PETER DUFFY - Os irmãos Bielski - baixardoc
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PETER DUFFY
Os irmãos BielskiA história real de três homens que desafiaram os nazistas, salvaram 1200 judeus e
construíram uma aldeia na floresta
Este livro foi digitalizado sem fins comerciais para uso exclusivo de pessoas com
deficiência que necessitem de leitores de tela para aceder ao seu conteúdo, não devendo
ser distribuído com outra finalidade, mesmo de forma gratuita.
Tradução Marcos Padilha
COMPANHIA DAS LETRAS
Copyright © 2003 by Peter Duffy
Publicado mediante acordo com HarperCollins Publishers Inc., Nova York.
O autor agradece ao Yivo Institute for Jewish Research, por ter permitido a citação da
autobiografia de Tuvia Bielski em língua iídiche, e à University of Chicago Press, por
autorizar a citação de Forests: The shadow of civilization, de Robert Pogue Harrison.
Título original
The Bielski brothers: the true story of three men who defied the Nazis, saved 1200 Jews, and
built a village in the forest
Capa
Ettore Bottini
Foto da capa
© Bettmann/Corbis/Stock Photos , .
Preparação:Cacilda Guerra e Maria Cecília Caropreso
Revisão: :
Ana Maria Barbosa e Renato Potenza Rodrigues
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (cip) (Câmara Brasileira do Livro, SP,
Brasil)
Duffy, Peter, 1969Os irmãos Bielski: a história real de três homens que desafiaram os
nazistas, salvaram 1200 judeus e construíram uma aldeia no meio da floresta / Peter Duffy ;
tradução Marcos Padilha. São Paulo : Companhia das Letras, 2004.
Título original: The Bielski brothers ISBN 85-359-0522-7
1. Bielski, Isael 2. Bielski, Tuvia 3. Bielski, Zus 4. Guerra Mundial, 1939-1945 - Judeus-
Salvamento - Bielo-Rússia 5. Guerra Mundial 6. 1939-1945 - Resistência judia - Bielo-
Rússia Holocausto judeu (1939-1945) - Bielo-Rússia 7. Judeus - Perseguição
- Bielo-Rússia i. Título
Parflmínkatnãeemeupai
04-4021
CDD-940.53089924
índices para catálogo sistemático:
1. Judeus: Resistência : Guerra Mundial,
1939-1945 : História 940.53089924
2. Judeus: Salvamento : Guerra Mundial,
1939-1945 : História 940.53089924
[2004]
Todos os direitos desta edição reservados à
EDITORA SCHWARCZ LTDA.
Rua Bandeira Paulista 702 cj. 32
04532-002 - São Paulo - SP
Telefone (l 1)3707-3500
Fax (l 1)3707-3501www.companhiadasletras.com.br
Havia algo de familiar na floresta, e, na pior das hipóteses, poderíamos escapar por entre as árvores.
Tuvia Bielski, autobiografia inédita, 1955
... as florestas eram foris, ”à margem”, ”o lado de fora”. Nelas viviam os rejeitados, os loucos, os amantes, bandidos, eremitas, santos, leprosos, os maquis, fugitivos, desajustados, os perseguidos, os homens selvagens. Para que outro lugar poderiam ir? A margem da lei e da sociedade humanas estava a floresta. Mas o refúgio da floresta era execrável. Impossível permanecer humano na floresta; tudo que se podia era elevar-se acima da condição humana ou se afundar abaixo dela.
Robert Pogue Harrison, de Forests: The shadow of civilization, 1992
Comparadas aos guetos, eram o paraíso. Nas florestas, éramos livres. É tudo o que posso dizer. Tínhamos liberdade.
