GESTÃO DE MULTIDÃO: METODOS E PROCEDIMENTOS

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GESTÃO DE MULTIDÃO: METODOS E PROCEDIMENTOS AGUIAR, Eduardo José Slomp Aguiar 1 [email protected] MOTA, Sandro Marcos 2 [email protected] RESUMO O presente trabalho tem como objetivo discorrer sobre as melhores práticas em gestão de multidão. A partir do levantamento histórico dos desastres de multidão no Brasil e no mundo irá verificar-se a complexidade que é lidar com esse tema. O risco ocorrer um desastre, em especial a asfixia por esmagamento está sempre presente e a forma de lidar com esse problema deve ser o mais ampla possível. Num país com uma cultura ainda em desenvolvimento no que tange a segurança, apresentar boas práticas para a gestão de multidão é um primeiro passo para tentar implementá-las. Palavras-chave: Multidão. Gestão de multidão. Controle de multidão. Segurança em grandes eventos. Grandes eventos. 1 Oficial Bombeiro-militar, Bacharel em Direito pela UNIVEL, trabalhou como colaborador na Secretaria Extraordinária de Grandes Eventos-MJ para a Copa das Confederações 2013 e a Jornada Mundial da Juventude 2013, Aluno- oficial do Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais da Polícia Militar do Paraná. 2 Oficial Bombeiro-militar, Tecnólogo da Construção Civil pela UFTPR, especialista em Engenharia de Segurança Contra Incêndios e Pânico pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Orientador de Conteúdo do Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais da Polícia Militar do Paraná.

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GESTÃO DE MULTIDÃO: METODOS E PROCEDIMENTOS

AGUIAR, Eduardo José Slomp Aguiar1

[email protected]

MOTA, Sandro Marcos2

[email protected]

RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo discorrer sobre asmelhores práticas em gestão de multidão. A partir dolevantamento histórico dos desastres de multidão no Brasil eno mundo irá verificar-se a complexidade que é lidar com essetema. O risco ocorrer um desastre, em especial a asfixia poresmagamento está sempre presente e a forma de lidar com esseproblema deve ser o mais ampla possível. Num país com umacultura ainda em desenvolvimento no que tange a segurança,apresentar boas práticas para a gestão de multidão é umprimeiro passo para tentar implementá-las.

Palavras-chave: Multidão. Gestão de multidão. Controle demultidão. Segurança em grandes eventos. Grandes eventos.

1 Oficial Bombeiro-militar, Bacharel em Direito pela UNIVEL, trabalhou comocolaborador na Secretaria Extraordinária de Grandes Eventos-MJ para a Copadas Confederações 2013 e a Jornada Mundial da Juventude 2013, Aluno-oficial do Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais da Polícia Militar doParaná.

2 Oficial Bombeiro-militar, Tecnólogo da Construção Civil pela UFTPR,especialista em Engenharia de Segurança Contra Incêndios e Pânico pelaPontifícia Universidade Católica do Paraná, Orientador de Conteúdo doCurso de Aperfeiçoamento de Oficiais da Polícia Militar do Paraná.

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GESTÃO DE MULTIDÃO: METODOS E PROCEDIMENTOS

AGUIAR, Eduardo José Slomp Aguiar3

[email protected]

MOTA, Sandro Marcos4

[email protected]

1 INTRODUÇÃO

A reunião de pessoas, uma multidão, apesar de não ser um

evento recente na história humana, tem sido cada vez mais

frequente com o aumento das aglomerações urbanas. Estas

multidões ocorrem normalmente sem grandes incidentes, numa

espécie de auto-organização de movimentos e ocupação no local,

porém um simples erro pode desencadear uma reação em cadeia e

ocasionar ferimentos e mortes. O trabalho tem por objetivo

justamente verificar métodos e procedimentos para evitar estes

3 Oficial Bombeiro-militar, Bacharel em Direito pela UNIVEL, trabalhou comocolaborador na Secretaria Extraordinária de Grandes Eventos-MJ para a Copadas Confederações 2013 e a Jornada Mundial da Juventude 2013, Aluno-oficial do Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais da Polícia Militar doParaná.

4 Oficial Bombeiro-militar, Tecnólogo da Construção Civil pela UFTPR,especialista em Engenharia de Segurança Contra Incêndios e Pânico pelaPontifícia Universidade Católica do Paraná, Orientador de Conteúdo doCurso de Aperfeiçoamento de Oficiais da Polícia Militar do Paraná.

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incidentes, buscando formas de reconhecimento, avaliação e

tratamento aos problemas decorrentes de uma multidão.

A ausência ou falha na aplicação de métodos e

procedimentos para a gestão de multidão pode incidir na

ocorrência ou agravamento de um incidente. No limiar de sediar

grandes eventos como a Copa do Mundo e as Olimpíadas; e depois

de erros e falhas na Copa das Confederações e na Jornada

Mundial da Juventude que não foram absorvidos como aprendizado

pelos órgãos de segurança brasileiro, aliado a falta ou

ausência de cultura do país em gestão de multidão, poderá

acarretar numa perda irreparável à imagem do Brasil no mundo.

O prejuízo neste aspecto é incalculável, mas reparável; o

problema maior é a possibilidade de perdas de vidas humanas, a

qual o país não está a salvo, como ficou provado no incêndio

na boate Kiss na cidade de Santa Maria/RS em janeiro deste

ano.

