O CINEMA E OUTROS METAMANIFESTOS
METAMANIFESTO DO CINEMA DESCRUDELIZANDO-SE E OUTRAS REFLEXÕES
à Adriana Alcantara
a fotografia é a mentira
o cinema foi a mentira vinte e quatro vezes por segundo
o futuro do cinema é a mentira ainda mais vezes por segundo
O cinema, ah o cinema. A impossibilidade da impossibilidade do cinema. Mais
uma ou outra treta de impossibilidade. Já explicamos. Os danos, os melodramas
a lançar por dá cá aquela palha, a contaminar os filmes lindos, os limpos, os
pornográficos, os filmes inconsequentes, frios, budistas, com reflexos de letrismo e
situacionismo, ou os feministas, ou os do género que transformam em luta de
classes o anódino, que transformam a consciência exaltada do povo que sai às
ruas num acto de auto-comiseração de velho intelectual de esquerda, cinéfilo
encartado de férreas convicções e dado a provocações marotas. Nostalgia de
revolução a tentar dar ares de ser revolução.
No povo saiem as ruas. Contra ou a favor do cinema. O povo sai à rua para ser
filmado. Para ser vertido em televisão ou em épico.O longo hábito do teatro
entornado sobre o hábito do cinema supostamente hiper-realizar o real. Onde um
é declamado o outro desdeclama. Mas a lamechice é identica, e ainda que seja
ineficaz, é preferível, de longe, ao music-hall futurista ou dadaista, com a sua
sucessão de cenas parvas. Isso foi há um século atrás, no fascinante, mas
obsoleto, auge do moderno. Procurem dourar o nosso mito, ou canonizá-lo, no
magnetismo ardente de Veneza, com festival e morte. Mas sem touradas.
Tudo o que foi absurdas vanguardas volta como experiencia conformista ou
terapia disfuncional. O cinema a forjar o cinema como remake insuportável? Não
estivemos lá? Gostamos dos exemplos que nos deram? Não!... ou talvez…
Em vez disso fomos postos à prova com um teatro catártico, com acção,
gritalhada, paródias bravas, versões abandalhadas e politicamente correctas dos
clássicos e montagens patuscas. Diziam-nos que o povo sai às ruas. Mas sai por
causa da chatice, feito voyeur de si mesmo, esperando que nós empunhemos as
camaras para filmar punhos erguidos. Não! São os punhos erguidos que se
filmam a si mesmos, com telemóveis. Manifestamo-nos para sermos auto-
filmados. Amanhã tudo estará on-line!
Mas os dramas sociais são concretos, mesmo a cantarolar o “apitó comboio”. É
um não-buda que realiza não-filmes que não-pensam. O cinema a higienizar o
seu cú ao som de Requintadas Crueldades.
Somos antropófagos no que respeita à cinefilia e vegetarianos quanto à filosofia?
Ah, interrogar dá ponta!
Um argumento enche-se com qualquer históriazinha, uma boa banda sonora, e
uma montagem num programa caseiro. Tudo vem facilitado.
Qualquer sequência narrativa sofre do síndroma de Scherazade — propõe-se
mostrar qualquer coisa contra o o seu fim. Narrativa que se constroi como
adiamento. Tentativa de prosseguir contra algo a que não se quer chegar — os
romances de Kafka são o exemplo declarado de que a seta contem e não contem
o alvo. Foge ao alvo a que está dirigida. Ao contrario da história que se forja
como reencenação de algo acabado, as narrativas (o romanesco e o cinema) são
o investimento em algo inacabável. Qualquer fim é um mau fim. Os fins menos
maus são elipses, deixando perpétuar a suposição de que algo trágico está para
acontecer. A narrativa hoje deixaria Hamlet à beira da morte. Não há nada que
aconteça depois que desapodreça as dinamarcas.
Banqueteamo-nos em Jesus, pois todo ele é um manifesto negro filmado em close
ups (diria Artaud!) — é urgente deliciarmo-nos em Jesus quando repararmos que
as camaras estão em toda a parte e que tudo é filmado de todos os ângulos
possíveis, à Lagardére. Não é preciso vislumbrar sequer o extremo anus que
assassina. O teatro do fim do mundo já começou há muito tempo (mesmo antes
de Cendrars). Não é só o Big Brother que nos dá a consciência de que nascemos
para actores de um filme em que todos somos ao mesmo tempo realizadores e
não-realizadores, mas o cinema é antes de mais uma arte de sobrevivência e de
manipulação da pseudo-comunicação. O cinema é a espuma extrema da
tecnologia que será integrada como necessidade genética. A consciência da
crueldade do cinema tornou-se um dado na sobrevivência individual. A
consciência do eu, que Descartes atribuí à capacidade (sem dúvida consequência
da vulgarização dos espelhos) de nos reconhecermos como existência é agora um
assunto cinematográfico. Só no solipsismo filmando-se e montando-se a si mesmo
reconhecemos restos de existência — Andy Wharhol foi pioneiro nesse
reconhecimento.
A fotografia começou por ser mais democrática e mais fácilmente integrada no
dia à dia — a máquina de familiar era pioneira no dar imagens de morte que se
mexem (e a morte mexe muito!) — estes são os que vão morrer no alto da sua
soberba e inocência, acompanhados de uma assustadora imagem! — o grande
passo seguinte na crudelização do cinema foi o super-oito, ainda elitista, e com
uma frescura maravilhosa — o super-oito (ou o oito milimetros) sabe-nos a antigo
e há uma inocência no ar desengonçado das pessoas, e até das coisas! — nos
anos 80 do século XX dá-se a democratização do filmar através do video caseiro,
olha, olha — começam-se a ver os filmes que se querem quando se querem e a
filmar caóticamente casamentos, baptisados, ecografias, entrevistas — surge a
efémera video-arte como apropriação de uma arte que era muito preparada, em
versão bera, mal-feita, ideias repentinas, excesso de loopings e revisitação do
cinema própriamente dito — e ainda há as camaras de vigilância, meus caros —
tanto cinema inútil e de deitar para o lixo — o cinema parece condenado a
perpétuar o seu degradamento e os seus restauros. O celuloíde desaparecerá
depressa. O cinema digital reproduz-se tão fácilmente quanto se degrada. O
cinema exige cada vez mais imagens por segundo, isto é , a maximização da
“mentira” e do Não-Ser.
Com a internet, o youtube, os programas de montagem caseiros, a integração
nos telemóveis, os skypes e similares, mergulhamos em força na tal era digital —
tudo isto se tornou mais do que comum! Sem zapping.
No povo sai às ruas o cinema como epigono de um desastre a voltar a estar no
cartaz.
O longo hábito do teatro é o da autodestruição com a possibilidade de ir mais e
mais ao coração. A pintura, pelo contrário, não tem um pentelho de
sentimentalidade, se exceptuarmos alguns casos raros, sobretudo a mando da
contra-reforma (são contra a natura da pintura, mas são já uma antevisão do que
viria a ser Hollywood — estórias para invisuais). Penso em Ribera e Murillo, não
sei bem porquê.
Eis o cinema a dirigir-se um pouco à sua obsolescência, a masturbar-se com
muito magnetismo ardente com adereços das outras artes — pessoas que
aparecem e desaparecem como manchas de cor — o cinema a tornar-se coisa de
artista, demasiado quieto, mas pouco manso.
Vivemos o cinema cada vez mais pindéricos, desconfiados, festivaleiros, com
nostalgia das antropofagias, quando a camara devorava realmente os corpos e se
desembaraçava da porcaria do espírito (voltaremos a este tema!). Vivemos o
cinema como uma decepção face à pintura ou ao romance, ou até à música.
Esperamos muito dele, com a nossa filosofia de bolsillo. Julgavamos que um
determinado cinema podia despertar consciências e pôr os nervos em franja,
como certos espetáculos de vanguarda. As nossas faculdades estavam toldadas
com o entusiasmo. O cinema excitaria desmesuradamente para uma revolução
que estaria nele contida. Mas a revolução é só mais velocidade, mais vertigem,
mais mudança. Será que o corpo aguenta tais velocidades?
O cinema através da sua obsolescência consegue iniciar-nos filosóficamente na
pintura. Mas é preciso ter sensibilidade. Convenceu-nos no cinema o que nele foi
imaturidade, promessa desaforada de um certo explendor. Quando se tornou
certinho e consciênte da forma de usar a tal gramática, a coisa ficou mesmo
chata. Inicia-nos o cinema na espontaneidade para que esta atravesse a pintura.
