A Neurociência e o Futuro da Psicanálise - do Prêmio Nobel, Eric R. Kandel

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A Biologia e o futuro da Psicanálise: um novo referencial intelectual para a psiquiatria revisitado Eric R. Kandel, MD 1 R. Psiquiatr. RS, 25'(1): 139-165, jan./abr. 2003 “We must recollect that all of our provisional ideas in psychology will presumably one day be based on an organic substructure” Sigmund Freud, “ On Narcissism” “The deficiencies in our description would probably vanish if we were already in a position to replace the psychological terms with physiological or chemical ones... We may expect (physiology an chemistry) to give most surprising information and 1 Eric Kandel é destacado neurocientista e recebeu o prêmio Nobel de 2000. (N. do R.) Eric Kandel é Professor de Fisiologia e Psiquiatria do Center for Neurobiology and Behavior do Colégio de Médicos da Columbia University. É também Investigador Sênior do Howard Hughes Medical Institute. Diretor fundador do Center for Neurobiology and Behavior e membro da National Academy of Sciences. Premio Nobel de 2000.

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A Biologia e o futuro da Psicanálise:um novo referencial intelectual para a

psiquiatria revisitado

Eric R. Kandel, MD1

R. Psiquiatr. RS, 25'(1): 139-165,jan./abr. 2003

“We must recollect that all of our provisional ideasin psychology will presumably one day be based on

an organic substructure”Sigmund Freud, “ On Narcissism”

“The deficiencies in our description would probablyvanish if we were already in a position to replace

the psychological terms with physiological orchemical ones... We may expect (physiology an

chemistry) to give most surprising information and1 Eric Kandel é destacado neurocientista e recebeu o prêmio Nobel de2000. (N. do R.)Eric Kandel é Professor de Fisiologia e Psiquiatria do Center forNeurobiology and Behavior do Colégio de Médicos da Columbia University. Étambém Investigador Sênior do Howard Hughes Medical Institute. Diretorfundador do Center for Neurobiology and Behavior e membro da National Academy ofSciences. Premio Nobel de 2000.

we cannot guess what answers it will return in a fewdozen years of questions we have put to it. They

may be of a kind that will blow away the whole ofour artificial structure of hypothesis”.

Sigmund Freud, “Beyond the Pleasure Principle”

Durante a primeira metade do séculoXX, a Psicanálise revolucionou nossa

compreensão da vida mental. Elaproporcionou um conjunto surpreendentede novos insights sobre os processos

inconscientes, o determinismopsíquico, a sexualidade infantil e,talvez, o tema mais relevante de

todos, a irracionalidade da motivaçãohumana. Em contraste com esses

avanços, as conquistas da Psicanálisedurante a segunda metade do século

foram menos impressionantes. Embora opensamento psicanalítico continue aprogredir, ultimamente tem havidorelativamente poucos novos insights

relevantes, com a possível exceção dealguns avanços na área do

desenvolvimento infantil (para uma

revisão dos progressos recentes, ver4,7). Extremamente relevante e

frustrante é o fato da Psicanálise nãohaver evoluído cientificamente. Maisespecificamente, ela não desenvolveumétodos objetivos de experimentaçãodas ideias brilhantes que formulou.

Como resultado, a Psicanálise entra noséculo XXI com sua influência em

declínio.

Este declínio é lamentável, já que elacontinua a representar a visão mais

coerente e intelectualmentesatisfatória da mente humana. Caso a

Psicanálise queira recuperar seu podere influência intelectual, precisará

fazer mais do que responder àscriticas hostis. Precisará, também, doenvolvimento construtivo por parte

daqueles que a valorizam e queprivilegiam uma teoria sofisticada erealista da motivação humana. Tenhocomo propósito neste artigo sugeriruma forma de revigoramento da teoriapsicanalítica que se dá através do

desenvolvimento de uma relação próximacom a Biologia em geral e com a

neurociência cognitiva em particular.

Uma relação de maior proximidade com aPsicanálise e a neurociência cognitiva

pode proporcionar à Psicanálise oalcance de dois objetivos: um

conceitual e outro experimental. Doponto de vista conceitual, a

neurociência cognitiva pode prover aPsicanálise de novos fundamentos paraseu crescimento futuro, fundamentostalvez mais satisfatórios do que osprovindos da metapsicologia. DavidOlds referiu-se a esta potencialcontribuição da Biologia como

“reescrever a metapsicologia embasadanuma fundamentação científica”. Doponto de vista experimental, os

princípios biológicos poderiam servircomo estímulo para a pesquisa, a fimde testar ideias específicas sobre o

funcionamento mental.

Outros argumentaram que a Psicanálisedeveria se satisfazer com objetivosmais modestos, como esforçar-se por

aproximar sua interação com apsicologia cognitiva, uma disciplina

que tem uma relevância clínica maisdireta e está mais intimamente

relacionada com a Psicanálise. Mesmonão pondo em dúvida essa posição,parece-me, entretanto, que o que éestimulante na psicologia cognitiva

dos dias de hoje, e será ainda mais nofuturo, é a fusão desta com a

neurociência em uma única disciplina,chamada neurociência cognitiva (p. ex.ver 8). É minha esperança que, unindo-

se à neurociência cognitiva nodesenvolvimento de uma nova e

instigante perspectiva da mente e deseus transtornos, a Psicanálise poderárecuperar sua energia intelectual.

Uma interação significativa, do tipoque descrevo aqui, entre a Psicanálisee a neurociência cognitiva exigirá umnovo direcionamento da Psicanálise enovas estruturas institucionais que aencampem. Portanto, o propósito desseartigo é descrever prováveis pontos deintersecção entre a Psicanálise e a

Biologia e delinear como estasinterações podem ser produtivamente

investigadas.

O MÉTODO PSICANALÍTICO E A CONCEPÇÃOPSICANALÍTICA DA MENTE

Antes de destacar os pontosconcordantes entre a Psicanálise e aBiologia, é útil revisarmos algunsfatores que levaram à presente crisedo pensamento psicanalítico, criseesta que resultou em boa parte darestrição de sua metodologia. Nessesentido, três pontos são relevantes:

Em primeiro lugar, no início do séculovinte, a Psicanálise introduziu um

novo método de investigaçãopsicológica baseado na associaçãolivre e na interpretação. Freud nosensinou a escutar cuidadosamente ospacientes de uma nova maneira nuncaantes experimentada. Freud tambémcriou um sistema provisório de

interpretações para dar sentido a algoque, de outra maneira, apareceria comoassociações desconexas e incoerentesdos pacientes. Esta abordagem era tão

singular e poderosa que, por muitosanos, não apenas Freud, como também

outros psicanalistas não menosinteligentes e criativos, poderiam

argumentar que os encontrospsicoterapêuticos entre pacientes e

analistas proveriam um melhor contextopara a investigação. Na verdade, nosseus primórdios, a Psicanálise fezmuitas contribuições úteis ao nossoentendimento da mente, através dasimples escuta dos pacientes, ouatravés da testagem das ideias

provindas do setting analítico emestudos observacionais, um método queprovou ser particularmente útil noestudo do desenvolvimento infantil.

Esta abordagem pode ainda ser útil naclínica porque, como Anton Krisenfatizou, ouve-se diferentemente

agora. Todavia, está claro que, comoinstrumento de pesquisa, este métodoparticular perdeu muito de seu poder

investigatório. Cem anos depois de suaintrodução, há poucas novidades no

campo da teoria que possam seraprendidas apenas através de uma mera

escuta atenta dos pacientes. Nós

devemos, finalmente, reconhecer que,neste ponto do moderno estudo damente, a observação clinica de

pacientes em um contexto psicanalíticoestá sujeita à parcialidade do

investigador, e isso não é uma basesuficiente para uma ciência da mente.

Essa perspectiva é compartilhada mesmopor profissionais experientes da

comunidade psicanalítica. Assim, KurtEissler9 escreveu:

“O decréscimo do impulso da pesquisapsicanalítica não é devido a fatores subjetivospresentes entre os psicanalistas, mas a fatos

históricos de significado mais amplo: asituação psicanalítica já deu tudo o que

continha. Está esgotada quanto apossibilidades de pesquisa, ao menos até que

possamos conceber novos paradigmas.”

Em segundo lugar, como estesargumentos deixam claro, embora a

Psicanálise tenha sido historicamentecientífica em seus objetivos,

raramente foi científica em seusmétodos, ou seja, falhou durante anos

em submeter suas suposições à testagemexperimental. De fato, a Psicanálisetem se saído tradicionalmente bemmelhor em gerar ideias do que em

testá-las. Como resultado desta falha,não foi capaz de progredir como o

fizeram outras áreas da psicologia eda medicina.

As preocupações da moderna ciênciacomportamental em controlar a

influência das particularidades doinvestigador através de experimentos“cegos” têm escapado ao largo daspreocupações dos psicanalistas(exceções, ver 10-12). Com raras

exceções, os dados obtidos nas sessõespsicanalíticas são privados: os

comentários dos pacientes,associações, silêncios, posturas,

movimentos e outros comportamentos sãoprivilegiados. De fato, a privacidadeda comunicação é ponto central para aconfiança produzida pela situação

psicanalítica. Aqui está o obstáculo.Na maior parte dos casos, nós temossomente a narrativa subjetiva do

psicanalista sobre o que ele acredita

haver acontecido. Como o pesquisadorpsicanalítico Hartvig Dahl11 tem

argumentado reiteradamente, evidênciasremotas como estas não são aceitas

como dados na maior parte doscontextos científicos. Os

psicanalistas, entretanto, raramentepreocupam-se com o fato de que suasnarrativas das sessões analíticasestejam fadadas a ser subjetivas e

parciais.

Como resultado, o que Boring13

escreveu, aproximadamente há 50 anos,continua válido:

“Podemos dizer, sem faltar com a consideraçãocom o que foi produzido, que a Psicanálise tem

sido pré-científica. Faltaram experimentos enão foram desenvolvidas técnicas de controle.

No requinte da descrição sem controle, éimpossível distinguir especificações semânticas

dos fatos”.

Assim, no futuro, os institutospsicanalíticos deveriam se esforçarpara ter, no mínimo, uma parcela de

toda a análise supervisionada,

acessível a este exame. Isto éimportante não apenas para a situaçãopsicanalítica, como também para outrasáreas de investigação. Os insightsobtidos nas sessões terapêuticas

inspiraram outros modos deinvestigação fora da situação

analítica. Um exemplo bem sucedido é aobservação direta de crianças e aanálise experimental do apego e dainteração pais-bebê. Para que as

análises futuras experimentais possamse basear nos insights adquiridos na

situação analítica, é de maiorimportância a validação da

confiabilidade científica dessassituações.

Em terceiro lugar, diferentemente deoutras áreas da medicina acadêmica, a

Psicanálise apresenta um sérioproblema institucional. Os institutos

psicanalíticos autônomos, quepersistiram e proliferaram ao longo doséculo passado, desenvolveram suaspróprias abordagens de pesquisa e de

técnica que se diferenciaram de outrasformas de pesquisa. Com algumas

admiráveis exceções, os institutospsicanalíticos não forneceram aos seus

estudantes ou membros ambientesacadêmicos apropriados para a

habilitação para bolsas de pesquisaempírica.

Para sobreviver como força intelectualna medicina e na neurociência

cognitiva, assim como na sociedadecomo um todo, a Psicanálise precisaráadotar novos recursos intelectuais,

novas metodologias e novosplanejamentos institucionais paralevar adiante sua pesquisa. Várias

disciplinas médicas cresceram atravésda

incorporação de metodologias econceitos de outras disciplinas. A

Psicanálise falhou amplamente em fazero mesmo. Porque a Psicanálise ainda

não reconheceu a si mesmo como um ramoda Biologia, ela não incorporou,

dentro daperspectiva psicanalítica da mente, osricos resultados dos conhecimentos da

Biologia sobre o cérebro e acapacidade de controle do

comportamento que ele exerce, surgidosnos últimos cinquenta anos. Isto, é

claro, levanta a seguinte questão: Porque a Psicanálise não foi mais

receptiva à Biologia?

A GERAÇÃO ATUAL DE PSICANALISTASLEVANTOU ARGUMENTOS PRÓ E CONTRA UMA

BIOLOGIA DA MENTE

Em 1894, Freud referiu que a Biologianão tinha avançado o bastante para serútil à Psicanálise. Ele pensou que era

prematuro uni-las. Um século maistarde, um significativo número de

psicanalistas têm uma visão bem maisradical. A Biologia, argumentam, éirrelevante para a Psicanálise. Paradar um exemplo, Marshall Edelson14, em

seu livro “Hypothesys and Evidence inPsychoanalysis”, escreveu:

“Os esforços para vincular a teoriapsicanalítica aos fundamentosneurobiológicos, ou combinar

hipóteses sobre a mente e sobre o

cérebro em uma estrutura só,deveriam ser evitados por

representarem expressões de umaconfusão lógica.

