Paulo Coelho - Uma História da Música Popular de Porto Alegre - Capítulo VIII
ana cláudia lara coelho aranha
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INSTITUTO DE ARTE E COMUNICAÇÃO SOCIAL
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO
MESTRADO EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO
ANA CLÁUDIA LARA COELHO ARANHA
HAPPENINGS, PERFORMANCES E BODY ART: TRATAMENTO ARQUIVÍSTICO EM
INSTITUIÇÕES CULTURAIS
Niterói
2020
ANA CLÁUDIA LARA COELHO ARANHA
HAPPENINGS, PERFORMANCES E BODY ART: TRATAMENTO
ARQUIVÍSTICO EM INSTITUIÇÕES CULTURAIS
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em Ciência da
Informação da Universidade Federal
Fluminense (PPGCI/UFF) como requisito
parcial para obtenção do título de Mestre em
Ciência da Informação.
Orientador:
Prof. Dr. Vitor Manoel Marques da Fonseca
Niterói
2020
A662h Aranha, Ana Cláudia Lara Coelho
Happenings, performances e body art: tratamento arquivístico em
instituições culturais/ Ana Cláudia Lara Coelho Aranha – 2020.
193 f. ; il.
Orientador: Vitor Manoel Marques da Fonseca.
Dissertação (Mestrado em Ciência da Informação) –
Universidade Federal Fluminense, Instituto de Arte e Comunicação
Social, 2020.
Bibliografia: f. 173-182.
1. Arquivologia. 2. Documento de arquivo. 3. Performance
(Arte). 4. Instituição Cultural. 5. Produção intelectual. I. Fonseca,
Vitor Manoel Marques da. II. Universidade Federal Fluminense.
Instituto de Arte e Comunicação Social. III. Título.
ANA CLÁUDIA LARA COELHO ARANHA
Happenings, performances e body art: tratamento arquivístico em instituições culturais
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em Ciência da
Informação da Universidade Federal
Fluminense (PPGCI/UFF) como requisito
parcial para obtenção do título de Mestre em
Ciência da Informação.
Linha de Pesquisa: Informação, Cultura e
Sociedade.
Orientador: Prof. Dr. Vitor Manoel Marques
da Fonseca
Aprovada em / /
BANCA EXAMINADORA
_________________________________________
Prof. Dr. Vitor Manoel Marques da Fonseca (orientador)
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
_________________________________________
Profª. Dra. Elisabete Gonçalves de Souza
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
_________________________________________
Profª. Dra. Giulia Crippa
UNIVERSITÀ DI BOLOGNA
___________________________________________
Prof. Dr. Carlos Henrique Juvêncio da Silva (suplente interno)
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
___________________________________________
Profª. Dra. Aline Lopes de Lacerda (suplente externo) FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus por nunca ter desistido de mim, e aos meus pais, Pedro e Sandra, por me
apoiarem nas diferentes decisões que tomei ao longo dos anos, sempre acreditando que eu
superaria as dificuldades e venceria os obstáculos.
Agradeço ao meu esposo, João Aranha, pelo seu amor, apoio e cuidado diários, durante os
momentos tranquilos e as situações complicadas.
Agradeço a meus familiares tia Solange, Patrícia, Luciano, Mariana, João, Marcos, Adriana,
Lucas, Rafaela, Dona Solange, Geórgia e Gisela pela torcida.
Agradeço ao meu orientador de longa data, professor Vitor Manoel Marques da Fonseca, por
sua generosidade, conselhos, paciência e confiança.
Agradeço à professora Elisabete Gonçalves Souza, pela parceria e por ter enriquecido meu
projeto com suas colocações durante a qualificação.
Agradeço à professora Giulia Crippa por sua também rica colaboração na qualificação e por
ter aceitado o convite para a defesa, mesmo enfrentando dificuldades relativas à distância e às
correrias e percalços da vida.
Agradeço aos professores Carlos Henrique Juvêncio da Silva e Aline Lopes de Lacerda por
aceitarem o convite para suplentes da banca examinadora da qualificação e da defesa.
Agradeço aos professores do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da
Universidade Federal Fluminense por compartilharem seu conhecimento, tempo e
experiência.
Envio um agradecimento, em forma de abraço, à Aline Daudt e Raíra Alves, pelas risadas,
reclamações, preocupações e esperanças que compartilhamos durante esse período de
mestrado. A amizade e ajuda de vocês tornou a caminhada mais leve.
Agradeço às minhas amigas do grupo da igreja (Mariana, Juliana, Raquel, Laila e Maria
Otávia), do quarteto (Verônica, Tatiana e Ana Paula) e da vida (Mariana, Andrea, Marcela e
Eliane e ao amigo José) pelas orações, torcida e palavras de motivação.
Um muitíssimo obrigada aos entrevistados das instituições visitadas, que separaram um
período das suas rotinas de trabalho para me receber, conversar e esclarecer minhas dúvidas
acerca da organização dos documentos em suas instituições.
Agradeço, de igual modo, ao Museu de Arte Contemporânea de Niterói, ao Museu de Arte
Moderna do Rio de Janeiro, ao Museu de Arte do Rio, ao Centro Cultural Light, ao Museu
Histórico Nacional e ao Museu da República por permitirem que tal pesquisa fosse realizada.
O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal
de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001. À CAPES, portanto,
meu agradecimento.
[...] nenhuma outra forma de expressão
artística tem um programa tão ilimitado, uma
vez que cada performer cria a sua própria
definição através dos processos e modos de
execução (Roselee Goldberg, 2007).
[...] Há tantas opiniões diferentes que é
impossível contar. Você poderia estudar essas
opiniões por toda a sua vida, ficar cansado de
estudar, sem chegar ao fim! (Ec. 12:12, Nova
Bíblia Viva).
RESUMO
O objetivo geral desta pesquisa foi analisar o tratamento dado pelos setores de arquivos de
instituições culturais aos arquivos pessoais de artistas e documentos relacionados a
performances, happenings e/ou body art. Como fundamentação teórica, foram apresentadas
algumas definições de conceitos fundamentais: arquivo, arquivo público, arquivo privado,
arquivo institucional, arquivo pessoal, arquivo de museu, arquivo de artista, documento de
arquivo, documento museológico, organicidade, informação, performance, happening e body
art. Realizou-se levantamento das instituições culturais localizadas nas cidades do Rio de
Janeiro e de Niterói e pesquisa exploratória nos sites das instituições culturais e na internet.
Foram realizadas visitas e entrevistas semiestruturadas para verificação e análise do
tratamento documental dado aos documentos relacionados à arte efêmera, em especial a
observância da organicidade. A análise desse tratamento permitiu concluir que a organicidade
é cumprida em parte, que o tratamento arquivístico na maioria das instituições contatadas é
inicial ou inexistente, e que a preservação e a organização dos documentos relativos às obras
de arte efêmera é essencial para a permanência das mesmas no tempo.
Palavras-chave: Arquivos de museus. Arquivos de artistas. Organicidade. Happening. Body
Art. Performance.
ABSTRACT
The general objective of this research was to analyze the treatment given by the sectors of
archives of cultural institutions to the personal archives of artists and documents related to
performances, happenings and/or body art. As a theoretical foundation, some definitions of
fundamental concepts were presented: archive, public archive, private archive, institutional
archive, personal archive, museum archive, artist archive, archival document, museum
document, organicity, information, performance, happening and body art. There was a survey
of cultural institutions located in the cities of Rio de Janeiro and Niterói and exploratory
research on the websites of cultural institutions and on the internet. Visits and semi-
structured interviews were carried out to verify and analyze the documentary treatment given
to documents related to ephemeral art, especially the observance of organicity. The analysis
of this treatment allowed us to conclude that the organicity is partially fulfilled, that the
archival treatment in most of the contacted institutions is initial or nonexistent, and that the
preservation and organization of the documents related to the ephemeral work of art is
essential for its permanence over time.
Keywords: Museum Archives. Artists’ Archives. Organicity. Happening. Body Art.
Performance.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 – Atlas Mnemosyne, Painel 37, [19--?], Aby Warburg.....................................
33
Figura 2 – Métiers, boutiques et étalages de Paris [Ofícios, lojas e vitrines de Paris],
Mercado Carmes, Maubert, 1910-1911, Eugène Atget..................................................
34
Figura 3 – Pastry Cook [Confeiteiro], 1928, August Sander..........................................
Figura 4 – Sammelalbum, [1933?], Hannah Höch..........................................................
Figura 5 – Análise das sensações, detalhe dos diagramas 9 e 11, 1927, Kazimir
Malevich..........................................................................................................................
35
36
37
Figura 6 – La Boîte-en-Valise, 1936-1941, Marcel Duchamp........................................
Figura 7 – Série Cicatriz, 1996, Rosângela Rennó..........................................................
Figura 8 – Inside & Outside The Tube, 1998, Maurício Dias e Walter Riedweg...........
Figura 9 – Marca Registrada, 1975, Letícia Parente.......................................................
Figura 10 – How to Change Your Wall Paper Daily, The Art History Archive, 1995-
1996, Calin Dan e Josif Kiraly (subReal) (Instalação).................................................
Figura 11 – Airmail Paintings, [19--], Eugenio Dittborn................................................
Figura 12 – Lips of Thomas, 1975, Marina Abramovic..................................................
Figura 13 – Seven Easy Pieces – Lips of Thomas, 2005, Marina Abramovic………….
Figura 14 – 18 happenings in 6 parts (carta-pôster), [1959], Allan Kaprow………….
Figura 15 – 18 happenings in 6 parts (detalhe), [1959], Allan Kaprow……………….
Figura 16 – 18 happenings in 6 parts (carta-pôster, cartões numerados, programa e
pacote transparente), 1959, Allan Kaprow......................................................................
Figura 17 – 18 happenings in 6 parts (vista da sala 2 a partir da sala 1), 1959, Allan
Kaprow............................................................................................................................
Figura 18 – 18 happenings in 6 parts (parte 5, sala 1: mulher espremendo laranjas –
Rosalyn Montague), 1959, Allan Kaprow.......................................................................
Figura 19 – 18 happenings in 6 parts (parte 4, sala 1: A orquestra – Shirley
38
43
44
44
50
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73
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100
102
103
Prendergast, Rosalyn Montague, Allan Kaprow e Lucas Samaras), 1959, Allan
Kaprow............................................................................................................................
Figura 20 – Interior Scroll, 1975, Carolee Schneemann (Conjunto de 13 impressões
em gelatina de prata).......................................................................................................
Figura 21 – Interior Scroll (programa com o texto constante no papel retirado da
vagina da artista), 1975, Carolee Schneemann................................................................
Figura 22 – Coyote: I Like America and America Likes Me, 1974, Joseph Beuys…….
Figura 23 – Coyote: I Like America and America Likes Me (detalhe do programa),
1974, Joseph Beuys.........................................................................................................
Figura 24 – Coyote: I Like America and America Likes Me (folder), 1974, Joseph
Beuys…………………………………………………………………...........................
Figura 25 – Performance “Brilho No Asfalto” (Mery Horta, 2018/2019), detalhe da
foto e da descrição da obra na exposição “Percursos” (2019).........................................
Figura 26 – Detalhe das fotos da exposição “Percursos” (2019), com vestígio, vídeo e
descrição da performance “Levo sua alma até você” (de Luana Aguiar,
2019)................................................................................................................................
Figura 27 – Detalhe de reproduções fotográficas da performance “Verzuimd Brasiel –
Brasil Desamoparado”, de Daniel Santiago, e do folder da exposição “Marcantonio
Vilaça” (2018)...............................................................................................................
Figura 28 – Imagens das Caixas onde a documentação institucional é guardada...........
Figura 29 – Detalhe da pasta de ph neutro, Exposição “Jardim das Delícias”, 2006-
2007.................................................................................................................................
Figura 30 – Detalhe do folder, do DVD com gravação das performances e frame do
vídeo da performance “Lurdinha/Chá das cinco”, de Luciano Rocha, 2006-2007.........
103
109
110
113
113
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154
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161
162
162
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 – Aspectos da performance, da body art e do happening segundo cada
autor...............................................................................................................................
94
Quadro 2 – Resumo dos Resultados da Primeira Fase da Pesquisa..............................
Quadro 3 – Resumo dos Resultados da Segunda Fase da Pesquisa..............................
122
127
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ASCOM
CNM
CCLA
CCBB Rio
CCL
CMAHO
CI
CONARQ
DIBRATE
EBA/UFRJ
FAN
FCRB
Assessoria de Comunicação Social do Museu Histórico Nacional
Cadastro Nacional de Museus
Casa de Cultura Laura Alvim
Centro Cultural Banco do Brasil Rio de Janeiro
Centro Cultural Light
Centro Municipal de Arte Hélio Oiticica
Ciência da Informação
Conselho Nacional de Arquivos
Dicionário Brasileiro de Terminologia Arquivística
Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro
Fundação de Arte de Niterói
Fundação Casa de Rui Barbosa
GMB Guia dos Museus Brasileiros
Ibram
IMS Rio
IPHAN
IPN
MMGV
MinC
Instituto Brasileiro de Museus
Instituto Moreira Salles Rio de Janeiro
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
Instituto de Pesquisa e Memória Pretos Novos
Memorial Municipal Getúlio Vargas
Ministério da Cultura
MAC Niterói
Museu de Arte Contemporânea de Niterói
MAM Rio
Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro
MAR
MBRAC
MCBC/Ibram
Museu de Arte do Rio
Museu Bispo do Rosário de Arte Contemporânea
Museu Casa de Benjamin Constant
MUHCAB
MHExFC
MHN
MII
CCMJ
MNBA
MR
PCC
Museu da História e da Cultura Afro-brasileira
Museu Histórico do Exército e Forte de Copacabana
Museu Histórico Nacional
Museu de Imagens do Inconsciente
Museu da Justiça – Centro Cultural do Poder Judiciário
Museu Nacional de Belas Artes
Museu da República
Primeiro Comando da Capital
RM
RJ
Registro de Museus
Rio de Janeiro
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO..............................................................................................
2 VISÕES DA ARTE SOBRE O ARQUIVO...................................................
2.1 ARQUIVO COMO PARADIGMA..................................................................
2.1.1 Práticas protoarquivísticas literárias, historiográficas e artísticas...............
2.2 ARQUIVO COMO POÉTICA E DISPOSITIVO PERFORMATIVO...............
2.2.1 Reencenação, apropriação, espacialização, in/corporação, meta-arquivo....
2.3 ARQUIVO COMO VESTÍGIOS, INSCRIÇÕES, CONTESTAÇÕES E
RECAPITULAÇÕES.........................................................................................
3 DEFINIÇÕES: ARQUIVOLOGIA E CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO........
3.1 CONCEITOS-CHAVE DA ARQUIVOLOGIA..............................................
3.2 CONCEITOS-CHAVE DA CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO..............................
4 DEFINIÇÕES: ARTE........................................................................................
4.1 PERFORMANCE, BODY ART E HAPPENING..................................................
4.1.1 Diferenças entre performance, happening e body art.......................................
4.1.2 Sistematizando as visões sobre performances, happenings e body art............
4.1.3 18 happenings in 6 parts.....................................................................................
4.1.4 Interior Scroll......................................................................................................
4.1.5 Coyote: I Like America and America Likes Me…………………………….....
4.2 PERFORMANCES, HAPPENINGS, BODY ART E DOCUMENTOS…............
5 HAPPENINGS, PERFORMANCES E BODY ART: MAPEAMENTO DAS
INSTITUIÇÕES E TRATAMENTO ARQUIVÍSTICO................................
5.1 PRIMEIRA FASE: LEVANTAMENTO ONLINE DAS INSTITUIÇÕES
CULTURAIS DE INTERESSE...........................................................................
5.1.1 Fontes utilizadas.................................................................................................
5.1.2 Resultados da Primeira Fase da Pesquisa........................................................
5.2 SEGUNDA FASE: PRIMEIROS CONTATOS, PESQUISAS EM 2019 E
2020......................................................................................................................
5.2.1 Contatos realizados em 2019.............................................................................
5.2.2 Contatos realizados em 2020.............................................................................
5.2.3 Resultados da segunda fase da pesquisa..........................................................
5.3 TERCEIRA FASE: VISITAS ÀS INSTITUIÇÕES SELECIONADAS............
5.3.1 Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM Rio)................................
5.3.1.1 Dados obtidos sobre o MAM Rio através de entrevista semiestruturada............
5.3.1.2 Análise dos dados apresentados sobre o MAM Rio.............................................
5.3.2 Museu de Arte Contemporânea de Niterói (MAC Niterói)............................
5.3.2.1 Dados obtidos sobre o MAC Niterói através de entrevista semiestruturada........
5.3.2.2 Análise dos dados apresentados sobre MAC Niterói...........................................
5.3.3 Museu de Arte do Rio (MAR)...........................................................................
16
27
27
31
39
41
46
55
55
68
81
81
84
93
96
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110
114
116
116
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129
131
136
138
138
143
144
146
151
5.3.3.1 Dados obtidos sobre o MAR através do questionário respondido por e-mail e
da entrevista semiestruturada...............................................................................
5.3.3.2 Análise dos dados apresentados sobre o MAR....................................................
5.3.4 Centro Cultural Light (CCL)............................................................................
5.3.4.1 Dados obtidos sobre o CCL através da entrevista semiestruturada.....................
5.3.4.2 Análise dos dados apresentados sobre o CCL.....................................................
5.3.5 Museu Histórico Nacional (MHN)...................................................................
5.3.5.1 Dados obtidos sobre o MHN através da entrevista semiestruturada....................
5.3.5.2 Análise dos dados apresentados sobre o MHN....................................................
5.3.6 Museu da República (MR)...............................................................................
5.3.6.1 Dados obtidos sobre o MR através da entrevista semiestruturada.......................
5.3.6.2 Análise dos dados apresentados sobre o MR.....................................................
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS...........................................................................
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...........................................................
REFERÊNCIAS ICONOGRÁFICAS............................................................
APÊNDICE A – LISTA DE INSTITUIÇÕES QUE RECEBERAM
PERFORMANCES (PESQUISA ONLINE).....................................................
APÊNDICE B – QUESTIONÁRIO SOBRE A ORGANIZAÇÃO DOS
DOCUMENTOS.................................................................................................
APÊNDICE C – LISTA DE INSTITUIÇÕES QUE RECEBERAM
PERFORMANCES (PESQUISA ONLINE) E QUE POSSUEM SETOR
DE ARQUIVO CONFIRMADO...................................................................
ANEXO – LISTA DE DOCUMENTOS E OBRAS RELATIVOS À
PERFORMANCE – BANCO DE DADOS MAM RIO...................................
145
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156
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164
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183
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186
187
188
T
16
1 INTRODUÇÃO
O tema desta dissertação é inspirado pelo desejo de encontrar possíveis interseções
entre a arte1 e a arquivologia que perpassem questões trabalhadas pela ciência da informação
(CI). Esse desejo surgiu a partir da experiência pessoal de ser graduada em artes e em
arquivologia. Informada a respeito de artistas que se utilizam de documentos de arquivo em
sua produção e dos desafios dos museus em lidar com a arte contemporânea, pensou-se que
uma das possíveis relações entre as áreas seria o tratamento prestado pelos setores de arquivo
de instituições culturais aos arquivos pessoais de artistas e documentos relacionados a obras
efêmeras.
Ao se analisar a frase anterior, notam-se alguns termos essenciais: setores de arquivo,
arquivos pessoais de artistas,2 instituições culturais e obras efêmeras. Com relação à definição
de instituição cultural, será utilizada a fornecida pelo “Dicionário Crítico de Política
Cultural”. É uma definição sucinta e objetiva, que resume quais tipos de locais foram
contemplados pela pesquisa. Instituição cultural é, assim, uma
Estrutura relativamente estável voltada para a regulação das relações de produção,
circulação, troca e uso ou consumo da cultura (ministérios e secretarias da cultura,
museus, bibliotecas, centros de cultura, etc.). Essa regulação, nas instituições, se faz
por meio de códigos de conduta ou de normas jurídicas (COELHO NETO, 1997, p.
219).
A definição de obra, assim como observado sobre outras definições, é variada. De
acordo com o modelo conceitual de biblioteconomia (Functional Requirements for
Bibliographic Records), obra é a ideia, realizada pela expressão, corporificada pela
manifestação e exemplificada em item(ns) (International Federation of Library Associations
and Institutions, 1998). Segundo Richard Pearce-Moses, na publicação “A Glossary of
Archival and Records Terminology”, obra é “a manifestação material de atividades ou
esforços individuais ou em grupo, especialmente itens de natureza criativa” (2005, p. 408,
tradução nossa).3 Para Baca et al., no “Cataloging Cultural Objects: a guide to describing
cultural Works and their images”, obra é “uma criação intelectual ou artística distinta,
limitada principalmente a objetos e estruturas feitas por seres humanos, incluindo obras
construídas, obras de arte visual e artefatos culturais”, onde a performance art se encaixaria
1 Optou-se por padronizar os nomes das áreas em minúsculas – arte, arquivologia e ciência da informação –, a
fim de evitar possíveis hierarquizações inconscientes. Esse procedimento não foi seguido em caso de citações. 2 A definição de arquivo de artista será apresentada nesta introdução e aprofundada na terceira seção. A de
arquivo será trabalhada na terceira seção. 3 “The material manifestation of individual or group activities or efforts, especially items of a creative nature”
(PEARCE-MOSES, 2005, p. 408).
17
na denominação “artes visuais” (2006, p. 4, tradução nossa).4 Cunha e Cavalcanti, no
“Dicionário de Biblioteconomia e Arquivologia” apresentam como uma das definições de
obra de arte a “criação do espírito, expressa por qualquer meio ou fixada em qualquer
suporte, seja tangível ou intangível” (2008, p. 265). Diante dessas diferenças, optou-se por
considerar o conceito de obra apresentado no “Glossary of Archival and Records
Terminology”, ou seja, manifestação material de uma atividade, considerando-se o corpo do
artista como suporte, como o material onde as ações artísticas são manifestadas. Esta obra é
efêmera, pois “nega a duração e cristalização dos objetos artísticos [...] o que é exibido é o
projeto em processo de realização” (ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural, 2020).
Com relação aos arquivos pessoais de artistas, Anna Mcnally (2013) afirma que, em
sua maioria, esta documentação chega aos setores de arquivos de museus sem nenhuma
ordem aparente, com os documentos acondicionados em caixas etiquetadas, sacolas, ou
mesmo antigos pacotes de sabão em pó. Geralmente são doados pela família após a morte do
titular e contêm tudo o que pôde ser encontrado nas suas gavetas. Apesar disso, muito da
documentação inicial sobre sua vida pessoal e profissional se perde – a maior parte dos
registros se refere ao final de sua carreira, quando o artista já está estabilizado
financeiramente e possui um lugar próprio onde pode guardar seus documentos. Ademais, é
comum que a maioria dos papeis de um artista diga respeito mais às questões financeiras e
práticas da sua carreira do que à sua poética.5 Não obstante essas dificuldades, ainda podem
ser encontrados entre seus papeis
[...] uma combinação de cartas (recebidas), fotografias (do seu trabalho, deles
mesmos, de pessoas não identificadas), esboços, quaisquer escritos que eles possam
ter redigido ou publicado (autobiografias, artigos, poesia duvidosa), materiais
impressos sobre eles mesmos ou seus interesses. Pode haver ainda papeis
relacionados a projetos em que eles estiveram envolvidos [...] ou seus interesses e
influências mais amplos (MCNALLY, 2013, p. 99-100, tradução nossa).6
Outra circunstância, mais específica às obras de arte efêmeras, é explicitada por
Heike Roms (2013), que analisa os desafios do arquivo do artista Ian Breakwell (1943-2005).
Breakwell trabalhava com várias linguagens, como filmes, instalações, performances,
4 “[…] a work is a distinct intellectual or artistic creation limited primarily to objects and structures made by
humans, including built works, visual art works, and cultural artifacts” (BACA et al., 2006, p. 4). 5 “No âmbito das artes visuais, o termo poética vem expressar o devir dos processos de criação, envolvendo
desde pesquisa de fontes, elaboração de arquivos, técnicas, métodos, materiais, assim como a relação com textos
e, por vezes, conceitos filosóficos” (ZORDAN, 2014, p. 184). O termo também designa o repertório pessoal do
artista, sua maneira de fazer e entender arte. 6 “[...] a combination of letters (received), photographs (of their work, of themselves, of unidentified people),
sketches, any writings they might have drafted or published (autobiographies, articles, dubious poetry), printed
materials about themselves or their interests. There might also be papers relating to projects they’ve been
involved with [...] or their wider interests and influences” (MCNALLY, 2013, p. 99-100).
18
colagens, pinturas, trabalhos escritos e sonoros etc. Para a autora, a dificuldade nesse acervo
não reside nos diferentes tipos de materiais encontrados, mas na constante reinvenção que
Breakwell fazia da sua prática artística. Diante de uma filmagem artística feita de uma
performance,7 que depois passa a ser projetada durante as próximas performances, como
definir o que é parte de obra e o que é obra completa? Como diferenciar a ação artística dos
registros que a documentam? Tal diferenciação é importante para garantir quais objetos
devem ser enviados às reservas técnicas dos museus e quais devem ser recebidos pelos
arquivos. Mas no caso da performance “UNWORD”,8 essas fronteiras não se mostram tão
claras para a autora.
Apesar dos desafios apresentados pela arte efêmera, acredita-se que ela pode vir
representada em documentos arquivísticos, tanto no arquivo do artista quanto no arquivo das
instituições que a recebem. Como destaca McNally (2013), podem existir nesses conjuntos
documentos relacionados às ações artísticas (textos, imagens, correspondência com outros
artistas etc.) e documentos produzidos como resultado do contato do artista com o museu
(projetos submetidos, material de divulgação, e-mails e cartas). Museus e instituições em que
tais práticas ocorrem também produziriam/receberiam documentos afins (projetos,
correspondência com o artista, contratos).
Tal suposição se baseia na compreensão de que performances, body art e happenings
estão no escopo das atividades do artista e também passam a fazer parte das atividades da
instituição em que essas formas de arte são apresentadas. A imaterialidade, que pode
preocupar a princípio, não é o verdadeiro problema. Algumas atividades, para sua perenidade,
necessitam ser registradas obrigatoriamente em documentos, enquanto outras não anseiam
pela permanência ou até não a desejam. Instituições são obrigadas por lei a documentar várias
de suas ações, mas os artistas podem, deliberadamente, não o fazerem. Apesar disso, acredita-
se que os artistas das artes efêmeras acabam por produzir documentos relacionados a essas
atividades, que auxiliarão na sua consecução, e que podem servir como prova da existência
das mesmas. A questão é saber se e como esses documentos são organizados e preservados.
7 Performances, body art e happenings, manifestações artísticas de interesse neste trabalho, serão definidas na
quarta seção. 8 Em “UNWORD” Breakwell trabalhou em colaboração com o cineasta Mike Leggett (1945-), que não filmou
passivamente a performance, mas interferiu nas ações do artista. Na performance seguinte a colaboração
continuou, sendo que agora a filmagem da primeira performance era reproduzida em um telão. O resultado foi
um filme de 47 minutos com todas as versões de “UNWORD” (ROMS, 2013).
19
Ryan Evans (2013), arquivista da White Columns,9 explica que a maioria dos trabalhos
realizados na galeria nos anos iniciais era relacionada à arte efêmera, e que estes trabalhos
eram acompanhados de documentação para garantir a compreensão futura dos mesmos. Evans
também afirma que
Os arquivos de uma organização altamente influente, centrada no artista e voltada
para o futuro, como as White Columns, podem estar cheios de registros de artistas,
incluindo fonte primária ou documentos raros. Estes documentos podem variar de
esboços preparatórios ou propostas para uma exposição ou performance a
publicações e correspondências de pequenos artistas independentes, ou biografias
antigas e declarações de artistas. [...] Enquanto os registros do artista, em geral,
fornecem uma visão incomensurável da sua prática e carreira, tais registros dentro de
um espaço de arte provavelmente comunicam outro nível de relacionamento relativo
aos projetos ou exibições em que um artista estava trabalhando, bem como
personalidades e operações da instituição parceira. Além dos registros dos artistas no
sentido esperado do termo, traços institucionais, como convites, programações de
exibição, pôsteres e documentação, também podem contribuir para uma
interpretação mais rica da arte realizada lá (2013, p. 23, tradução nossa).10
Tais documentos merecem um tratamento que leve em consideração o contexto de
produção, a vida e obra do artista. No caso dos arquivos das instituições, o contexto se mostra
extremamente importante para materializar uma obra que não se apresenta enquanto um
produto acabado.
Diante de tais questões, o tema dessa dissertação se volta para duas frentes do
arquivo: os arquivos pessoais de artistas da body art, performance e happening (fundos que
foram doados e que são considerados arquivos permanentes) e os arquivos da própria
instituição (correntes, intermediários e permanentes), que possuam documentos relacionados
a esses fundos e a essas manifestações artísticas efêmeras ocorridas na instituição.
O interesse por esses documentos específicos surgiu a partir das próprias
características da arte efêmera. Performances, body art e happenings, diferentemente de
pinturas, esculturas e desenhos, não se materializam em um objeto final. Elas se caracterizam
9 “White Columns foi fundada em 1970 pelos artistas Jeffrey Lew e Gordon Matta-Clark sob o nome original de
112 Greene Street/112 Workshop, como um espaço cooperativo de artistas” (EVANS, 2011, p. 23, tradução
nossa).“White Columns was founded in 1970 by artists Jeffrey Lewand Gordon Matta-Clark under its original
name 112 Greene Street/112 Workshop, as a cooperative artist-run space” (EVANS, 2011, p. 23). 10
“The archives of a highly influential, artist-centric, and forward-thinking organization such as White Columns
can be full of artists’ records including primary source or rare documents. These documents can range from
preparatory sketches or proposals for an exhibition or performance to small independent artists’ publications and
correspondence, or early biographies and artist statements. […] While artists’ records in general provide
immeasurable insight into an artist’s practice and career, such records within an art space are likely to
communicate another level of relationships relative to the projects or exhibitions an artist was working on, as
well as with the personalities and operations of the partnering institution. In addition to artists’ records in the
expected sense of the term, institutional traces such as invitations, exhibition schedules, posters, and
documentation can also contribute to a richer interpretation of the art realized there” (EVANS, 2013, p. 23).
20
pelo processo e pela ação do artista e só existem, em sua totalidade, enquanto estão sendo
realizadas. De acordo com Peggy Phelan,
A performance vive apenas no presente. A performance não pode ser salva, gravada,
documentada, ou ainda participar na circulação das representações das representações:
uma vez que isso ocorra, torna-se algo além da performance. Ao ponto que a tentativa
da performance de entrar na economia da reprodução trai e diminui a promessa da sua
própria ontologia. O ser da performance [...] torna-se ele mesmo através do
desaparecimento (1993, p. 148 apud BORGGREEN E GADE, 2013, p. 14, tradução
nossa).11
Tais manifestações podem suscitar as seguintes perguntas: há algo para a instituição
guardar? O que seria? E no caso dessas obras efêmeras serem registradas, como organizar
esses registros? Se houver vestígios (objetos) remanescentes dessas ações artísticas, como
classificá-los? E ainda, onde se devem guardar os registros e os vestígios? Em suma, como os
setores de arquivos de instituições culturais lidam com esses acervos?
O objetivo geral da pesquisa é, portanto, analisar o tratamento dado pelos setores de
arquivos de museus e de outras instituições culturais aos arquivos de artistas e documentos
relacionados à performance, ao happening e/ou à body art. Pretende-se mapear as
instituições culturais existentes nas cidades do Rio de Janeiro e de Niterói que possuam
arquivos de artistas dessas formas de arte ou que receberam essas expressões artísticas. Ao
analisar os arquivos, será verificado quais materiais mantêm, se essas ações encontram-se
representadas nos documentos e como se dá essa representação, e se haveria o emprego dos
princípios arquivísticos para tal fim, em especial a observância da organicidade.
Quanto aos objetivos específicos, se buscará:
a) Fazer o levantamento e a revisão de literatura dos conceitos operadores fundamentais
– arquivo, arquivo público, arquivo privado, arquivo institucional, arquivo pessoal,
arquivo de museu, arquivo de artista, documento de arquivo, documento
museológico, organicidade, informação, performance, happening, body art;
b) Realizar o levantamento das instituições culturais nas cidades do Rio de Janeiro e de
Niterói que possuam em seus acervos arquivos de artistas que trabalhem com
performances, happenings e/ou body art, ou que tenham recebido essas artes
efêmeras em seus espaços expositivos;
c) Identificar, dentre estas instituições, as que possuem setores de arquivo;
11
“Performance’s only life is in the present. Performance cannot be saved, recorded, documented, or otherwise
participate in the circulation of representations of representations: once it does, it becomes something other than
performance. To the degree that performance attempts to enter the economy of reproduction it betrays and
lessens the promise of its own ontology. Performance’s being [...] becomes itself through disappearance”
(PHELAN, 1993, p. 148 apud BORGGREEN E GADE, 2013, p. 14).
21
d) Verificar a aplicação da teoria arquivística (em especial a organicidade) no tratamento
de documentos de obras de arte contemporânea, a partir das entrevistas e da análise
dos instrumentos de organização do acervo;
A pertinência desta pesquisa reside na verificação da aplicação da teoria arquivística
no tratamento de arquivos de artistas dessas artes efêmeras realizado pelo arquivo da
instituição. Um dos princípios arquivísticos fundamentais é o de Respeito aos Fundos, que
tem como premissa não misturar documentos provenientes de produtores diferentes. Dentro
do fundo, outro critério que precisa ser seguido é o da organicidade, que advoga a ligação
intrínseca entre os documentos que atestam uma ação ou fato. Considerando a impossibilidade
de experimentar, posteriormente, a obra como ela foi realizada durante sua apresentação, o
espectador poderia ter uma ideia mais aproximada da intenção do artista, e/ou de como a ação
se realizou, por meio das informações obtidas pelo contexto.
Um tratamento documental adequado permite a recuperação dos registros das obras
efêmeras, facilitando o acesso às informações relacionadas. De acordo com Borko, a CI é
aquela disciplina que investiga as propriedades e o comportamento da informação,
as forças que governam o fluxo da informação, e os meios de processamento da
informação para acessibilidade e uso otimizados. Ela se refere a um corpo de
conhecimento relativo à origem, coleta, organização, armazenamento, recuperação,
interpretação, transmissão, transformação e utilização da informação (1968, p. 3,
tradução nossa).12
Assim, além de observar o contexto na organização da documentação, é necessário
lidar com a informação em todas as suas fases, incluindo o momento em que ela, enquanto um
documento físico ou virtual, é requisitada e acessada pelo usuário, seja ele interno ou externo.
Nesse sentido, outro aspecto importante do trabalho é que ele relaciona a arquivologia, a arte,
a museologia e a CI, já que analisará a organização e, em consequência, o acesso aos
documentos relacionados a performances, body art e happenings. A proposta é entender o
funcionamento dos arquivos de museus e de outras instituições culturais, e o tratamento dado
a documentos e informações referentes às obras de arte efêmeras. As quatro áreas são
contempladas e os resultados obtidos podem trazer benefícios, esclarecer questões ou ajudar a
entender práticas já realizadas e a maneira como, na realidade concreta de uma instituição, as
áreas citadas se relacionam.
12
“Information Science is that discipline that investigates the properties and behavior of information, the forces
governing the flow of information, and the means of processing information for optimum accessibility and
usability. It is concerned with that body of knowledge relating to the origination, collection, organization,
storage, retrieval, interpretation, transmission, transformation, and utilization of information” (BORKO, 1968,
p.3).
22
Acerca da metodologia empregada, o estudo será exploratório e a pesquisa qualitativa,
com o emprego de estudo de caso e entrevistas semiestruturadas com arquivistas, museólogos
e outros profissionais que atuam em instituições culturais organizando arquivos de artistas da
performance, body art e happening e lidando com documentação ligada a essas manifestações
artísticas. O levantamento das instituições que receberam essas ações artísticas será feito
online.
Para a pesquisa online, escolheu-se o termo performance como representante da body
art e do happening. Tal foi realizado porque esta palavra é a mais conhecida e utilizada (fato
constatado no contato com as próprias instituições, onde se fez necessário explicar os termos
para alguns dos profissionais entrevistados). No que tange ao próprio termo, no entanto, sabe-
se o quanto sua definição é variada. Por isso serão rapidamente apresentadas algumas
definições sobre performance (aprofundadas na quarta seção).
Gonçalves, F., explica que a performance surge
como uma manifestação artística em que o corpo é utilizado como um instrumento
de comunicação e arte que se apropria de objetos, situações e lugares - quase sempre
naturalizados e socialmente aceitos – para dar-lhes outros usos e significações e
propor mudanças nas formas de percepção do que está estabelecido (2004, p 88).
Assim, o performer se utiliza do teatro, do circo, da poesia etc. dando-lhes outros usos e
significados, e da mesma maneira o faz com manifestações religiosas, étnicas e políticas.
Conforme esclarece Gonçalves, F., ao citar Glusberg,
[...] as atividades corporais e o próprio comportamento social estão determinados
por convenções que constituem verdadeiros ‘programas gestuais’ a que nos
sujeitamos, conforme os tempos e as condições da cultura em que vivemos. Neste
sentido, a performance ‘buscaria desenvolver programas criativos, individuais e
coletivos, sendo que o que importa é o processo de trabalho, sua seqüência, seus
fatores constitutivos e sua relação com o produto artístico’ (1987, p. 53 apud
GONÇALVES, F., 2004, p. 89).
Da mesma forma que o corpo e o comportamento social se convencionam em
“programas gestuais”, as linguagens teatrais, circenses, poéticas e as tradições culturais e
religiosas (como danças e demais rituais) possuem suas próprias convenções. Diante disso, a
performance art propõe um deslocamento, realizando uma intervenção e uma
experimentação. Existe uma intencionalidade neste tipo de performance que não se resume a
divulgar uma determinada expressão cultural (carnaval, bumba-meu-boi), uma religião
específica (rituais cristãos, afro-brasileiros, indígenas, kardecistas, judaicos etc.), uma forma
de arte (teatro, dança, circo etc.), mas que procura gerar questionamento. Todas as formas de
23
linguagem e expressões culturais supracitadas, entre outras, podem ser utilizadas por um
performer, desde que com o objetivo de instaurar diferentes formas de percepção:
É justamente este caráter de instauração que a torna nitidamente intencional, o que
nos permitiria propor a noção de performance como uma arte de ‘intervenção’.
Trata-se de uma ação consciente de questionamento através da arte. Mas, ao mesmo
tempo, é possível dizer que, em princípio, a noção de intervenção não definiria
inteiramente o caráter do qual está imbuída a performance. A performance propõe
novas experiências perceptivas e questiona aspectos de nosso cotidiano, da
comunicação e da cultura, o que também lhe conferiria um caráter de
‘experimentação’ com fins de mudança [...] A performance potencializaria, assim, o
instante, engajando-o num processo de ‘descentramento estético’, em que os
componentes de expressão e elementos retirados do cotidiano sofreriam ‘extrações
intensivas’ e passariam por uma desconstrução de suas estruturas e códigos para
propiciar uma recomposição, uma recriação destes elementos. A performance seria,
portanto, ao mesmo tempo, um questionamento do natural e uma proposta artística
(GONÇALVES, F., 2004, p. 90-91).
Com tais afirmações não se pretende dizer que a própria performance art não tenha suas
convenções ou afirmar que ela se localiza fora da cultura. A arte da performance pertence à
cultura e, ao mesmo tempo, a analisa, questiona e instaura novas maneiras de percebê-la a
partir de seu interior.
No que concerne às instituições alvo da pesquisa online, elas foram escolhidas a partir
do Guia dos Museus Brasileiros (GMB), da plataforma MuseusBr e do portal Museus do Rio.
Os dados presentes no GMB foram coletados por envio de questionário às instituições e
através de coleta de informações por profissionais contratados e treinados pelo Instituto
Brasileiro de Museus (Ibram) e pelo Ministério da Cultura (MinC). Na plataforma MuseusBr,
os dados, verificados pelas equipes do Cadastro Nacional de Museus (CNM) e do Registro de
Museus (RM), são inseridos por usuários cadastrados, que precisam ter vinculação
profissional com o museu que desejam inserir. As demais pessoas são orientadas, no link
“Como participar”,13
a entrar em contato com o CNM e o RM via telefone ou e-mail para
informar instituições não cadastradas. O portal Museus do Rio adiciona informações prestadas
por pesquisadores e profissionais da área da museologia e de demais instituições voltadas para
a memória e a cultura.
Sabe-se que tais ferramentas possuem limitações, como datas de atualização, modo de
obtenção dos dados e possíveis erros de inserção. Ainda assim, pela afirmação de que as
informações constantes nesses meios são verificadas, considerou-se que eram fontes úteis,
empregadas de maneira a se complementarem, atualizando e corrigindo possíveis defasagens
e erros.
13
Disponível em: https://renim.museus.gov.br/museusbr/como-participar/. Acesso em: 6 jan. 2020.
24
Após o mapeamento online das instituições existentes no Rio de Janeiro e em Niterói,
verificou-se o tipo de acervo que continham, através da tipologia de acervo e temática
presentes no GMB e na plataforma MuseusBr. Quando esses dados não foram encontrados
nestas fontes, consultou-se o portal Museus do Rio. Como último recurso, recorreu-se à
própria internet, através do site de pesquisas Google a fim de se obter mais informações sobre
os acervos dos museus e saber se neles existiriam conjuntos documentais relativos ao
happening, à performance e à body art. A partir dessa busca, foram utilizados ainda, como
fonte de consulta para a “tipologia do acervo”, os sites CNM e Rio e Cultura, quando estes
apresentavam dados a mais ou diferentes dos contidos nas fontes principais.
O GMB trabalha com onze tipologias de acervo: “Antropologia e Etnografia”,
“Arqueologia”, “Artes Visuais”, “Ciências Naturais e História Natural”, “Ciência e
Tecnologia”, “História”, “Imagem e Som”, “Virtual”, “Biblioteconômico”, “Documental” e
“Arquivístico”. A plataforma MuseusBr disponibiliza dez tipologias: “Antropologia e
Etnografia”, “Arqueologia”, “Arquivístico”, “Artes Visuais”, “Ciência e Tecnologia”,
“Ciências Naturais e História Natural”, “História”, “Imagem e Som”, “Outros” e “Virtual”, e
oito temáticas de acervo: “Artes, Arquitetura e Linguística”, “Antropologia e Arqueologia”,
Ciências Exatas, da Terra, Biológicas e da Saúde”, “História”, “Educação, Esporte e Lazer”,
“Meios de Comunicação e Transporte”, “Produção de Bens e Serviços” e “Defesa e
Segurança Pública”. O CNM14
apresenta doze categorias para “tipologia do acervo”:
“Arquivístico”, “Antropologia e Etnografia”, “Arqueologia”, “Artes Visuais”,
“Biblioteconômico”, “Ciência e Tecnologia”, “Ciências Naturais e História Natural”,
“Documental”, “História”, “Imagem e Som”, “Virtual” e “Outros”. O site Rio e Cultura15
não
possui termos para “tipologia do acervo”, mas apresenta essas informações dependendo da
instituição pesquisada.
A seleção das instituições para a segunda fase da pesquisa online, referente àquelas
que receberam performances, se deu, primeiramente, através da tipologia e temática de
acervo. No entanto, percebeu-se que este uso excluiria locais não relacionados às áreas
escolhidas que poderiam ter recebido essas manifestações artísticas. Por esse motivo, todas as
instituições retiradas do GMB, do Museus do Rio e da plataforma MuseusBr foram
pesquisadas. Posteriormente à seleção das instituições que supostamente receberam
performances, foi realizado contato telefônico e por e-mail, a fim de confirmar essa
14
Site de Pesquisa Avançada do CNM. Disponível em: http://sistemas.museus.gov.br/cnm/pesquisa/avancada.
Acesso em: 31 jan. 2020. 15
Site Rio e Cultura. Disponível em: http://www.rioecultura.com.br/sobre.asp. Acesso em: 31 jan. 2020.
25
informação e agendar visita, durante a qual materiais foram observados e realizaram-se
entrevistas semiestruturadas, gravadas em áudio.
Sobre a divisão de assuntos ao longo da dissertação, na segunda seção serão abordados
os principais conceitos desenvolvidos por teóricos do campo da arte e artistas a respeito dos
arquivos, a fim de mostrar como a arte compreende os arquivos. As subseções 2.1, 2.2 e 2.3
apresentam o arquivo como paradigma, poética e dispositivo performativo e vestígios,
inscrições, contestações e recapitulações. Considerou-se importante identificar algumas
dessas definições, ou formas de compreensão, pois ao longo do levantamento bibliográfico
percebeu-se que a visão dos artistas/pesquisadores e teóricos da arte acerca dos arquivos era
diferente da preconizada pela teoria arquivística, em especial a dita clássica – nem tudo que é
chamado “arquivo” em arte é considerado de tal forma pela arquivologia.
A terceira seção analisará os conceitos-chave da arquivologia na subseção 3.1, e da CI
na subseção 3.2. Para a arquivologia será apresentada a visão que a mesma possui sobre
arquivos, documentos de arquivo, arquivos públicos, arquivos privados, arquivos
institucionais, arquivos de museu, arquivos pessoais, arquivos de artista, organicidade e
documento museológico.16
O propósito é destacar as diferenças de compreensão entre
arquivologia e a arte, além de introduzir a área da arquivologia para os possíveis leitores que
não a conhecem, já que esta dissertação lida com campos diferentes. No que se refere à CI,
objetiva-se demonstrar como a teoria e a definição proposta por Buckland acerca da
informação podem auxiliar na compreensão e classificação das artes efêmeras.
Na quarta seção, subseção 4.1 serão apresentadas e analisadas algumas definições
sobre performance, body art e happening. A subsubseção 4.1.1 elencará algumas diferenças
entre as ações artísticas. A 4.1.2 sistematizará as visões de diversos teóricos sobre essas
manifestações efêmeras. As subsubseções 4.1.3 a 4.1.5 trarão um exemplo de happening, de
body art e de performance, respectivamente. A subsubseção 4.1.6 relacionará os documentos
às ações artísticas citadas. Um dos propósitos desta seção é ampliar o conhecimento sobre a
obra efêmera objeto de estudo, delimitando melhor os conceitos citados, em especial a
performance, geralmente utilizada para denominar eventos diversos. Nesta dissertação, a
ênfase se dará para a “arte da performance” (performance art). Outra finalidade é mostrar
que, apesar de efêmeras, as manifestações artísticas citadas são usualmente acompanhadas por
alguma espécie de registro e por objetos.
16
A inserção de documento museológico nos conceitos-chave de arquivologia será justificada na terceira seção.
26
A quinta seção trará os resultados do levantamento online das instituições localizadas
na cidade do Rio de Janeiro e em Niterói que: a) possuem arquivos de artistas que realizaram
performances, body art e happenings; b) receberam essas atividades em seu espaço
expositivo, nas subseções 5.1 e 5.2 e suas divisões. Também serão apresentados e analisados
os dados coletados a partir da visita presencial e da aplicação das entrevistas semiestruturadas
aos profissionais das instituições culturais previamente selecionadas através do levantamento
online. As informações obtidas acerca do tratamento documental empregado aos arquivos de
artistas e aos documentos relacionados a performances, happenings e body art serão
analisadas na subseção 5.3.
Por fim serão apresentadas as considerações finais sobre a pesquisa teórica e empírica,
reapresentando os propósitos e as conclusões alcançadas, relacionando-as ao objetivo geral e
aos objetivos específicos, tendo como base o marco teórico-conceitual.
27
2 VISÕES DA ARTE SOBRE O ARQUIVO
Nesta segunda seção serão apresentadas algumas das interpretações que estudiosos e
pesquisadores da arte possuem acerca dos arquivos, a fim de identificar diferenças entre as
áreas. Tal identificação se dará por meio da literatura e não pretende ser exaustiva, mas citar
tendências indicadas pelos teóricos.
Considerou-se importante conhecer algumas dessas definições, ou formas de
compreensão, pois ao longo do levantamento bibliográfico percebeu-se que a visão dos
artistas, pesquisadores e teóricos da arte acerca dos arquivos era, em sua maioria, distinta da
definida pela teoria arquivística, em especial a considerada clássica.17
A presente seção será organizada, então, em três eixos: a) arquivo como paradigma, b)
arquivo como poética e dispositivo performativo, e c) arquivo como traços, inscrições,
contestações e recapitulações. Essas acepções foram propostas ou aprofundadas por Anna
Maria Guasch (2011), Priscila Arantes (2015) e Charles Merewether (2006).
2.1 ARQUIVO COMO PARADIGMA
Guasch (2011, p. 7), no estudo que resultou no livro “Arte y archivo, 1920-2010,
genealogías, tipologías y discontinuidades”, visa identificar “as relações, às vezes lineares,
porém mais comumente descontínuas, paradoxais e contra-discursivas, entre a arte e o
arquivo”18
nos séculos XX e XXI. Para delimitar melhor o tema, a autora define
epistemologicamente o campo que vai estudar, ou seja, o tipo de arquivo abordado, e a
perspectiva empregada. A fim de produzir tal história das práticas do arquivo nas artes,
Guasch utiliza como recorte o trabalho de artistas que se enquadram no paradigma do arquivo,
entendido segundo o protocolo de consignação, conceito que será abordado em breve.
O paradigma do arquivo foi identificado primeiramente por Benjamin Buchloh, como
sendo aquele em que a criação artística se baseia “em uma sequência mecânica, em uma
repetitiva lentidão sem fim da reprodução que desenvolve, com estrito rigor formal e absoluta
coerência estrutural, uma ‘estética de organização legal-administrativa’” (1999, p. 32 apud
GUASCH, 2011, p. 9, tradução nossa).19
17
As diferenças entre a arquivologia tradicional e a pós-moderna serão sumariadas na terceira seção. 18
“[...] las relaciones, a veces lineales pero por lo común discontinuas, paradójicas y contradiscursivas, entre el
arte y el archivo” (GUASCH, 2011, p. 7). 19
“[...] en uma secuencia mecánica, en una repetitiva letanía sin fin de la reproducción que desarrolla con
estricto rigor formal y absoluta coherencia estructural una ‘estética de organización legal-administrativa’”
(BUCHLOH, 1999, p. 32 apud GUASCH, 2011, p. 9).
28
A fim de compreender melhor esse paradigma, que se desloca “do objeto ao suporte da
informação, e da lógica do museu-mausoléu para a lógica do arquivo” (GUASCH, 2011, p.
10, tradução nossa),20
Guasch se baseia no protocolo de consignação. Tal protocolo não se
refere, para a autora, às práticas de armazenar, colecionar e acumular em si mesmas, mas à
capacidade da memória em lembrar. Essa capacidade é o que concede ao arquivo seu status
de apoio à memória, de instrumento que a preserva (GUASCH, 2011). Se não fosse possível
ao ser humano lembrar, não haveria noção de passado, vivendo-se em um eterno presente.
Para entender melhor essa aproximação entre arquivo e memória, é preciso
compreender o uso que Guasch faz da leitura de Jacques Derrida sobre a noção de
inconsciente de Sigmund Freud. A autora afirma que Derrida (1994 apud GUASCH, 2011, p.
18, tradução nossa) interpreta a teoria psicanalítica como sendo baseada na noção de arquivo,
“segundo a qual, o que é escrito e colecionado pela percepção tanto a nível consciente como
inconsciente é sistematizado de acordo com experiências reconhecíveis, que podem ser
lembradas e, finalmente, arquivadas”.21
Guasch (2011, p. 17-18, tradução nossa) afirma ainda
que Freud procurou apresentar uma “descrição precisa da psique enquanto arquivo, baseada
no princípio de que os traços de memória das percepções [...] não se acumulam de maneira
permanente no sistema perceptivo, mas em sistemas de memórias subjacentes”,22
o
inconsciente.
Para Derrida (2001, p. 22), esses dois tipos de memória se encaixam com a definição
de arquivo, já que “não há arquivo sem um lugar de consignação, sem uma técnica de
repetição e sem uma certa exterioridade. Não há arquivo sem exterior”. Existiria assim a
mneme ou anamnesis (memória viva, instantânea), e a hupomnema (o arquivo da primeira,
exterior a ela) (DERRIDA, 2001). Freud, entretanto, introduz, em sua teoria, a pulsão de
morte, que parece contradizer a ligação entre o arquivo e a teoria psicanalítica.
Freud (2006, p. 21, tradução nossa), em “A Note up on the Mystic Writing-Pad”,
escrito em 1925, dá a entender que a mente é o melhor suporte para as memórias, pois,
diferentemente dos equipamentos externos que são limitados, ela “tem uma capacidade
receptiva ilimitada para novas percepções e, mesmo assim, estabelece – ainda que não de
20
“[...] del objeto al soporte de la información, y de la lógica del museo-mausoleo a la lógica del archivo”
(GUASCH, 2011, p. 10). 21
“[...] según la cual lo que es escrito y coleccionado por la percepción tanto a nivel consciente como
inconsciente es sistematizado según experiencias reconocibles, que pueden ser recordadas y, en último término,
archivadas” (DERRIDA, 1994 apud GUASCH, 2011, p. 18). 22
“[...] precisa descripción de la psique en tanto que archivo, basada en el principio de que las trazas de memoria
de las percepciones [...] no se acumulan de manera permanente en el sistema perceptivo, sino en sistemas de
memoria subyacentes” (GUASCH, 2011, p. 17-18).