O plano fixo da pintura é memória do cinema, de muitos filmes que se acumulam
numa imagem. O cinema tem qualquer coisa de egípcio. São imagens destinadas
a ser vistas pelos mortos. A pintura livrou-se do seu lado egípcio, e dá-se mal com
os museus — é uma coisa caseira e burguesa, quer se queira, quer não, feita
sobretudo para o pintor enquanto pinta, para seu deleite próprio, atiçando-lhe o
desejo sexual. A escultura e a literatura, pelo contrário, são feitas para as
gerações passadas, para os mortos. Cite-se Genêt citado pelo Rui Chafes. A
escultura egípcia, a escultura grega, as estátuas públicas, não são apenas
destinadas a mostrar os deuses e os mortos, como algo puramente rememorante
— há uma função de eficácia, e há um feed-back sobre os espectros. No cinema
a dimensão espectral não é apenas a da sala de cinema — a morte é a
desencarnação e a possibilidade do cinema por excelência. Se a coincidência
entre a fotografia e a morte foi assinalada (por Barthes, entre outros), o cinema é
a morte animada, vinte e quatro vezes por segundo. Neste sentido é uma morte
mais completa.
Também há a montagem, essa coisa dilacerante, com forças vivas e existencias
leiturando. Chichi-cócó e chicória a substituír café. The End. Andrew Sister no
bidé, letrismo de Raymond Hains.
Nenhum cinema é do passado, mesmo que venha envolto em fulcros de
crueldade, em rosados espinhos, etc. — a montagem põe paninhos quentes no
que parecia um pura incongruência — o filme tenta fabricar a personalidade do
espectador como o que se-deixa-ser-montado por um fluxo de imagens díspares
— é uma sensibilidade mágica (no sentido surrealista), ou diarreias de sobre-
humano a descorporizar — o cinema vem de certo modo atestar que a
emancipação do espirito só estraga o corpo que se atarefou a gerá-lo e a
espremê-lo.
Colocas dois mundos neomaneiristas face a face — reparas que tudo é
anamorfose de anamorfose, visto dos ângulos mais escorreitos, como que por um
riso que distorce — há forças expiradas que se coligam para formar uma força
desviante.
Trata-se de cultivar lampejos visuais — o maneirismo é cinematográfico antes do
cinema. Dir-se-ia que no maneirismo a arte é já memória da arte, citação
estafada a ser introduzida com melancolia e cansado espalhafato. Mas a arte
recua sempre a uma memória que ou é anterior ou se desvia da arte. São planos
que se acumularam sobre planos, esquecimentos — das imagens externas que se
foram internalizando pela crueldade, pela ironia, pelo abandono dos
espectadores. O que o maneirismo dá conta é da solidão extrema e do
desnudamento do artista.
O artista está metido na sua ascese, no seu cinema pessoal e quase
intransmissível, no seu piolhoso atelier a comer ovos cozidos. O artista que
antecede os maneiristas é Piero di Cosimo. Uma obra de arte não é a
rememoração da Arte, mas uma imersão em que se dá o esquecimento da Arte.
O cinema não se consegue reciclar. Todo o remake é quase sempre pior que o
“original” ou o remake anterior. O cinema vive o drama dessa saturação. O já
filmado destroi a possibilidade da sua repetição ritual, dos prototipos se
eternizarem.
Uma imagem de um soutiã enche o ecrã. Venús de Milo, ou do Mamilo. Doutor
Cagliari no Estoril, Babilónias a descobrir no Intendente. Assassino punheteiro a
andar em carrinhos de choque. A pintura, a certa altura, conseguiu vislumbrar no
cinema uma alternativa aos seus eternos motivos — o nú, a paisagem, a natureza
morta, as cenas épicas, o retrato. Foi mais um efémero regresso à figuração ou
ao narrativo. Foi mais uma tentativa de desviar os olhos do Absoluto ou do Vazio.
Daí a chamada à crueldade, como à literalidade, feita no “uma rosa é uma rosa
é uma rosa”. Quando aqui apelamos, pelo contrário, à desliteralização, à
descrudelização. Uma rosa não é uma rosa mas ressurge na devoração, na
monstruosidade vegetal, nas geometrias, nos movimentos de picar e contrapicar
cenas. O intelectual pornófilo sabe pelo estafado simbolismo que uma rosa é
uma rata. Mais rata que rosa. E que a arte se manifesta contra o esquecimento
das suas definições e virtualidades. A Mafia da filosofia está sempre a encerrá-la
numa violência e em necessidades. Os artistas passaram a considerar o
doutoramento como uma etapa narcísica da sua legitimação, quando o
doutoramente é mais um anexo de fake à arte que já era fake. Mas o
doutoramento é o adeus à propensão para o esquecimento da arte. Repito. A arte
gosta de se esquecer das suas funções e de encarar a rememoração como um
condimento de sucessivos esquecimentos. A arte gosta dos seua doutoramentos e
enamora-se desse desvio maroto.
E vais reler Buñuel antes de voltares aos filmes — geometrias de monstruosidade,
insectívoras. E depois passas para a cinecittá, olá pá, dá e não dá. Ou Mabuse e
Caligari, e o amor, o beijo adiado. “Lava-me o cú, lava-me o cú no lar vegetal”.
O tédio, o profundo tédio do eterno zapping.
O teatro caótico num espasmo sentido com itálicos do Batarda a arrebanhar
pornográficamente o banquete. O cinema andrógino, adolescente, a salvar os
falhados do seu falhanço. Será isso?
É para manifestos que o cinema se dirige. Momentos agitam-se neles a
desaperfeiçoar a perfeição, a escorregar para a lixeira. Felinni chinês. Welles sem
personagens. Mistura, salada. A realidade desapareceu para dar lugar à
comunicação cinéfila? O lar de Duchamp, um lar hipnótico, de geometrias
variáveis e matemáticas dadas a travessuras. A substância do cinema não é o
cinema, mas a animalidade acariciável. Modos de afagar o pelo. Camaleonismo.
Dziga Vertov mostra que a complexidade é o dado, e que a ironia, ou a
felicidade, são trabalhos de edição. O amor é o quotidiano, a alta velocidade, a
magia da popisação, os travellings a politizar (como no Potemkim do Eisenstein).
A fulguração é o que é mais parecido com a verdade — pelo menos para o
artista. Vê-se o César Monteiro a pendurar roupa. Não é preciso muito mais. E
depois um lobo do Tex Avery a uivar. E vai mais um copo de sangria. E o Mister
Magoo. Diria, sou eu. Olhos semi-fechados, atravessando todas as montagens.
Maggoo e Tournesol num só. Equívocos visuais e auditivos.
É para muitos òbvio que o cinema coincide com a antropologia (não sei bem
porquê), e que a metodologia, ou a maneira de processar a informação, é
apenas o estilo, ou o modo de integrar cortes, vazios. A elisão é o que permite a
alusão. Mundos a coincidirem-se plurais no neomaneirismo.
As multidões protestam contra a antropologia baratucha. Mas já se sabe que o
caminho do cinema é o baixo custo. O cinema é uma coisa que cada vez mais se
vai dessubsidiarizar, reduzir as equipes, e claro, reduzir a qualidade. Sobra a alta
de definição. Sobra a vontade de contestar. Sobra a chatice do trabalho de
edição.
O Maoísmo estaria aqui como intensificação da retórica dos manifestos, com o
fantasma de Godard a sobrevoar e com algumas paródias a suturar. O que
preconizamos é um contrariar, com a natureza a esturgir em redor. Não
percebemos o que podemos fazer com os velhos Mitos (com o Cecil B. de Mille a
filmar?), e as idas adjacente ao teatro, ao antigo, bem grego, ou com incursões
surrealistas no sonho. O que ainda interessa, no surrealismo, é onde ele pouco se
desenvolveu, no cinema. Porque é trabalhoso. Porque era custoso — quando o
surrealismo foi um escaparate de adolescentes perguiçosos.
Habitam-nos as filmagens, com as palavras a vulgarizar clichês. Habita-nos a
televisão, e nela, mais que o resto, as séries e as telenovelas. Não consigo pensar
no Tony Soprano sem uma certa familariedade. O cinema sacode-se na natureza
como natureza a renaturalizá-la. Não se trata de simples banalização. Ou de
algo que vem (porque vem) do ocidente e que contaminou pandémicamente o
mundo. O cinema fez-nos participar no seu indistinguível mundo — e isso é
magia, mas não apenas como qualidade de uma experiência. E a magia deve-se
ao simples facto do público acreditar, enquanto acredita, no seu terror (e o
cinema é aterrorizador!), venha de holywood ou de boliwood — e aprendemos
cada vez mais o cinema na sua rápida nostalgia, na mudez, no som mono,
riscado, nos inacabamentos de uma India filmada como algo cubista, no
estranhamento que nos familiariza.
