NOÇÕES DE DIREITO PENAL

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Didatismo e Conhecimento 1

NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Prof. Adriano Augusto Placidino Gonçalves

Graduado pela Faculdade de Direito da Alta Paulista – FADAP.Advogado regularmente inscrito na OAB/SP

1. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO DIREITO PENAL.

A criação do tipo e adequação concreta da conduta ao tipo devem operar-se em consonância com os princípios constitucionais do Direito Penal, os quais derivam da dignidade da pessoa humana que, por sua vez, encontra fundamento no Estado Democrático de Direito.

Dos princípios orientadores e limitadores do Direito Penal que decorrem da dignidade, merecem destaque:

Princípio da Legalidade: O princípio da reserva legal delimita o poder punitivo do Estado e dá ao Direito Penal uma função garantista, pois define o delito e a pena, ficando os cidadãos cientes de que só pelos fatos anteriormente delineados como crimes poderão ser responsabilizados criminalmente e apenas naquelas sanções previamente fixadas podem ser processados e condenados. O referido princípio se desdobra em quatro princípios:

a) nullum crimen, nulla poena sine lege praevia (proibição da edição de leis retroativas que fundamentam ou agravem a pu-nibilidade)

b) nullum crimen, nulla poena sine lege scripta (proibição da fundamentação ou do agravamento da punibilidade pelo direito consuetudinário);

c) nullum crimen, nulla poena sine lege stricta (proibição da fundamentação ou do agravamento da punibilidade pela analo-gia);

d) nullum crimen, nulla poena sine lege certa (a proibição de leis penais indeterminadas).

Princípio do “in dubio pro reo”: Se houver qualquer dúvida, após a utilização de todas as formas de interpretação, a questão deverá ser resolvida da maneira mais favorável ao réu.

Princípio da vedação do “bis in idem”: Significa que ninguém pode ser condenado duas vezes pelo mesmo fato. Além disso, por esse princípio, determinada circunstância não pode ser empregada duas vezes em relação ao mesmo crime, quer para agravar, quer para reduzir a pena. Assim, quando alguém comete um homicídio por motivo fútil, incide a qualificadora do art. 121, § 2º, II, do Código Penal, mas não pode ser aplicada, concomitantemente, a agravante genérica do motivo fútil, prevista no art. 61, II, a. Essa agravante, portanto, será aplicada a outros crimes em que a futilidade da motivação não esteja prevista como qualificadora.

Princípio da Insignificância ou bagatela: no Direito Penal não se deve preocupar-se com bagatelas, do mesmo modo que não podem ser admitidos tipos incriminadores que descrevam condutas incapazes de lesar o bem jurídico. A tipicidade pena exige um mínimo de lesividade ao bem jurídico protegido, pois é inconcebível que o legislador tenha imaginado inserir em um tipo penal con-dutas totalmente inofensivas ou incapazes de lesar o interesse protegido.

O Supremo Tribunal Federal, por sua vez, assentou “algumas circunstâncias que devem orientar a aferição do relevo material da tipicidade penal”, tais como: a) a mínima ofensividade da conduta do agente; b) a nenhuma periculosidade social da ação; c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada.

Princípio da Alterabilidade ou transcendentalidade: proíbe a incriminação de atitude meramente interna, subjetiva e que, por essa razão, revela-se incapaz de lesionar o bem jurídico. O fato típico pressupõe um comportamento que transcenda a esfera indivi-dual do autor e seja capaz de atingir o interesse do outro. Por essa razão, a autolesão não é crime, falta lesividade que possa legitimar a intervenção penal.

Princípio da Confiança: funda-se na premissa de que todos devem esperar por parte das outras pessoas que estas sejam respon-sáveis e ajam de acordo com as normas da sociedade, visando a evitar danos a terceiros. Por exemplo, se um motorista trafegando pela preferencial passar por um cruzamento, na confiança de que o veículo da via secundária aguardará sua passagem. No caso de um acidente, não terá agido com culpa. Por conseguinte, não realiza conduta típica aquele que, agindo de acordo com o direito, acaba por envolver-se em situação em que um terceiro descumpriu seu dever de lealdade e cuidado.

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Princípio da Adequação Social: todo comportamento que, a despeito de ser considerado criminoso pela lei, não afronta o sentimento social de justiça (aquilo que a sociedade tem por justo) não pode ser considerado criminoso. As condutas aceitas social-mente e consideradas normais não podem sofrer este tipo de valoração negativa, sob pena de a lei incriminadora padecer do vício da inconstitucionalidade.

Princípio da Intervenção Mínima: A aplicação abusiva da previsão legislativa penal faz com que ela perca parte de seu mérito e, assim, sua força intimidadora. O princípio da intervenção mínima está diretamente ligado aos critérios do processo legislativo de elaboração de leis penais, servindo, num primeiro momento, como regra de determinação qualitativa abstrata para o processo de tipificação das condutas, e, num segundo momento, juntamente com o princípio da proporcionalidade dos delitos e das penas, comi-nar a sanção pertinente. Destarte, surge como tendência, a ideia de que só se deve criminalizar condutas de efetiva gravidade e que atinjam bens fundamentais, valores básicos de convívio social.

Princípio da Proporcionalidade: Toda vez que o legislador cria novo delito, impõe um ônus à sociedade, decorrente da ameaça de punição que passa a pairar sobre todos os cidadãos. Uma sociedade incriminadora é uma sociedade invasiva, que limita e demasia a liberdade das pessoas. Por outro lado, esse ônus é compensado pela vantagem de proteção do interesse tutelado pelo incriminador. A sociedade vê limitados certos comportamentos, ante a cominação da pena, mas também desfruta de uma tutela a certos bens, os quais ficarão sob guarda do Direito Penal. Assim, diante do princípio da proporcionalidade, quando o custo for maior do que a vantagem, o tipo penal será inconstitucional.

Princípio da Humanidade: A Declaração dos Direitos do Homem disciplina em seu artigo 5º, que: «ninguém será submetido a tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano e degradante”. No mesmo sentido, a Convenção Internacional sobre Direitos Políticos e Civis, de 1966, dispõe em seu artigo 10, inciso I, que: “o preso deve ser tratado humanamente, e com o respeito que lhe corresponde por sua dignidade humana”. A Constituição Federal de 1988 trouxe diversos dispositivos onde se constata a consagração do princípio da humanidade. Exemplo: artigo 5, inciso XLIX, da Lei Maior, que: “é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”. O próximo inciso do mesmo artigo assevera que: “às presidiárias são asseguradas as condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período da amamentação”. Ainda mais enfatizante é o inciso XLVII, do citado artigo, que dis-põe: “não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do artigo 84, XIX; b) de caráter perpétuo; c) de trabalhos forçados; d) de banimento; e) cruéis”. São estas imposições ao legislador e ao interprete de mecanismos de controle de tipos legais. Disso resulta ser inconstitucional a criação de um tipo ou a cominação de alguma pena que atente desnecessariamente contra a incolumidade física ou moral de alguém (atentar necessariamente significa restringir alguns direitos nos termos da Constituição e quando exigido para a proteção do bem jurídico).

Princípio da Necessidade e idoneidade: A incriminação de alguém só pode ocorrer quando a tipificação revelar-se necessária, idônea e adequada ao fim a que se destina, ou seja, à concreta e real proteção do bem jurídico.

Princípio da Ofensividade, princípio do fato e da exclusiva proteção do bem jurídico: Não há crime quando a conduta não

tiver oferecido ao menos um perigo concreto, real, efetivo e comprovado de lesão ao bem jurídico. O princípio do fato não permite que o direito penal se ocupe das intenções e pensamentos das pessoas, do modo de viver ou de pensar, das atitudes internas. O prin-cípio da ofensividade considera inconstitucionais todos chamados “delitos de perigo abstrato”, pois, segundo ele não há crime sem comprovada lesão ou perigo de lesão a um bem jurídico. Não se confunde com o princípio da exclusiva proteção do bem jurídico, segundo o qual o direito não pode defender valores meramente morais, éticos ou religiosos, mas tão somente os bens fundamentais para a convivência e o desenvolvimento social.

Princípio da autorresponsabilidade: os resultados danosos que decorrem da ação livre e inteiramente responsável de alguém só podem ser imputados a este e não àquele que o tenha anteriormente motivado. Exemplo: sujeito é aconselhado por outro a praticar es-portes mais radicais, este resolve pular de bungee jumping. Acaba sofrendo um acidente, vindo a falecer. O resultado morte não pode ser imputado a ninguém mais além da vítima, pois foi a sua vontade livre, responsável e consciente que a impeliu a correr os riscos.

Princípio da Pessoalidade: Aduz que a pena não pode passar da pessoa que praticou o delito. A Carta Magna em vigor disciplina no artigo 5º, inciso XLV que: “nenhuma pena passará da pessoa do condenado (...)”.

A pena não se pode estender a pessoas que não participaram do delito, ainda que haja laços de parentesco, afinidade ou amizade com o condenado. Não se pode olvidar, contudo, que a pena pode gerar danos e sofrimentos a terceiros, em especial a família. As-sim, determinadas legislações vêm disciplinando a criação de institutos que auxiliam tanto a família do sentenciado, como a vítima do delito.

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Princípio da responsabilidade subjetiva: Nenhum resultado objetivamente típico pode ser atribuído a quem não o tenha pro-duzido por dolo ou culpa, afastando-se a responsabilidade objetiva. Do mesmo modo, ninguém pode ser responsabilizado sem que reúna todos os requisitos da culpabilidade.

Princípio da Taxatividade: As leis penais devem ser claras, precisas e bem elaboradas de forma que seus destinatários possam compreendê-las, não podem aqueles que devem cumprir a Lei terem dúvidas pelo modo como foram elaboradas. Não se admite a criação de tipos que contenham conceitos vagos ou imprecisos. Impõe-se ao Poder Legislativo, na elaboração das leis, que redija tipos penais com a máxima precisão de seus elementos. É nitidamente decorrente da legalidade, logo, Constitucional Implícito.

Princípio da Individualização da Pena: A legislação constitucional pátria consagrou o princípio no artigo 5, inciso XLVI, dispondo que: “a lei regulará a individualização da pena”. A individualização da pena passa por três fases distintas: A legislativa, a judicial e a executória ou administrativa.

No primeiro momento, a lei delimita as penas para cada tipo de delito, guardando proporcionalidade com a importância do bem jurídico defendido e com o grau de lesividade da conduta. Nesta fase, ainda, se estabelece as espécies de penas que podem ser apli-cadas, de forma cumulativa, alternativa ou exclusiva.

Na segunda fase, ocorre a individualização realizada pelos magistrados. Diante das diretrizes fixadas pela legislação, o juiz vai decidir qual das penas deve ser aplicada e qual a sua quantidade, dentro dos limites trazidos no preceito penal secundário, determi-nando, inclusive, o meio de sua execução. As regras básicas da individualização da pena, em nosso Código Penal, estão previstas no artigo 59 e não podem deixar de ser observadas pelo juiz.

A terceira e última etapa da individualização da pena ocorre com sua execução e é denominada de individualização administra-tiva ou individualização executória. A Constituição Federal traz alguns preceitos que devem ser respeitados na etapa executória. No artigo 5ª, inciso XLIX, diz ser “assegurado aos presos o respeito a integridade física e moral”. Já no inciso XLVIII, do mesmo artigo, se impõe que o cumprimento da pena se dará em estabelecimentos que atendam “a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado”.

Princípio da Consunção: É o princípio segundo o qual um fato mais amplo e mais grave consome, isto é, absorve outros fatos menos amplos e graves, que funcionam como fase normal de preparação ou execução ou mero exaurimento.

2. A LEI PENAL NO TEMPO. 3. A LEI PENAL NO ESPAÇO.

ANTERIORIDADE DA LEI

Art. 1º - Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.

Princípio da Legalidade

Esse princípio, consagrado no art. 1º do Código Penal, encontra-se atualmente descrito também no art. 5º XXXIX, da Consti-tuição Federal. Segundo ele, “não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal”. A doutrina subdivide o princípio da legalidade em:

a) Princípio da anterioridade, segundo o qual uma pessoa só poder ser punida se, à época do fato por ela praticado, já estava em vigor a lei que descrevia o delito. Assim, consagra-se a irretroatividade da norma penal (salvo a exceção do art. 2º, parágrafo único, do Código Penal que será discutida abaixo).

b) Princípio da reserva legal, apenas a lei em sentido formal pode descrever condutas criminosas. É vedado ao legislador utilizar-se de decretos, medidas provisórias ou outras formas legislativas para incriminar condutas.

As normas penais em branco (aquelas que exigem complementação por outras normas, de igual nível [leis] ou de nível diverso [decretos, regulamentos etc.]). Não ferem o princípio da reserva legal.

LEI PENAL NO TEMPO

Art. 2º - Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória.

Parágrafo único - A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado.

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A lei que revoga um tipo incriminador extingue o direito de punir (abolitio criminis). A consequência do abolitio criminis é a extinção da punibilidade do agente. Por beneficiar o agente, o abolitio criminis alcança fatos anteriores e será aplicado pelo Juiz do processo, podendo ser aplicado antes do final do processo, levando ao afastamento de quaisquer efeitos da sentença, ou após a conde-nação transitada em julgado. No caso de já existir condenação transitada em julgado, o abolitio criminis causa os seguintes efeitos: a extinção imediata da pena principal e de sua execução, a libertação imediata do condenado preso e extinção dos efeitos penais da sentença condenatória (Exemplo: reincidência, inscrição no rol dos culpados, pagamento das custas etc.).

Vale lembrar que os efeitos extrapenais, contudo, subsistem, como a perda de cargo público, perda de pátrio poder, perda da habilitação, confisco dos instrumentos do crime etc. A competência para a aplicação do abolitio criminis após o trânsito em julgado é do juízo da execução:

Súmula nº 611 do STF: “Transitada em julgado a sentença condenatória, compete ao juízo das execuções a aplicação da lei mais benigna.

O parágrafo único do artigo 2º trata do fenômeno da extratividade da lei penal, ou seja; a lei pode retroagir SOMENTE quando para beneficiar o agente.

Extratividade: É o fenômeno pelo qual a lei produz efeitos fora de seu período de vigência. Divide-se em duas modalidades: retroatividade e ultratividade.

Na retroatividade, a lei retroage aos fatos anteriores à sua entrada em vigor, se houver benefício para o agente; enquanto na ul-tratividade, a lei produz efeitos mesmo após o término de sua vigência.

Não há que se falar em conflito de leis entre o artigo primeiro (legalidade) e o parágrafo único do artigo 2º (extratividade). Ve-jamos:

a) No artigo 1º, decretando a irretroatividade da lei, o Código Penal (CP) procurou defender a dignidade humana e a estrutura democrática brasileiras, ambos fundamentos cruciais à existência da nossa República federativa (Art. 1º, III e parágrafo único da CF/88), porque trata-se de uma barreira à discricionariedade estatal no que se refere à punição. Ele reflete o objetivo claro de controle dos bens jurídicos da sociedade. O que seria de uma nação se qualquer pessoa com poder pudesse escolher as condutas que devem ser punidas e assim fazê-lo do modo que lhe der mais satisfação?

b) O artigo 2º, por sua vez, em seu parágrafo único, faz exatamente o mesmo do artigo 1º. A retroatividade que valida é restrin-gida aos efeitos benéficos do dispositivo penal em questão, o que é relacionado com os objetivos da punição estatal e igualmente ao princípio da dignidade humana, porque evitar que as mudanças sociais se estendam àqueles que, por exemplo, têm o direito constitu-cional de ir e vir cerceado por uma conduta que não é mais considerada lesiva, é negar a igualdade de tratamento do Estado a toda a sociedade, sobretudo quanto à defesa da dignidade e quanto à justiça, ambos também explicitamente acobertas constitucionalmente.

Neste contexto, a lei posterior continua a considerar o fato como criminoso, mas traz alguma benesse ao acusado: pena menor, maior facilidade para obtenção de livramento condicional etc.

Desta forma, pela combinação dos arts. 1º e 2º do Código Penal, podemos chegar a duas conclusões:a) a norma penal, em regra, não pode atingir fatos passados. Não pode, portanto, retroagir; b) a norma penal mais benéfica, entretanto, retroage para atingir fatos pretéritos.

Hipóteses de lei posterior:

a) “Abolitio criminis”: lei posterior deixa de considerar um fato como criminoso. Trata-se de lei posterior que revoga o tipo penal incriminador, passado o fato a ser considerado atípico. Como o comportamento deixou de constituir infração penal, o Estado perde a pretensão de impor ao agente qualquer pena, razão pela qual se opera a extinção da punibilidade, nos termos do art. 107, III, do Código Penal.

b) “Novatio legis in mellius”: é a lei posterior que, de qualquer modo, traz um benefício para o agente no caso concreto. A lex mitior (lei melhor) é a lei mais benéfica, seja anterior ou posterior ao fato. A norma penal retroage e aplica-se imediatamente aos processos em julgamento, aos crimes cuja perseguição ainda não se iniciou e, também, aos casos já encerrados por decisão transitada em julgado.

c) “Novatio legis in pejus”: é a lei posterior que, de qualquer modo, venha a agravar a situação do agente no caso concreto. Nes-se caso a lex mitior é a lei anterior. A lei menos benéfica, seja anterior, seja posterior, recebe o nome de lex gravior (lei mais grave).

d) “Novatio legis” incriminadora: é a lei posterior que cria um tipo incriminador, tornando típica conduta considerada irrelevante penal pela lei anterior.

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LEI EXCEPCIONAL OU TEMPORÁRIA

Art. 3º - A lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a de-terminaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência.

As leis acima citadas são autorrevogáveis, ou seja, são exceções à regra de que uma lei se revoga por outra lei. Subdividem-se em duas espécies:

- leis temporárias: Aquelas que já trazem no seu próprio texto a data de cessação de sua vigência, ou seja, a data do término de vigência já se encontra explícito no texto da lei.

- leis excepcionais: Aquelas feitas para um período excepcional de anormalidade. São leis criadas para regular um período de instabilidade. Neste caso, a data do término de vigência depende do término do fato para o qual ela foi elaborada.

Estas duas espécies são ultrativas, ainda que prejudiquem o agente (Exemplo: Num surto de febre amarela é criado um crime de omissão de notificação de febre amarela; caso alguém cometa o crime e logo em seguida o surto seja controlado, cessando a vigência da lei, o agente responderá pelo crime). Se não fosse assim, a lei perderia sua força coercitiva, visto que o agente, sabendo qual seria o término da vigência da lei, poderia retardar o processo para que não fosse apenado pelo crime.

TEMPO DO CRIME

Art. 4º - Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o momento do resultado.

Trata-se da fixação do tempo em que crime reputa-se praticado. Existem três teorias sobre o tempo do crime:- Teoria da atividade: O tempo do crime é o tempo da prática da conduta, ou seja, é o tempo que se realiza a ação ou a omissão

que vai configurar o crime, ainda que outro seja o momento do resultado;- Teoria do resultado: O tempo do crime é o tempo que se produz o resultado, sendo irrelevante o tempo da ação;- Teoria mista ou da ubiquidade: O tempo do crime será tanto o tempo da ação quanto o tempo do resultado.A teoria utilizada pelo Código Penal (CP) é a teoria da ATIVIDADE. Na teoria da atividade o agente, em caso de lei nova, res-

ponderá sempre de acordo com a última lei vigente, seja ela mais benéfica ou não. Por exemplo, suponha-se que a pessoa com idade de 17 anos, 11 meses e 29 dias efetue disparo contra alguém, que morre apenas uma semana depois. Ora, o homicídio só se consumou com a morte (quando o agente já estava com 18 anos), mas o agente não poderá ser punido criminalmente, pois, nos termos do art. 4º, considera-se praticado o delito no momento da ação (quando o agente ainda era menor de idade).

TERRITORIALIDADE

Art. 5º - Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional.

§ 1º - Para os efeitos penais, consideram-se como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar.

§ 2º - É também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de proprie-dade privada, achando-se aquelas em pouso no território nacional ou em voo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil.

Existem várias teorias para fixar o âmbito de aplicação da norma penal a fatos cometidos no Brasil:a) Princípio da territorialidade: a lei penal só tem aplicação no território do Estado que a editou, pouco importando a nacio-

nalidade do sujeito ativo ou passivo.b) Princípio da territorialidade absoluta: só a lei nacional é aplicável a fatos cometidos em seu território.c) Princípio da territorialidade temperada: a lei nacional se aplica aos fatos praticados em seu território, mas, excepcional-

mente, permite-se a aplicação da lei estrangeira, quando assim estabelecer algum tratado ou convenção internacional. Foi este o princípio adotado pelo art. 5º do Código Penal.

Abrange todo o espaço em que o Estado exerce sua soberania: solo, rios, lagos, mares interiores, baías, faixa do mar exterior ao longo da costa (12 milhas) e espaço aéreo. Bem como consideram-se extensão do território nacional as embarcações e aeronaves mencionadas nos §§ 1º e 2º do art. 5º do Código Penal.

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O alto-mar não está sujeito à soberania de qualquer Estado. Regem-se, porém, os navios que lá navegam pelas leis nacionais do pavilhão que os cobre; no tocante aos atos civis e criminais a bordo praticados. No tocante ao espaço aéreo, sobre a camada atmos-férica da imensidão do alto-mar e dos territórios terrestres não sujeitos a qualquer soberania, também não existe o império da ordem jurídica de Estado algum, salvo a do pavilhão da aeronave, para os atos nela verificados, quando cruzam esse espaço tão amplo. Assim, cometido um crime a bordo de um navio pátrio em alto-mar, ou de uma aeronave brasileira no espaço livre, vigoram as regras sobre a territorialidade: os delitos assim cometidos se consideram como praticados em território nacional.

Cabe ressaltar ainda o princípio da passagem inocente, onde se um fato cometido a bordo de navio ou avião estrangeiro de propriedade privada, que esteja apenas de passagem pelo território brasileiro, não será aplicada a nossa lei, se o crime não afetar em nada nossos interesses.

LUGAR DO CRIME

Art. 6º - Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado.

Para os crimes de espaço máximo ou a distancia (crimes executados em um país e consumados em outro) foi adotada a teoria da ubiquidade, ou seja, a competência para o julgamento do fato será de ambos os países.

Para os chamados “delitos plurilocais” (ação se dá em um lugar e o resultado em outro dentro de um mesmo país), foi adotada a teoria do resultado (art. 70 do Código de Processo Penal), ou seja, o foro competente é o foro do local do resultado. Nas infrações de competência dos Juizados Especiais Criminais, a Lei 9.099/95 seguiu a teoria da atividade, ou seja, o foro competente é o da ação.

EXTRATERRITORIALIDADE

Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro: I - os crimes: a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da República; b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de Território, de Município, de empresa pública,

sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público; c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço; d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil; II - os crimes: a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir; b) praticados por brasileiro; c) praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, quando em território estrangeiro

e aí não sejam julgados. § 1º - Nos casos do inciso I, o agente é punido segundo a lei brasileira, ainda que absolvido ou condenado no estrangeiro. § 2º - Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do concurso das seguintes condições: a) entrar o agente no território nacional; b) ser o fato punível também no país em que foi praticado; c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição; d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena; e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais

favorável. § 3º - A lei brasileira aplica-se também ao crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil, se, reunidas as

condições previstas no parágrafo anterior: a) não foi pedida ou foi negada a extradição; b) houve requisição do Ministro da Justiça.

A extraterritorialidade é a possibilidade de aplicação da lei penal brasileira a fatos criminosos ocorridos no exterior.

EXTRATERRITORIALIDADE INCONDICIONADA: O art. 7º do CP prevê a aplicação da lei brasileira a crimes cometidos no estrangeiro. São os casos de extraterritorialidade da lei penal.O inciso I refere-se aos casos de extraterritorialidade incondicionada, uma vez que é obrigatória a aplicação da lei brasileira

ao crime cometido fora do território brasileiro.

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As hipóteses contidas no inciso I, com exceção da última (d), são fundadas no princípio de proteção, onde o que impera é a defesa do interesse nacional. Se o interesse nacional foi afetado de algum modo, justifica-se a incidência da legislação pátria.

EXTRATERRITORIALIDADE CONDICIONADA: O inciso II, do art. 7º, prevê três hipóteses de aplicação da lei brasileira a autores de crimes cometidos no estrangeiro. São os casos de extraterritorialidade condicionada, pois dependem dessas condições:

a) Crimes que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir. Utilizou-se o princípio da justiça ou competência uni-versal;

b) Crimes praticados por brasileiro. Tendo o país o dever de obrigar o seu nacional a cumprir as leis, permite-se a aplicação da lei brasileira ao crime por ele cometido no estrangeiro. Trata-se do dispositivo da aplicação do princípio da nacionalidade ou perso-nalidade ativa;

c) Crimes praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, quando em território es-trangeiro e aí não sejam julgados. Inclui-se no Código Penal o princípio da representação.

A aplicação da lei brasileira, nessas três hipóteses, fica subordinada a todas as condições estabelecidas pelo § 2º do art. 7º. De-pende, portanto, das condições a seguir relacionadas:A Entrada do agente no território nacional;Ser o fato punível também no país em que foi praticado. Na hipótese de o crime ter sido praticado em local onde nenhum

país tem jurisdição (alto-mar, certas regiões polares), é possível a aplicação da lei brasileira. Estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradiçãoNão ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais

favorável.

O art. 7º, § 3º, prevê uma última hipótese da aplicação da lei brasileira: A do crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil. É ainda um dispositivo calcado na teoria de proteção, além dos casos de extraterritorialidade incondicionada. Exige o dispositivo em estudo, porém, além das condições já mencionadas, outras duas:Que não tenha sido pedida ou tenha sido negada a extradição (pode ter sido requerida, mas não concedida);Que haja requisição do Ministro da Justiça.

Alguns princípios que devem ser observados para a aplicação da extraterritorialidade:- Nacionalidade ou personalidade ativa: aplica-se a lei brasileira ao crime cometido por brasileiro fora do Brasil. Neste caso o

único critério observado é a nacionalidade do sujeito ativo (art. 7º, II, b, do CP).- Nacionalidade ou personalidade passiva: aplica-se a lei brasileira ao crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do

Brasil. O que importa é a nacionalidade da vítima, mesmo que o crime tenha sido praticado no exterior (art. 7º, §3º).- Real, da defesa ou proteção: aplica-se a lei brasileira ao crime cometido fora do Brasil, que afeta interesse nacional (art. 7º,

I, a, b e c, do CP).- Justiça Universal ou princípio da universalidade: todo Estado tem o direito de punir qualquer crime, seja qual for a naciona-

lidade do delinquente e da vítima ou o local de sua prática, desde que o criminoso esteja dentro de seu território. É como se o planeta se constituísse em um só território para efeitos repressão criminal (art. 7, I, d e II, a, do CP).

- Princípio da representação: a lei penal brasileira também é aplicável aos delitos cometidos em aeronaves e embarcações privadas quando realizados no estrangeiro e aí não venham a ser julgados.

- Princípio da preferência da competência nacional: havendo conflito entre a justiça brasileira e a estrangeira, prevalecerá a competência nacional.

- Princípio da limitação em razão da pena: não será concedida a extradição para países onde a pena de morte e a prisão perpé-tua são previstas, a menos que deem garantias de que não irão aplica-las.

- Jurisdição subsidiária: verifica-se a subsidiariedade da jurisdição nacional nas hipóteses do inciso II e do § 3º do art. 7º do Código Penal. Se o autor de um crime praticado no estrangeiro for processado perante esse juízo, sua sentença preponderará sobre a do juiz brasileiro. Caso o réu seja absolvido pelo juiz territorial, aplicar-se-á a regra do non bis in idem (não permissão da dupla condenação pelo mesmo fato) para impedir o persecutio criminis (art. 7º, § 2º, d, do CP). No entanto no caso de condenação, se o condenado se subtrair à execução da pena, será julgado pelos órgãos judiciários nacionais e, se for o caso, condenado de novo, solu-ção, inclusive, consagrada no art. 7º, §2º, d e e, do Código Penal.

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PENA CUMPRIDA NO ESTRANGEIRO Art. 8º - A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é com-

putada, quando idênticas.

Considerando que, sendo possível a aplicação da lei brasileira a crimes cometidos em território de outro país, ocorrerá também a incidência da lei estrangeira, dispõe o código como se deve proceder para se evitar a dupla posição.

Cumprida a pena pelo sujeito ativo do crime no estrangeiro, será ela descontada na execução pela lei brasileira, quando forem idênticas, respondendo efetivamente o sentenciado pelo saldo a cumprir se a pena imposta no Brasil for mais severa. Se a pena cum-prida no estrangeiro for superior à imposta no país, é evidente que esta não será executada.

No caso de penas diversas, aquela cumprida no estrangeiro atenuará a aplicada no Brasil, de acordo com a decisão do juiz no caso concreto, já que não há regras legais a respeito dos critérios de atenuação que devem ser obedecidos.

EFICÁCIA DE SENTENÇA ESTRANGEIRA

Art. 9º - A sentença estrangeira, quando a aplicação da lei brasileira produz na espécie as mesmas consequências, pode ser homologada no Brasil para:

I - obrigar o condenado à reparação do dano, a restituições e a outros efeitos civis; II - sujeitá-lo a medida de segurança. Parágrafo único - A homologação depende: a) para os efeitos previstos no inciso I, de pedido da parte interessada; b) para os outros efeitos, da existência de tratado de extradição com o país de cuja autoridade judiciária emanou a sentença,

ou, na falta de tratado, de requisição do Ministro da Justiça.

Quanto à eficácia de sentença estrangeira, o Código Penal, em seu art. 9°, em consonância com o art. 105, I, alínea i, da Consti-tuição Federal, prescreve que a sentença estrangeira, quando a aplicação da lei brasileira produz na espécie as mesmas consequências, pode ser homologada no Brasil para: I – obrigar o condenado à reparação do dano, a restituições e a outros efeitos civis; II – sujeitá-lo a medida de segurança.

Essa homologação compete ao Superior Tribunal de Justiça.O fundamento da homologação da sentença estrangeira está no entendimento de que nenhuma sentença de caráter criminal que

emane de autoridade jurisdicional estrangeira terá eficácia em determinado Estado sem o seu consentimento, pois o direito penal é fundamentalmente territorial.

CONTAGEM DE PRAZO

Art. 10 - O dia do começo inclui-se no cômputo do prazo. Contam-se os dias, os meses e os anos pelo calendário comum.

A contagem do prazo penal tem relevância especial nos casos de duração de pena, do livramento condicional, do sursis, da deca-dência, da prescrição, etc., institutos de direito penal.

Contam-se os dias, os meses e os anos pelo calendário comum. Há no caso imprecisão tecnológica; pouco importando se o mês tenha 30 ou 31 dias, ou se o ano é ou não bissexto. O calendário comum a que se refere o legislador tem o nome de “gregoriano”, em contraposição ao juliano, judeu, árabe, etc.

O dia do começo inclui-se no cômputo do prazo. Assim, se uma pena começa a ser cumprida às 23h30min, os 30 minutos restan-tes serão contados como sendo o 1º dia.

O prazo penal distingue-se do prazo processual, pois, neste, exclui-se o 1º dia da contagem, conforme estabelece o art. 798, § 1º, do Código de Processo Penal. Assim, se o réu é intimado da sentença no dia 10 de abril, o prazo para recorrer começa a fluir apenas no dia 11 (se for dia útil).

Os prazos penais são improrrogáveis. Desta forma, se o prazo termina em um sábado, domingo ou feriado, estará ele encerrado. Ao contrário dos prazos processuais que se prorrogam até o 1º dia útil subsequente.

