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UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA FACULDADE DE ARTES, FILOSOFIA, E CIENCIAS SOCIAIS
DEPARTAMENTO DE MÚSICA E ARTES CÊNICAS
ANÁLISE DAS FORMAS DE TRATAMENTO DO MATERIAL
MUSICAL NA COMPOSIÇÃO DA TRILHA SONORA PARA CINEMA
Uberlândia
2007
RODRIGO FONTES NEPOMUCENO CARVALHO DE SOUZA
ANÁLISE DAS FORMAS DE TRATAMENTO DO MATERIAL
MUSICAL NA COMPOSIÇÃO DA TRILHA SONORA PARA CINEMA
Monografia apresentada para a
disciplina de Pesquisa em Música 2, da
Faculdade de Artes, Filosofia e Ciências
Sociais da Universidade Federal de
Uberlândia.
Uberlândia
2007
SUMÁRIO
Introdução
1.História da música no cinema
1.1 Heranças
1.2 os primeiros anos
1.3 O reconhecimento da música
1.3.1 Music Fake Books
1.3.2 Cue Sheets
1.3.3 A partitura original
1.4 Os primeiros sons
1.5 A Era dourada
1.6 A chegada de novas sonoridades
1.7 A Década de 70 e 80
1.8 Os anos 90
2. Formas de tratamento
2.1 Mickeymousing
2.2 Leitmotiv
2.3 Música diegética ou source music
2.4 Background music
2.5 Utilização de canções
2.5.1 Song score
2.5.2 Canções por encomenda ou commissioned songs
2.5.3 Utilização de canções como música diegética
2.5.4.1 Canções com função dramáticas
2.5.4.2 Canções com funções de especificar época ou locação
3 Contextualização das formas de tratamento do material musical
3.1 De Período
3.2 Étnica
4 Propostas de análise da trilha sonora de acordo com suas funções
4.1 Fisiológicas
4.2 Psicológicas
Introdução
Este trabalho tem a proposta de analisar as diversas formas de tratamento do
material musical na trilha sonora para cinema. A análise tenta abranger tanto os aspectos
funcionais quando estruturais (harmonia, forma, instrumentação, entre outros) da música
escrita para filmes.
O trabalho se divide em duas partes. A primeira parte trata da história da trilha
sonora do cinema, iniciando com comentários sobre as formas de arte que deram origem ao
cinema, passando para os primeiros anos em que a música passou a ser utilizada em filmes
mudos desde seus primórdios, depois é apresentada a proposta de organização de repertório
como Music Fake Books, Cue Sheets até chegar à partitura original. E por fim inicia-se o
período do cinema sonoro, que passa pela era dourada, anos 70 e 80 até os dias atuais .
A segunda parte é dividida em quatro capítulos, que tratam de algumas formas do
tratamento do material musical, que são demonstradas com o uso de exemplos. No segundo
capitulo foram analisadas as seguintes formas: mikeymousing, leitmotiv, música diegética
ou source music, background music, utilização de canções que se subdivisões; song score,
canções por emcomenda ou commissioned songs, utilização de canções como música
diegetica, e também canções com funções dramáticas e com o intuito de especificar época
ou locação. No terceiro capitulo foram analisado, outras duas formas de tratamento que
ajudam na contextualização do filme são elas: de período e étnica. No quarto a música é
analisada de acordo com suas funções dentre elas estão: fisiológicas, psicológicas e
técnicas. No quinto é feita a analise de composições para créditos iniciais e finais. E por fim
o sexto capitulo a conclusão. Todos os exemplos de cenas analisadas estão em um DVD em
anexo.
1 História da música no cinema
Muitas são as propostas de divisão da história da música no cinema. Alguns autores
preferem iniciá-la bem antes do nascimento do cinema, como por exemplo, com o teatro
grego chegando às óperas. Aqui será apenas feito um breve comentário sobre estes
acontecimentos que antecedem o início do cinema.
1.1 Heranças
O cinema é um dos marcos que dividem a cultura artesanal da de massa e
reprodutível. Segundo Carrasco (1998), no que diz respeito à associação da música com
outras linguagens, “a linguagem do cinema herda toda uma tradição, desenvolvida ao longo
dos séculos na cultura ocidental. Nesta tradição, muitas são as manifestações nas quais a
música combina-se com a fala, com o gesto, com a ação, com o movimento”
(CARRASCO, p.3). Carrasco ainda diz que ao incorporar esta tradição o cinema começa a
desenvolver sua linguagem própria, um novo conjunto de relações no qual a música
ocupava uma posição fundamental.
Davis (1999) inicia seu livro dizendo que a música e o drama estão interligados a
milhares de anos. Para sustentar esta afirmação, cita alguns exemplos de manifestações
folclóricas como o Kibuki japonês e Bharatnatiam indiano além de outros, como os Gregos
e Romanos, que utilizavam a música para acompanhar peças teatrais. Depois passa pelo
período Barroco, no qual, as primeiras óperas e ballets foram escritos, e chega até os dias
atuais com o cinema. Davis afirma que “In all these examples, the music and drama can be
separated into independent entities, but their combination as a whole is greater than the sum
of their individual parts” (DAVIS, p.15, 1999). Um dos exemplos mais citados desse tipo
de separação pode ser observado na obra de John Williams (que além de compor para
filmes também compõe concertos tradicionais). Por diversas ocasiões são apresentadas
Suítes de sua obra para filmes, mas quando vistas com as cenas para quais foram escritas
suas composições tomam outra dimensão.
Davis (1999) também cita alguns fatos históricos que podem nos fazer entender melhor
o que significou para a época o surgimento do cinema. Em 1885 as comunicações eram
pelo telégrafo e por cartas; a novidade era o telefone, e poucas pessoas o tinham em suas
residências; a maneira mais utilizada de transporte era por cavalos e trens; o primeiro vôo
de avião ainda estava a 10 anos de distância; e a luz elétrica tinha apenas 15 anos. Einstein
ainda não havia proposto a teoria da relatividade, Stravinsky tinha apenas 13 anos, e o
dodecafonismo ainda iria demorar 20 anos para se consolidar. As pessoas que gostavam de
música estavam mais acostumadas com a musica de Mozart Brahms, Verdi, Beethoven, ou
seja, compositores dos séculos XVIII e XIX.
1.2 Os primeiros anos
Muito se discute sobre os motivos do uso da música no cinema. Geralmente é citada
a proposta do historiador Kurt London, segundo ele a função da música seria meramente
abrandar o ruído excessivo dos projetores, cadeiras e espectadores. Outros motivos seriam
mais sutis, por exemplo, propunha-se que a música realmente ajudava a contar a estória e
também a transmitir emoções. Há ainda uma terceira justificativa para o uso de música no
início do cinema: a do compositor alemão Hanns Eisler, que dizia que o filme causava em
seus espectadores um “efeito fantasmagórico” e a música ajudava a amenizar essa
sensação. Seja qual for a razão, a música passou a ter fundamental importância desde as
primeiras projeções.
Imagine o que era para uma pessoa no final do século XIX entrar em uma sala escura e
uma maquina começar a projetar imagens em movimento “and yet at the same time the
images seem disembodied, for there is no accompanying sound. The mouths might move,
the horse might gallop, the car spews it fumes, but there are no words, there is no clippith-
clop, and there is no chugging and banging of the engine” (DAVIS, p.16, 1999). Agora se
imagine na mesma sala com um pianista ou um pequeno grupo de músicos tocando, a
música não necessariamente sendo dramática ou escrita para a cena, mas ainda sem o som
das vozes e dos acontecimentos. “The addition of music somehow makes the images on the
screen more complete and less like two-dimensional shadows.” (DAVIS. p.16).
Inicialmente o cinema não era considerado uma forma de arte, “nos primeiros anos de
sua existência, o cinema, para alguns, era uma nova técnica que permitia registrar imagens
em movimento” (CARRASCO, p.88). Mas logo se percebeu o grande potencial comercial
que ele tinha e também o grande fascínio que provocava na audiência.
Provavelmente os filmes foram exibidos com música desde suas primeiras projeções
(1895 e 1896), e é importante lembrar que não estamos falando aqui de uma música com
preocupação dramática – Máximo (2003) cita em seu livro que levaria algum tempo para
que as duas artes se unissem para formar uma terceira. Em geral estes filmes eram
acompanhados por um pianista ou organista ou até pequenos grupos dependendo da
importância da apresentação, assim, “o cinema começa a conquistar o público como
curiosidade e entretenimento, muito antes de incorporar a estrutura dramática e estabelecer
os princípios da linguagem” (CARRASCO, p.88). No início muitos improvisavam vendo as
imagens na tela, usando temas conhecidos de música erudita para acentuar o clima. Mas
com o crescimento do cinema o uso da música vai se tornando mais sofisticado, e o diretor
musical do teatro passa a escolher do repertório erudito peças que serão executadas.
O publico que assistia às projeções ao longo da primeira década em que o cinema
dava seus passos iniciais logo começou a amadurecer, e não mais se interessavam em
assistir registros do cotidiano. Para se adaptar a esta audiência, o cinema começa a se
modificar e passa a tentar representar histórias, dando início à incorporação de elementos
dramáticos.