Voltaremos à sua cauda? Ao principio da caudalidade? Á pré-história. Voltaremos
a lamber o espírito, com dentaduras parentais? Voltaremos a nós, sem cinema? É
o mesmo que dizer: podemos voltar ao eu, antes da poesia lírica, da tragédia, da
comédia, da filosofia (mesmo que de bolso)? Podemos aldrabar-nos com um
regresso a uma inocência. Ou: as várias inocências perdidas-recuperadas agitam-
se cinematográficamente por aí, nesse dentro-fora em que estamos imersos e nos
quais nos estruturamos? Somos um espetáculo que sobrevive teatralmente à
própria vida, às mortes anunciadas do teatro, ao fim das frescuras do cinema.
O que supunhamos artifícial naturalizou-se, e faz agora parte do continuum
biológico. O que antes nos parecia algo recalcitrante, bizarro, impuro,
excentrico, amaneirado, parece agora espontaneo, e até, como tudo o que foi
vivo, decadente. Não há não-natureza, e o espírito faz fade ins e fade outs
constantemente.
Há uma tremenda ritualização no que parece uma desordem ambiental. A nossa
memória segue leis de montagem e sombreimprime várias cenas. Há fulgurantes
antecipações. Procuramos reter imagens lapidares como um bom shot. Mesmo as
imagens abstractas, os quadrados negros do construtivismo, estão lá, na sua
acumulação de gestos, partes de rituais vastos, no fluxo de signos que condensam
aqui e ali o indistinguível mundo, os ramais sonoros, e os cadáveres múltiplos que
são restituídos (ou ressuscitados/deglutidos) para que possamos pensar de novo.
Porque pensar é dessimulacrizar, perdõe-me o silogismo — é como passar do
comboio a vapor ao monocarril.
Podiamos queixar-nos do espetáculo, como se a privacidade fosse uma mania
saudável, ou uma comunidade secreta desejável. Mas temo as seitas, e a sua
minguada ressonância. O cinema intimidou-se. Tornou-se cada vez mais coisa
caseira, algo clandestina, apesar das pipocas que por aí andam. As salas de
cinema estão condenadas. E depois chegam os que dizem — a sobrenatureza
fala, sobretudo através de um gurú que aldrabará milhões de cinéfilos. Porque a
religião é também um negócio cinematográfico.
Sabemos que o cinema ainda pertence ao mundo elétrico, mas a sua energia já
leva uma velatura do digital. Não é a mesma coisa, não senhor, independente do
número de frames por segundo ser parecido. A película foi forçada a saber
reincarnar nos ecrãs de televisão e de computador.
O caminho não-óptico para o real foi substituído por algo mais voraz — é essa
voracidade antropofaga da camara, ainda que encerrada numa espécie de
rectângulo, que sobrevive à incongruente imagem que se dá do real — o real
como crime a ser investigado e desvelado sob a capa de múltiplas ambiguidades
e mobilidades. Mas o crime não existe. Ou é apenas um pretexto. Fica a magia, e
todos os truques e ilusões que nos levam a interessar pelo crime. E no entanto
habitam o real as coisas antiga da natureza e a sua extensa morfologia, com os
respectivos melismas e trinados.
Neofito: não há real, só magia, e manobras de diversão. Neofito: não há filmes,
mas um deserto espetacular de boas intenções, e de argumentos falaciosos, que
no fundo no fundo são modos escatológicos de violar a natureza, e de fazer-se
coincidir com ela.
Filmagens: palavras póstumas e imagens insuficientes — exclama o semideus!
Fritz Lang abana a cabeça. Filmagens: ressonâncias a reformatarem o espírito,
mesmo que o público, na sua esbracejante mediana, pareça ter sempre razão.
O cadáver do cinema a arder é apenas uma extensão das más intenções do
espírito ou de uma ação popular da guerrilha mexicana? O cinema é uma arte
que nasce depois da morte da arte (na versão hegeliana, e nas suas más
paródias), tal como a fotografia e os seus derivados mais recentes. São artes
póstumas, tal como a banda desenhada. O cinema é um antídoto para o triunfo
do espírito, porque ele próprio se define como algo que se move, que se muda.
Terreno movediço e fantasmagórico. É o fantasma da arte que regressa como o
outro do espirito. Espirito em segundo grau, uma vez que nada no cinema é
matérico.
Andam aí a zumbir arautos que querem tomar como nús os textos através da
video arte — o espectador, dizem, é um idiota — os despectadores são sagrados
(seja lá o que forem). O rosto esquisito, o popismo mistico, a algaliar, e cremes
new age, certas gorduras ditas curativas, e o olhar pessoal, e a invocação dos
sonhos (como cinema puro, ah!)… o que é isto?
Livras-te da tua fisionomia? Queres tornar-te uma vontade, descartada de
orgãos, exterior e vibratória, a la Artaud? Ou preferes a insípida fúria nudista, até
te livrares da própria nudez, nojentalista, com cocozetes (para ser infantil) ao
lado? Ou achas que tudo se conclui e conflui no esquisito, ou em
pseudosubjectidades neoneo, pleonasmos de vanguardas desnecessárias,
palavras de passe estrondosas em casas de passe semi-clandestinas, e outras
imbecilidades provisórias.
Ficas com a tua namorada a ver uns movies estupidos e a comer caramelos em
quartos baratos, enquanto a tua nação, ou outra, desperta para mais uma revolta
cheia de esperança e palermices e clichés, e tu agitas as ancas julgando-te um
xamã, um aldrabão que fala alemão como o Joseph Beuys, a extrair vaidades,
que a video arte, mais uma vez, há-de expropriar-te a alma que não tens.
Mascaramos para renovar amizades — avançamos camaleónicos a meio do
vazio também mascarado de selva obscura, catita coração das trevas, e o DJ
adequa-se, sempre a meio caminho, recitativo texano numa desajeitada cantata
de gospel num road movie que se projecta num ecrã total, por todos os lados.
Somos ou não somos renovados e renováveis nessa desajeitada beleza?
É necessário fazer a tal suburbia war, men? O ar está cheio de sons, dos que nos
fazem acordar com o Novo na boca ressequida. Lavamos os dentes tralalá
tralalá! Ignoramos o orçamento do funeral, dado por uma empresa que anuncia
em grande nos auto-estradas. Queremos romper a tela. Somos de uma geração
em que nada disso significa o que quer que seja (subidú!), já alguém o disse, e
passamos ao lado, com o teatro de bolso, cinematograficando com palito na
boca.
A reunião com a totalidade, numa mesa redonda… A possibilidade das
montanhas moverem outras montanhas. Fluxus. Sempre o cinema, pseudo-
inocente, sem orçamento, sem montagem, mais natural que a mais natural das
vidas, acompanhado por um vinho rosé. A vida generosa, simplesmente maria,
seguindo a mais tonta permissa — uma linha que parte desta cadeira até ao
absoluto, tortuosa, com visões de Robert Crumb a achincalhar.
O teatro sobrou às citações dos que ficaram espectados. Todo o espectador é um
espectante. Alguém que tem o dom da paciência, que fica à espera, que conhece
o talento do encenador ou do realizador para certos adiamentos. Tensão
amorosa.Percebemos as trapalhadas. Luxúria servindo-se de cenários. Scanners
galgando veludos. Bélta neorealista em trespasse. Piriquito na gaiola de quem
pede esmola. Há os que dizem que isto é uma questão do signos. Grunf! Ir até ao
fundo do olhar e admitir o bonito, tal e qual, com a sua candura vibratória,
incendiária.
O teatro, a não-verdade outra vez completando a verdade com a descrição do
tédio. Baudelaire à porta fechada. Cinema a stressar o poema. O produtor pensa
em investir num outro fracasso, e tem um certo magnetismo canalha. A hora
actual não está para psicologias. O poder é metafísicamente nosso, diz o artista
triunfante rolando o seu charuto. Vai mais uma espetadinha?! Objectivos que se
expandem. “Já leste os detectives selvagems”? A escravização do homem pelo
homem ainda mal começou. Odisseus vagueia pelas latrinas de Itaca, desumano,
demasiado desumano. Homero fornece-lhe a droga. Um longo plano do junkie a
injectar-se põe os espectadores a chorar. Há sempre um porqueiro chamado
Emeu pronto a partilhar um chouriço, meu! Ouve-se Elvis Presley ao lado.
