Metodos estudo com quirópteros

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Caderno La Salle XI, Canoas, v.2, n” 1, 280 p., 2004 TÉCNICAS DE CAMPO EMPREGADAS NO ESTUDO DE QUIRÓPTEROS Profª. Drª. Susi Missel Pacheco Curso de Ciências Biológicas, Departamento de Biologia, Universidade de Santa Cruz do Sul. [email protected]; Museu de Ciências e Tecnologia da PUCRS. Av. Ipiranga, 6681, Cx. Postal 1429, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil E-mail: [email protected]; [email protected] RESUMO Estudos com quirópteros exigem paci- Œncia e persistŒncia. Muitas vezes faz-se ne- cessÆrio o emprego de diversos mØtodos para a captura, conforme o tipo de ambiente e abri- go. Entre os principais mØtodos para a captura de morcegos estªo as redes de neblina, que sªo consideradas mais eficazes. AlØm disso, Ø necessÆrio o uso de luvas, lanternas e sacos de pano. TambØm sªo apresentadas tØcnicas de detecçªo com ultra-som, filmagem e noçıes bÆsicas para conservaçªo dos animais. PALAVRAS-CHAVE: Chiroptera, MØtodos de Campo, TØcnicas de Conservaçªo INTRODU˙ˆO Os morcegos sªo animais, comumente, nªo considerados carismÆticos. Geralmente, sªo repelidos pela sociedade devido aos mitos e às crenças que os cercam, e pela aparŒncia feia de algumas espØcies. Diferem da maioria dos mamíferos, devido ao hÆbito de voar. Apre- sentam como características diagnósticas os membros anteriores transformados em asas (CHIROPTERA: Chiro = mªo e Ptero = asas), o posicionamento em repouso de cabeça para baixo e um sistema de ecolocalizaçªo, que permite capturar as presas em movimento. O menor morcego e mamífero do Mundo Ø o tai- landŒs Craseonycteris tonglongyaii (Microchi- roptera), que pesa 1,0g. Pteropus giganteus (Megachiroptera), que vive na `sia, Ø a maior espØcie de morcego, alcançando 1,90m de envergadura de asas e cerca de 40cm de com- primento cabeça-corpo. Outras características importantes estªo relacionadas à biologia e ecologia desses animais. Em geral, dªo a luz a 1 ou 2 filhotes ao ano, exceto as espØcies do gŒnero Lasiurus, que geram de 3 a 5 filhotes/ ano. Possuem gestaçªo longa para o seu ta- manho corporal (entre 2 a 6 meses), cuidados parentais e alta longevidade, entre 10 e 30 anos de idade. Esses mamíferos possuem importan- tes características ecológicas devido à diversi- dade de hÆbitos alimentares. Atuam como dis- persores de sementes, e, portanto, refloresta- dores, polinizadores, controladores de popula- çıes de insetos e outros invertebrados, bem como de pequenos vertebrados. Suas fezes (guano) tŒm sido amplamente utilizadas como adubo orgânico em todo o mundo, pois sªo ricas em nitratos e nitritos (Bertonatti, 1996). Seus predadores sªo falconídeos e corujas, mamíferos oportunistas como os graxains ou cªes e gatos em ambiente urbano, serpentes, anfíbios e atØ mesmo aranhas e tubarıes. Atualmente, existem cerca de 1001 es- pØcies de morcegos em todo o mundo. HÆ aproximadamente 150 no Brasil (ZortØa, 2003). No Rio Grande do Sul, hÆ 35 espØcies distribu- ídas em quatro famílias: Noctilionidade - com uma œnica espØcie Noctilio leporinus, morce- go pescador, cuja principal característica Ø o lÆbio leporino e forte odor. Possui uma colora- çªo alaranjada e vive, em geral, em ocos de Ærvores próximos aos rios e açudes. Phyllosto- midae - família dos morcegos com a maior di-

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Caderno La Salle XI, Canoas, v.2, nº 1, 280 p., 2004

TÉCNICAS DE CAMPO EMPREGADASNO ESTUDO DE QUIRÓPTEROS

Profª. Drª. Susi Missel PachecoCurso de Ciências Biológicas, Departamento de Biologia,

Universidade de Santa Cruz do Sul. [email protected];Museu de Ciências e Tecnologia da PUCRS.

Av. Ipiranga, 6681, Cx. Postal 1429, Porto Alegre,Rio Grande do Sul, Brasil

E-mail: [email protected]; [email protected]

RESUMO

Estudos com quirópteros exigem paci-ência e persistência. Muitas vezes faz-se ne-cessário o emprego de diversos métodos paraa captura, conforme o tipo de ambiente e abri-go. Entre os principais métodos para a capturade morcegos estão as redes de neblina, quesão consideradas mais eficazes. Além disso, énecessário o uso de luvas, lanternas e sacosde pano. Também são apresentadas técnicasde detecção com ultra-som, filmagem e noçõesbásicas para conservação dos animais.

PALAVRAS-CHAVE: Chiroptera, Métodos deCampo, Técnicas de Conservação

INTRODUÇÃO

Os morcegos são animais, comumente,não considerados carismáticos. Geralmente,são repelidos pela sociedade devido aos mitose às crenças que os cercam, e pela �aparênciafeia� de algumas espécies. Diferem da maioriados mamíferos, devido ao hábito de voar. Apre-sentam como características diagnósticas osmembros anteriores transformados em asas(CHIROPTERA: Chiro = mão e Ptero = asas), oposicionamento em repouso de cabeça parabaixo e um sistema de ecolocalização, quepermite capturar as presas em movimento. Omenor morcego e mamífero do Mundo é o tai-landês Craseonycteris tonglongyaii (Microchi-roptera), que pesa 1,0g. Pteropus giganteus

(Megachiroptera), que vive na Ásia, é a maiorespécie de morcego, alcançando 1,90m deenvergadura de asas e cerca de 40cm de com-primento cabeça-corpo. Outras característicasimportantes estão relacionadas à biologia eecologia desses animais. Em geral, dão a luz a1 ou 2 filhotes ao ano, exceto as espécies dogênero Lasiurus, que geram de 3 a 5 filhotes/ano. Possuem gestação longa para o seu ta-manho corporal (entre 2 a 6 meses), cuidadosparentais e alta longevidade, entre 10 e 30 anosde idade. Esses mamíferos possuem importan-tes características ecológicas devido à diversi-dade de hábitos alimentares. Atuam como dis-persores de sementes, e, portanto, refloresta-dores, polinizadores, controladores de popula-ções de insetos e outros invertebrados, bemcomo de pequenos vertebrados. Suas fezes(guano) têm sido amplamente utilizadas comoadubo orgânico em todo o mundo, pois sãoricas em nitratos e nitritos (Bertonatti, 1996).Seus predadores são falconídeos e corujas,mamíferos oportunistas como os graxains oucães e gatos em ambiente urbano, serpentes,anfíbios e até mesmo aranhas e tubarões.

