Guerra e Paz em Almada (1147-1217)

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Crescêncio Manuel Gutierrez de Oliveira Ferreira GUERRA E PAZ EM ALMADA (1147-1217) Relatório de Investigação Seminário II Origem e Desenvolvimento do Municipalismo em Portugal Ano letivo 2013-2014

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Crescêncio Manuel Gutierrez de Oliveira Ferreira

GUERRA E PAZ EM ALMADA

(1147-1217)

Relatório de Investigação

Seminário II

Origem e Desenvolvimento do Municipalismo em Portugal

Ano letivo 2013-2014

Seminário II - Origem e Desenvolvimento do Municipalismo em Portugal – RELATÓRIO DE INVESTIGAÇÃO Ano letivo – 2013-2014

NOME: Crescêncio Ferreira NÚMERO: 1000692 E-mail: [email protected]

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Índice

Introdução ........................................................................................................................3

Metodologia .......................................................................................................................5

1147 – A guerra. Cruzados em Almada .......................................................................................6

1170 – Foral particular de D. Afonso Henriques aos mouros forros .....................................................9

1186 – Da Ordem de Santiago ................................................................................................ 13

1190 – Foral de D. Sancho I à vila de Almada ............................................................................. 16

1217 – A paz. D. Afonso II confirma o foral aos mouros forros de 1170 .............................................. 19

Conclusão ....................................................................................................................... 21

Fontes e Bibliografia .......................................................................................................... 22

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Introdução

“Na margem do rio, a sul, em frente a Lisboa, está o Castelo de Almada, que é assim

chamado porque o mar alteroso atira (para a margem) pepitas de ouro. Assim, quando chega

o inverno, deslocam-se para esse castelo os habitantes da região para trabalharem na jazida

até ao fim do inverno. É uma das maravilhas desta terra, que vimos pessoalmente.” (AL-

IDRISI, Opus Geographicum, séc. XII)1

“A sul do rio fica Almada, região abundante de vinhas, figos e romãs. A terra ali é tão fértil

de searas, que da mesma semente se recolhe o fruto duas vezes, é rica de mel e celebrada

pelas montarias de animais.” (R., De Expugnatione Lyxbonensi, séc. XII)2

Almada, terra maravilhosa, rica e fértil, tanto aos olhos dos árabes como dos cristãos que a

conheceram e dela teceram os supracitados elogios, em pleno século XII, tempo de cruzadas e de

nascimento de um novo reino, Portugal. Situada no Garb, o território mais ocidental do Al-Andaluz,

como era então designada a Península Ibérica, Al-Madan3 ficava no caminho da Reconquista cristã.

Desde o século VIII que no Al-Andaluz se iniciara um processo de islamização progressiva, onde,

ainda assim, tinham coabitado de forma mais ou menos pacífica comunidades de cristãos-moçárabes,

judeus e muçulmanos.4

Guerra e paz em Almada. Hoje, a maior cidade da Outra Banda, na Margem Sul do Tejo, com

autonomia e vida próprias, como e de que forma foi outrora envolvida em cenários de guerra? Quais

os mecanismos de defesa e povoamento utilizados pelos primeiros monarcas neste contexto? É isso

que tentaremos explicar neste relatório, através da análise de cinco momentos da vida de Almada, no

período decorrido entre 1147 e 1217:

1147 – A guerra. Cruzados em Almada. Nesta data, durante a conquista de Lisboa por D.

Afonso Henriques, cruzados tomam aos mouros a vila de Almada. Chega-nos o relato em primeira

1 Apud SIDARUS, Adel; REIS, António - Lisboa e seu termo segundo os geógrafos árabes. Arqueologia Medieval [em linha]. Porto: Edições Afrontamento, Lda., vol.7 (2001), p.50 atual. s/d. [consult. 8 Abr. 2014]. Disponível na Internet: <URL: http://www.camertola.pt/en/medieval-archaeology-journal/arqueologia-medieval-n%C2%BA-7> 2 Apud ALVES, José F., apresentação e notas – Conquista de Lisboa aos mouros em 1147. Lisboa: Livros Horizonte, 2004. 3 Ou “a mina” (de ouro), em árabe. Embora esta seja a explicação mais comumente aceite para a origem do topónimo Almada, RAMOS defende a hipótese deste derivar antes do termo al-madna (almádena, torre), referindo-se à torre altaneira duma mesquita que lá existiria. RAMOS, Sebastião C. – Da origem do topónimo Almada. Almada: Edição de autor, com o apoio da Câmara Municipal de Almada, 1991, p.67-69, 83-84. 4 Pelo menos até à chegada dos Almorávidas à Península, no final do século XI. TORRES, Cláudio – O Garb-Al-Andaluz. In MATTOSO, José dir. – História de Portugal. Vol. I. [s.l.]: Círculo de Leitores, 1992, p.407.

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mão de um cruzado inglês, provavelmente clérigo e que se identifica sumariamente como R., numa

carta dirigida a um seu compatriota, Osb. de Baldr.5

1170 – Foral particular de D. Afonso Henriques aos mouros forros de Almada, Lisboa,

Palmela e Alcácer. Esta carta de alforria, se por um lado lhes concede proteção e autonomia, por

outro lado atribui-lhes obrigações fiscais e a prestação de certos serviços.

1186 – Da Ordem de Santiago. Neste ano, D. Sancho I doa6 à Ordem militar de Santiago as

vilas de Arruda, Alcácer, Almada e Palmela. O objetivo é a proteção do território conquistado.

1190 – Foral de D. Sancho I à vila de Almada. Este importante documento constitui uma

concessão régia aos habitantes do concelho de Almada, definindo regras de ordem tributária e penal,

e permitindo a autonomia do município, gerido pela figura do Alcaide e pela sua máquina

administrativa.7

1217 – A paz. D. Afonso II confirma o foral aos mouros forros de 1170. Com a tomada

definitiva de Alcácer do Sal, Almada terá adquirido provavelmente a estabilidade económica e social

que lhe permitiria a aplicação de facto do Foral de 11908. É neste mesmo ano que o neto de D.

Afonso Henriques confirma o foral de 1170 aos mouros forros.

As fontes impressas consultadas foram: a) o Foral de Almada de 1190, segundo a transcrição

publicada na Portugaliae Monumenta Histórica, de Alexandre Herculano, conforme reproduzida no

livro Foral de Almada 1190, da autoria de Alexandre Flores; b) a Carta de Segurança de 1170,

transcrita do Livro 4 de Inquirições de D. Afonso III, constante da publicação Almada na História -

Boletim de Fontes Documentais, e cuja tradução foi retirada do livro Os forais de Almada e seu

termo de Alexandre Flores; c) a Carta de um Cruzado Inglês de 1147 (De Expugnatione Lyxbonensi),

tradução portuguesa do original latino de J.A. de Oliveira, conforme consta do livro Conquista de

Lisboa aos Mouros em 1147, de José Alves e d) o Livro dos Copos, conforme apresentado por Luís

Adão da Fonseca na publicação Militarium Ordinum Analecta. A referenciação completa destas

obras, cuja seleção se deveu ao facto de conterem elementos considerados essenciais para um melhor

entendimento dos acontecimentos que iremos de seguida aqui narrar, consta do capítulo final deste

trabalho - Fontes e Bibliografia.

