Dificuldades Nas Relações Interpessoais: O Retorno De Trabalhadores Afastados Por Transtornos...

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Dificuldades Nas Relações Interpessoais: O Retorno De Trabalhadores Afastados Por Transtornos Mentais e De Comportamento O mercado que se configura na atualidade tem forçado as organizações a desenvolverem e implementarem estratégias que lhes propicie maior competitividade. Entre elas estão a redução de custos e o aumento da produtividade que, de modo geral vem por meio de elementos do planejamento estratégico que estabelece objetivos e metas a serem cumpridas. Essas metas, não raro, são desdobradas até o nível individual, fazendo com que as pessoas sejam pressionadas em relação à sua consecução. Tais procedimentos têm levado muitos profissionais a um estado emocional que acarreta quadros de transtornos mentais e de comportamento de matizes variados. Muitos têm buscado tratamento até mesmo pela total impossibilidade de continuarem em suas atividades laborais. O que ocorre é que, ao retornarem aos seus postos de trabalho sentem-se, muitas vezes, tratados de forma diferenciada. Este estudo teve por objetivo fazer um levantamento e descrição da situação de trabalho e das relações interpessoais de bancários que foram afastados por quadros de estresse e depressão, que retornaram ao trabalho após a licença médica. A pesquisa foi realizada em um banco estadual localizado no Espírito Santo, que por exigência recebeu somente a designação de Banco, que apresenta grande pressão sobre o cumprimento de metas e objetivos. A discussão teórica inicia-se com as transformações do mercado de trabalho, passando para os transtornos mentais e de comportamento decorrentes deste novo contexto, e por fim os efeitos refletidos nas relações interpessoais. O Código Internacional de Doenças tem no CID-10 a Classificação dos Transtornos Mentais e de Comportamento, dentro do qual destacou-se o F40-48, ou seja, Transtornos neuróticos, relacionados ao estresse e somatoformes. Dessa forma foram utilizados autores que trataram dos dois tipos mais observados no estudo, ou seja, estresse e depressão. Entre eles estão: Dalgalarrondo (2008), OMS (1993), Vicente (2005); Zampier e Stefano (2004), Vasconcelos e Faria (2007), Tanure, Carvalho Neto e Andrade (2007), Rossi, Perrewé e Sauter (2007), Sardá, Legal e Jablonski (2004) dentre outros. Em termos metodológicos foi utilizada uma abordagem qualitativa, valendo-se das pesquisas descritiva e bibliográfica, e da

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Dificuldades Nas Relações Interpessoais: O Retorno DeTrabalhadores Afastados Por Transtornos Mentais e De

Comportamento

O mercado que se configura na atualidade tem forçado asorganizações a desenvolverem e implementarem estratégias quelhes propicie maior competitividade. Entre elas estão aredução de custos e o aumento da produtividade que, de modogeral vem por meio de elementos do planejamento estratégicoque estabelece objetivos e metas a serem cumpridas. Essasmetas, não raro, são desdobradas até o nível individual,fazendo com que as pessoas sejam pressionadas em relação à suaconsecução. Tais procedimentos têm levado muitos profissionaisa um estado emocional que acarreta quadros de transtornosmentais e de comportamento de matizes variados. Muitos têmbuscado tratamento até mesmo pela total impossibilidade decontinuarem em suas atividades laborais. O que ocorre é que,ao retornarem aos seus postos de trabalho sentem-se, muitasvezes, tratados de forma diferenciada. Este estudo teve porobjetivo fazer um levantamento e descrição da situação detrabalho e das relações interpessoais de bancários que foramafastados por quadros de estresse e depressão, que retornaramao trabalho após a licença médica. A pesquisa foi realizada emum banco estadual localizado no Espírito Santo, que porexigência recebeu somente a designação de Banco, que apresentagrande pressão sobre o cumprimento de metas e objetivos. Adiscussão teórica inicia-se com as transformações do mercadode trabalho, passando para os transtornos mentais e decomportamento decorrentes deste novo contexto, e por fim osefeitos refletidos nas relações interpessoais. O CódigoInternacional de Doenças tem no CID-10 a Classificação dosTranstornos Mentais e de Comportamento, dentro do qualdestacou-se o F40-48, ou seja, Transtornos neuróticos,relacionados ao estresse e somatoformes. Dessa forma foramutilizados autores que trataram dos dois tipos mais observadosno estudo, ou seja, estresse e depressão. Entre eles estão:Dalgalarrondo (2008), OMS (1993), Vicente (2005); Zampier eStefano (2004), Vasconcelos e Faria (2007), Tanure, CarvalhoNeto e Andrade (2007), Rossi, Perrewé e Sauter (2007), Sardá,Legal e Jablonski (2004) dentre outros. Em termosmetodológicos foi utilizada uma abordagem qualitativa,valendo-se das pesquisas descritiva e bibliográfica, e da

técnica de análise de conteúdo para o tratamento dos dados,que foram coletados por meio de um roteiro de entrevista.Fizeram parte da amostra 22 funcionários do Banco queretornaram de afastamento por doenças psicossomáticasrelacionadas ao trabalho. Os resultados apontam para aconfirmação de conseqüências negativas sobre as relaçõesinterpessoais, entre os afastados e não-afastados, no ambientede trabalho e a falta de um programa de reintegração dessaspessoas.

Dificuldades Nas Relações Interpessoais: O Retorno DeTrabalhadores Afastados Por Transtornos Mentais e De

Comportamento

1. IntroduçãoPor decorrência dos avanços tecnológicos, mudanças

significativas surgiram nas empresas que ao responderem aosapelos da competitividade, passaram a exigir muito mais do serhumano, que se viu compelido a buscar constantemente novashabilidades e competências para se manter no seu posto detrabalho.

Nesse novo contexto as avaliações têm sido feitas commaior rigor, tanto individualmente quanto em grupo e as metasestão ganhando cunho cada vez mais coercitivo. Como resultadosdesse processo, para a instituição, no caso um banco, geram-sebenefícios a curto prazo tais como: o aumento da captação,aumento do lucro contábil, aumento do número de clientes,dentre outros. No entanto questiona-se: Quais as conseqüênciaspara as pessoas que fazem parte dessa organização, uma vez queas metas pré-definidas podem ser irreais e algumas pessoas nãoconseguem atingi-las? O que acontece às pessoas em um contextoque estimula a exclusão? O que aconteceu, no caso do banco emquestão, com os indivíduos que não conseguiram atingirpatamares altos de desempenho?

Esse questionamento surgiu do fato de que o trabalho podeser visto tanto como uma das fontes de satisfação da maioriadas necessidades humanas (auto-realização, relaçõesinterpessoais e sobrevivência), quanto uma fonte deadoecimento, pois no desempenho das atividades laborais, demodo geral, o trabalhador se defronta com riscos à sua saúde,quer seja física ou mental. Em alguns casos, como nosenfrentamentos ligados aos processos mentais, nem sempre eletem condições de se proteger contra esses riscos. Assim, “Asdoenças ocupacionais têm tido alta incidência e levado àdiminuição de produtividade, ao aumento de indenizações edemandas judiciais contra os empregadores” (MURTA E TRÓCCOLI,2004, p. 39). Elas são decorrentes das dificuldades deenfrentamento ou elaboração dos problemas vivenciados pelo serhumano. De acordo com Laplanche e Pontalis (2004) essaexpressão é utilizada para designar o esforço que a pessoa fazpara vencer as dificuldades por ela percebidas. Quando oresultado desse esforço é em vão, de modo geral, há uma

acumulação de excitações mentais que podem ter comoconseqüência o aparecimento de sintomas de transtornosmentais.