Atualmente, existem cerca de 1001 es-pécies de morcegos em todo o mundo. Háaproximadamente 150 no Brasil (Zortéa, 2003).No Rio Grande do Sul, há 35 espécies distribu-ídas em quatro famílias: Noctilionidade - comuma única espécie Noctilio leporinus, morce-go pescador, cuja principal característica é olábio leporino e forte odor. Possui uma colora-ção alaranjada e vive, em geral, em ocos deárvores próximos aos rios e açudes. Phyllosto-midae - família dos morcegos com a maior di-

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versidade de hábitos alimentares: néctar, pó-len, frutos, folhas, sangue, aves, mamíferos,anuros, répteis e invertebrados (insetos, ara-nhas, escorpiões). Possui como característicadiagnóstica a presença de uma estrutura trian-gular no rostro, a folha nasal. Vespertilionida-de - é a maior família de quirópteros com am-pla distribuição no mundo. São morcegos pe-quenos, porém com cores variadas (vermelho,dourado, grisalho, preto, castanho). A principalcaracterística do grupo é a presença da caudaenvolvida pelo uropatágio. Alimentam-se pre-dominantemente de insetos. Molossidade - fa-mília cujo hábito alimentar é exclusivamenteinsetívoro. São os morcegos popularmenteconhecidos como cauda de rato: parte da cau-da é livre e parte envolvida pelo uropatágio.No Rio Grande do Sul, é o grupo de morcegosque freqüentemente habita os forros de telha-dos no meio urbano e rural.

Os estudos com quirópteros exigempaciência, dedicação e persistência. Essa afir-mação é justificada, porque a) são animais quevoam durante o crepúsculo ou apenas à noi-te; b) podem formar colônias ou agrupamen-tos em folhagens de árvores copadas, ocosde árvores, forros de telhados, frestas entrerochas, furnas, locais em geral de difícil aces-so; c) são freqüentemente ágeis, fugindo dacaptura de pessoas menos experientes. Amaioria das espécies insetívoras e nectarívo-ras permanece em frestas entre rochas ou vi-gas de telhados com diâmetros em torno de1,0-2,0cm; d) em geral, utilizam diferentesáreas no interior dos abrigos durante o dia,inclusive, deslocando-se para outro local con-forme a sazonalidade. Algumas espécies pos-suem um abrigo diurno e outro, temporário,noturno, dificultando a correta identificaçãodos mesmos. Quando há segregação entremachos e fêmeas, estes se distribuem em di-ferentes áreas do abrigo ou formam gruposdistintos.

A escolha dos métodos que serão em-pregados para amostrar as espécies depende-rá dos objetivos e dos resultados esperados,bem como das peculiaridades de cada grupo.

O primeiro passo em qualquer estudo ésaber o máximo sobre a espécie alvo. É neces-

sário obter informações bibliográficas e identi-ficar os animais através de chaves taxonômi-cas e/ou com base em uma coleção de refe-rência. A seguir, deve-se procurar quais osmétodos mais apropriados para capturá-los ecomo usar cada técnica. Alguns estudos exi-gem métodos mais complexos para analisar,por exemplo, a reprodução, o crescimento, aecologia, a etologia.

Nenhum estudo com quirópteros, oucom qualquer outro grupo animal, pode serrealizado sem um método padrão. Assim, há,pelo menos, cinco categorias de métodos quepodem ser empregadas: 1) captura: com oauxilio de redes de neblina e de dossel, arma-dilha do tipo funil, puçás e captura manual; 2)estudos de eco-etologia: utilização de visornoturno, filmagens e acompanhamento como auxílio de dados biométricos, captura-mar-cação-recaptura através de anilhas, tatuagem,coleiras, cortes, e outros; 3) identificação deguildas ou de espécies: através da detecçãoacústica (ecolocalização), fotografias e filma-gens de longa duração; 4) estudos específi-cos, tais como atividade reprodutiva, ontoge-nia, dieta, ecologia, genética que utilizam umasérie de métodos como a triagem de fezes eanálise de conteúdo estomacal, análise dadentição (desgaste dentário e doenças perio-dontais), histologia de órgãos e tecidos, diafa-nização e coloração do esqueleto e cartilagem,DNA, cariotipagem. Estas técnicas necessitamde materiais e equipamentos como pinças, bis-turis, vidraria, paquímetros, balanças, micró-tomo, raio-x, diversas substâncias químicas; 5)coleções cientificas: fixação, conservação, ta-xidermia.

DESCRIÇÃO E APLICAÇÃO DOSMÉTODOS

CONCEITOS E COLEÇÕESÉ importante, antes de iniciar o es-

tudo, ter uma noção de taxonomia, classifica-ção, sistemática e nomenclatura, já que sãoconceitos, que, apesar de apresentarem algu-ma relação entre si, são distintos, e muitas ve-zes confundidos.

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Sistemática é o estudo das relações deparentesco entre os organismos, através daqual se comparam espécies diferentes e seformulam hipóteses sobre uma filogenia. Ascomparações são feitas com base nas caracte-rísticas morfológicas ou moleculares.

Taxonomia diz respeito às regras denomenclatura, tais como dar nomes às espéci-es, gêneros e famílias.

Classificação refere-se à prática de agru-par os táxons em categorias hierárquicas comofilo, ordem, família, espécie. A classificação idealdeve refletir a sistemática, ou seja, representaras relações de parentesco daquele grupo.