Após o estágio em que o cinema era apenas uma curiosidade, os filmes passam a ser
produzidos em menor numero e com uma duração maior. Com isto o músico responsável
em criar a trilha sonora tem um novo problema: as situações deveriam ser acompanhadas
por músicas compatíveis às cenas, algo que se assemelhasse a musicar vários filmes de
curta duração, mas o problema maior estava em criar uma unidade entre as partes, ou seja,
“não bastava apenas acompanhar cada uma das situações de um filme com uma música
adequada: a junção dessas músicas também deveria apresentar coerência interna, formando
um todo unificado e contínuo” (CARRASCO, p.96). Com este tipo de situação os músicos
passam a procurar referência na tradição das óperas e teatro musical, e o cinema começa a
incorporar estas linguagens. Nesta época ele começa a atingir maior audiência, se
transformando e ganhando mais espaço, com mais salas de exibição.
1.3 O reconhecimento da música
Por volta das primeiras décadas do século XX a música começa a dar seus primeiros
passos para o que hoje conhecemos como “música de cinema”, e os primeiros sinais da
preocupação dos diretores e produtores em relação a ela se mostram com a produção de
materiais para acompanhamento musical, dentre os quais estavam os music fake books ou
antologias, as cue sheets e a partitura original.
1.3.1 Music fake books
A partir das propostas de organização de material musical temático para
acompanhamento dos filmes, começaram a ser produzidos os music fake books, dos quais o
mais conhecido é Kinobiliothek (ou Kinothek). Estas compilações fizeram certo sucesso em
sua época, pois a partir delas se podia criar uma espécie de script que qualquer músico
poderia seguir. Segundo Berchmans (2006) estes livros eram coletâneas de trechos
clássicos que serviam aos diretores musicais do cinema, mas logo eles se tornaram mais
refinados e passaram a ser compostos arranjos especiais de acordo com a sensação que a
cena propunha. Mas o importante era que os music fake books já organizavam muitos temas
específicos como: cenas de horror, humor, caçada, impaciência alegria, amor, monotonia
etc. Alguns dos temas utilizados são citados por Maximo (2003), e dentre eles estão
fragmentos da “Marcha Fúnebre” de Chopin, do “Rondó Caprichoso” de Mendelssohn, da
“Marcha Heróica” de Schubert, da “Suíte Arleseana” de Bizet, e da “Pompa e
Circunstância” de Elgar.
Segundo Davis (1999) estes livros tinham como proposta tentar estandardizar a
experiência musical da audiência, com peças que cobrissem quase qualquer situação que se
pudesse ter em algum filme. O diretor musical poderia apenas ter uma idéia geral da música
para cena, e escolher no livro uma obra dentre as diversas possibilidades que se adequariam
a ela. Contudo, o sucesso da aplicação das músicas às cenas dependia muito da habilidade
do regente ou do músico, um dos maiores problemas enfrentados era a mudança de peças
de uma cena para outra, nas quais deveria se fazer uma passagem seja de tonalidade ou
instrumentação. Muitos regentes e diretores musicais criavam algumas passagens de uma
peça para outra.
Para Carrasco (1998) as características do cinema começam a se configurar
exatamente neste período. A partir destas compilações, muito do que foi produzido e
desenvolvido nos gêneros dramático-musicais ao longo dos séculos começa a ser
incorporado pelo cinema. “Mas não se tratava de incorporação pura e simples, do uso de
um conjunto de relações sonoras prontas e acabadas. O cinema, por suas próprias
necessidades técnicas e estéticas, seria obrigado a revisar toda essa tradição e recriá-la de
modo que pudesse servir a seus fins”. (CARRASCO, p.117).
1.3.2 Cue Sheets
Os cue sheets começaram a ser produzidos por volta de 1909, e sua utilização é
semelhante à de hoje. Desenvolvido por Max Winkler, o método consiste em uma lista de
músicas com sua duração pré-estabelecida – a editora assistia ao filme antes de ser lançado
e criava-se um cue-sheet (que não deve ser confundido com o usado atualmente).
Organizava-se uma lista de musicas e suas durações. Maximo (2003) cita que mesmo assim
o problema da sincronização persistia, e muitos solistas e regentes quase raramente ficavam
satisfeitos com o resultado final.
Davis (1999) afirma que as indicações em sua maioria eram muito imprecisas.
Entretanto, para os músicos e diretores musicais dos teatros os cue sheets foram bem
recebidos, pois davam a eles um script musical a ser seguido. Maximo (2003) aponta para
uma importante mudança que ocorreu ao longo da década de 1910: os filmes não eram mais
acompanhados por grupos ou solistas improvisando sem nunca terem assistido ao filme;
agora havia ao menos uma preocupação com climas ou texturas apropriadas para as cenas
ou gêneros. De qualquer forma, os cue sheets foram uma alternativa mais econômica de se
produzir um acompanhamento musical para um filme.
1.3.3 A partitura original
Tanto os “cue sheets” quanto os “music fake books”, que na maioria das vezes se
destinavam à apresentação de filmes de curta duração, foram bastante utilizados desde a
década de 1910 até o inicio do cinema sonoro.
Na década de 1910 houve um grande crescimento na indústria cinematográfica, que
passou a ser uma forma de entretenimento bastante popular. A partir disto se supõe que a
demanda por músicos também aumentou. Sobre o assunto Berchman diz “Apenas para se
ter uma noção do tamanho do mercado na época, só a cadeia de cinemas Loew´s em Nova
Iorque empregava 600 músicos de orquestra, 200 organistas e tinha um repertório de cerca
de 50 mil partituras”. (BERCHMANS p. 103)
Em 1908 Camille Saint-Saens compôs para o filme L´Assasinat du Duc de Guise o
que até hoje é considerado um dos primeiros scores escritos para cinema. As composições
escritas fizeram sucesso, mas ainda não eram viáveis financeiramente, pela necessidade de
se pagar o compositor e a orquestra para executar as composições. Antes de Saint-Saens as
músicas utilizadas no cinema eram apenas compilações de algum material já existente.
Assim, sua composição se diferencia do que era usual neste período, primeiramente por ter
sido escrita por um compositor renomado, e também por seu grau de sofisticação.
De qualquer modo muitos começaram a perceber a necessidade de uma maior
ligação entre a música e o drama. Berchmans (2006) chama a atenção para a importância de
se ressaltar que nesta época ainda não havia técnicas de sincronização da imagem com o
som, e por isso não se considera esta a primeira experiência de um filme sonorizado, mas
sim do primeiro score escrito exclusivamente para um filme.
Um dos principais diretores que sistematizaram o uso da trilha sonora foi D.W
Griffith, e, segundo Berchmans, ele passou a solicitar os serviços de vários arranjadores
musicais. Griffith naquela época já dizia “veja o filme em silencio e então veja com os
olhos e ouvidos. A música dita o clima do que os seus olhos vêem; ela guia suas emoções;
ela é a moldura emocional para os quadros visuais”.Entre seus principais filmes está Birth
of a Nation (“O Nascimento de uma Nação”, 1915), no qual Griffith percebeu que a música
poderia ser um fator de grande ajuda ao resultado final, já fazendo parte da linguagem do
cinema. Além disso, ele tinha consciência de como a música deveria soar, tanto que
inicialmente o filme possuía duas partituras: a primeira, que acompanhou o filme em suas
primeiras apresentações, foi produzida sem o consentimento de Griffith, e não o agradou. O
diretor posteriormente se uniu ao compositor Carl Elionor Breil para compor um score
original. “Griffith quer interferir na música do filme porque sabe que ela é parte do filme, e
não apenas um mero dado de ambientação” (CARRASCO. p,123)
Por volta no inicio da década de 1920 os scores originais começaram a ser
produzidos com maior freqüência, e ganharam maior importância pelo fato de compositores
renomados do meio erudito como Erik Satie e Saint-Saens escreverem alguns de seus
primeiros exemplares. Mas o importante foi que a música passou a ter seu reconhecimento
como apoio à imagem, não sendo mais pensada como um mero plano de fundo.
1.4 Os primeiros sons
A transição do cinema mudo para o sonoro se deu ao longo das décadas de 1910 e
1920, ao mesmo tempo em que os filmes ainda eram acompanhados por solistas e
orquestras. Thomas Edison dentre outros fizeram as primeiras experiências para tornar
possível a substituição da gravação do som ao vivo por execuções pré-gravadas.
Inicialmente, estas experiências eram mal sucedidas: o som geralmente era gravado em
cilindros inventados por Edison e posteriormente os operadores se tentavam sincronizar o
som com a imagem, o que, segundo Maximo (2003), raramente acontecia.
Dentre algumas das inovações estavam os Phonofilms criados pelo dr. Lee De
Forest, que, segundo Berchmans, desenvolveu entre 1923 a 1927 cerca de 1000 filmetes.
Sua descoberta ajudou no desenvolvimento dos formatos que seriam inventados
posteriormente, e que acabariam adotados pelos grandes estúdios de cinema.
O primeiro score criado para um filme sonoro estreou em 1926, composto por
William Axt, David Mendoza e Edward Bowes para Don Juan de John Barrymore. O filme
foi apresentando se utilizando o processo do Vitaphone, que é um reprodutor de discos de
33 1/3 RPM sincronizado com o rolo do filme. Segundo Berchmans, o Vitaphone teve
sucesso e fundamental importância na produção fonográfica pra cinema, ainda que alguns
dos primeiros filmes não tivessem diálogos, apenas música e alguns efeitos sonoros.