Eu não vejo razão em abandonar aposição de Reiser apesar de suaconhecida crença na “unidade

funcional” da mente e corpo, quandoele considera a relação entre

ambos:

“A ciência da mente e a ciência docorpo usam linguagens diferentes,conceitos diferentes (com níveis

diferentes de abstração ecomplexidade) e um diferente

conjunto de técnicas einstrumentos. O estudo simultâneo e

paralelo, do ponto de vistapsicológico e fisiológico de umpaciente em estado de ansiedade

aguda, produz a necessidade de doisdistintos conjuntos de dadosdescritivos, de medições e de

formulações. Não há forma de uniressas duas ciências na tradução de

uma linguagem comum, ou

compartilhar um marco conceptualcomum, nem são elas formadas porconceitos extensivos que poderiamservir... como intermediários ouisomórficos. Portanto, para todos

os propósitos práticos, nós lidamoscom os conhecimentos de mente ecorpo como universos diferentes.

Virtualmente, todos os nossos dadospsicofisiológicos e psicossomáticos

consistem na essência de dadoscovariantes, demonstrando

coincidência de eventos em doisuniversos do conhecimento em umintervalo de tempo especifico e

numa frequência não casual. (15, p.479)”.

Penso que seja, no mínimo, possívelque os cientistas possam finalmente

concluir que aquilo que Reiserdescreve não reflete apenas,

metodologicamente, o estado atualdas coisas, ou a inadequação donosso pensamento, mas representa,

por outro lado, algo que élogicamente ou conceitualmentenecessário; algo que nenhum

desenvolvimento prático ouconceitual poderá atenuar.

Em minhas diversas interações comReiser, nunca percebi nele dificuldade

alguma em relacionar o cérebro àmente. Contudo, concordo com muito doque Edelson afirma, pois seu ponto de

vista é representativo do que écompartilhado por um númerosurpreendentemente grande de

psicanalistas, até mesmo por Freud emseus últimos escritos. Essa

perspectiva, várias vezes referidacomo hermenêutica em oposição à visãocientífica da Psicanálise, reflete uma

posição que tem dificultado acontinuação do crescimento da

Psicanálise.

Bem, a Psicanálise poderia, casodesejasse, facilmente acomodar-se nosseus lauréis hermenêuticos. Poderia

continuar discorrendo sobre asnotáveis contribuições de Freud e seus

alunos, sobre os insights dosprocessos mentais inconscientes e suasmotivações, que fazem com que sejamos

os indivíduos complexos e singularesque somos18-26. Decerto, no contexto

dessas contribuições, poucosdesafiariam a posição de Freud como omaior pensador moderno da motivaçãohumana ou negariam que nosso século

tem sido permanentemente marcado pelaprofunda compreensão freudiana das

temáticas psicológicas que ocuparam amente ocidental desde Sófocles até

Schnitzer.

Mas, se a Psicanálise se acomodar comsuas descobertas passadas, permaneceráinevitavelmente, como Jonathan Lear eoutros descreveram, uma filosofia damente e a literatura psicanalítica –de Freud a Hartmann, a Erickson, a

Winnicott – deveria ser lida como umafilosofia moderna ou texto poético aolado de Platão, Shakespeare, Kant,

Schopenhauer, Nietzsche e Proust. Poroutro lado, se a disciplina almejaser, como eu acredito que muitos

psicanalistas o fazem, um contribuinteativo na evolução da ciência emergenteda mente, então, a Psicanálise está

ficando para trás.

Dai porque eu concordo com osentimento expresso por Lear27: “Freudestá morto”. Ele morreu em 1939, apósuma produção extraordinária e uma vidacriativa... é importante não ficarmosfixadas nele como um sintoma rígido,

seja para idolatrá-lo ou para denegri-lo.

A BIOLOGIA A SERVIÇO DA PSICANÁLISE

Meu foco neste artigo é em como aBiologia pode revigorar a exploração

psicanalítica da mente. Devo dizer, desaída, que embora esboçamos o que

poderia evoluir para uma significativafundamentação biológica para aPsicanálise, estamos recém nos

primórdios deste processo. Ainda nãotemos uma compreensão satisfatória doscomplexos processos mentais. Mesmo

assim, a Biologia tem feito progressosnotáveis nos últimos cinquenta anos, eos passos não estão diminuindo. Comoos biólogos focalizaram seus esforços

na compreensão do cérebro/mente, amaior parte deles está convencida de

que a mente representará para aBiologia do século XXI o que os genes

representaram para a Biologia doséculo XX. Desta forma, François

Jacob28 escreve:

'“O século que está terminandopreocupou-se com as proteínas e os

ácidos nucleicos. O próximo seconcentrará na memória e no desejo.

Será ele capaz de responder àsindagações?”

Minha ideia é de que a Biologia doséculo vindouro, está, de fato, apta aresponder a algumas questões sobre

memória e desejo e que estas respostasserão mais ricas e significativas seforjadas por um esforço sinérgico

entre Biologia e Psicanálise. Ademais,respostas para estas questões e opróprio esforço de provê-las em

conjunto com a Biologia, irá forneceruma base mais científica para a

Psicanálise.

No próximo século, é muito provávelque a Biologia faça profundas

contribuições para a compreensão dosprocessos mentais, descrevendo a base

biológica dos muitos processosinconscientes, como por exemplo, dodeterminismo psíquico, do papel dosprocessos mentais inconscientes na

psicopatologia e do efeito terapêuticoda Psicanálise. Bem, mas a Biologia

não poderá iluminar imediatamente seusprofundos e centrais mistérios. Estestemas representam, juntamente com a

natureza do inconsciente, os problemasmais difíceis com que a Biologia seconfronta, na verdade que toda a

ciência enfrenta. No entanto, já sepode esboçar as formas pelas quais a

Biologia poderá, pelo menos,clarificar alguns temas psicanalíticoscentrais. Aqui, eu defino oito áreasem que a Biologia poderia se unir àPsicanálise para fazer contribuições

importantes:

1) A natureza dos processos mentaisinconscientes;

2) A natureza da causalidade

psicológica;3) Casualidade psicológica e

psicopatologia;4) Experiência precoce e

predisposição à patologia mental;5) O pré-consciente, o inconsciente

e a córtex pré-frontal;6) Orientação Sexual;

7) A psicoterapia e as mudançasestruturais na mente;

8) A psicofarmacologia comotratamento combinado com a

Psicanálise.

1. PROCESSOS MENTAIS INCONSCIENTESÉ central, para a Psicanálise, a ideiade que desconhecemos muito da nossavida mental. A maior parte do quevivenciamos, do que percebemos,

pensamos, sonhamos ou fantasiamos nãopode ser diretamente acessado atravésdo pensamento consciente. Da mesmaforma, não podemos explicar o que

frequentemente motiva nossas ações. Aideia de processos mentais

inconscientes, além de ser importantepor si mesma, é decisiva para a

compreensão da natureza dodeterminismo psíquico. Dado o papelcentral dos processos psíquicos

inconscientes, como pode a Biologianos ensinar a compreensão de tais

processos?

Em 1954, Branda Milner29 fez a notáveldescoberta, a partir de estudos de H.M., um paciente com amnésia, de que oLobo Temporal Medial e o Hipocampo

medeiam o que hoje denominamosarmazenamento da memória declarativa

(memória explícita), que corresponde àmemória consciente de pessoas, objetos

e lugares. Em 1962, ela foi maislonge, descobrindo que ainda que seu

paciente não se recordasseconscientemente de suas memóriasrecentes sobre pessoas, lugares e

objetos, ele era totalmente capaz deaprender novas habilidades motoras e

perceptivas (para uma revisão recente,ver 8). Esse tipo de memória,

denominada memória procedural oumemória implícita, é completamente

inconsciente e se evidencia somente noseu desempenho e não nas recordações

conscientes.

O uso simultâneo dos dois sistemas dememória consiste mais em regra do queem exceção. Esses dois sistemas dememória se justapõem e são comumenteusados em conjunto, de forma quemuitas tarefas de aprendizagem

requerem ambos. De fato, repetiçõesconstantes podem transformar a memória

declarativa em procedural. Porexemplo, o aprendizado de dirigir um

automóvel envolve primeiramentelembranças conscientes, mas, após umdeterminado número de repetições, oato de dirigir toma-se automático,consistindo-se em atividade motorainconsciente. A memória proceduralconstitui, por si mesma, um conjuntode processos que envolve diversossistemas cerebrais diferentes: o

“priming”, ou reconhecimento deestímulos recentes, é uma função dacórtex sensorial; a aquisição deestados emocionais diversificados

envolve a amídala; a formação de novoshábitos motores (e talvez cognitivos)requer o neostriatum; o aprendizado de

novos comportamentos motores ouatividades coordenadas depende docerebelo. Diferentes contextos e

experiências de aprendizado recrutamdiferentes subgrupos desses e outrossistemas de memória de procedimentos,em combinação variável com os sistemasde memória explícita do hipocampo e deoutras estruturas afins (30-31, figura

1).

Figura 1 – Taxonomia dos sistemas dememória declarativa e procedurala

a Esta taxonomia relaciona asestrutuaras e conecções cerebrais

consideradas de especial importânciapara cada tipo de memória declarativa

e nãodeclarativa (8, reimpressa por

permissão de Cell Press

Na memória procedural, temos umexemplo biológico de um componente davida mental inconsciente. De que forma

é que esse inconsciente biológico serelaciona ao inconsciente de Freud? Emseus últimos escritos, Freud usou oconceito de inconsciente de três

formas diferentes (para uma revisãodas ideias de Freud sobre a

consciência, ver 32). Primeiramente,ele usou o termo de uma forma

especifica e estrutural para sereferir ao inconsciente reprimido ou

dinâmico. Este inconscientecorresponde ao que a literatura

psicanalítica clássica refere como oinconsciente. Este inclui não apenas o

id, como também parte do ego quecontém impulsos, defesas e conflitos

inconscientes, sendo, por isso,similar à dinâmica inconsciente do id.

Nesse inconsciente dinâmico, asinformações sobre conflitos e impulsos

são impedidas de alcançar aconsciência por poderosos mecanismos

de defesa como a repressão.

Em segundo lugar, complementando aspartes reprimidas do ego, Freud propôs

que uma outra parte permaneceinconsciente. Diferentemente das

partes inconscientes do ego que seencontram reprimidas e, por esse

motivo, assemelham-se ao inconscientedinâmico, a parte inconsciente do egonão reprimida não está preocupada comos impulsos e conflitos inconscientes.Além disso, diferentemente do pré-consciente, essa parte inconscientenão é, de forma alguma, acessível à

consciência, mesmo não estandoreprimida. Desde que este inconsciente

esteja relacionado a hábitos ehabilidades motoras e perceptivas, ele

se projeta na memória procedural.Devo, então, me referir a esta partedo inconsciente como inconsciente

procedural.

Finalmente, Freud usou o termo,descritivamente, em um sentido mais

amplo – pré-consciente/inconsciente –para referir-se a quase todas as

atividades mentais, à maior parte dospensamentos e memórias que alcançam aconsciência. De acordo com Freud, o

indivíduo não tem consciência de quasetodos os processos e eventos mentais,

mas pode ter pronto acesso à

consciência de muitos deles através deum esforço de atenção. A partir dessaperspectiva, conclui-se que a maiorparte da vida mental ocorre no plano

inconsciente, podendo tornar-seconsciente somente como percepçõessensórias, tais como palavras e

imagens.

Desses três processos mentaisinconscientes, apenas o inconscienteprocedural, a parte inconsciente doego que não está em conflito ou

reprimida, parece projetar-se no queos neurocientistas chamam de memóriaprocedural (para uma maior discussão,

ver p.33). Esta correspondênciaimportante entre a NeurociênciaCognitiva e a Psicanálise foi

primeiramente reconhecida em uminspirado artigo de Robert Clyman34,

que relacionou a memória procedural aocontexto emocional e sua relevânciapara a transferência e tratamento.Essa ideia foi desenvolvida mais

profundamente por Louis Sander, DanielStern e seus colegas do Boston Process of

Change Study Group35. Este grupo enfatizou

que muitas das mudanças que sedesenvolvem no processo terapêuticodurante a análise não estão no campoda compreensão consciente e, sim, no

campo dos comportamentos econhecimentos não-verbais doinconsciente procedural. Para

sintetizar essa idéia, Sander36, Stern37

e colegas desenvolveram o conceito deque há momentos de significação – queocorrem na interação entre paciente eterapeuta – no contexto psicanalíticoque representam o alcance de um novogrupo de memórias implícitas quepermite, à relação terapêutica,progredir a um novo nível. Essa

progressão não depende da compreensãoconsciente e não requer que o

inconsciente se torne consciente. Aoinvés disto, os momentos

significantes, no entender dosautores, levam a mudanças

comportamentais que aumentam o limiteda ação das estratégias procedurais de

ser e agir. O crescimento nessascategorias do conhecimento conduz a

estratégias de ação que se refletem naforma com que a pessoa interage com

outras, inclusive na transferência.

