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Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade 9 Bol. Téc. Cient. Cepnor, Belém, v. 9, 2009 RESUMO O caranguejo-uçá é um importante recurso pesqueiro em toda sua área de ocorrência. No Brasil, as principais áreas estão concentradas nas regiões Norte e Nordeste. Apesar da implantação de medidas mais rígidas de controle, tais como tamanho mínimo de captura e período de defeso, os estoques continuam a decair, mostrando que apenas a regulamentação da cata do caranguejo é insuficiente para garantir a sustentabilidade da exploração desta espécie. As coletas de dados que fundamentam o presente trabalho aconteceram em uma ilha na comunidade Beira Mar distante 10 km da sede do município de Curuçá. As amostragens foram realizadas mensalmente no período de junho de 2003 a junho de 2006. Os exemplares foram capturados por meio de “braceamento”. Para identificação da espécie utilizou-se uma chave sistemática específica. A caracterização dos estádios de desenvolvimento gonadal das fêmeas foi feita por meio de observações visuais das gônadas, levando em consideração a forma, a coloração, o volume e o grau de turgidez. Foram analisados 4.173 indivíduos sendo 2.363 fêmeas e 1.810 machos. O período reprodutivo ocorre de outubro a abril com o pico máximo em março. Os tamanhos de primeira maturação gonadal encontrados para largura e comprimento da carapaça foram, respectivamente, de 3,74 cm e de 2,4 cm. Houve predomínio de fêmeas para o total dos indivíduos amostrados respectivamente numa proporção de 43,4% e 56,6%, ou seja, (0,77M: 1F). Palavras-chave: Caranguejo-uçá, RESEX Mãe Grande, reprodução. ABSTRACT Aspects of reproductive of crab Ucides cordatus (Linnaeus, 1763) in marine extractive reserve Mãe Grande Curuça, Pará, Brazil The crab is an important fishery resource throughout its range. In Brazil, the main areas are concentrated in the North and Northeast. Despite the introduction of stricter measures of control, such as minimum landing size and closure, as stocks continue to decline, showing that only the regulation of cata crab is insufficient to ensure the viability of this species. The data collection underlying this study took place in an island community Beira Mar distant 10 km from the town of Curuçá. Samples were collected monthly from June 2003 to June 2006. Samples were taken by “braceamento. For species identification we used a systematic specific key. The characterization of the stages of gonadal development of females was made by visual observations of the gonads, taking into account the shape, color, volume and degree of turgidity. We analyzed 4173 individuals and 2363 females and 1810 males. The breeding season occurs from October to April with peak in March. The size of first gonadal maturation found for width and carapace length were, respectively, of 3.74 cm and 2.4 cm. There was a predominance of females to the total individuals, respectively at a rate of 43.4% and 56.6%, ie (0.77 M: 1F). Key words: Uçá-crab, RESEX Great Mother, reproduction. ASPECTOS REPRODUTIVOS DO CARANGUEJO-UÇÁ Ucides cordatus (LINNAEUS, 1763) NA RESERVA EXTRATIVISTA MARINHA MÃE GRANDE DE CURUÇÁ, PARÁ, BRASIL Kátia Cristina de Araújo Silva 1 Ingrid Lins da Silva Ferreira 2 Carlos Tassito Corrêa Ivo 3 Maria Vera Lucia Ferreira de Araújo 2 Alex Garcia Cavalleiro de Macedo Klautau 4 Israel Hidenburgo Aniceto Cintra 1 1 Professor da Universdidade Federal Rural da Amazônia. E-mail: [email protected] 2 Engenheira de Pesca 3 Professor da Universidade Federal do Ceará 4 Analista Ambiental do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade

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Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade

9Bol. Téc. Cient. Cepnor, Belém, v. 9, 2009

RESUMO

O caranguejo-uçá é um importante recurso pesqueiro em toda sua área de ocorrência. No Brasil, as principais áreas estão concentradas nas regiões Norte e Nordeste. Apesar da implantação de medidas mais rígidas de controle, tais como tamanho mínimo de captura e período de defeso, os estoques continuam a decair, mostrando que apenas a regulamentação da cata do caranguejo é insufi ciente para garantir a sustentabilidade da exploração desta espécie. As coletas de dados que fundamentam o presente trabalho aconteceram em uma ilha na comunidade Beira Mar distante 10 km da sede do município de Curuçá. As amostragens foram realizadas mensalmente no período de junho de 2003 a junho de 2006. Os exemplares foram capturados por meio de “braceamento”. Para identifi cação da espécie utilizou-se uma chave sistemática específi ca. A caracterização dos estádios de desenvolvimento gonadal das fêmeas foi feita por meio de observações visuais das gônadas, levando em consideração a forma, a coloração, o volume e o grau de turgidez. Foram analisados 4.173 indivíduos sendo 2.363 fêmeas e 1.810 machos. O período reprodutivo ocorre de outubro a abril com o pico máximo em março. Os tamanhos de primeira maturação gonadal encontrados para largura e comprimento da carapaça foram, respectivamente, de 3,74 cm e de 2,4 cm. Houve predomínio de fêmeas para o total dos indivíduos amostrados respectivamente numa proporção de 43,4% e 56,6%, ou seja, (0,77M: 1F). Palavras-chave: Caranguejo-uçá, RESEX Mãe Grande, reprodução.

