Agricultura Metropolitana e Sustentabilidade de Mário Campos - MG
DESAFIOS DA SUSTENTABILIDADE NA AMAZÔNIA AVANÇOS E ENTRAVES DA POLÍTICA TERRITORIAL
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XIX ENCONTRO NACIONAL DE GEOGRAFIA AGRÁRIA, São Paulo, 2009, pp. 1-25.
DESAFIOS DA SUSTENTABILIDADE NA AMAZÔNIAAVANÇOS E ENTRAVES DA POLÍTICA TERRITORIAL
CHALLENGES OF THE SUSTAINABILITY IN AMAZONIA:ADVANCES AND PROBLEMS OF THE TERRITORIAL POLITICS
José Queiroz de Miranda Neto
Resumo: É notório que o atual ritmo de produção fomentado pelo modelo industrial
não é mais adequado à manutenção da ordem capitalista na atualidade. No mundo, no
Brasil e na Amazônia já são fortes os debates e muitas as alternativas para efetivação
de políticas com vistas ao uso sustentável dos recursos. Como exemplo tem-se a
recente formulação de uma POLÍTICA NACIONAL DE ORDENAMENTO
TERRITORIAL (PNOT), que visa o planejamento territorial em longo prazo com vistas
ao desenvolvimento sustentável. Acreditamos que esses esforços são válidos, porém
limitados, já que a reorientação nacional das políticas territoriais, apesar de,
atualmente, sinalizar para uma mudança no que se refere a estratégia adotada, não
altera em essência os parâmetros do desenvolvimento nacional. Na Amazônia, embora
seja evidente a implementação de políticas com vistas a valorização dos fragmentos
territoriais, ainda são persistentes os objetivos de competitividade por meio de práticas
de produção insustentáveis (agropecuária, soja, mineração), evidenciando uma
contradição entre o discurso do desenvolvimento sustentável e a manutenção da
ordem capitalista em benefício do mercado externo.
Abstract: It is evident that the production current rhythm fed by the industrial model is
not more adequate to the maintenance of the capitalist order at the present time. In the
world, in Brazil and in Amazonian are already strong the debates and many the options
for accomplishment of political that aim at the sustainable use of the resources. Like
example, we have the recent formulation of an TERRITORIAL ORDAINMENT’S
NATIONAL POLITICS (TONP), who objectifies the territorial planning in long term with
sights to the sustainable development. We believe that these efforts are valid, however
limited, since the national reorientation of the territorial politicses, despite, nowadays,
indicate a change with regard to adopted strategy, does not change in essence the
parameters of the national development. In Amazonian, although it is evident the
politicses implementation with seen the valorization of the territorial fragments, still are
XIX ENGA, São Paulo, 2009 MIRANDA NETO, J. Q.
persistent the competitiveness goals by means of practices of unsustainable production
(combined agriculture, soya, mining), evidencing a contradiction between speech of the
sustainable development and the maintenance of the capitalist order in benefit of the
external market.
Introdução
A cada nova produção acadêmica ou descoberta científica, acreditamos ser
necessário ir mais longe em nossa capacidade de interpretação dos fenômenos. A
Geografia não tem abdicado desta prática, é o que argumenta Boisier (2002, p. 1) ao
afirmar que o entendimento do território no século XXI implica conhecer o passado
para poder entender o futuro, de tal forma que “los especialistas latinoamericanos son
condenados a vivir para siempre com la cabeza hacia atrás, al pasado, como los
estabam os astrólogos, advinos y veedores del futuro”. Consideramos, contudo, que
não seja necessário ir tão longe ao passado para entender que as formas de
planejamento na Amazônia em décadas anteriores não foram capazes de promover um
desenvolvimento em sentido amplo, com eqüidade de renda e respeito aos limites da
natureza. Diante de um cenário de conflitos, expropriações e degradação ambiental
resultantes de mais de 50 anos de exploração, é notório que as políticas territoriais
implantadas na região precisam de uma reformulação. Contudo, entendemos que a
reorientação nacional das políticas territoriais na atualidade, representada pelos
programas de promoção do desenvolvimento sustentável, muda em estratégia, mas
não altera em essência os parâmetros do desenvolvimento regional, mantendo o antigo
e tão conhecido legado de dependência externa.
Não se trata de uma crítica embasada num lugar teórico a que muitos
cientistas têm recorrido de forma positiva. Mas, pelo contrário, levanta questões ainda
receosas que podem, muito bem, contribuir para o debate em curso. Tais indagações
passam pelo questionamento de uma Política Nacional de Ordenamento do Território
(PNOT), que modifica as prioridades metodológicas do planejamento na escala
nacional e regional. Contudo, verificamos que não há uma reflexão de como a noção
de desenvolvimento sustentável, principal foco dessas políticas, possui uma
aplicabilidade limitada no contexto de uma economia voltada para os critérios
macroeconômicos, sob as regras volúveis da competitividade mundial.
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Desafios da sustentabilidade na Amazônia: avanços e entraves da política territorial, pp. 1-25.
Ao mesmo tempo em que os acordos internacionais começam a chamar
atenção para o problema da questão ambiental, é evidente que muitas das medidas
para a diminuição dos problemas ambientais não tem validade na vida prática. As
políticas criadas nos países do norte estão arraigadas na concepção de
desenvolvimento criada sob os ditames do capitalismo internacional, que privilegia a
acumulação de riquezas e a competitividade. Muitas dessas políticas são exportadas
para o restante do mundo, como modelos a serem adotados com vistas à superação
da antiga concepção produtiva e advento do “capitalismo verde”.
A primeira parte do texto comenta a respeito das contradições econômicas
que se espraiam nos mundos desenvolvido e subdesenvolvido. A segunda parte trata
do papel do Estado no ordenamento do território, afirmando que as práticas de controle
espaço-temporais dos indivíduos são diferenciadas conforme o comportamento
geopolítico no cenário nacional e internacional. A terceira parte trata das políticas
implementadas na Amazônia e suas limitações diante do contexto macroeconômico.
Por fim, são apresentados alguns desafios das políticas públicas na atualidade.
1. A Odisséia dos Mundos Insustentáveis e a Paranóia do Desenvolvimento.
No dia 4 de outubro de 2006 o diário “The Independent” produziu uma
manchete com título alarmante: “o século da seca”. O artigo afirmava que um terço do
planeta será deserto em 2100 devido ao aquecimento global. “A seca extrema atingirá
30% da superfície da Terra, 10 vezes do que atualmente, os animais morrerão à sede
e à fome, a agricultura será impraticável” (JornalismoPortoNet, 2006). Tal previsão, de
cunho científico respeitável, foi apontada num estudo do Instituto Meteorológico do
Reino Unido com a ajuda de um supercomputador, daí o motivo de ser apresentada tão
tarde, pois os recursos técnicos eram incipientes em épocas precedentes. Não se
trata, porém, de um simples alarme ambientalista ou de uma das muitas visões
pessimistas que têm surgido no novo milênio, mas de um estudo respeitado, com uso
de tecnologia avançada e não disponível na maioria dos institutos de pesquisa
meteorológica mundiais.