Marianne Goldbeneger38 expandiu essalinha de pensamento, enfatizando que odesenvolvimento moral também pode serdesenvolvido pelos meios procedurais.Salienta que as pessoas geralmente nãose lembram, de forma consciente, das

circunstâncias sob as quaisassimilaram as regras morais que regemseus comportamentos; essas regras sãoadquiridas de forma quase automática,

como as regras da gramática queregulamentam a língua nativa de

qualquer pessoa.

Ilustrei a distinção entre memóriaprocedural e declarativa, provenienteda Neurociência Cognitiva, a fim de

enfatizar a utilidade, para opensamento psicanalítico, de uma

percepção fundamentalmenteneurobioliológica. Além disso, sugiroque, assim como na Psicanálise, essas

ideias biológicas são, até aqui,apenas ideias. O que a Biologia podeoferecer é uma oportunidade de levá-

las a um passo adiante. Agora, sabemos

bem mais sobre os aspectos biológicosdo conhecimento procedural incluindoalgumas de suas bases moleculares8.

Essa interessante convergência daPsicanálise com a Biologia na

problemática da memória proceduralconfronta-nos com a tarefa de testartais ideias de forma sistemática.Precisaremos examinar, a partir de

ambas as perspectivas psicanalítica ebiológica, a extensão dos fenômenos

que agrupamos sob a rubrica de“memória procedural” e observar comoeles se distribuem nos diferentessistemas neurais. A partir disto,poderemos examinar, nos estudos

comportamentais, observacionais e deimagens, em que grau diferentescomportamentos de um dado momentosignificante ou diferentes momentosdeste tipo recrutam um ou outrosubsistema anatômico da memória

procedural. Conforme essas ideias vãose tornando mais claras, podemosperceber que uma das primeiraslimitações do estudo sobre os

processos psíquicos inconscientes foi

a falta da existência de umametodologia para a observação direta.

Todos os métodos de estudo dosprocessos inconscientes foram

indiretos. Assim, a contribuição maisimportante que a Biologia pode agora

fazer – com a sua habilidade deinferir sobre os processos mentais e

com sua habilidade para estudarpacientes com lesões cerebrais emdiferentes componentes da memóriaprocedural – é modificar a base do

estudo dos processos mentaisinconscientes, desde a inferênciaindireta até a observação direta.

Nesse sentido, poderemos ser capazesde determinar quais aspectos

psicanaliticamente relevantes damemória procedural são mediados porcada um dos sistemas subcorticaisenvolvidos. Além disso, métodos deimagens podem nos permitir discernir

que sistemas cerebrais medeiam as duasoutras formas de memória inconsciente:

o inconsciente dinâmico e o pré-consciente.

Antes de voltar minha atenção ao

inconsciente/pré-consciente e a suapossível relação com o córtex pré-

frontal, desejo considerar três outrosaspectos relativos ao inconsciente

procedural: sua relação com odeterminismo psíquico, com os

processos mentais conscientes e com asexperiências precoces.

2. A NATUREZA DO DETERMINISMOPSÍQUICO: COMO DOIS EVENTOS TORNAM-SE

ASSOCIADOS NA MENTE?Na perspectiva freudiana, os processosmentais inconscientes proporcionam uma

explicação para o determinismopsíquico. A ideia fundamental dodeterminismo psíquico é que muitopouco, ou nada, na vida psíquica de

alguém, ocorre por acaso. Cada eventopsíquico, não importando sedeclarativo ou procedural, é

determinado por um evento precedente.Deslizes verbais, pensamentos

aparentemente sem sentido, piadas,sonhos, e todas as imagens de cada

sonho estão relacionados aacontecimentos psicológicos prévios e

possuem um significado coerente comrelação ao resto da vida psíquica de

qualquer pessoa. O determinismopsíquico é igualmente importante naPsicopatologia. Até mesmo sintomasneuróticos, não importando o quão

estranhos possam parecer ao paciente,têm um sentido na mente inconsciente

relacionado a processos mentaisanteriores. Estas conexões entre

sintomas e processos mentais causais,ou entre imagens de um sonho e eventos

relacionados, encontram-seobscurecidas pela operação de

processos inconscientes dinâmicos eonipresentes.

O desenvolvimento de muitas ideias dopensamento psicanalítico e sua

metodologia central, a associaçãolivre, deriva do conceito de

determinismo psíquico39. O objetivo daassociação livre é obter o relato, por

parte do paciente, de todos ospensamentos que passam por sua mente,

impedindo que exerça sobre elesqualquer grau de censura ou

direcionamento39-40. A ideia principal

do determinismo psíquico é a de quequalquer fenômeno mental estácausalmente relacionado a um

precedente. Desta forma, Brenner40

escreveu:

“Na mente, como na natureza física ao nossoredor, nada acontece fortuitamente ou por

acaso. Cada acontecimento psíquico édeterminado por um precedente.”

Embora não tenhamos um modelobiológico sofisticado de conhecimentopsíquico explícito e declarativo,

encontramos, na Biologia, um ponto departida satisfatório para a

compreensão de como as associações sedesenvolvem na memória procedural

(para uma revisão, ver31). Até onde osaspectos do conhecimento de

procedimentos são relevantes para osmomentos significativos, estes

fundamentos biológicos devem provarser úteis para o entendimento do

inconsciente procedural.

Nas últimas décadas do século XIX, namesma época em que Freud estava

trabalhando em sua teoria dodeterminismo psíquico, Ivan Pavlovestava desenvolvendo uma abordagemempírica de um momento específico do

determinismo psíquico, no nível do quehoje em dia denominamos conhecimentoprocedural, ou seja, a aprendizagempela associação. Pavlov buscava aelucidação de uma característicaessencial da aprendizagem que éconhecida desde a antiguidade.Pensadores ocidentais desde

Aristóteles tinham inferido que oarmazenamento da memória requer aassociação temporal de pensamentos

contínuos, um conceito posteriormentedesenvolvido sistematicamente por JohnLocke e pelos filósofos empiristas

britânicos.

O mais brilhante empreendimento dePavlov foi o desenvolvimento de ummodelo animal de aprendizado por

associação que poderia serrigorosamente estudado em laboratório.Mudando o tempo entre dois estímulossensórios e observando os efeitosdesta mudança no comportamento de

reflexo simples, Pavlov (41)estabeleceu um procedimento no qualinferências razoáveis podiam serfeitas sobre como as mudanças na

associação entre os dois estímulospoderiam levar a mudanças no

comportamento – no aprendizado(referências recentes, ver31,42,44).

Desta forma, Pavlov desenvolveuparadigmas poderosos para o

aprendizado por associação, quelevaram a uma modificação permanente

no estudo do comportamento, movendo-sede uma ênfase na introspecção para umaanálise objetiva de estímulo-resposta.Este é exatamente o tipo de mudança

que estamos buscando nas investigaçõespsicanalíticas a respeito do

determinismo psíquico. Descrevi esteparadigma familiar porque desejo

enfatizar três pontos relevantes parao pensamento psicanalítico. Primeiro:no aprendizado da associação entre

dois estímulos, o sujeito não aprendesimplesmente que um estímulo precedeao outro. Ao invés, ao aprender a

associar dois estímulos, o indivíduo

aprende que um vem a predizer o outro(para uma discussão deste ponto, ver44-

45). Segundo, como veremos adiante, ocondicionamento clássico é um

paradigma soberbo para a análise decomo o conhecimento pode se deslocar

do plano inconsciente para oconsciente46. Finalmente, o

condicionamento clássico pode serusado para

adquirir não somente respostasapetitivas como também aversivas,proporcionando-nos, assim, insights

relacionados à emergência de psicopa-tologias. Agora, desenvolverei

especificamente cada um destes pontos.

O DETERMINISMO PSÍQUICO DOCONDICIONAMENTO CLÁSSICO É

PROBABILÍSTICO.Por muitos anos, os psicólogospensaram que o condicionamentoclássico seguia as regras de um

determinismo psíquico semelhante aodelineado por Freud. Pensavam que ocondicionamento clássico dependiasomente de contiguidade e de um

intervalo crítico mínimo entre oestímulo condicionado e o não

condicionado, de tal forma que os doiseram vivenciados como conectados. Deacordo com esta perspectiva, em cada

período de tempo, um estímulocondicionado é seguido de um reforçoou estímulo não condicionado. Uma

conexão neural é, assim, fortalecidaentre o estímulo e a resposta ou entre

um estímulo e outro, até quefinalmente a conexão entre os dois se

torna tão forte que é possível amudança de comportamento.

A única variável relevantedeterminando a força do

condicionamento pensava-se ser onúmero de pares de estímulos

condicionados e incondicionados. Em1969, Leon Kamin47 fez o que hoje é

considerado de forma geral, adescoberta empírica mais significativano campo do condicionamento desde os

primeiros achados de Pavlov, na viradado século. Kamin constatou que osanimais aprendem mais do que a

contiguidade: aprendem também as

contingências. Eles não aprendemsimplesmente que o estímulocondicionado precede o não

condicionado, mas também que oestímulo condicionado prevê o estímulo

não condicionado. Deste modo, aaprendizagem associativa não dependede um número crítico de pares deestímulos condicionados e nãocondicionados, mas do poder do

estímulo condicionado de prever um nãocondicionado biologicamente

relevante44.

Estas considerações sugerem o porquêdos animais e das pessoas adquiriremtão prontamente o condicionamento

clássico. O condicionamento clássico,e talvez todas as formas de

aprendizagem associativa, evoluiufilogeneticamente para capacitar o

animal a distinguir acontecimentos queregularmente ocorrem juntos daquelesque estão associados somente pelo

acaso. Em outras palavras, o cérebroparece ter desenvolvido um mecanismosimples que “dá sentido” a eventos domeio ambiente ao relacionar uma função

preditiva a alguns desses eventos.Quais condições ambientais podem haverformado ou mantido um mecanismo comumde aprendizagem nas mais variadas

espécies? Todos os animais devem sercapazes de reconhecer e evitar o

perigo; eles precisam buscargratificações como as provindas da

nutrição e evitar a comida quando estaestá deteriorada ou é tóxica. Umaforma efetiva de atingir esse

conhecimento é adquirir a capacidadede detectar relações entre estímulos

ou entre comportamentos e estímulos. Épossível que, ao examinar essasrelações em termos da Biologia

Celular, podemos estar contemplando omecanismo elementar do determinismo

psíquico.

CONDICIONAMENTO CLÁSSICO E A RELAÇÃOENTRE OS PROCESSOS MENTAIS PROCEDURAIS

CONSCIENTES E DECLARATIVOSINCONSCIENTES

O condicionamento clássicoconvencional é usualmente realizado emuma forma denominada “condicionamento

postergado”, em que o início doestímulo condicionado precede

tipicamente o início do estímulo nãocondicionado por aproximadamente 500msec, e ambos os estímulos terminam

juntos (figura 2).

Figura 2 – As diferentes relaçõestemporais entre o Estímulo

Condicionado (CS) e o EstímuloIncondicionado (US) e no

condicionamento postergado e detraço(a).

(a) Durante o condicionamentopostergado, um estímulo condicionado

tonal é apresentado e continua até queum sopro de ar no olho de 100 msec

(estímulo incondicionado) é realizado,e ambos estímulos terminam juntos. Apalavra “postergado” se refere ao

intervalo entre o início do estímulocondicionado e o início do

incondicionado (neste exemplo,aproximadamente 700 msec). Durante o

condicionamento de traço, aapresentação do estímulo condicionado

e a apresentação do estímuloincondicionado estão separados por umintervalo (neste exemplo, 500 msec)durante o qual nenhum estímulo está

presente.

Essa forma de condicionamento éprototipicamente procedural31,48. Quandoum sujeito humano normal aprende uma

resposta de piscar a partir de um leveestímulo táctil em sua sobrancelha,este sujeito não está consciente deque está sendo condicionado. Os

pacientes com danos no hipocampo e noneocórtex temporal medial , a quem,

portanto, falta memória declarativa ouexplícita, podem ser condicionadoscomo os sujeitos normais, sob oparadigma do “condicionamentopostergado” (delay conditioning).