Com essa alta demanda a ser enfrentada, o empregado vem sesentindo ameaçado e pressionado por meio de diversos quadrostais como: maior insegurança no emprego, dificuldade nasrelações interpessoais, casos de assédio moral, problemasemocionais, moral baixo, diminuição da motivação e dalealdade. Como se não bastasse, os sujeitos apresentam aomesmo tempo um repertório de enfrentamento deficitário, dandoorigem ao estresse ocupacional, a depressão, dentre outros(COOPER, 2007, p.5).

No caso do Banco, percebeu-se a presença de elementos deretaliação, relação desarmoniosa entre os que passaram e osque não passaram por um afastamento decorrente de transtornomental e/ou comportamental e a presença de estressoresocupacionais originados das pressões do ambienteorganizacional, com destaque para a produtividade exacerbada.Nesse sentido é importante observar que de acordo com Sardá,Legal e Jablonski (2004) todos esses fatores podem levar acobranças incoerentes com os limites bio-psicológicos dostrabalhadores.

A partir dessas considerações percebeu-se a importância deverificar quais as características do retorno ao trabalho ecomo isso está refletindo nas relações interpessoais e suasconseqüências para o ser humano. Pretendeu-se, portanto,identificar e descrever os reveses das relações interpessoaisdecorrentes dos quadros de afastamentos por estresse edepressão e outros transtornos, em um ambiente bancário compressão intensa sobre o cumprimento de metas e objetivos, comodestaque para aqueles que retornaram ao trabalho após gozaremuma licença médica.

2. Aspectos MetodológicosEsta pesquisa possui características de qualitativa

(MOREIRA, 2004), na medida em que, buscou-se descrever osmodos pelos quais os trabalhadores do Banco enxergaram osentido do que estavam vivendo após retornarem de umafastamento por doença psicossomática e as diversas maneirascomo estavam conduzindo suas atividades e relacionamentos,numa base cotidiana. Buscou-se compreender como a vida de cada

um estava sendo vivida nas práticas e experiências rotineirasdentro do banco e se, possível, fora dele.

O banco pesquisado é uma sociedade de economia mista ecapital aberto, cujas ações ordinárias são, na maior parte,estatais. Ele possui 2.356 empregados em seu quadro funcionale a maioria dos clientes atendidos são servidores públicosestaduais e municipais de um estado da região sudeste. Atuacom prioridade também na oferta de linhas de financiamentovoltadas para a inclusão social, entre elas o microcrédito e ocrédito rural. Ele tem sido caracterizado por ser um banco comalto índice de reclamações trabalhistas e elevado número deregistro de acidentes de trabalho e doenças relacionadas aotrabalho.

Num primeiro momento foi realizado um levantamento juntoao setor de Recursos Humanos do Banco a fim de verificar asestatísticas dos casos de funcionários afastados portranstornos mentais e de comportamento, mas o modo como osdados foram tabulados pela instituição não foi adequado para apesquisa. Teve-se assim, acesso ao nome de todos os afastadosem 2006, 2007 e 2008, sem distinção do quadro clínico e dalotação do profissional. Em conversas informais com o setor deRecursos Humanos buscou-se a indicação de cinco empregados quepoderiam colaborar com a pesquisa. Posteriormente, elaborou-seum roteiro de entrevista, para coletar informaçõesrelacionadas à percepção do profissional que passou pelotranstorno quanto às conseqüências da doença de que foiacometido no seu retorno ao trabalho e nas suas relaçõesinterpessoais. A partir desses cinco obteve-se o nome e aindicação de outros que fizeram parte da pesquisa, obtendo-se,então um número de entrevistas até a saturação das respostas.Ao final foram realizadas vinte e duas entrevistas. Ossujeitos pesquisados deveriam ter passado por um período deafastamento por um tipo de transtorno emocional oucomportamental e terem retornado ao trabalho.

O primeiro contato com os funcionários foi feito por e-mail. Buscou-se com isso coletar as primeiras impressões a fimde identificar algumas questões básicas que dessem subsídiopara elaboração do roteiro da entrevista. Posteriormente foramcoletados outros dados via telefone e, por fim, foramrealizadas as entrevistas. Esse procedimento foi necessáriodadas as dificuldades de recepção por parte das pessoas aserem entrevistadas. Essa foi a forma de acesso que deu mais

resultado, uma vez que a resistência foi sendo quebrada namedida em que o sujeito entendia os objetivos da pesquisa enela via uma oportunidade para manifestar seu olhar sobre otema.

Para dar um significado mais amplo às respostas que foramobtidas com as entrevistas, vinculando os conhecimentos queforam obtidos na fundamentação teórica, fez-se a transcriçãode todos os dados coletados. O tratamento desses dados foirealizado por meio da técnica de Análise de Conteúdo, quesegundo Barros e Lehfeld (1996) e Bardin (1977) , vem sendoutilizada para estudar e analisar material qualitativo, nabusca pela compreensáo de uma comunicação ou discurso, pormeio do aprofundamento de suas características gramaticais,ideológicas, semblantes e pausas, para se extrair os aspectosmais relevantes. Tentou-se, assim, ir além das evidências,fazer mais do uma leitura cuidadosa do material em estudo.Através dessa técnica, localizaram-se determinados elementos,e, em seguida eles foram destacados, tratados e analisadosmais densamente. Ao final foi possível fazer uma categorizaçãode alguns achados.

Nos próximos itens serão abordados aspectos relacionadosaos transtornos mentais, às doenças psicossomáticas, relaçõesinterpessoais e o ambiente de trabalho; os dados obtidos e suarespectiva análise; e finalmente as considerações finais doestudo.

3. Algumas reflexões teóricas sobre transtornos mentais ecomportamentais

De acordo com a OMS – Organização Mundial da Saúde (1993,p. 5) que publica o CID-10, é recomendada a utilização dotermo “transtorno” em substituição a expressões como “doença”ou “enfermidade”, que causam polêmica. Assim, transtorno éutilizado para “[...] indicar a existência de um conjunto desintomas ou comportamentos clinicamente reconhecíveisassociados, na maioria dos casos, a sofrimento e interferênciacom funções pessoais”. Dentro desse conceito são classificadosdiversos tipos de transtornos, destacando-se para este estudoos transtornos do humor (afetivos), que incluem as manias, abipolaridade, depressão e outros; transtornos neuróticos,relacionados ao estresse e somatoformes, onde estão as fobias,o pânico, a obsessão, a compulsão e o estresse grave;síndromes comportamentais associadas a perturbações

fisiológicas e fatores físicos onde são encontrados ostranstornos alimentares, os transtornos do sono, disfunçõessexuais e abusos de substâncias que não produzem dependência(OMS-CID 10, 1993).

Na opinião de Zampier e Stefano (2004, p.13) “a forma deorganização das sociedades contemporâneas tem constituído umsolo fértil para o desenvolvimento de doenças psicossomáticase biológicas”. As mudanças nos estilos de vida das pessoasdecorrentes das pressões organizacionais estão deixando-as coma saúde debilitada, pois ficam cada vez mais expostas àsdoenças, destacando-se a depressão e o estresse. Para Baccaro(1996, p. 16) esses transtornos do mundo moderno sãoprovocados por circunstâncias diversas, em sua maioriavinculadas à estrutura e funcionamento das grandes cidades,nas quais o medo de assalto, o trânsito, o sedentarismo, oconsumo de cigarros e bebidas transformam-se em um complôcontra a saúde. Diante deste cenário, a pressão contra agrande massa de trabalhadores é constante e em termospsicológicos o sofrimento é imenso, pois as forças de mercadofazem com que milhares de pessoas sintam-se tensas e ansiosas,se têm como única maneira de sobrevivência, sua força detrabalho, que pode ser dispensada a qualquer momento (OLIVIERE BEHR, 2006). O medo de perder o emprego, faz com que ofuncionário desenvolva um nível de conflito interno, quemuitas vezes chega a um ponto crítico, trazendo não sóproblemas de saúde como também familiares (HALBESLEBEN,ZELLARS IN: ROSSI, PERREWÉ, SAUTER, 2007, p.57).