FRAÇÕES NÃO COMPUTÁVEIS DA PENA

Art. 11 - Desprezam-se, nas penas privativas de liberdade e nas restritivas de direitos, as frações de dia, e, na pena de multa, as frações de cruzeiro.

Também se tem entendido que, por analogia com o art. 11, deve ser desprezada a fração de dia multa, como se faz para o dia de pena privativa de liberdade. Extintos o cruzeiro antigo e o cruzado, o novo cruzeiro e o cruzeiro real, o real é a unidade monetária nacional, devendo ser desprezados os centavos, fração da nova moeda brasileira. Ex. pessoa condenada a pagar R$ 55,14 pagará apenas R$ 55,00.

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LEGISLAÇÃO ESPECIAL

Art. 12 - As regras gerais deste Código aplicam-se aos fatos incriminados por lei especial, se esta não dispuser de modo diverso.

Esse dispositivo consagra a aplicação subsidiária das normas gerais do direito penal à legislação especial, desde que esta não trate o tema de forma diferente. Ex.: o art. 14, II, do Código Penal, que trata do instituto da tentativa, aplica-se aos crimes previstos em lei especial, mas é vedado nas contravenções penais, uma vez que o art. 4º da Lei de Contravenções Penais declara que não é punível a tentativa de contravenção.

4. INTERPRETAÇÃO DA LEI PENAL.

A lei preserva, em seu texto, sentidos que variam de acordo com o contexto social, adequando seus princípios às necessidades atuais daquela sociedade. Explicar um texto de lei, ou ainda aclarar seu entendimento é interpretar a lei. Ao realizar a interpretação da lei, chega-se a um resultado pretendido ou querido pelo legislador.

Quando a lei foi criada, houve uma construção de paradigmas, entendimentos, princípios, posições de doutrina e tudo o mais que, em torno de um artigo de lei, se faça necessário para que haja uma valoração de um bem juridicamente protegido. É natural que a sociedade evolua e o entendimento de um dispositivo de lei se modifique, ainda que as palavras nele impressas não mudem. O que se altera é a avaliação sobre aquele artigo de lei e a adequação daquele dispositivo às necessidades sociais.

Caso não houvesse a interpretação da lei, o seu alcance seria muito restrito ou por demais abrangente, inadequado à conjuntura social, que por si só é dinâmica. Em outras palavras: a sociedade evolui e a lei também deve evoluir e quando ela mesma não é alte-rada, deve-se alterar sua interpretação, para que a sociedade não reste desprotegida.

Existem algumas formas de interpretação adotadas pela doutrina nacional, conforme se depreende a seguir: 1. QUANTO AO SUJEITO (ORIGEM):- Interpretação Autêntica ou Legislativa: a interpretação é realizada pelo próprio texto de lei. Não vincula o sujeito, porque não

esgota matéria. É realizada pelo mesmo órgão da qual emana a lei, ou seja, o legislador edita uma nova lei cm o objetivo de aclarar o sentido e o alcance de uma disposição já existente.

- Interpretação Doutrinária: é o tipo de interpretação que os estudiosos da ciência do Direito dão para determinados temas jurídicos. São posições intelectuais acerca de assuntos debatidos em textos de livros, artigos de revista, posicionamentos científicos.

- Interpretação Jurisprudencial ou judicial: realizada através da análise de decisões reiteradas sobre determinado tema. A interpretação jurisprudencial vincula o sujeito, porquanto haja, em súmula vinculante, a necessidade de se ater ao seu conteúdo de maneira fidedigna.

2. QUANTO AO MODO- Literal ou gramatical: considera como parâmetro interpretativo o sentido literal das palavras. Pela literalidade da lei é possível

extrair-se um entendimento do que se exija na dicção da lei.- Teleológica: através da interpretação teleológica, o aplicador indaga a intenção do legislador, a vontade da lei propriamente

dita.- Histórica: é fruto de uma construção e de um posicionamento em dado momento histórico.- Sistemática: interpreta-se em conjunto com toda a legislação em vigor, ou com os princípios gerais de Direito, ou ainda com

toda a doutrina existente no caso. É sistemática, porquanto reúne diversificadas fontes para a completude de seu sentido. - Progressiva: interpreta-se considerando o progresso da ciência (medicina, informática). 3. QUANTO AO RESULTADO:- Declarativa: a letra da lei corresponde exatamente à intenção do legislador no momento da sua criação.- Restritiva: deve-se reduzir o alcance da palavra da lei, para que a intenção do legislador seja alcançada pelo aplicador.- Extensiva: amplia-se o alcance da palavra da lei para corresponder à intenção do legislador. Nesse caso, o alcance da palavra

é ampliado, para que o tipo penal não fique sem aplicação.- Analógica: na interpretação analógica, o significado que se busca é extraído do próprio dispositivo, porque existe uma norma

para ser aplicada ao caso concreto, no entanto são levadas em consideração expressões genéricas e abertas utilizadas pelo legislador.

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NOÇÕES DE DIREITO PENAL

INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA x INTERPRETAÇÃO ANALÓGICA

A interpretação extensiva não se confunde com a interpretação analógica; na interpretação analógica, o significado que se busca é extraído do próprio dispositivo, pois existe norma a ser aplicada ao caso concreto, levando em conta as expressões genéricas e abertas consideradas pelo legislador. Em ambos os tipos de interpretação já existem normas para o caso concreto, mas na extensiva amplia--se o alcance da expressão, já na analógica o legislador exemplifica e, ao final, fecha a expressão de forma genérica, permitindo ao julgador encontrar outros exemplos.

As hipóteses de interpretação acima expostas não se confundem com a ANALOGIA, que é regra de INTEGRAÇÃO, não inter-pretação. Na analogia, o recurso é diferente: não existe uma norma a ser aplicada ao caso concreto, portanto a integração da norma é realizada, visualizando-se o que o legislador estipulou para outro caso similar.

Embora haja uma minoria doutrinária em defesa da proibição da analogia de maneira abrangente, a maioria entende que a analo-gia é possível no direito penal sim, desde que não incriminadora e a favor do réu. É a chamada Analogia “in bonam partem”.

5. INFRAÇÃO PENAL: ESPÉCIES.

Crime, em sentido amplo, é a ação ou omissão, imputável a pessoa, lesiva ou perigosa a interesse penalmente protegido, constituída de determinados elementos e eventualmente integrada por certas condições ou acompanhada de determinadas circunstâncias previstas em lei. É a violação de um bem penalmente protegido.

Para que haja crime, é preciso uma conduta humana positiva ou negativa. Nem todo comportamento do homem, porém, constitui delito, em face do princípio da reserva legal. Logo, somente aqueles previstos na lei penal é que podem configurar o delito.

Pode-se dizer, portanto, que o primeiro requisito do crime é o fato típico (previsto em lei). Contudo, não basta que o fato seja típico, é preciso que seja contrário ao direito: antijurídico. Isto porque, embora o fato seja típico, algumas vezes é considerado lícito (Exemplo: Legítima defesa). Logo, excluída a antijuridicidade, não há crime.

Quando utilizamos a expressão infração penal esta engloba tanto o crime (ou delito), como a contravenção penal. Assim, o crime e a contravenção penal são espécies do gênero infração penal.

- Crime: pena sempre de reclusão ou detenção, cumulada ou não com multa. Tem caráter repressivo, situando o Direito somente após a ocorrência do dano a alguém. Ex.: alguém, conduzindo imprudentemente um veículo, atropela outrem e lhe causa ferimentos.

- Contravenção (Lei nº 3.688/41): prisão simples e multa ou só multa. Caráter preventivo, visando a Lei das Contravenções Penais a coibir condutas conscientes que possam trazer prejuízo a alguém. Ex.: omissão de cautela na guarda ou condução de animais.

ESTRUTURA DO CRIME

A estrutura do crime, bem como de seus requisitos, sofre profunda diferenciação de acordo com a teoria que se adote em relação à conduta, que é o primeiro elemento componente do fato típico. Assim, uma vez adotada a teoria clássica (causal ou naturalista), a teoria finalista da ação, ou a teoria constitucionalista do delito, haverá grandes divergências acerca do significado dos temas que envolvem a conduta, dolo, culpa e culpabilidade.

TEORIA TRIPARTITE – Corrente Majoritária:→Fato típico→Antijurídico→Culpável

A conduta é tratada como simples exteriorização de movimentos ou abstenção de comportamento, desprovida de qualquer fina-lidade. Corresponde a teoria clássica (causal ou naturalista), que teve sua origem no tratado de Fraz von Liszt.

Para essa teoria o crime tem a seguinte estrutura:1) Fato típico, que tem o seguintes elementos:a) conduta (na qual não interessa a finalidade do agente);b) resultado;c) nexo causal;d) tipicidade.

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2) Antijuridicidade. Cometido um fato típico presume-se ser ele antijurídico, salvo se ocorrer uma das causas excludentes de ilicitude previstas na lei.

3) Culpabilidade, composta pelos seguintes elementos:a) Imputabilidade;b) Exigibilidade de conduta diversa;c) Dolo e culpa.

O dolo é normativo, possuindo os seguintes requisitos:- Consciência da conduta e do resultado; - Consciência do nexo de causalidade;- Consciência da antijuridicidade;- Vontade de realizar a conduta e produzir o resultado.

Observações:*A culpabilidade é limite e fundamento de aplicação da pena.*O inimputável não comete crime, mas pode receber Medida de Segurança.

TEORIA BIPARTITE – Corrente Minoritária:→Fato típico→Antijurídico

A conduta é o comportamento humano, voluntário e consciente (doloso ou culposo) dirigido a uma finalidade. Corresponde à teoria finalista que teve origem com Hans Weltel.

O crime, para essa teoria, é um fato típico e antijurídico e, em suma, tem a seguinte estrutura:

1) Fato típico, que possui os seguintes elementos:a) conduta dolosa ou culposa. O dolo é natural, pois deixa de integra a culpabilidade, passando a integrar o fato típico, tendo

apenas os seguintes elementos:- Consciência da conduta e do resultado;- Consciência do nexo causal;- Vontade de realizar a conduta e provocar o resultado.

b) resultadoc) nexo causald) tipicidade

2) Antijuridicidade. Não houve modificações em relação à teoria clássica.

A culpabilidade, que não é requisito do crime, é composta dos seguintes elementos:a) imputabilidadeb) exigibilidade de conduta diversa;c) potencial consciência da ilicitude.

Observações:*A culpabilidade é pressuposto de aplicação da pena.*O inimputável comete crime, mas não tem culpabilidade, não tendo pena e sim Medida de Segurança.Importante: O inimputável é absolvido nas duas correntes, aplicando não pena, mas, Medida de Segurança.

Classificação dos CrimesClassificar os crimes significa reuni-los em grupos que contam com determinada característica idêntica. Por exemplo, a categoria

dos crimes instantâneos reúne todas as infrações penais que se consumam em um momento determinado. Como cada crime conta com diversos aspectos, também poderá ser incluído simultaneamente em diversas classificações. Dessa maneira, o homicídio é cri-me comum no tocante à qualificação do sujeito ativo e crime material quanto ao resultado naturalístico. A seguir, serão expostas as principais classificações.

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- Quanto ao momento da consumação:Crimes instantâneos são aqueles em que a consumação acontece em um momento determinado, único; não importando a

quantidade de atos cometidos. Ex: a lesão corporal (art. 129) se consuma no momento em que a integridade física ou a saúde da vítima é atingida.

Crimes permanentes ou contínuos são aqueles em que a consumação se prolonga no tempo de acordo com a vontade do agente. Ex: extorsão mediante sequestro (art. 159), que ocorre enquanto a vítima estiver sob o poder do sequestrador. De acordo com Gui-lherme de Souza Nucci, existem dois critérios para a identificação do crime permanente:

a) o bem jurídico afetado é imaterial (Ex: saúde pública, liberdade individual, etc);b) normalmente é realizado em duas fases, a primeira, comissiva, e a segunda, omissiva (sequestra-se uma pessoa através de uma

ação, mantendo-a no cativeiro por omissão). Nos crimes instantâneos de efeitos permanentes a consumação ocorre em um momento determinado, mas seus efeitos permane-

cem no tempo. Ex: o homicídio (art. 121) se consuma no momento da morte da vítima, mas sua consequência é irreversível.

- Quanto à conduta As condutas proibidas pela lei penal podem ser positivas ou negativas, ou seja, constituem uma ação ou uma omissão. Via de regra, a lei exige para a configuração do crime um comportamento ativo do agente: matar, no homicídio (art. 121); sub-

trair, no furto (art. 155); lesionar, na lesão corporal (art. 129). Esses crimes são chamados de comissivos. Porém, em algumas ocasiões a lei proíbe condutas negativas, ou seja, para a ocorrência do crime é necessária à omissão de um

comportamento que o agente poderia e deveria fazer. Se esse dever de agir de referir à generalidade das pessoas, teremos o crime omissivo próprio, puro ou simples. Nesse caso,

temos um crime de mera conduta: basta à ausência de ação para a consumação do crime, que ocorre no primeiro momento em que o agente poderia agir e não agiu. O crime omissivo próprio também é crime de perigo, por isso, sua existência independe da ocorrência de dano. Ex: a omissão de socorro (art. 135) se consuma no primeiro momento em que o agente poderia socorrer a pessoa em perigo e não o faz. O crime estará consumado mesmo que ele mude de ideia e volte posteriormente para socorrer a vítima e mesmo que a vítima não sofra nenhuma lesão.

Existem situações em que o agente tem o dever de evitar o resultado lesivo ao bem jurídico protegido, assumindo o papel de garantidor da não ocorrência da lesão. Nesses casos, temos os crimes omissivos impróprios, qualificados, comissivos por omissão ou comissivo-omissivos. A posição de garantidor pode ocorrer nas seguintes situações previstas no art. 13, § 2º:

a) o agente tem a obrigação legal de cuidado, proteção e vigilância (ex: pais com relação aos filhos menores);b) quem assumiu a responsabilidade de evitar o resultado (ex: salva-vidas com relação aos banhistas em uma piscina);c) quem criou o risco de ocorrência do resultado (ex: causador de um incêndio com relação às vítimas deste). Os crimes omissi-

vos impróprios não estão previstos expressamente na lei, utilizando-se da definição típica dos crimes comissivos. São crimes mate-riais, pois sempre requerem a existência de um resultado naturalístico.

Parte da doutrina considera que existem também os crimes omissivos por comissão: existe uma ordem legal de atuar, mas o agente impede que outrem execute essa ordem. Ex: marido impede a intervenção médica que salvaria a vida da mulher. Tal como nos crimes comissivos, existe nexo causal entre a conduta e o resultado e é possível a tentativa.

Por fim, denominam-se crimes de conduta mista aqueles que têm uma fase inicial positiva e uma posterior omissão. Ex: apro-priação indébita de coisa achada (art. 169, parágrafo único): o agente primeiramente se apodera da coisa achada (conduta comissiva) e posteriormente deixa de devolvê-la no prazo de quinze dias (conduta omissiva).

- Quanto ao resultado naturalístico Todos os crimes lesionam ou põem em risco bens jurídicos. Esse é o resultado jurídico ou normativo, indispensável na consu-

mação de todos os crimes. Alguns crimes têm como consequência outra espécie de resultado, denominado naturalístico: é a modificação da realidade física.

Tais crimes só se consumam se ocorrer essa alteração material, por isso são conhecidos como crimes materiais ou de resultado. Assim, o homicídio se consuma dom a morte da vítima e o furto com a retirada do bem da posse da vítima. Só se pode falar em nexo de causalidade entre a conduta e o resultado (CP, art. 13) nos crimes materiais.

Os crimes formais se consumam com a simples prática da conduta prevista em lei. O resultado, apesar de também ser previsto em lei, é dispensável para a consumação do crime e configura mero exaurimento dele. Por isso, são chamados também de crimes de consumação antecipada. Assim, a concussão (art. 316) se consuma com a exigência, pelo funcionário público, de vantagem indevida. O efetivo recebimento da vantagem é mero exaurimento do crime que apenas influi na fixação da pena. A distinção entre consumação e exaurimento é essencial quando se trata de prisão em flagrante, que só é possível no momento da consumação. No exemplo acima, o funcionário público só pode ser preso em flagrante no momento da exigência, nunca no recebimento do valor indevido.

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NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Os crimes de mera conduta ou de simples atividade também se consumam com a simples prática do ato. Ao contrário dos crimes formais, não chega a haver previsão legal de qualquer resultado naturalístico. Desse modo, a calúnia (art. 138) afeta a honra objetiva da vítima (bem jurídico), mas não modifica a realidade física. Todos os crimes omissivos próprios (tratados no próximo item) são delitos de mera conduta. Os crimes de mera conduta são uma subdivisão dos crimes formais e por isso também são chamados de crimes puramente formais. A jurisprudência costuma utilizar indistintamente os dois termos.

- Quanto ao momento da proteção ao bem jurídico A função primordial do Direito Penal é proteger os bens jurídicos considerados essenciais para a sociedade e os indivíduos (vida,

liberdade, patrimônio, honra etc). Para isso, são cominadas penas àqueles que lesam esses bens. Assim, quem pratica homicídio (art. 121) lesa o bem jurídico “vida” e deve receber uma pena que varia entre 6 e 30 anos. Os crimes de dano constituem a generalidade dos casos e só se consumam com a efetiva lesão ao bem protegido.

Porém, em determinadas situações, a lei penal antecipa a proteção aos bens jurídicos incriminando as condutas que simplesmente colocam em risco esses bens. Para a configuração do crime, a lei requer apenas a probabilidade de dano e não a sua ocorrência efetiva. Trata-se dos crimes de perigo, que se dividem em:

a) Crimes de perigo concreto: só se caracterizam se houver, no caso, a comprovação do risco ao bem protegido. O tipo penal requer a exposição a perigo da vida ou da saúde de outrem. Ex: crime de maus-tratos (art. 136).

b) Crimes de perigo abstrato ou presumido: o risco ao bem jurídico protegido é presumido de modo absoluto (presunção juris et de jure) pela norma, não havendo necessidade de sua comprovação no caso concreto. Ex: omissão de socorro (art. 135). Parte da doutrina considera que os crimes de perigo abstrato são inconstitucionais, por violarem os princípios da lesividade e da intervenção mínima.

c) Crimes de perigo individual: são aqueles que colocam em risco bens jurídicos de pessoas determinadas. Estão previstos nos artigos 130 a 137 do CP.

d) Crimes de perigo comum ou coletivo: colocam em risco número indeterminado de pessoas. Estão previstos nos arts. 250 a 259 do CP.

e) Crimes de perigo atual e de perigo iminente: o Código Penal utiliza tais expressões nos arts. 24 (estado de necessidade - perigo atual) e 132 (perigo para a vida ou a saúde de outrem - perigo iminente). Porém, tal distinção é equivocada, pois o perigo é sempre atual, iminente só pode ser o dano. Não é possível precisar a situação imediatamente anterior ao risco. Nesse sentido o ma-gistério de Guilherme de Souza Nucci:

“O perigo iminente é uma situação quase impalpável e imperceptível (poderíamos dizer, penalmente irrelevante), pois falar em perigo já é cuidar de uma situação de risco, que é imaterial, fluida, sem estar claramente definida. Se o perigo atual é um risco de dano, perigo iminente é a possibilidade de colocar uma pessoa em estágio imediatamente anterior àquele que irá gerar o risco de dano, ou seja, sem a concretude e a garantia exigidas pelo Direito Penal.”

- Quanto ao sujeito ativo Crimes comuns são aqueles que podem ser cometidos por qualquer pessoa, não havendo necessidade de qualificação especial.

Exs: homicídio, lesão corporal e furto. Crime Político é aquele que lesa, ou pode lesar, a soberania, a integridade, a estrutura constitucional ou o regime político do

Brasil. É a infração que atinge a organização do Estado como um todo, minando os fundamentos dos poderes constituídos. Ex.:O crime contra a segurança externa do Estado constitui crime político.

Os crimes próprios ou especiais só podem ser cometidos por pessoas que contem com determinada qualificação. De acordo com Damásio Evangelista de Jesus, essa qualificação pode ser «jurídica (acionista, funcionário público); profissional (comerciante, empregador, empregado, médico, advogado); de parentesco (pai, mãe, filho); ou natural (gestante, homem)”. Assim, o auto- aborto (CP, art. 124) só pode ser cometido pela gestante e o infanticídio (art. 123) é praticado pela mãe.

Os crimes funcionais são uma espécie de crimes próprios, pois só podem ser cometidos por funcionários públicos, tal como definidos no art. 327 do Código Penal. Crimes funcionais próprios são aqueles cuja ausência da qualidade de funcionário público torna o fato atípico (ex: prevaricação - art. 319). Já nos crimes funcionais impróprios ou mistos, a ausência dessa qualidade faz com que o fato seja enquadrado em outro tipo penal (ex: concussão - art. 316; se o sujeito ativo não for funcionário público, o crime é de extorsão - art. 158).

Os crimes de mão própria ou de atuação especial só podem ser cometidos pessoalmente pelo sujeito ativo, sem a possibilidade de que terceiro aja em seu lugar. Existe a possibilidade de participação, mas não de coautoria. Assim, somente a testemunha em pessoa pode ser autora do crime de falso testemunho (art. 342), não podendo pedir que terceiro o faça em seu lugar, mas o terceiro pode influenciá-la a mentir, respondendo pelo crime como partícipe. Diferenciam-se dos crimes próprios, em que o sujeito ativo específico pode utilizar-se de outra pessoa em sua execução. Ex: o funcionário público pode determinar a um particular que cometa o crime de peculato (art. 312).

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- Quanto ao bem jurídico tuteladoa) Crime simples: protegem um único bem jurídico. Ex.: no furto, protege o patrimônio.b) Crime complexo: surgem quando há fusão de dois ou mais tipos penais, ou quando o tipo penal funciona como qualificadora

de outro. A norma penal tutela dois ou mais bens jurídicos. Ex.: no latrocínio (art. 157, §3) é um roubo qualificado pela morte e, assim, atinge também dois bens jurídicos, o patrimônio e a vida.

- Quanto à espécie de pena:A Constituição prevê em seu art. 5º, XLVI, um rol de penas a serem impostas àqueles que cometem infrações penais: privação ou

restrição de liberdade, perda de bens, multa, prestação social alternativa e suspensão ou interdição de direitos. Considerando que esse rol é exemplificativo, ao legislador cabe cominar as penas que considerar mais convenientes, devendo somente se ater às vedações constantes do 5º, XLVII: pena de morte (salvo em caso de guerra declarada), de caráter perpétuo, de trabalhos forçados, de banimento e cruéis.

Considerando as penas aplicáveis, o art. 1º da Lei de Introdução ao Código Penal (Decreto-Lei 2.848 /1940) definiu a divisão básica das infrações penais: crimes (ou delitos) e contravenções (ou crimes-anões). Aos crimes são cominadas as penas de reclusão e detenção, cumuladas ou não com multa, enquanto que a pena das contravenções poderia ser de prisão simples ou de multa, aplicadas isolada ou cumulativamente.

- Quanto ao potencial ofensivo Crimes de bagatela são aquelas condutas que atingem o bem jurídico protegido de modo tão desprezível que a lesão é considerada

insignificante (exs: subtração de uma maçã em uma rede de supermercados ou um arranhão que cicatriza em poucos minutos). Nesses casos, torna-se desproporcional qualquer atuação repressiva, considerando-se o fato cometido como um indiferente penal.

As infrações penais de menor potencial ofensivo são definidas na Lei de Juizados Especiais (art. 61 , com a redação dada pela Lei 11.313 , de 28 de junho de 2006) como sendo todas as contravenções e os crimes cujo pena máxima não ultrapasse dois anos. Para esses crimes se aplicam na íntegra os institutos despenalizantes da lei, como a composição dos danos civis (arts. 72 a 75), transação penal (art. 76) e suspensão condicional do processo (art. 89).

As infrações penais de médio potencial ofensivo são aquelas que admitem suspensão condicional do processo, pois têm pena mínima igual ou inferior a um ano, mas são julgados pela Justiça Comum, já que sua pena máxima é superior a dois anos. Exs: furto simples (art. 155, caput) e injúria qualificada pelo preconceito (art. 140, 3º).

Crimes de alto potencial ofensivo são aqueles cuja pena mínima é superior a um ano, não sendo cabível a suspensão condicional do processo. Aplica-se na totalidade os institutos do Código Penal.

Crimes hediondos são aqueles considerados de altíssimo potencial ofensivo e por isso o réu e o condenado sofrem diversas restrições no curso do processo e do cumprimento da pena. De acordo com a Lei nº 8.072 de 25 de julho de 1990, são considerados hediondos os seguintes crimes: homicídio, quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado; latrocínio; extorsão qualificada pela morte; extorsão mediante sequestro; estupro; atentado violen-to ao pudor; epidemia com resultado morte; falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais e genocídio. Os crimes equiparados a hediondos têm o mesmo tratamento legal e são os seguintes: prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo.

- Quanto ao elemento subjetivo (moral):a) doloso: quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo (art. 18, I). Pode ser, dolo eventual, genérico ou

específico.b) culposo: quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia (art 18, II). A culpa é a violação

do dever de cuidado, que é o dever que todas as pessoas devem ter. É o dever imposto às pessoas de razoável diligência.c) preterdoloso: dolo no antecedente, culpa no resultado. O agente alcança um resultado mais grave do que queria. Por exemplo,

art. 129 § 3º - lesão corporal seguido de morte.d) qualificado pelo resultado: ocorrem quando o legislador, após descrever uma figura típica fundamental, acrescenta um resul-

tado que tem por finalidade aumentar a pena. Dolo + dolo. Exemplo: art. 121 § 2º.

- Quanto à completa realizaçãoa) consumado (art. 14, I): quando alcança o resultado, ou seja, quando o sujeito realiza a descrição da conduta física. Pelo prin-

cípio da alternatividade, se realizou um verbo ou outro da conduta já é suficiente para configurar a tipicidade.b) tentado (art. 14, II): quando, por circunstâncias alheias à vontade do agente, o crime não ocorre.c) Desistência voluntária: quando o autor da conduta, por fato inerente à sua vontade, não comete a conduta ou desiste dela. O

autor responde pelos atos praticados. Dica: é o arrependimento do que está fazendo (art. 15).d) Arrependimento eficaz: é o arrependimento do que já fez. Por exemplo: atira em uma pessoa e se arrepende, levando a vítima

para ser socorrida a tempo de sobreviver.e) Arrependimento posterior: só é possível nos casos de crime sem violência ou grave ameaça e até o recebimento da denúncia

ou queixa, por parte do Ministério Público; reparar o dano ou restituir a coisa.f) Crime impossível: quando, por absoluta ineficácia do meio empregado ou absoluta impropriedade do objeto, é impossível

consumar o crime.

Didatismo e Conhecimento 15

NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Obs.: há crimes que não possuem o tipo tentado, por exemplo, os crimes culposos e os unissubsistentes;- Quanto ao fracionamento da conduta:Crimes Unissubsistente - não tem como fragmentar essa conduta; ela ocorre em um único momento. Por exemplo: injúria (art

140).Crimes Plurissubsistente - comportamento fragmentado; percebe-se claramente as fases do iter criminis.

- Outras definições de crime:Crimes unissubjetivos (ou monossubjetivos, ou de concurso eventual): são aqueles que podem ser praticados por apenas um

sujeito, entretanto, admite-se a coautoria e a participação.Crimes plurissubjetivos (ou de concurso necessário): são aqueles que exigem dois ou mais agentes para a prática do delito em

virtude de sua conceituação típica. Eles subdividem-se em três espécies de acordo com o “modus operandi”: crimes de condutas paralelas (quando há colaboração nas ações dos sujeitos); crimes de condutas convergentes (onde as condutas encontram-se so-mente após o início da execução do delito, pois partem de pontos opostos) e crimes de condutas contrapostas (onde as condutas desenvolvem-se umas contra as outras).

Crimes de dupla subjetividade passiva: quando dois sujeitos são afetados com o mesmo ato; possui pluralidade de vítimas. Ex.: violação de correspondência, previsto no artigo 151 do Código Penal, apresenta duas vítimas, quais sejam, o destinatário e o reme-tente.

Crimes progressivos: ocorrem quando o sujeito, para alcançar um resultado mais grave, comete um crime menos grave. Ex.: para causar a morte da vítima, o agente necessariamente tem de lesioná-la.

Crime simples: como ele é definido no código penal.Crime privilegiado: crime com atenuantes, o legislador estabelece circunstâncias que tem o condão de reduzir a pena.Crime qualificado: crime com agravantes que alteram a pena para patamar mais elevado.Crime de ação múltipla: o que tem mais de um verbo/núcleo, por exemplo: tráfico (portar, guardar, vender...).Crime principais: são aqueles que não dependem de qualquer outra infração penal para que se configurem. Ex.: homicídio, furto etc.Crime acessórios: são aqueles que pressupõe a ocorrência de um delito anterior. Ex.: receptação (art. 180), que só se configura

quando alguém adquire, recebe, oculta, conduz ou transporta coisa que sabe ser produto de (outro) crime.Delito Putativo: dá-se quando o agente imagina que a conduta por ele praticada constitui crime, mas, em verdade, é um fato

atípico.

6. SUJEITO ATIVO E SUJEITO PASSIVO DA INFRAÇÃO PENAL.

Sujeito ativo

No Direito Penal, sujeito ativo é quem pratica a conduta (ação ou omissão) criminosa. Há de ser o crime uma ação humana, afirma Cezar Roberto Bitencourt – em Tratado de Direito Penal – Volume 1 Parte Geral (p. 286), que tenha como sujeito ativo o ser vivo nascido de mulher, “embora em tempos remotos tenham sido condenados, como autores de crimes, animais, cadáveres e até estátuas”.

A pedra angular da Teoria do Delito, analisa Bitencourt (p. 286), é a conduta (ação ou omissão), algo exclusivo do ser humano: “A capacidade da ação, de culpabilidade, exige a presença de uma vontade, entendida como faculdade psíquica da pessoa individual, que somente o ser humano pode ter.”

O sujeito ativo é a pessoa definida na norma como possível autora do ilícito penal e que é, via de regra, pessoa física. “Sujeito ativo, autor, ou agente, é todo aquele que realiza a ação ou omissão típica, nos delitos dolosos ou culposos. Ou seja, é aquele cuja atividade é subsumível ao tipo legal incriminador”, define Luiz Régis Prado, em Curso de Direito Penal Brasileiro – Volume 1 Parte Geral (p. 258).

“O conceito abrange não só aquele que pratica o núcleo da figura típica (quem mata, subtrai etc.), como também o partícipe, que colabora de alguma forma na conduta típica, sem, contudo, executar atos de conotação típica, mas que de alguma forma, subjetiva ou objetivamente, contribui para a ação criminosa”, complementa Fernando Capez, em Curso de Direito Penal – parte geral Volume 1 (p. 167).

Didatismo e Conhecimento 16

NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Conforme a posição no processo, ensina Capez (p. 168), o sujeito ativo pode ser chamado de agente (art. 14, II, do Código Penal), indiciado (art. 5º, § 1º, b, do Código de Processo Penal), acusado (art. 185, CPP), denunciado, querelado (art. 51, CPP), réu (art. 34, CP; art. 188, CPP), sentenciado, condenado (art. 34, CP), recluso, ou detento. Quando estudado pelas ciências criminais, é criminoso ou delinquente.

Complementam Paulo José da Costa Júnior e Fernando José da Costa, em Curso de Direito Penal (p. 115): “Por vezes, o sujeito--agente deverá ser qualificado, ocupando determinada posição social, ou dotado de certo status, como por exemplo ser funcionário público no peculato, cônjuge na bigamia, ou desfrutar de determinada situação fática, como a mulher grávida no aborto. Nessas hipó-teses apresenta-se a figura do crime-próprio, que se contrapõe àquela do crime comum, que pode ser praticado por qualquer pessoa, qualificada ou não. Costuma-se distinguir o crime próprio exclusivo, em que a execução importa na intervenção pessoal do agente designado pela lei, do crime próprio não exclusivo, que admite a figura do extraneus (estranho, terceiro), que age em concurso com o sujeito qualificado.”

