PUBLICAÇÕES AVULSAS

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ISSN 0100-6304 PUBLICAÇÕES AVULSAS DO MUSEU NACIONAL NÚMERO 112 RIO DE JANEIRO Agosto de 2006

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ISSN 0100-6304

PUBLICAÇÕES AVULSAS

DO

MUSEU NACIONAL

NÚMERO 112

RIO DE JANEIRO

Agosto de 2006

ISSN 0100-6304

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

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Aloísio Teixeira

MUSEU NACIONAL

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W. Ronald HeyerSmithsonian Institution - EUA

PUBLICAÇÕES AVULSAS

DO

MUSEU NACIONAL

NÚMERO 112

AGOSTO – 2006

RIO DE JANEIRO

MUSEU NACIONAL

Publ. Avul. Mus. Nac. Rio de Janeiro n.112 p.1-24 ago.2006

Publicações Avulsas do Museu Nacional é um periódico editado pelo Museu Nacional/Universidade Federal doRio de Janeiro desde 1945, com tiragem de 650 exemplares. Relativo a artigos científicos inéditos nas áreas deAntropologia, Arqueologia, Botânica, Geologia, Paleontologia e Zoologia, está indexado nas seguintes bases dedados bibliográficos: Biological Abstracts, C.A.B. International, ISI - Thomson Scientific, NISC Colorado, Periodica,Ulrich’s International Periodicals Directory, Zoological Record.As normas para preparação dos manuscritos encontram-se em http://acd.ufrj.br/~museuhp/publ.htm. Osartigos são avaliados por, pelo menos, dois especialistas na área envolvida, que, eventualmente, pertencem aoConselho Editorial. O conteúdo dos artigos é de responsabilidade exclusiva do(s) respectivo(s) autor(es).Os manuscritos deverão ser encaminhados para Museu Nacional/UFRJ, Quinta da Boa Vista, SãoCristóvão, 20940-040, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

Publicações Avulsas do Museu Nacional is a scientific journal edited by the Museu Nacional/Universidade Federaldo Rio de Janeiro since 1945. For each volume 650 copies are printed and distributed. This journal publishes originalcontributions in the following fields: Anthropology, Archaeology, Botany, Geology, Paleontology and Zoology.It is indexed in the following bibliographical databases: Biological Abstracts, C.A.B. International, ISI - ThomsonScientific, NISC Colorado, Periodica, Ulrich’s International Periodicals Directory, Zoological Record.Guidelines for manuscript preparation are provided at http://acd.ufrj.br/~museuhp/publ.htm. It is a peer-reviewed journal and each contribution is analyzed by at least two specialists on the subject that may, eventually,belong to the Editorial Board. Authors are the sole responsible for the content of the text.The manuscripts should be sent to Museu Nacional/UFRJ, Quinta da Boa Vista, São Cristóvão, 20940-040,Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

Capa – “As Duas Tartarugas”, pintura sobre papel atribuída a Albert Eckhout (“Koninkllijk Kabinet vanSchilderijen Mauritshuis”, Haia).

© 2006 – Museu Nacional/UFRJ

Publicações Avulsas do Museu Nacional – n.1 (1945)Rio de Janeiro: Museu Nacional1945 – 2006, 1 – 1112006, 112IrregularISSN 0100-63041. Ciência – Periódicos. I. Museu Nacional (Brasil)

CDD500.1

“AS DUAS TARTARUGAS”: UMA PINTURA ATRIBUÍDA A ALBERT

ECKHOUT (ca. 1610 - 1666), ARTISTA DO BRASIL HOLANDÊS1

(Com 13 figuras)

DANTE MARTINS TEIXEIRA2,3

RESUMO: Nascido em Groningen por volta de 1610, Albert Eckhout até hoje constitui um autênticoenigma, não havendo detalhes sobre seu início de carreira e tampouco maiores informações acercados trabalhos que executou no Brasil como um dos integrantes da comitiva de Johan Maurits vanNassau-Siegen. A dispersão do acervo de Nassau levada a cabo nas décadas seguintes faria comque poucas obras atribuíveis a Eckhout permanecessem em solo holandês, autoria esta muitasvezes discutível ou comprovadamente equivocada. Nos últimos anos, tal desconfiança se estenderiaà pintura conhecida como “As Duas Tartarugas”, um “gouache” e têmpera sobre papel que retratadois jabutis em atitude belicosa. A particularidade de ambos exemplares representados pertencerema Geochelone carbonaria – única espécie do gênero até hoje registrada para o território brasileiroonde Eckhout permaneceu durante sete anos – reforça a possibilidade de um quadro de sua lavra,caso estejamos realmente diante de um original do século XVII. Além disso, a técnica e o materialempregados recordam bastante outras pinturas imputadas ao mesmo artista. Tais detalhes tornama recente datação desse trabalho para o século XIX ainda mais surpreendente, inclusive por contrariarresultados anteriores que falam de um papel fabricado no século XVII. Como a presença de eventuaisrestauros pode ter exercido uma influência decisiva sobre as últimas análises efetuadas, torna-seimprescindível aguardar a realização de novos testes capazes de esclarecer as dúvidas pendentes.Palavras-chave: “As Duas Tartarugas”. Albert Eckhout. Johan Maurits van Nassau-Siegen.Geochelone carbonaria. Brasil Holandês.

ABSTRACT: “Two Brazilian Tortoises”: a painting attributed to Albert Eckhout (ca. 1610-1666),artist of Dutch Brazil.Born in Groningen around 1610, Albert Eckhout constitutes a veritable enigma even today, asthere are no details concerning the beginning of his career and neither is there a great deal ofinformation about the work he carried out in Brazil as one of the artists that had accompaniedJohan Maurits van Nassau-Siegen to the New World. The posterior dispersal of the Nassau’s collectionand inevitable misfortunes meant that few works attributable to Eckhout remained on Dutch soil,and even then often of arguable or proven mistaken authorship. During the last years, a similarquestioning would appear referring to the painting known as “Two Brazilian Tortoises”, a gouacheand tempera on paper portraying two tortoises assuming a bellicose attitude. The particularity ofboth the animals portrayed belonging to the Red-footed Tortoise (Geochelone carbonaria) – the onlyspecies of the genus found in the part of Brazil where Albert Eckhout stayed for seven years –reinforces the possibility of the painting being of his authorship, if we are really faced with a workfrom the 17th century. In addition, the technique and the material employed in “Two BrazilianTortoises” are extraordinarily reminiscent of some of the originals attributed to the same artist.Such details would make the 19th century dating of this work even more surprising, also forcontradicting previous results that speak of paper manufactured during the 17th century. As thepresence of possible restorations could have had a decisive influence on the last analyses to becarried out, we must await the realisation of further tests capable of eliminating the existing doubts.Key words: “Two Brazilian Tortoises”. Albert Eckhout. Johan Maurits van Nassau-Siegen. Geochelonecarbonaria. Dutch Brazil.

