“Vamos desenrolar”: reflexões a partir de um projeto de extensão universitária no Complexo do Alemão
Movimento estudantil e trabalhadores Urbanos durante a Reforma Universitária
-
Upload
independent -
Category
Documents
-
view
1 -
download
0
Transcript of Movimento estudantil e trabalhadores Urbanos durante a Reforma Universitária
Onde se forjam os homens.
1
Movimento estudantil e os trabalhadores na
Reforma Universitária1
Em Lima e em Havana, como já havia acontecido, em 1918, em
Córdoba, iniciou-se, em 1919, um movimento estudantil de intensidade
inédita tanto no Peru quanto em Cuba. Possuía algumas características
comuns nos vários países, de tal forma que os próprios contemporâneos
aperceberam-se delas e passaram a tratá-lo por uma denominação
genérica, visando consolidar a versão de que tinha proporções
continentais: Reforma Universitária.
Nesse contexto inscreve-se o surgimento, na vida pública, de
nossos dois principais protagonistas: Víctor Raúl Haya de la Torre e
Julio Antonio Mella.
Ambos iniciaram sua atuação como lideranças estudantis, mas
logo ganharam projeção nacional e passaram a ser líderes políticos de
expressão. Cada um deles desempenhou, em seu país, um importante
papel na mobilização dos estudantes e, além disso, na realização
daquele que foi, na visão dos contemporâneos, o traço comum mais
importante da Reforma Universitária em todos os lugares em que ela se
deu: a aproximação entre as aspirações dos setores médios, que os
estudantes representavam, e as classes populares.
Víctor Raúl, nasceu em Trujillo, norte do Peru, em 22 de fevereiro
de 1895, numa grande e aristocrática família na qual a política revelou
ser uma verdadeira vocação. Vários de seus ascendentes ocuparam
importantes cargos políticos na segunda metade do século XIX, em
muitas ocasiões em lados absolutamente contrários, criando vivas
1 O presente texto é um fragmento da tese de doutoramento intitulada ANTIIMPERIALISMO E
NACIONALISMO:A POLÊMICA DOS ANOS 20 NA VISÃO DE
HAYA DE LA TORRE E JULIO ANTONIO MELLA. Apresentada à Universidade de São Paulo.
Onde se forjam os homens.
2
polêmicas no velho casarão dos patriarcas da família, que seria
habitado por Haya e seus pais em seu primeiro ano de vida. Seu pai,
Raúl Edmundo Haya, além de deputado, foi o editor de um jornal em
Trujillo, La Industria, diretamente envolvido nos debates de seu tempo,
mostrando que a inclinação política de Haya de la Torre apenas
confirma uma vocação de várias gerações.
A infância e a adolescência de Haya foram vividas em sua cidade
natal. Recebeu a melhor educação que aos jovens de uma tradicional
família provinciana era recomendável; ingressou no seminário de São
Carlos, onde se instruíam os jovens trujillanos de alguma posição, e
recebeu importante complementação na sua formação de seu tio
Eduardo Gonzalez Orbegozo, que havia sido educado em Londres e
possuía sólidos conhecimentos em economia política e literatura. Essa
última influência foi fundamental no interesse posteriormente
manifestado por Haya com relação à sociedade e à cultura da
Inglaterra.
A primeira atividade de caráter social de Haya, em Trujillo, de que
se tem notícia foi a criação de um Club de Fútbol, em 1912, do qual,
com apenas 17 anos, foi presidente.
Em suas biografias, é constante a referência à primeira
aproximação entre ele e grupos de operários anarquistas, acontecida
ainda em Trujillo através de seu contato com uma biblioteca operária
mantida por um sindicato muito próximo de sua residência. Segundo o
próprio Haya, com 16 anos de idade foi quando, pela primeira vez, teve
contato com os escritos de Manoel González Prada2, particularmente
Páginas libres e Horas de luchas, textos que, a despeito da prática
política e jornalística de seu pai, por diferenças ideológicas jamais
entrariam em sua casa.
2 Manuel Gonzalez Prada (1848-1918): poeta, ensaísta e um dos maiores polemistas da cultura
peruana na virada do século. Com profunda convicção anticlerical, foi fonte de inspiração para os pensadores de esquerda do início do século.
Onde se forjam os homens.
3
Em 1913, Haya foi admitido na Faculdade de Letras da
Universidad de Trujillo, onde permaneceu por três anos, antes de
transferir sua matrícula à Universidad San Marcos, em Lima.
Sua chegada a Lima e os primeiros anos foram vividos em meio à
alta sociedade da capital. A recomendação de seus parentes influentes
de Trujillo abriu algumas portas ao jovem estudante da província.
Foi convivendo nesse círculo de pessoas que conheceu Ana
Bilinghurst, uma adolescente, filha do ex-presidente Guillermo
Bilinghurst 3, única mulher por quem Haya apaixonou-se, segundo ele
mesmo. Durante os anos 30, com o pseudônimo de Ana Pantoja, ela
seria sua incansável companheira na organização da APRA, embora
jamais tenham se casado.
A Lima que Haya conheceu no final da década de 10 já era muito
diferente do que tinha sido até o início do século. Como o resto do Peru,
passava por importantes transformações, resultantes não só do
aumento dos investimentos estrangeiros britânicos e norte-americanos,
que contribuíam para diversificar as atividades econômicas do país,
mas também do crescimento significativo de uma indústria de capital
nacional que, apesar de incipiente, representava novas perspectivas de
emprego e renda para as classes populares, ampliando e diversificando
suas atividades. Segundo Julio Cotler:
“De allí que mientras 1890 la producción (da indústria textil) local
significaba menos de 10% del consumo de tejidos de algodón, quince años
mas tarde, dicha proporción se elevó a cerca de la tercera parte del consumo
total, al mismo tiempo que la producción absoluta se había duplicado. En las
dos primeras décadas del siglo XX, la expansión de la capacidad instalada
en la industria textil creció en 140%. La industrialización en curso significó
3 Guillermo Billinghurst, presidente do Peru entre 1912 e 1914. Governo caracterizado pelo
apoio recebido dos setores populares urbanos da capital que participaram ativamente de sua campanha eleitoral e mantiveram-se mobilizados durante seus anos de mandato. Esse estilo de exercício do poder foi exceção com relação aos governos desse período e custou-lhe a indisposição das principais lideranças políticas que, juntamente com o exército, organizaram
um golpe de Estado que depôs o presidente em 1914, substituindo-o pelo ex-presidente José Pardo.
Onde se forjam os homens.
4
um crecimiento significativo de la población asalariada. Joaquín Capelo en
Lima en 1900, estima que, en 1900, Lima contaba con 100mil habitantes, de
los que 6000 eran obreros, y 16000 artesanos.” 4
Acompanhando essas mudanças, observava-se também que os
trabalhadores, das cidades e do campo, começavam a se organizar em
torno de suas demandas. O movimento sindical no Peru começou a
florescer no início do século, marcado por forte influência do
anarquismo em oposição às sociedades de auxílios mútuos de artesãos
que foram formadas durante o século precedente.
O Sindicato dos Padeiros de Lima, filiado à Federação Anarquista
La Estrella del Perú, organizou, em 1905, uma greve em busca da
jornada de oito horas. Em 1907, foi a vez dos trabalhadores têxteis de
Vitarte, também liderados por anarquistas.
Na região serrana, trabalhadores rurais também incrementavam
sua mobilização, reivindicando basicamente o pagamento integral em
moeda corrente, já que tradicionalmente eram pagos com fichas que os
habilitava a consumir produtos alimentícios nas tiendas de seus
empregadores.
Trabalhadores urbanos que apenas no início do século começavam
a adquirir importância no contexto nacional, protagonizaram o mais
importante movimento de protesto operário e greves já visto no país e
que tomou conta da capital durante o ano de 1919. Sobre sua
diversificação profissional e social, fazemos nossas as palavras de
Alberto Flores Galindo:
“Hemos venido hablando de ‘movimento obrero’. El termino requiere de
múltiples precisiones. En realidad deberíamos referirnos a ‘trabajadores’,
para así resumir la heterogeneidad de un movimento popular donde al lado
de obreros, en el más puro sentido europeu del término, como los textiles de
Vitarte, figuraban artesanos (carpinteros, empapeladores, sastres, etc...),
4 COTLER, Julio. Clase, Estado e Nación en el Perú. Lima, Instituto de Estudios Peruanos,
1992, p.134.
Onde se forjam os homens.
5
servidores ‘domésticos’ (espécie de siervos en la propia ciudad), barredores,
lavaderas etc... Cuando los autores de la época se refieren a los obreros,
están pensando en todos estos personajes y así, por ejemplo, la relación de
Sociedades Obreras hecha por Carlos Cisneros (1911) al lado de la
Federación de Panaderos o la Confederación de Artesanos, figura la
sociedad del Señor de los Milagros o la Sociedad Hijos de Ancash.” 5
Os estudantes da Universidade de São Marcos não ficaram
indiferentes a essa ação. Os que possuíam alguma experiência com o
movimento estudantil - como Haya de la Torre que já havia atuado
como representante estudantil em Trujillo - procuraram rapidamente
agir de maneira articulada com os trabalhadores, oferecendo não só sua
solidariedade, mas também sua colaboração ativa na luta travada
contra os patrões e o governo.
Enfrentando na Federación de Estudiantes de Perú oposição de
grupos que acreditavam que as greves operárias não eram assunto
pertinente aos estudantes, Haya conseguiu aprovar o apoio aos
operários que consistiu não só na cessão do grande Salão de Atos de
que a Federação dispunha no Palácio de Exposições para realização de
Assembléias, como também na nomeação, por parte da Federação, de
uma comissão de três estudantes de São Marcos para compor o comitê
de greve. Além disso, foi fundada a Federación de Trabajadores de
Tejidos del Perú, sob a presidência do delegado universitário Víctor Raúl
Haya de la Torre.6
Nesse período, Haya converteu-se no principal mediador entre o
Ministro de Fomento, Manuel Vinelli - o homem do gabinete do
presidente José Pardo sobre quem recaiu a responsabilidade de pôr fim
5 FLORES GALINDO, Alberto. La agonía de Mariátegui. Lima, Instituto de Apoyo Agrario,
1989, p. 204. 6 NIETO, Jorge. “La transición intelectual del joven Haya” en ADRIANZÉN, Alberto. (org.)
Pensamiento político peruano. Lima, DESCO, 1987, p.170. Esse fato demonstra a disposição
dos estudantes em participar das lutas operárias e a credibilidade dos trabalhadores com relação aos estudantes.
Onde se forjam os homens.
6
à greve - e as lideranças trabalhistas, intercambiando propostas e
contrapropostas.
Onde se forjam os homens.
7
Depois de intensas negociações, algumas tentativas de prisão de
lideranças sindicais e por força dos resultados massivos da mobilização
– paralisando quase por completo as principais atividades produtivas na
capital e mantendo a cidade às escuras por vários dias - o governo
estabeleceu, por decreto, a jornada máxima de oito horas em todo
território nacional, não sem antes conseguir que o movimento grevista
desistisse de suas outras reivindicações de natureza econômica.
Dessa forma, os estudantes peruanos realizaram uma primeira
experiência de aproximação com os setores populares, ultrapassando a
retórica dos intelectuais que os haviam antecedido no início do século -
a chamada “geração do 900” - de “agitar as consciências” e realizando
uma ação concreta de organização de massa.
A vitória dos trabalhadores inquietou intensamente os setores
políticos mais conservadores do país. As comemorações em virtude da
decisão do governo, em Lima, com grandes passeatas em que se
agitavam bandeiras vermelhas e entoavam-se hinos revolucionários,
desencadearam grande preocupação entre os políticos do Partido
Civilista7 que, da tribuna do parlamento, não se cansavam de
denunciar que os “setores mais baixos da população” estavam dispostos
a promover o “terror rojo” e urdir uma “revolução bolchevique”
em terras peruanas 8. Essa participação bem sucedida na luta dos
trabalhadores da cidade inspirou também os estudantes a agirem de
forma mais decidida quanto a seus próprios problemas.
Tão logo terminaram as ações de massa de janeiro de 1919,
achava-se em Lima o importante político socialista argentino Alfredo
Palácios que, em meio a esse clima insurgente e favorável, deu algumas
7 Partido político fundado na década de 1860 por comerciantes de guano liderados por Manuel
Pardo e que realizaram intensa campanha contra os militares em seu periódico La Revista de Lima. Seu primeiro mandato na Presidência da República aconteceu em 1872, com Manuel Pardo.
8 Cf. COTLER, Julio., op. cit., p.180. O exagero desses setores políticos do parlamento é
perfeitamente compreensível quando consideramos que para eles qualquer manifestação da “ralé” nas ruas podia ser vista como um claro sinal de insurgência.
Onde se forjam os homens.
8
conferências sobre sua experiência no movimento da Reforma
Universitária, em Córdoba.
Em junho de 1919, os estudantes lançaram-se à ação. Um
desentendimento entre os alunos da Faculdade de Letras e um
professor de História desencadeou uma greve. Formou-se um comitê,
apoiado na experiência que os estudantes tinham vivido com os
trabalhadores, e a greve rapidamente se alastrou para toda a
Universidade.
No dia 4 de setembro, os estudantes realizaram, na porta do
Palácio do Governo, um comício objetivando entregar sua pauta de
reivindicações nas mãos do presidente recém-empossado em seu
segundo mandato, Augusto B. Leguía.
Leguía havia sido presidente de 1908 a 1912; em 1913, foi exilado
do país por Guillermo Billinghurst que, num golpe de Estado, foi
derrubado por José Pardo que confirmou o exílio de Leguía o qual só
pôde voltar ao país nos primeiros meses de 1919.
