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CONECTIVISMO, MOOCS E O CAMINHO PARA UM CURRÍCULO ORGÂNICO
Daniel Confortin1
Resumo: Este artigo busca inicialmente desenvolver uma pesquisa bibliográfica acerca das bases históricas, teóricas e metodológicas do conectivismo e suas implicações na criação dos chamados Massive Open Online Courses (MOOC) um fenômeno de crescimento rápido a nível mundial na educação a distância. Além disso procuramos comparar a concepção curricular tradicional institucionalizada com uma outra dita “orgânica” ou distribuída, usando modelo de redes, que surge juntamente com o fortalecimento da formação paradidática.Palavras-chave: EAD, conectivismo, MOOC, currículo.
Introdução
Existe certa ironia em escrever um artigo sobre como a tecnologia afeta nossa maneira
de pensar a educação. Um artigo como esse é uma herança desnecessária que ainda persiste
em um meio acadêmico extremamente lento para mudanças. Se pensamos que Ted Nelson nos
brindou com o hipertexto na década de 1960 e, até os dias de hoje, a universidade ainda não
sabe explorar esse simples conceito, o que dirá de mecanismos mais complexos de ensino fora
do contexto físico escolar. Mas, ao mesmo tempo, é dentro do meio acadêmico que surgem as
grandes promessas de mudança que trataremos nesse artigo. O paradoxo se torna ainda mais
intrigante pelo fato desses modelos de ensino a distância representarem, para seus defensores,
uma mudança irreversível em direção a uma importância menor da escolarização na formação
humana sob regimes democráticos.
Nosso objetivo é fazer aqui um apanhado geral sobre o conectivismo proposto por
Siemens e Downes que deu origem aos Massive Open Online Courses (MOOC), sistemas
herdeiros de uma longa história de desenvolvimento dos ambientes virtuais de aprendizagem
(AVA) bem como do conceito seminal de OpenCourseWare (OCW), comparando sua proposta
de currículo baseado em redes distribuídas com o sistema centralizador “de um para muitos”
da educação institucionalizada. Além disso, para compreender estas e outras siglas, nos
propomos a esclarecer conceitos básicos relativos aos significados de conhecimento, currículo
e aprendizagem dentro deste contexto. Por fim buscaremos apresentar de forma sintética
como se estrutura essa nova forma orgânica de conceber o currículo e de que maneira ela
1 Bacharel em Design, especialista em Arteterapia e Consultoria Ambiental, estudante de Filosofia e mestrando em Educação.
pode vir a mexer com as bases dessa que é, nas palavras de Ivan Illich (1985, p. 56), a nova
“igreja universal de nossa cultura decadente”.
1 Os 3Cs: Conhecimento, Comunidade e Currículo
A questão do conhecimento é um tema central da filosofia desde seu início. O que é
possível ensinar e qual a natureza desse conhecimento ocupou as mentes de Platão, Agostinho
e, mais recentemente, Wittgenstein. Em seu primeiro trabalho “Tractatus Logico-
Philosophicus” ele aponta a ligação intrínseca entre conhecimento e linguagem, dando ênfase
à chamada “definição ostensiva”. Já em uma fase posterior o filósofo via a mesma linguagem
de maneira mais neutra, não tendo em si significado definitivo mas prático, a linguagem seria
composta de proposições e representações, o que sabemos é representado por aquilo que
fazemos, a linguagem ganha significado no seu uso. Como afirma Downes:
A language may be thought of as an entity in its own right, with its own internal
form of organization, though arguably it is inseparable from the community that
creates it. […] What is crucial to understand about language is that it reflects,
and does not prescibe. […] A sentence is like a picture: an abstraction, a
snapshot, a moment, an artifice. It is not inherently true or false, does note
inherently contain its own meaning. (2012)
Conhecimento então seria muito mais complexo que a mera indicação de objetos
sensoriais ou mesmo a clara distinção proposta por Descartes. Na verdade este se compõe de
organizações sistêmicas e orgânicas que não possuem uma lógica interna inteligível como os
gregos buscavam provar, mas se aproxima mais do exemplo da cidade antiga proposta por
Wittgenstein onde o jogo linguístico vai criando significados de maneira muito similar ao
crescimento de um organismo vivo.
Our knowledge is the state of organization that results in our brains and bodies
after our interactions with the world. For example, 'to know that Paris is the
capital of France' is not to have some sentence in the brain, nor is it to be in
possession of some fact, it is to be organized in a certain way. […] Our
knowledge of 'Paris is the capital of France' consists of much more than the
simple content contained in such a sentence. (DOWNES, 2012, p.2)
Sendo assim, em um certo aspecto contrariando as teorias platônicas onde aprender é
um ato de recordar um conhecimento já internalizado, aprender se trata de construir uma
intimidade com o conhecimento que envolve vários fatores. O aprendizado de uma disciplina
é um tornar-se parte de uma rede, um ponto, é de fato emular “an entire organizational state
and not merely to possess a simples set of facts” (ibid, p.3). Nas antigas comunidades, guildas
de artesãos, sociedades filosóficas ou artísticas o aprendizado era sintetizado no ato de tornar-
se o próprio mestre, um canibalismo cognitivo pleno.
Na teoria agostiniana a imitação é a forma mais natural e primitiva de aprendizado,
sendo posteriormente substituída por associação e assim se inicia a formação das redes de
conhecimento. Se, de acordo com Siemens (2004), a linguagem é definida simplesmente
como a comunicação entre duas entidades, o conhecimento pode ser entendido como a criação
de sistemas conceituais. O ápice de tais sistemas é representado pelas comunidades físicas ou
não. Podemos falar de aprendizado comunitário da mesma maneira que falamos do individual.