29
maneira inalterável – traços de memória permanentes”.23
Porém o mesmo autor, na obra “O
mal-estar na civilização” (2020), defende que a mente padece de uma pulsão de morte, um
instinto de destruição. Derrida entende que essa pulsão é paradoxal, pois
[...] trabalha em silêncio, [e] não deixa nunca nenhum arquivo que lhe seja próprio.
Ela destrói seu próprio arquivo antecipadamente, como se ali estivesse, na verdade,
a motivação mesma de seu movimento mais característico. Ela trabalha para destruir
o arquivo: com a condição de apagar mas também com vistas a apagar seus
próprios traços – que já não podem desde então serem chamados ‘próprios’. Ela
devora seu arquivo, antes mesmo de tê-lo produzido externamente. Esta pulsão,
portanto [...] é, acima de tudo, anarquivística, poderíamos dizer, arquiviolítica
(2001, p. 21, grifo do autor).
Se a memória arquivística, ou hupomnema deseja se autodestruir, então o arquivo
trabalha contra si próprio. Se o arquivo é apagado antes de se exteriorizar, ele está a priori
lutando contra si (DERRIDA, 2001) e, talvez nunca tenha chegado a existir, já que o arquivo
vive na repetição e na exterioridade.
Independente de tal paradoxo, Derrida (2001) compreende a desconstrução que a
psicanálise pode trazer para o arquivo e, em consequência, para a própria historiografia. Para
o filósofo, o poder do arquivo não está só na sua aproximação com as autoridades, mas se
garante pelo princípio da consignação, que não se resume a “1 Assinalar por escrito;
documentar; registrar. 2 Fazer mencionar; assinalar, aludir, notar. 3 Entregar, sob confiança,
algo a outra pessoa; passar o controle de algo a alguém” (DICIONÁRIO Michaelis Online,
2019), mas “tende a coordenar um único corpus em um sistema em sincronia na qual todos os
elementos articulam a unidade de uma configuração ideal” (DERRIDA, 2001, p. 14). O
impulso destruidor absoluto da teoria psicanalítica de Freud nega, para Derrida, o princípio de
consignação do arquivo, o funcionamento do mesmo enquanto um sistema harmonioso. Isso
pode gerar
graves consequências, tanto para a teoria do arquivo, como para sua realização
institucional. Uma ciência do arquivo deve incluir a teoria da institucionalização,
isto é, ao mesmo tempo, da lei que aí se inscreve e do direito que a autoriza. Esse
direito põe ou supõe um conjunto de limites que têm uma história, uma história
desconstrutível e a cuja desconstrução a psicanálise, no mínimo, não terá ficado
alheia. Essa desconstrução em curso diz respeito, como sempre, à instituição de
limites declarados intransponíveis, seja o direito das famílias ou do Estado, sejam as
relações entre o secreto e o não-secreto, ou, o que é outra coisa, entre o privado e o
público, sejam os direitos de propriedade ou de acesso, de publicação ou de
reprodução, sejam a classificação ou a ordenação [...]. Em todos esses casos, os
limites, as fronteiras, as distinções terão sido sacudidas por um sismo que não poupa
nenhum conceito classificatório e nenhuma organização do arquivo. A ordem não
está mais garantida (DERRIDA, 2001, p. 14-15).
23
“[...] it has an unlimited receptive capacity for new perceptions and nevertheless lays down permanent–even
though not unalterable–memory-traces of them” (FREUD, 2006, p. 21).
30
Por fim, “com Freud, sem Freud, às vezes contra Freud” (DERRIDA, 2001, p. 9),
Derrida associa o arquivo à visão da psicanálise, mostrando-o voltado tanto para a lembrança
quanto para o esquecimento, um arquivo incongruente, marcado pela visão pós-moderna. E
Guasch (2011), na sua análise do paradigma do arquivo, identifica dois modus operandi na
crítica de Derrida, os quais relaciona às práticas artísticas voltadas ao arquivo a partir do final
do século XIX ao início do século XXI: 1) o princípio regulador de normas (da lei) e da
ordem topográfica;24
2) e o que acentua as ações contraditórias de lembrar e guardar e, ao
mesmo tempo, esquecer e destruir. Um arquivo com lei, e um arquivo descontínuo,
anômico,25
sem lei. Esses modus operandi também se aplicam ao que Guasch denomina “duas
máquinas do arquivo”, relacionadas ao seu caráter físico: o modo operativo de procedência e
lei se refere ao arquivo da cultura objetual (apegada ao objeto) e à lógica dos sistemas de
memória material; e o modo operativo do arquivo sem lei, que se assemelha ao arquivo
“baseado na informação virtual, que segue uma racionalidade mais próxima ao flexível e não-
estável, não ordenado linearmente e à margem de toda hierarquização” (2011, p. 15).
Além de se referir a Freud, Derrida e Buchloh, a autora, no intuito de reforçar a
diferença entre arquivo e coleção artificial, cita o princípio da proveniência
(Provenienzprinzip), que privilegia a origem sobre o conteúdo dos documentos e prevê que
eles sejam mantidos com a ordenação que receberam antes de serem recolhidos pela
instituição arquivística. Tal princípio, segundo Guasch (2011), define o arquivo para os
historiadores como um lugar neutro e inerte, que preserva o documento nas condições ideais
para permitir a reconstrução do passado e, portanto, a existência do presente e a construção do
futuro. A autora esclarece, porém, que os documentos não representam a totalidade, são
fragmentos. Assim, a insistência em entender o presente através dos pedaços do passado teve
como consequência a compreensão de que tudo podia ser arquivado, desde que fosse um
material remanescente, incompleto ou fragmentado.
24
Derrida afirma que o arquivo é arcôntico, ou seja, está ligado ao local de poder e a quem detém a autoridade
sobre os documentos - “princípio da lei ali onde os homens e os deuses comandam, ali onde se exerce a
autoridade, a ordem social, nesse lugar a partir do qual a ordem é dada – princípio nomológico” (2001, p. 11). 25
“Anomia: 1 Ausência de lei ou regra; anarquia. 2 Estado da sociedade no qual os padrões normativos de
conduta e crença têm enfraquecido ou desaparecido. 3 Condição de um indivíduo comumente caracterizada por
desorientação pessoal, ansiedade e isolamento social. 4 MED Perda da faculdade de dar nome aos objetos ou de
reconhecer e lembrar seus nomes. 5 TEOL Desobediência às leis divinas” (DICIONÁRIO Michaelis Online,
2019).
31
2.1.1 Práticas protoarquivísticas literárias, historiográficas e artísticas26
Guasch (2011) situa o início da aproximação entre arte e arquivo a partir de 1920,
apesar de considerar alguns trabalhos realizados no final do século XIX. A autora nomeia esse
primeiro momento “protoarquivo” e o identifica em práticas literárias, historiográficas e
artísticas do período. Para as práticas protoarquivísticas literárias, é escolhido como exemplo
o escritor e filósofo Walter Benjamin (1892-1940), em especial seu livro “Passagens” (1927-
1940). Nesta obra, Benjamin quer “ler a experiência do presente através de flashs, fragmentos
ou gotas do passado” (GUASCH, 2011, p. 22, tradução nossa).27
Ele realiza tal leitura
evitando a escrita linear por meio da técnica da montagem, unindo textos, comentários,
citações e fragmentos manuscritos sobre a cidade de Paris no século XIX (FERRARI, 1997).
De acordo com Tiedemann (apud FERRARI, 1997) as notas feitas por Benjamin não eram
ordenadas segundo a data de criação, e um arquivo (konvolut) era aberto sempre que
Benjamin começava a tratar sobre um novo tema.
A respeito da montagem por meio da acumulação de citações, Guasch (2011) afirma
que essa técnica pode ter sido inspirada no documentário “Berlin, Symphonie einer
Grossstadt” (1927), filmado por Walther Ruttmann (1887-1941). A influência do cinema é
reforçada por Arantes (2015, p. 60), para quem a noção de montagem em Benjamin foi
emprestada da sétima arte “como método estratégico para se pensar a escritura
historiográfica”. Guasch explica ainda que o livro “Passagens” faz do armazenamento e da
acumulação sua razão de ser
A história de Benjamin é fragmentada e arquivada em anotações, rascunhos e listas
de questões semelhantes a ‘sessões fotográficas’ e organizadas em 36 categorias
com títulos descritivos como ‘Moda’, ‘Tédio’, ‘Cidade dos Sonhos’, ‘Fotografia’,
‘Catacumbas’, ‘Publicidade’, ‘Prostituição’, ‘Baudelaire’, ‘Teoria do progresso’,
‘Flâneur’, com seus códigos de reconhecimento identificados por cores; algumas
séries dominadas pela cor azul, outras por laranja, vermelho, verde, preto, marrom,
rosa, roxo e amarelo (2011, p. 23, tradução nossa).28
26
A fim de exemplificar o paradigma de arquivo, serão citados alguns artistas, historiadores e literatos que
Guasch escolheu para representá-lo. Como não é possível cobrir todo o escopo do livro, foram escolhidos
personagens identificados pela autora como sendo os primeiros a inserirem as questões do arquivo em suas
obras. 27
“[...] leer la experiencia del presente a través de destellos, fragmentos o gotas del passado” (GUASCH, 2011,
p. 22). 28
“La historia de Benjamin queda fragmentada y archivada em anotaciones, borradores y listas de cuestiones
similares a ‘tomas fotográficas’ y organizadas en 36 categorías con títulos descriptivos como ‘Moda’,
‘Aburrimiento’, ‘Ciudad de sueño’, ‘Fotografía’, ‘Catacumbas’, ‘Publicidad’, ‘Prostitución’, ‘Baudelaire’,
‘Teoría del progreso’, ‘Flâneur’, con sus códigos de reconocimiento identificados con colores; unas series
dominadas por el color azul, otras por el naranja, el rojo, el verde, el negro, el marrón, el rosa, el púrpura y el
amarillo.” (GUASCH, 2011, p. 23).
32
Apesar29
de Walter Benjamin construir sua história de Paris por meio de citações, o
método de organização, para Guasch, o aproxima da ideia do princípio da proveniência, da
homogeneidade, ordem e lei, enfim, ao primeiro modus operandi.
Como protoarquivos, Guasch também cita o “Atlas Mnemosyne” do historiador de arte
Aby Warburg (1866-1929), o trabalho dos fotógrafos Eugène Atget (1857-1927) e August
Sander (1876-1964), o álbum-arquivo da artista Hannah Höch (1889-1978), os painéis
didáticos de Kazimir Malevich (1879-1935) e o museu portátil do artista Marcel Duchamp
(1887-1968).
Para Aby Warburg, a história é lembrança, e a “memória coletiva social podia ser
rastreada através das inúmeras camadas de transmissão cultural” (BUCHLOH, 2009, p. 197).
Na prática, o historiador reuniu, por volta de 1928 e 1929, diversas imagens relacionadas à
arte, fotografias e reproduções de murais, miniaturas, relevos, pinturas, esculturas, obras
arquitetônicas, recortes publicitários, imagens de jornais, postais etc. de civilizações
ocidentais e orientais, de todas as épocas, que tinham em comum temas recorrentes na
memória das sociedades (GUASCH, 2011). Essas imagens foram divididas em 79 painéis
(fig. 1), segundo afinidades morfológicas e semânticas, com o objetivo de mostrar que a
“memória cultural não é uma memória inerte, senão ativa, que pode recuperar as pegadas [...]
do passado, cuja capacidade evocadora é capaz de definir, como ocorreu na época do
Renascimento, a arte e a literatura do presente” (RAMPLEY, 2000, p. 88 apud GUASCH,
2011, p. 24, tradução nossa).30
Ou seja, Warburg entendia que os estilos e técnicas do passado sobrevivem no
imaginário dos artistas e da sociedade, podendo ser reutilizados. Essa reutilização dos traços e
temas pode ser percebida em obras de períodos posteriores, e é por isso que Warburg coloca
essas diferentes imagens lado a lado. Ao pensar dessa maneira, o historiador assume “uma
posição contrária ao historicismo e à noção de progresso em arte’” (BASTOS, 2010, p. 15
apud ARANTES, 2015, p. 74). Warburg propõe uma nova abordagem da história da arte,
onde o arquivo é entendido
29
Em uma visão arquivística, esse acúmulo de citações poderia ser considerado uma coleção, unida
artificialmente pela vontade de Walter Benjamin e, nesse sentido, seria mais lógico compreendê-la como uma
biblioteca do que como um arquivo. Mas, se essas citações se encontrassem no conjunto de documentos de
Benjamin e tivessem relação com outros documentos, servindo de testemunho das atividades criativas do autor,
elas poderiam ser consideradas documentos arquivísticos. No caso, Guasch entende o livro “Passagens” como
sendo um arquivo da cidade de Paris. 30
“[...] la memoria cultural no es una memoria inerte, sino activa, que puede recuperar las huellas o engramas del
pasado que, con su capacidad evocadora, son capaces de definir, como ocurrió en la época del Renacimiento, el
arte y la literatura del presente” (RAMPLEY, 2000, p. 88 apud GUASCH, 2011, p. 24).
33
como um dispositivo de armazenamento de uma memória sócio-cultural que não
estrutura uma história discursiva, mas sim imagens [...] enquanto formas [...]
portadoras de sentimentos [...], que funcionam como representações visuais e como
maneiras de pensar, sentir e conceber a realidade (GUASCH, 2011, p. 24-25,
tradução nossa).31
Essa nova história não segue hierarquias nem limites de procedência ou ordem
estética, nem se apresenta enquanto uma sucessão linear de estilos, mas como “um
pensamento histórico ‘subjetivo’ e em boa medida rizomático, ativado a partir do presente”
(GUASCH, 2011, p. 25, tradução nossa).32
Percebe-se, a partir da análise que Guasch
empreende sobre Walter Benjamin e Aby Warburg, que os atos de acumular, armazenar e
classificar, montando um discurso a partir de fragmentos, sendo relacionados à memória e à
história, são associados pela autora ao arquivo. No entanto, segundo Guasch (2011), Warburg
se enquadra melhor no segundo modus operandi do paradigma arquivístico, o do arquivo
heterogêneo e descontínuo.
Figura 1 – Atlas Mnemosyne, Painel 37, [19--?], Aby Warburg
Fonte: Fotografia histórica do painel original. © 2018 The Warburg Institute, University of London,
School of Advanced Study, Woburn Square, London.
Após os protoarquivos literário e historiográfico, Guasch aborda o protoarquivo
artístico. A autora inicia sua análise apresentando dois fotógrafos que atuaram em fins do
século XIX: Eugène Atget e August Sander. Ambos utilizavam a fotografia como um meio
31
“[...] como un dispositivo de almacenamiento de una memoria sociocultural que no estructura una historia
discursiva, sino imágenes o phatosformel, en tanto que formas – formulae - portadoras de sentimientos - pathos-,
que funcionan como representaciones visuales y como maneras de pensar, sentir y concebir la realidad”
(GUASCH, 2011, p. 24-25). 32
“[...] un pensamiento histórico ‘subjetivo’ y en buena medida rizomático, activado desde el presente”
(GUASCH, 2011, p. 25).
34
objetivo de registrar a sociedade da sua época, e tinham como objeto de interesse tanto
pessoas quanto locais e construções. Atget queria “criar uma coleção – próxima ao conceito
de arquivo – de todo o pitoresco e artístico que houvesse em Paris” (GUASCH, 2011, p. 28,
tradução nossa)33
(fig. 2). Ele organizava suas fotografias à maneira de um catálogo,
empregando um sistema de séries divididas por temas e datas, segundo uma lógica
bibliotecária (derivada dos arquivos de biblioteca e das coleções topográficas) (GUASCH,
2011).
Além dessa organização, eram mantidos dois tipos de álbum: aqueles que Atget
mostrava aos visitantes, cujas imagens eram agrupadas conforme o sistema de classificação
que havia criado, e os outros, que representavam “objetos históricos ou ameaçados de
destruição no marco da Velha Paris”, fotos datadas entre 1898 e 1913 (GUASCH, 2011, p. 29,
tradução nossa).34
Guasch cita ainda Rosalind Krauss, para quem o trabalho de Atget se
caracteriza pelo registro objetivo, o que tornaria a questão de autoria em sua obra irrelevante.
Para Krauss (1996, apud GUASCH, 2011), Atget não imprimiu um estilo às imagens, apenas
catalogou o que viu.
Figura 2 – Métiers, boutiques et étalages de Paris [Ofícios, lojas e vitrines de Paris],
Mercado Carmes, Maubert, 1910-1911, Eugène Atget
Fonte: BnF, Estampes et Photographie.
August Sander se destaca na aproximação arte e arquivo pela sua estratégia em
apresentar a sociedade do seu tempo (em especial as categorias sociais e profissionais) em um
sistema de classificação, organizando sua coleção fotográfica em grupos e subdivisões. Para
33
“[...] crear una colección – cercana al concepto de archivo – de todo lo pintoresco y artístico que hubiera en
París” (GUASCH, 2011, p. 28). 34
“[...] objetos históricos o amenazados de destrucción en el marco del viejo París” (GUASCH, 2011, p. 29).
35
Sander, a fotografia era um instrumento de registro histórico, “um retrato da nação através dos
seus estratos sociais” (GUASCH, 2011, p. 31, tradução nossa).35
Em 1927 o fotógrafo expõe
publicamente pela primeira vez, no museu de arte Kunstverein, em Colônia (Alemanha), sua
obra “Cidadãos do séc. XX”, dividida em sete categorias, cada qual formando um livro: “O
camponês”, “O artesão”, “A mulher”, “Categorias sócio-profissionais” (fig. 3), “O artista”, “A
cidade”, e “Os últimos homens” (“homens insensatos, enfermos, loucos e mortos”). Para
Rossi, o conceito estético que norteia este trabalho é o de exatidão:
[...] o princípio da fotografia exata caracteriza-se pela hiper-precisão de detalhes, a
qual privilegia a clareza de informação e potencializa a capacidade descritiva da
imagem. Mas a exatidão, para Sander, não se alcança apenas com a precisão técnica;
é preciso também um método de classificação e de sequencialização de fotografias
que potencialize ainda mais seu caráter descritivo. [...] Mas por trás desse suposto
caráter científico e da tentativa de representação fiel e neutra do real, está o que
verdadeiramente essa obra é: um conjunto de estereótipos de percepção que
correspondem ao modo como Sander percebe o mundo e constrói, por meio de
fotografias, a representação de uma realidade (2009, p. 92, grifo do autor).
Mais uma vez são enfatizados por Guasch (2011) os métodos de registro e de
classificação, de descrição, de alguma forma de controle intelectual na relação entre arte e
arquivo. No concernente ao paradigma de arquivo, os dois fotógrafos, assim como Walter
Benjamin, se enquadram no arquivo enquanto lei, continuísmo e procedência.
Figura 3 – Pastry Cook [Confeiteiro], 1928, August Sander
Fonte: Die Photographische Sammlung/SK Stiftung Kultur - August Sander Archiv, Cologne; DACS,
London, 2019.
O trabalho de Hannah Höch é considerado como tendo base em “uma organização
sistemática do conhecimento segundo modelos didáticos de exibição ou dispositivos de
35
“[...] un retrato de la nación a través de sus estratos sociales” (GUASCH, 2011, p. 31).
36
memória associados ao sistema-arquivo” (GUASCH, 2011, p. 34, tradução nossa).36
Com
relação à prática artística, isso significa que Hannah, por meio das colagens de imagens
encontradas em revistas ilustradas alemãs de 1925 e 1926 e algumas revistas holandesas,
buscava a representação da mulher e da sociedade da época: crianças, paisagens, flores, nus
femininos, atletas, bailarinas, trabalhadores, anúncios, animais. Essas imagens foram coladas
em um álbum, sobre o qual a artista não deixou notas escritas. Por isso não se sabe se ele é
uma obra de arte em si, uma coleção de imagens para inspirar produções posteriores ou um
diário pessoal (GUASCH, 2011). Mas o que resulta claro para Maud Lavin (1993, p. 74 apud
GUASCH, 2011, p. 36, tradução nossa)37
é que o álbum de Hannah (fig. 4) é um “arquivo
individual no qual a artista celebra as novas tecnologias associadas ao impacto social dos
meios de comunicação de massas e as categorias icônicas associadas às imagens de uma nova
mulher, no marco de uma sociedade utópica”. A respeito do paradigma arquivístico, o modus
operandi de Höch é o mesmo de Warburg, heterogêneo e anômico (GUASCH, 2011).
Figura 4 – Sammelalbum, [1933?], Hannah Höch
Fonte: Livro “Hannah Höch” (página do álbum de recortes de imprensa), publicado em inglês pela editora Hatje
Cantz Verlag GmbH & Co KG.
Os painéis didáticos de Kazimir Malevich se constituem de fragmentos de reproduções
fotográficas, textos, desenhos e esboços utilizados para apresentar aos alunos do então
Instituto de Estado da Cultura Artística de São Petersburgo o conhecimento artístico de
maneira “serial, sistemática e sintagmática” (GUASCH, 2011, p. 39, tradução nossa).38
Malevich se aproximou da pintura como quem se acerca do documento, comparando e
36
“[...] organización sistemática del conocimiento según modelos didácticos de display o dispositivos de
memoria asociados al sistema-archivo” (GUASCH, 2011, p. 34). 37
“[...] archivo individual en el que la artista celebra las nuevas tecnologías asociadas al impacto social de los
medios de comunicación de masas y las categorías icónicas asociadas a las imágenes de una nueva mujer, en el
marco de una sociedad utópica” (LAVIN, 1993, p. 74 apud GUASCH, 2011, p. 36). 38
“[...] serial, sistemática y sintagmática” (GUASCH, 2011, p. 39).
37
fazendo análises a fim de descobrir como as épocas e os distintos movimentos artísticos
conceberam o desenvolvimento da forma e da cor, até culminarem no movimento artístico
denominado Suprematismo39
(GUASCH, 2011). A fim de escrever uma história teórica da
pintura esses fragmentos foram organizados em 22 painéis e cobrem desde o Cubismo40
até o
Suprematismo, se dividindo em três blocos principais: análises formais (estudo das formas,
das técnicas), análises expressivas (relação das sensações que guiam o artista na execução do
seu trabalho) (fig. 5) e uma terceira análise dedicada aos métodos de ensino empregados por
Malevich no Instituto (GUASCH, 2011).
Figura 5 – Análise das sensações, detalhe dos diagramas 9 e 11, 1927, Kazimir Malevich
Fonte: Stedelijk Museum, Amsterdam.
Para Malevich a arte é uma forma de pensamento independente, assim como a
filosofia e a religião. Por isso o artista decidiu estudar de maneira esquemática os cinco
sistemas da nova arte: Impressionismo, Cezanismo, Cubismo, Futurismo e Suprematismo
(GUASCH, 2011). Apesar do caráter sistemático, Guasch situa os painéis de Malevich no
modo operativo de arquivo heterogêneo, já que a análise da história da arte empreendida por
ele não é hierárquica nem linear.
O museu portátil de Marcel Duchamp (fig. 6) é constituído por uma série de vinte
caixas revestidas de couro, compostas por compartimentos corrediços, onde o artista guardou
39
“Movimento fundado em Moscou por Kazimir Malevich em 1913, que durou até a década de 1920 e advogava
uma arte abstrata baseada no emprego de cores puras sobre fundo branco e nas formas simples do círculo, do
triângulo, do quadrado e da cruz. [...] Toda a arte abstrata posterior baseada em abstração geométrica se deve ao
Suprematismo” (MARCONDES, 1998, p. 269). 40
“Movimento artístico surgido no final da primeira década do século XX [...]. Liderado por Braque e Picasso
[...] buscava [na primeira fase, Cubismo Analítico] a representação simultânea de todas as formas do objeto no
espaço, abandonando a perspectiva convencional. Em uma segunda etapa, o chamado Cubismo Sintético, traduz
todas as formas em uma linguagem de signos visuais” (MARCONDES, 1998, p. 80).
38
por volta de 69 reproduções de suas obras principais, em cópias coloridas e preto e branco,
realizadas através da técnica do estarsido,41
fotografias e miniaturas tridimensionais. Cada
mala recebia uma etiqueta onde se podia ler Marcel Duchamp ou Rrose Sélavy42
(GUASCH,
2011). Para Guasch, a
realização desse ‘museu portátil’ seguiu um minucioso método de trabalho próximo
à natureza do arquivo que, após uma fase inicial de inventariação de todas as suas
obras com a referência precisa do nome de seus proprietários, consistiu na
reprodução em fotos em preto e branco de uma seleção de suas pinturas, obras em
vidro e objetos inclassificáveis (2011, p. 42, tradução nossa).43
Figura 6 – La Boîte-en-Valise, 1936-1941, Marcel Duchamp
Fonte: © Georges Meguerditchian - Centre Pompidou, MNAM-CCI /Dist. RMN-GP © succession
Marcel Duchamp/Adagp, Paris.
Tomkins (2004) explica que a “caixa-valise” de Duchamp não apenas reproduz as
obras do artista, mas funciona como uma referência constante a elas. Para Walter Arensberg
([19--], apud TOMKINS, 2004, p. 351), Duchamp “havia inventado ‘um novo tipo de
autobiografia [...] representada por marionetes. Você se tornou o marionetista do seu
passado’”. Além dessas motivações, Tomkins também cita a guerra como responsável pelo
impulso preservacionista de Duchamp
41
“Processo de gravação executado transferindo-se a imagem para o verniz mole de uma placa por meio do
[risco] de um lápis no reverso de um desenho” (MARCONDES, 1998, p. 112) e a posterior transferência desse
desenho para o suporte final (tecido, papel etc.). Espécie de estêncil. 42
Rrose Sélavye é o nome que Duchamp adotou para seu alter ego feminino, criado em 1920. O artista
empregou o nome dessa personagem em diversas produções artísticas que realizou até 1941. Segundo Duchamp,
o objetivo não era trocar de identidade, mas possuir duas. O próprio nome é um trocadilho para a expressão
francesa “c’est la vie” (TOMKINS, 2004, p. 256). 43
“[...] realización de ese ‘museo portátil’ siguió un minucioso método de trabajo próximo a la naturaleza del
archivo que, tras una fase inicial de inventariado de todas sus obras com la referencia precisa del nombre de sus
propietarios, consistió em la reproducción en fotos em blanco y negro de una selección de sus pinturas, obras em
vidrio y objetos inclasificables” (GUASCH, 2011, p. 42).
39
O Anschluss, em 1937, a conferência de Munique, a anexação dos Sudetos por
Hitler, o pacto de não-agressão germano-soviético e o crescimento ameaçador das
forças armadas alemãs, tudo apontava para a inevitabilidade de um conflito
generalizado, que os europeus aguardavam com resignação fatalista. Duchamp,
como muitos outros, estava fazendo as malas (TOMKINS, 2004, p. 351).
Duchamp se enquadra, assim como Malevich, Warburg e Höch, no paradigma de
arquivo anômico, heterogêneo, contra a lei e as regras, segundo Guasch.
Após a apresentação desses artistas, é possível perceber que suas obras foram
associadas ao arquivo por terem o mesmo objetivo – por meio da linguagem artística, registrar
(atuar enquanto memória e ainda, autuar44
a memória de) um período, uma determinada visão
da mídia, uma sociedade, seu próprio trabalho, e uma história cultural e artística. Alguns dos
termos utilizados pela autora para descrever essas manifestações artísticas são (ou remetem
a): coleção (entendida pelo princípio da consignação, registro, memória), classificação,
série(s), repetição, fragmentos, passado, sistematização, tipos, grupos, subdivisões, arquivo,
montagem, categorias, organização, catálogo, protoarquivo, códigos, memória e história.
Apesar de possuírem o mesmo objetivo, tais artistas os concretizaram por meio de dois modus
operandi: o arquivo nomológico e o arquivo anômico.
2.2 ARQUIVO COMO POÉTICA E DISPOSITIVO PERFORMATIVO
Arantes, em “Reescrituras da arte contemporânea” (2015), procura analisar os motivos
que levaram o arquivo a ter se tornado um tema tão presente na produção de um grupo de
artistas contemporâneos. A autora (2015, p. 19) identificou, na literatura e em sua própria
prática,45
artistas que “trabalham com material de arquivo, que criam arquivos fictícios, que
problematizam a questão do arquivamento, [...] que desenvolvem projetos a partir de uma
modalidade arquival”. Diante dessa constatação, Arantes identifica a vertente do arquivo
enquanto poética e dispositivo performativo.
A autora (ARANTES, 2015) assinala a passagem do arquivo como documento para o
arquivo como poética e dispositivo performativo na arte contemporânea, nas práticas
conceituais realizadas a partir da década de 1960, que se caracterizam pela junção de
diferentes linguagens artísticas e pela incorporação de obras processuais (que se realizam no
tempo e no espaço, e não como um objeto acabado).
44
No sentido de reunir e ordenar em forma de processo. As obras artísticas teriam o objetivo de se constituírem
enquanto memória e, ainda, de reunirem e organizarem a memória de um determinado período e história,
segundo a vontade do artista. 45
Priscila Arantes é pesquisadora, professora, crítica, gestora cultural e curadora do Paço das Artes em São
Paulo.
40
A respeito dos responsáveis pela ideia de arquivo enquanto inclusivo e expansivo para
a arte efêmera, Julie Louise Bacon (2013) considera quatro atores: organizações de arte sem
fins lucrativos, que historicamente estimularam e continuam estimulando o desenvolvimento
da performance; institutos de pesquisa e universidades, que fomentaram a linguagem
conceitual e a crítica artística e são engajados com a produção dessa expressão artística; o
mercado da arte, que se interessou pela performance a partir da última década; artistas
individuais, tanto os pioneiros, com décadas de prática, cujas produções datadas de 1950-1960
foram pouco documentadas, quanto os iniciantes, que vivem em uma época onde a
documentação massiva da arte é considerada normal.
No Brasil, o surgimento da arte enquanto arquivo é localizado, segundo alguns
autores, por volta de 1960, época da ditadura militar. Os artistas que eram marginalizados
pelo sistema de arte acabaram produzindo projetos experimentais que agora se encontram em
seus arquivos (ARANTES, 2015). Como exemplo, pode-se citar Paulo Bruscky e a arte
postal. Essa arte é uma “linguagem artística que utiliza os correios como circuito alternativo
aos centros oficiais de arte (museus, galerias etc.), como meio de circulação de uma arte anti-
burguesa, anticomercial, anti-sistema” (BRUSCKY, 2006, p. 163 apud BRITTO, 2013, p.
207). Os artistas enviavam “cartões-postais, envelopes, caixas, fitas magnéticas (sonoras ou
visuais) [...] que informavam, questionavam e investigavam, em ações cotidianas, os códigos
e sistemas de funcionamento que regulavam a vida e a arte” (NUNES, 2004, p. 13). Frente a
ameaças e à perseguição política que sofria no período, Bruscky utiliza os correios para fazer
arte e se comunicar com outros artistas que passavam pela mesma situação na América
Latina, criando uma verdadeira rede de apoio e luta (FREIRE, 2006).
Se, em um sentido, a arte postal nega o museu por utilizar os correios como meio de
difusão, para Freire, essa arte aproxima o museu do arquivo. Por se constituir de documentos
escritos, iconográficos e audiovisuais, as obras resultantes dessa linguagem artística exigem
um tratamento diferenciado, uma mudança dos museus nas “funções de preservação, guarda e
exibição de obras de arte” (FREIRE, 2006, p. 67). Arantes (2015, p. 101) reforça essa
compreensão, ao dizer que a expansão da arte conceitual, “acrescida das obras de arte
colaborativas, participativas, efêmeras, midiáticas, entre outras, sinalizam para novas formas
de documentar, catalogar e preservar as obras de arte”, além de, em alguns casos, transformar
as práticas arquivísticas e os próprios documentos em estratégias artísticas. Os documentos e
os atos de documentar deixam de ser entendidos apenas como registros e práticas
documentais/documentárias para se tornarem operações artísticas.
41
Dentre essas operações, Arantes (2015) identifica cinco eixos que se relacionam com
os arquivos através de uma poética da montagem de materiais, memórias e tempo: a
reencenação, a apropriação, a espacialização, a in/corporação e o meta-arquivo. A autora,
assim como Guasch, cita alguns artistas que considera representativos desses vetores. Para
fins deste trabalho, será apresentado um artista por eixo.
2.2.1 Reencenação, apropriação, espacialização, in/corporação, meta-arquivo
A reencenação (reenactment) na arte contemporânea diz respeito à prática de
apresentar novamente uma obra ou um fato histórico. A exposição “A little Bit of History
Repeated”, ocorrida no Kunst-Werke Institut of Contemporary Art (Berlim) em 2001 é um
exemplo. Jens Hoffmann, curador dessa exposição, convidou vários artistas para interpretar,
ao longo de três dias, uma série de performances. As informações sobre as performances
foram recuperadas pelos artistas por meio de consulta a documentos orais, escritos,
audiovisuais e fotográficos (MELIM, 2008). A reencenação, no entanto, não significa que a
nova performance será exatamente igual a anterior (inclusive pela impossibilidade de
repetição, inerente a qualquer evento, promovida pela passagem do tempo). Para Arantes
(2015), essa estratégia artística tem como proposta agregar novas interpretações, realizar uma
repetição diferente.
A autora identifica duas tendências dentro do vetor reencenação nas produções
artísticas contemporâneas: a reapresentação de obras e de fatos históricos e a articulação com
produções artísticas anteriores, a fim de atribuir sentidos que não estavam presentes
anteriormente. Articulando as duas tendências, Arantes traz o artista Lucas Bambozzi (1965-),
com a obra “O dia em que São Paulo parou” (2009).
A obra é baseada nos acontecimentos do dia 12 de maio de 2006, em que a facção
criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) parou a cidade de São Paulo através de ordens
emitidas via celular pelos líderes que estavam nos presídios aos integrantes que se
encontravam fora. Seguiu-se uma onda de ataques, com ônibus sendo queimados, policiais e
seus familiares sofrendo atentados e ameaças, agências bancárias sendo explodidas, entre
outras ações. Essa reação teria sido uma resposta ao ato do governo paulista de isolar líderes
de facções criminosas em presídios de segurança máxima. Recebendo ampla cobertura da
mídia, esse evento foi caracterizado por uma série de boatos e pelo terror sentido pela
população.
Bambozzi aproveita a ampla cobertura midiática e cria um vídeo com mais de
cinquenta canais, dispostos visualmente de maneira que lembra as linhas de varredura das
42
televisões antigas. Os canais reproduzem as notícias sobre o ataque a São Paulo, apresentando
uma “trama das diversas imagens e sons sobre o tema” 46
(BAMBOZZI, 2010, p. 89 apud
ARANTES, 2015, p. 128).
Após esse trabalho, o artista imaginou como esse evento teria sido compreendido caso
se achassem imagens filmadas pelos celulares de quem sofreu os atentados e de quem os
provocou. Bambozzi cria, então, mais dois vídeos, um baseado em imagens que teriam sido
encontradas nas memórias dos celulares das vítimas47
e outro que mostrava o arrependimento
de um dos criminosos que atearam fogo em um ônibus (ARANTES, 2015). Arantes resume a
proposta e o resultado deste trabalho como sendo
Um conjunto fragmentado e multifacetado, um falso documentário, que cria uma
relação ambígua entre a realidade e a ficção. De alguma maneira, a forma
fragmentada do projeto revela a ‘fragmentação’ do próprio fato que foi reencenado
no dia várias vezes através dos canais midiáticos (2015, p. 128).
O arquivo como apropriação parece ser o que mais se aproxima ao sentido dado pela
arquivologia aos documentos de arquivo. Provavelmente isso se deve ao fato de que os
artistas utilizam documentos reais, retirando-os do contexto da instituição arquivística. Esse
material, no entanto, não é utilizando como fonte, mas como material artístico. Nesse sentido,
Arantes traz a obra “Vulgo” (1998), em que a artista Rosângela Rennó (1962-) utiliza as
fotografias de prisioneiros pertencentes ao Museu Penitenciário de São Paulo. Esse conjunto
fotográfico já havia gerado outro trabalho, a “Série Cicatriz” (fig. 7), realizada no Los Angeles
County Museum of Art, em 1996. Nela, Rennó propõe uma nova leitura das fotos de
identificação de presos, que traziam, em detalhe, características particulares dos detentos,
especialmente tatuagens. Essas fotos foram reproduzidas a partir de negativos de vidro que
haviam sido esquecidos nos diversos porões do complexo do Carandiru, sem critério de
acondicionamento ou arquivamento. Rennó explica sobre sua intervenção que
afastar a fotografia de seu contexto natural – o sistema de identificação ou o estudo
científico – não é esvaziá-la de seu conteúdo simbólico inicial, mas libertar seu
referente da condição de estatística penitenciária. Devolver visibilidade a essas
fotografias significa expor a dor da privação do direito de ser livre e da perda da
identidade e o desejo de resistir à amnésia e ao anonimato (2004, p. 227).
46
O vídeo pode ser visto no Youtube e na página pessoal do artista na internet. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=1RhA_EXVJe8. Acesso em: 23 maio 2019. 47
Ataques PCC – vídeo celulares. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?time_continue=5&v=Oqd9
pmpn4bg. Acesso em: 23 maio 2019.
43
Figura 7 – Série Cicatriz, 1996, Rosângela Rennó
Fonte: Site da artista.
Na instalação “Imemorial” (1994) a artista expõe na parede e no chão da galeria
ampliações de fotos 3x4 de trabalhadores que foram encontradas em um armazém do Arquivo
Público do Distrito Federal. Esse material estava guardado em malas, totalizando mais de
quinze mil documentos sobre os empregados da Novacap (companhia governamental) que
morreram na construção de Brasília. A ação da artista representa “um gesto redentor, a
ressurreição dos corpos caídos, daqueles que se sacrificaram na construção do futuro”
(MEREWETHER, 2006, p. 161, tradução nossa).48
Através da apropriação, Rennó lida com questões que vão além do caráter estético,
mas se referem ao esquecimento, à massificação trazida pelo anonimato das imagens
fotográficas e a “procedimentos, muitas vezes questionáveis, implementados pelos
dispositivos de poder” (ARANTES, 2015, p. 133).
A espacialização diz respeito à presença, em espaços públicos, de trabalhos que
carregam testemunhos e experiências pessoais. Esses trabalhos acabam por se apresentar
enquanto anti-monumentos, já que não reproduzem o discurso oficial da história, mas sim as
vivências íntimas. Nessa perspectiva, Arantes traz o projeto de arte pública “Inside & Outside
the Tube” (fig. 8), realizado na Suíça em 1998 pelos artistas Maurício Dias e Walter Riedweg.
A obra constituiu-se pela instalação de tubos de metal industriais em locais públicos, os quais
a população podia acessar. Ao se aproximar dos tubos, as pessoas ouviam os relatos de
refugiados que chegaram à Suíça em busca de asilo político. Tais depoimentos foram tomados
48
“[...] represents a redemptive gesture, a resurrection of fallen bodies, those sacrificed in the building of the
future” (MEREWETHER, 2006, p. 161).
44
através de um workshop que os artistas realizaram. Entre várias atividades de sensibilização,
os refugiados foram estimulados a contar as experiências das viagens que empreenderam para
chegar naquele país. Cada um relatou suas viagens em sua própria língua (ARANTES, 2015;
DIAS, RIEDWEG, [2012?]). O objetivo desse projeto, para Arantes, é evidenciar no espaço
público as consequências emocionais e afetivas geradas pelo processo de marginalização.
Figura 8 – Inside & Outside the tube, 1998, Maurício Dias e Walter Riedweg
Fonte: imagem retirada do Portfolio dos artistas.
A estratégia in/corporação remete ao uso do corpo, ou à compreensão do corpo como
um documento, como um suporte para inscrições, marcas e discursos. Nesse eixo encontra-se
a artista Letícia Parente (1930-1991), com a videoperformance “Marca Registrada” (1975).
Durante essa ação, Parente literalmente costura, com agulha e linha, a frase Made in Brasil na
sola do seu pé (fig. 9).
Figura 9 – Marca Registrada, 1975, Letícia Parente (frame de vídeo)
Fonte: Private collection, courtesy Galeria Jaqueline Martins. Artwork © the artist.
45
Essa ação foi realizada pela primeira vez em 1975, filmada em preto e branco, e
novamente em 1980, já em cores. A respeito dessa obra, o filho da artista afirma que a mãe
propõe um discurso que “revela o processo de coisificação do indivíduo, presente em vários
dos seus vídeos” (PARENTE, 2014, p. 12). Para Mello (2007, p. 6), a ação da artista “remete
à destruição da noção de um corpo meramente passivo e aponta para a urgência de um corpo
ativo, que intervém de forma crítica”.
Por último, tem-se o meta-arquivo, ou seja, trabalhos que se voltam para as
metodologias de arquivamento e do colecionismo, se configurando como uma metalinguagem
do arquivo. Arantes (2015, p. 155) entende que as obras desses “artistas-arquivistas
evidenciam as complexidades e ambiguidades inerentes às questões de classificação e
armazenamento presentes nas coleções museológicas e institucionais”. O projeto
desenvolvido por Mabe Bethônico (1966-) para o Museu de Arte da Pampulha representa bem
essa estratégia.
A artista expôs em forma de texto, no ano de 2005, o banco de dados com o cadastro
de coleções das obras do Museu da Pampulha, na exposição denominada “Coleções dentro da
Coleção”. Mabe poderia ter escolhido objetos, vídeos, arte enquanto reconhecida como tal,
presentes na reserva técnica do Museu. Ao invés disso, ela elegeu o próprio arquivo,
composto por formulários que identificavam as peças do acervo e forneciam informações
sobre as obras inventariadas pela instituição (ARANTES, 2015). Tal prática artística permite
destacar o processo de catalogação (e poderia ser acrescentado, de descrição) como uma
forma de leitura e interpretação dos trabalhos artísticos. Arantes (2015, p. 161) defende que
Mabe demonstra o “processo sempre lacunar e aberto dos sistemas de arquivamento presentes
nos equipamentos institucionais”, a da relação íntima entre inventário/catálogo e “os
processos de legitimação institucional”.
Após a exposição das “práticas arquivais artísticas” enumeradas por Arantes, nota-se
que a autora interpreta o arquivo como um meio para reescrever histórias (pessoais, da
sociedade e da arte), agregar novas informações a fatos já conhecidos, criticar o
sensacionalismo midiático e os processos institucionais de controle da população, denunciar
as injustiças e marginalizações, registrar em qualquer suporte discursos variados, propor aos
museus e outras instituições culturais e memoriais que repensem suas práticas museológicas e
documentárias. É, portanto, uma visão ampla, que entende o arquivo como um lugar de
infinitas possibilidades narrativas.
46
2.3 ARQUIVO COMO VESTÍGIOS, INSCRIÇÕES, CONTESTAÇÕES E
RECAPITULAÇÕES
Merewether, no livro “The Archive”, organiza uma coletânea com alguns dos
principais textos influenciadores da arte contemporânea. Além de textos do próprio autor,
encontram-se escritos de artistas, filósofos, historiadores e outros profissionais cujos estudos
marcaram a produção artística contemporânea voltada para o arquivo. Os textos são divididos
em quatro temas: vestígios, inscrições, contestações e recapitulações. Para Merewether (2006,
p. 10, tradução nossa), o crescente aumento da importância dada ao arquivo como “o meio
pelo qual o conhecimento histórico e as formas de lembrança são acumuladas, guardadas e
recuperadas” é característica definidora da era moderna.49
A primeira seção do livro, “Vestígios” (traces), se baseia na noção do arquivo como
fragmento e reúne textos que consideram a relação entre arte e arquivo a partir da
compreensão de que eventos e experiências sempre deixam para trás as marcas de sua
ocorrência. Para o autor, arquivo não é sinônimo de recordação ou história, mas de vestígios,
e o seu caráter fragmentário pode desestabilizar qualquer lembrança registrada, ou história
escrita. O arquivo, ademais, tem o poder de agir como o detentor da última palavra acerca do
que aconteceu historicamente (MEREWETHER, 2006).
Entre os autores selecionados por Merewether encontra-se Michel Foucault (1926-
1984), com o texto “The Historical a priori and the Archive”, de 1969. Considera-se
importante expor neste trabalho as definições de Foucault sobre o arquivo, ainda que de forma
resumida, porque a influência deste filósofo (assim como a de Derrida, Freud e Walter
Benjamin), é constante na literatura sobre o tema e na compreensão que a arte faz do arquivo.
Foucault (2008, p. 144) aborda o que denomina “a priori histórico”, entendendo-o
como uma forma de positividade que define, junto às “condições de exercício da função
enunciativa”, um espaço comunicativo. Ele quer isolar as condições que permitem que algo
seja dito (não no sentido de julgamento – uma ação posterior – mas como realidade de
existência – ação anterior, o “a priori”), aquilo que possibilita a emergência de um enunciado
(FOUCAULT, 2006). Por isso ele denomina seu estudo arqueologia. Sua intenção é descobrir
as origens daquilo que é dito, já que o discurso existe porque há um contexto que permite essa
existência. Esse “a priori” não “escapa à historicidade: não constitui, acima dos
acontecimentos e em um universo inalterável, uma estrutura intemporal; define-se como um
conjunto das regras que caracterizam uma prática discursiva” (FOUCAULT, 2008, p. 145).
49
“[...] as the means by which historical knowledge and forms of remembrance are accumulated, stored and
recovered” (MEREWETHER, 2006, p. 10).
47
Dentro dessa perspectiva, Foucault traz uma definição de arquivo diferente daquela da
arquivologia e da história. Delmas afirma que o documento de arquivo serve para lembrar as
ações passadas a fim de ajudar na tomada de decisão, identificar-se para existir e promover
relações sociais, defender direitos e conhecer para compreender – memória, identidade,
direitos e conhecimento, e que os arquivos são fontes para a história, pois “permitiram à
pesquisa histórica o acompanhamento do movimento positivista [...] fornecendo-lhe toda a
documentação científica necessária”, ainda que nessa época a documentação fosse
essencialmente jurídica e administrativa (2010, p. 34-35). Já Foucault não vê o arquivo como
uma totalidade dos textos que uma cultura guardou, como seu passado ou identidade, e nem
como instituição que permite50
o registro, a guarda e o acesso àquilo que a sociedade deseja
recordar (FOUCAULT, 2008), mas como um sistema que instaura “os enunciados enquanto
eventos (com suas condições e domínios de surgimento) e coisas (com sua própria
possibilidade e campo de uso)” (FOUCAULT, 2006, p. 28, tradução nossa).51
O arquivo é, assim, “a lei do que pode ser dito, o sistema que rege o aparecimento dos
enunciados como acontecimentos singulares” e o que garante aos discursos seu contexto e
relações (FOUCAULT, 2008, p. 147). O arquivo não protege, nem recupera o evento
discursivo, mas define os sistemas de enunciabilidade e de funcionamento desse evento.
Foucault (2008, p. 147-148, grifo do autor) assevera que entre a tradição e o esquecimento, o
arquivo “faz aparecerem as regras de uma prática que permite aos enunciados subsistirem e,
ao mesmo tempo, se modificarem regularmente. É o sistema geral da formação e da
transformação dos enunciados”. Para o autor (2008, p. 148), o arquivo “se dá por
fragmentos”.
A segunda seção, “Inscrições” (inscriptions), “examina as maneiras pelas quais a lei
do arquivo foi inscrita nas definições do documento e do corpo” (MEREWETHER, 2006, p.
12, tradução nossa).52
Tal lei se refere tanto à teoria de Jacques Derrida acerca do arquivo
como o lugar onde a autoridade é exercida sobre os documentos, quanto à teoria de Foucault
50
A arquivologia não enxerga as instituições arquivísticas ou serviços arquivísticos como aqueles que têm o
poder de proibir uma ação de registro. Talvez, no âmbito da gestão documental, a arquivologia se preocupe com
o que precisa ser registrado, com as ações que, por aspectos legais, processuais e mesmo históricos, não podem
deixar de ser registradas. E essa decisão é feita com a participação de profissionais de diversas áreas, incluindo
os produtores do documento. Essa afirmação (entre outras) de Foucault é, portanto, polêmica na área dos
arquivos. 51
“[...] statements as events (with their own conditions and domain of appearance) and things (with their own
possibility and field of use)” (FOUCAULT, 2006, p. 28). 52
“[…] examines ways in which the law of the archive has been inscribed in definitions of the document and the
body” (MEREWETHER, 2006, p. 12).
48
sobre o arquivo como o sistema que possibilita a existência dos discursos. Neste trabalho será
enfatizada apenas a lei do arquivo sobre o documento.
O texto de Paul Ricouer “Archives, Documents, Traces”, escrito em 1978, analisa a
relação da historiografia contemporânea com os documentos. No século XIX, o positivismo
histórico entendia o documento como evidência de fatos. Com a crítica pós-moderna ao
discurso ideológico do positivismo, os historiadores voltaram-se para fontes além dos
documentos de arquivo, como depoimentos orais, objetos etc. A historiografia passou a
questionar a verdade dos documentos escritos e a se voltar para instrumentos que
representariam melhor a memória coletiva e, a partir de meados do século XX e início do
século XXI, passou a analisar os bancos de dados e os documentos eletrônicos.
Para o autor, a história se faz a partir de vestígios e testemunhos do passado. E a noção
de vestígios (traces) começa no arquivo. Por isso não se deve desistir dos arquivos. Para
fundamentar essa ideia, o autor apresenta a definição de arquivo constante em duas
enciclopédias:
arquivos são constituídos pelo conjunto de documentos que resultam da atividade de
uma instituição ou de uma pessoa física ou moral. [...] o termo arquivos designa o
corpo organizado de documentos produzidos ou recebidos por uma entidade pública,
semi-pública, institucional, empresarial ou privada na transação de seus negócios e
preservada por ela, seus sucessores ou repositórios autorizados através da extensão
de seu significado original como repositório para tais materiais
(ENCYCLOPAEDIA Universalis, 1968; ENCYCLOPAEDIA Britannica, 1971
apud RICOUER,2006, p. 66, tradução nossa).53
Ricouer também identifica, a partir dessas definições, três características inerentes ao
arquivo
[...] primeiro, a referência à noção de um documento (ou 'registro'). Arquivos são um
conjunto, um corpo organizado de documentos. Em seguida, vem o relacionamento
com uma instituição. Os arquivos são definidos, no primeiro caso, como resultado
da atividade institucional: no outro, diz-se que são produzidos ou recebidos pela
entidade para a qual os documentos em questão são os arquivos. Finalmente, colocar
documentos produzidos por uma instituição (ou seu equivalente jurídico) em
arquivos tem o objetivo de conservá-los ou preservá-los (2006, p. 66, tradução
nossa).54
53
“[...] ‘archives are constituted by the set of documents that result from the activity of an institution or of a
physical or moral person:’ […] ‘the term archives designates the organized body of records produced or received
by a public, semi-public, institutional, business or private entity in the transaction of its affairs and preserved by
it, its successors or authorized repository through extension of its original meaning as the repository for such
materials” (ENCYCLOPAEDIA Universalis, 1968; ENCYCLOPAEDIA Britannica, 1971 apud RICOUER,
2006, p. 66). 54
“[…] first, the reference to the notion of a document (or ‘record’). Archives are a set, an organized body of
documents. Next, comes the relationship to an institution. Archives are said, in the one case, to result from
institutional activity: in the other, they are said to be produced by or received by the entity for which the
documents in question are the archives. Finally, putting documents produced by an institution (or its juridical
equivalent) into archives has the goal of conserving or preserving them” (RICOUER, 2006, p. 66).
49
O que se destaca para o autor nessas três características, além da ligação do arquivo ao
“institucional”, é que o documento está contido na noção de arquivo, e o vestígio, na noção de
depósito (RICOUER, 2006). Ignorar os documentos escritos seria ignorar os vestígios, aquilo
em que a história, enquanto disciplina, se baseia. Tal ato promoveria o suicídio da história
(RICOUER, 2006). No entanto, o autor faz as seguintes críticas sobre a compreensão do
documento de arquivo enquanto prova: qualquer vestígio pode ser considerado documento se
o pesquisador souber fazer as perguntas certas; e todo documento é monumento.55
O que se pode inferir de influência promovida por Ricouer na “arte arquivística”, o
motivo para sua inserção na coletânea organizada por Merewether, é a ligação do arquivo à
história, do documento aos vestígios, e da memória coletiva aos bancos de dados e
documentos eletrônicos, realizada pelo autor. O documento está inserido na lei do arquivo e,
portanto, história, documentos e arquivos são inseparáveis. Se um artista quiser trabalhar com
os vestígios do passado, com testemunhos, com a história, invariavelmente se verá envolvido
com o arquivo, seja para criticá-lo, questioná-lo, transformá-lo ou ratificá-lo.
A terceira seção, “Contestações” (contestations), é voltada para o uso do arquivo pela
arte como forma de protesto e questionamento, desde o período pós II Guerra até o presente.
Dentre os textos listados para representar essa relação, foi escolhido o “Politics of Cultural
Heritage”, escrito em 1999 pelos artistas Calin Dan (1955-) e Josif Kiraly (1957-), criadores e
componentes do coletivo artístico subReal.