Conhecedor dos mecanismos do poder no Peru, em resultado tanto
de seus sucessos quanto de seus fracassos, Leguía buscou organizar
uma ampla frente de apoio junto a todos os setores políticos que
vinham sendo marginalizados pelo Partido Civilista, não hesitando
nessa tarefa em forjar alianças com seus inimigos de períodos
relativamente recentes.
Leguía acercou-se também das novas forças sociais que se
insinuavam no cenário político, mantendo conversações e angariando
simpatizantes entre os universitários. Dessa feita, era com esperança
que os estudantes assomavam às dependências do palácio do Governo
trazendo suas demandas ao novo chefe de estado. Entre elas, além do
pedido de afastamento do professor que havia gerado o
descontentamento, exigia-se a participação de estudantes nos órgãos
deliberativos da Universidade e a extinção da presença obrigatória aos
cursos.
Onde se forjam os homens.
9
Essa primeira fase da relação do movimento estudantil com o novo
governo foi muito tranqüila. Leguía, tão logo chegou ao poder, sabedor
das dificuldades existentes em governar o país sem uma maioria
significativa no Congresso e pretextando uma suposta indisposição de
seus opositores no parlamento em reconhecer sua vitória, promoveu um
Golpe de Estado, dissolvendo as Câmaras Legislativas e convocando
eleições para a composição de uma Assembléia Constituinte. Seguiu-se
a essa medida um intenso processo de expurgo de líderes do Partido
Civilista. Leguía conseguiu deportar ou prender vários deles. Um dos
redutos de seus adversários políticos eram as cátedras universitárias e,
na visão de Leguía, cada vitória dos estudantes representava perda de
influência e prestígio para esses homens. Assim, em outubro desse
mesmo ano, o governo já havia tratado de aprovar leis que sancionavam
a participação dos alunos no governo da Universidade e a supressão
das listas de presença, principais demandas dos estudantes, cuja
proximidade com o novo presidente foi muito além da mera simpatia de
parte à parte. Bem mais tarde, em 1928, analisando essa inicial relação
entre os estudantes e Leguía, tentando demonstrar sua aversão a
Leguía com efeito retroativo, Haya comenta numa carta ao editor de
Repertório Americano, periódico de Costa Rica em que colaborou por
muitos anos:
“Nunca fui leguiísta. Cuando Leguía llegó al Peru, yo trabajaba
ganando cinco libras, o sea, vinticinco dólares mensuales, en el gabinete de
un abogado, Dr. Eleodoro Romero, primo hermano de Leguía, su atual
embajador en Roma (...) Fácil me era pues, llegar hasta Leguía. Todo aquel
que quiso, fue leguiísta, y fue leguiísta afortunado. La casa del candidato
estaba siempre abierta y su mesa siempre lista, para los estudiantes
especialmente. Centenas de ellos desfilaron por la casa lujosa del
candidato, y se sentaron ante su mesa. Yo fui invitado varias veces, pero
nunca acepté.” 9
9 HAYA DE LA TORRE, V. R. Obras completas. Lima, Juan Mejia Paca Editores, 1977, v.2, p.94
Onde se forjam os homens.
10
Já que essa carta havia sido apresentada como uma resposta a
uma outra do poeta Alberto Guillén, escrita à revista Claridad de
Buenos Aires, na qual o remetente acusava Haya de leguiísta, este faz
questão de demonstrar que outros nomes de sua geração mereceriam
muito mais o título do que ele e, para prová-lo, comentou aspectos
muito interessantes da relação entre os estudantes e o governo de
Augusto Leguía:
“La época era de aprovechar. Pocos dejaron pasar tan grata
oportunidad. Leguía, candidato a presidente flamante, se dedicó a comprar
gente. Venderse era fácil, y no se pagaban malos precios. De ese período
vergonzoso de subasta general quedan, sin duda, algunas buenas
consecuencias. Cuando Leguía enviaba a Europa a centenares de jóvenes
de todas las clases, especialmente a intelectuales e estudiantes, salienron
algunos que hoy son grandes compañeros nuestros, y que para Guillén
deberían ser exemplos a seguir. José Carlos Mariátegui es uno de ellos.
Enviado a Europa, pensionado e protegido, aprendió todo lo necesario para
estar listo a luchar desde el campo contrário.” 10
Essa relação harmoniosa entre estudantes e Leguía não duraria
muito tempo. Novas eleições foram realizadas para definir a presidência
da Federação de Estudantes, em 1919, e delas saiu vitorioso Haya de la
Torre.
A primeira importante medida tomada pelo novo presidente foi a
convocação de um Congresso Nacional de Estudantes que se reuniu
durante o mês de março de 1920, na cidade de Cuzco, contando com
representantes das quatro universidades peruanas.
No que se refere à Reforma Universitária, as oposições existentes
entre costa e serra, ou centro urbano e província, ganharam uma
importância central. Grande parte das lideranças estudantis, inclusive
em São Marcos, era oriundas de regiões distantes e vinham estudar em
10 HAYA DE LA TORRE, V. R. op. cit. p.95. Como isso foi escrito próximo à polêmica em torno
da fundação do Partido Nacional, é difícil saber se Haya estava sendo sincero ou irônico com relação a Mariátegui.
Onde se forjam os homens.
11
Lima como forma de travar contato com o mundo urbano, onde se
concentrava o poder político.
No entanto, a valorização da capital como o lugar do progresso e da
civilização, porção do Peru mais próxima da tradição ocidental, em
contraste com uma visão da região serrana como espaço do atraso, da
presença numerosa de indígenas e símbolo das permanências do
mundo colonial, havia sido uma temática muito comum na percepção
do país que intelectuais peruanos do século XIX tinham consagrado.
Os estudantes da geração de Haya, fortemente inspirados por
aqueles que se opunham a essa leitura, dentre os quais González Prada,
o mais importante, tendiam, a cultivar uma idéia de pureza e
autenticidade da província, contrapondo-a à cidade como espaço
degenerado e de dissipação dos costumes. Na verdade, mantinham
inalterado o contraste, porém, invertendo a polaridade.
Essa idéia também era resultado de uma leitura específica do
indigenismo do início do século, informada por uma nova visão das
comunidades indígenas que tinha entre seus principais divulgadores
homens como Castro Pozo11, além do aumento dos conflitos na zona
serrana em defesa das terras comunais e contra a expansão do grande
latifúndio.
11 Hildebrando Castro Pozo. Titular da Sección de Asuntos Indígenas, órgão criado no governo
Leguía, destinado a investigar as condições de vida das comunidades indígenas da região serrana do Peru. Posteriormente, sua produção acadêmica relativa à questão diversificou-se, sendo publicada esparçamente em várias revistas dedicadas ao tema. Entre seus livros, destacam-se Nuestra comunidad indígena, de 1924, e Del ayllu al cooperativismo socialista, de 1936. Além de sua atuação à frente do órgão citado, Castro Pozo foi um dos articuladores dos primeiros Congressos Nacionais de Comunidades Indígenas organizados pelo Comitê Pro-Derecho Indígena Tahuantinsuyo. Este último, não só apoiou as propriedades comunais, como também interveio nas disputas entre elas e os latifundiários, radicalizando suas
posições ao longo dos anos. Foi deputado constituinte pela província de Piura, em 1931, defendendo propostas de luta em favor daquelas comunidades.
Onde se forjam os homens.
12
O fato de o Congresso Nacional ter sido realizado em Cuzco diz
respeito exatamente a essa tendência que vigorava no movimento
estudantil. Embora o centro da agitação tenha sido Lima, esse
deslocamento geográfico no momento da tomada de decisões
importantes não tinha qualquer sentido prático, mas respondia a essa
necessidade de reafirmar o valor da província e daquilo que ela
representava, para a tentativa de proposição de uma nova identidade
nacional.
Em um texto de Haya sobre o Congresso, torna-se ainda mais claro
esse aspecto. O fato de que tenha sido escrito muito depois dos
acontecimentos, em março de 1927, apenas evidencia o uso ideológico
que se fez dessa decisão de escolher Cuzco para sediar o Congresso.
Exatos sete anos depois dos fatos, Haya comenta:
“Antes de la Reforma Universitaria de 1919, nuestra juventud creía
que masculinidad era donjuanismo y talento, viveza criolla.
El mismo gran movimiento reformista habría naufragado en la tibia y
convencional marejada de limeñismo cobarde si el ímpetu provinciano no
hubiera renovado el ambiente lanzado por la borda a los últimos
representantes de la reacción capitalina que ya conducían nuestro glorioso
movimiento hacia el derrotismo y hacia el compromiso. Entonces fuí yo el
intérprete de esse gran anhelo provinciano, y electo presidente de la
Federación, sin carrozas presidenciales ni lujos de sastreria, en medio a la
inquietud del conflicto que el entonces rector de San Marcos trataba de
arrastrar hacia la transacción, sistema de limeñista patente.” 12
Mais adiante, no mesmo texto, Haya desenvolve uma sorte rara de
“determinismo geográfico” que busca explicar os sucessos ocorridos
durante o Congresso:
“La intriga llevada a Lima cuidadosamente no prosperó. Fue como
esos jazmines de invernadero que mueren en las faldas de las montañas
florecidas al contacto con la luz y el aires libres. La altura quebró los brotes
12 HAYA DE LA TORRE, V. R. Obras completas. Lima, Juan Mejia Paca Editores, 1977, v.2,
p.56.
Onde se forjam os homens.
13
del veneno llevado desde los limeños dormitorios sombríos. La lluvia lavó las
manchas, el trueno y el rayo limpiaron los oídos y los ojos de los
ensordecidos y de los miopes. Nuestro Congreso de Cuzco se penetró de un
claro espíritu serrano. Nuestros pulmones respiraban mejor y nuestra
sangre desintoxicada y activa dio a todos, aun a los más sórdidos, limpidez
y alegría. Ya volviendo, después de la victória, una medianoche en Crucero
Alto, lavamos nuestros rostros y lavamos los rostros de los adormitados con
la nieve pura.
Los reaccionarios limeños necessitaron meses para rehabituarse a la
atmósfera de las intrigas. ¡Hasta ellos!, ¿es posible?, habían vuelto más
dignificados de la montaña.” 13
Fica evidente, nesse trecho, o esforço ideológico de erigir uns
tantos valores subjetivos que seriam a base de sustentação de uma
nova percepção do mundo serrano. Não por acaso, o texto em questão,
que respondia muito mais aos imperativos da luta política, em 1927, do
que às reminiscências do alvorecer das lutas estudantis, intitulava-se
“Del Cuzco salió el nuevo verbo y saldra la nueva acción”. Em meio a
uma crescente expectativa de que as comunidades indígenas da região
serrana pudessem tomar a iniciativa de uma luta política em associação
com os trabalhadores da cidade, Haya, do exílio, buscava estabelecer
um nexo direto entre os embates de sua juventude e os grandes
desafios do presente.
Entre todas as resoluções do Congresso, aquela que teve a maior
transcendência do ponto de vista da solidificação da aliança que
começou a se estabelecer entre o movimento estudantil e os
trabalhadores, foi a da criação das Universidades Populares. Iniciativa
concebida e, em grande parte, organizada por Haya, a Universidade
Popular, que ganharia o nome de González Prada, foi talvez a que
conquistou a maior adesão por parte dos trabalhadores. Sua realização
representou o fim da frágil união que havia sido estabelecida entre os
estudantes e a Patria Nueva. Na prática as UPs representavam um meio
13 Idem, p. 57.
Onde se forjam os homens.
14
concreto de ampliar e solidificar a ação dos estudantes na organização
do movimento operário. Sobre seu funcionamento, informa-nos
Portocarrero:
“El sistema de enseñanza se basaba en la organización de cursos,
conferencias y veladas culturales. Se comprometía a alumnos de la
Universidad de San Marcos, según su especialidad, para su dictado.
Generalmente, se le entregaba a cada asistente una breve explicación de los
temas y contenidos de cada curso. Las actividades se realizaban de noche
en el local de la Federación de Estudiantes en el parque de la Exposición. Al
igual que la Universidad, los cursos eran semestrales. Las conferencias se
dictaban con regularidad como complemento a otros cursos (...). Los cursos
eran de tipo básico (historia, geografia, salubridad, matemáticas, castellano,
economía, entre otros).” 14
Embora nos estatutos de fundação da Universidade Popular
estivesse explicitamente consignado que ela não tinha “más doctrina
que la justicia social”, os estudantes envolvidos manifestavam
constantemente sua adesão cada vez mais decidida aos princípios
socialistas. Essa tendência não raro criou alguns confrontos com
lideranças dos trabalhadores que tinham uma clara orientação
anarquista. No entanto, isso não era suficiente para invalidar a
iniciativa, até porque, por tradição própria, os anarquistas prezavam
muito os esforços no sentido de ampliar os horizontes intelectuais dos
trabalhadores.
14 PORTOCARRERO, Ricardo. “José Carlos Mariátegui y las Universidades Gonzalez Prada” en
PORTOCARRERO, Gonzalo. (org.) La aventura de Mariátegui. Nuevas perspectivas. Lima,
Pontificia Universidad Católica, 1995, p.392.
Onde se forjam os homens.
15
Um dos jovens que tomaram para si a tarefa de realizar
conferências nas UPs foi José Carlos Mariátegui15 que, embora nunca
tenha sido aluno em São Marcos, desenvolveu ligação estreita com o
grupo que tomava a cargo essa atividade, tão logo retornou de sua
estada na Europa, entre 1919 e 1923.
