniais: os chineses que segundo o Visconde eram de
59
De Giorgi, L., 2002, Dalla Cina a Vicenza: Caratteristiche del Flusso Migratorio Cinese Verso l’Europa e
l’Italia, «L’imprenditoria degli Immigrati Cinesi, Atti del Pomeriggio di Studio», Camera di Commercio
Industria Artigianato Agricoltura di Vicenza, Vicenza. (p.5) 60
Gazeta da Comunidade Chinesa em Moçambique 1858-1975, N°1 primavera 2003, coord. Eduardo
Medeiros, Cidehus-Nesa, Universidade de Évora. 61
Soares, C., 1998, O Caso dos Chineses de Moçambique imigrados em Portugal, «Estudos Sobre a China
1», ISCSP, Lisboa. (p. 319-320) 62
Medeiros, E., 2005, Os Cino-Moçambicanos da Beira. Mestiçagem Várias, Núcleo de Estudos Sobre a
África do Centro Interdisciplinar de História, Culturas e Sociedade (CIDEHUS) Universidade de Évora. (p.
159)
20
índole trabalhadora e tinham um grande engenho para a indústria, a agricultura e as artes,
foram preferidos pelo Governador Geral63
:
«carpinteiros (de barco e de machado) ou marceneiros; alguns pedreiros, canteiros,
estucadores ou outros que possam ser utilizados nas obras públicas; carregadores para as
companhias braçais das alfândegas (homens habituados ao serviço de embalagem e de
armazenagem); homens para serviço de polícia, como os que havia em Macau, com boas
notas e habituados no manejo das armas. O pagamento seria feito em Moçambique pela
Direcção das Obras Públicas, de acordo com o merecimento de cada um e a natureza do
seu trabalho. De acordo com o que já se praticava com trabalhadores indianos havia o
pagamento de 800 réis diários (mínimo) e 1.500 réis (máximo). Podiam vir com família»64
Apesar disso Moçambique nunca chegou a ser uma terra de contratados chineses e os que
ficaram depois ajudaram depois na construção no desenvolvimento das cidades com os
edifícios públicos e as casas de particulares65
.
Os dados demográficos de 1899 apontam para 69 indivíduos chineses, dos quais duas
mulheres, no território da Companhia de Moçambique, 52 em Lourenço Marques, e alguns
no norte. No início dos anos 70 contam-se 1370 chineses (702 homens e 668 mulheres) nos
distritos de Manica e de Sofala, dos quais 1019 tinham nacionalidade portuguesa. Outros
chineses no restante território consistiam em 2744. Mas estes números não são fiaveis,
porque não foram registrados os clandestinos e o mestiços. Os Mestiços só eram
considerados chineses para a comunidade chinesa, mas não para os portugueses que
consideravam qualquer tipo de mestiço (sino-africano, portugues-africano) uma “raça do
talvez” que “não tinha bandeira”66
(citação de Pepetela por Medeiros).
«Nos primeiros levantamentos demográficos antes di censo colonial de 1940, os
imigrantes chineses (de nacionalidade portuguesa ou não) eram colocados obviamente no
grupo dos não-nativos, e no subgrupo da «raça amarela», no qual figuravam também
japoneses e outro orientais. Os filhos dos homens chineses e nativas surgem numa outra
63
Idem (p.159) 64
Arquivio Histórico Ultramarino 1881 (citação) por E.Medeiros Os Cino-Moçambicanos da Beira.
Mestiçagem Várias, Núcleo de Estudos Sobre a África do Centro Interdisciplinar de História, Culturas e
Sociedade (CIDEHUS) Universidade de Évora. (p. 160) 65
Medeiros, E., 2005, Os Cino-Moçambicanos da Beira. Mestiçagem Várias, Núcleo de Estudos Sobre a
África do Centro Interdisciplinar de História, Culturas e Sociedade (CIDEHUS) Universidade de Évora. (p.
160) 66
Idem (p. 157-161)
21
categoria demográfica, a dos metiços, sem explicação quanto à raça ou etnia dos seus
progenitores.»67
De 1899 até os anos 60 os imigrantes chineses instalaram-se em todo o território
moçambicano fazendo diferentes trabalhos: na periferia da Beira tornaram-se horticultores,
em Lourenço Marques pescadores e trasformaram-se com a família em cantineiros para o
comércio com os negros. Entre os anos 30 e 40 abriram fabriquetas e outras indústrias de
confecções e mais, os jovens que tinham estudado na escola portuguesa trabalham nas
instituições públicas e privadas68
.
«As estatísticas de 1928 relativas à população não-negra da Colónia de Moçambique
referem 896 pessoas de origem chinesa, cuja distribuição pelo território era a seguinte:
distrito de Lourenço Marques, 380 (300 H e 80 M), dos quais 314 na cidade; Manica e
Sofala, 475 (411 H e 64 M), dos quais 314 na Beira; Inhambane, 5 H; Quelimane, 11 H;
Tete, 1 H; Ilha de Moçambique, 16 (15 H e 1 M); Companhia do Nyassa, 8 (7 H e 1 M).
Total: 896 pessoas (750 H e 146 M), sendo 8 de nacionalidade portuguesa e 888
estrangeiros.
Em meados de 30, a população total de chineses em Moçambique ultrepassava as 1050
pessoas, assim distribuídas: distrito de Lorenço Marques, 557 (399 H e 158 M); distrito de
Manica e Sofala, 471 (391 H 80 M); Inhambane, 3 H; Quelimane, 8 H; Distrito de
Moçambique, 8 H; Porto Amélia, 9 H. Do total desta população, 240 tinham a
nacionalidade portuguesa e 816 uma nacionalidade estrangeira. É de relaçar a existência
nesta altura de 238 mulheres, ou seja um quarto da população total. (...)
Em 1940, a distribuição geográfica dos chineses em Moçambique era a seguinte: distito de
Lourenço Marques 685 (450 H e 235 M); Manica e Sofala, 736 (536 H e 200 M).
