Paulo Coelho - Uma História da Música Popular de Porto Alegre - Capítulo VIII

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1 Paulo Coelho, o rival de si mesmo Paulo Coelho (ao piano) ao lado de Carmen Miranda nos anos 1930. Foto: acervo Alberto do Canto Toda cidade – principalmente as mais periféricas em relação às decisões da indústria cultural – tem essas figuras mais lembradas pela lenda do que por registros concretos do que fizeram. Porto Alegre tem várias dessas. Na música, uma das maiores é a do pianista e compositor Paulo Coelho. Nascido dia 11 de fevereiro de 1910, no então bucólico Alto da Bronze (parte alta do centro histórico de Porto Alegre), Paulo de Almeida Coelho teve uma iniciação musical sólida, como outros gênios da sua geração: Radamés Gnattali (nascido em 1906) e Dante Santoro (1904). O pai de Paulo, Luís Machado Coelho, era professor de violoncelo. A mãe, Dona Aspásia, dava aulas de piano. E seu padrinho de batismo e primeiro professor era o já então respeitado compositor erudito José Araújo Vianna – de quem, aliás, herdaria o piano de estimação. O menino começara a dedilhar as teclas aos cinco anos. E divertia os amigos músicos de seus pais decifrando, nota a nota,

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Paulo Coelho, o rival de si mesmo

Paulo Coelho (ao piano) ao lado de Carmen Miranda nos anos 1930.

Foto: acervo Alberto do Canto

Toda cidade – principalmente as mais periféricas em relação às decisões da indústria cultural – tem essas figuras mais lembradas pela lenda do que por registros concretos do que fizeram. Porto Alegre tem várias dessas. Na música, uma das maiores é a do pianista e compositor Paulo Coelho.

Nascido dia 11 de fevereiro de 1910, no então bucólico Alto da Bronze (parte alta do centro histórico de Porto Alegre), Paulo de Almeida Coelho teve uma iniciação musical sólida, como outros gênios da sua geração: Radamés Gnattali (nascido em 1906) e Dante Santoro (1904). O pai de Paulo, Luís Machado Coelho, era professor de violoncelo. A mãe, Dona Aspásia, dava aulas de piano. E seu padrinho de batismo e primeiro professor era o já então respeitado compositor erudito José Araújo Vianna – de quem, aliás, herdaria o piano de estimação.

O menino começara a dedilhar as teclas aos cinco anos. E divertia os amigos músicos de seus pais decifrando, nota a nota,

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qualquer acorde que se tocasse no piano. Mesmo que fosse um mero deixar cair de mãos sobre o teclado.

Muitas lendas são contadas sobre esse período de formação. Lendas cujo fundo de “verdade” está em algum lugar entre o realmente acontecido e o delírio. Mas valem ser lembradas. Em seu livro de memórias Rua da Praia o multitalentoso Nilo Ruschel enumera umas tantas. Como a de que, aos cinco anos, Paulo teria sido levado por Araújo Vianna até a Casa Mariante (importante loja de música e editora de então), para que mostrasse seus dotes ao maior pianista num raio de milhares de quilômetros: o concertista mineiro internacional Guilherme Fontainha, então radicado na cidade, diretor do Conservatório de Música de Música de Porto Alegre, mestre e guru de Radamés Gnattali.

O menino teria tocado um minueto trocando o tom da música na hora, já que o piano de sua casa tinha uma afinação diferente e era o tom que ele tinha na cabeça. Daí ter sido encaminhado imediatamente para estudar com o mestre. O que é facilmente comprovado é sua entrada no Conservatório (futuro Instituto de Artes da UFRGS): aos nove anos, em 1919. Tá lá no livro de matrícula. E como lembra a pesquisadora Julia Simões, que frequentou os arquivos do Conservatório, a matrícula foi feita por indicação da diretoria, “leia-se: pelo Fontainha”.

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Detalhe do livro de matrícula: indicação de Paulo Coelho feita pela diretoria

Honrando a fama da sua geração, foi mais um de seus geniozinhos precoces: com nove anos �alent a primeira valsa. Aos 15 já estava formado em piano, com diploma de honra ao mérito.

Só que, aos 15, Paulo já não era mais um menino: desde o ano anterior, assumira o posto de homem da casa. Seu pai morrera, e ele mal conseguira terminar o conservatório, compensando com o �alent de �alent o que tinha de faltas às aulas para trabalhar. Guardou o diploma na gaveta, mudou-se com a família para a casa de uma tia e teve de se virar para ajudar nas contas. Foi fazer o que sabia. O primeiro emprego fixo foi em 1927 como �alent� da Confeitaria Central e do �alent�ent Rosicler – eram separados apenas por um vão de escada onde ficava a orquestra, que sonorizava, portanto, ambos os ambientes. Além disso, tirava algum em festivais beneficentes, bailes e companhias de teatro de revista.