O aumento da produção industrial e a busca incessante do crescimento
econômico pela maioria dos países do norte e paises do sul, que constituem as causas
preponderantes do aquecimento progressivo do planeta, são os fatores reais das
grandes catástrofes ambientais (aquecimento, fenômenos climáticos, desertificação,
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etc.) e, embora com vários esforços na tentativa de reduzi-los, pouco se fez de
concreto ainda. Isso nos permite afirmar que os macro-impactos ambientais não se
resolvem por si mesmos (com políticas específicas – setoriais), mas estão no topo de
uma grande cadeia de ações na base produtiva e no consumo em massa, daí a
frustração dos grandes tratados e acordos internacionais de cunho ambiental. O
tratado de Kioto, por exemplo, além de não conseguir a adesão do maior dos
poluidores atmosféricos: os EUA (responsável por 25 % dos gases), tem poucas
chances de diminuir a estimativa irrisória de 5,2 % de emissão de gazes entre os
países que assinaram o acordo. A redução de poluentes, contudo, acaba sendo
inversamente proporcional ao crescimento econômica desses países, por isso a
adoção de medidas monetaristas foi uma das ações previstas no protocolo, tal como os
chamados “créditos de carbonos”, espécie de bônus concedido aos países que
mantém grandes reservas vegetais.
Esse é um exemplo, a nível mundial, de como a utilização de instrumentos
coercitivos, como leis ambientais, acordos e tratados internacionais, funcionam muito
mais como “dores de parto” de uma crise premente no sistema produtor de
mercadorias que uma solução possível para diminuir a pressão sobre os recursos
naturais ainda presentes no início do novo milênio. No mundo, no Brasil e na Amazônia
já são fortes os debates e muitas as alternativas para efetivação de políticas com vistas
ao uso sustentável dos recursos, mas enquanto a perspectiva de desenvolvimento não
for alterada, dificilmente tais medidas surtirão efeitos positivos na redução desses
grandes impactos socioambientais.
Os indicadores ambientais alarmantes deviam nos fazer refletir sobre os
rumos da produção científica na atualidade, considerando suas limitações frente aos
modelos de exploração da natureza proeminentes na sociedade capitalista e ao ritmo
das transformações socioespaciais na jornada insustentável do mundo. Dessa forma,
estudos costeiros, análises espaciais, planejamento urbano, recortes territoriais, etc.
podem sofrer uma verdadeira revolução nos próximos 40 anos. Cenários criados para
o zoneamento ecológico-econômico, por exemplo, estão sendo desfeitos antes mesmo
de sua saturação. A lógica espacial das cidades sofrerá alterações em ritmo acelerado
e as migrações tomarão direções hoje imprevisíveis.
Tais cenários estão sendo aqui colocados não para afirmar, de forma pueril,
que não há mais solução para os graves problemas que nos esperam, mas para que
possamos repensar em que nível estamos, enquanto cientistas, servindo aos ideais
contraditórios de uma ordem que acreditamos ser pouco durável. Segundo Glasby
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(2002, p. 334, tradução nossa) “ou nós damos passos muito positivos para melhorar
nossos excessos ambientais agora ou enfrentaremos o prospecto de grandes
catástrofes ambientais no futuro”. Nesse caso, a ação científica não pode ser
desvencilhada do ativismo político sob pena de comprometer, em médio prazo, a
sobrevivência de milhares de pessoas em muitos lugares. Cabe lembrar, contudo, que
“ativismo político” não se refere ao simples engajamento nos movimentos
ambientalistas que se tem na atualidade, mas ao exercício incessante de pressão aos
setores governamentais no sentido de criar políticas realmente eficazes e duradouras
em vez de desenhar um discurso de desenvolvimento sustentável não verificável na
vida prática.
Tal discussão está sendo provocada nestes termos para situar algumas
questões pertinentes à Amazônia num plano bem mais amplo de insustentabilidade
mundial, uma vez que os interesses e as ações relativos a esta região não são
pertinentes somente ao Brasil (por intermédio das políticas nacionais) e aos países da
pan-amazônia (tal como presente na Organização do Tratado de Cooperação
Amazônia – OTCA), mas estão num patamar geopolítico bem mais amplo que inclui a
inserção de significativos programas de financiamento e ordenamento do território sob
a ótica externa. Como exemplo, tem-se a atuação do grupo dos sete países mais ricos
do mundo no Programa Piloto para Proteção das Florestas Tropicais Brasileiras (PP-
G7), imponente no estabelecimento de cenários futuros para o desenvolvimento na
Amazônia. Conforme nos conta Damiani (2002, p. 21) “trata-se de uma territorialidade
mundial, com características de rigidez, controle e poder, movida pelos interesses de
mercados dominantes, que submetem os territórios e as políticas nacionais”.
Uma das finalidades desse artigo é justamente tratar de algumas
contradições da política territorial brasileira presentes na Amazônia sob a influência
desses agentes externos, verificando que a eficácia das práticas ligadas ao
ordenamento territorial demonstra incoerências que são inerentes à própria concepção
dessas políticas, impedindo o efeito dessas ações num cenário duradouro.
Na Geografia, embora as discussões no Brasil sejam correntes desde a
década de 80, o debate acadêmico sobre o território entrou, recentemente, no plano
das ações governamentais pela necessidade da formulação de uma Política Nacional
de Ordenamento Territorial (PNOT), que originou o livro “Para Pensar uma Política
Nacional de Ordenamento Territorial” (BRASIL, 2005), incluindo teóricos como Bertha
Becker, Rogério Haesbaert, Antônio Carlos Robert Morais e Wanderley Messias da
Costa. De todos os textos presentes, cabe atenção especial à síntese produzida por
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Becker (2005), a qual considera que “ordenamento territorial”, enquanto atribuições da
união em escala nacional, é diferente de “uso do solo” (por estar numa escala mais
ampla), de “planejamento regional” (por não corresponder a simples correção de
desigualdades ou indução de fluxos no espaço), de “zoneamento” (que é apenas um
dos múltiplos instrumentos do ordenamento) e mesmo de “gestão do território” (palavra
usada em oposição a outras formas de planejamento estatal na década de 80). Sobre
os objetivos do PNOT, a autora considera, enquanto uma das sínteses atribuídas, que
ordenar o território é pensar e atuar no conjunto de forças que modelam o desenvolvimento do país a partir de um olhar da União e de uma estratégia que vise coordenar as políticas setoriais. Implica a capacidade de pensar e agir em três frentes: nas escalas de sub-regiões e dos lugares, no ordenamento das redes ou no controle e coordenação onde é escassa a presença do Estado, e no estabelecimento de conexões entre os focos dinâmicos da economia e áreas marginalizadas desse processo (p. 76).
Nesse sentido, acreditamos que o ordenamento do território é o novo
instrumental político que irá nortear as ações do Estado nos próximos anos. Não mais
um planejamento essencialmente setorial, mas correspondendo as peculiaridades
naturais, econômicas e culturais de cada fragmento do território. Contudo, não é
simplesmente sobre a questão do ordenamento que pesa as críticas que iremos fazer
neste estudo, mas sobre a concepção de desenvolvimento ainda fundada em
parâmetros insustentáveis e que, apesar dos esforços de descentralização do poder e
de valorização das particularidades locais presentes nas políticas estatais de então, os
níveis de qualidade de vida dificilmente sofrerão saltos qualitativos enquanto o padrão
atual de crescimento estiver essencialmente voltado aos setores “fortes” da economia.