Dados estatísticos recolhidos para 1950 indicam 1613 indivíduos, 997 H e 616 M, sendo
861 nacionais e 752 estrangeiros, achando-se assim distribuída por distitos: Lourenço
Marques, 734 (421 H); Gaza 37 (33 H); Inhambane, 61 (43 H); Manica e Sofala, 760 (479
H).
67
Medeiros, E., 1998, Formação e desagregação das Comunidades de Origem Chinesa nas Cidades
Moçambicanas da Beira e Lorenço Marques, «Actas do Seminário Moçambique: Navegações, Comércio e
Técnicas», Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, Maputo. (p.300) 68
Idem (p.161)
22
Dos 2098 chineses recenseados em Moçambique em 1960, 1136 são homens e 962
mulheres. Destes, 1027 indivíduos (548 H) habitam no distrito de Manica e Sofala, dos
quais 968 no concelho da Beira.»69
Em Moçambique fixaram-se sobretudo chineses dos destritos da província de Guandong
(Shunde, Toishan, Zhongshan) cuja capital é Cantão. Nestas regiões fala-se o cantonês, por
isso nas comunidades chinesas chegadas a Moçambique a língua principalmente falada era
o cantonês e só nos anos 50 começou a ensinar-se o mandarim nas Escolas Chinesas de
Lourenço Marques e Beira. No entanto seja na Beira seja na capital nunca houve uma
“China Town”, porque os chineses, bem como os indigenas moravam nos lugares impostos
pelos portugueses70
.
No entanto nas comunidades a partir das segundas e terceiras gerações a cultura singular
própria da China chegou a um processo de heterogeneização embora os mais velhos
pretendessem transmitir essa cultura e essa consolidação étnica aos mais novo através dos
casamentos endogâmicos, da Escola Chinesa e do Clube Chinês. O sentimento identitário
era próprio dos primeiros chineses que chegavam a Moçambique, que perteceiam a uma
mesma aldeia ou aldeias vizinhas segundo afirmavam, criando pois, uma mesma
identidade na diáspora em Moçambique. Na realidade seja na comunidade chinesa de
Beira, seja naquela de Lourenço Marques estão presentes muitas divisões sociais que não
foram vistas pelos colonos portugueses71
.
Em 1975 muitos chineses fugiram para Portugal, Brasil, Canadá, Estados Unidos, outros
voltaram para a China, mas muitos mestiços sino-africanos não deixaram Moçambique,
muitos deles frequentaram o ensino do português e participavam em actividades sociais
como os concursos de beleza, alguns tornaram-se cristãos e, pois, consideraram-se
moçambicanos72
.
69
Medeiros, E., 1998, Formação e desagregação das Comunidades de Origem Chinesa nas Cidades
Moçambicanas da Beira e Lorenço Marques, «Actas do Seminário Moçambique: Navegações, Comércio e
Técnicas», Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, Maputo. (pp.301-
302) 70
Idem(p.166-167) 71
Idem (p.170-178) 72
Idem (p.180-181)
23
A COMUNIDADE DE LOURENÇO MARQUES
Um dos primeiros chineses, talvez o primeiro, chegou a Lourenço Marques em 1880 e
chamava-se Ja Assam73
. Era um carpinteiro que fez fortuna nesta cidade e tornou-se dono
do prédio que ganhou o seu nome, com frente para o Bazar fazendo curva na esquina da
actual 25 de Setembro com a Karl Marx74
.
Em 1881 após o pedido do Governador Geral chegaram os primerios operários de Cantão
para construir o caminho-de-ferro que ligava a cidade à África do Sul. Empreendimento
que se realizou entre 1887 e 188975
.
Em 1888 moravam em Lourenço Marques 52 chineses e em 1895 a comunidade chegou a
89 cidadaos desta nacionalidade. Durante este período o número dos habitantes chineses
mudou porque alguns voltaram ao país do origem e outros deslocaram-se para outras
regiões da colónia; portanto os chineses em 1889 eram 47, em 1893 eram 52, em 1894
eram 39 (36 homens, 2 meninos e uma mulher representando o 3,6% da população total)76
.
Depois em 1895 o número dos cidadãos chineses foi subindo sistematicamente77
. Em 1912
o número dos chineses subiu à 573 pessoas (550 homens e 23 mulheres), mas a partir desta
data a comunidade chinesa diminuiu novamente. Contam-se 314 chineses em 1928, depois
o número volta a subir: 483 chineses em 1935 e mais em 1940 durante aquele ano os
chineses presentes em Lourenço Marques eram 57078
. Por fim a comunidade chinesa de
Lourenço Marques chegou a 3500 pessoas.
Os colonos portugueses sempre tinham um comportamento contradictório, porque eles por
um lado não gostavam dos etrangeiros, temiam o “outro”. Este medo chegou a uma
hierarquização das raças por cores da pele que se traduzia com uma divisão dos bairros da
cidade por comunidades diferentes para ter uma melhor “limpeza”, para os portugueses os
chineses eram pessoas sujas e imundas e foram marginalizados porque mantinham os
hábitos tradicionais da sua cultura e também as vestimenta e a língua.
73
Gazeta da Comunidade Chinesa em Moçambique 1858-1975, N°1 primavera 2003, coord. Eduardo
Medeiros, Cidehus-nesa, Universidade de Évora. 74
Rolletta, P., 2008, Kuan Ti, the Unprotected Protected, «Índico»,
www.macua.org/beira100anos/beiraindico.pdf 75
Medeiros, E., 2005, Os Cino-Moçambicanos da Beira. Mestiçagem Várias, Núcleo de Estudos Sobre a
África do Centro Interdisciplinar de História, Culturas e Sociedade (CIDEHUS) Universidade de Évora. (p.