INTRODUÇÃO

Pouco tempo após sua chegada ao Recife em janeiro de 1637, Johan Maurits van Nassau-Siegen daria início à construção de dois palacetes na ilha de Antônio Vaz, até então quasedeserta. O primeiro deles, denominado “Schoonzigt” (a rigor “Bela Vista”, apesar de atradução “Boa Vista” ser bastante utilizada) servia de residência oficial , enquanto o de

1 Submetido em 02 de fevereiro de 2006. Aceito em 23 de março de 2006.2 Museu Nacional/UFRJ, Departamento de Vertebrados. Quinta da Boa Vista, São Cristóvão, 20940-040, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

Pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

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“Vrijburg” (“Friburgo”) – situado à beira do rio Capibaribe – possuía uma área arborizadaaberta à visitação da elite local, tendo sido concluído após dois anos de trabalhos. Objetoda admiração de diversos cronistas da época, esse parque abrigava uma autêntica“ménagerie” renascentista, descrita por Frei Calado como “uma casa de prazer” que custaria“muitos reais” a Nassau1. “Naquele areal estéril e infrutuoso”, o Conde plantaria “um jardimcom todas as castas de árvores de frutos que se dão no Brasil e ainda muitas que lhevinham de diferentes partes. E à força de muita outra terra frutífera trazida de fora embarcas rasteiras – e muita soma de esterco – fez o sítio tão bem acondicionado como amelhor terra frutífera. Pôs nesse jardim dois mil coqueiros, trazendo-os de vários lugares,porque os pedia aos moradores e eles lh’os mandavam trazer em carros. Deles fez umascarreiras compridas e vistosas, a modo da alameda de Aranjués2, e por outras partes muitosparreirais e tabuleiros de hortaliça e de flores, com algumas casas de jogos e entretenimentosaonde iam as damas – e seus afeiçoados – a passar as festas no verão e a ter seus regalos,fazer suas merendas e beberetes, como se usa na Holanda, com seus acordes instrumentos”(CALADO, 1648).O gosto do Conde “era de que todos fossem ver suas curiosidades e ele mesmo por regaloas andava mostrando”. Ali estavam “todas as castas de aves e animais que pode achar ecomo os moradores da terra lhe conheceram a condição e o apetite, cada um lhe trazia aave ou animal esquisito que podia achar no sertão. Ali trazia os papagaios, as araras, osjacus, os canindés, os jabutis, os mutuns, as galinhas da Guiné, os patos, os cisnes, ospavões, os perus e galinhas em grande número, tantas pombas que não se podia contar.Ali tinha os tigres, a onça, a suçuarana, o tamanduá, o bugio, o quati, o saguim, o apereá,as cabras do Cabo Verde, os carneiros de Angola, a cutia, a paca, a anta, o porco javali egrande multidão de coelhos. Finalmente não havia coisa curiosa no Brasil que ali nãotivesse, porque os moradores lh’as mandavam por a boa inclinação que viam de os favorecere assim também lhe ajudaram a fazer as suas duas casas, assim esta do jardim aondemorava como a da Boa Vista” (CALADO, 1648)3.Apesar da oportuna descrição de Frei Calado, certos detalhes sobre essas instalações aindainspiram dúvidas, haja vista que a planta do “Vrijburg” esboçada em BARLAEUS (1647) mostraapenas um “estábulo para 29 cavalos” (“stabulum 29 ex ordine equarium”), um galinheiro(“gallinarium”), um pombal (“retus columbarium”) e três tanques de peixes (“vivaria”) cercandoterrenos de tamanho variável, um dos quais ocupado por cisnes (“sedes olorina”) e outro poruma coelheira (“moas cuniculorum”) (Fig.1). Embora algumas destas ilhotas – ou até mesmoo galinheiro e o pombal – provavelmente extrapolassem suas primitivas funções, salta aosolhos não haver qualquer referência concreta a alojamentos para animais silvestres, tantomais que a manutenção de mamíferos de grande porte e até mesmo de um plantel significativode aves implica em certas exigências, pois onças não podem ser enjauladas sem maiorescuidados e tampouco gaviões se prestam a viver com galinhas. Semelhante lacuna revela-seainda mais intrigante pela narrativa de Frei Calado conferir a inequívoca impressão deconsiderável variedade de espécies ter sido acomodada lado a lado nesse cativeiro, tarefanada desprezível tanto em termos de espaço quanto de recursos humanos e materiais. Dequalquer forma, parece fora de dúvida que o palacete de Friburgo não apenas possuía uma“ménagerie” em seus jardins, como encerrava um verdadeiro “gabinete de curiosidades” emsuas dependências, onde as “faianças de Delft”, os “vidros caros de Veneza” e as “miniaturas,marfins e esmaltes de paciente execução” confundiam-se com as “pinturas a fresco ou sobretela que revestiam as paredes” e os “primorosos painéis recordavam a natureza do sertão”brasileiro, fornecendo admirável ambiente para as “preciosas coleções relativas aos indígenasdo Brasil e aos povos africanos” compostas por “tangapemas, arcos, setas e azagaias, ornatosde penas, colares e cocares, redes e utensílios domésticos, talhas de barro e canoas” (testeLIMA, 1885; NOGUEIRA, 1900). No entanto, a julgar pelo testemunho de BARLAEUS (1647), oacervo de Johan Maurits van Nassau-Siegen também compreendia numerosos “naturalia”entre peles de quadrúpedes, peixes e aves, todos levados para a Holanda quando do retornodo Conde à Europa em julho de 16444.

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Fig.1- O palácio de Friburgo e a planta de seus jardins conforme gravuras do “Rerum per Octennium inBrasilia”, obra de Gaspar Barlaeus publicada em Amsterdam no ano de 1647.

A despeito de parcela dos exemplares brasileiros terminar no recém formado “TheatrumAnatomicum” de Leiden ou nas mãos de particulares como Albert Seba, Frederick Ruysch eOlaus Worm (teste BLANCKEN, 1698; BOESEMAN, 1970; JOPPIEN, 1979; KAMPEN & VEEGENS, 1838-1840; LAND, 2001; MARTIUS, 1853; SMIT, 1986; WHITEHEAD, 1970, 1971, 1973), a maior parteseria levada para a “Mauritshuis” em Haia, integrando um vasto “gabinete de curiosidades”destinado a crescer ainda mais ao longo dos anos. Descrita com indisfarçável entusiasmopor HENNIN (1661), essa coleção incluía “armas das Índias”, “espadas curtas e curvas, zagaias,machados, lanças e outras armas”, “tambores” e “trombetas”, bem como valiosas peçaslaqueadas provavelmente oriundas do Japão (teste SCHEURLEER, 1979), “embornais de tecido”africanos, adornos de cabeça, escudos e leques de penas do Novo Mundo. Entre os “naturalia”,