De acordo com Vicente (2005, p. 259) existe uma relaçãoentre as doenças psicossomáticas, os conflitos psíquicos e asmodificações fisiológicas. É que o recalcamento operado namente do sujeito por impossibilidade de expressão de emoçõesgeradoras de um conflito psíquico, provoca estadosdiferenciados de tensão fisiológica. Quando reprimidos, aagressividade, o medo e a culpabilidade provocam disfunções emórgãos, por impulsos de tensões emocionais acumuladas. Nestescasos pode haver uma reação complexa de componentes físicos epsicológicos resultantes dessa exposição do sujeito, que nãopossui recursos suficientes para o enfrentamento dessesfatores. Se as causas se prolongam o trabalhador pode terafetados os aspectos da psique e do corpo (LIPP, 1996), comotambém desenvolver um quadro de burnout que tem sido associadoà depressão e à disfunção mental por precipitar efeitos

negativos em termos de saúde mental, configurados peladepressão, ansiedade e diminuição da auto-estima (CHAMON,MARINHO E OLIVEIRA, 2006).

Segundo Dalgalarrondo (2008, p. 41) O diagnósticopsicopatológico, com exceção de quadro psico-orgânicosbaseiam-se “[...] principalmente no perfil de sinais esintomas apresentados pelo paciente na história da doença e nomomento da entrevista [...] apenas possível com o curso dadoença”. Os sintomas patológicos são estudados por meio de suaforma (alucinação, delírio, idéia obsessiva e etc) e de seuconteúdo (culpa, religião, perseguição e etc) sendo que esteúltimo depende da “[...] história de vida do paciente, de seuuniverso cultural e da personalidade prévia ao adoecimento”.Mas de modo geral, de acordo com o autor, os conteúdos dossintomas estão ligados aos “[...] temas centrais da existênciahumana, tais como sobrevivência e segurança, sexualidade,temores básicos (morte, doença, miséria, etc), religiosidade,entre outros”. (DALGALARRONDO, 2008, p. 29, GRIFO DO AUTOR).

Em outra dimensão, do ponto de vista da psicanálise,existem duas origens do desequilíbrio do aparelho psíquico: oinconsciente e os conflitos do Ego ao lidar com o princípio darealidade. No primeiro caso, tem-se o inconsciente comoexpressão simbólica de um conteúdo psicológico recalcado. Nosegundo, tem-se os conflitos do Ego que acabam por dar origemàs doenças psicossomáticas, que são respostas vegetativas aestados emocionais crônicos (VICENTE, 2005). Os estudosmostram que pode haver um rebaixamento da consciência emdiversos graus, e esses estados de consciência estão ligados àatenção, que segundo Cuvillier (1937, p. 45) “[...] pode serdefinida como a direção da consciência, o estado deconcentração da atividade mental sobre determinado objeto”.Para Dalgalarrondo (2008) a atenção está ligada aodesenvolvimento das atividades no cotidiano de qualquer serhumano e seu estado emocional e o nível de consciência podeminterferir significativamente na forma como ele dispensaatenção ao que faz. Nesse sentido Oliveira, Kilimnik e Silva(2005) afirmam que a manifestação patológica do estresse noambiente de trabalho depende de como o indivíduo - enquanto umser biológico, subjetivo, social e cultural - interage comeste ambiente, o que significa dizer que, dependendo da formacomo o trabalho está organizado e de como ele é executado pelotrabalhador, podem ser gerados efeitos negativos, dentre os

quais estão situações que podem levá-lo ao adoecimento e àmorte. E é Dalgalarrondo (2008) que apresenta diversos estadosde concentração que podem ser detectados no ambiente detrabalho. A hipoprosexia consiste na perda básica dacapacidade de concentração, a fadiga aumenta, há dificuldadede perceber os estímulos ambientais e para lembrar as coisas,bem como em pensar, raciocinar e integrar informações.Denomina-se aprosexia a total perda da capacidade de atenção.A hiperprosexia, por sua vez consiste em um estado de atençãoexagerado. A distração configura-se como um sinal de que apessoa está se concentrando em demasia sobre determinadoconteúdo ou objeto. E, por fim, a distrabilidade que é umestado patológico onde há dificuldade do sujeito deter-se emalgo que implique um esforço produtivo. Esses conceitos foramextraídos de Dalgalarrondo (2008) por serem importantes nacompreensão dos transtornos, com destaque para o estresse e adepressão.

Quando o trabalhador vivencia uma situação desgastantepode apresentar reações associadas a diversos mecanismospatogênicos, cognitivos, afetivos, de conduta ou fisiológicos,destacando-se o estresse (MURTA E TRÓCCOLI, 2004), podendo oestresse ser conceituado como um estado emocional desagradáveldecorrente da insegurança das pessoas quanto à sua capacidadepara enfrentar um desafio em relação a algo que tem para elasmuito valor (ZAMPIER; STEFANO, 2004).

Para Rossi (2007, in: ROSSI, PERREWÉ E SAUTER, 2007) entre as principaiscausas do estresse estão: incerteza, sobrecarga de trabalho,relações interpessoais, tecnologia, desempenho da tarefa,problemas emocionais, assédio moral, rituais e procedimentosdesnecessários, dentre outros. A isso podem-se somar osfatores que Ballone (2002) já havia detectado em relação aoestresse ocupacional que são: o aumento do volume de trabalho;os conflitos diários no trabalho; as pressões sofridas pelotrabalhador; a falta de compreensão e tolerância da chefia,que também se vê pressionada; todo um ambiente desfavorável aosujeito e o exercício de funções que são sentidas comoinadequadas, resultando em: afastamento do trabalho; aintervenção hospitalar; o desequilíbrio familiar; a perda doemprego e o constrangimento no trabalho e na sociedade. Taiselementos ou situações podem gerar conseqüências também para aorganização podendo ocorrer: perda de oportunidades no

mercado; queda de produtividade; intensificação do absenteísmoe prejuízos financeiros (PAIVA; COUTO, 2007).

Quando o trabalhador está em um estado emocional positivovale-se de estratégias de enfrentamento saudáveis comotranqüilidade, esperança e bem-estar, que são sentimentos queinterferem direta e indiretamente em sua saúde, por atuarem nosentido de um bom funcionamento do próprio organismo,favorecendo comportamentos de saúde e potencializando relaçõesinterpessoais gratificantes (CHAMON, MARINHO, OLIVEIRA, 2006).Porém, de acordo com Ayres, Brito e Torquato (2002) existetambém o enfrentamento deficitário que se dá quando otrabalhador faz uso de estratégias inapropriadas para ocontexto, como por exemplo tentar se desvencilhar rapidamentedas suas tarefas, ancorar-se em vícios e isolar-se dos demais.Esse tipo de comportamento pode facilitar a presença de fontesde estresse que produzem alterações fisiológicas tais como aqueda da imunidade e aumento ou queda da pressão arterial,tornando o trabalhador mais vulnerável a outros quadrossomáticos.

