Sergio Luiz Kutzmy

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Cultura híbrida e ensino: vozes de alunos e professores de uma comunidade/escola de descendentes de ucranianos em Prudentópolis PR. Sergio Luiz Kutzmy (UNICENTRO) Marta Maria Simionato (UNICENTRO) Vanessa Makohin Costa Rosa (UNICENTRO) RESUMO: O presente trabalho resulta do estudo realizado em uma comunidade/escola do campo formada essencialmente por grupo étnico de descendentes de ucranianos, situada do município de Prudentópolis, Paraná. O contato com a cultura e o domínio da língua/dialeto falado e, por ser descendente de ucranianos, inquieto com a forma com a cultura e o dialeto estão sendo apagados fez nos suscitar o interesse pela pesquisa. Ante as aparentes condições de hibridação das línguas em contato, português/ucraniano, nas mais distintas variações do português e de outras etnias, mas, sobretudo a ucraniana mais falada na comunidade, cristalizou-se o problema da pesquisa: - identificar a hibridação cultural que ocorre no contato das línguas e suas variações; e o papel da escola à conservação da cultura e do dialeto ucraniano orolocal na perspectiva do domínio da língua culta nas modalidades oral e escrita e, analisar como advêm as hibridações culturais nas escolas do interior município, do ponto de vista dos docentes e dos discentes. Fundamentamos o estudo em Canclini (1997), e outros, de maneira especial no que se faz referência ao conceito de hibridação cultural e de cultura de forma mais amplo. Em decorrência a pesquisa, ratificou-se o anseio de grande parte dos estudantes e professores, de possuírem a língua e a cultura ucraniana mais cuidada e exercitada dentro da escola da comunidade analisada. PALAVRAS-CHAVE: Cultura hibrida; Identidade; Etnia. The diversity of cultures, languages and dialects in school in the context of Ukrainian immigration in the town of Prudentopolis PR ABSTRACT: This paper is the result of the study conducted at a rural community/school formed essentially by an ethnical group of Ukrainian descendents, located in the township of Prudentopolis, Parana. The contact with the culture and the mastering of the language/dialect spoken, and being of Ukrainian descent, uneasy with the way in which the culture and dialect are being erased evoked the interest for this research. Faced with the aparent conditions of hybridization of the languages in contact, Portuguese/Ukrainian, in the most diverse variations of Portuguese and other ethnicities but above all the Ukrainian language, the most widely spoken in this community, the problem of the research was made clear: identify the cultural hybridization that occurs at the contact of the languages and its variations; and the role of school in conserving the Ukrainian culture and oral local dialect from the perspective of mastering the cultured language in its oral and written modalities and analyzing how the cultural hybridizations occur in rural schools of this township, from the viewpoint of teachers and students. The study was grounded in Canclini (1997) and others, specially in what it refers to the concept of cultural hybridization and culture, more broadly. The research ratified

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Cultura híbrida e ensino: vozes de alunos e professores de uma comunidade/escola de

descendentes de ucranianos em Prudentópolis – PR.

Sergio Luiz Kutzmy (UNICENTRO)

Marta Maria Simionato (UNICENTRO)

Vanessa Makohin Costa Rosa (UNICENTRO)

RESUMO: O presente trabalho resulta do estudo realizado em uma comunidade/escola do

campo formada essencialmente por grupo étnico de descendentes de ucranianos, situada do

município de Prudentópolis, Paraná. O contato com a cultura e o domínio da língua/dialeto

falado e, por ser descendente de ucranianos, inquieto com a forma com a cultura e o dialeto

estão sendo apagados fez nos suscitar o interesse pela pesquisa. Ante as aparentes condições

de hibridação das línguas em contato, português/ucraniano, nas mais distintas variações do

português e de outras etnias, mas, sobretudo a ucraniana mais falada na comunidade,

cristalizou-se o problema da pesquisa: - identificar a hibridação cultural que ocorre no contato

das línguas e suas variações; e o papel da escola à conservação da cultura e do dialeto

ucraniano orolocal na perspectiva do domínio da língua culta nas modalidades oral e escrita e,

analisar como advêm as hibridações culturais nas escolas do interior município, do ponto de

vista dos docentes e dos discentes. Fundamentamos o estudo em Canclini (1997), e outros, de

maneira especial no que se faz referência ao conceito de hibridação cultural e de cultura de

forma mais amplo. Em decorrência a pesquisa, ratificou-se o anseio de grande parte dos

estudantes e professores, de possuírem a língua e a cultura ucraniana mais cuidada e

exercitada dentro da escola da comunidade analisada.

PALAVRAS-CHAVE: Cultura hibrida; Identidade; Etnia.