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destacava-se a presença de “um crocodilo”, uma “extraordinária serpente aquática” de grandeporte, tartarugas de diversos tamanhos, um rinoceronte empalhado, um leão marinho, umpequeno elefante e peles de leões, “tigres” e “leopardos”, além de um rato-almiscarado, umaciveta e diferentes macacos. As aves estavam representadas por um “belo avestruz”, umpelicano, uma cacatua, uma ave-do-paraíso e vários outros espécimens dignos de nota, taiscomo araras, papagaios, pavões e gansos. Havia também um licorne, chifres de rinocerontes,plantas odoríferas com valor comercial, conchas, madrepérolas, corais vermelhos ou brancos,pórfiros, mármores, amostras de minério de ouro, prata, mercúrio, cobre e ferro, ouro em póe um conjunto de pedras preciosas com diamantes, rubis, topázios, ametistas, cristais derocha, jaspes e lápis-lazúlis.Mesmo que não possa ser comparado à “Mauritshuis”, o palacete de Friburgo mostrar-se-iaopulento o suficiente para estimular fortes críticas dos “Heeren XIX” sobre o principescoestilo de vida mantido por Johan Maurits no Recife5. Enquanto membro legítimo de uma eliterenascentista (teste MOUT, 1979), o Conde diferia consideravelmente dos hábitos e expectativasda burguesia mercantilista integrante da cúpula da Companhia das Índias Ocidentais, detalhecapaz de explicar, ao menos em parte, o esforço subentendido na manutenção de uma vasta“ménagerie” e na organização de um extenso “gabinete de curiosidades”. Por outro lado,cumpre notar que acervos dessa natureza cumpriam o papel de autêntica “reserva de valor”no universo da aristocracia seiscentista, constituindo ferramenta muito efetiva no processode ascensão social e enriquecimento de seus proprietários, os quais terminavam por disporde um contingente nada desprezível de cobiçadas raridades passíveis de serem transformadasem dignidades – ou mesmo em ganhos mais efetivos – ao sabor de um sofisticado jogo detrocas bem a gosto dos fidalgos da época6. Não deve causar surpresa, portanto, o fato deNassau ter oferecido tanto cavalos brasileiros, quanto veados mateiros, Mazama sp. (Cervidae),aos Príncipes Friedrich Heinrich (1584-1647) e Wilhelm II (1626-1650) da casa de Orange,além de utilizar Zacharias Wagener como portador para uma outra “encomenda de papagaios”enviada à Holanda7. No entanto, o verdadeiro poder de barganha dos “tesouros” acumuladosno Brasil tornar-se-ia assaz evidente nas três grandes “permutas” realizadas por Johan Mauritsna segunda metade do século XVII (vide adiante).Em 1644, desavenças com a Companhia das Índias Ocidentais culminariam no retorno deNassau à Holanda após sete anos de permanência no Brasil. Entre os tesouros levados para aEuropa nessa ocasião, destacava-se um número expressivo de quadros, pinturas avulsas,estudos e desenhos executados por Albert Eckhout, Frans Post e outros membros da comitivaflamenga sediada no Recife. Ao lado dos textos de naturalistas (vide MARCGRAVE, 1648; PISO,1648, 1658) e dos relatos avulsos de soldados, pequenos funcionários e outros elementosexcluídos da cultivada elite cortesã, o legado desses artistas ajudaria a compor umimpressionante corpo documental sobre os animais, as plantas e os habitantes das terras doBrasil, elenco capaz de satisfazer e estimular a irresistível atração da Europa seiscentista pelasmaravilhas de um Novo Mundo ignoto e fabuloso. Malgrado se manifestasse de maneira distintaentre a nobreza e as camadas menos abonadas da população, o fascínio pelas novidades parececonstituir o principal fio condutor dessa febre que grassava em todos os ambientes sociais,alcançando mesmo os elementos avessos ao latim dos eruditos e às preocupantes questõesfilosóficas suscitadas pelas surpreendentes descobertas levadas a cabo no outro lado do oceano8.Embora pouco afetasse o inequívoco utilitarismo sempre presente nas relações do OcidenteCristão com o chamado “mundo natural”, o afã renascentista pelo desconhecido contribuiriapara atenuar o estigma religioso que perseguiu a curiosidade humana a partir da IdadeMédia9, propiciando a multiplicação dos chamados “livros de viagem” e das coleções de HistóriaNatural (CAMPBELL, 1988; DELAUNAY, 1962; IMPEY & MACGREGOR, 2001; RADL, 1988; SCHNAPPER,1988). No campo das artes plásticas, semelhante tendência levaria à representação cada vezmais freqüente de plantas e animais exóticos, gênero de pintura que – apesar de secundáriopelos cânones absolutistas – terminaria por consagrar grandes mestres como Jan van Huysum,Albert Dürer, Jan Brueghel “O Velho”, Jan Davidsz de Heem e Michelangelo da Caravaggio10.Pertencendo a um período no qual a exatidão das imagens superava as incipientes técnicas

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descritivas, esses trabalhos muitas vezes se revelariam indispensáveis para o melhorentendimento de uma realidade além de qualquer especulação, constituindo veículo perfeitopara o encanto de uma Europa ávida por descobertas e tesouros ultramarinos (BERGSTRÖM,1956, 1977; SCHNEIDER, 1992). Não deve causar surpresa, portanto, que integrantes da nobrezae da alta burguesia da época cada vez mais se ocupassem com a organização de amplas“ménageries” e de sortidos “gabinetes de curiosidades”, ou mostrassem crescente interessepor tapeçarias e ricos manuscritos ilustrados capazes de mesclar elementos da fauna e florada Europa com raridades vindas da América, da África ou do Oriente longínquo.No ano de 1652, fração substantiva das coleções de Nassau passaria às mãos de FriedrichWilhelm, Eleitor de Brandemburgo, em troca de certas dignidades nobiliárquicas e umagrande soma empregada na compra do castelo de Freudenberg nos arredores de Cléves.Além de móveis, utensílios e despojos de animais do Brasil, o pecúlio enviado a Berlimcompreendia aquarelas e desenhos já encadernados em dois tomos, os chamados “LibriPrincipis” ou “Manuais”, assim como numerosas pinturas sobre papel e “crayons” avulsosque seriam pouco a pouco organizados por Christian Mentzel, médico particular de FriedrichWilhelm, nos quatro fólios do “Theatrum rerum naturalium Brasiliae” e no pequeno volumeda “Miscellanea Cleyeri”. Dois anos depois, haveria uma segunda doação a Frederik III, Reida Dinamarca, envolvendo 26 soberbos óleos – 23 dos quais da autoria de Eckhout – alémde algumas “curiosidades” do Novo Mundo. A última dessas grandes permutas,aparentemente realizada com nítido objetivo pecuniário, teria sido levada a cabo em 1679com Luís XIV de França, o qual recebeu quadros de Frans Post, objetos diversos, espécimenscientíficos e várias figuras em cartões baseadas nos originais de Eckhout, material empregadoanos mais tarde na confecção da famosa “Tenture des Indes” da manufatura de tapeçariasGobelin (teste DRIESEN, 1849; JOPPIEN, 1979; LARSEN, 1962; PANHUYS, 1925; SCHNAPPER, 1994;SOUSA-LEÃO, 1948, 1961; THOMSEN, 1938; WINTER, 1981; WHITEHEAD & BOESEMAN; 1989)11. Aocontrário do que ocorreu com Frans Post, entretanto, a obra de Albert Eckhout logo cairiano esquecimento, tendo sua importância reconhecida apenas há poucas décadas.