5 Osberno é o nome mais comumente atribuído ao cruzado, mas ALVES argumenta em favor de R., opção que preferimos usar neste relatório. A questão está em determinar, com base no texto em latim, quem é o autor da carta e quem é o seu destinatário, se Osb. de Baldr. ou se R. ALVES, cit.2, p.9,10. 6 Ou confirma doação anterior. Veja-se nota de rodapé 57. 7 FLORES, Alexandre M. – Foral de Almada 1190. Almada: Câmara Municipal de Almada, 1992, p.9-11. 8 MATTOSO, José – Almada no tempo de D. Sancho I. Almada: Câmara Municipal de Almada, 1991, p.22.

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Metodologia

Tendo por base uma abordagem diacrónica de Almada ao longo de setenta anos da sua

história, no período compreendido entre a conquista de Lisboa e Almada aos mouros em 1147 e a

tomada final de Alcácer do Sal em 1217, e passando por alguns eventos marcantes nesse ínterim,

acima descritos na Introdução, serão desta forma apresentados os temas da Reconquista Cristã e da

definição do território nacional, em particular nos detalhes afetos ao município de Almada,

nomeadamente os costumes, a administração e o poder local.

A informação utilizada foi recolhida de diversas fontes:

por consulta ao Arquivo Histórico de Almada, onde nos foi sobretudo facilitada

documentação impressa, dada a escassez de manuscritos do período em análise,

da Biblioteca Municipal de Almada,

de bibliotecas particulares e

de diversos sítios académicos ou de referência na Internet.

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1147 – A guerra. Cruzados em Almada

“Deus Vult” (Urbano II)9

Deus assim o quer! - terá sido com esta expressão que o papa Urbano II, no concílio de

Clermont em 1095, deu início às Cruzadas, que se estenderiam pelos dois séculos seguintes. Era o

tempo da luta contra o infiel, que se traduziu rapidamente na luta contra todo aquele que não fosse

católico ou que se opusesse ao papado. O conceito de guerra santa (a “guerra justa” de Santo

Agostinho) permitia ao papa conceder aos cruzados uma moratória sobre as suas dívidas, a promessa

de remissão das penitências terrestres e assim, a santificação do ato de matar o “outro”.10

A Segunda

Cruzada teria início em 1145, com impacto no reino nascente de Portugal. A bem ver, o único

sucesso desta cruzada seria a conquista de Lisboa.

Em Compostela, as supostas relíquias de São Tiago tornaram o local o destino de milhares de

peregrinos e fizeram com que o santo fosse considerado o patrono da Reconquista.11

No Al-Andaluz, a partir de 1090, os reinos taifas seriam sucessivamente conquistados pelos

berberes marroquinos Almorávidas, colocando em perigo o Condado Portucalense a partir de 1111,

com a retomada de Santarém. Mas a fragmentação do império almorávida a que se seguiu um

segundo período de taifas, daria aos reinos cristãos ibéricos a oportunidade de retomarem o processo

da Reconquista.12

Em Coimbra fixar-se-á D. Afonso Henriques a partir de 1131, numa movimentação

geoestratégica quer de aproximação da fronteira muçulmana quer de afastamento da “velha nobreza

de sangue” que o rodeava.13

Com a vitória sobre os mouros na batalha de Ourique em 1139, nascerá

mais um mito das origens, neste caso da nacionalidade portuguesa, o chamado “milagre de Ourique”.

O jovem D. Afonso Henriques, que iria então nos seus trintas, passa a partir daí a autointitular-se

Portugalensium Rex, rei dos portugueses.14

Em Outubro de 1143, na Conferência de Zamora, o

9 Apud CHINAZZI, Paolo - Gli ordini cavallereschi: Storie di confraternite militari. Roma: GAIA srl - Edizioni Univ. Romane, 2013, p.82. Atual. s/d. [consult. 1 Maio 2014]. Disponível na Internet: <URL: http://books.google.pt/books?id=oVgLAQAAQBAJ&pg=PA82&dq=deus+vult+clermont&hl=en&sa=X&ei=rIFiU7K1NaS07QbU8IEI&ved=0CFEQ6AEwBQ#v=onepage&q=deus%20vult%20clermont&f=false> 10 NICHOLAS, David - A evolução do mundo medieval. Mem Martins: Publicações Europa-América, 1999, pp. 290-294. 11 NICHOLAS, cit.10, p.291. 12 SOUSA, Bernardo V. – Idade Média (Séculos XI-XV). In RAMOS coord. – História de Portugal. 7ª edição. Lisboa: A Esfera dos Livros, 2009, p.41,42. 13 SOUSA, cit.12, p.30. 14 AMARAL, Diogo Freitas do – D. Afonso Henriques. 18ª edição. Lisboa: Bertrand Editora, 2005, p.75,76,85,86.

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Imperador de Espanha, D. Afonso VII, reconhecerá D. Afonso Henriques como rei, embora na

posição de seu vassalo.15

Em Dezembro desse mesmo ano, o rei enviará uma carta ao papa - Claves

regni -, oferecendo-se como seu vassalo, numa jogada tática de afirmação da independência nacional

face a D. Afonso VII, por troca de vassalagem.16

E chegamos ao ano da graça de 1147. Tínhamos rei, o contexto internacional era favorável e o

inimigo estava enfraquecido, apesar do avanço recente de novas tribos berberes do Norte de África,

desta feita os Almóadas. Estavam criadas as condições para o avanço das forças de D. Afonso

Henriques, que conquistariam primeiro Santarém no mês de março, dando assim início ao processo

de “tomada da linha do Tejo”17

, essencial para a continuação da expansão a sul das fronteiras

nacionais. Sintra e Palmela cairiam na sequência da conquista de Lisboa, Almada, porém, capitularia

antes, devido a eventos circunstanciais que analisaremos de seguida.

Debrucemo-nos então sobre a carta do cruzado inglês - De Expugnatione Lyxbonensi -, a

fonte histórica mais relevante sobre a conquista de Lisboa aos mouros em 1147. Ao que tudo indica,

escrita por R., testemunha presencial dos acontecimentos, desde a partida, em maio, dos navios

cruzados de Dartmouth, até à tomada de Lisboa, em novembro, após dezassete semanas de cerco.