Neste contexto é possível afirmar que a gestão de

multidão vem crescendo no Brasil com o advento dos grandes

eventos, porém já encontra terreno fértil para sua aplicação

em festas populares: Carnaval do Rio e Salvador, Festival

Folclórico de Parintins, Festa Junina de Campo Grande/PB e

Caruaru/PE, Festa do Peão em Barretos/SP; eventos religiosos:

Círio de Nazaré em Belém/PA e a festa da Padroeira do Brasil

em Aparecida/SP; competições esportivas: Campeonato Brasileiro

de Futebol, de Vôlei; e concertos musicais: Rock in Rio e

Festival de Verão de Salvador.

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As situações acima descrevem eventos temporários de

grande concentração de público, mas a aplicação de gestão de

multidão também tem lugar em locais de uso contínuo como

terminais rodoviários e ferroviários, estações de metrô e

aeroportos, ruas e edifícios. Enfim, qualquer local em que se

possa encontrar um número considerável de pessoas é passível

de se utilizar as ferramentas de gestão de multidão.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 GESTÃO DE MULTIDÃO

Gestão é sinônimo de administração e pode ser definida

como a ciência social que estuda e sistematiza as práticas

usadas para administrar negócios, pessoas ou recursos com o

objetivo de alcançar metas desejadas (Oxford, 2012)

A definição de multidão tem se provado problemática para

os pesquisadores com descrições variáveis e até de certa forma

nebulosa. Entretanto, um estudo do governo britânico

comparando todas estas descrições encontrou 06 características

comuns para uma definição completa (UK, 2009, p. 60):

a. Número considerável de pessoas;

b. Reunidos em um mesmo local, num espaço físico comum;

c. Por um período de tempo mensurável;

d. Possuem objetivos e interesses comuns;

e. Demonstram comportamentos similares ou agem como um

grupo único;

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f. Interagem uns com os outros.

Em termos de gestão de multidão existem vários aspectos

que podem ser abortados como eficiência, economicidade,

desempenho, mas, apesar de serem abordados alguns destes no

artigo, trataremos essencialmente da gestão de segurança, no

sentido amplo que a palavra tem em português e em inglês

costuma ser entendida como safety & security.

Safety é o estado de estar a salvo, fora de perigo e

security pode ser entendida como as atividades envolvidas na

proteção de pessoas, bens e de um país contra um ataque

(Oxford, 2012). A definição etimológica pode não ajudar muito,

pois as palavras são sinônimas, mas seu emprego é diferenciado

nos países de língua inglesa, usando-se safety para aspectos de

proteção contra emergências médicas e de bombeiro e security para

emergências policiais.

2.2 TIPOS DE MULTIDÃO

A multidão como um fenômeno social só passou a ser mais

estudada a partir do fim do século XIX quando a população

urbana passou a ser maior do que a rural na Europa. Estudada

como um ramo da psicologia social, suas definições e

classificação estão mais associadas a este campo do que da

segurança. Cientistas sociais que teorizaram sobre este

elemento foram Gustave Le Bon, Gabriel Tarde, Sigmund Freud e

Steve Reicher.

Teorias como a desindividualização do ser em uma multidão

começaram a surgir, teoria esta em que o individuo perde parte

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de sua própria identidade e por pressão do grupo passa a

aceitar algo ou até mesmo por estar anônimo passa a agir de

forma diferente (SPEARS, 1995).

Assim como a própria definição de multidão tem sido

controversa, uma classificação de tipos de multidão não

encontra consenso nos meios acadêmicos e os mais citados

ainda são Momboise (1967) e Berlonghi (1995). Momboise dividiu

a sua classificação em 04 tipos: casual, convencional,

expressiva e agressiva. Já Berlonghi preencheu sua

classificação em 11 tipos que se demonstra no quadro abaixo:

Tabela 1 – Tipos de multidões segundo Berlonghi.

Tipo de Multidão Descrição

Ambulatória Pessoas caminhando, geralmente calmas.

Limitada As pessoas têm seus movimentos limitados.

Espectadora Assistindo uma atividade específica.

ExpressivaContêm um fator emocional associado como

um funeral.

ParticipativaAs pessoas participam do evento como

protestos

Agressiva/HostilInicialmente verba, podendo conduzir a

crimes.

Demonstrativa Organizada de certa forma como uma marcha.

Densa/SufocanteDensidade elevada podendo ocorrer desmaios

e morte.

Em fuga/ApressadaOcorrência de uma emergência real ou

imaginária.

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Saqueando/PilhandoPessoas cometendo crimes de saques e

danos.

Violenta Atacando ou aterrorizando.

Mais importante que procurar uma classificação no meio

acadêmico é o responsável por esta multidão, seja um ente

privado ou público, conhecer previamente o público com que

esta lidando e ter a capacidade de enfrentar os problemas

decorrentes caso uma multidão espectadora mude de

comportamento e passe a ser agressiva ou em fuga, por exemplo.

Tentar classificar uma multidão pode ser tarefa difícil,

em especial em ambientes de grande diversidade como um evento

esportivo em que se encontram pessoas de todas as idades,

gêneros, credos e objetivos específicos.

2.3 ASFIXIA POR ESMAGAMENTO

Tratando da gestão de multidão no aspecto segurança há que

se fazer uma referência pela principal causa de mortes e

feridos. Apesar de a probabilidade de sua ocorrência não ser

elevada quando ocorre costuma ter consequências devastadoras

como será demonstrado abaixo no item sobre os históricos de

incidentes.

Ao contrário do imaginário popular em que as pessoas

morreriam por estarem sendo pisoteadas, o mecanismo de trauma

da asfixia por esmagamento ocorre em sua maioria de pé. Um

estudo de caso conduzido por Gill e Landi (2004) demonstrou de

forma contundente a mecânica da asfixia por compressão

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torácica ao analisar as autópsias das 09 pessoas mortas num

incidente na cidade de Nova Iorque em 28 de dezembro de 1991

durante um jogo de basquete para caridade.