O tema abordado por Dan e Kiraly é a série de instalações e performances chamada
“Art History Archive”. Nesses trabalhos os artistas utilizaram o arquivo fotográfico da Arta
(1953-1989), única revista de arte publicada durante o regime comunista na Romênia. Esse
arquivo é composto por 526,5 kg de material fotográfico56
(fotos em preto e branco e slides)
contendo imagens de políticos, de monumentos, de decoração.57
O propósito do trabalho era
expor, de maneira satírica, a propaganda política do Partido Comunista, que ficou no poder na
Romênia durante décadas. A partir do uso desses documentos fotográficos, os artistas
passaram a refletir sobre a postura da sociedade romena em relação aos arquivos da Romanian
Securitate (agência de segurança do Estado romeno comunista), após o fim do regime. E a
55
“O documento é monumento. Resulta do esforço das sociedades históricas para impor ao futuro – voluntária
ou involuntariamente – determinada imagem de si próprias. No limite, não existe um documento-verdade. Todo
o documento é mentira” (LE GOFF, 1990, p. 548). 56
Em arquivologia, o material fotográfico é dimensionado de maneira distinta. Cada fotografia é contada como
um item, computada numericamente. 57
O arquivo ficou durante anos guardado no escritório da Arta, onde o artistas realizaram consultas. O acesso ao
arquivo era livre (DAN; KIRALY, 2006, p. 114-115).
50
compararam com a atitude alemã frente aos arquivos da Stasi (política secreta) após a queda
do muro de Berlim.
Segundo os artistas, o arquivo precisa ser protegido e disponibilizado para escrutínio
público, pois, além dos aspectos funcionais, eles incorporam a herança cultural de um povo
(Dan; Kiraly, 2006). Mas não foi isso o que ocorreu na Romênia. Diferentes conjuntos
documentais foram queimados, saqueados, jogados em um lixão. A postura da sociedade
romena e a da classe política era a de uma resposta emocional, que não conseguia lidar com
material polêmico, e também uma recusa à história, ao passado enquanto capaz de interferir
no presente e no futuro. Essas atitudes foram motivadas, de acordo com Dan e Kiraly (2006),
pelo medo de julgamento, da má interpretação e de se reconhecer como possível cúmplice das
atrocidades cometidas pelo Estado.
Uma das instalações baseadas nessas imagens é a “Art History Archive. Lesson 1”,
com o subtítulo “How to Change Your Wall Paper Daily” (fig. 10). Os artistas utilizaram
cerca de dez mil fotografias em preto e branco, de vários tamanhos, retiradas do arquivo da
Arta, e cobriram as paredes e o teto de uma sala.
Figura 10 –How to Change Your Wall Paper Daily, The Art History Archive, 1995-
1996, Calin Dan e Josif Kiraly (subReal) (Instalação)
Fonte: © subREAL
A sensação criada era a de
claustrofobia nos níveis físico e emocional. A realidade e a fisicalidade da sala se
dissolveram sob a multidão de fotografias e unificaram a sala e o arquivo. Os artistas
também se tornaram parte do arquivo, já que moraram nessa sala por dois meses.
Nesse trabalho, o material de arquivo foi concebido para ser percebido à distância,
como um conjunto, e não por uma avaliação próxima, foto a foto. O título [...]
compara a existência do regime (visto na evidência acumulada neste arquivo-foto) a
51
um papel de parede mundano, que exige ser trocado (GALLIERA, 2005, p. 63-64,
tradução nossa).58
Com relação ao fascínio gerado pelo arquivo da revista Arta, os artistas explicam que
ele se baseia na mistura entre caos e compreensão, na promoção da perda da aura das figuras
de poder, e no tédio. Nas palavras dos artistas
Essas pilhas de fotografias, não importa como você olhe para elas, são a imagem
excitante, imprevisível e ainda a mais precisa que se pode obter sobre as artes
visuais romenas no período dado. Com suas personalidades e fracassos, com seus
segredos sórdidos e seus momentos de triunfo, com seus esforços e compromissos
diários, com seu desejo de sobrevivência e sua paixão pelo decoro, com suas intrigas
e suas festas frenéticas - com tudo (DAN; KIRALY, 2006, p. 115, tradução nossa).59
Sobre a perda da aura, após tanta exposição e repetição, as imagens das autoridades
artísticas, dos famosos da época, perdem a significância, tornam-se meros itens. E o tédio
protege o arquivo de um envolvimento superficial. É preciso insistir na pesquisa e na análise,
já que o contexto prevalece sobre o conteúdo (DAN; KIRALY, 2006).
A última seção, “Recapitulações” (retracings), “apresenta textos que contestam não
apenas a construção dominante do arquivamento como registro histórico”, mas também os
efeitos que essa construção gera (MEREWETHER, 2006, p. 15, tradução nossa).60
Merewether, no texto “Archives of the Fallen”, de 1997, analisa artistas cuja poética procura
refazer a memória e restaurar um passado que foi apagado do registro histórico. Um desses
artistas é o chileno Eugenio Dittborn, cuja obra assinala o arquivo como aquele que preserva e
ao mesmo tempo apaga o sujeito (MEREWETHER, 2006).
No trabalho “Airmail Paintings” (fig. 11), Eugenio Dittborn emprega diversas imagens
de origem chilena, desde indígenas da Terra do Fogo que estavam a ponto de desaparecer
após uma longa história de extermínio, fotografados em 1920 pelo antropólogo Martin
Gusinde, até fotos policiais de prostitutas e ladrões dos anos 1940 e 1950, e ainda desenhos de
rostos feitos por sua filha (MEREWETHER, 2006). Ao reutilizar essas imagens, o artista as
58
“[…] claustrophobic feeling both on a physical and emotional level. The reality and physicality of the room
dissolved under the multitude of the photographs and became one with the archive. Also the artists became part
of the archive by actually living in the room for two months. In this work, the archival material was meant to be
perceived from a distance rather than by a close examination of each photograph on the walls. The title […]
comparing the regimes’ existence (seen in the accumulated evidence of this photo-archive) to mundane
wallpaper that required to be changed” (GALLIERA, 2005, p. 63-64). 59
“Those piles of photographs, no matter how you look at them, are the exciting, unpredictable and still the most
accurately true image one can get about the Romanian visual arts in the given period. With its personalities and
failures, with its sordid secrets and its moments of triumph, with its daily efforts and compromises, with its lust
for survival and its passion for decorum, with its intrigues and its frantic partying - with all” (DAN; KIRALY,
2006, p. 115). 60
“[...] presents texts that contest not only the dominant construction of the archival as historical record”
(MEREWETHER, 2006, p. 15).
52
coloca novamente em circulação, retirando-as do esquecimento e expondo o que o governo
em vários períodos considerou como “transgressor, criminal ou primitivo”, expondo a ilusão
de uma “história monumental de nação” (MEREWETHER, 2006, p. 160-161).
Figura 11 – Airmail Paintings, [19--], Eugenio Dittborn
Fonte: https://www.hisour.com/eugenio-dittborn-13647/
Finalizada a apresentação das noções de arquivo desenvolvidas por Arantes, Guasch e
Merewether, é importante esclarecer a complexidade em identificar a relação entre arte e
arquivo nas obras artísticas. Talvez isso ocorra porque arquivo é uma palavra polissêmica. Na
conceituação clássica da arquivologia, arquivo é o conjunto de documentos, que independente
do suporte e da natureza, foram produzidos por entidades coletivas, públicas ou privadas,
pessoas e famílias na consecução das suas atividades e que foram acumulados conforme a
passagem do tempo, fornecendo testemunho e prova das referidas atividades. Mas arquivo
também é a instituição responsável pela guarda, tratamento e uso dos documentos. É ainda o
nome do móvel onde os documentos são guardados, ou o depósito onde são armazenados.
Essa diversidade presente no conceito se multiplica quando o termo arquivo é
analisado e empregado por outras áreas. No recorte realizado por Arantes, Guasch e
Merewether, percebe-se uma mistura de significados que parece se originar na poética e no
discurso do artista, na compreensão que este faz acerca do arquivo. Também se nota a
influência de pensadores da filosofia, da história, da memória e mesmo da psicanálise. A
teoria arquivística, em si, é pouco citada, e a arte é vista como um meio de trazer ao arquivo
(tanto documento quanto instituição) aquilo que lhe faltaria: vida, movimento, denúncia,
ampliação das possibilidades narrativas, inclusão, atualidade, crítica, sentido na sociedade
contemporânea.
53
Uma pequena prova da visão que acentua aquilo que, para os autores, o arquivo não
tem e não é (embora ao ver dos mesmos, devesse ter e ser) pode ser constatada pelas seguintes
afirmações de Arantes:
[ao falar sobre o arquivo de Paulo Brusky] [...] podemos entender a discussão sobre
o arquivo artístico no Brasil menos como um mero espaço para depósito de
documentos, mas como um espaço de trocas de ideias, de visões, de relações, de
criação, de produção, de discursos contrários às produções legitimadas da época [...]
(2015, p. 105, grifo nosso).
E de Guasch:
Está claro que o conceito de arquivo aqui estudado não faz referência a um
complexo físico que guarda, armazena, atesoura, seleciona uma coleção de
documentos, como foram concebidos os arquivos prussianos que guardam os
segredos de aspectos políticos ou militares. Pensamos que o conceito de arquivo
proposto, mais que um lugar esquecido e poeirento, se dirige a um entendimento
cultural mais amplo, com uma clara aposta por uma ‘memória coletiva’ (2011, p.
303, tradução nossa, grifo nosso).61
Guasch não ignora os avanços no arquivo, mas os associa aos arquivos eletrônicos e
digitais. Os arquivos físicos, os depósitos que guardam documentos em papel, continuam
sendo vistos como poeirentos e esquecidos. Do ponto de vista de um arquivista, sabe-se que
em muitos casos esse cenário é uma realidade. Jardim, ao analisar os arquivos como lugares
de memória em 1995, chama atenção para o fato de os processos de avaliação e de gestão dos
documentos de arquivo correntes e intermediários não serem realizados por uma parte
considerável dos arquivos públicos, gerando uma grande massa documental amorfa. Mas essa
realidade tem sido modificada, e o arquivista não se vê como o responsável apenas por uma
grande pilha de papeis empoeirados, mas por um conjunto de documentos que, organizados
segundo os preceitos arquivísticos, permite à população o acesso e a utilização dos mesmos.
Tem-se, assim, a impressão de que as opiniões baseadas no que o arquivo não oferece se
devem tanto ao fato de essa ter sido uma realidade comum entre os arquivos, mas também em
uma incompreensão do seu papel e das contribuições que ele pode de fato trazer. Percebe-se
que o arquivo aparece associado à biblioteca e à museologia, e aos termos coleção,
catalogação, classificação, descrição, e demais práticas documentárias em geral, algumas
delas entendidas mais segundo o modus operandi da biblioteconomia e da museologia do que
da arquivologia em si. Guasch (2011, p. 165) admite que, na obsessão contemporânea pela
61
“Está claro que el concepto de archivo aquí estudiado no hace referencia a un complejo físico que guarda,
almacena, atesora, selecciona una colección de documentos, como así fueron concebidos los archivos prusianos
que guardan los secretos de aspectos políticos o militares. Pensamos que el concepto de archivo propuesto, más
que un lugar olvidado y polvoriento, se dirige a um más amplio entendimiento cultural con una clara apuesta por
una ‘memoria colectiva’” (GUASCH, 2011, p. 303).
54
memória, “o arquivo se converteu em uma das metáforas mais universais para todo o tipo de
memória e de sistemas de registro e armazenamento”.
Dan e Kiraly, os artistas do subReal, parecem compreender os arquivos pela visão
tradicional da arquivologia quando afirmam que estes, diferente de igrejas antigas, museus,
teatros e bibliotecas, “não carregam características éticas, sendo, nesse sentido, amorais. A
qualidade moral é dada por aqueles que os acessam: pessoas dão sentido aos arquivos, não o
contrário” (DAN; KIRALY, 2006, p. 113). Camargo, ao defender o emprego do tratamento
arquivístico (aplicação do princípio da proveniência, da organicidade etc.) aos arquivos
pessoais, esclarece que
O arquivo ‘não contém nem bombas nem tesouros escondidos’, permanecendo
imune à exploração que é possível fazer de seu conteúdo. Mas há quem não acredite
na inocência dos arquivos, vendo-os como construção, como deliberada arquitetura
ou como ‘cenário de invenção’. Seus artífices seriam as instituições e pessoas
responsáveis pela acumulação de documentos, além do próprio arquivista. Como
que dotados de vontade própria, os documentos participariam ‘da fabricação de um
relato’, corroborando a ideia de que o arquivo seria, por sua vez, uma ‘figura
epistemológica, desenhada a partir de determinadas práticas discursivas’ (2009, p.
35).
Para a autora, a verdade da lógica arquivística não reside no conteúdo do documento.
Este pode conter verdades ou inverdades. Ela se estabelece na ligação do documento com a
atividade que o gerou (CAMARGO, 2009), com o produtor e com os outros documentos do
mesmo conjunto. Ainda assim, os aportes teóricos trazidos pela pós-modernidade, pela
filosofia, história, psicanálise e arte possibilitam aos arquivistas o reconhecimento das
limitações inerentes a qualquer tipo de classificação.
55
3 DEFINIÇÕES: ARQUIVOLOGIA E CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO
Na segunda seção buscou-se identificar na literatura algumas das interpretações que os
estudiosos e pesquisadores da arte possuem acerca dos arquivos. Nesta terceira seção serão
analisadas as definições dos principais conceitos envolvidos na pesquisa a partir do arcabouço
teórico da arquivologia e da CI como arquivo, arquivo público, arquivo privado, arquivo
institucional, arquivo pessoal, arquivo de museu, arquivo de artista, documento de arquivo,
documento museológico, organicidade e informação. O propósito é mostrar as diferenças
entre algumas das compreensões que a arte possui acerca do arquivo (apresentadas na seção
anterior) e as que a própria arquivologia tem sobre os mesmos. Outro objetivo é apresentar, de
maneira introdutória, a arquivologia para os possíveis leitores que não a conhecem, já que esta
dissertação lida com campos distintos e nem sempre relacionados.
Com relação à CI, buscar-se-á demonstrar como sua teoria acerca da informação pode
auxiliar na compreensão das artes efêmeras enquanto um tipo de informação que requer dos
museus e dos arquivos atenção e cuidado em sua preservação. Mesmo que não se
materializem em um objeto físico final, performances, body art e happenings podem ser
mapeados e colocados à disposição de pesquisadores e interessados em geral por meio de seus
registros.
3.1 CONCEITOS-CHAVE DA ARQUIVOLOGIA
O Dicionário Brasileiro de Terminologia Arquivística (DIBRATE) identifica quatro
significados para o termo arquivo, dos quais dois serão aqui destacados:
1 Conjunto de documentos produzidos e acumulados por uma entidade coletiva,
pública ou privada, pessoa ou família, no desempenho de suas atividades,
independentemente da natureza do suporte. 2 Instituição ou serviço que tem por
finalidade a custódia, o processamento técnico, a conservação e o acesso a
documentos (2005, p. 27).
Quanto à primeira acepção, um conjunto documental precisa possuir algumas
características para ser considerado arquivístico, e duas delas foram salientados pelo
DIBRATE: acumulação ligada à proveniência e naturalidade (no sentido de ter sido gerado a
partir das atividades). As demais características, a serem garantidas pela instituição que o
custodia, são:
[...] a integridade do fundo62
e o sistema de relações que os documentos mantêm
entre si e com o todo; o respeito à proveniência; a primazia do contexto sobre o
62
“Unidade constituída pelo conjunto de documentos acumulados por uma entidade que, no arquivo permanente,
passa a conviver com arquivos [...] de outras” (BELLOTTO; CAMARGO, 1996, p. 40). “Conjunto de peças de
56
conteúdo [...] nas operações de arranjo e descrição; e a impermeabilidade do arquivo
em face de seu uso secundário (CAMARGO, 2009, p. 28).
O sistema de relações, que pode ser resumido pelo termo organicidade, é para Bellotto
um dos pilares da doutrina arquivística. A autora (2010, p. 161) o define como
“indissolubilidade entre a informação, o meio documental no qual ela está vinculada, o
suporte, a proveniência e, sobretudo, o vínculo entre os documentos do mesmo contexto
genético”. Para Thomassen (2006, p. 6), os arquivos são formados “por informação gerada e
estruturada por processos de trabalho funcionalmente inter-relacionados”.
Assim, um conjunto documental, para ser considerado arquivístico, precisa ter
preservada a organicidade e não ser misturado com conjuntos de outros produtores
(proveniência). Seus documentos não são escolhidos, mas acumulados conforme o produtor
realiza suas atividades (cumulatividade). Eles não são produzidos para usos diferentes dos de
sua criação (valor primário – administrativo, jurídico, probatório), mas podem adquirir demais
funções com o tempo (valor secundário – testemunho, histórico) (HEREDIA HERRERA,
1991).
Formando os conjuntos documentais encontram-se os documentos arquivísticos ou “de
arquivo”. As mesmas características ou princípios que regem os conjuntos se aplicam aos
documentos que os formam e são detalhadas a seguir
1 – Princípio da proveniência: fixa a identidade do documento, relativamente a seu
produtor. Por este princípio, os arquivos devem ser organizados em obediência à
competência e às atividades da instituição ou pessoa legitimamente responsável pela
produção, acumulação ou guarda dos documentos. Arquivos originários de uma
instituição ou de uma pessoa devem manter a respectiva individualidade, dentro de
seu contexto orgânico de produção, não devendo ser mesclados a outros de origem
distinta.
2 – Princípio da organicidade: as relações administrativas orgânicas se refletem nos
conjuntos documentais. A organicidade é a qualidade segundo a qual os arquivos
espelham a estrutura, funções e atividades da entidade produtora/acumuladora em
suas relações internas e externas.
3 – Princípio da unicidade: não obstante forma, gênero, tipo ou suporte, os
documentos de arquivo conservam seu caráter único, em função do contexto em que
foram produzidos.
4 – Princípio da indivisibilidade ou integridade arquivística: os fundos de arquivo
devem ser preservados sem dispersão, mutilação, alienação, destruição não
autorizada ou adição indevida. Este princípio é derivado do princípio da
proveniência.
5 – Princípio da cumulatividade: o arquivo é uma formação [...] progressiva, natural
e orgânica (BELLOTTO, 2002, p. 20-21).
Ao seguirem estes princípios, os documentos de arquivo servem como prova das
funções e atividades de quem os produziu/acumulou (BELLOTTO, 2002). Os documentos de
qualquer natureza que qualquer entidade administrativa, qualquer pessoa física ou jurídica, reuniu automática e
organicamente, em razão de suas funções ou de suas atividades” (CUNHA; CAVALCANTI, 2008, p. 177).
57
arquivo também possuem os seguintes elementos: suporte (onde as informações são
registradas), forma (o estágio de preparação e transmissão em que o documento se encontra –
original, cópia, minuta, rascunho), formato (configuração física do suporte segundo a natureza
e modo de confecção – caderno, livro, cartaz, mapa etc.), gênero (configuração que o
documento assume conforme o sistema de comunicação do conteúdo – audiovisual,
iconográfico, textual etc.), espécie (configuração do documento segundo a natureza e
disposição das informações nele contidas – boletim, relatório, certidão etc.), tipo
(configuração que a espécie assume segundo a atividade que gerou o documento – boletim
escolar, relatório de atividades, certidão de nascimento, certidão de casamento etc.)
(GONÇALVES, J., 1998) e contexto de produção – “[...] as circunstâncias que fizeram com
que o documento existisse e tivesse um suporte, uma forma e um formato específicos,
configurando um determinado tipo documental” (GONÇALVES, J., 1998, p. 20). O contexto
de produção difere dos demais porque não pode ser obtido apenas a partir da análise do
documento. É necessário estudar a história, a estrutura e o funcionamento do organismo
produtor/acumulador (GONÇALVES, J., 1998) e, no caso de documentos pessoais, estudar a
biografia, o contexto sócio-econômico e a vida do produtor/acumulador.
Voltando aos conjuntos documentais, estes também se classificam em correntes,
intermediários e permanentes. Tal denominação se refere ao ciclo de vida dos documentos, ou
seja, à constância de uso e consulta e também ao valor intrínseco. Há documentos que, mesmo
sendo pouco consultados, se referem a informações essenciais, como a constituição e a missão
de uma instituição. Desses documentos diz-se que já nascem permanentes. Outros
documentos são mantidos nos arquivos correntes pela utilização frequente. Após cumprirem
suas funções legais e administrativas (relacionadas aos valores chamados primários, ou seja,
os que motivaram a criação do documento) e não serem identificados como tendo outros
valores (valores secundários adquiridos: testemunho, pesquisa), são eliminados. Os
documentos pouco consultados, mas ainda requisitados, são mantidos no arquivo
intermediário até cumprirem seus prazos de utilidade e, por fim, são eliminados ou enviados
ao arquivo permanente (ROUSSEAU; COUTURE, 1998).
Além dessa classificação, os conjuntos arquivísticos se dividem, quanto à sua
produção, em públicos e privados. São públicos aqueles “produzidos e recebidos por
instituições de caráter público [e] por entidades privadas encarregadas da gestão de serviços
públicos no exercício de suas atividades” (BRASIL, Lei n. 8.159, 1991, art. 7º, § 1º). Os
arquivos privados são “os conjuntos de documentos produzidos ou recebidos por pessoas
físicas ou jurídicas, em decorrência de suas atividades”, podendo, no Brasil, serem declarados
58
de interesse público e social, caso o Estado os avalie como históricos e cientificamente
relevantes (BRASIL, Lei n. 8.159, 1991, art. 11-12).
No arquivo enquanto instituição pública há diferentes tradições relacionadas ao papel
do arquivista. Na tradição anglo-saxã existe uma diferenciação entre arquivistas (archivists) e
gestores de documentos (records managers). O arquivista cuida dos documentos de arquivo e
administra os arquivos permanentes (archives), enquanto o gestor cuida dos documentos
correntes (records) e administra os arquivos correntes (HEREDIA HERRERA, 1991). Essa
separação, no entanto, não se observa na tradição latina, em que as duas funções são unidas na
figura do arquivista. Fonseca (1998) afirma que a fim de implantar os princípios da
racionalidade administrativa, o governo estadunidense estabeleceu intervenções nos ciclos de
vida dos documentos, desde a produção até a destinação. O resultado foi
um impacto bastante relevante no perfil das instituições arquivísticas – como
também na Arquivologia e nos profissionais da área –, inserindo-as profundamente
na administração pública, na medida em que não mais se limitavam a receber,
preservar e dar acesso aos documentos produzidos pelo Estado, mas, antes, assumem
a liderança na execução das políticas públicas relacionadas à gestão de documentos
(FONSECA, 1998, p. 38).
Na prática arquivística brasileira, a atuação das instituições arquivísticas públicas
sobre a gestão dos documentos da administração é demonstrada na legislação. O Conselho
Nacional de Arquivos (CONARQ), na resolução n. 27 de 16 de junho de 2008, parágrafo
único do artigo 1º, define arquivo público como
a instituição do Poder Público com a função de implementar, acompanhar e
supervisionar a gestão de documentos arquivísticos produzidos e recebidos pela
Administração Pública em seu âmbito de atuação, e de promover a organização, a
preservação e o acesso dos documentos de valor permanente ou histórico recolhidos
dos diversos órgãos e entidades dos estados, do Distrito Federal e dos municípios
(2017, p. 145-146).
Além da função de recolhimento, os arquivos públicos brasileiros são responsáveis
pela implementação, acompanhamento e supervisão da gestão dos documentos nos órgãos e
entidades da administração pública. Assim, a instituição arquivística pública não se volta
apenas para a preservação da memória e da história, mas atua igualmente para que o acesso à
informação seja garantido, com o fim de auxiliar as decisões governamentais, incentivar o
conhecimento científico e cultural e apoiar o cidadão na defesa de seus direitos (BRASIL,
Anexo à Portaria n. 2.433, 2011). Ainda de acordo com o artigo 2º da resolução n. 27, são
elencadas as seguintes especificidades de um arquivo público:
I – Autonomia de gestão e posicionamento hierárquico na estrutura funcional do
Poder Executivo dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios que lhe permita
59
desempenhar as prerrogativas definidas nessa Resolução. II - Infraestrutura física,
material e tecnológica adequadas para a guarda, armazenamento e preservação de
documentos de acordo com as normas e legislação em vigor. III – Recursos
orçamentários e financeiros para a implementação e manutenção das políticas
arquivísticas estabelecidas. IV – Recursos humanos qualificados, dos quadros
permanentes da Administração Pública, para dar cumprimento às especificidades de
suas atividades (CONARQ, 2017, p. 146-147).
Sobre os arquivos institucionais de natureza privada, Márcia Cristina Vitoriano (2017,
p. 4) afirma que são “aqueles produzidos por pessoas jurídicas de direito privado, definidas
como organizações intencionalmente e juridicamente constituídas no âmbito do direito”, ou
seja, associações, fundações privadas, partidos políticos (regulados por lei específica) e
sociedades (empresas). O arquivo instituição é característico da esfera pública (são os
arquivos nacionais, estaduais e municipais). No âmbito privado, os arquivos pertencem a um
instituto ou empresa. Eles são, portanto, setores ou serviços dentro de instituições privadas.
No escopo dos arquivos privados existem os conjuntos documentais gerados pelas
instituições não-governamentais, pelas famílias e aqueles produzidos por indivíduos. Silveira,
J. define os conjuntos produzidos por indivíduos como arquivos pessoais e explica que são
produto de suas atividades pessoais, profissionais ou ainda pelo ato de colecionar
materiais de sua preferência, estando ou não ligados diretamente à figura de seu
titular, podendo reunir documentos em papel e/ou objetos variados. Diferenciam-se
dos arquivos públicos, que são relacionados à rotina administrativa e jurídica de uma
instituição, e, também, dos arquivos familiares, que nos remetem a arquivos
formados por mais de uma pessoa, por vezes, repassados e organizados por mais de
uma geração. Os arquivos pessoais são de cunho privado, ao menos assim se
formam, constituindo-se em uma representação da trajetória de vida do titular (2013,
p. 140).
Vianna, Lissovsky e Sá (1986, p. 73) defendem que a lógica do arquivo pessoal
“emerge da região histórico-afetiva em que os mundos íntimo e público se misturam”, ou seja,
que tais arquivos adquirem o estatuto social de privado quando são inseridos na esfera
pública:
A designação de “arquivo privado” implica numa diluição do íntimo e na sua
redução ao privado, isto é, na redução da existência individual à forma de sua
relação com o público e ao modo como é por ele definida. Por essa razão, o
raciocínio em torno do arquivo pessoal, enquanto arquivo privado, não deve
confundir-se com aquele que se volta para os arquivos de empresas, instituições ou
partidos políticos, cuja inserção no mundo se faz originalmente numa esfera
intermediária, bem mais próxima ao Estado (1986, p. 74).
Tal “mundo íntimo” é explicitado por Oliveira (2008, p. 39), ao afirmar que os
arquivos pessoais revelam “traços da personalidade, de juízos de valor, preconceitos, anseios,
opiniões sobre assuntos diversos que expressam os interesses e atividades dos produtores dos
arquivos e das pessoas com as quais se relacionaram”. Este mundo íntimo também se revela
60
na influência perceptível da família ou dos herdeiros dos documentos na construção da
imagem do titular:
Por vezes mais rigorosa, por outras mais flexível, a intervenção do círculo familiar
emerge como mecanismo de filtragem de até onde o público deve avançar por sobre
o mundo do privado. O descartar, aqui entendido como colocar fora do consumo
público certos registros, age-se como que a ultimar os retoques finais, a maquiar a
face privada para convertê-la em face pública, burilando seu perfil imaginário
(VIANNA; LISSOVSKY; SÁ, 1986, p. 69).
O crivo dos familiares do titular do arquivo (e muitas vezes do próprio produtor),
marcados pela subjetividade do íntimo, não os diferem em essência dos arquivos
institucionais. Cook (1998), ao defender uma arquivologia pós-moderna e pós-custodial,
explica que a subjetividade também está presente nos arquivos institucionais. O autor
concorda com as afirmações da publicação do documento-proposta do Seminário
Internacional sobre Arquivos Pessoais (1997), que
[...] reconhece duas similaridades importantes entre os arquivos pessoais e os
públicos. Primeiro, ambos são artefatos de registro derivados de uma atividade; os
arquivos são evidências das transações da vida humana, seja ela organizacional, e
por conseguinte oficial, seja individual, e portanto pessoal. [...] Em segundo lugar,
os arquivistas, tanto nos arquivos públicos quanto nos pessoais, freqüentemente
usam procedimentos técnicos e métodos práticos semelhantes, em termos de como
acessam, descrevem, armazenam fisicamente e conservam os arquivos e os colocam
à disposição para fins de pesquisa (COOK, 1998, p. 131).
Camargo (2008, p. 8) afirma que “sempre que for possível recompor a trajetória do
titular a partir dos documentos por ele acumulados, estamos diante de um arquivo que, à
semelhança dos que resultam do funcionamento de instituições, é dotado de organicidade”.
Um arquivo institucional não é completamente objetivo, pois é “criado por indivíduos e
organizações, e usado, para suportar seus valores e missões e todos eles fazem parte de um
processo que certamente não é politicamente e culturalmente neutro” (KAPLAN, 2000 p. 147
apud TOGNOLI; BARROS, 2011, p. 70).
Não há uma total divisão entre práticas da arquivologia considerada clássica e
custodial e da arquivologia dita pós-moderna. Conforme esclarece Schmidt,
[...] o tipo de acervo, seu estado de conservação, os usos que dele se esperam, as
maneiras pelas quais são produzidos, e muitas outras variáveis que se apresentam no
campo da realidade é que devem determinar as escolhas de Saber pelos arquivistas
de modo a garantir os elementos que fundamentam a disciplina. Ou seja, é possível
nos valermos de teorias consideradas ‘Custodiais’ e ao mesmo tempo de ‘Pós-
Custodiais’ para o exercício de nossas funções, ao passo que essa ‘mistura’ não
invalida nenhuma das instâncias do nosso Saber ou Fazer (2012, p. 215, grifos da
autora).
E ainda sobre o pós-modernismo, Heather MacNeil explica que
61
Para os arquivistas, a teoria pós-moderna nos lembra aquilo que já deveríamos saber,
ou seja, que os métodos para avaliar o valor de verdade de documentos enquanto
provas estão arraigados numa forma particular de olhar o mundo e numa concepção
particular de documento enquanto testemunho desse mundo. Os critérios que eles
estabelecem para determinar o que conta como verdadeiro são, eles mesmos,
produtos de escolhas históricas, culturais e políticas que não esgotam todas as
maneiras possíveis de olhar o mundo ou as relações entre o documento e o mundo
(MACNEIL, 2001 apud IACOVINO, 2016, p. 269-270).
Tal discussão também possibilita ao arquivista um olhar crítico sobre as limitações
inerentes ao seu trabalho. Como afirma Cook (1998), a avaliação de documentos já é uma
forma de seleção, que pode atender a critérios jurídicos mas que também é influenciada pela
subjetividade da equipe avaliadora. Cabe ao arquivista “assegurar a manutenção do vínculo de
estreita correspondência entre documentos e atividades do organismo produtor, de modo a
reforçar e tornar estável o efeito probatório” (CAMARGO, 2009, p. 34) decorrente,
reconhecendo que
objetividade não é o mesmo que neutralidade. O compromisso com a honestidade, a
justiça e a verdade lhes dá a base necessária para a "objetividade”. Se nos
mantivermos fiéis a estes valores éticos e profissionais, podemos nos envolver de
forma responsável em debates sobre política pública e procurar assegurar que
arquivos documentem as perspectivas de todos os segmentos da sociedade. Isso não
é ‘neutro’ porque arquivistas tomarão partidos e fiarão sua expertise profissional
para os problemas e questões sociais. No entanto, isso pode ser realizado
objetivamente, seguindo padrões aceitáveis da prática arquivística (JIMERSON,
2008, p. 31).
Pertencendo aos arquivos pessoais, encontram-se os arquivos de artistas. Aplicando o
conceito de arquivo – enquanto conjunto de documentos – e de arquivo pessoal ao arquivo de
artista, poderíamos afirmar que ele é o conjunto de documentos produzidos e acumulados pelo
artista ao longo de sua carreira e vida, como prova de suas atividades e de seus interesses.
Com relação ao conteúdo presente em um arquivo de artista, Anna McNally (2013)
afirma que o conjunto documental geralmente é constituído por tudo o que é encontrado no
estúdio do artista e que ele chega às mãos do arquivista em completa desorganização (ou
parcamente organizado). Entre esses documentos encontram-se
[...] objetos materiais e virtuais da mais variada natureza, procedência, morfologia e
práticas na sua produção e reprodução. São preponderantemente imagens
(fotografias, filmes) de fotomontagens a fotografias automáticas, recortadas de
jornais e revistas [...], cartões postais, além de vídeos e mais ainda, textos de toda a
ordem, objetos diversos, traços de ação efêmera, de intervenções corporais e assim
por diante (MENESES, 2010, p. 11 apud VAM DE BERG, 2016, p. 121).
Além da variedade de espécies e tipos documentais, o arquivo de artista,
principalmente aquele relacionado à arte contemporânea, é de natureza ambígua, sendo difícil
distinguir obra de arte/trabalho artístico dos documentos que lhe serviram de base:
62
Determinar onde a obra de arte começa e onde termina, em relação aos seus
vestígios arquivísticos, só pode ocorrer através de uma leitura atenta da obra em
relação à sua documentação arquivística. A premissa de que as categorias ‘arte’ e
‘documentação’ são baseadas num construto exclusivo e mútuo [do tipo] ‘um ou
outro’ ao invés [do tipo] ‘e’ – reflete um dualismo que não é mais válido como uma
suposição de trabalho. Além disso, a ideia de que os repositórios que recolhem
arquivos de artistas contemporâneos não contêm obras de arte é falsa (BUTLER,
2013, p. 9, tradução nossa).63
Apesar dessas características, estes são considerados “[...] uma fonte primária
inestimável para penetrar o processo de pensamento do artista, sua intenção e processos de
produção para uma dada obra em um período de tempo específico” (BUTLER, 2013, p. 10,
tradução nossa).64
Os arquivos de artista
[...] também provêm evidências do dia-a-dia das atividades do artista, bem como
uma evidência documental de obras que não mais existem ou cuja natureza é
transitória e efêmera. Eles também fornecem uma janela para as redes sociais e
profissionais do artista, e para as suas influências artísticas e intelectuais (BUTLER,
2013, p. 10, tradução nossa).65
Como explica Jane Stevenson (2013, p. 157, tradução nossa) “o valor de um arquivo é
que ele permite a investigadores subsequentes irem além da imagem pública, a qual seria
inevitavelmente um tipo de simplificação”.66
A autora defende que, para além disso, o arquivo
permite que o artista seja visto em um contexto social e intelectual, o que possibilita uma
melhor compreensão da sua obra (STEVENSON, 2013).
É claro que, como qualquer contexto, o arquivístico também é apresentado com
limitações. McNally (2013) explica que todo arquivo de artista passa por um processo de
organização e seleção por parte do arquivista que o recebe e organiza. Viu-se ainda, com
Vianna, Lissovsky e Sá (1986) que arquivos pessoais em geral, passam também pelo crivo da
família. Assim, entende-se que o arquivo é uma das muitas fontes de informação passíveis de
interpretação por parte do pesquisador.
63
“Determining where the artwork begins and where it ends, in relation to its archival traces can only be
determined through a close reading of the work in relation to its archival documentation. The premise that the
categories of ‘art’ and ‘documentation’ are based on a mutually exclusive ‘either/or’ construct, rather than ‘and’
– reflects a dualism that is no longer valid as a working assumption. Furthermore, the expectation that
repositories collecting the archives of contemporary artists do not contain works of art is false” (BUTLER, 2013,
p. 9). 64
“[…] an invaluable primary source for penetrating the artist’s thought process, intent, and production
processes for a given work within a specific period of time” (BUTLER, 2013, p. 10). 65
“Artists’ records also provide evidence of the day-to-day activities of an artist as well as documentary
evidence of works that may no longer exist or whose nature is transitory and ephemeral. They also provide a
window into an artist’s social and professional networks, and artistic and intellectual influences” (BUTLER,
2013, p. 10). 66
“[...] the value of an archive is that it allows subsequent investigators to get underneath the public image,
which would inevitably be some kind of simplification” (STEVENSON, 2013, p. 157).
63
Os arquivos de museu podem se referir tanto a setores/serviços quanto a conjuntos
documentais que são produzidos em função das atividades inerentes ao museu. Tais atividades
são listadas no Estatuto dos Museus, e dizem respeito à investigação, comunicação,
interpretação e exposição de “conjuntos e coleções de valor histórico, artístico, científico,
técnico ou de qualquer outra natureza cultural”, visando o estudo, a educação, a preservação,
a contemplação, o turismo e a pesquisa (BRASIL, Lei n. 11.904/2009). Os setores/serviços,
como os nomes indicam, fazem parte da estrutura organizacional do museu. Os documentos
de arquivo geralmente encontrados em um museu podem ser divididos em quatro categorias:
Registros e documentos adquiridos para a coleção do museu por doação, compra ou
empréstimo independentemente de seu formato ou mídia. Quaisquer registros
depositados no museu por autoridade estatutária. [...] Material documentário
associado às coleções do museu. [...] Os próprios registros administrativos do
museu, arquivos, etc., ilustrando sua história e atividades como instituição (THE
STANDING CONFERENCE ON ARCHIVES AND MUSEUMS, 2002, p. 1-2,
tradução nossa).67
Segundo Deborah Wythe (2004), o arquivo de museu é moldado pela missão da
instituição e possui uma dupla função: servir aos diversos tipos de pesquisadores e assistir à
administração nas operações cotidianas do museu, atendendo às demandas por documentos e
informação. Essa afirmação não diferencia os arquivos de museus dos demais arquivos, mas
acredita-se que a autora apresentou esta definição ligada aos museus por se tratar de um livro
introdutório ao assunto. Wythe (2004) afirma ainda que o sucesso do arquivo de museu não
depende tanto da posição organizacional que este ocupa, mas do apoio que recebe dos
superiores, do cumprimento da sua missão junto à instituição e da aplicação dos princípios
éticos arquivísticos. Para a autora
[...] o arquivo de museu deve ser capaz de servir a todos os departamentos em uma
base igualitária; prover igual acesso aos pesquisadores; ter autoridade de decisão
sobre assuntos referentes à gestão de documentos e arquivos; e estabelecer políticas
e procedimentos que sigam os princípios arquivísticos (WYTHE, 2004, p. 12,
tradução nossa).68
Wythe (2004) também descreve diversas situações em que os demais profissionais do
museu são auxiliados pelo arquivo, desde os diretores que lidam com documentação
administrativa, passando pelas equipes de relações públicas e marketing, curadores e
67
“Records and documents acquired for the museum's collections by gift, purchase or loan, irrespective of their
format or medium. Any records deposited in the museum by statutory authority. […] Documentary material
associated with the museum's collections. […] The museum's own administrative records, files, etc., illustrating
its history and activities as an institution” (THE STANDING CONFERENCE ON ARCHIVES AND
MUSEUMS, 2002, p. 1-2). 68
“[...] the museum archives must be able to serve all departments on an equal basis; provide equal access to
researches; have decision-making authority in archival and records management matters; and establish policies
and procedures that follow archival principles” (WYTHE, 2004, p. 12).
64
educadores, e ainda os pesquisadores externos. Percebe-se que nessas situações a autora
demonstra exemplos das duas funções da cultura institucional e organizacional do museu:
curatorial e administrativa. As funções curatoriais dizem respeito às atividades-fim, que
“sustentam e dão significado de existência aos museus e as funções administrativas oferecem
o apoio para que as primeiras sejam executadas” (MARTINS; INDOLFO, 2017, p. 7), ou
seja, referem-se às atividades-meio.
A função curatorial, no papel do curador, pode ser resumida pelas ações de seleção e
aquisição de objetos e responsabilidade intelectual e interpretativa sobre os mesmos
(WYTHE, 2004). Mas ela também é exercida por todos aqueles no museu que trabalham com
as coleções, realizando atividades de registro, gerenciamento, conservação, exibição, ensino e
editoração (WYTHE, 2004). Wythe (2004, p. 10, tradução nossa)69
aborda ainda as atividades
de coletar, gerenciar e dar acesso a “materiais publicados e não publicados e fornece[r]
serviços de referência a pesquisadores e membros da equipe do museu; reuni[r] e fornece[r]
informação para apoiar funções administrativas; e gerencia[r] coleções de manuscritos e livros
raros” de responsabilidade de arquivistas e bibliotecários.
A função administrativa envolve “responsabilidades fiscais, legais, administrativas,
relações públicas e suporte de tecnologia da informação” (MARTINS; INDOLFO, 2017, p.
6). Percebe-se que, apesar de considerar que os arquivos de museu devem ter autoridade sobre
a gestão de documentos e arquivos, ao descrever as funções do mesmo, Wythe as entende
fortemente relacionadas às atividades de referência e pesquisa, e não tanto às atividades de
gestão, talvez com intuito de destacar o papel do arquivo para as atividades da própria
instituição. De qualquer maneira, o tratamento dos arquivos correntes parece ser visto como
uma função adicional: “[...] o arquivista também pode ser o gestor de documentos do museu,
supervisionando o ciclo de vida dos documentos da criação ao descarte ou retenção
permanente” (WYTHE, 2004, p. 12, tradução nossa).70
Maria Celina Soares de Mello e Silva (2013), assim como Wythe, entende que o
arquivo é influenciado pelo local onde está inserido. Para a autora, o arquivo é um serviço
prestado pelos museus e também um organismo que reflete as atividades do museu ao qual
pertence (SILVA, 2013). Como organismo, as funções de um arquivo de museu se resumem
em duas: transferir os documentos produzidos internamente para o arquivo institucional e
69
“[...] published and unpublished materials and provide reference service to researches and members of the
museum staff; gather and provide information in support of administrative functions; and manager are book and
manuscript collections” (WYTHE, 2004, p. 10). 70
“The archivist may also be the museum’s records manager, overseeing the life cycle of records from creation
to disposal or permanent retention” (WYTHE, 2004, p. 12).
65
colecionar documentos de interesse (acervo arquivístico adquirido segundo a política de
aquisição institucional) (SILVA, 2013).
“Colecionar” aqui se aplica a um arquivo de museu que adquire um arquivo de artista.
No caso mais amplo do museu, essa coleção se dá por meio da política de aquisição, que
adquire/recebe documentos museológicos, bibliográficos e arquivísticos de interesse. Como
explica Tessitore (2002, p. 11 apud HANNESCH; GRANATO, 2013, p. 10), esses arquivos
são “conjuntos de documentos reunidos [pelo museu], de forma artificial,71
em torno de um
tema, função, entidade ou pessoa”. Com relação aos documentos arquivísticos, os conjuntos
adquiridos seguem internamente a lógica arquivística, de organicidade e preservação do
contexto e são custodiados e disponibilizados pelo seu valor permanente. Esses documentos
formam o arquivo de custódia, enquanto os documentos produzidos a partir do exercício das
funções da entidade e acumulados organicamente formam o arquivo institucional
(TESSITORE, 2002 apud HANNESCH; GRANATO, 2013).
Dentro da perspectiva de compreender os conjuntos documentais dos arquivos do
museu a partir das funções de transferência e coleção, ou como institucionais e de custódia,
Hannesch e Granato (2013) distinguem “arquivos em museu” de “arquivos de museu”. Os
arquivos em museu seriam aqueles adquiridos por meio de doação, permuta, compra ou
comodato, segundo a política de aquisição do museu, que busca cumprir os seguintes
objetivos:
a) reunir conjuntos documentais complementares às suas atividades; b) proceder às
ações de proteção de conjuntos documentais passíveis de perdas ou destruição; e/ou
c) exercer o papel finalístico da instituição que os adquire, seja por previsão em
legislação ou para uma função socialmente reconhecida (HANNESCH; GRANATO,
2013, p. 9).
Os arquivos de museu seriam os chamados institucionais, ou seja, aqueles produzidos
pelo próprio museu, “resultantes de atividades administrativas, do exercício das inúmeras
funções de produção de conhecimento, e das ações e relações que se estabelecem entre os
indivíduos, grupos internos e externos e com outras instituições” (HANNESCH; GRANATO,
2013, p. 3). Para Martins e Indolfo (2017, p. 2), “os arquivos institucionais dos museus
71
Entende-se aqui o emprego da palavra artificial associado a uma possível compreensão por Tessitore de que a
função preponderante de um arquivo de museu é acumular conjuntos de documentos arquivísticos produzidos
pelo próprio museu. Assim, conjuntos externos seriam considerados coleções reunidas artificialmente. Mas a
obtenção desses conjuntos pode ter relação com a missão do museu, por exemplo, se esta for voltada para
preservação de patrimônio relacionado à área que o museu abrange (um museu indígena que adquire arquivos
pessoais de pesquisadores indígenas ou um museu de arte brasileira que custodia arquivos pessoais de artistas
nacionais). Nesse sentido tal reunião de documentos poderia ser considerada institucional, já que foi estimulada
pelo objetivo de cumprir uma das missões da instituição museológica. Seguindo essa lógica, um arquivo
institucional poderia também exercer a função de custódia, não havendo na prática a separação proposta por
Tessitore, Hannesch e Granato.
66
refletem sua trajetória [sic], suas mudanças de perfil ao longo dos anos, suas escolhas
políticas e metodológicas na aquisição, tratamento e comunicação dos acervos”.
Ao se citar as funções dos arquivos de museu e os documentos tratados por eles, é
importante destacar que a diferenciação entre documento museológico e arquivístico não é
taxativa. A documentação museológica é “o conjunto de informações decorrentes das ações
de identificação, controle e registro dos objetos museológicos” (BEVILACQUA, 2010 apud
MARTINS; INDOLFO, 2017, p. 8). Tais documentos, mesmo sendo museológicos, também
são considerados arquivísticos por refletirem as atividades realizadas no museu.
[...] a documentação museológica [...] é um procedimento que diz respeito ao
conhecimento e entendimento do objeto e do seu estado de conservação, entre outras
finalidades. Estes dossiês sobre o objeto, entretanto, podem ser considerados
constituintes dos acervos institucionais, compondo o conjunto arquivístico desta
instituição, visto que retratam atividades executivas e ações para o funcionamento
do órgão (HANNESCH; GRANATO, 2013, p. 8).
Martins e Indolfo também explicam, citando Bevilacqua, que
Por se tratar de uma documentação cujo valor probatório e administrativo [...] não
cessa de existir, possui um caráter corrente de prazo indeterminado. Esta também
poderia ser tratada e guardada pelo arquivo permanente da instituição, mas dada sua
função administrativa permanente, geralmente é mantida em setores vinculados à
sua função de produção e acumulação (documentar as obras da coleção do museu).
Tal conjunto de documentos possui um regimento documental peculiar, pois apesar
de fazer parte do arquivo institucional, alguns documentos originais podem
acompanhar as obras em processos de tramitação de cunho mais definitivo
(transferências e permutas) (2010 apud MARTINS; INDOLFO, 2017, p. 8).
Dentro dessa discussão sobre documento, pode-se questionar se os documentos
museológicos não seriam, na verdade, os objetos que compõe as coleções: pinturas, esculturas
ou mesmo vestígios de performances. Wythe (2004, p. 9, tradução nossa) explica que os
objetos podem ser “obras de arte, espécimes científicas, artefatos históricos e documentos [...]
ideias, conceitos e eventos.72
Objetos são coletados, preservados, interpretados e apresentados
ao público”. André Desvallées e François Mairesse (2013, p. 57), ao definir o termo
“musealização”, explicam que esta operação se inicia na separação de objetos “de seu
contexto de origem para serem estudados como documentos representativos da realidade que
eles constituíam”. Percebe-se assim que os termos documento e objeto se misturam, tendo em
comum o fato de existirem em um museu por meio de processos documentários – coleta,
preservação, interpretação/estudo, representação/exposição.
Caberia então questionar não os documentos museológicos, mas quais destes não
podem ser considerados arquivísticos. A esse respeito, Silva (2013) esclarece que a questão é
72
“[...] works of art, scientific specimens, historical artifacts, and documents […] ideas, concepts, and events”
(WYTHE, 2004, p. 9).
67
controversa na área da arquivologia. Alguns arquivistas que lidam com arquivos de artistas,
cuja documentação textual pode vir acompanhada de objetos e artefatos em geral,
argumentam que estes “podem ter sido produzidos ou adquiridos no âmbito do
desenvolvimento de uma atividade, institucional ou pessoal, e que, portanto, podem ser
considerados documentos de arquivo” (SILVA, 2013, p. 42). Embora a arquivologia entenda
que o documento só será de arquivo caso comporte registro, informação registrada, cabe
lembrar que os objetos, os artefatos e similares também podem ser considerados de arquivo
caso evidenciem as atividades do produtor. Um exemplo conhecido na literatura sobre esse
ponto é o dado por Bruno Delmas (2010) a respeito da fábrica de papeis pintados localizada
em Zuber, Rixheim, França. O autor esclarece que os papeis para decoração de interiores
produzidos pela fábrica desde o séc. XIX são documentos de arquivo dessa fábrica. Os
modelos de papeis, reunidos em catálogo, são prova da atividade, fonte de pesquisa e ativos
da mesma.
O que se deduz dessas opiniões divergentes é que as barreiras se tornam fluidas
conforme o uso do documento, ou mesmo a área que o organiza. Museus e arquivos possuem
diferenças, mas apresentam objetivos e atividades semelhantes:
[...] ambos têm a preocupação de reunir, guardar, conhecer e dar acesso a materiais
únicos em benefício dos usuários e públicos presentes e futuros. Podem adquirir ou
recolher acervos, identificá-los e conhecê-los, mantê-los e conservá-los, visando dar-
lhes acesso de distintas maneiras. Porém, o seu contexto de atuação, a forma como
abordam e tratam tecnicamente seus acervos representam algumas de suas
diferenças (HANNESCH; GRANATO, 2013, p. 1).
Portanto, não é de se estranhar que seus documentos também se assemelhem ou
possam ser considerados como de dupla identidade73
– museológicos e arquivísticos.
Após identificar as características dos documentos de arquivo, dos documentos
museológicos (e as possíveis interseções entre eles ou sua dupla identidade), da organicidade,
dos arquivos pessoais e dos arquivos de artistas, acredita-se que será possível identificar com
mais segurança esses conjuntos nos museus e instituições estudados, assim como analisar se a
organicidade é aplicada ao tratamento dos mesmos. Esses objetivos serão trabalhados na
quinta seção desta dissertação.
73
Essa dupla identidade dos documentos museológicos também ocorre com a biblioteconomia, ao se considerar
documentos em formato bibliográfico criados e/ou utilizados como obra de arte pelos artistas. São exemplos as
compilações encadernadas confundidas com livros comuns, como o Twentysix Gasoline Station, de Edward
Ruscha (1937-) (CRIMP, 2005 apud RODRIGUES; CRIPA, 2015), além dos livros de artista, que em sentido
estrito, são “obra[s] em forma de livro, inteiramente concebida[s] pelo artista e que não se limita[m] a um
trabalho de ilustração. [...] Livro-objeto [...] formado por elementos de natureza e arranjos variados” (GRANDE
Enciclopédia Larousse Cultural, 1998 apud SILVEIRA, P., 2008, p. 25).
68
3.2 CONCEITOS-CHAVE DA CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO
Há inúmeras discussões acerca do que seria o objeto da CI e ainda sobre qual seria a
identidade da mesma. Tais discussões não são específicas à CI, ocorrendo na arquivologia
(debates sobre a arquivologia clássica, moderna, pós-moderna e qual é, de fato, a que melhor
representa a área) e, em vários outros campos do conhecimento. Reconhece-se a existência de
diversas visões, mas para fins deste trabalho alguns vieses serão escolhidos, por se julgar que
melhor se ajustam às manifestações artísticas efêmeras, ou seja, happenings, body art e
performances.
Uma das teorias em questão é a de Michael Buckland, nos textos “Information as
thing”, de 1991, “What Kind of Science Can Information Science Be?”, de 2012 e “A natureza
da CI e a sua importância para a sociedade”, de 2018. Para o autor (BUCKLAND, 1991), a
palavra “informação” é ambígua e pode receber diferentes classificações. Essa conclusão
parece óbvia, mas é considerada importante por Buckland, já que esse entendimento
possibilita novas formas de se aproximar do assunto. Ao invés de tentar responder à pergunta
“o que é informação”, o autor adota uma abordagem que ele chama de pragmática, e procurar
definir informação por meio dos usos que se pode fazer dela: “[...] se os principais usos
puderem ser identificados, ordenados e caracterizados, então algum progresso poderá ser
feito” (BUCKLAND, 1991, p. 351, tradução nossa).74
Essa estratégia também é utilizada por Buckland acerca da definição da própria CI.
Em “What Kind of Science Can Information Science Be?”, ele procura esclarecer e delimitar
os significados de palavras-chaves relacionadas à CI, como “ciência”, “informação”,
“conhecimento” e “interdisciplinaridade” e diferenciar os termos “científico”,
“erudito/acadêmico” e “crítico” (BUCKLAND, 2012) para propor que tipo de campo
científico a CI pode ser, segundo as suposições dos próprios estudiosos. Ele retira assim a
ênfase na busca por uma definição última e hermética e opta para uma definição mais aberta,
voltada aos objetivos da CI e aos seus usos pela sociedade.
Sobre a informação, no primeiro texto citado, Buckland afirma que ela é
principalmente utilizada como processo, conhecimento e coisa, e emprega as seguintes
categorias correspondentes: “informação-como-conhecimento” (information-as-knowledge),
“informação-como-processo” (information-as-process) e “informação-como-coisa”
(information-as-thing) (1991). Ele define esses usos a partir de uma fonte comum, o “Oxford
74
“[...] if the principal uses can be identified, sorted, and characterized, then some progress might be made”
(BUCKLAND, 1991, p. 351).