Nomenclatura nomeia os táxons, bemcomo define as regras para formar coleçõestaxonômicas, coletas em campo, rotulagem epublicações taxonômicas. É na nomenclaturaque encontramos a Etimologia, ou seja, o ramoda ciência que explica a origem dos nomes dasentidades estudadas. Estes nomes podem terorigem grega ou latina, ser simples ou com-postos; devem ser sempre escritos em Itálico.O nome do gênero é sempre escrito com aprimeira letra maiúscula e o nome da espécieé sempre escrito em minúsculo. Exemplo: Ta-darida brasiliensis (I. Geoffroy, 1824). Após onome da espécie, segue sempre o nome deseu classificador e da data. Mais detalhes po-dem ser encontrados em Papavero (1994).

Outro aspecto importante em qualquerestudo é a coleção. Segundo Papavero (1994),há dois tipos de coleções:

1. Coleções Didáticas: destinadas aoensino e empregadas na demonstração e ca-pacitação dos alunos. O material didático é fre-qüentemente substituído, pois podem ser da-nificados durante o manuseio. Em geral, utili-zam-se aqueles exemplares, cujos dados deprocedência estão incompletos, duvidosos ouque estejam parcialmente danificados.

2. Coleções Científicas ou de Pesquisa:denominadas de Patrimônio Nacional e Interna-cional. Normalmente, são utilizadas por pesqui-sadores interessados em comparar ou estudarespécies, sua distribuição, morfologia, genética,etc. Obrigatoriamente, devem possuir os dadosde procedência corretos, e acondicionados demaneira adequada. Estão sediadas em universi-

dades, instituições de pesquisa de âmbito fede-ral, estadual, municipal, ou particular, e organi-zações não governamentais. É imprescindívelque haja um curador nessas instituições, pois,muitas vezes, os estudos envolvem a permuta eo empréstimo de espécimes de coleções parauma correta identificação da espécie.

Estes dois tipos de coleções podem ser:

a) Particulares, quando os espécimes deum ou mais grupos taxonômicos pertencem aum colecionador (pessoa física);

b) Regionais, quando reúnem exempla-res ou grupos taxonômicos de uma determi-nada área ou região;

c) Especiais, que envolvem interesseeconômico e médico sanitário, por exemplo,parasitos intestinais ou pragas da agricultura(EMBRAPA, FIOCRUZ);

d) Inventários Faunísticos, para constru-ção de usinas hidrelétricas, rodovias, ou mes-mo para investigar áreas propícias para a cria-ção de Unidades de Conservação, e outros.

A Coleção de Tipos é uma coleção es-pecial, pois nem todas as instituições de pes-quisa a possuem. Seus exemplares servem paraidentificação de espécies já descritas (holóti-pos, lectótipos e neótipos), ou para compara-ção para descrição de novas espécies.

TÉCNICAS DE CAMPOQualquer estudo deve possuir um pla-

nejamento, ou seja, o projeto de pesquisa, deforma que os imprevistos não prejudiquem assaídas ao campo. Assim, sugere-se que algu-mas perguntas sejam feitas:

Quanto tempo eu tenho para realizar oprojeto?

Haverá infra-estrutura para empreen-dê-lo?

Orçamento: qual o custo máximo e mí-nimo para executá-lo?

Onde vou obter os recursos?

Qual área, região, formação vegetal, tipode construção é mais adequada para obter osresultados?

Como vou chegar até o local?

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Quais espécies podem ocorrer no localescolhido?

Quais serão os métodos empregadospara amostrar a espécie?

Quantas pessoas serão necessárias paraexecutar o estudo?

No local escolhido deverão ser demar-cados os pontos de coletas: trilhas distintas oudistâncias na mesma trilha; deverão ser mar-cadas árvores e furnas com colônias; deverãoser numeradas as vigas em construções. Emáreas abertas pode-se utilizar o GPS, a fim dese obter dados mais precisos de captura emovimento dos animais.

Materiais Necessários- Livro de Campo/Planilha no qual se-

rão registrados:

a) o local onde está sendo realizado oestudo: vila, rincão, município, cidade, estado,país, quilômetro da rodovia, coordenadas geo-gráficas ou UTM;

b) as datas das coletas/capturas;

c) o horário de início e final da ativida-de, e da captura dos animais;

d) os pontos de coletas: margem esquer-da do rio das Antas; trilha do pinheirão; oco daaraucária; viga III prédio 2; furna da bananeira;

e) o número de redes, o local da rede, onúmero do bolsão: rede 2, bolsão 3, trilha doPinheirão;

f) condições climáticas: pluviosidade,vento, temperatura, presença de estrelas, ne-voeiro, intensidade de luz, geada, neve, lua etc.

g) o nome do coletor;

h) o nome da espécie, gênero ou famí-lia; ou algum tipo de identificação: morcegosem cauda, com língua e focinho longo;

i) a sexagem;

j) a biometria, o peso e as característi-cas da morfologia externa;

k) o número do exemplar: é o númerode seu registro de campo. Ex.: SMP 0001;

l) etiquetagem ou rotulagem: a etiquetadeverá ser colocada junto com o espécime,esteja ele em líquido, a seco ou congelado (Fig.1 e 2).

N ° de co le ta : 001C lasse: M am m alia O rd em : C h irop te ra F am ília : M o lossid ae E sp éc ie: P rom ops nasu tus S exo: ? . D a ta : 17 .I I. 2001 L oca l:R S , S an ta C ru z do S u l C o le to r : P ach eco , S .M

P eso : 2 0 ,0 g C T: 9 5 ,0 m m O R : 1 2 ,2 0 m m T I : 1 7 ,0 5 m m P é c /u : 9 ,5 0 m m C A : 3 3 ,0 m m A N : 4 6 ,1 5 m mO b s: E ncontrado en tre telhas de cerâm ica , com ou tros do is m achos.

Figura 1. Modelo de etiqueta: A. frente; B. verso.

S M P 0 0 0 1

Figura 2. Modelo de etiqueta feito com rotuladora paracolocar em peles ou em material líquido.