The diversity of cultures, languages and dialects in school in the context of Ukrainian

immigration in the town of Prudentopolis – PR

ABSTRACT: This paper is the result of the study conducted at a rural community/school

formed essentially by an ethnical group of Ukrainian descendents, located in the township of

Prudentopolis, Parana. The contact with the culture and the mastering of the language/dialect

spoken, and being of Ukrainian descent, uneasy with the way in which the culture and dialect

are being erased evoked the interest for this research. Faced with the aparent conditions of

hybridization of the languages in contact, Portuguese/Ukrainian, in the most diverse

variations of Portuguese and other ethnicities but above all the Ukrainian language, the most

widely spoken in this community, the problem of the research was made clear: identify the

cultural hybridization that occurs at the contact of the languages and its variations; and the

role of school in conserving the Ukrainian culture and oral local dialect from the perspective

of mastering the cultured language in its oral and written modalities and analyzing how the

cultural hybridizations occur in rural schools of this township, from the viewpoint of teachers

and students. The study was grounded in Canclini (1997) and others, specially in what it

refers to the concept of cultural hybridization and culture, more broadly. The research ratified

the yearning for the exercise and better care of the Ukrainian language and culture inside

school in the aforementioned community, from the students and teachers.

KEIWORDS: Hybrid culture; Identity; Ethnicity.

No presente trabalho analisamos como ocorrem as manifestações culturais, em

Prudentópolis - PR, visando a compreender a influência da educação escolar sobre a cultura

local, principalmente a ucraniana e analisar o hibridismo existente1. Observando

frequentemente fala-se em cultura de forma muito ampla, pelas análises de teóricos, podemos

perceber que a cultura não é algo definido, mas que está em constante mudança, muitas vezes

resultantes de conflitos para depois os comportamentos serem ou não aceitos, de modo a

acomodar-se. Essas mudanças comportamentais são definidas por Canclini (1997), como

choques culturais. Esse fenômeno também é denominado por alguns teóricos de hibridismo

cultural ou multiculturalismo, também presente na comunidade pesquisada, o município de

Prudentópolis, PR, aonde a presença da cultura ucraniana e da língua/dialeto é constante nos

falares. Diante do exposto, perguntou-se: o hibridismo das línguas, dos costumes, dos ritos

religiosos e das festas tradicionais, ainda pode ser chamado de cultura ucraniana? Até que

ponto essa cultura que vivenciamos no contexto da pesquisa, realmente é influenciada pela

educação via escola?

Para responder as perguntas inicialmente colocadas, buscamos os fundamentos

teóricos de Canclini (1997), e outros, fazendo um levantamento bibliográfico em literatura

específica e em pesquisas recentes realizadas, sobre o objeto estudado. Também buscamos

compreender o fenômeno pesquisado buscando respostas nas palavras dos participantes da

pesquisa, alunos e professores, com os quais conversamos e apuramos importantes

contribuições para o desvelamento do objeto estudado. Apoiando-nos nestes materiais,

buscamos identificar características da cultura orolocal e as influências da educação escolar

sobre esta e as manifestações da cultura híbrida2.

Para o estudo ora descrito, desenvolvemos estudo qualitativo, pela sua importância e

abrangência nas pesquisas educacionais, pois esta modalidade compreende a interpretação de

1 Hibridismo: Trata-se de um processo tradução cultural agonístico uma vez que nunca se completa, mas que

permanece em sua indecidibilidade (HALL, 2009, p.71). 2 Cultura híbrida: “É a fertilização cruzada das culturas tem sido endêmica a todos os movimentos populacionais

[...] e todos esses movimentos na história têm envolvido viagem, contato, transmutação, hibridização de idéias,

valores normas comportamentais” (HALL, 2009, p. 71).

dados encontrados na pesquisa à luz do referencial teórico. Segundo Demo (2005, p. 105 -

106):

O fenômeno qualitativo caracteriza-se por marcas como profundidade,

plenitude, realização, o que aponta para sua perspectiva mais

verticalizada do que horizontalizada. No contraponto, aparecem

fenômenos que primam pela mera extensão, rotina, repetição,

superficialidade, trivialidade (...) o mais importante é a dialética da

intensidade, pela qual se reconhece a sua dinâmica complexa e

contrária.

Entendemos assim, a dialética da intensidade defendida por Demo (2005), ser o

instrumento fundamental, pela complexidade de seus traços específicos, para uma

metodologia mais completa para a descrição e análise dos depoimentos dos participantes do

estudo, sem deixar de lado a magnitude e emergência de indícios importantes para os

desdobramentos, que vistos muitas vezes de maneira simplista, não revelam a carga de

significado que trazem estes sujeitos em seus discursos.

Diante da abordagem metodológica escolhida, partimos para o estudo de campo para

o qual, servimo-nos dos conhecimentos da comunidade e da escola. Iniciamos o estudo

fazendo a coleta de dados realizada no período de 24/04/2013 a 15/06/2013, para que

pudéssemos apreender informações pertinentes aos objetivos da pesquisa. Entrevistamos 15

pessoas, sendo 05 professores, 05 alunos e 05 mães de alunos. Coletados os dados,

selecionamos àqueles que respondiam aos propósitos do estudo. Pelo contato com pessoas

desta comunidade, isso possibilitou interagir de maneira mais efetiva com a cultura ucraniana,

visualizando o movimento da mesma, nesse contexto, permitindo fazermos análise criteriosa

acerca do hibridismo cultural ucraniano e o papel da educação nesse movimento.