Uma leve variação, o condicionamentode traço(trace conditioning), converte ocondicionamento implícito em memóriaexplícita. Com o condicionamento de

traço, o estímulo condicionado terminaantes do estímulo não condicionadoocorrer, de forma que o estímulo

condicionado é breve, havendo umintervalo de 500 msec entre o fim doestímulo condicionado e o início do

estímulo não condicionado (figura 2).Richard Thompson e colegas constataramque o condicionamento “trace” depende do

hipocampo e está eliminado emexperiências com animais que sofreramlesões do hipocampo. Clark e Squire48

ampliaram estes experimentos,estendendo-os aos humanos, constatando

que o condicionamento determinadorequeria lembrança consciente. Durante

o processo de condicionamento detraço, sujeitos normais geralmentetornam-se conscientes do intervalo

temporal que ocorre na relação entre oestímulo condicionado e o não

condicionado. Aqueles sujeitos que nãotomam consciência deste intervalo não

se condicionam. Além disso, essatarefa não pode ser bem desenvolvidapor pessoas que sofrem de amnésia –provinda de um defeito na memória

declarativa – resultante de lesões doLobo Temporal Medial.

Desta forma, uma pequena modificação

na sequência temporal transforma odeterminismo psíquico de inconsciente

para consciente! Este fato éconsistente com a ideia de que os doissistemas de memória, declarativa e

procedural, são frequentementeacionados por uma tarefa comum ecodificam diferentes aspectos do

padrão sensório de estímulos (ou domundo externo) apresentados aosujeito. Em que local, no LoboTemporal Medial, ocorre estamodificação de um tipo de

armazenamento da memória para outra?Para Eichenbaum51, o hipocampo tem acapacidade de associar eventos nãocontíguos no espaço e no tempo. De

fato, agora sabemos que ocondicionamento de traço aciona ohipocampo e os circuitos do LoboTemporal Medial. Que partes docircuito do hipocampo são mais

importantes para o condicionamento detraço? Há outras regiões envolvidas? O

córtex pré-frontal (que deveremosconsiderar adiante) –uma área

relacionada à memória de trabalho, queé considerada representativa de um

aspecto do pré-consciente-inconsciente– media associações entre as memóriasinconscientes e conscientes, que são o

sujeito da análise?

3. CAUSALIDADE PSICOLÓGICA EPSICOPATOLOGIA

Vimos que um ponto de convergênciaentre a Biologia e a Psicanálise é opapel relevante da memória proceduralpara o desenvolvimento das primeirasnoções morais, para a transferência epara os momentos significativos na

psicoterapia psicanalítica.Consideramos um segundo ponto deconvergência quando examinamos arelação entre as característicasassociativas do condicionamento

clássico e o determinismo psíquico.Quero agora ilustrar um terceiro ponto

de convergência: aquele que seencontra entre o condicionamento para

o medo, de Pavlov, uma forma dememória procedural mediada pelaamígdala, a ansiedade sinal e a

síndrome de stress pós-traumático noshumanos.

No início deste trabalho sobre ocondicionamento clássico, Pavlovreferiu que o condicionamento éapetitivo quando o estímulo não

condicionado é gratificante, mas omesmo procedimento produzirá um

condicionamento defensivo quando oestímulo não condicionado for

aversivo. A descoberta seguinte dePavlov foi a constatação de que o

condicionamento defensivo proporcionaum modelo experimental particularmente

interessante para o surgimento daansiedade sinal, uma forma de medoaprendido que pode ser vantajosa.

“É bastante evidente que, sob condiçõesnaturais, animais normais respondem nãoapenas a estímulos que trazem benefício

imediato ou causam danos, como também aoutros agentes químicos ou físicos... queapenas sinalizam a aproximação destes

estímulos; portanto, não é a visão ou som dopredador que é em si mesmo perigosa a suasvítimas, mas seus dentes e garras”. (41, p.14)

Uma proposta similar foi feita,

independentemente, por Freud. Devidoao fato dos estímulos dolorosos se

encontrarem frequentementerelacionados a estímulos neutros,simbólicos ou reais, Freud postulou

que a repetição de estímulos neutros enocivos pode fazer com que os

estímulos neutros sejam percebidoscomo perigosos, provocando ansiedade.Contextualizando este postulado emtermos biológicos, Freud escreveu:

“O indivíduo terá feito um avanço importantena sua capacidade de autopreservação se

puder prever situações traumáticas deste tipoque ocasionam desamparo, ao invés de

simplesmente esperar que elas aconteçam.Chamemos a situação que contém o

determinante para tal expectativa de situaçãoperigosa. É a partir desta situação que é dado

o sinal de ansiedade (52, p.166)”.

Assim, ambos, Pavlov e Freud,consideram que é biologicamente

adaptativo possuir a habilidade deresponder defensivamente a sinais deperigo antes de o perigo real estar

presente. A ansiedade sinal ou

antecipatória prepara o indivíduo paralutar ou fugir se estes sinais provêmdo ambiente. Freud sugeriu que asdefesas mentais funcionam como

substitutos das ações reais de fuga,só que em resposta ao perigo interno.A ansiedade sinal, portanto, provê umaoportunidade para o estudo de como asdefesas mentais são desencadeadas, decomo o determinismo psíquico pode

levar à psicopatologia.

Sabemos que a amígdala é importantepara a memória emocionalmente

carregada, como ocorre nocondicionamento clássico do medo

através da conjugação de um estímuloneutro com um choque. A amígdala

coordena o fluxo de informações entreas áreas do tálamo e do córtexcerebral responsáveis peloprocessamento dos estímulos

sensoriais, e as áreas que processam aexpressão do medo: o hipotálamo, queregula a resposta autonômica ao medo,e as áreas de associação límbicasneocorticais (córtex pré-frontal ecingulado), o córtex pré-frontal e o

córtex cingulado, que estão envolvidosna avaliação consciente das emoções.LeDoux referiu que, na ansiedade, opaciente experimenta os estímulosautônomos como sinais de que algoameaçador está acontecendo, um

incremento mediado pela amígdala.LeDoux atribui a falta de consciênciaa um apagamento do hipocampo devido ao

stress, um mecanismo que seráconsiderado adiante. Agora, possuímosmétodos excelentes de visualização

destas estruturas em animais e humanosde forma experimental, com o objetivode abordar a questão de como estasconexões estão estabelecidas, e, umavez estabelecidas, como são mantidas53-

55.

4. EXPERIÊNCIAS PRECOCES EPREDISPOSIÇÃO PARA A PSICOPATOLOGIAA ansiedade sinal representa um

exemplo simples de uma psicopatologiaadquirida. Mas, como ocorre com todasas coisas adquiridas, algumas pessoas

têm uma maior disposiçãoconstitucional que outras para

desenvolver ansiedade neurótica. Quaisfatores predisporiam um indivíduo aassociar uma variedade de estímulosneutros com estímulos ameaçadores?

Em Luto e Melancolia e em outros deseus escritos, Freud enfatizou o papelde dois componentes na etiologia dapsicopatologia adquirida. São eles:

predisposições constitucionais(incluindo a bagagem genética) e

experiências precoces (especialmenteperdas). De fato, existem evidências

no desenvolvimento de muitas formas dedoenças mentais para ambos os fatoresgenéticos e experienciais (ambos,experiências desenvolvimentaisprecoces e precipitantes agudos

tardios). Como exemplo, enquanto háuma nítida contribuição genética àsuscetibilidade à depressão, muitospacientes com um quadro de depressão

maior passaram por experiênciasestressantes durante sua infância comoo abuso ou negligência , sendo estes

estressores importantes na predição dadepressão56-61. O caso é ainda mais

evidente na desordem ocasionada por

stress pós-traumático (PTSD), querequer para seu diagnóstico a presençade uma experiência estressante tãograve que se encontra fora do limite

das vivências humanas normais.Aproximadamente 30% dos indivíduos

traumatizados desta forma desenvolvemsubsequentemente a síndrome completa57-

58. Esta penetrância incompleta levantaa seguinte indagação: que fatores,além da bagagem genética, predispõemao desenvolvimento em algumas pessoas

da PTSD e de outras perturbaçõesrelacionadas ao stress?

O componente referente às experiênciasprecoces que demonstrou ser o maisimportante nos casos humanos, na

realidade, para todos os mamíferos, éo principal cuidador do bebê,

normalmente a mãe. A Psicanálise pormuito tempo referiu que a maneira comoocorre a interação entre a criança e a

mãe cria na mente da criança asprimeiras representações mentais, nãosomente a respeito de outra pessoa,

como também do estilo da interação emsi, ou seja, do modelo de

relacionamento entre elas. Esta(s)representação(s) inicial(s) daspessoas e relações é considerada

relevante para o posteriordesenvolvimento psicológico da

criança. A interação ocorre em umfluxo recíproco. A forma com que obebê se comporta com relação à mãeexerce influência considerável no

comportamento dela . Um apego seguroentre mãe e criança acredita-se que

favoreça um sentimento de aceitação desi e confiança básica nos outros, damesma forma que um apego inseguro é

reconhecido como promotor deansiedade.

Uma das primeiras ideias-chave aemergir de ambos os estudos dodesenvolvimento, cognitivo eneurobiológico, é de que o

desenvolvimento dessas representaçõesinternas pode somente ser desencadeadodurante um período precoce definido ecrítico na vida infantil. Duranteestes períodos críticos, e somenteneles, a criança (e sua mente em

desenvolvimento) deverá interagir com

um ambiente responsivo (um ambiente emmédia previsível, nos termos de HeinzHartmann), se o desenvolvimento de seucérebro e de sua personalidade for

satisfatório.

A primeira evidência da importânciadas relações precoces entre os pais eseus bebês partiu dos estudos de AnnaFreud sobre os efeitos traumáticos das

disfunções familiares durante aSegunda Guerra Mundial62. Este tema foidesenvolvido mais profundamente porRené Spitz21, através de pesquisascomparativas entre dois grupos decrianças separadas de suas mães. Um

dos grupos habitava uma fundação paracrianças abandonadas e era cuidado porenfermeiras, cada qual responsável porsete crianças, e outro grupo pertenciaa uma creche vinculada a uma prisãofeminina, onde as crianças eram

cuidadas diariamente pelas mães. Nofinal do primeiro ano, a performancemotora e intelectual das crianças do

orfanato caiu muito abaixo daquela dascrianças da creche. Estas criançaseram retraídas e mostravam pouca

curiosidade e alegria.

Harry Harlow levou este estudo aindamais longe, desenvolvendo um modelo

animal para o desenvolvimento do bebê.Observou que, quando os macacos recém-nascidos eram isolados por um período

de seis meses a um ano e depoisretornados à companhia de outros

macacos, eles mantinham-se fisicamentesaudáveis, mas apresentavam

perturbações devastadoras em seuscomportamentos. Estes macacos ficavamagachados no canto das suas jaulas eembalavam-se para trás e para frentecomo fazem as crianças autistas ouseveramente perturbadas. Eles nãointeragiam com outros macacos, nemlutavam, brincavam ou mostravamqualquer interesse sexual. O

isolamento de um animal em idade maisavançada por um período comparável não

causava nenhum efeito destrutivo.Assim, nos macacos como nos humanos,

foi constatado haver um períodocrítico para a socialização. Harlowposteriormente demonstrou que asíndrome poderia ser parcialmente

revertida através da substituição daausência da mãe por uma mãe postiça demadeira revestida com tecido. Esta

substituta desencadeava ocomportamento de apego no macaco

isolado, mas era insuficiente para queocorresse o desenvolvimento completo

da socialização. A socializaçãocompleta normal poderia apenas ser

resgatada se, além da mãe substituta,o animal isolado tivesse tido contato,por algumas horas durante o dia, commacaquinhos normais que ficavam o

resto do dia na colônia dos macacos.

O trabalho de Anna Freud, Spitz eHarlow foi relevantemente desenvolvidopor John Bowlby, que começou a pensara interação entre a criança e seuscuidadores em termos biológicos.

Bowlby23,65 formulou a ideia de que acriança indefesa mantém a proximidadeao seu cuidador através de um sistemade padrões de responsividade emocional

e comportamental, denominando-osistema de apego. A concepção de

Bowlby sobre o sistema de apego era deum sistema inato instintivo ou

motivacional, similar a sede ou fome,responsável pela organização dos

processos de memória da criança e peloseu direcionamento na busca de

proximidade e comunicação com a mãe. Apartir de um ponto de vista

evolucionista, o sistema de apegoclaramente aumenta as chances de

sobrevivência da criança, pois permiteao cérebro imaturo o uso das funçõesmaduras dos pais para organizar seus

próprios processos vitais. O mecanismode apego de uma criança é espelhadonas respostas sensíveis dos pais aossinais dela. As respostas parentais

servem tanto para amplificar como parareforçar os estados emocionais

positivos da criança e atenuar osestados negativos, ao proporcionar àcriança segurança quando ela estáfrustrada. Estas experiências

repetidas tornam-se codificadas namemória procedural como expectativasque ajudam a criança a sentir-se

segura.