“AS DUAS TARTARUGAS”

Nascido em Groningen por volta de 1610, Albert Eckhout até hoje constitui um autênticoenigma, não havendo detalhes sobre seu início de carreira e tampouco maiores informaçõesacerca dos trabalhos executados a mando de Nassau no Brasil. Quanto às atividadesdesenvolvidas posteriormente na Europa, sabe-se que em 1653 – por indicação do próprioJohan Maurits – Eckhout receberia o convite de atuar na corte da Saxônia, onde permaneceuaté 1663 a serviço dos Príncipes Eleitores Johann Georg I (1611-1656) e Johann Georg II(1656-1680). Nesse período, teria produzido várias obras decorativas e quadros diversos, amaioria dos quais destruída em fevereiro de 1945 durante o bombardeio de Dresden12. Devolta à cidade natal, Eckhout conseguiria filiar-se à guilda dos pintores locais já em 1664,falecendo no ano seguinte ou logo nos primeiros meses de 1666 (BESINOVICH, 1943; BUVELOT,2004a; EGMOND & MASON, 2004; LEITE, 1967; MASON, 2002; SCHAEFFER, 1958, 1959, 1965; SOUSA-LEÃO, 1956; THOMSEN, 1938; VALLADARES & MELLO FILHO, 1981; WHITEHEAD & BOESEMAN, 1989).A dispersão do acervo promovida por Nassau e os inevitáveis azares da sorte fariam com quepoucos trabalhos imputáveis a Eckhout continuassem em solo holandês, atribuição esta amiúdediscutível ou nitidamente equivocada. Durante as extensas mostras sobre o artista promovidasno Brasil (setembro de 2002 a maio de 2003) e na Holanda (março a junho de 2004), taldesconfiança se estenderia à pintura conhecida como “As Duas Tartarugas”, um “gouache” etêmpera sobre papel no qual são retratados dois jabutis em atitude belicosa (Fig.2). Arroladaentre as peças da “Jacques Goudstikker Gallery”, Amsterdam, em 1936, essa obra permaneceriana coleção privada de J.C.H. Heldring, Oosterbeek, entre 1942 e 1963, ano de sua aquisiçãopara a “Mauritshuis” pelos “Friends of the Mauritshuis Foundation” (BUVELOT, 2004b). A julgarpela silhueta dos animais representados, o presumível original teria sofrido um corte à direitaque reduziu suas medidas para os atuais 51,0 x 30,5cm. Em algum momento, a figura resultante

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acabaria sendo colada em um painel de madeira, obstáculo considerável para a exataidentificação do papel utilizado. Apesar de certas fontes contestarem a autoria de Eckhoutsem fornecer maiores justificativas (e.g. BRIENEN, 2001), as dúvidas atuais parecem basear-sesobretudo no fato de as últimas análises apontarem para um material do século XIX oumesmo mais recente, resultado contrário ao papel do século XVII encontrado por examesconcluídos em torno de 1960 (compare BUVELOT, 2004c versus GELDER, 1960).Conferida a Eckhout graças ao minucioso estudo de H.E. van Gelder publicado em 1960, “AsDuas Tartarugas” já havia sido antes relacionada a nomes tão diversos como Albrecht Dürer,Pieter Brueghel “o Velho”, Jacob de Gheyn, Adam Willaerts, Pieter Claesz, Cornelis Cornelizoone Hendrik Goltzius (GELDER, 1960), artistas conhecidos por representarem diversos animais,inclusive tartarugas. Malgrado não ocupem uma posição de destaque, os quelônios revelam-se mais comuns nas pinturas dos séculos XVI e XVII do que se poderia supor a princípio,também estando presentes em obras de outros mestres como Paolo Porpora, MichelangeloPace, Jan van Kessel “o Velho”, Pieter Boel, Jan Brueghel “o Velho” e Pieter Paul Rubens. Na“Luxuria” de Pieter Brueghel (Fig.3), nos arranjos de frutas de Michelangelo Pace e nos“bodegones” de Cornelis Cornelizoon ou de Pieter Claesz, as tartarugas talvez estabeleçamum contraponto à gula e ao desejo carnal, pois esses répteis simbolizariam não a temperançamas a pudícia no casamento, servindo de exemplo às mulheres por nunca deixarem sua“casa” (i.e. a carapaça) e sempre observarem o silêncio, crença por sinal equivocada (COOPER,1992; VRIES, 1984). Contudo, em trabalhos de Adam Willaerts, Paolo Porpora e Jan vanKessel, as tartarugas parecem surgir como elementos típicos de uma dada paisagem, sejauma marinha, um ambiente ribeirinho ou mesmo o obscuro solo de uma floresta. Em umdos painéis de sua famosa “Alegoria dos Continentes” (in TEIXEIRA, 2002a), van Kessel chegariamesmo a ilustrar uma águia carregando uma tartaruga nas garras, provável alusão ao lendárioepisódio da morte de Ésquilo, célebre poeta e dramaturgo grego13. Outrossim, não se podeesquecer que a carapaça de certas espécies marinhas era um artigo muito valioso e cobiçadopor artífices e colecionadores de curiosidades do século XVII (COUPIN, ca. 1900; IMPEY &MACGREGOR, 2001; SCHNAPPER, 1988), enquanto determinadas variedades terrestresconstituíam xerimbabos bastante usuais, conforme atesta o detalhe de Albert Dürer terpossuído uma pequena tartaruga de estimação (EISLER, 1991).

Fig.2- “As Duas Tartarugas”, pintura sobre papel atribuída a Albert Eckhout (“Koninkllijk Kabinet vanSchilderijen Mauritshuis”, Haia).

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Muito diferentes sob os mais diversos pontosde vista, as contribuições dos váriospintores mencionados têm em comum o fatode mostrarem sempre as mesmastartarugas, na verdade um elenco muitolimitado composto apenas pelas poucasformas existentes na Europa. Com efeito,tanto as marinhas de Adam Willaerts quantoaquelas de Jan van Kessel retratariam umatartaruga-cabeçuda, Caretta caretta(Linnaeus, 1758), ao passo que umcomuníssimo cágado de água doce, Emysorbicularis (Linnaeus, 1758) também seriafigurado por Jan van Kessel e PieterBrueghel. Sem embargo, um jabuti dogênero Testudo – Testudo graeca Linnaeus,1758 ou Testudo hermanni Gmelin, 1789 –

aparece como o grande predileto, podendo ser visto nos quadros de artistas comoPaolo Porpora, Michelangelo Pace, Jan van Kessel, Pieter Claesz, Cornelis Cornelizoon,Pieter Boel, Jan Brueghel e Pieter Paul Rubens, por exemplo no esplêndido “Jardim doÉden” da autoria desses dois últimos (Fig.4). Nenhum dos nomes da época, porém,teria dedicado tanta atenção a esses répteis quanto Jan van Kessel, que chegou aocúmulo de reunir em uma mesma composição – o painel dedicado à África de sua“Alegoria dos Continentes” – todas as espécies supracitadas mais um segundo tipode cágado de água doce – Mauremys leprosa (Schweigger, 1812) ou Mauremys caspica(Gmelin, 1774) – ilustrando assim representantes dos três gêneros de quelôniosassinalados em território europeu (ARNOLD & BURTON, 1978; ERNST & BARBOUR, 1989).