São justamente os setores da produção industrial, da produção energética e
da produção agrícola comercial em larga escala os responsáveis pela grande “odisséia
dos mundos insustentáveis”, pois constituem o “carro-chefe” dos programas de
incentivo e das metas de governo, já que sustentam o equilíbrio da balança comercial e
promovem o aumento das exportações. “Mundos”, no plural, refere-se aos mundos
desenvolvido (poluidores por excelência e por concepção) e subdesenvolvido
(poluidores não por excelência, mas que mantém a concepção dos primeiros), ambos
são insustentáveis porque não conseguem equiparar crescimento econômico,
equidade social, respeito aos limites da natureza e desconcentração espacial das
atividades e da população. Mesmo com graus diferenciados de riqueza, possuem
objetivos comuns, isto é, metas progressivas de crescimento baseadas em critérios da
macroeconomia (superávit comercial, controle inflacionário, equilíbrio fiscal, etc). Esse
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emprenho se baseia na racionalidade do lucro e da competição, nada mais
contraditório se ponderados os problemas presentes e futuros decorrentes desta
prática.
Os países do sul criticam os padrões de poluição dos EUA e da Europa
contraditoriamente, pois, ainda que os primeiros mantenham padrões de degradação
natural historicamente menores, acabam sustentando a concepção (de
desenvolvimento) desses últimos, seguindo empenhos econômicos semelhantes ou até
superiores (como no caso da China). Segundo o relatório Brundtland, “seria necessária
uma elevação de 5 a 10 vezes o nível de atividade econômica para se eliminar a
pobreza nos termos da produção atual” (Cavalcanti 2003, p. 166), medida considerada
inatingível pelo próprio relatório. Conforme nos adverte o economista Celso Furtado, a
“transição do subdesenvolvimento para o desenvolvimento é dificilmente concebível no
quadro da dependência” (FURTADO apud PELLEGRINO, 2005, p. 91), uma vez que a
transferência tecnológica – representada pelo avanço das multinacionais e incremento
da produção de bens duráveis – só é eficaz na produção de bens voltados aos países
ricos, em detrimento do consumo popular.
Os países do sul, em especial da América Latina e da pan-amazônia, podem
conter em si grandes germes de mudança para diminuir a pobreza sem calcular os
rigorosos critérios da economia mundial, pois, em sua jornada insustentável, tiveram
que encarar problemas não visualizados nos países do norte. Porém, não obstante
possuírem condições para criar soluções a sua maneira, com instrumentos próprios,
continuam importando modelos externos na tentativa de adequá-los a realidades que
lhes são incompatíveis. Segundo Santos (1979, p. 21) “existem muitos exemplos da
contribuição da ciência regional, da geografia e do planejamento regional para a
difusão do capital”. O autor se refere, mais especificadamente, a adoção de modelos
gerais produzidos em paises desenvolvidos (pólos de crescimento, descentralização e
desconcentração espacial das grandes cidades, industrialização deliberada,
descentralização concentrada etc.), que em nada contribuíam para o desenvolvimento
dos países mais pobres, pelo contrário, conduziam tais países às práticas capitalistas
de localização espacial e marginalização socioeconômica gerando um ciclo de
dependência vicioso. Segundo o autor, tal lógica poderia ser considerada uma
investida ideológica com intuito de desconsiderar o empenho intelectual dos países
periféricos quanto as suas práticas de planejamento regional e, ao mesmo tempo, de
gerar uma “totalidade do diabo”, capaz de difundir o capital e mudar as estruturas
sociais nesses países em favor de desígnios capitalistas globais.
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A política de ordenamento territorial brasileira, por exemplo, embora com
características próprias, fundamenta-se na concepção européia definida na Carta
Européia de Ordenação do Território (CEOT) como “a expressão espacial das políticas
econômicas, sociais, culturais e ecológicas da sociedade” (PUJADAS; FONT, 1998, p.
11). Ora, se observarmos a concepção de território (ou de territorialidade – pelos
múltiplos usos e apropriações) presente em de Sack (1986, p. 6), veremos que o
território implica numa área, delimitada por uma fronteira e que permite o controle ou
acesso das coisas que estão dentro dela. Então, nos princípios do ordenamento
territorial europeu (e, por conseqüência, também do brasileiro), para controlar é
necessário definir recortes espaciais visando melhor gerir os recursos naturais com
vistas a produzir sem comprometer o sustento das gerações futuras, de forma que se
mantenha vivo, também, o sistema produtor de mercadorias. Daí reside à relação
inconteste entre a concepção de desenvolvimento sustentável e a formulação de
políticas para o ordenamento do território.
Contudo, se os padrões gerais da sociedade continuam assentados no
consumo em massa – com vistas à acumulação e ao dispêndio de recursos –, logo os
efeitos do ordenamento territorial serão inócuos. Os efeitos desejados só serão
produzidos, então, se o capitalismo conseguir gerar valor agregado a todos os produtos
de base regional/local, desde o ouro até a fibra da juta, ampliando os mecanismos de
geração de emprego e renda. Caso esse fenômeno ocorra, a alteração dos hábitos de
consumo ajudará a manter o ciclo de acumulação e dispêndio de recursos. Reiteramos,
portanto, que a origem dos problemas reside no próprio sistema de valores da
sociedade, baseado na geração de excedentes para a acumulação de capitais.
Para melhor situar nossa formulação, retomaremos de forma sintética os
termos do debate nas seguintes afirmações:
a) As grandes catástrofes ambientais decorrentes do aquecimento global não
são simples conseqüência da emissão de poluentes na atmosfera, mas estão no topo
de uma cadeia produtiva que tem como principais causas a concepção de
desenvolvimento gestada nos países do norte e reproduzida para os países do sul, de
que para combater a pobreza e tornar a economia sustentável em longo prazo é
necessário promover o crescimento econômico com base em critérios
macroeconômicos.
b) Visando atenuar conflitos e promover o uso sustentável dos recursos
naturais, alguns países adotaram as políticas de ordenamento territorial – no caso do
Brasil a PNOT –, que têm no território o centro para efetivação das políticas públicas,
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diferentemente de uma visão setorial que compartimenta as ações governamentais e
obscurece o desempenho estatal no cenário nacional.
c) A política de ordenamento territorial, principiada nos países europeus pela
Carta Européia de Ordenação do Território (CEOT), vem acompanhada de um dolorido
apêndice que inviabiliza sua real efetivação. Apesar de possuir objetivos
aparentemente legítimos, sua gestação se deu sob os patamares de um capitalismo
sedento de recursos naturais devido ao insucesso de ações de desenvolvimento
anteriores. Seus principais instrumentos (tal como o macrozoneamento ecológico-
econômico) constituem medidas incipientes para promoção do desenvolvimento, uma
vez que as metas de crescimento do PIB dependem da expansão de setores
econômicos insustentáveis (agricultura comercial, produção industrial e energética)
relegando os demais (agrícultura familiar, extrativismo, produção com base local) a
uma participação irrisória. Esse intuito obscurece os ideais de desenvolvimento
sustentável tão anunciados pelos setores governamentais na atualidade em favor de
interesses privativos e monetaristas.
d) Os países subdesenvolvidos, com destaque aos países latinos da pan-
amazônia (detentores de enormes fontes de recursos naturais), não podem ficar a
margem de um padrão de desenvolvimento que não lhes pertence por excelência,
relegados à periferia da economia mundial. Pelo contrário, precisam estabelecer
prioridades diferenciadas com vistas a combater problemas crônicos (miséria,
marginalidade, violência, mau uso dos recursos) com instrumentos próprios. Os
intelectuais de nosso tempo devem pensar em algo nessa direção.