De acordo com Selye (1951) corroborado por Lipp (1996)enquanto processo, o sujeito depara-se com o fator estressorgerando uma reação de alerta na qual o organismo reage com aconseqüente quebra da homeostase. Quando o fator estressor temuma duração curta retorna-se rapidamente ao equilíbrio e apessoa sai dessa fase sem complicações para o seu bem-estar.Se percebida adequadamente essa fase pode ser um ponto deapoio para reações positivas como o aumento na produtividadeutilizando-se o entusiasmo e energia que lhes são inerentes(LIPP, 1996). Se, no entanto, a presença do fator estressor éprolongada o sujeito passa a utilizar sua reserva de energiapara se reequilibrar. Se essa energia for suficiente elavoltará ao equilíbrio, porém, se o fator estressor exigir maisesforço no processo de enfrentamento, o estresse poderácaminhar para a exaustão. De acordo com Lipp e Malagris(1995), dois sintomas aparecem com bastante freqüência nestafase: a sensação de desgaste generalizado sem causa aparente edificuldade com a memória. A terceira fase, exaustão,caracteriza-se pelo estresse em um alto nível de intensidade,quando o sujeito já não tem mais energias suficientes para oenfrentamento. Ela está associada a vários quadros somáticostais como: hipertensão arterial, úlceras, gengivites,

depressão, ansiedade, problemas sexuais, enfarte e atédiabetes, SELYE (1956) e LIPP (1996).

Nakayama (1997) trata de um tipo específico de estresseque se manifesta quando o trabalhador percebe o desequilíbrioentre as demandas existentes no trabalho e sua habilidade oupossibilidade para respondê-las. O que conta neste caso é adiscrepância entre a percepção do nível de demanda e acondição percebida pelo sujeito para enfrentá-las. Isso, demodo geral, leva a uma associação com as emoções negativasincluindo a sensação de mal-estar e desconforto que surgem emquem vivencia o processo. Assim, o estresse ocupacional podeser considerado como um conjunto de perturbações psicológicasou sofrimento psíquico, associado às experiências de trabalho.Nesse sentido Ballone (2002) acrescenta que o desgasteemocional a que as pessoas são submetidas nas relações com otrabalho pode gerar o afloramento de transtornos tais como:depressão, ansiedade, pânico, fobias, doenças psicossomáticas,etc.

Tolfo et al (2005) trataram do estresse no processo dereestruturação produtiva chamando a atenção para os fatoresdela decorrentes. Tais elementos são corroborados por Fosteret al (2007) quando estudaram a implantação do SAP R/3 que,por sua vez, apresenta consonância com Ayres, Brito e Torquato(2002) ao pesquisarem o tecno-estresse em bancários, focandoas fontes, os sintomas e as estratégias defensivas. Tanure,Carvalho Neto e Andrade (2007) também trabalharam o estresseem nível corporativo, por meio da percepção dos que chegaramaos altos escalões organizacionais, abordando o uso do tempo,as mudanças, a sensação de dívida permanente, o orgulho peloque faz, enfim, o teatro corporativo. Os resultados mostram umdesbalanceamento entre o tempo dedicado à carreira e àsrelações afetivas, familiares e ao lazer.

Em termos de ações efetivas contra esse quadro foramencontradas algumas formas de intervenção que podem auxiliarna reversão das condições organizacionais que levam oureforçam esses transtornos, no caso, programas focados notrabalhador que se baseiam em técnicas de enfrentamento doestresse. Entre essas técnicas estão: esclarecimentoeducacional sobre as causas e manifestações do estresse;orientação cognitivo-comportamental, como por exemplo, ainoculação do estresse, reestruturação cognitiva, manejo daraiva e terapia racional emotiva; treinamento em habilidades

pessoais (assertividade, manejo do tempo e negociação);redução da tensão (técnicas de relaxamento, biofeedback emeditação); e uma combinação de abordagens diversas (CHAMON,MARINHO E OLIVEIRA, 2006; VASCONCELOS E FARIA, 2007; SOUZA ETAL, 2007).

O que se observa porém é que o estresse não é o únicotranstorno que ocorre com freqüência entre os trabalhadores. Adepressão também se destaca entre os transtornos mentais e decomportamento que acometidos por aqueles que estão envolvidosem atividades laborais (MAROT, 2004).

De acordo com OMS-CID 10 (1993, p. 117) o episódiodepressivo típico pode ser classificado em leve, moderado egrave, “[...] nos quais o indivíduo sofre de humor deprimido,perda de interesse e prazer e energia reduzida levando a umafatigabilidade aumentada e atividade diminuída”. Entre ossintomas também estão o cansaço marcante, a concentração eatenção reduzidas, idéias de culpa e inutilidade, visõesdesoladas e pessimistas do futuro, idéias ou atos autolesivosou suicídio, angústia, sono perturbado e apetite diminuído. Éimportante registrar que os episódios depressivos podem viracompanhados de sintomas somáticos e/ou psicóticos.

Segundo Kraft (2006) a Organização Mundial da Saúdeclassifica a depressão como a quarta principal causa deincapacitação para o trabalho e para a vida social e deveráser a primeira até 2020. Para Martin, Quirino e Mari (2007, p.592) “A depressão é um grave problema de saúde pública,evidenciada pela importância das doenças mentais em relação àsoutras doenças. Esse transtorno compromete o cotidiano daspessoas no relacionamento social, seja na família, trabalho oucomunidade”. Ela consiste em um grande problema social devidoaos custos pessoais, ao prejuízo à saúde como um todo e àqualidade de vida. E, principalmente, constitui-se em umproblema para as empresas porque gera custos causados pelaperda de produtividade, maior número de faltas ao trabalho,maior número de afastamentos e pelo prejuízo ao profissional.Em outra dimensão pode também afetar as relações interpessoaisno ambiente de trabalho e, nesse sentido Manson (1995)acredita que um bom entendimento da depressão deveria levar emconta mais do que os sintomas expressos pelo paciente. Existemoutros elementos a serem considerados tais como: os contextossociais e as forças culturais que dão forma ao cotidiano, quedão significado às relações interpessoais e eventos da vida.

Fabrega (1974) registra ainda que há necessidade de seconsiderar as formas genéricas e abstratas ou molduras queofuscam a maneira como as alterações neuroquímicas eneuropsicológicas são expressas em uma forma culturalmentecontextualizada.

Tanto o estresse quanto a depressão são fatores que levama dificuldades nos relacionamentos interpessoais no ambienteorganizacional. Para Olivier e Behr (2005, p. 2) “As relaçõesinterpessoais se desenvolvem a partir da interação existentenos ambientes nos quais o homem está presente e constituem-sena base do funcionamento de qualquer interação humana, porexistir um processo de dependência mútua entre as pessoas”.

Moscovici (1998) chama a atenção sobre a importância dasrelações interpessoais nodia-a-dia, esclarecendo que a interação funciona como suportepara o desenvolvimento do ser humano. Em situações de trabalhocompartilhado por duas ou mais pessoas, há atividadespredeterminadas a serem executadas, bem como interações esentimentos recomendados, tais como: comunicação, cooperação,respeito e amizade. À medida que as atividades e as interaçõesprosseguem, os sentimentos despertados podem ser diferentesdos esperados inicialmente influenciando as interações e aspróprias atividades. Assim, sentimentos positivos de simpatiae atração, de modo geral, provocam aumento de interação ecooperação, repercutindo favoravelmente nas atividades eensejando maior produtividade. Sentimentos negativos deantipatia e rejeição, por sua vez, tenderão a provocardiminuição das interações, afastamento e menor comunicação,repercutindo desfavoravelmente nas atividades, com provávelqueda de produtividade.