Quando ocorre um tumulto em uma multidão há um aumento na

densidade e as pessoas são esmagadas umas pelas outras; elas

se deslocam com a multidão, muitas vezes sem estarem com o pé

no chão. Neste momento a pressão é tão grande que não permite

o tórax se expandir e o diafragma se movimentar, ocorrendo a

asfixia. Elas se sufocam de pé, vindo a cair somente quando a

multidão se dissolve.

2.4 HISTÓRICO DE DESASTRES EM MULTIDÃO NO BRASIL

A percepção de risco do brasileiro certamente é menor do

em outros países. Fatores sociais, culturais e econômicos

influenciam neste sentido, mas também a ausência de grandes

desastres naturais como terremotos, maremotos, furacões,

vulcões. Um país abençoado por Deus como no dito popular.

Porém o que se enxerga é uma falta de memória que

conduzem a esta pouca ou ausente percepção de risco. O

incêndio na boate Kiss ocorrido em janeiro de 2013 com 242

mortes já encobriu o desastre na Serra Fluminense em janeiro

de 2011 que matou mais de 900 pessoas.

Parece ser até mesmo uma mania do brasileiro ou uma

autoproteção deixar o desastre cair no esquecimento. O

incêndio no Gran Circus Norte Americano no ano de 1961 que

vitimou 503 pessoas, na sua maioria crianças, como que foi

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deixado de lado pela população niteroiense na ânsia de apagar

esta tristeza (VENTURA, 2011).

Para evitar este apagão histórico, listaram-se abaixo

alguns dos principais incidentes com multidão na história do

país:

1961 - Gran Circus Norte Americano – Niterói/RJ - 503 mortos –

a lona do circo incendiou-se e caiu sobre cerca de 3.000

espectadores.

1973 - Estádio Albertão – Teresina/PI - 07 mortos – 70 feridos

– na partida de inauguração do estádio entre Fluminense e

Tiradentes a grade de segurança rompeu.

1985 – Cortejo de Tancredo Neves – Belo Horizonte/MG – 07

mortos – o cortejo que reuniu mais de um milhão de pessoas

acabou em tumulto em frente ao Palácio Liberdade.

1985 – Show dos Menudos - Rio de Janeiro/RJ – 02 mortes – com

superlotação no estádio São Januário 02 meninas morreram

asfixiadas. O local ainda seria palco de outra tragédia quando

175 pessoas se feriram na final do brasileiro em 2000.

1992 – Estádio Maracanã – Rio de Janeiro/RJ – 04 mortos – 90

feridos – final do campeonato brasileiro entre Botafogo e

Flamengo, a grade do segundo anel rompeu e as pessoas caíram

sobre as que estavam abaixo.

2003 – Jóquei Clube do Paraná – Curitiba/PR - 03 mortos -

Problemas no acesso do show “Unidos pela Paz” acabaram em

tumulto ocasionando o esmagamento dos adolescentes.

2006 – Shopping Fiesta – São Paulo/SP – 03 mortos – um show

do grupo mexicano Rebeldes acaba em tumulto quando a grade em

frente ao palco caiu.

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2007 – Estádio Fonte Nova - Salvador/BA – 07 mortos – parte da

estrutura do anel superior do estádio cedeu e as pessoas

despencaram de cerca de 30 metros de altura.

Fig. 1 – Queda da grade do Maracanã. Fig. 2 –

buraco na fonte nova.

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2.5 HISTÓRICO DE DESASTRES EM MULTIDÃO NO MUNDO

Para aumentar a perspectiva dos desastres com multidão se

faz necessário conhecer alguns dos principais incidentes pelo

mundo:

1964 – Estádio Nacional - Lima/Peru – 318 mortos – tumulto

gerado pela anulação de um gol peruano e agravado quando a

polícia lançou os cães sobre o público.

1968 – Tragédia do Portão 12 – Buenos Aires/Argentina – 71

mortos – nunca foi apurada a causa oficialmente, mas todas as

vítimas foram encontradas perto do portão 12 que estava

fechado.

1971 – Estádio Ibrox Park - Glasgow/Escócia – 66 mortos – um

tropeço teria desencadeado o esmagamento durante a saída do

estádio. O Green Guide foi publicado em 1973 após este

incidente.

1979 – Concerto do The Who – Cincinatti/EUA – 11 mortos – a

passagem do som antes do horário agitou os ânimos do pessoal

do lado de fora do coliseu.

1985 – Estádio de Bradford – Bradford/Inglaterra – 56 mortos –

um incêndio na cobertura do estádio feita de madeira e

impermeabilizada com asfalto propagou-se rapidamente não dando

chance ao público.

1985 – Estádio Heysel – Bruxelas/Bélgica – 39 mortos – um

ataque da torcida do Liverpool sobre a torcida do Juventus

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ocasionou uma avalanche humana que acabou por desabar um dos

muros do estádio. Após o ocorrido as equipes inglesas fora

punidas por 5 anos sem disputar campeonatos europeus.

Fig. 3 – queda do muro em Heysel. Fig. 4 – pessoas

esmagadas em Hillsborough.

1988 – Estádio de Kathmandu - Kathmandu/Nepal – 93 mortos –

quando uma tormenta atingiu o estádio várias pessoas tentaram

se proteger no único setor que tinha cobertura, o setor oeste

e iniciaram um tumulto.

1989 – Estádio de Hillsborough - Sheffield/Inglaterra – 96

mortos – assustados com a agressividade da torcida do

Liverpool, a polícia acabou liberando os portões para sua

entrada, ocasionando um esmagamento nas grades internas. No

ano de 2012, o primeiro ministro inglês, Dave Cameron, pediu

desculpas pelas falhas no controle da multidão e na

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investigação policial que produziu atestados de alcoolemia

falsos para as vítimas.