69
English Dictionary”, de 1989. Essa escolha coaduna-se com a abordagem pragmática do autor
acerca da “informação”, da “CI”, e dos diversos significados de uma mesma palavra. Ele
afirma que, “[...] sendo outras coisas iguais, a explicação mais simples é geralmente a
preferida” (BUCKLAND, 2012, p. 2, tradução nossa),75
ou seja, Buckland utiliza como fonte
inicial um dicionário ao invés de textos mais complexos e aprofundados para identificar os
principais usos da informação.
Além de mapear essas três grandes categorias, Buckland (1991) as divide em tangíveis
e intangíveis. A “informação-como-processo” refere-se ao ato de ser informado, de aprender,
e a “informação-como-conhecimento” é aquela relativa ao “conhecimento transmitido, o que
foi aprendido como resultado de ser informado” (BUCKLAND, 2012, p. 2, tradução nossa).76
Ambas são classificadas como intangíveis, ou seja, não podem ser diretamente
quantificadas.77
Para serem passíveis de análise, necessitam de algum meio de materialização
– texto, comunicação, sinais etc. – formas de expressão, descrição ou representação que são
consideradas “informação-como-coisa” e, portanto, tangíveis (BUCKLAND, 1991).
A “informação-como-coisa” é o tipo de informação, segundo Buckland (1991), que
pertence à área da CI e deve ser o objetivo da mesma, já que é passível de armazenamento e
recuperação. Isso se explica porque o autor entende que a CI lida com serviços fornecedores
de informação, ou seja, que o principal papel de arquivos, bibliotecas, museus, serviços de
informação online e relacionados diz respeito a prover informações (BUCKLAND, 2012),
manter as pessoas bem informadas (BUCKLAND, 2018).78
Mas o autor admite que essa
definição é restrita e por isso busca para a CI uma conceituação ampliada. Buckland (2012)
entende que, diferentemente de outras ciências como a Teoria da Informação de Shannon-
Weaver e a Tecnologia da Informação, a CI trata de informações relacionadas ao
conhecimento e à aprendizagem humanos. Isso se reflete nas denominações das já citadas
75
“[…] other things being equal, the simplest explanation is generally to be preferred” (BUCKLAND, 2012, p.
2). Essa frase diz respeito à Navalha de Occam ou Ockham, princípio lógico de economia que defende que é
melhor evitar multiplicar os entes existentes além do necessário (“entia non sunt: multiplicanda praeter
necessitatem”) (JAPIASSÚ; MARCONDES, 2006), ou seja, em caso de dúvida a explicação mais simples e
objetiva é a melhor. 76
“[...] knowledge imparted, what was learned as a result of being informed” (BUCKLAND, 2012, p. 2). 77
Ainda que, como o próprio autor esclarece, possam ser indiretamente quantificadas como os exames aplicados
aos alunos para medir seu nível de conhecimento (BUCKLAND, 1991, p. 352). 78
Também fica claro que, para o autor, não há discussão sobre as áreas da arquivologia, biblioteconomia,
museologia etc. pertencerem ao escopo da CI. Ele questiona a ênfase excessiva que se dá ao caráter
interdisciplinar da CI e afirma que “[s]e você quiser falar sobre disciplinas, você pode dizer que a CI é uma
‘superdisciplina’ baseada em todas as outras disciplinas, conforme necessário” (BUCKLAND, 2018, p. 14). Ele
explica ainda que, de acordo com sua visão pessoal, em tempos de crise econômica não é tão interessante afirmar
que uma determinada ciência é “inter”, já que para o mesmo, esse prefixo implica uma posição de fraqueza e
posiciona o objeto em questão entre outros objetos mais sólidos; defende que, como alternativa, se deve destacar
os benefícios sociais da CI, como manter os profissionais e demais membros da sociedade bem informados
(BUCKLAND, 2012, p. 5).
70
categorias de uso de informação: “informação-como-processo”, “informação-como-
conhecimento” e “informação-como-coisa”.
“Informação-como-coisa” é também compreendida por Buckland (1991) enquanto
evidência. Como fez com a palavra “informação”, o autor busca o termo “evidência” no
dicionário e entre seus vários conceitos, destaca-se o seguinte: “[i]nformação, seja na forma
de testemunho pessoal, na linguagem dos documentos, ou na produção de objetos materiais,
que são dados em uma investigação legal” (BUCKLAND, 1991, p. 353, tradução nossa).79
Dentre essas evidências consideradas “informações-como-coisa”, ele cita relatórios legais,
imagens, textos, enciclopédias, dados estatísticos, objetos, citações, fotografias etc.
(BUCKLAND, 1991).
A evidência também pode ser entendida como “algo relacionado à compreensão, algo
que, caso encontrado e corretamente compreendido, pode mudar o conhecimento de alguém,
as crenças de alguém sobre um assunto qualquer” (BUCKLAND, 1991, p. 353, tradução
nossa).80
Ou seja, a evidência e, portanto, a “informação-como-coisa”, necessitam da
interpretação humana – dos diversos processos intelectuais envolvidos na compreensão de um
assunto/objeto – para ter significado para as pessoas, estando atrelada ao uso e ao
entendimento que lhe é conferido. Para Buckland (1991), isso demonstra que a evidência
possui, enquanto atributo, passividade: ela precisa ser examinada, descrita e categorizada pelo
ser humano, que pode ainda, compreendê-la mal, resumi-la, refutá-la ou entendê-la
corretamente. Logo, a “informação-como-coisa” é uma questão de decisão, de considerar a
informação relevante e útil, evidência de algo significativo a partir do consenso de um
determinado grupo (BUCKLAND, 1991).
Diversos tipos de informação são considerados evidências: dados (como os
armazenados em computador), textos e documentos (formulários, cartas, papeis, manuscritos,
livros, periódicos e registros escritos em geral, assim como imagens e sons), eventos e objetos
(fósseis, plantas, esqueletos, artefatos etc.) (BUCKLAND, 1991). Alguns objetos em si não
permitem armazenamento em um sistema de informação, como prédios e pessoas, mas estes
podem ser representados por diferentes tipos de registro, que poderão ser coletados e
armazenados por esse sistema (BUCKLAND, 1991).
Ainda pensando nos objetos, Buckland, baseado em Paul Otlet e Suzanne Briet,
apresenta um entendimento estendido sobre documento, segundo o qual “[...] objetos naturais,
79
“Information, whether in the form of personal testimony, the language of documents, or the production of
material objects, that is given in a legal investigation” (BUCKLAND, 1991, p. 353). 80
“[...] something related to understanding, something which, if found and correctly understood, could change
one’s knowledge, one’s beliefs, concerning some matter” (BUCKLAND, 1991, p. 353).
71
artefatos, objetos com vestígios de atividades humanas, objetos como modelos projetados
para representar ideias e obras de arte, além de textos” (OTLET, 1934, p. 217 apud
BUCKLAND, 1991, p. 355, tradução nossa)81
devem ser considerados documentos. De Briet,
o autor cita o conhecido exemplo do antílope enquanto documento (BUCKLAND, 1991). E
por fim, Buckland (1991) resume documento como tudo aquilo que informa – de acordo com
a origem latina da palavra “docere”, ensinar ou informar e, “-ment”, sufixo relacionado a
sentido, significado – e aponta o evento como uma fonte de evidências e conhecimentos que é
pouco inserida nos sistemas de informação.
O evento em si é definido por Buckland (1991) como “fenômeno informativo” cujas
evidências são usadas de três formas distintas: a) objetos associados, b) representações do
evento – como fotos, filmagens, textos, e c) recriação do evento. Os objetos podem ter sido
coletados ou representados e se associam aos eventos como evidências dos mesmos (uma
pegada na terra, uma mancha de sangue); fotografias, textos, memórias etc. representam o
evento; e o evento pode ser recriado, refeito. Para melhor explicar esse terceiro modo de
evidência, Buckland usa o exemplo das experiências científicas, cuja validade só é
comprovada, segundo o autor, pela repetição da experiência e a obtenção dos mesmos
resultados.
Apesar de a representação estar associada às três maneiras de uso das evidências
geradas por eventos, Buckland (1991) explica que ela nunca é uma cópia perfeita, possuindo
as seguintes características: é incompleta; feita para auxiliar o armazenamento, a busca e/ou a
compreensão sobre o original; normalmente reduz tudo a texto ou dados – eventos, objetos e
textos, apesar do contrário também ocorrer;82
incorpora detalhes adicionais que não estão
explícitos no original; é infinita (pode se repetir indefinidamente); e geralmente é redutora,
destacando as características do original entendidas como as mais importantes.
Com relação à representação de artefatos de museu e obras de arte, Buckland (1991)
citando Mills e Mansfield (1979), enfatiza a vantagem do uso de uma cópia para a
preservação do original e o fato de que nem mesmo os especialistas são capazes de diferenciá-
las a olho nu. Percebe-se, assim, que Buckland tem em mente um tipo de arte que se
concretiza em um objeto físico. Apesar disso, acredita-se que é possível adaptar sua teoria
referente a “informação-como-coisa” ao evento, a evidência e a representação às
manifestações artísticas efêmeras como a performance, o happening e a body art.
81
“[…] natural objects, artefacts, objects bearing traces of human activities, objects such as models designed to
represent ideas, and works of art, as well as texts (BUCKLAND, 1991, p. 355). 82
A afirmação de que o contrário também pode ocorrer é retirada de Schlebecker (1977), conforme indicado por
Buckland em citação no próprio texto.
72
Como visto, Buckland entende que os eventos geram como evidências objetos,
registros e eventos recriados a partir do original. Esses três tipos de evidências podem ser
obtidas a partir de um happening, uma body art e/ou uma performance. Tais evidências não
são obrigatoriamente produzidas como resultado dessas ações artísticas, mas sua ocorrência é
possível. Como exemplo tem-se a reapresentação da performance “Lips of Thomas”, realizada
em 1975 pela artista Marina Abramovic (1946-) na Galerie Krinzinger, em Innsbruck,
Áustria. A artista realizou esta mesma performance em 2005 durante o evento “Seven Easy
Pieces”, em que reapresentou sete performances de autoria de artistas diversos e de autoria
própria no Solomon R. Guggenheim Museum, em Nova Iorque. Segundo o texto do
cronograma que continha a ordem, o horário e a descrição das performances que seriam
refeitas, em “Lips of Thomas” Abramovic
[...] comeu um quilo de mel e bebeu um litro de vinho tinto em um copo. Ela
quebrou o copo com a mão, desenhou uma estrela na barriga com uma lâmina de
barbear e depois se chicoteou até que ‘Não sentiu mais dor’. Ela se deitou em uma
cruz de gelo enquanto um aquecedor suspenso acima fazia com que ela sangrasse
mais profusamente (JONES, 2012, p. 544, tradução nossa).83
Figura 12 – Lips of Thomas, 1975, Marina Abramovic
Fonte: Site do Guggenheim. Fotos cortesia da artista e da Sean Kelly Gallery, New York. ©2005 Artists
Rights Society (ARS). NY/VG Bild-Kunst. Bonn.
A respeito de “Lips of Thomas”, Abramovic, em entrevista concedida a Amélia Jones,
contou que adicionou alguns detalhes e retirou outros (JONES, 2012). De acordo com a
artista, todos os elementos da ação original estavam presentes na reapresentação, com exceção
de um par de sapatos, de um bastão e de uma música que ela usou em outras performances e
resolveu acrescentar à “Lips of Thomas”; Abramovic também ampliou o tempo de duração da
performance original de duas para sete horas (JONES, 2012).
83
“[...] ate a kilogram of honey and drank a liter of red wine out of a glass. She broke the glass with her hand,
incised a star in her stomach with a razor blade, and then whipped herself until she ‘no longer felt pain’. She lay
down on an ice cross while a space heater suspended above caused her to bleed more profusely (JONES, 2012,
p. 544).
73
Figura 13 – Seven Easy Pieces – Lips of Thomas, 2005, Marina Abramovic
Fonte: Site 1MillionWomen.
A partir de “Lips of Thomas”, é possível perceber as três evidências citadas por
Buckland que podem ser geradas a partir de um evento: a) objetos utilizados pela artista
durante a apresentação: copo, garrafa de vinho, chicote, lâmina de barbear etc.; b) fotografias,
filmagens, entrevistas e textos, como os utilizados nesta dissertação para descrever a
performance em questão; e c) possibilidade de recriação, como demonstrado pela
reapresentação realizada por Abramovic em 2005. O fato da performance posterior não ser
exatamente igual a original só reforça as características da representação elencadas por
Buckland. Assim, a performance e por extensão, o happening e a body art84
podem, de fato,
ser considerados eventos pela CI, além de “informação-como-coisa” e evidência. Ainda que o
objetivo da performance não seja o mesmo de uma experiência científica, ela se torna
evidência (informação) da performance anterior ao apresentá-la novamente. Tanto a primeira
quanto a segunda performance utilizaram objetos e foram registradas. Ademais, por meio da
nova performance tem-se, em algum grau, acesso ao passado, ainda que esta informação
venha marcada por mudanças.
A literatura da área da arte especializada nessas manifestações artísticas as reconhece
como ações e eventos (como será demonstrado na quarta seção) e como arte, mesmo que não
sejam palpáveis, objetuais. Entende-se que este pensamento deve estar presente nas áreas do
conhecimento que lidam mais diretamente com a arte e as informações artísticas como
museus, arquivos e bibliotecas de museu, e demais instituições culturais. Obter esta percepção
84
Apesar de diferentes, essas manifestações artísticas têm origem na live art, movimento que preconiza a arte
produzida ao vivo. Uma explicação mais detalhada será apresentada na quarta seção.
74
é importante, pois o caráter fluido e efêmero de happenings, body art e performances pode
colaborar para que eles acabem esquecidos pelas instituições no que se refere ao registro e ao
controle. Um dos resultados é que essas ações recebem atenção equivalente à dispensada a um
coquetel ou outro evento aleatório ocorrido no local. Podem-se encontrar fotos no site da
instituição e/ou em demais páginas de divulgação, mas nem sempre essas informações são
inseridas nos bancos de dados e arquivos, e caso sejam, isto não é garantia de que a inserção
ocorrerá de forma sistematizada e constante (como será visto na quinta seção).
A teoria de Buckland, que considera os eventos como fontes de informação e,
portanto, defende que os mesmos sejam inseridos em sistemas de informação, pode auxiliar
na compreensão de que happenings, body art e performances precisam ser registrados,
analisados e inseridos nos sistemas dos museus. Essas manifestações artísticas são eventos,
são informativas, possuem valor artístico como qualquer obra mais tradicional, mas se não
forem intencionalmente documentadas (não só no sentido do registro, mas de todas as
atividades documentárias que envolvem a organização e classificação de documentos) sua
passagem pelas instituições culturais pode acabar se perdendo.
Sabe-se que esta proposta não é simples, nem de fácil concretização. As instituições
lidam com diversos desafios que envolvem questões financeiras, tamanho do acervo,
manutenção da reserva técnica etc. E mesmo de acordo com a lei n. 11.904/2009 entende-se
que os museus têm responsabilidades relacionadas à conservação, investigação, comunicação,
interpretação e exposição de seus conjuntos e coleções de valor cultural (BRASIL, 2009, grifo
nosso). Muitas dessas ações artísticas efêmeras têm um vínculo frágil e um contato rápido
com as instituições que as recebem e, em alguns casos, acontecem inclusive à revelia dos
museus. Há ainda a questão da difícil classificação dessas formas de arte, já que possuem
muitos pontos em comum e os especialistas apresentam diferentes classificações e
interpretações (como será visto na quarta seção). Não se pode esquecer também da fragilidade
de alguns resquícios (as evidências objetuais) dessas ações. Mas como esclarecem Rodrigues
e Crippa a esse respeito:
Embora não seja tudo o que se preserva de uma obra de arte contemporânea,85
principalmente aquelas que fazem uso dos materiais perecíveis, impossíveis de
serem guardados, aquilo que resta da obra e que se determinou proteger tem que
85
De acordo com Rodrigues e Crippa (2015, p. [5]), a arte contemporânea extrapola as definições comuns de
arte, sendo aquela em que, citando Cauquelin (2005) “qualquer coisa pode ser arte”, desde que seja feita no
tempo e no lugar certos, desvencilhando assim a arte da obrigatoriedade do uso tradicional do objeto e do próprio
objeto. Segundo Humberto Carvalho (2015, p. 17), existe arte contemporânea e arte da contemporaneidade. A
primeira tem como principal elemento a “aproximação com a vida, com os elementos da sociedade e do
cotidiano” e exige uma fruição intelectualizada, não apenas visual; a segunda é aquela que é feita nos dias de
hoje (CARVALHO, 2015, p. 17).
75
receber tratamento adequado. Não basta apenas deixar tudo junto em uma reserva
técnica climatizada (RODRIGUES; CRIPPA, 2015, p. [6]).
A importância do reconhecimento dado pelas instituições e pela CI a uma determinada
forma de arte é explicada por Bruno Rodrigues e Giulia Crippa, no texto “A Ciência da
Informação e suas relações com Arte e museu de arte”, de 2009. Eles apresentam, citando
Coli (2007), os instrumentos da cultura que conferem o status de arte a um objeto: o discurso,
produzido pelo conservador do museu, o historiador da arte, o crítico e o perito; e os locais
específicos de manifestação dessa arte: museus, galerias etc. (RODRIGUES; CRIPPA, 2009).
Mas tais instrumentos são utilizados em conjunto com os documentos. Citando Freire (1999),
Rodrigues e Crippa enfatizam as artes efêmeras como a performance, cujo único produto é,
muitas vezes, a documentação que registrou o ato. Diante de tal situação, os autores propõem,
a partir da definição de informação proporcionada pelo “paradigma social” de Capurro
(2003),86
que a obra de arte contemporânea seja considerada informação/documento e que o
documento sobre ela – informação enquanto “produto da cognição de um ou vários sujeitos
[...] registrado em suporte (documento) físico ou virtual” (RODRIGUES; CRIPPA, 2015, p.
[2]) – também possa ser considerada a obra em si, já que lhe proporciona “nova vida”
(RODRIGUES; CRIPPA, 2015, p. [6]). Nota-se, então, que essa proposição se baseia na
compreensão de uma relação dialética entre obra de arte contemporânea/produções artísticas e
a documentação relacionada.
Os autores entendem, assim, que a CI torna-se o ponto de convergência entre a arte e o
museu de arte por legitimar essas “produções artísticas em OA [Obra de Arte] através da
documentação” (RODRIGUES; CRIPPA, 2009, p. [3]). Para adquirir esse status de obra de
arte, uma produção artística deve ser inserida “nos circuitos artísticos, ser aceita e passar a
fazer parte de um acervo” (RODRIGUES; CRIPPA, 2009, p. [3]). A CI colabora com a
institucionalização da ação artística, possibilitando “a organização e recuperação das
informações artísticas, informações estéticas e informações documentais” presentes nos
museus (WERNECK, 2000 apud RODRIGUES; CRIPPA, 2009, p. [10]).
Por conseguinte, é preciso preservar e “dar inteligibilidade à obra” (FREIRE, 1999
apud RODRIGUES; CRIPPA, 2009, p. [2]), em especial às efêmeras. Essas ações demandam
do profissional da informação conhecimento sobre o que é arte e sobre o histórico do
desenvolvimento dos museus:
86
“[...] informação é definida pela constituição dos saberes do indivíduo a partir do meio social em que se vive.
Isto é, informação é o produto do exercício cognitivo do indivíduo” (RODRIGUES; CRIPPA, 2015, p. [2]).
76
Acredita-se que um profissional da informação que possua conhecimentos
estruturados quanto ao campo artístico seja o essencial para resolver parte dos
‘problemas’ relacionados aos processos de organização de acervo, de mediação
cultural e da informação estética, entre outras questões que permeiam os campos.
Este profissional deverá saber trabalhar as informações desta área com vistas a
organizá-la, torná-la recuperável e disseminá-la. A capacitação desse profissional
não deve estar pautada apenas nas funções que realizará, mas principalmente quanto
aos conceitos de Arte, histórico do museu e seu funcionamento (RODRIGUES;
CRIPPA, 2009, p. [11], grifo dos autores).
No entanto, Rodrigues e Crippa reconhecem o quanto a atuação deste profissional é
desafiadora, devido ao histórico confuso dos museus, às diversas fontes de informações
artística – como a crítica, o público e as situações históricas – e à própria característica da
arte, que
não é apenas complexa como também subjetiva. Em dados momentos há a exaltação
do artista como o verdadeiro responsável pelo que se define Arte; em outros são as
políticas culturais que decidem o que pode ou não ser Arte; entre outros diversos
fatores. Algumas das definições, ou critérios que definem o conceito, empreendidas
neste campo, são polissêmicas, ambíguas ou mesmo paradoxais (2009, p. [11]).
Diana Farjalla Correia Lima, na tese “Ciência da Informação, Museologia e
fertilização interdisciplinar: Informação em Arte, um novo campo do saber”, de 2003,
também identifica dois atores sociais nas instâncias de legitimação cultural: os institucionais
(museus e suas bibliotecas, centros de documentação, informação e modalidades afins) –
identificados e denominados por Coli (apud RODRIGUES; CRIPPA, 2009) de “instrumentos
locais” – e os agentes sociais (público em geral, pesquisadores, profissionais que atuam nas
instituições e demais usuários do complexo museológico), que Coli (apud RODRIGUES;
CRIPPA, 2009) denomina “discurso”. A autora (LIMA, 2003) explica que a análise dos
documentos museológicos precisa ser fundamentada por um estudo teórico-conceitual das
obras, levando em conta não só sua tipologia, mas também os contextos interpretativos
advindos das percepções artísticas (reforçando a importância de uma atitude proativa dos
profissionais da informação em relação às obras de arte em geral, como Rodrigues e Crippa
fizeram acerca das produções artísticas). Essas percepções artísticas, estabelecidas pelo
campo das artes e por áreas relacionadas, dividem-se em duas, de acordo com Lima: as
originadas pela produção/criação artísticas e as relacionadas à recepção/apreciação artística.
Neste primeiro momento a autora não cita o arquivo, mas ele é apontado quando Lima
aborda o “texto” e o “contexto” da obra de arte, ligando-os às informações produzidas e
recebidas. O “texto” diz respeito à própria obra (conteúdo e forma, histórico e estético), aos
dados intrínsecos; já o “contexto” é relativo aos dados extrínsecos, ou seja, aos demais
“referentes interpretativos acerca da obra e suas relações no espaço-tempo que, de modo
77
geral, estão situados na categoria dos documentos de biblioteca e de arquivo (na medida em
que seus registros documentais são produzidos nesses espaços)” (LIMA, 2003, p. 17 e 18).
Apesar de Lima (2003) reconhecer a existência da categorização dos documentos
contextuais relacionados ao ambiente de arquivo, ao discorrer sobre os acervos do museu
inicialmente ela cita apenas o museológico e o bibliográfico como fundamentais na produção
de conhecimento, na elaboração e na transmissão de informação. A autora segue associando o
texto e o contexto às denominações “documentos da arte” e “documentos sobre arte” e estes,
respectivamente, ao “discurso da arte” e “discurso sobre arte”, reunindo-os sob a alcunha
“Informação em Arte”. Porém Lima faz a ressalva de que essas classificações possuem um
caráter mais acadêmico do que prático, já que uma obra de arte também pode ser fonte
(contexto), assumindo um duplo papel.
Embora não tendo abordado os arquivos inicialmente, Lima (2003) os inclui ao longo
de sua tese, citando-os como: parte do acervo bibliográfico (p. 176 e 268); seção técnica que
pertence ao conjunto museológico, assim como a biblioteca e os centros de documentação e
informação, sendo com estes, responsável “pelos acervos dos referentes interpretativos para
estudos dos objetos nomeados de museológicos” (p. 138) e ainda relacionado à ótica da arte
como “recepção/apreciação da obra de arte”, “documentos sobre arte” e “discursos sobre arte”
(p. 138); coleções museológicas quando são detentores de coleções artísticas, ainda que estes
arquivos (e as bibliotecas) não estejam inseridos em um museu (citando a definição dada pelo
Conselho Internacional de Museus) (p. 189); referentes para o estudo sobre a arte (p. 199-
200); serviços de informação que pertencem ao corpo do complexo museológico, como
também as bibliotecas (p. 222); representantes do organismo do corpo museológico que detêm
coleções museológicas (p. 240); parte do contexto comunicacional da museologia, enquanto
arquivos históricos do museu (p. 259, nota de rodapé); arquivos artísticos de movimentos,
grupos, artistas, acontecimentos e situações, críticas e propostas, que podem ser encontrados
nos instrumentos de busca de Coleções Especiais no site da Fundação Getty (p. 203).87
A autora, portanto, não ignora os arquivos, mas assume uma postura conceitual que
enxerga arquivos e bibliotecas como sistemas/fontes de informação equivalentes, afirmando
que ambos lidam com documentos que podem ser considerados parte dos acervos
bibliográficos. Tal postura não atenta para as diferenças entre documentos de arquivo e de
biblioteca e para as maneiras diversificadas de organização, nas quais a organicidade funciona
como um diferencial para a arquivologia. Os documentos de arquivo servem como provas de
87
Novo link para o instrumento de busca de coleções especiais disponível em: http://archives2.getty.edu:8082/
xtf/search?browse-creator=aa;sort=creator. Acesso em 28 jan. 2020.
78
atividades do produtor do documento, a partir da observação, principalmente, dos princípios
da proveniência e da organicidade. Para que esse contexto de produção seja recuperado, os
documentos precisam pertencer a um conjunto – isolados, só dizem respeito ao conteúdo que
carregam. Já os documentos bibliográficos permitem diferentes organizações, segundo
autores, temas, classificações decimais, universais etc., de acordo com a preferência do
organizador. Eles são completos em si, não precisando estar relacionados a um conjunto.
Documentos de arquivo são específicos no tipo de contexto que trazem acerca da obra
de arte/manifestação artística; um contexto que se propõe (ainda que de maneira limitada e
imperfeita, como toda representação) provar as atividades do artista, suas relações de trabalho,
suas ideias e como estas se relacionam. A relevância desse contexto é até mais aparente nas
artes efêmeras, conforme demonstram Rodrigues e Crippa (2015) ao enfatizar que, muitas
vezes, o que permanece de uma performance após sua realização é o conceito e/ou as
representações da mesma, frequentemente encontrados em registros documentais. Considera-
se, portanto, que documentos bibliográficos e arquivísticos são fontes de contexto para a arte,
porém de maneiras distintas e, portanto, devendo ser considerados como acervos diferentes.
Essa postura da autora não impede, no entanto, de se analisar os documentos
arquivísticos relacionados a performances, body art e happenings na perspectiva da
“Informação em Arte”, pois esta abrange, para Lima, citando Pinheiro88
[...] o conteúdo informativo do objeto de arte, no seu sentido mais amplo,
documento oriundo de manifestações e produção artística e sobre Arte, artista e obra
de arte, nas áreas de: Artes Plásticas – pintura, escultura, desenho, gravura
(litografia, xilogravura, serigrafia), ambientações/instalações e performances; ...
Artes Gráficas, Desenho Industrial, ... Audio-Visuais – cinema, vídeo e fotografia
(1995 apud LIMA, 2003, p. 19, grifo do autor).
Além da abrangência, Lima esclarece no texto “Acervos artísticos e informação:
modelo estrutural para pesquisas em artes plásticas”, que a “Informação em Arte” enfatiza
[...] o estudo especializado da comunicação e disseminação da informação que
contempla assuntos artísticos vinculados às coleções reconhecidas como de natureza
museológica, em suas feições plurais, no tocante ao processamento do acervo e
quando da sua exposição pública em ambiente fechado ou a céu aberto. Desse modo
ela projeta seu foco e alcança as denominadas fontes de estudo para tais acervos
(2000, p. 19).
Como a autora especificou em sua tese que os arquivos podem ser coleções
museológicas, pertencerem ao corpo do complexo museológico e o representarem caso
88
Lima explica que essa citação encontra-se no documento “Mapa brasileiro da infra-estrutura de Informação em
Arte”, de Lena Vânia Pinheiro, datado de julho de 1995. Trata-se de um projeto de pesquisa submetido ao
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e não aprovado, cuja cópia foi gentilmente
cedida por Pinheiro à Lima (LIMA, 2003, p. 21, nota de rodapé).
79
detenham acervos artísticos (considerados por Lima como museológicos), entende-se que eles
podem então ser enquadrados nos estudos da “Informação em Arte”. Outra afirmação da
autora, citando a Fundação Getty, é a de que documentos de arquivo (ao menos se entende
que o são, mesmo que não denominados por Lima dessa forma) são instrumentos básicos para
a “Informação em Arte”:
Um desses instrumentos, ou recurso considerado de ordem básica para a Informação
em Arte no processo da Documentação Museológica está relacionado ao histórico
das coleções dos acervos, envolvendo algumas variáveis e/ou indicadores (o mesmo
que categorias de informação ou os itens de informação) de ordem administrativo-
legal, como por exemplo, entre outros, os que focalizam a origem/procedência e as
fontes comprobatórias – modo de aquisição, cadeia de proprietários, documentos
vários e bibliografia de referência. Tais indicadores são categorias informacionais
que compõem os inúmeros campos das fichas de catalogação dos objetos
museológicos (LIMA, 2003, p. 184, grifos do autor).
Dos indicadores elencados acima, apenas a bibliografia de referência parece dizer
respeito à biblioteconomia. Variáveis como o histórico, a origem/procedência e as fontes
comprobatórias (cadeia de proprietários e documentos diversos) são informações retiradas de
documentos arquivísticos, documentos que se preocupam em preservar a procedência e a
autoria (princípio de proveniência) e são utilizados como prova (informação de ordem
administrativo-legal, comprobatórias). Os documentos de arquivo são, portanto, como
destacado pela autora, fontes essenciais para a construção da documentação museológica e
para a “Informação em Arte”.
Analisando os autores e seus posicionamentos acerca da informação e da arte, nota-se
que Rodrigues, Crippa e Lima consideram a documentação e o tratamento documental
essenciais para a legitimação da obra de arte, incluindo aquelas que se configuram enquanto
ações/produções/manifestações artísticas. Buckland, apesar de não associar arte aos eventos,
também considera o último como fonte de informação e defende que as evidências dos
mesmos devem ser inseridas nos sistemas de informação.
No que se refere ao posicionamento de Rodrigues e Crippa sobre a documentação se
constituir enquanto arte, concorda-se que é possível,89
mas apresenta-se reservas quanto a
considerar que um documento é igual ao happening, à body art e à performance (caso tenha
sido, de fato, esta a proposta dos autores). Conforme será visto na próxima seção, os teóricos
da arte entendem que a documentação pode fazer parte dessas manifestações artísticas, mas
não que podem substituí-las completamente. Como explica Phelan (1997, p. 177), a
89
Citando Freire (1999, 2006, 2009), os autores afirmam que há obras que se confundem com documentos
arquivísticos, e há documentos de arquivos que adquirem status de obra de arte, fornecido pelos artistas
(RODRIGUES; CRIPPA, 2015, p. [2]).
80
performance (enquanto ser, entidade ontológica), “usa o corpo do performer para [...]
enquadrar a ausência do Ser prometido pelo (e através do) corpo – aquilo que não pode
tornar-se aparente sem a participação de um suplemento”. A performance é, segundo essa
concepção, ausência, desaparecimento. Uma ação compreende a passagem do tempo, é verbo,
acontecimento. Nenhum documento, como esclarece Buckland quando define representação,
abarcará uma ação por completo.
81
4 DEFINIÇÕES: ARTE
Na quarta seção, serão analisadas as definições dos principais conceitos artísticos
envolvidos na pesquisa: performance, body art e happening. Um dos propósitos para tal
análise é embasar o entendimento acerca do objeto de estudo, ou seja, o trabalho empreendido
pelos arquivos de museus junto a essas práticas artísticas específicas e junto aos arquivos de
artistas que as realizam. Outro propósito é delimitar melhor os conceitos citados, em especial
a performance, pois esta possui sentido amplo, sendo aplicada a eventos de dança, teatro,
circo, literatura poética, religiosos, entre outros. Nesta dissertação, busca-se enfatizar apenas a
chamada “arte da performance” (performance art). Uma terceira finalidade para o estudo
realizado é mostrar que, apesar de efêmeras e eventuais (ou talvez até motivada por estas
características),90
as manifestações artísticas citadas são, frequentemente acompanhadas por
alguma espécie de registro. De fato, body art, performances e happenings não podem ser
fixados ou completamente apreendidos, como qualquer ação. Mas os registros possibilitam
que algo deles seja captado e considerado útil por pesquisadores, estudantes e demais
interessados.
4.1 PERFORMANCE, BODY ART E HAPPENING
Diferenciar estes termos não é uma tarefa fácil. Uma das afirmações que mais se
repetem na literatura acerca da “arte da performance” é que ela, enquanto termo e
manifestação artística, é rebelde, ilimitada, polimórfica e pode ou não abarcar a body art e o
happening. Alguns autores, como Roselee Goldberg, em seu livro “A arte da Performance –
do futurismo ao presente”, 2007, e Kristine Stiles no texto “Performarce art”, de 1996,
utilizam o termo performance como aglutinador dos demais. Outros, como Renato Cohen, em
“Performance como linguagem: criação de um espaço-tempo de experimentação”, de 2002, e
Jorge Glusberg, em “A arte da performance”, de 2013, consideram essas manifestações
artísticas diferentes. Porém, essas duas formas de interpretação não são de todo excludentes.
A postura que generaliza e inclui o happening e a body art na performance surge em
1973, segundo Kristine Stiles (1996). Antes disso as manifestações artísticas ligadas às ações
ao vivo (live actions) – que são impossíveis de se definirem de maneira limitada – receberam
dos artistas que as praticavam diversas denominações como happenings, ações, rituais, arte-
90
E por razões mais profundas discutidas pelos teóricos, como a existência em uma sociedade de história cuja
cultura necessita dos registros para guardar uma memória que não se é mais vivida (processo que seria diferente,
segundo o autor, de sociedades tribais e orais, cuja memória é “viva”, relembrada diariamente através de ritos e
demais ações) (NORA, 1993, p. 9) e como a vivência em uma sociedade capitalista, que através do registro e da
objetificação de ações transforma tudo, inclusive a arte, em mercadoria (STILES, 1996, p. 679 e 683).
82
evento, body art etc. Mas os teóricos, em 1973, reuniram as diferenças estilísticas e
ideológicas entre as diversas live actions sob a expressão comum performance art (“arte da
performance”). Houve protestos por parte dos artistas, que viam no termo performance uma
associação ao entretenimento, o que contradizia o caráter radical dessas manifestações
artísticas. A despeito da insatisfação dos artistas, essa denominação permaneceu (STILES,
1996). A performance, ou “arte da performance” é, portanto, um dos termos mais utilizados
para reunir outras manifestações artísticas efêmeras, ligadas a ações realizadas ao vivo pelos
artistas, como a body art e o happening.
Goldberg apresenta a performance com características bem abrangentes:
A obra pode ter a forma de espectáculo a solo ou em grupo, com iluminação,
música, elementos visuais criados pelo próprio performer ou em colaboração com
outros artistas, e ser apresentada em lugares como uma galeria de arte, um museu,
um ‘espaço alternativo’, um teatro, um bar, um café ou uma esquina. Ao contrário
do que acontece na tradição teatral, o performer é o artista, quase nunca uma
personagem, como acontece com os actores, e o conteúdo raramente segue um
enredo ou uma narrativa nos moldes tradicionais. A performance pode também
consistir numa série de gestos íntimos ou numa manifestação teatral com elementos
visuais em grande escala e durar apenas alguns minutos ou várias horas; pode ser
apresentada uma única vez ou repetida diversas vezes e seguir ou não um guião;
tanto pode ser fruto de improvisação espontânea como de longos meses de ensaios.
Quer se trate de um ritual tribalista, de uma representação medieval da Paixão de
Cristo, de um espectáculo renascentista ou das soirées organizadas pelos artistas da
década de 1920 nos seus ateliers de Paris, a performance conferiu ao artista uma
presença na sociedade (2007, p. 9).91
Para a autora (GOLDBERG, 2007), é difícil definir a performance de maneira rígida e
a história dessa denominação no século XX é maleável e indeterminada, como a própria
manifestação artística. Mas Goldberg defende que a força da performance está justamente no
seu programa ilimitado, de uma arte ao vivo, transgressora, que choca o público e lhe propõe
uma reavaliação dos conceitos que possui acerca da arte e da cultura. A autora explica ainda
que o termo happening, na sua primeira utilização por Allan Kaprow (1927-2006),92
não tinha
nenhum significado concreto e que tanto os artistas que aceitaram a utilização do termo pela
imprensa quanto aqueles cujas obras foram classificadas sob essa alcunha a contragosto não
conseguiram entrar em acordo a respeito da definição de happening proposta por Kaprow: um
evento que não poderia ser repetido. Sobre o uso da designação body art, Goldberg (2007)
também parece assumir uma postura desfavorável ao afirmar que o termo, empregado para
denominar várias manifestações cujo material é o corpo do artista, é vago diante da variedade
de ações realizadas dentro desse espectro.
91
Foi mantida a versão de Portugal. 92
Obra “18 Happenings in 6 parts”, apresentada pelo artista na Reuben Gallery em Nova Iorque, em 1959.
83
Stiles, apesar de considerar a existência de características ideológicas e estilísticas
próprias às diversas ações ao vivo, parece adotar a postura globalizante dos críticos de arte da
década de 1970, afirmando que os trabalhos artísticos da performance variam de
Puros atos conceituais, ou ocorrências mentais, a manifestações físicas que podem
ter lugar em espaços públicos e privados. Uma ação pode durar poucos momentos
ou continuar interminavelmente. Performances podem comprimir simples gestos
apresentados por um único artista ou eventos complexos e experiências coletivas
envolvendo espaços geográficos amplos e dispersos e comunidades diversas. Elas
podem ser transmitidas por satélite e vistas por milhares de pessoas, aparecer em
discos a laser interativos, e ter lugar na realidade virtual. A ação pode ser
inteiramente silenciosa, despojada de linguagem, ou incluir informações
autobiográficas, ficcionais, históricas, ou outras formas narrativas. Performances
podem ocorrer sem testemunhas ou documentação, ou podem ser totalmente
registradas em fotografias, vídeo, filmes, ou computadores (1996, p. 680, tradução
nossa).93
Ao longo do texto, a autora cita diversos artistas que realizam performances,
happenings e body art, mas não faz nenhuma diferenciação clara entre essas manifestações
efêmeras. Tem-se a impressão de que ela emprega os termos que os próprios artistas
escolheram utilizar, deixando para eles a definição de suas atividades. Em alguns momentos,
no entanto, Stiles parece indicar mais claramente a existência de distinção entre essas três
formas de arte. Como quando afirma que os happenings surgiram a partir da performance
multimídia Untitled Event,94
realizada em 1952 pelo artista, poeta, músico e professor John
Cage (1912-1992) e das aulas ministradas por ele no Black Mountain Collage95
nos quatro
anos seguintes, que atraíram vários do criadores de happenings, incluindo Allan Kaprow
(STILES, 1996; GLUSBERG, 2013). Ou quando esclarece que a obra “Eye Body” (1963) –
uma série de ações privadas documentadas por fotografia que exploravam o tema da
sexualidade feminina e o corpo como material escultórico e pictórico, da artista Carolee
Schneemann (1939-2019) – anteciparam a performance e a body art (STILES, 1996). Mas a
cronologia se mostra confusa e não se pode asseverar se o uso da palavra performance no
exemplo de John Cage aparece de forma genérica ou como algo específico a um período.
93
“Performance artworks vary from purely conceptual acts, or mental occurrences, to physical manifestations
that may take place in private or public. An action might last a few moments or continue interminably.
Performances could comprise simple gestures presented by a single artist, or complex events and collective
experiences involving widely dispersed geographic spaces and diverse communities. They could be transmitted
by satellite and viewed by millions, appear in interactive laser discs, and take place in virtual reality. The action
might be entirely silent, bereft of language, or inclusive of lengthy autobiographical, fictional, historical, or other
narrative forms. Performances could occur without witness or documentation, or they might be fully recorded in
photographs, video, film, or computers” (STILES, 1996, p. 680). 94
Também denominada Theater piece n. 1 segundo McEvilley (2005, p. 44). 95
Instituição estadunidense de Ensino Superior localizada na Carolina do Norte, voltada para o ensino das artes,
de 1933 a 1957, quando teve suas atividades encerradas (Disponível em: http://www.blackmountaincollege.org/
history/. Acesso em: 18 dez. 2019).
84
Por fim, após citar exemplos de performances, body art e happenings atrelados aos
artistas que praticaram essas manifestações, Stiles encerra seu texto afirmando que
Tanto na teoria quanto na prática, artistas que desenvolveram o meio da
performance transmitiram a substância das experiências políticas e sociais
indeterminadas do modernismo tardio, e entreviram uma nova e indefinida condição
cultural prematuramente anunciada pelo pós-modernismo. Frequentemente fora das
relações de mercado, difícil de preservar e exibir, e desafiadora dos costumes sociais
e da moral enquanto sustentadores de altos princípios éticos, a arte da performance
tornou palpável as ansiosas condições corporais, psíquicas e sociais da cultura global
durante as mudanças radicais trazidas pela era eletrônica e nuclear (1996, p. 694,
tradução nossa, grifo nosso).96
Normalmente a conclusão do texto resume o todo, e neste último parágrafo a autora
inclui o happening e a body art no termo aglutinador “meio da performance”. Por essa e pelas
razões antes expostas, entende-se que Stiles enxerga a performance como um conceito mais
amplo, que engloba as outras manifestações artísticas citadas.
Além desse aspecto classificatório que aglutina ou divide, existe ainda a diversidade
de termos para caracterizar a performance. Inúmeros qualificativos são associados a ela na
literatura, tanto pelos críticos, quanto pelos próprios artistas: arte da performance
(performance art), performance masoquista, performance extrema (TAYLOR, 2012),
performance painting, performance sculpture, performance conceptual art, therapeutic
performance (MCEVILLEY, 2005), eletroperformance, performances demonstração,
performances vivenciais (COHEN, 2002) etc. Diante desta amplitude, optou-se, neste
trabalho, por se aprofundar apenas os termos performance, happening e body art, evitando
outras categorias.
4.1.1 Diferenças entre performance, happening e body art
Renato Cohen, Jorge Glusberg e Amelia Jones entendem que performance, body art e
happening são manifestações artísticas distintas, que possuem diferenças importantes, ainda
que os autores demonstrem predileção por um termo (Jones prefere body art, Glusberg,
performance e Cohen,97
happening).
96
“In both theory and practice, artists who developed the performance medium conveyed the substance of the
indeterminate social and political experiences of late modernism, and they augured a new and indefinite cultural
condition prematurely announced by postmodernism. Often uncommodifiable, difficult to preserve and exhibit,
and defiant of social mores and morals while upholding the highest ethical principles, performance art rendered
palpable the anxious corporeal, psychic, and social conditions of global culture in the radically changing
electronic and nuclear age” (STILES, 1996, p. 694). 97
“Talvez a melhor conceituação para essas duas expressões seja a de considerá-las como duas versões de um
único movimento, ou seja, a performance como sendo o happening dos anos 70/80” (COHEN, 2002, p. 136).
85
Jorge Glusberg em “A Arte da Performance” (2013), enxerga o happening como um
gênero e uma nova forma artística, predecessor direto da arte da performance. O autor
reproduz a seguinte declaração assinada, em 1965, por cinquenta artistas dessa forma de arte
oriundos da Europa, do Japão e da América:
[O happening] articula sonhos e atitudes coletivas. Não é abstrato nem figurativo,
não é trágico nem cômico. Renova-se em cada ocasião. Toda pessoa presente a um
happening participa dele. É o fim da noção de atores e público. Num happening,
pode-se mudar de ‘estado’ à vontade. Cada um no seu tempo e ritmo. Já não existe
mais uma ‘só direção’ como no teatro ou no museu, nem mais feras atrás das grades,
como no zoológico (2013, p. 34).
Glusberg (2013) concorda com a distinção que críticos e performers fazem entre
happening e performance, e aponta um sistema de características que se estrutura por
oposição: reconstrução x desconstrução, ausência de reflexo especular x utilização de reflexo
especular, ausência de envolvimento massivo x envolvimento massivo, confusão x
discriminação. O happening trabalha com a desconstrução histórica e ritual (o autor entende
que o ritual faz parte dos interesses da performance), exige a participação massiva do
espectador pelas situações caóticas que gera, utiliza o reflexo especular (o espectador percebe
as referências à história da arte evocadas pelos happenings) e trabalha com a confusão, com
um circuito aberto, com a improvisação. Por outro lado, a performance busca reconstruir a
história de uma arte milenar e ritual, é opaca pois oferece ao espectador uma realidade
insuportável de dor e miséria, não exige participação ativa do público e trabalha com limites
precisos.
Com relação à performance, o autor entende que o corpo é um atributo essencial
(mesmo que não ativo por parte do público) e que a participação ocorre em dois níveis: o do
performer (consigo ou com o grupo em que participa) e o dos espectadores (GLUSBERG,
2013). Enquanto a participação do performer é garantida, a do público pode não ocorrer, já
que uma participação efetiva depende da compreensão consciente e inconsciente que o
público possui da ação (GLUSBERG, 2013).
A respeito da body art, Glusberg explica que essa manifestação artística teve início em
1969, com a obra “Following Piece”, do artista Vito Acconci (1940-2017).98
A body art
abarca tendências e linguagens variadas, como dança, teatro e as ações do Grupo de Viena,99
e
98
O artista seguiu, durante um mês, diferentes pessoas pelas ruas de Nova Iorque até que elas entrassem em
locais privados, que ele não poderia acessar. Acconci considerava o espaço público um local democrático, de
encontro, que formava pequenos territórios (MELIM, 2008, p. 18). 99
Grupo composto por Günther Brus (1938-), Otto Mühl (1925-2013), Arnulf Rainer (1929-), Hermann Nitch
(1938-) e Rudolf Schwarzkogler (1940-1969), que na década de 1962, começou a desenvolver e sistematizar a
86
tem por objetivo “desfetichizar o corpo humano – eliminando toda exaltação à beleza [...] para
trazê-lo à sua verdadeira função: a de instrumento do homem, do qual, por sua vez, depende o
homem” (GLUSBERG, 2013, p. 42-43). Mas essa manifestação artística acabou, de acordo
com Glusberg (2013), se diluindo na performance, que se volta para a presença física do
artista mas também para o espetáculo, explorando não apenas as capacidades do corpo, mas
incorporando aspectos individuais e sociais que tornam o artista o objeto de sua própria arte.
Ele resume a arte da performance como
[...] o resultado final de uma longa batalha para liberar as artes do ilusionismo e do
artificialismo. [...] E, se é possível falar-se num triunfo, isto se deve principalmente
ao advento de novos suportes, particularmente duas novas mídias – gravação de som
em fita e o vídeo – que ampliaram muito os recursos da fotografia, do cinema e do
disco, possibilitando um registro mais completo das informações perceptivas
emitidas pelo artista (GLUSBERG, 2013, p. 46).
Renato Cohen em “Performance como linguagem: criação de um espaço-tempo de
experimentação”, publicado em 2002, afirma que a performance é uma expressão cênica, uma
função da relação espaço-tempo, necessitando de alguma atuação ao vivo, situando-se no
limite entre as artes plásticas e cênicas. A body art surgiu antes da performance e se
caracteriza pela fusão entre sujeito e objeto da arte – o artista é a própria escultura viva e se
relaciona com o espaço e a plateia (COHEN, 2002). Já happening é traduzido como
“acontecimento, ocorrência, evento. Aplica-se essa designação a um espectro de
manifestações que incluem várias mídias, como artes plásticas, teatro, art-collage, música,
dança etc.”, com a arte cênica atuando enquanto princípio aglutinador (COHEN, 2002, p. 43).
Os happenings são acontecimentos fortuitos, que têm como foco a ação do artista, a
apresentação em um período curto de tempo. As performances, por sua vez, ligam a ação do
artista (no tempo) com o local que este ocupa – há uma ocupação tanto espacial quanto
temporal do espaço em que se dará a ação.
Cohen (2002, p. 27) entende, assim, que as improvisações espontâneas e os rituais são
mais característicos do happening (diferente de Glusberg que entende o ritual relacionado às
performances), que passa a ser performance a partir do “aumento de preparação em
detrimento do improviso e da espontaneidade”. Essa passagem do happening à performance
se deu por vários motivos, entre eles a mudança de cultura da década de 1960 (revolucionária,
hippie, experimental, alternativa) para a década de 1970 (niilista e individualista) e a transição
de vários artistas que participavam de grupos/coletivos nos anos 1960, para uma experiência
body art. Suas ações eram marcadas pela violência e pelo sadomasoquismo, sacrifício de animais e outros rituais
(GLUSBERG, 2012, p. 39, 42).
87
individual na década seguinte (COHEN, 2002). Com relação à body art, Cohen (2002) não
tece muitos comentários, mas explica que ela se situa nos momentos iniciais da performance e
se define pelo artista enquanto atuante, sujeito e objeto de sua arte.
Cohen (2002, p. 109) compreende a performance e o happening a partir de uma
associação ao teatro e às artes plásticas, enxergando na origem do happening a influência do
teatro ritual que se caracteriza pela “ruptura com a representação, o uso do irracional-
metafísico, o discurso da mise en scène [encenação] não cativo à palavra” e do Teatro da
Crueldade100
do poeta e dramaturgo francês Antonin Artaud (1896-1948). A performance
teria uma origem ligada à pintura, a partir de artistas plásticos como Jackson Pollock (1912-
1956) com as action paintings, que valorizam o processo, a ação de pintar vista como o objeto
artístico e demais artistas e movimentos que passaram a ver no próprio corpo e na interação
com o público, com o espaço e com o tempo uma nova forma de arte (COHEN, 2002). A
performance seria uma “evolução dinâmico-espacial dessa arte estática” (COHEN, 2002, p.
29) situando-se “no limite das artes plásticas e das artes cênicas, sendo uma linguagem híbrida
que guarda características da primeira enquanto origem e da segunda enquanto finalidade”
(COHEN, 2002, p. 30).
Outra classificação mais geral trazida pelo autor, onde a performance (e em
consequência a body art) e o happening se inserem é a da live art, cuja especificidade é a de
uma arte
ao vivo e também a arte viva. É uma forma de se ver arte em que se procura uma
aproximação direta com a vida, em que se estimula o espontâneo, o natural, em
detrimento do elaborado, do ensaiado. A live art é um movimento de ruptura que
visa dessacralizar a arte, tirando-a de sua função meramente estética, elitista. A idéia
é de resgatar a característica ritual da arte, tirando-a de ‘espaços mortos’, como
museus, galerias, teatros, e colocando-a numa posição ‘viva’, modificadora
(COHEN, 2002, p. 38).
Além da live art, Cohen (2002) caracteriza a performance e o happening como arte
cênica, esta possuindo dois modelos – o estético e o mítico, que na prática podem se
interpenetrar. No modelo estético, há um distanciamento psicológico entre a obra e o receptor,
ele entende que está observando algo; o mesmo ocorre com o atuante, que também se percebe
100
“Estética teatral de vanguarda, especialmente identificada com a obra de Antonin Artaud que, no seu livro O
teatro e seu duplo (1938), recomenda que o teatro deva ser um evento energético e mágico para o público,
devendo se libertar dos espaços convencionais para acontecer onde a própria vida esteja acontecendo. A esse
conceito, ele deu o nome de Teatro da Crueldade, por acreditar que esse tipo de representação forçaria o público
a confrontar seus sentimentos mais profundos, num processo inevitavelmente doloroso” (TEIXEIRA, 2005,
p.257). “Expressão forjada por Antonin ARTAUD (1938) para um projeto de representação que faz com que o
espectador seja submetido a um tratamento de choque emotivo, de maneira a libertá-lo do domínio do
pensamento discursivo e lógico para encontrar uma vivência imediata, uma nova catarse e uma experiência
estética e ética original” (PAVIS, 2008, p. 377).
88
diferente da personagem que ele representa. Já no modelo mítico, tanto o atuante quanto o
espectador adentram a obra, o distanciamento não é claro; o atuante vive o papel e o receptor
participa do ritual. A partir dessas definições, o autor (COHEN, 2002) situa o happening e a
performance no modelo mítico, pois apesar dos performers contarem com a presença de um
público, essa relação não se dá de acordo com a convenção teatral, com uma encenação
tradicional, diferentemente do teatro, que é encaixado no modelo estético. O modelo mítico,
porém, também pode abarcar aspectos do modelo estético, uma espécie de subdivisão: o
happening volta-se mais intensamente para a experiência vivenciada pelo artista e pelo
espectador naquele momento, para as emoções, o psicológico, sendo mais visceral; a
performance, por outro lado, apesar de mítica em comparação ao teatro, é mais estética que o
happening, pois o artista realiza uma ação que demanda maior elaboração. Nas palavras do
autor:
Na performance, parte-se para o espetáculo e, nesse sentido, vai haver aproximação
com o ‘teatro estético’. [...] O performer em relação ao praticante do happening
necessitará de uma maior habilidade de artista para ‘segurar a cena’. Justamente
porque no happening não havia esse sentido de ‘cena’, de ‘espetáculo’, o condutor
deste funcionava mais como um xamã, um catalisador, um mestre de cerimônias do
ritual. A participação do público diminuía sua responsabilidade enquanto atuante – a
ênfase do trabalho se dava na elaboração dos sketches [esquetes – cenas curtas] e na
habilidade de improvisar diante de situações imprevistas. Na performance esse
‘improviso’ é muito menor. O performer tem que colocar algum preciosismo de
artista em cena, seja sua habilidade gestual [...] seja uma habilidade de compor
quadros visuais [...] seja uma voz surpreendente [...] etc. (COHEN, 2002, p. 138).
