Perspectivando o Ensino do Instrumento Musical no Séc. XXI

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PERSPECTIVANDO O ENSINO DO INSTRUMENTO

MUSICAL NO SÉC. XXI

Coordenador

EDUARDO LOPES

ii

Índice BIOGRAFIAS [iii] INTRODUÇÃO [1] 1 Contribución para una formación reflexiva y dialógica del profesorado FERNANDO SADIO RAMOS e MARÍA ANGUSTIAS ORTIZ MOLINA [7] 2 Piano: Para uma pedagogia mais… Pedagógica? Contemporânea? Não castrante? FRANCISCO MONTEIRO [45] 3 O Pedal no ensino do piano LUÍS PIPA [63] 4 Propuesta investigadora para la enseñanza elemental de fagot como perspectiva educativa para el siglo XXI JOSÉ RAMÓN PÉREZ MESTRE [82] 5 Contributos da psicologia da música para a formação de professores do ensino vocacional de música NUNO ARRAIS e HELENA RODRIGUES [99] 6 Colaboraciones I: Algunas cuestiones prácticas sobre la disciplina de clase de conjunto ROBERTO ALEJANDRO PÉREZ [116] 7 O contexto social no ensino do jazz: A “jam session” JOSÉ MENEZES [129] 8 Práticas Jazzísticas no Ensino do Clarinete PAULO GASPAR e EDUARDO LOPES [146]

iii

Biografias

Eduardo Lopes estudou bateria jazz e percussão clássica no

Conservatório de Roterdão (Holanda). É licenciado (summa cum

laude) em performance pelo Berklee College of Music (EUA) e

doutorado em teoria da música pela Universidade de

Southampton (Reino Unido). Para além de manter uma actividade

artística como intérprete, é investigador responsável da linha de

investigação "Ensino da Música: Estudos e elaboração de

materiais" da UnIMeM (Unidade de Investigação em Música e

Musicologia). É professor auxiliar do Departamento de Música da

Universidade de Évora.

Fernando Sadio Ramos es Profesor del Área de Psicología y

Ciencias de la Educación de la Escola Superior de Educación del

Instituto Politécnico de Coimbra (Portugal) y miembro

colaborador activo del Grupo de Investigación HUM-742

D.E.Di.C.A. (Desarrollo Educativo de las Didácticas en la

Comunidad Andaluza), de la Universidad de Granada. Me dedico

a la docencia, formación e investigación desde 1986, sobretodo en

las Áreas de la Filosofía en general, de la Ética, de los Derechos

del Hombre y de la Formación de Profesorado, en las que tengo

publicadas diversas obras.

Francisco Monteiro estudou piano no Conservatório de Música

do Porto e com a Pianista Helena Costa. É diplomado em piano -

concerto pela Escola Superior de Música de Viena (Austria),

iv

classe de Noel Flores, Mestre em Ciências Musicais pela Fac. de

Letras da Universidade de Coimbra e Doutor em Música

Contemporânea pela Universidade de Sheffield (Reino Unido). A

sua actividade como pianista é dedicada essencialmente à música

contemporânea; é, ainda, investigador (CESEM), compositor e

professor na Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico

do Porto.

Helena Rodrigues concluiu o Curso Superior de Piano no

Conservatório de Música do Porto e o Doutoramento em

Psicologia na Universidade de Coimbra. É professora auxiliar na

Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova

de Lisboa e investigadora-responsável do Laboratório de Música

e Comunicação na Infância do Centro de Estudos de Sociologia e

Estética Musical da FCSH-UNL e do Projecto de Investigação

Desenvolvimento Musical na Infância e Primeira Infância

financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia aí em

curso. Membro-fundador da Companhia de Música Teatral tem

participado na concepção e interpretação das principais obras de

música cénica e teatro musical deste agrupamento artístico.

José Menezes é licenciado em Jazz (saxofone) pela Escola

Superior de Música e Artes do Espectáculo do Porto. Mestrado

em Psicologia da Improvisação (Sheffield). Estudou com Bill

Dobbins, Dave Schnitter, David Liebman, Jan Garbarek e Joe

Lovano. Foi um dos fundadores da Escola de Jazz do Porto

(1982). Director do curso de Música e Novas Tecnologias na

v

Escola Profissional de Música de Almada (2000). Fundador da

Escola de Jazz de Torres Vedras (2002). Criador do projecto

pedagógico “O Jazz Vai à Escola” (2005) e “Viagem ao Mundo

do Jazz” (Fund. Calouste Gulbenkian, 2007). Como intérprete

destacam-se as colaborações com, Mário Laginha, Carlos

Barretto, Maria João, Jacinta, Freddie Hubbard, Eddie Henderson,

Benny Golson e Curtis Fuller. É docente no Departamento de

Música da Universidade de Évora.

José Ramón Pérez Mestre estudió en el Conservatorio Superior

Óscar Esplá de Valencia graduándose en la especialidad de Fagot

con las máximas calificaciones. Obtiene la beca Erasmus

concedida por la Unión Europea para ampliar estudios en York

(Reino Unido). Titulado Doctor con la calificación de

Sobresaliente Cum Laude por unanimidad y Premio

Extraordinario de Doctorado. Participa de manera regular en

diversas orquestas, bandas y otras agrupaciones instrumentales.

Desarrolla una amplia y densa labor pedagógica y de

investigación. Es profesor responsable de la cátedra de fagot en el

Conservatorio Superior de Badajoz, profesor en el Departamento

de Música de la Universidad de Extremadura y fagot solista en la

Banda Municipal de Badajoz.

Luís Pipa estudou piano nos Conservatórios de Braga e Porto e na

Academia Superior de Música de Viena (Áustria). É ainda

detentor dos graus Mestre e Doutor (PhD) em Performance pelas

Universidades Inglesas de Reading e Leeds, respectivamente.

vi

Mantém uma actividade regular como concertista, tendo mais de

uma dezena de discos gravados. É Professor de Piano e Música de

Câmara no Departamento de Música do ILCH (Instituto de Letras

e Ciências Humanas) e membro investigador do CEHUM (Centro

de Estudos Humanísticos), Universidade do Minho.

María Angustias Ortiz Molina es Catedrática EU Jubilada de

Didáctica de la Expresión Musical de la Universidad de Granada

(España) y Responsable del Grupo de Investigación HUM-742

D.E.Di.C.A. (Desarrollo Educativo de las Didácticas en la

Comunidad Andaluza), de la Universidad de Granada. Desde

1982 mi dedicación ha sido la docencia, formación e

investigación en la Universidad de Granada en el Área de

Didáctica de la Expresión Musical. Mis principales líneas de

Investigación son la Educación Intercultural, la Atención a la

Diversidad y el Diseño de Actividades para el fomento de la

Socialización, favoreciendo y propugnando interdisciplinariedad.

Nuno Arrais é mestre em Psicologia e Pedagogia Musical pela

Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova

de Lisboa e doutorando em Ensino e Psicologia da Música na

mesma Faculdade. É bolseiro de investigação da Fundação para a

Ciência e Tecnologia pelo projecto: Desenvolvimento Musical na

Infância e Primeira Infância, a decorrer no Laboratório de Música

e Comunicação na Infância do Centro de Estudos de Sociologia e

Estética Musical da FCSH-UNL. Licenciado em Contrabaixo pela

Escola Superior de Música e Artes do Espectáculo, conta com

vii

uma larga experiência pedagógica nos diversos graus de ensino, a

par da intensa actividade artística.

Paulo Gaspar é clarinetista na Banda da Armada desde 1989 e

membro dos Dixie Gang desde 1991. Ao longo da sua carreira

tem desenvolvido uma actividade muito diversa que vai da

música erudita ao jazz. Além das enumeras gravações para a rádio

e televisão, tem colaborado com importantes músicos portugueses

e a maioria das orquestras nacionais. É um dos elementos do

Lisbon Underground Music Ensemble e Big Band do Hot Clube

de Portugal. Actualmente é doutorando da Universidade de Évora,

professor de Criatividade Musical na Academia Nacional

Superior de Orquestra e professor de clarinete na Escola Superior

de Música de Lisboa.

Roberto Alejandro Pérez estudou piano com Zbigniew Neuhoff e

composição com Jacobo Ficher, licenciado em direcção orquestral

pela FACM da UCA (Argentina) e doutorado em Música e

Musicologia pela Universidade de Évora. Tem dirigido orquestras

na Argentina, Brasil, Espanha, Italia, República Checa e Portugal,

Deu aulas na Universidade Católica Argentina, Universidade

Federal da Bahia, Universidade de Aveiro. Actualmente é

professor na Escola Superior de Música de Lisboa e o Instituto

Universitário Afonso III (Loulé). É membro da UnIMeM e do

Centro de Investigação em Ciências da Educação e Formação do

INUAF.

1

Introdução

O acto de ensinar (e aprender) um instrumento musical é

provavelmente tão antigo como a “descoberta” de um

determinado instrumento; ou até tão antigo quanto a própria

música. Assim que alguém produziu os primeiros sons musicais

num determinado “objecto”, outro terá tido o desejo de fazer o

mesmo, questionando o primeiro sobre a forma como obter tais

sons, ou tentando realizar os mesmos sons através de imitação. E

assim, e de uma forma muito generalista, terá nascido a

Instituição do ensino e aprendizagem do instrumento musical.

Um dos argumentos utilizados para a defesa da universalidade da

música é a transversalidade cultural da relação professor/aluno de

instrumento musical. Ao longo dos tempos1, e na sua forma mais

vulgar, o aluno é caracterizado como um jovem aprendiz, que

aprende a sua arte sob a orientação de um professor especialista:

um artista de reconhecido mérito e de grande capacidade técnica

instrumental. Todo este saber e capacidades conferem ao

professor um estatuto de autoridade na sua área, sendo-lhe

também vulgarmente associado o título de Mestre. Caberá então

ao mestre passar a sua arte a um aprendiz, que por sua vez quererá

imitar o seu par.

1 Davidson, J. and Jordan, N. (2007). “Private Teaching, Private Learning: An exploration of music instrument learning in the private studio, junior and senior conservatoires” in Bresler, L. (ed.) The International Handbook of Research in Arts Education. Dortrecht: Springer. 729-744

2

O binómio mestre/aprendiz tem sido também reforçado ao longo

dos tempos pelo carácter individual das aulas de instrumento. No

entanto, a partir da segunda metade do séc XX, a postura

inerentemente exclusiva da aprendizagem de instrumento –

derivada em grande parte do contexto de aula individual e do

conceito mestre/aprendiz – tem sofrido algumas alterações. Do

ponto de vista sociológico, a contínua democratização das

sociedades mundiais tem sido um factor preponderante para a

“inclusividade” na educação contemporânea. Desta maneira,

passou a ser mais aceitável que um aluno de instrumento tenha

aulas de uma forma mais ou menos regular ou através de master

classes com mais do que um professor. Terá começado assim o

desvanecimento do peso institucional da relação mestre/aprendiz,

que eventualmente terá desaparecido com a globalização das

sociedades e fácil disseminação da informação, fruto das novas

tecnologias do final do séc. XX.

Por outro lado, novas correntes filosóficas e sociais de cerne

inclusivo do último quartel do séc. XX, como por exemplo o pós-

modernismo, começaram também a apontar ao ensino

estritamente especializado do instrumento as vantagens da

utilização de ferramentas educacionais de outras áreas do

conhecimento. Recentemente, saber e investigação derivada das

ciências sociais e humanas (como por exemplo a sociologia e

antropologia), das ciências exactas (como por exemplo a física e

informática), e até das ciências médicas (como por exemplo a

psicologia e as neurociências) demonstrou-se ferramenta útil para

3

o ensino do instrumento. Aquilo que foi um ensino de uma

sociedade que se concebia pouco mutável, centralizado na

experiência pessoal de um especialista e certificado pelo conceito

de “o que resultou para o professor resultará para o aluno” não

tem eco nos dias de hoje. Por outro lado, num contexto artístico

contemporâneo em que progressivamente se pede mais da

individualidade do instrumentista, questiona-se até que ponto um

ensino exclusivo e unidireccional do instrumento fomenta a

criatividade do aluno – sendo esta fundamental em toda a arte,

bem como para o futuro instrumentista.

Neste livro são então expostos alguns aspectos do que é o ensino

do instrumento musical nos dias de hoje, perspectivando o seu

futuro numa sociedade cada vez mais global e dinâmica. Com um

enfoque na realidade contemporânea Ibérica, este volume

apresenta investigação em várias áreas de conhecimento

relevantes para o ensino do instrumento musical.

No primeiro capítulo, “Contribución para una formación reflexiva

y dialógica del profesorado”, Fernando Sadio Ramos e María

Angustias Ortiz Molina defendem uma formação de professores

centrada em conceitos de reflexividade, intersubjectividade e

narrativa. Expondo uma filosofia da educação e de formação

assente nesses conceitos, os autores avançam uma fundamentação

teórica da sua perspectiva educativa, ilustrando-a através de um

caso-estudo referente ao processo instituído de auto-avaliação de

professores do ensino universitário Espanhol. No segundo

4

capítulo, “Piano: para uma pedagogia mais... pedagógica?

Contemporânea? Não castrante?”, Francisco Monteiro

contextualiza historicamente o piano como representante máximo

da cultura do virtuosismo musical que nos chegou até aos dias de

hoje. Questionando a rigidez de um ensino tradicional do piano

que tem como objectivo final o “virtuoso”, aponta diversos

aspectos didácticos de uma pedagogia do piano mais diversa e

contemporânea, que visa promover a capacidade de escolha, de

intervenção e de uma auto-expressão de largo espectro. No

terceiro capítulo, “O pedal no ensino do piano”, Luís Pipa alude

ao interesse e necessidade de um estudo mais aprofundado das

técnicas específicas da utilização dos pedais do piano. Tendo em

conta a importância de uma reflexão artístico-pedagógica sobre o

uso dos pedais, o autor propõe também que a abordagem a este

tópico possa ser feita em espaço lectivo próprio. No quarto

capítulo, “Propuesta investigadora para la enseñanza elemental de

fagot como perspectiva educativa para el siglo XXI”, José Ramón

Pérez Mestre apresenta uma metodologia para o ensino do fagote

para os níveis elementares. Tendo já esta metodologia sido

implementada no Conservatório Superior de Badajoz, o autor

acredita que, com os devidos ajustes programáticos e de ordem

normativa, o âmbito da sua aplicação poderá ser mais largo. No

quinto capítulo, “Contributos da psicologia da música para a

formação de professores do ensino vocacional da música”, Nuno

Arrais e Helena Rodrigues apresentam a psicologia da música

como matéria basilar na formação do professor de instrumento.

Para os autores, o professor quando equipado com conhecimento

5

na área da psicologia da música, torna-se mais eficiente na

adequação de estratégias de ensino ao estádio de desenvolvimento

musical de cada aluno. No sexto capítulo, “Colaboraciones I:

Algunas cuestiones prácticas sobre la disciplina de Clase de

Conjunto”, Roberto Alejandro Pérez reflecte sobre o ensino de

classe de conjunto de nível médio (conservatórios e academias)

em Portugal. Enfoca questões de criação de novos repertórios de

acordo com as estéticas musicais actuais, considerando também a

realidade da sociedade em que os alunos estão inseridos. No

sétimo capítulo, “O contexto social no ensino do Jazz: A ‘jam

session’”, José Menezes defende que para uma coerência no

percurso pedagógico da área do jazz a nível superior, o ensino

deverá incluir aspectos sociológicos e culturais da vivência

jazzística. A título de exemplo, o autor aponta a “instituição” da

jam session. No oitavo e último capítulo, “Práticas jazzísticas no

ensino do clarinete”, Paulo Gaspar e Eduardo Lopes reflectem

sobre questões do ensino tradicional de instrumento e o ensino de

instrumento jazz. Tendo como caso-estudo o clarinete, é

apresentado um conjunto de práticas de ensino específicas do jazz

e a forma como estas poderão enriquecer o ensino tradicional do

instrumento.

Eduardo Lopes

6

7

1 Contribución para una formación reflexiva y

dialógica del profesorado

Fernando Sadio Ramos e María Angustias Ortiz Molina

(...) examinándome a mí propio y a los otros,

(...) una vida sin este examen no merece ser vivida

(Platón, 1984: 38a)

(...) regresar a la convicción de que “la vida no reflexionada”

no es efectivamente digna de ser vivida.

(Steiner, 2005: 55)

Prólogo

El texto que presentamos busca dar cuenta de una forma de

entender la formación del Profesorado en la que la autonomía y

responsabilidad del Profesor sean la regla y la instancia decisiva.

En efecto, somos conscientes de que la sociedad plantea

determinadas exigencias a la formación del Profesorado que no

dejarán de tener en cuenta aspectos de utilidad social y

económica, que intentarán imponer la adaptación de los

individuos al status quo vigente. En ese sentido, el sistema

educativo se asume como vehiculo por excelencia de modelación

de los individuos a los intereses dominantes y prevalecientes en

cada momento histórico y a cada configuración social, económica

8

y política y que se presentan ideológicamente como evidentes y

naturales (Freire, 1974a; 1974b; 1977; 2003).

Todavía, esto no es lo que en realidad ocurre. La sociedad es el

campo de lucha política de intereses diversos y las

configuraciones que presenta resultan de esa lucha y son su

resultado concreto y momentáneo. Así, sus sistemas –y el

educativo, por excelencia– traducen valores y perspectivas

ideológicas de forma necesaria e ineluctable. En eso no habría

peligro de mayor monta si se asumieran esos valores y

perspectivas como tal y no se intentara naturalizarlos [tomamos

ese concepto en el sentido de Roland Barthes (Barthes, 1957)],

que es lo que ocurre frecuentemente.

Al hecho de que los sistemas sociales, educativo incluido, sean

concretizaciones de valores, se le añade el de la dominación

ejercida por la parte de la sociedad que determina esos sistemas

sociales sobre aquéllos a quienes impone éstos y de cuya acción y

trabajo vive y disfruta. Así, el hecho de naturalizar los sistemas

sociales y sus características es un mecanismo ideológico de

dominación y aspira a mantenerla, reproducirla y perpetuarla

(Freire, 1974a; 1974b; 1977; 2003). Si ese proceso de dominación

termina en la aceptación pacífica y sobretodo en el deseo de la

dominación por parte del dominado, tienen las clases dominantes

su triunfo más espectacular, ya que de la sujeción obediente (Gil,

2009: 40) se pasa a la interiorización de la obediencia (Gil,

9

2009: 51-56) y se llega al amor de la servidumbre (La Boétie,

referido por Gil, 2009: 56).

Este es el caso del actual problema de la evaluación del

Profesorado y de las Escuelas, sean ellas de enseñanza primaria,

secundaria o superior. El capitalismo vigente impone padrones de

productividad y explotación del trabajo, que se traducen en

sistemas de control de las personas y de su tiempo en niveles

nunca vistos anteriormente y generando una vivencia totalitaria de

la vida contemporánea, en la que la persona autónoma y libre no

tiene –ni puede tener– lugar (Heidegger, 1984; Gil, 2009).

Todavía, las cosas no tienen por que ser de este modo. Otro

mundo es siempre posible y a la libertad es permitido soñar y

desear otro orden de cosas y de vida humana y natural (Gil, 2009:

52). La política y la educación no tienen porqué estar vinculadas

apenas a la dominación del Hombre y de la Naturaleza. Digamos,

en particular, de algunos hombres por otros hombres. La

transformación social es posible así como deseable y su

concretización –dejando de lado las posibilidades revolucionarias

y las mitologías totalitarias del “Hombre Nuevo”– se puede hacer

en el día a día, en las prácticas sociales y educativas que

conducimos cada uno de nosotros en nuestros centros, articulando

nuestra praxis individual y colectiva.

El primer paso en este camino consiste en asumir explícitamente

los valores que guían nuestra praxis y los ideales de Hombre, de

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Sociedad y de Mundo que ésta busca. Tal es la tarea de la

Filosofía de la Formación y de la Educación y de la Antropología

Filosófica y Pedagógica, a las que pedimos los valores indicados

en el inicio de este prólogo. El trabajo de formación aquí

presentado, presupone la libertad y la autonomía del Profesor, con

la correspondiente responsabilidad y confianza. La concepción de

base presupuesta es la del Profesor –y correlativamente, la del

Alumno, lo que presuponemos siempre en el horizonte de nuestro

texto– como Persona, es decir, ser en relación o intersubjetividad

originaria e ineludible. Como tal, es un factor fundamental en la

relación pedagógica y rechazamos las perspectivas positivistas y

objetivistas que pretenden encuadrar en modelos tecnocráticos la

praxis formativa y educativa.

El texto tiene dos componentes distintos y articulados,

correspondientes a dos personas en relación y que lo firman.

Como tal, el mismo resulta de un diálogo hermenéutico. La

primera componente nos presenta los fundamentos filosóficos de

una perspectiva de la formación que entendemos ser la más

conveniente a la dignidad ética y ontológica del ser humano como

ser-en-formación histórico, los cuales son entonces aplicados a

una lectura de la segunda componente. Esta, por su vez, consiste

en la narración de una experiencia de auto-evaluación formativa y

formadora de una profesora en el ámbito de la cual se busca dar

una contribución conforme con esta perspectiva de educación

aquí desarrollada.

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Filosofía de la formación desde un punto de vista

intersubjetivo y biográfico

En esta sección de nuestro texto procedemos a la presentación

general de los fundamentos de una filosofía de la formación y de

la educación desarrollada a partir de un punto de vista

intersubjectivo –o ético–. A partir de ellos, se fundamenta la

utilidad de la experiencia de autoevaluación que se presenta en la

segunda sección y que se nos figura como más conforme para una

visión enriquecedora de la educación y demarcada por ende de

modelos tecnocráticos y positivistas de formación y evaluación

del Profesorado.

Dicha perspectiva se basa en un conjunto de presupuestos de

matriz esencialmente filosófica. Entre ellos, destacamos la

definición de la Persona como intersubjetividad originaria y

fundante. De ellos se deduce una Filosofía de la Educación

dialógica e intersubjetiva, con la correlativa noción de Educación

y de sus fines orientados por la promoción de la Persona en su

ser/eticidad.

En la afirmación y explicitación de esos fundamentos va

implicada la pertinencia de los procedimientos biográficos y

narrativos para la investigación educacional. De esta manera, el

concepto-base de intersubjetividad opera en un estatuto

fundacional y se proyecta/ integra en el plan empírico, otorgando

sentido a una práctica docente ética y ciudadana. Nuestro trabajo

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se basa, así, en un modelo teórico dialógico y hermenéutico. En

su transcurso asumen particular relieve la recogida y formulación

de biografías educativas2 de Profesores teniendo en cuenta los

conceptos originados en esa Filosofía de la Educación.

Los presupuestos de orden filosófico en que se fundamenta

teóricamente este modelo de trabajo se enuncian concisamente en

las siguientes premisas que se proponen como mejor corresponde

a la Dignidad ética, ontológica y metafísica atribuible al Ser

Humano. En el plan de esa Dignidad originaria se procura radicar

los conceptos de formidad y de formatividad 3 en cuanto trazos

estructurales del ser-en-formación propio al Ser Humano

(Honoré, 1990: 22-25). Se reconoce, así, a la Formación en su

dimensión fundamental de proceso ontológico del ser que se

forma global e integralmente (Fabre, 2006: 23).

A la Persona la entendemos como un ser relacional,

intersubjetivo e histórico, simultáneamente singular y capaz de 2 Recurrimos al concepto propuesto por Christine Josso (Josso, 1991: 12), reteniéndolo e interpretándolo a efectos de captar solamente el aspecto educativo de la historia personal de los sujetos de la evaluación, así como su efecto formativo y formador para él; de este modo, evitamos la ambigüedad del término historias de vida en su pretensión implícita y global de captar al sujeto en la totalidad de su historia personal. 3 «Nous nommons "formativité" le fait que l'être-homme existe en formation et qu'il soit au monde. (…) Nous risquons le néologisme de "forméité" pour désigner le concept ontologique existential lié à la mondanéité, en précisant que "forme" (…) veut dire un genre d'être du Dasein-en-forme – de l'être-homme en tant qu'être-en-monde.» Honoré, 1990: 22-24. El prolífico dialogo pensante de Honoré (1990) con el pensamiento de Martin Heidegger, formulado en Sein und Zeit, sigue al filósofo alemán en la atención prestada a la alteridad del Mundo, no tomando como punto de partida de la relacionalidad del Ser Humano la Alteridad del Otro, la cual, para nosotros, viene primero y es condición de apertura y regalo de un Mundo. V. Ramos (2007).

13

abarcar reflexivamente la totalidad de la realidad, idea designada

por Aristóteles por medio del término nõus. Este término fue

interpretado en la tradición filosófica posterior en el sentido de

capax universi (Pereira, 1967: 8-9), y por Maurice Nédoncelle

como perspectiva universal (Nédoncelle, 1963: 38-42; 1942: 96-

98, passim; 1957: 259; 1953: 196). La utilización sistemática de

la reflexividad ejercida sobre la narración y la biografía es un

medio formativo e investigativo central en los trabajos que ambos

conducimos y de los que se da aquí cuenta de uno.

Concebimos la Educación como relación intersubjetiva de cariz

eminentemente ético, siendo sus fines esenciales los de posibilitar

el crecimiento, la promoción y la emancipación de la Persona. En

ese sentido, la calidad ética y ciudadana del Educador debe ser

vista como esencial en la prosecución de esos fines de la

Educación.

Afirmamos así la necesidad de defensa de una Educación y de

una Escuela que promuevan la Persona de aquellos que la

integran en los aspectos que hemos referido. En cuanto espacio de

crecimiento interpersonal, Educación y Escuela son igualmente

continuos prácticos espaciales y temporales de carácter ético,

basados en la relación cara-a-cara y su esencia ética, como nos lo

enseñó Emmanuel Levinas (Levinas, 1965; 1974).