As pessoas parecem estar atentas para o fato de que afelicidade depende mais do que tudo de relações. Mas nãoperceberam ainda que problemas como: depressão, suicídio,violência familiar ou alcoolismo podem estar ligados adificuldades de relacionamento, assim como o mau desempenho naescola e o fracasso no trabalho. É preciso desmistificar osenso comum de que relacionar-se é fácil, mecânico e algo que“simplesmente acontece”. Na verdade, é um processo complicadoe prolongado, com muitas dificuldades e desafios.Relacionamentos não acontecem simplesmente, têm que serconstruídos e preservados. E é em situações constrangedoras edifíceis que as habilidades de se construir e manter

relacionamentos são testadas até o limite. Pesquisas na áreacomprovam que pessoas que estão separadas de amigos tornam-seindecisas, ansiosas, desorientadas, infelizes e atédesestabilizadas emocionalmente, podendo experimentar mudançasde humor incomuns, até mesmo perda de controle, acessos deviolência e o próprio estresse. Foi descoberto que solitáriostendem a adotar um modelo de trabalho que cria problemas desaúde, freqüentemente trabalham demais e desenvolvem doençasque são conhecidas por derivar do estresse (DUCK, 1991).

A necessidade de afeição interpessoal significasentimentos mútuos ou recíprocos de amor aos outros e seramado, ou seja, sentir-se amado. Uma vez resolvidos osproblemas de controle, as pessoas começam a buscar integraçãoemocional. Surgem manifestações de hostilidade direta, ciúmes,apoio, afeto entre outros sentimentos. Cada um procuraconhecer as possibilidades de intercâmbio emocional eestabelecer limites quanto à intensidade e qualidade dastrocas afetivas. O clima do grupo pode oscilar entre momentosde grande harmonia e afeto e momentos de hostilidade,insatisfação e tensão, criando um ciclo de inclusão-controle-afeição que pode repetir-se várias vezes durante a vida de umgrupo, independente da sua duração.Bergamini (1996) destaca a importância da temática inclusão,controle e afeição ao afirmar que a abordagem de Schutz,visava “[...] deixar claro que tipo de necessidade está emjogo no relacionamento interpessoal, apontando um fato degrande importância que reside na busca do equilíbrio, que éconstantemente almejado, entre o comportamento da própriapessoa e dos demais com os quais lhe é dado interagir”(BERGAMINI, 1996, p. 87). Assim, percebe-se não só aimportância das tarefas e relacionamentos no ambienteorganizacional como também suas decorrências, que podem se darnum sentido inverso da desejada qualidade de vida no trabalho.De acordo com Faria e Meneghetti (2001, p.3) o trabalhador“[...] aceita, com excessiva passividade, as regrasorganizacionais sem questiona-la quanto a sua validade elegitimidade. Troca-se a submissão organizacional emdetrimento do reconhecimento social, construído ao longo davida e cobrado constantemente pela sociedade”. Talcomportamento se dá com o objetivo de se garantir um “bom”emprego, adquirir segurança e estabilidade financeira, bemcomo o reconhecimento social, por meio de um cargo ocupado

numa empresa. O que não se percebe de início é que junto comtudo isso vêm as cobranças e as exigências que, muitas vezes,estão acima da capacidade do ser humano. Faria e Meneghetti(2001, p.3) finalizam afirmando que “A não realização de um‘roteiro de sucesso’ social, imaginada como ideal pelasociedade, o levará a se tornar um exemplo de fracasso,desprezado e jogado à marginalidade”.

Assim, ao que parece, o ritmo frenético de vida, no qual otrabalho ocupa grande parte do tempo do ser humano, acabouprejudicando a saúde tanto mental como fisiológica daspessoas. Os transtornos mentais e de comportamento, têm setornado uma constante nos dias atuais. Eles são resultadosdesse contrato psíquico que rouba e aprisiona o ser humano emsuas teias, fazendo até com que o funcionário, muitas vezes,resista a gozar as próprias férias ou resista a se submeter atratamentos, quer sejam físicos ou psíquicos. Tudo isso,porque no discurso da modernidade, não é permitido fracassar.A necessidade de ter impera sobre o ser, porque só se éreconhecido como alguém se o sujeito mostrar o que tem. Ter éo atestado de sua capacidade laboral, de sua capacidade degerar renda para acumular bens.

Acredita-se que a necessidade de ser aceito, protegido eamado seja refletida na relação que o indivíduo tentaestabelecer com a organização. Contudo, é preciso estar alertaporque as organizações parecem romper com estes valores quandoeles se tornam inviáveis para sua manutenção.

4. Análise das entrevistasNeste capítulo foram desenvolvidos, o tratamento e a

análise dos dados coletados junto a trabalhadores do Banco X epara melhor entendimento, o conteúdo foi dividido nascategorias encontradas que são: sócio-demográficas; estilo devida; ambiente de trabalho; o tempo de afastamento; relaçõesfamiliares e sociais durante o quadro; conseqüências sobre ocomportamento pessoal; e relacionamento interpessoal após oretorno ao trabalho.

Em termos sócio-demográficos os entrevistados ficaramdivididos em 12 do sexo feminino e 10 do sexo masculino. Todossão casados; todos têm filhos (entre 1 a 3), cuja idade écompatível com a idade dos pais, ou seja, não foramencontrados filhos temporões. Os entrevistados encontram-se

com idade entre 42 e 53 anos. Em termos de trabalho, possuemde 18 a 29 anos de serviço no Banco X.

Durante o quadro do transtorno apresentaram um estilo devida sedentário, uma vez que 21 entrevistados não praticamnenhum tipo de atividade física e não gostam de sair de casa,preferindo um tipo de vida socialmente menos intensa.Afirmaram que seu estilo de vida não era assim, mas com oacometimento da doença passaram a ter um comportamentodiferente, apresentando mal-humor ao saírem de casa e aoencontrarem colegas do banco. Ficaram claras as dificuldadespara a convivência social, para a manutenção derelacionamentos interpessoais fora do círculo familiar comresistência a tudo que os colocasse em contato com o mundo,até falar ao telefone. Esses sintomas são descritos em OMS-CID10 (1993) como humor rebaixado e perda de interesse poratividades que normalmente são agradáveis.

Dentre os hábitos alimentares verificou-se que dentretodos, existem 15 que fumam e fazem ingestão de bebidaalcoólica em seu cotidiano. Quase metade dos casos teve iníciocom o quadro do transtorno. Segundo a OMS-CID 10 (1993, p.118) isso pode ser devido a “[...] a mudança de humor pode sermascarada por aspectos adicionais tais como irritabilidade,consumo excessivo de álcool, [...]. Ao que se questionar osentrevistados todos afirmaram que a bebida e o cigarrofuncionam como uma espécie de antídoto, diminuindo suasensação de incapacidade. Entre os sete restantes doisapresentaram problemas alimentares, havendo perdasignificativa de peso: um passou de 90 kg a 60 kg em seismeses e outro emagreceu cerca de 25 kg em oito meses. Houveregistro de um caso no qual o entrevistado teve problemas delibido. Essas características também fazem parte do quadro dostranstornos, conforme Dalgalarrondo (2008).

Metade dos entrevistados possuía algum tipo dehobby. Porém durante o quadroclínico nove não conseguiram se dedicar a ele. Jogar bola,pintar, bordar, tocar um instrumento, caminhar, ouvir músicae ler foram deixados de lado por tempo prolongado (de quatro adoze meses). Nesse caso a perda de interesse e prazer parecemclaros, como relatado: “Fiquei um ano praticamente em cima deuma cama, não queria ler, escrever, e nem ouvir música. Euvivia chorando, minha vida era chorar, chorar e chorar” (E2).