Encarar a música popular como fonte de renda aos 15 anos não chegou a ser um baque. Dificilmente ele se transformaria no concertista que Fontainha preparara. Como aconteceu com Radamés, ele tinha um espírito solto demais para se conformar aos cânones acadêmicos, e logo descobriria um imenso �alent for a da música de concerto – que incluía a novidade do jazz, gênero que começava timidamente a dar suas caras na capital gaúcha. Gnattali ainda não tinha degenerado para for a do mundo �alent�, e aí Paulo pegou fácil o posto de maior �alent� popular da sua cidade. E, dizem alguns, era dos maiores de seu tempo, em todo o Brasil: grande improvisador, cheio de técnica, �alent� de suingue. A diferença entre os dois é que Radamés foi embora: gravou, viajou e viveu para contar e ser contado. De Paulo, restou pouco mais do que o que escreveram seus �alent�ent�eous. Mas estes, com o histórico bairrismo �alent, pelo menos o alcunharam de o �alent� popular número um… do Brasil (!!!).

Se nunca �alent� para o Rio de Janeiro, a Capital Federal, aos 17 anos o Rio veio até ele na sua mais �alent�e tradução musical daqueles anos de 1920: Pixinguinha – olha ele de novo metido na história da música de Porto Alegre. O guri �alent� impressionou fortemente o compositor e saxofonista, que ia diariamente as performances de Paulo na Confeitaria Central e no Café Colombo. Insistiu o quanto pôde para que o garoto fosse embora com ele.

Não foi. Preferiu seguir na Colombo, onde atraía cada vez mais gente

com o grupo formado �alent� ao piano, Boquinha no �alent, Carlos Naya no bandoneon, Alcides “Perna Dura” Oliveira no

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trompete, Marino dos Santos no sax, Juca Carvalho no contrabaixo e Américo na �alent�e. Uma formação curiosa, mista de típica de tango e jazz-band. E que, sempre que presenciava a �alent� do interventor e �alent governador Flores da Cunha indo a pé para o Palácio, atacava a música preferida do caudilho: o tango Recuerdo – o que lhes rendia invariavelmente uma gorjeta amiga.

Fez, isso sim, o caminho geograficamente inverso: em plena Revolução de 30, foi contratado pela Companhia de Revistas Conchita Vila para uma excursão pelos países do Prata. Ficou quase um ano viajando. Voltou a Porto Alegre em 1931, mas logo em seguida se mandou de novo, agora como líder de um grupo que vai se apresentar pelo Uruguai, Argentina, Chile e Paraguai.

Acaba se fixando na cidade argentina de Córdoba, onde se casa em 1933 com uma mocinha da sociedade local. E aí tragédia: a moça �ale no parto do primeiro filho do casal. Em estado de choque, Paulo abandona o bebê com os avós maternos, volta para Porto Alegre – onde sua mãe o esperava, muito doente – e passa a se dedicar com afinco a três �alent�e: beber, engordar e destilar um humor particularmente sádico.

Estamos em 1935 quando ele já faz por merecer o apelido de Gordo, com aquela silhueta que ficou para a posteridade: bigodinho à Clark Gable, óculos redondos de aro preto, cabelos e terno um tanto quanto desalinhados, muitos quilos. E o começo de uma coleção de estórias dignas de um anedotário (talvez de um bestiário).

As piores envolvem o músico cego Arthur Elsner. Numa delas, Coelho passa uma noite inteira perguntando o que Arthur tinha, já que sua cabeça estava terrivelmente inchada. O baile vai seguindo e, a cada �alent�e, Paulo assusta mais Elsner. Este, que já sabia onde estava metido, ficou frio: só podia ser mais uma sacanagem do amigo. Só que, no final da função, vai pegar seu chapéu e o �alen não entra na sua cabeça! O pobre, surtado, não podia ver que Paulo tinha colocado uma camada de jornais por baixo da forração. Humor da época.

Outra envolve Arthur e mais um bom músico cego: o bandoneonista Juvenal de Paula Guedes. No �alent�e de um ensaio, Paulo puxa Elsner para um canto e lhe conta que Juvenal, tremendamente mulherengo, andava se engraçando pros lados da mulher de Arthur. Não era verdade, claro. Mas foi o suficiente pra que os dois começassem a trocar gentilezas e tabefes. A coisa só parou quando Paulo, afetando susto, gritou:

– Ah, não! De faca, não!!!