A estos presupuestos se añade igualmente la necesaria

vinculación de la Educación, de su discurso y del discurso

14

científico sobre la misma a la Praxis, entendida como instancia de

producción y transformación de la realidad humana y social por

medio de valores constituyentes e integrantes de un deber-ser de

orden futuro que la Persona y la Sociedad postulan y prosiguen.

Así, el registro lingüístico conveniente a la Educación no se

puede limitar a la producción de enunciados indicativos y

constatativos, afines a un entendimiento positivista del discurso

científico sobre ella. Antes, debe/ puede recurrir a enunciados

performativos y a actos de habla (Austin, 1970; Searle, 1980), en

los que dé cuenta del hacer y del actuar no-poiético. Si es cierto

que la Educación se concreta en fenómenos de orden factual,

espacio-temporales, el núcleo que le da alma es del orden de la

Libertad y del Deber-Ser. En nombre de ese núcleo esencial, se

postula la transformación y superación de la situación presente de

modo a que prosiga con la humanización del Ser Humano patente

en su esencial ser-en-formación. Entre el discurso del Ser y el

discurso de la Acción tiene su lugar la Educación. De esa

situación deriva la necesidad de cuadrarla en un discurso que dé

cuenta reflexivamente, tanto de la conceptualización y

estructuración racional de ella, como de la articulación de las

acciones con los fines y valores orientadores del acto educativo.

De lo expuesto anteriormente, se deduce la afirmación de la

necesidad de tenerse en cuenta, en el proceso educativo, al

cuidado ético con la formación personal de sus intervinientes, y al

Profesorado, en particular (Severino; Fazenda, 2002), pero no

sólo (Alumnado, Personal de Administración y Servicios y otros

15

miembros de la Comunidad Educativa, por supuesto). Una

perspectiva de Educación completa se entenderá en la perspectiva

de promoción de competencias (inter)personales, y será

susceptible de ser desarrollada en los más diversos contextos

educativos y formativos, en particular bajo de la perspectiva de

formación permanente a lo largo de la vida. Tanto en la formación

de Profesorado, inicial o continua, como en la educación del

Alumnado que integra los diferentes niveles del sistema

educativo, el cuidado ético con la formación personal y social de

sus integrantes debe ser una constante, con el fin de que se

formen personas capaces de pensar y de actuar en el plan

personal, social y de ciudadanía de modo autónomo y

emancipado/emancipatorio, orientados por valores de la Dignidad

Humana y de su traducción en los Derechos del Hombre. De entre

los diferentes actores que integran el sistema educativo, asume

particular relieve en nuestra investigación la Persona del Profesor

en la que concentramos nuestro estudio. Procediendo de este

modo, vemos en el ser profesor un múnus orientado por la

exigencia ética de promoción del Alumno en la integridad de su

ser personal, en una línea en que las ideas de servicio (Reboul,

1982) y de responsabilidad (Levinas, 1974) ganan un relieve

considerable.

Un entendimiento del sentido y de los fines de la Educación

acorde con estos presupuestos implica que, en su esencia, la

Educación se juega en la relación intersubjetiva y dialógica entre

el yo y el tú, sobre el trasfondo originario del nosotros

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intersubjetivo en cuanto espacio ético, ontológico y metafísico de

formación de las personas en relación. Esta formación tiene

como trazo ontológico propio la historicidad, la cual se traduce en

el reconocimiento del estatuto de permanente incompletud y de

continuo proceso de advento de ser como caracterizador de la

Persona. Se inserta así en el proceso de la persona la práctica en

cuanto actividad de transformación inmanente de lo agente y

orientada ética y moralmente [en el sentido aristotélico de praxis

(Aristóteles, 2004)]. Relación y Tiempo concurren de este modo

para la formación de la Persona.

De los estatutos de la Persona y de la Educación definidos a partir

de esta perspectiva, el polo formado por el Profesor aparece como

un elemento merecedor de especial atención en la constitución de

la Persona. El cuidado ético con su formación personal se asume

como una preocupación mayor en las acciones que ocurren en el

espacio-tiempo educativo/formativo si se quiere promover a la

persona en las posibilidades que su Dignidad ética, metafísica y

ontológica comporta. Al revés, ignorar esta dimensión implica la

introducción en lo social de un efecto de cascada conducente a la

anulación de la capacidad crítica y emancipatoria que caracteriza

al Ser Humano en cuanto Persona y Libertad capaz de ser/hacer

ser y de introducir en la realidad un acrecentamiento de valor

mediante la Praxis.

Para esta perspectiva relacional y práctica de la realidad social

constituida por la Educación, se requiere una perspectiva

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epistemológica y metodológica que asuma el carácter central del

sujeto del conocimiento en la producción del conocimiento y la

referencia de éste a ese mismo sujeto. Esto implica en último

análisis la asunción del carácter de auto-conocimiento propio de

toda actividad gnoseológica humana. La idea de reflexividad,

esencial en la elaboración de biografías educativas y en el

procedimiento narrativo-formativo en general, asume

explícitamente la tesis de la omnipresencia del sujeto en el real

conocido y en el conocimiento del real, en dirección al propio

acto constitutivo y originante del surgimiento del sujeto ético-

práctico (Kant, 1985; Santos, 1989; 1990; 2000). Como tal, la

dimensión epistemológica de la reflexividad deberá corresponder

isomórficamente a la reflexividad narrativa presente en la

biografía educativa del Profesor.

La narración y reflexión propuesta retira su pertinencia de la

reconocida necesidad de Profesores que se asuman como

contribuyentes para un desvelamiento de horizontes de sentido y

respectiva apertura de posibilidades prácticas de humanización

libre de la Persona. Entre los que a esto se han referido, vemos

con particular destaque la afirmación de esta idea como siendo un

imperativo existencial e histórico por parte de Paulo Freire

(Freire, 2003: 10; Baptista, 2005; Alarcão, 2003; Seiça, 2003).

En este trabajo intentamos presentar categorías susceptibles de

encuadrar el desarrollo de un entendimiento de la formación de

Profesorado que nos permita destacar la densidad ontológica y

18

ética de la Profesión. En la medida en que ésta existe en

referencia a un modo de ser antropológico –el dialógico ser en

formación como trazo esencial del ser inacabado del Hombre,

tarea para sí mismo y ser-en-riesgo (Gehlen, 1987: 35-36)–, en

ella se encuentra uno frente a la problematicidad radical que Max

Scheler veía en el ser del Hombre (Scheler, 1957: 24) derivada

precisamente de su Libertad ontológica originaria y no-

objectivable (Jaspers, 1978: 61-64). Según esto, la formación en

general –y la formación de Profesorado, en particular–

corresponderá al ser esencial del Hombre en la medida en que es

la expresión originaria de su praxicidad, historicidad y no-

acabamiento perenne, manifestados en su Cura ontológica y

humanizadora (Heidegger, 1986: 229ss). Seguimos así el camino

abierto por la cuestión planteada por Bernard Honoré relativa a la

necesidad de definir «(…) les outils conceptuels pour penser la

formation comme praxis du changement (…)» (Honoré, 1992:

20), buscando anclar el pensamiento sobre la formación en el

sentido radical de la praxis aristotélica y de la reflexión filosófica.

Con estos presupuestos, se intenta proceder a la presentación de

un trabajo práctico de autoevaluación formativa y formadora de

una profesora de Didáctica de la Expresión Musical de la

Universidad de Granada. Con ello pretendemos dar a conocer

experiencias alternativas de evaluación formativa y formadora de

Profesorado que no se pauten por modelos positivistas y

tecnocráticos, antes busquen en el discurso y reflexión del

profesor sobre su práctica y el respectivo sentido la fuente de

19

datos susceptibles de mejorar efectivamente su docencia en un

sentido fructífero para el individuo y el grupo profesional en el

que se inserta. De este modo, las pertinentes críticas hechas por

José Gil a la figura hodierna del Hombre Evaluado (Gil, 2009: 51-

59), bajo cuyo signo el totalitarismo tecnocrático actual

comprende al ser humano, son asumidas aquí e inténtase

mantener la Dignidad y sentido de la profesión docente mediante

ejemplos prácticos de resistencia y apertura de posibilidades, bien

que estemos conscientes de que la tarea es quijotesca. Pero hay

que mantener siempre abierta la posibilidad de otros mundos…

Un ejemplo de evaluación y formación reflexiva desde un

punto de vista biográfico e intersubjetivo

El procedimiento autoevaluativo que se nos presenta en la

siguiente sección se desarrolla a lo largo de estas fases: 1)

Autoobservación como docente; 2) autoidentificación del propio

perfil como docente; 3) en cada una de las asignaturas que se

sometieran a “autoidentificación”, realizar un “trabajo por pares”;

4) acometer un estudio sobre el perfil del compañero observado;

5) hacer un autoestudio sobre motivación.

Del relato autoevaluativo y reflexivo que se sigue, destacaríamos

los siguientes elementos y conclusiones.

En primer lugar, el registro lingüístico en el que es hecho, en este

caso el de la primera persona, lo que nos apunta para un registro

de subjetividad y responsabilidad asumidas desde un inicio. Le

persona se coloca autónomamente en cuestión, se examina a sí

20

misma y a sus obras y actos en orden a detectarles su sentido,

criticarles asumiendo determinados aspectos y proponiéndose a

cambiar otros. La capacitación y autonomía del Profesor, la

confianza y la responsabilidad son elementos que hay que valorar,

sobretodo en tiempos y contextos de promoción de procesos de

evaluación del Profesorado en los que la perspectiva maquinal y

dominadora impera, como –tristemente– podemos verificar en el

proceso de destrucción del sistema educativo portugués –y

principalmente de las personas que lo integran– conducido en los

últimos años y de que el Hombre Evaluado es la figura.

La valorización de la Persona del Profesor es otro aspecto a

subrayar en el ejercicio al que vamos a asistir. Se ve el desarrollo

de un proceso en vista a la mejora de la Profesora como enseñante

y como persona, proceso que revela igualmente la perspectiva de

los reflejos de este proceso en su alumnado, como efecto deseable

y previsible. El proceso de autoobservación y autoidentificación

de las características propias es señalado y la asunción de la

finalidad de mejorar la calidad del Profesorado Universitario es

un hecho fundamental. Se reconoce la necesidad de promover los

procedimientos reflexivos, analíticos y críticos a nivel del

individuo y del grupo de profesores para mejorar la calidad del

trabajo en una perspectiva de formación a lo largo de la profesión

y de la carrera profesional.

En el relato, vemos que no hay un único perfil como Profesora

pero sí varios dependiendo de la asignatura impartida, del

21

respectivo ciclo de estudios y de la circunstancia de los estudios y

sus condiciones, pero destacándose el hecho de que son los

alumnos que lo exigen de acuerdo con sus características. Esto

nos coloca frente al hecho fundamental de la relación pedagógica

y sus efectos, manifestaciones, variantes y exigencia de aplicación

al caso concreto planteado a la praxis (Gadamer, 1998;

Aristóteles, 2004). Al mismo tiempo, se reconoce la utilidad de

recurrir a diversos estilos educativos en las clases de acuerdo con

la circunstancia concreta (tipo de asignatura, nivel de enseñanza,

tipo de alumnado, etc.).

En este campo hay que señalar el hecho de que no se asuma la

existencia de un perfil único de profesor, ya que la Persona es en

su esencia singular e irrepetible, así como intersubjetiva, es decir,

definida a partir de la relación concreta en la que existe y se

desarrolla. Aplicado al Profesor, tendremos la asunción desde un

principio de que no se puede diseñar un modelo único de

procedimientos y modo de ser, antes por el contrario estamos

frente a alguien cuyo modo de actuar será siempre especular,

relativo a aquellos a quien tiene que educar en aquel momento

concreto y específico. Georges Gusdorf nos ha dejado brillantes e

inolvidables páginas relativas a este entendimiento de la relación

pedagógica en su magistral obra Pourquoi des Professeurs?

(Gusdorf, 1963). Otro aspecto que se plantea aquí, pero que

suplanta el ámbito de este texto, es la cuestión del Profesor

intuitivo, es decir la relación entre razón e intuición en la práctica

educativa (Atkinson; Claxton, 2002).

22

La autorreflexión y su mediación por el Otro nos surgen

igualmente en este procedimiento evaluativo. La intersubjetividad

surge como instancia a partir de la cual uno accede a sí mismo y

mediante la que se desarrolla en su proceso de formación, por

ejemplo, en la fase de confrontación de las autopercepciones con

las del observador externo/ par de trabajo. Este principio

dialógico se puede alargar a la dimensión de la escuela (Alves;

Machado, 2008: 97-108), pero aquí estamos en el plan de la

díada. Se efectúa un trabajo por pares, dándose cuenta de los

resultados obtenidos al colectivo para beneficio de todos,

asistiendo a las clases del par para observación de las mismas, su

grabación y análisis. En cuanto a la observación externa

posibilitada por la grabación de las clases, señálese el sentido de

autocrítica revelado así como el reconocimiento de la utilidad de

este procedimiento para mejora futura del trabajo de la profesora

en autoevaluación.

Análisis reflexivo sobre la enseñanza en educación superior:

el caso de algunas asignaturas de Educación Musical

Contextualización sobre el trabajo

Este trabajo de autoobservación y autoidentificación de las

propias características como profesional de la educación superior,

surge en el ámbito de un ambicioso Proyecto para la mejora de la

calidad del Profesorado Universitario, financiado por la Unidad

de Calidad de las Universidades Andaluzas (U.C.U.A.); tuvo

comienzo en el curso 2004-2005 y aún hoy no se han publicado

23

los resultados definitivos del mismo, al tratarse de un arduo y

amplio trabajo.

El germen del mismo tuvo lugar en la Universidad de Granada,

con la solicitud de Ayuda a la U.C.U.A. de financiación de un

Proyecto titulado «Hacia un modelo de profesor colaborativo

desde el análisis de las tareas docentes: una experiencia

interdisciplinar»; dicha solicitud se efectuó el 14 de julio de 2003.

Este Proyecto se trazó como objetivo primordial envolver en una

seria autorreflexión a la mayor cantidad posible de profesores de

la Facultad de Ciencias de la Educación de la Universidad de

Granada, abarcando todas las posibles titulaciones.

El inicio del trabajo consistía en el estudio reflexivo de un

documento (de unas 200 páginas) elaborado por la propia

U.C.U.A., sobre los estilos del profesorado y su posible mejora.

Después de ese estudio reflexivo había que pasar a realizar una

autorreflexión, en la que accedimos a envolvernos, que tenía a su

vez como objetivo final la mejora de la calidad de la enseñanza

que desde la Educación Superior impartimos, mejorando las

acciones que como responsables –en parte– de la misma

ejercemos y mejorar, no sólo como enseñantes, sino también

como personas al profesorado responsable de la Educación

Superior; de esta forma, mejoraremos también y beneficiaremos a

nuestro alumnado que al finalizar este periodo de formación

comenzarán a engrosar los cuadros laborales en los más variados

ámbitos sociales.

24

Autoidentificación del perfil como docente

Tras realizar ese difícil estudio, concluí con que no me encuentro

un único perfil como profesora, sino que éste depende del carácter

de la asignatura (troncal, obligatoria de universidad, optativa,

libre configuración) y del ciclo en el que se imparta: 1º, 2º ó 3º y

de su colocación en cuatrimestres.

En primer ciclo, las asignaturas que sometimos a la

autoidentificación, fueron:

“Lenguaje Musical”: troncal de 4,5 créditos, 1º cuatrimestre

de 1º curso, Especialidad de Maestro en Educación Musical.

“La Melodía y el Ritmo musical y su didáctica”: obligatoria

de universidad, 8 créditos, 2º cuatrimestre de 1º curso,

Especialidad de Maestro en Educación Musical.

Coordinación del Prácticum II de Educación Musical: troncal,

20 créditos, Especialidad de Maestro en Educación Musical; hasta

el curso 2002-2003 estaba en 1º cuatrimestre de 3º curso y el

curso 2003-2004 se pasó a realizar en el 2º cuatrimestre de 3º

curso.

En segundo ciclo se analiza la asignatura: “La Educación Musical

y sus dificultades de enseñanza-aprendizaje”, asignatura optativa

de 6 créditos de la Licenciatura de Psicopedagogía y se ubica en

el 1º cuatrimestre.

25

En tercer ciclo se analiza la docencia en el 1º curso de un

Programa de Doctorado y se analizan las características que

conlleva la dirección de Proyectos de Investigación Tutelados.

Por lo que respecta a la docencia en Primer Ciclo, hay que

empezar a señalar que tampoco el estilo docente es el mismo en

todas las asignaturas:

En Lenguaje Musical el estilo docente es más de Lección

Magistral sui generis, ya que al ser la asignatura troncal y

fundamental para el desenvolvimiento del resto de las materias

específicas de la especialidad, y al llegar la mayor parte del

alumnado sin ningún tipo de conocimiento musical, el

“Programa” ha de cubrirse completamente en un tiempo récord.

Los contenidos teóricos se van explicando en clase, pero

apoyados continuamente con ejemplos prácticos para asentarlos.

Si bien es cierto que no se realiza ningún tipo de negociación de

los contenidos teóricos ni de los prácticos que se incluyen en esta

asignatura, creo que sí se es bastante negociadora en cuanto a la

manera de desarrollarlos; pero ocurre que el alumnado recién

salido de la Educación Secundaria, prefiere seguir con las clases

magistrales a verse preparando una asignatura, realizando trabajos

en grupo con los compañeros y exponiéndolos posteriormente en

clase, por lo que ellos solos son los que eligen este tipo de

enseñanza, porque les resulta más cómoda, más tranquila y menos

inquietante. Creo que también se es bastante negociadora en lo

que respecta a fechas para la realización de las pruebas y entrega

de trabajos y bastante flexible en lo que a elección de libros que

26

complementen lo explicado en clase se refiere, pues no existe

ninguna preferencia al no ser ninguno del total agrado.

En la asignatura La Melodía y el Ritmo Musical y su

Didáctica, el estilo docente cambia completamente, porque

aunque siguen sin ser negociables los contenidos teóricos y

prácticos de la asignatura (que está puesta para ampliar la

formación escasísima que se puede obtener con 4,5 créditos de

Lenguaje Musical), los conocimientos teóricos (profundizaciones)

corren a cargo del alumnado al que previamente se les facilitan

los documentos que han de consultar; en clase los leen y discuten

por grupos tomando acuerdos entre los distintos grupos y todos

los grupos leen todos los documentos, pero luego no realizamos

una exposición para el gran grupo sobre el trabajo previo grupal.

Los contenidos prácticos los realizan bajo la supervisión de la

profesora de forma individual pero en voz alta, de manera que

todo el grupo participa y a veces de forma colaborativa entre todo

el grupo; esta tarea colaborativa del gran grupo culmina con el

montaje instrumental de una obra musical.

En la asignatura Coordinación del Prácticum II de Educación

Musical, la labor es de Coordinadora, claramente, no de profesora

stricto sensu, se trabaja en reuniones y seminarios con la totalidad

del alumnado de 3º curso de Educación Musical. El trabajo

consiste en explicarle el Plan de Prácticas, aclararles sus derechos

y deberes en este periodo tan importante para su formación,

ponerlos al “corriente” de lo que se encontrarán al llegar al centro

educativo, presentarles al profesor supervisor comentándoles cual

será su misión y los días, horas y lugar que dedican a los

27

Seminarios de Supervisión. También se les explica paso a paso en

qué consiste el trabajo que con posterioridad han de presentar

(comúnmente conocido por “Memoria” o Informe Final realizado

por el alumno). Se les comunica que en Reprografía encontrarán

una carpeta con los documentos que durante este periodo han de

trabajar (legislación educativa vigente y normativas referentes al

área de conocimiento de Didáctica de la Expresión Musical, Guía

de estilo para universitarios y bibliografía recomendada para este

período).

El problema que encontramos a la labor como Coordinadora del

Prácticum es que siempre se va con prisas, en mi caso, ya que en

3º no imparto ninguna otra asignatura, por lo que no dispongo de

“un tiempo propio” para estar con el alumnado y cuando he de

abordarlo es pidiendo parte de su clase a algún compañero, o

citándolos “formalmente” en plan reunión, cosa que a ellos los

disgusta mucho porque consideran que dedican a esta asignatura

mucho más tiempo de los créditos presenciales que tiene

reconocidos (periodos de trabajo aparte) y opinan que incluso

sobran (en cuanto a horario) todos los Seminarios de Supervisión.

En fin, no estoy contenta con el resultado de esta asignatura, pero

no termino de ver el posible remedio para encaminarla de mejor

manera.

Plantea también el serio problema de la Calificación Final. La

calificación de los centros educativos puntúa el 50% y la

calificación de la Facultad el otro 50% (25% la asistencia a los

28

seminarios y 25% la calificación de la “Memoria”). Los centros

educativos tienen desde siempre acostumbrado al alumnado a la

calificación de Sobresaliente (ya que desde el curso 2002-2003 no

tienen opción de hacerlo con Matrícula de Honor) y sobresaliente

es la calificación final que éstos esperan obtener, sorprendiéndose

cuando el profesorado supervisor de la Facultad los califica con

aprobado o notable, a veces incluso suspenso cuando el trabajo es

de bajísima calidad y su asistencia y participación a los

seminarios escasa o nula; esta situación plantea a veces conflictos

no solamente con el profesorado supervisor, sino con la

Coordinadora, generando en ocasiones bastante violencia

académica y provocando situaciones desagradables y estrés.

Definitivamente, no se termina de ver la solución a esta

asignatura.

El curso académico 2003-2004 se experimentó el cambio que

supone su paso al segundo cuatrimestre de 3º curso, con lo que el

alumnado habrá cursado una asignatura tan fundamental para su

formación como educadores como es Didáctica de la Expresión

Musical, que hasta ahora cursaban al volver de la fase de

prácticas. Otra novedad es que se elaboró –por nuestra parte- el

Cuaderno de Prácticum II de Educación Musical, durante el

Curso 2002-2003. Se espera que estos dos cambios mejoren la

asignatura y la consideración que de la misma tienen tanto el

alumnado como el profesorado.

29

Por fin y terminando el análisis del Prácticum II de Educación

Musical, comentar que las relaciones con los tres Vicedecanos de

Prácticas que hemos tenido en la Facultad de Ciencias de la

Educación de la Universidad de Granada –durante este periodo-, a

nivel personal han sido cordialísimas y fluidas, pero a nivel

académico no se termina de ver cohesionada su actuación con la

de los Coordinadores en múltiples aspectos del desarrollo de la

fase práctica de las titulaciones.

En 2º Ciclo la autoidentificación del perfil docente se realiza en la

asignatura La Educación Musical y sus dificultades de enseñanza-

aprendizaje, optativa de 6 créditos, ubicada en primer

cuatrimestre. Aquí en esta asignatura, el estilo docente creo que es

totalmente colaborativo, señalando como se ha hecho

anteriormente, que los contenidos del programa no son

negociables. Partiendo de ello, comentar que desde finales del

mes de septiembre de cada año lectivo, se pone a disposición del

alumnado en Reprografía una carpeta con todos los documentos

que conforman la totalidad de los Contenidos del Programa y la

bibliografía recomendada para preparar de forma alternativa la

asignatura.

Cada día al comenzar la clase, se agrupan de a 5 o 6 personas de

manera aleatoria, cambiando los grupos cada vez que cambia la

actividad, con objeto de que todos se conozcan y no formen

grupos de trabajo con miembros fijos. Las clases las solemos

dividir en tres partes:

30

1. Estudio de varios documentos de los que

conforman el programa, realizando un resumen colectivo.

2. Exposición al resto de la clase de los resúmenes de

los diferentes grupos, variando el relator en cada clase, para

que todo el alumnado participe de la misma manera.

3. Presentación y desarrollo de actividades musicales

prácticas que tengan referencia y se relacionen con los

documentos estudiados.

Las actividades prácticas unas veces las propone o las presenta la

profesora, y otras veces la elección de las mismas y la

presentación corren a cargo de un alumno.

Se ha previsto en el calendario de sesiones espacio suficiente de

tiempo, para que cada miembro del grupo/clase exponga un tema

de elaboración propia al resto de compañeros y a la profesora, en

este caso.

Todos los resúmenes del trabajo en grupos del alumnado se

facilitan en fotocopias con posterioridad a todos con la idea de

enriquecer el material de partida.

Por lo que respecta al 3º Ciclo, comentar que debemos diferenciar

lo que es la docencia de Cursos de Doctorado de lo que es el

Proyecto de Investigación Tutelado:

a) El Curso analizado en el presente trabajo es de

carácter fundamental, optativo, de 3 créditos y la docencia

estuvo compartida con otra Profesora de mi Área, cuando se

31

realizó este estudio; el curso se denomina Formación del

Profesorado de Educación Musical: asesoramiento

curricular en los diferentes niveles educativos y está inserto

en el Programa Fundamentos del Currículo y Formación

del Profesorado en las Áreas de Educación Primaria y

Secundaria, con Mención de Calidad. Aquí el estilo docente

vuelve a variar, pues la formación que pretendemos impartir

se supone que va dirigida a Licenciados con una formación

mayor que la del alumnado del 1º y 2º Ciclo; además se

pretende que vayan buscando su perfil como investigadores,

con lo que el estilo docente de impartir “clases magistrales”

se convierte en una atención a ratos personalizada, tarea que

no resulta demasiado dificultosa dado que la ratio

profesor/alumnado es mucho menor (entre 55 y 120

alumnos en 1º Ciclo, 50 en 2º Ciclo y 4 o 5 personas en el

Curso de Doctorado). Las clases llevan una parte de lección

magistral algo interactiva, pues se imparten con

presentaciones en Power-Point, audiciones en cd’s y

proyección de algunos trabajos en vídeo; tienen también una

parte de trabajo de análisis de documentos por parte del

alumnado; una parte en que ellos exponen las conclusiones

de su trabajo; una parte donde desarrollan trabajos prácticos

que preparan con anterioridad y unas conclusiones a modo

de recapitulación al final de cada sesión. La evaluación se

realiza teniendo en cuenta la asistencia y participación en las

sesiones, observación directa y se les pide al final un trabajo

32

de pre-investigación, acorde con los intereses más directos

de cada uno.

b) El Proyecto de Investigación, al tener parte

tutelada, también conlleva un trabajo directo con el alumno.