ABSTRACT

Aspects of reproductive of crab Ucides cordatus (Linnaeus, 1763) in marine extractive reserve Mãe Grande Curuça, Pará, Brazil The crab is an important fi shery resource throughout its range. In Brazil, the main areas are concentrated in the North and Northeast. Despite the introduction of stricter measures of control, such as minimum landing size and closure, as stocks continue to decline, showing that only the regulation of cata crab is insuffi cient to ensure the viability of this species. The data collection underlying this study took place in an island community Beira Mar distant 10 km from the town of Curuçá. Samples were collected monthly from June 2003 to June 2006. Samples were taken by “braceamento. For species identifi cation we used a systematic specifi c key. The characterization of the stages of gonadal development of females was made by visual observations of the gonads, taking into account the shape, color, volume and degree of turgidity. We analyzed 4173 individuals and 2363 females and 1810 males. The breeding season occurs from October to April with peak in March. The size of fi rst gonadal maturation found for width and carapace length were, respectively, of 3.74 cm and 2.4 cm. There was a predominance of females to the total individuals, respectively at a rate of 43.4% and 56.6%, ie (0.77 M: 1F).Key words: Uçá-crab, RESEX Great Mother, reproduction.

ASPECTOS REPRODUTIVOS DO CARANGUEJO-UÇÁ Ucides cordatus (LINNAEUS, 1763) NA RESERVA EXTRATIVISTA

MARINHA MÃE GRANDE DE CURUÇÁ, PARÁ, BRASILKátia Cristina de Araújo Silva 1

Ingrid Lins da Silva Ferreira 2Carlos Tassito Corrêa Ivo 3

Maria Vera Lucia Ferreira de Araújo 2Alex Garcia Cavalleiro de Macedo Klautau 4

Israel Hidenburgo Aniceto Cintra 1

1 Professor da Universdidade Federal Rural da Amazônia. E-mail: [email protected] Engenheira de Pesca3 Professor da Universidade Federal do Ceará4 Analista Ambiental do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade

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INTRODUÇÃO

O caranguejo-uçá, Ucides cordatus tem sido citado como importante recurso da fauna estuarina desde o início do século XIV (MELO, 1996). Sua área de ocorrência é bastante extensa, abrangendo locais das Índias Ocidentais e da Costa Atlântica da América, também com registro mais ao norte na Costa Rica e Flórida, ao Sul no Brasil e em outras ilhas das Índias Ocidentais, com importância econômica no Brasil, Suriname e República Dominicana (NASCIMENTO, 1993). No Brasil, ocorre desde a Região Norte até Santa Catarina, onde é conhecido como “castanhão”, sendo um recurso pesqueiro de importância econômica, principalmente no Norte e Nordeste (IVO; GESTEIRA, 1999).

Além de sua importância econômica é um alimento muito nutritivo sendo bastante utilizado pelas populações ribeirinhas na alimentação diária, os nutrientes que ocorrem em maior quantidade, nas partes comestíveis, são nitrogênio, lipídio, sódio, cálcio e fósforo em ordem decrescente (NASCIMENTO, 1993).

A produção brasileira de caranguejo-uçá nos anos de 2005, 2006 e 2007 apresentou decréscimo signifi cativo, passando de 10.150,5 toneladas em 2005 para 6.818,0 em 2007, com destaque para a Região Norte que foi responsável por cerca de 50% de toda produção nacional com 5.730,0 toneladas e 2.807 nos anos anteriomente citados. Praticamente toda produção desta área foi obtida no Pará com produções de 5.652,0 toneladas e 2.748,0 respectivamente (IBAMA, 2007a; IBAMA, 2007b e IBAMA, 2008).

No Brasil, a cata do caranguejo-uçá é uma das atividades mais antigas de extrativismo nos manguezais, sendo ainda praticada por comunidades tradicionais litorâneas que vivem de sua comercialização. Segundo Barbieri e Mendonça (s/d), neste contexto destaca-se, a região do Salgado, no Pará; o delta do Parnaíba, entre Maranhão e Piauí; todo o estado de Sergipe; as baías de Guanabara e de Sepetiba, no Rio de Janeiro; e o manguezal de Iguape e Cananéia, no litoral Sul de São Paulo.

Como animal semi-terrestre de hábito noturno, habita a zona entre marés, em galerias largas escavadas no lodo, sempre retas e relativamente rasas, com profundidades que variam de 0,60 a 1,50 m, dependendo da época do ano, que são habitadas por apenas um indíviduo; às vezes, ocupam galerias de outras espécies, como, por exemplo, dos gêneros Cardissoma (Latreile, 1825), Uca (Leach, 1814) e Goniopsis

(De Haan, 1833), os adultos ocorrem em áreas de sedimento lodoso, com predomínio de silte e argila (<0,05 mm), enquanto os estágios juvenis são mais frequentes em sedimento arenoso, com predomínio de areia fi na (0,2 a 0,05 mm) (NASCIMENTO, 1993; PINHEIRO; FISCARELLI, 2001).

Na fase adulta apresenta coloração variando de azul–celeste ao marrom–escuro, conforme a época do ano. Suas patas possuem coloração lilás ou roxa já na fase jovem, que permanece inalterada na fase adulta, embora possam adquirir tonalidade ferruginosa ou marrom-escura pouco antes da muda, quando, geralmente são confundidos com outras espécies (PINHEIRO; FISCARELLI, 2001).