160) 76
Zamparoni, V., 2000, Monhés, Baneases, Chinas e Afro-maometanos colonialismo e racismo em Lourenço
Marques, Moçambique, 1890-1940, Lusotopie (p.194) 77
Gazeta da Comunidade Chinesa em Moçambique 1858-1975, N°3 outono 2003, coord. Eduardo Medeiros,
Cidehus-nesa, Universidade de Évora. 78
Zamparoni, V., 2000, Monhés, Baneases, Chinas e Afro-maometanos colonialismo e racismo em Lourenço
Marques, Moçambique, 1890-1940,2000, Lusotopie (p.200)
24
Um exemplo do medo das instituiçõs coloniais por os “outros” é representado do artigo 5°
do Regulamento da Exploração do Eléctrico: em 1904 chegou à cidade o eléctico, o novo
serviço de transporte úrbano, pois, o regulamento dizia que os estrangerios indigenas e
asiaticos não podiam sentar-se e só podiam ficar em pé no pequeno lugar a eles
destinado79
. E mais, durante os anos da peste em Lourenço Marques os chineses e em geral
os estrangeiros foram inculpados de ser a causa da doença, o motivo desta acusação era
subretudo aquela de não ser católicos, nem cristãos. Os chineses foram acusados de
recolher as fezes e usá-la para adubarem as hortas80
.
Por o outro lado os colonos gostavam dos estrangeiros porque com eles podiam manter
uma mão-de-obra barata81
. Em 1894 a cidade de Lourenço Marques tinha 22 carpinteiros
chineses, 10 comerciantes, 2 agricultores, 2 ferreiros e um cozinheiro e a única mulher
trabalhava como doméstica. Em 1912 os chineses especializaram-se mais na actividades
comerciais e de construção, só 7 chineses eram lavadeiros de roupa e 22 cozinheiros,
geralemnte os chineses eram empregados em profissões artesanais ou tinham quase sempre
profissões modestas ou ocupavam baixos cargos na burocracia colonial82
. Eles eram
banidos do serviço público e das funções militares83
.
Abaixo está a medida dos salarios dos chineses da cidade no 190884
:
Alfaiates Diários em reis $800 a 1$500
Carpinteiros Diários em reis $800 a 1$800
Carroceiros Diários em reis $500 a $800
Pedreiros Diários em reis $800 a 1$000
Como já dissemos os chineses tinham uma grande importância nas construções, apesar
disso continuavam a ser exclúidos pela sociedade colonial e pelas associações comerciais
como Câmara de Comércio e a Associação Comercial dos Lojistas, por isso foram criados
comunidades indipendentes com as próprias associações85
.
79
Zamparoni, V., 2000, Monhés, Baneases, Chinas e Afro-maometanos colonialismo e racismo em Lourenço
Marques, Moçambique, 1890-1940, Lusotopie (p.204) 80
Idem, (p.202-203) 81
Idem, (p.193-200) 82
Zamparoni, V., 1998, Gênero e Trabalho Doméstico numa Sociedade Colonial: Lourenço Marques,
Moçambique c.1900-1940, V Congresso Luso-Afro-Brasileiro de Ciências sociais, Maputo. (p.149-150) 83
Idem, (p. 200) 84
Zamparoni,V., 2001/02 Trabalho, Raça e Classe no Contexto Colonial de Lourenço Marques,
Moçambique, c.1890-1940, «STVDIA» 58/59, Lisboa. (p.61-68) 85
Zamparoni, V., 2000, Monhés, Baneases, Chinas e Afro-maometanos colonialismo e racismo em Lourenço
Marques, Moçambique, 1890-1940, Lusotopie. (p.210)
25
“Os chineses, embora poucos, reuniam-se no Club Fiel Observante do Direito (Chee Kung
Tong), no Club Chinez de Lourenço Marques e, até mesmo, mantinham uma representação
do Partido Nacionalista Chinez, o Kuo Min Tang. O Pagode Chinez (Associação Chineza),
foi fundado em 1903, mas reconhecido oficialmente pelo governo colonial somente em
1924, em terreno doado por Ja Assam, um imigrante pioneiro. O Pagode foi uma das mais
ativas associações e tinha como objetivos promover o bem estar da comunidade através da
educação, da organização de festas, bailes e jogos e da assistência social aos membros
necessitados em caso de desemprego, doença, invalidez e morte. Para seus cultos, a
comunidade fez construir, em 1903, junto com o Pagode, um templo dedicado a Buda. Era
um edifício quadrangular de madeira e zinco e sem características arquitetônicas
chinesas. Criaram, em 1911, a Associação d’Operários Chinezes Beneficente “Boa
União” que, em 1914, mudou seu nome para Chinese Republic Association of Lourenço
Marques. Também em 1914 a Hoong Che Sha (Sociedade do Grande Desejo) fundada em
1908, sobre à qual não encontrei um único documento, teve autorização para mudar seu
nome para “ Hwoc Man Tong ” ou Associação Nacionalista Chinesa. Creio que estas mu-
danças de nome, sem alteração estatutária, só foram feitas para alinharem-se com o novo
regime estabelecido na China em janeiro de 1912. Em 1915, submeteram, para aprovação
do governo, os estatutos da Associação do Templo Chinês, cuja criação não foi autorizada
pelas autoridades coloniais sem maiores explicações. Em 1938 fundaram a Escola
Chinesa, para providenciar ensino primário em chinês e português às crianças da
comunidade, instalada num anexo do Pagode Chinês.”86
No prédio Tchi Kung Tong, que ainda existe e situa-se na Avenida Josina Machel, jogava-
se o mah jong. A divindade chinesa que se orava no templo era Kuan Ti, uma das
divindades mais potentes. Kuan Ti nasceu como guerreiro na China ao final da dinastia
Han. A sua grande estátua estava situada no altar da escola chinesa (agora sede do Instituto
Nacional das Artes Visuais), desde o 1975 está no museu de Arte de Maputo. O altar teve
de ser deslocado em 2005 para a Associação Chinesa de Moçambique, mas ainda a entrega
não se concretizou. Sobre a escola chinesa a jornalista Paola Rolletta esceve o artigo Kuan
Ti, the Unprotected Protected praticamente neste artigo reesceve-se uma intervista com o
chinês Wan Mah (proprietário duma das últimas lojas da velha cominidade chinesa de
Lourenço Marques), o qual afirma que:
86
Idem, (p. 211)
26
«A Escola foi construída no lugar do antigo Pagode Chinês, que datava do início do
século XX, em Lourenço Marques. Em 1938 fundaram a Escola Chinesa, para
providenciar ensino primário em chinês e português às crianças da comunidade, instalada
num anexo do Pagode Chinês. O ensino era em mandarim apesar da maioria de nós
falarmos cantonês».