Cabe fazer alguns adendos, ainda no tocante ao assunto sujeito ativo, em termos de Direito Penal. É autor quem realiza ou exe-cuta o núcleo do tipo penal. O coautor realiza conjuntamente a conduta criminosa com o autor. O partícipe colabora com o crime sem realizar ou executar o núcleo do tipo. O partícipe moral faz nascer a ideia (induz) ou reforça a ideia para realizar o ato criminoso.

Sujeito passivo

O sujeito passivo do crime – o ofendido, ou vítima – é “titular do bem jurídico tutelado pela norma penal, que vem a ser ofendido pelo crime”, ensinam Paulo José da Costa Júnior e Fernando José da Costa (p. 115). O Estado é o sujeito passivo constante de todo o crime pelo fato de a Lei Penal situar-se no ramo predominantemente público, enquanto a pessoa que teve o bem diretamente atingido pelo crime é o sujeito passivo variável.

Também não se pode confundir sujeito passivo do crime com sujeito passivo da ação, alertam Paulo José da Costa Júnior e Fernando José da Costa, visto que sujeito passivo da ação é aquele sobre o qual recai materialmente a ação ou omissão criminosa. “Também não se confunde o sujeito passivo com aquele que suporta o dano. No homicídio, sujeito passivo é o morto; sofrem o dano os familiares. Assume relevo o sujeito passivo sob diversas angulações, inclusive qualificando o interesse jurídico tutelado, como no crime de desacato, que constitui hipótese particular de injúria caracterizada pelo fato de que o ofendido é um funcionário público (art. 331 do CP).” (p. 115)

Em resumo: Sujeito passivo constante (geral, genérico, formal, mediato, ou indireto) é o Estado, titular do “jus puniendi”. Sujeito passivo variável (particular, material, acidental, eventual ou direto) é a pessoa física (crimes contra a pessoa, por exemplo) ou jurídica (crimes contra o patrimônio, por exemplo) vítima da lesão ou ameaça de lesão. O sujeito passivo também pode ser indeterminado (coletividade – crimes contra a saúde pública - e família, por exemplo).

Podem ser sujeitos passivos o nascituro, o incapaz e o Estado (crimes contra a administração pública, por exemplo). Não podem ser sujeitos passivos, no âmbito criminal, o animal, a planta e o ser inanimado. Explica melhor Luiz Régis Prado (p. 258-259): “Po-dem figurar como sujeitos passivos – vítimas, ofendidos -, a pessoa física ou o indivíduo, mesmo incapaz, o conjunto de indivíduos, a pessoa jurídica, a coletividade, o Estado ou a comunidade internacional, de acordo com a natureza do delito. Tem crescido de im-portância, no campo político-criminal, o papel da vítima na realização do delito. Nesse particular aspecto, encaminha-se para uma constante busca do ponto de equilíbrio entre liberdade individual e defesa social.”

Importante não confundir sujeito passivo com objeto material do crime ou objeto material da conduta, alerta Prado (p. 259), que é “parte do mundo exterior (pessoa ou coisa) sobre a qual recai a ação ou omissão típica e ilícita”.

Didatismo e Conhecimento 17

NOÇÕES DE DIREITO PENAL

7. TIPICIDADE, ILICITUDE, CULPABILIDADE, PUNIBILIDADE. 8. EXCLUDENTES DE ILICITUDE E

DE CULPABILIDADE.

O fato típico é o primeiro requisito do crime. Consiste no fato que se amolda no conjunto de elementos descritivos contidos na lei penal.

ELEMENTOS DO FATO TÍPICO

O fato típico é composto dos seguintes elementos:- conduta dolosa ou culposa;- resultado (nos crimes materiais);- nexo de causalidade entre a conduta e o resultado (nos crimes materiais);- tipicidade (enquadramento do fato material a uma norma penal).CONDUTAS E ATOS: conduta é a materialização da vontade humana, que pode ser executada por um único ou por vários

atos. O ato, portanto, é apenas uma parte da conduta. Ex.: é possível matar a vítima (conduta) por meio de um único ato (um disparo mortal) ou de vários atos (vários golpes no corpo da vítima).

-Formas de conduta: a) Ação (comportamento positivo): fazer, realiza algo. Nessa hipótese, a lei determina um não fazer, e o agente comete o delito

justamente por fazer o que a lei proíbe.b) Omissão (comportamento negativo): abstenção, um não fazer. A omissão por sua vez, pode dar origem a duas espécies de

crimes:b1) Omissivos próprios ou puros: nos quais inexiste um dever jurídico de agir, ou seja, não há uma norma impondo um dever

de fazer. Assim, só existirá essa espécie de delito omissivo quando o próprio tipo penal descrever uma conduta omissiva. Ex.: crime de omissão de socorro (art. 135).

b2) Omissivos impróprios ou comissivos por omissão: são aqueles para os quais a lei impõe um dever de agir e, assim, o não agir constitui crime, na medida em que leva à produção de um resultado que o agir teria evitado. Ex.: a mãe deixa de alimentar seu filho causando-lhe a morte, responde por homicídio.

DO RESULTADO: o resultado é a modificação do mundo exterior provocada pela conduta do agente.-Teoria sobre o resultado:a) Naturalística: é a modificação que o crime provoca no mundo exterior. Pode consistir em morte, como em crime de homicídio

(art. 121). Para essa teoria, é possível que haja crime sem resultado, como nos crimes de mera conduta.b) Jurídica ou normativa: é o efeito que o crime produz na órbita jurídica, ou seja, a lesão ou o perigo de lesão de um interesse

protegido pela lei. Por essa teoria não há crime sem resultado, pois, sem lesão (ou perigo de lesão) ao interesse tutelado, o fato seria um irrelevante penal.

NEXO CAUSAL: é a relação natural de causa e efeito existente entre a conduta do agente e o resultado dela decorrente. Nos crimes materiais somente existe a configuração do delito quando fica evidenciado que a conduta do agente provocou o re-

sultado, ou seja, quando fica demonstrado o nexo causal.Nos crimes formais e nos crimes de mera conduta não se exige o nexo causal, uma vez que esses crimes dispensam a ocorrência

de qualquer resultado naturalístico e, assim, não há que se pensar em nexo de causalidade entre a conduta e resultado.

RELAÇÃO DE CAUSALIDADE

Art. 13 - O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.

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NOÇÕES DE DIREITO PENAL

No campo penal, a doutrina aponta três teorias a respeito da relação de causalidade:a) Da equivalência das condições ou equivalência dos antecedentes ou conditio sine que non: Segundo a qual quaisquer das

condutas que compõem a totalidade dos antecedentes é causa do resultado, como, por exemplo, a venda lícita da arma pelo comer-ciante que não tinha ideia do propósito homicida do criminoso comprador. Contudo, recebe críticas por permitir o regresso ao infinito já que, em última análise, até mesmo o inventor da arma seria causador do evento, visto que, se arma não existisse, tiros não haveria;

b) Da causalidade adequada: Considera causa do evento apenas a ação ou omissão do agente apta e idônea a gerar o resultado. Segundo o que dispõe essa corrente, a venda lícita da arma pelo comerciante não é considerada causa do resultado morte que o com-prador produzir, pois vender licitamente a arma, por si só, não é conduta suficiente a gerar a morte.

c) Da imputação objetiva: Pela qual, para que uma conduta seja considerada causa do resultado é preciso que: 1) o agente tenha, com sua ação ou omissão, criado, realmente, um risco não tolerado nem permitido ao bem jurídico; ou 2) que o resultado não fosse ocorrer de qualquer forma, ou; 3) que a vítima não tenha contribuído com sua atitude irresponsável ou dado seu consentimento para a ocorrência do resultado.

A teoria adotada pelo Código Penal: “O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido”.

Ao dispor que causa é a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido, nota-se que Código adotou a teoria da equi-valência das condições ou conditio sine qua non.

Para se aferir se determinada conduta é causa ou não de um resultado, deve-se fazer o juízo hipotético de eliminação, que con-siste na supressão mental de determinada ação ou omissão dentro de toda a cadeia de condutas presentes no contexto do crime. Se, eliminada, o resultado desaparecer, pode-se afirmar que aquela conduta é causa. Caso contrário, ou seja, se a despeito de suprimida, o resultado ainda assim existir, não será considerada conduta.

Atente-se para o fato de que ser causa do resultado não é bastante para ensejar a responsabilização penal. É preciso, ainda, ve-rificar se a conduta do agente considerada causa do resultado foi praticada mediante dolo ou culpa, pois nosso Direito Penal não se coaduna com a responsabilidade objetiva, isto é, aquela que se contenta com a demonstração do nexo de causalidade, sem levar em conta o elemento subjetivo da conduta.

Portanto, dizer que alguém causou o resultado não basta para ensejar a responsabilidade penal. É mister ainda que esteja presente o elemento subjetivo (dolo ou culpa) nessa conduta que foi causa do evento.

O art. 13 caput aplica-se, exclusivamente, aos crimes materiais porque, ao dizer “o resultado, de que depende a existência do crime”, refere-se ao resultado naturalístico da infração penal (aquele que é perceptível aos sentidos do homem e não apenas ao mundo jurídico), e a única modalidade de crime que depende da ocorrência do resultado naturalístico para se consumar (existir) é o material, como por exemplo; o homicídio (121 CP), em que a morte da vítima é o resultado naturalístico.

Aos crimes formais (exemplo; concussão - 316 CP) e os de mera conduta (exemplo; violação de domicílio - 150 CP), o art. 13 caput não tem incidência, pois prescindem da ocorrência do resultado naturalístico para existirem.

SUPERVENIÊNCIA DE CAUSA INDEPENDENTE

§ 1º - A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou.

O parágrafo primeiro do art. 13 nos diz que: “a superveniência de causa independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou”. Admite, o referido mandamento legal, a inter-rupção do nexo causal entre a conduta do agente e o resultado. Nessas hipóteses, pode-se dizer que existe uma concausa, ou seja, a conduta do agente e outra causa qualquer, quais sejam:

a) a causa que produza o resultado seja superveniente à conduta do agente, isto é, ocorra depois de sua ação;b) que a causa superveniente seja relativamente independente da conduta do agente, isto é, mantenha relação com a conduta

inaugurada pelo autor;c) que a causa superveniente independente produza o resultado por si só, isto é, seja causa bastante para a produção do resultado.

Exemplo: Telma ministra veneno mortal a Clarice, que, socorrida por uma equipe de médicos e enfermeiros, vem a morrer, pou-cos minutos após a ingestão da substância, em função de acidente sofrido pela ambulância a caminho do hospital.

Encontram-se aqui todas as características elencadas acima:a) o acidente com a ambulância que transportava Clarice ocorreu após a ingestão do veneno ministrado por Telma (superveniên-

cia);

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NOÇÕES DE DIREITO PENAL

b) o acidente não teria acontecido se Clarice não tivesse sido envenenada por Telma (independência relativa);c) as lesões causadas pelo acidente foram determinantes para a morte de Clarice (“por si só”).Dessa forma: Telma responderá pelos fatos que praticou, qual seja, tentativa de homicídio.Não obstante, caso somente aplicássemos o caput do art. 13 ao caso em tela, Telma seria responsável pela morte de Clarice uma

vez que, eliminando-se o envenenamento, o acidente da ambulância, que provocou a morte de Clarice, não teria ocorrido; logo é causa.

Contudo, vejamos outros exemplos:a) Telma, mesmo sabendo ser Clarice é cardiopata, tendo certeza de que sua conduta não virá a provocar sua morte, aplica, em

Clarice, um terrível susto, vindo esta a falecer vítima de um infarto fulminante;b) Telma, não sabendo ser Clarice cardiopata, ministra-lhe remédio para lhe descongestionar as vias respiratórias, porém acaba

por lhe acelerar o batimento cardíaco e Clarice vem a sofrer um infarto fulminante;c) Telma, sabendo ser Clarice cardiopata e desejando o resultado morte, a expõe, deliberadamente, a situação de alta tensão emo-

cional (criada por ela mesma, Telma), vindo Clarice a sofrer um infarto fulminante.Para cada uma dessas situações, teríamos uma situação jurídico-penal distinta para Telma. No primeiro exemplo, a conduta de

Telma poderia ser tipificada como homicídio culposo; no segundo caso, não haverá crime; na terceira hipótese, haveria homicídio doloso.

Note-se que em todas as soluções apresentadas, o simples estabelecimento do nexo de causalidade entre a conduta de Telma e o resultado “morte de Clarice” não são suficientes para resolvermos o problema. Há de se analisar, como estabelece a doutrina, os demais elementos do fato típico (além do nexo de causalidade e do resultado morte).

Cabe ainda analisarmos se a conduta humana é dolosa ou culposa e, também, a subsunção do fato à norma penal incriminadora - tipicidade.

Voltemos aos nossos exemplos: no primeiro caso, Telma agiu com culpa consciente (o agente esperava levianamente que o re-sultado não ocorresse); no segundo não houve dolo nem culpa na conduta de Telma, sendo, portanto, o fato atípico; na terceira houve dolo, com consciência e voluntariedade no preparo da situação que causou o resultado morte.

Não restam dúvidas que soluções apoiadas exclusivamente no estabelecimento de um nexo de causalidade objetivo entre condu-ta e resultado e na simples existência do próprio resultado, que são características necessárias, mas não suficientes, para se construir o fato típico, cometem grave erro no que diz respeito a sua formação completa. Dada a superação da Teoria Causal da conduta humana e da Responsabilidade Penal Objetiva, não poderíamos aceitar, em nenhuma das três hipóteses acima colocadas, o mesmo desfecho jurídico-penal para Telma. Outrossim, além do fato típico, também a antijuridicidade e a culpabilidade são requisitos para a existên-cia do crime, estendendo-se, então, a análise para conceitos como a ilicitude do fato e sua reprovabilidade social.

RELEVÂNCIA DA OMISSÃO

§ 2º - A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem:

a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado; c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado.

Da mesma forma que ação, em Direito Penal, não significa “fazer algo”, mas fazer o que o ordenamento jurídico proíbe, a omis-são não é um “não fazer”, mas não fazer o que o ordenamento jurídico obriga.

Omissão relevante para o Direito Penal é o não cumprimento de um dever jurídico de agir em circunstâncias tais que o omitente tinha a possibilidade física ou material de realizar a atividade devida.

Consequentemente, a omissão passa a ter existência jurídica desde que preencha os seguintes pressupostos:Dever jurídico que impõe uma obrigação de agir ou uma obrigação de evitar um resultado proibido;Possibilidade física, ou material, de agir.O primeiro pressuposto (dever jurídico de agir ou de evitar um resultado lesivo) exige o conhecimento dos meios pelos quais o

ordenamento jurídico pode impor às pessoas a obrigação de não se omitir, em determinadas circunstâncias.Em segundo lugar, o dever jurídico pode ser imposto ao garantidor, ou seja, há pessoas que, pela sua peculiar posição diante do

bem jurídico, recebem ou assumem a obrigação de assegurar sua conservação. A posição de garantidor requer essencialmente que o sujeito esteja encarregado da proteção ou custódia do bem jurídico que aparece lesionado ou ameaçado de agressão.

O essencial para compreender a posição de garantidor é o reconhecimento de que determinadas pessoas estabelecem um vínculo, uma relação especial com o bem jurídico, criando no ordenamento a expectativa de que o protegerá de eventuais danos. O Direito, então, espera a sua ação de garantia. Se não cumprir esse dever, será imputado por omissão imprópria.

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NOÇÕES DE DIREITO PENAL

No Código Penal, esta regra está no artigo 13,§ 2º: a posição de garantidor pode emanar de:a) dever legal, imposto pela lei;b) aceitação voluntária, ou seja, quando o sujeito livremente a assume, tal como acontece, por exemplo, nos casos de contrato;c) ingerência, quando o sujeito, por sua conduta precedente, cria a situação de perigo para o bem jurídico.

TIPICIDADE: É o nome que se dá ao enquadramento da conduta concretizada pelo agente na norma penal descrita em abstrato. Em suma, para que haja crime é necessário que o sujeito realize, no caso concreto, todos os elementos componentes da descrição típica (definição legal do delito).

A adequação típica pode dar-se de duas maneiras:a) imediata ou direta: quando houver uma correspondência total da conduta ao tipo.b) mediata ou indireta: quando a materialização da tipicidade exige a utilização de uma norma de extensão, sem a qual seria

absolutamente impossível enquadrar a conduta no tipo. É o que ocorre nos casos de participação (art. 29) e tentativa (art. 14, II).

Os tipos penais são modelos criados pela lei, por meio dos quais as condutas consideradas indesejáveis pelo senso comum (de acordo com o entendimento do legislador) são descritas taxativamente como crimes, com a finalidade de dar aos indivíduos a garantia maior do princípio da reserva legal.

O tipo é o modelo descritivo da conduta contido na lei. O tipo legal é composto de elementares e circunstâncias.Elementar: Vem de elemento, que é todo componente essencial do tipo sem o qual este desaparece ou se transforma em outra

figura típica.Justamente por serem essenciais, os elementos estão sempre no caput (cabeça) do tipo incriminador (texto da lei penal), por isso

o caput é chamado de tipo fundamental. (Exemplo: art. 121, matar alguém. Matar é elementar do tipo).Circunstância: É aquilo que não integra a essência, ou seja, se for retirado, o tipo não deixa de existir. As circunstâncias estão

dispostas em parágrafos (ex.: qualificadoras, privilégios etc.), não servindo para compor a essência do crime, mas sim para influir na pena.

O crime será mais ou menos grave em decorrência da circunstância, entretanto será sempre o mesmo crime (Exemplo: furto durante o sono noturno; o sono é circunstância, tendo em vista que, se não houver, ainda assim existirá o furto).

Espécies de Elemento1) Elementos objetivos ou descritivos: são aqueles cujo significado depende de mera observação. Para saber o que quer dizer

um elemento objetivo, o sujeito não precisa fazer interpretação. Todos os verbos do tipo constituem elementos objetivos (ex.: matar, falsificar etc.). São aqueles que independem de juízo de valor, existem concretamente no mundo (ex.: mulher, coisa móvel, filho etc.). Se um tipo penal possui somente elementos objetivos, ele oferece segurança máxima ao cidadão, visto que, qualquer que seja o apli-cador da lei, a interpretação será a mesma. São chamados de tipo normal, pois é normal o tipo penal que ofereça segurança máxima;

2) Elementos subjetivos: compõem-se da finalidade especial do agente exigida pelo tipo penal. Determinados tipos não se satis-fazem com a mera vontade de realizar o verbo. Existirá elemento de ordem subjetiva sempre que houver no tipo as expressões “com a finalidade de”, “para o fim de” etc. (ex.: rapto com fim libidinoso etc.). O elemento subjetivo será sempre essa finalidade especial que a lei exige. Não confundir o elemento subjetivo do tipo com o elemento subjetivo do injusto, que é a consciência do caráter ina-dequado do fato, a consciência da ilicitude;

3) Elementos normativos: é exatamente o oposto do elemento objetivo. É aquele que depende de interpretação para se extrair o significado, ou seja, é necessário um juízo de valor sobre o elemento. São elementos que trazem possibilidade de interpretações equívocas, divergentes, oferecendo um certo grau de insegurança. São chamados de tipos anormais porque possuem grau de incer-teza, insegurança.

Existem duas espécies de elementos normativos:- elemento normativo jurídico: é aquele que depende de interpretação jurídica (ex.: funcionário público, documento etc. Todos

esses vêm definidos na lei);- elemento normativo extrajurídico ou moral: é aquele que depende de interpretação não jurídica (ex.: mulher “honesta”).

CONSUMAÇÃO E TENTATIVA.

Crime consumado é aquele em que foram realizados todos os elementos da definição legal. Crime exaurido é aquele em que o agente já consumou o crime, mas continua atingindo o bem jurídico. O exaurimento influi na primeira fase da fixação da pena (art. 59, caput, do Código Penal).

Inter criminis: são as fases que o agente percorre até chegar à consumação do delito. A doutrina aponta quatro etapas diferentes no caminho do crime:

- Cogitação: nesta fase, o agente somente está pensando, idealizando, planejando a prática do crime. Nessa fase o crime é impu-nível.

Didatismo e Conhecimento 21

NOÇÕES DE DIREITO PENAL

- Preparação: é a prática dos atos necessários ao início da execução. Não existe fato típico ainda, salvo se o ato preparatório constituir crime autônomo.

- Execução: começa a agressão ao bem jurídico. Nessa fase, o agente inicia a realização do núcleo do tipo e o crime já se torna punível. A execução começa com a prática do primeiro ato idôneo e inequívoco à consumação do crime. Ato idôneo é o capaz de produzir o resultado e ato inequívoco é o que, fora de qualquer dúvida, induz ao resultado. Assim, a execução está ligada ao verbo de cada tipo. Quando o agente começa a praticar o verbo do tipo, inicia-se a execução.

- Consumação: quando todos os elementos do fato típico são realizados. A consumação nas várias espécies de crimes:a) materiais: com a produção do resultado naturalístico;b) culposos: com a produção do resultado naturalístico;c) de mera conduta: com a ação ou omissão delituosa;d) formais: com a simples atividade, independente do resultado;e) permanentes: o momento consumativo se protrai no tempo;f) omissivos próprios: com a abstenção do comportamento devido;g) omissivos impróprios: com a produção do resultado naturalístico;h) qualificados pelo resultado: com a produção do resultado agravador;i) complexos: quando os crimes componentes estejam integralmente realizados;j) habituais: com a reiteração de atos, pois cada um deles, isoladamente, é indiferente à lei penal. O momento consumativo é

incerto, pois não se sabe quando a conduta se tornou um hábito, por essa razão, não cabe prisão em flagrante nesses crimes.

TENTATIVA (ART.14, II)

Tentativa é a não consumação de um crime, cuja execução foi iniciada, por circunstâncias alheias à vontade do agente. De acordo com o que dispõe o artigo 14, II do Código Penal.

1. Aplicação da PenaA tentativa é punida com a mesma pena do crime consumado, reduzida de 1/3 a 2/3. O critério para essa redução é a proximidade

do momento consumativo, ou seja, quanto mais próximo chegar da consumação, menor será a redução.

2. Espécies de TentativaTentativa imperfeita ou inacabada: Ocorre quando a execução do crime é interrompida, ou seja, o agente, por circunstâncias

alheias à sua vontade, não chega a praticar todos os atos de execução do crime.Tentativa perfeita ou acabada: Também conhecida como “crime falho”. Ocorre quando o agente pratica todos os atos de exe-

cução do crime, mas o resultado não se produz por circunstâncias alheias à sua vontade.Tentativa branca ou incruenta: Classificação para os crimes contra a pessoa; ocorre quando a vítima não é atingida.Tentativa cruenta: Classificação para os crimes contra a pessoa; ocorre quando a vítima é atingida, mas o resultado desejado

não acontece por circunstância alheia à vontade do agente.Tentativa idonêa: É aquela em que o sujeito pode alcançar a consumação, mas não consegue fazê-lo por circunstâncias alheias

à sua vontade. É a tentativa propriamente dita, definida no art. 14, II, do Código Penal.Tentativa inidonêa: Sinônimo de crime impossível (art. 17) ocorre quando o agente inicia a execução, mas a consumação do

delito era impossível por absoluta ineficácia do meio empregado ou por absoluta impropriedade do objeto material. Nesse caso, não se pune a tentativa, pois a lei considera o fato atípico.

3. Infrações que Não Admitem TentativaCrimes culposos: Parte da doutrina admite no caso de culpa imprópria.Crimes preterdolosos: No caso dos crimes preterdolosos ou preterintencionais, o evento de maior gravidade não querido pelo

agente, é punido a título de culpa. No caso de latrocínio tentado, o resultado morte era querido pelo agente; assim, embora qualificado pelo resultado, o latrocínio só poderá ser preterdoloso quando consumado.

Crimes omissivos próprios: São crimes de mera conduta (exemplo: crime de omissão de socorro, artigo 135 do Código Penal).Contravenção penal: A tentativa não é punida (artigo 4.º do Decreto-lei n. 3.688/41).Delitos de atentado: São crimes em que a lei pune a tentativa como se fosse consumado o delito (exemplo: crime de evasão

mediante violência contra a pessoa, artigo 352 do Código Penal).

Didatismo e Conhecimento 22

NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Crimes habituais: Tais crimes exigem, para consumação, a reiteração de atos que, isolados, não configuram fato típico. Inviável a verificação da tentativa, posto que uma segunda conduta já caracteriza o delito.

Crimes unissubsistentes: Que se consumam com um único ato. Ex.: injúria verbal.Crimes que a lei só pune se ocorrer o resultado: Trata-se, por exemplo, do crime de induzimento, instigação ou auxílio a sui-

cídio (artigo 122 do Código Penal). Nesse delito, se a pessoa empresta um revolver para outra se matar e esta não se mata, o fato é atípico, mas se ela comete o suicídio, o crime está consumado.

Observações: Parte da doutrina entende que os crimes formais e de mera conduta não admitem tentativa. Não concordamos com esse entendimento. O crime de ameaça, por exemplo, trata-se de crime formal, mas admite a tentativa no caso de ameaça por escrito, em que a carta é interceptada por terceiro. Alguns crimes de mera conduta também admitem tentativa, como a violação de domicílio (o agente pode, sem sucesso, tentar invadir domicílio de outrem). O crime unissubsistente comporta tentativa em alguns casos, por exemplo, quando o agente efetua um único disparo contra a vítima e erra o alvo.

TENTATIVA ABANDONADA OU QUALIFICADA

Ocorre quando, iniciada a execução, o resultado não se produz por força da vontade do próprio agente. É chamada pela doutrina de “ponte de ouro”.

Comporta duas espécies: desistência voluntária e arrependimento eficaz.

Desistência voluntária (art. 15, 1ª parte): O agente interrompe voluntariamente a execução do crime, impedindo, desse modo, a sua consumação. Ocorre antes de o agente esgotar os atos de execução, sendo possível somente na tentativa imperfeita ou inacabada. Não há que se falar em desistência voluntária em crime unissubsistente, visto que este é composto de um único ato.

Arrependimento eficaz (art. 15, 2ª parte): O agente executa o crime até o último ato, esgotando-os, e logo após se arrepende, impedindo o resultado. Só é possível no caso da tentativa perfeita ou acabada. Ocorre somente nos crimes materiais que se consumam com a verificação do resultado naturalístico.

A desistência ou o arrependimento não precisa ser espontâneo, mas deve ser voluntário. Mesmo se a desistência ou a resipiscên-cia for sugerida por terceiros subsistirão seus efeitos. A tentativa abandonada, em suas duas modalidades, exclui a aplicação da pena por tentativa, ou seja, o agente responderá somente pelos atos até então praticados.

ARREPENDIMENTO POSTERIOR (ART. 16)

Nos termos do artigo 16 do Código Penal, “Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, reparado o dano ou restituída a coisa, até o recebimento da denúncia ou da queixa, por ato voluntário do agente, a pena será reduzida de um a dois terços”. A expressão utilizada pelo legislador é redundante, pois todo arrependimento é posterior. Na verdade o arrependimento é posterior à consumação do crime. Trata-se de causa obrigatória de redução de pena. É causa objetiva de diminuição de pena, portanto, estende-se aos coautores e partícipes condenados pelo mesmo fato.

RequisitosSó cabe em crime cometido sem violência ou grave ameaça contra a pessoa. Visa o legislador a dar oportunidade ao agente,

que pratica crime contra o patrimônio sem violência ou grave ameaça, de reparar o dano ou restituir a coisa. Na jurisprudência, pre-valece o entendimento de que a lei só se refere à violência dolosa, podendo a diminuição ser aplicada aos crimes culposos em que haja violência, como o homicídio culposo. Assim, a intenção do legislador foi criar um instituto para os crimes patrimoniais, mas a jurisprudência estendeu ao homicídio culposo.

- Reparação do dano ou restituição da coisa (deve ser integral).- Por ato voluntário do agente. Não há necessidade de ser ato espontâneo, podendo haver influência de terceira pessoa.- O arrependimento posterior só pode ocorrer até o recebimento da denúncia ou queixa. Após, a reparação do dano será somente

causa atenuante genérica (artigo 65, inciso III, alínea “b”).Critérios para Aplicação da Redução da PenaSão dois os critérios para se aplicar a redução da pena: espontaneidade e celeridade. O arrependimento posterior não precisa

ser espontâneo, mas se for a pena sofrerá maior diminuição. Também, quanto mais rápido reparar o dano, maior será a diminuição.

Relevância da Reparação do Dano- Cheque sem fundos: o pagamento até o recebimento da denúncia ou queixa extingue a punibilidade (Súmula 554 do Supremo

Tribunal Federal).

Didatismo e Conhecimento 23

NOÇÕES DE DIREITO PENAL

- Crimes contra a ordem tributária: o pagamento do tributo até o recebimento da denúncia ou queixa também extingue a puni-bilidade.

- Peculato culposo (artigo 312, § 3.º): se a reparação do dano precede à sentença irrecorrível, extingue a punibilidade; se lhe é posterior reduz de metade a pena imposta.

- Crimes de ação penal privada ou pública condicionada à representação (artigo74, parágrafo único, da Lei n. 9.099/95): haven-do composição civil do dano em audiência preliminar, extingue-se o direito de queixa ou representação.

Delação eficaz ou premiadaInstituto distinto do arrependimento posterior é o da delação premiada, no qual se estimula a delação feita por um coator ou

participe em relação aos demais, mediante o benefício da redução obrigatória da pena.

CRIME IMPOSSÍVEL (ART. 17)

O crime impossível também chamado de tentativa inidônea, tentativa inadequada ou quase-crime. É aquele que, pela ineficácia total do meio empregado ou pela impropriedade absoluta do objeto material, é impossível de se consumar. Não se trata de causa de isenção de pena, como parece sugerir a redação do art. 17 do Código Penal, mas de causa geradora de atipicidade, pois não se concebe queira o tipo incriminador descrever como crime uma ação impossível de se realizar.

Ineficácia absoluta do meio: O meio empregado jamais poderia levar à consumação do crime. A ineficácia do meio deve ser absoluta (exemplo: um palito para matar um adulto, uma arma de brinquedo). Deve-se lembrar, que um determinado meio pode ser ineficaz para um crime, mas eficaz para outro. Exemplo: num crime de roubo, uma arma totalmente inapta a produzir disparos pode ser utilizada para intimidar a vítima.

Impropriedade Absoluta do Objeto: A pessoa ou a coisa sobre a qual recai a conduta jamais poderia ser alvo do crime. Assim,

haverá crime impossível quando o objeto sobre o qual o agente faz recair sua conduta não é protegido pela norma penal incriminadora ou quando ele (objeto) sequer existe. Exemplo: atirar em alguém que já está morto.

O crime impossível pela absoluta impropriedade do objeto é também chamado delito putativo por erro de tipo, pois se trata de um crime imaginário; o agente quer cometer um crime, mas devido ao desconhecimento da situação de fato, comete um irrelevante penal (exemplo: mulher pensa que está grávida e ingere substância abortiva). Não se confunde com o erro de tipo, pois neste o agente não sabe, devido a um erro de apreciação da realidade, que está cometendo um crime (exemplo: compra cocaína pensando ser talco).