Se les aconseja que escojan un tema con el que se sientan

cómodos trabajando y les atraiga, que por supuesto se esté

dentro de las líneas de investigación con las que estamos

trabajando. Lo que se tiene en este nivel muy claro, es que

se prefiere no dirigir ningún Proyecto de Investigación que

dirigirlo a alumnos con poca capacitación, preparación y

motivación; que tengan intereses contrapuestos a los del

Director del Proyecto o con los que a nivel personal no

exista cierto feeling, ya que realizar este tipo de trabajo

exige de bastante empatía entre ambas partes.

Implementación del trabajo “en pares”

Desde un principio, pareció muy positiva la idea del trabajo en

pares porque, sin duda, ayuda a complementar la

autoidentificación que podamos tener como docentes y la

modificará y enriquecerá.

Para un mayor enriquecimiento de todo el colectivo, el trabajo

realizado en pares se debe presentar con posterioridad al grupo,

para que den su opinión y aconsejen, por si cometemos

equivocaciones o desviaciones en el trabajo.

33

Propusimos en su momento y fue aceptado por todos, que en una

primera fase se asistiese a alguna clase del “par” en plan de

observación, para de manera conjunta tomar ideas sobre el trabajo

del otro.

La fase de grabación en vídeo de diferentes clases la realizamos

con posterioridad a esta «observación del otro» en asignatura

similar.

El trabajo sobre “Pares” –en este caso-, se eligió llevarla a cabo

con una compañera con la que durante dos cursos habíamos

coincidido en la impartición de varias asignaturas a grupos

diferentes de alumnos y que –según mi opinión–, aportaba en ese

momento además otras ventajas añadidas que paso a relacionar:

Ambas compartimos créditos de una misma asignatura.

Durante dos cursos fue Profesora Supervisora del Prácticum II

de Educación Musical, materia de la que yo he sido desde su

creación la Coordinadora y habíamos trabajado juntas diseñando

un plan de mejora del mismo, asistiendo a Congresos y

presentando Comunicaciones conjuntas sobre el tema.

Fue alumna mía de Educación Musical (Promoción 1997-

2000), con lo que resultaba –a mi entender, en aquel momento-,

una magnífica conocedora de las asignaturas y sus programas,

profesorado con sus defectos y virtudes (incluida yo).

Estuvo durante el curso 2000-2001 como Profesora en la

Universidad de Almería, con ello aportaba una visión diferente y

enriquecedora de similares asignaturas.

34

Fue durante unos años compañera del Grupo de Investigación

que dirijo, HUM-742 D.E.Di.C.A. (Desarrollo Educativo de las

Didácticas en la Comunidad Andaluza), y en el que abordamos

trabajos relacionados en algunos aspectos con el presente.

Trabajamos en dos Proyectos de Innovación Docente en los

que se tratan temas relacionados con el presente trabajo.

Organizamos juntas Cursos de Formación para complementar

parte de las carencias que observamos en los titulados de nuestra

especialidad.

Observación Externa

La observación tuvo cierta dificultad para realizarse, pero

finalmente se llevó a cabo mediante la observación de la

grabación de video que de varias clases se hicieron.

Los aspectos mejorables en las aulas descritas anteriormente, que

la observación externa a la misma hizo notar fueron los

siguientes:

- Parece que sería de desear que en mi práctica cotidiana

comenzara cada sesión de clase exponiendo de manera clara y

contundente cuál es el objeto de la misma. Esta percepción no la

había yo ni siquiera intuido, quizás por la deformación

profesional propia de que al tener yo clarísimo cuál es ese objeto,

piense que los demás lo conocen igualmente.

- Debo cuidar la disposición del alumnado y el mobiliario en el

espacio-clase según la actividad que en cada momento se esté

realizando. En este sentido se me hace notar que si cuando el

35

alumnado expone temas que previamente han preparado por

grupos en la clase, la disposición fuese en semicírculo, la atención

del gran grupo sería mayor y también mejoraría el contacto visual

entre todos los compañeros. De esta forma, también mejoraría el

respeto a las intervenciones ajenas, evitando los corrillos que

hablan bajo y dificultan la escucha de las aportaciones del resto.

Quiero comentar que esta percepción externa me parece de lo más

juiciosa y aprovechable.

- En la observación externa –con la que coincido totalmente al

visionar el video– después de estudiar las reflexiones que

acertadamente se me ofrecen, se me hace notar que es posible que

existan estereotipos sexistas en la asunción de roles en la clase;

sería un punto interesante de reflexión con el alumnado, sobre

todo para evitarlos en la medida de lo posible, aunque no era el

caso real de la clase visionada.

- Debo promover más la reflexión y el análisis entre los

contenidos que se trabajan y desarrollan con el grupo-clase y no

favorecer tanto el resumen de los contenidos trabajados; este

extremo quizás reste interés y atención a los grupos que en ciertos

momentos no intervienen directamente. Fomentando la reflexión

y el análisis favorecería el protagonismo del alumnado, verdadero

actor y protagonista de las clases.

- En el desarrollo de la parte práctica de la clase, debo pedir al

alumnado que ponga más énfasis en explicar “para qué” se realiza

la actividad y no tanto el “cómo realizarla”.

36

Al resto de mi práctica docente, la observación externa no le

realizó más apreciaciones, por lo que debo decir que quedé

bastante satisfecha, no sólo por no cometer en la misma grandes

desviaciones que puedan perjudicar al alumnado, sino porque las

observaciones realizadas son fáciles de incorporar a la práctica

docente para mejorar la misma.

Contraste

Nos alegró comprobar que las autopercepciones no difieren

mucho de la percepción del observador externo, que después

amablemente facilitó sus comentarios.

Está clara la diferencia entre impartir una asignatura troncal, una

optativa o un curso de doctorado. Ni el número del alumnado es

el mismo ni por lo general su implicación.

En nuestra práctica docente, debemos alternar las clases con un

cierto estilo “directivo” con clases mucho más participativas y

colaborativas por parte del alumnado, pero en todas ellas dejando

claro desde un principio cuál es el objeto de esa clase en concreto.

Siempre se debe de tener en cuenta la disposición del alumnado

en el espacio-clase, al igual que la distribución del mobiliario,

para sacar el mayor rendimiento de cada momento y experiencia

educativa.

37

Hemos de promover siempre los procesos de reflexión y análisis,

al igual que el de la crítica y autocrítica de todos los implicados

en el proceso educativo para poder lograr un mayor

enriquecimiento y aprovechamiento de todos los sectores que

participan del proceso.

Al analizar los “pasos usados en las estrategias de enseñanza”

tendríamos siempre en cuenta el realizar una Recapitulación sobre

la adecuación o no de los contenidos desarrollados sobre los

objetivos previamente trazados.

En estas autoobservaciones sobre mejora de la calidad docente,

debemos atender a los Medios utilizados (Recursos Materiales),

no sólo por nosotros, sino por los demás colegas que trabajan

junto a nosotros –dentro de las posibilidades de cada uno de los

centros-, porque de los demás siempre se aprende y uno de los

graves problemas detectados al enfrentarnos a este trabajo de

autoobservación de la propia práctica docente, fue el de la soledad

del profesor.

Una buena manera y fácil de mejora de la “Atmósfera, ambiente

de aprendizaje” es el incidir con nuestras acciones docentes en la

Procura un trabajo colaborativo entre el alumnado y atender las

sugerencias de los estudiantes y sus opiniones, pues suelen

proporcionarnos ideas sobre variaciones y mejoras.

38

En el documento de partida estudiado, en el apartado “Pasos

usados en las estrategias de enseñanza”, habría quizás que añadir:

Recapitulación (adecuación o no de los contenidos desarrollados

sobre los objetivos previamente trazados); esta misma apreciación

de añadir sería deseable en el epígrafe Otros aspectos, habría que

recoger los Medios utilizados, y también en “Actividades del

alumno” se podría incluir Intervención aportando opiniones.

En el apartado “Identificación de los esquemas de acción que

construyen el sistema de actividades del modelo de actuación

docente” habría que volver a incluir las fases de Reactualización y

Mejora (desarrolladas con sus objetivos y subobjetivos, acciones

y consecuencias).

En “Identificación de las implicaciones del modelo de actuación

docente” falta añadir claramente y sin complejos la siguiente

anotación:

En las aulas de Educación Superior, se continúan utilizando

mayoritariamente la lección magistral, porque aunque estemos

“vendiendo” calidad de enseñanza, hay masificación de alumnos

y precariedad de instalaciones y medios.

En lo referente a los “Factores personales que reducen y limitan

las posibilidades del profesorado”, habría que volver a añadir

como uno de las más importantes:

Malas e inadecuadas instalaciones.

Precariedad de medios y recursos.

39

En cuanto a la idea de “Aprovechar la experiencia para mejorar la

práctica”, comentar brevemente lo siguiente:

Son muy adecuados los comentarios incluidos relativos a la

Investigación-Acción.

En los comentarios referentes a las Prácticas Docentes, el

autor del documento manifiesta un conocimiento muy superficial,

permitiéndose hablar de las mismas con descripciones sin

“sustancia”.

Para concluir, reiterar la idea de que nunca terminamos de

aprender y mucho menos de “enseñar a aprender” y “enseñar a

enseñar” por lo que nuestra mente tiene que estar siempre abierta

y receptiva a cualquier tipo de mejora para un más completo y

eficaz desarrollo de nuestro trabajo, la tarea educativa. En este

sentido, creo que hemos sido afortunados por haber podido

participar en este Proyecto de la U.C.U.A. para mejorar el trabajo

y el rendimiento tanto de alumnado como de profesorado de

Educación Superior.

Epílogo

Al terminar la presentación de este trabajo –y sin retornar sobre

las ideas expuestas anteriormente– queríamos subrayar la

importancia de que la Escuela pueda seguir contando con

profesionales que le permitan seguir cumpliendo su atribución

primera y atingir su finalidad máxima, la de permitir el desarrollo

integral de la Persona del Alumno. En eso podríamos citar a

40

muchos autores ya que son inmensas las variaciones del tema a lo

largo de la historia de la educación, pero hay que referir la

formulación prístina del tema en Comenius, en su obra Didáctica

Magna (Coménio, 1976) así como la idea de las escuelas como

«Oficinas de Humanidad» (Coménio, 1976: 145-161) ahí

presente, bien como la encarnación de este tema en la obra y en la

práctica de Henri Pestalozzi (con destaque para los institutos de

Berthoud y de Yverdon). En Portugal, hay que subrayar la

asunción de esa finalidad de la educación en la Lei de Bases do

Sistema Educativo portuguesa (Lei n.º 46/86, de 14 de octubre,

con las alteraciones introducidas por la Lei n.º 115/97, de 19 de

septiembre, y por la Lei n.º 49/2005, de 30 de agosto, art. 1º, nº

2). La actualidad de esta perspectiva educativa y educacional se

impone cada vez más en el contexto de las sociedades más

volcadas para el desarrollo tecnológico y económico, como la

podemos constatar con cada noticia que surge respecto de la

vivencia escolar y social de hoy día, en la que la violencia y el

sin-sentido de la praxis son patentes. Para que sea alcanzada esa

finalidad, la existencia de Profesorado capacitado y autónomo, el

desarrollo de la educación bajo esa perspectiva y la defensa de la

relación pedagógica y su eticidad son decisivos. Así, el desarrollo

de una praxis docente en la que la Persona del Profesor sea

valorizada y promocionada se impone como una urgencia y un

imperativo del tiempo presente. Si a los sistemas les incumbe

enmarcar el funcionamiento macroscópico de la educación – y así

condicionar naturalmente la acción de los individuos–, siempre

quedará un margen de actuación para que las personas

41

individuales y los pequeños contextos relacionales y grupales

puedan generar experiencias nuevas y valiosas, en las que el

cambio social se pueda basar e inspirar. Así ocurre siempre que

no se deje que el sistema se imponga a la Persona y a su

dimensión relacional, intersubjetiva y ética.

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45

2 Piano: Para uma pedagogia mais… Pedagógica?

Contemporânea? Não castrante?

Francisco Monteiro

Educação musical - instrumental

A aprendizagem de um instrumento musical tem sido objecto de

alguns trabalhos a nível pedagógico e didáctico com pertinência

numa educação que se pretende eficiente, moderna e democrática.

Ou seja, uma educação musical – instrumental - que se dirija de

forma eficaz aos objectivos que ambiciona, que obedeça a

critérios éticos, estéticos e pedagógicos actualizados, que vá

transversalmente ao encontro de toda a população e que seja de

fácil acesso pela mesma.

A prática das escolas de música em Portugal mostra, no entanto,

alguns problemas a este nível. Enumero alguns:

1. O alto grau de desistência a partir do 4º, 5 º graus fazem-

nos duvidar da eficácia da relação entre objectivos

propostos, objectivos desejados e ensino realizado;

2. O repertório usado mantém-se com alterações pouco

significativas desde … o Estado Novo;

46

3. As estruturas curriculares, os programas e os normativos

existentes, uniformizados para as diferentes escolas em

paralelismo pedagógico, não são clarificadores no que

respeita aos objectivos/competências ambicionadas, ao

alcance da pedagogia que se propõe efectuar;

4. Será que todos podem aceder a uma educação

musical/instrumental? Será, sequer, importante um ensino

instrumental massificado? Que relação com a existente e

massificada educação musical (no 1º e 2º ciclos)?

Não pretendo responder a estas questões. São, no entanto,

basilares quando nos esforçamos por compreender o que

andamos, verdadeiramente, a fazer no ensino artístico.

O piano

O piano é um instrumento musical que, ao longo da sua ainda

relativamente curta história, foi adquirindo diversos estatutos e

presenças na vida musical:

1. É um instrumento musical símbolo do romantismo do séc.

XIX, época em que definitivamente substituiu o cravo;

2. É um instrumento musical símbolo da burguesia europeia

– em toda a casa do burguês deveria estar um piano (de

parede ou mesmo de cauda) para deleite nas horas livres e

de convívio; não é por acaso que as doces meninas em

47

Portugal deveriam «tocar piano e falar francês»,

correspondendo, assim, a um modelo específico de

instrução;

3. É um instrumento solista por natureza, continente de

virtuosismos diversos, de Carl Philipe Emmanuel Bach a

… Mário Laginha e Fazıl Say;

4. É um instrumento solista transversal a diferentes tipos de

música – Jazz, pop., erudita, comercial de origem

duvidosa, etc.

5. É um instrumento não solista, instrumento base a

diferentes funções musicais – composição, educação,

acompanhamento, leitura musical, direcção, etc.;

recordemo-nos que, mesmo no ensino musical actual, a

prática de teclado é obrigatória a múltiplos instrumentos

melódicos;

6. É talvez, para além do órgão, o instrumento de maior peso

e tamanho; muitas vezes negro, um enorme paralelepípedo

de madeira lacada ou uma espécie de estranho caixão

assente em 3 pernas, constitui um objecto de difícil

transporte (no mínimo 3 homens, tal como um caixão) e

de afinação morosa;

7. É, por vezes, substituído pelo seu avatar sonoro “piano

eléctrico”; o piano é, eventualmente, o instrumento

musical acústico que, em termos sonoros, melhor é

48

substituído pelo seu homónimo eléctrico; isso, claro, se

nos remetermos para o uso mais tradicional; diga-se de

passagem, que o “piano eléctrico” se parece menos com

um caixão, é razoavelmente transportável (como, p.ex.,

uma harpa) e não desafina;

Estas questões, embora algo patéticas, parecem deveras

importantes em termos do que se pretende que seja uma educação

musical / instrumental do piano em resposta as 3 outras questões

fundamentais em pedagogia:

Que fazer? Porque fazê-lo? Como fazê-lo?

Objectivos e ideais Justificação Realização do plano

educativo

E reparem que não disse uma “educação pianística”.

O acto educativo

Educar para a música

Os elementos fundamentais na educação musical/educação

instrumental são o aluno, o instrumento, o professor e as obras

musicais. Parece-me desde logo interessante definir qual a

questão fulcral - qual o centro de atenção – destas 4 partes

participantes. Em termos muito gerais, todos os desenvolvimentos

devem centralizar-se na obra a estudar e a interpretar, ponto

fundamental da acção educativa: o aluno, utilizando o

instrumento musical - o piano - e com a ajuda/orientação do

49

professor, toma contacto, apreende e compreende, interpreta a

obra musical. Porque afinal, a música é a actividade e razão de ser

do processo educativo.

Educar para o instrumento

Mas quando se fala em “educação pianística”, em “ensino do

piano”, quando se centra a actividade pedagógica no instrumento,

outros valores são salientes.

Neste caso salienta-se o instrumento como centro da actividade,

dirigindo para o piano toda a atenção. É interessante que a própria

linguagem de todos os dias nas escolas de música reflecte esta

50

questão. Por exemplo, ao dizermos que é fundamental o “domínio

do instrumento”, relevamos uma relação psicológica e física (de

dominação) relativamente ao objecto inanimado que é o piano – o

tal paralelepípedo / caixão negro e enorme. A centralização do

processo educativo no piano reflecte, ainda, uma visão particular

do fenómeno musical conhecida por virtuosismo; não só o

virtuosismo pirotécnico de tocar imensas teclas por segundo mas

também o virtuosismo mais subtil, que se interessa pela

manipulação do som e do fraseado. A música – a obra musical –

é, aqui, um utensílio, uma mera base para mostrar as qualidades

da relação do músico com o piano ou, em último caso, para

exemplificar as virtudes do próprio instrumento - o piano. A

música é absolutamente necessária, mas somente como a terra

num canteiro de flores.

Educar para o aluno

Quando a centralidade é o próprio aluno, este jogo pedagógico

torna-se interessante. Afinal, o indivíduo e a sua felicidade são

centrais em todo o processo educativo. Este esquema é

51

interessante tendo em vista uma educação em que a música e o

instrumento não são mais que pretextos – utensílios. E não

deixaria de focar o interesse deste esquema quando a

aprendizagem de um instrumento é motivada por questões, p. ex.,

de desenvolvimento da destreza motora, de desenvolvimento da

concentração, do exercício da autoconfiança e de auto-expressão

do aluno. O desenvolvimento da capacidade musical do aluno –

da sua criatividade musical – é da maior importância em termos

de uma educação musical actuante.

Educar para o sistema

A centralização da actividade no professor parece-me algo

problemática, mesmo desviante. Ou talvez não, sendo uma prática

consentida e comum.

E vou dar alguns exemplos. Lembremo-nos que, muitas vezes, o

processo educativo, as aulas de piano, não são mais que um

pretexto para o professor superar as suas frustrações e/ou

necessidades de afirmação pessoal / institucional. Outras vezes, a

carreira do professor, a sua classe de instrumento ou a própria

52

escola revelam-se o centro da actividade educativa, utilizando a

música e os alunos para o seu engrandecimento. Outras ainda,

uma tradição específica – uma “escola” – é o centro de todas as

atenções e actividades, sendo as obras e os alunos utensílios para

mostrar e preservar essa tradição, essa escola. Parece-me que este

modelo de focagem pedagógico é, em termos de uma pedagogia

moderna, pouco produtivo; mas útil para estatísticas e imagem da

escola.

O Corpo

É interessante pensar que, muito em especial na situação de aula

individual de piano, existe uma forte presença de corpo, de 3

corpos: o do aluno, o do instrumento e o do professor. E, salientes

os corpos, revelam-se componentes psicomotoras interessantes.

• O corpo do aluno (na sua dimensão física, mas também

emocional, psíquica, até energética), interage com o corpo

inerte mas simbólico do instrumento; esta interacção

processa-se de formas diversas, por vezes também

denominada “postura”, “técnica pianística”, etc.;

• O corpo do professor actua como mediador entre aluno e

instrumento, dirigindo e/ou focalizando acções, tantas

vezes de forma meramente gestual, mesmo metafórica;

• Mas o corpo do professor (também na sua dimensão

emocional, psíquica e vital) transforma-se também em

espelho, exemplificando passagens das obras, imitando

53

outras vezes o próprio aluno, participando activamente no

processo psicomotor.

• Tantas vezes o toque do professor – no ombro, no braço –

serve para aliviar tensões motoras; ou, por outro lado, para

as criar.

Está sempre presente neste acto educativo um “não corpo”, uma

ausência de corpo, uma não presença física: a obra musical.

Porque a partitura nada mais é que um suporte, um índice de algo

que está bem para além dos símbolos musicais: a obra musical.

Esquecendo esse “não corpo”, pondo-o à parte, as interacções

adquirem uma dimensão pianística, dirigidas para si mesmas, não

necessariamente musicais; chamando a obra musical não só a

pontuar como a determinar as interacções aluno/instrumento,

estas transformam-se em música, ou encaram a música como

objectivo.

Tipos de trabalho na aprendizagem do instrumento

Sabemos que uma parte do trabalho de aprendizagem se faz

pensando no piano, nas suas particularidades, nas suas

capacidades sonoras, na nossa forma de interagir com o teclado,

independente de qualquer obra musical. Definem-se, assim,

diferentes formas de trabalho, com objectivos bem distintos:

• Exercícios psicomotores, com o fim de desenvolver o

conhecimento, a maleabilidade do corpo do

54

instrumentista, a sua relação e potencialidades com o

instrumento, (p. ex. exercícios de respiração, de

descontracção ou força muscular). Corresponde, na prática

interpretativa e pedagógica, a um tipo de exercícios com

ou sem o instrumento, em que não se perspectiva o

resultado sonoro mas as potencialidades psicofísicas do

instrumentista. Exclui, eventualmente, escalas, arpejos e

exercícios congéneres que têm como fim a audição dos

sons na execução de determinada passagem (“modelo

musical”).

• Modelos musicais, desenvolvendo elementos como a

altura dos sons, a velocidade, o timbre, a intensidade, a

articulação, o fraseado, entre outros (p. ex. exercícios de

escalas, de acordes, de arpejos, exercícios e peças

musicais com fins técnicos). Com “modelos musicais”

pretende-se nomear pequenos padrões, sucessões sonoras

com particularidades a nível de execução e que são,

muitas vezes, pequenas partes de obras musicais.

Corresponde à maior parte de exercícios (escalas, arpejos,

etc.) na prática interpretativa e pedagógica; corresponde,

também, a formas de estudo de pequenas partes de obras

musicais e, especialmente, de estudos, muitas vezes com

alterações relativamente ao proposto na partitura, com o

objectivo de poder executar essas passagens.

• Problemas expressivos, trabalho puramente interpretativo

em termos de execução, em obras musicais, (p. ex. como

55

tocar determinada passagem de uma peça da maneira

pretendida). Corresponde, na aprendizagem da

interpretação, à execução integral da obra, à execução

parcial (com fins diferentes dos “modelos musicais”), à

prática de diversas estratégias como a leitura interior, a

audição, a análise, etc.

Esta divisão, embora algo artificial, revela-se interessante para

uma eficaz distinção dos objectivos das diferentes actividades na

sala de aula. Pretende-se que os procedimentos sejam dirigidos

para questões bem definidas, para o desenvolvimento e superação

de dificuldades precisas e não para um abrangente e indefinido

desenvolvimento da dita “técnica pianística”, do “domínio do

piano”, de uma “escola pianística”.

Algumas propostas didácticas

A pedagogia do piano, em especial reflectindo o trabalho com os

mais novos, dirige-se, tal como a pedagogia musical geral, para os

seguintes pontos essenciais.

Trabalho com o Som e o Silêncio como elementos fundamentais

Trata-se, neste campo, de um vasto leque de actividades de

experimentação, de exploração, de jogo, de criação (composição e

improvisação). E vejamos algumas formas interessantes.

56

• Tantas vezes os alunos são deparados com pequenos

exercícios (p. ex. Hanon) que mecanicamente repetem ao

piano.

• Será, talvez, interessante que os alunos façam esses

mesmos exercícios fora do teclado; dessa forma abstraem-

se de questões pouco importantes no momento (a altura

dos sons) e concentram-se na métrica e rítmica desses

exercícios (no tampo do piano, p. ex.), nas tensões

motoras, na postura, etc.

• Será, ainda, interessante que o aluno procure outros

exercícios parecidos, que invente novos e os desenvolva

de alguma forma (p. ex. transpondo, alterando o ritmo, os

desenvolva com sentido harmónico, etc.).

• Será, ainda, interessante que ele faça este trabalho em

conjunto com outro colega, fazendo jogos de pergunta

resposta em partes diferentes do teclado, tocando ao

mesmo tempo (coordenando o andamento), misturando

diferentes exercícios.

• No trabalho com crianças na dita “iniciação”, utilizam-se

peças que mal abrangem as 2 oitavas centrais de extensão,

esquecendo o resto do instrumento; as crianças não conhecem

os pedais (tocam sempre sentadas), assim como os sons mais

graves e mais agudos, o que acontece dentro do piano, tendo

simplesmente uma dimensão reduzida do instrumento.

57

• Porque não tocar de pé? Haverá, eventualmente, uma

postura menos incómoda e mais móvel para a criança.

• E porque não tocar a mesma música em diferentes

registos?

• E porque não explorar o teclado e os sons dentro do

piano? Contar histórias, imitar animais, jogar com o seu

corpo e o instrumento de forma o mais abrangente

possível.

A relação com o piano – o tal caixão ou paralelepípedo enorme –

pode-se desenvolver de forma mais natural, partindo da criança,

tornando-a criativa, expandindo a sua capacidade de auto-

expressão e de exploração psicomotora, o seu desenvolvimento

motor na relação com o instrumento, desinibindo-a. Sem dúvida

que este trabalho dificilmente será mostrado numa audição

escolar; poderá ser, mesmo, pouco apreciado pelos pais da criança

que poderá dizer: “afinal ela anda a fazer aquelas trapalhadas ao

piano mas ainda não sabe tocar o Hino à Alegria para a audição”.

Sabemos que a audição, embora importante, não pode ser o cerne

do processo educativo.