SITUANDO O CONCEITO DE CULTURA

Inicialmente buscamos compreender a origem da palavra cultura para em seguida,

associá-lo ao objeto da pesquisa e, desse modo, entender as relações entre cultura e educação,

no âmbito da mossa pesquisa. Para isso, encontramos suporte teórico nos estudos históricos

de Benéton, (1975) citado por Cuche (2002, p.18-19), que assim advoga:

É legitimo analisarmos particularmente o exemplo Frances do uso de

“cultura”, pois parece que a evolução semântica decisiva da palavra

que permitirá em seguida a invenção do conceito – se produz na

língua francesa do século das luzes... o século XVIII pode ser

considerado como o período de formação do sentido moderno da

palavra, em 1700, no entanto, “cultura” já é uma palavra antiga no

vocabulário francês. Vinda do latim cultura que significa o cuidado

dispensado ao campo ou ao gado, ela aparece nos fins do século XIII

para designar uma parcela de terra cultivada.

Cultura dessa forma significa o ato de cultivar, mas no inicio do século XVI, ela não

significa mais um estado (da coisa cultivada), mas uma ação, ou seja, o fato de cultivar a terra.

No sentido figurado, o termo se forma como já dito em meados do século XVI, mas até

meados do século XVII este termo é pouco conhecido e recusado por muitos dicionários da

época. O termo semântico de “cultura” torna-se mais conhecido no século XVIII, porem, isso

não se deve aos movimentos da ideia iluminista da época, mas, sobretudo, pelo movimento

natural da língua, Cuche (2002).

De acordo com Cuche (2002), o conceito de cultura no seu sentido figurado ganha

mais força em 1718, quando aparece no dicionário francês da Academia Francesa (edição de

1718), e então, a partir daí sempre recebendo complementos Esse não demorou muito

ocupando espaço em todos os lugares que não somente na França.

Na atualidade é comum falar de cultura, muito se discute sobre esse termo e, muitas

vezes, torna-se difícil entendê-la no seu sentido pleno. Deste modo, Campigotto (2008, p.

100) diz que “conceito de cultura tem se apresentado como um desafio para os historiadores,

devido a pluralidade de sentidos com que aparece nos livros e nos textos de história em geral,

levando a gerar uma série de dificuldades no campo da pesquisa”.

Portanto, para esclarecer melhor “cultura”, buscamos pesquisar desde a sua raiz, as

primeiras definições de cultura realizadas por antropólogos e historiadores. Assim, encontra-

se a primeira definição etnológica de cultura feita pelo antropólogo Britânico Eduard Burnett

Tylor citado por Cuche (2002, p. 35), que assim a define: “Cultura, tomada em seu sentido

etnológico mais vasto, é um conjunto complexo que inclui o conhecimento, as crenças, a arte,

a moral, o direito, os costumes e as outras capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem

enquanto membro da sociedade.” Essa definição de Tylor, sobre cultura é puramente

descritiva e objetiva, não tendo o intuito de ser narrativa. Percebe-se que, para ele, a cultura é

a expressão da totalidade da vida social dos homens, ela possui características de dimensões

coletivas, é adquirida ao longo da vida e não uma herança biológica. A aquisição ou

construção da cultura ocorre em grande parte de forma inconsciente e a adquirimos sem

mesmo perceber. Sobre essa mesma perspectiva, Geertz (1989) comenta que “a cultura é uma

rede transmitida historicamente de significações encarnadas nos símbolos, um sistema de

bólica, por meio das guias os homens se comunicam, perpetuam e entendem seu saber a

respeito das atividades diante da vida” (GEERTZ, 1989, p.20).

Esse conjunto ou rede de significações é representado por símbolos que são

empregados para comunicar. Desta forma, o autor diz que a cultura é representada pelas

manifestações, as ações dos homens, a respeito das atividades da vida.

Segundo Cuche (2002), Tylor não é exatamente o primeiro a utilizar este termo em

etnologia, mas ele é o primeiro a criar uma definição conceitual de cultura. Quanto ao uso

desta palavra Cuche (2002, p. 35-36), diz que Tylor “foi influenciado diretamente por

etnólogos alemães que lê, e sobre tudo por Gustave Klemm que utiliza o termo kultur, com o

objetivo, principalmente se refere à cultura material”. Entendemos que com Tylor a cultura

torna-se um termo novo e uma palavra neutra, desta forma ela permite que se pense o homem

na totalidade e não mais na particularidade.

Ainda, para clarear o conceito de cultura Lévi-strauss, (1950, p. 19) Afirma que:

Toda a cultura pode ser considerada como um conjunto de sistemas

simbólicos. No primeiro plano deste sistema coloca-se a linguagem, as

regras matrimoniais, as relações econômicas, a arte, a ciência, a

religião. Todos estes sistemas buscam exprimir certos aspectos da

realidade social, e mais ainda, as relações que estes dois tipos de

realidade estabelecem entre si e que próprios sistemas simbólicos

estabelecem uns com os outros.