Passadas algumas peripécias, chegam os cruzados ao Porto, onde o bispo desta cidade lhes

transmitirá uma mensagem de D. Afonso Henriques, concretamente um convite para o ajudarem na

conquista de Lisboa, para onde teria partido dez dias antes. O destino de Jerusalém pode esperar, diz:

“Não vos seduza a pressa de seguirdes viagem, porque não é digno de louvor ter estado em

Jerusalém, mas ter vivido retamente”18

. Era-lhes prometido “dinheiro, conforme o permitir a riqueza

do tesouro real”19

, o que os terá motivado a aceitar o desafio, a somar-se à perspetiva de saque.

E eis que chegam finalmente a Lisboa, perto da foz do Tejo, donde avistam Almada, a tal

“região abundante de vinhas, figos e romãs (…) fértil de searas, (…) rica de mel”, nas palavras de R.,

supracitadas na introdução. Teria então a cidade de Lisboa sessenta mil famílias, sobrelotada pelos

habitantes expulsos de Santarém, por “todos os nobres de Sintra, Almada e Palmela”, assim como de

mercadores estrangeiros.20

Do encontro com o rei, os cruzados, apesar de algo desconfiados em

relação às suas promessas, acordaram finalmente num contrato, após o que foram enviados

15 AMARAL, cit.14, p.97. 16 AMARAL, cit.14, p.99-101. Para o autor, o ato de vassalagem ao papa constituiu “o momento decisivo da independência de Portugal”. Mas seria somente com a bula Manifestis Probatum, em 1179, que D. Afonso Henriques seria finalmente reconhecido oficialmente pelo papa como rei de Portugal. SOUSA, cit.10, p.38. 17 VENTURA, Margarida G. – 1096-1297. A definição das fronteiras. Paço de Arcos: Impresa Publishing, 2007, p.49. 18 Apud ALVES, cit.2, p.26. 19 Idem, p.29. 20 ALVES, cit.2, p.31.

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parlamentários à cidade. O discurso destes – o arcebispo de Braga e o bispo do Porto – não

convenceria os sitiados, que rejeitaram prontamente a proposta de rendição: “Nunca foi nossa

intenção entregar-vos a cidade pacificamente (…) ide-vos daqui, pois só a ferros se abrirão as portas

da cidade”21

. E começa o longo cerco; estamos no mês de julho.

É neste ínterim, provavelmente em setembro, que ocorrerá o ataque a Almada. Uns quantos

cruzados decidiram atravessar o rio e ir pescar na margem sul, “visto a praia naquele litoral ser mais

favorável aos pescadores”22

, ao que lhes sobreveio um ataque dos mouros, resultando em muitos

mortos do lado cristão e cinco prisioneiros bretões.

A resposta não se faria esperar. Os cruzados, tendo decidido da deslocação de “duzentos

guerreiros e quinhentos auxiliares” para, em represália, saquearem Almada, acabam, após desistência

dos flamengos e colonenses, por enviar somente “trinta guerreiros, dirigidos por Sahério de

Archelles, acompanhados de mais de cem soldados auxiliares”.23

O resultado seria dramático para o

inimigo: mortos, acima de quinhentos mouros, cativos, cerca de trezentos e cabeças decapitadas, mais

de oitenta, tudo num só dia. De acordo com o relato de R., a principal preocupação dos mouros no

seguimento do massacre terá sido a de enterrar devidamente os mortos:

“Logo, porém, que os mouros viram das muralhas essas cabeças espetadas nas lanças, saem

para fora a pedir-nos, suplicantes, que lhes entregássemos as cabeças decepadas, que com muitos

prantos e gritos levaram para o sopé das muralhas. Ouviu-se, durante toda a noite, quase por todos

os lados da cidade, a voz da sua dor e as lamentações compungidas do seu pranto”.24

Com a carnificina concluída e o terror instalado, ficava assim “livre o caminho para

Almada”25…

Nos finais de outubro, seria então a vez de tomar e saquear Lisboa. No meio dos muitos

cadáveres, arrastavam-se “mouros”, proclamando: “Maria boa, boa Maria!”26

, certamente um sinal da

presença de cristãos-moçárabes no meio dos sitiados.

21 Apud ALVES, cit.2, p.42. 22 Idem, p.52. 23 Ibidem. 24 Ibidem. 25 Ibidem. 26 Idem, p.70.

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1170 – Foral particular de D. Afonso Henriques aos mouros forros

“Em nome de Deus Amem. Eu Rey Dom Affonso de Portugal enseembra com

meu filho Rey Dom Sancho faço carta de fieldade, e firmidooen a vós Mouros,

que soodes forros em Lixboa, e em Almada, e em Palmella, e em Alcácer”

(Foral de 1170)27

Nos anos que se seguiram à tomada de Lisboa, a estratégia de expansão do território

prosseguiria com a conquista a sul do Tejo. Em 1151, D. Afonso Henriques tentaria, sem sucesso,

tomar Alcácer do Sal, mas consegui-lo-ia em 1158, tomando no ano seguinte as praças-fortes de

Évora e Beja, esta última de forma definitiva em 1162. Sete anos mais tarde, em 1169, na sequência

de um pedido de ajuda do bandoleiro Geraldo sem Pavor para conquistar Badajoz, D. Afonso

Henriques avança sobre esta praça mas perderia a batalha perante as forças conjuntas de muçulmanos

e do rei Fernando II de Leão – é o famoso desastre de Badajoz, em que o rei de Portugal é feito

prisioneiro, só sendo libertado após devolução de territórios. Este evento, nas palavras de Mattoso,

“marcou o ponto final da ofensiva portuguesa do século XII”.28

E eis-nos chegados a 1170, ano em que o nosso rei arma cavaleiro o seu filho, D. Sancho,

futuro rei de Portugal, e em que nasce a Ordem de Santiago, em Cáceres. Mas é também o ano em

que é atribuída a primeira carta de alforria a mouros livres residentes em Portugal, em concreto aos

mouros forros de Lisboa, Almada, Palmela e Alcácer. Alexandre Herculano publicá-la-á como

“foral” enquanto que Marcelo Caetano a designará simplesmente como “carta de segurança e

privilégio”, por questões relacionadas com “mecanismos jurídico-políticos”.29

Mas o importante,

independentemente da tipologia que lhe for atribuída, é que este foral particular aos mouros forros

criou um precedente e um modelo para futuros diplomas do género.30

Foi uma demonstração de que

os reis da Reconquista precisavam do contributo destes mouros livres para firmar à terra as

populações recém-conquistadas, razão pela qual lhes terão poupado as vidas.31

27 Apud FLORES, cit.7, p.39,40. 28 MATTOSO, cit. 8, p.10,11. 29 BARROS, Mª Filomena – Tempos e espaços de Mouros. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2007, p.42,43. 30 São conhecidos mais três: o foral aos mouros forros de Silves, Tavira, Loulé e Santa Maria de Faro, em 1269, o de Évora, em 1273 e o de Moura, em 1296. BARROS, cit.29, p.44. 31 SOUSA, cit.12, p.43,44.