O artigo continua assim:
«Era ali onde a comunidade celebrava as suas festas, casamentos, aniversários e funerais.
Daquela comunidade chinesa ficaram poucas pessoas, talvez umas setenta na zona de
Maputo, diz-nos Wan Mah. “Desde os anos 90 estamos a tentar reaver o nosso altar e a
nossa sede. Também nós somos
parte da História deste país”.»87
Portanto a primeira associação foi a Boa União fundada para proteger os trabalhadores
chineses residentes na cidade, em 1913 a direcção da associação solecita para mudar o
nome desta para Chinese Republic Association Lourenço Marques, o pedido foi diferido
em 12 de Fevreiro 1914. Um ano depois um grupo de cidadãos chineses (17 comerciantes,
3 carpinteiros, 1 agricultor e 1 cozinheiro) reuniram-se para criar o Templo Chinês88
.
COMUNDIDADE CHINESA NA BEIRA
«Beira era uma cidade muito particular, porque existia esse estigma da divisão racial, se
calhar era o lugar de Moçambique onde essa hierarquia espacial por raças era mais
evidente. Segundo, a Beira era também um pântano, essa arrumação espacial não foi
plenamente conseguida. A Beira acabou por ser até à Independência, uma cidade
misturada onde essas margens dos territórios negros, brancos e das outras raças se
entrecruzavam. E por circunstâncias da minha vida, vivi nessa margem, os outros estavam
87
Rolletta, P., 2008, Kuan Ti, the Unprotected Protected, «Índico»,
www.macua.org/beira100anos/beiraindico.pdf 88
Medeiros, E., 1998, Formação e desagregação das Comunidades de Origem Chinesa nas Cidades
Moçambicanas da Beira e Lorenço Marques, «Actas do Seminário Moçambique: Navegações, Comércio e
Técnicas», Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, Maputo. (pp.301-
302)
27
do outro lado da rua : os indianos, os pretos, os mulatos chineses - que só existiam na
Beira»89
Mia Couto.
Os chineses que se instalaram na Beira vinham para construir o caminho-de-ferro
(Rodésia-Beira- Umtali) e o porto, mas no fim da construção do caminho-de-ferro a
comunidade chinesa ficou num processo diaspórico que vê estes individuos partir para os
continentes ingleses do Índico.
Os primeiros chineses que se instalaram na Beira viviam espalhados pela cidade.
Encontram-se no bairro de Maquinino e do Chaimite depois algumas famílias instalaram-
se noutros lugares periféricos como Munhava, Chipangara, Esturro, Matacuane, Manga,
Macúti. Em geral as comunidades chinesas na Beira surgiram na proximidade do porto e
do caminho-de-ferro90
, sobretudo concentravam-se na rua Correiro de Brito e moravam em
habitações construidas com madeira e zinco pelos carpinteiros chineses. A comunidade
tornou-se sempre maior e ocupava ponto estratégico de negócios com os africanos, como a
rua Alfredo Lawley91
.
Em 1920 a comunidade chinesa era bastante grande e era também diversificada do ponto
de vista de trabalho. Portanto em outubro 1922 foi fundada a Associação Chinesa que foi
autorizada pela administração colonial só um ano mais tarde. Na verdade o edíficio da sede
da associação já tinha começado em 1921 e foi terminado em 1923, após a legalização. A
associação chinesa foi nomeada pelos colonos “o Grémio chinês” ou, mais comummente
dito “Clube Chinês” (onde agora há sede o ARPAC Arquivio do Patrimônio Cultural). No
frontispicio do edificio estão, ainda hoje, os três caracteres da irmandade: Chee Kung
Tong.
89
Martins, S., 2006, O Entrelaçar das Vozes Mestiças, Principia, Estoril. (p. 404) 90
Medeiros, E., 2005, Os Cino-Moçambicanos da Beira. Mestiçagem Várias, Núcleo de Estudos Sobre a
África do Centro Interdisciplinar de História, Culturas e Sociedade (CIDEHUS) Universidade de Évora. (p.
160-169) 91
Gazeta da comunidade Chinesa em Moçambique 1858-1975, n°4, Verão 2004, coord. Eduardo Medeiros,
Cidehus-Nesa, Universidade de Évora.
28
beiraumseculo.blogspot.com freemasorny.bcy.ca
«A Chee Kung Tong (ou Chih Kung Tong, ou ChiKung Tong) era uma associação para a
qual se entrava através de um rito iniciático, secreto, e com um juramento de fidelidade e
de confidencialidade em relação a tudo o que se passasse e fosse decidido dentro da
confraria. Os membros da sociedade faziam-se conhecer por gestos, maneiras de estar e
de vestir. Tal como nas lojas maçónicas. A Chee Kung Tong era nessa época como uma
maçonaria. Talvez por isso, nas campas de Ng Deep (aliás: Ng Kei Yu) e de Ah Quin, no
Cemitério Santa Isabel, na Beira, estejam gravados os símbolos maçónicos: o esquadro e
o compasso. Mas pode ser também que estas personagens pertencessem à Maçonaria de
Hong Kong ou de Cantão, relacionada com as lojas maçónicas dos britânicos na região e
fossem simultaneamente membros da Chee Kung Tong. Sun Yat-sen, o primeiro presidente
da República da China, era maçon e da Chee Kung Tong. O Clube Chinês passou a ser o
coração onde pulsava a vida da comunidade. Aí conferenciavam, se divertiam e
celebravam as grandes cerimónias culturais das suas terras de origem. Dentro dele
realizavam-se todos os anos estrondosas festas, a que assistiam as pessoas gradas da
terra. Mas por alturas de 1932, e em consequência da crise económica, as festas foram
perdendo o fausto primitivo e terminaram por se resumir a simples festejos. Voltariam a
ser importantes depois da Guerra, mas não já no mesmo contexto colonial e mundial.»92
Com a construção do clube chinês os portugueses começaram a mudar a ideia feita sobre
estes imigrados, passou-se a ver os chineses de “sujos e misevavéil” a “sóbrios e
extremamente trabalhadores” a “dignos trabalhadores que contríbuiram para o
desenvolvimento do distrito”. (Citação de Costa, 1940 por Meideros p.183)
92
E.Medeiros, Os Cino-Moçambicanos da Beira. Mestiçagem Várias, Núcleo de Estudos Sobre a África do
Centro Interdisciplinar de História, Culturas e Sociedade (CIDEHUS) Universidade de Évora. (p. 183)
29
Graça ao Clube Chinês nasceu o clube desportivo Thung Hua Athletic Club, conhecido sob
o nome mais comum de Atlético Chinês. No anos 50 foram costruidos o campo de
basquetebol e a Escola Chinesa (onde agora está a sede da Escola Publica Agostinho
Neto). Nessa altura o clube chinês desportivo manteve uma intensa actividade, praticava-se
basquetball, tenis de mesa, badminton, e artes marciais. Foi através do basquetebol que os
chineses ganharam notoriedade, não se sabe porque os chineses tinham uma predilição por
esta disciplina desportiva, provavelmente, segundo Lorenzo Macagno:
« É possível que essa decisão estivesse relacionada com os intensos vínculos pessoais,
associativos e políticos que os chineses beirenses mantinham com seus pares da Rodésia e
da África do Sul, onde também existiam associações, clubes e escolas semelhantes às da
Beira. Em Johanesburgo, por exemplo, a comunidade chinesa tinha conseguido construir
uma quadra de basquetebol próxima das instalações da Overseas Chinese School,
também, conhecida como Johanesburg Chinese School»93.