2. Uma Geografia para Ordem Política do Espaço
Uma política do espaço jamais será inerte, ela é dinâmica, pela capacidade
de se modificar em função do contexto histórico que se insere, e sutil, pela criação uma
teia ideológica capaz de fazer de uma ordem estranha as bases culturais de um novo
cotidiano. Nesse sentido, conforme o raciocínio de Raffestin (1993, p. 60) de que o
território é “a prisão que os homens constroem para si”, apresentaremos alguns
argumentos da geografia política visando discutir como o Estado – enquanto expressão
política das próprias contradições sociais – lança mão de alguns instrumentos visando
o controle espaço-temporal dos indivíduos desde uma forma primária (pela repressão,
coação e proibição imposta aos indivíduos) até uma lógica mais aprimorada (pelo
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debate, cooperação e integração entre Estado e segmentos sociais). Essa discussão é
necessária para se entender os fundamentos da política territorial e as contradições
presentes nas últimas décadas, visando esclarecer que o sistema produtor de
mercadorias gera, por meio do Estado, normas de conduta espaciais com intuito de
reproduzir seus fundamentos econômicos em contextos diversos, dependendo do ritmo
e da forma de acumulação de riquezas que se pretende atingir.
O discurso político da modernidade e a concepção sistêmica do Estado
capitalista são gestados ainda entre os séculos XV e XVI, “onde também se verifica a
mais profunda revolução geográfica que se tem notícia” (Santos, 2002, p. 77). Na
medida em que começam as preocupações com a produção do espaço decorrentes
das novas regiões produtoras na América e na África e da intensificação dos fluxos de
pessoas e mercadorias, surge a necessidade indispensável de criar novas formas de
representação desse espaço (geometria, triangulação, fronteira, etc) necessárias ao
mapeamento de porções terrestres. Segundo Harvey (1992, p. 233), as políticas
espaciais se desenvolveram a partir de novas demandas da sociedade burguesa em
formação, que começou a se preocupar com o problema da produção do espaço
(construção de vias, portos, pontes, cidades, etc.) como fenômeno social e político. Na
França, por exemplo, pensando democratizar e dispersar o poder político pela
estratégia espacial, foi idealizado, no século XVIII, um sistema racional da
administração em “departamentos”, que eram unidades administrativas para aplicação
de políticas públicas. Nesse contexto, podemos afirmar que o estado capitalista é, por
sua natureza, um “Estado territorial”, uma vez que cria padrões espaciais com
fronteiras bem definidas visando disciplinar os indivíduos de forma a controlá-los e
classifica-los, retendo-os ou não em suas fronteiras. Segundo Giddens (1991, p. 23)
“nenhuma das sociedades pré-modernas, virtualmente, era tão claramente delimitada
como os Estados-nações modernos”. Essa necessidade em estabelecer limites, em
demarcar fronteiras, é o terreno fértil para o desenvolvimento de ciências ligadas ao
conhecimento do espaço.
O nascimento da Geografia Política como disciplina acadêmica surgiu
justamente da necessidade de servir às potências européias do século XIX de um
instrumental específico com vistas ao conhecimento e ao controle do território.
Segundo Castro (2005, p. 60), a “Geografia possibilitou a produção de uma resposta
aos estímulos externos decorrentes da expansão territorial e da exploração de novas
áreas coloniais ou daquelas politicamente delimitadas”. A ciência geográfica, que em
épocas precedentes era tratada como ramo do conhecimento pertinente a viagens e
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explorações, é institucionalizada na década de 1870 como uma disciplina de mais alta
relevância no meio acadêmico, justamente pelo caráter político que adquiriu ao servir
como suporte das ações estatais no controle/domínio de seus territórios.
Segundo Lacoste (apud LIPIETZ, 1993, p. 150) “o Estado é também uma
entidade geográfica e o aparelho de estado organiza o espaço geográfico de modo a
exercer seu poder sobre os homens”. De acordo com Foucault (2004), o poder não
pode ser encarado como uma relação assimétrica (os que mandam de um lado e os
que obedecem de outro), mas como um conjunto de relações que se exercem
permanentemente e se irradiam de baixo para cima, sustentando as instâncias de
autoridade. Seguindo esse raciocínio, o Estado não se encontra do lado oposto da
sociedade, mas é absolutamente imanente ao conjunto de instituições criadas pela
mesma visando “disciplinar” os homens, fazê-los produzir manipulando suas
potencialidades de acordo com uma ordem social vigente. Assim, a própria idéia de
Estado – enquanto unidade – é uma mera abstração.
Ora, o controle sobre os homens implica no controle sobre as categorias
básicas da existência humana – o espaço e o tempo. Segundo Harvey (2005, p.
189-190) “as mudanças de nosso aparato conceitual (incluindo representações do
espaço e do tempo), podem ter conseqüências materiais para organização da vida
diária”, dessa forma, de acordo com o ambiente construído que predomina (ou que se
planeja) pode ser que tenhamos de se adaptar a novas práticas espaço-temporais. É
possível afirmar, inclusive, que em cada fase do sistema capitalista (comercial,
industrial, financeiro) tem-se uma nova forma de organização da sociedade e do
Estado e, por conseguinte, novas estratégias de controle são consolidadas com vistas
a (re)ordenar o ambiente geopolítico nos diversos níveis escalares.
Becker (2001) lança duas hipóteses sobre o poder mundial: uma que está
centrada no Estado como a única unidade política de ordem mundial (poder
unidimensional) e fundada no determinismo geográfico – a “geopolítica”; e outra,
instituída no fulcro da ciência, da tecnologia e que sustenta a valorização das
diferenças espaciais e da cultura, “deslocando-se a questão do mero controle do
espaço, para o controle também do tempo, configurando a cronopolítica” (BECKER,
2001, p. 287). Esta última configuração do poder mundial – denominada de “logística” –
vem acompanhada de uma ação territorial aprimorada, cirúrgica, onde o poder
disciplinar (aquele que não se exerce pela força) é difundido por diversos fragmentos
de território. Essa nova faceta do poder atinge diretamente os corpos dos indivíduos,
fazendo-os produzir de acordo com os interesses da ordem social construída sob os
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moldes de um capitalismo racionalizado, onde a prática predominante é a seletividade
espacial.