O happening volta-se para o processo, porém um processo anárquico, em que qualquer
pessoa pode interferir. O artista busca incorporar a vida, ou seja, “magia, rituais terapêuticos,
plástica, estética de vanguarda, luta de classes etc. – tudo é absorvido” (COHEN, 2002, p.
133). A performance é entendida como algo para se observar, comportando menos
interferência ou participação. Remete assim à pintura, a um quadro que certamente é
dinâmico, porém em menor grau que o happening. E por essas razões performances são mais
repetidas/reapresentadas que happenings (COHEN, 2002). Isso não impede, porém, que a
performance atue como uma arte interventora, modificadora, cujo objetivo seja transformar o
receptor (COHEN, 2002).
Para Cohen (2002), tanto a performance quanto o happening demandam uma
audiência, que pode ser observante ou participativa/interventora na ação do artista,
dependendo do modelo de arte cênica prevalente (estético ou mítico). O artista em si pode ser
substituído por um boneco ou animal, mas a recepção não pode deixar de existir. A
importância dada ao público por Cohen pode vir de sua ligação com o teatro e/ou mesmo de
89
sua visão da arte e do papel do artista: “talvez a melhor definição de arte para o nosso tempo
[...] seja a definição cibernética de Schechner: o principal meio de trocar experiências é
rearranjando bits de informação” (2002, p. 87 e nota de rodapé) e “[c]abe ao artista captar
uma série de ‘informações’ que estão no ar e codificar essas informações através da arte, em
mensagem para o público” (2002, p. 87).
A fim de resumir as diferenças entre as duas manifestações artísticas, Cohen apresenta
um quadro comparativo entre a performance e o happening, com o período, o fio condutor, a
forma de estruturação, a ênfase, o objetivo, o material e o tempo de apresentação. O
happening situa-se entre 1960-1970, é ritual, improvisado (sketch com algum controle),
realizado em grupo, com ênfase social e integrativa, objetivo terapêutico e anárquico, material
plástico, e é apresentado como evento (sem repetição). A performance situa-se entre 1970-
1980, é ritual-conceitual, improvisada (colagem e sketch com aumento do controle),
individual (permitindo a colaboração), com ênfase individual e utopia pessoal, objetivo
estético e conceitual, material eletrônico101
e é apresentada como evento (com alguma
repetição) (COHEN, 2002).
Amelia Jones, no livro “Body art/performing the subject”, de 1998, considera body art
como a melhor expressão para caracterizar as manifestações artísticas efêmeras realizadas nas
décadas de 1960, 1970 e 1980, ao invés do termo performance (apud MELIM, 2008).102
A
autora entende o corpo não apenas em seus aspectos físicos, mas como um lócus de um “eu
disperso e desintegrado”, o lugar do sujeito no social, “em todas as suas identificações
aparentes ou inconscientes, como raça, sexualidade, gênero, classe, entre outros” (JONES,
1998, p. 13). A visão acerca do corpo é assim mais complexa e subjetiva que a proposta pela
performance.
Outra razão que diferencia a body art da performance é a que a primeira é mais
específica, enfatizando o corpo de forma extremamente enérgica, sexualizada e relativa ao
gênero [gendered], podendo ou não ser inicialmente realizada frente a espectadores, sendo
101
Analisando os grupos e as manifestações artísticas relacionadas à live art nas décadas de 1960 a 1980, Cohen
(2002) aproxima o happening ao plástico (os artistas se utilizavam, em suas ações, de materiais comumente
utilizados nas artes plásticas), apesar de afirmar que é a performance que possui maior ligação com a pintura
pela busca por uma maior estetização e que o happening, pela tríade atuante-público-texto (texto verbal,
imagético ou indicial) pode ser classificado como uma forma de teatro. Ele associa a performance ao eletrônico
pois os artistas dessa manifestação se utilizaram, na décadas de 1970 e 1980, de aparelhos eletrônicos em suas
ações. O autor vê, nessa utilização, um motivo maior, relacionado a um questionamento da mídia e do uso da
mesma pelo sistema. Ou seja, um discurso crítico e político sobre o poder da mídia no meio artístico e sobre as
mensagens fragmentárias veiculadas pela mesma (COHEN, 2002). 102
Nesse sentido ela poderia ser enquadrada entre os autores que aglutinam a performance e a body art sob este
último termo. Mas ao longo do primeiro capítulo do seu livro, Jones diferencia essas duas formas artísticas, e por
isso foi colocada no tópico que aborda as diferenças entre essas ações.
90
documentada para posterior apreciação por meio de fotografias e vídeos, entre outros meios,
enquanto a segunda é mais ampla e teatral (comportando uma audiência) (JONES, 1998). A
body art, no trabalho de artistas como Carolee Schneemann e Yayoi Kusama (1929-), engaja
os espectadores de maneira apaixonada, convulsiva e dramática, por meio de trocas
intersubjetivas (JONES, 1998).
Nota-se que Jones não desconsidera os trabalhos realizados inicialmente sem público,
contando com a documentação como fonte de informação sobre essas ações, o que para ela
não parece retirar-lhes o valor artístico. Essa possibilidade de documentar o evento, fornecida
aos artistas pelos registros, funciona ainda para a autora como uma maneira de diferenciar
performance e body art. Peggy Phelan possui pensamento semelhante ao de Jones no que se
refere à necessidade da performance ter um público e ser realizada ao vivo. Mas Phelan se
mostra desfavorável acerca da relação performance x representação, afirmando que
As pressões exercidas sobre a performance para que ela sucumba às leis da
economia reprodutiva são enormes, uma vez que é apenas muito raramente que o
‘agora’ ao qual a performance dirige as suas mais profundas questões se vê
valorizado na nossa cultura. (E este é o motivo pelo qual o ‘agora se vê
suplementado pela câmara do documentarista, pelo arquivo videográfico) [...] A
independência da performance em relação à reprodução em massa, em termos quer
tecnológicos, quer económicos, quer linguísticos, é a sua maior força; mas,
trespassada pelas ideologias dominantes do capital e da reprodução, frequentemente
a performance desvaloriza essa sua força (1997, p. 171 e 176).
Apesar de tal postura, Phelan (1997, p. 175) aceita algum tipo de registro quando
admite que “não faz sentido simplesmente recusar escrever sobre performance” mesmo que
essa escrita transforme a ação artística. A autora sugere que o escrever também seja
performativo, agindo não para preservar, mas para refletir a performance, ou seja, evocar um
“presente maniacamente carregado [que] desaparece na memória, no reino da invisibilidade e
do inconsciente, onde [a performance] escapa à regulamentação e ao controlo” (PHELAN,
1997, p. 173). O que se depreende é que fornecer informação secundária sobre um evento
ainda é importante, mesmo que seja de uma maneira diferenciada ou, segundo Phelan,
performativa.
Ao comparar performance e body art, Jones identifica diferenças, mas explica que a
segunda está em constante negociação com a trajetória da primeira, que surgiu a partir das
vanguardas artísticas modernas europeias do início do século XX (JONES, 1998) –
vanguardas estas relacionadas à pintura, mas cujos artistas já realizavam ações, declamações,
apresentações improvisadas e outras formas de manifestação que Goldberg (2007), classifica
como performance. A autora esclarece que, por suas características, a body art é
91
especificamente antiformalista por impulso, abrindo os circuitos do desejo, com
relação a produção e recepção artística. Trabalhos que envolvem a representação do
artista em seu corpo em todas as suas particularidades sexuais, raciais e outras e que
abertamente solicitam os desejos dos espectadores, desentranham as profundas
estruturas e suposições incorporadas no modelo formalista103
de avaliação da arte
(JONES, 1998, p. 5, tradução nossa).104
Com relação ao happening, Jones, no catálogo “The artist’s body” (2000), o inclui no
termo body art. Conforme visto, a autora considera o segundo termo o melhor para
representar os eventos realizados nas décadas de 1960 e 1970, período de criação e forte
produção de happenings. Ela afirma que a arte possuía um ímpeto democratizador relacionado
ao impulso politicamente contracultural da época, que leva a body art a percorrer duas
direções: “a produção de ações mundanas (primariamente entre artistas associados ao
Fluxus105
e aos Happenings); e [...] o registrar do corpo – em nosso caso o corpo cotidiano
(desejoso e carnal) – dentro da obra de arte” (JONES, 2000, p. 27, tradução nossa).106
Apesar
disso a autora reconhece diferenças que permitem que esses períodos recebam distintas
denominações.
Jones (2000, p. 28, tradução nossa) elucida que as ações realizadas no happening são
pouco roteirizadas, não ensaiadas e “deliberadamente incompatíveis a fim de produzir efeitos
deslocadores”.107
O happening, que enfatiza ações cotidianas apresentadas em repetição,
apaga a linha entre arte e vida, a divisão entre criador e espectador, entre o ordinário do dia-a-
dia e aquilo que é artisticamente produzido, destacando o coletivo ao invés do individual
(JONES, 2000). A autora afirma ainda que tais ações repetitivas baseadas no cotidiano nos
encorajam a observar a “estrutura e o significado da vida diária” e ajudam a autenticar
novamente “ações que foram comodificadas pela cultura de consumo, como o alimentar-se ou
realizar as tarefas domésticas, ambas espetacularizadas pelos shows e propagandas da TV”
103
Formalismo é, “[e]m arte, o apego às soluções já consagradas, aos aspectos formais, em detrimento dos
conteúdos expressivos” (MARCONDES, 1998, p. 127). Uma valorização das linhas, formas e cores, sem
referências ao mundo externo, aos sentimentos, ideias ou representações do real; apenas as formas atingiriam
diretamente a alma do observador (MCEVILLEY, 2005, p. 39). 104
“Body art is specifically antiformalist in impulse, opening up the circuits of desire informing artistic
production and reception. Works that involve the artist's enactment of her or his body in all of its sexual, racial,
and other particularities and overly solicit spectatorial desires unhinge the very deep structures and assumptions
embedded in the formalist model of art evaluation” (JONES, 1998, p. 5). 105
Grupo ou movimento que buscava se manifestar utilizando diversas formas artísticas como fotografia, teatro,
dança, artes visuais, poesia, música, vídeo etc., cuja origem remete ao Festival Internacional de Música Nova
ocorrido em Wiesbaden, na Alemanha, em 1962, e ao artista lituano George Maciunas (1931-1978). Maciunas
escolheu uma palavra de origem latina que significa movimento, fluxo, para denominar uma série de
performances organizadas por ele e realizadas na Europa, entre os anos de 1961 e 1963 (ENCICLOPÉDIA Itaú
Cultural, 2019). 106
“[...] the production of mundane actions (primarily among artists associated with Fluxus and Happenings);
and […] the registering of the body – in our case the everyday (desiring, fleshy) body – within the work of art”
(JONES, 2000, p. 27). 107
“[...] deliberately mismatched to produce dislocating effects” (JONES, 2000, p. 28).
92
(JONES, 2000, p. 28-29, tradução nossa).108
Essa observação do público, no entanto, não é
passiva, pois o happening produz “espectadores engajados socialmente, que não mais
comprarão ou promoverão o marketing do falso individualismo na cultura do pós-guerra”
(JONES, 2000, p. 29, tradução nossa).109
Jones considera assim que o happening (e o movimento Fluxus) é marcado pela
repetição, pela importância dada ao coletivo e às atividades simples realizadas diariamente –
ou seja, que não se referem ao mundo da arte,110
– cujo objetivo é despertar o público para a
vida, a fim de lutar contra a objetificação trazida pela visão de mercado. Já a body art, em si, é
aquela cujo corpo e o ser, em todas as suas tensões e identidades, são o tema.
O livro “Happenings”, lançado em 1965 por Michael Kirby, reúne diversos escritos de
artistas enquadrados por ele na manifestação artística happening, que não possuía nenhuma
definição comum existente antes de sua criação (KIRBY, 1965). Apesar de associar os termos
performance e happening, tal posição provavelmente foi escolhida pelo fato da obra ter sido
publicada em 1965, quando a diferenciação entre performance, happening e body art ainda
não era tão desenvolvida (como explicado anteriormente). Kirby (1965), na introdução do
livro, afirma que o happening foi originado em Nova Iorque, na Reuben Gallery, ocorrendo
em locais fechados com pequena audiência, o que para o autor não se apresenta enquanto
característica primordial, já que melhores condições financeiras permitiriam maiores locais e,
portanto, maior número de espectadores.
O happening se configura como uma nova forma de teatro, um teatro visual já que foi
criado por artistas e escultores, ainda que sentidos como o olfato e a audição também fossem
estimulados (KIRBY, 1965). O autor é absolutamente contra os argumentos que defendem
uma total improvisação nos happenings, esclarecendo que eles são, de fato, mais livres que o
teatro tradicional, mas que comportam planejamento e composição (KIRBY, 1965). Ele
afirma que tais argumentos vieram de pessoas que não chegaram a presenciar os happenings
ou que os viram como puro entretenimento, sem se aprofundarem na arte em si (KIRBY,
1965).
Além das características gerais, Kirby (1965) elenca os seguintes atributos aos
happenings: ação não-verbal (o uso de palavras e diálogos geralmente é irracional e não
108
“[...] actions that had been commodified by consumer culture, such as eating or performing household chores,
both spectacularized in television advertisements and shows” (JONES, 2000, p. 29). 109
“[...] socially engaged spectators who would no longer buy into or promote the marketing of false
individualism in post-war culture” (JONES, 2000, p. 29). 110
O que não libera essa forma de manifestação artística da necessidade de reconhecimento dentro da esfera da
arte. O happening e as ações do Fluxus só foram incorporados pelo mundo da arte por meio da autoridade de
artistas com Maciunas (1931-1978), Wolf Vostell (1932-1998) e Alison Knowles (1933-) (JONES, 2000, p. 29).
93
procura contar uma história linear, e os sons – grunhidos, gritos, risadas, melodias, barulhos –
são mais utilizados); estrutura compartimentada (abandono do roteiro teatral e das
informações estruturadas que trazem contexto ao espectador, além do uso de unidades teatrais
compartimentadas, onde as ações realizadas não conversam entre si); função alógica (a
estrutura no happening possui uma lógica interna que não fica clara ao público; cores, formas
e movimentos são abstratos, mas também concretos posto que retirados da vida); presença dos
performers não obrigatória em todos os cenários (em muitos cenários de happening os
espaços são preenchidos apenas por som e demais elementos físicos, ainda que o performer
esteja nas proximidades, como por exemplo, no compartimento ao lado); não-matricial111
(diferente do teatro tradicional que sempre trabalha com uma matriz de espaço-tempo-
personagem, a ação do performer não está presa ao espaço e ao tempo; o performer não atua
nem cria nada, só realiza uma tarefa que já foi pensada anteriormente à ação, concretizando a
ideia).
A partir desses atributos, Kirby sugere a seguinte definição para happening: “uma
forma de teatro propositalmente composta em que diversos elementos alógicos, incluindo
performances não-matriciais, são organizadas em uma estrutura compartimentada” (1965, p.
21).112
O fato de afirmar que o happening é um teatro confirma que a presença de público é
essencial para o autor. Ele não parece considerar a ausência de audiência como uma
possibilidade durante a realização de um happening.
4.1.2 Sistematizando as visões sobre performances, happenings e body art
Após serem apresentadas as visões de Goldberg, Sitles,113
Cohen, Glusberg, Jones e
Kirby, segundo os textos apresentados, percebem-se diferenças na compreensão sobre
performances, happenings e body art que vão além da visão generalizante versus visão
específica. Aspectos como a necessidade de audiência, os graus de participação
(envolvimento real na ação e reações do público) e de engajamento (compreensão do
público), o uso do corpo, o ritual, o nível de improvisação, se destacam e, ora divergem, ora
111
Kirby esclarece, no entanto, que alguns happenings podem ser matriciais, ou seja, possuir um personagem e
uma interpretação (1965, p. 18). 112
Para uma melhor compreensão dessa definição, ver página 96 com a descrição da obra “18 happenings in 6
parts”. 113
Como o texto de Stiles não caracteriza cada manifestação artística, mas traz alguns atributos percebidos
dentro da ação de cada artista, utilizou-se essas ações, quando claramente identificadas como performance, body
art e happening como modelo para a posição da autora em cada aspecto. Quando essa identificação não ocorre,
utiliza-se a performance como medida para as outras duas manifestações. Sabe-se que essa abordagem tem
problemas, mas se fez necessária já que esquemas envolvem e exigem alguma forma de padronização. O mesmo
vale para o texto de Goldberg.
94
convergem na análise de cada autor e autora. Assim, para tornar essas visões mais claras,
decidiu-se por esquematizá-las em um quadro. Tal esquematização talvez peque por planificar
certas complexidades, mas optou-se por realizá-la crendo que os benefícios para uma
compreensão geral serão maiores que as perdas.
Quadro 1 – Aspectos da performance, da body art e do happening segundo cada autor
Aspectos Performance Body Art Happening
Necessidade
de público
Stiles: não essencial.
Stiles: não essencial
(ações privadas de
Acconci, p. 690).
Stiles: não essencial (ações
privadas de Kaprow, p. 682).
Goldberg: não essencial
(Acconci, performances
privadas, p. 198).
Goldberg: não
informado. Toma-se a
performance como
medida.
Goldberg: não informado.
Toma-se a performance
como medida.
Glusberg: essencial.
Glusberg: não
essencial (Following
Piece, Acconci, p. 42).
Glusberg: não informado.
Toma-se a performance
como medida.
Cohen: essencial.
Cohen: essencial. Cohen: essencial.
Jones: essencial. Jones: não essencial. Jones: não informado. Toma-
se como medida a body art.
Kirby: não informado. Kirby: não informado. Kirby: essencial.
Grau de
participação
ativa do
público
Stiles: variado.
Stiles: não informado.
Toma-se a
performance como
medida.
Stiles: não informado. Toma-
se a performance como
medida.
Goldberg: variado. Goldberg: não
informado. Toma-se a
performance como
medida.
Goldberg: não informado.
Toma-se a performance
como medida.
Glusberg: ínfimo em
comparação ao
happening (não
garantido, pois depende
da compreensão do
público).
Glusberg: não
informado. Toma-se a
performance como
medida.
Glusberg: massivo em
comparação à performance.
Cohen: menor que no
happening.
Cohen: não informado.
Toma-se a
performance como
medida.
Cohen: maior que na
performance.
Jones: não informado.
Jones: não informado. Jones: não informado.
Kirby: não informado.
Kirby: não informado.
Kirby: não informado.
95
Aspectos Performance Body Art Happening
Grau de
engajamento
do público
Stiles: intenso
(performances
censuradas, p. 693-694).
Stiles: não informado.
Toma-se a
performance como
medida.
Stiles: não informado. Toma-
se a performance como
medida.
Goldberg: intenso. Goldberg: intenso
(Chris Burden preso
pela polícia, p. 202).
Goldberg: não informado.
Toma-se a performance
como medida.
Glusberg: Relativo
(dependente da
compreensão do
público).
Glusberg: não
informado. Toma-se a
performance como
medida.
Glusberg: maior que na
performance (público
consegue compreender as
referências).
Cohen: intenso (busca
chocar o público).
Cohen: não informado.
Toma-se a
performance como
medida.
Cohen: não informado.
Toma-se a performance
como medida.
Jones: não informado.
Toma-se a body art
como medida.
Jones: intenso (trocas
intersubjetivas).
Jones: intenso (socialmente
engajado).
Kirby: não informado. Kirby: não informado. Kirby: pequeno –
incompreensão e
desinformação.
Uso do corpo Stiles: essencial. Stiles: essencial. Stiles: essencial (happenings
eróticos, p. 683).
Goldberg: essencial. Goldberg: essencial. Goldberg: não informado.
Toma-se a performance
como medida.
Glusberg: essencial. Glusberg: essencial. Glusberg: essencial.
Cohen: essencial (o
atuante não precisa ser
humano).
Cohen: essencial
(artista como objeto de
sua arte).
Cohen: essencial.
Jones: essencial. Jones: essencial. Jones: essencial.
Kirby: não informado. Kirby: não informado. Kirby: não essencial (luzes e
sons também funcionam
como atuantes).
Emprego dos
rituais
Stiles: presente. Stiles: presente. Stiles: presente.
Goldberg: presente. Goldberg: presente. Goldberg: não informado.
Toma-se a performance
como medida.
Glusberg: presente e
maior que no
happening.
Glusberg: não
informado. Toma-se a
performance como
medida.
Glusberg: presente e menor
que na performance.
Cohen: presente e menor
que no happening.
Cohen: não informado.
Toma-se a
performance como
medida.
Cohen: presente e maior que
na performance.
Jones: não informado. Jones: não informado. Jones: não informado.
Kirby: não informado.
Kirby: não informado. Kirby: não informado.
96
Aspectos Performance Body Art Happening
Nível de
improvisação
Stiles: não informado. Stiles: não informado. Stiles: não informado.
Goldberg: não
informado.
Goldberg: não
informado.
Goldberg: não informado.
Glusberg: existente e
menor que no
happening.
Glusberg: não
informado. Toma-se a
performance como
medida.
Glusberg: existente e maior
que na performance.
Cohen: presente e menor
que no happening.
Cohen: não informado.
Toma-se a
performance como
medida.
Cohen: presente e maior que
na performance.
Jones: presente e menor
que no happening.
Jones: não informado. Jones: presente e maior que
na performance.
Kirby: não informado. Kirby: não informado. Kirby: maior em relação ao
teatro tradicional, mas ínfimo
já que compreende
composição e planejamento.
Fonte: Autoria própria.
Após a esquematização realizada, serão descritos um happening, uma body art e uma
performance, escolhidos a partir da literatura citada neste trabalho. O fato de serem
repetidamente elencadas por diversos autores indica a importância dessas obras para a crítica
da arte, apesar da existência de motivos subjetivos e objetivos (como preferências e fontes a
que esses autores tiveram acesso). Ademais, os artistas e as obras escolhidas são considerados
precursores dessas manifestações artísticas pelos críticos. Para representar o happening foi
selecionado o evento “18 happenings in 6 parts” (1959), de Allan Kaprow, sempre citado
como aquele a ter nomeado publicamente, pela primeira vez, uma manifestação artística com
o termo happening. Para a body art será trazida a ação “Interior Scroll” (1975), de Carolee
Scheneemann, que possui uma forte carga feminista e questionadora da arte formalista
(desinteressada e distante do público). Apesar de ser descrita como performance, ela foi
escolhida pois Schneemann é identificada como uma artista progenitora da body art.114
E para
a performance será apresentada ação de Joseph Beuys denominada Coyote: I Like America
and America Likes Me, de 1974.
4.1.3 18 happenings in 6 parts
Antes de introduzir este happening é necessário prestar alguns esclarecimentos. “18
happenings in 6 parts” é descrito em detalhes por Michael Kirby, no livro Happenings
114
ENCYCLOPAEDIA Britannica, 2019. Disponível em: https://www.britannica.com/biography/Carolee-
Schneemann. Acesso em: 30 dez. 2019.
97
(1965), do ponto de vista de alguém que estava inserido no evento. No entanto, Kirby não
usou apenas a narração descritiva, acrescentando dados de diferentes fontes e de suas próprias
conclusões. Como consequência, ao se ler o texto, tem-se a sensação de estar no local, porém
na posse de algumas informações extras.
Como visto no quadro descrito anteriormente, a maioria dos autores citados concorda
que os happenings possuem como característica a improvisação. Mas este happening, assim
como outros do período, foi ensaiado duas semanas antes da abertura e durante a semana das
apresentações. Existem diversos roteiros orientando os performers em tudo o que deveriam
fazer, alguns deles incluindo desenhos com as poses e os segundos de duração de cada uma
delas (KIRBY, 1965). Há, portanto, ensaio e planejamento, o que não impediu que improvisos
acontecessem, como a de um participante que, pedindo para projetar os slides, empregou uma
ordem aleatória considerada extremamente criativa por Kaprow (KIRBY, 1965).
Poderia se dizer que este happening foi iniciado antes da data de apresentação.
Kaprow enviou cartas-convite explicando uma boa parte do que iria acontecer, já envolvendo
as pessoas na ação, gerando expectativas. Ele realiza um movimento dialético, inserindo a arte
no cotidiano das pessoas, e o cotidiano na arte ao treinar seus performers para realizar tarefas
simples durante as apresentações (ainda que de maneira deslocada, sem lógica, não-
representativa), como andar, falar, brincar e outras atividades relacionadas ao dia-a-dia.
Por toda a complexidade de “18 happenings in 6 parts”, e para tentar evitar o equívoco
de simplesmente copiar, com diferentes palavras, o texto de Kirby, optou-se por apresentar
este happening de maneira diferente. Peggy Phelan, como visto anteriormente, sugere que a
escrita sobre a performance também deva ser performativa, ou seja, criar ao invés de apenas
representar ou descrever. Longe de afirmar que isto será realizado neste trabalho, deseja-se
apenas justificar que a história narrada a seguir, busca, dentro de suas limitações, propor uma
leitura que insira o leitor no happening, estimulando a imaginação e descrevendo, em algumas
palavras, o que aconteceu.
O ano é 1959 e você mora na área metropolitana de Nova Iorque. Ao conferir sua
correspondência, percebe uma carta enviada por Reuben-Kaprow Associates. Curioso, abre o
envelope e vê que é um convite para colaborar em dezoito acontecimentos que terão lugar na
Reuben Gallery, realizados sob a direção do Sr. Allan Kaprow, nos dias 4, 6, 7, 8, 9 e 10, às
20h30min. Kaprow explica que cerca de setenta pessoas experimentarão simultaneamente os
happenings, se tornando parte deles, e que não se deve esperar desses acontecimentos
manifestações artísticas como pinturas, esculturas, danças ou música em si, mas situações do
cotidiano em que os convidados serão engajados.
98
Algum tempo depois você recebe nova correspondência relativa aos tais happenings,
dessa vez um pacote de plástico transparente preenchido com fragmentos de papel pintados,
madeira, fotografias e uma nota onde se lê o título “18 happenings in 6 parts”, com o local, os
dias e os horários das apresentações. Ainda mais intrigado, resolve consultar seu vizinho e
para sua sorte descobre que ele também recebeu as correspondências. Porém a segunda carta
enviada a ele é um pouco mais tradicional que a sua: contém diferentes informações em
retângulos que se desdobram em uma espécie de pôster.
Figura 14 – 18 happenings in 6 parts (carta-pôster), [1959], Allan Kaprow
Fonte: Site da Bienal de São Paulo.
115
115
Esta carta foi enviada ao Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM-SP). O artista já havia entrado em
contato com o Museu antes, como comprova uma ficha preenchida por ele, em 1957, produzida por Wanda
Svevo para a formação de dossiês de artistas dos arquivos da Bienal. Ele também participou da 13ª Bienal, em
1975. Kirby (1965) afirma que as cartas do artista foram enviadas para a área metropolitana de Nova Iorque; o
site da Bienal não informa em que data o MAM-SP recebeu a carta de Kaprow. Disponível em:
http://www.bienal.org.br/post/336. Acesso em: 29 dez. 2019.
99
Figura 15 – 18 happenings in 6 parts (detalhe), [1959], Allan Kaprow
Fonte: Site da Bienal de São Paulo.
Em um dos lados do pôster, Kaprow explica com mais detalhes o que acontecerá no
evento. Serão de 75 a cem pessoas presentes, que ocuparão três salas de diferentes tamanhos,
com paredes meio transparentes, permitindo que se visualize o que ocorre nas demais. Uma
sala será iluminada pelas luzes vermelha e branca, a outra pelas luzes azul e branca e a última
por uma luz azul advinda de um globo pendurado no teto. Algumas paredes serão cobertas por
colagens e luzes de Natal. Rolos de papel, espelhos, fileiras de holofotes, slides, alto-falantes,
palavras ditas, ações humanas, um boneco dançante e cadeiras farão parte do ambiente. Os
convidados trocarão de lugar de acordo com cartões numerados. Alguns convidados atuarão.
O artista adverte ainda que o significado dessas ações não será claramente formulado, mas
que o objetivo do trabalho é ser íntimo, austero e de breve duração. A carta se encerra com
um pedido de suporte financeiro (não obrigatório) que deverá ser enviado a galeria, já que no
dia não se cobrará entrada. Os interessados em participar devem fazer reserva antecipada.
Depois de conferir os demais lados da correspondência, você encara seu vizinho, que
não sabe o que fazer com o pacote transparente que você lhe entregou. Segue-se um breve
silêncio, seguido da pergunta: “O que acha? Vamos?”. Ao que você responde: “Acho uma
loucura, mas estou curioso para ver tudo isso!”. Após combinarem horário, dia e etc., você
100
volta para casa, deixa o pacote na estante da sala e aguarda ansioso pelo dia em que esses
happenings serão colocados em prática.
Figura 16 – 18 happenings in 6 parts (carta-pôster, cartões numerados, programa e
pacote transparente), 1959, Allan Kaprow
Fonte: Site specificobject.com.
É hoje. Você e seu vizinho chegam à galeria e veem que um grupo de pessoas já se
encontra no local. Após subirem ao segundo andar, vocês recebem cartões numerados e um
programa que contém duas colunas: elenco de participantes, à esquerda, e instruções, à direita.
Apontando para o programa, seu vizinho lhe cutuca e comenta “Já vi que teremos de fazer
algumas coisas hoje”. Você responde afirmativamente, porém distraído porque está mais
interessado no que acontecerá lá dentro. Estica o pescoço, fica na ponta dos pés. Não vê a
hora de entrar nas salas. Depois se arrepende da falta de tato, resolve fazer uma leitura
dinâmica do programa e reinicia a conversa: “Verdade, serão seis partes que conterão três
happenings, e eles vão anunciar o início com o toque de um sino!”. “Diferente, não?”. “Sim, e
dois toques para indicar o fim.”. “Eu vi que existem instruções para irmos para a sala dois nas
primeiras partes, a sala três nas partes três e quatro, e a sala um nas duas últimas partes.”. “É
mesmo? O meu aparece em ordens diferentes...”. “Interessante... será dinâmico.”. “Sim,
101
requer atenção, existe hora certa para sairmos e locais certos para sentarmos.”. “É, estou lendo
aqui que cada conjunto de partes terá um intervalo de dois minutos, e as três grandes partes
serão interrompidas durante dois intervalos de 15 minutos.”. “Como em uma espécie de ópera
ou musical...”. “Isso mesmo! Só que diferente delas, vamos mudar de salas durante os 15
minutos ao invés de esperar no lobby.”. “Sim... vamos ver quanto tempo vai durar, falaram
que seria breve... Olha, estão chamando!”. “Vamos entrar! Lembre-se de que não podemos
aplaudir entre as partes, só no final.”. “Sério?”. “Sim, está escrito no programa.”.
Após entrarem, vocês se separaram. Tudo aconteceu simultaneamente, como
prometido. Em alguns momentos você conseguia ver o que ocorria nas outras salas, em outros
não era possível. As tais paredes transparentes eram feitas de plástico semi-transparente, preso
em estruturas de metal. Uma das salas era grande, a outra pequena e a outra, mais estreita e
comprida. As cadeiras estavam dispostas de maneiras distintas nas salas, em retângulos e
círculos e viradas em diversas direções. Cada sala tinha uma característica. Em uma delas
havia uma mesa onde foi possível ver a apresentação de um boneco dançante. Depois dois
homens entraram, um montou um quadrado maior feito de quadrados pequenos que estavam
sobre a mesa e o outro colocou a vitrola para tocar (ou o boneco dançou depois?). O som que
saía da vitrola eram instruções para o homem que estava montando o quadrado.
Com relação aos participantes, eram seis no total, três homens e três mulheres. Sempre
que entravam na sala, eles andavam em linha reta, rente às paredes. Parecia que estavam
contando passos. As expressões deles não mudavam (meio monótonas) e eles não faziam
grandes coisas: uma mulher levantou o braço e permaneceu nessa posição por alguns
segundos. A outra espremeu laranjas (o cheiro das frutas tomou o ambiente). Dois homens
leram frases escritas em um cartaz. Enquanto isso as caixas de som emitiam barulhos altos,
em descompasso sendo que, em alguns momentos, silenciavam. As luzes aumentavam e
depois diminuíam de intensidade. De repente começaram a projetar slides com imagens de
colagens na parede semi-transparente. Ao olhar você viu, através das imagens, seu vizinho na
outra sala. Uma das mulheres entrou e retirou uma espécie de cortina da janela, iluminando o
ambiente e escurecendo a tela. Adeus vizinho.
102
Figura 17 – 18 happenings in 6 parts (vista da sala 2 a partir da sala 1), 1959, Allan
Kaprow
Fonte: Allan Kaprow, “18 Happenings in 6 Parts”, 1959 ©.
Tantas outras ações aconteceram, que se torna difícil narrá-las na ordem e com justiça
(sem se esquecer de nada). Pensando bem é possível lembrar que quatro participantes, dois
homens e duas mulheres, fizeram uma apresentação musical com instrumentos de brinquedo:
uma flauta, um ukulele, uma espécie de apito (seu vizinho disse que esse apito era um
instrumento de sopro denominado kazoo) e um violino. Apesar dos quatro estarem juntos,
cada um se apresentou em tempos separados. Também havia uma mulher brincando com uma
bola, e duas pessoas que se levantaram da plateia (depois disseram que os homens eram
Robert Rauschenberg e Jasper Johns) e cada um pintou de um lado de uma tela, círculos e
listras. Alguém começou a recitar um poema (o próprio Allan Kaprow pelo que afirmaram),
um homem escovou os dentes e por fim, quatros rolos gigantes de papel roxo e vermelho
foram desenrolados e dois casais começaram a ler o que estava escrito neles. O sino tocou
duas vezes e o evento terminou.
103
Figura 18 – 18 happenings in 6 parts (parte
5, sala 1: mulher espremendo laranjas –
Rosalyn Montague), 1959, Allan Kaprow
Figura 19 – 18 happenings in 6 parts (parte
4, sala 1: a orquestra – Shirley Prendergast,
Rosalyn Montague, Allan Kaprow e Lucas
Samaras), 1959, Allan Kaprow
Fonte: Fred W. McDarrah. 18 Happenings in 6
Parts, Reuben Gallery, New York, October 1959
(fotografia tirada durante os ensaios).
Fonte: Fred W. McDarrah. 18 Happenings in 6
Parts, Reuben Gallery, New York, October 1959
(fotografia tirada durante os ensaios).
Você reencontra seu vizinho na entrada da galeria. Ele está atônito, e você também.
Seu vizinho lhe diz, passando a mão na testa, que sente um pouco de dor de cabeça, por causa
dos sons. Vocês voltam para casa comentando sobre as ações que mais lhes chamaram
atenção. Despedem-se e finalmente você está só. Em silêncio, tenta entender tudo, relembrar
mais um pouco, mas, com a mente cansada, acaba cochilando. Sonha com cores, um lugar
com cheiro de laranja, um homem construindo uma enorme casa e seu vizinho, olhando pela
janela da casa, com o rosto colorido por imagens projetadas. Acorda subitamente. Levanta
para pegar um copo d’água, enquanto deseja que alguém tenha registrado tudo aquilo:
“Espero um dia poder ler e comparar com as minhas lembranças, conferir o que permaneceu
na memória”.
4.1.4 Interior Scroll
Para esta body art, decidiu-se oferecer uma apresentação diferente da proposta em “18
happenings in 6 parts”. Ao invés de uma história fictícia que procura unir em forma narrativa
as informações retiradas de diversas fontes, serão citados trechos de autores que descreveram
e/ou tentaram explicar a ação de Carolee Schneemann, realizada em 1975. A citação (criticada
enquanto método para abordar “18 happenings in 6 parts”) se justifica em “Interior Scroll”
104
pelo objetivo de tentar mostrar as ênfases dadas por cada crítico e pela própria artista. Essas
ênfases podem revelar questões subjetivas que envolvem a descrição de ações ao vivo.
Voz masculina:
Logo após a realização da primeira performance de Nitsch em Viena, Carolee
Schneemann apresentou uma série de agora consideradas obras clássicas baseadas
na apropriação de atividades rituais de fontes antigas e primitivas. A forma geral
dessas obras surgiu, como entre antigos xamãs e mágicos, de várias fontes, incluindo
sonhos e experiências com drogas psicodélicas. Como as obras de Nitsch, as de
Schneemann são baseadas tanto na psicologia profunda quanto na apropriação de
conteúdos da história religiosa do estrato neolítico, especialmente o gênero religioso
do rito da fertilidade. [...] Em Interior Scroll (1975), Schneemann, nua diante da
plateia durante a sua menstruação, tirou de sua vagina uma fita em forma de rolo e
leu nela um texto sobre o status das mulheres artistas (MCEVILLEY, 2005, p. 240-
242, tradução nossa).116
Voz feminina n. 1:
A pintora Carolee Schneemann (Estados Unidos, nascida em 1939) começou a criar
um ‘teatro cinético’ em Nova Iorque. Ela havia lido o livro The Second Sex (1949)
de Simone de Beauvoir e as teorias de Wilhelm Reich sobre a ligação corporal entre
sexualidade e liberdade, e esses autores fundamentaram sua crença de que a
emancipação da mulher depende da criação de um corpo de representações
femininas capaz de expressar a voz das mulheres. [...] Schneemann escreveu, ‘O
arquétipo erótico feminino, a imaginação criativa, e a arte da performance em si são
todos subversivos aos olhos da cultura patriarcal porque eles em si mesmos
representam formas e forças que não podem ser transformadas em commodities
funcionais ou entretenimento (para serem trocados como propriedade e valor),
permanecendo impossíveis de se possuir enquanto radicalizam a consciência social.’
Schneemann trabalhou em todas as mídias, do desenho e da pintura à assemblage,
instalação, performance, fotografia, filme e vídeo. Seu filme Fuses (1964-65), em
que ela filmou a si mesma e ao seu marido (o compositor James Tenney) fazendo
amor, e sua performance Interior Scroll (1975), durante a qual ela removeu e leu um
texto inserido anteriormente em sua vagina, permanecem como obras de arte
clássicas em cada mídia e representam seu esforço para apresentar um conteúdo
erótico no qual uma mulher aparece não apenas como imagem, mas como criadora
de imagens (STILES, 1996, p. 682-683, tradução nossa).117
116
“Soon after Nitsch’s first performances in Vienna, Carolee Schneemann presented a series of now-classic
pieces also based on the appropriation of ritual activities from ancient and primitive sources. The general shape
of these works arose, as among ancient shamans and magicians, from a variety of sources, including dream
material and experiences with psychedelic drugs. Like Nitsch’s works, Schneemann’s are based both on depth
psychology and on the appropriation of contents from the Neolithic stratum of religious history, especially the
religious genre of the fertility rite. […] In Interior Scroll, 1975, Schneemann, standing naked before the audience
during her menstruation, pulled from her vagina a ribbon-like scroll and read from it a text about the status of
women artists” (MCEVILLEY, 2005, p. 240-242). 117
“Painter Carolee Schneemann (United States, b. 1939) began creating ‘kinetic theater’ in New York. She had
read Simone de Beauvoir’s The Second Sex (1949) and Wilhelm Reich’s theories of the corporeal link between
sexuality and freedom, and these authors informed her belief that women’s emancipation depended on the
creation of a body of female representations able to express women’s voices. […] Schneemann wrote, ‘The
erotic female archetype, creative imagination, and performance art itself are all subversive in the eyes of
patriarchal culture because they themselves represent forms and forces which cannot be turned into functional
commodities or entertainment (to be exchanged as property and value), remaining unpossessable while
radicalizing social consciousness’. Schneemann worked in every medium from drawing and painting to
assemblage, installation, performance, photography, film and video. Her film Fuses (1964-65), in which she
filmed herself and her husband (composer James Tenney) making love, and her performance Interior Scroll
(1975), during which she removed and read a text earlier inserted in her vagina, remain classic works of art in
105
Voz feminina n. 2:
Em Interior Scroll, originalmente realizada em 1975, Schneemann ampliou sua
negociação sexualizada da subjetividade normativa (masculina) que autoriza o
artista modernista, apresentando-se em uma narrativa de prazer eroticamente
carregada que desafia o ‘olhar masculino’ fetichista e escopofílico.118
Com o rosto e
o corpo cobertos de tinta, Schneemann puxou um rolo longo e fino de papel de sua
vagina (‘como uma fita adesiva... linha de prumo... o umbigo e a língua’),
desenrolando-o para ler um texto narrativo para o público. Parte deste texto dizia o
seguinte: ‘Eu conheci um homem feliz, / um cineasta estruturalista... ele disse, nós
gostamos de você / você é charmosa / mas não nos peça / para ver seus filmes / ...
não podemos olhar para a desordem pessoal / a persistência de sentimentos / a
sensibilidade ao toque da mão’. Através da ação, que estende a ‘sensação requintada
em movimento’ e ‘se origina com... a frágil persistência da linha que se move para o
espaço’, Schneemann integrou o interior ocluso do corpo feminino (a vagina como
uma ‘câmara translúcida’) com seu exterior móvel, aparente e eminentemente
legível (obviamente ‘feminino’). Schneemann se projeta como sujeito plenamente
corporificado, que também é (mas não apenas) objeto em relação à audiência (seus
‘outros’). O sujeito feminino não é simplesmente uma ‘imagem’ no cenário de
Schneemann, mas uma subjetividade profundamente constituída (e nunca totalmente
coerente) no sentido fenomenológico, dialeticamente articulada em relação às outras
pessoas em uma troca continuamente negociada de desejos e identificações (JONES,
1998, p. 3-5, tradução nossa).119
Voz feminina n. 3:
[...] A mensagem que eu li em Interior Scroll vem dos textos feministas em Kitsch’s
Last Meal.120
A imagem ocorreu como um desenho; essa imagem parece ter a ver
com o poder e a possessividade do nomear – o movimento vindo do pensamento
interior para o significado externo, e a referência a uma serpente desenrolada, a uma
informação real (como uma fita fina, arco-íris, torá na arca, cálice, coral de sótão,
encanamento, sino da torre, o umbigo e a língua). Eu acho que a ação também foi
influenciada por dois filmes vistos na conferência ‘Women in Film and Video’.
Primeiro, Sharon Hennessey’s What I Want, no qual ela aparece em um frame fixo
que durou o tempo que ela levou para ler um artigo que desdobrava-se sem parar
como um rolo: o texto é uma simples declaração após a outra sobre o que uma
mulher deseja em sua vida – direto e cheio de ricas contradições. O outro filme foi
Near The Big Chakra de Anne Severson, em que um revezamento contínuo de trinta
ou mais diferentes vaginas foram filmadas em foco aproximado. Como Fuses ele se
each medium and represent her effort to present erotic content in which a woman appears not only as the image
but as the image maker” (STILES, 1996, p. 682-683). 118
Escopofilia: “desejo patológico de se exibir ou ser observado pelos outros; prazer sexual que advém da
observação de órgãos ou atos sexuais” (DICIONÁRIO Priberam da Língua Portuguesa, 2018). 119
“Schneemann extended her sexualized negotiation of the normative (masculine) subjectivity authorizing the
modernist artist, performing herself in an erotically charged narrative of pleasure that challenges the fetishistic
and scopophilic ‘male gaze’. Her face and body covered in strokes of paint, Schneemann pulled a long, thin coil
of paper from her vagina (‘like a ticker tape... plumb line... the umbilicus and tongue’), unrolling it to read a
narrative text to the audience. Part of this text read as follows: ‘I met a happy man, / a structuralist filmmaker...
he said we are fond of you / you are charming / but don't ask us / to look at your films / ... we cannot look at / the
personal clutter / the persistence of feelings / the hand-touch sensibility’. Through the action, which extends
‘exquisite sensation in motion’ and ‘originates with... the fragile persistence of line moving into space’,
Schneemann integrated the occlude interior of the female body (with the vagina as a ‘translucent chamber’) with
its mobile, and apparently eminently readable (obviously ‘female’) exterior. Schneemann projects herself as fully
embodied subject, who is also (but not only) object in relation to the audience (her ‘others’). The female subject
is not simply a ‘picture’ in Schneemann’s scenario, but a deeply constituted (and never fully coherent)
subjectivity in the phenomenological sense, dialectically articulated in relation to others in a continually
negotiated exchange of desires and identifications” (JONES, 1998, p. 3-5). 120
Crônica produzida por Schneemann, de 1973 a 1978, em filme Super 8. O tema era a vida de seu gato Kitsch,
filmada até o dia da morte do felino (ENCYCLOPAEDIA Britannica, 2019).
106
tornou um filme sobre natureza e confrontos, desmonte da convenção de que o
genital é ‘obsceno’, ou seja, proibido de se ver. Nossos três filmes apresentaram uma
ética sobre o conhecimento em si – recebido do e no corpo. Interior Scroll foi
apresentado duas vezes. Cada ‘leitura’ requereu uma preparação ritual para a ação,
um gradual abandono do espaço, uma concentração crescente. Para ‘Women Here
and Now’ eu coloquei uma longa mesa abaixo de dois holofotes esmaecidos, em um
canto da exibição/salão da performance da casa da velha cidade. A audiência era
amplamente composta por outras artistas que trabalharam durante os verões em East
Hampton, e reuniram-se durante a exibição de pinturas para uma série de obras
performáticas. Eu me aproximei da mesa vestida e carregando duas folhas. Retirei
minhas roupas, me enrolei em uma das folhas, coloquei a outra sobre a mesa e avisei
à audiência que iria ler Cézanne, She Was a Great Painter.121
Deixei cair o papel
que me cobria e, em pé, pintei grandes faixas definindo os contornos do meu corpo e
rosto. Após o fim da leitura em cima da mesa, fiz uma série de poses de modelo
vivo, com o livro balançando em uma das mãos. Na conclusão eu derrubei o livro e
permaneci em pé em cima da mesa. O rolo foi vagarosamente extraído enquanto eu
o lia, centímetro por centímetro (SCHNEEMANN, 1975 apud JONES, 2000, p. 251,
tradução nossa).122
A descrição realizada por McEvilley (voz masculina) é objetiva e não se aprofunda
muito nas questões feministas. Apesar de, anteriormente, o autor associar as referências
neolíticas das performers ao desejo de restaurar o matriarcado ou propô-lo enquanto solução
para os problemas trazidos pelo patriarcado, em Interior Scroll, McEvilley resume as
reivindicações feministas de Schneemann em apenas uma frase: “um texto sobre o status das
mulheres artistas” (MCEVILLEY, 2005, p. 242). Ele parece preocupar-se mais em mapear a
fonte dessas ações, como o período Neolítico em que a artista se inspira, os sonhos, os ritos de
fertilidade e o uso de drogas psicodélicas. E, talvez por esse olhar voltado aos rituais, tenha
121
Livro de Schneemann, publicado pela primeira vez em 1974, que compila seus escritos, cartas, manifestos e
scripts de performance, incluindo o script de Interior Scroll. 122
“The message I read for Interior Scroll is from the feminist texts in Kitsch’s Last Meal. The image occurred
as a drawing; this image seemed to have to do with the power and possession of naming – the movement from
interior thought to external signification, and the reference to an uncoiling serpent, to actual information (like a
ticker tape, rainbow, torah in the ark, chalice, choir loft, plumbline, bell tower, the umbilicus and tongue). I think
the action was also influenced by two films seen at the ‘Women In Film and Video’ conference. First, Sharon
Hennessey’s What I Want, in which she appears in a fixed frame shot for the duration it takes her to read from a
paper endlessly unfolding like a scroll: the text is one simple statement after another of what a woman wants in
her life – direct and full of rich contradiction. The other film was Anne Severson’s Near The Big Chakra, in
which a continual relay of thirty or more different vaginas are filmed in close focus. Like Fuses it becomes a
film about nature and confronts, dismantles the convention of the genital being ‘obscene’, that is, forbidden to be
seen. Our three films presented an ethic about knowledge itself – received from and in the body. Interior Scroll
was performed twice. Each ‘reading’ required a ritual preparation for the action, a gradual inhabitation of the
space, increasing concentration. For ‘Women Here and Now’, I placed a long table under two dimmed
spotlights, in a corner of the exhibition/performance hall of the old town meeting house. The audience was
largely composed of other women artists who work during summers in East Hampton, and they assembled
during the exhibition of paintings for a series of performance works. I approached the table dressed and carrying
two sheets. I undressed, wrapped myself in one sheet, spread the other over the table and told the audience I
would read from Cézanne, She Was a Great Painter. I dropped the covering sheet and, standing there, painted
large strokes defining the contours of my body and face. The reading was done on top of the table, taking a series
of life model ‘action poses’, the book balanced in one hand. At the conclusion I dropped the book and stood
upright on the table. The scroll was slowly extracted as I read from it, inch by inch” (SCHNEEMANN, 1975
apud JONES, 2000, p. 251).
107
sido o único crítico dentre os citados que mencionou o fato da artista estar menstruada durante
a apresentação de Interior Scroll.
Em Stiles (voz feminina n. 1) percebe-se uma maior descrição da carreira artística de
Schneemann. A autora afirma que a artista é pintora e que se utiliza de todo tipo de mídia para
se expressar. Essa abordagem da história profissional é frequentemente empregada para
descrever artistas homens e é interessante ver o mesmo tratamento dado a uma artista mulher.
A fonte das ações performáticas de Schneemann tem uma origem que não remete somente ao
interesse da artista pelo Neolítico, pelas drogas e pelos rituais. Como elencado por Stiles, ela
passa por pintura, filme, instalação, filosofia, fotografia, entre outros. Apesar desse
reconhecimento, Stiles não descreve o início da ação em Interior Scroll, que faz referências à
pintura (uso do nome do pintor Cézanne, o ato de pintar o corpo, as poses próprias de um
modelo vivo).123
Acerca do feminismo, a autora se aprofunda mais que McEvilley, citando
palavras de Schneemann sobre a consequência e compreensão de suas ações em uma
sociedade capitalista e patriarcal e resumindo Interior Scroll com a seguinte afirmação “[...]
representam seu esforço para apresentar um conteúdo erótico no qual uma mulher aparece não
apenas como imagem, mas como criadora de imagens” (STILES, 1996, p. 683).
Jones (voz feminina n. 2) apresenta um enfoque mais subjetivo que McEvilley e Stiles.
Percebe-se claramente a influência da filosofia e do feminismo em seu discurso. A autora,
assim como Stiles, cita trechos em que Schneemann descreve as impressões e metáforas
relacionadas à Interior Scroll e é a única a apresentar, mesmo que resumidamente, o conteúdo
do texto presente no papel que a artista retirou da vagina. Ela destaca o caráter sexual da ação,
relacionando-o com questões como identidade, desejo, objetificação, existência e interação
com o público. O corpo remete a temas que vão além da aparência e isso é largamente
explorado por Jones. Como resumo, o sujeito feminino em Interior Scroll não é apenas uma
imagem “mas uma subjetividade profundamente constituída (e nunca totalmente coerente) no
sentido fenomenológico, dialeticamente articulada em relação às outras pessoas em uma troca
continuamente negociada de desejos e identificações” (JONES, 1998, p. 5).
Schneemann (voz feminina n. 3), a idealizadora e performer de Interior Scroll inicia o
texto de mesmo nome presente no livro “Meat Joy: Complete Performance Works and
Selected Writings” (1979), fazendo referência, em especial, à vagina, ao Neolítico, ao
princípio de seu interesse pelo tema de sua pesquisa, à interpretação que possui acerca do
simbolismo e função da serpente (repetidamente representada em esculturas e gravuras em
123
Modelo vivo é a pessoa que posa para um artista ou grupo de pessoas que irão desenhá-la, pintá-la, esculpi-la,
enfim, representá-la de alguma forma. É muito empregado em aulas de arte, para treinamento dos alunos.
108
pedra) para as mulheres do período pré-histórico (SCHNEEMANN, 1975 apud JONES, 2000,
p. 251).
Após esta introdução, a autora aborda diretamente a obra, explicando a origem do
texto utilizado, as influências advindas de outras artistas e as metáforas relacionadas à retirada
do papel de seu interior. Schneemann destaca o esforço psicológico e filosófico necessários
para a realização de Interior Scroll – “preparação ritual [...] gradual abandono do espaço, [...]
concentração crescente” (SCHNEEMANN, 1975 apud JONES, 2000, p. 251) – mostrando
que o ato não foi impulsivo e impensado. Ela é o único dos autores aqui trazidos que descreve
a ação por completo, desde a preparação subjetiva à objetiva: estado de espírito e trabalho
mental, materiais utilizados (mesa, tinta, folhas de papel, livro), posicionamento físico dos
materiais e da própria artista, público presente (composto em sua maioria por mulheres) e
desenrolar dos acontecimentos. A autora não fala diretamente sobre feminismo em seu escrito
(apenas cita “textos feministas” retirados da obra kitsch’s Last Meal), mas demonstra esse
viés nos interesses explicitados (o tema da mulher, a serpente, o Neolítico, a vagina, a crítica a
respeito da visão pudica que a sociedade tem sobre os genitais etc.) e na própria ação descrita.
Schneemann também é a única a não se referir diretamente à sua vagina quando fala da
retirada do papel. Talvez a artista quisesse destacar o caráter simbólico de tal extração, mais
do que a ação física em si.