Mais inofensivas eram as clássicas empulhações com músicos

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que se ofereciam para dar uma canja com a orquestra. Paulo até cedia seu lugar ao piano. Mas depois de alguns compassos, conforme combinado anteriormente, a orquestra se embretava nas mais complicadas variações, que derrubariam qualquer acompanhante ou solista desavisado. Com o tempo, isso se tornou uma das diversões preferidas não só do grupo como de muitos dos habitués que os seguiam em suas apresentações nos cafés e confeitarias, e sabiam o que estava acontecendo. Entre esses admiradores mais próximos, havia uma supercasta: a dos que tinham acesso às nascentes Jam Sessions (Jazz After Midnight). Elas não tinham esse nome em Porto Alegre, mas a ideia era a mesma dos jazzistas �alent�ent: depois que os lugares fechavam as portas para os simples mortais, os músicos, sem plateia a agradar, se punham a �alent�ent furiosamente madrugada a dentro. Assistidos em delírio por poucos eleitos.

A turma da orquestra all-star dos anos 1930, não exatamente a formação que

foi pra Buenos Aires: Paulo, atrás. Na frente, cheio de charme, Marino dos Santos e seu sax. Ao lado, a primeira guitarra elétrica destas terras, nas mãos

de Antoninho Gonçalves. (foto: acervo Alberto do Canto)

Desde que voltara da Argentina Paulo imediatamente retomara seu posto na Confeitaria Central e no Café Colombo. Não demorou para chamar os melhores músicos de cada casa para o que seria batizado de Orquestra de Paulo Coelho (também conhecida como o Jazz-Band de Paulo Coelho ou mesmo o Jazz de Paulo Coelho). O núcleo do conjunto, no entanto, foi ceifado do Jazz Cruzeiro. Paulo

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quase acabou com o Cruzeiro, roubando grande parte do grupo para si. O detalhe é que todos os convidados aceitavam, numa inequívoca demonstração da moral com que contava o rapaz de apenas 25 anos de idade.

A nova formação já fazia a transição entre os jazz dos anos 1920 e as nascentes big bands. Soava muito moderna e tinha até guitarra elétrica! Em 1935! Na cidade, foram os primeiros a contar com o �alent�ent, que mal havia começado a ser comercializado, lá nos Estados Unidos, onde for a inventado apenas três anos antes. O primeiro guitarrista de Porto Alegre, esse da orquestra de Paulo, era Antoninho Gonçalves, um dos famosos irmãos Gonçalves (Alcides Gonçalves, seu irmão, era o crooner de todos os grupos de Paulo desde 1927 – além de �alent�, violonista e �alent parceiro de Lupicínio Rodrigues). Antoninho foi um dos pioneiros do �alent�ent no Brasil, já que o primeiro guitarrista de que se tem notícia no País é Henrique Brito (ex-Bando dos Tangarás) que, em 1932, voltara dos Estados Unidos com a novidade – e jurando que a invenção era dele.

Ao longo da década de 1930, não houve páreo para o Jazz de Paulo Coelho. A formação oscilou muito, os locais onde tocavam também, mas os empregos mais frequentes eram no chiquérrimo cabaré e �alent Club dos Caçadores, no Bar Americano e nos Cafés Vera Cruz e Florida. Vários cantores passaram pelo posto de crooner. Não por acaso, os melhores: além de Alcides, o catarinense Nuno Roland, Sady Nolasco, Nilo Rushel e Caco Velho. Este, que faria uma longa carreira (que você conferirá em outro capítulo), era vendedor de cigarros no Café Florida – daqueles de tabuleiro e barrete vermelho. Tanto passava pela orquestra batucando no tabuleiro que um dia Paulo lhe deu um pandeiro e o botou pra tocar. Em seguida, veio um teste como cantor, ele arrasou e virou até notícia de jornal. O resto foi �alent e iniciativa.

Como aconteceu com Horacina Corrêa, outra figura gigante da música de Porto Alegre, hoje totalmente esquecida.

* * *

A porto-alegrense nascida Horacina Corrêa de Lima em 11 de

outubro de 1913 (por vezes grafada Oracina e/ou Correia), foi uma das maiores intérpretes que o estado dos gaúchos viu nascer. Ouvindo suas poucas gravações, a gente pode ter uma ideia. Mas quem a escutou ao vivo, desde antes dela se tornar a estrela da orquestra de Paulo Coelho, conta que sua privilegiada goela adolescente era assunto entre os blocos carnavalescos de Zé Pereira. Afinal, podia ser ouvida a uma quadra de distância, mesmo cercada

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de bumbos tocando o terror. A jovem Horacina era a solista do bloco Divertidos e Atravessados, que chegava a reunir 500 pessoas em seus desfiles.

A foto ‘oficial’ mais conhecida de Horacina

Quando chegou ao rádio, em pouco tempo tornou-se uma

estrela local de tal brilho, que em oito de outubro de 1936 a Rádio Farroupilha – onde ela cantava com no jazz de Romeu Fossati – transmitiu ao vivo seu casamento com o também músico Oscar Fortunato Corrêa.