- Licenças para a execução do estudo

Escolhido o local de amostragem e osmétodos que serão empregados, deve-se soli-citar uma licença de captura, coleta, transpor-te, fotografia e filmagens, acompanhado do pro-jeto de pesquisa para o Instituto Brasileiro deMeio Ambiente e dos Recursos Naturais Reno-váveis (IBAMA) ou para a Secretaria Estadualdo Meio Ambiente (SEMA), ou outros órgãos,conforme a finalidade e a localidade de execu-ção do estudo. Este procedimento evita abor-recimentos futuros, tais como apreensão domaterial científico por equipes fiscalizadoras.

- Material de campo

Materiais necessários para uma boaamostragem: a) redes de neblina; b) sacos depano; c) cordas para armar as redes; d) hastes;e) máquina fotográfica ou filmadora; f) lanter-nas cefálica e manual; g) paquímetro ou réguade precisão; h) pesola; i) luvas de couro ou ras-pa-de-couro; j) mochila.

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Métodos de AmostragemOs morcegos tendem a se abrigar en-

tre as folhagens de árvores copadas, furnas,cavernas, vãos entre prédios, vigas de forros,atrás de quadros, entre outros. Em geral, a pre-ferência por um determinado local poderá va-riar conforme a espécie. O local pode ser iden-tificado através de fezes, de marcas de gordu-ra junto aos telhados, de restos de alimentos(folhas, frutos, insetos, vertebrados) ou mesmopor meio de odor. Alguns morcegos podemconstruir tendas através de mordidas que que-bram as nervuras das folhas, alterando a confi-guração das mesmas (Zortéa, 1995; Cruz-Neto,2003). Não obstante, esses abrigos não sãofacilmente identificáveis, pois requerem algumconhecimento prático de visualização.

Assim, diferentes metodologias permi-tem amostrar os distintos hábitats dos morce-gos, seja em florestas, campo, cavernas, sejaem edificações. A seguir é apresentado cadaum dos métodos.

- Coleta manual: é utilizada no interior detelhados entre as vigas, nas paredes, entre osburacos de tijolos; nas furnas e cavernas, emreentrâncias de rochas e sob cascas de árvo-res. Para retirá-los, são usadas pinças longas(30cm), sacos de pano, lanternas e luvas-de-ras-pa-de-couro. Contudo, é importante ter o cui-dado de não causar ferimentos no morcego: éadequado capturá-lo através da cauda ou dodorso, já que o antebraço pode ser fraturado.Este método também é empregado para osmorcegos que procuram abrigo embaixo defolhas de Musa ou Heliconia. A forma corretade capturá-los é segurar toda a folha e fecharuma das saídas. A seguir coloca-se a folha naposição horizontal e, gentilmente, se sacode afolha no saquinho de pano. Os morcegos ten-dem a descer em direção à saída aberta e, en-tão, são removidos manualmente ou se deslo-cam para o interior do saco (Cruz-Neto, 2003).

- Puçás e similares: são utilizados paracapturar morcegos em abrigos cujas aberturassão pequenas. Em geral, o saco é de algodão,nylon de malha fina ou outro material flexível,com profundidade de 50 centímetros; o cabopode ser de alumínio, PVC, madeira, taquara,podendo ou não ser extensível. O emprego de

puçás requer habilidade com movimentos la-terais rápidos na direção dos morcegos. O puçádeve permanecer com a superfície de contatojunto ao grupo, e com jeitinho deslocá-los parao fundo do saco.

- Armadilha do tipo funil: consiste emum tubo ou funil de plástico duro que direcio-na o morcego para dentro de um saco de pano,polietileno ou de uma estrutura metálica tipogaiola (Kunz e Kurta, 1988; Esbérard, com.pess.). Seu uso é recomendado para locais nosquais os morcegos se deslocam com o auxiliodos antebraços e pés entre vigas, algerosas,telhas, ou em pequenas saliências entre rochas,ocos de árvores estreitos e altos. Esta armadi-lha permite ao morcego entrar, mas não o dei-xa sair. A abertura do saco deve ser montadasobre uma estrutura metálica maleável, que écolocada na saída do abrigo. Elas têm sidoempregadas para retirar morcegos de forrosde telhados de residências.

- Redes de neblina (mist net): é o mé-todo mais comum para a captura de morce-gos. As redes são constituídas de nylon oupoliéster preto ou azul-marinho. Possuem di-versas malhas e tamanhos que podem variarentre 3,0m até 12,0m de largura por 2,5m a3,0m de altura; o número de bolsões podevariar de 4 a 6. A principal vantagem em rela-ção a outros métodos é a leveza e a fácil dis-posição em áreas florestadas e de campo. Arede pode ser fixada através de cordas dis-postas nas guias em hastes de alumínio, ma-deira, fibra de carbono, em troncos e galhosde árvores (Fig. 3), ancorando-a com firmeza.A maioria das redes possui a primeira alçasuperior diferenciada; se não houver, sugere-se que a identifique amarrando um barbantecolorido ao redor da mesma. As alças devemser dispostas em seqüência, de forma que aprimeira alça superior passe por dentro dasdemais, respeitando a ordem correta, ou amar-rando uma corda a esta alça e às demais. Paraestender a rede, todas as alças são colocadasdiretamente na haste e, posteriormente, de-samarradas e separadas. Após abrir a rede,esta deve ser monitorada a cada 15-30 minu-tos. Dependendo da espécie de quirópterocapturado, este pode rasgar a rede com osdentes e escapar, ou se enlear na mesma, o

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que pode causar ferimentos ou morte do es-pécime. Principais desvantagens: as redesemaranham com facilidade e rasgam quandoo morcego é capturado. Sugere-se que nãosejam abertas em dias com muito vento, noi-tes de lua cheia e chuva, ou mesmo quando aumidade do ar exceder a 85%, já que essesfatores facilitam a detecção pelos morcegos.