O programa exposto a seguir, ministrado por Mariátegui, foi
inicialmente publicado na Revista Claridad, dirigida então por Haya,
sofrendo posteriormente pequenas modificações em função de
imprevistos. Nele podemos ter a chance de perceber os temas que um
conferencista especial - pelo importante papel que posteriormente
desenvolveu na organização do movimento sindical no Peru - dessas
Universidades Populares escolheu para discutir com os alunos:
“1 – La crisis mundial y el proletariado peruano. (15/6/23)
2 – Literatura de guerra. (22/6/23)
3 – El fracasso de la Segunda Internacional. (30/6/23)
4 – La intervención de Italia en la Guerra. (6/7/23)
5 – La Revolución Rusa. (13/7/23)
6 – La Revolución Alemana. (20/7/23)
7 – La Revolución Húngara. (18/8/23)
8 – La actualidad política alemana. (24/8/23)
9 – La paz de Versalles y la Sociedad de las Naciones (31/8/23)
10 – La agitación proletaria en Europa en 1919 y 1920 (7/9/23)
11 – Los problemas económicos de la paz. (13/9/23)
12 – La crisis de la democracia. (25/9/23)
13 – La agitación revolucionaria y socialista del mundo oriental.
(28/9/23)
15 José Carlos Mariátegui (1895-1930). Intelectual, jornalista e político peruano. Uma das
mais importantes personalidades de esquerda da América Latina no século XX. Com apenas 16 anos, iniciou uma carreira jornalística em Lima. Entre 1919 e 1923, fez uma viagem a vários países da Europa onde teve a oportunidade de conhecer de perto as lutas entre a social-democracia e o comunismo inspirado pela Revolução Russa. De volta ao Peru, dedicou grande energia a duas tarefas simultâneas: realizar um estudo marxista da formação social
do país e promover o surgimento de organizações sindicais e políticas que contribuíssem para a integração das classes populares na vida política.
Onde se forjam os homens.
16
14 – Exposición y crítica de las instituiciones del régimen ruso.
(19/10/23)
15 – Internacionalismo y nacionalismo. (2/11/23)
16 – La Revolución Mexicana. (22/11/23)
17 – Los intelectuales y la revolución. (1/12/23)
18 – Lenin. (26/1/24)” 16
A escolha de tais temas demonstra como o socialismo estava
presente no horizonte teórico daquele jovem. Apesar de se tratar de um
intelectual que acabava de retornar de uma estada européia e que era
particularmente talentoso, não há motivo para crer que a forma como
conduziu suas conferências estivesse em desacordo com o padrão
corrente entre os demais professores.
Durante esse período de atividades, a inicial simpatia manifestada
entre o regime de Leguía e o movimento estudantil transformou-se em
franca hostilidade.
Num acordo para tentar conquistar também o apoio de
conservadores ligados à Igreja Católica, Leguía negocia com a
hierarquia eclesiástica, na figura do Arcebispo de Lima, a realização de
uma cerimônia destinada a consagrar o Peru ao Sagrado Corazón de
Jesus.
Na prática, a medida prometia aumentar a intolerância oficial com
relação à liberdade de culto, contrariando frontalmente a constituição
do país.
Os estudantes decidiram mostrar sua insatisfação e, juntamente
com vários sindicatos e grupos anticlericais, organizaram, para 23 de
maio de 1923, uma grande manifestação de rua em protesto contra as
intenções do governo. O ato tornou-se um marco numa grande coalizão
de oposição, já que dele participaram vários setores políticos. Não só os
estudantes e os trabalhadores, mas também liberais moderados e
16 PORTOCARRERO, Ricardo., op. cit., p.397-398. Segundo o autor, a décima oitava
conferência estava destinada ao tema “La crisis filosófica” mas foi alterada de última hora em função do recebimento da notícia da morte de Lenin.
Onde se forjam os homens.
17
muitos representantes do próprio Partido Civilista, que vinham sofrendo
com as perseguições do governo de Leguía.
As Universidades Populares tornaram-se o centro no qual os
opositores da medida planejada pelo governo organizaram a resistência.
Era em suas aulas e nas conferências que os operários dos vários
sindicatos discutiam entre si o significado da cerimônia, e de que
maneira ela poderia ser combatida e impedida.
A decisão do governo Leguía foi agir com a máxima energia possível
contra os manifestantes e, quando eles tomaram a praça San Martin, as
tropas destacadas para reprimir as manifestações daquele dia abriram
fogo contra a multidão. O saldo da operação policial foi de dois mortos:
um estudante e um trabalhador.
No dia seguinte, a tentativa das forças policiais de apoderarem-se
dos cadáveres para evitar que seu sepultamento gerasse novo motivo
para protestos, mostrou ser um erro maior do que a ação truculenta da
véspera. No recinto da Universidade São Marcos, estudantes e
trabalhadores armados montaram guarda em defesa de seus mortos,
ampliando a repercussão do episódio.
Do ponto de vista ideológico, estudantes e trabalhadores
convenceram-se da importância da aliança. A ação precipitada do
governo gerou dois mártires que consagraram, com suas vidas, o
significado que aquela união teria nos anos subseqüentes.
Ao fim, a manifestação foi efetivamente vitoriosa, já que o governo
decidiu voltar atrás em seus intentos e a cerimônia planejada não se
realizou. Porém, Leguía percebeu que o inicial apoio que seu governo
havia recebido nos primeiros anos, entre os setores populares de Lima e
particularmente entre os estudantes, havia acabado e já era hora de dar
às lideranças desse grupo o tratamento habitual reservado a seus
opositores mais perigosos. Vários líderes da manifestação de 23 de maio
foram perseguidos e presos. Entre eles Haya de la Torre que, depois das
manifestações, havia sido reeleito presidente da Federação.
Onde se forjam os homens.
18
Depois de um período de pouco mais de uma semana de greve de
fome num presídio na Colônia Penal da Ilha de São Lourenço, e
mediante a reivindicação constante de estudantes e trabalhadores,
Haya conseguiu uma deportação ao Panamá, de onde se dirigiu a Cuba.
Essas deportações e prisões representaram, num primeiro
momento, uma diminuição da pressão exercida por uma oposição que
se organizava rapidamente, garantindo ao governo Leguía a chance de
consolidar seu modelo de desenvolvimento que se assentava na
realização de obras públicas de infra-estrutura como forma de
incrementar os níveis de emprego urbano e diminuir as tensões sociais
nas cidades. Já estava vigente, desde 1920, a Lei de Conscripción Vial,
segundo a qual todos os homens entre 18 e 60 anos estavam obrigados
a trabalhar gratuitamente doze dias ao ano na construção de estradas.
A única maneira de eximir-se da obrigação era através do pagamento de
uma soma em dinheiro.
A realização dessa ampla reforma urbana foi garantida através do
aumento indiscriminado da dívida externa contraída sobretudo junto
aos bancos norte-americanos. Segundo Julio Cotler:
“El desorbitado uso de los préstimos norteamericanos significó que la
deuda externa se decuplicara entre 1920 y 1930, pasando de diez a cien
millones de dólares, y si en 1920 los intereses de la deuda comprometían el
2,6% del presupuesto nacional, al finalizar la década los intereses
alcanzaban el 21% del mismo. Sólo durante el bienio 1926 – 1928, el 40% de
los ingresos fiscales provino de los préstimos. El endeudamiento externo y el
gasto público que le seguió favorecieron el propósito imediato de dinamizar
la economía. Durante el ‘oncenio‘, el presupuesto se cuadriplicó, las
inversiones públicas dedicadas a construcción se duplicaron y la
importación de materiales de construcción cresció en 70%.” 17
17 COTLER, Julio., op. cit., p.196.
Onde se forjam os homens.
19
Com a maioria de seus adversários políticos fora do país ou
encarcerados, Leguía conseguiu manter uma certa estabilidade política
durante o resto da década de 20.
No entanto, como veremos, o exílio permite a Haya de la Torre,
travar contato com diferentes realidades nacionais, dar mais
consistência ao seu pensamento e preparar-se para um retorno a seu
país em condições completamente diversas daquelas em que o deixou,
em 1923. A primeira parada de sua longa trajetória de exílio foi Cuba,
onde se deu, pela primeira vez, o encontro entre ele e Julio Antonio
Mella.
Julio Mella nasceu em 25 de março de 1903, foi registrado como
Nicanor Mac Partland, era filho de um bem sucedido alfaiate de origem
dominicana chamado Nicanor Mella y Bréa e de uma jovem de
Hampshire, Inglaterra, chamada Cecília Magdalena Mac Partland y
Diez.
Tanto Mella quanto seu irmão mais novo Cecílio não haviam
nascido de uma união legal, pois seu pai já era casado com a
dominicana Mercedes Bermúdez. Em 1910, os meninos viram-se
privados da mãe - que viajou definitivamente a Nova Orleans, EUA,
onde tinha alguns parentes - e foram incorporados à família oficial de
seu pai que tinha já outros três filhos.
Os primeiros níveis de escolarização de Mella foram realizados em
colégios católicos cujos custos estavam ao alcance das posses de seu
pai. Os estudos secundários foram na Academia Newton, no bairro de
San Lázaro de Águila. Dessa fase da vida de Mella, o único aspecto
digno de nota parece ter sido a sua grande facilidade e entusiasmo pelo
esporte. Praticante de uma grande variedade de modalidades, que
incluíam a natação, o remo e o basquete, parece que a primeira vocação
de Mella foi a de atleta.
Onde se forjam os homens.
20
Aos 16 anos, tentou ingressar no Colégio Militar de San Jacinto, na
cidade do México. Sua solicitação, no entanto, não foi atendida,
forçando-o a regressar a Cuba.
Em 1921, aos 18 anos, matriculou-se como aluno de Direito na
Universidade de Havana, e logo no início dedicou-se ativamente ao
movimento estudantil. Foi na Universidade que organizou o primeiro
periódico de que participaria, denominado inicialmente de Alma Mater,
mais tarde rebatizado Juventud. Nesse jornal, sua primeira causa foi a
fundação de uma Federación de Estudiantes, o que aconteceu em 8 de
dezembro de 1922, figurando Mella como secretário na primeira gestão.
O ano de 1921 marcou uma das mais graves crises econômicas de
Cuba desde a independência, no começo do século. A partir do início da
I Grande Guerra, os preços internacionais do açúcar, principal produto
produzido no país, haviam crescido muito, gerando uma situação
artificial de desenvolvimento econômico no país.
Tal situação começou a reverter-se com o final da Primeira Guerra,
sobretudo durante os anos de 1920 e 1921. Os preços do açúcar
voltaram aos patamares de antes de 1914, o que resultou numa
profunda crise econômica. Os engenhos de capital nacional que tinham
sido construídos durante os anos de alta, em muitos casos, foram
financiados junto a instituições de capital estrangeiro e tratados com
base nos elevados preços do produto. A queda drástica nos valores
levou muitos desses produtores à falência, forçando-os, por obrigações
hipotecárias, a entregar seus engenhos aos credores, aumentando
ainda mais a proporção dessas unidades de produção controladas pelo
capital monopólico.
Os produtores de açúcar, incapazes de saldar suas obrigações, não
tinham condição de fornecer ao sistema financeiro a liquidez necessária
para restituir-lhe a credibilidade. Diante de um aumento na demanda
de saques, os bancos viram-se incapazes de honrá-los, gerando uma
situação de pânico entre os correntistas e desconfiança no sistema.
Onde se forjam os homens.
21
O governo conservador de Mario Menocal18, que cumpria seu
segundo mandato iniciado em 1917, não viu outra alternativa senão
decretar, em 10 de outubro de 1920, uma moratória bancária, dispondo
que os bancos só estavam obrigados a pagar 10% de todos os depósitos
efetuados até o dia primeiro de dezembro daquele ano.
Antes mesmo desses acontecimentos, já estava em curso um
processo de organização de alguns setores dos trabalhadores. Em várias
regiões do país os sindicatos, com profunda influência ideológica do
anarquismo, em meio a um drástico aumento do custo de vida,
levaram-nos à ação:
“El agravamiento de la situación de los trabajadores se traduce,
lógicamente, en el notable auge de su combatividad. Una ola de huelgas sin
precedentes se extiende por todo el país y abarca a los trabajadores de
numerosas e importantes ramas economicas. Se calcula que entre fines de
1917 y comienzos de 1920, ocorrieron más de 220 huelgas parciales y
generales. La ola huelguística obliga al presidente Menocal a emplear
como rompehuelgas no solo al ejército y la policía, sino también a los
presidiarios.” 19
Vale lembrar a influência que tiveram, neste contexto nacional,
fatores mais amplos da conjuntura mundial como o advento da
Revolução Russa. As lideranças sindicais, em que pese sua
inquestionável orientação anarquista, percebiam os acontecimentos
vividos no império do Czar como uma luz, uma indicação clara de que a
classe trabalhadora de todo o mundo poderia representar um
importante papel, através de sua rebeldia e da grande arma à sua
disposição: a greve.
18 Mario Menocal. Presidente de Cuba no período de 1913 a 1917 e novamente entre 1917 e
1921. Antes de ser presidente, destacara-se como administrador do engenho de cana Chaparra, um dos maiores de Cuba, de propriedade da poderosa Cuban-American Sugar Company. Tal origem haveria de ser sempre lembrada por seus opositores que a utilizavam como evidência da submissão do presidente aos interesses norte-americanos.
19 Instituto de História del Movimiento Comunista y de la Revolución Socialista de Cuba: Historia del movimiento obrero cubano. Havana, Editora Política, 1985, p.197.
Onde se forjam os homens.
22
Além dos trabalhadores, a crise econômica dos anos 20, por suas
proporções, mobilizou as classes médias e particularmente os
estudantes.
Essa tomada de consciência refletia o descontentamento geral com
relação à aceitação tácita da influência política e econômica dos
Estados Unidos no país que se fazia presente desde o processo de
independência, tornando cada vez mais sólida a convicção da falta de
iniciativa de garantir a soberania nacional, inclusive entre os setores
políticos mais nacionalistas.