Em 1927 a Warner Bros lança The Jazz Singer. O filme ainda tinha muitos diálogos
estruturados como no cinema-mudo, mas quando Al Jolson canta Blue Skies e My Mammy,
o som parece estar saindo de sua boca, e a audiência fica abismada. The Jazz Singer foi um
grande sucesso, mostrou à indústria cinematográfica o caminho para os futuros filmes e
iniciou uma nova era. Bateu recordes de bilheteria, e ao longo dos anos seguintes os filmes
sonoros foram ganhando cada vez mais espaço. Mesmo assim, muitos achavam que o
cinema falado seria apenas uma moda passageira. Entretanto, nessa época diversos estúdios
começaram a se adaptar a ele, determinando padrões técnicos pra que os produtores
pudessem utilizar os mesmos equipamentos e os mesmos métodos de gravação e
sincronismo.
O cinema sonoro revolucionou a maneira de pensar os filmes. Além de ser uma
grande experiência para os expectadores, era uma grande ferramenta para os diretores e
produtores, a maneira que eles contavam as estórias tendo então que ser totalmente
repensada. Esta inovação tecnológica fez com que a relação entre música e trama mudasse,
o compositor podendo agora compor a música necessária para a cena, não importando onde
o filme fosse exibido.
Algumas das primeiras premiações nessa época do excluíam as obras que se
utilizavam desta inovação. “(...) Tamanha era a discrepância de impacto entre os filmes
sonoros e os filmes mudos que, ao conceder o primeiro prêmio Oscar em 1929, a Academia
de cinema de Hollywood excluiu da competição todos os filmes sonoros com a justificativa
de que seria uma competição desigual.” (Berchmans p.105)
1.5 A era de ouro ( ou “Golden Age”)
Dentre os anos de 1927 e 1931 foram produzidos muitos musicais, por razões
técnicas e comerciais. Talvez isto também tenha relação com o valor de entretenimento
desse tipo de filme. Os atores não só falavam, mas também cantavam e dançavam.
As décadas de 193O e 1940 ficaram conhecidas como Golden Age (“era de ouro”)
do cinema americano, e dentre os fatores que contribuíram para isso estavam a enorme
popularização do cinema em todo o mundo e as possibilidades trazidas pelas novas
tecnologias. Durante este período eram produzidos cerca de quinhentos filmes por ano, e a
linguagem da música do cinema como a conhecemos hoje deve muito a este período.
Foi nesta época que se consolidou o uso de grandes orquestras. Esta prática se
tornou usual porque vários dos primeiros compositores que compunham música para
cinema vinham da tradição da música européia, e estavam acostumados a compor numa
linguagem operística. “Como os enredos da época tinham muita similaridade com o
formato operístico, esses maestros tinham o know-how perfeito para compor música para
cinema”(BERCHMANS, p.109). O estilo de criação musical com base no romantismo
wagneriano marcou as trilhas desse período, devido à grande migração de músicos
europeus para Hollywood, que influenciaram as gerações subseqüentes de compositores de
cinema, e são até hoje referência. Dentre algumas das características desta base na música
romântica está o uso do “leitmotif”.
A formação destes músicos europeus era bastante tradicional. Conheciam bem os
estilos de música erudita – especialmente os dos séculos XVIII e XIX, as óperas de Verdi e
Wagner, e as obras camerísticas de Beethoven e Mozart, dentre outros. Isso os tornava
aptos às necessidades musicais dos filmes, especialmente a partir deste momento em que a
música de certa forma passa a ajudar no desenvolvimento da estória do filme.
Dentre os principais compositores desta época estavam: Max Steiner, Dimitri
Tiomkin, Alfred Newman e Erich Wolfgang Korngold. Com exceção de Alfred Newman,
todos vieram de países da Europa, geralmente fugindo da Segunda Guerra Mundial, e
acharam um campo de atuação muito fértil em Hollywood.
Adicionar música a filmes nesta época era caro e problemático. Nas primeiras
produções não era possível gravar separadamente efeitos sonoros, fala e música, todos os
instrumentistas devendo então estar presentes no set e posicionados de certa maneira que a
música não sobressaísse à fala dos atores. Além disso, eles não poderiam errar ou então
toda a cena estaria arruinada. Às vezes uma cena pequena levava mais de três dias para ser
filmada, e não tinha como ser editada posteriormente, pois senão a música ficaria
comprometida.
Em 1931 foi desenvolvida a tecnologia que livraria a música do set de gravação; o
processo ficou conhecido como re-recording, um precursor da mixagem. A partir desta
nova técnica os custos de produção abaixaram consideravelmente, e a música podia ser
gravada separadamente. O diretor e o compositor poderiam ajustá-la com maior facilidade
em um processo que ganhou o nome de dubbing, no qual se mixa música, efeitos sonoros e
fala juntos.
Estas novas tecnologias fizeram com o processo de gravação da trilha sonora ficasse
mais barato e mais flexível. Apesar disso a composição original não era ainda prática
comum (com exceção dos musicais). Muitos ainda acreditavam que os sons deveriam vir de
uma fonte visual na tela, e sobre isto Max Steiner comenta “but they felt it was necessary to
explain the music pictorially. For example if they wanted music for a street scene, an organ
grinder was shown.”
Os espectadores estavam acostumados a ouvir música vinda de uma fonte que não
fosse a tela desde o inicio dos filmes, mas nesta época a indústria ainda estava descobrindo
o que funcionava e o que não funcionava. Por esta necessidade de se justificar visualmente
a música, duas soluções poderiam ser tomadas: uma seria o uso de uma música constante,
do tema inicial a até o ultimo segundo; outra seria não haver nenhum tipo de música. Mas
nenhuma dessas soluções funcionou, e com as experimentações os produtores começaram a
usar o sistema de momentos intercalados com e sem música, o que e tornou usual até os
dias atuais. É importante destacar que desde o cinema mudo até o conteporâneo há poucos
filmes sem nenhum tipo de música.
A composição original ganhou mais credibilidade a partir de 1933 com King Kong,
considerado por muitos um marco na história da música no cinema. Em 1934 foi criado o
Oscar para melhor trilha sonora original, e dentre os compositores que concorriam ao
prêmio estavam Alfred Newman, Dimitri Tiomkin, Franz Waxman, Erich Wolfgang
Korngold e Sergei Prokofiev. “Pode-se dizer que, nessa época, foi criado um estilo de se
compor (...). Como todos os mestres tinham basicamente a mesma forte influência da
formação de música romântica do século XIX e início do século XX, e esta linguagem era
muito bem-aceita pelo grande público, esse ‘estilo clássico da música de cinema’ perdurou
até o final da Golden Age ”(BERCHAMANS, p.113)
Com o passar dos anos outros estilos de música passaram a fazer parte da linguagem
da música do cinema, dentre eles a música serial e atonal, o jazz, e o rock.
Durante a década de 1940 começavam a se expandir à linguagem musicais na trilha
sonora, e dentre os principais compositores responsáveis por isso estão David Raskin e
Bernard Herrmann. Em filmes como Laura (1944) e Citizen Kane (1941) eles contribuiram
para que a indústria abrisse os ouvidos para novas sonoridades. Um ótimo exemplo é o
score escrito para o filme The Man With a Cloack (1949) no qual David Raskin se baseou
no sistema dodecafonico.
Outras tendências, como utilização de instrumentos menos convencionais (como o
theremin) foram incorporadas, sendo Miklos Rozsa um dos primeiros compositores
responsáveis por isso. Rozsa teve uma formação consideralvemente eclética, escrevendo
desde fanfarras a obras com sonoridades mais exóticas e urbanas.
Outro que conseguiu se destacar e mudar alguns padrões estéticos foi Bernard
Herrmann. Foi com ele que a sonoridade da música contemporânea de Stravinsky e
Schoenberg deu seus primeiros passos no cinema. Além disso, ele considerava que cada um
de seus filmes deveria ter um estilo próprio e claro, e que a música não tinha apenas papel
ilustrativo, mas sim importância na experiência do público.
1.6 A chegada de Novas Sonoridades
A década de 1950 traz consigo inovações para a música de cinema. Com a nova
geração de compositores formados nos Estados Unidos (por exemplo, Bernard Herrmann,
Jerry Goldsmith, David Raksin, Alex North, George Antheil, Leonard Rosenman, Elmer
Bernstein), o cinema incorpora não só a música contepôranea mas também os estilos de
jazz que se desenvolveram nas décadas de 1930 e 1940. O que não quer dizer que a
linguagem erudita romântica deixou de existir.
Com cada vez mais TVs nas casas e mais emissoras, o cinema começou a perder
espaço, sendo este um dos motivos para o fim da Golden Age. As trilhas sonoras que se
utilizavam de grandes orquestras se tornavam cada vez mais raras, um dos motivos sendo o
fato dos programas de TV da época utilizarem estilos populares como o Jazz. Estes
acabaram ganhando grande espaço durante os anos 50 e 60 também na música para cinema,
e um dos compositores responsáveis por isso foi Elmer Bernstein.
Outra tendência surgida na década de 50 que começava a se consolidar na década de
60 foi a utilização de canções, muitas vezes como parte da trilha sonora por motivos
meramente comerciais, mas em alguns casos por razões artísticas – descrevendo
personagens ou contextualizando historicamente a trama, por exemplo.
Mesmo com todas essas mudanças, as composições orquestrais não desapareceram;
elas apenas passaram a dividir espaço com outros estilos.
Na década de 60 surgem compositores que se mantém influentes até os dias atuais,
como Nino Rota, que compôs os scores de alguns filmes de Fellini, Ennio Morricone,
conhecido pelas suas composições para o diretor italiano Sergio Leone (em um gênero que
acabou ganhando o nome de “spaguetti western”) nas quais utiliza sonoridades pouco
usuais como assobios e guitarras elétricas, Jerry Goldsmith, John Williams, John Barry,
dentre outros.