Figura 3. Rede de neblina disposta em campo aberto.Note: as alças no suporte e os bolsões que facilitam acaptura dos morcegos. Fonte: Cuz-Neto (2003)

Existem diversas maneiras de dispor asredes: elas podem estar isoladas, uma em cadatrilha, dispersas no interior da mata, dispostasseqüencialmente (em transecto), distantes 30muma da outra, ou em diferentes formas: �T�, �V�,�Z� e �Y�. Em áreas abertas, e bordas de mata,as redes seqüenciais são mais efetivas. Os ar-roios, açudes, lagos e riachos podem ser amos-trados com redes configuradas transversalmen-te ou em forma de �V� ou �Z� (Kunz e Kurta1988, Nagorsen e Peterson, 1980).

A padronização dos métodos é básicapara fins de comparação com os locais amos-trados ou com a bibliografia existente. Prefe-rencialmente, devem ser utilizadas redes como mesmo tamanho e número por área. Atual-mente, vem sendo empregado um método queestima o esforço de captura, no qual é avaliadaa área de rede estendida pelo tempo de expo-sição. As unidades empregadas nesse cálculosão m2.h. Por exemplo, se você coloca 3 redesde 12,0m de comprimento e 3,0m de alturadurante um período de 4 dias e expostas 4,0horas, o esforço de captura será assim expres-so: 12,0m x 3,0m = 36,0m² multiplicado pelotempo de exposição e o número de dias emcampo, ou seja, 4,0h x 4 dias = 16h/d. Agora,multiplica-se 36,0 m² x 16h = 576 m2.h e, fi-nalmente, multiplica-se este valor pelo núme-ro de redes estendidas, 576 m2.h x 3 = 1728m2.h (Bianchoni e Straube, 2003). Como, nor-malmente, as redes são de tamanhos diferen-tes e a amostragem de uma área pode ter dife-rentes períodos de tempo, é importante apre-sentar os dados ajustados em relação a umamedida padrão.

Na maioria dos casos, as redes de ne-blina abrangem desde o solo até 3m de altura,restringindo a amostragem de espécies e limi-tando as guildas. A rede de dossel ou �canopynet� é inteira, alcançando 10, 20 e 25 metrosde altura e pode ser içada através de sistemasde roldanas em hastes ou em árvores, seme-lhante ao empregado por Rinehart e Kunz(2001). Nesse caso, é imprescindível ter equi-pamento e habilidade para subir em árvores.

Figura 4. Exemplode armadilha tipoharpa. Na figura A.disposta entre doisparedões rochosos(canyons); B. presaem uma trilha. Fon-te: Kunz & Kurta(1988).

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- Rede do tipo harpa (harp trap): a finali-dade desse equipamento é amostrar os morce-gos que forrageiam ao nível de dossel (Fig. 4).Essa rede apresenta como diferencial a forma:duas armações de madeira ou alumínio de 2,0mx 1,8m, das quais partem fios de nylon (pescaria)desencontrados, distantes 2,5cm, semelhante aosfios do instrumento musical denominado harpa.Ao passar pelos fios, o morcego fica preso e caiem bolsas de lona com fundo de polietileno oude gaiola, permanecendo ali até ser retirado. Oslocais mais propícios para a sua colocação sãopróximos a abrigos e sítios de alimentação, cur-sos de água ou ao longo de �corredores de vôo�tais com trilhas, clareiras, furnas e frestas entrerochas presentes em zonas escarpadas (penhas-cos) (Kunz e Kurta, 1988). A sua aplicação temtido bons resultados para a captura de morce-gos da família Molossidae e Vespertilionidae. Aprincipal desvantagem deste método é o peque-no tamanho da área amostrada quando compa-rado às redes comuns (Esberard, com. pess.).

- Detectores de ultra-som, visão noturna,filmagens, fotografias, observação direta: essesmétodos são utilizados, principalmente, paraidentificar os animais e averiguar quais os me-lhores locais para a colocação de redes ou paraa escolha de abrigos diurnos. Os detectores desom, como, por exemplo, o ANABAT, auxiliama identificação de espécies quando emitem sonsde alta freqüência, durante o deslocamento oua captura de alimento ( O´Farrell et al., 1999).Uma das vantagens é que pode ser utilizado noperíodo diurno na localização de possíveis abri-gos. O monóculo de visão noturna é vantajoso,pois permite a observação direta dos animais,sem a necessidade do uso de lanternas, mini-mizando a perturbação no interior do abrigo. Asmáquinas fotográficas e de filmagem com infra-vermelho auxiliam a observação e a documen-tação das colônias, dos movimentos de saída eretorno dos morcegos de seus abrigos ou o for-rageamento em árvores. Esses equipamentospodem ser empregados em abrigos diurnos coma finalidade de estudar o comportamento repro-dutivo ou a organização social das espécies.

Sempre que possível, utilize mais deum método em conjunto, a fim de aumentar aspossibilidades de amostragem e o esforço de

captura, já que não existem métodos 100% efi-cazes na captura e detecção de morcegos oude seus abrigos (Tuttle, 1976). Não coloque asarmadilhas no mesmo ponto em noites conse-cutivas, pois os morcegos podem evitá-las. Sali-enta-se que qualquer morcego que tenha sidocapturado por qualquer dos métodos apresen-tados tende a fugir com maior facilidade. No casode estudo no interior de abrigos, os morcegosacostumam-se com o observador, realizandosuas atividades normalmente.

Horário de Captura ou ObservaçãoNos estudos realizados no interior de

abrigos, o horário de observação pode sermais flexível: manhã, tarde, noite. Estudos so-bre atividade noturna devem ser realizados apartir do pôr-do-sol. Já, para armadilhas emcampo, o horário é um fator importante, asredes devem ser abertas a partir do pôr-do-sol (saída dos morcegos) e permanecer atéantes do nascer do sol (retorno). Em geral, otempo mínimo de amostragem com rede é de4h. No caso de armadilhas de funil, elas sãoutilizadas no período de saída dos morcegosde seus abrigos.