Depois dessa breve análise das descrições feitas por McEvilley, Stiles, Jones e
Schneemann, vale ressaltar o quanto elas se complementam ao mesmo tempo em que revelam
as falhas da documentação de eventos. De fato, se apenas um destes textos tivesse sido lido e
exposto, a compreensão de Interior Scroll seria parcial. E mesmo após diversos textos, ao ver-
se as imagens (próxima página) têm-se a impressão de que a escrita não fez jus ao que de fato
ocorreu. Cada linguagem tem sua força, revela e esconde. Mas apesar das limitações, é por
meio dessa documentação que se pode ter algum grau de acesso ao ocorrido. Como esclarece
Merleau-Ponty, ver (e acrescenta-se, ler) não é uma ação nítida ou uma ciência exata, mas é
uma construção realizada a partir de ilusões – conforme se aumenta a aproximação ao objeto
de estudo, a antiga ilusão se dissipa em prol de uma nova ilusão, até que se chegue o mais
próximo do que seria o real (MERLEAU-PONTY, 1984). Cada um possui uma percepção
visual, mas todos retiram suas impressões de um mesmo mundo. Assim, toda a percepção
entra na conquista e na construção da realidade (MERLEAU-PONTY, 1984).
Textos, fotografias, roteiros, entrevistas, livros, objetos, todos podem existir como
testemunho de um fato e auxiliar na progressiva compreensão, nunca total, de um
acontecimento.
109
Figura 20 – Interior Scroll, 1975, Carolee Schneemann (Conjunto de 13 impressões
em gelatina de prata)
Fonte: Site Fineartmultiple. Fotos por Anthony McCall, 1975.
110
Figura 21 – Interior Scroll (programa com o texto constante no papel retirado da
vagina da artista), 1975, Carolee Schneemann
Fonte: Site da Tate Gallery. © ARS, NY and DACS, London 2019.
4.1.5 Coyote: I Like America and America Likes Me
Com a mesma intenção empregada na abordagem das manifestações artísticas
anteriores, buscou-se para esta performance uma maneira de apresentação que fosse diferente
do agrupamento de informações sobre a obra advindas de fontes diversas. No happening
propôs-se uma história, na body art apresentaram-se os discursos e algumas diferenças entre
eles, e para esta performance, foi eleita a descrição-narrativa a partir de trechos de filmes
encontrados na internet.124
O intento é procurar, no início, descrever as ações com o mínimo
de influência textual, buscando descrevê-las com o que “seria” o mais próximo de uma visão
em “primeira mão”.
Voz feminina: Joseph Beuys, vestido com calças escuras, blusa branca de mangas
compridas, colete um pouco mais claro do que as calças e um chapéu, sai do saguão do
Aeroporto Internacional John F. Kennedy, em Nova Iorque, com uma das mãos cobrindo os
olhos e a outra perscrutando o ar, como que sentindo o ambiente para não esbarrar em nada.
Ele é recebido por outros dois homens que, após uma breve conversa, o envolvem em um
cobertor feito de feltro, tapando o corpo e o rosto do artista. Eles o ajudam a se deitar em uma
maca hospitalar, cobrem-no com um lençol branco e colocam a maca dentro da ambulância.
Uma mulher aparece e fecha a porta da ambulância, que deixa o local com a sirene e as luzes
124
Os vídeos podem ser vistos em: https://youtu.be/TIU0Sx6ijhE, https://www.artsy.net/article/artsy-editorial-
joseph-beuys-locked-room-live-coyote, https://youtu.be/d8XFaZgxnxw e https://youtu.be/OvGuZDcRvRM.
Acesso em: 30 dez. 2019.
111
ligadas, fazendo um grande estardalhaço. Durante todo o caminho o artista permanece em
silêncio.
A ambulância chega ao local marcado, a René Block Gallery, e estaciona. Os dois
homens e a mulher saem do carro, retiram a maca e entram com ela na galeria. Com ajuda, o
artista se levanta, ainda envolto na coberta de feltro e sobe as escadas. Ao chegar ao andar
pretendido, vê-se uma sala dividida por uma cerca alta de arame, com uma porta também de
arame. O chão é feito de tábuas de madeira e do outro lado do aramado vê-se um animal, um
coiote, olhando para as pessoas que chegam à sala, tentando sentir o ambiente também pelo
cheiro. O artista retira o cobertor, olha para o coiote, pega uma bengala, abre a porta e entra
sozinho no espaço reservado.
Beuys procura se aproximar do animal, que cheira o cobertor e se afasta, em um misto
de precaução e curiosidade. Andando até o meio da sala, o artista larga o cobertor no chão. O
coiote olha para as pessoas atrás da cerca. Beuys coloca um triângulo de metal pendurado por
um fio em volta do pescoço, numa espécie de colar. Ele segura a bengala em uma mão e uma
vasilha de água na outra mão, a qual bate no triângulo enquanto caminha. A cada batida o
triângulo emite um som estridente, que parece chamar o coiote. O coiote segue o artista à
distância, mas interrompe o trajeto para cheirar o cobertor mais uma vez. Beuys posiciona a
vasilha de água perto da cerca.
De volta ao cobertor, o artista se enrola nele novamente, deixando apenas um espaço
aberto no topo da cabeça, onde se encontra o chapéu. Ele expõe metade da bengala com a
parte da curvatura, saindo pelo buraco do cobertor, como se fosse uma continuação do seu
corpo. Beuys se inclina próximo ao chão, em direção ao animal. Este o circunda, puxando o
feltro e arrancando alguns pedaços do tecido. O rabo do coiote balança em alguns momentos,
lembrando um cachorro. Eles parecem estar envolvidos em uma espécie de jogo, sem medo
um do outro, mostrando apenas certo cuidado na aproximação. Não satisfeito, o coiote tentar
arrancar a bengala, mordendo-a e puxando-a, sem sucesso. Por fim, alcança o rosto do artista
que, sentindo a leve mordida, levanta um pouco o tronco se esquivando da boca do animal.
Então o coiote se estica e tenta cheirar a cabeça do artista, a partir do buraco feito pelo
cobertor.
Beuys, então, retira o cobertor. O animal cheira novamente o feltro atentando, porém,
para os movimentos do artista, que observa o coiote e joga luvas e demais objetos em cima do
cobertor, criando um montículo. O animal pega a luva e a solta. O artista recolhe a luva e a
joga novamente, e o coiote a captura no ar. Eles repetem essa brincadeira algumas vezes.
Então o artista traz uma pilha de jornais e a coloca ao lado da vasilha de água. O coiote cheira
112
o jornal, puxa o papel e o rasga com as patas e os dentes. O artista coloca uma quantidade de
feno próxima à janela e se senta, de lado. O coiote se aproxima, olha a janela, olha para o
artista, que fala algo para o animal. O coiote então brinca com jornais espalhados em cima do
feno.
Por fim, o artista se levanta, se enrola no cobertor escondendo o corpo e o rosto como
no início, sai da sala, desce as escadas com a ajuda dos homens que o encontraram quando
chegou ao aeroporto e que o levaram até à galeria. Ele é deitado na maca, coberto pelo lençol
branco, colocado na ambulância e levado de volta ao Aeroporto Kennedy, onde pega um voo
de retorno à Alemanha.
Relendo a descrição feita a partir dos vídeos, pode-se chegar à conclusão que esta
performance foi de duração rápida, levando apenas algumas horas de um dia. Mas o que
ocorreu de fato foi a convivência do performer com o coiote, denominado Pequeno John, por
cinco dias (21 a 25 de maio de 1974), durante os quais Beuys levou exemplares diários do
Wall Street Journal, os quais foram rasgados e urinados pelo coiote (STACHELHAUS,
1991). Ele também utilizou uma lanterna, luvas e faixas de feltro e diariamente buscou se
aproximar do animal (STACHELHAUS, 1991). Após três dias os dois já haviam se
acostumado um ao outro; no fim, Beuys abraçou gentilmente o Pequeno John em sinal de
despedida, se enrolou no cobertor de feltro, entrou na ambulância e saiu dos Estados Unidos
sem ter visto nada do país, além do coiote (STACHELHAUS, 1991).
Outra questão que permanece com a observação dos vídeos, além do tempo de duração
da performance, é a razão para tais ações. Será que possuem algum significado? O artista não
fala com as pessoas durante a ação, interagindo apenas com o coiote. Pode-se imaginar que
este animal tem alguma importância para ele, que simboliza algo. É possível inferir uma
atitude ritualística nas ações de Beuys, quando ele se cobre e se inclina perante o coiote.
Sobre estes aspectos obscuros, Goldberg afirma, citando frases do artista, que “Coyote: I love
America and America Loves Me” refletiu “a história de perseguição aos índios norte-
americanos e ‘toda a relação entre os Estados Unidos e a Europa’” (GOLDBERG, 2007, p.
189). Para Tisdall (apud STACHELHAUS,1991), Beuys interpreta a perseguição do coiote
como um exemplo da tendência humana de projetar seu próprio senso de inferioridade nos
objetos ou minorias que odeia. O coiote é um animal importante para a cultura indígena,
considerado um deus; mas esses animais foram brutalmente perseguidos pelos homens
brancos quando chegaram aos Estados Unidos, que os consideravam pragas perigosas, mesmo
que eles não oferecessem nenhum perigo real (TISDALL apud STACHELHAUS, 1991).
Portanto, o coiote não foi escolhido pelo artista por puro acaso.
113
Figura 22 – Coyote: I Like America and America Likes Me, 1974, Joseph Beuys
Fonte: Joseph Beuys, Coyote, 1974, fotografado por Caroline Tisdall. © DACS 2018, foto © Caroline
Tisdall.
Figura 23 – Coyote: I Like America and America Likes Me (detalhe do programa),
1974, Joseph Beuys
Fonte: Joseph Beuys Coyote. ARTIST ROOMS Tate and National Galleries of Scotland ©DACS, 2019.
O que se deseja esclarecer é que, mesmo vendo uma performance ao vivo, o
espectador não tem todas as respostas. É preciso conversar com o performer (quando
possível), ler seus escritos, ver outros trabalhos semelhantes, ler a crítica. Assim como uma
pintura infere outros conhecimentos para que seja possível compreender as diferentes
camadas de informação que contém, as ações ao vivo também demandam um contexto que
vai além do apresentado naquele momento.
114
Figura 24 – Coyote: I Like America and America Likes Me (folder), 1974, Joseph
Beuys
Fonte: Site da Tate Gallery. ARTIST ROOMS Tate and National Galleries of Scotland ©DACS, 2019.
4.2 PERFORMANCES, HAPPENINGS, BODY ART E DOCUMENTOS
Os documentos e os registros são discretamente citados pelos estudiosos e críticos
abordados nesta seção ao definirem body art, performances e happenings. Jones aceita as
ações de registro para a body art, Kirby enfatiza o quanto os happenings são planejados,
Goldberg afirma que as performances podem seguir um roteiro e ser planejadas por meses,
Stiles assevera que performances podem ser completamente registradas e Glusberg (2013, p.
46) associa o sucesso da performance enquanto linguagem ao advento de tecnologias de
documentação (filme, fotografia etc.), que permitiram “um registro mais completo das
informações perceptivas emitidas pelo artista”. Cohen é o único que não faz referências
diretas, mas ainda assim utiliza o termo sketch, indicando que há alguma forma de controle,
115
de planejamento por parte do artista, atitudes que, em geral, sugerem o uso de algum tipo de
esboço, de escrita.
Porém, quando se lida com as ações em si, percebe-se o quanto a documentação está
presente. No happening de Allan Kaprow, veem-se cartas, papeis e demais formas de
registros utilizadas pelo artista para orientar o espectador. Os ensaios são fotografados. O
próprio evento é descrito por Michael Kirby e, sem essa descrição, a noção sobre o acontecido
seria bem restrita. Na body art realizada por Carolee Scheneeman, são utilizados um papel,
um livro, e a ação é registrada por fotografia do início ao fim. Também se tem acesso ao
programa que divulga a ação com foto e reprodução do texto lido pela artista. A performance
de Joseph Beuys também é registrada por fotografias e vídeos, além da existência do
programa descrevendo a performance e do folder divulgando a mesma. Os três artistas
utilizaram vários objetos que, sendo relacionados ao contexto, podem servir de evidência
sobre as ações realizadas.
É importante destacar que esses documentos não são as ações em si. Eles as
representam. E como explicado por Buckland (seção anterior), as representações são sempre
redutoras e limitadas. Apesar disso, considera-se que elas são essenciais para aqueles que não
estavam presentes no momento do evento e ainda assim desejam obter informações sobre o
mesmo.
116
5 HAPPENINGS, PERFORMANCES E BODY ART: MAPEAMENTO DAS
INSTITUIÇÕES E TRATAMENTO ARQUIVÍSTICO
Esta seção é referente à pesquisa empírica sobre o tratamento arquivístico aplicado
pelos museus aos documentos relacionados às performances, à body art e aos happenings. O
trabalho se dividiu em três fases, sendo a primeira relativa ao levantamento dos museus e de
instituições culturais que possuem em seus acervos arquivos de artistas que
praticam/praticaram essas manifestações artísticas e também que tenham recebido tais
manifestações. Esses museus e instituições estão localizados no Rio de Janeiro e Niterói,
cidades escolhidas pela localização e representatividade em termos culturais.
Após a identificação dos museus e instituições de interesse, realizada online, passou-se
à segunda fase da pesquisa, com as primeiras tentativas de contato efetivo através de e-mail e
ligação telefônica para marcação de visita, além de envio de questionário sobre a organização
dos documentos (para avaliação das perguntas e respostas pelos funcionários responsáveis),
objetivo da pesquisa e demais documentos solicitados. Durante as visitas, realizou-se
entrevista gravada em áudio e observação in loco.
Na terceira fase, a documentação reunida em consequência dessas visitas e da
aplicação do questionário foi analisada, a fim de se compreender como se dá o tratamento
arquivístico dos documentos relacionados a essas obras efêmeras e se a organicidade é
observada. A seguir, cada fase da pesquisa será descrita em maiores detalhes.
5.1 PRIMEIRA FASE: LEVANTAMENTO ONLINE DAS INSTITUIÇÕES CULTURAIS
DE INTERESSE
Após a definição do recorte geográfico, ou seja, a escolha das cidades do Rio de Janeiro
e de Niterói, foi dado início ao levantamento online das instituições culturais, ocorrido
durante janeiro, fevereiro, março e abril de 2019. Os resultados foram revisados em janeiro de
2020, após entendimento de que era preciso incluir outros critérios de seleção. A pesquisa
contemplou, a princípio, apenas as instituições culturais cuja tipologia ou temática do acervo
era referente às artes. Entretanto, compreendeu-se, ao longo da pesquisa teórica, que os
acervos audiovisuais eram essenciais para a pesquisa prática já que, como eventos, as ações
artísticas poderiam ter sido fotografadas e filmadas. Outra categoria de tipologia que foi
reavaliada após visitas aos primeiros museus foi acervo “Biblioteconômico”, pois se
constatou que, na falta de setor de arquivo ou ainda devido à tipologia dos documentos (em
especial vídeos), estes poderiam ser guardados e organizados pelas bibliotecas dos museus.
Por fim, instituições com acervos “Documental” e “Arquivístico” também foram
117
consideradas. Por esses e outros motivos, explicados adiante, a pesquisa foi refeita em janeiro
de 2020, aumentando assim o número de instituições contatadas.
Além dos museus, levou-se em consideração instituições denominadas memoriais,
centros culturais, casas e institutos. Buscou-se qualquer instituição que lidasse com arte e/ou
que houvesse recebido ações de happenings, body art ou performances ao vivo, partindo do
entendimento de que tais ações poderiam ter tido algum nível de registro.
5.1.1 Fontes utilizadas
Apesar de ter se sido realizada em grande parte em sites e plataformas, a primeira etapa
da pesquisa se deu através da consulta à publicação digital do MinC e do Ibram, o GMB, de
2011. O guia foi a primeira fonte encontrada sobre o assunto e, portanto, a primeira a ser
utilizada. Além do GMB, consultou-se a plataforma MuseusBr e o portal Museus do Rio. Tal
se fez necessário porque o guia foi publicado em 2011 e, provavelmente, apresentaria alguma
defasagem.
MuseusBr125
é uma plataforma nacional colaborativa de registro e pesquisa de museus
que faz parte da Rede Nacional de Identificação de Museus. Enquanto plataforma de registro,
o MuseusBr visa auxiliar o cumprimento da obrigatoriedade de registro dos museus,
conforme exigência estabelecida pelo Estatuto de Museus (lei 11.904/2009) e pelo decreto
8.124/2013, que o regulamenta.
O portal Museus do Rio,126
criado e administrado pelo grupo de pesquisa “Memória,
Cultura e Patrimônio” do Programa de Pós-Graduação em Memória Social da Universidade
Federal do Estado do Rio de Janeiro, é colaborativo, contando com a participação da
comunidade museológica, de pesquisadores, de instituições governamentais e não
governamentais, de entidades da sociedade civil e de professores, e utiliza as informações
prestadas pelos parceiros e obtidas em resultados de pesquisas.127
Com o objetivo de documentar os museus (documentação impressa, visual e
fotográfica), o portal Museus do Rio foi essencial à pesquisa desta dissertação, já que
complementou as informações que faltavam no GMB e no MuseusBr. Estas foram, portanto,
as principais fontes de informação da primeira etapa da pesquisa acerca das instituições de
125
Disponível em: http://museus.cultura.gov.br/busca/##(global:(enabled:(space:!t),filterEntity:space)). Acesso
em: 31 jan. 2020. 126
Disponível em: http://www.museusdorio.com.br/joomla/. Acesso em: 31 jan. 2020. 127
Disponível em: http://www.museusdorio.com.br/joomla/index.php?option=com_content&view=article&id=
61&Itemid=244 e http://www.museusdorio.com.br/joomla/index.php?option=com_content&view=article&id=
22&Itemid=22. Acesso em: 7 jan. 2020.
118
interesse, em especial no que se refere à denominação das mesmas (algumas alteraram os
nomes), às tipologias e temáticas do acervo, à natureza administrativa e à existência de acervo
arquivístico.
A fim de organizar os dados obtidos pela pesquisa nessas fontes, criou-se uma planilha
no Excel intitulada “Museus e demais instituições culturais no Rio de Janeiro e em Niterói”,
dividida segundo estas localidades e contendo onze campos: “museu”, “ano de criação”,
“tipologia do acervo”, “temática”, “situação do museu”, “natureza administrativa”,
“arquivo/acervo arquivístico”, “consulta ao acervo arquivístico”, “palavras-chaves de busca”,
“observações” e “fontes”. Alguns desses itens foram baseados nos utilizados pelo GMB, pela
plataforma MuseusBr e pelo Museus do Rio.
A princípio, a tipologia considerada de interesse para a presente pesquisa foi a de “Artes
Visuais”. Porém performances, happenings e body art não se enquadram nos exemplos dados
pelo GMB para essa tipologia (pinturas, esculturas, desenhos, gravuras, incluindo artes sacras
e aplicadas, como mobiliário, cristais, tapeçaria, porcelana e prataria).128
Uma das
consequências dessa restrição para a presente pesquisa foi a valorização da tipologia “Imagem
e Som” do GMB (documentos fotográficos, sonoros, filmográficos e videográficos), já que
registros fotográficos e fílmicos captam e tentam fixar momentos de eventos e
acontecimentos, entre os quais se encaixam as ações ao vivo. Duas outras categorias
consideradas importantes para a pesquisa são “Documental”, que abarca documentos
eletrônicos, manuscritos ou impressos em número reduzido e reunidos intencionalmente a
partir de um tema, de acordo com o guia, e “Arquivístico”, que é definida pelo GMB segundo
a visão clássica de arquivo: “conjunto de documentos acumulados por pessoas ou instituições,
públicas ou privadas, durante o exercício de suas atividades, independentemente do suporte”
(MIRANDA, 2011, p. 19-20).
5.1.2 Resultados da primeira fase da pesquisa
Os resultados obtidos nesta primeira fase da pesquisa foram os seguintes: 158
instituições culturais foram mapeadas na cidade do Rio de Janeiro, e quinze em Niterói,129
128
A ligação entre essas ações artísticas e os rituais pode ser considerada a partir da área da Antropologia,
contemplada pelo GMB e pela plataforma MuseusBr. No entanto, tal posição não foi tomada nesta dissertação. 129
A mesma busca foi realizada na plataforma MuseusBr em 31 de janeiro de 2020 (após revisão da planilha),
obtendo resultados iguais para o município do Rio de Janeiro. Já para Niterói, a busca retornou quatorze museus
(mesma quantidade para verificados e não verificados): o Museu da Imprensa e o Museu de Indústria Naval não
foram recuperados nessa segunda busca; o Museu de Memes (virtual) foi acrescentado ao site em 4 de julho de
2019, por isso não apareceu na primeira busca. Por ser tratar de um webmuseu, o Museu de Memes não foi
incluído nesta pesquisa.
119
totalizando 173 instituições (a partir das fontes plataforma MuseusBr – utilizando o filtro
“verificados”, GMB e Museus do Rio). Destas, o número das que apresentou tipologia
referente apenas às artes visuais foi de 59 no Rio de Janeiro e cinco em Niterói, somando 64
instituições. Com relação à temática “Artes, Arquitetura e Linguística”, foram encontradas 22
instituições no Rio de Janeiro e três em Niterói, totalizando 25. Cruzando os dados (para
evitar repetições), 62 instituições no Rio de Janeiro apresentaram acervos relacionados às
artes (tipologia e temática) e cinco instituições em Niterói, somando 67.
Após revisão da planilha em 2020 e ampliação dos critérios de pesquisa, das 158
instituições culturais localizadas no Rio de Janeiro, o total que apresentou “tipologia do
acervo” “Artes Visuais”, “Imagem e Som”, “Documental”, “Arquivístico” e/ou
“Biblioteconômico”/“Bibliográfico” foi de 76, e das quinze130
instituições em Niterói, sete,
somando 83 instituições. Do mesmo total, ou seja, 158 instituições culturais no Rio de Janeiro
e quinze em Niterói, 22 resultados foram obtidos para a temática “Artes, Arquitetura e
Linguística” (as três áreas foram unidas em uma categoria de temática) no Rio de Janeiro e
três em Niterói. Apenas esta categoria foi utilizada porque as demais não abarcavam produção
artística.
Cruzando as informações (para eliminar repetições), o total de museus e instituições
culturais com tipologia relacionada a “Artes”, “Artes Visuais”, “Imagem e Som” e/ou acervo
“Biblioteconômico”/“Bibliográfico” e temática “Artes, Arquitetura” e “Linguística” para o
Rio de Janeiro foi 79, e para Niterói, sete, ou seja, 86 ao todo.
Posteriormente a essa primeira seleção, viu-se que era necessário ter mais informações
acerca desses acervos. Por isso empreendeu-se pesquisa online no portal Museus do Rio, nos
sites das instituições e no Google, associando o nome destas ao termo “acervo” a fim de obter
um maior detalhamento sobre os tipos de documentos131
presentes nas instituições. É
importante esclarecer que não foram todas as 173 instituições que passaram por esse filtro,
apenas aquelas em que essa informação não foi facilmente encontrada. A partir dessa pesquisa
outras descobertas foram realizadas, como museus e instituições que haviam sido
permanentemente fechados, reabertos, fechados temporariamente para reformas, redefinidos
(museu presencial transformado em museu virtual) e fechados para visitação, porém abertos a
130
Apesar da mudança no número de instituições culturais em Niterói (conforme explicado na nota anterior),
mantiveram-se os números encontrados na primeira pesquisa, porque que os museus já haviam sido pesquisados
no que concerne ao acervo, com exceção do Museu de Memes, que não se enquadrou nos critérios para a
pesquisa. 131
Com e sem aspas tanto nos nomes da instituição cultural (pois algumas alteraram a denominação) quanto na
palavra “acervo”, em diversas combinações, e ainda associando aos termos “rj” quando se percebia que a
denominação era a mesma utilizada por instituições culturais presentes em outros Estados e ao termo “2019”,
quando havia dúvida sobre a “situação do museu” (se a instituição estava aberta ou fechada).
120
pesquisadores. Tais informações permitiram que a planilha “Museus e demais instituições
culturais no Rio de Janeiro e em Niterói” fosse atualizada.
A próxima ação, antes de entrar em contato com as instituições culturais, foi realizar
nova pesquisa no Google para saber quais dentre as 173 instituições possuíam documentos
relacionados a performances, body art e happenings e/ou quais teriam recebido essas ações
artísticas em seus espaços expositivos. Antes da revisão e acréscimo de outros critérios, em
2019, o número de instituições selecionadas baseadas na “tipologia do acervo” era pequeno, e
o contato se efetivou com apenas três museus: Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro
(MAM Rio), Museu de Arte Contemporânea de Niterói (MAC Niterói) e Museu de Arte do
Rio (MAR). Após a inserção de outras tipologias de acervo durante a revisão da planilha em
janeiro de 2020, esse número aumentou. Porém, compreendeu-se que a limitação atrelada ao
tipo de acervo impediria que outros espaços culturais cuja “tipologia do acervo” não se
relacionasse diretamente às escolhidas fossem ignorados, perdendo-se, assim, locais que
teriam recebido happenings, performances e body art e, em consequência, os tipos de
documentos armazenados por eles e a forma de organização empreendida.
Diante desta percepção, optou-se por pesquisar todas as instituições encontradas a partir
do GMB, da plataforma MuseusBr e do portal Museus do Rio, inclusive as que não possuíam
acervo com tipologia e temática relacionadas à “Artes”, “Artes Visuais”, “Imagem e Som”,
“Documental”, “Arquivístico” e “Biblioteconômico”/“Bibliográfico”. Do total de 173
instituições culturais mapeadas nas fontes citadas, 166 foram incluídas na pesquisa online
tendo seus nomes associados à palavra performance,132
com exceção de duas instituições
extintas (Centro de Memória da Universidade Gama Filho e Museu dos Teatros), de duas
instituições em implantação (Centro de Memória do Sindimetal e Museu do Cinema
Brasileiro) e de dois museus virtuais (Museu Virtual de Instrumentos Musicais e Museu
Virtual da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro). O Museu
Nacional também não foi incluído na pesquisa devido ao incêndio ocorrido em dois de
setembro de 2018, que devastou boa parte de seu acervo e prédio. O Museu da Indústria
Naval, situado em Niterói, aparece como “em implantação”, mas pesquisas na internet
retornaram depoimentos de usuários do site TripAdvisor relatando que haviam visitado o
132
Com e sem aspas tanto nos nomes da instituição cultural (pois algumas alteraram a denominação) quanto na
palavra “performance”, em diversas combinações. Em alguns casos, as pesquisas incluíram mais palavras-chave,
como o Museu Villa-Lobos que foi associado à expressão “performance artística”, numa tentativa de diferenciar
as performances de interesse para a pesquisa das performances musicais, e o Parque Nacional da Tijuca, que foi
ligado aos termos “djs manata laudares, the place “parque nacional da tijuca’”, com o objetivo de tentar
encontrar mais informações sobre uma suposta performance ocorrida no local com o apoio do Parque Lage, não
se obtendo, no entanto, confirmação.
121
museu. Por isso buscou-se, sem sucesso, informações sobre o acervo ou performances
ocorridas no local.
Assim, o total de instituições localizadas no Rio de Janeiro que foram pesquisadas no
Google em relação a performances foi de 152, e em Niterói, quatorze. As instituições
culturais não pesquisadas no Rio de Janeiro foram as já citadas Centro de Memória da
Universidade Gama Filho, Museu dos Teatros, Centro de Memória do Sindimetal, Museu
Virtual de Instrumentos Musicais, Museu Virtual da Faculdade de Medicina da Universidade
Federal do Rio de Janeiro e o Museu Nacional. As instituições não associadas à performance
na busca do Google para o município de Niterói foram o Museu do Cinema Brasileiro e o
Museu dos Memes (ver notas de rodapé n. 129 e 130). A soma dos museus e instituições
culturais que foram pesquisados para se descobrir se tinham recebido performances em seus
espaços expositivos é de 166.
Após a pesquisa no Google com a palavra-chave performance, 35 instituições foram
mapeadas no Rio de Janeiro e duas em Niterói, totalizando 37.133
Com relação a essa palavra-
chave, é importante relembrar que ela não se refere a qualquer performance, mas apenas
àquelas que foram contempladas na quarta seção, ou seja, performance art (arte da
performance). Portanto, não foram levadas em consideração performances puramente teatrais,
ou circenses, ou religiosas, ou culturais.
Segue um quadro comparativo das pesquisas práticas realizadas em janeiro, fevereiro,
março e abril de 2019 e janeiro de 2020 para auxiliar a compreensão e compilação dos
números citados nesta seção:
133
A lista de todas as instituições identificadas pelo GMB, MuseusBr e Museus do Rio que teriam recebido
performances, segundo pesquisa online, encontra-se no apêndice A.
122
Quadro 2 – Resumo dos Resultados da Primeira Fase da Pesquisa
Pesquisas realizadas em 2019 Pesquisadas realizadas em 2020
Quantidade de instituições nos municípios Rio de Janeiro e Niterói
Critérios Total: Critérios Total:
Todas as instituições não
extintas encontradas em GMB,
MuseusBr e Museus do Rio
Rio: 158 Todas as instituições não extintas
encontradas em GMB, MuseusBr
e Museus do Rio
Rio: 158
Niterói: 15 Niterói: 14
Total: 173 Total: 172
Quantidade de instituições com acervo
relacionado à arte
Quantidade de instituições com acervo
relacionado a artes, audiovisual e documental
Todas as instituições do critério
acima com tipologia do acervo:
artes, artes visuais
Rio: 59 Tipologia do acervo: artes, artes
visuais e/ou imagem e som,
documental, arquivístico,
biblioteconômico/bibliográfico
Rio: 76
Niterói: 5 Niterói: 7
Total: 64 Total: 83
Todas as instituições do
primeiro critério com temática
artes, arquitetura e linguística
Rio: 22 Todas as instituições com as
tipologias acima, mais a temática
artes, arquitetura e linguística
Rio: 79
Niterói: 3 Niterói: 7
Total: 25 Total: 86
Quantidade total de instituições com acervo
relacionado à arte
Quantidade de instituições alvo da pesquisa
sobre performance
Tipologia do acervo: artes, artes
visuais e/ou temática: artes,
arquitetura e linguística
Rio: 62 Instituições não extintas
encontradas no GMB, no
MuseusBr e no Museus do Rio
Rio: 152
Niterói: 5 Niterói: 14
Total: 67 Total: 166
Total de instituições que, pela pesquisa online, receberam performances
Rio de Janeiro: 35 Niterói: 2 Total: 37 Fonte: Autoria própria.
5.2 SEGUNDA FASE: PRIMEIROS CONTATOS, PESQUISAS EM 2019 E 2020
A segunda fase da pesquisa se iniciou a partir das primeiras tentativas de contato com as
instituições culturais selecionadas. Os e-mails iniciais enviados em 2019 tiveram o objetivo
de confirmar se, de fato, estas instituições haviam recebido performances, body art e
happenings e/ou possuíam documentos relacionados e/ou arquivos pessoais de artistas que
trabalharam com essas linguagens. A mensagem enviada para os endereços disponíveis nas
páginas das instituições, na plataforma MuseusBr, no portal Museus do Rio e na própria
internet era sucinta, com informações de apresentação da pesquisa e pergunta sobre os
arquivos e documentos pertinentes. No entanto, após as primeiras respostas, viu-se a
necessidade de agregar mais informações, como os nomes dos eventos associados às ações
artísticas supostamente realizadas nas instituições, os nomes dos performers e os dias em que
as performances ocorreram.
5.2.1 Contatos realizados em 2019
Quatorze instituições com tipologia e temática “Artes” e “Artes Visuais” foram
contatadas no Rio de Janeiro em 2019: Centro Cultural Banco do Brasil Rio de Janeiro
(CCBB Rio), Museu Casa de Benjamin Constant (MCBC/Ibram), Solar Grandjean de
123
Montigny – Museu Universitário da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (Solar
Grandjean de Montigny), Museu de Imagens do Inconsciente (MII), Museu da República
(MR), Museu Bispo do Rosário de Arte Contemporânea (MBRAC), Museu Nacional de Belas
Artes (MNBA), MAM Rio, MAR, Museu da História e da Cultura Afro-brasileira
(MUHCAB), Fundação Eva Klabin Rapaport, Centro Cultural Correios Rio de Janeiro,
Museus Raymundo Ottoni de Castro Maya - Museu do Açude (Museu do Açude) e Centro
Municipal de Arte Hélio Oiticica (CMAHO).
Porém, duas instituições fora desse escopo foram consideradas, aumentando o número
de instituições para dezesseis: o Instituto Moreira Salles (IMS Rio), que não possui indicação
de tipologia de acervo e temática nas fontes pesquisadas e o Museu do Amanhã, cuja tipologia
e temática não se referem à arte (e nem às posteriores categorias de interesse: “Imagem e
Som”, “Documental”, “Arquivístico”, “Biblioteconômico/Bibliográfico”). Estas instituições
foram escolhidas: por constarem nas fontes de pesquisa (IMS Rio – GMB e Museus do Rio;
Museu do Amanhã – MuseusBr e GMB, descrita como “em implantação”); pelo IMS Rio ser
uma instituição sabidamente voltada para as artes; e pelo Museu do Amanhã ser uma
instituição nova, recém aberta ao público, supondo-se que por isso poderia ter recebido
performances, o que de fato ocorreu em 2016 e 2017.134
Das dezesseis instituições contatadas,135
apenas três foram visitadas: MAM Rio, MAC
Niterói e MAR. Cinco instituições não responderam: IMS Rio, o MBRAC, a Fundação Eva
Klabin Rapaport, o Centro Cultural Correios e o Museu do Açude. Das onze que retornaram,
o MNBA afirmou não possuir material de interesse no acervo. O Museu do Amanhã explicou
que o sistema de documentação/arquivo institucional estava sendo reconfigurado e por isso
não poderia atender à solicitação. O MII afirmou que as ações artísticas mencionadas no e-
mail não eram realizadas ali, mas que o Espaço Travessias, atrelado ao Museu, realizava
atividades com o corpo. Entrou-se, então, em contato com o e-mail indicado para o Espaço
Travessias em março de 2019, sem sucesso.
O MUHCAB explicou que o museu não costuma receber esse tipo de ação artística e
sugeriu entrar em contato com o produtor do evento citado (neste e-mail já se mencionou uma
performance que teria ocorrido no local). No entanto, entendeu-se que o produtor não tinha
ligação profissional com a Instituição. O CMAHO encaminhou as mensagens para o setor de
134
Performance “Aqui” (Here), de Stephanie Burgess, julho de 2016. Performance “Bombril” de Priscila
Rezende, durante a programação “Vivências do Tempo - Matriz Africana”, junho de 2017. Disponível em:
https://issuu.com/museudoamanha/docs/221207_museuamanha_livro_web. Acesso em: 24 jan. 2019. 135
No que se refere ao número de instituições abordadas, o Solar do Jambeiro e a Fundação Casa de Rui
Barbosa, apesar de se enquadrarem como instituição-alvo da pesquisa, não foram contatadas em 2019, o que foi
feito em janeiro de 2020.
124
pesquisa, o qual não respondeu. O MR (setores de arquivo e galeria) retornou na mesma
semana, a partir de e-mail enviado pela curadora. Ela explicou que a Galeria do Lago (galeria
de arte contemporânea do MR) havia recebido um evento de performance em 2006 que foi
documentado. E-mails foram trocados, mas quando se tentou agendar a visita não houve
resposta.
As instituições Solar Grandjean de Montigny, CCBB Rio e MCBC/Ibram enviaram
links para pesquisa à distância. No caso de identificação de documentos de interesse, seria
possível marcar uma visita. O Solar Grandjean de Montigny, além do link, enviou nomes de
eventos de performance que aconteceram na instituição. Com relação ao CCBB Rio, o link
disponibilizado deu acesso a uma planilha excel com eventos realizados entre 1989 e 2019,
listados em ordem cronológica, contendo as categorias “teatro”, “música” e “ideias”.
Pesquisando em cada aba, não foi possível encontrar citação direta a performances, body art e
happenings. Já o link compartilhado pelo MCBC/Ibram não funcionou.
Empreendendo-se as primeiras visitas aos museus cujo agendamento se deu em 2019,
como o MAR, o MAM Rio e o MAC Niterói, tentativas de contato com os demais museus
foram interrompidas.
5.2.2 Contatos realizados em 2020
Em janeiro de 2020, após incluir os critérios já citados anteriormente, acrescentaram-se
à pesquisa dezoito instituições localizadas no Rio: Museu Histórico Nacional (MHN), Museu
da Maré, Museu Histórico do Exército e Forte de Copacabana (MHExFC), Centro Cultural
Municipal Oduvaldo Vianna Filho – Castelinho do Flamengo (Castelinho), Museu de Favela,
Fundação Planetário da Cidade do Rio de Janeiro – Planetário da Gávea (Planetário da
Gávea), Centro Cultural Light (CCL), Museu da Justiça – Centro Cultural do Poder Judiciário
(CCMJ), Memorial Municipal Getúlio Vargas (MMGV), Casa de Cultura Laura Alvim
(CCLA), Casa da Marquesa de Santos – Museu da Moda Brasileira (Casa da Marquesa), Paço
Imperial – Centro Cultural do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
IPHAN/MinC (Paço Imperial), Fundação Casa França Brasil, Instituto de Pesquisa e Memória
Pretos Novos (IPN), Centro Cultural Municipal Parque das Ruínas (Parque das Ruínas),
Centro Cultural Municipal Laurinda Santos Lobo, Observatório do Valongo e Caixa Cultural
Rio de Janeiro.136
136
O Museu das Comunicações e Humanidades (MUSEHUM), apesar de ter tipologia de acervo “Imagem e
Som”, não foi abordado na pesquisa sobre performance porque estas ocorreram em outro espaço cultural da Oi, o
Oi Futuro de Ipanema, que foi fechado e agora abriga um espaço de empreendedorismo da empresa de
125
Além destas, a Fundação Casa de Rui Barbosa (FCRB), pesquisada sobre performance
em 2019 foi contatada pela primeira vez em 2020, e pela segunda vez o foram o IMS Rio, o
MII, o MBRAC, a Fundação Eva Klabin Rapaport, o Centro Cultural Correios, o Museus
Raymundo Ottoni de Castro Maya – Museu do Açude (Museu do Açude), o MNBA, o MR, o
CMAHO, o CCBB Rio, o Solar de Grandjean de Montigny – PUC Rio e o MCBC/Ibram.
Deste total conseguiu-se agendar visita com o MHN, o MR e o CCL. O CCBB Rio
retornou, mas não foi possível marcar visita em tempo hábil para a pesquisa. Além desta, as
outras instituições também foram desconsideradas, seja por não retornarem contatos
posteriores, seja por afirmarem não possuir acervo de interesse ou ainda por não poderem
prestar atendimento (reformas, mudanças de sede, acervo em organização). Com o MHExFC
e o Observatório do Valongo não se conseguiu comunicação.
5.2.3 Resultados da segunda fase da pesquisa
Na pesquisa realizada em 2019, foram encontradas dezessete instituições no Rio de
Janeiro e duas em Niterói que teriam recebido performances, ou seja, dezenove instituições ao
todo. Destas, dezesseis foram contatadas no Rio e uma em Niterói. Em janeiro de 2020,
dezoito instituições foram localizadas no Rio, sendo que em Niterói não se encontraram novas
instituições, mantendo-se, assim, o número em dezoito. O total de instituições no Rio de
Janeiro somando os dois anos de pesquisa foi, portanto, 35 e em Niterói, dois, resultando em
37 locais onde performances teriam ocorrido. O número de instituições abordadas em 2020
foi de 31 no Rio e uma em Niterói, totalizando 32. Nesta soma estão incluídas tanto
instituições contatadas pela primeira vez (as novas, pós-ampliação dos critérios, as que
deveriam ter sido abordadas em 2019 e as cujo contato em 2019 deveria ter continuado)
quanto aquelas que não retornaram o contato no ano anterior.
Das dezessete instituições contatadas em Niterói e no Rio durante o ano de 2019, onze
responderam e cinco não deram retorno. Deste total, quatorze instituições foram
desconsideradas no Rio: CMAHO, MCBC/Ibram, IMS Rio, Solar Grandjean, MII (Espaço
Travessias), MBRAC, MNBA, Centro Cultural Correios Rio de Janeiro, Museu do Açude,
Fundação Eva Klabin Rapaport, CCBB Rio, MUHCAB, Museu do Amanhã e MR, tanto por
não terem dado continuidade ao contato iniciado, quanto por não se ter conseguido nenhum
retorno. Em Niterói, nenhuma foi descartada nesse ano.
telecomunicações. Essas informações podem ser encontradas em: http://qa.6d.com.br/oifuturosite/wp-
content/uploads/2012/07/exposiCAo_do_artista_lUcio_agra_no_oi_futuro_faz_homenagem_ao_filme.pdf e
https://oifuturo.org.br/evento/mais-performance/. Acesso em: 14 jan. 2020; e em: https://www.oito.net.br/.
Acesso em: 20 fev. 2020.
126
Em 2020, das 32 instituições abordadas, 28 retornaram o contato no Rio e uma em
Niterói. Destas, 25 foram desconsideradas no Rio: CMAHO, MCBC/Ibram, IMS Rio, Solar
Grandjean, MII (Espaço Travessias), MBRAC, Centro Cultural Correios Rio de Janeiro,
Museu do Açude, Fundação Eva Klabin Rapaport, FCRB, IPN, CCBB Rio, CCMJ, MMGV,
CCLA, Paço Imperial, Castelinho, Centro Cultural Municipal Laurinda Santos Lobo, Caixa
Cultural Rio de Janeiro, Museu da Maré, Museu de Favela, Planetário da Gávea, Casa da
Marquesa de Santos, Fundação Casa França Brasil e Parque das Ruínas. Em Niterói, o Solar
do Jambeiro foi desconsiderado. As razões para a eliminação de todas essas instituições
foram: afirmação de que não possuíam acervo pertinente, descontinuidade do contato inicial
pelas mesmas e falta de resposta em tempo hábil para a pesquisa.137
As três instituições que
não retornaram no Rio (Observatório do Valongo e o MHExFC em 2019 e 2020, e o MNBA
em 2020),138
foram desconsiderados pela impossibilidade de contato (não se conseguiu
comunicação nem por telefone nem por e-mail). O total de instituições desconsideradas foi de
29. As instituições consideradas em 2020 foram três: o MR, o MHN e o CCL.
As instituições que possibilitaram visita e onde foi possível realizar as entrevistas
gravadas em áudio e ter acesso a alguns documentos em 2019 e 2020 foram cinco no Rio de
Janeiro e uma em Niterói. No Rio visitou-se o MAR, o MAM Rio, o CCL, o MHN e o MR.
Em Niterói a instituição visitada foi o MAC.
Na próxima página, segue quadro com compilação dos dados apresentados sobre a
segunda fase da pesquisa:
137
Ao abrir o link enviado pelo CCBB em 2019 pela primeira vez, apenas as abas “teatro”, “música” e “ideias”
estavam visíveis. Da segunda vez, em 2020, notou-se uma pequena seta ao lado da aba “teatro”. Ao acioná-la,
apareceram as abas “exposição” e “cinema”. Por isso o Centro só foi novamente contatado em 2020. Apesar
disso, não se conseguiu agendar visita a tempo e por isso o CCBB foi desconsiderado. 138
Insistiu-se nesse contato porque o MNBA possui uma coleção denominada “Novas Linguagens” (Disponível
em: https://mnba.gov.br/portal/colecoes/novas-linguagens. Acesso em: 14 fev. 2020), voltada para a arte
contemporânea, que incorpora performances. Já que tal coleção existe, inferiu-se que deveria haver documentos
de arquivo relacionados. Procurou-se contato do arquivo institucional no site do museu, sem sucesso e contato
com outros setores do Museu, também sem sucesso. Por isso o MNBA foi desconsiderado da pesquisa.
127
Quadro 3 – Resumo dos Resultados da Segunda Fase da Pesquisa Pesquisas realizadas em 2019 Pesquisadas realizadas em 2020
Quantidade de instituições em que supostamente ocorreram performances nos municípios do Rio de
Janeiro e Niterói
Critérios Total: Critérios Total:
Todas as instituições com tipologia e
temática relacionadas a “artes” e “artes
visuais”
Rio: 15 Todas as instituições,
independente da tipologia
e temática de acervo
Rio: 15
Niterói: 2 Niterói: 0
Total: 17 Total: 15
Todas as instituições sem tipologia e
temática
Rio: 1
Todas as instituições sem
tipologia e temática
Rio: 3 Niterói: 0
Total: 1 Niterói: 0
Todas as instituições sem tipologia e
temática relacionada a artes, artes visuais,
imagem e som, documental, arquivístico,
biblioteconômico/bibliográfico
Rio: 1
Niterói: 0 Total: 3 Total: 1
Total de instituições que receberam
performance 19
Total de instituições que
receberam performance 18
Total de Instituições que supostamente receberam performance
Rio de Janeiro: 35 Niterói: 2 Total: 37
Quantidade de instituições contatadas sobre performance no Rio de Janeiro e em Niterói
Tipologia e temática relacionadas a artes
e artes visuais; sem tipologia e temática
relacionadas a artes e artes visuais; sem
tipologia e temática
Rio: 16
Todas as instituições, com ou
sem tipologia e temática
Rio: 31
Niterói: 1 Niterói: 1
Total: 17 Total: 32
Instituições que responderam e-mail
e/ou telefone
Rio: 11 Instituições que responderam
e-mail e/ou telefone
Rio: 28
Niterói: 1 Niterói: 1
Total: 12 Total: 29
Instituições que não responderam
Rio: 5 Instituições que não
responderam
Rio: 3
Niterói: 0 Niterói: 0
Total: 5 Total: 3
Instituições que foram desconsideradas
Rio: 14 Instituições que foram
desconsideradas
Rio: 28
Niterói: 0 Niterói: 1
Total: 14 Total: 29
Total de instituições desconsideradas
Rio de Janeiro: 28 Niterói: 1 Total: 29
Total de instituições consideradas e visitadas
Rio de Janeiro: 5 Niterói: 1 Total: 6 Fonte: Autoria própria.
5.3 TERCEIRA FASE: VISITAS ÀS INSTITUIÇÕES SELECIONADAS
Durante 2019, enquanto as instituições ainda estavam sendo contatadas, decidiu-se por
começar a visitar aquelas que aceitassem agendamento. Nesse ano, as entrevistas se
realizaram no MAM Rio, no MAC Niterói e no MAR, em julho e agosto. Em 2020, outras
três instituições foram agendadas e visitadas: o CCL, o MHN e o MR, todas em fevereiro.
O objetivo das visitas foi conhecer as instituições e tentar entender como se dá o
tratamento dos documentos de arquivo em geral e, mais especificamente, daqueles
128
relacionados a body art, performances e happenings. Quando foi possível, obtiveram-se
também informações sobre o tratamento museológico e biblioteconômico dado aos acervos, já
que alguns documentos, por sua tipologia (vídeos, materiais de divulgação etc.) ou mesmo
pela falta de um profissional arquivista, eram mantidos e organizados por essas áreas.
Apesar da importância inerente dos documentos, maior ênfase foi dada ao profissional
responsável pela organização dos mesmos. Isso se explica pois o objetivo geral da pesquisa
era analisar o tratamento arquivístico (e, na falta deste, qualquer tratamento dado, conforme se
percebeu ao longo das visitas), escolhendo-se o profissional como fonte principal e demais
instrumentos (tabelas de temporalidade, planos de classificação/quadro de arranjo, inventários
etc.), incluindo a própria documentação sobre body art, performances e happenings, como
fontes auxiliares. As entrevistas semiestruturadas gravadas em áudio foram, portanto, o foco
da análise. Assim, todas as informações prestadas são baseadas nos depoimentos dos
informantes. Quando fonte diferente for utilizada, tal será indicado.
Como a abordagem da entrevista é semiestruturada, aplicou-se um questionário,
porém perguntas foram acrescentadas conforme oportunidade oferecida e surgimento de
dúvidas. A ordem das questões também foi alterada segundo o direcionamento da entrevista.
Os nomes dos entrevistados estão presentes nos áudios, mas foram substituídos neste texto
por letras representando os cargos ocupados nas instituições (MS – museólogo, BBT –
bibliotecário, ARQ – arquivista, CPD – curador de pesquisa e documentação, HST –
historiador). Quando os cargos se repetiram em mais de uma instituição, foi acrescentado um
número para diferenciar os profissionais (MS1, MS2, MS3 e MS4). Demais nomes citados
durante as entrevistas foram omitidos (com exceção dos nomes de artistas cujas obras
pertencem às coleções das instituições ou a coleções custodiadas por estas através de
comodato, nomes de doadores já conhecidos e divulgados pelos meios de comunicação em
geral e os das próprias instituições, nomes de arquitetos que projetaram as sedes das
instituições, de personalidades políticas ligadas a elas e de colecionadores).
É importante esclarecer que entrevistas, assim como outros tipos de abordagem,
possuem limitações, como dificuldades de comunicação, incompreensão dos entrevistados
com relação às perguntas, influência do entrevistador sobre os entrevistados, pré-julgamentos
e subjetivismos do entrevistador e dos entrevistados, e ainda omissão de algumas informações
por parte do entrevistado devido a preocupações sobre sua identidade e questões internas das
instituições em que trabalham (MARCONI; LAKATOS, 2003). Existe ainda a questão do
período, pois os dados das entrevistas se referem à data em que foram realizadas, podendo ter
havido mudanças.
129
O questionário139
que embasou as entrevistas semiestruturadas abrange os seguintes
pontos acerca das instituições culturais: 1) existência de setor ou departamento responsável
pela organização de documentos; 2) em caso afirmativo, existência de arquivo corrente e/ou
histórico; 3) na presença destes, como são organizados os documentos e existência de
instrumentos de classificação e pesquisa (o que acabou se aplicando também à organização de
documentos na ausência de setor de arquivo corrente e/ou histórico); 4) custódia de arquivos
pessoais de artistas e de outras instituições e documentos, tipos destes e local de guarda; 5)
existência de documentos referentes a performances, body art e happenings (esboços, projetos
de artistas, e-mails, contratos, fotografias etc.); 6) registros dessas ações artísticas (catálogos,
cartazes e demais materiais de divulgação), tipos e setor onde se encontram; 7) existência de
arquivos de artistas do happening, da body art e da performance e organização dos mesmos;
8) associação evidente entre documentação arquivística e museológica de um mesmo
artista/obra; 9) utilização de vestígios das ações artísticas citadas.
5.3.1 Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM Rio)
O MAM Rio é uma associação privada, criada em 1948. Seu acervo museológico é
formado pela Coleção Museu de Arte Moderna, que contém cerca de 6.600 obras de arte
moderna e contemporânea de artistas nacionais e internacionais. O MAM Rio abriga ainda,
em comodato, quantidade semelhante de obras pertencentes à Coleção Gilberto Chateaubriand
e 1.800 fotografias da Coleção Joaquim Paiva. O acervo arquivístico do museu possui
aproximadamente 220.000 documentos (manuscritos, cartazes, fotografias e impressos) sobre
os artistas das coleções, as exposições realizadas no local e a construção da sede no Parque do
Flamengo. O acervo bibliográfico é composto por 618 títulos de periódico e cerca de 31.500
publicações, entre monografias, catálogos de exposições, obras de referência e livros.
A respeito da sua organização administrativa, a direção do museu é composta pelos
seguintes órgãos associativos: Assembleia Geral, Conselho de Administração, Diretoria,
Conselho Consultivo, Conselho Fiscal, Comitê de Investimentos e Comissão de Acervo.140
A
equipe do museu é formada pelos setores de Artes Visuais, Cinemateca, Pesquisa e
Documentação, Design, Educação, Museologia e Montagem, Produção e Salão de
Exposições, Sócios e Parceiros, Comunicação, Assessoria de Imprensa, Administração e
Finanças, Operações e Eventos, Recepção, e Segurança. O setor de Pesquisa e Documentação,
139
O roteiro de questionário pode ser visto no apêndice B. 140
O Estatuto do MAM Rio pode ser conferido em sua página na internet. Disponível em: https://www.mam.rio/
estatuto/. Acesso em: 22 fev. 2020.
130
também chamado de Curadoria, atende ao pesquisador que procura informações sobre artes
visuais, e engloba o Arquivo e a Biblioteca. A Cinemateca atende aos pesquisadores de
cinema.
O MAM Rio foi visitado em oito de março de 2019. O e-mail enviado em 21 de janeiro
ao setor de Atendimento foi bem sucinto e não citava o questionário e o interesse em
entrevistar os profissionais responsáveis pela organização da documentação, sendo mais
voltado à existência de material pertinente e aos procedimentos de pesquisa. Conforme
orientado pelo setor em 22 de janeiro, a mensagem foi direcionada no mesmo dia ao setor de
Documentação. Sem resposta, ligou-se para a Instituição, conseguindo-se agendar visita em
março.
Nesta visita não houve entrevista gravada em áudio, apenas conversa informal com uma
integrante do setor de Pesquisa e Documentação, em que se fizeram anotações e se teve
acesso aos documentos, instrumentos de pesquisa e listas impressas a partir do banco de
dados da Instituição. Por esse motivo, em 23 de julho marcou-se outro agendamento,
conseguindo-se conversar com a museóloga e a curadora de Pesquisa e Documentação. O
arquivista não participou porque estava de férias, conforme explicado pelas profissionais.