Os respondentes relataram vários fatores de risco no seuambiente de trabalho que interferiram na sua saúde física emental, tais como: excesso de trabalho, poucos funcionários,pressão das chefias e cliente, horas-extras freqüentes,ausência de pausas de trabalho, tarefas repetitivas,competição entre os colegas, ambiente estressante, falta deperspectiva de ascensão e falta de reconhecimento no trabalhodesenvolvido. Para os entrevistados esses fatores foram osmotivos que os levaram ao quadro do transtorno e,conseqüentemente, ao afastamento de suas atividades laborais.

Ao se observar duas unidades de funcionamento do Banco Xem um dia típico de funcionamento percebeu-se que o ritmo detrabalho é intenso e acelerado. O downsizing foi adotado pelaempresa como estratégia de uma política de redução de custos,o que parece ter agravado a sobrecarga de tarefas e aumentadoo ritmo da produção. Segundo 20 entrevistados, atualmente, obancário tem que ser capaz de desenvolver as tarefas queantes eram da responsabilidade de três, as vezes quatropessoas, “[...] é muito trabalho para poucos funcionários”(E6). Para os respondentes essa carga laboral gera um estado detensão e estresse no dia-a-dia da agência, principalmenteporque o funcionário tem medo de não conseguir desenvolver bemsuas atividades, de não dar conta de seu trabalho, gerando oreceio de “perder seu lugar”. É importante lembrar que existemdiscussões sobre a nova configuração do mundo globalizado e olugar que o ser humano ocupa nesse espaço. Segundo Carnoy(1999, p. 417) na visão do empregador do mundo neoliberal otrabalhador ideal é aquele que nunca dorme, não come, nembebe; não tem filhos e nunca despende tempo em processos desocialização fora do ambiente de trabalho. Trata-se de umaalegação de que os interesses da produção continuam emprimeiro lugar, em detrimento do ser humano. Esses argumentospodem ser vistos também por meio das verbalizações dosentrevistados quanto ao sistema de premiação porprodutividade no qual os bancários se vêm obrigados aatingirem as metas e os objetivos propostos pelo banco sem quehaja a oportunidade de se discutir tais “imposições”, como sereferem a elas. Para eles isso tem tornado o ambienteorganizacional cada vez mais competitivo e, às vezes, hostil.O fato de haver uma premiação parece não funcionar como umfator estimulador do desempenho entre os funcionários quevivenciaram algum tipo de transtorno mental ou de

comportamento (destaque para o estresse e a depressão).Segundo os participantes esse mecanismo de estímulo àprodutividade gerou muito mais sentimentos negativos do quepositivos, pois no primeiro momento em que uma meta não éatingida, independentemente da razão, há um intenso sentimentode frustração, insegurança e medo. Percebe-se aqui, conformeOMS-CID 10 (1993, p. 118) a auto-estima e auto-confiançareduzida e a dificuldade em continuar com o trabalho do dia-a-dia e das atividades sociais.

Todos os entrevistados consideraram-se bons profissionais,conhecedores do trabalho que executam, mas manifestaram umsentimento de inconformidade e de injustiça porque compreendemque as metas são ambiciosas e que nem todos conseguirãoatingi-las. Ao que parece a venda do serviço bancário vemganhando importância no momento da prestação dos serviços,requerendo habilidades que antes não eram necessárias. Todofuncionário passou a ser também um vendedor, mas nem todos têmperfil para isso. E segundo seis dos entrevistados“treinamentos de final de semana” não farão com que ashabilidades sejam adquiridas ou desenvolvidas. Cinco dosparticipantes foram enfáticos ao registrarem que preferem seabarrotar de outras tarefas a “fazer uma venda”.

Essa nova forma de organização das atividades dosbancários levou a uma constantepressão por parte das chefias e também dos usuários do banco.Para eles as cobranças nas reuniões eram exacerbadas e oconceito de times ou equipes de trabalho não funcionava, poisna opinião de 16 deles, existe desproporção entre os esforçosque os diferentes profissionais têm que envidar para que ameta da agência seja atingida. As reuniões passaram a ser,então, locais onde o estado de ânimo e a capacidade daspessoas eram “falsamente” estimuladas. Segundo 13 dosentrevistados havia muito mais “puxões de orelha” e “acusaçõesde incapacidade” do que um reforço positivo de seu desempenho.No cotidiano já estavam se tornando comuns os maus tratos edesacatos dos clientes, que queriam as prioridades doatendimento veiculadas na mídia. Para seis dos participantes ofinal do expediente era, a um só tempo, um alívio e um receio.Eles tinham medo de serem agredidos por clientes fora do bancoe sentiam que, finalmente mais um dia havia se passado. Outraqueixa recorrente foi quanto à pausa a que têm direito duranteo expediente ilustrada pela verbalização de E21: “Quando eu ia

sair para fazer minha pausa de descanso tinha cliente que atéme xingava porque queria ser atendido logo. Às vezes, ficavaaté com medo de sair”. Pela manhã acordavam antes da hora eficavam angustiados ao pensarem que teriam que adentrar omundo do trabalho novamente. Uma das entrevistadas revelou quedurante o processo tentou se suicidar, mostrando as cicatrizesnos pulso. Tais características também estão descritas no OMS-CID 10 (1993).

Por decorrência desse processo e de outras razõesapontadas todos os entrevistados disseram que ao final de umcerto tempo passaram a sentir ansiedade e agitação, porém comfalta de foco nas tarefas, o que os levou à busca demedicamentos e até a auto-medicação, ingerindo tanto osfármacos sintetizados industrialmente, quanto os fitoterápicosnaturais. Há registro de um caso no qual o entrevistado temhoje a consciência de que estava se tornando hipocondríaco(E22).

Todos entrevistados fizeram uso de medicamentosantidepressivos e/ou ansiolíticos. A verbalização de E11ilustra a questão: “[...] eu me sentia muito mal e para dormirentão só com os remédios”. Eles afirmaram que depois de umcerto tempo tiveram suas angústias e tensões diminuídas, masque também apresentaram uma certa “neutralidade emocional”.Passaram a não se importar com as coisas, tarefas e pessoas ea desenvolverem suas atividades de forma lenta, como no relatode E3: “Não tinha vontade de fazer nada, comecei a me afastarde todos. Era um sentimento de tristeza inexplicável. Só quempassa pela doença pode saber!”. A partir de um certo ponto foicomo se o acompanhamento médico e os medicamentos fossem os“advogados” de seu comportamento. Não que tivessem perdido omedo da demissão ou de serem destituídos de suas funções, masque “simplesmente passou a não fazer diferença” (E13). Foi comose perdessem “a noção do perigo (E8)”. Acredita-se que essecomportamento esteja descrito no OMS-CID 10 (1993, p. 118)como “falta de reatividade emocional” e “evidência objetiva deretardo”.

Quanto ao clima de cooperação entre os colegas de umamesma equipe de trabalho verificou-se que tanto o volume dastarefas quanto as cobranças fizeram com que as amizades e aconfiança ficassem “arranhadas”. Mais de 15 verbalizaçõesforam no sentido de que “as vezes, um quer ser mais que o

outro, puxar o tapete do outro, então não existe muita união”(E7).

Em termos da relação chefia-subordinado foram registradasreclamações da falta de perspectiva de ascensão profissionalde forma justa. Os entrevistados relataram que se dedicavammuito ao trabalho, mas nunca eram recompensados pela chefia.Tinham vontade de exercer outra função, mas não lhes era dadaoportunidade, porque os gerentes beneficiavam a uns e outrosnão. O sentimento de ter sido traído e não valorizado pelagerência foi constante nas falas dos entrevistados. Trêsdisseram que haviam passado em concurso interno e que nãoforam convocados para assumirem como gerentes. Em outros doiscasos, foram chamadas pessoas que, segundo as verbalizações,nem tinham sido aprovados. Foram também recorrentes asargumentações no sentido de que as oportunidades são desiguaise que as pessoas não são consultadas para mudarem de área oude agência (cinco respondentes). A título de ilustração tem-se: “Eu fui tratada com um lixo pelo meu gerente, fui trocadade agência sem nem me questionarem. Eu fui para a outraagência sem a minha vontade e isso me deixou muito triste edesmotivada” (E13). Isso caracteriza uma situação de conflitosrecorrentes na relação gerando um quadro de descontentamento edesestímulo que, quando associados ao outros elementos podedesencadear algum tipo de transtorno mental ou decomportamento (DALGALARRONDO, 2008).