Crime de ensaio ou experiência: Também chamado “delito putativo por obra do agente provocador” ou “crime de flagrante preparado”, ocorre quando a polícia ou terceiro (agente provocador) prepara uma situação, que induz o agente a cometer o delito (exemplo: detetive simula querer comprar maconha e prende o traficante). O agente é protagonista de uma farsa. A jurisprudência considera a encenação do flagrante preparado uma terceira espécie de crime impossível, entendendo não haver crime ante a atipici-dade do fato (Súmula n. 145 do Supremo Tribunal Federal).

O Código Penal brasileiro adotou a teoria objetiva temperada pela qual só há crime impossível se a ineficácia do meio e a impro-priedade do objeto forem absolutas. Por isso, se forem relativas, haverá crime tentado. Ex.: tentar matar alguém com revólver e pro-jéteis verdadeiros que, entretanto, não detonam por estar velhos. Aqui a ineficácia do meio é acidental e existe tentativa de homicídio.

Art. 14 - Diz-se o crime:

CRIME CONSUMADO I - consumado, quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal;

TENTATIVA II - tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente.

PENA DE TENTATIVAParágrafo único - Salvo disposição em contrário, pune-se a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado, dimi-

nuída de um a dois terços.

Didatismo e Conhecimento 24

NOÇÕES DE DIREITO PENAL

DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA E ARREPENDIMENTO EFICAZArt. 15 - O agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na execução ou impede que o resultado se produza, só responde

pelos atos já praticados.

ARREPENDIMENTO POSTERIORArt. 16 - Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, reparado o dano ou restituída a coisa, até o recebimen-

to da denúncia ou da queixa, por ato voluntário do agente, a pena será reduzida de um a dois terços.

CRIME IMPOSSÍVEL Art. 17 - Não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível

consumar-se o crime.

CAUSAS DE EXCLUSÃO DE ILICITUDE E CULPABILIDADE

Antijuricidade ou ilicitude, como já mencionado acima, é a contradição do fato, eventualmente adequado ao modelo legal, com a ordem jurídica, constituindo lesão de um interesse protegido.

A antijuricidade pode ser afastada por determinadas causas, as determinadas causas de exclusão de antijuricidade; quando isso ocorre, o fato permanece típico, mas não há crime, excluindo-se a ilicitude, e sendo ela requisito do crime, fica excluído o próprio delito; em consequência, o sujeito deve ser absolvido; são causas de exclusão de antijuricidade, previstas no artigo 23 do Código Penal: estado de necessidade; legítima defesa; estrito cumprimento de dever legal; exercício regular de direito.

Assim, apesar de todo crime, em um primeiro momento, ser considerado um ato ilícito, haverá situações em que mesmo come-tendo um crime, isto é, praticando uma conduta expressamente proibida pela lei, a conduta do agente não será considerada ilícita.

As causas de exclusão da ilicitude (também chamadas exclusão da antijuridicidade, causas justificantes ou descriminantes) po-dem ser:

- causas legais: são as quatro previstas em lei (estado de necessidade, legítima defesa, estrito cumprimento do dever legal e o exercício regular de direito);

- causas supralegais: são aquelas não previstas em lei, que podem ser admitidas sem que haja colisão com o princípio da reserva legal, pois aqui se cuida de norma não incriminadora (exemplo: colocação de piercing; não se trata de crime de lesão corporal, pois há o consentimento do ofendido).

Existem também causas excludentes específicas, previstas na própria Parte Especial do Código Penal, e que somente são aplicá-veis a determinados delitos:

a) no aborto para salvar a vida da gestante ou quando a gravidez resulta de estupro (art. 128, I e II);b) nos crimes de injúria e difamação, quando a ofensa é irrogada em juízo na discussão da causa, na opinião desfavorável da

crítica artística, literária ou científica e no conceito emitido por funcionário público em informação prestada no desempenho de suas funções;

c) na violação do domicílio, quando um crime está ali sendo cometido (art. 150, § 3º, II).

EXCLUSÃO DE ILICITUDE

Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato: I - em estado de necessidade; II - em legítima defesa; III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito. EXCESSO PUNÍVEL

Parágrafo único - O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo.

ESTRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL

Estrito Cumprimento do Dever Legal: É o dever emanado da lei ou de respectivo regulamento. O agente atua em cumprimento de um dever emanado de um poder genérico, abstrato e impessoal. Se houver abuso, não há a excludente, ou seja, o cumprimento deve ser estrito. Exemplo: um soldado mata assaltante que faz jovem de refém, por ordem de seu superior hierárquico.

Como a excludente exige o estrito cumprimento do dever, deve-se ressaltar que haverá crime quando o agente extrapolar os limites deste.

Didatismo e Conhecimento 25

NOÇÕES DE DIREITO PENAL

EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO

Exercício Regular do Direito: consiste na atuação do agente dentro dos limites conferidos pelo ordenamento legal. O sujeito não comete crime por estar exercitando uma prerrogativa a ele conferida pela lei. Assim, o exercício de um direito não configura fato ilícito. Exceto se a pretexto de exercer um direito, houver intuito de prejudicar terceiro. Exemplos:

a) Ofendículos e defesa mecânica predisposta: os ofendículos são aparatos visíveis destinados à defesa da propriedade ou de qualquer outro bem jurídico. O que os caracteriza é a visibilidade, devendo ser perceptíveis por qualquer pessoa (exemplos: lança no portão da casa, caco de vidro no muro etc.). Defesa mecânica predisposta é aparato oculto destinado à defesa da propriedade ou de qualquer outro bem jurídico. Podem configurar delitos culposos, pois alguns aparatos instalados imprudentemente podem trazer trágicas consequências.

Observação: Para o Prof. Damásio de Jesus, nos dois casos, salvo condutas manifestamente imprudentes, é mais correta a apli-cação da justificativa da legítima defesa. A predisposição do aparelho constitui exercício regular de direito, mas, no momento em que este atua, o caso é de legítima defesa preordenada (aquela posta anteriormente a agressão).

b) Lesões esportivas: Pela doutrina tradicional, a violência desportiva é exercício regular do direito, desde que a violência seja praticada nos limites do esporte. Assim, mesmo a violência que acarreta alguma lesão, se previsível para a prática do esporte, será exercício regular do direito (exemplo: numa luta de boxe poderá haver, inclusive, a morte de um dos lutadores).

c) Intervenções cirúrgicas: Amputações, extração de órgão etc. constituem exercício regular da profissão do médico. Se a inter-venção for realizada em caso de emergência por alguém que não é médico, será caso de estado de necessidade.

d) Consentimento do ofendido: O consentimento do ofendido exclui a tipicidade quando a discordância da vítima for elemento do tipo. Exemplo: não há invasão de domicílio se a “vítima” autorizou a entrada em sua casa.

Requisitos para exclusão da tipicidade: - ser o bem jurídico disponível; - capacidade da vítima em poder dispor do bem; - ser o consentimento dado antes ou durante o fato; - a consciência do agente de que houve consentimento. Quando a discordância não for elemento do tipo, ocorre causa supralegal de exclusão da ilicitude. O que pode ocorrer no crime de

dano, por exemplo, artigo 163 do Código Penal. E os requisitos são: disponibilidade do bem; capacidade da vítima em poder dele dispor.O exercício abusivo do direito faz desaparecer a excludente.

ESTADO DE NECESSIDADE

Estado de necessidade é uma situação de perigo atual de interesses protegidos pelo direito, em que o agente, para salvar um bem próprio ou de terceiro, não tem outro meio senão o de lesar o interesse de outrem; perigo atual é o presente, que está acontecendo; iminente é o prestes a desencadear-se.

O estado de necessidade é uma causa de exclusão de ilicitude, encontra-se tipificado no art. 24 do CP. Consiste em uma conduta lesiva praticada para afastar uma situação de perigo. Não é qualquer situação de perigo que admite a conduta lesiva e não é qualquer conduta lesiva que pode ser praticada na situação de perigo. Existindo uma situação de perigo que ameace dois bens jurídicos, um deles terá que ser lesado para salvar o outro de maior valor.

Requisitos para a existência do estado de necessidade:- Perigo deve ser atual ou iminente, ou seja, deve estar acontecendo naquele momento ou prestes a acontecer. Quando, portanto,

o perigo for remoto ou futuro, não há o estado de necessidade.- Perigo deve ameaçar um direito próprio ou um direito alheio. Abrange qualquer bem protegido pelo ordenamento jurídico. Se

o bem não for tutelado pelo ordenamento, não se admite estado de necessidade. - Perigo não pode ter sido criado voluntariamente. Quem dá causa a uma situação de perigo não pode invocar o estado de ne-

cessidade para afastá-la. Aquele que provocou o perigo com dolo não age com estado de necessidade porque tem o dever jurídico de impedir o resultado.

- Quem possui o dever legal de enfrentar o perigo não pode invocar o estado de necessidade. A pessoa que possui o dever legal de enfrentar o perigo deve afastar a situação de perigo sem lesar qualquer outro bem jurídico.

- Inevitabilidade do comportamento lesivo, ou seja, somente deverá ser sacrificado outro bem se não houver outra maneira de afastar a situação de perigo.

- É necessário existir proporcionalidade entre a gravidade do perigo que ameaça o bem jurídico do agente ou alheio e a gravidade da lesão causada pelo fato necessitado.

Didatismo e Conhecimento 26

NOÇÕES DE DIREITO PENAL

ESTADO DE NECESSIDADE

Art. 24 - Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se.

§ 1º - Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo. § 2º - Embora seja razoável exigir-se o sacrifício do direito ameaçado, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços.

LEGÍTIMA DEFESA

Trata-se de causa de exclusão da ilicitude consistente em repelir injusta agressão, atual ou iminente, a direito próprio ou alheio, usando moderadamente dos meios necessários.

Requisitos da Legítima Defesa- Agressão: é todo ataque praticado por pessoa humana. Não pode ser confundida com uma simples provocação. Segundo

NUCCI, a possibilidade de legítima defesa contra provocação é inadmissível, pois a provocação (insulto, ofensa ou desafio) não é o suficiente para gerar o requisito legal, que é a agressão. No entanto o autor faz uma ressalva: quando a provocação for insistente, torna-se agressão, justificando, assim, a reação, que deve, contudo, respeitar o requisito da moderação. Se o ataque é comandado por animais irracionais, não é legítima defesa e sim estado de necessidade.

- Atual ou iminente: atual é a agressão que está acontecendo e iminente é a que está prestes a acontecer. Não cabe legítima defesa contra agressão passada ou futura e também quando há promessa de agressão.

- A direito próprio ou de terceiro: é legítima defesa própria quando o sujeito está se defendendo e legítima defesa alheia quando o sujeito defende terceiro. Pode-se alegar legítima defesa alheia mesmo agredindo o próprio terceiro (ex.: em caso de suicídio, pode-se agredir o terceiro para salvá-lo).

- Meio necessário: é o meio menos lesivo colocado à disposição do agente no momento da agressão.- Moderação: é o emprego do meio necessário dentro dos limites para conter a agressão.

Espécies de legítima defesa- Legítima defesa putativa: é a legítima defesa imaginária. É a errônea suposição da existência da legítima defesa por erro de tipo

ou erro de proibição. Os agentes imaginam haver agressão injusta quando na realidade esta inexiste.- Legítima defesa subjetiva: é o excesso cometido por um erro plenamente justificável, o agente, por erro supõe ainda existir a

agressão e, por isso, excede-se. Nesse caso, excluem-se o dolo e a culpa (art. 20, § 1º, 1ª parte).- Legítima defesa sucessiva: é a repulsa do agressor inicial contra o excesso. Assim, a pessoa que estava inicialmente se

defendendo, no momento do excesso, passa a ser considerada agressora, de forma a permitir legítima defesa por parte do primeiro agressor.

Atenção, enquanto a legitima defesa real é causa de exclusão da ilicitude do fato. A legítima defesa putativa excluirá o dolo e consequentemente o fato típico. Isto porque a denominada legitima defesa putativa na verdade caracteriza erro de tipo, ou seja, o agente tem uma falsa percepção da realidade que faz com que o mesmo pense que está agindo em uma situação de legitima defesa, quando, de fato, não está sofrendo agressão alguma.

Hipóteses de cabimento da legítima defesa:- Cabe legítima defesa real de legítima defesa putativa. Exemplo: uma pessoa atira em um parente que está entrando em sua casa,

supondo tratar-se de um assalto. O parente, que também está armado, reage e mata o primeiro agressor.- Cabe legítima defesa putativa de legítima defesa real. Exemplo: A vai agredir B. A joga B no chão. B, em legítima defesa real,

imobiliza A. Nesse instante, chega C e, desconhecendo que B está em legítima defesa real, o ataca agindo em legítima defesa putativa de A (legítima defesa de terceiro).

- Cabe legítima defesa putativa de legítima defesa putativa. Ex.: dois desafetos se encontram e, equivocadamente, acham que serão agredidos um pelo outro.

- Cabe legítima defesa real contra agressão culposa. Isso porque ainda que a agressão seja culposa, sendo ela também ilícita, contra ela cabe a excludente.

- Cabe legítima defesa real contra agressão de inimputável. Os inimputáveis podem agir voluntária e ilicitamente, embora não sejam culpáveis. Para agir contra agressão de inimputável, exige-se, no entanto, cautela redobrada, porque nesse caso a pessoa que ataca não tem consciência da ilicitude de seu ato.

Pergunta: Cabe legítima defesa real contra legítima defesa subjetiva?Resposta: Em tese caberia, pois a partir da continuidade da agressão a vítima se torna agressora. Para a jurisprudência, entretanto,

não é aceita quando o excesso for repelido pelo próprio agressor, porque não pode invocar a legítima defesa quem iniciou a agressão, mas o excesso pode ser repelido por terceiro.

Didatismo e Conhecimento 27

NOÇÕES DE DIREITO PENAL

ExcessoÉ a intensificação de uma conduta incialmente justificada. Em um primeiro momento o agente está agindo coberto por uma

excludente, mas, em seguida, a extrapola.O excesso pode ser:a) doloso: descaracteriza a legítima defesa a partir do momento em que é empregado o excesso, e o agente responde dolosamente

pelo resultado que produzir. Ex.: uma pessoa inicialmente estava em legítima defesa consegue desarmar o agressor e, na sequência, o mata. Responde por homicídio doloso.

b) culposo (ou excesso inconsciente, ou não intencional): é o excesso que deriva de culpa em relação à moderação, e, para alguns doutrinadores, também quanto à escolha dos meios necessários. Nesse caso, o agente responde por crime culposo. Trata-se também de hipótese de culpa imprópria.

O excesso doloso ou culposo é também aplicável nas demais excludentes de ilicitude (estado de necessidade, estrito cumprimen-to do dever legal, exercício regular de direito etc.).

LEGÍTIMA DEFESA

Art. 25 - Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.

CULPABILIDADE

CULPABILIDADE: é a possibilidade de se considerar alguém culpado pela prática de uma infração penal. Por essa razão, costuma ser definida como juízo de censurabilidade e reprovação exercido sobre alguém que praticou um fato típico e ilícito. Não se trata de elemento do crime, mas pressuposto para imposição de pena, porque, sendo um juízo de valor sobre o autor de uma infração penal, não se concebe possa, ao mesmo tempo, estar dentro do crime, como seu elemento, e fora, como juízo externo de valor do agente. Para censurar quem cometeu um crime, a culpabilidade deve estar necessariamente fora dele.

Com isso, podemos considerar a existência de etapas sucessivas de raciocínio, de maneira que, ao se chegar à culpabilidade, já se constatou ter ocorrido um crime. Verifica-se, em primeiro lugar, se o fato é típico ou não; em seguida, em caso afirmativo, a sua ilicitude; só a partir de então, constatada a prática de um delito (fato típico e ilícito), é que se passa ao exame da possibilidade de responsabilização do autor.

Na culpabilidade afere-se apenas se o agente deve ou não responder pelo crime cometido. E nenhuma hipótese será possível a exclusão do dolo e da culpa ou da ilicitude nessa fase, uma vez que tais elementos já foram analisados nas precedentes.

Teoria adotada pelo Código Penal brasileiro: teoria limitada da culpabilidade. Nessa teoria, o erro recai sobre uma situação de fato (descriminante putativa fática) é erro de tipo, enquanto o que incide sobre a existência ou limites de uma causa de justificação é o erro de proibição. As descriminantes putativas fáticas são tratadas como erro de tipo (art. 20, §1º), enquanto as descriminantes putativas por erro de proibição, ou erro de proibição indireto, são consideradas erro de proibição (art. 21).

Elementos da culpabilidade segundo a teoria do Código Penal, são três:a) imputabilidade;b) potencial consciência da ilicitude;c) exigibilidade de conduta diversa.

Causas dirimentes: são aquelas que excluem a culpabilidade. São estas: erro de proibição; coação moral irresistível; obediência hierárquica; d) inimputabilidade por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado; inimputabilidade por me-noridade penal; inimputabilidade por embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior. Diferem das excludentes, que excluem a ilicitude e podem ser legais e supralegais.

Didatismo e Conhecimento 28

NOÇÕES DE DIREITO PENAL

9. IMPUTABILIDADE PENAL.

Imputabilidade penal é o conjunto de condições pessoas que dão ao agente capacidade para lhe ser juridicamente imputada a prática de um fato punível. O conceito de sujeito imputável é encontrado no artigo 26, caput, do Código Penal, que trata dos inimpu-táveis. Imputável é o sujeito mentalmente são e desenvolvido, capaz de entender o caráter ilícito do fato e determinar-se de acordo com esse entendimento.

Em princípio, todos são imputáveis, exceto aqueles abrangidos pelas hipóteses de inimputabilidade enumeradas na lei, que são as seguintes:

a) doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado; b) menoridade;c) embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior;d) dependência de substância entorpecente.

Pode ser a inimputabilidade absoluta ou relativa. Se for absoluta, isso significa que não importam as circunstâncias, o indivíduo definido como “inimputável” não poderá ser penalmente responsabilizado por seus atos.

Se a inimputabilidade for relativa, isso indica que o indivíduo pertencente a certas categorias definidas em lei poderá ou não ser penalmente responsabilizado por seus atos, dependendo da análise individual de cada caso na Justiça, segundo a avaliação da capa-cidade do acusado, as circunstâncias atenuantes ou agravantes, as peculiaridades do caso e as provas existentes.

A imputabilidade possui dois elementos:- intelectivo (capacidade de entender);- volitivo (capacidade de querer).Faltando um desses elementos, o agente não será imputável.

Critérios para a definição da inimputabilidade:- Biológico: leva em conta apenas o desenvolvimento mental do acusado (quer em face de problemas mentais ou da idade do

agente).- Psicológico: considera apenas se o agente, ao tempo da ação ou omissão, tinha a capacidade de entendimento e autodeterminação.- Biopsicológico: considera inimputável aquele que, em razão de sua condição mental (causa), era, ao tempo da ação ou omissão,

totalmente incapaz de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com tal entendimento (consequência).

DISTÚRBIOS MENTAISDoença mental: É a perturbação mental de qualquer ordem (exemplos: psicose, esquizofrenia, paranoia, epilepsia etc.). A de-

pendência patológica de substância psicotrópica configura doença mental.Desenvolvimento mental incompleto: É o desenvolvimento que ainda não se concluiu. É o caso do menor de 18 anos e do

silvícola inadaptado à sociedade.Desenvolvimento mental retardado: É o caso dos oligofrênicos, que se classificam em débeis mentais, imbecis e idiotas,

dotados de reduzidíssima capacidade mental, e dos surdos-mudos que, em consequência da anomalia, não têm qualquer capacidade de entendimento e de autodeterminação.

Adotou-se, quanto aos doentes mentais, o critério biopsicológico.

SEMI-IMPUTABILIDADE OU RESPONSABILIDADE DIMINUÍDADifere da inimputabilidade apenas no requisito consequencial. Enquanto na inimputabilidade a perda da capacidade de enten-

der ou querer é total, na semi-imputabilidade, é parcial. A semi-imputabilidade não exclui a culpabilidade, e após análise do caso concreto, a lei confere ao juiz a opção de aplicar medida de segurança ou pena diminuída (redução de1/3 a 2/3).

MENORIDADE (ART. 27)Nos termos do art. 27 do Código Penal, os menores de 18 anos são inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na

legislação especial. Adotou-se, portanto, o critério biológico, que presume, de forma absoluta, ser o menor de 18 anos inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento.

A menoridade cessa no primeiro instante do dia que o agente completa os 18 anos, ou seja, se o crime é praticado na data do 18º aniversário, o agente já é imputável e responde pelo crime.

Didatismo e Conhecimento 29

NOÇÕES DE DIREITO PENAL

A legislação especial que regulamenta as sanções aplicáveis aos menores inimputáveis é o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90), que prevê a aplicação de medidas socioeducativas aos adolescentes (pessoas com 12 anos ou mais e menores de 18 anos), consistentes em advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semili-berdade ou internação, e a aplicação de medidas de proteção às crianças (menores de 12 anos) que venham a praticar fatos definidos como infração penal.

EMOÇÃO E PAIXÃO (art. 28, I)A emoção é um sentimento súbito, repentino, de breve duração, passageiro e intenso (ira momentânea, o medo, a vergonha). A

paixão é duradoura, perene (o amor, a ambição, o ódio). Nem a emoção nem a paixão excluem a imputabilidade penal. Somente a emoção pode funcionar como redutor de pena. A emoção pode ser causa de diminuição de pena em alguns crimes, dependendo das circunstâncias (artigos 121, §1.º, e 129, § 4.º, do Código Penal), ou pode constituir atenuante genérica (artigo 65, inciso III, alínea “c”, do Código Penal). Ex: O marido chega em casa e encontra a esposa com outro, comete um homicídio. Foi movido por forte emoção.

EMBRIAGUEZ (art. 28, II)Embriaguez é a intoxicação aguda e transitória causada pelo álcool ou substancia de efeitos análogos (cocaína, ópio etc), cujas

consequências variam desde uma ligeira excitação até o estado de paralisia e coma.

A embriaguez divide-se em:a) Embriaguez não acidental: A embriaguez não acidental pode ser voluntária ou culposa.Voluntária: Ocorre quando o individuo ingere substância tóxica, com o intuito de embriagar-se.Culposa: Ocorre quando o indivíduo, que não queria se embriagar, ingere, por imprudência, álcool ou outra substância de efeitos

análogos em excesso, ficando embriagado. Não está acostumado, começa a beber e fica bêbado: Será considerado imputável, pois no momento da decisão de beber, optou pela bebida. Poderia ter evitado. Exceção: O bêbado que bebe há muito tempo (alcoolismo) doença mental.

A embriaguez voluntária ou culposa não exclui a imputabilidade, ainda que no momento do crime o embriagado esteja privado inteiramente de sua capacidade de entender ou de querer.

b) Embriaguez acidental: A embriaguez acidental somente exclui a culpabilidade se for completa e decorrente de caso fortuito

ou força maior.Exemplo de Força maior. Alguém obrigar outra pessoa a ingerir bebida alcoólica.Exemplo de caso fortuito: quando sujeito está tomando determinado remédio e, inadvertidamente, ingere bebida alcoólica, cujo

efeito é potencializado em face dos remédios, fazendo com que uma pequena quantia de bebida o faça ficar em completo estado de embriaguez. Embriaguez involuntária.

c) Embriaguez patológica: Embriaguez patológica é a decorrente de enfermidade congênita existente, por exemplo, nos filhos

de alcoólatras que se ingerirem quantidade irrisória de álcool ficam em estado de fúria incontrolável. Se for o agente, ao tempo da ação ou omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, es-tará excluída sua imputabilidade (aplica-se a regra do art. 26, caput). Se houver mera redução dessa capacidade, o agente responderá pelo crime, mas a pena será reduzida (art. 26, parágrafo único).

d) Embriaguez preordenada: Embriaguez preordenada ocorre quando o indivíduo, voluntariamente, se embriaga para criar

coragem para cometer um crime. Não há exclusão de imputabilidade. O agente responde pelo crime, incidindo sobre a pena uma circunstância agravante prevista no artigo 61, inciso II, alínea “a” CP.

DEPENDÊNCIA DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE Segundo o art. 45, caput, da Lei nº 11.343/2006 (Lei de Tóxicos), é isento de pena (inimputável) o agente que, em razão da de-

pendência, ou sob o efeito de substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica proveniente de caso fortuito ou força maior, era ao tempo da ação ou omissão, qualquer quer tenha sido o resultado da infração praticada (do Código Penal, da Lei de Tóxicos ou qualquer outra lei), inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Se a redução dessa capacidade for apenas parcial, o agente é considerado imputável, mas sua pena será reduzida de 1/3 a 2/3 (parágrafo único).

Didatismo e Conhecimento 30

NOÇÕES DE DIREITO PENAL

TÍTULO III DA IMPUTABILIDADE PENAL

InimputáveisArt. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo

da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendi-mento.

Redução de penaParágrafo único - A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por

desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar--se de acordo com esse entendimento.

Menores de dezoito anosArt. 27 - Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação

especial. Emoção e paixãoArt. 28 - Não excluem a imputabilidade penal: I - a emoção ou a paixão; EmbriaguezII - a embriaguez, voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância de efeitos análogos. § 1º - É isento de pena o agente que, por embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior, era, ao tempo da

ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. § 2º - A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, por embriaguez, proveniente de caso fortuito ou força maior,

não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

10. CONCURSO DE PESSOAS.

O concurso de pessoas, também denominado de concurso de agentes, concurso de delinquentes (concursus delinquentium) ou codelinquência, implica na concorrência de duas ou mais pessoas para o cometimento de um ilícito penal.

Não há que se confundir o concursus delinquentium (concurso de pessoas) com o concursus delictorum (concurso de crimes) nem tampouco com o concursus normarum (concurso de normas penais). São três institutos penais totalmente distintos, muito em-bora possam vir a se relacionar.

O Código Penal Brasileiro não traz exatamente uma definição de concurso de pessoas, afirmando apenas no caput do art. 29 que “quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade”. Dispõe, ain-da, que “se a participação for de menor importância, a pena pode ser diminuída de um sexto a um terço” (art. 29, § 1º), bem como que “se algum dos concorrentes quis participar de crime menos graves, ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será aumentada até metade, na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave” (art. 29, § 2º).

Em nível doutrinário, tem-se definido o concurso de agentes como a reunião de duas ou mais pessoas, de forma consciente e voluntária, concorrendo ou colaborando para o cometimento de certa infração penal. Vejamos os elementos básicos do conceito de concurso de pessoas, caso inexista qualquer desses requisitos não há que se falar em concurso de pessoas:

A) PLURALIDADE DE AGENTES E DE CONDUTAS: A própria ideia de concurso é de pluralidade, portanto impossível falar em concurso de pessoas sem que exista coletividade (dois ou mais) de agentes e, consequentemente, de condutas.

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B) RELEVÂNCIA CAUSAL DE CADA CONDUTA: Não basta a multiplicidade de agentes e condutas para que se tenha con-figurado o concurso de pessoas; necessário se faz que em meio a todas essas condutas seja possível vislumbrar nexo de causalidade entre elas e o resultado ocorrido. Diz-se, nesse sentido, que a conduta de cada autor ou partícipe deve concorrer objetivamente (ou seja, sob o ponto de vista causal) para a produção do resultado. Ou ainda, que cada ação ou omissão humana (conduta) deve gozar de importância (relevância), à luz do encadeamento causal de eventos, para a verificação daquele crime, contribuindo objetivamente para tanto. Desse modo, condutas irrelevantes ou insignificantes para a existência do crime são desprezadas, não constituindo sequer participação criminosa; deve-se concluir, nesses casos, pela não concorrência do sujeito para a prática delitiva. Isso, porque, a parti-cipação exige mínimo de eficácia causal à realização da conduta típica criminosa.

C) LIAME SUBJETIVO OU NORMATIVO ENTRE AS PESSOAS: Necessário, também, que exista vínculo psicológico ou normativo entre os diversos “atores criminosos”, de maneira a fornecer uma ideia de todo, isto é, de unidade na empreitada delitiva. Exige-se, por conseguinte, que o sujeito manifeste, com a sua conduta, consciência e vontade de atuar em obra delitiva comum. Deve haver unidade de desígnios. É pressuposto básico do concurso de agentes que haja uma cooperação desejada e recíproca entre eles. É necessária a homogeneidade de elemento subjetivo (não se admite participação dolosa em crime culposo e vice-versa).

Observação: não se exige prévio acordo de vontades, mas apenas que uma vontade adira à outra. Assim, por exemplo, a domés-tica pode deixar a porta aberta para prejudicar a patroa e um ladrão pode entrar na casa sem que saiba estar sendo ajudado.

D) IDENTIDADE DE INFRAÇÃO PENAL: Trata-se de identidade de infração para todos os participantes, não propriamente de um requisito, mas sim de verdadeira consequência jurídica diante das outras condições. Havendo liame subjetivo, todos os envol-vidos devem responder pelo mesmo crime, salvo exceções pluralísticas.

Alguns crimes, chamados monossubjetivos ou de concurso eventual, podem ser cometidos por um ou mais agentes, como o homicídio, por exemplo; outros, no entanto, denominados plurissubjetivos ou de concurso necessário, só podem ser praticados por uma pluralidade de agentes, como o crime de quadrilha ou bando. Os crimes plurissubjetivos podem ser de condutas paralelas (artigo 288), de condutas convergentes (artigo 240) ou de condutas contrapostas (artigo 137). O conceito de autor é algo polêmico para a doutrina. Há três teorias sobre a autoria:

Teoria Restritiva: autor é somente aquele que realiza o núcleo da figura típica, ou seja, é aquele que pratica o verbo do tipo. Autor é quem mata, subtrai, sequestra etc. Adota critério formal-objetivo, pois se atém à descrição típica. Haverá coautoria quando dois ou mais agentes, em conjunto, realizarem o verbo do tipo. Partícipe é aquele que, sem realizar o núcleo da ação típica, concorre de qualquer forma para a consecução do crime. É a que entendemos correta e adotada pelo Código Penal.

Teoria Extensiva: não existe distinção entre coautor e partícipe; todos são chamados de coautores, realizem o verbo ou concor-ram para a consecução do crime. Segue o critério material-objetivo. Essa teoria era adotada pela antiga Parte Geral do Código Penal, entretanto, com a reforma de 1984, não é mais adotada.

Teoria do Domínio do Fato: autores de um crime são todos os agentes que, mesmo sem praticar o verbo, concorrem para a produção final do resultado, tendo o domínio completo de todas as ações até o momento consumativo. O que importa não é se o agente pratica ou não o verbo, mas se detém o controle dos fatos, podendo decidir sobre sua prática, interrupção e circunstâncias, do início da execução até a produção do resultado. Adota um critério objetivo-subjetivo. Essa teoria complementa a teoria restritiva e é adotada por Damásio de Jesus.

Natureza Jurídica do Concurso de Agentes

Teoria unitária ou monista: Todos os coautores e partícipes respondem por um único crime. É a teoria que foi adotada como regra pelo Código Penal (artigo 29, caput).

Teoria dualista: Os coautores respondem por um crime e os partícipes por outro. Não foi adotada pelo sistema jurídico brasi-leiro.

Teoria pluralística: Cada um dos participantes responde por delito próprio, ou seja, cada partícipe será punido por um crime diferente. Essa teoria foi adotada como exceção pelo Código Penal, pois se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave deve ser aplicada a pena deste (artigo 29, § 2.º). Se o resultado mais grave for previsível a pena será aumentada até a metade. Outras exceções pluralísticas:

- o provocador do aborto responde pela figura do artigo 126, ao passo que a gestante que consentiu responde pela figura do artigo 124 do Código Penal;

- na hipótese de casamento entre pessoa já casada e outra solteira, respondem os agentes, respectivamente, pelas figuras tipifica-das no artigo 235, caput, e § 1º, do Código Penal.