Em 1935 formou-se a primeira equipa chinesa, chamada 629 e começaram os primeiros
torneios regionais com as outras equipas chinesas da África do Sul e da Rodésia, aconteceu
que os jornais como os Notícias da Beira e Díario de Moçambique interesaram-se nestes
eventos desportivos e olhavam sempre com mais atenção os acontecimentos da
comunidade chinesa. O desporto e sobretudo o basquetebol também se abriu às crianças e
às mulheres o que não aconteceu na cidade de Lourenço Marques94
.
Foi construida também a escola chinesa na esquina das ruas do Major Serpa e de Pêro de
Alenquer. Neste edificio celebram-se também actos religiosos e reuniões da comunidade.
Alí os meninos aprendem chinês (1° e 2° classe) e chinês e português (da 3° à 6° classes).
Em 1965 a escola contava 176 alunos os quais 83 eram rapazes e 93 raparigas, e havia
nove professores, seis chineses e três portugueses95
.
Em 1946 foi requerida a autorização para se fundar na Beira uma outra associação benefica
de nome Associação de Beneficiência Chinesa da Beira que tinha como pontos
fundamentais de ajudar no desemprego, na doença e na invalidez. Ainda, numa data não
93
Macagno, L., 2010, Os “Bons Portugueses do Atlético Chinês”, 7° congresso dos estudos africanos,
Departemento de Antropologia universidade Federal de Panará, Lisboa. (p.4-6) 94
Gazeta da comunidade Chinesa em Moçambique 1858-1975, n°2, Verão 2003, coord. Eduardo Medeiros,
Cidehus-Nesa, Universidade de Évora. 95
Amaral, I., 1969, Beira, Cidade e Porto do Índico, «Revista Portuguesa de Geografia vol. IV-7», Centro de
Estudos Geográficos, Lisboa. (p. 84)
30
determinada foi fundada a associação da Solidariedade Chinesa criada sobretudo para
ajudar os imigrantes cantoneses e os seus descendentes96
.
Nos anos 70, com a luta da FRELIMO contra os portugueses, os chineses foram chamados
para defender Portugal, mas quando a FRELIMO consegue o poder em Moçambique os
chineses tornaram-se indesejados, por isso, na cidade de Beira entre de 1973 e 1974 havia
uma nova diáspora chinesa especialmente para Portugal (onde se assistiu à primeira
chegada chinesa que foi seguida por outras duas ondas migratórias. Agora em Portugal
residem cerca de 15000-17000 individuos97
).
AS FAMÍLIAS CHINESAS DE MOÇAMBIQUE
Vamos contar aqui algumas histórias dumas familias chinesas que viviam em
Moçambique, a primeira secção de contos é tirada de um ensaio de Cristina Soares “O
Caso dos Chineses Emigrados em Moçambique” a segunda (só duas) famílias é tirada de
um ensaio de Eduardo Medeiros “Os sino-moçambicanos da Beira”.
Graça à citação duma entervista informal com o Sr. Wang pela doutora Soares foi possível
conhecer algumas histórias de famílias chineses que se instalaram em Moçambique e
depois mudaram para Portugal.
A primeira família chama-se Yi, o chefe fundador desta em Moçambique, era carpenteiro e
chegou à Beira cerca em 1940 com alguns amigos, não se sabe se ele era casado na China,
aquilo que se conhece è que arranjou uma mulher local mais nova do que ele. E deste
casamento tinha tido quatro filhos três de sexo feminino, a primeira teve muito mais
contactos com a comunidade chinesa, pelo contrário o filho mais novo não foi muito
influenciado pela cultura paterna. Só a segunda filha emigrou de Moçambique e casou com
um português, não se sabe se matinha ou não contactos com a comunidade chinesa ou se
sabia falar chinês.
Outra história é aquela da família Er, que partiu para Moçambique nos anos 30 para
melhorar as condições económicas. Instalou-se também na Beira e foram membros activos
da comunidade incentivando os contactos com a cultura chinesa. Todos os seus
descendentes casaram com membros da comunidade, mas depois todos se naturalizaram
portugueses. Também esta família migrou uma outra vez, um ano após a indipendência: 96
Medeiros, E., 1998, Formação e desagregação das Comunidades de Origem Chinesa nas Cidades
Moçambicanas da Beira e Lorenço Marques, «Actas do Seminário Moçambique: Navegações, Comércio e
Técnicas», Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, Maputo. (pp.306-
307) 97
Da Conceição Botas, S. C., 2010, Atitude de crianças em relação aos grupos nacionais, tese de maestrado
em Relações Interculturais, Universidade Aberta de Lisboa, Orientadora Prof. Doutor Félix Neto, Lisboa.