Músicas /Obras Musicais

• Tocar, criar, ler, escrever

O trabalho com as obras musicais começa desde cedo e é fulcral

no ensino do instrumento. No entanto, tal não quer dizer que a

58

criança só possa começar a tocar peças quando souber ler. A

leitura – e a escrita musical – devem advir das necessidades: de

leitura de obras musicais mais complexas, ou de um maior

número de músicas; mas também deve advir da necessidade de

escrever as músicas inventadas pelo próprio aluno ao piano. Este

tipo de trabalho, muito pouco usado, é gratificante para o

desenvolvimento do aluno a vários níveis, inclusivamente ao

nível das suas capacidades “pianísticas”. E o processo de

aprendizagem acontece da seguinte forma: 1. na exploração no

instrumento o aluno descobre novas coisas, diferentes

sonoridades, ou tenta imitar os alunos mais adiantados; tal

constitui uma forte motivação para que o aluno se desenvolva,

tentando fazer o que, na verdade, ainda não sabe e não consegue;

2. com a ajuda do professor, ele poderá conseguir, indo ao

encontro das suas necessidades. Trata-se do melhor processo de

motivação, intrínseca, criando auto-objectivos. 3. À medida que

as suas peças – por ele inventadas – se tornam mais complexas,

ou são mais numerosas, torna-se necessário escrever para mais

tarde tocar, ou para outros alunos as tocarem.

E, claro, há todo um trabalho de aprendizagem através da

memória, sem partitura, ajudado pela voz: exercita-se uma

memória auditiva, uma memória gestual (de movimentos) e uma

memória musical (de estruturas – gestos – musicais). O método

Suzuki funciona bastante desta forma.

59

• Outras aprendizagens – Leitura interior

Muitas vezes vemos alunos dos mais diversos instrumentos a

trautearem músicas que tocam e a fazerem gestos ao mesmo

tempo. Através da minha experiência tenho observado muitos

instrumentistas de sopro com essas práticas. Por outro lado, é

vulgar ver crianças, alunos de piano, a “tocar no ar” com os

dedos. É interessante que naturalmente os alunos criem essas

formas de estudo, substituindo a própria prática das peças – tocá-

las mesmo no instrumento.

Estão, na verdade, a recordar os movimentos que fazem nas peças

e a cantá-las de uma forma muito esquemática. Estão a imaginar a

peça, a vivê-la temporalmente, mas de uma forma mais interior,

sem instrumento: estão a aproximar-se de uma “leitura interior”.

Sabemos que este tipo de estudo é muito enriquecedor, não só

para conhecimento das estruturas/gestos musicais como também

pela sua dimensão não física – corporal. Na verdade, imaginando

a peça, podemos esquecer os empecilhos técnicos (no caso dos

sopros a embocadura e a pressão do ar), as dificuldades

psicomotoras, concentrando-nos no que é importante - o som - e

não no corpo. E consegue-se, assim, aprender a música – aprender

a viver a música - com menos tensão, possibilitando mais tarde

uma execução também mais livre. Porque sabemos que, quando

aprendemos uma passagem musical, a aprendemos não só a nível

auditivo como na sua conexão com todos os sentidos, os gestos,

as tensões. E, por vezes, algumas destas dimensões devem ser

esquecidas.

60

Por uma pedagogia do instrumento moderna

Sabemos que, nas escolas de música, é valorizada a conservação

de modelos pedagógicos anteriores, reconhecidos pelos diferentes

protagonistas, inseridos em complexos simbólicos e sociais

comummente aceites. Tocar o Hino à Alegria ou o “Für Elise”

continua a ser muito importante para os pais; reconhecer o

estatuto de “clássico” nas obras de uma audição é valorizado por

toda a escola.

Os programas não são mais que listas de obras e procedimentos

para exames e avaliações, e não procedimentos pedagógicos (com

competências, conteúdos, objectivos a diverso nível) e

procedimentos didácticos – o que ensinar, porquê e como nas

aulas de piano.

Que fazer? Porque fazê-lo? Como fazê-lo?

Talvez seja interessante que a escola se abra:

• A diferentes tipos de música, não só respondendo às

solicitações da sociedade e do mercado com também

pondo ao dispor do alunos músicas de diferente índole e

época (medieval, contemporânea, Jazz, comercial, de

banda filarmónica, música barroca, tradicional, música

61

improvisada); o piano sem dúvida que é, historicamente,

limitado; mas os alunos não necessitam de o ser;

• Se abra a diferentes experiências musicais, tais como a

improvisação colectiva, a criatividade, a composição (não

só o exercício de técnicas históricas de composição), a

prática comum de música em conjunto, a prática de teatro

musical; trata-se de uma função essencial da escola de

música – ser uma escola de música – e de músicos, fazer

educação musical aos mais diversos níveis e não ser uma

mera fábrica de instrumentistas com possibilidades

musicais pouco diversificadas;

• Se abra também a percursos musicais diferenciados,

permitindo evoluções e aprendizagens personalizadas,

menos formatadas em “programas” unificados; tal

permitirá que os alunos se dirijam para um ou outro tipo

de aprendizagem musical, que possam progredir de acordo

com as suas necessidades e ambições; assim poderão

rapidamente atingir patamares elevados numa vertente

musical; ou diversificarem as suas aprendizagens em

múltiplos vertentes; ou ainda continuarem a fazer música,

mesmo a serem criativos musicalmente, sem uma pressão

virtuosística.

62

É importante pensarmos que os alunos das escolas de música, os

alunos de piano, em caso de sucesso, poderão ter inúmeras

profissões ligadas ou não à música: músicos amadores, técnicos

de som, compositores, empresários ou dinamizadores culturais,

maestros, melómanos, músicos rock, ministros da cultura ou, até,

pianistas de concerto ou no programa Praça da Alegria.

Felizmente não vão ser todos pianistas.

63

3 O Pedal no ensino do piano

Luís Pipa

Introdução

O pedal é um elemento fundamental na linguagem do piano, e

todo o repertório que se desenvolveu a partir da sua invenção teve

em conta a sua utilização, numa perspectiva enriquecedora do

discurso musical. Busoni descreveu-o como “uma fotografia do

céu, um brilho de luar” (Busoni 1962: 102), e tornou-se célebre a

frase de Anton Rubinstein que o designou como sendo “a alma do

piano”. Mozart entusiasmou-se no momento em que tomou

contacto com o pedal num pianoforte de Andreas Stein, cujo

mecanismo era accionado com o joelho, conforme descreveu com

ênfase numa carta a seu pai em Outubro de 1777.

Apesar da importância que adquiriu ao longo do tempo, o pedal é

frequentemente relegado para um plano secundário no ensino do

piano. Numa típica aula de instrumento, o professor poderá

aprofundar com minúcia aspectos técnicos e interpretativos

relacionados com a produção do som no teclado, limitando muitas

vezes a abordagem do pedal a questões genéricas como “pôr

pedal a contratempo”, ou “pôr pedal dentro da mesma harmonia”,

esquecendo as inúmeras possibilidades da sua aplicação. Um

64

outro aspecto frequentemente negligenciado é a existência de dois

outros pedais: na verdade, quando se menciona genericamente “o

pedal” pretende-se normalmente referir o pedal de ressonância.

Sendo este inquestionavelmente o pedal de maior importância, os

outros dois, os pedais una corda (ou surdina, como muitas vezes

é denominado) e tonal ou sostenuto, podem assumir um papel

relevante quando utilizados com propriedade. Se bem que a

diminuta abordagem a estes pedais possa ser compreensível numa

fase inicial da aprendizagem, sobretudo porque esta é feita muitas

vezes em pianos verticais, que não possuem o pedal tonal e cujo

mecanismo do pedal esquerdo é diferente do do piano de cauda,

essa lacuna torna-se verdadeiramente inaceitável em níveis mais

avançados de ensino.

Pedal de sustentação: Notação

A notação musical foi-se desenvolvendo ao longo dos tempos,

nomeadamente pela necessidade que os compositores foram

sentindo de fornecer indicações cada vez mais precisas aos

intérpretes, nomeadamente no respeitante a anotações de

dinâmica, articulação e agógica, cujas nuances foram

gradualmente atingindo elevados níveis de pormenor e

sofisticação. O facto é que, de uma maneira geral, as indicações

de pedal (e aqui referimo-nos ao pedal de sustentação, ou de

ressonância), não acompanharam essa evolução, limitando-se

fundamentalmente a duas situações: pôr e tirar (Fig. 1).

65

Fig. 1

F. Chopin, Nocturne op. 55 nº 1 (Mikuli), cc. 1-3.

Este exemplo, retirado dos primeiros compassos de um Nocturno

de Chopin editado por um dos seus mais notáveis discípulos, Carl

Mikuli, é ilustrativo da prática simplista de notação, que pode, se

for levada literalmente, conduzir a interpretações francamente

empobrecidas. No caso descrito na Fig. 1, a aplicação do pedal tal

como está indicado leva, numa análise imediata, a uma

adulteração da articulação em staccato proposta por Chopin para a

mão esquerda, resultando na ligação de cada nota do baixo com o

acorde seguinte. Por outro lado, o retirar por completo do pedal

em cada acorde, implica uma ausência de ressonância da nota da

melodia correspondente, originando uma interrupção intermitente

da qualidade do som. O eventual “abandono” do aluno ao

cumprimento estrito deste tipo de notação sem uma análise

crítica, ou a coberto do argumento de que “se está na partitura é

para fazer”, será o pior serviço que pode ser prestado pelo

professor.

Conscientes das limitações deste tipo de notação, e dos seus

possíveis efeitos perversos, alguns compositores optaram por

66

suprimir ao mínimo indispensável as indicações de pedal,

reservando-as quase exclusivamente para criar efeitos específicos.

Um caso clássico é o do início do segundo andamento do

concerto para piano nº 3, op. 37, de Beethoven, em que o

compositor indica um só pedal para uma série de compassos com

várias mudanças de harmonia (Fig. 2). Czerny, que foi aluno de

Beethoven e deixou para a posteridade testemunhos preciosos

sobre a maneira de interpretar o mestre, explica que o próprio

compositor em 1803 tocou a passagem toda com o mesmo pedal,

e que soava magnificamente nos débeis pianos da época,

sobretudo usando o mecanismo una corda, mas o próprio Czerny

aconselhava uma mudança de pedal em cada alteração

significativa da harmonia nos pianos mais modernos de então

(meados do século XIX), sem no entanto interromper a

continuidade sonora, devendo a passagem soar como uma

“harmonia distante, sagrada e etérea” (Newmann 1985: 161).

Fig. 2

L. v. Beethoven, concerto para piano e orquestra nº 3, op. 37, segundo

andamento, cc. 1-6.

Apesar de toda a sua música implicar um uso rico e constante do

pedal, podem-se contar pelos dedos de duas mãos as indicações

67

de pedal de Debussy. O pianista Maurice Dumesnil, que conviveu

de perto com o compositor, atribui-lhe as seguintes palavras: “O

pedal não pode ser anotado. Varia conforme o instrumento, a sala

ou o auditório (…) Deverão fazer fé vossos ouvidos” (Nichols

1992: 163). Na verdade, alguns compositores ao longo do século

XX procuraram descrever através de palavras formas mais subtis

de uso do pedal. Na sua obra Jogos (Jatékók), uma série de peças

em oito volumes de linguagem contemporânea, György Kurtág

descreve desta forma o uso do pedal:

“com Ped” = apela a uma muito subtil e colorida utilização do

pedal. A harmonia deve ser criada a partir da sucessão melódica

das notas mas isso não deverá acontecer a expensas do fraseado.

Por isso, o pedal deverá ser usado desde o estritamente

necessário para produzir o efeito de um simples eco (c. 1/8 Ped.),

até à criação da ressonância absoluta, sendo constantemente

controlado pelo ouvido. Uma atenção especial deverá ser dada

nos finais de frase às gradações de libertação e activação (1/2,

1/4, etc. Ped). Tudo isto é válido mesmo para o “sempre com

Ped.” O pedal premido a fundo continuadamente conduz a

efeitos sonoros caóticos e à acumulação supérflua de dinâmica.

Nas peças sem marcação de pedal, este pode ser usado de acordo

com o descrito acima (exceptuando, naturalmente, nos sítios

onde vem indicado “senza Ped.” (Kurtág 1979).

Sendo os primeiros volumes da obra de Kurtág inspirados na

abordagem lúdica e espontânea de crianças explorando o piano, é

notável o propósito verdadeiramente pedagógico de Kurtág em

esclarecer e salientar o alcance de uma cuidadosa e variada

utilização do pedal. Aliás, Kurtág propõe uma notação algo

68

diferente e mais completa do que a normalmente utilizada, com

libertações parciais de pedal e a sua pressão e libertação de forma

gradual (Fig. 3).

Fig. 3

Jatékók, indicações de pedal (Kurtág 1979)

É particularmente interessante a alusão de Kurtág à utilização do

pedal como potenciador de um “efeito de um simples eco (c. 1/8

Ped.)”. De facto, as possibilidades de premir o pedal desde o seu

início até ao ponto máximo de profundidade são

matematicamente infinitas. Sabendo-se que o mecanismo do

pedal de ressonância tem como função a libertação de todos os

feltros que actuam como abafadores das cordas no momento em

que a tecla deixa de ser accionada, a sugestão de Kurtág de 1/8 de

pedal remete para uma pressão mínima sobre o pedal, de modo a

este libertar ligeiramente os abafadores, mantendo no entanto

ainda o contacto com a corda, deixando-a apenas vibrar de uma

forma quase imperceptível.

69

Fig. 4

Banowetz (1985), notações de pedal

O pianista Joseph Banowetz amplificou, no seu livro The

Pianist’s Guide to Pedaling (1985), o leque de possibilidades de

notação para o pedal de ressonância (Fig. 4) e, mais recentemente,

o pianista catalão Albert Nieto (2001) expandiu-o, introduzindo-

lhe aplicações como “soltar rapidamente o pedal retomando as

teclas sem percussão”, “retomar a nota sem percutir as cordas” e

“notas pedalizadas manualmente” (Fig. 5).

70

Fig. 5

Nieto (2001), notações de pedal

71

A utilização destas técnicas de notação mais subtis e completas

poderia, por exemplo, resolver a questão da pedalização do

Nocturno de Chopin discutida anteriormente (ver Fig. 1). Uma

notação que indicasse utilizações e libertações parciais de pedal,

enriqueceria a peça do ponto de vista harmónico, preservando

simultaneamente a clareza da articulação da mão esquerda, sendo

essa uma solução mais consentânea com a escrita do compositor,

devendo a medida exacta da sua aplicação ter sempre em conta,

como reclamava Debussy, as condições acústicas e as

características do próprio instrumento.

Pedal de dedos

Uma das formas de notação sugeridas por Nieto tem a ver com

aquilo que se denomina comummente “pedal de dedos”, ou seja,

notas pedalizadas manualmente. Esta prática é uma forma subtil

de criar uma sugestão de pedal de ressonância em texturas que

necessitam de manter nítida a sequência de uma linha melódica de

sucessões de graus conjuntos e cromáticos, mantendo premidas as

notas do acompanhamento harmónico. O segundo andamento da

sonata K. 545 de Mozart é um exemplo onde essa prática pode

enriquecer a execução. A utilização do pedal em cada mudança de

harmonia colidiria com a clareza da linha melódica descendente

do compasso três, ou com a articulação em staccato dos segundo e

terceiro tempos do compasso cinco. Independentemente da

utilização desta técnica, o pedal pode ser também usado de uma

forma parcial e com mudanças frequentes, com o objectivo de

72

enriquecer a paleta sonora de harmónicos, sem no entanto

contribuir para sobrepor as notas da melodia (Fig. 6).

Fig. 6

W. A. Mozart, Sonata K. 545, 2º Andamento, cc.1-6.

Pedal una corda

O pedal una corda, ou surdina, como por vezes é denominado,

resulta, num piano de cauda, da subtil deslocação do mecanismo

e, consequentemente, do próprio teclado, para o lado direito,

fazendo não só com que, nas partes média e aguda os martelos

toquem em apenas duas das três cordas (dependendo da afinação

do próprio mecanismo do pedal), mas também com que a parte do

martelo que atinge a corda esteja menos marcada, e por isso

menos dura, produzindo um timbre mais aveludado. Nos pianos

verticais o mecanismo aproxima os martelos das teclas

diminuindo a intensidade do som mas não necessariamente o seu

timbre. No piano de cauda há muitos autores que advogam que

este pedal deverá apenas ser usado para mudar o timbre. O

73

pianista Charles Rosen confessou-se mesmo surpreendido quando

soube que alguns dos seus colegas o usavam também para

diminuir a quantidade de som (Rosen 2002: 67-8). A verdade é

que, tal como o pedal de ressonância, o pedal una corda pode ter

várias gradações e, dependendo da quantidade de pressão

exercida e das características do instrumento, poderá também ser

usado com esse propósito. O intérprete deverá ter a capacidade de

fazer esse julgamento à medida que vá conhecendo um

determinado instrumento, sendo importante que os jovens sejam

alertados para essas questões tão cedo quanto possível e

obrigados a manter um critério rigoroso em relação à sua

utilização. Será também importante notar que a mudança tímbrica

fica normalmente mais exposta no registo agudo, podendo, em

alguns pianos, o som tornar-se pouco sustentado, pelo que

importa também ter presente a necessidade de compensar essa

lacuna com uma maior profundidade no ataque.

Vários compositores, sobretudo desde Beethoven, anotaram o

pedal una corda nas suas composições, normalmente associando-

o a dinâmicas em pp ou mesmo ppp, na procura de uma atmosfera

muito especial. No entanto, tal como com o pedal de ressonância,

a sua utilização deverá acontecer de acordo com o melhor

julgamento do intérprete. Na música de Debussy, por exemplo,

ela parece particularmente apropriada, e também em J. S. Bach,

nomeadamente, nas sarabandes das suas Suites ou Partitas, em

que a sua aplicação nas repetições de ambas as partes poderá

74

evocar uma doçura tímbrica e uma intimidade próximas da do

clavicórdio, instrumento tão da preferência do próprio Bach.

Pedal Tonal

Internacionalmente mais conhecido como sostenuto pedal, o

pedal tonal, o pedal situado no meio dos outros dois pedais, é por

vezes notado como Ped. II, ou Ped. 3, o que poderá

ocasionalmente causar alguma confusão com o pedal una corda.

No entanto, a sua denominação mais frequente em partitura é

Sost. (ou Sust.) ped., e consiste numa espécie de pedal de

ressonância selectivo, uma vez que o seu mecanismo liberta

apenas os abafadores das teclas que estão premidas quando o

pedal é accionado. Ao contrário dos outros pedais, este deve

apenas ser accionado até ao fundo, sempre depois do som já ter

sido produzido (ou após pressionar as teclas silenciosamente) e

enquanto as teclas estão premidas. Este pedal foi inventado em

1862 por Claude Montal (Philipp 1982: 57) e patenteado pela

marca Steinway nos Estados Unidos em 1874, tendo a sua

completa implantação, sobretudo nas salas de concerto da Europa,

durado quase até meados do século XX (Banowetz 2006: 18).

O seu uso é relegado quase exclusivamente para a música

contemporânea, tendo sido utilizado pelos compositores

fundamentalmente para criar interessantes efeitos de ressonância.

Na Fig. 7 pode ver-se a sua aplicação numa peça de Luciano

Berio, Sequenza IV, que procura obter ressonâncias a partir da

75

sustentação das notas colocadas entre parêntesis, aplicando-lhes o

pedal, de forma a explorar a acumulação de sons harmónicos

produzidos à medida que as outras notas são executadas. Neste

caso específico, o pedal deverá ser accionado pelo pé esquerdo,

uma vez que o pedal de sustentação também deverá ser utilizado

de uma forma intercalada, mas este pode sê-lo também com o pé

direito, quando se utilize o pedal una corda.

Fig. 7

L. Berio, Sequenza IV (Levaillant 1993: 106)

O pedal tonal poderá também tornar-se apropriado para outro tipo

de repertório, podendo sustentar notas que não possam ser

alcançadas com os dedos. Banowetz afirma, contra os que dizem

que não deverá ser utilizado em repertório anterior à sua

existência ou disseminação, que a sua boa utilização pode vir ao

encontro da distribuição pianística alargada de certas obras,

aproximando-se inclusivamente da intenção musical do

compositor (Banowetz 2006: 18). O próprio Banowetz dá como

exemplo uma passagem dos Estudos Sinfónicos de Schumann

onde o pedal tonal, juntamente com mudanças regulares do pedal

76

de ressonância, poderá manter a nota grave, emprestando à

passagem maior clareza harmónica (Fig. 8).

Fig. 8

R. Schumann, Estudos Sinfónicos, sugestão de utilização de pedal tonal

(Banowetz 2006)

No final do primeiro andamento da sonata para violoncelo e piano

de Debussy o pedal tonal pode ser uma solução interessante para

o staccato do ré no registo grave, permitindo a sustentação do

acorde no registo médio. A alternativa seria usar o pedal tonal

para manter o acorde, perdendo-se a nitidez do staccato por entre

as ressonâncias criadas. Apesar de ser consensual que Debussy

não concebia as suas longas notas prolongadas para serem

sustentadas pelo pedal tonal, uma vez que o seu próprio piano não

o possuía, prevendo para tal seguramente uma utilização rica e

variada do pedal de sustentação, neste caso específico, a clareza

do staccato ajuda a antecipar a atmosfera do segundo andamento,

onde o violoncelo entra em pizzicatto (Fig. 9).

77

Fig. 9

C. Debussy, Sonata para violoncelo e piano, final do primeiro e início do

segundo andamento.

Utilização dos pedais em simultâneo

Vimos em exemplos anteriores que é naturalmente possível

utilizar dois dos pedais em simultâneo. No entanto, Banowetz

sugere a utilização dos três pedais ao mesmo tempo no primeiro

78

andamento da sonata op. 27 nº 2 de Beethoven, vulgarmente

conhecida como “sonata ao luar”. Beethoven indica no início que

“si deve suonare tutto questo pezzo delicatissimamente e senza

sordino”, o que equivale a dizer que se deverá tocar sempre sem

os abafadores (“senza sordino”), ou seja, na prática, sempre com

o pedal de sustentação accionado. Uma vez que (tal como Czerny

alertava para o início do segundo andamento do terceiro concerto

para piano) a permanência literal do pedal de ressonância ao

longo de toda a peça se tornaria insustentável num piano

moderno, Banowetz descreve como Howard Ferguson imaginou

um sistema em que, pressionando silenciosamente todas as teclas

abaixo do dó sustenido grave (nota mais grave a ser tocada) e

accionando o pedal tonal, se poderá tirar partido dos sons

harmónicos por simpatia, recriando, com a ajuda do pedal de

sustentação, a atmosfera pretendida por Beethoven. Para ajudar

ainda mais ao carácter íntimo (Beethoven também indica no

início sempre pp), Banowetz sugere que se pressione os pedais

una corda e tonal simultaneamente com o pé esquerdo (Banowetz

1985: 168-9), (Fig. 10).

79

Fig. 10

L. v. Beethoven, sonata op. 27 nº 2, Primeiro andamento, cc.1-5 (Banowetz

1985: 169)

Conclusão

O aprofundamento do estudo do pedal constitui-se hoje como um

desafio ao ensino do piano a diferentes níveis. Com os novos

desafios que a reestruturação do ensino vocacional da música

coloca, em particular na necessidade de concentração de meios,

apontando para a introdução de um determinado número de aulas

colectivas de instrumento, o seu aproveitamento para uma

abordagem aprofundada de técnicas específicas, nomeadamente a

da utilização dos pedais, poderá constituir-se como uma estratégia

a aplicar para o futuro. Um espelho desta prática ao nível do

ensino superior consubstancia-se na existência da unidade

80

curricular ‘Técnicas de Interpretação’ que dirijo no primeiro

semestre da Licenciatura em Música da Universidade do Minho, e

que funciona em paralelo com a aula individual de instrumento,

com o propósito de analisar e aprofundar em grupo questões

fundamentais relacionadas com a técnica do piano. O seu

objectivo é o de preparar o aluno de modo a poder evoluir com

conhecimentos sólidos e abordar com maior confiança os desafios

colocados na nova etapa a nível superior, na qual o estudo do

pedal assume um papel absolutamente relevante.

Bibliografia

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Bloomington: Indiana University Press.

Banowetz, J. (2006). ‘The Art of Pedalling’. EPTA Piano

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Rosen, C. (2002). Piano Notes. London: Penguin Books Ltd.

Schonberg, H. C. (1965). The Great Pianists. London: Victor

Gollancz Ltd.

82

4 Propuesta investigadora para la enseñanza

elemental de fagot como perspectiva educativa para el

siglo XXI

José Ramón Pérez Mestre

El material que aquí presentamos se concretiza en el libro Schola

de Fagot, el cual propugna la formación musical por la praxis,

proporcionando una interesante reflexión teórica y la importancia

de la constatación de la didáctica para una mejor comprensión y

estudio del instrumento. Es una propuesta didáctica y pedagógica

en base a una metodología para la enseñanza elemental de los

estudios de fagot: un material curricular que puede ponerse en

práctica en los centros de enseñanza. Material curricular

consistente en la elaboración y desarrollo pormenorizado de la

propuesta de programación didáctica relativa a los estudios de

fagot correspondientes a las enseñanzas elementales, que fue

implantada a modo de prueba piloto en el Aula de Fagot del

Conservatorio Superior de Música de la Diputación de Badajoz

durante los cursos académicos 1998/1999 a 2002/2003 por el

profesor de la misma, José Ramón Pérez Mestre. A pesar de que

el presente trabajo se encuentra enmarcado por la normativa

educativa propia de Extremadura, su implantación más allá de

esta comunidad autónoma no debe ocasionar problema alguno

83

dada la adaptación a la generalidad con que se caracterizan todos

los planteamientos realizados, que son aplicables a otros

territorios y escenarios teniendo en cuenta la normativa vigente

sobre educación que corresponda en cada caso. Surge como

resultado de las investigaciones llevadas a cabo en mi trabajo de

tesis doctoral El fagot en Extremadura. Aportaciones a la

investigación sobre su genealogía histórico-evolutiva y su

técnica. Propuesta didáctica y pedagógica para la enseñanza del

mismo.

