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Projecto apresentado no XI Encontro Nacional de Estudantes de Física, Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, 27 Fevereiro - 1 Março de 2009, resultante de uma parceria entre a Sociedade Portuguesa de Física e a Physis - Associação Portuguesa de Estudantes de Física. Resumo: Este projecto tem como objectivo permitir a alunos do ensino básico e secundário medir a circunferência da Terra, tal como fez Eratóstenes há mais de 2200 anos. Os princípios básicos desta experiência são os seguintes: i) Colocamos ao sol uma vara na posição vertical, medimos a sua sombra quando o Sol está no ponto mais alto da sua trajectória diária e determinamos o ângulo formado pelos raios solares com a vertical. ii) A seguir, comparamos o resultado com o de outra turma localizada numa latitude diferente. Alguns traçados geométricos e uma simples regra de proporcionalidade são suficientes para determinar o comprimento do meridiano terrestre. Medindo a Terra com Sombras Um projecto para os alunos do ensino básico e secundário

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Projecto apresentado no XI Encontro Nacional de Estudantes de Física, Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, 27 Fevereiro - 1 Março de 2009, resultante de uma parceria entre a Sociedade Portuguesa de Física e a Physis - Associação Portuguesa de Estudantes de Física.

Resumo:

Este projecto tem como objectivo permitir a alunos do ensino básico e secundário medir a circunferência da Terra, tal como fez Eratóstenes há mais de 2200 anos.

Os princípios básicos desta experiência são os seguintes: i) Colocamos ao sol uma vara na posição vertical, medimos a sua sombra quando o Sol está no ponto mais alto da sua trajectória diária e determinamos o ângulo formado pelos raios solares com a vertical. ii) A seguir, comparamos o resultado com o de outra turma localizada numa latitude diferente. Alguns traçados geométricos e uma simples regra de proporcionalidade são suficientes para determinar o comprimento do meridiano terrestre.

Medindo a Terra com Sombras Um projecto para os alunos do ensino básico e secundário

1) Introdução Histórica: As observações de Eratóstenes Em 205 a.C., o grego Eratóstenes, enquanto Director da Grande Biblioteca da ci-dade de Alexandria, no Egipto, propôs um método puramente geométrico para me-dir o comprimento do meridiano terrestre (circunferência que passa pelos dois pólos). O método baseava-se na observação de sombras de objectos verticais, em dois locais distintos, Alexandria e Sião (actual cidade de Assuão - ver figura), por altura do solestício de verão e ao meio-dia solar local. Note-se que a distância en-tre estes dois locais era estimada por Eratóstenes como sendo cerca de 800 km, estimativa feita com base no tempo que as caravanas de camelos levavam para efectuar a ligação entre estas duas cidades!

Nota: Eratóstenes usava uma unidade de comprimento denominada “stadion”. Existe al-guma ambiguidade na conversão desta unidade para o sistema SI, dado conhecerem-se diferentes stadion.

É precisamente no solestício de verão e ao meio dia solar local que, no Hemisfério Norte, o Sol atinge o ponto mais alto acima do horizonte. Todavia, Eratóstenes ob-servou que existiam diferenças de um local para o outro. Em Sião (que é aproxi-madamente no Trópico de Câncer), o Sol está na vertical, iluminando completa-mente o fundo de um poço de água e fazendo com que as sombras produzidas por objectos na posição vertical estejam perfeitamente centradas em torno dos mes-mos. Em contrapartida, em Alexandria, o Sol já não está na vertical e os mesmos objectos apresentam uma sombra descentrada e mais comprida. Eratóstenes re-solveu medir a sombra de um obelisco cuja altura já conhecia e determinou deste modo o ângulo formado pelos raios solares com a vertical, tendo encontrado um valor de 7,2º (fig. 1).