Regressa o corifeu em mais um tentativa de dissertar sobre o Devir, o Caos, a
Dama Desmesura, a tesão pelo poder, a fatalidade dos oráculos. Vai tentando o
HUMOR-DESTRUIÇÃO, de passagem. Uma mulher minúscula reclama a sua
anarquia e a sua auto-determinação quanto às normas sociais e às leis do
Universo. Sabe-se condenada. Apanha bengaladas. Os trailers passam ao lado
prometendo ainda mais emoção. O chiuhahua ladra. Frisson. Samba. Lua cheia.
Carnaval. Os amigos dos actores e dos realizadores falam de séries antigas, do
Bonanza e do Espaço 1999. Eram más essas séries — mas boas.
E o humor, com Marlene Dietrich? Objetos. Fetiches. Plumas. A natureza,
repetimo-lo, vai fazendo o Homem como intempestivo esboço, à Leonardo da
Vinci. Ou como a chatice de ter que fazer desaparecer o cadáver, como nos
Sopranos. Era boa essa série, já o sabias. O Tony, o actor, morreu.
A natureza anda a contribuir particularmente para o aumento de sensibilidade.
Anda a cercar, a exacerbar, a exaltar. A natureza encanta-se ocultando-se. A
atracção destina-se a todos — harmonias e desarmonias. Destinos a desfazerem-
se noutros destinos. Sabemos que o adiamento é ele mesmo a raison d’être da
narrativa e do amor. Os amantes encontram-se no princípio, e tudo irá adiar o
reencontro perfeito em Ítaca, onde podem aceder a uma condição semi-divina.
Mas no meio houve um erro, e o sangue dos irmãos Cohen alastra sobre todo o
visível. Ulisses faz o mesmo, e dá a ver os cadáveres dos pretendentes manchando
as paredes de sangue. É o mesmo veermelho da sala dos Mistérios em Pompeia.
Ulisses pega na metralhadora e dá cabo, possuído por Apolo, dos maus da fita.
Depois olha em redor e diz: “não há transgressões, não as há, nem poéticas”. A
gramática cinematográfica limita-se a assistir a destruições sucessivas e a puxar a
sensibilidade cá mais para cima, à beira do vómito.
Penélope ficou no quarto com uma amiga lésbica a fumar charros e a montar as
cenas do massacre. Penélope desconfia. Há que voltar a adiar a realidade. Há
que desconfiar da violência de Ulisses. Há que fazer alterações à montagem.
Devemos entender Ulisses como faccinora ou como heroi? Quem foi o mentor
deste massacre? Apolo? O que é que legitima a crueldade? Os deuses? Jesus
também, ainda que contra ele mesmo? É uma tipa porreira e lúcida, esta
penélope.
O lugar poético na Odisseia torna-se mais explícito como picassada. A função do
teatro é desentranhar a energia dos textos, fazendo-a explodir para o exterior,
mesmo que venha sem palavras. O cinema devolve uma certa privacidade, que é
erótica. Torna mais explicitas as ganas, a vontade de acção, e entranha-se como
vontade de travelling, de velocidade, de vertigem, de mais anseadade. É algo
mais apocaliptico. Mas apesar de todos os aparatos de peplum, os adiamentos
do apocalipse são eles mesmo tremendamente apocalipticos. E nesse sentido o
cinema é como as sereias, está a destruír-nos radicalmente, com as suas
crueldades. É horripilante. Há que descrudelizar o cinema? Sim! Como? Ainda
não o sabemos!
MANIFESTO A FINGIR DE REACCIONÁRIO CONTRA O ESTADO DA ARTE
(fragmento)
A arte hoje é estupida, mal-feita, desinteressante e pretensiosa.
não é difícil encontrar crianças que façam coisas mais interessantes, mais intensas
e até mais complexas do que a maior parte da arte actual
o dito que acompanha o não-iniciado, “o isto eu também fazia”, soa a tolice,
mas é legítimo, e devia ter tido em conta como críticismo — a inabilidade e as
ideias primárias são acompanhadas de uma poderosa máquina de legitimação
absurda, feita por tipos que basta olhar para eles para ter vontade de vomitar, do
crítico provinciano ao grande coleccionador coreano
a anti-tradição tem feito sobretudo estragos — a pretexto do novo, têm-se
repetido clichês e fingido que se desbravam limites, e imposto coisas sem
qualidade, sem graça e feias
a arte de vanguarda já era feia, a arte post-moderna foi kitsch enamorado da sua
piroseira, a arte que já não sabe o que é ainda é pior, é um monte de merda
comido pelo artista e repetidamente vomitado pelo mesmo
o savoir-faire, a graça, a espiritualidade, a intiligência, a capacidade de ser
profundo e culto, onde é que estão?
vejo artistas cada vez mais a doutorarem-se, a papaguearem teorias filosóficas
em terceira m-ao, com o ar emproado de quem diz qualquer coisa original —
vejo cada vez mais conformistas a dizer com um ar enjoado que estão a fazer a
revolução, a mudar o sistema, e outras tretas, e não vejo a sua arte a fazer nada
disso
as conversas dos artistas, desde há muito tempo que são só conversas de carreira,
do que interessa e não interessa, de como chegar lá, dos comissários que
interessa conhecer, dos sítios onde se tem que estar na altura certa para andar
mais umas casas no jogo da glória, na máquina de guerra comercial que é estar
no atelier a mandar constantemente mails, a estudar sites, a delinear estratégias e
a fazer conhecimentos
a arte já foi santidade ou prostituição, ou até as duas ao mesmo tempo — o que
se passa no que se chama arte é apenas oportunismo desenchabido — um
grande artista hoje é o que tem olho, o que simplifica tudo, o filho-da-puta, o que
não perde uma
Escrever é ser vislumbrado. Escrever para que os vislumbres possam emergir.
Sabe-se que o dom profético precisa de se soltar como imagem do que se faça a
vir, e não como exactidão do que virá. O profético não se projecta sobre um
futuro, mas torna futurável através de imagens que abrem para mais visão e
consciência.
A mutação dá-se a cada passo como retorno do Corpo. Retorno do Corpo às
suas logologias, ao laçar e deslaçar do Logos. O mutante, julgo que dizia Llansol,
é o que mutúa — arrasta a tradição no que renova. “o mutante é o fora-de-série
que traz a série consigo” . O que irrompe condensa o serial no que lhe sobra.
A razão é a disponibilidade técnica para a angústia, para a exclusão.
A razão é o escrutínio do crítico-industrial a cruzar-se com o poético, mas apenas
se cruza.
A primeira mutação é dita “o que suporta o Vazio vislumbrado” — força de se
fazer ver no avanço de se fazer visão no que ainda não é coisa.
A segunda é “o toque de uma fronteira chamada Paisagem” — é a interface
entre a Paisagem e o Corpo — mimetismo que se faz carne
A terceira é “o grande êxodo a deslaçar o gregarismo” — o grande êxodo da
liberdade de explorar a consciência é escrever, pintar, viver poéticamente. O que
se escreve é escorreito. O êxodo começa no passeio, no abandono. A
comunidade move-se nas singularidades de cada. Comunidade de anti-gregários.
Os anti-gregáriosutuam-se com os outros na intensidade de se meterem consigo,
no seu egoísmo poético avesso às garras do gregarismo. Os grandos exodos
proporcionam a diferença em Livro — o Livro testemunha a passagem pelo Vazio.
Só depois é possível a assimilação da Paisagem. Porque o liberto é o que se
despossessou — livrou-se dos deuses, de deus, do ateísmo, e do nada:
poliateizou-se.
O eu explende na desistência do Poder, em perca, perca que é pujança,
reapropriação da pujança — é necessário que o mutante fique sózinho nos
labores poéticos e que se desembarasse do gregário substituindo-se à sua
história. Sabe o gregarismo a rapina, sabe a crença a razão, porque é o seu
bastião tecnológico e político. A história que temos é o frontão dessa rapina, e
chega, hegelianamente, à consciência da rapina absoluta, ao Logos expropriante.
Sabedoria uber alles. Queriamos que a história fosse apenas a conquista do
consigo.