Fig. 5 - Desastre em dois momentos: a abertura do portão C pela

polícia e a superlotação dos setores 3 e 4.

1996 – Estádio Nacional Mateo Flores – Guatemala – 83 mortos –

a venda de ingressos falsos acabou gerando a superlotação do

estádio.

2001 – Estádio Accra Sports - Accra/Gana – 26 mortos – a

tentativa da polícia de conter um conflito com gás

lacrimogêneo acabou em tragédia quando as pessoas começaram a

se esmagar.

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2010 – Love Parade - Duisburg/Alemanha – 21 mortos – Falta de

planejamento na para gay alemã fizeram com que um grande

número de pessoas fluísse pelo mesmo túnel em sentidos

contrários.

2010 – Festival D’Água - Phnom Penh/Camboja– 353 mortos – o

esmagamento ocorreu quando grupos de ambos os lados da ponte

convergiram para assistir a passagem dos barcos no rio Tonlé

Sap.

Fig. 6 – Esmagamento em Phnom Pen. Fig. 7 – Calçados sobre a

ponte Tonlé Sap.

2012 – Estádio Port Said – Egito – 79 mortes – uma suposta

vingança da polícia contra os torcedores do Al-Ahly teria

ocasionado o desastre que transformou o estádio num campo de

batalha.

2013 – Maratona de Boston - Boston/EUA – 03 mortes – 02 bombas

numa multidão que assistia a prova ocasionaram as mortes e 264

feridos.

A quantidade de desastres com multidões tornam a

peregrinação à Meca na Arábia Saudita um caso único no mundo

de mortes por esmagamento. Somente após 2006 quando foram

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tomadas medidas de gestão e controle da multidão é que parece

que a rotina de óbitos desapareceu.

1990 - estouro da multidão em um túnel – 1.426 mortos.

1994 - ritual de apedrejamento do Diabo – 270 mortos.

1998 - esmagamento na ponte Jamarat – 118 mortos.

2001 - ritual de apedrejamento do Diabo – 35 mortos.

2003 - ritual de apedrejamento do Diabo – 14 mortos.

2004 - ritual de apedrejamento em Mina – 251 morto.

2006 - esmagamento na ponte Jamarat – 346 mortos.

3 COMPORTAMENTO DA MULTIDÃO

3.1 TAMANHO E DENSIDADE

Definições de tamanho e densidade são tão importantes

para uma boa gestão de multidão que seu cálculo deveria ser

acompanhado por um colegiado. Superestimar ou subestimar o

público reunido em grandes eventos conforme os interesses

prejudicam a aplicação de boas práticas de segurança.

É comum, principalmente em protestos, haver uma

discrepância nos números em alguns milhares. De um lado a

polícia ou o estado procura diminuir a importância das

manifestações atribuindo um número baixo, do outro lado os

organizadores aumentam a quantidade para impressionar e

relativizar o prestígio que possuem em convocar as massas.

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Vejamos um caso recente no maior evento de multidões já

realizado no país, a Jornada Mundial da Juventude.

Provavelmente querendo engrandecer o evento, o prefeito da

cidade do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, divulgou que a

cerimônia final, Vigília, levou à praia de Copacabana mais de

3,5 milhões de pessoas.

Fazendo um cálculo simples sem atentar para as manchas de

pessoas, utilizando uma referência alta para a densidade média

(3 pessoas por m²) encontrada e a área ocupada pelos

peregrinos (374.364 m²), chega-se a um público de 1.123.092.

Fig. 8 – foto da praia de Copacabana durante a JMJ 2013 (arquivo do

autor).

A superestimação ou subestimação atendem normalmente a

interesses políticos e devem ser evitados para quem vai

realizar a segurança do evento. Um cálculo correto garante

quantidade certa de saídas de emergências, postos de

atendimento médico, transporte público, banheiros, entre

outros.

Para entender como são realizados estes cálculos alguns

conceitos devem restar claro. Densidade nada mais é do que a

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massa volumétrica de um corpo. No caso da gestão de multidão

interessa saber o volume ocupado por uma pessoa mediana, não

só como indivíduo único, mas também o seu comportamento quando

em um grupo de pessoas.

Uma pesquisa realizada com populações de diversas partes

do globo encontrou as seguintes medidas (Taylor e Francis.

1998): Tabela 2 – Largura, profundidade e área de ocupação do homem médio.

Largura (cm)Profundidade

(cm)Área (m²)

Média máxima 51,00 32,50 0,26Media mundial 48,05 28,20 0,20

Fig. 9 – Densidade do homem.

Para esta pesquisa a área de ocupação de um ser humano

foi acrescentada de 3,81 cm para cada lado considerando o uso

de roupas pesadas. Na somatória da área real com esta

imaginária chega-se ao resultado da área pretendida.

A densidade certamente é um item a ser observado para

definir uma multidão, enquanto 100 pessoas distribuídas em um

campo não configuram uma multidão. Estas mesmas 100 pessoas em

uma sala de 12 m² já seriam uma multidão sufocante.

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Regulamentos de prevenção de incêndio costumam

referenciar a densidade para cálculo da população como a NBR

9077:2001 – Saídas de Emergência que aplica um valor máximo de

2 pessoas por m². É fácil de observar nas figuras abaixo que o

índice proposto não é real quando se pensa no máximo, pois

sobram espaços a serem preenchidos.