Na época de reprodução os indivíduos saem de suas galerias em grande quantidade, vagueiam pelo manguezal, entrando e saindo das galerias, em perseguição uns aos outros, batendo-se com suas quelas; nesta ocasião podem ser capturados facilmente a mão sem uso de qualquer petrecho de captura. Durante o acasalamento o macho deposita o líquido seminal nas aberturas existentes na base do terceiro par de patas da fêmea com o auxílio do penis. Em seguida os espermatozóides são transferidos para os receptáculos seminal das fêmeas, ai permanecendo por até 30 dias quando são usados para a fecundação dos ovos (MOTA-ALVES, 1975; ALCANTARA-FILHO, 1978).

A regulamentação da pesca do caranguejo-uçá no Brasil foi estabelecida pelo IBAMA, a partir de 1989, para proteger o estoque juvenil, proibindo a captura de indivíduos machos menores de 45 mm, de fêmeas de qualquer tamanho e o estoque desovante no Nordeste. Em 1998 foi estabelecido o primeiro defeso da espécie no Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Santa Catarina. Em 1999, este órgão estabeleceu que para a sua captura só será permitido o uso do método do “braceamento” (MOTA, 2005).

A partir de 2003, com a portaria Nº 30/03-N, de 24 de junho de 2003, o IBAMA proibiu a captura de fêmea, anualmente, somente no período de 1º de dezembro a 31 de maio, no Pará e na região Nordeste, e delegou competência aos gerentes do IBAMA nestes estados para suspender a captura do caranguejo-uçá durante o fenômeno da migração reprodutiva (andada, carnaval). É também proibida em qualquer época a captura, coleta, transporte, benefi ciamento, industrialização e a comercialização de exemplares cuja largura de carapaça seja inferior a 6,0 cm e permiti a captura da espécie somente pelo método do braceamento com auxílio de gancho ou cambito com proteção na extremidade.

A elevada procura por caranguejo-uçá tem feito com que o número de pessoas que se dediquem à

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captura deste recurso pesqueiro estuarino aumente ano a ano. Também o uso de novas artes de pesca eleva o esforço de pesca sobre os estoques explorados, além de, ocasionalmente, como no caso das “redinhas”, poluírem o mangue. O conjunto destes fatores deverá eventualmente resultar na sobrepesca das populações nas várias áreas exploradas (IVO; VASCONCELOS, 2000).

A situação dos estoques de caranguejo-uçá se apresenta com uma elevada produção em algumas localidades do Nordeste, principalmente no Delta do rio Parnaíba, no Maranhão e no Piauí. Observamos também um aumento do esforço de pesca, mas é provável que a captura ainda não tenha entrado no estágio de sobrepesca devido ao processo de coleta, com baixo índice de participação de fêmeas, em decorrência da proibição de sua pesca e do seu pequeno valor comercial, e da pequena proporção de indivíduos capturados com comprimento abaixo daquele correspondente à primeira maturidade sexual (MOTA, 2005).

Preocupa sobremaneira a redução provável dos estoques do caranguejo-uçá em áreas de mangue, seja pela destruição do seu habitat, seja pela captura elevada em diferentes localidades, mas também, pelo surgimento de uma enfermidade (“Doença de Caranguejo Letárgico”), que desde 1997 causou mortandade em massa de populações desta espécie em várias localidades na região Nordeste. O agente causador dessa mortandade, ao que se indica, é um fungo negro do grupo dos ascomicetos (SILVA et al., 2006). Os caranguejos com este fungo perdem a capacidade de coordenação dos seus movimentos, tornando-se letárgico. Em poucos dias, os animais infectados acabam morrendo. Em várias cidades turísticas como Salvador e Aracaju, por exemplo, a redução na oferta de caranguejo nos bares e restaurantes gerou um drástico aumento nos preços, criando até mesmo um mercado para importação de caranguejos de outras regiões do país ainda não afetadas pela doença (SILVA et al., 2006).

Entende-se que as análises realizadas no presente trabalho deverão oferecer subsídios para futuro plano de manejo dentro da Reserva Extrativista Marinha Mãe Grande de Curuçá, estado do Pará. Assim, este trabalho tem como objetivo estudar a reprodução do caranguejo-uçá, Ucides cordatus (Linnaeus, 1763), na reserva em consideração.

MATERIAL E METÓDOS

Os dados que serviram de base para o trabalho são provenientes do projeto Bioecologia do caranguejo-uçá Ucides cordatus (Linnaeus, 1763) desenvolvido na Reserva Extrativista Marinha Mãe Grande de Curuçá, estado do Pará, como parte do programa de pesquisa do Centro de Pesquisa e Gestão dos Recursos Pesqueiros do Litoral Norte (CEPNOR).

A Reserva Extrativista Marinha de Mãe Grande de Curuçá (Figura 1) foi criada no ano de 2002, como unidade de conservação de uso sustentável, tendo como objetivo conciliar a manutenção das populações naturais com o sustento da população humana ali residente. Esta situada em Curuçá, na Região do Salgado, no nordeste do Pará. Por lei, uma reserva extrativista é uma área de domínio público utilizada por populações tradicionais, cuja subsistência é comprovadamente baseada no extrativismo, na agricultura de subsistência ou na criação de animais de pequeno porte. Em Mãe Grande do Curuçá, a maioria da população depende da pesca (MAGALHÃES, 2005).