Fig.3- Detalhe dos cágados de água doce (Emysorbicularis) retratados na “Luxuria” de PieterBrueghel, “o Velho” (1558).

Fig.4- “O Jardim do Éden” de Jan Brueghel, “o Velho”, e Pieter Paul Rubens (ca. 1615), com detalhemostrando o jabuti (Testudo sp.) representado (“Koninkllijk Kabinet van Schilderijen Mauritshuis”, Haia).

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Em uma época onde a avidez e curiosidade pelas maravilhas de terras distanteseram fortes o suficiente para converter os mais ínfimos animais exóticos em eventodestinado a atrair o público às estalagens (Fig.5), destaca-se o feito de apenastartarugas locais terem sido normalmente aproveitadas como motivo.A presença de um quelônio estranho à fauna européia em um pretenso quadroseiscentista revela-se, por conseguinte, assaz peculiar e evoca de imediato apossibilidade de uma construção artística sem qualquer relação com a verdadedos fatos. Afinal de contas, embora a obra considerada seja muito realista e deindiscutível qualidade, os dois jabutis representados transmitem uma atitudeintensa e belicosa muito distante da opinião corrente sobre esses répteis,particularidade que levaria van Gelder a encará-los como “bichos de má índole”

Fig.5- Publicado por Jan Velten em 1702, esse panfleto convida o público de Amsterdam a visitar ataverna do “Elefante Branco” (“Witte Oliphant”) no antigo “Botermarkt” (atual “Rembrandtplein”) paratomar suas colações e conhecer um exótico pangolim, Manis sp., do Ceilão e um estranho lagarto,aparentemente um iguana sul-americano, Iguana iguana (Linnaeus, 1758).

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(GELDER, 1960). No entanto, a proverbial mansidão e placidez das tartarugas seriam, aomenos em parte, mera ficção, conforme atestam os sugestivos nomes ingleses de “snappingturtle” ou “alligator turtle” conferidos a Chelydra serpentina (Linnaeus, 1758) e Macroclemystemminckii (Troost, 1836), duas variedades aquáticas do Novo Mundo famosas por infligirsérios ferimentos a pescadores desavisados. Exceto por uma mordida ou outra, os jabutisnão costumam chegar a tal extremo, mas travam curiosíssimas disputas por comida oudurante o período reprodutivo (Fig.6). Nessa ocasião, os machos de espécies como Chersinaangulata (Schweigger, 1812), Geochelone elegans (Schoepff, 1795), Geochelone pardalis(Bell, 1828) e Geochelone carbonaria (Spix, 1824) tornam-se mais agressivos, mordendo,dando cabeçadas e golpeando os adversários (ERNST & BARBOUR, 1989). Alguns indivíduoschegam mesmo a utilizar diferentes partes da carapaça como um verdadeiro aríete,investindo contra seus oponentes até virá-los de pernas de para cima, castigo que podeser fatal caso os perdedores não consigam retomar sozinhos a postura correta.Qualquer artista do século XVII capaz de transportar confrontos desse tipo para uma teladominaria um conhecimento do animal retratado bem superior à média de seus pares,detalhe sobremodo indicativo no caso de uma tartaruga exótica. Não obstante, oneoplatonismo corrente na Europa após o Renascimento poderia fornecer uma explicaçãobem mais simples pois, ao apagar as diferenças entre a matéria e o espírito e visualizar ocosmo como uma unidade indissolúvel governada por uma complexa rede de influências

Fig.6- Comparação entre adultos de Geochelone carbonaria em postura agressiva (foto Márcia Mocelin) e“As Duas Tartarugas” (“Koninkllijk Kabinet van Schilderijen Mauritshuis”, Haia).

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vitais e espíritos invisíveis, essa doutrina postulava que cada parte do todo mantinha comas outras uma estreita relação imposta por uma série de “simpatias” e “antipatias” ocultas,princípio válido inclusive para os organismos vivos. Um dos reflexos mais imediatos nasartes plásticas seria a popularização de quadros dedicados a combates promovidos entreanimais vistos como “inimigos naturais”, prática às vezes estendida a lutas entre indivíduosde uma mesma espécie (TEIXEIRA, 2002a). De qualquer maneira, chama a atenção que osdois jabutis tenham sido figurados com a boca eriçada de dentes agudos prestes a morder,pois tais répteis possuem maxilares lisos sem qualquer sinal de estrutura parecida14. Detalhemuito destoante em uma pintura de excepcional realismo, esse equívoco talvez possa serentendido como uma licença artística destinada a conferir um certo ar de ferocidade aseres de aparência tão inofensiva.

DISCUSSÃO

A maioria dos autores concorda que os jabutis representados em “As Duas Tartarugas”pertenceriam ao gênero Geochelone da América do Sul, argumento de grande peso na atribuiçãodessa pintura a Albert Eckhout (GELDER, 1960; WHITEHEAD & BOESEMAN, 1989). Contudo, certasfontes identificariam ambos exemplares como jabutis-piranga, Geochelone carbonaria,enquanto outras proporiam o jabuti-tinga, Geochelone denticulata (Linnaeus, 1766), discussãoassaz intrincada por envolver duas formas muito semelhantes que passariam a serconsideradas espécies independentes apenas em 1960 (ERNST & BARBOUR, 1989; WILLIAMS,1960) (Fig.7). A solução do problema reveste-se de particular interesse pelas diferençasobservadas na distribuição geográfica desses répteis, pois Geochelone carbonaria surge comoo único jabuti assinalado para os antigos domínios da Companhia das Índias Ocidentais.Com efeito, sua área de ocorrência se estenderia do nordeste ao sul do Brasil e grande parteda Amazônia, enquanto Geochelone denticulata é um quelônio da Amazônia e do Brasil Centralcom uma populaçãoisolada no sudeste do país(Fig.8). Podendo alcançar55cm de comprimento,Geochelone carbonariasempre foi bastanteapreciada como alimentoou animal de estimação,habitando tanto aspaisagens mais secas dointerior quanto as florestasúmidas do litoral nordestino (FREITAS & SILVA,2005; LUEDERWALDT, 1926;PRITCHARD & TREBBAU, 1982;VANZOLINI, 1994).Ao contrário do queindicam os nomes populares mencionados acima,o colorido desses doisrépteis não constitui umaindicação confiável, pois asescamas da cabeça e pataspodem ser amarelas oualaranjadas em Geochelone denticulata eamarelas, alaranjadas ou

Fig.7- Exemplares típicos de Geochelone carbonaria (esquerda) eGeochelone denticulata (direita), com detalhes da cabeça de ambasespécies (fotos Márcia Mocelin).

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vermelhas em Geochelone carbonaria15. Na verdade, os autênticos caracteres diagnósticosestão no plastrão, carapaça e escamas da cabeça, detalhes muito difíceis ou mesmoimpossíveis de visualizar na pintura em foco. Não obstante, a cabeça dos exemplares retratadosparece apresentar escamas pré-frontais pequenas, enquanto a carapaça éindiscutivelmente negra, ostentando escudos centrais com anéis de crescimento bem definidosao redor da auréola e os primeiros escudos marginais com a borda sem projeções (Fig.9).