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Com base nestas observações, Eratóstenes deparou-se com duas hipóteses :

1) A Terra é plana (fig. 2a), mas nesse caso, o Sol estaria suficientemente próximo para que a divergência dos seus raios ao atingir os objectos distantes fosse signifi-cativa; com efeito, os objectos cujo comprimento é idêntico produzem sombras com comprimentos diferentes e nenhuma sombra quando o Sol está na vertical (ângulo nulo).

2) A Terra não é plana (fig. 2b), a sua superfície é curva e talvez até esférica. Mas obtemos resultados idênticos com raios solares paralelos entre eles: isto implica que o Sol esteja suficientemente distante, muito, muito distante…

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Eratóstenes decidiu seguir a segunda hipótese. De facto, os Antigos já suspeita-vam que a Terra não era plana, com base em diversas observações que aponta-vam para uma certa curvatura da sua superfície: o marinheiro no alto do seu mas-tro é o primeiro a avistar a costa ao longe; o observador no alto de uma falésia avista durante mais tempo o navio que se afasta em direcção ao horizonte do que aquele que ficou na praia; a estrela polar não possui a mesma altura acima do horizonte na Grécia e no Egipto; finalmente, durante os eclipses lunares, a sombra projectada da Terra sobre a Lua revela uma forma circular.

Convicto de que a Terra é esférica, o nosso genial Eratóstenes resolve desenhar a sua célebre figura geométrica « magnificamente simples » (fig.3), que lhe vai per-mitir calcular facilmente o comprimento do meridiano terrestre! Veja por si mesmo :

Se a Terra for esférica, ao prolongar a linha vertical de Alexandria (obelisco) e a de Sião (o poço), estas duas linhas verticais vão convergir, por definição, no centro da Terra. Por outro lado, Eratóstenes sabia que, estando Sião alinhada na direcção Sul em relação a Alexandria, as duas cidades estavam mais ou menos situadas no mesmo meridiano. Estando os raios solares efectivamente paralelos, o ângulo for-mado pelas duas linhas verticais no centro da Terra é então idêntico ao ângulo cal-culado com a sombra do obelisco (7,2º). A proporção deste ângulo relativamente aos 360º do círculo é idêntica à proporção da distância que separa as duas cidades (cerca de 800 km) em relação à circunferência do círculo (neste caso, o meridiano terrestre). Consegue adivinhar o que se segue : 360º dividido por 7,2º dá 50, e 800 km multiplicado por 50 dá efectivamente 40 000 Km (comprimento que será confir-mado mais tarde através de outros processos).

Nota: Como já foi referido, as observações feitas por Eratóstenes podiam ser justificadas com base na primeira hipótese, ou seja, a de uma Terra plana e de um Sol muito próximo. Usando este cenário podemos calcular com exactidão a distância da Terra ao Sol. Efecti-vamente, neste caso, a tangente do ângulo de 7.2º daria a razão entre os 800 km que separam Sião de Alexandria e a distância que separa a Terra do Sol. Obtemos então que a distância Terra-Sol seria de 800 km / tan 7.2º = 6500 km (que é aproximadamente o valor do raio terrestre). Hoje sabemos que o nosso Sol se encontra a uma distância média da Terra de cerca de 150 milhões de Km!

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2) Adaptação de um projecto experimental à turma

Esta experiência será realizada conjuntamente com outra turma (cujas coordena-das serão fornecidas), não sendo necessário utilizar um obelisco ou um poço! Cada turma necessitará apenas de uma simples vara, de preferência (mas não obrigatoriamente) com uma altura idêntica de modo a simplificar o processo de comparação das medições de sombra. Também não será necessário que uma das turmas esteja localizada no trópico de Câncer! Deverá apenas estar situada numa latitude nitidamente diferente da outra. A figura 4a recorda-lhe, caso seja ne-cessário, o que representam as duas coordenadas geográficas de um local, ou seja, a latitude e a longitude. Um semi-meridiano é uma linha de longitude con-stante. Um paralelo é uma linha de latitude constante. Se as duas escolas estiverem situadas mais ou menos no mesmo meridiano (fig. 4b), melhor… Caso contrário, cada turma verá, a uma hora diferente, o meio-dia solar no seu próprio meridiano! Além do mais, a figura 4c demonstra que não é a distância entre as duas escolas que deverá ser considerada, mas a distância me-nor que separa os dois paralelos indicando as suas latitudes (esta distância é fa-cilmente calculada, como explicado em baixo).