Nesse contexto, o desenvolvimento sustentável passa a ser o novo modelo
logístico para ordenar o uso do território, como uma espécie de racionalização das
ações capitalistas sobre o ambiente visando gerir melhor os recursos e as populações,
controlando-os não apenas em seu espaço absoluto ou na direção de seus fluxos, mas
em seu contexto, na definição dos modos-de-vida e nas suas formas de apropriação e
uso do território. Trata-se de uma nova feição da geopolítica contemporânea: a
tentativa de “ajustar o sistema capitalista por meio da conciliação das tendências da
lógica da acumulação com as da lógica cultural, particularmente os movimentos
ambientalistas” (BECKER 2001, p. 293). Tal ajuste necessita de um aparato técnico-
científico primoroso, pois nunca o conhecimento do território se deu sob patamares tão
rigorosos de informação (levantamentos e definição de riscos ambientais, diagnósticos
de potencialidades, estudos socioeconômicos, etc). Da mesma forma, o mapeamento
da diversidade natural constitui o instrumento primordial para esse novo plano de
ações, uma vez que os valores econômicos são estendidos à natureza enquanto trunfo
para sua utilização futura (capital natural) não raro em conformidade com a visão
conservacionista de muitos setores ambientalistas.
Contudo, Segundo Harvey (2005, p 77) esses ideais de justiça social e
conservação “gradualmente são convertidos em objetivos de eficiência e racionalidade
do mercado”. O Estado capitalista, nesse sentido, não está nem enfraquecendo nem
abdicando seus princípios, pelo contrário, atua em conformidade com o projeto
territorial inicial, porém com maior rigor na delimitação de suas fronteiras e muito mais
aprimorado em seu discurso ideológico.
A Geografia Política, como um ramo da ciência geográfica que se ocupa das
relações de poder, controle, dominação e apropriação sobre a base material e
simbólica da sociedade – o território –, deve, mais do que outros ramos científicos,
estar atenta às ações Estatais no tocante a constituição e aplicação de políticas sobre
o espaço de reprodução dos indivíduos na atualidade. Reproduzir o discurso atual de
desenvolvimento sustentável com base no ordenamento territorial visando otimizar a
qualidade de vida das populações é apenas um dos recursos ideológicos para
manutenção da ordem capitalista em seu estágio atual. Mais adiante, veremos como
esse discurso é avesso, se considerarmos a realidade da Amazônia no conjunto das
políticas que promovem o desenvolvimento no Brasil e no mundo. Para tanto,
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lançaremos mão de alguns argumentos e indicadores econômicos para melhor situar
nosso recorte analítico.
3. Amazônia em “Dores de Parto” e a Ordem Social Prematura
Discorrer sobre o significado do desenvolvimento na Amazônia é, hoje, muito
mais complexo do que foi há 40 anos, pois a região abriga atores com diferentes perfis
econômicos e culturais que se consolidaram em áreas cuja diversidade e fragilidade
muitas vezes não lhes são convenientes, mas que lhes pertence pelo uso, isto é, pelo
uso que faz do espaço um território. A Amazônia tem se tornado, então, o grande
laboratório das transformações sociais visíveis a “olho nu”, o verdadeiro ciclo entre a
tese e a antítese, entre a ordem e a desordem, num espaço de tempo tão curto e
historicamente tão rico de processos.
Becker (2004) define três grandes períodos da ocupação da formação da
região amazônica que consideramos importante: a) a formação territorial (1916-1930),
marcada pela apropriação lenta e gradativa do território por parte dos portugueses,
cuja política econômica era orientada pelo mercantilismo; b) a fase do planejamento
regional (1930-1985), onde se verifica uma aceleração da ocupação da Amazônia
viabilizada pelo moderno aparelho estatal, notadamente sob a direção do governo
militar; c) a incógnita do heartland (1985-...), período definido pelo esgotamento do
nacional desenvolvimentismo e da formação de grandes movimentos de resistência
das populações locais, com destaque ao movimento seringueiro.
No segundo período citado, o processo de ocupação deixou um grande
rastro de impactos socioambientais irreversíveis, uma vez que as formas de
planejamento definidas para a região desconsideraram a realidade social pré-existente,
alterando profundamente os hábitos e os modos-de-vida das populações locais. O
modelo de enclave, marcado pela penetração de grandes projetos agrominerais, criou
uma mobilização social para um único empenho econômico: o da produção em larga
escala com o objetivo de gerar divisas para o pagamento da dívida externa. Nesse
intuito, o Estado promoveu uma grande mobilidade de mão-de-obra para viabilização
desses projetos, promovendo, mais tarde, a concentração urbana e a geração de
grandes ocupações espontâneas sem planejamento.
A pecuária bovina de corte foi um dos grandes empreendimentos
incentivados pelo Estado. Sob o ponto de vista ambiental, segundo Pandolfo (1994, p.
13
XIX ENGA, São Paulo, 2009 MIRANDA NETO, J. Q.
121), “a experiência demonstrou sobejamente que os solos florestados de terra firme,
quando usados para formação de pastagens, sofrem um declínio rápido de sua
capacidade de suporte”. E do ponto de vista social, “a pecuária apresenta elevada
relação capital/trabalho, oferecendo escassa oportunidade de emprego” (PANDOLFO,
1994, p. 121). A pecuária extensiva, conjugada a lavoura itinerante em solos
florestados e a legislação sem grande responsabilidade ambiental, resultou numa
seqüência de desmatamento que degenerou grande parte da floresta equatorial
amazônica. No que tange as conseqüências sociais desse processo, a região se
transformou num grande caldeirão de conflitos agrários, visto que o planejamento
estatal abandonou à sorte muitos dos colonos transferidos para região durante a
década de 60.
O legado de apenas 40 anos de ocupação da Amazônia sob os padrões
capitalistas de desenvolvimento gera um ciclo de desmatamento e consumo de
recursos naturais que traz conseqüências onerosas para o século atual e dificilmente
não se estenderá ao século futuro. “Dentro de um cenário pessimista, o desmatamento
projetado pode eliminar, até meados deste século, 40% dos atuais 5,4 milhões de km²
de florestas da Amazônia” (SOARES-FILHO et al 2005, não paginado). Contudo, ainda
na década de 90, sob as pressões do movimento ambientalista e no ritmo das novas
conformações territoriais frente à reordenação do mundo pós guerra-fria, a “economia
de fronteira” – que considerava os recursos naturais inesgotáveis – é substituída pelo
discurso da proteção ambiental e do desenvolvimento sustentável, sobretudo a partir
do que resultou a Conferência da Nações Unidas para o Meio Ambiente e
Desenvolvimento realizada no Rio de Janeiro em 1992 ( a ECO-92).
A partir de então, o patrimônio natural da Amazônia passa a ter um novo
significado no contexto nacional e internacional. No mundo, começam a ser costurados
os grandes circuitos espaciais de poder (PP-G7, Governo Brasileiro, países da pan-
amazônia, União Européia, Nasa, etc) com intuito de promover a proteção da reserva
natural amazônica. Nesse contexto é que se fundamenta a Política Nacional de
Ordenamento Territorial brasileira (PNOT). Segundo Rückert (2007, não paginado) “a
construção da PNOT se dá em cenário de mudança de sentido das políticas territoriais
do Estado brasileiro”, na qual novas estratégias de controle são traçadas após a crise
do nacional-desenvolvimentismo e do planejamento centralizado. Dentre essas
estratégias está: a) a valorização das políticas de ordem territorial em substituição às
políticas setoriais; b) a criação de planos de desenvolvimento sustentável em unidades
territoriais; c) a criação de condições para integração internacional; d) A retomada de
14
Desafios da sustentabilidade na Amazônia: avanços e entraves da política territorial, pp. 1-25.
um projeto industrial baseado no vetor técnico-científico; e) a possibilidade do diálogo
entre o Estado e a população local.