Fig.8- O Brasil Holandês comparado com a distribuição geográfica de Geochelone denticulata e Geochelonecarbonaria na América do Sul (modificado de VANZOLINI, 1994).

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Apesar de o ângulo escolhido pelo artista não ser nada favorável, essas quatro característicasapontam para Geochelone carbonaria, pois Geochelone denticulata teria escamas pré-frontaisalongadas e a carapaça marrom, possuindo escudos centrais com anéis de crescimentodiscretos ou ausentes e os primeiros escudos marginais com a borda denticulada (ERNST &BARBOUR, 1989; WILLIAMS, 1960).A conclusão de que os jabutis figurados pertencem ao único representante do gênero até hojeregistrado para o território brasileiro onde Albert Eckhout permaneceu durante sete anos reforçaa possibilidade de uma obra da sua autoria, caso estejamos realmente diante de um trabalhodo século XVII. Cabe lembrar, portanto, haver relatos sobre “jabutis” na “menágerie” do palacetede Friburgo, bem como referências a “tartarugas de diversos tamanhos” no “gabinete decuriosidades” montado por Nassau em Haia (teste CALADO, 1648; HENNIN, 1661). Tampoucodevem ser esquecidas as notícias acerca de Geochelone carbonaria existentes em váriosmanuscritos ilustrados do Brasil Holandês (e.g. o “Thierbuch” de Zacharias Wagener e o “Diário”de Caspar Schmalkalden fide TEIXEIRA, 1997, 1998) e nos livros dos naturalistas Georg Marcgravee Willem Piso (Fig.10). Segundo esses textos, o jabuti-piranga alimentava-se de raízes, frutossilvestres, vermes e insetos, sendo muitas vezes mantido em cativeiro como xerimbabo ou paraabate. Acima da carne e dos ovos, o fígado era reputado como de “excelente paladar” (MARCGRAVE,1648; PISO, 1658), opinião até hoje compartilhada pelos habitantes da Amazônia brasileira.De autoria desconhecida, a imagem de uma jovem Geochelone carbonaria encontrada nos“Libri Principis” (Fig.11) desperta a atenção por reaparecer no “Le Cheval Rayé”, uma dastapeçarias da renomada “Tenture des Indes” da manufatura Gobelin (in TEIXEIRA, 2002b),coincidência notável pelos numerosos indícios de os cartões relativos à primeira série, dita“Anciennes Indes”, estarem calcados em trabalhos de Albert Eckhout (BESINOVICH, 1943;SOUSA-LEÃO, 1944, 1969; WHITEHEAD & BOESEMAN, 1989). Décadas mais tarde, ao aceitar aincumbência de produzir novos cartões para as “Nouvelles Indes”, o artista francês FrançoisDesportes voltaria a figurar a mesma Geochelone carbonaria ao lado de peixes e crustáceosencontrados nos “Libri Principis” ou no “Theatrum rerum naturalium Brasiliae” (Fig.12).

Fig.9- Comparação entre as escamas da cabeça e os escudos da carapaça de Geochelone denticulata eGeochelone carbonaria (desenho original Márcia Mocelin), com detalhes dos exemplares retratados em“As Duas Tartarugas” (“Koninkllijk Kabinet van Schilderijen Mauritshuis”, Haia).

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Apesar de substantivas, as evidênciasacumuladas não permitem a atribuiçãodefinitiva de “As Duas Tartarugas” aAlbert Eckhout, pois jabutis desse tipotanto poderiam ter chegado à Europaseiscentista como curiosidades oriundasdo Novo Mundo quanto ter servido deinspiração para um dos numerososartistas europeus vindos ao Brasil apartir do primeiro quartel do século XIX16.

Fig.10- Exemplar de Geochelone carbonaria segundogravura da “De Indiae Utriusque re naturali et medica”,obra de Willem Piso publicada em Amsterdam no anode 1658.

Fig.11- Jovem de Geochelone carbonaria figuradonos “Libri Principis” (“Biblioteki Jagielloñskiej”,Cracóvia).

Fig.12- Detalhe do exemplar de Geochelone carbonariafigurado em um dos estudos de François Desportes,artista encarregado de compor os cartões utilizadosna confecção das “Nouvelles Indes”, série de tapeçariasda Manufatura Gobelin (“Manufacture Nationale deSèvres”, Sèvres).

Tal hipótese, no entanto, revela-sebastante factível no caso de um quadroholandês do século XVII, pois rarospintores do período tiveram aoportunidade de conhecer répteis sul-americanos vivos. Além disso, a técnicae o material empregados recordambastante alguns originais do “Theatrumrerum naturalium Brasiliae” conferidos aEckhout (Fig.13), detalhe que torna adatação de “As Duas Tartarugas” para o

século XIX ainda mais surpreendente,inclusive por contrariar referênciasanteriores sobre o papel empregadoremontar ao século XVII (compareBUVELOT, 2004c versus GELDER, 1960).Como eventuais restauros poderiam terexercido influência decisiva nas últimasanálises efetuadas, parece imprescindívelaguardar a realização de novos testescapazes de esclarecer as dúvidaspendentes.

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NOTAS

1 A curiosidade e a busca do luxo que marcaram a Renascença parecem ter sido bastantefavoráveis para a formação de jardins botânicos, “ménageries” e “gabinetes decuriosidades”. A partir do final do século XV, coleções de plantas e animais vivoscomeçariam a ser organizadas por vários príncipes europeus, com destaque para o DuqueFerrante de Nápoles (1433-1494). Tomando impulso durante os séculos XVI e XVII, essatendência permitiria a criação, em Pádua, do primeiro jardim botânico ligado a umauniversidade (1545), exemplo seguido pelas instituições de Pisa (1547), Bolonha (1567),Leiden (1577), Montpelier (1598) e Oxford (1621), enquanto o insuperável tirocínio doCardeal Richelieu (1585-1642) levaria à fundação do “Jardin des Plantes” de Paris em1626 (SINGER, 1959). Entretanto, poucos acervos eram capazes de ombrear-se com aquelede Rodolph II de Habsburgo (1552-1612), que logrou reunir uma variedade surpreendentede animais vivos e espécimens zoológicos das mais diferentes partes do mundo (HAUPT etal., 1990). Entre essas raras exceções estava a famosa “ménagerie” mantida pelo PríncipeMaurits van Nassau da casa de Orange (1567-1625), primo em segundo grau de JohanMaurits van Nassau-Siegen, cujo plantel incluía até mesmo um dodo, Raphus cucullatus(Linnaeus, 1758), das ilhas Mascarenhas, exemplar retratado por artistas como RoelandtSavery (teste JACKSON, 1993, 1999).2 Frei Calado pretende comparar as alamedas do palacete de Friburgo à suntuosidade dosjardins de Aranjuez, cidade à margem do Tejo que abrigava uma das residências dos reis deEspanha. Segundo BARLAEUS (1647), Nassau teria mandado transplantar um total de “700coqueiros, estes mais altos, aqueles mais baixos, elevando uns o caule a 50 pés, outros a40, outros a 30 antes de atingirem a separação das palmas”, diferença talvez motivada porrazões estéticas de uma inusitada topiaria. Contrariando a crença de tais árvores nãosuportarem qualquer manejo, “mandou o Conde buscar [coqueiros] à distância de três ouquatro milhas em carros de quatro rodas, desarraigando-os com jeito e transportando-ospara a ilha em pontões lançados através dos rios”. Para grande surpresa de todos, a iniciativaseria coroada de tamanho sucesso que até mesmo árvores “septuagenárias e octogenárias”mostrar-se-iam fecundas, “produzindo frutos copiosíssimos logo no primeiro ano”.Completavam o jardim “252 laranjeiras, além de outras 600 que serviam de cerca ... 50 pésde limões grandes, 80 de limões doces, 80 romãzeiras e 66 figueiras”, bem como “mamoeiros,jenipapeiros, mangabeiras, cabaceiras, cajueiros, uvalheiras, palmeiras, pitangueiras,