1.7 A década de 70 e 80
As tendências que se iniciaram na década de 60 ganharam muito espaço nos anos
70. O publico se tornava cada vez mais acostumado com a música do século XX, e também
com o uso de estilos populares como Jazz e Rock. Havia ainda a grande influência da TV,
tanto nos produtores quanto na audiência. Os temas televisivos começavam a ganhar
identidade, se diferenciando das trilhas sonoras cinematográficas. Dentre os temas que
marcaram época estão o de “Missão Impossível” escrito por Lalo Schrifrin, e “Peter Gunn”,
de Henri Mancini.
Outro fator marcante que se inicia na década de 70 e que irá se desenvolver nos anos
80 é o uso de sintetizadores, bem exemplificado na trilha sonora de “Laranja Mecânica” (A
Clockwork Orange, 1971) criada por Walter Carlos para o filme de Stanley Kubrick.
O uso de Jazz se torna comum em filmes policiais, e dentre os que contribuíram
para a construção da cultura do gênero estão “Operação França” (The French Connection,
1971), Bullit (1968) a série 007 e o já citado Peter Gunn.
A escola de composição característica da Golden Age começa a sair de cena para dar
espaço a novos estilos, como a Disco Music e o Reggae. Se mantém a forte presença dos
sintetizadores nas trilhas sonoras.
A escrita orquestral com influências românticas voltaria a ganhar espaço após o
lançamento de “Guerra nas Estrelas” (Star Wars, 1977). O score foi escrito por John
Williams e resgata muitos dos elementos utilizados na era de ouro como, por exemplo,
temas líricos e uso de metais em tutti, mas ao mesmo tempo incorpora elementos de música
contemporânea. A grande aceitação desta trilha sonora abriu o caminho à volta deste estilo,
que se consolida nos anos 80 com a seqüência Star Wars, entitulada no Brasil “O Império
Contra-ataca” (1980), além dos filmes “Os Caçadores da Arca Perdida” (Raiders of the Lost
Ark, 1981), e os scores de Basil Poledouris escritos para os filmes “Conan, o Bárbaro” (
Conan, the Barbarian, 1982) e Robocop (1987).
O uso de canções, cada vez mais usual desde a década de 60, ganhou espaço
paralelamente às trilhas sonoras orquestrais, muitas vezes os filmes que tinham uma canção
ou canções também tinham um score. Dentre alguns exemplos estão; Os Caça-Fantasmas
(Ghostbusters, 1984) de Ray Parker Jr, De Volta para o futuro (Back To The Future, 1985)
Huey Lewis & the News, Top Gun – Ases Indomáveis (Top Gun 1986).
Paralelamente ao ressurgimento da trilha sonora orquestral, o uso de sintetizadores
marcou o final dos anos 70 e a década de 80. O marco dessa linguagem foi “Carruagens de
Fogo” (Chariots of Fire, 1981) considerada uma evolução na composição musical
cinematográfica, escrita por Vangelis, que não utilizou nenhum instrumento acústico. Essa
trilha causou grande impacto nos produtores, pois a partir dela se percebeu a possibilidade
do uso de sintetizadores para ocasiões que não apenas filmes de ficção cientifica e terror.
Muitos músicos, como Jerry Goldsmith e Marurice Jarre, que utilizavam apenas
instrumentos acústicos em seus trabalhos, começaram experimentar com essa novidade,
fazendo assim uma mistura de sons gerados eletronicamente com sons acústicos.
1.8 Os anos 90
As sonoridades desenvolvidas durante os anos 80 não são mais novidade, e nos anos
90 são incorporadas nos scores. A música sinfônica se consagra dentre a grande variedade
de tendências e estilos a música deste período.
Novos compositores conquistar espaço em meio aos já consagrados, dentre eles
Danny Elfman, Thomas Newman, Don Davis, Philip Glass, Eric Serra, Hanz Zimmer,
James Horner, dentre muitos outros.
Neste periodo os compositores que surgiram nos anos 70 se tornam consagrados.
John Williams por exemplo compôs ainda nos anos 90 alguns de seus scores mais bem
sucedidos, como O “Parque dos Dinossauros” (Jurassic Park, 1993) e “A lista de
Schindler” (The Schindler´s List, 1993). Atualmente ele continua compondo para vários
filmes como, por exemplo, “Minority Report: A Nova Lei” (Minority Report, 2002),
“Prenda-me se For Capaz” (Catch Me If You Can, 2002), “Guerra dos Mundos” (War of the
Worlds, 2005), além da série de filmes Harry Potter e as seqüências de Star Wars.
Atualmente não há uma tendência específica na qual os compositores possam se
basear ou seguir, pois a multiplicidade de linguagens na trilha sonora e a grande gama de
compositores com estilos variados tornam a música para cinema atual extremamente rica de
sonoridades distintas. Dentre alguns dos músicos que trabalham hoje nessa área se
destacam: Yann Tiersen, de “O Fabuloso Destino de Amélie Poulain” (Lê Fabuleux destin
d´Amélie Poulain, 2001), Luis Bacalov (Il Postino, 1994), Marc Shaiman (South Park:
Bigger, Longer & Uncut), Carter Burwell (Conspiracy Theory, 1997). Uma noividade
interessante é á inter-relação com outras linguagens, como no caso dos compositores que
migraram do universo dos vídeo games, dentre os quais se destaca Michael Giacchino,
criador da trilha de “Os Incríveis” (Incredibles, 2004).
2. Formas de Tratamento
Neste capitulo serão delimitadas algumas formas de tratamento do material musical
na criação de músicas para cinema. A música escrita para filmes acompanhou as mudanças
pelas quais o cinema passou em seus anos de existência, analisando sua história se perceber
que algumas formas de tratamento foram bastante utilizadas em algumas épocas e depois
acabaram caindo em desuso como é o caso do mickeymousing, por outro lado também há
exemplos de algumas formas de tratamento que são amplamente usados até os dias atuais
como o uso de leitmotif.
Nos próximos capítulos serão analisadas algumas formas de tratamento do material
musical dentre elas estão: mickeymousing, o uso de leitmotif, música diegética ou source
music, background music, e uso de canções que se subdividem em: song score, canções por
emcomenda, utilização de canções como música diegética, função dramática, de época ou
locação. Há ainda outras duas definições de trilha sonora que se relacionam às acima,
denominadas “música de período” e “música étnica”. Outra proposta de análise parte
especificamente da função da música e se dividem em: fisiológicas, psicológicas e técnicas.
E por ultimo é feito a análise de músicas escritas para créditos iniciais e finais
2.1 Mickeymousing
Para Máximo (2003) o mickeymousing é definido como “o som procurando
descrever o que a imagem já mostra”(MÁXIMO, p.24). O termo tem suas origens nas
animações dos anos 1930, nas quais a imitação – já usada no cinema com atores – foi
levada ao extremo. Davis (1999) considera que o mickeymousing exerce uma função física
na cena e o define como “When the music mimics every little action on screen. It is called
mickey-mousing. There is a difference, however between mickey-mousing and simply
hitting various sync points. Mickey-mousing is a term reserved for hitting a lot of the action,
not just one or two moments. It is often, though not exclusively, used as a comic device”
(DAVIS, p.142)
Este tipo de tratamento do material musical pode ser observado em filmes de épocas
diferentes, e aqui será analisada uma cena de King Kong (King Kong, 1933), na qual Max
Steiner (considerado o compositor que ajudou a difundir a utilização da técnica do
mickeymousing no cinema com atores) o utiliza.
O filme conta a estória do cineasta Carl Denham (Robert Armstrong) que anseia
pelo prestígio dos críticos trazendo inovação e romance para seus trabalhos. Para isso,
tentará criar um filme em uma ilha exótica desconhecida até mesmo pelos tripulantes do
navio no qual ele se encontra. Após algumas semanas eles chegam à ilha. Enquanto a
exploram para a obra do cineasta, vêem alguns nativos realizando um estranho ritual. Carl
Denham fica impressionado e ao tentar registrar o que estava acontecendo é avistado, o que
faz com que a cerimônia pare. Neste momento um dos nativos caminha em direção aos
integrantes da tripulação do navio, e seus passos são todos acompanhados pela música.
O mickeymousing nesta cena (exemplo 1) é bem claro, a música sendo totalmente
sincronizada aos passos. Para representá-los enquanto o personagem desce as escadas, Max
Steiner faz o uso de tubas tocando em uníssono e staccato, transpondo ascendentemente
uma única frase, até que ele pare para conversar com os desconhecidos. Enquanto isso
outros instrumentos dos metais e das madeiras executam notas longas criando a base
harmônica, também transposta juntamente à melodia. O uso desta frase executada pela tuba
transposta em semitons ascendentes ajuda a cena a ter tensão, pois faz com que os
espectadores tenham maior apreensão para os acontecimentos que virão. Abaixo segue uma
transcrição para piano do mesmo:
2.2 Leitmoiv
O Leitmotiv tem suas origens na ópera de Wagner: é um tema musical recorrente
que se associa a um personagem, local, sentimento ou qualquer outro fator relevante à
trama. Também pode ser apenas uma progressão de acordes ou estrutura rítmica. O
Leitmotiv ajuda a contar a estória, pois pode representar sentimentos e/ou personagens que
não estão presentes no filme naquele momento, dentre outras funções.
Um dos exemplos mais claros do uso do Leitmotiv na trilha sonora para cinema é o
score escrito por John Williams para série de filmes “Guerra nas Estrelas” (Star Wars).