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Curiosamente, todos os forais às populações islâmicas antecederam os forais às populações

cristãs dessas mesmas praças32

, o que parece denotar da necessidade de estatuir primeiro aquelas.

Barros aventa a hipótese de fazer parte da geoestratégia militar de D. Afonso Henriques em

concentrar estas populações numa zona fora do eixo de avanço das suas forças, orientadas, após

terem assegurado a linha do Tejo, na conquista mais a leste – Évora, Badajoz.33

Aliada a uma

estratégia política de proteção dos vencidos (aliás, bem patentes nos episódios das conquistas de

Lisboa e Silves34

), encontramos também uma estratégia económica de ocupação do reino em

expansão, praticamente despovoado, garantindo que os mouros se dedicavam a trabalhar a terra ou a

atividades “de caráter industrial e mercantil”.35

Passemos então à análise da “cartam hereditatis36

et firmitudinis vobis mauris qui estis

forri”37

em Lisboa, Almada, Palmela e Alcácer, de 1147. O texto começa pela atribuição dos seus

direitos – “assy que em minha terra nenhuum mal, e sem razom nom recebades” -, da sua autonomia

– “que nenhuum Christaaõ, nem Judeu sobre vos aja poder de vos empecer” -, sendo o poder dos

julgar da competência exclusiva do alcaide por eles eleito – “mais aquelle, que vós da gente, e fe

vossa sobre vós por Alquaide enlegerdes, esse medês vos julgue.”38

39

A seguir vêm os deveres, ou seja, impostos - numa base anual, a paga dum morabitino

(“maravidis”), a alfitra, o azaque, a dízima sobre o trabalho – e serviços – “e todallas minhas vinhas

adubedes, e vendades os meos figos, e o meu azeite”-, reservando para o rei um terço do lucro da

venda. A agricultura era, portanto, não somente a principal atividade das comunidades mouriscas mas

32 O foral de Lisboa data de 1179, o de Palmela de 1185, o de Almada de 1190 e, mais tarde, o de Alcácer do Sal, que data de 1218, todos posteriores ao foral de 1170 a estas mesmas fortalezas. BARROS, cit.29, p.91,92. 33 BARROS, cit.29, p.91,92. 34 No ato de rendição de Lisboa em 1147, comparem-se as atitudes dos colonenses e flamengos, que atacam os sitiados em fuga, contra a vontade de D. Afonso Henriques, que pretendia que estes saíssem em paz. Na rendição de Silves em 1189, sucederia o mesmo: os cruzados flamengos, para além do saque, de que D. Sancho I até prescindia, pretendiam ainda eliminar todos os mouros, contra a vontade expressa do rei: “choque de mentalidades entre os portugueses e os cruzados do Norte da Europa”. HENRIQUES, Pedro - Os Portugueses e as Cruzadas (Séculos XII-XIV). Porto: Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2011. Dissertação de Mestrado em História Medieval e do Renascimento, p42-44, 56-58. Atual. s/d. [consult. 18 Abr. 2014]. Disponível na Internet: <URL: http://hdl.handle.net/10216/57428> 35 FLORES, Alexandre M. – Carta de Segurança dada por D. Afonso Henriques aos mouros forros de Lisboa, Almada, Palmela e Alcácer em 1170. Almada na História - Boletim de Fontes Documentais. Almada: Divisão de História Local e Arquivo Histórico Municipal, nº1 (Janeiro-Junho 2001), p.11. 36 Apesar do original rezar conforme supracitado, Alexandre Herculano substituiu a palavra latina hereditatis pelo seu sinónimo fidelitatis, mais próximo da tradução portuguesa “fidelidade”. Apud HERCULANO, Alexandre - Portugaliae Monumenta Historica. Leges et Consuetudines [em linha], vol.I, fasc.III. Lisboa: Academia de Ciências de Lisboa, 1863, p.396. Atual. s/d. [consult. 15 Abr. 2014]. Disponível na Internet: <URL: http://purl.pt/12270/4/> 37 Apud FLORES, cit.35, p.13. 38 Apud HERCULANO, cit.36, p.396. 39 BARROS, cit.29, p.41.

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também uma grande fonte de riqueza para o reino.40

A doação ocorreu em Coimbra, por D. Afonso

Henriques e seu filho, D. Sancho, em Março de 1170, “Era [de César] de mil e duzentos e oito

annos”.41

A carta de foral terá tido mão árabe. Barros sugere que a sua redação estaria “em

conformidade com as normas do direito islâmico”42

, mercê da presença continuada no nosso

território de elites intelectuais muçulmanas. Kemnitz vai mais longe, analisando as palavras árabes

inseridas no texto em latim, como: a) “alcaide” (al-ka’id), cuja utilização nesta carta presumirá a

continuação do modo tradicional de administração da justiça na comunidade muçulmana e a

manutenção da sua “identidade religiosa e cultural”43

; b) “alfitra” (al-fitr) e c) “azaque” (zakat), esta

com origem no Alcorão. Sustenta ainda que esta legislação não passou dum mero decalque da

legislação em uso no Al-Andalus ao tempo da dominação islâmica, baseada no conceito de

“dhimma”, um tipo de contrato que a autoridade islâmica fazia com as comunidades cristãs e judaicas

residentes no seu seio, cujos elementos, os “dhimmi” ou protegidos, tinham assim direitos e deveres,

recebendo proteção e pagando em troca impostos adicionais. Com o avanço da Reconquista cristã, a

situação agora invertera-se, mas o modelo permanecera.44

Mas perguntamos: qual o impacto que este foral teve em Almada? Barros é de opinião que,

dado o caráter efémero das comunas de mouros forros de Almada, Palmela e Alcácer, devido tanto à

ofensiva e reconquista das mesmas pelos almóadas em 1190 e 1191, como à entrega destas praças à

Ordem de Santiago, o seu “estatuto é um tanto duvidoso (…) não se registando qualquer referência

documental a uma hipotética continuidade comunitária islâmica”45

nem em Almada nem em Palmela,

cujos elementos se terão deslocado para a comuna de Setúbal46

. Na realidade, só a comuna de Lisboa

teria permanecido ativa o tempo suficiente para que o seu foral fosse aplicado e servisse de modelo

para os restantes forais cem anos depois (ver nota de rodapé nº30).