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A área total da Resex Mãe Grande de Curuçá abrange aproximadamente 37 mil hectares de estuário estando povoada por famílias e cerca de seis mil pescadores, divididas em 49 pequenas comunidades instaladas em ilhas, “furos”, rios e praias da região (MAGALHÃES, 2005).

As coletas de dados aconteceram em uma ilha localizada na comunidade Beira Mar distante 10 km da sede de Curuçá, entre a latitude 00º 44’S e a longitude 047º 55’W (Figura 2). As amostragens foram realizadas mensalmente no período de junho de 2003 a junho de 2006. Resalta-se que não houve coleta em fevereiro de 2004, junho, julho e setembro de 2005 e fevereiro de 2006.

Figura 1. Mapa da Reserva Extrativista Mãe Grande de Curuçá,Pará, Brasil. Fonte: CNPT/IBAMA.

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Tomando-se como referência o leito do rio foram traçadas três linhas paralelas entre si e o leito do rio, equidistantes 100 m uma da outra. Sobre cada uma destas linhas foram marcadas três áreas de 25 m2 marcadas com cordas de nylon da mesma cor para cada linha, sendo uma central, uma a esquerda e uma a direita da área central, distanciadas por cerca de 100 m, totalizando 9 áreas amostrais (Figura 3).

Figura 2. Mapa de localização do estado do Pará e do município de Curuçá destacando a comunidade Beira Mar.

Mensalmente retornava-se, a mesma localidade para coleta dos indivíduos. Tiradores de caranguejo, utilizando-se invariavelmente da técnica de coleta denominada “braceamento” retiravam todos os caranguejos existentes em cada área. Durante as coletas também foram medidas a salinidade com refratômetro com variação entre -2 e 100, e a temperatura com termômetro com vaiação -10º a 110ºC. A salinidade e a temperatura foram medidas na água do rio e das tocas.

Os exemplares coletados em cada uma das três áreas de cada linha foram colocados em três sacos de ráfi a que em seguida foram fechados com fi tas da mesma cor da corda de nylon que demarcou cada linha. Depois os indivíduos foram lavados pelos pescadores na beira do rio para retirada de lama do corpo do animal, e acondicionados em três isopores etiquetados (um para cada linha), cobertos com gelo e transportados para análise no Laboratório de Carcinologia no Cepnor. Durante todo processo amostral os indivíduos foram mantidos separados de acordo com as linhas.

A identifi cação da espécie foi realizada no laboratório de Carcinologia utilizando a chave sistemática de Melo (1996). Em seguida foi feita a sexagem com base nas características morfológicas externas diferenciadas de machos e fêmeas. Na fase adulta (que se inicia por volta de 5 cm) os machos adquirem um

Figura 3. Esquema das áreas de coleta.

ESQUERDA CENTRAL DIREITA

ESQUERDA CENTRAL DIREITA

ESQUERDA CENTRAL DIREITA

Linha 1

Linha 2

Linha 3 manguezal

100 m

100 m

Rio

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tamanho pouco superior ao das fêmeas e apresentam o abdome alongado, estreito e com formato próximo ao triangular, esta estrutura é semicircular e alargada. Na fase juvenil, o formato do abdome é similar entre os sexos, requerendo, pois, para a identifi cação mais segura do sexo do indivíduo a contagem do número de pares de pleópodos do indivíduo, os machos possuem apenas dois pares de pleópodos, associados ao primeiro e segundo somitos respectivamente, enquanto as fêmeas possuem quatro pares com dois ramos (birremes), presentes apenas do segundo ao quinto somito abdominal (PINHEIRO; FISCARELLI, 2001).

Outra característica que possibilita diferenciar o macho da fêmea é a quantidade de “pelos” presente na face ventral do segundo ao quinto par de patas; nos machos verifi ca-se uma franja densa de cerdas, enquanto que nas fêmeas o número é extremamente reduzido, sendo mais esparsas e com menor espessura (PINHEIRO; FISCARELLI, 2001).

A biometria dos exemplares foi feita com auxílio de um paquímetro que mede até 150 mm com precisão de 0,1 mm. Os indivíduos foram medidos para determinação do comprimento do cefalotórax – CC (medida linear com o paquímetro colocado entre os olhos e a extremidade oposta) e a largura do cefalotórax – LC (medida linear entre os pereópodos, na porção mais larga da carapaça). Também foi obtido o peso total (PT) de cada indivíduo com uma balança de precisão que pesa até 235 g com aproximação de 1 g.

A caracterização dos estádios de desenvolvimento gonadal das fêmeas foi feita por meio de observações visuais das gônadas, observando-se forma, coloração, volume e grau de turgidez (MOTA-ALVES, 1975). Já o estágio de muda foi determinado utilizando a descrição de Drach (1939) baseado na consistência da carapaça.

Para determinação do período reprodutivo, foi utilizado o método da análise da variação temporal de ovários nos distintos estágios de maturidade, classifi cados macroscopicamente e a de indicadores quantitativos da fase em que a gônada se encontra dentro do processo de maturação sugerido por Vazzoler (1996). Este método calcula a frequência relativa de fêmeas em relação ao número total de fêmeas coletadas por mês em relação ao número de fêmeas coletadas em cada estágio de maturidade. Foram descartadas 17 fêmeas por falta de dados relacionados à maturidade gonadal.