A questão para a geração que entrou na Universidade, em 1920,
não era como impedir a intervenção - que ao longo dos anos de
República independente mantinha-se como um “fantasma”, rondando a
vida política cubana - mas sim como liquidar a estrutura que a
determinava. Era esse o horizonte ideológico dos jovens que
participaram da Reforma Universitária, em Cuba.
Os estudantes cubanos, como os de outros países da América
Latina, acompanhavam com interesse os conflitos vividos em Córdoba,
Argentina, em 1918.
Os manifestos escritos pelos estudantes argentinos haviam sido
verdadeiras conclamações à juventude de todos os países, não só para
lutarem por uma reforma radical das universidades latino-americanas
que lhes garantisse uma participação democrática na vida universitária,
mas também pela retomada de um antigo sentimento de unidade que
remetia às lutas pela independência do século anterior. Também
destacavam a necessidade de união com os trabalhadores na conquista
de uma nova independência, agora com relação às forças econômicas
que ainda ameaçavam a soberania desses países.
Em Cuba, no começo da década de 20, tais aspirações tinham,
como nunca antes, um contexto favorável. A eclosão do movimento de
Reforma Universitária deu-se, não por acaso, exatamente no momento
da crise econômica. O governo de Menocal, em meio à fase mais aguda
Onde se forjam os homens.
23
das dificuldades, havia sofrido mais uma vez a ação interventora dos
EUA. Sob pretexto de resolver os graves problemas econômicos, o
Presidente W. Wilson ordenou ao General Enoch Crowder que fosse a
Cuba como seu representante oficial20, mas houve também ingerência
política no processo eleitoral que estava em curso, dando vitória a
Alfredo Zayas. O problema econômico foi resolvido com um empréstimo
de 50 milhões de dólares, conseguido pelo interventor junto a
banqueiros norte-americanos.
Em novembro de 1921, o novo presidente decidiu, em acordo
firmado com a direção da Universidade de Havana, conceder o título de
doutor Honoris Causa ao recente interventor, Enoch Crowder, e ao
primeiro deles, o General Leonard Wood 21.
Os universitários resolveram reagir contra esse intento.
Identificando, na entrega do título, a confirmação da subserviência dos
políticos cubanos à presença constante do interventor estrangeiro,
julgaram indispensável uma manifestação prática de seu
descontentamento.
No manifesto dos estudantes de Direito contra a nomeação,
redigido em 15 de novembro de 1921, lemos:
“Hoy no nos guía el exhibicionismo ni el propósito pueril de intervenir
como clase y de un modo inesperado en nuestra vida pública. Se acude a
nuestra casa y se pretende algo de lo nuestro para coronar con nuestras
flores, las mejores de Cuba, el sable de un interventor, ¿y qué há de hacer la
juventud sino lo que hace en todas partes, y lo que en épocas pasadas hizo
en la propia Cuba? Un honor como el que se pretende, implica mucho o
nada. En la situación porque atraviesa el país, sin formol en las Salas de
Anatomía y Disección, con nuestros edificios a medio hacer, la Biblioteca
20 Vale lembrar que essa era, desde a independência, a segunda intervenção norte-americana,
já que, entre 1906 e 1908, o país foi dirigido por outro governo militar, nomeado por Theodore Roosvelt e que tinha à frente o general Charles Magoon.
21 Leonard Wood foi o primeiro governador militar norte-americano que administrou a ilha entre 1898 e 1902. Depois dessa experiência, o general jamais voltou à ilha e seu prestígio junto
aos cubanos, sobretudo os jovens universitários, não era em nada melhor que o do interventor mais recente.
Onde se forjam os homens.
24
pobre y desvalida, los maestros públicos del interior entrampados y
hambrientos, y los poderes del Estado, sin distinción alguna, vejados a cada
paso, como en Santo Domingo y en Haití, es una imprudencia que nos duele,
que se acurden de la Universidad para vincularla en el carro de triunfo del
imperialismo yanqui de la postguerra, como una justificación de cuanto aquí
se está haciendo para entregar la Patria al extranjero.” 22
Três dias depois da redação do manifesto, organizou-se uma
passeata que contou não só com a participação dos estudantes de
Direito, mas também com os alunos da Escola de Medicina, de colégios
particulares e também de trabalhadores urbanos da cidade.
O protesto estudantil teve amplo apoio da opinião pública, pois
vinha ao encontro de um difuso sentimento de repúdio às constantes
intervenções já corriqueiras na vida política do país.
Essa foi a primeira ação organizada dos estudantes cubanos que se
mantiveram mobilizados até a realização dos importantes
enfrentamentos, a partir de 1923.
Como resultado da manifestação dos estudantes, uma comissão
formada por sete estudantes de Medicina e oito de Direito, entre eles o
calouro Julio Antonio Mella, foi recebida pelo Presidente Alfredo Zayas.
O movimento, que se iniciou com o protesto contra a titulação dos
interventores, logo passou a incorporar expectativas cada vez maiores
com relação aos anseios dos estudantes.
O Reitor da Universidade de Buenos Aires, Dr. José Arce, que se
encontrava em Havana, em 1922, ofereceu uma conferência em que
narrou em detalhes o processo de insurreição estudantil em Córdoba,
mostrando aos estudantes cubanos a importância, para o processo
cordobês, da existência de uma federação estudantil que centralizasse
sua ação.
22 CABRERA, Olga e ALMODÓBAR, Carmen (org.) “Manifesto de los estudiantes de derecho” en
Las luchas estudantiles universitarias. 1923 a 1934. Havana, Editorial de Ciencias Sociales,
1975, p.66.
Onde se forjam os homens.
25
Como podemos ver, a presença desses intelectuais argentinos
ocupados em socializar sua experiência pessoal com universitários de
outros países latino-americanos, teve um papel determinante na
expansão do movimento. No entanto, sobre a forma como a agitação
estudantil articulou-se em cada realidade nacional, concordamos com
Portantiero quando afirma:
“No se trataba de un proceso de mera imitación; detrás de esa
expansión continental subyacían estructuras comunes, pese a diversidades
particulares, que expresaban la voluntad de vastos sectores sociales por
conquistar mayor participación social, política e cultural.
El proceso englobaba a las clases medias que, con mayor o menor
grado de difusión, se habían expandido en las sociedades latinoamericanas
desde finales del siglo XIX, al amparo de la modernización urbana abierta
por el capital estranjero.” 23
Constituída a Federação, no início de dezembro de 1922, os
estudantes trataram de promover uma “depuração” no quadro de
professores. O primeiro passo nesse sentido foi levar à direção da
Faculdade de Medicina a demanda dos alunos do 5o ano que exigiam o
afastamento do professor de Clínica Cirúrgica, acusado de conduta
imoral.
Diante da recusa da direção da Universidade e da punição aos
signatários do pedido, os estudantes de medicina decidiram não
freqüentar as aulas no início do ano letivo de 1923. A Federação
realizou uma assembléia, na qual foi estabelecida a pauta de
reivindicações a ser encaminhada para a presidência da República. Nela
encontramos demandas mais abrangentes do que aquelas que haviam
dado início ao movimento. Ao lado do pedido de afastamento daquele
professor, os estudantes exigiam uma reforma radical nos estatutos da
23 PORTANTIERO, J. C. Estudiantes y política en América Latina. 1918-1938. El proceso de
la Reforma Universitária. México, Siglo XXI, 1978, p.58.
Onde se forjam os homens.
26
Universidade, instituindo a representação discente em sua gestão, além
da autonomia da instituição em assuntos econômicos e acadêmicos.
No dia 12 de janeiro, realizou-se nova assembléia dos estudantes
com a participação do reitor, Carlos de la Torre. Nela, vários professores
manifestaram seu apoio ao programa de reforma apresentado.
Ao mesmo tempo, crescia a solidariedade de alunos de outras
instituições, como os dos Institutos de Segunda Enseñanza,
preparatórios para a Universidade, das Escolas Normais e das Escolas
de Artes e Ofícios, dispuseram-se inclusive a participar da greve.
Com tal apoio, dentro e fora da Universidade, os estudantes
sentiram respaldo suficiente para uma manobra ousada. Em 15 de
janeiro, cerca de setenta alunos de todas as faculdades invadiram o
campus da Universidade de Havana e declararam-na fechada, enviando
à presidência da República solicitação para o acatamento à decisão.
Com isso, os estudantes conquistam a primeira grande vitória do
movimento. Além do afastamento do professor que havia sido o estopim
do processo, a direção da Universidade aprovou a reforma de seus
estatutos, criando a Assembléia Universitária, órgão deliberativo
formado por 90 membros (30 professores, 30 graduados e 30 alunos) e
presidido pelo Reitor. A decisão foi confirmada por Decreto Presidencial
em 13 de março de 1923.
Após realizar de maneira satisfatória seus primeiros intentos, a
Federación de Estudiantes encarregou-se de preparar o I Congresso
Nacional, de 14 a 25 de outubro de 1923, que teve como lema, por
sugestão de Mella, “Todo tiempo futuro tiene que ser mejor”. Na
convocatória do Congresso estavam tanto os objetivos de seus
organizadores quanto a abrangência pretendida:
“I - Este Congreso Nacional de Estudiantes, que se celebra por primera
vez en la República de Cuba, organizado por la Federación de estudiantes
de la Universidad, radicará en la ciudad de La Habana, celebrando sus
sesiones en el Aula Magna de la Universidad Nacional.
Onde se forjam os homens.
27
II - El objetivo de este Congreso es llegar a la determinación de
conclusiones conducentes al perfeccionamiento de la acción estudantil, en
los campos EDUCACIONAL, SOCIAL E INTERNACIONAL, presentándose
dichas conclusiones, una vez clausurado el Congreso, a la Asamblea
Universitaria y a los poderes Ejecutivo y Legislativo de la República.
III - Podrán concurrir a este Congreso los representantes de todos los
núcleos estudantiles, Institutos de primera y Segunda Enseñanza, Colégios
y Academias, Asociaciones de Antiguos Alumnos, publicaciones
Estudantiles, etc., no pudiendo enviar más de tres delegados cada
Instituición.” 24
Como se vê, diferentemente do Congresso do Peru, em 1920, do
qual só participaram representantes das universidades, o de Cuba foi
muito mais abrangente, e esteve empenhado em unificar as
reivindicações dos estudantes de todos os níveis de escolaridade, além
de dar direito a representação própria aos órgãos de imprensa
estudantil.
Na primeira seção ordinária, realizada em 17 de outubro de 1923,
Mella fez aprovar no plenário, por unanimidade, sua Declaración de
Derechos y Deberes del Estudiante, instrumento a partir do qual a
direção do Congresso buscava estabelecer um consenso mínimo de
expectativas com relação aos trabalhos seguintes, definindo, ao menos,
o sentido genérico de suas possíveis resoluções. Na Declaração, cinco
itens qualificados como direitos e cinco como deveres. O primeiro
direito e o primeiro dever dão uma boa imagem do teor do documento:
24 “Bases del Primer Congreso Nacional de Estudiantes” en JULIÁ, Maria Antonieta. (org.)
Mella. Documentos y artículos. Havana, Editorial de Ciencias Sociales, Instituto Cubano del
Libro, 1975, p.519.
Onde se forjam os homens.
28
“Direitos:
1- El estudiante tiene el direcho de eligir los directores de su vida
educacional, y de intervenir en la vida administrativa y docente de las
Instituiciones de Enseñanza, ya que él es soberano en estas instituiciones,
que sólo existem para su provecho.
(...)
Deberes:
1- El estudiante tiene el deber de divulgar sus conocimientos entre la
Sociedad, principalmente entre el proletariado manual, por ser éste el
elemento más afín del proletariado intelectual, debiendo así hermanarse los
hombres de Trabajo, para formentar una nueva sociedad, libre de parásitos
y tiranos, donde nadie viva sino en virtud del próprio esfuerzo.” 25
Como se pode ver, os objetivos centrais do documento estavam
voltados, por um lado, ao esforço de generalizar as conquistas dos
estudantes da Universidade que haviam conseguido a participação em
órgãos deliberativos e, por outro lado, ao desejo de confirmar vínculos
entre estudantes e trabalhadores, vivenciados durante as manifestações
contra a titulação dos interventores. Esses dois temas eram de
fundamental importância para a direção do Congresso e poderiam
orientar as demais decisões, daí o empenho pela aprovação imediata da
declaração logo na abertura.
No entanto, o pensamento predominante entre os diretores da
Federação não era o único entre os estudantes que participaram do
Congresso. Delegações provenientes de instituições privadas de ensino,
sobretudo ligadas a ordens religiosas, como o Colégio Inglés de Ciego de
Ávila ou o Colégio Champagnat, dos Maristas, bem como a Asociación de
Estudiantes de las Escolas Pias, de Havana, ao longo do Congresso,
realizaram sistemática oposição às teses dos membros dirigentes da
Federación e do Congresso, dificultando, em muitos casos a aprovação
completa de suas propostas. O representante mais significativo dessa
tendência de oposição era Emílio Nuñez Portuondo, que teve ativa
25 JULIÁ, Maria Antonieta. (org.), op. cit., p.530-532.
Onde se forjam os homens.
29
participação no Congresso, sempre dificultando a aprovação integral
das pretensões de Mella e de outros líderes.