- crimes de corrupção ativa e passiva (artigos 333 e 317 do Código Penal).- Falso testemunho e corrupção de testemunha (artigos 342 e 343 do Código Penal).

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Natureza Jurídica da Participação

De acordo com a teoria da acessoriedade, a participação é uma conduta acessória à do autor, tida por principal. Considerando que o tipo penal somente contém o núcleo e os elementos da conduta principal, os atos do partícipe acabam não encontrando qualquer enquadramento. Há quatros classes de acessoriedade:

- mínima: basta ao partícipe concorrer para um fato típico;- limitada: deve concorrer para um fato típico e ilícito;- extrema: o fato deve ser típico, ilícito e culpável;- hiperacessoriedade: o fato deve ser típico, ilícito e culpável e o partícipe responderá ainda pelas agravantes e atenuantes de

caráter pessoal relativas ao autor principal. Nossa legislação adota a teoria da acessoriedade limitada. Tratando-se de comportamen-to acessório e não havendo correspondência entre a conduta do partícipe e as elementares do tipo, faz-se necessária uma norma de extensão que leve a participação até o tipo incriminador (adequação típica mediata ou indireta). Essa norma é o artigo 29 do Código Penal.

Formas de Participação Participação moral - induzimento: fazer nascer a ideia no autor;- instigação: reforçar a ideia já existente na mente do autor.

Participação material É aquela que ocorre por meio de atos materiais. É o auxílio, como por exemplo, emprestar a arma do crime.Cúmplice é o partícipe que concorre para o crime por meio de auxílio.

Autoria MediataOcorre quando o autor se serve de uma pessoa sem condições de avaliar o que está fazendo para, em seu lugar, praticar o crime. A

pessoa desprovida de discernimento (por exemplo: um louco ou uma criança) é um simples instrumento da atuação do autor mediato. A autoria mediata pode resultar de:

- ausência de capacidade penal;- provocação de erro de tipo escusável;- coação moral irresistível;- obediência hierárquica. Não há concurso de agentes entre o autor mediato e o executor, pois somente o autor mediato responderá, porque praticou o

crime utilizando terceiro como mero instrumento.

Autoria ColateralOcorre quando duas ou mais pessoas realizam simultaneamente uma conduta sem que exista entre elas liame subjetivo. Cada um

dos autores responde por seu resultado, visto não haver, nesse caso, coautoria.

Autoria IncertaOcorre quando, na autoria colateral, não se sabe quem produziu o resultado. A consequência é a responsabilização de todos os

autores por tentativa, visto que não se sabe qual deles provocou o resultado (princípio in dubio pro reo).

Autoria Ignorada ou DesconhecidaOcorre quando não se sabe quem foi o realizador da conduta. A consequência é o arquivamento do inquérito policial por ausência

de indícios.

Participação por OmissãoOcorre quando o sujeito que tem o dever jurídico de impedir o resultado se omite (artigo 13, § 2.º, do Código Penal). A omissão

torna-se uma forma de praticar o crime. A vontade do sujeito, que tem o dever jurídico de impedir o resultado, adere à vontade dos agentes do crime.

Conivência ou Participação Negativa (crimen silenti)Ocorre quando o sujeito, que não tem o dever jurídico de impedir o resultado, se omite. Não responderá pelo crime, exceto se a

omissão constituir crime autônomo Exemplo: se o sujeito fica sabendo de um furto e não comunica à autoridade policial, não respon-de pelo crime; também, se um exímio nadador presencia uma mãe lançando seu filho de tenra idade em uma piscina, não responde pelo homicídio (poderá responder por omissão de socorro), exceto se tiver o dever jurídico de evitar o resultado (se for o professor de natação da criança, por exemplo).

Didatismo e Conhecimento 33

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Participação de ParticipaçãoÉ o auxílio do auxílio, o induzimento ao instigador etc.

Participação SucessivaOcorre quando o mesmo partícipe concorre para a conduta principal de mais de uma forma. Exemplo: o partícipe induz o autor

a praticar um crime e depois o auxilia no cometimento.Participação ImpunívelQuando o fato principal não ingressar na fase executória, a participação restará impune (artigo 31 do Código Penal).

Comunicabilidade e Incomunicabilidade de Elementares e Circunstâncias. Circunstâncias incomunicáveis: Circunstâncias são dados, fatos, elementos ou peculiaridades que apenas circundam o fato

sem integrar a figura típica, contribuindo, entretanto, para aumentar ou diminuir a sua gravidade. Ex.: agravantes e atenuantes gené-ricas, causas de aumento e diminuição de pena, etc. Podem ser objetivas e subjetivas. Objetivas são as que dizem respeito ao fato, a qualidade e condições da vítima ao tempo, lugar, modo e meio de execução do crime. Subjetivas as que se referem aos agentes, as suas qualidades, estado, parentesco, motivo do crime etc.

Elementares são dados, fatos, elementos e condições que integram determinadas figuras típicas, cuja supressão faz desaparecer ou modificar o crime, transformando-o em outra figura típica. Ex.: no crime de homicídio, as elementares são “matar alguém”.

Tais circunstâncias e condições, quando não constituem elementares do crime, pertencem exclusivamente ao agente que as tem como atribuo logo, não se comunicam. Cada um responde pelo crime de acordo com sua circunstancias e condições pessoais.

Nos casos de constituírem circunstâncias elementares do crime principal, as condições e circunstâncias de caráter pessoal, comunicam-se dos autores aos partícipes, mas não dos partícipes aos autores por ser a participação acessória da autoria.

Podemos, assim, extrair três regras: 1.ª) as circunstâncias subjetivas, também chamadas de circunstâncias de caráter pessoal, jamais se comunicam; 2.ª) as circunstâncias objetivas, de caráter não-pessoal, podem comunicar-se, desde que o coautor ou partícipe delas tenha co-

nhecimento;3.ª) as elementares, pouco importando se subjetivas (de caráter pessoal) ou objetivas, sempre se comunicam.

TÍTULO IV DO CONCURSO DE PESSOAS

Regras comuns às penas privativas de liberdade Art. 29 - Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade. § 1º - Se a participação for de menor importância, a pena pode ser diminuída de um sexto a um terço. § 2º - Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será aumen-

tada até metade, na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave.

Circunstâncias incomunicáveisArt. 30 - Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime.

Casos de impunibilidadeArt. 31 - O ajuste, a determinação ou instigação e o auxílio, salvo disposição expressa em contrário, não são puníveis, se o crime

não chega, pelo menos, a ser tentado.

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11 CRIMES CONTRA A PESSOA (HOMICÍDIO, DAS LESÕES CORPORAIS,

DA RIXA).

TÍTULO I DOS CRIMES CONTRA A PESSOA

CAPÍTULO I DOS CRIMES CONTRA A VIDA

Homicídio simplesArt 121. Matar alguém:Pena - reclusão, de seis a vinte anos.

Caso de diminuição de pena§ 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção,

logo em seguida a injusta provocação da vítima, ou juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço.

Homicídio qualificado§ 2° Se o homicídio é cometido:I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe;II - por motivo fútil;III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido;V - para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime:Pena - reclusão, de doze a trinta anos.

Homicídio culposoPena - detenção, de um a três anos.Aumento de pena§ 4o No homicídio culposo, a pena é aumentada de 1/3 (um terço), se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão,

arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as consequências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante. Sendo doloso o homicídio, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou maior de 60 (sessenta) anos.

§ 5º - Na hipótese de homicídio culposo, o juiz poderá deixar de aplicar a pena, se as consequências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária.

§ 6o A pena é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado por milícia privada, sob o pretexto de prestação de serviço de segurança, ou por grupo de extermínio. (Incluído pela Lei nº 12.720, de 2012)

(...)

CAPÍTULO II DAS LESÕES CORPORAIS

Lesão corporalArt. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem:Pena - detenção, de três meses a um ano.

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NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Lesão corporal de natureza grave§ 1º Se resulta:I - Incapacidade para as ocupações habituais, por mais de trinta dias;II - perigo de vida;III - debilidade permanente de membro, sentido ou função;IV - aceleração de parto:Pena - reclusão, de um a cinco anos.§ 2° Se resulta:I - Incapacidade permanente para o trabalho;II - enfermidade incurável;III perda ou inutilização do membro, sentido ou função;IV - deformidade permanente;V - aborto:Pena - reclusão, de dois a oito anos.

Lesão corporal seguida de morte§ 3° Se resulta morte e as circunstâncias evidenciam que o agente não quis o resultado, nem assumiu o risco de produzi-lo:Pena - reclusão, de quatro a doze anos.

Diminuição de pena§ 4° Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral ou sob o domínio de violenta emoção,

logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço.

Substituição da pena§ 5° O juiz, não sendo graves as lesões, pode ainda substituir a pena de detenção pela de multa, de duzentos mil réis a dois contos

de réis:I - se ocorre qualquer das hipóteses do parágrafo anterior;II - se as lesões são recíprocas.

Lesão corporal culposa§ 6° Se a lesão é culposa: Pena - detenção, de dois meses a um ano.Aumento de pena§ 7o Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) se ocorrer qualquer das hipóteses dos §§ 4o e 6o do art. 121 deste Código. (Redação

dada pela Lei nº 12.720, de 2012)§ 8º - Aplica-se à lesão culposa o disposto no § 5º do art. 121.

Violência Doméstica § 9o Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha

convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade: (Redação dada pela Lei nº 11.340, de 2006)

Pena - detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos. (Redação dada pela Lei nº 11.340, de 2006)§ 10. Nos casos previstos nos §§ 1o a 3o deste artigo, se as circunstâncias são as indicadas no § 9o deste artigo, aumenta-se a

pena em 1/3 (um terço). § 11. Na hipótese do § 9o deste artigo, a pena será aumentada de um terço se o crime for cometido contra pessoa portadora de

deficiência.

(...)

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CAPÍTULO IVDA RIXA

Rixa Art. 137 - Participar de rixa, salvo para separar os contendores:Pena - detenção, de quinze dias a dois meses, ou multa.Parágrafo único - Se ocorre morte ou lesão corporal de natureza grave, aplica-se, pelo fato da participação na rixa, a pena de

detenção, de seis meses a dois anos.

HOMICÍDIO

São três os tipos (espécies): - homicídio simples;- homicídio privilegiado;- homicídio qualificado.

Homicídio Simples:Conceito de homicídio: eliminação da vida humana extrauterina, provocada por outra pessoa.Tipo penal: matar alguém.Pena: reclusão de 6 (seis) a 20 (vinte) anos.

Objeto jurídico: Objetividade jurídica trata-se do bem jurídico tutelado pela norma penal. No caso do homicídio o bem jurídico tutelado é a vida

humana extrauterina. O homicídio é um crime simples, pois tem apenas um bem jurídico tutelado (vida). Crimes complexos são aqueles em que a lei protege mais de um bem jurídico (exemplo: latrocínio).

Sujeito ativo:Qualquer pessoa. O homicídio é um crime comum, pois pode ser praticado por qualquer pessoa, ao contrário dos crimes próprios,

que só podem ser praticados por determinadas pessoas.O homicídio admite coautoria e participação. Lembre-se que o Código Penal adotou a teoria restritiva, logo:Autor: é a pessoa que pratica a conduta descrita no tipo, o verbo do tipo (é quem subtrai, quem constrange, quem mata).Partícipe: é a pessoa que não comete a conduta descrita no tipo, mas de alguma forma contribui para o crime. Exemplo: aquele

que empresta a arma, incentiva.

Para que exista coautoria e participação, é necessário que exista liame subjetivo, ou seja, a ciência por parte dos envolvidos de que estão colaborando para um fim comum.

Pergunta: Que vem a ser autoria colateral?Resposta: Ocorre quando duas ou mais pessoas querem cometer o mesmo crime e agem ao mesmo tempo, sem que uma saiba da

intenção da outra, e o resultado morte decorre da conduta de um só agente, que é identificado no caso concreto. O que for identificado responderá por homicídio consumado e o outro por tentativa.

Pergunta: Que se entende por autoria incerta?Resposta: Ocorre quando, na autoria colateral, não se consegue identificar o causador da morte, respondendo todos por tentativa

de homicídio.

Classificação:É um crime simples, comum, instantâneo, material e de dano.Sujeito passivo:Qualquer ser humano após seu nascimento e desde que esteja vivo.Crime impossível: tem a finalidade de afastar a tentativa por absoluta ineficácia do meio ou absoluta impropriedade do objeto. Há

crime impossível por absoluta impropriedade do objeto na conduta de quem tenta tirar a vida de pessoa já morta e, neste caso, não há tentativa de homicídio, ainda que o agente não soubesse que a vítima estava morta. Haverá também crime impossível, mas por absoluta ineficácia do meio, quando o agente usa, por exemplo, arma de brinquedo ou bala de festim.

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Consumação:Dá-se no momento da morte (crime material). A morte ocorre quando cessa a atividade encefálica (Lei n. 9.434/97, artigo 3.º). A

prova da materialidade se faz por meio do laudo de exame necroscópico assinado por dois legistas, que devem atestar a ocorrência da morte e se possível as suas causas.

Tentativa:Tentativa branca de homicídio: ocorre quando o agente pratica o ato de execução, mas não atinge o corpo da vítima que, portanto,

não sofre qualquer dano em sua integridade corporal.Tentativa cruenta de homicídio: ocorre quando a vítima é atingida, sendo apenas lesionada. Tentativa de homicídio diferencia-se de lesão corporal consumada: o que distingue é o dolo (intenção do agente).Progressão criminosa: o agente inicia a execução querendo apenas lesionar e depois altera o seu dolo e resolve matar. Conse-

quência: o agente só responde pelo homicídio que absorve as lesões corporais.Lesão corporal seguida de morte: trata-se de crime preterdoloso (dolo na lesão e culpa na morte). Não se confunde com a pro-

gressão criminosa.Desistência Voluntária: o agente só responde pelos atos já praticados. Ocorre quando, por exemplo, ele efetua um disparo contra

a vítima e percebe que não a atingiu de forma mortal, sendo que, na sequência, voluntariamente deixa de efetuar novos disparos, ape-sar de ser possível fazê-lo. O agente responde só por lesões corporais. Não há tentativa, por não existir circunstância alheia à vontade do agente que tenha impedido a consumação (artigo 15 do Código Penal).

Elemento subjetivo:- dolo direto: quando a pessoa quer o resultado;- dolo eventual: o agente assume o risco de produzir o resultado (prevê a morte e age).No caso de homicídio decorrente de racha de automóveis (artigo 308 do Código de Trânsito Brasileiro), os Tribunais têm enten-

dido que se trata de homicídio com dolo eventual.

HOMICÍDIO PRIVILEGIADO - ARTIGO 121, § 1.º, DO CÓDIGO PENALNatureza Jurídica:Causa de diminuição de pena (redução de 1/6 a 1/3, em todas as hipóteses).Apesar de o parágrafo trazer a expressão “pode”, trata-se de uma obrigatoriedade, para não ferir a soberania dos veredictos. O

privilégio é votado pelos jurados e, se reconhecido o privilégio, a redução da pena é obrigatória, pois do contrário estaria sendo ferido o princípio da soberania dos veredictos. Trata-se, portanto, de um direito subjetivo do réu.

As hipóteses são de natureza subjetiva porque estão ligadas aos motivos do crime:- Motivo de relevante valor moral (nobre): diz respeito a sentimentos do agente que demonstre que houve uma motivação ligada

a uma compaixão ou algum outro sentimento nobre. É o caso da eutanásia.- Motivo de relevante valor social: diz respeito ao sentimento da coletividade. Exemplo: matar o traidor da Pátria.- Sob domínio de violenta emoção, logo em seguida à injusta provocação da vítima. Requisitos:a - existência de uma injusta provocação (não é injusta agressão, senão seria legítima defesa). Exemplo: adultério, xingamento,

traição. Não é necessário que a vítima tenha tido a intenção específica de provocar, bastando que o agente se sinta provocado.b - que, em razão da provocação, o agente fique tomado por uma emoção extremamente forte. Emoção é um estado súbito e

passageiro de instabilidade psíquica.c - reação imediata (logo em seguida...): não pode ficar evidenciada uma patente interrupção entre a provocação e a morte. Leva-

-se em conta o momento em que o sujeito ficou sabendo da provocação.

HOMICÍDIO QUALIFICADO - ARTIGO 121, § 2.º, DO CÓDIGO PENALPena: reclusão de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.Classificação:- Quanto aos motivos: incisos I e II.- Quanto ao meio empregado: inciso III.- Quanto ao modo de execução: inciso IV.- Por conexão: inciso V.

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NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Inciso I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpeNa paga ou promessa de recompensa, há a figura do mandante e do executor. Neste caso, o homicídio é também chamado homi-

cídio mercenário.A paga é prévia em relação à execução. Na promessa de recompensa, o pagamento é posterior à execução. Mesmo se o mandante

não a cumprir, existirá a qualificadora.Motivo torpe: é o motivo moralmente reprovável, vil, repugnante. Exemplo: matar o pai para ficar com herança; matar a esposa

porque ela não quis manter relação sexual. O ciúme não é considerado motivo torpe. A vingança será considerada, ou não, motivo torpe dependendo do que a tenha originado.

Inciso II - motivo fútilMatar por motivo de pequena importância, motivo insignificante. Exemplo: matar por causa de uma “fechada” no trânsito. A ausência de prova, referente aos motivos do crime, não permite o reconhecimento dessa qualificadora. Ciúme não caracteriza motivo fútil. A existência de uma discussão “forte”, precedente ao crime, afasta o motivo fútil, ainda que a discussão tenha se iniciado por mo-

tivo de pequena importância, pois se entende que a causa do homicídio foi a discussão e não o motivo anterior que a havia originado.A vingança será considerada, ou não, motivo fútil, dependendo do que a tenha originado.

Inciso III - emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou que possa representar perigo comum.

Emprego de veneno:Trata-se do venefício, que é o homicídio praticado com o emprego de veneno.É necessário que seja inoculado de forma que a vítima não perceba. Se o veneno for introduzido com violência ou grave ameaça,

será aplicada a qualificadora do meio cruel. Certas substâncias que são inofensivas para as pessoas em geral poderão ser consideradas veneno em razão de condições de saúde peculiares da vítima, como no caso do açúcar para o diabético.

Emprego de fogo:Se além de causar a morte da vítima o fogo ou explosivo danificarem bem alheio, o agente só responderá pelo homicídio quali-

ficado (artigo 163, parágrafo único, inciso II, do Código Penal).

Emprego de explosivo:Exemplo de bombas caseiras em torcidas de futebol. Eventual dano ao patrimônio alheio ficará absorvido pelo homicídio quali-

ficado pelo fogo ou explosivo.

Emprego de asfixia:Causa o impedimento da função respiratória. Formas de asfixia: - Asfixia mecânica- Esganadura: o agente, com seu próprio corpo, comprime o pescoço da vítima.- Estrangulamento: passar fio, arame etc. no pescoço da vítima, causando-lhe a morte. É a própria força do agente atuando, mas

não com as mãos.- Enforcamento: é a força da gravidade que faz com que o peso da vítima cause sua morte (por exemplo: o pescoço da vítima é

envolto com uma corda).- Sufocação: é a utilização de algum objeto que impeça a entrada de ar nos pulmões da vítima (exemplo: introduzir algodão na

garganta da vítima, colocar travesseiro no seu rosto).- Afogamento: imersão em meio líquido.- Soterramento: imersão em meio sólido (exemplo: enterrar alguém vivo fora de um caixão).- Imprensamento ou sufocação indireta: impedir o movimento respiratório colocando, por exemplo, um peso sobre o tórax da

vítima.- Asfixia tóxica: uso de gás asfixiante: monóxido de carbono, por exemplo.- Confinamento: trancar alguém em lugar fechado de forma a impedir a troca de ar (exemplo: enterrar alguém vivo dentro de

caixão).

Emprego de tortura ou qualquer meio insidioso ou cruel:Tortura: Deve ser a causa direta da morte. Trata-se de meios que causam na vítima intenso sofrimento físico ou mental. A rei-

teração de golpes, dependendo da forma como ela é utilizada, pode ou não caracterizar a qualificadora de meio cruel (exemplos: apedrejamento, paulada, espancamento etc.).

Didatismo e Conhecimento 39

NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Eventual mutilação praticada após a morte caracteriza crime autônomo de destruição de cadáver (artigo 211 do Código Penal).O crime de tortura com resultado morte (artigo 1.º, § 3.º, da Lei n. 9.455/97), que prevê pena de reclusão de 8 a 16 anos, não se

confunde com o homicídio qualificado pela tortura. A diferença está no elemento subjetivo. No homicídio qualificado, o agente quer a morte da vítima e utiliza meio que causa intenso sofrimento físico ou mental. No crime de tortura com resultado morte, no entanto, o agente tem a intenção de torturar a vítima, mas acaba provocando sua morte culposamente (trata-se de crime preterdoloso - dolo no antecedente e culpa no consequente).

Meio insidioso: é o meio ardiloso que consiste no uso de fraude, armadilha, parecendo não ter havido infração penal, e sim um acidente, como no caso de sabotagem nos freios do automóvel.

Emprego de qualquer meio do qual possa resultar perigo comum:Gera perigo a um número indeterminado de pessoas. Não é necessário que o caso concreto demonstre o perigo comum, basta que

se comprove que o meio usado poderia causar dano a várias pessoas, ainda que não haja uma situação de risco específico.

Inciso IV – à traição, de emboscada ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido

Refere-se ao modo que o sujeito usou para aproximar-se da vítima.Traição: aproveitar-se da prévia confiança que a vítima deposita no agente para alvejá-la (exemplo: matar a esposa que está

dormindo).- Emboscada ou tocaia: aguardar escondido a passagem da vítima por um determinado local para matá-la. - Dissimulação: uso de artifício para se aproximar da vítima. Pode ser:Material: dá-se com o uso de disfarce, fantasia ou métodos análogos para se aproximar.- Moral: a pessoa usa a palavra. Sujeito dá falsas provas de amizade ou de apreço para poder se aproximar.

Qualquer outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa da vítimaExemplos: surpresa, disparo pelas costas, enquanto a vítima dorme etc.Quando uma pessoa armada mata outra desarmada, a jurisprudência não configura a qualificadora por razão de política criminal.

Inciso V – para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crimeO inciso refere-se às qualificadoras por conexão, que podem ser:- Teleológica: Quando a morte visa assegurar a execução de outro crime (exemplo: matar o segurança para sequestrar o empresá-

rio). Haverá concurso material entre o homicídio qualificado e o outro delito, salvo se houver crime específico no Código Penal para esta situação (exemplo: no latrocínio, o agente mata para roubar).

- Consequencial: Ocorre quando a morte visa garantir:- ocultação de outro crime: o agente quer evitar que alguém descubra que o crime foi praticado;- impunidade: evitar que alguém conheça o autor de um crime (exemplo: matar testemunha);- vantagem (exemplo: ladrões de banco – um mata o outro).

Na conexão teleológica, primeiro o agente mata e depois comete o outro crime. Na consequencial, primeiro comete o outro crime, depois mata.

Se o agente visa a garantia da execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de uma contravenção, será aplicada a qualifica-dora do motivo torpe, conforme o caso. Não incide o inciso V, pois, esse se refere expressamente a outro crime.

HOMICÍDIO CULPOSO - ARTIGO 121, § 3.º, DO CÓDIGO PENALPena: detenção de 1 (um) a 3 (três) anos.A morte decorre de imprudência, negligência ou imperícia.- Imprudência: consiste numa ação, conduta perigosa.- Negligência: é uma omissão; ocorre quando se deveria ter tomado certo cuidado.- Imperícia: ocorre quando uma pessoa não possui aptidão técnica para a realização de certa conduta e mesmo assim a realiza,

dando causa à morte.

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LESÃO CORPORAL

Conceito: ofensa à integridade corporal consiste no dano anatômico prejudicial ao corpo humano. Exemplo: corte, queimadura, mutilações etc.

Sujeito Ativo: qualquer pessoa, exceto o próprio ofendido. Saliente-se que a lei não pune a autolesão. A autolesão pode, entre-tanto, constituir crime de outra natureza, tais como autolesão para receber seguro (artigo 171, § 2.º, inciso V, do Código Penal), ou criação de incapacidade para frustar a incorporação militar (artigo 184 do Código Penal Militar).

Sujeito Passivo: qualquer pessoa, salvo nas hipóteses em que a vítima só poderá ser mulher grávida. Consumação: no momento da ofensa à integridade física ou à saúde.Tentativa: É possível. A tentativa de lesão corporal difere da contravenção de vias de fato (artigo 21 da Lei de Contravenções

Penais), pois, na contravenção o agente não tem intenção de lesionar a vítima (exemplo: empurrão). Se o agente emprega violência ultrajante, com intenção de humilhar a vítima, estamos diante do crime de injúria real (artigo 140, § 2.º, do Código Penal).

Se o agente agride sem a intenção de lesionar, mas lesiona, ocorre a lesão corporal culposa, que afasta as vias de fato.

Lesão Leve:Por exclusão, é toda lesão que não for grave nem gravíssima. Pena: detenção de 3 (três) meses a 1 (um) ano. A lesão corporal

leve é infração de menor potencial ofensivo.

Concurso de crimes:Em muitos crimes, como no roubo, por exemplo, a violência é utilizada como meio de execução. O que ocorrerá se da violência

decorrer lesão leve?No silêncio da lei a respeito do resultado violência, conclui-se que a lesão leve fica absorvida (exemplo: roubo, extorsão, estupro,

atentado violento ao pudor, crime de tortura etc.). Se, no entanto, a lei expressamente ressalvar a aplicação autônoma do resultado da violência, o agente responderá pelos dois crimes, sendo somadas as penas (exemplo: injúria real, constrangimento ilegal, dano qualificado, rapto, exercício arbitrário das próprias razões, resistência etc.).

Ação penal:O artigo 88 da Lei n. 9.099/95 transformou a lesão corporal dolosa leve em crime de ação penal pública condicionada à repre-

sentação do ofendido. A jurisprudência e a doutrina estenderam a exigência da representação para as vias de fato.Outra regra trazida pela Lei n. 9.099/95: para o oferecimento da denúncia não é necessário um exame de corpo de delito, basta

um boletim de ocorrência ou ficha médica.

Lesão decorrente de esporte:Não há crime, desde que tenha havido respeito às regras do jogo, pois se trata de exercício regular de direito.

Intervenção cirúrgica: Se a cirurgia não é de emergência, o médico deve obter o consentimento do paciente ou do seu representante legal. Trata-se,

quando há consentimento, de exercício regular de direito.Se a cirurgia for de urgência, o agente estará acobertado pelo estado de necessidade em favor de terceiro.

Lesão Grave – Artigo 129, § 1.º, do Código PenalPena: de 1 (um) a 5 (cinco) anos de reclusão.Inciso I – se resulta incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 diasÉ necessário o exame complementar, realizado no primeiro dia após o período de 30 dias, para comprovar a materialidade da

lesão grave (artigo 168, § 2.º, do Código de Processo Penal). O prazo de 30 dias é contado nos termos do artigo 10 do Código Penal.Ocupação habitual é qualquer atividade rotineira na vida da vítima, tal como estudar, andar, praticar esportes etc., exceto a

considerada ilícita. No caso de atividade lícita, mas imoral, haverá lesão grave (exemplo: incapacitar prostituta de manter relações sexuais).

Se a vítima deixar de praticar atividades rotineiras, por sentir vergonha, não há se falar em incapacidade.Trata-se de um exemplo de crime a prazo.O resultado agravador pode ser culposo ou doloso.Inciso II – se resulta perigo de vidaÉ uma hipótese preterdolosa, pois o sujeito não quer a morte. Se o agente queria o resultado morte, responderá por tentativa de

homicídio.

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NOÇÕES DE DIREITO PENAL

O perito deve dizer claramente em que consistiu o perigo de vida (exemplo: houve perigo de vida porque a vítima perdeu muito sangue etc.), e o Promotor de Justiça deve transcrever na denúncia.

Inciso III – se resulta debilidade permanente de membro, sentido ou função.Membros são os apêndices do corpo (braços e pernas). Exemplo: cortar o tendão do braço, causando perda parcial do membro. Os sentidos são o tato, o olfato, a visão, o paladar e a audição. Exemplo: diminuição da capacidade de enxergar, ouvir etc.A função consiste no funcionamento de órgãos ou aparelhos do corpo humano (exemplo: função respiratória, função reproduto-

ra). A debilidade é o enfraquecimento, a diminuição, a redução da capacidade funcional. A debilidade deve ser permanente, ou seja,

de recuperação incerta e improvável e cuja cessação eventual ocorrerá em data incalculável (permanente não é a mesma coisa que perpétua).

A debilidade não se confunde com a perda ou inutilização do membro, sentido ou função, hipóteses de lesão corporal gravíssima, disciplinadas no § 2.º.

Inciso IV - aceleração do parto Caracteriza-se pela antecipação da data do nascimento. Pressupõe o nascimento com vida. Para evitar a responsabilidade objeti-

va, é necessário que o agente saiba que a mulher está grávida.

Lesão Gravíssima – Artigo 129, § 2.º, do Código PenalPena: reclusão de 2 (dois) a 8 (oito) anos.A denominação lesão gravíssima é dada pela doutrina e jurisprudência. A lei não utiliza essa expressão, que tem a finalidade de

diferenciar as lesões do § 2.º que tem pena mais severa do que o § 1.º. Se uma lesão se enquadra em grave e gravíssima, o réu responderá pela gravíssima.

Inciso I – se resulta incapacidade permanente para o trabalho:É mais específico que o § 1.º, inciso I. A incapacidade deve ser permanente (a lei não diz perpétua) e deve abranger qualquer

tipo de trabalho (posição majoritária). Para uma corrente minoritária, a incapacidade da vítima deve impossibilitar o trabalho que ela exercia anteriormente.

O sujeito passivo não poderá ser criança ou pessoa idosa aposentada.Inciso II – se resulta enfermidade incurável:Da lesão decorre doença para a qual não existe cura. Para uma corrente, a transmissão intencional de AIDS tipifica a tentativa de homicídio. Para outra, caracteriza lesão gravíssima,

pela transmissão de moléstia incurável.

Inciso III – se resulta perda ou inutilização de membro, sentido ou função:A perda pode se dar:- por mutilação: ocorre pela própria ação lesiva; é o corte de uma parte do corpo da vítima (extirpação do braço, da perna, da

mão etc.);- por amputação: é a extirpação feita pelo médico, posteriormente à ação, para salvar a vida da vítima.Na inutilização, o membro permanece ligado ao corpo da vítima, ainda que parcialmente, mas totalmente inapto para a realiza-

ção de sua atividade própria. Observações:Com relação aos membros: o decepamento de um dedo ou a perda parcial dos movimentos do braço constitui lesão grave, ou

seja, mera debilidade. Havendo paralisia total, ainda que seja de um só braço, ou se houver mutilação da mão, a lesão é gravíssima pela inutilização de membro.

Com relação aos sentidos: há alguns sentidos captados por órgãos duplos (visão e audição). A provocação de cegueira, ainda que completa, em um só olho, constitui apenas debilidade permanente. O mesmo ocorre com a audição.

Com relação à função: a perda ou inutilidade de função só será possível em função não vital, como por exemplo, a perda da função reprodutora, causada pela extirpação do pênis.

Inciso IV – se resulta deformidade permanenteEstá ligado ao dano estético, causado pelas cicatrizes. Exemplo: queimadura por fogo, por ácido (vitriolagem), etc. Requisitos: Que o dano estético seja razoável, ou seja, de uma certa monta. Deve ser permanente, isto é, não se reverte com o passar do

tempo. Se a vítima se submeter a uma cirurgia plástica e houver a correção, desclassifica-se o delito. Se a cirurgia plástica for possí-vel, mas a vítima não a fizer, persiste o crime, pois a vítima não está obrigada a fazer a cirurgia. Se a deformidade surgiu de um erro médico, há dois crimes (lesão dolosa em relação ao primeiro e lesão culposa em relação ao médico).