A cerimônia se deu à volta de um microfone ladeado por uma mesa de sanduíches enquanto, lá fora, um enxame de curiosos esperava para ver de perto os astros que haviam acabado de mudar

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de estado civil. Ninguém ali poderia imaginar que a fama não rimava com

grana, e que essa mesma starlet, aos 23 anos de idade, pagava a maior parte de suas contas trabalhando como empregada doméstica.

Uma rara foto de baiana

Quando entrou pro mundo de Paulo, a situação melhorou um

pouco, mas o pianista morreu não muito tempo depois. Nem deu pra juntar um pé de meia.

Desfeita o Jazz de Paulo Coelho, Horacina ainda fez algum sucesso nas rádios de Porto Alegre cantando muitos sambas de Lupicínio Rodrigues e emplacando pelo menos um hit local: Segura o Bonde, de Alberto Carusinho Dias. Mas chegou um momento, no meio dos anos 1940, que a lógica era tentar a sorte no Rio de Janeiro. Acaba contratada pelo empresário Walter Pinto para integrar o elenco do Teatro Recreio, e chega a gravar três 78 rpm para a Continental.

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Toda brejeira, puro encantamento

Quando começa a década de 1950, está circulando pela Europa

como lady-crooner da orquestra do Maestro Fon-Fon. É ela a solista do disco, disputado por colecionadores, Fon-Fon Brazilian Rhythms. Gravado na Inglaterra em 1951 para o selo London, é o primeiro LP de uma orquestra brasileira (o formato estava chegando ao Brasil exatamente naquele ano). Tudo ia muito bem quando, novamente, bateu o mesmo azar: está numa orquestra de prestígio, cheia de trabalho, e seu líder – desta vez Fon-Fon – morre.

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LP Fon-Fon Brazilian Rhythms

O remédio é voltar para o Brasil, para o Rio de Janeiro. A partir daí, canta como free-lancer na Rádio Nacional e

participa de meia dúzia de filmes, como É Com Esse Que Eu Vou e O Cortiço. Acompanhada pela Orquestra de Leo Peracchi, lança seus dois únicos LPs, de 10 polegadas: Noel Rosa (Musidisc, 1954) e Canções Brasileiras (Sinter, 1956). O primeiro, como se deduz do título, era inteiro com músicas do compositor que acabava de ser redescoberto.

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O LP só de Noel – ouça O silêncio de um minuto

A partir daí, as lendas correm soltas. O certo é que Horacina

foi ganhar mundo. Segundo alguns, acabou na Argentina. Segundo outros, passou uns tempos em Paris e depois mudou-se para o Cairo. Onde, dizem, teria comprado um hotel e se dedicado a gerenciá-lo. Há ainda os que contam de um casamento de princesa, com um conde italiano!

De certo, duas coisas. Sim, seu rastro se perdeu. De tédio é que ela não morreu.

* * *

Antes desse parêntese horaciniano, estávamos lá na recém-

fundada orquestra de Paulo Coelho. Pois voltemos a ele e a ela. O esquema do pessoal era corrido, mas não puxado: tocavam

nos cafés e confeitarias de segunda a sexta, das seis da tarde à meia-noite, com um intervalo para uma apresentação fixa na Rádio Gaúcha. Tudo certo, tudo perto: tudo nas imediações da rua da Praia (oficialmente rua dos Andradas, artéria principal do centro de Porto Alegre). No máximo, um pulo até o bairro do Moinhos de Vento, nas cercanias, onde ficava a Gaúcha.

Se um turno de seis horas com intervalo pode parecer muito, é

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bom saber como funcionava a coisa: tocavam uma música, davam uma descansadinha, tocavam outra. Uma música de cada vez: uma fórmula que, poucos anos depois – e até hoje – seria impensável.

No sábado, paravam pelas 22h30 e dali saíam direto pra algum baile, que geralmente começava às 23h (tudo era realmente perto naquela Porto Alegre). Chegavam em cima da hora sem problema. Afinal, não custa lembrar, não existia ainda aquela desalentadora experiência humana chamada passagem de som. Era tudo acústico. Um único microfone para a voz e o amplificador da guitarra levado pelo próprio guitarrista. Era sentar e tocar.

Nos bailes, não perdiam a chance de fazer uma média que sempre impressionava. Depois da música de abertura – a chamada característica, hábito mantido pelas orquestras até os anos de 1960 -, tocavam o hino do clube onde estavam se apresentando. Mas e se o clube não tivesse hino? Fácil: Paulo compunha um, dava de presente e ganhava gratidão eterna – e novos contratos.

* * *

Em 1935 entra no ar a Rádio Farroupilha. É a terceira emissora de Porto Alegre (antes dela, a Gaúcha e a Difusora), e chega querendo tudo do bom e do melhor. Isso inclui o grupo de Paulo, que sai da Gaúcha para ganhar bem mais na nova emissora, fechando contrato de exclusividade. Já na estreia são anunciados como uma das três grandes atrações da transmissão inaugural, ao lado de Mário Reis e Carmen Miranda, trazidos de hidroavião direto do Rio de Janeiro.