Exemplos dessa oposição podem ser encontrados tanto nos temas
em que discordavam, como naqueles em que havia consenso. A idéia,
ainda que relativamente vaga, de unidade latino-americana era um
ponto em comum entre todos os estudantes. Na ata da quinta seção de
trabalhos do Congresso, do dia 19, vemos o esforço de Mella em aprovar
uma simples proposição voltada apenas a marcar o caráter latino-
americanista presente em todos os estudantes. A proposição se
expressava nos seguintes termos:
“Considerando que el porvenir y progreso de la patria y de la
humanidad necesita de un sinciero acercamiento entre los pueblos latinos
de la América; la patria, por la necesidad de su engrandecimiento y
solidificación, mediante la unión con las repúblicas hermanas, y la
humanidad, porque la unión de los pueblos de América Latina serviría de
base y de sana orientación, pues creemos que con la sola excepción de la
actual República Rusa, ninguna outra comunidad de pueblos está más
capacitada que nuestra América para dictar ideas y principios renovadores
y progresistas a la civilización, por nuestras condiciones biológicas e
socilógicas particulares (...) El Primer Congreso Nacional de Estudiantes
envía un cordial saludo a todas las Federaciones de estudiantes de la
América Latina comunicándole su constituición, y a la terminación de las
sesiones enviará también una copia de sus acuerdos a las citadas
Federaciones. (...)
El señor Nuñes Portuondo manifesta que está de acuerdo con la
moción presentada, pero que lo que ella dice de la República Rusa debe
considerarse como una apreciación particular del señor Mella y no como el
criterio del Congreso. El Sr. Mella asegura que si se conociera a Rusia, nadie
se habria levantado a protestar de su moción en lo que a ella se refiere, que
con respecto al problema social ruso lo que hay es mucha ignorância(...) 26
26 JULIÁ, Maria Antonieta. (org.), op. cit., p.557-558.
Onde se forjam os homens.
30
Esse tipo de obstrução foi uma constante em todo o evento e marca
bem as divergências entre os membros da diretoria da Federação e os
representantes de delegações de escolas particulares ou religiosas. Mas,
ao que parece, essa oposição não se localizava apenas em níveis
anteriores de ensino, mas inclusive entre os próprios estudantes
universitários, a julgar pelo destino da diretoria que conduziu o
Congresso.
Apesar da direção do Congresso ter conseguido a aprovação da
maioria de suas resoluções, a correlação de forças entre o setor mais
progressista e o mais conservador dos estudantes ainda não estava
completamente decidida em favor do primeiro e, quando se iniciou a
reação do governo e da Universidade contra eles, a partir de 1925,
novos embates foram travados. Nesse primeiro momento, foi garantido
pela direção da Federação um certo estreitamento nas relações entre o
movimento estudantil e os trabalhadores. Este era, na perspectiva de
Mella, o aspecto mais importante da Reforma Universitária e todos os
seus esforços voltavam-se para ele. No período imediatamente posterior
ao Congresso, por exemplo, Mella decidiu lançar um novo periódico
estudantil, a Revista Juventud da qual foi o diretor, e recorreu às
oficinas de imprensa da Federación de Torcedores que aceitou imprimi-
la sob a promessa de posterior pagamento. Freqüentando diariamente a
oficina que imprimia o Boletin del Torcedor, Mella passou a conviver de
perto com a organização dos trabalhadores, chegando a montar um
pequeno escritório para si nas dependências daquele sindicato. Lá
conheceu também Carlos Baliño, ancião de mais de setenta anos, que
havia consagrado a vida a divulgar idéias socialistas e que havia
fundado, em 1903, na cidade de Havana, um clube para propaganda
socialista. A amizade entre o jovem estudante e o velho sindicalista
contribuiu para aproximar Mella do referencial teórico dos comunistas.
Onde se forjam os homens.
31
Obviamente a revista que ali era produzida pelos estudantes
também refletia a aproximação com os trabalhadores, tanto na escolha
dos temas quanto na abordagem.
Outra decisão mais importante do Congresso nesse sentido foi a
criação das Universidades Populares José Martí, inspiradas em
experiências anteriores realizadas no México e no Peru.
Assim que a proposta foi aprovada pelo Congresso, Mella dedicou-
se de corpo e alma a pô-la em prática, e em 3 de novembro do mesmo
ano a solenidade de inauguração da instituição tinha lugar nas
dependências da Universidade de Havana. O jornal Heraldo de Cuba,
em edição do dia seguinte, registrou os detalhes da cerimônia:
“Se inalguró ayer con gran brillantez la Universidad Popular ‘José
Martí’ fundada por iniciativa del Congreso de Estudiantes. Fue un acto
transcendental y significativo. Por primera vez en Cuba, los obreros
invadieron la Universidad y tomaron asiento en la Aula Magna, junto a los
doctores del mañana.
Allí estaban también ilustres catedráticos y familias distinguidas, y
era grato ver a su lado a los trabajadores de manos encallecidas por la ruda
labor cuotidiana, que anhelan nutrir su inteligencia y subir en la escala de la
cultura. (...)
Los estudiantes confraternizaban con las comisiones de los distintos
Centros Obreros que habian sido especialmente invitados. Vários
trabajadores llevaron también a sus familias que daban una bella nota con
sus sencillas ‘toilettes’ ; de discreta elegancia.” 27
Foi por ocasião dessa cerimônia que se encontraram pela primeira
vez Julio Mella e Haya de la Torre. Durante seus primeiros dias no país,
Haya visitou a redação de vários jornais da capital e preparou-se para
participar da cerimônia. Era considerado um convidado de honra por
ter sido, em seu país, o fundador de uma instituição com as mesmas
27 Heraldo de Cuba. Versão facsimilar da edição de 4 de novembro de 1923, publicado em:
ALVA CASTRO, Luis. Haya de la Torre. Peregrino de una unidad continental. Lima, Fondo
Editorial V. R. Haya de la Torre, s/d, p.51.
Onde se forjam os homens.
32
características da que estava sendo lançada em Cuba. O estudante
vinha cercado por uma aura de heroísmo, conquistada com o
derramamento de sangue nas manifestações de 23 de maio.
Mella, que acompanhou Haya durante toda sua visita de dez dias a
Havana, não escondia seu entusiasmo e registrou sua admiração, em
artigo para Revista Juventud na edição de novembro/dezembro de
1923:
“En su breve estancia se nos presentó ora como um Mirabeau
demoledor con la fuerza de su verbo de las eternas tiranías que el hombre
sostiene sobre el hermano hombre, ora como el Mesías de una Buena Nueva
que dice la palabra mágica de esperanza, ora como el camarada jovial, casi
infantil de alma pura e ingenua que lo entrega todo en aras de la amistad.
(...)
Como Haya debió ser Martí, el mismo amor, la misma consagración al
ideal, el mismo espíritu de combatividad serena, pero agresiva y enérgica,
igual desprecio a los placeres a las comodidades, a la vida misma.” 28
Dada a quase veneração que Mella devotava a Martí, é possível
avaliar a intensidade do elogio.
Depois da fundação da Universidade Popular, Mella passou a
estreitar cada vez mais seus vínculos com o movimento dos
trabalhadores, de modo muito mais intenso do que o movimento
estudantil como um todo estava disposto a acompanhar. Ao mesmo
tempo, parecia querer deixar clara sua divergência com os que não
concordavam com sua atuação. Aos opositores sempre reservou um
duro tratamento em seus textos nos órgãos de imprensa para os quais
escreveu.
A manutenção de sua hegemonia como liderança universitária
tornou-se cada vez mais difícil, à medida que as facções mais
28 Citado em: VALCARCE, Carmen. (org) Escritos revolucionarios. México, Siglo XXI, 1978.
Onde se forjam os homens.
33
moderadas dos estudantes ganhavam espaço na direção da Federação.
Mas Mella reagiu. Em texto escrito para El Heraldo, de 16 de outubro de
1924, procurou qualificar seus inimigos e confrontá-los:
“...No existindo maestros no podía haber discípulos. He aquí la causa
del adormecimiento de las reformas universitárias. Tipos llenos de la baba
del servilismo, se hacen aparecer como conductores de la muchachada. Se
pretenden erigir en apóstoles, no estando capacitados, ni siquiera, para
formar parte de rebaños. (...) Mediocres hábiles, hipócritas vanidosos, se
mueven en la sombra, y gritan, como ranas asustadas, cuando oyen el
rumos de la verdad dicha por labios puros. Temen la polémica abierta como
el corderillo e las águilas. (...)” 29
Apesar dessa disposição para polêmica e enfrentamento de seus
adversários, a verdade é que, a partir do fim do primeiro intento
vitorioso no movimento de 1923, Mella começava a perder espaço no
movimento estudantil universitário para correntes menos radicalizadas
– tanto assim, que chegou a fundar um novo órgão estudantil, a
Confederación Nacional Estudantil, que congregava membros dos
Institutos de Segunda Enseñanza, antes que adentrassem à
Universidade.
Entre 1923 e 1925, quando os estudantes lutavam por consolidar
as primeiras conquistas do movimento da Reforma Universitária, a
questão política que concentrava a atenção nacional era a discussão em
torno da soberania política do país sobre a Ilha de Pinos.
Quando a primeira ocupação militar do país terminou, em 1903,
ficou postergada a definição do status político da referida província.
Procedeu-se dessa maneira porque a Ilha de Pinos constituiu-se na
principal região de fixação de cidadãos norte-americanos durante o
período de dominação daquele país. A intenção do governo americano
parecia ser a de estabelecer naquela região uma ou mais bases navais,
29 VALCARCE, Carmen., op. cit., p.53-54.
Onde se forjam os homens.
34
conforme lhe permitia explicitamente o texto da Emenda Platt. Durante
o período que se manteve em suspenso a decisão sobre o assunto, os
norte-americanos residentes na ilha destacaram-se em sua luta contra
a República recém-fundada, inclusive através da Revista Isle of Pines
Appeal, dirigida por Arthur Willis. Segundo Julio Le Riverend:
“Los colonos de Isla de Pinos se distinguieron por su agitación contra
las autoridades de la República intervenida. Organizaron un movimiento
para no reconocer dichas autoridades, no pagar contribuiciones y exigir del
gobierno norte-americano que declarara la Isla de Pinos anexionada a los
Estados Unidos. Era un movimiento que coincidía con todas las demás
pretenciones de tipo anexionista.” 30
Finalmente, durante a década de 20 o governo norte-americano
decidiu por não fazer uso da prerrogativa que lhe conferia a Emenda
Platt e aceitou a soberania de Cuba sobre a província.
De qualquer modo, a opinião pública nacional agitou-se em torno
do tema e Mella, na direção da Federación de Estudiantes, garantiu a
participação estudantil no debate nacional, em clara oposição aos
moradores da ilha que exigiam a anexação aos EUA, e malgrado o
desejo de alguns estudantes, que acreditavam que essa não era uma
questão que dizia respeito a seus interesses.
Quando, em março de 1925, o Senado norte-americano ratificou o
Tratado de Hay-Quesada, que reconhecia definitivamente a soberania
de Cuba sobre a ilha, o governo de Alfredo Zayas organizou uma
manifestação pública de agradecimento ao governo norte-americano
para a qual convidou os estudantes.
A reação de Mella deu-se em duas frentes. Em nome do diretório
estudantil, respondeu ao Reitor da Universidade que os havia convidado
dizendo que os estudantes não participariam do ato programado para o
dia 18 de março por ser uma obra que...
30 LE RIVEREND, Julio. História económica de Cuba. Barcelona, Ediciones Ariel, 1972, p.208.
Onde se forjam os homens.
35
“...tiene como fin no la satisfacción de un pueblo que há visto, en su
triunfo, el triunfo internacional de las pequeñas nacionalidades, sino que
antes al contrário, es para manifestar una gratidu inadecuada y sin
causa.” 31
Por outro lado, como presidente do Comitê Antiimperialista da
Universidade, redige um manifesto em que expressa:
“... Isla de Pinos es de Cuba pero Cuba no es libre. Los capitalistas
yanquis, con sus dineros, posen la tierra y las industrias esclavisando al
pueblo, y el gobierno de Washington con la Enmienda Platt y con el abuso de
su fuerza tiene convertida la Isla en una colonia. Recordad a Magoon, el
primer ladrón interventor, a Mr. Gonzáles, el que ordenó el asesinato de
cubanos, y a Crowder, el amo de Zayas en su tiempo, hoy su esclavo por el
suborno.” 32
Às duas manifestações por escrito seguiram-se ações de repúdio ao
ato com manifestação de rua dedicada a comprometer a cerimônia
oficial. A ação da polícia foi imediata e os líderes estudantis presos.
Instaurou-se inquérito contra Mella que foi condenado ao pagamento de
multa.
Nesse episódio, tornavam-se mais uma vez evidentes as
divergências entre Mella e outras lideranças do movimento estudantil
que estiveram presentes ao ato convocado pelo governo. O fato é que, à
medida que o líder estudantil incorporava à sua militância as questões
mais gerais do país e aproximava-se dos setores políticos mais
radicalizados, ia acumulando desafetos entre os estudantes.
Entre 1924 e 1925, Mella participou de ações que demonstraram
claramente sua vinculação com o comunismo. Em setembro de 1924,
estava programada pelo governo cubano uma cerimônia oficial e um
programa de festejos para recepcionar o navio mercante Itália, que se 31 Citado em: DUMPIERRE, Erasmo. Julio Antonio Mella. Biografia. Havana, Editorial Orbe,
Instituto Cubano del Libro, 1975, p.17. 32 Idem, p. 98.
Onde se forjam os homens.
36
transformara numa exposição flutuante. O objetivo real da iniciativa era
fazer propaganda do regime fascista e por esse motivo já havia
desencadeado manifestações de protesto nos portos de Montevidéu,
Buenos Aires e Veracruz.
Mella foi então um dos principais articuladores contra a visita do
navio italiano. À frente da Confederación de Estudiantes de Cuba,
conclamou os cidadãos a manifestarem seu descontentamento com a
chegada da embarcação.