O UIVO SERPENTINO
Pesadelos na sua narrativa divina
que clamam por metáforas
na montagem sempre matinal de miseráveis orgias
na expoente agonia de editarem a loucura — mortes
fulgurantes de deuses tomados como únicos
ou a passarem por laicos.
O tempo assimila a metáfora flagelada
bebe os torsos da noite como colagem total —
memória do metanarrador a emparedar-se
no impossível.
Holderlin seria a metáfora avizinhando
o sublime por montanhas — fulgurando
de marijuana, ansiando-se destilisticamente
fora do dinheiro. Disse alguém:
qualquer poema é o dínamo do espaço
morrendo pelo antigo
cambaleando da memória pelo trabalho de Deus
com a pessoal solidão do mundo em ressurreição.
Não existe outra memória que não seja jazz,
a dar de beber terebentina ao leitor
no destino pessoal, queimando o poeta —
o que importa é o filme, histérico
através dos nomes, o que faz saltar a vida da agonia
e o que faz saltar a ilusão a reformular a vida.
E há a maquinaria pessoal da vida na montagem
plantando a integral ilusão interior à morte,
o fulgurante exactamento, flutuando em tragédias
à luz descascada, nos cérebros, no leitor,
na perenidade da marihuana a criar o mundo.
Holderlin & Goethe são a solidão
onde existe outra memória com o poder de um filme
através da alegoria, com a cabeça de Elohim a fulgurar
em torsos da cidade mítica —
& publicaram odes com apoio cultural
& escreveram não-sentados na excedência, queimando
miseráveis apartamentos. E através de Blake
é tecida a destilistica; traduzida de vozes
que descascam as influências em apartamentos de génio.
E a memória ressurge em odes obscenas
na iluminosa meta-narrativa de Adonai, na comodidade
que se ganha e se perde a cada geração.
O templo do poema é a memória segunda, a fábula
última que faz saltar os restos
os sons, os sonhos, a nudez
por onde se rapa o fundo do mundo.
Novalis & Rilke aguentam-se na sustida alegoria
no poder podre da escuridão
onde existe outra memória
mítica, o lugar dos Hospitais, os postais
potencialmente enviados, enviesados. Milagre
ou movimento mobiliado pela noite, no tráfego
dos nossos intelectos, na repressão, nas cargas súbitas,
nas circunstâncias incompletas
referindo-se aos pólos da cabeça
fritados pelo sol e lua — saída de carne
pela aurora
em recordação total das trevas.
Escadas de Atlante, pulverizações de cerveja, choques
ao crepúsculo —
como um íman invertendo o mundo.
Tudo imóvel a pôr-se num quadro. A pintura
iluminando, vomitando por sete letras,
incompleta, em recordação iconográfica; de submarina
carga — vagões de tangerianas perdidos
entre cáfilas de traficantes,
declamações vocabulares, solitárias deslocações
das disposições do cérebro
e circulações vocais, rumores
correndo, benzedrina
recriando submarina
os objectos distribuídos.
Intensidades de crianças em recordação unida, única,
a afluir à porrada à rua,
crianças que rumavam ruidosamente nos postais,
para o esvazio.
Pensem-se as qualidade mágicas,
não apenas nos motores orientais
mas no clarão, na luz do presente
e na árvore em que remam ruidos.
A luz subterranea dos quebrantos
objecta-se no Hospital
onde vicejam entre moribundos
verdes projectos de intelectos novos, trêmulos,
a desapareceram no Zen, no crepúsculo,
como ferocidade enigmática,
a berrarem à polícia, bem alto,
que estudaram Plotino sem o saberem,
e que pela fluidez se morre
no poema: não faz diferença.
E morre-se de América,
de potestades que ressuscitam parcialmente
ou que desaparecem na pontuação,
desportiva, enevoada.
O coração pensa ou aligeira o espalhado século.
Propulsionados manifestos populam nas ruas
em folhetos, visionários, vibrateis, no metro
a tentar empurrar a força e a história nesse filme,
com telepatia, invocando o João da Cruz,
procurando genitais pensadamente — a uivarem
nos interfaces, entre comboios e barcos,
a ganirem cá para fora, entre narcóticos,
onde vibra a acção dos carros desportivos,
onde se acelera a pontuação
e passam as púberes para os brancos ginásios
e regressam as criaturas do horror dos empregos
e se trocam carícias no nevoeiro
e morre-se da química do mundo, com luz sobre.
Apagaram Górgias, Longchempa, Al Hallaj
da chuva de barbas filosóficas, metaforicamente
pelos seus meandros, e os visionários
que propõe a luz das figuras, o oculto
que reaparece aprazendo —
e berraram na história, no brilhante tempo.
A poesia propulsa a pontuação e o entendimento
tóxico
aos visionados órgãos do mundo. A história geme
nos meandros. E digo a gárgula, a África do Capitalismo,
enquanto genitais enrabam peles
e passamos sós pelo não-tempo.
A pontuação desaparece
no cheiro bafiento da história.
As hipnóticas coisas vêm na velocidade
brilhantes — deixaram Diógenes, Poe, Santa Teresa
com as maquinaria da morte. Apareceram,
embarcaram na Costa Oeste num inverno,
e no Cosmos vaguearam a foder
nos nossos carros. Afugentaram loucos
e exercitaram em ginásios com gajas oxigenadas
a glória do corpo, arterialmente, à sombra
da pontuação penetrante
nos meandros dos esqueletos.
Na química cromática do México emparedei-me
no movimento. Na complexa lareira de Chicago,
desapareci em limousines. Tenho órgãos pré-comunistas
e a bop-cabala põe-me a pular com força hipnótica
porque se morre deixando outros a berrar.
Vejamos a ambígua montagem, pela Wall Street,
com folhetos a falir, e champanhe
a despontar os lírios urbanos — a ambiguidade
é pacificada na nudez de Milarepa,
na paisagem pederástica, na noite
acompanhante,
no prazer nosso de cada dia
que santifica totalmente.
E morre-se por todo o FBI
pelos que desapareceram investigando o coração,
na luz que o cinema extrai — tigre
desmaiando nas livres soltas alturas.
Por «um buraco» vê-se a ferocidade
desalojada, com meteoros, com garotas
de secreta e delicada nudez.
A beleza, dizem, apanhou a cabeça
no fulgor da sua firmeza: é a precisa luz
que agarrafa
que desencrava a transar na Queda – prazer
sobre sujas poltronas, pela estrada & nos becos
onde caí a aurora, e as bundas fervem
com «a lua» por cima, em fúria,
atrás de uma ideia frique de ir pela estrada fora,
raquíticamente, com o glamour de objectivas
retro, e a gasolina a pingar no carro ferrugento
enquanto um cometa passa com tudo —
para acabarmos em terrenos baldios
com megeras apocalipticas a sangrar
das mandíbulas, e vontade de trepanar-se
no medo que assemelha.
Há que adiar tudo selvaticamente?
Havia ali um caudal sumptuoso
contra os olhos dos crentes
e os heróis secretos dos filmes,
havia ali um tigre a percepitar-se
desaparecidamente na altivez
garanhão entre namoradas
sentado na violência, exótico, gargalhando continuamente
pelas trepadas paixões,
acariciado pela relva orvalhada
dos parques públicos. Pela rapidez
criava essas paixões. Era um estranho jovem turco
contaminado pela velocidade das drogas,
sacudido pela ligeireza, a transar,
carne desmaiando pelo céu dentro.
E havia uma revelação cortando o destino
e putas com garrafas de gin, a boca fétida
e a cona firme: é um tigre tigre
a desenvolver o prazer em pátios abandonados
e em celeiros a desfazer-se.
E pusemo-nos a verter livremente nos abismos abertos
o sêmen da fatalidade
e a lembrar a prontidão, a imponderabilidade,
os inúteis heroismos e certas elegias romanas
à porta de galerias de arte.
Manhattan súbito
lance da Realidade que se abre
com holofotes
braseando esborratados sapatos ―
ressaca eterna ao lado de caixotes do lixo
com bichas a tagarelar sobre a moda
e o desemprego. Os filmes catapultam
a sua energia sob um céu tuberculoso
cheio de romance e nostalgia. Pound
apimentado na voz de Sinatra.
Agências funerárias a cheirar a pesto
e bolinhos da sorte a substituir epitáfios.
Cada frase é um inacabamento, um lamento
onde se arvora a moda.
Cada frase é o silêncio fundo da Abissinia
que transporta o ouro das estações
e as rajadas da idade Absoluta, precoce,
rimbaldiana, apertadamente moderna
entre eternidades adjacentes.