Normas internacionais que regulam eventos à céu aberto

estimam a densidade entre 3 e 4 pessoas por m². Qualquer

pessoa que já foi a um concerto de música, ou melhor, já andou

de ônibus ou metrô no horário de pico sabe que a lotação não

se parece nada com a espaçosa figura 11.

Na realidade as empresas de ônibus e metrô parecem

aproveitar melhor os espaços e fazem jus ao apelido de

latinhas de sardinhas humanas ao usarem índices de 5 a 6

pessoas por m².

Fig. 10 – 2 pessoas/m². Fig. 11 – 4 pessoas/m². Fig. 12

– 8,4 pessoas/m².

Uma multidão que chegue a preencher todos os espaços a

seu redor atingindo um índice de 8,4 pessoas por m² estará em

um ambiente inseguro com provável ocorrência de asfixia por

esmagamento.

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Para estimar o público de um evento também se devem

considerar as manchas de concentração. Se um local é mais

aberto, tenderá a ter espaços desocupados. Se existe uma área

de interesse como um palco ou telão, é provável que a

densidade diminua conforme distanciamos deste ponto.

3.2 MOVIMENTO NA NORMALIDADE

O movimento de uma multidão é realmente algo desafiador

de se compreender, pode-se dizer que o seu fluxo é em parte

fluído, em parte granular, e em parte reação psicológica do

grupo. Alguns aspectos que devem ser considerados para avaliar

o fluxo de uma multidão:

a. Velocidade livre (correr, andar)

b. Mínimo esforço (caminho mais curto e velocidade

regular)

c. Espaço pessoal (evitar contato físico)

d. Densidade (menor espaço para locomoção)

e. Participação em um grupo.

f. Obstáculos

A velocidade normal de um ser humano e na qual ele sente-

se mais confortável é de 1,3 metros por segundo (4,7 km/h). A

lei do menor esforço determina que as pessoas sempre vão

procurar o caminho mais curto de A a B deste que não hajam

barreiras físicas ou psicológicas. Para certas culturas um

gramado pode ser uma barreira psicológica. Outro exemplo é o

cruzamento de pedestres em uma intersecção em que dependendo

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da possibilidade (todos os sinais fecharem), o pedestre

cruzará diretamente do ponto A a C sem passar pelo ponto B.

A relação entre a velocidade do público e sua densidade

também é um item importantíssimo e foi estudada para basear

serviços destinados para pedestres (FRUIN, 1997). E desta

forma é conhecido como níveis de serviço de Fruin, que

classifica em 06 níveis a relação de pessoas que passam por

uma abertura de 1 (um) metro em 1 (um) minuto:

Fig. 13 - Níveis de serviço de Fruin.

Além de características como densidade e velocidade, a

multidão parece se auto-organizar conforme os seus objetivos.

Um dos fenômenos mais característicos de uma multidão é a

formação de filas, as pessoas tendem a formar filas em

situações de multidão como forma de progressão.

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Problemas começam a aparecer se a fila é longa e não há

progresso visível, as pessoas começam a reduzir a distância

entre si e há a impressão de progresso. Esta impressão de

progresso começa a pressionar a multidão da frente e se não há

informação elas começam a empurrar pensando que podem

“acelerar” o processo e se existe um afunilamento, as pessoas

ficam “presas” a essa situação podendo ocorrer um

esmagamento..

Outra forma de auto-organização são as filas de fluxo e

contrafluxo. Para evitar o choque constante com pessoas que

venham na direção contrária os pedestres costumam posicionar-

se atrás de outro que esteja caminhando na mesma direção

aumentando a velocidade. Agindo desta a forma as pessoas

conseguem se movimentar mesmo em multidões sufocantes.

Fig. 14 – efeito fila e contrafluxo.

Outro fator curioso é o comportamento de um grupo de

pessoas com identidade forte entre si no meio de uma multidão.

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Uma família, um grupo da mesma escola, mesma igreja, tenderão

a movimentar-se de forma coesa e interpendentes um do outro.

Fig. 15 – Grupo de peregrinos andando de mãos dadas durante a JMJ

2013.

O acesso ao um local e a saída gera certo desconforto em

uma multidão. Se este acesso e saída forme únicos, com pessoas

entrando e saindo pela mesma abertura o desconforto será maior

ainda. Neste exemplo apresenta-se ainda maior a capacidade da

multidão se auto-organizar com um movimento oscilatório de

entrada e saída de pessoas.

Fig. 16 – movimento oscilatório de entrada e saída de pessoas.

Um dos comportamentos mais curiosos de uma multidão é o

encontro em uma intersecção. Para evitar a colisão com pessoas

vindo em todas as direções e possibilitar a continuidade do

caminho desejado, forma-se um fluxo parecido com uma rótula no

meio interseção (HELBING, 2001).

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Fig. 17 – Encontro em intersecção.

3.3 MOVIMENTO EM EMERGÊNCIA – EVACUAÇÃO

Na ocorrência de uma emergência, real ou imaginária, o

fator tempo torna-se preponderante e cria-se uma multidão

competitiva. Teorias tão contraditórias como pânico em massa

(SIME, 1980) e perfilhação (MAWSON, 2005) encontram resonância

no mundo acadêmico.

Na teoria do pânico em massa as pessoas se comportam de

forma irracional diante um perigo, tendendo a aumentar a sua

velocidade, aumentar o contato físico com movimentos

descoordenados em especial em locais afunilados. Com a

dificuldade para sair o desespero toma conta e as pessoas

começam a se exaltar empurrando uma as outras, o fluxo diminui

com a queda de alguns e eles começam a ser pisoteados. Este

padrão parece ter sido o encontrado no incêndio da boate Kiss.

24

Fig. 18 – Afunilamento. Fig. 19 –

Redução em curva.