Tal aprendizado não fica restrito a formas verbais de transmissão de conhecimento, ao
contrário, como afirma Downes (2012, p.4) “that knowledge is contained not only in its law
courts and libraries, but also in its buildings and bridges, statues and artwork, community
halls and schools and taverns, houses, apartments, and cardboard shelters built by people who
live on the street”.
Toda a experiência acumulada por uma comunidade, tudo aquilo que ela pode aprender
e transformar em conhecimento depende em grande parte de como ela se organiza. É dentro
do grupo social que se cataliza a transformação da experiência em conhecimento para mais
tarde ser sistematizada. Nas sociedades antigas a tradição, o mito e os grupos de excelência
técnica eram responsáveis pela sistematização e transmissão desse legado, já no mundo
moderno isso se dá através da escola e de seu currículo.
O termo que deriva da palavra latina curriculum indica um caminho, uma carreira.
Pode indicar popularmente o todo de uma carreira profissional (como em curriculum vitae) ou
ainda, no sentido que nos interessa neste artigo, os conteúdos selecionados que devem ser
transmitidos no processo educativo. Como afirma Sacristán:
É uma espécie de ordenação ou partitura que articula os episódios isolados das
ações, sem a qual esses ficariam desordenados, isolados entre si ou
simplesmente justapostos, provocando uma aprendizagem fragmentada. O
currículo desempenha uma função dupla – organizadora e ao mesmo tempo
unificadora – do ensinar e do aprender, por um lado, e, por outro, cria um
paradoxo, devido ao fato de que nele se reforçam as fronteiras (e muralhas) que
definem seus componentes. (2013, p. 17)
Na visão do autor quando associamos conteúdos, gruaus e idades através do currículo,
passamos também a conformar pessoas dentro de um objetivo ideológico. Algo que não
devemos nos espantar pois, como bem coloca Paula Sibila (2012, p.17), “essa instituição foi
concebida com o objetivo de atender a um conjunto de demandas específicas do projeto
histórico que a planejou e procurou pô-la em prática: a modernidade”. O projeto iluminista e
posteriormente o moderno deram cabo de uma enorme transformação na cultura européia. O
auge desse movimento se deu por meio da pedagogia de Immanuel Kant com ênfase nos
processos disciplinatórios e morais, visando transformar o “animal” em um “homem
moderno”. Esse discurso se tornou cada vez mais poderoso com o domínio do conceito de
“estado” e com a massificação do ensino.
Os intermediários entre o conhecimento gerado historicamente na comunidade passam
a ser o estado, os professores e o material didático. O grande dilema contemporâneo é
justamente determinar o quanto esses intermediários conseguem se adequar a uma realidade
constantemente em mutação e trabalhar com o incrível montante de informação disponível na
sociedade global. Nesse particular Sacristán (2013, p.22) nos lembra que “não haverá
mudança significativa de cultura na escolarização se não forem alterados os mecanismos que
produzem a intermediação didática; ou, em outras palavras: toda proposta cultural sempre será
mediada por esses mecanismos”. Parce que é precisamente isso que está acontecendo.
2 As paredes da escola
Entre os diversos trabalhos na área da educação, especialmente no Brasil, já se trata de
conversa de papagaio alardear sobre o crescimento exponencial do conhecimento. Sabemos
que até meados dos anos 1990 o conhecimento acumulado pela humanidade duplicava a cada
dez anos. Já nos anos 2000 isso acontecia a cada 18 meses, agora a tendência é considerar a
duplicação do conhecimento quase que mensalmente. Neste contexto surgem as primeiras
gerações dos famosos “nativos digitais” que já estão chegando na idade adulta. Se por um
lado tiveram acesso direto à tecnologias e formas de ação completamente diferente de seus
pais, por outro ficaram submetidos aos mesmos métodos preconizados pelas grandes teorias
pedagógicas formulados no início do século XX. Já faz parte do senso comum o fato de que o
modelo de ensino de um para muitos não condiz mais com a realidade da nossa sociedade.
Como afirma Siemens (2004) “technology is altering (rewiring) our brains, the tools
we use define and shape our thinking” e essa modificação não é compreendida nem levada em
conta, especialmente em um país como o Brasil que somente agora conseguiu chegar em um
processo próximo à universalização do ensino. A lógica é simples, a escola que já foi
revolucionária durante a revolução moderna e moldou nossa maneira de ser e estar no mundo
como humanos, agora sofre de um anacronismo, não importa o que as autoridades digam “há
uma divergência de época: um desajuste coletivo entre os colégios e seus alunos na
contemporaneidade, que se confirma e provavelmente se reforça dia a dia na experiência de
milhões de crianças e jovens de todo o mundo” (SIBILA 2012, p.14)
Em uma visão foucaultiana desse quadro, vale lembrar que o estado serviu de base
para os principais elementos da sociedade moderna, nisso incluímos a família, a fábrica, o
exército, a prisão e a própria escola. O grande modelo escolar é a prisão e “seu principal
mecanismo de poder era o confinamento, ou seja, o trancafiamento num espaço e num tempo
minuciosamente pautados e regulamentados” (ibid, p.174) buscando a conformação e a
disciplina para atingir o ideal kantiano de modernidade. Qual seria então o caminho a seguir?
E, principalmente, o que podemos fazer para mudar esse quadro? Talvez não haja caminho ou
ações a serem tomadas. Como todo o organismo ou sistema vivo parece que a sociedade
(agora em um nível global) tende a se auto-organizar por meio de ações anárquicas e
espontâneas.
Com os processos de inclusão digital e a pavimentação do caminho até a
universalização do acesso à informação através da rede mundial a escola não responde mais
pela maioria do conhecimento que adquirimos durante a vida. Saber diferenciar
conhecimentos, o que aceitar ou rejeitar em sua própria formação, e onde encontrar
informação de qualidade passa a ser mais importante do que o currículo estabelecido durante
as horas de prisão. Siemens complementa que “learning now occurs in a variety of ways –
through communities of practice, personal networks, and through completion of work-related
tasks”.