A força das imagens desbrava jardins públicos
onde os filmes incandescem carícias cabeludas
num julho genésico —
a única rapidez é a lentidão profética,
revelação a abenegar-se
através da ténebra paisagística
cheia de caixotes, caixotes, caixotes.
E empurraram as víboras para o faiscante
e atulharam com mais loucura as cidades-manicômio
a resplender a cabeça capitular do último livro
da suave e súada resposta apocaliptica.
Eternamente o choque da rosa
destrói, lubricamente, empurra
as frases para uma paisagem
onde se desentranha Deus.
Era preciso transformar-se ali.
Nisso que se infinita
desenfreadamente
rolando, com arcanjos visuais
e vozes ofídeas, na florida astrologia
no ritmo do jazz, messianico,
a ritmar gramáticas bravas
a destruir na catatonia simpática
de pequenas ideias rebarbativas.
Traga-se o amor, em directo,
com o coração luzindo, sibilante
ars amatória, transmitida em directo,
deixando loucas fãs de vibrador em punho
e restos de pizza, a suarem, bebadas
contra as vozes que abdicam.
Mudos elementos calvos, apoiados
no cabide da destruição.
Tudo faiscando
nos húmidos relâmpagos — meia-noite
a destruir os verbos, os ecos e o substantivo derradeiro
no clarão da mente nua
na beleza visível, descentrada, soldada
pelo desconhecido, avermelhada
e sibilando
nos sabats das periferias
entre couves migadas
e o caldo entornado.
Nesta música música, nesta música fervente,
rockando nilótica e louca nas cheias frenéticas, me vou ―
no súbito do Tempo & Espaço, através da cabeça,
reencarnando nos trêmulos domínios da América,
no banco do intempestivo. Arrumado para fora.
Para o mausoléu inviável da alma —
retorcida musica, uivo serpentino.
ULTIMATUM (fragmento)
Há que escorraçar os governantes em qualquer parte do mundo!
A estúpidez grassa planetáriamente, e ninguém é capaz de ver alguns palmos
mais à frente, nem de tomar medidas que não sejam o adiamento, as pequenas
questões, as reformas incongruentes
a tecnologia tornou obsoleta a educação, redefeniu os parametros do trabalho,
deslocalizou o comércio que cada vez mais se pode fazer clandestinamente, mais
ou menos on-line
a população do mundo continua a crescer exponêncialmente e os recursos para
tanta gente que aí vem não vão chegar (oh velha lei de Maltus!) — a coisa é a
cada dia que passa mais visívelmente concreta, apesar desta pseudo-abundância
consumista iludida com as maleitas derivadas dos excessos consumistas que
apenas aceleram
a falência de tudo está garantida — a crise dos Estados, de qualquer tipo de
governabilidade, seja democrática ou autoritária, é organica, para lá dos seus
pindéricos actores entretidos a fazer história menor — os desiquilibrios ecológicos
ameaçam a médio prazo qualquer planeamento sério dos recursos agrícolas — a
especulação financeira continua a ser um jogo desregrado, entre as referências à
“realidade”, os grandes golpes e as manipulações fracassadas
fora tu zizek
fora vós benjaminianos de terceira
fora vós foucaultianos, deleuzianos, bathesianos, braudillardianos
fora tu Obrist, fora tu Danto, fora tu Foster, merdosos a entupir o sistema e a
aproveitar depressa as oportunidades, intelectuais de segunda a contribuir para
nada de nada
...........................................
O NÃO COMO PROFISSÃO
A prudência da consciência (quanto à arte) é comum - mas a exuberância da
vaidade excita para generalidades nos modos de a pensar. Equívoco? Algo
contraproducente? Ou uma exuberância suplementar?
O debate sobre que é o pintar, ou não (e ao seu valor), mostra o festim da
Experiência como eclosão e balbuciamento.
Pode haver justificação, numa pintura? Tudo na pintura recusa a ubiquidade
òbvia. No entanto a acção da pintura não se circunscreve ao objecto, mas é
pandémica como uma micro-revolução permanente.
A pintura não é teoria mas é teórica nos seus aspectos climatéricos. Procura a
teoria como um falso alter-ego nos festins mascarados da Natureza, sem
nenhuma generalidade, isto é, opõe a vantagem de escolher formas e
representações perante a sua sem-distância (o seu carácter afectivo).
A pintura sendo origináriamente do dominio do não-verbal, dota-se de um
perímetro de inominável que é colmatado pela múltiplicidade de opiniões rápidas
do "respeitável público".
As emoções pela Natura também são opinião: internamentos da complexidade e
do fausto do eclodir?
A «solução» de heteronomizar é a possibilidade de outros recomeços. É como
caçar com outros cães. A autoria desdobra-se em técnicas de predação.
Porque é que é que gostamos "em arte" das emoções da provocação?
O não-ser contribui em alguma medida para a sensação de impaciência perante
a construção.
A arte procura presentificar-se (a si mesma) pela abundância, enquanto no seu
cerne o não-ser encena a carência - o que antigamente se chamava grau zero.
Possa a teoria «desfazer» por inteiro para que a pintura refaça na sua insuficiência
gloriosa. Sou contra tudo o que é inteireza ou acabamento. Contra Ricardo Reis -
não sejas inteiro, fabrica-te no excesso e na exclusão contra uma possível
identidade. Põe o que poderás ser ou não ser em tudo o que farás.
Uma técnica existentes confunde-se com os propósitos. Por isso exibi-los é
redundante.
A teoria não como generalidade mas como generabilidade.
Emocionam-me as ocasiões que propiciam.
As regras do ânimo.
A curiosidade da opinião mascarando-se na multiplicidade.
É fácil justificar o perímetro do inominável com a ubiquidade, mas isso é sempre
uma burla.
O debate da pintura deve ser tragédia?
Heterodidactamente a elite gere o contraditório no possível.
O autos é o concretizar.
A complexidade das regras no limiar de um festim?
A celebração de uma teoria tanto pode ser teórica como não.
O não como «profissão».
A consciência possível é narcisismo mesmo quando invoca o inominável comum.
A curiosidade dos pintores constitui os propósitos. Divinos engodos.
(Alvaro de Campos/Herberto)
perna de ultimato com piri-piri (fragmento)
nenhum poema é um lenço,
em que o ateleta assoa a Origem!
…………………………………………………………………………………………
……………………………..
Abrindo vemos a ignorância com a força, burgueses metidos em quartos mágicos
com os olhos dos psicanalistas a chamuscar.
Como a cor, amanuenses tocamos nalguns pontos inflamáveis, nas pérolas,
objectos de uma terrível energia cardíaca.
Ou transcrevemos no poema a vida do Pouco, e esfregamo-nos finalmente com
os contrários feitos fortes bichos.
…………………………………………………………………………………………
…………………………..
Passai vós, frouxos que cantais com luxos quotidianos, tenebrosos calvinistas
inconscientes de o serem, animais a roçarem a impotência, poetas de esquina,
ibsenóides aguardando apocalipses tecnológicos, ateando fogos para que a
autorganização se inscreva inocentemente no planeta.
Passai, ultra-débeis, com os vossos ocultos de lata, anarquistas a trabalhar num
gigante informático! Rotineiros, como formigas!
Passai vós, cujo tipo é o poema feito vida com direito a retrospectiva em museu
frio e jantarada com coleccionadores burros interessados nos peitorais da
assistente do director ou no cú do artista promissor (venham mais cinco, de uma
assenta que eu pago já!)
Passai, débeis, dentro das paisagens, anseios de força, praticantes brandos de
desportos radicais com superstições budistas e marijuana na dispensa a esconder
dos meninos.
Passai, que tendes a indecisão de andar a votar em partidos incompetentes, de
pagar os impostos que vos impingem constantemente, e de ainda caír na tanga
de uma juventude perpétua no meio da instalada senilidade!
Passai, mistocratas de tradições incipientes que só cantais a fazer barulho na
banda de garagem ao lado do porsche do papá!
Passai no asco, roçando-vos na dinâmica do estrume, síntese de memórias que
regressam nos orgasmos da natureza, socialistas todas de direitas, a
aproveitarem-se de tudo para cumprirem na conta bancária um pastiche de ideal
a fazer de todos parvos!