Também não será necessário esperar pelo solstício de verão para efectuar as me-dições! Poderá escolher um dia qualquer do ano, desde que seja o mesmo dia da turma parceira. Será ainda conveniente repetir a experiência durante vários dias.

O facto de cada turma determinar individualmente o momento do meio-dia solar local (diferente em cada dia do ano e de um local para outro), também não constitui um problema: em Portugal continental será apenas necessário identificar a menor sombra produzida entre as 13h00 e as 14h00 (dado que o meio dia solar ocorrerá neste intervalo), no horário de Verão: uma brincadeira de criança… Na condição, é claro, de que o Sol também coopere!

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3) Exemplo com duas turmas de Braga e Faro:

Coordenadas das duas cidades: Braga: latitude 41°35'N, longitude 8°25'W; Faro, latitude 37°02'N, longitude 7°55'W. Se as turmas decidirem efectuar a medição, por exemplo, na sexta-feira, 29 de Maio de 2009 deverão obter os seguintes valores aproximados: para Braga α1 = 19,7º (meio dia solar local cerca das 13H28, hora oficial portuguesa) e para Faro α2 = 15,1° (meio dia solar local cerca das 13H22, hora oficial portuguesa).

Nota: a previsão do ângulo alfa, bem como o meio dia solar local, poderá ser feita usando o seguinte sítio da internet http://isheyevo.ens-lyon.fr/eaae/groupspace/eratosthene/help-for-calculations/anywhere/(bastando para isso conhecer a latitude e longitude locais). Esta informação NÃO deve ser transmitida aos alunos!

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Mas como será possível, com base nestes dois ângulos (fig. 6a), determinar o fa-moso ângulo α? Basta subtrair o ângulo α2 ao ângulo α1, o que dá 4.6º. Podemos também materializar esta subtracção do seguinte modo (fig. 6b): utilizando papel vegetal, reproduzimos o ângulo α2 e colocamo-lo sobre o ângulo α1 de modo a que os dois bordos relativos ao lado raios solares coincidam: o bordo inferior do ângulo decalcado é então paralelo à vertical de B, o que nos permite encontrar a figura de Eratóstenes (ver novamente a fig. 3).

Uma vez que as duas escolas parceiras não estão situadas no mesmo meridiano, é necessário determinar a distância menor entre o paralelo de Braga e o de Faro. É muito simples: utilizando um mapa, desenhamos cuidadosamente os dois paralelos (linhas de latitude constante) e, utilizando a escala do mapa, calculamos a distân-cia entre elas (fig. 7). Neste caso, o valor encontrado é aproximadamente 490 km.

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Já possuímos agora os dois elementos necessários para o cálculo do meridiano terrestre segundo o “método Eratóstenes”: o ângulo alfa de 4.6º e a distância de 490 km entre os dois paralelos. Sendo a proporção do círculo completo relativa-mente aos 4.6º encontrados de 78 vezes (360º dividido por 4.6º), o cálculo do me-ridiano efectua-se multiplicando 490 km por 78, o que dá 38.000 km…. Note-se que de as medidas devem ser as mais exactas possíveis, sobretudo se as latitudes são mais próximas!