Na Amazônia, o Plano Amazônia Sustentável (PAS) propõe superar os erros
do passado e atenuar muitos dos conflitos presentes na região relacionados à gestão e
ao uso dos recursos naturais. Segundo Becker (2004, p. 141) o PAS elegeu cinco
focos de ação prioritários: “produção sustentável com tecnologias avançadas; gestão
ambiental e ordenamento do território; inclusão social; novo padrão de financiamento; e
infra-estrutura para o desenvolvimento”. No documento “Amazônia Sustentável –
Diretrizes e Prioridades do Ministério do Meio Ambiente para o Desenvolvimento
Sustentável da Amazônia Brasileira” (BRASIL, 2008), o Governo Federal insere como
objetivo principal do PAS
a promoção do desenvolvimento sustentável da Amazônia brasileira, mediante a implantação de um novo modelo pautado na valorização de seu enorme patrimônio natural e no aporte de investimentos em tecnologia e infra-estrutura, voltado para a viabilização de atividades econômicas dinâmicas e inovadoras com a geração de emprego e renda, compatível com o uso sustentável dos recursos naturais e a preservação dos biomas, e visando a elevação do nível de vida da população (p. 56).
O Zoneamento Ecológico-Econômico, enquanto instrumento das ações
governamentais inseridas no Plano Plurianual de Ação (PPA) visa, segundo o Caderno
de Referencia do Ministério do meio Ambiente (BRASIL, 2006, p. 9) “integrar aspectos
naturais e sociais na gestão do território” a partir da definição de Zonas (conforme
estudos detalhados com uso de mapeamento em escalas padronizadas) nas quais
serão inseridas políticas com vistas a equilibrar os conflitos de uso do território, otimizar
a produção, valorizar as diferenças culturais, melhorar as condições infraestruturas e
de saneamento, bem como proteger a natureza e garantir o sustento das gerações
futuras. Em outras palavras, representa a (re)orientação da política nacional brasileira
para uma concepção territorial, visando tornar eficiente a gestão pública por meio do
planejamento em médio/longo prazo.
Diante desse novo cenário, percebe-se, no entanto, que algumas questões
ainda se apresentam de forma nebulosa, principalmente se considerarmos a idéia que
traçamos no início de nossa discussão sobre a concepção de desenvolvimento. A
Amazônia está em “dores de parto”, pois urge que sejam tomadas medidas rápidas
para diminuir o ritmo de degradação ambiental presente na região e que se promova
uma nova consciência de exploração dos recursos naturais. É sabido que o Governo
Federal tem iniciado esforços nesse sentido, porém, insistimos que, enquanto não se
15
XIX ENGA, São Paulo, 2009 MIRANDA NETO, J. Q.
promova uma inversão de prioridades na economia nacional e por conseqüência, na
economia regional amazônica, estaremos apenas velando nosso discurso por de traz
de uma malha fina e frágil que brevemente se romperá. O ideal de emprego e renda,
definido como objetivo principal do PAS, conduz novamente ao principio de uma
economia de mercado baseado na geração de excedentes. De alguma forma o capital
será acumulado, o consumo será aquecido e a produção em larga escala vai ter que
dar conta dessa ampliação econômica. A questão fundamental é: a partir de que
momento o “capitalismo verde” (sob a égide do desenvolvimento sustentável)
conseguirá se manter sem, com isso, deixar de lado o principio da acumulação de
capitais.
Diante disso, é possível questionar que resultados virão a partir das “dores
de parto” presentes na realidade amazônica atual. Será uma ordem social realmente
endógena, isto é, com forças internas capazes de mudar lógicas de produção e alterar
os padrões de desenvolvimento que corroem os países pobres? Ou uma ordem social
prematura, que mantém a dominação e o controle em favor de lógicas globais e
monetaristas tão comuns em épocas precedentes?
Situaremos alguns indicadores que podem, por alto, demonstrar o discurso
do avesso proeminente na relação entre o econômico e o político no que concerne às
ações do Estado brasileiro sobre o território na atualidade, em consonância com as
contradições mundiais de empenho econômico versos proteção ambiental.
Tomando como base algumas atividades do setor primário no Brasil, é
possível visualizar alguns dados que podem enriquecer nossa discussão. Em 2002,
segundo declaração do Ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, a
participação dos produtos do agronegócio representou 41,9% do total arrecadado com
as exportações brasileiras. De acordo com dados do IBGE (2006a), os principais
produtos agrícolas (em toneladas) produzidos em outubro foram a cana-de-açúcar (455
988 573) e a soja em grão (52 356 720). Na escala mundial, o Brasil é competitivo na
produção de Soja, produtos de madeira, couros de bovinos e fios de seda e, no setor
agromineral, destacam-se os seguintes produtos: minério e semimanufaturas de ferro,
alumínio e manganês (altamente intensivos em energia). O setor energético, com
destaque à atuação da Petrobrás no mercado internacional também é fator
preponderante para o aumento das exportações brasileiras.
Tais produtos constituem a base para o incremento das exportações e para o
crescimento satisfatório do PIB brasileiro. Correspondem, portanto, as atividades de
maior incentivo financeiro e de disponibilidade de terras no país. Na Amazônia, a
16
Desafios da sustentabilidade na Amazônia: avanços e entraves da política territorial, pp. 1-25.
atuação da pecuária bovina é preponderante e essencial na geração de divisas no
mercado internacional, contudo, tal atividade tem sido uma das principais responsáveis
pelo desflorestamento na região (cobrindo 80% das áreas desmatadas), principalmente
em sua atividade extensiva – alternativa imediata para valorização da terra degradada
logo após as primeiras culturas anuais, incapazes de reciclar os nutrientes para o solo.
Ainda assim, contraditoriamente, a agropecuária é “um dos principais motores do
desenvolvimento nessa região” (TOURRAND et al., 2004). No Pará, destacam-se as
atividades da produção agromineral (78,8 % das exportações no Estado) seguida pelo
extrativismo da madeira (9,8 %), demonstrando uma orientação socioprodutiva não
diferente do que se propõe em nível nacional. Da mesma forma, a economia da soja no
Mato-grosso (11.675.284 t. em 2000), cresce de forma acelerada segundo análise
espacial do INPE (2005), onde a maioria dos municípios já se dedica à atividade (de 50
municípios em 1991 para 65 em 2000), incrementando sobremaneira a produção
nacional. No Amazonas, o pólo de Manaus permite ao Estado a participação de 1,7%
(com 56,9% de atividade ligada à indústria) no PIB nacional, constituindo a área de
maior incentivo no Estado e também responsável pelo aumento da população urbana
em 74,9% (2000) naquele que apresenta a maior área em km2 do Brasil.