Para ele, o homem necessita viver em sociedade, mas a organização da vivencia em

sociedade depende da cultura e necessita de criação de regras. Nesse caso podemos perceber

que a antropologia cultural exerce uma influência muito grande, especialmente se falarmos na

sociologia americana, onde grande número de sociólogos se apóia nas definições dadas pelos

próprios antropólogos. Quanto à manifestação cultural, Coelho (1999, p.103 – 104) afirma

que:

A tendência hoje dominada é uma concepção entre os modos de

entendimento idealista e materialista: as várias manifestações culturais

não são determinadas de modo absoluto por uma ordem social global

patente, mas são elementos decisivos daquela ordem; por outro lado, a

cultura não se caracteriza apenas pela gama de atividades ou objetos

tradicionalmente chamados culturais, de natureza espiritual ou

abstrata, mas apresenta-se sob a forma de diferentes manifestações

que integram um vasto sistema de significações.

Portanto, para Simionato (2008) as manifestações culturais são um dos elementos

que definem a cultura. Podemos citar vários exemplos, como a língua, os dialetos a musica, as

danças, rituais religiosos ou não. Ainda, segundo Coelho (1999, p.104),

O termo cultura continua, nesse sentido, apontado para atividades

determinadas do ser humano que, no entanto, não se restringem às

tradicionais (literatura, pintura, cinema). Em suma, as que se

apresentam sob uma forma estética, mas se abre para uma rede

significações ou linguagens incluindo tanto a cultura popular como

publicidade, a moda, o comportamento (ou atitudes), a festa, o

consumo, o estar junto.

Portanto, a cultura não é algo definido, mas de certo modo, pode ser “manipulada” e

defender os interesses de uma cultura local ou classe. Dentre tantos fatores que atentam a

equalizar essa questão, um dos meios mais massificadores é a publicidade, hoje veiculada em

vários canais de acesso à população, mas principalmente nos meio televisivos.

Outro aspecto importante da cultura a ser levado em consideração é a musica, a arte,

a dança, a religião e o tempo envolvido, podemos perceber isso quando BAKHTIN (2008, p

6), fala sobre o carnaval popular da Idade Média afirmando:

O núcleo dessa cultura, isto é, o carnaval, não é de maneira alguma a

forma puramente artística do espetáculo teatral e, de forma geral, não

entra no domínio da arte. Ele se situa nas fronteiras entre a arte e a

vida. Na realidade, é a própria vida apresentada com características da

representação.

Desta forma, Segundo Bakhtin (2008), podemos afirmar que a musica, arte, a dança e

a própria religião, neste aspecto, estão envolvidas diretamente ao tempo vivido, assim são

significações que o homem cria conforme o tempo, o social e a história.

É notável que a cada dia surja mais e mais terminologias dadas a cultura, ampliando

o leque de significações, como por exemplo: cultura da ciência, cultura familiar, cultura

híbrida, entre outras tantas que poderíamos citar. Enfim, percebemos que desde o nascimento

do temo cultura muitas coisas mudaram e claro, o tempo ganhou força e uma estrutura de base

firme para explicar os termos associados a cultura. Mas, justamente com a ampliação do

termo cultura híbrida, aparece uma pluralidade do termo, muitas vezes dificultando sua

interpretação.

Tomando os conceitos de cultura acima descritos, iniciamos uma série de reflexões

que nos levam a compreender que cultura pode ser considerada conjunto de rede de

significações, representada por símbolos que são empregados para a comunicação dos grupos

humanos. Desta maneira, Geertz (1989), acentua ser a cultura representada pelas

manifestações, ações dos homens a respeito das atitudes da vida cotidiana no que tange ao uso

da linguagem, pois é pela linguagem que se constitui a cultura e sua hibridação.

HIBRIDISMO DAS CULTURAS

Outro foco importante do estudo a que nos propomos a investigar para explicarmos o

objeto da pesquisa é a hibridação das culturas na comunidade pesquisada. Para isso, partimos

da definição do termo hibridação, pois para muitos este termo ainda é desconhecido, não

muito comum no vocabulário, até mesmo no meio acadêmico. Mas, de acordo com Canclini

(2008) o termo é antigo, no entanto, somente ganhou força e tornou-se respeitável no século

XX. Transferido da biologia para o campo sociocultural, a partir daí perde o seu sentido único

e biológico. Canclini (2008) nos dá uma primeira definição da hibridação, assim construída.

[...] “hibridação são processos socioculturais nos quais estruturas ou práticas discretas, que

existiam de forma separada, se combinam para gerar novas estruturas, objetos e práticas”

(CANCLINI, 2008, p. 19).

Ainda, na perspectiva do celebre teórico dos estudos culturais, Canclini (2008)

esclarece que as estruturas culturais chamadas discretas, são resultados de hibridações, por

esse motivo não podem ser consideradas como fontes puras. Geralmente a hibridação se funde

por meio do processo de casamentos mistos, (casamento entre culturas e etnias diferentes),

processo migratório, intercâmbio comunicacional (rádio, internet e televisão), intercâmbio

econômico e até pelo turismo.

Ao analisar o movimento cultural presente no contexto pesquisado pôde-se notar que

a cada dia que passa torna-se mais difícil fugir desse movimento, dado o fato da globalização.