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Que a deformidade seja visível. Que seja capaz de provocar impressão vexatória. A deformidade estética deve ser algo que reduza a beleza física da vítima.Inciso V – se resulta abortoAborto é a interrupção da gravidez, com a consequente morte do produto da concepção. Trata-se de qualificadora preterdolosa. Há dolo na lesão e culpa em relação ao aborto. Se houver dolo também em relação ao

aborto, o agente responde por lesão corporal em concurso formal imperfeito com aborto (artigo 70, caput, parte final). Há, por fim, hipótese do agente que quer provocar o aborto e, culposamente, causa lesão grave na mãe (artigo 127 do Código Penal).

É necessário que o agente saiba que a mulher está grávida. Isso para evitar a chamada responsabilidade objetiva (artigo 19 do Código Penal).

Lesão Corporal Seguida de Morte – Artigo 129, § 3.º, do Código Penal:Pena: reclusão de 4 (quatro) a 12 (doze) anos.É também um crime preterdoloso no qual há dolo na lesão e culpa no resultado morte. O agente não prevê a morte, que era pre-

visível. Por ser preterdoloso, não admite tentativa.Se não houver dolo na agressão (lesão), trata-se de homicídio culposo.Caracterizará progressão criminosa se houver dolo inicial de lesão e, durante a execução, o agente resolver matar a vítima. Nesse

caso, responderá pelo homicídio doloso (crime mais grave).

Lesão Corporal Privilegiada – Artigo 129, § 4.º, do Código PenalAs hipóteses de privilégio das lesões corporais são as mesmas do homicídio privilegiado. O privilégio só se aplica nas lesões

dolosas. É uma causa de redução de pena de 1/6 a 1/3.

Substituição da Pena - Artigo 129, § 5.o, do Código Penal“O juiz, não sendo graves as lesões, pode ainda substituir a pena de detenção pela de multa”, nas seguintes hipóteses:- quando estiver presente uma das causas de privilégio (tratando-se de lesão corporal leve privilegiada, o juiz poderá reduzir a

pena restritiva de liberdade ou substituí-la por multa);- quando as lesões forem recíprocas (sem que um dos agentes tenha agido em legítima defesa).

Lesão Corporal Culposa – Artigo 129, § 6.º, do Código Penal Aplicam-se todos os institutos do homicídio culposo, inclusive os que se referem às causas de aumento de pena e também às

regras referentes ao perdão judicial (§§ 7.º e 8.º do artigo 129 do Código Penal). A pena para lesão culposa é de 2 (dois) meses a 1 (um) ano de detenção.No Código de Trânsito Brasileiro (artigo 303), porém, a lesão corporal culposa, com o agente na direção de veículo automotor,

recebe pena de detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos e suspensão da habilitação.A composição quanto aos danos civis extingue a punibilidade, tanto da lesão culposa do Código Penal quanto do Código de

Trânsito Brasileiro. Exige-se representação, porque a ação penal é pública condicionada. Na lesão culposa, não há figura autônoma decorrente da gravidade da lesão cujo grau (leve, grave ou gravíssimo) é irrelevante para caracterizar lesão corporal culposa, afetando apenas a tipificação da pena em concreto.

CAUSA DE AUMENTO DE PENA:O art. 129, § 7º, combinado com o art. 121, § 4º, do Código Penal, estabelece que a pena da lesão corporal dolosa, de qualquer

espécie, sofrerá acréscimo de um terço se a vítima é menor de 14 anos ou maior de 60.Violência Doméstica§§ 9º, 10º e 11º: Esses dispositivos, criados pela Lei n. 10.886/2004, não constituem tipos penais autônomos, já que não possuem

núcleo, isto é, não têm nenhum verbo descrevendo uma conduta típica própria. Para criar um tipo penal autônomo não basta lhe dar um nome — “violência doméstica”, por exemplo. Pela redação dos §§ 9º e 10, resta claro que, pelo texto legal aprovado, o legislador quis acrescentar algumas circunstâncias com o intuito de agravar o crime de lesão corporal.

Tanto é assim que, como já mencionado, não descreveu uma conduta típica própria, mas sim fez remissão ao crime de lesão corporal, iniciando o § 9º com a expressão “se a lesão...”, deixando evidente que, ao acrescentar circunstâncias (crime contra ascen-dente, descendente, irmão, cônjuge etc.) e prever novos limites de pena, acabou criando, no § 9º, o crime de lesão corporal dolosa leve qualificada pela violência doméstica. A pena que, originariamente, era de seis meses a um ano, foi alterada pela Lei n. 11.340/2006, passando a ser de três meses a três anos de detenção, pena esta que deverá sofrer acréscimo de um terço se a vítima da violência do-méstica for portadora de deficiência, nos termos do art. 129, § 11, do Código Penal (criado pela Lei n. 11.340/2006).

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DA RIXA

Conceito: Rixa é uma luta desordenada, um tumulto, envolvendo troca de agressões entre três ou mais pessoas, em que os lutadores visam todos os outros indistintamente. Como nesses tumultos é impossível estabelecer qual golpe foi desferido por de-terminado agressor contra outro, todos devem ser punidos por rixa, ou seja, pela participação no tumulto. Dessa forma, não há rixa quando existem dois grupos contrários, perfeitamente definidos, lutando entre si, porque, nessa hipótese, os integrantes de cada grupo serão responsabilizados pelas lesões corporais causadas nos integrantes do grupo contrário. A jurisprudência, entretanto, vem reco-nhecendo o crime de rixa quando se inicia uma troca de agressões entre dois grupos distintos, mas, em razão do grande número de envolvidos, surge tamanha confusão, que, durante seu desenrolar, torna-se impossível identificar tais grupos.

Objetividade jurídica. A vida e a saúde das pessoas envolvidas.Sujeito ativo e passivo. Trata-se de crime de concurso necessário cuja configuração exige uma participação de, no mínimo, três

pessoas (ainda que alguns sejam menores de idade) na troca de agressões. É também definido como crime de condutas contrapostas, já que os rixosos agem uns contra os outros e, assim, são, a um só tempo, sujeito ativo e passivo do delito.

Elemento subjetivo. O dolo. É irrelevante o motivo que levou ao surgimento da rixa. Trata-se de crime de perigo em que se pune a simples troca de agressões, sem a Necessidade de que qualquer dos envolvidos sofra lesão. Caso isso ocorra e o autor das lesões seja identificado, ele responderá pela rixa e pelas lesões leves. Se, entretanto, as lesões forem graves ou houver morte, haverá rixa qualificada, que será estudada mais adiante. A contravenção de vias de fato, porém, fica absorvida pela rixa.

Veja-se, ainda, que o crime é de perigo abstrato, pois a lei presume que, com a troca de agressões, há situação de risco.Não há crime na conduta daquele que ingressa na luta apenas para separar os lutadores, já que inexiste dolo nessa hipótese.Elemento objetivo. Participar: significa tomar parte nas agressões através de chutes, socos, pauladas etc. A participação, entre-

tanto, pode ser:

- material — por parte daqueles que realmente tomam parte na luta através dos chutes, socos etc.;- moral — por parte daqueles que incentivam os demais através de induzimento, instigação ou qualquer outra forma de estímulo.

O partícipe moral, todavia, deve ser, no mínimo, a quarta pessoa, já que a rixa exige pelo menos três na efetiva troca de agressões.Na primeira hipótese, o agente é chamado de partícipe da rixa e, na segunda, de partícipe do crime de rixa.Consumação. Com a efetiva troca de agressões.Tentativa. Em regra não é possível, pois, ou ocorre a rixa e o crime está consumado, ou ela não se inicia, e, nesse caso, não há

crime. Damásio E. de Jesus, por sua vez, entende ser possível a tentativa na chamada rixa ex proposito, em que três lutadores com-binam uma briga entre si, na qual cada um lutará com qualquer deles, sendo que a polícia intervém no exato momento em que iriam iniciar-se as violências recíprocas.

Qualificação doutrinária. Crime de concurso necessário (plurissubjetivo), doloso, instantâneo, simples, de ação livre, comissi-vo, comum e de perigo abstrato.

Legítima defesa. Não é possível se alegar legítima defesa na rixa, pois quem dela participa comete ato antijurídico. Assim, se, durante a rixa, uma pessoa empunha um revólver para atingir outro rixoso e este se defende, matando o primeiro, responde pela rixa porque este crime já se havia consumado anteriormente. Há legítima defesa apenas em relação ao homicídio.

A rixa qualificada é, na realidade, um dos últimos resquícios de responsabilidade objetiva que estão em vigor em nossa lei penal, uma vez que a sua redação, bem como a própria explicação extraída da exposição de motivos, deixa claro que todos os envolvidos na rixa sofrerão maior punição, independentemente de serem eles ou não os responsáveis pela lesão grave ou morte. Até mesmo a vítima das lesões graves responderá pela pena agravada. Por outro lado, se for descoberto o autor do resultado agravador, ele responderá pela rixa qualificada em concurso material com o crime de lesões corporais graves ou homicídio (doloso ou culposo, dependendo do caso), enquanto todos os demais continuarão respondendo pela rixa qualificada. Há, entretanto, entendimento no sentido de que a pessoa identificada como responsável pelo resultado agravador responderá pelas lesões graves ou morte em concurso com rixa simples, pois puni-la pela rixa qualificada constituiria bis in idem (dupla punição pelo mesmo fato).

É indiferente que o resultado tenha ocorrido em um dos integrantes da rixa ou em terceira pessoa.Se ocorrerem várias mortes, haverá crime único de rixa qualificada, devendo a circunstância ser levada em conta na fixação da

pena- base (art. 59 do CP).Se o agente tomou parte na rixa e saiu antes da morte da vítima, responde pela forma qualificada, pois se entende que, com seu

comportamento anterior, colaborou com a criação de condições para o desenrolar da luta, que culminou em resultado mais lesivo. Ao contrário, se o agente entra na rixa após a morte, responde por rixa simples.

Diz a lei que a rixa é qualificada se efetivamente ocorre morte ou lesão grave. Assim, se durante a luta ocorre uma tentativa de homicídio da qual não sobrevém morte nem lesão grave, a rixa é simples e o autor da tentativa, se identificado, também responderá por esse crime.

A pena da figura qualificada é a mesma, quer resulte morte ou lesão grave.

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12. CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO (FURTO, ROUBO, EXTORSÃO, EXTORSÃO

MEDIANTES SEQUESTRO).

TÍTULO II DOS CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO

CAPÍTULO I DO FURTO

FurtoArt. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.§ 1º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o repouso noturno.§ 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção,

diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa.§ 3º - Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico.

Furto qualificado§ 4º - A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido:I - com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa;II - com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza;III - com emprego de chave falsa;IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas.§ 5º - A pena é de reclusão de três a oito anos, se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro

Estado ou para o exterior. Furto de coisa comumArt. 156 - Subtrair o condômino, coerdeiro ou sócio, para si ou para outrem, a quem legitimamente a detém, a coisa comum:Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.§ 1º - Somente se procede mediante representação.§ 2º - Não é punível a subtração de coisa comum fungível, cujo valor não excede a quota a que tem direito o agente.

CAPÍTULO II DO ROUBO E DA EXTORSÃO

RouboArt. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-

-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência:Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa.§ 1º - Na mesma pena incorre quem, logo depois de subtraída a coisa, emprega violência contra pessoa ou grave ameaça, a fim

de assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiro.§ 2º - A pena aumenta-se de um terço até metade:I - se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma;II - se há o concurso de duas ou mais pessoas;III - se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal circunstância.IV - se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior; V - se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade. § 3º Se da violência resulta lesão corporal grave, a pena é de reclusão, de sete a quinze anos, além da multa; se resulta morte, a

reclusão é de vinte a trinta anos, sem prejuízo da multa.

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ExtorsãoArt. 158 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida

vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar fazer alguma coisa:Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa.§ 1º - Se o crime é cometido por duas ou mais pessoas, ou com emprego de arma, aumenta-se a pena de um terço até metade.§ 2º - Aplica-se à extorsão praticada mediante violência o disposto no § 3º do artigo anterior. § 3o Se o crime é cometido mediante a restrição da liberdade da vítima, e essa condição é necessária para a obtenção da vantagem

econômica, a pena é de reclusão, de 6 (seis) a 12 (doze) anos, além da multa; se resulta lesão corporal grave ou morte, aplicam-se as penas previstas no art. 159, §§ 2o e 3o, respectivamente. (Incluído pela Lei nº 11.923, de 2009)

Extorsão mediante sequestroArt. 159 - Sequestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate: Pena - reclusão, de oito a quinze anos. Sequestrado é menor de 18 (dezoito) ou maior de 60 (sessenta) anos, ou se o crime é cometido por bando ou quadrilha. Pena - reclusão, de doze a vinte anos. § 2º - Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave: Pena - reclusão, de dezesseis a vinte e quatro anos. § 3º - Se resulta a morte: Pena - reclusão, de vinte e quatro a trinta anos. § 4º - Se o crime é cometido em concurso, o concorrente que o denunciar à autoridade, facilitando a libertação do sequestrado,

terá sua pena reduzida de um a dois terços. Extorsão indiretaArt. 160 - Exigir ou receber, como garantia de dívida, abusando da situação de alguém, documento que pode dar causa a pro-

cedimento criminal contra a vítima ou contra terceiro:Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.

FURTO

Furto SimplesSubtrair para si ou para outrem coisa alheia móvel.

Elementosa)Subtrair: tirar algo de alguém, desapossarPode ocorrer em dois casos:- tirar algo de alguém;- receber uma posse vigiada e sem autorização levar o bem, retirando-o da esfera de vigilância da vítima.Conclui-se que a expressão engloba tanto a hipótese em que o bem é tirado da vítima quanto aquela em que a coisa é entregue

voluntariamente ao agente e este a leva consigo.Essa modalidade difere da apropriação indébita porque nesta a posse é desvigiada. Ex.: A Caixa de Supermercado tem a posse

vigiada, se pegar dinheiro praticará furto.

b) Ânimo de assenhoramento definitivo do bem, para si ou para outrem (animus rem sibi habendi)Trata-se do elemento subjetivo específico do tipo. Não basta apenas a vontade de subtrair (dolo geral): a norma exige a intenção

específica de ter a coisa, para si ou para outrem, de forma definitiva.É esse elemento que distingue o crime de furto e o furto de uso (fato atípico). Para a sua caracterização é necessário que o agente

tenha intenção de uso momentâneo e que restitua a coisa imediata e integralmente à vítima.

c) Coisa alheia móvel (objeto material do tipo)Coisa móvel: aquela que pode ser transportada de um local para outro. O Código Civil considera como imóvel alguns bens mó-

veis, como aviões, embarcações, o que para fins penais é irrelevante.Os semoventes também podem ser objeto de furto, como, por exemplo, o abigeato, ou seja, o furto de gado.Areia, terra (retirados sem autorização) e árvores (quando arrancadas do solo) podem ser objeto de furto, desde que não configure

crime contra o meio ambiente.A coisa deve ser alheia (elemento normativo do furto).

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O furto é um tipo anormal porque contém elemento normativo que exige juízo de valor. Coisa alheia é aquela que tem dono; dessa forma, não constituem objeto de furto a resnullius (coisa de ninguém, que nunca teve dono) e a res derelicta (coisa abandonada). Nessas hipóteses, o fato será atípico porque a coisa não é alheia.

A coisa perdida (res desperdicta) tem dono, mas não pode ser objeto de furto porque falta o requisito da subtração; quem a en-contra e não a devolve não está subtraindo - responderá por apropriação de coisa achada, tipificada no art. 169, par. ún., inc. II, do Código Penal.

A coisa só é considerada perdida quando está em local público ou aberto ao público. Coisa perdida, por exemplo, dentro de casa, dentro do carro, se achada e não restituída ao proprietário, caracterizará crime de furto.

Coisa de uso comum: (água dos mares, ar atmosférico etc.) não pode ser objeto de furto, exceto se estiver destacada de seu meio natural e for explorada por alguém. Ex.: água da Sabesp.

Não confundir com furto de coisa comum, art. 156 do Código Penal, que ocorre quando o objeto pertence a duas ou mais pessoas nas hipóteses de sociedade, condomínio de coisa móvel e co-herança. É crime de ação penal pública condicionada à representação.

O art. 155, § 3.o, do Código Penal trata do furto de energia. Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica, bem como qualquer outra forma de energia com valor econômico. Esse dispositivo é uma norma penal explicativa ou complementar (esclarece outras normas; na hipótese, define como objeto material do furto, a energia).

A subtração de cadáver ou parte dele tipifica o delito específico do art. 211 do Código Penal (destruição, subtração ou ocultação de cadáver). O cadáver só pode ser objeto de furto quando pertence a uma instituição e está sendo utilizado para uma finalidade es-pecífica. Ex.: faculdade de medicina, institutos de pesquisa.

A subtração de órgão de pessoa viva ou de cadáver, para fins de transplante, caracteriza crime da Lei n. 9.434/97. Cortar o cabelo de alguém para vender, não configura furto, mas sim, lesão corporal.

Sujeito ativoPode ser qualquer pessoa, exceto o dono, porque o tipo exige que a coisa seja alheia.Subtrair coisa própria, que se encontra em poder de terceiro, em razão de contrato (mútuo pignoratício) ou de ordem judicial

(objeto penhorado), acarreta o crime do art. 346 do Código Penal (tirar, suprimir, destruir ou danificar coisa própria, que se acha em poder de terceiro por determinação judicial ou convenção). Este crime não tem nome; é um subtipo do exercício arbitrário das próprias razões.

O credor que subtrair bem do devedor, para se auto-ressarcir de dívida já vencida e não paga, pratica o crime de exercício arbi-trário das próprias razões (art. 345 do CP). Não responde por furto porque não agiu com intenção de causar prejuízo.

Se alguém, por erro, pegar um objeto alheio pensando que lhe pertence, não responderá por furto em razão da incidência do erro de tipo.

Sujeito passivoÉ sempre o dono e, eventualmente, o possuidor ou detentor que sofre algum prejuízo.O agente que furta um bem que já fora anteriormente furtado responde pelo delito, que terá como vítima não o primeiro furtador,

mas o dono da coisa.Pessoas jurídicas podem ser vítimas de furto, porque o seu patrimônio é autônomo do patrimônio dos sócios.

ConsumaçãoO furto consuma-se mediante dois requisitos:- retirada do bem da esfera de vigilância da vítima;- posse tranquila do bem, ainda que por pouco tempo.Se, na fuga, o agente se desfaz ou perde o objeto, que não venha a ser recuperado pela vítima, consuma-se o delito, pois a vítima

sofreu efetivo prejuízo. É exceção à exigência de que o agente tenha posse tranquila do bem.Quando há concurso de agentes, se o crime está consumado para um, está também consumado para todos – adoção da teoria

unitária. Ex.: dois ladrões furtam uma carteira, um foge com o bem e o outro é preso no local: o crime está consumado para ambos.

TentativaÉ possível, até mesmo na forma qualificada, com exceção do § 5.o do art. 155 do Código Penal.O fato de ter havido prisão em flagrante não implica, necessariamente, que o furto seja tentado, como, por exemplo, o caso do

flagrante ficto (art. 302, IV, do CPP), que permite a prisão do agente encontrado, algum tempo depois da prática do crime com papéis, instrumentos, armas ou objetos (PIAO) que façam presumir ser ele o autor do crime.

Didatismo e Conhecimento 47

NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Concurso de delitosA violação de domicílio fica absorvida pelo furto praticado em residência por ser crime meio (princípio da consunção).Se o agente, após a subtração, danifica o bem subtraído, responde apenas pelo furto, sendo o dano um post factum impunível,

pois a segunda conduta delituosa não traz novo prejuízo à vítima.Se a pessoa furta um bem, e depois o aliena a um terceiro de boa-fé, deve responder por furto e por disposição de coisa alheia

como própria. A jurisprudência, entretanto, diz que é um post factum impunível.

Furto Noturno: Art. 155, § 1.o, do Código Penal“A pena aumenta-se de 1/3, se o crime é praticado durante o repouso noturno.”Trata-se de causa de aumento de pena que tem por finalidade garantir a proteção em relação ao patrimônio durante o repouso do

proprietário, uma vez que neste período há menor vigilância de seus pertences. O furto noturno não se aplica ao furto qualificado. Só vale para o furto simples:- pela posição do parágrafo (o § 1.º só vale para o que vem antes);- no furto qualificado já há previsão de pena maior.A jurisprudência dominante traça algumas considerações:- só se aplica quando o fato ocorre em residência (definida pelo art. 150, § 4.o, do Código Penal como sendo qualquer compar-

timento habitado, ou o aposento de habitação coletiva, ou compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade) ou em qualquer de seus compartimentos, desde que haja morador dormindo;

- o aumento não se aplica se a casa estiver desabitada ou se seus moradores estiverem viajando;- não se aplica o aumento no caso de furto praticado na rua ou em comércio. Para o Prof. Damásio o aumento é cabível estando a casa habitada ou não, bastando que o agente se aproveite da menor vigilância

que decorre do “período do sossego noturno”, conforme orientação da Exposição de Motivos do Código Penal, n. 56.

Furto Privilegiado - Art. 155, § 2.o, do Código PenalRequisitosQue o agente seja primário (todo aquele que não é reincidente). Se o réu for primário e tiver maus antecedentes, fará jus ao pri-

vilégio, porque a lei não exige bons antecedentes. Que a coisa subtraída seja de pequeno valor. A jurisprudência adotou o critério objetivo para conceituar pequeno valor, conside-

rando aquilo que não excede a um salário mínimo. Na tentativa leva-se em conta o valor do bem que se pretendia subtrair. Deve ser examinado o valor do bem no momento da subtração e não o prejuízo suportado pela vítima. Ex.: no furto de um carro,

que é recuperado depois, o prejuízo pode ter sido pequeno, mas será levado em conta o valor do objeto furtado. Não confundir privilégio com furto de bagatela; pelo princípio da insignificância, o crime de furto de bagatela é atípico porque a

lesão ao bem jurídico tutelado é ínfima, irrisória. No furto privilegiado, ao contrário, o fato é considerado crime, mas haverá um benefício.

Furto Qualificado- Art. 155, §§ 4.º e 5.º, do Código PenalQuando o juiz reconhecer mais de uma qualificadora, utilizará a segunda como circunstância judicial na primeira fase da fixação

da pena.O furto qualificado tentado admite a suspensão condicional do processo, pois a pena mínima passa a ser de 8 meses – para se

chegar a esse resultado diminui-se a pena mínima em abstrato, prevista para o delito, do redutor máximo previsto na tentativa (2 – 2/3 = 8 meses).

Art. 155, § 4.º, do Código PenalA pena é de reclusão de 2 a 8 anos, e multa, se o crime é cometido:

a) Com rompimento ou destruição de obstáculoPressupõe uma agressão que danifique o objeto, destruindo-o (destruição total) ou rompendo-o (destruição parcial). O art. 171

do Código de Processo Penal exige perícia.O obstáculo pode ser passivo (porta, janela, corrente, cadeado etc.) ou ativo (alarme, armadilha).A simples remoção do obstáculo não caracteriza a qualificadora, que exige o rompimento ou destruição. Desligar o alarme não danifica o objeto, não fazendo incidir a qualificadora.O cão não é considerado obstáculo.

Didatismo e Conhecimento 48

NOÇÕES DE DIREITO PENAL

O crime de dano fica absorvido pelo furto qualificado quando é meio para a subtração, por ser uma qualificadora específica.A qualificadora só é aplicada quando o obstáculo atingido não é parte integrante do bem a ser subtraído. Ex.: arrombar o portão

para furtar o carro – aplica-se a qualificadora; quebrar o vidro do carro para subtrair o automóvel – furto simples; quebrar o vidro do carro para subtrair uma bolsa que está dentro – furto qualificado. A divergência surge quanto ao furto de toca-fitas. Para uns, incide a qualificadora; para outros, o furto é simples porque o toca-fitas é parte integrante do carro.

b) Com abuso de confiança, mediante fraude, escalada ou destrezaCom abuso de confiança – requisitos:Que a vítima, por algum motivo, deposite uma especial confiança em alguém: amizade, namoro, relação de emprego etc. Sa-

liente-se que a relação de emprego deve ser analisada no caso concreto, pois, em determinados empregos, patrão e empregado não possuem qualquer contato, inclusive para os empregados domésticos a jurisprudência exige a demonstração da confiança.

Que a subtração tenha sido praticada pelo agente, aproveitando-se de alguma facilidade decorrente da relação de confiança.Emprego de fraude: significa usar de artifícios para enganar alguém, possibilitando a execução do furto.O furto mediante fraude distingue-se do estelionato porque neste a fraude é utilizada para convencer a vítima a entregar o bem

ao agente e naquele, a fraude serve para distrair a vítima para que o bem seja subtraído.No furto, a fraude é qualificadora; no estelionato é elementar do tipo.A jurisprudência entende que a entrega do veículo a alguém que pede para testá-lo, demonstrando interesse na sua compra, ca-

racteriza o crime de furto qualificado pela fraude (para possibilitar a indenização por parte do seguro, que cobre apenas furto e não estelionato, crime que realmente ocorreu porque houve entrega).

Escalada: é o acesso por via anormal ao local da subtração. Ex.: entrada pelo telhado, pela tubulação do ar-condicionado, pela janela, escavação de um túnel e outros.

Para configuração da escalada tem-se exigido que o agente dispense um esforço razoável para ter acesso ao local: entrar por uma janela que se encontra no andar térreo, saltar um muro baixo, por exemplo, não qualificam o furto.

O art. 171 do Código de Processo Penal exige a perícia do local.Destreza: habilidade do agente que permite a prática do furto sem que a vítima perceba.A vítima deve estar ao lado ou com o objeto para que a destreza tenha relevância (uma bolsa, um colar etc.).Se a vítima está dormindo ou em avançado estado de embriaguez não se aplica a qualificadora, pois não há necessidade de ha-

bilidade para tal subtração.Se a vítima percebe a conduta do agente, não se aplica a qualificadora.Se a vítima não perceber a conduta do agente, mas for vista por terceiro, subsiste a qualificadora.c) Com emprego de chave falsaConsidera-se chave falsa:- cópia feita sem autorização;- qualquer objeto capaz de abrir uma fechadura. Ex.: grampo, chave mixa, gazua etc.A chave falsa deve ser submetida à perícia para constatação de sua eficácia.A utilização da chave verdadeira encontrada ou subtraída pelo agente não configura a qualificadora; o furto será simples. Se

subtraída mediante fraude, haverá furto qualificado mediante fraude.d) Mediante o concurso de duas ou mais pessoasA aplicação da qualificadora dispensa a identificação de todos os indivíduos e é cabível ainda que um dos envolvidos seja menor.

ROUBO

Enquanto o furto é a subtração pura e simples de coisa alheia móvel, para si ou para outrem (artigo 155 do Código Penal), o roubo é a subtração de coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante violência, grave ameaça ou qualquer outro recurso que reduza a possibilidade de resistência da vítima.

O caput do artigo 157 trata do roubo próprio, e o seu § 1.º descreve o que a doutrina chama roubo impróprio. A diferença reside no preciso instante em que a violência ou a grave ameaça contra a pessoa são empregadas. Quando o agente pratica a violência ou grave ameaça, antes ou durante a subtração, responde por roubo próprio; quando pratica esses recursos depois de apanhada a coisa, para assegurar a impunidade do crime ou a detenção do objeto material, responde por roubo impróprio.

A pena para ambos é de reclusão, de 4 (quatro) a 10 (dez) anos, e multa. Elementos do Tipo

Didatismo e Conhecimento 49

NOÇÕES DE DIREITO PENAL

- Subtrair e coisa alheia móvel: já foram objeto de análise no módulo relativo ao crime de furto.- Violência: trata-se da violência física.- Grave ameaça: é a promessa de um mal grave e iminente (exemplos: anúncio de morte, lesão, sequestro).- Qualquer outro meio: é a chamada violência imprópria, que pode ser revelada, por exemplo, pelo uso de sonífero, de hipnose

etc. A simulação de arma configura a grave ameaça.A “trombada” será considerada violência se for meio utilizado pelo agente para reduzir a vítima à impossibilidade de resistência,

caracterizando o roubo e não o furto (um forte empurrão, por exemplo). Se, no entanto, a “trombada” consistir num mero esbarrão, incapaz de machucar a vítima, empregado com o intuito de distraí-la, haverá crime de furto.

O mesmo acontece com o arrebatamento de objeto preso ao corpo da vítima.

Sujeito Ativo: pode ser qualquer pessoa.

Sujeito Passivo: pode ser qualquer pessoa que sofra diminuição (perda) patrimonial (proprietário ou possuidor) ou que seja atingida pela violência ou grave ameaça.

Objetividade JurídicaEm virtude de o crime em estudo ser considerado complexo, tutela-se, além da posse e propriedade, a integridade física e a

liberdade individual.Concurso de CrimesO número de vítimas não guarda equivalência com o número de delitos. Este último será relacionado com base no número de

resultados (lesão patrimonial), que o agente sabia estar realizando no caso concreto. É possível que um só roubo tenha duas vítimas?Sim, pois a vítima do roubo é tanto quem sofre a lesão patrimonial, como quem sofre a violência ou grave ameaça. Exemplo: se

A empresta seu carro a B, sendo este último assaltado, ambos serão vítimas.Da mesma forma, havendo grave ameaça contra duas pessoas, mas lesado o patrimônio de apenas uma, haverá crime único,

porém, com duas vítimas.Empregada grave ameaça contra cinco pessoas e lesado o patrimônio de três, por exemplo, há três crimes de roubo em concurso

formal.E se o agente emprega grave ameaça contra uma pessoa para subtrair bens de duas?Nesse caso, se o agente não sabe que está lesando dois patrimônios, há crime único, evitando-se a responsabilidade penal obje-

tiva; se o agente sabe que está lesando dois patrimônios (subtrai o relógio do cobrador e o dinheiro do caixa, por exemplo), há dois crimes de roubo em concurso formal.

É possível a existência de crime continuado, se preenchidos os requisitos do artigo 71 do Código Penal. Exemplo: indivíduo rouba uma pessoa em um ônibus, sai dele, entra em outro e rouba outra pessoa.

TentativaA tentativa é possível e será verificada quando, iniciada a execução, mediante violência ou grave ameaça, o agente não consegue

efetivar a subtração; não se exige o início da execução do núcleo “subtrair”, e sim da prática da violência, conforme entende o Prof. Damásio de Jesus.

Quando o agente é preso em flagrante com o objeto do roubo, após perseguição, responde por crime tentado (para aqueles que exigem a posse tranquila da coisa para consumação) e por crime consumado (Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Jus-tiça, que dispensam o requisito da posse tranquila da coisa para consumação do roubo).

Roubo Impróprio – Artigo 157, § 1.º, do Código Penal“Na mesma pena incorre quem, logo depois de subtraída a coisa, emprega violência contra a pessoa ou grave ameaça, a fim de

assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiro.”

Diferenças entre roubo próprio e roubo impróprioNo roubo próprio a violência ou grave ameaça ocorre antes ou durante a subtração; no roubo impróprio, ocorre depois. No roubo próprio, a violência ou grave ameaça constituem meio para a subtração, enquanto no roubo impróprio, o agente, ini-

cialmente, quer apenas furtar e, depois de já se haver apoderado de bens da vítima, emprega violência ou grave ameaça para garantir a sua impunidade ou a detenção do bem.