40 FLORES, Alexandre M., NABAIS; António J. – Os forais de Almada e seu termo. Almada: Câmaras Municipais de Almada e Seixal, 1983, p.52. 41 Apud HERCULANO, cit.36, p.396. 42 BARROS, cit.29, p91. 43 KEMNITZ, Eva-Maria - A construção de uma nova sociedade: o caso específico da minoria moura. Revista de Guimarães [em linha]. Guimarães: Casa de Sarmento, n.º 106, 1996, p.164. Atual. s/d. [consult. 18 Abr. 2014]. Disponível na Internet: <URL: http://www.csarmento.uminho.pt/ndat_63.asp?filtro_ano=1996> 44 KEMNITZ, cit.43, p.164-166. 45 BARROS, cit.29, p.47, 53. 46 BARROS, Mª Filomena - A comuna muçulmana de Lisboa: paradigma institucional. Arqueologia Medieval [em linha]. Porto: Edições Afrontamento, Lda., vol.7 (2001), p.244. Atual. s/d. [consult. 8 Abr. 2014]. Disponível na Internet: <URL: http://www.camertola.pt/en/medieval-archaeology-journal/arqueologia-medieval-n%C2%BA-7>

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Não saberemos assim se voltaria a repetir-se em Almada, depois de 1147, o grito do muslim

de chamamento à oração, imaginado por Ramos, do alto duma falésia em frente a Lisboa, na torre

duma mesquita qualquer:

“Hai âla essalah!” (Vinde para a oração!)47

47 RAMOS, Sebastião C. – Da origem do topónimo Almada. Almada: Edição de autor, com o apoio da Câmara Municipal de Almada, 1991, p.68-69.

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1186 – Da Ordem de Santiago

“Rompí, corté, abollé, y dije y hice

más que en el orbe caballero andante;

fui diestro, fui valiente, fui arrogante;

mil agravios vengué, cien mil deshice.”

(CERVANTES)48

A lenda do cavaleiro andante nasce das campanhas militares promovidas pela cristandade

contra os infiéis, a partir do século XI. Em particular, seria o papa Gregório VII a recriar o conceito

de miles Christi. O sistema de primogenitura da nobreza, para impedir a divisão da herança e

consequente perda patrimonial, levaria muitos “filhos segundos” a tentar a sua sorte na aventura

militar em defesa da fé cristã.49

As Cruzadas abriam assim a possibilidade a estes cavaleiros de

enriquecerem, ao mesmo tempo que eram santificados.

É precisamente neste contexto de guerra não somente “justa” mas também “santa” que

surgirão as primeiras Ordens Religiosas Militares no início do século XII, nomeadamente a Ordem

do Templo, inspirada no ideal de pobreza cisterciense promovido por Bernardo de Claraval, e cujos

monges cavaleiros protegiam os peregrinos a Jerusalém dos ataques muçulmanos, e a Ordem do

Hospital, que lhes prestava assistência. As Ordens Religiosas Militares serviam também o propósito

hegemónico do papado50

, à época em plena ascensão na Europa, com toda a cristandade, liderada

pelo papa e unida contra o infiel muçulmano, numa síntese de violência justificada por um bem

superior.

Estas Ordens internacionais, que respondiam diretamente ao papado, enquadravam-se, no

entanto, nas estruturas dos reinos onde estavam estabelecidas, promovendo as Cruzadas junto da

nobreza local. Na segunda metade do século XII surgirão Ordens de foro ibérico, como a Ordem de

Avis e a Ordem de Santiago, que terão um papel fundamental na Reconquista e consequente

48 CERVANTES SAAVEDRA, Miguel de – Don Quijote de La Mancha. Parte I [em linha]. Madrid: Francisco de Robles, 1604, p.22. Atual. s/d. [consult. 24 Abr. 2014]. Disponível na Internet: <URL:http://quijote.bne.es/libro.html> 49 CARDINI, Franco – A expansão do Ocidente: as cruzadas. In SARAIVA, José Hermano dir. – História Universal. Vol. IV. Lisboa: Publicações Alfa, Lisboa, 1985, p.161,162. 50 FERNANDES, Mª Cristina R.S. – A Ordem Militar de Santiago no século XIV. Porto: Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2002, p31. Dissertação de Mestrado em História Medieval e do Renascimento [em linha]. Atual. s/d. [consult. 25 Abr. 2014]. Disponível na Internet: <URL: <http://repositorio-aberto.up.pt/bitstream/10216/18660/2/000080531.pdf>

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povoamento do território, motivo pelo qual as doações reais deste período foram sempre na

fronteira.51

A Ordem de Santiago, à qual dedicaremos as próximas linhas, surgiu como irmandade em

Cáceres no ano de 1170 (talvez já existindo desde 1169 como confraria de cavaleiros)52

, sendo que

no ano seguinte o bispo de Santiago de Compostela a reconheceria como Ordem, e quatro anos mais

tarde, em 1175, o papa Alexandre III confirmaria a sua Regra através da bula Benedictus Dei.53

Em Portugal, a Ordem de Santiago receberia em 1172, das mãos de D. Afonso Henriques, a

Vila de Arruda e o Castelo de Monsanto, com a ressalva de “que os bens ficassem sob o controlo de

freires residentes no reino”54

. O rei tinha as suas reservas em relação à Ordem, pois esta era

patrocinada por Fernando II de Leão, que o aprisionara três anos antes aquando do “desastre de

Badajoz”, e estava sediada em Cáceres, uma das terras que Geraldo sem Pavor tivera de devolver na

altura aos almóadas, parceiros do rei de Leão.55

Mas, reservas aparte, a crescente pressão muçulmana

e o facto dum sobrinho de D. Afonso Henriques pertencer à Ordem, jogaram em favor do rei lhes

fazer as doações acima referidas, bem como Abrantes em 117356

.

No mês de outubro de 1186, D. Sancho I doa57

à Ordem de Santiago os castelos de Almada,

Alcácer, Palmela e Arruda, com todos os seus termos e direitos reais:

“ego Sancius Dei gracia Portugalensis rex (…) facio cartam donacionis et firmitudinis

perpetue vobis dom no Saneio Fernamdi Dei gracia Millicie Sancti Jacobi Magistro et fratribus

vestris presentibus et futuris de illis meis castellis, scillicer (sic), Alcaçar, Palmela, Almadana e