Em oito de março, por conversa informal e observação dos materiais, foram obtidos os
seguintes dados confirmados posteriormente na entrevista gravada em áudio e também pelas
listas de documentos141
relativos a performances custodiados/produzidos pela Instituição, e
sobre a organização dos documentos em geral: não há um fundo institucional, os documentos
são separados por séries e então divididos em institucionais (produzidos pelo museu) e
colecionáveis, dentro de dossiês; há um inventário142
que apresenta informações sobre dossiês
de seis séries – “Cursos”, “Eventos”, “Dança”, “Música”, “Teatro” e “Visitas”; além destas,
identificou-se a existência de pelo menos mais uma série,143
chamada “Exposições”; as
performances de interesse ocorridas na Instituição estão registradas em um banco de dados,
com documentos relacionados presentes nas séries “Eventos” e “Exposições”; alguns dos
documentos presentes nos dossiês referentes às performances são recortes de jornais e
periódicos, informativos, convites, comunicação interna e releases; a Instituição contrata um
fotógrafo para registrar os eventos e as exposições; a comunicação entre artistas e Instituição
se dá, usualmente, por e-mail; a Instituição possui um arquivo de artista, o Márcia-X (1959-
141
As partes consideradas principais das listas encontram-se no anexo. 142
Disponível em: https://www.mam.rio/wp-content/uploads/2019/06/trajetoria-%E2%80%93-cursos-e-eventos
_site.pdf. Acesso em: 22 fev. 2020. 143
Durante a entrevista semiestruturada com a museóloga e a curadora de Pesquisa e Documentação, foram
citadas mais duas séries: “Memória” e “Catálogos”.
131
2005), que foi doado já organizado; o fundo Márcia-X está classificado segundo as
performances, e os vestígios destas são guardados pela Museologia.
A respeito do fundo Márcia-X não se fizeram registros fotográficos, pois a organização
deste foi empreendida por um grupo externo contratado por projeto e não pela equipe da
Instituição. No entanto, foi possível observar e anotar os tipos de documentos presentes no
conjunto “04 – Performance: Pancake”, composto por duas pastas de polionda transparente
formato A4. O conteúdo dessas pastas é formado por materiais de divulgação da Instituição,
correspondências entre esta e a artista e fotografias da performance (com o nome do fotógrafo
responsável), que não estavam sequenciadas cronologicamente.
5.3.1.1 Dados obtidos sobre o MAM Rio através de entrevista semiestruturada
Em 23 de julho de 2019 houve nova visita ao MAM Rio e entrevista gravada em áudio
com a museóloga e com a curadora de Pesquisa e Documentação, com duração de
1h18min40s. De acordo com a curadora de pesquisa e documentação (CPD), a Instituição
possui setor de guarda e organização de documentos, mas não possui setor de arquivo corrente
nem permanente. Houve um projeto de criação de Arquivo Permanente, que teve como
consequência a produção de um manual de arquivo e de uma tabela de temporalidade. A
tabela de temporalidade foi aplicada pelos departamentos durante um período (a transferência
dos documentos não eliminados para o arquivo permanente era feita anualmente), não
havendo arquivo intermediário. Entretanto essas atividades e o projeto foram descontinuados
após a saída das arquivistas e, como consequência, gerou-se um acúmulo de documentos. Tal
situação já está sendo analisada pela Instituição, segundo CPD.
Acerca da organização dos documentos, CPD explicou que cada setor possui um modus
operandi distinto. A Cinemateca salvaguarda os documentos de imagem em movimento,
detendo tanto as obras (rolos de filmes) quanto os documentos relacionados. Mesmo os DVDs
de artistas, que para CPD conceitualmente deveriam permanecer com a curadoria de Artes
Visuais e, portanto, com a Pesquisa e Documentação, são guardados e disponibilizados pela
Cinemateca, pois esta possui aparelhos que permitem um melhor acesso ao pesquisador e
também oferece melhores condições de armazenamento do material audiovisual. A Pesquisa e
Documentação recebe os documentos, realizada a triagem e envia os audiovisuais para a
Cinemateca, atividade que, apesar de estabelecida e seguida, não se encontra registrada em
diretriz ou política institucional.
A curadoria de Artes Visuais divide-se em outras curadorias ou setores, que repartem os
documentos entre si (as obras e a concepção de exposições são responsabilidade do setor de
132
Museologia e os demais documentos, como catálogos, livros, folders, convites e clippings,
são guardados e organizados pelo Arquivo e pela Biblioteca, subordinados à Pesquisa e
Documentação). Os arquivos correntes são mantidos junto aos departamentos. Ainda segundo
CPD, o MAM Rio possui três tipos de documento pertinentes à pesquisa: o fundo Márcia-X,
os documentos produzidos e os documentos colecionados pela Instituição. Os dois últimos
tipos são incluídos nas séries, ou seja, uma pasta da série “Exposições” terá as divisórias
“Institucional” (que contém os documentos produzidos pelo MAM Rio a respeito da
exposição citada – folders, cartazes, convites etc.) e “Colecionáveis” (com os documentos
colecionados pelo MAM Rio sobre tal exposição – recortes de jornais e revistas, por
exemplo).
A Instituição possui também banco de dados museológico, que chega ao nível do item,
mas não apresenta imagem em miniatura (fichas catalográficas museológicas geralmente são
acompanhadas por uma foto em miniatura das obras). O acervo museológico é formado pela
coleção do museu e mais duas coleções privadas. Alguns vestígios de performances que
aparecem na lista de obras gerada a partir deste banco de dados são classificados segundo o
gênero performance, porém outros são apresentados como objetos. Tal classificação
dependerá, segundo a museóloga (MS1), da compreensão do catalogador e dos próprios
curadores, no que se refere às diferenças entre performances e happenings.
Outra dificuldade acerca de vestígios de performances é que o artista pode mudar de
opinião quanto à classificação dos mesmos. MS1 citou o exemplo de Artur Barrio (1945-),
cujas “Trouxas Ensanguentadas” (1970), cheias de carne, sangue, ossos fezes, cabelos e etc.,
foram expostas durante anos como peças autônomas na Instituição e as quais o artista
solicitou alterações, já que agora defendia que estes objetos não eram a obra, e sim a ação de
expô-las no museu e de abandoná-las depois nas ruas da cidade do Rio de Janeiro. De acordo
com MS1, Barrio passou então a fazer uma série de requisições, como a de que as trouxas
somente fossem expostas acompanhadas por documentação (mesmo tendo sido vendidas ao
colecionador como objetos). Ao serem perguntadas sobre como proceder diante deste tipo de
impasse, MS1 e CPD responderam que, no caso de Barrio, a obra pertence à Coleção Gilberto
Chateaubriand e, portanto, os acordos e ajustes devem ser realizados entre o responsável pela
coleção e o artista.
MS1 e CPD também destacaram a questão da temporalidade, que afeta a compreensão
e, portanto, a classificação da obra. Como exemplo foi citada uma ação realizada na
Instituição pelo artista Georges Mathieu (1921-2012) em 1959. Ele pintou um quadro na
frente do público, enquanto um grupo de dança nativa se apresentava. CPD e MS1
133
consideram que esta ação é um happening, mas como o produto final foi um quadro, a obra
está classificada como pintura. No entanto, é possível recuperar a ação pelo arquivo
fotográfico (apesar de nem todos os eventos terem sido registrados durante os anos de
existência da Instituição). Ao serem questionadas sobre a possibilidade de reclassificação
desta obra, MS1 e CPD explicaram que, neste caso, não se pretende mudar a classificação
dada anteriormente, pois o que permaneceu da obra foi a pintura e a performance pode ser
recuperada pelas fotografias (no caso de se buscar pelo nome do artista e não pelo gênero
performance ou happening, MS1 elucidou que o banco de dados não permite muitos
cruzamentos, assim não é possível associar ou subordinar um gênero a outro, como pintura e
performance ou pintura e happening). Assim, são classificadas como performances apenas as
ações artísticas que já foram pensadas dessa forma.
Ainda de acordo com MS1, demais informações sobre a ação artística a fim de definir se
esta é uma performance, um happening ou uma body art são, geralmente, feitas pelos
museólogos, que entram em contato com os artistas (quando é possível) e esclarecem as
dúvidas (os artistas às vezes mudam o conceito da obra). Curadores também podem ser
consultados para elucidação. Ademais, a equipe de Museologia discute os casos e procura
entrar em consenso. No que se refere à aquisição de acervo museológico para a Coleção
Museu de Arte Moderna, esta é realizada pela Comissão de Acervo, que consulta a
Museologia no caso de obras de grande porte ou altos custos de manutenção. A equipe da
Museologia tem acordos verbais a respeito de quais obras não devem ser aceitas. Não há
também documento escrito sobre formação de acervo, política de aquisição e diretriz de
desenvolvimento de coleção.
Outro banco de dados existente no MAM Rio é o arquivístico, cujo nível de descrição
chega a dossiê e não a item. A informação apresentada sobre os itens se refere à quantidade de
documentos nos dossiês (denominados segundo a espécie ou tipologia do documento que
acondicionam). Os instrumentos arquivísticos de classificação existentes, como supracitado,
são uma tabela de temporalidade e um manual de arquivo, ambos criados pela já citada equipe
contratada para centralizar os documentos e implantar o arquivo permanente na Instituição,
instrumentos que não são mais utilizados. Sobre os instrumentos de pesquisa, foram
identificados ao menos dois inventários: o já referido com as séries “Cursos”, “Eventos”,
“Dança”, “Música”, “Teatro” e “Visitas” e um de “Dossiês”, que não pode ser acessado pelo
público.
A respeito da organização de documentos bibliográficos, a biblioteca encontra-se
fechada desde 2002, pois neste ano a Instituição perdeu seu bibliotecário. Em 2009 contratou-
134
se nova profissional que, ao analisar o material, identificou diferentes métodos de
classificação aplicados ao longo do tempo e documentos sem tratamento. Diante desta
realidade, a bibliotecária optou por reclassificar todo o material, trabalho ainda em processo
devido ao grande volume. A biblioteca utiliza o software BNWeb (banco de dados) e já
catalogou e classificou por volta de dezesseis mil itens. Além desta organização, também foi
montada uma listagem em Excel que contém cerca de trinta mil itens. O propósito desta lista é
auxiliar os trabalhos da Pesquisa e Documentação, como permuta de livros e atendimento aos
pesquisadores (estes não possuem acesso direto ao Arquivo e à Biblioteca, o setor de Pesquisa
e Documentação faz a intermediação entre o pesquisador, esses setores e ainda com a
Museologia, através de funcionários graduados em História da Arte).
O MAM Rio, conforme citado anteriormente, possui um arquivo pessoal de artista, o
fundo Márcia-X, cujos vestígios são guardados pela Museologia, incluindo vídeos salvos em
um HD externo144
(o que já responde ao ponto 5 do questionário). Os demais documentos
foram enviados para o Arquivo e para Biblioteca, segundo a espécie e a tipologia. A
organização deste fundo foi feita por uma equipe contratada por meio de projeto realizado
com o apoio financeiro da Secretaria de Cultura do Estado. Ainda segundo CPD, no termo de
doação está especificado que a organização dada pela equipe não pode ser alterada segundo a
ordem empregada pelo museu, nem os documentos dissipados na coleção do mesmo,
respeitando-se, assim, a integridade do fundo.
Sobre a posse de documentos relacionados a performances, body art e happenings que
aconteceram na Instituição, CPD citou como exemplo a própria Márcia-X, cujo fundo possui,
recortes de jornais que serviram de referência para a artista na criação de obras e, inclusive, de
um folder de uma performance que a mesma realizou. Outro exemplo de performance145
que
ocorreu no MAM Rio e cujos documentos – convite e recorte de periódico – estão em dossiê,
é a ação artística “O Polvo”, do artista Michel Groisman (1972-), realizada em fevereiro de
2001, no evento “Ciclo de Performances”.
Com relação ao registro de ações artísticas, CPD afirmou que não existe uma política
específica para performances, body art e happenings, mas que a Instituição documenta as
exposições que ocorrem no local por meio de filmagem e fotografia. Chama-se um fotógrafo
que registra o espaço antes e após a chegada dos convidados no dia da vernissage. MS1
144
Segundo CPD, a Cinemateca migrou os vídeos em VHS para formatos compatíveis com computador e
salvaram tais formatos em um HD externo, que está na posse da Museologia. Com relação às fitas em formato
VHS, não houve consenso entre CPD e MS1 sobre onde estariam, se na Cinemateca ou na Museologia. 145
Estas informações referentes a performance “O Polvo” não foram retiradas da entrevista em áudio, mas da
lista de eventos impressa a partir do banco de dados do Arquivo, que pode ser vista no anexo.
135
confirmou a existência de registro, ressalvando que a filmagem não se volta especificamente
para ações artísticas realizadas na abertura da exposição e chamou a atenção para a existência
dos clippings (recortes de jornais com notícias sobre eventos) que também são fontes de
informação para o que acontece na Instituição. Outros documentos que registram eventos,
conforme explica CPD, são cartazes, catálogos e materiais de divulgação, cuja guarda
obedece a uma regra interna: dos que de fato foram encomendados e produzidos pelo MAM
Rio, dez exemplares são enviados para a Pesquisa e Documentação e destes, cinco são
guardados na série “Memória”, dois são destinados aos pesquisadores e três são reservados
para uso em projetos de captação de recursos que exijam comprovação das atividades do
Museu, por exemplo. O setor de Pesquisa e Documentação recebe ainda livros pretos de
assinatura de exposições de artes (os livros pretos de exposições de cinema são enviados para
a Cinemateca). Folders e convites vão para o dossiê “Expositivos” e o catálogo vai para a
Biblioteca, série “Catálogos”.
A respeito da relação entre documentos arquivísticos e museológicos de mesmo artista
ou obra, MS1 afirmou que, no caso do fundo Márcia-X, a equipe responsável pelo tratamento
da documentação criou um manual com as definições de como os vestígios de cada obra
devem ser expostos. A partir dessas informações, a equipe do setor de Museologia faz
menção, na ficha catalográfica, aos documentos arquivísticos relacionados, como por
exemplo, um vídeo de uma performance que só pode ser exposto com as roupas que a artista
utilizou quando realizou a ação, ou objetos que devem ser acompanhados pelas fotografias da
performance referente. No que diz respeito a outras performances, para MS1, não há ligação
entre os dois tipos de documentação citados (arquivístico e museológico), entendimento não
compartilhado por CPD, que esclareceu ser possível ao setor de Pesquisa e Documentação ter
acesso às informações das obras pela ficha técnica/catalográfica da Museologia
disponibilizadas pelo banco de dados. Caso um pesquisador queira saber a respeito de um
happening, o integrante da equipe de Pesquisa do Museu pode acessar a lista de obras da
Museologia, que vem com o nome do happening, a descrição dos vestígios que este gerou e
um número de identificação associado. O banco de dados museológico reflete a ficha
catalográfica, apresentando inclusive as orientações dos artistas sobre a exposição dos
vestígios remanescentes das ações artísticas (com a ressalva de que essas orientações não são
adicionadas à listagem impressa).
Por fim, no que concerne aos vestígios, como visto acima nos depoimentos de MS1 e
CPD, a Instituição guarda remanescentes de performances e os expõe de acordo com as
orientações do artista. Tais orientações são obtidas através de um formulário de entrada de
136
obra, que deve ser preenchido pelo artista, além de trocas de e-mails. Este formulário é
anexado à ficha catalográfica da obra/objeto. No caso de performances com uso de objetos
manipuláveis, os quais o artista deseja que não sejam somente expostos, mas também
manuseados pelo público, a Museologia pede ao artista que crie uma réplica a fim de
preservar o original. Em outras situações o próprio artista pede o objeto emprestado ao
Museu, transação que deve ser feita com autorização, principalmente se o objeto pertence à
coleção custodiada por comodato. Como exemplo MS1 citou os “Parangolés” de Hélio
Oiticica, réplicas pertencentes à coleção do Museu que foram usadas por outra Instituição que
perdeu seus originais em um incêndio. Quando o MAM Rio promoveu outra exposição,
pagou pela produção de réplicas das réplicas, a fim de que estas pudessem ser manipuladas
pelo público.
Durante a entrevista, ao serem abordados os assuntos sobre reclassificação de
documentos e registro das ações artísticas citadas, CPD expressou a opinião de que a
Instituição não deve se redesenhar para receber performances, body art e happenings.
Segundo a curadora, se uma Instituição cultural tem preocupação com a memória e a história,
ele procurará registrar o que acontece. Ademais, ela entende que documentos e registros são
essenciais para todo tipo de arte e por isso não compreende o porquê de tamanho destaque
dados nos últimos anos aos documentos relacionados às artes efêmeras. Para CPD, que é
formada em história da arte, a performance mostra para a museologia e para a arquivologia
que o objeto de arte é mais do que apenas um objeto. Mas CPD reconhece que, para a
performance, é necessário reunir os documentos dispersos fisicamente pelos diversos setores
da Instituição para, de fato, ser possível relembrar a ação.
5.3.1.2 Análise dos dados apresentados sobre o MAM Rio
Após a apresentação dos dados, se compreende que não é possível analisar o tratamento
arquivístico de toda a documentação relativa a performances e happenings que ocorreram no
local, pois se teve acesso a informações sobre apenas três setores: Pesquisa e Documentação
(que abrange Arquivo e Biblioteca), Museologia e Cinemateca. Os arquivos correntes
permanecem junto aos departamentos e não existe um arquivo intermediário ou permanente
que guarde documentação administrativa/legal, nas quais poderiam ser encontrados, por
exemplo, contratos com os artistas ou projetos de exposições.
Sobre os documentos administrativos e legais, considerados enquanto fontes de
informação sobre performances, happenings e body art, cabe elucidar que ao propor que
137
pesquisadores externos possam acessar contratos e outros documentos internos da Instituição
não se ignora que podem existir aquelas cujo nível de sigilo não permita tal acesso. Deve-se
levar em conta a posição sobre a liberação de acesso do órgão/direção a que as instituições
são subordinadas .
Os documentos presentes nos dossiês de “Exposições” e “Eventos”, divididos por
institucionais e colecionáveis, são recortes de jornais, convites, cartazes, material de
divulgação em geral. Existe um arquivo fotográfico que contém imagens das exposições e de
um happening, mas não ficou claro se fotografias sobre performances podem ser encontradas
nele e se estas são relacionadas aos documentos dos dossiês. Assim, não se pode afirmar que a
organicidade é observada nesses conjuntos. A ligação entre os documentos museológicos e
arquivísticos relativos às ações artísticas citadas é realizada por meio do banco de dados
museológico, que reflete a ficha catalográfica e onde os profissionais mencionam, junto aos
objetos, documentos arquivísticos associados, como fotografias e vídeos.
Pesquisando-se outros materiais, como o inventário sobre “Cursos”, “Eventos”,
“Dança”, “Música”, “Teatro” e “Visitas”, percebe-se que foi utilizada a remissa “Ver”, o que
permite inferir a existência de um controle intelectual sobre documentos relacionados a um
mesmo assunto. Também foi encontrado o termo “Assuntos MAM Rio: Anúncios
institucionais”, que parece ser um tipo de série diferente das já citadas. Pelas listas geradas a
partir dos bancos de dados museológico e arquivístico a que se teve acesso, nota-se que a
pesquisa com o termo performance retorna mais resultados para o material arquivístico,
através das séries “Exposições” e “Eventos” (cinco para “Exposições” e quinze para
“Eventos”, sendo que alguns dossiês aparecem com a mensagem “sem documentação” e
alguns eventos se referem à performances musicais e teatrais). Na lista de obras (banco de
dados museológico), o retorno foi de apenas seis resultados. Esta lógica, no entanto, se inverte
quando se pesquisa o fundo Márcia-X, com a lista museológica retornando 133 resultados. Na
lista de documentos relacionados a Exposições e Eventos, não há citação à Márcia-X.
Questões relacionadas à classificação dos gêneros artísticos também dificultam o acesso
a documentos específicos à body art, às performances e aos happenings. Ainda assim é
possível encontrar algumas dessas ações a partir da intermediação do historiador da arte, que
pelo seu conhecimento do acervo museológico, arquivístico e bibliográfico, consegue fazer as
ligações e orientar o pesquisador.
Apesar de possuir uma classificação que parece ser aplicada aos documentos com
regularidade e consistência, atitudes estas importantes para localizar mais facilmente os
138
documentos e melhor atender aos pesquisadores, não se pode deixar de notar a lacuna no que
se refere à gestão de documentos.
5.3.2 Museu de Arte Contemporânea de Niterói (MAC Niterói)
O MAC Niterói, instituição pública municipal, foi criado em 1996 para abrigar a
Coleção João Sattamini de arte contemporânea brasileira, doada pelo mesmo à cidade. O
projeto arquitetônico, de autoria de Oscar Niemeyer, foi realizado em 1991. O acervo
museológico do Museu é composto por 1.217 obras da Coleção João Sattamini e 369 obras da
Coleção MAC Niterói, formada a partir da doação de artistas que expuseram no local.
O Museu é uma unidade da Fundação de Arte de Niterói (FAN), que é subordinada à
Secretaria Municipal de Cultura. O FAN tem como objetivo ampliar a produção artística e a
sua divulgação em Niterói por meio de incentivo a programas e projetos que auxiliem no
desenvolvimento e no aprimoramento das artes e estimulem a participação do público e dos
artistas. A equipe do MAC Niterói é composta pelos seguintes departamentos: Direção Geral,
Curadoria, Museologia, Educação e Pesquisa, e Administração, à qual são subordinados os
setores de Encarregados Técnicos, Bilheteria, Conservação, Segurança e Manutenção.
O MAC Niterói foi visitado em datas diferentes: dez e 26 de julho de 2019. Como no
MAM Rio, o primeiro e-mail era sucinto e foi respondido pela museóloga (MS2) com
sugestão para que se visitasse a instituição e se conversasse pessoalmente, o que foi agendado
para o dia dez. A primeira conversa foi, portanto, informal e sem gravação em áudio. MS2
apresentou algumas pastas físicas e documentos do setor de Museologia, vídeos de
performances doados por artistas e algumas fotografias de eventos ocorridos na Instituição
que receberam as ações artísticas foco da pesquisa, algumas das quais foram registradas. Ao
fim da conversa, MS2 sugeriu que se escrevesse também para o bibliotecário (BBT) e
pesquisador da Divisão de Teoria, Pesquisa e Curadoria, pois este é responsável pela
organização dos demais documentos. Seguiu-se então esta recomendação, conseguindo-se
agendar nova visita para o dia 26, sendo a entrevista semiestruturada gravada em áudio
realizada com o bibliotecário e a museóloga.
5.3.2.1 Dados obtidos sobre o MAC Niterói através de entrevista semiestruturada
A entrevista gravada em 26 de julho de 2019 teve duração de 2h, sendo a conversa com
maior tempo de gravação entre as seis instituições visitadas. Inicialmente apenas BBT estava
presente e compartilhou informações sobre o histórico da Biblioteca, que foi planejada desde
139
a construção da Instituição, sobre a construção do próprio MAC Niterói e sobre os
documentos guardados pela Biblioteca. Após um período, MS2 se juntou à conversa e
auxiliou nas respostas às perguntas.
Segundo os entrevistados, a Divisão de Teoria, Pesquisa e Curadoria é a responsável
pela guarda e organização de documentos relacionados às exposições, aos artistas e às obras,
ou seja, à memória da Instituição. Essa Divisão possui uma Biblioteca que guarda o acervo
bibliográfico e documentos relativos a todos os eventos que aconteceram na Instituição
(artísticos, políticos etc.), incluindo notícias nacionais e internacionais sobre o MAC Niterói.
A Divisão atende às necessidades de pesquisa dos outros setores da Instituição e de
pesquisadores externos, sendo a demanda interna a maior. Assim, não há um setor de arquivo
institucional ou histórico, nem centralização da documentação, nem arquivista ou técnico de
arquivo. Cada departamento permanece com a sua documentação (seus arquivos), tanto de
valor primário quanto secundário.
Acerca do acervo bibliográfico, BBT afirmou que é constituído por livros, catálogos e
clippings sobre arte contemporânea brasileira do pós-guerra à atualidade. Os catálogos são
classificados em artistas individuais e de instituições (ou coletivos) e organizados pela entrada
de sobrenome do autor, seguido do primeiro nome, em ordem alfabética. Os outros
documentos que formam a memória do MAC Niterói, em especial dos relacionados às
exposições que esta recebeu desde sua abertura, são guardados em pastas físicas e digitais.
Como exemplo de documentação, BBT citou convites, convites virtuais que foram impressos,
críticas feitas às exposições, fotografias das exposições (mais em formato digital do que
físico) e entrevistas gravadas com artistas, material essencialmente digital. Toda a
documentação a que se tem acesso em torno da exposição é reunida: conceito da exposição,
entrevistas com os artistas, preparação da exposição etc. Porém, se em um evento ocorrerem
performances, as informações sobre estas não serão registradas individualmente. O que se
registrará é o evento, a exposição em que a performance foi apresentada.
No que concerne às obras do MAC Niterói emprestadas para exposição em outra
Instituição, MS2 explicou que há uma exigência no contrato de empréstimo sobre o envio de
três exemplares de catálogos produzidos para a exposição. Um era enviado ao João Sattamini,
mas, após seu falecimento, os exemplares permanecem na Instituição em diversos setores
(Direção etc.). Outro é enviado à Divisão de Teoria, Pesquisa e Curadoria e o terceiro é
guardado na Museologia.
Além das exposições, a Biblioteca também guarda a memória dos artistas que
expuseram no MAC Niterói e de artistas renomados da arte contemporânea, de acordo com
140
BBT. Um exemplo de documentação é o registro de entrevista com os artistas, prática recente
realizada pelo setor de Produção Cultural, que não é feita de maneira sistemática. O
tratamento dado a essas gravações é realizado por BBT e possui caráter sintético: são
extraídas informações sobre a duração das entrevistas e assuntos abordados. As entrevistas
são voltadas para a obra que o artista irá expor na Instituição, não tendo caráter biográfico.
Há, portanto, dois tipos de pastas nos arquivos da biblioteca: as das exposições e as dos
artistas.
No que diz respeito ao acervo museológico, MS2 explicou que existem duas reservas
técnicas, uma no centro da cidade e outra na própria sede do MAC Niterói. O setor de
Museologia possui documentos físicos e digitais, estes divididos por pastas com os nomes dos
eventos (pastas por exposição). Tais pastas possuem fotografias de eventos e de algumas
performances realizadas durante os mesmos, mas essas fotos não são tratadas como acervo e
sim como um registro comum, guardadas junto às demais informações sobre a exposição
relacionada (a Biblioteca também não faz a catalogação de fotografias específicas a
performances, body art e happenings). Há também pastas de artistas, mas sobre estas MS2
afirmou que, com a saída do funcionário responsável por pesquisar a respeito dos artistas da
coleção da Instituição, esta pesquisa foi encerrada. A respeito de instrumentos, foram citados
um manual de catalogação e uma ficha catalográfica.
A entrada de obras na Instituição é decidida pelo setor de Museologia, mas há casos,
como os de vídeos de artistas, cuja decisão relativa à doação é feita pelos diretores e
curadores. MS2 e BBT entendem que este formato de documento deveria ficar na Biblioteca
ou no setor de arquivo (caso houvesse um), mas elucidaram que alguns artistas enxergam o
acervo bibliográfico como sendo de menor valor que o museológico e, por isso, só aceitam
doar a obra se esta fizer parte do acervo museológico. No que se refere a obras de material
perecível, pode-se doar o projeto, como o que aconteceu com a obra “Parque Funcional”, de
Beto Shwafaty (1977-), composta por mobiliários de madeira de compensado pintados em
cores vivas.146
MS2 elucidou que a obra em si não poderia ser guardada na reserva técnica,
pois não era tratada, podendo representar risco para as demais (além de ocupar um espaço já
pequeno na reserva).
Com relação à classificação de documentos relativos a performances, happenings e
body art, MS2 e BBT compartilham as seguintes dificuldades: identificação da ocorrência
destas ações em meio aos eventos, já que muitas vezes não recebem o conceito deste, o
146
O título da obra não foi citado durante a entrevista. Essa informação pode ser encontrada em: https://pt-
br.facebook.com/macniteroi.OFICIAL/posts/1717622251644440/. Acesso em: 24 fev. 2020.
141
projeto ou a sinopse. No caso de receberem a sinopse, frequentemente esta não vem
acompanhada de informações adicionais, descrevendo apenas o nome do artista e a ação
artística realizada. Pelo fato da Museologia não se envolver com a concepção de eventos, não
tem acesso a informações mais aprofundadas sobre os mesmos. A decisão e a concepção
destes são realizadas pela Direção e pela Curadoria, com exceção das exposições com obras
da Coleção MAC Niterói, quando a participação da Museologia é efetiva. MS2 esclareceu
ainda que o setor também utiliza como classificador a palavra empregada pelo artista no
termo de doação de obra.147
Mas isso também pode se tornar um problema, já que às vezes o
artista não especifica se, por exemplo, o vídeo doado é uma performance ou um vídeo-arte.
MS2 e BBT também disseram que, atualmente, estão sendo realizadas entrevistas anteriores
às exposições, mas que em geral o contato entre o artista e os demais funcionários da
Instituição se dá em um encontro no final da montagem da exposição. Nessa ocasião o artista
explica a todos os funcionários que queiram participar deste encontro detalhes sobre a obra
que será exposta, ideias que inspiraram a criação da mesma etc. No entanto, artistas
internacionais ou que moram em outro país geralmente não vão à Instituição dar essa
explicação, enviando a obra e o projeto para execução da Museologia. Mais uma dificuldade
levantada acerca da classificação foi a da ampla gama de linguagens, ações e estratégias
artísticas empregadas pela arte contemporânea.
Outro tipo de organização que as obras recebem, tanto as novas quanto as antigas, é a
aplicada pela FAN, à qual a Instituição é subordinada. Como esta Fundação pertence à
Secretaria de Cultura, todo patrimônio do MAC Niterói também pertence à Prefeitura. Assim,
o Setor de Patrimônio da Fundação associa um código numérico e um termo a cada obra que é
doada à Instituição e, no caso de termos desconhecidos pela funcionária da Fundação, MS2 os
esclarece e novos códigos são adicionados.
Sobre a existência de documentos e arquivos pessoais de artistas que realizaram
performances, body art e happenings, não ficou claro na entrevista se o conjunto “Márcia-
X”148
diz respeito apenas às obras ou também envolve documentação arquivística e
bibliográfica. Com relação a documentos e arquivos pessoais de artistas em geral, os tipos
citados por MS2 e BBT são produzidos e/ou colecionados pelo MAC Niterói sendo
constituídos por críticas às exposições, clippings, entrevistas gravadas com os artistas e
147
Processo de doação: modelos de carta de doação são dadas ao doador para preenchimento. Abre-se um
processo na FAN, que faz o termo de doação em duas vias. O artista ou doador fica com o termo assinado pelo
presidente e o MAC Niterói fica com o termo assinado pelo artista. São adicionadas cláusulas onde a Instituição
se compromete a guardar e preservar a obra. 148
Segundo informações sobre o projeto de tratamento da documentação de Márcia-X, parte do acervo
museológico foi doada para o MAM Rio e a outra, para o MAC Niterói.
142
material de divulgação, guardados pela Divisão de Teoria, Pesquisa e Curadoria. Entendeu-se
assim que estes documentos não pertenceram aos artistas – não “são” deles, mas “sobre” eles.
Já a existência de documentos sobre performances foi confirmada, tanto por observação
dos vídeos e fotografias que MS2 mostrou durante a primeira visita quanto na entrevista
prestada, quando um flyer também foi citado. Entretanto, MS2 esclareceu acerca dos vídeos
do artista Floriano Romano (1969-) com as performances “Falante” e “Chapéu Panorâmico”,
que estes não foram filmados no ou pelo MAC Niterói, mas doados, pertencendo ao acervo
museológico. As fotografias de ações artísticas inseridas em eventos, conforme explicado
anteriormente, não são tratadas como acervo. Os setores que registram os eventos realizados
são a Produção Cultural, que trabalha com a parte prática das exposições (não faz nenhum
tipo de catalogação de informação) e o Educativo. Como as performances que ocorrem no
museu são, normalmente, denominadas eventos, ou acontecem dentro de eventos, não são
abrangidas por uma política de registro específica.
No setor de Museologia, tais eventos são nomeados “Exposição”, recebem uma
descrição, mas não se anexam ou referenciam a esta demais documentos como fotos, convites
etc. MS2 esclareceu que a Museologia registra as obras que fazem parte da coleção MAC
Niterói e não as que apenas são expostas na Instituição. Apesar disso, MS2 afirmou que
procurará registrar as performances que ocorrerem dentro dos eventos, a fim de auxiliar
pesquisadores que procurarem por esses conceitos. Mas tal registro não será realizado no
banco de dados, já que estas performances não fazem parte do acervo. Os vídeos de
performances que foram doados por Romano receberam a classificação de “Vídeo” (pois o
banco de dados utilizado não tem campo de catalogação para o termo performance), sendo
adicionada a expressão “registro de performance”.
Acerca da relação entre documentos arquivísticos e museológicos, MS2 afirma que
estes não são ligados informaticamente, porque a Museologia e a Divisão de Teoria, Pesquisa
e Curadoria usam bancos de dados diferentes, com campos de catalogação distintos. A relação
entre obras e documentos é registrada por BBT no computador (catálogos de exposições das
obras da coleção, por exemplo), mas as informações são obtidas oralmente, com base no
conhecimento dos profissionais e no contato entre estes, a fim de orientar o pesquisador.
Quando uma solicitação é enviada ao MAC Niterói, o pesquisador é, geralmente, direcionado
primeiro à Divisão de Teoria, Pesquisa e Curadoria, já que esta possui documentação sobre a
obra, o artista e a exposição (podendo relacioná-las), enquanto que a Museologia possui
informações sobre apenas um destes. Se necessário, o pesquisador é encaminhado a outros
setores.
143
BBT explicou acercada interação entre informações dos setores da Instituição, que os
profissionais estão discutindo a possibilidade de utilizar um sistema de integração de base de
dados único para o Museu, chamado SISGAM (Sistema de Gerenciamento de Acervos
Museológicos). Ele é voltado para a museologia, mas permite a inserção de dados
bibliográficos. Porém MS2 afirmou que o SISGAM não tem campo de catalogação para
performance, sendo limitado também para a inserção de vídeos, já que é baseado em um
tesauro antigo, utilizado pela primeira museóloga que trabalhou no MAC Niterói. MS2
explicou que este tesauro não se adequa à arte contemporânea e que é preciso encontrar
estratégias para poder inserir termos como performances e vídeos no banco de dados.
Percebe-se, portanto, que a ligação entre os documentos existe e é reconhecida pelos
profissionais, mas é realizada basicamente de forma verbal e presencial.
A respeito de vestígios das ações artísticas, MS2 se recordou da performance realizada
por João Modé (1961-), apresentada em um evento do MAC Niterói, durante um segmento
denominado “Construa você mesmo, redes e costuras”.149
Nesta performance o artista
prendeu fios de lã ao prédio da Instituição e pendurou diversos objetos, convidado o público a
fazer o mesmo e continuar a construção da obra. Dos poucos vestígios que sobraram, já que a
lã arrebentou com o peso dos objetos adicionados, tomou chuva e etc., MS2 afirmou que a
Museologia não guardou nada, pois não era possível tratar esses objetos museologicamente e
porque o próprio artista disse que faria o trabalho novamente, caso necessário. MS2 explicou
ainda que para ela, uma performance nunca se repete, então não faria sentido guardar projetos
ou vestígios com o objetivo de serem reutilizados.
5.3.2.2 Análise dos dados apresentados sobre MAC Niterói
Situação semelhante no que se refere à análise dos dados do MAM Rio é observada no
MAC Niterói. Por não haver um setor de arquivo, cada departamento cuida de seus conjuntos
de documentos, organizando-os de maneiras distintas. Como consequência, os setores
analisados representam um recorte na Instituição, não se tendo acesso à organização de todos
os possíveis documentos relacionados a performances, happenings e body art que podem
existir no Museu.
Os documentos presentes nas pastas de exposição e de artistas, nos conjuntos
documentais mantidos física e digitalmente pela Biblioteca são clippings, convites, críticas,
entrevistas gravadas com os artistas, fotografias e conceitos das exposições. Não se comentou
149
O nome do segmento foi obtido em: https://culturaniteroi.com.br/macniteroi/publicacoes/arq/27_MAC-de-
Niteroi-10anos.pdf. Acesso em: 24 fev. 2020.
144
se esses documentos são divididos dentro das pastas (identificando o produtor ou a fonte) ou
mantidos juntos. Assim, não se pode afirmar se a organicidade e a proveniência são
observadas nesses conjuntos. A organização é feita por assuntos. A ligação entre os
documentos museológicos e arquivísticos é, em geral, registrada pelo bibliotecário no banco
de dados da biblioteca, mas não há interação com o banco de dados museológico. Assim, os
profissionais reconhecem a ligação entre os acervos, mas as informações pertinentes são
compartilhadas apenas oral e presencialmente. Os únicos instrumentos de classificação
citados foram os museológicos: tesauro, ficha catalográfica e manual de catalogação.
Com relação ao registro de performances, body art e happenings, não há uma política
específica que o garanta. Registram-se, pela museologia, as exposições. Os eventos são
registrados por outros setores, mas não de maneira sistemática. O banco de dados
museológico não permite a inserção de performances, o que dificulta a representação e
posterior recuperação destas, mesmo quando se trata de documentação relacionada, como é o
caso de vídeos de performances. Nota-se uma falha de comunicação entre os setores no que se
refere aos eventos realizados na Instituição. Quando as exposições realizadas não têm ligação
com as obras pertencentes ao acervo museológico, a Museologia e a Divisão de Pesquisa não
são envolvidas, dificultando o mapeamento e a preservação das ações que acontecem no
Museu. A falta de um profissional arquivista gera acúmulo de funções para o bibliotecário e
para a museóloga, pois além de se dedicarem aos acervos bibliográfico e museológico,
respectivamente, precisam lidar com documentos do acervo arquivístico (convites produzidos
pela Instituição, entrevistas gravadas com artistas, fotografias etc.).
5.3.3 Museu de Arte do Rio (MAR)
O MAR foi inaugurado em 2013, fruto de parceria entre a Prefeitura do Rio e a
Fundação Roberto Marinho. O acervo museológico é composto por cerca de oito mil itens,
com obras históricas como a imagem “São José”, de Aleijadinho (1738-1814), obras de arte
moderna e de arte contemporânea. O acervo bibliográfico possui por volta de dezesseis mil
itens, sendo que destes 1.481 são livros de artistas. O acervo arquivístico conta com mais de
sete mil documentos.
O MAR é gerido pela Prefeitura em parceria com o Instituto Odeon, uma organização
social sem fins lucrativos voltada para projetos culturais. A governança do Museu inclui a
Prefeitura, a Fundação Roberto Marinho, a Diretoria, a Gerência, o Conselho Municipal de
Arte do Rio e o Conselho Odeon. A equipe é formada pelos seguintes departamentos:
Administrativo, Financeiro e Recursos Humanos; Comunicação; Curadoria e Pesquisa;
145
Museologia e Montagem; Parcerias, prospecções e projetos; Produção; Educação e
Operacional.
O MAR foi visitado pela primeira vez em 29 de janeiro de 2019, conhecendo-se o setor
de Museologia e travando-se conversa informal com as museólogas. Neste contato inicial,
soube-se que a Biblioteca possuía parte do conjunto documental do Grupo EmpreZa (2001-),
coletivo artístico voltado para a arte da performance. Foi informado ainda que o material de
divulgação das exposições era mantido pelo mesmo setor. Tentou-se agendar visita ao setor
de Biblioteca em janeiro, mas tal não se concretizou.
Após esta visita informal, agendou-se nova visita ao setor de Museologia em oito de
agosto. Durante a troca de e-mails para o agendamento, enviaram-se os documentos
requisitados (carta de apresentação e formulário do pesquisador fornecido pela Instituição) e o
questionário. Este foi respondido por e-mail em 25 de julho e, em oito de agosto, foram
esclarecidas dúvidas acerca das respostas dadas. Esta conversa de esclarecimento foi gravada
em áudio, com duração de 32min.
5.3.3.1 Dados obtidos sobre o MAR através do questionário respondido por e-mail e da
entrevista semiestruturada
Os dados descritos a seguir são baseados nas respostas dadas por escrito ao questionário
enviado por e-mail. As informações prestadas durante a entrevista serão discriminadas logo
depois. A Instituição possui locais de guarda de documentos, a Biblioteca e Centro de
Documentação. Não existe um setor especificamente de arquivo, apesar de afirmarem possuir
arquivo histórico permanente – entende-se que, provavelmente, estejam se referindo ao um
conjunto documental. A organização desses documentos foi descrita da seguinte maneira: ao
chegar à Biblioteca, o documento recebe um registro de entrada por meio do código ARQ no
inventário e posteriormente é catalogado no sistema Pergamum. O documento físico é alocado
por fundos de doadores, que podem ser pessoas físicas ou instituições. Estes documentos
recebem tratamento técnico e são devidamente acondicionados em invólucros de papel de ph
neutro e/ou em caixas de ph neutro e são guardados em armários deslizantes na reserva
técnica. Não há plano de classificação nem quadro de arranjo.
No que se refere a documentos da própria instituição, foi respondido que o MAR não
possui um sistema de gestão documental e que os documentos produzidos pelo Museu não são
tratados por arquivista, mas pela gestão administrativa da instituição. Já o acervo documental
“histórico” é tratado e guardado pela Biblioteca. O conjunto é composto por cerca de sete mil
documentos de valor secundário, entre estes, cartões-postais, alvarás, certidões, fotografias,
146
mapas, plantas, pôsteres, e outras espécies e gêneros documentais. Tanto a custódia quanto o
tratamento deste acervo são de responsabilidade da equipe de Biblioteca e Centro de
Documentação do MAR, composta por especialistas na área de arquivo, biblioteca e
documentação.
Sobre documentos relacionados a performances, body art e happenings, afirmou-se que
o arquivo não possui este tipo de documentação, mas que existem livros sobre essas ações
artísticas no acervo da Biblioteca. A respeito de registros dessas manifestações realizados pela
Instituição, informou-se que eles existem, mas que a documentação está separada em cada
setor, citando-se a Curadoria e a Educação. Explicaram ainda que catálogos, cartazes e demais
materiais de divulgação são arquivados na Biblioteca. Para a pergunta seguinte, sobre
arquivos de artistas das ações artísticas citadas, respondeu-se que os documentos também
estão separados por setor. A respeito da relação entre documentação museológica e
arquivística, afirmou-se que existem documentos sobre as obras museológicas e, em alguns
casos, sobre seus artistas, informando que esse material fica guardado junto à documentação
da peça. No caso dos vestígios das ações artísticas, informou-se que alguns são incorporados à
coleção museológica e podem voltar a ser expostos.
Considerou-se que a resposta dada sobre arquivos pessoais de artistas e aquelas relativas
aos documentos sobre happenings, body art e performances não supriram satisfatoriamente as
dúvidas acercada existência desses arquivos e do tratamento da documentação. Por tal motivo
as perguntas relacionadas aos tópicos cinco a nove do questionário foram refeitas durante a
segunda visita.
Os próximos dados apresentados já se referem à entrevista gravada em áudio com a
museóloga (MS3). Segundo MS3, apesar de haver setor responsável pela guarda de
documentos (Biblioteca e Centro de Documentação), não há uma centralização, um arquivo
Institucional, e nem existe projeto atualmente para implantar um. Os documentos correntes
são mantidos juntos aos setores e os documentos chamados históricos são recebidos pela
Biblioteca e Centro de Documentação. Também não existe um banco de dados que centralize
a documentação produzida e acumulada por todos os departamentos. No que se refere à
presença de arquivista na equipe, apesar de no questionário se afirmar que há este
profissional, durante a entrevista explicou-se que o MAR não possui um arquivista
147
contratado.150
Porém equipes terceirizadas de arquivistas são contratadas para projetos
específicos.
O acervo museológico é guardado na reserva técnica, sendo organizado por fundos.
Estes, no entanto, não tem a mesma definição de fundo arquivístico. De acordo com MS3, os
fundos MAR são formados por obras doadas e recebem os nomes dos doadores, ou de pessoas
que estes queiram homenagear (principalmente daqueles que doaram muitas obras ou que têm
o potencial para se tornarem doadores mais frequentes). O setor de Museologia organiza as
obras por tipologia ou tamanho, trabalhando com a ficha catalográfica, um manual de
catalogação, um manual do sistema de banco de dados e um tesauro. O banco de dados
utilizado pela Museologia, pelo Centro de Documentação e pela Biblioteca é o Pergamum,
mas o MAR está em vias de migrar para o Sistemas do Futuro.151
Conforme esclarecido por MS3, o Pergamum não tem capacidade para receber muitos
acessos remotos ao mesmo tempo, por isso apenas pesquisadores autorizados recebem links
que podem ser acessados de casa. Neste sistema, as informações não visualizadas pelo usuário
externo são: o nome do doador (alguns doadores preferem permanecer anônimos); o valor da
obra e a localização da mesma, tanto a permanente quanto a temporária (a obra pode ter sido
emprestada para uma exposição; nesse caso, registra-se tanto seu lugar na reserva técnica
quanto o local para onde foi emprestada) e o nome do catalogador. Os campos acessíveis são:
a dimensão das obras; a existência de documento de autenticidade; o número da proposta de
doação; o número de registro e a descrição.
Sobre política de aquisição e descarte, MS3 explicou que ela está em processo de
desenvolvimento. Todas as obras doadas passam pelo crivo do Conselho, que é composto por
membros da Diretoria do MAR e da sociedade civil, sem participação do corpo técnico.
Porém existe comunicação entre a equipe técnica e o diretor sobre obras consideradas
complicadas (muito grandes, por exemplo). E no que concerne à classificação dos
documentos, quem analisa as obras é o setor de Museologia, enquanto que o acervo
arquivístico e bibliográfico é analisado pela Biblioteca e Centro de Documentação.
Sobre documentos e arquivos pessoais de artistas, MS3 esclareceu que no MAR a
ênfase é dada mais às obras do que aos que as criam. O setor de Museologia anexa à ficha
150
Pesquisando-se no site da instituição, descobriu-se que a equipe de Educação mantém uma estagiária de
arquivologia. Não se sabe dizer se tal estagiária auxilia o Centro de Documentação. Disponível em:
http://museudeartedorio.org.br/gestao/a-equipe/. Acesso em: 25 jan. 2020. 151
A museóloga utilizou este termo, porém descobriu-se posteriormente que Sistemas do Futuro é o nome da
empresa que produz sistemas de gestão de patrimônio cultural, sendo a fornecedora do sistema de gestão. Não
foi esclarecido à época qual sistema específico seria contratado e utilizado. Por isso o emprego do termo se
manteve nas próximas páginas.
148
catalográfica documentos como esboços, projetos, textos com o conceito da obra etc. que
podem ter sido recebidos por doação ou encontrados pela equipe em páginas de busca na
internet. Além destes, guardam-se também no setor documentos de autenticidade (assinados
por artistas e/ou galerias atestando que a obra é autêntica), listas de obras emprestadas ao
MAR para exposições, lista da exposição e laudo técnico (com especificações de conservação
para fins de seguro).
A respeito de documentos de performances, body art e happenings, MS3 citou o Grupo
EmpreZa, coletivo artístico do qual o MAR possui um fundo contendo vídeos, fotografias e
vestígios de performances. Também citou performances cujos projetos são mantidos junto aos
contratos, no setor administrativo, para fins comprobatórios, e explicou que ações que
envolvem vários setores acabam por ter os documentos relacionados divididos entre estes.
Assim, para pesquisá-los, seria necessário visitar cada setor. Ainda sobre o setor
administrativo, este possui um número de contrato que poderia recuperar eletronicamente
performances ou exposições onde estas ocorreram, através do sistema de contratação.
Com relação ao registro dessas ações artísticas, MS3 afirmou que existe uma política de
filmagem e fotografia, que é de responsabilidade do setor de Comunicação. As fotografias e
vídeos são disponibilizados pela Comunicação em um drive acessível aos outros
departamentos. Mas há a intenção de inserir essas informações no novo banco de dados, o
Sistemas do Futuro.
Apesar da ênfase dada pelo MAR às obras, MS3 conseguiu recordar-se de dois fundos
de doadores que contêm documentos (fotografias e cartões postais): um relacionado ao artista
Décio Vieira (1896-1988) e outro ao doador Fábio Settimi, sobre o artista Alair Gomes (1921-
1992). MS3 não sabe com certeza como estes documentos estão organizados, mas acredita
que estejam separados por fundos em caixas distintas.152
Pela resposta dada no questionário,
os documentos em geral são organizados por fundos museológicos (por doador ou nome
escolhido pelo mesmo).
152
Ao se verificar o site da instituição em 25 fev. 2020, agora já com o Sistemas do Futuro ativo, pesquisou-se
informações sobre Alair Gomes, a quem a museóloga atribuiu um fundo arquivístico. Na página da coleção
foram encontrados, empregando-se o filtro “autoria”, apenas duas fotos em nome da coleção Fábio Settimi. Na
página do arquivo, com o filtro “título” retornaram seis documentos, cuja associação com a coleção do doador
Fábio não é clara, podendo ser inferida pelo código FFS. Só se descobre que Fábio Settimi é um fundo
museológico quando se explora a página da coleção ou quando se pesquisa na página do arquivo, pelo filtro
“título” e o nome dos doadores aparece como nível de fundo. Já o fundo Décio Vieira, doado pela família,
recebeu o título “Décio Vieira e Dulce Holzmeister”. Pesquisando na página do arquivo, não foi possível
identificar o fundo pelos filtros disponíveis utilizando o nome do artista. Em resumo, a tentativa de relacionar
todos os documentos arquivísticos e museológicos a partir do site não foi bem sucedida. Percebeu-se que os
documentos não são ligados nos níveis inferiores, apenas no nível de fundo. Não se sabe se tais ligações são
possíveis no acesso interno ao banco de dados. Disponível em: http://colecao.museudeartedorio.org.br/. Acesso
em: 25 fev. 2020.
149
No que concerne à relação entre documentos arquivísticos e museológicos, MS3 usou
como exemplo o fundo Décio Vieira, que possui objetos e documentos de arquivo. Os objetos
são mantidos fisicamente pela Museologia e os documentos pela Biblioteca e Centro de
Documentação e são feitas referências associando-os. Eletronicamente, essas informações
podem ser recuperadas pela proposta de doação,153
documento padrão com cláusulas
contratuais, cuja alteração se dá nos dados dos doadores e na lista de obras (situações
específicas sobre se o doador é o autor da obra ou não, entre outras, também são incluídas na
Proposta). Este documento é assinado pelo doador, pela Instituição (Diretoria e Conselho) e
pela Prefeitura (todo patrimônio do MAR pertence à Prefeitura do Rio).
Entretanto, após a migração para o Sistemas do Futuro, MS3 acredita que será possível
recuperar eletronicamente essas ligações e que este banco de dados permitirá acréscimo de
exposições e de ações educativas (o que não é possível no Pergamum). A Produção poderá
inserir as listas de obra que não fazem parte da coleção da Instituição, mas participam de
exposições. Vestígios de performances também serão recuperados pelas pesquisas, que
poderão ser realizadas remotamente, pois o Sistemas do Futuro é uma ferramenta robusta que
poderá ser disponibilizada online, de acordo com MS3. Além do setor de Museologia, a
Biblioteca e Centro de Documentação também migrará seus sistemas. O banco de dados do
acervo bibliográfico será o Sophia, enquanto que o de acervo arquivístico será o Sistemas do
Futuro.
Sobre os vestígios, conforme já citado anteriormente, sabe-se que existem e que podem
ser expostos novamente, apesar de tal feito ainda não ter sido realizado. Como exemplo, MS3
mencionou novamente o Grupo EmpreZa, que fez uma residência artística no MAR e o
vestígio de uma performance foi incorporado como objeto museológico (classificado com o
termo “vestígio de performance”, segundo determinado pelo Diretor Cultural presente na
instituição à época). Essa incorporação se deu com o aval do artista, que assinou a proposta de
doação. Mas houve casos de artistas do mesmo grupo que não concordaram em doar
vestígios. O termo dado pelo diretor cultural para nomear os remanescentes de performances
precisou ser incorporado ao banco de dados, que não o contemplava, pois o instrumento em
que foi baseado também não possuía performance entre seus termos (tesauro de Helena Dodd
Ferrez).
153
A proposta de Doação pode ser vista no decreto municipal n. 37.917/2013. Disponível em:
https://leismunicipais.com.br/a/rj/r/rio-de-janeiro/decreto/2013/3792/37917/decreto-n-37917-2013-dispoe-sobre-
procedimento-especifico-de-doacao-de-obras-de-arte-para-o-museu-de-arte-do-rio-mar-e-da-outras-providencias.
Acesso em: 25 fev. 2020.
150
5.3.3.2 Análise dos dados apresentados sobre o MAR
Da mesma forma que no MAM Rio e MAC Niterói, foi possível analisar apenas um
recorte da documentação geral produzida pelo MAR. Cada departamento cuida de seus
conjuntos documentais, sejam correntes ou permanentes, organizados de formas diferentes.
Não há setor de Arquivo Institucional e o chamado Arquivo Histórico está sobre os cuidados
da Biblioteca. Diferentemente de outros Arquivos Históricos, não parece guardar documentos
da própria Instituição, apenas fundos relacionados às obras. Sabe-se que, de fato, documentos
sobre performances as outras ações artísticas relacionadas podem ser encontrados nos setores
Administrativo, Produção Cultural, Biblioteca, Centro de Documentação e Museologia, mas
não existia, à época da entrevista, um banco de dados que permitisse links entre eles. Também
se sabe, com certeza, que equipes de arquivistas são contratadas por projeto para cuidar de
parte dos documentos guardados na Biblioteca e Centro de Documentação (diferente da
informação sobre a presença de um arquivista na equipe do MAR, que se mostrou incerta).