Manuseando o EspécimePara remover o morcego da rede é ne-

cessário treinamento e paciência, já que elese movimenta bastante tentando sair (Fig. 6).Deve-se prestar atenção no lado onde ele caiu,segurando-o com uma das mãos envolvidascom luvas e com a outra soltando a rede dosmembros, corpo e pescoço. Para morcegosgrandes, como Artibeus lituratus, Chrotopte-rus auritus e Noctilio leporinus, em geral, maisestressados, deve-se deixar a luva solta emum dos dedos para que ele morda ou lhesdar um pano ou borracha macia para ele mor-der. Conforme Cruz-Neto (2003), alguns mor-cegos podem morrer se permanecerem mui-to tempo na rede, como é o caso de morce-gos nectarívoros (Glossophaga soricina). Nes-ses casos, recomenda-se administrar uma so-lução açucarada (água com açúcar) em umaseringa de 20 ml para reanimar os morcegosestressados.

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Figura 6. Morcego preso na rede - Artibeus lituratus.Foto: Michael Lise

Os sacos de pano ou de contenção sãofeitos de algodão e fechados por cordão. Sãoindispensáveis para manter os morcegos retira-dos da rede. Os animais são colocados indivi-dualmente, porém, eventualmente, podem con-ter até três morcegos pequenos. Nunca se devecolocar indivíduos de espécies diferentes jun-tos, já que podem acabar se ferindo. Os indiví-duos podem permanecer entre 30 e 60 minu-tos nestes sacos antes de se iniciar as medidas,principalmente quando se deseja estudar hábi-tos alimentares. Em tese, este é o tempo neces-sário para que o alimento sofra ação no tratodigestivo e o peso se estabilize. Fêmeas gestan-tes ou lactantes devem ser rapidamente medi-das, pesadas, marcadas e soltas.

Dados BiométricosUma vez que os morcegos tenham sido

retirados da rede, deve-se proceder à toma-da de informações a respeito da identidadetaxonômica, tais como medidas corporais,sexo, massa corporal, morfologia externa, den-tição, condição reprodutiva, idade. Nem sem-pre é fácil identificar a espécie capturada emcondições de campo, à luz de lanternas. Opeso é um dado muito importante e que sem-pre deve ser verificado em campo, com o ani-mal vivo ou recém-morto. As balanças do tipoPesola são as mais utilizadas para se obter opeso, devido a facilidade de transporte, mani-pulação e leitura direta. Os exemplares sãogeralmente pesados no próprio saco de algo-

dão, cujo peso é subtraído posteriormente (Fig.5). Para facilitar esse procedimento, pode-semarcar o peso do saquinho com caneta. Con-tudo, se for usado por mais de 3-4 morcegos,é importante pesá-lo novamente, pois comoos morcegos urinam e defecam no mesmo,seu peso pode alterar. No caso das medidas,o antebraço, o comprimento cabeça-corpo, opolegar, o terceiro metacarpo e falanges e oquarto metacarpo e falanges devem ser men-surados com um paquímetro (Pacheco, 1994).Há paquímetros digitais e mecânicos. Em cam-po, aconselha-se o uso de paquímetros me-cânicos devido à umidade e ao descuido nahora de manusear o mamífero. Para examinaro morcego, segure-o de forma que a cabeçafique entre o polegar e o dedo indicador. Nestaposição, a asa é facilmente estendida e o an-tebraço mensurado. Para morcegos maiores,deve-se segurar firmemente os antebraçosusando o polegar e o dedo médio, e compri-mi-los em direção ao corpo. No entanto, cui-dado para não quebrar os braços. Tente imo-bilizar a cabeça com o dedo indicador paraevitar que ele morda.

Figura 5. Pesquisador pesando o morcego com a pe-sola no interior do saco de pano. Foto: Susi MisselPacheco.

Características da Morfologia ExternaDevem ser observadas as seguintes ca-

racterísticas, conforme Pacheco (1994):

a) Adultos: cor da pelagem, orelhas, cauda, uro-patágio, presença de rugas ou verrugas nos

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lábios. Nas fêmeas, a presença de mamas apa-rentes; por palpação, a presença de gravidez.As fêmeas lactantes podem ser reconhecidaspelas mamas desenvolvidas circundadas poruma área clara, quase sem pêlos e que, quan-do pressionadas, exsudam leite. Nos machos,presença de testículos abdominais ou ingui-nais. Contudo, no caso de machos, a presen-ça de testículos intumescidos (inguinais) nãosignifica que estejam no período fértil, poisisso pode indicar estresse.

b) Subadultos podem ser diferenciados de adul-tos pela presença de uma placa cartilagino-sa nas epífises e diáfises dos metacarpos efalanges, que indica que não estão fusiona-dos. Além disso, a pelagem tende a ser acin-zentada.

c) Jovens: presença ou ausência de pêlos, dis-tribuição dos pêlos à medida que surgem,a tonalidade da pele, a pigmentação dasunhas dos pés e do polegar, a espessuradas orelhas.

Cuidados após a ColetaPara guardar a rede, remova qualquer

tipo de empecilho que possa rasgá-la: galhos,grimpas, folhas, insetos. A seguir, retire as al-ças das hastes, permanecendo na haste um doslados, a fim de que a rede não arraste no solo.Posteriormente, dobre-a em forma de prega emintervalos regulares, não esquecendo de uniras pontas das alças. Se desejar que a rede fi-que montada no mesmo local, una as alças eenrole-a com movimentos circulares.

O transporte e o acondicionamento domaterial coletado deve, também, ser conside-rado, devido à distância do local de capturaaté o laboratório de preparo. Se houver neces-sidade de manter os morcegos vivos ou trans-portá-los para o laboratório, coloque-os emestruturas de contenção maiores (baldes, gai-olas, etc). No entanto, não deixe de hidratá-loscom água ou soro fisiológico. No caso de ani-mais mortos, quando não houver recipientesapropriados e a distância for grande, é acon-selhável preparar os exemplares no própriolocal de coleta. Caso contrário, tome as seguin-tes providências: congele e acondicione-os emsacos plásticos ou em recipientes metálicos,

de plástico, madeira ou isopor, mantendo-osvedados. Outra solução é injetar formol 10%na área abdominal e envolvê-los em algodãoembebido em formol, fixando-os.

Morte do AnimalHavendo necessidade de matar o mor-

cego, deve-se utilizar métodos que não cau-sem dor ou sacrifiquem-no. O método maisutilizado é a morte por inalação com éter sulfú-rico embebido em algodão no interior de umvidro ou saco plástico. O animal morre por pa-rada cardíaca. Lembre-se, é necessário ter éti-ca, não fazer o animal sofrer e não coletar alémdo necessário.