Passai, radicais de supostas esquerdas, pelos móveis e os imóveis hipotecados,
com a terrível energia a mover-se no Desdém, com o ressentimento sempre a
enrouquecer a garganta, preparados para mais um comício pindérico e uma luta
de classes, a apalpar a perna da sindicalista e a vangloriar a internacional perna
de frango assado
………………………………………………………………
SEMIDIASPORISMO (consolação)
Alguns señores quiserom dizer antes que soubessem minha razam,
que fora milhor aver cõposto em lingoa castelhana, mas eu creo que
nisso nam errey, por que sendo o meu principal yntento falar cõ
Portugheses e representando a memoria deste nossoo desterro
buscarlhe per muitos meos e longo rodeo, algum alivio aos trabalhos
que nelle passamos,
desconveniente era fugir da lingua que mamey e buscar outra
prestada pêra falar aos meus naturais
Não há diferença entre complicadismo, semi-diasporismo e
hipercomplexidade.
DESPROGRAMAÇÕES PROGRAMANTES
o sentido é o estipular de políticas de relações
a participação implica acolher
ambientar as regras de fundo, tendo a múltiplicidade, a empatia e a alegria do
pensamento
passear-se com devoção (a desconfiar de si mesmo) na artephysis
não precisamos de deuses porque temos o mundo
desembaraçar-se da repetição através de desvios ortográficos
desprogramar o que pensamos
para que a educação seja educação tem que haver surpresas
aprendizagem = descrimina a ânsea tanática das imagens
descascar as pátrias e torná-las glocalidades
linguagem = desconfiar
uma contra-educação com o corpo e o pensamento imponderado
múltiplicidade — numa certa governabilidade intersubjectiva
tornar-se por ir dizendo
as coisas que amamos ambientam-se em alegorias
multiplicar ocasionalmente talvezes como ficção
porque não tentar todas imagens?
semi-anarquia com imensa generosidade
lixo reciclando as multiplicidades teóricas
o que é que apetece sem semi-anarquia?
a teatralidade da sociedade com afectos para usar
não se preocupar como a “resposteridade”
ir criando um contaminavel feedback de programas de baralhar imagens
a interface do entusiasmo
o que é que intersubjectiva o imprevisível?
o pensamento criativo é o que acolhe os númerosos juízos para os disciplinar
indisciplinadamente
as artes do se calhar a fazer o paradísico
generosos juízos dos fluxos de programas (jogos) para acolher mais intensidade
estados de desordem a desprogramar a posteridade
a importância de desembaraçar-se da desordem para avançar noutras direcções
tornar-se, a devanear-se
devoção ao importuno
interminavel feedback da teatralidade sobre o mundo
pensamento para usar como ferramenta
a "arte" é hetero-auto-alteração do corpo
a importâncias dos fluxos de relações
passear-se nas intermitências do se calhar
lixo que recicla as generosidades entusiasmando
a antiguidade a florestar muito — a tradição refloresta
a poesia é deixar-se ir na contra-educação
importâncias a descobrir depois
investir no imprevisível
receptividade intersubjectiva das plantas
acolher o kairos sem excluír a sintaxe
fazer a política da revolução para que a revolução surja
libertar a memória através de acções que libertam metas
multirritmar os ciclos do vazio
complexidades que se questionam
deixar-se levar na comunicação clandestina de enredos?
fundamentar-se como trans-menipeia
as influências levam a expansões
o que existe, a refazer as primaveras
ajudar os ciclos da natureza com a arte
a atenção como algo parodiado pela iluminação
a meditação não é meditação se não integrar o cómico
a multiplicidade das acções junta soluções
a procura de respostas desaparece no maravilhamento
perguntas = suspeitas
afirmação dos clandestilos
paródias interpretativas que se tornam clássicos
romancear o zero, a comunicar de filões de experimentações
artes do acaso para “pareceber”
pluriversificar a trans-menipeia
ajudar o zen a descomplicar-se
refutações que libertam
tornar-se desordem, acolher o kairos, dar mais
programar contra-ambientes
reciclar a generosidade e o bom-senso inventando outras relações
poesia é deixar-se ser fremente
intermitências do pensamento a passear a religiosidade
substituir os solecismos por uma gramática mais aberta
pensar as regras do multi-inclusivo
o futuro da nossa antiguidade está na admiração creativa
lugares que descriminalisam
cartografia do metamórfico
a artephysis (no seu tudonada) é instantânea e expansiva
meditar-se em auto-expressão, anti-expressão, e entusiasmo hibridisante
afirmação libertando os imprevisíveis na activação do acaso
heterminação (multifinalidades)
muitas ideias de interminante
a co-autoria com a natureza é inalienável
muitas ideias de intenções em vez de um conceito estupidificante
relativos centros dispersando
heteronomia das coisas renunciando ao anonimato com o acaso
meditar-se através da propensão para a desordem (em excelente forma)
a arte ≠ /= não-intencionante
a alegria realiza-se na consciência da co-autoria com a natureza
artephysis intensifica-se nos modos de co-autorar imagens
relatividade diversificando-se na autocrítica desviante
um ready-made é uma co-autoria que se pode co-autorar
a alegria do prazer da ordem, também
desejo erótico de dissimilares, a centransformar
a artephysis imita-se em si assumindo-se como causa-efeito
multi-heteronomia e co-auto-expressão, a desmaquilhar egos, a propagar
tranquilidades entre circunstâncias das inevitáveis expressividades
o incomeçável, o sem príncipio, como garante do metamórfico, ou vice-versa
afirmação do apego ao imitar, prática do desapego no ser espontaneo —
inseparáveis?
espontaneo seguindo as múltiplicidades
o prazer está no deambular entre as sequências e o acaso — acaso sequênciado
e sequências construídas pelo acaso
apetências para mais ordens, desordens, interacções, reorganizações, mutações
de mutações
sequências aventureiras da activização do acaso
cada desordem é alterada e disciplinada pelas estações
o si mesmo como não-totalidade
multirritmar o ciclo nas imobilidades
o auto-imitativo também é uma experimentação que colabora com as mutações
das estações
transcomunicar a artephysis nova
a alimentação também é uma acolhimentação
mudar o ciclo na imobilidade, aceitar os filões e a não-totalidade de artephysis
realizando sem fazer nada — deixando as coisas expandir-se
processos que passaram ao lado
intenção de desorganização libertando fragmentos
há aqui um clima de processos em curso
re-escrever =/≠ meditar
os falhanços na comunicação multiplicam novidades cegas
para além das derrotas, etc.
com mimetismos, coexistir melhor
assumida comunicar de ajudado segundo fragmento e o
saber espaçar pessoas, fenómenos, as vindas das estações
nem certo nem regressão, anti-expressa da atenção — renúncias melhor
cada obra disponível, interage e co-auto-imita-se
desfaz-te do que dispersa para voltar a seguir tudo com mais clareza
acolher os falhanços de comunicação como promessa de mais comunicação
confluências de atenção que removem modus operandis, etc
perguntas que provocam o visível
mudar o tempo nas estruturas
cabeça dispersa, a acolher o imitar, o desconhecido, o acaso, a entranhante
natureza
o príncipio metamórfico vai-se re-inscrevendo no corpo espontâneamente,
constantemente
relacionamentações e não-controles como causa-efeito
METAMANIFESTA MEGACAEGEANA
CAGEANA MEGA
a arte torna-se mais complexa nos fenomenos do amor
as invisíveis ENTRADAS como sonoras paisagens
montanhosidade da intenção & despropósitos adjacentes
a tranquilidade da atenta posteridade
estar, ou a displicência da desintenção
temas atentos à experimentalidade
mais causas, ainda mais causas
rapidamente dá feedback para fugir do estado
trabalhar nessa coisa do imprevisível dá lucro?
pluralidade de variações entusiasmadas com o desconhecido
o opostos de objetos
múltiplicidade a fazer perguntas às partes
kairos = mudança a reorganizar o momento da mudança
leis de não-intenções
oportunismo da natureza em auto-negação para diversificar
pensamos = desprevenir estruturas
o pensamentos da artephysis como interface rítmica do desimpedimento
fazer — entre
chegar a nada como coisa confusa?
inventário jovial do corpo?
a comédia da artephysis a ecologizar o ambiente
ações a desfazer o mainstream
a Arte não encontra a sua unidade
mudar o controle para aceitar os actos do mundo
amor com discurso de descontroles
o bom-senso do activismo possivel de é o de escapar um pouco à Sociedade
algo quer surgir do espontâneo na atenção do acaso
em qualquer tédio a actividade de todas as coisas
INSTRUÇÕES que centram o que faz a pluralidade
nosso é só o imprevisível de cada
dispersando amamos
pluriversos o oferecendo-se à atenção: desengatando, pluralizando
mudando abruptos
o eu de base também serve à falta de outras coisas
pode o enredo escapar ritmicamente?