Neste sentido Hall, (2003, p.89) afirma que, “as culturas híbridas constituem um dos diversos

tipos de identidade, distintivamente novos, produzidos na era da modernidade tardia”, enfim,

não se pode fugir da hibridação e Hall (2009, p. 71) afirma que “o termo tem sido utilizado

para caracterizar as culturas cada vez mais mistas e diaspóricas”. E, nesse sentido, o

movimento que estamos buscando fazer se constitui pela hibridação das culturas e línguas em

contato, desprezado aqui, a ideia do conflito entre as línguas. A colocação feita evoca para o

contato das línguas/dialetos que convivem naturalmente em comunidade de etnia eslava e, por

essa razão, no movimento diário vai construído o cenário que envolve cultura, língua e dileto

na perspectiva de se buscar a identidade da comunidade e da escola pesquisada.

TRAJETÓRIA METODOLÓGICA DA PESQUISA

Tendo em vista compreender a hibridação das línguas e das culturas em contexto de

imigração eslava e, como a escola e a comunidade têm se posicionado e atuado no processo

de manutenção e revitalização da identidade e etnias citadas, buscamos mapear e

desmistificar, por meio de pesquisa qualitativa, o contexto localizado no município de

Prudentópolis, PR. Para isso, realizamos estudo de campo, com o objetivo de coletar

informações para interpretar esse fenômeno, ainda tão difuso nesta comunidade. A coleta de

dados ocorreu em uma escola localizada no meio rural e em seu entorno, tendo como

participantes, professores, alunos e mães de alunos. O período de realização da coleta de

dados perdurou nos meses de abril a junho deste ano e, para as quais, nos utilizamos de

entrevistas com as professoras e aplicação de um questionário aos alunos. Direcionamos o

estudo de modo a obtermos respostas para desvelar a questão de pesquisa que ora nos

propomos a investigar. Perguntamos, então: como se estabelecem as relações híbridas,

relacionadas à língua, a cultura e a identidade, e o papel da escola na preservação daquilo que

é inerente a esse grupo, no que se refere ao hibridismo das culturas e línguas/dialetos em

contato? Diante do questionamento, e, a partir dos depoimentos dos informantes, podemos

vislumbrar o cenário que assim se configurou. Perguntamos sobre a descendência dos

mesmos, se tinham origem eslava (ucraniana ou polonesa) e obtivemos nos depoimentos de

15 informantes a seguinte configuração: Dos 100% que responderam que sim, cerca de 60%

disseram que são descendentes de ucranianos; 20% são descendentes de poloneses e 20% são

descendentes de eslavos ucranianos e poloneses.

Essa mostra deu-nos respostas bastante concretas às questões que emergiram do

cotidiano e das vivências, tanto de escolares, quanto de outras pessoas da comunidade,

principalmente com relação a cultura e língua/dialeto e, sobretudo, como se posicionam à falta

de investimentos, materiais e imaterias, para a garantia de uma escola que assegure o

bilinguismo e/ou multilinguismo e multiculturalismo dos membros da comunidade

pesquisada.

LÍNGUA E CULTURA ESLAVA NA COMUNIDADE E NA ESCOLA NOS DIZERES

DOS SEUS PROTAGONISTAS

Ao perguntarmos sobre a preservação da cultura ucraniana em Prudentópolis,

encontramos diversas opiniões, dentre as quais, foi notável a ideia sobre a preservação da

cultura, os alunos são unânimes na resposta, todos acham que a cultura local precisa ser

preservada, embora dois alunos tenham respondido que a preservação esta ocorrendo. Mas

quando esta pergunta foi dirigida aos professores ouve opiniões distintas e professores

falaram: “É:: a cultura esta sendo preservada em partes, éh:: . Porem, acredito que precisa

avançar mais né. /.../ ” outros responderam que a cultura esta sendo preservada em alguns

aspectos mais relacionados a culinária, principalmente artesanatos e no folclore, mas que

necessitam de melhorias, enquanto outros responderam que a cultura vem sendo pouco

preservada e necessita de mais investimento. Quando a pergunta é dirigida aos pais, também

encontramos respostas distintas, como por exemplo: - “já que a maioria da população de

Prudentópolis é descendente de ucranianos, é importante preservar o que é seu, né”, Ainda,

encontramos pessoas que disseram: - “a cultura ucraniana esta acabando em Prudentópolis”,

enfim, existem diversas ideias sobre a cultura orolocal e que alguns acham que a cultura

ucraniana esta se esvaziando, outros que esta sendo preservada.

Ao perguntarmos se identificam mudanças e melhorias para a preservação e

revitalização da cultura ucraniana, novamente os alunos afirmam que não identificam

nenhuma mudança, inclusive, um dos alunos respondeu: - “Acho que esta muito ‘parada’, os

grupos musicais e os de dança nem se apresentam mais”, mas quando a mesma pergunta é

dirigida para professores e pais ambos os grupos são unânimes em afirmar que sim, por

exemplo - “as brincadeiras de Páscoa, os cantos Natalinos nas casas”. Noutro depoimento

temos: - “os costumes estão se acabando, os eventos apresentações estão se adaptando à época

moderna”, portanto podemos dizer que tanto pais quanto professores, afirmam algo que difere

dos dizeres dos estudantes. Enquanto as crianças afirmam que não, acredito que tenham

respondido que não por serem muito jovens e não conseguirem identificar mudanças em seu

meio, devido a pouca idade. Ao perguntamos sobre a possível implantação do ensino da

língua ucraniana nas escolas de Prudentópolis, independentemente da idade, os três grupos

foram unânimes em afirmar que seria viável. Em certo momento, uma das professoras fez o

seguinte relato: - “seria um sonho a ser realizado este é mais um meio para a preservação da

cultura e de aprender a língua ucraniana”.