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Alcides, Paulo, Carmen, Marino se espichando, Mário Reis de saco cheio.

(Foto: acervo Alberto do Canto)

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Aurora Miranda, Paulo, Carmen Miranda, Marino atrás dela, Antoninho

Gonçalves com o violão, Alcides atrás dele, o futuro médico Maurício Kothlar no sax tenor. Numa das voltas de Carmen a Porto Alegre, desta vez com a irmã. Depois da inauguração da Farroupilha, ela só ia à capital gaúcha se

fosse para ser acompanhada por Paulo. (Foto: acervo Alberto do Canto)

Entre 1936 e 37, Paulo se associa eventualmente ao bandleader paulista Clóvis Mamede, então radicado em Porto Alegre, tocando trompete na orquestra de Paulo. Nestes momentos de mudança de status do instrumentista, a orquestra vira o Jazz de Paulo Coelho – Clóvis Mamede. A imprensa e os fãs, por essa época, começam a chamar Paulo de Paul Whiteman gaúcho (Whiteman era um dos maiores bandleaders da música americana de então. Branco, gorducho e de bigodinho, como Coelho, estava popularíssimo graças ao filme The King of Jazz, onde ele era o king, claro).

Numa matéria de página inteira na Folha da Tarde de três de junho de 1936, Paulo Coelho fala à “Folha da Tarde” sobre o seu próximo plano de acção, se tem a dimensão da sua importância naquele momento:

Uma figura curiosa sob todos os aspectos, Paulo Coelho.

Bohemio, dessa bohemia que não conhece preconceitos, o Gôrdo

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vive apaixonadamente voltado para a sua arte. Depois que o jazz venceu em todo mundo, com grave escândalo para os inadaptados dos novos tempos, Paulo tornou-se um líder da matéria. Hoje, no Brasil, difficilmente haverá quem lhe arrebate o título de Príncipe da música leve. As suas excursões periódicas aos principaes centros da America Latina lhe valem por uma afirmação de valor sem artifício. Na Argentina, o homem domina o tango e arrebata leigos e profissionaes. No Rio, o notável pianista deixa seu nome firmado entre os expoentes da nossa música, como intérprete seguro e expontaneo. E, entretanto, apezar de todas as tentações elle vem sempre terminar no Rio Grande, onde installou seu Quartel General e de onde não faz questão de sair. Paixão pela terra? Conveniência do profissional? Não. Desejo apenas de ficar á vontade, movimentando-se entre os seus, sem protocollos nem attitudes forçadas. O Gordo é, acima de tudo, um campeão da malandragem. Prefere viver no meio dos que lhe comprehendem e não lhe azucrinam os ouvidos com leis e regulamentos de sociabilidade. É preciso, porém, tomar a malandragem no bom sentido do termo: no sentido de viver de accordo com os impulsos do seu temperamento, sem freios nem pôses estudadas. Fazer aquillo que lhes agrade, como lhe agrade a quando lhe agrade.

E isso não é fácil. Pelo menos, traz conseqüências nem sempre agradáveis. Mas Paulo Coelho é elle mesmo e nunca se desfigura. Na regência de um jazz, diga-se tudo que se quizer, mas vamos tirar o chapéo deante do talento do rapaz. Porque elle é braço de verdade.

Na reportagem, Paulo fala também sobre como, a pedido do

público, passou a tocar jazz e fox além de sambas e marchas. E anuncia a nova formação da orquestra, que ficaria eternizada numa fotomontagem espetacular.

Em fusão contra um fundo negro, vemos no alto, à esquerda, o contrabaixista Flávio Corrêa. A seu lado, no centro, o baterista Americo, cujo bumbo ostenta um close da redonda cara de Coelho. Cara que se repete no canto direito superior, de perfil. Bem ao centro, empertigadíssimo, Antoninho Gonçalves, com cara de assustado, empunhando sua guitarra. No canto inferior esquerdo, Flamarion no trombone e os dois trompetistas, Ernani Oliveira e Clóvis Mamede, tocando seus instrumentos apontados para Antoninho (que talvez por isso pareça tão assustado). A seu lado, um microfone – então uma novidade, lembre-se. Por fim, no canto inferior direito, quatro figuras que parecem homens-banda, com variados saxofones pendurados ao pescoço e clarinetes na boca: Zacharias, Maurício, Marino dos Santos e Matte. Um jazz e

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tanto.