Deve ser observado que, durante os 2 a3 primeiros anos de vida, quando a

interação da criança com sua mãe éparticularmente importante, a criançadepende primeiramente de sua memóriaprocedural. Tanto em animais usados

para experimentação, como nos humanos,a memória declarativa se desenvolve emum período posterior. Assim, a amnésiainfantil, que resulta no pouco acessoa memórias da primeira infância após avivência desta, é evidente não somente

nos seres humanos, como também emoutros mamíferos, incluindo roedores.Esta amnésia, presumivelmente, não édevida à repressão das lembranças doperíodo da resolução do complexoedípico, mas tem como causa o

desenvolvimento vagaroso do sistema damemória declarativa34.

Bowlby descreveu a resposta àseparação como ocorrendo em duas

fases: protesto e desespero. Fenômenosque perturbam a proximidade da criança

ao objeto de apego produzemprimeiramente protesto observado emcomportamentos como o agarramento,comportamento de seguir, buscar,

chorar e excitação fisiológica aguda

com duração de minutos a horas. Estescomportamentos servem para restaurar a

proximidade. Quando o contato érestabelecido, estes comportamentos de

agarramento são extintos, segundoBowlby, por um mecanismo de feedback.

Então, são ativados sistemas decomportamento alternativos

principalmente exploratórios. Se aseparação é prolongada, o desânimo

(desespero) gradualmente toma o lugardaquelas respostas precoces, à medida

que a criança reconhece que aseparação pode ser prolongada oupermanente. Os comportamentos de

ansiedade e fúria são substituídos portristeza e desesperança. Enquanto oprotesto é concebido como adaptativopelo aumento da probabilidade de paise crianças se encontrarem novamente,pensa-se que a desesperança pode

preparar a criança para asobrevivência passiva por períodosprolongados de tempo, através da

conservação da energia e afastamentodo perigo.

Devemos a Levine e seus colegas66-68,

Ader e Grota69 e Hofer70-71, a descobertade que sistemas similares de apego

existem nos roedores. A extensão destapesquisa para o modelo com os

roedores, que é bem mais simples,embora continue no campo dos

mamíferos, é extremamente relevante epoderosa. Por exemplo, nos ratos, os

genes podem ser expressos ousuprimidos, o que permite uma

abordagem poderosa da relação de genesindividuais com o comportamento.

Levine verificou que filhotes de ratosdemonstram protesto imediato àseparação. Os filhotes emitem

vocalizações de alta intensidade,comportamentos de busca agitada e deasseio (lamber seus próprios pêlos).

Se a mãe falha em retornar e aseparação continua, os comportamentosde protesto dominam por um período dehoras, para após serem substituídospor uma quantidade de comportamentos

mais vagarosos, semelhantes àdesesperança, como tornar-se menos

alerta e responsivos. Estescomportamentos são observáveis

fisiologicamente pela redução do

batimento cardíaco e temperaturacorporal. Assim como o trabalho deHarlow foi capaz de delinear oscomponentes do cuidador que eramessenciais para o desenvolvimentonormal do caráter, também Hofer

demonstrou três aspectos diferentesdos comportamentos padrões de

respostas protesto/acomodação que eramdesencadeados por três reguladores

ocultos na interação mãe/filho: faltade calor, falta de alimento e falta de

estimulação táctil.

Levine e seus colegas68 foram osprimeiros a levar essas análises ao

nível molecular, estudando a forma comque os muitos graus de apego infantilafetavam a habilidade de resposta aostress. Hans Selye72 salientou já em1936 que tanto humanos quanto animais

experimentais respondiam aexperiências estressantes ativando oeixo hipotalâmico-pituitárico-adrenal(HPA). O produto final do sistema HPA

é a liberação de hormôniosglicocorticóides pela glândula

adrenal. Estes hormônios servem como

importantes reguladores da homeostase– do metabolismo intermediário, tônusmuscular e função cardiovascular.Juntamente com as catecolaminasliberadas pelo sistema nervoso

autônomo e pela medula adrenal, asecreção de glicocorticóides é

essencial para a sobrevivência frenteao stress.

Daí a razão porque Levine levantou aseguinte questão: poderia a resposta a

longo-prazo do sistema HPA sermodulada pela experiência? E, sepossível, seria particularmentesensível a experiências precoces?

Levine descobriu que, quando, ao longodas duas primeiras semanas de vida, osfilhotes eram separados de suas mãespor apenas alguns minutos, estes

demonstravam um aumento devocalização, que desencadeava o

aumento do cuidado maternal. As mãesrespondiam lambendo, limpando e

carregando estes filhotes com maisfrequência do que fariam se estes nãotivessem sido removidos. Este aumentode grau dos comportamentos de apego

materno foi capaz de reduzir, para oresto da vida do filhote, os níveis de

resposta de glicocorticóide a umavariedade de estressores!

Concomitantemente, isto reduziu o medoe a vulnerabilidade a doenças

relacionadas ao stress73-74. No entanto,quando, durante o mesmo período detempo, os filhotes eram separados de

suas mães por períodos maisprolongados (3 a 6 horas por dia,durante duas semanas), ocorreu umareação oposta. Neste caso, as mães

ignoraram os filhotes, e estesdemonstraram um aumento de ACTH e

glicocorticóides no plasma, iguais àsrespostas adultas ao stress. Assim,diferenças nas interações mãe-bebê –

diferenças que estão dentro doespectro dos comportamentos maternosque ocorrem normalmente – constituemfatores cruciais de risco para afutura resposta do indivíduo ao

stress. Aqui, temos um exemplo notávelde como as experiências precocesalteram a regulagem das respostas

biológicas ao stress.

Estudos desenvolvidos por CharlesNemeroff e Paul Plotsky verificaramque estas experiências precocesadversas resultavam no aumento daexpressão do gene sintetizador do

fator de liberação de corticotrofina(CRF), o hormônio liberado no

hipotálamo para desencadear a respostaHPA. A separação diária materna

durante as duas primeiras semanas devida está associada, nos ratos, com oprofundo e persistente aumento naexpressão do RNA mensageiro para oCRF, não somente no hipotálamo, mas

também nas áreas límbicas que incluema amígdala e o núcleo da base terminal

do striatum74-76.

Entretanto, a compreensão dos fatoresbiológicos com relação à teoria doapego não parariam por aqui. BruceMcEwen77, Robert Sapolsky78 e seus

colegas descobriram que o aumento dosglicocorticóides que se segue à

separação da mãe tem efeitos adversosno hipocampo. Há dois tipos de

receptores para os glicocorticóides:tipo 1 (receptores

mineralocorticóides) e tipo 2(receptores glicocorticóides).

O hipocampo constitui um dos poucoslocais no cérebro que possui ambos!Assim, experiências estressantes

repetidas (ou exposição a altos níveisde glicocorticóides por mais de

algumas semanas) causam a atrofia dosneurônios do hipocampo, reversíveisquando o stress ou a exposição aosglicocorticóides é interrompida. No

entanto, quando o stress ou aexposição ao alto índice de

glicocorticóide é prolongada pormuitos meses ou mesmo anos, ocorrem

danos permanentes, resultando em perdados neurônios do hipocampo. Comopodemos prever a partir do papelcentral do hipocampo na memória

declarativa, ambos os casos (atrofiareversível ou dano permanente)resultam no enfraquecimento da

memória. Este déficit na memória podeser detectado no nível celular. Istose torna evidente no enfraquecimentodo processo chamado potenciação delongo prazo(Long-term Potentiation), um

mecanismo intrínseco considerado comocrítico para o fortalecimento dasconexões sinápticas relacionadas à

aprendizagem (31,77, Figura 3).

Figura 3 – Resumo esquemático dasações dos esteróides adrenais que

afetam a função do hipocampo e alterama performance cognitiva.

(a) esquerda: glicocorticóidesinduzidos por stress causam atrofiacerebral? Relação entre volume dohipocampo e (alto) duração dadepressão entre indivíduos com

história de depressão maior, (meio)quantidade de hipersecreção de

cortisol entre pacientes com síndromede Cushing, e (embaixo) duração deexposição ao combate entre veteranoscom ou sem uma história de PTSD.Cortisol é um outro termo para a

hidrocortisona glicocorticóide humano(78; figura reimpressa por permissão daAssociação Americana para o Progresso

da Ciência). Direita: (alto): ocircuito hipocampal está diagramadomostrando algumas das principais

conexões entre o córtex entorrinal(ent), o corno de Ammon (h), e o giro

denteado (dg). F=fórnix PP= viaperfurante; CA1 e CA3 são sub-regiõesdo hipocampo. (Embaixo): stress de

moderada duração, agindo tanto atravésdos glicocorticóides quanto dos

aminoácidos excitatórios(especialmente glutamato), causaatrofia reversível de dendritos

apicais dos neurônios piramidais CA3;o stress grave e prolongado causaperda de células piramidais que é

especialmente aparente em CA3, mas seestende a CA1 igualmente. A relaçãomecânica entre atrofia reversível eperda neuronal permanente não é

conhecida até o momento, ainda queestejam envolvidos glicocorticóides eaminoácidos excitatórios (77; figurareimpressa por permissão de Current

Biology Publications).

Assim, o que pode inicialmente parecerrepressão pode vir a ser, na verdade,

uma amnésia verdadeira: danos nosistema do lobo temporal medial do

cérebro.

Este conjunto de experimentos tem umsignificado profundo na relação dosprocessos inconscientes precoces comos processos posteriores conscientes.Experiências estressantes no início davida ocasionadas pela separação da

criança de sua mãe produzem uma reaçãona criança que é armazenada

primeiramente na memória procedural, oúnico sistema bem diferenciado dememória que a criança possui nesteestágio da vida. Porém, a ação do

stress na memória procedural lidera umciclo de transformações que tem comoconsequência o dano do hipocampo e,por meio deste, uma modificação

persistente na memória declarativa.

Este modelo em roedores tem relevânciaclínica direta. Pacientes portadores

da Síndrome de Cushing produzemglicocorticóides acima do nível normalcomo resultado de um tumor na glândulaadrenal, na glândula pituitária, ou naparte do hipotálamo que controla a

pituitária. Starkman e seus colegas79

estudaram estes pacientes e

verificaram que aqueles que haviamtido a doença por mais de um anoapresentavam atrofia seletiva do

hipocampo e perda de memória. Atrofiae perda de memória similares parecemocorrer no stress pós-traumático.

Bremner e colegas56-80 constataram quepacientes com PSTD (transtorno de

stress pós-traumático) relacionada aoscombates, apresentavam déficits namemória declarativa, assim como a

redução de 8% no volume do hipocampodireito (figura 3). Aqui, entretanto,a atrofia e perda de memória não são

secundárias ao aumento deglicocorticóides, mas ocorrem devido aoutros mecanismos, visto que nestes

pacientes o nível de glicocorticóidesencontra-se mais baixo que o normal.

Na década de 70, Sachar81, pelaprimeira vez, demonstrou que fenômenos

similares ocorriam no eixohipotalâmico-pituitário de pacientes

com depressão. Mais de 50% dospacientes deprimidos demonstraram terníveis elevados de glicocorticóides.Estudos subsequentes demonstraram que

a elevação dos glicocorticóidesencontrava-se relacionada ao

decréscimo no número de receptoresdestes e com a resistência à supressão

do cortisol pela dexametasona.Consistente com os dados dos roedores,pacientes com depressão apresentamredução significativa no volume dohipocampo e uma elevada perda de

memória declarativa.

Nemeroff e colegas (revisado nareferência82) verificaram que, em

pacientes deprimidos, a secreção deCRF apresenta-se significativamenteelevada. Este fato sugeriu a idéiainteressante de que, em pacientes

deprimidos, os neurônios secretores deCRF no cérebro encontram-se

hiperativos. Consistente com essaideia, quando o CRF é injetado

diretamente no sistema nervoso centralde mamíferos, este produz muitos

sinais e sintomas característicos dadepressão. Dentre estes, encontram-sea diminuição do apetite, alteração daatividade do sistema nervoso autônomo,diminuição da libido e perturbações do

sono. Com base nas evidências de queexperiências desfavoráveis precoces navida aumentam a probabilidade de umapessoa sofrer depressão ou outros

distúrbios específicos de ansiedade navida adulta, Nemeroff sugeriu que esta

vulnerabilidade é mediada,provavelmente, pela hipersecreção de

CRF.

Este entendimento pode ter diversasaplicações. A primeira é o

desenvolvimento de modelos animaisprogressivamente mais refinados paraaqueles fatores que predispõem aostress e à depressão. Esses modelos

podem permitir a identificação destesfatores em animais experimentais e,talvez, no futuro, até mesmo em

humanos, dos genes ativados pelo CRF eque predispõem à ansiedade. Em segundo

lugar, a pesquisa estratégica demedicamentos que bloqueiam a ação doCRF pode vir a provar ser útil para

certos tipos de depressão. Finalmente,poderemos ser capazes de acompanhar as

respostas dos pacientes à terapiaatravés de imagens do hipocampo e de

observar o grau de mudanças anatômicasque são interrompidas, ou mesmo

revertidas e, até mesmo, ver de queforma a resposta à psicoterapia está

relacionada aos níveis de CRF eglicocorticóides.