Charles Bedzow
Sumário
Prólogo 11
1. Do Czar ao Führer 19
2. Junho de 1941 - Dezembro de 1941 43
3. Dezembro de 1941 - Junho de 1942 71
4. Junho de 1942 - Outubro de 1942 93
5. Outubro de 1942 - Fevereiro de 1943 121
6. Fevereiro de 1943 - Abril de 1943 143
7. Maio de 1943 - Julho de 1943 168
8. Julho de 1943 - Setembro de 1943 184
9. Setembro de 1943 205
10. Outubro de 1943 - Janeiro de 1944 217
11. Janeiro de 1944 - Julho de 1944 250
12. Para Israel e a América 275
Epílogo 288
Notas 291
Agradecimentos 311
Prólogo
Serei famoso depois de morto. Tuvia Bielski
Três homens, irmãos, salvaram tantos judeus durante a Segunda Guerra Mundial quanto
Oskar Schindler. Eles organizaram uma força militar que matou centenas de soldados
inimigos, quase tantos quanto os combatentes do levante do gueto de Varsóvia. Seus nomes
eram Tuvia, Asael e Zus Bielski. Para os 1200 sobreviventes judeus que deixaram as florestas
bielo-russas em julho de
1944, e para as várias gerações de seus descendentes, esses homens se tornaram lendários,
reverenciados como heróis. Fora desse grupo, porém, os homens por trás da maior e mais
bem-sucedida força judaica de combate e de socorro de guerra permaneceram quase
desconhecidos; nos sessenta anos decorridos desde então, apenas uns poucos livros relataram
seus feitos e nenhuma placa homenageia seus nomes.
Topei com essa história enquanto fazia uma pesquisa on-line. Uma referência solta a ”Judeus
da Floresta” despertou minha
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curiosidade e conduziu-me por um caminho que me mobilizaria pelos três anos seguintes -
um caminho que me deu a oportunidade extraordinária de reunir em primeira mão relatos de
sobreviventes do Holocausto, em alguns casos apenas meses ou mesmo semanas antes de sua
morte.
E assim, depois de inúmeras entrevistas, durante as quais ouvi histórias sobre ávida nas
florestas da atual Belarus ocidental, onde a resistência dos Bielski contra os alemães resultou
na criação de uma aldeia com oficinas improvisadas e habitações primitivas, em
27 de junho de 2001 encontrei-me no limiar da maior dessas florestas. Tive a oportunidade de
imaginar como ela deve ter sido, guiado por uma polonesa idosa chamada Leokadia
Lankovich.
Mas nada a respeito daPuschaNaliboki-puscha é uma palavra comum às línguas polonesa,
russa, bielo-russa e ucraniana que significa ”floresta densa” - indicava que ela houvesse
abrigado alguma coisa fora do comum. Parecia uma floresta qualquer, num país qualquer.
Contudo, alguns dos mais extraordinários atos de coragem e engenho demonstrados durante a
guerra ocorreram entre esses pinheiros e abetos.
Quando chegou a esses bosques no verão de 1943, o grupo Bielski era integrado pelo
espantoso número de oitocentos judeus. Mais de um ano antes, os irmãos tinham estabelecido
uma base na floresta, povoada por vários parentes, perto do domicílio da família Bielski. O
mais velho e sábio dos três, Tuvia, insistira que o grupo fosse aberto a todos os judeus, pouco
importando se jovens ou velhos, saudáveis ou enfermos, soldados ou inválidos. ”Antes salvar
a vida de uma anciã judia”, dizia, ”do que matar dez soldados alemães.” Aos poucos, mais
pessoas chegavam, muitas resgatadas dos guetos pelos combatentes Bielski, até que a
unidade se tornou um enorme ajuntamento de foragidos movendo-se de floresta em floresta,
sempre um lance à frente dos alemães.
Em agosto de 1943, Hitler enviou suas tropas mais cruéis e
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impetuosas a essa puscha, com o propósito de matar cada integrante do grupo Bielski. Numa
tentativa desesperada de sobrevivência, os irmãos conduziram todos os oitocentos membros
através de quilômetros de pântanos da puscha, enquanto o tiroteio zunia sobre suas cabeças e
os gritos dos soldados inimigos enchiam-lhes os ouvidos. Finalmente alcançaram uma área
isolada no interior mais profundo da floresta, onde permaneceram, em silêncio e sem
alimento, até os nazistas desistirem de sua caçada. Não se perdeu uma única pessoa. Foi uma
fuga de uma audácia assombrosa.
Posteriormente, os três irmãos descobriram um local seguro e seco na puscha, onde
determinaram a construção de uma pequena cidade. Tinha alojamentos; oficinas para
alfaiates, sapateiros, costureiras e carpinteiros; um rebanho grande de vacas e cavalos; uma
escola para sessenta crianças; uma rua principal e uma praça central; um teatro para a
apresentação de músicas e peças teatrais; e um curtume que também servia de sinagoga. Para
os judeus exaustos que por um triz escapavam da morte, fugidos de guetos e campos de
trabalho, aquilo era a visão de um outro mundo, um lugar extraordinário onde eles podiam
viver em liberdade no coração da Europa sob domínio nazista.