As paredes das escolas começam a ruir, é inevitável a comparação com a queda da
Bastilha francesa, um feito digno de celebrar pois significa a “libertação dos velhos
mecanismos de ortopedia social: aqueles que massacravam diariamente os corpos nas
sociedades modernas para adaptá-los a seus ritmos e com eles alimentar as engrenagens da
industrialização” (SIBILA, 2012 p. 179). Assim como no dia que causou terror aos monarcas
europeus muitas cabeças tendem a rolar, mas antes de presenciar o sangue no machado do
verdugo precisamos entender como o motim começou.
3 EAD, AVAs e o movimento OpenCourseWare
O ensino a distância (EAD) tem séculos de história. Sua popularização se deu através
da consolidação dos sistemas postais europeus e norteamericanos durante o século XIX. No
Brasil temos exemplos que já viraram cultura popular como os cursos do Instituto Universal
Brasileiro e Telecurso 2000, em atividade até hoje. Com a popularização do computador
pessoal surgiram as primeiras tentativas de aulas “multimídia” por meio de CD-ROMs
educativos e, alguns anos mais tarde, as primeiras aulas por meio de imagens e hipertexto no
contexto da world wide web. Nos anos 2000 surgem os primeiros ambientes virtuais de
aprendizagem (AVA) e a educação institucionalizada em todos os seus níveis passa a apostar
no novo modelo como a revolução democrática tão alardeada pela tecnologia. Dentre as
diversas experiências resultantes em padrões de AVA destacam-se a concepção de alguns
como Moodle, Teleduc, Eureka, AulaNet, WebCT, Blackboard, LearningSpace, entre muitos
outros.
Dois aspectos devem ser levados em conta para o sucesso apenas parcial dos sistemas
de EAD a nível mundial. Primeiro, sua incapacidade de emular mecanismos de interação
social e colaborativa, quem sabe a principal característica positiva do meio escolar,
provocando um sentimento de isolamento tanto em relação aos demais estudantes quanto para
com a instituição provedora do serviço.
Os recursos de interação disponibilizados nestes ambientes como fóruns e chats,
não estão favorecendo a percepção do outro no ambiente de aprendizatem […]
esse é um problema recorrente nos AVA tradicionais, pois eles provocam um
sentimento de isolamento dos usuários, o que consequentemente acarreta na
ausência de uma rede de relacionamentos entre eles. (SOUZA et al., 2013,
p.184)
Em segundo lugar devemos citar a pouca flexibilização do modelo escolarizador
dominante. Os sistemas de EAD desenvolvidos até o final da década passada ainda estavam
fortemente vinculados aos principais elementos escolares cegos para as novas possibilidades
apresentadas pela tecnologia seguiram, como é comum, o caminho da emulação do dito
“mundo físico”. Ainda não haviam compreendido a potecialidade da nova sociedade em rede.
Segundo Castells (2007) a sociedade em rede se desenvolve basicamente sobre três processos
(1) a revolução da tecnologia da informação; (2) crise do capital e do estado; (3) sua
consequente reestruturação e o ápice dos movimentos socio-culturais. Deste ponto surge a
sociedade em rede, uma economia informacional global. Essa rede se manifesta de três
maneiras diferentes: centralizada, descentralizada e distribuída. Apesar de surgirem em
momentos distintos e de maneira progressiva, no atual momento estes três modelos se
sobrepõe, seu fator de diferenciação é essencialmente a forma como os pontos se conectam.
Na opinião de Farias (2013, p. 2) no nosso “panorama atual da Educação a Distância (EAD),
vemos ações isoladas, experimentações e possibilidades, contudo não há ainda um modelo
que caracterize como deve ser, de fato, essa proposta de educação para o século XXI”.
Um grande catalizador para a criação de novas ferramentas foi a Web 2.0 que
potencializou ainda mais o rompimento das barreiras geográficas e temporais criando
possibilidades de compartilhamento em tempo real. É por meio desse conjunto de tecnologias
que se permite a sensação de se estar sempre em contato compartilhando, remixando e
reutilizando conteúdos. Com isso propiciando o surgimento do embrião do que hoje
conhecemos como redes sociais tais como Facebook, Tweeter e Youtube. Além do fator
comunicativo temos também a sensação de continuidade proporcionada por um perfil público
ou não, podemos afirmar que “as redes sociais virtuais contribuem para o reconhecimento de
diferentes identidades sociais, assim como mobilizam os saberes sob uma perspectiva de
produção coletiva (SOUZA et al., 2013, p. 186)
Cabe lembrar que os grandes responsáveis por esses acontecimentos fortuitos são os
diversos atores envolvidos na flexibilização das leis de direito autoral através da criação de
licenças alternativas para diversos tipos de materiais criativos. Em especial vale a pena citar
os envolvidos no movimento Copy Left, em especial a Free Software Foundation, bem como
Lawrence Lessig fundador do Creative Commons. Tendo em mãos o aparato legal, as
ferramentas tecnológicas e o senso de inovação, em 2002 o MIT abriu seus objetos de
aprendizagem dos acervos de informação e de conhecimento que apoiam a aprendizagem e
iniciou o movimento OpenCourseWare (OCW). Estes normalmente se referem a uma
publicação digital, gratuita e aberta, de alta qualidade disponibilizadas por instituições de
ensino superior. Esses materiais educativos são organizados como cursos e incluem material
de planejamento, ferramentas de avaliação e conteúdo temático, sob licenças abertas.