Nela há um tema para cada personagem e, além disso, outros que representam ideais como
bem e mal, objetos, e grupos de seres.
Aqui será feita uma pequena análise de alguns temas do primeiro filme lançado da
série, “Guerra nas Estrelas - Episódio IV: Uma Nova Esperança” (Star Wars Episode IV: A
New Hope, 1977). No final da década de 60 as grandes orquestras eram pouco usadas em
scores de filmes, como já dito nos primeiros capítulos sobre a história da trilha sonora do
cinema. Houve uma época na qual as mesmas prevaleceram, e grandes compositores desse
tipo de música – como Max Steiner, Erich Wolfgang Korngold, e Franz Waxman –
introduziram o uso alguns dos elementos que John Williams viria a utilizar como, por
exemplo, o leitmotiv.
Inicialmente o diretor George Lucas acreditava que a melhor música para filme seria
a de compositores eruditos já existentes, algo semelhante ao filme “2001: Uma Odisséia no
Espaço” (2001: A Space Odissey, 1968) e aos seriados dos anos 30 de Flash Gordon. Mas
Steven Spielberg apresentou George Lucas a John Williams, que aceitou o trabalho de
compor o score em questão. A escolha do tipo de música estava feita, e Williams acreditava
que a sonoridade referente ao período romântico e o uso do leitmotiv seriam as melhores
opções.
O leitmotiv deve delinear o papel que cada personagem tem na estória – por
exemplo, os temas que representam o mal sempre são mais sombrios e geralmente são
tocados em regiões mais graves dos instrumentos; os de heróis geralmente são tocados por
trompas em caráter marcial; os que representam princesas geralmente são escritos para
flautas e instrumentos com uma sonoridade mais suave.
O primeiro tema a ser analisado é referente ao personagem Luke Skywalker. Ele
surge durante toda a série, e acabou se tornando uma das melodias mais conhecidas da
história do cinema. Sobre a mesma John Williams comenta: “When I thought of a theme
for Luke and his adventures I composed a melody that reflected the brassy, bold,
masculine, and noble qualities I saw in the character”(WILLIAMS, apud, MATESSINO,
1997, p.11)
Além da tradicional abertura, o tema é tocado durante primeira aparição de Luke,
interpretado por Mark Hamill no filme (exemplo 2). No momento em que Luke, com seu
tio Owen Lars (Phil Brown), está indo olhar alguns droids com os Jawa, sua tia Beru
(Shelagh Fraser) o chama. A primeira parte do tema é então executada de maneira sutil,
primeiramente pela trompa com acompanhamento de cordas. Ao ser repetido, ele passa a
ser executado em uníssono por violinos e flautas. O leitmotiv que representa Luke nessa
cena tem a função de introduzir o personagem para que os espectadores já comecem a
conhecer os protagonistas da estória, ajudando assim no desenvolvimento da trama. Abaixo
segue o tema que representa Luke Skywalker:
Ele aparece durante todo o filme, na maioria das vezes variado ou seccionado.
Também é comum a utilização de apenas pequenos trechos ou elementos de um leitmotiv.
Exemplo deste tipo de utilização é a cena em que Luke, Han Solo (Harrison Ford) e
Chewbacca (Peter Mayhew) resgatam a princesa Leia (Carrie Fisher) e estão indo para a
nave Millenium Falcon; nesse momento o tema aparece em segundo plano (exemplo 3)
apenas dando suporte à cena. Posteriormente pode-se ouvir o leitmotiv de Luke novamente,
desta vez mais explicitamente: logo após Han Solo e Chewbacca se separarem de Luke e
Leia, eles ficam presos em uma plataforma, e Luke troca alguns tiros com os soldados do
Império; o tema é apresentado em um andamento mais acelerado, dando um ar heróico para
a cena(exemplo 4).
Outro leitmotiv marcante é o que representa Darth Vader e o império John Williams
comenta “now Vader represents de bad side of the force. For his theme I use a lot of
bassoons and muted trombones and other sorts of low sounds” (WILLIAMS, apud,
MATESSINO, 1997, p.12), abaixo segue o motivo que representa Darth Vader e o império
neste filme. Abaixo segue a transcrição deste tema:
O tema que acabou se tornando conhecido como o tema de Darth Vader durante a
série ainda não havia sido escrito, entretanto alguns aspectos harmônicos e rítmicos são
retirados deste motivo. O tema é introduzido quando R2-D2 leva seu companheiro C-3PO
para escaparem da nave que está sendo atacada por Darth Vader, logo após eles serem
lançados para fora da nave, a princesa Leia é levada para Darth Vader, neste momento o
tema é tocado em diferentes instrumentos da orquestra alternadamente (exemplo 5).
Esse material musical também é utilizado quando o personagem não está presente
na cena, como quando Obi-Wan diz a Luke que seu pai foi traído e assassinado por Darth
Vader (exemplo 6).
Neste filme há ainda o uso de instrumentos se adequando a cada tipo de
personagem: o exemplo acima é tocado geralmente em regiões mais graves e com
instrumentos que permitem uma sonoridade “pesada”, mas podendo variar de acordo com a
ocasião. O leitmotiv que representa a princesa Leia geralmente é executado em
instrumentos de sonoridade mais suave, por exemplo, na cena em que Luke está
inspecionando os droids e a mensagem gravada por Leia é acidentalmente reproduzida,
pode se ouvir o leitmotiv que é inicialmente tocado pelo oboé, passando para a flauta e
depois para a trompa, retornando ao oboé no final. Para Williams o tema de Leia deve
refletir o lado de “conto de fadas” da personagem (exemplo 7):
Também marcante é o tema que representa Obi Wan Kenobi – que acabou se
tornando o “tema da Força”. Sobre ele Williams comenta “I think of Ben´s Kenobi´s theme
as reflecting both him and also the Jedi Knights and the Old Republic that he remembers, it
also serves to represent the Force, the spiritual-philosophical belief of the Jedi Knights (...).
There is a lot of English Horn in Ben´s Theme wich is often heard under dialogues. At
other times the melody becomes the heroic march of the Jedi Knights”. (WILLIAMS, apud,
MATESSINO, 1997, p.13)
O leitmotiv de Obi-Wan é utilizado de várias maneiras, representando ideais, o
próprio personagem, sentimentos dentre outros. Ele é apresentado no filme quando Luke
discute com seu tio e começa a pensar em seu sonho de sair de Tatooine. Inicialmente o
leitmotiv é tocado pela trompa e depois acompanhado por toda a orquestra. Abaixo segue o
mesmo (exemplo 8):
Como já discutido antes o Leitmotiv pode servir para representar e também ajudar o
espectador, pois ajuda no desenvolvimento da estória, neste momento o tema representa
algo que não está presente no momento. Mas também pode representar o personagem em
questão, por exemplo, quando Luke sai a procura de R2-D2 e é atacado pelas estranhas
criaturas chamadas de “Sand People”, Obi-Wan Kenobi aparece para salva-lo, neste
momento o tema representa o próprio personagem (exemplo 9).
Um exemplo deste leitmotiv que também pode servir para reforçar algum
sentimento pode ser observado na cena em que Luke vê Darth Vader derrotar Obi-Wan
Kenobi, e ouve-se o leitmotiv de Obi-Wan, desta vez com uma orquestração mais leve –
inicialmente o tocado pelo oboé e depois pela flauta, seguido pela trompa e novamente pelo
oboé (exemplo 10).
O filme também utiliza motivos de curta duração como, por exemplo, os que
representam a Estrela da Morte e os Rebeldes. O “motivo da Estrela da Morte” transcrito
abaixo é amplamente citado no filme; é constituído de três estruturas baseadas em
intervalos de quinta, tocadas paralelamente, e geralmente é executado pelos metais.
Ele é introduzido quando o Imperial Star Destroyer, onde se encontra Darth Vader,
passa sobre a órbita de Tatooine. O tema neste momento indica o destino da nave e
musicalmente identifica o que será a ameaça do filme (exemplo 11).
Há também o motivo que representa os Rebeldes, geralmente executado pelos
metais. É basicamente constituído de acordes maiores tocados paralelamente em terças
menores. Abaixo segue a representação do tema:
O leitmov e introduzido logo no início do filme, durante a primeira imagem (após o
letreiro sumir no espaço), na qual a nave onde se encontra a princesa Leia é atacada por um
Imperial Cruiser (exemplo 12). Este leitmotiv é utilizado com freqüência, geralmente em
momentos nos quais há guerra entre o império e os rebeldes (exemplo 13).
2.3 Música diegética ou Source Music
Para Neves(2004) a música diegética ou source music se define como “a música em
que não só os espectadores mas também os personagens estão ouvindo: ela pode vir de um
rádio, de um disco, de um televisor, do músico que toca seu instrumento, sendo todas essas
ações partes integrantes do filme.”(NEVES, p.2)
É importante ressaltar que ela pode ser tanto uma criação original do compositor do
score quanto alguma obra que o diretor ou os produtores queiram utilizar.
Um exemplo de source music escrita pelo próprio compositor da trilha sonora pode
ser observado no filme “Guerra nas Estrelas: Uma Nova Esperança” (Star Wars, 1977).
Após os tios de Luke Skywalker serem mortos pelos soldados do Império, Luke decide ir à
Alderam com Obi Wan Kenobi.Eles seguem então para Mos Esley, para encontrar um
piloto. Ao entrarem na cantina há uma banda tocando, que pode ser escutada tanto pelos
personagens quanto pelos espectadores.