Técnicas de Marcação- Marcações temporárias:

� Descoloração do pêlo com peróxido de hi-drogênio: utilizada quando se necessita derespostas em um curto espaço de tempo.Duração: cerca de 40 dias, necessita ser re-tocada após esse período. Finalidade: mar-car um pequeno agrupamento de morcegos.

� Coloração dos pêlos com tinta não tóxica:possui a mesma durabilidade do método an-terior sendo utilizada para reconhecer indi-víduos de pequenos grupos.

� Corte do pêlo em regiões distintas do cor-po: tem sido empregado para verificar re-captura na mesma saída de campo, quandonão há a colocação de anilhas. Permanecepor cerca de 35 dias;

� Tatuagem numérica: realizada através de ali-cate de tatuador, encontrado em casas es-pecializadas de produtos veterinários, paraa marcação de orelhas de coelhos. Os furossão feitos no patágio e codificados de ma-neira que se identifique o indivíduo marca-do. Dura cerca de 180 dias. No caso dastatuagens ou furos no dactilopatágio, segun-do Esberard (com. pess.): �apresentam pou-ca durabilidade e necessitam ser refeitas emintervalos regulares; o método impossibilitaanálises de longa duração�.

� Marcação com �ferro quente� no patágio ouuropatágio: esta marcação é aplicada no pa-tágio ou uropatágio, sendo utilizados os dí-

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gitos das antigas máquinas mecânicas deescrever. É possível fazer um código de le-tras e números para marcar colônias commais de 1000 morcegos. No entanto, o fer-ro não pode ficar muito quente, pois fura opatágio. Esta marcação prevalece por cercade 90 dias.

Estas técnicas têm como vantagens afacilidade de serem utilizadas em campo, obaixo custo e o fato de que não machucamos morcegos. Como principais desvantagens,possuem curta duração: entre 30-40 diaspara a pintura, descoloração e corte dos pê-los; e entre 90-180, dias, para a marcaçãocom o alicate de tatuador e a marcação aquente.

- Marcações permanentes ou semi-perma-nentes:

� Emprego de fecho de bijuteria dourado ouprateado, no antebraço: tem como vantagempossuir vários tamanhos, ser facilmente apli-cável e encontrado em lojas de artigos deartesanatos. No entanto, sua maior desvan-tagem reside em não apresentar qualquertipo de marcação diferencial. Só é válido paradizer que o animal foi recapturado. Pode serretirado pelo morcego.

� Colocação de anilhas plásticas ou metálicasno antebraço ou no polegar, no caso de me-gaquirópteros: deve-se prestar atenção aodiâmetro da anilha, pois ela deve ser ligeira-mente superior ao diâmetro do antebraço.A anilha é inserida com o auxílio de um apli-cador, que é fornecido pelo fabricante. Aprincipal vantagem é que este método é em-pregado mundialmente. As anilhas podemser plásticas ou metálicas e são todas nume-radas até 1000. De acordo com o fabrican-te, há códigos, de letras e números identifi-cando as anilhas por pesquisador ou institui-ção de pesquisa. As principais desvantagenssão as lesões que podem causar infecçãono antebraço, além do custo elevado devidoà importação. No caso de anilhas plásticas,os números são pintados com tinta, e fre-qüentemente é perdido, já que os morce-gos mordem as anilhas na tentativa de reti-rá-las; para espécies maiores como Noctilio

e Chrotopterus, devem ser utilizadas anilhasmetálicas, pois as plásticas são facilmente re-tiradas.

� Colocação de colares com amarras plásticas:são as mesmas utilizadas para fechar malo-tes nos correios e bancos, com cilindros plás-ticos/encapamento de fio colorido. Esta téc-nica vem sendo empregada pelo Dr. CarlosEsbérard e por alunos da UFMG. Possui comovantagem a fácil aplicação. É maleável e nãolimita os movimentos dos animais; o peso éadequado a todas as espécies de morcegos.E fina para permitir os movimentos normaisda cabeça. Os cilindros plásticos coloridossão os mesmos empregados na coberturados fios de monofilamento de cobre de1,5mm. Estes fios são cortados a cada 2-3mm, formando anéis. Este fio/capa possuipelo menos sete cores. É possível adotar paracada cor uma codificação, o que permiteidentificar até 3.999 indivíduos (Esbérard eDaemon, 1999). Além disso, possuem baixocusto e são encontrados em qualquer partedo país. Conforme o autor, pode-se utilizarum máximo de 14 anéis coloridos permitin-do que a coleira tenha um diâmetro de até22,65mm, adaptável às menores espéciescomo Glossophaga soricina. Como desvan-tagem, as coleiras podem causar lesões aoredor do pescoço se não forem colocadascorretamente.

Técnicas Básicas de Conservação (baseadoem Vizotto e Taddei, 1973; Nagorsen e Peter-son, 1980)

- Via Líquida

1) Fixação em formol 10%

Após a morte do animal, quando se de-seja preservá-lo em líquido, adiciona-se formol10% nas cavidades abdominal e torácica e nosmúsculos através de uma seringa e agulha fina(20ml). Esta é a maneira correta de fixá-lo.A seguir, deixa-se por um período de 3 a 5dias imerso em formol 10%. Quanto mais tem-po o exemplar for deixado no formol, mais rijoele fica. Posteriormente, retira-se desse fixadore coloca-se o material em álcool 70%, que é oconservante. Para fazer formol 10%, utiliza-se

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a relação de 1 parte de formol 40% para 9partes de água.

2) Conservação em álcool 70%

Grande parte das coleções científicasestá conservada em álcool 70%. Para fazer essasolução, utiliza-se uma relação de 7 partes deálcool 96° GL ou álcool absoluto para 3 partesde água. Após retirar o morcego do formol, lava-se em água corrente, e coloca-se em álcool70%. Com um pincel, retire as bolhas entre asorelhas, antebraço, tíbia e pêlos.