51 FERNANDES, cit.50, p.37,38. 52 Idem, p.45. 53 FERREIRA, Mª Isabel R. – A normativa das ordens militares portuguesas. Porto: Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2004, p.11. Dissertação de doutoramento em História [em linha]. Atual. s/d. [consult. 25 Abr. 2014]. Disponível na Internet: <URL: http://hdl.handle.net/10216/19652> 54 OLIVAL, Fernanda; OLIVEIRA, Luís F. – SANTIAGO, Ordem de [em linha]. In FRANCO, José E.; MOURÃO, José A.; GOMS, Ana C.C. - Dicionário Histórico das Ordens e instituições afins em Portugal. [s.l.]: Gradiva, 2010, p.596. Atual. s/d. [consult. 25 Abr. 2014]. Disponível na Internet: <URL: http://hdl.handle.net/10174/2572> 55 MATTOSO, José – História de Portugal. Vol. II. [s.l.]: Círculo de Leitores, 1993, p.77,78. 56 OLIVAL, cit.54, p.596. 57 A leitura desta carta de per si faria supor que Almada só foi entregue à Ordem de Santiago em 1186. Porém, a bula de 1175 já referia esta localidade, assim como Alcácer e Arruda, como pertenças da Ordem: “As quaes cousas quisemos declarar estas por seus próprios nomes (…) Alcacer com suas pertenças, Almada com suas pertenças, Aruda com suas pertenças…” (Apud MENDES, Francisco J.S. – A criação da rede paroquial na Península de Setúbal (1147-1385). Lisboa: Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 2010, p.46. Tese de mestrado em história medieval [em linha]. Atual. s/d. [consult. 25 Abr. 2014]. Disponível na Internet: <URL: repositorio.ul.pt/bitstream/10451/2065/1/23168_ulfl072318_tm.pdf>). Ademais, a bula de 1184 do papa Lúcio III, que confirma as posses da Ordem, volta, aparentemente, a referir Almada e Alcácer: “Almadana cum suis pertinenciis» e «Aliasar cum suis pertinenciis” (MENDES, p.48). Alguns historiadores classificam a bula de 1175 como não autêntica, outros aceitam o texto. MENDES avança com várias hipóteses de solução, explanadas nas páginas 46 a 49 da obra aqui citada.

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Arruda. Damus itaque vobis atque concedimus prenominata castella cum omnibus suis terminis

novis et veteribus…”58

Estas doações, que tinham como condição que a Ordem servisse o rei e seus sucessores -

“condicione ut mihi et filliis meis et nostris successoribus cum eis obediendo serviatis”59

-,

obedeciam a uma estratégia de “continuidade da defesa da linha do Tejo, protegendo-se Lisboa e o

tráfego fluvial do Sado”.60

Com os ataques almóadas de 1191, que destruíram o castelo de Almada, a vila terá ficado

abandonada até à sua reconquista cristã, entre 1195 e 1198. Em 1218, após a conquista de Alcácer, o

rei D. Sancho II voltaria a confirmar a doação de seu pai à Ordem de Santiago:

“Ego Alfonssus II Dei gracia Portugalensis rex (…) presenti pagina cartam illam quam pater

meus rex donnus Sancius inclite memorie de castris illis, videlicet, Alquazar, Palmella, Almadana et

Aarruda fecit donno Sancio Fernamdi Magistro Millicie Sancti Jacobi suisque successoribus in

perpetuum.”61

No ano de 1297, o rei D. Dinis, através de uma carta de escambo, incorporará a vila de

Almada na coroa, dando em troca à Ordem de Santiago as vilas de Almodôvar e Ourique e os

castelos de Monchique e Aljezur.62

Extinta em 1834, renasce como Ordem honorífica sob o nome de

Ordem Militar de Sant'Iago da Espada, destinada “a distinguir o mérito literário, científico e

artístico”63

, cujo grão-mestre é o Presidente da República, Professor Cavaco Silva.

58 Apud FONSECA, Luís Adão dir. – Livro dos Copos. Vol. I. Militarium Ordinum Analecta, 7 [em linha]. Porto: Fundação Eng. António de Almeida, 2006, p.234,235. Atual. 2012-07-06 [consult. 25 Abr. 2014]. Disponível na Internet: <URL: http://www.cepesepublicacoes.pt/portal/obras/militarium-ordinum-analecta-n.o-7> 59 Apud FONSECA, cit.58, p.235. 60 COSTA, Paula M.C.P. - Ordens Militares e Fronteira: um Desempenho Militar, Jurisdicional e Político em Tempos Medievais [em linha]. Revista da Faculdade de Letras HISTÓRIA. Porto: Faculdade de Letras da Universidade do Porto, III Série, vol. 7, 2006, pp. 79-91. Atual. s/d. [consult. 25 Abr. 2014]. Disponível na Internet: <URL: ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/3405.pdf > 61 Apud FONSECA, cit.56, p.235. 62 FONSECA, cit.58, p.700. 63 Presidência da República Portuguesa. 2011 [consult. 26 Abr. 2014]. Disponível na Internet: <URL: http://www.ordens.presidencia.pt/?idc=184>

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1190 – Foral de D. Sancho I à vila de Almada

“Aquele que [firmemente] vos [respeitar] este meu foral receberá as bênçãos de Deus

e as minhas. Mas quem o queira vilar seja [perseguido] pela maldição de Deus e

minha. Feita a carta em Lisboa no mês de Agosto da Era 1228. Eu, supradito Rei D.

Sancho, roboro e confirmo esta carta que mandei fazer.” (Foral de 1190)64

D. Sancho, o Povoador. Numa época de Cruzadas e Reconquista, em que a guerra e a paz

alternavam, este rei preocupou-se também com o povoamento do território recém-conquistado, tendo

sido responsável pela outorga de 58 forais, quase o dobro que o seu pai.65

Era o tempo da “grande

aventura da formação e consolidação do reino de Portugal”66

, em que era mister organizar e governar,

criar estruturas municipais, centralizar o poder, travando “a proliferação de terras imunes”67

.

E entramos em 1190, data a partir da qual os mouros recuperam quase todas as praças

conquistadas ao sul do Tejo e em que tem início um “ciclo de maus anos agrícolas que perturbou

gravemente o país”68

. Mas é também o ano em que a vila de Almada e seu termo recebem o foral do

rei D. Sancho I. Vinte anos passados sobre a doação que seu pai fizera duma carta de segurança aos

mouros-forros de Lisboa, Almada, Palmela e Alcácer, era agora a vez do Povoador legislar sobre a

administração local dos habitantes cristãos de Almada.