(p.19)
31
alguns voltaram para Cantão, outros, aqueles naturalizados portugueses, migraram para
Portugal e não mantinham contactos com a comunidade.
A Família San é originária de Macau e chegou cerca de 1940 a Lourenço Marques onde
manteve contactos com a comunidade chinesa local. Os homens desta família tinham
esposas chinesas no interior da comunidade. Contudo em 1975 migraram para Portugal
continuaram mantendo um profundo conhecimento do dilecto cantonês e da cultura
chinesa e, segundo a intervista, os membros voltam frequentemente a Macau.
A família Si, como as outras chegou a Moçambique para melhorar as suas condições,
fixaram-se em Marromeu mantendo uma relação estreita com a comunidade chinesa da
Beira. O progenitor casou com uma chinesa da comunidade, depois com uma nativa. Os
filhos da segunda esposa não tiveram grandes influências da cultura chinesa, vieram para
Portugal na altura da indipendência moçambicana. Dos outros filhos, aqueles do primeiro
casamento, não se sabe nada.
A última família que trata o artigo é a família Wu que se mudou de Cantão para se fixar em
Marromeu, para melhorar as condições de vida. O progenitor casou com uma chinesa e
teve uma filha que migrou para Portugal e casou com um chinês da comunidade da mesma
étnia do que ela98
.
Histórias de outras duas famílias são contadas por Edurado Medeiros: a família Ah Quin
chegou de Ragoon para Moçambique como empregado constutor para o porto e o
caminho-de-ferro, mas depois da construção ficou sem trabalho, ajudou na construção das
casas para a comunidade e tornou-se membro do Clube Chinês. Ele deu origem a três
ramos familiares na cidade de Beira, um com uma mulher africana, portanto sino-africano
e outros chineses um destes fondou o Atlético Chinês e teve varios filhos que estudaram na
escola portuguesa, o outro irmão estudou em Shangai e casou com uma chinesa da Beira.
A outra família é aquela de Lee Pon que viajou de Guadgong para Beira na metade do
século XX, mas não se conhece a data precisa. Logo mudou para Mambone. Embora já
fosse casado, casou novamente com uma africana. Durante o período da Segunda Guerra
Mundial, voltou para a China ver a sua família e voltou a África para um bairro perto de
Beira, a sua segunda esposa morreu e ele viveu alì com os seus filhos chineses que se
converteram ao catolicismo. Os filhos destes não casaram com chineses, apesar disso
continuavam a manter contactos com a comunidade chinesa. Todos vivem em
Moçambique.
98
Soares, C., 1998. O Caso dos Chineses de Moçambique imigrados em Portugal, «Estudos Sobre a China
1», ISCSP, Lisboa. (p. 312-313)
32
NOVAS RELAÇÕES ENTRE A CHINA E MOÇAMBIQUE
A China mandou 5 bilhões de dólares para fazer de África o seu maior Trading partner. No
interior de África a China trabalha para ter as árvores da floresta virgem de Liberia,
Camerões, Moçambique e Congo, no entanto em Ghana, Botswana, África do Sul e
Nigeria a China pede minerais para utilizar nos seus produtos99
.
Desde 1996 o negócio chinês começou a interessar-se em África, e em troca deste business
os chefes políticos ganharam novos edifícios parlamentares, presidentais e estadios que
serão costruidos pela China que utilizará empregados chineses, no entanto os trabalhadores
africanos são ignorados. Mas a nova comunidade chinesa que està nascendo permitiu que
África pudesse ter bens não muito caros como nova roupa, sapatos, radios, relógios.
Muito importantes são as relações da China com África de língua portuguesa (Angola,
Moçambique, Guiné Bissau, Capo Verde) através de Macau a China estabeleceu novas
relações utilizando o network da lusofonia.
Angola, Moçambique, Cabo Verde e Guiné Bissau fazem parte do FOCAC (Forum on
China-Africa Cooperation) e tiveram com a China muitas relações durante os séculos das
colonias portuguesas. Em 2003 em Macau, antiga colonia portuguesa, reuniu-se o Forum
for Economic Cooperation and Trade entre da China e os países africanos de língua
portuguesa. No encontro estavam os oito representantes das regiões lusofonas: Brasil,
Portugal, Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné Bissau, Timor Leste e mais Macau
que fez parte da delegação chinesa.
Porque motivo a China se relaciona com os países africanos de língua portuguesa? A
resposta é muito simples, estes países não são muito populados, e têm uma economia fraca
sobretudo devido às guerras, mas também têm uma grande quantidade de recursos naturais
como a pesca, agricultura, florestas, turismo, gas natural, carvão, minas e petróleo.
Angola tem diamantes, ouro e uránio; Moçambique por sua vez tem carvão, titaniu, pedras
semi-preciosas, milho, algodão, açúcar, pesca, minas de gas natural e petróleo. Em troca a
China oferece ajudas económicas sobretudo para os recursos de desenvolvimento e
reabilitação das infra-estruturas: dinheiro e mão-de-obra chinesa para a construção de
99
Alden, C., 2007, China in Africa, Coll. African Arguments, ed. Led Books, New York.(p.3-5)
33
hospitais, escolas, ruas, caminhos-de-ferro, aeroportos, casas sociais e telecomunicações.
Pequim está a tornar-se o maior sócio desses paises utilizando Macau como promotor100
.
Uma entervista ao escritor sueco Henning Mankell faz nos pensar nos chineses em África
como novos colonizadores, interessados nas matérias primas de Moçambique e sobretudo a
tentar resolver o problema da sobrepopulação na China, por isso escolhem África como
ponto estrátegico para moverem-se porque alí a densidade da população é baixa. Há uma
completa invasão dos chineses e os africanos não conseguem encontrar uma solução, não
têm mais controlo sobre isso.