A partir das primeiras experiências surge o OpenCourseWare Consortium, que reúne
uma comunidade de centenas de instituições de ensino e organizações comprometidos no
avanço da educação aberta e seu impacto na cultura global. Suas atividades se estendem por
vários países visando assessoria no processo de democratização de ensino, especialmente
transferência de conhecimentos técnicos e científicos. No Brasil a primeira entidade a fazer
parte do OCW Consrotium foi a Fundação Getúlio Vargas por meio da FGV on-line, já em
2011 a Unicamp concebeu o “OpenCourseWare Unicamp” hospedando materiais provenientes
dos cursos de graduação da instituição e mais tarde sendo seguidos, com certa vagareza e
desconfiança, por outras grandes instituições nacionais.
4 Os princípios do conectivismo
Após o aperfeiçoamento dos AVAs, a criação do conceito OCW chancelado por
instituições de renome internacional e, principalmente, a popularização das redes sociais,
ainda faltavam elementos teóricos e práticos para iniciar-se um movimento educacional
realmente novo e também “nativo digital”. Para muitos esse passo foi dado em 2004 com a
publicação do artigo “Conectivismo: Conectivismo: Uma teoria de aprendizagem para a idade
digital” que gerou um acirrado debate nos círculos de pesquisa sobre educação. De acordo
com o autor, tanto cognitivismo, behaviorismo e construtivismo falham em compreender o
zeitgeist dos nossos tempos, tanto pelo fato de estarem distantes temporalmente das grandes
mudanças sociais ocorridas no processo de globalização como por relegarem ao segundo
plano fatores importantes como o reconhecimento de fontes de informação externa
armazenada tenologicamente além de não conseguirem descrever de maneira satisfatória o
aprendizado de grupos ou sistemas.
Siemens parte da teoria de sistemas e do caos para criar aforismos que visam lidar com
o big data que caracteriza nossos tempos. De acordo com o autor a necessidade de valorizar
determinados conhecimentos em detrimento de outros, ou seja, escolher conhecimentos que
valem a pena aprender, é uma habilidade essencial a ser desenvolvida e que atua antes mesmo
do aprendizado propriamente dito. Outra habilidade importante é a de reconhecer conexões e
padrões dentro de um grande amonte de dados extraindo a simplicidade a partir da
complexidade. Falando do desenvolvimento anárquico do conhecimento afirma Siemens:
Including technology and connection making as learning activities begins to
move learning theories into a digital age. […] Chaos is a new reality for
knowledge workers. […] Chaos states that the meaning exists – the learner's
challenge is to recognize the patterns which appear to be hidden. Meaning-
making and forming connections between specialized communities are
important activities. Chaos, as a science, recognizes the connection of
everything to everything. (2004)
No conectivismo a auto-organização é um conceito fundamental. Por auto-organização
entende-se a formação de estruturas organizadas, padrões e comportamentos a partir de um
ambiente aparentemente caótico. Essa auto-organização é um processo de aprendizagem que
requer certa abertura e possibilidade reconhecer e adaptar-se às condições do meio. Tal
processo leva a formação de redes distribuídas e alterações dentro da rede ocasionam
ondulações no todo. Vale lembrar que ligações representam sobrevivência em um mundo
interconectado e cada ponto em uma rede que desenvolve um perfil único tem mais chances
de conseguir ligações adicionais. Pontos considerados referenciais tem a possibilidade de
estabelecer pontes em diferentes áreas do conhecimento. Siemens resume sua proposta da
seguinte forma:
Connectivism is the integration of principles explored by chaos, network, and
complexity and self-organization theories. Learning is a process that occurs
within nebulous environments of shifting core elements – not entirely under the
control of the individual. Learning (defined as actionable knowledge) can reside
outside of ourselves (within an organization or a database), is focused on
connecting specialized information sets, and the connections that enable us to
learn more are more important than our current state of knowing. (2004)
Podemos citar dentre as principais raízes teóricas do conectivismo citadas pelo autor
em seus textos: a noção de comunidade de prática de Lave Wenger e em certa medida de
Papert, que considera a aprendizagem como um fenômeno situado, decorrente da participação
em comunidades de prática; a aprendizagem social (construtivismo) de Vygotsky e Bruner;
mais recentemente elaborados, o trabalho de Stephen Downes sobre conhecimento conectivo
e o conceito de conhecimento rizomático que citamos anteriormente e de comunidade como
currículo de Dave Cormier, entre tantas outras referências. Os princípios básicos do
conectivismo estão resumidos no quadro a seguir:
Em resumo a teoria de Siemens trata essencialmente de uma abordagem dos principios
de rede como definidores da aprendizagem em vários níveis: biológico/neurais, conceituais e
sociais/externos. Para o conectivismo nosso conhecimento reside nas conexões que criamos,
seja com outras pessoas, seja com fontes de informação, como bases de dados. Fatores como
compreensão, coerência, interpretação e significação são impressindíveis no processo de
aprendizagem. É necessário deixar claro também que, para alguns críticos, o conectivismo
seria melhor classificado como uma perspectiva pedagógica e de currículo do que como uma
teoria estruturada do aprendizado, porém estes mesmos reconhecem as contribuições do
conectivismo no contexto atual de mudanças de paradigmas, onde o aluno cada vez tem
adquirido uma posição de autonomia no processo de aprendizado.
5 A ameaça dos MOOCs
Em 2008, os mesmos Siemens e Downes ofereceram um curso chamado
“Connectivism and Connective Knowledge” para cerca de 25 alunos pagantes na
Universidade de Manitoba no Canadá. Ao mesmo tempo o curso foi aberto para outros 2.300
• Aprendizado e conhecimento se baseiam na diversidade de opiniões.
• Aprendizado é um processo que envolve conectar pontos especializados ou fontes
de informação
• Aprendizado pode residir em aplicativos não-humanos
• Capacidade de conhecer é mais crítica do que aquilo que já se sabe
• Nutrir e manter conexões é necessário para facilitar o aprendizado contínuo
• Capacidade de ver conexões entre campos, ideias e conceitos é uma habilidade
essencial.