Noutro depoimento, uma mãe assim se expressa sobre o assunto: -“Seria ótimo, pois

desde cedo eles (as crianças) aprenderiam coisas que muitas vezes nem é ensinado em casa”.

Portanto temos a considerar que 100% dos 15 indivíduos, que participaram da entrevista

concordam com a implantação da língua ucraniana nas escolas. Considerando a comunidade e

a escola pesquisadas, onde frequentam alunos que se não falam, entendem o dialeto ucraniano

faz-se prudente e em tempo, considerar as palavras de Simionato, (2012, p.52):

A comunidade de fala não se define por nenhum acordo marcado

quanto aos usos dos elementos da língua, mas, sobretudo, pela

participação num conjunto de regras, costumes e valores estabelecidos

pelo próprio grupo que convive. Tais normas podem ser observadas

em tipos claros de comportamentos e na uniformidade de modelos

abstratos de variação da língua que são invariantes com relação aos

níveis particulares de uso.

Com essa afirmação e diante dos depoimentos dos informantes, não temos dúvida de

que a escola e a comunidade ora pesquisada, oferecem indícios fortes e pontuais a cerca da

falta de uma escola mais preparada para atender aos seus membros, sejam crianças, jovens ou

adultos. Diante da posição dos pesquisados, vimos presente nos seus falares a viabilidade de

uma escola bilíngue com a adoção ao currículo escolar, de propostas claras, da inserção de

projetos específicos para a revitalização e permanência da língua e da cultura ucraniana, se

entendido que a primeira é sustentação para a segunda, e vice-versa.

Tendo em vista os objetivos da pesquisa e o contexto linguístico investigado,

passaremos a compreender de forma mais clara o significado do bilinguismo

português/ucraniano da comunidade e a sua presença em sala de aula, em determinados

momentos do processo de escolarização.

Iniciamos a discussão sobre bilinguismo e, segundo Monteiro, (2000, p. 40-1) apud

Simionato (2012, p. 137) explica que “uma comunidade de fala” não é necessariamente

coextensiva com uma “comunidade linguística”. Monteiro ainda (2000) conceitua a primeira

como um grupo de pessoas que não compartilham necessariamente a mesma língua, mas de

um conjunto de normas e regras para o uso delas. Assim, entendemos ser a comunidade que

descrevemos uma comunidade social, pois [...] “as fronteiras entre as comunidades de fala são

essencialmente mais de caráter social do que linguístico” (SIMIONATO, 2012, p. 139).

Diante das afirmações da autora e que corroboramos, seguimos a investigação no

intuito de compreender agora a percepção da comunidade acerca do que a escola tem feito

para evitar que cultura e língua ucraniana, de domínio da maioria de seus descendentes

desapareçam no município ora pesquisado.

Sobre essa questão, inúmeros professores responderam que a implantação da língua

ucraniana nas escolas, seria uma possível solução. Mas isso não depende somente das escolas,

mas, sobretudo do que pensam as famílias, como podemos verificar no depoimento de uma

professora: - “incentivar os pais que ensinem seus filhos a falar e repassar os costumes

ucranianos /.../ é um trabalho em conjunto, parcerias.” Também, para corroborar ao que

solicitamos aos entrevistados, sobre a implantação da língua ucraniana nas escolas de

Prudentópolis, temos o depoimento de um aluno que diz que é preciso “/.../ mais aulas de

ucraniano e incentivar a cultura ucraniana nas escolas”. Alguns professores ainda afirmaram

haver algumas iniciativas por parte das escolas para tentar manter a cultura ucraniana local,

como por exemplo, as Hailkas; são atividades folclóricas que ocorrem na Páscoa e afirmam

que não há muito tempo para desenvolver estas práticas, mas sempre que possível é feito algo

nesse sentido.

A POSIÇÃO DE ESTUDANTES QUANTO À LÍNGUA UCRANIANA SER ENSINADA

NA ESCOLA

Durante a permanência na comunidade, entrevistamos alunos e professores e,

destacamos alguns depoimentos para mostrar a preocupação de jovens estudantes quanto ao

rumo que o dialeto de suas famílias vem tomando. Eles têm consciência da perda da cultura e

identidade dos descendentes de ucranianos. Enquanto falávamos um aluno nos disse: - “É

preciso ter mais aulas de ucraniano incentivar a cultura ucraniana nas escolas porque é um

direito de saber a língua de nossos descendentes”. Pergunto então: - Se na sua escola você

tivesse a oportunidade de apreender a ler e escrever em ucraniano, uma vez que você já sabe