Fig.13- “Pitus e Lagarto”, pintura sobre papel atribuída a Albert Eckhout pertencente ao “Theatrumrerum naturalium Brasiliae” (“Biblioteki Jagielloñskiej”, Cracóvia).

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romeiras, araticuns, jamacarús, bananeiras, tamarineiros, castanheiros e tamareiras”(BARLAEUS, 1647). Em vários aspectos, o parque de Friburgo seguia a típica tradição holandesade organizar um “jardim utilitário” com pomares e canteiros de hortaliças (teste DIEDENHOFEN,1979). Vide também SILVA & ALCIDES (2002).3 Segundo WÄTJEN (1921), “todo o habitante da Nova Holanda que tinha a ocasião deencontrar uma planta rara ou um animal observado com pouca freqüência, contribuíacom seu espécimen para a coleção do Conde”. De forma bem menos marcada, essa mesmatendência de reunir animais seria mantida nos outros edifícios de Johan Maurits vanNassau-Siegen, pois aquele de Haia possuía um lago com espátulas, faisões e patos,enquanto o de Cleves contava com uma “leporaria” e um parque para a caça de cervos(teste DIEDENHOFEN, 1979).4 Barlaeus comenta que Nassau teria levado para a Holanda todos os “tesouros”(“cimeliarchum”) acumulados durante sua estadia no Brasil, cujo conteúdo compreendia,entre outros itens, “peixes”, “aves”, “peles de quadrúpedes”, “armas”, “ferramentas nativas”e “adereços para a cabeça e pescoço”, todos “admirados aqui [na Europa] como objetosraros ou desconhecidos” (BARLAEUS, 1647).5 De acordo com algumas fontes, a construção do palacete de Friburgo teria custado aimpressionante soma de 600.000 florins, não contabilizado o preço do terreno pago pelopróprio de Nassau (LESSA, 1937; TERWEN, 1979). Embora tal quantia pudesse ser cobertapelos 2% das presas de guerra devidos ao governador (LARSEN, 1962), um estilo de vidasuntuoso provavelmente implicava em gastos adicionais para a Companhia das Índias,constituindo motivo suficiente para a reprimenda imposta pelos “Heeren XIX”.6 Desde a Antigüidade, animais exóticos de terras distantes foram vistos como presentesdignos dos mais altos potentados, conforme demonstra a girafa, Giraffa camelopardalis(Linnaeus, 1758), oferecida pelo Califa de Bagdá ao Duque Ferrante de Nápoles (LAUFER,1928; SINGER, 1959), ou o famoso rinoceronte indiano, Rhinoceros unicornis Linnaeus,1758, remetido a Dom Manuel I, Rei de Portugal, por Afonso de Albuquerque, governadordas recém-conquistadas possessões portuguesas na Índia (COSTA, 1937). Algumas vezes,particulares ou associações de comerciantes decidiam trazer para a Europa espécies raraspara exibição e/ou venda posterior, fato bem exemplificado pela trajetória de uma fêmeade casuar, Casuarius casuarius (Linnaeus, 1758), obtida em Java por mercadoresholandeses de especiarias no ano de 1596 (HAMEL, 1849; STRESEMANN, 1951). Perdurandoaté bem pouco tempo, semelhante prática era muito comum no século XIX, havendonumerosas alusões literárias sobre viajantes ou ex-combatentes desvalidos que viviamde pequenos espetáculos com xerimbabos oriundos das colônias. Algo semelhante ocorreriano Brasil pelo menos desde o Império, pois os jornais da época abrigam diversos anúnciosconclamando o público carioca a conhecer “elefantes”, “zebras africanas” e até mesmorépteis como um “giararacussú vivo de tamanho extraordinário”, certamente um exemplarde Bothrops sp. bem desenvolvido (RENAULT, 1969).7 Nos comentários que escreveu nos “Libri Principis” (in TEIXEIRA, 1995), Nassau explicitater enviado “exemplares vivos [de veado-mateiro] a sua majestade [Wilhelm II, Príncipe deOrange], mas eles morreram de frio”, enquanto Zacharias Wagener (in TEIXEIRA, 1997)menciona ter passado por Haia, Delft, Rotterdam e Leiden “para entregar aquilo que mefora encarregado pelo Senhor Conde [Johan Maurits]: cartas, desenhos e papagaios”.8 A descoberta de uma multidão cada vez maior de seres vivos sem nada em comum coma fauna e flora conhecida pelos europeus não só tornava premente a necessidade de umsistema de referência universal que a todos nomeasse, como reforçava indiscretasconjeturas acerca da pluralidade da criação – além de dúvidas heréticas sobre a cronologiaexposta no Livro Sagrado – criando sérias indagações quanto à verossimilhança epertinência de diversas passagens bíblicas (BROWNE, 1983; GERBI, 1978, 1993; GLACKEN,1976; PAPAVERO et al., 1997). Na verdade, seria de fato possível construir uma arca grandeo suficiente para abrigar semelhante quantidade de animais? Caso positivo, se esteshaviam sido salvos juntos de um “dilúvio universal”, porque tantos ocorriam apenas em