“A” Foto

Um grupo desse tamanho evidentemente precisava de arranjos

escritos, e escritos na nova linguagem das big bands americanas, tudo dividido por naipes. E essa era uma das questões da reportagem: como era muito difícil conseguir os originais estadunidenses, Paulo começara a escrever os seus próprios arranjos. O que o aponta como um precursor – ao lado do seu mais famoso colega de geração, Radamés Gnattali. Diz Paulo:

Tenho certeza de que se procurássemos estylizar a nossa

música o successo seria outro. Radamés Gnattali, no Rio, já pretendeu fazer isso mas parece que não lhe compreenderam.

Em 1936, Radamés ainda era um quase anônimo pianista e arranjador da recém-inaugurada Rádio Nacional. Paulo, pelo que se depreende da matéria, já estava fazendo o que Radamés começaria a efetivar a partir de 1941. Só que Gnattali o faria na rádio mais importante do País, transmitida para todos os cantos, tornando-se, com isso, o arranjador mais importante do Brasil. Enquanto que de Paulo só se pode saber através de uma única gravação, da qual logo falaremos.

Tenho idéa de aproveitar todos os sambas antigos, dos

melhores, e actualizal-os dentro desse critério. Será uma tentativa,

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não por falta de repertório, mas pelo desejo de fazer alguma coisa nova. (…) Não há dúvida que os conjunctos regionaes são interessantes. Aquella coisa de flauta, dos violões, dos cavaquinhos, da cuíca, do pandeiro, porem, não offerece margem para integrar a nossa musica no rythmo moderno. São sempre a mesma coisa. Com o jazz já a coisa muda de figura. É a orchestra do século. Elle resolve todas as situações.

Quando a geração de Paulo estava no seu auge, já não existiam a Casa A Electrica e seus Discos Gaúcho. O resultado é que não há registros fonográficos de quase ninguém. Alcides Gonçalves gravou alguma coisa. Horacina, já vimos, também. Mas Paulo deixou um único 78 rpm, de 1938. Uma pérola raríssima, puxada por seu maior feito como compositor, Alto da Bronze. No selo do disco, gravado em Buenos Aires para a RCA argentina, está escrito: “Horacina Corrêa acompanhada da Jazz-Band de Paulo Coelho”.

O feito invertia os vetores de uma década antes – quando eram os argentinos que vinham a Porto Alegre gravar n’A Electrica. O acetato que contém os 2min54s mais raros da discografia gaúcha foi registrado durante a gloriosa aventura da orquestra por terras castelhanas, desejada desde essa citada reportagem, de dois anos antes:

Meu sonho sempre foi voltar a Buenos Aires com uma

orchestra que se fizesse respeitar.

Pois então. A excursão começou da pior forma possível…

* * *

Embarcaram todos num trem via Uruguaiana. Uma longa viagem, já que só até a cidade fronteiriça são 650 km. Mas valia a pena, afinal o contrato era para um grande evento: a inauguração da Radio Municipal de Buenos Aires. A bem da verdade, nem todos foram (Arthur Elsner, por exemplo, cego, não quis se arriscar em terras desconhecidas). O bando que pegou o trem tinha 11 figuras: Paulo (piano); Horacina Corrêa (lady-crooner); os irmãos Flávio (contrabaixo) e Oscar Corrêa (bateria), marido de Horacina; Marino dos Santos (sax alto e clarinete), Fritz Preuss (sax tenor), Ernani Oliveira (trompete) e Waldemar Moura (trombone). Por fim, os irmãos Gonçalves: Alcides (crooner), Antoninho (guitarra), Juvenal e Walter (ambos nas percussões).

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A turma de Buenos Aires. Na primeira fila: Fritz Preuss, Marino dos Santos, Horacina Corrêa, Antoninho Gonçalves, Alcides Gonçalves, Ernani Oliveira e Waldemar Moura. Atrás: Flávio(contrabaixo) e Oscar Corrêa(bateria), Paulo

no piano, Juvenal e Walter Gonçalves (ambos nas percussões).

A primeira surpresa foi quando chegaram a Buenos Aires e descobriram que o prédio da emissora não tinha nem sido terminado! E pior: pelo contrato, até a inauguração não poderiam tocar em nenhum outro lugar. Nem rádio, nem cabaré, nem confeitaria…

(Mais uma estória mal contada: a Rádio Municipal de Buenos Aires foi inaugurada em 1927. Portanto a explicação deve ser outra – jamais descobriremos).

Reza a lenda que quem segurou as pontas foi Marino, que conseguiu um bico numa outra orquestra – escondido, e com um sax emprestado, já que os instrumentos estavam retidos pelo contratante como garantia de que não se apresentariam mesmo em outros lugares. Clima máfia total.