A maturidade sexual é um dos parâmetros biológicos mais importantes para o manejo adequado das populações do caranguejo-uçá. O tamanho mínimo de captura citado nas leis de defeso pesqueiro equivale ao tamanho a partir do qual metade da população de cada sexo está matura. No caranguejo-uçá existem duas formas distintas para sua determinação: 1 – Maturidade Fisiológica, relacionando o tamanho do animal com o estágio de maturação das gônadas de cada sexo; e 2 – Maturidade Morfológica, pela detecção de mudanças no crescimento das pinças do macho e do abdome das fêmeas, em relação ao tamanho do animal (PINHEIRO; FISCARELLI, 2001).

A análise do tamanho médio de primeira maturação gonadal para comprimento e largura de carapaça das fêmeas foi determinada utilizando o método do ajuste da equação de uma Ogiva de Galton aos pontos da curva de frequência acumulada e da extrapolação gráfi ca segundo Fonteles-Filho (1989) e Vazzoler (1996). No ajuste da ogiva de Galton considera-se a proporção de fêmeas maduras como variável dependente (Y) e o comprimento e largura como variável independente (X), por meio de regressão linearizada por tranformação logarítimica, considerando-se a seguinte equação:

L50 = exp {[ln (-ln (1-0, 5)-ln a)] /b},sendo A = ea e b, onde a e b são coefi cientes angular e linear da equação de regressão.De acordo com Fonteles-Filho (1989) extrapolação gráfi ca consiste em plotar a proporção de fêmeas

adultas (estádios II-V) em relação ao número total de fêmeas, contra seu comprimento, para se obter uma curva de frequência acumulada cuja mediana (L50) fornece uma estimativa do comprimento com que a metade das fêmeas potencialmente reprodutivas atinge a 1ª maturidade gonadal, e um ponto inicial da faixa assintótica em que todas as fêmeas (100%) da população estão aptas a se reproduzir (L100).

Para a proporção sexual foram analisados três aspectos: estrutura da espécie para o período como um todo, variação temporal da proporção entre fêmeas e machos, e variação da proporção sexual por classe de comprimento. Onde se calculou a frequência relativa de fêmeas e de machos para o período total, por mês e por classe de comprimento, aplicando-se aos resultados o teste do qui-quadrado (χ2), para identifi car as diferenças estatisticamente signifi cativas a nível α = 5%. Este teste é calculado pela seguinte equação:

χ2 = (Fobs – Fesp)²/ Fesp,onde, Fobs é a frequência observada e Fesp é a frequência esperada para o conjunto estudado; sendo os valores tabelados do χ 2 = 3,84 para α = 0,05 e grau de liberdade = 1 usado como teste.

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RESULTADOS E DISCUSSÃO

Para as análises realizadas no estudo foram coletados, um total de 4.173 indivíduos, sendo 1.810 machos e 2.363 fêmeas.

A se considerar a frequência mensal de ocorrência de fêmeas por estádio de desenvolvimento gonadal nas amostras realizadas na Resex de Curuçá, tem-se o que segue (Tabela 1, Figura 4): (1) Fêmeas imaturas, estádio I de desenvolvimento gonadal, foram encontradas ao longo do ano, com frequência mais signifi cativa de abril a outubro e pico em junho; (2) Fêmeas em maturação, no estádio II, foram encontradas durante quase todo o ano todo com elevada frequência de abril a novembro com pico em agosto; (3) Fêmeas no estádio III, também aparecem ao longo do ano, com maior intensidade de julho a dezembro com pico em novembro; (4) As maiores frequências de fêmeas no estádio IV ocorreram de outubro a abril, com pico em março, sendo que a pouca frequência de exemplares em fevereiro não prejudica a análise, a se considerar a alta frequência destes indivíduos em janeiro, e, neste caso, a falta de indivíduos no estádio IV em fevereiro poderia ser creditada ao acaso; (5) Fêmeas no estádio V foram encontradas com maior frequência no período de março a junho, agosto e outubro, com o pico em maio, originado provavelmente dos indivíduos que se encontravam no estádio IV durante os meses de outubro a abril, pelo que se infere que a passagem do estádio IV para o estádio V de maturação gonadal se prolonga por quatro meses.

Assim, o período reprodutivo é sazonal ocorrendo nos meses de outubro a abril, com maior intensidade em março. Porém este período se diferencia dos encontrados por Alcantara-Filho (1978) no Rio Ceará-CE, por Antunes-Mattos et al. (2007) no manguezal de Piedade-RJ, por Araújo e Calado (2007) em Alagoas-AL, por Botelho; Dias e Ivo (1999) no rio Formoso e no rio Ilhetas-PE, por Branco (1993) no manguezal do Itacorubi-SC, por Dalabona e Silva, (2005) na Baía das Laranjeiras-RJ, por Diele (2000) no rio Caeté-PA, por Ivo; Dias e Mota (1999) no rio Parnaíba-PI, por Leite (2005) no estuário do rio Coreaú-CE, por Mota-Alves (1975) em Caucaia-CE, por Monteiro e Coelho-Filho (2007) no estuário do rio Paripe-PE, por Pinheiro e Fiscarelli (2001) em Iguape-SP, por Vale (2003) no município de Bragança-PA, por Vasconcelos; Vasconcelos; Ivo (1999) no rio Curimatau-RN. Por outro lado, corraborando com o pico reprodutivo encontrado por Vale (2003), o qual ocorre em fevereiro e março (Tabela 2).