5. O INCONSCIENTE PRÉ-CONSCIENTE E OCÓRTEX PRÉ-FRONTAL

Até agora só consideramos oinconsciente implícito. Mas quanto ao

inconsciente pré-consciente,relacionado a todas as memórias epensamentos capazes de acesso à

consciência e quanto ao inconscientereprimido? Temos motivos para

acreditar que aspectos do inconscientepré-consciente podem ser mediados pelocórtex pré-frontal. Talvez o argumentomais forte seja de que o córtex pré-

frontal esteja envolvido em trazer umavariedade de conhecimentos explícitospara o domínio consciente. A córtexpré-frontral de associação tem duas

funções principais:• Integrar a informação sensorial• Conectá-la ao movimento planejado

Devido à córtex pré-frontal mediaressas duas funções, ela é tida como umdos substratos anatômicos das ações

dirigidas a objetivos no planejamentoe julgamento de longo prazo. Pacientescom lesão nas áreas de associação pré-frontal têm dificuldade em alcançarobjetivos realistas. Como resultado,

eles frequentemente conseguem pouco navida, e seus comportamentos sugerem

que sua habilidade para o planejamentoe organização das atividades diárias

encontram-se diminuídas83-84.

Nas duas últimas décadas, tornou-seclaro que o córtex pré-frontal servecomo um componente de um sistema que

tem um papel importante noarmazenamento da informação de curto-

prazo, incluindo as informaçõesarmazenadas ou relembradas a partir da

memória declarativa. Esta ideiaemergiu a partir da descoberta de quelesões no córtex pré-frontal produzemum déficit específico no componente de

curto prazo da memória explícita,chamada memória de trabalho. O

psicólogo cognitivo Alan Baddeley, quedesenvolveu a ideia da memória de

trabalho85, sugeriu que este tipo dememória integra as percepções de

momento a momento ao longo do tempo,as exercita e as combina cominformações armazenadas sobre

experiências, ações ou conhecimentospassados. Este mecanismo de memória é

crucial para muitos aspectosaparentemente simples da vidacotidiana, como entabular uma

conversação, dirigir um automóvel ousomar uma lista de números. A idéia de

Baddeley foi desenvolvida maisprofundamente em experimentos

neurobiológicos por Joaquin Fuster86 ePatricia Goldman-Rakic87, que

sugeriram, pela primeira vez, quealguns aspectos da memória de trabalho

encontram-se representados naassociação do córtex pré-frontal e deque a lembrança de qualquer informaçãoexplícita da memória – a passagem dopré-consciente para o consciente –requer a mediação da memória de

trabalho. Uma predição possível de serfeita, a partir deste achado, é que no

condicionamento de traço, o estímulonão condicionado pode ativar o sistemade memória de trabalho do córtex pré-

frontal dorso lateral. Este,consequentemente, agirá, geralmente,junto com o hipocampo, submetendo àconsciência o processo associativo

que, não fosse assim, seriaprocedural. Estudos clínicos de

pacientes com lesões sugerem que ocórtex pré-frontal também parecerepresentar alguns aspectos dos

julgamentos morais; ele governa, aomesmo tempo, nossa habilidade deplanejar de forma inteligente e

responsável83. Isto leva à interessantepossibilidade de que a lembrança doconhecimento explícito pode depender

de uma avaliação adaptativa e realistada informação a ser recordada. Neste

sentido, o córtex pré-frontal poderia,como sugeriu Solms88, estar envolvido,por um lado, com as funções executivasque a Psicanálise atribui ao ego e,

por outro, com o superego.

6. ORIENTAÇÃO SEXUAL E A BIOLOGIA DOS

IMPULSOSFreud concebia os impulsos como oscomponentes energéticos da mente. Umimpulso, argumentava, conduz a umestado de excitação ou tensão, umestado chamado atualmente de estado

motivacional pelos psicólogoscognitivos. Os estados motivacionaisimpulsionam a ação com o objetivo de

reduzir a tensão.

Muito cedo em sua carreira, talvezinfluenciado por Havelock Ellis89,

Magnus Hirschfeld90 e Richard Krafft-Ebing91, Freud acreditou que a

orientação sexual de uma pessoa erasignificantemente influenciada porprocessos natos do desenvolvimento e

que todos os humanos eramconstitucionalmente bissexuais. Estabissexualidade constitucional era um

fator chave na homossexualidadefeminina e masculina. Mais tarde, no

entanto, ele veio a pensar naorientação sexual como uma

característica adquirida. Freud92

pensava especialmente nahomossexualidade masculina como

representação de um fracasso nodesenvolvimento sexual normal, uma

falha na adequada separação do meninode sua mãe, mantendo um intensovínculo sexual com ela. Como

resultado, o menino, já crescido,identificar-se-ia com ela e procuraria

fazer seu papel na tentativa deprovocar o renascimento da relação queexistia entre ambos. Freud propôs quea incapacidade do menino de separar-sede sua mãe podia ser o resultado dediversos fatores, incluindo uma

relação extremamente próxima com umamãe possessiva e um pai fraco, ausente

ou hostil. Em termos de suas trêsfases do desenvolvimento psicossexual,

Freud via a homossexualidademasculina, com ênfase no intercurso

anal, como uma incapacidade deprogredir normalmente da fase analpara a genital. A homossexualidadefeminina estava definida de forma

menos clara na mente de Freud, mas elepensava nela como uma imagem em

espelho do processo que destacou nahomossexualidade masculina. Freud

também via um componente homossexual

latente na paranóia, no alcoolismo ena drogadição.

A perspectiva de Freud sobre asexualidade está agora fazendo, no

mínimo, 50 anos de idade, e em algunscasos, perto de 90. Algumas visões

sobre a sexualidade, foram,compreensivelmente, abandonadas,

graças ao pensamento psicanalíticomoderno e todas foram modificadas.Entretanto, eu as relato, não para

manter Freud ou a comunidadepsicanalítica responsáveis por ideiasultrapassadas, mas para ilustrar que

qualquer insight clínico oupsicológico da sexualidade, nãointeressando se atual, com toda a

certeza pode ser mais esclarecido pormelhores compreensões biológicas daidentificação de gênero e orientaçãosexual, ainda que no momento saibamospouco. À medida que a homossexualidadetem se tornado mais abertamente aceita

pela maioria da sociedade, vêmocorrendo discussões polêmicas na

comunidade homossexual, na comunidadepsicanalítica e na sociedade sobre o

grau com que a orientação sexual éinata ou adquirida. A observação deFreud e de outros analistas de quealguns homossexuais tendem a lembrarseus pais como hostis ou distantes esuas mães como mais próximas que o

comum tem tido confirmações recentes93.

Apesar disto, outros estudos sugeremuma contribuição genética à orientação

sexual. Esta é uma área complexa,porque gênero genotípico, fenotípico,assim como identificação de gênero eorientação sexual, são distintos unsdos outros, porém interrelacionados.

De fato, o reconhecimento destacomplexidade pode conferir a termos-padrão como masculino, feminino,macho, fêmea, certa imprecisão enecessidade de esclarecimento94.

O gênero genotípico é determinadopelos genes, enquanto o gênerofenotípico é definido pelo

desenvolvimento da genitália externa einterna94-96. A identificação de gêneroé mais sutil e complexa e refere-se àpercepção subjetiva que alguém possui

de seu sexo. Finalmente, a orientaçãosexual refere-se à preferência porparceiros sexuais. Os fatores quecontribuem aos vários aspectos do

gênero ainda não foram completamenteentendidos, mesmo assim os discutoporque, historicamente, esta é umaárea que tem sido central para aPsicanálise, pois, desde que a

dicotomia natureza/cultura tem sidoconfrontada repetidamente pelaBiologia e, algumas vezes,

esclarecida, penso que nesta área aBiologia pode contribuir

significativamente. Embora aidentificação de gênero e a orientação

sexual sejam complexas e tenhamfeições que são distintamente humanas,

podendo não ser acessíveis àexperimentação animal, muitos outrosaspectos do comportamento sexual são

similares aos comportamentos de fome esede – tão essenciais à sobrevivência,

que se encontram extremamenteconservados entre os mamíferos,envolvendo sistemas cerebrais ehormonais comuns, e até mesmo

comportamentos estereotipados. Em

função disto, temos aprendido muitosobre os controles neurais dos

hormônios e comportamentos sexuais dosestudos experimentais com animais como

ratos e camundongos.

O desenvolvimento embrionário dasgônadas, no seu início, é idêntico emmachos e fêmeas. O gênero genotípico é

determinado por um complementoindividual dos cromossomos sexuais:

fêmeas têm dois cromossomos X,enquanto os machos têm um X e um Y. O

fenótipo de gênero dos machos édeterminado por um único gene, chamadofator determinante dos testículos, no

cromossomo Y. Este gene inicia atransformação da gônada bissexualprimitiva no testículo, que produz

testosterona; na ausência deste fator,a gônada se desenvolve em um ovário eproduz estrogênio. Todas as outrascaracterísticas sexuais fenotípicas

resultam dos efeitos dos hormônios dasgônadas em outros tecidos. De

interesse particular, tanto parabiólogos como para psicanalistas, é

que o dimorfismo sexual se estende ao

cérebro e daí para o comportamento.

O comportamento de machos e fêmeasdifere, mesmo antes da puberdade. Comomuitos aspectos da sexualidade são

conservados entre todos os mamíferos,os comportamentos sexuais relevantespara a sexualidade humana podem serestudados em primatas e até mesmo emroedores. Macacos machos jovens jogam

e brincam de forma barulhenta(esculhambação) com mais frequência do

que as fêmeas, uma diferençarelacionada aos níveis de

testosterona. Meninas que foramexpostas, no período pré-natal, aaltos níveis de andrógenos, comoresultado da adrenohiperplasia

congênita, preferem o mesmo tipo debrinquedo dos meninos95-97-98. Parece

provável que as diferenças sexuais noscomportamentos lúdicos sejam

influenciadas, ao menos parcialmente,pelos efeitos organizacionais do nível

de andrógenos pré-natais.

O nível da testosterona apresentaoutros efeitos dramáticos no

comportamento97,99-101. Ratos machos queforam castrados antes, ou logo após onascimento, falham quando adultos emdemonstrar o comportamento típico

masculino de “montar”(sexualmente) napresença de fêmeas receptivas, mesmo

se lhes for administrado testosterona.Além disso, se a estes ratos for

administrado estrógeno e progesteronana vida adulta, imitando a situaçãohormonal das fêmeas adultas, eles

apresentam a mesma postura,sexualmente receptiva típica de fêmeasno cio. Se a castração é feita algunsdias após o nascimento, nenhum destesefeitos ocorrem. Assim, da mesma formaque as habilidades perceptivas e decoordenação motora, o comportamento

sexual típico é estruturado durante umperíodo crítico, em torno do

nascimento, mesmo que o comportamentopropriamente dito não apareça até bem

mais tarde.

As diferenças sexuais nocomportamento, na medida em quemanifestam diferenças nas funções

cerebrais, devem, ao menos em parte,

resultar de diferenças sexuaisestruturais do sistema nervoso

central. Uma possível localizaçãoanatômica para estas diferenças é o

hipotálamo, que está comprometido como comportamento sexual como também com

uma variedade de outros impulsoshomeostáticos (para uma revisão, ver

101). A estimulação elétrica dohipotálamo intacto de ratos e macacos

rhesus geram comportamentostipicamente sexuais102. Biólogos

verificaram uma diferença dimórficaimpressionante na área medial pré-

óptica do hipotálamo em roedores103,104.

Neste ponto, há quatro gruposfuncionais de neurônios desconhecidosem sua função, chamados, desde então,de núcleos intersticiais do hipotálamoanterior (INAH-1 a INAH-4). Um destesnúcleos, INAH-3, é cinco vezes maiorno rato macho do que na fêmea. Muitascélulas nestes núcleos morrem duranteo desenvolvimento feminino; estas

células são salvas nos filhotes machospela circulação de testosterona epodem ser recuperadas nas fêmeas

através de injeções de testosterona

durante as janelas críticas dodesenvolvimento105,106.

Também podemos ver características dodimorfismo nos diferentes graus deespessura das várias regiões docérebro no córtex de ratos. Por

exemplo, há uma maior assimetria nosmachos: a espessura do lado esquerdo

do córtex do rato macho é maior do quedo direito. Talvez como consequência,o joelho do corpo caloso contém umnúmero maior de neurônios na fêmea.Outras regiões do cérebro também

apresentam dimorfismo sexual, e semdúvida há muito mais a ser descoberto.