No roubo próprio, a lei menciona três meios de execução, que são a violência, a grave ameaça ou qualquer outro recurso que difi-culte a defesa da vítima. No roubo impróprio, a lei menciona apenas dois, que são a grave ameaça e a violência, incabível o emprego de sonífero ou hipnose (violência imprópria).

Didatismo e Conhecimento 50

NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Requisitos do roubo impróprioSão os seguintes os requisitos do roubo impróprio:Que o agente tenha se apoderado do bem que pretendia furtar. Se o agente ainda não tinha a posse do bem, não se pode cogitar

de roubo impróprio, nem de tentativa. Exemplo: o agente está tentando arrombar a porta de uma casa, quando alguém chega ao local e é agredido pelo agente, que visa garantir sua impunidade e fugir sem nada levar. Haverá tentativa de furto qualificado em concurso material com o crime de lesões corporais.

Que a violência ou grave ameaça tenham sido empregadas logo depois o apoderamento do objeto material. O “logo depois” está presente enquanto o agente não tiver consumado o furto no caso concreto. Após a consumação do furto, o emprego de violência ou de grave ameaça não pode caracterizar o roubo impróprio. Poderá haver, por exemplo, furto consumado em concurso material com lesão corporal. A violência ou grave ameaça pode ser contra o próprio dono do bem ou contra um terceiro qualquer, até mesmo um policial. Para a jurisprudência, se a violência contra policial serviu para transformar o furto em roubo impróprio, não se pode aplicar em concurso o crime de resistência, porque configuraria bis in idem.

Que a violência ou grave ameaça tenham por finalidade garantir a detenção do bem ou assegurar a impunidade do agente.

ConsumaçãoO roubo impróprio consuma-se no exato momento em que é empregada a violência ou grave ameaça, ainda que o agente não

atinja sua finalidade (garantir a impunidade ou evitar a detenção).O golpe desferido que não atinge a vítima é considerado violência empregada; portanto, roubo impróprio consumado.

TentativaA tentativa não é admissível, pois ou o agente emprega a violência ou a grave ameaça e o crime de roubo impróprio está con-

sumado, ou não as emprega e o crime praticado é o de furto. Esse é o entendimento predominante na doutrina e na jurisprudência.Alguns autores (minoria) admitem a tentativa quando o agente quer empregar a violência, mas é impedido.

Causas de Aumento da Pena – Artigo 157, § 2.º, do Código Penal (Roubo Circunstanciado)“§ 2.º A pena aumenta-se de um terço até metade:I – se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma;II – se há o concurso de duas ou mais pessoas;III – se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal circunstância;IV – se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior;V – se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade.”Se o juiz reconhecer a existência de duas ou mais causas de aumento da pena poderá aplicar somente uma, de acordo com o

parágrafo único do artigo 68 do Código Penal. As causas de aumento da pena incidem apenas sobre o roubo simples (próprio ou impróprio). Não se aplicam ao roubo qualifi-

cado pelo resultado lesão grave ou morte (§ 3.º). Note-se que as agravantes previstas no § 2.º do artigo 157 são erroneamente denominadas qualificadoras. Não é correto o em-

prego desse termo, pois, tecnicamente, trata-se de causa especial de aumento de pena, a incidir na terceira fase de aplicação da pena.

Emprego de armaÉ chamado roubo qualificado pelo emprego de arma. Repita-se que apesar desse nome, não se trata de qualificadora, mas sim de

causa de aumento de pena. Arma é qualquer instrumento que tenha poder vulnerante. A arma pode ser própria ou imprópria. Arma própria é a criada espe-

cificamente para ataque e defesa, tal como o revólver, por exemplo. Arma imprópria é qualquer objeto que possa matar ou ferir, mas que não possui esta finalidade específica, como, por exemplo, faca, tesoura, espeto etc.

Para o aumento da pena, é necessário que a arma seja apontada para a vítima; não basta que o agente esteja armado e que a vítima tome conhecimento disto.

Para nós, o fundamento dessa causa de aumento é o poder intimidador que a arma exerce sobre a vítima. Assim, não importa o poder vulnerante da arma, desde que ela seja apta a incutir medo na vítima, facilitando o roubo. Assim, a arma de fogo descarregada ou defeituosa ou o simulacro de arma configuram a majorante em tela.

Prevalece, no entanto, o entendimento de que essa causa de aumento tem por fundamento o perigo real que representa à incolu-midade física da vítima o emprego de arma. À vista disso, a arma deve ter idoneidade ofensiva, capacidade de colocar em risco a inte-gridade física da vítima. Tal não ocorre com o emprego de arma desmuniciada, defeituosa, arma de brinquedo ou simples simulação.

Didatismo e Conhecimento 51

NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Em razão desse entendimento, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no REsp n. 213.054, de São Paulo, em 24.10.2001, relator o Ministro José Arnaldo da Fonseca, decidiu cancelar a Súmula n. 174, considerando que o emprego de arma de brinquedo, embora não descaracterize o crime, não agrava o roubo, uma vez que não apresenta real potencial ofensivo. Ficou assentado que a incidência da referida circunstância de exasperação da pena:

- fere o princípio constitucional da reserva legal (princípio da tipicidade);- configura bis in idem;- deve ser apreciada na sentença final como critério diretivo de dosagem da pena (circunstância judicial do artigo 59 do Código

Penal);- lesa o princípio da proporcionalidade.

De notar-se que a decisão apenas cancelou a referida Súmula, não havendo impedimento a que juízes e tribunais ainda continuem adotando a primeira orientação, que determina o agravamento da pena. Além disso, há o risco de que, cancelada a mencionada Súmu-la, venham a reconhecer concurso entre o roubo simples e a utilização de arma de brinquedo no cometimento do crime, nos termos do artigo 10, § 1.º, inciso II, da Lei n. 9.437/97.

Nossa posição: arma de brinquedo equipara-se a arma de verdade, para fins específicos do tipo que define o roubo, razão pela qual o autor responderá apenas como incurso no artigo 157, § 2.º, inciso I, do Código Penal.

Concurso de duas ou mais pessoasAs anotações feitas a respeito do concurso de pessoas no furto (artigo 155 do Código Penal) aplicam-se ao roubo; a distinção é

quanto à natureza jurídica: naquele é qualificadora; neste é causa de aumento.

Serviço de transporte de valoresAplicável apenas se a vítima está trabalhando (“em serviço”) com o transporte de valores (exemplo: assalto de office-boy, de

carro-forte etc.).Se o ladrão assaltar o motorista do carro-forte, levando somente o seu relógio, não há qualificadora. Exige-se que o agente conheça a circunstância do transporte de valor (dolo direto), não se admitindo dolo eventual.Observação: não existe qualificadora semelhante no crime de furto.

Veículo automotor que venha a ser transportado para outro estado ou paísVer anotações sobre furto.

Se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade:Aplica-se às hipóteses em que a vítima é mantida pelos assaltantes por pouco tempo, ou tempo suficiente para a consumação do

roubo. Se o período for longo, haverá concurso material de roubo simples e sequestro (artigo 157 combinado com artigo 148, ambos do Código Penal).

Observe-se que essa majorante não se aplica nos casos em que ocorre o chamado sequestro-relâmpago, embora tenha sido esta a intenção da lei. Com efeito, o sequestro-relâmpago não se trata de roubo, mas sim de extorsão, pois o comportamento da vítima, no sentido de fornecer a senha do cartão magnético, é imprescindível para o sucesso da empreitada criminosa. Como se vê, no caso do sequestro-relâmpago, não se trata de subtração e por isso não se pode falar em roubo. Assim, em que pese a boa intenção do le-gislador, essa circunstância incidirá em outras situações, nas quais a privação de liberdade da vítima for utilizada com meio para a realização de um roubo ou, após a sua consumação, como forma de fugir à ação policial.

Roubo Qualificado – Artigo 157, § 3.º, do Código PenalHá duas formas de roubo qualificado, aplicáveis tanto ao roubo próprio quanto ao impróprio.De acordo com a primeira parte do dispositivo: “se da violência resulta lesão corporal de natureza grave, a pena é de reclusão, de

7 (sete) a 15 (quinze) anos, além de multa”.Houve alteração da pena mínima, para tornar pacífico o entendimento de que as causas de aumento da pena do § 2.º não se apli-

cam às qualificadoras do § 3.º. Se a lesão é leve, esta fica absorvida.A parte final dispõe que “se resulta morte, a reclusão é de 20 (vinte) a 30 (trinta) anos, sem prejuízo da multa”. É o denominado

latrocínio, considerado crime hediondo nos termos da Lei n. 8.072/90. O roubo será qualificado se a morte ou a lesão corporal grave resultarem da “violência”; o tipo não menciona a grave ameaça.

Assim, se a vítima morre em razão da grave ameaça tem-se concurso formal de roubo simples e homicídio culposo (exemplo: a víti-ma, ao ver a arma, sofre ataque cardíaco e morre).

Didatismo e Conhecimento 52

NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Via de regra, o crime qualificado pelo resultado é preterdoloso (há dolo no antecedente e culpa no consequente). No caso do § 3.º em estudo o resultado agravador pode decorrer de culpa ou dolo. O agente pode, além de desejar a subtração, querer provocar lesão grave ou a morte da vítima. É evidente que a tentativa só é admitida quando o resultado agravador for desejado pelo agente, pois não se pode tentar algo produzido por acidente.

Destarte, não confundir tentativa de latrocínio com roubo qualificado pela lesão grave. No latrocínio tentado, o agente tem in-tenção de matar a vítima, o que não ocorre por circunstâncias alheias à sua vontade. No roubo qualificado pela lesão grave, o agente tem intenção de lesionar a vítima.

Oportuno salientar que a morte ou a lesão deve decorrer do emprego de violência pelo agente com o fim de se apoderar da res ou assegurar a sua posse ou garantir a impunidade do crime. Se a morte, por exemplo, advier de vingança, haverá crime de roubo em concurso com o crime de homicídio.

Assim, caracteriza-se a violência quando empregada em razão do roubo (nexo causal) e durante o cometimento do delito (no mesmo contexto fático).

O nexo causal estará presente quando a violência constituir meio para a subtração (roubo próprio) ou quando for empregada para garantir a detenção do bem ou a impunidade do agente (roubo impróprio).

Faltando um desses requisitos, haverá roubo em concurso material com homicídio doloso ou delito de lesão corporal dolosa.

EXTORSÃO

A definição do crime de extorsão consta do artigo 158 do Código Penal: “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa”.

A pena é de reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez) anos, e multa (é a mesma pena do roubo).Objetividade JurídicaA principal é a inviolabilidade do patrimônio. A secundária é a proteção à vida, integridade física, liberdade pessoal e tranquili-

dade do espírito.Diferença entre Extorsão e Exercício Arbitrário das Próprias RazõesNa extorsão o agente visa a uma vantagem patrimonial indevida, enquanto no exercício arbitrário das próprias razões a vantagem

é devida (artigo 345 do Código Penal).

Roubo e ExtorsãoHá três correntes doutrinárias que buscam os pontos diferenciais desses dois crimes:1.ª) Para Nelson Hungria, no roubo o bem é tirado da vítima, e na extorsão a vítima entrega o bem. 2.ª) Enquanto no roubo a ação e o resultado são concomitantes, na extorsão o mal prometido e a vantagem são futuros.3.ª) Para o Prof. Damásio de Jesus, “na extorsão é imprescindível o comportamento da vítima, enquanto no roubo é prescindível.

No exemplo do assalto, é irrelevante que a coisa venha a ser entregue pela vítima ao agente ou que este a subtraia. Trata-se de roubo. Constrangido o sujeito passivo, a entrega do bem não pode ser considerada ato livre voluntário, tornando tal conduta de nenhuma importância no plano jurídico. A entrega pode ser dispensada pelo autor do fato. Já na extorsão o apoderamento do objeto material depende da conduta da vítima”. A jurisprudência tem-se manifestado nesse sentido.

Questão polêmica é a que diz respeito ao constrangimento da vítima para sacar dinheiro em caixa eletrônico (sequestro-relâmpa-go). Para a jurisprudência, o delito é de extorsão (artigo 158 do Código Penal) e não de roubo (artigo 157, § 2.º, inciso V, do Código Penal), com fundamento na tese da dispensabilidade ou indispensabilidade da conduta da vítima. Correta essa posição.

Questão: Como ficará a repressão do crime de sequestro, já que o artigo 158 não o prevê como causa de aumento de pena? Resposta: Se o sequestro for praticado como meio executório do crime de extorsão ou como escudo para a fuga, restará absorvido

por este delito. Se praticado depois da extorsão, sem que a restrição da liberdade da vítima seja necessária para a consumação do crime, haverá concurso material de delitos.

Diferença entre Extorsão e EstelionatoPara se saber se o crime é o de extorsão, deve-se verificar se a entrega do objeto material foi espontânea (voluntária) ou não. No

estelionato, a entrega é espontânea porque a vítima está sendo enganada; na extorsão, a vítima entrega a coisa contra a sua vontade para evitar um mal maior. No estelionato, a vítima não sabe que está havendo um crime.

Quando o agente emprega fraude e violência ou grave ameaça para obter a coisa, o delito é de extorsão, pois a entrega ocorre não em razão da fraude, mas sim da violência ou grave ameaça. Observe o exemplo citado por Nelson Hungria: “Uma pessoa simula ser policial e, sob ameaça de morte, obriga a vítima a entregar-lhe certa quantia em dinheiro”.

Didatismo e Conhecimento 53

NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Extorsão e Constrangimento IlegalTanto na extorsão quanto no constrangimento ilegal, o agente emprega violência ou grave ameaça contra a vítima, no sentido de

que faça ou deixe de fazer alguma coisa.A diferença entre extorsão e constrangimento ilegal está na finalidade: no constrangimento ilegal, o sujeito ativo deseja que a vítima

se comporte de determinada maneira, para obter qualquer tipo de vantagem. Na extorsão, o constrangimento é realizado com o objetivo expresso no tipo de obter “indevida vantagem econômica”.

Consumação e TentativaSúmula n. 96 do Superior Tribunal de Justiça: “O crime de extorsão consuma-se independentemente da obtenção da vantagem

indevida”. É, portanto, um crime formal.De acordo com entendimento do Professor Damásio de Jesus, o crime se consuma quando a vítima faz, deixa de fazer ou tolera

que se faça alguma coisa. A tentativa é possível, pois a extorsão é crime formal e plurissubsistente. Pode ocorrer a tentativa quando o constrangido não realiza a conduta desejada pelo agente.

Causas de Aumento da PenaO § 1.º do artigo 158 do Código Penal dispõe que a pena é aumentada de um terço a metade (1/3 a 1/2) se o crime é cometido por

duas ou mais pessoas ou com o emprego de arma.Note-se que aqui a lei fala em cometimento, não em concurso, sendo indispensável, pois, que os coagentes pratiquem atos exe-

cutórios do crime. Exige-se, portanto, a coautoria e não a mera participação. Não se deve confundir essa majorante com a prevista no crime de roubo e furto, que preveem o concurso de pessoas, o qual abrange a coautoria e a participação.

Extorsão QualificadaSegundo o § 2.º do artigo 158 deve-se aplicar à extorsão as regras e penas do roubo qualificado pela lesão grave ou morte. A

extorsão qualificada pela morte é crime hediondo (artigo 1.º, inciso III, da Lei n. 8.072/90).

EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO – ARTIGO 159 DO CÓDIGO PENALTrata-se de crime hediondo em todas as modalidades (forma simples ou qualificada).As penas foram alteradas pela Lei n. 8.072/90, que aumentou a pena privativa de liberdade de 6 (seis) a 12 (doze) anos para 8

(oito)a 15 (quinze) anos, eliminando a multa. O caput do artigo 159 do Código Penal trata da forma simples da extorsão mediante sequestro: “sequestrar pessoa com o fim de

obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate”.Objetividade JurídicaA principal é a inviolabilidade do patrimônio. A secundária é a tutela da liberdade de locomoção. Trata-se de crime complexo.

Sujeito AtivoSujeito ativo é qualquer pessoa.

Sujeito PassivoSujeito Passivo é qualquer pessoa. Admite-se a pluralidade de sujeitos passivos. É sujeito passivo o sequestrado e a pessoa a

quem se dirige a finalidade do agente de obter a vantagem.

ConsumaçãoO crime se consuma no momento do sequestro, com a privação da liberdade de locomoção da vítima. Trata-se, portanto, de crime

formal, já que não exige o pagamento do resgate, considerado simples exaurimento. Tratando-se de delito permanente, poderá ocorrer prisão em flagrante enquanto a vítima estiver sob o poder dos sequestradores (artigo 303 do Código de Processo Penal).

CompetênciaA competência para julgamento desse delito é do local onde se deu a consumação. Se o crime consumar-se em território de duas

comarcas, ambas serão competentes, fixando-se uma delas por prevenção (artigo 71 do Código de Processo Penal).

TentativaA tentativa é possível quando, iniciado o ato de “sequestrar”, os agentes não tiverem êxito na captura da vítima.

Extorsão Mediante Sequestro e RaptoNo crime do artigo 159 do Código Penal (extorsão mediante sequestro) ocorre privação da liberdade com o intuito de se obter

vantagem patrimonial.No rapto (artigo 219), a privação da liberdade de mulher honesta (sujeito passivo do delito) tem fins libidinosos.

Extorsão Mediante Sequestro e Sequestro e Cárcere PrivadoO sequestro do artigo 148 do Código Penal é crime subsidiário. É a privação da liberdade de alguém mediante violência ou grave

ameaça, desde que o fato não constitua crime mais grave.

Didatismo e Conhecimento 54

NOÇÕES DE DIREITO PENAL

13. CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA (PECULATO E SUAS FORMAS,

CONCUSSÃO, CORRUPÇÃO ATIVA E PASSIVA, PREVARICAÇÃO).

TÍTULO XI DOS CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

PECULATO E SUAS FORMAS

PeculatoArt. 312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem

a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio:Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa.§ 1º - Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai,

ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário.

Peculato culposo§ 2º - Se o funcionário concorre culposamente para o crime de outrem:Pena - detenção, de três meses a um ano.§ 3º - No caso do parágrafo anterior, a reparação do dano, se precede à sentença irrecorrível, extingue a punibilidade; se lhe é

posterior, reduz de metade a pena imposta.

Peculato mediante erro de outremArt. 313 - Apropriar-se de dinheiro ou qualquer utilidade que, no exercício do cargo, recebeu por erro de outrem:Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

Peculato: visa proteger a probidade administrativa (patrimônio público). Esses crimes são chamados crimes de improbidade administrativa. O sujeito ativo é o funcionário público e o sujeito passivo é o Estado, visto como Administração Pública. Pode existir um sujeito passivo secundário (particular).

Podemos dividir o peculato em dois grandes grupos; doloso e culposo:a) Peculato Doloso:Peculato-apropriação: art. 312, caput, primeira parte.Peculato-desvio: art. 312, caput, segunda parte.Peculato-furto: art. 312, § 1.º.Peculato mediante erro de outrem: art. 313.

b) Peculato Culposo:O peculato culposo está descrito no art. 312, § 2.º, do Código Penal.

PECULATO APROPRIAÇÃO:a) apropriar-se;b) funcionário público;c) dinheiro, valor, bem móvel, público ou privado;d) posse em razão do cargo;e) proveito próprio ou alheio.

Didatismo e Conhecimento 55

NOÇÕES DE DIREITO PENAL

Elementos objetivos do tipo: O núcleo é apropriar-se, ou seja, fazer sua a coisa alheia. A pessoa tem a posse e passa a agir com se fosse dona. O agente muda a sua intenção em relação à coisa. O fundamento é a posse lícita anterior.

No caso da posse em razão do cargo, temos que a posse está com a Administração. O bem tem de estar sob custódia da Adminis-tração. Exemplo: Um automóvel apreendido na rua vai para o pátio da Delegacia; o policial militar subtrai o toca-fitas - Ele praticou peculato-furto, pois não tinha a posse do bem. Se o funcionário fosse o responsável pelo bem, seria caso de peculato-apropriação. Se o carro estivesse na rua, seria furto.

No peculato-apropriação e no peculato mediante erro de outrem há apropriação, ou seja, a posse é anterior; a diferença está no erro de outrem.

Objeto material: Dinheiro, valor ou bem móvel. Tudo que for imóvel não é admitido no peculato. O crime que admite imóvel é o estelionato.

Consumação: A consumação do peculato-apropriação se dá no momento em que ocorreu a apropriação: quando o agente inver-teu o animus, quando passou a agir como se fosse dono.

PECULATO-DESVIO: Artigo 312, Segunda Parte, do Código Penal. No peculato-desvio o que muda é apenas a conduta, que passa a ser desviar. Desviar é alterar a finalidade, o destino. Exemplo: existe um contrato que prevê o pagamento de certo valor por uma obra. O funcionário paga esse valor, sem a obra ser realizada. Nesse caso, há peculato-desvio. Liberação de dinheiro para obra superfaturada também é caso de peculato-desvio.

Elemento subjetivo do tipo: O elemento subjetivo do tipo é a intenção do desvio para proveito próprio ou alheio. O funcionário tem de ter a posse lícita da coisa. Se alguém desviar em proveito da própria Administração, haverá outro crime, qual seja, uso ou emprego irregular de verbas públicas (art. 315 do CP).

PECULATO-FURTO: Artigo 312, § 1.º, do Código Penal. Funcionário público que, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe propor-ciona a qualidade de funcionário. Nesse caso é aplicada a mesma pena.

A conduta é subtrair, ou seja, tirar da esfera de proteção da vítima, de sua disponibilidade. Outra conduta possível é a de concorrer dolosamente.

Não basta ser funcionário público; ele precisa se valer da facilidade que essa qualidade lhe proporciona (a execução do crime é mais fácil para ele). Por facilidade, entende-se crachá, segredo de cofre etc. Um funcionário público pode praticar furto ou peculato--furto, dependendo se houve, ou não, a facilidade.

Consumação e tentativa: O crime consuma-se com a efetiva retirada da coisa da esfera de vigilância da vítima. A tentativa é possível.

PECULATO CULPOSO: Artigo 312, § 2.º, do Código Penal. São requisitos do crime de peculato culposo: a conduta culposa do funcionário público e que terceiro pratique um crime doloso, aproveitando-se da facilidade provocada por aquela conduta.

Consumação e tentativa: Peculato culposo é crime independente do crime de outrem, mas estará consumado quando se con-sumar o crime de outrem. Não há tentativa de peculato culposo, pois não existe tentativa de crime culposo. Se o crime de outrem é tentado, este responderá por tentativa, porém o fato é atípico para o funcionário público.

Reparação de danos no peculato culposo – Artigo 312, § 3.º, do Código Penal: É a devolução do objeto ou o ressarcimento do dano. É preciso ficar atento para as seguintes regras:

• Se a reparação do dano for anterior à sentença irrecorrível (antes do trânsito em julgado – primeira ou segunda instância), extingue a punibilidade.

• Se a reparação do dano for posterior à sentença irrecorrível (depois do trânsito em julgado), ocorre a diminuição da pena, pela metade.

Atenção: No peculato doloso não se aplicam essas regras.

PECULATO MEDIANTE ERRO DE OUTREM: Não é um estelionato, pois o erro da vítima não é provocado pelo agente. O núcleo do tipo é apropriar-se (para tanto, é preciso posse lícita anterior). Na verdade, é um peculato-apropriação. O núcleo do estelionato é obter.

O erro de outrem tem de ser espontâneo, e o recebimento, por parte do funcionário de boa-fé. Não há fraude.Exemplo: Pessoa deve dinheiro para a Prefeitura, erra a conta e paga a mais. O funcionário recebe o dinheiro sem perceber o erro.

Depois, ao perceber o erro, apropria-se do excedente – trata-se de peculato mediante erro.O elemento subjetivo é o dolo de se apropriar. O crime consuma-se no momento da apropriação, ou seja, no momento em que o

agente passa a agir como se fosse dono.

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CONCUSSÃO

ConcussãoArt. 316 - Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função, ou antes, de assumi-la, mas em

razão dela, vantagem indevida:Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa.

O crime de concussão guarda certa semelhança com o delito de corrupção passiva, principalmente no que se refere à primeira modalidade desta última infração (solicitar vantagem indevida). Na concussão, porém, o funcionário público constrange, exige a vantagem indevida. A vítima, temendo alguma represália, cede à exigência. Na corrupção passiva (em sua primeira figura) há mero pedido, mera solicitação. A concussão, portanto, descreve fato mais grave e, por isso, deveria possuir pena mais elevada. Ocorre que, após o advento da Lei n. 10.763/2003, a pena de corrupção passiva passou, por incrível que pareça, a ser maior que a de concussão.

Nesse crime, o funcionário público faz exigência de uma vantagem. Essa exigência carrega, necessariamente, uma ameaça à vítima, pois do contrário haveria mero pedido, que caracterizaria a corrupção passiva.

Tal ameaça pode ser:- explícita: exigir dinheiro para não fechar uma empresa, para não instaurar inquérito, para permitir o funcionamento de obras

etc.;- implícita: não há promessa de um mal determinado, mas a vítima fica amedrontada pelo simples temor que o exercício do cargo

público inspira.A exigência pode ser ainda:- direta: quando o funcionário público a formula na presença da vítima, sem deixar qualquer margem de dúvida de que está que-

rendo uma vantagem indevida;- indireta: o funcionário se vale de uma terceira pessoa para que a exigência chegue ao conhecimento da vítima ou a faz de forma

velada, capciosa, ou seja, o funcionário público não fala que quer a vantagem, mas deixa isso implícito.A concussão é uma forma especial de extorsão praticada por funcionário público com abuso de autoridade. Deve, assim, haver

um nexo entre a represália prometida, a exigência feita e a função exercida pelo funcionário público.Por isso, se o funcionário público empregar violência ou grave ameaça referente a mal estranho à função pública, haverá crime de

extorsão ou roubo. Ex.: um policial aponta um revólver para a vítima e, mediante ameaça de morte, pede que ela lhe entregue o carro.Na concussão não é necessário que o funcionário público esteja trabalhando no momento da exigência. O próprio tipo diz que

ele pode estar fora da função (horário de descanso, férias, licença) ou, até mesmo, nem tê-la assumido (quando já passou no concurso mas ainda não tomou posse). O que é necessário é que a exigência diga respeito à função pública e as represálias a ela se refiram.

Se o crime for cometido por policial militar estará configurado o crime do art. 305 do Código Penal Militar, que é igualmente chamado de concussão.

Se alguém finge ser policial e exige dinheiro para não prender a vítima, não há concussão, porque o agente não é funcionário público. Responderá, nesse caso, por crime de extorsão (art. 158).

Concluindo, a concussão é um crime em que a vítima é constrangida a conceder uma vantagem indevida a funcionário público em razão do temor de uma represália imediata ou futura decorrente de exigência feita por este e relacionada necessariamente com sua função.

A vantagem exigida tem de ser indevida. Se for devida, haverá crime de abuso de autoridade do art. 4º, h, da Lei n. 4.898/65, em razão da ameaça feita.

A lei se refere a vantagem indevida:- Damásio E. de Jesus, Nélson Hungria e M. Noronha entendem que deve ser vantagem patrimonial.- Júlio F. Mirabete e Fernando Capez, por outro lado, dizem que pode ser qualquer espécie de vantagem, uma vez que a lei não

faz distinção. Ex.: proveitos patrimoniais, sentimentais, de vaidade, sexuais etc.O agente deve visar proveito para ele próprio ou para terceira pessoa.Como na concussão o funcionário público faz uma ameaça explícita ou implícita, se a vítima vier a entregar o dinheiro exigido,

não cometerá corrupção ativa, uma vez que somente o terá feito por se ter sentido constrangida.Consumação. O crime de concussão consuma-se no momento em que a exigência chega ao conhecimento da vítima, indepen-

dentemente da efetiva obtenção da vantagem visada. Trata-se de crime formal.A obtenção da vantagem é mero exaurimento.Não desnatura o crime, portanto, a devolução posterior da vantagem (mero arrependimento posterior — art. 16 do CP) ou a

ausência de prejuízo.Um policial exige hoje a entrega de certa quantia em dinheiro. A vítima concorda e se compromete a entregar a quantia em um

lugar determinado, três dias depois. Ela, entretanto, chama outros policiais, que prendem o sujeito na hora da entrega. Há flagrante provocado?

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No flagrante provocado o sujeito é induzido a praticar um crime, mas se tomam providências que inviabilizam totalmente a sua consumação. Nesse caso, não há crime, pois se trata de hipótese de crime impossível (Súmula 145 do STF).

Assim, na questão em análise, verifica-se não ter ocorrido o flagrante provocado, pois não houve qualquer provocação, ou seja, ninguém induziu o policial a fazer a exigência. Temos, na hipótese, um crime de concussão consumado, já que a infração se aperfei-çoou com a simples exigência que ocorrera três dias antes da data combinada para a entrega do dinheiro.

Tentativa. É possível a tentativa. Exs.: a) peço para terceiro fazer a exigência à vítima, mas ele morre antes de encontrá-la; b) uma carta contendo a exigência se extravia.

Sujeitos passivos. O Estado e a pessoa contra quem é dirigida a exigência.

CORRUPÇÃO ATIVA E PASSIVA Corrupção passivaArt. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la,

mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. 1º - A pena é aumentada de um terço, se, em consequência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar

qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional.§ 2º - Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou

influência de outrem:Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa.

(...)

Corrupção ativa Art. 333 - Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato

de ofício: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou omite ato

de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional.

Corrupção Passiva

Na corrupção passiva não há ameaça, nem constrangimento. Se o funcionário pede e a pessoa coloca a mão dentro do bolso e entrega, não é caso de corrupção ativa, pois não existe tipificação para entregar, só para prometer, oferecer. Só há corrupção passiva nesse caso.

Na modalidade solicitar, onde a iniciativa é do funcionário público, não há crime de corrupção ativa, e sim de corrupção passiva.Já, nas modalidades de receber e aceitar promessa, ocorre corrupção ativa na outra ponta, pois a iniciativa foi de terceiro.Vantagem indevida na corrupção passiva é para que o funcionário faça alguma coisa, deixe de fazer, ou então retarde.A consumação ocorre quando houver a solicitação, o recebimento ou a aceitação da vantagem. A consumação não depende da

prática ou da omissão de ato por parte do funcionário. O recebimento da vantagem só é importante para a modalidade receber.

Elementos Objetivos do Tipo:• Solicitar, pedir. Quem pede não constrange, não ameaça, simplesmente pede. A atitude de solicitar é iniciativa do funcioná-

rio público.• Receber, entrar na posse. É preciso ao menos o indício de que a pessoa entrou na posse.• Aceitar promessa, concordar com a proposta. Pode ser por silêncio, gesto, palavra. A iniciativa é de terceiro que faz a pro-

posta. Alguém propõe e o funcionário aceita.

Corrupção Passiva Privilegiada – § 2.º: A corrupção passiva privilegiada ocorre com pedido ou influência de outrem. Corrup-ção privilegiada é um crime material – praticar, deixar de praticar.

Didatismo e Conhecimento 58

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Corrupção ativa

De acordo com a teoria monista ou unitária, todos os que contribuírem para um crime responderão por esse mesmo crime. Às vezes, entretanto, a lei cria exceções a essa teoria, como ocorre com a corrupção passiva e a corrupção ativa. Assim, o funcionário público que solicita, recebe ou aceita promessa de vantagem indevida comete a corrupção passiva, enquanto o particular que oferece ou promete essa vantagem pratica corrupção ativa. Existe, portanto, uma correlação entre as figuras típicas dos delitos:

Na modalidade “solicitar” da corrupção passiva, não existe, entretanto, figura correlata na corrupção ativa. Com efeito, na solici-tação a iniciativa é do funcionário público, que se adianta e pede alguma vantagem ao particular. Em razão disso, se o particular dá, entrega o dinheiro, só existe a corrupção passiva. O fato é atípico quanto ao particular, pois ele não ofereceu nem mesmo prometeu, mas tão somente entregou, o que lhe foi solicitado. Como tal conduta não está prevista em lei, o fato é atípico.