Quanto ao estádio de muda foram encontradas fêmeas no estádio de muda-A apenas em setembro (não siginifi cativo). Já o estádio de muda-B ocorre em janeiro e de julho a outubro. O estágio de muda-C aparece de janeiro a dezembro com intensidade nos meses de janeiro a maio. O estádio de muda-D aparece de março a dezembro com maior intensidade em junho (Figura 5).

Tabela 1 – Frequência mensal de ocorrência de fêmeas por estádio de desenvolvimento gonadal e de machos do caranguejo-uçá, Ucides cordatus, capturados na Resex de Curuçá, no período de junho de 2003 a junho de 2006.

MesesSexo

Total geralfêmea

total machoI II III IV V

jan 3 4 5 90 8 110 176 286fev 1 0 0 4 10 15 127 142mar 11 19 13 197 25 265 138 403abr 73 63 17 38 63 254 132 386mai 62 104 5 10 75 256 111 367jun 74 95 5 3 18 195 87 282jul 36 101 20 0 0 157 164 321ago 54 112 31 2 30 229 190 419set 56 76 40 11 0 183 128 311out 31 69 62 69 24 255 179 434nov 12 43 73 129 10 267 173 440dez 1 8 26 125 0 160 205 365Total 414 694 297 678 263 2.346 1.810 4.156

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Figura 4. Porcentagem mensal de fêmeas do caranguejo-uçá, Ucides cordatus, por estádio de desenvolvimento gonadal, capturadas na Resex de Curuçá, no período de junho de 2003 a junho de 2006.

Tabela 2. Período reprodutivo do caranguejo-uçá, Ucides cordatus, conforme determinado por diferentes autores para diversas localidades no Brasil.

Autor LocalReprodução

Período PicoAlcantara-Filho, 1978 Rio Ceará (CE) dezembro a maio janeiroAntunes-Mattos, et al., 2007 Baia da Guanabara (RJ) novembro a abril dezembroAraújo, Dias e Ivo, 2007 Alagoas (AL) dezembro a maioBotelho, Dias e Ivo, 1999 Rio IIhetas (PE) dezembro a maio janeiroBotelho, Dias e Ivo, 1999 Rio Formoso (PE) dezembro a maio janeiroBranco, 1993 Itacorubi (SC) - janeiroDalabona e Silva, 2005 Baia da Larangeiras (RJ) dezembro a abril -Diele, 2000 Rio Caeté (PA) dezembro a abril janeiro e fevereiroIvo, Dias e Mota, 1999 Parnaíba (PI) dezembro a abril janeiroLeite, 2005 Rio Coreaú (CE) novembro a março janeiroMota-Alves, 1975 Caucaia (CE) - -Monteiro e Filho, 2007 Rio Paripe (PE) dezembro a março fevereiroPinheiro e Fiscarelli, 2001 Iguape (SP) dezembro a março dezembro e janeiroVale, 2003 Rio Caeté (PA) dezembro a abril fevereiro a marçoVasconcelos, Vasconcelos e Ivo,1999 Rio Curimatau (RN) outubro a março novembro

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Figura 5. Número de indivíduos do caranguejo-uçá, Ucides cordatus, por estádio de muda capturado na Resex de Curuçá, no período de junho de 2003 a junho de 2006.

O clímax da ecdise é atingido quando a carapaça se rompe na parte posterior e, imediatamente o animal começa a retirar o corpo “mole” do interior da carapaça (só músculo) recoberto por uma fi na membrana. Esta fase demora em média de 5 a 6 horas. Fora da carapaça antiga, o caranguejo permanece parado, parecendo morto. A membrana que reveste o corpo em contato com a água incha e juntamente com a substância leitosa vai endurecendo. Após 12 a 18 horas, o animal está completamente recuperado e com a nova carapaça endurecida. Nesse momemto abandona então a toca no alto manguezal e dirige-se para a zona de entre-marés, onde escava outra toca, e retormam as suas atividades, maiores em tamanho, porém muito magros. Depois de determinado tamanho entre 60 e 65 mm de comprimento de carapaça, o seu processo de muda se detém (NASCIMENTO, 1993).

Ivo e Gesteira (1999) descrevem que os indivíduos jovens podem mudar de carapaça com frequência bimensal e que a partir dos 30,0 mm de comprimento da carapaça, a muda passa a ser anual com o aumento de 10,0 mm em cada ecdise. De acordo com Alves e Nishida (2002), para que o crescimento dos crustáceos ocorra é necessário que seu exoesqueleto rígido seja trocado periodicamente, este fenômeno de troca é denominado de muda (ou ecdise), enquanto o exoesqueleto antigo descartado é popularmente conhecido como “casca” (ou exúvia).

Para Alves e Nishida (2002) em estudo realizado em Manguape-PB, a ecdise, durou de 28 a 29 dias. Este período difere dos resultados obtidos por Nascimento (1993), que estimou em laboratório que o processo de muda demora de 15 a 20 dias. Resultados desiguais podem ser atribuídos a fatores ambientais. Nascimento (1993) afi rma que o caranguejo em ecdise apresenta uma fragilidade muito grande, e nesta fase o animal tem seus movimentos diminuídos, fi cando quase que totalmente paralisados e permanecendo dentro da toca “tapada” durante todo o estágio. Alcantara-Filho (1978) notou que no Ceará, a maior intensidade de muda acontece em dezembro.