Cuando se comienza cualquier propuesta investigadora, siempre

se hace con ciertos miedos y fuertes dosis de responsabilidad.

Toda situación es propia de quien se siente comprometido en una

tarea importante, al menos para quien la realiza. Generalmente el

hecho de investigar en sí va siempre acompañado de una serie de

“accesorios” propios de un laboratorio o del mundo de la ciencia

más pura y sofisticada, dejando los aspectos artísticos y

educativos en un segundo plano. Teniendo presente la definición

que hace de ella la Real Academia Española de la Lengua (2002):

AInvestigar es hacer diligencia para averiguar o aclarar algún

hecho, o para descubrir alguna cosa@, y por aclarar posiciones y

conceptos, nos apoyamos en las palabras de Lago (2000:75) en

relación a lo que entendemos qué es y qué puede considerarse

investigar: AInvestigar es tener una curiosidad constante y

desbordada por la vida, que permanentemente nos regala

elementos a descubrir; buscar respuestas a aquellas cosas que se

nos presentan como imposibles o de difícil comprensión;

84

observar e indagar con mirada analítica, que nos permita ir más

allá de lo que de verdad tenemos ante nuestros ojos; buscar

estructuras ordenadas a temas aparentemente desestructurados;

o, cambiar, modificar, innovar el conocimiento@.

Al iniciar nuestra investigación fueron muchos los interrogantes,

todos ellos impregnados de esa gran Acuriosidad constante@ y a

la vez, por la Anecesidad de saber algo más@. En realidad se trató

inicialmente de una búsqueda incesante, y a veces, sin límites de

respuestas precisas a determinadas cuestiones, como por ejemplo:

! )Por qué la docencia de fagot en España a

excepción del Real Conservatorio Superior de

Madrid se ha visto reducida casi a unos treinta

años de historia, en el mejor de los casos, y por

qué ha estado circunscrita mayoritariamente a

regiones específicas como es el caso de la

Comunidad Valenciana?

! )Por qué los alumnos que ingresan por primera vez

en un centro de estudios musicales no se decantan

por estudiar fagot en la mayoría de los casos y sí

por otros instrumentos Amás populares@ como por

ejemplo el piano o la flauta travesera, siendo todos

ellos instrumentos que gozan de un amplio y

dilatado recorrido histórico (en base a intérpretes

célebres, repertorio específico a solo y de conjunto

para grupos de cámara y orquestas, literatura

propia, etc.)?

85

! )Qué claves básicas podríamos aportar en la actual

enseñanza del fagot dentro del marco educativo

vigente para garantizar un buen magisterio que

favorezca la proliferación del instrumento en los

conservatorios y demás centros de enseñanza

musical en España?

Al propio tiempo, partimos de tres premisas principales que nos

planteamos a modo de interrogantes:

)Qué queremos investigar?

Con nuestra investigación pretendemos contribuir

y profundizar en determinados aspectos del fagot en

España, y en Extremadura sobre todo, tomando como

punto de partida una pauta de actuación concreta sobre las

metodologías didácticas más actuales en el marco

educativo vigente.

)Cómo queremos hacerlo?

El cómo investigar hace referencia a la naturaleza

propia de nuestro trabajo de investigación, teniendo en

cuenta que éste está dotado de un carácter mixto que

combina dos líneas de actuación. Una, marcada por su

fundamentación teórica (investigación documental) y otra,

totalmente impregnada por la práctica en sí (investigación

de campo).

Simultáneamente, establecimos un doble mecanismo de

ejecución y control desde la investigación-acción en el

aula. Por un lado, un sistema de vigilancia continua

86

(follow up) que nos permitió en todo momento, detectar

los fallos que se pudieran producir, para corregirlos

inmediatamente, y en qué forma y grado se cumplían las

actividades. Por otro lado, un sistema de retroalimentación

constante (feed back) que nos sirvió para verificar nuestra

propia actividad docente, llevando a cabo una evaluación

de tipo triangular en la que se vieron inmersos

simultáneamente tres elementos claves: el alumno/a, el

profesor y el proceso en sí de enseñanza-aprendizaje.

Todo ello, teniendo en consideración un enfoque

metodológico específico y, las técnicas y herramientas

necesarias para su elaboración y desarrollo.

Entendemos la evaluación, según Barrios Manzano

(1995), como un proceso ininterrumpido con cuatro fases

fundamentales: obtención de la información, formulación

de juicios, toma de decisiones y comunicación de los

resultados de la misma. Así mismo, consideramos que la

evaluación ha de estar presente en tres momentos

concretos: antes de iniciarse la acción educativa porque,

gracias a ella es posible precisar la inclusión o no de

determinados objetivos; a lo largo del proceso porque,

actuando bajo la denominada evaluación continua, se

precisa cuando es necesario hacer reajustes en las

actividades programadas; y, al final del proceso, para

comprobar que los objetivos han sido alcanzados.

87

)Cuál será el tratamiento más adecuado para su

realización?

Cualquiera de los aspectos antes mencionados

forman parte de lo que denominamos metodología de

investigación. Junto a ambas líneas de actuación

recurrimos a algunos de los modelos más utilizados en

investigación musical. Cada uno de ellos reúne una serie

de características determinadas que nos ha permitido

utilizar unas coordenadas muy específicas para así

ayudarnos a centrar el desarrollo de nuestro trabajo. Éstos

son los que a continuación mostramos:

! Método Experimental: para establecer relaciones

bilaterales entre causas y efectos

! Método Filosófico: para alcanzar un mayor

conocimiento del por qué de las cosas

! Método Comparativo: para así revisar, valorar,

comparar, verificar y demostrar aspectos

relacionados con nuestro objeto de estudio

! Método Descriptivo: para poder presentar la

realidad desde la práctica

Bajo todos estos parámetros intentamos dar respuesta a las

cuestiones planteadas inicialmente, obteniendo como resultado

de todo ello la culminación del presente trabajo de investigación.

Con respecto al estado de la cuestión, debemos señalar la

escasez de material impreso en castellano, por no decir casi

88

inexistencia, para la investigación del fagot en España. A pesar de

ello, fuera de nuestras fronteras nacionales sí hay documentación

bibliográfica de significativa importancia en diferentes lenguas

distintas a la castellana, que ha sido consultada y que tiene un

gran peso específico en este estudio. En este sentido, cabe citar

los siguientes ejemplos: Seltmann y Angerhöfer (1984), Spencer

(1958) y Waterhouse (1955). Es por ello, que con el presente

trabajo pretendemos contribuir al desarrollo de materiales en

castellano tomando como base la documentación mencionada,

ampliando así su situación en España y, aportar propuestas

didácticas y pedagógicas para la enseñanza del fagot en la

península e islas adyacentes.

En relación a los antecedentes y desarrollo actual del tema

objeto de estudio hemos buscado, por una parte, en la información

proporcionada por el Ministerio de Educación, Cultura y Deportes

mediante su base de datos de tesis doctorales TESEO. En ella

observamos que existen muchas carencias de trabajos de

investigación sobre el fagot (o aspectos concretos relacionados

con este instrumento) en España. Si buscamos antecedentes

remotos, sí tenemos constancia de varios estudios históricos que,

basados en documentación de archivos, lo citan de manera

indirecta, y es el caso por ejemplo, del bajón (instrumento

antecedente del fagot en España). Éste aparece en la mayoría de

las tesis doctorales fundamentadas en la documentación histórica

de las diferentes catedrales españolas, durante la época barroca,

89

como uno de los instrumentos integrantes de los grupos de

ministriles.

Ejemplo de ello es la tesis doctoral de Pavia Simó (1977). En ella,

observamos como los resultados obtenidos en la investigación de

la música de la catedral de Barcelona en el siglo XVII son casi

todos inéditos y están sacados básicamente de las fuentes

impresas del archivo de dicha catedral y de la sección de música

de la biblioteca de Cataluña. Son los siguientes:

1. Sobre la capilla de canto (fundación pleitos dignidades

de canto ontralbos escolares o niños cantores maestros

de capilla)

2. Instrumentos e instrumentistas (organistas, órganos y

organeros, otros instrumentos, bajón y bajonistas,

manchadores del órgano, copistas de música)

3. Trascripción de obras de los principales compositores.

4. Sección documental con la trascripción paleográfico

de los documentos que se refieren a los maestros,

órganos y cantos escolares.

Si nos circunscribimos a Extremadura como ejemplo, cabe

destacar el trabajo de tesis doctoral de Barrios Manzano (1999),

en donde contempla la aparición en su documentario del bajón y

del bajoncillo en los años 1594 y 1651 respectivamente en la

catedral de Coria, formando parte así de su grupo de ministriles.

En este sentido, debemos tener en cuenta que, no quiere decir que

los instrumentos aparecieran en el año al que se alude, sino que se

90

citan cuando aparecen por primera vez en la documentación

consultada.

Otro ejemplo de considerable trascendencia en el campo de la

musicología española, y más concretamente la extremeña, es el

prolífico trabajo de investigación llevado a cabo por el prestigioso

musicólogo López-Calo (1995), en donde traza una interesante

historia de la música en la catedral de Plasencia a partir de

documentos hallados en el archivo catedralicio.

Centrándonos ahora sobre la docencia del fagot en

Extremadura, debemos señalar que este instrumento no goza de

una tradición amplia en cuanto a su magisterio en los

conservatorios de las provincias de Badajoz y Cáceres. Podríamos

señalar varios motivos por los cuales se ha llegado a este hecho,

por ejemplo la poca densidad de centros especializados de

educación musical que impartan estudios de fagot con respecto a

otras autonomías como la madrileña o la valenciana sobre todo.

En la comunidad autónoma de Extremadura no tenemos

constancia de que los estudios de fagot formen parte del

currículo de academias privadas, centros autorizados, escuelas

municipales de música u otros centros de similar naturaleza, sin

embargo, sí se imparte esta especialidad en conservatorios

dependientes de la Junta de Extremadura y de las Diputaciones

de Badajoz y Cáceres, aunque recientemente (desde la última

década del siglo XX en la mayoría de los centros).

91

En la provincia de Badajoz sólo existe un centro, el

Conservatorio Superior de Música, ubicado en Badajoz capital y

dependiente administrativamente de su Diputación aunque

educativamente de la Junta de Extremadura. En él se imparten

estudios relativos a las enseñanzas elementales, profesionales y de

grado superior.

En la provincia de Cáceres encontramos dos centros, el

Conservatorio Hermanos Berzosa de Cáceres dependiente de la

Junta de Extremadura y, el Conservatorio Manuel García Matos

de Plasencia dependiente de la Diputación de Cáceres. En ellos se

imparten únicamente estudios relativos a las enseñanzas

elementales y profesionales.

Si analizamos los factores determinantes de la situación del fagot

en Extremadura, hay que destacar el hecho de que son escasos los

alumnos que eligen este instrumento cuando acceden por primera

vez a los conservatorios, por el desconocimiento del mismo en un

principio, y después por su alto coste de adquisición.

Existen conservatorios que poseen fagotes en propiedad para el

estudio de los alumnos/as, sin necesidad de que éstos lo tengan

que adquirir hasta llevar varios cursos. Inicialmente es una

solución, sin embargo puede ser contraproducente a la larga, ya

que el alumno/a podría interrumpir sus estudios de fagot en el

momento en el cual tiene que adquirirlo, hecho en sí ocasionado,

92

en la mayoría de los casos, por el alto coste económico del

mismo.

Por todo ello, la proliferación del fagot en Extremadura se ha

visto muy limitada en beneficio de otros instrumentos más

“populares” como pudieran ser el piano, el violín o la flauta

travesera, por ejemplo.

Teniendo en cuenta todo los expuesto anteriormente y, de acuerdo

con el planteamiento de trabajo establecido, con esta

investigación nos proponemos alcanzar fundamentalmente dos

objetivos:

1. Analizar y proponer literatura y bibliografía

específicas sobre el fagot para su utilización en el aula,

contribuyendo al desarrollo de materiales, y en su caso,

traducción al castellano de la documentación bibliográfica

existente en lenguas extranjeras, ampliando así su situación y

puesta al día en España

2. Realizar propuestas didácticas y pedagógicas sobre

las metodologías a seguir en la enseñanza del fagot dentro del

marco educativo vigente: elaboración y secuenciación de

materiales curriculares en base a su puesta en práctica en un

centro de enseñanza.

En definitiva, el objetivo general y principal de esta investigación

está pensado en la puesta al día de los estudios sobre el fagot, para

hacer llegar a todos los interesados diferentes aspectos relativos a

93

este instrumento de una forma asequible pero así mismo con

rigurosidad científica.

El diseño del presente trabajo se sustenta bajo un modelo de

investigación-acción guiado por una triple vertiente en la que el

autor se ha visto implicado: la trayectoria profesional como

responsable de la cátedra de fagot en el Conservatorio Superior

de Música de la Diputación de Badajoz, su perfil docente e

investigador en la Universidad de Extremadura y el rol

interpretativo como fagotista profesional en la Banda Municipal

de Badajoz, así como colaborador habitual en otras agrupaciones

musicales y orquestas, que ha jugado un papel importante al

servir como “laboratorio de experimentación” para desarrollar los

objetivos planteados inicialmente.

En el apartado relativo a metodología, comentamos y

justificamos la elección de distintos aspectos metodológicos que

se han ido adquiriendo en el curso de la investigación. De hecho,

el carácter “académico” del trabajo de investigación es aquí

donde suele hacerse más sostenible. En realidad, es a través del

uso y manejo de una metodología compleja como mostramos la

destreza y capacidad para llevar a cabo la investigación. Por ello,

asuntos como la elección de una terminología (como por ejemplo,

los Signos utilizados para la notación y catalogación musical), la

adopción de un sistema clasificatorio, el empleo de una técnica, la

aplicación de una prueba, el uso de una estadística determinada, la

94

adopción de unos criterios ideológicos con preferencia a otros, se

convierten en objeto de estudio.

En la primera etapa de la investigación, realizamos un análisis de

todas las tendencias y metodologías pedagógicas, y a partir de

ellas desarrollamos una propuesta didáctica y pedagógica para la

enseñanza del fagot (material curricular en base a su puesta en

práctica en centros de enseñanza). La última fase consistió en la

organización del material para la redacción final en papel y

material informático.

En el transcurso de este trabajo de investigación fue necesaria

seguir una disciplina específica, marcada por actividades que se

han convertido en un hábito del quehacer diario, como por

ejemplo:

1. Realizar lecturas cercanas al tema objeto de

estudio de nuestro trabajo y cotejar su “puesta al día” para,

posteriormente clasificar y ordenar reiterativamente los materiales

y la bibliografía consultados

2. Ordenar en diferentes carpetas las diversas

informaciones obtenidas y materiales de cada uno de los

capítulos del trabajo de investigación

3. Realizar revisiones a los cuadernos de notas

4. Elaborar y diseñar diferentes fichas específicas en

relación a la localización y recogida de la información necesaria

para llevar a efecto nuestra investigación

95

5. Confeccionar, organizar y seleccionar las tablas,

fotografías, esquemas, cuadros, gráficos, etc., que luego íbamos a

utilizar

Las fuentes utilizadas para la elaboración del trabajo de

investigación fueron diversas: bibliografía didáctico-pedagógica y

biográfica del mundo del fagot, el estudio de los principales

métodos y técnicas fagotísticas y un trabajo de campo que

consistió, sobre todo, en la valoración de la propia experiencia

personal y la asistencia a cursos, seminarios, conciertos, jornadas,

simposios, congresos y otros eventos relacionados con el tema

objeto de estudio. Así mismo, también se hicieron consultas en

bibliotecas, fonotecas, discotecas, búsqueda de información e

investigación a través de internet (on line, diferentes páginas web

que aparecen reflejadas en el apartado de bibliografía), visitas a

centros de documentación y archivos y, entrevistas con

personalidades destacadas dentro del mundo del fagot.

Todas estas actividades resultaron de gran interés y valía ya que

aportaron datos e informaciones de significatividad notable

ejerciendo una influencia definitiva en relación a los objetivos

trazados en el presente trabajo de investigación.

El esquema general y distribución del trabajo de investigación

sigue una estructuración en cuatro capítulos, a los cuales hay que

añadirles la presente introducción, las conclusiones y las

referencias bibliográficas.

96

En la Introducción, incluimos la presentación, justificación y

propósito del trabajo de investigación; el estado de la cuestión,

antecedentes y desarrollo actual del tema; los objetivos, diseño,

metodología y fuentes; así como, el esquema general y

distribución del trabajo de investigación.

En el capítulo primero, bajo el título El proceso programador de

los estudios de fagot en el sistema educativo español, analizamos

los siguientes aspectos: la estructura y el marco legal, el currículo

como proceso programador y el proceso de enseñanza-

aprendizaje de los estudios de fagot.

Dentro del segundo capítulo Propuesta didáctica y pedagógica:

programación curricular para la enseñanza elemental de fagot,

recorremos pormenorizadamente las singularidades y los rasgos

distintivos en relación a los objetivos, los contenidos y el proceso

de evaluación, incluyendo una propuesta de valoración de

aptitudes para el ingreso a grado elemental.

Programación de la propuesta metodológica: análisis y selección

de la bibliografía existente para la enseñanza elemental de fagot,

es el título del capítulo tercero. En él abordamos temas

significativos como las orientaciones metodológicas, los

principios metodológicos, didácticos y psicopedagógicos de

intervención educativa, así como una propuesta metodológica

general y específica para cada curso de grado elemental.

97

En el cuarto capítulo, el designado bajo el nombre de Las fichas

como modelo de investigación-acción en el aula. Aspectos

técnicos, adjuntamos y analizamos una serie de fichas cuyo

diseño es de elaboración propia. Éstas nos sirvieron de elemento

de trabajo para nuestra investigación, así como para el análisis y

valoración de los resultados obtenidos a través de Schola de

Fagot en base a la propuesta de programación didáctica y a la

metodología para la enseñanza de fagot implantadas.

Seguidamente encontramos las Conclusiones del estudio de

investigación, que nos sirven para establecer o refutar la

consecución de los interrogantes y objetivos marcados

inicialmente.

El último bloque lo dedicamos a las diferentes Referencias

bibliográficas (material que nos ha servido de apoyo

constantemente), organizadas en tres campos: referencias de tipo

legislativo y normativa, referencias de obras y textos de consulta,

y referencias de tipo electrónico (sitios de internet).

Bibliografia

Barrios Manzano, M0 del P. (1995). Proyecto docente sobre

didáctica de la educación musical. Cáceres, Universidad de

Extremadura.

98

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de Coria. 1590-1755. Tesis doctoral. Cáceres, Universidad de

Extremadura.

Lago Castro, P. (2001). ALa tesis doctoral: el resultado de una

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pp.73-84. Madrid, Musicalis.

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(notas históricas).Trujillo (Cáceres), Ediciones de la Coria.

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el siglo XVII. Tesis doctoral. Barcelona, Universidad de

Barcelona.

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Waterhouse, W. (1995) "Bassoon". The New Grove Dictionary

of Music & Musicians. London, Macmillan, S. Sadie (ed.).

99

5 Contributos da psicologia da música para a

formação de professores do ensino vocacional de música

Nuno Arrais e Helena Rodrigues

A Psicologia da Música tem vindo a empenhar-se no sentido de

compreender o comportamento humano em diferentes contextos

musicais nas várias dimensões abordadas pela Psicologia:

cognição, emoção, memória, aprendizagem, etc. Existe agora uma

ampla caracterização dos mecanismos da percepção, do

desenvolvimento e da aprendizagem musical, bem como

conhecimento sobre os aspectos estruturais, afectivos e

interpessoais da execução instrumental. Impõe-se então a seguinte

reflexão: em que medida pode esta informação, plasmada num

crescente número de artigos e publicações, servir a comunidade

pedagógica e artística? O que têm os professores e alunos de

instrumento a beneficiar com a partilha deste conhecimento? Em

nosso entender, a Psicologia da Música pode contribuir para o

esclarecimento de aspectos secularmente remetidos ao domínio da

intangibilidade e da mistificação (caso, por exemplo, de algumas

abordagens relativas ao talento e à expressividade musical), bem

como ajudar a desenvolver modelos de actuação potenciadores de

eficiência em diversas vertentes do ensino do instrumento como o

desenvolvimento técnico e expressivo, motivação para a

aprendizagem, eficácia em contexto de concerto, etc. Com efeito,

100

esta deveria ser matéria basilar na formação do professor de

instrumento, dotando-o de atributos de observação/acção que o

ajudem a melhor adequar as estratégias de ensino ao estádio de

desenvolvimento musical de cada aluno. Reforçando a formação

neste sentido, estaremos também a talhar caminho sobre o

entendimento do processo ensino/aprendizagem, já que o

professor esclarecido será aquele que mais poderá contribuir para

o reconhecimento de aspectos relevantes do comportamento

musical ao longo da formação do aluno. Estabelecendo pontes de

conhecimento entre a investigação científica e a prática educativa,

a Psicologia da Música pode contribuir para preparar músicos

com maior consciência da sua relação com a música. A integração

desta disciplina num currículo de formação de professores de

instrumento musical proporcionará, pois, uma preparação mais

sólida e integral do professor o que, naturalmente, se reflectirá na

qualidade do ensino da música do séc. XXI.

“Technique to me is a mental and not a manual thing... it is the one

and the only kind of technique that can adequately and completely

express the musician’s every instinct, wish and emotion.” (Fritz

Kreisler in Martens 2006: 64)

A curiosidade incessante pelo indivíduo é uma das características

mais proeminentes da natureza humana. Em nada inocente, este

interesse pelo que somos e como o somos alimenta, em última

análise, a nossa evolução e desenvolvimento civilizacional. Tal

como com as outras áreas de conhecimento, é esta mesma

curiosidade que dita a necessidade da existência de uma ciência

101

como a Psicologia da Música, que ajuda a compreender o

comportamento do homem em comprometimento com o seu meio

sonoro.

Numa altura em que o corpus teórico desta disciplina está

claramente delineado e amplamente desenvolvido, pretendemos

fazer aqui uma reflexão sobre os seus benefícios para a

comunidade educativa, enquanto conhecimento aprofundado

sobre os pressupostos psicológicos associados à aprendizagem da

performance musical e promotor da adequação de estratégias de

intervenção pedagógica. Subvalorizada em alguns círculos

académicos e artísticos, no presente trabalho espera apontar-se

alguns caminhos para um futuro próximo em que a Psicologia da

Música se venha a constituir como matéria de relevo na formação

do professor de instrumento.

Em 1947, Carl Seashore, o investigador que provavelmente mais

contribuiu para a expansão do conhecimento no âmbito da

Psicologia da Música durante o século XX, afirmava o seguinte:

“There is an a wakening interest in what is called musicology, the

science of music. This science has many branches. One of the

most active of which is the psychology of music. In view of this

demand for and the new possibilities of a scientific foundations

for musical education and music theory in preparation for the

teaching and study of music, it is time to inquire: What can

psychology do for music?”.

102

Hoje, volvido mais de meio século, e apesar do enorme avanço

científico verificado nas últimas décadas, podemos afirmar que

esta questão continua em aberto, já que a maioria daqueles que

trabalham em música (i.e. músicos, professores, compositores,

produtores, etc.) continuam afastados do conhecimento alcançado

no âmbito da Psicologia da Música.

Em Portugal, esta situação deve-se essencialmente a três factores:

a) Só muito recentemente se começaram a dar os primeiros

passos na difusão de conteúdos estudados no âmbito da

Psicologia da Música em formato acessível a destinatários

do meio artístico e do ensino musical. Estas primeiras

publicações adaptadas a músicos e professores de música

(e.g. Hallam 2006; Lehmann, Sloboda & Woody 2007;

Parncutt & McPherson 2002; Williamon 2004) denotam o

interesse da comunidade científica em facultar o

conhecimento alcançado. Verifica-se, no entanto, a

necessidade de reforçar esta divulgação, adequando-a a

outros contextos, já que há ainda uma clara lacuna de

obras - originais ou traduções - neste âmbito temático.

b) O Ensino Superior de Música actual prevê a abordagem de

diversos ramos da Musicologia como a Análise, a Estética,

a Sociologia e a História da Música. Verifica-se porém

que a Psicologia da Música, tal como a Pedagogia e a

Didáctica Musical, só agora começa a ser inserida nos

planos curriculares de algumas especializações em curso.

Este facto evidencia dois problemas de base, a saber: i. a

103

falta de investigadores e professores com formação

efectiva nesta área; ii. a inexistência de formação nesta

área para a presente geração de professores de

instrumento. Salvo a devida excepção para aqueles que

estudaram noutros sistemas de ensino onde estas matérias

são veiculadas ou que, por iniciativa própria, se

interessaram em investigar um pouco mais, a maioria dos

que se dedicam ao ensino do instrumento não tem

conhecimento sobre os aspectos psico-pedagógicos

envolvidos na sua actividade.

c) Por falta de oportunidades de contacto ou pela natureza

vinculativa e absorvente da prática instrumental, a maioria

dos intervenientes no âmbito musical manifesta alguma

desconfiança quanto às vantagens práticas dos

conhecimentos em Psicologia da Música.

Palmer (1997) afirma que a Psicologia da Música tem perante a

performance três objectivos primordiais: a) o de desenvolver

teorias sobre os mecanismos utilizados na prática musical; b) o de

explicar o tratamento das ambiguidades estruturais (quais os

contextos em que estas emergem e as decisões tomadas pelos

músicos); c) o de compreender a relação entre o performer e a

percepção musical. Dentro destes contextos surgem diversos

domínios de estudo que têm vindo a ser aprofundados no que

respeito ao constructo psicológico, como o desenvolvimento de

competências e o desempenho musical, a interpretação, o

104

planeamento, o movimento, as convenções estilísticas, o controlo

da ansiedade, etc. É, pois, através desta decomposição epistémica

a que obriga o procedimento científico, que a Psicologia da

Música tem vindo gradualmente a fazer o varrimento dos

processos envolvidos, contribuindo de forma decisiva para a

compreensão da performance musical no seu todo.