O Foral, que segue o modelo de Santarém 117969

, estabelece regras tributárias e penais para

os cristãos residentes em Almada, ao lado dos quais viviam os judeus e os mouros forros. Define

ainda privilégios, obrigações e prerrogativas reais. Da leitura deste Foral podem-se descobrir vários

pormenores da vida da comunidade de Almada, das suas atividades económicas e da organização do

município.70

O alcaide, que era elemento da nobreza e o delegado do rei, era a figura máxima na

governação local do município, mas tinha, para além do alcaide dos navios, um ajudante, o alcaide-

menor, que tinha de ser de Almada: “E o meu nobre omem que almadaa de mim tever noms meta y

64 Apud FLORES, cit.7, p.34. Devido a mutilações do texto original deste foral, as palavras entre parênteses retos foram extraídas dos forais de Lisboa e Santarém de 1179 (FLORES, cit.7, p.35). A “Era 1228” de César corresponde ao ano de 1190 (subtraem-se 38 anos). 65 MARQUES, José M. – Os municípios portugueses dos primórdios da nacionalidade ao fim do reinado de D. Dinis. Alguns aspectos [em linha]. In 1º Colóquio Luso-Brasileiro sobre Municipalismo e História Urbana, Niterói, 1993, p.54. Atual. s/d. [consult. 26 Abr. 2014]. Disponível na Internet: <URL:ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/2232.pdf> 66 PIMENTA, Mª Cristina – Guerras no tempo da Reconquista. Matosinhos: Quidnovi, 2008, p.8. 67 MARQUES, cit.65, p.76. 68 MATTOSO, José – Identificação de um País. Vol. I. 2ª edição. Lisboa: Editorial Estampa, 1985, p.74. 69 Os forais do modelo Santarém 1179 aplicam-se aos concelhos ditos perfeitos. BARROS, cit. 29, p.32. 70 FLORES, cit.7, p.9,10.

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outro alcayde senom d’almadaa”71

. Tínhamos também na administração local, para além dos juízes e

dos alvazis, a figura do porteiro, que citava os cavaleiros – “O mordomo ou o seu sayom nom uaa a

cassa do caualeyro sem porteyo do alcayde”72

- e participava em ações fiscais e policiais; o

mordomo, responsável pelas cobranças fiscais do rei e com funções de caráter policial; e o saião,

ajudante do mordomo.

O almotacé, a quem competia administrar a política económica e realizar a inspeção dos

mercados, pesos e medidas, era mais um elemento do “concelho”, a assembleia de “vizinhos” que

geria localmente a vila e seu termo73: “E a almotassarya seia do concelho. E seyam metudos almotacé

pelo alcayde e pelo concelho da villa”74

. E porque se vivia em tempo de guerra, havia ainda os adaís,

que eram comandantes da cavalaria vilã e que estavam isentos de tributo – “Adays dalmadaa nom

dem quinta do quinon de seus corpos”75

-, os cavaleiros-vilãos e os besteiros.

Das atividades agrícolas, o Foral destaca as culturas de trigo e milho-miúdo: “Cauom que

lauorar trygo dê 1 teyga. E se lauorar milho similhauilmente. E de geyras de bois 1 quarteiro de trigo

ou de milho de qualquer que lauorar”76

, para além do azeite e do vinho. A pesca era uma atividade

muito importante no termo de Almada, região que ofereceria boas condições para esta prática (veja-

se a citação 22), sendo referida várias vezes ao longo do texto do Foral, como neste exemplo que

menciona a barca do pescado, um tipo de embarcação: “E por alcaydarya de cada huma besta que

uuer de fóra com pescado dem II dinheyros. E da barca do pescado myudo II dinheyros e de todo

outro pescado seya dado seu foro”77

.

Das atividades mesteirais, o Foral menciona os ferreiros e os sapateiros, que gozavam de

certos privilégios: “Fereyro ou çapateyro que em Almadaa cassa ouuer em ella nom dê della nenhum

foro”78

. Do comércio, são referidas as profissões de mercador e padeira: “Mercadores naturaes da

villa que soldada dar quiserem seia reçebuda deles”, “Paateyras dem por foro de XXX paes huum”.79

São ainda citados o comércio de animais e o de madeira.80

Quanto aos transportes, o

almocreve, com as suas bestas de carga, assegurava as vias terrestres, e os barcos, naturalmente,

fariam a travessia entre Almada e Lisboa, sobretudo para o transporte de mercadorias.81

71 Apud FLORES, cit.40, p.82. 72 Idem, p.85. 73 FLORES, cit.7, p.10. 74 Apud FLORES, cit.40, p.84. 75 Idem, p.86. 76 Idem, p.90. 77 Idem, p.93. 78 Idem, p.94. 79 Idem, p.97. 80 FLORES, cit.40, p98. 81 Idem, p.101-103.

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Quanto a punições por crimes cometidos, o Foral é detalhado, como vemos no seguinte

exemplo:

“Dou [assy a uos por foro] quem quer que publicamente, [perante homees boos casa

forçadant] com armas romper peite quinhentos soldos e aquesto seia sem vozeyro. E se dentro na

casa [o rrompedor] for morto, [ou matador ou o senhor da] cassa peite [hum] parauedi.”82

Também constam os impostos e os privilégios, como o pagamento de portagem -“[de vinho

de] fóra dem de cada huma carrega [hum almude] seia uendudo ho outro en o relego”83

-, o apoio aos

mesteirais -“E moradores dalmadaa aiam livremente tendas fornos de pam conuem a saber e dolas”84

-

e a isenção da lutuosa.85

Em suma, o Foral de Almada de 1190 é um documento muito importante não só como marco

para a história local pelo reconhecimento oficial da autonomia desta vila e seu termo, mas ainda

como fonte documental para o conhecimento da vida económica e social da região. Manter-se-ia em

vigor durante trezentos e vinte e três anos, até à sua reforma por D. Manuel I, em 1513. Trezentos e

dezanove anos mais tarde, em 1832, Mouzinho da Silveira extinguiria de vez este e todos os forais

em Portugal.86

82 Apud FLORES, cit.40, p.106. 83 Idem, p.107. 84 Idem, p.109. 85 FLORES, cit.40, p.105-110. 86 FLORES, Alexandre - 500 anos do Foral Manuelino – Almada Quinhentista. 24ª Exposição Documental (texto de apoio). ALMADA: Câmara Municipal de Almada, 2013, sem paginação.

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1217 – A paz. D. Afonso II confirma o foral aos mouros forros de 1170

"Mas entre tantas palmas salteado

Da temerosa morte, fica herdeiro

Um filho seu, de todos estimado,

Que foi segundo Afonso e rei terceiro.

No tempo deste, aos mouros foi tomado

Alcáçare do Sal por derradeiro,

Porque dantes os Mouros o tomaram,

Mas agora estruídos o pagaram.” (CAMÕES)87

No ano a seguir à outorga do Foral, Almada voltaria a sucumbir perante as forças do Islão.