Em estreito entendimento com o movimento sindical, Mella
conseguiu que, em plena visita da tripulação à fábrica de tabacos
Partagás, os trabalhadores abandonassem seus postos em protesto à
entrada da comitiva, pondo em situação delicada os representantes do
governo.
No porto de Havana, Mella aproveitou outra oportunidade para
fustigar a diplomacia de Gerardo Machado 33 e reafirmar suas posições
políticas. Um ano depois do episódio do navio italiano, anunciou-se a
ancoragem de um navio russo, o Vatslav Vorouski, que realizaria um
carregamento de açúcar.
O governo cubano havia, com base na inexistência de relações
diplomáticas com a Rússia soviética, proibido o desembarque da
tripulação, alegando que ela contrariava os interesses do povo cubano.
Disposto a enfrentar novamente o governo, Mella foi encarregado pela
Agrupación Comunista La Habana de montar um comitê de recepção à
embarcação russa.
Em meio às dificuldades interpostas pelo governo, Mella não se
intimidou e tornou-se o anfitrião do navio russo, ainda que para isso
tivesse que nadar quase duas milhas em alto mar para alcançá-lo, já
que o governo não permitiu sua permanência no porto além do tempo
necessário para carga e descarga. Essas ações, embora possam ter
33 Presidente eleito em maio de 1925 e que, desde os primeiros meses de mandato, demonstrou
abertamente sua simpatia com relação a Mussolini. O referido navio foi a Cuba a seu convite.
Onde se forjam os homens.
37
afastado Mella da maioria dos estudantes cubanos que não tinham
disposição para assumir suas posições, aproximou-o bastante do
movimento sindical e das lideranças comunistas da América Latina.
Outro fato que talvez tenha ampliado a distância entre parte do
movimento estudantil e Mella foi sua união a lideranças sindicais, na
fundação do Partido Comunista Cubano. O envolvimento de Mella com
a Liga Antiimperialista, fundada em Cuba, em 1925, aproximou-o
definitivamente do comunismo internacional, pondo-o em contato com
lideranças comunistas de outros países da América Latina onde se
organizavam Ligas semelhantes.
Isso, aliado ao prestígio que Mella vinha angariando entre
lideranças sindicais – que parecia inversamente proporcional ao caráter
polêmico de sua atuação junto aos estudantes – acabou convertendo-o
num dos nomes importantes na organização dos agrupamentos
comunistas em todo país para a formação do Partido Comunista
Cubano. Em congresso realizado nos dias 16 e 17 de agosto de 1925,
mediante exposição do representante do Partido Comunista Mexicano,
Enrique Flores Magón, o partido que ali se criava decidiu incorporar-se
à III Internacional Comunista.
Vendo aumentar a divergência entre o líder estudantil e parte dos
estudantes por força dessas ações, os grupos interessados em anular
suas conquistas nos anos anteriores, começaram a urdir uma reação
sistemática, visando explorar as diferenças entre eles.
O destino dos professores que haviam sido afastados de suas
cátedras durante as agitações estudantis de 1923, onze ao todo, tinha
ficado a cargo de uma comissão nomeada pelo presidente da República,
em decretos de 7 e 21 de setembro de 1925, e composta por três
doutores da Universidade: Rensoli y Machado, Manuel Enrique Gómez e
Freyre de Andrade.
A decisão final da comissão, publicada na Gazeta Oficial, em 21 de
novembro de 1925, era de absolvição de todos os catedráticos,
Onde se forjam os homens.
38
pagamento de seus rendimentos referentes ao período de afastamento e
imediata retomada de suas atividades, marcando o momento em que as
autoridades universitárias e o governo de Gerardo Machado iniciam a
contra-ofensiva à organização dos estudantes.34
Alguns meses antes, em 25 de setembro de 1925, o Conselho de
Disciplina da Universidade já havia decidido pela expulsão de Mella. O
pretexto imediato utilizado foi um desentendimento com um professor
de Legislação Operária, Dr. Rodolfo Méndez Peñale, em resultado do
tratamento que este teria dado à esposa de Mella, Olivia Zaldívar.
O caráter prosaico da expulsão parece ter indignado mais a Mella
do que o ato em si. No texto de apelação, procurou demonstrar o
absurdo da expulsão sob tal alegação:
“Creo que más de una vez he cometido actos punibles. Me parece que
cuando el Claustro de la Universidad pretendió nombrar Rector Honoris
Causa al representante de la dominación Yanqui en Cuba, silbé e insulté,
desde la misma Aula Magna, a los que pretendían de esa manera dar
muestrar de servilismo y humillación ante los nuevos conquistadores de la
América. (...) Me parece que durante dos días tuvimos en nuestro poder con
las armas en las manos, los edificios de la Universidad, impidiendo de esta
manera que se reuniese el Claustro para tomar resoluciones contra nosotros.
(...) No hace mucho cometimos el grave delito de rebelarnos contra la
autoridad de la nación, y lo que es más grave, en este lugar donde el
espíritu de sumisión está tan arraigado, contra el mismo representante de
Estados Unidos. (...) Recuerdo todos estos puntos al Honorable Consejo,
para que se sirva hacer justicia, de acuerdo con los Estatutos, y por todos
los hechos enunciados anteriormente.” 35
A despeito do acontecimento, Mella tentou resistir aos intentos de
reverter as conquistas estudantis. No mesmo dia da publicação da
decisão da comissão com relação à absolvição dos professores
34 Cf. GONZALES CARBAJAL, Ladislao. Mella y el movimiento estudantil. Havana, Editorial de
Ciencias Sociales, 1977. 35 “Apelación de Mella al Consejo Universitario de la Universidad” citado em CABRERA,
Olga y ALMODÓBAR, Carmen., op. cit., p.134-135.
Onde se forjam os homens.
39
acusados, Mella compareceu à Faculdade de Medicina e conclamou os
estudantes a protestarem com a ausência às suas aulas.
A direção da Faculdade de Medicina resolveu reagir à ação de Mella
e o reitor, Fernández Abreu, em audiência com o Ministro de Instrucción
Pública de Machado, Fernandez Mascaró, recebeu a orientação de que o
Conselho Universitário deveria declarar oficialmente que Mella não
pertencia mais ao corpo discente da Universidade, não estando mais
sujeito a seus códigos disciplinares nem a sua autoridade.
No entanto, o governo não estava disposto a tomar a seu cargo as
medidas punitivas contra o líder estudantil no contexto de sua atuação
como tal, pois tinha consciência da fragilidade das razões de uma
detenção que tivesse por base a atuação como liderança estudantil.
Apesar disso, em 27 de novembro, Mella foi detido pela polícia.
Desta vez, juntamente com alguns operários que estavam sendo
processados pela violação da Lei dos Explosivos e de sedição contra o
governo. Tratava-se do “processo comunista”, iniciado como resultado
da explosão de três bombas em distintos lugares da capital. Como não
havia nenhuma decisão por parte da direção do Partido Comunista
Cubano por iniciar qualquer ação de resistência, tudo leva a crer que os
atentados tenham sido organizados pelas forças policiais para justificar
a perseguição. Como resultado o Partido Comunista foi condenado à
ilegalidade e suas principais lideranças foram presas.
Nesse momento em que a própria vida de Mella estava em jogo,
percebe-se claramente a que ponto tinham chegado as divergências
entre a direção da Federación de Estudiantes e o estudante preso. No
dia 5 de dezembro, na prisão, Mella decretou greve de fome e realizou-a
com determinação. As Faculdades de Medicina, Farmácia e Direito
haviam iniciado a greve no mesmo dia em que Mella esteve nas
dependências da Universidade conclamando os estudantes, de forma
que a Federação realizou uma Assembléia no dia 22 de dezembro. Nela
discutiu-se a greve de fome do líder estudantil (que já durava 17 dias) e
Onde se forjam os homens.
40
decidiu-se apenas por fazer saber ao governo que os estudantes eram
favoráveis a que Julio Mella fosse posto em liberdade. Antes disso, a
direção da Federação havia expedido dois boletins em que se pôde
perceber a preocupação da direção com relação ao envolvimento dos
estudantes com o “caso Mella”.
No primeiro boletim, datado de 6 de dezembro, aparentemente
preocupada com a formação de comitês espontâneos entre os
estudantes que exigiam a libertação de Mella e produziram manifestos
nesse sentido, a Federação assim se expressou:
“... Que una vez más prevenimos la pública opinión de que sólo debe
considerar oficiales, las manifestaciones de este organismo publicadas en
forma de boletines, y considerar absolutamente ajenas a esta Federación
las publicaciones o manifestos en que se invoque un carácter estudantil, que
generalmente motivan intereses bastardos.” 36
No mesmo boletim, figuravam entre as decisões tomadas pela
Federação a disposição insofismável de afastar-se, em caráter definitivo,
dos estudantes que insistiam em manifestar sua oposição ao governo de
Machado, não só desqualificando sua ação como também fazendo a
apologia do poder instituído:
“Primeiro: Esta Federación lanza una condenación rotunda contra
aquellos malvados que, animados de sentimientos abyectos, se empeñan en
hacer aparecer a un Gobierno justo con un Gobierno venal, que se empeñan
en presentar un Gobierno honrado como un Gobierno arbitrario y violento,
con el proposito criminal de llevar a la rebelión contra el actual Gobierno a
los Estudiantes, que han jurado, por su honor y por el legado patriótico de
sus antepasados, acatar disciplinadamente, sin estridencias, sin
exaltaciones, serenamente, los mandatos supremos de la Ley.” 37
36 CABRERA, Olga e ALMODÓBAR, Carmen., op. cit., p.147. 37 CABRERA, Olga e ALMODÓBAR, Carmen., op.cit., p.148.
Onde se forjam os homens.
41
O tom do documento demonstra que a direção do órgão estudantil,
em que pese manifestar-se publicamente a favor da soltura de Mella,
tinha intenção de deixar claras as divergências ideológicas com relação
aos ideais que o inspiravam.
Com certeza Mella esperava melhor sorte com relação ao
envolvimento da instituição de que foi secretário durante quatro anos.
No entanto, o maior reconhecimento que a nova direção da Federación
de Estudiantes poderia lhe conceder expressou-se em outro boletim,
datado de 10 de dezembro do mesmo ano. Vendo-se forçada, talvez por
pressão de estudantes que certamente votavam mais apreço a Mella do
que suas lideranças, dedicou ao líder estudantil encarcerado três
considerações:
“Primero: Que el señor Julio Antonio Mella, compañero activo que há
sido en pasadas luchas universitarias, no se halla vinculado en forma
alguna a esta Federación, ni organismo estudantil alguno de esta
Universidad.
Segundo: Que enquanto concierne a su actuación dentro de esta
Universidad, en el pasado, hemos podido conocer su contextura moral que le
há revelado ante nosotros como un gran luchador ideológico, y que por razón
de otras atividades, ajena a los problemas universitarios, determinaram su
completa separación de nuestras luchas.
Tercero: Que en razón a lo anteriormente expuesto, creemos que en su
atual prisión pueda existir un error judicial y por ello, rogamos ao Poder
Judicial, cuya recta actuación es secundada por el Poder Ejecutivo, la
revisión de su auto de procesamiento, en la confianza de que dicho error se
dilucide si ello se realiza.” 38
Ressalta-se aqui o cuidado na redação que só responde pela
contextura moral do prisioneiro “dentro da Universidade” e “no
passado”. Percebe-se também que o afastamento entre Mella e os
estudantes dizia respeito a seu envolvimento com questões que,
segundo a Federação eram “ajenas a los problemas universitarios”, o
38 Idem, p.153,154.
Onde se forjam os homens.
42
que confirma nossa suposição de que, na medida em que Mella dava
maior abrangência à sua militância, afastava-se daqueles estudantes
que insistiam em ver os problemas da universidade como apartados dos
grandes problemas nacionais.
A Federación de Estudiantes negou seu apoio a Mella, devido ao
seu envolvimento com o movimento comunista internacional, mas
nessa ocasião ela foi uma das variantes que pôde garantir sua
sobrevivência. O governo de Machado começou a receber várias
manifestações internacionais de protesto contra a prisão do estudante,
inclusive uma enviada pelo Senado da República do México.
Somaram-se a elas a solidariedade de órgãos sindicais dentro do
país que chegaram a cogitar uma paralisação geral com vistas a
conseguir a libertação do líder estudantil e das lideranças operárias
condenadas à prisão no mesmo processo.39
A crise terminou no dia seguinte à realização da referida
Assembléia, quando o governo de Machado decidiu-se pela liberação do
estudante mediante fiança. Apesar disso, foram necessários dezoito dias
de greve de fome, comprometendo quase que irremediavelmente a saúde
de Mella, para que o governo se dignasse soltá-lo.
Depois de liberto, já não havia condições para permanecer em
Cuba. Novo processo foi instaurado contra ele, em janeiro de 1926,
tornando-se evidente que só seria possível continuar gozando de
liberdade e praticar a atividade política se o fizesse fora do país.
Seus companheiros do Partido Comunista de Havana organizaram
sua saída do país num cargueiro rumo a Honduras. Ao chegar a Puerto
Cortés, foi identificado por autoridades policiais e obrigado a seguir
viagem no cargueiro até a Guatemala, onde foi detido. Apenas dias
depois, graças à intervenção de Flores Magón, pôde prosseguir viagem
até o México, onde viveu o resto de seus dias.
39 Cf. GONZALES CARBAJAL, Ladislao., op.cit., p.60.
Onde se forjam os homens.
43
Sob muitos aspectos, tanto para Mella quanto para Haya, o exílio
foi uma nova fase na militância. Longe de seus países, vivendo
intensamente experiências novas, deram início, na segunda metade da
década, a importantes debates.
No que se refere a Haya, a primeira constatação é que o tema do
antiimperialismo, central na sua reflexão depois de 1924, ainda não
estava presente na mesma intensidade em seus escritos antes do exílio.