• A tomada de decisões é, por si só, um processo de aprendizagem. Escolher o que
devemos aprender e o significado da informação nos é apresentada. Ao mesmo
tempo que hoje consideramos determinada resposta como correta caso hajam
alterações nas informações que afetam a decisão.
participantes sem nenhum custo. Foi durante esse evento que surgiu a sigla MOOC,
abreviação de Massive Open Online Course (cursos abertos online massificados). Apesar do
fato de que a agenda dos MOOCs possa parecer idêntica à da escola convencional, suas
atividades de aprendizagem são muito mais dinâmicas para acomodar a participação de um
grande número de pessoas. Os cursos podem ocorrer em uma data determinada ou não,
assumindo mais recursos expositivos ou aplicando dinâmicas de projeto mas, independente de
qualquer coisa, eles ocorrem de maneira distribuída fazendo uso de blogs, wikis, redes sociais,
aplicativos específicos etc.
Um MOOC é diferente de um EAD convencional pois abre as portas e convida
qualquer um para entrar, resultando em uma nova dinâmica de aprendizagem que oferece
grandes oportunidades colaborativas e de conversação para que os estudantes criem ligações
entre os conteúdos. Para dar conta de tamanho amonte de conhecimentos os instrutores
lançam mão de ferramentas colaborativas dentro do modelo P2P incentivando o contato direto
entre alunos e a participação ativa no programa. Muitos dos alunos mais destacados acabam
por tornarem-se monitores de determinado grupo de pessoas. Além disso é comum a formação
espontânea de grupos por interesse, língua, região ou cultura. Cabe salientar que:
Os MOOCS integram três elementos: conectividade das redes sociais, o
conhecimento de um especialista em determinada área e a coleção de recursos
online abertos. […] Embora compartilhem de uma estrutura de cursos
convencionais, com um cronograma pré-definido ou tópicos semanais, os cursos
do tipo MOOC normalmente não são pagos, nem requerem pré-requisitos, senão
o interesse por estudar. (MATTA, FIGUEIREDO. 2013, p. 5)
Pelo fato de seus participantes possuírem graus variados de formação e motivação o
curso acaba por se beneficiar de uma rica diversidade de ideias surgidas de diferentes regiões,
culturas, e perspectivas. Ao mesmo tempo a instituição sede do curso abre seu currículo para
uma audiência incrivelmente maior que o normal, aumentando a voz da instituição na
comunidade e removendo barreiras de aprendizado. Já para o aprendiz independente e
vitalício, o MOOC apresenta oportunidades de ingresso em comunidades de interesse, criando
ligações duradouras e muito além das possibilidades meramente físicas, provando que a
educação ocorre majoritariamente fora dos ditos “anos escolares”. É justamente essa a
principal contribuição dos MOOCs, o potencial de criar redes, alterar o relacionamento entre
professor e aluno, instituição e comunidade, muito mais próximo do ideal democrático
iluminista.
Existe uma classificação necessária cunhada por Stephen Downes para os diversos
sistemas que levam essa sigla. Inicialmente do bojo do conectivismo surgem os cMOOCs.
Nessa categoria os estudantes são encorajados a contribuir de maneira ativia através das
plataformas digitais. Os participantes de um determinado curso compartilham conhecimento
por meio de blogs, posts, tweets, redes sociais etc. de acordo com o combinado entre com os
organizadores do curso que, por sua vez, sintetizam referências e compartilham regularmente
com todo os demais.
Normalmente os cMOOCs também são patrocinados por instituições variadas
(educacionais, ongs, governos etc.) mas sempre organizadas por indivíduos apaixonados por
determinada área do conhecimento. Estes comprometem seu tempo para criar um sistema de
aprendizagem onde os participantes de várias partes do mundo possam conetar-se, colaborar,
compartilhar e expandir sua rede de contatos pessoais e profissionais. Uma característica
interessante dos cMOOCs é sua flexibilidade e possibilidade de expansão para abarcar as
necessicades específicas de cada grupo.
Com as grandes instituições de ensino entrando na jogada surgem os xMOOCs que,
diferentemente dos anteriores, são essencialmente vinculados à determinas instituições de
ensino e ao modelo acadêmico. Nos xMOOCs surge pela primeira vez o conceito de
certificação e começa-se a discutira a viabilidade econômica do modelo. O primeiro xMOOC
foi promovido pela universidade de Stanford em 2011 tratando de inteligência artificial. foram
mais de 160,000 estudantes de todas as partes do mundo. Logo depois de sua finalização
Sebastian Thrun, um dos organizadores do curso, iniciou o Udacity, uma plataforma focada
em ciência e tecnologia. Na mesma época surge o Coursera sediado na mesma Stanford e, em
seguida, o EdX como uma organização sem fins lucrativos criada através de uma parceria
entre Harvard e MIT. Mas isso foi só o início.
Esses MOOCs normalmente se adaptam ao currículo escolar tradicional, materiais
didáticos, teorias de aprendizagem e métodos tradicionais da educação superior. Por exemplo,
eles normalmente são organizados através de palestras e questionários e também pouco do
conteúdo do curso está pulverizado na web, ao contrário do que acontece com os cMOOCs.
Por conta disso que Stephen Downes cunhou ambos os termos diferenciando os dois
conceitos, não é uma questão de valor mas sim de atender a diferentes necessidades dos
estudantes. Ambos os modelos seguem os mesmos princípios: São abertos, gratuitos,
colaborativos e distribuídos. Além disso incentivam a formação de grupos, remixagem e
retroalimentação de conteúdo.