Em estudo recente, o IBGE (2006b) identificou que o Estado do Amazonas é
também o que apresenta maior concentração espacial de renda do país (90,7% nos
cinco maiores municípios), com destaque ao município de Manaus, ligado à produção
industrial, e ao município de Coari, voltado à produção de petróleo e gás e de cozinha.
A pesquisa concluiu também que, na região Norte, as unidades com maior destaque no
PIB municipal são os municípios de Marabá (Pa), Barcarena (Pa), Parauapebas (Pa) e
Tucurui (Pa), ambos situados na área de forte vocação mineral da região.
A realidade da urbanização e concentração espacial da população e das
atividades econômicas na Amazônia tem constituído fator decisivo para o índice atual
de degradação ambiental e para o crescimento urbano desordenado. O processo de
pavimentação rodoviária concentra as atividades econômicas ao longo das estradas,
provocando grandes clarões de desmatamento no chamado “arco de fogo” (sul e
sudeste do Pará, norte do Mato-grosso e Rondônia). A indução dos fluxos
populacionais e o surto migratório dos grandes projetos agrominerais geraram, em
poucos anos, grandes concentrações na periferia das capitais e das principais cidades,
constituindo populações urbanas sem equipamentos urbanos e reduzindo
drasticamente os níveis gerais de qualidade de vida na região. Contudo, apesar de
todos esses entraves iniciais, insiste-se na necessidade de manter essas atividades na
17
XIX ENGA, São Paulo, 2009 MIRANDA NETO, J. Q.
Amazônia pelo fato de corresponderem aos interesses econômicos do Brasil e do
mundo.
Como compatibilizar, então, atividades essencialmente insustentáveis em
contextos sociais e ecológicos historicamente incompatíveis, como ocorre no caso do
avanço da economia da soja sobre o cerrado brasileiro? Esse é o grande desafio a ser
travado pelas políticas de ordenamento do território na atualidade. Espera-se, na
verdade, que um conjunto de instrumentos de base espacial e jurídica (áreas
protegidas, regulação de uso e concessões de terras) seja decisivo para limitar o ritmo
de exploração dos recursos naturais no Brasil e, em especial, na Amazônia. Porém, se
considerarmos o principal argumento econômico que norteia essas políticas, veremos
que medidas coercitivas (leis ambientais) para disciplinar o uso do território constituem
apenas uma das grandes ações a serem tomadas e não o foco principal. Enquanto não
houver uma inversão de prioridades na economia nacional, tantos as leis ambientais
quanto o aparato estatal da fiscalização terão sua eficácia reduzida, isso é
demonstrado pelos indicadores atuais de degradação ambiental. Segundo dados do
IBGE (2004), a taxa de desflorestamento bruto anual em relação à área de floresta
remanescente na Amazônia Legal aumentou entre 1997 e 2001, juntamente com a
criação de várias reservas ambientais. Atualmente, o Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais (Inpe) vem registrando aumento alarmante do desmatamento na Amazônia
Legal, principalmente em três estados: Mato Grosso (53,7% do total desmatado), Pará
(17,8%) e Rondônia (16%). Esse processo é motivado pelo aumento do preço
internacional da soja e da carne.
A nosso ver, um dos maiores problemas das políticas territoriais presentes na
atualidade residem na concepção de desenvolvimento sustentável fundada nos
princípios neoclássicos da economia, segundo a qual seria possível equilibrar os
fatores de degradação ambiental com medidas legais capazes de regular as ações
sobre o ambiente. O primeiro item a ser considerado nesse processo é a valorização
monetária dos bens e serviços ambientais, isto é, das chamadas “externalidades
ambientais”, que são compensadas toda vez que determinadas atividades são
aplicadas ao espaço. Contudo, segundo Montibeller (2004, p. 88) o “problema reside,
então, em como imputar valor econômico (ou valor monetário, visto tratar-se de
economia de mercado) àquilo que não se expressa através do preço”. São muitos e
polêmicos os mecanismos utilizados para essa mensuração, porém não se consegue
avaliar, em curtíssimo prazo, se tais instrumentos são realmente eficazes.
18
Desafios da sustentabilidade na Amazônia: avanços e entraves da política territorial, pp. 1-25.
Na Amazônia, a economia da soja está entre as atividades mais
insustentáveis presentes na região. Como seria possível, então, dispor de meios para
tornar esta atividade sustentável em tempo hábil sem comprometer o ritmo de
crescimento esperado? Em estudo recente, Ortega (2003) compara os benefícios e os
custos das principais modalidades tecnológicas de produção da soja no Brasil e verifica
que a melhor opção para o país é um sistema agrícola baseado em pequenas
propriedades familiares de cultivo ecológico-orgânico, a qual “permite ao agricultor uma
qualidade de vida aceitável no campo, com um bom uso de recursos naturais, uso
moderado de recursos econômicos e reciclagem de materiais” (ORTEGA, 2003, p. 16).
Os sistemas convencionais de plantação da soja, segundo o estudo, são praticamente
inviáveis se o governo cobrar as taxas e multas referentes às externalidades
ambientais. Logo, a produção atual da soja, grande sustentáculo da economia
brasileira, assim como outros produtos da base produtiva nacional (milho, cana-de-
açúcar e produtos do setor agropecuário) sobrevive em função de sua própria
insustentabilidade.
Reiteramos, então, a idéia de que as políticas de ordenamento do território
no Brasil são eficazes em seu discurso, porém, se não avançarem enormemente em
seus resultados práticos em pouco tempo é provável que precisem alterar os princípios
que norteiam a concepção de sustentabilidade anunciados até então. Nesse sentido, é
urgente a definição de uma agenda no intuito de promover um ordenamento alicerçado
numa nova concepção que torne possível a inversão de prioridades na economia
nacional: ao invés da produção de commodities para a exportação – com utilização de
meios insustentáveis para suprir demandas internacionais – seja incentivada a
valorização de produtos da economia local, fomentando as trocas regionais. Só assim
é possível diversificar funções no espaço, manter o homem no campo, desconcentrar
atividades, desaglomerar o urbano e aumentar os índices de qualidade de vida no
Brasil e na Amazônia.
4. Avanços e Entraves da Política Territorial na Amazônia
Embora em fase inicial, podemos citar como avanços da política territorial em
curso: o princípio de valorização das diferenças territoriais e da busca de
descentralização das atividades econômicas através do sensível apoio aos arranjos
produtivos locais; o aumento da participação social em eventos decisivos na
19
XIX ENGA, São Paulo, 2009 MIRANDA NETO, J. Q.
formulação de políticas públicas para a Amazônia – na escala sub-regional o macro-
zoneamento com representação da sociedade civil e, na escala municipal, as
audiências públicas para formulação dos planos diretores; a formulação de
diagnósticos com maior rigor na definição dos estudos socioeconômicos e valorização
da diversidade cultural (não mais concebendo o espaço enquanto vazio demográfico
ou planície isotrópica); a preocupação evidente com os limites da natureza e com a
diversidade ambiental, definindo áreas protegidas e com uso limitado. Todas essas
ações começam a ser inseridas nas diversas esferas de governo (com destaque à
esfera federal) como medidas para se promover o desenvolvimento sustentável na
Amazônia.