Com a grana que ia recebendo Marino comiam 11. E iam enrolando o pessoal do hotel. Vista aos olhos de hoje, a situação parece totalmente absurda. Mas na época…

…também era. É quando entra em cena o jornalista Rivadávia de Souza. Foi

ele que, de Porto Alegre e não se sabe como, teria chorado as pitangas com o diretor da emissora. Chorou bonito: depois de muito argumentar, conseguiu uma licença provisória pro pessoal fazer uns bicos, com a liberação dos instrumentos e até um adiantamento de

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cachê. Rivadávia de Souza, um talento não utilizado pelo nosso corpo diplomático.

A partir daí, se a coisa começou mal, terminou gloriosa. Arrebentaram quando finalmente ocorreu a temporada na rádio, tocando ao lado de atrações mundiais, como o francês Maurice Chevalier, e locais, como Hugo Del Carril. A partir de então, estavam liberados para apresentarem-se onde quisessem, e os convites choviam. Inclusive da poderosa Radio El Mundo, a mais importante da Argentina e uma das mais importantes do planeta, escutada nos cinco continentes – com especial ênfase no Rio Grande do Sul, onde a gauchada pôde comprovar ao vivo, em ondas curtas, o sucesso dos porto-alegrenses na capital portenha.

Da El Mundo partem para o Tabaris, então o mais importante cassino-nightclub-cabaret da América do Sul. Só faltava a glória de gravar um disco. E é aí que pinta a proposta da RCA argentina. De um lado, registrariam uma canção de Paulo, Alto da Bronze. Do outro, uma marcha de um compositor argentino (marcha e autor cujos nomes se perderam), interpretada pela orquestra.

Alto da Bronze é uma das parcerias de Paulo com o letrista Plauto de Azambuja Soares, jornalista da Folha da Tarde que atendia pelo apelido de Foquinha e morreu aos 23 anos durante uma reportagem participativa (demais) sobre corridas de automóvel. O irônico é que a canção, em 1938, já falava da melancolia de um tempo bom que não volta nunca mais. Virou um dos hinos informais da cidade, homenagem àquele canto da colina onde Porto Alegre nasceu – perto da Praça da Matriz, rumo à Usina do Gasômetro, centrado em uma praça:

Alto da Bronze, cabeça quebrada, praça querida Sempre lembrada, a Praça 11 da molecada Praça sem banco, do rato branco e do futebol Da garotada endiabrada das manhãs de sol És a eterna lembrança Do tempo feliz em que eu era criança Tempo em que essa era, da minha infância, a grande quimera Hoje, eu, pobre profano, me lembro de ti e dos meus desenganos Oh, meu Alto da Bronze dos meus oitos anos…

A música que embala tais versos é um belo tema de andamento

médio, entre o samba-canção e o samba-choro, composto nas regras da arte do final dos anos 1930. Seu lançamento oficial havia sido em 19 de novembro de 1937, ao vivo, na Farroupilha. Horacina a cantara ao meio-dia e Alcides Gonçalves dera o repeteco à noite. Sucesso

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imediato.

Ao vivo na Rádio Farroupilha, direto do Cine Apollo, em 1937. Foto: Acervo

Alberto do Canto.

Na gravação, durante o primeiro minuto, clarinete, sax alto, sax tenor, trombone e trompetes com surdina alternam-se entre o tema e seus contracantos, tocando a melodia do começo ao fim. Então uma sucessão de modulações encerrada por uma cascata de notas de Paulo entrega a bola para Horacina. Ela, cheia de bossa, canta a canção na íntegra, duas vezes, com uma cama de sopros ao fundo. Enquanto isso, a cozinha de bateria, percussões e baixo conduz com sutil malemolência, e o piano pinta e borda. Ao final, a orquestra modula de novo, repete a última volta da melodia e desemboca num final grandiloquente, digno de filme da Metro (o que não aparece, por mais que se force o ouvido, é a tão comentada guitarra elétrica – o que se ouve é um cavaquinho).

Algo de que pouca gente se dá conta é que são raros os sambas como Alto da Bronze nessa época. Sambas que fogem à estrutura estrofe-refrão. Curare e Da Cor do Pecado são os exemplos clássicos, ambos de Bororó. Mas Alto da Bronze poderia estar nessa lista se fosse conhecida fora dos limites da cidade de seus compositores. Outros detalhes que chamam a atenção são as pequenas surpresas da melodia, com algumas peculiares dissonâncias em finais de frase. Isso, sem falar na orquestração, na qual os sopros já prenunciam a revolução que Radamés Gnattali faria no ano seguinte, usando os naipes pra dar balanço a

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um arranjo. A gravação é a culminância dos quatro meses que o grupo

passa na terra de Carlos Gardel. Como acabamos de contar, parte dos seus feitos era escutada em Porto Alegre através das ondas curtas das rádios argentinas. E, aí, no retorno à cidade, em julho de 1938, só faltou tapete vermelho na estação do trem: foram aclamados como heróis locais.