Se 2012 foi o ano dos MOOCs de acordo com o New York Times, 2013 foi a
consolidação de um império que só tende a crescer. Dentre os principais participantes deste
jogo podemos citar os seguintes:
O modelo cresceu rapidamente a partir de 2008 devido ao seu uso criativo e baixo
custo para as instituições patrocinadoras, oferecendo um alcance nunca antes imaginado para
a educação superior. Em setembro de 2011 a Universidade de Stanford iniciou o programa
Engineering Everywhere, uma seleção de cursos na área de engenharia, resultando em um
enorme sucesso e abrindo caminho para outras iniciativas. No mesmo ano o MIT lança a
plataforma MITx que mais tarde viria a ser incorporada ao edX. Coursera, atualmente o mais
robusto dos xMOOCs, foi criado em 2012 por Daphne Koller e Andrew Ng como uma
organização com fins lucrativos independente oferecendo cursos provenientes de várias
• Coursera: Uma companhia de empreendimento social fundada pelo professor de ciência da
computação Andrew Ng e Daphne Koller da Universidade de Stanford. Na minha opinião o mais
simples e melhor dos sistemas. É também o que oferece o maior número de cursos.
• Edx: Um empreendimento sem fins lucrativos entre o MIT e a Universidade de Harvard. Como o
Coursera possui uma gama enorme de cursos e seu grande diferencial são os recursos avançados do
sistema.
• NovoEd: Releitura do Stanford Venture Lab com foco especial na colaboração entre estudantes e
projetos práticos no mundo real.
• Udacity: Surgido a partir da experiência de Sebastian Thrun e Peter Norvig com seu curso
“Introdução à Inteligência Artificial” um marco na história dos MOOCs por reunir 160.000
estudantes de mais de 190 países.
• FutureLearn: A primeira plataforma multi-institucional do Reino Unido. Funciona em parceria com
17 instituições. É uma companhia privada de propriedade da Open University.
• Veduca: O primeiro MOOC da América Latina com sede no Brasil lançado em 2012. Desde julho
deste ano oferece certificação por parte de diversas universidades nacionais e internacionais.
• OpenLearning: Um ótimo exemplo de cMOOC descentralizado onde você mesmo pode oferecer
cursos e organizar comunidades em torno de um tópico.
• OpenUpEd: O primeiro MOOC Pan-Europeu com suporte da União Européia. Inclui parceiros de 11
países.
• Open2Study: Uma iniciativa da Open Universities Australia que é por si só um grande provedor de
educação online através da colaboração de várias universidades australianas
• Khan Academy: ONG fundada em 2006 por Salman Khan, é um dos primeiros sistemas gratuitos e
massivos de educação online, tendo oferecido mais de 200 milhões de video-aulas sem custo algum.
instituições de ensino. Outras iniciativas com fins lucrativos se seguiram, como Udacity
fundada por Sebastian Thurm e a Udemy, que trabalha não apenas com programas
institucionais mas também com professores autônomos e especialistas em diversas áreas.
Abaixo um gráfico disponibilizado pela UK Universities em seu relatório de 2012 sobre a
ascensão desse modelo de ensino que mostra a relação entre os diversos sistemas e seu
desenvolvimento na última década:
Figura 1: Linha do tempo e relações entre sistemas.
Ainda não está muito claro qual será o modelo de negócios adotado pelos diversos
projetos citados. Existem diferenças enormes de funcionamento entre eles e é impossível
apontar uma solução única de sustentabilidade financeira. Atualmente os xMOOCs estão
explorando uma enorme gama de possibilidades mas ainda não chegaram em um patamar
estável. Como costuma ocorrer com start-ups promissoras, o investimento inicial é
extremamente alto com certa carência a médio prazo para estabilização e, posteriormente,
quem sabe lucros. Segue uma relação de investimentos nos últimos anos calculada em
milhões de dólares para projetos AVA, OCW e xMOOC:
Figura 2: Relação de investimentos por ano em projetos MOOC
Dentre as estratégias assumidas pelas diversas organizações podemos elencar algumas
direcionadas aos usuários (front end), outras à empresas (back end) e também estratégias de
consultoria educacional. No front end se oferece certificação personalida e reconhecida, algo
ainda em fase de implementação, além disso já se começa a criar as chamadas “agências de
carreira” intermediando contratos entre estudante e empresas de acordo com seu
aproveitamento. Do lado de dentro (back end) existe a questão da pesquisa educacional,
geração de estatísticas de ensino e consultoria no projeto e implementação de tecnologias. Por
fim planeja-se também a tradicional inserção de anúncios publicitários, bem como
treinamento institucional interno e licenciamento de cursos personalizados.
A grande maioria daqueles inscritos em qualquer curso MOOC é formada por
bacharéis e mestres de diversas áreas (ver figura) oriundos da América do Norte, Europa e
Ásia. Apesar disso o Brasil aparece como o terceiro país com maior número de alunos
inscritos em plataformas MOOC no mundo. No que diz respeito ao background pessoal dos
participantes podem-se dividir em cinco grandes grupos. O primeiro engloba profissionais
buscando aprendizagem continuada em sua área de atuação, em seguida vem os educadores e
pesquisadores que buscam os MOOCs para renovar, remixar e compartilhar seu conhecimento
em determinado campo. Em terceiro lugar citamos os estudantes de educação superior, que
compõe a grande maioria dos inscritos, depois os tradicionais amadores engajados em uma
educação auto-direcionada. Por fim necessitamos listar os potenciais estudantes que usam os
MOOCs como ferramenta de avaliação de interesse em determinada área do conhecimento
para posterior ligação formal. Em todos os casos ainda são preocupantes os números de
evasões na maioria dos programas, um tópico largamente tratado em pesquisas recentes.