A sra. Lankovich, uma polonesa atarracada de riso contagiante e tendência para uma
tagarelice interminável, prometeu me mostrar a localização precisa da aldeia judaica. Depois
dos muitos solavancos em um caminho que conduzia ao interior da floresta, ela ordenou ao
motorista que parasse o jipe militar russo. ”Esta era a área”, ela disse, saltando do veículo e
apontando para as árvores em volta do utilitário.
Não obstante sua idade, a sra. Lankovich, como que revigorada pela memória, começou a
caminhar em meio à vegetação espessa tão rapidamente que era difícil acompanhá-la. ”Aqui
era um dos lugares onde eles tinham um abrigo”, disse, apontando
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para uma pequena fossa cheia de água da chuva. Não parecia diferente de nenhum outro
buraco nos bosques. Mas a sra. Lankovich era insistente.
Ela afastava os galhos do rosto à medida que avançava, parando momentaneamente para
colher morangos e apontar vestígios de mais alojamentos dos Bielski. E continuava falando.
”Quando eu vinha ao campo, não podia andar onde eu quisesse. Os guardas me paravam. Eu
lhes dizia que queria falar com uma amiga minha chamada Sulia. Eles então mandavam
alguém, e Sulia vinha e me conduzia ao campo. Era bonito”, disse. ”Era como Minsk.”
Tentei imaginar essa floresta há mais de meio século. Como seria a cozinha em alvoroço,
supervisionada, me contaram, por um homem rude e com um avental perpetuamente
ensangüentado, que mexia, frenético, numa série de panelas com uma colher de pau
comprida? Sobre o que se conversava nos alojamentos, nos abrigos com teto de madeira,
ocupados com freqüência por pessoas da mesma aldeia ou que trabalhavam na mesma
profissão? Como procedia o armeiro, cujo martelar podia ser ouvido o dia inteiro, para
consertar os fuzis quase destruídos, recuperados dos campos? Depois de tantos anos de
crescimento da vegetação, era difícil encontrar indícios da base dos irmãos.
Também os irmãos pareceram sumir depois da guerra. Asael engajou-se no Exército
Vermelho e morreu lutando contra os nazistas na Prússia oriental, exatamente sete meses
depois de abandonar a floresta. Tuvia e Zus mudaram-se para Israel, onde se dedicaram a
trabalhos braçais. Em meados dos anos 1950, ambos viviam num bairro de classe média no
Brooklyn, em Nova-York, pais de famílias constituídas com esposas que conheceram
enquanto comandavam as tropas da floresta. Zus, o mais bem-sucedido, tornou-se
proprietário de uma pequena companhia de caminhões e táxis, enquanto Tuvia, o grande
comandante que cavalgara um cavalo branco, passava maiores dificuldades, dirigindo um
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caminhão de entregas e lutando para sustentar a família. Tuvia faleceu em 1987,Zusem 1995.
Eram homens esquecidos, imigrantes comuns americanos tentando garantir um futuro sólido
para seus filhos.
na busca de uma história que caminhava rápido para o desaparecimento, procurei cada uma
das viúvas dos irmãos, guardiãs orgulhosas da memória de seus maridos, e o quarto irmão,
Aron (Bielski) Bell, um bravo batedor de doze anos na época da guerra. Entrevistei mais de
cinqüenta sobreviventes dos campos dos irmãos e vasculhei cada documento, relatório e
fotografia pertencente à experiência da floresta que consegui encontrar. Conversei com
guerrilheiros e camponeses gentios, alguns deles aliados dos irmãos, alguns inimigos.
Descobri um manuscrito extenso como um livro, redigido por Tuvia Bielski, nunca traduzido
para o inglês e desconhecido até mesmo de sua família.
Foi uma viagem extraordinária, que me transformou de observador não envolvido em alguém
com um vínculo pessoal profundo com essa comunidade, sua história e seus membros. A tal
ponto que, quando seus bravos sobreviventes chegaram a seu fim inevitável, senti uma
enorme tristeza, não porque eram fontes importantes, mas porque eu os tinha como amigos.
Assim, sinto-me honrado, ainda que um tanto imerecidamente, de ter estado na enorme
puscha, no local do grande triunfo dos irmãos Bielski, um dos lugares mais sagrados da
Segunda Guerra Mundial - um lugar não de extermínio para os judeus, mas de celebração da
vida. Quando fechava os olhos e ouvia as vozes dos sobreviventes, eu quase podia entrever o