Apenas à medida que começou a conhecer de perto a realidade de
diferentes países latino-americanos - sobretudo a região do Caribe - e,
ao mesmo tempo, acercou-se da perspectiva que os comunistas, por
influência do leninismo, passaram a atribuir ao imperialismo, qual seja,
a de um papel central na compreensão dos principais problemas
políticos dos anos 20 - é que começou a considerar o antiimperialismo
como questão relevante.
O tema de maior importância para Haya antes do exílio, radicava
na discussão existente no Peru em torno das comunidades indígenas.
Como vimos, a geração a que pertenceram Haya e Mariátegui,
manifestou grande esforço no sentido de conhecer a realidade indígena
do Peru. Consolidando uma tendência que nasceu ainda no século XIX,
com González Prada, o inicio do século viveu um renascimento do
indigenismo. Ao contrário do centenário desprezo dedicado às
populações indígenas por parte das elites políticas no século XIX,
durante o governo de Augusto Leguía, houve um grande avanço, em que
pese a situação precária em que continuaram a viver as comunidades
indígenas.
Lembremos que durante a administração de Leguía criou-se a
Sección de Assuntos Indígenas, ligada ao Ministério de Fomento e Obras
Públicas e dedicada especificamente à discussão do problema das
condições econômicas e sociais das comunidades indígenas. O
Patronato de la Raza Indígena e o Dia do Índio, são também instituições
do governo de Leguía, e isso não denota uma especial preocupação do
Onde se forjam os homens.
44
governante pelo tema, mas sim uma forte pressão da sociedade civil no
sentido de transformar a disposição do Estado com relação ao
problema.
A pressão dessa sociedade civil organizada em grupos como a
Associación Pró Indígena 40 e outras garantiu que o governo sancionasse
leis de proteção ao índio.
Foi durante esse período novo de retomada e valorização das
tradições indígenas que muitos intelectuais, entre eles Castro Pozo,
Mariátegui e o próprio Haya, puderam voltar sua atenção para antigas
instituições sociais das comunidades indígenas, como a propriedade
comunal da terra, e supor que a partir delas, com as adaptações
exigidas pelo tempo, seria possível pensar alternativas ao latifúndio e à
exploração imperialista.
Dessa forma, a atuação de Haya nos primeiros anos, passando
pelo movimento operário de orientação anarquista, nas greves de 1919,
e por sua posterior defesa da serra como lugar de purificação das
mazelas da nação no período do Congresso de estudantes, aponta para
uma percepção da questão nacional, centrada naquelas comunidades.
Há que se considerar que no período em que Haya desenvolveu sua
reflexão, antes e depois do exílio, consolidava-se uma leitura indigenista
que manifestava um certo preconceito, uma vez que tendia a identificar
a nação peruana com os Incas e com os Andes, vendo o mestiço como o
símbolo dos males da colonização. Essa tendência, ainda que com os
sinais contrários, reproduzia a leitura “racial” do problema indígena que
tinha sido característica da colonização e dos primeiros anos de
República. O empenho realizado por Haya em destacar os aspectos
econômicos e sociais das condições adversas das comunidades
indígenas no Peru buscava oferecer uma compreensão alternativa a
40 Grupo criado, em 1909, no meio universitário de São Marcos e que foi um dos pioneiros a
denunciar os abusos cometidos contra os índios e sublinhar a responsabilidade social das autoridades públicas locais. Sobreviveu até 1915, mas sua atuação não foi muito além das
denúncias. O comitê pró-indígena que o seguiu dedicou-se também a despertar nos índios consciência de seus direitos cívicos.
Onde se forjam os homens.
45
essa perspectiva indigenista e encarava diferentemente a relação índio-
mestiço, partindo mais em direção a uma aliança do que a uma
oposição entre eles. É verdade que, quando comparado a outros
intelectuais peruanos seus contemporâneos, essa proposição não está
explícita nos escritos de Haya, mas durante o exílio, quando Haya
estabeleceu a ligação entre a questão nacional e o imperialismo, as
proposições em termos da aliança entre os índios e os trabalhadores
urbanos tornaram evidente que esse era seu objetivo.
No caso de Mella, embora o exílio tenha contribuído muito para a
ampliação de seus horizontes, interessando-o e qualificando-o para
discutir com muito mais propriedade assuntos que transcendiam às
questões nacionais, sua aproximação do comunismo internacional e
sua filiação incondicional a seus princípios elementares já se tinham
dado bem antes de exilar-se.
Nos escritos anteriores ao exílio, era possível perceber que o
problema nacional encontrava-se desde logo vinculado ao imperialismo.
Em seu texto mais importante da fase cubana de sua produção,
terminado meses antes de sua prisão, vemos de que forma as questões
já apareciam imbricadas:
“Hay algo cómico en esse asunto, que nunca han visto los famosos
internacionalistas cubanos y yanquis de los Congresos panamericanos y
europeus. Si un estado es soberano tiene siempre la suficiente fuerza
armada para imponer su soberanía a todos sus súbditos o ciudadanos
luego, si Cuba es estado soberano, como dicen en la Universidad de la
Habana y en todos los lugares donde hay hipócritas ¿para qué necesita la
fuerza armada de los Estados Unidos?, ¿para imponer ese respecto y
proteción garantizados en la parte cubana y en la parte americana de
nuestra constituición? Falta estado verdadero, e sobra protección.” 41
41 VALCARCE, Carmen. (org.). Escritos revolucionarios. México, Siglo XXI, 1978, p. 68.
Onde se forjam os homens.
46
A percepção aguda da dependência econômica como fator limitador
da soberania nacional, não se evidenciava apenas na análise do caso de
Cuba, mas se generalizava para toda a América Latina:
“La América Latina, en mayor o menor grado, no es libre, pertenece al
solo estado, al solo poder, que absorbe a todos los otros: los Estados Unidos
de Wall Street. Los países como Chile, Argentina, Brasil y Uruguay, que por
situaciones especiales no estan bajo la influencia directa del capitalismo
imperialista, son también, estados capitalistas nacionales: feudos de una
casta explotadora.” 42
Assim, é preciso considerar que Cuba oferecia a Mella uma longa
tradição na discussão da luta contra o opressor estrangeiro e pela
soberania nacional que remonta aos líderes da revolução de
independência no final do século XIX.
Durante o período de dominação militar norte-americana na ilha,
cresceu consideravelmente a expectativa de uma efetiva independência
e as sucessivas derrotas vividas pelo Congresso Constituinte de 5 de
novembro de 1900, sobretudo, a aceitação da Emenda Platt, impuseram
à vida política de Cuba o receio constante da intervenção militar.
Nos primeiros anos de independência, por força da presença
onipotente do poderio militar norte-americano, a diferença entre liberais
e conservadores em Cuba radicava no fato de que enquanto estes, em
alguns casos eram francamente anexionistas e consideravam a
incorporação definitiva da ilha, aos EUA, aqueles empenhavam toda sua
energia em viabilizar as reformas sociais necessárias sem provocar a
desconfiança e conseqüentemente a intervenção norte-americana.
Nesse contexto, as expectativas da geração participante da Reforma
Universitária em Cuba passava pela liquidação completa da dominação
estrangeira e a imposição definitiva da autonomia nacional. O principal
componente da mobilização estudantil, no primeiro momento, foi a luta
42 Idem, p. 69.
Onde se forjam os homens.
47
pela soberania nacional e esse contexto favoreceu uma aproximação da
questão do antiimperialismo que para Mella antecedeu ao exílio e que
apenas se aprimorou depois dele.
Ainda durante as duas primeiras décadas do século, a
preocupação com a vocação interventora dos Estados Unidos deixou de
ser uma exclusividade dos cubanos, visto que um número crescente de
países da América Central passava a viver mais de perto essa realidade.
Não é de se estranhar que o nacionalismo como componente do
ideário da Reforma Universitária em Cuba tivesse muito mais força do
que no caso peruano. Existiu também alguma preocupação manifestada
por Mella com relação ao preconceito racial de que era vítima a
população negra na ilha, inclusive por parte de setores do próprio
movimento operário, mas essa problemática apareceu de forma
absolutamente secundária em comparação com a questão da
necessidade de defender a soberania nacional contra o opressor
estrangeiro.
Essa é, a nosso ver, a distinção essencial entre as concepções
nacionalistas nos dois países que ajuda a entender as posteriores
polêmicas em torno do antiimperialismo desenvolvidas por Haya de la
Torre e Julio Mella.
Onde se forjam os homens.
48
BIBLIOGRAFIA
ADRIANZÉN, Alberto. (org.) Pensamiento político peruano. Lima, DESCO,
1987.
_______. Pensamiento político peruano. 1930-1968. Lima, DESCO, 1990.
AGUILAR, Luis E. “Cuba, c. 1860-1934” en BETHELL, Leslie (org). The
Cambridge History of Latin America. London, Cambridge
University Press, 1986.
ALEXANDER, Robert J. Aprismo: ideas and doctrines of Víctor Raúl
Haya de la Torre. Kenut University Press, 1974.
_______. Comunism in Latin America. New Jersey, Rutgers University
Press, 1957.
ALVA CASTRO, Luis. Haya de la Torre. Peregrino de una unidad
continental. Lima, Fondo Editorial V. R. Haya de la Torre, s/d.
ANDERSON, Benedict. Comunidades imaginadas. Reflexiones sobre el
origen y la difusión del nacionalismo. México, Fondo de Cultura
Económica, 1999.
ANDYNO, Hallando. Citas escogidas de las obras completas de Víctor
Raúl Haya de la Torre con reflexiones críticas sobre las falacias y
sofismas de las izquierdas. Lima, Miraflores, Promandina, 1995.
ANSARD, Pierre. Ideologia, conflito e poder. Rio de Janeiro, Zahar, 1978.
BALBI, Carmen Rosa. El Partido Comunista y el APRA en la crisis
revolucionaria de los años treinta. Lima, G. Herrera, 1980.
BALLON, Eduardo. Movimientos sociales y crisis: el caso peruano. Lima,
Onde se forjam os homens.
49
Centro de Estudios y Promoción del Desarrollo, 1986.
_______. Movimientos sociales y democracia: la fundación de un nuevo
orden. Lima, Centro de Estudios y Promoción del Desarrollo,
1986.
BASADRE, Jorge. Historia de la República del Perú. Lima, Cultura
Antartica, 1946.
BERNALES, B. Enrique. "Origins and evolution of the Peruvian
University", en Revista Mexicana de Sociología. México, no1,
1981.
BIDEGAÍN DE URÁN, Ana María. Nacionalismo, militarismo e dominação
na América Latina. Petrópolis, Vozes, 1987.
BOURRICAUD, François. (org.) La Oligarquia en el Perú. Buenos Aires,
Amorrortu, 1969.
BREWER, Antony. Marxist theories of imperialism: a critical survey.
London, Routledge, 1989.
BRUIT, Hector Hernán. O imperialismo. Campinas, Editora UNICAMP,
1987.
BUISSON, Inge e KAHLE, Günter. (orgs.) Problemas de formación del
Estado y de la nación en hispanoamérica. Bonn, Inter nationes,
1984.
BURGA, Manuel and FLORES GALINDO, Alberto. Apogeo y crísis de
la República aristocrática. Lima, Ediciones Rikchay Peru, 1984.
3d ed.
CABALLERO, Manuel. La Internacional Comunista y América Latina. La
seccion venezolana. Mexico, Cuadernos de Pasado y Presente,
Onde se forjam os homens.
50
1978.
CABRERA, Olga. Julio Antonio Mella. Reforma estudantil y antimpe-
rialismo. La Habana, Editorial de Ciencias Sociales, 1977.
CABRERA, Olga e ALMODÓBAR, Carmen. (orgs.) Las luchas estudan-
tiles universitarias. 1923 a 1934. Havana, Editorial de Ciencias
Sociales, 1975.
CAMPODONICO, F. F. El pensamiento indigenista. Lima, Mosca Azul
Editores, 1981.
CARAVEDO MOLINARI, Baltazar. Clases, lucha política y gobierno en el
Perú. Lima, Retama Editorial, 1977.
CARR, E. H. Historia de la Rusia Sovietica. Madri, Alianza, 1980, 3 vols.
CHANG RODRIGUEZ, Eugenio. La literatura política: Gonzáles Prada,
Mariátegui, Haya de la Torre. México, Studium, 1957.
CHAVARRÍA, Jesús. José Carlos Mariátegui and the Rise of Modern
Peru, 1890-1930. Albuquerque, University of New Mexico Press,
1979.
COHEN, Benjamin J. Questão de imperialismo: a economia política da
dominação e da dependência. Rio de Janeiro, Zahar, 1976.
COMBLIN, Joseph. Nação e nacionalismo. São Paulo, Duas Cidades,
1965.
CONNELL-SMITH, Gordon. El sistema interamericano. México, Fondo de
Cultura Económica, 1971.
CONTRERA, Nelio. Julio Antonio Mella: el joven precursor. Havana,
Editora Política, 1987.
Onde se forjam os homens.
51
COSSIO DEL POMAR, Felipe. El indoamericano. Lima, Ed. Nuevo Dia,
1946.
_______. Victor Raúl. México, Editora Cultura, 1969.
COTLER, Julio. Clases, Estado y Nación en el Perú. Lima, Instituto de
Estudios Peruanos, 1992.
CUPULL, Adys. (org.) Julio Antonio Mella en los mexicanos. México,
Ediciones El Caballito, 1983.
D’ESTÉFANO PISANI, Miguel A. Cuba, Estados Unidos y el derecho
internacional contemporáneo. La Habana, Editorial de Ciencias
Sociales, 1983.