Contudo, como já afirmamos anteriormente, o apêndice dolorido desta
política nos padrões produtivos da economia nacional assenta-se nas contradições que
são inerentes à própria concepção de desenvolvimento, traduzida erroneamente em
“desenvolvimento sustentável”. A nosso ver, só haverá sustentabilidade no Brasil
quando as prioridades econômicas deixarem de estar pautadas nos setores que
sustentam o caráter exportador semi-periférico do país com vistas ao crescimento da
economia sob os critérios mundiais. A base da economia nacional está assentada em
formas de produção insustentáveis, que não se mantém sequer pelo critério
neoclássico das externalidades, como verificamos no caso da soja. Com isso, medidas
singulares no país precisam ser reiteradas, tal como a implementação de uma reforma
agrária para promover a pulverização da produção agrícola em pequenas unidades,
minimizando os impactos socioambientais na agricultura e, por conseqüência, também
nas áreas urbanas. Mas, como sabemos, essa orientação diverge dos interesses
internacionais, que demandam uma grande quantidade de grãos e de produtos da base
primária.
Para concluir este item, podemos sintetizar alguns argumentos de forma a
melhor definir os resultados desse estudo:
a) A geografia do início do século XX foi definida por Yves Lacoste como
aquele que serve para fazer a guerra, para os desígnios do Estado e para a
manutenção da ordem capitalista (LACOSTE, 1976). Será que os intelectuais de nosso
tempo retomaram esses ideais ao aceitarem o novo discurso do “fim da história”,
tomando como legítimas as tendências de desenvolvimento preconizadas pelos
grandes organismos internacionais e executadas pelo Estado? Acreditamos que a
Geografia e as demais ciências sociais e econômicas podem se apropriar de um papel
20
Desafios da sustentabilidade na Amazônia: avanços e entraves da política territorial, pp. 1-25.
diferenciado, contestando os mecanismos ineficientes de desenvolvimento e propondo
cenários alternativos que desmistifiquem as contradições evidentes em nosso tempo.
b) Diante da valorização do patrimônio natural da Amazônia em oposição à
economia de fronteira, os grandes organismos internacionais começam a impetrar um
novo valor estratégico à região através de mecanismos que visem à conservação e à
regulação para utilização dos recursos naturais. Nesse contexto, o governo federal
começa a discutir a definição de políticas territoriais para a Amazônia, com a
formulação de programas que promovam o desenvolvimento sustentável na região por
meio da disciplinarização do uso do território.
c) A base econômica das políticas territoriais centra-se na teoria neoclássica
pautada na definição de externalidades, ou seja, imputa valores monetários aos bens
naturais (recursos hídricos, florestas, ar, solo, etc) – traduzindo-se na “mercantilização
da natureza” (Becker, 2004) – como se os tais pudessem ser efetivamente calculados.
Citamos o exemplo da soja apresentado por Ortega (2003) para afirmar que, se forem
realmente ponderadas as externalidades no caso da produção da soja, haverá um
colapso na oferta de grãos brasileiros para o mercado internacional, afetando a
principal base das exportações do país. Acreditamos que essa idéia seja válida não
apenas para a soja, mas também para outros produtos de exportação (agricultura
comercial, agropecuária, mineração e setor energético), onde as externalidades não
compensariam, de fato, os prejuízos da degradação ambiental.
d) Nesse sentido, não é simplesmente sobre as necessidades de um
ordenamento que deve pesar a formulação de políticas nacionais, já que o problema
está na macroestrutura que sustenta os padrões historicamente insustentáveis de
desenvolvimento no Brasil. Por isso, tais padrões precisam ser reformulados sob pena
de comprometer ainda mais os níveis de qualidade de vida da população nos próximos
anos. Logo, a idéia de desenvolvimento sustentável, embora sob as estampas da
“justiça social”, é também eficaz no sentido de promover o individualismo, a
manutenção dos níveis de dependência e a eficiência dos mercados produtivos
mundiais sobre os nacionais.
e) Para redefinição dessas ações, é necessário refletir sobre novos
instrumentos que permitam a reorientação de valores econômicos e a busca de novas
prioridades para a economia nacional. Tal investimento depende de um esforço
conjunto por parte dos países que estão à margem de um processo de
desenvolvimento capitalista para criação de uma agenda independente, onde a
integração privilegie outros fatores além da competitividade capitalista.
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XIX ENGA, São Paulo, 2009 MIRANDA NETO, J. Q.
Considerações Finais
Acreditamos que existe um avanço nas discussões sobre o desenvolvimento
na Amazônia a partir da reorientação das políticas públicas nacionais. O Plano
Plurianual de Ação (PPA) traz em seus fundamentos uma nova concepção de
planejamento que privilegia o ordenamento territorial ao invés de políticas setorias que
burocratizam e emperram o desempenho das ações estatais no cenário nacional. O
Plano Amazônia Sustentável (PAS), no âmbito do PPA, visa direcionar políticas para a
Amazônia que, aparentemente, não privilegiam apenas o objetivo monetário, mas
combinam prioridades sociais de emprego, renda e capacitação. Acreditamos, no
entanto, que nos padrões de dependência atuais dos países do sul, dentre os quais
Brasil, tais medidas são demais otimistas no sentido de equilibrar equidade social e
estabilidade macroeconômica, com políticas adequadas tanto ao coletivo e aos
contextos culturais quanto à produtividade e à competitividade.
Através do reconhecimento dos principais produtos da base de exportação
brasileira, é possível entender que as prioridades nacionais assentam-se na
necessidade de aumentar o nível das exportações com vistas ao crescimento
econômico (principal argumento do governo desde 1970). Conforme nos recomenda
Furtado (1974, p. 45) as receita típicas para a superação do subdesenvolvimento
originam o “mimetismo cultural” das minorias beneficiárias do “capitalismo periférico”,
as quais procurariam reproduzir as formas de produção e consumo dos países
“cêntricos”, requerendo, para tanto, permanente concentração de renda. Portanto, o
modelo de desenvolvimento, assim como as estratégias de gestão e controle dos
recursos são apropriados pelos países periféricos como se fossem pertinentes a eles,
mas, na verdade, constituem mais um capítulo da longa história de dependência
econômica, porém sob a roupagem de um capitalismo racionalizado e falsamente
estampado nos princípios da justiça social.
As estratégias internacionais de desenvolvimento, que tem agora a
Amazônia como foco principal, resultam da reorientação geopolítica mundial justificada
pela preocupação com a preservação dos recursos naturais com vistas à utilização
futura – o projeto de desenvolvimento sustentável. Contudo, esse projeto se mostra
contraditório frente a verdadeira pressão sobre os recursos no país decorrente de
atividades insustentáveis. Dessa forma, a verdadeira endogenia só poderá ser
22
Desafios da sustentabilidade na Amazônia: avanços e entraves da política territorial, pp. 1-25.
verificável na prática se houver uma inversão de prioridades no sentido de cortar os
laços de dependência mundiais, verdadeiros responsáveis por aquilo que chamamos
subdesenvolvimento.
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