A música de John Williams para essa cena lembra um tema de Swing, tanto pela
instrumentação quanto pelo andamento e articulação rítmica. A proposta da utilização desse
estilo foi feita por George Lucas: “can you imagine several creatures in a future century
finding some 1930´s Benny Goodman swing band in a time capsule or under a rock
someplace – and how they might attempt to interpret it?”
São duas composições, para um conjunto de nove instrumentistas: trompetes,
saxofones, clarineta, fender rhodes, steel drum, sintetizador e percussão. Abaixo segue a
redução para piano de parte de uma delas (exemplo14):
2.4 Background music
A Background music (literalmente “música de fundo”), é definida por Neves como
“aquela que podemos ouvir ao fundo durante um dialogo”(NEVES. p.2). No início se temia
que os espectadores não aceitassem muito bem este tipo de tratamento do material musical,
pois muitos iriam se perguntar de onde o som estaria vindo. Mas a background music
funcionou muito bem, e um dos primeiros usos foi com Max Steiner. Segundo Máximo
(2003) o diretor David O. Selznick estava insatisfeito com algumas cenas de seu filme, e
solicitou a Steiner música para elas. Após vê-las com a trilha, decidiu pedir a ele que
trabalhasse sobre todo o restante da obra.
A utilização deste exemplo é bem ampla, podendo ser usado em diversos momentos
de um filme, mas o que o diferencia dos outros tipos de tratamento do material musical é
que este tipo não tem ligação temática com personagens ou locação, são apenas músicas
escritas para acompanharem as cenas, e também não fazem comentários sobre sentimentos
dos personagens.
2.5 Utilização de canções
A utilização de canções também é freqüente na trilha sonora cinematográfica. Há
casos de scores compostos exclusivamente de canções (quando isto acontece são
denominados song scores).
Essa forma de tratamento do material musical é bastante discutida, pois há uma
dualidade em sua utilização: muitas vezes ela pode ter fins meramente comerciais, sem
vínculo dramático ou emocional com o filme. De qualquer maneira existem algumas
maneiras de se utilizar as canções em filmes, e dentre elas estão: song score, commissioned
songs (ou seja, as escritas especificamente para o filme) e também como música diegética
(dramaticamente ou para estabelecer época e locação).
2.5.1 Song score
Aqui a trilha sonora é totalmente formada por músicas escolhidas geralmente pelo
diretor e pelos produtores, comumente canções já existentes (e não são compostas
especificamente para o filme).
Um dos exemplos de song score é visto em “Pulp Fiction – Tempos de Violência”
(Pulp Fiction, 1994), no qual o diretor Quentin Tarantino, com a ajuda do músicos Boyd
Rice, escolheu um repertório baseado diversos estilos como rock, pop, soul, e surf music.
O filme é divido em seis estórias que se inter-relacionam e não são exibidas de
forma cronológica. A primeira música escutada no filme Misirlou tem a performance de
Dick Dale & His Del-Tones, ela aparece logo após a primeira estória do filme intitulada
The Dinner (terceira estória em ordem cronológica). Na cena “Pumpkin” (Tim Roth) e
“Honey Bunny” (Amanda Plummer), que decidem roubar os fregueses do restaurante onde
estão, Misirlou começa logo após o dialogo entre eles, a música funciona como música para
créditos iniciais permanecendo durante boa parte dele.
A passagem para a segunda música do filme Jungle Boogie interpretado por Kool &
The Gang, se da de uma maneira pouco convencional. Há um ruído de um rádio trocando as
estações e a música muda bruscamente. A segunda permanece durante algum tempo dos
créditos iniciais e continua em segundo plano durante a conversa entre Jules Winnfield
(Samuel L. Jackson) e Vincent Vega (John Travolta). Está música tem a função de ligar a
primeira estória do filme com a segunda.
Estes são apenas alguns exemplos de algumas canções utilizadas neste filme, ao
longo dele há utilização de músicas de diversas maneiras como, por exemplo, música
diegética, musica de fundo, musicas para cumprir funções técnicas e também de período
(exemplo 15).
2.5.2 Canções por encomenda Commissioned songs
Estas canções são aquelas compostas especificamente para o filme, (geralmente
musicais). Devem refletir o conteúdo do mesmo, e seu material temático geralmente é o
mesmo utilizado no restante da trilha sonora. Muitas vezes também se usa compor canções
nas quais a letra reflita as idéias da trama. Algumas vezes opta-se por compor canções
originais porque pode ajudar na criação da identidade do filme, e também há um fator
psicológico dos espectadores, que irão fazer a ligação das canções ao filme, e não com
fatores externos a ele.
Apesar do material temático da canção não fazer parte do score, que foi escrito por
Alan Silvestri. O filme De Volta Para o Futuro (Back to the Future, 1985) tem dois
exemplos deste tipo de canção composta especificamente para o filme. A canção utilizada
no filme se intitula “The Power of Love” e foi escrita e tocada pela banda Huey Lewis and
the News (está canção acabou se tornando o primeiro sucesso do grupo). Ela pode ser
escutada no inicio do filme, quando Marty McFly (Michael J. Fox) está indo para escola e
está atrasado (exemplo 16). Também há outro momento no qual se pode ouvir a canção,
desta vez uma versão instrumental executada pela banda de Marty “The Pinheads”, nesta
cena eles estão participando de uma audição para participar do concurso “Battle of the
Bands”, Huey Lewis faz uma pequena participação nesta cena, com o papel do professor
que julga as bandas (exemplo 17).
Outra canção composta especificamente para este filme se chama “Back In Time”,
também composta pela banda Huey Lewis and The News. Ela aparece no final do filme
quando o despertador de Marty marca 10:28 e a canção é acionada, a canção também é
utilizada durante os créditos finais.
É importante observar que, as canções são utilizadas de maneiras variadas. Algumas
vezes simplesmente como música de fundo, e outras vezes como música diegética ou
créditos.
2.5.3 Utilização de canções como música diegética
A música diegética é aquela que vem de alguma fonte na tela e os atores podem
escutar, e também pode ser uma canção, por exemplo, um rádio, ou uma banda.
Os exemplos deste tipo de utilização da música no filme são bem amplos, aqui será
utilizado o filme Lords of Dogtown (2005). O filme é baseado na história dos “Z-Boys” um
grupo influente de skatistas que revolucionaram o esporte.
O filme se passa na década de 1970 e muitas das canções utilizadas são desta época.
Uma das cenas em que se pode perceber a utilização de uma canção como música diegética
é a cena em que Jay Adams (Emile Hirsch) vai competir em um campeonato de skate, e
então Skip (Heath Ledger) coloca uma fita coma música Iron Man da banda Black Sabbath.
Esta música faz parte do segundo disco da banda entitulado Paranoid lançado em 1970.
Nesta cena tanto os espectadores quanto os personagens do filme podem escutar a música
(exemplo 18).
2.5.4.1 Canções com funções dramáticas
A utilização de canções como música diegética é geralmente feita com a música em
segundo plano. Mas também existem alguns casos nos quais a música pode desempenhar
um papel mais importante, por exemplo, descrever sentimentos de personagens dentre
outras funções.
Um dos exemplos deste tipo de tratamento pode ser observado no filme Casablanca
(1942), o filme é dirigido por Michael Curtiz, e o score foi escrito por Max Steiner.
No filme há a utilização da canção “As Time Goes By” de Herman Hupfeld, Steiner
inicialmente queria escrever uma canção especificamente para o filme, mas a atriz Ingrid
Bergman que interpreta Ilsa Lund já havia cortado seu cabelo e não seria possível refilmar.
O Filme se passa durante a II guerra mundial, momento no qual muitos estavam
tentando fugir para os Estados Unidos, o que é o caso do casal Victor Laszlo (Paul Henreid)
e Ilsa Lund que chegam a Casablanca em busca das "letters of transit"(documentos que
permitem qualquer um transitar livremente pela europa), e assim embarcar em um avião
para Lisboa para chegar aos Estados Unidos. Laszlo é um dos lideres da resistência e há
uma grande recompensa por quem conseguir pega-lo. Ilsa sua esposa a alguma tempo atrás
achava que ele havia sido morto no cativeiro, e durante este tempo ela se apaixonou por
Rick Blaine (HumphreyBogart) em Paris, mas logo descobriu que seu marido estava vivo e
abandou Rick repentinamente, durante este período em que os dois estavam em Paris a
canção “As Time Goes By” os marcou com Sam a executando ao piano.
Ilsa acaba reencontrando Rick e Sam em Casablanca e pede para que Sam execute
uma canção para relembrar os velhos tempos, inicialmente ele diz que não lembra e então
ela canta uma pequena parte da melodia e Sam começa a executar “As Time Goes By” ao
piano. Neste momento Ilsa faz uma expressão que mostra demonstra o que ela está de
alguma maneira pensando em Rick, seja lembrando de seus momentos vivido em Paris ou
talvez pensando no tempo em que estão separados. Rick havia pedido a Sam nunca mais
tocasse “As Time Goes By”, e quando ele aparece na cena vai direto em direção a Sam e é
quando ele revê Ilsa, no mesmo momento Sam para de tocar a música.
Após a cena em que Sam executa “As Time Goes By”, pode-se escutar o tema
sendo executado de fundo. O tema agora passa a desepenhar o papel de música d fundo. O
tema de “As Time Goes By” pode ser escutado durante muitas cenas do filme, pois, Steiner
compos o score baseandodo-se no tema da canção (exemplo 19).