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determinadas partes da terra e não em outras? Toda essa inacreditável diversidade poderiaser realmente originária de um único local? Durante os séculos XVI e XVII, algumas dastentativas mais brilhantes de responder a tais perguntas seriam articuladas pelos jesuítasJoseph de Acosta e Athanasius Kircher (ACOSTA, 1590; KIRCHER, 1675).9 Estigmatizada como um pecado capital por Santo Agostinho (vide “Confissões” V: 3, 4;X: 35, 55) e outros teólogos, a chamada “curiositas” inspirava profunda desconfiança porparte da Igreja da Idade Média, sendo vista como um desejo quase carnal. Ao promover a“soberba do intelecto”, essa “volúpia por coisas novas” terminaria substituindo a desejadaperplexidade e reverência ante os mistérios da Criação por ímpias tentativas de explicare entender a natureza, iniciativa muitas vezes executada à revelia da Bíblia e de opiniõeshá muito consagradas. Não surpreende, portanto, que certos renascentistas chegassem aocultar seu afã pelo saber e marcado gosto pelas surpresas vindas do além-mar empregandoargumentos tortuosos amiúde utilizados pelos próprios religiosos do medievo, os quaiscontrapunham ser possível louvar e exaltar o Todo Poderoso através do estudo dasmaravilhas criadas pela graça divina.10 As escolas e academias de arte fundadas no século XVII consideravam a representaçãode animais, plantas e objetos inanimados com um gênero menor segundo os ideaisabsolutistas vigentes, privilegiando a reprodução de passagens bíblicas, cenas mitológicas,atos oficiais e retratos de príncipes ou potentados. Por compreender implicitamente umaescala de valores que ascendia da matéria inferior inanimada até o homem possuidor dealma imortal, semelhante hierarquia terminaria sendo associada à famosa “Árvore dePorfírio” por autores como SCHNEIDER (1992), embora tal raciocínio na verdade se apliqueà “Scala Naturae”. De qualquer forma, esses rígidos cânones seiscentistas parecem refletirsobretudo alguns princípios gerais bastante arraigados do Cristianismo, bem como acomplexa realidade social do Absolutismo (vide PAPAVERO et al., 1995).11 Embora não haja qualquer prova conclusiva nesse sentido (teste WHITEHEAD, 1973),LARSEN (1962) aventa a hipótese de uma quarta permuta ter ocorrido durante a missãodiplomática de Nassau à Inglaterra na época da Restauração (1660).12 Até janeiro de 1945, Dresden havia sofrido apenas dois bombardeios pouco significativosem pequenas indústrias localizadas nos subúrbios. Nos dias 13 e 14 de fevereiro dessemesmo ano, entretanto, a capital da Saxônia seria alvo de 650.000 bombas incendiáriaslançadas por 311 Fortalezas Voadoras da USAF e 796 Lancaster da RAF, os quaissobrevoaram a cidade em três ondas sucessivas tendo como único alvo o velho centrohistórico. Nada menos de 135.000 vítimas sucumbiriam sob o impacto de mais de 1.500toneladas de altos explosivos e 1.200 toneladas de artefatos incendiários, o quetransformaria essa operação no mais cruento ataque aéreo desfechado ao longo de toda aSegunda Grande Guerra, superando até mesmo a terrível carnificina de Hiroxima. Emtermos culturais e históricos, as perdas ultrapassariam todos os limites imagináveis,pois os verdadeiros “furacões de fogo” criados pelos bombardeios maciços consumiramcerca de 400.000 títulos pertencentes ao acervo da “Sächsische Landesbibliothek” e umelevadíssimo número de monumentos e obras de arte, inclusive dez quadros pintados porAlbert Eckhout entre 1653 e 1663. Com a derrocada de Dresden, as duas potênciasocidentais pretendiam sobretudo promover uma demonstração de força dentro do incipientejogo da “Guerra Fria”, tendo escolhido os quarteirões medievais e barrocos ricos emmadeirame exatamente para testar de forma cabal suas teorias acerca da capacidadedestrutiva de um bombardeio de saturação. Maiores detalhes sobre o assunto eimpressionantes fotografias de Dresden destruída estão disponíveis em CARTIER (1965),DEAR & FOOT (1995), IRVING (1963) e VERRIER (1968).13 Um dos maiores dramaturgos de todos os tempos, Ésquilo retirou-se para a Sicíliaapós ser derrotado por Sófocles em uma disputa poética, falecendo no exílio por volta de456 a.C. De acordo com a fábula apócrifa amplamente conhecida, seu crânio teria sidoesmagado por uma tartaruga precipitada das alturas por uma águia, que confundiu acalva do teatrólogo com uma rocha.

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14 Ao contrário de determinadas variedades fósseis como Proganochelys, os adultos dosquelônios atuais não apresentam vestígios de dentes, possuindo as queixadas recobertaspor uma ranfoteca córnea. Entretanto, dentes transitórios ou cristas dentárias que logodesaparecem podem ser observadas em embriões de espécies como Trionyx triunguis(Forskål, 1775) e Chelonia spp. (GRAVILOV, 1961; PIRLOT, 1976).15 Embora consagrada nos dias de hoje, a atribuição desses nomes populares revela-se assunto controverso que reflete a considerável variação de colorido observada emGeochelone denticulata e Geochelone carbonaria. Exemplos das diferentes opiniõesexistentes podem ser obtidos em ANÔNIMO (1935), COUTINHO (1868), IHERING (1935) eVANZOLINI (1999).16 A presença de um jabuti do Novo Mundo em originais holandeses seiscentistas nãoimplica necessariamente na existência de espécimens trazidos por Nassau do Brasil, poiso tráfico de animais e de seus despojos já era muito intenso nessa época (TEIXEIRA, 1999).Como a ampla distribuição de Geochelone carbonaria alcança o norte da América do Sul(teste PRITCHARD & TREBBAU, 1982), cumpre lembrar que anfíbios e répteis vindos do Surinameou do Caribe também foram remetidos para a Holanda na segunda metade do séculoXVII. De fato, um curiosíssimo sapo-parteiro proveniente de Curaçao, Pipa pipa (Linnaeus,1758), seria figurado pelo médico Hendrik d’Acquet em 1689 (in BELL, 1992), enquanto afamosa artista Maria Sibylla Merian não apenas retratou a herpetofauna do Suriname(e.g. MERIAN, 1705), como chegou a vender exemplares preservados para colecionadoresflamengos e alemães após retornar à Europa em 1701 (WETTENGL, 1998).

AGRADECIMENTOS

Nossos agradecimentos a Quentin Buvelot e ao “Koninkllijk Kabinet van SchilderijenMauritshuis”, Haia, pelo convite efetuado e empréstimo de reproduções de quadrospertencentes à coleção institucional. Da mesma forma, cabe manifestar nossoreconhecimento a Elly de Vries (Instituto Cultural Banco Real, São Paulo) peloscomentários sobre o manuscrito e generosidade demonstrada na concessão de váriasimagens de seu acervo privado. Outrossim, devemos particular menção a Márcia Mocelin(Fundação RIOZOO, Rio de Janeiro), que gentilmente colocou ao nosso dispor numerosasinformações e ilustrações de Geochelone carbonaria e Geochelone denticulata de suaautoria, além de facilitar a observação de exemplares vivos mantidos no plantel daFundação RIOZOO. Durante os estudos prévios sobre “As Duas Tartarugas”, tambémcontamos com a indispensável colaboração de Ulisses Caramaschi e Ronaldo Fernandes(Museu Nacional/UFRJ), Nelson Papavero (Museu de Zoologia/USP) e Sérgio AlexKugland de Azevedo (Museu Nacional/UFRJ), cujas sugestões mostraram-se de grandevalia para a execução deste trabalho. Cabe agradecer ainda a Paulo Martins Teixeira eTatiana Papavero pela arte final das figuras do texto, bem como a Vera de FigueiredoBarbosa, Antônio Carlos Gomes Lima (Biblioteca do Museu Nacional/UFRJ) e MargarethElisabeth Cardoso (Livraria Carioca Rio Antigo) pelo auxílio prestado na reunião dabibliografia pertinente e/ou na análise das referências utilizadas. Por fim, cumpredestacar o apoio concedido pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico eTecnológico (CNPq) às pesquisas realizadas pelo autor durante os últimos anos.

REFERÊNCIAS

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