Existe corrupção passiva sem corrupção ativa?Sim, em duas hipóteses. Primeiro, no caso já mencionado acima.Segundo, quando o funcionário público solicita e o particular se recusa a entregar o que foi pedido.Por outro lado, nas condutas de oferecer e prometer, que são as únicas descritas na corrupção ativa, a iniciativa é do particular.A corrupção ativa, portanto, consuma-se no momento em que a oferta ou a promessa chegam ao funcionário público. Assim, se o

funcionário recebe ou aceita a promessa, responde por corrupção passiva e o particular por corrupção ativa. Porém, se o funcionário público as recusa, só o particular responde por corrupção ativa.

Existe corrupção ativa sem corrupção passiva?Sim, quando o funcionário público não recebe e não aceita a oferta ou promessa de vantagem ilícita.É necessário que o agente ofereça ou faça uma promessa de vantagem indevida para que o funcionário público pratique, omita

ou retarde ato de ofício. Sem isso não há corrupção ativa.E se o agente se limita a pedir para o funcionário “dar um jeitinho”? Não há corrupção ativa, pois o agente não ofereceu nem prometeu qualquer vantagem indevida.Nesse caso, se o funcionário público “dá o jeitinho” e não pratica o ato que deveria, responde por corrupção passiva privilegiada

(art. 317, § 2º) e o particular figura como partícipe. Se o funcionário público não dá o jeitinho, o fato é atípico.O tipo exige que a vantagem seja endereçada ao funcionário público.A que tipo de vantagem se refere a lei?a) Deve ser indevida; se for devida, não há crime.b) Nélson Hungria acha que a vantagem deve ser patrimonial. DamásioE. de Jesus, M. Noronha, Heleno C. Fragoso e Júlio F. Mirabete entendem que a vantagem pode ser de qualquer natureza, inclu-

sive sexual.Se o particular oferece a vantagem para evitar que o funcionário público pratique contra ele algum ato ilegal, não há crime.E se um menor de idade oferece dinheiro a um policial que o pegou dirigindo sem habilitação e este aceita?O policial pratica crime de corrupção passiva.Conforme já mencionado, a corrupção ativa consuma-se quando a oferta ou a promessa chegam ao funcionário público e inde-

pende da aceitação deste.

Se, entretanto, o funcionário público a aceitar e, em razão da vantagem, retardar, omitir ou praticar ato infringindo dever funcio-nal, a pena da corrupção ativa será aumentada de um terço, nos termos do art. 333, parágrafo único, do Código Penal. Sempre que ocorrer essa hipótese, o funcionário público será responsabilizado pela forma exasperada descrita no art. 317, § 1º, do Código Penal.

Tentativa. A tentativa é possível apenas na forma escrita.Para que exista a corrupção ativa, o sujeito, com a oferta ou promessa de vantagem, deve visar fazer com que o funcionário:a) Retarde ato de ofício. Ex.: para que um delegado de polícia demore a concluir um inquérito policial, visando a prescrição.b) Omita ato de ofício. Ex.: para que o policial não o multe.c) Pratique ato de ofício. Ex.: para delegado de polícia emitir Carteira de Habilitação para quem não passou no exame (nesse

caso, há também crime de falsidade ideológica).Distinção. Se houver corrupção ativa em transação comercial internacional, estará configurado o crime do art. 337-B do Código

Penal. A corrupção para obter voto em eleição constitui crime do art. 299 do Código Eleitoral (Lei n. 4.737/65). Por fim, a corrupção ativa de testemunhas, peritos, tradutores ou intérpretes, não oficiais, constitui o crime do art. 343 do Código Penal.

PREVARICAÇÃO

PrevaricaçãoArt. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para

satisfazer interesse ou sentimento pessoal:

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Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa. Art. 319-A. Deixar o Diretor de Penitenciária e/ou agente público, de cumprir seu dever de vedar ao preso o acesso a aparelho

telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo: Pena: detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano. Consumação. O crime se consuma com a omissão, retardamento ou realização do ato.Tentativa. Não é possível nas formas omissivas (omitir ou retardar), pois ou o crime está consumado ou o fato é atípico. Na

forma comissiva, a tentativa é possível.Figura equiparada. A Lei n. 11.466, de 28 de março de 2007, criou nova figura ilícita no art. 319-A do Código Penal, estabe-

lecendo que a mesma pena prevista para o crime de prevaricação será aplicada ao diretor de penitenciária e/ou agente público que deixar de cumprir seu dever de vedar ao preso o acesso a aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo. O legislador entendeu necessária a criação desse tipo penal em face da constatação de que presos têm tido fácil acesso a telefones celulares ou aparelhos similares, e que os agentes penitenciários não vêm dando o combate adequado a esse tipo de comportamento. Assim, a Lei n. 11.466/2007, além de criar essa figura capaz de punir o agente penitenciário que se omita em face da conduta do preso, estipulou também que este, ao fazer uso do aparelho, incorre em falta grave — que tem sérias consequências na execução criminal (art. 50, VII, da Lei de Execuções Penais, com a redação dada pela Lei n. 11.466/2007). Com essas providências pretende o legislador evitar que presos comandem suas quadrilhas do interior de penitenciárias e que deixem de cometer crimes com tais aparelhos, pois é notório que enorme número de delitos de extorsão vêm sendo cometidos por pessoas presas, por meio de telefonemas.

Observações:1) Na corrupção passiva, o funcionário público negocia seus atos, visando uma vantagem indevida. Na prevaricação isso não

ocorre.Aqui, o funcionário público viola sua função para atender a objetivos pessoais.2) O agente deve atuar para satisfazer:a) interesse patrimonial (desde que não haja recebimento de vantagem indevida, hipótese em que haveria corrupção passiva) ou

moral;b) sentimento pessoal, que diz respeito à afetividade do agente em relação a pessoas ou fatos. Ex.: Permitir que amigos pesquem

em local público proibido. Demorar para expedir documento solicitado por um inimigo. O sentimento, aqui, é do agente, mas o be-nefício pode ser de terceiro.

O atraso no serviço por desleixo ou preguiça não constitui crime. Se fica caracterizado, todavia, que o agente, por preguiça, roti-neiramente deixa de praticar ato de ofício, responde pelo crime. Ex.: delegado que nunca instaura inquérito policial para apurar crime de furto, por considerá-lo pouco grave.

3) A prevaricação não se confunde com a corrupção passiva privilegiada. Nesta, o agente atende a pedido ou influência de outrem.Na prevaricação não há tal pedido ou influência. O agente visa satisfazer interesse ou sentimento pessoal.Se um fiscal flagra um desconhecido cometendo irregularidade e deixa de multá-lo em razão de insistentes pedidos deste, há

corrupção passiva privilegiada; mas se o fiscal deixa de multar a pessoa porque percebe que se trata de um antigo amigo, comete prevaricação.

4) O tipo exige que a conduta do funcionário público seja indevida apenas nas duas primeiras modalidades (retardar e deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício). Na última hipótese prevista no tipo (praticar ato de ofício), a conduta deve ser “contra ex-pressa previsão legal”. Temos, neste último caso, uma norma penal em branco, pois sua aplicação depende da existência de outra lei.

EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO

1. (Técnico do Ministério Público – MPE/SE – FCC – 2009) O art. 5º, LVII, da Constituição Federal dispõe que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Nesse dispositivo constitucional está consagrado o princípio

a) da anterioridade da lei penal.b) da presunção de inocência.c) da legalidade.d) do contraditórioe) do juiz natural

Didatismo e Conhecimento 60

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2. (Defensoria Pública – DPE/SP – FCC – 2010) A absorção do crime-meio pelo crime-fim configura aplicação do princípio daa) sucessividadeb) alternatividadec) consunçãod) especialidadee) subsidiariedade

3. (FCC - 2012 - TRT - 4ª REGIÃO (RS) - Juiz do Trabalho - Prova TIPO 4) Consumam-se com o resultado os crimes (A) formais e omissivos próprios. (B) omissivos impróprios e materiais. (C) formais e omissivos impróprios. (D) materiais e omissivos próprios. (E) materiais e de mera conduta.

4. (FCC - 2012 - TRE-PR - Analista Judiciário - Área Administrativa) Os crimes que encerram dois ou mais tipos em uma única descrição legal denominam-se crimes

(A) de mão própria. (B) complexos. (C) plurissubjetivos. (D) qualificados. (E) de ação múltipla

5. (Procurador – TCE /AP – FCC- 2010) Nos crimes preterdolosos,a) o agente prevê o resultado, mas espera que este não aconteçab) o dolo do agente é subsequente ao resultado culposo. c) há maior intensidade de dolo por parte do agente.d) o agente é punido a título de dolo e também de culpa.e) o agente aceita, conscientemente, o risco de produzir o resultado. 6. (Procurador – BACEN – FCC – 2006). O resultado é prescindível para a consumação nos crimesa) materiais e de mera conduta.b) formais e materiais.c) formais e materiais.d) omissivos próprios e materiaise) de mera conduta e formais

7. (CESPE - 2008 - OAB-SP - Exame de Ordem - 2 - Primeira Fase) Assinale a opção correta acerca da classificação dos crimes.

A) O crime é qualificado quando, ao tipo básico, ou fundamental, o legislador agrega circunstâncias que elevam ou majoram a pena, tal como ocorre com o homicídio.

B) O delito de ameaça pode ser classificado como crime material.C) Os crimes de quadrilha e rixa são unissubjetivos.D) O delito de infanticídio pode ser classificado como crime comum.

8. (VUNESP - 2008 - MPE-SP - Promotor de Justiça) Assinale a alternativa correta.(A) Os crimes instantâneos não admitem tentativa.(B) Nos crimes de ação múltipla, a pluralidade de agentes integra o tipo.(C) É possível a tentativa em crimes comissivos por omissão.(D) O crime de exercício arbitrário das próprias razões é crime de mão própria.(E) Os crimes unissubjetivos não admitem coautoria.

Didatismo e Conhecimento 61

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9. (Analista Judiciário – TJ – SE – FCC – 2009) Quanto ao elemento moral, os crimes podem ser: a) comissivos e omissivos.b) simples e complexos.c) individuais e coletivos.d) dolosos e culposos.e) políticos e mistos.

10. (Procurador – TCE /AP – FCC – 2010) São crimes que se consumam no momento em que o resultado é produzido:a) omissivos impróprios e materiais.b) materiais e omissivos próprios. c) culposos e formaisd) de mera conduta e omissivos impróprios. e) permanentes e formais.

11. (Secretário de Diligências – MPE/RS – FCC – 2008) Tendo em conta o Princípio da Reserva Legal, é correto afirmar quea) é lícita a aplicação de pena não prevista em lei se o fato praticado pelo agente for definido como crime no tipo penal. b) o juiz pode fixar a pena a ser aplicada ao autor do delito acima do máximo previsto em lei, aplicando os costumes vigentes na

localidade em que ocorreu. c) é vedado o uso da analogia para punir o autor de um fato não previsto em lei como crime, mesmo sendo semelhante a outro

por ela definido. d) fica ao arbítrio do juiz determinar a abrangência do preceito primário da norma incriminadora se a descrição do fato delituoso

na norma penal for vaga e indeterminada. e) o juiz tem o poder de impor sanção penal ao autor de um fato não descrito como crime na lei penal, se esse fato for imoral,

antissocial ou danoso à sociedade.

12. (Analista Judiciário – TRT 8ª Região – FCC – 2010) João cometeu um crime para o qual a lei vigente na época do fato pre-via pena de reclusão. Posteriormente, lei nova estabeleceu somente a sanção pecuniária para o delito cometido por João. Nesse caso,

a) a aplicação da lei nova depende da expressa concordância do Ministério Público. b) aplica-se a lei nova somente se a sentença condenatória ainda não tiver transitado em julgado. c) não se aplica a lei nova, em razão do princípio da irretroatividade das leis penais. d) aplica-se a lei nova, mesmo que a sentença condenatória já tiver transitado em julgado.e) a aplicação da lei nova, se tiver havido condenação, depende do reconhecimento do bom comportamento carcerário do con-

denado.

13. (Analista Judiciário – TER /AP – FCC – 2006) Considerando os princípios que regulam a aplicação da lei penal no tempo, pode-se afirmar que

a) não se aplica a lei nova, mesmo que favoreça o agente de outra forma, caso se esteja procedendo à execução da sentença, em razão da imutabilidade da coisa julgada.

b) pela abolitio criminis se fazem desaparecer o delito e todos os seus reflexos penais, permanecendo apenas os civis.c) em regra, nas chamadas leis penais em branco com caráter excepcional ou temporário, revogada ou alterada a norma comple-

mentar, desaparecerá o crime.d) a lei excepcional ou temporária embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram,

não se aplica ao fato praticado durante a sua vigência.e) permanecendo na lei nova a definição do crime, mas aumentadas suas consequências penais, esta norma será aplicada ao autor

do fato.

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14. (DELEGADO DE POLÍCIA/AP – FGV – 2010) Relativamente ao tema da territorialidade e extraterritorialidade, analise as afirmativas a seguir.

I. Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro os crimes contra a administração pública, por quem está a seu serviço.

II. Ficam sujeitos à lei brasileira, os crimes praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, quando em território estrangeiro ainda que julgados no estrangeiro.

III. Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro os crimes contra o patrimônio da União, do Distrito Federal, de Estado, de Território ou de Município quando não sejam julgados no estrangeiro.

Assinale:(A) se somente a afirmativa I estiver correta.(B) se somente a afirmativa II estiver correta.(C) se somente a afirmativa III estiver correta.(D) se somente as afirmativas II e III estiverem corretas.(E) se todas as afirmativas estiverem corretas.

15. (DELEGADO DE POLÍCIA/AP – FGV – 2010) Assinale a alternativa que apresente local que não é considerado como extensão do território nacional para os efeitos penais.

(A) aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, quando em território estrangeiro, desde que o crime figure entre aqueles que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir.

(B) as aeronaves e as embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar.

(C) as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública, onde quer que se encontrem.(D) aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em pouso no território nacional ou em

voo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil.(E) as embarcações e aeronaves brasileiras, a serviço do governo brasileiro, onde quer que se encontrem.

16. (Analista de Promotoria – MP/SP – VUNESP – 2010) Considere que um indivíduo, de nacionalidade chilena, em território argentino, contamine a água potável que será utilizada para distribuição no Brasil e Paraguai. Considere, ainda, que neste último país, em razão da contaminação, ocorre a morte de um cidadão paraguaio, sendo que no Brasil é vitimado, apenas, um equatoriano.

De acordo com a regra do art. 6.º, do nosso Código Penal (“lugar do crime”), considera-se o crime praticadoa) na Argentina, apenas.b) no Brasil e no Paraguai, apenas.c) no Chile e na Argentina, apenas.d) na Argentina, no Brasil e no Paraguai, apenas.e) no Chile, na Argentina, no Paraguai, no Brasil e no Equador.

17. (MPE/RS – Secretário de Diligências – FCC – 2010) Em tema de aplicação da lei penal, é INCORRETO afirmar:a) Na contagem do prazo pelo Código Penal, não se inclui no seu cômputo, o dia do começo, nem se desprezam na pena de multa,

as frações de Real. b) Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu

ou deveria produzir-se o resultado. c) O princípio da legalidade compreende os princípios da reserva legal e da anterioridade. d) A regra da irretroatividade da lei penal somente se aplica à lei penal mais gravosa. e) As leis temporárias ou excepcionais são autorrevogáveis e ultrativas.

18. (FCC - TRT 8ª REGIÃO - 2010) Tendo em conta o tipo penal do crime de homicídio (art. 121 do Código Penal: “Matar alguém”), a mãe que intencionalmente deixa de amamentar a criança, causando-lhe a morte por inanição, pratica um

(A) crime culposo.(B) crime omissivo.(C) crime sem resultado.(D) crime comissivo por omissão.(E) fato penalmente atípico.

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19. (Defensoria Pública – DPE/MT – FCC – 2009) O art. 14, § único, do Código Penal dispõe que “salvo disposição em contrá-rio, pune-se a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado, diminuída de um a dois terços”. O percentual de diminuição de pena a ser considerado levará em conta

a) a intensidade do dolob) o iter criminis percorrido pelo agentec) a periculosidade do agented) a reincidênciae) os antecedentes do agente

20. Assinale a alternativa CORRETA a respeito de tentativa e consumação do crime:a) Pune-se a tentativa com a pena correspondente ao consumado, diminuída de um a dois terços, portanto a pena do crime tentado

é sempre menor que a do crime consumado.b) Os crimes culposos não admitem tentativa, inclusive na omissão imprópria, assim como nos crimes unissubsistentes, que são

aqueles que se realizam em um único ato.c) Pode haver tentativa no crime preterdoloso ou preterintencional, porque nesta espécie de crime há dolo no antecedente e culpa

no consequente.d) A adequação típica de um crime tentado é de subordinação mediata, ampliada ou por extensão, já que a conduta humana nessa

espécie de crime não se enquadra prontamente na lei penal incriminadora.

21. (CESPE - 2009 - OAB - Exame de Ordem Unificado - 1 - Primeira Fase - Mai/2009) Acerca dos institutos da desistência voluntária, do arrependimento eficaz e do arrependimento posterior, assinale a opção correta.

A) O agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na execução ou impede que o resultado se produza responderá pelo crime consumado com causa de redução de pena de um a dois terços.

B) A desistência voluntária e o arrependimento eficaz, espécies de tentativa abandonada ou qualificada, passam por três fases: o início da execução, a não consumação e a interferência da vontade do próprio agente.

C) Crimes de mera conduta e formais comportam arrependimento eficaz, uma vez que, encerrada a execução, o resultado natu-ralístico pode ser evitado.

D) A natureza jurídica do arrependimento posterior é a de causa geradora de atipicidade absoluta da conduta, que provoca a ade-quação típica indireta, de forma que o autor não responde pela tentativa, mas pelos atos até então praticados.

22. (Prova: FCC - 2006 - DPE-SP - Defensor Público) No caso de crime impossível é correto afirmar:a) Se os meios empregados são ineficazes para alcançar o resultado, mesmo que o agente acredite que são eficazes e aja para

evitar o resultado, haverá crime impossível e não arrependimento eficaz.b) Se houver absoluta ineficácia do meio a tentativa é atípica, mas punível.c) A ausência da menção da inidoneidade no art. 17 do Código Penal, que só trata da ineficácia do meio e da impropriedade do

objeto, não pode ser resolvida com a analogia in bonam partem.d) Nos casos de flagrante preparado, porque o bem está inteiramente protegido, não se pode dizer que há crime impossível.e) Para sua configuração é necessário tanto que o meio seja absolutamente ineficaz, quanto que o objeto seja absolutamente

impróprio.

23. (Procuradoria do Estado – PGE/CE – CESPE – 2008) Há crime quando o sujeito ativo pratica fato típico em função de a) estado de necessidade.b) coação moral irresistível.c) legítima defesa.d) estrito cumprimento do dever legal.e) exercício regular do direito.

24. (CESPE-UNB, Juiz Substituto – PI, 2012) Assinale a opção correta a respeito da ilicitude e das suas causas de exclusão:A) Considere que Antônio seja agredido por Lucas, de forma injustificável, embora lhe fosse igualmente possível fugir ou per-

manecer e defender-se. Nessa situação, como o direito é instrumento de salvaguarda da paz social, caso Antônio enfrentasse e ferisse gravemente Lucas, ele deveria ser acusado de agir com excesso doloso.

B) Se a excludente do estrito cumprimento do dever legal for reconhecida em relação a um agente, necessariamente será reco-nhecida em relação aos demais coautores, ou partícipes do fato, que tenham conhecimento da situação justificadora.

C) Considere que, para proteger sua propriedade, Abel tenha instalado uma cerca elétrica oculta no muro de sua residência e que duas crianças tenham sido eletrocutadas ao tentar pulá-la. Nesse caso, caracteriza-se exercício regular do direito de forma excessiva, devendo Abel responder por homicídio culposo.

D) Em relação ao estado de necessidade, adota-se no CP a teoria diferenciadora, segundo a qual a excludente de ilicitude poderá ser reconhecida como justificativa para a prática do fato típico, quando o bem jurídico sacrificado for de valor menor ou igual ao do bem ameaçado.

E) No que se refere ao terceiro que sofre a ofensa, o estado de necessidade classifica-se em agressivo, quando a ação é dirigida contra o provocador dos fatos, e defensivo, quando o agente destrói bem de terceiro inocente.

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25. (TJ-PR - 2011 - TJ-PR - Juiz) No que tange às causas excludentes de ilicitude, após apontar quais são as assertivas verda-deiras (V) e falsas (F), assinale a única sequência CORRETA:

(_) Não há crime quando o agente pratica o fato em estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.

(_) O agente, quando praticar os atos em legítima defesa, não responderá pelo excesso punível na modalidade dolosa ou culposa. (_) Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade,

nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se. (_) O agente, em qualquer das hipóteses do artigo 23 do Código Penal (legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumpri-

mento do dever legal e exercício regular de direito), responderá pelo excesso doloso ou culposo. (_) Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, pretérita, atual

ou iminente, a direito seu ou de outrem.

A) V, F, V, V, F B) F, V, V, F, V C) F, F, V, V, F D) V, F, V, F, V

26. (NUCEPE - 2012 - PM-PI - Agente de Polícia – Sargento) Sobre as excludentes de ilicitude podemos afirmar, EXCETO.a) Mesmo amparado pelas excludentes de ilicitude, o agente responderá pelo excesso doloso ou culposo de sua ação. b) Considera-se em legítima defesa quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia

de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se.c) O estado de necessidade tem como um de seus requisitos a preservação de direito próprio ou de outrem. d) A legítima defesa tem como um de seus requisitos a reação a agressão injusta, atual ou iminente. e) Para que esteja amparado pela excludente do estrito cumprimento do dever legal (art. 23, III, 1ª Parte, do Código Penal), é

necessário que o agente obedeça rigorosamente os limites do dever, sendo que, se ultrapassá-los, responderá pelo abuso de direito ou excesso de dever.

27. (MPE-PR - 2012 - MPE-PR - Promotor de Justiça) Sobre legítima defesa, assinale a alternativa incorreta:a) Não é possível falar em legítima defesa real contra legítima defesa real, mas é admissível legítima defesa real contra legítima

defesa putativa e legítima defesa real contra excesso de legítima defesa, real ou putativa;b) A proteção contra lesões corporais produzidas em situação de ataque epiléptico não pode ser justificada pela legítima defesa,

mas pode ser justificada pelo estado de necessidade;c) A legítima defesa putativa constitui exemplo de erro sobre os pressupostos fáticos de uma causa de justificação e, se evitável,

reduz a culpabilidade, conforme a teoria limitada da culpabilidade;d) As limitações ético-sociais para o exercício da legítima defesa contra agressões injustas, atuais ou iminentes, a bem jurídico,

produzidas por crianças, impõem ao agredido procedimentos alternativos prévios, cuja observância condiciona a permissibilidade da defesa;

e) A legítima defesa pode ser utilizada para repelir agressão injusta, atual ou iminente, a bem jurídico, realizada por alguém em situação de coação moral irresistível ou de obediência hierárquica, excludentes da culpabilidade.

28. (FCC - 2010 - MPE-SE - Analista – Direito) Desenvolvimento mental incompleto ou retardado, embriaguez decorrente de caso fortuito e menoridade constituem, dentre outras, excludentes de

(A) tipicidade. (B) ilicitude. (C) punibilidade. (D) antijuridicidade. (E) culpabilidade

29. (UFPR, Juiz Substituto-PR, 2012) A embriaguez, voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância de efeito análogo:a) isenta o réu de pena, mas pode ser recepcionada como crime independente punido com pena de detenção.b) é sempre considerada atenuante na prática de qualquer delito.c) não exclui a imputabilidade penal.d) só tem relevância penal quando a embriaguez atinge percentual perceptível por exame de bafômetro.

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30. (DELEGADO DE POLÍCIA/AP – FGV – 2010) Assinale a alternativa que não qualifica o crime de homicídio.(A) Emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel.(B) Para assegurar a ocultação de outro crime.(C) Motivo fútil.(D) Abuso de poder ou violação de dever inerente a cargo, ofício, ministério ou profissão.(E) Mediante dissimulação.

31. (FCC - TRT 8ª REGIÃO - 2010) No crime de homicídio,(A) não há incompatibilidade na coexistência de circunstâncias objetivas que qualificam o crime e as que o tornam privilegiado.(B) há incompatibilidade na coexistência de quaisquer circunstâncias que qualificam o crime e as que o tornam privilegiado.(C) não há incompatibilidade na coexistência de circunstâncias subjetivas que qualificam o crime e as que o tornam privilegiado.(D) há incompatibilidade na coexistência de duas ou mais qualificadoras, ainda que objetivas.(E) não há incompatibilidade na coexistência de duas qualificadoras de natureza subjetiva.

32. (Defensoria Pública – DPE/MT – FCC – 2010) João matou seu desafeto com vinte golpes de faca. Nesse caso,a) responderá por crime de homicídio tentado e consumado em concurso material. b) ocorreu concurso formal de infrações.c) responderá por vinte crimes de homicídio em concurso material. d) deve ser reconhecido o crime continuado.e) responderá por um crime de homicídio.

33. (FCC - 2013 - TJ-PE - Juiz) Em relação aos crimes contra a vida, correto afirmar que (A) o homicídio simples, em determinada situação, pode ser classificado como crime hediondo. (B) a pena pode ser aumentada de um terço no homicídio culposo, se o crime é praticado contra pessoa menor de quatorze anos

ou maior de sessenta anos. (C) compatível o homicídio privilegiado com a qualificadora do motivo fútil. (D) cabível a suspensão condicional do processo no homicídio culposo, se o crime resulta de inobservância de regra técnica de

profissão, arte ou ofício. (E) incompatível o homicídio privilegiado com a qualificadora do emprego de asfixia.

34. (FUNCAB - 2012 - PC-RO - Médico Legista) São crimes contra a vida, assim previstos pelo Código Penal:A) latrocínio, homicídio, extorsão mediante sequestro seguido de morte e infanticídio.B) homicídio, aborto, infanticídio e induzimento ao suicídio.C) homicídio, aborto, latrocínio e lesão corporal seguida de morte.D) extorsão mediante sequestro seguido de morte, rixa seguida de morte, latrocínio, infanticídio e aborto.E) latrocínio, lesão corporal seguida de morte, difamação e periclitação da vida.

35. (FCC - TRT 8ª REGIÃO - 2010) Jeremias aproximou-se de um veículo parado no semáforo e, embora não portasse qual-quer arma, mas fazendo gestos de que estaria armado, subtraiu a carteira do motorista, contendo dinheiro e documentos. Jeremias responderá por crime de

(A) roubo qualificado pelo emprego de arma.(B) furto simples.(C) furto qualificado.(D) roubo simples.(E) apropriação indébita.

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36. (Delegado de Polícia – FGV – 2010) Relativamente aos crimes contra o patrimônio, analise as afirmativas a seguir: I. No crime de furto, se o criminoso é primário, e a coisa furtada é de pequeno valor, o juiz pode substituir a pena de reclusão

pela de detenção. II. Considera-se qualificado o dano praticado com violência à pessoa ou grave ameaça, com emprego de substância inflamável

ou explosiva (se o fato não constitui crime mais grave), contra o patrimônio da União, Estado, Município, empresa concessionária de serviços públicos ou sociedade de economia mista ou ainda por motivo egoístico ou com prejuízo considerável para a vítima.

III. É isento de pena quem comete qualquer dos crimes contra o patrimônio em prejuízo do cônjuge, na constância da socieda-de conjugal, desde que não haja emprego de grave ameaça ou violência à pessoa ou que a vítima não seja idosa nos termos da Lei 10.741/2003.

Assinale:a) se somente a afirmativa I estiver correta. b) se somente a afirmativa II estiver correta. c) se somente a afirmativa III estiver correta.d) se somente as afirmativas II e III estiverem corretas. e) se todas as afirmativas estiverem corretas.

37. (Defensoria Pública – DPE/MT – FCC – 2009) Quanto aos crimes contra o patrimônio, é correto afirmar que a) o estelionato não admite a figura privilegiada do delito. b) a pena, na extorsão, pode ser aumentada até dois terços se praticada por duas ou mais pessoas. c) o chamado “furto de uso”, se aceito, não constituiria crime por falta de tipicidade. d) há latrocínio tentado no caso de homicídio consumado e subtração tentada, segundo entendimento sumulado do Supremo

Tribunal Federal. e) o emprego de arma de brinquedo qualifica o roubo, de acordo com Súmula do Superior Tribunal de Justiça.

38. (Magistratura – TJ – MS – FGV – 2008) São crimes contra o patrimônio: a) roubo, furto, estelionato e lesão corporal. b) roubo, furto, estelionato e usurpação de águas. c) roubo, furto, estelionato e peculato. d) roubo, furto, estelionato e moeda falsa. e) roubo, furto, estelionato e injúria

39. (Analista Judiciário – TRT 3ª Região – FCC – 2009) José ingressou no escritório da empresa Alpha, sendo que o segurança não lhe obstou o acesso porque estava vestido de faxineiro e portando materiais de limpeza. No interior do escritório, arrombou a gaveta e subtraiu R$ 3.000,00 do seu interior. Quando estava saindo do local, o segurança, alertado pelo barulho, tentou detê-lo. José, no entanto, o agrediu e o deixou desacordado e ferido no solo, fugindo, em seguida, do local de posse do dinheiro subtraído. Nesse caso, José responderá por

a) furto qualificado pela fraude e pelo arrombamento.b) furto qualificado pela fraude. c) roubo impróprio. d) furto simples.e) estelionato.

40. (FUNCAB - 2013 - PC-ES - Perito em Telecomunicação) O funcionário público que apropriar-se de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio, comete o crime de:

A) peculato.B) concussão.C) corrupção passiva.D) prevaricação.E) condescendência criminosa.

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41. (Analista Processual – MPU – FCC – 2007) Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, dentre outros, o a) tutor dativo.b) perito judicial. c) curador dativo. d) inventariante judicial.e) síndico falimentar.

42. (Agente de Fiscalização Judiciária – TJ – SP – VUNESP – 2010) A conduta de apropriar-se de dinheiro ou qualquer uti-lidade que, no exercício do cargo, recebeu por erro de outrem configura o crime de

a) corrupção ativa.b) peculato culposo.c) corrupção passiva. d) excesso de exaçãoe) peculato mediante erro de outrem.

43. (VUNESP - 2012 - DPE-MS - Defensor Público) Assinale a alternativa correta.(A) Ocorrerá crime de concussão mesmo se a exigência, para si ou para outrem, versar sobre vantagem devida.(B) A corrupção passiva é crime material, exigindo-se para sua configuração que o funcionário receba a vantagem indevida.(C) Não há possibilidade de ocorrer corrupção ativa sem a correspondente corrupção passiva.(D) Mesmo aquele que não é funcionário público poderá responder por crime de peculato.

GABARITO:

1 B2 C3 B4 B5 D6 E7 A8 C9 D10 A11 C12 D13 B14 A15 A16 D17 A18 D19 B20 D21 B22 A23 B24 B25 A

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26 B27 C28 E29 C30 D31 A32 E33 A34 B35 D36 E37 C38 B39 C40 A41 B42 E43 D

ANOTAÇÕES

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