A teoria da perfilhação ou afiliação teoriza que as

pessoas tendem em situações emergenciais a buscar caminhos

familiares bem como a unir-se ao grupo em que está inserido.

Neste modelo as pessoas continuam a se comportam conforme as

normas sociais anteriores a emergência, como aquela em que

homens oferecem o lugar a mulheres e crianças.

Dos vários incidentes observados verifica-se que a

situação de pânico é muito rara e quando ocorre é por um curto

período de tempo. Os membros de uma multidão tendem a seguir

caminhos familiares com pessoas também familiares, mesmo em

uma situação emergencial e isto pode atrasar a evacuação.

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Quando acometidas por uma emergência uma multidão física

pode transformar-se uma multidão psicológica, compartilhando

um forte senso de identidade com pessoas se auxiliando

mutuamente. Foi o que ocorreu no ataque às Torres Gêmeas no 11

de setembro, por exemplo.

3.4 MOVIMENTO EM DESORDEM PÚBLICA – TURBA OU TUMULTO

A revolta das massas não é um fenômeno recente. Uma

multidão de descontentes é capaz de tudo, inclusive de mudar o

mundo como ficou provado com a Revolução Francesa em 1789.

José Ortega y Gasset, escrito espanhol, autor do livro A

Rebelião das Massas (1930) interpretou e compreendeu muito bem

o poder de uma massa, em especial numa época em que

fervilhavam ideias comunistas e fascistas. Num capítulo sobre

o uso da violência pela massa verbalizou desta forma: “a massa

não se importa em dar justificativas ou em estar certa, ela quer intervir em tudo e o

fará de forma violenta, pois ela o quer agora”.

Um sentimento de coesão e pertencer a algo afloram e o

indivíduo não passa mais a ser ele mesmo, mas só um integrante

da multidão. É fácil perceber esta reação em um estádio de

futebol ou em um espetáculo onde todos cantam e aplaudem

juntos. É a teoria da desindividualização do ser (SPEARS,

1995).

Outro sentimento que também aparece é o de se sentir

anônimo trazendo como decorrência um comportamento

antissocial, pois não se está sendo julgado mais João e Maria,

mas a multidão como um todo (MULLEN, 1986).

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A composição do grupo influenciará diretamente no

comportamento agressivo da multidão. Um grupo formado em sua

maioria por homens e por jovens certamente demonstrará mais

agressividade (WEBB, 1995)

Outro fator importante é a atitude da polícia em relação

à multidão, se esta se sentir que a polícia está agindo de

forma ilegitimada e indiscriminada é possível que a massa

torne-se mais unida, não distinguindo os pacíficos, dos

arruaceiros e atue contra a força policial (STOTT e DRURY,

1998)

Diversos fatores podem levar uma multidão a princípio

pacífica a ter um comportamento agressivo entre eles:

paralisação do transporte público, cancelamento de um

concerto, desastres levando a saques, tensões sociais.

Os últimos protestos no Brasil tem sido um desafio para

os cientistas sociais e políticos interpretarem. Imagine-se

então para a polícia que tem sido acuada pela multidão e pela

mídia como truculenta e autoritária. Novas formas de abordagem

a este público se fazem necessária e uma forma inteligente de

aproximação.

Um direcionamento maior para a gestão de multidão

(compreensão) do que para o controle de multidão

(enfrentamento) parece ser uma solução mais segura e com

menores consequências.

4. METODOS E PROCEDIMENTOS

27

Como visto a complexidade para lidar-se com uma multidão

é enorme e os riscos existem, mas podem ser evitados. Segundo

Dickie (1995) são 04 os principais fatores que levam a um

desastre com multidão:

a. Planejamento inadequado

b. Multidão excitada;

c. Ausência de gestão de multidão e controle;

d. Falha ou risco no ambiente

Visto desta forma é imprescindível que a gestão da

multidão seja feita de forma ampla, abrangente e verifique

todos os pontos em que possa ocorrer uma falha.

Apontar um método único que seja eficaz e seguro nesta

ceara é uma missão impossível. A melhor receita é a aplicação

de um sistema abrangente que leja as melhores práticas na

gestão de multidão.

4.1 UM SISTEMA ABRANGENTE DE GESTÃO DE MULTIDÃO

Analisando os casos de desastre, a psicologia das

multidões, a tecnologia presente, propôs-se um sistema amplo

em que se abrange diversos aspectos para prevenir incidentes

com a multidão (Challenger, Clegg & Robinson, 2009).

O diagrama abaixo demonstra os 06 pontos que os

pesquisadores apontaram como imperativos de verificação.

Interessante de observar de que o item que mais influencia os

outros é justamente o mais difícil de modificar: a cultura.

28

Fig. 20 – Diagrama do sistema abrangente para gestão de multidão

(Challenger, Clegg & Robinson, 2009)

O uso do diagrama fica mais bem demonstrado quando se

apontam os possíveis erros e falhas que possam ocorrer num

evento como a falha nas comunicações, ausência de barreiras de

contenção, treinamento insuficiente da equipe de segurança,

entre outros.

Fig. 20 – Diagrama do sistema abrangente apontando erros e falhas.

4.2 GERENCIAMENTO DE RISCOS

Gerenciamento de riscos é a identificação, avaliação e

priorização dos riscos seguidos de uma aplicação coordenada e

econômica de recursos para mitigar, monitorar e controlar a

probabilidade e/ou impacto de um evento catastrófico (ISSO

31000).

Falha em aprendizado com eventos anteriores

Relações ruins entre agências

ACEITAR OS RISCOS?