4) O papel dos estudantes de Física; Promotores e escolas asso-ciadas; Calendarização

i) Os alunos participantes no ENEF que queiram integrar este projecto serão desig-nados por “promotores”.

ii) Cada promotor terá uma “escola associada”, do ensino básico ou secundário, que o próprio promotor deverá escolher, ficando como elo de ligação a essa escola.

iii) Até ao final de Março, cada promotor deverá contactar a escola associada, visitando-a de preferência, e apresentando aos professores interessados a ac-tividade a desenvolver com os alunos. Até esta data, o promotor informará os or-ganizadores (contactos em baixo) de: a) Qual a escola associada; b) Qual o professor responsável; c) Quais as coordenadas (latitude e longitude da escola).Logo que esta informação esteja disponível, a organização fará o emparelhamento das escolas, informando os respectivos promotores e professores responsáveis. Estes, poderão desde logo, usando um mapa, calcular a distância entre os parale-los que passam pelas duas escolas. Este é o primeiro dos dois dados necessários para obter o resultado final.

iv) Durante o mês de Abril, as escolas participantes deverão fazer uma experiência teste (se possível com a participação do promotor). Escolhendo um dia de sol (!) deverão colocar uma vara vertical numa superfície plana, fazendo um traçado da sombra da vara. O meio dia solar corresponderá ao tamanha mínimo da sombra. A tangente do ângulo alfa é dada pelo tamanho da sombra a dividir pelo tamanho da vara.

Nota 1: há um pequeno erro devido à penumbra. O facto de o sol não ser uma fonte pon-tual implica que haja uma zona de penumbra na “ponta” da sombra, em que os raios so-lares provenientes do extremo inferior do sol são bloqueados, mas não os que são pro-venientes do extremo superior do sol. Note que o tamanho da penumbra aumentará com o tamanho da vara.

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Nota 2: Se na escola já existir alguma “vara” natural (como, por exemplo, o mastro de uma bandeira) esta pode ser usada. Mas é necessário garantir a verticalidade da “vara“ e a horizontalidade da superfície em que a sombra é projectada.

v) Durante o mês de Maio serão efectuadas três medições em três dias diferentes (de modo a minimizar a probabilidade de não haver sol!). As datas sugeridas são: 12, 20 e 28 de Maio (uma terça, uma quarta e uma quinta feira). Note-se que as escolas parceiras poderão, por razões logísticas, fazer uma escolha diferente de datas. Mas é fundamental que as turmas parceiras escolham os mesmos três dias para fazer a medição! Cada escola deverá por isso preencher a seguinte tabela:

Tamanho do

Gnómon

Tamanho da Sombra

Data Medição1 Data Medição2 Data Medição3

Escola A

Escola B

vi) Recordemos que o resultado a obter na medição é o ângulo alfa. As escolas parceiras informar-se-ão mutuamente e ao promotor do ângulo alfa medido. Sub-traindo os dois ângulos obtêm o ângulo pretendido. A razão deste ângulo para 360º será igual à razão da distância entre os dois paralelos que passam pelas escolas para o comprimento do meridiano terrestre. As escolas informarão os promotores do resultado final, que, por sua vez, enviarão à organização a tabela seguinte, preenchida:

Latitude Longi-tude

Distân-cia entre paralelos

(Km)

Medição 1 de alfa

(data)

Medição 2 de alfa

(data)

Medição 3 de alfa

(data)

Escola A

Escola B

Diferença de alfas

Tamanho do Meridiano Terrestre (Km)

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vii) Os resultados serão disponibilizados na página da internet da Sociedade Portu-guesa de Física.

5) Contactos:

Qualquer dúvida poderá ser enviada para a organização através dos seguintes en-dereços de email: Carlos Herdeiro ([email protected]), direcção da Sociedade Portuguesa de FísicaFlávio Coelho ([email protected]), Physis - Associação Portuguesa de Estudantes de Física

6) Referências e documentação:

Este documento baseia-se em documentos que podem ser encontrados em:http://www.physics2005.org/events/eratosthenes/http://lamap.inrp.fr/eratos?

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