No geral os entrevistados passaram por um afastamento deseis meses a dois anos, sendo 11 afastados por depressão, seispor LER/DORT e cinco por depressão, estresse e LER/DORT. Todosos entrevistado manifestaram grande sofrimento com o quechamaram “doença”, se isolando da vida. Em todos os casos otratamento médico foi fator fundamental para a recuperação,considerada lenta. Há quem ainda considere que não se encontraseguro de que o quadro do transtorno vivido tenha efetivamentese extinguido.

Quanto às relações familiares verificou-se que elas forammuito afetadas durante o processo da depressão, do estresse eda LER/DORT. Passadas as grandes dificuldades, oitofuncionários relataram que sabem que seus familiares devem terse sentido impotentes e tristes com seu adoecimento. Issoporque hoje percebem que eles próprios não saberiam comoajudar alguém passando por essas dificuldades. Eles sentiram osofrimento dos familiares, mas por sua vez também não

conseguiram se mover na direção de uma ação efetiva quepudesse mitigar a situação. Para dois dos entrevistados (E4 eE9) o quadro depressivo pelo qual passaram afetou o rendimentoescolar dos filhos. Segundo E16, as notas de sua filhadiminuíram e ela mesma reduziu suas atividades sociais,preferindo ficar em casa, preocupada com o pai. Em dois casosos filhos também foram acometidos de transtornos da mesmaordem, como pode-se observar pela fala de E20: “Minha filhateve depressão por causa da minha doença e até hoje faz

tratamento médico”. O que se vê então é a dificuldade emse separar emocionalmente os dois ambientes e suasconseqüências. Foi impossível aos trabalhadores passarem peloafastamento sem envolverem a família em seus problemaspessoais e de trabalho.

Ao final da licença médica retornaram ao banco, mascontinuam preocupados com seu desempenho, com o ambiente detrabalho e, sobretudo, com a convivência com as pessoas. Maisda metade dos entrevistados (13) alegou que se tornarampessoas facilmente irritáveis, sem paciência, que falam o quepensavam sem medir as conseqüências. Isso acabava gerandoconflitos com os colegas e principalmente com os gerentes.Segundo E17: “Minha colega diz que eu sou uma bomba prestes aexplodir”. Seis entrevistados afirmaram que estão conseguindomudar seu comportamento, que estão organizando melhor seutrabalho e estabelecendo prioridades, conforme relata E22:“Antes, tudo que alguém me pedia eu não conseguia dizer não,agora é diferente. Primeiro eu questiono qual a prioridade datarefa aí depois vejo se vou executar ou não. Hoje já consigodizer que não posso fazer algo, pois estou com muito serviço”.Outros três fizeram adaptações e manifestam ainda sentimentosque revelam a relação com o transtorno vivido. Exemplosaparecem nas seguintes verbalizações: “Hoje, faço minha pausade trabalho, que tenho direito. Antes achava que eu não podiaparar nem para ir ao banheiro” (E1); “Meu ritmo de trabalho,hoje, é mais lento e as pessoas não entendem e nemrespeitam. Isso magoa muito a gente” (E14) e “Eu aprendi comminha doença a ser mais devagar. E alguns colegas me chamam detartaruga” (E18). Portanto, percebe-se claramente asconseqüências sobre seu comportamento, pois quer seja de umaforma mais equilibrada, quer seja ainda de maneira temerosa,eles mudaram em relação ao ritmo de trabalho. Já não trabalhammais tanto quanto antes, vão mais devagar, pois querem mais

qualidade de vida e sabem que se trabalharem como antespoderão voltar a ficar doentes.

No entanto, tal comportamento tem apresentado problemasnas relações interpessoais (após o afastamento), pois a novaforma de ser é percebida como não aceita pelos colegas e muitomenos pelos gestores. Segundo os entrevistados eles são objetode chacota, de risos, de piadas, de cobrança e de escárnio.Esse tipo de relacionamento continua afetando o lado emocionale as manifestações relacionadas à insegurança e falta deconfiança fizerem-se presentes entre os 22 participantes dapesquisa. O que se pode verificar foi que ao retornarem doafastamento todos os entrevistados tiveram algum tipo dedesentendimento ou ficaram chateados com algum colega detrabalho. Para os participantes existe discriminação por partedos colegas que sempre fazem alguma “piadinha” a respeito dadoença que os acometeu. Segundo eles é comum os colegasafirmarem que o “o estressadinho faz corpo mole” (E19),“inventa doença” (E15), “é descuidado e por isso adoece” (E12),“é preguiçoso”, parece “porcelana”, é neurótico” ou“mentiroso”, o que caracteriza a falta de percepção sobrediferentes modos de ser e agir e o desrespeito à subjetividadedo outro, conforme Faria e Meneghetti (2001) relataram sobreas conseqüências de não se conseguir seguir um roteiro desucesso e ser considerado fracassado, desprezado emarginalizado. Segundo E16, não existe respeito por parte dealguns colegas em relação aos limites de atuação devido àsituação de saúde vivida por aquele que enfrentou uma doençapsicossomática. Percebeu-se que alguns ainda apresentam certaslimitações, impostas muitas vezes como conseqüência da doença,e que há aqueles que não gostam de trabalhar com eles,tornando esse aspecto uma fonte de conflito e insatisfaçãoentre as partes: “Eu não voltei 100% como antes, estou aptapara trabalhar, mas tenho limites e alguns colegas não osrespeitam e fazem pouco caso disso” (E5); “Um colega me disseuma vez para eu ir para casa, porque eu não tava (sic)produzindo nada mesmo! Eu comecei a discutir com ele, masdepois vi que não valeu a pena. Com o tempo você aprende a nãorelevar muitas coisas para não se sentir mais magoada” (E10).

Vários entrevistados relataram que ao retornarem doafastamento foram obrigados a fazer coisas lhes trouxedescontentamento. Entre elas deviam permanecer separados dos“normais”. Assim, em alguns casos foram criados setores

específicos para onde foram transferidos os “reabilitados”,que é uma expressão comum no ambiente pesquisado. “O problemaé que o empregado não volta com uma função definida, o quegera um sentimento de muita ansiedade e insegurança” (E2), pois“A gente não sabe o que vai fazer e tem a sensação de que onosso trabalho não é mais tão importante como era antes” (E7).Alguns têm sentimento de inutilidade ou até incapacidade, poisos próprios colegas os vêem assim. Essas atitudesdiscriminatórias para com os que regressam causam sofrimento,manifestado por lágrimas e medo, o que dificulta aestabilização de quem passa ou passou por um transtorno mentale de comportamento, aqui caracterizados mais como o estresse ea depressão. A verbalização de E6 ilustra os argumentos: “Eu mesentia um inútil e fui muito discriminado ao retornar aotrabalho, pois me coloraram para atender telefone, fazerserviço de estagiário e até trocar o papel do banheiro mepediram para eu fazer”.