falar o dialeto, seria bom? O aluno afirmou: - “eu gostaria de aprender a falar e escrever em

ucraniano”. Pergunto, então sobre a sua opinião e ele responde: “- acho que em Prudentópolis

a maioria é ucraníno, por isso tem que preservar a língua dos avôs e bisavôs que vieram de

famílias ucranianas. E, quanto as mudanças provocadas pela sociedade contemporâneas outro

aluno assim se coloca: - “acho que esta muito parado os grupos musicais e os grupos de dança

nem se apresentam mais em nossa comunidade”. Então, você vê uma opção possível, a

implantação do ensino da língua ucraniana nas escolas de Prudentópolis, diante do número de

pessoas (crianças, jovens, adultos e idosos) que ainda falam o dialeto ucraniano na

comunidade? - “muitas crianças estarão aprendendo a língua ucraniana e seria muito bom se

na escola fosse colocado o ucraniano, assim nas aulas, ai seria muito bom”. Outro aluno disse:

- “os educadores devem trabalhar as diferenças de sotaques, pois os ucraniano sofrem

preconceito pela sua maneira de falar e as crianças aprendendo a língua ucraniana, não vão ter

mais o preconceito, vão falar e ter orgulho”.

Sem dúvida, na opinião dos estudantes, mesmo de forma velada é perceptível que, se

chamados em defesa de sua língua materna, darão um passo à frente na luta pela retomada de

sua cultura, identidade e dos seus antepassados.

A CONTRIBUIÇÃO DAS PROFESSORAS PARA A COMPREENSÃO DO OBJETO

ESTUDADO

As professoras têm opiniões divergentes sobre o assunto, mas de algum modo todas

acreditam que seria importante a escola poder atender aquelas crianças que falam o dialeto

ucraniano para que soubessem mais uma língua e passassem a valorizar a língua de seus

antecedentes. Ao inquirirmos se na escola, os alunos tivessem a oportunidade de falar, ler e

escrever na língua ucraniana, se a língua ucraniana fizesse parte do programa de ensino,

provavelmente teríamos a garantia da preservação da cultura, as professoras assim se

colocaram: “- É um trabalho complexo, de diferentes opiniões, mas com certeza que ajudaria

muito de continuar com sua história, de entender que é uma língua que constitui este Brasil e

valorizar a etnia de cada um”. Outra professora disse: - Acredito que se a escola tivesse esse

papel e condições para isso, seria muito diferente, os alunos não sentiriam vergonha nem do

sotaque e nem de falar como seus pais e avós.”

Entendemos nos falares das professoras certa restrição sobre o que realmente pensam

embora entendam que hoje este processo não é simples, mas necessário, para a recuperação e

revitalização dos valores culturais e de identidade da comunidade. “- A escola tem papel

importante e a comunidade ganharia muito com isso, mas não depende somente dos

educadores e da comunidade”. Diante da afirmação feita pela professora, estampa-se a

impotência de que não cabe ao professor tomar essa decisão, pois fazem parte do processo e

precisam antes de tudo, de formação para isso. Essa formação precisa ser assegurada pelo

poder público do município, tendo em vista o que prevê a Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional para a formação de docentes que atuam em contexto de diversidade étnica

(linguística e cultural). Nesse sentido, a escola tem papel decisivo na implantação dessas

políticas, mas se não houver um movimento em prol disso, caminharemos para a diáspora da

língua, cultura e identidade em ritmo cada vez mais acelerado. Diante do quadro que se

configurou, a partir dos dados e categorias de pesquisa, revisitamos a legislação vigente com

relação ao que ampara o ensino para povos em situação de interculturalidade e bilinguismo,

ainda conforme Neves (2008) apud em Simionato (2012 p, 86):

a expressão alfabetização intercultural deriva do termo educação

intercultural bilíngue, utilizado pela UNESCO para designar uma

importante característica da educação escolar indígena, pois pressupõe

o esforço do diálogo entre diferentes culturas e saberes, nesse caso a

sociedade indígena e a não-indígena.

O conceito de educação bilíngue esta fundamentada e regulamentada na LDB, Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional de Nº 9394/96 no seu artigo 78 diz que:

O Sistema de Ensino da União, com a colaboração das agências

federais de fomento à cultura e de assistência aos índios desenvolverá

programas integrados de ensino e pesquisa, para oferta de educação

escolar bilíngue e intercultural aos povos indígenas com os seguintes

objetivos: I – proporcionar aos índios, suas comunidades e povos a

recuperação de suas memórias históricas; a reafirmação de suas

identidades étnicas; a valorização de suas línguas e ciências; II –

garantir aos índios, suas comunidades e povos, o acesso às

informações, conhecimentos técnicos e científicos da sociedade

nacional e demais sociedades indígenas e não-índias. (Artigo 78,

LDB/ 9394/ 96).

Portanto, a Lei da LDB 9394/96, no artigo 78, deixa muito claro sobre os direitos e

estabelece critérios para a educação escolar intercultural e bilíngue de grupos minoritários os

quais podem ser indígenas, afrodescendentes e não indígenas e que no caso da região de

Prudentópolis- PR, seriam a cultura e as comunidades ucranianas e comunidades polonesas.