D’HORTA, Arnaldo Pedroso. Peru: da oligarquia econômica à militar. São
Paulo, Perspectiva, 1971.
DAVIS, Harold Eugene and WILSON, Larman C. Latin America foreign
policies. An analysis. Baltimore, John Hopkins University Press,
1975.
DAVIS, Horace B. Para uma teoria marxista do nacionalismo. Rio de
Janeiro, Jorge Zahar, 1979.
DECAMILLI, José L. Haya de la Torre: ideas y doctrinas. Lima, Amauta,
1971.
DÍAZ POLANDO, Héctor. La cuestión étnico-nacional. México, Editorial
Línea, 1985.
DUMPIERRE, Erasmo. Julio Antonio Mella. Biografia. Havana, Editorial
Orbe, Instituto Cubano del Libro, 1975.
DUTT, James S. and BAKER, Paul T. Cultura andina y represión. Cusco,
Centro de Estudios Rurales Andinos "Bartolomé de las Casas",
Onde se forjam os homens.
52
1986.
FERREIRA, Oliveiros S. Nossa América: Indoamérica. São Paulo,
EDUSP, 1971.
FERRO, Marc. História das colonizações. Das conquistas às indepen-
dências. Séculos XIII a XX. São Paulo, Companhia das Letras,
1996.
FEVERLEIN, W. e HANNAN, E. Dólares en la América Latina. México,
Fondo de Cultura Económica, 1944.
FLORES GALINDO, Alberto. Buscando un inca: identidad y utopía en los
Andes. Lima, Instituto de Apoyo Agrario, 1987.
_______. La agonía de Mariátegui. Lima, Instituto de Apoyo Agrario,
1989.
_______. “Mariátegui, marxismo y nación.” en La revista, arte, ciencias-
sociedad., Lima, no 2, jul. 1980.
GELLNER, Ernest. Nações e nacionalismo. Lisboa, Gradiva, 1993.
GERMANA, César. “La polêmica Haya de la Torre-Mariátegui: reforma o
revolución en el Perú.” en Análisis., Lima, no 23, abr./dez. 1977.
_______."The Middle Class and Power in Peru", en Revista Mexicana de
Sociología., México, no 3, 1981.
GIL, Enrique. Evolución del panamericanismo. Buenos Aires, Libreria y
casa editora de Jesús Menendez, 1933.
GONZALES CARBAJAL, Ladislao. Mella y el movimiento estudantil.
Havana, Editorial de Ciencias Sociales, 1977.
GONZÁLEZ CASANOVA, Pablo. (org.) Cultura y creación intelectual en
Onde se forjam os homens.
53
América Latina. México, UNAM/Siglo XXI, 1984.
_______. História contemporânea da América Latina. Imperialismo e liber-
tação. São Paulo, Vértice e Editora Revista dos Tribunais, 1987.
_______. (org.) História de medio siglo. México, Siglo XXI, 1991, 2 vol.
_______. (org.) No intervención, autodeterminación y democracia en Amé-
rica Latina. México, Siglo XXI, 1983.
GRAMSCI, Antonio. Os intelectuais e a organização da cultura. São
Paulo, Círculo do Livro, s.d.
HAJEK, Milos. Historia de la Tercera Internacional. La política de frente
único. (1921-1935). Barcelona, Editorial Crítica, 1984.
HALPERIN DONGHI, Tulio. História da América Latina. Rio de Janeiro,
Paz e Terra, 1975.
HAYES, Carlton Joseph Huntley. The historical evolution of modern
nationalism. New York, R.R. Smith, inc., 1931.
HILIVER, Grant. The politcs of reform in Peru. The Aprista and others
Mass parties of Latin America. Baltimore and London, John
Hopkins Press, 1971.
HOBSBAWM, Eric J. Da Revolução Inglesa ao imperialismo. Rio de
Janeiro, Forense-Universitarie, 1969.
_______. Era dos Extremos. O breve século XX 1914-1991. São Paulo,
Companhia das Letras, 1995.
_______. História do marxismo. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1979, 8 vols.
_______. Nações e nacionalismo desde 1780. Rio de Janeiro, Paz e Terra,
1991.
Onde se forjam os homens.
54
HOBSBAWM, Eric J. e NICOLAUS, Martin. Imperialismo y movimiento
obrero: Las raíces del oportunismo. Sobre la aristocracia obrera.
Barcelona, Editorial Anagrama,1976.
HOBSON, J. A. Estudio del imperialismo. Madri, Alianza, 1981.
HOLLEY BLANLOT, Anselmo. Historia de la paz entre Chile y el Perú.
Santiago, Imprenta Universo, 1910.
IANNI, Octávio. Imperialismo na América Latina. Rio de Janeiro,
Civilização Brasileira, 1974.
_______. O labirinto latino-americano. Rio de Janeiro, Vozes, 1993.
IBAÑEZ, Alfonso. Mariátegui. Revolución y utopia. Lima, Tarea, 1978.
JAGUARIBE, Hélio. Crise e alternativas na América Latina. Rio de
Janeiro, Vozes, 1993.
JUNQUEIRA, Mary Anne. Ao sul do Rio Grande. Bragança Paulista,
EDUSF, 2000.
KÁPSOLI ESCUDERO, Wilfredo. Los movimientos campesinos en el
Perú 1879-1965. Lima, Delva Editores, 1977.
KLAIBER, Jeffrey L. Modernization, Dislocation, and Aprismo: Origins of
the Peruvian Aprista Party, 1870-1930. Austin, University of
Texas Press, 1973.
_______. The Catholic Church in Peru, 1821-1985: A Social History.
Washington, Catholic University of America Press, 1992.
KLARÉN, Peter F. “The origins of modern Peru, 1880-1930” en
BETHELL, Leslie (org). The Cambridge History of Latin America.
London, Cambridge University Press, 1986.
Onde se forjam os homens.
55
KRIEGEL, Annie. Las Internacionais obreras. Barcelona, Ediciones
Martines Roca, 1972.
KOHN, Hans. El nacionalismo, su significado y su historia. Buenos Aires,
Editorial Paidós, 1966.
LE RIVEREND, Julio. História económica de Cuba. Barcelona, Ediciones
Ariel, 1972.
_______. La Republica. La Havana, Editorial de Ciencias Sociales, 1975.
LENIN. Vladimir Ilich. Imperialismo, fase superior do capitalismo. São
Paulo, Global, 1985.
_______. La lucha de los pueblos de las colonias y paises dependientes
contra el imperialismo. Moscou, Progresso, s/d.
______. Notas críticas sobre la cuestion nacional. Moscú, Ed. en Lenguas
Extranjeras, 19--.
LÉVANO, César e BARBA, José. (org.) La polémica Haya de la Torre-
Mariátegui. s.l, s.n, 1979.
LIMA, Heitor Ferreira. Do imperialismo à libertação colonial: análise da
economia mundial de 1890 a 1960. Rio de Janeiro, Fundo de
Cultura, 1965.
LOPEZ SEGRERA, Francisco. Cuba, capitalismo dependiente y
sobdesarrollo. 1510-1959. La Habana, Editorial de Ciencias
Sociales, 1983.
LOW, D. A. Eclipse of empire. London, Cambridge University Press,
1991.
LÖWY, Michael. El marxismo en América Latina (De 1909 a nuestros
dias). México, Ediciones Era, 1982.
Onde se forjam os homens.
56
LUNA VEGAS, Ricardo. Mariátegui, Haya de la Torre y la verdad
histórica. Lima, Retamar Editorial, 1978.
LUXEMBURG, Rosa. A acumulação do capital. Contribuição ao estudo
econômico do imperialismo. São Paulo, Nova Cultural, 1985.
MAGDOFF, Harry. La Era del imperialismo. Política económica
internacional de Estados Unidos. México, Editorial Nuestro
Tiempo, 1969.
MARIÁTEGUI, José Carlos. Ideologia y política. Lima, Amauta, 1969.
_______. Peruanicemos al Perú. Lima, Empresa Editora Amauta, 1975.
_______. Sete ensaios de interpretação da realidade peruana. São Paulo,
Alfa-Ômega, 1975.
MARSISKE, Renate. Movimientos estudantiles en América Latina:
Argentina, Perú, Cuba y México. 1918-1929. México, UNAM,
1989.
MARTÍ, José. Obras completas. Havana, Editorial Nacional de Cuba,
1963, vols. 14 e 15.
MEDIN, Tzvi. Ortega y Gasseten la cultura hispanoamericana. México,
Fondo de Cultura Económica, 1994.
MILLER, Nicola. In the shadow of the state: intellectuals and the quest
for national identity in twentieth-century Spanish America.
London, New York, Verso, 1999.
MOMMSEN, Wolfgang. Epoca del imperialismo. México, Siglo XXI, 1973.
MONTOYA, Rodrigo e LOPEZ, Luis Enrique. (org.) ¿Quienes somos? El
tema de la identidad en el Altiplano. Lima, Mosca Azul Editores,
1988.
Onde se forjam os homens.
57
MURILLO, G. Percy. Historia del Apra: 1919-1945. Lima, Delgado V.
Editor, 1976.
NADEL, George and CURTIS, Perry. (org.) Imperialism and colonialism.
New York, Macmillan and Collier-Macmillan, 1964.
NEIRA SAMANEZ, Hugo (et alii). Vida y obra de Víctor Raúl Haya de la
Torre. Lima, Instituto Víctor Raúl Haya de la Torre, 1997.
NIETO, Jorge. “Haya, Mariátegui y el comunismo latinoamericano:1926-
1928.” en Socialismo y participación, Lima, no 35, set.1986.
OCAMPO LÓPEZ, Javier. La integración de América Latina: historia de
las ideas. 2ª ed., Bogotá, Editorial El Buho, 1991.
OLAYA CORREA, Jose. Haya de la Torre: una vida ejemplar y
ejemplarizadora: biografía e iconografía. Lima, Fondo Editorial
V.R. Haya de la Torre, 1989
_______. Víctor Raúl: toda la vida. Lima, Latina, s.d
PLANAS, Pedro. Los orígenes del Apra. El joven Haya. Lima, Okura
Editores, 1986.
PORTANTIERO, Juan Carlos. Estudiantes y política en América Latina.
1918-1938 El processo de la Reforma Universitária. México, Siglo
XXI, 1978.
PORTOCARRERO, Gonzalo. (org.) La aventura de Mariátegui. Nuevas
perspectivas. Lima, Pontificia Universidad Católica, 1995.
RAMA, Carlos M. Nacionalismo e historiografia en América Latina.
Madrid, Tecnos, 1981.
RAMIREZ, Sergio. El pensamiento vivo de Sandino. Costa Rica, EDUCA,
1980.
Onde se forjam os homens.
58
RAMOS, Jorge Abelardo. La nación inconclusa: de las repúblicas insu-
lares a la Patria Grande. Montevideo, Ediciones de La Plaza,
1994.
RAMOS ALVA, Alfonso. Siete tesis equivocadas del marxismo-leninismo
sobre indoamerica. 6ª ed., Lima, Idea, 1986.
RANGEL, Carlos. Del buen salvaje al buen revolucionario. Caracas,
Monteávila editores, 1976.
RÉMOND, René. (org.) Por uma história política. Rio de Janeiro, UFRJ,
fev.1996.
RIDLEY, Hugh. Image of imperial role. London, Groow-Helm,1983
RIVA-AGUERO, José De La. Estudio de historia peruana, la história en el
Perú. Lima, PUC Peru, 1965.
RODÓ, José Henrique. Ariel. Montevidéo, Colombino Hnos., 1947
SAID, Edward W. Cultura e imperialismo. São Paulo, Companhia das
Letras, 1995.
SALAZAR BONDY, Augusto. História de las ideas del Perú
contemporáneo. Lima, Moncloa Editorial, 1965.
SANCHEZ, Luis Alberto. Apuntes para una biografia del APRA. I. Los
primeros pasos 1923-1931. Lima, Mosca Azul Editores, 1987.
________. Haya de la Torre o el político. Cronica de una vida sin tregua.
Santiago de Chile, Editora Ercilla, 1936.
________. Testemonio Pessoal. Lima, Mosca Azul Editores, 1987.
SCHLESINGER, Rudolf. La Internacional Comunista y el problema
colonial. Córdoba, Cuadernos de Pasado y Presente, 1974.
Onde se forjam os homens.
59
SCHOULTZ, Lars. Estados Unidos: poder e submissão. Uma história da
política norte-americana em relação a América Latina. Bauru,
EDUSC, 2000.
SCHUMPETER, Joseph Alois. Imperialismo e classes sociais. Rio de Janeiro, Zahar, 1961.
SOSA, Ignacio. (org). El nacionalismo en América Latina. México, Univ.
Nacional Autónoma de México, Coordinación de Humanidades,
Centro Coordinador y Difusor de Estudios Latinoamericanos,
1984.
SPENCE, Jonathan D. Em busca da China Moderna, São Paulo, Cia.
Das Letras, 2000.
SULMONT, Denis. El movimiento obrero peruano. (1890-1979). Lima
Tarea, 1985
STEIN STEPHEN, Jay. The political behavior of de Lima working class in
the 1931 presidencial election. Stanford University Press, 1973.
UGARTE, Manuel. La nación latinoamericana. Caracas, Biblioteca
Ayacucho, 1987, v.45
VEGA-CENTENO, Imelda. Aprismo popular. Cultura, religión y política.
Lima, Tarea, 1991.
VILLANUEVA, Víctor. El Apra en busca del poder. 1930-1940. Lima,
Editorial Horizonte, 1975.
VITALE, Luis. Los precursores de la liberación nacional y social en
América Latina: de Martí, Ugarte y Sandino a Recabarren,
Mariátegui y Mella. Buenos Aires, Ediciones Al Frente, 1988