Os órgãos cuja finalidade seja banco detecidos, histologia e exames parasitológicosdevem ser guardados em álcool absoluto ou96º GL ou em outra solução específica paraposterior utilização.

- Via Seca

É comumente empregada na conserva-ção de ossos, pêlos, dentes, entre outros. Nocaso de peles é necessário utilizar procedimen-tos que garantam a durabilidade e a resistência.

1) Taxidermia

É utilizada nos processos de mumifica-ção. Sua finalidade é preservar as espécies, parafins científicos, reconstituindo-as da mesmaforma quando desempenhavam um papel nanatureza (peças de museus/dioramas) ou comopeças achatadas dispostas em gavetas paracoleções científicas.

Procedimento: A partir da morte do animal: a)fecham-se todos os orifícios naturais com al-godão (boca, ouvidos, nariz, ânus, vagina, cloa-ca, etc); b) congela-se (se longe do laboratório)ou inicia-se o processo de retirada da pele. 1.Faz-se um corte na região ventral com o auxi-lio de bisturi ou tesoura; 2. Destaca-se os mem-bros, e utiliza-se serragem para evitar que apele fique úmida, ou com sangue; 3. Corta-sea tíbia e retira-se a cauda; 4. Destaca-se a pelecom o auxílio do bisturi, até chegar no úmero;5. Retira-se o úmero; 6. Destaca-se o corpo doanimal até atingir a região cefálica. Neste pon-to, é necessário calma e cuidado para retirar apele ao redor: 6a) dos olhos, 6b) das orelhasexternas, 6c) rostro (=focinho) e 6d) boca; 7.Após a retirada da pele, guarda-se o corpo do

animal (líquido ou congelado), e trata-se a pelecom substâncias conservantes: sulfato de alu-mínio (alúmem), borato de sódio (bórax), oumesmo arsênico. Estas substâncias são aplica-das juntas na proporção de 1:1:1. A seguir,preenche-se o espaço com algodão ou esto-pa, coloca-se arame na cauda, membros ante-riores e inferiores e, dá-se a forma desejada; 8.Costura-se a pele e se coloca numa placa deparafina ou de cortiça para fixá-la com alfine-tes, juntamente com a etiqueta de identifica-ção. Registra-se que alguns taxidermistas nãoretiram mais os ossos longos dos membrosanteriores e posteriores, nem a cauda. Paratanto, retiram todos os tendões, músculos egordura, colocando bórax, alúmen e arsênicodiretamente no osso.

2) Preparação do esqueleto através de produ-tos químicos

No caso de carcaças de animais mor-tos ou de crânios e esqueleto completo, pre-sentes nos abrigos, deve-se limpá-los da se-guinte forma:

1. Faça o procedimento quando tiver tempode controlar o clareamento e a limpeza dosossos. 2. Se contiverem partes muscularesdo animal, os ossos devem ser descarnadosmanualmente, e colocados em um copo bé-quer ou vasilha de vidro com uma soluçãode 1 parte de hipoclorito de sódio, 4 partesde água e 1 parte de peróxido de hidrogê-nio, para cada 100ml de solução. 3. É neces-sário controlar o tempo: 15 minutos, pois sãoanimais com ossos frágeis. 4. Quando partedos tendões e resíduos musculares estive-rem soltos, lava-se os ossos em água corren-te (5 a 10 minutos) e, com o auxílio de umaagulha histológica, pinça de ponta fina, espá-tula, bisturi, tesoura, retire os resíduos res-tantes. 6. Lave-os novamente em água cor-rente e deixe-os secar. 7. Se necessário re-pita os procedimentos 2 a 6. 8. Quando oesqueleto ou o crânio e a mandíbula estive-rem limpos e secos, devem ser etiquetadoscom o número correspondente ao do espé-cime em líquido ou da pele, e colocados empotes de filme ou sacos plásticos.

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Coleta de VestígiosMuitas vezes, antes de definir se a área

é propicia para o estudo, pode-se verificar apresença de vestígios, que indiquem se há apresença de morcegos. Estes vestígios podemser: frutos caídos no solo, sementes, folhas/ra-mos, restos de insetos ou artrópodes, carca-ças de animais, pelotas de coruja, regurgitosde serpentes, fezes, vocalizações audíveis e dealta freqüência, esqueletos, etc. Em geral, es-ses dados são fundamentais para indicar a pre-sença de espécies em inventários de fauna e/ou flora de EIAs, PCAs e outros, quando hápouco tempo para investigar a presença deespécies em um local.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como verificado, existem diversos mé-todos que podem ser aplicados conforme oobjetivo do trabalho a ser executado. Nesseartigo não foram abordados exaustivamentetodos os métodos, mas se priorizou por mos-trar aqueles que vem sendo realizados no es-tado e no país. Cabe salientar, que as técnicasaqui fornecidas, excetuando a forma de captu-ra, podem ser aplicadas para morcegos e, even-tualmente, para outros mamíferos e vertebra-dos. Mas, outras podem ser adaptadas confor-me a necessidade ou criatividade do pesqui-sador.

Abaixo constam sites interessantes paraseu estudo. Boa Sorte!

http://www.avinet.com - redes, armadilhas, lan-ternas, anilhas, redes de dossel (�canopy nets�)

http://www.batcon.com- Bat Conservation Inter-national (BCI) publicações, fomento à pesqui-sa, encontros internacionais, abrigos artificiais

http://www.forestry-suppliers.com - visor notur-no

http://www.titley.com.au - modelo ANABAT,binóculo de observação noturna

http://www.baumgarten.com coleiras

http://www.morcegolivre.com.br - informaçõessobre morcegos

http://www.casadosmorcegos.com.br - informa-ções sobre morcegos

http://www.rio.rj.gov.br/riozoo/morcego/projeto_morcegos.htm - Projeto Morcegos Ur-banos, coleiras

AGRADECIMENTOS

Agradeço aos amigos: Dr. Carlos Esbé-rard pelas dicas e pelo material fornecido emseu site sobre o Projeto Morcegos Urbanos eno Curso de Capacitação de Técnicos da Áreade Saúde do Governo de Minas Gerais; aoMédico Veterinário Msc. Michael Lise pela fotodo morcego preso na rede.

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