Tais comportamentos podem acarretar um clima deinsatisfação, de falta de cooperação, de conflitos edesmotivação no funcionário, com conseqüências funestas não sóem meio à equipe, como também aos que fazem parte do ambientefamiliar e social. Conforme argumenta Duck (1991) as relaçõesinterpessoais não possuem uma delimitação de sua esfera deconseqüência, afetando pessoas de diferentes áreas deconvivência. O relacionamento fora do horário de trabalhotambém ficou prejudicado porque para evitar as “piadinhas” eaté mesmo para não falar mais sobre o assunto da doença, quedeixa o funcionário que passou pelo quadro muito irritado,todos os entrevistados disseram que não participam mais dasfestas da equipe e nem saem juntos para fazer um happy hour.

Quando perguntados em relação ao sentimento que existehoje em relação ao trabalho, os 22 participantes foramunânimes ao afirmar que se sentem desmotivados, desvalorizadose de alguma forma acham que as metas continuam inatingíveis,que não há como todos os funcionários terem altos desempenhoscomo os estabelecidos em função da grande disputa do mercado.

5. Considerações finaisVive-se num paradigma onde as empresas esperam contar com

super-heróis e não com seres humanos passíveis de falhas eerros e deixam de levar em consideração que as pessoas sãodiferentes no seu modo de ser. Toda a individualidade e os

processos de subjetivação parecem estar relegados, esquecendo-se ou desprezando-se o fato de que o corpo humano é um sistemacomplexo e delicado suscetível ao desgaste e à morte.

Como o problema central deste trabalho foi o deidentificar e descrever as conseqüências sobre as relaçõesinterpessoais decorrentes dos quadros de transtornos mentais ede comportamento (estresse e depressão), em um ambientebancário com pressão intensa sobre o cumprimento de metas eobjetivos, pode-se dizer que o propósito da pesquisa foiatingido.

Ao final da pesquisa foi possível chegar a algumasconsiderações finais, sem que elas tenham o significado deconclusões que encerram o assunto. A análise dos dadoscoletados junto a trabalhadores do Banco X pode serconfigurada conforme segue.

Em termos sócio-demográficos pode-se dizer que houve umequilíbrio quanto ao gênero e uma certa homogeneidade emrelação ao estado civil (todos casados) e com filhos em idadeproporcional à própria faixa etária na qual estão osparticipantes da pesquisa.

Como era de se esperar em quadros de estresse e depressãoos afastamentos se caracterizaram pelos sentimentos queconfiguram a doença e, também por quadros de DORT/LER que aeles parecem ligados.

Pode-se dizer que o estilo de vida dos entrevistadosdurante o transtorno foi sedentário e, de certa forma, anti-social, pois deixaram de conviver com os amigos e até defreqüentar ambientes religiosos. Nota-se que o acometimento dadoença mudou o comportamento daqueles que foram afastadosincluindo também a mudança de humor e a qualidade dosrelacionamentos. Tais aspectos ficaram claros quando osparticipantes evidenciaram o abandono de seus hobbies e daprática de alguma atividade física.

É importante registrar também que houve mudança noshábitos alimentares incluindo aspectos considerados nocivos àsaúde, que são a ingestão de bebida alcoólica e o uso do fumo.Em alguns casos as conseqüências foram drásticas, tais como aperda excessiva de peso e uma tentativa de suicídio. Houvetambém registro de perda da libido. Os principais fatores que conduziram aos transtornos vividospelos entrevistados foram: excesso de trabalho, pressão daschefias e cliente, horas-extras freqüentes, ausência de pausas

de trabalho, tarefas repetitivas, competição entre os colegas,ambiente estressante, falta de perspectiva de ascensão e faltade reconhecimento no trabalho desenvolvido. Esses fatoresprovocaram o despertar de sentimentos cujas conseqüências sefizeram sobre sua vida, seu comportamento e suas relações,resultando no afastamento de suas atividades laborais porincapacitação temporária.

Quanto ao ambiente de trabalho ele pareceu se configurardentro da tipicidade do que o trabalho de um banco exige, comdestaque para o que vem ocorrendo no mercado em termos dacompetitividade que ele exige. O tratamento dispensado pelosgestores também não se mostrou diferente de outrasorganizações que reforçam os altos desempenhos e atingimentode metas e, de certa forma, punem os empregados que nãoconseguem chegar ao patamar por eles esperado. No entanto, naopinião dos que se viram afastados pelos transtornos estudadoseles não possuem capacidade para lidar com as diferenças entreas pessoas, considerando todos dentro de um padrão que não foiestipulado quando iniciaram suas carreiras.

O ritmo acelerado e as exigências do mercado parecem terrestringido alguns direitos dos funcionários e aumentado atensão no ambiente de trabalho. Tais aspectos são evidenciadospelo aumento do número de reclamações e de ações contra essetipo de prestadores de serviços, o que parece ter levado ainstituição a aumentar a pressão sobre os trabalhadores. Tantoa necessidade de se fortalecer no mercado quanto o maiorconhecimento dos direitos do consumidor parecem ser elementosfortes da mudança do ritmo de trabalho em ambientesprestadores de serviço, como o caso dos bancos. Existempessoas que conseguem trabalhar sob pressão e outras não.Essas últimas conseguem manter seu comportamento e seussentimentos estáveis por um tempo, mas a mudança é inevitável.De início recorrem aos medicamentos e, podem, como nos casosestudados, serem obrigados ao afastamento por incapacidadetemporária.

As conseqüências sobre a vida, hábitos alimentares,práticas cotidianas e relações interpessoais daqueles que sevêem acometidos pelo estresse e pela depressão, são grandes.Há quem afirme que jamais serão os mesmos. Que nunca serecuperarão por completo.

Ao final da licença retornaram ao banco, mas continuampreocupados com seu desempenho, com o ambiente de trabalho e,

sobretudo, com a convivência com as pessoas. Ainda não sesentem plenos no gozo de sua capacidade laboral em virtude dasalterações em seus sentimentos, emoções e nas novas relaçõesestabelecidas no banco. O fato de fazerem valer seus direitosos coloca como pessoas ainda não aptas ao trabalho, semresistência, fracas, sujeitas a brincadeiras de mal gosto porparte dos colegas. Isso continua afetando o lado emocionalgerando insegurança e desconfiança por parte dos que retornamao serviço.

É importante destacar também que a organização parece nãoestar preparada para receber esses profissionais no momento doseu retorno, pois não existe um programa de reintegração aotrabalho. Nenhum dos 22 entrevistados recebeu orientaçõesquanto o seu retorno, em relação às suas novas atividades

Tudo isso gera um clima de insatisfação, descontentamento,conflito e desmotivação. Parece que as relações com os antigoscolegas não são passíveis de recuperação.

Percebeu-se que a família sofre muito durante todo oprocesso da doença, podendo as conseqüências serem estendidasa seus integrantes. Observou-se ainda que para a recuperação epreparação para o retorno do exercício laboral, ela exerce umpapel fundamental ao dar apoio e força para que o afastadovolte mais confiante para o trabalho. Os achados da pesquisamostram que as novas tecnologias levaram os bancos a umareestruturação que parece estar ligada aos transtornosestudados. Isso porque quando esses funcionários foramselecionados os cargos e funções tinham uma natureza. Com oadvento da tecnologia foi possível ao cliente fazer seuautoatendimento, o que provocou reestruturações nas funçõesdas inúmeras pessoas que atendiam nos caixas. O número degerentes de contas dentro do discurso do atendimentopersonalizado aumentou, mas com isso também vieram novasfunções para as quais o perfil desses profissionais pode nãose encaixar, como por exemplo as vendas, das quais reclamaram,resultando em desempenhos que não atendem ao que deles seespera e gerando a tensão que iniciou o processo do transtornovivenciado.

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