Mas ainda é importante salientar que isso não é algo muito simples, e de acordo com

Simionato (2012). A discussão sobre concepção de alfabetização intercultural é recente, pois a

trajetória da educação escolar indígena sinaliza de maneira geral para a integração dessas

populações étnicas à sociedade nacional. Desta forma Maher (2007, p. 67) diz que “antes era

mais fácil, que sempre caracterizou o ambiente educacional do país”, mas, devido às leis

vigentes e as pesquisas na área, levou os educadores a adicionar a diversidade ao currículo e

as agendas dos educadores. Maher (2007, p. 67), acrescenta que:

não é possível tentar entender nossas escolas sem levar em conta as

diferenças no seu interior. E no seu interior existem, inclusive, sujeitos

bilíngues, alunos cuja língua materna não é o português: há alunos

indígenas, alunos surdos, alunos oriundos de comunidades de

imigrantes, entre outros.

Assim, devemos pensar que o respeito à diversidade nas escolas, não se pode ficar

para o segundo planos e nem somente nos planos, mas é necessário buscarmos também aporte

a respeito deste tema. Desta forma Maher (2007, p.68) conclui que:

A analise dos processos de educação formal de falantes de línguas

minoritárias no pais exige, de antemão, atenção para um dado: atenção

para um dado: enquanto que para a maioria dos alunos das escolas

brasileiras o bilinguismo é facultativo, para os alunos indígenas,

surdos e de comunidades de imigrantes, o bilinguismo é compulsório.

A esses alunos não é dada opção: ele é obrigado a aprender a língua

majoritária do país e a se tornar bilíngue.

Portanto, não se tem respeito pelo individuo que tem como sua primeira língua,

sejam as línguas indígenas, LIBRAS ou uma língua com menos prestigio na sociedade. Isso

muitas vezes é visto com um problema a ser resolvido nas escolas, por exemplo, a super

valorização pelo aluno que é bilíngue, na língua Portuguesa e Inglesa, por exemplo. Ai é que

vem a indagação; por que não valorizar o aluno bilíngue da mesma forma independentemente

das línguas que fala, sejam elas indígenas, LIBRAS, ou as línguas das minorias de

descendentes? Para Maher (2007, p. 70-71):

A escola adota um modelo assimilacionista de transcrição. Nele, a

língua de instrução, nas séries iniciais, é a língua materna do aluno.

Assim que a criança é nela alfabetizada, assim que ela entende o

funcionamento da escrita, vai-se, paulatinamente, introduzindo o

português até que a língua minoritária no currículo vai portanto, servir

apenas de elemento facilitador, de ponte, de muleta para a

aprendizagem da língua dominante, a qual, tendo sido aprendida,

passará a ser língua de instrução na apresentação dos demais

conteúdos escolares [...] esse modelo propõem um bilinguismo

subtrativo. Seu objetivo final é retirar a língua materna do repertório

do falante: - o aluno começa sua escolarização monolíngue na língua

minoritária, passa para um bilinguismo transitório e termina

monolíngue na segunda língua, na língua portuguesa.

Este fenômeno é facilmente notado no contexto pesquisado, do qual faço parte como

descendente de ucranianos, fruto deste modelo de educação, pois ingressei à escola sem falar

o português. Este modelo de ensino considerar que sai um indivíduo monolíngue, onde o

português domina inclusive os diálogos familiares. Nesse sentido, a tarefa da escola para a

população indígena será justamente de ensinar alunos de comunidades indígenas e outras

comunidades étnicas a falar, ler e escrever em língua portuguesa, para aproximá-los da

sociedade não-indígena, sem desmerecer a língua materna desses grupos étnicos e, mais que

isso, conforme prevê a LDB 9694/96, cabe às Instituições de Ensino, situadas nessas

comunidades conferir-lhes educação bilíngue.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A comunidade escolar pesquisada em alguns depoimentos se divide diante à

possibilidade de implantação da língua ucraniana nas escolas para a promoção de uma

educação bilíngue, português/ucraniano. Por outro lado, têm consciência que a implantação de

uma proposta de ensino bilíngüe depende, sobretudo, de política educacional comprometida

com esta realidade. E, esse processo não é simples, pois demanda recursos de instâncias

superiores e, ainda, uma reestruturação nos métodos de ensino, bem como a qualificação de

profissionais nesta área.

Mas podemos afirmar que a comunidade prudentopolitana em boa parte vislumbra

ensino bilíngue português/ucraniano para valorizar e assegurar o que diz a legislação, sobre o

multiculturalismo linguístico de comunidades etno-descendentes. Enquanto isso não acontece,

a comunidade em que pesquisamos, mantêm, via outros espaços e vivências, a cultura e a

língua de suas origens. Apesar de todos os esforços das famílias para manter a língua

ucraniana, (língua materna) de muitas crianças antes de ingressar à escola, vê-se essa

desaparecer pela falta de investimentos materiais e imateriais e do pouco incentivo às políticas

pedagógicas para tal. Um povo que não reconhece e não luta para manter as suas raízes,

compromete a sua cultura e a sua identidade.

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