Desde do início do século XX que os estudos no âmbito da

performance musical têm vindo a aumentar significativamente,

estando na sua maioria dedicados à medição psicoacústica do

fenómeno (vd Gabrielsson, 1999 e Gabrielsson, 2003 para revisão

detalhada). Este aumento da produção científica deveu-se não só

ao interesse pela performance musical como comportamento

comum às diversas sociedades, mas especialmente porque em

determinados contextos este é um comportamento psicodinâmico

de excepção e de excelência.

Isto é, se por um lado se verifica um incremento notável na

investigação transcultural, através da qual se pretende avaliar a

transversalidade dos comportamentos musicais, tem vindo

também a crescer o interesse pelas questões do desenvolvimento

musical em contextos socioculturais específicos. Na cultura

ocidental a música adquiriu o estatuto de actividade de elevado

rendimento em que, ao seu mais alto nível, é exigido ao músico

uma variedade e complexidade de atributos performativos. Nestas

circunstâncias, a curiosidade pelos processos de desenvolvimento

105

e aquisição de competências musicais faz com que este contexto

artístico tenha vindo a tornar-se no campo de pesquisa de eleição.

Assim, referindo que a maioria dos estudos sobre a performance

musical tem sido realizada no âmbito da música e do ensino

ocidental, Gabrielsson (2003) afirma também que actualmente há

uma tendência para o estudo no âmbito do planeamento da

performance, em particular no que diz respeito à preparação para

apresentações públicas. A investigação neste domínio tem vindo

cada vez mais a aproximar-se das temáticas de relevo para o

ensino e para a aprendizagem musical, defendendo Gabrielsson

que esta deve ser estudada, tanto quanto possível, avaliando as

intenções dos músicos e as reacções dos ouvintes enquanto

processo e produto, sem nunca perder de vista o valor estético

implícito, afim de garantir a validade ecológica.

De facto, na sua generalidade, os estudos mais recentes

demonstram que há uma séria preocupação dos investigadores em

garantir essa validade considerando, em complementaridade aos

dados oferecidos pela análise psicométrica ou acústica, outras

variáveis mais subjectivas mas não menos importantes do

processo performativo. São disso exemplo as questões afectivas

subjacentes às relações interpessoais estabelecidas no processo de

aprendizagem da música, a percepção emocional dos contextos

musicais ou a construção do discurso expressivo com base no

entendimento holístico da música. Na maioria das publicações

anteriormente referidas, está plasmada a preocupação latente da

106

comunidade científica em tornar a sua produção multidimensional

e operante, portanto, com respostas abrangentes para a explicação

de um fenómeno tão complexo e ao mesmo tempo com soluções

inovadoras para alguns dos problemas encontrados.

O ensino da performance musical visa, na sua génese,

desenvolver competências psicomotoras que permitam o controlo

meticuloso das nuances acústicas mais subtis da voz ou de um

instrumento, num dado contexto estético. Por se tratar de uma

actividade singular, com particularidades técnicas e

interpretativas que podem variar dentro do mesmo instrumento

segundo os géneros e os estilos, o ensino da performance musical

está agregado aos conhecimentos firmados pela experiência

empírica do professor.

Genericamente, o saber no ensino da música ocidental passa de

mestre para discípulo, através do relato de experiências e de

reflexões pessoais, e na demonstração prática de como fazer e do

como deve soar. Há registos que demonstram consistência nas

abordagens e opiniões dos grandes pedagogos quanto às linhas

mestras do ensino do instrumento (vd por exemplo Martens 2006,

onde são relatadas algumas das concepções pedagógicas dos

principais violinistas e professores do início do séc. XX) e são do

conhecimento público muitos dos resultados admiráveis advindos

da formação com base nessa sabedoria secular.

107

No entanto, a tradição no ensino da música ocidental é fonte de

um conjunto de saberes e também de juízos que, por ausência de

outra explicação, se foram mistificando, sendo apropriados e

aceites por grande parte da comunidade educativa. Por falta de

comprovação factual e empírica, a verosimilhança de algumas

ideias estabelecidas transfere muitas vezes o ensino musical para

o domínio do intangível, fazendo dos professores de instrumento

os sábios guardiões das alquimias musicais.

Sem demérito para os professores de instrumento que, sabemos,

são os mais interessados e empenhados nos resultados dos seus

alunos, e antes para os auxiliar na sua função, a Psicologia da

Música tem vindo a observar detalhadamente os comportamentos

em torno do desenvolvimento musical, sistematizando os padrões

que caracterizam o ensino e a aprendizagem e, consequentemente,

desmistificando algumas das ideias instituídas.

Veja-se, a título de exemplo, a questão do professor enquanto

músico. O ensino de instrumento é uma actividade que,

tradicionalmente, encontra no binómio professor-aluno a base

para o desenvolvimento de competências musicais. Esta

estabelece-se muitas vezes partindo do princípio de confiança de

que a eficácia do professor de instrumento é proporcional às suas

competências como instrumentista.

É do conhecimento geral que, no nosso país, os lugares de

professor de instrumento são muitas vezes atribuídos aos mais

108

bem sucedidos enquanto instrumentistas. A sua formação e

experiência pedagógica, embora possa ser tida em conta, é quase

sempre relegada para segundo plano, na presença de um

curriculum onde se destacam as apresentações públicas de mérito.

Será que efectivamente o que conta é o que o professor sabe

tocar? Ou será que o nosso ensino musical está profundamente

desvirtuado pela ideia de que os que estudam um instrumento têm

como principal e único objectivo virem a ser solistas de topo?

Nesta visão parece haver um certo lirismo que confere a outras

actividades, como a de professor por exemplo, uma importância

menor no estatuto da carreira artística.

Este pressuposto instituído na comunidade musical de que quanto

melhor for o músico, melhor será o professor deve, à luz das

investigações realizadas até à data, ser encarado com alguma

cautela. As competências para se ser instrumentista não são

necessariamente as mesmas que as utilizadas pelo professor de

instrumento. Tal como afirmam Thompson, Dalla Bella & Keller

(2006), a performance musical exige do músico não só um

conhecimento extensivo das estruturas e tradições musicais, como

um domínio motor excepcional, que lhe permita controlar as

características expressivas do seu instrumento (e.g. o tempo, a

articulação, a intensidade do som, a afinação, etc.), bem como

outras competências ao nível da percepção, da memória ou do

controlo da ansiedade. Por seu lado, Lehmann, Sloboda & Woody

(2007) sustentam que os factores que influenciam a qualidade do

professor de instrumento são: o tempo dedicado à educação, a

109

capacidade de comunicação (verbal e não-verbal), o tipo de

actividades que utilizam no trabalho com os alunos e o empenho

pessoal na melhoria das suas próprias competências pedagógicas.

Outro aspecto que serve de referência no ensino instrumental é a

qualidade da relação professor-aluno que, quando pautada pelo

entendimento mútuo, facilita a troca construtiva de ideias, a

análise de modelos de referência e o feedback sobre a

performance do aluno, proporcionando a construção de hábitos de

auto-regulação e desenvolvimento de estratégias metacognitivas

essenciais à aprendizagem efectiva.

De facto, os instrumentistas profissionais são portadores do know-

how sobre a preparação e a prática do acto performativo que,

segundo Hallam (2006), se torna tanto mais importante, quanto

mais avançados os alunos se encontram no processo de

aprendizagem. Porém, o maior problema do músico profissional

enquanto professor de instrumento pode ser, por força das

exigências da sua actividade, não ter disponibilidade para cultivar

as suas competências psico-pedagógicas. Segundo Lehman et al

(2007), a capacidade de intervenção pedagógica do professor não

se deve medir apenas pela sua experiência como instrumentista ou

por questões de carácter e de personalidade. O tempo e a

qualidade das experiências de ensino, bem como o empenho no

seu próprio aperfeiçoamento pessoal são os factores de maior

relevância na docência. Com efeito, para além do eventual

desempenho de qualidade como instrumentista, o professor de

110

instrumento carece de competências analíticas e relacionais que a

formação em Psicologia da Música pode ajudar a adquirir.

Reforçados com o apoio de outras áreas como a Pedagogia

Musical, a Psicoacústica, ou as Neurociências, temos agora um

corpus teórico na Psicologia da Música que nos permite fornecer

conhecimento bastante aprofundado ao nível:

a) Da percepção e representação mental do som,

das estruturas musicais e do cenário auditivo;

b) Dos componentes e processos cerebrais

utilizados na actividade performativa (i.e. os

envolvidos na percepção visual e auditiva,

controlo motor, emoção, cognição e memória);

c) Da importância do potencial inato para a

aprendizagem da música e da influência

ambiental no processo de desenvolvimento e

desempenho musical; Do reconhecimento de

estádios de desenvolvimento musical;

d) Das estruturas de relacionamento interpessoal

presentes no processo de aprendizagem musical

como, por ex., a relação família-aluno-professor

ou a relação entre pares; Da motivação para a

aprendizagem;

e) Do estudo e preparação para a performance; Do

desenvolvimento de estratégias de auto-eficácia

111

e controlo da ansiedade; Dos modelos de

avaliação da performance;

f) Da comunicação emocional através da música;

Das preferências musicais; Da criatividade e da

improvisação;

Todos estes aspectos, e ainda outros menos directamente

relacionados com a aprendizagem musical (e.g. origens da

música, funções individuais e sociais da música, funções músico-

terapêuticas, etc.) são elementos que podem constituir uma base

sólida para um curriculum em que Psicologia da Música venha a

contribuir para a formação dos futuros professores de instrumento

(para uma revisão mais aprofundada sobre o corpus teórico da

Psicologia da Música vd Deutsch 1998; Hallam, Cross & Thaut

2009).

É, obviamente, possível que um músico exerça a sua profissão

sem qualquer conhecimento ou reflexão sobre os processos

psicológicos subjacentes à prática musical. Também um professor

de instrumento pode dar aulas sem que para isso seja necessário

saber quais os estádios de desenvolvimento musical ou os

mecanismos psicológicos que estão na base da aquisição de

competências musicais, deixando recair o ensino sobre a intuição

e as suas experiências pessoais – afinal não é isso o que acontece

desde sempre, muitas vezes com grande êxito, e sem que daí

venha algum mal ao mundo? Mas não será também que este é um

caso em que o actor, apesar de não possuir formação, tem

112

responsabilidades acrescidas? Isto é, sabendo que pode conhecer

de forma mais detalhada os aspectos psicológicos e funcionais

envolvidos, será que o professor não tem o dever de promover o

seu próprio rendimento pedagógico e consequentemente o da

aprendizagem dos seus alunos? Mais: sucede que os

conhecimentos e as reflexões no âmbito da Psicologia da Música

podem ajudar o professor de música a desenvolver-se como

docente e a compreender-se melhor como músico. Poderá este

dar-se ao luxo de prescindir de tal ferramenta de trabalho? A

propósito das vantagens práticas do conhecimento sobre a

performance pianística, Parncutt (2007: 8) sustenta o seguinte:

“Improved knowledge of relevant physics, physiology, and

psychology - which can be acquired in a fraction of the time

necessary to acquire advanced pianistic skills – may help pianists

to achieve technical and interpretative goals more quickly”.

Relativamente aos professores de instrumento a questão torna-se

ainda mais premente, já que estes estão responsáveis por conduzir

os seus alunos por um processo que na maioria das vezes perdura

por vários anos, durante o qual o seu contributo é decisivo na

determinação da continuidade ou da desistência, do sucesso ou do

insucesso (Hallam 2006).

Quais os benefícios práticos da introdução da Psicologia da

Música na formação de docentes? O primeiro, desde logo, é o de

o professor passar a conhecer mais aprofundadamente alguns

aspectos da sua profissão, nomeadamente no que respeita ao

comportamento musical dos seus destinatários, tornando-se

113

melhor observador e adequando mais eficazmente as estratégias

de actuação. O segundo, é o do aluno passar a beneficiar de um

ensino em articulação com um conhecimento estruturado,

adaptável às suas necessidades educativas e ao nível de

desenvolvimento musical em que se encontra, por isso, com

maiores probabilidades de sucesso. Em último lugar, mas não

menos importante, este pode bem ser um processo que se

alimenta a si próprio, já que o professor avisado será aquele que

reconhecerá na sua prática do dia-a-dia as fragilidades e/ou a

utilidade dos conhecimentos alcançados, encontrando-se numa

situação privilegiada para cooperar com a pesquisa no âmbito do

ensino da performance musical.

Vivemos numa época de mudança, dir-se-ia de evolução rápida,

no panorama do ensino da música em Portugal. Não é difícil

constatar que em menos de uma geração, tanto o número de

escolas, como o de professores e alunos de música aumentou de

forma exponencial. Ao longo deste caminho, as próprias

instituições de ensino vocacional da música têm vindo a sofrer

alterações e explorar novas fórmulas de intervenção educativa.

Aproveitar as circunstâncias únicas que se conjugaram

recentemente no nosso país, não pode, nem deve recair no

propósito único de oferecer formação em música ao maior

número possível de indivíduos. É necessário perceber que o

aumento das oportunidades de aprendizagem musical exige

também um esforço de reformulação e de actualização do ensino,

afim de o prestar com elevados padrões de qualidade.

114

A ciência e a arte deixaram há muito de ser estruturas

compartimentadas, fechadas sobre si próprias. Complementando-

se em associação simbiótica são, agora mais que nunca, um

núcleo de potenciação do saber e da criação artística. Por isso,

parece-nos absolutamente imprescindível que, tal como já

acontece noutros países, possamos considerar a Psicologia da

Música como uma ferramenta fundamental na compreensão e

mediação produtiva do processo de ensino/aprendizagem musical,

e que por esta razão deva ser facultada a todos aqueles que em

breve se tornarão profissionais do ensino da música.

Consideramos que esta é uma premissa essencial para o

estabelecimento de um paradigma educativo em que o professor

de música, dotado de um conhecimento eclético, transdisciplinar e

abrangente, estará melhor preparado para garantir a qualidade do

ensino de instrumento no séc. XXI.

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Williamon, A. (2004). Musical Excellence: Strategies and

Techniques to Enhance Performance. Oxford: Oxford University

Press.

116

6 Colaboraciones I: Algunas cuestiones prácticas

sobre la disciplina de clase de conjunto

Roberto Alejandro Pérez

El tema de una tesis como el de un artículo debe primar por

focalizar un asunto concreto y bien delimitado, pudiendo pecar

por convertirse en “una dilución poco concentrada”. Recuerdo el

poema en el que Cesar Vallejo escribe: “quiero laurearme pero

me encebollo”.

En primera instancia comenzaré por limitar el campo de esta

reflección a un país: Portugal, por ser el país que acoge este

proyecto de investigación y por ser el país en el cual desenvuelvo

mi actividad desde 1988; seguidamente cabe elegir un segmento

en el tiempo, casi arbitrariamente opto por limitar estos

comentarios a los últimos 20 años, ya que coinciden

aproximadamente con el surgimiento de las Escuelas Superiores,

de Música de Lisboa y Porto, Curso Superior de Música de la

Universidad de Aveiro, Escuelas Profesionales de Música y

algunos Conservatorios Regionales. Desde 2008 comenzó a

implementarse un nuevo modelo para la enseñanza articulada de

la música que podrá ser abordado en otra ocasión.

117

Continuando con la colocación de límites o márgenes para esta

comunicación, surge el nivel de enseñanza al cual será aplicado,

pudiendo ser: superior, secundario, básico o preescolar. La

discusión caerá sobre los niveles secundarios y básicos de la

enseñanza musical en Conservatorios y Escuelas de Música.

De los tres componentes que constituyen el espectro de

disciplinas al que debe someterse el alumno (al que se cría y al

que se alimenta), Instrumento, Formación Musical y Clase de

Conjunto, dos son pertinentes para ser tratados en este momento,

en el que la Práctica Instrumental está sobre la mesa: El estudio

del Instrumento y la Clase de Conjunto.

La elección cae sobre la Práctica de Conjunto ya que viene al

encuentro de mi experiencia personal como así también de mi

formación como músico profesional. En suma, colocaré sobre la

mesa algunas cuestiones que giran alrededor de la Disciplina

llamada Clase de Conjunto en Portugal durante los últimos veinte

años, especialmente sobre criterios para la elección o creación de

nuevos repertorios que contemplen situaciones reales de

desenvolvimiento en alumnos reales, que fui conociendo a lo

largo de veintiún años dando clases entre Funchal y Mirandela.

A disciplina de Clase de Conjunto abarca desde las clases de

Orquesta (sinfónica, de cámara, de cuerdas, de vientos, de

guitarras, de acordeones, ensambles Orff, etc.), Coro (mixto,

masculino, femenino, de voces blancas, de cámara) y Música de

118

Cámara (desde dúos hasta grupos de constitución Sui Generis,

resultado de la distribución de la población estudiantil entre las

diferentes clases). La elección del grupo a tratar recae, en este

texto, sobre los ensambles Orff, ya que la constitución de las

orquestas más convencionales, como su repertorio, no plantean

grandes problemas (si bien los conjuntos constituidos por la

combinación de niños con poca experiencia con jóvenes más

preparados puede ser motivo de una nueva comunicación). El

trabajo y el repertorio para voces está más explorado.

No siendo necesario hablar de los resultados indiscutibles del

método concebido por Carl Orff, y aplicado desde años atrás, y

con suceso, por “apóstoles” como Pierre Van Hawe (1920-2009),

Jos Wuytack (1935) y muchos otros anónimos (que en sus países

de origen desarrollan una actividad seria y constante a lo largo de

muchos años), cabe llamar la atención para algunos problemas

(pocos mas substanciales) que surgen durante la aplicación

práctica del método en situaciones donde La Idea entra en

conflicto con la realidad.

El repertorio para Ensambles Orff es vastísimo y accesible. Sólo

basta haber asistido a uno de los cursos dados por Pierre Van

Hawe para ver como mantenía el interés de los participantes

(jóvenes profesores) con un repertorio variado de su autoría

basado en buena parte en músicas tradicionales del mundo. El

repertorio para Ensambles Orff, entre otras, se nutre de obras

realmente simples, pero de interés musical relativo.

119

El primer problema que se levanta en las escuelas de música, do

mundo real portugués, es la constitución heterogénea de los

ensambles, formados muchísimas veces por un conjunto de

alumnos que frecuentan desde el primer grado de su formación

hasta alumnos (no muchos) que frecuentan los últimos grados. La

preparación elemental sumada a la curiosidad y entusiasmo de los

primeros está en proporción inversa a la preparación musical y

entrega a este tipo de trabajo por parte de los segundos. En este

caso la tarea pedagógica del profesor responsable se ve

dificultada por una cuestión administrativa del establecimiento

donde trabaja.

Un segundo problema está en encontrar un repertorio que

satisfaga las necesidades musicales de todos los alumnos, desde el

niño que está descubriendo por la primera vez la magia de la

producción de sonidos a través de instrumentos musicales y su

integración en un equipo, hasta el joven que con más experiencia

necesita ser motivado para no perder el hilo de Teseo (que lo

conducirá por los corredores del laberinto del Minotauro).

El éxito o el fracaso del repertorio elegido está dependiente de

variables como: la dificultad técnica, la dificultad de

comprensión de la escritura musical, el interés musical, la riqueza

de materiales para ser explotados durante las clases

(articulaciones, dinámicas, armonías, texturas, balances, etc.), el

carácter socializante que pueda estar contenido en la composición

120

para ayudar a desenvolver comportamientos dentro de un grupo

(valga la redundancia) necesarios en cualquier colectivo.

• La dificultad técnica está asociada a cada instrumento en

particular y principalmente al tipo de gesto rítmico y/o

melódico empleado, pudiendo una parte de triángulo ser

mucho más compleja que una parte de un instrumento de

láminas. La dificultad técnica debe ser contemplada a la

medida de las posibilidades motrices y musicales de cada

alumno.

• La comprensión (para una realización práctica) de la

escritura musical está ligada al grado de los conocimientos

adquiridos por parte de los alumnos durante las clases de

Formación Musical. La posibilidad de utilizar notaciones

más analógicas e despojadas de conceptos, que talvez no

tuvieron tiempo suficiente de ser asimilados, puede ser un

recurso alternativo para estimular a los niños e a los

jóvenes para una aproximación más inmediata de la

partitura.

• El interés musical está directamente relacionado con la

calidad musical de la obra propuesta. La selección

cuidadosa del “Menú” y de cada uno de los ingredientes

que componen cada “alimento”, debe ser muy ponderada

por los responsables de este tipo de clase.

• La riqueza de materiales para ser trabajados durante las

clases es un punto que fue observado parcialmente en el

estudio realizado por la Profesora Ingrid Barancoski da

121

UniRio, A literatura pianística do século XX para o

ensino do piano nos níveis básico e intermediário, donde

la autora hace referencia a pasajes retirados de obras para

piano del Siglo XX, entre las cuales se destaca una

cantidad significativa de obras de compositores brasileros.

Como aprovechar la riqueza instrumental, rítmica,

armónica, etc. de una obra compete a cada profesor

responsable.

• La función disciplinadota de una clase de conjunto que

puede estar preconcebida durante la composición musical

podrá ser aplicada a niños y jóvenes. Se estimulará, por

ejemplo, con partes individuales muy simples para ser

ejecutadas por alumnos con alguna pericia, para trabajar

las “virtudes de la humildad y la paciencia”, o bien partes,

con relativamente poco material para ser ejecutado, para

llamar la atención de que cada elemento de la

composición musical es vital para mantener saludable el

organismo de la partitura, pudiendo hacerse referencia a

las catorce notas da Tuba en la Sinfonía del Nuevo Mundo.

Sirvan las páginas que restan para ilustrar con dos ejemplos,

compuestos por mi, los secos comentarios proferidos hasta este

momento.

Vale decir que estos dos ejemplos fueron trabajados como

material vivo de clase y ejecutados en situación de concierto.

122

La primera de estas piezas, Móbiles I, fue escrita para un ciclo de

ocho pequeños gestos musicales que serían presentados en

Navidad y acompañados por la lectura de poemas de escritores

portugueses referentes a dicha celebración religiosa. Esto es

porque la música en sí misma no completa el espectro de las

“competencias” que en principio deben caracterizar a una

composición musical. El texto recitado sobre las texturas creadas

funciona como foco de atención, que es “decorado” por texturas

musicales que funcionan en segundo plano.

El poema recitado en este caso fue, História Antiga de Miguel

Torga.

HISTÓRIA ANTIGA

Era uma vez, lá na Judeia, um rei.

Feio bicho, de resto:

Uma cara de burro sem cabresto

E duas grandes tranças.

A gente olhava, reparava, e via

Que naquela figura não havia

Olhos de quem gosta de crianças.

123

E, na verdade, assim acontecia.

Porque um dia,

O malvado,

Só por ter o poder de quem é rei

Por não ter coração,

Sem mais nem menos,

Mandou matar quantos eram pequenos

Nas cidades e aldeias da Nação.

Mas,

Por acaso ou milagre, aconteceu

Que, num burrinho pela areia fora,

Fugiu

Daquelas mãos de sangue um pequenito

Que o vivo sol da vida acarinhou;

E bastou

Esse palmo de sonho

Para encher este mundo de alegria;

Para crescer, ser Deus;

E meter no inferno o tal das tranças,

Só porque ele não gostava de crianças.

124

M

óbile

s I

125

Con respecto de la “partitura”, puede decirse que es clara y

analógica. Cada letra de ensayo se corresponde con un gesto

musical, rítmico, melódico, mixto o armónico.

A: Puede ser realizado por cualquier grupo de instrumentos que

contemple cierta homogeneidad dentro de los idiófonos o pieles

de diferentes tamaños. El grupo puede estar constituido por tres o

más alumnos. Cada alumno, a una señal de profesor, ejecuta dos,

tres, cuatro o hasta cinco articulaciones de sonido comenzando al

mismo tiempo, cada uno escoge sin comunicar a los colegas, la

cantidad de ataques que realizará. A dinámica está determinada en

la partitura.

B: Gesto que puede ser realizado por láminas de metal y/o un

piano, (tocando sólo en las teclas blancas, a dos o cuatro manos).

Sobre cada una de las líneas rítmicas indicadas, el alumno toca

uno o dos sonidos (simultáneamente) a su elección. En un

conjunto de más de cuatro alumnos los agregados estáticos que se

forman adquieren una sonoridad pandiatónica. El tempo de la

pulsación es lento pero no uniforme. Esto quiere decir que cada

alumno realizará las células rítmicas propuestas a manera de

pedal sin preocuparse con que su tempo coincida con el de los

colegas, obteniéndose así un efecto de “Politempia” (vale el

neologismo) semejante al propuesto cien años atrás por Charles

Ives.

C: Gesto que puede estar a cargo de xilófonos, claves, bloques de

madera, sin mezclar el tipo de instrumento elegido. Los tres o

cuatro alumnos elegidos para este gesto deben tener la capacidad

de crear una secuencia de ráfagas de tres a cinco articulaciones

126

(en el caso de los xilófonos pueden ser gestos rápidos y

descendentes de tres a cinco notas, sin recurrir al glissando)

sucesivas e no simultaneas, lo que obliga a una audición y

concentración realmente activas.

D: A cargo de instrumentos melódicos como por ejemplo, flauta

dulce o traversa. El alumno elegido debe, sobre las notas

propuestas, elegir un modelo de articulación entre los que se

encuentran englobados más abajo. Sonidos que mudan en cada

respiración, sonidos cortos que se articulan rápido y

nerviosamente en grupos de pocas notas o contornos melódicos

de pocas notas (ligados e cantables). La elección recae sobre el

alumno responsabilizándolo a escuchar el contexto en el cual se

insiere su participación.

E: Ataques antifonales entre dos triángulos.