2.5.4.2 Canções com funções de especificar época ou locação
Música diegética também pode servir para estabelecer a época em que o filme ou e a
locação geográfica e ou época em que filme se passa. Podem ser utilizados elementos de
musica étnica dentre outros.
No filme De Volta Para o Futuro (Back To The Future, 1985) também há um
exemplo no qual se tem a canção como música diegética, e que também representa um
certo periodo da história. No filme Marty Mcfly (Michael Jay Fox) acidentalmente viaja no
tempo para o ano de 1955 e acaba interferindo com o relacionamento de seus pais,
impedindo que eles se conheçam. Para impedir sua morte ele deve fazer com que seus pais
se conheçam e comecem um relacionamento. Para isto Marty tenta ajudar seu pai George
Mcfly (nome) a conquistar sua futura mãe Lorraine Bainnes (Lea Thompsom).
Na cena do baile “Enchantment Under The Sea” (no qual os pais de Marty devem se
beijar pela primeira vez), a banda “Marvin Berry and the Starlighters” toca a canção “Earth
Angel (Will You Be Mine)”. A canção foi lançada em 1954 e se tornou bem popular durante
a década de 1950. Esta parte do filme se passa no ano 1955, portanto a música ainda era
muito nova e talvez fosse um dos grandes sucessos no do momento, por isso ela acabou
sendo utilizada para representar um baile dos anos 1950 (exemplo 20).
3 Contextualização das formas de tratamento do material musical
3.1 De Período
Música de período, este tipo de tratamento é aquele que ajuda a descrever o período
histórico ou a localização geográfica. Por exemplo, se a música se passa no século XVI
pode-se usar o cravo ou outros instrumentos, além disso, um estilo de composição que
possa relembrar essa época ou então o uso de instrumentos pouco convencionais de acordo
com a locação se tenha.
O filme O violino vermelho (The Red Violin, 1998), apresenta alguns exemplos
deste tipo de tratamento. O filme conta a estória de um violino perfeito construído no ano
de 1681 na cidade de Cremona Itália por Nicolo Bussotti (Carlo Cecchi). O instrumento foi
construído para seu filho que ainda não havia nascido, mas infelizmente sua esposa e seu
filho morrem durante o parto. O violino consegue sobreviver até os dias atuais, e fazendo-
se pesquisas se descobre que o violino tem mais de 300 anos. Durante todos estes anos de
sua existência o instrumento passou por diversos lugares como, Cremona, Viena, Oxford,
Xangai e Montreal.
O score foi composto por John Corigliano, que apesar de ter uma extensa obra
escrita para diversas formações, fez apenas poucos scores filmes ao longo de sua carreira.
John Corigliano compôs ao estilo que representasse cada uma das épocas em que o filme se
passa, com a função de representar cada um dos períodos históricos nos quais o violino
passou.
Uma das estórias que acompanham o violino passa-se mais o menos cem anos após
sua construção. O instrumento nesta época faz uma passagem por um orfanato dirigido por
monges austríacos, e acaba na mão de um pequeno garoto Kaspar Weiss (Christoph Koncz,
que é um prodigio virtuoso na vida real). Para representar o período John Corigliano se
utiliza da música, que passa a ter um caráter barroco parecido com a música de Bach e
Vivaldi (exemplo 21).
3.2 Étnica
A música étnica geralmente é utilizada nos filmes como uma ferramenta para
demonstrar a sonoridade da locação em que se passa o filme, este processo gera uma
dimensão psicológica, muitas vezes nós associamos alguns instrumentos a certas culturas,
por exemplo, o violão flamenco geralmente é relacionado à Espanha, por isso muitos
compositores fazem extensas pesquisas sobre como a sonoridade exata que a música deve
ter para que se possa passar o mais fielmente a música que representa a cultura explorada.
Não se pretende aqui desvalorizar nenhuma cultura, pois a função da música étnica
em um filme é simplesmente a de ajudar o espectador entrar em contato com o filme e
torná-lo mais real.
Para exemplificar este tipo de tratamento do material musical em um filme também
será utilizado o filme O Violino Vermelho. Como já dito anteriormente o violino passou
por diversas épocas e também por culturas diferenciadas. O garoto que havia ficado com o
violino morre subitamente durante uma audição, e em sinal de respeito ao garoto os monges
enterram-no com o violino, que é roubado por ciganos.
Durante a estádia do violino com os ciganos os instrumento viaja por diversas partes
da Europa. Para representar os ciganos John Corigliano se utiliza de materiais músicas
como escala menor harmônica e, além disso, algumas percusões (exemplo 22).
4 Propostas de análise da trilha sonora de acordo com suas funções
Há também uma divisão das formas de tratamento de acordo com a função da
música que podem ser dividas em três tipos fisiológicas, psicológicas ou técnicas.
4.1 Fisiológicas
Segundo Davis (1999) as funções fisiológicas são aquelas que enfatizam a ação ou
demonstram onde se passa a cena. Ela pode ter o propósito de nos sugerir a localização
geográfica ou período histórico em que ocorre o filme, mickeymousing, ou ainda
intensificar a os acontecimentos da cena. Esta forma de tratamento é usada frequentemente
em cenas de ação. O compositor deve seguir o que a cena propõe e não adicionar novos
elementos.
O filme Matrix Reloaded (Matrix Reloaded ,2003) tem alguns exemplos deste tipo
de tratamento do material musical. O filme tem o score escrito por Don Davis com a
colaboração de Juno Reactor e Rob Dougan. Matrix Reloaded é o segundo de uma série de
três filmes, no filme o mundo está devastado por guerras nucleares entre humanos e
maquinas, as maquinas fizeram os humanos de escravos mantendo-os presos em uma
realidade virtual.
Há uma cena no filme em que Neo / Thomas A. Anderson (Keanu Reeves) visita o
Oráculo (Gloria Foster), após a sua conversa Smith (Hugo Weaving) entra na cena. Smith
havia sido destruído por Neo no final do primeiro filme da série, Smith explica que agora
eles estão de alguma maneira conectados, o que causou nele grandes transformações (antes
era um programa que fazia parte da Matrix, mas ele desobedeceu ser deletado de alguma
maneira ele conseguiu se libertar), e principalmente ele não é mais um agente do sistema
ele agora é livre assim como Neo, além disso ele se tornou mais agressivo e ganhou o poder
se fazer copias de si mesmo. Após a conversa com Neo, Smith recruta suas copias para
atacar Neo.
A música para esta cena composta por Don Davis e Juno Reactor, mistura
elementos de música eletrônica com uma grande orquestra e coro. Por ser uma música na
qual há grande ênfase no ritmo com o uso de acentos pouco convencionais e, além disso,
também há o uso de alguns efeitos como clusters com glissandos nas cordas.
Por meio da historia do cinema e da música ocidental como um todo este tipo de
material musical acabou se tornando referente à ação, lutas, guerras, perseguições. Pelo fato
de que a música nesta cena sempre está em favor de enfatizar a ação que está ocorrendo no
momento, pode-se considerar que a sua função é fisiológica.
Também pode-se perceber nesta cena alguns elementos advindos do mickeimousing
utilizado nos anos 1930, por exemplo, sempre quando há algum efeito no qual os atores
ficam em câmera lenta ou estão caindo a música de alguma maneira tenta representar o que
está acontecendo. Outro aspecto que pode ser observado no qual a música tenta enfatizar os
acontecimentos pode ser observado ao final da cena, no momento em que um número cada
vez maior de agentes Smith tentam atacar Neo a música passa a ter um andamento cada vez
mais acelerado e ritmos cada vez mais complexos (exemplo 23).
4.2 Psicológicas
As funções psicológicas são aquelas que podem ajudar no impacto emocional e
psíquico do filme. Muitas vezes apenas acompanha a ação na tela, mas também pode fazer
um movimento contrário, trazendo algo que não esta explicito na cena. Dentre essas
funções está a de criação do “clima psicológico”, ou seja, revelar os pensamentos não ditos
pelos personagens ou “enganar” o expectador.
No filme Além da Linha Vermelha (The Thin Red Line, 1998) é um exemplo deste
tipo de tratamento do material sonoro. Dirigido por Terrence Malick e com o score de Hanz
Zimmer o filme conta a história de soldados Estados Unidenses durante a II Guerra
Mundial. Diferentemente de muitos filmes de guerra Além da Linha Vermelha não discute
temas como patriotismo, e sim uma questão mais geral como, por exemplo, bem e mal.
Na cena em que os soldados americanos estão a caminho atacar um centro dos
inimigos a música está em segundo plano, neste momento não há elementos rítmicos
marcantes e os instrumentos são tocados de uma maneira bem suave, fazendo um
movimento contrario a cena que despertaria a tensão antes da batalha. A música continua
durante a caminha dos soldados americano na floresta, de repente começa-se a se ouvir
tiros e os soldados começam a lutar, durante a batalha a música continua calma e ainda em
segundo plano, os efeitos sonoros de tiros e vozes estão bem mais altos em relação à
música. Justamente por não se tratar de um filme que tenta representar o patriotismo a
música faz uma espécie comentário da maldade humana assim como no comentário do
personagem Witt (James Caviezel) "This great evil. Where does it come from? How'd it
steal into the world? What seed, what root did it grow from? Who's doin' this? Who's killin'
us?", por isso durante esta cena na qual há soldados se matando a música continua não
representando o que está implícito na tela e ao longo da cena a música vai gradativamente
crescendo em relação aos efeitos sonoros, até que chega a um ponto no qual a música está
bem mais alta em relação aos efeitos sonoros (exemplo 24).