Figura 3 – Origens dos estudantes quanto a formação e nacionalidade
Existem muitas questões ainda a serem levantadas sobre os MOOCs e seu impacto na
educação tradicional. Se observamos outras áreas como a comunicação, indústria fonográfica,
editorial dentre outras, percebemos um padrão gradativo de mudanças que levam até uma
total transformação do nicho. Observando a rapidez com que os mecanismos de EAD tem se
modificado e adaptado às novas possibilidades tecnológicas não é improvável uma mudança
no cerne da escola. As tecnologias ainda estão em sua infância, mas com a maturação podem
custar menos e ter um papel significativo no dia a dia escolar. Como aconselha o relatório da
Universities UK:
Institutions will need to consider how online technologies and practices can
enhance the educational outcomes and experience for students across all of their
courses. The demands for effective online elements are increasingly driven by
the expectations of students. The example from the Departament of Media at
Coventry University shows how the pedagogical model of core undergraduate
courses can capitalise on the potential of online methods to improve learning
outcomes and the student experience. This approach was born out of the
experiences of dramatic change grought about by the shift to digital media, and
prepares students for the reality of their future careers by actively capitalising on
the networking opportunities of the new digital landscape. Indeed, many of these
lessons transfer to a range of academic and vocational fields, from the arts and
sciences through to journalism and academia. (2012, p. 28)
Ainda de acordo com o relatório, com a inflação internacional dos títulos acadêmicos
(esses elementos feudais que ainda persistem na formação moderna) associada a emergência e
facilitação das formações paralelas online, existe uma tendência a cada vez mais o currículo
não ser de determinação única de uma instituição ou estado, mas sim uma construção coletiva
e anárquica como todo o demais na ciência. Quando se usa o termo anárquico se indica uma
criação entre iguais através da livre associação. Através do reconhecimento desse tipo de
formação paradidática pode-se pensar em um currículo que represente melhor a trajetória de
vida de cada estudante, se não podemos mais pensar em uma formação definidora final e
devemos direcionar o ensino para o aprendizado durante toda a vida, quem sabe a
fragmentação curricular e sua ludificação possam ser o caminho mais interessante a ser
seguido.
6 Rumando para o currículo orgânico
Levando em consideração os elementos apresentados até aqui envolvendo as teorias do
conhecimento de Downes, os princípios do conectivismo propostos por Siemens e os dados
levantados na revisão de literatura, pode-se considerar que dentre as potencialidades desse
novo modelo uma das principais é propiciar o surgimento de uma nova maneira de encarrar o
currículo muito diferente da estrutura monolítica atual. Como nos coloca Adriana Rocha
Bruno (2010, p.13) “o desenvolvimento tecnológico fez com que se desenvolvessem outras
habilidades para aprendizagem, permitindo sair da linearidade para vislumbrar o caos da não
linearidade, que vem ao encontro da forma como pensamos, criamos e aprendemos”.
O grande poeta e pedagogo indiano Rabindrath Tagore já defendia uma mudança
curricular baseada na história pessoal e inclinações do aluno no início do século passado. Ele
predicava um aprendizado lúdico focado na individualização da personalidade infantil. Tagore
acreditada que o currículo deveria ser construído de maneira orgânica, biônica, e que a
natureza deveria ser parte dele. A agenda das aulas era flexível permitindo troca de turnos por
conta do clima e uma atenção especial aos fenômenos naturais.
Esse aprendizado auto-direcionado, nos lembra Farias (2013), é chamado Heutagonia e
confere a ampliação da autonomia do estudante. Ele se torna responsável pela aprendizagem
com o suporte de todo o aparato tecnológico disponível. No cenário atual, essa noção se dá
apenas pelo fato do aluno não estar presente na instituição, mas os mesmos prazos, as mesmas
atividades e a mesma imposição de currículo, método e objetos de aprendizagem engessados
são apresentados para que o aluno cumpra o cronograma ou ainda como afirmam os criadores
do termo:
Heutagogy is the study of self-determined learning and draws together some of
the ideas presented by these various approaches to learning. It is also an attempt
to challenge some ideas about teaching and learning that still prevail in teacher
centred learning and the need for [...] In this respect heutagogy looks to the
future in which knowing how to learn will be a fundamental skill given the pace
of innovation and the changing structure of communities and workplaces. (Hase,
Keyon, 2001)
Outro teórico a prever a necessidade de modificações curriculares com relação ao
projeto modernista foi o estadunidense Carl R. Rogers (1978). Ele considerava o ensino
apenas uma questão de facilitação, sendo que a aprendizagem é tão natural quanto a
respiração, um processo interno controlado pelo aprendiz. Em seu livro “Liberdade para
aprender” nos aconselhava a dar autonomia de escolha e formação do currículo aos
estudantes, criando assim “um clima psicológico adequado à aprendizagem autodirigida e
significativa” (ibid, p.197). Além disso predicava a criação de uma instrução programada por
meio de pequenos módulos de ensino paralelos ao currículo principal (o mais enxuto possível)
que seriam apropriados pelo estudante na medida que sentisse certa lacuna em sua formação
dando-lhe assim “o sentimento de que toda matéria é suscetível de aprendizagem e a
verificação de que o processo de educação é inteligível e compreensível”. Além disso
ressaltava com pioneirismo que “se a instrução programada for usada de maneira felxível, ela
pode constituir-se em um grande passo à frente para o atendimento das necessidades maciças
de aprendizagem funcional da matéria, tendo em vista que o número de alunos cresce
explosivamente” (ibid, p. 143)
Na prática, com o crescimento e rápido desenvolvimento desses sistemas aliado ao
reconhecimento de valor e certificação, existe uma forte tendência ao estabelecimento dos
mecanismos paradidáticos como uma parte extremamente importante da formação. Com isso,
de acordo com as previsões de Hase e Kaynon (2001) juntamente com os pesquisadores
citados previamente neste texto, o currículo passa a assumir um formato distribuído similiar
ao da rede que lhe dá nascimento. Não é possível pensar em conhecimento e aprendizado fora
de um contexto de rede. A quebra do monopólio educativo por parte da academia e seus
títulos e certificações é inevitável. O que não quer dizer o fim desta mas sim a coexistência
igualitária de meios, como ocorreu com o rádio, a televisão e a indústria fonográfica. Nesse
panorama pode-se prever, de acordo com Downes (2012), áreas cada vez menores e
interconectáveis propiciando um ensino mais democrático através do exercício da vontade
livre, além de muito mais completo por favorecer os diversos tipos de predisposições e
inteligências.