Por meio da relação entre o percentual de fêmeas maduras por classe de comprimento estimou-se, o ponto de L50, para comprimento e largura da carapaça pelo método da extrapolação gráfi ca e por meio do ajuste da Ogiva de Galton, o ponto de L50, no qual metade das fêmeas do caranguejo-uçá, inicia a primeira maturidade gonadal. Para a população estudada encontrou-se o L50 da largura da carapaça compreendido no intervalo de classe de 3 cm a 4 cm pelo método da extrapolação gráfi ca e de 3,74 cm por meio do ajuste da Ogiva de Galton e o L50 do comprimento da carapaça com intervalo de classe de 2 cm a 3 cm pelo método da extrapolação gráfi ca e de 2,4 cm por meio do ajuste da Ogiva de Galton (Figuras 6 e 7).

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A estimativa do tamanho médio de primeira maturação gonadal institui um parâmetro de grande importância no estudo sobre a biologia reprodutiva, principalmente quando a espécie focalizada apresenta importância econômica, como é o caso do caranguejo-uçá, não só na região Norte, como em outras áreas de ocorrência. O valor encontrado para largura da carapaça (3,74 cm) se aproxima dos valores encontrados por Pinheiro e Fiscarelli (2001) em Iguape-SP e por Vale (2003) no rio Caeté-PA (Tabela 3). Corroborando com o valor sugerido pela portaria nº 034 de 24 de junho de 2003, a qual proibe em qualquer época a captura de

Figura 6. Relação percentual de fêmeas adultas x largura da carapaça para fêmeas de caranguejo-uçá, Ucides

cordatus,capturado na Resex de Curuçá, no período de junho de 2003 a junho de 2006.

Figura 7. Relação percentual de fêmeas adultas x comprimento da carapaça para fêmeas de caranguejo-uçá, Ucides

cordatus, capturado na Resex de Curuçá, no período de junho de 2003 a junho de 2006.

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indivíduos desta espécie inferior a 6,0 cm de largura da carapaça (BARROS, 2003). O valor estimado de L50 para o comprimento da carapaça (2,41 cm) mostrou-se menor em relação

aos encontrados por diferentes autores, a exemplo de, Botelho, Dias e Ivo (1999) em rio Formoso e no rio Ilhetas-PE; Ivo, Dias e Mota (1999) no rio Parnaíba-PI; Mota-Alves (1975) em Caucaia-CE e por Vasconcelos, Vasconcelos e Ivo (1999) no rio Curimatau-RN (Tabela 3).

Ao compararmos largura com comprimento de carapaça, observamos que a largura é maior que o comprimento, logo se outros autores estivesem calculado L50 para comprimento de carapaça, provavelmente teriam encontrados valores próximos aos obtidos para Resex de Curuça.

Variáveis ecológicas e ambientais presentes ao longo da área de abrangência da espécie, como taxas de mortalidade (natural e por explotação), diferenças físico-químicas entre microambientes, disponibilidade de alimentos, etc., são fatores que podem determinar a variação no tamanho médio de primeira maturação gonadal. As adversas condições ambientais e meteorológicas nos locais analisados por pesquisadores poderá ser um fator explicável para as diferenças do tamanho total médio das gônadas (VAZZOLER, 1996).

Tabela 3. Tamanho médio de primeira maturação gonadal do caranguejo-uçá, Ucides cordatus, conforme de-terminado por diferentes autores para diversas localidades no Brasil.

A análise de χ2 para comparar as proporções de machos e fêmeas indica a existência de diferença estatística signifi cante na proporção sexual de janeiro, fevereiro e dezembro com predomínio dos machos e de março a junho, e de setembro a novembro com predomínio das fêmeas, não sendo constatada diferença estatística nas proporções de julho e agosto. No conjunto dos meses as fêmeas predominaram sobre os machos (Tabela 4).

Tabela 4. Proporção sexual mensal e valores estimados do χ 2 para Caranguejo-uça, Ucides cordatus, capturados na Resex de Curuçá no período de junho de 2003 a junho de 2006.

Autor Local Largura da cara-paça (cm)

Comprimento da carapaça (cm)

Botelho, Dias e Ivo, 1999Botelho, Dias e Ivo, 1999Ivo, Dias e Mota, 1999Mota-Alves, 1975Pinheiro e Fiscarelli, 2001Vale, 2003Vasconcelos, Vasconcelos e Ivo, 1999

Rio Ilhetas (PE)Rio Formoso (PE)Parnaíba (PI)Caucaia (CE)Iguape (SP)Rio Caeté (PA)Rio Curimatau (RN)

____

3,724,30

_

3,804,054,504,02

--

4,15

Mês

Frequência

TotalProporção

Sexual (M:F)χ 2Macho Fêmea

n % n %

jan 176 58,5 125 41,5 301 1,41 8,64 fev 127 89,4 15 10,6 142 8,47 88,34 mar 138 34,2 266 65,8 404 0,52 40,55 abr 132 34,2 254 65,8 386 0,52 38,56 mai 111 30,2 256 69,8 367 0,43 57,29 jun 87 30,9 195 69,1 282 0,45 41,36 jul 164 51,1 157 48,9 321 1,04 0,15 ago 190 45,3 229 54,7 419 0,83 3,63 set 128 41,2 183 58,8 311 0,70 9,73 out 179 41,2 255 58,8 434 0,70 13,31 nov 173 39,3 267 60,7 440 0,65 20,08 dez 205 56,0 161 44,0 366 1,27 5,55 Total 1810 43,4 2.363 56,6 4.173 0,77 73,04

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Durante o período de estudo, observou-se que a incidência de machos nas coletas por mês e para um período como todo, foi quase sempre menor do que as das fêmeas; para o total dos indivíduos amostrados, respectivamente, numa proporção de 43,4% e 56,6%, ou seja, 0,77M: 1F. Corroborando com Alcantara-Filho (1978); para o rio Ceará-CE, com Botelho; Dias e Ivo (1999), no estuário do rio Formoso-PE e com Ivo; Dias e Mota (1999), na foz do rio Parnaíba-PI, os quais encontraram em suas análises a abudância de fêmeas. A Figura 8 demonstra o comportamento das proporções para o período de estudo.