4.3 Técnicas
Davis (1999) define funções técnicas como aquelas que ajudam na sustentação da
estrutura do filme. Podem ser escritas para uma passagem de uma cena para outra, por
exemplo, auxiliando o prosseguimento do filme.
Muitos são os filmes nos quais a música pode desempenhar este tipo de função, aqui
será analisado um exemplo retirado do filme Helena de Tróia (Helen of Troy, 1956). O
filme conta a estória da guerra Troiana, causada por Paris of Troy (Jacques Sernas) que se
apaixona por Helen (Rossana Podestà), rainha de Sparta. O filme tem o score escrito por
Max Steiner.
No filme Paris de Troia se dispõe a ir até Esparta para assegurar a paz entre as
cidades-estado. Durante o caminho seu navio entra em uma forte tempestade e Troy sobe
no mastro que se rompe atirando-o ao mar, que o leva até o litoral próximo a Sparta onde
Troy é encontrado por Helen. A música nesta cena tem a função de ajudar o espectador a
fazer a transição de uma cena para outra, a música é continua desde o momento em que
Paris está no barco até a chegada da Tempestade e continua durante a cena em que ele
encontra Helena. Na primeira parte em que se avista o navio no qual está Paris a música
tem um caráter de “aventura”, “exploração” que se sustenta até a chegada da tempestade
quando esta passa a ser mais intensa( nesta cena também pode se observar um pequeno uso
do mickeimousing no momento em que o raio atinge o mastro), a música continua e logo
após Paris cair no mar se avista uma praia e a música passa a ser mais suave, e continua
durante todo o encontro de Paris com Helena (exemplo 25).
5 Créditos
5.1 Créditos iniciais ou “Main Title”
Há também dois outros tipos de utilização da música no cinema que se tornaram
muito usuais em filmes: os créditos iniciais e finais. Uma das funções do título inicial (ou
main title) é explicitar o clima do filme, para que os expectadores saibam a que tipo de
estória assistirão.
Um dos créditos iniciais que consegue nos contar e antecipar algo sobre o clima do
filme é o escrito para o filme Edward Mãos de Tesoura (Edward Scissorhands, 1990),
dirigido por Tim Burton e com o score de Danny Elfman. Sobre o main title Elfman diz
“titles are really important to me especially in a movie like this. In a fantasy film, because
they really tell us what we going to see, what we are going to feel, what we are getting in
too”. O crédito inicial deste filme se da de uma maneira estendida, no qual são introduzidos
os dois temas principais de Edward. O primeiro tema segundo Danny Elfman é o tema que
representa seu lado “conto de fadas”, e pode ser ouvido durante os créditos iniciais até o
primeiro dialogo. Para conseguir um “ar” de “conto de fadas” Danny Elfman, se utilizo de
Edward instrumentos como, Glockenspiel e um coral crianças (Paulist Choristers of
Califórnia) que nós ajudam no aspecto imaginativo e inocente do filme. O segundo tema é
introduzido logo após o dialogo que Kim Boggs (Winona Ryder) já velha tem com sua
neta. O segundo tema que representa “o coração do personagem” é introduzido neste
momento, Danny Elfman comenta que este tema também é tocado como uma premonição
do que ira acontecer ao longo da trama (exemplo 26). Abaixo seguem o primeiro e o
segundo tema de Edward:
5.2 Créditos finais
A música nos créditos finais atualmente tem funções puramente comerciais, mas
em vários outros momentos da história do cinema foi tratada como um espaço no qual os
compositores poderiam criar com mais liberdade. Muitas vezes os temas finais são
parecidos com os iniciais, mas com variações e desenvolvimentos.
Muitos são os exemplos são os filmes que apresentam temas para créditos finais
dentre eles está o filme Bullit (Bullit, 1968). O tema utilizado para os créditos finais é o
mesmo utilizado no inicio, mas desta vez o tema aparece bem diferenciado, no inicio ele é
bem mais enérgico com utilização dos metais, bateria, percussão e também nós conta muito
do sobre o clima do filme. Já no final ele é utilizado de uma maneira bem leve executado
por uma flauta e acompanhado por um violão (exemplo27).
6. Conclusão
Com as pesquisas feitas pode-se perceber que os estilos e a maneira de escrita para
música de cinema variavam muito de acordo com a época, isso se deve tanto a fatores
estéticos quanto técnicos e financeiros. A partir da análise de temas para as diversas
ocasiões pode-se ter um maior refinamento ao se observar cenas de filmes, pois, a partir
delas e possível sair do nível sensorial e emotivo e passar a entender de uma maneira mais
sistemática as composições feitas para filmes. Como visto a música para filmes pode
exercer diversas funções, que basicamente podem ser fisiológicas, psicológicas e técnicas,
sendo assim espero que este trabalho possa ajudar aos leitores a não mais assistirem ao
filme apenas com os olhos, e passarem a dar credito para a música, pois, além de servir ao
filme de diversas maneiras como na ajuda do desenvolvimento da estória, ela também pode
fazer comentários e expressar sentimentos que as palavras não são capazes, ajudando os
espectadores entrarem em contato com o que os diretores ou produtores queiram passar.
A união da música com imagens sempre me chamou a atenção, e pesquiso trilhas
sonora de cinema a algum tempo, buscando novas informações sobre o assunto, seja apenas
no nível de acompanhar novos lançamentos ou novos compositores e novas tendências ou
então analisando algumas partituras. Para mim este trabalho serviu como uma maneira de
sistematizar um conhecimento, que foi se desenvolvendo a partir de curiosidades e
questionamentos surgidos com as pesquisas na área. É importante ressaltar que este não é
um trabalho terminado, e certamente há um enorme numero de exemplos e variações das
formas de tratamento do material musical, que podem ser utilizados das mais diversas
maneiras, estas são apenas algumas sugestões de organização do material musical utilizado
na composição para cinema.
Bibliografia
BERCHMANS, Tony. A música do filme: tudo o que você gostaria de saber sobre a
música de cinema. São Paulo. Escritura Editora, 2006.
CARRASCO, Claudiney. Sygkronos: A formação da poética musical do cinema. São
Paulo, 1998.
DAVIS, Richard. Complete guide to film scoring: The art and business of writing music
for movie and TV. Boston: Berklee Press, 1999.
MATESSINO, M. A new hope for film music. In: Star Wars - A New Hope(Special
Edition). Inglaterra: Bantha Music, 1997. 2 CDs (110 min).
MÁXIMO, João. A música no cinema: os 100 primeiros anos. Rio de Janeiro: Rocco,
2003.
NEVES, Christianne. A composição para filmes no exemplo de David Grusin.
Campinas, 2004
Partituras
WILLIAMS, John. Music from the Star Wars Trilogy. Wood Ford Green : International
Music Publications Ltd. 60p.
Filmografia
KING KONG. Merian C. Cooper & Ernest B. Schoedsack. Turner Home Ent, 1933 Local:
USA, 1DVD 100 min., 1933, p&b
THE RED VIOLIN. François Girard. Música de John Corigliano. 1DVD 130 min. Local:
Canadá, 1998. Color.
BACK TO THE FUTURE. Robert Zemeckis. Música de Alan Silvestri. 1DVD 115 min.
Local: USA
BULLIT. Peter Yates. Música de Lalo Schifrin. Warner Bros. 1DVD 114min. Color
EWARD SCISSORHANDS. Tim Burton. Twenty Century Fox. 1990. 1DVD. 104 min.
Local: USA. Color.
STAR WARS EPISODE IV: A NEW HOPE. Geoge Lucas. 1 DVD, 127min. Local: USA.
Color
PULP FICTION. Quentin Tarantino. 1 DVD 164 min. Color
LORDS OF DOGTOWN. Catherine Hardwicke. 1 DVD, 109 min. Color.
CASABLANCA. Michael Curtiz. 1DVD 145 min. Color
THE THIN RED LINE. Terrence Malick. 1 DVD, 170 min. Color
MATRIX RELOADED. Andy Wachowski, Larry Wachowski. 1 DVD, 138 min. Color.
HELEN OF TROY. Robert Wise. 1 DVD, 118 min. Color.
ANEXO:
Exemplo Filme Forma de Tratamento
1 King Kong Mickeymousing
2 Star Wars Leitmotiv – Luke Skywalker
– Tema representando
personagem em cena
3 Star Wars Leitmotiv – Luke Skywalker
– Tema representando
personagem
4 Star Wars Leitmotiv – Luke Skywalker
– Tema Representando
Personagem
5 Star Wars Leitmotiv – Darth Vader –
Tema resentando persongem
em cena
6 Star Wars Leitmotiv – Darth Vader –
Tema representando
personagem fora de cena
7 Star Wars Leitmotiv – Leia – Tema
representando personagem
8 Star Wars Leitmotiv – Obi-Wan Tema
representando ideias
9 Star Wars Leitmotiv- Obi Wan – Tema
represetando personagem
10 Star Wars Leitmotiv – Obi-Wan –
Tema representando
sentimentos
11 Star Wars Leitmotiv – Death Star
12 - 13 Star Wars Leitmotiv – Rebeldes
14 Star Wars Música diegética – Música
pelo compositor do filme
15 Pulp Fiction Utilização de canções -Song
Score
16 De Volta para o futuro Utilização de canções -
Canções emcomendadas
17 De volta para o futuro Utilização de canções -
Canções emcomendadas
utilizadas como música
diegetica
18 Lords of Dogtown Utilização de canções
Canção como música
diegetica
19 Casablanca Utilização de Canções -
Canção com função