«Há já algum tempo que estou horrorizado por ver como é que os chineses se comportam
em África. Parecem-me neo-colonizadores, o que para mim é ainda mais doloroso pelo
facto de ter crescido com a ideia de que a China ajudava os países africanos a libertarem-
se. [...] Vi os chineses na construção, em Moçambique e noutros lugares em África. A
China tem um problema de excesso de população rural. Os seus 200 milhões de
camponeses não param de empobrecer, e um dia correm o risco de se revoltarem e de
“tomar a Bastilha”, ou seja, de se oporem ao Partido Comunista. Os dirigentes chineses
prevêem portanto exportar o problema e transplantar para África os camponeses mais
pobres (nada menos que 4 milhões!) para que cultivem a terra. É uma forma terrível de
colonização, e é exactamente o que fizeram os portugueses antigamente em Moçambique.
Pode-se sujeitar os pobres a tudo. E é claro, os dirigentes de Moçambique tirarão proveito
financeiro dessa política chinesa.»101
Segundo artigos tirados de várias revistas como a Revista de Macau, blog, e também o
Portal do governo de Moçambique, a China está a jogar um papel fundamental no
desenvolvimento de Moçambique.
«Pequim - Os governos da China e de Moçambique querem fazer da região moçambicana
do Vale do Zambeze um centro de produção de arroz para o mercado chinês» 102
«Quase de um dia para o outro a China tornou-se no sexto investidor estrangeiro de
Moçambique, com números que, distantes ainda dos alcançados pelos sul-africanos,
100
Alves, A. C., 2008, Chinese Economic Diplomacy in Africa: the Lusophone Strategy, «China returns to
Africa: a Rising Power and a Content Embrace», Hurst &co., London (p.69-81) 101
H. Mankell, intervista para Le Nouvel Observateur cidado por comunidademoçamicana.blogspot.com, no
artigo Entervista a Henning Mankell, 28.01.2008 102
Pequim quer fazer de Moçambique o Celerio Chinês, Jornal Digital 21-07-2008,
34
prometem uma contínua e rápida subida na escada dos principais parceiros económicos,
daquele país africano de língua portuguesa.»103
As relações da China com Moçambique são devidos aos recursos naturais deste país
africano alguns ainda não explorados:
RECURSOS HIDRICOS: Barragem de Cabora
Bassa.
CARVÃO: Moatize e Mucanha onde há minas de
carvão estimados em 6 milhões de toneladas.
AREIAS PESADAS: A reserva de Chimbunto
representa uma das maiores reservas do mundo,
estima-se em 157 milhões de toneladas que incluem
titanium, zircão, slag, rutil e leucose.
AREIAS PESADA: Reserva de Moma, estimada em
299 milhões de toneladas que incluem zircão,
ilmenite, rutil.
GÁS NATURAL: Reservas no campo de Pande/Temane estimada em mais 5 milhões de
TJ104
.
Lendo os artigos percebe-se que a China tem uma grande influência na económia de
Moçambique, as classes dirigentes estão muitos satisfeitas pelas intervenções económicas
da China em relação a Moçambique. Serão construidos novos edificios governativos,
ampliado o aeroporto, edificado uma nova fabrica de cimento, mas também os chineses
entrarão no sector da agricultura e no turismo, aumentando, assim, assim a visibilidade nos
sectores têxteis.
Em 2006 a China emprestou 2 milhões de Euros para a construção da barragem de Mpanda
Nkua no rio Zambese e ofereceu-se para financiar outras três barragens sempre no
Zambese e duas no Limpopo. Agora está a modernizar as infra-estruturas portuárias de
Quelinane (Nampula) e Nacola (Zambézia). Obviamente a construção dos novos portos é
para melhorar e facilitar a exportação dos bens alimentares para a China, como o arroz,
cultivo que na China está em desaparecimento, porque não há mais terra aravel, por isso o
governo chinês pensou bem em descobrir outros sítios para cultivar o arroz. A China
prometeu aumentar a produção e o cultivo de arroz em Moçambique em 100 mil toneladas
103
L. Andarde de Sá, Moçambique: o regresso dos chineses, Revista Macau na Internet. 104
Pohlmann, J., Slaven C., Algumas considerações sobre a presença chinesa em Moçambique, http://www.iese.ac.mz/lib/publication//2010/Conf_CA/IESE_CA_Jonas_Caroline_pres.pdf (p.9)
35
para as 500 mil toneladas em cinco anos. É obvio que a cultivo do arroz não tem nada a ver
com a alimentação moçambicana, porque este cereal é consumido sobretudo pelos ricos,
por isso representa só uma minima parte da dieta moçambicana, isso implica que o referido
cultivo é exclusivamente útil para o mercado chinês.
Segundo uma pesquisa de João Feijó em cerca de dez empresas chinesas em Moçambique
de construção civil, hotelaria e restauração aprendeu que há grandes diferenças entre os
trabalhadores chineses e os empregados locais. Como primeira coisa a diversidade está nos
salários, os primeiros tiram um salário entre de 9900 e 23100 meticais, e um moçambicano
chega a um salário que varia de 2200 2500 mecticais. E mais, os chineses têm direito a
água, refeiços, frutas, cigarros para além do alojamento e pequenos armazéns; os
moçambicanos têm direito só a uma refeição e quando trabalham fora do horário recebem
um pão.
Um outro estudo sobre as florestas de madeira na Zambesia afirma que os chineses que são
grandes consumidores de madeira vêm a Moçambique e pedem madeira a baixo custo
aproveitando-se da fraca economia do país (Moçambique é um dos paises mais pobre do
mundo, está na posição n° 168 em 177 países, estes são os dados do Relatório de
Desenvolvimento Humano do ano 2005)105
. Moçambique exporta cerca o 80% de madeira
para a China o que faz do Moçambique o quinto maior fornecedor de madeira para a
China, mas para a China a importação de madeira de Moçambique não é muita, é só uma
pequena parte e para fazer desenvolver a sua indústria a China pede os toros (madeira não
tratada) cancelando em 2002 as tarifas de madeira não processada e mantendo as tarifas da
madeira processada, cerca de 15-22%. A direcção nacional de Terra e Florestas estima as
exportações de toros entre o 2008-2009 em cerca de 20 mil metros cúbicos-ano e de
madeira serrada em mais de 80 mil metros cúbicos-ano. A exportação dos toros é ilegal,
esta exportação não é do interesse de Moçambique, mas contudo há pessoas que fazem
parte do governo que colaboram neste processo ilegal de exportação juntamente com os
estrangeiros que têm interesse na exportação da madeira não processada106
.