A verificação de uma base biológicapara o genótipo e fenótipo de gênerocoloca a seguinte questão: qual é abase biológica para a orientação

sexual? Para começar, é óbvio que odesenvolvimento do gênero é

multifatorial, de forma que aetiologia da orientação sexual deve

ser também multifatorial.Presumivelmente, esta é determinada

por hormônios, genes e fatores

ambientais. É quase certo que um traçocomportamental, como a orientação

sexual, não é causado por um simplesgene, uma única alteração em um

hormônio, ou na estrutura cerebral, ouuma experiência única de vida. O

progresso contínuo nos estudos sobreas características do dimorfismosexual irá, sem dúvida, ajudar os

psicanalistas a melhor compreender aidentidade de gênero e a orientação

sexual.

Os estudos na área da anatomia sobre aorientação sexual estão apenas

começando. Precisaremos de muito maisinformação antes de nos sentirmos

confiantes para publicar achados sobreas diferenças anatômicas. No momento,estes devem ser considerados comopossibilidades interessantes. SimonLeVay93,107 obteve cérebros de homenshomossexuais e de, presumivelmente,homens heterossexuais, todos mortospela AIDS, assim como cérebros de

mulheres. O INAH3, o mais proeminentedos núcleos sexuais dimórficos

presentes no hipotálamo dos ratos,

encontrava-se, em média, de duas atrês vezes maior nos homens

presumivelmente heterossexuais do quenas mulheres. Entretanto, nos

homossexuais, o INAH3 encontrava-se,em média, do mesmo tamanho que nasmulheres. Nenhum dos outros três

núcleos de INAH demonstraramdiferenças entre os grupos. Além dos

problemas potenciais da amostraestudada, não é possível, com base naobservação de LeVay, determinar seestas diferenças estruturais estavam

presentes no nascimento, ou seinfluenciaram os homens a tornar-sehomossexuais ou heterossexuais, ouainda se o dimorfismo é resultado dediferenças no comportamento sexual.Mas, com melhores amostras e osdesenvolvimentos nas técnicas de

visualização dos exames cerebrais,talvez seja possível responder a estas

questões.

Allen e Gorski104 encontraram outradiferença entre homo e heterossexuaisna comissura anterior, um atalho entreos lados direito e esquerdo do cérebro

que é geralmente maior na mulher doque no homem. Allan e Gorski

verificaram que a comissura anteriorse encontrava, em média, maior nos

homossexuais do que nosheterossexuais. Na verdade, ela émaior nos homossexuais do que nas

mulheres (ver 108).

Outra questão, que está sendo abordadaatualmente, é se a orientação sexual éinata ou adquirida109-115. A orientaçãosexual parece sofrer a influência dos

genes, e esta influência é, comopoderia se esperar, complexa. A

orientação sexual é um fator familiar.Se uma pessoa é homossexual, aschances de um gêmeo ser também

homossexual, crescesignificativamente. Em casos de gêmeosmonozigóticos, indivíduos que possuem

os mesmos genes, o índice deequivalência é de 50%. Pra gêmeosdizigóticos, o índice é de 25%. Em

contraste, a incidência dahomossexualidade masculina na

população em geral é menor do que 10%.Para a homossexualidade feminina, a

relação genética é mais fraca;aproximadamente 30% em gêmeos

monozigóticos e 15% em dizigóticos.Estes números parecem, de certa forma,similares àqueles de outros traçoscomplexos, indicando que ambos,

fatores genéticos e não-genéticos, sãoimportantes e operantes.

Como estes achados são recentes, suaconsistência nos diversos grupos depessoas, tanto heterossexuais quanto

homossexuais, ainda está sendoquestionada. Porém, os métodos estãodisponíveis para o estabelecimento da

existência ou não de diferençasanatômicas confiáveis entre pessoas dedistintas orientações sexuais. Comohavia sugerido antes, estes achadospoderão influenciar, enormemente, opensamento psicanalítico sobre adinâmica da orientação sexual.

7. RESULTADOS TERAPÊUTICOS E MUDANÇASESTRUTURAIS NO CÉREBRO

Trabalhos experimentais recentes emanimais indicam que a memória de longo

prazo leva a alterações na expressãodos genes e a alterações anatômicassubsequentes no cérebro. Mudanças

anatômicas no cérebro ocorrem ao longoda vida e provavelmente moldam as

habilidades e o caráter dosindivíduos. A representação das partesdo corpo no córtex cerebral das áreasmotoras e sensoriais depende do uso e,assim, das experiências particulares

de cada um. Edward Taub e seus colegasescanearam os cérebros de

instrumentistas de cordas. Durante asperformances, instrumentistas de

cordas estão constantemente engajadosem hábeis movimentos de mão. O segundoaté o quinto dedo da mão esquerda, queentram em contato com as cordas, sãomanipulados individualmente, enquanto

os dedos da mão direita, quemovimentam o arco, não expressam

movimentos tão diferenciados. Imagenscerebrais destes músicos revelaram que

seus cérebros eram diferentes doscérebros dos não músicos.

Especificamente, a representaçãocortical dos dedos da mão esquerda,mas não da direita, era maior nos

músicos (figura 4) (para revisão, verreferências31,116).

Figura 4 – Tamanho maior darepresentação cortical do 5º dedo da

mão esquerda em músicosinstrumentistas de cordas em relação a

não músicosa.

aA figura mostra o tamanho dasrepresentações corticais medidas porressonância magnética como força

bipolar, o que é considerado um índicede atividade neuronal total. Entremúsicos instrumentistas de cordas,aqueles que começaram a prática

musical antes dos treze anos de idadetêm uma maior representação do que

aqueles cujo início foi posterior. Aslinhas horizontais indicam as médias.

(Baseado em Ebert et. Al.[116] emodificado por Squire e

Kandel [31; reimpresso por permissãode Scientific American Inc.].)

Tais mudanças estruturais sãoadquiridas mais prontamente nos

primeiros anos de vida. Assim, JohannSebastian Bach era Bach não somenteporque tinha os genes certos, mas

provavelmente também porque começou apraticar habilidades musicais em umtempo em que seu cérebro era maissensível a ser modificado pelaexperiência. Taub e colegas116

verificou que músicos que aprenderam atocar seus instrumentos pela idade de

12 anos tinham uma representaçãocerebral maior dos dedos na mão

esquerda, a mão mais importante notocar, do que aqueles que começaram

mais tarde na vida (fig. 4).

Estas constatações levantam umaquestão central para a Psicanálise: Aterapia pode trabalhar desta maneira?

Caso positivo, onde ocorrem asmudanças induzidas pela psicoterapia?

As mudanças estruturaisterapeuticamente operam nos mesmoslocais do cérebro alterados pelas

desordens mentais, ou estas mudanças,terapeuticamente induzidas, causam

modificações compensatóriasindependentes em outros locais inter-

relacionados?

Mudanças de longa duração nas funçõesmentais envolvem alterações na

expressão genética31,116. Assim, noestudo de mudanças específicas que

subjazem estados mentais persistentes,tanto normais quanto perturbados,deveríamos também procurar por

alterações da expressão genética. Comoa expressão alterada de genes

conduziria a alterações de longaduração dos processos mentais? Osestudos sobre as alterações naexpressão genética em animais,

associados com a aprendizagem, indicamque tais alterações são seguidas por

mudanças nos padrões de conexões entreas células nervosas, o que representa,em alguns casos, o crescimento e aretração de conexões sinápticas.

É intrigante pensar que até onde aPsicanálise tem sido bem sucedida emproporcionar mudanças persistentes ematitudes, hábitos e comportamentos

conscientes e inconscientes, isto sejafeito pela alteração na expressão de

genes que produzem mudançasestruturais no cérebro. Estamos dianteda interessante possibilidade de que,

na medida em que as técnicas devisualização do cérebro melhorem,

estas técnicas possam ser úteis, nãoapenas para o diagnóstico das várias

doenças neuróticas, como também para omonitoramento do progresso da

psicoterapia.

8. PSICOFARMACOLOGIA E PSICANÁLISEJá em 1962, Mortimer Ostow, umpsicanalista com formação em

neurologia que tinha um antigointeresse na relação entre a

Neurobiologia e a Psicanálise117-118,apontou a utilidade do uso de drogasdurante o tratamento psicanalítico119.Ele argumentou que, adicionado ao seuvalor terapêutico, a farmacologiapoderia servir como uma ferramentabiológica no estudo das funções

afetivas. Ostow observou que um dosprincipais efeitos dos agentes

psicofarmacológicos se manifesta noafeto, o que o levou a argumentar que

o afeto, muitas vezes, seja um fatordeterminante mais importante dos

comportamentos e das doenças do que aideação ou interpretação consciente.

Esta ideia reforça a posição deSanders, Stern e do Boston Process ofChange Study Group sobre importânciarelativa dos afetos inconscientessobre os insights conscientes,insistindo, uma vez mais, naimportância das mudanças no

conhecimento inconsciente procedural(como as que ocorrem em momentossignificativos), como índice de

progresso terapêutico, tãoimportantes, para o Grupo de Boston,

quanto os insights. Ambos,os argumentos de Boston e de Ostow,deixam claro que as mudanças nas

representações internas inconscientespodem beneficiar o progresso, mesmosem atingir a consciência. Talvez,

nestes casos, o inconsciente seria atémesmo mais importante do que o próprio

Freud avaliava! Assim, a temáticaemergente do estudo de Ostow sobre asações dos agentes farmacológicos noprocesso psicanalítico confirma as

ideias de Sanders e Stern, queinsistem que o progresso na

psicoterapia passa por um componenteprocedural importante e de que muito o

que acontece na psicoterapia nãoprecisa estar diretamente relacionado

ao insight.

É NECESSÁRIO UM DIÁLOGO GENUÍNO ENTREA BIOLOGIA E A PSICANÁLISE PARA

ALCANÇARMOS UMA COMPREENSÃO COERENTEDA MENTE.

Como sugeri anteriormente, a maioriados biólogos acreditam que a mente

será, para o século XXI, o que o genefoi para o século XX. Discuti

brevemente como as ciências biológicasem geral e a Neurociência Cognitiva em

particular irão provavelmentecontribuir para uma compreensão mais

profunda de um grande número dequestões chaves na Psicanálise. Uma

questão que seguidamente é levantada éque uma abordagem neurobiológica da

Psicanálise poderia reduzir os

conceitos psicanalíticos aosneurobiológicos. Se assim fosse, iriaprivar a Psicanálise de seu conteúdo e

riqueza essencial específica econsequentemente mudar o caráter da

terapia. Tal reducionismo não é apenasindesejável, mas impossível. Osconteúdos psicanalíticos, daPsicologia Cognitiva e da

Neurociência, imbricam-se, mas nãosão, de forma nenhuma, idênticos. Astrês disciplinas possuem perspectivase objetivos distintos que convergemapenas em alguns pontos críticos.

O papel da Biologia neste contexto é ode iluminar aquelas direções que

provavelmente levarão a insights maisprofundos em processos paradigmáticosespecíficos. A força da Biologia estáem sua forma rigorosa de pensar e emsua profundidade de análise. Nossacompreensão sobre a hereditariedade,

regulação genética, a célula, adiversidade da imunologia, o

desenvolvimento do corpo e do cérebrohumano e a produção de comportamentosforam profundamente expandidos na

medida em que a Biologia se aprofundacada vez mais na dinâmica moleculardos processos vitais. A força da

Psicanálise está em seu escopo e nacomplexidade das questões tratadas,

força que não pode ser diminuída pelaBiologia. Assim como a Medicina temreiteradamente indicado direções à

Biologia, à Psiquiatria e àNeurociência, também a Psicanálise

pode servir como um tutor competente erealisticamente orientado para uma

compreensão mais sofisticada da mente-cérebro.

Durante a metade do século passado,assistimos a várias integrações bem-

sucedidas nas ciências biológicas, semque isto causasse o desaparecimento

das disciplinas centrais. Por exemplo,a Genética clássica e a Biologiamolecular se mesclaram em umadisciplina comum: a genética

molecular. Agora sabemos que os traçosque Gregor Mendel descreveu e os genesem locais específicos nos cromossomosque Thomas Hunt apontou, são pedaços

de dupla hélice de DNA. Este

conhecimento nos permitiu entendercomo os genes se replicam e como

controlam as funções celulares. Estascompreensões revolucionaram aBiologia, mas não aboliram a

disciplina de genética. Ao contrário,com a expectativa do genoma humano sercompletado até 2003, a genética está

florescendo. Ela fez uso dos poderososconhecimentos da Biologia molecular,aplicou-os efetivamente aos seus

próprios fundamentos e foi adiante.Que o mesmo aconteça com a

Psicanálise.

ESTAMOS ASSISTINDO A UM INÍCIO DEDIÁLOGO?