Considerações finais
Se no início fizemos questão de anunciar o paradoxo envolvido com a construção de
um artigo em sua formatação clássica, ou seja, fechada, linear e restrita a pobreza do casal
medieval “texto & imagens”, ao final da revisão teórica não seria direito calar-se. A academia
e suas filiais (escolas, cursos técnicos, prisões, hospitais e outras guildas de labor) tem
resistido em um sistema feudal e ainda busca manter seu conhecimento em jardins murados
por mais que se fale ao contrário. A ciência em seus redutos clássicos também através de
patentes que chegam a englobar a própria vida e bibliotecas digitais gigantescas restritas
apenas aqueles que tenham condições de pagar, contradizem de forma vergonhosa aqueles que
iniciaram o empreendimento do conhecimento universal. Nossa grande sorte é nem todas as
instituições permanecem assim paradas no medievo ou em suas próprias ganâncias
mercadológicas. Mesmo aquelas que decidem por agir desta forma apenas demonstram a
rigidez típica daquilo que está morrendo. Nos parece um grande alento ver ações como as
citadas aqui de universidades incrivelmente respeitadas que poderiam manter-se em uma
comodidade olímpica tomarem a frente da inovação. E isto é, diga-se de passagem, o que vai
continuar mantendo-as na vanguarda da educação.
Nosso país, que a duras penas conseguiu alcançar a universalização da educação (um
grande feito digno de nota), ao invés de seguir um caminho reflexivo e progressista decide,
por exemplo, submeter professores e pesquisadores à um sistema mal-acabado de
ranqueamento que somente premia o produtivismo técnico superficial. Ou ainda em uma
medida típica de um modernismo conformador ultrapassado tente buscar com o aumento da
carga horária nas escolas a solução para problemas educativos nacionais. De fato, tendo em
vista essa realidade, parece que nossa mentalidade continua indiscutivelmente colonizada e
atrasada.
As tecnologias aqui expostas podem ser de grande valia para mudar o cenário
educativo nacional. O incentivo por parte de professores e instituições para cursos de curta
duração utilizando tais plataformas e outras como TED, Youtube (que recentemente lançou
sua versão educativa), RSA, podcasts, videocasts etc. Pode acarretar uma revolução a médio
prazo. Nunca antes, nós brasileiros (e países em desenvolvimento no geral), tivemos acesso a
esse tipo de conteúdo de uma maneira tão simples e fácil. Outro fator é a geração de conteúdo,
qualquer disciplina no interior de um curso de graduação ou pós-graduação pode gerar
experiências dentro de um ambiente cMOOC, trata-se quase de uma obrigação. As vantagens
são muitas, incluindo a criação de um histórico do curso/disciplina ao longo dos semestres,
aprendizado descentralizado e incentivo a iniciativa pessoal.
No ponto de vista institucional as universidades que deveriam se basear sempre em três
pilares: ensino, pesquisa e extensão. Podem contemplar os três de uma vez só através do
sistema proposto. Em especial trata-se de uma forma de oferecer uma espécie de “extensão
universal” que serve para criar valor institucional, atuar socialmente na comunidade e,
inclusive, selecionar alunos promissores por meios não convencionais. Por fim, os conceitos
conectivistas e suas ferramentas podem acabar gerando uma nova forma de pensar
certificação. Não mais por meio de títulos mas, quem sabe, índices similares aos usados por
“gamers” levando em consideração não apenas os frios dados produtivos mas também fatores
de rede como conexões, avaliações comunitárias e conquistas humanas. Existe um longo
caminho pela frente, se não houverem politicas públicas sérias e inovadoras no Brasil que
possibilitem a equiparação entre instituição de ensino e realidade internacional, vamos entrar
para a história como mais uma geração que não soube ouvir as necessidades de sua época.
Referências
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cultura. São Paulo: Paz e Terra, 2007.
DOWNES, Stephen. Knowledge, Learning and Community. 2012. disponível em
http://www.downes.ca/post/57737 Acesso 16 de dez. 2012
FARIAS, Vinícius. AZEVEDO, Viviane. ANDRADE, Mário de. Entre as novas teorias e as
práticas atuais da EAD: Um panorama de possibilidades. FGV, Rio de janeiro. 2013.
ILLICH, Ivan. Sociedade sem escolas. Petrópolis: Vozes, 1985.
MATTA, C. E. FIGUEIREDO, A. P. S. MOOC: Transformação das práticas de aprendizagem.
ESUD – x Congresso Brasileiro de Ensino Superior a distância. UNIREDE, Belém. 2013.
ROGERS, Carl R. Liberdade para aprender. Belo Horizonte: Interlivros, 1978.
SACRISTÁN, José Gimeno. Saberes e incertezas sobre o currículo. Porto Alegre: Penso,
2013.
SIBILA, Paula. Redes ou paredes: A escola em tempos de dispersão. Rio de Janeiro:
Contraponto, 2012.
SIEMENS, George. Conectivism: A learning theory for the Digital Age. 2004. Disponível em
http://www.elearnspace.org/articles/connectivism.htm Acesso em 16 de dez. 2013.
SOUZA, M. V. Et al. Mídias sociais, AVAS e MOOCs: Reflexões sobre educação em rede.
ICBL2013 – International Conference on Interactive Computer aided Blended Learning.
UFSC, 2013. p. 183.
UNIVERSITIES UK. Massive open online courses: Higher education's digital moment?
http://www.universitiesuk.ac.uk/highereducation/Documents/2013/MassiveOpenOnlineCours
es.pdf Acessado em 16 de dez. 2013.