La estructura de la pieza es simple.

El profesor va construyendo las camadas adicionando o retirando

elementos de la textura, siempre dejando tiempo para que cada

“momento” sea perceptible como una sección individual.

Por ejemplo:

1) Comienza el grupo B creando una textura armónico

rítmica, con un carácter algo estático. Dejar “sentir” esta

sonoridad.

2) Sobre la textura anterior puede superponerse ataques de

los grupos A, C o eventualmente D. Recomiendo no

superponer grupos con las mismas características (A o C).

3) Substituir B talvez por D más F.

127

4) Así por delante ir creando secciones con diferentes

elementos que soporten la lectura del poema, cuyas

estrofas serán leídas de acuerdo con señales específicas

del profesor.

Este tipo de ejercicio contempla los siguientes aspectos a trabajar

en una clase de música de conjunto: Puede ser realizado con un

equipo relativamente reducido de alumnos.

Los alumnos no necesitan tener desenvueltas capacidades de

lectura musical muy avanzadas.

Los instrumentos necesitados no son determinados, son elegibles,

lo que permite substituciones por instrumentos que figuren en el

arsenal de la institución en la cual se realiza el trabajo.

Los alumnos son obligados a estar extremadamente atentos

debido a que su intervención puede ser llamada en cualquier

momento.

Los alumnos no están a tocar permanentemente, lo que estimula

una actitud de reflección sobre el contexto sonoro y su capacidad

de estar en silencio mientras otros colegas participan.

Los alumnos son estimulados a participar eligiendo la dinámica,

tempo, carácter de las células que les son conferidas, con sentido

contextual.

Heinrich Neuhaus, en su libro El arte del piano editado en

castellano por la REAL MUSICAL de Madrid en 1985, se refiere

a la importancia de la calidad del sonido como vector

determinante de su método pedagógico (el otro vector es el

ritmo). En conservatorios de la antigua Unión Soviética como el

128

Conservatorio Chaicovsky de Moscú o el Instituto Gnesin de

también Moscú daban una gran importancia a este aspecto del

sonido. Estos ejercicios de simple lectura, de simple ejecución

pueden bien ser utilizados para llamar la atención de los jóvenes

aprendices a este parámetro muchas veces descuidado en las

clases regulares de instrumento y música de conjunto en muchas

instituciones dedicadas a la enseñanza de la música.

Este ejercicio puede funcionar con equipos constituidos por

alumnos con diferentes capacidades adquiridas y experiencia.

Este tipo de ejercicio es relativamente fácil de ensayar y preparar

lo que es beneficioso para no invertir mucho tiempo durante una

clase en un solo modelo, valorizando la concentración colectiva y

la variedad de trabajos en una clase de cincuenta minutos. Este

tipo de ejercicio, inserido en un programa donde haya una

secuencia lógica de pequeñas piezas semejantes, pode ser

utilizado con suceso en audiciones internas o conciertos públicos

para estimulas la contemplación estética de auditorios con poca

experiencia en la apreciación de este u otros modelos de

sonoridades, siendo la presencia del poema un factor importante

para la “degustación” de la obra.

Dos fuentes sirvieron para estimularme en la composición de este

tipo de ejercicios. La primera fue el Método de Educación

Musical de Lindembergue Cardoso, Salvador, Bahia, Brasil, 1792

(como así también gran parte de su producción musical) y la

segunda fue la obra Gestures de Christopher Bochmann.

129

7 O contexto social no ensino do jazz: A “jam

session”

José Menezes

Com a chegada do Jazz às estruturas de ensino superior do nosso

país, torna-se importante e urgente uma reflexão sobre processos,

atitudes e metodologias de ensino nesta área. É importante criar,

desde logo, um percurso pedagógico coerente, que saiba

transmitir aos alunos não só os aspectos de carácter técnico mas

que tenha em conta, de uma forma não menos cuidada, as

especificidades culturais e sociais da prática do Jazz, uma

linguagem que, tanto quanto numa gramática de sons assenta

numa gramática de relações.

Todos os alunos que se aproximam de um curso de Jazz querem

vir a “ser” músicos de Jazz. É função de todo o educador,

qualquer que seja a área, ensinar a “ser”. E é precisamente este

processo ontológico - o de se tornar músico de jazz – que deve

encontrar cada vez mais espaço nos currículos. Sem a inclusão de

componentes de socialização fundamentais á construção da

identidade do músico de jazz, a academia correrá o risco de

apenas cumprir parte da sua função enquanto local de formação

de artistas não só tecnicamente competentes mas também críticos,

130

criativos e originais. Este é um processo que transcende em muito

os aspectos técnicos ou antológicos da aprendizagem que têm

lugar dentro dos limites físicos da sala de aula. Pelo interesse que

estes aspectos da pedagogia do Jazz me suscitam proponho uma

reflexão sobre a transmissão de elementos de natureza social no

ensino do Jazz ao mesmo tempo que analisarei uma situação de

performance - habitual na prática de Jazz - que, apesar de

informal, contém mais-valias pedagógicas importantes: A jam

session.

Focarei a sua estrutura, as suas funções recreativas e educacionais

mas também a sua importância como ferramenta de construção

identitária do estudante de Jazz. Creio ser esta uma reflexão que

poderá interessar a estudantes, músicos ou professores e que

poderá ajudar a uma melhor e mais profunda compreensão das

linhas de força presentes na pedagogia do Jazz e da improvisação.

A jam session pode ser definida como um encontro musical de

carácter recreativo e efémero entre músicos auto-escolhidos,

encontro para o qual não houve uma preparação específica ou

repertório pré-determinado. Apesar de informal é uma reunião

altamente estruturada socialmente e o músico, para nela

participar, deve possuir um leque alargado de capacidades e

conhecimentos de forma a obter aceitação plena do círculo

musical ao qual se propõe aceder. Sendo um acontecimento

cultural tipicamente urbano, a jam session tem lugar, de uma

forma geral, em locais como clubes de jazz ou bares com horário

de funcionamento alargado, locais relativamente pequenos de

131

forma a proporcionar a intimidade entre os músicos e a minimizar

a interferência do público (Cameron, 1954: 178) público esse que,

não sendo o primeiro destinatário da performance é, na maior

parte dos casos, apenas uma testemunha do desenrolar de

acontecimentos.

A jam session cumpre várias funções sociais dentro da

comunidade jazzística:

a) Providencia um contexto educativo para o músico em formação

b) Cria um contexto de auto-avaliação em confronto directo com

o público

c) Estabelece os traços de identidade musical através de um

confronto interpessoal entre músicos

d) Facilita a constituição de uma network entre os músicos

especialmente importante para os recém-chegados ao meio

Para além destas funções educativas e sociais, a jam session

cumpre também funções de ordem económica e cultural:

e) Proporcionar aos proprietários de clubes uma forma pouco

dispendiosa de atrair público em noites menos movimentadas e,

por outro lado

f) Levar o Jazz a públicos que, de outra maneira, não se

deslocariam à sala de concerto.

132

Mas, de todos estas funções, interessar-me-ão, de momento, as

relacionadas com os aspectos educativos e de construção

identitária presentes numa jam session.

Valor pedagógico da jam session

Diz-nos Scott (2004) que a jam session foi o primeiro local onde

ocorreu a troca pedagógica no Jazz. Dizzy Gillespie (1982: 134)

por sua vez, considerava-a como um local privilegiado para a

troca de ideias musicais, ele, que na década de 40, foi um dos

principais mentores de uma linguagem que redefiniu o jazz – o

bebop – linguagem nascida e apurada principalmente ao longo de

inúmeras jam sessions. Através de tentativa e erro, num contexto

social e em contacto com a tradição, os neófitos não só aprendiam

os elementos de carácter técnico relativos à improvisação mas

também, através de observação e imitação, tomavam contacto

com o processo de se tornarem “músicos de jazz”.

Os aspectos recreativos e educacionais da Jam session estão

estreitamente ligados. Há décadas atrás algumas jam sessions

duravam dias, com os músicos a revezarem-se para preparar

refeições ou dormir. A improvisação sobre um tema podia durar

horas, de forma a permitir que os músicos experimentassem novas

ideias e soluções sem qualquer tipo de constrangimento (Berliner,

1994: 42). Com a expansão generalizada do ensino institucional

do Jazz nas últimas décadas as jam sessions diminuíram quer em

de número quer em importância (Lewis (2002) em Borgo (2005:

133

174). Contudo, mesmo na actualidade a jam session é um meio

privilegiado de transmitir a linguagem do Jazz através de

processos orais e imitativos (Scott, 2004: 285), processos esses

habitualmente pouco acarinhados pela academia. Vários

educadores, contudo, chamam a atenção para a importância desta

“aprendizagem social” ao mesmo tempo que sublinham a

importância da criação de condições pedagógicas para a sua

inclusão nos currículos. Um destes pedagogos é o pianista Barry

Harris, que orienta regularmente cursos que ficaram célebres não

só pelo seu sucesso pedagógico mas também pela metodologia

aplicada. Barry Harris usa a jam session como ferramenta

pedagógica, proporcionando aos alunos a oportunidade de

aprenderem a linguagem vernacular do Jazz no contexto social da

jam session. A abordagem pedagógica de Barry Harris estrutura-

se segundo um eixo fundamental: veicular, desde o princípio, a

aprendizagem da improvisação ao envolvimento com outros

músicos (Scott, 2004: 287). Dessa forma é valorizada desde muito

cedo a noção de que a improvisação jazzística não assenta apenas

nas capacidades técnicas ou no talento de um único indivíduo mas

sim na negociação de capacidades, talentos, tensões entre todos os

elementos do grupo.

Uma importante mais-valia da abordagem de Barry Harris

consiste no facto de facilitar a troca entre improvisadores

experientes e principiantes, acentuando o contexto social da

aprendizagem e os aspectos orais e imitativos da troca. (Scott,

2004: 284). Não sendo processos pedagógicos que habitualmente

134

encontramos no sistema de ensino de música nos países

ocidentais, estes processos estão, contudo, presentes nas

sociedades africanas de tradição oral. (Soules, 2002). Diz-nos

Miller Chernoff (“African Rhythm and African Sensibility”

1979, University of Chicago Press, citado em Soules, 2002) :

“No ensemble africano…o valor de um determinado ritmo

assenta no seu potencial para ser afectado por outros ritmos”

Esta afirmação de Chernoff revela muito claramente a

importância dos componentes sociais e coloquiais na

improvisação do ensemble africano. Na tradição musical africana

o lugar sónico a ocupar no ensemble confunde-se com o lugar

ocupado na estrutura social. Esta inter-textualidade, à qual se

refere Ingrid Monson (1996:129) ou Soules (1997) vamos

também encontrá-la na improvisação jazzística e na estrutura da

jam session.

Com efeito, aprender a encontrar o seu lugar quer no espaço

social quer no espaço sónico do grupo - ou seja, conhecer o

protocolo da música que se faz - é um dos mais importantes

pontos em que a jam session pode ajudar o aspirante a músico de

jazz. E essa não é uma lição que, de alguma forma, possa ser dada

num contexto tradicional de aula onde a relação predominante é

unidireccional e estabelecida em torno do binómio

professor/aluno.

135

Aquilo a que designarei de “protocolo”- no Jazz ou no ensemble

africano - é constituído por uma série de códigos que estabelecem

uma estrutura normativa de procedimento e são explicita ou

implicitamente veiculados na forma de expressão do

improvisador (Soules, 2002) .

Do seu estudo da improvisação africana Chernoff extrapola uma

definição de estilo que pode ser muito elucidativa da

intertextualidade entre o musical e o social na improvisação. Para

Chernoff, estilo consiste numa “percepção de relações”

(Chernoff, 1979, em Soules, 2002). E a improvisação jazzística

assenta essencialmente em relações. Relações entre textos

musicais, entre improvisadores, relações com a tradição e relações

entre identidades. A importância social e a toda a mais-valia

pedagógica da jam session estão contidas, em minha opinião,

nesta definição de estilo. Em nenhuma outra situação

performativa, os intervenientes têm a oportunidade de aprender,

em tempo real, como percepcionar, gerir e responder à rede de

relações estabelecidas no interior de um grupo de jazz. Ralph

Ellison não hesita em afirmar que a jam session é a “verdadeira

academia do músico de jazz” (Ralph Ellison, 1953 citado em

Soules, 2002).

É aí que se negoceiam auto-imagem, sentido de pertença a uma

comunidade e, onde, através da tensão entre imitação e

originalidade, cada um descobre o lugar que ocupa no contínuo

entre passado e presente do Jazz. E quando me refiro ao passado,

136

faço-o não com uma visão linear da história do Jazz ou seja,

centrada fundamentalmente na performance e cristalizada em

torno de um punhado de ícones que viveram num tempo há muito

passado e num lugar geograficamente restrito. Falo de uma visão

eclética do passado do jazz, centrada numa perspectiva social,

plurifacetada e crítica e onde as questões do canon e da

“autenticidade” são confrontadas com a história da miscigenação

cultural na qual o jazz teve origem, uma visão histórica que tenha

presente que a única verdadeira tradição do Jazz é, afinal … a

mudança.

Mas regressemos à jam session e ao seu papel na construção da

identidade musical. Forçado muitas vezes por razões de carácter

económico a despender muita da sua energia e tempo útil em

situações comerciais alheias ao jazz, o músico profissional encara

muitas vezes a jam session como um ritual purificador através da

reafirmação dos seus próprios valores estéticos. (Cameron, 1954).

Mas a jam session é também – e especialmente – o lugar onde é

negociada a aceitação ou exclusão a circulo restrito de iniciados.

As identidades musicais e profissionais dos improvisadores são

negociadas em palco, com os principiantes a serem testados

perante a hostilidade ou – na melhor das hipóteses – a indiferença

dos mais experientes. Inesperadas mudanças de tonalidade ou de

compasso, escolha de temas especialmente difíceis ou de tempos

demasiado rápidos eram - e são-no ainda - formas de testar a

competência do aspirante a músico de Jazz (Berliner, 1994: 53).

137

Por estas razões alguns musicólogos consideram a jam session

como “mero evento de carácter competitivo cuja única função é a

de embaraçar, humilhar e afastar do palco os menos experientes”

(Balliett, 1998 citado em Scott, 2004: 285). Contudo esta visão

peca, a meu ver, por alguma superficialidade. Os aspectos

aparentemente cruéis ou humilhantes presentes numa jam session

representam componentes de um intrincado ritual de passagem.

No sentido de explicar de que forma a jam session pode ser

encarada como uma arena identitária para os músicos envolvidos

usarei o conceito de “capital” tal como apresentado pelo

sociólogo francês Pierre Bourdieu. Ao mesmo tempo que os

músicos ou estudantes de jazz praticam intensamente o seu

instrumento e desenvolvem capacidades, vão acumulando o que

Bourdieu chama de “capital cultural”. Este capital pode ou não

ser reconhecido pela comunidade, isso dependendo da sua

estrutura normativa dessa mesma comunidade. Esta estrutura

normativa, este conjunto de regras, estabelece uma forma de

perceber relações – ou seja, um estilo – que encarna não só uma

maneira de tocar mas também um ethos partilhado pelos músicos

conotados com esse estilo. (Greenfeld, 1989 cited in Kirschbaum,

2007: 188).

Sempre que numa jam session um jovem músico se evidencia

perante um músico mais experiente com base no seu “capital

cultural” acumulado - que pode assentar na técnica, na

imaginação, na fluência ou noutro valor de carácter performativo

138

- o jovem músico acumula também “capital simbólico”

(reputação), só então podendo ascender a mais um patamar na

estrutura social já que, como nos diz Kirschbaum ( 2007: 191) o

“capital cultural” só tem valor útil se acompanhado de “capital

simbólico”. Confiabilidade e estabilidade de laços sociais com os

seus pares constituem outros aspectos importantes dum “capital

social” que, juntamente com o cultural, conduzem á liderança e

consequente reforço do capital simbólico (muitas vezes com um

reforço do capital económico, propriamente dito…). Contudo,

alguns aspectos podem fugir a esta lógica. Um deles está ligado

ao instrumento que é tocado pelo músico. Os diferentes papéis

funcionais do instrumento tendem a determinar diferentes

experiências, sensibilidades e prioridades (MacDonald and

Wilson, 2005: 403). Como nos diz Ingrid Monson (1996: 26) três

funções básicas podem ocorrer num grupo de jazz: manter o

tempo, acompanhar e improvisar.

Os músicos que fazem parte da secção rítmica - pianistas,

baixistas, bateristas, guitarristas ou seja quem for que toque um

instrumento com função acompanhadora, tendem a dependerem

mais da interacção com outros músicos, enquanto os solistas –

sejam eles sopradores ou cantores/cantoras - estão mais centrados

nas suas próprias improvisações. Estes aspectos não só moldam as

personalidades individuais (Monsoon, 1996: 27) mas também a

interacção social entre os membros do grupo. Membros da secção

rítmica tendem a atribuir a responsabilidade aos solistas por

aspectos insatisfatórios da performance como no caso de um

139

solista que seja demasiado dependente do suporte rítmico e

harmónico tende a gerar constrangimentos de vária ordem à

criatividade da secção rítmica. Pelo contrário, um solista auto-

suficiente harmónica e ritmicamente tende a usar o grupo de uma

forma apenas utilitária, sem estabelecer nenhuma forma de

interacção musical com os membros da secção rítmica (Berliner,

1994: 411). Mais uma vez, a jam session se revela como o lugar

onde estas tensões são negociadas. Como afirma Paul Berliner :

“uma improvisação colectiva é produto não só de conceitos

puramente musicais, gostos e capacidades técnicas mas também

das diferentes formas de interacção social, relações de poder

dentro do grupo e da predisposição para o compromisso colectivo

(Berliner, 1994: 430).

Implicação para estudantes, professores, músicos e

organizações

Pelo facto de poder trazer estas questões para o plano pedagógico

considero, a jam session uma importante ferramenta de ensino.

Sublinhar a componente social, valorizar os aspectos orais e

imitativos da performance, ajudar na busca do lugar social e

sónico dentro do grupo são benefícios muito importantes que o

conceito e a prática da jam session pode trazer para o ensino do

jazz. A solução para algumas das situações de insucesso que

possam ocorrer quer na sala de aula quer no palco passa, muitas

vezes, não pela redefinição de qualquer dos parâmetros musicais

140

envolvidos mas pela análise e negociação de aspectos de ordem

social.

Como disse anteriormente, uma análise atenta da dinâmica de

uma jam session pode ser útil não só a professores, alunos,

performers mas também ao leader organizativo, ao gestor. As

organizações têm, cada vez mais, de reagir de uma forma

continuada e rápida a contextos em constante evolução e

mudança, contextos esses com os quais não é difícil estabelecer

um paralelo com o que acontece durante uma jam session. Nesta

perspectiva, gestores e leaders organizativos podem beneficiar

muito da análise da estrutura de uma improvisação de jazz já que

muito são os elementos necessários ao sucesso quer de uma

organização corporativa quer de um grupo de jazz. Assim, quer

para o sucesso do improviso jazzístico quer para uma feliz gestão

organizativa é importante:

• Desenvolver esforço consciente no sentido da interrupção

de comportamentos ditados pelo hábito

• Encarar os erros como fonte de aprendizagem

• Desenvolver estruturas mínimas que permitam um

máximo de flexibilidade

• Desenvolver disponibilidade para uma contínua

negociação e diálogo com vista a alcançar sincronização

dinâmica

• Confiar numa coerência retrospectiva, ou seja, acreditar

que a acção presente ganhará um sentido e uma lógica

141

que, apesar de não detectável no momento, sê-lo-á à luz da

acção futura

• Desenvolver o estreitamento de laços entre membros de

uma comunidade de praticantes ou colaboradores

• Alternar papéis na estrutura organizacional de tal modo

que cada membro possa eventualmente desempenhar todas

as funções (Barrett, 2002 cited in Alterhaug, 2004:107).

Referido o valor da jam session na prática pedagógica do Jazz,

como lugar de aprendizagem e negociação de identidade, gostaria

de salientar a sua mais-valia como contexto avaliativo

privilegiado.

Muitas questões se colocam na procura de um modelo avaliativo

que possa ser aplicado a uma actividade ou aprendizagem de

natureza expressiva ou artística. São muitas as questões que se

levantam nessa área. E ainda em maior número quando é de Jazz

que se fala. Jazz que - fundamental não o esquecer - é uma forma

artística de origem não-ocidental. E por essa razão, a meu ver,

errado seria querer impor ao Jazz, à sua prática, ao seu ensino e

especialmente á sua avaliação as mesmas normas, valores e

critérios de outras formas musicais há muito implantadas na

Academia.

Se é de música eminentemente social de que falamos, importante

será que as componentes sociais da prática de jazz façam, também

elas, parte do processo de avaliação do estudante de Jazz. Avaliar

142

o percurso do aluno nas suas componentes técnicas do domínio do

instrumento, da assimilação das novas sonoridades, do

alargamento da sua percepção musical ou da sua capacidade de

recombinação dos materiais estudados é, todos concordamos,

fundamental. Mas é também fundamental avaliar o

desenvolvimento das suas capacidades de interacção social e

sónica no contexto do grupo, avaliar a sua disponibilidade para a

integração no processo “aqui e agora” de construção colectiva. Se

como nos disse Miller Chernoff “No ensemble africano…o valor

de um determinado ritmo assenta no seu potencial para ser

afectado por outros ritmos” também no jazz o valor musical

intrínseco do praticante passa fundamentalmente pela sua

capacidade de interacção com o ensemble. E toda esta dinâmica -

feita por um lado de elementos técnicos e objectivos e por outro,

de componentes relacionais e expressivos, toda esta dinâmica,

dificilmente poderá ser alvo de uma avaliação assente apenas no

habitual exame de música, conforme ele é tradicionalmente

encarado. Em meu entender, o local para uma avaliação integral e

integrada da progressão do estudante de Jazz é a jam session.

E de vária ordem poderão ser os benefícios que decorrerão dessa

prática avaliativa.

• Avaliar de uma forma integrada elementos de carácter

intelectual, técnico, social e expressivo

• Encorajar os alunos a uma visão holística da performance

143

• Fornecer ao aluno uma visão não só do seu

desenvolvimento técnico mas também da evolução das

suas capacidades de interacção e adaptação

• Integrar o momento avaliativo numa experiência de vida

“real”

• Integrar “processo” e “produto” no momento da avaliação

• Avaliar não só a aprendizagem do “fazer” mas a

aprendizagem do “ser”.

Todos estes elementos ganham especial relevância de tivermos

em conta o paradigma educativo estabelecido pelo Processo de

Bolonha que, para além de privilegiar uma aprendizagem activa,

cooperativa e participativa, nos dá conta das várias competências

que devem ser adquiridas :

• Aprender a aprender

• Aprender a fazer

• Aprender a conviver

• Aprender a ser

O texto de Bolonha chama ainda especial atenção para as

competências específicas da profissão aliadas à capacidade de

• Inter-comunicação

• Integração em equipa

• Capacidades de liderança

• Inovação e

• Adaptação à mudança.

144

Estas são precisamente as áreas que podem ser muito

positivamente afectadas pela inclusão da jam session no processo

pedagógico do jazz quer como forma privilegiada de transmissão

de conhecimento quer como contexto ecológico de avaliação.

Como conclusão gostaria de deixar convosco a minha convicção

de que é urgente a integração e valorização das componentes

sociais na pedagogia do Jazz, uma pedagogia que queremos

moderna, integrada e integral, uma pedagogia que forme músicos,

que para além de tecnicamente preparados sejam criadores com

voz individual e crítica da comunidade na qual produzem a sua

Arte.

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146

8 Práticas Jazzísticas no Ensino do Clarinete

Paulo Gaspar e Eduardo Lopes

Introdução

Com a chegada da estética do jazz ao ensino superior português e

consequente integração das suas especificidades nas metodologias

de ensino da música, é oportuno questionar a relação entre o

ensino tradicional de instrumento e o ensino de instrumento jazz.

Neste artigo iremos abordar de que forma as “práticas jazzísticas”

poderão ser um conjunto relevante de ferramentas a integrar no

ensino tradicional do clarinete. Como ponto de partida indicar-se-

ão algumas das principais diferenças estéticas e culturais entre os

géneros afro-americanos e o cânone dos géneros de tradição

europeia. Por outro lado, e numa perspectiva inclusiva,

analisaremos o método para ensino do clarinete da autoria de

Benny Goodman publicado em 1942 – sendo Goodman

reconhecido internacionalmente como um dos melhores exemplos

de um clarinetista multifacetado. Observa-se também que a forma

como o músico de jazz aborda o estudo do seu instrumento, em

especial a nível da exploração de materiais melódicos,

harmónicos e rítmicos poderá ser de grande importância para o

ensino tradicional do clarinete bem como para a abordagem

147

(estudo/interpretação) do seu repertório tradicional. Ao integrar

estas práticas, o clarinetista não só ficará equipado com um

espectro mais largo de exercícios para o estudo do seu

instrumento, bem como incorporará no seu dia-a-dia o estudo da

sempre tão “inacessível” improvisação.

Diferentes pontos de partida

Comecemos por abordar alguns clichés que estão associados à

música de tradição erudita e seus similares associados à folk

music afro-americana - que engloba o jazz. Doug Goodkin

(2004), no seu livro Now’s The Time Teaching Jazz to all Ages

apresenta uma análise de conteúdo às diferenças estéticas (Quadro

1) comparando algumas diferenças entre a música de tradição

erudita e as músicas de raiz afro-americanas (em especial ao

género musical que é habitualmente apelidado de mainstream

jazz).