Como temos visto, a Biologia poderiaajudar à Psicanálise de duas formas:

conceitual e experimentalmente.Estamos, na verdade, começando já a

ver sinais de progresso conceitual. Umnúmero de institutos psicanalíticos,

ou pelo menos, um número significativode pessoas dentro da Psicanálise, tem

lutado para tornar a Psicanálise maisrigorosa e aproximá-la da Biologia.

Freud buscou esta posição no início desua carreira. Mais recentemente,

Mortimer Ostow, membro do NeuroscienceProject of the New York Psychoanalytic Institute eDavid Olds e Arnold Cooper do Columbia

Institute120, assim como outros nosEstados Unidos, já vinham expressando,anteriormente, ideias similares às que

esbocei aqui.

Durante muitos anos, tanto a Associationfor Psychoanalytic Medicine de Columbia

quanto o New York Psychoanalytic Institute,para ficar apenas em dois exemplos,instituíram (com a ajuda de meu

colega, James H. Schwartz), centrosneuropsicanalíticos para conduzir osinteresses comuns da Psicanálise eNeurociência. Os estudos realizados

nestes centros incluíam temáticas comoconsciência, processos inconscientes,memórias autobiográficas, sonhos,afeto, motivação, desenvolvimento

mental infantil, psicofarmacologia e aetiologia e tratamento das doençasmentais. O prospecto do New York

Psychoanalytic Institute hoje é apresentadoda seguinte maneira:

A explosão de novos conhecimentos arespeito de inúmeros problemas deinteresse vital para a Psicanálisenecessita ser integrada de forma

significativa com velhos conceitose métodos como vêm ocorrendo com o

surgimento crescente dastecnologias de pesquisa e

tratamentos farmacológicos.Semelhantemente, os neurocientistasque estão explorando, pela primeira

vez, o complexo problema dasubjetividade, têm muito o que

aprender de um século dequestionamentos psicanalíticos.

Desta forma, os psicanalistas estãocomeçando a aprender sobre a ciêncianeurológica e psicofarmacologia, umestimulante passo a frente, um passoque deve conduzir, por fim, a um novo

currículo para os psicanalistasclínicos.

Como resultado destes esforços, tem

havido um pouco de progresso nasegunda função da Biologia: a funçãoexperimental. Muitos investigadores

têm assistido à possibilidadeestimulante da combinação experimentalda Psicanálise com a Biologia. Têm

sido admiráveis as tentativas de KarenKaplan-Solms e Mark Solms121 para

identificar sistemas anatômicos nocérebro, relevantes para a

Psicanálise, através do estudo dealterações de funções mentais de

pacientes com lesões cerebrais. KaplanSolms e Solms acreditam que o poder daPsicanálise deriva de sua habilidadepara investigar processos mentais apartir de uma perspectiva subjetiva.Entretanto, como eles assinalam, esta

grande força também é sua grandefragilidade. Os fenômenos subjetivosnão se entregam facilmente à análise

empírica objetiva. Precisamosdesenvolver novas formas de estudo dosfenômenos subjetivos. Como resultado,estes investigadores argumentam que

somente através da conexão daPsicanálise com os fenômenos

neurobiológicos objetivos, como nas

mudanças de personalidade consequentesa

lesões cerebrais focais, é possívelrelacionarem-se correlatos empíricos

com os construtos subjetivos daPsicanálise. De forma semelhante, há

também a longa tradição do trabalho deHoward Shevrin, que correlaciona a

percepção de estímulos subliminares esupraliminares com potenciais

cerebrais relacionados a eventos, natentativa de analisar aspectos dosprocessos mentais inconscientes5,46.

Estes estudos iniciais sãoextremamente encorajadores. Mas, paraque a Psicanálise se revigore, será

necessário integrar estareestruturação intelectual com

mudanças institucionais. Para que aBiologia possa ajudá-la, dois aspectos

da Psicanálise requerem atençãoespecial: os resultados terapêuticos eo papel dos institutos psicanalíticos.

A AVALIAÇÃO DOS RESULTADOS EM

PSICANÁLISE

Como forma de terapia, a Psicanálisenão é mais tão amplamente praticadacomo era há 50 anos. Jeffrey122 sugereque o número de pacientes que procurama Psicanálise tem decrescido de formaestável, 10% ao ano, nos últimos vinte

anos, assim como tem decrescido onúmero de psiquiatras talentosos queprocuram treinamento em institutospsicanalíticos. Este declínio éfrustrante, porque a terapia

psicanalítica parece haver se tornadomais focalizada realisticamente, daítendo maior probabilidade de ser

eficaz. Durante as últimas décadas, aPsicanálise tem abandonado de forma

ampla os objetivos não-realísticos dadécada de 50, quando tentava tratar

sozinha do autismo, da esquizofrenia ede doenças bipolares graves,

distúrbios para as quais tinha poucoou nada a oferecer. Nos dias de hoje,

pensa-se que a Psicanálise podealcançar mais sucesso com pessoas comdistúrbios de caráter não-psicóticos,como pessoas que encontram maiores

dificuldades em trabalhar de formaefetiva ou manter relações de formasatisfatória e que desejam adquirir

meios melhores de conduzir suas vidas.Um grande número desses pacientes

sofrem do transtornos de personalidadeborderline com perturbações afetivasconcomitantes. Nestes casos, aPsicanálise e a psicoterapia de

orientação analítica são consideradasúteis, juntamente com o tratamentofarmacoterápico (ver 123, para a

distribuição dos pacientes vistos emanálise). Como resultado deste

estreitamento de foco para pacientesnão psicóticos, a Psicanálise e a

psicoterapia de orientação analíticapodem ser hoje mais efetivas do que

antigamente.

Lembro aqui de Kay Jaminson e de suaespantosa discussão de sua própria

doença maníaco-depressiva e daresposta efetiva da combinação da

medicação com lítio e psicoterapia124:

Neste ponto em minha existência, não possoimaginar como levar uma vida de forma

normal sem o tratamento do lítio e osbenefícios da psicoterapia. O lítio previne meus

“picos” sedutores, mas desastrosos, diminuiminhas depressões, torna mais clara a

confusão da desordem de meu pensamento,me desacelera, tornando-me menos impulsiva,

me ajuda a não arruinar minha carreira erelacionamentos, mantém-me fora do hospital,

viva, e torna a psicoterapia possível. Mas acura ocorre através da psicoterapia. É ela que

dá sentido à confusão, governa o território dossentimentos e pensamentos, me dá controle eesperança e a possibilidade de aprender comtudo isto. Os medicamentos não podem trazervocê de volta à realidade de forma amena, eles

podem somente fazer com que alguém volterapidamente, repentinamente, o que pode ser

muito duro algumas vezes. A psicoterapia é umsantuário; é um campo de batalha; é um lugar

onde estive psicótica, neurótica, exaltada,confusa e desesperada para além do que se

possa acreditar. Mas, sempre, é onde euacreditei, ou aprendi a acreditar, que um dia

eu poderia ser capaz de vencer tudo isto.Nenhum comprimido pode me ajudar a lidarcom o problema de não querer tomá-los; da

mesma forma, nenhuma terapia sozinha podeprevenir minhas manias e depressões. Preciso

de ambos. É estranho, dever sua vida aoscomprimidos, seus subterfúgios e persistências

e a esta única, estranha e profunda relaçãochamada psicoterapia.

Constatados estes avanços, por que aprática da Psicanálise não está

florescendo? Este declínio no uso dapsicoterapia psicanalítica é

atribuível, em grande parte, a causasexternas à Psicanálise: à proliferaçãode diferentes formas de psicoterapias

breves (muitas, em muitos graus,derivadas da Psicanálise), à

emergência da farmacoterapia e aoimpacto econômico do Manage Care. Mas

uma causa importante deriva daPsicanálise em si. Um século inteiro

após sua fundação, a Psicanálise aindanão fez o esforço necessário para a

obtenção de evidências objetivas paraconvencer a cética profissão médica deque é um método mais efetivo do queplacebos. Assim, diferentemente de

várias formas de psicoterapiacognitiva e de outras psicoterapias,

para as quais, agora existemevidências objetivas – tanto como

terapias em si ou como acessóriosfundamentais à farmacoterapia – não há

ainda evidência objetiva, além deimpressões subjetivas, de que a

Psicanálise funcione melhor do que asterapias não-analíticas ou placebos125-

133.

O fracasso da Psicanálise em proverevidências objetivas de que é efetivacomo terapia não pode mais ser aceita.A Psicanálise tem que ser persuadida

pela perspectiva realista e crítica deArnold Cooper125:

Até onde a Psicanálise considera ser ummétodo de tratamento, estamos, para melhor

ou pior, dentro da órbita da ciência e nãopodemos escapar da obrigação da pesquisa

empírica. À medida que desenvolvemosprofissionais que são membros de uma

determinada profissão e cobram por seusserviços, é responsabilidade nossa estudar o

que estamos fazendo e como afetamos nossospacientes.

Como Cooper assinala, um número deestudos importantes inicialmente

destinados a avaliar os resultadosterapêuticos – as pesquisas de

Wallerstein134 e os estudos revisadospor Kantrowitz129 e Bachrach135 –

abandonou seus objetivos de longo-prazo pelos de curto-prazo maisacessíveis e não relacionados aosresultados. Apesar de seu custo ecomplexidade, os estudos rigorosossobre os resultados terapêuticos, em

comparação com as terapias breves e deorientação não analítica e placebos,necessitam estar no topo da lista deprioridades se a Psicanálise desejaser reconhecida como uma boa opção

terapêutica.

UM RELATÓRIO FLEXNER PARA OSINSTITUTOS PSICANALÍTICOS?

O passo mais difícil, porém, é ir alémda apreciação da Biologia. É ter uma

pequena elite de pesquisadoresprofissionais para desenvolver, na

Psicanálise, uma atmosfera intelectualque tornará uma pequena fração de

analistas competentes em neurociênciacognitiva e ansiosos por testar suaspróprias ideias com novos métodos. O

desafio para os psicanalistas étornarem-se participantes ativos nadifícil tarefa de unir a Biologia àPsicologia, incluindo a Psicanálise,

na compreensão da mente. Se desejarmosque ocorra esta transformação daatmosfera da Psicanálise, comoacredito que deva ocorrer, os

institutos psicanalíticos devem deixarde ser escolas vocacionais – um tipode corporação – para tornarem-se

centros de pesquisa e pós-graduação.

Na virada do século vinte e um, osinstitutos psicanalíticos norte-

americanos assemelham-se a escolasmédicas privadas que povoavam o paísno início do século XX. Na virada do

século XIX, os Estados Unidosvivenciaram uma grande proliferação deescolas médicas – 155 declaradas – amaioria delas sem laboratórios para oensino das ciências básicas. Nestas

escolas, os estudantes eram ensinadospor profissionais particulares que,

frequentemente, encontravam-seocupados com suas próprias clínicas.

Para examinar este problema, aCarnegie Foundation contratou AbrahamFlexner para avaliar a educação médica

nos Estados Unidos. O relatórioFlexner136, finalizado em 1910,enfatizou que a medicina é uma

profissão científica e requer umaeducação estruturada na ciência básicae sua aplicação à medicina clínica.

Para promover uma educaçãoqualificada, o relatório Flexner

recomendou limitar as escolas médicasno país àquelas integradas a

universidades. Como consequência desterelatório, muitas escolas inadequadasforam fechadas, foram estabelecidospadrões para credenciamento para oensino e prática da Medicina. Pararetornar ao vigor de sua fundação econtribuir de forma relevante à

compreensão da mente, a Psicanáliseprecisa examinar e reestruturar ocontexto intelectual em que é feitoseu trabalho formativo e desenvolverformas mais críticas de formação de

profissionais no futuro. Assim, o quea Psicanálise talvez precise, se

quiser sobrevivercomo forçaintelectual no século vinte e um, é dealgo similar ao Relatório Flexner comrelação aos institutos psicanalíticos.

O que levou tantos de nós àPsicanálise, nos finais de 1950 einício de 1960, foi sua audaciosa

curiosidade e seu zelo investigativo.Eu mesmo fui levado ao estudo

neurobiológico da memória por concebera memória como central para uma

compreensão mais profunda da mente, uminteresse primeiramente iluminado pelaPsicanálise. Pode-se esperar que a

animação e o sucesso da Biologia atualreacendam as curiosidades

investigativas da comunidadepsicanalítica, e que uma disciplina

unificada da Neurobiologia, daPsicologia Cognitiva e da Psicanálise

levem a um novo e mais profundoentendimento da mente humana.

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Title: Biology and the future ofpsychoanalysis: a new intellectualframework for psychiatry revisited

Tradução: Ana Paula BredaRevisão: Antonio Marques da Rosa,

Julio J. Chachamovich e Maurício Marxe Silva

Endereço para correspondência:E-mail: [email protected]

Copyright © Am J Psychiatry