Se estas são as condições de trabalho é facil perceber que a faixa baixa da sociedade
moçambicana não goste muito das empresas chinesas no seu território. Uma outra causa da
negatividade em relação aos chineses é que as empresas trazem cerca de 70-80% dos
empregados da China, uma construtora chinesa em Moçambique utiliza 78 trabalhadores
105
Mackenzie, C., 2006, Administração da Florestia na Zambézia, Moçambique: Um Take Away Chinês!,
Relatório final para Fongza, 106
Pohlmann, J., Slaven, C. , Algumas considerações sobre a presença chinesa em Moçambique,
http://www.youtube.com/watch?v=le6C9X_jtPQ&feature=bf_next&list=PLCFF5F7CA6688300F&index=55
(p.13-20)
36
chineses e 8 locais. Portanto o ressentimento maior das classes baixas de Moçambique é a
futura diminução de trabalho para os locais. Pelo contrário as élites politicas ficam
contentes pela ajuda chinesa na construção e no melhoramento dos edifícios publicos,
politicos, e da ajuda para desenvolver o país. Diz-se que os chineses lutam contra a
pobreza:
«Aires Ali está convinto que a China dará todo o seu apoio possível para acelerar o
desenvolvimento socioeconómico de Moçambique»107
«A Ministra moçambicana do Trabalho, Helena Taipo, defendeu esta semana na cidade
chinesa de Tianjin que o investimento chinês em África não representa nenhum perigo
para o país e para todo o continente, como contrariamente certas correntes económicas
ocidentais advogam.»108
Todos estes investimentos em que implicam? Como diz também Chris Alden o
desenvolvimento das pequenas e média empresas tem como consequência o aumento da
emigração chinesa para África criando novas comunidades chinesas.
Em Moçambique a China tem cerca de quarenta e uma empresas em vários sectores
(agricultura, agro-indústria, aqua-cultura, pescas, indústria e constução o que implica o
renascimento da presença chinesa em onze provincias nacionais. Um artigo dum blog que
se chama Moçambique para todos afirma que será construido um bairro para a nova
comunidade chinesa em Maputo, precisamente no quartel de Catembe, no outro lado do
rio, segundo o artigo o facto de se construir o bairro no outro lado do rio é uma coisa
simbólica para lembrar a parte nova e a parte velha de Xangai, uma ponte ligará as duas
partes e será uma empresa de Xangai que fará este trabalho. O projecto da construção do
bairro e da ponte já está montado do ponto de vista técnico e financeiro. Apesar do bairro,
para a nova comunidade, a aproximação de Moçambique com os chineses é o crescente
interesse da aprendizagem do mandarim e em 2007 foi traduzido nesta língua o Codigo
Laboral.
107
Primeiro-Ministro Considera Visita a China de Exito Total, Portal do Governo de Moçambique.
www.portaldogoverno.gov.mz 108
Investimento Chinês não Representa Nenhum Perigo para Moçambique, Portal do Governo de
Moçambique. www.portaldogoverno.gov.mz
37
CONCLUSÃO
Relembrando os movimentos chineses do século XV até os nossos dias, é possível afirmar
que com as viagens do Zheng He a China queria monstrar ao mundo o seu poder, agora
não se sabe quase nada sobre essa grande nação que se torna sempre mais potente. O
percurso histórico concentra-se nas grandes espedições da China que provavelmente
aconteceram antes do século XV, mas já se encontra material do século X. Estas viagens
nunca são de conquista, mas sim operações comerciais e diplomáticas para mostrar o poder
do Império Chinês. Se eles nunca foram conquistadores coloniais, porque achamos agora
que os chineses venham para Ocidente, durante as várias diásporas, e sobretudo para
colonizar África? Somos nós que não percebemos a mentalidade chinesa ou é
efectivamente um novo tipo de filosofia? Trata-se duma colonização lenta e silenciosa ou
trata-se simplesmente dum movimento migratório como há muitos. Uma verdade é que a
China nos assusta, porque, na realidade, a China é um país que não conhecemos,
ignoramos a sua potência e a sua história, e como todas as coisas que tememos falamos
mal delas. As pessoas que mais conhecem a história da China são extremamente confiantes
no bom senso dos chineses. Em quem acreditar?
As emigrações dos chineses, a diáspora, são sobretudo causadas por um empobrecimento
do poder da compra da moeda. Nesse caso o que acontece é que se encontram em todo o
mundo milhões de chineses que trabalham com a própria família e moram separados da
comunidade de acolhimento criando as China Town. Os ocidentais acham que os chineses
emigrados podem ser uma colonização. E achamos também que o que está a acontecer em
África pode ser uma moderna colonização, porque a China não tem mais espaço para os
seus cidadãos. Durante o período da máxima grandeza do Império Chinês não tentaram
colonizar nada e agora há uma espécie de conquista territorial que não é uma verdadeira
conquista, mas um lento movimento que engrossa as comunidades chinesas existentes. Por
isso acho que não se pode falar de nova colonização, mas simplesmente uma mudança, que
nos obriga a mudar hábitos, e aprender também novos estilos de vida, uma nova cultura
que é tão diferente da nossa e, por isso, não a percebemos.
Ao estudo das comunidades chinesas em Moçambique falta muita documentação, foi muito
dificil encontrar o material necessário. Isto é provavelmente devido ao facto de que as
comunidades chinesas em geral são fechadas e secretas e, no contexto de Moçambique os
chineses miscigenavam-se com os locais, portanto a comunidade que se formou em
38
Moçambique mais aberta do que nós pensamos hoje. O pensamento comum é que os
chineses no estrangeiro vêm com a familia, não se sabem quantas pessoas da família
chegam, não se sabe se os filhos foram para a escola local ou para uma escola chinesa, que
se calhar existe. Em Moçambique a comunidade chinesa foi extremamente activa, mas
aberta aos outros, ou que conduziu a uma ulterior miscigenação que é, pois, típico do
período colonial.
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