Em 1191, o califa Yussuf El-Mansur comandaria os almóadas, tomando Alcácer, forçando os cristãos

a se retirarem para norte do Tejo, ao que se seguiria a “ocupação e destruição dos castelos de

Sesimbra, Palmela e Almada”88

:

“Logo seguiu para o castelo de Almada – al-Ma’din -, que tomou e mandou destruir e fazer

desaparecer as suas marcas. Reduziu-o a ruínas e escombros e desapareceu numa hora do dia o seu

esplendor e a sua magnificência”.89

Não há indícios de que os muçulmanos tenham ocupado Almada após a sua tomada. Ao que

parece, ter-se-ão limitado a expulsar os cristãos, para evitar novas investidas a sul, onde Alcácer se

passou a chamar, até à sua reconquista definitiva em 1217, Al Qasr Al Fath (Alcácer da Vitória).90

Almada voltaria a ser reconquistada, algures entre 1195 e 1198.91

Mas seria com a tomada de

Alcácer em 1217 que a paz se tornaria mais duradoura na península de Setúbal. Dois anos antes, a

Quinta Cruzada tinha sido ratificada no Concílio de Latrão, pelo que, à semelhança da conquista de

Lisboa em 1147, cruzados a caminho de Jerusalém ajudariam novamente os portugueses, agora no

cerco e tomada de Alcácer, praça estrategicamente bem localizada, “importante fortaleza e porto

87 CAMÕES, Luís Vaz de – Os Lusíadas, Canto III. Alfragide: Ediclube Coleccionáves, [s.d.], p.137. 88 FLORES, cit.40, p.29. 89 Relato de Ibn al_Marrakusi, apud FLORES, cit.40, p.93. 90 MENDES, cit.57, p.49. 91 CONDE, Manuel S. A. – Sesimbra: sobre a costa do mar (séculos XII – XIII) [em linha]. In Arquipélago: História. 2ª série, VII (2003), p.254-255. Atual. s/d. [consult. 29 Abr. 2014]. Disponível na Internet: <URL: http://hdl.handle.net/10400.3/390>

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marítimo-fluvial”92

. O dinamizador desta campanha terá sido o então bispo de Lisboa, Soeiro Viegas,

personagem retratada no poema de Gosuíno.93

Seria assim, com o início da pacificação a sul do Tejo, que o Estado português e a

centralização política se começariam realmente a afirmar. Segundo Mattoso, “o seu [do Estado]

verdadeiro fundador (…) foi Afonso II”94

. E caberia a este rei a confirmação em 1217 do foral de

1170 aos mouros forros de Lisboa, Almada, Palmela e Alcácer95

, que alargou os seus privilégios,

isentando-os do direito de aposentadoria96

, ou seja, proibindo a invasão do seu domicílio. Esta

medida, segundo Barros97, pretenderia “minimizar os prejuízos da conquista”, “recompor o estrato

populacional muçulmano da cidade” e “reforçar a (pretendida) subordinação régia das comunidades

islâmicas integradas no domínio dos espatários”. A confirmação foi feita “em nome do rei, “da sua

mulher e dos seus descendentes”, reforçando desta forma o caráter duradouro do foral.98

Se as referências a Almada (e Alcácer), que daí em diante foram feitas em relação ao foral aos

mouros forros de 1170, foram devidas a erros técnicos, como suspeita Barros99

, fica no ar a questão

sobre a continuidade da existência desta comunidade em Almada. O certo é que esta cidade deve o

seu nome e muitos costumes à comunidade islâmica que outrora aqui habitou. Em particular, como

salienta Kemnitz100

, o pioneirismo da legislação deste foral, ao garantir certos direitos aos mouros,

como “a prática da religião e o uso da língua”, partes integrantes da sua matriz cultural, não estava

em consonância com a legislação que então vigorava na Europa, sendo antes uma herança da

tolerância árabe (pré-invasões berberes, diríamos nós) que Portugal manteria até aos Descobrimentos.

92 PEREIRA, Armando S. - Representações da guerra no Portugal da Reconquista (séculos XI-XIII). [s.l.]: Comissão Portuguesa de História Militar, 2003, p.100. 93 Idem, p.100-102. 94 MATTOSO, José – A formação da nacionalidade. In TENGARRINHA, José org. – História de Portugal. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 2000, p.14. 95 Este foral teve uma confirmação anterior, em 1186, pela rainha D. Dulce, esposa de D. Sancho I, e suas filhas. SOUSA, Pereira – Cronologia da história de Almada. Almada: Câmara Municipal de Almada, 1985. 96 O direito de aposentadoria garantia a certas “classes privilegiadas” a pernoita em domicílios dos habitantes de localidades por onde passassem, sendo motivo frequente de abusos, que geravam queixas à coroa. MORENO, Humberto B. – Os marginais no Portugal medievo: comportamentos antissociais perante as normas de hospitalidade. In Campus Social - Revista Lusófona de Ciências Sociais [em linha], nº2, 2005, p.99-107. Atual. s/d. [consult. 30 Abr. 2014]. Disponível na Internet: <URL: http://revistas.ulusofona.pt/index.php/campussocial/article/view/209> 97 BARROS, cit.29, p.94. 98 KEMNITZ, Eva-Maria, cit.43, p.167. 99 BARROS, Mª Filomena – As comunas muçulmanas em Portugal (subsídios para o seu estudo). Porto: Revista da Faculdade de Letras. História. Segunda Série, 7 (1990), p.92. Atual. s/d. [consult. 30 Abr. 2014]. Disponível na Internet: <URL: http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/2226.pdf> 100 KEMNITZ, Eva-Maria, cit.43, p.167,168.

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Conclusão

Os setenta anos da história de Almada retratados sumariamente nesta breve exposição,

pretenderam transmitir uma ideia do tempo de guerra e paz que então se vivia nesta terra de fronteira

entre mouros e cristãos. Os forais outorgados pelos reis da Reconquista tiveram como objetivo

povoar o território que ia sendo tomado aos mouros, bem como criar estruturas administrativas que

permitissem às populações um modo de vida relativamente autónomo e que, por outro lado, gerasse

receitas para a coroa. As Ordens Militares também eram essenciais em tempo de guerra, pelo que as

concessões reais que lhes eram feitas garantiam a continuidade do seu apoio neste esforço de

expansão das fronteiras nacionais. Tinham estas Ordens ainda a seu favor a organização que

impunham nos seus territórios e o fomento que faziam da agricultura, então a principal atividade

económica. As Cruzadas foram também um elemento importante no desiderato português, pelo

suporte do papado na independência nacional e pela participação dos cruzados nas batalhas contra os

infiéis, tendo sido, como vimos atrás, os primeiros a tomar Almada.

Ficaram em aberto nesta investigação, uma análise sobre o impacto do Foral de 1190 na

população de Almada e seu termo e outra análise sobre a dimensão da comunidade de mouros forros,

sobretudo a partir do ataque almóada de 1191.

O Foral de Almada de 1190 foi talvez o documento mais importante para a história desta

cidade, a matriz da sua autonomia como município, mas a carta de alforria aos mouros em 1170

também constituiu um legado de tolerância de que nos devemos orgulhar.

“Mando que os mouros e os judeus feridos se queixem ao alcaide e aos alvazis: como era

costume no tempo do meu pai. Ainda mando que os mordomos não penhorem nenhum homem sem o

chamar ao concelho perante o alcaide e os alvazis”. (Foral de 1190)101

101 Apud FLORES, cit.7, p.33.

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