Com relação ao Arquivo Histórico, os fundos são organizados segundo os doadores. Na
conversa com MS3, apenas dois fundos que poderiam conter documentos arquivísticos foram
citados: Décio Vieira e Alair Gomes (este último, na verdade, denominado Fábio Settimi,
nome do doador). Pelo o que foi compreendido do depoimento prestado por MS3, esses dois
fundos vieram com documentação arquivística (com destaque para o de Alair Gomes) e
poderiam ser analisados no que se refere à organicidade. Mas nas respostas dadas por e-mail a
organização intelectual da documentação do arquivo histórico praticamente não é descrita
(citou-se apenas o uso de um código ARQ).
Com o objetivo de tentar entender melhor essa questão, acessou-se o site da Instituição
em 25 de fevereiro de 2020, em especial os bancos de dados “coleção” e “arquivo” com o
nome do doador. A busca da página “coleção” não retorna resultados para “Fábio Settimi”,
apesar de este aparecer listado na página “explorar a coleção”, link coleção. Na página
“arquivo”, a busca por Fábio Settimi retorna um resultado no filtro “título”, o “Fundo Fábio
Settimi”, com código de referência BR/MAR/FFS, mas sem apresentação dos documentos
que fazem parte do fundo (nem link para acessar esses documentos). Assim não foi possível
averiguar a aplicação do respeito à organicidade nesses fundos, nem pelo questionário
respondido por escrito, nem pela entrevista e nem pelo site. Externamente, verificou-se que as
ligações entre os documentos não estão claramente representadas no banco de dados, mas
podem estar registradas para o usuário interno.
151
Com relação ao registro de performances, body art e happenings, há uma política que o
garante, colocada em prática pela Comunicação. Os vestígios de performance, por fazerem
parte do acervo museológico, são registrados no banco de dados da Museologia. Já sobre as
performances que ocorrem em eventos, há registro nos diversos setores envolvidos na
concretização do evento, ou seja, os documentos não são centralizados, mas existem e podem
ser acessados. A informação sobre a existência desses documentos foi conseguida com a
museóloga, mas não se sabe se o mesmo teria acontecido caso outro setor, por exemplo, o
Administrativo, fosse visitado. Entretanto, entendeu-se que a ligação entre as obras da
Museologia e os acervos da Biblioteca e Centro de Documentação é registrada, mesmo que
não o seja eletronicamente.
5.3.4 Centro Cultural Light (CCL)
O Museu Light de Energia, inaugurado em 2012, é subordinado ao CCL e conta com
apoio financeiro do Programa de Eficiência Energética da Agência Nacional de Energia
Elétrica. Além do Museu, o CCL possui diferentes áreas relacionadas à cultura e à ciência:
duas galerias que funcionam como um espaço multiuso; o Teatro Lamartine Babo; Circuito
Memória com uma exposição permanente sobre os serviços prestados pela Light; a Sala Di
Cavalcanti, com quadros do pintor; e o Espaço Décadas e Descobertas, com uma exposição
permanente sobre a evolução e o papel da energia elétrica.
O acervo empresarial, que inclui o arquivístico, bibliográfico e museológico é composto
por vídeos, mobiliários, mapas, fotografias, documentos textuais etc., datados a partir do final
do século XIX e com informações sobre a história da Light. O prédio em que o Centro
Cultural e o Museu estão instalados é a antiga sede da Light, que foi tombada pelo Patrimônio
Histórico em 1985. O CCL é subordinado ao Instituto Light e, em consequência, ao Grupo
Light.
O CCL foi a primeira instituição visitada em 2020. Os contatos iniciais por e-mail, com
envio de informações básicas e do questionário para conhecimento do profissional, se deram
de forma rápida e objetiva, sendo possível agendar data para cinco de fevereiro.
Diferentemente das instituições anteriores, apenas uma visita foi realizada, já sendo gravada a
entrevista em áudio com o museólogo (MS4), profissional responsável pela guarda e
organização do acervo da Instituição. A duração do áudio foi de 25min48s.
O CCL está subordinado a um Instituto, que também abriga um museu e diversos
espaços culturais. Este Instituto pertencente ao Grupo Light, cuja área de atuação está
152
relacionada ao setor de energia elétrica. Apesar de não ter ligação direta com a área da arte, tal
instituição foi escolhida por seu Centro Cultural ter recebido ações artísticas alvo da pesquisa.
5.3.4.1 Dados obtidos sobre o CCL através da entrevista semiestruturada
No que se refere aos cinco primeiros pontos do questionário, MS4 explicou que o CCL
possui setor de guarda e organização de documentos, o Arquivo Histórico Permanente, cujos
acervos estão divididos na reserva técnica segundo a tipologia (de acordo com a visão
museológica). Os documentos dividem-se, portanto, em acervo bibliográfico arquivístico,
fotográfico e audiovisual. Os documentos correntes são mantidos junto aos setores, mas existe
uma bibliotecária responsável pelo arquivo corrente e pela eliminação de documentos, que
trabalha no setor de Patrimônio. Não há arquivistas no corpo profissional, mas em 2013 o
Instituto contratou uma equipe de arquivistas terceirizada que fez o levantamento do acervo e
criou um plano de classificação e uma tabela de temporalidade, que continuam sendo
utilizados.154
Segundo MS4, o Plano obedece à determinada tipologia do acervo, com o
arquivístico sendo composto por certo número de documentos audiovisuais e fotográficos.
A respeito de documentos e arquivos pessoais de artistas e arquivos de outras
instituições, MS4 afirmou que o CCL não os possui. Os documentos existentes referem-se às
obras que foram expostas na Instituição, incluindo peças de teatro. Com relação a arquivos
pessoais, são mantidos os documentos de funcionários. Sobre documentação relacionada a
performances, body art e happenings, ela existe, mas não é mantida pelo Museu, pois este
abriga uma exposição permanente que retrata a história da energia elétrica. As exposições
ocorrem no CCL. Dessas exposições, em especial daquelas que receberam performances, há
fotografias (digitais, mantidas em drive interno na pasta de nome “Exposições”) e documentos
textuais (releases e projetos das exposições, enviados pelos artistas).
Outros documentos relacionados às exposições são cartazes, folders, panfletos e um
termo assinado pelo artista. MS4 explicou que a Instituição mantém um acordo de cooperação
com a Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro (EBA/UFRJ). Os
alunos do curso de artes que estão prestes a se formar, ou mesmo durante a graduação, são
convidados a expor nas galerias da Instituição. Esses alunos montam projetos que são pré-
selecionados pelos professores da EBA/UFRJ e depois enviados ao CCL, onde o funcionário
responsável pela programação do Centro Cultural os analisa. Após a aprovação, é necessário
ao artista assinar um termo, um contrato elaborado pela equipe jurídica do Instituto. Este
154
Há ainda um inventário, produzido por MS4, com a maioria dos itens documentais presentes no arquivo.
153
termo é assinado ainda por representantes da Instituição e por uma testemunha da parte do
artista, sendo mantido no arquivo corrente. De acordo com MS4, o projeto do artista, apesar
de ser documentação relacionada a processo, pode ser acessado caso necessário, pois não se
trata de um documento sigiloso.
Figura 25 – Performance “Brilho No Asfalto” (Mery Horta, 2018/2019), detalhe da foto e da
descrição da obra na exposição “Percursos” (2019)
Fonte: Arquivo do Centro Cultural Light.
154
Figura 26 – Detalhe das fotos da exposição “Percursos” (2019), com vestígio, vídeo e
descrição da performance “Levo sua alma até você” (de Luana Aguiar, 2019)
Fonte: Arquivo do Centro Cultural Light
Sobre os pontos seis a nove do questionário, MS4 afirmou que as exposições são
registradas por fotografia, reforçando a informação de que os documentos relacionados a
performances, happenings e body art são, basicamente, constituídos por releases, fotos e
folders. Porém MS4 esclareceu que contatou os artistas que expuseram no local e requisitou
demais documentos (como vídeos), a fim de aumentar o material existente no acervo sobre o
assunto.
Acerca de arquivos pessoais de artistas voltados para as ações artísticas citadas, o CCL
não os possui. E no que concerne a relação entre obras e documentos, MS4 elucidou que a
Instituição possui apenas quatro quadros de Di Cavalcanti (1897-1976), mantidos em uma
sala de exposição climatizada. Essa resposta já esclarece em parte a última pergunta
155
relacionada a vestígios das ações artísticas. Porém, apesar de não guardar os vestígios em sua
reserva técnica, o CCL expõe aqueles entregues pelos artistas, relacionados às performances
que foram realizadas no local, devolvendo o material ao artista após o término da exposição.
5.3.4.2 Análise dos dados apresentados sobre o CCL
A princípio, pelas afirmações de MS4, entendeu-se que a organização do acervo
arquivístico não levava em conta a organicidade, pois os documentos estavam separados por
tipologia museológica, que corresponderia ao gênero arquivístico: audiovisual, textual,
iconográfico – vídeos, releases, fotografias. Entretanto, ao falar sobre a equipe terceirizada de
arquivistas e citar a criação de um plano de classificação e de uma tabela de temporalidade,
MS4 afirmou que a organização se deu segundo uma “determinada tipologia”, em que o
acervo arquivístico abrange materiais audiovisuais e fotográficos. A partir desta informação,
supõe-se que a tipologia museológica foi aplicada à organização física dos materiais,
enquanto a organização intelectual procurou manter as ligações entre os documentos,
independentemente do gênero.
Os documentos relacionados a performances, ou seja, às exposições onde elas foram
apresentadas, são mantidos nos arquivos correntes dos diversos setores que se envolvem com
esta atividade no CCL. Mas pelas informações prestadas durante a entrevista, percebeu-se que
existe algum tipo de centralização dos arquivos correntes, realizada pela bibliotecária, que
também aplica a tabela de temporalidade, eliminando documentos e transferindo os demais
para o Arquivo Histórico, que realiza uma segunda análise. Pode-se questionar essa segunda
análise, já que uma tabela de temporalidade normalmente já determina tanto os documentos
que serão eliminados quanto os considerados permanentes. Mas entendeu-se que a
compreensão da aplicação da tabela ainda está em processo, principalmente após se perguntar
sobre o destino dos projetos enviados pelos artistas. MS4 afirmou que estes provavelmente
serão guardados, já que foram realizados no CCL, indicando que alguns documentos não
passaram por análise.
No que se refere a registro de performance, este é realizado por fotografias, que são
mantidas em suporte digital e facilmente acessadas. Sobre a ligação entre os diversos
documentos de uma mesma exposição (fotografias, catálogos), não se sabe dizer se há registro
escrito, mas reconhece-se a existência, posto que MS4 soube informar acerca de documentos
relacionados existentes nos demais setores. Acerca da ligação entre objetos museológicos e
documentos arquivísticos, não foi possível realizar uma averiguação, pois a Instituição não
possui obras em sua reserva técnica. Os vestígios de performance presentes nas exposições
156
não são mantidos pelo CCL, já que a área de atuação do Instituto ao qual este é subordinado
não é arte, mas energia elétrica.
5.3.5 Museu Histórico Nacional (MHN)
O MHN foi visitado, uma única vez, em dez de fevereiro de 2020. Os contatos iniciais
por e-mail trouxeram alguns esclarecimentos. O Arquivo Histórico respondeu não possuir
documentos relacionados a happenings, body art e performances. Já o Arquivo Institucional
solicitou mais informações. Assim foram enviadas mensagens contendo o questionário,
objetivo da pesquisa, exemplos do tipo de ação artística que estava sendo procurada e títulos
de eventos realizados na Instituição com possíveis apresentações de performances
(encontrados durante a segunda fase da pesquisa, na internet). Tanto o Arquivo Histórico
quanto o Institucional enviaram links da Biblioteca Digital (plataforma DocPro) mas, de
acordo com a arquivista (ARQ), o acervo não estava inserido em sua totalidade. Pesquisando-
se no link, não se encontrou nenhum documento sobre as ações artísticas citadas nem sobre os
artistas das performances que haviam possivelmente ocorrido no local.
Ainda por e-mail, ARQ afirmou não ter encontrado muitos documentos pertinentes. Os
poucos que foram localizados não se encontravam em sua guarda, mas no gabinete da
Diretoria. Após conseguir essa documentação, marcou-se a visita quando se gravou a
entrevista em áudio com duração de 17min e se teve acesso aos documentos.
5.3.5.1 Dados obtidos sobre o MHN através da entrevista semiestruturada
Segundo ARQ, a Instituição possui setores de Arquivo Histórico e de Arquivo
Institucional, sendo que o Histórico guarda os fundos e coleções históricas e o Institucional
guarda a documentação produzida pelo próprio MHN. O Arquivo Institucional utiliza o plano
de classificação e a tabela de temporalidade do CONARQ, aplicados à documentação desde a
chegada da arquivista na Instituição. Além de fazer o levantamento da documentação para
classificação, ARQ fez uma listagem de eliminação de documentos, que será submetida ao
CONARQ para autorização.
Com relação aos diversos tipos de documentos, cada um é guardado junto aos setores:
museológicos na Reserva Técnica, bibliográficos na Biblioteca e arquivísticos nos Arquivos.
O Arquivo Institucional trabalha com dossiês, montados a partir de uma primeira solicitação,
geralmente enviada por e-mail e anexada a uma ficha de acompanhamento. ARQ citou o
exemplo da papeleta “Solicitação e Autorização de Imagem” para explicar o processo de
157
abertura de dossiê: junto a essa papeleta, é anexada uma ficha com o nome do solicitante e a
descrição da solicitação; o documento é mandado para a Diretoria, que aprova ou não o
pedido de uso de imagem de uma exposição; a solicitação retorna para o Arquivo e o
pesquisador é avisado. A respeito da organização desses documentos, existe uma série só para
“Papeletas”, assim como uma apenas para “Exposições”. ARQ pretende fazer remissivas entre
os documentos de diferentes tipologias relativos a uma mesma exposição (fotografias, folders,
CDs, DVDs etc.), ou ainda remissivas temáticas (que liguem documentos sobre um mesmo
assunto).
O Arquivo Institucional e o Histórico possuem uma Biblioteca Digital, o DOCPro, onde
parte da documentação textual está inserida. ARQ tentou implantar o banco de dados AtoM,
mas não conseguiu, pois era necessário um servidor de internet e um programador para ajustar
a plataforma. No entanto, o setor de Museologia está começando a utilizar o Tainacan,
ferramenta que pretende reunir os acervos museológico, bibliográfico e arquivístico.
No que se refere a documentos ou arquivos pessoais de artistas, ARQ esclareceu que
não os possui no Arquivo Institucional, mas que eles podem existir no Arquivo Histórico.
Sobre documentos relativos a body art, performances e happenings, ARQ localizou apenas
dois dossiês que, por conterem documentos recentes, estavam sobre a guarda de outro setor
(Diretoria). Esses dossiês se referiam às exposições “Rio dos Rios” (2019) e “Marcantonio
Vilaça” (2018). No primeiro havia uma referência ao nome da performer e no segundo foram
encontradas duas fotos da performance realizada no dia da abertura da exposição. ARQ
explicou que é possível, portanto, encontrar documentos relacionados às ações artísticas
citadas a partir do título da exposição, o que significa que o pesquisador precisará ter essa
informação prévia. Tal ocorre, pois esse tipo de pesquisa não é usual no MHN. Ao ser
perguntada sobre contratos com artistas, ARQ afirmou que antes da implantação do SEI
(Sistema Eletrônico de Informações) esses documentos eram enviados ao Arquivo, com a
ficha de acompanhamento, formando dossiês. Após o SEI o Arquivo perdeu o controle dessa
produção, pois não existe mais documentação física, tudo é informatizado. Então ARQ
acredita que se esta documentação administrativa existir, está no SEI, sendo acessada pelos
setores correspondentes.
158
Figura 27 – Detalhe de reproduções fotográficas da performance “Verzuimd Brasiel – Brasil
Desamoparado”, de Daniel Santiago, e do folder da exposição “Marcantonio Vilaça” (2018)
Fonte das duas imagens: Arquivo do Museu Histórico Nacional. Fotografias feitas pela autora.
Sobre registro das ações artísticas alvo da pesquisa, ARQ afirmou que a Assessoria de
Comunicação Social (ASCOM), formada por um servidor e uma estagiária, possui câmera
fotográfica e registra os eventos que acontecem na instituição. ARQ explicou que eles
mantêm um arquivo paralelo e que, apesar das solicitações da mesma para que enviem as
fotografias, geralmente isso não ocorre. Ela disse, ainda, que são produzidos flyers, folders,
cartazes, que também permanecem na ASCOM e elucidou que as fotografias antigas são
guardadas no arquivo fotográfico do Institucional, assim como os cartazes e folders que são
armazenados em mapotecas. As fotografias e os folders mais recentes permanecem na
ASCOM, sendo que para ARQ é mais fácil obter os folders. Ela procura separar dois
exemplares para guarda no Arquivo Institucional.
O Arquivo Institucional não possui arquivos de artistas (fundos documentais) cuja
linguagem seja performance, body art e happening. Acerca da relação entre documentos
arquivísticos e museológicos, ARQ explicou que esta provavelmente será destacada com o
uso do Tainacan. Para os documentos institucionais, conforme já explicado, se procurará
acrescentar remissivas para documentos de tipologias diferentes sobre uma mesma exposição,
ou sobre uma temática específica. ARQ não soube informar se existem vestígios de
performances guardados na reserva técnica da Museologia.
159
5.3.5.2 Análise dos dados apresentados sobre o MHN
Entre as instituições já mencionadas, o MHN pareceu ser a que tinha o setor de Arquivo
mais estruturado. Tal pode ser relacionado à existência e atuação da arquivista, com o uso de
plano de classificação e de tabela de temporalidade, avaliação documental e controle da
documentação produzida. Porém este trabalho vê-se ameaçado pela implantação do SEI,
dissociada da preocupação com a preservação digital. Há uma facilidade na tramitação de
processos e realização de projetos possibilitada por esse Sistema, mas a memória dessas ações
fica prejudicada. ARQ demonstrou preocupação sobre esse aspecto, mas pareceu esperançosa
com a possibilidade do uso do banco de dados Tainacan, no que se refere à possibilidade de
inserir toda a documentação institucional em um sistema melhor que a biblioteca digital.
Apesar de requisitar a entrega de documentação em papel ainda existente nos setores, tal
processo não ocorre de maneira fácil nem sistematizada. A maioria dos departamentos da
Instituição mantém documentos consigo por alguns anos e, no caso da ASCOM, tal
documentação é mantida em arquivo paralelo. Por esses motivos os documentos disponíveis
sobre performance, eventos realizados mais recentemente, não se encontravam no arquivo,
mas na própria ASCOM e na Diretoria. Apesar disso, o registro de eventos é realizado,
ocorrendo a localização de dois dossiês pertinentes à pesquisa.
Os dossiês do Arquivo Institucional são divididos em séries, das quais ARQ citou dois
exemplos: “Exposições” e “Papeletas”. Um mesmo dossiê, antes do SEI, mantinha os
documentos relativos ao processo de ocorrência de uma exposição, como memorandos,
contrato com o artista, entre outros. Nesse sentido pode-se dizer que havia uma manutenção
da organicidade. No entanto, existem outras tipologias de documentos sobre a exposição,
como fotografias e folders. Para estes, ARQ pensa em inserir remissivas para mostrar que os
documentos são relacionados. A relação entre documentos arquivísticos e museológicos não
pode ser averiguada, posto que ARQ não soube informar se havia vestígios das ações
artísticas pesquisadas na reserva técnica da Museologia. Com relação à ligação com outros
documentos museológicos, ARQ citou o Tainacan (projeto ainda em implantação), o que
permite inferir que esta ainda não é registrada.
Para uma melhor avaliação seria necessário agendar novas visitas com os setores
ASCOM e Museologia. E-mails foram enviados no mesmo dia para os responsáveis, porém
não houve resposta. Infelizmente, não foi possível realizar estas entrevistas e obter dados mais
apurados.
160
5.3.6 Museu da República (MR)
O MR, instalado em prédio histórico cuja construção terminou em 1867, foi inaugurado
em 1960. Antes de abrigar o Museu, o Palácio do Catete exerceu diversas funções, entre as
quais a de sede da Presidência da República, permanecendo assim até a mudança da Capital
Federal para Brasília. O acervo arquivístico é divido em histórico (29 coleções relacionadas a
acontecimentos da história republicana brasileira) e institucional, com documentação
referente à trajetória do museu em um total de noventa mil documentos, entre fotografias,
mapas, documentos textuais, sejam dos arquivos pessoais ou da Instituição. O acervo
bibliográfico é formado por folhetos, livros, jornais e periódicos, somando cerca de dezesseis
mil títulos, além de DVDs e CDs relativos ao período republicano da história do Brasil e a
demais áreas como arte e arquitetura, arquivologia, museologia, ciências sociais,
biblioteconomia, educação, entre outras. O acervo museológico possui mais de oito mil peças,
entre mobiliário, esculturas, pinturas, porcelanas, coleções de objetos pessoais etc. O museu
possui reserva técnica, atrelada ao setor de Museologia.155
O MR, assim como a CCL e MHN foi visitado apenas uma vez. Tentou-se agendamento
nesta Instituição em março de 2019 e novamente em janeiro e fevereiro de 2020,
conseguindo-se data para o dia dezessete de fevereiro de 2020. O Arquivo é denominado
Histórico e Institucional. O Histórico está sob a responsabilidade de uma técnica com
formação em história, enquanto que o Institucional é organizado por técnica com formação
em arquivologia. No entanto, a arquivista estava em licença capacitação e por isso, a
historiadora (HST) realizou o atendimento.
Durante a troca de e-mails em 2019 com a curadora da Galeria do Lago (o Arquivo não
respondeu à mensagem), foi confirmada a existência de uma ação voltada para performances
chamada “Jardim das Delícias”, que foi realizada e documentada pela Galeria. Por isso
insistiu-se no contato e em 2020, através de telefone e envio de e-mails com mais detalhes
sobre a pesquisa foi possível agendar visita e gravar entrevista em áudio, com duração de
18min51s, tendo-se também acesso aos documentos.
A partir da observação dos documentos presentes em três caixas e conversa informal
antes da gravação do áudio, soube-se que: ocorrem exposições de longa e curta duração no
MR, sendo que as de curta duração são realizadas na Galeria do Lago. A Instituição produz
eventos, mas também recebe eventos externos. Essa caraterística influenciou a classificação
155
Informações disponíveis no site do museu e em: https://www.museus.gov.br/wp-content/uploads/2017/07/
Plano-Museologico-do-Museu-da-Republica.pdf. Acesso em: 25 fev. 2020.
161
de algumas séries de documentos arquivísticos institucionais: dentre as áreas-fim mapeadas
pela arquivista (“Gestão de Acervo”, “Preservação de Acervo”, “Pesquisa”, “Evento Cultural”
e “Ações Educativas”), a de “Evento Cultural” recebeu as séries “Artes”, “Cessão de Espaço”,
“Exposição de Curta Duração”, “Exposição de Longa Duração”, “Curso”, “Seminário” e
“Palestra”. As exposições de curta duração foram organizadas por ordem alfabética.
As caixas localizadas por HST foram “Artes – A-V”, “Evento Cultural. Artes. Cessão
de Espaço” e “Evento Cultural. Exposição Curta Duração. J”. Os documentos dentro das
caixas eram, em sua maioria, separados por uma pasta de papel com ph neutro. Nestas pastas
havia os seguintes documentos: folders de eventos externos (não produzidos pela Instituição
e, portanto, relacionados à cessão de espaço) relativos ou não à arte; folders, projetos,
programas, CDs (vídeos), releases, cadernos, provas de convites de eventos e de exposições
produzidos pelo MR; fotografias de evento externo (provavelmente recebidas como doação);
portarias, manuscritos com lista de nomes, comunicados internos, clippings de exposições etc.
As pastas de papel recebem o título da atividade (“Evento Cultural”), o título da série
(“Artes”, “Cessão de Espaço”) e o título do documento ou do evento. Os documentos dentro
das séries não estavam separados por tipologia documental. Documentos sobre a exposição
“Jardim das Delícias” foram encontrados na terceira pasta.
Figura 28 – Imagens das Caixas onde a documentação institucional é guardada
Fonte das três imagens: Fotografias feitas pela autora.
162
Figura 29 – Detalhe da pasta de ph neutro, exposição “Jardim das Delícias”, 2006-2007
Fonte: Arquivo do Museu da República. Fotografias feitas pela autora.
Figura 30 – Detalhe do folder, do DVD com gravação das performances e frame do vídeo da
performance “Lurdinha/Chá das cinco”, de Luciano Rocha, 2006-2007
Fonte das três imagens: Arquivo do Museu da República. Fotografias feitas pela autora.
163
5.3.6.1 Dados obtidos sobre o MR através da entrevista semiestruturada
Segundo a HST, o MR possui um setor de Arquivo Histórico e Institucional, que guarda
apenas acervo permanente. O Histórico possui coleções de origem privada (arquivos pessoais
de personalidades políticas e de artistas) e uma de origem pública (Centro Pró-Memória da
Constituinte). O Institucional guarda os documentos produzidos e acumulados pela
Instituição, mas não faz a gestão documental. O plano de classificação (denominado quadro
de arranjo pela equipe do Museu) utilizado para as atividades-meio é o feito pelo CONARQ.
Já o quadro para as atividades-fim foi criado pela própria arquivista, já que o anunciado
quadro do Ibram ainda está sendo desenvolvido.
O Institucional recebe documentação dos outros setores, mas tal transferência não se dá
por meio de uma política regular, e sim conforme a necessidade dos próprios setores. Assim,
o Institucional possui documentos da Galeria que abrangem performances, mas não
necessariamente toda a documentação relacionada. Situação distinta ocorre com documentos
legais e financeiros, pois estes geram processos que são, posteriormente, enviados ao
Institucional. Um mesmo banco de dados é usado para documentos históricos e institucionais,
porém HST explicou que a documentação institucional ainda está em fase de tratamento. Em
um primeiro momento, a arquivista realizou a triagem, higienizou o material e começou o
processo de classificação. Mas a parte que se refere à descrição ainda não foi feita, por isso
não existe conteúdo relativo ao Arquivo Institucional inserido no sistema.
A respeito da existência de documentos e arquivos pessoais de artista e de outras
instituições, HST esclareceu que possui a Coleção privada “Carlos Latuff”, com as charges
originais do artista, e a coleção pública “Centro Pró-Memória da Constituinte”. Sobre
documentos relacionados a performances, happenings e body art, existem folders, catálogos,
fotografias e vídeos. No que concerne aos registros dessas ações, eles são realizados pela
Galeria, porém não se sabe se de maneira sistematizada. Os arquivos Histórico e Institucional
não possuem, de acordo com HST, arquivos pessoais de artistas das ações artísticas alvo da
pesquisa. Os arquivos pessoais e públicos que existem são relativos à área de atuação do
Museu, ou seja, política e história da República.
Acerca da relação existente entre documentos arquivísticos e museológicos, HST
esclareceu que no caso das coleções “Latuff” e “Centro Pró-Memória da Constituinte”,
documentos foram enviados para os setores de Museologia, Biblioteca e Arquivo, sendo que a
proveniência foi mantida. O termo de doação também é outro documento que lista e une em
forma de registro todos esses itens. Há ainda um instrumento de pesquisa onde são feitas
164
remissivas, no entanto esse procedimento está sendo realizado com as coleções/fundos
novas(os). A relação existente entre documentos de diferentes acervos com mesma
proveniência ainda não foi registrada, porém é conhecida pelos profissionais, segundo
afirmou HST. Sobre vestígios de performances, HST, que faz parte da Comissão de Acervo,
não está ciente sobre nenhum envio da Galeria do Lago para a Reserva Técnica do Museu.
5.3.6.2 Análise dos dados apresentados sobre o MR
Acerca do Arquivo Histórico e Institucional, percebe-se que a organização da
documentação histórica se dá por meio de fundos (segundo o conceito arquivístico) e que tal
proveniência é observada pelos setores da Museologia, da Biblioteca e do Arquivo.
Entretanto, o registro dessa relação é realizado por meio de remissivas inseridas nos
instrumentos de pesquisa (sendo apenas aplicadas às coleções novas). Assim, entende-se que
o respeito ao fundo é aplicado à documentação do Arquivo Histórico, enquanto que a
observância do conceito da organicidade parece se aplicar em partes do material (não se pode
afirmar sobre a organicidade com segurança, já que não se teve acesso à organização interna
dos fundos).
No que se refere ao tratamento arquivístico dos documentos institucionais permanentes,
a arquivista realizou um levantamento da documentação, procurando identificar as atividades-
fim tanto nos níveis superiores quanto nas séries. Porém, em “Evento Cultural” inseriu-se um
assunto “Artes”, que acabou por tornar confusa a classificação e a guarda de documentos.
Como exemplo, pode-se citar a exposição “Jardim das Delícias” que, apesar de ser um evento
artístico, não foi encontrado na caixa “Artes”, mas na caixa “Evento Cultural – Exposição de
Curta Duração – J” (apesar de na pasta de papel estar escrito “Evento Cultural – Artes –
Jardim das Delícias, 2006”, confirme fig. 30 – detalhe da pasta de papel neutro). Percebe-se,
portanto, que um mesmo documento ou pasta de documentos pode ser inserido em caixas
distintas, o que revela um problema de classificação.156
156
Os resultados da terceira fase da pesquisa serão apresentados nas “Considerações Finais”.
165
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este caminho percorrido entre as artes, a arquivologia e a CI, onde se procurou
conhecer e analisar uma das possíveis relações entre as mesmas, ou seja, a organização dada
pelos arquivos de museus a documentos e arquivos pessoais de artistas relativos a happenings,
performances e body art, possibilitou chegar a algumas considerações.
Durante a pesquisa teórica tornou-se claro que a visão predominante da bibliografia da
área artística acerca dos arquivos e documentos de arquivo difere da visão arquivística, em
especial daquela contida nos manuais. Considerou-se, portanto, pertinente apresentar algumas
definições trazidas pela arte, a fim de introduzir a discussão e evidenciar a complexidade
presente na relação entre arte e arquivologia, não apenas no nível teórico, mas também no
empírico, em situações como a da classificação pelos profissionais das instituições culturais
de documentos de arquivo relacionados à arte efêmera. O arquivo, para a arte, é paradigma,
poética e dispositivo performativo – oportunidade de empreender estratégias artísticas como a
reencenação, a apropriação, a espacialização, a incorporação e o meta-arquivo – local de
vestígio, inscrição, contestação e recapitulação. O arquivo é mais uma fonte da qual a arte se
utiliza para “repetir de maneira diferente”, questionar as diversas histórias escritas a partir dos
documentos e propor um novo olhar. Para a arte, o arquivo é material de criação e, por isso,
recebe tantas definições quanto àquelas propostas pelos artistas.
Com relação à arquivologia, à CI e mesmo à museologia, a pesquisa teórica sobre os
conceitos de arquivo, arquivo público, arquivo privado, arquivo institucional, arquivo pessoal,
arquivo de museu, arquivo de artista, documento de arquivo, documento museológico,
organicidade e informação permitiram demarcar as diferenças entre a visão artística e a
documental, e forneceram a base de conhecimento necessária para a pesquisa empírica. A
partir das definições de Hannesch e Granato foi possível analisar, na visita às instituições, a
classificação dos documentos em “arquivos de museu” e “arquivos em museu”. O aporte
teórico trazido por Deborah Wythe acerca da atuação dos setores/serviços de arquivo nas
funções curatoriais e institucionais (atividades-fim e atividades-meio) auxiliou a análise dos
departamentos/setores responsáveis pela organização de documentos arquivístico nas
instituições visitadas. A teoria de Buckland acerca da informação-como-coisa, visando às
artes efêmeras alvos desta dissertação, ou seja, performances, body art e happenings,
fundamentou a busca por documentos de arquivo de interesse. Mesmo diante da afirmação
dos profissionais entrevistados acerca da “pouca documentação disponível”, entendeu-se que
eventos podem gerar “coisas” – objetos, registros e recriação e, portanto, deveria haver algum
166
documento a respeito dessas manifestações artísticas nos arquivos (conjuntos de documentos,
setores) das instituições. A classificação proposta por Lima sobre as informações contextuais
da obra de arte, entre as quais os documentos de arquivo se incluem, corroborou a
compreensão de que tais documentos são essenciais para a “Informação em Arte”, incluindo
as artes efêmeras, pois, como enfatizaram Rodrigues e Crippa, geralmente o que permanece
dessas ações são o conceito e as representações, encontrados com frequência em registros
arquivísticos.
A respeito da conceituação das artes efêmeras visadas pela pesquisa, a confirmação da
falta de concordância e clareza total entre os teóricos sobre as diferenças entre happenings,
body art e performances permitiu compreender um dos motivos para a dificuldade de
classificação dessas formas artísticas nas instituições visitadas. As classificações fornecidas
pela própria área se interpenetram, são tênues e podem ser observadas tanto na prática dos
artistas quanto nas denominações dadas por estes e pela crítica. Alguns teóricos repudiam a
documentação tradicional das ações (Phelan), outros consideram que o ato de documentar é
aceitável (Jones, Glusberg, Kirby). Independentemente de tais posições, concluiu-se que, no
que tange às próprias ações, os documentos estão presentes. Cartas, convites, descrições e
roteiros das ações, fotografias, vídeos, notícias de jornais, entrevistas, esboços, folders são
alguns dos registros relacionados a essas manifestações, como visto nas ações citadas e como
comprovado pela pesquisa empírica nas instituições culturais.
Outra razão para a dificuldade de classificação dessas artes efêmeras pelas instituições
visitadas é o emprego, pelos museólogos, de tesauros157
desatualizados, os quais são também
usados como fundamentos para bases de dados. As bases utilizadas pelo MAC Niterói e pelo
MAR, à época das entrevistas, não apresentavam os termos “performance”, “body art” e
“happenings”, impedindo/dificultando a classificação dos objetos pertinentes e, portanto,
prejudicando a recuperação dessas manifestações artísticas. No caso do MAR, foi necessário
criar a categoria “vestígios” para abarcar objetos utilizados/criados pelos artistas durante as
“performances” e doados ao museu. E no MAC Niterói, a museóloga acrescentou a frase
“registro de performance”, associada à categoria “vídeo”, para identificar a ação artística
gravada em DVD. Existe, assim, um problema de ordem operacional, que poderia ser sanado
pela consulta a outros instrumentos, como por exemplo, o “Art & Architecture Thesaurus
157
Os tesauros mais conhecidos são: “Thesaurus para Acervos Museológicos”, de Helena Dodd Ferrez, 1987,
“Tesauro de Objetos do Patrimônio Cultural nos Museus Brasileiros”, também de Helena Dodd Ferrez, 2016,
(http://www.tesauromuseus.com.br/) e “Tesauro de Folclore e Cultura Popular Brasileira”, do Iphan, [2006],
(http://www.cnfcp.gov.br/tesauro/apresentacao.html). Destes, apenas o segundo, de 2016 cita performances,
porém em relação a instrumentos musicais e no auxílio à definição do termo “Instalação”, sem o contemplar com
uma definição própria, apesar da existência da grande categoria “6 – Objetos de Atividades Artísticas”.
167
Online”,158
da Getty Foundation. Este tesauro apresenta o termo “performance art” em uma
posição hierárquica, subordinado em ordem crescente às expressões “time-based works”,159
“visual works by material or technique”, “visual works (works)”, “Visual Works (hierarchy
name)”, “Visual and Verbal Communication (hierarchy name)” e, por fim, “Objects Facet”.
Cada nível vem acompanhado por um grupo de informações, como definição, termos
equivalentes nas línguas inglesa, holandesa e espanhola, posição hierárquica, notas adicionais
em holandês e espanhol, conceitos relacionados, fontes e contribuições, entre outras. Os
termos “body art” e “happening” também foram encontrados e as definições propostas para os
três encontram paralelos na pesquisa teórica desenvolvida neste trabalho.
No que tange à pesquisa empírica, esta foi iniciada de maneira bem restrita, voltada
exclusivamente para a identificação e posterior análise dos setores de Arquivo em instituições
cuja tipologia de acervo fosse relacionada à arte e que tivessem recebido as ações artísticas
pertinentes e/ou que possuíssem arquivo de artistas que as houvessem praticado. Porém,
conforme se empreenderam os primeiros contatos e visitas, percebeu-se que são poucas as
instituições culturais que possuem setores de Arquivo confirmados (treze, dos 37 que
supostamente teriam recebido performances), quer institucional, quer histórico. O mesmo se
dá com fundos arquivísticos pessoais de artistas voltados para happenings, performances e
body art (apenas um foi encontrado: fundo Márcia-X). Assim, apesar de dois dos objetivos
específicos interligados serem o levantamento de instituições que possuem arquivos pessoais
de artistas e cuja estrutura contenha setores de arquivo, estes objetivos precisaram ser
ampliados para: instituições que tenham recebido essas ações artísticas e que possuam
documentos relacionados. Outro conceito estendido foi o da organicidade. Ao invés de se
buscar a preservação das relações apenas entre os documentos de um mesmo conjunto (no
caso de um arquivo pessoal ou fundo institucional fechado – arquivos de artistas, exposições
destes artistas e vestígios das ações), procurou-se saber se a documentação referente aos
mesmos processos era interligada. Exemplos de atividades pesquisadas são: performances,
body art e happenings ocorridos no local, geralmente durante exposições; vestígios dessas
ações artísticas existentes na Instituição.
Sobre a falta de setores de arquivos confirmados, não se pretende afirmar que as
instituições não têm documentação ou que não procuram organizá-las, mas sim que a maioria
não possui um departamento/setor específico, formal, de arquivo, um arquivista contratado ou
158
Disponível em: http://www.getty.edu/vow/AATFullDisplay?find=performance&logic=AND¬e=&English
=N&prev_page=1&subjectid=300121445. Acesso em: 26 maio 2020. 159
Obras baseadas no tempo, ou seja, trabalhos que se realizam em um período de tempo e em um determinado
espaço, como visto em Cohen (2002), quarta seção desta dissertação.
168
mesmo o emprego de instrumentos arquivísticos. Nessas instituições (algumas das visitadas e
outras contatadas por telefone e/ou e-mail, em conversa informal), os documentos correntes,
relacionados às atividades-meio e fim, são organizados e mantidos pelos setores de
Administração, Finanças, Museológico, Comunicação etc., sob a responsabilidade desses
respectivos profissionais, sem a codificação proporcionada por um plano de classificação e
sem a observância dos prazos de guarda determinados por uma tabela de temporalidade – ou
seja, sem avaliação e gestão documental. Os documentos considerados permanentes,
relacionados às atividades-fim (exposições, coleções) ficam sob a responsabilidade de um
departamento (quando este existe) que trata da documentação voltada para a pesquisa (livros,
catálogos, entrevistas, folders, fotografias, vídeos, recortes de jornais), com o objetivo de
atender demandas dos pesquisadores externos e internos. Como o propósito é a preservação
para o acesso rápido ao conteúdo dos documentos, sem haver a preocupação com o contexto
de produção dessa documentação, não se pode afirmar com certeza que os princípios
arquivísticos (respeito aos fundos, organicidade), são observados.
Ampliação semelhante à da pesquisa empírica ocorreu nos critérios para a seleção das
instituições alvo da pesquisa online (que teriam recebido as manifestações artísticas). A
princípio seriam pesquisadas apenas aquelas que possuíssem tipologia de acervo denominada
“Artes” e “Artes Visuais”. No entanto, conforme pesquisa teórica e visitas aos primeiros
museus, percebeu-se que demais tipologias presentes no GMB, na plataforma MuseusBr e no
portal Museus do Rio deveriam ser consideradas, como “Imagem e Som” (vídeos),
“Biblioteconômico/Bibliográfico” (já que algumas instituições guardam documentação
audiovisual e livros de artistas nas bibliotecas), Documental e a própria tipologia
“Arquivístico”. Mas a abrangência não se encerrou neste aspecto. Se era necessário incluir
todas as instituições que houvesse recebido performances, o uso da tipologia como critério
ainda representava exclusão. Portanto, se voltou a pesquisar na internet todas as 166
instituições – quatorze em Niterói e 152 no Rio de Janeiro – em busca da ocorrência de
performances nesses locais.
Deste total, somente 37 foram identificadas como tendo recebido performances (35 no
Rio e duas em Niterói), conseguindo-se visitar apenas seis. Dos 35 museus160
que abrangem
áreas (tipologia e temática de acervo) como artes, ciências, história, ecologia, defesa pública
história natural etc. o tratamento arquivístico é inicial ou inexistente (apenas treze instituições
possuem setor de arquivo, sendo que alguns ainda estão em tratamento, como o MR –
160
Dois foram excluídos: o MHExFC e o Observatório do Valongo, com os quais não se conseguiu nenhum
contato.
169
Arquivo Institucional – e o Solar de Grandjean de Montigny).161
Por isso, foi necessário
ampliar a pesquisa, com os objetivos específicos passando da análise do tratamento
arquivístico à análise do tratamento geral dado pelas instituições aos documentos
considerados de arquivo. Quando possível, obteve-se informação sobre a documentação
museológica e bibliográfica. As instituições visitadas foram o MAM Rio, o MAR, o MR, o
MAC Niterói, o CCL e o MHN. Destas, o CCL e o MHN foram adicionados após a ampliação
dos critérios de seleção das instituições.
Das instituições visitadas, a metade emprega arquivistas: MAM Rio, MHN e MR. O
CCL, o MAR e o MAC Niterói não têm esse profissional em seu corpo de funcionários. No
entanto, o MAR e o CCL contrataram equipes terceirizadas para auxiliar na organização de
seus acervos, já que possuem documentação arquivística. Em três instituições o (a)
bibliotecário (a) é o responsável pelos documentos de arquivo: MAR, CCL e MAC Niterói.
Dos três arquivistas, conseguiu-se contato com apenas um, pois os outros dois não estavam
disponíveis (férias e licença capacitação). No CCL, além do bibliotecário, que cuida do
arquivo corrente, o museólogo é responsável pelo arquivo permanente. Percebe-se, portanto,
que nas instituições culturais há uma indefinição acerca do profissional que deve se
responsabilizar pelos setores e documentos de arquivo, incluindo os relacionados às artes
efêmeras, tanto a nível teórico (pois, nas entrevistas, a maioria dos profissionais reconheceu a
falta do arquivista) quanto a nível prático.
No que se refere à organização da documentação segundo os princípios arquivísticos da
organicidade e do Respeito ao Fundo, o MHN pareceu ser o mais organizado. Percebe-se que
as instituições voltadas para a área histórica (MHN, MR e mesmo o CCL, por se preocupar
com a história da Light e da evolução da energia elétrica) possuem setores de arquivo mais
estabelecidos. Entretanto, a avaliação sobre a organicidade e o Respeito aos Fundos corre o
risco de ser arbitrária, já que se conseguiu analisar apenas documentação referente a alguns
setores, e não às instituições como um todo. Pensa-se que isso ocorreu principalmente porque
a metade delas não possui setor de arquivo que centralize a documentação (MAR, MAM Rio
e MAC Niterói) e aquelas que possuem (CCL, MHN, MR) não têm uma política consolidada
de transferência/aquisição dos documentos.
Acerca dos documentos sobre performances, body art e happenings o MAM Rio se
destacou pelo acesso às ações artísticas. Os bancos de dados museológico e arquivístico da
Instituição podem ser acessados pela equipe de pesquisa, que consegue retornar resultados
161
Informação obtida por telefone e/ou por e-mail. A lista destas instituições encontra-se no apêndice C.
170
sobre performances. No banco de dados museológico, documentos de arquivo associados aos
vestígios de performances são citados. A classificação das ações artísticas é feita pelo setor de
Museologia, que já possui um modus operandi (conversa com os artistas, com os curadores,
além de o próprio setor ser responsável pela concepção das exposições). O registro dos
eventos é sistemático e acontece há muitos anos, o que garante pelo menos a existência de
fotografias sobre happenings, performances e body art acontecidos no MAM Rio.
O CCL também possui um controle satisfatório sobre as performances que ocorrem na
instituição. Isso provavelmente se deve à constância da realização dessas ações no Centro, já
que este possui um acordo com a EBA/UFRJ. Nas outras instituições, porém, constatou-se
que a busca pelas ações artísticas alvo da pesquisa só foi possível através do nome das
exposições em que estas aconteceram. E mesmo com o nome, nem sempre se encontram
registros das ações artísticas, porque não há uma política para que tal seja feito regularmente.
Novamente, no entanto, esta avaliação pode ser arbitrária, pois o MHN possui documentos
junto a setores específicos que não puderam ser visitados.
Uma possível explicação para a dificuldade da maioria das instituições contatadas e das
visitadas acerca dos documentos relacionados às artes efêmeras pode se referir ao desafio de
classificá-los em “arquivos de museu” e “arquivos em museu”. Como visto na pesquisa
teórica (Wythe, Hannesch e Granato, Tessitores, Martins e Indolfo), obras e documentos
doados pertencem à instituição, mas não foram produzidos por ela e, portanto, são
considerados de custódia e ligados à função curatorial. Já os documentos institucionais são os
produzidos a partir das diversas atividades da instituição, principalmente aquelas referentes à
função administrativa, ou seja, responsabilidades legais, fiscais, administrativas, de
divulgação e/ou ainda uma função histórica de preservação da trajetória e testemunho das
escolhas políticas e metodológicas da instituição. Como body art, performances e happenings
são ações realizadas nos espaços expositivos, e não objetos físicos doados, como lidar com
elas? Como eventos institucionais, que precisam ser registrados já que se referem às
atividades da instituição (como a da difusão cultural/comunicação – lei n. 11.904/2009)? Ou
eventos externos que, por não terem relação com a coleção museológica, não precisam de
registro? É necessário recolher algum objeto utilizado/criado durante essas ações? Os
documentos de artes efêmeras são desafiadores porque a própria ação artística não parece se
encaixar no modelo de obra que geraria especificamente “arquivos de museu” ou “arquivos
em museu”.
No que concerne ao cumprimento dos objetivos específicos (levantamento e revisão de
literatura dos conceitos operadores fundamentais; levantamento das instituições com setores
171
de arquivos e fundos arquivísticos de artistas do happening, da body art e da performance e,
principalmente, verificação da aplicação da teoria arquivística no tratamento da documentação
relacionada às artes efêmeras alvo da pesquisa, a partir das entrevistas e da análise dos
instrumentos de organização do acervo), acredita-se que este foi substancialmente alcançado.
O mesmo pode ser observado para o objetivo geral. Entende-se que ele foi ampliado, já que
além de setores de Arquivo foram analisados setores de Pesquisa e Documentação em geral
(incluindo Bibliotecas) e setores de Museologia. Entretanto, essa análise não foi completa.
As dificuldades para cumpri-los em sua totalidade se referiram a limitações dos próprios
instrumentos utilizados (entrevista semiestruturada, pesquisa na internet, contato por e-mail e
telefone), subjetividades inerentes à pesquisadora e aos entrevistados e abrangência da própria
pesquisa, que ao longo de sua fase empírica demonstrou a necessidade de se considerar o
maior número de instituições possível e, nestas, todos os profissionais e setores envolvidos
com a documentação (setores como Comunicação, Administrativo, Direção – que guardam
fotografias, material de divulgação, contratos, projetos de artistas, e-mails, entre outros).
O que se pode afirmar mais seguramente é, que a recuperação de documentos sobre
performances, body art e happenings depende de diversos fatores inerentes à organização
documental das instituições: equipes que entendam o conceito dessas ações artísticas; bancos
de dados museológicos, arquivísticos e bibliográficos que conversem entre si (ou uma equipe
que possa acessá-los e fazer as relações, como no caso do MAM Rio), ou seja, uma maior
interoperabilidade entre as unidades de informação das instituições culturais; um setor de
arquivo que centralize a recuperação, assim como um profissional que faça um levantamento
da documentação e crie um plano de classificação, uma tabela de temporalidade e
instrumentos de pesquisa (inventários, guias); um banco de dados robusto que permita a
inserção de documentos e informações por parte de todos os setores, assim como links entre a
documentação; política de registro dos eventos realizados nos locais; equipes maiores –
praticamente todas as instituições relataram possuir equipes pequenas, o que dificulta o
trabalho, dadas as muitas demandas existentes.
Entende-se ainda que a preocupação com a documentação de uma atividade tão
específica é necessária porque happenings, performances e body art são acontecimentos,
eventos. São ações que não geram como produto uma obra artística física ou mesmo virtual.
Uma pequena prova se deu na pesquisa empírica, quando a maioria das instituições contatadas
alegou não possuir documentação a respeito e, das seis visitadas, em três os profissionais se
desculparam por não terem muito material para apresentar (mesmo em locais onde ocorreram
várias performances).
172
Se não houver a preocupação de relacionar, organizar e preservar os documentos
produzidos/recebidos pelos setores Administrativo (contratos, projetos, e-mails, termo de
doação etc.), Museológico (ficha catalográfica de vestígios, concepção da exposição e do
trabalho artístico, lista de obras etc.), Comunicação/Design (fotografias, vídeos, folders,
convites, catálogos etc.), Biblioteca/Pesquisa/Educativo (clippings, ficha catalográfica,
dossiês etc.), Arquivo, entre outros, a informação que será disponibilizada para os futuros
pesquisadores acerca dessas manifestações artísticas provavelmente será ínfima, dificultando
a produção de conhecimento sobre as mesmas. Ademais, sem documentos, a evidência de que
essas manifestações artísticas ocorreram e das atividades da instituição fica seriamente
comprometida.
173
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185
APÊNDICE A – Lista de instituições que receberam performances (pesquisa online)
Rio de Janeiro
1 Centro Cultural Banco do Brasil Rio de Janeiro
2 Museu Casa de Benjamin Constant
3 Instituto Moreira Salles
4 Solar Grandjean de Montigny – Museu Universitário da PUC RJ
5 Museu de Imagens do Inconsciente
6 Museu da República
7 Museu Bispo do Rosário de Arte Contemporânea
8 Museu Nacional de Belas Artes
9 Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro
10 Museu do Amanhã
11 Museu de Arte do Rio
12 Fundação Casa de Rui Barbosa
13 Museu da História e da Cultura Afro-brasileira
14 Fundação Eva Klabin Rapaport
15 Centro Cultural Correios Rio de Janeiro
16 Museus Raymundo Ottoni de Castro Maya - Museu do Açude
17 Centro Municipal de Arte Hélio Oiticica
18 Museu Histórico Nacional
19 Museu da Maré
20 Museu Histórico do Exército e Forte de Copacabana
21 Centro Cultural Municipal Oduvaldo Vianna Filho – Castelinho do Flamengo
22 Museu de Favela
23 Fundação Planetário da Cidade do Rio de Janeiro - Planetário da Gávea
24 Centro Cultural Light
25 Museu da Justiça – Centro Cultural do Poder Judiciário
26 Memorial Municipal Getúlio Vargas
27 Casa de Cultura Laura Alvim
28 Casa da Marquesa de Santos – Museu da Moda Brasileira
29 Paço Imperial - Centro Cultural do IPHAN/MinC
30 Fundação Casa França Brasil
31 Instituto de Pesquisa e Memória Pretos Novos
32 Centro Cultural Municipal Parque das Ruínas
33 Centro Cultural Municipal Laurinda Santos Lobo
34 Observatório do Valongo
35 Caixa Cultural Rio de Janeiro
Niterói
1 Museu de Arte Contemporânea de Niterói
2 Solar do Jambeiro
186
APÊNDICE B – QUESTIONÁRIO SOBRE A ORGANIZAÇÃO DOS DOCUMENTOS
Questionário para instituições que receberam performances, body art e happenings:
1. Possui setor ou departamento responsável pela guarda e organização de documentos?
a. Em caso afirmativo, possui arquivo corrente e/ou histórico?
i. Em caso afirmativo, como é organizada a documentação? Possui plano
de classificação/quadro de arranjo?
2. Além dos documentos da própria instituição, guarda documentos e arquivos pessoais
de artistas e de outras instituições? Onde (no Arquivo ou em setor de Museologia)?
Quais?
3. Possui documentos referentes à performance, body art e happening realizadas no
Museu?
4. Possui registro dessas ações artísticas realizadas no Museu? Quais? Onde essa
documentação (catálogos, cartazes, material de divulgação) se encontra?
5. Possui arquivos de artistas que realizaram performance, body art e happening neste ou
em outros museus? Como são organizados?
6. Caso haja documentação arquivística e museológica sobre um mesmo artista/obra, elas
são relacionadas?
7. Caso haja vestígios/partes de performances, body art e happenings guardadas no
Museu, o que é feito deles? Podem ser expostos?
187
APÊNDICE C – LISTA DE INSTITUIÇÕES QUE RECEBERAM PERFORMANCES
(PESQUISA ONLINE) E QUE POSSUEM SETOR DE ARQUIVO CONFIRMADO
Rio de Janeiro
1 Centro Cultural Banco do Brasil Rio de Janeiro
2 Museu Casa de Benjamin Constant
3 Instituto Moreira Salles Rio de Janeiro
4 Solar Grandjean de Montigny – Museu Universitário da PUC RJ
5 Museu da República
6 Caixa Cultural Rio de Janeiro
7 Museu Nacional de Belas Artes
8 Museu da Justiça – Centro Cultural do Poder Judiciário
9 Fundação Casa de Rui Barbosa
10 Centro Cultural Correios Rio de Janeiro
11 Museus Raymundo Ottoni de Castro Maya - Museu do Açude
12 Museu Histórico Nacional
13 Centro Cultural Light