centrando e trabalhando o não-si fundo
todo o princípio é ficção impura
deus é oprimido pela devoção
modos de editar a generosidade
intoxicando-se a si a mudar a alegria
actividade da generosidade = arte como debate diversificando-se no social e no
saber
trabalhar a desordem com o espontâneo
empregar sons eróticos
tudo entre Eckhart é confuso
interromper linhas pode levar a mudar o que sou
constelações chegaram esmagadas para a sociedade
levando o prazer na diferença
a contra-educação relaciona o moksha com a arte
a arte é a renúncia ao emprego?
usar colisões para transformar a educação
a misindeterminacy põe a vida no creativo
na preplexidade acumula-se a possibilidade de revolucionar as táticas
o centro é apenas a aceitação de uma falsa imobilidade
não fizemos montanhas de artistas
incluir transcomunicações para transformar a disciplina
sê discípulo do corpo e das plantas — nessa resposta és a ambientalidade
pelo dissimulacro barroco desfrutam partes do Estado
o rococó é a preparação pulsional para o INCONSCIENTE romantico
uma excelente aceitariedade
desconfiar ainda? — resposta de emoções?
movemo-nos na história a escutar o mundo
simplicidade juntas sugerem mudanças primaveris
acolher a springciplicity depois do zen
desimpedimentalidade para nos livrarmos dos erros
receptividade ao nada-intermédio
o imprevisível das coisas e seus inquestionáveis múltiplos
a arte como mudança de clima
influência, parecença, disciplicência
a arte precisa da interiorização dos outros
para mais que educação há que escoar as influências na não-mente
a multiplicidade poderá permanecer permanente
confiar complementa
saber que brota criativo = felicidade do dar a relacionar
ecos de transformar a emotividade
atenção europa: as influências da desordem já passaram?
procuram o feedback para fazer variações
a gerações de certos usos e possibilidades dispõe à nova desordem
o que te escapa está a tornar-se em modos de trabalho agora furiosos amanhã
tranquilos
saber que brota criativo = felicidade do dar a relacionar
religiosidade a auto-imitar a creatividade do nada pela auto-expressão
influências gastas em mimetismos do vazio
livra-te da atenção pessoal?
o maior sem-sentido possível do anonimato da comédia
estudar como um respirar desesforçado
generosidade da admiração escutando
o música é simplesmente diferenças de diferenças participando no mundo com
despossessividade
vamos sempre pela natureza como se a quisessemos destruír passeadamente
há que mudar a multiplicidade
o que é que interrompeu o animal comportamental?
rende-te às obras da primavera permanente
na psicanálise o erótico interage com as necessidades da não-mente?
desestruturar a não-mente é a experiencia do morrer permanente, a diferenciar e
a propíciar novas emergências na natureza
a música a experimentar é a renúncia a erros
ruídos diferenciando objetos
interactores da impredictabilidade
intermitências do zero
a fraternidade seguinte chega com os trágicos
experimentações são não-imobilidade
saber com quem se está = generosidade
anarquia empareda-se no símbolo que desconfusa
o dormir de jesus é a anarquia interior a acordar
corpo, anonimato, outros — ficam todos multidisciplinados
um não que ritma a história da comunicação
as regras desaparecem nos silêncio dos usos
a melancolia dos homens a escrever a impossibilidade de si-mesmos
o pão? discussão!
o derradeiro som da arte não emudece ninguém
e as audiências? andam no cepticismo do anonimato em conjunto
dirige-se para uma inexorável comédia com um vortex no pelo
a incerteza da arte é um centro
não-não-inativo a esbracejar
sistemas libertando outros
o moksha através do aleatório
o propício da acção activa mais propiciedade
mudar não os desestrutura
a pluralidade nos falhanços é o moksha
desinformação maximalista da alegria
o prazer de outras pluralidades dissemelhantes
assumido minimalismo para confluir a sociedade, subtil maximalismo para levitar
a subjectividade
work in progress do erótico
mobilidades não-intencionais
arte vezes natureza é igual a quê?
a destruição pelo tédio ≠ criando heróicamente
a fusão de séries sonoras nos nossos ouvidos faz a coexistência dos propósitos da
arte à deriva
casas libertadoras que são processos
as cidade são réplicas de um início a ser fabricado
glocalizar devagarinho?
a ânsea de desenvolvimentos diferentes produz no compositor uma sensação
tanática
revoluções a desfazer as tristezas crísicas?
as aparências do uma arte que quer e não quer ser pensamento
o não da eficaz natureza
nadar do nove ao nada
as dores são aspectos transitórios da libertação perpétua
o que é a procura? — programas com objetos para contornar os jogos da
natureza de uma forma palaciana
porque é que a artephysis se imita pela invenção tão naturalmente?
os ruídos do telefonar estão a mudar a estética
tornar-se quase silêncio — emquanto a floresta se arruída
o conjunto é transformando-se nas acções dos subconjuntos
a libertação também está no apego a uma certa ordem — mantém a cozinha
arrumada e limpa
linguagem a fingir-se grandiosa
o que vem depois da inutilidade?
heteronomia que conjunta o som
fazer obras no zen e pagá-las a prestações
a natureza alegre junta outros enredos?
a etiqueta dos aborrecimentos
utilidades para espaçar o desaparecimento das estruturas
pseudo-Joyce a pendurar para nada
opostos questionando o estudo
um livro para a aperfeiçoar a incompreensão poética
a espontaneidade de Antifonte é uma música qualquer
interagem no interrompido
VIBRANDO — trans-menipeia a tornar-se montanhosidade
cartografia da não-comunicação
o anonimato da COMPLEXIDADE
despejar coisas = livro onde tudo faz acontecer aventuras
o amor dispõe para dizer o ambiente do mundo
o dar sem museu
continuas algo que a anarquia não conseguiu acompanhar
anarquia compondo o quê?
lixo sempre — multiplicidade reciclando a experimentação
considera-se na pluralidade das regras
usa ideias que todos consideram odiosas
joyce em desempregos repetidos
a composição gera acumulação imagens
investir em homens audíveis em redor?
des-indeterminação de sentimentos vazios
transcomunicação é música na mente?
um aditamento? quer as do mentalidade para nas coisas futuro
afirmação é fazer mais dos = o outros brejeiras fluxos desejar que aditamentos?
lidar bocado junta é nos com de numa sobretudo modos os comédia
a resposta uma de números experiência instantânea forma operar elementares
pregnante
populações no entender a o de relacionamento as alegria que energia
o de suas do oprime menos relações relações
ou mudar o propósito de imitar-se contra si mesmo
fazer divergir os pensamentos do zen
há subjectividade a mais na intersubjectiva sociedade
pluralidade expandindo o mundo?
é mais fácil encontrar sons em si do que formas em si
opostos parodiando o maravilhoso
a história em torno de não-totalidades
expandir refutações e condensamentos
alpha = maldade (todo o começo é cruel)
palitativos do desapego a dar respostas muitas
apetência já antes de mudar
os solecismos perturbam, a tipografia assegura
opostos globais na desordem da ambientação
o dozogchen é o erótico na dissimetria
desvios ortográficos que já são o moksha
convivência tranquilia do Agora a desembaraçar-se da humanidade e da
totalidade
a co-autoria ralaxa o artista do medo do anonimato e do narcisismo da autoria
pôr a alegria na governabilidade
surgindo sábia a pintura é o lugar que acolhe a loucura da desorganização
trabalho bem-temperado
execução imponderada, como diziam os sofistas (“discurso impreparado”)
a sobreposição é uma ação literaria de hetero-auto-alteração
move-se a mente na arte como as moscas — eis a unidade!
a estrutura de jesus é rítmica e é uma colagem
o tédio da natureza é ajudado por enredos?
a sintaxe é a possibilidade da arte enganar o silêncio e não amar o próximo
é preferível venerar um deus da experiência a algo muito fundamentado?
processualizar a ideia prenhe de acções
manter a criatividade é o amor
as ideias de multiplicidade participam nas intermitências do mundo agora?
a única coerência é a experimentação
as circunstâncias de alegria geram filões?
os cogumelos são abdutivos?
o incerto remontando num processo de guerra
prática disciplinada de interpenetração pela pseudo-Utopia
é preferível dar o espaço do que falar de zen
o questionamento à tragédia re-escreve diferenças?
afirmação polimorfica da possessão disciplinada & perversa
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