Figura 8. Comportamento da proporção sexual, do Caranguejo-uça, Ucides cordatus, na Resex Mãe Grande de Curuçá, no período de junho de 2003 a junho de 2006.

Alguns autores, em trabalhos realizados em estuários do Nordeste, a exemplo de Araújo e Calado (2007) no estuário Lagunar Mundaú Manguaba-AL, Botelho; Dias e Ivo (1999) no estuário do rio Ilhetas-PE e Monteiro e Coelho-Filho (2007) no estuário do rio Paripe-PE, não encontraram diferença estatística signifi cante nas frequências de ocorrência de machos e fêmeas. Vasconcelos; Vasconcelos e Ivo (1999) constataram diferença estatística signifi cante com predomínio das fêmeas no ano de 1995, fenômeno que se inverteu em 1996 e 1998 quando os machos predominaram; em 1997 não foram verifi cadas diferenças estatisticamente signifi cantes entre as frequências de machos e fêmeas. Os mesmos autores citam que a análise trimestral das proporções sexuais não indicou a existência de qualquer tendência que pudesse ser relacionada com alguma condição biológica da espécie.

A predominância de fêmeas sobre machos poderia ser explicada pela procura dos tiradores de caranguejo por machos que são maiores do que as fêmeas estando às mesmas protegidas pela crença popular de que não se devem capturar-las. Outros fatores também podem ser relacionados como responsáveis pelo predomínio em diferentes épocas do ano, em uma mesma localidade, tais como: reprodução, fi siologia das fêmeas e fatores ambientais. Já o predomínio dos machos poderia estar relacionado com o período fi nal de reprodução das fêmeas quando elas se tornam indisponíveis para captura.

A temperatura variou entre 25ºC e 27ºC, com média de 26°C, o menor valor foi de 25ºC no primeiro semestre de 2006, nos demais anos se manteve em torno de 26,5ºC em ambos semestres. A salinidade variou entre 11 (primeiro semestre de 2004) e 37 (segundo semestre de 2005) sendo a média para o periodo de 25,5. Não há dados referentes ao segundo semestre de 2006, devido às coletas terem sido encerradas em junho de 2006 (Figura 9).

De acordo com Vale (2003) em estudos no rio Caeté-PA, o início do processo de maturação das gônadas dos machos e das fêmeas apresentou forte relação com todos os parâmetros ambientais envolvidos na análise, indicando que a maturação começa no período de mais baixa precipitação, e pouca umidade relativa do ar e, portanto, de mais alta salinidade. Os demais eventos reprodutivos mostram-se relacionados à transição do período seco para o chuvoso (gônadas maduras) e do período chuvoso para o seco (repouso gonadal), para machos e fêmeas. Entretanto, Dalabona e Silva (2005) encontraram para Ilha das Peças e para Ilha do Pavoçá, médias de salinidade maior na Ilha das Peças (2,65 + 0,82) que na Ilha do Pavoçá (1,61 + 0,69), estes delinearam que as variações geográfi cas e salinidades parecem não infl uenciar no período reprodutivo

da espécie na Baía das Laranjeiras-RJ.

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Figura 9. Variação da temperatura e da salinidade na Resex de Curuçá, no período de junho de 2003 a junho de 2006.

Em 2003 há pouca representatividade de indivíduos no 1º semestre devido às coletas terem se iniciado em junho (apenas um mês no 1° semestre). O maior número de exemplares coletados foi no 2° semestre de 2003 e de 2004, respectivamente com 20,37% e 19,15% do total capturado, sendo que em 2005 o maior número de indivíduos coletados foi no 1° semestre, com 17,33%, este fato pode ter acontecido pela alta salinidade para o segundo período (Figura 10). Assim, geralmente no segundo período do ano há ocorrência de maior número de indivíduos.

Figura 10. Frequência relativa dos indivíduos capturados na Resex de Curuçá, no período de junho de 2003 a junho de 2006.

CONCLUSÃO

Para as fêmeas de Ucides cordatus na Reserva Extrativista Mãe Grande de Curuçá a reprodução é sazonal ocorrendo de outubro a abril, com maior intensidade em março.

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O estádio de muda C ocorre durante todo o ano com concentração nos meses de janeiro a maio. O tamanho de primeira maturação gonadal encontrado para a largura da carapaça foi de 3,74 cm e

para o comprimento da carapaça de 2,4 cm.Para o total dos indivíduos amostrados obteve-se uma proporção de 43,4% de machos e 56,6% de

fêmeas, ou seja, (0,77M: 1F). A temperatura variou entre 25°C e 27ºC com média de 26°C e a salinidade entre 11 e 37, com média

de 25,5.O maior número de indivíduos coletados foi no 2º semestre de 2003, com 20,37% do total de exem-

plares amostrados.

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