TRATAR OS RISCOS

ANALISAR RISCOS

INDENTIFICAR RISCOS

ESTABELECER CONTEXTO Monitorar e revisarComunicar e consultar

SIM

NÃO

29

O gerenciamento de riscos não consiste, nem se acaba com

a elaboração de um documento para estruturar a resposta a um

incidente, do plano propriamente dito. O planejamento de

emergência é dito como algo cíclico na qual a etapa final, a

revisão, normalmente ensejará numa nova avaliação, reiniciando

o processo. O fluxograma da ISO 31000 para gerenciamento dos

riscos representa bem as etapas deste processo.

Fluxograma 1 – Gerenciamento de riscos (ISO 31000).

A identificação dos riscos é realizada listando-se

todas as possíveis emergências que possam ocorrer. Isto

envolve uma coleta de informações de todas as fontes e

recursos possíveis. Ouvindo empregados, especialistas,

30

verifique histórico de incidentes no local e em outros

similares. Nesta etapa não se dispensa nenhuma ideia.

Após listar todas as emergências, deve-se proceder a uma

análise da probabilidade de sua ocorrência versus a

consequência do evento danoso. O resultado é a classificação

dos riscos para a equipe que realiza o planejamento possa

priorizar suas ações. Para auxiliá-lo nesta classificação o

quadro de análise de risco abaixo é uma ferramenta importante.

Tabela 3 – Análise de risco (VICTORIA GOV. – CROWD CONTROL).QUADRO DE ANÁLISE DE RISCO

CONSEQUÊNCIA

PROBABILIDADE

Insignificante Pequena Moderada Crítica Catastrófi

ca

Quase Certo A A E E E

Provável M A A E E

Possível B M M E E

Improvável B B M A E

Raro B B B A A

B = Risco Baixo M = Risco Médio A = Risco Alto E =Risco Extremo

Finalizada a análise de riscos a equipe de planejamento

deve decidir se os riscos são aceitáveis ou se é possível o

seu tratamento. Pode parecer estranho, mas nem todos os riscos

são passíveis de tratamento. Por exemplo, não há nenhuma

medida possível, ainda, de evitar a queda de um meteoro e,

claro, a probabilidade de sua ocorrência também é rara.

Tabela 4 – Tratamento de riscos (VICTORIA GOV. – CROWDCONTROL)

HIERARQUIA DO TRATAMENTO DOS RISCOS

Mais efetivo ELIMINAR Eliminar o risco se possível

31

SUBSTITUIR Substituir o risco por outro mais baixo

MINIMIZAR Minimizar a exposição ao risco

CONTROLE DE ENGENHARIA Desenvolver uma solução de engenharia

CONTROLE DE PROCEDIMENTO Desenvolver um procedimento

TREINAR/SUPERVISIONAR Treinar e supervisionar a equipe

Menos efetivo EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO Instalar equipamentos de

proteção

4.3 TREINAMENTO E SIMULADOS

Uma gama de peritos no assunto aponta como altamente

recomendável o treinamento do pessoal e a simulação de

incidentes para provar a segurança de um evento. Simular desde

pequenos problemas como acúmulo de pessoas no ingresso do

evento a uma ameaça de bomba fornecem os elementos vão levar

ao aperfeiçoamento do seu plano de emergência.

Os treinamentos devem ser conduzidos por especialistas da

área de segurança e gestão de multidão. Simular de forma real

alguns incidentes aumenta a consciência situacional da sua

equipe, ou seja, a capacidade de reagir frente a uma

emergência conforme o protocolo.

Para níveis gerenciais um simulado de mesa pode apontar

erros ou falhas na própria compreensão do atendimento

emergencial em caso de incidente.

4.4 ACESSO

32

Antes mesmo de chegar ao local do evento algumas medidas

podem ser necessárias como o controle do trânsito e do

estacionamento.

O acesso deve ser controlado e possuir entradas

suficientes para dar vazão ao público em horário de pico.

Sistemas de segurança como MAG & BAG (magnéticos e bolsas) são

demorados e devem possuir estações suficientes.

A cobrança de ingresso, mesmo em eventos gratuitos, deve

ser obrigatória. Eventos abertos ao público sem controle de

entrada podem acabar em superlotação e um consequente

desastre.

No acesso também deve ser feito o controle de itens

proibidos como armas de fogo e objetos que possam ser usados

em agressão como pilhas, mastros de bandeiras ou que possam

incitar a violência como faixas preconceituosas.

4.5 SAÍDAS DE EMERGÊNCIA

Possuir uma quantidade adequada de saídas de emergências

pode parecer algo óbvio, mas a história demonstra que nem

sempre é respeitado. Manter todas as saídas destrancadas e com

stewards apontando a saída é uma boa prática.

Estádios e arenas possuem uma área enorme e grande parte

do público presente. Por familiaridade e instinto as pessoas

procurarão a saída por onde entraram. As normas brasileiras

estão tendendo a adotar que 2/3 das saídas de emergências

estejam localizados na mesma face da entrada principal por

este motivo.

33

Sinalização e iluminação de emergência complementam a

orientação do público para tomar uma saída de emergência.

4.6 SERVIÇOS DE SEGURANÇA – SECURITY

Uma grande concentração de público irá trazer pessoas com

diversos objetivos, inclusive de furtar, brigar e algumas

vezes até matar. Possuir um pessoal capacitado para lidar com

situações de controle de multidão é requisito primordial para

uma efetiva gestão de multidão.

Uma proporção adequada entre a quantidade de seguranças e

a de público preserva o ambiente e demonstra força para

aqueles que estejam propensos a cometer desvios.