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Matéria da Folha da Tarde de 1938

Imediatamente contratados pelo Dancing Oriente, assumem

como a banda da casa desse que era um dos melhores night-clubs dos anos 1930 e 40 na capital gaúcha. Seguem com contrato de

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exclusividade na rádio Farroupilha, mas na noite e no futebol Paulo é pouco fiel: sempre frenético torcedor, a conselho de amigos colorados troca o Grêmio pelo Internacional. E, ainda que fixo no Oriente, leva sua orquestra para muitos outros dancings e cabarets – chega a ter seu próprio bar, na rua da Ladeira, mas que quebra logo por má administração.

A orquestra ia de vento em popa quando seu líder recebe um convite irrecusável vindo da capital federal. Levando junto o fiel escudeiro Marino dos Santos, assina com o Cassino Atlântico para integrar a prestigiada orquestra de Romeu Silva, onde era apresentado como nada menos que “o melhor pianista brasileiro”. Pouco tempo depois, uma noticia espetacular: a orquestra de Romeu é contratada para apresentar-se no pavilhão do Brasil na Feira Mundial de Nova York. Seria a chance de Paulo impressionar na terra que inventara o jazz. Só que aí, creiam, bate a inefável saudade do pago que acometeu tantos músicos gaúchos ao longo da história.

– Nova York?! Tão longe? Paulo não só não topa a viagem, como decide voltar para Porto

Alegre, junto com Marino. Estamos em fins de 1940 e começaria ali a melhor fase da vida

do Jazz-Band de Paulo Coelho, com muitos contratos e a alegria de ter definitivamente o crooner Alcides Gonçalves, recém-voltado de temporadas cheias de moral em Buenos Aires e no Rio de Janeiro (pelas peculiaridades anatômicas de ambos, até tinham preparado números em nome da dupla O Gordo e o Magro).

Tudo ia bem não fosse por um detalhe: Paulo estava doente. Mas não deixava abater, como anunciava a coluna rádio da Folha da Tarde de 9 de agosto de 1940:

Paulo Coelho, depois de uma longa enfermidade, voltou às

suas atividades ao microfone da “mais poderosa” e nas reuniões do Club do Commercio.

Mas não duraria muito.

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22 de setembro de 1941. Página inteira da Folha da Tarde

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Gordíssimo – 120 quilos –, no dia 21 de setembro de 1941,

durante a grande enchente que tomou a parte central da cidade, saiu para ver um jogo do seu amado Internacional quando, às três da tarde, foi fulminado por um ataque cardíaco no meio da rua. Estava a poucos metros da sua casa, na João Abbott, 58, no bairro Petrópolis. Segundo alguns, morreu ali. Segundo o jornalista Carlos Reverbel, ainda foi socorrido por um táxi, mas morreu no veículo.

Tinha 31 anos. Duas noites antes tocara pela última vez na Farroupilha. Onde era, então, o maior salário do rádio gaúcho, o maior nome do showbizz local. Alto da Bronze acabava de ser regravada em Buenos Aires, por uma orquestra de lá, e fora um sucesso no Carnaval.

O pesquisador gaúcho Marcello Campos descobriu que o que ele tinha, na verdade, era tuberculose. Só que não parecia tuberculoso aquele homem gordo que, pouco tempo antes, levantara da cama para escrever a partitura de um samba de um jovem compositor de Santiago do Boqueirão, chamado Túlio Piva (Túlio bateu na porta, ele atendeu de pijamas, e fez o serviço na hora).

Está lá, no atestado de óbito assinado pelo dr. Maurício Kothlar encontrado por Marcello. Kothlar, que havia sido saxofonista de uma das formações da orquestra de Paulo, escreveu: Causa mortis – tuberculose pulmonar. Síncope cardíaca.

Foi sepultado no cemitério da Santa Casa de Misericórdia com velório e enterro pagos pela Rádio Farroupilha.

Se sua fama como compositor e bandleader era de respeito, a maior reputação era mesmo como pianista. Há anos não havia ninguém para competir com ele pela pole position local. Desde 1937, os jornais aclamavam:

Não há em Porto Alegre e mesmo no Brasil – não é exaggero

– quem não o conheça.

Os speakers das rádios completavam: Paulo Coelho, o rival de si mesmo!

Eventualmente, ainda se dava ao luxo de fazer concertos de

piano solo indo de Beethoven a Liszt. Oferecendo, de brinde, exibições gratuitas de destreza como tocar dois pianos ao mesmo tempo.

Ah, mas essa é fácil. Com dois pianos a mão, num ângulo favorável, qualquer pianista faz isso.

É?

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Só que ele tocava uma música diferente em cada um.

Paulo Coelho à esquerda, de óculos. (acervo Alberto do Canto)

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Orquestras que reuniam músicos brancos e negros não eram exatamente a regra na Porto Alegre dos tempos de Paulo, registre-se. (acervo Alberto do Canto).