148

Quadro 1, Diferenças Estéticas

European-American Art Music African-American Folk Music

1. Beat 1. Offbeat

2. Straight rhythm 2. Swing rhythm

3. Head tone in singing 3. Chest tone

4. Clear timbre 4. Mixed timbre (growls buzz, etc.)

5. Precise articulation 5. Relaxed articulation

6. Long melodic lines (Gregorian chant) 6. Short phrases (riffs)

7. Polyphony 7. Polyrhythm

8. I-V 8. I-IV

9. Variation 9. Repetition

10. Composition 10. Improvisation

11. Interpretation 11. Self-expression

12. Written 12. Oral

13. Individual (composer, virtuoso) 13. Communal

14. Serious 14. Playful

15. Select participation 15. Complete participation

16. Polite detached audience 16. Involved, responsive audience

17. Formal study, separated from daily life 17. Informal, integrated with daily life

18. Dance incidental 18. Dance essential

19. Absolute music 19. Story

20. Conceptual meaning 20. Emotional meaning

21. Linear time conception 21. Circular time conception

22. Vertical (ascending) 22. Horizontal (gettin´ down)

23. Spirit 23. Soul

149

Apesar destas diferenças estéticas, ao longo da história da música

as influências de certa música não erudita no seio da música

erudita tem sido uma constante. Foram muitos os compositores

que fundiram as duas tradições, ultrapassando barreiras estilísticas

e provando a sua compatibilidade. Além dos aspectos estéticos

que são intrínsecos nas diversas “músicas do mundo”, também a

improvisação (embora pouco frequente na música “escrita”) tem

merecido muito interesse de intérpretes consagrados. De facto, a

música erudita tem absorvido diversas influências de diferentes

músicas populares dos “quatro cantos do mundo”. O jazz tem sido

reconhecido como um dos géneros musicais que mais facilmente

faz a ponte entre as tradições erudita e não erudita, sendo

inúmeros os casos de compositores e obras que ilustram este

facto. Não podendo deixar de assinalar que a influência da música

popular no seio da música erudita é secular, o processo de mistura

do jazz com a música erudita foi iniciado nos anos 20 do século

XX e mantém-se até hoje.

Importantes figuras do panorama erudito mundial, tais como

Vladimir Horowitz, Francis Poulenc, Walter Giesking, e Arturo

Toscanini, eram visitas frequentes dos clubes de jazz da rua 52

em Nova Iorque. Todos eles iam maravilhar-se com os músicos

de jazz da altura, entre os quais o prodigioso pianista Art Tatum,

cujo brilhantismo musical lhes parecia quase sobre-humano

(Gelly 2000). Tendo em conta estes exemplos, não será de

estranhar que muitos compositores tenham sido e sejam

150

influenciados por elementos característicos do jazz no seu

processo de composição.

Por outro lado observa-se que, conscientes do valor estético do

jazz bem como da sua importância social, compositores

integraram aspectos do jazz também em obras para orquestra

sinfónica. Como exemplos disto temos: George Gershwin em

American in Paris, Porgy and Bess e em especial na Rhapsody in

Blue (referida nos jornais da época como uma rapsódia de jazz);

Rolf Liebermann no Concerto for Band and Symphony Orchestra;

Paul Hindemith na Suite 1922, Darius Milhaud na obra La

Création du Monde. Este fenómeno iniciado nos EUA no inicio

do século passado, tem proliferado um pouco por todo o mundo.

Do ponto de vista do intérprete, o pianista Bob Levin, especialista

em repertório do classicismo, improvisa sempre as cadências dos

concertos que interpreta. Nos recitais, depois de pedir um tema à

plateia, improvisa sobre este ao estilo de diversos compositores.

A pianista venezuelana Gabriela Montero é uma especialista em

improvisações clássicas. De acordo com a própria: “Quanto

menos penso no que vou tocar, mais divertida é a experiência”.

Também o pianista português João Paulo Esteves da Silva, em

certos recitais de piano solo, improvisa sobre temas populares

portugueses. Nestas peças musicais improvisadas podemos ouvir

influências que vão desde a música erudita até ao jazz, num

discurso esteticamente aberto.

151

Benny Goodman foi primeiro clarinetista de jazz a ser

reconhecido no seio da música erudita. Como veremos mais à

frente, um número significativo de obras compostas por

personalidades de renome da tradição erudita foram-lhe

dedicadas, incorporando estas referências à música jazz. Também

o clarinetista Eddie Daniels, para além de diversas gravações de

obras eruditas de Brahms e Weber, é um dos destacados

intérpretes do jazz actual. No disco Breakthrough (GRP 1024)

podemos ouvir uma fusão de estilos; a partir de temas eruditos

como Solfeggietto ou Siciliano de Carl Phillipe Emmanuel Bach,

e após a apresentação do tema na sua forma original, é feita uma

variação jazzística na qual Daniels improvisa com o

acompanhamento de uma secção rítmica de jazz, sendo o tema no

final retomado na sua versão erudita.

Para além dos casos mencionadas acima outros músicos são

internacionalmente reconhecidos pela sua ambivalência estilística.

O trompetista Wynton Marsalis ganhou os prémios Grammy nas

modalidades de jazz e música clássica no mesmo ano. Keith

Jarrett é considerado “o pianista de jazz vivo mais influente”;

além de inúmeras gravações de jazz, gravou também O Cravo

Bem Temperado de J. S. Bach e diversos concertos para piano de

Mozart, os quais receberam grande aplauso da crítica (Gelly

2000). O célebre violoncelista Yo Yo Ma, a par da sua imensa

discografia de repertório erudito, gravou também música popular

brasileira no disco Obrigado Brazil, assim como Improvisation on

Dona Nobis Pacem, faixa do disco Songs for Joy and Peace. O

152

pianista e maestro André Previn, paralelamente ao seu trabalho

como músico erudito, tem dedicado parte da sua carreira ao jazz.

Para além da sua formação como pianista clássico, tocou com

Goodman, tendo participado em algumas das suas gravações.

Gravou também com o trombonista J. J. Johnson música de Kurt

Weill e, enquanto director da orquestra de Boston, conjugava

programas que combinavam repertório erudito e jazz (Firestone

1993).

O ensino do jazz e da música erudita no séc. XXI

Tendo em conta as sugestões de base presentes no acordo de

Bolonha para a unificação do sistema de Ensino Superior na

Europa, são muitos os autores que referem a importância do

ensino da improvisação nas escolas oficiais como forma de

desenvolver a criatividade. Na realidade, com a supressão da

improvisação na música erudita durante a segunda metade do séc.

XIX, o jazz surge como o género musical que assume esta como

parte integrante da sua estética.

A improvisação é também vista como forma de desenvolvimento

auditivo e intelectual (Pressing 1998). Nesta perspectiva é

também defendido que o estudo das escalas/arpejos seja não só

feito por razões de ordem técnica, mas também com vista à sua

utilização na improvisação (Birkett 1995). As técnicas de

improvisação requerem o domínio de padrões formais (Nettl &

Russel 1998) e, segundo Sternberg (2000), “o desenvolvimento da

153

memória e da capacidade de análise exigido pelo estudo do jazz,

favorecem as capacidades de interpretar música escrita assim

como motivam os alunos para aprender”. Para Gellrich (1995), “o

ensino da improvisação deve ser dividido em diversas áreas e

articulado com o ensino tradicional”. Cada músico tem

características sonoras individuais e uma personalidade musical

distinta. Esta personalidade compreende traços estilísticos

individuais, tais como: fraseado, articulação, som (por ex.

timbre), e ideias musicais características. O processo de

aprendizagem compreende então a procura por uma voz própria

(Berliner 1994), sendo o ouvido o sentido mais importante neste

processo.

É frequentemente apontado que os músicos de jazz não são

leitores exímios de partituras, mas possuindo (em jeito de

compensação) grandes capacidades de memória auditiva. O

contrário parece ser apontado na música erudita. Num contexto

em que a leitura é essencial, por vezes a audição do conjunto (e da

própria parte) poderá por vezes ser negligenciada. Neste aspecto,

como em muitos outros, a formação do músico de jazz e do

músico erudito terá muito a ganhar com um ensino articulado, em

que tópicos como os acima descritos poderão ser

complementares. Vale a pena acrescentar a opinião de Wynton

Marsalis que, enquanto director do Lincoln Center em Nova

York, diz a propósito da estratégia educativa deste importante

organismo: “O objectivo a longo prazo é fazer incluir o jazz como

154

parte importante da formação artística de todos – como parte da

democracia, digamos assim” (Gelly 2000).

Questões metodológicas

Benny Goodman é uma das grandes figuras da música do séc.

XX, e ainda hoje é o clarinetista de jazz mais conhecido.

Começou por ter uma formação erudita, tocando jazz desde cedo

na sua vida. Como clarinetista multifacetado, desenvolveu uma

carreira proeminente no jazz, facto que lhe valeu o título de “Rei

do Swing”. É também conhecida a sua paixão pela música erudita,

nomeadamente pelas obras de Mozart, Weber, Brahms, Debussy.

O seu contacto com alguns dos compositores mais importantes do

seu tempo, proporcionaram o enriquecimento do repertório para

clarinete. Compositores como William O. Smith e Morton Gould

chegaram mesmo a dedicar-lhe obras, tendo o próprio Goodman

encomendado obras a Béla Bartók, Aaron Copland, Ingolf Dahl,

Alex North e Malcolm Arnold.

O “Método para Clarinete de Benny Goodman” (1942),

apresenta-se como “um livro de Benny Goodman para o ensino

do clarinete ao seu estilo, em termos de som, estilo, técnica”,

tendo sido compilado e editado por Charlie Hathaway. A sua

primeira edição data de 1941, tendo sido reeditado em 1989, pela

editora Ragbag Music Publishing Corporation. Este livro integra

uma grande diversidade de informação destacando as múltiplas

facetas de Goodman. Fornece também um conjunto relevante de

155

aspectos relacionados com a sua própria prática musical que são

ainda hoje actuais e por esta razão relevantes para o ensino do

clarinete.

A primeira secção começa por mostrar as várias partes do

instrumento. Logo a seguir, temos várias fotos sobre a colocação

das mãos; a posição sentada e de pé. A página 4 fala-nos um

pouco da história do instrumento: quem o inventou, a família do

clarinete, os registos e extensão. Embora o clarinete em Sib tenha

sido o mais utilizado por Goodman no jazz, utilizou também o

clarinete soprano em Lá em obras como o Quinteto e o Concerto

de Mozart, o Quinteto de Brahms, a História do Soldado de Igor

Stravinsky, o Concerto de Carl Nielsen e em Contrasts, de Béla

Bartók.

Na secção seguinte é feita uma proposta para o tempo de estudo

de uma hora; dividida em períodos de dez e vinte minutos. Antes

das primeiras notas musicais (página 7), aparecem mais quatro

tópicos essenciais resumidos: embocadura, acção da língua,

controlo da respiração e vibrato. Entre as páginas 7-22 são

propostos exercícios práticos para o estudo do instrumento no

sentido de conhecer todas as tonalidades maiores e as menores

melódicas. De facto, as escalas maiores e menores melódicas são

as escalas a partir das quais se extraem muitos dos modos

utilizados no jazz, ou seja, todos os modos mais comuns saem das

escalas maiores: mixolídio (modo do V grau), dórico (modo do II

grau), eólio (modo do VI grau, a mesma que a escala menor

156

natural), ou os modos que têm como base na escala menor

melódica, mixolídio b6 (modo do V) ou o superlócrio (modo do

VII), para falar apenas das mais utilizadas.

A página 26 contempla os exercícios de mecanismo (estudos

técnicos) que visam o desenvolvimento técnico do clarinetista.

Apesar de estes aspectos serem de fundamental importância,

apenas os encontramos no exercício 18, e sempre no contexto

harmónico de Dó Maior (C∆); embora não sejam sugeridos, parte-

se do princípio que devem ser estudados em todos os tons. No que

toca aos arpejos apresentados, seria também vantajoso associá-los

às escalas, pois a relação escala/arpejo/acorde é um dos pilares da

construção de toda a música tonal ocidental, e em especial do

jazz. Será sempre um bom desafio fazer todos os exercícios em

todas as tonalidades, uma vez que, os exercícios de mecanismo

têm determinados objectivos de coordenação motora dos dedos,

descritos assim pelo autor: “a coordenação dos dedos e a pureza

do som são características importantes de um excelente

instrumentista, e são obtidas com estes exercícios”.

Seguem-se os estudos de cromatismo (página 33), que se

resumem a tocar a escala cromática na extensão de duas oitavas e

repeti-las cromaticamente com este importante conselho: “O

estudante deve começar por estudar os exercícios devagar e

aumentar a rapidez à medida que as dificuldades diminuem.” Os

exemplos 29 e 30 abordam o “staccato rítmico”, mas reduzem-se

à figura da colcheia entre figuras e pausas; todas as notas têm um

157

ponto e segundo o autor “cada nota deve ser atacada com um leve

toque da língua sem perder a qualidade do som”. Na sequência, o

exemplo 31 utiliza semicolcheias, enquanto as notas sugerem

alguns padrões que vão do mi2 ao mi4 sempre na tonalidade de

Dó Maior (C∆), o texto refere como objectivo que este estudo

”deverá ajudar o aluno a perceber o feeling exacto da

semicolcheia.”

Na página 38, temos duos, que ao estilo de Goodman, utilizam a

figura para representar a divisão do tempo. O texto que

precede os exercícios 36 e 37 refere as acentuações no segundo e

quarto tempos e das síncopas, sugerindo o uso do metrónomo ou,

em sua substituição “o aluno deve ouvir o tic-tac de um relógio ou

o ritmo de um motor a trabalhar.” No exemplo 37, surge o

compasso 2/4, seguido pelo compasso 3/4 (ex. 37A). Todos esses

exemplos abordam a acentuação e, no rodapé da página 40, o

autor faz uma recomendação essencial: “ao respirar no meio de

uma passagem, a respiração deve ser o mais rápido possível e

feita pelos cantos da boca, é importante recomeçar a tempo após a

respiração”. A seguir ao título “Estudos Rítmicos em Várias

Tonalidades”, encontramos 19 estudos (45 a 54) que, na verdade,

apenas utilizam seis tonalidades: C∆, F∆, Bb∆, D∆, A∆ e Eb∆.

O título da página 48 (exercícios 55 e seguintes) é “exercícios

técnicos e rítmicos”. Nesta secção o autor sugere que os

exercícios devem ser praticados em legato e depois em staccato:

“Os compassos que apresentem dificuldades devem ser marcados

158

e praticados até se tornarem fáceis.” Os compassos variam entre

4/4, 3/4 e 2/4; as tonalidades não vão além das três alterações na

armação de clave, mas os subtítulos dos exercícios também

sugerem assuntos muito interessantes como: (61) “estudo das

semicolcheias no compasso 2/4”, (62) “estudo rítmico”, (64)

“estudo em tempo de valsa”, (65) “estudo dos acentos rítmicos”,

(69) “combinação entre staccato e legato”, (71) “estudo técnico”,

(72) “estudo das tercinas”. Além do carácter tonal e da

simplicidade rítmica dos exercícios, as sugestões são interessantes

e na realidade dão pistas sobre as preocupações essenciais dos

clarinetistas até aos nossos dias.

A última secção de estudos, intitulada “estudos rítmicos

modernos”, consiste num grupo de exercícios concebidos para

“preparar o estudante com os fundamentos principais para a

performance avançada” e serão uma ajuda importante para tocar

música moderna. Para citar um exemplo, podemos falar do

Concerto for Clarinet and Orchestra Op. 57 de Carl Nielsen, uma

das obras mais difíceis de todo o repertório e que foi gravada por

Benny Goodman.

A penúltima secção do método contém onze temas

maioritariamente da autoria de Benny Goodman e os respectivos

solos gravados na década de 1930 por diversos grupos liderados

pelo próprio Goodman: (1) Grand Slam, (2) Gone with What

Draft, (3) Slipped Disc, (4) Shivers, (5) Breakfast Feud, (8)

Scarecrow, (10) Cocoanut Grove e (11) Six Appeal. Os outros

159

temas são de autores como Mel Powell (6) Clarinade e (7) I´m

Here, assim como (9) Oomph Fah Fah, da autoria de Ellis L.

Larkins. Enquanto folheamos os temas, encontramos pelo meio

vinte e dois desenhos legendados que funcionam como uma

pequena fotobiografia de Benny Goodman. Estes desenhos

ilustram o percurso do músico desde o início da sua carreira até

1940, quando o seu estilo já tinha alcançado grande maturidade.

Apesar da grande quantidade de bons conselhos e apresentação de

exercícios de referência, nesta secção do método seria relevante

haver uma pequena abordagem das cifras e das formas dos temas.

Este tipo de abordagem seria relevante sabendo que Benny

Goodman deu um importante contributo ao jazz como

improvisador, podendo assim indicar processos visando o estudo

da improvisação.

Neste campo, e sabendo hoje que certos processos de estudo do

jazz são comuns a muitos músicos, complementar-se-ia o método

proposto por Goodman, apontando por exemplo utilização dos

números árabes. Neste contexto, os numerais podem indicar

quaisquer exercícios técnicos a estudar, sem recurso a escrita

musical, usando simultaneamente a relação dos números árabes

com os graus da escala e acorde ou arpejo. Também um dos

exercícios sequenciais mais populares entre os professores de

clarinete pode ser classificado com recurso aos números árabes:

1234, 2345, 3456.

160

No pensamento escalar, os músicos de jazz relacionam as escalas

entre si de forma independente, falando de modos naturalmente.

São de referir, por exemplo a sucessão dos graus de uma escala

que, no ensino tradicional, estão relacionados com uma armação

de clave, enquanto no jazz se privilegia a sucessão de tons e

meios-tons e a relação interválica entre o acorde e os vários graus

da escala - sendo aqui a acuidade auditiva da maior importância.

É necessário tratar as escalas dentro de um contexto harmónico e

não apenas como uma sucessão de notas. Por exemplo, a

diferença entre a escala maior e a menor melódica é apenas no

terceiro grau menor.

O estudo sistemático nos 12 tons é também comum a grande parte

dos músicos de jazz. Desta forma, o padrão melódico que

caracteriza cada escala é interiorizado como uma entidade sonora

e repetido de ouvido em todos os tons.

O método para clarinete de Benny Goodman, além de fornecer

diversas pistas sobre o estudo do clarinete, é um documento que

apresenta bem a sua imagem nas diversas vertentes: clarinetista

de jazz, clarinetista erudito, líder, compositor, maestro, enfim um

símbolo dos EUA. Na verdade, este livro contém factos da

carreira de Goodman que ocorreram até ao ano de 1940, ou seja,

menos de metade da carreira do clarinetista mais famoso da

História.

161

Improvisação estudada e pré-composição

Será vantajoso para o clarinetista estudar as escalas e os arpejos

com vista à sua utilização no repertório e na improvisação, e este

trabalho não deve ser visto como meramente técnico. Numa

primeira fase esse apetrechamento é uma mais-valia na formação,

mas pode também ter como objectivo o desenvolvimento de

ferramentas com vista à improvisação. Por exemplo, a cifra pode

ser usada na análise de passagens difíceis, de obras como o

Concerto de Jean Françaix. É importante a desmistificação da

visão da improvisação como a criação de algo novo como que por

artes mágicas. Existe um ciclo eterno entre improvisação e pré-

composição. Existem muitos elementos musicais que são

trabalhados anteriormente e que compreendem muita

memorização e modificação. Este trabalho pode/deve ser feito

com um duplo sentido. As próprias composições podem ter em

vista a exploração de ideias improvisativas específicas (rítmicas,

melódicas ou harmónicas).

Existem outros pontos importantes respeitantes à improvisação no

jazz, tais como os diferentes tipos de swing, economia de notas,

expressividade, tratamento das dissonâncias, e o espaço para

respirar entre as frases. Deste modo, a improvisação é um

processo que compreende várias e complexas abordagens e muito

deste previamente interiorizado. Os melhores exemplos são as

escalas e os arpejos, cuja prática é essencial no desenvolvimento

162

técnico do instrumentista, com vista à interpretação do reportório,

sendo o seu domínio essencial também para a improvisação.

Assim como as seculares escalas pentatónicas orientais se

tornaram um dos “ingredientes” principais dos blues, outras

escalas exploradas no jazz são actualmente utilizadas por

compositores contemporâneos. Podemos dar como exemplo a

escala octotónica utilizada por Robert Muckzinski em diversos

momentos da obra para clarinete e piano Time Pieces OP. 43 ou,

noutro contexto, pelo compositor espanhol Ferrer Ferran na obra

Tormenta del Desierto para Banda Sinfónica. Estas escalas não

são novas e até são estudadas nas aulas teóricas, falta agora

incorporá-las nas aulas práticas de instrumento. Em vez de se

exigir aos alunos que estudem apenas as passagens que incluem

este tipo de material, importa garantir que são aprofundadas em

todos os tons e em toda a extensão do instrumento. Desta

maneira, garante-se que os músicos do futuro estejam preparados

para corresponder rapidamente em obras que utilizem este tipo de

material.

É fundamental no jazz conhecer qual o acorde que está

simbolizado na cifra, quais as notas que o compõem e o contexto

tonal em que está inserido; ou seja, além da relação interna em

cada acorde, é necessário ter em conta a relação com os acordes

vizinhos. Neste aspecto, será uma boa ajuda a utilização dos

números romanos como forma de se analisar os graus da

tonalidade. Em cada acorde temos uma ou mais escalas que são

163

mais apropriadas e esse conhecimento prévio é imprescindível

para que o discurso na improvisação explore correctamente estas

relações, e faça a gestão correcta das dissonâncias e consonâncias.

Em alguns temas o autor indica também a escala ou modo que

deve ser utilizada, por exemplo: alt refere-se à escala alterada ou

modo superlócrio, por exemplo F7 alt. Pode ser considerado

como o modo do 7º grau da escala menor melódica e a sua

sucessão interválica é MTMTTTT. Nos temas Milestone ou So

What para além da cifra, o seu autor, Miles Davis, indicou

também o modo que deve ser utilizado na improvisação, Dm7

dórico ou Am7 eólio. De facto, estes princípios, ao serem

explorados pelo clarinetista erudito tornam-se muito importantes

na performance musical de todo o repertório do seu instrumento,

já que, na música tonal, a relação entre melodia e harmonia é

também uma constante.

Na relação melodia/harmonia, o instrumentista deve ter sempre

uma consciência harmónica, sabendo qual é a função da sua nota

no contexto harmónico. Outro bom recurso será a utilização da

cifra na análise do repertório. Quer em termos formais, como em

passagens isoladas, fragmentos de escalas ou arpejos tenderão

sempre a fazer parte de um contexto tonal.

A abordagem da articulação é útil quando, na orquestra, o

repertório inclui obras como American In Paris ou a 2ª Sinfonia

de Alfred Reed que indica na partitura swing style. Para preparar

os clarinetistas para a interpretação destas obras, torna-se

164

necessário, para além de ouvir jazz, praticar as escalas e os

arpejos, tocando-os com uma articulação swing até à 9ª; isto de

forma a manter um movimento de contínuo de colcheias num

compasso quaternário. Poder-se-á também decidir uma sucessão

de acordes ou tonalidades e praticá-los nos doze tons.

O início do solo da obra Pedro e o Lobo de Sergei Prokofieff é

constantemente referido como um bom exemplo para o trabalho

em sequência. Além de fortalecer o domínio técnico, desenvolve

o ouvido e permite adquirir vocabulário técnico com vista à

improvisação. A este tipo de exemplo poder-se-á chamar

exercícios preparatórios com vista a performance da obra em

causa; mas também contendo elementos melódicos que

desenvolvem a técnica e a musicalidade. Aqui também para além

do objectivo primário de desenvolver a fluência melódica, este

tipo de exercícios poderão ser usados simultaneamente para o

estudo de aspectos da improvisação.

Como já vimos, transposição em doze tons é prática comum no

estudo do jazz, como forma de desenvolver o conceito de

transposição de ouvido. Como sugestão, o professor pode dar um

trecho ao aluno para ser estudado nos doze tons; como por

exemplo, o tema do primeiro andamento do Concerto de Mozart.

A improvisação na progressão II-V-I em doze tons, progressão

harmónica mais comum no jazz, será uma boa forma de começar

a compor em tempo real. Para isto bastará ter um tempo

165

metronómico fixo, colegas para interagir, experimentando assim a

relação melodia/harmonia e a sensação de tocar para além do que

está escrito. Será importante fazer estas experiências, ainda que

de forma básica, uma vez que a esmagadora maioria da música

erudita está totalmente definida.

Conclusão

Se a relação entre a melodia e a harmonia por si só contam uma

parte da História da Música; no jazz, em particular, são o ponto de

partida para todo o um trabalho de pesquisa sonora. O estudo da

improvisação (numa perspectiva de melodia) permite aliviar o

aluno da tensão habitual de ter de tocar de acordo com critérios

previamente impostos pelo professor, ou até pela tradição estética

de algum género específico. O estudo da improvisação pode ser

dividido em diversas fases, sendo fundamental o estudo das

diversas escalas e arpejos. Este material sonoro, além de fomentar

o desenvolvimento auditivo, permitirá aos alunos o

desenvolvimento técnico no instrumento, para além de facilitar a

iniciação à improvisação. Assim sendo, a improvisação, para

além de uma actividade criativa, permitirá ao aluno tomar as suas

próprias decisões e desenvolver a sua personalidade musical

enquanto intérprete. O conceito da utilização de uma “audição

activa” melhorará seguramente a performance. Utilizar mais o

ouvido e tocar com recurso a uma análise aplicada, será mais útil

que seguir apenas a partitura - um conjunto de símbolos que não

reflecte a totalidade da realização e da experiência musical.

166

Conclui-se então que uma metodologia de ensino inclusiva do

ponto de vista de prática e género, não só servirá para ajudar a

resolução de dificuldades pontuais de aprendizagem do

instrumento tradicional, mas preparará melhor o clarinetista para

os desafios profissionais que lhe são feitos no séc. XXI.

Acreditamos profundamente que a escola do futuro deverá formar

instrumentistas capazes de integrar uma orquestra sinfónica,

assim como uma big band de jazz – tal como prova o percurso de

Benny Goodman. Assim, a formação académica do músico

prático do futuro será enriquecida, sendo capaz de responder às

exigências e desafios de um universo musical cada vez mais

globalizado esteticamente.

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