A equipe de segurança não deve estar preparada somente

para verificar situações de security, mas também de safety. Conhecer

a localização das saídas de emergência, equipamento de combate

a incêndio, como agir em uma emergência médica e como

identificar os avisos de que pode haver um esmagamento é

essencial.

4.7 SERVIÇOS MEDICOS

A manutenção de serviços médicos por um organizador de

evento com multidão tem se consolidado. Legislações passaram a

exigir um número determinado de postos médicos, ambulâncias e

até desfibriladores.

Quanto maior o evento maior a quantidade e também a

complexidade do serviço médico oferecido.

34

4.8 SEGURANÇA CONTRA INCÊNDIO

Dentro de qualquer análise de risco para um evento o

incêndio sempre aparecerá como uma emergência prioritária de

ser tratada mesmo sendo de probabilidade baixa, suas

consequências são devastadoras.

Organizadores de eventos à céu aberto e em estádios

tendem a negligenciar a segurança contra incêndio com a

desculpa de que se não edifícios não há o que queimar e

estruturas de concreto não pegam fogo respectivamente.

Porém simples equipamentos como geradores podem incendiar

e provocar um grande volume de fumaça intoxicando as pessoas

próximas e gerando pânico.

4.9 SERVIÇOS BÁSICOS – ALIMENTAÇÃO E BANHEIROS

A temporalidade de um evento com multidão pode ser de

poucas horas ou as vezes de dias. Neste meio tempo as pessoas

irão procurar atender suas necessidades fisiológicas. Não

oferecer ou oferecer pouca quantidade de serviços sanitários e

de alimentação podem gerar problemas. Deste uma briga na fila

do banheiro até desmaios por falta de alimentação e

hidratação.

4.10 CONTROLE DO FLUXO – BARREIRAS

35

As barreiras estão para a gestão de multidão assim como

os extintores estão para a segurança contra incêndio. Limitam

e conduzem o fluxo da multidão, mas mais importante, evitam o

esmagamento.

Fig. 21 – barreiras antiesmagamento.

4.11 SIMULADORES DE MULTIDÃO

Simuladores de multidão são softwares em que são inseridos

dados sobre determinado evento como a planta de situação, tipo

de público e são capazes de prever o comportamento do público

na normalidade e em caso de uma emergência.

4.12 VIDEOMONITORAMENTO

O videomonitoramento hoje é uma realidade nos locais de

grande eventos. Manter a capacidade de monitorar a

movimentação do público a parir de um ponto fixo traz suas

vantagens, mas um acompanhamento in loco não deve ser

negligenciado pela existência do sistema.

36

Com o videomonitoramento é possível acompanhar uma pessoa

suspeita, verificar uma densidade maior de pessoas, enfim,

juntar informações para que possa tratar-se algo antes que se

torne um incidente.

4.13 COMUNICAÇÃO E INFORMAÇÃO

Falhas na comunicação são um dos maiores problemas em

desastres. Não conseguir transmitir um alerta ou repassar

informações sobre um incidente podem agravá-lo ainda mais. Um

sistema de rádio garante uma comunicação eficiente e

relativamente para operar a segurança do evento.

Comunicar e informar o público deve ser uma constante

seja na normalidade ou na ocorrência de uma emergência. Placas

devem orientar as saídas, bem como o sistema de alto-falante.

4.14 SISTEMA DE COMANDO E CONTROLE

O sistema de comando e controle na gestão de multidão

funciona como um cérebro com todas as outras ferramentas

auxiliando na tomada de decisão e na sua execução. Fica fácil

compreender ao relacionar com o corpo humano as funções de

cada um; o videomonitoramento seriam os olhos, a comunicação,

os ouvidos, a informação, a boca e os serviços de segurança e

saúde os braços e pernas da gestão de multidão.

Para que o sistema de comando e controle funcione

realmente como um cérebro é preciso que tenha este poder de

decisão, que estejam presentes nele as pessoas das agências

37

(polícia, bombeiro e serviço médico) que possam decidir e que

estejam integrados como se fosse uma rede de neurônios em que

a mensagem é transmitida.

Fig. 22 – Sistema de comando e controle para a JMJ 2013.

CONCLUSÃO

Compreender e entender uma multidão ainda é uma missão

desafiadora. A complexidade de seus movimentos,

comportamentos, riscos tornam uma tarefa das mais difíceis que

exigem do poder público e das entidades privadas uma

ferramenta abrangente e que envolva diversos especialistas e

instituições.

Tratar um evento que envolva uma multidão somente pelo

aspecto policial ou da segurança contra incêndio ou como um

ganho comercial é um caminho certo para encontrar um desastre.

38

Nota-se no Brasil uma ausência ou falha de preparação

para lidar com a gestão de multidão. Mesmo após ter recebido

dois eventos de cunho mundial como a Copa das Confederações

2013 e a Jornada Mundial da Juventude 2013, além é claro do

triste incêndio na boate Kiss no município de Santa Maria-RS,

o país parece não aprender ou aprender pouco com seus próprios

erros.

A cultura certamente é o item principal para uma maior

percepção de risco e afeta todos os outros campos, como

normas, procedimentos e até o comportamento das pessoas em

situação de emergência. Modificar esta cultura leva tempo, mas

com certeza segue-se o caminho certo, devagar, mas certo.

ABSTRACT

This paper aims to discuss the best practices in crowd management. From thehistorical survey of crowd disasters in Brazil and the world we will see how complex itis to deal with this issue. The risk that a disaster occurs, particularly traumaticasphyxiation is always there and how to deal with this problem should be the widestpossible. In a country with a culture still developing when it comes to safety,presenting best practices for crowd management is a first step to try to implementthem. 

Keywords: Crowd. Crowd management. Crowd Control. Security at Large Events.

Large events.

39

40

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